Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

69
Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico por Separação João Pedro Rodrigues Cardoso Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia Mecânica Júri Presidente: Prof. Rui Manuel dos Santos Oliveira Baptista Orientador: Prof. Pedro Alexandre Rodrigues Carvalho Rosa Co-orientador: Prof. José Carlos Martins Outeiro Vogal: Doutor Valentino Anok Melo Cristino Maio de 2012

Transcript of Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

Page 1: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

Comportamento Mecânico de Materiais em Processos

de Fabrico por Separação

João Pedro Rodrigues Cardoso

Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em

Engenharia Mecânica

Júri

Presidente: Prof. Rui Manuel dos Santos Oliveira Baptista Orientador: Prof. Pedro Alexandre Rodrigues Carvalho Rosa Co-orientador: Prof. José Carlos Martins Outeiro Vogal: Doutor Valentino Anok Melo Cristino

Maio de 2012

Page 2: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...
Page 3: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

i

Agradecimentos

Agradeço a todos aqueles que contribuíram e tornaram possível a realização desta

tese de mestrado, especialmente:

Aos meus orientadores, Professor Pedro Alexandre Rodrigues Rosa e Prof. José

Carlos Martins Outeiro pelo seu incansável empenho, pela sua constante dedicação e pela

inigualável motivação que me transmitiu ao longo do meu percurso académico.

Ao mestre Carlos Manuel Alves da Silva por toda a preciosa ajuda, valiosos

ensinamentos e incansável acompanhamento durante a realização desta tese. A sua amizade,

motivação e dedicação foram essenciais na realização deste trabalho.

Ao doutor Valentino Anok e aos mestres Ivo Bragança e Gabriel Ribeiro por todo o

apoio e auxílio que me prestaram, e pela amizade com que me acompanharam durante este

período. O seu contributo foi bastante importante para o desenvolvimento deste trabalho.

A todo o pessoal técnico que sempre se mostrou disponível para me acompanhar e

ajudar durante a utilização dos diversos equipamentos existentes na secção de tecnologia

mecânica do Instituto Superior Técnico.

A todos os meus amigos que me têm acompanhado ao longo do meu percurso

académico, e que com todo o companheirismo, espirito de entreajuda e compreensão que se

estabeleceu entre nós me permitiu alcançar os meus objectivos.

Em especial quero agradecer aos meus pais por todo o seu amor, pela educação e

valores que me têm transmitido ao longo da minha vida, pelo apoio incondicional que sempre

me deram e por tudo o que representam para mim.

Page 4: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

ii

Resumo

Do ponto de vista dos processos de fabrico que têm por base a deformação plástica do

material, a curva tensão-extensão em função da velocidade de deformação é um dos

parâmetros mais importantes a ser determinado para se conseguir uma reprodução mais

realista do processo de fabrico. Mas numa breve revisão bibliográfica verifica-se que existem

algumas discrepâncias entre as estimativas da simulação teórica dos processos de fabrico e os

valores obtidos na realidade. Este trabalho pretende identificar algumas destas discrepâncias,

e fornecer explicações por detrás destas ambiguidades.

Na presente tese são apresentadas as evoluções da tensão de escoamento da liga de

alumínio AA1050, em função da velocidade de deformação e da extensão, considerando a

evolução da extensão com a velocidade de deformação características inerentes dos

processos de fabrico. O estudo é realizado com base em processo de fabrico tradicionais tais

como o corte por arrombamento e o corte por arranque de apara.

Os ensaios foram realizados numa máquina de ensaios inovadora que realiza testes de

compressão a elevadas velocidades de deformação. Esta máquina de ensaios baseia-se numa

came electromagnética, que oferece por um lado os requisitos energéticos suficientes para a

realização deste tipo de caracterização mecânica do material e por outro é capaz de fornecer a

evolução da velocidade de deformação com a extensão típica característica dos diferentes

processos de fabrico.

O presente estudo aborda igualmente a componente de separação de material

intrínseca aos processos de corte por arranque de apara e corte por arrombamento através da

mecânica da fractura dúctil. Os principais parâmetros avaliados com este tipo de ensaios foram

a força máxima e a tensão normal, pela sua significativa importância nos processos de fabrico

apresentados anteriormente. Os parâmetros de entrada estudados (tensão de escoamento e

tenacidade à fractura) foram utilizados para a simulação analítica e numérica (software I-

FORM) do mecanismo de separação intrínseco aos processos de corte por arrombamento e

arranque de apara.

Palavras-chave

Comportamento mecânico dos materiais

Tensão de escoamento

Tenacidade à fractura

Corte por arrombamento

Corte ortogonal

Page 5: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

iii

Abstract

In metal forming processes, the identification of material flow curve at the appropriate

rates of loading is one of the most important parameter for achieving a more realistic modelling

of the manufacturing process. However, a brief bibliographical review shows that there are

certain disagreements. As the following, the present works presents an experimental study to

identify and explain some of these discrepancies.

The evolution of the flow stress of the aluminium alloy AA 1050 is presented at different

strain and strain rate, taking into account the typical velocity evolution of different manufacturing

processes, such as blanking and metal cutting. The experiments were conducted in an

innovative cam-driven electromagnetic test machine at high strain rates, which allows to

reproduces the typical velocity evolution for several manufacturing processes.

The present study also focused on separation processes such as blanking and metal

cutting, from the view of ductile fracture mechanics, where the key parameters, such as, the

maximum load and normal stress were evaluated. Input parameters such as the flow stress and

the fracture toughness, were utilized in a finite element analysis software (I-FORM) for

modelling the separation mechanism, which marks the blanking and metal cutting processes.

Key words

Mechanical behavior of the materials

Flow stress

Fracture toughness

Blanking

Orthogonal metal cutting

Page 6: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

iv

Índice

Agradecimentos……………………………………………………………………………………… i

Resumo………………………………………………………………………………………………... ii

Abstract………………………………………………………………………………………………... iii

Lista de Figuras………………………………………………………………………………………. v

Lista de Tabelas……………………………………………………………………………………… viii

Abreviaturas…………………………………………………………………………………………... ix

Nomenclatura…………………………………………………………………………………………. x

1 INTRODUÇÃO……………………………………………………………………………….. 1

2 ESTADO DA ARTE………………………………………………………………………….. 3

2.1 Processos de Fabrico …………………………………………………………... 3

2.1.1 Processos de deformação em massa………………………………….......... 5

2.1.2 Corte por arranque de apara…………………………………………………… 6

2.1.3 Corte por arrombamento………………………………………………………... 9

2.2 Caracterização Mecânica dos Materiais…………………………….………………. 11

2.3 Equipamentos de Ensaio……………………………………………………………… 12

2.4 Tensão de Escoamento……………………………………………………………….. 17

2.5 Tenacidade à Fractura………………………………………………………………… 20

2.6 Nova abordagem aos ensaios mecânicos………………………………………….. 22

3 DESENVOLVIMENTO EXPERIMENTAL…………………………………………………. 25

3.1 Máquina de ensaios por came electromagnética…………………………………... 25

3.1.1 Componentes estruturais……………………………………………………….. 25

3.1.2 Componentes mecânicos……………………………………………………….. 26

3.1.3 Componentes eléctricos e electromagnéticos………………………………... 29

3.2 Prensa de impulsão electromagnética ……………………………………………… 32

3.2.1 Prensa de impulsão electromagnética………………………………………… 32

3.2.2 Ferramenta de ensaios de fractura…………………………………………….. 33

3.3 Material………………………………………………………………………………….. 34

3.4 Plano de Ensaios………………………………………………………………………. 35

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO……………………………………………………………. 37

4.1 Ensaios de compressão a alta velocidade………………………………………….. 37

4.2 Ensaios de Fractura…………………………………………………………………… 43

5 CONCLUSÕES E TRABALHO FUTURO ………………………………………………… 49

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS………………………………………………………. 51

7 ANEXOS…………………………………………………………………………………… 53

Page 7: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

v

Lista de Figuras

Figura 2.1: Mecanismo de deformação nos processos de deformação em massa a) forjamento

em matriz aberta; b) extrusão. ...................................................................................................... 5

Figura 2.2: a)Mecanismos de deformação no corte ortogonal: b) Hodógrafo representativo do

corte ortogonal............................................................................................................................... 7

Figura 2.3: Mecanismo de deformação no corte ortogonal a) Representação esquemática do

mecanismo de deformação ao longo de dois caminhos diferentes de escoamento E1 e E2 em

condições de deformação plana, .................................................................................................. 8

Figura 2.4: representação esquemática dos perfis de deformação correspondentes ao corte por

arrombamento ............................................................................................................................... 9

Figura 2.5: Estado de tensão do processo de corte ortogonal ................................................... 10

Figura 2.6: Estado de tensão no corte por arrombamento e corte fino; a) plano físico e b) plano

de Mohr. ...................................................................................................................................... 11

Figura 2.7: Extensões, velocidades de deformação e temperaturas homólogas típicas de alguns

processos de fabrico (Guo, 2003). .............................................................................................. 12

Figura 2.8: Representação esquemática das características das prensas mecânicas e martelos

utilizados nos processos de fabrico; a) curvas de velocidade relativa ( ) versus

deslocamento relativo ( ) com identificação da região de deformação; b) Perfil de

velocidade de deformação ( / ) versus extensão durante o processamento do material .. 14

Figura 2.9- Esquema do aparato da barra de Hopkinson (SHPB) e visualização das ondas de

pressão durante os testes (Jaspers, 2002). ................................................................................ 16

Figura 2.10: Formato dos provetes utilizados nos principais ensaios para obtenção da tensão

de escoamento dos materiais a) compressão, b) Tracção. ........................................................ 19

Figura 2.11: Geometria dos provetes utilizados nos ensaios de fractura ( ;

; , ). ............................................................................................... 21

Figura 2.12: Comportamento mecânico dos materiais em condições de similaridade com alguns

processos de fabrico a) perfis de velocidade de deformação versus extensão, b) Possíveis

evoluções de tensão-extensão para os diferentes perfis definidos em a). ................................. 23

Figura 2.13: Possíveis evoluções da a) tensão normal com a espessura de corte e b) energia

por unidade de área com a espessura de corte, para várias velocidades de actuação em

ensaios de fractura ...................................................................................................................... 24

Figura 3.1: Máquina de ensaios por came electromagnética. a) Esquema da máquina de

ensaios por came electromagnética com unidade de aquisição e monitorização de dados. b)

Fotografia da máquina de ensaios por came electromagnética ................................................. 25

Figura 3.2: a) Desenho esquemático da came de translação, do seguidor, dos pratos de

compressão, da célula de carda e do sensor de deslocamento. b) Fotografia da totalidade do

sistema de compressão por came. ............................................................................................. 26

Page 8: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

vi

Figura 3.3: a) representação esquemática do perfil da came logística e seguidor, b) fotografia

da came logística, c) perfil da came e angulo de pressão, d) Velocidade da came(

na região de trabalho do seguidor). ............................................................................................ 28

Figura 3.4: a) Velocidade e aceleração do seguidor na região de trabalho da came logística. b)

Valor de pulso (Jerk) na região de trabalho da came logística. .................................................. 28

Figura 3.5: a) Fotografia da came quadrática, b) perfil da came e ângulo de pressão, c)

velocidade e aceleração do seguidor na região de trabalho da máquina de ensaios por came

electromagnética equipada com a came quadrática. ................................................................. 29

Figura 3.6: a) Esquema tridimensional do desenho de conjunto do actuador linear simultâneo

de relutância magnética e b) Fotografia do actuador linear simultâneo de relutância magnética

c) Representação da interacção das linhas de campo magnético com o núcleo de ferro. ........ 31

Figura 3.7: Representação esquemática do circuito de potência do actuador linear de relutância

magnética .................................................................................................................................... 31

Figura 3.8: a) Esquema das ligações da ferramenta à unidade de aquisição e monitorização de

dados e b) Fotografia da máquina de impulsão electromagnética com a ferramenta de ensaios.

..................................................................................................................................................... 32

Figura 3.9: a) Representação esquemática do ensaio de fractura com aplicação de força

normal, b) e c) Fotografia da ferramenta utilizada nos ensaios de fractura. .............................. 33

Figura 3.14: Provetes utilizados nos ensaios de compressão a alta velocidade a) sistema de

filtragem para fundição, b) fotografia do torneamento dos provetes c) fotografia do provete final

..................................................................................................................................................... 34

Figura 3.15: Provetes utilizados nos ensaios de fractura. a) Dimensões do provete em mm, b)

fotografia do provete ................................................................................................................... 34

Figura 4.1: Evolução experimental da evolução da força-deslocamento para diferentes

condições de ensaio, casos 3 e 8 ............................................................................................... 38

Figura 4.2: a) Evolução da força com o deslocamento antes e depois da aplicação do filtro de

frequências. b) Diagrama de blocos do programa desenvolvido em Labview para cálculo das

transformadas de Fourier, funções transferência e filtragem de dados...................................... 39

Figura 4.3: Curvas da tensão de escoamento do alumínio obtidas com a came quadrática; a)

Perfis de deformação para as diferentes velocidades de ensaio da Tabela 3.1; b) Gráfico

tridimensional da superfície da tensão de escoamento. ............................................................. 40

Figura 4.4: Curvas da tensão de escoamento do alumínio obtidas com a came logística; a)

Perfis de deformação para as diferentes velocidades de ensaio da Tabela 3.1; b) Gráfico

tridimensional da superfície da tensão de escoamento e dados experimentais. ....................... 41

Figura 4.5: Curvas de tensão - extensão das cames logística e quadrática para diferentes

valores de velocidade de deformação ........................................................................................ 42

Figura 4.6: a) Representação esquemática da simulação do ensaio de corte por arrombamento

e b) respectivo gráfico da evolução da velocidade de deformação com a extensão. ................ 43

Page 9: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

vii

Figura 4.7: Evolução experimental da força com o deslocamento para os ensaios de fractura

realizados com diferentes espessuras de ligamento em condições a) quasi-estáticas e b) com

velocidade de actuação m/s .............................................................................................. 44

Figura 4.8: a) Procedimento de determinação da tenacidade à fractura R, para diferentes

velocidades de ensaio , sem tensão normal aplicada. b) Evolução da tenacidade à fractura

com a variação da tensão normal aplicada, para as diferentes velocidades de ensaio. ............ 45

Figura 4.9: Discretização por elementos finitos no instante inicial e final da simulação numérica

do ensaio de fractura com o programa I-FORM ......................................................................... 46

Figura 4.10: Evolução da energia por unidade de volume U com a espessura do ligamento e

com a velocidade do ensaio ..................................................................................................... 46

Figura 4.11: Gráfico de comparação entre os valores experimentais, teóricos e resultantes da

simulação numérica das forças máximas de corte em função da espessura do ligamento para

uma velocidade de actuação a) quasi-estática e b) 3m/s. .......................................................... 48

Figura 4.12: Valores experimentais e calculados analiticamente das forças máximas de corte

em função da espessura do ligamento para o ensaio de fractura a uma velocidade de actuação

a) quasi-estática e b) 3 m/s ......................................................................................................... 48

Figura 3.10 Etapas de restauro exterior do limador, a) estado inicial, b) e c) processo de

decapagem e pintura, d) limador restaurado .............................................................................. 53

Figura 3.11: a) Projecto do suporte de transporte do limador, b) fotografia da posição de

transporte, c) simulação do percurso e metodologia de transporte da máquina ........................ 54

Figura 3.12: Etapas de fabrico da célula de carga, a)maquinagem na fresadora CNC,

b)maquinagem por electroerosão, c) célula de carga terminada com base de suporte. ............ 55

Figura 3.13: Fotografias representativas da evolução do laboratório de ensaios dinâmicos

(LED). a) e b) local do laboratório antes da remodelação. c) laboratório montado e operacional.

..................................................................................................................................................... 55

Page 10: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

viii

Lista de Tabelas

Tabela 3.1: Plano de ensaios da caracterização das curvas de escoamento do alumínio

AA1050 ........................................................................................................................................ 35

Tabela 3.2: Tabela representativa dos ensaios de fractura do alumínio AA1050 para o caso em

que a tensão normal é 0. ............................................................................................................. 36

Tabela 4.1: Tabela com as constantes determinadas para modelo hibrido ............................... 41

Page 11: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

ix

Abreviaturas

IST – Instituto Superior Técnico

SHPB – Split Hopkinson Pressure Bar

DEM - Departamento de Engenharia Mecânica

AA – Aluminium Association

ISO - International Organization of Standardization

NI - National Instruments

UTL - Universidade Técnica de Lisboa (Technical University of Lisbon)

Page 12: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

x

Nomenclatura

Símbolos Definição

ɛ Extensão

Velocidade de deformação

h Altura da peça

h0 Altura inicial da peça

v Velocidade de compressão da peça

V Volume de material

α Ângulo de ataque

D0 Diâmetro de entrada na matriz

D1 Diâmetro de saída na matriz

Taxa volúmica

v0 Velocidade de compressão inicial

Rc Grau de encalque

φ Ângulo do plano de corte

Vc Velocidade de corte da ferramenta

Ve Velocidade de saída da apara

VAB Velocidade do plano de corte

Distorção no plano de corte

Velocidade de distorção no plano de corte

Tempo decorrido para o metal percorrer uma distância ao longo do

plano de corte

Distância ao longo do plano de corte

Espessura da zona de corte

j Folga entre o punção e a matriz

d Penetração do punção

Ep Energia disponível

m Massa do carro de impacto

Ec Energia cinética

Page 13: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

xi

σs Tensão no provete

E Módulo de elasticidade

A0 Secção da barra transmissora

A Secção do provete

Extensão na barra transmissora ao longo do tempo

Extensão da barra incidente ao longo do tempo

L Comprimento do provete antes do impacto

Velocidade da onda na barra incidente

Densidade da barra

Tensão verdadeira

Força de compressão

Área do provete em cada instante

hi Altura do provete em cada instante

WExp. Energia total

Wplast. Energia de deformação plástica

WFract. Energia necessária para a formação de novas superfícies

R Tenacidade à fractura

c Espessura do ligamento

U Energia por unidade de volume

Ventalhe Volume do entalhe

Fmáx. Força máxima de corte

Fplást. Força necessária para a deformaçção plástica

Ffract. Força necessária para a formação de novas superfícies

Fatrito

Força necessária para se vencer o atrito entre o material e a

ferramenta

Page 14: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

1

1 INTRODUÇÃO

O comportamento mecânico do material é o parâmetro de entrada de maior importância na

modelação teórica dos processos de fabrico por deformação plástica, tanto para aplicações

industriais no dimensionamento de ferramentas ou na escolha das máquinas-ferramenta, como

também em estudos académicos orientados para a compreensão do mecanismo através do qual

ocorre o processamento da matéria-prima em bens de consumo. Outros parâmetros de entrada, tais

como a tribologia ou a indutância magnética, podem ser considerados para permitir modelar o estado

de tensão e extensão na fronteira entre o material e a ferramenta. Os ensaios e os métodos

experimentais utilizados para a quantificação destes parâmetros de entrada estão facilmente

disponíveis na literatura da especialidade (Kalpakjian,1997)

Apesar do aparente sucesso que os ensaios mecânicos têm demonstrado ter na

quantificação dos parâmetros de entrada dos processos de fabrico por deformação plástica, parecem

existir alguns processos onde o seu sucesso não é consensual. Vários autores têm verificado

algumas incongruências entre as estimativas da simulação teórica dos processos de fabrico e os

valores obtidos na realidade, (Tekkaya, 2009; Atkins, 2000), indiciando questões por resolver ao nível

da quantificação dos parâmetros de entrada.

Mesmo que se encontrem disponíveis equipamentos para ensaios a médias e elevadas

velocidades de deformação, as características técnicas das ferramentas da máquina e dos

mecanismos de deformação do processo são muitas vezes ignorados.

A importância do histórico de velocidade de deformação-extensão, além de ser de interesse

para avaliar a resposta da tensão do material (Silva, Rosa e Martins, 2010) também é relevante para

determinar texturas cristalográficas e avaliar simulações numéricas no corte ortogonal (Guo 2011).

Como resultado, a caracterização mecânica de materiais para aplicações de deformação

plástica exige um profundo conhecimento sobre as máquinas e os mecanismos de deformação dos

processos antes da selecção do equipamento de ensaio mais adequado às condições de operação

(Field, 2004).

Para se estudar a fiabilidade e aplicabilidade destas novas técnicas de caracterização dos

materiais, o presente trabalho apresenta as curvas da tensão de escoamento para o alumínio

AA1050, resultantes da análise dos resultados experimentais obtidos com uma máquina de ensaios

inovadora por came electromagnética, onde se conseguiu sincronizar o sinergismo entre os ensaios e

as condições reais do processo. Os históricos de velocidade de deformação-extensão que foram

replicados com o auxílio deste aparato experimental correspondem aos processos de corte por

arrombamento e de corte ortogonal, largamente utilizados na indústria de todo o mundo.

Apresenta-se de seguida uma maneira pouco usual de classificarem os processos de fabrico

que envolvem deformação plástica, pela necessidade de se efectuar uma melhor interacção entre a

teoria da plasticidade aplicada aos processos de fabrico e a mecânica da fractura dúctil. Esta

classificação está dividida em dois grupos distintos, os processos em que a fissuração é indesejável e

aqueles em que é parte integrante do processo. O primeiro grupo inclui a generalidade dos processos

convencionais de deformação plástica tais como, o forjamento, a estampagem, a extrusão e a

Page 15: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

2

laminagem, enquanto o segundo grupo é fundamentalmente constituído pelos processos de fabrico

que envolvem separação de material como por exemplo, o corte por arrombamento e o corte por

arranque de apara.

A aceitação de um mecanismo de formação de novas superfícies (nos processos de fabrico

que envolvem separação do material) exclusivamente baseado na teoria da plasticidade pareceria à

primeira vista a opção mais segura tendo em conta o elevado numero de trabalhos científicos

realizados neste domínio, assim como, os autores de renome que o apoiam. No entanto, será de

estranhar um conjunto de relatos ao longo da história da investigação neste domínio, os quais

referem principalmente problemas na utilização preditiva dos modelos teóricos do processo de corte

ortogonal com a utilização unicamente da tensão de escoamento e do factor de atrito.

A utilização das metodologias apresentadas para obtenção da tensão de escoamento têm

mostrado resultados distintos, onde por vezes a lei do comportamento do material obtida

experimentalmente não permite reproduzir os valores das forças de corte, ou, os valores estimados

numericamente para a tensão de escoamento são fisicamente inaceitáveis para determinado tipo de

material.

Deste modo apresenta-se um também um trabalho focado na importância da mecânica da

fractura dúctil em processos de fabrico de deformação plástica com fissuração intrinsecamente

associada, como é o caso do corte por arrombamento e o corte por arranque de apara. Os principais

parâmetros avaliados com este tipo de ensaios foram a força máxima e a tensão normal, pela sua

significativa importância nestes processos de fabrico.

O trabalho experimental associado a esta investigação foi realizado com a liga de alumínio

AA1050, onde se efectuaram ensaios de caracterização da tenacidade à fractura com o auxílio de

uma prensa de impulsão electromagnética equipada com uma ferramenta especial para este tipo de

ensaios. O trabalho teórico envolveu a modelação analítica e numérica (software I-FORM) dos

ensaios de fractura.

Page 16: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

3

2 ESTADO DA ARTE

Este capítulo apresenta uma breve revisão do estado da arte em termos de ensaios de

caracterização mecânica, procurando identificar lacunas ao nível das metodologias e procedimentos

experimentais dos ensaios mecânicos que contribuam para o afastamento entre a modelação teórica

do parâmetro de entra e o seu comportamento real em condições simulares aquelas que ocorrem

durante o processo de fabrico. Começa por apresentar uma breve revisão das principais

características dos processos de fabrico em termos de modos de deformação e valores típicos ao

nível da tensão, extensão e velocidade de deformação, para permitir verificar a compatibilidade com o

escoamento plástico dos processos de fabrico reais.

2.1 Processos de Fabrico

Os processos de fabrico podem ser classificados quanto ao fenómeno predominante através

do qual o material é processado (acção mecânica, térmica ou química) e quanto ao mecanismo de

alteração de forma (replicação, adição ou separação). Os processos de acção mecânica

caracterizam-se pelo processamento da matéria-prima no estado sólido através da aplicação de

pressão por intermédio de ferramentas rígidas (cunhos e cortantes) ou flexíveis (fluídos pressurizados

ou campos electromagnéticos) e são tradicionalmente utilizados para a alteração de forma por

replicação da geometria do molde ou para separação do excesso de material de um bruto de

maquinagem.

A classificação dos processos de acção mecânica não é única podendo-se, alternativamente

efectuar a sua classificação em função de outros aspectos tais como o formato ou a temperatura da

matéria-prima no início do processo, a velocidade com que se desenvolve o processo, o modo de

deformação, etc.

Os processos de acção mecânica são muitas vezes classificados em dois grupos distintos; os

processos de deformação plástica de chapa e os processos de deformação plástica na massa, em

função da relação entre a área e o volume dos componentes fabricados. Podem ser classificados

quanto à temperatura em três grupos distintos; os processos de deformação plástica a quente, a

morno e a frio, sendo a temperatura de transição definida em função da temperatura de

recristalização do material. No caso, por exemplo, dos processos de deformação plástica a quente a

deformação do material ocorre sob condições de temperatura e velocidade de deformação tais que os

fenómenos de recristalização têm lugar em simultâneo com a deformação plástica. Este facto permite

reduzir consideravelmente a tensão de escoamento do material e, em algumas situações, permite

eliminar a necessidade de tratamentos térmicos. Os processos de deformação plástica a frio são

efectuados a temperaturas inferiores à temperatura de recristalização do material e, portanto, são

susceptíveis ao encruamento e à correspondente diminuição de ductilidade que promove o

aparecimento de fissuras.

O aumento da velocidade de deformação aplicada aos materiais origina uma transição do seu

comportamento dúctil para frágil, havendo assim um grande interesse na quantificação do

Page 17: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

4

comportamento dos diversos materiais quando sujeitos aos diferentes mecanismos de deformação de

cada processo de fabrico. De facto, há um grande número de fenómenos físicos e diferentes

mecanismos que interagem entre si e que governam o comportamento mecânico dos materiais a

diferentes velocidades de deformação.

A deformação plástica que ocorre durante a acção mecânica também pode ser um critério de

classificação na medida do seu valor ser capaz de promover a formação e propagação de fissuras.

Deste modo podem ser classificados em dois grupos distintos; os processos em que a fissuração é

indesejável e aqueles em que é parte integrante do processo. O primeiro grupo inclui a generalidade

dos processos convencionais de deformação plástica tais como, o forjamento, a estampagem, a

extrusão e a laminagem, enquanto o segundo grupo é fundamentalmente constituído pelos processos

de fabrico que envolvem separação de material, como por exemplo o corte por arrombamento ou o

corte por arranque de apara.

Para escolher um ensaio de caracterização mecânica e a respectiva metodologia

experimental é condição fundamental e necessário o conhecimento das condições de escoamento

plástico a que o material está sujeito durante a deformação plástica e as contribuições de outros

fenómenos físicos intrínsecos ao processo de fabrico. Torna-se portanto fundamental conhecer o

mecanismo por detrás do processo de fabrico e em que condições vai ser realizado, o que em geral

inviabiliza a selecção de muitos dos ensaios de caracterização mecânica normalizados por se

afastarem da realidade prática dos processos de fabrico.

A generalidade dos bens de consumo são produzidos através de tecnologias de produção em

massa tais como o forjamento, a estampagem e o corte por arrombamento, por estes processos

apresentarem elevadas taxas de produção aliadas a um custo unitário de produção muito reduzido.

Quando se tratam de bens de consumo em lotes de fabrico reduzidos são geralmente escolhidos os

processos de corte por arranque de apara por permitirem conciliar uma elevada precisão e

flexibilidade para a produção da generalidade dos bens de consumo. Por estas razões serão estes os

processos de fabrico que iremos utilizar para procurar compreender quais as diferenças que possam

necessitar de ensaios de caracterização mecânica específicos.

2.1.1 Processos de deformação em massa

O forjamento em matriz aberta tratasse de um processo axial de deformação plástica, o qual

consiste na compressão da extremidade da peça de modo a obter nessa zona uma geometria com

maior secção transversal, o que origina intervalos consideráveis de extensão e velocidades de

deformação ( ). O forjamento de uma peça com uma altura inicial de sob condições

de deformação homogénea estará sujeita a uma velocidade de deformação definida pela equação

2.1.

(2.1)

Page 18: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

5

em que corresponde à velocidade de compressão da peça e à altura inicial. Por outro lado a

extensão é dada pela equação 2.2.

[

] (2.2)

Através da combinação das duas equações anteriores é possível obter a equação que

relaciona a velocidade de deformação com a extensão no processo de forjamento:

(2.3)

Uma vez que a velocidade de compressão se mantem aproximadamente constante

nas máquinas-ferramenta características de forjamento (martelos de queda e prensas

hidráulicas), verifica-se uma evolução exponencial da velocidade de deformação com a extensão, a

qual define o mecanismo de deformação do processo de forjamento em matriz aberta.

L

Li

a) b) Figura 2.1: Mecanismo de deformação nos processos de deformação em massa a) forjamento em matriz aberta;

b) extrusão.

O processo de extrusão trata-se de um processos de deformação plástica em massa, no qual

o material é colocado no interior de um contentor e devido à acção de um punção, forçado a passar

através do orifício da matriz que define o perfil da peça final, originando níveis altos de extensão e

velocidade de deformação ( ). A Figura 2.1 destaca a geometria da matéria-prima no

interior da matriz de extrusão, onde o correspondente volume de material é dado pela equação:

(2.4)

Matriz

Punção Matriz Superior

Matriz Inferior

Peça Forjada

Page 19: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

6

Como a taxa volúmica , que atravaessa a secçao de entrada da matriz por unidade de

tempo é igual a

(2.5)

Pode-se concluir que o tempo necessário para efectuar o preenchimento do elemento de

volume definido será dado por:

(2.6)

Permitindo assim o cálculo da velocidade de deformação média

(2.7)

Uma vez que se trata de um processo estacionário , a equação representa a

evolução da velocidade de deformação de um volume de material ao longo do contentor de extrusão,

definindo assim o mecanismo de deformação característico do processo de extrusão.

2.1.2 Corte por arranque de apara

O processo de corte por arranque de apara trata-se de um processo de separação

influenciado por alterações no comportamento mecânico do material, promovidas pela elevada

extensão efectiva e pela variação da velocidade de deformação (até ) ocorrida no plano de

corte. Estes aspectos têm particular importância na modelação do mecanismo de formação de apara

uma vez que na generalidade dos processos de fabrico a tensão de escoamento do material é um

dos principais parâmetros de entrada dos modelos teóricos.

Uma característica geométrica bastante importante do corte ortogonal é o ângulo do plano de

corte , o qual pode ser obtido por medição directa a partir de uma micrografia do processo. Embora

seja um ângulo extremamente difícil de prever experimentalmente, pode ser determinado de forma

analítica com base na razão de compressão da apara, geralmente denominada de grau de encalque,

, o qual representa o racio entre a espessura da apara t e da espessura de corte t0. A relação entre

o grau de encalque e o ângulo do plano de corte, é obtida com o auxílio da Figura 2.2

(2.8)

Page 20: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

7

Com esta equação é possível determinar analiticamente o ângulo do plano de corte, ,

através da aferição experimental da espessura da apara , tendo claro conhecimento dos parâmetros

controláveis, o ângulo de ataque e a espessura de corte :

[

] (2.9)

a) b)

Figura 2.2: a)Mecanismos de deformação no corte ortogonal: b) Hodógrafo representativo do

corte ortogonal

Existem três velocidades de interesse no processo de corte ortogonal Figura 2.2 (i) a

velocidade de corte , que é a velocidade da ferramenta relativa á peça de trabalho e que actua

paralelamente à força de corte, (ii) a velocidade da apara, , ou velocidade de saída,a qual é a

velocidade relativa da apara com a ferramenta e tem a direcção da face de ataque da ferramenta e

(iii) a velocidade do plano de corte , que é a velocidade relativa da apara com peça de trabalho e

com a direcçao do plano de corte. A velocidade da apara, , é facilmente obtida através da condição

de incompressibilidade:

(2.10)

Em conformidade com os princípios da cinemática, estes três vectores de velocidade devem

formar um diagrama de velocidade fechado como apresentado no hodógrafo da Figura 2.2. A soma

dos vectores da velocidade de corte , e da velocidade de saída da apara é igual ao vector de

velocidade no plano de corte. A velocidade no plano de corte , é dada por:

(2.11)

Page 21: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

8

Os valores de distorção no plano de corte, , definida na Figura 2.2 sao dados por :

(2.12)

e a velocidade de distorção esperada no plano de corte é dada por:

(

)

(

)

(2.13)

onde, é o tempo decorrido para o metal para percorrer uma distância ao longo do plano de

corte, e é a espessura da zona de corte. A extensão e velocidade de deformação efectivas são

determinadas a partir dos valores correspondentes em corte utilizando o critério de von Mises:

(2.14)

Os processos de corte por arranque de apara operam geralmente em condições estacionárias

com velocidade de corte constante, o que origina um mecanismo de deformação específico do

processo de corte ortogonal, o qual não corresponde ao obtido através dos tradicionais modelos

analíticos. Considerando por exemplo dois elementos de volume que fluem ao longo de duas rotas

diferentes E1 e E2, onde a deformação plástica ocorre numa zona bastante limitada chamada de

plano de corte Figura 2.3. É esperado que a velocidade de deformação cresça com o aumento da

extensão à medida que o material da região não deformada se move para o plano de corte, e diminua

quando o material se afasta até a face de ataque da ferramenta. Uma vez que a rota de fluxo E1 é

mais longa do que a E2, e porque a apara enrola, segue-se que a velocidade ao longo de E1 é maior

do que ao longo de E2, e consequentemente, a sua velocidade de deformação.

Figura 2.3: Mecanismo de deformação no corte ortogonal a) Representação esquemática do mecanismo de

deformação ao longo de dois caminhos diferentes de escoamento E1 e E2 em condições de deformação plana,

Page 22: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

9

2.1.3 Corte por arrombamento

No processo de corte por arrombamento, a deformação decorrente do estado de tensão de

corte puro pode ser identificada na Figura 2.4. A região ABCD corresponde á folga entre o punção e a

matriz, e por acção das tensões de corte o material desta região vai distorcendo progressivamente,

acompanhando o avanço do punção, AA'. Para a mesma penetração do punção, AA', a distorção

aumenta com a diminuição da folga (equação 2.15). Naturalmente, à medida que o punção vai

penetrando também a deformação plástica do material vai aumentando, em concordância com o

aumento da distorção na zona da folga.

A' C

C

B' D

A

C

A'

A

t

ri

reBD

V

Figura 2.4: representação esquemática dos perfis de deformação correspondentes ao corte por arrombamento

(2.15)

O processo de corte por arrombamento é efectuado principalmente em prensas mecânicas e

hidráulicas. Embora estes equipamentos apresentem cinemáticas diferentes, as pequenas

espessuras de corte relativamente aos cursos da máquina permitem assumir que a velocidade do

processo é aproximadamente constante . Perante esta simplificação e considerando que a

zona de deformação plástica do material é ABCD e a velocidade de distorção , a velocidade

de deformação apresenta um valor constante ao longo de todo o processo de deformação .(equação

2.16)

(2.16)

Como referido anteriormente, a visão tradicional considera que o mecanismo de separação

dos processos de corte é um problema meramente do domínio da teoria da plasticidade,

considerando desprezável a energia necessária para a abertura de novas superfícies. No entanto,

será de estranhar um conjunto de relatos ao longo da história da investigação neste domínio, os quais

referem problemas na utilização preditiva dos modelos teóricos baseados unicamente em

plasticidade.

Page 23: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

10

Devido a estas divergências, (Atkins, 2003) e, mais recentemente (Rosa, Martins, Atkins

2007), demonstraram a importância de contabilizar a energia necessária para a formação de novas

superfícies (designada por tenacidade à fractura) nos processos de corte por arranque de apara. Este

conceito apresentado inicialmente por (Atkins 2003) para o corte por arrombamento e posteriormente

para o corte ortogonal é fundamentado pela elevada deformação plástica que se verifica na

vizinhança da fissura junto da aresta de corte e tem servido de base a diversos trabalhos na área dos

processos de corte.

Este novo olhar sobre o cálculo da força de corte em processos de separação assenta na

contabilização da energia de separação (tenacidade á fractura) nos modelos teóricos dos processos

de corte. No entanto, a omissão dos efeitos do estado de tensão na zona de corte para obtenção dos

valores de tenacidade à fractura pode ser uma fonte de erro, tendo em conta que em alguns

processos de separação a tensão de corte é dependente da tensão hidrostática/normal do processo.

No corte por arranque de apara, a dependência da tensão de corte com a tensão normal está

implícita no parâmetro do encruamento positivo, uma vez que o valor da tensão normal na zona de

corte é elevado, comparável ou até maior que a tensão de corte, como é o caso do corte de materiais

dúcteis. A existência da tensão normal no plano de corte permite manter um encruamento positivo

para elevadas extensões de corte (distorções) e as microfissuras na zona de corte, levando à

fractura.

A

B

a

c

b

dC

c

b

P

a

d

Figura 2.5: Estado de tensão do processo de corte ortogonal

O corte por arrombamento convencional, embora possa ser aproximado ao mecanismo de

corte puro, apresenta variantes que possuem diferentes estados de tensão, tais como o processo de

‘shaving’ ou de corte fino /precisão. Embora seja determinante para a boa qualidade da superfície

cortada que a folga no corte fino seja muito pequena, só esse facto não é suficiente para formar

novas superfícies. Todavia, a acção combinada do encostador, do anel de retenção e do

encostador/desembainhador permite introduzir estados hidrostáticos de compressão na zona

solicitada. (Figura 2.6). Desta forma, torna-se importante avaliar qual a influência que a tensão

normal/ hidrostática de um determinado processo de separação tem na tenacidade à fractura, e

verificar se deverá ser incluída na sua modelação.

Page 24: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

11

m

m

m

m

P

P

Pólo

3 m 1

corte fino

convencionalarrombamento

a) b) Figura 2.6: Estado de tensão no corte por arrombamento e corte fino; a) plano físico e b) plano de Mohr.

2.2 Caracterização Mecânica dos Materiais

Os ensaios mecânicos são comummente utilizados no controlo de qualidade e aceitação de

materiais em produção industrial e em processos de selecção de materiais em actividades de

investigação e desenvolvimento. Os procedimentos experimentais são geralmente regulamentados

através de normas reconhecidas pela generalidade dos principais laboratórios, possibilitando a

obtenção de valores comparáveis entre laboratórios independentes. A escolha da metodologia de

ensaio é função da propriedade mecânica que se deseja conhecer, do tipo de solicitação a que a

peça ou componente vai estar sujeita e/ou das especificações a que o produto fabricado deve

obedecer. Os ensaios mecânicos são conduzidos em laboratórios onde é possível monitorizar o

comportamento mecânico em diferentes condições de carregamento e deformação através de

ensaios padrão, tais como ensaios de tracção, compressão, torção.

A aplicação directa dos ensaios mecânicos à simulação teórica dos processos de fabrico é

uma tarefa necessária mas que deve ser conduzida com cautela pois nem sempre as condições de

ensaio são compatíveis com a prática real dos processos de fabrico. Este aspecto começou a tornar-

se óbvio (no início do século XIX) quando se observou diferenças no comportamento dos materiais

numa gama alargada de temperaturas, ou sujeito a diferentes condições de carregamento. Apesar da

constatação as investigações experimentais nesta altura estavam limitadas por carências ao nível dos

equipamentos, da instrumentação e da aquisição de dados. Actualmente, e apesar da melhoria das

infra-estruturas laboratoriais modernas, observam-se na literatura da especialidade relatos indicando

que as velocidades de deformação reproduzidas por estes ensaios são em geral muito inferiores à

prática dos processos de fabrico, e adicionalmente a realização desses ensaios em condições

isotérmicas, enquanto os processos industriais são realizados em condições adiabáticas (Guo, 2003).

Na maioria dos processos de fabrico o material é deformado sob circunstâncias bastante diferentes

daquelas encontradas em testes convencionais, o que resulta num afastamento do comportamento

mecânico dos materiais. Isto indicia a necessidade de determinar a priori as condições de

deformação do material durante o processo de fabrico para uma escolha adequada do ensaio

mecânico (Lei, 1999).

Page 25: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

12

Processo Extensão Velocidade de

deformação (s-1

) Th

Extrusão 2 - 5 10-1

a 102 0.16 – 0.7

Forjamento 0.1 – 0.5 10 a 103 0.16 – 0.7

Estampagem 0.1 – 0.5 10 a 102 0.16 – 0.7

Maquinagem 1 - 10 103 a 10

6 0.16 – 0.9

Tabela 2.1: Extensões, velocidades de deformação e temperaturas homólogas típicas de alguns processos de

fabrico

Figura 2.7: Extensões, velocidades de deformação e temperaturas homólogas típicas de alguns processos de

fabrico (Guo, 2003).

2.3 Equipamentos de Ensaio

A caracterização mecânica de materiais para aplicações de deformação plástica exige um

profundo conhecimento sobre os mecanismos de deformação dos processos antes de se seleccionar

o equipamento de ensaio mais adequado às condições de operação (Field, 2004). De facto, quando

um material é ensaiado para diferentes condições de deformação verifica-se que a resposta da

tensão de escoamento apresenta uma evolução também ela distinta (Banabic, 2000). Não ter em

consideração esta exigência leva muitas vezes a uma caracterização incorrecta da curva da tensão

de escoamento e, portanto, uma importante fonte de erros que afecta seriamente a confiabilidade e

precisão da modelação analítica e numérica de processos de deformação plástica de metais

(Tekkaya, 2009).

Para condições de carregamento quási-estático ou a baixas velocidades de deformação (por

exemplo na gama de 0.001-1.0 s-1

) são utilizadas máquinas de ensaios universais de compressão,

torção, tracção, etc. No que compete a médias velocidades (103 s

-1), são geralmente utilizados

equipamentos com mecanismos de actuação característicos dos processos de deformação plástica,

tais como sistemas de queda de graves, hidráulicos ou mecânicos, onde as velocidades de actuação

se encontram na ordem de grandeza das verificadas em alguns equipamentos industriais. Os

equipamentos de queda são amplamente utilizados na caracterização dos materiais a médias

velocidades e são baseados no princípio da queda dos corpos livres, onde a velocidade do ensaio é

Page 26: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

13

definida através da altura de elevação de um carro de impacto, e a energia disponível definida pela

massa desse carro , também designado por carro de massas (Fig. 6). Geralmente o carro de

impacto ou a ferramenta são instrumentados, possibilitando a medição das variáveis do processo ou

ensaio. (Centeno, 2007)

Embora se encontrem disponíveis equipamentos para ensaios a médias velocidades de

deformação, uma técnica frequentemente ignorada e mal controlada está relacionada com a

adequação das condições de ensaio com os mecanismos de deformação de cada processo de

fabrico. O sinergismo entre o mecanismo de deformação dos processos e os equipamentos de

caracterização requer a compreensão da relação tempo-deslocamento de cada ferramenta de ensaio

e da sua influência nas variáveis dependentes da velocidade. Considerando um cenário típico de

funcionamento da ferramenta na região mais importante do curso relativo dos equipamentos (Figura

2.8), pode facilmente concluir-se que num equipamento com actuação mecânica (biela manivela) a

velocidade do carro diminui em direcção ao ponto morto inferior enquanto num equipamento de

queda de um grave aumenta desde o início. Como a velocidade média da ferramenta num

equipamento de queda é muito maior do que num equipamento biela-manivela, segue-se que os

tempos de contacto sob pressão são menores no caso de martelos e maiores no caso de prensas

mecânicas.

O perfil da velocidade da ferramenta de um equipamento de compressão na zona de

deformação plástica é dependente das características funcionais do equipamento aquando da

compressão do provete. Através da análise do detalhe da Figura 2.8 a), verifica-se que nos

equipamentos de queda, a velocidade se mantém aproximadamente constante durante o curso de

deformação plástica e no caso dos sistemas biela-manivela se reduz ao longo do tempo, o que

origina diferentes perfis de velocidades de deformação versus extensão como apresentado na Figura

2.8 b). O comportamento de equipamentos de ensaio hidráulicos ( ), comuns na obtenção

da tensão de escoamento dos materiais, assemelha-se mais aos equipamentos de queda do que aos

sistemas biela-manivela, no entanto a sua velocidade média de funcionamento é menor.

Page 27: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

14

Carro

Martelo de

Queda

Prensa

Mecânica

d

a)

Carro

Provete

Ferramenta

h0

h

b) Figura 2.8: Representação esquemática das características das prensas mecânicas e martelos utilizados nos

processos de fabrico; a) curvas de velocidade relativa ( ) versus deslocamento relativo ( ) com

identificação da região de deformação; b) Perfil de velocidade de deformação ( / ) versus extensão durante

o processamento do material

A caracterização dos materiais num intervalo de velocidades de deformação elevadas ( >103

s-1

) é geralmente obtida pela utilização de aparelhos de teste especiais baseados em barras de

Hopkinson (Lindholm, 1968) ou testes de impacto Taylor (Taylor, 1948). De entre os ensaios

mecânicos, a barra de Hopkinson é a técnica experimental mais utilizada pois permite avaliar a

tensão de escoamento do material na gama típica de velocidade de deformação em que ocorrem por

exemplo os processos de corte por arranque de apara (Jaspers, 2002; Zheng, 1999). Esta técnica

avalia a evolução da tensão de escoamento do material em função da extensão verdadeira para uma

velocidade de deformação aproximadamente constante. A realização de ensaios para diferentes

velocidades de deformação permite estabelecer a tensão de escoamento em função da extensão

verdadeira e da velocidade de deformação .

A barra de Hopkinson tem sido amplamente utilizada para executar testes de materiais a

velocidades de deformação até 104 s

−1 e pode ser modificada para testes a temperaturas elevadas

(Vernaza-Peña, 2002). Desta forma, alguns autores defendem que este método é apropriado para

determinação da tensão de escoamento em condições semelhantes às encontradas nos processos

de fabrico, nomeadamente os processos de corte. Alguns autores, tal como (Jaspers, 2002)

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

0 0,2 0,4 0,6 0,8 1

Velo

cd

ida

de R

ela

tiva

Deslocamento Relativo

Prensa Mecânica

Martelo de Queda

0

0,2

0,4

0,6

0,8

1

0 0,2 0,4 0,6 0,8 1

Vel.

d

e D

efo

. R

ela

tiva

Extensão Efectiva

Prensa Mecânica

Martelo de Queda

Page 28: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

15

defendem que o modo de deformação nos processos de separação é predominantemente em corte

simples, sendo preferível caracterizar o material recorrendo a ensaios de torção. Contudo, de acordo

com (Hartley, 1990), o uso de uma SHPB de torção impõe desvantagens distintas, para além de ser

geralmente mais difícil de construir e implementar do que uma de ensaios axiais.

A Figura 2.9 apresenta um esquema simplificado do funcionamento do ensaio de Hopkinson,

o qual consiste em disparar uma barra projéctil, com velocidades geralmente entre os 2.5 e os 25

m/s, contra uma barra incidente (Field, 1994). Este impacto provoca uma onda de pressão elástica

que se propaga ao longo da barra incidente até à interface com o material a ensaiar, provocando a

sua deformação. Uma vez aí, parte dessa onda é transmitida para a barra transmissora e a outra

parte é reflectida para a barra incidente. A onda reflectida é uma onda de tracção enquanto a onda

transmitida continua a ser uma onda de compressão. A propagação das ondas de pressão ao longo

das barras pode ser monitorizada através da utilização de extensómetros (A e B), os quais medem as

deformações elásticas das barras.

Os sinais obtidos são amplificados e adquiridos num sistema de aquisição, onde a

manipulação matemática destas medições de extensão nas barras permitem determinar a curva da

tensão de escoamento do material. Os dados dos ensaios na barra de Hopkinson provêm de

extensómetros colocados a meio das barras incidente e transmissora, onde é possível obter o

historial de cada ensaio, nomeadamente as ondas de pressão que percorrem as barras. Através da

existência da onda reflectida na barra incidente e da onda transmitida , Kolsky desenvolveu a

Equação 2.17 para calcular a tensão no provete:

(2.17)

onde é o Módulo de Elasticidade da barra transmissora, a secção da barra transmissora, é a

secção do provete e é a extensão na barra transmissora ao longo do tempo.

A velocidade de deformação do provete é calculada pela equação 2.18.

(2.18)

onde é a extensão da barra incidente ao longo do tempo, é o comprimento do provete antes

do impacto, e é a velocidade da onda na barra incidente, calculada através da equação 2.19.

(2.19)

Nesta equação e , representam o Módulo de Elasticidade e a densidade das respectivas

barras. Deste modo, através de uma simples integração, consegue-se obter o valor da extensão do

provete (equação 2.20):

Page 29: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

16

(2.20)

Estas equações têm sido utilizadas desde os anos 40 e só nas últimas duas décadas é que o

processamento de dados teve uma grande evolução devido ao desenvolvimento dos computadores

(Salisbury, 2001). Actualmente as barras de Hopkinson instaladas nos centros de investigação são

accionadas por um canhão a ar comprimido de alta pressão, onde o controlo dessa pressão e da

massa da barra permitem definir uma velocidade de deformação do ensaio aproximadamente

constante .

a) b)

Figura 2.9- Esquema do aparato da barra de Hopkinson (SHPB) e visualização das ondas de pressão durante os

testes (Jaspers, 2002).

As barras de Hopkinson são actualmente o equipamento mais utilizado na caracterização dos

materiais, no entanto, os seguintes factores devem-se ter em conta os seguintes factores no

planeamento e análise dos resultados desta metodologia (1) oscilação da tensão de escoamento,

especialmente a baixos valores de extensão, (2) os dados na gama elástica não são geralmente

disponibilizados, (3) efeitos de inércia devido às velocidades elevadas de impacto, (4) velocidades de

deformação moderadas, (5) baixos valores relativos de extensão, geralmente abaixo de 1 e (6)

extrapolação exigida para estimar a tensão de escoamento a velocidades de deformação elevadas e

em grandes extensões. Os erros induzidos por estes problemas são difíceis de quantificar, e como tal

é necessário ter uma especial atenção na utilização de uma SHPB, e posterior interpretação dos

dados (Guo ,2003).

Metodologias de ensaio

Embora os provetes circulares de compressão e de tracção sejam amplamente utilizados

para realização de ensaios nas barras de Hopkinson para obtenção do comportamento mecânico dos

materiais, nas últimas décadas, diferentes metodologias e geometrias têm sido utilizadas para

Ten

são

(M

Pa)

Ve

loci

dad

e d

e d

efo

rmaç

ão (

s-1)

Page 30: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

17

estudar o comportamento dos materiais quando sujeitos a diversas solicitações, tais como por

exemplo a velocidade de deformação, temperatura, corte, concentração de tensões, e bandas de

corte adiabático, no entanto a interpretação dos resultados experimentais é complexa.

2.4 Tensão de escoamento

Para uma modelação correcta dos mecanismos de deformação e dos estados multiaxiais de

tensão dos processos de fabrico, é necessário uma avaliação correcta da tensão de escoamento

numa vasta gama de extensão, velocidades de deformação e temperatura. A precisão destes dados

depende da influência do dispositivo de ensaio utilizado, dos componentes electrónicos e o tipo de

provete utilizado nestes ensaios de comportamento mecânico dos materiais, entre outros. Contudo,

nem todas as metodologias e geometrias de provetes existentes na literatura são indicadas para

obter o correcto comportamento dos materiais.

A maioria dos investigadores defende que apesar da tensão de escoamento ser função da

extensão verdadeira e da velocidade de deformação, esta é fortemente influenciada pela temperatura

(Childs, 1998), enquanto alguns acrescentam a dependência de outros factores, tais como evoluções

microestruturais e históricos de deformação, evoluções da velocidade de deformação e temperatura

(Anurag, 2007). Devido à sua importância, estes factores devem ser incluídos na determinação da

tensão de escoamento, uma vez que para deformações a elevadas velocidades de deformação o

fluxo plástico adiabático pode produzir mudanças significativas no comportamento mecânico do

material.

Merchant e outros investigadores assumiram que a tensão de escoamento nos processos de

corte é igual à obtida nos testes convencionais de tracção. Assim a relação tensão-extensão obtida

nestes ensaios pode ser usada no corte por arranque de apara. (Spaans, 1972) sugeriu que o

equilíbrio mútuo do encruamento e do amaciamento térmico faz com que a tensão de escoamento no

corte permaneça a mesma nos ensaios padrão de materiais. Jaspers (2002) analisou quais os

melhores ensaios a aplicar para obtenção da tensão de escoamento para o corte por arranque de

apara, verificando que os ensaios de tracção não podem ser utilizados devido a problemas

associados à estricção preliminar. Assim, o método preferencial de carregamento do material deveria

ser através de ensaios de torção ou de compressão. No entanto, devida á influência na tensão no

caminho da extensão, os valores encontrados para a tensão de escoamento durante a torção podem

diferir dos verificados na compressão. Para além disso, a complexidade do equipamento de ensaio de

torção para elevadas velocidades de deformação e a instrumentação necessária para obtenção de

todas as variáveis é elevada.

Actualmente os ensaios mais utilizados para obtenção da tensão de escoamento são os

ensaio de compressão, através dos quais Astakhov (1999) chegou à conclusão que o trabalho

específico realizado na compressão e nos processos de corte é consistente. Mas, mesmo que os

valores da tensão de escoamento e extensão ao corte variem devido aos efeitos da extensão, da

velocidade de deformação e da temperatura, o seu produto, isto é, o trabalho específico, pode ainda

assim não variar, sendo consistente com o trabalho específico na compressão. Assim, a opinião de

Page 31: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

18

(Astakhov, 1999) de que o processo de corte é um processo de trabalho a frio seria mais convincente

se o efeito individual de cada factor na tensão de escoamento pudesse ser isolado.

O ensaio de compressão convencional é a metodologia mais utilizada para caracterizar a

tensão de escoamento dos materiais, no qual o provete de geometria cilíndrica é comprimido

axialmente entre dois pratos planos de elevada dureza, polidos e muito bem lubrificados. A variação

da deformação por unidade de tempo é denominada velocidade de deformação ( ), e pode ser

descrita pela seguinte equação:

(2.21)

em que representa a extensão verdadeira e é dada por:

(2.22)

Neste caso a variação de no tempo representa a velocidade de compressão .

Os valores experimentais de força-deslocamento obtidos nos ensaios são convertidos em

tensão e extensão através das equações de tensão e extensão verdadeira, equação (2.23)

(2.23)

onde é a tensão verdadeira, é a força de compressão e a área do provete em cada instante.

Assumindo a conservação de volume durante o ensaio de compressão

(2.24)

e tendo em conta que a altura do provete em cada instante é dada por

(2.25)

é possível calcular a área do provete em cada instante

(

)

(2.26)

Page 32: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

19

Desta forma, pode-se exprimir a tensão verdadeira como sendo

(

)

(

)

(2.27)

h

hi

V

a) b) Figura 2.10: Formato dos provetes utilizados nos principais ensaios para obtenção da tensão de escoamento dos

materiais a) compressão, b) Tracção.

O ensaio de torção a elevada velocidade de deformação, é usado maioritariamente para

obtenção da curva de escoamento em condições próximas de corte puro. Como a geometria do

provete permanece inalterada, é possível obter grandes deformações sem existência de expansão

radial dos provetes, bem como dos efeitos de inércia e de atrito presentes nos tradicionais ensaios

axiais (compressão e tracção). É possível alargar este ensaio para um estado biaxial de

carregamento, aplicando uma carga axial (de compressão ou de tracção), a qual permite concentrar a

deformação plástica em zonas específicas do provete e assim avaliar a influência da tensão de

compressão na tensão de escoamento.

Para avaliação da tensão de escoamento em condições de corte adiabáticas, para além dos

tradicionais ensaios de torção, foram desenvolvidos nos últimos anos diversas geometrias, tais como

o denominado provete de “chapéu” nos quais é possível aplicar diferentes carregamentos através da

variação da sua geometria. Foram também desenvolvidos os provetes de compressão/corte de

Meyer, os quais oferecem um estado biaxial de carregamento, sem uma concentração forçada de

tensões, permitindo assim ao material “responder” livremente se tende ou não a fissurar devido ao

corte.

Por outro lado, os provetes entalhados de compressão, são outro método utilizado para a

determinação de tensões de escoamento biaxiais até extensões relativamente elevadas. É possível

com esta geometria, obter diferentes estados de tensão, variando a inclinação do entalhe presente na

geometria do provete. A utilização de provetes de corte por arranque de apara acoplados em

sistemas de compressão, é também uma metodologia que permite igualmente produzir bandas

adiabáticas de corte para obtenção da tensão de escoamento em condições de corte. A maioria

destas configurações podem ser utilizadas em qualquer aparato típico experimental de

Pratos de compressão

Provete

Provete

Page 33: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

20

compressão/tracção, tanto para condições quase estáticas ou condições dinâmicas, onde a barra de

Hopkinson é a mais aplicada.

As técnicas numéricas de identificação inversa da tensão de escoamento recorrem à

utilização combinada de ensaios de corte (torneamento em varões com alhetas (Guo (2006), discos

circulares Zheng (2006), fresagem ortogonal, etc) e da sua reprodução através de técnicas de

modelação numérica (FEM) ou com base em modelos analíticos do processo de corte ortogonal para

determinar os dados da tensão de escoamento dos materiais (Shatla (2001), (Hambli, 2002). Assim, o

comportamento do material é um parâmetro que é ajustado de modo a permitir reproduzir os valores

das forças observadas durante a realização dos ensaios de corte em condições laboratoriais

controladas (Lei, 1999; Shatla, 2001). Esta é uma metodologia, que para além de ser menos

complexa que uma barra de Hopkinson e aparentemente eficaz para estimar o valor médio da tensão

de escoamento para uma escala de grandes extensões, velocidades de deformação e temperatura, é

significativamente influenciada por outros fenómenos, que apesar de interligados com o mecanismo

de deformação, não se referem unicamente ao fenómeno de plasticidade.

Para superar as desvantagens dos ensaios do corte e dos ensaios convencionais de

materiais, uma série de estudos [(Stevenson, 1995 e 1997) e (Guo, 1999) combinaram os dois

métodos (compressão/tracção e corte) para obter o comportamento mecânico nas escalas elásticas

e/ou plásticas, extrapolando a extensão, velocidade de deformação e temperatura. No entanto, a

precisão do modelo constitutivo é afectada pelo caminho da extensão, do modo de deformação do

material, dos efeitos microestruturais, dos modelos de corte, e do modelo constitutivo adoptado. (Guo,

2003).

2.5 Tenacidade à Fractura

A aceitação de um mecanismo de formação de novas superfícies exclusivamente baseado na

teoria da plasticidade pareceria à primeira vista a opção mais segura tendo em conta o elevado

numero de trabalhos científicos realizados neste domínio, assim como, os autores de renome que o

apoiam. No entanto, será de estranhar um conjunto de relatos ao longo da história da investigação

neste domínio, os quais referem principalmente problemas na utilização preditiva dos modelos

teóricos do processo de corte ortogonal com a utilização unicamente da tensão de escoamento e do

factor de atrito.

As metodologias apresentadas para a obtenção da tensão de escoamento têm mostrado

resultados distintos. Por vezes a lei do comportamento do material obtida experimentalmente não

permite reproduzir os valores das forças de corte, ou, os valores estimados numericamente para a

tensão de escoamento são fisicamente inaceitáveis para determinado tipo de material. Na modelação

dos processos de separação, é importante identificar as condições no interior da peça deformada e o

mecanismo de iniciação e propagação de fissuras. Dentro deste quadro, simulações numéricas são

amplamente utilizadas na indústria para optimizar estes processos. No entanto, a fim de haver

coerência nos resultados de tais simulações, é necessário um modelo de material suficientemente

preciso e que englobe todas as propriedades mecânicas do material.

Page 34: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

21

A fractura de um material dúctil tem sido frequentemente observada como sendo o resultado

da formação e coalescência de poros microscópicos, mecanismo agravado pela sobreposição de

uma tensão hidrostática num campo de deformação plástica (McClintock, 1968, 1966; Rice, 1969).

Um suporte para a análise deste mecanismo é dado por simulações FEM que revelam que tem de ser

empregue um critério de separação na ponta da ferramenta. Algumas considerações mostram que os

critérios de separação são versões de modelos de início, crescimento e coalescência de poros que

são empregues na mecânica da fractura dúctil.

A nova análise apresentada por (Atkins, 2003), mostra que as forças de corte dos materiais

dúcteis nos processos de separação dependem da tenacidade à fractura, bem como da plasticidade e

do atrito e revela uma forma simples de determinar tanto a tenacidade e a tensão de escoamento a

partir de ensaios de corte. De acordo com o trabalho desenvolvido por (Rosa, 2007), a tenacidade à

fractura dos materiais dúcteis pode ser obtida através de ensaios de fractura à temperatura ambiente

com provetes semelhantes aos que se encontram esquematicamente representados na Figura 2.11.

A geometria dos provetes foi optimizada por intermédio de elementos finitos, de modo a permitir

reproduzir os campos de tensões e deformações que são característicos da abertura de novas

superfícies em modo II.

c

b t

ri

rext

Deslocamento d

w

c

R

F

c1

R

w1w2

w3

vaument.

WExp.

c2

c3

c1 c2 c3

a) b) Figura 2.11: Geometria dos provetes utilizados nos ensaios de fractura ( ; ; ,

).

O início da fissuração nos ensaios de fractura Figura 2.11 encontra-se associado a uma

quantidade de energia crítica que é indispensável para dar início ao processo de formação de novas

superfícies. O procedimento que é habitual seguir ao nível da mecânica da fractura para contabilizar

este valor de energia crítica inicia-se com a determinação da energia total (deformação plástica e

fractura) que resulta da integração da evolução experimental da força com o deslocamento até ao

instante de deslocamento corresponde ao início das fissuras (Figura 2). Assumindo que o instante

correspondente ao início das fissuras coincide com o valor de força máxima, a energia total ,

determina-se através da seguinte equação,

(2.28)

Provete

Punção

Base

Page 35: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

22

Utilizando a hipótese formulada por (Turner 1990; Siegmund, 2000) e que está na base dos

modelos teóricos de zona coesiva que são habitualmente utilizados na mecânica da fractura, é

possível separar a energia total em duas parcelas distintas; uma parcela correspondente à energia de

deformação plástica (não reversível) e outra parcela associada à energia necessária para a

formação de novas superfícies ,

(2.29)

A tenacidade à fractura R é definida como o valor da energia por unidade de área que é

necessária para a formação de novas superfícies (abertura da fissura) (Atkins 2000)

Como os valores de energia supracitados estão interligados e, portanto, são difíceis de

individualizar, utiliza-se uma metodologia para determinação da tenacidade à fractura que consistiu

na realização de ensaios de fractura para várias dimensões do ligamento , seguida de uma

extrapolação dos valores obtidos experimentalmente para o caso limite em que a espessura do

ligamento , Figura 2.11 b). O procedimento utilizado elimina a contribuição da parcela de energia

por unidade de área devida à deformação plástica e, desta forma, permite obter uma estimativa

experimental do valor da tenacidade à fractura,

(

)

(

) (2.30)

2.6 Nova abordagem aos ensaios mecânicos

As dificuldades na obtenção das curvas da tensão de escoamento a velocidades de

deformação adequadas e o sinergismo entre os ensaios e as condições reais do processo, justificam

uma investigação compreensiva do escoamento plástico dos metais nos principais processos de

fabrico, baseada num novo conceito de assinatura de processo. Alargar este conceito a diversos

processos e verificar a influência dos perfis de deformação visco-plástico na simulação numérica é

um passo importante na modelação analítica e numérica.

Apesar do interesse, não parece existir na literatura da especialidade um estudo

compreensivo do comportamento mecânico dos materiais em condições de deformação similares aos

processos de fabrico que permita esclarecer as razões do desacordo na modelação de alguns

processos e direccionar metodologias para a sua resolução. A questão frequentemente ignorada e

mal controlada está relacionada com a adequação das condições dos tradicionais ensaios de

caracterização com as configurações do mecanismo de deformação dos processos de fabrico. A

importância do histórico de velocidade de deformação-extensão, além de ser de interesse para

avaliar a resposta da tensão do material também é relevante para determinar texturas cristalográficas

e avaliar simulações numéricas (Guo, 2011).

Alguns dos caminhos de velocidade de deformação-extensão teóricos verificados nos

principais processos de fabrico são significativamente diferentes dos obtidos por meio de

Page 36: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

23

equipamentos de ensaio actualmente disponíveis para caracterização a elevadas velocidades. Por

exemplo, no caso das barras de Hopkinson, os perfis de deformação são caracterizados por um nível

aproximadamente constante da velocidade de deformação (Jaspers 2002), os quais se aproximam

apenas nos verificados no corte por arrombamento Figura 2.12. A necessidade de determinar

experimentalmente o comportamento mecânico dos materiais em condições de ensaio semelhantes

ás do processo implica avaliar as curvas obtidas em condições de diferentes velocidades de carga e

verificar se fornecem a mesma resposta para um determinado valor de extensão e velocidade.

Velo

cid

ade d

e D

efo

rmação

Tensão

Extensão Extensão

Corte Arrombamento

Forjamento

Corte O

rtogonal

P

P

A

B

C

a) b)

Figura 2.12: Comportamento mecânico dos materiais em condições de similaridade com alguns processos de

fabrico a) perfis de velocidade de deformação versus extensão, b) Possíveis evoluções de tensão-extensão para

os diferentes perfis definidos em a).

A existência da separação de material nos processos de corte por arranque de apara e no

corte por arrombamento, distingue estes processos dos que são exclusivamente baseados na teoria

da deformação plástica, como os processos de forjamento e de extrusão. O conhecimento do valor da

tenacidade à fractura R e da sua evolução em função da velocidade e do estado de tensão do

processo é igualmente imprescindível para uma correcta previsão das forças de corte e do campo de

tensões/deformações dos processos de fabrico em que a abertura de novas superfícies é parte

integrante do processo Figura 2.13.

A sua contabilização na modelação teórica dos processos de separação, à semelhança da lei

do material e da lei de atrito, permitirá resolver algumas das questões em aberto na modelação dos

processos de separação.

Page 37: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

24

Tensão m

édia

Tenacid

ade à

Fra

ctu

ra (

R)

Espessura de corte Espessura de corte

v3

v2

v1

a) b)

Figura 2.13: Possíveis evoluções da a) tensão normal com a espessura de corte e b) energia por unidade de

área com a espessura de corte, para várias velocidades de actuação em ensaios de fractura

Perante estas observações apresentadas, os investigadores estão a ser cada vez mais

confrontados com as seguintes questões que precisam de ser devidamente abordadas: 1) É possível,

através de ensaios de caracterização convencionais, determinar experimentalmente a curva de

escoamento sob condições de ensaio que reproduzam com exactidão o mecanismo de deformação

de determinado processo? Por outro lado, 2) é possível determinar experimentalmente a tenacidade à

fractura sob condições de ensaio que reproduzam com exactidão o estado de tensão de determinado

nos processos de corte? Se sim, quais são os parâmetros de ensaio que necessitam de ser

cuidadosamente controlados e o qual o ensaio de caracterização mais apropriado? Neste âmbito, o

presente trabalho procura desenvolver uma metodologia para avaliação da tensão de escoamento e

da tenacidade à fractura de materiais submetidos a elevadas velocidades de deformação, bem como

avaliar através do método de elementos finitos toda a metodologia proposta.

V3

V2

V1

Ten

são

No

rmal

Page 38: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

25

3 DESENVOLVIMENTO EXPERIMENTAL

Neste capítulo encontram-se descritos os vários aparatos e procedimentos experimentais que

foram desenvolvidos no decorrer deste trabalho, quer na determinação da tensão de escoamento do

alumínio AA1050, quer nos estudos da tenacidade à fractura para a formação de novas superfícies.

3.1 Máquina de ensaios por came electromagnética

Como foi descrito anteriormente, a determinação das curvas da tensão de escoamento da liga

de Alumínio AA1050 foi realizada com o auxílio de um aparato experimental inovador, denominado

por máquina de ensaios por came electromagnética, apresentada na Figura 3.1, onde se identificam

três grandes grupos de componentes, nomeadamente 1) componentes estruturais, 2) sistemas

mecânicos e 3) sistemas eléctricos e electromecânicos.

a) b)

Figura 3.1: Máquina de ensaios por came electromagnética. a) Esquema da máquina de ensaios por came

electromagnética com unidade de aquisição e monitorização de dados. b) Fotografia da máquina de ensaios por

came electromagnética

3.1.1 Componentes estruturais

As peças estruturais deste aparato experimental incluem os suportes e os quadros de apoio

que são independentes das condições de ensaio e material a caracterizar. Os quadros de apoio

permitem a instalação dos sistemas eléctricos e electromagnéticos e o seu comprimento foi

projectado tendo em conta a possibilidade de poderem vir a ser aplicados actuadores com diferentes

comprimentos e sistemas de compressão maiores. Desta forma o sistema torna-se mais flexível,

podendo ser utilizado para ensaiar provetes de maiores dimensões, a maiores velocidades de

deformação, com requisitos energéticos mais exigentes. Esta flexibilidade permite o estudo de um

vasto leque de materiais que possuam tensões de escoamento superiores às do alumínio AA1050.

Actuador

electromagnético

Sistema de compressão

com came e seguidor

Célula de carga

Sensor de deslocamento

Amplificador

de sinal

Unidade de

aquisição

Page 39: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

26

3.1.2 Componentes mecânicos

Existem diversos componentes mecânicos presentes no sistema de compressão, Figura 3.2,

nomeadamente o suporte da came, dois pratos de compressão, um seguidor e uma came de

translação cujo projecto depende da cinemática da máquina-ferramenta e das condições operacionais

que se pretendem reproduzir.

Os pratos de compressão são feitos a partir de um aço ferramenta DIN 120WV4 temperado e

endurecido a 60 HRc. A came de translação e o seguidor são de aço DIN 14NiCr14 e 100Cr6 DIN

respectivamente, e possuem entre eles um ajuste de deslizamento H7/f7 (ISO). Foram ambos obtidos

num centro de maquinagem CNC o que lhes conferiu uma elevada precisão de fabrico. Para se

garantir o perfeito funcionamento do sistema, (com o mínimo de vibrações e interferências

indesejadas possíveis), as peças obtidas no centro de maquinagem foram posteriormente polidas,

assegurando-lhes assim todos os requisitos geométricos necessários. A protecção dos elementos

deslizantes do sistema de came foi conseguida com a utilização de PTFE (óleo lubrificante com base

de Teflon), o que reduziu também o atrito entre os componentes móveis do sistema.

SeguidorPratos de Compressão

Sensor de Deslocamento Correntes Eddy

Célula de Carga

Perfil da Came Provete

Vx

Vy

Prato de Compressão Inferior

a)

b)

Figura 3.2: a) Desenho esquemático da came de translação, do seguidor, dos pratos de compressão, da célula

de carda e do sensor de deslocamento. b) Fotografia da totalidade do sistema de compressão por came.

O sistema de compressão, que é accionado pelo actuador electromagnético, é composto por

uma came de translação, através da qual passa um seguidor que traça o perfil da came, convertendo

perpendicularmente o seu movimento para o prato de compressão móvel. Este movimento traduz-se

na compressão do provete contra o prato fixo, por sua vez ligado a uma célula de carga, o que

permite a medição da força exercida durante o ensaio. O deslocamento é medido através de um

sensor de correntes Eddy localizado no extremo oposto do prato de compressão móvel.

Page 40: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

27

Após ser efectuada a estimativa dos perfis de velocidade de deformação – extensão dos

processos de fabrico, o mecanismo de came irá possibilitar a compressão uniaxial dos provetes

segundo o que foi previamente estimado, sincronizando-se assim o desempenho do equipamento de

compressão com o da máquina-ferramenta e respectivo processo de fabrico a simular.

Deste modo, o conceito de came linear consiste em transformar uma velocidade de actuação

numa evolução previamente definida reproduzindo assim os diversos perfis de

deformação dos processos de fabrico.

Neste trabalho foram utilizados dois tipos de cames, consoante o histórico de deformação

pretendido. A came logística foi projectada de modo a que a velocidade de deformação no ensaio de

compressão tenha uma evolução linear com a extensão (fenómeno observado no corte ortogonal),

figura 2.11. Já a came quadrática simula condições de velocidade de deformação constantes com a

extensão ao longo do processo, (condições similares ás do corte por arrombamento), figura 2.11.

Ambas as cames foram construídas segundo as mesmas metodologias e princípios de

funcionamento. A título representativo, apresenta-se o desenvolvimento do perfil da came logística,

Figura 3.3, que é caracterizado por uma entrada suave seguida de um aumento do contorno e uma

queda final na parte superior do perfil. A velocidade do seguidor está directamente relacionada

com a primeira derivada da curva de deslocamento, equação 3.1, onde a velocidade da

came/actuador é aproximadamente constante na região de trabalho do seguidor (região localizada

entre as linhas verticais na Figura 3.3 d).

(3.1)

A região mais à esquerda da Figura 3.3 d), caracterizada por um forte aumento na velocidade

do actuador, resulta da aceleração inicial devida ao campo electromagnético gerada pelas bobinas

dentro do actuador electromagnético. Não há movimento vertical do seguidor ao longo desta região,

logo o provete não é comprimido. A região mais à direita na Figura 3.3 d) desvenda parte da

desaceleração do actuador após o seguidor atingir o perfil superior da came, deixando de haver

compressão do provete ao longo desta região. Deste modo, o movimento do seguidor da came que

origina a compressão do provete só é observado na região delimitada pelas linhas verticais da Figura

3.3 d), denominada “região de trabalho do perfil da came” ou simplesmente “região de trabalho”.

Justifica-se assim a razão pela qual as figuras que apresentam o deslocamento do seguidor com o

eixo estarem limitadas à região de trabalho apresentada anteriormente.

Page 41: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

28

Vy

Vx

(a) (b)

(c) (d)

Figura 3.3: a) representação esquemática do perfil da came logística e seguidor, b) fotografia da came logística,

c) perfil da came e angulo de pressão, d) Velocidade da came( na região de trabalho do seguidor).

A aceleração do seguidor da came é calculada a partir da variação da velocidade com o

deslocamento (assumindo-se a aproximação mencionado acima de ). A análise cinemática do

seguidor, apresentada na Figura 3.4 a) permite concluir que esta came fornece o valor máximo de

velocidade no ponto de inflexão do seu perfil.

a) b)

Figura 3.4: a) Velocidade e aceleração do seguidor na região de trabalho da came logística. b) Valor de pulso

(Jerk) na região de trabalho da came logística.

A aceleração é aproximadamente constante na entrada do perfil da came e apresenta uma

mudança abrupta de valores positivos para negativos no seu ponto médio. Deste modo, o valor de

pulso (Jerk) é relativamente baixo junto á entrada do perfil da came, o que resulta num baixo nível de

vibrações associadas a este perfil, Figura 3.4 b).

Os pequenos valores de aceleração na entrada do perfil da came logística combinados com o

facto dos ângulos de pressão do seguidor estarem abaixo de 30 º (máx. , Figura 3.3 c))

ajudam a manter as forças de inércia num nível baixo. Por outro lado, permitem justificar a razão pela

0

5

10

15

20

25

0

1

2

3

4

5

6

7

0 10 20 30 40θ (

º)

Y (

mm

)

X (mm)

Cam profile

Pressureangle

0

2

4

6

8

10

12

-10 0 10 20 30 40 50 60 70 80

Vx (

m/s

)

X (mm)

-8

-6

-4

-2

0

2

4

6

0

1

2

3

4

5

0 10 20 30 40

ay (

10

3 m

/s2)

Vy (

m/s

)

X (mm)

Velocity

Acceleration

-20

-15

-10

-5

0

5

10

15

0 10 20 30 40

Jerk

(10

3 m

/s3)

X (mm)

𝑑 𝑦

𝑑𝑡

y

xo

Zona de trabalho do

seguidor da came

Velocidade Aceleração

Perfil da came

Ângulo de

pressão

Page 42: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

29

qual este equipamento funcionou sem choques e vibrações significativas durante a execução de

ensaios de materiais a elevadas velocidades de actuação.

(a)

(b) (c)

Figura 3.5: a) Fotografia da came quadrática, b) perfil da came e ângulo de pressão, c) velocidade e aceleração

do seguidor na região de trabalho da máquina de ensaios por came electromagnética equipada com a came

quadrática.

Uma das grandes mais valias desta máquina de ensaios é a sua flexibilidade, sendo possível

alterar a sua cinemática de modo a se replicarem as características de outra máquina-ferramenta ou

outro tipo de equipamento de ensaio mecânico de materiais, bastando para isso alterar a came no

mecanismo de compressão.

Por exemplo, substituindo a came logística por uma came quadrática, Figura 3.5, consegue-

se replicar a cinemática de uma barra de Hopkinson, e deste modo simular as características

presentes no corte por arrombamento, isto é, um perfil de velocidade de deformação constante

.

3.1.3 Componentes eléctricos e electromagnéticos

As partes eléctricas e electromagnéticas do sistema de came incluem os transdutores de

deslocamento e força e os componentes que fornecem a energia para o actuador electromagnético.

Destacam-se os circuitos eléctricos para carregar e disparar o banco de condensadores e as bobinas

que geram a pressão para acelerar a barra actuadora ligada a uma extremidade da came de

translação. No caso de uma única fase de 230 V, o pulso de corrente acelerara a came até

velocidades da ordem dos 18 m/s.

Foi utilizado o sensor de deslocamento ECL100, que funciona através de correntes de Eddy e

uma célula de carga de dimensões reduzidas, célula de carga comercial HBM de 50 KN (tipo C9B),

com sensibilidade nominal de 1 mV/V e classe de precisão 0,5, a qual permite a medição estática e

0

5

10

15

20

25

30

0

1

2

3

4

5

6

0 10 20 30 40

θ (

º)

Y (

mm

)

X (mm)

Cam profile

Pressure angle

-6

-5

-4

-3

-2

-1

0

0

1

2

3

4

5

6

0 10 20 30 40

ay (

10

3

m/s

2)

Vy (

m/s

) X (mm)

Velocity

AccelarationPerfil da came

Ângulo de

pressão

Velocidade

Aceleração

Page 43: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

30

dinâmica de forças de compressão. A célula de carga é ligada a um amplificador de sinal Vishay e ao

sistema de aquisição programado na linguagem Labview.

O actuador electromagnético referido anteriormente, torna possível uma precisa e controlada

transmissão de energia para a came de translação, quando são necessárias velocidades de actuação

bastante elevadas.

Este dispositivo foi projectado de modo que fosse possível impulsionar uma barra actuadora,

através da interacção de um campo magnético gerado por uma bobina com um núcleo

ferromagnético, que ao ser magnetizado adquire uma polarização inversa à do campo anterior. O

pólo induzido é atraído pelo pólo contrário ao da bobina, o que resulta numa aceleração do núcleo,

independentemente do sentido da corrente (princípio de relutância magnética) figura 3.6.

O actuador electromagnético desenvolvido apresenta uma concepção modular, o que

possibilita um controlo dos seus principais parâmetros operativos (velocidade e energia), adaptando-

os a diferentes planos de ensaios.

Para uma perfeita caracterização das curvas de tensão de escoamento do alumínio AA1050

foi necessário garantir a deformação dos provetes até valores de extensão relativamente altos e

velocidades de actuação do actuador electromagnético na ordem dos 18 m/s.

No caso do plano de ensaios de fractura, também foram necessárias velocidades de

actuação do actuador electromagnético relativamente elevadas.

Deste modo, a configuração modular do actuador electromagnético quer para a

caracterização das curvas da tensão de escoamento, quer para os ensaios de fractura foi a

apresentada na Figura 3.6, denominada de configuração simultânea.

Como se pode observar, o actuador tem a particularidade de ter montado ao longo do seu

comprimento vários núcleos independentes, de forma a estarem síncronos com as bobines, que ao

serem activadas aceleram a barra actuadora através da indução de uma força electromagnética.

a)

b)

Separador Dieléctrico

Núcleo

Ferromagnético

Barra

Actuadora/Projéctil

Sistema de Rolamento

Escudo

Ferromagnético Separadores

Ferromagnéticos

Tubo Acrílico

Bobina

c)

Page 44: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

31

Figura 3.6: a) Esquema tridimensional do desenho de conjunto do actuador linear simultâneo de relutância

magnética e b) Fotografia do actuador linear simultâneo de relutância magnética c) Representação da

interacção das linhas de campo magnético com o núcleo de ferro.

Foram desenvolvidos dois actuadores com o mesmo princípio físico mas com diferentes

valores de energia 6 KJ e 12 KJ, consoante o número de condensadores presentes nos respectivos

bancos de potência. Deste modo é possível fazer uma gestão optimizada das diferentes actividades

experimentais, consoante as especificidades de cada uma delas. Neste caso o actuador de maior

energia, 12 KJ, foi utilizado na máquina de ensaios onde se efectuou a caracterização mecânica do

alumínio AA1050, devido aos maiores requisitos energéticos inerentes ao plano de ensaios em

questão. O actuador de 6 KJ utilizou-se na prensa electromagnética para a realização dos ensaios de

fractura.

O banco de potência, representado esquematicamente na Figura 3.7, consiste num conjunto

de circuitos eléctricos para carregar/descarregar os condensadores de armazenamento de energia

(cada um com 6 mF). Deste modo existe uma correspondência destes condensadores aos diversos

binómios bobina- núcleo ferromagnético.

Em ambos os actuadores foram utilizadas bobinas típicas de cobre com comprimentos iguais

mas com diferentes diâmetros. As dimensões das barras actuadoras também variam entre o actuador

de 6 KJ e o de 12 KJ.

Figura 3.7: Representação esquemática do circuito de potência do actuador linear de relutância magnética

Os condensadores são carregados por meio de corrente monofásica alternada fornecida com

230 V e convertida em corrente contínua de alta tensão. Uma vez carregados os condensadores, os

circuitos de carga são fechados e os interruptores tirístores, localizados nos circuitos de descarga de

cada bobina, são activados simultaneamente. O impulso de corrente que passa nas bobines dura

poucos milissegundos, tempo suficientemente baixo para impedir a desaceleração que os núcleos

sofrem ao passarem na segunda metade da bobine. Deste modo a barra adquire quer uma

velocidade, quer uma energia cinética bastante elevadas.

Page 45: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

32

O equipamento proposto consegue operar numa ampla gama de condições de teste, por se

conseguir controlar a tensão nos condensadores e nas bobinas, controlando-se assim o valor da

energia cinética da barra.

3.2 Prensa de impulsão electromagnética

Para a realização dos ensaios de fractura utilizou-se um aparato experimental que consiste

numa máquina de impulsão electromagnética acoplada a uma ferramenta de investigação

desenvolvida especificamente para este tipo de ensaios Figura 3.8.

a) b)

Figura 3.8: a) Esquema das ligações da ferramenta à unidade de aquisição e monitorização de dados e b)

Fotografia da máquina de impulsão electromagnética com a ferramenta de ensaios.

3.2.1 Actuador electromagnético

Com o objectivo de se realizarem ensaios de investigação a elevadas velocidades de

actuação, com requisitos energéticos relativamente altos a um baixo custo de implementação, foi

desenvolvida uma prensa de impulsão electromagnética em trabalhos passados.

Para se alcançarem as elevadas velocidades e forças de actuação, utilizou-se um actuador

electromagnético de 6KJ como sistema de actuação da prensa, tendo o seu princípio de

funcionamento sido descrito anteriormente.

As cargas e descargas dos circuitos RLC da unidade de potência são supervisionadas na

unidade de monitorização com a ajuda de multímetros digitais (DT-830B) e de um amperímetro

analógico (D72SD5A/2-00), controlando-se assim as características de ensaio. Por outro lado a

unidade de controlo possui diversos interruptores que possibilitam operar as diferentes fases de

preparação e actuação da máquina de ensaios (carga e descarga).

A estrutura desta máquina é em colo de cisne invertida ou C, fabricada em tubo mecânico de

secção 300x300mm com 15mm de espessura de parede, uma altura total de 2000mm, possuindo

Unidade de monitorização

Unidade de potência

Unidade de controlo

Actuador

Ferramenta

Amplificador

de sinal

Unidade de

aquisição de

dados

Page 46: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

33

uma mesa do tipo prateleira com dimensões de 300x400mm com reforços em trave triangular,

assentando em duas sapatas de aço de 25x300x1005mm.

Desta forma, devido à elevada rigidez e massa da estrutura, os resultados experimentais que

se obtêm com esta máquina são muito positivos, visto que as suas vibrações estruturais são bastante

atenuadas.

3.2.2 Ferramenta de ensaios de fractura

Para se avaliar a influência da velocidade ensaio e da tensão normal no valor da tenacidade à

fractura da liga de alumínio AA1050 utilizou-se uma ferramenta desenvolvida especificamente para

este fim, a qual foi instalada na prensa de impulsão electromagnética apresentada anteriormente.

a) b) c)

Figura 3.9: a) Representação esquemática do ensaio de fractura com aplicação de força normal, b) e c)

Fotografia da ferramenta utilizada nos ensaios de fractura.

A ferramenta para os ensaios de fractura foi concebida tendo por base a necessidade de

avaliar a evolução do carregamento durante a realização do ensaio de fractura dúctil em modo II com

controlo da tensão normal ao plano de fractura.

A ferramenta de ensaios possui o conceito tradicional das ferramentas de corte por

arrombamento com placa guia/desembainhador do punção, Figura 3.9, com algumas alterações para

que se pudessem medir a carga (na direcção tangencial e normal ao plano de fractura) e o

deslocamento do punção. As partes activas desta ferramenta foram montadas num conjunto

base/tecto com recurso a um sistema de guiamento por coluna/casquilho de escorregamento,

garantindo-se assim a posição relativa entre o punção e a matriz, ao mesmo tempo que a propagação

de vibrações transversais característica deste tipo de ensaios é minimizada. Esta ferramenta é

composta genericamente por um punção e uma matriz de aço inoxidável AISI304 alinhados entre si,

os quais permitem realizar ensaios de fractura em provetes duplamente entalhados com uma tensão

normal pré-definida.

Após se fixar o provete numa cavidade existente na matriz, são de seguida estabelecidas as

condições de ensaio com a aplicação e leitura da força normal FN com o auxílio respectivamente do

parafuso específico, e da célula de carga.

Depois do aperto da tampa da matriz, o provete fica por fim completamente encastrado e

preparado para a realização do ensaio de fractura.

Célula

de carga

Punção Potenciómetro

Tecto

invertido

Base

invertida

Matriz

Page 47: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

34

A força de corte é registada com a ajuda de uma célula de carga que está conectada à

estrutura da matriz. Para a medição do deslocamento do punção foi necessário utilizar um sistema de

fixação que permite a colocação um potenciómetro entre a base e o tecto da ferramenta de modo que

o deslocamento relativo entre estes dois componentes pudesse ser medido.

3.3 Material

Como já foi referido anteriormente, o material utilizado foi o Aluminio da série AA1050 com uma

pureza de 99.50% conseguida através da utilização de um sistema de filtragem Figura 3.10 a) e da

utilização de um gás inerte (Árgon) durante o processo de fundição deste material.

Os provetes utilizados nos ensaios de compressão a alta velocidade são cilindricos, com 6

mm de diâmetro e 6 mm de altura e foram obtidos a partir de torneamento. Estes provetes depois de

maquinados foram sujeitos a um processo de recozimento de modo a eliminar as tensões residuais

caracteristicas da fundição e do torneamento.

a) b) c)

Figura 3.10: Provetes utilizados nos ensaios de compressão a alta velocidade a) sistema de filtragem para

fundição, b) fotografia do torneamento dos provetes c) fotografia do provete final

No caso dos ensaios de fractura, os provetes utilizados foram obtidos a partir da fresagem

convencional e posterior maquinagem por electroerosão da liga de alumínio apresentada

anteriormente. As dimensões e a fotografia destes provetes encontram-se apresentadas na Figura

3.11 a) e b) respectivamente

a) b)

Figura 3.11: Provetes utilizados nos ensaios de fractura. a) Dimensões do provete em mm, b) fotografia do

provete

12

20

a

c

0,7

0

14

40

Page 48: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

35

3.4 Plano de Ensaios

Na determinação das curvas de escoamento do aluminio AA1050, obtidas experimentalmente

com ensaios de compressão a alta velocidade na máquina de ensaios por came electromagnética,

seguiu-se o plano de ensaios apresentado na Tabela 3.1.

Caso Condições de Ensaio Velocidade Vx (m/s)

1 Quase-estático 0,01

2 Came Logística 1,85

3 Came Logística 3,9

4 Came Logística 5,8

5 Came Logística 7,8

6 Came Logística 9,2

7 Came Quadrática 3,5

8 Came Quadrática 6,9

9 Came Quadrática 10,4

10 Came Quadrática 13,9

11 Came Quadrática 17,5

Tabela 3.1: Plano de ensaios da caracterização das curvas de escoamento do alumínio AA1050

Na Tabela 3.2 apresenta-se a numeração dos ensaios de fractura para as três velocidades de

ensaio e para os vários intervalos de espessura de ligamento . Esta tabela de ensaios é semelhante

nos casos em que a tensão normal é igual a 30 MPa e a 60 MPa.

Page 49: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

36

Caso Intervalo de valores da

espessura do ligamento c (mm) Velocidade de ensaio (m/s)

1 0 e 1,5 Quasi-estático

2 0 e 1,5 Quasi-estático

3 1,5 e 2,5 Quasi-estático

4 1,5 e 2,5 Quasi-estático

5 2,5 e 3,5 Quasi-estático

6 2,5 e 3,5 Quasi-estático

7 0 e 1,5 2

8 0 e 1,5 2

9 1,5 e 2,5 2

10 1,5 e 2,5 2

11 2,5 e 3,5 2

12 2,5 e 3,5 2

13 0 e 1,5 3

14 0 e 1,5 3

15 1,5 e 2,5 3

16 1,5 e 2,5 3

17 2,5 e 3,5 3

18 2,5 e 3,5 3

Tabela 3.2: Tabela representativa dos ensaios de fractura do alumínio AA1050 para o caso em que a tensão

normal é 0.

Page 50: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

37

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nesta secção irão ser apresentados os resultados dos valores experimentais da tensão de

escoamento nos ensaios de compressão a alta velocidade e o seu posterior ajuste tridimensional em

função da extensão e velocidade de deformação. Nestes casos utilizaram-se os dois tipos de cames,

acopladas ao mecanismo descrito no capítulo anterior, simulando-se deste modo as condições de

deformação características dos respectivos processos de fabrico.

No caso dos ensaios de fractura, apresentam-se e discutem-se os resultados obtidos para o

valor da tenacidade à fractura do alumínio AA1050, a sua evolução com propriedades geométricas do

material e velocidades de ensaio, assim como a influência da tensão normal nesta mesma

característica do material.

Por fim comparam-se as diferenças obtidas no cálculo da força máxima neste tipo de ensaios

quando se utilizam modelações numéricas baseadas nos resultados obtidos da tenacidade à fractura,

com os resultados obtidos aquando da utilização de uma nova metodologia de determinação da

energia por unidade de volume necessária à formação de novas superfícies.

4.1 Ensaios de compressão a alta velocidade

Os ensaios de compressão são bastante utilizados na caracterização da tensão de

escoamento de materiais, nos quais o provete cilíndrico é comprimido axialmente entre dois pratos de

elevada dureza. As variáveis medidas ao longo destes ensaios, nomeadamente o tempo, o

deslocamento e a força instantânea, vão permitir que se infiram através das expressões

apresentadas no capítulo 2, as variáveis necessárias para a obtenção das superfícies tridimensionais

da tensão de escoamento.

A Figura 4.1 apresenta a variação da força-deslocamento a partir dos ensaios experimentais

3 e 8 (Tabela 3.1), onde se utilizaram respectivamente a came logística e quadrática.

Page 51: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

38

Figura 4.1: Evolução experimental da evolução da força-deslocamento para diferentes condições de ensaio,

casos 3 e 8

Verifica-se que não existem grandes oscilações no caso da came logística (caso 3). Já no

caso da came quadrática (caso 8) observam-se características semelhantes a sistemas vibratórios

atenuados ao longo do tempo. Como se pode verificar no caso 8, a vibração inicial livre tem tendência

a desaparecer devido ao fenómeno de amortecimento. Este comportamento é semelhante a todos os

ensaios que se realizaram com a came quadrática, concluindo-se portanto que as características

dinâmicas deste mecanismo influenciam significativamente os resultados obtidos.

Elaborou-se assim uma análise do espectro de frequência dos resultados experimentais,

aplicando-se o princípio da transformada de Fourier. Depois de identificados os valores de

ressonância e de anti-ressonância do sistema, determinaram-se os intervalos de frequência que

devem ser filtrados dos valores experimentais de força-deslocamento.

Para isso elaborou-se um programa em Labview que permitiu calcular as FFT, a média da

função transferência dos diversos ensaios experimentais e onde se aplica o filtro de gama de

frequências a eliminar. Na Figura 4.2 a) apresenta-se o resultado da aplicação desta metodologia

para o ensaio experimental 8.

0

5000

10000

15000

20000

25000

30000

35000

0 1 2 3 4 5

Fo

rça (

N)

Deslocamento (mm)

Caso 3

Caso 8

Page 52: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

39

a) b)

Figura 4.2: a) Evolução da força com o deslocamento antes e depois da aplicação do filtro de frequências. b)

Diagrama de blocos do programa desenvolvido em Labview para cálculo das transformadas de Fourier, funções

transferência e filtragem de dados.

Esta evolução filtrada da força-deslocamento revelou-se bastante importante para a obtenção

da evolução tridimensional da tensão de escoamento do Alumínio AA1050, por se aumentar a

precisão do ajuste da evolução da tensão com a extensão em cada um dos ensaios experimentais

realizados no caso da came quadrática.

Admitiu-se como modelo constitutivo do comportamento mecânico deste material o modelo

hibrido, equação 4.2, no qual a tensão de escoamento depende de duas variáveis características do

material, nomeadamente a velocidade de deformação e a extensão (equação 4.1)).

(4.1)

Ao contrário da maioria dos modelos empíricos ou semi-empíricos tradicionais que expressam

a tensão de escoamento em função de uma única variável característica, este modelo desenvolvido

recentemente, equação 4.2, combina os efeitos da extensão e velocidade de deformação, o que lhe

confere uma ampla gama de aplicabilidade.

As constantes A, B, C, m, n; r dependem do material em causa e das condições em que são

feitos os ensaios experimentais de caracterização mecânica do mesmo.

(4.2)

Estas constantes são obtidas a partir do ajuste dos valores experimentais com a expressão

matemática do modelo hibrido apresentada anteriormente, recorrendo-se para isso a diversas

iterações e análises computacionais em softwares de tratamento de dados.

Page 53: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

40

0

1000

2000

3000

0 0,5 1 1,5 2

Ve

loc

ida

de

de

De

f. (

s-1

)

Extensão

caso 1

caso 7

caso 8

caso 9

caso 10

caso 11

Estes resultados, aliados ao facto da expressão possuir duas variáveis independentes,

nomeadamente a extensão e a velocidade de deformação, permitem que se gerem os gráficos

tridimensionais da tensão de escoamento apresentadas no decorrer deste capítulo.

Nas Figura 4.3 a) e b) encontram-se representados respectivamente os perfis de velocidade

de deformação-extensão e a superfície tridimensional da tensão de escoamento resultantes dos

ensaios experimentais realizados com a came quadrática. Na Figura 4.3 b) também estão

representados os diferentes resultados experimentais filtrados deste plano de ensaios, onde se

verificam evoluções constantes da velocidade de deformação com a extensão.

a) b)

Figura 4.3: Curvas da tensão de escoamento do alumínio obtidas com a came quadrática; a) Perfis de

deformação para as diferentes velocidades de ensaio da Tabela 3.1; b) Gráfico tridimensional da superfície da

tensão de escoamento.

Na Figura 4.4 a) apresentam-se os perfis de velocidade de deformação-extensão para os

ensaios experimentais realizados com a came logística. Estes perfis reproduzem fielmente as

condições reais de escoamento na região deformada plasticamente no processo de corte ortogonal.

A superfície tridimensional de ajuste da tensão de escoamento obtida através da came

logística é apresentada na Figura 4.4 b). Neste gráfico também se encontram representados os vários

resultados experimentais deste tipo de ensaios, que possuem evoluções lineares das respectivas

velocidades de deformação com a extensão.

Veloc. de Def. (s-1) Extensão

Te

nsão

(M

pa

)

Page 54: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

41

0

1000

2000

3000

0 0,5 1 1,5 2

Ve

loc

ida

de

de

De

f. (

s-1

)

Extensão

caso 1

caso 2

caso 3

caso 4

caso 5

caso 6

a) b)

Figura 4.4: Curvas da tensão de escoamento do alumínio obtidas com a came logística; a) Perfis de deformação

para as diferentes velocidades de ensaio da Tabela 3.1; b) Gráfico tridimensional da superfície da tensão de

escoamento e dados experimentais.

As contantes matemáticas que se obtiveram para a expressão do modelo hibrido da evolução

da tensão de escoamento em função da velocidade de deformação e da extensão, para o alumínio

AA1050, nos dois tipos de ensaios apresentados anteriormente encontram-se explicitadas na Tabela

4.1.

Parâmetro Came Quadrática Came Logística

0.45 0.22

-0.19 -0.34

0.38 0.36

77.04 134.12

12.9 12.58

3.19 0.844

Tabela 4.1: Tabela com as constantes determinadas para modelo hibrido

Veloc. de Def. (s-1)

Te

nsão

(M

pa

)

Extensão

Page 55: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

42

As diferenças entre as superfícies da tensão de escoamento obtidas a partir dos ensaios de

compressão realizados com a came logística e came quadrática são também clarificadas na Figura

4.5, onde estão representadas intersecções de ambas as superfícies tridimensionais com planos de

velocidades de deformação constantes ( ).

Figura 4.5: Curvas de tensão - extensão das cames logística e quadrática para diferentes valores de velocidade

de deformação

A capacidade que a came logística possui de modelar o corte ortogonal, e deste modo reproduzir o

amaciamento do material devido ao rearranjo das deslocações sob recristalização dinâmica (Sima

2010), é traduzida nas diferenças observadas no gráfico anterior. Deste modo as diferenças inerentes

aos dois tipos de ensaios são perfeitamente clarificadas.

4.1.1 Validação dos resultados através de FEM

Para a validação dos resultados obtidos nos ensaios com a came quadrática, procedeu-se à

simulação numérica de um ensaio típico de corte por arrombamento, onde se utilizou como lei de

comportamento do material a expressão apresentada anteriormente para a variação da tensão de

escoamento do alumínio AA1050, Figura 4.6.

Para isso utilizou-se o programa I-Form e estudou-se a evolução da velocidade de

deformação com a extensão para dois elementos localizados na zona central sujeita a deformação

plástica, como se apresenta na Figura 4.6.

0

50

100

150

200

250

0 0,5 1 1,5 2

Te

ns

ão

(M

Pa

)

Extensão

Quase Estático

1000 s-1 (Quadrática)

1000 s-1 (Logística)

2000 s-1 (Quadrática)

2000 s-1 (Logística)

Page 56: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

43

a) b)

Figura 4.6: a) Representação esquemática da simulação do ensaio de corte por arrombamento e b) respectivo

gráfico da evolução da velocidade de deformação com a extensão.

Como se pode observar na Figura 4.6 b), a evolução da velocidade de deformação com a

extensão é praticamente constante nos dois elementos utilizados. Estes resultados além de estarem

concordantes com os diversos estudos de corte por arrombamento que têm sido desenvolvidos ao

longo do tempo e apresentados anteriormente neste trabalho, permitem concluir que a caracterização

da evolução da tensão de escoamento para o alumínio AA1050 foi bem conseguida, e que a

metodologia apresentada serve de referência para trabalhos futuros.

4.2 Ensaios de Fractura

Estes ensaios experimentais tiveram como principal objectivo a determinação da evolução da

força com o deslocamento para os vários valores da velocidade de actuação (quase-estático, 2m/s e

3m/s) e da espessura do ligamento, como se pode verifica na Figura 4.7.

0

250

500

750

1000

1250

0,0 0,1 0,2 0,3

Vel.d

e d

efo

rmação

(s

-1)

Extensão

Elemento 1065 Elemento 478

Elem. 1065

Elem. 478

Page 57: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

44

0

2000

4000

6000

8000

10000

12000

0 1 2 3

Fo

rça

(N

)

Deslocamento (mm)

c=2.4 c=1.7 c=1.3 c=0.8

0

2000

4000

6000

8000

10000

12000

0 1 2 3

Fo

rça

(N

)

Deslocamento (mm)

c=2.8 c=2 c=1.6 c=0.8

a) b)

Figura 4.7: Evolução experimental da força com o deslocamento para os ensaios de fractura realizados com

diferentes espessuras de ligamento em condições a) quasi-estáticas e b) com velocidade de actuação

m/s

Observa-se que a força de corte aumenta com o aumento da espessura de ligamento para

cada velocidade de actuação. Observa-se também que a força de corte aumenta à medida que a

velocidade de actuação também aumenta, para valores idênticos da espessura de ligamento.

Como explicado anteriormente, para a determinação do valor da tenacidade à fractura R

realizaram-se vários ensaios com diferentes espessuras de ligamento c, seguida de uma

extrapolação dos valores obtidos experimentalmente para o caso limite em que a espessura do

ligamento é igual a 0.

O resultado desta metodologia de estudo para as diferentes velocidades de ensaio, com a

ausência de força normal aplicada aos provetes, pode ser observado na Figura 4.8 a).

Na Figura 4.8 b) apresenta-se o estudo da evolução da tenacidade à fractura R, com a

variação da tensão normal aplicada, para diferentes velocidades de ensaio.

Page 58: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

45

50

60

70

80

90

100

110

0 1 2 3

w (

kJ

/m2

)

c (mm)

Quasi-estático 2 m/s 3 m/s

45

50

55

60

65

70

75

80

0 30 60

R (

KJ/

m2)

σ (MPa)

0 m/s 2 m/s 3 m/s

a) b)

Figura 4.8: a) Procedimento de determinação da tenacidade à fractura R, para diferentes velocidades de ensaio

, sem tensão normal aplicada. b) Evolução da tenacidade à fractura com a variação da tensão normal aplicada,

para as diferentes velocidades de ensaio.

A partir da análise da figura anterior, constata-se que a tenacidade à fractura aumenta com a

velocidade do ensaio. Por outro lado verifica-se que para todas as velocidades de ensaio, o valor da

energia por unidade de área aumenta com o crescimento da espessura do ligamento.

Analisando a Figura 4.8 b), verifica-se que com o aumento da tensão normal, o valor da

tenacidade à fractura cresce de um modo pouco significativo para todas as velocidades de ensaio.

Este resultado é importante na medida em que se exclui, numa primeira aproximação, a necessidade

de inclusão deste parâmetro aquando da modelação deste tipo de ensaios.

Como foi descrito no capítulo anterior, utilizou-se outra metodologia no tratamento dos

resultados experimentais, tendo-se determinado a energia por unidade de volume U que é necessária

para a formação de novas superfícies. Este valor resulta da subtracção entre a energia total obtida no

respectivo ensaio experimental, com a energia teórica necessária à deformação plástica do material..

Assume-se ainda que o mecanismo de fissuração ocorre na totalidade do volume em deformação

plástica, e como tal a expressão de U é descrita pela equação 4.3.

(4.3)

R

Page 59: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

46

O valor teórico da energia necessária à deformação plástica do material foi encontrado

através da simulação numérica de elementos finitos, com o programa I-Form, amplamente utilizado

na simulação computacional de processos de deformação plástica. Esta simulação computacional

tirou partido da simetria planar dos vários ensaios experimentais, tendo-se recorrido à discretização

dos provetes com elementos quadriláteros e à discretização das ferramentas com elementos lineares

de contacto com atrito Figura 4.9.

Figura 4.9: Discretização por elementos finitos no instante inicial e final da simulação numérica do ensaio de

fractura com o programa I-FORM

Na Figura 4.10 apresentam-se os valores obtidos para a evolução da energia por unidade de

volume U que é necessária para a formação de novas superfícies, com a variação da espessura de

entalhe c, para várias velocidades de ensaio.

Figura 4.10: Evolução da energia por unidade de volume U com a espessura do ligamento e com a velocidade

do ensaio

Verifica-se que o valor da energia por unidade de volume U é praticamente constante com a

variação da espessura de entalhe c, para cada velocidade de ensaio. Este resultado valida de forma

indirecta, o pressuposto da deformação plástica estar limitada ao material adjacente ao ligamento.

22

26

30

34

38

42

46

50

0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5

U (

MJ/m

3)

c (mm)

Quase estático 2 m/s 3 m/s

Page 60: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

47

Um dos parâmetros mais importantes que se pretende prever com exactidão com a

modelação deste tipo de ensaios é a força máxima de corte. Tendo em conta o que foi referido

anteriormente relativamente à contribuição das várias parcelas de energia para o valor final da

energia total, é lícito esperar-se que a expressão da força máxima de corte que é disponibilizada na

literatura da especialidade seja o resultado do somatório da força necessária para a deformação

plástica, com a força necessária para a formação de novas superfícies, e ainda com a força

necessária para a se vencer o atrito entre o material e a ferramenta (ao nível das folgas).

(4.4)

Visto que neste tipo de ensaios não existe contacto entre o material que se está a deformar e

a parte inferior da ferramenta de ensaios, a parcela correspondente à força de atrito pode ser

desprezada.

A força necessária para a formação de novas superfícies é contabilizada através das medidas

de energia específica R e U, (apresentadas anteriormente) conforme se demonstra com as seguintes

equações.

(4.5)

(4.6)

Na determinação da força necessária para a deformação plástica do material Fplást. admite-se

que a separação do material se processa pela acção de tensões de corte e que a força máxima de

corte é proporcional à tensão de corte máxima à espessura c e ao perímetro de corte p ao longo

do que se encontram aplicadas as tensões de corte. A equação 4.7 representa o que foi referido

anteriormente, onde a tensão de corte máxima é substituída pelo valor que resulta do critério de

plasticidade de Von Mises √ . (Rodrigues; Martins, 2005)

√ (4.7)

Estes valores da força associada à deformação plástica do material foram alternativamente

contabilizados por intermédio de simulação numérica com o método dos elementos finitos, com

recurso ao programa I-FORM. As diferenças dos valores obtidos através destas duas metodologias,

para as velocidades de ensaio quasi-estáticas e 3m/s, são quase inexistentes, como se pode verificar

na Figura 4.11.

Page 61: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

48

0

2000

4000

6000

8000

10000

12000

0,80 1,30 1,70 2,40

Fm

áx

(N

)

c (mm)

EXP. R U

0

2000

4000

6000

8000

10000

12000

0 1 2 3

Fo

rça

x. (N

)

c (mm)

Exp.

Iform

0

2000

4000

6000

8000

10000

12000

0 1 2 3

Fo

rça

x (

N)

c (mm)

Exp.

Iform

Analít.1

0

2000

4000

6000

8000

10000

12000

0,8 1,6 2 2,8

Fm

áx

(N

)

c (mm)

EXP. R U

a) b)

Figura 4.11: Gráfico de comparação entre os valores experimentais, teóricos e resultantes da simulação

numérica das forças máximas de corte em função da espessura do ligamento para uma velocidade de actuação

a) quasi-estática e b) 3m/s.

A validação do cálculo da força máxima de corte baseada numa análise de plasticidade e

fractura foi realizada por comparação dos valores experimentais com os que resultam da soma da

força devida à deformação plástica com a força necessária para a formação de novas superfícies se

obtém a partir dos resultados da tenacidade à fractura R e da energia por unidade de volume U,

equações 4.5 e 4.6. Os valores obtidos com esta metodologia para as velocidades de ensaio quase

estática e de 3 m/s estão representados na Figura 4.12 a) e b) respectivamente.

a) b)

Figura 4.12: Valores experimentais e calculados analiticamente das forças máximas de corte em função da

espessura do ligamento para o ensaio de fractura a uma velocidade de actuação a) quasi-estática e b) 3 m/s

A partir da análise dos gráficos apresentados anteriormente, conclui-se que a contribuição da

mecânica da fractura é fundamental para se assegurar uma boa correlação entre os valores

experimentais e os calculados analiticamente.

Verifica-se ainda que os resultados da força máxima determinados a partir dos valores da

energia por unidade de volume U, se aproximam mais dos obtidos experimentalmente, apesar de

ainda não se ter chegado a uma concordância generalizada sobre os princípios físicos por detrás

desta metodologia.

Page 62: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

49

5 CONCLUSÕES E TRABALHO FUTURO

O conhecimento do comportamento mecânico dos materiais sob condições de ensaio que

garantam similaridade com a máquina real e o processo de deformação é fundamental para uma

caracterização precisa e confiável da deformabilidade e encruamento dos materiais.

Pode-se concluir que a máquina de ensaios por came electromagnética é capaz de operar

numa gama muito alargada de condições similares às encontradas em processos reais de fabrico.

Deste modo as variações no perfil da came, modificações nas bobines do actuador e mudanças nas

tensões do circuito de carga e descarga (que influenciam a energia cinética disponível na máquina)

são facilmente realizáveis, com um custo de implementação muito baixo, sendo possível efectuar-se

a caracterização dos materiais sob inúmeras condições de velocidade de deformação-extensão.

Tal como comprovado experimentalmente e analiticamente neste trabalho, os perfis de

velocidade de deformação-extensão durante a deformação plástica têm uma influência significativa

na resposta do material em termos de tensão de escoamento. Conclui-se portanto que a inclusão da

precisa evolução da tensão de escoamento com a velocidade de deformação e extensão é essencial

para a obtenção de resultados viáveis na simulação de qualquer processo de fabrico.

A investigação realizada no âmbito deste trabalho permitiu também tirar conclusões

relativamente à contribuição da mecânica da fractura dúctil para o mecanismo de formação de novas

superfícies, que é intrínseco aos processos de fabrico por separação. Conclui-se que o valor da

tenacidade à fractura R varia com a velocidade de deformação a que o material está sujeito e que é

independente da espessura da secção resistente (para velocidades semelhantes).

Conclui-se também que a tensão normal não faz variar significativamente o valor da

tenacidade à fractura R, qualquer que seja a velocidade de deformação do material. Estes resultados

são particularmente importantes na simulação de processos que envolvam a formação de novas

superfícies, tanto na escolha dos parâmetros de simulação, como na integração destas conclusões

nas formulações de elementos finitos. Deste modo, os resultados obtidos permitem concluir que a

contribuição da mecânica da fractura com a deformação plástica é fundamental para a obtenção de

estimativas precisas, teóricas ou numéricas, da força máxima nos processos de corte.

Como trabalho futuro propõe-se a caracterização de outros materiais de engenharia com

valores de tensão de escoamento superiores ás do alumínio AA1050. Será portanto necessário

aumentar a capacidade do actuador electromagnético e verificar a integridade do sistema de

compressão das cames para se ir ao encontro destes novos requisitos.

Sugere-se ainda um estudo mais aprofundado dos fenómenos físicos por detrás dos valores

obtidos para a energia por unidade de volume U, por não se ter encontrado ainda um consenso

generalizado para os resultados obtidos através desta metodologia. Para isso, será eventualmente

necessário realizar um estudo computacional mais aprofundado do estado de tensão no plano de

corte, bem como realizar esta investigação para materiais com comportamentos mecânicos diferentes

da liga de alumínio AA1050. Será também necessário actualizar as actuais formulações de elementos

Page 63: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

50

finitos de modo a integrar estes novos aspectos fenomenológicos relacionados com a mecânica da

fractura.

Page 64: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

51

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Alves M. L., Rodrigues J. M. C. and Martins P. A. F. (2004), Three-dimensional modelling of forging processes by

the finite element flow formulation, Journal of Engineering. Manufacture, 218, 1695-1708.

Anurag, S. e Guo, Y.B. 2007. A modified micromechanical approach to determine flow stress of work materials

experiencing complex deformation histories in manufacturing processes. Int. J. of Mechanical Sciences, 49, p.

909–918

Atkins, A.G., “Ductile shear fracture mechanics”, Key Engineering Materials, Trans Tech Publications, Switzerland,

Vols. 177-180, pp. 59-68, 2000.

Atkins, A.G., “Ductile shear fracture mechanics”, Key Engineering Materials, Trans Tech Publications, Switzerland,

Vols. 177-180, pp. 59-68, 2000.

Atkins A. G., “Modelling metal cutting using modern ductile fracture mechanics: quantitative explanations for some

longstanding problems”, Int. J. Mech. Sci., 45: 373-396, 2003.

Banabic D., Bunge H.-J., Pöhlandt K. and Tekkaya A. E. (2000), Formability of metallic materials, Springer-

Verlag, Berlin.

Centeno G., Benítez F. G. and Wideberg J. P (2007), Experimental study of impact on SMC composite used in

the automotive industry, Int. J. Vehicle Design, Vol. 44, Nos. 3/4.

Childs, T. H. C. (1998). Material property needs in modeling metal machining, Machining Science and

Technology, 2: 2, 303-316.

Field J. E., Walley S. M., Proud W. G., Goldrein H. T., Siviour C. R. (2004) Review of experimental techniques for

high rate deformation and shock studies, International Journal of Impact Engineering, 30, 725–775.

Guo Y. B. (2003) An integral method to determine the mechanical behaviour of materials in metal cutting, Journal

of Materials Processing Technology, 142, 72-81.

Guo Y., Saldana C., Mann J. B., Saoubi R. M., Chandrasek S. (2011), Deformation and Microstructure in

Machining, Advanced Materials Research, 223, 325-331.

Hambli R., Reszka M. (2002), “Fracture criteria identification using an inverse technique method and blanking

experiment”, International Journal of Mechanical Sciences,

Jaspers S. P. F. C., Dautzenberg J. H. (2002) Material behaviour in conditions similar to metal cutting: flow stress

in the primary shear zone, Journal of Materials Processing Technology, 122, 322-330

Kalpakijan S., “Manufacturing process for engineering materials”. Addison-Wesley, 1997

Lei, S., Shin, Y. C. e Incropera, F. P. (1999), Material constitutive modeling under high strain rates and

temperatures through orthogonal machining tests, J. of Manufacturing Science and Engineering, 121, p. 577-585.

Lindholm, U. S., 1964, “Some experiments with the split-Hopkinson pressure bar”, Journal of the Mechanics and

Physics of Solids, 12, pp.317-335

Rodrigues J.M.C. and Martins P.A.F., “Tecnologia da deformação plástica, Vol. I. Fundamentos teóricos”, Escolar

Editora, Portugal, (2005).

Rosa P. A. R., Martins P. A. F., Atkins A. G. (2007) Revisiting the fundamentals of metal cutting by means of finite

elements and ductile fracture mechanics, International Journal of Machine Tools and Manufacture, 47, 607–617

Salisbury, C., 2001, “Spectral Analysis of Wave Propagation Through a Polymeric Hopkinson Bar”, MSC Thesis,

Ontario (Canada).

Shatla, M., Kerk, C. e Altan, T. 2001. Process modeling in machining. Part I: determination of flow stress data, Int.

J. of Machine Tools & Manufacture, 41, p. 1511–1534.

Siegmund, T., & Brocks, W., “A numerical study on the correlation between the work of separation and the

dissipation rate in ductile fracture”, Engineering Fracture Mechanics, 67: 139-154, 2000.

Page 65: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

52

Silva C.M.A., Rosa P.A.R., Martins P.A.F., “Mechanical characterization of materials for bulk forming using a drop

weight testing machine”, Journal of Mechanical Engineering Science, 224, p. 1795-1804, 2010

Taylor G. I. (1948), The use of flat-ended projectiles for determining dynamic yield stress - Theoretical

considerations, Proceedings Royal Society London A, 194, 289–299.

Tekkaya A. E. and Martins P. A. F. (2009), Accuracy, reliability and validity of finite element analysis in metal

forming: a user’s perspective, Engineering Computations.

Turner CE., “A re-assessment of ductile tearing resistance (Part I and II)”. Fracture Behaviour and Design of

Materials and Structures. Proc ECF 8, vol. II. p. 933–49. and p. 951–68, 1990.

Vernaza-Peña, K. M., J. J. Mason, M. Li, 2002, “ Experimental Study of the Temperature Field Generated During

Orthogonal Machining of an Aluminum Alloy, Experimental Mechanics, Vol. 42, Nº2.

W. Brocks, P. Anuschewski, “Parametrizing ductile tearing resistance by four parameters”, Engineering Fracture

Mechanics, Volume 71, Issue 1, pp 127-146, 2004.

Zheng, Y., Sutherland, J.W.(1999). An orthogonal cutting model based on finite deformation analysis, Part II.

Constitutive equations and experimental verification, ASME MED, 10, p. 301–309.

Page 66: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

53

7 ANEXOS

Aparto experimental para futuros ensaios de corte ortogonal

Este aparato experimental foi desenvolvido com o objectivo se se estudar experimentalmente

o corte ortogonal no alumínio, passando a ser possível fazer a comparação de resultados obtidos

através de simulação com elementos finitos (a partir das metodologias de caracterização de material

apresentadas neste trabalho), com os valores resultantes dos ensaios no processo real.

Para se alcançarem os requisitos energéticos necessários a este tipo de ensaios, foi

necessário conciliarem-se elevadas velocidades e forças de corte, com o menor custo e tempo de

implementação possível.

Para isso desenvolveu-se uma máquina de ensaios que tem por base um limador mecânico

do tipo L2.05.6 de 1967, que se encontrava inactivo e bastante danificado nas antigas oficinas de

metalomecânica do Instituto superior técnico.

Apesar de ser uma máquina bastante antiga, possui características mecânicas que lhe

permitem alcançar forças de corte e velocidades de actuação suficientes, reunindo-se assim todas as

condições necessárias a este tipo de investigação experimental.

Realizou-se todo o processo de restauro e modernização desta máquina, com o objectivo de

a tornar não só funcional, mas também bastante flexível para os diversos planos de ensaios a

realizar.

Procedeu-se à identificação e substituição de todos os componentes que se encontravam

danificados ou que necessitavam de melhoramentos. Procedeu-se à troca de óleo dos sistemas de

engrenagens, bem como à correcção de algumas folgas existentes no movimento do cabeçote, e

efectuou-se todo o trabalho de decapagem, restauro e de pintura da máquina.

a) b) c) d)

Figura 7.1 Etapas de restauro exterior do limador, a) estado inicial, b) e c) processo de decapagem e pintura, d)

limador restaurado

Page 67: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

54

Foi necessário efectuar o planeamento cuidado de todo o processo de transporte do limador,

visto existirem diversos factores adversos à realização desta tarefa, nomeadamente as reduzidas

dimensões e complexidade do caminho desde a saída do elevador monta cargas no piso -2 do

pavilhão de pós-graduação até ao laboratório de ensaios dinâmicos, assim como o elevado peso e

características geométricas desta máquina.

Para se ultrapassar os obstáculos existentes no caminho até ao laboratório de destino da

máquina, optou-se por se projectar e construir um suporte móvel direccionável, no qual se assentou a

traseira do limador, diminuindo-se assim o comprimento total do volume a ser deslocado.

Para se minimizar os riscos inerentes a este processo e para se prevenir eventuais

contratempos, além de se ter planeado cuidadosamente todas as etapas de transporte, utilizou-se o

software Cosmos para se garantir a estabilidade estrutural do suporte móvel.

a) b) c)

Figura 7.2: a) Projecto do suporte de transporte do limador, b) fotografia da posição de transporte, c) simulação

do percurso e metodologia de transporte da máquina

.

Para se poder medir as forças exercidas durante os ensaios de corte ortogonal, acompanhou-

se o projecto, construção e implementação de uma célula de carga de medição bidimensional das

forças envolvidas neste tipo de corte. Estas etapas passaram pela simulação dos esforços a que a

célula de carga estaria sujeita com o auxílio do programa Ansys, e o seu posterior dimensionamento.

De seguida utilizou-se o programa MasterCam para se programarem as várias etapas de

maquinagem na fresadora CNC deste componente. Após efectuados todos os processos de

fresagem e furação, a elevada espessura da peça levou a que se tivesse optado pela técnica de

maquinagem por electroerosão para a remoção do material entre os furos previamente realizados.

Equipou-se também esta máquina com um sensor de deslocamento de elevada precisão

para que se possa medir com exactidão o deslocamento realizado durante estes ensaios

experimentais.

Page 68: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

55

a) b) c)

Figura 7.3: Etapas de fabrico da célula de carga, a)maquinagem na fresadora CNC, b)maquinagem por

electroerosão, c) célula de carga terminada com base de suporte.

Laboratório de Ensaios Dinâmicos (LED)

Como o objectivo de se proporcionar um local ideal à investigação experimental de diversos

processos de deformação plástica do material, desenvolveu-se um laboratório de ensaios dinâmicos

que reúne todas os requisitos a este tipo de investigação.

Para isso foi necessário efectuar-se uma completa remodelação da área adjacente às

escadas de acesso ao laboratório de tecnologia mecânica, no piso -2 do pavilhão de pós-graduação

do Instituto Superior Técnico. Esta remodelação passou pelo melhoramento do pavimento existente,

tendo-se optando por um revestimento antiderrapante e resistente a infiltrações de óleos,

respeitando-se assim a legislação em vigor. As paredes do laboratório também respeitam as normas

estipuladas. Foram escolhidas tintas foscas, impermeáveis, fáceis de limpar e com uma cor clara para

se rentabilizar a pouca luz natural disponível naquele local.

Por não existir nenhuma barreira física de delimitação do laboratório, optou-se pela colocação

de uma estrutura de alumínio com painéis de vidro. Deste modo consegue-se uma optimização dos

consumos energéticos e gastos em equipamentos, por se aumentar a utilização da luz natural.

O layout escolhido colmata algumas dificuldades inerentes à reduzida área útil do laboratório

de ensaios dinâmicos, sendo possível trabalhar eficientemente em qualquer máquina de ensaios.

a) b) c)

Figura 7.4: Fotografias representativas da evolução do laboratório de ensaios dinâmicos (LED). a) e b) local do

laboratório antes da remodelação. c) laboratório montado e operacional.

Page 69: Comportamento Mecânico de Materiais em Processos de Fabrico ...

56