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AÇÃO EDUCATIVA INCLUSIVA E COMUNICAÇÃO MUSEOLÓGICA: Mudança de Paradigmas Amanda Pinto da Fonseca Tojal Museóloga e Educadora de Museus. Mestre em Arte e Educação e Doutora em Ciência da Informação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Consultora em Acessibilidade e Ação Educativa Inclusiva em Museus e Instituições Culturais. Educa- dora e Coordenadora dos Programas Educativos para Públicos Espe- ciais do Museu de Arte Contemporânea da USP (1988 a 2003) e da Pi- nacoteca do Estado de São Paulo (2003 a 2012). Docente de cursos de formação sobre "Acessibilidade Expográfica e Ação Educativa Inclu- siva em Museus e Instituições Culturais". Sócia-diretora da empresa Arteinclusao Consultoria em Ação Educativa e Cultural, desde 2003. lí-mail: [email protected]/ Site: www.arteinclusao.com.br

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AÇÃO EDUCATIVA INCLUSIVA E COMUNICAÇÃO MUSEOLÓGICA: Mudança de Paradigmas Amanda Pinto da Fonseca Tojal

Museóloga e Educadora de Museus. Mestre e m A r t e e Educação e

D o u t o r a e m Ciência da Informação pela Escola de Comunicações e

Artes da U n i v e r s i d a d e de São Paulo. Consul tora e m Acessibi l idade e

Ação Educat iva Inc lus iva e m Museus e Instituições C u l t u r a i s . Educa­

dora e Coordenadora dos Programas Educat ivos para Públicos Espe­

ciais d o M u s e u de A r t e Contemporânea da USP (1988 a 2003) e da P i ­

nacoteca d o Estado de São Paulo (2003 a 2012). Docente de cursos de

formação sobre "Acess ib i l idade Expográfica e Ação Educat iva I n c l u ­

siva e m Museus e Instituições C u l t u r a i s " . Sócia-diretora da empresa

Arteinclusao C o n s u l t o r i a e m Ação Educat iva e C u l t u r a l , desde 2003.

lí-mail: [email protected]/ Site: w w w . a r t e i n c l u s a o . c o m . b r

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RESUMO

Este ar t igo , baseado nas reflexões e experiências desenvolvidas pela

autora, tanto e m pesquisas académicas , como e m seu trabalho c o m

ações educativas para púbUcos especiais (pessoas c o m deficiências

visuais , audi t ivas , físicas e intelectuais) , t e m p o r objet ivo demonstrar

a necessidade da mudança de paradigmas n o processo comunicac iona l

museológico , como f o r m a de v i a b i l i z a r a implantação de programas

permanentes de ação educativa inclusiva, e m museus e instituições

cul turais .

P A L A V R A S C H A V E : M u s e u ; Públicos Especiais e Inc lus ivos ; Ação

Educat iva ; Comunicação Museológica ; Didática M u l t i s s e n s o r i a l .

COMUNICAÇÃO MUSEOLÓGICA: Mudança de Paradigmas

Este art igo é u m a reflexão sobre o impor tante papel d o m u s e u enquan­

to canal de comunicação c o m o público, sendo por ele representado

através das estratégias de mediação, aplicadas tanto para o espaço ex­

posi t ivo como na ação educativa da instituição.

C u r y , (2005, p.87), ao analisar e m sua tese de d o u t o r a d o os processos

do comunicação museológica na sociedade contemporânea , destaca:

A exposição e a ação educativa são manifestações da política de comunicação de um museu e para o público é o que define a instituição, pois é através delas que o museu se faz visível e se torna relevante para a sociedade.

C") que ocorre, porém, dent ro de u m a política c u l t u r a l que se af ir -

m . i a par t i r dos novos paradigmas da museologia , é que o processo

t o i i i u n i c a c i o n a l d o objeto c u l t u r a l v a i a lém da sua função t rad ic io -

i i . i l , isto é, a transmissão de u m a mensagem predeterminada , para

. i l i .iiiçar u m a função mais flexível e democrática - a de interagir o

••iiinlo-í-missor (o pro f i s s iona l/mediador d o museu) c o m o sujeito-re-

t rplor (o público par t ic ipante) . '

I lllvl I N ( ' ( ! ' « • ( ) i i l .ulo por C u r y (200')), p S I , b . i sc i i l i i c m c s l i u l o s sobre n i n l c r a ç a o onlrc insti-

l i i l i , , > i i i m i N < M l O ( ; i i , i i ' o vi.sil .inlc, t IcsUua o n i u s c u ( i ' scu.s jirolissuui . i i .s) c o p u b l i u ) a u n o sujeitos

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A comunicação museológica é operada pela linguagem dos objetos, mas se efetiva na interação entre o museu e o público sobre o significado a que se propõe, se apreende, se reelabora e se negocia. (CURY, 2005, p.88).

Propõe-se , dessa f o r m a , u m redimensionamer i to do processo c o m u ­

nicacional e, consequentemente, u m a n o v a condição da relação entre

os seus sujeitos - o emissor e o receptor.

A p a r t i r desse n o v o p a r a d i g m a comunicac ional , o de p r o p o r c i o n a r

u m a in te ra t iv idade mais a m p l a entre o objeto museológico e seu pú­

b l i co , as estratégias de mediação passam a redimens ionar a f o r m a

de participação d o sujeito receptor - de u m a condição anter iormente

mais passiva, como simples ass imilador de u m a mensagem - para

u m a condição mais dialógica, isto é, a de u m part ic ipante mais a t ivo

n o processo de apreensão e de resignificação d o objeto c u l t u r a l pre ­

sente na exposição.

Porém, para que se c u m p r a essa desafiadora tarefa de p r o p o r c i o n a r

u m a m a i o r i n t e r a t i v i d a d e entre o objeto c u l t u r a l e o público é neces­

sário que o corpo de profissionais de m u s e u adote u m a política c u l t u ­

r a l de caráter in terd isc ip l inar , pela q u a l todos os profissionais e n v o l ­

v i d o s c o m as questões de comunicação e mediação possam c o n t r i b u i r

c o m as suas experiências e especificidades na concepção de exposi­

ções , b e m como de ações educativas d i r i g i d a s aos diversos públ icos ,

como f o r m a de p e r m i t i r e es t imular o p leno exercício de percepção,

fruição, como também, de resignificação dos objetos cul tura is .

C u r y analisa essa n o v a atribuição de papéis entre os profissionais de

m u s e u , mais especificamente aquele cuja função recai sobre a c o m u -

rúcação museológica e o público, a p a r t i r da existência, segundo as

ciências sociais, de dois paradigmas : o tradicional e o emergente.

Hssas duas concepções, aplicadas às questões comunicacionais muse­

ológicas, t r a d u z e m c o m m a i o r clareza os modelos mais c o m u m c i i U '

u t i l i zados pelos museus na atual idade: o modelo tradicional e o moiklo

emergente.

A m b o s os modelos assumem posturas antagónicas , pois se o p r i m e i ­

ro m o d e l o , o t r a d i c i o n a l , atua n o campo d o conhecimento enfat izan­

d o o conteúdo d o processo comimicac iona l , apresentado segundo a

perspectiva d o olhar d o prof iss ional especialista o u curador d a expo­

sição; o segundo m o d e l o , o emergente, vê como essencial não m a i s

o conteúdo, isto é, a mensagem pré-estabelecida e ser t r a n s m i l i i l . i ,

mas o diálogo resultante entre a bagagem de referências trazitlas pcl( >

público e os múlt iplos signif icados obt idos , a p a r t i r da sua inliMaç.io

c o m o objeto c u l t u r a l .

Sendo assim, a autora citada considera que a a p r e n d i z a g e m e a f r u i ­

ção do objeto c u l t u r a l n o espaço museológico está relacionada à parti­

cipação ativa do público ao alcançar suas expectativas ritualísticas dnniiilc

II visita, pois ele é o agente de sua própria experiência da qual participa sen­

sorial, emocional e fisicamente, pois utiliza seu corpo como elemento para a

apropriação do museu. (CURY, 2005, p.84)

E, ao concluir sobre as questões relacionadas à mudança de p a r a d i g ­

ma d o processo de comunicação museológica v i sando a u m a nova

ri'lação entre o público e o objeto c u l t u r a l , a autora reaf i rma:

Ao afastar o caráter educativo do museu da primazia do conteúdo, abre-se espaço para que o museólogo e o educador desfaçam a primazia do pesquisador de coleção e atuem coordenando equipes e processos interdisciplinares. Fssos dois profissionais são os responsáveis pelos processos de comunicação em mu.seu que sustentem os objclivos essenciais de promover o diálo)',o cnlrc .1 experiência da visita o o (o l i i l i .Mi i i do púMiio. l í i l . i o , I r . i l . i •,(• 11.10 so de nuid.ini,.! ile

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pnrmli)',iii,i, mas ainda, ilc i om cslmliir.is autoritárias lio musou. (CURY, 2005, p.85)

l i n p o r t . i i i l c , liinibóm, frisar que, ao discorrer sobre as novas concep­

ções de in tera t iv idade e part icipação d o público na exposição, t endo

como enfoque o objeto museológico , não se pode abandonar p o r c o m ­

pleto o conceito t r a d i c i o n a l da comurúcação museológica , baseada na

transmissão d o conhecimento, a p a r t i r da contextual ização d o objeto

e m exposição, pois o m u s e u é, e sempre será, u m espaço, t ambém,

relacionado ao ensino, m e s m o e m se t ra tando de u m ensino c o m ca­

racterística não f o r m a l , v i n c u l a d o à fonte pr imária - o objeto cultural

musealizado.

Dessa f o r m a , os profissionais de m u s e u , responsáveis pela comunica ­

ção e mediação museológica d e v e m ter u m a compreensão clara das

possibi l idades de ampliação desses aspectos, a princípio antagónicos,

c o n t e m p l a n d o n o plane jamento de seus projetos comurúcacionais ,

tanto os aspectos relacionados às questões de ensino, c o m o t a m b é m

àqueles relacionados às questões de aprendizagem.

Algumas estratégias de comunicação favorecem, muitas vezes, a teoria do ensino, enquanto aquelas preocupadas com a construção do sigrúficado pelo público favorecem a teoria do aprendizado. Uma privilegia a emissão e a outra a recepção. Privilegiar um polo não significa ignorar o outro, mas significa estabelecer um ponto de onde se fará a observação crítica do processo de comunicação. (CURY, 2005, p.318)

Compete , p o r t a n t o , à instituição museológica , consciente d o seu t e m ­

p o e história, preparar o m u s e u para as novas perspectivas e funções

intrínsecas a sua natureza, tanto concei tuai c o m o social - a d o museu

emergente, m u s e u esse, e m permanente diálogo i n t e r n o , entre seus

profiss ionais e externo, entre seu público.

lissa contcpç. io , v i i u i i l . u l . i aos novos p . i m d i g m . i s l i . i nuisi 'oli) j ' , i , i

contemporânea , v, com H M I C / . I , .1 que mais .se a p r o x i m a d o museu

consciente de sua i m p o r l a n l e função comunicadora , acredi tando ser

o espaço museológico u m c a m p o simbólico, recept ivo, p r o v o c a t i v o e

es t imulante à compreensão , fruição e decodificação dos objetos c u l ­

turais dos diversos públ icos , l evando e m consideração seus interesses

e especificidades, ass im como, aberto, t ambém, às múlt iplas i n t e r p r e ­

tações e resignificações que p e r m i t a m , a todos, construir , a p r o p r i a r -

se e criar suas novas trajetórias tendo como referência o pa t i imônio

c u l t u r a l museaUzado.

A Mediação do Objeto Cultural e suas Múltiplas Leituras

N o tópico anterior , discorreu-se sobre o m u s e u como canal de c o m u ­

nicação c o m o público e a importância da m u d a n ç a de p a r a d i g m a d o

modelo t r a d i c i o n a l d o processo comurúcacional para o m o d e l o emer­

gente, v i n c u l a d o às questões conceituais do plane jamento e mediação

do espaço expos i t ivo de f o r m a in terd i sc ip l inar , a l iada à participação

e inclusão mais efetiva d o público nessa instituição, tendo como refe­

rência u m a visão contemporânea da museologia .

Vê-se, dessa f o r m a , t o d a a abrangência de signos e signif icados que

o espaço museológico , b e m como os objetos nele incluídos possuem,

fazendo c o m que se reaf i rme a responsabi l idade e o sentido político

dessa instituição ao expor não somente objetos, mas t a m b é m ideias.

C o m o observa C u r y (2005, p.314), o "objeto museológico n ã o é n e u t r o

( '60 m u s e u que faz desvelar n ã o somente o seu sentido c u l t u r a l , mas

o i n t i o d u z n u m a rede de repertórios s imból icos" .

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A n 'S|i()ns.iliili(.l .i(.li ' pol i t ica di-ssa i i i s l i t i i i i , ao se aplica, também, na

fornia d i ' como os profissionais o cducadori-s l ie museus d e v e m a t u -

ar, tendo e m vista a sua i m p o r t a n t e função de comunicadores e m e ­

diadores dos objetos cul tura is f rente ao públ ico vis i tante .

Sendo assim, cumpre- lhes a conscientização e valorização da função

p o r eles desempenhada, buscando, permanentemente , p o r m e i o de

técnicas expográficas e ações educativas, processos que v i a b i l i z e m a

compreensão dos conteúdos , interpretação e apropriação das mensa­

gens transrrútidas pelos objetos cu l tura i s , pois t o d o objeto c u l t u r a l ,

assim c o m o u m d o c u m e n t o histórico, traz implícito u m a rede de i n ­

formações por tadoras de múlt iplos s ignif icados.

Por o u t r o lado , ao se deter sobre o plane jamento e a organização de ex­

posições, deve-se ter, também, por princípio, u m a postura semiótica,

isto é, u m a compreensão da concepção e da f o r m a de como os objetos

possam ser interpretados e de c o m o obter, a p a r t i r desses objetos, a

d ivers idade de interpretações, referências e s ignif icados, passíveis de

serem resignificadas pelo público f requentador d o m u s e u , tendo e m

vista o seu repertório de conhecimentos, vivências e valores.

Uma postura semiótica aplicada à exposição privilegia a compreensão da recepção perante os estímulos dos objetos, visuais, sonoros e outros. Esta postura tem a intenção de compreender a produção de sentido em uma exposição a partir de seus elementos constitutivos e de conhecer as formas como o público percebe os elementos expográficos e apreende a mensagem. Nessa postura, busca-se compreender a relação entre os objetos, organização do conteúdo, textos e legendas e uso dos demais elementos expográficos e como produzem sentidos. Essa preocupação semiótica auxilia a produção de exposições pensar nas partes com relação ao todo -, assim como a análise do produto final como produtor de sentido. (CURY, 2005, p.32-33)

A concepção d i ' uma expografia deve, por tanto , p . i r l u ' de u m nlliiii ilr

mocrtítico, ins t igador de ideias e experimentações , mesmo salx-ndo d i '

antemão, da i m p o s s i b i l i d a d e de, ao se planejar u m a exposição, obter-

se u m o lhar tota lmente neut ro frente aos objetos nela apresentados.

O u t r o aspecto relevante que deve ser levado e m consideração d u ­

rante a concepção de u m a expograf ia , é o de respeitar a diversidade

do público que dela irá par t i c ipar . Esse aspecto destaca a importância

e a atenção que deve ser dada às diversas formas de comunicação

(textos, informações , recursos de apoio , m u l t i m e i o s , dentre outros)

que p e r m i t a m u m a var iedade de le i turas , de acordo c o m diversos rú-

veis de compreensão d o público - desde a apresentação de conteúdos

mais complexos e subjetivos aos mais objetivos e concretos.

Dessa f o r m a , a concepção de u m a expograf ia , dentro d o m o d e l o

emergente - que a m p l i e o diálogo e a participação mais i n t e g r a l d o

público c o m o objeto c u l t u r a l - deve contemplar tanto a mediação in-

direta, isto é, toda a f o r m a de comunicação , prev iamente concebida

para aquele espaço exposi t ivo (seleção dos objetos, textos, etiquetas,

m o n t a g e m , i luminação, recursos de apoio , m u l t i m e i o s , entre outros) ,

como também, a mediação direta, desempenhada pela ação educat iva,

contando c o m a participação d o prof i ss ional educador e o públ ico,

durante a sua v is i ta à exposição.

D a mesma f o r m a , o m o d e l o emergente, i m p l a n t a d o nesse processo

comunicac ional , não poderá, também, presc indir de u m trabalho de

natureza in terd isc ip l inar , real izado entre os vários profiss ionais d o

m u s e u , pesquisadores e conhecedores dos públicos c o m os quais se

pretende interagir , b e m como, c o m a presença e a atuação d o p r o f i s ­

s ional educador , ao c o m p a r t i l h a r essa i m p o r t a n t e função c u l t u r a l e

social desempenhada p o r essa instituição museológica .

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M i l s , l o m i ) SC ()l>lfr, t i o n l r o di) processo comuniciícional, o o lhar de-

m o i n l t i i o p i M i i i i l a que os seus sujeitos - o ciiiissor e o receptor -

possam desempeuliar p lenamente as suas participações n o espaço

museal?

A questão recai sobre as estratégias que d e v e m ser aplicadas pelos

profissionais comunicadores ao ser l e v a d o e m consideração o objeto

cultural e, também, de como esses profissionais p o d e m reconhecer,

desenvolver e despertar esse olhar democrát ico e interessado d o pú­

bl ico frente à qua l idade inerente ao objeto c u l t u r a l de suscitar múlt i ­

plas interpretações.

Cabe, p o r t a n t o , aos profissionais e educadores de museus, a função

de ref let ir , permanentemente , sobre a sua prática e sobre o seu p ap e l

de m e d i a d o r , ao desenvolver est iatégias aplicadas tanto às questões

de produção expográfica, como às d i r i g i d a s às ações educativas, rela­

cionadas ao conhecimento, necessidades e potencial idades referentes

aos seus públicos, a começar pela valor ização desses públicos c o m o

sujeitos, c o m plenas condições de interagir , colet ivamente e i n d i v i d u ­

almente , nesse espaço exposi t ivo , c r i a n d o e recr iando seus códigos e

interpretações, b e m como, r e a f i r m a n d o a importância cultural e de in­

clusão social, presente de f o r m a tão s igni f icat iva na instituição museal .

A o se t o m a r como p r i o r i d a d e a presença e part icipação d o público -

sujeito receptor - n o espaço museológico , d e n t i o d o m o d e l o emergen­

te, passa-se a p r i o r i z a r , também, os aspectos relat ivos à mediação da

l e i t u r a d o complexo expos i t ivo e dos objetos nele apresentados.

A importância dada p o r C u r y ao público c o m o sujeito leitor dent ro de

u m sentido mais a m p l o , daquele que "ao ler interpreta e ao interpretar

recria" reforça a importância dos processos comunicacionais de l e i ­

t u r a , tanto da i m a g e m , como d o objeto c u l t u r a l , destacando, nesse

processo, o e d i u a i l o r tic i i u i s n i , q i i i ' pela sua alu.iç.ío e i ' sp i ' c i l i i i i l . i i l e

c o m o prof iss ional , é a(.|ui'Ie i.|uc' estabelece o contato mais d i r e l o c o m

o público nessa instituição.

G r i n s p u m (2001, p.7) destaca, também, a importância d o p a p e l d o

educador como m e d i a d o r , sujeito de sua ação reflexiva, que conlwce o

acervo, as exposições e os processos de comunicação com o público.

Anal i sando as questões sobre os processos de comunicação e as suas

formas de mediação aplicadas às exposições de arte, G r i n s p u m (2001,

p.6) anota, c i tando Mart in -Barbero :

As exposições são antes de tudo um veículo de comunicação, uma forma de discurso. No entanto, as mais simples ou sofisticadas articulações entre as obras de arte colocadas nas paredes ou em painéis podem não dar conta de uma eficácia comimicacional. Muitas vezes, o discurso de curadores ou e museológos é tão complexo ou subjetivo, que suas ideias só podem ser compreendidas com a leitura do texto do catálogo ou de parede.

Instrumentos de mediação, tais como textos de parede, folhetos, catálogos, audio-tours, cd-rom são, com frequência criados para facilitar o diálogo com o público. Muitos museus ainda depositam nesses instrumentos a esperança de resolução do problema de comunicação. Sem dúvida, que há validade neles. Mas adotá-los como únicos recursos para a acessibilidade ao conhecimento "criptografado" dos objetos está longe de constituir uma ação educacional que se relaciona com o público, de maneira a "recuperar uma dimensão da vida como espaço de produção de sentido, de iniciativa e criatividade dos sujeitos.

Vê-se, p or tanto , na ação educacional - i n s t r u m e n t o val ioso de m e d i a ­

ção, representada pelo educador de m u s e u - a função de desenvol­

ver , a lém de estratégias indiretas para o planejamento expográfico e

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n'( niíioM t l l i l A l i i o s de apoio , estratégias específicas de relação d i re ta

c o m o p i i l > l i i D , l endo como p o n t o de p a r t i d a o objeto c u l t u r a l .

lissas estratégias diretas de le i tura têm p o r ob jet ivo levar o sujeito

le i tor a explorar e analisar os vários s ignif icados presentes n o objeto,

como os aspectos técnicos, estéticos, fo r m ais , históricos e contextuais ,

b e m c o m o os aspectos inerentes às interpretações i n t r a e interpesso­

ais^ dos participantes.^

O u t r o aspecto, t ambém, relevante tendo c o m o propósito estratégias

de mediação são as atividades lúdico-plásticas ou propostas poéticas que

visam a concretizar, tomando vivenciais, os conteúdos tratados na leitura

da imagem ou do objeto cultural. ( A r t e Brasileira - Século XX, 2005, V.3) .

A essas propostas podem-se, t ambém, acrescentar exercícios de l e i t u ­

ra que p o s s i b i l i t e m desenvolver interfaces entre as diversas linguagens

visuais, musicais, verbais e corporais, propondo uma investigação tanto no

âmbito cognitivo como perceptivo ( A r t e Brasileira - Século XX, 2005, V.3) ,

sem deixar de considerar, n o entanto, as características e os níveis de

compreensão de cada público part ic ipante .

2 Intrapessoal - capacidade de relacionamento dirigida para o autoconhecimento, automotivação e autoestima. F. O. Marques - capacidade de relacionamento dirigida para o reconhecimento do outro e da coletividade. (ANTUNES, 1998, p.79-90).

3 Grinspum, ao analisar as formas de mediação propostas pelos educadores/monitores entre as exposições e o público, destaca aquelas que utilizam métodos que priorizam as formas de leitura interpretativista. Dentre esses métodos, os mais utilizados atualmente em museus são: visita-pales-tra, discussão dirigida e descoberta orientada. Visita-palestra: prioriza a fala do monitor/educador e tem por objetivo oferecer informações em tomo de um tema específico e adotando um estQo mais informal de apresentação. Discussão dirigida: prioriza o diálogo entre o monitor/educador e os vi­sitantes e tem como característica lançar perguntas e buscar a interação do grupo, respeitando os níveis de aprendizagem dos participantes. Descoberta orientada: prioriza a participação e a escolha de roteiros pelos participantes, a partir de hipóteses formuladas pelo monitor/educador, permi­tindo que os visitantes possam estabelecer suas próprias formas de leituras no espaço expositivo, sendo, porém, constantemente estimulados e orientados pelo monitor a buscarem novas direções e descobertas. (GRINSPUM, 2000).

Sendo assim, ao estabelecer e t ( )mp.\rli lh. ir esse diãl()j',o entre o objeto

c u l t u r a l e o públ i io , o I H I I H a i lor i r i i i londiçiu-s para que os p a r t i c i ­

pantes possam ampliar c csliiiiiilar a sua percepção, interpretação, análise

e crítica das obras, desde que [essas estratégias de le i tura] não tomem o lu­

gar do ato de olhar, com curiosidade, para uma obra como algo desconhecido,

a ser descoberto. ( A r t e Brasileira - Século XX, 2005, V.3) .

Dia logar c o m o público p o r meio d o objeto c u l t u r a l é, t ambém, u m a

f o r m a inst igante de trocar ideias e perceber que para o le i tor os conte­

údos explorados podem adquirir um sentido próprio, e que essas descobertas

podem ter repercussões práticas em sua vida presente e futura. (Ar te Brasi­

le ira - Século XX, 2005, V.3) .

E, para que se possa a t ingi r o ato prazeroso da le i tura , n o caso a l e i t u ­

ra d o objeto c u l t u r a l , ato esse n ã o somente condic ionado pelos senti­

dos da cognição, da fruição e d o prazer, mas t a m b é m da capacidade

e disposição d o le i tor de poder decodif icar e in terpretar esse objeto,

i m p o r t a p r o p o r u m a n o v a f o r m a de le i tura , n ã o mais aquela v o l t a d a

para o s imples ato de ler c o m a intenção de se obter u m a única respos­

ta, mas o ato de ler, sabendo que todas as le i turas de u m objeto estão

abertas a u m m u n d o de múlt iplos e i n f i n i t o s s ignif icados.

Essa p l u r a l i d a d e de sentidos e significados inerente aos objetos, revela­

da durante o ato de ler, seria a estratégia de mediação que hoje mais se

aprox imar ia d o diálogo que propõe o mode lo emergente - processo co-

mimicac ional , que visa a ampl iar o diálogo e a participação mais inte­

gra l do público c o m o objeto cu l tura l , presente n o espaço museológico.

Porém, ao se p r o p o r essa n o v a f o r m a de le i tura , há de se buscar novas

formas de pensar a le i tura , formas essas que u l t i a p a s s a m o ato da

le i tura t r a d i c i o n a l a u m o u t r o pensar, mais a m p l o , que leve o le i tor ao

i n e x p l o r a d o e ao desconhecido.

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\.uHii Mov.i pioposla, por tanto , v e m ao encontro d o conceito de des-

((>(/.'./(;/^(/(» ilii foniiii tradicional de leitura, c o m o propõe Jorge Larrosa

(2()()l, p.')), ,\r d o p o n t o de vis ta d o pensamento nietzschiano para

a educarão - o de desmontar os pressupostos hermenêuticos da velha edu­

cação humanística.

Larrosa (2004, p.17), c i tando Steiner, a f i r m a que a experiência da leitura

não consiste somente em entender o significado do texto, mas em vivê-lo, e

essa seria a m e l h o r tradução, também, para o ato de ler u m objeto e

dele se obter u m a experiência s igni f icat iva .

É a q u i que a relação da l e i tura se encontra c o m a experiência d a v i ­

vência - a experiência concreta - a b r i n d o o c a m i n h o para o conlieci-

mento e a percepção multissensorial, aquela que a m p l i a o acesso d o p ú ­

bl ico le i tor aos mais diversos canais de experimentação e exploração,

p e r m i t i n d o , dentro das características e especificidades de cada pú­

bl ico , que ele possa c o m t o d o o seu potenciaL apropriar-se d o objefo

c u l t u r a l .

D i z Larrosa (2004, p.27):

A tarefa de formar um leitor é multiplicar suas perspectivas, abrir seus ouvidos, apurar seu olfato, educar seu gosto, serisibilizar seu tato, dar-lhe tempo, formar um caráter livre e intrépido... e fazer da leitura uma aventura. O essencial não é ter um método para ler bem, mas saber ler, isso é: saber rir, saber dançar e saber jogar, saber interiorizar-se jovialmente por territórios inexplorados, saber produzir sentidos novos e múltiplos. A única coisa que pode fazer um mestre de leitura é mostrar que a leitura é uma arte livre e infinita que requer inocência, sensibilidade, coragem e talvez, um pouco de maldade. (...) Todos os livros ainda estão para serem lidos e suas leituras possíveis são múltiplas e infinitas; o mundo está para ser lido de outras formas; nós mesmos ainda não fomos lidos.

Pijblicos Especiais: a percepção multissensorial do objeto cultural

A mudança de p a r a d i g m a d o processo comunicac ional museológico ,

proposto pelo m o d e l o emergente, abre caminhos para novas técnicas

expográficas de mediação tanto i n d i r e t a (elaborada para o espaço ex­

pos i t ivo) como di re ta (envolvendo as ações educativas n o seu contato

d i re to c o m o públ ico) . E m ambos os casos, o que se busca é a m p l i a r e

es t imular a l e i tura d o objeto c u l t u r a l pelo público f r u i d o r , l evando-o

a perceber, analisar, interpretar , cr i t icar , e n f i m , decodif icar esse obje­

to, explorando-o e apropriando-se d o seu conteúdo e da sua essência,

e fazendo desse ato u m a experiência prazerosa e s ignif icat iva .

A percepção do objeto museal, fonte primária de apropriação da c u l ­

tura , representada pelo patr imônio universa l , encontra n o m u s e u o

espaço p r i v i l e g i a d o de mediação , o que, consequentemente, faz c o m

que essa instituição se i m p o n h a u m a grande responsabi l idade, tanto

política c o m o sociaL de p r o m o v e r a interação entre o objeto c u l t u r a l

e o seu público.

Sendo assim, de nada adiantar ia o trabalho de mediação no m u s e u

sem que fossem dadas todas as garantias e o p o r t u n i d a d e s de p leno

acesso a esse patr imônio, o que signif ica abrir essa instituição para

todos os t ipos de públicos, p r i n c i p a l m e n t e àqueles que p o r fatores

sociais e, também, p o r l imitações sensoriais, físicas e mentais f a z e m

parte de grupos c o m menores condições de par t i c ipar desses espaços.

A o se pretender abr i r o espaço museológico a todos os públicos, há

de se levar e m consideração novos fatores que i m p õ e m aos processos

de comunicação múlt iplas formas de diálogo, pois a igua ldade de d i ­

reitos está, int i insecamente , relacionada ao respeito pela d ivers idade

coletiva o u i n d i v i d u a l .

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í'., licss.i l o r m . i , as estratégias de mediação di 'verao a m p l i a r o uso

dos eanais d i ' percepção, de f o r m a não somente verbal (oral e escrita),

mas, também, in tera t iva e exper imenta l , pois ao se pensar e m todos

os públicos, os profiss ionais de museus se d e p a r a m c o m u m a i m p o r ­

tante e s igni f icat iva parcela da sociedade - os públicos com necessidades

especiais - o que i m p l i c a incremento e adaptação das estratégias para

ações que, também, e n v o l v a m a percepção multissensorial.

A percepção mult i ssensor ia l é, também, parte inerente de u m a pos­

t u r a semiótica apl icada à comunicação museológica que p r i v i l e g i a a

compreensão da recepção, a p a r t i r dos est ímulos provenientes dos

objetos e dos sentidos, a eles atribuídos pe lo público f r u i d o r , sendo

que, nesse caso mais específico, a ênfase da recepção está v i n c u l a d a à

fruição d o objeto c u l t u r a l , a p a r t i r de todos os canais sensoriais a l ém d o

v i s u a l , como o tátil, o a u d i t i v o , o o l f a t i v o , o paladar e o cinestésico.*

Esses canais serisoriais p o d e m ser es t imulados p o r meio de recursos

mediáticos^, especialmente, concebidos para faci l i tar a percepção d o

objeto c u l t u r a l por parte d o público f r u i d o r , fa tor esse f u n d a m e n t a l

para a compreensão e significação desse objeto, p r i n c i p a l m e n t e , aos

públicos c o m necessidades especiais.

C o m p a r t i l h a n d o as reflexões de Ballestero*, os sentidos d o tato, a u d i ­

ção, visão, o l fato e paladar são canais de entrada m u i t o valiosos para

4 anestesia: sentido pelo qual se percebem os movimentos musculares, o peso e a posição dos membros. Fonte: Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 3. Ed. São Paulo: Positivo, 2004.

5 Recursos mediáticos: materiais sensoriais de apoio - objetos, réplicas, maquetes, extratos sonoros, entre outros, utilizados como instrumentos mediadores entre o púbHco e o objeto cultural.

6 BALLESTERO, 2003, p.l2. Segundo o autor, "O tato, a audição, a visão, o paladar e o olfato po­dem atuar como canais de entrada de informações muito valiosas (...). Esses dados informativos, apesar de estarem entrando por canais diferentes, têm um destino comum: o cérebro; é aí onde es­sas informações se inter-relacionam adquirindo um significado que é o que aprendemos. Para que esse aprendizado seja adequado e completo é importante que não se negligencie nenhum sentido ou canal de entrada, caso contrário estaremos limitando, reduzindo, empobrecendo a informação com a qual nosso cérebro elaborará a ideia fiitól apreendida."

aquisição de informaçi)es, ai resci-ntamio i j u i ' o desenvolv imento da

percepção pela via nnillisseiisorial predispõe, também, os indivíduos a

u m a m a i o r recept iv idade e s intonia , tanto c o m o m e i o ambiente c o m o

c o m seus semelhantes.

Os ctieiros, texturas, sons e gostos aliados ao tato se convertem nos protagonistas de um entendimento mais amplo de todas as coisas que fazem parte de nosso viver (...) adquirindo, assim, uma sensibilidade maior para com o nosso semelhante e a natureza. (BALLESTERO, 2003, p.83).

As estratégias de mediação que c o n d u z e m à percepção mul t i ssen­

sorial , aplicadas à ação educat iva e m museus, apresentam aspectos

didáticos e pedagógicos provenientes tanto da educação não formal

como, também, da educação formal, t endo como enfoque métodos que

v a l o r i z e m a aprendizagem, a p a r t i r das experiências concretas e da

aproximação dos alunos c o m o meio ambiente .

Reprodução em relevo; Mulher de Turbante, 1930, Oscar Pereira da Silva; Pinacoteca do Estado de São Paulo

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I''a/. paili ' ilfssa l o n c e p ç ã o a Didática Mnllissciisorial das Ciências, de-

scMivolviíla pi'lc) pedagogo e professor de ciências M i g u e l - A l b e r t Sol-

ler (1999, p.17-18) deficiente v i s u a l , que descreve:

[...] o ensino atual, desde o fundamental até o médio e superior, está recebendo um tratamento didático enfocando quase que predominantemente o ângulo visual. As consequências diretas que podemos imaginar desse enfoque podem ser: a fragmentação do ambiente que nos rodeia e que ocasiona uma interpretação parcial dos fenómenos que ocorrem; [...] visão reduzida, restrita e empobrecida da observação científica perda de grande quantidade de informações não visuais; apresentação das matérias aos alunos cegos ou deficientes visuais de maneira pouco motivadora para eles, o que por sua vez pressupõe mais uma dificuldade ao estudo e desenvolvimento da percepção; quando se observa normalmente só se olha, porém se esquecem os outros canais sensoriais de recepção de informação.

Essa pesquisa, a princípio relacionada mais especificamente à apren­

d i z a g e m de alunos cegos o u c o m deficiências visuais , é i g u a l m e n t e

válida para alxmos c o m outros t ipos de deficiências, b e m c o m o para

aqueles que não apresentam esses t ipos de l imitação.

N a verdade , as experiências perceptivas desenvolvidas segundo a

a b o r d a g e m mult i ssensor ia l p o s s i b i l i t a m m e l h o r compreensão da re­

a l idade, b e m como das representações humanas e d o m e i o ambiente ,

da mesma f o r m a que exerc i tam e e s t i m u l a m as potencial idades per­

ceptivas de pessoas c o m o u sem deficiências e a m p l i a as capacidades

de reconhecimento e apreensão d o m u n d o , garant i ndo , dessa f o r m a ,

a concretude e incorporação dos conltecimentos e descobertas efetuadas du­

rante as leituras de obras, capazes de promover a transformação dos indiví­

duos e, por extensão, da sociedade.{CHIOWKYTO, 2006)

Atividade "Quadro Vivo"; Caracterização da obra: jviestlço, 1934, Cândido Portinari; Pinacoteca do Estado de São Paulo

Ferraz e Fusari (1993), c o m apoio e m Gardner , descrevem que, à me­

dida que traballiamos para desenvolver a percepção, ajudamos a "ver melhor,

fazer discriminações sutis e ver as conexões entre as coisas".

Ao se pretender , p o r t a n t o , a igua ldade de dire i tos e o respeito às d i ­

versidades dos públicos e, ao enfocar os públicos especiais, c o m suas

especificidades e potencial idades que p o d e m e d e v e m ser desenvol­

v idas no espaço museológico , há de se i n c l u i r , nos processos c o m u ­

nicacionais e de ação educacional , recursos e programas v i sando ao

acesso sensorial (comunicação dire ta e indire ta ) baseados nos princí­

pios da mediação multissensorial de f o r m a a u t i l i z a r , nesse espaço, re­

cursos que v i a b i l i z e m u m a fruição não somente v i s u a l , mas também,

poss ib i l i tando a percepção e fruição pelos outros sentidos.

A s possibi l idades de util ização e manipulação desses recursos pode­

rão var iar de exposição para exposição, i n c l u i r objetos or ig inais o u

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ri'pi()ilii(,0»'s i ' m relevo desses objetos, agregar materiais s imilares e

reíereneiais, i n t r o d u z i r propostas interat ivas ut i l izando-se dos senti ­

dos, como f o r m a de a m p l i a r a percepção, decodificação e a in terpre ta ­

ção dos objetos, a p a r t i r de u m a perspect iva v i v e n c i a l e concreta que

p e r m i t a , também, àquelas pessoas c o m limitações físicas, sensoriais

o u mentais , possam assimilar e potencial izar as suas experiências p o r

m e i o desses canais sensoriais.

Uma abordagem multissensorial do museu evita a exclusão. Usando informação escrita e oral com diversos níveis de complexidade e empregando meios de comunicação visuais, orais, tácteis e interactivos, o museu cumprirá melhor a sua missão, comunicando mais eficazmente com mais pessoas. Essa abordagem não implica a banalização nem a perda de qualidade da informação. Pelo contrário, permite reflectir sobre os objectivos estabelecidos, avaliar a eficácia do trabalho realizado, atingir um público mais vasto, enriquecer as exposições e descobrir mais valias no seu acervo. (Museus e Acessibilidade, 2004, p.22).

Conclui-se , p o r t a n t o , que as est iatégias de mediação baseadas nos

métodos de percepção mult i ssensor ia l , ao contemplar tanto as d i f e ­

renças pessoais c o m o as diversas formas de percepção apreendidas

de u m mesmo objeto, p r o p o r c i o n a m respostas verdadei ramente esti­

mulantes , p o d e n d o ser aplicadas e compart i lhadas p o r todas as pes­

soas, n ã o i m p o r t a n d o as suas necessidades o u lirrutações.

Faz-se i m p o r t a n t e , também, fr isar que as concepções apresentadas

pelos métodos de percepção mult issensor ia l , aplicadas tanto na e d u ­

cação f o r m a l (instituições educativas) como na educação n ã o f o r m a l

(instituições socioculturais) , reforçam as teses sobre as m u d a n ç a s de

paradigmas e n v o l v e n d o o er^sino e a a p r e n d i z a g e m na a tua l idade ,

ev idenc iando a necessidade de m u d a n ç a s es t iutura is e pedagógicas

que respeitem, antes i le t u i l o , a im lu.sao t' a participação mais efetiva

de todos os seres h u m a n o s em nossa sociedade.

C o m o c o n c l u i D e r d y k (1989, p . l 9 4 ) :

Os sentidos: a visão, a audição, o olfato, o paladar, o tato, bem como a emoção e a percepção, passaram por um processo de humanização, desde os mais remotos tempos. O nosso jeito de perceber se transforma de uma maneira histórica, mantendo uma correspondência com o curso do desenvolvimento social, técnico, cultural e espiritual da humanidade. O olho, o ouvido possuem um sentido "estético" - são instrumentos de leitura.

Maquete tátil tridimensional de pintura; Mauricio Nogueira Lima; Composição n° 2, 1952; Exposição "Sentir prá Ver", 2012; Pinacoteca do Estado de São Paulo

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Conclusão

Pode-se concluir , p o r t a n t o , a p a r t i r das análises e reflexões desenvol­

v i d a s para este ar t igo , que a implantação de u m p r o g r a m a p e r m a ­

nente de Ação Educativa Inclusiva e m museus o u instituições cu l tura is

deve ter p o r premissa u m a redefinição d o p a r a d i g m a educacional ,

c o m o também, d o processo comunicac ional museológico , o que su­

põe, n o p r i m e i r o caso, u m a ação educat iva c o m p r o m e t i d a c o m os

processos de inclusão sociocultural e da educação não formal, l evando e m

consideração os pressupostos de u m a educação racional, responsável e

responsiva, e, no segundo caso, que o processo comunicac iona l possa,

também, ser red imens ionado , l evando e m consideração exposições

baseadas n o m o d e l o emergente, p e r m i t i n d o u m a m a i o r i n t e r a t i v i d a ­

de e part icipação mais a m p l a ent ie o objeto c u l t u r a l e o seu público,

fa tor esse f u n d a m e n t a l para a compreensão e significação d o objeto c u l ­

t u r a l , p r i n c i p a l m e n t e , aos públicos c o m necessidades especiais.

Essas mudanças , no entanto, não p o d e m ser aplicadas de f o r m a isola­

da, mas, ao contiário, d e v e m ser pensadas a p a r t i r de u m a política cul­

tural que tome por paradigma as concepções museológicas contempo­

râneas. Tais concepções compreendem, além das funções tiadicionais

(pesquisar, preservar e comunicar) , o conceito da responsabilidade social,

ex ig indo ações interdisciplinares que e n v o l v a m todas as áreas dessas

instituições, o que n o caso da frequência de públicos especiais d e m a n ­

dará a participação de todas as instâncias do m u s e u - u m processo de­

mocrático que reúna, a lém das áreas de tiabalho, os profissionais nela

envolv idos i n c l u i n d o , também, a comunidade e m geral.

Essa compreensão v e m , p o r t a n t o , just i f icar a importância desse con­

ceito, que se cont iapõe a u m a visão e m que as ações educativas apare­

c e m dissociadas d o processo museológico, visão essa a inda presente

e m grande parte dos museus, exposições temporárias de grande p o r ­

te o u e m out ias instituições cul tura is brasileiras, o que, consequen-

temente, passa a .se relU-tir d ire lanu-nle na lonci-pçao, reali/.ição e

c o n t i n u i d a d e de projetos e d i i i at ivos des.sa natureza.

E m razão, p o r t a n t o , da sua f r a g i l i d a d e , os projetos educat ivos realiza­

dos a p a r t i r dessa concepção e sem o respaldo de u m a política c u l t u ­

ra l que efetive e p r o m o v a , permanentemente , u m p r o g r a m a educat i ­

vo e s t i u t u r a d o , restringem-se a a tendimentos superficiais ao público

vis i tante , descaracterizando a sua verdadei ra função sociocul tural

e revelando apenas u m caráter temporário e c o m interesses m u i t a s

vezes apenas promociona is , sendo a locução responsabi l idade social

também, a p r o p r i a d a de f o r m a i n d e v i d a .

Estender, pois , u m pro jeto de acessibilidade a todas as instâncias

museológicas, v i s a n d o a u m trabalho mais substancial e co le t ivo d o

museu para essa i m p o r t a n t e parcela da sociedade, mater ia l iza u m ob­

jet ivo que exige u m a política cultural na f o r m a de políticas públicas que

efet ivamente, possam conceber e i m p l a n t a r u m trabalho permanente

de acessibilidade e ação c u l t u r a l para esse público especial, já que o

conceito de inclusão social compreende todos os espaços públicos,

o que confere a u m a instituição como o m u s e u u m a função e m i n e n ­

temente social, ev idenc iando sua responsabi l idade c o m o patrimônio

material e imaterial p o r ela preservado e d i s p o n i b i l i z a d o à sociedade.

É evidente , n o entanto, a progressiva conscientização e a implantação,

por parte dos museus brasileiros, de políticas d i r i g i d a s aos públicos

específicos, considerando o i m p o r t a n t e p a p e l social desempenhado

por essas instituições como espaços de referência da i d e n t i d a d e c u l ­

t u r a l e autorreconhecimento dos c idadãos e m sua c o m u n i d a d e .

Porém, a conscientização e valorização d o espaço museológico e m

torno de mais esse objet ivo não poderá ser concretizada sem projetos

consistentes que possam ser v iab i l izados c o m o apoio tanto da irucia-

tíva pública quanto da in ic ia t iva p r i v a d a , i n c l u i n d o a colaboração da

c o m u n i d a d e a que se pretende a t i n g i r .

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