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CONCEITOS DE ESTABILIDADE ATMOSF ´ ERICA E DISPERS ˜ AO ATMOSF ´ ERICA Mateus Bernardes , PPGMNE - UFPR / LEMMA E-mail: [email protected] 1 Introdu¸ ao Come¸ camos com uma breve descri¸ ao da atmosfera terrestre e da camada limite planet´ aria que ´ e o cen´ ario onde se desenvolve a dispers˜ ao de escalares na atmosfera. As vari´ aveis que s˜ ao in- dispens´ aveis nesta descri¸ ao tamb´ em ser˜ ao apresentadas, bem como seu comportamento m´ edio. Uma vez que o escoamento na camada limite ´ e predominantemente turbulento, n˜ ao se pode evitar o tratamento deste assunto, complexo entretanto fascinante (ainda que nossa abordagem esteja muito longe do rigor e formaliza¸ ao necess´ aria num curso de mecˆ anica dos fluidos ou da turbulˆ encia). Alguns resultados do grupo de pesquisadores do LEMMA s˜ ao mostrados breve- mente. Perfis m´ edios, fluxos turbulentos e plumas tamb´ em s˜ ao vistos de maneira r´ apida. 2 A Atmosfera Terrestre e a Camada Limite Planet´ aria A atmosfera terrestre ´ e dividida em camadas determinadas pelo perfil de temperatura absoluta edia nela encontrada. A varia¸ ao desta ´ e que define a estratifica¸ ao da atmosfera terrestre. A atmosfera ´ e dividida em: Troposfera e a camada mais baixa da atmosfera terrestre. Sua profundidade varia de 9 a 16 km aproximadamente, dependendo da latitude. Nesta camada a temperatura diminui com a altura, a uma taxa aproximada de 6,5 o C km -1 . Convec¸ ao (vertical) e advec¸ ao (horizontal) mantem a troposfera relativamente bem misturada. A maior parte do clima se forma nesta camada. Quase todos os poluentes emitidos pr´ oximos ` a superf´ ıcie terrestre s˜ ao transportados, dispersos, transformados e removidos dentro desta camada. O topo desta camada, onde a temperatura come¸ ca a assumir um perfil constante ´ e chamado de tropo- pausa. As baixas temperaturas no topo deste estrato s˜ ao respons´ aveis pela manuten¸ ao da ´ agua na Terra. Estratosfera : a pr´ oxima camada se estende a, aproximadamente 50 km e a temperatura aumenta com a altura, na m´ edia. A invers˜ ao t´ ermica e a quase ausˆ encia de turbulˆ encia fazem com que esta camada n˜ ao seja bem misturada. Al´ em disso a ausˆ encia de nuvens e de precipita¸ ao fazem com que poluentes eventualmente lan¸ cados nesta altura dificilmente sejam removidos. Mesosfera : estendendo-se desde o final da estratopausa (cerca de 50 km) at´ e aproximada- mente 85 km encontra-se a mesosfera, onde a temperatura volta a diminuir com a altura. Termosfera :a´ ultima camada ´ e a termosfera onde a gradiente de temperatura volta a ser positivo.

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CONCEITOS DE ESTABILIDADE ATMOSFERICA EDISPERSAO ATMOSFERICA

Mateus Bernardes,PPGMNE - UFPR / LEMMAE-mail: [email protected]

1 Introducao

Comecamos com uma breve descricao da atmosfera terrestre e da camada limite planetaria quee o cenario onde se desenvolve a dispersao de escalares na atmosfera. As variaveis que sao in-dispensaveis nesta descricao tambem serao apresentadas, bem como seu comportamento medio.Uma vez que o escoamento na camada limite e predominantemente turbulento, nao se podeevitar o tratamento deste assunto, complexo entretanto fascinante (ainda que nossa abordagemesteja muito longe do rigor e formalizacao necessaria num curso de mecanica dos fluidos ou daturbulencia). Alguns resultados do grupo de pesquisadores do LEMMA sao mostrados breve-mente. Perfis medios, fluxos turbulentos e plumas tambem sao vistos de maneira rapida.

2 A Atmosfera Terrestre e a Camada Limite Planetaria

A atmosfera terrestre e dividida em camadas determinadas pelo perfil de temperatura absolutamedia nela encontrada. A variacao desta e que define a estratificacao da atmosfera terrestre. Aatmosfera e dividida em:

• Troposfera: e a camada mais baixa da atmosfera terrestre. Sua profundidade varia de 9 a16 km aproximadamente, dependendo da latitude. Nesta camada a temperatura diminuicom a altura, a uma taxa aproximada de 6,5oC km−1. Conveccao (vertical) e adveccao(horizontal) mantem a troposfera relativamente bem misturada. A maior parte do clima seforma nesta camada. Quase todos os poluentes emitidos proximos a superfıcie terrestre saotransportados, dispersos, transformados e removidos dentro desta camada. O topo destacamada, onde a temperatura comeca a assumir um perfil constante e chamado de tropo-pausa. As baixas temperaturas no topo deste estrato sao responsaveis pela manutencaoda agua na Terra.

• Estratosfera: a proxima camada se estende a, aproximadamente 50 km e a temperaturaaumenta com a altura, na media. A inversao termica e a quase ausencia de turbulenciafazem com que esta camada nao seja bem misturada. Alem disso a ausencia de nuvens ede precipitacao fazem com que poluentes eventualmente lancados nesta altura dificilmentesejam removidos.

• Mesosfera: estendendo-se desde o final da estratopausa (cerca de 50 km) ate aproximada-mente 85 km encontra-se a mesosfera, onde a temperatura volta a diminuir com a altura.

• Termosfera: a ultima camada e a termosfera onde a gradiente de temperatura volta a serpositivo.

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Figura 1: Estratificacao da atmosfera sugundo o perfil de temperatura absoluta. Figura “emprestada”de [1]

2.1 A Camada Limite Atmosferica

A chamada Camada Limite Atmosferica (CLA) ou Camada Limite Planetaria e a camada di-retamente influenciada pela superfıcie terrestre, respondendo aos forcantes ali originados em nomaximo uma hora, o que corresponde em media a uma camada de 1 km acima da superfıcieterrestre ([8]). Estes forcantes incluem o atrito com a superfıcie, evaporacao, transpiracao, trans-ferencia de calor, emissao de poluentes e modificacoes no escoamento induzidas pela topografia.Sua importancia deve-se ao fato de que a grande maioria das atividades humanas originam-se,ocorrem e geram consequencias dentro desta camada. Nesta camada o fenomeno da turbulenciaesta fortemente presente, e ela e fundamental por ser muito mais eficiente no transporte demassa, calor e momentum do que a difusao molecular pura.

Desta forma, o assunto de que trata este texto desenvolve-se totalmente na CLA, isto e es-taremos interessados na dispersao que ocorre apenas dentro da CLA, por ser exatamente aquique o nosso cotidiano gera esta dispersao e e por ela afetado.

2.2 Variaveis de Estado e Termodinamica da CLA

Listamos a seguir (tabela 1) as variaveis de estado presentes na CLA.

Estas variaveis estao relacionadas entre si atraves de equacoes de estado ou atraves de leistermodinamicas, por exemplo, a equacao fundamental de estado para um gas ideal:

p = R ρT, (1)

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Variaveis Dimensoes Valores tıpicos na CLAPressao Atmosferica (p) mb, Pa 1013,25 mb (ao nıvel do mar)Temperatura do Ar (T) K,o C,o F -Densidade do Ar (ρ) kg m−3 1,29 kg m−3 (a 1013,25 mb e 273,2 K)Umidade Especıfica do Ar (q) partes por mil, g kg−1 -

Tabela 1: Variaveis de Estado na CLA.

onde R = 287,04 J K−1 kg−1 e a constante especıfica dos gases, e as outras variaveis explicam-sena tabela 1.

Se a atmosferica estiver em equilıbrio hidrostatico (uma suposicao que em geral nao e valida)vale a equacao:

dp

dz= −ρ g, (2)

onde g = 9,8 ms−2 e a aceleracao da gravidade. A primeria lei da termodinamica aplicada auma parcela de ar diz que o acrescimo de energia interna na parcela (dU) e resultado da somade acrescimos externos a parcela (dH) com o trabalho realizado sobre a parcela (dW ).

dU = dH + dW. (3)

Levando-se em conta que num processo a pressao constante, dU = cp dT (onde cp ≈1005 J K−1 kg−1 e o calor especıfico a pressao consante) e tambem a equacao de equilıbriohidrostatico (2), temos que:

dH = cp dT − dp

ρ. (4)

Num processo adiabatico, em que nao ha trocas de calor entre a parcela de ar e o ambienteonde esta inserida esta parcela, ou seja dH = 0, a equacao 4 acima resulta em:(

dT

dz

)ad

= − g

cp. (5)

Esta equacao surpreendente diz que a temperatura decresce a uma taxa constante (na ca-mada inferior da atmosfera). Este valor e conhecido como taxa adiabatica, denotado por Γ, e ede aproximadamente 9,8 K km−1.

Outro efeito importante do estado adiabatico da atmosfera pode ser observado se olharmospara a equacao 4 (com dH = 0). Neste caso, a integracao da equacao que resulta:

cp dT =dp

ρ(6)

e usando a equacao de estado de um gas ideal (1), teremos :

T = T0

(p

p0

)R/cp

, (7)

onde T0 e uma temperatura de referencia, correspondente a pressao p0 e onde R/cp ≈ 0, 286 econstante. Esta equacao define uma importante variavel na CLA que e a temperatura potencial,θ. A temperatura potencial e a temperatura que uma parcela de ar (a uma pressao p e cujatemperatura real e T ) teria se fosse trazida adiabaticamente ate o nıvel do mar (a pressao dereferencia de aproximada de 1000 mb):

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θ = T

(1000

p

)R/cp

. (8)

Numa camada adiabatica da atmosfera, a temperatura potencial nao varia com a altura. Osgradientes de temperatura e de temperatura potencial relacionam-se por:

∂θ

∂z=

θ

T

(∂T

∂z+ Γ

)≈ ∂T

∂z+ Γ. (9)

Esta aproximacao e bastante razoavel na CLA, onde a diferenca entre θ e T costuma naoser nao ser maior que 10%. Como numa atmosfera adiabatica, ∂θ/∂z = 0, o valor de ∂θ/∂z euma boa medida do grau de afastamento da atmosfera em relacao ao estado adiabatico. Esteafastamento esta resumido na tabela 2.

Superadiabatica: −∂T/∂z > ΓAdiabatica: −∂T/∂z = ΓSubadiabatica: −∂T/∂z < ΓIsotermica: −∂T/∂z = 0Inversao Termica: ∂T/∂z > 0

Tabela 2: Classificacao da atmosfera segundo os gradiente de temperatura e temperatura potencial.

Para que seja levada em consideracao a umidade do ar, o conceito de temperatura virtual eintroduzido. A temperatura virtual, Tv, e definida em termos da temperatura absoluta T e daumidade especıfica q por:

Tv = T (1 + 0,61 q). (10)

Esta e a temperatura que o ar seco teria sujeito a mesma temperatura e pressao que o arumido. Tambem e possıvel definir uma temperatura potencial virtual de maneira analoga adefinida pela equacao 8, como:

θv = Tv

(1000

p

)R/cp

. (11)

As mesmas relacoes que valem para o gradiente de temperatura potencial valem tambempara o de temperatura potencial virtual, por exemplo:

∂θv

∂z≈ ∂Tv

∂z+ Γ. (12)

2.3 Establidade Atomsferica

A classificacao da estabilidade (estatica) atmosferica usando o gradiente de tempertura potencialvirtual tem um carater local que e dado pela tabela 3.

∂θv/∂z Estabilidade Atmosferica Atmosfera> 0 Estavel Subadiabatica= 0 Neutra Adiabatica< 0 Instavel Superadiabatica

Tabela 3: Estabilidade estatica e o gradiente de tempertura potencial virtual.

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Figura 2: Estabilidade atmosferica e o perfil de θv. (Mais uma) Figura “emprestada” de [1]

Entretanto o conceito de estabilidade atmosferica mais usado e o de carater nao local que sebaseia no perfil de tempertura potencial virtual, como mostra a figura 2 .

Uma camada da atmosfera se encaixa na classificacao instavel se uma parcela de ar que alientra e transita, o faz devido a sua propria fltutuabilidade. Nao deve ser levada em consideracaonesta definicao, uma unica parcela de ar, que pode nao atravessar toda a camada instavel. Acamada e definida a partir da movimentacao de todas as parcelas dentro da camada (por exem-plo, nas figuras 2 c, e e f , as linhas pontilhadas mostram a movimentacao de diferentes parcelasde ar dentro da camada instavel).

Uma camada da atmosfera sera classificada como estavel onde nao seja instavel e em regioesonde ∂θv/∂z > 0. Sera classificada como neutra se nao for instavel e se ∂θv/∂z = 0, ainda que oestado neutro seja ideal e raramente ocorre na atmosfera, onde usamos o termo “quase-neutro”para situacoes em que ∂θv/∂z ≈ 0.

2.4 Estrutura da CLA

A espessura da CLA sobre a superfıcie terrestre varia com a latitude, o ciclo das estacoes e ahora do dia. Sobre os oceanos esta variacao e bem menor uma vez que a temperatura do marvaria muito pouco com o ciclo diurno e a capacidade calorıfica da agua e alto, e assim um dosprincipais forcantes sobre a camada superficial fica “enfraquecido”.

A figura 3 mostra a variacao da espessura e estrutura da CLA sobre o chao. dependendo dociclo do diurno.

Num dia quente e sem muitas nuvens uma camda convectiva (ou camada de mistura) estabem formada. A superfıcie terrestre aquecida transfere calor convectivamente para a camadasuperficial e acima desta, uma vez que a temperatura decresce com a altura ate mais ou menosa metade da camada de mistura. O perfil do vento medio e logarıtmico na camada superficial eaproximadamente constante acima desta. Esse gradiente de velocidades cria cisalhamento que

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Meio-dia Por-do-Sol Meia-noite Nas er-do-Sol Meio-dia10002000

Altura(m)Camada Super ial CS CSCamada LimiteConve tiva (CLC)

Zona de Entranhamento (ZE) Camada Residual (CR)Camada Limite Estavel Noturna (CLE) CLCInvers~ao termi aAtmosfera Livre (AL)

Figura 3: Ciclo diario da CLA em condicoes ideais. Figura adaptada de [8].

junto com as termicas ascendentes sao responsaveis pela forte presenca de turbulencia, portantomistura, nesta camada convectiva diurna. No topo desta camada ha uma inversao do perfilde temperatura, gerando uma camada estavel, que funciona como um limite para as termicasascendentes. E chamada de zona de entranhamento (ou arrasto).

Um pouco antes do por do sol, o movimento convectivo das termicas cessam, portanto o fluxovertical positivo (para cima) de calor que ocorria na camada mista vai dando lugar a um fluxonegativo (para baixo) ja que o perfil de temperatura vai lentamente se invertendo: a tempera-tura aumenta com a altura. Esta camada e bastante estavel e apresenta pouca turbulencia, naforma de jatos noturnos de vento. Nesta fase de transicao, as variaveis ainda apresentam o perfilda camada de mistura, formando o que e chamado de camada residual neutra. Esta camada semantem acima da camada estavel noturna que e bem mais baixa que a camada convectiva diurna.

Uma fina camada em contato com o solo permance durante todo o ciclo, apresentando poucavariacao de altura. Trata-se da camada superficial (CS), onde os fluxos nao variam mais do que10%, sendo portanto considerada uma camada de fluxos constantes.

No dia seguinte, com o nascer do sol, o mesmo ciclo se reinicia.

3 Dinamica do Escoamento na CLA

A dinamica da atmosfera pode ser prescrita atraves de dois princıpios basicos: o da conservacaode massa e da conservacao da quantidade de movimento. Esta e a maneira classica de se olharpara um escoamento sobre a camada limite atmosferica e cujos fundamentos sao conhecidos damecanica dos fluidos.

Desta forma consideramos que o ar e um fluido incompressıvel escoando sobre a camadalimite atmosferica isto e:

Dt= 0, (13)

onde ρ e a densidade do ar e Dρ/Dt = dρ/dt + u · ∇ρ e a derivada material de ρ. Supondo quea densidade do ar e constante no tempo, esta expressao simplifica-se para:

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∇ · u = 0, (14)

onde u = (u, v, w) e o vetor velocidade do vento. Portanto, o princıpio da conservacao de massaimplica que a divergencia do vetor velocidade e nula.

A segunda lei de Newton aplicada a uma parcela de ar, diz que quantidade de movimentotambem se conserva, isto e:

Du

Dt= −1

ρ

∂ p

∂ x+ f v + ν∇2u; (15)

Dv

Dt= −1

ρ

∂ p

∂ y− f u + ν∇2v; (16)

Dw

Dt= −1

ρ

∂ p

∂ x− g + ν∇2w; (17)

onde ν e a viscosidade cinematica do fluido e f = 2Ω sen φ e o parametro de Coriolis que dependeda latitude φ. Este e conjunto das equacoes de Navier-Stokes.

3.1 Escoamentos Invıscidos de Larga Escala

Um fluido sem viscosidade (ν = 0) da origem a um escoamento invıscido. Na CLA, a viscosidadetem papel fundamental, portanto esta aproximacao nao pode ser aplicada aqui. Acima destacamada entretanto esta aproximacao pode ser util. Fazendo ν = 0 nas equacoes de Navier-Stokes(17), temos as equacoes de Euler:

Du

Dt= −1

ρ

∂ p

∂ x+ f v; (18)

Dv

Dt= −1

ρ

∂ p

∂ y− f u; (19)

Dw

Dt= −1

ρ

∂ p

∂ x− g. (20)

(21)

Um otimo exemplo deste tipo de escoamento e o chamado vento geostrofico, que se obtemquando os termos de inercia das equacoes de Euler sao desprezados (D/Dt = 0):

ug = − 1ρ f

∂p

∂y; vg =

1ρ f

∂p

∂x. (22)

A nao ser na CLA (onde a aproximacao invıscida nao vale) e proximo ao equador, onde| f |→ 0, o vento geostrıfico e uma boa aproximacao para o vento real (com erro da ordem de10% [1]) nas camadas superiores da atmosfera.

3.2 Escoamento Viscosos de Pequena Escala: Turbulencia

Na camada limite planetaria entretanto a viscosidade desempenha um papel crucial. Ela e res-ponsavel pelo surgimento de tensoes cisalhantes devido ao atrito do ar com a superfıcie ou comobstaculos e e responsavel pela dissipacao de energia cinetica que e convertida em calor.

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Um escoamento viscoso pode ser laminar ou turbulento. Considerando um escoamoentodentro da CLA onde as velociades tıpicas sao da ordem de U = 5ms−1; onde L = 100m e umaescala de comprimento bastante representativa; e, levando-se em consideracao que um valoraproximado para a viscosidade cinematica do ar de ν = 1,5 × 10−5m2s−1 ([8]), o Numero deReynolds para este escoamento, vale aproximadamente Re = UL/ν ≈ 3× 107. Este parametroadimensional e um quociente que compara os efeitos inerciais e viscosos, e da uma boa medida dequao laminar ou turbulento e um escoamento e, no caso da atmosfera, caracaterizando-o como(altamente) turbulento.

A turbulencia na CLA e caracterizada por uma vasta gama de escalas de tempo e compri-mento. Enquanto os menores vortices sao da ordem de milimetros, os maiores chegam a espessurada camada limite. As escalas de tempo tambem variam do milisegundo a escala horaria.

As figuras 4 e 5 mostram como se comporta um sinal turbulento tıpico. Estas medidas foramrealizadas no lago de Furnas, com inıcio as 8 h (hora local) do dia 17/07/2004, durante umahora, a uma taxa de 20 Hz.

Uma estrategia para descrever a dinamica do escoamento turbulento na atmosfera e a de-composicao de Reynolds do sinal turbulento a (que pode ser uma componente da velocidade dovento, temperatura, umidade, concentracao de um poluente, etc) em uma componente media ae uma flutuacao em torno desta media a′:

a = a + a′. (23)

0

0.5

1

1.5

2

2.5

3

3.5

0 10000 20000 30000 40000 50000 60000 70000 80000

Vel

ocid

ade

(ms−

1 )

RUNS

Figura 4: Sinal turbulento: Velocidade instantanea, medida a cada 1/20 s, e velocidade media no perıodo

Esta decomposicao, que pode ser vista na figura 6 goza de algumas propriedades basicas. Sea e b sao dois sinais turbulentos e k e uma constante, entao:

• a + b = a + b;

• k a = k a;

• a b = a b;

8

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291

291.5

292

292.5

293

293.5

0 10000 20000 30000 40000 50000 60000 70000 80000

Tem

pera

tura

(K

)

RUNS

Figura 5: Sinal turbulento: Temperatura absoluta, medida a cada 1/20 s, e temperatura media noperıodo

−1.5

−1

−0.5

0

0.5

1

1.5

2

0 10000 20000 30000 40000 50000 60000 70000 80000

Vel

ocid

ade

(ms−

1 )

RUNS

Figura 6: Decomposicao de Reynolds da velocidade instantanea em media e flutuacao.

9

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• a′ = 0;

• ∂a/∂s = ∂a/∂s;

•∫

a ds =∫

a ds.

Uma questao crucial e saber com qual tipo de media estamos lidando. Esta discussao naosera abordada neste texto (mais detalhes ver [6]), simplesmente estamos supondo que as propri-edades desta decomposicao sao validas para as medias temporais e espaciais.

Quando aplicamos esta decomposicao sobre as variaveis que regem a dinamica da CLAatraves das equacoes 14-17, obtemos as seguintes equacoes para a dinamica do escoamentomedio na CLA:

∇ · u = 0, (24)

que diz que o escoamento medio e incompressıvel, e;

Du

Dt= −1

ρ

∂ p

∂ x+ f v + ν∇2u−

(∂u′2

∂x+

∂u′v′

∂y+

∂u′w′

∂z

); (25)

Dv

Dt= −1

ρ

∂ p

∂ y− f v + ν∇2v −

(∂v′u′

∂x+

∂v′2

∂y+

∂v′w′

∂z

); (26)

Dw

Dt= −1

ρ

∂ p

∂ x− g + ν∇2w −

(∂u′w′

∂x+

∂v′w′

∂y+

∂w′2

∂z

); (27)

que sao as equacoes de Navier-Stokes para o escoamento medio. O mais fascinante neste conjuntode equacoes e a intromissao de termos envolvendo as covariancias u′2, u′v′, u′w′, etc, mostrandoque, mesmo quando se trata do escoamento medio a turbulencia deve ser levada em consideracao.

Alem disso, estes termos sao novas variaveis, o que da origem ao chamado problema do fecha-mento em turbulencia, assunto que tambem nao trataremos aqui (ver [2] ou [8]). Este problemae contornado atraves das teorias de fechamento em turbulencia, que propoe parametrizacoespara estes termos.

3.3 Difusao Turbulenta

Os fluxos turbulentos resultantes da substituicao da decomposicao de Reynolds nas equacoes deNavier-Stokes sao fundamentais, por serem os termos de transporte turbulento no escoamento,e, como ja foi dito, a difusao turbulenta e muito mais eficiente que a a molecular com mecanimode mistura. A importancia destes fluxos e bem explicada por Moraes e Acevedo [6]:

“A superfıcie do planeta e fonte de calor sensıvel e sumidouro de momento do sistema terra-atmosfera. Alem disso, e nela que se originam quantidades como vapor d’agua, dioxido decarbono, poluentes e outros escalares. O entendimento das transferencias dessas quantidades efundamental para a caracterizacao do tempo e do clima da superfıcie. Tambem interessa para es-tudos ecologicos e de meio ambiente, como o estudo do ciclo do carbono do planeta, diretamenteafetado pelas transferencias de CO2 entre ecossistemas e a atmosfera, e para o entendimentodos processos que governam a turbulencia atmosferica”.

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Em analogia com a difusao molecular, os fluxos turbulentos podem ser considerados propor-cionais aos gradientes medios, como abaixo:

u′w′ = −Kmdu

dz(28)

w′θ′ = −Kθdθ

dz(29)

w′c′ = −Kcdc

dz, (30)

onde km, kθ e kc sao, respectivamente, as difusividades turbulentas de quantidade de movimento,calor e massa.

A analogia com a difusao molecular e um pouco “forcada” no sentido de que nao se baseia emnenhum princıpio fısico. Estas difusividades nao sao propriedades do fluido e sim do escoamentoturbulento, portanto podem variar caso a caso, so podendo ser determinados empiricamente.Esta situacao acaba sendo meio paradoxal, pois a difusividade sendo propriedade do escoamentonao pode ser resolvida a priori (isto e, antes de resolver as equacoes!!!). Alternativas, alem deprescrever valores para estes K’s, e prescrever a dinamica destes coeficientes de transferencia(ou seja, mais equacoes!), ou ainda determinar perfis para eles. Neste ultimo caso, os perfisvao depender de parametros tıpicos da atmosfera, tais como estabilidade, altura, velocidade deatrito, etc.

3.4 Similaridade

Outra maneira de tratar a turbulencia atmosferica e usar teorias de similaridade, onde ao invesde tentar descrever a dinamica do escoamento atraves das equacoes de Navier-Stokes, argumen-tos dimensionais e empıricos dao origem a uma das teorias mais bem-sucedidas em explicar aturbulencia na CLA. Trata-se da Teoria de Similaridade de Monin-Obukhov (TSMO). Nesta teo-ria a dinamica na camada superficial da amtosfera e governada por apenas quatro parametros: aaltura acima da superfıcie z, a tensao superficial τ0, o fluxo superficial de temperatura Q0 = w′θ′ve um parametro de flutuabilidade β = g/T (T e a temperatura absoluta media na camada limite).

A partir destes parametros, Obukhov definiu as escalas de velocidade e temperatura tıpicasdo escoamento na camada superfcial (CS), com sendo respectivamente, a velocidade de atrito:

u∗ = |τ0|/ρ, (31)

onde τ0 = −ρ u′w′ e a tensao superficial produzida pelo escoamento sobre a superfıcie, supondoque o sistema de coordenadas esteja alinhado com a direcao media do vento (isto e, v = w = 0);e uma escala de temperatura que depende de u∗:

θ∗ = Q0/u∗. (32)

Obukhov [7] ainda introduziu uma escala de comprimento, que caracteriza a subcamdadinamica da turbulencia atmosferica:

L =u3∗

k Q0 β, (33)

onde k ≈ 0,4 e a constante de von Karman.

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A partir de equacoes empıricas e argumentos dimensionais, Obukhov [7] mostrou que osgradientes de velocidade e temperatura medios adimensionalizados sao funcoes universais doparametro de estabilidade de Monin-Obukhov, ζ = z/L, e que sao dados por:

z

k u∗

du

dz= φu(ζ); (34)

z

k θ∗

dz= φθ(ζ). (35)

Para z < |L|, φu = constante, o que da origem ao conhecido perfil logarıtmico de vento(obtido por integracao da equacao 34):

u =u∗k

ln(z/z0), (36)

onde z0 e chamado de comprimento de rugosidade.Os desvios padrao de velocidade sao parametros fundamentais nos modelos gaussianos de

dispersao e, adimensionalizados por u∗ tambem devem ser funcoes universais de ζ:

σu,v,w

u∗= φ1,2,3(ζ). (37)

Entretanto, em condicoes convectivas, o comportamento dos dados de micometeorologia ob-tidos tradicionalmente para σu e σv teimam em nao seguir a teoria (o que nao acontece emcondicoes neutras, por exemplo), ainda que as previsoes da teoria funcionem bem para σw e σθ

[4].

A TSMO vale na subcamada da CLA limitada por z < |L|, cuja caracterıstica basica e ade ser uma camada onde a producao de energia cinetica turbulenta (ECT) e conduzida pre-dominantemente por cisalhamento devido ao vento, ou seja a producao de ECT e de origemprincipalmente mecanica. Acima desta camada, onde z > |L|, os perfis medios comecam a sedesviar destes e a estrutura da turbulencia atmosferica comeca a depender de outros parametros,uma vez que as tensoes superficiais deixam de ser importantes. A producao de ECT e dominadabasicamente por efeitos termicos. Esta camada e chamada de conveccao livre e as escalas develocidade e temperatura tıpicas nesta camada sao:

uf = [Q0 z β]1/3, (38)θf = Q0/w∗L. (39)

(40)

Apesar de muito bem-sucedida, a TSMO muitas vezes carece de melhor comprovacao expe-rimental. Alem disto, a passagem de uma camada onde a turbulencia tem origem mecanica paraoutra onde e governada por efeitos termicos nao fica muito bem resolvida.

4 RESULTADOS DE EXPERIMENTOS REALIZADOS EMCAMPO E MODELAGEM

Esta secao e dedicada a mostrar alguns resultados de experimentos realizados em campo pelaequipe de pesquisadores do LEMMA (Laboratorio de Estudos em Modelagem e MonitoramentoAmbiental).

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O Lemma atua em diversas areas de pesquisa em modelagem e monitoramento, entre elasqualidade do ar, estudo da CLA, turbulencia, qualidade da agua, hidrologia, etc. A equipe depesquisa e formada por professores do curso de Engenharia Ambiental da UFPR, professoresassociados, alunos de pos-graduacao (mestrado e doutorado) e alunos de graduacao (iniciacaocientıfica e estagio). Aqui, mostraremos aguns resultados obtidos sobre a CLA.

4.1 EXFU3: Modelagem da Turbulencia sobre o Lago de Furnas

O experimento intensivo de campo em Furnas (EXFU-3) foi realizado no Lago do Reservatoriode Furnas (FURNAS CENTRAIS ELETRICAS S.A.) no estado de Minas Gerais entre os dias14 e 22 de julho de 2004. Os equipamentos foram instalados numa torre de medicoes microme-teorologicas, chamada estacao Guape, instalada no centro do lago (figura 7). Neste experimentoforam utilizados dois conjuntos de medicao como mostra a figura 8, um de resposta rapida, eoutro de resposta um pouco mais lenta. O conjunto de resposta rapida e composto de:

• Um anemometro sonico Campbell CSAT3, que mede as componentes da velocidade dovento, u, v e w e a temperatura virtual θv; mais um higrometro de criptonio CampbellKH2O que mede a densidade de vapor ρv e um termopar de fio fino Campbell FWTC3para medir a temperatura do ar.

Para o outro conjunto, temos:

• um anemometro sonico Young 81000, que mede as componentes da velocidade do ventou, v e w e a temperatura virtual θv, um sensor de temperatura e umidade relativa CS500para medir a densidade de vapor ρv, e com um termopar Campbell FWCT3 para medir atemperatura do ar.

A figura 8 mostra a configuracao dos equipamentos utilizados durante o EXFU-3. Os dadosforam medidos a uma frequencia de 20 Hz e armazenados em um Palm m125 utilizando cartoesde memoria de 512 megabytes, sendo coletados diariamente, transferidos para um notebook everificados para detectar eventuais falhas.

Figura 7: Estacao Guape: torre suporte para conjuntos de medicao

Esta configuracao de anemometros nao permite estimar gradientes de velocidade e tempe-ratura, assim exibimos alguns resultados obtidos em turbulencia atmosferica, para os desvios

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Figura 8: Conjutos de medicao. A esquerda o conjunto de resposta rapida; e a direita, o deresposta lenta

padrao de velocidade (vertical na figura 9; e longitudinal, figura 10) e temperatura (figura 11).

0

0.5

1

1.5

2

2.5

3

0.001 0.01 0.1 1 10

σ w/u

*

−z/L

σw, adimensionalizado por u*, 60 min, CSAT3

Figura 9: Desvio padrao adimensional de w como funcao de ζ: σw/u∗ = φ1(ζ)

As funcoes φ sao determinadas empiricamente. Neste caso, foi usada uma funcao potenciado tipo φ(ζ) = a + b ζc, onde a, b e c sao constantes. Nota-se a semelhanca entre os desviospadrao de w e de θ e a dificuldade de tratamento no caso do desvio-padrao de u.

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−5

0

5

10

15

20

0.001 0.01 0.1 1 10

σ u/u

*

−z/L

σu, adimensionalizado por u*, 60 min, CSAT3

Figura 10: Desvio padrao adimensional de u como funcao de ζ: σu/u∗ = φ2(ζ)

0

5

10

15

20

25

0.001 0.01 0.1 1 10

σ T/T

*

−z/L

σT, adimensionalizado por T*, 60 min, CSAT3

Figura 11: Desvio padrao adimensional de θ como funcao de ζ: σT /T∗ = φ3(ζ)

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4.2 Modelagem da Altura da Camada Limite

Com o intuito de verificar a influencia da CLA sobre a dispersao de poluentes na atmosfera,citamos a dissertacao de mestrado de Andre Malheiros (LEMMA, [5]). Nele foram aplicadosdois modelos diferentes para a determinacao da camada limite sobre a regiao de Curtiba.

0

250

500

750

1000

1250

1500

1750

2000

00 02 04 06 08 10 12 14 16 18 20 22

Altu

ra (

m)

Hora

JULHO

hBG/ZBhpratico

Figura 12: Ciclo diario medio da altura CLA no mes de julho. Figura cedida pelo autor.

0

250

500

750

1000

1250

1500

1750

2000

00 02 04 06 08 10 12 14 16 18 20 22

Altu

ra (

m)

Hora

FEVEREIRO

hBG/ZBhpratico

Figura 13: Ciclo diario medio da altura CLA no mes de fevereiro. Figura cedida pelo autor.

Sem levar em consideracao as pequenas discrepancias obtidas com a aplicacao de dois mo-delos distintos, fica claro que, qualitativamente, a evolucao diaria da altura da CLA independedo modelo adotado. Alem disso, percebe-se claramente que a altura da CLA diurna e menor noinverno (figura 12, de 700 a 1000 m, dependendo do modelo) que no verao (figura 13, da ordemde 1500 m).

Nas figuras 14 e 15 podemos observar os efeitos da altura da CLA sobre a concentracao dedioxido de enxofre (SO2) medida em estacoes da qualidade do ar em Curitiba. Percebe-se que

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02505007501000125015001750200000 06 12 18 00 06 12 18 00 06 12 18Altura(m)

HorahBG=ZBhprati o

Figura 14: Ciclo diario da altura CLA em Curitiba, de 29 a 31 de maio de 2004. Figura cedida peloautor.

0102030405060708090100

00 06 12 18 00 06 12 18 00 06 12 18Con entra ~ao(gm3 )

HoraSO2

Figura 15: Ciclo diario da concentracao de SO2 em Curitiba, de 29 a 31 de maio de 2004. Figura cedidapelo autor.

com a diminuicao da sua altura no ciclo diario (ocorrendo no perıodo noturno) as concentracoesaumentam, uma vez que a regiao de dispersao fica mais estreita.

A mesma analise, feita para um intervalo maior de dias e levando-se em consideracao maisdois fatores, precipitacao acumulada (figura 17) e temperatura potencial media (figura 18),mostramos a seguir. Percebe-se claramente a influencia da chuva como fator limpante, uma vezque a concentracao de SO2 cai drasticamente em 27/05 e 08/06. Ja para a altura da camadalimite, considerando o primeiro modelo (figura 16, linha contınua) nota-se que a diminuicaoocorrida do dia 29/05 ate o dia 04/06 (figura 19) contribui para o aumento da concentracao deSO2 medida.

02505007501000125015001750200025/05 27/05 29/05 31/05 02/06 04/06 06/06 08/06Altura(m)

DatahBG=ZBhprati o

Figura 16: Altura da CLA em Curitiba, de 25 de maio a 8 de junho de 2004. Figura cedida pelo autor.

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0246810

23/05 27/05 31/05 04/06 08/06Pre ipita ~ao(mm)

DataP

Figura 17: Precipitacao acumulada em Curitiba, de 22 de maio a 9 de junho de 2004. Figura cedidapelo autor.

27028029030031032023/05 27/05 31/05 04/06 08/06Temperatura(

K)Data

Ta

Figura 18: Temperatura potencial media em Curitiba, 22 de maio a 9 de junho de 2004. Figura cedidapelo autor.

010203040506070809010025/05 27/05 29/05 31/05 02/06 04/06 06/06 08/06Con entra ~ao

(gm3 )Data

SO2

Figura 19: Concentracao de SO2 em Curitiba, de 25 de maio a 8 de junho de 2004. Figura cedida peloautor.

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4.3 Perfis na CLA obtido por Veıculo Aereo nao Tripulado

Os parametros mais importantes da CLA podem ser medidos fazendo-se uso de sensores acopla-dos a baloes cativos ou livres. Usualmente, a determinacao da espessura da CLA e realizada combase nos perfis termicos obtidos por meio de radiossonda, que possuem a capacidade de gerar per-fis ate alturas da ordem de 100mb, cobrindo as estratificacoes de maior interesse dentro da CLA.

O uso do Veıculo Aereo nao Tripulado (VANT) representa diversas vantagens em termos daobtencao destes perfis, tanto do ponto de vista economico, quanto do ponto de vista tecnico,uma vez que o uso da aeronave permite uma autonomia e controle muito maior sobre a regiaovarrida para a coleta de dados.

Figura 20: Veıculo Aereo Nao Tripulado sendo preparado para campanha de medicoes. Figura cedidapelo autor.

Os equipamentos para medir os perfis de temperatura, umidade relativa e pressao ba-rometrica estao instalados no interior do VANT (figura 21). Maiores detalhes sobre a instalacaodo equipamento e seu funcionamento, ver [9]. Alem disso, a aeronave foi equipada com umacamera de vıdeo com alcance de 3 km que permite efetuar voos fora do alcance visual do piloto.

Os primeiros voos experimentais aconteceram no Aeroclube de Planadores de Balsa Nova,a cerca de 40 km de Curitiba, PR. O plano de voo consistiu em uma elevacao lenta e gradualespiralada ate uma altitude de aproximadamente 2000m (Figura 24). Ate cerca de 1000m dealtura foi possıvel controlar o modelo de forma visual, nao sendo necessaria a utilizacao dasimagens enviadas pela camera de vıdeo a bordo.

Dois perfis de temperatura potencial obtido com este equipamento sao mostrados a seguir(figura 25. A da esquerda com o sensor instalado no interior da aeronave, o da direita com osensor externo, numa tentativa de resolver o problema de falta de renovacao de ar no interiorda aeronave que supunha-se ser responsavel pelas discrepancias apresentadas.

O perfil de subida da aeronave e de descida obtidos sao distintos, e como se ve na comparacaodas duas figuras o sensor externo responde melhor as variacoes de altitude durante o voo do

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Figura 21: Veıculo Aereo Nao Tripulado decolando. Figura cedida pelo autor.

Figura 22: Veıculo Aereo Nao Tripulado em pleno voo. Figura cedida pelo autor.

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Figura 23: VANT: Equipamento instalado no interior da aeronave. Figura cedida pelo autor.

Figura 24: Plano de Voo do VANT. Figura cedida pelo autor.

Figura 25: Perfil de temperatura potencial. A esquerda: sensor interno. A direita: sensor externo.Figura cedida pelo autor.

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VANT. Ainda assim o tempo de resposta dos sensores parece afetar as medicoes de descida (ver[9]).

5 Forma de Plumas

Alem da influencia sobre o tamanho do domınio de dispersao de poluentes, a CLA tambem temforte influencia sobre a forma das plumas de fumaca lancadas a partir de chamines de fabricas.Abaixo, descreve-se brevemente a configuracao destas plumas, na ordem em que aparecem nafigura 26.

Figura 26: Formas tıpicas das plumas dependendo das condicoes de estabilidade e perfis de vento etemperatura (absoluta, linha pontilhada; e potencial, linha contınua) tıpicos (figura “emprestada” de[1]).

• Leque (“fanning”): Configuracao tıpica de uma pluma ocorrendo a noite, sob condicoes

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fortemente estaveis, com uma inversao superficial de temperatura marcante e ventos fracos.A dispersao da pluma ocorre quase que totalmente na horizontal, com pouca (ou nenhuma)dispersao vertical. Esta configuracao pode durar ate o amanhecer.

• Fumigacao (“Fumigation”): Situacao transitoria tıpica do amanhecer, quando a camadaestavel noturna e dissipada pelo aquecimento da superfıcie e uma camada instavel comecaa se formar, sugando a pluma em direcao ao solo. Devido a grande capacidade de mistura,a fumaca fica restrita a altura desta camada. A medida que a camada cresce, ela se espalha.

• (“Looping”): Pluma tıpica na camada convectiva diurna, quando a circulacao induzidapelas termicas ascendentes faz com que a fumaca serpenteie para cima e para baixo (figura28).

• Cone (“Coning”): Pluma tıpica de dias nublados com ventos fortes, com estabilidadequase-neutra e perfil adiabatico de temperatura. A dispersao e uniforme tanto na verticalquanto na horizontal.

• (“Lofting”): Condicao tıpica da transicao do dia para a noite (atmosfera instavel paraestavel, desenvolvendo uma especie de teto, acima do qual ocorre a dispersao). Umainversao termica ocorre acima da pluma, prevenindo-a de penetrar a camada estavel abaixo(figura 27).

• (“Trapping”, nao aparece na figura 26): Quando ocorre um aprisionamento da pluma.Geralmente, em condicoes instaveis, as plumas ficam presas ocupando toda a camadaconvectiva. Numa situacao tıpica do inverno, onde a camada convectiva pode demorar acrescer e ficar bastante rasa, este fenomeno e conhecido como inversao termica (figuras29 e 30). Agravada nos grandes centros urbanos se associado a baixa umidade do ar, ainversao termica acompanhada de fumigacao ocorre geralemente pela manha e e um fatorque piora bastante a qualidade do ar.

Figura 27: Dispersao de pluma entre duas camadas: estavel abaixo e neutra acima.

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Figura 28: Pluma em “Looping” na camada limite instavel.

Figura 29: Inversao termica sobre Curitiba vista do Centro Politecnico em junho/2008.

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Figura 30: Inversao termica sobre Curitiba vista do Centro Politecnico em junho/2008.

Referencias

[1] Arya, P. S. Air Pollution, Meteorology and Dispersion, Oxford University Press, New York,1999.

[2] Blackadar, A. K. Turbulence and Diffusion in the Atmosphere, Springer-Verlag, Berlin,1997.

[3] Eiger, S. Qualidade da Agua em Rios e Estuarios in “Hidrologia Ambiental” (Porto, R. L.L. (org)), Editora da USP/ABRH, Sao Paulo, 1991.

[4] Kader, B. A., Yaglom, A. M. Mean fields and fluctuation moments in unstably stratifiedturbulent boundary layers, J. Fluid Mech., 212, 1990.

[5] Malheiros, A. L. Avaliacao de Modelos para a Altura da Camada Limite Atmosferica Urbanae Seus Efeitos Sobre a Qualidade do Ar., Dissertacao de Mestrado, UFPR, Curitiba, 2004.

[6] Moraes, O. L. L., Acevedo, O. Fluxos Turbulentos na Atmosfera in “Topicos em Turbulenciae Modelagem da Dispersao de Poluentes na Camada Limite Planetaria” (Moreira, D. M.;Carvalho, J. C.; Vilhena, M. T. (org)), Editora da UFRGS, Porto Alegre, 2005.

[7] Obukhov, A. M. Turbulence in an Atmosphere With Non-uniform Temperature, BoundaryLayer Meteorology, 1, 1971.

[8] Stull, R. B. An Introduction to Boundary Layer Meteorology, Kluwer Academic Publishers,Doordrecht, 1991.

[9] Goncalves, J. E., Maggiotto, S. R., Dias, N. L., Malheiros, A. L., Nascimento, E. L. VeıculoAereo Nao Tripulado para Periflamento Atmosferico em Alta Resolucao, SBMET, 2006.

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