Conceitos - Frank Loyd Wright

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 Frank Lloyd Wright  ARQUITETURA E NA TUREZA  Minha receita para uma casa moderna: primeiro, um bom lugar. Escolha aquele no ponto mais difícil – escolha o lugar que ninguém quer – mas, escolha um que tenha características que o distinga: árvores, individualidade, uma imperfeição de qualquer tipo aos olhos do empreendedor. Tudo isto quer dizer distanciar-se da cidade. Então, parado num ponto deste lugar, contemple o entorno até descobrir o que é charmoso. Qual é a razão para você querer construir aí? Descubra. Construa, então, sua casa de modo que você ainda possa ver, desde aquele ponto, tudo aquilo que lhe parecera charmoso, e muito mais, sem perder nada daquilo que você vira antes da casa construída. Se a arquitetura é correta, a associação arquitetônica acentua o caráter da paisagem. (1938) Primeiro, um estudo da natureza dos materiais que você escolheu usar e das ferramentas que você empregará, buscando descobrir, em ambos, as qualidades características que satisfaçam seu propósito. Segundo, com o ideal de uma arquitetura orgânica como guia, reuna estas qualidades para atender seu propósito de modo que a imagem daquilo que você criar tenha integridade ou se adeqüe naturalmente, ignorando noções preconcebidas de estilos. O estilo é um subproduto do processo e resulta do homem ou da mente em atividade. O estilo da coisa, portanto, será o homem – é dele. Deixe sua forma em paz. (1924) Em todo caso, o que é arquitetura? É a vasta coleção de tantos edifícios que têm sido construídos para agradar o gosto diferente de vários senhores da humanidade? Penso que não. Não, eu acho que arquitetura é vida, ou, pelo menos, é a própria vida tomando forma e, por isso, é o registro mais verdadeiro da vida como ela foi no passado, como é hoje ou como será então. Assim, penso ser a arquitetura um Grande Espírito. Não pode ser somente algo que consista de edifícios construídos pelo homem na terra...hoje na maioria simplesmente empilhados ou prestes a ser...A arquitetura é aquele grande espírito criativo vivo que, de geração em geração, age, persiste, cria, de acordo com a natureza do homem e suas circunstâncias, conforme mudem. Isto é arquitetura de fato. (1939)

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Estudos sobre a arquitetura de Frank Loyd Wright

Transcript of Conceitos - Frank Loyd Wright

  • Frank Lloyd Wright ARQUITETURA E NATUREZA Minha receita para uma casa moderna: primeiro, um bom lugar. Escolha aquele no ponto mais difcil escolha o lugar que ningum quer mas, escolha um que tenha caractersticas que o distinga: rvores, individualidade, uma imperfeio de qualquer tipo aos olhos do empreendedor. Tudo isto quer dizer distanciar-se da cidade. Ento, parado num ponto deste lugar, contemple o entorno at descobrir o que charmoso. Qual a razo para voc querer construir a? Descubra. Construa, ento, sua casa de modo que voc ainda possa ver, desde aquele ponto, tudo aquilo que lhe parecera charmoso, e muito mais, sem perder nada daquilo que voc vira antes da casa construda. Se a arquitetura correta, a associao arquitetnica acentua o carter da paisagem.

    (1938) Primeiro, um estudo da natureza dos materiais que voc escolheu usar e das ferramentas que voc empregar, buscando descobrir, em ambos, as qualidades caractersticas que satisfaam seu propsito. Segundo, com o ideal de uma arquitetura orgnica como guia, reuna estas qualidades para atender seu propsito de modo que a imagem daquilo que voc criar tenha integridade ou se adeqe naturalmente, ignorando noes preconcebidas de estilos. O estilo um subproduto do processo e resulta do homem ou da mente em atividade. O estilo da coisa, portanto, ser o homem dele. Deixe sua forma em paz.

    (1924) Em todo caso, o que arquitetura? a vasta coleo de tantos edifcios que tm sido construdos para agradar o gosto diferente de vrios senhores da humanidade? Penso que no. No, eu acho que arquitetura vida, ou, pelo menos, a prpria vida tomando forma e, por isso, o registro mais verdadeiro da vida como ela foi no passado, como hoje ou como ser ento. Assim, penso ser a arquitetura um Grande Esprito. No pode ser somente algo que consista de edifcios construdos pelo homem na terra...hoje na maioria simplesmente empilhados ou prestes a ser...A arquitetura aquele grande esprito criativo vivo que, de gerao em gerao, age, persiste, cria, de acordo com a natureza do homem e suas circunstncias, conforme mudem. Isto arquitetura de fato.

    (1939)

  • Assim, fazer de uma residncia uma completa obra de arte, por si mesma expressiva e bela, intimamente ligada vida moderna e apropriada para se viver nela, acomodando livre e agradavelmente as necessidades individuais dos residentes enquanto entidade harmoniosa, incorporando na cor, no padro e na natureza as demandas da utilidade e, ainda, uma expresso deles no seu aspecto esta a grande oportunidade americana na arquitetura. Autnticos fundamentos para uma cultura autntica. Uma vez fundada, tornar-se- uma nova tradio: um largo passo frente daquela moda imposta quando uma residncia era um composto de ambientes isolados: cmodos para conter meras agregaes de moblia, faltando conforto e utilidade. Uma entidade orgnica, este edifcio moderno, quando comparado insensata e antiga agregao de partes. Seguramente, temos aqui o mais alto ideal de unidade enquanto uma soluo mais ntima para expresso de uma vida no seu prprio entorno. Uma coisa ao invs de muitas; uma grande coisa ao invs de uma coleo de coisas pequenas.

    (1910) Nenhum edifcio verdadeiramente italiano parece incomodado na Itlia. Todos esto contentes com o ornamento e a cor que naturalmente carregam. As pedras e as rvores naturais e as encostas ajardinadas concordam com eles. Onde quer que os ciprestes cresam, l, como o toque da mo de um mgico, tudo se resolve numa composio harmoniosa e completa. O segredo deste charme inefvel seria procurado em vo no ar rarefeito da escolstica ou nos atelis de qualquer das pedantes belas-artes. Faz parte da prpria terra, como um punhado mido e doce dela. To simples que, para as cabeas modernas, treinadas na ginstica intelectual do gosto cultivado, pareceria de pouca importncia. To perto do corao est que quase universalmente ignorado, sobretudo pelos estudiosos. Quando pegamos a estrada, nos atraem flores de uma cor viva incomum ou de uma aparncia charmosa. Tomados por elas, aceitamos generosamente sua graa perfeita. Mas, procurando o segredo deste charme inefvel, descobrimos que as flores, cujo apelo mais bvio chamou primeiro nossa ateno, so nativas, intimamente ligadas textura e ao tipo da folhagem que h sob ela. Descobrimos a conformidade entre a forma daquelas flores e o sistema no qual as folhas esto dispostas no galho. Da somos levados a perceber uma maneira caracterstica de crescimento e a descobrir um tipo resultante de estrutura que primeiro tomou forma nas razes escondidas na terra clida, sempre mida pela cobertura de humo. A estrutura como agora podemos observar estende-se do geral ao particular, chegando assim s flores, que nos atraem, revelando, em suas linhas e forma, a natureza da

  • estrutura que as sustenta. Temos a algo orgnico. Lei e ordem so o princpio da graa e da beleza completas. A beleza a expresso de condies fundamentais na linha, na forma e na cor, fiis quelas condies e parecendo existir para complet-las de acordo com algum desenho original inspirado.

    (1910)

  • Frank Lloyd Wright A DESTRUIO DA CAIXA (1952) Acho que, conscientemente, comecei a tentar destruir a caixa pela primeira vez em 1906 no projeto do Edifcio Larkin. Encontrei a abertura natural que procurava quando (depois de uma grande briga) finalmente empurrei as torres das escadas para alm dos cantos do edifcio principal, transformando-as em elementos individuais, auto-portantes. A a coisa comeou a acontecer, como voc pode perceber. Havia sentido esta necessidade de elementos bem cedo na minha carreira. Voc ver esta sensao crescendo, tornando-se mais aparente um pouco mais tarde na Igreja Unitria: talvez, seja l onde voc encontrar a primeira expresso verdadeira da idia de que o espao interno a realidade do edifcio. Na Igreja Unitria onde eu penso t-la alcanado, esta idia de que a realidade de um edifcio no se reduzia mais a paredes e cobertura. Aflorou ento este senso de liberdade, que se tornou, para vocs, a arquitetura de hoje, a qual chamamos de arquitetura orgnica. Voc pode ver l, na Igreja Unitria, como lidei, naquele tempo, com este grande problema arquitetnico. Voc perceber o sentido do salo se construindo um espao no enclausurado, mas mais ou menos livre para se revelar. Na Igreja Unitria, voc notar as paredes, de fato, desaparecendo, o espao interior abrindo-se ao exterior, o exterior penetrando. Vai ver reunidos em torno deste interior, emoldurando-o, vrios elementos livres relacionados ao invs de paredes que o encerram. Veja, voc agora pode propor elementos de vrios tipos para delimitar o ambiente e agrup-los em torno do espao interior sem aquela sensao de encaixot-lo. Mas, o mais importante , acima de tudo, a sensao de abrigo estendido, expandido, que d o indispensvel sentido de proteo ao mesmo tempo em que libera a viso do homem para alm das paredes. Este sentido primitivo de abrigo o que uma arquitetura de qualidade sempre deve ter. Se, em um edifcio, voc denota no s proteo de cima, mas tambm liberao do interior em direo ao exterior (o que se sente na Igreja Unitria e em outros edifcios que constru), ento voc possui o segredo importante de deixar o espao interior manifestar-se. Agora devo tentar mostrar a voc por que a arquitetura orgnica a arquitetura da liberdade democrtica. Por qu? Bem... Aqui, suponhamos, est sua caixa: uma grande abertura nela, ou aberturas pequenas se voc preferir, claro.

  • O que voc tem a agora um continer quadrado. Certo? Alguma coisa no se ajusta nossa profisso liberal de carter democrtico, uma coisa essencialmente anti-individual. A voc pode notar (mais ou menos) o que faz o aluno de arquitetura de quase todas as nossas escolas. Nunca quis ser um engenheiro. Infelizmente, fui educado como um deles na Universidade de Wiscosin. Mas, sei o suficiente de engenharia para saber que nos ngulos externos de uma caixa no onde estaria o apoio mais econmico, se voc fizesse dela um edifcio. No, a uma certa distncia de cada canto em todos os lados onde, invariavelmente, se encontrariam os pontos de apoio mais econmicos. Concorda? Agora, quando voc lana apoios nestes pontos voc cria um pequeno balano nas extremidades que encurta a distncia entre pilares e deixa a esquina livre ou aberta na medida que voc escolher. Os cantos todos desaparecem se voc preferir por a deixar entrar ou sair espao. Ao invs de construo de pilares e vigas, a tradicional caixa edifcio, voc agora tem um novo sentido da construo de edifcios atravs do balano e da continuidade. Ambos so novos elementos estruturais, uma vez que agora fazem parte da arquitetura. Mas, em todo o mundo, tudo o que se v hoje desta liberao radical do espao a janela de canto. Nesta pequena alterao do pensamento, porm, reside a essncia da mudana arquitetnica da caixa para o plano livre e a nova realidade que o espao ao invs da matria. Deste ponto em diante podemos falar, ento, de arquitetura orgnica, ao invs de arquitetura clssica. Vamos l. Estas paredes laterais deslocadas tornam-se algo independente, no mais paredes que encerram o ambiente. So planos de apoio separados, alguns do quais podendo ser encurtados, estendidos ou perfurados, ou ocasionalmente eliminados. Estes planos auto-portantes sustentam a cobertura. E a cobertura? Elevada, ela fica realada como uma esplndida sensao de abrigo, mas um abrigo que no esconde nada quando, desde dentro, se olha para fora. uma forma de abrigo que realmente causa a sensao do exterior entrando ou do interior estendendo-se para fora. Sim, voc tem agora uma amplitude que realmente a liberao deste espao interior ao exterior: liberdade onde antes existia aprisionamento. Voc pode aperfeioar a imagem da liberdade com aqueles quatro planos; de qualquer modo, a circunscrio da caixa morreu. Algo se transforma, e algo na natureza da planta ou dos materiais aparece naturalmente como possibilidade. Vou adiante: se esta liberao funciona no plano horizontal, por que no funcionaria no plano vertical? Ningum nunca olhou para o cu l em cima atravs do ngulo superior da caixa, olhou? Por que no? Porque a caixa sempre tinha uma cornija no topo. Era adicionada aos lados para que a caixa no parecesse tanto uma caixa, e sim, mais clssica. Esta cornija era o elemento que fazia da sua caixa convencional, clssica.

  • Agora para seguir adiante no Edifcio Johnson, voc no tem nenhuma sensao de encerramento em qualquer dos ngulos, superiores ou laterais. Voc est vendo o cu e sentindo a liberdade do espao. As colunas so projetadas para ficar em p e sustentar o teto, a coluna feito uma parte do teto: continuidade. A velha idia de um edifcio, como voc v, j se foi. Tudo antes destes pensamentos libertadores de balano e continuidade tiveram efeito, era a construo pilar e viga: superimposio de uma coisa sobre a outra e repetio de laje sobre laje, sempre sobre pilares. E agora? Estabeleceu-se um uso natural do vidro consoante com esta nova liberdade espacial. O espao agora pode entrar ou sair de onde h vida, espao como um componente dela. Por isso a arquitetura orgnica a arquitetura na qual voc sente e v tudo isto acontecer como uma terceira dimenso. Muito chato que os gregos no saibam deste novo uso do ao e do vidro como uma terceira dimenso. Se tivessem conhecido o que eu estou tentando descrever aqui, voc no teria de pensar muito sobre isto hoje, as escolas h muito teriam ensinado estes princpios a voc. Seja como for, este senso de espao (espao vivo pela terceira dimenso), no aquele senso, ou sensao de arquitetura, de que falara, um implemento para caracterizar a liberdade do indivduo? Penso que sim. Se voc recusa este sentido liberado da construo voc no est jogando fora aquilo que mais caro nossa vida humana e mais promissor como um novo campo para a verdadeira expresso artstica criativa em arquitetura? Haver algo mais? Por tudo isto, e mais, que eu tenho brigado, a vida toda, pelo fim da cavilosa velha caixa. Tenho tido um tempo to curioso, controverso, interessante, nesta batalha que eu mesmo me tornei controverso. A suspeita est sempre pronta. Agora, voltando s minhas prprias experincias: depois do edifcio do Templo Unitrio, como disse, eu pensava ter algo grandioso nas mos. Estava me sentindo, imagino eu, como um profeta devesse se sentir. Pensava freqentemente: bem, ao menos aqui est o nascimento genuno de um pensamento, de um sentimento e de uma oportunidade nesta era da mquina. Este o meio moderno. Eu o realizei! Naturalmente, lembro-me bem, tornei-me cada vez menos tolerante e, suponho, intolervel. Arrogante, acredito, seria a palavra certa. Eu a escutei muito. Bem, sempre acontece alguma coisa quando voc desproporcionadamente arrogante. Certo dia fui para o meu estdio em Taliesin para descansar. Apanhei um pequeno livro que eu acabara de receber do embaixador japons nos Estados Unidos. Chamava-se O livro do Ch, escrito por Okakura Kakuzo. Me pergunto quantos de vocs o leram. Bem, naquele livrinho eu encontrei citaes do grande poeta-profeta Laotze, coisas que ele disse quinhentos anos antes de

  • Cristo. Ao virar as pginas, de repente dei de topo com isto: A realidade da edificao no consiste nas quatro paredes e o teto, e sim no espao entremeio onde se vive. Curioso! Jamais o havia visto antes. Mal podia acreditar no que lia e o reli inmeras vezes. Bem...bem...por um ou dois dias andei desiludido comigo mesmo: sentia alguma coisa parecida a uma vela sendo arriada. At que, me sentindo bem, recomecei a raciocinar. Pensei...ora...espere a: Laotze o disse. Sim. Mas, eu o construi. A me reergui e tenho passado bem desde ento, arrogncia intocada - obrigado.