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APRESENTAÇÃO
Este módulo faz parte da coleção intitulada MATERIAL MODULAR, destinada às três
séries do Ensino Médio e produzida para atender às necessidades das diferentes rea-
lidades brasileiras. Por meio dessa coleção, o professor pode escolher a sequência que
melhor se encaixa à organização curricular de sua escola.
A metodologia de trabalho dos Modulares auxilia os alunos na construção de argumen-
tações; possibilita o diálogo com outras áreas de conhecimento; desenvolve as capaci-
dades de raciocínio, de resolução de problemas e de comunicação, bem como o espírito
crítico e a criatividade. Trabalha, também, com diferentes gêneros textuais (poemas,
histórias em quadrinhos, obras de arte, gráficos, tabelas, reportagens, etc.), a fim de
dinamizar o processo educativo, assim como aborda temas contemporâneos com o ob-
jetivo de subsidiar e ampliar a compreensão dos assuntos mais debatidos na atualidade.
As atividades propostas priorizam a análise, a avaliação e o posicionamento perante
situações sistematizadas, assim como aplicam conhecimentos relativos aos conteúdos
privilegiados nas unidades de trabalho. Além disso, é apresentada uma diversidade de
questões relacionadas ao ENEM e aos vestibulares das principais universidades de cada
região brasileira.
Desejamos a você, aluno, com a utilização deste material, a aquisição de autonomia
intelectual e a você, professor, sucesso nas escolhas pedagógicas para possibilitar o
aprofundamento do conhecimento de forma prazerosa e eficaz.
Gerente Editorial
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
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2014
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@LIT030Autores e obras da
literatura brasileira
@LIT030
Dados Internacionais para Catalogação na Publicação (CIP)(Maria Teresa A. Gonzati / CRB 9-1584 / Curitiba, PR, Brasil)
D541 Dias, Nathalia Saliba.Ensino médio : modular : literatura : concretismo, neoconcretismo e tropicalismo /
Nathalia Saliba Dias, Sergio Augusto Kalil. – Curitiba : Positivo, 2013.: il.
ISBN 978-85-385-7163-6 (livro do aluno)ISBN 978-85-385-7164-3 (livro do professor)
1. Literatura. Ensino médio – Currículos. I. Kalil, Sergio Augusto. II. Título.
CDU 373.33
SUMÁRIO
Unidade 1: Concretismo e Neoconcretismo no Brasil
Concretismo 10
Neoconcretismo 27
Unidade 2: Tropicalismo e Poesia Marginal
Tropicália 36
Poesia Marginal 41
[...]
verbivocovisual
[...]
Augusto de Campos
Concretismo e Neoconcretismo no Brasil
1
4 Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
Poema: obra em verso.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. 3. ed. Curitiba: Positivo, 2004. p. 1586.
Observe esta composição de Augusto de Campos:
CAMPOS, Augusto de. Poesia 1949-1979: São Paulo: Ateliê Editorial, 2000. p. 118.
Que palavras estão presentes nessa composição?
Como é o aspecto dos tipos (letras) empregados para escrever cada uma delas? Que relação teria isso com o sentido dessas palavras?
É possível afirmar que há no poema uma palavra “dentro” da outra? Como você interpreta isso?
Para você, o que é mais importante para a construção do sentido desse texto: o ambiente gráfico, o visual ou as palavras?
Em sua opinião, é possível chamar essa composição de poema? Por quê?
Ensino Médio | Modular 5
LITERATURA BRASILEIRA
No início da década de 1950, o Brasil vivia o projeto de desenvolvimento político e econômico proposto pelo então presidente da República, Juscelino Kubitschek de Oliveira, com o lema “Cinquenta anos em cinco”. A construção da nova capital federal – Brasília –, com o projeto de Oscar Niemeyer e Lucio Costa, inseria o país nas tendências da arquitetura mundial.
A cidade de São Paulo, já então configurada como polo econômico do país, ganhava contornos definitivos de uma grande metrópole. Imagem que se consolidou quando, em setembro de 1950, recebeu a sede da primeira emissora de televisão no país, a Rede Tupi, inaugurada por Assis Chateaubriand.
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Vinheta de apresentação da TV Tupi, em 1950 A TV passa, gradativamente, a fazer parte dos lares brasileiros: entretenimento e informação transmitidos por imagem
Tal avanço das telecomunicações do país veio acompanhado de uma popularização dos itens tecnológicos: além dos caros aparelhos de televisão, muitos outros eletrodomésticos passaram a ser desejados pelas famílias brasileiras. E juntamente com o desejo de adquirir esses ícones da moder-nidade, que gradativamente começaram a fazer parte do dia a dia das famílias, veio o consumo do design: a modernidade dos novos objetos constituía-se não apenas de sua capacidade funcional, mas também de seu desenho arrojado. A expectativa de povoar o cotidiano com elementos cuja imagem fosse a dos tempos modernos se manifesta nas mais diversas camadas da população.
A presença da televisão no cotidiano das pessoas e a necessidade da indústria de apresentar seus produtos de forma sedutora a um público que desconhecia inovações tecnológicas exigiram a formação de uma linguagem rápida, concisa e eficiente. Assim, os aspectos visuais da comunicação passaram a ganhar espaço diante do texto verbal padrão, disposto em forma contínua com a leitura segundo a tradição ocidental da esquerda para a direita e de cima para baixo.
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Desenvolvimento e modernidade crescentes: faces do Brasil urbano dos anos de 1950
6 Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
Eletrodomésticos nos anos de 1950: símbolos da agilidade e da praticidade dos tempos modernos e objetos de desejo nos lares brasileiros
A industrialização crescente implicava necessidade de expandir o mercado consumidor – e depressa. A necessidade era de comunicar a mensagem e vender o produto em conformidade com a dinâmica de tempo do próprio meio de comunicação – e notável velocidade do mundo contemporâneo. Isso provocou uma verdadeira revolução nas artes gráficas, na exploração comunicacional dos conteúdos visuais. A publicidade e o design se tornaram, então, a partir dos anos de 1950, segmentos econômicos de extrema importância para a indústria e o comércio.
Surgiu um modelo novo de consumo que se sustentou na publicidade, realizada de modo cada vez mais profissional, sobre pesquisas de mercado e um desenvolvimento ímpar dos aparatos gráficos, em revistas, folhetos e outdoors. Manifestou-se um novo modo de explorar e difundir a imagem na indústria cultural de modo geral (televisiva e gráfica impressa).
Mercadológica, social e culturalmente, o Brasil aderiu à onda desenvolvimentista. A cidade de São Paulo passou a concentrar essa efervescência. Em 1951, foi inaugurada a Primeira Bienal do Museu de Arte
Moderna de São Paulo, com convidados de diversos países. Um evento que inseriu a cidade de maneira definitiva no circuito mundial das artes e a consolidou como centro de agitação e produção cultural no Brasil.
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Com edições até os dias atuais, a Bienal das Artes é um dos mais importantes eventos das artes visuais no mundo
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Ensino Médio | Modular 7
LITERATURA BRASILEIRA
Antônio Maluf (1926-2005), artista, designer gráfico e programador visual, [...] vence, em 1951, o concurso para o cartaz da 1.ª Bienal Internacional de São Paulo, [...] considerado um marco do design gráfico no país. [...] Sua obra, Equação dos desenvolvimentos em progressões crescentes e decrescentes, adaptada para participar desse concurso, é considerada um de seus primeiros trabalhos afinados com a estética concreta.
ITAUCULTURAL.ORG. Enciclopédia Itaú Cultural de Artes Visuais. Disponível em: <http://www.itaucultural.org.br/aplicexternas/enciclopedia_ic/Enc_Artistas/artistas_imp.cfm?cd_verbete=559&imp=N&cd_idioma=28555>. Acesso em: 3 mar. 2012.
Como um evento cultural de sucesso, cuja realização periódica já se demonstrava garantida por sua repercussão, a Bienal ganhou, em 1957, um pavilhão construído especialmente para as exposições. Projetado por Oscar Niemeyer, o prédio é o verdadeiro ícone da arquitetura modernista brasileira e atesta a vocação cosmopolita da cidade de São Paulo.
Para a Bienal de 1951, foram trazidas ao Brasil, pela primeira vez, obras de Pablo Picasso (1881-1973), Alberto Giacometti (1901-1966) e René Magritte (1898-1967).
Ao lado desses nomes do Modernismo, foram apresentados novos expoentes da arte. Essas obras prenunciavam o espírito estético e artístico em que vingaria a poesia concreta no Brasil.
A escultura Unidade tripartida, de Max Bill (1908-1994), e a tela Formas, de Ivan Serpa (1923-1973), premiadas nessa Bienal, estavam entre essas obras. A exemplo do que ocorreu com o cartaz dessa exposição, são também sintomáticas da atenção despertada pelas novas tendências da arte naquele momento.
Já no cartaz de divulgação da primeira Bienal são demonstradas as ten-dências artísticas do Brasil dos anos de 1950, um país em que a informação visual e o design ganharam cada vez mais espaço. Ao observar a reprodução do cartaz, qual seu posicionamento a respeito dessa vertente artística que se insinuava? Ela primava pelo rebuscamento ou pela concisão? Pela objetividade ou subjetividade? Valorizava as formas naturais, a expressão emotiva ou as formas geométricas e a razão?
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Pavilhão da Bienal, projetado por Niemeyer para abrigar, em São Paulo, o cosmopolitismo desse evento artístico. O pavilhão das Indústrias, que hoje é chamado de Pavilhão Ciccillo Matarazzo, passou a abrigar a Bienal em 1957
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo8
Observe como se exploram, nas obras a seguir, conceitos da Matemática, da Geometria e da racionalização do espaço.
BILL, Max. Unidade tripartida. 1948-1949. 1 escultura em aço inoxidável. 114 cm x 88 cm x 98 cm. MAC-USP, São Paulo.
Especialmente elaborada a partir do trabalho sobre um conceito matemático, a Unidade tripartida, de Max Bill, é emblemática no sentido de demonstrar o enlace das artes com as ciências exatas, almejado pelas estéticas e poéticas dos meados do século XX. Sua estrutura remete à Fita de Moebius, um espaço topológico obtido pela colagem das duas extremidades de uma fita, girando uma das extremi-dades em 180º. Trata-se de uma superfície intrigante, que possui apenas um lado e apenas uma borda.
Veja o que Kátia Canton, do MAC-USP, afirma sobre a importância dessa obra para as artes bra-sileiras dos anos 50.
[...] A escultura Unidade tripartida (1948-49), do suíço Max Bill, foi prêmio Internacional da
Primeira Bienal de São Paulo, em 1951. Trata-se de uma fita de Moebius, em aço inoxidável, na qual o artista demonstra formalmente a experiência de um espaço infinito, sem-começo, sem-fim, e de um tempo que não termina, que se enrosca e volta para si mesmo na pulsão sintética da gestualidade racionalista. O artista suíço buscava “substituir o caos pelo cosmos”, criando uma arte pura, organizada, sintética.
A presença de Max Bill no Brasil, que já havia realizado em São Paulo uma exposição, anterior ao prêmio da Bienal, tornou-se um poderoso espelho, refletindo a ânsia de modernidade, de racionalidade, de internacionalidade compartilhada por uma nova geração de artistas, inicialmente em São Paulo.
[...]
CANTON, Kátia. A história em movimento: os contextos da arte. Disponível em: <http://www.mac.usp.br/mac/templates/exposicoes/exposicao_mac_40anos/exposicao_mac_40anos_historia.asp>. Acesso em: 3 mar. 2012.
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Fita de Moebius
LITERATURA BRASILEIRA
9Ensino Médio | Modular
Concretismo
Como movimento de vanguarda, o Concretismo encontra manifestações na música, nas artes plás-ticas, na poesia. Surgido na década de 1950, prega uma arte cujo valor se encerra em si, despojado de qualquer conotação, lírica, pessoal e simbólica.
No âmbito das artes visuais, por exemplo, a estética concreta prega que os construtos artísticos sejam elaborados exclusivamente a partir de elementos plásticos – planos, linhas, cores – sem que esses elementos detenham qualquer significação para além de si próprios.
Dentro da proposta concreta, por exemplo, muitos serão os artistas visuais que partirão para a exploração da representação gráfica de elementos matemáticos, como equações.
Na poesia, o Concretismo consagra um fazer literário que considera a linguagem em toda a sua materialidade, dando relevo, a um só tempo, aos aspectos gráficos da escrita (tipos, espaçamento, mancha), sua materialidade sonora, e inclusive a materialidade da palavra, que passa a poder ser desmembrada em seus constituintes morfológicos e reagrupada de diversas maneiras.
Tipo: segundo o Dicionário
Aurélio, letra im-pressa, resultante
de composição tipográfica ou de fotocomposição.Mancha: segun-
do o Dicionário Aurélio, a parte
impressa da pági-na, por oposição às
margens.
Leia este texto:
[...]É bem verdade que a Semana de 22 já havia importado as novidades artísticas produzidas na Europa. Entretanto,
tais novidades ficaram restritas [...] a um pequeno grupo de escritores, pintores, escultores e músicos. Do ponto de vista de suas consequências sociais, ficou restrito também a um pequeno grupo da elite paulistana. Se a Semana de 22 representou um avanço para os artistas, foi a Bienal de São Paulo que assegurou a incorporação da chamada “arte moderna” na vida social do País. A Semana de 22 reciclou os artistas, a Bienal, o público. Em 1951, com a abertura da I Bienal, ganhou as ruas uma verdadeira polêmica em torno do valor da arte abstrata. Os jornais abriram espaço para a querela “figurativo x abstrato”.
Graças à Bienal, o público, isto é, a sociedade, passou a tomar conhecimento das novas tendências artísticas criadas ao longo da primeira metade do século XX. Assim, a Bienal desempenhou, em suas primeiras edições, um extraordinário papel educativo e formador de gosto. Ao longo dos anos 50, as residências começaram a ostentar nas paredes de suas salas reproduções de pinturas abstratas ou expressionistas ou surrealistas ou derivadas de outros “ismos”.
[...]
KNOLL, Victor. Bienal de São Paulo: 50 anos. Revista USP, São Paulo, n. 52, p. 6-9, dez./fev. 2001-2002. Disponível em: <http://www.usp.br/revistausp/52/01-victor.pdf>. Acesso em: 19 jul. 2012.
Agora, responda:
Tanto a Semana de Arte Moderna de 1922 quanto a 1.ª Bienal Internacional de Arte de São Paulo foram responsáveis por trazer a estética moderna para o Brasil. Porém, a recepção do público foi distinta para cada um dos eventos. Com base nesse texto e em seus conhecimentos sobre a Semana de Arte Moder-na, apresente essa distinção.
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo10
a) Quanto ao aspecto sonoro, qual a função da repetição do som representado pela letra “v” no poema?
b) E quanto ao aspecto gráfico, o que se pode depreender dessa repetição e da maneira como ela está disposta na impressão?
c) Ao fim, é possível realizar uma leitura satisfatória do poema sem considerar esses dois aspectos juntamente ao significado da palavra “velocidade”?
O poema concreto Velocidade, de Ronaldo Azeredo, é um exemplo da exploração, defendida pelo Concretismo literário, dos âmbitos concreto, sonoro, material e visual da palavra.
Poesia concreta no Brasil Nos fins dos anos de 1940, os irmãos Augusto e Haroldo
de Campos conheceram Décio Pignatari no curso de Direito da Universidade de São Paulo. O interesse comum pela poesia de vanguarda permitiu que os três definissem os novos parâ-metros para a poesia brasileira nos anos de 1950 e criassem o movimento literário conhecido como Concretismo.
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Leia este poema concreto de Ronaldo Azeredo:
AZEREDO, Ronaldo. Velocidade. In: SIMON, Iumna Maria. Poesia concreta. São Paulo: Abril Educação, 1982.
Haroldo de Campos, Décio Pignatari e Augusto de Campos: tríade de poetas criadores do Concretismo brasileiro
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LITERATURA BRASILEIRA
As concepções teóricas que fundamentaram o movimento concretista, alavancadas por esses então jovens estudantes, surgiram orientadas por um horizonte histórico em que o vertiginoso desenvolvimento tecnológico despertou novos interesses e ideias. Um cotidiano em que a publicidade ganhou novo fôlego para instigar e sustentar os padrões de consumo vigentes conquistou, no Brasil da década de 1950, um grande aliado: a difusão da TV em território nacional. O design moderno e a agilidade comunicativa passaram definitivamente a fazer parte da vida das pessoas.
Cientes desses novos valores e expectativas da sociedade em que viviam, os poetas concretos passaram a estudar outros autores que exploraram a possibilidade de escrever poemas rompendo com a sintaxe convencional do verso, acentuando assim seus aspectos visuais, em uma dinâmica literária em que a leitura se dá na materialidade visual, sonora e verbal do poema.
Observe o poema em sua língua original, o francês: Confira a tradução de Augusto de Campos para o português:
Um lance de dados
JAMAIS
MESMO QUANDO LANÇADO EM CIRCUNSTÂNCIASETERNASDO FUNDO DE UM NAUFRÁGIO [...]...JAMAIS ABOLIRÁ [...]...
FOSSE êxito estelar.
SERIApior
nãomais nem menos
indiferentemente mas tanto quanto [...]O ACASO [...]vigiando
duvidandorolando
brilhando e meditandoantes de se deter
em algum ponto último que o sagre.Todo Pensamento emite um Lance de Dados
Inspirações literárias para a poesia concreta
O poema “Um lance de dados”, do francês Stéphane Mallarmé (1842- -1898), escrito em 1897, abriu as portas para uma nova realidade poética ao empregar uma tipografia funcional. Ou seja, os tipos gráficos utilizados não são recursos mera-mente embelezadores do texto. Eles possuem um intenso significado.
O mesmo ocorre com o espaçamento entre as palavras. Ele não é escolhido em prol da boa leitura, ou da harmonia da página, mas completa a leitura dos elementos sugeridos verbalmente no poema. Assim como as palavras e seus sen-tidos, o ambiente visual desse poema constrói sua leitura.
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MALLARMÉ, Stéphane. Mallarmé. 3. ed. São Paulo: Perspectiva, 1991.
O poeta Stéphane Mallarmé
12 Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
Outro poeta que compõe as bases da poesia concreta é Ezra Pound.
Influenciado pelos estudos das línguas orientais, Pound insere em suas obras os princípios dos ideogramas chineses. Observe como opera o princípio ideogrâmico, fundamental a diversas com-
posições de Pound.
POUND, Ezra. The cantos of Ezra Pound. Londres: Faber and Faber, 1975. p. 639.
[...]
[...]
POUND, Ezra. Os Cantos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
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O poema de Mallarmé não segue a disposição gráfica convencional com a qual os leitores estão acos-tumados. Feita essa ressalva, pergunta-se:
a) Qual é o tema abordado nesse fragmento do poema?
b) De que maneira o tema se relaciona com a disposição gráfica do poema?
Ezra Pound
Ensino Médio | Modular 13
LITERATURA BRASILEIRA
Assim como um ideograma cria um novo conceito com base na sobreposição de elementos, o poema poundiano leva o leitor a depreender uma nova significação da leitura, ao somar palavras, imagens, grafemas de diversas línguas e formar um novo e global significado para a obra.
Ezra Pound também desafia a sintaxe, funde elementos de idiomas diversos por ele conhecidos e opera com a visualidade como parte integrante da concepção de seus poemas. Em sua obra Os Cantos, de 1934, Pound retoma temas da tradição literária universal ao estabelecer o diálogo com obras como a Odisseia, de Homero, e A divina comédia, de Dante Alighieri. Esse franco contato com a tradição é também essencial aos poetas concretos brasileiros.
Tanto é assim que a exploração do âmbito visual na poesia não foi uma invenção dos poetas concretos. Representou, antes, uma apropriação realizada por eles de formas literárias integrantes da tradição literária universal.
Como já foi visto anteriormente, os concretistas exploraram ideias gráficas já manifestas em poetas anteriores. Tão importante como criar algo completamente novo é dar novos sentidos a práticas já instauradas, conhecidas da tradição. Sobretudo quando essas práticas exploradas são quase tão antigas quanto a cultura que as resgata.
Observe este poema:
RODES, Símeas de. Ovo. In: PAES, José Paulo. Poemas da antologia grega ou palatina. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 43.
Ele foi escrito em grego antigo, por Símeas de Rodes, aproximadamente no ano 325 a.C. Como discute geração e nascimento, sua forma é a de um ovo.
14 Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
O poeta brasileiro José Paulo Paes preparou uma versão em português para esse poema.
PAES, José Paulo. Poemas da antologia grega ou palatina. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 43.
Em 1956, inspirado por Símeas, Augusto de Campos também produziu um poema sobre ovo, gênese, que tem a forma de ovo.
Leia-o:
CAMPOS, Augusto de. Poesia: 1949-1979. São Paulo: Ateliê Editorial,2011. p. 94.
Trata-se, sem dúvida, de um diálogo com a tradição. O importante, contudo, é notar que a poesia visual, como “Ovo”, de Símeas, é uma forma poética praticada há muito. Os concretistas foram inspi-rados por ela, embora a poesia concreta não seja apenas mais um grupo de poemas visuais.
Poesia visual x poesia concreta
Deve-se tomar cuidado, visto que é comum confundir a poesia concreta com a poesia figurativa (ou visual). É claro que a poesia concreta explora os aspectos visuais da palavra e a própria forma do poema. Contudo, a poesia figurativa estabelece uma relação sempre direta entre a forma e o conteúdo, enquanto a poesia concreta se apropria da estrutura formal do poema para dar significado à leitura final.
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LITERATURA BRASILEIRA
Manifestos e manifestaçõesEm 1952, os irmãos Augusto e Haroldo de Campos e o poeta Décio Pignatari
formaram o grupo Noigandres, nominado com base em uma palavra que fora extraída de Os Cantos, de Ezra Pound, e tomada pelo grupo como sinônimo de uma poética em experimentação.
Os primeiros poemas concretos passaram a ser publicados em revistas editadas pelos próprios poetas. Vale notar que, como em praticamente todo movimento de vanguarda, eles tiveram uma reação negativa do público.
A revista NoigandrA revista A revista NoigandresNoigandres, que teve sua primeira edição publicada , que teve sua primeira edição publicadaem 1953, foi o principal veículo de divulgação das poesias em 1953, foi o principal veículo de divulgação das poesiasconcretasconcretas
Os leitores em geral se fixam em modelos culturais e, quando os artistas propõem algo novo ou diferente, a primeira reação é de repulsa. Observe-se, a título de exemplo, o que aconteceu com a Semana de Arte Moderna de 1922. Os artistas Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Anita Malfatti e Heitor Villa-Lobos foram violentamente vaiados e, na atualidade, noventa anos depois, são considerados verdadeiros ícones da cultura brasileira. Como dizia o poeta Luís de Camões: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”.
Manifestos concretosAs ideias dos poetas concretos eram, talvez, muito inovadoras para serem explicadas somente
por suas realizações poéticas em si. Como já ocorrera em outras vanguardas, os representantes do Concretismo brasileiro desejavam deixar claras suas concepções e mesmo impô-las à crítica e ao público. Desse modo, foram fundamentais para a fixação da poesia concreta, como um movimento, os manifestos que divulgavam, de modo bastante contundente, os paradigmas dessa nova vertente poética.
Nas palavras de Augusto de Campos, expoente do movimento, esses manifestos não seriam mais que
“[...] um tacape a que o poeta se vê obrigado a recorrer ante a incompetência dos críticos, para abrir a cabeça do público [...].”
CAMPOS, Augusto de. Teoria da poesia concreta. São Paulo: Brasiliense, 1987. p.11.
Conheça, a seguir, o primeiro dos mais importantes manifestos caracterizadores do ideário con-cretista no Brasil.
poesia concreta
– a poesia concreta começa por assumir uma responsabilidade total perante a linguagem: aceitando o pressuposto do idioma histórico como núcleo indispensável de comunicação, recusa-se a absorver as palavras com meros veículos indiferentes, sem vida sem personalidade sem história – túmulos-tabu com que a convenção insiste em sepultar a ideia.
– o poeta concreto não volta a face às palavras, não lhes lança olhares oblíquos: vai direto ao seu centro, para viver e vivificar a sua facticidade.
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Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo16
– o poeta concreto vê a palavra em si mesma – campo magnético de possibilidades – como um objeto dinâmico, uma célula viva, um organismo completo, com propriedades psico- -fisico-químicas tacto antenas circulação coração: viva.
– longe de procurar evadir-se da realidade ou iludi-la, pretende a poesia concreta, contra a introspecção autodebilitante e contra o realismo simplista e simplório, situar-se de frente para as coisas, aberta, em posição de realismo absoluto.
– o velho alicerce formal e silogístico-discursivo, fortemente abalado no começo do século, voltou a servir de escora às ruínas de uma poética comprometida, híbrido anacrônico de coração atômico e couraça medieval.
– contra a organização sintática perspectivista, onde as palavras vêm sentar-se como “cadáveres em banquete”, a poesia concreta opõe um novo sentido de estrutura, capaz de, no momento histórico, captar, sem desgaste ou regressão, o cerne da experiência humana poetizável.
– mallarmé (un coup de dés-1897), joyce (finnegans wake), pound (cantos-ideograma), cummings e, num segundo plano, apollinaire (calligrammes) e as tentativas experimentais futuristas-dadaístas estão na raiz do novo procedimento poético, que tende a impor-se à organização convencional cuja unidade formal é o verso (livre inclusive).
– o poema concreto ou ideograma passa a ser um campo relacional de funções.– o núcleo poético é posto em evidência não mais pelo encadeamento sucessivo e linear
de versos, mas por um sistema de relações e equilíbrios entre quaisquer partes do poema.– funções-relações gráfico-fonéticas (“fatores de proximidade e semelhança”) e o uso
substantivo do espaço como elemento de composição entretêm uma dialética simultânea de olho e fôlego, que, aliada à síntese ideogrâmica do significado, cria uma totalidade sensível “verbivocovisual”, de modo a justapor palavras e experiência num estreito colamento fenomenológico, antes impossível.
– POESIA-CONCRETA: TENSÃO DE PALAVRAS-COISAS NO ESPAÇO-TEMPO.
(Publicado originalmente na revista A+D – arquitetura e decoração. Rio de Janeiro: Target, n. 20, nov./dez. 1956).
CAMPOS, Augusto de. Teoria da poesia concreta. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 50.
O manifesto que você leu apresenta as características fundamentais da poesia concreta, as quais aparecem sintetizadas a seguir:
Características gerais da poesia concreta
Espaçamento visual.
Exploração de ordem não convencional para a leitura (nem sempre da esquerda para a direita e de cima para
baixo, somente).
Trânsito livre entre extratos verbais e não verbais.
Fragmentação e concentração vocabular.
Supressão ou relativização dos elos sintáticos.
Materialidade da linguagem sob os aspectos visual e sonoro (verbal + vocal + visual = verbivocovisual).
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LITERATURA BRASILEIRA
2. É possível ler o poema optando por ordens não convencionais para a sequência de palavras? Em caso afirmativo, o sentido final seria alterado?
3. Considere o seguinte trecho do manifesto concreto:
“– o núcleo poético é posto em evidência não mais pelo encadeamento sucessivo e linear de versos, mas por um sistema de relações e equilíbrios entre quaisquer partes do poema.”
Como ele se relaciona com a prática e a leitura propostas para o poema em questão?
Observe o poema ao lado.
1. Qual foi a ordem de palavras escolhida por você e qual o sentido que se depreende da leitura realizada desse modo?
CAMPOS, Augusto de. Despoesia. São Paulo: Perspectiva, 1994. p. 35.
As fases do movimento concretistaO movimento concretista passou por diversas fases. A primeira, conhecida como fase ortodoxa,
tentou cumprir rigorosamente o programa apresentado nos manifestos. Assim, o poema deveria ser escrito fora da forma versificada e, também, ser contrário à expressão sentimental determinada pela experiência do poeta com o mundo.
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo18
Um exemplo é o poema “Tensão”, de Augusto de Campos, originalmente publicado em 1956.
CAMPOS, Augusto de. Viva Vaia – Poesia 1949-1979. São Paulo: Ateliê Editorial, 2011. p. 95.
Em um segundo momento, com a mudança radical do contexto político dos anos de 1960, que incluiu a ascensão da esquerda política e os problemas com as ligas camponesas e greves, os poetas concretos deram um “salto participativo” e passaram a manifestar em suas composições esses núcleos temáticos.
Um exemplo da produção típica dessa fase é o poema “Greve”, de Augusto de Campos.
O poema “Tensão” realiza uma exploração estética verbivocovisual? Por quê?
Que efeito ocasiona, na leitura do poema “Greve”, a colocação dessa palavra em vermelho sobre outras escritas no poema?
Nos fins dos anos de 1960, os poetas paulistas passaram a explorar caminhos poéticos individual-mente. Décio Pignatari começou a trabalhar com as “chaves léxicas”, Augusto optou pelos pop poemas objetos e Haroldo enveredou pela grandeza vocabular de obras como Galáxias.
CAMPOS, Augusto de. Viva Vaia – Poesia 1949-1979. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001. p. 110.
Ensino Médio | Modular 19
LITERATURA BRASILEIRA
1. (UFF – RJ) Na década de 50, surgiu um movimen-
movimento relacionado com as artes plásticas e com a música. Propõe uma poesia não linear ou discursiva, mas espacial. Os concretistas rompem com a sintaxe tradicional e elaboram novas for-mas de comunicação poética em que predomina o visual, em consonância com as transformações ocorridas na vida moderna, pela influência dos meios de comunicação de massa. A opção que apresenta um texto na linha concretista é:
a) a onda andaaonde andaa onda?a onda aindaainda ondaainda andaaonde?aonde?a onda a onda
b) Com seu colar de coral,Carolinacorre por entre as colunasda colina.O colar de Carolinacolore o colo de cal,torna corada a menina.
c) O poeta municipaldiscute com o poeta estadualqual deles é capaz de bater o poeta federalEnquanto isso o poeta federaltira ouro do nariz.
d) Seringueiro brasileiro,Na escureza da florestaSeringueiro, dorme.Ponteando o amor eu forcejoPra cantar um cantigaQue faça você dormir.Que dificuldade enorme!Quero cantar e não posso
e) Raiva o incêndio. A ruir, soltas, desconjuntadas,As muralhas de pedra, o espaço adormecido
De eco em eco acordando ao medonho es-tampido,Como a um sopro fatal, rolam esfaceladas.
2. (CESGRANRIO – RJ) Dentre as correlações a se-guir, aquela que associa corretamente o movi-mento literário à sua característica é:
a) Concretismo – valorização do espaço gráfico como elemento estruturador do poema con-jugada à sintaxe tradicional para enfatizar o lirismo do poeta.
b) Realismo – retratação da realidade contem-porânea, apresentando tipos concretos, vi-vos, não idealizados, na ânsia de apresentar uma visão patológica do homem, reduzin-do-o a simples animal.
c) Parnasianismo – movimento eminentemente poético em que se observam o alheamento a problemas sociais, o culto da forma e poesias excessivamente descritivas, num enfoque objetivo e impessoal.
d) Simbolismo – expressão direta e precisa de ideias e emoções na retratação da realidade, além da obsessão pela musicalidade e pela busca da essência do ser humano: a alma.
e) Romantismo – movimento literário que, em sua concepção primeira de traduzir a arte pela arte, evade-se na aspiração por outro mundo, o mundo idealizado, o que se confi-gura numa estrutura formal rígida.
3. (FECILCAM – PR) Segundo Augusto de Campos:
“ ____________________ radicaliza e torna
Explícito o procedimento que é inerente
À natureza da poesia (...) capaz de provocar
A espacialização do tempo.”
Qual alternativa completa adequadamente o pensamento do autor no poema acima?
a) a prosa poética;
b) a poesia concreta;
c) a pintura;
d) a poesia épica;
e) a poesia lírica.
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo20
Augusto de CamposAugusto de Campos nasceu em São Paulo, no ano de 1931. Desde pequeno mostrou interesse pelo estudo de línguas estrangeiras tanto que, ainda jovem, buscava a leitura
de autores que exploravam a linguagem como instrumento primordial da literatura. Cursou Direito na Universidade de São Paulo com seu irmão, o também poeta e en-saísta Haroldo de Campos. A carreira de poeta teve início com a publicação do livro Rei menos o reino, que era fruto das primeiras experiências poéticas ainda muito presas às estruturas do verso. Foi com o livro Poetamenos, de 1953, que Augusto e Haroldo de Campos definiram as novas vertentes da poesia brasileira ao explorar
cores e abusar do processo de implosão verbal.
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Leia este poema:
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CAMPOS, Augusto de. Viva Vaia – Poesia 1949-1979. São Paulo: Ateliê, 2001. p. 83-85.
Nesse poema, Augusto de Campos explora recursos tipográficos que permitem ao leitor realizar, em alguns momentos, duas leituras sobre alguns versos. Exemplo disso está no momento em que o poeta é igualado ao pássaro condor ou a um indivíduo que sente dor. Que recursos seriam esses e como operam?
Ensino Médio | Modular 21
LITERATURA BRASILEIRA
1. O poema ”Dias, dias, dias” explora a sintaxe convencional da língua portuguesa? Explique.
2. E a morfologia das palavras é respeitada?
3. Que função teriam as cores diferenciadas no poema?
Em outro poema, “Dias, dias, dias”, de 1956, Augusto de Campos também investiu na diferenciação tipográfica para gerar várias leituras possíveis.
Observe:
CAMPOS, Augusto de. Viva Vaia – Poesia 1949-1979. São Paulo:Ateliê, 2001. p. 77.
Leia o poema “Cidade”, também de Augusto de Campos, escrito em 1963:
ATRODUCAPA...
1. A leitura de “Cidade”, segundo o modo conven-cional, permite alguma compreensão do poe-ma? Experimente outras possibilidades de leitu-ra, rompendo com os modelos tradicionais. Siga, por exemplo, uma leitura que busque palavras no princípio e fim do texto.
A partir dos anos de 1960, a poesia concreta realizada por Augusto de Campos sofreu uma verda-deira guinada e passou a explorar elementos da realidade cotidiana. Deve-se observar, contudo, que os recursos visuais, verbais e sonoros continuaram a ser explorados com rigor.
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo22
2. Agora, exponha como é a cidade apresentada pelo poeta. Que efeitos linguísticos conduzem o leitor a essa conclusão?
3. Agora, leia novamente o poema que você conhe-ceu na abertura da unidade.
A leitura desse poema, publicado originalmente em 1965, permite concluir que o poeta faz uma crítica à sociedade de consumo? Justifique.
4. (UFES)
Essa obra intitula-se “Pluvial”, de 1959, e perten-ce ao livro Viva Vaia (1949/1979), de Augusto de Campos. Dela não se pode afirmar que:
a) lança mão da paronomásia (sons parecidos e significados diferentes);
b) pode ser lida e vista vertical (chuva que cai) e horizontalmente (rio que corre);
c) aponta para o projeto estético concretista da “arte pela arte”;
d) rompe com a estrutura frásica do verso tra-dicional;
e) utiliza os espaços brancos da página de for-ma significativa.
Em um dos ápices de inovação em sua obra, Augusto de Campos chegou a criar poemas com estru-turas físicas tridimensionais que permitiram a junção definitiva entre a literatura e as artes plásticas, dando à palavra corpo físico.
Esses são poemas objetuais, com volume tridimensional e, no
caso do segundo exemplo, movimento, como elemento da compo-sição do sentido.
CAMPOS, Augusto de. Caixa preta. São Paulo: Edições Invenção, 1975.
CABLE – incomunicable. In: CAMPOS, Augusto de; PLAZA, Julio. Poemóbiles. São Paulo: Edição do Autor, 1974.
LITERATURA BRASILEIRA
23Ensino Médio | Modular
Caetano Veloso musicou um trecho de Galáxias, transformando-o na faixa “Circuladô de fulô”, que você confere a seguir.
circuladô de fulô ao deus ao demodará que deus te guieporque eu não posso guiá e viva quem já me deu circuladôde fulô e ainda quem falta me dá soando como um shamisene feito apenas com um arame tenso um cabo e uma latavelha num fim de festafeira no pino do sol a pino mas paraoutros não existia aquela música não podia porque nãopodia popular aquela música se não canta não é popularse não afina não tintina não tarantina e no entanto puxadana tripa da miséria na tripa tensa da mais megera misériafísica e doendo doendo como um prego na palma da mão
Haroldo de CamposHaroldo de Campos nasceu em 1929, na ci-
dade de São Paulo. Fez seus primeiros estudos no Colégio São Bento e poste-
riormente se formou em Direito pela Universidade de São Paulo. Estudioso da Literatura, se doutorou em Letras pela USP e atuou como professor de Literatura na PUC-SP e na Universida-
de de Yale, nos Estados Unidos. Fale-ceu em 2003.
A obra intelectual de Haroldo de Campos é extremamente vasta e
abrange principalmente a produção poética, a crítica literária e a tradução de poesia.
Observe, ao lado, o poema “Silêncio”.Outra vertente poética de Haroldo é a mani-
festa em sua obra Galáxias. Nela, o poeta ex-plora ao máximo o fluxo verbal e a diversidade linguística: falares regionais misturam-se em uma torrente verbal a expressões idiomáticas fixas, ditados populares, bordões, trechos em língua estrangeira. Tudo organizado em uma sintaxe amplamente mais poética e livre do que conven-cional e regrada.
CAMPOS, Haroldo de. Xadrez de estrelas. São Paulo: Perspectiva, 1976. p. 73.
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Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo24
1. A letra da música de Caetano Veloso é um excerto do poema Galáxias, de Haroldo de Campos, pu-blicado pela primeira vez em 1976. Nesse poema, Haroldo faz uso recorrente do neologismo, que é a formação de novas palavras. Exemplo disso é o termo inventalínguas. Em sua interpretação, o que significa inventalínguas e de que maneira ele se relaciona com a linguagem descrita no poema?
2. (UEPG – PR) – Considerando o poema concretista de Haroldo dos Campos, assinale o que for correto.
(01) Respeita-se a distribuição linear do verso como elemento fundamental do poema.
(02) A relação entre leitor se dará mais através da comunicação visual do que da verbal.
(04) Ocorre exploração estética do som e da letra impressa, com a decomposição e montagem da palavra.
(08) Ocorre um desinteresse pela exploração de novos campos semânticos.
(16) No poema concreto, ocorre o abandono do discurso tradicional, privilegiando os recursos gráficos das palavras.CAMPOS, Haroldo de. In: Teoria da poesia concreta,1987.
um ferrugem prego cego na palma espalma da mãocoração exposto como um nervo tenso retenso um renegroprego cego durando na palma polpa da mão ao sol [...]o povo é o inventalínguas na malícia da maestria no matreiroda maravilha no visgo do improviso tenteando a travessiaazeitava o eixo do sol[...]Circuladô de fulô [...] aodeusaodemodará [...] que deus [...] te guie[...] porque não posso guiá [...]e não peça que eu te guie não peça despeça que eu te guiedesguie que eu te peça promessa que eu te fie me deixa meesqueçe me larga me desamarga que no fim eu acertoque no fim eu reverto que no fim eu conserto e para o fimme reservo e se verá que estou certo e se verá que tem jeitoe se verá que está feito que pelo torto fiz direito que quemfaz cesto faz cento se não guio não lamento pois o mestreque me ensinou já não dá ensinamento
VELOSO, Caetano. Circuladô vivo. 1992. São Paulo: Polygram Brasil, 1 CD: digital.
Ensino Médio | Modular 25
LITERATURA BRASILEIRA
Em uma sequência de poemas bastante experimental no sentido do avanço das fronteiras da visuali-dade sobre a palavra, Décio emprega a elaboração a partir de chaves léxicas. As palavras propriamente ditas são excluídas do corpo dos poemas, dando lugar a símbolos gráficos que as representam, cujo significado surge na forma de chave léxica ao lado das composições.
(UFRGS – RS) Leia o poema a seguir, de Décio Pignatari, e considere as afirmações que se-guem.
“beba coca cola
babe cola
beba coca
babe cola caco
caco
cola
cloaca.”
I. Trata-se de um exemplo de poesia concre-ta, vanguarda do século XX que alterou ra-dicalmente os recursos materiais da cons-trução poética, valendo-se, inclusive, de técnicas da publicidade.
II. No poema, o uso do imperativo e o jogo lú-dico das aliterações contribuem para denun-ciar a forma persuasiva e sedutora da men-sagem publicitária que induz ao consumo.
III. O último verso é a síntese da intenção satí-rica do poema, que desqualifica o produto anunciado e, por extensão, a sociedade de consumo que ele representa.
Quais estão corretas?
a) Apenas I.
b) Apenas II.
c) Apenas III.
d) Apenas II e III.
e) I, II e III.
Décio PignatariDécio Pignatari nasceu em Jundiaí, São Paulo, em
1927. Poeta, ensaísta, tradutor, contista, romancista, dramaturgo e professor, publicou seus primeiros poemas avulsos na Revista Brasileira de Poesia, em 1949. Em 1952, publicou o livro de poemas Carrossel e, no mesmo ano, fundou o grupo Noigandres, com Haroldo e Augusto de Campos. Formou-se em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), em 1953. Em 1956, lançou, com esse mesmo grupo, o movimento de poesia concreta, du-rante a Exposição Nacional de Arte Concreta. Décio apresenta importantes produções críticas e literárias no âmbito da semiótica.
A poesia de Pignatari, além de provocar reflexões específicas sobre linguagem, conduz o leitor a pensar a realidade social, principalmente a da sociedade de consumo, que começou a se dimensionar nos anos de 50-60 do século XX.
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PIGNATARI, Décio. Poesia, pois é, poesia. Campinas: Unicamp, 2000. p. 128.
26 Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
Veja:
PIGNATARI, Décio. Poesia, pois é, poesia. Campinas: Unicamp, 2000.
(UFJF – MG) – Leia o poema concreto abaixo de Décio Pignatari para responder à questão.
PIGNATARI, Décio. Contribuição a um alfabeto duplo. In: Poe-sia, pois é, poesia/Poetc. São Paulo: Brasiliense, 1986. p. 184.
Uma das questões centrais para Décio Pignatari é a “afirmação plena da vida por meio da afirmação da razão, do sensível e do sexual, numa síntese feliz”
SIMON, Lumna Maria; DANTAS, Vinícius. Literatura comentada: poesia concreta. São Paulo: Abril Educação, 1982. p. 18.
Levando em consideração esse comentário, elabo-re uma proposta de leitura para esse poema.
Neoconcretismo
Com a intenção de divulgar a arte concreta, foi organizada, em 1957, a primeira exposição em São Paulo e, em seguida, no Rio de Janeiro. Quando da organização desta, o poeta Ferreira Gullar, que até então compactuava com as ideias concretistas, discordou do grupo paulista, a seu ver muito racionalista. A visão da arte quase como “um objeto científico” defendida pelos artistas concretos parecia, para Ferreira Gullar, exacerbada e desencontrada da realidade artística. No ano de 1959, Gullar publicou o Manifesto Neoconcreto, que é também assinado pelos artistas Fraz Weissman, Amílcar de Castro e Lygia Clark. Esse grupo, embora valorizasse a estrutura, a precisão geométrica e a exploração do elemento linguístico materialmente, pregava a necessidade de ver a arte como expressão das dinâmicas humanas.
Ensino Médio | Modular 27
LITERATURA BRASILEIRA
Ferreira GullarO poeta Ferreira Gullar nasceu em 1930, na
cidade de São Luís, Maranhão. Ainda jovem, trabalhou como locutor de rádio e jornalista. Com vinte anos, viajou para o Rio de Janeiro onde
entrou em contato com críticos de arte e escritores. No ano de 1954, publicou
o livro A luta corporal, obra que deu início ao relacionamento
do poeta com os concretistas paulistas Décio Pignatari, Augusto e Haroldo de Campos. Em 1957, Gullar participou da 1.a Exposição Nacional
de Arte Concreta. Contudo, discordando das teorias sobre
a poesia concreta pregada pelo grupo paulista, rompeu com o mo-
vimento. Dois anos depois, apresentou o Manifesto Neoconcreto, que contrariava a exacerbada arte racionalista e reafirmava a ideia da arte como expressão das percepções da realidade pelo artista.
A poesia de Ferreira Gullar apresenta-se em diversas fases. A primeira já revela a intensa preocupação do poeta com a linguagem. Gullar frequentemente implode as pala-vras na busca da exploração máxima de seu significado.
Fogos da florafru
toluto
sedosa carneo lume desatado
luto
o cheiro expõe o seu avesso leproso pústula
ar flora isconde ôr rostro dentro êr frôerf’olhocartrera
cecapúcaro
mofoSOLAR
ouCUJOS CAULESágua e chama
ar fluora sipintia êr rostro furtremecânicaespelho
GULLAR, Ferreira. Toda a poesia. Rio de Janeiro: José Olímpio, 2001. p. 67.
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O neoconcreto, nascido de uma necessidade de exprimir, dentro de uma linguagem estrutural da nova plástica, a complexa realidade do homem moderno, nega a validez das atitudes cientificistas e positivistas em arte. E repõe o problema da expressão.
TELLES, Gilberto Mendonça. Vanguarda europeia e modernismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1985. p. 406.
Flor mineral, de Franz Weissmann, obra presente na exposição "A política da forma", no Museu de Arte Contemporânea (MAC), em Niterói, no Rio de Janeiro
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Escultura do artista plástico Amilcar de Castro, que faz parte do acervo permanente do IAC (Instituto de Arte Contemporânea), em São Paulo (SP)
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Obra da série “Os bichos”, exposta ao público em 1995, no Rio de Janeiro, de autoria da mineira Lygia Clark, uma das mais importantes artistas brasileiras do século XX
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Leia um trecho do manifesto que declara essa preocupação:
Leia.Informações
sobre o
poeta
Ferreira
Gullar
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Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo28
Envolvido posteriormente com os poetas do Concretismo paulista, Gullar passou a compor seus poemas segundo a estética desse movimento.
mar azulmar azulmar azul mar azulmar azul
marco azul marco azul marco azul marco azul
barco azulbarco azulbarco azul
arco azularco azul ar azul
1. Qual é o tema trabalhado pelo poeta nesse poema?
2. A forma de apresentação do poema tem alguma relação com o seu conteúdo?
(PUCPR) Leia atentamente o poema de Ferreira Gullar. Em seguida, analise as afirmações feitas sobre esse texto.
O morto e o vivoInútil pedirperdãodizerque o trazno coraçãoO morto não ouve
I. O poema acima faz parte de um grupo de metapoemas encontrado em Muitas vozes.
II. Os versos curtos apontam para a falta de diá-logo entre morto e vivo.
III. A disposição dos versos na página remete a um recurso utilizado pelos concretistas.
IV. O poema pertence a um grupo de poemas encontrados em Muitas vozes, que têm a morte como tema.
V. O poema trata de uma questão própria dos jovens.
Está(ão) correta(s):
a) Somente as afirmações I, II e III.
b) Somente as afirmações I e V.
c) Somente as afirmações II e V.
d) Somente as afirmações IV e V.
e) Somente as afirmações III e IV.
GULLAR, Ferreira. Toda a poesia. Rio de Janeiro: José Olímpio, 2001. p. 97.
Ensino Médio | Modular 29
LITERATURA BRASILEIRA
Tropicalismo e Poesia Marginal2
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Alegria, alegriaCaminhando contra o ventoSem lenço e sem documentoNo sol de quase dezembroEu vou... O sol se reparte em crimesEspaçonaves, guerrilhasEm Cardinales bonitasEu vou Em caras de presidentesEm grandes beijos de amorEm dentes, pernas, bandeirasBomba e Brigitte Bardot... O sol nas bancas de revistaMe enche de alegria e preguiçaQuem lê tanta notíciaEu vou Por entre fotos e nomesOs olhos cheios de coresO peito cheio de amores vãosEu vouPor que não, por que não Ela pensa em casamentoE eu nunca mais fui à escolaSem lenço, e sem documento, eu vou Eu tomo uma coca-colaEla pensa em casamentoE uma canção me consolaEu vou
Por entre fotos e nomesSem livros e sem fuzilSem fome, sem telefoneNo coração do Brasil... Ela nem sabe até, pensei,Em cantar na televisãoO sol é tão bonitoEu vou, sem lenço, sem documentoNada no bolso ou nas mãosEu quero seguir vivendo, amorEu vou
Por que não, por que não...Por que não, por que não...Por que não, por que não...Por que não, por que não...
VELOSO, Caetano. Alegria, alegria. Intérprete: Caetano Veloso. Rio de Janeiro: Philips, 1968. 1 CD.
Caetano Veloso, GalCosta e Gilberto Gil
Caetano Veloso, GalCaetano Veloso, GalCosta e Gilberto GilCosta e Gilberto GilCosta e Gilberto Gil
30 Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
1. Essa música foi composta na década de 1960 e está diretamente relacionada com qual período his-tórico nacional? Em quais trechos se pode identificar uma referência a esse momento? Localize-os e explique a relação entre eles.
2. A música faz referência a vários elementos da cultura pop. Identifique-os.
3. A canção diz “eu vou...” para onde? Elabore hipóteses.
4. O que essa música tem a intenção de suscitar nos ouvintes? Qual é a sua mensagem central?
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Humberto Castelo Branco passa em revista as tropas no Humberto Castelo Branco passa em revista as tropas no Humberto Castelo Branco passa em revista as tropas noPP lácio dos Campos Elíseos. São Paulo, fevereiro de 19 5PaP lácio dos Campos Elíseos. São Paulo, fevereiro de 1965PaP lácio dos Campos Elíseos. São Paulo, fevereiro de 1965
Na década de 1960, parte da cena artística e cultural no Brasil era diretamente influenciada pelos acontecimentos sociais. A Ditadura, que iniciou com um Golpe Militar no dia 31 de março de 1964, durou até 1985 e mudou a vida dos cidadãos.
Alegando que o Brasil sofria uma ameaça comunista, os militares se organizaram para retirar o então presidente da República, João Goulart, que foi deposto. Formou-se uma nova junta governativa e, nesse período, cinco presidentes foram nomeados, começando com Humberto de Alencar Castelo Branco.
Para garantir a legitimidade do Governo Militar e a sua permanência no poder, praticaram-se vários Atos Institucionais (AI), que restringiam o direito dos eleitores brasileiros, cancelavam direitos básicos da Constituição Brasileira de 1946, criando um estado de exceção e suspendendo a democracia plena.
O auge dos Atos Institucionais ocorreu em 1968, quando o regime já estava consolidado e se ins-taurou o AI-5, que transferia totalmente o poder para os militares, dissolvendo o Congresso Brasileiro e suprimindo as liberdades individuais, em especial com a proibição de manifestações públicas de caráter político, o habeas corpus e impondo a censura prévia para jornais, revistas, livros, peças de teatro e música.
Ensino Médio | Modular 31
LITERATURA BRASILEIRA
Em oposição ao Regime Militar, o círculo cultural brasileiro manifestou-se de maneira muito produtiva. Alguns artistas foram considerados verdadeiros “guerrilheiros” contra o sistema.
Surgiram cerca de 150 periódicos nacionais e regionais nesse período, que tinham como objetivo denunciar os problemas da população, as torturas, a falta de liberdade, o arrocho salarial, além de ironizar a conduta dos militares e dar visibilidade para figuras de esquerda, legitimando e popularizando suas ideias.
A primeira e mais conhecida dessas publicações alternati-vas é O Pasquim, de 1969. O jornal foi um sucesso de público, atingindo cerca de 200 mil exemplares vendidos em seu auge e se estabeleceu como um dos maiores fenômenos do mercado editorial nacional.
Sua publicação durou até 1991 e recentemente suas me-lhores matérias foram compiladas e publicadas para acesso do público atual. Entre seus colaboradores destacam-se Jaguar, Ziraldo, Millôr Fernandes, Paulo Francis, Henfil e Ruy Castro, figuras importantes do cenário jornalístico brasileiro.
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JAGUAR; AUGUSTO, Sérgio (Org.). O Pasquim. Rio de Janeiro: Desiderata, 2006.
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Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo32
Nas artes plásticas, artistas como Roberto Magalhães, Artur Barrio e Rubens Gerchmann manifestavam-se contra a Ditadura, criando trabalhos que tinham a intenção de intervir na realidade. Não se tratava apenas de criticar, mas de modificar a paisagem, manipular o cenário e se colocar no mundo, entendendo que a arte não se dissocia da política.
Seguindo as propostas do poeta russo Maiakovsky: “Sem forma revolu-cionária não há arte revolucionária”, esses artistas procuravam novas formas de comunicação, novas maneiras de atingir as pessoas e de experimentar a experiência estética, daí o uso de diversas matérias-primas, de colagens, do tridimensional em suas obras.
Trouxas, de Artur Barrio, é um ótimo exemplo dessa arte intervencionista. O artista fabricava sacos de panos com manchas de sangue e os amarrava. Esses “corpos” eram jogados no Rio Arudas, em Minas Gerais. Eles sim-bolizavam os corpos despachados, as pessoas torturadas e desaparecidas durante o Regime Militar.
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BARRIO, Artur. Trouxas ensanguentadas (T.E), 1970, 2ª. parte, fotografias 45 × 30 (cada) Registros diapositivos e P.B. de César Carneiro. Coleção Inhotim, Minas Gerais
JAGUAR; AUGUSTO, Sérgio (Org.). O Pasquim. Rio de Janeiro: Desiderata, 2006. p. 34.
LITERATURA BRASILEIRA
33Ensino Médio | Modular
No mesmo sentido, o trabalho LUTE, de Rubens Gerchmann, dialogava com o design e com os meios de comunicação da época e era composto de letras gigantes que diziam “LUTE”. Essa escultura foi instalada na Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro, com o propósito de atrapalhar o trânsito e chamar a atenção da população contra a Ditadura.
No teatro, grupos como o Oficina – fundado em 1958 por Celso Martinez Corrêa, Amir Haddad e Carlos Queiroz Telles – e o Arena foram importantes ao denunciar a situação do país e promover uma nacionalização e renovação do teatro nacional.
Ainda em seus primórdios, o grupo Oficina, que funciona até hoje em São Paulo, encenou a peça O rei da vela, de Oswald de Andrade, sendo um dos grandes motivadores da revolução cultural ao fazer um resgate do Antropofagismo, da Primeira Geração Modernista na década de 1920, cujo ideal será aproveitado também por outros movimentos culturais na área da música e do cinema principalmente.
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Nessa história satírica, os eternos amantes, Nessa história satírica, os eternos amantes, Nessa história satírica, os eternos amantes,Abelardo e Heloísa, são retomados para Abelardo e Heloísa, são retomados paracompor um irônico painel da hipocrisia burcompor um irônico painel da hipocrisia bur--guesa e dos vícios da classe rural decadente, guesa e dos vícios da classe rural decadente,ffuncionando como um paralelo com vícios da funcionando como um paralelo com vícios dasociedade dominada pelo regime militarsociedade dominada pelo regime militar
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O Rei da Vela, Renato Borghi, Teatro Oficina, 1968.
Disponível em: <http://blogdozecelso.wordpress.com/2012/03/01/roda-viva-energia-milenar-do-coro-aqui-agora/> Acesso em: 19 jun. 2013.
34 Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
CCena do filme Ladrões de bicicletaVittorio de Sica em 1948
CCena do filme CCena do filme Ladrões de bicicletaLadrões de bicicleta, dirigido por , dirigido por Vittorio de Sica, em 1948Vittorio de Sica, em 1948
O cinema também passou por uma espécie de “revolução”, que ficou conhecida como Cinema Novo. Cansados das grandes produções, que não discutiam as questões sociais, um grupo de cineastas, como Glauber Rocha, Cacá Diegues, Nelson Pereira dos Santos, Ruy Guerra, começou a produzir novos filmes de baixo orçamento. Esses artistas retratavam o Brasil e sua realidade, focando especialmente o subdesenvolvimento social e econômico.
Do ponto de vista estético, os cineastas do Cinema Novo foram influenciados pela Nouvelle Vague francesa e pelo Neorrealismo italiano.
O movimento francês era formado por um grupo de jovens cineastas que tinham a intenção de transgredir as regras do cinema comercial. Françoise Giroud, Claude Chabrol, Jean-Luc Godard e François Truffaut criavam filmes que fugiam da linearidade tradicional e eram amorais, muitas vezes trabalhando com longos diálogos e cortes bruscos de cenas. Para eles, era o subjetivo dos personagens que contava mais, suas sensações e impressões.
Dois filmes históricos desse movimento são Acossado, de Jean-Luc Godard, e Os incompre-endidos, de François Truffaut.
Já o Neorrealismo italiano se caracterizava por retratar pessoas marginalizadas que busca-vam ascender socialmente.
Dois de seus principais diretores são Roberto Rossellini e Vittorio de Sica, e os filmes Roma, cidade aberta e Ladrões de bicicleta são exem-plos dessa estética. Em Ladrões de bicicleta, por exemplo, discutem-se problemas sociais graves pós-Segunda Guerra Mundial, como o desem-prego, baixos salários, pouca infraestrutura so-cial, etc. O filme traz ainda vários elementos do Neorrealismo, como a temática dos problemas sociais, a criança, os atores amadores ou desco-nhecidos, a ambientação in loco, a ausência de apelos técnicos ou dramatúrgicos e, ao mesmo tempo, um intenso conflito na trama.
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Cena do filmeCena do filmeCena do filme AcossadoAcossado, dirigido por Jean-Luc, dirigido por Jean-LucGodard, em 1960Godard, em 1960Godard, em 1960
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Cena do filme , dirigido CCena do filme Cena do filme Os incompreendid sOs incompreendidosOs incompreendidos, dirigido , dirigidopor François Truffaut, em 1959por François Truffaut, em 1959
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Ensino Médio | Modular 35
LITERATURA BRASILEIRA
Tropicália
Naquela mesma época, com a efervescência cultural contra o regime militar, surgiram os festivais de música, em especial o que era televisionado pela TV Record, nos quais os compositores, que depois se tornaram muito conhecidos, apresentavam suas canções para o grande público e funcionavam como a “voz do povo” contra os abusos.
Eram as chamadas canções de protesto, que tinham como um de seus maiores exemplos Alegria, alegria, de Caetano Veloso. Desses jovens artistas que se engajavam na luta contra o regime, formou--se um movimento denominado Tropicalismo, entre os anos de 1967 e 1968.
Em Deus e o diabo na terra do sol, o sertanejo Manuel e sua mulher levam o gado para um coronel, a fim de lucrar um dinheiro com a entrega e, assim, comprar um pedaço de terra. Porém, algu-mas cabeças de gado morrem no percurso e o coronel diz que não irá pagar a parte de Manuel. Em um acesso de fúria, o sertanejo mata o coronel e foge com a família, deixando tudo para trás. Os dois acabam se envolvendo com um grupo religioso, que luta contra os latifundiários.
A perspectiva realista e a abordagem do tema da seca e da mi-séria do Nordeste estabelecem uma aproximação entre a produção do Cinema Novo e a literatura da Segunda Geração Modernista, conhecida como regionalista e representada por Graciliano Ramos, José Lins do Rego e Rachel de Queiroz.
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As canções de protesto ou músicas de interven-ção são canções produzidas a fim de contestar e criticar o sistema político, social e econômico. Foram produzidas em diversos momentos da história nacional e não se trata, portanto, de um movimento coeso e consolidado como grupo. Entre eles pode-se citar: Chico Buarque, Cazuza, Legião Urbana, Titãs, etc.
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Informações
sobre o
movimento
Tropicália
@LIT1030
36 Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, a banda Os Mutantes, Tom Zé, Nara Leão e Rogério Duprat foram os organizadores desse movimento, que revolucionou a música e a cultura nacional.
A proposta desses artistas era criar uma música que combinasse diversos estilos diferentes, desde rock, rumba, samba, bolero, baião, bossa nova, música erudita, atualizando a produção nacional ao quebrar as barreiras entre o popular e o sofisticado, a esquerda e a direita, o certo e o errado.
A MPB tradicional e a bossa nova eram fontes de inspiração para esses músicos, porém eram manifestações muito elitistas, que precisavam ser atualizadas para que o povo e os jovens se identi-ficassem com elas. Os tropicalistas seguiam o rumo do rock'n'roll e do iê-iê-iê, distanciavam-se da academia e dos formalistas para atender ao gosto mais popular.
O disco Tropicália ou Panis et Circencis, com participação de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Nara Leão, Os Mutantes e Tom Zé, seria o manifesto musical desse movimento.
Tropicália ouCCapa do disco CCapa do disco TropicáliaTropicália ouou Panis et CircencissPanis et Circencis
Mas de onde vem a expressão Tropicália?
Em 1967, Hélio Oiticica fez uma exposição no MAM, do Rio de Janeiro, chamada Nova Objetividade Brasileira. Con-sistia em uma instalação formada por um cenário tropical, em que duas tendas penetráveis levavam o espectador a passear sobre areia e brita espalhadas pelo chão, araras e vasos com plantas e uma espécie de labirinto que percorria a tenda principal, às escuras.
Mas a Tropicália não se resumiria ao clichê da chita, bananas e arara. Ela consistia na ruptura do padrão estran-geiro, do condicionamento dos padrões, do conformismo cultural. A experiência do samba, do morro e da favela ganharam poder como representação do nacional.
No ano seguinte, esse nome seria “emprestado” por Caetano Veloso para o disco e o movimento.
Visualmente, esse grupo se destacou pela psicodelia de suas vestimentas e pelas capas de discos, pôsteres de shows, etc. Eles pareciam hippies com cabelos longos e despenteados, roupas coloridas e chamativas, lembrando essa miscelânea cultural e trazendo a irreverência que era marca do grupo.
A Pop Art surgiu como uma influência muito forte, pois trazia várias referências da cultura popular norte-americana, que eram incorporadas pelos tropicalistas. O uso da técnica do ready made, das colagens e de elementos do design foram aproveitados pelos idealizadores do movimento, seguindo os ideais estéticos de artistas como Andy Warhol e Roy Lichtenstein.
Ready made é uma técnica artística que consiste em se aproveitar de algo já pronto e atribuir a esse objeto, ou texto, um novo significado e o status de arte.
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OITICICA, Hélio. Éden. 1969. Museum of Contemporary Art, Chicago, 2005.
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OITICICA, Hélio. Tropicália Penetráveis PN2 e PN3, 1967.
Ensino Médio | Modular 37
LITERATURA BRASILEIRA
Ao observamos a seguinte canção do grupo Os Mutantes, de autoria de Caetano Veloso e Gilberto Gil, é possível fazer um paralelo entre o Tropicalismo e o Concretismo.
Bat macumba Batmakumbayêyê batmakumbaobá Batmakumbayêyê batmakumbao Batmakumbayêyê batmakumba Batmakumbayêyê batmakum Batmakumbayêyê batman Batmakumbayêyê bat Batmakumbayêyê ba Batmakumbayêyê Batmakumbayê Batmakumba Batmakum Batman Bat Ba Bat Batman Batmakum Batmakumba Batmakumbayê Batmakumbayêyê Batmakumbayêyê ba Batmakumbayêyê bat Batmakumbayêyê batman Batmakumbayêyê batmakum Batmakumbayêyê batmakumbao Batmakumbayêyê batmakumbaobá
GIL, Gilberto; VELOSO, Caetano. Bat macumba. Intérpretes: Gilberto Gil, Os Mutantes, Gal Costa e Caetano Veloso. Tropicália ou Panis et Circensis. Rio de Janeiro: Universal, 2006. 1 CD (2min33), digital, estéreo. Faixa 11.
As letras das canções são de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Torquato Neto e José Carlos Capinan e servem como exemplos de poemas de alta qualidade estética, que retomam as propostas concretistas ao se valerem dos elementos plásticos, jogos e brincadeiras linguísticas, coloquialismo, condensação imagética e observação irônica da realidade nacional.
LICHTENSTEIN, Roy. No carro. 1963. 1 magna sobre tela, color., 172 cm x 203,5 cm. Scottish National Gallery of Art, Edimburgo.
WARHOL, Andy. Marilyn. 1962. Serigrafia e acrílico sobre tela, 101,5 cm X 101,5 cm. Coleção particular.
Capa do disco Caetano Veloso
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo38
Os tropicalistas mantiveram uma mais estreita ligação com o movimento antropofágico, da Primeira Geração Modernista, em especial com os escritos de Oswald de Andrade.
Seguindo o modelo dos primeiros modernistas, os tropicalistas defendiam o uso de vários re-ferenciais, inclusive estrangeiros, que deveriam ser apropriados pela cultura nacional. Porém, não se trata de apenas importar as ideias, mas transformá-las, adaptando-as a um cenário local, daí a proposta de “antropofagia”, que significa literalmente “comer outro ser humano”, mas que aparece simbolicamente com a proposta de trazer a cultura estrangeira, mastigá-la, digeri-la, a fim de criar um novo produto nacional.
Na década de 1920, Oswald de Andrade tinha a intenção de questionar as bases político-sociais e culturais impostas pelo europeu colonizador. Na década de 1960, esse ideal era reatualizado para criticar a dominação militar.
Os recursos usados pelos tropicalistas eram os mesmos dos antropofagistas, isto é, faziam uso do humor, da paródia, da ironia e da anarquia.
1. Os concretistas acreditavam que o poema se realiza com a exploração dos elementos visuais, auditi-vos e verbais, seguindo a proposta verbivocovisual. Como essa relação se estabelece na canção?
2. O verso “Bat macumba” pode ser lido de, pelos menos, duas formas diferentes. Quais são elas? Qual é o jogo de linguagem presente?
3. Os tropicalistas misturavam referências nacionais e internacionais. Nessa canção, quais são elas?
Tropicália
“Quando Pero Vaz de Caminha descobriu que as terras brasileiras eram férteis, escreveu uma carta ao rei: Tudo que nela se planta, tudo cresce e floresce. E o Gaus da época gravou...”.
Sobre a cabeça os aviõesSob os meus pés os caminhõesAponta contra os chapadõesMeu nariz
Eu organizo o movimentoEu oriento o carnavalEu inauguro o monumentoNo Planalto Central do país
Viva a Bossa, sa, saViva a Palhoça, ça, ça, ça, çaViva a Bossa, sa, saViva a Palhoça, ça, ça, ça, ça
O monumento é de papel crepom e prataOs olhos verdes da mulataA cabeleira esconde atrás da verde mataO luar do sertão
VELOSO, Caetano. Tropicália. Rio de Janeiro: Philips, 1968. 1 CD.
Manifesto antropófago
Só a Antropofagia nos une. Socialmente. Economicamente. Filosoficamente.Única lei do mundo. Expressão mascarada de todos os individualismos, de todos os coletivismos. De todas as religiões. De todos os tratados de paz.Tupy, or not tupy that is the question.Contra todas as catequeses. E contra a mãe dos Gracos.Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago.
TELES, Gilberto Mendonça (Org.). Vanguardas europeias e modernismo brasileiro: apresentação e crítica dos principais manifestos vanguardistas. Rio de Janeiro: Vozes, 1976. p. 293.
Oswald de
Andrade:
biografia,
cronologia,
obras e
estilo
@LIT1013
Ensino Médio | Modular 39
LITERATURA BRASILEIRA
1. Analisando comparativamente a canção Tropicália e o Manifesto Antropófago, quais são os ele-mentos comuns entre eles?
2. Na segunda estrofe, a canção faz referência a um “eu”. Sobre quem se está falando?
“Eu organizo o movimentoEu oriento o carnavalEu inauguro o monumento”
3. Há uma fala sobre o descobrimento do Brasil antes de iniciada a canção? Por que ela está colocada ali?
4. O refrão da música exalta a bossa nova e a palhoça. Por quê?
5. Essa canção apresenta uma linguagem muito sim-ples, com termos cotidianos, que aproximam o leitor da realidade narrada, porém se vale de uma figura de linguagem muito comum aos grandes poetas clássicos. Analise o trecho a seguir e faça uma inferência sobre qual figura é essa.
Aponta contra os chapadõesMeu nariz
Os olhos verdes da mulataA cabeleira esconde
Atrás da verde mataO luar do sertão
Outra canção, espécie de “hino” do movimen-to tropicalista, é “Geleia geral”, de Gilberto Gil e Torquato Neto.
Geleia geral Um poeta desfolha a bandeiraE a manhã tropical se iniciaResplendente, cadente, fagueiraNum calor girassol com alegriaNa geleia geral brasileiraQue o Jornal do Brasil anuncia
Ê, bumba, yê-yê, boiAno que vem, mês que foiÊ, bumba, yê-yê-yêÉ a mesma dança do boiÊ, bumba, yê-yê, boiAno que vem, mês que foiÊ, bumba, yê-yê-yêÉ a mesma dança do boi
A alegria é a prova dos noveE a tristeza é teu porto seguro Minha terra é onde o Sol é mais limpoEm Mangueira é onde o Samba é mais puroTumbadora na selva selvagem Pindorama, país do futuro
GIL, Gilberto; NETO, Torquato. Geleia geral. Intérprete: Gilberto Gil. Tropicália ou Panis et Circensis. Rio de Janeiro: Universal, 2006. 1 CD (3min43), digital, estéreo. Faixa 6.
6. O título da canção faz referência a um conceito muito difundido pelos tropicalistas. Qual ideia ela retoma?
7. A canção faz uma exaltação da cultura nacional em qual sentido? Justifique.
8. De maneira muito sutil, a canção se vale de alguns ideais românticos. Quais são eles?
9. Chico Buarque não chegou a se envolver direta-mente na Tropicália, mas escreveu canções de protesto. Para escapar da perseguição política, muitas vezes os autores precisavam elaborar textos ambíguos que servissem tanto para criticar o sistema quanto pudessem se relacionar a outros temas. Leia o trecho desta letra de Chico Buarque e responda ao que se pede.
Pai, afasta de mim esse cálicePai, afasta de mim esse cálicePai, afasta de mim esse cáliceDe vinho tinto de sangue Como beber dessa bebida amargaTragar a dor e engolir a labutaMesmo calada a boca, resta o peitoSilêncio na cidade não se escutaDe que me vale ser filho da santaMelhor seria ser filho da outraOutra realidade menos mortaTanta mentira, tanta força bruta[...]
BUARQUE, Chico; GIL, Gilberto. Cálice. Intérpretes: Chico Buarque e Milton Nascimento. Chico Buarque. [S.l.]: Polygram, p1978. 1 CD (4min), digital, estéreo.
Há um jogo linguístico presente no poema, que torna possível uma leitura ambígua. Qual é esse jogo? Explique os sentidos que derivam dessa ambiguidade.
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo40
Poesia Marginal
A Poesia Marginal surgiu nos anos de 1970, logo após a Tropicália, e manifestava-se contra a Ditadura Militar.
Uma série de intelectuais, escritores e pessoas desconhecidas de um modo geral resolveu se expressar por meio de poemas, que eram distribuídos fora do circuito editorial, de maneira alternativa.
Não se constituiu em um movimento integrado, mas se consolidou quando diversos jovens resolveram se manifestar informalmente contra o regime. A poesia foi parar nos muros, em pichações, foi às praças, distribuídas de mão em mão, às universidades e aos bares, vendidas a preços irrisórios.
A principal forma de impressão eram folhetos reproduzidos por mi-meógrafos, meio mais barato e acessível disponível à época. Às vezes, a impressão era em offset ou outro processo semelhante, em tiragens pequenas, de acabamento rústico e manual. Por esse motivo, a Poesia Marginal é também conhecida como Geração Mimeógrafo.
Sem qualquer tipo de organização e catalogação, essas manifestações dos autores dessa geração não eram reconhecidas pelo público até que, no ano de 1975, a editora Brasiliense resolveu compilar alguns textos selecionados por Heloisa Buarque de Hollanda em um livro intitulado 26 Poetas Hoje.
Alguns dos nomes selecionados se tornaram grandes expoentes da literatura nacional:
Francisco Alvim Vera Pedrosa Ricardo G. Ramos
Carlos Saldanha Antonio Carlos Secchin Leomar Fróes
Antônio Carlos de Brito (Cacaso) Flávio Aguiar Isabel Câmara
Roberto Piva Ana Cristina Cesar Chacal
Torquato Neto Geraldo Carneiro Charles
José Carlos Capinan João Carlos Pádua Bernardo Vilhena
Roberto Schwarz Luiz Olavo Fontes Leila Miccolis
Zulmira Ribeiro Tavares Eudoro Augusto Adauto de Souza Santos
Afonso Henriques Neto Waly Salomão
Os poemas dessa coleção não apresentavam um padrão entre si, pois estavam reunidos por serem produzidos por artistas excluídos do circuito. Eram distribuídos informalmente, na busca de se expressar livremente em um momento de repressão política, nos fins da década de 1960 e início dos anos de 1970.
Em linha gerais, a Poesia Marginal tende à coloquialidade, à espontaneidade, à expe-rimentação rítmica e musical, ao humor, à paródia e à representação do cotidiano urbano, ligando-se estreitamente ao movimento tropicalista, o que se pode perceber inclusive pela colaboração de alguns artistas em ambos os movimentos, como Torquato Neto.
Divergiam, porém, do Concretismo, ao privilegiar a expressão da subjetividade do artista e a sua liberdade expressiva, mas nem por isso deixavam de se valer das suas conquistas formais e da sua liberdade criativa.
Dos vários poetas que colaboram com esse movimento, destacam-se Ana Cristina Cesar, Paulo Leminski, Ricardo Carvalho Duarte (Chacal), Francisco Alvim e Cacaso.
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O mimeógrafo fazia perfurações que permitiam a passagem da tinta e a consequente impressão no papel. Essa tinta da matriz dissolvia-se em álcool, que era colocado em um recipiente da máquina, e a matriz rodava no cilindro, que fazia a gravação
Ensino Médio | Modular 41
LITERATURA BRASILEIRA
Ana Cristina Cesar Ana Cristina Cesar nasceu e morreu na cidade do
Rio de Janeiro (1952-1983). Além de poeta, ela foi tradutora e é reconhecidamente uma das expoentes da Poesia Marginal.
Ainda jovem, viajou à Inglaterra, onde entrou em contato com a obra de vários artistas que a in-fluenciaram, como Sylvia Plath e Emily Dickinson. Já demonstrava, desde cedo, uma aptidão para a escrita.
Formou-se em Letras e fez mestrado em Comunicação na Universidade Federal do Rio de Janeiro e depois na Universidade de Essex, na Inglaterra, onde concluiu outro mestrado em tradução literária.
Seus poemas foram distribuídos seguindo o esquema da Poesia Marginal, em forma de folhetos e publicações esparsas. Lançou seus primeiros livros em edições independentes: Cenas de abril e Correspondência completa. Mas é somente depois da década de 1980 que são publicados A teus pés e Inéditos e dispersos por uma casa editorial.
Em sua breve vida, deixou muitos poemas e cartas de cunho au-tobiográfico.
Paulo Leminski Escritor curitibano (1944-1989) que se destacou pela produção
de poemas curtos, como haicais. Em 1964, fez sua estreia na revista Invenção, cuja direção era
de Décio Pignatari. Acabou se aproximando do grupo concretista, colaborando em diversos trabalhos desse movimento. Apesar de ser considerado um dos grandes escritores da Poesia Marginal, não participava de nenhum grupo com outros escritores dessa vertente, relacionando-se mais estreitamente com os artistas da Tropicália na elaboração de letras musicais.
Foi tradutor de várias línguas: inglês, francês, la-tim, grego, japonês e espanhol, aproximando-se muito da cultura japonesa, publicando em 1983 uma biografia de Matsuo Bashô, um dos mais famosos poetas japoneses.
Colaborou também com o suplemento “Folhetim”, do jornal Folha de S.Paulo e com a revista Veja.
Ganhou grande notoriedade ao escrever Catatau, obra experimental que trabalha com repertório de diversas línguas, misturando prosa e poesia. Faleceu em 1989.
Editora Abril/Abril Imagens/Ricardo Chaves
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O haicai é uma forma poética japonesa muito concisa, formada por três versos, que, normal-mente, possuem cinco sílabas no primeiro e no terceiro versos e sete sílabas no segundo.
Abrindo um antigo caderno foi que descobri Antigamente eu era eterno
LEMINSKI, Paulo. Boa companhia: haikai. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. p. 163.
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo42
Chacal Ricardo de Carvalho Duarte nasceu no Rio de Janeiro, em 1951. Fez Comunicação na Universidade Federal do Rio de Janeiro e
distribuiu seus primeiros poemas com a técnica do mimeógrafo. Na década de 1970, publicou seu primeiro livro, Muito prazer, Ricardo, com 100 exemplares mimeografados. No ano seguinte, pu-blicou Preço da passagem – 34 folhas mimeografadas, dentro de um envelope, com uma tiragem de mil exemplares.
Em 1975, Chacal envolveu-se com o grupo Nuvem Cigana, que tinha a intenção de retirar a poesia dos livros e fazer ex-perimentações entre a poesia e a música. Com o fim desse grupo, o escritor fez parceria com o grupo musical Blitz e com Lobão, compondo diversas músicas.
Atualmente, é curador e produtor cultural do projeto cha-mado CEP 20.000 – Centro de Experimentação Poética –, que desenvolve projetos multimídia, envolvendo as mais diversas manifestações artísticas.
Cacaso Antônio Carlos de Brito (1944-1987) nasceu no interior de Minas Ge-
rais, em Uberaba, mas com 11 anos mudou-se para o Rio de Janeiro. Foi professor universitário e poeta, lecionando Teoria Literária na PUC-RJ. Contribuiu com muitos artigos sobre a cena artística nacional.
Colaborou regularmente para diversos periódicos e revistas, mas seu lançamento de estreia ocorreu somente em 1967, com A palavra cerzida. Seguiram-se Grupo escolar (1974), Beijo na boca (1975), Segunda classe (1975), Na corda bamba (1978) e Mar de mineiro (1982).
Fez trabalhos em parceria com muitos músicos, compondo letras com Tom Jobim, Toquinho, Djavan, Edu Lobo e outros.
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ress/João Sal
1. Leia o poema de Ana Cristina Cesar e responda ao que se pede.
Poema óbvio Não sou idêntica a mim mesmasou e não sou ao mesmo tempo, no mesmo lugar e sob
o mesmo ponto [de vistaNão sou divina, não tenho causaNão tenho razão de ser nem finalidade própria:Sou a própria lógica circundante.
CESAR, Ana Cristina. Inéditos e dispersos. São Paulo: Ática, 1998. p. 59.
a) Qual é a imagem que o “eu lírico” faz de si mesma?
b) Ao se definir como a “lógica circundante”, o que o “eu lírico” diz sobre o momento em que vivia?
c) Qual é a relação entre os acontecimentos so-ciais da década de 1960 e aquilo que o “eu lírico” diz sobre a lógica circundante?
2. O poema de Ana Cristina Cesar se constrói com base em uma figura de linguagem. Qual figura é essa?
Ensino Médio | Modular 43
LITERATURA BRASILEIRA
a) Hipérbole, ao exagerar uma ideia a fim de im-pressionar o leitor.
b) Personificação, ao atribuir características hu-manas a seres inanimados.
c) Antítese, que consiste na apresentação de ideias opostas.
d) Gradação, ao enumerar de forma crescente vários elementos.
e) Ironia, que consiste em dizer o contrário da-quilo que se pensa.
O seguinte poema é da autoria de Paulo Leminski. Analise-o.
Marginal é quem escreve à margem deixando branca a página para que a paisagem passee deixe tudo claro à sua passagem.
Marginal, escrever na entrelinha, sem nunca saber direitoquem veio primeiro,o ovo ou a galinha.
LEMINSKI, Paulo. Melhores poemas de Paulo Leminski. São Paulo: Global, 1999. p. 130.
3. O que é a Poesia Marginal para o “eu lírico”? Ex-plique com base em seus conhecimentos sobre esse movimento.
4. O autor exalta uma característica da Poesia Mar-ginal. Qual é? Explique.
5. A linguagem do poema é hermética ou simples? Justifique com uma passagem do texto.
6. Os poemas da Poesia Marginal se caracteriza-vam muitas vezes pela sua brevidade, seguindo o exemplo do poema-pílula, desenvolvido por Oswald de Andrade. Assinale o poema que, além de sintético, é um exemplo de haicai.
( ) CiúmesTenho ciúmes deste cigarro que você fuma Tão distraidamente.
CESAR, Ana Cristina. Inéditos e dispersos. São Paulo: Ática, 1998. p. 30.
( ) Prezado cidadãocolabore com a lei. colabore com a Light.mantenha luz própria.
CHACAL. Drops de abril. São Paulo: Brasiliense, 1983. p. 15.
( ) PreceitoDinheiro não tolera desaforo
BRITO, Antônio Carlos de. Antônio Carlos de Brito: Lero-lero. Rio de Janeiro: 7 letras, 2002. p. 25.
( ) Incenso fosse música isso de quererser exatamente aquilo que a gente éainda vai nos levar além
LEMINSKI, Paulo. Melhores poemas de Paulo Leminski. São Paulo: Global, 1999. p. 139.
7. O seguinte poema de Chacal retoma a Primeira Geração Modernista em quais aspectos?
Papo de índio veiu uns ômi de saia pretacheiu di caixinha e pó brancoque eles disserum qui chamava açucri. aí eles falarum e nós fechamu a cara. depois eles arrepetirum e nós fechamu o corpo. aí eles isistirum e nos comemu eles.
CHACAL. Drops de abril. São Paulo: Brasiliense, 1983. p. 20.
8. Pode-se afirmar que os poemas desse movi-mento têm como temas predominantes:
a) A expressão da subjetividade do artista e a crítica aos problemas sociais vividos à época.
b) Uma revisão da história nacional e um apelo para que o público se envolva na oposição ao sistema vigente.
c) A exaltação da mulher e de seus sentimen-tos, bem como uma idealização da pátria.
d) Análise de caráter social das pessoas comuns e uma descrição das instituições sociais.
e) O transcendente e o religioso como meios de alcançar a verdade sobre o mundo.
44 Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo
Textos para as questões 1 e 2.
Texto 1
Pau-BrasilEra uma vez uma floresta cheia de festa e balangandãNa noite fresca carnavalesca brilhava a estrela AldebarãE nas quebradas da madrugada toda menina era cunhãUm belo dia uma menina achou no mato uma maçãOlhou a fruta meio de banda como se fosse coisa malsãDeu uma dentada, meteu o dente, e de repente, tchan-tchantchan-tchanOuviu na mata a voz possante e extravagante do Deus TupãQue então lhe disse: Mas que tolice, minha menina, minha cunhãUma maçã é uma maçã, é uma maçã, é uma maçãE a menina foi pra gandaia cantarolando Cubanacan.
HIME, Francis. Pau-Brasil. Rio de Janeiro: Biscoito Fino, 2008. 1 CD. Faixa 7.
Texto 2
O que foi dito no ano de 1968“Eles gostam de se dizer ‘antropofágicos’, isto é, seguidores do modernista Oswald de Andrade. São os poetas concretos e os músicos da Tropicália e o que querem é criar uma nova linguagem. Os con-cretos, na faixa restrita dos livros, da poesia. Os tropicalistas, na faixa mais larga do consumo, através de discos, festivais e programas de TV”.
Veja. São Paulo, Abril, p. 143, set. 2008. Edição comemorativa de 40 anos. (Adaptado).
1. (UFG – GO)
a) Analisando o texto 2, explique por que a can-ção “Pau-Brasil” (texto 1) pode ser considera-da integrante do movimento da Tropicália.
b) Que ato praticado pela personagem, no texto 1, sugere a construção da temática antropofágica? Justifique.
2. (UFG – GO)
a) A música “Pau-Brasil” (texto 1) reafirma a crí-tica que Oswald tece às ações dos europeus na formação da cultura brasileira. Relacione trechos dessa música à crítica de Oswald a res-peito da linguagem herdada dos europeus.
b) A expressão “Um belo dia” instaura uma mu-dança na organização sequencial do texto 1. Ex-plique que mudança é essa.
3. (ENEM) Leia a letra da canção “Geleia geral”, do álbum Tropicália ou Panis et Circensis, de 1968, considerado o manifesto central do movimento artístico “Tropicália”, no âmbito da música.
Um poeta desfolha a bandeira e a manhã tropi-cal se inicia
Resplandecente, cadente, fagueira num calor girassol com alegria
Na geleia geral brasileira que o Jornal do Brasil anuncia
[...]
A alegria é a prova dos nove e a tristeza é teu Porto Seguro
Minha terra é onde o sol é mais limpo e Man-gueira é onde o samba é mais puro
Tumbadora na selva-selvagem, Pindorama, país do futuro
[...]
É a mesma dança na sala, no Canecão, na TV
E quem não dança não fala, assiste a tudo e se cala
Não vê no meio da sala as relíquias do Brasil:
Doce mulata malvada, um LP de Sinatra, mara-cujá, mês de abril
Santo barroco baiano, superpoder de paisano, formiplac e céu de anil
Ensino Médio | Modular 45
LITERATURA BRASILEIRA
Três destaques da Portela, carne-seca na janela, alguém que chora por mim
Um carnaval de verdade, hospitaleira amizade, brutalidade jardim
[...]
Salve o lindo pendão dos seus olhos e a saúde que o olhar irradia
[...]
Voz do morro, pilão de concreto tropicália, ba-nanas ao vento
Ê, bumba-yê-yê-boi ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê é a mesma dança
GIL, Gilberto; NETO, Torquato. Geleia geral. Intérprete: Gilberto Gil. In: Tropicália ou Panis et circensis. São Paulo: RGE, 1968. 1 disco de vinil. Lado 1, faixa 6.
Agora, assinale a alternativa falsa.
a) A letra da música evoca a noção de brasilidade que os representantes do movimento artístico da Tropicália queriam abordar, a de um país que convive com elementos modernos sem se desvincular da tradição.
b) A Tropicália se apropria de elementos da arte de vanguarda, da cultura de massa, da música pop, difundidos, então, no exterior. Essa medida ten-tava inserir a arte brasileira no cenário mundial.
c) A Tropicália, mesmo marcando suas composi-ções musicais com elementos do pop interna-cional, como as guitarras e os baixos elétricos, e da música conceitual, como os barulhos do cotidiano inseridos nas gravações das músi-cas, não deixou de se valer de elementos do folclore e da tradição musical tipicamente bra-sileira, como o samba.
d) A Tropicália valeu-se de uma ideia de Brasil idêntica à dos modernistas de 1922. O resgate da cor local, da tradição e do folclore brasi-leiros predominava na poética do movimento, dando aos seus produtos artísticos um tom saudosista e completamente desvinculado da realidade urbana contemporânea e interna-cional.
e) A letra da música apresenta intertextualida-de com elementos do hinário cívico nacional (Hino à Bandeira) e com a Canção do exílio, de Gonçalves Dias, cujos primeiros versos são “Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá”.
4. (PUC-RJ) No período de governo do presidente Juscelino Kubitschek, entre 1956 e 1961, a so-ciedade brasileira vivenciou a esperança da su-peração do subdesenvolvimento. “Os anos JK” prometeram um desenvolvimento nacional, por meio da industrialização do país e da elevação das condições de vida da população brasileira.
Assinale a alternativa que não caracteriza corre-tamente esse ambiente político e intelectual:
a) O movimento do Cinema Novo, que tinha em Glauber Rocha um de seus expoentes e foi re-alizado com poucos recursos financeiros, se propôs a narrar o Brasil “real”, tanto no meio urbano como no meio rural.
b) A criação da Sudene tinha como objetivo re-fletir e elaborar planos de ação para diminuir as disparidades regionais, especialmente o di-lema vivido pelo Nordeste brasileiro.
c) A construção de Brasília, a cidade modernista, constituiu-se em meta síntese do Plano de Me-tas do governo, como uma demonstração do estágio de desenvolvimento do país.
d) O movimento tropicalista criou uma nova es-tética musical, pela utilização das guitarras elétricas, pelos temas e formas poéticas reno-vadas.
e) A indústria automobilística exemplificou a co-laboração entre o capital nacional e o capital estrangeiro para o desenvolvimento acelerado da industrialização brasileira.
5. “Uma câmera na mão e uma ideia na cabeça” foi slogan do Cinema Novo, movimento de jo-vens cineastas que, a partir do início dos anos 60 procurou, através de suas produções, abor-dar os problemas do povo brasileiro, mostrar os desequilíbrios sociais do país e transformar a realidade. A única alternativa que reúne três cineastas do Cinema Novo é:
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo46
a) Leon Hirszman, Ruy Guerra e Paulo César Sarraceni.
b) Alberto Cavalcanti, Joaquim Pedro de Andrade e Eurides Ramos.
c) Glauber Rocha, Lima Barreto e Victor Lima.
d) Carlos Diegues, Watson Macedo e Alberto Pieralise.
e) Luís Sérgio Person, Carlos Manga e Abílio Pereira de Almeida.
6. (UFU – MG) Leia este poema:
A vida é uma viagem
Pena eu estar
Só de passagem.
LEMINSKI, Paulo. La vie em close.
Assinale a alternativa correta:
a) O texto pode ser considerado um haicai, pois celebra a relação harmoniosa e equilibrada entre homem e natureza.
b) O “eu poético” não se manifesta neste poema, uma vez que se trata de um haicai, gênero lite-rário constituído de 17 sílabas poéticas.
c) Há uma tentativa do “eu poético” de refletir sobre a rápida passagem do tempo, preo-cupação comum a todo haicai contemporâ-neo.
d) Este texto pode ser considerado um haicai, mesmo não seguindo de forma tradicional as regras antigas da poética oriental.
7. (UFES)
Texto I
[...]
– Não, não... Não pode bater em Mamãe, não pode... Diante do pai, que se irava feito um fero, Miguilim não pôde falar nada, tremia e soluça-va; e correu para a mãe, que estava ajoelhada encostada na mesa, as mãos tapando o rosto. Com ela se abraçou. Mas dali já o arrancava o pai, batendo nele, bramando. [...] Quando pôde respirar, estava posto sentado no tamborete, de castigo.[...] O Dito vinha, desfazendo de conta. Quando um estava de castigo, os outros não podiam falar com esse. Mas o Dito dizia tudo
baixinho, e virado para outro lado, se alguém visse não podiam exemplar por isso, conversan-do com Miguilim até que ele não estava. – Vai chover. O vaqueiro Jê está dizendo que já vai de chover chuva brava, porque o tesoureiro, no curral, está dando cada avanço, em cima das mariposas! [...] Miguilim não respondia. De cas-tigo, não tinha ordem de dar resposta, só aos mais velhos. Sim sorria para o Dito, quando ele olhava – só o rabo do olho. O tesoureiro era um pássaro imponente de bonito, pedrês cor de cinza, bem as duas penas compridas da cauda, pássaro com mais rompante do que os outros. Gostava de estar vendo aquilo no curral.[...]
ROSA, João Guimarães. Campo geral. In: ____ . Manuelzão e Miguilim. 11. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001, p. 36-38.
Texto II
Por um lindésimo de segundo
tudo em mim
anda a mil
tudo assim
tudo por um fio
tudo feito
tudo estivesse no cio
tudo pisando
macio tudo psiu
tudo em minha volta
anda às tontas
como se as coisas
fossem todas
afinal de contas
LEMINSKI, Paulo. Distraídos venceremos. São Paulo: Brasi-liense, 1987, p. 23.
Considerando que as obras literárias da atualida-de se caracterizam pelo esforço de incorporação e de eventual estilização das regras linguísticas populares, observe a linguagem de Guimarães Rosa, no Texto I, e de Paulo Leminski, no Texto II, e julgue como verdadeira (V) ou falsa (F) cada uma das seguintes afirmações.
I. Formas como “dali já arrancava o pai”, “chu-va brava” e “dando cada avanço” são exem-plos de incorporações de regras linguísticas populares no texto de Guimarães Rosa.
Ensino Médio | Modular 47
LITERATURA BRASILEIRA
II. O fragmento de “Campo geral” contém di-versos exemplos de uso literário de expres-sões populares, como “tapando o rosto”, “desfazendo de conta” e “só o rabo do olho”.
III. O poema de Paulo Leminski não apresenta incorporação de formas populares; ao con-trário, valoriza a chamada norma culta, por meio de expressões como “a mil”; “por um fio”, e “pisando macio”.
IV. O vocabulário utilizado por Paulo Leminski no poema pertence ao mesmo universo so-cial do personagem Miguilim, no enredo de “Campo geral”.
V. O poema em duas estrofes, espacialmente assimétrico, explora uma instabilidade na re-lação entre um Eu e o Mundo, por meio de versos livres, aliterações em t e antítese entre “tudo” e “todas”.
A sequência correta de respostas, de cima para baixo, é:
a) V V V F V
b) F V F V F
c) F F V V F
d) V F V F V
e) V V F F V
8. (UEG – GO)
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue
Como beber dessa bebida amarga
Tragar a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta.
Disponível em: <http://natura.di.uminho.pt/~jj/musica/html/brasil-calice.html>. Acesso em: 19 set. 2007.
Durante a Ditadura Militar, a censura política fun-cionou como uma mordaça à liberdade de expres-são no Brasil.
Em função disso, artistas de diversas tendências usaram a sua criatividade na produção de obras de forte apelo político, mas que, ao mesmo tem-po, preservavam a beleza estética. Um exemplo é a canção “Cálice”, composta por Chico Buarque e Gilberto Gil, em 1973. Sobre a expressividade poética e política dessa canção, é incorreto afir-mar:
a) Ela explora o duplo sentido que se pode verifi-car na leitura do vocábulo “cálice”, em razão da identidade fônica entre essa palavra e a forma verbal do verbo “calar”, na terceira pessoa do imperativo.
b) Percebe-se a manifestação de uma intertextuali-dade entre os três primeiros versos e o contexto bíblico da crucificação de Cristo.
c) “Bebida amarga”, no contexto da canção, me-taforiza o contexto sócio-histórico em que ela foi composta.
d) A canção é um exemplo da bossa nova, um gênero musical que tentou extirpar qualquer influência norte-americana na música popular brasileira.
Concretismo, Neoconcretismo e Tropicalismo48