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CONDICIONANTES DA ESTRUTURA DE FINANCIAMENTO SOBRE A DECISÃO DE INVESTIMENTO: Análise do Setor de Distribuição de Gás Natural Marcelo Colomer Ferraro Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós- graduação em Ciências Econômicas do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Economia da Indústria e da Tecnologia. Orientador Edmar Luiz Fagundes de Almeida Rio de Janeiro Abril/2006

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CONDICIONANTES DA ESTRUTURA DE FINANCIAMENTO SOBRE A DECISÃO DE INVESTIMENTO: Análise do Setor de

Distribuição de Gás Natural

Marcelo Colomer Ferraro

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Ciências Econômicas do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Economia da Indústria e da Tecnologia. Orientador Edmar Luiz Fagundes de Almeida

Rio de Janeiro Abril/2006

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CONDICIONANTES DA ESTRUTURA DE FINANCIAMENTO SOBRE A DECISÃO DE INVESTIMENTO: Análise do Setor de Distribuição de Gás Natural

Marcelo Colomer Ferraro

Orientador

Edmar Luiz Fagundes Almeida

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Ciências Econômicas do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Economia da Indústria e da Tecnologia. Aprovada por:

________________________________________________________________

Edmar Luiz Fagundes Almeida, D. Sc. (IE-UFRJ) Presidente da Banca (orientador)

___________________________________________________________________________ Prof. Helder Queiroz Pinto Junior, D.Sc. (IE-UFRJ)

______________________________________________________________________________ Nelson Fontes Siffert Filho, D.Sc. (Gerente Executivo BNDES)

Rio de Janeiro Abril/2006

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Ferraro, Marcelo Colomer Condicionantes da Estrutura de Financiamento sobre a

Decisão de Investimento: Análise do Setor de Distribuição de Gás Natural/ Marcelo Colomer Ferraro – Rio de Janeiro: UFRJ/IE, 2006.

xiii, 198p.: il, tab.; 31 cm. Orientador: Edmar Luiz Fagundes de Almeida Dissertação (Mestrado) – UFRJ/IE Programa de pós-

graduação em Economia da Indústria e da Tecnologia, 2006. Referências Bibliográficas: pp.162-166. 1.Estrutura financeira. 2.Gás natural. 3. Empresas

distribuidoras. 4. Barreiras não financeiras. I. Almeida, Edmar. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. III. Título.

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As opiniões expressas neste trabalho são de exclusiva responsabilidade do autor.

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Dedicatória

Dedico esta dissertação aos meus Pais pelo carinho e apoio durante toda minha vida.

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Agradecimento

Agradeço ao Corpo Docente do Grupo de Economia da Energia do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, especialmente ao Profs. Helder Queiroz Pinto Jr, Mariana Iooty, Ronaldo Bicalho, à Carla Maria de Souza e Silva, à Joseane Oliveira e à Daisy Barreto, pela amizade, dedicação, e constante ajuda durante todo o período em que trabalhamos juntos. Agradeço também aos meus amigos da turma de mestrado de 2004 do Instituto de Economia da UFRJ pela amizade, aprendizagem e apoio nos momentos de dificuldade. Agradecimento para Bárbara Oliveira, Maurice Etienne, Maria Carolina e Solon Carlos Seixas pelo carinho e amizade desenvolvido durante estes anos de convívio. Aos meus pais, irmãos, amigos e namorada pelo amor, compreensão, carinho e apoio que tanto contribuíram para minha formação acadêmica. Agradecimento especial para meu orientador Edmar Luiz Fagundes Almeida pelos ensinamentos fundamentais para a realização desta dissertação e para meu crescimento pessoal e profissional.

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“Nunca ande pelo caminho traçado, pois ele leva somente até onde os outros foram”. Alexandre Graham Bell

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RESUMO

CONDICIONANTES DA ESTRUTURA DE FINANCIAMENTO SOBRE A DECISÃO DE INVESTIMENTO: Análise do Setor de Distribuição de Gás Natural.

Marcelo Colomer Ferraro

Orientador

Prof.: Edmar Luiz Fagundes de Almeida

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Ciências Econômicas do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Economia da Indústria e da Tecnologia.

A análise dos níveis de investimento e da expansão das malhas de distribuição de gás

no Brasil mostrou haver uma grande diferença entre as empresas privadas e estatais. Desta forma, o objetivo principal desta dissertação é analisar se a estrutura financeira das empresas de distribuição de gás natural explica os diferentes níveis de investimento existentes no setor, e em caso negativo, identificar quais são os condicionantes do baixo volume de investimento das empresas públicas de distribuição de gás. O trabalho utiliza as teorias sobre o investimento desenvolvidas por Kalecki e Minsky para mostrar como o padrão de financiamento utilizado por uma empresa influencia o risco financeiro e consequentemente o custo de captação de recursos de terceiros. Em seguida, esta dissertação verifica, por meio da análise dos principais indicadores financeiros das empresas distribuidoras de gás, se o padrão de financiamento adotado pelas diferentes empresas explica a diferença existente entre os níveis de investimento. Os resultados da análise feita mostram que existem barreiras não financeiras a massificação do uso de gás natural. Entre os principais condicionantes do baixo nível de investimento das empresas públicas de distribuição de gás natural o trabalho destaca o contingenciamento de crédito imposto pelo BACEN ao setor público, através da resolução 2827, e a falta de uma política energética integrada. Palavras-Chave: estrutura financeira, gás natural, empresas distribuidoras, barreiras não financeiras.

Rio de Janeiro

Abril/2006

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ABSTRACT

CONDITIONER OF FINACIAL STRUCTURE OVER INVESTMENT DECISION: Analysis of Natural Gas Distribution Sector.

Marcelo Colomer Ferraro

Orientador

Prof.: Edmar Luiz Fagundes de Almeida

Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-graduação em Ciências Econômicas do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Economia da Indústria e da Tecnologia.

The analysis of the levels of investments and the expansion of the network of natural

gas distribution in Brazil revealed a great difference between private and state owned companies. Thus, the main objective of this paper is analyze if financial structure of the companies of natural gas distribution explains the different levels of investments on this sector, and in negative case, identify which are the reasons of the low volume of investments of public companies of gas distribution. This document uses the theories on the investment developed by Kalecki and Minsky to show how financial pattern used by a company influences the financial risks and therefore the cost of resource capitation of third parties. Following that, this dissertation verify, through the analysis of the main financial indicators of natural gas distribution companies, if the pattern of financing adopted by different companies explains the existing difference between the levels of investments. The results of the performed analysis showed that does exists non financial barriers to the wide use of natural gas. Among the main restrictions of the low level of investments of public companies of natural gas distribution, this paper will stress the restrictions of credit imposed by Central Bank of Brazil to the public sector, through resolution 2827, and the lack of an integrated energy politic. Key-Words: financial structure, natural gas, distribution companies, non financial barriers.

Rio de Janeiro April/2006

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Listas de Tabelas Tabela 1 – Investimento Acumulado 2001-2030 por Região e Atividade (Bilhões de Dólares)7 Tabela 2 – Estrutura de Financiamento de Uma Firma Representativa ...................................35 Tabela 3 – Emissão de ação como Proporção da formação Bruta de Capital Fixo (1996) ......58 Tabela 4 – Investimento no Brasil (US$ Bilhões)....................................................................60 Tabela 5 - Evolução das Fontes de Financiamento das Empresas Estatais Federais 1980/1998..................................................................................................................................................64 Tabela 6 – Custos de Distribuição de Gás Natural (%) sobre a Margem Bruta (1995) ...........71 Tabela 7 – Demonstrativo de Resultados 2004 ........................................................................72 Tabela 8 – Participação sobre a Margem Bruta........................................................................73 Tabela 9 – Pesos Relativos dos Custos.....................................................................................73 Tabela 10 - Setor Nacional de Distribuição de Gás Natural (2004)*.......................................79 Tabela 11 – Nível de Endividamento Setorial – Brasil ............................................................90 Tabela 12 – Nível de Endividamento da Gás Natural SDG .....................................................91 Tabela 13 – Recentes Projetos de Gás Natural Apoiados pelo BNDES ................................112 Tabela 14 – Projetos de Distribuição de Gás Apoiados Pelo BNDES ...................................113 Tabela 15 – Rentabilidade Média do Ativo............................................................................124 Tabela 16 – Investimento das Empresas de Distribuição de Gás Natural ..............................131 Tabela 17 – Produção de Gás Natural no Brasil.....................................................................133 Tabela 18 – Importações de Gás Brasileiras ..........................................................................135 Tabela 19 – Consumo de Gás Natural por Segmento (mês de abril de cada ano)..................136 Tabela 19 – Consumo de Gás por Segmento Econômico ......................................................150 Tabela 20 – Investimentos da COMGAS...............................................................................155

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Lista de gráficos Gráfico 1 – Comportamento Financeiro de Uma Firma Representativa ..................................29 Gráfico 2 – Risco do Tomador de Empréstimo........................................................................31 Gráfico 3 – Nível de Investimento da Firma ............................................................................33 Gráfico 4 – Sensibilidade do Investimento ao Grau de Aversão ao Risco...............................34 Gráfico 5 – Retorno Sobre o Ativo Imobilizado ......................................................................52 Gráfico 6 – Investimento em infra-estrutura e sua participação no PIB. Caso Brasileiro........59 Gráfico 7 – Participação setorial nas Desestatizações no Brasil (1991/1998) .........................63 Gráfico 8 – KM de redes em 2003 (1.000)...............................................................................80 Gráfico 9 – Nível de Endividamento Financeiro das Empresas de Distribuição de Gás Privadas e Estatais ....................................................................................................................92 Gráfico 10 – Nível de Endividamento Financeiro das Empresas de Distribuição de Gás Privadas e Estatais (sem a Sulgás)............................................................................................93 Gráfico 11 – Nível de Endividamento Financeiro X Nível Geral de Endividamento..............94 Gráfico 12 – Participação do Capital de Terceiros Sobre o Capital Total nos Segmentos de Energia no Mundo no Período de 1992 a 2001 (%) .................................................................95 Gráfico 13 – Nível de Liquidez Geral (Média das empresas privadas e estatais) ....................98 Gráfico 14 – Nível de Liquidez Geral das Empresas Privadas.................................................98 Gráfico 15 – Nível de Liquidez Geral das Empresas Estatais..................................................98 Gráfico 16 – Nível de endividamento X Capacidade de Endividamento das Empresas Privadas................................................................................................................................................100 Gráfico 17 – Capacidade de Pagamento de Juros ..................................................................101 Gráfico 18 – Nível de endividamento X Capacidade de Endividamento das Empresas Estatais................................................................................................................................................102 Gráfico 19 – Giro do Ativo ....................................................................................................104 Gráfico 20 – Margem EBITDA..............................................................................................104 Gráfico 21 – Rentabilidade do PL e Nível de endividamento................................................105 Gráfico 22 – Evolução do ROFA das Empresas Privadas e Estatais .....................................107 Gráfico 23 – Participação do Ativo Permanente das Empresas Públicas e Estatais Sobre o Ativo Permanente Total (2004) ..............................................................................................108 Gráfico 24– Taxa de Crescimento do Ativo Permanente X ROFA das Empresas Privadas..108 Gráfico 25 – Taxa de Crescimento do Ativo Permanente X ROFA das Empresas Estatais ..109 Gráfico 26 – Potencial de Endividamento Bancário das Empresas Estatais ..........................131 Gráfico 27 – Projeção de Oferta e Consumo de Gás Natural no Brasil .................................138

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Lista de Quadros Quadro 1 - Sistema Financeiro após as reformas de 1964-66 ..................................................39 Quadro 2 – Valor adicionado no Segmento de Distribuição de Gás Natural, 1995 .................70 Quadro 3 – Estrutura Patrimonial das Empresas de Distribuição de Gás Natural ...................80 Quadro 4 - Condições Operacionais Básicas..........................................................................114 Quadro 5 – Sinopse da Crise da Bolívia.................................................................................139 Quadro 6 – Políticas Setoriais para a Indústria de Gás Natural..............................................144 Quadro 7 – Projetos de Lei do Gás.........................................................................................146

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Sumário

Sumário ....................................................................................................................................1

Introdução ...............................................................................................................................5

Capítulo 1- Principais Correntes Teóricas Sobre o Investimento ..........................11

1.1 Pode a decisão de financiamento de uma firma criar valor? Uma abordagem

de finanças corporativas...................................................................................................12

1.1.1 Fontes básicas de financiamento:.....................................................................12

1.1.1.1 Ações ordinárias ...........................................................................................12

1.1.1.2 Ações Preferenciais .....................................................................................13

1.1.1.3 Dívidas de longo prazo ou títulos de dívidas ...........................................14

1.1.1.4 Autofinanciamento........................................................................................15

1.1.2 Padrões de Financiamento ................................................................................15

1.1.3 Estrutura de Capital (Teoria de Modigliani e Miller, 1958) ............................16

1.2 Conceito de Risco Financeiro Crescente ................................................................21

1.2.1 Os Determinantes do Investimento...................................................................23

1.3 Risco do Credor X Risco da Firma ...........................................................................26

1.3.1 A Estrutura do Passivo (das dívidas) e a Evolução do Investimento da

Firma ................................................................................................................................28

1.3.2 Risco do Tomador de Empréstimo ...................................................................30

1.3.3 Risco do Credor ...................................................................................................31

1.4 Exemplificação do Risco Financeiro ........................................................................34

1.5 Conclusões...................................................................................................................36

2

2

Capítulo 2 - Sistema Financeiro e o Setor de Infra-Estrutura no Brasil ...............38

2.1 Sistema Financeiro Brasileiro e o Modelo de Financiamento Predominante no

Brasil ....................................................................................................................................38

2.2 Sistema Financeiro Internacional .............................................................................43

2.3 Inovações Financeiras ...............................................................................................46

2.3.1 Securitização ........................................................................................................47

2.3.2 Mercado de Derivativos ......................................................................................48

2.3.3 Investidores Institucionais ..................................................................................50

2.4 Financiamento de Indústrias de Rede .....................................................................50

2.4.1 Características da Indústria de Infra-Estrutura ...............................................51

2.4.2 Evolução dos Investimentos em Infra-Estrutura no Brasil ............................59

2.4.3 Fontes de Financiamento de Infra-Estrutura...................................................63

2.4.4 Alternativas para o Financiamento de Projetos de Infra-Estrutura ..............65

2.5 Conclusões...................................................................................................................67

Capítulo 3 - Padrão de Financiamento e a Estrutura do Setor Brasileiro de

Distribuição de Gás Natural..............................................................................................68

3.1 Estrutura da Distribuição de Gás Natural................................................................69

3.1.1 Características Econômicas do Setor de Distribuição de Gás Natural.......69

3.1.1.1 Principais Custos da Distribuição de Gás Natural ..................................70

3.1.1.2 Economias de Escala e de Densidade .....................................................73

3.1.1.3 Aspectos Regulatórios e Monopólio Natural ............................................75

3.1.2 Estrutura do Setor de Distribuição de Gás Natural Brasileiro ......................78

3.1.3 – Contratos de Concessão.................................................................................82

3.1.3.1 Contratos de Concessão: Modelo Privado...............................................83

3

3

3.1.3.2 Contratos de Concessão: Modelo Estatal ................................................85

3.2 Análise dos Indicadores Financeiros das Principais Empresas Brasileiras de

Distribuição de Gás Natural. ............................................................................................87

3.2.1 Nível de Endividamento das Empresas de Distribuição de Gás Natural....89

3.2.2 Capacidade de Endividamento das Empresas de Distribuição de Gás

Natural .............................................................................................................................95

3.2.3 Escala de Produção do Setor de Distribuição de Gás Natural (Giro do

Ativo e Margem EBITDA) ..........................................................................................103

3.2.4 Rentabilidade média X Nível de Endividamento .........................................105

3.2.5 ROFA (retorno sobre o ativo imobilizado) .....................................................106

3.3 Principais Fontes de Financiamento Utilizadas pelas Empresas de Distribuição

de Gás ...............................................................................................................................110

3.3.1 Bancos de Desenvolvimento ...........................................................................110

3.3.1.1 BNDES .........................................................................................................111

3.3.1.2 BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul) ..........113

3.3.2 Ação dos Investidores Institucionais...............................................................115

3.3.2.1 PETROS ......................................................................................................116

3.3.3 Instituições Internacionais de Crédito.............................................................117

3.3.4 Mercado de capitais ..........................................................................................118

3.4 Considerações finais ................................................................................................118

Capítulo 4 - Condicionantes e Propostas para o Desenvolvimento do Setor de

Distribuição de Gás Natural............................................................................................120

4.1 Teoria do Investimento e o Financiamento do setor de Distribuição de Gás

Natural ...............................................................................................................................121

4

4

4.2 Principais Barreiras ao Desenvolvimento do Setor de distribuição de Gás

Natural ...............................................................................................................................128

4.2.1 Resolução 2827 do BACEN.............................................................................129

4.2.2 Planejamento Energético e Risco de Desabastecimento ...........................132

4.2.2.1 Estrutura de Oferta de Gás Natural no Brasil e o Papel da Petrobras

....................................................................................................................................132

4.2.2.2 Risco de Desabastecimento .....................................................................135

4.2.2.3 Crise Política na Bolívia.............................................................................138

4.2.2.4 Alternativa ao Gás Boliviano e Planejamento Energético ...................141

4.3 Algumas Propostas para o Desenvolvimento do Setor ......................................145

4.3.1 Planejamento Energético .................................................................................145

4.3.2 Securitização de Recebíveis............................................................................149

4.3.3 Reestruturação Patrimonial das Empresas Estatais....................................152

4.4 Considerações Finais ...............................................................................................156

Conclusões .........................................................................................................................158

Referencias Bibliográficas ..............................................................................................161

Anexo I..................................................................................................................................166

Anexo II.................................................................................................................................184

Anexo III ...............................................................................................................................193

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Introdução

A partir da revolução industrial do século XVIII, as transformações no paradigma

tecnológico têm ocorrido de forma cada vez mais acelerada. O desenvolvimento do

capitalismo desencadeado nos últimos séculos teve como base o uso intensivo dos

combustíveis, principalmente os de origem fóssil. O crescimento e desenvolvimento das

economias globais dependem da capacidade de produção ou importação de petróleo de cada

país. O consumo de petróleo nos Estados Unidos da América (EUA) em 2003, por exemplo,

foi de 20 milhões de barris por dia o que correspondeu a 40% do consumo primário de energia

(EIA, 2004).

Os sucessivos aumentos do preço do petróleo no mercado mundial, ocorridos a partir

do final da década de 90, as constantes crises políticas e religiosas no oriente médio e a

redução das reservas de hidrocarbonetos de alguns países têm levantado a questão da

segurança energética mundial. Por ser um combustível fóssil, o petróleo é uma fonte de

energia não renovável, dessa forma, o esgotamento das reservas petrolíferas, ou melhor, o

aumento dos custos de extração, tem despertado a atenção para a necessidade de fontes

alternativas de combustível. Nesse contexto a demanda mundial de gás natural, como de

outros combustíveis, vem aumentando consideravelmente nas últimas décadas. Estima-se que

em 2030 a demanda mundial de gás natural será de 5.047 bilhões de metros cúbicos (Bcm)

(EIA, 2002), isto é, mais do que o dobro do consumo de 2001.

O gás natural é um combustível fóssil encontrado em rochas porosas derivado das

transformações químicas e físicas de matérias orgânicas no subsolo. Ele pode ser encontrado

na forma associada ao petróleo ou não. O principal componente do gás natural é o metano,

sendo encontrado muitos poucos componentes poluentes como o dióxido de carbono,

nitrogênio ou compostos de enxofre. A sua combustão é completa, liberando como produtos o

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6

dióxido de carbono e vapor de água, o que faz do gás natural uma energia mais limpa do que

os derivados de petróleo. Além da combustão limpa, o gás natural é menos denso do que o ar,

dissipando-se no caso de um vazamento, e só entra em combustão a temperatura de 620º C,

enquanto outros energéticos como o álcool e a gasolina possuem pontos de combustão iguais

a 200º C e 300º C, respectivamente, o que faz com que seu manuseio seja mais seguro. Em

relação ao petróleo, as reservas de gás natural estão mais bem distribuídas pelo globo, o que é

um fator geopolítico muito importante, já que a substituição de derivados de petróleo pelo gás

natural pode diminuir a dependência de alguns países em relação á importação de petróleo cru

e de seus derivados.

Para fazer frente ao aumento da demanda por gás natural e evitar possíveis crises de

desabastecimento faz-se necessário um grande esforço de investimento, tanto da iniciativa

privada quanto do setor público. Estima-se que o investimento mundial necessário,

acumulado no período de 2001 a 2030, será de $3,1trilhões, ou seja, $105 bilhões por ano

(EIA, 2004). A tabela 1 mostra a estimativa dos investimentos necessários na indústria do gás

mundial. Podemos perceber que cerca de 30% do investimento mundial no setor de gás

natural serão destinados à expansão e manutenção das redes de distribuição, aumentando de 5

milhões de km em 2000 para 8,5 milhões de km em 2030. Só na América Latina, estima-se

que serão gastos $39 bilhões de dólares, ou seja, $1,4 bilhão por ano, na expansão das redes

de distribuição, o que representa 16% do investimento requerido por toda cadeia de gás

natural da região. Esses dados mostram a importância dos investimentos nas redes de

distribuição domésticas. O Brasil, pela sua extensão territorial e importância econômica

dentro do grupo, necessita de grande parte destes recursos, ainda mais quando se compara a

extensão da malha de distribuição nacional (9.261 km em 2004)1 com a de outros países latino

americanos, como a Argentina (124.539 km em 2002)2.

1 Gasnet 2004 2 EIA 2002

7

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Tabela 1 – Investimento Acumulado 2001-2030 por Região e Atividade (Bilhões

de Dólares)

Exploração e

DesenvolvimentoTransmissão e Armazenagem LNG Distribuição Total

Paises OCDE 826 277 102 318 1.523Rússia 187 109 5 32 333Outras Economias em Transição 85 56 0 19 160China 31 29 5 35 100Ásia 168 51 18 31 268América Latina 141 52 21 39 253Oriente Médio 140 65 64 12 281África 153 34 37 3 227Total dos Países Desenvolvidos 633 230 145 120 1.128Total Não-OCDE 905 395 150 171 1.621Total do Mundo 1.731 673 252 489 3.145

Fonte: EIA Outlook Energy Investment 2004

Os investimentos necessários para suprir o crescimento estimado da demanda por gás

natural enfrentam uma série de dificuldades. Os investimentos na indústria do gás como um

todo, necessitam ser feitos anteriormente a materialização da demanda, dessa forma, as

incertezas a respeito das condições de oferta de gás natural, dos preços do mercado e do

ambiente político e regulatório de cada país funcionam como um adicional de risco,

inviabilizando certos projetos. A inflexibilidade física dos segmentos de infra-estrutura de gás

natural cria a necessidade de sincronização dos projetos nas diferentes etapas de produção da

cadeia produtiva, de forma a não criar gargalos. Assim, os investimentos na produção podem

ser inviabilizados pela falta de investimentos nas redes de transmissão e de distribuição, já

que não há como se comercializar o gás produzido.

Dentro da cadeia de gás natural, o setor de distribuição é um dos setores que apresenta

menor risco, principalmente quando a demanda e a oferta podem ser razoavelmente

estimadas, isto porque na maioria dos países, este segmento possui tarifas administradas que

protegem o retorno do investimento. Portanto era de se esperar que o acesso às fontes de

financiamento desta atividade fosse mais fácil. Entretanto, a existência de determinadas

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barreiras aos recursos necessários para a adequada expansão das redes de distribuição tem

retardado o crescimento do consumo de gás natural.

Dessa forma, o presente trabalho irá avaliar os condicionantes dos investimentos no

segmento de distribuição de gás natural no Brasil. A análise da estrutura do setor de

distribuição brasileira indica uma clara diferença entre os níveis de investimentos das

empresas privadas e estatais. Dessa forma o objetivo central do trabalho é verificar se as

diferentes estruturas financeiras, ou melhor, se o padrão de financiamento adotado pelas

diferentes empresas distribuidoras de gás natural é um fator condicionante da baixa

capacidade de investimento das empresas públicas de distribuição e no caso negativo

determinar quais os possíveis condicionantes não financeiros do investimento na expansão

das redes de distribuição.

Assim, o trabalho foi dividido em 4 capítulos além desta introdução e da conclusão. O

primeiro capítulo irá apresentar o referencial teórico escolhido para se analisar os

condicionantes do nível de investimento de uma empresa. A análise será iniciada

introduzindo-se alguns conceitos de finanças corporativas e de determinação de valor de uma

empresa. Posteriormente, será mostrado como se iniciou o estudo teórico dos condicionantes

do investimento, a partir do desenvolvimento das duas proposições de Modigliani e Miller. A

partir deste ponto, serão desenvolvidas as duas teorias escolhidas como referencial teórico de

nossa análise. Assim, serão abordadas, de forma sucinta, a teoria do risco crescente de

Kalecki e a teoria de Minsky sobre os diferentes riscos envolvidos nas operações de crédito. A

revisão bibliográfica feita tem por objetivo servir de base teórica para a análise dos

condicionantes financeiros das empresas de distribuição de gás natural, de forma a servir

como suporte teórico às principais conclusões retiradas do estudo do setor de distribuição de

gás natural brasileiro.

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O segundo capítulo irá mostrar como se deu o desenvolvimento do setor financeiro

brasileiro, qual o modelo de financiamento de longo prazo predominante no Brasil e quais as

principais fontes de recursos para o investimento no setor de infra-estrutura. Nesse sentido

indicaremos as principais instituições financeiras atuantes no Brasil, qual o papel do mercado

financeiro internacional no financiamento dos investimentos e a importância das inovações

financeiras como fontes de recursos de longo prazo. Posteriormente serão analisadas as

características da indústria de infra-estrutura, na qual se insere o setor de distribuição de gás

natural, mostrando quais os principais mecanismos de financiamento utilizados e qual o

melhor padrão de financiamento a ser adotado pelas empresas de acordo com as espeficidades

do setor.

O terceiro capítulo irá analisar o setor de distribuição de gás natural brasileiro.

Inicialmente, serão identificadas as principais características econômicas e regulatórias

associadas ao serviço de distribuição de gás encanado. Nesta parte, serão enfatizadas as

questões dos diferentes custos envolvidos na atividade distribuição, o arcabouço institucional

e regulatório, dando particular atenção aos contratos de concessão, e as economias de escala e

escopo existentes. Posteriormente, a estrutura do setor brasileiro de distribuição de gás será

analisada, identificando-se os principais agentes e indicadores da atividade do setor, o que

deixará clara a diferença entre o nível de desenvolvimento das empresas privadas e estatais.

Por final, se determinará, a partir do balanço patrimonial e do demonstrativo de resultados das

14 maiores empresas do setor, os principais indicadores financeiros, separados entre empresas

privadas e estatais. A análise dos índices de endividamento, da capacidade de endividamento,

da rentabilidade das empresas, como dos índices de liquidez tem por objetivo mostrar que os

bons indicadores das empresas estatais quando comparados com o das empresas privadas,

mostram que as barreiras ao investimento, ou melhor, ao financiamento da expansão das redes

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de distribuição públicas de gás natural não são de origem financeira, o que será melhor

analisado no capítulo 4.

Dessa forma, o capítulo 4 será dividido em três seções, na primeira serão avaliados os

resultados obtidos na análise dos indicadores financeiros a partir do referencial teórico

desenvolvido no capítulo 1, o que irá mostrar que as empresas estatais operam em um ponto

sub-ótimo de endividamento. Esse fato sugere que não é a estrutura financeira das empresas

públicas de distribuição de gás natural que condiciona o baixo investimento do setor. Na

segunda parte do capítulo, as principais barreiras não financeiras ao desenvolvimento das

redes de distribuição de gás natural serão identificadas. Nesta parte, será dada ênfase ao

problema de risco de desabastecimento, à falta de uma política energética integrada e ao

contingenciamento de crédito imposto pela resolução 2827 do Banco Central do Brasil

(BACEN) ao setor público. Por último, serão propostas, a partir dos problemas identificados

ao longo do trabalho, algumas recomendações para o desenvolvimento do setor de

distribuição de gás natural no Brasil.

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Capítulo 1- Principais Correntes Teóricas Sobre o Investimento

O objetivo deste capítulo é analisar os principais referenciais teóricos a respeito da

influência do padrão de financiamento escolhido por uma empresa sobre o risco financeiro e

consequentemente sobre os custos diretos e indiretos associados ao aumento da participação

do capital de terceiros. Com esta finalidade, irá se desenvolver introdutoriamente a

abordagem feita pela teoria de finanças corporativas sobre os padrões de financiamento

utilizados pelas empresas. Em seguida, serão expostas, de forma sucinta, as duas proposições

da teoria de Modigliani e Miller, tratadas daqui para frente com MM.

Partindo da negação, feita pelas teorias de finanças corporativas, às duas proposições

MM, mostraremos que diferentes padrões de financiamento afetam de forma diferenciada o

valor das empresas. Os autores contrário às proposições MM defendem que as empresas

deveriam usar tanto capital de terceiros quanto possível. Contudo, este fato não se verifica na

prática já que as empresas em geral apresentam níveis de endividamento moderados. Dessa

forma, buscou-se mostrar argumentos teóricos que explicassem o uso moderado de capital de

terceiro. Assim escolheu-se a teoria do risco financeiro crescente, desenvolvida por Kalecki,

em conjunto com a teoria desenvolvida por Minsky, a respeito da diferença de risco existente

entre o tomador de empréstimo e as instituições credoras.

A finalidade deste desenvolvimento teórico será mostrar como a estrutura financeira,

isto é, o padrão de financiamento adotado por uma empresa, condiciona seus níveis de

investimento. Ou seja, como a elevação dos riscos financeiros associados ao aumento da

participação do capital de terceiro, ou em outras palavras, ao aumento do índice de

endividamento, afeta o acesso das firmas aos recursos necessários para a expansão de suas

atividades. Assim, utilizaremos o referencial teórico desenvolvido nesse capítulo para

verificar se a estrutura financeira das empresas distribuidoras de gás natural, principalmente

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das estatais, tem condicionado os baixos níveis de investimento na expansão da capacidade de

distribuição.

1.1 Pode a decisão de financiamento de uma firma criar valor? Uma abordagem de finanças corporativas.

As empresas possuem quatro fontes básicas de financiamento de longo prazo: ações

ordinárias, ações preferenciais, dívidas de longo prazo e capital próprio (lucro retido). Além

dessas fontes tradicionais de financiamento de longo prazo, ainda existem outros tipos mais

complexos como debêntures conversíveis e arrendamento. A escolha do padrão de

financiamento adequado ao tipo de investimento a ser executado é fator determinante da

decisão de se investir ou não. Dessa forma, a estrutura de oferta das diferentes fontes de

financiamento é um condicionante fundamental para os investimentos com longos prazos de

maturação.

1.1.1 Fontes básicas de financiamento:

1.1.1.1 Ações ordinárias

São ações emitidas pelas empresas sem qualquer preferência de pagamento de

dividendos ou ressarcimento em caso de liquidação. Os titulares de ações ordinárias

denominam-se acionistas da empresa e possuem um certificado representando as ações que

possuem. Geralmente, os certificados possuem um valor estipulado chamado de valor nominal

das ações. A diferença entre o valor nominal das ações e o valor pelos quais as ações são

vendidas no mercado é o que se chama de ágio de venda. As ações ordinárias representam a

unidade básica das empresas anônimas, dessa forma o estatuto deve conter a quantidade de

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ações ordinárias autorizadas, que não necessariamente deve ser igual à emitida, tendo que ser

apenas menor do que esse valor3.

É importante enfatizar a diferença entre o valor patrimonial das ações, o valor de

mercado e o valor de reposição do ativo. O valor patrimonial é dado pela razão entre o

patrimônio liquido da empresa e o número de ações existentes no mercado (logo, deve-se

deduzir o numero de ações retidas pela empresa na tesouraria), o valor de mercado é o preço

pelo quais as ações estão sendo negociadas na bolsa de valores, enquanto que o valor de

reposição é o custo corrente estimado de reposição dos ativos da empresa. Como exemplo,

podemos ter o valor patrimonial por ação igual à R$14,65 e o valor de mercado entre $35 e

$42 (preços negociados na bolsa de valores). Dois indicadores importantes sobre a avaliação

do mercado sobre a qualidade dos investimentos é a razão Valor de mercado/valor

patrimonial e o Q de Tobin (valor de mercado/valor de reposição). Quando esses indicadores

possuem valores maiores do que 1 significa que as empresas estão sendo bem avaliadas pelo

mercado.

1.1.1.2 Ações Preferenciais

Como as ações ordinárias, representam capital próprio da empresas com a diferença de

ter preferência quanto ao pagamento de dividendos e de ativos no caso de liquidação da

empresa. Uma ação preferencial estipula o valor do dividendo a ser pago periodicamente,

sendo que as empresas não possuem a obrigação desse pagamento. A única restrição é que os

acionistas ordinários só poderão receber algum dividendo após o pagamento aos acionistas

preferenciais. Se os dividendos forem acumulativos, no ano em que se paga dividendos deverá

ser pago todos os dividendos dos anos anteriores não pagos. Uma ação preferencial,

3 As empresas podem reter uma parte das ações ordinárias em tesouraria.

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geralmente, não tem direito a voto, mas se por um determinado tempo não for pago nenhum

dividendo aos acionistas preferenciais esses passam a ter esse direito.

1.1.1.3 Dívidas de longo prazo ou títulos de dívidas

Outra forma de financiamento é a utilização de capital de terceiros. Chama-se

empréstimo o tipo de contrato que determina o pagamento de juros regulares e do principal

em um determinado período. As dívidas correspondem ao passivo exigível da empresa, isto é,

a empresa pode deixar de pagar a qualquer momento as suas obrigações devendo entregar,

contudo, seus ativos aos credores, incorrendo, assim, em risco de falência. As dívidas não

representam participação no capital da empresa não dando direito a voto. O pagamento de

juros por empréstimos adquiridos é dedutível do imposto de renda enquanto o pagamento de

dividendo não, o que implica em um subsídio do governo para a captação de recursos de

terceiros. Existem quatro tipos básicos de títulos de dividas; temos as chamadas debêntures,

obrigações, notas e consols. As debêntures são dívidas não garantidas, isto é não dão direito a

hipoteca dos ativos enquanto as obrigações são dívidas garantidas dando direito à

exigibilidade de ativos em face do não cumprimento do pagamento dos juros ou do principal.

Notas são dividas de curto prazo muitas vezes inferiores a sete anos. Alguns títulos de dívidas

são perpétuos não havendo período para pagamento de seu principal, esses títulos são

conhecidos como consol.

Um título de dívida possui geralmente um valor de face, o qual a empresa se

compromete a pagar na data do vencimento. Esses títulos são normalmente vendidos com

deságios, isto é, a um preço inferior ao preço de face. A taxa de juros paga pelos títulos é

determinada como uma porcentagem do valor nominal ou de face desses.

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Uma empresa pode saldar suas dívidas antes do vencimento dos títulos, chama-se isso

de resgate antecipado. Um título de dívida possui um valor predeterminado para resgate

antecipado, sendo estipulado um período de carência no qual não se pode fazer o resgate.

1.1.1.4 Autofinanciamento

As empresas poderão financiar seus investimentos por meio da geração interna de

recurso, isto é, através do lucro retido nos exercícios passados. Muitas vezes as empresas

formam reservas, seja em moeda corrente ou em títulos. Estas reservas servem para cobrir

eventuais necessidades decorrentes das imprevisibilidades do mercado. Esta margem de

segurança, como se mostrará adiante, reduz o risco dos empréstimos tomados reduzindo seu

custo financeiro. Assim, as empresas possuem uma capacidade limitada do uso dos lucros

retidos como fonte de financiamento.

1.1.2 Padrões de Financiamento

Reconhece-se como padrão de financiamento a escolha das diferentes opções de

financiamento dos gastos das empresas. Tradicionalmente existem três fontes distintas de

recursos: financiamento interno, financiamento com dívidas e financiamento com capital

próprio externo. Os recursos disponíveis para o financiamento interno são derivados dos

lucros retidos mais a depreciação menos os dividendos. O financiamento com dívidas está

associado aos empréstimos captados, enquanto o financiamento com capital próprio externo

nada mais é do que a emissão de novas ações. Historicamente, tem-se que o financiamento a

partir da emissão de novas ações representa uma parcela pequena da estrutura de

financiamento das empresas. A opção mais utilizada é a geração interna de recursos. A

participação de cada forma de financiamento depende, contudo, do comportamento da

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economia e do setor analisado. Esta hierarquização das formas de financiamento, onde a

utilização de recursos internos predomina sobre o endividamento que por sua vez predomina

sobre a emissão de ações, é conhecida na teoria das finanças corporativas como packing

order. Na prática, esta hierarquização das formas de financiamento não aparece tão definida.

Em períodos de crescimento econômico, vemos uma maior participação dos recursos internos

dado que os lucros das empresas nesses períodos crescem mais rapidamente do que a

necessidade de capital o que não acontece em períodos de recessão. Alguns autores não

acreditam que aja uma hierarquização das formas de financiamento, mas sim uma composição

ótima que maximiza o valor da empresa.

1.1.3 Estrutura de Capital (Teoria de Modigliani e Miller, 1958)

Uma das questões fundamentais para uma empresa é determinar sua estrutura de

capital ótima, isto é, qual a melhor proporção ente capital de terceiro e capital próprio. Na

teoria de finanças corporativas, define-se como valor da empresa a soma dos direitos

financeiros sobre esta, isto é a soma do valor das dívidas e ações. O administrador financeiro,

dessa forma, deve procurar uma estrutura de capital que maximize o valor da empresa (V),

onde V = B + S, sendo (B) o valor de mercado das dívidas e (S) o valor de mercado das ações.

Apesar das inúmeras teorias a respeito do conflito de interesse entre a gerência da

empresa e seus proprietários (acionistas) considera-se aqui, que o principal objetivo do

administrador financeiro de uma firma é maximizar o valor do acionista. A maximização da

riqueza dos acionistas não se restringe a maximização do valor a que lhe pertence. A estrutura

de capital que maximizar a riqueza dos acionistas, dessa forma, é aquela que maximiza o

valor total da empresa (V).

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Partindo do pressuposto acima, a pergunta que se faz é qual a estrutura de capital

ótima, isto é, qual a estrutura de capital que maximiza o valor da empresa e, por conseguinte,

a riqueza dos acionistas. Para Modigliani e Miller, na ausência de impostos e de qualquer

imperfeição de mercado4, não se pode mudar o valor da empresa alterando sua estrutura de

capital, isto é, Vl = Vu, onde (Vl) é o valor da empresa quando se utiliza tanto capital próprio

quanto de terceiros e (Vu) é o valor da empresa quando se utiliza somente capital próprio. Em

outras palavras, nenhuma estrutura de capital é melhor ou pior do que outra para os acionistas.

Esse resultado é a famosa proposição I de MM5. Mostraremos a seguir como Modigliani e

Miller chegaram a esse resultado.

Deve-se lembrar que o objetivo da gerência da empresa é maximizar a riqueza do

acionista, ou em outras palavras, o valor (V) da empresa. Em um ambiente sem impostos e

sem nenhuma imperfeição de mercado o valor da empresa ou a riqueza do acionista, como se

queira, independe da escolha da estrutura de financiamento por esta utilizada. Vejamos: Duas

empresas idênticas em todos os sentidos exceto no que diz respeito a sua estrutura de capital.

Empresa A Empresa B Va ? Vb R$ 1.000,00 Ba R$ 500,00 Bb R$ 0,00 Sa ? Sb R$ 1.000,00 Rb R$ 0,10

Onde (Va) e (Vb) são os valores totais das empresas A e B respectivamente, (Ba) e

(Bb) são os valores do capital de terceiros de cada empresa, (Sa) e (Sb) são os valores do

capital próprio e (rb) é o custo do capital de terceiros ou em outras palavras a taxa de juros do

4 Entende-se como imperfeições de mercado a existência de assimetria de informação, custos de transação entre outros fatores. 5 MODIGLIANI, F., MILLER, M The cost of Capital, corporation finance and the theory of investment. American Economic Review, Junho 1958.

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empréstimo. Inicialmente não se conhece o valor do capital próprio da empresa A, logo não se

conhece o valor total da empresa.

Um investidor ou acionista que desejar fazer uma operação de arbitragem possui as

seguintes opções de escolha:

a) comprar 10% das ações da empresa B esperando receber 10% de retorno sobre o

lucro esperado Y, ou;

Estratégia I Investimento 0,10 X R$ 1.000 = R$ 100 Retorno Esperado = 0,10 Y = 0,10 VB

b) comprar 10% das ações da empresa A, sendo que Sa no momento é uma

variável desconhecida, esperando receber 10% sobre o lucro esperado, sendo que

nesse caso o lucro líquido será (Y) menos o custo financeiro do capital de terceiros

que é igual a (rb.Ba), ou;

Estratégia II Investimento = 0,10 x Sa Retorno Esperado = 0,10 X ( Y- rb.Ba) = 0,10 x (Va - Ba)

c) o investidor ou acionista toma emprestado um valor igual a 10% do

capital de terceiros da empresa A (0,10.Ba), a uma taxa de juros igual a rb = 10%

que juntando com seus recursos próprios irá utilizar para comprar 10% das ações

da empresa (B), isto é 0,10 Vb = 0,10 Sb.

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Estratégia III Investimento - 0,10.Ba Retorno Esperado - rb.(0,10.Ba) + 0,10.Vb + 0,10 x Y = 0,10 x (Vb - Ba) = 0,10 x (Y - rb.Ba)

Comparando as estratégias II e III, vemos que os retornos esperados de ambas as

estratégias são iguais a 0,10 x (Y – rb.Ba). Na estratégia II, o investidor recebe 10% do lucro

liquido de uma empresa com capital de terceiro, enquanto na estratégia III o investidor recebe

10% do lucro de uma empresa sem capital de terceiros menos o que ele deve pagar com juros

decorrentes do empréstimo pessoal feito. Como os retornos totais das duas estratégias são

iguais, então os custos também devem ser iguais, logo temos que 0,10 x (Va – Ba) = 0,10 x

(Vb – Ba). Assim, temos que Va igual à Vb. Dessa forma, demonstra-se que não havendo

incidência de impostos e desde que se possa obter empréstimo a mesma taxa que o custo de

capital de terceiros da empresa, não importa, para o problema de maximização da riqueza do

acionista, se o endividamento é feito pela empresa ou pelo próprio acionista. Isto nos leva a

proposição I da MM em que o valor da empresa independe da estrutura de capital.

A segunda proposição da MM afirma que, em um ambiente sem imposto, a taxa de

retorno exigida pelo capital próprio (ou de outra forma o custo do capital próprio) está

diretamente relacionada com o endividamento da empresa, pois o risco do capital próprio se

eleva com o endividamento, já que agora existem credores a serem pagos.

Sendo rs o custo de capital próprio, r0 igual ao custo do capital próprio sem a utilização

de capital de terceiros e rb o custo de capital de terceiros.

No caso da incidência de imposto de renda, Modigliani e Miller reconhecem que o

padrão de financiamento utilizado afeta o valor da empresa. Dessa forma, temos que o valor

rs = r0 + B/S(r0 – rb)

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da empresa, quando se utiliza capital de terceiros, é proporcional ao grau de endividamento.

Isto porque o custo do capital de terceiros pode ser deduzido do imposto de renda enquanto o

custo de capital próprio (pagamento de dividendos) não.

No caso da proposição II da teoria MM, a incidência do imposto mantém a correlação entre o

custo do capital próprio (rs) e o nível de endividamento (B/S) sendo que nesse caso há um

fator de redução desta proporcionalidade (1-Tc), onde Tc é a alíquota do imposto de

renda.

Conclui-se a partir das duas proposições da teoria de Modigliani e Miller que em

ambiente com ausência de imposto de renda e imperfeições de mercado e onde cada indivíduo

consiga captar recursos à mesma taxa do que uma pessoa jurídica, a estrutura de

financiamento de uma empresa não afeta seu valor. Com a incidência de imposto, contudo,

Modigliani e Miller mostram que a utilização de capital de terceiro é preferível à utilização de

capital próprio, pela possibilidade de dedução do custo do capital de terceiros do imposto de

renda.

Embora a introdução do imposto na análise da MM aproxime seu resultado do que

efetivamente ocorre na prática, a preferência pelo endividamento não parece ser uma

característica da administração financeira das empresas, já que a análise da estrutura de

financiamento mostra níveis moderados para baixo de endividamento.

Dessa forma, quais seriam os fatores não abordados pela teoria de Modigliani e Miller

(1958) que explicariam os padrões de financiamento das empresas? Nesse sentido, irá se

rs = r0 + B/S(r0 – rb).(1-Tc)

Vl = Vu + T.B

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analisar a teoria do custo financeiro crescente, desenvolvida por Kalecki, e

complementarmente a teoria do investimento de Minsky.

O risco de dificuldade financeira está associado à obrigação jurídica que a empresa

tem em relação ao pagamento de juros e amortização de empréstimos, com a penalidade de

perda de seus ativos. Como vimos anteriormente, o pagamento de dividendos não é uma

obrigação jurídica da empresa, isto é, não gera risco de falência.

O efeito negativo que o risco de falência exerce sobre o valor da empresa não está

associado com o risco em si, mas sim com os custos associados a esta falência, como o custo

jurídico.

O que se pode ver é que existe uma integração dos efeitos fiscais e dos custos de

dificuldades financeiras. Os benefícios fiscais advindos da utilização do capital de terceiros

são contrabalanceados pelo aumento dos custos de dificuldades financeiras decorrentes de um

aumento do endividamento das empresas.

1.2 Conceito de Risco Financeiro Crescente

Kalecki em sua obra “Teoria da Dinâmica Econômica” (1954) analisa quais são os

condicionantes da decisão de investir de uma firma. Contrário da visão de muitos economistas

que acreditam existir uma democracia econômica onde qualquer pessoa com as qualidades

técnicas e a vontade de investir poderia obter capital para iniciar uma atividade produtiva,

Kalecki defendia que a capacidade de investimento de uma firma está relacionada com a

propriedade de capital. Esta propriedade de capital não se resume, contudo, a capacidade de

formação de poupança das firmas, mas engloba também, a poupança pessoal dos membros do

grupo controlador.

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Partindo desta visão, desenvolve-se o conceito de risco financeiro crescente, que

iremos analisar a seguir. Muitos autores associam o comportamento dos mercados como fator

de limitação ao crescimento de uma firma. Embora tal hipótese apresente um grande apelo

empírico, já que muitas vezes são as limitações impostas pelo mercado que determinam as

taxas de crescimento das firmas, ele não explica a diferença entre o tamanho de firmas dentro

de um mesmo mercado. A teoria do risco crescente contribui nesse sentido para explicar tais

diferenças.

A capacidade de expansão dos negócios de uma firma está associada à taxa de

investimento, tanto em reposição quanto em novos investimentos. Esta capacidade de investir,

por outro lado, está associada à capacidade de geração interna de recursos e ao acesso destas

firmas às formas de financiamento de longo prazo existentes, incluindo mercado de capitais e

o sistema financeiro. Partindo desse pressuposto, o que irá determinar o acesso destas firmas

ao capital de terceiros? A resposta é a capacidade de autofinanciamento da firma.

Por exemplo, uma firma que tente captar recursos a partir da emissão de ações6

desproporcional ao seu capital, não conseguirá uma subscrição total, mesmo prometendo

dividendos mais altos, já que esta própria promessa poderá levantar dúvidas quanto à

capacidade de pagamento desses dividendos. Caso esta empresa tentasse captar esses recursos

por meio de títulos de dívidas, teria que oferecer juros muito elevados, que acabariam por

comprometer a aceitabilidade desses títulos, já que aumentariam o risco de insolvência da

empresa ao aumentar a probabilidade de ocorrência de dificuldades financeiras.

Assim, a capacidade de financiamento de uma empresa está relacionada com o seu

capital. Na realidade, o que se verifica é que as empresas limitam seus investimentos a um

nível mais baixo que seu capital permitiria. Isto decorre do fato de que quanto maior a

proporção do capital da empresa alocado em investimento maior o risco de retorno do

6 Nesse sentido Kalecki considera o financiamento por emissões de ações com recursos de terceiros.

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empréstimo no caso de fracasso do projeto financiado, seja por uma redução dos dividendos7

seja por um risco de não pagamento das dividas, isto é o que se chama na literatura econômica

de risco financeiro crescente.

A diferença de tamanho entre firmas de um mesmo segmento é explicada, dessa

forma, em termos do capital de cada empresa. Isto se agrava pelo fato de que empresas com

volume de capital muito baixo não têm, tão pouco, acesso ao mercado de capitais.

O que se tentou mostrar é que a capacidade de expansão de uma firma depende da sua

acumulação de capital a partir de lucros correntes. Esse fato permite que a firma enfrente os

problemas impostos pelo mercado de capitais limitado e pelo “risco crescente”. O acúmulo de

capital serve tanto para financiar novos investimentos como para facilitar a captação de novos

empréstimos, seja diminuindo o risco da emissão de novas ações e aumentando o mercado

para esses papéis, seja aumentando a garantia de recebimento de juros e do principal de novos

empréstimos.

1.2.1 Os Determinantes do Investimento

As decisões de investir, segundo Kalecki, seguem-se com um hiato temporal do

investimento efetivo. Esse lag temporal relaciona-se tanto com o tempo necessário para a

construção de novos fatores produtivos como também com as decisões de investimento.

Existe um ponto em que os novos investimentos em capital fixo deixam de ser lucrativos, seja

por uma limitação do mercado para esses produtos, seja por motivos de risco crescente e

limitações do mercado de capitais, como visto anteriormente. A partir desse ponto, somente

7 Alguns autores afirmam que o limite de emissão de ações só se daria no caso de ações preferenciais devido ao risco de não recebimento de dividendos, mas que a emissão de ações ordinárias não apresentaria limites. Este fato não é realista já que os controladores da empresa possuem alguns incentivos para não emitirem de forma indiscriminada ações deste tipo. O primeiro deles é manter o controle acionário da empresa, o segundo é a redução dos dividendos do grupo controlador caso o rendimento do novo investimento não acompanhe as novas emissões de ações, o que aumenta o risco crescente e por ultimo a limitação que o próprio mercado de capitais impõe a emissão de novas ações ordinárias.

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mudanças na situação econômica serão capazes de estimular novos investimentos. Estas

mudanças podem ocorrer de duas formas; primeiro por meio de uma acumulação bruta de

capital pelas firmas, decorrente de lucros do período corrente, segundo, através de uma

mudança da taxa de lucros em função de modificações nos lucros correntes em conjunto com

modificações no estoque de capital.

Partindo das hipóteses de mercado de capitais limitado e risco crescente, Kalecki

deriva os condicionantes do investimento. Como se mostrou acima, a decisão de investir

depende da poupança bruta da empresa8, ao reduzir o problema de risco financeiro crescente e

aumentar a capacidade de autofinanciamento. Assim a taxa de variação do investimento

(∆I/∆t) é uma função crescente da taxa de formação da poupança bruta S.

Além da poupança bruta, o aumento do lucro em função da unidade de tempo torna

certos projetos atraentes, o que não ocorreria com uma taxa de lucro menor. Assim uma taxa

de lucro mais elevada permite a escolha entre uma gama maior de projetos. A decisão de

investir, dessa forma, é uma função crescente da variação da taxa de lucro (∆π/∆t).

Outro fator condicionante é o investimento de capital em equipamentos ou ativos

fixos. Isto é, um aumento do estoque de capital fixo (∆K/∆t), sem uma mudança nos

rendimentos, reduz a taxa de retorno sobre o capital fixo aumentando o risco financeiro da

empresa. Assim um aumento do investimento em equipamentos não acompanhado por um

aumento das receitas atua de forma negativa na decisão de novos investimentos, já que reduz

a lucratividade sobre o capital investido. A partir disso chegamos a seguinte fórmula:

∆I/∆t = S + b(∆π/∆t) - c(∆K/∆t) + d

8 Entende-se como poupança bruta da empresa o lucro não distribuído mais a depreciação e mais a poupança pessoal do grupo controlador.

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O que se tenta mostrar com a teoria do custo financeiro crescente é que os

investimentos de uma firma são limitados por sua capacidade de acumulação de capital, em

outras palavras, pela capacidade de geração de lucro. O processo de acumulação de capital

atua tanto no autofinanciamento, limitando os recursos próprios, quanto nos custos diretos e

indiretos da captação de recursos de terceiros. Esse aumento dos custos de capital está

associado ao aumento do risco de crédito gerado por uma razão divida/capital elevada, o que

limita a capacidade de endividamento das empresas.

A acumulação de capital ou lucro retido pela empresa como foi mostrado por Kalecki

é de extrema importância para a determinação do nível de investimento de uma empresa.

Contudo, na maioria das vezes, os recursos acumulados não são suficientes frente às

necessidades de investimento, ainda mais quando se considera as reservas de segurança

necessárias para viabilizar o financiamento por meio de capital de terceiros.

Minsky (1975) irá mostrar que o nível de investimento de uma empresa irá depender

tanto do lucro gerado pelos ativos de capital no período passado quanto pela capacidade de

endividamento da empresa, o que não acrescenta nenhuma novidade ao que foi visto até o

presente momento. A grande inovação do autor é considerar que a capacidade de

endividamento está condicionada á existência de duas classes de risco, uma referente ao risco

do tomador do empréstimo e a segunda referente ao risco do emprestador ou credor. Dessa

forma, irá se analisar a teoria do investimento desenvolvida por Minsky de maneira a

complementar a teoria do risco crescente desenvolvida por Kalecki.

∆I/∆t - Variação do investimento no tempoS - Poupança Bruta

∆π/∆t - Variação da taxa de lucro ∆K/∆t - Variação do estoque de capital

A - Parâmetro B - Parâmetro C - Parâmetro D - Parâmetro

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1.3 Risco do Credor X Risco da Firma

Partindo de uma visão Keynesiana sobre o investimento, Minsky vai desenvolver sua

teoria explicando as flutuações do nível de produto, que é uma variável real, a partir do

comportamento de variáveis monetárias.

O lado real vai afetar o investimento de duas maneiras. Primeiramente o investimento

em capital objetiva os fluxos de renda gerados por esse investimento ao longo da vida útil do

equipamento, Q1, Q2, Q3,... Qn. Ou seja, a decisão de investir depende dos fluxos de renda

esperados do novo investimento. Por outro lado esses fluxos de renda esperados vão depender

da relação técnica entre insumo e produto e do comportamento do mercado ao longo da vida

útil do bem de capital. Dessa forma, pode se notar que a decisão de investimento depende em

grande parte das expectativas quanto ao comportamento futuro da economia.

A segunda maneira pela qual o lado real afeta o investimento é através do preço de

oferta de um bem de capital. Esse preço não é o preço de mercado aos quais os bens de capital

são negociados, mas sim o preço necessário para induzir o empresário a produzir uma unidade

adicional do bem de capital.

Na visão de Minsky, o aumento do investimento em um determinado bem de capital

irá criar uma pressão de demanda sobre o mercado desse bem que irá elevar seu preço de

oferta. Além disso, esse aumento do investimento irá acabar por aumentar a oferta dos bens

produzidos por esse bem de capital, o que irá reduzir seu preço de demanda ao reduzir os

fluxos de rendimentos esperados.

Segundo a teoria de investimento Minskiana, o empresário irá aumentar seu

investimento até o ponto onde o fluxo de rendimento descontado irá se igualar ao preço de

oferta do bem de capital, isto é, onde o preço de demanda iguala-se ao preço de oferta. A

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questão que se segue é determinar qual taxa de desconto utilizar. É nesse ponto que se faz o

link entre as flutuações das variáveis reais e as variáveis monetárias.

O preço de oferta do bem de capital costuma ser estável ao longo do tempo, assim as

flutuações do investimento devem ser explicadas por variações nas seguintes variáveis:

a) nos retornos esperados, o que reflete as expectativas dos agentes quanto ao futuro;

b) na taxa de juros;

c) na ligação entre o fator de capitalização dos retornos esperados e a taxa de juros

dos empréstimos ou dívidas.

Segundo Minsky, o método dos fluxos capitalizados de rendimento quando

devidamente interpretados nos permite visualizar de forma clara a influência tanto da variação

do fluxo de rendimentos do ativo de capital quanto da variação da relação entre o valor

presente dos rendimentos e a taxa de juros dos empréstimos monetários sobre os

investimentos. Além disso, esse método segundo o autor, é a forma mais natural de se

introduzir o conceito de incerteza e de grau de aversão ao risco.

Segundo Minsky o preço de demanda de um bem de capital (PK) é determinado pelo

fluxo de rendimento esperado e pelo fator de desconto (Ci), ou seja, o valor de demanda é o

valor presente do fluxo de rendimento descontado a uma taxa Ci.

PKi = Ci.(Qi)

Na existência de um mercado perfeito de capitais, onde os recursos financeiros para

investimento estão disponíveis sem limites e independe do volume requisitado, o preço de

demanda Pk vai iguala-se ao preço de oferta Pi, e como Pi é uma função do investimento, esse

também será determinado a partir desta igualdade.

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A questão que se sucede é determinar o fator de desconto Ci. Para isto se supõe que a

taxa de juros, que é o preço da moeda hoje em termos de moeda futura, é dada. O preço de um

contrato de empréstimo de moeda é igual a Pl = Cl.(CC), onde Cl é a taxa de desconto para

empréstimos de moeda e CC é o fluxo de pagamento de um ativo sem risco. A relação entre

Ci e Cl vai depender da valoração da segurança dos rendimentos do ativo de capital (Qi) em

relação à CC. Assim, para um dado estado de incerteza, Ci = µCL onde 0< µ <1. Uma

mudança do estado de incerteza irá mudar µ e dessa forma a relação entre Pk e Pl.

1.3.1 A Estrutura do Passivo (das dívidas) e a Evolução do Investimento da Firma

Minsky reconhece que Keynes, embora não tenha entrado em detalhes a respeito de

como as finanças afetam o comportamento do sistema, reconhece que em um mundo com

credores e tomadores de empréstimos o sistema financeiro exerce grande influência sobre as

flutuações do produto. Ele reconhece a existência de dois tipos de risco, um por parte do

empresário, que está associado com a probabilidade dos retornos sobre os investimentos feitos

não serem compatíveis com suas expectativas, e outro por parte do credor, que está associado

com a probabilidade de não recebimento dos juros e do principal. Esse segundo risco deve-se

à existência de risco moral (moral hazard), de imperfeições no sistema jurídico e do próprio

risco do empreendimento financiado.

As firmas, como foi visto anteriormente, utilizam-se de empréstimos, debêntures e

emissões de ações como forma de financiamento para seus investimentos. Dessa forma, em

contra partida aos fluxos de retornos advindos dos investimentos realizados, as firmas

possuem obrigações financeiras em adição as suas dividas operacionais. Exceto no caso das

ações, as obrigações financeiras envolvem relações contratuais com penalidades ao não

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pagamento das dívidas contraídas. No caso das ações o não pagamento de dividendo acarreta

apenas em uma diminuição do preço de mercado destas.

A firma pode se financiar por meio de capital próprio ou através de capital de

terceiros9. O problema que um administrador financeiro enfrenta é compor a estrutura de

financiamento dos investimentos requeridos pela firma, isto é, quanto de capital próprio e

quanto de capital de terceiro devem ser utilizados para financiar suas necessidades de

expansão e reposição. Esta decisão dependerá do tamanho da firma (que pode ser mensurado

pelos ativos de capital ou pelas vendas) e da sua taxa de crescimento10.

Vamos supor que uma firma representativa possua um lucro bruto11 igual à Qî, que o

preço de oferta dos bens de capital seja Pi e que esse preço Pi seja independente do

investimento da firma. Nesse caso, o volume de investimento capaz de ser financiado pelo

capital próprio da firma vai ser igual Î = Qî/Pi, como pode ser visto no gráfico 1.

Gráfico 1 – Comportamento Financeiro de Uma Firma Representativa

Fonte: Elaboração Própria

9 A emissão de novas ações é considerada um financiamento a partir de capitais de terceiros. 10 Está afirmação aproxima-se bastante da exposta por Kaleki, ao afirmar que a capacidade de investimento de uma firma esta diretamente associada com sua propriedade de capital. 11 Lucro depois dos impostos, dividendos e juros.

I Î

Pi

Î1

PI, PK

A

30

30

Caso a empresa resolva investir Î ao preço de oferta Pi então ela poderá financiar todo

o investimento através de recursos próprios, caso a empresa resolva investir Î1 > Î, ao mesmo

preço de oferta Pi, então ela deverá incorrer em dívidas, já que o ponto A está fora da curva

Qî. Contudo, é comum em ambiente de incerteza, que as empresas mantenham reservas

monetárias ou de ativos financeiros de forma a se protegerem do comportamento imprevisível

dos mercados. Esse excesso de caixa pode ser usado para financiar a diferença entre Pi. Î1 e

Qî. Conforme esta reserva vá diminuindo, aumenta-se o grau de exposição da firma, isto é,

diminui a margem de segurança financeira.

Segundo Minsky, o investimento irá aumentar até o ponto onde o preço de oferta do

bem de capital se iguale ao preço de demanda desse bem. Considerando que o lucro bruto Qî

é gerado a partir de um fluxo de recebimento Qi, temos que o preço de demanda Pk será

determinado a partir do valor presente desse fluxo de receita.

O lucro bruto gerado no período só permite um nível de investimento igual a Î. Como

foi visto anteriormente, nem sempre esse nível de investimento é o desejado pela empresa.

Nesse caso, a firma terá que recorrer aos recursos de terceiros. Como se demonstrará a seguir,

existe um limite ao endividamento da empresa que será dado pela existência de riscos

crescentes tanto para o tomador de empréstimo quanto para o credor.

1.3.2 Risco do Tomador de Empréstimo

O risco do tomador de empréstimo apresenta duas componentes. Primeiramente, em

um mundo com incertezas a respeito do destino dos investimentos realizados, o grau de

aversão ao risco não é uma variável fixa. Isto é, existe um ponto a partir do qual o incremento

de ativos de capital aumenta a aversão ao risco das firmas o que acarreta em uma diminuição

do fator de capitalização, ou em outras palavras, em um aumento da taxa de retorno exigida.

31

31

A segunda vertente, é que desde que, as firmas (tomador de empréstimo) considerem

os fluxos de débitos como certos e os retornos esperados como incertos, conforme aumenta o

investimento financiado por dívidas diminui-se a margem de segurança e exigi-se um retorno

maior sobre o ativo de capital, reduzindo o fator de capitalização.

Assim, a existência do risco para o tomador de empréstimo irá reduzir o preço de

demanda (PK) do ativo de capital a partir de certo volume de investimento, devido a uma

diminuição do fator de capitalização decorrente da exigência de taxas de retornos mais

elevadas12, como pode ser visualizado no gráfico 2.

Gráfico 2 – Risco do Tomador de Empréstimo

Fonte: Elaboração Própria

1.3.3 Risco do Credor

O risco do credor não aparece de forma explicita nos contratos de financiamento. Para

qualquer conjunto de condições de mercado o risco de credor toma a forma de exigências

crescentes nos fluxos de pagamentos dos contratos de financiamento. Isto aparece nos 12 Considera-se que não há mudança no fluxo de rendimento Qi.

I Î

PI

Î1

PK

Risco do tomador Curva PK

32

32

contratos financeiros das mais variáveis formas; taxas de juros mais altas, prazos menores de

financiamento, exigência de garantias, restrição quanto ao pagamento de dividendos e quanto

à captação de novos empréstimos.

O risco do credor cresce conforme a razão entre os fluxos de pagamentos e os fluxos

de rendimentos aumenta. O risco de credor de fato é a probabilidade desse em não receber os

juros e o próprio principal do empréstimo feito.

A existência de risco para o credor vai fazer com que o preço de oferta de um ativo de

capital não seja exatamente o valor que induz o produtor a oferecer uma unidade adicional

daquele ativo. O preço de oferta de fato vai ser o preço necessário para o produtor oferecer

esse bem mais uma “taxa de risco” representada pelos custos das exigências presentes nos

contratos de empréstimos. Esse valor adicional é dado pela diferença entre os fluxos de

exigências financeiras decorrente de contratos de financiamento em relação aos fluxos

implícitos de exigências decorrentes do financiamento interno. Isto é, quando maior for o

nível de endividamento da firma em relação ao financiamento através de recursos próprios

maior será o valor desta taxa de risco. Dessa forma, a partir de um ponto a direita de Î (total

de investimento capaz de ser financiado por recursos próprios) a curva PI (preço de oferta)

sofre uma descontinuidade e passa a ter um comportamento crescente em função do aumento

de I, como podemos ver no gráfico 3. Como a razão de débito contratual aumenta, todos os

outros débitos terão que se comportar como o contrato marginal, assim é a curva de risco

marginal e não a curva de risco do credor que é usada como ferramenta de decisão.

33

33

Gráfico 3 – Nível de Investimento da Firma

Fonte: Elaboração Própria

Deve-se atentar para o fato que tanto o risco do tomador quanto o risco do credor são

variáveis subjetivas que dependem do julgamento de cada individuo. A interseção entre a

curva do preço de demanda, que reflete o risco do tomador ou da firma, com a curva do preço

de oferta, que reflete o risco do credor, nos dar o nível de investimento que será possível ser

financiado a partir dos recursos próprios e de terceiros (I1), como pode ser visto no gráfico 3.

Embora a curva de risco do credor apresente um comportamento crescente, o preço de oferta

do bem de capital continua sendo PI, assim, o aumento da curva se dá pelo aumento da taxa de

segurança exigida pelos credores, dessa forma, temos que o valor total do investimento será

dado pela área retangular 0I1PI’PI, sendo que 0AA1I1 será financiado por recursos próprios e o

restante por recursos de terceiros.

O investimento, como se tentou mostrar, é muito sensível ao risco de crédito do

tomador e do credor. Mudanças do nível de aversão ao risco das firmas (tomador)

acompanhado por uma redução do grau de aversão ao risco dos bancos e instituições

financeiras (credor) nos levam a um nível de investimento mais elevado para um mesmo

retorno esperado (ver gráfico 4), ou seja, passa-se a aceitar uma razão divida/capital mais

elevada.

C1

D1

Risco do Tomador

Risco marginal do credor

PI

PK

E1

II1 Î

PI

PK

C

PK, PI

PI’

A1

0

A

34

34

Gráfico 4 – Sensibilidade do Investimento ao Grau de Aversão ao Risco

Fonte: Elaboração Própria

O que se tentou mostrar a partir do desenvolvimento teórico desenvolvido por Minsky,

foi que a existência de riscos, tanto para credores quanto para os tomadores de empréstimo,

que crescem com a escala de investimento, limita o uso de capital de terceiros, estabelecendo

o que seria um ótimo de endividamento. Esse ponto ótimo, contudo, irá depender do grau de

aversão ao risco de ambas as classes, isto mostra que além das condições técnicas que

determinam o comportamento das curvas de riscos, o estado de confiança dos indivíduos é

fundamental para determinar o nível de investimento.

1.4 Exemplificação do Risco Financeiro

O exemplo que se segue mostra como o nível de endividamento de uma empresa

aumenta seu grau de exposição ao risco. Uma empresa defronta-se com duas modalidades de

riscos. Primeiramente, tem-se o risco operacional que depende das incertezas associada ao

desempenho operacional da empresa, independente da forma como esta é financiada. O risco

operacional é caracterizado por variações no retorno sobre o ativo RSA (ROA).

D1

Risco do Tomador

Risco marginal do credor

PI’

D2

PI

PK

I2I1 Î

PI

PK

PK, PI

0 I

35

35

O segundo risco é o risco financeiro que está associado com o grau de alavancagem da

empresa, isto é, com nível de endividamento desta. Ele é caracterizado por variações do

retorno sobre capital próprio (ROE) ou retorno sobre o patrimônio líquido da empresa

(RSPL). Dessa forma, depende da composição da estrutura de capital.

A existência de custos financeiros se reflete no aumento da taxa de juros dos

empréstimos ou em custos indiretos, como diferença no prazo de amortização das dívidas e

exigência de garantias.

O risco financeiro cresce rapidamente com o uso de capital de terceiros, esta é a

hipótese de risco financeiro crescente desenvolvida por Kalecki. Resumidamente, tem-se que

em situações de elevados graus de endividamento as perdas provenientes de um cenário

desfavorável crescem em uma proporção maior do que os ganhos em um cenário otimista.

O exemplo abaixo mostra cinco estruturas diferentes de financiamento em ordem

crescente de endividamento. Para cada uma mostram-se os resultados em um cenário otimista

e em um cenário pessimista, ambos com cinqüenta por cento de chance de ocorrência.

Tabela 2 – Estrutura de Financiamento de Uma Firma Representativa

0 1 2 3 4 5 Ativo 200 400 600 800 1000 1200 Patrimônio liquido (PL) 200 200 200 200 200 200 Passivo exigível 0 200 400 600 800 1000 Retorno sobre o Ativo (15%) 30 60 90 120 150 180 Custo de capital de terceiros 0 -18 -36 -54 -72 -90 Total de retorno sobre PL 30 42 54 66 78 90 Taxa de retorno sobre PL 0,15 0,21 0,27 0,33 0,39 0,45 Retorno sobre o Ativo (-15%) -30 -60 -90 -120 -150 -180 Custo de capital de terceiros 0 -18 -36 -54 -72 -90 Total de retorno sobre PL -30 -78 -126 -174 -222 -270 Taxa de retorno sobre PL -0,15 -0,39 -0,63 -0,87 -1,11 -1,35 Retorno esperado 0 -0,09 -0,18 -0,27 -0,36 -0,45

Fonte: Elaboração Própria

36

36

Se considerarmos os dois cenários com mesmas probabilidades de ocorrência, um

otimista com retorno sobre o ativo de 15% e outro pessimista com retorno negativo sobre o

ativo de -15%, e um mesmo patrimônio líquido, conforme aumentamos o grau de

endividamento da firma reduzimos o retorno esperado sobre o patrimônio liquido o que

mostra que o aumento do grau de alavancagem aumenta o nível de exposição ao risco das

empresas.

Com uma estrutura de capital predominantemente formada por capitais próprios tem-

se que o retorno esperado, formado pela média entre o retorno em um cenário otimista e o

retorno em um cenário pessimista, será igual a 0, conforme se aumenta o nível de

endividamento o retorno esperado torna-se cada vez mais negativo como pode-se ver na

estrutura cinco (-0,45).

1.5 Conclusões

O desenvolvimento e exposição dos pensamentos teóricos a respeito do investimento

feito nesse capítulo tiveram como objetivo levantar algumas questões que contribuem para

explicar as principais razões do baixo nível de investimento da maior parte das empresas de

distribuição de gás natural no Brasil. As espeficidades do setor de gás natural fazem com que

a expansão das redes de distribuição dependa dos recursos de terceiros, isto é, a geração

interna de recurso não é suficiente para financiar o investimento necessário para expansão e

manutenção das redes de distribuição.

O desenvolvimento teórico feito nesse capítulo mostrou a existência de um risco

financeiro crescente associado ao nível de endividamento e a capacidade de geração de

recursos de uma firma. Esse comportamento do risco de crédito faz com que o custo

37

37

financeiro de uma empresa aumente de acordo com sua relação dívida/capital. Assim, alguns

projetos de investimento podem ser inviabilizados pelo alto custo do capital de terceiros.

Dessa forma, o objetivo desse capítulo é fornecer um suporte teórico para a análise dos

condicionantes do investimento no segmento de distribuição de gás natural. No capítulo três,

iremos, a partir do balanço patrimonial e do demonstrativo de resultado das principais

empresas de distribuição de gás natural do país, analisar se a estrutura financeira, em outras

palavras, se o padrão de financiamento, adotado pelas empresas distribuidoras explicam os

baixos níveis de investimento das empresas estatais.

No capítulo seguinte irá se analisar mais detalhadamente o sistema financeiro

brasileiro e internacional, identificando as principais fontes de financiamento de longo prazo.

Em seguida, buscou-se descrever as principais inovações financeiras associadas ao novo

padrão de financiamento de longo prazo. Por último, será analisada a evolução dos

investimentos nos setores de infra-estrutura, identificando as principais características desse

setor e as principais fontes de financiamento.

38

38

Capítulo 2 - Sistema Financeiro e o Setor de Infra-Estrutura no Brasil

O presente capítulo irá mostrar como se deu o desenvolvimento do setor financeiro

brasileiro, qual o modelo de financiamento de longo prazo predominante no Brasil e quais as

principais fontes de recursos utilizadas. Posteriormente serão analisadas as características do

setor de infra-estrutura, no qual se insere o segmento de distribuição de gás natural,

mostrando quais os principais mecanismos de financiamento utilizados e qual o melhor

padrão de financiamento a ser adotado pelas empresas pertencentes a este setor, de acordo

com suas espeficidades.

2.1 Sistema Financeiro Brasileiro e o Modelo de Financiamento Predominante no Brasil O sistema financeiro brasileiro praticamente originou-se com as reformas de 1964-66.

Até o início da década de 60, predominava no Brasil três tipos de instituições financeiras:

bancos comerciais privados, responsáveis pelo financiamento de capital de giro, as caixas

econômicas federais e estaduais, responsáveis pelo financiamento imobiliário, e os bancos

públicos, com ênfase para o Banco do Brasil e o BNDES, que até o momento eram as únicas

instituições que operavam na intermediação financeira com prazos mais longos. As demais

instituições financeiras não-bancárias que existiam possuíam pouca expressão.

O objetivo da reforma financeira de 1964-66 era criar condições para que o sistema

financeiro brasileiro fosse capaz de financiar o processo de industrialização, criando novos

mecanismos de captação de poupança. Dessa forma, deu-se ênfase ao desenvolvimento do

setor financeiro privado de longo prazo, criando instituições, instrumentos e novas

39

39

regulamentações específicas. O quadro 1 mostra a estrutura do sistema financeiro após as

reformas de 1964-66.

Quadro 1 - Sistema Financeiro após as reformas de 1964-66

Tipos de Instituições Área de atuação

Conselho Monetário Nacional

Criado em 1964, em substituição á superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), com funções normativa e reguladora do sistema financeiro.

Banco Central do Brasil (BACEN)

Criado em 1964, executor das políticas monetárias e financeiras do Governo.

Banco do Brasil (BB)

Atuando como banco comercial e agente financeiro do governo, especialmente na administração de linhas de crédito especiais, de médio e longo prazo, para a agricultura.

Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico (BNDE)

Criado em 1952; atuava no financiamento seletivo de longo prazo para áreas consideradas prioritárias, em termos mais favoráveis que os de mercado.

Banco de Desenv. (BD) Reg. e Estaduais Atuação semelhante ao do BNDE.

Sistema Financeiro de Habitação (SFH)

Criado em 1964, tendo o Banco Nacional da Habitação (BNH) como instituição central, e composto ainda pela Caixa Econômica Federal (CEF), Caixas Econômicas Estaduais (CE), Sociedades de Crédito Imobiliário (SCI), e Associações de Poupança e Empréstimo (APE).

Bancos Comerciais (BCO) Atuando no segmento de curto e médio prazo do mercado de crédito (basicamente para capital de giro das empresas).

Bancos de Investimento (BI)Atuando no segmento privado de crédito a longo prazo e no mercado primário de ações (operações de underwriting13).

Financeiras - Soc. de crédito, financ. e invst.

(SCFI)

Classificadas como instituições não-bancarias e voltadas para o financiamento direto do consumidor (de curto e médio prazo).

Corret. E Distrib. De Valores (CDV)

Atuando nos mercados primários e secundários de ações.

Fonte: Hermann (1998).

13 É uma operação realizada por uma instituição financeira mediante a qual, sozinha ou organizada em consórcio, subscreve títulos de emissão por parte de uma empresa, para posterior revenda ao mercado. A instituição financeira subscreve somente as sobras da emissão, nos casos em que a lei brasileira assegura aos acionistas o direito de preferência à subscrição das novas ações a serem emitidas, na proporção das ações que possuírem na época.

40

40

No modelo instituído com as reformas de 1964-66, o financiamento de longo prazo

dos setores de infra-estrutura ficou a cargo do BNDES, dos BD regionais, dos bancos de

investimentos e das corretoras e distribuidoras de valores, ao auxiliarem a colocação de ações

no mercado de capitais.

O processo de reforma de 1964-66 atingiu seu objetivo quanto a aumentar a

participação do setor privado (o volume de empréstimo privado em relação ao PIB cresceu de

26,1% em 1968 para 51,5% no período de 1985-89) e a diversificar as fontes de

financiamento de longo prazo. A participação dos bancos comerciais nos empréstimos

concedidos caiu de 80,8% em 1964 para 43,7% em 198914, o que mostra uma maior

participação das instituições não-bancárias no processo de intermediação financeira. Contudo

o modo de operação do sistema financeiro durante a década de 80 aproximou-se pouco do

idealizado pelos formuladores das reformas.

Apesar dos incentivos, principalmente fiscais, dados ao mercado de capitais15, esse

não apresentou o desenvolvimento desejado. Esse fato derivou-se principalmente dos

problemas de informação e supervisão do mercado de título, que em conjunto com a escassez

de poupadores de longo prazo inviabilizou a utilização do mercado de ações como fonte de

financiamento de investimentos de longo prazo16.

No que se refere ao sistema de crédito privado, a capitalização dos bancos privados,

decorrente do processo de concentração bancária17 ocorrido após as reformas de 1964, não

resultou em um aumento da oferta de crédito. O aumento do volume de empréstimo do setor 14 HERMANN (1998). 15 Redução do imposto de renda a ser pago pelas sociedades de capital aberto e abatimento do imposto de renda decorrente da compra de ações. 16 HERMANN (1998). 17 “...para os próprios bancos passou a ser interessante redistribuir seu capital, investindo-o nas instituições não-bancárias incentivadas pelas reformas (financeiras, BI, e outras), cujas condições se mostravam mais favoráveis - tanto pela não incidência de recolhimento compulsório, quanto pela autorização para emissão de títulos longos com correção monetária. Estas condições explicam que grande parte dos novos tipos de instituições financeiras surgidos nesse período tenha sido aberta pelos bancos comerciais já existentes ou, mais tarde, a eles incorporada.” HERMANN (1998).

41

41

privado verificado no período decorreu principalmente dos repasses dos recursos públicos e

externos.

O que se verificou no período foi um entrave ao investimento de longo prazo em

conseqüência de um incipiente mercado de capitais e de um setor de crédito bancário pouco

desenvolvido. Dessa forma, as principais fontes de financiamento utilizadas pelas empresas

continuaram sendo o autofinanciamento, os recursos públicos, em particular através do

BNDES, e o financiamento externo. Esse fato fica mais evidente quando se analisa a

participação do autofinanciamento sobre o total de recursos utilizados pelas empresas, que

passou de 58,8% em 1978 para 76,8% em 198418 (HERMANN, 1998).

Assim, verificou-se nesse período que o principal agente financiador de longo prazo

da indústria continuou sendo o BNDES, o que configura um modelo de crédito público,

contrário ao visualizado pelos formuladores das reformas de 1964. A reforma bancária de

1988, instituída pela resolução 1524 do BACEN (21/09/88), permitiu o funcionamento de

bancos múltiplos. Por esta resolução, foi permitido aos bancos, caracterizados como

múltiplos, exercerem as atividades de banco comercial, banco de investimento, financeiras e

de associações de poupança e empréstimo. Esta concentração do sistema bancário, contudo,

não resultou em um aumento do crédito privado. O financiamento de longo prazo continuou

dependente do tripé autofinanciamento, crédito público e crédito externo.

A partir de 1992, o volume dos recursos externos aumentou consideravelmente em

função do aumento da confiança do investidor estrangeiro. Esse fato decorreu do novo acordo

estabelecido com os credores das dívidas dos países em desenvolvimento, que permitiu a

securitização da dívida externa dos países latino-americanos (conhecido como plano Brady), e

do novo cenário macroeconômico do país, que se caracterizou por uma maior estabilidade dos

18 Dados citados em Lees, Bott e Cysne (90), p. 330.

42

42

preços, uma política monetária fortemente restritiva e uma redução do déficit público

(operacional).

O sistema financeiro brasileiro, atualmente, é formado pelas instituições apresentadas

no quadro 1 com exceção do BNH que foi extinto em 1986 e com a inclusão dos bancos

múltiplos. Embora a participação do sistema bancário sobre o sistema financeiro com um todo

tenha crescido consideravelmente nos últimos anos, não se verificou um modelo de

financiamento baseado no crédito privado.

A dificuldade de captação de poupança de longo prazo, a concorrência com o sistema

financeiro internacional, caracterizado pela desintermediação financeira, e a abertura do

mercado financeiro brasileiro ao capital externo têm feito com que o sistema financeiro

nacional caminhe para a substituição das formas de crédito tradicionais, baseada

principalmente no crédito bancário, pela aquisição de títulos de dívidas mobiliárias, isto é,

pelo processo de securitização19. Assim as fontes tradicionais de captação de recursos –

depósitos a prazo – têm perdido importância na captação de recursos via fundo de

investimento.

O que se verificou foi que esse novo modelo de financiamento, caracterizado pelo

processo de securitização, tornou-se dependente do desenvolvendo do mercado de capital,

tanto primário quanto secundário. Dessa forma, diante da escassez de poupadores individuais

dispostos a investirem em títulos de ações, o desenvolvimento dos mercados primário e

secundário de capital depende dos investidores institucionais. No Brasil, existem três

principais tipos de investidores institucionais: os fundos mútuos de investimento, as entidades

de previdência e os investidores externos.

O que se tem verificado nos últimos anos, é uma redução da participação do crédito

público em detrimento de uma maior participação do crédito externo e do autofinanciamento. 19 O mecanismo de securitização de recebíveis baseia-se na oferta dos direitos creditórios ou de recebíveis como garantia na emissão de títulos de forma a reduzir o risco de crédito do investidor e dessa forma o custo de captação de recursos.

43

43

A oferta de recursos externos por sua vez depende do cenário macroeconômico enquanto o

autofinanciamento depende da decisão de firma quanto a seu plano de expansão.

2.2 Sistema Financeiro Internacional

Define-se como sistema financeiro internacional o conjunto de instituições e mercados

operante em escala mundial, sem controle de uma autoridade reguladora com poder igual à

das agências e órgãos reguladores nacionais. A importância do sistema financeiro

internacional depende do grau de abertura da economia nacional ao movimento de capitais.

Nas últimas décadas, verificou-se uma redução das barreiras ao livre movimento de capitais

na maior parte dos países em desenvolvimento como o Brasil.

A abertura financeira da economia deu origem a novas fontes de recursos para o

financiamento de investimentos em infra-estrutura, seja através da captação direta de recursos

em bancos estrangeiros, seja pela possibilidade de colocação de papéis de empresas nacionais

em bolsas de valores estrangeiras. Nesta seção serão analisados os principais atores e

mecanismos internacionais de financiamento de longo prazo.

A modalidade de atividade financeira está dividida em três tipos: intermediação,

securitização e apoio. Os processos de intermediação e securitização, devido a sua

complexidade, serão analisados na seção seguinte. A modalidade de apoio, no entanto, se

refere ao desenvolvimento de instrumentos e de mercados que permitam uma maior

especialização dos ativos negociados.

Os principais atores são as grandes empresas, governos e bancos domésticos como

tomadores de recursos, e os grandes bancos internacionais e investidores institucionais como

ofertantes de recursos. Quanto às instituições financeiras envolvidas, temos os bancos

comerciais responsáveis principalmente pela operação de intermediação, os bancos de

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44

investimentos, que são encarregados de promover as operações de securitização e os

mercados de derivativos responsáveis pela operação de apoio. Os derivativos têm a função de

separar e reagrupar os diferentes tipos de riscos envolvidos nas operações de mercado criando

dessa forma novos instrumentos diferenciados quanto as suas características de risco. Dessa

forma, o mercado de derivativo possibilita que os diferentes tipos de riscos envolvidos nas

operações financeiras sejam distribuídos de acordo com a preferência de cada agente.

As principais fontes de financiamento nos mercados internacionais são a colocação de

papéis e as operações de crédito. No que se refere ao mercado de capitais ou de papéis, temos

as operações envolvendo títulos de propriedades isto é ações (equity) e as operações de títulos

de dívidas (notas, bônus, etc...) que são realizadas geralmente em mercados de bolsa ou de

balcão. As operações de crédito por outro lado são realizadas pelos bancos individuais ou

mais freqüentemente pela organização de sindicatos de emprestadores liderado por uma ou

mais instituições. As operações de colocação de papel, mais especificamente de títulos de

dívidas, predominam sobre as operações de crédito. O instrumento financeiro mais utilizado

no mercado internacional é a emissão de bônus20. A emissão de euronotas21, contudo, vem

apresentando um crescimento considerável nos últimos anos, fato decorrente da facilidade de

apoio desse instrumento financeiro, enquanto que a emissão de ações continua tendo papel

secundário.

Uma importante característica do sistema financeiro internacional é a participação dos

governos como principal emissor de títulos de dívidas, como bônus22 e notas. Os países

industrializados, principalmente os EUA, são os principais emissores desses bônus enquanto

os principais tomadores são as corporações e os bancos. A participação dos países em

20 São títulos de dividas de longo prazo emitidos por empresas financeiras ou não financeiras com colocação pública ou privada acrescidos de juros e que possuem prazos superiores a dez anos. 21 Euronotas são notas de curto prazo subscritas por um grupo de Bancos. Internacionais (comerciais ou de investimento) vendidas com um desconto sobre o valor de face. 22 Existem dois tipos de Bônus ou Bond: Bônus internacionais são aqueles colocados em mais de uma praça financeira denominados em uma moeda qualquer. Bônus estrangeiros são aqueles títulos colocados em um determinado mercado denominado em uma moeda específica.

45

45

desenvolvimento no mercado internacional de títulos de dívidas (Bônus), embora venha

crescendo nos últimos anos, ainda é pequena.

Como foi visto, o fluxo de recursos para investimento nos países em desenvolvimento

caracteriza-se por uma predominância do financiamento privado em detrimento das fontes

governamentais de recursos, que vêem apresentando uma redução significativa nos últimos

anos. A redução do fluxo oficial de recursos deve-se as seguintes razões: i) problemas fiscais

dos países desenvolvidos, ii) fim da guerra fria e iii) dúvida quanto à eficiência dos

investimentos públicos.

Dessa forma, a última década caracterizou-se por uma maior participação das fontes

de recursos privadas, embora de forma diferente do que usualmente se fazia antes da crise

bancária Norte Americana23 (1989). Passado o período de turbulência, marcado pela crise

bancaria ocorrida nos EUA e pelas crises mexicana (1994) e asiática (1997), o fluxo de capital

privado tomou novamente importância só que agora de outra forma. As mudanças regulatórias

voltadas para o reforço do patrimônio líquido dos bancos e a expansão da economia norte

americana fizeram com que os bancos iniciassem a década de 90 com uma alta liquidez.

Assim, a busca de novos canais de aplicação de recursos em conjunto com a redução dos

riscos dos empréstimos decorrente da expansão dos mecanismos de securitização possibilitou

o aumento dos fluxos de investimento para os países em desenvolvimento.

Os países latino-americanos perderam sua posição de preferência dos investidores

internacionais para os países asiáticos. Contudo, o aumento da capacidade dos intermediários

financeiros em distinguir as diferenças entre as economias emergentes tem favorecido o

Brasil. Esta nova abordagem dos investidores internacionais tende a analisar individualmente

23 Com o processo de liberalização financeira iniciado em meados dos anos 80, que eliminou as barreiras aos fluxos internacionais de capitais, os bancos japoneses começaram a atuar dentro da economia americana. Como a regulação incidente em cada instituição dependia do arcabouço regulatório do seu país de origem, criou-se uma desvantagem competitiva para os bancos americanos que possuíam exigências de coeficientes de capital muito maiores do que os bancos japoneses. Dessa forma, o final da década de 80 foi marcado por uma crise bancária nos EUA, que levou ao estabelecimento de Basiléia I, que teve por objetivo igualar os custos regulatórios dos bancos internacionalmente ativos.

46

46

os projetos a serem financiados. Nesse sentido, os projetos de infra-estrutura física parecem

ser favorecidos. Nesse setor, muitas vezes a geração de receita é em dólar e a demanda

apresenta certa estabilidade o que reduz os riscos de crédito e de mercado desses

investimentos.

Nas últimas décadas, as pressões competitivas, as inovações tecnológicas e financeiras

e as mudanças no arcabouço político-regulatório deram origens a novos produtos e mercados

financeiros. A seção seguinte irá analisar as principais inovações financeiras ocorridas nos

últimos anos.

2.3 Inovações Financeiras

O recente processo de globalização financeira, a expansão das operações de

securitização e dos mercados de derivativos e o aumento da importância dos investidores

institucionais têm transformado o perfil das operações e das instituições financeiras. Observa-

se nos últimos anos uma obsolescência dos modelos estruturais predominante nos países

desenvolvidos e uma convergência para uma estrutura padronizada. Tanto o modelo

segmentado, característico da economia americana, quanto o modelo alemão24, centrado na

figura do banco universal, parecem estar se tornando obsoletos. As inovações tecnológicas e o

aumentando da competição têm criado uma série de dificuldades para manter a segmentação

enquanto a expansão das operações de securitização tem transformado o sistema de bancos

24 O sistema financeiro Americano foi organizado a partir dos princípios gerais do New Deal incorporados pela lei Glass-Steagal. Tal sistema caracteriza-se pela segmentação dos mercados financeiros e a especialização das instituições. Dessa forma bancos comerciais não podiam exercer as atividades de banco de investimento nem de financeiras. A competição com os bancos japoneses e a crise bancaria ocorrida nos EUA fizeram com que os princípios sobre os quais se baseava a regulação bancária norte americana fossem revistos, possibilitando uma expansão das atividades dos bancos para outros segmentos financeiros. O sistema Alemão tem origem na Lei Bancária Alemã de 1961 que permitiu a operação de bancos universais caracterizados pelas funções de banco comercial, banco de investimento e financeira. A sofisticação dos mercados de financeiros alemães é limitada, os poupadores possuem uma preferência por depósitos bancários ou pela aplicação em papéis emitidos pelos próprios bancos. Dessa forma os bancos alemães nunca atuaram efetivamente como bancos universais enfrentando sérias dificuldades para se adaptarem ao recente processo de globalização financeira.

47

47

universais, tradicionalmente baseado nas operações de crédito. Abaixo serão analisadas as

principais inovações financeiras das últimas décadas e suas repercussões sobre o

financiamento de longo prazo.

2.3.1 Securitização

O aumento das restrições regulatórias sobre as operações de concessão de empréstimo

tem aumentado o custo das operações tradicionais de crédito e dessa forma, incentivado

formas alternativas de captação de recursos, como à colocação de papéis. A utilização da

emissão de títulos como forma de captação de recursos não é um instrumento recente, contudo

esse mecanismo sempre esteve restrito às grandes empresas com baixo risco de crédito. Com

as inovações financeiras surgidas a partir da década de 90, representadas pelo aumento das

operações de securitização de recebíveis tem se expandido o uso da emissão de títulos como

forma de captação de recursos.

O mecanismo de securitização de recebíveis baseia-se na oferta dos direitos creditórios

ou de recebíveis como garantia na emissão de títulos de forma a reduzir o risco de crédito do

investidor e dessa forma o custo de captação de recursos. O processo inicia-se quando o

originador realiza uma venda a prazo e contrai dessa forma um crédito referente a esta venda.

Posteriormente, o originador repassa esse direito de crédito para um emissor ou uma

sociedade de propósito específico que utiliza esse direito como garantia na emissão de títulos

de forma a tentar reduzir o risco de crédito desses papéis. Os recursos captados pelo emissor

são repassados para o originador que os utiliza no financiamento do processo produtivo.

Além do originador, do emissor e do investidor, outros agentes externos são essenciais

para o bom funcionamento do processo de securitização. Entre eles temos as empresas de

ratings que têm como principal função oferecer aos investidores uma avaliação imparcial e

48

48

especializada do risco de crédito da operação por meio da divulgação de uma nota. Para isso

analisam a qualidade da carteira de recebíveis e seu histórico, a situação econômica e

financeira dos originadores desses créditos e a estrutura de garantias da operação (presença de

auditor, overcollateral, conta vinculada, etc.).

Outro importante agente é o auditor que é incumbido de auditar os relatórios emitidos

pelos originadores, pelo emissor e pela instituição responsável pela cobrança dos créditos

cedidos. Determinadas operações incluem também auditores de processos de produção.

Dessa forma, vemos que o processo de securitização de recebíveis permite a expansão

da emissão de títulos (dividas, debêntures, notas etc.) como forma de captação de recursos

para empresas de menor porte e de maior risco, aumentando dessa forma as possibilidades de

financiamento de longo prazo.

2.3.2 Mercado de Derivativos25

Os derivativos são ativos que têm seu valor atrelado ao movimento dos preços de um

outro ativo. A principal característica dos contratos de derivativos é a partição dos diversos

riscos envolvidos em uma determinada transação financeira entre diferentes agentes de acordo

com seus perfis de risco. Assim, ao eliminar determinados riscos, a expansão do mercado de

derivativos aumenta a liquidez do mercado de títulos aumentando a capacidade de

financiamento das empresas através da emissão de papéis.

O crescimento das operações de derivativos teve como origem a instabilidade

financeira decorrente da alta inflação e das políticas monetárias restritivas que criaram uma

instabilidade no equilíbrio entre as taxas de câmbio e de juros. Os contratos de derivativos

25 Para maiores detalhes ver CARVALHO, 2000.

49

49

foram expandidos para diferentes tipos de risco que não o cambial, o de juros e o de variações

nos preços.

Os contratos de derivativos dividem-se nas seguintes categorias:

a) opções – representam um direito, mas não uma obrigação de comprar ou vender

um título ou outro ativo durante um período determinado por um preço específico.

Uma opção de compra especifica o direito de comprar ou de vender o ativo em

questão, enquanto a opção de venda determina a obrigação de compra ou de venda

de um determinado ativo;

b) contrato a termo – nesse tipo de contrato o comprador e o vendedor são obrigados

a negociar um título em uma data futura a um preço determinado na data da

assinatura do contrato;

c) contratos futuros – determinam o direito de compra ou de venda de um

determinado ativo de qualidade e quantidade especificada a um preço determinado

na assinatura do contrato. Os contratos futuros são muito parecidos com os

contratos a termo só que por serem padronizados são negociados em bolsas e não

em balcão;

d) swaps – são contratos referentes à troca de fluxos de pagamentos ao longo de

determinado período de acordo com regra predeterminada na data do contrato.

O desenvolvimento do mercado de derivativo se deu em paralelo ao desenvolvimento

das operações de securitização. A colocação de papéis por empresas e governos foi

beneficiada pela decomposição dos seus riscos envolvidos. Assim o mercado de derivativos

tem importância semelhante ao mercado secundário ao aumentar a liquidez dos títulos,

principalmente títulos de dívidas.

50

50

2.3.3 Investidores Institucionais

Os investidores institucionais representam um pool de recursos para aplicações

financeiras originadas de um conjunto heterogêneo de iniciativas de investimento. Os

principais investidores institucionais são os fundos de pensão, as companhias de seguros e as

companhias de investimento.

A principal característica dos investidores institucionais é sua dimensão. A agregação

dos recursos permite o melhor uso e aproveitamento das oportunidades de investimentos que

os poupadores individualmente não teriam acesso.

O investidor institucional ainda é um fenômeno americano. Contudo, nos últimos

anos, vemos a expansão desta inovação Norte Americana para outros países. A existência de

investidores institucionais aumenta a oferta de recursos para o financiamento, principalmente

de longo prazo.

2.4 Financiamento de Indústrias de Rede

Os setores que compõem a indústria de rede, na qual se insere grande parte dos

serviços de infra-estrutura, apresentam algumas características comuns que os diferenciam

dos demais setores da economia, como a grande complementaridade existente entre os

segmentos de suas cadeias produtivas, cujos elos estabelecem – por razões de natureza

tecnológica – graus de interdependência entre os segmentos da rede bem mais elevados do

que aqueles existentes em outros tipos de indústria. Além do alto grau de interdependência

entre os componentes da indústria, os setores de infra-estrutura apresentam certas

características tecnológicas e econômicas que condicionam um padrão ótimo de

financiamento. A presente seção pretende analisar as particularidades da indústria de infra-

51

51

estrutura como condicionante do modelo de financiamento a ser utilizado pelas empresas

desses setores. Além disso, irá se descrever a evolução do financiamento em infra-estrutura no

caso brasileiro e as principais fontes de recursos utilizadas pelas indústrias de rede nas últimas

décadas.

2.4.1 Características da Indústria de Infra-Estrutura

Os setores de infra-estrutura, onde o setor de distribuição de gás natural se insere,

caracterizam-se pela existência de economias de escala, longo prazo de maturação dos

investimentos, uso intensivo de capital, espeficidades de ativos, e na maioria das vezes,

exclusividade na prestação dos serviços. Esses fatores conjuntamente criam limitações quanto

aos padrões de financiamento a serem adotados pelas empresas pertencentes à indústria de

rede.

Os setores de infra-estrutura são beneficiados pelo que chamamos de densidade de

consumo, isto é, quanto mais capilarizada for a rede do serviço prestado e quanto maior for a

densidade populacional da região atendida pelo serviço, menor será o custo marginal de

atender a solicitação de um novo usuário. Assim, a rentabilidade da indústria de rede aumenta

com seus investimentos, pelo menos em sua fase de expansão. Esse fato permite que as

empresas desses setores operem com um nível de endividamento elevado. Um exemplo da

importância da densidade de consumo pode ser visto no caso do setor de distribuição de gás

natural.

A análise do retorno sobre o ativo imobilizado (ROFA) das 13 principais empresas26

de distribuição de gás natural do Brasil mostra que a rentabilidade destas empresas cresceu,

no período de 1999 a 2002, mais do que o aumento do ativo imobilizado, como pode ser visto 26 Selecionou-se o balanço das seguintes empresas de distribuição de gás natural para a análise dos indicadores financeiros utilizados nesse trabalho: ALGAS, EMSERGÁS, POTIGÁS, SULGÁS, BAHIAGÁS, COPERGAS, PBGÁS, SCGÁS, COMPAGAS, CEG, CEG-RIO, COMGAS, SPS GÁS NATURAL.

52

52

no gráfico 5. O cálculo do ROFA é feito dividindo-se o lucro Earning Before Interest, Taxes,

Depreciation e Amortizations (EBITDA) pelo ativo permanente e indica a rentabilidade dos

investimentos realizados em ativos fixos. Dessa forma, o crescimento do índice ROFA sugere

que está havendo um aumento da lucratividade dos novos investimentos, isto é, o lucro

EBITDA tem aumentado proporcionalmente mais do que os investimentos em ativo fixo.

Esse fato indica que houve uma diluição do custo com o investimento em novos ativos. Dessa

forma, pode-se concluir que as empresas estiveram operando nesse período em um nível de

retorno de escala crescente, permitindo elevar seus níveis de endividamento.

Gráfico 5 – Retorno Sobre o Ativo Imobilizado

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Empresas Privadas Empresas Estatais

Fonte: Elaboração própria a partir dos balanços das empresas selecionadas.

Outra importante característica das indústrias de rede é o longo prazo de maturação de

seus investimentos. A vida útil das redes de distribuição de gás natural pode chegar a sessenta

anos em alguns países europeus (Eurogas 2000), enquanto que a depreciação contábil varia

em torno de 30 a 40 anos. Esses dados indicam que os investimentos realizados em infra-

estrutura apresentam um horizonte de muito longo prazo. Assim, diferente de outras

indústrias, o retorno sobre o capital investido acontece apenas depois de um longo período de

53

53

operação, esse período varia de setor para setor, mas no caso da indústria de infra-estrutura

esse período costuma ser superior a dez anos. Esse fato, em conjunto com o volume de capital

investido e com a grande espeficidades dos ativos, faz com que o investimento necessário

para expansão adequada das redes de infra-estrutura não possa ser financiado exclusivamente

por recursos próprios. Por esse motivo, o desenvolvimento dos setores de infra-estrutura

depende da capacidade das empresas em captar recursos de terceiros.

Assim, devido à intensidade de capital e a necessidade de recursos de terceiro, o custo

financeiro ou de capital representa um importante componente dos custos das empresas de

infra-estrutura. A fim de estimar o impacto do custo de capital sobre o custo dos serviços de

infra-estrutura pode-se calcular a possível variação na tarifa de transporte de gás natural a

partir da variação do custo de capital.

Para esse cálculo usaremos um modelo de investimento em gasodutos de transporte no

Brasil cuja sistemática consiste basicamente na formulação de um fluxo de caixa. Isto é, para

cada combinação binária de vazão (em mil m³/dia) e distância transportada (em km), calcula-

se a tarifa capaz de zerar o valor presente líquido (VPL) do fluxo de caixa. Dessa forma faz-se

uma série de premissas técnicas e econômicas:

a) preço do gás combustível: R$ 0,45/m³;

b) taxa de Câmbio: R$ 2,31/US$;

c) vida útil: 20 anos;

d) período de depreciação: máximo de 10 anos;

e) taxa de juros: 10% ao ano;

f) alíquota de Cofins: 7,6%;

g) alíquota do imposto de renda: 25%;

h) alíquota PIS: 1,7%;

i) alíquota de Contribuição Social: 9,0%;

54

54

j) alíquota de CPMF: 0,38%;

k) alíquota de ICMS: 18%;

l) taxa média de Atratividade: 12% ao ano;

m) ritmo de desembolso do investimento (em 3 anos): 30%, 50% e 20%;

n) ritmo de desenvolvimento do mercado (em 3 anos): 30%, 50% e 100%;

o) valor residual do investimento (em 10 anos): 10%;

p) grau de Endividamento 80%;

q) número de parcelas: 10.

A partir destas premissas econômicas, desenvolve-se o cálculo da tarifa mínima capaz

de cobrir pelo menos os custos de investimento e o operacional. O custo de investimento é

composto pelo custo de investimento no gasoduto e pelo custo de investimento no

compressor, o custo operacional é composto pelo custo de operação do gasoduto e pelo custo

de operação do compressor. Assim utiliza-se a seguinte fórmula para o lucro do

investimento:

Onde:

t igual a tarifa a ser calculada;

CI é o custo de investimento

CO o custo operacional

Vazão é dada em m³

CIg é o custo de investimento do gasoduto

CIc é o custo de investimento do compressor

L = Receita - Custo

L = t.Vazão - (CI + CO)

L = t.Vazão – CI(CIg+CIc) + CO(Cog + Coc)

t ⇒ L = 0

55

55

Cog é o custo operacional do gasoduto

Coc é o custo operacional do compressor

Considerando um nível de endividamento de 80% e um custo de capital de 10%,

refletido pela taxa de juros, chega-se a uma tarifa de R$ 28,1 por mil metros cúbicos

transportado por quilometro. Aumentando-se o custo de capital para 20% e mantendo o

mesmo nível de endividamento tem-se uma tarifa de R$ 33,3. Isto é, para cada variação de

uma unidade no custo de capital tem-se uma variação de quase 0,2 unidades na tarifa.

Considerando que exista uma série de outros custos, como custos operacionais e impostos, a

participação do custo de capital sobre o custo total é relativamente alta, mais ou menos 20%.

O exemplo27 acima mostra a importância e a sensibilidade dos investimentos em infra-

estrutura em relação ao custo de capital, daí a importância de um padrão de financiamento

especifico para esse setor.

A maioria dos setores de infra-estrutura possui preços administrados, isto é, os valores

das tarifas e os processos de revisão tarifária são regulados por agências ou órgãos

governamentais, o que limita a transferência dos custos de capital para os preços. Assim um

aumento do custo financeiro leva a uma redução da rentabilidade o que pode inviabilizar

certos planos de expansão.

O custo de capital no caso da indústria de rede é afetado pelo elevado nível de

investimento em ativos fixos imobilizados, pelas espeficidades dos ativos e pela sazonalidade

da demanda por alguns serviços de infra-estrutura como é o caso do gás natural e da

eletricidade. Esses fatores aumentam o risco dos investimentos nesses setores elevando o

retorno exigido pelos credores privados. Nesse sentido, a atuação do financiamento público

27 O exemplo desenvolvido para o calculo da tarifa de transporte tem como objetivo apenas mostrar a importância do custo de capital para os investimentos em infra-estrutura. O detalhamento dos cálculos feitos para se determinar tais tarifas, por envolver uma série de combinações binárias de vazão e distância, são de uma grande complexidade e extrapola o objetivo deste trabalho.

56

56

torna-se essencial para o desenvolvimento da rede de infra-estrutura de um país, já que em

geral possui custos e condições melhores do que o financiamento privado.

As inovações ocorridas no mercado financeiro (expansão do mercado de derivativo,

securitização e maior participação dos investidores institucionais) têm criado fontes

alternativas de financiamento compatíveis com as características das indústrias de rede.

Apesar da demanda pela maioria dos serviços de infra-estrutura apresentar vales e picos28, a

exclusividade do fornecimento de certos serviços garantida pelos contratos de concessão faz

com que as empresas desses setores apresentem um fluxo de receita mais ou menos estável e

previsível, isto é, a demanda por esses serviços apresenta baixa elasticidade. Assim, o

processo de securitização de recebíveis, descrito na seção III.1, ao reduzir o risco do credor,

pode vir a ser tornar uma alternativa de redução dos custos de capital. Ou seja, a concessão

dos direitos de recebíveis ao credor contribui para a redução do risco de crédito das operações

de financiamento de obras em infra-estrutura, reduzindo dessa forma, o custo de capital de

terceiros, seja através de menores taxas de juros cobradas seja reduzindo o valor dos

dividendos exigidos para a colocação de novos papéis.

Por se tratar na maioria das vezes de concessões do governo e por ser muitas vezes

submetida à regulação, a indústria de rede apresenta um componente de risco adicional

chamado risco regulatório. Chamaremos de risco regulatório o risco que os arcabouços

institucional e regulatório podem trazer para a operação de uma atividade econômica. Dessa

forma, a estrutura de regulação das atividades de infra-estrutura deve passar confiança sobre a

estabilidade das regras vigentes, embora não deva ser rígida ao ponto de não permitir o ajuste

28 Dizemos que a demanda apresenta vales e picos quando existe sazonalidade, ou seja, a demanda varia de acordo com o período do ano. Um exemplo claro deste fenômeno é a demanda por eletricidade no sudeste brasileiro. No período o que vai de dezembro até final de março existe um aumento do consumo em decorrência da maior utilização de sistemas de ar condicionado. Outro exemplo é o caso do gás natural nos EUA, que apresenta um pico de consumo nos período de dezembro a fevereiro em decorrência do uso nos sistema de aquecimento interno.

57

57

a certas variações dos parâmetros econômicos, principalmente aqueles relacionados à

estrutura de custo das empresas.

Pode se concluir que os setores de infra-estrutura, em particular aqueles com

características de rede, exigem fontes de financiamento diferentes dos demais setores da

economia. As características analisadas até aqui mostram que em geral o risco associado aos

projetos de infra-estrutura é menor do que de outros setores da economia, esse fato deve-se

em grande parte a inelasticidade da demanda e aos longos períodos de concessão. Dessa

forma, os baixos riscos somados com o peso do custo de capital sobre o custo total exigem

fontes de financiamento de baixo custo de captação.

Além dos recursos públicos, o desenvolvimento do mercado de capitais, em particular,

do mercado de derivativos e das operações de securitização, pode vir a ser uma alternativa de

captação barata de recurso. O problema nesse caso é que o desenvolvimento do mercado de

capitais requer uma série de mudanças estruturais que só poderão ser realizadas no longo

prazo29 (ver ROCCA, 2004). A tabela 3 mostra a participação do mercado de ações como

fonte de financiamento no mundo.

A partir da década de 90, tem havido alguns avanços no sentido de superar os

obstáculos ao desenvolvimento do mercado de títulos brasileiro. No âmbito das políticas

públicas vem-se objetivando uma redução da taxa de juros através de uma política fiscal

conservadora e com geração de superávit primário, de metas de redução dos gastos públicos e

de políticas de superávit comercial, que ao reduzir o grau de exposição da economia, reduz o

risco país.

29 O desenvolvimento do mercado de capitais no Brasil esbarra tanto em aspectos regulatórios quanto em aspectos culturais, como a preferência do investidor brasileiro por aplicações bancárias.

58

58

Tabela 3 – Emissão de ação como Proporção da formação Bruta de Capital Fixo

(1996)

Além das políticas públicas, novos instrumentos de proteção ao investidor, novas

regras de tributação, a organização de novos mercados e instrumentos financeiros e medidas

para a superação dos obstáculos culturais, como o programa da Bolsa de Valores do Estado de

São Paulo (BOVESPA) de popularização do mercado de capitais, têm tentado superar as

barreiras ao desenvolvimento e crescimento do mercado de capitais no Brasil.

A seção seguinte analisa a importância e a evolução dos investimentos em infra-

estrutura no Brasil como tenta também identificar as principais fontes de recursos utilizadas

pelos setores de infra-estrutura.

59

59

2.4.2 Evolução dos Investimentos em Infra-Estrutura no Brasil

A rede de infra-estrutura de um país é essencial e fundamental para o seu crescimento

econômico e social. Incluem-se no conjunto da rede de infra-estrutura de uma sociedade as

utilidades públicas como os serviços de transporte, coleta de lixo, telecomunicações, água,

esgoto e gás, e os serviços públicos como as rodovias e os sistemas de irrigação e drenagem.

A crise vivida pelo Estado brasileiro nas últimas décadas inviabilizou a formação de

poupança capaz de financiar as obras necessárias à expansão da rede de infra-estrutura

nacional. Dessa forma, vimos uma deterioração dos serviços e do estoque de capital dos

serviços de infra-estrutura, o que elevou os custos gerais da economia, traduzidos em

deterioração dos termos de troca e da competitividade internacional.

Os investimentos em infra-estrutura no Brasil sempre estiveram priorizados pela ação

estatal, a participação do setor privado nesse setor da economia só passou a ser representativa

nos últimos anos. O gráfico 6 mostra a evolução dos investimentos em infra-estrutura no

Brasil no período de 1970 a 1998.

Gráfico 6 – Investimento em infra-estrutura e sua participação no PIB. Caso

Brasileiro

Fonte: PEGO, 2002

60

60

Como pode ser visto, o período de ouro dos investimentos em infra-estrutura se deu

entre 1977 e 1982. O boom de crescimento desse período esteve relacionado com o projeto de

lei do II plano de desenvolvimento nacional (II PND) apresentado pelo governo Geisel em

1974 para vigorar de 1975 a 1979. O plano baseou-se no financiamento externo decorrente da

ampla liquidez internacional e teve como foco as indústrias de base e de infra-estrutura.

“Os principais setores contemplados no Plano eram (i) insumos básicos, metais não-ferrosos, exploração de minério, petroquímica, fertilizantes e defensivos agrícolas, papel e celulose; (ii) Infra-estrutura e energético – ampliar a prospecção e produção de petróleo, energia nuclear, ampliar a capacidade produtiva de energia hidroelétrica (Itaipu) e substituir a utilização de derivados de petróleo por energia elétrica, programa do álcool (Proalcool) para substituir a gasolina, expandir o transporte ferroviário (ferrovia do aço), ampliar a exploração e utilização de carvão; (iii) bens de capital...” [Gremaud, Amaury Patrick (1997) p.193].

A partir da década e 80, com as duas crises do petróleo, e principalmente, devido à

crise do México de 1982, diminuiu-se o fluxo de capital para as economias em

desenvolvimento e consequentemente os investimentos em infra-estrutura.

Os investimentos nas indústrias de rede, principalmente a de origem estatal, sempre

estiveram concentrado nas áreas de energia, telecomunicações e transporte. A tabela 4 mostra

o volume de investimento por área de aplicação no Brasil no período de 1990 a 1998. O setor

de energia absorveu a maior parte dos investimentos nesse período, seguido pelos setores de

telecomunicações e transporte.

Tabela 4 – Investimento no Brasil (US$ Bilhões)

Ano Energia Telecomunicações Transportes Total 1990 8,8 1,6 0,6 11,0 1991 5,7 2,8 0,9 9,4 1992 4,9 2,8 1,0 8,7 1993 4,5 3,2 0,9 8,6 1994 3,9 3,2 1,2 8,3 1995 4,2 4,0 1,1 9,3 1996 4,0 6,0 1,6 11,6 1997 4,8 7,5 1,5 13,8 1998 5,4 3,7 0,8 9,9 Total 46,2 34,8 9,6 90,6

Fonte: PEGO, 2002

61

61

Embora o setor de energia tenha atraído a maior parte dos investimentos em infra-

estrutura, a distribuição dos recursos dentro desse setor não se deu de forma simétrica, isto é,

grande parte dos recursos destinados a esse setor foram para a indústria do petróleo e para a

produção hidroelétrica. Nesse sentido, os investimentos em gás natural foram praticamente

nulos até o final dos anos 80. Somente a partir do Programa Nacional do Gás Natural

(PNGN), de 1987, que se passou a considerar o gás natural como um terceiro pilar energético

do país. Contudo, as sucessivas crises econômicas e a precariedade das finanças públicas

levaram ao fracasso do programa.

Assim, até meados da década de 90, a participação do gás natural na matriz energética

brasileira era inexpressiva. Em 1970, por exemplo, o consumo de gás natural representou

0,2% do consumo de energético no Brasil (Santos 2002 p.245). A partir da década de 80, a

participação na matriz energética aumentou para a média de 2% ao ano chegando a 3% em

1999 (Santos 2002 p.245). Esses dados indicam o baixo investimento feito na cadeia de

produção do gás natural nesses períodos.

A década de 90 foi marcada por uma mudança do papel do Estado nos setores de infra-

estrutura. O processo de privatização iniciado nas últimas décadas fez com que o estado

deixasse de atuar diretamente na produção dos serviços de infra-estrutura e passasse a atuar

como agente regulador e supervisor dos mercados. A lei de Concessões de 13 de fevereiro de

1995 indicou uma mudança de rumo na importância do papel do Estado no setor de infra-

estrutura. Foram criadas agências autônomas voltadas para a regulação dos setores elétrico, de

petróleo e gás e de telecomunicações.

Segundo o BNDES, a privatização e a concessão dos serviços de infra-estrutura têm

como objetivo intensificar o processo de competição no atendimento dos serviços, elevar a

eficiência e a competitividade da indústria nacional, pela redução do custo Brasil, aumentar o

estoque de receita, ajudando na redução da dívida pública, desonerar os cofres públicos de

62

62

prejuízos acumulados por empresas deficitárias, liberar um maior aporte de recursos para o

governo federal concentrar esforços nas políticas sociais (educação, saúde, habitação,

segurança pública, etc.) e impulsionar o mercado acionário doméstico atraindo investidores

externos e capitalizando as empresas (BNDES, 1994).

De acordo com a Secretaria de Desestatização do BNDES foram privatizados, nos

vinte e cinco meses do governo Itamar Franco, um total de quinze projetos, que representaram

cerca de US$ 6,5 bilhões, dos quais US$ 4,6 bilhões em vendas e US$ 1,9 bilhão em dívidas

transferidas. No período 1991 a 1998 os setores com maior participação nos resultados gerais

da desestatização foram o de telecomunicações (37%); energia elétrica (33%); siderurgia

(10%); e mineração (8%) (BNDES, 1994). O gráfico 7 mostra o percentual das participações

dos setores no processo de desestatização.

No caso das concessões, a maior dificuldade encontrada (Pinheiro, 1996) é a falta de

mecanismos de financiamento de longo prazo para as obras de expansão necessárias. A

viabilização das concessões no Brasil é fundamental como instrumento de atração dos

investimentos e de regulação do setor. A regulação do setor deve conter regras claras e

estáveis, mas com suficiente flexibilidade para comportar as alterações tecnológicas e as

mudanças econômicas e institucionais.

Wald, Moraes e Wald indicam alguns importantes condicionantes para o sucesso das

concessões (PEGO, 2002 p.43). Os projetos devem ter capacidade de autofinanciamento,

garantia da manutenção de tarifas acordadas no contrato e a possibilidade de reajuste,

compatibilização de tarifas com a capacidade de financiamento dos usuários, redução dos

riscos econômicos (comercial e financeiro) a serem assumidos pelo concessionário e redução

dos riscos político e social, assumidos pelo governo. Essas condicionantes ressaltam a

importância do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão, que deve ter

63

63

como elementos centrais a tarifa e a repartição dos riscos entre o concessionário e o poder

concedente.

Gráfico 7 – Participação setorial nas Desestatizações no Brasil (1991/1998)

Telecomunicações37%

Decreto 1.0681%

Mineração8%

Outros2%

Petroquímica4%

Siderurgia10%

Gás/Saneamento Básico

1%

Energia Elétrica33%

Financeiro2%

Ferroviário2%

Fonte: PEGO, 2002

Atualmente, vive-se um período de transição marcado pela existência de empresas

recém privatizadas, empresas públicas e empresas privadas já consolidadas. Nos setores em

que empresas privadas convivem com empresas estatais, como é o caso do setor de

distribuição de gás natural30, existe uma clara diferença no que se refere à eficiência

econômica.

2.4.3 Fontes de Financiamento de Infra-Estrutura

Os investimentos nas indústrias de rede, como se mostrou acima, estiveram por muito

tempo a cargo do Estado. Dessa forma, os recursos para financiar os investimentos nos

serviços de infra-estrutura no Brasil vieram, em sua maior parte, das empresas estatais, que

30 Atualmente, existem no Brasil 24 empresas de distribuição de gás natural, sendo que apenas 18 destas estão em operação, as demais aguardam a finalização de projetos de transporte que garantam o suprimento para suas regiões. Do total das empresas apenas cinco foram privatizadas (CEG, CEG Rio, COMGAS, Gás Natural SPS e Gás Brasiliano) as restantes são controladas direta ou indiretamente pelos governos estaduais.

64

64

dispõem de quatro fontes: receita operacional; operações de crédito (interno e externo);

receita não operacional e recursos do Tesouro Nacional.

No período que vai de 1980 até 1998, a principal fonte de financiamento das empresas

estatais foi a geração interna de recurso, ou seja, a receita operacional da venda de bens e

serviços e a receita oriunda das operações financeiras. A participação da geração interna de

recurso chegou a 61,2% em 1998, seguida pelas operações de crédito (22,6%) (IPEA, 1999).

A tabela 5 mostra a principal fonte de recursos das empresas estatais federais no período de

1980 a 1998.

Tabela 5 - Evolução das Fontes de Financiamento das Empresas Estatais

Federais 1980/1998

(em %) Receita 1980 1985 1989 1992 1995 1997 1998Operacional 70,5 66,1 82,5 90,8 71,8 59,3 61,2Op. de crédito 18,4 21,5 10,1 3,4 11,4 16,3 22,6Não operac. 3,3 6,5 2,7 1,9 0,8 0,1 0,1Tesouro 3,2 5,9 4,7 0,7 1,3 1,8 0,8Outros 4,6 0 0 3,2 14,7 22,5 15,3Total 100 100 100 100 100 100 100Fonte: PEGO, 2002

A deterioração dos setores de infra-estrutura no Brasil deve-se em grande medida a

crise financeira da União. Recentemente a capacidade de investimento do setor público, seja

ele Federal, Estadual ou Municipal, encontra-se aquém das necessidades demandadas pelos

setores de infra-estrutura. Esse fato deve-se a incapacidade do governo em gerar poupança,

devido à mudança de prioridade de seus gastos, ao pagamento de elevados juros em razão do

endividamento crescente, a restrição à obtenção de novos empréstimos, as crescentes

necessidades de repasses aos fundos de pensão e a incapacidade de redução dos custos no

curto e médio prazo.

O início dos anos 90 foi marcado por uma mudança na condução da política

econômica. Sucessivos planos econômicos (Plano Collor, Plano Real) buscaram criar um

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ambiente de estabilidade. Nesse contexto passou-se a adotar políticas orçamentária, fiscal, e

monetária restritivas, reduzindo-se drasticamente os recursos disponíveis para o investimento

em infra-estrutura. No conjunto das reformas propostas pelos planos de estabilização, reduziu-

se a atuação do Estado na produção de bens e serviços através do fortalecimento do processo

de privatização. A tendência das reformas propostas foi aumentar a participação do Estado

nas áreas consideradas de prioridade como saúde e educação, e deixar a cargo da iniciativa

privada, a exploração dos serviços de infra-estrutura, cabendo ao Estado apenas a regulação e

supervisão dessas atividades.

2.4.4 Alternativas para o Financiamento de Projetos de Infra-Estrutura

O surgimento recente de inovações financeiras tem criado alternativas para o

financiamento de longo prazo, como foi visto na seção 2.3 No caso dos setores de infra-

estrutura destacam-se dois novos mecanismos de financiamento, o Project Finance e o

lançamento de título no mercado internacional. O Project Finance (Pinheiro, 1996) trata-se da

mobilização de recursos a partir da elaboração de projetos específicos que exigem

detalhamento apurado do risco envolvido e da sua distribuição entre os participantes.

A avaliação dos riscos envolvidos no Project Finance é de extrema importância. No

caso Brasileiro, um obstáculo à sua implementação é o mercado incipiente de seguros

(Pinheiro, 1996). As companhias seguradoras possuem pouca ou nenhuma experiência na área

de estruturação de riscos, principalmente em projetos de infra-estrutura. Dessa forma, o

desenvolvimento do mercado secundário de papéis securitizados fica extremamente

prejudicado pela falta de avaliação correta dos riscos envolvidos nos projetos a serem

financiados.

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A análise do setor de infra-estrutura de outros países mostra uma tendência à adoção

do Project Finance como alternativa para o financiamento de longo prazo. Dados do banco

mundial mostram que os recursos obtidos através do Project Finance dobraram no período de

outubro de 1992 a outubro de 1993 (PEGO, 2002). Os países que mais se utilizam do Project

Finance são os de rendas alta e média. O setor mais beneficiado tem sido o de transporte, que

engloba a construção de rodovias e pedágios.

O lançamento de títulos no mercado internacional é uma segunda alternativa ao

financiamento de longo prazo das empresas. Após 1994, com a renegociação da divida

externa brasileira, o Brasil voltou a captar recursos no mercado financeiro internacional. A

maior vantagem das novas emissões externas foi a formação de uma base de investidores de

longo prazo, consolidando a abertura de novos mercados e viabilizando um maior leque de

alternativas para o financiamento do setor público brasileiro. Em 2006, por exemplo, a

Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) emitiu US$ 1 Bilhão em bônus com prazo de

vencimento de 10 anos e rendimento de 6,25% ao ano. O retorno para o investidor é inferior

ao retorno sobre os bônus emitidos pela companhia em 2003, o que reflete a melhor

percepção de risco de crédito da companhia pelas principais agencias de rating. Os bônus de

2006 da CVRD receberam classificação de risco BBB pela Standard & Poor’s e Baa3 pela

Moody’s.

No caso brasileiro, a emissão de títulos no mercado internacional é restringida pela

situação política e econômica do país, que faz com que o risco Brasil oscile constantemente.

Dessa forma, a colocação de títulos no mercado internacional, mesmo os das empresas

estatais e dos municípios, que apresentam isenção de imposto, pode ser dificultada caso a

percepção de risco do agente emissor seja elevada. Assim, a estabilidade econômica e política

do país é um elemento central na expansão das opções de financiamento de longo prazo.

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2.5 Conclusões

O objetivo desse capítulo foi analisar, de forma sucinta, a evolução do sistema

financeiro brasileiro, as características do setor de infra-estrutura brasileiro e o padrão de

financiamento adotado pelas empresas deste setor, identificando dessa forma, as principais

fontes de recursos para o financiamento de longo prazo.

Assim verificou-se que o financiamento, principalmente de longo prazo, no Brasil

sempre esteve muito dependente dos recursos públicos, em especial dos recursos do BNDES,

e do crédito internacional. Esse fato deve-se a dificuldade de captação de poupança interna

devido à falta de mecanismos financeiros e a falta de uma cultura poupadora. Nos últimos

anos vemos uma redução do crédito publico, devido à política orçamentária restritiva dos

últimos governos. Assim o financiamento de longo prazo passa a depender cada vez mais dos

recursos externos e do autofinanciamento.

As características dos setores de infra-estrutura mostram que o financiamento dos

investimentos necessários para a expansão de sua rede de serviço não pode ser feito apenas a

partir de recursos próprios. Nesse caso, a existência de fontes de financiamento torna-se

essencial para o desenvolvimento da indústria de rede no país.

No capítulo seguinte serão analisadas as principais características do setor de

distribuição de gás natural, identificando um possível padrão de financiamento adotado pelas

empresas operantes nesse setor. Assim, as empresas distribuidoras serão dividas em dois

grupos, o das estatais e o das empresas privadas. A análise do balanço das principais empresas

do setor tentará identificar se o nível de endividamento atual das empresas e o custo

financeiro a ele associado são obstáculos à expansão dos investimentos.

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Capítulo 3 - Padrão de Financiamento e a Estrutura do Setor Brasileiro de Distribuição de Gás Natural

O presente capítulo pretende analisar a estrutura do setor de distribuição de gás natural

e os principais indicadores financeiros das empresas de gás canalizado no Brasil. A primeira

seção mostrará como o setor de distribuição está estruturado, quais são as características

técnicas e econômicas do serviço de fornecimento de gás natural e quais são as diferenças

entre os contratos de concessão das empresas estatais e das empresas privadas.

A segunda seção irá analisar os principais indicadores financeiros das empresas de

distribuição de gás. O setor de distribuição de gás natural brasileiro após 1999 passou a ser

dividido em dois grupos de empresas, o primeiro das empresas estatais e o outro das empresas

privadas. Nos últimos cinco anos observou-se uma rápida expansão das redes de distribuição

e do número de clientes das empresas privadas, esse crescimento, contudo, não foi

acompanhado pelas empresas públicas de distribuição de gás. Nesse sentido, o objetivo da

seção 3.2 será identificar quais as possíveis limitações financeiras que explicam a diferença

existente entre os graus de desenvolvimento das empresas estatais e privadas do setor. Para

isto, dividiu-se a análise em dois grupos, o primeiro englobando as empresas privadas e o

segundo as empresas estatais, de forma a enfatizar as diferenças existentes na gestão

financeira dessas duas classes de empresas.

A terceira seção buscou identificar as principais fontes de recursos utilizadas pelas

empresas de fornecimento de gás canalizado. Dessa forma foram apontadas e analisadas as

principais linhas de financiamento existentes, como por exemplo, os programas do BNDES

destinados ao fomento do setor de gás natural, os principais agentes internacionais e os

mecanismos de mercado utilizados pelas empresas de distribuição de gás.

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Dessa forma, o principal objetivo desse capítulo é mostrar as principais diferenças

existentes entre as empresas privadas e estatais do setor de distribuição de gás natural,

principalmente no que diz respeito a seus programas de investimentos e a estrutura de

financiamento de seus projetos de expansão. A metodologia usada partirá da análise do

balanço patrimonial e do demonstrativo de resultado das principais empresas31 de distribuição

de gás natural, para verificar se o nível e a capacidade de endividamento das empresas do

setor explicam as diferenças existentes entre as empresas.

3.1 Estrutura da Distribuição de Gás Natural

A indústria de gás natural, em particular, o segmento de distribuição apresenta

espeficidades técnicas e econômicas que condicionam um padrão de financiamento adequado

a expansão do setor. Dessa forma, a análise das características específicas e da estrutura do

segmento de distribuição de gás natural é um pré-requisito para qualquer estudo que se queira

fazer a respeito dos condicionantes do investimento nas redes de distribuição.

3.1.1 Características Econômicas do Setor de Distribuição de Gás Natural

Conforme foi analisado no capítulo anterior o setor de infra-estrutura apresenta uma

série de características que o diferenciam dos demais setores da economia. Dentro dos

serviços de infra-estrutura destaca-se o serviço de distribuição de gás natural, que como será

visto a partir desta seção, apresenta também uma série de particularidades técnicas e

econômicas. Com o objetivo de tornar a análise mais didática, se dividirá a seção em três 31 Selecionou-se o balanço das seguintes empresas de distribuição de gás natural para a análise dos indicadores financeiros utilizados nesse trabalho: ALGAS, EMSERGÁS, POTIGÁS, SULGÁS, BAHIAGÁS, COPERGAS, PBGÁS, SCGÁS, COMPAGAS, CEG, CEG-RIO, COMGAS, SPS GÁS NATURAL.

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partes, a primeira identificará os principais custos existentes na cadeia do gás natural, a

segunda analisará os aspectos regulatórios relacionados à existência de monopólio natural no

segmento de distribuição de gás e a terceira buscará identificar a existência de economias de

escala e de densidade no serviço de fornecimento de gás.

3.1.1.1 Principais Custos da Distribuição de Gás Natural

A indústria do gás natural é dividida nos seguintes segmentos: Produção ou

importação, transporte, distribuição e comercialização. O segmento de distribuição é

responsável em média por 50% do valor adicionado ao preço final. O quadro 2 mostra a

diferença entre a porcentagem do valor adicionado pelo segmento de distribuição ao preço

final em diferentes países. Esses dados indicam que, na maior parte dos países, os custos

associados ao segmento de distribuição representam uma alta parcela, se não a maior, do

custo de se levar o gás natural do poço até o consumidor final. Esse fato é importante quando

se analisa os condicionantes do investimento nesse segmento.

Quadro 2 – Valor adicionado no Segmento de Distribuição de Gás Natural, 1995

Fonte:IEA,1998

No que diz respeito ao investimento, a indústria do gás é muito intensiva em capital.

Estima-se que excetuando a produção e ou importação, o segmento de distribuição

corresponde entre 70 e 80% do total do custo de investimento, enquanto que o custo de

investimento em transporte (transmissão) corresponde entre 20 a 30%. Entre os investimentos

Bélgica 46% França 52% Alemanha 53,7% Itália 37% Holanda 19,7% Inglaterra 48,2%

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em distribuição, as redes de dutos correspondem a 75%, a medição 5% e as estações de

redução de pressão 10%. (IEA, 1998)

Os principais custos associados ao serviço de distribuição de gás natural, excetuando o

custo de aquisição de gás, são salários e encargos sociais, os custos operacionais e os custos

de depreciação32 e amortização. A Tabela 6 mostra os diferentes custos associados à

distribuição de gás natural como porcentagem da margem operacional bruta, em 4 países

europeus. Na média percebe-se que o custo de depreciação corresponde a 1/3 do custo total,

enquanto os custos operacionais e os encargos sociais e salários correspondem aos outros 2/3.

Tabela 6 – Custos de Distribuição de Gás Natural (%) sobre a Margem Bruta

(1995)

Alemanha Bélgica Itália Holanda Salários 29,5 21,4 25,1 28,2 Custos Operacionais 27,4 19,7 31,8 26,7 Depreciação 31,2 17,1 27,9 23,4 Sub Total 88,1 58,2 84,8 78,3 Lucro Operacional 11,9 41,8 15,2 21,7 Margem Bruta 100,0 100,0 100,0 100,0

Fonte: IEA,1998

No caso brasileiro a distribuição entre os custos não se dá de forma tão simétrica. A

análise do Demonstrativo de Resultado e do Balanço Patrimonial da COMGAS e da Bahiagás

do período de 2004 mostrou que a depreciação representou 23% dos custos da COMGAS e

apenas 2% no caso da Bahiagás33. Os custos operacionais representaram a maior parcela das

despesas da COMGAS e 43% dos custos da Bahiagás, que teve os salários como principal

componente dos seus custos (54%).

32 A depreciação se refere a distribuição do custo de investimento ao longo da vida útil das instalações e bens físicos necessários para o serviço de distribuição de gás natural. Dessa forma o custo de depreciação vai depender do investimento e das regras contábeis a serem adotadas por cada país. 33 O baixo valor do custo de depreciação da Bahiagás se da pela ausência de grandes investimentos recentes e pela discrepância entre o período contábil de depreciação e a vida útil dos bens de capital. Dessa forma grande parte dos ativos fixos, utilizados pela empresa atualmente, já foram integramente depreciados.

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Como observado acima o custo de depreciação, em alguns casos, representa 1/3 dos

custos totais de distribuição. A conta de depreciação representa a diluição do investimento

feito ao longo do tempo de vida útil das instalações e equipamentos necessários ao

fornecimento de gás canalizado. As regras de depreciação variam de país para país, e no caso

brasileiro são determinadas pelos contratos de concessão. Em muitos casos o período de

depreciação estabelecido é inferior a vida útil do bem de capital, o que acaba superestimando

o custo de depreciação. O período de depreciação contábil é em media 20 anos, enquanto

alguns ativos fixos de distribuição de gás natural possuem vida útil de sessenta anos. Dessa

forma, o estabelecimento de períodos de depreciação próximos a vida útil dos equipamentos e

instalações de distribuição de gás natural é fundamental para a análise da capacidade de

financiamento das empresas.

Tabela 7 – Demonstrativo de Resultados 200434

Comgás % Bahiagas % Receita Operacional 2.223.794.000,00 100,0 500.059.000,00 100,0 (Despesas com Gás) (1.444.068.000,00) (64,9) (430.069.000,00) (86,0)Margem Bruta 779.726.000,00 35,1 69.990.000,00 14,0 (Salários) (109.708.000,00) (4,9) (11.817.000,00) (2,4)(Outros custos operacionais) (121.066.000,00) (5,4) (9.619.000,00) (1,9)(Depreciação e Amortização) (67.614.000,00) (3,0) (449.000,00) (0,1)Resultado Operacional 481.338.000,00 21,6 48.105.000,00 9,6 Resultado financeiro (112.745.000,00) (5,1) 4.243.000,00 0,8 Resultado não operacional (59.201.000,00) (2,7) (5.232.000,00) (1,0)Lucro antes dos impostos 309.392.000,00 13,9 47.116.000,00 9,4 Impostos (67.642.000,00) (3,0) (15.264.000,00) (3,1)Lucro líquido 241.750.000,00 10,9 31.852.000,00 6,4 Fonte: Balanço Patrimonial e DRE das empresas

34 A escolha das empresas da exemplificação feita na tabela 7 teve por objetivo mostrar a diferença entre as componentes do custo das empresas de distribuição de gás natural, em particular da depreciação. A análise das tabelas 7 e 8, contudo, deve ser feita com cuidado já que existe uma grande diferença entre estas empresas, tanto no que diz respeito aos investimentos realizados quanto ao numero de clientes e por conseguinte, ao faturamento.

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Tabela 8 – Participação sobre a Margem Bruta

Comgas Bahiagas Salários 14,07% 16,88% Custos Operacionais 15,53% 13,74% Depreciação 8,67% 0,64% Sub Total 38,27% 31,27% Lucro Operacional 61,73% 68,73% Margem Bruta 100,00% 100,00%

Fonte: Balanço Patrimonial e DRE das empresas

Tabela 9 – Pesos Relativos dos Custos

Comgas Bahiagas Salários 36,77% 54,00% Custos Operacionais 40,57% 43,95% Depreciação 22,66% 2,05% Sub Total 100,00% 100,00%

Fonte: Balanço Patrimonial e DRE das empresas

O custo de aquisição de gás natural não pode ser considerado como um custo direto da

atividade de distribuição, mas sua importância para o custo total das empresas distribuidoras

faz com que a questão dos contratos de aquisição de gás com as transportadoras seja essencial

para a viabilidade econômica dos investimentos das empresas. No caso dos países europeus

analisados, o custo de aquisição de gás corresponde em média a 60% da receita operacional

(IEA,1998). No Brasil esta participação é ainda mais elevada, 65% no caso da Comgas e 86%

no caso da Bahiagás, como podem ser observados na tabela 7.

3.1.1.2 Economias de Escala e de Densidade

Entre as características mais importantes do setor de distribuição de gás natural estão a

densidade de consumo, a economia de escala e a economia de escopo. A indústria do gás

natural, como qualquer indústria de rede, se beneficia do que em economia se chama de

densidade de consumo. Isto é, quanto mais capilarizada for à rede de distribuição menor será

o custo de expandir o serviço para um novo cliente que se situe dentro da área já atendida pela

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empresa de gás. Dessa forma, a expansão da rede de distribuição tende a diminuir o custo

marginal de produção do serviço de gás encanado.

Uma outra característica da indústria de gás natural é a economia de escala. Dizemos

que uma empresa possui economia de escala quando o aumento da produção reduz o custo

médio de longo prazo. Isto é, quando f(tK, tL) > t f(K, L), ou seja, quando o aumento da

utilização dos insumos produtivos aumenta mais do que proporcionalmente o produto final. A

teoria econômica tradicional dos custos admite que as economias de escala de um setor

existem até um determinado ponto onde se atingiria o mínimo dos custos, a partir desse ponto,

o aumento das empresas causaria ineficiências gerenciais e administrativas que elevariam os

custos35. No caso de monopólios naturais, a estrutura de custos é caracterizada por economias

de escala em todas as faixas produtivas relevantes, o que permite que as empresas desse setor

assumam tamanhos suficientes para atender a todo o mercado.

As economias de escopo definem-se pela redução dos custos da empresa quando esta

passa a utilizar sua planta para a produção de mais de um tipo de bem. Isto é, C(qa, qb) < C(qa,

0) + C(0, qb), ou seja, quando o custo de produzir conjuntamente qa e qb é menor do que a

soma dos custos de produzir separadamente cada produto. Assim o aumento da variedade de

produtos no portfolio da empresa diminui seu custo médio.

O conceito de economia de escopo depende da subaditividade de custos, logo a

existência de economias de escopo depende da economia de escala. Na prática existem três

fontes de economia de escopo que são:

a) a existência de fatores comuns, isto é, quando um determinado fator de produção é

utilizado para a produção de mais de um produto ou serviço;

b) a existência de reserva de capacidade, ou seja, quando existe capacidade ociosa na

planta produtiva;

35 Existem outras correntes teóricas que não admitem o crescimento dos custos com o tamanho da empresa. Para estes autores, a ineficiências gerenciais poderiam ser supridas por modernas técnicas administrativas.

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c) complementaridade tecnológica.

O setor de distribuição de gás, nesse sentido, apresenta algumas atividades onde a

existência de economias de escala e de escopo estimulam o crescimento e desenvolvimento do

serviço de distribuição. Entre estas atividades podemos citar:

a) processo de medição: apresenta baixa potencialidade para economias de escala,

mas um grande potencial para economia de escopo, já que um mesmo individuo

pode ser responsável pela medição dos serviços de gás, água e eletricidade.

b) faturamento: grande potencial de economias de escopo, já que uma única fatura

seria suficiente para cada individuo.

c) formalidades contratuais: beneficia-se de economia de escopo, dado que um único

contrato seria necessário para todos os serviços contratados.

d) os custos de monitoramento e de controle são parcialmente fixos, dessa forma o

aumento do tamanho da empresa tende a reduzir o custo médio.

Estimativas da Agência Internacional de Energia (EIA 1995) mostrou que 25% dos

custos das empresas européias de distribuição poderiam ser reduzidos com as economias de

escala. O não aproveitamento pleno das economias de escala, de escopo e da densidade do

consumo indicam uma ineficiência das empresas do setor.

3.1.1.3 Aspectos Regulatórios e Monopólio Natural

O segmento de distribuição de gás natural é comumente associado à idéia de

monopólio natural, na verdade, somente a distribuição física pode ser considerada um

monopólio natural, já que não é eficiente economicamente se ter duas redes de distribuição

competindo entre si. As demais atividades relacionadas com o segmento de distribuição,

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como a comercialização e os serviços de medição e cobrança, não apresentam características

de monopólio sendo eficiente economicamente promover a competição nesses setores.

Na década de 90, o estado brasileiro passou por uma série de reformas que tiveram

como objetivo mudar o papel do estado na economia. Dentro destas reformas destaca-se o

programa de privatização das empresas públicas. No setor de distribuição de gás natural,

verificou-se, no final da década de 90, a privatização de alguma das maiores empresas de

distribuição de gás canalizado. Assim, a Comgas, Ceg, Ceg Rio, SPS Gás natural e a Gás

Brasiliano, passaram a ser controladas pela iniciativa privada. Sendo considerado como um

caso de monopólio natural e de serviço de infra-estrutura, o serviço de distribuição de gás

passou a ser feito sobre a forma de concessão. Nesse sentido a regulação do setor passou a ser

essencial para a adequação dos interesses privados aos interesses públicos.

A construção de um marco regulatório para a indústria do gás se deu com a

promulgação da Lei 9478/97, conhecida como “Lei do Petróleo”, que entre outras medidas

criou a Agência Nacional do Petróleo (ANP), que tem por objetivo regular todas as atividades

relacionadas à indústria do Petróleo, Gás e derivados. A questão que se levanta sobre os

objetivos da regulação do setor de distribuição é se esta deve priorizar aspectos sociais como

segurança no abastecimento e massificação do uso ou deve concentrar seus esforços na

eficiência econômica. Em países com indústria nascente, parece razoável que se dê

preferência para o primeiro objetivo, contudo em países com indústria mais madura, a busca

por uma maior eficiência econômica, pode trazer benefícios para os usuários finais.

A regulação, dessa forma, não deve ser vista como um fim em si mesma. Cabe a esta

viabilizar objetivos políticos e econômicos específicos. No caso do segmento de distribuição

de gás natural esses objetivos deveriam ser:

a) eficiência econômica;

b) segurança no fornecimento;

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Na maioria dos países, as empresas de distribuição de gás natural operam sobre o

regime de exclusividade geográfica, isto é, elas detêm o direito exclusivo de distribuição de

gás natural em uma determinada região ou cidade, como é o caso brasileiro, e tem suas

atividades regidas por contratos de concessão de longo prazo. No que se refere à tarifação,

existem diferentes metodologias com diferentes objetivos, que nem sempre assumem

características puramente econômicas. Em alguns casos, as companhias de transporte

possuem o direito de fornecimento de gás natural para grandes consumidores finais, sendo

destinado para as empresas de distribuição apenas o fornecimento doméstico. Dessa forma, a

participação das empresas de distribuição no fornecimento de gás natural varia muito de país

para país. Na Alemanha, por exemplo, as empresas de distribuição são responsáveis por 68%

das vendas finais de gás natural, sendo o restante abastecido diretamente pelas empresas

transportadoras (IEA, 1995).

No que diz respeito à estrutura de capital das empresas de distribuição, tem-se uma

diferença clara entre as estrutura de incentivos das empresas privadas e das empresas estatais.

O capital privado tem com objetivo principal a maximização dos lucros e/ou dividendos que

retornam para o setor privado servindo como fonte de recursos para novos investimentos. No

caso das empresas estatais há um interesse claro em manter as tarifas reduzidas em detrimento

da maximização dos lucros. Por serem controladas pelos governos estaduais e representarem

um serviço de utilidade pública, a atividade de distribuição de gás canalizado é comumente

utilizada como instrumento eleitoral.

O setor de gás natural no Brasil é carente de uma regulação específica que considere

as particularidades da indústria gasífera. Com a promulgação de Lei 9478/97 o gás natural

passou a ser visto e tratado como um derivado da produção de petróleo, isto deve-se

principalmente pelo fato de por muito tempo a produção de gás natural ter sido vista como um

resíduo da produção de petróleo, isto evidencia-se pelos altos volumes de gás natural

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queimados e/ou ventilados no processo de extração de petróleo. Entre os 83 artigos da Lei

9478/97, apenas três deles tratam o gás natural independentemente36.

Dessa forma, as regras de regulação da distribuição de gás natural dependem dos

contratos de concessão estabelecidos entre os governos estaduais e as empresas

concessionárias. Os diferentes modelos de contratos existentes estabelecem diferentes regras

para cada empresa de distribuição. Ainda nesse capítulo, se analisará as diferenças existentes

entre os contratos de concessão das empresas privadas e os contratos das empresas estatais e

as limitações regulatórias referentes a cada tipo de contrato.

3.1.2 Estrutura do Setor de Distribuição de Gás Natural Brasileiro

Segundo a constituição federal e a Lei n° 9.478, a distribuição de gás canalizado com

fins comerciais é de exploração exclusiva dos Estados, exercida direta ou indiretamente

através de concessões. Existem no Brasil 24 empresas de distribuição de gás natural, sendo

que apenas 20 destas estão em operação, as demais aguardam a finalização de projetos de

transporte que garantam o suprimento para suas regiões. Do total das empresas apenas cinco

foram privatizadas (CEG, CEG Rio, COMGAS, Gás Natural SPS e Gás Brasiliano) as

restantes são controladas direta ou indiretamente pelos governos estaduais. Na tabela 4

mostra-se a relação das principais empresas do setor de distribuição.

36 Atualmente existem dois projetos de lei para o setor de gás, o que será analisado no próximo capítulo.

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Tabela 10 - Setor Nacional de Distribuição de Gás Natural (2004)*

Empresas Nº de cidades

na área de concessão

Nº de cidades

atendidas

Nº de clientes

Extensão da rede de distribuição

(km)

Vendas em 2005

(1000/m³ dia)

Algas 22 5 155 106 399 Bahiagás 417 7 144 300 3.976 Cegas 184 7 110 180 714 Copergás 185 13 89 211 813 Sergás 75 5 35 63 201 PB Gás 223 6 56 70 253 Potigás 166 8 53 140 291 Gasmig 853 13 169 185 1.804 BR Distribuidora 77 nd 33 150 1.790 Compagás 399 7 106 402 586 Sulgás 467 16 83 370 2.301 Scgás 293 17 74 409 884 Msgás 78 2 10 58 605 Total Estatais 3.439 106 1.117 2.644 14.617 Ceg 16 16 606.766 2.560 4.101 Ceg Rio 75 65 1.500 383 3.265 Comgás 177 44 404.256 3.400 9.873 Gás Natural São Paulo Sul s.a. 93 6 7.230 150 334 Gás Brasiliano 375 4 nd 124 128 Total Privadas 736 135 1.019.752 6.617 17.701

Total 4.175 241 1.020.869 9.261 32.318 * Em 2006 mais duas empresas estatais começaram a operar (GASPISA, no Piauí, e a MTGAS no Mato Grosso), aumentando para 20 o números de empresas operantes. nd: dados não disponíveis Fonte: Elaboração Própria a partir do site Gasnet

A partir da tabela acima pode se comparar o desenvolvimento do conjunto das

empresas privadas com o conjunto das empresas estatais. Os dados da tabela deixam claro o

diferencial existente entre os níveis de investimentos das empresas públicas e privadas de

distribuição de gás natural no Brasil. O gráfico 8 exemplifica melhor a diferença entre as

80

80

empresas distribuidoras de gás ao se analisar a extensão das redes de distribuição de cada

empresa.

Gráfico 8 – KM de redes em 2003 (1.000)

67

75

135

160

170

207

250

311

311

409

425

434

479

2717

3503

PBGAS/PB

MSGAS/MS

ALGAS/AL

CEGAS/CE

POTIGAS/RN

CPERGAS/PE

GASMIG/ MG

BAHIAGA/BA

SULGAS/RS

COMPAGAS/PR

GAS NATURAL/SP

CEG RIO/RJ

SCGAS/SC

CEG/RJ

COMGAS/SP

Fonte: BNDES

Apesar de 82% das cidades estarem na área de concessão das empresas estatais apenas

42% das cidades com fornecimento de gás natural são atendidas por estas empresas. Além

disso, dos 9.261 km de rede de distribuição 73% pertencem às empresas privadas. No que se

refere ao número de usuários, 99% são clientes das empresas privadas. O quadro 3 mostra a

estrutura patrimonial das principais empresas de distribuição de gás natural.

Quadro 3 – Estrutura Patrimonial das Empresas de Distribuição de Gás Natural

Estrutura Patrimonial das empresa de distribuição de gas natural

Algas Gaspart (41,5%) Gaspetro (41,5%) Estado de Alagoas (17%)

Bahiagás Gaspart (41,5%) Gaspetro (41,5%) Estado da Bahia (17%)

Cegas Textília S.A. (41,5%) Gaspetro (41,5%)

Estado do Ceará (17%)

Copergás Gaspart (41,5%) Gaspetro (41,5%)

Estado de Pernambuco (17%)

81

81

Sergás Gaspart (41,5%) Gaspetro (41,5%) Estado de Sergipe (17%)

PB Gás Gaspart (41,5%) Gaspetro (41,5%) Estado da Paraíba (17%)

Potigás Gaspetro (41,5%)

Gás Industrial Participações (20,75%)

Empresa Industrial Técnica (20,75%)

Estado do Rio Grande do Norte (17%)

Gasmig

Cia. Energética de Minas Gerais – Cemig (55,19%) Gaspetro (0,50%)

TSS Participações (39,50%)

Minas Gerais Participações (4,38%)

BR Distribuidora*

BR Distribuidora (100%)

Compagás Copel (51%) Dutopar (24,5%) Gaspetro (24,5%)

Sulgás

Estado do Rio Grande do Sul (51%) Gaspetro (49%)

Scgás Gaspart (41%) Gaspetro (41%) Estado de Santa Catarina (17%) Infragás (1%)

Msgás

Estado do Mato Grosso do Sul (51%) Gaspetro (49%)

Ceg Bndespar (34,54%) Enron (25,38%)

Gás Natural SDG (18,89%)

Iberdrola (9,87%)

Ceg Rio Ementhal (33,8%) Gás Natural (25,10%) Gaspetro (25%)

Iberdrola (13,10%)

Comgás

Integral Investimentos (62,69%) Outros (18%) Shell (15,56%)

Governo Federal (0,06%)

Gas Natural São Paulo Sul s.a.

Gás Natural SDG (100%)

Gás Brasiliano SNAM (51%) Italgás (49%) Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados da Gasnet.

Dentro do grupo das empresas estatais predomina a participação da GASPETRO e da

GASPART no controle acionário das firmas de distribuição. No conjunto das empresas

privadas temos a empresa espanhola Gás Natural SDG como principal acionista. Além desta,

temos a Shell, BG, Ementhal, Iberdrola e a Pluspetrol com importantes participações. O

BNDES através de sua subsidiária BNDESPAR possui uma importante participação na CEG

(35%). A Comgas é a maior empresa de distribuição operante no Brasil, tanto em extensão de

rede (3,5 mil de km) quanto em total do ativo (2,2 Bilhões), seus principais acionistas são a

British Gás (BG) e a Shell.

82

82

3.1.3 – Contratos de Concessão

Como foi visto na seção anterior, pode-se dividir o setor de distribuição de gás natural

em dois grupos; o das empresas estatais e o das empresas privadas. Dessa forma, no que se

refere aos contratos de concessão temos três modelos distintos. As empresas estatais são

regidas por um contrato único enquanto que no caso das empresas privadas existe dois

modelos distintos de contrato, um para as empresas do Rio de Janeiro (CEG e CEG- Rio) e

outro para as empresas de São Paulo (Comgás, Gás Natural SPS e Gás Brasiliano). O

Objetivo desta seção é analisar de forma breve os diferentes contratos de concessão existentes

identificando possíveis diferenças regulatórias que expliquem a discrepância entre os níveis

de investimento das empresas privadas e estatais.

A função de regulação do setor de gás natural está dividida entre dois órgãos. A

regulação das atividades de produção, importação e transporte estão sobre a responsabilidade

da ANP, enquanto os setores de distribuição e comercialização são de responsabilidade dos

estados.

“Art. 25 Art. 25 - Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.” (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 5, de 15/08/95).

“§ 2º - Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os

serviços locais de gás canalizado, na forma de lei, vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação.” (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 5, de 15/08/95).

Dessa forma os estados cumprem a função de regulador dos serviços de distribuição

de gás natural ou delegam esta função a um órgão especializado, como é o caso da CSPE,

responsável pela regulação dos serviços de distribuição do estado de São Paulo e da ASEP-

RJ, no caso do Rio de janeiro. Segundo o comissário chefe da CSPE, Zevi Kann, a regulação

em âmbito estadual deve seguir os seguintes princípios: promover a competição na indústria

do gás, corrigir as imperfeições de mercado, estabelecer regras para o livre acesso, assegurar a

83

83

prática de tarifas adequadas, incentivar a eficiência, garantir a qualidade adequada dos

serviços e manter o equilíbrio econômico financeiro das empresas concessionárias. (KANN,

2003)

3.1.3.1 Contratos de Concessão: Modelo Privado

As empresas privadas são regidas por dois modelos de contrato de concessão, um

referente à Comissão de Serviços Públicos de Energia (CSPE) de São Paulo e outro referente

às empresas do estado do Rio de Janeiro. Embora existam algumas espeficidades contratuais

pode-se identificar características comuns a esses dois modelos que os diferenciam dos

contratos estatais.

No caso de São Paulo, o período de concessão dos contratos privados é de 30 anos

podendo ser prorrogado por mais 20 anos uma única vez. Durante todo o período de

concessão são de exclusividade da concessionária os serviços de distribuição e

comercialização a usuários residenciais e comerciais. No que se refere à comercialização a

outros usuários, que não os mencionados acima, o prazo de exclusividade é de 12 anos, no

caso da COMGAS. Após o final do período de exclusividade os usuários ficam livres para

adquirir gás natural da própria concessionária ou de outros comercializadores. Dessa forma, a

concessionária fica obrigada a permitir o livre acesso sem discriminação de usuários mediante

o pagamento de uma tarifa de serviço.

No caso dos contratos do estado do Rio de Janeiro, o período de concessão é de 30

anos podendo ser prorrogado por mais trinta anos uma única vez. A Concessionária tem

exclusividade (no período e na área de sua concessão) na distribuição de gás canalizado, para

qualquer utilização e em qualquer quantidade. Vale ressaltar que, na hipótese de prorrogação

da concessão, o estado poderá decidir sobre todos os termos do novo período da concessão,

84

84

inclusive no que diz respeito à manutenção ou não da exclusividade na prestação do serviço

na área concedida.

O plano de investimentos segue metas estabelecidas pelos órgãos estaduais que devem

ser cumpridas no período de 10 anos, para ambos os contratos (Rio de Janeiro e São Paulo).

Tais metas têm por objetivo manter um grau de expansão da rede de infra-estrutura capaz de

atender a demanda atual e futura de gás natural. Além das metas determinadas pelos estados,

as concessionárias têm a obrigação de atender a solicitação de novos clientes desde que seja

economicamente viável.

Além das metas de investimento os contratos de concessão privados tentam

estabelecer tarifas capazes de proteger os consumidores ao mesmo tempo em que não

desestimulam novos investimentos na expansão das redes de infra-estrutura. Dessa forma os

contratos de concessão privados determinam tarifas teto por classe de consumo de forma a

proteger os consumidores cativos. A tarifa é composta por um mix de preço do gás mais custo

de transporte e margem da empresa. Embora exista uma política de tarifa teto não há restrição

quanto aos descontos dados de forma a possibilitar que as empresas operem com preços

competitivos. As variações no preço de aquisição do gás e do custo de transporte podem ser

repassadas ao preço final dependendo, contudo, da aprovação das autoridades estaduais.

Os contratos de concessão determinam além da metodologia de determinação das

tarifas o plano de revisão tarifária. O processo de revisão tem por objetivo refletir nas tarifas

as alterações nos custos de capital e operacional, na estrutura de mercado, nos investimentos

em expansão das redes de infra-estrutura, na produtividade das empresas do setor e na

tecnologia. Dessa forma o processo de revisão tarifária tem uma periodicidade de 5 anos,

tendo como abrangência a estrutura, o nível e as classes das tarifas.

Outro aspecto regulatório dos contratos de concessão diz respeito à aquisição de gás

natural pelas empresas distribuidoras. Cabe ao estado a aprovação de todos os contratos de

85

85

aquisição e transporte de gás natural como também do grau de repasse dos preços de

transporte e compra de gás para os consumidores finais. No caso das obrigações contratuais

do tipo Take or Pay37 e Ship or Pay, as autoridades regulatórias estaduais não permitem que o

custo de gás comprado e não vendido pelas distribuidoras seja repassado para os

consumidores finais de modo a transferir o risco comercial para as empresas de distribuição

de gás natural.

No que se refere à estrutura patrimonial e de balanço das empresas de São Paulo a

Portaria CSPE – 16/99 de 15/09/1999 limita o controle acionário de diferentes

concessionárias pelo mesmo grupo controlador. Além disso, a concessionária não poderá

contratar fornecimento, em volume superior a 30% do volume total de gás canalizado

adquirido de empresas a ela vinculadas (controladas, controladora e coligada).

Quanto ao balanço das empresas paulistas estas devem respeitar o Plano de Contas de

Registro, ou seja, devem separar os registros contábeis dos custos, despesas e receitas das

atividades de distribuição e comercialização, de forma a possibilitar uma futura separação

dessas atividades.

3.1.3.2 Contratos de Concessão: Modelo Estatal

O modelo do contrato de concessão estatal refere-se àqueles contratos firmados no

início dos anos 90 com as empresas estaduais de distribuição de gás canalizado (controle de

51 % pelo estado e 49% por outras empresas). Dessa forma com exceção das cinco empresas

privadas (CEG, CEG Rio, COMGAS, Gás Natural SPS e Gás Brasiliano) todas as demais

37 Os contratos do tipo Take or Pay ou Ship or Pay caracterizam-se pela compra de um determinado volume de gás a um determinado preço por um determinado período de tempo independente da demanda. Dessa forma as distribuidoras são obrigadas a pagar pela quantidade contratada independente da sua demanda ser maior ou menor.

86

86

empresas de distribuição gás natural têm sua atividade de distribuição regulamentada por

esses contratos. Esta seção analisará as principais características comuns a esses contratos.

O prazo da concessão de todos os contratos firmados no início da década de 90 é de 50

anos, sendo que as atividades de distribuição e comercialização são exclusivas da

concessionária durante todo o período de concessão. Diferente do modelo privado os

contratos estatais não estipulam metas de investimento, eles apenas exigem que o projeto de

investimento a ser realizado possua uma rentabilidade mínima de 20%.

No que diz respeito à metodologia tarifária não existe uma regra de fixação de tarifa

como acontece com as empresas privadas. A concessionária sugere um determinado valor e a

autoridade concedente aprova ou não. A cobrança de tarifas diferenciadas é permitida de

acordo com a sazonalidade, interruptibilidade do fornecimento, perfil do consumo diário,

fator de carga e do preço do energético a substituir. Quanto ao ajuste das tarifas em função

das variações dos preços de compra e de transporte do gás, pode ser feito o repasse imediato

aos preços finais sem prévia autorização. Embora haja previsão de revisões tarifárias anuais,

as tarifas poderão ser revistas a qualquer tempo caso ocorram causas que ponham em risco o

equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ou quando os critérios e parâmetros utilizados

para a fixação das tarifas mostrarem-se desfavoráveis à viabilidade econômica dos

investimentos e da atividade da concessionária, ou imprópria para que a mesma obtenha a

remuneração prevista no contrato.

A aquisição de gás natural junto aos transportadores e produtores, diferente do que

acontece nos contratos privados, não necessita de aprovação prévia dos contratos, sendo ainda

permitido o repasse automático e ilimitado do aumento dos preços de transporte e de compra

do gás ao consumidor final.

A descrição das principais características dos diferentes contratos de concessão deixou

claro que os contratos estatais apresentam uma série de deficiências que explicam em certa

87

87

medida a grande diferença existente entre as empresas privadas e estatais no que se refere à

suas políticas de investimento. A falta de segregação entre as atividades de distribuição e

comercialização não estimula a competição entre esses setores. A metodologia tarifária

utilizada não estimula a redução de custos ao garantir uma remuneração fixa independente da

estrutura de capital da empresa e do custo de oportunidade. A falta de metas de investimento

não garante a existência de uma política de investimento capaz de expandir a rede de infra-

estrutura de modo a atender a demanda atual e futura.

A seção seguinte analisa os principais indicadores financeiros das empresas de

distribuição de gás natural. Esta análise tem por fim verificar se a estrutura financeira,

paralelamente às deficiências dos contratos de concessão, pode explicar o diferencial no nível

de investimento das empresas privadas e estatais.

3.2 Análise dos Indicadores Financeiros das Principais Empresas Brasileiras de Distribuição de Gás Natural.

A análise dos indicadores financeiros das empresas de distribuição de gás tem como

objetivo identificar a capacidade de endividamento do setor de distribuição, de forma a

verificar se as empresas distribuidoras de gás natural possuem capacidade financeira de obter

novos empréstimos para financiar a expansão de suas redes de infra-estrutura. Para tal, foi

desenvolvida uma metodologia própria para o cálculo da capacidade de endividamento que se

baseia na geração de caixa (medido pelo EBITDA38). A escolha do EBITDA como medida de

lucro se deve as suas virtudes enquanto aproximação do fluxo de caixa das empresas de infra-

estrutura.

38 EBITDA é a abreviação da expressão em inglês Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization, que significa lucro antes de descontar os juros, os impostos sobre o lucro, a depreciação e a amortização, em português é conhecido como LAJIDA. Em essência, corresponde ao caixa gerado pela operação da empresa.isto é, o lucro operacional menos o resultado financeiro (receitas menos despesas financeiras) mais a depreciação total.

88

88

O EBITDA tornou-se conhecido e ganhou notoriedade no mercado norte americano na

década de 70. Nessa época, o EBITDA era utilizado pelos analistas como uma medida

temporária para avaliar o tempo que seria necessário para que uma empresa, com grande

volume de investimento em infra-estrutura, viesse a prosperar sob uma perspectiva de longo

prazo. Ao excluir os juros dos recursos financiados e somando-se a depreciação dos ativos, os

investidores conseguiam projetar uma medida de desempenho futuro da empresa,

considerando apenas a atividade operacional. Com o passar dos anos o EBITDA passou a ser

utilizado pela maioria das empresas, principalmente com ações em bolsa, e pelos analistas

financeiros como parâmetro de desempenho e valor das empresas.

O EBITDA, dessa forma, mostra-se como um bom parâmetro para a análise da

lucratividade de empresas principalmente por que ao eliminar os efeitos dos financiamentos e

decisões contábeis, sua utilização pode fornecer uma comparação relativamente boa para o

analista, pois mede a produtividade e a eficiência do negócio. Ademais, o EBITDA como

percentual de vendas pode ser utilizado para identificar empresas que sejam as mais eficientes

dentro de um determinado segmento de mercado. Uma outra vantagem do EBITDA é que

esse pode ser utilizado para comparar a tendência de lucratividade nas indústrias pesadas (ex:

siderurgia e automobilística) até as de alta tecnologia porque remove da análise, o impacto

dos financiamentos de grandes inversões de capital. Além disso, o EBITDA é uma excelente

ferramenta de medição para organizações que apresentem utilização intensiva dos

equipamentos (mínimo de vinte anos). A seguir iremos analisar os principais indicadores

financeiros das empresas de distribuição de gás natural.

89

89

3.2.1 Nível de Endividamento das Empresas de Distribuição de Gás Natural

Tradicionalmente consideram-se dois índices de endividamento na análise de balanço

de uma empresa, o primeiro dele refere-se ao endividamento financeiro, que corresponde ao

valor total das dívidas bancárias sobre o ativo total (EF39/AT40). O segundo índice analisa o

grau de endividamento total da empresa, dessa forma entra não só as dívidas bancárias como

também todas as obrigações da empresa com terceiros [(PC41+ELP42)/AT]. Os índices de

endividamento determinam a relação entre as principais fontes de recursos da empresa, isto é,

qual a porcentagem do ativo que é financiada a partir do capital próprio e qual a porcentagem

que é financiada por capitais de terceiros. A capacidade de endividamento, ou alavancagem,

de uma empresa depende do setor a que pertence. Existem setores da economia que

conseguem operar com níveis mais elevados de endividamentos do que outro, pois seus

credores estão mais propensos a aceitar um nível de risco maior. Assim a quantidade de risco

que possa ser considerável aceitável para uma determinada empresa depende da natureza de

sua atividade, do nível de risco de seu negócio e da sua lucratividade.

39 EF = endividamento financeiro. 40 AT = Ativo Total. 41 PC = Passivo Circulante. 42 ELP = Exigível de longo Prazo.

90

90

Tabela 11 – Nível de Endividamento Setorial – Brasil

Ano de 2005 Recursos de terceiros onerosos*/Ativo total

(1) %

Outras fontes de recursos/Ativo Total (2)

%

Total de recursos de terceiros/Ativo Total

(1)+(2) % Alimentos 39,0 25,0 64,0Bebidas e Fumo 26,1 19,3 45,4Calçados 16,2 23,8 40,0Equipamentos elétricos 41,9 31,1 73,0Máquinas e equipamentos 27,1 23,5 50,6Material de construção 33,7 21,8 55,5Metalurgia 42,9 42,8 85,7Mineração 27,0 24,2 51,2Papel e Celulose 43,3 12,9 56,2Petróleo e Gás 31,9 25,9 57,8Siderurgia 28,1 29,4 57,5Têxtil 20,5 23,9 44,4

Fonte: Relatório IEDI, 2005 *Recursos de terceiros onerosos inclui empréstimos, financiamento e debênture menos aplicações financeiras e disponibilidades.

A tabela 11 mostra a diferença no nível de endividamento existente entre os setores

econômicos brasileiros. Como pode se notar, cada tipo de atividade apresenta um nível de

endividamento adequado. Embora o nível de endividamento ótimo seja diferente de setor para

setor, a teoria de análise financeira considera empresas pouco alavancadas aquelas com níveis

de endividamento inferior a 50%. No setor de distribuição de gás natural, a análise do nível

geral de endividamento das maiores empresas de distribuição de gás natural no mundo

mostrou que estas operam como níveis de alavancagem em torno de 50% (EIA 2004), o que

indica que o nível adequado de endividamento para o setor de gás esteja em torno de 0,5 do

ativo43. A tabela abaixo mostra a evolução do nível de endividamento da GAS Natural SDG, a

maior empresa de distribuição de gás natural da Espanha e uma das maiores do mundo. Os

dados indicam que a empresa vem operando com um nível de endividamento médio de 50%.

43 É evidente que o nível de endividamento ótimo depende de inúmeros parâmetros referentes às particularidades de cada economia estudada, entre eles a abertura do mercado de capitais, a cultura econômica do investidor local, a abertura comercial e dos aspectos regulatórios. A Utilização de dados de empresas de outros países tem apenas a finalidade de estimativa de um índice adequado de endividamento para o setor de distribuição em países com recente desenvolvimento da indústria do gás.

91

91

Tabela 12 – Nível de Endividamento da Gás Natural SDG

2000 2001 2002 2003 2004 Ativo Total 9.735.122 10.060.186 8.809.506 10.008.582 11.336.842ELP 3.282.139 2.522.742 2.142.018 2.848.721 3.087.333PC 1.861.553 2.775.034 1.926.571 2.111.974 2.669.685 PC + ELP/

AT 0,53 0,53 0,46 0,50 0,51

Fonte: Balanço Patrimonial da Empresa

No caso das empresas brasileiras privadas de distribuição de gás natural, o nível médio

de endividamento financeiro em 2004 ficou em torno de 33% o que representou um aumento

de 67% em relação a 1999. Isto significa que do total do ativo, 33 por cento são financiados

por recursos de terceiros44. O crescimento do nível de endividamento das empresas privadas

mostra que estas empresas vêm conseguindo elevar seu grau de alavancagem, o que indica um

maior acesso ao capital de terceiros. Embora o nível de endividamento das empresas privadas

venha apresentando uma trajetória ascendente, o valor de 33% é considerado baixo quando

comparado aos níveis de endividamentos das empresas de outros países com perfil de

mercado semelhante ao do Brasil, como podemos comprovar analisando a tabela 12.

N caso das empresas estatais, a utilização de recursos de terceiros é ainda menor do

que no caso das empresas privadas, isto fica claro quando se analisa o nível de alavancagem

destas empresas. Até 2002, 6 empresas da amostra selecionada não possuíam dívidas

bancárias. Em 2003 o nível de endividamento médio das empresas estatais foi de 13,87%,

enquanto o das empresas privadas esteve na faixa dos 30%. O gráfico 8 mostra a evolução do

nível de endividamento financeiro dos grupos das empresas privadas e estatais.

A comparação dos níveis de endividamento das empresas brasileiras de distribuição de

gás natural com a de outros países, que como o Brasil, apresentaram um recente

desenvolvimento do mercado de gás natural, mostrou que o setor de distribuição de gás no

44 Quanto menor for este índice menor será a dependência da empresa em relação ao capital de terceiros e maior será a liberdade para a tomada de decisões financeiras.

92

92

Brasil encontra-se em um nível sub-ótimo de endividamento. Contudo, vemos um aumento da

captação de recursos de terceiros por parte das empresas privadas, o que fica mais bem

evidenciado pelo gráfico 9. Por outro lado a participação dos recursos de terceiros no

financiamento das empresas estatais, com exceção de algumas poucas empresas do Sul do

país, continuou muito baixo.

Gráfico 9 – Nível de Endividamento Financeiro das Empresas de Distribuição de

Gás Privadas e Estatais

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

40%

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Nível de end. Empresas Priv Nível de end. Empresas Esta.

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

O crescimento do nível de endividamento das empresas privadas se deve

principalmente ao início das operações da Gás Natural São Paulo Sul em 2000 e ao aumento

do nível de endividamento da CEG, que passou de 18,41% em 1999 para 48,10% em 2004.

Nos últimos anos, a CEG vem expandindo sua rede de distribuição no estado do Rio de

Janeiro. Além disso, vem sendo feito, pela empresa, um maciço investimento na conversão do

GLP para gás natural, nas residências do estado, o que explica o aumento no nível de

endividamento da empresa. A principal origem dos recursos continuou sendo o BNDES, que

expandiu a concessão de crédito para o setor de distribuição de gás natural.

93

93

O leve crescimento do nível de endividamento das empresas estatais, não indica um

aumento generalizado da capacidade de obtenção de recursos de terceiros das empresas

públicas de distribuição de gás. Os dados a respeito dos níveis de endividamento das

empresas do sul do país distorcem a média do nível de endividamento da empresas públicas

de distribuição. Esse fato fica mais bem evidenciado quando comparamos o nível médio de

endividamento das empresas estatais com e sem a Sulgás (ver gráfico 10). No primeiro caso o

nível de endividamento médio foi de 13,31% em 2004, enquanto que no segundo, esse nível

passou para 5,57%, no mesmo ano. A Sulgás aumentou seu nível de endividamento de

33,36% em 1999, para 83 % em 2004. Dessa forma, o crescimento do nível de endividamento

do setor estatal de distribuição de gás natural não tem indicado um aumento da

disponibilidade de recursos de terceiros para o financiamento do investimento e da expansão

das redes de distribuição em todo o país.

Gráfico 10 – Nível de Endividamento Financeiro das Empresas de Distribuição

de Gás Privadas e Estatais (sem a Sulgás)

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

40%

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Nível de end. Empresas Priv Nível de end. Empresas Est

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

O gráfico 9 mostra que além do nível de endividamento das empresas privadas ser

maior do que o das empresas estatais, o grau de alavancagem daquelas vem apresentando um

crescimento nos últimos anos muito mais acentuado do que o das estatais. O baixo nível de

94

94

endividamento das empresas estatais, que se reflete em baixo risco de insolvência, como visto

anteriormente, levanta a questão da existência de barreiras não financeiras ao acesso das

empresas estatais ao capital de terceiros.

O gráfico 11 mostra que o nível de endividamento financeiro tem acompanhado o

nível geral de endividamento, o que indica uma preferência das empresas privadas pelos

empréstimos bancários como fonte de recursos de terceiros. A participação das outras fontes

de recursos, como emissão de debêntures e ações, sobre o nível de endividamento parece ter

se mantido constante no período analisado. Esse fato indica que as empresas possuem um

limitado acesso ao mercado de títulos, seja esse de dívida, seja esse de propriedade, isto é

explicado, como visto anteriormente, pelo baixo desenvolvimento do mercado de capital

brasileiro. A Comgas, por exemplo, até 2004, não havia emitido nenhum debêntures de curto

ou longo prazo.

Gráfico 11 – Nível de Endividamento Financeiro X Nível Geral de

Endividamento

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Endiv. Financeiro Endiv. Geral

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

Um outro indicador importante é a participação do capital de terceiro sobre o capital

total das empresas45. No caso das empresas privadas a média desta participação passou de

45 A participação do capital de terceiro sobre o capital total se calcula dividindo o valor da conta capital de terceiro pela soma do patrimônio liquido com o capital de terceiro.

95

95

19,11% em 1999 para 59,23% em 2004, enquanto que a participação do capital de terceiros

sobre o capital total das empresas estatais passou de 31,69% em 1999 para 6,16% em 2003. A

análise da participação do capital de terceiros das atividades de energia no mundo no período

de 1992 à 2001 mostra, como podemos ver no gráfico 12, que no setor de distribuição e

transporte de gás natural o nível de participação dos recursos de terceiros sobre o capital total

das empresas esteve acima de 50%. Dessa forma podemos ver que enquanto as empresas

privadas aumentaram seu nível de endividamento, aproximando dos índices mundiais, às

empresas estatais reduziram a participação dos recursos de terceiros sobre seu capital total,

ficando muito abaixo dos padrões internacionais de endividamento. Os dados sobre os níveis

de endividamento deixam clara a diferença existente entre as estratégias financeiras das

empresas privadas e estatais. Esse fato fica mais claro quando comparamos o nível de

endividamento com a capacidade de endividamento das empresas privadas e estatais.

Gráfico 12 – Participação do Capital de Terceiros Sobre o Capital Total nos

Segmentos de Energia no Mundo no Período de 1992 a 2001 (%)

Fonte: EIA 2004

3.2.2 Capacidade de Endividamento das Empresas de Distribuição de Gás Natural

A capacidade de endividamento de uma empresa está definida da seguinte forma:

96

96

“Em economia empresarial, é a aptidão que uma empresa demonstra para captar recursos tendo por base a sua estrutura financeira. No plano da análise financeira especificamente, convencionou-se que uma empresa que apresente a relação capital próprio/ativo permanente< 0,5 se encontra no limite de sua capacidade de endividamento”. (SANDRONI, 2005)

Existe mais de uma maneira de se calcular a capacidade de endividamento ou de

pagamento de uma empresa. Esse método varia de acordo com a instituição credora e depende

em grande parte do ratings das empresas. Chamamos de ratings o grau de risco que as

empresas oferecem aos seus investidores, sejam eles os seus acionistas, sejam eles os seus

credores. Algumas instituições de crédito, como o BNDES, possuem um mecanismo próprio

de cálculo do ratings de seus clientes. Outras instituições menores e, na maioria das vezes, os

acionista, recorrem às empresas especializadas no cálculo de ratings, como a Standart and

Poor e Moody’s.

O cálculo do rating de uma empresa envolve uma série de fatores e estimativas dos

cenários político e econômicos que o tornam muito complexo e, na maioria das vezes,

confidenciais. De acordo com a classificação da empresa, esta pode ter maior ou menor

acesso ao recurso de terceiros, e dessa forma uma menor capacidade de endividamento.

Segundo relatório da Moodys a metodologia de cálculo do rating de uma empresa deve

englobar alguns importantes aspectos:

a) determinação da previsibilidade da geração de caixa da empresa;

b) exame das tendências setoriais, como custos e preços, concorrência interna e

internacional e possíveis mudanças tecnológicas que possam alterar os níveis de

rentabilidade futura, os valores dos ativos e as possíveis necessidades de

financiamento;

c) análise do cenário político, econômico e regulatório do país ou dos países a onde a

empresa mantém operações;

97

97

d) a qualidade da administração da empresa, isto é, a capacidade da empresa em

utilizar sua capacidade de financiamento, a relação com as autoridades

governamentais, a capacidade de competir com as demais empresas do setor e o

desempenho passado versus o planejado pela empresa;

e) comparação com outras empresas do setor no que diz respeito à capacidade de

geração de receita, à situação financeira e de liquidez e às garantias da empresa.

A análise do ratings das empresas de distribuição de gás natural é um assunto muito

complexo e que foge do escopo desse trabalho. Uma empresa que possui uma elevada

capacidade de geração de caixa tem maior capacidade de endividar-se, dessa forma mesmo

uma empresa com elevado nível de endividamento pode apresentar um nível baixo de risco

dependendo da sua capacidade de geração de recurso. Para a análise da capacidade de

endividamento das empresas de distribuição de gás natural será usada uma metodologia

elaborada a partir do método de avaliação de risco de crédito de algumas importantes

instituições de financiamento do país.

Muitas instituições financeiras analisam a capacidade de endividamento das empresas

a partir da sua geração de lucro, medida pelo EBITDA, e pela sua classificação de risco. Um

exemplo é o da Gas Natural del Espanha que em 1999 obteve sua primeira avaliação de

rating decorrente da sua entrada no mercado de capital europeu em função do programa Euro

Medium Term Notes (EMTN) que permitiu que a GAS Natural de Espanha emitisse bônus no

mercado de capitais europeu. Segundo a Moodys a Gás Natural apresenta classificação A2

enquanto a Standard & Poor’s a classifica como A+, ambas as classificações indicam que a

empresa inspira confiança para os investidores e credores. A classificação do ratings é

especifica para cada empresa do setor e em alguns casos, principalmente de empresas de

capital fechado, ela é de difícil acesso . No Brasil, como a maioria das empresas são de capital

fechado não encontramos com facilidade as classificações de ratings das distribuidoras de gás,

98

98

ainda mais porque os principais agentes financiadores desse setor possuem sua própria

classificação de rating, sendo contudo confidencial, como é o caso do BNDES. Por outro lado

a análise do nível de liquidez e do nível de endividamento das empresas de distribuição de gás

natural em conjunto com a classificação das empresas distribuidoras de outros países com

perfil de mercado semelhante ao do Brasil indicam que estas devem possuir uma boa

classificação no ratings das instituições credoras.

Gráfico 13 – Nível de Liquidez Geral (Média das empresas privadas e estatais)

0

0,5

1

1,5

2

2,5

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Empresas privadas a Empresas estatais

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

Gráfico 14 – Nível de Liquidez Geral das Empresas Privadas

0,00

0,10

0,20

0,30

0,40

0,50

0,60

0,70

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Comgas Ceg Ceg Rio Gás Natural São Paulo

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

Gráfico 15 – Nível de Liquidez Geral das Empresas Estatais

99

99

0,00

0,50

1,00

1,50

2,00

2,50

3,00

3,50

4,00

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Algas Bahiagas Copergas Compagas Sulgas Scgas

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

O índice geral de liquidez é calculado dividindo-se a soma do ativo circulante com o

ativo realizável no longo prazo pela soma do passivo circulante com o passivo realizável no

longo prazo (AC+RLP)/(PC+RLP). Em 2003, por exemplo, a Copergas apresentou um índice

de liquidez de aproximadamente 3,5, isto significa que a soma dos seus direitos de curto e

longo prazo eram 3,5 vezes maior do que a soma das sua obrigação de curto e longo prazo,

dessa forma a empresa poderia pagar todas suas dívidas e ainda ficar com uma margem de

250%. Quando o índice de liquidez de uma empresa é maior do que 1 considera-se que a

empresa apresente baixa probabilidade de incorrer em risco financeiro, já que a soma de seus

ativos de curto e longo prazo é igual ou maior do que a soma das exigências de curto e longo

prazo. Os gráficos 13,14 e 15 mostram que as empresas de distribuição de gás natural, em

particular as empresas estatais, apresentam ótimos níveis de liquidez. Das empresas estatais

analisadas todas possuíam em 2003 índices de liquidez maiores ou muito próximos a um o

que indica uma boa situação financeira, ou seja, uma boa capacidade de pagamento de suas

dívidas.

Algumas instituições financeiras limitam a concessão de seus empréstimos a um

multiplicador da capacidade de geração de caixa menos suas dívidas bancárias. Assim nesse

100

100

trabalho, se utilizará uma metodologia para o cálculo da capacidade de endividamento que

segue a seguinte fórmula:

Pode se dividir a capacidade de endividamento pelo ativo total para determinar qual a

porcentagem do ativo que poderia ser financiada por novos empréstimos. Quanto maior esse

índice, maior será a capacidade da empresa em financiar sua expansão com recursos de

terceiros.

No caso das empresas privadas de distribuição de gás natural, a capacidade de

endividamento do conjunto das empresas passou de 750 milhões em 2002 para 1,2 bilhões de

reais em 2004. O gráfico 16 mostra que o aumento do nível de endividamento das empresas

privadas vem sendo acompanhado pelo aumento de sua capacidade de endividamento.

Segundo a metodologia empregada, o nível de endividamento se encontra ligeiramente acima

da capacidade de endividamento, o que mostra que as empresas privadas apresentam um grau

de alavancagem moderado para alto.

Gráfico 16 – Nível de endividamento X Capacidade de Endividamento das

Empresas Privadas

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

40%

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Cap End/Ativo Nível de Endividamento

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

A melhora na capacidade de endividamento nos últimos anos reflete um aumento das

receitas das vendas de serviços decorrente da conclusão das obras de novos ramais de

Capacidade de Endividamento = ((2,4 x EBITDA) – dívidas bancárias)

101

101

distribuição. O crescimento acentuado da receita operacional, o alto nível de liquidez e o

baixo índice de endividamento das empresas privadas de distribuição criam um espaço para o

aumento da alavancagem, das distribuidoras de gás natural. Esse fato se reflete na capacidade

de pagamento de juros46. O índice de capacidade de pagamento de juros indica quantos por

centos das dívidas bancárias poderiam ser pagos pela geração de caixa da empresa, isto é, qual

a taxa de juros sobre a dívida bancária ou onerosa, que poderia ser suportada pela geração de

caixa. Em 2004, a capacidade de pagamento de juros das principais empresas de distribuição

de gás natural foi de 89% no caso da COMGAS, 115% no caso da Gás Natural SPS e 62% no

caso da CEG Rio e 151% no caso da Compagas. O gráfico 17 mostra a evolução da

capacidade de pagamento de juros de três das principais companhias privadas de distribuição

de gás natural.

Gráfico 17 – Capacidade de Pagamento de Juros

-0,5

0

0,5

1

1,5

2

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Comgas Ceg Rio SPS

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

A aparente facilidade de captação de recursos das empresas privadas não se reflete nas

empresas estatais. Esse fato fica mais evidente quando comparamos o nível de endividamento

do grupo das estatais com a sua capacidade de financiamento. Nos últimos anos houve uma

melhora na capacidade de endividamento das empresas estatais como conseqüência do

46 A capacidade de pagamento de juros é calculada dividindo-se o lucro EBITDA pelo total das dividas bancarias.

102

102

aumento da capacidade de geração de receita. O EBTIDA da Bahiagás, por exemplo, passou

de aproximadamente 13 milhões de reais em 1999 para 74 milhões em 2004. Contudo o nível

de captação de recursos de terceiros não acompanhou o crescimento da receita, o que pode ser

visto no gráfico 18.

Gráfico 18 – Nível de endividamento X Capacidade de Endividamento das

Empresas Estatais

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

1999 2000 2001 2002 2003 2004

Cap End/Ativo Nível de Endividamento

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

Fica evidente que as empresas estatais operam em um nível muito baixo de

alavancagem. Com exceção da Sulgás, que em 2002 possuía uma dívida de curto e longo

prazo somando 110 milhões de reais (balanço patrimonial 2003), da SCgas que possuía uma

dívida bancária de 71 milhões de reais (balanço patrimonial 2003) e da Compagas que possuía

dividas bancárias igual a 44 milhões de reais (balanço patrimonial 2004), a maioria das

empresas estatais não possuía dívidas bancárias até 2004. Esse fato mostra que existem

barreiras não financeiras na captação de recursos por parte das empresas estatais, o que limita

o investimento na expansão das suas redes de distribuição.

103

103

3.2.3 Escala de Produção do Setor de Distribuição de Gás Natural (Giro do Ativo e Margem EBITDA)

Uma característica importante do setor de distribuição de gás natural diz respeito a sua

escala de rendimento. Como vimos anteriormente, as empresas que oferecem serviços

considerados de rede, como a distribuição do gás natural, usufruem de economias de escala e

da densidade de consumo, isto é, conforme a rede de distribuição se expande reduz-se o custo

médio e o custo por unidade adicional de serviço, ou seja, há uma redução do custo marginal

de longo prazo com o aumento da produção. Esta seção verifica se as empresas de

distribuição de gás natural estão operando com rendimentos crescentes de escala, ou seja, se

estão se beneficiando da densidade de consumo e das economias de escala inerentes ao setor.

A fim de verificar se o aumento do investimento está se refletindo em melhora da

margem operacional irá se analisar a evolução do giro do ativo e da margem EBITDA no

período de 1999 a 2004. O giro do ativo (faturamento liquido/ ativo) mostra à proporção que a

receita de vendas deve crescer para o aumento de uma unidade do ativo. Quando o giro do

ativo está crescendo significa que o faturamento aumentou mais do que esta proporção, ou

seja, o aumento do ativo está trazendo uma melhoria para o faturamento liquido causando um

deslocamento da curva de escala de produção.

A margem EBITDA se calcula dividindo o valor do EBITDA pelo faturamento

líquido. Esse índice reflete o quanto à empresa obteve de lucro para cada R$ 100 vendidos. O

crescimento desse índice indica que aumentou a capacidade da empresa em diluir seus custos,

isto significa que tanto o custo fixo quanto o custo marginal por unidade de serviço diminuiu.

O gráfico 19 reflete a evolução do giro do ativo das empresas do setor de distribuição de gás

natural analisadas. Pode se observar que de 1999 até 2003 o índice apresentou uma trajetória

crescente, isto reflete o aumento da receita de venda por unidade adicional do ativo, ou seja,

houve um aumento da eficiência produtiva.

104

104

Gráfico 19 – Giro do Ativo

0,00

0,10

0,20

0,30

0,40

0,50

0,60

0,70

0,80

0,90

1,00

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

Quanto à margem EBITDA, o gráfico 20 mostra que no mesmo período analisado

(1999 a 2003) o percentual do lucro sobre o faturamento liquido aumentou, como uma ligeira

queda no período de 2002 a 2003. A análise de ambos os índices mostra que as empresas de

distribuição de gás natural estão operando em um nível de rendimento crescente de escala,

isto significa que o investimento em novos ativos tende a aumentar a capacidade de geração

de caixa e naturalmente o lucro destas empresas.

Gráfico 20 – Margem EBITDA

0%

5%

10%

15%

20%

25%

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

105

105

3.2.4 Rentabilidade média X Nível de Endividamento

Uma maneira de verificar se as empresas estão operando em um nível ótimo de

alavancagem é comparando o nível de endividamento com a rentabilidade média do

patrimônio líquido das empresas. O cálculo do nível de endividamento já foi descrito na seção

3.2.1 desse capítulo. A rentabilidade média do patrimônio líquido se calcula dividindo o lucro

líquido do exercício pelo patrimônio líquido médio (LL/PL).

A escolha da rentabilidade do patrimônio líquido ao invés da rentabilidade do ativo

deve-se ao fato de que a decisão de investir, ou seja, de contrair novos empréstimos está

relacionada com o ganho que esta decisão pode trazer para o acionista, assim o retorno sobre

o capital próprio é um indicador melhor para o nível ótimo de alavancagem. No gráfico 21

podemos ver que a rentabilidade sobre o patrimônio líquido cresce junto com o índice de

endividamento no caso das 14 empresas analisadas, esse fato indica que na média, as

empresas do setor de distribuição de gás natural operam em um nível subótimo de

endividamento já que o ponto ótimo de alavancagem seria aquele a partir do qual a

rentabilidade começa a reduzir.

Gráfico 21 – Rentabilidade do PL e Nível de endividamento

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Nível de end. Empresas Total Rentabilidade média

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

106

106

3.2.5 ROFA (retorno sobre o ativo imobilizado)

Como foi visto anteriormente, as empresas de distribuição de gás natural são muito

intensivas em capital, dessa forma, embora a margem EBITDA seja um bom indicador da

existência ou não de ganhos de escala, ela é uma medida operacional e não uma medida de

rentabilidade. Um bom indicador da eficiência dos investimentos feitos, no caso de empresas

intensivas em capital é o ROFA. Como pode ser verificar através da análise do balanço das

empresas de distribuição de gás natural, o ativo permanente corresponde a grande parte do

ativo das empresas (em 2004, por exemplo, o ativo permanente correspondeu a 71% do ativo

total da COMGAS e 73% do ativo da CEG). Assim, nesta seção irá se analisar a evolução do

ROFA do grupo das empresas privadas e estatais.

O cálculo do ROFA é feito a partir da divisão do lucro EBTIDA pelo ativo

permanente e indica qual a variação da rentabilidade sobre os investimentos em ativo

imobilizado, que no caso das empresas de distribuição de gás natural é composto

principalmente pela rede de distribuição. Para fins de análise usou-se a média do EBITDA das

empresas privadas e estatais e a média do ativo permanente das empresas de ambos os grupos.

A escolha da média tem por objetivo reduzir o erro causado pela falta de disponibilidade de

informações sobre o balanço patrimonial de algumas empresas de capital fechado, assim

tentou-se analisar ambos os grupos, empresas privadas e estatais, a partir de duas empresas

representativas.

107

107

Gráfico 22 – Evolução do ROFA das Empresas Privadas e Estatais

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Empresas Privadas Empresas Estatais

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

O gráfico acima mostra que o retorno sobre o ativo imobilizado vem crescendo nos

últimos anos em ambos os grupos de empresas (privadas e estatais), isto mostra que o ganho

de receita dos novos investimentos têm sido maior do que o investimento feito em capital

fixo. Esse índice comprova tanto o fato do setor de distribuição de gás natural estar operando

em um nível subótimo de investimento como também o fato da rentabilidade e a atratividade

dos projetos de expansão das redes de distribuição serem altos.

A linha do retorno sobre o ativo imobilizado das empresas estatais a partir de 2001

passou a cima da linha das empresas privadas. Esse fato deve-se não só ao aumento das

receitas de venda de ambos os grupos, mas também ao grande diferencial nos investimentos

em capital fixo entre esses mesmos grupos. Embora, na soma do grupo, as empresas estatais

venham apresentando taxas de crescimento dos ativos permanentes maiores do que às das

empresas privadas (52% contra 17% em 2003), a participação da soma dos ativos

permanentes das empresas estatais corresponde apenas a 18 % do total do setor. Esse

diferencial torna-se mais relevante pelo fato de em 2004 existirem 13 empresas estatais e

108

108

apenas 5 empresas privadas. O gráfico 23 mostra a participação das empresas privadas e

estatais sobre o ativo permanente total do setor.

Gráfico 23 – Participação do Ativo Permanente das Empresas Públicas e

Estatais Sobre o Ativo Permanente Total (2004)

82%

18%

Empresas Privadas Empresas Estatais

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

Os gráficos 24 e 25 analisam a evolução da rentabilidade do ativo fixo (ROFA) e da

taxa de crescimento do ativo permanente. Em ambos os grupos, percebe-se que a

rentabilidade do ativo fixo está acima da sua taxa de crescimento, esse fato fortalece a

afirmação de que os projetos de expansão das redes de distribuição de gás canalizado tem-se

mostrado financeiramente vantajoso, tanto para os acionistas (investidores diretos da

empresa), quanto para quem financiou esta expansão (os investidores indiretos).

Gráfico 24– Taxa de Crescimento do Ativo Permanente X ROFA das Empresas

Privadas

(0,20)

0,00

0,20

0,40

0,60

0,80

1,00

2000 2001 2002 2003 2004

Taxa de cresc. AP ROFA

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

109

109

Gráfico 25 – Taxa de Crescimento do Ativo Permanente X ROFA das Empresas

Estatais

0,000,200,400,600,801,001,201,401,601,80

2000 2001 2002 2003

Taxa de cresc. AP ROFA

Fonte: Elaboração Própria a partir dos dados das empresas

O grande crescimento do ativo permanente verificado no ano de 2000 deve-se, no caso

das empresas estatais, aos investimentos feitos em ativos fixos pela COMPAGAS e pela

SCGAS no ano de 1999 e no caso da empresas privadas, aos 500 milhões investidos pela

COMGAS nesse mesmo ano. Contudo verifica-se que o crescimento nos anos posteriores

reduz-se bastante, o que comprova a excepcionalidade do ano de 1999.

A análise do ROFA como dos demais indicadores financeiros mostra que existe uma

considerável diferença entre as empresa privadas e estatais no que diz respeito a suas

estruturas de financiamento. A participação do capital de terceiros no conjunto das empresas

estatais, embora crescente, é extremamente baixa embora os indicadores financeiros destas

empresas indiquem a existência de uma capacidade de endividamento ociosa. Esse fato

somado a análise dos indicadores de liquidez e endividamento financeiros das empresas

estatais sugere que existam entraves ao endividamento que em conjunto com as

características, já explicadas, do setor, desestimulam e inviabilizam novos projetos de

expansão das redes de distribuição, o que será visto no capítulo seguinte. A próxima seção

analisa as principais fontes de financiamento utilizadas pelas empresas de distribuição de gás

natural.

110

110

3.3 Principais Fontes de Financiamento Utilizadas pelas Empresas de Distribuição de Gás

Como já citado anteriormente o setor de distribuição de gás natural, como a maioria

dos setores de infra-estrutura, depende dos recursos de terceiros para financiar seus

investimentos. Como visto na seção 2.1 existe uma série de mecanismos de captação de

recursos: mercado de capital, o sistema bancário privado, financiamento público e o

financiamento externo. Esta seção analisa quais as principais fontes de recursos utilizadas

pelas empresas de distribuição de gás natural.

Existem no Brasil quatro principais fontes de financiamento de longo prazo. Em

primeiro lugar, em termos de recursos destinados ao financiamento das empresas de infra-

estrutura, temos os bancos de desenvolvimento, com destaque para o BNDES. As outras

fontes de financiamento são os investidores institucionais, as instituições internacionais de

crédito e o mercado de capitais. A participação do setor bancário privado no financiamento de

longo prazo, principalmente nos setores de infra-estrutura, é inexpressiva. A seguir irá se

analisar, separadamente, cada fonte de financiamento, mostrando a participação de cada uma

no financiamento dos investimentos em gás natural.

3.3.1 Bancos de Desenvolvimento

Os bancos de desenvolvimento tanto nacional quanto os regionais são instituições

pública criadas com o objetivo de promover o desenvolvimento social, industrial e econômico

das diversas regiões brasileiras. Nesse sentido seu principal foco de atuação sempre foi as

indústrias de infra-estrutura e de bens de capitais. As atividades desses bancos foram

expandidas para o financiamento de capital de giro e de investimento de pequenas e médias

empresas, através de inúmeras linhas especiais de crédito, que se caracterizam por taxas de

juros baixas e prazos de amortizações mais longos do que os utilizado no mercado privado.

111

111

Os bancos de desenvolvimento são os principais órgãos de financiamento de longo

prazo para a economia brasileira e os principais parceiros de organizações multilaterais de

crédito. No setor de energia, são responsáveis pelo financiamento de longo prazo, pela

articulação de diversos agentes financeiros, pelo compartilhamento do risco das operações e

pela modelagem dos produtos financeiros adequados para cada atividade.

Os principais bancos de desenvolvimentos são os Bancos Regionais de

Desenvolvimento e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

No que se refere a atuação no financiamento recente de projetos relacionados ao setor de gás

natural temos as seguintes iniciativas.

3.3.1.1 BNDES

O BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - é uma

empresa pública federal vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio

Exterior, que tem como objetivo financiar a longo prazo os empreendimentos que contribuam

para o desenvolvimento do país.

Criado em 1952, O BNDES possui duas subsidiárias: a BNDESPAR que objetiva

fortalecer a estrutura de capital das empresas privadas e desenvolver o mercado de capitais, e

a FINAME, que financia a comercialização de máquinas e equipamentos e administra as

operações de financiamento à exportação.

Os produtos e serviços do BNDES e de suas subsidiárias atendem as necessidades de

investimentos das empresas de qualquer porte e setor, estabelecidas no país. A parceria com

instituições financeiras e com agências estabelecidas em todo o país, permite a disseminação

do crédito, possibilitando um maior acesso aos recursos do BNDES.

112

112

O Programa de Apoio aos Investimentos em Petróleo e Gás (PROGAP) é uma linha de

financiamento do BNDES para empresas privadas e foi elaborado com o objetivo de apoiar a

implantação, ampliação, e modernização dos empreendimentos do setor de petróleo e gás,

estendendo-se por toda a cadeia produtiva. Os investimentos financiáveis pelo programa

(PROGAP) são:

a) desenvolvimento da produção de campos de petróleo e gás natural, inclusive de

recuperação de campos maduros (upstream);

b) refinarias e unidades de beneficiamento de gás;

c) dutos de transporte e de distribuição de petróleo e gás natural, inclusive dutos de

transferência;

d) usinas termelétricas a gás natural, inclusive plantas de co-geração;

e) infra-estrutura logística e de serviços de apoio.

A tabela 13 mostra os recentes projetos apoiados pelo BNDES no setor de gás natural.

A maior parte dos recursos do banco, para o setor de gás natural, vai para o segmento de

transporte. As iniciativas para o setor de distribuição se dão sobre a forma de participação do

BNDESPAR no controle acionário de algumas empresas estatais e por alguns projetos de

financiamento específicos.

Tabela 13 – Recentes Projetos de Gás Natural Apoiados pelo BNDES

Investimento Total Financiamento BNDES Apoio E&P R$ 642 mi R$ 245 mi 38% Transporte R$ 8,1 bi R$ 5,0 bi 62% Distribuição R$ 1,2 bi R$ 618 mi 53% Termoeletricidade R$ 2,7 bi R$ 1,1 bi 41% Cogeração R$ 24 mi R$ 20 mi 82% Total R$ 12,6 bi R$ 7,0 bi 55% Fonte: BNDES

Em 2004, o BNDES concluiu um acordo com a CEG-Rio para a liberalização de R$

16 milhões por seis anos para a construção do Gasoduto Rio – Petrópolis. Nesse mesmo ano

113

113

foi também concluído um acordo com a CEG para a liberação de R$ 57,9 milhões em seis

anos referentes à construção do gasoduto que liga São Gonçalo a Niterói. A tabela 14 mostra

os principais projetos do setor de distribuição de gás apoiados pelo BNDES. Nota-se que o

BNDES participou financiando, na maioria das vezes, mais da metade do investimento.

Tabela 14 – Projetos de Distribuição de Gás Apoiados Pelo BNDES

Empresa Estado Ampliação

da Rede (KM)

Ampliação do Volume (m³/dia)

Total do Investimento

(R$ mil)

Participação de BNDES

(R$ mil) COMGAS SP 893 5.650 417.882 258.074CEG RJ 152 3.900 229.734 122.530SCGAS SC 579 500 161.245 76.018CEG RIO RJ 137 500 40.165 19.679SULGAS RS 436 750 86.597 43.299COMPAGAS PR 330 900 72.956 44.120Total 2.527 12.200 1.008.579 563.720

Fonte: BNDES

3.3.1.2 BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul)

O Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul - BRDE é uma instituição

financeira pública de fomento criada pelos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e

Paraná em 22 de dezembro de 1961. Organizado como autarquia interestadual, o Banco conta

com autonomia administrativa e personalidade jurídica próprias. Como autarquia, com capital

partilhado igualmente entre os Estados membros, seu acervo integra o patrimônio desses

Estados, que são subsidiariamente responsáveis por suas obrigações.

Sua área de atuação é a Região Sul do Brasil e, para tanto, possui agências em Porto

Alegre (RS), onde também se situa sua sede, Florianópolis (SC) e Curitiba (PR). Cada

agência é responsável pela condução dos negócios no respectivo Estado. O BRDE possui

projetos de investimento nas seguintes atividades do setor de gás natural:

a) conversão para gás natural;

114

114

b) centrais de cogeração;

c) postos de abastecimento;

d) oficinas convertedoras veiculares;

e) conversão de frotas de veículos;

f) construção, modernização e conversão de embarcações para o transporte de gás e

petróleo;

g) fabricantes de máquinas e equipamentos para a indústria do gás.

Itens financiáveis pelos projetos de investimento:

a) despesas pré-operacionais;

b) obras civis e instalações associadas ao projeto;

c) máquinas e equipamentos de fabricação nacional ou importados de países membro

do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) (esse último para empresas

com faturamento anual até R$ 35 milhões);

d) dutos de distribuição de gás natural;

e) treinamento de recursos humanos;

Quadro 4 - Condições Operacionais Básicas

Porte da Empresa Receita

Operacional Bruta

Limite de Participação

Custo Financeiro(**)

Micro/EPP Inferior ou

igual a R$ 700 mil

Até 90% TJLP + 5%

Pequena Inferior a R$ 6,125 mil Até 90% TJLP + 5%

Média e Grande Superior a R$ 6,125 mil

Equipamentos: Até 80% demais itens:

Até 60% TJLP + 6,5%

Reconversul47* - Até 90% TJLP + 5% (*)Todas as empresas localizadas na região de abrangência do Reconversul (**)Condições específicas segundo natureza do projeto poderão ser consultadas Fonte: BNDES 47 Programa do BNDES para reconversão da produtiva da metade sul e do noroeste do RS.

115

115

Entre os projetos financiados pelo BRDE temos o convênio com a Sulgas, que permitirá aos

empresários financiar o investimento necessário para aquisição, instalação e montagem dos

equipamentos para uso de gás natural. A Sulgás disponibiliza a chegada do gás até a porta da

empresa. Daí em diante, a responsabilidade e dos investimentos é da empresa interessada. O

objetivo desse convênio é oferecer, através dos recursos do BNDES e do BRDE, linhas de

crédito para incentivar as empresas a utilizarem o gás natural.

3.3.2 Ação dos Investidores Institucionais “Investidores institucionais compreendem um conjunto relativamente

heterogêneo de iniciativa que têm como traço comum o de constituírem pools de recursos para aplicação financeira”. (CARDIM, 2000)

Dessa forma, os três principais tipos de investidores institucionais são; os fundos de

pensão, que representam a organização de um grupo de indivíduos para reunir determinado

volume de forma a potencializar seus ganhos financeiros com o objetivo de obtenção de renda

futura, os fundos de investimentos, que é a reunião de poupadores interessados em aplicar

seus recursos em um determinado mercado, como por exemplo, o mercado de câmbio ou de

juros, e por último, as seguradoras que buscam a aplicação dos prêmios pagos por seus

segurados de forma a permitir o pagamento das compensações devidas no caso de uma

contingência adversa.

Os principais investidores institucionais brasileiros são, no caso dos fundos de pensão,

a Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (PREVI) e a Fundação Petrobrás

de Seguridade Social (PETROS). A partir da década de 70 as maiorias das empresas estatais

criaram seus próprios fundos de pensão. Em relação aos fundos de investimentos os principais

são os fundos imobiliários, os fundos de ações e os fundos cambiais. Entre as companhias

116

116

seguradoras temos a Sul América Saúde e a Bradesco Saúde como as maiores em termos de

prêmios ganhos (Valor Econômico, 2006).

Em relação ao financiamento dos investimentos do setor de gás natural tem-se a

presença dos seguintes investidores institucionais.

3.3.2.1 PETROS

A PETROS é o segundo maior fundo de pensão do Brasil em total de ativos,

totalizando R$ 8 bilhões, em um mercado onde operam mais de 350 instituições. A instituição

está destinando cerca de R$ 2 bilhões, do total de R$ 4 bilhões, que estão sendo aplicados em

renda fixa, para financiamento de projetos.

Com 30 anos de experiência, é mantida, por 18 empresas patrocinadoras, tendo 90 mil

associados entre ativos e aposentados. Para garantir o pagamento de aposentadorias e pensões,

investe seu patrimônio em aplicações que tenham rentabilidade e segurança. Dessa forma,

possui participações em empresas de vários setores e projetos na área de energia,

principalmente de petróleo e gás natural como a usina termelétrica TermoBahia, onde estão

sendo investidos US$ 190 milhões, em parceria com a Petrobrás e a ABB Energy Venture.

Outro projeto financiado pela PETROS foi o desenvolvimento da produção no campo

gigante de Marlim, na Bacia de Campos. Foram destinados cerca de R$ 35 milhões para

pesquisa e desenvolvimento do processo de extração de gás e petróleo.

Outra grande iniciativa da PETROS no fomento a investimentos no setor de energia

foi à criação de três fundos de private equity em parceria com o BNDESPAR, para aplicação

em projetos na área de óleo e gás.

117

117

3.3.3 Instituições Internacionais de Crédito

Além das instituições de fomento descritas acima, outros agentes financeiros

participam do financiamento do investimento na infra-estrutura de distribuição de gás natural.

No que se refere aos recursos de origem externa a Corporação Financeira Internacional (IFC),

entidade para o setor privado do Grupo do Banco Mundial, tem como missão promover o

investimento sustentável do setor privado nos países em desenvolvimento.

A IFC financia investimentos, mobiliza capital nos mercados financeiros

internacionais, ajuda clientes a melhorar a sustentabilidade social e ambiental e presta

assistência técnica e assessoramento a governos e empresas. Desde sua fundação em 1956 até

o exercício financeiro de 2003, a IFC já destinou mais de US$37 bilhões de seus próprios

fundos e conseguiu US$22 bilhões em empréstimos consorciados para 2.990 empresas em

140 países em desenvolvimento. No exercício financeiro de 2003, a carteira de empréstimos

de âmbito mundial da IFC elevou-se a US$16,8 bilhões, em fundos próprios, e US$6,6

bilhões, em empréstimos consorciados.

No Brasil, em 2004, o organismo firmou um empréstimo no valor de US$90 milhões

para Companhia de Gás de São Paulo (Comgás). O empréstimo compõe-se do equivalente a

US$45 milhões da própria conta da IFC e de empréstimos consorciados equivalentes a US$45

milhões. O financiamento concedido apoiará os planos de expansão e atualização da rede de

distribuição da empresa, a fim de expandir o fornecimento de gás para 70.000 novos clientes

nos próximos cinco anos e para 200.000 em 10 anos.

Ainda em 2004, a Companhia Estadual de Gás (CEG) concluiu as negociações com o

Banco Europeu de Investimento (BEI) para a liberalização de US$ 40 milhões, com prazo de

8 anos e custo libor mais 0,40% a.a. Esses recursos foram utilizados para a negociação das

dívidas de curto prazo alongando o prazo médio de endividamento.

118

118

3.3.4 Mercado de capitais

Como analisado no capítulo 2, o mercado de capitais brasileiro apresenta um reduzido

grau de desenvolvimento, o que inviabiliza o seu uso como fonte de recurso para o

financiamento das empresas de distribuição de gás natural. Apenas as 5 empresas privadas são

companhias de capital aberto com ações em bolsas de valores, e mesmo nestas empresas, as

subscrições de novas ações para financiar seus investimentos não é uma prática corrente. Um

exemplo é o caso da CEG que emitiu, em março de 2000, uma única série de debêntures que

foi integralmente subscrita pelo Banco Nacional de Desenvolvimento econômico.

Uma alternativa a indisponibilidade de recursos, usada pela Cemig, foi a venda de

parte do capital da empresa. A Gaspetro, subsidiária da Petrobrás, adquiriu 40% das ações

representativas da Companhia de Gás de Minas Gerais (GASMIG). A aquisição faz parte do

acordo estabelecido entre a Cemig e a Petrobrás para viabilizar a expansão da rede de

distribuição e transporte do estado de Minas Gerais. O investimento estimado será de R$ 114

milhões e faz parte da estratégia da Petrobrás em liderar o mercado brasileiro de gás natural.

3.4 Considerações finais

A análise desenvolvida nesse capítulo mostrou que existe um grande diferencial entre

as empresas privadas e estatais no que diz respeito à expansão das redes de distribuição de gás

natural nos últimos anos. A tabela 10, desse capítulo, deixa clara a diferença entre os

investimentos realizados pelas empresas estatais e privadas na expansão de suas redes de

infra-estrutura de distribuição de gás canalizado.

As características específicas do setor de distribuição de gás natural, como a

necessidade de um grande aporte de capital em ativos fixos, o longo prazo de maturação dos

119

119

investimentos, as especificidades de seus ativos e a existência de retornos de escala fazem

com que os projetos de expansão das redes de distribuição dependam do financiamento de

terceiros. Dessa forma a capacidade de captação de recursos é essencial para o

desenvolvimento do serviço de fornecimento de gás canalizado.

Um dos determinantes da capacidade de captação de recursos é a estrutura financeira

das empresas. A oferta de crédito, seja ele feito por instituições públicas de fomento, como o

BNDES, seja ele proveniente do crédito privado, depende da avaliação do mercado do risco e

da capacidade das empresas em cumprir com suas obrigações. Dessa forma, a análise dos

principais indicadores financeiros é um ótimo indicador da saúde financeira e, dessa forma, da

capacidade das empresas em obter recursos para seus investimentos.

Contudo, o exame do balanço das principais empresas de distribuição de gás natural

no período de 1999 a 2004 mostrou que as empresas estatais, com algumas exceções,

apresentaram um baixo índice de endividamento financeiro, o que reflete uma baixa utilização

de recurso de terceiros quando comparadas com as empresas privadas. Os bons indicadores

financeiros, como os índices de liquidez, a capacidade de endividamento e pagamento de

juros e o baixo grau de alavancagem indicam que existem barreiras não financeiras ao acesso

das empresas estatais aos recursos de terceiros.

O capítulo seguinte se propõe a identificar as possíveis causas do limitado acesso das

empresas estatais às principais fontes de financiamento público e privado e, dessa forma,

explicar o porquê do baixo investimento destas empresas na expansão de suas redes de

distribuição. Identificando esses fatores, mostraremos às possíveis alternativas para transpor

as barreiras que limitam o desenvolvimento do setor de gás natural no Brasil.

120

120

Capítulo 4 - Condicionantes e Propostas para o Desenvolvimento do Setor de Distribuição de Gás Natural

Ao longo do trabalho concluiu-se que as características específicas do setor de

distribuição de gás natural condicionam um padrão de financiamento dependente dos recursos

de terceiros. As formas de financiamento e o grau de acesso das empresas a esses recursos são

de fundamental importância para explicar os diferentes níveis de desenvolvimento das

empresas de distribuição de gás natural. O presente capítulo apresenta um caráter conclusivo

das principais análises feitas nos capítulos anteriores. Assim a primeira seção irá mostrar

como a análise dos principais indicadores financeiros das empresas de distribuição de gás

natural, feita no capítulo 3, se encaixa nas principais correntes teóricas sobre o investimento

desenvolvidas no capítulo 1.

A partir das conclusões desenvolvidas na seção 4.1, a seção 4.2 irá indicar quais são as

possíveis barreiras econômicas, regulatórias e institucionais ao desenvolvimento das

empresas, principalmente das estatais, de distribuição de gás natural. Assim, serão enfatizadas

as barreiras criadas pela Resolução 2827 do BACEN e pela falta de uma política energética

integrada, que garanta a segurança do suprimento de gás natural.

Na seção 4.3, serão apresentadas, a partir das análises feitas sobre as características do

setor de distribuição de gás natural e sobre as recentes inovações financeiras, algumas

sugestões de políticas públicas e de gestão financeira capazes de auxiliarem o

desenvolvimento do setor de gás natural. Dessa forma, mostrar-se-á como a securitização de

recebíveis, a mudança na estrutura patrimonial das empresas e o planejamento adequado da

oferta de gás natural podem contribuir para o aumento da oferta de crédito e, dessa forma,

para o investimento na expansão das redes de infra-estrutura.

121

121

Assim, conclui-se que as principais barreiras ao financiamento do setor de gás natural

são a falta de uma política energética integrada e a política macroeconômica restritiva dos

últimos governos. Isto é, não são as barreiras financeiras que estão limitando o

desenvolvimento do setor de distribuição de gás natural.

4.1 Teoria do Investimento e o Financiamento do setor de Distribuição de Gás Natural

O capítulo 1 mostrou como a teoria econômica e as teorias de finanças corporativas

correlacionam o nível de investimento com a estrutura financeira de uma empresa. Dessa

forma, foram descritas as principais correntes teóricas sobre o padrão ótimo de financiamento,

começando pelas proposições I e II de Modigliani e Miller, que deram origem ao estudo

teórico da influência do padrão de financiamento escolhido sobre o valor da empresa e, assim,

sobre a riqueza dos acionistas.

Embora a teoria de Modigliani e Miller seja a precursora dos estudos teóricos sobre o

financiamento dos investimentos ela apresenta uma série de deficiências já mostradas no

capítulo 1. Teorias subseqüentes foram desenvolvidas de forma a cobrir as lacunas deixadas

pela teoria MM, como a Teorias sobre o risco crescente de Kalecki e a teoria do investimento

de Minsky. Assim o objetivo desta seção é mostrar, a partir da análise dos indicadores

financeiros das empresas de distribuição de gás natural, como a teoria do risco crescente de

Kalecki e a teoria do investimento de Minsky interpretam a diferença no grau de investimento

feito pelas empresas privadas e estatais do setor.

Como foi visto no capítulo 1, existe um padrão ótimo de financiamento para cada tipo

de empresa, esse padrão ótimo condiciona o nível adequado de endividamento de forma a

maximizar o valor da firma, e dessa forma, a riqueza de seus acionistas. Para Kalecki, os

122

122

benefícios fiscais advindos da utilização do capital de terceiros48 são contrabalanceados pelo

aumento dos custos associados ao risco de falência. Dessa forma, existe um nível ótimo de

endividamento, onde os custos e os benefícios da utilização de capital de terceiros se anulam.

O custo associado ao risco de falência está relacionado com a obrigação jurídica que a

empresa tem em relação ao pagamento de juros e de amortizações de empréstimos com a pena

de perda de seus ativos. Vale destacar que o pagamento de dividendos não é uma obrigação da

empresa, não acarretando, assim, em risco de falência.

Segundo a teoria desenvolvida por Kalecki, a capacidade de investimento de uma

firma está relacionada com a sua propriedade de capital, sendo que esta propriedade de capital

não se resume apenas à capacidade de formação de poupança da firma, mas também da

poupança pessoal de seus acionistas controladores. Assim, a capacidade de expansão de uma

firma está associada à capacidade de geração de recursos e ao acesso as formas de

financiamento de longo prazo, incluindo o mercado de capitais e o sistema financeiro.

O acesso da firma ao capital de terceiros, por sua vez, está relacionado ao seu capital.

Assim, se uma empresa tentar captar recursos financeiros desproporcionalmente ao seu

capital, ela irá aumentar a probabilidade de ocorrência de dificuldades financeiras e,

consequentemente, o risco financeiro dos empréstimos a ela concedidos. Dessa forma, a

capacidade de endividamento, ou o acesso ao capital de terceiros, se dá de forma proporcional

ao capital da empresa. Nesse sentido, a capacidade de acumulação de capital de uma firma é

de extrema importância, já que, além de dar origem a recursos capazes de financiar seus

investimentos, viabiliza o maior acesso aos recursos de terceiros.

A análise do setor de distribuição de gás natural no Brasil mostrou haver uma grande

diferença entre os níveis de investimentos feitos pelas empresas privadas e pelas empresas

estatais na expansão de suas redes de distribuição. Vimos no capítulo 3 que os o baixo nível

48 Vale lembrar que o pagamento de juros é dedutível do imposto de renda, enquanto o pagamento de dividendos não.

123

123

de investimentos das empresas estatais não pode ser explicado a partir dos níveis de

endividamento e, consequentemente, pela capacidade de endividamento das empresas

públicas de distribuição de gás natural. Nesta parte do trabalho utilizaremos a teoria do risco

crescente desenvolvida por Kalecki em conjunto com os dados obtidos a partir da análise dos

indicadores financeiros das empresas de distribuição de gás, feita no capítulo 3, de forma a

criar um embasamento teórico para a constatação empírica de que os condicionantes do

investimento das empresas estatais não estão associados as suas estruturas financeiras.

Quando se compara o nível de endividamento financeiro entre as empresas privadas e

as estatais, verificamos que as empresas públicas apresentam um baixo índice de alavancagem

em relação às empresas privadas. Na seção 3.2.1 do capítulo 3 verificou-se que o índice de

endividamento financeiro médio em 2003 das empresas estatais foi de 13,87% enquanto que

no caso das empresas privadas esse índice foi de 30%, no mesmo ano. Além da diferença

entre os níveis de endividamento, o crescimento do grau de alavancagem vem sendo muito

maior no caso das empresas privadas (ver gráfico 9).

Outro dado importante é a participação do capital de terceiros sobre o capital total das

empresas. No caso das empresas privadas esse índice passou de 19,11% em 1999 para 59,23%

em 2004. Já no caso das empresas estatais esse índice passou de 31,69% em 1999 para 6,16%

em 2003.

No que se refere à capacidade de acumulação de capital, a rentabilidade do ativo,

calculada dividindo-se o lucro EBITDA pelo ativo total mostra que a capacidade de

acumulação de capital das empresas estatais esteve quase sempre no mesmo nível das

empresas privadas. Uma rentabilidade de 25,5% sobre o ativo total mostra que as empresas

estatais possuem uma boa capacidade de geração de caixa, capaz de ser utilizada tanto para

financiar seus planos de expansão, quanto para aumentar a garantia dos empréstimos de

terceiros, reduzindo assim o risco financeiro.

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124

Tabela 15 – Rentabilidade Média do Ativo

1999 2000 2001 2002 2003 Empresas Privadas 5,27% 18,01% 19,06% 23,90% 20,01% Empresas Estatais 19,43% 17,79% 20,38% 23,26% 25,50%

Fonte: Elaboração Própria a partir do balanço das empresas

Como pode ser visto por meio da análise dos indicadores financeiros do setor de

distribuição de gás natural, a existência de um risco financeiro crescente não é suficiente para

explicar a diferença entre os níveis de investimentos das empresas privadas e estatais. Isto é,

não é a falta de capacidade financeira de endividamento que explica os baixos índices de

expansão das redes de distribuição públicas de gás natural. As empresas privadas, possuem

uma alta capacidade financeira para a obtenção de recursos de terceiros, o que pode ser

evidenciado pelos altos níveis de liquidez geral (acima 1) das empresas estatais quando

comparados com as empresas privadas (0,5 na média)49.

Nesse sentido, a teoria dos diferentes riscos existentes nas operações de crédito,

elaborada por Minsky e desenvolvida no capítulo 1, servirá para enfatizar a existência de

barreiras não financeiras ao desenvolvimento do setor de distribuição de gás natural. Como

foi visto no capítulo 1, a teoria do investimento elaborada por Minsky parte da análise do

fluxo de caixa esperado dos projetos financiados e do preço mínimo necessário para induzir a

produção dos bens de capital para derivar, respectivamente, o que Minsky chamou de preço

da demanda e preço da oferta. Segundo Minsky o investimento irá crescer até o ponto onde o

preço de demanda se igualar ao preço de oferta.

Como visto anteriormente, uma firma pode financiar seu projeto de expansão por meio

da utilização de capital próprio ou via recursos de terceiros. A função da administração

financeira é determinar e administrar a composição ótima do capital próprio e do capital de

terceiros. Como Kalecki, Minsky reconhece que a escolha da estrutura de financiamento a ser

utilizada pela firma depende do seu tamanho e da sua taxa de crescimento. A contribuição de

49 Vide seção II.2 capítulo 3.

125

125

Minsky para a teoria do investimento se deve à percepção da existência de mais de uma

categoria de risco. Além do risco do credor, que pode ser analisado a partir de uma

probabilidade alta de não pagamento de juros e do principal, existe uma segunda classe de

risco que é o próprio risco do tomador do empréstimo. Dessa forma, o nível de endividamento

de uma firma vai ser limitado tanto pelo risco de crédito quanto pela percepção de risco do

próprio empreendedor em relação às perspectivas de rentabilidade do projeto.

O risco do tomador de empréstimo, como analisado anteriormente, irá afetar o preço

de demanda do ativo de capital de duas formas. Primeiramente, por meio da componente

psicológica de aversão ao risco. Em um mundo onde existe incerteza a respeito dos retornos

dos investimentos realizados, o grau de aversão ao risco não é uma variável fixa. Existe um

ponto em que o incremento no ativo de capital aumenta o grau de aversão ao risco, elevando

dessa forma, a taxa de retorno exigida.

A segunda maneira como o risco do tomador afeta o preço de demanda se dá pela

assimetria de informação entre os fluxos de rendimentos e de pagamentos futuros. Ao

considerar os débitos operacionais e financeiros como certos e os fluxos de rendimentos como

incertos, o aumento da parcela do investimento financiado por dívida aumenta a probabilidade

de dificuldades financeiras e, assim, aumenta a taxa de retorno exigida. O aumento da taxa de

retorno exigida reduz o fator de capitalização dos fluxos de rendimentos, reduzindo, assim, o

preço de demanda.

O risco do credor, por outro lado, aumenta conforme a razão entre os fluxos de

rendimentos e os fluxos de pagamentos aumenta. A existência de tal risco, como sugerido

anteriormente, não aparece de forma explícita nos contratos de financiamento. Ele se reflete

em taxas de juros mais altas, prazos de amortizações mais curtos, entre outros termos já

citados. O risco do credor faz com que o preço de oferta não seja dado apenas pelo preço que

induz a produção do bem de capital. Assim, deve-se inserir nesse preço uma “taxa de risco”

126

126

representada pelos custos das exigências presentes nos contratos de empréstimos. Dessa

forma, o nível de endividamento das firmas acaba por aumentar o preço de oferta dos bens de

capital e influencia, assim, o nível de investimento.

Como pode ser visto no gráfico 4 do capítulo 1, o nível de investimento vai ser dado

no ponto em que o preço de oferta se iguala com o preço da demanda, ou seja, onde a linha do

risco do tomador cruza com a linha do risco marginal do credor. A análise das características

e dos indicadores financeiros do setor de distribuição de gás natural sugere que as empresas,

em particular as estatais, estão trabalhando em um nível de investimento a esquerda de I150.

No que se refere ao preço de demanda, e dessa forma, ao risco do tomador de

empréstimo, as características e a situação atual do setor de distribuição de gás indicam que o

nível de investimento das empresas apresenta-se em um ponto distante daquele onde a grau de

aversão ao risco dos empresários tende a aumentar. Esse fato fica melhor evidenciado quando

percebemos que as empresas estão operando em um ponto de retorno crescente de escala,

como foi analisado na seção 3.2.3. Assim, o aumento do investimento em bens de capital

aumenta a capacidade de geração de lucro. Não é de se esperar, portanto, que o grau de

aversão ao risco dos empresários aumente com a aquisição de novos ativos, pelo contrário, a

existência de densidade de consumo tende a reduzir o risco dos projetos ao reduzir o custo

marginal de produção.

Um segundo fator a ser considerado sobre o preço de demanda se deve a

particularidade do serviço de distribuição de gás natural. As empresas distribuidoras operam

em um regime de concessão com exclusividade51, dessa forma, a demanda de gás natural

apresenta baixa elasticidade, isto é, embora haja picos e vales de consumo, esses ocorrem

sempre nos mesmos períodos do ano e podem ser razoavelmente previstos, isso faz com que

50 Nível de investimento “ótimo” permitido pela existência de um determinado risco do credor e do tomador de empréstimo. 51 Os contratos de concessão (vide seção I.3 capítulo 3) conferem um período de exclusividade de prestação de serviço na área de atuação da concessionária, assim, nesse período a empresa atua como Monopólio de fornecimento de gás natural.

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haja pouca incerteza quanto aos fluxos de recebimentos. Esse fato em conjunto com a

reduzida parcela do investimento financiado por capital de terceiros, o que pode ser visto pelo

baixo índice de endividamento, principalmente das empresas estatais, indica uma baixa

probabilidade de ocorrência de dificuldades financeiras. Assim, a percepção do baixo risco

dos projetos de infra-estrutura de distribuição de gás sugere que os empresários do setor não

tendem a aumentar a taxa de retorno exigida conforme se aumenta o investimento.

No que se refere ao risco credor, a análise do capítulo 1 mostrou que conforme se

aumenta a razão dívida/receita aumenta-se o risco de “default”, elevando-se, dessa forma, a

taxa de risco inserida no preço de oferta. A análise dos indicadores financeiros feito no

capítulo 3, contudo, mostrou que as empresas estatais de distribuição de gás natural estão

operando com um baixo nível de endividamento e com um elevado grau de liquidez,

principalmente quando comparadas com as empresas privadas. Dessa forma, é de se esperar

que a taxa de risco inserida no preço de oferta, refletida nos custos adicionais dos contratos de

empréstimos, seja pequena e relativamente constante, pelo menos para níveis de

investimentos próximos aos das empresas privadas52. Isto mostra que as empresas estatais têm

condições de aumentar seus níveis de investimento antes de um aumento da taxa de risco

exigida.

Assim pode se concluir que o nível de investimento das empresas estatais encontra-se

em um ponto horizontal ou pelo menos com pouca inclinação da linha de risco do credor e de

risco do tomador. Isto é, em um ponto distante da igualdade entre preço de demanda e preço

de oferta. Assim, segundo a análise de Minsky, existe um espaço financeiro, isto é, uma

capacidade de endividamento ociosa, possível de ser utilizada para o aumento do

investimento, principalmente no caso das empresas estatais.

52 Posteriormente se mostrará qual a capacidade de investimento das empresas estatais caso estas mantivessem níveis de endividamentos iguais ao das empresas privadas.

128

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Utilizando o embasamento das teorias sobre o investimento de Kalecki e Minsky, é

possível dar um suporte teórico às conclusões empíricas originadas da análise dos indicadores

financeiros feita no capítulo 3. Ficou evidente que o baixo nível de investimento das empresas

estatais não é causado por restrições financeiras, ou melhor, por restrições impostas pela

estrutura financeiras das empresas. Assim, nas seções seguintes tentaram-se identificar quais

são as principais barreiras não financeiras ao desenvolvimento do setor de distribuição de gás,

quais as possíveis medidas de políticas públicas e quais os principais instrumentos financeiros

capazes de promover uma expansão dos investimentos nas redes de distribuição de gás

natural.

4.2 Principais Barreiras ao Desenvolvimento do Setor de distribuição de Gás Natural

As teorias do investimento analisadas no capítulo 1 serviram para mostrar que a

estrutura financeira das empresas de distribuição de gás não explica o baixo nível de

investimento das empresas estatais do setor. Dessa forma, o objetivo desta seção será mostrar

quais são as principais barreiras ao desenvolvimento do setor de gás natural brasileiro.

Considera-se o contingenciamento dos recursos destinados às empresas públicas, explícito na

resolução 2827 do Banco Central, e a falta de uma política energética definida e integrada,

que se reflete na falta de segurança quanto à oferta de gás para as empresas de distribuição,

como as principais causas do baixo índice de desenvolvimento das redes de distribuição de

gás encanado53.

53 Um importante fator limitante do investimento é o tamanho do marcado da área de concessão de cada empresa. A diferença entre os altos níveis de investimento da COMGAS e da CEG em comparação ao investimento de algumas empresas estatais, em certa medida, reflete a diferença entre o tamanho dos mercados de suas áreas de concessão. Contudo a analise do nível de investimento e da evolução deste investimento ao longo do tempo em alguns estados com um elevado mercado consumidor potencial para o gás natural, como Bahia e Minas Gerais, indica que há barreiras ao investimento que não são condicionadas pelo tamanho do mercado.

129

129

4.2.1 Resolução 2827 do BACEN

A Resolução 2827 do Banco Central redefine as regras de contingenciamento de

crédito ao setor público. O Banco Central em março de 2001, por meio da Resolução 2827,

passou a controlar de forma mais efetiva as operações de crédito ao setor estatal. Dessa forma,

passou-se a limitar as operações de crédito de cada instituição financeira e demais instituições

autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil com órgãos e entidades do setor público

a 45% do patrimônio de referência (PR)54.

A Resolução 2827 vem como parte da política econômica dos últimos governos que

tem como objetivo a redução do déficit do setor público. Dessa forma, o contingenciamento

do crédito as empresas de controle estatal mostra-se como uns dos instrumentos do governo

para se atingir as metas de superávit.

Entende-se como órgão e entidade pública a administração direta da União, dos

estados, do Distrito Federal e dos municípios, as autarquias e fundações instituídas ou

mantidas, direta ou indiretamente, pela União, pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos

municípios, as empresas públicas e sociedades de economia mista não financeiras, suas

subsidiárias e demais empresas controladas, direta ou indiretamente, pela União, pelos

estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, inclusive as sociedades de objeto exclusivo

e os demais órgãos ou entidades dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos

municípios.

Assim as operações de crédito, como as operações de empréstimos e financiamentos,

as operações de arrendamento mercantil e as operações garantidas pela emissão de títulos

mobiliários dos estados, do Distrito Federal e da União ficam sujeitas aos limites impostos

54 O patrimônio de referência é usado pelo Banco Central para definir os limites operacionais das instituições financeiras e foi definido pela resolução 2837 do BACEN em maio de 2001.

130

130

pela resolução 2827. As operações de financiamento de licitações internacionais55 e as

operações de financiamento com títulos mobiliários, contudo, não estão sujeitas às restrições

de crédito.

Em 2005, por exemplo, o limite para a alavancagem do setor público com instituições

financeiras privadas e estatais foi de R$1,2 bilhões. Considerando que 15 das 20 empresas em

operação na distribuição de gás canalizados são controladas pelos governos estaduais, a

restrição de crédito ao setor público mostra-se como uma das principais barreiras ao

desenvolvimento do setor de gás no país. Segundo o gerente do Departamento de Gás,

Petróleo, Cogeração e Outras Fontes de Energia do BNDES, Rodrigo Matos Huet de Bacellar,

referindo-se aos investimentos realizados pelas Petrobrás no aumento da oferta e da

capacidade de transporte: “Não adianta investir no início da cadeia do gás se no final há um

gargalo" (Diário Popular, 2005)

Segundo estimativas do mercado, em 2005, existiam cerca de R$ 6 bilhões em

projetos parados nas empresas públicas aguardando a liberação de recursos. No caso das

empresas de distribuição de gás natural, caso não houvesse restrição de crédito às empresas

estatais, e elas fossem capazes de manter níveis de alavancagem próximos aos das empresas

privadas, estima-se que, por exemplo, em 2003, o investimento das empresas públicas de

distribuição poderia ter sido de R$ 345 milhões, ou seja, poderia ter sido 43 % maior do os R$

242 milhões investidos nesse ano.

Isto é, as empresas privadas possuíam um grau médio de endividamento bancário de

cerca de 33% em 2003 contra 13% das empresas estatais. Assim caso não houvesse restrições

de crédito e as empresas públicas de distribuição pudessem manter um grau e endividamento

55 Licitação internacional é aquela em que se permite a participação de firmas nacionais e estrangeiras, isoladamente ou em consórcio com empresas nacionais. O seu procedimento é o mesmo de qualquer concorrência, apenas com sujeição às diretrizes estabelecidas pelos órgãos federais responsáveis pela política monetária e de comércio exterior, ou seja, às normas expedidas pelo Banco Central do Brasil (ver Res. 153, de 27.8.70) e pelo Ministério da Fazenda (ver Port. GB-6, de 14.1.69). Quando o contrato versar sobre importações, empréstimos, financiamentos e quaisquer outras operações externas de interesse dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, dependerá de autorização do Senado Federal (CF, art. 52, V)." (52)

131

131

bancário de 35% sobre seus ativos, seus investimentos somados poderiam ter sido de R$ 345

milhões, o que representa um aumento de 43% em relação ao investimento realizado nesse

mesmo ano pelas empresas estatais, o que pode ser observado no gráfico 26.

Gráfico 26 – Potencial de Endividamento Bancário das Empresas Estatais

0

50

100

150

200

250

300

350

400

1999 2000 2001 2002 2003 2004

Milh

ões

Díivida Bancária Dívida Bancária Potencial

Fonte: Elaboração Própria

O gráfico 26 mostra que a partir de 2001, data da publicação da Resolução 2827, a

diferença entre a dívida bancária realizada e a dívidas bancárias em potencial aumentou. Esse

dado mostra que a restrição de crédito ao setor público vem afetando o nível e endividamento

e, dessa forma, a capacidade de financiamento dos projetos de expansão das redes de infra-

estrutura de distribuição de gás encanado, o que fica mais bem evidenciado pela diferença

entre o nível de investimento realizado pelas empresas privadas e pelas estatais, mostrada na

tabela 16.

Tabela 16 – Investimento das Empresas de Distribuição de Gás Natural

Milhões R$ 2002 2003Investimento 1,3 1,1CEGAS Lucro Liquido 5,3 10,1Investimento 1,1 5,3PBGAS Lucro Liquido 2,5 6,0Investimento 3,0 11,8CPERGAS Lucro Liquido 12,0 21,2

132

132

Investimento 2,4 5,1ALGAS Lucro Liquido 3,2 4,6Investimento 0,0 1,5SERGAS Lucro Liquido 0,0 5,5Investimento 24,1 42,0BAHIAGAS Lucro Liquido 34,7 45,6Investimento 20,8 22,1GAS MIG Lucro Liquido 24,8 38,7Investimento 134,3 229,2CEG/CEG

RIO Lucro Liquido 69,1 98,2Investimento 201,3 235,8COMGAS Lucro Liquido 107,7 103,5Investimento 29,3 11,7COMPAGAS Lucro Liquido 2,7 29,4Investimento 38,0 28,0SCGAS Lucro Liquido 9,0 19,0Investimento 9,8 8,1SULGAS Lucro Liquido -3,3 14,2Investimento 465,4 601,7

Total Lucro Liquido 267,7 396,0

Fonte: Relatório anual das empresas

Os dados da tabela mostram que dentro do grupo das estatais, apenas a SCGAS, a

COMPAGAS, a SULGAS e a ALGAS apresentaram níveis de investimentos maiores do que

seus lucros líquidos, o que indica a utilização de capitais de terceiros no financiamento de

seus investimentos. Além disso, fica clara, a partir da tabela acima, a diferença entre o nível

de investimento das empresas privadas e estatais. O contigenciamento de crédito ao setor

público, decorrente do enrijecimento do controle fiscal do governo, tem atuado, dessa forma,

como um fator condicionante do baixo investimento das empresas estatais de distribuição de

gás natural.

4.2.2 Planejamento Energético e Risco de Desabastecimento

4.2.2.1 Estrutura de Oferta de Gás Natural no Brasil e o Papel da Petrobras

A produção de gás natural no Brasil começou em 1954 no estado da Bahia. Em 1980 a

produção baiana representava cerca de 50% da produção nacional de gás natural. Apenas em

133

133

meados da década de 80 é que se começou a produzir gás natural na Bacia de Campos no Rio

de Janeiro. Em dezembro de 2005, a produção fluminense de gás natural correspondeu a 49%

enquanto que a produção baiana respondeu por apenas 11,7% da produção brasileira de gás

natural, segundo dados da revista Brasil Energia.

Tabela 17 – Produção de Gás Natural no Brasil

mil m³

jul/05 Ago/05 Set/05 out/05 nov/05 dez/05 % Dez

Rio de Janeiro 22.403,80 21.357,30 21.553,80 22.775,40 23.092,50 23.358,00 49,0%Amazonas 10.037,60 10.047,60 9.891,50 10.351,40 9.807,90 8.014,00 16,8%Bahia 5.536,70 5.710,30 2.437,40 5.066,60 5.786,50 5.576,40 11,7%Rio Grande do Norte 3.529,60 3.596,40 3.563,40 3.683,70 3.497,10 3.386,10 7,1%Alagoas 3.006,50 3.104,40 3.098,50 3.172,50 3.202,40 3.059,40 6,4%Sergipe 1.845,70 1.817,60 1.857,40 1.928,60 1.661,00 1.559,60 3,3%Espírito Santo 1.373,30 1.399,90 1.416,30 1.419,20 1.408,10 1.328,80 2,8%São Paulo 912,60 1.042,00 1.021,70 1.012,60 901,40 903,10 1,9%Ceará 297,00 293,70 270,80 264,80 338,50 311,70 0,7%

Paraná 192,70 180,30 150,70 197,10 192,90 125,70 0,3%

Brasil 49.135,50 48.549,50 45.261,50 49.871,90 49.888,30 47.622,80 100,0%Fonte: Revista Brasil Energia – n° 304 - março de 2006

Os dados da tabela 17 mostram que existe uma concentração da produção de gás

natural na região sudeste do país. Embora o estado do Amazonas participe com 16% da

produção nacional, a falta de redes de interconexão entre os estados do norte e Nordeste do

país faz com que todo o gás produzido na reserva de Urucu seja reinjetado.

Em 2003 as reservas provadas no Brasil alcançavam 245 bilhões de m³, segundo dados

da ANP. Nesse mesmo ano, contudo, a descoberta de uma reserva gigante no litoral de São

Paulo (reserva de Santos) mudou as estimativas da Petrobrás. Segundo estudos preliminares,

estima-se que a reserva recém descoberta possua um volume de 420 bilhões de m³, desse total

apenas 78 bilhões de m³ já foram incorporados às reservas brasileiras, o restante ainda está em

fase de análise de viabilidade econômica. Assim, em 2004, as reservas brasileiras de gás

natural atingiram 330 bilhões de m³ (ANP 2006).

134

134

A descoberta da reserva de Santos cria uma perspectiva de redução da dependência da

importação de gás. Contudo, a Petrobrás estima que o desenvolvimento completo da produção

da reserva de Santos leve de 6 a 10 ano. Assim, no curto e médio prazo, o desenvolvimento do

setor de gás natural dependerá da importação. Em 2003, 5,2 bilhões de m³ foram importados

da Bolívia ou da Argentina, como pôde ser visto no tabela 18. O gás Argentino destinou-se

principalmente ao abastecimento da estação termoelétrica de Uruguaiana. Cerca 90% do gás

importado utilizado no Brasil em 2003 teve origem Boliviana.

A produção, importação e o transporte de gás natural são controlados direta ou

indiretamente pela Petrobras. Dessa forma, as estratégias e políticas desenvolvidas pela estatal

funcionam, junto com os fatores já mencionados acima, como condicionantes do nível de

investimento das empresas de distribuição do país. A definição de uma estratégia de

segurança do abastecimento e de expansão da rede de transporte, principalmente para o

Nordeste, em conjunto com o estabelecimento de uma política clara e confiável de preço para

o gás, tanto nacional quanto importado, é fundamental para gerar a confiança necessária para

a expansão das redes de distribuição.

Um exemplo do papel da Petrobras é o caso da interrupção das obras do Gasene. A

não renovação dos contratos de fornecimento de gás com as empresas do Nordeste em

decorrência das incertezas a respeito da conclusão do gasoduto de transporte que irá ligar a

malha Nordeste à malha Sudeste do país levantou a possibilidade de escassez de oferta de gás

natural para o Nordeste, o que tem inviabilizado uma série de projetos de expansão das redes

de distribuição locais. Assim a definição de uma estratégia, por parte da Petrobras, para o

abastecimento do Nordeste brasileiro, seja este feito através da importação de GNL ou através

do Gasene, é fundamental para o desenvolvimento do segmento de distribuição nesta região.

O que pode ser visto é que não só o segmento de distribuição, mas toda a cadeia de gás

natural depende da definição de políticas e estratégias por parte da Petrobras.

135

135

Tabela 18 – Importações de Gás Brasileiras

Países Importação de gás natural (milhões m3) 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Total 400 2.211 4.608 5.269 5.947 8086Argentina 0 106 753 492 350 451Bolívia 400 2.105 3.855 4.777 5.597 7.635

Fonte: ANP/SCM

Nota: O país começou a importar gás natural em 01/07/99.

4.2.2.2 Risco de Desabastecimento

A análise dos indicadores financeiros e das características do mercado de gás

brasileiro mostrou que o risco de crédito e de mercado das empresas de distribuição de gás

natural são relativamente baixos quando comparados com o risco de outros setores da

economia. Ou seja, o baixo nível de endividamento, o elevado índice de liquidez e a baixa

elasticidade da demanda fazem com que o setor de distribuição de gás apresente um baixo

risco de “default”. Entretanto, a instabilidade política na Bolívia, as incertezas quanto à

viabilidade econômica das reservas de Santos e a falta de uma política energética integrada

fazem com que o risco de desabastecimento, isto é, o risco de oferta de gás, desestimule o

investimento em determinados projetos de expansão da rede de distribuição, principalmente

na região Nordeste.

Em 1999, com o início das operações do gasoduto Brasil-Bolívia (GASBOL),

acreditava-se haver uma escassez de demanda de gás natural no Brasil. A diferença entre o

volume de gás contratado da Bolívia e o efetivamente importado indicava a necessidade de

estímulo à demanda. A dificuldade de atrair novos clientes para o gás boliviano fez das

térmicas a alternativa para o consumo da capacidade ociosa de importação de gás da Bolívia.

Dessa forma, o governo lançou em 1999 o Programa Prioritário de Termelétricas (PPT) que

136

136

tinha por objetivo estimular o uso do gás natural para a geração de energia elétrica.

Paralelamente ao PPT, promoveu-se a disseminação do gás natural em outros segmentos,

como o veicular e o industrial, além de se estimular a substituição do gás liquefeito do

petróleo (GLP) por gás natural em algumas capitais. A perspectiva da entrada das novas

térmicas em operação levou o governo a estudar o possível aumento do volume de gás

importado pelo GASBOL. Assim, em 2001, a Transpetro e a Transportadora Brasileira

Gasoduto Brasil-Bolívia (TBG) iniciaram o processo de concurso aberto, que tinha por

objetivo vender capacidades de transportes de gás natural pelo GASBOL aos agentes

interessados. A crise do setor elétrico brasileiro, contudo, reduziu a demanda por eletricidade

criando uma capacidade ociosa no sistema hídrico de geração elétrica inviabilizando a

construção de novas térmicas.

A indefinição sobre a demanda das termoelétricas levou a revisão do concurso aberto

que vinha sendo realizado de forma que a capacidade de importação do GASBOL manteve-se

nos 30 milhões de m³ inicialmente contratados. A descoberta das reservas de Santos, em

2003, e a mudança do papel das térmicas no sistema elétrico brasileiro desestimularam o

aumento das importações de gás da Bolívia. Entretanto, as reavaliações negativas da real

viabilidade econômica da reserva de Santos somadas ao aumento da demanda de gás natural,

principalmente dos setores automotivo e industrial (ver tabela 19) levantou o temor de

desabastecimento.

Tabela 19 – Consumo de Gás Natural por Segmento (mês de abril de cada ano)

M³/dia 2000 2001 2002 2003 2004 % Variação 2003-2004Industrial 12.063,7 14.396,4 16.191,8 18.191,9 20.612,1 0,59 13,30%Automotivo 738,1 1.557,3 2.500,9 3.459,4 4.251,1 0,12 22,88%Residencial 421,4 394,1 422,6 504,0 523,5 0,01 3,86%Comercial 256,4 290,1 342,6 379,8 413,1 0,01 8,75%Geração 957,7 4.014,9 7.261,9 6.180,5 9.354,4 0,27 51,35%Total 14.437,3 20.652,8 26.719,8 28.715,6 35.154,1 1,00 22,42%Fonte ANP

137

137

O gráfico 27 mostra a projeção da necessidade de importação frente a um aumento

estimado da demanda, da produção e das importações em 10% ao ano, mantendo-se os

mesmos volumes de gás natural contratados da Bolívia e da Argentina. Como podemos ver, a

partir de 2008, considerando o perfil atual da estrutura de oferta de gás, haverá um

esgotamento da capacidade de importação e uma possível situação de escassez de oferta. Esse

cenário pode ser antecipado já que a estimativa de 10% de crescimento para demanda e para a

produção é extremamente conservadora frente à situação atual da indústria do gás natural. A

demanda, de 2003 para 2004, cresceu 17%, a produção, por sua vez, 7%, segundo dados da

Agência Nacional de Petróleo (ANP). Dessa forma, a estimativa de crescimento de 10%, tanto

para a demanda quanto para a produção, apresenta uma visão otimista, principalmente quando

consideradas as incertezas a respeito da reserva de Santos.

A análise dos dados de oferta e demanda mostram, portanto, que o desenvolvimento

do setor esbarra na questão da dependência das importações de gás natural. A instabilidade

política na Bolívia e a falta de posicionamento do governo quanto às diferentes alternativas

concorrentes para o fornecimento de gás criam um ambiente de incerteza em relação à

segurança do abastecimento do mercado interno de gás, inviabilizando, assim, a expansão da

rede de distribuição de gás natural. Um exemplo disso é a não renovação dos contratos de

fornecimento de gás com as empresas do Nordeste pela Petrobras, em função das paralisações

das obras do Gasene.

138

138

Gráfico 27 – Projeção de Oferta e Consumo de Gás Natural no Brasil

0

20

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60

80

100

120

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 *2006 *2007 *2008

Milh

ões

de m

³/dia

Gás Produzido Internamente Importação Capacidade de Importação

* Os dados a partir de 2006 são estimados

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da ANP

4.2.2.3 Crise Política na Bolívia

A crise política boliviana, iniciada em 2001, que culminou com a renuncia de dois

presidentes em menos de dois anos e com a nacionalização de todas as etapas de exploração e

comercialização de gás e petróleo do país, levantou a questão, até então pouco discutida,

sobre o risco de desabastecimento de gás natural no Brasil. A exportação de gás natural

corresponde a 29% (EIA 2004) do valor total das exportações bolivianas sendo a Petrobras

responsável por 45% da produção de gás do país. O aumento do preço internacional do

petróleo e do gás natural e o crescimento da produção boliviana devem elevar ainda mais a

importância do gás natural para a economia da Bolívia. Assim, os projetos de nacionalização

da indústria de gás e petróleo do país estiveram na frente dos movimentos nacionalistas, que

foram a causa da instabilidade política nos últimos anos.

139

139

A vitória de Evo Morales, em 2006, o primeiro indígena a governar o país, reacende as

incertezas a respeito do gás na Bolívia. Em 2005, ainda no governo do Presidente Carlos

Mesa, o congresso boliviano aprovou um imposto de 32% sobre as vendas das companhias de

petróleo e gás além dos 18% já cobrados na forma de royalties. Embora o aumento da

tributação sobre a produção e a comercialização de hidrocarbonetos tenha representado uma

ameaça aos investimentos das companhias multinacionais na Bolívia, os 50% de imposto não

indicava um risco de abastecimento de gás boliviano. Contudo, em maio de 2006, o

presidente Evo Morales decretou a nacionalização de todas as empresas multinacionais

atuantes no setor de gás e petróleo. Segundo o decreto, as empresas de petróleo e gás deverão

vender à estatal YPFB uma quantia de ações suficiente para que o Estado detenha o controle

de cada companhia. O exército boliviano ocupou todas as refinarias e campos de produção de

gás e petróleo, o que evidencia a tensão política envolvendo a indústria de gás da Bolívia.

Dessa forma, o risco de interrupção do fornecimento de gás da Bolívia para o Brasil torna-se

cada vez mais real.

Quadro 5 – Sinopse da Crise da Bolívia

2003 Queda do Presidente Sanches de Lozada

2003 Assume a Presidência Carlos Mesa

Fortalecimento dos movimentos indígenas nacionalistas, que lutam contra a política

econômica liberal dos últimos anos, que segundo eles só enriqueceu as elites e as multinacionais

do petróleo.

2003 Plebiscito Sobre Lei do Gás

Discussão sobre os caminhos do gás natural na Bolívia. Povo apóia a proposta do governo de mudança da política energética do país com a

recuperação da propriedade dos recursos energéticos na superfície (sem perfuração) e a

reconstituição da estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB

mai/05 Aprovação de aumento

de imposto pelo Congresso

O congresso Boliviano aprovou um novo imposto de 32%, além dos 18% já cobrados na forma de

royalties, a ser cobrado das companhias de petróleo, em uma tentativa de manter Mesa no

Poder. Acentua-se os movimentos pela autonomia de diversas regiões e pela

convocação de uma assembléia constituinte

140

140

Jun/05 Renúncia de Carlos Mesa

Acentua-se a instabilidade política na Bolívia e as incertezas quanto ao futuro da indústria de hidrocarbonetos no país. Fortalecimento dos

movimentos indígenas nacionalistas

2006 Assume a Presidência Evo Morales

A eleição de Evo Morales, primeiro indígena a assumir a presidência da Bolívia. Nacionalização das empresas de petróleo e gás. Dificuldade de

negociação do aumento das importações.

Fonte: Elaboração própria

Dessa forma, as incertezas quanto à garantia de oferta do gás boliviano e sobre os

novos preços do gás no Brasil começam a criar dúvidas sobre a viabilidade de novos projetos

de expansão das redes de distribuição. A nacionalização das subsidiárias da Petrobrás ameaça

os contratos de longo prazo, que não permitem o repasse do aumento dos impostos e dos

royalties para os preços. Dessa forma, as empresas de distribuição de gás brasileiras temem

que a quebra desses contratos possa afetar o preço do gás no país.

Segunda a avaliação da companhia espanhola Repsol-YPF, maior produtora de gás na

Bolívia, as incertezas quanto à nova lei dos hidrocarbonetos na Bolívia e a possível

nacionalização das multinacionais atuantes no país, pode vir a comprometer a fornecimento

de gás natural para o Brasil, criando uma crise de abastecimento já em 2008. Segundo o

diretor de comercialização de gás da companhia, Marco Aurélio Tavares, o mercado brasileiro

de gás corre o risco de apresentar risco de déficit no setor de gás a partir de 2008, devido à

suspensão de novos investimentos no país vizinho.

“Precisamos de uma agenda mínima de investimentos para acompanhar o

crescimento do mercado, mas a demora em uma solução na Bolívia está atrasando os projetos.” (Estado de São Paulo – 2006).

O Ministério de Minas e Energias (MME) brasileiro, também se mostrou preocupado

com a possibilidade de um déficit no setor de gás nos próximos anos. A previsão do MME é

que faltarão 20 milhões de m³ de gás em 2006, caso todas as térmicas tenham que operar em

plena capacidade ao mesmo tempo. Segundo o MME a situação no Nordeste ainda é mais

141

141

crítica, estima-se que faltarão 5 milhões de m³ por dia para a região em 2006. Esse problema é

agravado pela falta de conexão entre os gasodutos do Sudeste, que trazem o gás boliviano, e

os gasodutos do Nordeste. O problema poderia ser amenizado com a construção do Gasene,

que ligará a malha Sudeste com a malha Nordeste. Contudo, a Petrobrás suspendeu

temporariamente as obras do Gasene, para reavaliação de sua viabilidade. Acredita-se que a

crise na Bolívia e a ameaça de redução do suprimento daquele país seja a principal causa da

suspensão das obras do Gasene.

Como pôde ser visto, a crise institucional na Bolívia levantou a possibilidade de uma

crise nacional de abastecimento de gás, o que vem atuando como freio a expansão dos

investimentos na expansão das redes de distribuição. As incertezas quanto à viabilidade

econômica e ao volume corretos da reserva de Santos, fazem como que o crescimento anual

de 22,42% na demanda nacional de gás natural continue dependendo da importação de gás

natural (ANP, 2006).

4.2.2.4 Alternativa ao Gás Boliviano e Planejamento Energético

Os problemas políticos na Bolívia mostraram que a dependência do suprimento de um

único país aumenta o risco de mercado, o que pode vir a inviabilizar alguns projetos de

investimento. Assim, algumas alternativas à substituição do gás boliviano vêem sendo

estudadas. O aumento da importação na Argentina, através do Gasoduto Paraná-Uruguaiana

poderia abastecer os estados do sul do país, diminuindo a dependência do gás fornecido pelo

Gasbol. Contudo, a redução do fornecimento de gás causado pelo racionamento de gás na

Argentina, ocorrido em 2004, tem inviabilizado a expansão do gasoduto até Porto Alegre.

Uma alternativa ao gás boliviano, começou a ser estudada com o início da produção

em 2004 do projeto Camisea no Peru. O objetivo do projeto é transformar o país em

142

142

exportador de hidrocarbonetos. O principal foco do projeto é o mercado criado pelo setor

elétrico Mexicano, mas também se estuda a criação de um anel energético, interligando o Peru

aos demais países sul-americanos. As atenções voltadas para o Peru aumentaram com a crise

política da Bolívia, transformando esse país em um potencial concorrente ao gás boliviano.

Contudo, as autoridades peruanas temem que suas reservas não sejam suficientes para

atender toda a demanda de seus países vizinhos. Segundo Carlos Del Solar, presidente da

Sociedade de Energia, Minas e Petróleo, uma organização do setor privado:

“Temos que ser realistas. Atualmente o Peru não tem reservas de gás suficientes para atender à demanda de toda a região. Precisamos encontrar mais reservas”. (Oil & Gas Journal Latinoamérica, 3º trimestre/05)

Assim, as incertezas quanto ao potencial das reservas do Peru inibem os investimentos

em novos gasodutos capazes de viabilizar a utilização do gás peruano. A utilização do gás do

país em substituição ao gás boliviano ainda mostra-se, portanto, envolto em muitas incertezas.

Uma terceira alternativa seria a importação de gás da Venezuela. Os governos de

Brasil, Argentina e Venezuela estudam a construção de um gasoduto ligando Caracas a

Buenos Aires. A construção de 8 mil quilômetros de gasodutos levaria de 5 a 7 anos e custaria

em torno de US$ 20 bilhões. No Brasil, esse gasoduto chegaria até Manaus onde se dividiria

em dois braços, um para o Nordeste brasileiro e outro para Brasília e Rio de Janeiro, a partir

do qual iria descer até Buenos Aires. Existem diferentes versões de projeto, mas acredita-se

que o gasoduto construído seria capaz transportar entre 50 e 150 milhões de m³/dia, o que vai

depender do projeto escolhido.

O projeto ainda esta em fase de análise e provavelmente enfrentará alguns problemas,

principalmente de cunho ambiental, por atravessar a Amazônia. Para alguns críticos do

projeto, a construção do gasoduto seria motivada por questões políticas, já que pelas

distâncias envolvidas seria mais viável economicamente liquefazer o gás natural. Além disso,

143

143

o fato de ser governado por um governo nacionalista de esquerda levanta a mesma

problemática política da Bolívia.

A importação de GNL, poderia vir a ser uma alternativa de oferta de gás natural,

principalmente para o Nordeste brasileiro. Antes da decisão de se construir o gasoduto

Sudeste-Nordeste, a Petrobras em conjunto com a Shell estudaram um projeto de

investimento de US$ 200 milhões para a construção de uma planta de regaseificação em

Pernambuco. A utilização do gás natural liquefeito diminuiria a dependência do gás boliviano,

além de aumentar a flexibilidade do suprimento e da estocagem. Os principais fornecedores

poderiam ser a Nigéria e Trinidad Tobago e, futuramente, Venezuela e Angola.

Como pôde ser visto, a crise política na Bolívia mostrou que o risco de

desabastecimento de gás é uma ameaça ao desenvolvimento do setor gasífero brasileiro. As

incertezas a respeito do suprimento de gás no país têm inviabilizado tanto a expansão da

capacidade de transporte, quanto à expansão das redes de distribuição. O risco de aumento do

preço do gás nacional, como a dificuldade de renovações dos contratos de gás entre as

distribuidoras e a Petrobrás, principalmente no Nordeste, têm feito com que muitos dos

projetos de expansão das empresas de distribuição sejam adiados ou até mesmo cancelados.

A existência de inúmeros projetos concorrentes à diminuição da dependência do gás

boliviano cria incertezas a respeito da estratégia a ser adotada pela Petrobrás. Além disso, a

indefinição do papel das térmicas na política energética brasileira impede que se avalie de

forma precisa qual o volume de gás demandado pelo mercado nacional. Assim, a definição de

um planejamento energético integrado pelo governo brasileiro torna-se fundamental para se

diminuir as incertezas e, dessa forma, aumentar os investimentos no setor de distribuição de

gás. O quadro 6 mostra de forma resumida a falta de um planejamento energético definido, a

partir da alternância de diferentes e antagônicos projetos do governo em relação ao setor de

gás natural.

144

144

Quadro 6 – Políticas Setoriais para a Indústria de Gás Natural

Ano Marco Situação de Mercado Política de Gás

1999 Inicio das

operações do GASBOL

Excesso de Oferta de Gás Natural: gás importado menor que o volume contratado da

Bolívia

Expansão da geração térmica (PPT), desenvolvimento do consumo em outros setores

(veicular e industrial). Construção do gasoduto ligando a região Sudeste com a região Nordeste, para levar o

gás da Bolívia até as térmicas da região (GASENE)

2001 Crise do setor elétrico brasileiro

Perspectiva de excesso de demanda de energia elétrica.

Inicio do Racionamento

Iniciativa de concurso aberto para aumentar o volume de gás

contratado da Bolívia

2002 Fim do Racionamento

Redução da demanda por eletricidade e aumento da

capacidade ociosa de geração hidroelétrica. Mudança da visão

do papel das térmicas no sistema elétrico brasileiro:

Backup.

Diminuem-se os incentivos a geração termoelétrica. Revisão do

processo de concurso aberto e mantimento do volume de gás

contratado da Bolívia.

2003 Descoberta da reserva de Santos

Possibilidade de auto-suficiência de gás natural e menor dependência do gás

Boliviano.

Falta de estímulo a revisão dos contratos de fornecimento de gás

natural com a Bolívia. Mantêm-se os 30 milhões de m³ diários

contratados.

2004 Reavaliação da

reserva de Santos e crise na Bolívia

Percepção de falta de oferta. O aumento anual da demanda de 20%, as reavaliações negativas da capacidade de produção da

reserva de Santos e a dificuldade de negociação de novos volumes de gás com a Bolívia indicam uma possível

escassez de gás natural já em 2008.

Interrompem-se as obras do GASENE - gás insuficiente para os mercados das regiões Sudeste e

Nordeste. Conversão das Térmicas para diesel - projeto não avança

pela inviabilidade técnica de abastecimento.

2005 Agravamento da Crise da Bolívia

Perspectiva de Excesso de Demanda

Estudo de alternativas para a importação de gás natural: Da

região de Camisea no Peru e da Venezuela - projetos concorrentes.

2006 Indefinição Política

e econômica da Bolívia

Perspectiva Excesso de Demanda

Estudo de uma planta de GNL no Nordeste - Alternativa ao gás

Boliviano. Tentativa de Negociação com a Bolívia - aumentar o volume

de gás contratado.

Fonte: Elaboração própria

Esta seção apresentou as principais barreiras à expansão dos investimentos no

segmento de distribuição de gás natural no Brasil. A próxima seção irá mostrar os principais

instrumentos capazes de estimular o investimento na expansão do setor de gás natural.

145

145

4.3 Algumas Propostas para o Desenvolvimento do Setor

4.3.1 Planejamento Energético

Uma das prioridades para o desenvolvimento não só do setor de gás natural, mas como

de todo o setor energético no país, é a definição de uma política energética integrada. O

aumento da sintonia entre os diferentes agente públicos envolvidos no planejamento

energético é fundamental para se melhorar a coordenação entre as políticas públicas e tornar

mais claro para o mercado os objetivos e as ações do governo.

Nesse sentido, a formulação de uma lei do gás que determine um marco regulatório

para o setor e a definição do papel do gás na matriz energética, principalmente a partir da

definição do papel das térmicas no sistema elétrico brasileiro são essenciais para a criação de

um ambiente de confiança capaz de estimular novos investimentos na expansão da capacidade

de oferta e da capacidade de distribuição de gás. O setor de gás natural é tratado como um

sub-setor do petróleo. As questões envolvendo a indústria do gás natural são tratadas na lei do

petróleo em apenas dois artigos. Assim, existe uma série de regras que precisam ser melhor

definidas, de forma a aumentar a confiança do mercado e a estimular os investimentos no

setor.

As regras estabelecidas pela ANP para o acesso aos gasodutos e os procedimentos de

negociação das tarifas de transporte se mostram ineficientes para a promoção da competição

na venda às distribuidoras. As diferentes tarifas para o gás, nacional, importado e direcionado

para termelétricas segmentam o mercado e distorcem a evolução da demanda. No caso do gás

da Bolívia, a estrutura tarifária mostrou-se pouco flexível às variações dos custos de produção

e dos preços de outras fontes energéticas de forma a comprometer a competitividade do gás

natural importado.

As indecisões e a falta de um consenso entre as partes envolvidas na nova lei do gás

enfatiza a falta de um planejamento para o setor e atrasa inúmeros projetos de investimento,

146

146

tanto no aumento da capacidade de transporte quanto na capacidade de distribuição. Em maio

de 2006 tramitavam no senado dois projetos de lei, um de autoria do senador Rodolpho

Tourinho, que defendia a quebra do monopólio da Petrobrás e o aumento da competição no

setor, e um do Ministério de Minas e Energia, que trouxe algumas reivindicações da

Petrobrás. O quadro 7 resume as principais diferenças entre os projetos d lei, o que caracteriza

a falta de um esforço integrado para o estabelecimento de uma política definida para o gás

natural.

Quadro 7 – Projetos de Lei do Gás

Projeto de Lei 1 (Tourinho) Projeto de Lei 2 (MME)

Atividade de transporte e estocagem

Realizadas mediante contrato de concessão, precedido de licitação, por empresas que se dediquem, de forma exclusiva, a atividade de transporte de gás natural (desverticalização da indústria).Criação do Operador do Sistema Nacional de Transporte de Gás Natural (ONGAS) que tem por objetivo estabelecer regras de operação do sistema de Transporte e Armazenagem de Gás Natural.

Realizado mediante contratos de concessão ou autorização.

Prazo dos contratos de concessão ou autorização dos gasodutos de transporte

O prazo da concessão leva em conta a amortização e a depreciação dos investimentos realizados pelos proprietários. Extinta a concessão, os bens reverterão ao patrimônio da União, ficando sob a administração da ANP. A transferência da concessão é permitida.

35 anos. Extinta a autorização, os bens vinculados à atividade autorizada serão revertidos ao patrimônio da União. Os bens vinculados à concessão, após o término do prazo da autorização, poderão ser novamente licitados, na forma da regulamentação.

Acesso de terceiros

Fica assegurado o acesso de terceiros aos gasodutos de transporte, mediante oferta pública de capacidade, caso haja oferta disponível.

Fica assegurado o acesso de terceiros aos gasodutos de transporte, que poderá ser realizado sobre as seguintes formas: contratação firme, contratação interruptível e contratação extraordinária. Os contratos sobre a modalidade firme terão prioridades no acesso ao gás natural e ocorrerão através de chamada pública.

Comercialização e Mercado Secundário

Terminado o prazo de exclusividade das distribuidoras, os usuários não-residenciais e não-comerciais poderão adquirir gás natural junto aos comercializadores, utilizando-se das redes de gasodutos das distribuidoras. Não há referencia quanto ao mercado secundário.

A comercialização de gás natural se dará mediante a celebração de contratos, registrados na ANP. O atendimento do mercado secundário é permitido sendo que a interrupção do fornecimento poderá ocorrer sempre que houver demanda pelo consumidor primário.

147

147

Regulação Tarifaria

As tarifas aplicáveis ao transporte de gás natural, bem como os critérios de cálculo e revisão, serão fixadas pela ANP.

As tarifas de transporte de gás natural para novos gasodutos, objeto de concessão, serão estabelecidas com base no processo de licitação. As tarifas e processos de revisão definidos até a data de publicação da lei ficam preservados.

Atribuições da ANP

Implementar a Política Energética Nacional para o Gás natural, regular e fiscalizar as atividades da indústria do gás natural, realizar concurso público para a oferta e alocação de capacidade de transporte, promover as licitações para a concessão das atividades de transporte e de armazenagem de gás natural, fixar as tarifas de transporte e de armazenagem de gás natural e fiscalizar as atividades do ONGÁS

Promover o processo de licitação, conforme as diretrizes do Ministério de Minas e Energia, elaborar editais de licitação e contratos de concessão para a construção, ampliação e operação dos gasodutos de transporte.

Atribuições do MME Não faz nenhuma menção.

Propor os gasodutos que deverão ser construídos, estabelecer as diretrizes para o processo de contratação de capacidade de transporte, determinar o regime de concessão ou autorização, fixação do período de exploração exclusiva e da capacidade contratada pelos carregadores iniciais e aprovação das tarifas de transporte de gás natural para novos gasodutos.

Distribuição

Cabe aos estados, através de seus órgãos competentes, regularem e fiscalizarem a atividade de distribuição. A coordenação entre as empresas de distribuição e de transporte fica a cargo da ONGAS. Somente poderão obter concessão para o exercício da atividade de distribuição de gás canalizado as empresas que se dediquem, com exclusividade, a tal atividade. Os Estados poderão atribuir às distribuidoras, nas respectivas áreas de concessão, prazos de exclusividade na distribuição e comercialização de gás natural aos diversos segmentos usuários

Não faz nenhuma menção.

Fonte: Elaboração própria a partir dos projetos de lei.

Além das indefinições a respeito da lei do gás, a falta de uma política clara que

definida o papel do gás na matriz energética, e nesse sentido, o papel das termelétricas, mostra

a falta de um planejamento energético integrado. A complementaridade entre setor elétrico e

de gás, faz com que a definição do papel das térmicas e das condições de despacho de gás

148

148

para a geração elétrica seja fundamental para a decisão de investimento, tanto nas redes de

transporte quanto de distribuição.

A abundância de recursos hídricos no país, fez com que o sistema elétrico brasileiro

tivesse a geração hídrica de eletricidade como principal fonte de energia elétrica. A crise

vivida pelo sistema elétrico em 2001 levantou a importância de fontes de geração elétrica

alternativas à produção hídrica. Embora o custo de construção seja menor no caso da

produção térmica, o custo operacional das termoelétricas é maior do que o custo das plantas

hídricas. Esse fato, em conjunto com a dificuldade de acesso às reservas da região Norte e

Nordeste fizeram com que, até meados da década de 90, os investimentos em produção

térmica de eletricidade se limitassem a algumas poucas regiões fora da rede nacional de

distribuição elétrica.

A partir do inicio da importação de gás da Bolívia mudou-se a visão da importância da

geração termoelétrica no país. A necessidade de absorver o grande volume de gás importado e

as vantagens ambientais e financeiras da utilização do gás natural criou um forte estímulo ao

uso da termoeletricidade. A dificuldade de atrair novos clientes para o gás boliviano fez com

que se estabelecesse a geração térmica de energia elétrica como principal âncora para o

desenvolvimento do setor.

Como forma de incentivar o uso da termoeletricidade, o governo lançou em 1999 o

PPT - Programa Prioritário de Termelétricas – que consistiu em uma série de incentivos para a

construção de aproximadamente 15 plantas de geração termoelétrica a partir do gás natural.

Entre algumas medidas se estabeleceu um preço teto para os contratos de fornecimento de gás

para as térmicas, de forma e evitar que o temor de possíveis flutuações nos preços do gás

inviabilizasse os projetos de investimento. Em 2000, o governo lançou uma segunda versão

do PPT. Nesse novo programa, 49 projetos passaram a ser prioritários.

149

149

A partir de 2001, um novo cenário elétrico começou a se configurar e a questão que se

levanta é da adequação do gás natural a esse novo ambiente. A percepção de um excesso de

oferta de eletricidade de origem hídrica, o risco de abastecimento de gás natural decorrente da

instabilidade política na Bolívia, e o possível aumento dos preços do gás levaram à utilização

da energia termoelétrica como “Backup” do sistema hídrico. Isto é, as usinas à gás entrariam

em operação somente quando a demanda por eletricidade superasse a oferta das hidroelétricas.

Assim a definição do modelo elétrico brasileiro a ser adotado nos próximos anos, e

nesse sentido a definição do papel das térmicas na geração de energia elétrica é fundamental

para se determinar com clareza a demanda de gás natural esperada para os próximos anos. As

estimativas dos volumes de gás consumidos são essenciais para o planejamento de projetos de

transporte e de produção. Até meados da década de 90 se falava em falta de mercados para o

gás, em 2005, a preocupação já era de escassez de oferta. Esta mudança de percepção em

menos de dez anos mostra a falta de um plano energético integrado bem definido capaz de

sinalizar corretamente para o mercado quais as perspectivas de oferta e de consumo do setor.

A expansão do setor de distribuição de gás natural depende de certa forma das

garantias de fornecimento de gás pelas transportadoras. Os investimentos no setor de

transporte e produção, por sua vez, necessitam de uma política clara e definida do governo a

respeito do papel do gás natural na matriz energética brasileira.

4.3.2 Securitização de Recebíveis

A seção 4.3.1 mostrou que as indefinições a respeito da oferta de gás natural geram

um ambiente de incerteza aumentando dessa forma o risco de mercado dos projetos de

investimento na expansão da capacidade de distribuição do país. O problema da segurança do

abastecimento depende, como exposto acima, da definição de uma política energética

150

150

integrada. No âmbito microeconômico, a resolução 2827 do BACEN se mostra como a

principal barreira ao investimento das empresas estatais. Esta seção e a próxima mostrarão

quais instrumentos podem ser utilizados pelas empresas estatais de distribuição de gás para

transpor as limitações de crédito impostas pelo Banco Central.

Como se mostrou anteriormente, a demanda de gás por parte dos consumidores finais

possui baixa elasticidade. Esse fato decorre da própria especificidade do consumo residencial.

Isto é, uma vez instalada a rede de distribuição de gás natural, a substituição desse, por outra

fonte de energia, é limitada por fatores técnicos. Por exemplo, a utilização de GLP em fogões

a gás natural requer a transformação dos queimadores, o que implica custos financeiros. No

setor industrial, o estabelecimento de contratos de médio e longo prazo é uma prática comum,

o que cria uma estabilidade contratual da demanda. O único segmento que apresenta certo

grau de flexibilidade entre diferentes fontes de energia, é o setor de gás veicular. A

possibilidade de utilização, tanto de gás natural, quanto de gasolina faz com que a demanda

nesse setor seja bastante sensível a variações de preço. Contudo, a participação do transporte

no consumo de gás natural ainda é pequena, 8,29% em 2003, embora o país possua a segunda

maior frota de veículos movidos a gás.

Tabela 19 – Consumo de Gás por Segmento Econômico

UNIDADE: Mm³ANO 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Share Produção de Derivados de Petróleo 561 616 785 1.150 1.250 772 848 5,29%

Geração Elétrica 264 349 632 976 2.329 3.011 2.959 18,47%Consumo Final Não-Energético 768 845 807 831 798 821 791 4,94%Setor Energético 1226 1.471 1.696 2.278 2.419 2.722 2.938 18,33%Residencial 81 87 79 114 140 154 196 1,22%Comercial/Público 92 71 57 86 180 250 275 1,72%Transporte 47 132 159 313 572 980 1.328 8,29%Industrial 3194 3.133 3.517 4.343 5.141 6.343 6.687 41,73%Consumo Total 6233 6.704 7.732 10.091 12.829 15.055 16.024 100,00%(*) Inclusive não-aproveitada e reinjeção.

Fonte: ANP

151

151

A estabilidade e previsibilidade do volume de gás consumido das distribuidoras em

conjunto com os contratos de fornecimento de gás de médio e longo prazo firmados com os

grandes consumidores industriais e comerciais fazem com que a conta “receber de clientes”

do balanço patrimonial represente uma considerável parcela do ativo circulante total. Por

exemplo, em 2004 a conta clientes a receber representou 62% do ativo circulante total da

Bahiagas, em 2003 esta mesma conta representou 45% do ativo circulante total da Potigas.

A existência desse grande volume a receber de médio e longo prazo permite que o

mecanismo de securitização de recebíveis seja uma alternativa as empresas estatais para fugir

das restrições de crédito criadas pela resolução 2827 do BACEN. O mecanismo de

securitização de recebíveis, como foi visto no capítulo 2, baseia-se na oferta dos direitos

creditórios ou de recebíveis como garantia na emissão de títulos e na concessão de

empréstimo, de forma a reduzir o risco de crédito do investidor e dessa forma o custo de

captação de recursos.

Dessa forma, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)

estruturou um novo modelo de financiamento para as empresas de distribuição de gás natural,

baseado na securitização de recebíveis. Apesar de a maioria das empresas públicas de

distribuição de gás natural terem a oferta de recursos limitada pela resolução 2827 do

BACEN, existe uma brecha nesta resolução que permite a captação de recurso a partir da

garantia com recebíveis.

A partir das brechas deixadas pela Resolução do BACEN, o BNDES estuda um

primeiro contrato de acordo com o novo modelo a ser firmado com a Potigás, do Rio Grande

do Norte, que pediu ao banco R$11 milhões para o investimento na expansão da sua

capacidade de distribuição. O banco vai pegar duplicatas dos grandes clientes da distribuidora

como garantia para o empréstimo. A operação já foi aprovada pela diretoria do BNDES e

152

152

pode ser usada como modelo para outras empresas, já que elimina as limitações impostas pela

resolução 2827 do BACEN.

Uma segunda alternativa de captação de recursos utilizando as brechas deixadas pela

resolução do BACEN é a emissão de títulos no mercado de capitais. As regras de

contingenciamento de crédito estabelecidas pela resolução 2827 não limita a captação das

empresas públicas no mercado de capitais. Assim, o volume de recursos disponível nesse

nicho de mercado para uma determinada empresa depende da aceitabilidade dos seus papéis

pelos investidores. No caso das empresas de gás, principalmente das estatais, a utilização da

emissão de títulos de dívidas e de títulos imobiliários possui um grande potencial para a

captação de recursos já que o baixo nível de endividamento, os altos índices de liquidez e o

mercado de gás em expansão fazem das empresas de distribuição de gás potenciais bons

geradores de lucro.

Um bom exemplo da potencialidade do mercado de capitais como fonte de recursos

pode ser visto no caso da COMGAS. De acordo com a CVM, até março de 2006, a COMGAS

configurava entre as 100 ações mais atraentes de acordo com a geração de lucro de 2006.

Além disso, o setor de distribuição de energia está entre os setores de maiores altas no mesmo

ano. Esses dados mostram que as ações do setor de distribuição de gás natural apresentam

uma boa aceitabilidade do mercado.

4.3.3 Reestruturação Patrimonial das Empresas Estatais

O processo de privatização das empresas de distribuição de gás natural se iniciou com

o conjunto das reformas institucionais da década de 90 que tiveram como objetivo mudar o

papel do Estado na economia brasileira. No que se refere ao campo energético, esse processo

153

153

teve início com a Emenda Constitucional n° 9, de 9/11/1995, que deu nova redação ao artigo

177 da Constituição:

“A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV desse artigo, observadas as condições estabelecidas em lei”.

Esse dispositivo jurídico foi regulamentado pela Lei 9478/97, conhecida como “Lei do

Petróleo”, que estabeleceu as condições necessárias para que qualquer empresa ou consórcio

de empresas, constituídas sob as leis brasileiras pudessem participar das atividades envolvidas

na cadeia do petróleo e do gás natural (exploração, produção, desenvolvimento, importação,

transporte etc.). Na atividade de distribuição de gás natural, a participação das empresas

privadas foi permitida com a aprovação da Emenda Constitucional n° 5, de 1995, que

modificou o artigo 25, § 2º, estabelecendo que:

“Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei ...”.

Nesse sentido, a partir de 1999 começou o processo de privatização do setor de

distribuição de gás natural. Operam nesse setor cinco empresas privadas: CEG, CEG Rio,

COMGAS, SPS Gás Natural e Gás Brasiliano. A dificuldade de mudança da Resolução 2827

do BACEN, dada as necessidades de redução do déficit público, faz com que a mudança na

estrutura patrimonial das empresas estatais seja, junto com o processo de securitização de

recebíveis e o mercado de capitais, uma alternativa às limitações de crédito impostas pela

resolução do BACEN.

A resolução de contingenciamento de crédito se restringe ao setor público, isto é,

somente as empresas públicas administradas direta ou indiretamente pela União, estados, pelo

Distrito Federal e pelos municípios. Conforme já foi definido, entende-se por empresa pública

a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com patrimônio próprio e

capital exclusivamente público. Dessa forma, a mudança na estrutura patrimonial das

154

154

empresas estatais de distribuição de gás pode vir a ser um instrumento capaz de superar as

limitações de recursos para o investimento necessário na expansão do serviço de distribuição

de gás natural.

Dentre as mudanças da estrutura patrimonial de uma empresa, temos o processo de

privatização, que corresponde à aquisição, fusão ou incorporação de companhia ou empresa

pública por uma empresa privada. Nesse processo, a empresa passa a ser considerada como

uma empresa de capital privado, não estando mais incluída nas restrições de crédito do Banco

Central. A privatização, entretanto, é um processo que envolve grande polêmica, pois setores

da sociedade, geralmente comprometidos com uma visão de esquerda, acreditam tratar-se de

uma simples transferência de recursos do Estado para as mãos da iniciativa privada, que

objetiva o lucro, e não o bem estar da população. Além destas críticas, nos setores de infra-

estrutura, as empresas públicas podem ser usadas muitas vezes, como ferramentas eleitorais,

dessa forma, estados e municípios possuem pouco ou nenhum interesse na privatização das

empresas sob sua administração. Um terceiro problema envolvendo a privatização é a enorme

burocracia envolvida, que torna o processo muito lento.

Existem, contudo, alguns mecanismos que podem ser utilizados de forma a viabilizar o

processo de mudança patrimonial de uma empresa estatal. No que se refere à manutenção do

controle do governo sobre as empresas, costuma-se utilizar a chamada “Golden Share”. A

ação dourada, como queiram, é um tipo especial de ação que assegura controle sobre as

decisões de compra e venda da empresa. Essa ação pode dar, por exemplo, direito de veto

sobre decisões dos sócios privados. Dessa forma o governo manteria, mesmo com a

privatização, certo controle sob as empresas consideradas por eles estratégicas. Em relação ao

dinamismo do processo, a formalidade jurídica, isto é, a burocracia, é inerente ao processo de

venda de empresas públicas. Dessa forma, uma alternativa a remoção das barreiras de crédito

do Banco Central sem, contudo, exigir um lento processo de privatização, seria a parceria de

155

155

empresas públicas com empresas privadas em determinados projetos de expansão de rede de

distribuição de gás natural pode remover.

Apesar das inúmeras críticas e polêmicas envolvendo os processos de privatização, a

análise das empresas de distribuição de gás natural recém privatizadas mostra que a mudança

da estrutura patrimonial das empresas estatais pode contribuir para a expansão dos

investimentos nas redes de infra-estrutura de distribuição.

A maior parte das empresas privadas de distribuição de gás natural possui como

principais acionistas grandes empresas multinacionais, como é o caso da Shell e da BG no

caso da COMGAS, e da Gás Natural SDG no caso da CEG. Esse fato permite que se aumente

o acesso da empresa não só aos recursos nacionais, como também aos recursos do setor

externo, devido às garantias dadas por estas empresas. A análise dos investimentos feitos pela

COMGAS após a sua privatização, apresentada na tabela 20, mostra que o investimento da

empresa aumentou 415% no período, de 1999 a 2004. Nesse mesmo período houve um

aumento de 156% na ampliação da rede de distribuição da empresa, enquanto que seu

consumo médio diário aumentou 188%. Esses dados mostram que a capacidade de

investimento da empresa elevou-se consideravelmente após a sua privatização.

Tabela 20 – Investimentos da COMGAS

1999 2000 2001 2002 2003 2004

Ampliação da Rede (km) 134,3 109,8 252,1 235,8 302,8 343,9Consumo Médio Diário (milhões de m³) 3,6 4,6 6,1 8,1 9,4 10,4N° Total de Clientes (mil) 314,0 329,0 345,0 378,0 416,0 451,0Receita ( Milhões de R$) 341,0 535,0 869,0 1.260,0 1.940,0 2.200,0

Investimento (milhões de R$) 54,3 103,3 229,4 201,3 235,8 280,0Fonte: Site COMGAS

A diferença entre os investimentos realizados pelo conjunto das empresas privadas e

pelo conjunto das empresas estatais observado no capítulo 3 e o crescimento da rede de

distribuição e do número de clientes das empresas privadas após o processo de privatização

156

156

indica que a mudança da estrutura patrimonial das empresas estatais pode contribuir para o

desenvolvimento do setor de gás natural. Isto se faz tanto pelas metas de investimentos

impostas nos contratos de concessão privados como pelo aumento da capacidade de captação

de recursos.

4.4 Considerações Finais

A análise do setor de distribuição de gás natural brasileiro sob o foco das teorias de

investimento de Kalecki e de Minsky mostrou que a diferença entre os níveis de investimento

das empresas privadas e estatais não pode ser completamente explicado pelos condicionantes

financeiros do investimento. A análise dos indicadores financeiros mostra que as empresas

públicas de distribuição de gás possuem uma boa capacidade de endividamento, capaz de

financiar os investimentos necessários na expansão das redes de distribuição. Contudo, a

existência de barreiras não financeiras limita o crescimento do setor.

A falta de uma política energética integrada e bem definida por parte do governo e da

Petrobrás tem criado um ambiente de incertezas, principalmente no que diz respeito a

segurança do abastecimento de gás natural. Dessa forma, embora o perfil da demanda final de

gás natural não crie incertezas quanto ao fluxo de recebimento do serviço de distribuição de

gás natural, as incertezas quanto suprimento das transportadoras, principalmente na região

Nordeste, aumenta os riscos dos investimentos em expansão das empresas de distribuição de

gás.

Além da falta de planejamento energético, o contingenciamento dos gastos públicos,

regulamentado pela resolução 2827 do BACEN tem racionado o crédito, tanto público quanto

privado, para as empresas estatais do setor de gás natural. Assim, a limitada capacidade de

157

157

investimento das empresas estaduais de gás não se da pela sua estrutura financeira, mas sim

pela impossibilidade de captação de recursos junto ao sistema financeiro nacional.

Nesse sentido, qualquer ação destinada ao desenvolvimento e expansão do uso do gás

natural depende em primeiro lugar do estabelecimento de um planejamento energético

integrado que defina de forma clara o papel do gás na matriz energética brasileira, de forma a

se traçar estratégias que diminuam as incertezas, principalmente quanto a segurança da oferta

no setor. Em segundo lugar, deve-se procurar instrumentos capazes de transpor as limitações

de crédito impostas pela política fiscal restritiva dos últimos governos. Nesse sentido, os

mecanismos de securitização de recebíveis, o mercado de capitais e a continuidade do

processo de privatização das empresas estaduais de distribuição de gás natural mostram-se

como importantes alternativas para ampliar a capacidade de investimento dessas empresas,

superando as limitações impostas pelo racionamento de crédito ao setor público.

158

158

Conclusões

A indústria do gás natural no Brasil teve início por volta de 1940 com a descoberta de

petróleo e gás na Bahia, atendendo principalmente as indústrias locais. Com a descoberta das

reservas de Campos, nos anos 80, aumentou-se a utilização do gás natural, principalmente na

região Sudeste do país, fazendo com que a participação desse na matriz energética se elevasse

para 2,7%. Contudo, foi somente a partir da construção do gasoduto Brasil-Bolívia que o gás

natural passou a ser considerado como um importante substituto dos derivados de petróleo.

Em 2003, por exemplo, a participação do gás na matriz energética brasileira passou para 7,8%

(ANP 2005). O recente desenvolvimento da indústria do gás natural, contudo, esbarra nos

gargalos existentes no fim da cadeia de produção, isto é, nas redes de distribuição.

A análise do balanço patrimonial e da demonstração de resultado das principais

companhias de distribuição de gás do país mostrou que o baixo nível de investimento das

empresas estatais não pode ser explicado a partir de suas gestões financeiras. Como pode ser

visto, a existência de um risco financeiro crescente não é suficiente para explicar a diferença

entre os níveis de investimentos das empresas privadas e estatais. Isto é, não é a falta de

capacidade financeira de endividamento que explica os baixos índices de expansão das redes

de distribuição públicas de gás natural. As empresas privadas, possuem uma alta capacidade

financeira para a obtenção de recursos de terceiros, o que pode ser evidenciado pelos altos

níveis de liquidez geral (acima 1) das empresas estatais quando comparados com as empresas

privadas (0,5 na média)56.

A análise feita na primeira parte do trabalho mostrou, dessa forma, que existem

barreiras não financeiras ao desenvolvimento do setor de gás natural brasileiro. Em seguida,

foram mostrados, segundo a opinião do autor, os principais impedimentos à expansão das

56 Vide seção II.2 capítulo 3.

159

159

redes de distribuição. Percebe-se dessa forma, que a falta de recursos para o financiamento

das empresas estatais de distribuição, decorrente do contingenciamento de crédito imposta

pela resolução 2827 do BACEN ao setor público, as incertezas quando ao futuro da oferta de

gás no Brasil, em função das instabilidades políticas na Bolívia e da falta de um

posicionamento do governo quanto a uma estratégia energética para o gás natural, e as

indefinições regulatórias associadas à indústria do gás natural têm sido os principais fatores

inibidores do crescimento e da expansão da atividade de distribuição no Brasil.

Assim, a expansão do uso do gás natural, através da superação dos gargalos no sistema

de distribuição ao consumidor final, depende da definição de uma política energética

integrada que defina o papel do gás natural na matriz energética brasileira. Segundo

estimativas feitas no presente trabalho, em 2008 a demanda por gás natural atingirá o total da

capacidade de oferta, incluindo a produção interna e o volume de gás contratado da Bolívia.

Dessa forma, a definição de estratégias de importação de gás natural é essencial para diminuir

as incertezas quanto à segurança do abastecimento, dado que a real capacidade de produção

da reserva de Santos ainda é indefinida. Além disso, é necessário o estabelecimento de regras

regulatórias claras e específicas para o setor de gás natural, de forma a definir sistemas

tarifários que estimulem o aumento da eficiência e da produtividade das empresas e metas de

investimento que orientem a expansão das redes de distribuição.

Além da superação das incertezas de mercado, as questões das fontes de recursos

financeiros e do custo de capital, como vimos ao longo do trabalho, são essenciais para

viabilizar os projetos de expansão das empresas de distribuição de gás natural. Considerando

o contingenciamento de crédito imposto pelo BACEN ao financiamento do setor público, as

empresas estatais de distribuição de gás natural possuem uma capacidade limitada de captação

de recursos. O presente trabalho, contudo, mostrou alguns mecanismos capazes de aumentar a

capacidade de financiamento destas empresas. Assim a utilização do mercado de capital,

160

160

principalmente a partir das operações de securitização, as parcerias público-privada e a

mudança da estrutura patrimonial das empresas são instrumentos que as companhias estatais

de distribuição de gás natural possuem para aproveitar as brechas deixadas pela resolução

2827, de forma a aumentar a captação de recursos de terceiros.

Constatou-se nesse trabalho, que o desenvolvimento da indústria do gás natural está

sendo comprometido pelas políticas econômicas e pela falta de políticas setoriais bem

definidas. As políticas macroeconômicas contracionistas, refletidas nas metas de superávits

primário, que tem como principal medida a redução do déficit público através restrição de

crédito, exemplificada pela resolução 2827, e a falta de um planejamento energético de longo

prazo que trate de forma integrada todos os setores de energia, como mostrou o trabalho, são

os principais empecilhos aos novos investimentos nas redes de infra-estrutura de gás natural.

Assim faz-se necessário uma ação conjunta das diferentes esferas da administração pública,

Banco Central, Ministérios de Minas e Energia, ANP, Petrobrás e o Congresso Nacional para

se traçar o rumo do gás natural no Brasil.

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Anexo I

PROJETO DE LEI DO SENADO N.º 226, DE 2005

Dispõe sobre a importação, exportação, processamento, transporte, armazenagem, liquefação, regaseificação, distribuição e comercialização de gás natural.

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

CAPÍTULO I Dos Princípios e Objetivos da Política Energética Nacional.

Art. 1º A Política Energética Nacional para o gás natural tem por objetivo incrementar a sua utilização em bases econômicas, mediante a expansão da produção e da infra-estrutura de transporte e armazenagem existente, garantir uma adequada proteção aos usuários e ao meio ambiente e promover um mercado competitivo, sem discriminações entre as empresas que nele atuam. Art. 2º Cabe ao Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) propor ao Presidente da República programas específicos para o uso do gás natural, bem como diretrizes para a sua importação e exportação, de modo a atender às necessidades de consumo interno e assegurar o adequado funcionamento do Sistema Nacional de Estoques de Combustíveis e o cumprimento do Plano Anual de Estoques Estratégicos de Combustíveis, de que trata o art. 4º da Lei nº 8.176, de 8 de fevereiro de 1991.

CAPÍTULO II

Do Monopólio da União

Art. 3º Além do disposto no art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, constituem monopólio da União as seguintes atividades relacionadas ao gás natural:

I – a importação e a exportação;

II – o transporte, por meio de conduto.

Art. 4º As atividades econômicas associadas à indústria do gás natural, nos termos do art. 5º, inciso II desta Lei, serão reguladas e fiscalizadas pela União, por meio da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), e pelos Estados, no caso da distribuição de gás canalizado, e poderão ser exercidas, na forma desta Lei, mediante concessão ou autorização, por empresas constituídas sob as leis brasileiras, com sede e administração no País. CAPÍTULO III

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Das Definições Técnicas

Art. 5º Sem prejuízo das demais definições aplicáveis ao gás natural, previstas no art. 6º da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, ficam estabelecidas as seguintes definições para os fins desta Lei e de sua regulamentação:

I – gás natural liquefeito (GNL): gás natural submetido a processo de liquefação para armazenagem e transporte, passível de regaseificação em unidades próprias; II – gás natural comprimido (GNC) – todo gás natural processado e condicionado para o transporte em ampolas ou cilindros à temperatura ambiente e a uma pressão que o mantenha em estado gasoso;

III – indústria do gás natural: conjunto de atividades econômicas relacionadas com a exploração, desenvolvimento, produção, importação, exportação, processamento, transporte, armazenagem, liquefação, regaseificação, distribuição de gás canalizado e comercialização de gás natural;

IV – processamento de gás natural: conjunto de operações realizadas em unidades próprias para permitir o transporte, distribuição e utilização do gás natural; V – armazenagem de gás natural: estocagem de gás natural em formações geológicas naturais, tais como jazidas esgotadas de petróleo e gás natural, aqüíferos e formações de sal; VI – transporte de gás natural: movimentação de gás natural em gasodutos de transporte, abrangendo a construção, a expansão e a operação das instalações; VII – distribuição de gás canalizado: serviços locais de comercialização de gás canalizado, junto aos usuários finais, explorados com exclusividade pelos Estados, diretamente ou mediante concessão, nos termos do § 2º do art. 25 da Constituição Federal; VIII – comercialização de gás natural: venda de gás natural, por empresa autorizada, a distribuidora ou a usuário; IX – gasoduto de transporte: duto destinado à movimentação de gás natural, considerado de interesse geral, incluindo estações de compressão, de medição, de redução de pressão, de armazenagem e de entrega; X – gasoduto de transferência: duto destinado à movimentação de gás natural, considerado de interesse específico e exclusivo de seu proprietário, vedado o seu o uso para fins comerciais; XI – gasoduto de produção: duto destinado à extração, coleta e movimentação de gás natural nas áreas de produção; XII – produtor: empresa, ou consórcio de empresas, concessionária da exploração e produção de gás natural; XIII – importador: empresa autorizada a importar gás natural; XIV – exportador: empresa autorizada a exportar gás natural; XV – transportador: empresa concessionária da atividade de transporte de gás natural por meio de duto; XVI – carregador: empresa autorizada que contrata o serviço de transporte de gás natural junto ao transportador;

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XVII – armazenador: empresa concessionária da atividade de armazenagem de gás natural; XVIII – distribuidora: empresa concessionária da distribuição de gás canalizado; XIX – comercializador: empresa autorizada a exercer a atividade de comercialização de gás natural; XX – unidades de processamento: instalações destinadas ao processamento de gás natural; XXI – concurso público: procedimento público de oferta e alocação de capacidade em gasodutos de transporte novos e nas expansões dos gasodutos de transporte existentes, bem como em formações geológicas naturais utilizadas para armazenagem de gás natural; XXII – serviço firme: serviço de transporte ou armazenagem não passível de interrupção pelo transportador ou armazenador, nos termos do respectivo contrato, a não ser em casos de emergência ou força maior declarados pela ANP; XXIII – serviço interruptível – serviço de transporte ou armazenagem passível de interrupção pelo transportador ou armazenador, nos termos do respectivo contrato; XXIV – capacidade de transporte: volume máximo diário de gás natural que o transportador pode movimentar em um determinado gasoduto de transporte; XXV – capacidade contratada de transporte: volume diário de gás natural que o transportador é obrigado a movimentar para o carregador, nos termos do respectivo contrato de transporte; XXVI – capacidade disponível de transporte: volume de gás natural obtido pela diferença entre a capacidade de transporte e a totalidade da capacidade contratada de transporte na modalidade de serviço firme; XXVII – capacidade ociosa de transporte: volume diário de gás natural obtido pela diferença entre a capacidade de transporte e o volume diário de gás natural programado para ser movimentado na modalidade de serviço firme; XXVIII – capacidade de armazenagem: volume máximo de gás natural que o armazenador pode armazenar em uma determinada formação geológica natural; XXIX – capacidade contratada de armazenagem: volume diário de gás natural que o armazenador é obrigado a armazenar para o interessado, nos termos do respectivo contrato de armazenagem; XXX – capacidade disponível de armazenagem: volume de gás natural obtido pela diferença entre a capacidade de armazenagem e a totalidade da capacidade contratada de armazenagem na modalidade de serviço firme; XXXI – capacidade ociosa de armazenagem: volume de gás natural obtido pela diferença entre a capacidade de armazenagem e o volume diário de gás natural programado para ser armazenado na modalidade de serviço firme; XXXII – ponto de entrega: ponto nos gasodutos de transporte no qual o gás natural é entregue pelo transportador ao carregador, ou a quem esse venha a indicar; XXXIII – ponto de recebimento: ponto nos gasodutos de transporte no qual o gás natural é recebido pelo transportador do carregador, ou de quem esse venha a indicar. CAPÍTULO IV Do Operador do Sistema Nacional de Transporte de Gás Natural Art. 6º. Fica instituído o Operador do Sistema Nacional de Transporte de Gás Natural – ONGÁS, pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, a ser organizado na forma de associação civil.

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Parágrafo único - O ONGÁS terá sede e foro na cidade de Brasília, Distrito Federal, podendo instalar unidades administrativas regionais. Art. 7º. O ONGÁS terá como objetivo promover o uso eficiente dos Gasodutos de Transporte e Unidades de Armazenagem de Gás Natural, com vistas a aumentar a confiabilidade do sistema e a eliminar condutas discriminatórias, cabendo-lhe: I – Estabelecer regras para a correta e eficiente operação do sistema de Transporte e Armazenagem de Gás Natural, assegurando a continuidade e a qualidade do fornecimento; II - Coordenar as operações realizadas pelas empresas de Transporte e Armazenagem de Gás Natural e de Distribuição de Gás Canalizado; III – Coordenar e adequar os planos de manutenção dos Gasodutos de Transporte e unidades de Armazenagem de Gás Natural; IV – Propor e adotar as ações necessárias para restaurar os serviços de transporte em caso de falhas no suprimento de Gás Natural; V – Planejar o uso do sistema de acordo com as previsões setoriais de demanda; VI – Interagir com a Empresa de Pesquisa Energética - EPE na formulação de planos de expansão do sistema; VII – Elaborar e divulgar indicadores de desempenho do sistema de Transporte e Armazenagem de Gás Natural. Art. 8º. O ONGÁS terá como associadas as empresas titulares de concessão ou autorização para o exercício das atividades da Indústria do Gás Natural e empresas usuárias de gás natural, sendo constituído pelos seguintes órgãos: I – Assembléia Geral, como órgão deliberativo superior, composto pelas empresas referidas no caput desse artigo; II – Conselho de Administração, órgão colegiado composto por onze membros, sendo dez indicados pelas empresas referidas no caput desse artigo e um pelo Ministério das Minas e Energia, eleitos pela Assembléia Geral; III – Diretoria, órgão colegiado ao qual competirá a direção geral da associação; IV – Conselho Fiscal, órgão permanente ao qual competirá fiscalizar as contas da associação e verificar o cumprimento dos deveres legais e estatutários da administração; Parágrafo único. A Diretoria será composta por, no máximo, cinco membros, sendo um o Diretor-Geral, todos profissionais de reconhecida competência em sua área de atuação, domiciliados no país, com dedicação exclusiva e em tempo integral, eleitos e destituíveis pelo Conselho de Administração. Art. 9º. Observadas as disposições desta Lei, os órgãos do ONGÁS serão estruturados e exercerão suas atribuições na forma estabelecida no Estatuto Social. CAPÍTULO V Da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Art. 10 Sem prejuízo das atribuições que lhe foram conferidas na Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, cabe à ANP: I – implementar, em sua esfera de atribuições, a Política Energética Nacional para o Gás natural, nos termos do Capítulo I desta Lei;

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II – regular e fiscalizar as atividades da indústria do gás natural; III – realizar concurso público para a oferta e alocação de capacidade nos gasodutos de transporte novos; IV – elaborar os editais e promover as licitações para a concessão das atividades de transporte e de armazenagem de gás natural, celebrando os contratos decorrentes e fiscalizando a sua execução; V – estabelecer critérios e fixar as tarifas de transporte e de armazenagem de gás natural; VI – aprovar o regulamento das ofertas públicas de capacidade a serem promovidas pelos transportadores; VII – autorizar o exercício das atividades de importação, exportação, processamento, carregamento, liquefação, regaseificação, compressão, descompressão e comercialização de gás natural, na forma estabelecida nesta Lei; VIII – autorizar a construção e operação de gasodutos de transferência e de produção e reclassificar os gasodutos de transferência na forma estabelecida no art. 37 desta Lei; IX – homologar os contratos de conexão de outros gasodutos aos gasodutos de transporte, inclusive os procedentes do exterior; X – interagir com a EPE na formulação de planos de expansão do sistema de transporte; XI – elaborar e publicar relatórios anuais de desempenho da concorrência nas atividades que compõem a indústria do gás natural; XII – quando for aplicável à indústria do gás natural o disposto no art. 19 da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, ou quando houver conflito de interesses entre agentes de gás natural, solicitar a manifestação prévia da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça - SDE e da Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda - SEAE; XIII – articular-se com a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL e com órgãos reguladores estaduais, objetivando compatibilizar e uniformizar as normas aplicáveis aos mercados de gás natural e de energia elétrica; XIV – interagir com os órgãos encarregados da administração e regulação das atividades de gás natural de outros países, em razão de acordos internacionais celebrados e no âmbito do Mercosul, objetivando promover o intercâmbio de informações e harmonizar o ambiente legal e regulamentar. XV – fiscalizar as atividades do ONGÁS. CAPÍTULO VI Do Transporte de Gás Natural Art. 11 A atividade de transporte de gás natural por meio de dutos será exercida mediante contratos de concessão, precedidos de licitação, na forma desta Lei. Seção I Dos Gasodutos de Transporte Novos Art. 12 A ANP, com base em estudos setoriais e técnicos desenvolvidos pela EPE ou por qualquer interessado, definirá os novos gasodutos de transporte a serem objeto de concessão. Art. 13. A licitação será precedida de concurso público a ser promovido pela ANP, com o objetivo de identificar Carregadores e dimensionar a capacidade de transporte do novo gasoduto.

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Parágrafo único. Qualquer empresa interessada em adquirir capacidade de transporte ou em exercer a atividade de transporte de gás natural por meio de dutos poderá solicitar à ANP a realização do concurso público, justificando e fundamentando o pedido. Art. 14. O concurso público observará os princípios de transparência, publicidade e igualdade entre os participantes, devendo a ANP editar regulamento dispondo sobre: I – critérios utilizados para o dimensionamento do projeto; II – pontos de entrega e recepção; III – custo médio ponderado de capital, refletindo as condições de mercado e os riscos associados ao transporte; IV – tarifa máxima de transporte prevista e metodologia de cálculo adotada; V – condições para o redimensionamento do projeto. § 1º Caso a capacidade de transporte projetada seja compatível com as solicitações apresentadas pelos carregadores interessados, a ANP promoverá a licitação do novo gasoduto. § 2º Os carregadores que solicitarem capacidade de transporte no concurso público deverão assinar com a ANP termo de compromisso de compra da capacidade solicitada. § 3º O termo de compromisso referido no parágrafo anterior será irrevogável e irretratável e fará parte integrante do edital de licitação. § 4º Caso a capacidade de transporte projetada não seja compatível com as solicitações apresentadas pelos carregadores, ou caso não haja transportadores interessados, o projeto será redimensionado e novo concurso público será promovido, observados os princípios desse artigo. Seção II Dos Gasodutos de Transporte Existentes Art. 15. Os proprietários de instalações classificadas pela ANP como gasodutos de transporte na data de publicação desta Lei deverão, no prazo de noventa dias a contar da publicação, transferir a propriedade de tais instalações para empresa coligada, já existente ou a constituir, que exercerá a atividade de transporte de gás natural, observado o disposto no art. 16 desta Lei. Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica às empresas proprietárias de gasodutos de transporte que se dediquem, com exclusividade, à atividade de transporte de gás natural. Art. 16. Cumprido o disposto no artigo 15 desta Lei e dentro do prazo de cento e oitenta dias a contar da publicação desta Lei, a ANP celebrará contratos de concessão para o exercício da atividade de transporte de gás natural com as empresas transportadoras proprietárias dos gasodutos de transporte existentes, dispensada a licitação prevista no art. 7º desta Lei. Parágrafo único. O prazo da concessão levará em conta a amortização e a depreciação dos investimentos realizados pelos proprietários. Seção III Da Concessão Art. 17. Somente poderão obter concessão para o exercício da atividade de transporte de gás natural por meio de dutos as empresas que se dediquem, com exclusividade, a esta atividade e que atendam aos requisitos técnicos, econômicos e jurídicos estabelecidos pela ANP.

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§ 1º Fica facultado ao transportador o exercício da atividade de armazenagem de gás natural, observado o disposto no Capítulo VIII desta Lei. § 2º O transportador que exercer a atividade de armazenagem de gás natural deverá manter contabilidade distinta para ambas as atividades, na forma a ser estabelecida pela ANP. § 3º O transportador não poderá comprar ou vender gás natural, a não ser para consumo nas operações de transporte e para manter a segurança operacional do gasoduto, conforme as normas operacionais baixadas pela ANP. Art. 18. As concessões extinguir-se-ão: I – pelo vencimento do prazo contratual; II – por acordo entre as partes; III – pelos motivos de rescisão previstos no contrato. § 1º Extinta a concessão, os bens reverterão ao patrimônio da União, ficando sob a administração da ANP, não implicando a reversão ônus de qualquer espécie para a União ou para a ANP, nem conferindo ao concessionário qualquer direito de indenização. § 2º Em qualquer caso de extinção da concessão, o concessionário fará, por sua conta e risco, a remoção dos bens e equipamentos que não sejam objeto de reversão, ficando obrigado a reparar ou indenizar os danos decorrentes de suas atividades e praticar os atos de recuperação ambiental determinados pelos órgãos competentes. Art. 19. É permitida a transferência do contrato de concessão, preservando-se o seu objeto e as condições contratuais, desde que o novo concessionário atenda aos requisitos previstos no art. 17 desta Lei. Parágrafo único. A transferência do contrato somente poderá ocorrer mediante prévia e expressa autorização da ANP. Seção IV Do Edital de Licitação Art. 20. A licitação para outorga dos contratos de concessão referidos no art. 11 desta Lei obedecerá ao disposto nesta Lei, na regulamentação a ser expedida pela ANP e no respectivo edital. Art. 21. O edital de licitação será acompanhado do termo de compromisso referido nos §§ 2º e 3º do art. 14 desta Lei e da minuta básica do contrato de concessão, devendo indicar, obrigatoriamente: I – o percurso do gasoduto de transporte objeto da concessão, a capacidade de transporte projetada e os critérios utilizados para o seu dimensionamento e os pontos de entrega e recepção; II – a tarifa máxima de transporte prevista e os critérios utilizados para o seu cálculo; III – os requisitos exigidos dos concorrentes, nos termos do art. 17 desta Lei, e os critérios de pré-qualificação, quando esse procedimento for adotado; IV – a relação dos documentos exigidos e os critérios a serem seguidos para aferição da capacidade técnica, da idoneidade financeira e da regularidade jurídica e fiscal dos interessados, bem como para o julgamento técnico e econômico-financeiro da proposta; V – a expressa indicação de que caberá ao concessionário o pagamento das indenizações devidas por desapropriações ou servidões necessárias ao cumprimento do contrato, bem como a obtenção de licenças junto aos órgãos competentes, inclusive as de natureza ambiental;

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VI – o prazo, local e horário em que serão fornecidos, aos interessados, os dados, estudos e demais elementos e informações necessários à elaboração das propostas, bem como o custo de sua aquisição. Art. 22. No caso de participação de empresa estrangeira, o edital conterá a exigência de que a mesma apresente, juntamente com a sua proposta e em envelope separado: I – prova de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal, nos termos da regulamentação a ser editada pela ANP; II – inteiro teor dos atos constitutivos e prova de encontrar-se organizada e em funcionamento regular, conforme a lei de seu país; III – designação de um representante legal junto à ANP, com poderes especiais para a prática de atos e assunção de responsabilidade relativamente à licitação e à proposta apresentada; IV – compromisso de, caso vencedora, constituir empresa segundo as leis brasileiras, com sede e administração no país. Parágrafo único. A assinatura do contrato de concessão ficará condicionada ao efetivo cumprimento do compromisso assumido de acordo com o inciso IV desse artigo. Seção V Do Julgamento da Licitação Art. 23. O julgamento da licitação identificará a proposta mais vantajosa segundo o critério de menor receita anual requerida, com fiel observância aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e igualdade entre os concorrentes. Parágrafo único. Para os fins desse artigo, a receita anual requerida será calculada multiplicando-se a capacidade de transporte projetada do gasoduto pela tarifa máxima de transporte prevista. Seção VI Do Contrato de Concessão Art. 24. O contrato de concessão deverá refletir fielmente as condições do edital e da proposta vencedora e terá como cláusulas essenciais: I – a descrição do gasoduto objeto da concessão; II – o prazo de duração da concessão e as condições para a sua prorrogação; III – o cronograma de implantação, o investimento mínimo previsto e as hipóteses de expansão do gasoduto; IV – as tarifas fixadas e os critérios para a sua revisão; V – as garantias prestadas pelo concessionário, inclusive quanto à realização do investimento proposto; VI – a especificação das regras sobre desocupação e devolução de áreas, inclusive retirada de equipamentos e reversão de bens; VII – os procedimentos para acompanhamento e fiscalização das atividades da concessionária e para a auditoria do contrato; VIII – a obrigatoriedade de o concessionário fornecer à ANP relatórios, dados e informações relativos às atividades desenvolvidas;

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IX – as regras de acesso, por qualquer carregador interessado, ao gasoduto objeto da concessão, conforme o disposto na Seção VIII, do Capítulo VI, desta Lei; X – os procedimentos relacionados com a transferência do contrato, conforme o disposto no art. 19 desta Lei; XI – as regras sobre solução de controvérsias, relacionadas com o contrato e sua execução, inclusive a conciliação e a arbitragem; XII – os casos de rescisão e extinção do contrato; XIII – as penalidades aplicáveis na hipótese de descumprimento pelo concessionário das obrigações contratuais. Parágrafo único. As condições contratuais para a prorrogação do prazo da concessão, referidas no inciso II desse artigo, serão estabelecidas de forma a assegurar a continuidade dos serviços e o respeito aos contratos de transporte celebrados. Art. 25. O contrato estabelecerá que o concessionário estará obrigado a: I – celebrar com os carregadores contratos de transporte para todas as modalidades de serviço oferecidas, que deverão ser previamente homologados pela ANP; II – adotar, em todas as suas operações, as medidas necessárias para a preservação das instalações, das áreas ocupadas e dos recursos naturais potencialmente afetados, garantindo a segurança das populações e a proteção do meio ambiente; III – comunicar, imediatamente, à ANP a ocorrência de acidentes e de quaisquer outros fatos ou circunstâncias que interrompam, ou possam interromper, os serviços de transporte; IV – responsabilizar-se civilmente pelos atos de seus prepostos e indenizar todos e quaisquer danos decorrentes das atividades empreendidas, devendo ressarcir a ANP e a União dos ônus que venham a suportar em conseqüência de eventuais demandas motivadas por atos do concessionário; V – adotar as melhores práticas da indústria internacional do gás natural e obedecer às normas e procedimentos técnicos e científicos pertinentes à atividade de transporte de gás natural; VI – disponibilizar, em meio eletrônico acessível a qualquer interessado, informações sobre as características de suas instalações, os serviços prestados, as tarifas aplicáveis, as capacidades disponíveis e os contratos celebrados, especificando partes, prazos e quantidades envolvidas. Seção VII Dos Princípios Tarifários Art. 26. As tarifas aplicáveis ao transporte de gás natural, bem como os critérios de cálculo e revisão, serão fixadas pela ANP de forma a: I – garantir tratamento não discriminatório a todos os carregadores; II – guardar relação com o tipo de serviço de transporte e grau de eficiência requerido; III – garantir rentabilidade adequada ao transportador, compatível com os riscos inerentes à atividade de transporte de gás natural; IV – garantir o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão; V – garantir a segurança e a confiabilidade dos serviços de transporte;

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VI – incentivar o transportador a reduzir custos e ampliar a oferta de capacidade de transporte; VII – refletir as alterações dos tributos incidentes sobre as atividades de transporte de gás natural. § 1º.As tarifas aplicáveis às atividades de transporte de gás natural serão publicadas pelo transportador, na forma a ser estabelecida pela ANP. § 2º. Nenhum tipo de subsídio poderá ser considerado na remuneração de investimentos realizados por empresas privadas, públicas, ou de economia mista. Seção VIII Do Acesso aos Gasodutos de Transporte Art. 27. Fica assegurado a qualquer carregador interessado o acesso aos gasodutos de transporte, mediante o pagamento da tarifa aplicável. Art. 28. O acesso se dará mediante oferta pública de capacidade, que deverá ser promovida pelo transportador sempre que houver capacidade disponível de transporte ou capacidade ociosa de transporte. Parágrafo único. O transportador não estará obrigado a promover oferta pública de capacidade caso não haja capacidade disponível de transporte ou capacidade ociosa de transporte ou, ainda, em caso de impedimentos técnicos e de segurança declarados pela ANP. Art. 29. A oferta pública de capacidade observará os princípios de transparência, de publicidade e de igualdade entre os participantes e será regida por regulamento a ser elaborado pelo transportador e aprovado previamente pela ANP. § 1º O transportador disponibilizará o regulamento em meio eletrônico acessível a qualquer interessado, devendo o mesmo dispor sobre: I – o procedimento de oferta de capacidade, especificando prazos, termos e condições para as solicitações dos carregadores interessados, inclusive por meio eletrônico; II – o modelo dos contratos de transporte a serem celebrados; III – os critérios da alocação de capacidade entre os carregadores interessados, caso as capacidades solicitadas sejam superiores às capacidades ofertadas; § 2º O transportador disponibilizará, em meio eletrônico acessível a qualquer interessado, as capacidades passíveis de serem contratadas como serviço firme ou interrompível e as tarifas aplicáveis; § 3º A solicitação de capacidade vinculará os carregadores interessados a todos os termos e condições do regulamento; § 4º A alocação de capacidade a que se refere o inciso III desse artigo deverá estar baseada em critério objetivo e de fácil mensuração. Seção IX Da Expansão dos Gasodutos de Transporte Art. 30. O transportador deverá submeter à ANP projeto para a expansão do gasoduto de transporte, nas hipóteses previstas no contrato de concessão ou em circunstâncias que a justifiquem. Art. 31. Qualquer empresa interessada poderá solicitar à ANP a expansão dos gasodutos de transporte, mediante justificativa fundamentada.

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Parágrafo único. Aprovada a solicitação, a ANP determinará ao transportador a apresentação de projeto para a expansão do gasoduto, especificando as características a serem observadas. Art. 32. A implementação do projeto de expansão será precedida de concurso público a ser promovido pelo transportador, na forma de regulamento a ser previamente aprovado pela ANP, observando-se os princípios de transparência, publicidade e igualdade entre os participantes. § 1º O regulamento do concurso público disporá sobre: I – critérios utilizados para o dimensionamento do projeto de expansão; II – novos pontos de entrega e recepção; III – custo orçado para o projeto, a tarifa de transporte prevista e a metodologia de cálculo aplicada; IV – condições para o redimensionamento do projeto de expansão. § 2º Caso a capacidade de transporte projetada seja compatível com as solicitações apresentadas pelos carregadores interessados, o projeto será implementado. § 3º Os carregadores que solicitarem capacidade de transporte no concurso público deverão assinar com o transportador termo de compromisso de compra e venda da capacidade solicitada, em caráter irrevogável e irretratável. § 4º O carregador interessado que já esteja utilizando mais de cinqüenta por cento da capacidade de transporte do gasoduto, somente poderá concorrer a, no máximo, quarenta por cento da capacidade ofertada na expansão. § 5º Caso não haja solicitação de capacidade por outros carregadores, o carregador interessado que já esteja utilizando mais de cinqüenta por cento da capacidade de transporte do gasoduto poderá concorrer à totalidade da capacidade ofertada na expansão. § 6º Caso a capacidade de transporte projetada não seja compatível com as solicitações apresentadas pelos carregadores, ou caso não haja carregadores interessados, o projeto será redimensionado e novo concurso público será promovido, observados os princípios desse artigo. Seção X Da Interconexão Art. 33. O transportador permitirá a conexão de outros gasodutos de transporte ao gasoduto objeto da concessão. Parágrafo único. Os contratos de conexão a serem celebrados e as tarifas a serem praticadas deverão ser previamente homologados pela ANP. Seção XI Da Cessão de Capacidade Art. 34. A ANP estabelecerá normas para a cessão de capacidade de transporte entre carregadores, assegurando a publicidade e a transparência do processo para inibir práticas discriminatórias. CAPÍTULO VII Dos Gasodutos de Transferência e de Produção Art. 35. Observadas as disposições legais pertinentes, qualquer empresa que atenda ao disposto no art. 4º desta Lei poderá receber autorização da ANP para construir e operar gasodutos de transferência e gasodutos de produção.

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§ 1º A ANP baixará normas sobre a habilitação dos interessados e as condições para a autorização, bem como para a transferência de sua titularidade, respeitados os requisitos de proteção ambiental e segurança das instalações. § 2º No prazo de cento e oitenta dias a contar da publicação desta Lei, as empresas proprietárias de gasodutos de transferência e gasodutos de produção receberão da ANP as respectivas autorizações, ratificando sua titularidade sobre os mesmos. Art. 36. Os gasodutos de transferência e gasodutos de produção não estarão sujeitos ao regime de acesso previsto na Seção VIII, do Capítulo VI, desta Lei. Art. 37. Os gasodutos de transferência serão reclassificados pela ANP como gasodutos de transporte caso haja comprovado interesse de carregadores em sua utilização, observados os requisitos técnicos e de segurança das instalações, ou caso se verifique a utilização do gás para fins comerciais Parágrafo único. Em caso de reclassificação, aplicar-se-ão as regras da Seção II, do Capítulo VI, desta Lei. CAPÍTULO VIII Da Armazenagem de Gás Natural Art. 38. A atividade de armazenagem de gás natural será exercida mediante contratos de concessão, precedidos de licitação, na forma estabelecida nesta Lei. Parágrafo único. A construção e operação de outras instalações de armazenagem de gás natural e de gás natural liquefeito, inclusive terminais marítimos, ficam submetidas ao regime de autorização, na forma estabelecida nesta Lei e na Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997. Art. 39. A ANP definirá as formações geológicas naturais a serem objeto de concessão, com base em estudos setoriais e técnicos desenvolvidos pelos órgãos competentes ou por qualquer interessado. Art. 40. Qualquer empresa interessada em exercer a atividade de armazenagem de gás natural poderá solicitar à ANP a realização de licitação, mediante justificação fundamentada. Art. 41. Somente poderão obter concessão para o exercício da atividade de armazenagem de gás natural as empresas que se dediquem, com exclusividade, a esta atividade e que atendam aos requisitos técnicos, econômicos e jurídicos estabelecidos pela ANP, ressalvado o disposto no § 1º do art. 13 desta Lei. § 1º Quando a atividade de armazenagem de gás natural for exercida, com exclusividade, o armazenador não ficará sujeito ao regime de acesso previsto na Seção VIII, do Capítulo VI, desta Lei e poderá praticar tarifas diferenciadas mediante prévia homologação da ANP. § 2º A atividade de armazenagem de gás natural, quando exercida por transportador, ficará sujeita ao regime de acesso previsto na Seção VIII, do Capítulo VI, desta Lei e às tarifas fixadas pela ANP. § 3º O armazenador não poderá comprar ou vender gás natural, a não ser para consumo próprio e para manter a segurança operacional das instalações de armazenagem, conforme as normas operacionais baixadas pela ANP. Art. 42. As concessões de que trata o art. 39 desta Lei extinguir-se-ão: I – pelo vencimento do prazo contratual; II – por acordo entre as partes; III – pelos motivos de rescisão previstos no contrato.

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§ 1º Extinta a concessão, as formações geológicas serão devolvidas ao patrimônio da União, juntamente com os bens reversíveis, ficando sob a administração da ANP. A devolução e a reversão não implicarão ônus de qualquer espécie para a União ou para a ANP, nem conferirá ao concessionário qualquer direito de indenização. § 2º Em qualquer caso de extinção da concessão, o concessionário fará, por sua conta e risco, a remoção dos bens e equipamentos que não sejam objeto de reversão, ficando obrigado a reparar ou indenizar os danos decorrentes de suas atividades e praticar os atos de recuperação ambiental determinados pelos órgãos competentes. Art. 43. É permitida a transferência do contrato de concessão, preservando-se o seu objeto e as condições contratuais, desde que o novo concessionário atenda aos requisitos previstos no art. 41 desta Lei. Parágrafo único. A transferência do contrato somente poderá ocorrer mediante prévia e expressa autorização da ANP. Art. 44. O edital de licitação, o julgamento da licitação, o contrato de concessão, os princípios tarifários e o acesso à capacidade de armazenagem serão regidos, no que for aplicável, pelo disposto nas Seções IV, V, VI, VII e VIII do Capítulo VI desta Lei. CAPÍTULO IX Da Importação, Exportação e Processamento do Gás Natural e Condensado Art. 45. Qualquer empresa que atenda ao disposto no art. 4º desta Lei poderá receber autorização da ANP para exercer as atividades de importação, exportação e processamento de gás natural e condensado. Parágrafo único. O exercício das atividades de importação e exportação de gás natural e condensado observará as diretrizes do CNPE, em particular as relacionadas com o cumprimento do art. 4º da Lei nº 8.176, de 8 de fevereiro de 1991, e obedecerá às demais normas legais e regulamentares pertinentes. CAPÍTULO X Da Compressão, Descompressão, Liquefação e Regaseificação de Gás Natural Art. 46. Qualquer empresa, ou consórcio de empresas, que atenda ao disposto no art. 4º desta Lei poderá receber autorização da ANP para construir e operar unidades de compressão, descompressão, liquefação e regaseificação de gás natural. Parágrafo único. A ANP baixará normas sobre a habilitação dos interessados e condições para a autorização, bem como para a transferência de sua titularidade, respeitados os requisitos de proteção ambiental e segurança das instalações. CAPÍTULO XI Da Distribuição de Gás Canalizado Art. 47. Cabe aos Estados explorar os serviços públicos locais de gás canalizado, diretamente ou mediante concessão, nos termos da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, e de suas legislações. Art. 48. Somente poderão obter concessão para o exercício da atividade de distribuição de gás canalizado as empresas que se dediquem, com exclusividade, a tal atividade e que atendam aos requisitos técnicos, econômicos e jurídicos estabelecidos pelo órgão estadual competente, ressalvada a atividade prevista no capítulo VIII desta Lei. Art. 49. Os Estados poderão atribuir às distribuidoras, nas respectivas áreas de concessão, prazos de exclusividade na distribuição e comercialização de gás natural aos diversos segmentos usuários.

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CAPÍTULO XII Da Comercialização de Gás Natural Art. 50. Findo o prazo de exclusividade na comercialização de que trata o art. 49 desta Lei, facultar-se-á aos usuários não-residenciais e não-comerciais adquirir gás natural junto a comercializador, utilizando-se das redes de gasodutos das distribuidoras para transportar o gás natural até as suas instalações. Art. 51. Qualquer usuário que atenda os requisitos previstos nos artigos 4º e 50 desta Lei e aos requisitos técnicos, econômicos e jurídicos estabelecidos pela ANP poderá receber autorização do Poder Concedente Estadual para exercer a atividade de comercialização de gás natural. Parágrafo único. As empresas transportadoras, armazenadoras e distribuidoras não poderão exercer, diretamente, a atividade de comercialização de gás natural, ressalvada a comercialização de gás natural, pelas empresas distribuidoras, nas suas respectivas áreas de concessão, nos termos os contratos de concessão celebrados. CAPÍTULO XIII Da Empresa Integrada Art. 52. Para os fins desta Lei, serão consideradas integradas: I – as empresas que exercerem a atividade de transporte de gás natural e que participarem, com mais de vinte por cento, com poderes ou não de controle, do capital de outras empresas que exerçam qualquer das atividades de produção, armazenagem e comercialização de gás natural; II – as empresas que exercerem qualquer das atividades de produção, armazenagem e comercialização de gás natural e que participarem, com mais de vinte por cento, com poderes ou não de controle, do capital de outras empresas que exerçam a atividade de transporte de gás natural. Art. 53. A ANP, com relação à empresa integrada, deverá: I – exigir estrutura gerencial própria e a elaboração de relatórios de desempenho para cada atividade; II – exigir que pessoas que já exerçam cargos de administração e gerência em uma empresa integrada não ocupem cargos similares em outra, de modo a assegurar a tomada de decisões de forma autônoma e independente; III – estabelecer período de impedimento para que as pessoas que exerçam cargos de administração e gerência em uma empresa integrada possam exercê-los em outra; IV – exigir que os planos orçamentários, financeiros e de investimentos das empresas integradas sejam elaborados individualmente, para aprovação dos órgãos de administração e gerência de cada uma delas; CAPÍTULO XIV Das Disposições Finais Art. 54. As atividades de exploração e produção de gás natural regem-se pela Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997.

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Art. 55. Os incisos IV e V do art. 2º da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passam a vigorar com a seguinte redação: “Art. 2° .............................................................................................. .......................................................................................................... IV – estabelecer diretrizes para programas específicos, como os de uso do carvão, da energia termonuclear, dos biocombustíveis, da energia solar, da energia eólica e da energia proveniente de outras fontes alternativas; V – estabelecer diretrizes para a importação e exportação, de maneira a atender às necessidades de consumo interno de petróleo e seus derivados e assegurar o adequado funcionamento do Sistema Nacional de Estoques de Combustíveis e o cumprimento do Plano Anual de Estoques Estratégicos de Combustíveis, de que trata o art. 4º da Lei nº 8.176, de 8 de fevereiro de 1991. .................................................................................................(NR)” Art. 56. Dê-se aos incisos III e IV do art. 4º da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, a seguinte redação: “Art. 4º............................................................................................... .......................................................................................................... III – a importação e exportação de petróleo e de seus derivados; IV – o transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem como o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto e de seus derivados. ................................................................................................ (NR)” Art. 57. Os incisos VII e XIX do art. 6º da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passam a vigorar com a seguinte redação: “Art. 6° .............................................................................................. .......................................................................................................... VII – transporte: movimentação de petróleo e seus derivados em meio ou percurso considerado de interesse geral; .......................................................................................................... XIX – indústria do petróleo: conjunto de atividades econômicas relacionadas com a exploração, desenvolvimento, produção, refino, transporte, importação e exportação de petróleo e outros hidrocarbonetos líquidos e seus derivados. ................................................................................................ (NR)” Art. 58. O inciso I do art. 8º da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 8º .............................................................................................. I - implementar, em sua esfera de atribuições, a política nacional de petróleo e de biocombustíveis, contida na política energética nacional, nos termos do Capítulo I desta Lei, com ênfase na garantia do suprimento de derivados de petróleo e de biocombustíveis, em todo o território nacional, e na proteção dos interesses dos consumidores quanto a preço, qualidade e oferta dos produtos; ................................................................................................ (NR)” Art. 59. O caput do art. 53 da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 53. Qualquer empresa ou consórcio de empresas que atenda ao disposto no art. 5° poderá submeter à ANP proposta, acompanhada do respectivo projeto, para a construção e operação de refinarias e de unidades de processamento e de armazenagem de gás natural, bem como para a ampliação de sua capacidade. ................................................................................................ (NR)”

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Art. 60. O título do Capítulo VII da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação: “CAPÍTULO VII Do Transporte de Petróleo e de seus Derivados (NR)” Art. 61. O caput do art. 56 da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 56. Observadas as disposições das leis pertinentes, qualquer empresa ou consórcio de empresas que atender ao disposto no art. 5° poderá receber autorização da ANP para construir instalações e efetuar qualquer modalidade de transporte de petróleo e de seus derivados, seja para suprimento interno ou para importação e exportação. (NR)” Art. 62. O título do Capítulo VIII da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação: “CAPÍTULO VIII Da Importação e Exportação de Petróleo e de seus Derivados (NR)” Art. 63. O caput do art. 60 da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 60. Qualquer empresa ou consórcio de empresas que atender ao disposto no art. 5° poderá receber autorização da ANP para exercer a atividade de importação e exportação de petróleo e de seus derivados. .................................................................................................(NR)” Art. 64. O título do Capítulo VI da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação: “CAPÍTULO VI Do Refino de Petróleo (NR)” Art. 65. O caput do art. 53 da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, passa a vigorar com a seguinte redação: “Art. 53. Qualquer empresa ou consórcio de empresas que atenda ao disposto no art. 5° poderá submeter à ANP proposta, acompanhada do respectivo projeto, para a construção e operação de refinarias, bem como para a ampliação de sua capacidade. (NR)” Art. 66. Esta Lei entra em vigor sessenta dias após a sua publicação. Art. 67. Ficam revogados o inciso VI do art. 1º e os incisos VI, XXII e XXIII do art. 6º da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997. JUSTIFICAÇÃO Esse Projeto de Lei, que trago à apreciação de meus pares, é de fundamental importância para o desenvolvimento da economia nacional e objetiva estabelecer um regime legal mais adequado para a indústria do gás natural, cujas atividades não foram tratadas, com o devido detalhamento, na Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, a chamada Lei do Petróleo. Ele se reveste dos requisitos de relevância e urgência, características próprias das Proposições que requerem celeridade na sua tramitação nesta Casa. A sua relevância baseia-se em causas estruturais e regulatórias. A Lei nº 9.478, de 1997, veio regulamentar a Emenda Constitucional nº 9, de 9 de novembro de 1995, que flexibilizou o monopólio estatal e permitiu o exercício das atividades a ele submetidas por empresas privadas. A citada norma infra-constitucional procurou dar tratamento abrangente às atividades das indústrias do petróleo e do

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gás natural, sem, contudo, levar em conta as especificidades técnicas e econômicas desta última. A Lei do Petróleo tornou-se, assim, ao longo do tempo, instrumento legal insuficiente para desenvolver a indústria do gás natural e inadequado para o exercício de algumas de suas atividades, sobretudo aquelas sujeitas aos chamados monopólios naturais, como o transporte por gasodutos, cujos regimes estão a necessitar de urgente revisão que elimine conflitos imprevistos e que permita uma maior concorrência na comercialização do produto. A ausência de um marco legal adequado para o gás natural tem inibido investimentos na indústria e agravado a concentração do mercado na empresa estatal, na contra-mão da flexibilização do monopólio pretendida pela Constituição. Apesar da abertura do setor, a Petrobras continua responsável pela produção de noventa e cinco por cento do gás natural nacional e pela comercialização de quase noventa por cento do gás importado. No segmento de transporte por gasodutos, a estatal é proprietária da totalidade da rede operada pela Transpetro, sua subsidiária integral, detendo, ainda, o controle da TBG (operadora do gasoduto Bolívia-Brasil) e participação relevante na TSB (operadora do gasoduto Uruguaiana-Porto Alegre). A Petrobras participa, ainda, em vinte das vinte e cinco concessionárias estaduais de distribuição de gás canalizado, além de possuir interesses na geração termelétrica e na petroquímica. Tal concentração, pelo ônus que impõe ao Estado em um cenário de crescente escassez de recursos públicos, poderá impedir que o país venha a usufruir, plenamente, os benefícios ambientais e econômicos decorrentes do uso do gás natural, que hoje ainda representa insignificantes oito por cento da matriz energética nacional, contra a média mundial de 24%. Por se tratar de indústria onde algumas atividades não são naturalmente competitivas, a intervenção do Estado é necessária para assegurar uma concorrência saudável entre os agentes e uma adequada proteção aos direitos dos consumidores, em face dos princípios consagrados no art. 170, incisos IV e V, da Constituição Federal. Assim, sem prejuízo no disposto na Lei do Petróleo, o novo modelo legal para a indústria do gás natural deverá ainda: a) Promover o investimento, criando um ambiente atrativo para a expansão das atividades de exploração, produção, transporte e armazenagem. b) Aperfeiçoar a regulação de determinadas atividades, estabelecendo regimes transparentes que previnam o exercício do poder de monopólio, que impeçam práticas anticompetitivas e que garantam a utilização da infra-estrutura existente, mediante tarifas justas e adequadas. c) Promover a concorrência nos setores de distribuição e comercialização, ampliando a oferta de gás natural aos diversos segmentos consumidores, sobretudo indústrias e unidades geradoras de energia elétrica. Portanto, na busca desse aperfeiçoamento normativo, o presente Projeto de Lei mantém os regimes estabelecidos na Lei do Petróleo, para o exercício de determinadas atividades e institui, para outras, regimes mais adequados às peculiaridades da indústria do gás. O regime de concessão é mantido para as atividades de exploração e produção, permanecendo as atividades de processamento, importação e exportação submetidas ao regime de autorização. Propõe-se também o regime de autorização para atividades não contempladas na Lei do Petróleo, como a compressão, a liquefação, a regaseificação e a comercialização de gás natural, ressalvada a competência do Poder Concedente Estadual nesta última. A atividade de transporte, por não ser naturalmente competitiva, e a de armazenagem em formações geológicas naturais serão exercidas mediante concessão da União, ampliando-se as atribuições da Agência Nacional do Petróleo (ANP), que passa a atuar como órgão licitante e tarifário para tais atividades. O projeto introduz, ainda, definições técnicas próprias para a indústria. No que diz respeito à distribuição de gás canalizado, o projeto vem complementar a legislação estadual nas interações entre agentes que necessitam de autorização simultânea dos poderes concedentes estadual e federal, respeitando rigorosamente a competência estadual estatuída no art. 25 da Constituição Federal. Finalmente, o projeto de lei prevê ajustes na Lei do Petróleo, de modo a transferir para o projeto de lei

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todas as definições e prescrições próprias das indústrias do gás natural. Não bastassem essas justificativas estruturais do PLS, altamente relevantes para o desenvolvimento da indústria do gás natural no Brasil, não podemos olvidar que, conjunturalmente, o País passa por uma grave ameaça de desabastecimento energético. Duas são as causas conjunturais para essa ameaça: a falta de infra-estrutura de gasodutos, principalmente para o Nordeste, e a crise da Bolívia. Ambas impõem a urgente necessidade de se apreciar o Projeto de Lei que ora apresento. A Região Nordeste já é, hoje, dependente do gás natural porque esgotou toda a capacidade de geração de energia hidroelétrica do seu único rio, o São Francisco. Dependente porque não tem mais como importar, no curto-médio prazo, energia por linhas de transmissão, quer do Norte, quer do Sudeste, a menos que outros empreendimentos hidroelétricos de porte venham a ser construídos. No prazo referido, é impossível que isso aconteça: desde 2003 não foi dada concessão nova alguma pela Aneel para construção de novas hidroelétricas, A curto-médio prazo, a solução é o gás natural, e sem ele afirmo que faltará energia no Nordeste, mesmo que as demais Regiões estejam em situação normal. A esse prognóstico preocupante para o Nordeste, soma-se a crise institucional boliviana, que tem potencial para afetar todo o País, mas sobretudo a região Nordeste. Convém lembrar que os atuais acontecimentos são frutos da exigência de setores radicais para que se aumentasse a tributação sobre aqueles produtos de 18% para 50%, o que afinal foi aprovado pelo congresso boliviano. O agravamento vem, agora, pelas exigências de desapropriação das multinacionais, entre elas a Petrobras, a britânica BP, e a Repsol. Há uma ameaça real de aumento do preço do gás no Brasil, e mesmo de desabastecimento, por força da potencial paralisação da produção advogada por movimentos sociais que contestam o marco regulatório estabelecido naquele País. Urge, portanto, criar condições para que a indústria de gás natural se desenvolva no Brasil, inclusive com a participação de investidores que venham a deixar a Bolívia. Creio ser da maior relevância que o marco regulatório do gás seja separado do de petróleo, tratando específica e unicamente das suas questões. O objetivo é criar condições para esses novos investimentos que serão necessários. Somente agora se cogita uma mudança na política nacional para o gás natural, com vistas a acelerar o desenvolvimento do campo de Mexilhão, na Bacia de Santos. A Ministra de Estado de Minas e Energia está empenhada em antecipar para 2008 a entrada em operação do campo de Mexilhão, inicialmente previsto para 2010. Mas o atendimento dessa meta só será alcançado com esforço de guerra. O Projeto de Lei que ora apresento, se aprovado, terá o condão de apoiar esse esforço pela auto-suficiência no abastecimento de gás natural em todas as regiões do País, em futuro próximo, porque dará aos potenciais investidores a segurança regulatória de que necessitam para investirem no longo-prazo. Por todas essas razões é que peço o apoio de Vossas Excelências para a aprovação da presente proposição legislativa, a qual contribuirá enormemente para o desenvolvimento econômico de nosso País e para a preservação ambiental decorrente de uma maior participação do gás natural na matriz energética nacional. Sala de Sessões, de 2005. Senador RODOLPHO TOURINHO

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Anexo II

PROJETO DE LEI Dispõe sobre a movimentação, estocagem e comercialização de gás natural, altera e acresce dispositivos à Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, e dá outras providências O CONGRESSO NACIONAL decreta: CAPÍTULO I DA MOVIMENTAÇÃO E ESTOCAGEM DE GÁS NATURAL Seção I Do Transporte Duto viário de Gás Natural Art. 1o A atividade de transporte de gás natural será exercida por sociedade ou consórcio, cuja constituição seja regida pelas leis brasileiras, com sede e administração no País, por conta e risco do empreendedor, mediante os regimes de: I - concessão, precedida de licitação; ou II - autorização. Parágrafo único. Os concessionários ou autorizados da atividade de transporte de que trata o caput somente poderão explorar as atividades referidas no art. 65 da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997, incluída a atividade de estocagem. Art. 2o Caberá ao Ministério de Minas e Energia: I - propor os gasodutos que deverão ser construídos ou ampliados; II - estabelecer as diretrizes para o processo de contratação de capacidade de transporte; III - definir o regime de concessão ou autorização, na forma da regulamentação; e IV - fixar o período de exploração exclusiva da capacidade contratada pelos carregadores iniciais. § 1o Carregador inicial é aquele cuja contratação de capacidade de transporte tenha viabilizado, ou contribuído para viabilizar, a construção do gasoduto, no todo ou em parte. § 2o O Ministério de Minas e Energia considerará estudos de expansão da malha duto viária do País para dar cumprimento ao disposto nos incisos I, III e IV do caput. § 3o Para os empreendimentos em processo de licenciamento ambiental ou já autorizados pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis - ANP, até a data de publicação desta Lei, o período de carência de que trata o inciso IV do caput será de dez anos, contados do início da operação comercial do respectivo gasoduto de transporte. Art. 3o A licitação para a concessão, ou a outorga de autorização, para o exercício da atividade de transporte que contemple a construção ou a ampliação de gasodutos obedecerá ao disposto nesta Lei e na Lei no 9.478, de 1997, no que couber, e será precedida de chamada pública para contratação de capacidade, com o objetivo de identificar os potenciais carregadores e dimensionar a demanda efetiva.

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§ 1o Para os fins desta Lei, entende-se por: I - chamada pública: procedimento, com garantia de acesso a todos os interessados, que tem por finalidade a contratação de capacidade de transporte em dutos existentes, a serem construídos ou ampliados; e II - carregador: agente que utilize ou pretenda utilizar o serviço de movimentação de gás natural em gasoduto de transporte, mediante autorização da ANP. § 2o Os carregadores que não possuam autorização deverão solicitar à ANP outorga da respectiva autorização, na forma e prazo previstos em regulamentação. § 3o O prazo de duração das novas autorizações de que trata o caput será de até trinta e cinco anos, observadas as normas previstas no ato de outorga e na regulamentação. § 4o Extinta a autorização, os bens vinculados à atividade autorizada serão revertidos ao patrimônio da União, observado o disposto nos arts. 9o e 10 desta Lei. Art. 4o A ANP, conforme diretrizes do Ministério de Minas e Energia, promoverá, direta ou indiretamente, o processo de chamada pública de que trata o art. 3o. Art. 5o O Ministério de Minas e Energia poderá determinar que a capacidade de um gasoduto seja superior àquela identificada na chamada pública, definindo os mecanismos econômicos para a viabilização do projeto, conforme regulamentação. Art. 6o Caberá à ANP promover o processo de licitação, conforme as diretrizes do Ministério de Minas e Energia. Art. 7o A ANP elaborará os editais de licitação e o contrato de concessão para a construção ou ampliação e operação dos gasodutos de transporte. § 1o A ANP, mediante delegação do Ministério de Minas e Energia, poderá celebrar os contratos de concessão referidos no caput. § 2o O prazo de concessão será de, no máximo, trinta e cinco anos, incluídas eventuais prorrogações, quando for o caso. § 3o Fica assegurado ao transportador, cuja instalação estiver sendo ampliada, o direito de preferência, nas mesmas condições da proposta vencedora. Art. 8o No processo de licitação, o critério para a seleção da proposta vencedora será o de menor receita anual, na forma da regulamentação e do edital. § 1o A receita anual referida no caput corresponde ao montante anual a ser recebido pelo transportador para a prestação do serviço contratado. § 2o As tarifas de transporte de gás natural para novos gasodutos, objeto de concessão, serão estabelecidas com base no processo de licitação previsto nesta Lei. Art. 9o Extinta a concessão, os bens vinculados aos gasodutos de transporte serão revertidos para a União, nos termos da lei e da regulamentação. § 1o O concessionário, cuja concessão tenha sido extinta, fica obrigado a continuar prestando os serviços de transporte até que um novo concessionário seja designado, ou o duto seja desativado. § 2o As tarifas de operação para o período a que se refere o § 1o serão estabelecidas pela ANP de modo a cobrir os custos efetivos de uma operação eficiente. Art. 10. Os bens vinculados à concessão de que trata o art. 9o poderão ser novamente

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licitados, na forma da regulamentação. § 1o Na licitação referida no caput, poderá ser utilizado como critério de seleção da proposta vencedora o maior pagamento pelo uso do bem público, o disposto no art. 8o, ou ainda a combinação entre ambos os critérios. § 2o Os recursos arrecadados com a licitação de que trata o caput poderão ser revertidos para a expansão da malha de transporte de gás natural e, quando for o caso, para a indenização das parcelas dos investimentos vinculados a bens reversíveis, ainda não amortizados ou depreciados, que tenham sido realizados, com o objetivo de garantir a continuidade e atualidade do serviço concedido. § 3o Somente será indenizada a parcela dos investimentos que tenham sido expressamente autorizados pela ANP. § 4o O processo de licitação previsto no caput poderá ser iniciado até vinte e quatro meses antes do término do período de concessão, visando garantir a continuidade dos serviços prestados. Art. 11. Os gasodutos de transporte somente poderão movimentar gás natural que atenda às especificações estabelecidas pela ANP, salvo acordo firmado entre transportadores e carregadores, que não imponha prejuízo aos demais usuários. Art. 12. O transportador deverá permitir a interconexão de outras instalações de transporte e de transferência, nos termos da regulação estabelecida pela ANP, respeitada a especificação do gás natural movimentado e os direitos dos carregadores existentes. Art. 13. As tarifas de transporte de gás natural para novos gasodutos objeto de autorização serão propostas pelo transportador e aprovadas pela ANP, segundo os critérios por ela previamente estabelecidos, conforme regulamentação. Seção II Do Acesso de Terceiros aos Gasodutos e da Cessão de Capacidade Art. 14. Fica assegurado o acesso de terceiros aos gasodutos de transporte, nos termos da lei e de sua regulamentação. Art. 15. O acesso aos gasodutos de transporte dar-se-á, entre outras formas previstas em regulamentação, por contratação de serviço de transporte: I - firme em capacidade disponível; II - interruptível em capacidade ociosa; e III - extraordinário em capacidade disponível. § 1o Entende-se como: I - capacidade disponível a parcela da capacidade de movimentação do gasoduto de transporte que não tenha sido objeto de contratação sob a modalidade firme; II - capacidade ociosa a parcela da capacidade de movimentação do gasoduto de transporte contratada e que, temporariamente, não esteja sendo utilizada; e III - serviço de transporte extraordinário a modalidade de contratação de capacidade disponível, a qualquer tempo, e que contenha condição resolutiva, na hipótese de contratação da capacidade referida no inciso I do caput. § 2o O acesso aos gasodutos dar-se-á primeiramente na capacidade disponível e somente após sua integral contratação é que ficará garantido o direito de acesso à capacidade ociosa, observado o disposto no inciso IV do caput do art 2o e no seu § 3o.

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Art. 16. O acesso ao serviço de transporte firme em capacidade disponível, referido no inciso I do caput do art. 15, dar-se-á mediante chamada pública, na forma da regulamentação. Parágrafo único. Os acessos aos serviços de transporte interruptível, em capacidade ociosa, e extraordinário, em capacidade disponível, dar-se-ão na forma da regulamentação, assegurada a publicidade, transparência e garantia de acesso a todos os interessados. Art. 17. Fica autorizada a cessão de capacidade, assim entendida como a transferência, no todo ou em parte, do direito de utilização da capacidade de transporte contratada sob a modalidade firme. Parágrafo único. A ANP deverá disciplinar a cessão de capacidade de que trata esse artigo de forma a preservar os direitos do transportador. Seção III Da Estocagem e do Acondicionamento de Gás Natural Art. 18. A atividade de estocagem de gás natural em reservatórios será exercida por sociedade ou consórcio, cuja constituição será regida pelas leis brasileiras, com sede e administração no País, por conta e risco do empreendedor, mediante autorização ou concessão, precedida de licitação. Parágrafo único. A atividade de estocagem poderá integrar a autorização ou concessão para a atividade de transporte de gás natural, dentre outras. Art. 19. O exercício da atividade de estocagem de gás natural em reservatórios de hidrocarbonetos devolvidos à União e em outras formações geológicas não produtoras de hidrocarbonetos será objeto de concessão, mediante licitação, por conta e risco do concessionário, na forma da regulamentação. § 1o Caberá ao Ministério de Minas e Energia ou, mediante delegação, à ANP definir as formações geológicas referidas no caput que serão objeto de licitação. § 2o A ANP elaborará os editais e promoverá a licitação, conforme diretrizes estabelecidas pelo Ministério de Minas e Energia. § 3o O Ministério de Minas e Energia poderá delegar à ANP a celebração dos contratos de concessão para estocagem de gás natural. § 4o O gás natural importado ou extraído, nos termos do art. 26 da Lei no 9.478, de 1997, e armazenado em formações geológicas naturais, não constitui propriedade da União, conforme o art. 20 da Constituição Federal. Art. 20. A ANP disponibilizará aos interessados, de forma onerosa, os dados geológicos relativos às áreas com potencial para armazenagem de gás natural, para a análise e confirmação de sua adequação. § 1o A realização das atividades de pesquisas exploratórias não exclusivas, necessárias à confirmação da adequação das áreas com potencial para estocagem, dependerá de autorização da ANP. § 2o Todos os dados obtidos nas atividades exploratórias de que trata o § 1o serão repassados, de forma não onerosa, para a ANP. Art. 21. A estocagem de gás natural em instalação diferente das previstas no art. 19 será autorizada pela ANP, nos termos da legislação pertinente. Art. 22. A atividade de acondicionamento de gás natural será exercida por sociedade ou consórcio, constituída sob as leis brasileiras, com sede e administração no País, por conta e risco do empreendedor, mediante autorização.

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Parágrafo único. Acondicionamento de gás natural é o confinamento de gás natural na forma gasosa, líquida ou sólida, para o seu transporte ou consumo. Art. 23. A ANP regulará o exercício da atividade de acondicionamento para transporte e a comercialização de gás natural ao consumidor final por meio de modais alternativos ao duto viário. § 1o Entende-se por modais alternativos ao duto viário a movimentação de gás natural por meio rodoviário, ferroviário e aquaviário. § 2o A ANP articular-se-á com outras agências para adequar a regulação do transporte referido no § 1o, quando for o caso. Seção IV Do Compartilhamento de Gasoduto de Escoamento da Produção e de Instalação de Processamento ou Tratamento de Gás Natural Art. 24. Fica assegurado, havendo disponibilidade, o compartilhamento da infra-estrutura de gasodutos destinados ao escoamento da produção de gás natural, ainda que integrantes da concessão para produção e exploração, conforme regulamentação. § 1o Entende-se por gasoduto de escoamento da produção o conjunto de instalações destinado à movimentação de gás natural entre o ponto de medição e a unidade de processamento ou entre o ponto de medição e o gasoduto de transporte, quando não houver unidade de processamento. § 2o Os gasodutos de escoamento da produção que integrarem a concessão de produção e exploração deverão ser registrados na ANP. § 3o Os gasodutos de escoamento da produção não integrantes da concessão de exploração e produção terão procedimento de autorização específico e simplificado, na forma da regulamentação, que observará, no que couber, o disposto nos §§ 3o e 4o do art. 3o e no art. 34. § 4o O prazo de duração da autorização de que trata o § 3o deverá ser compatível com o contrato de concessão de exploração e produção do respectivo proprietário das instalações de movimentação de gás natural. § 5o O valor a ser pago para a utilização da infra-estrutura e o prazo de duração serão objeto de acordo entre as partes, cabendo à ANP, caso não haja acordo, fixar a forma de remuneração, a cobertura dos custos e o prazo de duração, com base em critérios previamente definidos em regulamentação. § 6o O proprietário das instalações terá a preferência na sua utilização, até o limite da capacidade de movimentação declarada na ANP, conforme os §§ 2o e 3o. § 7o Em caso de redução do valor comercial do gás originalmente movimentado, decorrente da introdução do produto que tenha composição diversa por novo usuário no gasoduto, o prejudicado poderá exigir compensação. Art. 25. Fica assegurado, havendo disponibilidade, o compartilhamento de instalação de tratamento ou processamento de gás natural com agentes interessados, conforme regulamentação. § 1o O proprietário da instalação terá prioridade na utilização, até o limite da capacidade declarada na autorização emitida pela ANP. § 2o O valor a ser pago para a utilização da infra-estrutura e o prazo de duração serão objeto de acordo entre as partes, cabendo à ANP, caso não haja acordo, fixar a forma de remuneração, a cobertura dos custos e o prazo de duração, com base em critérios previamente definidos em regulamentação.

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§ 3o Em caso de redução do valor comercial do gás originalmente tratado ou processado, decorrente da introdução do produto que tenha composição diversa por novo usuário no gasoduto, o prejudicado poderá exigir compensação. Art. 26. Os custos adicionais resultantes das novas condições operacionais, decorrentes do exercício do direito de que tratam os arts. 24 e 25, serão de responsabilidade exclusiva do novo usuário da infra-estrutura. Parágrafo único. Os investimentos e custos adicionais necessários para adequar as novas condições operacionais poderão ser compartilhados, caso beneficiem o proprietário. CAPÍTULO II DA COMERCIALIZAÇÃO DE GÁS NATURAL Art. 27. Ressalvado o disposto no § 2o do art. 25 da Constituição Federal, a comercialização de gás natural dar-se-á mediante a celebração de contratos, registrados na ANP. § 1o Caberá à ANP informar a origem ou a caracterização das reservas que suportarão o fornecimento dos volumes de gás natural contratados, conforme regulamentação. § 2o A ANP, conforme disciplina específica, poderá requerer os dados referidos no § 1o do agente vendedor do gás natural. Art. 28. Os contratos de comercialização de gás natural para atendimento ao mercado secundário identificarão o consumidor ou conjunto de consumidores do mercado primário, cuja interrupção no consumo permitirá a disponibilização desse gás. § 1o Os contratos referidos no caput deverão prever também que o fornecimento de gás natural ao mercado secundário somente poderá ser interrompido para atendimento ao consumidor primário previamente identificado. § 2o Para todos os efeitos, entende-se por mercado secundário de gás natural o conjunto de consumidores e potenciais consumidores que se dispõem a adquirir e utilizar gás natural que: I - já tenha sido contratado em mercado primário mediante compromisso de pagamento independentemente da efetiva retirada; II - temporariamente não esteja sendo utilizado pelo consumidor primário; e III - possa ter o fornecimento interrompido sempre que houver a demanda pelo consumidor primário. Art. 29. Os contratos de comercialização de gás natural deverão conter cláusula para resolução de eventuais divergências, podendo, inclusive, prever a convenção de arbitragem, nos termos da Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996. Art. 30. As empresas públicas e as sociedades de economia mista, suas subsidiárias ou controladas, titulares de concessão ou autorização, ficam autorizadas a aderir ao mecanismo e à convenção de arbitragem a que se refere o art. 29. Parágrafo único. Consideram-se disponíveis os direitos relativos a créditos e débitos decorrentes das contratações de gás natural de que trata o art. 27. Art. 31. A utilização de gás natural em atividade econômica que não seja a de consumo próprio fica equiparada à comercialização de gás natural para usuário final, nos termos do inciso XXII do art. 6o da Lei no 9.478, de 1997.

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Parágrafo único. Entende-se por consumo próprio o volume de gás natural destinado ao uso específico e exclusivo pelo respectivo proprietário do gás. CAPÍTULO III DAS DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 32. As licitações a serem realizadas para a outorga das concessões deverão observar o disposto nesta Lei e, no que couber, na Lei no 9.478, de 1997, na Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, bem como na regulamentação própria. Parágrafo único. A outorga de autorizações e concessões para exploração das atividades econômicas de que trata esta Lei correrão por conta e risco do empreendedor, não se constituindo, em qualquer hipótese, prestação de serviço público, na forma do § 1o do art. 177 da Constituição Federal. CAPÍTULO IV DAS DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS Art. 33. Os novos contratos de concessão, ou a outorga de autorização, para ampliação de instalação de transporte não prejudicarão os direitos dos transportadores e carregadores existentes. Art. 34. Ficam ratificadas as autorizações expedidas pela ANP até a data da publicação desta Lei, na forma do art. 56 da Lei no 9.478, de 1997. § 1o Atendidas as obrigações previstas ou a serem estabelecidas no ato de outorga e na regulação, as autorizações para o exercício da atividade de transporte dutoviário de gás natural referidas no caput terão prazo de duração de trinta e cinco anos, contado a partir da data de publicação desta Lei. § 2o Aplica-se o disposto nesse artigo aos empreendimentos em processo de licenciamento ambiental na data de publicação desta Lei, ainda que não tenham obtido autorização da ANP. § 3o Extinta a autorização, os bens vinculados à atividade autorizada serão revertidos ao patrimônio da União, observado o disposto nos arts. 9o e 10 desta Lei. § 4o Caberá à regulamentação disciplinar as condições, forma e prazo para a reversão ao patrimônio da União dos bens vinculados aos gasodutos de que trata o art. 59 da Lei no 9.478, de 1997. Art. 35. Ficam preservadas as tarifas de transporte e os critérios de revisão já definidos até a data da publicação desta Lei. Art. 36. Os arts. 2o, 8o, 53 e 58 da Lei no 9.478, de 1997, passam a vigorar com a seguinte redação: “Art. 2o .......................................................................................................................................... ..................................................................................................................................................................................... VII - estabelecer as prioridades de consumo de gás natural em situações que caracterizem emergência ou força maior, reconhecidas em decreto do Presidente da República. ............................................................................................................................. ” (NR) “Art. 8o .............................................................................................................................. IV - elaborar os editais e promover as licitações para a concessão de exploração,

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desenvolvimento e produção, transporte e estocagem, conforme diretrizes estabelecidas pelo Ministério de Minas e Energia, celebrando, mediante delegação, os contratos delas decorrentes e regulando e fiscalizando permanentemente a sua execução; V - autorizar a prática das atividades de refinação, liquefação, regaseificação, carregamento, processamento, transporte, estocagem, acondicionamento, importação e exportação, na forma estabelecida em lei e sua regulamentação; .................................................................................................................................... VII - fiscalizar diretamente, e de forma concorrente nos termos da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, ou mediante convênios com órgãos dos Estados e do Distrito Federal, as atividades integrantes da indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis, bem como aplicar as sanções administrativas e pecuniárias previstas em lei, regulamento ou contrato; ................................................................................................................................ XIX - regular e fiscalizar o acesso à capacidade dos gasodutos; XX - estabelecer critérios para a repartição de custos de compartilhamento das instalações para o escoamento da produção, tratamento e processamento de gás natural, bem como arbitrar seus valores, caso não haja acordo entre as partes; XXI - promover, direta ou indiretamente, as chamadas públicas para a contratação de capacidade de transporte de gás natural, conforme as diretrizes do Ministério de Minas e Energia; XXII - registrar os contratos de transporte e de interconexão entre instalações de transporte, inclusive as procedentes do exterior e os contratos de comercialização, celebrados entre os agentes de mercado; XXIII - informar a origem ou a caracterização das reservas do gás natural contratado e a ser contratado entre os agentes de mercado, na forma da regulamentação; XXIV - regular e fiscalizar o exercício da atividade de estocagem de gás natural, inclusive no que se refere ao direito de acesso de terceiros às instalações concedidas.” (NR) “Art. 53. Qualquer empresa ou consórcio de empresas que atenda ao disposto no art. 5o poderá submeter à ANP proposta, acompanhada do respectivo projeto, para a construção e operação de refinarias e de unidades de processamento, liquefação, regaseificação e de estocagem de gás natural, bem como para a ampliação de sua capacidade. ................................................................................................................................... ” (NR) “Art. 58. Será facultado, a qualquer interessado, o uso dos dutos de transporte e dos terminais marítimos existentes ou a serem construídos, mediante remuneração adequada ao titular das instalações ou da capacidade de movimentação de gás natural, nos termos da lei e da regulamentação aplicável. § 1o A ANP fixará o valor e a forma de pagamento da remuneração adequada, com base em critérios previamente estabelecidos, na forma da regulamentação, caso não haja acordo entre as partes, cabendo-lhe também verificar se o valor acordado é compatível com o mercado . § 3o A receita referida no caput deverá ser destinada a quem efetivamente estiver suportando o custo da capacidade de movimentação de gás natural, conforme regulamentação.” (NR)

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Art. 37. A Lei no 9.478, de 1997, passa a vigorar acrescida do art. 8o-A: “Art. 8o-A. Caberá à ANP supervisionar a movimentação de gás natural na rede de transporte e coordená-la em situações caracterizadas como de emergência ou força maior. § 1o O Ministério de Minas e Energia definirá as diretrizes para a coordenação das operações da rede de movimentação de gás natural em situações caracterizadas como de emergência ou força maior, reconhecidas pelo Presidente da República, por meio de decreto. § 2o No exercício das atribuições referidas no caput, caberá à ANP, sem prejuízo de outras funções que lhe forem atribuídas na regulamentação: I - supervisionar os dados e as informações dos centros de controle dos gasodutos de transporte; II - manter banco de informações relativo ao sistema de movimentação de gás natural permanentemente atualizado, subsidiando o Ministério de Minas e Energia com as informações sobre necessidades de reforço ao sistema; III - monitorar as entradas e saídas de gás natural das redes de transporte, confrontando os volumes movimentados com os contratos de transporte vigentes; IV - dar publicidade às capacidades de movimentação existentes que não estejam sendo utilizadas e as modalidades possíveis para sua contratação; e V - estabelecer padrões e parâmetros para a operação e manutenção eficientes do sistema de transporte e estocagem de gás natural. § 3o Os parâmetros e informações relativos ao transporte de gás natural necessários à supervisão, controle e coordenação da operação dos gasodutos deverão ser disponibilizados pelos transportadores à ANP, conforme regulação específica.” (NR) Art. 38. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 21 fevereiro de 2006.

Silas Rondeau Cavalcante Silva Ministro de Estado de Minas e Energia

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Anexo III

RESOLUCAO 2.827 Consolida e redefine as regras para o contingenciamento do crédito ao setor público. O BANCO CENTRAL DO BRASIL, na forma do art. 9º da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964, torna público que o CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL, em sessão realizada em 29 de março de 2001, tendo em vista as disposições do art. 4º, incisos VI e VIII, da mencionada lei, das Leis nºs 4.728, de 14 de julho de 1965, e 6.385, de 7 de dezembro de 1976, dos Decretos-lei nºs 1.986, de 28 de dezembro de 1982, e 2.285, de 23 de julho de 1986, dos arts. 28 do Decreto-lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, 4º do decreto-lei nº 261, de 28 de fevereiro de 1967, e 15 e 40 da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977, R E S O L V E U : Art. 1º Limitar o montante das operações de crédito de cada instituição financeira e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil com órgãos e entidades do setor público a 45% (quarenta e cinco por cento) do Patrimônio de Referência (PR), nos termos da regulamentação em vigor. Parágrafo 1º Para efeito do disposto nesta Resolução entende-se: I - por órgãos e entidades do setor público: a) a administração direta da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios; b) as autarquias e fundações instituídas ou mantidas, direta ou indiretamente, pela União, pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios; c) as empresas públicas e sociedades de economia mista não financeiras, suas subsidiárias e demais empresas controladas, direta ou indiretamente, pela União, pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, inclusive as sociedades de objeto exclusivo; e d) os demais órgãos ou entidades dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. II - por operação de crédito: a) os empréstimos e financiamentos; b) as operações de arrendamento mercantil; c) a aquisição definitiva ou realizada por meio de operações compromissadas de revenda de títulos e valores mobiliários de emissão dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios, bem

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como dos órgãos e entidades do setor público mencionados no parágrafo 1º, inciso I, alínea c, exclusive a aquisição definitiva de ações de sociedades economia mista; d) a concessão de garantias de qualquer natureza; e e) toda e qualquer operação que resulte, direta ou indiretamente, em concessão de crédito e/ou captação de recursos de qualquer natureza, inclusive com uso de derivativos financeiros. Parágrafo 2º Não estão sujeitas ao limite estabelecido no caput as operações de crédito de responsabilidade ou que tenham garantia formal, integral e solidária do Tesouro Nacional. Art. 2º As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil sujeitas à elaboração de demonstrações financeiras consolidadas nos termos da Resolução nº 2.723, de 31 de maio de 2000, com a redação dada pela Resolução nº 2.743, de 28 de junho de 2000, devem apurar o limite de que trata o artigo anterior, de forma consolidada. Art. 3º As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil podem solicitar destaque de parcela do PR para aplicação exclusiva em operações de crédito com órgãos e entidades do setor público, que será deduzida do PR para efeito do cálculo de todos os limites operacionais, inclusive daquele previsto no art. 1º desta Resolução. Parágrafo 1º Para o exercício da opção prevista no caput, as instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil devem solicitar autorização prévia ao Banco Central do Brasil. Parágrafo 2º O saldo devedor das operações de crédito mencionadas nesse artigo não integra a base de cálculo do Patrimônio Líquido Exigido (PLE), de que trata o Regulamento Anexo IV à Resolução nº 2.099, de 17 de agosto de 1994, com a redação dada pela Resolução nº 2.692, de 24 de fevereiro de 2000. Art. 4º As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil podem contratar novas operações de crédito com os estados, o Distrito Federal e os municípios, bem assim com suas autarquias, fundações e empresas estatais dependentes, desde que observados, cumulativamente, os seguintes limites e condições: I - o montante global das operações de crédito, conforme definido no art. 1º, não pode, em cada exercício financeiro, ser superior a 18% (dezoito por cento) da Receita Líquida Real, observado o limite de 8% (oito por cento) da Receita Líquida Real para as operações de antecipação de receitas orçamentárias - ARO; II - o dispêndio anual máximo com as amortizações, juros e demais encargos de todas as operações de crédito, já contratadas e a contratar, inclusive o originário de débitos renegociados ou parcela dos acrescido, ainda, do valor devido, vencido e não pago, não pode exceder 13% (treze por cento) da Receita Líquida Real; III - o saldo total da dívida não pode superar valor equivalente a 1,7 (um inteiro e sete décimos) da Receita Líquida Real anual para 2001, decrescendo essa relação à razão de 0,1 (um décimo) ao ano, até atingir valor equivalente à Receita Líquida Real anual; e IV - Resultado Primário positivo apurado nos doze meses anteriores. Parágrafo 1º Fica o Banco Central do Brasil incumbido de publicar a metodologia a ser utilizada para o cálculo do Resultado Primário e da Receita Líquida Real.

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Parágrafo 2º Para efeito da verificação do atendimento do limite a que se refere o caput, inciso II: I - será apurada a média aritmética das relações percentuais entre o serviço da dívida e a Receita Líquida Real, para o período de cinco anos, incluído o exercício em que for apresentado o pleito, que deverá atender cumulativamente, as seguintes condições: a) ser inferior a 13% (treze por cento); e b) apresentar relações percentuais com tendência não crescente, na hipótese de a média ser superior a 10% (dez por cento) da Receita Líquida Real; II - a Receita Líquida Real será projetada mediante a aplicação de taxa anual equivalente à taxa de crescimento potencial do Produto Interno Bruto - PIB, divulgada pelo Banco Central do Brasil. Parágrafo 3º As operações previstas nos Programas de Ajuste Fiscal firmados entre os estados e a Secretaria do Tesouro Nacional, como parte integrante dos contratos de refinanciamento firmados com a União, no âmbito da Lei nº 9.496, de 11 de setembro de 1997, bem como aquelas que vierem a substituí-las, desde que limitadas ao montante global previsto, são examinadas segundo as regras do referido Programa. Parágrafo 4º Ficam excluídas das disposições do inciso IV do caput, as operações de crédito realizadas pelos municípios com instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES/Programa de Modernização da Administração Tributária - PMAT, destinadas, exclusivamente, à implantação de programas de investimentos em modernização tributária. Parágrafo 5º O disposto no parágrafo anterior aplica-se somente às operações aprovadas pelo BNDES e apresentadas a análise do Banco Central do Brasil até 31.12.2001. Art. 5º As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil somente podem contratar novas operações de crédito com empresas públicas e sociedades de economia mista não financeiras e não dependentes, controladas direta ou indiretamente pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, caso o controlador observe os limites e condições definidos no artigo anterior. Parágrafo 1º Na hipótese do controlador ser estado ou Distrito Federal e tenha assinado acordo de refinanciamento com a União, no âmbito da Lei nº 9.496, de 11 de setembro de 1997, a análise dos limites será feita de acordo com os critérios dos respectivos programas de ajuste fiscal firmados pelo ente público com a Secretaria do Tesouro Nacional; Parágrafo 2º Ficam dispensadas do cumprimento do disposto no caput as seguintes operações: I - de financiamento de projetos vinculados a licitações internacionais, com cláusula de financiamento prevista no Edital; II - com títulos e valores mobiliários, desde que a emissão primária tenha observado as normas aplicáveis estabelecidas pela Comissão de Valores Mobiliários. Art. 6º Para a realização de novas operações de crédito, nos termos desta Resolução, as instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil devem estar enquadradas nos limites operacionais estabelecidos pela regulamentação em vigor. Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica às operações de crédito de responsabilidade ou que tenham garantia formal, integral e solidária do Tesouro Nacional e que

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apresentem estruturas de captação e aplicação vinculadas e idênticas, no que se refere ao prazo e a taxa de juros. Art. 7º São vedadas às instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil: I - a realização de operações de crédito com órgãos e entidades do setor público que estiverem inadimplentes com as instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil; II - a contratação de novas operações com órgãos e entidades do setor público caso apresentem pendências de registro no Sistema de Registro de Operações com o Setor Público - CADIP; III - o recebimento de, em qualquer modalidade de operações de crédito, como garantia principal ou acessória, notas promissórias, duplicatas, letras de câmbio ou outros títulos da espécie, bem como cartas de crédito, avais e fianças de responsabilidade direta ou indireta de órgãos e entidades do setor público, correspondentes a compromissos assumidos junto a fornecedores, empreiteiros de obras ou prestadores de serviços; e IV - a realização de qualquer tipo de operação que importe em transferência, a qualquer título, da responsabilidade direta ou indireta pelo pagamento da dívida para órgãos ou entidades do setor público. Parágrafo 1º A vedação prevista no inciso III não se aplica às operações contratadas pelas empresas públicas ou pelas sociedades de economia mista controladas direta ou indiretamente pela União, pelos estados, pelo Distrito Federal e pelos municípios, nem às operações garantidas formal e exclusivamente por duplicatas de venda mercantil ou de prestação de serviços sacadas contra as entidades definidas na alínea "c" do inciso I do parágrafo 1º do art. 1º desta Resolução. Parágrafo 2º. Considera-se inadimplente o órgão ou a entidade do setor público que apresentar dívida, total ou parcialmente vencida, por prazo superior a trinta dias. Art. 8º Às instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil que apresentem, na data da entrada em vigor desta Resolução, excesso em relação ao limite fixado no art. 1º: I - é facultado manter as atuais operações de crédito, inclusive os desembolsos programados, desde que os encargos incidentes sobre essas operações sejam pagos nas respectivas datas de vencimento; II - é permitida a opção pela faculdade prevista no art. 3º, desde que continuem enquadradas nos limites operacionais previstos na legislação em vigor; III - é vedada a realização de novas operações de crédito com órgãos e entidades do setor público até que a relação a que se refere o caput atinja percentual igual ou inferior a 45% (quarenta e cinco por cento); IV - é vedada a realização de operações de aquisição de créditos, com ou sem coobrigação, cujo tomador seja órgão ou entidade do setor público;

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V - é vedada a cessão de créditos com coobrigação, cujo tomador seja órgão ou entidade do setor público. Parágrafo Único. As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil que descumprirem o disposto nesse artigo ficam sujeitas às penalidades previstas no art. 10. Art. 9º O valor global das novas operações de crédito efetuadas ao amparo desta Resolução será de até R$ 1.000.000.000,00 (um bilhão de reais). Parágrafo 1º Não se incluem no valor global as seguintes operações de crédito das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil: I - contratadas com as entidades mencionadas na alínea "c" do inciso I do parágrafo 1º do art. 1º desta Resolução: a) garantias formais e exclusivamente por duplicatas de venda mercantil ou de prestação de serviços, de emissão da própria beneficiária do crédito; b) operações de amparo à exportação; e c) financiamentos de projetos vinculados a licitações internacionais, com cláusula de financiamento prevista no Edital. II - garantidas formal e exclusivamente por duplicatas de venda mercantil ou de prestação de serviços, sacadas contra as entidades mencionadas na alínea "c" do inciso I do parágrafo 1º do art.1º desta Resolução, embora devam ser computadas para efeito do limite previsto no art. 1º; III - contratadas com municípios com recursos do BNDES/PMAT, destinadas, exclusivamente, à implantação de programas de investimentos em modernização tributária; IV - operações descritas no art. 1º, parágrafo 1º, inciso II, alínea "c", desta Resolução. Parágrafo 2º O limite definido no caput inclui as operações cadastradas no Sistema de Registro de Operações com o Setor Público - CADIP, nos termos da Resolução nº 2.784, de 18.11.2000, na mesma ordem de cadastro. Art. 10. As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil que contratarem operações de crédito em desacordo com o disposto nesta Resolução devem recolher ao Banco Central do Brasil, até o quinto dia útil posterior à notificação da irregularidade, o valor correspondente ao crédito contratado irregularmente, atualizado pela respectiva taxa contratual até a data do recolhimento, independentemente de outras medidas de natureza administrativa.

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Parágrafo 1º Tratando-se de nova contratação de crédito ou vencimento de encargos que infrinjam o limite estabelecido no art. 1º, deve ser recolhido o valor correspondente ao excesso. Parágrafo 2º O valor recolhido à conta Reservas Bancárias não será passível de qualquer remuneração, permanecendo indisponível e inalterado por período equivalente àquele em que permanecer a irregularidade. Parágrafo 3º A instituição que não possua conta Reservas Bancárias deve firmar convênio com instituição financeira para esse fim, de acordo com a regulamentação em vigor, não podendo tal convênio ser denunciado, por qualquer das partes, sem a prévia autorização do Banco Central do Brasil. Art. 11. A contratação de novas operações de crédito, de acordo com o disposto nesta Resolução, depende de prévia autorização do Banco Central do Brasil, a quem compete divulgar os critérios de habilitação. Parágrafo 1º O disposto no caput não se aplica às operações descritas no art. 5º, parágrafo 2º, inciso II, desta Resolução. Parágrafo 2º O Banco Central do Brasil disponibilizará, mensalmente, via Sistema de Informações Banco Central - SISBACEN, o valor acumulado das operações de crédito autorizadas a que se refere o art. 9º. Art. 12. Fica mantido o Sistema de Registro de Operações com o Setor Público - CADIP. Art. 13. Fica o Banco Central do Brasil autorizado a adotar as medidas e a baixar as normas necessárias ao cumprimento do disposto nesta Resolução. Art. 14. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação. Art. 15. Ficam revogadas as Resoluções nºs 2.653, de 23 de setembro de 1999, 2.668, de 25 de novembro de 1999, 2.727, de 8 de junho de 2000, 2.784, de 18 de outubro de 2000, 2.800 de 6 de dezembro de 2000, e 2.807 de 21 de dezembro de 2000. Brasília, 30 de março de 2001 Arminio Fraga Neto Presidente