Conflitos envolvendo indígenas no Brasil Colonial

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Conflitos envolvendo indígenas no Brasil Colonial A Confederação dos Tamoios é a denominação dada à revolta liderada pela nação indígena Tupinambá, que ocupava o litoral do que hoje é o norte paulista, começando por Bertioga e litoral fluminense, até Cabo Frio, já no Rio de Janeiro, envolvendo também tribos situadas ao longo do Vale do Paraíba, na Capitania de São Vicente, contra os colonizadores portugueses, entre 1556 a 1567. Aproveitando da prática do “cunhadismo”, pela qual um homem, ao se casar com uma mulher de uma determinada tribo, passava a ser membro dessa mesma tribo, João Ramalho, parceiro do governador da Capitania de São Vicente, Brás Cubas, casou-se com uma filha da tribo dos guaianases. Através dessa parceria, eles comandaram um ataque à aldeia dos tupinambás, na tentativa de aprisioná-los e usá-los como mão-de-obra escrava, capturarando o chefe da tribo, Caiçuru, e o mantiveram em um cativeiro. Preso em péssimas condições de sobrevivência, o tupinambá Caiçuru acabou morrendo no cativeiro. Seu filho, Aimberê, assumiu o comando da tribo e declarou guerra aos colonos portugueses e à tribo dos guaianases. Para fortalecer o levante, ele se reuniu com os membros tupinambás Pindobuçu, da Baía de Guanabara, Koakira, da aldeia de Ubatuba, e Cunhambembe, de Angra dos Reis. Cunhambembe assumiu a liderança da Confederação dos Tamoios e conseguiu o apoio das tribos goitacases e aimorés. Neste momento, os franceses estavam chegando no Rio de Janeiro, na intenção de colonizar territórios brasileiros e extrair suas tão faladas riquezas. Para patrocinar o conflito contra os portugueses, o francês Villegaignon ajuda os tupinambás oferecendo armamentos a Cunhambembe. Porém, uma epidemia dizimou alguns indígenas combatentes, inclusive o líder Cunhambembe, enfraquecendo enormemente o levante. Aimberê continuou a revolta contra os portugueses e fez o possível para que os guaianases lutassem a seu favor. Ele fez contato com o líder Tibiriçá, através do sobrinho Jagoanharó, e marcou um encontro para selar a Confederação. Quando os tamoios chegaram na aldeia, Tibiriçá se declarou fiel aos portugueses e matou seu sobrinho, suscitando em uma investida que dizimou grande parte da tribo dos guaianases. Apesar de algumas tréguas, os portugueses se fortaleceram e continuaram a invasão às aldeias para escravizar e aprisionar os índios. Em 1567, a chegada de Estácio de Sá ao território do Rio de Janeiro provocou a expulsão dos franceses e dos tamoios,

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Conflitos envolvendo indígenas no Brasil Colonial

A Confederação dos Tamoios é a denominação dada à revolta liderada pela nação indígena Tupinambá, que ocupava o litoral do que hoje é o norte paulista, começando por Bertioga e litoral fluminense, até Cabo Frio, já no Rio de Janeiro, envolvendo também tribos situadas ao longo do Vale do Paraíba, na Capitania de São Vicente, contra os colonizadores portugueses, entre 1556 a 1567.

Aproveitando da prática do “cunhadismo”, pela qual um homem, ao se casar com uma mulher de uma determinada tribo, passava a ser membro dessa mesma tribo, João Ramalho, parceiro do governador da Capitania de São Vicente, Brás Cubas, casou-se com uma filha da tribo dos guaianases. Através dessa parceria, eles comandaram um ataque à aldeia dos tupinambás, na tentativa de aprisioná-los e usá-los como mão-de-obra escrava, capturarando o chefe da tribo, Caiçuru, e o mantiveram em um cativeiro.

Preso em péssimas condições de sobrevivência, o tupinambá Caiçuru acabou morrendo no cativeiro. Seu filho, Aimberê, assumiu o comando da tribo e declarou guerra aos colonos portugueses e à tribo dos guaianases. Para fortalecer o levante, ele se reuniu com os membros tupinambás Pindobuçu, da Baía de Guanabara, Koakira, da aldeia de Ubatuba, e Cunhambembe, de Angra dos Reis.

Cunhambembe assumiu a liderança da Confederação dos Tamoios e conseguiu o apoio das tribos goitacases e aimorés. Neste momento, os franceses estavam chegando no Rio de Janeiro, na intenção de colonizar territórios brasileiros e extrair suas tão faladas riquezas.

Para patrocinar o conflito contra os portugueses, o francês Villegaignon ajuda os tupinambás oferecendo armamentos a Cunhambembe. Porém, uma epidemia dizimou alguns indígenas combatentes, inclusive o líder Cunhambembe, enfraquecendo enormemente o levante. Aimberê continuou a revolta contra os portugueses e fez o possível para que os guaianases lutassem a seu favor. Ele fez contato com o líder Tibiriçá, através do sobrinho Jagoanharó, e marcou um encontro para selar a Confederação. Quando os tamoios chegaram na aldeia, Tibiriçá se declarou fiel aos portugueses e matou seu sobrinho, suscitando em uma investida que dizimou grande parte da tribo dos guaianases.

Apesar de algumas tréguas, os portugueses se fortaleceram e continuaram a invasão às aldeias para escravizar e aprisionar os índios. Em 1567, a chegada de Estácio de Sá ao território do Rio de Janeiro provocou a expulsão dos franceses e dos tamoios, encerrando o conflito. Após este episódio, os portugueses chegaram a conclusão de que era praticamente impossível escravizar indígenas e decidiram importar escravos de navios negreiros africanos.

No Ceará Colonial, além da Confederação dos Cariris, houve um outro conflito envolvendo indígenas. Foi a Guerra entre Montes e Feitosas, a região dos Inhamuns, onde uma guerra entre duas famílias em disputa de terras se aproveitou da rivalidade entre tribos e se aliou a jucás e cariús, tendo estes como uma espécie de “exército particular”.

Já a Guerra Guaranítica ocorreu na mesma época, no sul do Brasil. Na fronteira com o Paraguai, numa região hoje situada no Estado do Rio Grande do Sul, viviam índios da nação Guarani , que, assim como muitas outras nações indígenas, receberam um grupo de jesuítas. Esses missionários, entretanto, pensavam diferente da Igreja oficial e da maioria dos seus colegas. Eles respeitavam a cultura indígena e defendiam que a terra era dos nativos, não podendo ser tomada por ninguém. Queriam que os índios se convertessem ao cristianismo, mas a partir da identificação da vida comunitária e solidária que levavam, com os princípios cristãos do amor ao próximo e do desapego às riquezas. Esses padres achavam que os

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guaranis reproduziam a vida dos primeiros cristãos contada nos Atos dos Apóstolos, onde todos colocavam o que tinham à disposição dos outros e não havia necessitados entre eles. A Sociedade que empolgou o grupo de jesuítas tinha as seguintes características: 1. Davam ou trocavam entre si as coisas de que precisavam; 2. As terras e os bens de produção eram coletivos; 3. A sociedade era comunitária, o trabalho coletivo, havia ajuda mútua e solidariedade.

Os missionários integraram-se na vida dos guaranis e contribuíram com seu senso de organização. Assim, os povos foram organizados em sete aldeias que organizavam sua vida através de assembléias específicas na qual escolhiam uma coordenação. Discutiam também questões relativas ao conjunto e levavam suas propostas à Assembléia Geral dos Sete Povos, onde era eleita uma coordenação central. Funcionava de fato o poder popular. Naturalmente a síntese cultural não se deu de forma linear entre os indios e os jesuítas. Houve um momento, por exemplo, em que os padres cederam às pressões dos superiores e tentaram introduzir a propriedade privada, estabelecendo o trabalho em roças individuais durante alguns dias da semana. Os guaranis reagiram da seguinte forma: nos dias do trabalho individual, todos ficavam em casa deitados, conversando ou brincando pelas aldeias. Nos dias do trabalho coletivo, iam todos juntos para as roças, cantando alegremente. Construíram uma vida harmoniosa, solidária, sem exploração, onde o homem era irmão do homem e não o lobo. Por isso, a experiência ficou conhecida como República Comunista Guarani, pois tudo era comum e não havia superiores e subordinados entre eles.

A região dos Sete Povos das Missões estava no domínio do invasor espanhol que não tinha interesse nela, pois estava muito ocupado com o ouro e a prata do México e de outras nações que conquistara. Mas para resolver conflitos com os portugueses, os reis das duas nações invasoras fizeram nova divisão da América do Sul – O Tratado de Madri – que, assinado em janeiro de 1750, passava para o domínio português a região das missões. Os portugueses , a essa altura, não deixavam escapar o menor pedaço de terra sob o seu poder, querendo assim aumentar o poderio perante os outros países europeus. Assim, acabou-se a paz dos guaranis que não aceitaram se retirar dos seus territórios. “Essa terra já tem dono”, diziam eles e passaram a organizar a resistência. Os padres ainda tentaram a interferência dos seus superiores da Igreja Católica para evitar a invasão, mas estes não lhes deram a menor atenção. Foi aí que se destacou a capacidade de liderança e de estrategista de um jovem de 27 anos, Sepé Tiaraju. Portugueses e espanhóis montaram um exército comum que foi derrotado em duas ocasiões pelo povo guarani, embora com armamento inferior .

Certa vez, caindo numa cilada, Sepé entrou num quartel português, de onde saiu ileso, apesar de receber uma saraivada de balas de todos os lados. A partir de então passou a ser ainda mais admirado pelo seu povo e temido pelos invasores que consideravam ser ele um ser sobrenatural. Na batalha final, travada em 7 de fevereiro de 1756, Sepé acabou cercado sozinho por mais de mil homens e ainda lutou muito tempo até tombar bravamente, aos 33 anos, depois de ferir o soldado que o acertou.Sepé não era sobrenatural, como pensavam os invasores. Sua energia, sua bravura e as vitórias que obtinha eram inteiramente naturais, vinham do

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seu povo: Do amor à liberdade , do horror à escravidão, da defesa de sua terra.

Foram seis anos de resistência. Sepé tombou em combate. Seu povo foi vencido, escravizado e disperso. Alguns ainda lutaram em guerrilhas contra o invasor por vários anos.