Considerações Sobre a Análise de Discurso

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  • 8/15/2019 Considerações Sobre a Análise de Discurso

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    Faculdade do Vale do IpojucaCurso de Jornalismo – Técnica de Projetos em Comunicação

    Profa. Mariana Mesquita

    CONSIDERAÇÕES SOBRE A ANÁLISE DE DISCURSO E ANÁLISE DECONTEÚDO

    1. ANÁLISE DE DISCURSO

    Não existe apenas uma linha de Análise de Discurso; existem muitos estilosdiferentes (mais de 50 variedades), com enfoques variados, a partir dediversas tradi!es te"ricas, por#m todas reivindicando o mesmo nome$ %que esses diferentes estilos parecem ter em comum, ao tomar como o&'eto odiscurso, # que partilham de uma re'eião da noão realista de que alinuaem # simplesmente um meio neutro de refletir, ou descrever o mundo,e uma convicão da importncia central do discurso na construão da vidasocial$

     Apesar de se falar na *+scola de Análise de Discurso francesa, o termopode ser questionado no sentido em que pode tomar a palavra +scola$-omo a AD considera a l.nua, hist"ria e su'eito, e cada pa.s tem sua pr"prial.nua e hist"ria, então poder.amos falar em análise de discurso ermnica,americana, inlesa, italiana, &rasileira, $$$ / se pensamos nessa disciplinasendo desenvolvida em diferentes rei!es do mundo, com suas diferentestradi!es de estudos e pesquisas so&re o discurso$ reforada a id#ia deque o conhecimento produ1 rela!es de fora e de poder; por isso, ao sedi1er +scola de análise de discurso, francesa ou anl"fona, está seatri&uindo um poder privileiando certos luares$

     A AD não # uma metodoloia, # uma disciplina de interpretaão fundada pelaintersecão de epistemoloias distintas, pertencentes a áreas da lin2.stica,do materialismo hist"rico e da psicanálise$ +ssa contri&uião ocorreu da

    seuinte forma3 da lin2.stica deslocou/se a noão de fala para discurso; domaterialismo hist"rico emeriu a teoria da ideoloia; e, finalmente, dapsicanálise veio a noão de inconsciente, por meio da qual a AD tra&alhacom o descentramento do su'eito$ 

    % processo de análise discursiva tem a pretensão de interroar os sentidosesta&elecidos em diversas formas de produão, que podem ser ver&ais enão ver&ais, &astando que sua materialidade produ1a sentidos parainterpretaão; podem ser entrecru1adas com s#ries textuais (orais ouescritas) ou imaens (fotorafias) ou linuaem corporal (dana)$

    4m dos fundadores dos estudos so&re o discurso foi ichel 67cheux,esta&elecendo a relaão existente no discurso entre l.nua8su'eito8hist"ria ou

    l.nua8ideoloia; portanto, quem seue este princ.pio pode afirmar umafiliaão com a AD da linha francesa$ 

     A AD da linha francesa articula o lin2.stico com o social e o hist"rico; assim,a linuaem # estudada não apenas enquanto forma lin2.stica, comotamm enquanto forma material da ideoloia / al#m de que, # no contato dohist"rico com o lin2.stico, que se constitui a materialidade espec.fica dodiscurso$

     A AD tra&alha com o sentido e não com o conte9do do texto, um sentido quenão # tradu1ido, mas produ1ido; pode/se afirmar que o corpus da AD #constitu.do pela seuinte formulaão3 ideoloia : hist"ria : linuaem$ Aideoloia # entendida como o posicionamento do su'eito quando se filia a um

    discurso, sendo o processo de constituião do imainário que está noinconsciente, ou se'a, o sistema de id#ias que constitui a representaão; ahist"ria representa o contexto s"cio/hist"rico e a linuaem, por meio da

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    materialidade do texto vão/se erando pistas do sentido que o su'eitopretende dar$

    6ortanto, na AD a linuaem vai al#m do texto, tra1endo sentidos pr#/constru.dos que são ecos da mem"ria do di1er$ +ntende/se como mem"riado di1er o interdiscurso, ou se'a, a mem"ria coletiva constitu.da socialmente;

    o su'eito tem a ilusão de ser dono do seu discurso e de ter controle so&re ele,por#m não perce&e estar dentro de um cont.nuo, porque todo o discurso 'áfoi dito antes$

    +xemplificando, com o olhar da AD o enunciado # dando que se rece&epermite uma multiplicidade de sentidos$ +ste pode ser pronunciado tanto por um padre franciscano, quanto por um pol.tico ou por uma prostituta, comsentidos diferentes para cada su'eito$ A fonte oriinária deste enunciado foi odiscurso reliioso, permanecendo no contexto s"cio hist"rico e ficando namem"ria do di1er, ou mem"ria discursiva, e voltando em um novo contexto,de outro momento hist"rico, com novas sinifica!es, perdendo o sentidoreliioso e populari1ando/se no sentido pol.tico e vular$

     A l.nua não # transparente e homo7nea como muitas ve1es aparenta ser;isto fa1 com que ela se'a capa1 de equ.voco, de falha, de desli1es$ %equ.voco contraria a id#ia do sentido 9nico do enunciado; este permiteleituras m9ltiplas$ % sentido não está colado na palavra, # um elementosim&"lico, não # fechado nem exato, portanto sempre incompleto; por isso, osentido pode escapar$ % enunciado não di1 tudo, devendo o analista &uscar os efeitos dos sentidos e, para isso, precisa sair do enunciado e chear aoenunciável, atrav#s da interpretaão$

     A AD não a&re mão da l.nua, em&ora não tenha o mesmo enfoquea&ordado por aussure (semioloia8linu.stica)$ 6ara 67cheux, a l.nua # aforma de materiali1aão da fala, contando com os planos material esim&"lico; o discurso produ1ido pela fala sempre terá relaão com o contextos"cio hist"rico$+xemplificando com o discurso de um pol.tico, que parte de uma ideoloiapol.tica, 67cheux di1 que, em outras palavras, um discurso # semprepronunciado a partir de condi!es de produão dadas3 por exemplo, odeputado pertence a um partido pol.tico que participa do overno ou a umpartido da oposião; # porta/vo1 de tal ou tal rupo que representa tal ou talinteresse$ s condi!es de produão impostas pela ordemsuperior esta&elecida, em&ora tenha ilusão de autonomia$ 

    6artindo do princ.pio que a AD tra&alha com o sentido, sendo o discursohetero7neo marcado pela hist"ria e ideoloia, a AD entende que não irádesco&rir nada novo; apenas fará uma nova interpretaão ou uma re/leitura$%utro aspecto a ressaltar # que a AD mostra como o discurso funciona nãotendo a pretensão de di1er o que # certo, porque isso não está em

     'ulamento$

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     A formaão discursiva constitui/se na relaão com o interdiscurso e ointradiscurso$  % interdiscurso sinifica os sa&eres constitu.dos na mem"riado di1er; sentidos do que # di1.vel e circula na sociedade; sa&eres queexistem antes do su'eito; sa&eres pr#/constru.dos constitu.dos pelaconstruão coletiva$ % intradiscurso # a materialidade (fala), ou se'a, aformulaão do texto; o fio do discurso; a lineari1aão do discurso$

     A interpretaão do discurso # um ?esto?, ou se'a, # um ato no n.vel sim&"lico$ A interpretaão # o vest.io do poss.vel$ o luar pr"prio da ideoloia e #?materiali1ada? pela hist"ria$ +la sempre se dá de alum luar da hist"ria e dasociedade$ % esto de interpretaão # assumido, sendo um esto sim&"licoque dá sentido fa1endo a sinificaão$ Não há sentido sem interpretaão,portanto deverá sempre existir uma interpretaão para dar visi&ilidade aosentido que o su'eito pretendeu transmitir no seu discurso$

    Na interpretaão, # importante lem&rar que o analista # um int#rprete, quefa1 uma leitura tamm discursiva influenciada pelo seu afeto, sua posião,suas crenas, suas experi7ncias e viv7ncias; portanto, a interpretaão nuncaserá a&soluta e 9nica, pois tamm produ1irá seu sentido$

    @amos supor, por exemplo, que o analista disponha/se ao enfoque daposião de professor, no discurso peda"ico de uma disciplina do curso de-omunicaão$ 6ara constituir o corpus para análise, representativo dessediscurso, decide ouvir os professores em entrevistas, fa1endo a transcriãoda ravaão feita; não há um caminho pronto para efetivar a análise, masap"s várias leituras poderão ser identificados eixos temáticos, que emeremnum movimento em que o enunciado leva ao enunciável e vice/versa,explorando/se marcas lin2.sticas cu'o funcionamento discursivo irátra&alhar, fa1endo os recortes das formula!es nas quais aparece tal 7nfase$-a&e informar o enfoque anal.tico que # dado > pesquisa$ ualquer elemento pode ser estudado enquanto marca lin2.stica, ou marca dediscurso, podendo ser selecionadas poucas marcas lin2.sticas parainterpretaão; na AD não # necessário analisar tudo que aparece na

    entrevista, pois se trata de uma análise vertical e não hori1ontal$ %importante # captar a marca lin2.stica e relacioná/la ao contexto s"cio/hist"rico$ Deste modo, várias leituras do texto farão com que o analista dodiscurso estranhe aquela(s) palavra(s) ou formas sintáticas, pode ser, quemarca(m) o discurso e se repete(m), visuali1ando assim as marcaslin2.sticas no material$

    Bamm # interessante explicar o motivo que indu1iu a escolha do recortes"cio/hist"rico, pois este fa1 parte das condi!es de produão do discurso,representadas no corpus em análise, &em como a necessidade de ilustrar ascondi!es da constituião do corpus$  Ap"s ter delimitado o eixo temático, oanalista irá tra&alhar com este, o que sup!e o esta&elecimento de recortesdiscursivos, onde se representam linuaem e situaão$ % recorte resulta da

    teoria e # uma construão do analista; no estudo do recorte se &uscacaracteri1ar as reularidades na formaão discursiva, no confronto comsentidos hetero7neos$   As reularidades das marcas lin2.sticas queaparecem no discurso fa1em parte da identidade do discurso acessado pelosu'eito, tra1endo sentidos pr#/constru.dos que fiuram na mem"ria do di1er da sociedade$

     A interpretaão deverá ser feita sempre entre o interdiscurso e ointradiscurso cheando >s posi!es representadas pelos su'eitos atrav#s dasmarcas lin2.sticas$ A AD não vai tra&alhar com a forma e o conte9do, masirá &uscar os efeitos de sentido que se pode apreender medianteinterpretaão$ Nunca esquecer que a interpretaão sempre # pass.vel deequ.voco, pois em&ora a interpretaão parea ser clara, na realidade existem

    muitas e diferentes defini!es, sendo que os sentidos não são tão evidentescomo parecem ser$  67cheux refora a AD so& o prisma de uma leiturainterpretativa$ +m&ora a AD se'a mais relevante para as ci7ncias da

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    linuaem, ela está presente no exerc.cio das ci7ncias humanas;  portanto, ainterpretaão ca&erá tanto ao analista da linuaem quanto > do cientista emeral$ 

    2. ANÁLISE DE CONTEÚDO

     A Análise de -onte9do (A-) suriu no in.cio do s#culo CC nos +stados4nidos para analisar o material 'ornal.stico, ocorrendo um impulso entre EF0e E50, quando os cientistas comearam a se interessar pelos s.m&olospol.ticos, tendo este fato contri&u.do para seu desenvolvimento; entre E50 eEG0 a A- estendeu/se para várias áreas$  6ortanto, esta t#cnica existe hámais de meio s#culo em diversos setores das ci7ncias humanas, sendoanterior > Análise de Discurso$  

     A A- seria, então, um con'unto de t#cnicas de análise das comunica!esvisando o&ter, por procedimentos, sistemáticos e o&'etivos de descrião doconte9do das mensaens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam ainfer7ncia de conhecimentos relativos >s condi!es de produão8recepãodestas mensaens$

     A definião da A-, em EFH, era como sendo *a semntica estat.stica dodiscurso pol.tico=$   A A- pode ser quantitativa e qualitativa$ +xiste umadiferena entre essas duas a&ordaens3 na a&ordaem quantitativa se traauma freq27ncia das caracter.sticas que se repetem no conte9do do texto$  Naa&ordaem qualitativa, se considera a presena ou a aus7ncia de uma dadacaracter.stica de conte9do ou con'unto de caracter.sticas num determinadoframento da mensaem$ 

     A maioria dos autores refere/se > A- como sendo uma t#cnica de pesquisaque tra&alha com a palavra, permitindo de forma prática e o&'etiva produ1ir infer7ncias do conte9do da comunicaão de um texto replicáveis ao seucontexto social$  Na A-, o texto # um meio de expressão do su'eito, onde o

    analista &usca cateori1ar as unidades de texto (palavras ou frases) que serepetem, inferindo uma expressão que as representem$

    No texto em que marca a diferena te"rica entre conte9do e sentido, a A-costuma ser feita atrav#s do m#todo de deduão freq2encial ou análise por cateorias temáticas$ A deduão freq2encial consiste em enumerar aocorr7ncia de um mesmo sino lin2.stico (palavra) que se repete comfreq27ncia, visando constatar a pura exist7ncia de tal ou tal materiallin2.stico,  não preocupando/se com o sentido contido no texto, nem >diferena de sentido entre um texto e outro,  culminando em descri!esnum#ricas e no tratamento estat.stico$   A análise por cateorias temáticastenta encontrar uma s#rie de sinifica!es que o codificador detecta por meiode indicadores que lhe estão liados; codificar ou caracteri1ar um semento# colocá/lo em uma das classes de equival7ncias definidas, a partir dassinifica!es, em funão do 'ulamento do codificador, o que exiequalidades psicol"icas complementares como a fine1a, a sensi&ilidade, aflexi&ilidade, por parte do codificador para apreender o que importa$  

     A análise cateorial # o tipo de análise mais antia e, na prática, a maisutili1ada$ Iunciona por opera!es de desmem&ramento do texto emunidades, em cateorias seundo rearupamento anal"icos$ A análisecateorial poderá ser temática, construindo as cateorias conforme os temasque emerem do texto$ 6ara classificar os elementos em cateorias # precisoidentificar o que eles t7m em comum, permitindo seu arupamento$  

     A t#cnica de A- se comp!e de tr7s randes etapas3 ) a pr#/análise; J) aexploraão do material; H) o tratamento dos resultados e interpretaão$   Aprimeira etapa seria a fase de orani1aão, que pode utili1ar váriosprocedimentos, tais como leitura flutuante (scannin), ela&oraão de

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    indicadores que fundamentem a interpretaão, etc$ Na seunda etapa, osdados são codificados a partir das unidades de reistro$ Na 9ltima etapa sefa1 a cateori1aão, que consiste na classificaão dos elementos / se'aseundo suas semelhanas, se'a por diferenciaão / com posterior rearupamento, em funão de caracter.sticas comuns$ 6ortanto, acodificaão e a cateori1aão fa1em parte da A-$

    3. DIFERENÇAS ENTRE ANÁLISE DO DISCURSO E ANÁLISE DECONTEÚDO

    o&re a análise de conte9do e a teoria do discurso, referindo/se > análise deconteúdo como sinKnimo da análise de texto -  perce&e/se que, antes detudo, a diferena entre a AD e a A- # o modo de acesso ao o&'eto$ 

     A interpretaão da A- poderá ser tanto quantitativa quanto qualitativa,enquanto que na AD a interpretaão será somente qualitativa$

     A A- tra&alha tradicionalmente com materiais textuais escritos$ +xistem doistipos de textos que podem ser tra&alhados pela A-3 os textos produ1idos em

    pesquisa, atrav#s das transcri!es de entrevista e dos protocolos deo&servaão, e os textos 'á existentes, produ1idos para outros fins, comotextos de 'ornais$  Na AD existe o corpus de arquivo e emp.rico$ uando seanalisa em AD material 'á existente / como documentos, leislaão,pronunciamentos em 'ornal, livros e outros / refere/se ao corpus de arquivo;se o material # constru.do especialmente para a pesquisa, como por exemplo, atrav#s de entrevista, refere/se ao corpus emp.rico, experimental$

     A maior diferena entre as duas formas de análises # que a AD tra&alha como sentido e não com o conte9do; 'á a A- tra&alha com o conte9do, ou se'a,com a materialidade lin2.stica atrav#s das condi!es emp.ricas do texto,esta&elecendo cateorias para sua interpretaão$ +nquanto a AD &usca osefeitos de sentido relacionados ao discurso, a A- fixa/se apenas no

    conte9do do texto, sem fa1er rela!es al#m deste$ A AD preocupa/se emcompreender os sentidos que o su'eito manifesta atrav#s do seu discurso; 'áa A- espera compreender o pensamento do su'eito atrav#s do conte9doexpresso no texto, numa concepão transparente de linuaem$ Na AD, alinuaem não # transparente, mas opaca, por isso, o analista de discurso sep!e diante da opacidade da linuaem$

    % analista, ao utili1ar a AD, fará uma leitura do texto enfocando a posiãodiscursiva do su'eito, leitimada socialmente pela união do social, da hist"riae da ideoloia, produ1indo sentidos$ Na utili1aão da A-, o que # visada notexto # 'ustamente uma s#rie de significações que o codificador detecta por meio dos indicadores que lhe estão liados$

    Texto baseado e!

    -AL+MNAB%, Lita -atalina Aquino; 4BB