Continuação da Entrevista com Kepler - [ SBF ... · Física na Escola, v. 4, n. 1, ... cussão...

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19 Física na Escola, v. 4, n. 1, 2003 Entrevista com Kepler Este artigo apresenta a continuação da bem humorada conversa entre Kepler e um grupo de professores em descanso tranqüilo no sítio de um deles, à beira de um pacote de amendoim. A primeira parte deste texto teve ótima reper- cussão junto aos leitores e sua continuação vem enfatizar a possibilidade de se unir Física a uma atividade lúdica como o teatro. Alexandre Medeiros Departamento de Física – Universidade Federal Rural de Pernambuco Continuação da Entrevista com Kepler: A Descoberta da Terceira Lei do Movimento Planetário R ogério: E então Kepler, você já descansou o bastante. Por fa- vor, explique, agora, como foi que você chegou, mesmo, à sua ter- ceira lei. K epler: Ok! Como vocês se lem- bram, no Mysterium Cosmographicum, de 1596, escrito ainda em Graz, eu havia tentado construir o Universo baseado nos cinco sólidos platônicos, mas como aquilo não se mostrara frutífero, eu decidi perseguir uma abordagem pitagórica ainda mais fundamental, ou seja, tentei construir o Universo a partir das harmonias musicais da escala pitagórica. P edr o: Sim, isso nós já sabemos em linhas gerais, mas como você chegou na 3 a lei, mesmo? K epler: Calma, eu chego lá. Eu buscava encontrar as razões harmô- nicas que eu supunha existirem no movimento planetário, mas elas insis- tiam em permanecer ocultas. Lendo o meu Harmonici Mundi, você verá co- mo eu descrevi todo o processo de descoberta da terceira lei em detalhes. R ogério: Pois conte logo como foi cara, até eu já estou impaciente em saber. K epler: Você não quer ler o meu livro? P edr o: Depois a gente dá uma lida, conte logo e depressa, por favor. Você é muito demorado, enrola muito, des- culpe lhe dizer isso, com todo o res- peito. K epler: Você percebeu isso agora? Eu sempre fui demorado, sempre fiz esses raciocínios meio tortuosos e acho que deve ter sido por isso que muitos não me entenderam ou não gostaram do que eu escrevia. Eu sei que eu era meio confuso, mas a coisa era mesmo complicada e eu não dis- punha das melhores ferramentas ma- temáticas necessárias para enquadrar o problema. A princípio eu tentei en- contrar as razões harmônicas nos períodos de revolução dos planetas. Mas parece que o Criador não havia escolhido aquele tipo de harmonia. Tentei encontrar aquelas razões harmônicas experimentando os cál- culos entre o que me pareciam serem os volumes dos planetas. Mas, tam- bém não deu certo. Tentei, então, ajustar as menores e maiores distân- cias de cada planeta ao Sol e calcular as suas razões. Galamba: E foi aí que você deu com a solução. K epler: Não! Isso, também não deu certo. Jomar: Puxa. E quanto tempo você passou em todas essas tenta- tivas? K epler: Muito, muito tempo, anos a fio, até 1618, quando encontrei a solução e a publiquei no ano seguinte. Contando desde a publicação do meu Astronomia Nova, de 1609, que con- tinha as minhas duas primeiras leis, foram mais nove anos de trabalho extenuante. Inclusive essa minha de- mora, que para mim sempre foi um sinal de persistência, de obstinação religiosa, foi muito mal compreen- dida. Mesmo após resolver a questão, alguns tripudiaram dizendo-se admi- rados de que eu houvesse demorado todos aqueles anos para resolver o problema do movimento planetário. Amélia: E qual foi a sua resposta para essas críticas? K epler: Eu afirmei, em um tom certamente irônico, que havia solucio- nado naqueles anos o que a humani- dade não havia solucionado em milênios. Amélia: Isso é que é resposta! Galamba: Bonito, mas um tanto presunçoso, não? K epler: E você, mocinho, quanto tempo passa insistindo em resolver um problema quando não acerta logo de cara? Na Ciência não basta apenas talento, estalo de gênio. Aliás, esse Kepler já velho

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19Física na Escola, v. 4, n. 1, 2003 Entrevista com Kepler

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Este artigo apresenta a continuação da bemhumorada conversa entre Kepler e um grupode professores em descanso tranqüilo no sítiode um deles, à beira de um pacote de amendoim.A primeira parte deste texto teve ótima reper-cussão junto aos leitores e sua continuação vemenfatizar a possibilidade de se unir Física a umaatividade lúdica como o teatro.

Alexandre MedeirosDepartamento de Física – UniversidadeFederal Rural de Pernambuco

Continuação da Entrevista com

Kepler:A Descoberta da Terceira Lei do Movimento Planetário

Rogério: E então Kepler, você jádescansou o bastante. Por fa-vor, explique, agora, como foi

que você chegou, mesmo, à sua ter-ceira lei.

Kepler: Ok! Como vocês se lem-bram, no Mysterium Cosmographicum,de 1596, escrito ainda em Graz, euhavia tentado construir o Universobaseado nos cinco sólidos platônicos,mas como aquilo não se mostrarafrutífero, eu decidi perseguir umaabordagem pitagórica ainda maisfundamental, ou seja, tentei construiro Universo a partir das harmoniasmusicais da escala pitagórica.

Pedro: Sim, isso nós já sabemosem linhas gerais, mas como vocêchegou na 3a lei, mesmo?

Kepler: Calma, eu chego lá. Eubuscava encontrar as razões harmô-nicas que eu supunha existirem nomovimento planetário, mas elas insis-tiam em permanecer ocultas. Lendoo meu Harmonici Mundi, você verá co-mo eu descrevi todo o processo dedescoberta da terceira lei em detalhes.

Rogério: Pois conte logo como foicara, até eu já estou impaciente emsaber.

Kepler: Você não quer ler o meulivro?

Pedro: Depois a gente dá uma lida,conte logo e depressa, por favor. Vocêé muito demorado, enrola muito, des-culpe lhe dizer isso, com todo o res-peito.

Kepler: Você percebeu isso agora?Eu sempre fui demorado, sempre fizesses raciocínios meio tortuosos eacho que deve ter sido por isso quemuitos não me entenderam ou nãogostaram do que eu escrevia. Eu seique eu era meio confuso, mas a coisaera mesmo complicada e eu não dis-punha das melhores ferramentas ma-temáticas necessárias para enquadraro problema. A princípio eu tentei en-contrar as razões harmônicas nos

períodos de revolução dos planetas.Mas parece que o Criador não haviaescolhido aquele tipo de harmonia.Tentei encontrar aquelas razõesharmônicas experimentando os cál-culos entre o que me pareciam seremos volumes dos planetas. Mas, tam-bém não deu certo. Tentei, então,ajustar as menores e maiores distân-cias de cada planeta ao Sol e calcularas suas razões.

Galamba: E foi aí que você deucom a solução.

Kepler: Não! Isso, também nãodeu certo.

Jomar: Puxa. E quanto tempovocê passou em todas essas tenta-tivas?

Kepler: Muito, muito tempo, anosa fio, até 1618, quando encontrei asolução e a publiquei no ano seguinte.Contando desde a publicação do meuAstronomia Nova, de 1609, que con-tinha as minhas duas primeiras leis,foram mais nove anos de trabalhoextenuante. Inclusive essa minha de-mora, que para mim sempre foi umsinal de persistência, de obstinaçãoreligiosa, foi muito mal compreen-dida. Mesmo após resolver a questão,alguns tripudiaram dizendo-se admi-rados de que eu houvesse demoradotodos aqueles anos para resolver oproblema do movimento planetário.

Amélia: E qual foi a sua respostapara essas críticas?

Kepler: Eu afirmei, em um tomcertamente irônico, que havia solucio-nado naqueles anos o que a humani-dade não havia solucionado emmilênios.

Amélia: Isso é que é resposta!Galamba: Bonito, mas um tanto

presunçoso, não?Kepler: E você, mocinho, quanto

tempo passa insistindo em resolverum problema quando não acerta logode cara? Na Ciência não basta apenastalento, estalo de gênio. Aliás, esse

Kepler já velho

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estalo de gênio é muitas vezes o frutode muita perseverança, como foi nomeu caso.

Jomar: Você está coberto de razãoKepler, eu digo sempre isso aos meusalunos, mas, por favor, conte o restoda história. Como você chegou à suaterceira lei? Já estamos todos enten-dendo como você não chegou, só estáfaltando compreender como é quevocê chegou lá.

Kepler: Mas, meu caro, esse é oponto central da minha heurística,uma heurística do erro. É preciso apre-ciar as minhas muitas tentativas parapoder saborear o acerto que finalmen-te consegui obter. Porque esse acertofoi, sobretudo, fruto de uma constan-te correção de rumo. E o que me levoua corrigir o rumo?

Pedro: Sim, o que foi que lhe levoua corrigir o rumo?

Kepler: Bem, eu tentei encontraras razões harmônicas estudando asvelocidades extremas dos planetas.

Amélia: E, então, graças a Deus,você, finalmente, encontrou a soluçãodesejada.

Kepler: Ainda não!Galamba: Eu já teria desistido.Kepler: Disso eu tenho certeza.Galamba: Epa, rapaz, agora fui eu

que não gostei. O que você quer dizercom isso?

Kepler: Nada. Eu, então, tenteiencontrar as razões harmônicascalculando as variações de tempo ne-cessárias para o planeta percorreruma unidade de comprimento de suaórbita. Aquela me pareceu uma solu-ção bastante engenhosa.

Amélia: E então?Kepler: Também não deu certo.Galamba: A gente não vai sair da-

qui hoje. Eu duvido que essa entre-vista não seja cortada.

Kepler: Foi, então, que resolvi exa-minar a posição do observador locali-zado no centro do Universo, no Sol,quero dizer.

Pedro: Mas o Sol é o centro doUniverso?

Kepler: Para mim era. Lembre-se:eu era um pitagórico e aquele negóciodo fogo central do Filolau era tãoimportante para mim quanto haviasido para o Copérnico. E ao fazer essamudança, ocorreu-me estudar as va-

riações de velocidade angular, sem meimportar com as distâncias, quandovistas do Sol.

Galamba: Já sei, e aí não deu cer-to, novamente.

Kepler: Não, absolutamente.Dessa vez eu senti que havia encon-trado algo de muito fundamental. Foi,justamente, aí que eu descobri a ter-ceira lei.

Rogério: Espera aí. A sua terceiralei, da forma como a ensino, estabeleceuma proporcionalidade entre o qua-drado dos períodos das órbitas plane-tárias e o cubo das distâncias médiasdestes até o Sol, certo? Como é quevocê veio a pensar em tentar essequociente? Como lhe veio à mente essaidéia? Porque, para mim, essa relaçãonão é daquelas que a gente começarialogo testando. Eu sei que você não tes-tou logo essa relação, mas o que fezvocê, finalmente, testá-la?

Kepler: Bem, eu não testei essarelação diretamente.

Nairon: Agora sou eu que nãoestou mais entendendo. Você não tes-tou essa relação? E como chegou a ela?

Kepler: Eu não expressei a minhaterceira lei, inicialmente, nessa lingua-gem dos livros didáticos de vocês, domesmo modo que o Newton não disseque F = ma, vocês sabem.

Pedro: Do caso do Newton eu sa-bia, mas da sua terceira lei, não. Ecomo foi, então? De onde nasceu a suaidéia de estudar as velocidades angu-lares e como chegou à terceira lei,mesmo?

Kepler: Eu já falei que estavapreocupado em construir uma dinâ-mica do movimento planetário, parausar a linguagem de vocês. Foi aí queabandonei aquela idéia de espíritosconduzindo os planetas e pensei emtermos de uma força magnética queemanasse do Sol como tentáculos eque arrastasse os planetas, varrendo-os pelo espaço.

Rogério: E como era o mecanismode atuação dessa força magnética?

Kepler: Bem, de início eu imagi-nava que os espíritos que moviam osplanetas eram menos ativos quandoos planetas estavam distantes do Solou, então, que havia apenas um únicoespírito localizado no Sol e que moviaos planetas vigorosamente perto do

mesmo, mas que se mostrava quaseexausto ao atuar sobre os planetasmais distantes, porque a distânciaenfraquecia a sua força. Eu me per-guntei que tipo de força motora pode-ria distorcer as trajetórias circularesconvertendo-as em elipses. Supus,então, que existia uma força entre oplaneta e o Sol, que era atrativa du-rante metade da órbita e repulsiva naoutra metade. Uma força com essascaracterísticas era, sem dúvida, a forçamagnética. Eu já sabia que a própriaTerra era um imã, como expliqueiantes, pois a bússola era um indíciodisso. Imaginei, então, que os planetaspossuíam pólos magnéticos também.Como o eixo da Terra em sua trajetó-ria em torno do Sol sempre apontapara uma mesma direção, acarretavaque parte do ano um dos seus pólosestava mais próximo do Sol e na outraparte do ano essa situação se invertia.Isso deveria acontecer com os outrosplanetas, também. Supus, também,que o Sol tivesse um único pólomagnético e assim estariam explica-das a atração e a repulsão dos plane-tas. Era uma teoria engenhosa, não?

Pedro: Engenhosa, mas errada. OSol tem dois pólos magnéticos e, alémdisso, a força magnética é muito pe-quena para influenciar naquela escalade distâncias.

Kepler: Mas eu não sabia disso. Detoda forma, aquilo me serviu de ins-piração para reconsiderar o problemade como os planetas varriam o espaço.

Galamba: Que idéia mais doida,cara.

Kepler: Doida para você que estáacostumado a pensar em termos dife-rentes, mas, entretanto, aquilo erauma clara tentativa de buscar as cau-sas dos movimentos. Ainda que essascausas fossem os tais espíritos ou oespírito único vindo do Sol. Mas foi,então, que eu mudei o meu esquemapara as forças magnéticas, abando-nando os tais espíritos. Eu saquei queeles não precisavam existir e afirmeique deveríamos substituir a palavraespírito pela palavra força. E, assim,nós podemos obter o princípio subja-cente aos movimentos planetários, aFísica dos Céus. Eu passei a acreditar,firmemente, que a força motriz nãoera um espírito ao comparar a

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diminuição que a ação desse espíritosofria com a distância ao Sol, que meparecia muito semelhante a da luz quetambém diminuía com a distância. Euestava emergindo de conceitos antigose medievais e construindo uma trilhaque seria seguida posteriormente peloNewton. Para mim, aquela força de-veria ser algo substancial, não no sen-tido literal da palavra, mas do mesmomodo em que a luz é algo substancial,significando que era algo que emana-va de um corpo. Eu fui, a duras penas,enquadrando os meus próprios mitosem um crescente padrão de racionali-dade, sem jamais, entretanto, ter dei-xado de lado a minha visão mística.Como disse no início, eu sempre fuium místico, mas não um místico nosentido de adotar, exclusivamente, umpensamento especulativo. Eu sempretentei, crescentemente, enquadrar asminhas próprias convicções místicasem um padrão de racionalidade mate-mática. Meu objetivo voltou-se paraum mecanicismo em desenvolvimen-to e o meu intento passou a ser cadavez mais mostrar que existia algo co-mo uma máquina celeste e que essamáquina não era apenas divina, masera, igualmente, um certo tipo de reló-gio muito complexo, construído pelomaior de todos os relojoeiros: Deus. Epara mim, os movimentos dessemagnífico relógio eram causados porforças magnéticas, de modo seme-lhante àquele como o peso movia aspeças de um relógio. Restava expressaressas causas em termos matemáticos.

Amélia: Esse é um caminho queleva direto ao Newton, essa misturade misticismo com enquadramentoracional conduzindo a um mecanicis-mo em desenvolvimento.

Kepler: Creio que sim. Mas eu evo-luí até essa postura, eu não comeceiadotando-a. O Newton, entretanto, jáparece haver partido dessa mescla deatitudes. Não somos exatamente acontinuação um do outro, mas temosmuitos pontos de contato, talvez maisque aqueles, porventura existentesentre o Newton e o Galileu. Este erabem mais cético.

Pedro: Mas você estava falando decomo havia chegado à sua terceira lei.Havia falado que resolvera estudar asvariações de velocidade angular, sem

se importar com as distâncias, quan-do vistas do Sol. Disse que foi daí quenasceu a terceira lei. E ainda disse queela não foi expressa, inicialmente, domodo como estamos acostumados aformulá-la, não foi?

Kepler: Foi.Pedro: E então, onde é que o mag-

netismo entra nessa história? E comovocê expressou a terceira lei? Aindaestou sem entender como chegou aela.

Galamba: Eu já estou voando faztempo.

Kepler: Você, agora, vai entender.Vou juntar todas essas peças.

Amélia: Graças a Deus!Kepler: Foi o fato de haver conside-

rado uma força magnética emanandodo Sol, que às vezes repelia e às vezesatraia os planetas, que me levou a re-considerar as varreduras em termosdas variações de velocidade angular,sem me importar com as distâncias,quando vistas do Sol. Foi então quepassei a contemplar, realmente, a bele-za da música celestial. Saturno, porexemplo, quando está no afélio, oponto mais distante da órbita, move-se a uma velocidade angular de 106segundos de arco por dia. Entretanto,quando está no periélio, a distânciamais próxima do Sol, sua velocidadeangular é de 135 segundos de arco pordia. A razão entre essas quantidades106/135 difere em apenas dois segun-dos de 4/5 que é a terça maior da es-cala musical pitagórica. Comparando,de modo semelhante, os movimentosde Júpiter no afélio e no periélio euencontrei uma terça menor. Para Mar-te eu encontrei uma quinta e assimpor diante. O meu espanto aumentouquando resolvi comparar os dados dasvelocidades angulares extremas depares de diferentes planetas. Foi aí quea harmonia dos mundos saltou à mi-nha vista. Eu pude ouvir, através daMatemática, a música celestial. Osvalores extremos daquelas velocidadesdavam os intervalos da escala com-pleta. Havia, efetivamente, um ritmonaquelas razões. Assim me pareceu.

Jomar: Isso me parece bonito, po-rém confuso. Onde estava a sua ter-ceira lei, afinal?

Kepler: Estava oculta naquelas ra-zões, estava presente naqueles ritmos

planetários. Foi, por isso, que adoteia nova Matemática dos ritmos, a ma-temática das razões, a nova Matemá-tica que simplificava os cálculosastronômicos: os logaritmos.

Rogério: Não entendi.Jomar: Nem eu. Onde os logarit-

mos entram nessa história?Nairon: Logaritmos e escalas mu-

sicais são primos irmãos. A própriapercepção auditiva obedece a uma es-cala logarítmica. Agora estou come-çando a perceber onde quer chegar.

Jomar: Então explique para nós.Nairon: Não, deixe o Kepler expli-

car, ele é que é o pai da criança.Kepler: Eu estava motivado pela

idéia de que as órbitas planetárias de-veriam satisfazer um conjunto derelações matemáticas simples que ospitagóricos haviam descoberto e des-crito como a escala musical. Aquelasrazões numéricas entre tons harmo-niosos formavam os ritmos musicais.Ao estudar os períodos dos planetas eas suas distâncias médias, eu encon-trei que as razões entre os logaritmosdaquelas quantidades formavam umaproporção de 3 para 2. Esse foi oenunciado original da minha terceiralei, que é equivalente a esse que vocêsusam em suas aulas. Pode parecerpouco ter demorado tanto para per-ceber essa relação tão simples, mas eunão dispunha da Geometria Analíticae muito menos desses seus maravi-lhosos computadores ou mesmo depapéis log-log e mono-log que permi-tem linearizar curvas de modo tãosimples. Eu acho que essa coisa daslinearizações é algo que todos os estu-dantes de Física deveriam estudar commuito carinho. No meu tempo isso

Caderno de cálculos de Kepler.

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não existia.Jomar: Dá para explicar melhor

essa coisa dos logaritmos?Kepler: É simples. No fundo o que

eu estava fazendo, falando em termosmais modernos, era estudar a relaçãoentre os logaritmos dos períodos e dosraios orbitais médios. Atualmente issose faz com gráficos log-log, não? Masas escalas logarítmicas do Napier sóapareceram em 1614 e eu chegueiàquela idéia, mais ou menos, simulta-neamente e de modo independente. Sódepois tive contato com as idéias doNapier. Eu escrevi um livro sobre oassunto em 1621. Eu, portanto, des-crevi, inicialmente, a minha terceiralei em termos da razão 1,5, do mesmomodo que apareceria se eu houvesseutilizado um papel log-log para cons-truir, em termos modernos, um grá-fico daquelas variáveis. Eu não falei,inicialmente, nos termos mais fami-liares, que vocês conhecem bem, dasrelações entre os quadrados dos perío-dos e os cubos das distâncias médias.Para mim, a terceira lei era a pura ex-pressão da harmonia logarítmica,assim como na música. Os logaritmosme influenciaram na formulação daterceira lei na mesma medida em que,por exemplo, as cônicas de Apolôniohaviam me influenciado antes naformulação da primeira lei. Hoje, per-cebo que os logaritmos exerceramsobre mim um papel semelhante aoque a Análise Tensorial e a GeometriaRiemanniana exerceu, muito depois,no desenvolvimento das equações deCampo na Relatividade Geral peloEinstein.

Rogério: Como assim?Kepler: Em cada um desses casos

é lícito perguntar se foi a estruturamatemática que forneceu a ferramen-ta com a qual tanto eu quanto o Eins-tein pudemos descrever nossas teoriasdos fenômenos em causa ou se foi aestrutura matemática efetivamenteque selecionou um certo aspecto da-queles fenômenos a ser considerado.

Nairon: Dá para falar um poucomais dos logaritmos e da sua conjun-ção com a música e com as razões as-tronômicas que você buscava?

Kepler: Certamente! Como vocêdeve saber, o próprio Napier inventouos logaritmos tendo em mente suas

capacidades descritivas da Natureza.A referência aos movimentos é, por-tanto, muito apropriada. Napier,originalmente, concebeu os logarit-mos como “números artificiais” e, de-pois, renomeou-os como logaritmos,que quer dizer números provenientesdas razões, dos ritmos. O sufixo “rit-mo” não é nenhuma coincidência.Uma tábua de logaritmos é, neste sen-tido, uma tabela que nos permiteobter um conhecimento geométricode todas as dimensões e movimentosno espaço.

Jomar: Eu ainda não entendi aequivalência que você falou entre essasua forma de expressar sua terceiralei em termos de logaritmos e a nossamaneira usual de apresentá-la.

Kepler: Veja lá: eu acho que todoestudante questionador ao ver a mi-nha terceira lei pela primeira vez devesentir nela algo de diferente dasoutras, de mais difícil. Isso porque daforma como ela veio a se tornar maisconhecida, ela diz que a razão entreos quadrados dos períodos de dois pla-netas quaisquer é igual à razão entreos cubos das distâncias médias dessesmesmos planetas ao Sol, não é isso?E além de falar nessa relação esquisitaentre quadrados e cubos, ela ainda en-volve, simultaneamente, dois planetasdiferentes.

Pedro: É, isso é mesmo muitocomplicado, mas a sua explicação emtermos dos logaritmos não ajudoumuito até agora.

Kepler: Pois bem, vou colocar ascoisas em termos mais modernos paraque vocês compreendam a linha domeu pensamento. Eu não comecei tes-tando razões entre parâmetros de pla-netas distintos, mas de um mesmoplaneta. A comparação cruzada veiologo depois. Eu, de início, percebi, apósmuitas tentativas baseadas na buscadas harmonias, que a razão entre oslogaritmos do período e da distânciamédia ao Sol para um determinadoplaneta estava na razão de 3/2. Ouseja, em termos simbólicos modernos,que

ou seja, que aquela razão era 1,5, co-mo disse antes. Isso era o mesmo que

dizer que

ou seja,

Isso valia para quaisquer planetasp1 e p2, ou seja:

Assim sendo,

Isso acarreta que

E note, portanto, que eu ainda es-tou tomando uma razão referente aosparâmetros de um certo planeta ecomparando-a com uma razão seme-lhante tomada para um outro plane-ta. Só, então, eu mudo a ordem,cruzando os dados e chegando narelação mais conhecida como sendo aminha 3a lei:

Sacou?Pedro: Agora, sim! Mas você não

escreveu exatamente desse jeito, nãofoi?

Kepler: Isso mesmo! O raciocínioque acabei de explicar é algo comouma tradução do modo como eu pen-sava, porque, certamente, se eu fossefalar com vocês neste momento, domesmo modo que eu falava à minhaépoca, sem traduzir, vocês dificilmentecompreenderiam aquilo eu queriadizer. Eu sempre falei e escrevi em ter-mos acentuadamente metafóricos.

Jomar: Explica melhor esses taistermos metafóricos e essa necessidadede tradução.

Kepler: Veja lá! Quando eu final-mente cheguei à minha 3a lei, queespero já tenham compreendido, eudisse, exatamente, o seguinte: “Tendopercebido o primeiro lampejo da au-rora há dezoito meses, a luz do dia hátrês meses, e só há alguns dias o Solde maravilhosíssima visão, nada medeterá. Sim, entrego-me ao santodelírio”. Entenderam?

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Amélia: Mais ou menos! Vocêestava se aproximando gradativa-mente da solução, não é isso? Mas quesanto delírio é esse?

Kepler: São os acordes harmônicosda música celestial que eu passei a per-ceber, expressos na beleza da minha3a lei. Aquelas razões logarítmicaseram, para mim, uma pura músicacelestial. E eu ainda acrescentei oseguinte: “Zombeteiramente desafiotodos os mortais com essa confissãofranca: roubei os vasos de ouro dosegípcios para deles fazer um taberná-culo para o meu Deus, longe dasfronteiras do Egito”. Entenderam?

Galamba: Está meio complicado,você falava de um modo muito es-tranho, mas deu para entender quevocê admitiu que era mesmo ladrão.Se não roubou os dados do Tycho, co-mo disse antes, admitiu agora queroubou os vasos de ouro de uns certosegípcios. Eu bem que desconfiei devocê, desde o início.

Kepler: Não foi nada disso, meujovem! Você entendeu tudo de modomuito direto, como se estivesse assis-tindo ao Big Brother. Eu falei de ummodo metafórico, que necessita deuma interpretação mais aprimorada,que vá aos significados mais profun-dos do meu discurso, ou seja, umahermêneutica. O “ouro dos egípcios”significa o conhecimento pitagóricodas harmonias musicais que eu sem-pre acreditei que o Pitágoras haviaaprendido de sacerdotes egípcios mui-to antigos, como o Hermes Trisme-gisto. E eu utilizei aquela inspiraçãopagã para honrar ao meu Deus, paracompreender o seu plano matemáticodo Universo, para ouvir os acordesmatemáticos da sua sinfonia celestial.

Nairon: Muito bonito, mas comoconcluiu sua mensagem?

Kepler: Eu afirmei que: “Se meperdoardes, rejubilar-me-ei. Se voszangardes, suporta-lo-ei. Olhai, lanceios meus dados, e estou escrevendo pa-ra os meus contemporâneos ou paraa posteridade. É o mesmo para mim.Bem pode esperar cem anos por umleitor, uma vez que Deus também es-perou seis mil anos por uma teste-munha”. Entenderam?

Pedro: Certamente! Essa sua alu-

são à espera de Deus por seis mil anosparece ser uma menção bíblica à cria-ção do mundo. E a testemunha, comcerteza, é você mesmo. Isso é muitobonito, mas seria bom você voltar afalar do nosso modo, senão o revisorda revista vai pedir para reescreveressas suas partes.

Amélia: Mas, como foi a intro-dução dos logaritmos na Astronomia?

Kepler: Não foi tão tranqüilaquanto possa imaginar. À primeiravista, os logaritmos foram vistos,como muitos, infelizmente, ainda osvêm hoje em dia, como um mero arti-fício para encurtar os cálculos. Poucosentenderam como essa idéia está en-raizada na estrutura da própria Na-tureza. A história dos logaritmos éalgo de uma beleza indescritível. Elesnão são, absolutamente, um meroartifício de cálculo. Mas até o Maestlinnão compreendeu essa dimensão maisprofunda dos logaritmos por consi-derá-los puro artifício, e sugeriu enfa-ticamente, condenou mesmo, osastrônomos que os utilizavam a refa-zer os cálculos. E eu estava no meiodesses “condenados”.

Galamba: Não é possível que vácomeçar a se lamentar novamente.

Kepler: Olha, é difícil explicar me-lhor essas coisas todas de música,magnetismo, logaritmos em um tem-po tão curto de uma entrevista. Acon-selho que consultem a bibliografia aofinal desta entrevista.

Rogério: Ok! Vamos passar adian-te.

Galamba: Graças a Deus. Pode serque agora eu aterrisse novamente.

Amélia: Deixando um pouco delado suas três leis, fale mais das suasoutras obras e do restante de sua vida.

Kepler: Vou abreviar, pois as trêsleis são, realmente, o ponto principal.Eu desenvolvi muitos trabalhos comosubprodutos da minha busca pelastrês leis. Por exemplo, em 1611 eu es-crevi o meu Dioptrice onde explicavao funcionamento do telescópio. Aqui-lo foi feito sob a clara influência dostrabalhos do Galileu. Aliás, eu, no anoanterior, havia escrito um livro sobreas descobertas astronômicas do Ga-lileu intitulado Dissertatio cum Nun-cio Sidereo, ou seja, Dissertação sobre o

Mensageiro Sideral. Foi aí que eu intro-duzi o termo “satélite”.

Pedro: O que mais você tratava noDioptrice, além de explicar o funcio-namento do telescópio?

Kepler: Eu fui o primeiro no Oci-dente a explicar a formação das ima-gens real, virtual, direita, invertida ea ampliação das imagens. Os árabesjá haviam explicado boa parte da Ópti-ca Geométrica, mas creio que o fiz deforma mais sistemática. Eu tambémexpliquei o fenômeno da reflexãointerna total. No meu livro sobre oCálculo, o Stereometrica Doliorum,também de 1611, eu me ocupei dasmarés como um fenômeno causadopela Lua. O Newton desenvolveu pos-teriormente essa minha idéia, mas naépoca que eu a lancei o encardido doGalileu foi enfaticamente contra. Issopoucos dizem. Eu também utilizei aparalaxe para tentar medir as distân-cias das estrelas e, além disso, expli-quei como a nossa percepção tridi-mensional de profundidade decorriado fato da nossa visão ser binocular.Isso, conjuntamente, deu origem aoque hoje vocês chamam de Astrome-tria.

Amélia: Você fez tudo isso em Pra-ga?

Kepler: Não. Em 1612 o impera-dor Rodolfo II foi deposto e eu saí dacidade. Mudei-me para Linz, na Áus-tria, deixando o posto de matemáticoimperial para ser matemático distrital.Coisas da vida.

Alexandre: Como foi aquela his-tória do ano do nascimento de Cristo?

Kepler: Bem, isso foi em 1614. Euestudei o calendário em profundidadee escrevi um livro que em portuguêsseria algo como O Verdadeiro Ano emque o Filho de Deus nasceu no Útero daVirgem Maria. Nele eu mostrava quehavia um erro de quatro anos nocalendário cristão e que Jesus havianascido em 4 a.C., uma conclusãoaceita até hoje.

Pedro: Para mim isso era novi-dade.

Kepler: Pois é! E então, entre 1616a 1620 eu me ocupei bastante com ofato da minha mãe ser processada peloSanto Ofício por atos de bruxaria. Emum sentido metafórico, ela era mesmo

24 Física na Escola, v. 4, n. 1, 2003Entrevista com Kepler

uma bruxa. Então eu tive de defendê-la e fiz muitas viagens que me toma-ram muito tempo. Isso também atra-sou o meu trabalho sobre a terceira lei.

Galamba: Por favor, não fale maisnessa lei que já não agüento mais. Euvou até pedir para o Rogério trocar asminhas aulas de Mecânica por outrasde Termologia (risos).

Kepler: Pois bem. Em 1618 o inícioda Guerra dos Trinta Anos acirrou atensão entre protestantes e católicos.Em 1621 eu publiquei a EpitomeAstronomia, o meu trabalho maiscompleto sobre a Astronomia helio-cêntrica. Publiquei ainda as TabelasRodolfinas, que substituíram ediçõesmais antigas de obras semelhantes,mas baseadas no geocentrismo. Eu aíjá usava extensivamente os logarit-mos. Em 1626 mudei-me de Linz de-vido a perseguições religiosas, e noano seguinte me fixei na pequena ci-dade de Sagan, onde fui prestar meusserviços de astrólogo ao general Wal-lenstein, meu último senhor. Em 1629cheguei a ser convidado para traba-lhar na Universidade de Rostock, masnão fui para lá. No ano seguinte esta-va fazendo uma viagem de Sagan aNuremberg no lombo de um velhocavalo, para cobrar um antigo débito,mas não cheguei ao meu destino. Pareimuito doente em Regensburg, que emportuguês chama-se Ratisbona. Entreiem coma, talvez devido às pústulas fe-bris, não sei ao certo qual a minha do-ença. Talvez fosse uma afecção dopulmão. O certo é que morri em 15 denovembro de 1630. Mas também deivárias contribuições técnicas que aquinão vou mencionar e ainda deixei umpequeno livro de que foi publicadopostumamente e é considerado um pre-

cursor da Ficção Científica: Somnium.Nele eu descrevia uma viagem à Lua.

Galamba: Era você mesmo viajan-do para a terra dos pés juntos, com-panheiro.

Cleide: Que crueldade, Galamba!Kepler: Deixe para lá; certas coisas

que alguns professores de Física fazemque me deixam bem mais triste.

Pedro: O que, por exemplo?Kepler: Essa mania que alguns de

vocês têm de se referirem à minhaobra como a cinemática planetária eapenas às concepções gravitacionaisdo Newton como sendo uma Físicaplanetária. Isso me deixa revoltado.Aquilo para mim não era mera cine-mática, era pura Física. Uma Física,certamente, diferente da de vocês, masainda assim uma Física. Então, jogamfora a minha Física e se apossam dasminhas leis. Entender dessa maneiraé tomar uma visão divorciada daHistória da Ciência. Eu vi algo assim,um dia desses, num desses livrosdidáticos que vocês usam. Fiquei umafera! Quase mando uns livros de His-tória da Ciência de presente paraaquele distinto. Se vocês quiserem mefazer alguma justiça, por favor, nãodigam mais isso.

Cleide: E o que de bom você reco-mendaria para que os professores deFísica lessem a seu respeito, a respeitodas suas idéias?

Kepler: Olha, em outras línguasencontramos muitos textos excelen-tes, como, por exemplo, o do MaxCaspar. Outros estão apontados nabibliografia dessa entrevista.

Rogério: Mas e em português? Oque você recomendaria?

Kepler: Infelizmente, há bem me-nos trabalhos de boa qualidade do que

deveria haver ao meu respeito. Agoravocês têm esta entrevista (risos). E valea pena ainda assinalar que nestepreciso ano de 2003 um professordefendeu uma tese belíssima no de-partamento de Filosofia da USP sobreo meu trabalho, sobre a minha formaparticular de encarar a produção doconhecimento. O autor da tese foi oClaudemir Roque Tossato e o título éForça e Harmonia na Astronomia Físicade Johannes Kepler, um trabalho real-mente muito bonito.

Alexandre: Eu consegui uma có-pia no dia seguinte ao da defesa, emmarço deste ano. É realmente umestudo profundo e digno de ser lidocom toda a atenção.

Jomar: Eu sei que você já contoua sua história até a sua morte, maseu ainda queria que você falasse umpouco mais do seu interesse pelo Mag-netismo. Eu estou ensinando isso e...

Carriço: Pois é, eu me interessomuito por Magnetismo. Lá na UFRNeu tenho pesquisado sobre isso há bas-tante tempo e...

Pedro: Gente, o Carriço acordou,o Kepler foi embora.

Carriço: O Kepler esteve aqui? Ecomo eu não vi?

Amélia: Você era ele…Carriço: O que, menina? Que

brincadeira é essa? Eu vim aqui paraouvir o Kepler falar.

Alexandre: Pois o jeito vai ser lera entrevista dele (risos).

Rogério: Mas valeu, o cara é com-plicadinho todo, mas valeu. E agora,quem é que nós vamos entrevistar?

Alexandre: Calma, deixa ver an-tes o que os nossos colegas acham des-se papo para lá de heterodoxo do Ke-pler.

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Voelkel, J. Johannes Kepler and the newastronomy. (Oxford Portraits in Science). Ox-ford: Oxford University Press, 2001.