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EDUARDO HENRIQUE DE MACEDO OLIVEIRA
A CONSTITUCIONALIDADE DA TRIBUTAÇÃO
DOS CONTRATOS DE FRANQUIA PELO ISS
UBERLÂNDIA – MG
DEZEMBRO DE 2009
2
Eduardo Henrique de Macedo Oliveira
A CONSTITUCIONALIDADE DA TRIBUTAÇÃO
DOS CONTRATOS DE FRANQUIA PELO ISS
Artigo científico apresentado como exigência final do curso de Pós-graduação Lato Sensu em Direito Público, pela Universidade Gama Filho.
Professor Orientador: Alex Linhares
Uberlândia – MG
Dezembro de 2009
3
A CONSTITUCIONALIDADE DA TRIBUTAÇÃO
DOS CONTRATOS DE FRANQUIA PELO ISS
Eduardo Henrique de Macedo Oliveira1
RESUMO
O crescimento da atividade econômica no Brasil provocou o surgimento de formas contratuais que a exemplo da franquia ou franchising não foram previstas pelo Código Civil ou pelo Código Comercial. O contrato de franquia é um contrato complexo que mistura elementos de contratos nominados e inominados, daí a dificuldade de saber seu correto enquadramento dentro da ordem tributária vigente. O objetivo deste trabalho é saber se é possível, diante do conceito constitucional de serviços e pela regra matriz de incidência do ISS, submeter os contratos de franquia à tributação municipal. Para tanto, foram empregados, no desenvolvimento deste artigo, a pesquisa bibliográfica e o método dialético. Assim, o presente trabalho, amparado em larga discussão doutrinária e incipiente prática forense sobre a matéria, conclui que para saber se as atividades de franquia podem ser tributadas pelos municípios é necessário submeter o questionamento ao estudo preliminar da Constituição Federal e do sentido que a Carta Magna atribui ao vocábulo serviço. Se o significado da palavra serviço for tomado no sentido usual ou econômico do termo, não restará dúvida sobre a possibilidade da incidência do imposto municipal sobre as atividades de franquia, entretanto se o sentido ficar restrito ao âmbito do direito privado, não será possível obstar a inconstitucionalidade da referida tributação, caso não seja identificada obrigação de fazer no contrato de franquia. Verifica-se, portanto, que compete ao Supremo Tribunal Federal, como guarda maior da Constituição Federal, dirimir esta questão da qual não pode mais se afastar.
Palavras-chave: Franquia. Franchising. ISS.
INTRODUÇÃO
O crescimento econômico do Brasil fez surgir novas técnicas contratuais que
passaram a ser adotadas pelas empresas. Essas figuras contratuais, em geral transladadas de
outros países, mormente de origem norte-americana, não se ajustaram aos tipos previstos no
1 Bacharel em Direito e Ciências Contábeis. Pós-graduação em Auditoria e Perícia pela Universidade Federal de Uberlândia. Fiscal de Tributos Municipais. E-mail: [email protected].
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Código Civil e no Código Comercial. Cita-se o exemplo do contrato de franchising que,
segundo Lobo2, surgiu em 1860 nos Estados Unidos.
O termo franchising foi traduzido no Brasil pelo vocábulo franquia e deriva do
inglês franch oriundo, por sua vez, de franc, do francês medieval. Assim, francher tem o
sentido de outorga de um privilégio, de uma autorização ou abandono de uma servidão.
Franchising, particípio do verbo to franch, significa um conjunto de atividades direcionadas a
favorecer processos de distribuição e venda em larga escala3.
O contrato de franquia foi regulado no Brasil pela Lei nº 8.955 de 15 de
dezembro de 1994, que no seu art. 2º trouxe a definição de franquia empresarial:
Art. 2º. Franquia empresarial é o sistema pelo qual um franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício4.
A adoção do contrato de franquia pelo empresariado brasileiro fez surgir,
inicialmente, dois questionamentos: o primeiro sobre seu caráter jurídico e o segundo sobre
seu enquadramento tributário. Estas questões estão intimamente ligadas, pois é de seu caráter
jurídico que defluirá a tipificação da atividade, dentro da ordem tributária vigente.
A Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de
20035, fez constar no subitem 17.08 as atividades de franquia (franchising) como hipótese de
incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza. A partir deste fato, grande
polêmica travou-se na doutrina sobre a constitucionalidade da tributação das atividades de
franquia pelo Imposto sobre Serviços e a jurisprudência dos tribunais de segundo grau
mostrou-se dividida. Embora o Superior Tribunal de Justiça tenha, recentemente, prolatado
decisões favoráveis a essa tributação, a posição da doutrina majoritária é pela não incidência
2 LOBO, Jorge. Contrato de Franchising. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 23.3 MARTINS, Sergio Pinto. Manual do imposto sobre serviços. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2004, p. 279.4 BRASIL. Lei nº 8.955, de 15 de dezembro de 1994. Dispõe sobre o contrato de franquia empresarial
(franchising) e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8955.htm>. Acesso em: 16 set. 2009.5 BRASIL. Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003. Dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de
Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp116.htm>. Acesso em: 16 set. 2009.
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do ISS sobre as atividades de franquia, sob a alegação de não configurarem prestação de
serviços, tendo em vista que a Constituição Federal, ao cumprir seu papel de distribuição de
competências tributárias entre os entes federativos, dispôs em seu art. 156, inc. III, que
compete aos Municípios instituir impostos sobre “serviços de qualquer natureza, não
compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar” 6.
Provocado por agravo de instrumento o Supremo Tribunal Federal,
invariavelmente, negava apreciar a matéria e julgava o descabimento do recurso
extraordinário, porque considerava que a ofensa ao art. 156, inc. III, da Constituição Federal,
se houvesse, seria apenas indireta ou reflexa por ser o tema de natureza infraconstitucional7.
O escopo geral deste trabalho é demonstrar que a discussão sobre a tributação
dos contratos de franquia pelo ISS é eminentemente constitucional, porque tem como base a
definição do campo de abrangência do vocábulo “serviços” constante no art. 156, inc. II, da
Constituição Federal. Corrobora esse propósito recente decisão monocrática proferida pelo
Supremo Tribunal Federal que deu provimento a agravo de instrumento determinando sua
conversão em recurso extraordinário, para posterior julgamento sobre a incidência do ISS nas
atividades de franquia8.
O objetivo específico do artigo é saber se é possível, diante do conceito
constitucional de serviços e pela regra matriz de incidência do ISS, submeter os contratos de
franquia à tributação municipal, conforme determina a Lei Complementar nº 116/20039.
Neste contexto, para desenvolvimento do trabalho, realizou-se pesquisa teórica
bibliográfica que possibilitou a obtenção dos dados necessários e facultou a exploração desta
nova área onde os problemas ainda não se cristalizaram suficientemente. As análises textual e
interpretativa foram utilizadas como procedimentos técnicos.
6 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.7 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Primeira Turma. 1. ISS. Contrato de franquia. Recurso extraordinário:
descabimento: controvérsia decidida à luz da legislação infraconstitucional pertinente ao caso: a alegada ofensa ao artigo 156, III, da Constituição, se houvesse, seria indireta ou reflexa, que não enseja o recurso extraordinário: incidência da Súmula 636. 2. Improcedência das alegações de negativa de prestação jurisdicional ou violação dos princípios constitucionais invocados no RE. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 583632/MG. Agravante: Município de Belo Horizonte. Agravado: ACF Minas Centro Serviços Ltda ME. Relator: Ministro Sepúlveda. Brasília, 26 de junho de 2007. Diário [da] Justiça, p. 40, 17 out. 2007.
8 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Decisão monocrática. Decisão ISS – franquia – admissão da incidência na origem – recurso extraordinário – trancamento – agravo – acolhida do pedido de sequência e julgamento nos próprios autos. Agravo de instrumento nº 651255/RJ. Agravante: Spoleto Franchising Ltda. Agravado: Município do Rio de Janeiro. Relator: Ministro Marco Aurélio. Brasília, 28 de abr. de 2009. Diário [da] Justiça Eletrônico, n. 96, 26 maio 2009, Disponível em:
< http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp>. Acesso em: 16 set. 2009.9 BRASIL. Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003. Dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de
Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp116.htm. Acesso em: 16 set. 2009.
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O artigo norteou-se, em seu conjunto, pelo método dialético, ou seja, do
confronto entre uma ideia e sua crítica - entre a tese e a respectiva antítese, buscou-se alcançar
a solução que, neste caso, é chamada síntese.
A TRIBUTAÇÃO DOS CONTRATOS DE FRANQUIA PELO ISS
I. DOUTRINA E PRÁTICA FORENSE
Segundo Gomes, contrato de franquia é “a operação pela qual um empresário
concede a outro o direito de usar a marca de produto seu com assistência técnica para a sua
comercialização, recebendo, em troca, determinada remuneração”10.
Deve-se acrescentar, aqui, que o objeto da franquia não se limita apenas a
produtos, mas alcança, também, uma série de bens e serviços. E o franqueador se obriga a
fornecer ao franqueado assistência técnica e comercial que abrange, também, a publicidade
dos produtos e serviços.
Logo, verifica-se que o contrato de franquia tem natureza complexa por
misturar, na composição da sua tessitura, elementos de diversos contratos nominados ou
inominados o que faz com que se conjuguem nele diversas prestações com variadas
contraprestações obrigacionais bilaterais. Indubitavelmente, o que se destaca com maior
proeminência na franquia é a “concessão, a uma determinada empresa, de marcas de produtos,
devidamente registradas, já perfeitamente conhecidas do público e aceitas por sua qualidade,
seu preço, etc.”11
As atividades de franquia não eram tributadas pelos municípios e os tribunais
afastavam a incidência da regra matriz de incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer
Natureza sob a alegação de que esta atividade não se encontrava prevista em qualquer item da
Lista de Serviços anexa ao Decreto-lei nº 406, de 31 de dezembro de 196812, com redação
10 GOMES, Orlando. Contratos. 18ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 571.11 MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais, 15ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 485.12 BRASIL. Decreto-lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968. Estabelece normas gerais de direito financeiro,
aplicáveis aos impostos sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre serviços de qualquer natureza, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del0406.htm#art9§3.>. Acesso em: 16 set. 2009.
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alterada pela Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 198713. Apenas as atividades de
agenciamento de contratos de franquia figuravam como hipótese de incidência do imposto
municipal e, portanto, eram tributadas.
A Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, trouxe, entre as suas
novidades, a hipótese de incidência do imposto municipal sobre a atividade de franquia que
foi prevista no subitem 17.08 da sua nova Lista de Serviços. Tal fato causou, naturalmente, a
reação do empresariado que logo impetrou diversas ações na tentativa de obstar tal tributação.
Ocorre que o pensamento majoritário da doutrina é contrário à tributação das
atividades de franquia pelo Imposto Sobre Serviços tendo em vista que o art. 156, inc. II, da
Carta Magna de 1988 somente atribuiu competência aos municípios para instituir impostos
sobre “serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei
complementar” 14.
Neste sentido, afirma Barreto:
É inequívoca a intributabilidade, por via de ISS, da atividade de franquia. O franchising (espécie de cessão de direitos) não se subsume ao conceito constitucional de serviços tributáveis por esse imposto municipal; consequentemente, dita atividade econômica não está abrangida pela competência tributária atribuída aos Municípios pela Constituição Federal. A exigência do ISS agride a Carta Magna15.
Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido de forma reiterada
pela incidência do imposto municipal sobre as atividades de franquia16.
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal que, invariavelmente, negava
apreciar a matéria, porque julgava ser o tema de natureza infraconstitucional, em recente
decisão monocrática, modificou seu posicionamento e deu provimento a agravo de
13 BRASIL. Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987. Dá nova redação à Lista de Serviços a que se refere o art. 8º do Decreto-lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, e dá outras providências . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp56.htm>. Acesso em: 16 set. 2009.
14 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.15 BARRETO, Aires F. ISS na constituição e na lei. 2ª ed. São Paulo: Dialética, 2005, p.219.16 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. T2 – Segunda Turma. Tributário. Agravo Regimental. ISSQN.
Franquia. Fato gerador posterior à vigência da Lc n. 116/03 (item 26.01 do anexo). Incidência. Inexistência de declaração de inconstitucionalidade. Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Recurso Especial nº 786861/DF. Agravante: Associação das Franquias de Correios do Distrito Federal - Afranco/DF. Agravado: Distrito Federal. Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Brasília, 18 de dezembro de 2008. Diário [da] Justiça Eletrônico, 13 fev. 2009, Disponível em:<http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=786861&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=2>. Acesso em: 11 dez. 2009.
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instrumento determinando sua conversão em recurso extraordinário, para posterior julgamento
sobre a incidência do ISS nas atividades de franquia.
Observa-se que o Supremo Tribunal Federal acabou por admitir sua
competência para exame da matéria, porque toda dúvida sobre o tema reside na exata
delimitação do objeto do Imposto sobre Serviços, ou seja, é necessário saber se o conceito de
serviço adotado pela Constituição Federal abrange as atividades de franquia.
II. O CONCEITO DE SERVIÇO ADOTADO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
Em tese, o termo serviço pode ser adotado pela Constituição Federal em um
sentido lato ou estrito. O sentido lato refere-se ao conceito econômico de prestação de
serviços que significa a transferência de qualquer bem imaterial. Neste diapasão, para Moraes
serviço “vem a ser o resultado da atividade humana na criação de um bem que não se
apresenta sob a forma de bem material, v.g., a atividade do transportador, do locador de bens
móveis, do médico, etc” 17. Por outro lado, o conceito estrito ou jurídico do vocábulo serviço é
menos abrangente e está associado apenas ao conceito de obrigação de fazer atribuído pelo
direito civil, ou seja, neste caso, a prestação de serviços configuraria apenas fornecimento de
trabalho.
O Supremo Tribunal Federal julgava constitucional a previsão legal de
tributação das atividades de locação de bens móveis pelo Imposto sobre Serviços18, entretanto,
a jurisprudência atual do colendo Tribunal mudou e inclinou-se pela impossibilidade da
incidência do imposto municipal sobre os contratos de locação, por entender não se tratar de
obrigação de fazer, mas obrigação de dar ou entregar não abrangida pela expressão “serviços
de qualquer natureza” constante no art. 156, inc. III, da Constituição Federal, tendo em vista a
17 MORAES, Bernardo Ribeiro de. Doutrina e prática do imposto sobre serviços. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1975, p. 42.
18 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Segunda Turma. Tributário. ISS na locação de bens móveis. O que se destaca, utilitatis causa, na locação de bens móveis, não é apenas o uso e gozo da coisa, mas sua utilização na prestação de um serviço. Leva-se em conta a realidade econômica, que é a atividade que se presta com o bem móvel, e não a mera obrigação de dar, que caracteriza o contrato de locação, segundo o artigo 1.188 do código civil. Na locação de guindastes, o que tem relevo é a atividade com eles desenvolvida, que adquire consistência econômica, de modo a tornar-se um índice de capacidade contributiva do imposto sobre serviços. Recurso não conhecido. Recurso Extraordinário nº 112947/SP. Recorrente: Ideal Transportes e Guindastes Ltda. Recorrido: Prefeitura Municipal de Santos. Relator: Ministro Carlos Madeira. Brasília, 19 de junho de 1987. Diário [da] Justiça, p. 15.439, 07 out. 1987. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudenciaDetalhe.asp?s1=000059259&base=baseAcordaos>. Acesso em: 11 nov. 2009.
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impossibilidade de legislação municipal alterar a definição e o alcance de conceitos de direito
privado, conforme dispõe o art. 110 do Código Tributário Nacional19.
Não obstante, verifica-se que, de fato, a Constituição Federal utiliza o vocábulo
serviço no sentido lato ou econômico do termo em seu artigo 150, § 5º, que dispõe: “A lei
determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que
incidam sobre mercadorias e serviços” (grifo nosso) 20. Assim, o vocábulo “serviços” deste
artigo deve ser interpretado no sentido lato ou econômico do termo, para abranger, também,
as atividades de locação de bens móveis, sem o que, injustificadamente, os consumidores
ficariam sem a garantia constitucional do esclarecimento somente sobre os impostos
incidentes sobre tais atividades. Admitir outra forma de interpretação, ou seja, que aqui,
também, o sentido do vocábulo se limita ao campo mais estrito da obrigação de fazer,
significaria, por conseguinte, presumir, forçosamente, que o § 2º do art. 3º, do Código de
Defesa do Consumidor21 seria inconstitucional ao dispor que “serviço é qualquer atividade
fornecida no mercado de consumo mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária,
financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”,
porque estaria conferindo amplitude maior ao vocábulo do que aquele atribuído pelo direito
privado o que, evidentemente, seria um contra senso.
Logo, do exposto conclui-se que o tema é controvertido, o que justifica a forte
polêmica que existe na doutrina e na jurisprudência sobre o sentido que a constituição confere
ao vocábulo serviço constante no art. 156, inc. III, da Constituição Federal. Mas o deslinde da
vexata quaestio é essencial para delimitação exata do objeto do Imposto sobre Serviços.
III. A TRIBUTAÇÃO DOS CONTRATOS DE FRANQUIA
19 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Segunda Turma. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS. NÃO-INCIDÊNCIA. LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS. 1. O Plenário deste Tribunal fixou entendimento no sentido de que não incide o Imposto sobre Serviços - ISS sobre contratos de locação de bens móveis. 2. Não se configura, no caso, excepcionalidade suficiente a autorizar a aplicação de efeitos ex nunc a declaração de inconstitucionalidade. Precedente. Agravo regimental a que se nega provimento. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 748786/RJ. Agravante:Município do Rio de Janeiro. Agravado: CPM Comunicações, Processamento e Mecanismos de Automação Ltda. Relator: Ministro Eros Grau. Brasília, 18 de agosto de 2009. Diário [da] Justiça Eletrônico, n. 171, 11 nov. 2009. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudenciaDetalhe.asp?s1=000165670&base=baseAcordaos >. Acesso em: 11 nov. 2009.
20 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.21 BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras
providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm>. Acesso em: 11 nov. 2009.
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O contrato de franquia é caracterizado por ser complexo e misto, porque traz
em seu bojo elementos indissociáveis relativos a contratos nominados e inominados, ou seja,
nele encontram-se entrelaçadas obrigações de dar, de fazer e não fazer. A doutrina destaca
diferenças entre as obrigações de dar e fazer quanto ao objeto: na primeira, a prestação
consiste na entrega de uma coisa, certa ou incerta, e na segunda, em ato ou serviço humano
em geral, seja material ou imaterial. Contudo, segundo Gonçalves, “a distinção entre essas
duas modalidades sofre restrições na doutrina contemporânea, a ponto de ser abandonada por
alguns códigos, tendo em vista que dar não deixa de ser fazer alguma coisa”22.
Os elementos constitutivos do contrato de franquia e que caracterizam outros
tipos contratuais são indissociáveis, ou seja, não são autônomos e se houver cisão do conjunto
contratual, o resultado ficará desnaturado e não terá a mesma consideração jurídica.
A obrigação que sobressai no contrato de franquia é a cessão de direitos de uso
de marca ou produto. E entre as obrigações típicas de fazer que podem compor um contrato de
franquia destacam-se: assistência técnica, seleção de pessoal, instrução, treinamento e
assistência quanto aos meios e métodos. Esta última obrigação presente nos contratos de
franquia é que viabiliza a exploração da concessão.
A questão que se coloca é saber o tratamento tributário que deve ser dado à
atividade de franquia. É necessário saber se a atividade é tributável e qual ente federativo tem
competência para cobrar impostos incidentes sobre uma atividade tão complexa como a
franchising que mistura obrigações de dar, fazer e não fazer e que não corresponde aos
conceitos jurídicos tradicionais de circulação de mercadorias, produção ou prestação de
serviços. Aqui não se trata de simples conflito de competência, mas da própria atribuição de
competência.
A Lei Complementar nº 116 de 31 de julho de 2003 arrolou no subitem 17.08
de sua Lista de Serviços as atividades de franquia como suscetíveis de tributação pelo
Imposto sobre Serviços e dispôs em seu art. 1º: “O Imposto Sobre Serviços de Qualquer
Natureza tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que
esses não se constituam como atividade preponderante do prestador”. 23
22 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. volume II: teoria geral das obrigações. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 69.
23 BRASIL. Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003. Dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp116.htm>. Acesso em: 16 set. 2009.
11
Não obstante, para Azevedo:
“A positivação dessa atividade na lista de serviços sujeitos à incidência do ISS, dada pela Lei Complementar nº 116/2003 não tem o condão de legitimar essa tributação, posto que o contrato de franquia é complexo e não se caracteriza por mera prestação de serviço, por nele haver obrigações de diversas naturezas.”24
A mesma problemática verificada quanto à tributação das atividades de
franquia pelo Imposto sobre Serviços existe com relação ao enquadramento tributário das
atividades de leasing, que estão previstas no subitem 15.09 da Lista de Serviços anexa à Lei
Complementar nº 116/2003. Isso ocorre porque o Contrato de leasing como o de franquia
também é complexo e mistura obrigações de dar e fazer. O contrato de leasing é complexo
porque contém elementos dos contratos de locação, compra e venda e financiamento. Neste
caso, o Supremo Tribunal Federal não só admitiu com repercussão geral os Recursos
Extraordinários números 547245/SC e 592905/SC que versavam sobre a constitucionalidade
da tributação das atividades de leasing pelo Imposto sobre Serviços, bem como a maioria dos
ministros julgou constitucional a inclusão do leasing na Lista de Serviços da Lei
Complementar nº 116/2003. O acórdão para o julgamento conjunto dos recursos ainda não foi
publicado, pois a decisão é recente: o julgamento iniciou-se na sessão do dia 04 de fevereiro
de 2009 e foi concluído no dia 02 de dezembro de 2009. O voto divergente foi do ministro
Marco Aurélio que considerou que a operação de leasing representa atividade de locação que
é obrigação de dar não sujeita ao Imposto Sobre Serviços. Em seu voto, o ministro relator
Eros Grau afirmou:
O contrato de leasing é autônomo e caracteriza-se como negócio jurídico complexo resultante da fusão de elementos de outros contratos. [...] Trata-se de serviços assim conceituados por força da própria lei, configurando atividades que em si mesmas não revestem essa natureza, mas que também não exprimem, rigorosamente, a natureza de outro tipo de atividade diferentemente tributada, de tal sorte que, sem aquela definição legal, tais atividades, injustificadamente, ficariam a cobro de qualquer exação fiscal. [...] Em síntese: Há serviços? Sim para os efeitos do inc. III do artigo 156 da Constituição que por serem de qualquer natureza não consubstanciam típicas obrigações de fazer. Raciocínio adverso a este conduziria a afirmação de
24 AZEVEDO, Mariângela Garcia de Lacerda et al. Imposto sobre serviços – de acordo com a lei complementar nº 116/2003. São Paulo: Quartier Latin, p.71.
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que haveria serviços apenas nas prestações de fazer nos termos do que define o direito privado. Note-se, contudo, que afirmação como tal faz tábula rasa da expressão “de qualquer natureza” afirmada na Constituição. [...] A Lei Complementar não define o que é serviço apenas o declara para os fins do inc. III do art. 156 da Constituição, não inventa, simplesmente descobre o que é serviço para os efeitos do inc. III do art. 156 da Constituição Federal.25
Em seguida, o ministro Joaquim Barbosa disse que não lhe impressionava a
argumentação de que haveria um conceito inequívoco para a expressão “serviços de qualquer
natureza” utilizada pelo constituinte originário para definir a competência para instituição do
ISS e completou:
Ainda que se socorra de outros influxos de comunicação jurídica como a dogmática e a jurisprudência, não é possível identificar conceito incontroverso, imutável ou invencível para serviços de qualquer natureza. A segunda dificuldade que vislumbro refere-se à necessidade de interpretação da constituição conforme a legislação ordinária, ainda que existente por ocasião da sua promulgação. Ainda que a legislação ordinária contivesse um conceito universal e unívoco para prestação de serviços de qualquer natureza, o alcance do texto constitucional não é condicionado de forma imutável por ele. De outra forma seria necessário concluir pela possibilidade de estabilização, com força constitucional, da legislação infraconstitucional de modo que haveria confusão entre os planos normativos.26
Posteriormente, o ministro Cesar Peluzo esclareceu:
As dificuldades teóricas opostas pelas teses contrárias a todos os votos já proferidos vêm, a meu ver, de um erro que eu não diria apenas histórico, mas um erro de perspectiva qual seja o de tentar interpretar a complexidade, não apenas da economia do mundo atual, mas, sobretudo, os instrumentos, institutos e as figuras jurídicas com que o ordenamento regula tais atividades complexas, com a aplicação de concepções adequadas a certas simplicidades do mundo do Império Romano em que um certo numero determinado de contratos típicos tinham as suas obrigações perfeitamente explicáveis com base nessa distinção escolástica entre obrigações de dar, fazer e não fazer. O mundo moderno é extremamente complexo para poder ser explicado à luz da
25 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Sessão de julgamento conjunto dos Recursos Extraordinários de nº 547245/SC e 592905/SC. Brasília, 04 de fev. de 2009. Disponível em:<http://www.direitointegral.com/2009/03/iss-leasing-arrendamento-mercantil-stf.html>. Acesso em: 11 nov. 2009.
26 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo STF. Brasília, n. 570, 30 de nov. a 04 de dez. de 2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo570.htm>. Acesso em: 11 dez. 2009.
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economia do mundo romano ou à luz dos institutos que o regiam. O contrato é complexo e envolve uma série de atividades que podem, de algum modo, ser reduzidas na produção individualizada de uma atividade e isso, evidentemente, só pode corresponder, hoje, ao sentido de prestação de serviços.27
Portanto, nota-se que as atividades de franquia somente poderão ser tributadas
pelo Imposto sobre Serviços em duas hipóteses: se o vocábulo serviços constante no inc. III
do art. 156 da Constituição Federal for tomado em seu sentido econômico, ou se forem
consideradas, para fins de tributação pelo Imposto Municipal, as atividades típicas de
prestação de serviços presentes na complexidade do contrato de franquia que fizeram a União,
ao editar a Lei Complementar nº 116/2003, incluir a franquia no item 17 da sua Lista de
Serviços que arrola os “serviços de apoio técnico, administrativo, jurídico, contábil, comercial
e congêneres”28.
CONCLUSÃO
A questão sobre a tributação das atividades de franquia pelos municípios tem
natureza constitucional, porque somente por meio do estudo aprofundado acerca da
competência tributária atribuída pelo texto da Constituição a este ente federativo é que se será
possível determinar quais atividades podem ou não compor a regra matriz de incidência do
Imposto sobre Serviços.
É preciso saber o significado que a Carta Magna atribui ao vocábulo serviço.
Se o significado da palavra serviço for tomado no sentido econômico do termo, não restará
dúvida sobre a constitucionalidade da tributação dos contratos de franquia pelo ISS, entretanto
se o significado do vocábulo ficar restrito ao âmbito do direito privado, somente será possível
a incidência do Imposto sobre Serviços, se a atividade de franquia for considerada obrigação
de fazer com fundamento na complexidade jurídica do seu contrato, que mistura, em sua
27 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Informativo STF. Brasília, n. 570, 30 de nov. a 04 de dez. de 2009. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo570.htm>. Acesso em: 11 dez. 2009.
28 BRASIL. Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003. Dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LCP/Lcp116.htm>. Acesso em: 16 set. 2009.
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tessitura, obrigações de fazer indissociáveis do todo e não somente acessórias, mas que
caracterizam o contrato.
De qualquer forma, verifica-se que compete ao Supremo Tribunal Federal,
como guarda maior da Constituição Federal, dirimir essa questão que envolve matéria
constitucional de repercussão geral.
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______. Supremo Tribunal Federal. Primeira Turma. 1. ISS. Contrato de franquia. Recurso extraordinário: descabimento: controvérsia decidida à luz da legislação infraconstitucional pertinente ao caso: a alegada ofensa ao artigo 156, III, da Constituição, se houvesse, seria indireta ou reflexa, que não enseja o recurso extraordinário: incidência da Súmula 636. 2. Improcedência das alegações de negativa de prestação jurisdicional ou violação dos princípios constitucionais invocados no RE. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 583632/MG. Agravante: Município de Belo Horizonte. Agravado: ACF Minas Centro Serviços Ltda ME. Relator: Ministro Sepúlveda. Brasília, 26 de jun. de 2007. Diário [da] Justiça, p. 40, 17 out. 2007.
______. Supremo Tribunal Federal. Segunda Turma. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS. NÃO-INCIDÊNCIA. LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS. 1. O Plenário deste Tribunal fixou entendimento no sentido de que não incide o Imposto sobre Serviços - ISS sobre contratos de locação de bens móveis. 2. Não se configura, no caso, excepcionalidade suficiente a autorizar a aplicação de efeitos ex nunc a declaração de inconstitucionalidade. Precedente. Agravo regimental a que se nega provimento. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 748786/RJ. Agravante:Município do Rio de Janeiro. Agravado: CPM Comunicações,
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Processamento e Mecanismos de Automação Ltda. Relator: Ministro Eros Grau. Brasília, 18 de agosto de 2009. Diário [da] Justiça Eletrônico, n. 171, 11 nov. 2009. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudenciaDetalhe.asp?s1=000165670&base=baseAcordaos>. Acesso em: 11 nov. 2009.
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