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Políticas nacionais de redução de GEE COP21 Como avançar em Paris - 170 Contribuições da União Europeia para a Redução das Emissões Globais de Gases de Efeito Estufa Cleonir Tumelero Resumo A UE se esforça para deixar o posto de terceiro maior emissor global de GEE. Forte orientação estratégia e financiamento são os viabilizadores da agenda de eficiência energética na UE, dadas suas críticas emissões, de 77%, oriundas da dependência da matriz energética fóssil e de setores correlatos, como os transportes. Por isso, a UE se esforça em convergir o interesse de 28 Estados Membros e tal capacidade lhe confere o status de liderança supranacional em intenções e ações ambientais. Tomando 1990 como ano base e observando o horizonte de intenções até 2020, a UE já reduziu em 19,2% as emissões de GEE, enquanto o PIB cresceu 44% no mesmo período, demonstrando que é possível crescer sem poluir. No horizonte 2020-2030 a UE apresentará na COP21 INDCs propondo redução em 40% sobre o ano-base de 1990. Migrar para uma economia “verde” e de serviços baseados em conhecimento foi a estratégia adotada pela UE para o enfrentamento das mudanças climáticas. As Smart Cities são o centro convergente dessa mudança de paradigma, e estão permitindo que adaptação e mitigação se tornem agendas em ciência, tecnologia e inovação (CT&I), e gerem oportunidades de negócios em todo o continente. Abstract The EU is attempting to leave the position of the third largest greenhouse gas emitter. Strong strategic orientation and financing are the facilitators of the energy efficiency agenda in the EU, given that its critical emissions, 77%, originate from dependency on the fossil fuel energy matrix and related sectors such as transport. Because of this, the EU aims to converge the interest of all 28 member states in its capacity as a supranational leader in intentions and environmental action. Taking 1990 as a baseline and observing the horizon intentions up to 2020, the EU has already reduced its greenhouse gas emissions by 19.2%, while its GDP grew by 44%, showing that it is possible to grow without polluting. On the horizon 2020-2030 the EU will present an INDC aiming to reduce emissions by 40% from 1990 at COP21. Movement to a green economy and knowledge-based industries are the major strategies to be adopted by the EU to confront climate change. The Smart Cities are the convergent point of this paradigm change, and are allowing adaptation and mitigation to become key themes in Science, Technology and Industry (ST&I), and create business opportunities for the whole continent.

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Políticas nacionais de redução de GEE COP21 Como avançar em Paris

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Contribuições da União Europeia para a Redução das Emissões Globais de Gases de Efeito Estufa Cleonir Tumelero

Resumo A UE se esforça para deixar o posto de terceiro maior emissor global de GEE. Forte orientação estratégia e financiamento são os viabilizadores da agenda de eficiência energética na UE, dadas suas críticas emissões, de 77%, oriundas da dependência da matriz energética fóssil e de setores correlatos, como os transportes. Por isso, a UE se esforça em convergir o interesse de 28 Estados Membros e tal capacidade lhe confere o status de liderança supranacional em intenções e ações ambientais. Tomando 1990 como ano base e observando o horizonte de intenções até 2020, a UE já reduziu em 19,2% as emissões de GEE, enquanto o PIB cresceu 44% no mesmo período, demonstrando que é possível crescer sem poluir. No horizonte 2020-2030 a UE apresentará na COP21 INDCs propondo redução em 40% sobre o ano-base de 1990. Migrar para uma economia “verde” e de serviços baseados em conhecimento foi a estratégia adotada pela UE para o enfrentamento das mudanças climáticas. As Smart Cities são o centro convergente dessa mudança de paradigma, e estão permitindo que adaptação e mitigação se tornem agendas em ciência, tecnologia e inovação (CT&I), e gerem oportunidades de negócios em todo o continente.

Abstract The EU is attempting to leave the position of the third largest greenhouse gas emitter. Strong strategic orientation and financing are the facilitators of the energy efficiency agenda in the EU, given that its critical emissions, 77%, originate from dependency on the fossil fuel energy matrix and related sectors such as transport. Because of this, the EU aims to converge the interest of all 28 member states in its capacity as a supranational leader in intentions and environmental action. Taking 1990 as a baseline and observing the horizon intentions up to 2020, the EU has already reduced its greenhouse gas emissions by 19.2%, while its GDP grew by 44%, showing that it is possible to grow without polluting. On the horizon 2020-2030 the EU will present an INDC aiming to reduce emissions by 40% from 1990 at COP21. Movement to a green economy and knowledge-based industries are the major strategies to be adopted by the EU to confront climate change. The Smart Cities are the convergent point of this paradigm change, and are allowing adaptation and mitigation to become key themes in Science, Technology and Industry (ST&I), and create business opportunities for the whole continent.

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Introdução A ciência vem sistematicamente comprovando desde os anos de 1850 as influências antrópicas sobre as condições climáticas do planeta Terra. Há suficientes indícios científicos para comprovação da influência dos gases poluentes, notadamente do carbono, na morte de pessoas por complicações pulmonares. Outros indícios demonstram a influência das emissões de gases, especialmente oriundos da queima de combustíveis fósseis, no aquecimento global. Do aquecimento global acelerado tem resultado a não adaptação e morte de espécies animais e vegetais. Não se trata de cenários hipotéticos, e sim, de fatos observados e vividos. Os efeitos das mudanças climáticas atuais estão muito além daqueles historicamente observados e esperadas para o tempo presente.

As observações científicas são baseadas em tecnologias de navios e de satélites sobre a medição da temperatura dos oceanos. Também são considerados dados de estações de pesquisa da Antárctica e de 6.300 estações meteorológicas ao redor do mundo. As conclusões são de que a média da temperatura da Terra aumentou cerca de 0,7°C desde 1880. Dois terços desse aquecimento ocorreram desde 1975, a uma taxa média de 0.15 to 0.20 °C por década1.

O aumento da poluição causado especialmente pela matriz energética de base fóssil e pelas tecnologias emissoras de Dióxido de Carbono e demais gases poluentes é um paradigma reducionista e polarizado, que justificou o modelo de desenvolvimento econômico social adotado até o presente século, contudo, já não consegue sustentar o desenvolvimento das nações e a coexistência das espécies vivas do planeta Terra.

Do ponto de vista biogeoquímico a Terra é um superorganismo que precisa ser holisticamente cuidado. A ciência vem sistematicamente avançando da integração do estudo das partes com o estudo do todo, ou do holos. Na medida em que a consciência humana alcança patamares inteligíveis sobre sustentabilidade da vida, arranjos científicos expandidos passam a justificar o paradigma holístico. O biocentrismo toma espaço racional nas discussões climáticas e vem paulatinamente instruindo que é a vida o centro lógico do todo. Implica assumir que nenhuma espécie viva possui o privilégio de destruição de outras espécies. É uma premissa básica que deve ser incialmente aplicada aos seres dotados da consciência.

1 Intergovernmental Panel on Climate Change. Climate Change 2014 Synthesis Report Summary for Policymakers

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No enfrentamento do aquecimento global a Conferência das Partes (COP) tem sido fundamental. Esses encontros anuais entre países permitiram que a revisão de intenções e o estabelecimento de regras para adaptação e mitigação das emissões de gases de efeito estufa (GEE) fossem estabelecidos e organizados pela United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC). Profundas discussões estimularam que os equivocados mindsets dos países não apoiadores da causa da redução das emissões dessem espaço a uma melhor consciência de Estado.

Em 2015 acontecerá em Paris a COP21. Será uma oportunidade de mais uma vez os países expressarem seus esforços políticos, econômicos, culturais, e ambientais, na adaptação e mitigação das emissões de gases poluentes.

Ressalva-se a importância de que os países e regiões, maiores emissores de gases poluentes, Estados Unidos, China, União Europeia (UE), Brasil, dentre outros, possam liderar por meio da própria atitude política as agendas de discussão e fixação de metas ambiciosas para as emissões. Na agenda da COP21 destaca-se a formalização das intenções dos países por meio dos INDCs - Intended Nationally Determined Contribution.

Os INDcs representam o que de melhor os países conseguiram politicamente fazer até o momento frente às mudanças climáticas. Embora muitos esforços sejam sabidamente aquém daqueles que os países realmente poderiam fazer, de maneira geral, percebe-se um avanço das intenções ao longo das últimas rodadas de negociação internacional. Intenções precedem as ações para a manutenção das emissões dentro do limite tolerável. Daí a importância da fixação pública dos INDCs.

Na declaração pública dos INDCs destacam-se as intenções da UE. A UE possui a terceira maior taxa global de emissão de GEE é uma das dez regiões mundiais mais afetadas pelas mudanças climáticas. É possível assumir que a UE está desempenhando um papel de liderança rumo à COP21. Trata-se de uma posição aguardada, dada a sua responsabilidade supranacional enquanto bloco econômico e político.

O presente estudo analisa as contribuições da UE para a redução das emissões globais de GEE. Inicia com a descrição do (i) perfil demográfico e socioeconômico da UE. Em seguida são analisadas a (ii) matriz energética, (iii) as fontes de emissões de GEE, os (iv) compromissos para a redução de emissões de GEE para o horizonte pré-2020, (v) os compromissos divulgados sobre o horizonte de emissões pós-2020, (vi) a economia verde frente às emissões de GEE; e, por fim, destacam-se as conclusões do estudo.

1. O perfil demográfico e socioeconômico da União Europeia

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Os esforços da UE para unificação em bloco iniciaram em 1951, a fim de permitir a livre movimentação de produtos, serviços e capital, entre os países pertencentes ao bloco. Atualmente, a UE é composta por 28 Estados Membros: Bélgica, Bulgária, Croácia, República Checa, Dinamarca, Alemanha, Estônia, Irlanda, Grécia, Espanha, França, Itália, Chipre, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Hungria, Malta, Holanda, Áustria, Polônia, Portugal, Romênia, Eslovênia, Eslováquia, Finlândia, Suécia e Reino Unido.2

A UE é um dos principais centros mundiais de irradiação de tendências na educação, na arte, na cultura, e na CT&I. Preserva a importante história evolutiva humana, belezas naturais, culturais, espirituais, econômicas, e políticas, da humanidade. Como berço do Renascimento, abriga a maior parte do Patrimônio Cultural Mundial3.

Os países da UE são a rota aérea mundial mais acessada para escala entre os continentes. Sua posição geográfica é privilegiada em rotas para todos os mares. A UE possui uma área de 4.324.782 km2, 3.102 aeroportos, 461.096 KM de trilhos de trem, 10.582.653 KM de rodovias, e 53.384 KM de vias navegáveis4.

Em nível de bloco, a população é de 508,3 milhões de habitantes. A distribuição populacional por faixa etária segue distribuição equivalente para homens e mulheres e indica acentuado nível de envelhecimento. A UE apresentou em 2014 o segundo maior PIB global, de 18,46 trilhões de dólares, com crescimento de 1,3% em 2014. Do total do PIB, 74,7% são originados por serviços, 23,7% pela indústria, e 1,5% pela agricultura5.

A matriz energética Em nível energético, a UE é terceiro maior produtor mundial, com 3.26 trilhões de kWh. Possui o terceiro maior consumo global, de 2.798 trilhões kWh. É o maior exportador mundial, com 343.9 bilhões de kWh e também o maior importador mundial, com 363.1 bilhões kWh. A matriz energética é predominantemente baseada na geração a partir de combustíveis fósseis: 50,5% da capacidade instalada. Em seguida destacam-se as gerações nuclear, com 13,5%; hidrelétrica, com 16,3%; e de outras fontes renováveis, com 19,6%.6

2 Europe Union. List of Countries 3 United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (Unesco). World Heritage List 4 Central Intelligence Agency. The World Factbook - Europe Union 5 The World Bank. Europe Union Data 6 Central Intelligence Agency. The World Factbook. Europe Union

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A União Europeia é fortemente dependente das importações de energia, em termos de gás, petróleo e eletricidade, provenientes dos países vizinhos do Magrebe, da Rússia, e da Noruega. Países da região Sul, juntamente com Alemanha e Bélgica são os mais dependentes de importação (Figura 1)7.

Figura 1: Comércio Líquido de Energia na UE, 2011

Fonte: ESPON

Projetos de petróleo e gasodutos nos Balcãs atestam a dependência a longo prazo de fontes externas, e também o objetivo de diversificar a oferta. Contudo, fontes de combustíveis fósseis, como os campos de petróleo e gás no Mar do Norte e ao longo da costa da Noruega estão cada vez mais sendo complementadas por produção de energia renovável, através de energia solar no sul da Espanha, e fotovoltaica, no Leste da Alemanha8.

7 European Spatial Planning Observation Network (ESPON). Net Energy Trade 8 European Spatial Planning Observation Network (ESPON). Net Energy Trade

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As fontes de emissões de GEE A UE é o terceiro maior emissor global de GEE, com 4.522 Mt CO2-eq. O setor energético, e suas atividades relacionadas, é isoladamente o principal emissor, respondendo por 77,3% das emissões, considerando a indústria energética (31%), os transportes (19,7%), outros setores (14,9%), as indústrias de manufatura e da construção (11,7%). Complementarmente, a agricultura responde por 10,3% das emissões; processos industriais, por 7,3; resíduos, por 3,1%, emissões fugitivas, por 1,8%; e, outras emissões diversas, por 0,2%. Agregadamente, as emissões totais da UE correspondem a 10% das emissões globais9 .

Na análise da variação das emissões entre os anos de 1990 e 2010, o mapa da Figura 2 sugere que crescimento pode ser dissociado de emissões de GEE, na medida em que se observa que as emissões da UE diminuíram cerca de 19% em relação aos níveis de 1990, enquanto o PIB cresceu 44% no mesmo período.

Em nível geográfico, as cidades da EU são as principais responsáveis pelas emissões de GEE10. Zonas rurais e menos povoadas tendem a ter níveis mais baixos de emissões de GEE. É possível considerar que as emissões de GEE regionais seguem a distribuição regional do consumo de energia final11.

9 European Environment Agency. Total greenhouse gas (GHG) emission trends and projections 10 Cities and Green Growth: A Conceptual Framework 11 European Spatial Planning Observation Network (ESPON). Greenhouse gas emissions

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Figura 2: Emissão de GEE em 201012

Nota: as emissões de GEE são expressas em 1000 toneladas de CO2-eq. O indicador não inclui emissões e remoções

relacionadas a UTMUTF e a partir da aviação internacional e transporte marítimo. O tamanho do círculo indica o volume de emissões em 2010, enquanto a cor se refere à comparação desses níveis de emissão com aqueles de 1990. Quanto mais verde o círculo, maior a diminuição das emissões. Nuances verdes indicam reduções, enquanto nuances

vermelhas indicam aumentos.

Mais especificamente, no período de 1990-2010 foram verificadas reduções maciças de emissões nos países da Europa Oriental, onde os níveis de CO2 estão consideravelmente mais baixos, notadamente na Romênia e nos Estados Bálticos. A redução tem sido alcançada graças à eliminação em grande escala da indústria pesada desses países e à migração para uma economia de serviços. Contudo, alguns países do Sul estão emitindo mais CO2 do que em 199013.

Acordos climáticos e esforços objetivos tem permitido a estabilização das emissões de GEE pelos países da UE em relação ao ano de 1990 (Figura 3). As emissões de CO2 per capita da Europa seguem uma tendência de estabilização. Dados de 2010 indicam uma emissão média de 7,64 toneladas métricas por pessoa. Um índice bem abaixo dos Estados Unidos (17,56), Austrália (16,93), Canadá (14,68), e Rússia (12,23)14.

12 The World Bank. CO2 Emissions Metric Tons Per Capita 13 European Spatial Planning Observation Network (ESPON). Greenhouse gas emissions 14 The World Bank. CO2 Emissions Metric Tons Per Capita

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Tal resultado indica que as metas de emissões assumidas a partir do Protocolo de Quioto, de redução de pelo menos 20% das emissões de GEE até 2020 em relação a 1990, estão sendo cumpridas1315.

Quanto aos cenários futuros, a previsão também é de queda das emissões. O resultado final, de cumprimento ou superação das metas, dependerá da efetividade das políticas definidas e implementadas desde o tempo presente16 .

Figura 3 – Emissões históricas (1990-2010), Projeção atual de emissões (2010-2020) e Emissões futuras (2030-2050)17

Compromisso da UE para a redução de emissões de GEE para o horizonte pré-2020 Dentre as mudanças climáticas e eventos extremos já em curso na União Europeia podem ser destacados os aumentos do nível do mar, de enchentes, do clima seco e quente, de incêndios florestais, de tornados, e a queda da cobertura de neve. Extinção de espécies vegetais e animais, além de duros impactos sobre a saúde humana, especialmente a partir de doenças pulmonares em crianças, são outros fenômenos também observados na UE e cientificamente relacionadas ao aquecimento global causado pelas emissões de gases de efeito estufa (GEE) 18 19 20 21 22 23 24 25.

15 European Commission. Progress Towards Achieving the Kyoto and EU 2020 Objectives 16 PBL Netherlands Environmental Assessment Agency. Enhanced policy scenarios for major emitting countries 17 Climate Action Tracker. Europe Union 18 Intergovernmental Panel on Climate Change. Climate Change 2014 Synthesis Report Summary for Policymakers

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No sentido acima descrito, são notáveis os esforços da UE para adaptação às mudanças climáticas, notadamente no contexto das cidades. No Acordo de Copenhagen a UE propôs de forma independente uma diminuição de 20 a 30% sobre as emissões de 1990 para 2020, e de 80-95% sobre 1990 para 2050. Até o presente momento de 2015, a UE alcançou a redução de 19,2% sobre as emissões de 1990. Tudo indica que reduções de 20-30% serão alcançadas até 202026.

Para a consecução, as principais ações para o horizonte de emissões de GEE pré-2020 da União Europeia estão ancoradas nas metas “20-20-20”, do Pacote de Energia e Clima (PEC). O PEC é um conjunto de leis que visa assegurar que União Europeia cumpra os seus objetivos climáticos e energéticos para 2020. As metas possuem os chamados objetivos "20-20-20", que preveem: (i) redução de 20% nas emissões de GEE aos níveis de 1990; (ii) aumento do consumo de energia produzido a partir de fontes renováveis para 20%; e, (iii) melhora de 20% na eficiência energética da UE27 .

Quatro ações estão sendo adotadas para assegurar a consecução dos objetivos em energia e clima: (i) reformar o Sistema de Crédito de Emissões (SCE) da UE; (ii) definir metas para as emissões não comercializáveis no SCE-UE, de residências, da agricultura, de resíduos, e dos transportes (excluindo aviação); (iii) definir metas para a geração de energia renovável; e (iv) regulamentar tecnologias de captura de Dióxido de Carbono emitido a partir de processos industriais, bem como armazená-lo em formações geológicas subterrâneas28.

As ações ambientais estão sendo politicamente viabilizadas a partir da Política de Coesão, para apoio estratégico e financeiro aos Estados Membros. Destacam-se enquanto viabilizadores das políticas climáticas o mecanismo de financiamento Common Strategic Framework (CSF)29 para adaptação às mudanças climáticas e prevenção de riscos, entre os anos de 2014-2020.

19 American Meteorological Society. State of the Climate in 2013. Vol. 95, No. 7, July 2014. 20 European Environment Agency. Adaptation Strategies for European Cities 21 European Commission. An EU Strategy on adaptation to climate change 22 Department of Urban Studies and Planning-MIT. Progress and Challenges in Urban Climate Adaptation Planning 23 Aerts, Jeroen; Botzen, Wouter. Cities’ response to climate risks. Nature Climate Change. Vol. 4, 2014.

24!European)Environment)Agency.)Climate()ange,(impa.s(and(vulnerability(in(Europe(2012!

25!Van$Renssen,$Sonja.$EU$adaptation$policy$6u8ers$and$starts.$Nature$Climate$Change.$Vol.$3,"2013.!

26 European Commission. Progress Towards Achieving the Kyoto and EU 2020 Objectives 27 European Commission. The 2020 Climate and Energy Package 28 European Commission. The 2020 Climate and Energy Package 29 European Commission. Elements for a Common Strategic Framework 2014 to 2020

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Compromissos divulgados pela UE sobre a redução de emissões de GEE pós-2020 No nível de intenções de emissões determinadas para o horizonte pós 2020, a União Europeia e seus 28 Estados Membros estão empenhados na adoção de um acordo global a ser apresentado na Conferência de Paris, a COP21. Conduzido pela United Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC), o processo de negociação sobre as emissões de GEE, tendo por meta um cenário de aquecimento global inferior a 2°C até o ano de 2050, foi concluído em 2014 e, portanto, antes da submissão dos INDCs em 2015. Nesse sentido, em 6 de março de 2015, a UE comprometeu-se, por meio de seus INDCs, a redução interna de pelo menos 40% das emissões de GEE até 203030 em relação aos níveis de 1990 (UNFCCC, 2015) (Quadro 1).

30 European Commission. Intended Nationally Determined Contribution of the EU and its Member States

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Quadro 1 – Quadro resumido dos INDCs da UE a serem apresentados na COP21 31 Intended Nationally Determined Contribution (INDC)

Tipo Redução absoluta de emissões de GEE a partir do ano base de 1990. Cobertura Redução absoluta em toda a economia a partir das emissões do ano base. Escopo Todos os GEE não controlados pelo Protocolo de Montreal: Dióxido de carbono (CO2), Metano

(CH4), Óxido Nitroso (N2O), Hidrofluorocarbonetos (HFC), Perfluorocarbonetos (PFCs), Hexafluoreto de enxofre (SF6), e Trifluoreto de Nitrogênio (NF3)

Período 1 de janeiro de 2021 a 31 de dezembro de 2030. Redução Pelo menos 40% de redução doméstica em emissões de GEE até 2030. Planejamento Legislação interna juridicamente vinculativa já em vigor para o Pacote de Energia e Clima para 2020;

Legislação existente para UTMUTF (Decisão da UE 529/2013) baseada nas regras contábeis existentes no âmbito do segundo período de compromisso do Protocolo de Quioto; Propostas legislativas para implementar o Pacote de Energia e Clima para 2030, tanto no setor de comércio de emissões quanto no setor não comercializável, a serem apresentadas pela Comissão Europeia ao Conselho e ao Parlamento Europeu em 2015-2016, com base nas orientações políticas gerais do Conselho Europeu

Pressupostos - chave Métricas Aplicadas

Potencial de Aquecimento Global em uma escala de tempo de 100 anos em conformidade com o 4º Relatório de Avaliação do IPCC.

Metodologia para estimação

Orientações IPCC de 2006 e IPCC Suplemento do Protocolo de Quioto de 2013.

Cobertura Energia: Queima de combustível: Indústria energética, Indústrias de transformação e de construção, Transportes, Outros setores, Outros; Emissões fugitivas a partir de combustíveis: Combustíveis sólidos, Petróleo e gás natural e outras emissões provenientes da produção de energia; Transporte e armazenamento de CO2. Processos industriais e uso do produto: Indústria mineral, Indústria química, Indústria metal, Produtos não energéticos de combustíveis e uso de solventes, Indústria eletrônica, Uso de produto substitutos para substâncias que afetam a camada de ozônio (ODS), Outros produtos manufaturados e usos, Outros. Agricultura: Fermentação entérica, Gestão de estrume, Cultivo de arroz, Solos agrícolas, Queimadas prescritas para savanas, Queima de resíduos agrícolas, Aplicação de óxidos de cálcio, Aplicação de ureia, Outros fertilizantes contendo carbono, Outros. Resíduos: Disposição de resíduos sólidos, Tratamento biológico dos resíduos sólidos, Incineração e queima de resíduos a céu aberto, Tratamento de águas residuais e de descarga, Outros Uso da Terra, Mudança no Uso da Terra, e Floresta (UTMUTF) estabelecido na Decisão 529/2013/UE: Florestamento, reflorestamento; Desmatamento; Manejo florestal; Gestão de solos agrícolas; Gestão de pastagens; Ou contabilidade baseada em terra equivalente usando categorias dos relatórios da UNFCCC; Outras categorias/ atividades definidas pela UE e seus Estados Membros como Partes do Protocolo de Quioto e a Rodada de Doha.

31 European Commission. Intended Nationally Determined Contribution of the EU and its Member States

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Para a definição dos INDCs a UE ancorou as metas na observação das emissões passadas, diferentemente de outros países que basearam suas metas para o COP21 em cenários de emissões futuras. O olhar sobre o futuro é obviamente considerado, contudo, as metas da UE vinculadas às emissões do ano base de 1990 demonstram clareza e objetividade, no sentido de que são baseadas em medição científica objetiva e não hipotética. Dito de outro modo, o sistema padrão baseado nas emissões passadas minimiza possíveis distorções na contabilização das emissões e reduções.

Sob o âmbito do escopo, nas intenções anteriormente apresentadas, a UE não considerava toda a economia nos parâmetros de emissões. Portanto, nos INDCs submetidos para a COP21, é considerado extremamente positiva a inclusão das emissões sobre Uso da Terra, Mudança do Uso Terra e Florestas (UTMUTF) (Land Use, Land Use Change and Foresty - LULUCF). Todavia, ainda há falta de clareza na intenção de contabilização, lançando evidências de que a redução proposta, de pelo menos 40%, poderia ser atingida sem a contabilização das emissões em UTMUTF. Em outras palavras, as metas poderiam ser mais ambiciosas ao se considerar o potencial de mitigação da UE. Ainda assim, é um notório avanço e a UE destaca em seus INDCs que as emissões em UTMUTF serão mais bem esclarecidas antes de 2020, na medida em que condições técnicas permitam aperfeiçoar o modelo de mitigação atual. Espera-se que o detalhamento possa ser realizado o mais breve possível, pois se sabe que as intenções e ações da UE servem de guia para outros países.

Sabe-se também, que o uso da terra constitui uma das principais razões para as mudanças ambientais, com impactos significativos na qualidade de vida, nos ecossistemas e na gestão de infraestruturas. É um desafio que envolve vários níveis e áreas de políticas climáticas e ambiental32.

Na UE, o uso da terra está sob intensa transformação e entre os mais intensamente utilizados no mundo. Possui a maior taxa de uso para fixação, sistemas de produção e infraestrutura. A UE possui um padrão biogeográfico importante, com a floresta rural homogênea nos países do Norte e do Báltico. Em contraste, o Sul da Europa é dominado por terras aráveis e uma grande diversidade de paisagens rurais. Ao mesmo tempo, um aumento das economias baseadas em serviço, inovação, conhecimento intensivo, e estilos de vida relacionados, está ocorrendo. Isso intensifica o uso do solo, causa aumento dos valores de propriedades e crescimento nas áreas urbanas33.

32 European Environment Agency. Climate change, impacts and vulnerability in Europe 2012 33 European Spatial Planning Observation Network (ESPON). Land Change Hotspots, 1990-2006

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As mudanças no uso da terra na UE apresentam um declínio continuado da produção econômica baseada na terra, notadamente em agricultura, silvicultura, indústria extrativa mineral, entre outros. Essas mudanças são predominantemente impulsionadas pela trajetória no desenvolvimento socioeconômico que está ocorrendo, devido aos efeitos da globalização e seus efeitos sobre a divisão global do trabalho. Isto tem ocasionado processos de extensificação, resultantes do abandono de antigas zonas de produção quando as condições naturais ou as restrições limitam a competitividade34.

Mudanças no uso da terra podem-se observar mudanças de leste a oeste. Grandes volumes de extensificação do uso da terra são encontrados quase exclusivamente na Europa Central e Oriental, em particular na Polônia, República Checa e Hungria. Grandes volumes de intensificação da terra são especialmente notáveis na Holanda, Bélgica, Espanha, Portugal e Croácia. Algumas das mudanças mais significativas ocorreram na Península Ibérica. A nível regional, a intensificação está associada ao crescimento ou expansão de áreas urbanas e de suas superfícies artificiais associadas. A intensificação também ocorre em maior grau nas regiões costeiras da Espanha, França, Croácia, entre outros. Muito provavelmente isso está relacionado com o crescimento do setor de turismo35.

6. A economia verde frente às emissões de GEE

A economia “verde” é um dos pilares das estratégias ambientais da União Europeia36. A Política de Coesão da UE, por exemplo, objetiva lidar com uma economia de baixo carbono e eficiência de recursos, alocando recursos financeiros para adaptção climática. Isso é especialmente necessário no Sul da Europa, que é a área mais vulnerável às alterações climáticas e têm desempenho econômico “verde” e econômico relativamente menor. Piorando tal situação, é possível assumir que regiões com desempenho econômico menos verde estão mais expostas aos impactos climáticos negativos, na medida em que demoram mais para se adaptar às mudanças climáticas.

Na União Europeia, a economia verde é mais alta nas regiões nos países nórdicos, como um resultado de ativos naturais e ambientais combinados com baixos níveis de emissão. Destacam-se Alemanha, Áustria, Suíça, regiões da Irlanda, Finlândia, Holanda, Reino Unido, França e Espanha. Por consequência, também são as regiões que apresentam maior volume de patentes verdes depositadas European Patent Office (EPO), deixando evidente que desempenho “verde” está relacionado ao desempenho econômico. Por outro lado, as regiões Sul, Oriental e Leste têm um baixo desempenho da economia verde (Figura 4).

34 European Spatial Planning Observation Network (ESPON). Land Change Hotspots, 1990-2006 35 European Spatial Planning Observation Network (ESPON). Land Change Hotspots, 1990-2006 36 Comissão Europeia. Ação Climática

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Figura 4 – Performance Econômica Verde Regional37

Nota: A economia verde é mensurada a partir dos domínios territorial, econômico, ambiental,

social e da econosfera.

Em geral, regiões urbanas tendem a ser mais fortes no desempenho econômico verde do que as regiões rurais, embora as diferenças sejam relativamente pequenas. No domínio da econosfera, o desempenho das regiões nórdicas é alto, em razão da alta produção econômica por unidade de energia utilizada. Por outro lado, as regiões do Sul sofrem pela elevada exposição à poluição do ar, e a região Leste sofre pela baixa expectativa de vida. Isso explica o baixo desempenho destas regiões no domínio social e no desempenho econômico global verde38

37 European Spatial Planning Observation Network (ESPON). Tipologia da Performance Econômica Verde Regional 38 European Spatial Planning Observation Network (ESPON). Tipologia da Performance Econômica Verde Regional

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Ações políticas de suporte à migração para a economia verde combinam dois objetivos de crescimento sustentável na UE: (i) "União da Inovação39", que visa criar ambientes propícios à inovação e compartilhar conhecimento entre pequenas e médias empresas (PMEs), grandes empresas, universidades e outros institutos de ciência e tecnologia (ICTs); e, (ii) “Eficiência de Recursos40”, que visa dissociar o crescimento econômico do consumo de recursos e energia e modernizar processos de produção industrial em PMEs.

Os resultados de tais políticas podem ser observados por meio das patentes e do aumento da capacidade tecnológica dos países, estratégias governamentais e corporativas, fundamentais para viabilizar as intenções para o enfrentamento das mudanças climáticas. Há, dessa forma na UE, a emergência de “tecnologias verdes” (“greentech”). Tecnologias verdes são consideradas pela OCDE como patentes em: (i) veículos eletrônicos e híbridos, (ii) eficiência energética nos edifícios e iluminação, (iii) geração de energia renovável, (iv) redução da poluição, (v) poluição da água, e (vi) gestão de resíduos41.

As tecnologias verdes possuem a função de melhorar a competitividade regional e global, através do desenvolvimento e uso de produtos e processos eficientes. Essas tecnologias permitem a utilização sustentável dos recursos naturais e a redução da exposição aos choques externos, como as alterações climáticas e eventos climáticos extremos42 43.

Conclusões Os países da União Europeia já estão sofrendo as consequências das mudanças climáticas e dos eventos extremos. A redução das emissões de GEE pela União Europeia e demais países de todo o mundo é indicada tanto como opção de para a mitigação das alterações climáticas quanto para objetivos mais amplos de desenvolvimento econômico, incluindo oportunidades de negócio e resultados de eficiência mais elevados. Por isso, manter a coesão em nível econômico e político em favor de 28 países aumenta a responsabilidade da UE de liderar a agenda climática. A UE demonstra sua capacidade de coesão ao financiar países menos desenvolvidos a adotar rotas tecnológicas de baixa ou nula emissão de GEE.

39 European Commission. State of the Innovation Union 40 European Commission. A resource-efficient Europe 41 Cities and Green Growth: A Conceptual Framework 42Cities and Green Growth: A Conceptual Framework 43 Cities and Green Growth: A Conceptual Framework

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Sabe-se, contudo, que as metas de redução da União Europeia estão condicionalmente ligadas aos esforços dos outros países, notadamente dos mais desenvolvidos como Estados Unidos, Japão e Canadá, e daqueles em desenvolvimento, como Brasil, China, Índia, México e Rússia. Portanto, é de cada nação a responsabilidade pela agressão ambiental das tecnologias produzidas, utilizadas ou vendidas para outros países. É saliente o papel da China nesse contexto. Ao se empoderar política e economicamente a partir de sua capacidade produtiva, especialmente devido aos seus conhecidos recursos de mão de obra, a China assume grande responsabilidade sob a sustentabilidade do sistema tecnoindustrial mundial. Todavia, essa responsabilidade também é diretamente aplicável às nações e empresas que decidiram pela construção de seus parques produtivos na China. Tal premissa é válida para a União Europeia, notadamente considerando a recente desindustrialização dos países do Leste Europeu.

Do pensamento global devem emergir as ações locais. Orientação estratégia e financiamento são parte fundamental da agenda climática da UE, especialmente em eficiência energética, uso de energias renováveis e uso de técnicas de produção menos intensivas em emissões de GEE. Subsídio estratégico financeiro está permitindo que ações locais na UE definam barreiras alfandegárias, no sentido de inibir importações de produtos não sustentáveis ambientalmente. Já em nível de apoio financeiro aos Estados Membros é corrente o financiamento aos países menos desenvolvidos, os quais inclusive possuem o maior potencial para redução das emissões de GEE.

Ademais, restrições à atividade produtiva poluidora estão sendo cada vez mais adotadas na UE. É a maneira pela qual o Bloco desempenha de forma objetiva o seu papel de regulador ambiental e de controle das emissões. Paralelamente, políticas de crescimento sustentável e de uso eficiente de recursos são prioritárias para UE, visando tornar a economia menos dependente do consumo de energia, produzindo mais energia a partir de fontes renováveis, e evitando altas emissões de GEE.

Por seu impacto nas emissões, o cenário energético da UE é o mais preocupante na agenda das emissões de GEE. Destaca-se O Pacote Energia e Clima 2020, que dentre diversas ações, visa limitar as importações de combustíveis fósseis, notadamente a partir da Rússia, promovendo a aumento das energias renováveis e a eficiência energética de residências, edifícios, do transporte, e da indústria.

Neste ano corrente de 2015, o baixo preço do petróleo está sendo um impedimento para investimentos em energia renovável, e uma causa para a disfunção do Sistema de Comércio de Emissões. No entanto, a segurança energética e a competitividade estão sendo suportados por investimentos alocados em projetos de interligação energética da UE e demais países europeus.

Os governos locais estão alinhados aos objetivos de aumentar a independência energética através da promoção da economia de energia ou do aumento das interligações entre a produção, distribuição e utilização de energia na UE. Apoio a projetos de energia renovável em regiões menos desenvolvidas são práticas que vem sendo financiadas, especialmente na conversão de resíduos de biomassa.

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O setor de transportes também preocupa as políticas de coesão, em razão de apresentar a segunda maior taxa de emissões de GEE na União Europeia. Mais de dois terços das emissões estão relacionados com o transporte rodoviário. Assim, os setores energético e do transporte emitem 51,8% dos gases poluentes totais na Europa. Por serem atividades econômico sociais críticas, tais setores estão recebendo políticas objetivas de regulamentação e apoio à viabilização econômica de tecnologias de baixo ou nulo carbono, tanto em produtos quanto em processos limpos. No centro dessas ações estão as cidades, as quais são ao mesmo tempo, polos de maior emissão de GEE e vetores estruturantes das ações de adaptação e mitigação das mudanças climáticas.

Na União Europeia, cerca de 80% das pessoas vivem em cidades, na sua maioria, próximas aos oceanos, logo, são críticos os cenários futuros de maior degelo polar e de elevação do nível dos mares. Há uma grande desvantagem para as cidades europeias no aumento global das temperaturas. Essa realidade aumenta a responsabilidade do homem urbano sobre a sustentabilidade do aglomerado cidade, principalmente sobre o direito de ir e vir e contribuir para os contextos em que vive.

No cenário da sustentabilidade destacam-se ações ambientais nas cidades europeias como Londres, Paris, e Berlin, que hoje podem ser chamadas de Smart Cities. O aumento da inteligência digital das cidades da UE está sendo uma importante forma de enfrentamento das emissões encontrada pelos países. Interconexão digital, alto uso de tecnologias verdes, governança participativa, e maior consciência sobre o consumo, são algumas características dessas cidades. Possuem, não somente a responsabilidade de conectar digitalmente as pessoas, mas também de educá-las na travessia para a consciência sobre o consumo e, portanto, sobre a sustentabilidade ambiental do planeta. Educando os cidadãos residentes espera-se que a cultura de sustentabilidade acolha as constantes levas de outros cidadãos que estão saindo do campo e chegando às cidades.

Por tudo isso, as cidades europeias desempenham um papel crucial para atingir os objetivos de crescimento e de emissões de GEE toleráveis estabelecidas pelas diversas políticas e convenções do clima. Nesse sentido, um mínimo de 5% dos recursos do Fundo de Desenvolvimento Regional Europeu (FDRE) de cada Estado-Membro devem ser investidos em ações integradas de resiliência urbano sustentável. Avançar nos níveis de neutralização das emissões de GEE e se reaproximar da natureza verde já são metas objetivas de muitas cidades da UE.

Além dos esforços energéticos e em transportes, os avanços tecnológicos na UE podem ser observados na substituição da madeira por tecnologias de materiais ecológicos, na substituição de agrotóxicos da base química tradicional pelos da base renovável. Outros importantes avanços tecnológicos são observados em peso, medidas, reuso, e reciclabilidade de materiais, e na contenção das emissões de GEE no processo produtivo em cadeia e no uso final.

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Resumindo, observam-se avanços na maturidade do sistema nacional de ciência, tecnologia e inovação (SNCT&I) dos países da UE. Mudanças climáticas e eventos extremos parecem ser “recados” para que universidades/ ICTs, governo, e empresas, despertem para o diálogo com o todo, com os entornos, com o que está abaixo e com o que está acima, com o que está em todo lugar.

A economia verde tem forçado a inovação sustentável nos países da UE. Parece estar claro que inovação distante da necessidade de preservação da vida é um trabalho vazio e sem herança, e que não há sentido em regredir. A inovação que agora deve comandar é aquela que permite a adaptabilidade dos países às mudanças climáticas. A adaptabilidade é a ponte para a neutralidade das emissões de GEE. Note-se por este estudo, que adaptação está fortemente baseada na migração para uma plataforma energética menos poluente e dependente de combustíveis fósseis.

Vive-se um tempo decisivo sobre a consciência de que o custo da inação sobre as externalidades superará em muito o custo das imediatas ações dos países no enfrentamento das emissões. É, dessa forma, evidente a necessidade de limitar até o final do século XXI o aumento das temperaturas globais a 2ºC, acima dos níveis pré-industriais. No caso da UE, já há consenso de que as metas climáticas definidas a partir do Protocolo de Quioto serão atingidas. Contudo, o progresso observado em suas políticas climáticas permite considerar que uma trajetória mais ambiciosa pode ser traçada para o horizonte 2020-2050. Caberá à própria União Europeia decidir se suas políticas devem ser lembradas pelo cumprimento exato ou pela superação das metas de emissões futuras.