Controle preciso da 2004.03.pdf · Paulo Molin, coordenador do Projeto AP ... cendo uma...

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Sistema de posicionamento ...... Controleprecisoda produtividade Altos custos e falta de mão-de-obra qualificada emperram o avanço da tecnologia de agriculturade precisão em território nacional ~ A agricultura brasileira deve gran- de parte de seu sucesso recente à pesquisa e aos investimentos em novas tecnologias. Éo que impulsionou o crescimento de quase 50% na produ- ção de grãos nos anos 90 sem que a área de plantio fosse aumentada. Os resulta- dos poderiam, contudo, ser ainda mais positivos, já que imensa parte dos agri- cultores brasileiros ainda não lança mão de uma série de recursos já disponíveis no mercado e usados em larga escala pelos concorrentes Estados Unidos e União Européia. Vide o caso da agricultura de preci- são (AP), um pacote cujo consumo ain- da engatinha no país seis anos depois de seu desembarque na lavoura nacional. Aplicada com freqüência por um seleto grupo de 5% dos agroempreendedores brasileiros-estima-seque 12%jáa expe- rimentaram em suas plantações-, a tec- nologia é baseada em uma máxima tão simples quanto antiga: a de não tratar como igual coisas diferentes. Explican- 14 . www.agrinova.com.br do: em uma fazenda com milhares de hectares, as extensões de solo apresen- tam manchas com característicasvaria- das, determinantes da capacidade pro- dutiva de cada talhão, ou sítio, como gostam de dizer os americanos. Mais ou menos carentes de certos nutrientes, essas zonas podem produ- zir melhor sob intervenções humanas que atendam às suas necessidades específicas ou até mesmo dispensar a

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Sistema de posicionamento

.......

ControleprecisodaprodutividadeAltos custos e falta de mão-de-obra qualificada emperramo avanço datecnologia de agriculturade precisão em território nacional

~

Aagricultura brasileira deve gran-de parte de seu sucesso recente àpesquisa e aos investimentos em

novas tecnologias. Éo que impulsionouo crescimento de quase 50% na produ-

ção de grãos nos anos 90 sem que a áreade plantio fosse aumentada. Os resulta-dos poderiam, contudo, ser ainda mais

positivos, já que imensa parte dos agri-cultores brasileiros ainda não lança mãode uma série de recursos já disponíveisno mercado e usados em larga escalapelos concorrentes Estados Unidos eUnião Européia.

Vide o caso da agricultura de preci-são (AP), um pacote cujo consumo ain-

da engatinha no país seis anos depois deseu desembarque na lavoura nacional.Aplicada com freqüência por um seletogrupo de 5% dos agroempreendedoresbrasileiros-estima-seque 12%jáa expe-rimentaram em suas plantações-, a tec-

nologia é baseada em uma máxima tãosimples quanto antiga: a de não tratarcomo igual coisas diferentes. Explican-

14 .www.agrinova.com.br

do: em uma fazenda com milhares de

hectares, as extensões de solo apresen-tam manchas com característicasvaria-

das, determinantes da capacidade pro-dutiva de cada talhão, ou sítio, comogostam de dizer osamericanos.

Maisou menos carentes de certos

nutrientes, essas zonas podem produ-zir melhor sob intervenções humanasque atendam às suas necessidadesespecíficas ou até mesmo dispensar a

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Molin,da ESALQ:o avanço daagricultura de precisão no país vaidepender da queda do custo final

aplicação de quantidades exageradasde fertilizantes, por exemplo. Aindahoje, contudo, muitos produtores cal-culam que quantidades e qualidadesde insumos são aplicadas na fazendapor uma média obtida de amostras detoda a propriedade, desconsiderandosuas particularidades.

De um total de mais de 50 milhões

de hectares entre as áreas de grãos ecana, que concentram o usoda tecnolo-gia,apenas 150milhectares são planta-doscom a divisãopor zonas. Resultado:desperdício de recursos, potencial deprodutividade subexplorado e perda decompetitividade. "Faz-se agriculturapela média, porque é mais prático,cômodo, mastemos de observar que aslavouras são diferentes, aprender agerenciar as desconformidades e tirarproveito disso", afirma o professor JoséPauloMolin,coordenador do ProjetoAPna EscolaSuperior de Agricultura Luizde Queiroz(Esalq/USP),de Piracicaba/SP.

O gerenciamento da aplicação defertilizantes, sementes e defensivos é o

carro-chefe da agricultura de precisão no

Brasil,mas astecnologias abrangem umagama de possibilidades muito maior,como o monitoramento da produtivida-de. Por meio da geração de mapas, o agri-cultor tem a possibilidade de saber oquanto determinado talhão está produ-

zindo. A partir daí, pode trabalhar de for-ma mais precisa suas estratégias nas áreas

menos produtivas ou mesmo deslocarinvestimentos para asde maior poten-cial. Trata-se,contudo, de umtrabalholongo de análises. "Podem ser necessá-rios cerca de cinco anos para estudartodos os dados gerados pelo sistema eentender bem o funcionamento da

lavoura", explica o especialista de pro-

. dutos da Case IH, Nilson Righi.A necessidade de aprofundamento

nas informações geradas pelo monitor

de produtividade desestimulou algunsprodutores que compraram a APcomo

uma revoluçãosimpleseautomatizada."Nem a importância, nem a forma deutilizar adequadamente o pacote tec-

nológico foram assimiladas pelos pro-

Produtoresnãoassimilarama

importânciaeaformadeuso

adequadadaAP

dutores. o agroempreendedor no Bra-sil não tem paciência para ficar horassobre dados", explica. Por isso, as pou-cas colheitadeiras equipadas com o hard-

ware capaz de gerar osmapassãosuba-proveitadas por algunsprodutores, queinvestiram até US$10 mil no monitor

sem usar as informações que gera. "Esse

é um mercado que estagnou, não evo-

luiu", desaponta-se Molin. Uma das

exceções é a Usina Açucareira Guaíra,

localizada no município paulista de mes-mo nome. Com cerca de 20 mil hectares

r

destinados ao cultivo de cana-de-açúcar,a empresa é uma das mais avançadas no

país no uso de agricultura de precisão.

Desde 2002, a companhia testa um

protótipo - o único do Brasil-desenvol-

vido pela CaseIH para o monitoramento

da sua produtividade. Os primeiros resul-tados devem sair ainda neste ano. O

gerenciamento de insumos, contudo, jádemonstrou seus frutos. A Guaíra eco-

nomiza cerca de 10% na aplicação decalcário no solo, o que representou, em

uma safra, o pagamento de todo o inves-timento na tecnologia. A redução fica

dentro das expectativas de Molin, segun-

do o qual experiências demonstram que

a redução de gastos com insumos, prin-

cipalmente fertilizantes, pode variarentre 10% e 20%.

Já a Usina Jales Machado, em Goia-

nésia, no interior de Goiás, apresentou

resultados ainda mais expressivos: eco-

nomia de 38,8% na aquisição de fósfo-ro e 34,4% na de calcário, que compen-sou em duas vezes o total investido com

infra-estrutura e mão-de-obra para AP."Avançamos muito com a aplicação deinsumos. Édifícil fazer uma média dos

ganhos, mas é certo que, quanto mais

heterogêneo o solo, maior a vantagem

da agricultura de precisão", explica Leo-

nardo Menegatti, diretor da APagri, con-sultoria responsável pela aplicação dos

procedimentos de AP na Guaíra e naJales Machado.

Com o advento da nova tecnologia,em ritmo ainda lento, consultorias como

a APagri devem multiplicar-se no país.Hoje,já existem entre 10e 12delas emterritório brasileiro. "Aagricultura deprecisão não foi feita para o usuáriofinal, esim paraosconsultores", explicaMolin. A empresafoi criada em maio de2002, dentro da Esalq/USP,e já atendemais duas usinas de açúcar e álcool(Colombo e Cerradinho). Além disso,acompanhia já possuiclientes em MinasGerais,Maranhão eparaguai. EmPalmi-tal, no interior de São Paulo, 12fazen-

das, entre pequenas e médias, contrata-

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ecnologia Sistema de posicionamento

ram serviço de coleta de solo por amos-

tragem em grade e correção por zonaem toda a propriedade.

O controle de insumos exige a ado-

ção de um pacote básico de equipamen-tos e procedimentos, que irão permitir acoleta e a tabulação dos dados, ofere-cendo uma "radiografia" ao produtor.Basicamente, são necessários um apa-relho dotado de GPS (Sistema de Posi-

cionamento Global), plataformasmóveis, softwares e máquinas agrícolas

compatíveis com o sistema de AP.O pro-cesso começa com a retirada de amos-tras de solo a distâncias que variam deacordo com o tamanho da propriedade- "entre dois e cinco hectares", sugere

o professor da Esalq. O GPS registra alocalização da extração, logo registra-da no computador na forma de um pon-to - a seqüência de pontos, na tela docomputador, gera uma grade, transfor-

mada em mapas por um Sistema deInformação Geográfica (SIG),um soft-ware que reproduz a visão espacial dasinformações coletadas.

Com o resultado das amostras ana-

lisadas em laboratório, o SIGgera ummapa de intervenções, com informaçõessobre as necessidades de correção quecada zona tem. Existeuma variedade de

ofertas desses programas, "desde oscaríssimos, até os de domínio público",

segundo Molin.As 'intervenções' sãofei-tas por máquinas compatíveis com essa

tecnologia, com regulagem automáticapara a saída do insumo. Este pacote bási-co de AP custa em média R$ 22,00 por

hectare (serviço de coleta de amostras eanálise dos dados), além do valor empre-

gado nas máquinas para aplicação-cer-ca de R$ 30 mil - com capacidade decobrir até 3 mil hectares/ano.

o controle deinsumos exige a

adoção de umpacote básicodeequipamentos

Já a geração de mapas de produtivi-dade envolve custos mais altos e investi-

mentos de longo prazo - cerca de US$9mil por máquina. Além disso, para cada

colheitadeira, o agricultor tem de pagarcerca de US$ 1.500 anuais pelo uso doDGPS(Differential Postioning System),um corretor diferencial do sinal do GPS.

Isso porque o sistema tem uma margemde erro proposital, da ordem de metros,criado durante a Guerra do Golfo pelosnorte-americanos. O DGPSreduz esse

erro para cercade quatro polegadas (10centímetros). Alguns sistemas de locali-zação, já disponíveis no Brasil,vêm dota-dos de um software que reduz a falha

com menor preci-são que o DGPS.Devalor estimado

em US$700, repre-sentam a alterna-tiva de melhor cus-

to-benefício, na

opinião de Molin:"O uso do DGPStorna o custo da

operação inviá-vel", afirma. NosEstados Unidos,

produtores jáusam uma antena

Mapa gerado pelo 51G:indicações das áreas maiscarentes de calcário

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estacionária, que reduz o erro de metros

para uma polegada. O custo da estrutu-ra-cerca de US$100 mil-está, contudo,fora da realidade brasileira.

Os altos valores dos monitores de

qualidade, diante de um mercado queainda não acordou para a tecnologia,inibiram os fabricantes de máquinas

agrícolas no Brasil,que fazem pouca pro-moção de seus produtos nessa linha. Deacordo com Righi, as empresas do setortêm preferido apostar nos sistemas denavegação por barra de luz - vedeteentre os produtores. Orientados pelo

GPS, plantadeiras e pulverizadoresganham mais precisão e podem ser utili-zados tanto de dia como de noite.

Não apenas os altos va lores de inves-timento, mas a falta de mão-de-obra qua-

lificada também é, na opinião quase unâ-nime dos especialistas do setor, um entra-

ve para o avanço da agricultura de preci-são no Brasil."Simplesmente, falta mate-

rial humano para entender os mapas",afirma Menegatti. De acordo com Molin,omercadodeAP no Brasilnão possui maisque 50especialistas. "Talvezmais uns200

estivessem aptos a entrar para esse mer-cado", explica o professor. "Temos inves-

tido na qualificação de profissionais e empesquisas que gerem alternativas maisbaratas", informa.

Molin acredita que os custos da AP

poderiam cai r pela metade se a tecnolo-gia empregada fosse nacional. "Os kitspara equipar os sistemas de bordo, quepodem significar um investimento de R$30 mil, não sairiam mais do que R$ 15mil", calcula. Um dos próximos passos é

a criação de sensores de solo que dispen-sem as caras análises laboratoriais do

solo. Só a Case já investiu, em uma par-ceria com a Esalq, Fundação ABC, doParaná, mais de US$200 mil em pesqui-

sa de modelos que sejam adequadas àrealidade brasileira. "Sem dúvida, o

avanço da agricultura de precisão no país

vai depender da adoção de novas tecno-logias que barateiem o custo final dasoperações", sentencia Molin. (G.F.J.).