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    JAZ UM PLANEJAMENTO? O ENFRAQUECIMENTO DO PLANEJAMENTO ESTRATGICO DE LONGO PRAZO NA ERA CONTINGNCIAL: ANLISES A PARTIR DA PARADIGMA DA COMPLEXIDADE E DA TEORIA DO CAOS.

    Igor Martins1 [email protected]

    Alex Bruno Ferreira Marques do Nascimento2 - [email protected]

    Douglas Moraes Bezerra3 - [email protected]

    Resumo

    O presente ensaio dedicado a relacionar o mundo complexo e a teoria do caos com a perda da potencialidade instrumental do planejamento estratgico tradicional, este com seu enfoque mais utilizado, as de projees em longo prazo. As atitudes instrumentais, comuns aos gestores foi abordada como herana da revoluo da cincia moderna, principalmente baseado no pensamento iluminista. Os estudos de Edward Lorenz e os conceitos sobre complexidade de Morin sero base para o entendimento das mudanas que o mundo atual vem sofrendo, impossibilitando as previses que no sejam em curto prazo. Sendo assim, pensamentos inovadores e contingenciais assumem o papel central na tomada de decises, as organizaes devendo assumir um papel de fomentador da criatividade com as atitudes contingenciais preponderantes para sobrevivncia em um mundo turbulento como o de hoje. A proposta do artigo expor argumentos capazes de proporcionar futuras discusses relacionadas a necessidade de transpor a racionalidade dita limitada e expor um modelo de planejamento estratgico situacional capaz de interagir com as constantes mudanas organizacionais, deixando uma linha de pensamento provocadora aos leitores e principalmente aos administradores mais conservadores. Palavras-Chave: Estratgia. Organizaes. Planejamento Tradicional. Complexo. Catico.

    Abstract This paper is devoted to relate the complex world and chaos theory with the potential loss of traditional instrumental in strategic planning, this approach with its most used, the long-term projections. The instrumental attitudes, common to managers has been approached as a legacy of the revolution of modern science, especially based on Enlightenment thought. Edward Lorenz's studies and the concepts of complexity Morin will be the basis for understanding the changes that the world today is suffering, precluding predictions that are not in the short term. Therefore, innovative thinking and contingency assume the central role in decision-making, organizations should assume a role of promoter of creativity with the attitudes prevalent contingency for survival in a turbulent world like today. The aim of this paper is to present arguments capable of providing future discussions regarding the need to bridge the so-called limited rationality and expose a situational strategic planning model capable of interacting with the constant organizational change, leaving a line of thought provoking to the readers and especially administrators more conservadores. Keywords: Strategy. Traditional Planning. Complex. Chaotic.

    1 Professor Mestre de Administrao da UEPB Campus VII - Rua Alfredo Lustosa Cabra, s/n.

    Salgadinho CEP: 58706560 - Patos, PB - Brasil [email protected] 2

    Professor Mestre de Gesto Pblica da UFCG - Campus CDSA, Rua Luiz Grande, s/n. CEP 58540-000 / Sum, PB Brasil [email protected] 3 Professor Mestre do Departamento de Administrao da UFPI - Campus Universitrio Ministro

    Petrnio Portella - Bairro Ininga - Cep: 64049-550 / Teresina-PI Brasil - [email protected]

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    1. Introduo

    Com o advento da globalizao e dos avanos tecnolgicos, todas as

    fronteiras, sejam as de mercado, ou mesmo sociais, vem sofrendo um estreitamento

    e massivas relaes de mudanas.

    O planejamento estratgico tradicional amplamente utilizado nos meios

    organizacionais est diretamente ligado a viso e misso institucional, predizendo

    objetivos e metas para longos perodos, geralmente mais de cinco anos

    (MINTZBERG, 2008). Este instrumento determinstico foi difundido no meio

    organizacional, porm tem revelado pontos de ineficincia diante um mundo cada

    vez mais inserido no contexto da complexidade e contingncia. Cenrio este

    caracterizado por mutaes e/ou distrbios, tanto internos como externos, e

    percebidos em toda a cadeia econmico-social do globo.

    Para Morin (1998) essa complexidade pode ser traduzida por uma extrema

    quantidade de interaes e de interferncias entre um nmero muito grande de

    unidades que desafiam nossa possibilidade de clculo; mas a complexidade

    abrange tambm indeterminaes e fenmenos aleatrios, que convivem com uma

    parte de incerteza, seja na dimenso do nosso entendimento ou inscrita nos

    fenmenos.

    Aliado a esta premissa da complexidade h um dos conceitos-chave da Teoria

    do Caos, o qual afirma que diante da impossibilidade de se fazer previses de longo

    prazo, so necessrias uma adaptabilidade s condies momentneas e uma

    rpida reao s adversidades impostas pelo ambiente. Alm disto, ela prev a

    possibilidade de se guiar por padres e leis simples, ainda que estes no

    determinem a possibilidade real de se fazer previses exatas, como afirma Wood

    (2008):

    [...] a Teoria do Caos est ligada descoberta de padres e leis razoavelmente simples que governam uma srie de fenmenos complexos. No se confunda, porm, esta existncia de padres com a possibilidade de previso. Uma caracterstica dos sistemas caticos que qualquer mnima alterao em uma das suas condies iniciais pode provocar profundas mudanas de trajetria ou comportamento. (WOOD, 2008, p. 36).

    A atuao na fronteira do caos e da complexidade exige organizaes capazes

    de operar com dinamismo, criatividade, flexibilidade e abertura para mudanas nem

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    sempre previstas ou antecipadas. Partindo deste pressuposto, as organizaes

    devem planejar suas aes e projees futuras de maneira mais pontuais e de curto

    prazo, necessitando assim, promover o pensamento estratgico situacional em

    detrimento ao antigo planejamento, arraigado de determinismos irreais.

    Partindo do contexto apresentado, este ensaio objetivou atravs de uma

    pesquisa bibliogrfica, traar uma construo lgica para, em um cenrio

    contingencial, explicar o enfraquecimento do uso do planejamento estratgico

    tradicional de longo prazo como ferramenta de competitividade nas organizaes

    sob a luz da Teoria do Caos e Teoria da Complexidade.

    Seguindo uma tendncia contempornea da Administrao como cincia, o

    artigo dialogou com autores de diversas reas, como o marketing, filosofia,

    sociologia, cincias exatas, das escolas do planejamento, alm de outros;

    mostrando assim, a capacidade de se estreitar as diversas reas do conhecimento

    na busca por respostas para as investigaes cientficas. Mesmo com os seus

    arcabouos sendo epistemologicamente construdos por linhas diferentes, a

    interdisciplinaridade mostra que possvel relacionar cincias diferentes em um

    mesmo discurso. Contudo, advirta-se que a interdisciplinaridade deste artigo se

    limita s contribuies de cada cincia para o debate, e, sendo assim, o trabalho no

    tem a pretenso de colocar no mesmo espectro de anlise a natureza e

    procedimentos metodolgicos das cincias aqui abordadas, pois se sabe que as

    cincias clssicas (cincias exatas, por exemplo) e as fticas (humanas, por

    exemplo) possuem caractersticas singulares que no podem ser totalmente

    aglutinadas.

    Uma vez destacada esta ressalva metodolgica, vislumbra-se a Administrao

    como uma das reas que historicamente tem seguido uma abordagem

    multifacetada, o que tem funcionado como uma ampliao horizontal de seus

    estudos.

    Outra ressalva necessria a se fazer nesta introduo a conscincia de que o

    planejamento tradicional aqui abordado como enfraquecido tem que ser relativizado,

    pois esse instrumento determinstico ainda pode alcanar resultados significativos

    em uma condio de estabilidade, pouco mutvel e com indicadores certamente

    conhecidos. Partindo deste pressuposto o presente ensaio tem um foco nas

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    condies que seriam afetadas pelas contingncias e turbulncias caractersticas

    desta era informacional que vivem as organizaes.

    O artigo est organizado da seguinte forma: a primeira parte demonstra a

    origem da forma de pensar determinstica e funcional tpicos das organizaes

    formais orientadas pelo paradigma positivista; a segunda mostra o momento em que

    o planejamento estratgico de longo prazo se posicionou como referncia na

    previso das metas organizacionais; na terceira o enfraquecimento desta forma de

    se planejar, fazendo uma relao mais estreita com a Teoria do Caos e com a

    Teoria da Complexidade para explicar os motivos do declnio deste modelo; por fim,

    as consideraes finais desta pesquisa, onde se apresenta o planejamento

    estratgico situacional (PES) como opo metodolgica para essa nova era

    contingencial.

    2. Origem do Modo de Pensar Funcionalista

    Antes de abordar o tema planejamento estratgico, se faz necessrio um breve

    resgate histrico para entender a forma de atuao utilitarista e funcional, germinada

    no Iluminismo, comum nas organizaes e por consequncia a vida social como um

    todo.

    Para Silva e Tourinho (2009) o Iluminismo moderno compreende do final do

    sculo XVII ao final do sculo XVIII. Surgido na Frana, defendia o domnio da razo

    contrapondo a viso teocntrica que dominava a Europa desde a Idade Mdia. Para

    os filsofos Iluministas, esta forma de pensar tinha o propsito de iluminar as trevas

    em que se encontrava a sociedade.

    Ainda para Silva e Tourinho (2009) a filosofia iluminista possui uma confiana

    embasada na razo humana, prope um despreconceituado uso crtico da razo

    voltada para a libertao em relao: aos dogmas metafsicos, aos preconceitos

    morais, s supersties religiosas, s relaes desumanas e s tiranias polticas; os

    quais representam para os iluministas tipos de heteronmia, que Kant (1985) define

    como a verdade imposta. E a libertao dessas heteronmias por meio do uso

    crtico da razo possibilitaria experincias de autonomia.

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    Ramos (1981) mostra uma percepo de Horkheimer, no qual o Iluminismo

    encarado como o momento em que o conhecimento da razo foi separado de sua

    herana clssica. Esse ideal de iluminismo transforma pensamentos em

    matemtica, qualidade em funes, conceito em frmulas, e a verdade em

    frequncias estatsticas de mdias. Em outras palavras, com o Iluminismo, o

    pensamento se transforma em tautologia (RAMOS, 1981, p.8). Nesta perspectiva o

    mundo escrito em frmulas matemticas genricas e o desconhecido perde seu

    transcendente significado clssico, tornando-se alguma coisa relativa s

    capacidades de clculo disponvel. A generalizao das interpretaes sociais e

    naturais posicionou a cincia em um paradigma denominado funcionalista.

    Precisamente em 1926, Bronislaw Malinowski introduz o termo funcionalismo

    para designar o que seria um mtodo especfico da antropologia social. Para ele em

    qualquer tipo de cultura, os costumes, ideias ou crenas, objetos materiais tm sua

    prpria funo no grupo social, ou seja, so responsveis por alguma finalidade

    indispensvel na totalidade qual pertencem. O funcionalismo tambm foi chamado

    de estrutural-funcionalismo, para designar a ideia de que a funo deve estar

    inserida em uma estrutura social, pois assim qualquer benefcio gerado deveria ser

    para o grupo social e no para o indivduo em separado. Assim, resgata-se a

    impossibilidade de reduzir os fenmenos sociais ao comportamento de cada um dos

    indivduos para dar lugar importncia da continuidade do sistema (GAETA;

    GENTILE; LUCERO, 2008).

    Segundo Morin e Le Moigne (2000, p. 199) a cincia clssica se apoia nos trs

    pilares da certeza, que so a ordem, a separabilidade e a lgica: o primeiro a noo

    de ordem se depreendia de uma concepo determinista e mecnica do mundo, na

    qual qualquer desordem aparente era considerada como o fruto da nossa

    ignorncia; o segundo pilar a, noo de separabilidade, corresponde ao princpio

    cartesiano segundo o qual preciso, para estudar um fenmeno ou resolver um

    problema, decomp-lo em elementos simples; e o terceiro pilar, o nosso modo de

    pensar o da lgica indutivo-dedutivo-identitria identificada com a razo absoluta

    (MORIN; LE MOIGNE, 2000, p. 199). A cincia do sculo XIX, motivada pelos

    estudos de cientistas como Descartes, Newton e Laplace, que buscavam eliminar o

    que individual e singular, para s reter leis gerais com identidades simples e

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    fechadas, e os mtodos cientficos buscavam conceber um universo que fosse

    uma mquina determinstica perfeita.

    Esta ambio retratada em quatro princpios metodolgicos de Descartes

    (2003), em seu Discurso do Mtodo: o primeiro era o de nunca aceitar algo como

    verdadeiro que no se conhecesse claramente como tal; o segundo o de repartir

    cada uma das dificuldades analisadas em tantas parcelas quantas fossem possveis

    e necessrias a fim de melhor solucion-las; o terceiro o de conduzir por ordem os

    pensamentos, iniciando pelos objetos mais simples e mais fceis de conhecer, para

    elevar-se, pouco a pouco, como galgando degraus, at o conhecimento dos mais

    compostos, e presumindo at mesmo uma ordem entre os que no se precedem

    naturalmente uns aos outros; o ltimo o de efetuar em toda parte relaes

    metdicas to completas e revises to gerais nas quais se tivesse a certeza de

    nada omitir.

    O modelo cartesiano e matemtico se perpetuou em paralelo s teorias

    funcionalistas e chegou aos dias atuais passando desde a obra do liberalista Adam

    Smith, em A Riqueza das Naes, de 1776, at as idias de aes mecanizadas

    da Escola da Administrao Cientfica de Frederick Taylor, do incio do sculo XX

    (MOTTA; VASCONCELOS, 2006).

    A revoluo cientfica moderna, com seu movimento antropomrfico prprio da

    humanidade, desmitificou as msticas inerentes natureza antes atribudas ao

    poder divino mas tambm engessou o modo de pensar, generalizando e atribuindo

    solues pr-definidas aos problemas, muitas vezes promovida por uma poltica

    cognitiva. Para Ramos (1981), a prtica corrente da sociedade centrada no

    mercado, tratando-se da desvirtuao das reais teorias moldando-as s

    necessidades e padres para um melhor funcionamento do processo produtivo.

    Morin (2001, p.86) chama todo esse processo de paradigma da simplicidade, que

    pe ordem no universo e expulsa dele a desordem.

    Em um cenrio que Ramos (1981) define como unidimensional, o mercado o

    parmetro nico no ordenamento da vida e dos negcios, sociais e pessoais,

    tratando as questes de forma funcionalistas e puramente tcnica atravs do

    operacionalismo, no qual tudo depende de comprovao cientfica. Enquadram-se

    neste contexto algumas das diversas formas de planejamento, incluindo-se o

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    tradicional, responsvel at ento pela simplificao do predizer futuro tomando por

    base acontecimentos do passado.

    3. O Planejamento Estratgico Tradicional

    A idia de planejamento, no sentido mais emprico, pode ser observada

    desde os primrdios do homem primitivo, quando nos trabalhos de agricultura,

    preocupavam-se em cultivar alimentos para colheita futura. A partir de ento todo

    sistema de produo estava inerentemente ligado ideia de planejamento, ainda

    que os pressupostos tivessem se diferenciados (filosofia, religio, mercado,

    tradies e outros).

    Com a Revoluo Industrial e advento da ideologia capitalista, as organizaes

    produtivas ganharam maiores dimenses e para a sua continuidade no mercado, o

    planejamento se tornou prtica recorrente entre os administradores daquela poca.

    Contudo, as recentes descobertas cientficas e o avano da tecnologia nos anos

    1990 e 2000 inseriram na sociedade um grau de incerteza de tamanha dimenso

    que reduz a probabilidade de quaisquer predies, e neste caso, inclui-se o

    planejamento estratgico tradicional e sua postura determinstica de predizer o

    futuro. Segundo Ackoff (1976, p. 15), o planejamento a longo prazo baseava-se na

    crena de que o futuro poderia ser melhorado por sua interveno ativa no

    presente.

    A grande maioria das organizaes se acostumou a planejar com base nos

    predizeres futursticos, em muito por sua herana iluminista de que tudo explicvel

    pela simples razo instrumental, derivado de um comportamento cartesiano comum

    na maioria dos gestores, moldados em um paradigma funcionalista, que segundo

    Morgan (1996), originou-se no positivismo e reflete uma posio objetiva com uma

    teoria de regulao social.

    O planejamento estratgico uma evoluo do planejamento de longo prazo,

    que nos meados da dcada de 1950 era considerado como modelo. Essa

    metodologia se embasava nas projees de lucro e indicadores financeiros, com o

    tempo se demonstrou ineficaz dentro das organizaes (GLUCK,et al, 1981).

    Apesar de sua exploso prtica e conceitual na dcada de 1970, a escola do

    planejamento estratgico tem origem em meados dos anos 60, e teve como um de

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    seus livros mais influentes Corporate Strategy, publicado em 1965 por Ansoff. Foi

    nesta poca que foi formado a Planning Forum, uma conjugao de foras do

    Planning ExecutivesInstitute e a North American Society Corporate Plannersque

    junto ao Collegeon Planning, configuravam-se como fortes instituies que

    fomentavam e produziam estudos baseadas em planejamento (RUMELT, 1994).

    Com o aumento demasiado no tamanho das organizaes, tanto no setor

    privado como o estatal, agravarem-se problemas relacionados administrao,

    principalmente nas esferas de controle e coordenao. E nesse cenrio que a obra

    de Igor Ansoff Corporate Strategy ganha espao entre os gestores e

    acadmicos, pois ao mesmo tempo em que colaborava para desenvolver uma

    atitude de anlise das variveis estratgicas da firma, o planejamento estratgico

    fornecia os elementos para a racionalizao de processos e ganhos de eficincia. O

    surgimento dessa Escola veio atender a problemas das corporaes que se viam em

    condies de reduo de competitividade e diminuio de resultados, e buscavam

    por novas tcnicas de gerenciamento (ANSOFF, 1988, p. 165). O planejamento

    estratgico chegava como uma alternativa mais flexvel ao planejamento em longo

    prazo, pois considerava as interaes com o ambiente. (MINTZBERG, AHLSTRAND

    e LAMPEL, 2000; MINTZBERG, 2008).

    Advirta-se que o planejamento estratgico, tal como aceito atualmente,

    prope-se trabalhar com ideias de risco calculado, decises no tempo presente e

    no se coloca como uma caixa mgica perfeita. Mesmo assim, alguns autores

    colocavam, e muitos ainda colocam, como uma ferramenta capaz de predizer o

    futuro, como diz Drucker (1977), pai da administrao moderna e referncia at os

    dias atuais, planejamento estratgico um processo contnuo, sistemtico,

    organizado e capaz de predizer o futuro, de maneira a tomar decises que

    minimizem riscos.

    Para Montana e Charnov (2005), o planejamento estratgico exige um longo

    perodo entre o incio e os resultados, e considera o futuro nos termos da misso da

    organizao. Tambm para Kotler (2002), o planejamento estratgico uma

    metodologia gerencial que permite estabelecer a direo a ser seguida pela

    organizao, visando maior grau de interao com o ambiente. Por direo

    compreende-se o estabelecimento do mbito de atuao, e em dimenso macro: as

    polticas, as estratgias e os objetivos. E nesse contexto que a metodologia do

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    planejamento comea a ter sua credibilidade colocada em xeque, pois para o

    planejamento estratgico se mostrar eficiente, ele necessita diretamente da

    capacidade de suas previses estarem corretas e, para isso, so necessrias

    medidas de resultado, ou indicadores crticos, que ajudem a medir a eficcia das

    estratgias de ao.

    na idia de previsibilidade que, basicamente, enquadra-se o planejamento

    estratgico tradicional, considerando apenas um passado e um futuro. Esta forma de

    planejar tem uma quebra epistemolgica crucial; ela se baseia em uma realidade

    passada para preparar um resultado futuro, pois, uma vez definido um objetivo

    qualquer, ela planifica tomando como base pressupostos singulares sobre variveis

    que no controla. Neste modelo no so consideradas as incertezas nem surpresas,

    as matrias manipuladas pelo planejador nunca sero afetadas por objetos estranho

    ao seu plano, sendo assim o mesmo que fazer predies absolutas (HUERTAS,

    1996).

    A realidade contempornea a de um mundo turbulento e com inteiraes

    complexas que promovem mudanas reais a todo instante, por isso to difcil

    encontrar resultados condizentes aos planejados em perodos longos. A teoria do

    caos associada a da complexidade aparecem como arcabouos opcionais para

    embasar a linha crtica ao planejamento estratgico tradicional.

    4. Complexidade e Caos uma Era de Adaptabilidade e Inovao para as

    Organizaes

    Werner Heisenberg uma vez definiu a natureza como incerta, imprecisa e

    impreditvel, denominando seu ponto de vista como o princpio da incerteza. Para a

    Fsica Quntica, a matria no tem consistncia em si, e somente os

    relacionamentos e as conexes so que do tal consistncia. E ainda, o observador

    faz parte da realidade observada, portanto, a realidade composta pelo observador,

    pela observao e pelo objeto ou fato observado. Assim, o Universo no composto

    somente de matria e energia, mas sim deste e, principalmente dos relacionamentos

    e conexes entre eles (TRRES, 2005).

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    Portanto, as organizaes como fato ou fenmeno do universo esto

    conectadas aos sujeitos observadores e observao. Assim, seria ingnuo

    imaginar que o planejamento tradicional (determinstico e preditivo) possa ser uma

    ferramenta eficaz. Mas isso no significa o abandono total do planejamento, apenas

    uma mudana na forma como ele feito, ou seja, planejar considerando as

    provveis influncias exgenas (prprias do ambiente) que tal planejamento pode

    sofrer (MATUS, 1997).

    Toda organizao atua em um determinado ambiente que ir conduzir o

    comportamento a ser tomado para sua sobrevivncia. Com o advento da

    globalizao e os avanos tecnolgicos, os laos integrantes de mercado se

    estreitaram, transformando todo o globo em um nico meio protagonista. Alteraes

    espordicas no oriente podem afetar organizaes no eixo ocidental e a recproca

    tambm verdadeira.

    A complexidade que permeia o ambiente transferiu s organizaes a

    necessidade de se adaptarem s inconstncias e no-linearidade do meio como

    fator chave para sua sobrevivncia. Para Morin (1998), a maior descoberta do

    sculo que a cincia no o reino da certeza.

    Na busca pela melhor forma de entender as mutaes do mercado, as teorias

    administrativas transcendem suas fronteiras em busca da interdisciplinaridade capaz

    de fomentar as respostas necessrias aos seus problemas. Uma vertente das

    cincias exatas vem sendo amplamente difundida na administrao para explicar a

    mutabilidade do cenrio, a Teoria do Caos, que segundo Gleick (1991), significa

    estabelecer um padro organizado para a desordem aparente.

    A referida teoria se baseia em complexos clculos matemticos que remetem

    na administrao organizacional na impossibilidade de se prever acontecimentos

    que no sejam de curtssimo perodo.

    Conforme Gleick (1991), o matemtico francs Jules Henri Poincar (1985-

    1912), precursor da teoria do caos, atravs de sutis mudanas decimais em frmulas

    determinsticas, concluiu que pequenas mudanas podem ser a causa de grandes

    efeitos. Na mesma linha de pensamento, as descobertas do meteorologista Edward

    Lorenz, considerado pai da Teoria do Caos, atravs de estudos realizados no

    Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), determinou ser impossvel prever o

    tempo em longo prazo com preciso.

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    Utilizando um computador Lorenz projetou um sistema de mapeamento do

    comportamento das nuvens, mas ao analisar os dados pensou ter cometido algum

    engano; rapidamente percebeu que a discrepncia havia sido em decorrncia de

    nmeros digitados errados. Nos primeiros testes ele havia colocado nmeros com

    seis casas decimais; j em teste posteriores diminuiu o nmero para trs casas

    decimais imaginando que a diferena seria imperceptvel. Quando os grficos dos

    dados numricos foram gerados foi observado que o comportamento deles

    divergiam progressivamente, concluindo que pequenas diferenas se propagam,

    gerando uma verdadeira bola de neve (GLEICK, 1991)

    Os estudos de Poincar e Lorenz deram origem ao conceito do Efeito

    Borboleta, que recebeu este nome com base na metfora de que o bater de asas

    deste inseto na sia, poderia causar uma tempestade devastadora na Amrica,

    caractersticas do comportamento de um sistema catico, no qual as variveis

    mudam de forma complexa e errtica, tornando impossvel fazer previses alm de

    um determinado ponto (WOOD, 2008).

    Assim, em meados dos anos 1960, a Teoria do Caos, juntamente com a

    Fractais, Teoria das Catstrofes e Lgica Fuzzy (dentre outras), compuseram o que

    se chamou de Teoria da Complexidade surgindo assim a viso complexa do

    mundo. Nesta viso a realidade tida como inacabada, ou seja, um infinito e

    catico fluir, mas para isso necessrio analisar a realidade a partir das conexes

    entre as partes, bem como estas e o todo global. Como diz Trres (2005):

    A realidade inacabada, um eterno e catico fluir. Devemos reconhecer a incompletude e a incerteza da realidade, bem como as mltiplas conexes entre os componentes dessa realidade. Examinar isoladamente um componente no faz sentido o reducionismo das partes. Devem ser examinados, tambm, os relacionamentos deste componente com os demais e com o global constitudo por todos eles. Examinar somente o global sem examinar os seus componentes e os relacionamentos, tambm no faz sentido o reducionismo do todo. (TRRES, 2005, p. 05)

    Assim, a Teoria da Complexidade trata da realidade como uma

    interdependncia entre os fenmenos, e isto o que Capra (1996) chama de Viso

    Ecolgica Profunda; prope-se que todos os elementos esto encaixados nos

    processos cclicos da natureza, em uma rede chamada Teia da Vida, na qual o

    homem apenas uma das partes, e que se pressupe no-linearidade e dilogo

    entre as partes.

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    Aqui se observa um dos argumentos baseado em lgica cientfica para criticar

    a forma tradicional de planejamento, demandando assim novas atitudes por parte

    dos estrategistas, com atuao sistemtica, situacional e contingente as turbulncias

    inerentes ao meio organizacional. Porque no faz mais sentido acreditar que o

    homem tem a capacidade racional ilimitada de analisar todas as possveis

    influncias que seu planejamento pode sofrer ao longo da execuo. Vale ressaltar

    que a crtica aqui no sobre o planejamento em si, mas ao modelo tradicional de

    planejar que se prope ser o mximo assertivo quanto s possibilidades futuras.

    Se o futuro de curto prazo pode ser previsvel e com padres racionais e

    analticos de aes, o futuro de longo prazo totalmente imprevisvel e

    desconhecido, tornando as ferramentas financeiras, modelos, e simulaes de longo

    prazo ineficazes. O que se pode utilizar so padres qualitativos similares para

    desenvolver novos padres mentais para quando este futuro chegar.

    Matus (1997), economista chileno, desenvolveu a teoria do Planejamento

    Estratgico Situacional (PES), que diz respeito a um conjunto de princpios tericos,

    procedimentos metodolgicos e tcnicas de grupo que podem ser aplicados a

    qualquer tipo de organizao que demanda um objetivo, que persegue uma

    mudana situacional futura. Parte dos pressupostos crticos ao planejamento

    tradicional e prope um novo modo de agir estrategicamente.

    Apesar dos estudos terem partido de uma vertente da gesto pblica e

    governabilidade, ela se aplica em qualquer tipo de instituio, pois parte do

    pressuposto da necessidade de ser agir contingencialmente para as interferncias

    naquilo que foi planificado. As organizaes criam e so criadas em um ambiente

    catico, assim, o planejamento de longo prazo passa a considerar as constantes

    influncias e mudanas concomitantes ao processo.

    Para se chegar a uma nova ordem, um perodo de instabilidade tem que ser

    enfrentada, e neste caos as predies determinsticas do modelo tradicional de

    planejamento perdem sua firmeza dando espao ao que a abordagem contingencial

    considera primordial, o poder de inovar e agir sob condies no programadas.

  • 13

    5. Consideraes Finais

    As perspectivas apreendidas pela construo lgica deste ensaio propem um

    sugestionamento na ordem de promover um pensamento estratgico situacional em

    detrimento ao planejamento tradicional. A capacidade de adaptao a situaes

    turbulentas ascendem como diferencial principal nas aes planejadas.

    A dificuldade em se planejar para longos perodos podem ser supridas por

    aes corretivas contingentes e a capacidade gestora de flexibilizar o plano

    tradicional, moldando as intervenes ao passo que o ambiente exige.

    Existe a necessidade de se compreender que as alternativas que esto fora

    do planejado no tem valor neutro, elas assumem sim um papel preponderante no

    resultado final do plano proposto.

    Enquanto o modelo se basear em uma lgica predizvel, alm de usar um

    modo no determinista para compreenso do passado, continuar aplicando um

    modo determinista para planificao futura, produzindo uma clara, e brutal, ruptura

    epistemolgica (HUERTA, 1996).

    A construo lgica do planejamento tem que conseguir propor a transio da

    predio para previso, assim assumindo que problemas podem ocorrer e

    direcionamentos adaptativos podem ser impostos na busca por metas e objetivos

    estabelecidos.

    O desafio associado ao planejamento estratgico situacional reflete a

    necessidade de transpor o paradigma cientfico que o impede de se estabelecer.

    Enquanto o paradigma cartesiano ainda transmite ao administrador ortodoxo a

    segurana de que um mecanismo bem projetado e friamente calculado ter um bom

    desempenho se for bem operado, as idias de um paradigma mais interpretativista e

    contingente estar sempre lembrando ao administrador complexo que, por mais

    que ele faa a sua parte, os rumos da organizao dependero de um contnuo jogo

    com o ambiente.

    Mas como o ser humano normalmente avesso a mudanas ou incertezas,

    atuar no meio da turbulncia, do caos e da complexidade se mostra como um dos

    grandes desafios para gestores e organizaes nesse mundo moderno. Os

    planejamentos e previses passam a vir acompanhadas de alternativas para

    consequncias no esperadas durante o processo objetivado, e os mais dispostos a

  • 14

    entender essa dinmica sero os que se destacaro no futuro da administrao

    contempornea.

    Uma passagem proferida por Matus (1997) sintetiza a guisa conclusiva deste

    ensaio: O planejamento no trata apenas das decises sobre o futuro, mas

    questiona principalmente qual o futuro de nossas decises.

    Nestas consideraes finais cabe ressalvar mais uma vez o carter relativo da

    abordagem aqui assumida, na qual coloca o planejamento dentro de um contexto

    pouco estvel e de extrema interatividade com seus diversos ambientes e atores

    que o circulam.

    Assume-se aqui a conscincia de que em momentos pontuais e particulares, os

    modelos baseados em predies tradicionais podem sim funcionar, o que no

    diminui a contribuio deste ensaio para somar ao arcabouo terico sobre

    planejamento e gesto estratgica, abrindo uma lacuna para se aplicar estudos

    empricos, sejam quantitativos ou qualitativos, abordando a temtica aqui exposta,

    principalmente a trade: Teoria do Caos, a complexidade e o PES.

    Referncias

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  • 15

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