Coordenação de Projetos de Edifícios_Cap06_livro_vfinal

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Coordenação de Projetos de Edifícios Conclusões e perspectivas de evolução 95 COORDENAÇÃO DE PROJETOS DE EDIFÍCIOS Silvio Melhado Dificuldades para a Coordenação de Projetos Em um cenário de competitividade, o papel do coordenador de projetos mostra-se estratégico para integrar os métodos de trabalho de empreendedores, profissionais de projeto, gerentes de obras, consultores e outros profissionais especializados. Sabe-se, porém, que qualquer forma de cooperação e de integração é mais complexa do que a simples independência entre agentes; isso se aplica a todos os níveis intra e interorganizações. No nosso caso específico, dentro do processo de projeto, é bastante clara a dificuldade que certas estruturas de empresa têm ou tiveram para passar de um estado de departamentalização a uma estrutura integrada por processos. Essas organizações são solicitadas por difíceis problemas de interface quando se deparam com a necessidade de desenvolverem os processos do empreendimento em conjunto com outros agentes. Uma das principais barreiras para o projeto simultâneo está ligada à carência de ferramentas de gestão e de comunicação que tornem produtivo o trabalho conjunto de projetistas de diferentes especialidades. Esses profissionais, atuando com seus métodos de trabalho convencionais, conseguem uma produtividade interna – que não obrigatoriamente agrega valor ao processo de projeto como um todo -, a qual será muito dificilmente atingida em equipe. Embora a solução global para o produto ou para a definição de seus processos de execução seja beneficiada, o projetista terá por vezes a sensação de estar sendo improdutivo e de aumentar seus custos para desenvolvimento do projeto. A inércia criada pela tradição do projeto seqüencial somente pode ser vencida em condições organizacionais que compensem essa incerteza ligada à mudança compulsória de modelo de trabalho para o projetista. Desse modo, a cooperação e integração colocadas no nível do empreendimento exigem ajustes entre as partes, ou seja, devem ser estabelecidos mecanismos que permitam a criação coletiva dos processos e que fomentem o engajamento dos agentes frente aos objetivos em comum. Como cada agente influencia não só sua atividade, mas o sistema como um todo, deve-se procurar uma otimização nas articulações, no compromisso e na mútua cooperação entre todos, para a obtenção de elevados padrões de qualidade, focalizando a situação de maneira sistêmica. Expectativas e Tendências de Evolução A implementação de sistemas de gestão da qualidade no segmento da construção de edifícios tem ajudado a provocar uma reflexão a esse propósito e, assim, exigido a mudança de métodos de trabalho. Existe uma demanda crescente das empresas construtoras por serviços diferenciados e uma oferta cada vez mais significativa desses serviços por parte das empresas de projeto. Deve-se mencionar, ainda, que aqueles que se comprometem com a gestão da qualidade têm-se mostrado mais sensíveis às questões ligadas à renovação das práticas profissionais. As empresas de projeto passaram a prestar serviços mais bem direcionados às necessidades dos empreendedores e dos construtores, como condição de sobrevivência para ambos: contratante e contratado.

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Coordenação de Projetos de Edifícios Conclusões e perspectivas de evolução

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COORDENAÇÃO DE PROJETOS DE EDIFÍCIOS

Silvio Melhado

Dificuldades para a Coordenação de Projetos

Em um cenário de competitividade, o papel do coordenador de projetos mostra-se estratégico para integrar os métodos de trabalho de empreendedores, profissionais de projeto, gerentes de obras, consultores e outros profissionais especializados.

Sabe-se, porém, que qualquer forma de cooperação e de integração é mais complexa do que a simples independência entre agentes; isso se aplica a todos os níveis intra e interorganizações. No nosso caso específico, dentro do processo de projeto, é bastante clara a dificuldade que certas estruturas de empresa têm ou tiveram para passar de um estado de departamentalização a uma estrutura integrada por processos. Essas organizações são solicitadas por difíceis problemas de interface quando se deparam com a necessidade de desenvolverem os processos do empreendimento em conjunto com outros agentes.

Uma das principais barreiras para o projeto simultâneo está ligada à carência de ferramentas de gestão e de comunicação que tornem produtivo o trabalho conjunto de projetistas de diferentes especialidades. Esses profissionais, atuando com seus métodos de trabalho convencionais, conseguem uma produtividade interna – que não obrigatoriamente agrega valor ao processo de projeto como um todo -, a qual será muito dificilmente atingida em equipe. Embora a solução global para o produto ou para a definição de seus processos de execução seja beneficiada, o projetista terá por vezes a sensação de estar sendo improdutivo e de aumentar seus custos para desenvolvimento do projeto. A inércia criada pela tradição do projeto seqüencial somente pode ser vencida em condições organizacionais que compensem essa incerteza ligada à mudança compulsória de modelo de trabalho para o projetista.

Desse modo, a cooperação e integração colocadas no nível do empreendimento exigem ajustes entre as partes, ou seja, devem ser estabelecidos mecanismos que permitam a criação coletiva dos processos e que fomentem o engajamento dos agentes frente aos objetivos em comum. Como cada agente influencia não só sua atividade, mas o sistema como um todo, deve-se procurar uma otimização nas articulações, no compromisso e na mútua cooperação entre todos, para a obtenção de elevados padrões de qualidade, focalizando a situação de maneira sistêmica.

Expectativas e Tendências de Evolução

A implementação de sistemas de gestão da qualidade no segmento da construção de edifícios tem ajudado a provocar uma reflexão a esse propósito e, assim, exigido a mudança de métodos de trabalho. Existe uma demanda crescente das empresas construtoras por serviços diferenciados e uma oferta cada vez mais significativa desses serviços por parte das empresas de projeto. Deve-se mencionar, ainda, que aqueles que se comprometem com a gestão da qualidade têm-se mostrado mais sensíveis às questões ligadas à renovação das práticas profissionais. As empresas de projeto passaram a prestar serviços mais bem direcionados às necessidades dos empreendedores e dos construtores, como condição de sobrevivência para ambos: contratante e contratado.

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Dentro de um ambiente de gestão da qualidade, o processo de projeto deve ter por objetivo atender às necessidades de informação de todos os clientes envolvidos no ciclo de vida do empreendimento. Esse objetivo deve ser atingido de forma eficiente e coerente com a atuação dos demais agentes, evitando retrabalho na elaboração desse projeto.

No entanto, tal objetivo só é atingido em estruturas de trabalho conjunto. Cada novo empreendimento de construção é único e exige, portanto, esforços de organização e de cooperação particulares; a excelência do projeto de um empreendimento passa pela excelência do processo de cooperação entre seus agentes.

Trata-se essencialmente de reconhecer que o projeto é um processo iterativo e coletivo, exigindo assim uma coordenação do conjunto das atividades envolvidas, compreendendo momentos de verificação, de análise crítica e de validação das soluções, no entanto, sem impedir o trabalho especializado de cada um dos seus participantes. Essa coordenação deve considerar aspectos do contexto legal e normativo que afeta cada empreendimento, estabelecer uma visão estratégica do desenvolvimento do projeto e levar devidamente em conta os riscos inerentes à atividade.

Nossa hipótese para a evolução é que, diante da exigência de evoluções capazes de responder positivamente à atual busca de eficiência e eficácia dos processos, a ênfase deva ser colocada exatamente na mudança de postura e de métodos adotados pelos agentes; dentro desse enfoque, no momento atual, a iniciativa de mudança estaria principalmente nas mãos dos empreendedores.

Sem o apoio do empreendedor, muitas das tentativas para se elevar a eficiência da construção de edifícios são limitadas. Assim sendo, propõe-se uma participação mais ativa do empreendedor nas fases posteriores à montagem e ao lançamento do empreendimento, de modo a comprometer o empreendedor com a máxima antecipação possível na contratação dos agentes que irão interferir na elaboração do projeto e execução do empreendimento, ou seja, dos projetistas; do coordenador do projeto e do coordenador de obras; das equipes de execução e dos principais subempreiteiros, com o objetivo de favorecer o trabalho em equipe multidisciplinar, anteriormente à fase de execução do edifício; a rever as regras atuais de contratação dos projetistas, de forma a sugerir novas modalidades de contrato de projeto, que perdurem até o término da obra, incluindo acompanhamento e visitas aos canteiros de obras e a exposição do projeto à equipe técnica das construtoras e, inclusive, aos subempreiteiros; a definir mais precisamente os papéis e as responsabilidades dos agentes envolvidos.

No outro elo da cadeia, entendemos que as empresas de projeto devem se organizar para atender a requisitos essenciais de qualificação. Tais requisitos – de modo geral – estão ligados à capacidade da empresa de projeto para considerar efetivamente os requisitos do cliente e demais agentes envolvidos no empreendimento, em seus projetos, estabelecendo contato efetivo com as necessidades da execução, por exemplo; à confiabilidade da empresa de projeto na prestação de serviço, seja quanto ao cumprimento de prazos, seja quanto à sua disponibilidade e capacidade de resposta, quando solicitada. A comunicação, a documentação e o tratamento dispensado aos clientes são, portanto, indicadores de uma capacidade de prestação de serviços de projeto.

Quanto ao emprego da Tecnologia da Informação, pode-se constatar que o desenvolvimento de projetos com o uso de Extranets ou sistemas de gerenciamento eletrônico, faz parte do dia-a-dia de um número expressivo e crescente de projetos. Isso, longe de resolver as dificuldades do dia-a-dia, traz novos desafios para a atuação dos coordenadores de projetos.

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Fronteiras para a Gestão do Processo de Projeto

Atualmente, podem-se identificar algumas fronteiras de conhecimento para a gestão do processo de projeto que devem ainda ser alvo de melhor desenvolvimento, dentre as quais podem ser destacadas:

! Redefinição do perfil, das atividades e da autonomia do coordenador de projetos: dada a crescente especialização dos projetos, a coordenação é atividade cada vez mais importante e complexa no âmbito da gestão dos empreendimentos e torna-se necessário que o seu perfil, sua formação e sua atuação estejam bem definidos e fundamentados, e que o coordenador tenha autonomia para tomar as principais decisões no processo de projeto;

! Desenvolvimento de métodos de gestão do processo de projeto: pela sua estreita ligação com a estratégia competitiva, o desenvolvimento do projeto é baseado em processos adequados às necessidades do empreendedor ou de um seu empreendimento em particular; a sua gestão é materializada por meio dos procedimentos de contratação, coordenação, análise crítica, controle, avaliação e retroalimentação de projetos, que devem ser implementados, integrados e continuamente melhorados;

! Criação de mecanismos para retroalimentação do processo de projeto e análise do ciclo de vida das edificações: pela sua importância em si, devem evoluir os processos de coleta e análise de dados nas fases posteriores ao projeto, de modo a proporcionar orientações que permitam analisar criticamente o projeto e aperfeiçoar os procedimentos de produção, seja visando sua repetição no mesmo empreendimento, ou registro que servirá de apoio ao detalhamento de futuros empreendimentos;

! Implementação da fase de preparação da execução das obras: atividade na interface projeto-produção, que depende da continuidade de atuação do coordenador de projetos, a partir dos subsídios fornecidos pelos procedimentos de execução e controle e pelos projetos para produção disponíveis para orientação da produção no canteiro de obras; pode ter papel decisivo na eficácia da implementação das decisões tomadas em projeto, e nos resultados reais em termos de qualidade e de produtividade;

! Melhoria na gestão interna aos projetistas: evolução organizacional das empresas de projeto, cujo conhecimento técnico, experiência e motivação pela evolução na atividade respectiva devem ser respeitados e cuja gestão deve ser um dos principais “alicerces” da gestão do empreendimento;

! Difusão das aplicações da Tecnologia da Informação: na construção de edifícios atual, boa parcela dos problemas de gestão identificável envolve questões de fluxo e processamento de informação; no entanto, o uso dos recursos disponíveis apresenta-se aquém de seu verdadeiro potencial, que pode ser francamente incrementado com o maior desenvolvimento específico das ferramentas e melhoria da qualificação de seus usuários.

Tais evoluções envolvem atividades de gestão que fazem interface com o processo de produção dos seus empreendimentos e são críticas para a qualidade. Dentre essas atividades, apenas a coordenação de projetos estará envolvida tanto com o desenvolvimento dos produtos (ou seja, a concepção de novos empreendimentos), como também com o projeto para produção das obras correspondentes. O desempenho da coordenação de projetos, portanto, é essencial para o sucesso do empreendimento e pode contribuir para que haja mais coerência entre os procedimentos adotados em cada fase do empreendimento, levando à sinergia das ações e a melhores resultados.

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Palavras Finais

"Podemos definir a organização das indústrias como sendo a ciência que tem por objeto o estudo do fator humano na produção das riquezas. Mas a organização das indústrias não é apenas uma ciência, é também uma arte..." (NOGUEIRA DE PAULA, 1932).

Àqueles que, como os autores deste livro, são incondicionalmente apaixonados por essa arte e todas as suas derivações e aplicações, desejamos sucesso na árdua mas gratificante tarefa que abraçamos: exercer e aprimorar continuamente a gestão e coordenação de projetos.

Silvio Melhado (coordenador);

Ana Rocha de Souza; Eduardo Fontenelle;

Janayna Aquino; Leonardo Grilo;

Luiz Sérgio Franco; Maria Julia Mesquita;

Monserrat Dueñas Peña; Márcio Fabricio;

Otávio J. Oliveira.

Bibliografia do Capítulo

MELHADO, S.B. Gestão, Cooperação e Integração para um Novo Modelo Voltado à Qualidade do Processo de Projeto na Construção de Edifícios. Tese (Livre-Docência) – Escola Politécnica, Universidade de São Paulo. São Paulo: 2001. 235p.

NOGUEIRA DE PAULA, L. Racionalização. Rio de Janeiro, s.ed., 1932.