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Copyright©2015ThiagoSoaresPereira.

Todos os direitos reservados. Qualquer parte deste livro pode ser copiada oureproduzidasobquaisquermeiosexistentessemautorizaçãoporescritodoseditorese/oudosautores,desdequeacópiasejausadaparafinsacadêmicosecomadevidacitaçãobibliográficaconformeasregrasdaAssociaçãoBrasileiradeNormasTécnicas(ou equivalente). Distribuído sob atribuição Creative Commons: Atribuição-NãoComercial-SemDerivações4.0Internacional.

S586o

ThiagoSoaresPereira,MatheusPassosSilva(coord.).

Oprincípiodadignidadedapessoahumanaeaautonomiadamulherfrenteàampliação das hipóteses de aborto legal [recurso eletrônico] / Thiago SoaresPereira,MatheusPassosSilva(coord.).Brasília:Vestnik,2015.

Recursodigital.

Incluibibliografia.

Formato:ePub

Requisitosdosistema:multiplataforma

ISBN:978-85-67636-14-6

Mododeacesso:WorldWideWeb

1.Direito.2.Dignidadehumana.3.Mulheres.4.Abortolegal.I.Título.

EditadoporMatheusPassosSilva.

Todososdireitosreservados,noBrasil,por

EditoraVestnik

CNB13Lote9/10Apto.304–Taguatinga

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72115-135–Brasília–DF

Tel.:(61)8127-6437

Email:[email protected]

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SobreoautorThiagoSoaresPereiraatualmenteéservidorpúblicodoSuperiorTribunaldeJustiça,onde ingressou em 2012 e atua como chefe-substituto da Seção de Direitos doServidor e Líder da Gestão de Projetos no Sistema de Gestão de Pessoas Integra.Ingressouno serviço público em2009noMinistério doTrabalho eEmprego, ondetrabalhou com Políticas Públicas de Emprego na Intermediação-de-Mão-de-Obra,ministrandotreinamentoseatuandonaimplantaçãodoSistemaNacionaldeEmpregoportodooBrasil.FoiaprovadotambémnosconcursosdoMinistériodosEsporteseMinistério da Saúde e atualmente almeja a aprovação em concursos do PoderLegislativo e naCarreira Jurídica. ÉBacharel emDireito, formado pela FaculdadeProjeçãoem2014.Dedica-seaoaperfeiçoamentoacadêmicoeprofissional,possuindoem seu curriculum o Curso deDireito Constitucional Avançado pelo Instituto deDireitoPúblicodeBrasília,ministradopeloDoutoMinistroGilmarMendes,oscursosOPoderLegislativo, IntroduçãoaoDireitoConstitucionaleAdministraçãoPúblicapeloInstitutoLegislativoBrasileiro,alémdesercertificadoemGestãodeMudançasOrganizacionais-ofatorhumanonaliderançadeprojetos–HCMBOK.

Sobreocoordenadordestaedição

Matheus Passos Silva atualmente (2015) cursa o doutorado em Direito, comespecializaçãoemCiênciasJurídico-Políticas,naUniversidadedeLisboa(Portugal).Possui mestrado em Ciência Política pela Universidade de Brasília (2005) egraduação tambémemCiênciaPolíticapelaUniversidadedeBrasília (2002).Cursatambémpós-graduaçãoemDireitoEleitoraleemDireitoConstitucionalpeloInstitutoBrasiliensedeDireitoPúblico(Brasília/DF,Brasil).ÉConselheiroCientíficoeEditorda Revista Jus Scriptum, do Núcleo de Estudos Luso-Brasileiro da Faculdade deDireito da Universidade de Lisboa, desde 2014. Leciona disciplinas no curso deDireito, tais como Ciência Política e Teoria Geral do Estado, Filosofia Geral eJurídica, Direito Constitucional, Direito Eleitoral, Orientação de Trabalho deConclusãodeCurso,HistóriadoDireito,SociologiaeMetodologiadePesquisa.Temlarga experiência como coordenador de núcleo de pesquisa na área jurídica, bemcomo na coordenação de trabalhos de conclusão de curso. Dedicou-se ao NúcleoDocente Estruturante e ao Colegiado do curso de Direito em várias IES nas quaistrabalhou.Áreas de interesse:Ciência Política,Democracia,DireitoConstitucional,Direito Eleitoral, Direitos Políticos, Representatividade, Justiça, Nações eNacionalismo no Leste Europeu. Mais informações sobre o autor podem serencontradasnoslinksabaixo:

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CanalnoYoutube:www.youtube.com/profmatheuspassosPáginanoFacebook:www.facebook.com/profmatheusSitedoProf.MatheusPassos:http://profmatheus.comCurrículoLattes:http://lattes.cnpq.br/4314733713823595

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SobreoProjeto“JovensJuristas”Venho trabalhando como orientador de trabalhos de conclusão de curso (TCC) docurso de Direito desde 2008. Neste período um dos meus principais objetivos foiincutiremmeusalunosaideiadequeumTCCnãopode(nemdeve)servistoapenascomo “mais um trabalho acadêmico”: o trabalho faz parte de um processo deaprendizado e, como tal, deve ser visto como o ápice de uma graduação em nívelsuperior.Destamaneira,apropostafoiadetransformarosTCCs,cadavezmais,emverdadeirosprojetosdepesquisaacadêmica,aindaquecomâmbitolimitadodevidoàsua própria natureza – muitas vezes um TCC é o primeiro trabalho acadêmico-científicorealizadopeloaluno.

ÉnestecontextoqueseinsereoProjeto“JovensJuristas”.Oobjetivodoprojetonãoéoutrosenãoodeidentificar,dentreosinúmerostrabalhosdeconclusãodecursoquesãoapresentadossemestralmentepelosalunos,aquelesquemaissedestacam,sejadoponto de vista da robustez doutrinária, seja do ponto de vista da inovação e/ouoriginalidade trazidapeloalunoouainda sobopontodevistadaanálisepráticadarealidadepormeiodeumapesquisadecampo,demaneiraquetaistrabalhospossamserpublicadoscomolivroemformatodigital-oconhecidoeBook.TodosostrabalhospublicadospassarampelocrivodeumaBancaExaminadoracompostapeloprofessor-orientadoreporpelomenosmaisdoisprofessores-examinadores.Oprojetoseiniciouem janeiro de 2014 e os livros já publicados podem ser obtidos por meio dositehttp://profmatheus.com/livros.

Nestelivro,intituladoOprincípiodadignidadedapessoahumanaeaautonomiadamulher frenteàampliaçãodashipótesesdeaborto legal, busca-se verificar junto àsociedade, pormeiodepesquisade campo, sobqual óticada ideologia feminista oaborto deve ser legalizado. Trata-se de tema polêmico e discutido com intensidadeatualmente,dadaadelicadezadadecisãoeconsequênciada legalização,amortedoserhumanoemdesenvolvimento.Asmulheresaolongodosanosvêmconquistandoetendo reconhecidos a si direitos e princípios fundamentais, dentre eles os direitos àliberdadesexualereprodutivadamulher,àautonomiadedecisãoeàigualdadeentregêneros,deformaqueasfeministasbuscamatotal liberaçãodoabortocomoformadeliberdadeematenção,também,àdignidadedapessoahumana.Taisdireitos,assimcomo o direito à vida, também são reconhecidos internacionalmente e já foramdiscutidos em diversas conferênciasmundiais, havendo um conflito de princípios edireitos fundamentais, os quais não podem deixar de existir ou serem descartados,masdevemserconfrontadosepesados.

Oobjetivodo livro, logicamente,nãoéodeesgotaroassunto;aocontrário, tem-se

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comoobjetivoestimulararealizaçãodemaispesquisasdestetiponoâmbitojurídicodemaneira que se possa sair da rotina de trabalhos de conclusão de curso que sãogeralmentevistospelosalunoscomoummero"pré-requisito"parasuaaprovaçãoemuma disciplina. Espera-se que o Projeto Jovens Juristas incentive novospesquisadores na área do Direito, além de fazer com que os autores participantespossam,jánoiníciodesuavidaacadêmica,teremseucurrículoumapublicaçãoqueeventualmente poderá ser continuada no âmbito de uma pós-graduação ou de ummestrado.

O texto apresentado a seguir é o original conforme defendido pelo aluno ThiagoSoares Pereira perante Banca Examinadora no ano de 2014, já com as devidascorreçõessugeridaspelaBanca.Oautorédetentordetodososdireitosautoraisdestaobra,sendoomesmooúnicoresponsávelpeloconteúdoapresentadonolivro.

Esperoquealeiturasejaagradávelequeotextopossaenriquecerseusconhecimentosarespeitodetema.

MatheusPassosSilva

Projeto"JovensJuristas"

Abrilde2015

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AgradecimentosAgradeçoededicoestaobraprimeiramenteaDeusqueéomeupilarmaior.Àminhafamília que me apoiou e é responsável por cada conquista em minha vida,acompanhando e direcionando meus passos, em especial meus pais, meus irmãos,minha avóAurina emeu tio João Paulo. Àminha filha Eduarda,meu bemmaior,amor incondicional, que me dá forças para lutar e buscar caminhos melhores. ÀminhanamoradaCamila,mãedaminha joia,quesoubeserpacienteecompanheiranasdificuldadesimpostasporessemomento.

Alémdosprofessoreseamigosquecompartilharamcomigoessemomentodeminhahistória.

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ResumoNa presente obra busca-se verificar junto à sociedade, por meio de pesquisa decampo,sobqualóticadaideologiafeministaoabortodeveserlegalizado.Trata-sedetemapolêmicoediscutidocomintensidadeatualmente,dadaadelicadezadadecisãoeconsequênciadalegalização,amortedoserhumanoemdesenvolvimento.Odireitoàvidaétidocomoessencialeprotegidomundialmente,sendoconsideradodemodogeralodireitomaisimportanteaserobservado,integrandoesendoimprescindívelàdignidadedapessoahumana.Noentanto,nãohádireitosabsolutosenessecasonãopoderia ser diferente. As mulheres ao longo dos anos vêm conquistando e tendoreconhecidosasidireitoseprincípiosfundamentais,dentreelesosdireitosàliberdadesexualereprodutivadamulher,àautonomiadedecisãoeàigualdadeentregêneros,de forma que as feministas buscam a total liberação do aborto como forma deliberdade em atenção, também, à dignidade da pessoa humana. Tais direitos, assimcomo o direito à vida, também são reconhecidos internacionalmente e já foramdiscutidos em diversas conferênciasmundiais, havendo um conflito de princípios edireitos fundamentais, os quais não podem deixar de existir ou serem descartados,masdevemserconfrontadosepesados.Assim,otrabalhofoidesenvolvidoemquatrocapítulos, no primeiro são abordados o conceito, evolução histórica, tipificação ecaracterísticaspenais,alémdasformasatualmentepermitidasdoabortonoBrasil.Emseguida confrontam-se os direitos ora em discussão, apresentando-se tanto oposicionamento dos Pró-vida (contra o aborto) quanto dos Pró-escolha (a favor doaborto), apresentando-se de que forma tal celeuma pode ser dissolvida. Por fim, éapresentada a pesquisa e análise dos dados coletados entre 266 participantes dopúblico em geral do Distrito Federal, abordando-se aspectos de ambos osposicionamentoscomointuitodesechegaràverdadeiraopiniãosocialemrelaçãoàinterrupção voluntária da gravidez. Os resultados foram bastante satisfatórios,permitindo-se definir bemo entendimento da sociedade em relação ao tema, o queleva a crer que emalguns aspectos são favoráveis à legalização, principalmente notocanteàsformasjápermitidas,havendocertatendênciaàaprovaçãonoqueserefereà descriminalização em casos de graves anomalias ou doenças incuráveis ereprovabilidadeno tocanteà liberaçãoporvontadedamulheratéadécimasegundasemana.

Palavras-chave: Aborto; Dignidade da Pessoa Humana; Direito à Vida; LiberdadeSexualeReprodutiva;Descriminalização.

Abstract: In the present work it seeks to verify in society, through field research,

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under which viewpoint of feminist ideology abortion should be legalized. It is acontroversialtopicandcurrentlydiscussedintensively,withthedecisiondelicacyandtheconsequenceoflegalization,thedeathofthedevelopinghuman.Therighttolifeis seen as essential and protected worldwide, being generally considered the mostimportant right to be observed, integrating and being essential to human dignity.However, therearenoabsoluterightsand in thatcasecouldnotbeotherwise.Overthe years, women have gained and having recognized fundamental rights andprinciples,amongthemtherightstosexualandreproductivefreedom,theautonomyof decision andgender equality, so the feminists seek total release of abortion as aformoffreedomnotetodignityofthehumanperson.Suchrights,aswellastherighttolife,arealsointernationallyrecognizedandhavealreadybeendiscussedinvariousworldconferences,havingaconflictoffundamentalprinciplesandrights,whichcannotceasetoexistorbediscarded,butmustbeconfronted.Therefore, thestudywasconducted in four chapters, the first are discussed the concept, historical evolution,classification and criminal characteristics, beyond the currently permitted forms ofabortion in Brazil. Then, facing the rights under discussion, presenting the bothposition of Pro-life (against abortion) and the Pro-choice (pro-abortion), presentinghowsuchastircanbedissolved.Finally,theresearchandanalysisofdatacollectedfrom 266 participants is presented from the general public at the Distrito Federal,coveringupaspectsofbothpositionsinordertoachievetruesocialopinionregardingabortion. The results were quite satisfactory, allowing to define well theunderstanding of society by the topic, which suggests that in some respects are infavorof legalization,mainlyon the formsalreadymadeavailable, there isacertaintendencyforapprovalregardingthedecriminalizationincasesofseriousorincurablediseases and anomalies disapproval regarding the release by thewill of thewomanuntilthetwelfthweek.

Keywords:Abortion;DignityofTheHumanPerson;RighttoLife;ReproductiveandSexualFreedom;Decriminalization.

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Listadeabreviaçõesesiglas

ADPF-ArguiçãodeDescumprimentodePreceitoFundamental

CEDAW - Convention on the Elimination ofAll Forms ofDiscriminationAgainstWomen(ConvençãosobreaEliminaçãodeTodasasFormasdeDiscriminaçãoContraaMulher).

CF-ConstituiçãoFederal

CFM-ConselhoFederaldeMedicina

CF/88-ConstituiçãoFederalde1988

CID10-10ªRevisãodaClassificaçãoInternacionaldeDoenças

CNTS-ConfederaçãoNacionaldosTrabalhadoresdaSaúde

CP-CódigoPenal

DIU-DispositivoIntrauterino

OMS-OrganizaçãoMundialdeSaúde

PLS-ProjetodeLeidoSenado

STF-SupremoTribunalFederal

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IntroduçãoOcrimedeabortoestáprevistonosartigos124a128doCódigoPenalBrasileiroeétipificadocomocrimecontraavidadapessoahumana,protegendoavidaintrauterinadesdeanidação.Oabortodefine-secomoainterrupçãodagravidezcomadestruiçãodoprodutodaconcepção,acarretandoamortedoovo,embriãooufeto,independentedesuaexpulsão,tendoemvistaquetalprodutopodeserdissolvido,reabsorvidopeloorganismo da mulher, mumificado ou implicar à morte da gestante antes de suaexpulsão.

EmumcontextohistóricodoabortonoBrasil, tem-sequenemsempreoabortofoitipificadocomocrime,sendo,aprincípio,umapráticacondenadapelaIgrejaCatólicaem uma colônia que possuía como ditames os dogmas do cristianismo e a buscaestatalpelopovoamento territorial.Assim, somentenoanode1830, comoCódigoCriminal do Império, foi que o aborto surgiu pela primeira vez na legislaçãobrasileira,tipificandocomocondutacriminosaoabortocausadoporterceiroscomousemoconsentimentodagestante,nãoconsiderandocrime,porém,apráticadoauto-aborto.NoCódigoPenalde1890,odelitode interrupçãodagravidezpassou a sermais severo, no entanto, com algumas restrições quanto ao praticado pela gestante.Finalmente,comaediçãodoCódigoPenalde1940,alegislaçãosobreotemapassouasermaisclaraeespecífica,apesardecontroversa,tipificandocomocriminosatantoa prática da gestante como de terceiros, qualificando o crime quando o resultadocausar morte ou lesão corporal grave à gestante, além de prever formas de abortolegal,previsõesessasqueatéhojeimperamemnossoordenamentojurídico.

Nessaconjuntura,ficaclaroqueavedaçãolegaldapráticadoabortobuscaprotegeravida intrauterina e tem como bem juridicamente protegido a vida humana emdesenvolvimento, como também a integridade física e psíquica da mulher quandopraticadoporterceiros.Porém,partindodessapremissa,questiona-seondecomeçaavida e qual a aplicabilidade do seu conceito no âmbito do Direito Penal.Majoritariamente,avidainicia-secomaconcepção,noentanto,parafinsdaleipenal,a vida terá relevância quandoo óvulo já fecundado se implantar no úteromaterno,nidação.Alémdisso,noâmbitoconstitucional,odireitoàvidaéprotegidodeformageral, inclusive a uterina (não expresso), devendo o Estado assegurá-lo tanto naconcepçãodecontinuarvivoquantonadegarantirosmeiosdesubsistência,deformaa ser considerado o direito mais fundamental e pré-requisito para a existência eexercíciodosdemaisdireitos.

Oabortopodeserespontâneoounatural,acidentalouprovocado,sendoesseúltimooobjetodeestudoparaaaplicaçãodaleipenal,umavezqueénecessárioqueoagente

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queira o resultado ou assuma o risco de produzi-lo. Atualmente, o Código Penalsomentepermiteoabortoquandooferecerriscoàvidadagestante–abortonecessário– ou no caso de gravidez resultante de estupro, além da nova possibilidadeimplementada pelo Supremo Tribunal Federal na ADPF n. 54/2004, em favor doaborto do feto anencéfalo. Diante dessa limitação legislativa, a prática do abortocriminoso aumenta e suas causas consistem em fatores econômicos, morais ouindividuais, oque leva àbusca incessanteda sua legalização e reconhecimentodosdireitosdareproduçãoedasexualidadeàmulher.

Alegalizaçãooudescriminalizaçãodoabortoéumassuntoquedivideopiniõesevemsendo discutido ao longo da história, sendo que na atualidade essa busca temcaminhado a passos lentos, considerando a aprovação da lei de biossegurança e aADPFn.54/2004peloSupremoTribunalFederal,quetinhamcomofocoprincipalavida. Além disso, Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei do Senado n.236/2012,quetemcomoobjetivoalterardiversosdispositivosdoatualCódigoPenal,dentre eles a flexibilização e expansão das formas de aborto consideradas legais emudança da pena aplicável. Nesse diapasão, e por se tratar de tema polêmico edelicado,surgemdiversosdebates,dividindoopiniõesentregrupossociais.

Emregra,dividem-seem2 (duas)vertentes, aprimeira,denominadaPró-escolha, écompostaemsuamaioriaporgruposfeministas,quelutampelosdireitosdamulherebuscamadescriminalizaçãodoaborto,demodoqueamulhertenhaautonomiasobresualiberdadesexualereprodutiva.ASegunda,denominadaPró-vida,écompostaporgrupos cristãos e conservadores, que lutam contra a legalização do aborto emqualquerformaqueseapresente,defendendoosdireitosdofetoedonascituro.

Omovimento Pró-escolha sustenta sua ideologia no sentido de que cabe àmulherescolherprosseguirounãocomagestação,nãodevendooEstadointerferirdeformapotencial, ao ponto de exercer um controle discriminatório e injustificado sobre ocorpo feminino. Além disso, tem como princípios basilares o reconhecimento dodireito à liberdade e autonomia reprodutiva das mulheres, sua sexualidade eautodeterminação.Frenteaessa ideologia,essegrupobuscaa legalizaçãodoabortoemqualquerhipótese,sejaeconômica,moral,socialoueugênico,afimdealcançaroamparolegislativoparaqueamulherpossadispordoseucorpodaformaquedesejarconforme sua sexualidade e reprodução. Sustentam ainda que, embora proibida, háum quantitativo alto de interrupção voluntária da gravidez, uma vez que, por sercriminosa, muitas mulheres buscam meios não seguros para sua execução,ocasionando danos físicos e psicológicos irreparáveis ou até mesmo morte a umnúmeroconsideráveldessasmulheres.

Sobessaótica,pode-se imaginarqueomovimentoPró-escolhadesconsidereavida

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intrauterina.Noentanto, essapremissanão éverdadeira, umavezque a reconhece,masadmiteasuaviolabilidade,oquevaideencontroaodireitofundamentaldavidaeénessepontoqueo feminismocria sua tese.Nota-se, nessemomento, queháparaesse grupo um conflito entre o direito fundamental à vida do feto e os direitosassegurados à mulher, cabendo ao intérprete da norma ponderá-lo de forma que ointeressefemininoprevaleçasobreosdofeto.

Em contrapartida ao feminismo, tem-se o movimento Pró-vida que defende adignidade e o direito fundamental à vida e é desfavorável ao aborto em qualquerformaqueseapresente.Defendequeavidadeveserprotegidaemqualquerestágio,inclusive no da concepção. Integrante e idealizadora em grande parte dessemovimento, a Igreja Católica doutrina que a descriminalização do aborto é algoilegítimoeimoral,alémdeferiromandamentodivinodenãomatar,afirmandoqueninguémpodereivindicarodireitodematarumserhumanoinocente,quepossuividadesdeaconcepção.Alémdisso,osavançadosestudosdaembriologiafazemcomquemais adeptos defendam a causa, definindo que a vida inicia-se na concepção, deforma que a não-punibilidade representa condenar a morte o ser humano emformação.Afirmam,ainda,quepornãoseenxergar,presenciarououvirosofrimentodofeto,amorteéaceitacomtranquilidade,masqueissoéumerro,devendoavidaserprotegidaindependentementedoseutempo.

Diantedetodosessesfatos,nota-sequealegalizaçãooudescriminalizaçãodoabortoé um assunto delicado, polêmico, controverso e com posicionamentos totalmentedistintos,porém,semnenhumadefiniçãomaisconsolidadadaopiniãodasociedade.Seráqueemsuamaioriaasociedadedesejasualegalizaçãoouatotalabolição?Ouseráqueponderarosdoispontosdevistaeemcertoscasosdefinircomomajoritárioosdireitosdamulhersobreodavidaintrauterinaouvice-versa,seriaomaiscorreto?Époressemotivo,queoTrabalhodeConclusãodeCursofoirealizadosobaformadepesquisa de campo, comquestionário que apresente a posição social noDistritoFederalemdiferentesclassessociais, regiões, idadeeescolaridade.Sendocoletadas266 respostas de diferentes perfis, haja vista que não se delimitou o perfil doentrevistado,massim,buscou-sedefini-loposteriormentedeformageralemanáliseaosdadoscoletadosinerentesaeles.

Desse modo, e com base no exposto, será buscada, por meio da pesquisa a serrealizada,arespostadaseguintepergunta:oabortodeveserlegalizadosobaóticadofeminismo?

Alémdisso,foramanalisadosdiversospontosquecircundamtalpolêmicataiscomo:influência religiosa na norma; momento em que começa a vida; soluções a seremadotadaspelogovernantepara reduçãoda taxademortalidadematernaedoaborto;

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comparaçãocomoordenamentojurídicodeoutroPaísdaAméricadoSulqueoptoupeladescriminalizaçãodoaborto.Dessaforma,apesquisaapresentou-secompletaeabrangentetantoemrelaçãoaoposicionamentoprócomocontra,deixandoaescolhatotalmenteacritériodoentrevistadodemodoquenãohajainterferênciaseinduçõesemsuasrespostas.

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DoabortoConceito

OcrimedeabortoestáprevistonoCódigoPenalBrasileirocomofimdeprotegeravida humana intrauterina em desenvolvimento, sendo que, a depender do caso,protegesecundariamenteavidaeaincolumidadefísicaepsíquicadamulhergestante.Odireitoàvidaéconstitucionalmenteprotegido,sendo,paraAlexandredeMoraes,“o mais fundamental de todos os direitos, já que constitui-se em pré-requisito aexistência e exercício de todos os demais direitos. A Constituição Federal, éimportanteressaltar,protegeavidadeformageral, inclusiveauterina.”(MORAES,2013,p.34).

Considera-se aborto a interrupção da gravidez com a destruição do produto daconcepção,nãoseexigindo,paraquesejaconfigurado,aexpulsãodoproduto,umavez que, além da expulsão, ele poder ser dissolvido, reabsorvido ou pode sofrerprocessodemumificação,continuando,nessecaso,noúteromaterno.Diz-seprodutodaconcepção:a)ovo,atéaterceirasemanadagestação;b)embrião,detrêssemanasatrêsmeses; c) feto, após trêsmeses. (MIRABETE;FABBRINI,2013,p.59).Nessesentido,lesionaFernandoCapez:

Considera-se aborto a interrupção da gravidez, com a consequentedestruição do produto da concepção. Consiste na eliminação da vidaintrauterina.Não faz parte do conceito de aborto a posterior expulsão dofeto,poispodeocorrerqueoembriãosejadissolvidoedepoisreabsorvidopeloorganismomaterno emvirtudedeumprocessode autólise; ou entãopode suceder que ele sofra processo de mumificação ou maceração, demodo que continue no úteromaterno.A lei não faz distinção entre óvulofecundado(3primeirassemanasdegestação),embrião(3primeirosmeses)oufeto(apartirde3meses)[…].(CAPEZ,2012,p.143-144).

Nesse diapasão, define o douto doutrinador Rogério Greco que o aborto pode serovular,embrionáriooufetal,conformesesegue:

Oobjetomaterialdodelitodeabortopodeseroóvulofecundado,oembriãoou o feto, razão pela qual o aborto poderá ser considerado ovular (secometidoatéosdoisprimeirosmesesdegravidez),embrionário(praticadono terceiro ou quarto mês de gravidez), e, por último, fetal (quando oproduto atingiu os cinco meses de vida intrauterina e daí em diante).

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(GRECO,2011,p.228,grifodoautor).

Diante do exposto, pergunta-se: o que se considera vida para fins da proibição docrimedeaborto?Poisbem,apesardadefiniçãodomomentoemquecomeçaavidasetratardeumtemapolêmico,poisparaunsinicia-secomaconcepção,ouseja,instanteemqueoespermatozoidefecundaoóvulo,eparaoutrosseiniciacomaformaçãodoSistema Nervoso Central, momento em que o feto passará a ter consciência,majoritariamente, a doutrina se posiciona de acordo com a primeira definição. Noentanto, para fins penais, a proteção à vida será juridicamente protegida a partir danidação - momento de implantação do embrião de na parede uterina, conformedefinem Greco (2011), Mirabete e Fabbrini (2013). Assim, não será configuradoaborto o uso de métodos e medicamentos anticoncepcionais que atuam após afecundação e não permitem a nidação, bem como no caso de manipulação deembriõesforadoorganismohumano.Damesmaforma,nãoseconfiguraránoscasosde gravidez extrauterina, quando o aninhamento é feito fora da cavidade uterina,instalando-seoóvulonatrompa,noovárioounacavidadeabdominal.

Ressalta-seque,ParaFernandoCapez,apráticaabortivajápodeseconfigurarapartirdo momento da fecundação, sendo que os meios anticoncepcionais permitidos sãoformasdeexclusãodatipicidadeoudailicitudedocrime,inverbis:

É certo que o óvulo fecundado ainda não se fixou na parede do útero e,portanto,aindanãoiniciouoseudesenvolvimento,masvidajáexiste.Umavidaqueaindavaicomeçarasedesenvolver,que,porém,jáfoigeradapelafertilização do óvulo. Desse momento em diante, pode haver aborto. Nochamado dispositivo intrauterino, mais conhecido como DIU, há que seatentarparaoseguintedetalhe:existemdoissistemas.Oprimeiroatuasobreo óvulo já fecundado, impedindo a fixação no útero […] o uso domencionado dispositivo é permitido por lei, estando amparado peloexercícioregulardodireito,causadeexclusãoda ilicitude,aqualcomoopróprio nome já indica, exclui o crime (CP, art. 23, III, parte final).(CAPEZ,2012,p.147).

Emcontrapartidaaoiníciodaproteçãoàvidapelotipopenal,seuencerramentodar-secomoiníciodoparto,encerrando-seapossibilidadedeaborto,passandoamortedonascituro a ser considerada como infanticídio ou homicídio a depender do caso.Oparto inicia-se com a dilatação do colo do útero, como rompimento damembranaamniótica ou, sendo cesariana, com a incisão das camadas abdominais. (GRECO,2011,p.226).

Dessa forma, conclui-se que ocorrerá aborto quando o produto da concepção for

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destruído entre a nidação e o início do parto, colocando fim à vida humanaintrauterina em desenvolvimento, independente da sua expulsão. Assim, defineNélsonHungriaapud(GRECO,2011,p.226):

o Código, ao incriminar o aborto, não distingue entre óvulo fecundado,embrião ou feto: interromper a gravidez antes do seu termo normal, hácrimedeaborto.Qualquerquesejaafasedagravidez(desdeaconcepção9até o início do parto, isto é, o rompimento da membrana amniótica),provocar sua interrupção é cometer o crime de aborto.A ocasião do feto(alheio à sua imaturidade ou ao emprego dosmeios abortivos), depois deiniciadooprocessodoparto,éinfanticídio,enãoabortocriminoso.

Definido o conceito de aborto no ordenamento jurídico do país, faz-se necessáriodefinir como tal prática foi positivada no Código Penal Brasileiro, visto que nemsempretodasasformasprevistasatualmentetinhamocaráterilícitoouaexceçãoparaa sua prática, sendo implementado, primeiramente, por força dos costumes, semprevisãoexpressa,vindoaserinseridoemodificadoformalmenteapartirde1830.

EvoluçãohistóricanoBrasil

Apráticadoabortonemsemprefoicondenadajuridicamentenoordenamentojurídicobrasileiro, não estandoprevistana legislação.Emumprimeiromomento, quandooBrasil era colônia de Portugal, a prática do aborto era condenada por interessesreligiosos, políticos, econômicos e sociais da época, buscando atender aos dogmasmorais da Igreja Católica e à colonização do território pelo Estado português.(EMMERICK,2008,p.54).Em1830,foiqueCódigoCriminaldoImpériopassouapreverapráticadoabortocomocrimequandocometidoporterceiro,positivando-onoordenamento jurídico brasileiro,mas não previa o perpetrado pela própria gestante,tipificaçãoessainserida,posteriormente,peloCódigoPenalde1890.Finalmente,em1940,oCódigoPenaltipificouasfigurasdoabortoprovocado,sofridoeconsentido,osquaisestãoprevistoslegalmenteatéomomento.(CAPEZ,2012,P.144.)

Alémdisso,cabeenfatizarquenessecontextoapráticadoabortonemsemprebuscouaproteçãododireitoàvidadofeto,masrelacionava-seàsquestõesmorais,aosbonscostumes,aoadestramentodamulhernocasamentoeaopovoamentodoterritóriodoBrasil colônia.Posteriormente, obem jurídico tuteladopassou a ser a segurançadamulhere,emseguida,asuahonra,passandoaprotegerefetivamenteavidafetalcomoCódigode1940.(EMMERICK,2008,p.55-58-59-61)

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NoBrasilcolônia,apráticadoabortonãoerapositivadajuridicamente,talvezpornãoterrelevâncianoplanododireito,noentanto,apráticaera totalmenterejeitadapelaIgreja Católica – religião que imperava à época – e pelo Estado que buscava aexpansão territorial e o seu povoamento. Primeiramente, a Igreja buscava protegernão a vida,mas sim os valoresmorais damulher e a finalidade última do sexo, aprocriação,de formaqueo idealmaternoeraessencialparaa educaçãoeexpansãodos bons costumes, além de que tudo levava a crer que a prática do aborto eracorriqueira quando o produto da concepção era fruto de relacionamentos fora docasamento,contrariandoosmandamentosdaépoca.Poroutrolado,ecomoapoiodaIgreja na luta contra o aborto, o Estado se valia dessa premissa para garantir aexpansão e povoamento territorial que necessitava a colônia.Nesse sentido,RulianEmmerick define que não era o direito à vida que se protegia, mas questõesdemográficas,moraisereligiosas,comoseexpõe:

A condição feminina no Brasil colônia estava associada aos interessesreligiosos, políticos, econômicos e sociais da época, ou seja, estritamenteligada aoprojetoda colonizaçãodo império colonial português.OEstadoportuguês tinha como preocupação central o vazio demográfico doBrasilColônia,aopassoqueapreocupaçãodaIgrejaCatólicaeracomaquestãomoralnoinsipienteEstadocolonial,construindoumaassociaçãodamulheràimagemda“santa-mãe”.

[…]

Nesseperíodohistórico todoprojetode construçãoda “santa-mãe” estavaimersodentrodoquesepodedenominarmaternidadeideal,umavezqueoplano de colonização em vias de expansão necessitava, urgentemente,povoaroterritóriodoBrasilColônia.

[…]

Tal fato configurava um flagrante controle do corpo e da sexualidade damulher,poisoqueestavaemjogonãoeraaproteçãoàvidadofetodesdeaconcepção, mas questões de cunho demográfico, moral e religioso.(EMMERICK,2008,p.54-55).

Considerando-sequeocrimedeabortonãoeratipificadoequeseusditamestinhamorigens religiosas,nãohavia tambémum tipopenalpunitivoparaa suaprática.Naépoca, associava-se a prática àmaternidade e ao casamento, de forma que quem opraticavasofriapuniçõesmoraisereligiosasseverasporpartedaIgreja,associandoàmulher uma vida sexual desregrada e de relacionamentos ilegítimos, uma vez que

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rompiacomasleisdanaturezaedeDeus,poisesvaziavaopoderdivinoenaturaldeconceberumfilho.(EMMERICK,2008,p.57).

Em1830,comapromulgaçãodoCódigoCriminaldo Império, foiqueapráticadoaborto foi positivada no ordenamento jurídico brasileiro. No entanto, somente seconfigurou nesse código a prática por terceiro com ou sem o consentimento dagestante, não sendo passível de condenação, portanto, o denominado auto-aborto.Nessapassagemhistórica,bemjurídicotuteladoaindanãoeraavida,masasegurançadapessoa,nocasoamulher,tendoqueoreferidocódigo,emseusartigos199e200,refere-seaos“CrimescontraaSegurançadaPessoaedaVida”,(EMMERICK,2008,p.57),inverbis:

Art. 199 – “Occasionar aborto por qualquer meio empregado interior ouexteriormentecomconsentimentodamulherpejada.”

Penas-deprisãocomtrabalhoporumacincoanos.

Seocrimefôrcommettidosemconsentimentodamulherpejada.

Penas–dobradas.”

Art. 200 – “Fornecer com conhecimento de causa drogas ou quaisquermeiosparaproduziraborto,aindaqueestenãoseverifique.”

Penas–deprisãocomtrabalhospordousouseisanos.

Seestecrimefôrcommettidopormedico,boticário,cirurgiãooupraticantedetaesartes.

Penas–dobradas.”

Emrelaçãoàpuniçãodamulherquantoàpráticadoauto-aborto,verifica-sequeessetipo penal somente foi positivado no Brasil no século XIX, quando passou a serRepública,momentoemqueoCódigoPenaldaRepúblicaampliouoroldotipopenaldoabortoparaabrangeraprópriamulher,bemcomoimplementouanoçãodeabortolegal ou necessário a fim de salvar a vida da gestante. Cabe ressalta-se que,juntamentecomaprevisãodocrimedeauto-aborto,foiinseridaumaatenuanteparaquando a conduta fosse praticada para ocultar desonra própria.OCódigo Penal daRepública,de1890,surgiuemummomentoemqueideaisliberaisseexpandiampeloBrasile,nessecontexto,obemjurídicotuteladonapráticadocrimedeabortopassoua ser ahonradamulher,não tendoaindacomo focoavidado feto. (EMMERICK,2008,p.58-59).Assim,previamosartigos300a302doreferidoCódigo:

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Art.300.Provocaraborto,hajaounãoaexpulsãodofructodaconcepção:

Noprimeirocaso:-penadeprisãocellularpordousaseisannos.

Nosegundocaso:-penadeprisãocelluarporseismezesa-umanno.

§1.Siemconsequênciadoabortooudosmiosempregadosparaprovocaí-oseguir-seamortedamulher:Pena–deprisãocellulardeseisa24annos.

§2.Sioabortoforprovocadopormédico,ouparteiralegalmentehabilitadaparaoexercíciodamedicina:

Pena-amesmaprecedentementeestabelecida,eaprivaçãodoexercíciodaprofissãoportempoigualaodacondenação.

Art.301.Provocarabortocomannuenciaeacordodagestante:

Pena–deprisãocellularporumacincoannos

Paragraphoúnico.Emigualpenaincorreráagestantequeconseguirabortarvoluntariamente, empregando para esse fim osmeios; e com recuccão daterçaparte,siocrimeforcom-mettidoparaocultarades-honraprópria.

Art. 302. Si o medico ou parteira, praticando o aborto legal, ou abortonecessário,parasalvaragestantedamorteinevitável,ocasionar-lheamorteporimperíciaounegligencia:

Penas - de prisão cellular por dois mezes a dous annos, e privação doexercíciodaprofissãoporigualtempoaodacom-demnacão.(EMMERICK,2008,p.59)

Por fim, em1940, foi editadooCódigoPenalBrasileiro, que tipificou apráticadoabortocomocrimecontraavidae,seguindoaevoluçãohistóricadoaludidocrime,previu o auto-aborto, o aborto praticado por terceiro, consentido ou não, além deabarcaraquestãodeaumentodepenasecausarlesãocorporalouamortedagestanteedoabortolegalnocasoderiscoàvidadagestanteegravidezresultantedeviolaçãosexual. Tais dispositivos legais foram implementados no ordenamento jurídicobrasileiroe,atualmente,vigoramcomoseguintetexto:

Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lhoprovoque:

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Pena–detenção,de1(um)a3(três)anos.

Art.125.Provocaraborto,semoconsentimentodagestante:

Pena–reclusão,de3(três)a10(dez)anos.

Art.126.Provocaraborto,comoconsentimentodagestante:

Pena–reclusão,de1(um)a4(quatro)anos.

Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não émaior de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se oconsentimentoéobtidomediantefraude,graveameaçaouviolência.

Art.127.Aspenascominadasnosdoisartigosanterioressãoaumentadasdeum terço, se, em consequência do aborto ou dosmeios empregados paraprovoca-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e sãoduplicadas,se,porqualquerdascausas,lhesobrevémamorte.

Art.128.Nãosepunooabortopraticadopormédico:

I-semnãoháoutromeiodesalvaravidadagestante;

II–seagravidezresultadeestuproeoabortoéprecedidodeconsentimentodagestanteou,quandoincapaz,deseurepresentantelegal.

Levando-seemconsideraçãoocontextohistóricoapresentado,tem-sequeapraticadoabortofoirepresadanoordenamentojurídicobrasileirodesdeosprimórdios,quandonão positivado, até atualmente, levando-se em consideração questões morais,religiosas,demográficas e emseguida tutelando-seaproteçãoàmulher e àvidadofeto.Passou-sedaprevisãoincriminadorarestritatãosomentedapráticarealizadaporterceiro para a infração do auto-aborto, bem como passou a legalizar o aborto emcertoscasos.

Atualmente, a questão do aborto é duramente discutida e causamuita polêmica nasociedade brasileira, uns clamam pelo reconhecimento dos direitos da mulherreferentesàsexualidadeeàreproduçãocomconsequentelegalizaçãototaldoaborto,enquantooutrosreprovamtotalmenteapráticaepriorizamodireitoàvidaintrauterinaedonascituro.Talquestãoédiscutidanãosónoparlamento,ondetramitaoProjetodeLei doSenadon. 236/2012, que, dentre outrasmatérias, amplia o rol da práticaabortiva considerada legal, mas também no âmbito do Poder Judiciário, querecentemente aprovou, na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental n.

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54/2004,apráticadeabortodosfetosanencefálicos,ouseja,semcérebro.

Dascaracterísticaspenais

Quandosetratadocrimedeaborto,oCódigoPenalBrasileirooprescrevedeformamuitosucintaeobjetiva,ficandoacargodadoutrinaedajurisprudênciaespecificaredetalharmaisconcretamenteessetipopenal,afimdefacilitaroseuentendimentoeaplicabilidade.Inicialmente,paraqueseincorranatipificaçãopenaloraemcomentoénecessárioseverificardequeformaocorreuoaborto,considerandoqueessepodeserespontâneoounatural,acidentalouprovocado.Oprimeirodecorredeproblemasnaturaisnagestaçãoeoabortoocorrepela expulsãodoprodutodaconcepçãopeloorganismo materno; o segundo configura-se quando o aborto ocorre porcircunstânciasexternasenãointencionais,sejapelagestantesejaporterceiro,comonocasodeumaquedaoudeumatropelamento, respectivamente.Nessescasos,nãoserá configurado o crime de aborto, haja vista que no primeiro não há conduta,ocorrendonaturalmente,enosegundo,emquepesehaverumaconduta,essaocorresem intensão,não seconfigurandocrimepor inexistiroabortona formaculposa,oque exclui a punibilidade damulher gestante ou imputa o crime de lesão corporalculposaaterceiro.

Dessaforma,tem-sequesomenteseráamparadoetipificadocomocrimepeloCódigoPenaloabortoprovocado,considerando-secomosujeitoativoagestante,nocasodoauto-aborto,equalquerpessoanosdemaiscasosprevistos.Poroutrolado,porseroproduto da concepção objeto material do delito, tutelando-se juridicamente a vidahumanaemdesenvolvimento,osujeitopassivoserá,emregra,oovo,embriãooufeto,sendo para Fragoso apud (MIRABETTE; FABBRINI, 2013, p. 60) o Estado ou acomunidade nacional, por considerar que o feto não é titular do bem jurídicoprotegido.Alémdisso,emsetratandodeabortosemoconsentimentodamulher,seráela também considerada sujeito passivo juntamente com o feto. Ressalta-se que, apriori, amulhernão será sujeitopassivoquando realizadooprocedimento comseuconsentimento, no entanto, para Greco (2011, p. 228) “sendo graves as lesões ouocorrendo amorte da gestante, esta também figurará como sujeito passivo,mesmoquesecundariamente,hajavistaainvalidadedeseuconsentimento,emdecorrênciadagravidadedosresultados.”

Quantoaoelementosubjetivodacondutanapráticadoaborto,exige-sequeoagenteaja com dolo, ou seja, é necessário que ele queira o resultado, seja direta ouindiretamente, não havendo sua forma culposa. Para Capez (2012, p. 150) o dolo

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direito ocorrerá quando o agente agir com livre vontade e consciência a fim deinterromperagravidez,aopassoquenoindiretoassume-seoriscodoresultadoaoserealizardeterminadoato.Dessaforma,oagentedevepraticaroatoinfracionalcomânimosdecausaramortedoprodutodaconcepçãoouassumaoriscodeproduzi-la,utilizando-sedemétodosabortivosparacausa-la.TaismétodosaseremempregadossãoclassificadosporMirabeteeFabbrinidaseguinteforma:

Os processos utilizados podem ser químicos, orgânicos, físicos oupsíquicos. São substâncias que provocam a intoxicação do organismo dagestanteeoconsequenteabortoofósforo,ochumbo,omercúrio,oarsênio(químicos),eaquinina,aestricnina,oópio,abeladonaetc.(orgânicos).Osmeiosfísicossãoosmecânicos(traumatismodoovocompunção,dilataçãodo colo do útero, curetagem do útero, microcesária), térmicos (bolsas deágua quente, escalda-pés etc.) ou elétricos (choque elétrico por máquinaestática).Osmeiospsíquicosoumoraissãoosqueagemsobreopsiquismoda mulher (sugestão, susto, terror, choque moral etc.). (MIRABETE;FABBRINI;2013,61).

Dessa forma, realizadas tais práticas, o crime se consuma com a interrupção dagestação e consequentemorte do feto, seja ainda no útero ou após a expulsão comfalecimento desde que decorrente do método abortivo empregado, configurando-secrimeconsumado.Noentanto,casoapráticaabortivanãointerrompaagestação,porcausas alheias à vontade do agente, ou, após a expulsão, o feto sobreviva, ficaráconfigurada a forma tentada do aborto, lembrando que, se o agente vier amatar onascituro,considerar-se-á infanticídio(mãe)ouhomicídio(terceiro)emconcursodecrimecomaprática tentadadoaborto.Umavezpraticado,ocrimedeabortodeixavestígios, sendo indispensável a sua comprovação o exame de corpo de delito,podendoelesersupridoporprovadocumentaloutestemunhalpelaimpossibilidadedarealizaçãodoexameporteremdesaparecidoseusvestígios.

Realizadooexamedecorpodedelitoenãosejaconstatadooestadodegravidezouausente a prova que ateste a gravidez, não há de se cogitar o crime de aborto.Damesmaforma,nãoseconfiguraráoabortoquandocomprovadoqueofetoaotempoda prática já se encontrava morto (impropriedade absoluta do objeto) ou quandoempregado meio inteiramente ineficaz de causar o aborto. Assim, além dacomprovaçãodoestadogravídico,deve-seprovarqueprodutodaconcepçãopossuíavidaaotempodapráticaabortiva.Notequeénecessáriaaprovadavida,masnãoaviabilidadefetal,conformedispõeCapez(2012,p.148):“Nãoénecessário,contudo,comprovaravitalidadedofeto,ouseja,acapacidadedeatingiramaturação;exige-setãosomentequeestejavivoequenãosejaumprodutopatológico,comoporexemplo,agravidezextrauterina.”.

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Porfim,cabecolocarqueapráticadoabortonãoocorresomentenaformacomissiva,mas também admite-se sua forma omissiva.Nos casos em que o agente tem papelgarantidor,afimdeevitaroresultado,noentanto,nãoofazeoabortoseconsuma,responderáelepeloabortoporomissão,conformelecionaCapez:

Odelitotambémpodeserpraticadoporcondutaomissivanashipótesesemqueosujeitoativo temaposiçãodegarantidor;porexemplo,omédico,aparteira, a enfermeira que, apercebendo-se do iminente aborto espontâneoouacidental, não tomamasmedidasdisponíveis para evita-lo, respondempelapráticaomissivadodelito(CAPEZ,2012,p.146).

Assim, para que seja configurado o crime de aborto, deve-se verificarminunciosamenteoselementosacimaapresentados,considerando-seque,casoalgumdos elementos não estejam presentem, não haverá crime ou, se houver, não seráconsideradoaborto.

Formasdeaborto

Atualmente,asincriminadorasexistentesnoCódigoPenalBrasileirotratamdoauto-abortoouabortoconsentidopelagestante(art.124),doprovocadoporterceirosemoconsentimentodagestante(art.125),doconsensualpraticadoporterceiro(art.126).Alémdisso,insere,emseusartigos127e128,aqualificadoradodelitoeasformaslegalmentepermitidas,respectivamente,nãoestandoabrangidoporesseroloabortodofetoanencefálicoautorizadopeloSupremoTribunalFederalnaADPFn.54/2004.Cadaformaprevistanecessitadeelementosprópriosparaqueseconfigure.

Nocasodoauto-abortoedoabortoconsentido,lecionaMirabeteeFabbrini(2013,p.62-63) que se trata de crime especial, o qual somente poderá ser praticado pelagestante, entendendo-se como crime de mão própria, incorrendo, nesse dispositivopenal, a princípio, somente a gestante, aopassoqueo agentequeopraticar comoconsentimentoresponderáconformeoart.126doCódigoPenal.Noentanto,emquepeseumaprimeiraanáliseimputartalpráticaapenasàgestante,adoutrinalecionaapossibilidade de terceiro, mesmo não participando ativamente do aborto, serpenalmente condenado com base no artigo 124 do CP como partícipe, caso tenhainduzido, instigado ou auxiliado de maneira secundária, conforme coloca Capez(2012,p.217).

Em se tratandode aborto provocadopor terceiro semo consentimento da gestante,previstonoartigo125doCódigoPenal,tem-setipopenaldepenamaisgravosapor

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considerar como vítima também a gestante, por não consentir o ato. No referidoincidente penal, apresenta-se como elementar do crime a condição de ser praticadoporterceiroequesejasemoconsentimentodagestante,empregando-sefraude,graveameaçaouviolência,enquadrando-setambémnessetipopenalcasooconsentimentodagestantesejadeclarado inválido.NessesentidodefineCapez(2012,p.153-154),aoconsiderarquenãoocorreoconsentimentoquandoseempregameiosoumanobrasabortivassemoconsentimentodagestante,quaissejam:

Dissentimento real. O dissentimento é real quando o sujeito empregacontraagestante(cf.2ªpartedoparágrafoúnicodoart.126):

a) fraude: é o emprego de ardil capaz de induzir a gestante em erro; porexemplo:médicoque,apretextoderealizarexamesderotinanagestante,realizamanobrasabortivas;

b)graveameaçacontraagestante:éapromessadeummalgrave,inevitávelouirresistível;porexemplo:maridodesempregadoqueameaçasematarseamulhernãoabortaracriança,paiqueameaçaexpulsarafilhadecasaseelanãoabortar;

c)violência:éoempregodeforçafísica;porexemplo:homicídiodemulhergrávidacomconhecimentodagravidezpelohomicida;

Dissentimento presumido. O art. 126, parágrafo único, 1ª parte, prevêhipótesesemquesepresumeodissentimentodavítimanapráticadoabortopor terceiro. O legislador, em determinados casos, considera inválido oconsentimento da gestante, por não ser livre e espontâneo, de modo queaindaqueaquele estejapresente, a condutadoagente será enquadradanotipopenaldoart.125.(grifodoautor)

No último caso previsto na legislação, penaliza-se aquele que causou o abortoconsentido pela mãe, a qual incorrerá no artigo 124 do Código Penal como visto.Nesse caso, a elementar em análise será a validade do consentimento damãe, bemcomoa suamantençaaté a configuraçãodo tipopenal.Assim, segundoMirabeteeFabbrini(2013,p.63-64),oconsentimentoseráexpressooutácito,devendoexistiratéaconsumaçãodocrimee,casoagestantedesista,oagenteincorreránocrimeprevistonoart.125doCP.ParaFragosoapud(MIRABETE;FABBRINI,2013,p.63-64)“apassividadeeatolerânciadamulherequivalemaoconsentimentotácito”.

Noque tangeàqualificadora,conformeCapez,MirabeteeFabbrini,verifica-sequeelaocorreráquandodapráticadoabortoresultarlesãocorporaldenaturezagravena

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gestanteouasuamorte.Nessecaso,deve-severificaracondutadoagente,umavezque é necessário que ele não pretenda atingir o resultado, tratando-se de crimepreterdoloso(dolosoquantoaoaborto–anterior-eculposoquantoàlesãooumorteda gestante - posterior), uma vez que, caso desejasse o resultado, responderia porhomicídiooupelalesãojuntamentecomoaborto.Alémdisso,éimportantefrisarquetalqualificadoranãoseaplicaàgestantenemaopartícipenocasodeauto-abortooudasuaconcessão.Ressalta-se,ainda,que“nãoocorreaqualificadoraquandohouverlesãogravenecessáriaparaoaborto(lesãodoútero,porexemplo).Nessescasos,éelaconsequêncianormaldofato.”(MIRABETE;FABBRINI,2013,p.64).

Embora o Código Penal Brasileiro elenque os tipos penais aplicáveis à prática doaborto, o mesmo texto trouxe também para o ordenamento jurídico brasileirocircunstânciasqueautorizamsuapráticalegalmente,semqueseusagentesincorramnoscasosprevistosnosartigos124a127docitadocódigo.Aprimeirahipóteseocorrequandonãoháoutraformadesalvaravidadagestantesenãooaborto,denominando-se aborto necessário ou terapêutico, tendo em vista o estado de necessidade parasalvar a vida damãe, onde a legislação optou pela gestante ao feto.Nesse sentidodefineGreco (2011,p. 235), “no casode abortonecessário, tambémconhecidoporaborto terapêuticoouprofilático,não temosdúvidaemafirmarque se tratadeumacausade justificaçãocorrespondente ao estadodenecessidade.”.Ponto chavedessaforma de aborto, é que não há necessidade de que o aborto seja concedido pelagestante, devendo o médico decidir sobre o estado de necessidade. (MIRABETE;FABBRINI,2013,p.65).

Outra forma legalmente prevista é o denominado aborto sentimental, o qual épermitidoemcasodegravidezdecorrentedeestupro.Nessecaso,autoriza-seoabortopor entender que não está amulher obrigada a prosseguir a gravidez resultante deviolência sexual, além de se levar em conta as más características do estuprador.Mirabete eFabbrini (2013,p.66)dizque “justifica-se anormapermissivaporque amulhernãodeveficarobrigadaacuidardeumfilhoresultantedecoitoviolento,nãodesejado.Alémdisso, frequentementeoautordoestuproéumapessoadegenerada,anormal, podendo ocorrer problemas ligados à hereditariedade.”. Além disso, osmesmos autores afirmam que a norma não exige autorização judicial para que seprocedaaoaborto,bastandoqueagestanteouseurepresentantelegal,adependerdocaso, o autorize e que sejam apresentadas provas quanto ao estupro, como porexemplo,umboletimdeocorrência.

Assim, fica demonstrado que as formas não incriminadoras da prática do abortoprevistas no Código Penal são extremamente limitadas e são permitidas em casosextremosparaproteger amulher, seja fisicamente sejapsicologicamente,não sendopermitidanoordenamentojurídicobrasileironenhumaoutraformadeabortolegal,a

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exceçãodedecisãoproferidarecentementepeloSupremoTribunalFederal.Nacitadadecisão, a Suprema Corte acordou, por meio da Arguição de Descumprimento dePreceito Fundamental n. 54/2004, que ficaria autorizada a prática de abortodenominadaterapêuticanoscasosdefetosquenãopossuíssemcérebro(anencéfalos),protegendo-semaisumavezamulherpornãoserelaobrigadaamanterumagravidezdeprodutoinviávelàvida.

A prática do aborto no caso de fetos anencéfalos, até a prolação da respeitáveldecisão,ocorriaapósautorizaçãojudicial,quandonãointempestiva,oupormeiodepráticasilícitas.Essaeramaisumadascausasquelevavaamulherapraticaroabortoilegalmente e que atualmente está descriminalizada. No entanto, há ainda muitascausas que levam asmulheres a praticar tal ato de forma insegura e ilegal, são osdenominados por Capez, Greco, Mirabete e Fabbrini como aborto eugenésicos(eugênico ou piedoso) e sociais (econômico) ou honoris causa. Para os referidosdoutrinadores,primeirodecorredaverificaçãodeanomaliasoudeficiênciasnofeto,casoemqueagestanteoptapornãoprosseguir comagravidez. Jáo segundocasoocorre quando a gestante não tem condições econômicas de manter a gravidez ouaquelaéindesejadaeaprejudicaráprofissionalmente,ouatéemcasosdagravidezsedá por relação extramatrimonial. Em ambos os casos, não há exceções para serempraticados.

Tendoemvistaascausasquelevamàpráticadoabortoilegal,aolongodahistória,foram apresentadas diversas propostas legislativas buscando-se a descriminalizaçãodo aborto, no entanto, nenhuma prosperou. Atualmente, tramita no CongressoNacionaloProjetodeLeidoSenadon.236/2012,quebuscareformarodesatualizadoCódigo Penal Brasileiro, entre elas, a alteração em relação ao aborto legal, a qualbuscaampliarsuashipóteses,inverbis:

Exclusãodocrime

Art.128.Nãohácrimedeaborto:

I–sehouverriscoàvidaouàsaúdedagestante;

II–seagravidezresultadeviolaçãodadignidadesexual,oudoempregonãoconsentidodetécnicadereproduçãoassistida;

III – se comprovada a anencefalia ou quando o feto padecer de graves eincuráveis anomalias que inviabilizem a vida extra-uterina, em ambos oscasosatestadospordoismédicos;ou

IV-seporvontadedagestante,atéadécimasegundasemanadagestação,

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quando o médico ou psicólogo constatar que a mulher não apresentacondiçõespsicológicasdearcarcomamaternidade.

Parágrafoúnico.NoscasosdosincisosIIeIIIedasegundapartedoincisoIdesteartigo,oabortodeveserprecedidodeconsentimentodagestante,ouquandomenor,incapazouimpossibilitadadeconsentir,deseurepresentantelegal,docônjugeoudeseucompanheiro.

Talalteraçãolegislativaabarcariadeformapotencialgrandepartedascircunstânciasque dão causa ao aborto ilegal e clandestino atualmente, mas pergunta-se se talalteração é o que a sociedade realmente almeja - aprovação ou reprovabilidade –,tendoemvistaquetrata-sedeumapropostadoSenadoFederalequeasociedadenãoopinou quanto as citadas mudanças. Outro aspecto a ser imprescindivelmenteobservadoéseessainovaçãolegislativaproduziráseusefeitosquantoàproibiçãodoaborto caso seja aprovada, inibindo sua prática ilícita na República Federativa doBrasildeformapotencial,tendoemvistaqueanormaatualeasanterioresnãoforamcapazesdelimitaroureduzirtalprática.Nessesentido,explicitaEmmerick:

No que diz respeito ao delito de aborto, crime esse, historicamentecontrovertidoecomsignificativasconotaçõespolíticas,moraisereligiosas,este somente passou a ser tipificado como conduta delituosa, poracondicionamentos históricos, sociológicos, antropológicos, econômicos,políticos,morais e religiosos, emumcontextodemudançadeparadigma,qualseja,osurgimentodaIdadeModerna.Atravésdeestudosteóricosedaobservaçãoempírica,verifica-sequenãoháestreitarelaçãoentreonúmerodeabortospraticados,suaproibiçãoesuailegalidade;queacriminalizaçãonuncainibiuarealizaçãodeabortos.(EMMERICK,2008,p.36).

Além disso, em relação ao âmbito constitucional, assim como qualquer normapositivada no ordenamento jurídico brasileiro, o Código Penal também deve estarconsoanteàCartaMagna.Nesseaspecto,tem-sequealegislaçãoreferenteaoabortobusca resguardar, a priori, o direito à vida em desenvolvimento e, num segundomomento,aincolumidadefísicaepsíquicadamulher.Noentanto,háquemdefendaque a criminalização do aborto viola o princípio da igualdade e do Estadodemocráticodedireito,alémdeirdeencontroaodireitoàprivacidade,àintimidade,àliberdadeeàautonomiaindividual,todosexpressosnaConstituiçãoFederalde1988,de modo que o Estado passa a interferir de tal forma que reprime, controla edomesticaocorpodamulherapartirdasuasupremaciadepoder,entendendoqueolegislador ao tipificar o aborto, não se restringiu à proteção da vida,mas buscou ocontroledocorpo,dasexualidadeedareproduçãodamulher,preservando,assim,osbonscostumeseosprincípiosmoraisereligiosos.(EMMERICK,2008,p.45-46)

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Nesse sentido, grupos buscam incessantemente a ampla legalização do aborto emfavor de um vasto exercício da cidadania, lutando pela igualdade de direitos entrehomens e mulheres, principalmente quanto ao direito de controle do corpo e dasexualidade feminina, de forma que os direitos humanos da mulher abrangemquestões relativas à sua sexualidade, inclusive sua saúde sexual e reprodutiva,podendo decidir livremente com respeito a essas questões, livres de coerção,discriminação e violência.Assim, o Estado buscaria prevenir o aborto não por ummeio coercitivo, mas sim, pela implementação de programas governamentais quevisem à educação sexual e contraceptiva e ao planejamento familiar, a fim de quefossemreduzidososnúmerosdegravidezindesejadae,consequentemente,onúmerodeabortosemortesmaternais.

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Dos conflitos de direitos e princípiosfundamentaisOconflitoprincipiológico

Os que defendem a descriminalização do aborto têm como pilar basilar de suafundamentação o reconhecimento do direito à liberdade sexual e reprodutiva damulher. Tem como objetivo estabelecer uma forma onde amulher possa exercer ocontrole sobre o seu corpo e ter autonomia para decidir se mantem ou não umagravidez, seja por questões do seu planejamento reprodutivo e familiar, seja porquestõeseconômicasoupelofetoteranomalias.Alémdisso,vislumbramqueaquelasque optem por realizar o aborto, o faça de forma segura, de modo que sejamminimizadasasmortes,sequelasedanosfísicosepsicológicosdecorrentesdeabortosnãosegurosemalrealizados.Enfim,tudoissorelaciona-seaoprincípiodadignidadedapessoahumana,deformaqueamulhertenhaessedireitoeprincípiofundamentaisresguardadosasinessaquestãotãodelicada.

ParaLuísRobertoBarroso(2013,p.272-273),adignidadedapessoahumanaéumprincípiocomstatusconstitucionalequeingressanomundojurídicovaloresmoraisepolíticos fundamentais.Dessa forma, a dignidade passa a integrar grande parte dosdireitos fundamentais, sendo fonte e núcleo essencial de regras que incidem sobreregrasconcretas,mesmoqueessasnãosejamproibidasexpressamente,tendo-seque,se praticadas, não são legítimas, pois afrontam o princípio basilar da dignidade dapessoahumana.Assim, tal princípio tornou-se umdos grandes consensos éticos domundoocidental, comdefinição abrangente e quepassou a ser adotadadediversasformas para que os conflitos sejam sanados e interesses sejam atendidos eresguardados.Assim,nasquestõesmoralmentecontrovertidas,utilizam-se,ambososlados,desse institutocomofundamentodeseusanseios,comoénocasodoaborto,conformelecionaocitadoautor:

Isso temfeitocomquea ideiadedignidadesejafrequentemente invocadapelosdoisladosdolitígio,quandoestejamemdisputaquestõesmoralmentecontrovertidas.Éoquetemsepassado,porexemplo,emdiscussõessobreoaborto, suicídio assistido ou pesquisas com células-tronco embrionárias.(BARROSO,2013,p.273).

Assim,emboraoprincípiodadignidadedapessoahumanasejainvocadocomoformaparaselegalizaroabortoemfavordamulher,omesmoprincípioéchamadoparase

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preservar a vida intrauterina. Para o Pró-vida, a dignidade da pessoa humana doproduto da concepção vincula-se ao direito basilar e principal do ordenamentojurídico brasileiro, o direito à vida. Nesse diapasão, tem-se que todos os direitosmaterialmente fundamentais irradiam da dignidade da pessoa humana e devem terproteção máxima, independente da sua posição formal, conforme lesiona Barroso(2013,p.201-202).Osprincípiosoraemcomento,dividem-seemdimensões,sendomaisfortementenadoutrinaosdeprimeiraaterceirageraçãoeodequartacolocadoapenasporalgunsautores(BARROSO,2013,eNASCIMENTOFILHO,2013).

No âmbito da discussão do aborto, os princípios invocados, tanto de um como deoutrogrupo,estãoprimordialmenteindicadosnosdireitosdeprimeiradimensãoquesereferemaosdireitosindividuaisemrelaçãoaosvaloresligadosàproteçãodavida,da liberdadeeda igualdade jurídica,protegendoo indivíduoemfacedoEstado.Nasegundadimensão,tem-sedireitossociais,econômicoseculturais,principalmentenoque tange a prestaçãode saúde e educaçãopeloEstado.Todos eles retomamo fimexistencialdecada ser,osvaloresque lhes sãoasseguradosparaexistir eviver suacondiçãodepessoadeformadigna, trazendoparaoplanojurídicoaobservânciadetrêspatamaresessenciaisparaexistênciadadignidade,quaissejam:ovalorintrínsecodapessoahumana;aautonomiaindividuale;comobalançadoexercíciodecadaum,o limite imposto pelo valor comunitário. Para que esses valores sejam atribuídos atodos,necessita-sequeseuconteúdoeasnormasdelederivadastenhamomínimodelaicidade, a fim de não sofrer intervenções religiosas, que podem prejudicar seuusufrutoegarantiaporumouporoutro,devendo,ser tratadodeformahomogênea,igualitária,ouseja,comneutralidadepolíticaeuniversalidade.(BARROSO,2013,p.274).

Dosreferidosvaloresnascemprincípiosedireitosfundamentais,osquaiscompõeovalorintrínsecodadignidade.Barrosoapresentaosseguintes:

a)Direto à vida: todos os ordenados jurídicos protegem o direito à vida.Como consequência, o homicídio é tratado em todos eles como crime.Adignidadepreenche,emquasetodasuaextensão,oconteúdodessedireito.Nãoobstanteisso,emtornododireitoàvidasetravamdebatesdegrandecomplexidade moral e jurídica, como a pena de morte, o aborto e aeutanásia;

b)Direito à igualdade: todas as pessoas têmomesmovalor intrínseco e,portanto,merecemigualrespeitoeconsideração,independentedaraça,cor,sexo,religião,origemnacionalousocialouqualqueroutracondição.Aquise inclui a igualdade formal – o direito a não ser discriminadoarbitrariamentenaleieperantealei–assimcomoorespeitoàdiversidadee

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à identidade de grupos sociais minoritários (a igualdade comoreconhecimento). É nesse domínio que se colocam temas controvertidoscomo ação afirmativa em favor de grupos sociais historicamentediscriminados, reconhecimento de uniões homoafetivas, direitos dosdeficientesedosíndios,dentreoutros;

c)Direitoàintegridadefísica:dessedireitodecorremaproibiçãodetortura,do trabalhoescravo, aspenascruéis eo tráficodepessoas.Éaquique secolocamdebatescomplexoscomooslimitesàstécnicasdeinterrogatórios,admissibilidade da prisão perpétua e regimes prisionais. E, também, docomérciodeórgãosedaspesquisasclínicas;

d)Direitoàintegridademoraloupsíquica:nessedomínioestãoincluídasaprivacidade, a honra e a imagem. Muitas questões intrincadas derivamdesses direitos da personalidade, nas suas relações com outros direitos esituaçõesconstitucionalmenteprotegidas.Têmsidorecorrentesepolêmicasascolisõesentrealiberdadedeexpressão,deumlado,eosdireitosàhonra,à privacidade e à imagem, de outro. (BARROSO, 2013, p. 275, grifo doautor).

Tais princípios são basilares e inerentes ao ser humano, sendo pressupostos paraexercer sua autonomia, deixando a cargo dele os rumos da própria vida e do livredesenvolvimentodesuapersonalidade,valoresmorais,culturais,religiosos,afetivos,políticos, dentre outros.Autonomia essa que, segundoBarroso (2013, p. 275), nãopodeterimposiçõesexternasindevidasenãodevemsersubtraídasdoindivíduosemquesuadignidadesejaviolada.Nessesentido,acriminalizaçãodoabortoseriaumaformadeviolaçãodadignidadedamulher,umavezquenãopodedisporlivrementedasuaautonomiaparaexercerseusdireitosàvida,àigualdade,àintegridadefísica,moralepsíquica.

De outro lado, há o Estado que tem o dever de proteger os interesses de todos osmembros da comunidade, em particular os interesses daqueles que não podemproteger-seporcontaprópria,conformeexplanaDworkin(2003,p.17-18).Ora,seoEstado resguarda direitos ao nascituro e o exercício de todos os direitos dependeestritamente do direito à vida, conforme colocado porAlexandre deMoraes (2013,p.34), como o legislador se eximirá de tal prestação? Como deixará de garantir odireitoàvidadeumserhumanoemformação?Nessesentido,afronta-se tambémàdignidadedavidaintrauterina.

Essaceleumaéfrutodademocracia,quebuscaumajustiçasocialeigualdadeentreosadministrados.Sãoprincípiosdoordenamento jurídicogarantidosao serhumano,o

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qualéopossuidordasabedoriaedaformadeexercê-lo.Diantedisso,nãoépossívelse determinar que um princípio sempre subsiste em detrimento de outro, eles seintegram e compõe conjuntamente o âmbito normativo.Ocorre que cada indivíduotem a sua particular forma de exercê-lo, sendo que em determinados momentossurgirá o conflito de princípios, devendo o legislador, julgador e administradorponderá-losparadecidirqualmelhorseaplicaemcadacasoconcreto.

Diferentemente das regras, os princípios não são, essencialmente, ditadores decondutasecomportamentos,demodoque,casodeterminadacondutacoadunecomaregra,porelaseráabarcada,poroutrolado,nãocoadunando,aelanãopertence.Osprincípios possuem valores jurídicos e buscam um fim, os quais variam e sãovaloradossegundocadasituaçãoespecífica,gerandoconflitosdeinteresses,conformedefineBarroso:

Já os princípios indicamumadireção, umvalor, um fim.Ocorre que, emumaordemjurídicapluralista,aConstituiçãoabrigaprincípiosqueapontamem direções diversas, gerando tensões e eventuais colisões entre eles.Algunsexemplos:a livre iniciativaporvezessechocacomaproteçãodoconsumidor;odesenvolvimentonacionalnemsempreseharmonizacomapreservação do meio ambiente; a liberdade de expressão frequentementeinterferecomodireitodeprivacidade.Comotodosessesprincípios têmomesmo valor jurídico, o mesmo status hierárquico, a prevalência de umsobre o outro não pode ser determinada em abstrato; somente à luz doselementosdocasoconcreto serápossível atribuirmaior importânciaaumdo que a outro. Ao contrário das regras, portanto, princípios não sãoaplicadosnamodalidadetudoounada,masdeacordocomadimensãodepesoqueassumemnasituaçãoespecífica.Caberáao interpreteprocederàponderação dos princípios e fatos relevantes, e não a uma subsunção dofatoaumaregradeterminada.(BARROSO,2013,p.231)

Portanto,hánaverdadeumconflitodeprincípioseinteresses,deumlado,ointeressedamulhernabuscaincessantepelaigualdadeepelogozoplenodesuadignidadenoestadodemocráticodedireito.Dooutro,osquedefendemavida,emespecialaemformaçãoepossuidoradedireitosdesdeaconcepção,aqualsequerpodedefender-sedas práticas abortivas e que a levará à morte. Nessa seara, surge a técnica daponderação, que consiste na valoração dos princípios e definição de qual prevaleceem cada caso concreto. No entanto, antes de melhor definir tal ferramenta, faz-senecessárioestudarmaisdetalhadamenteas indagaçõesdecadagrupo,emespecialoPró-escolha.

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Pró-vida

Os movimentos Pró-vida têm como adeptos, em sua grande maioria, religiososcristãos que defendem a vida como fundamento universal.A partir dessa premissa,são contrários e buscam que as penas demorte, o aborto e a eutanásia não sejampositivadoseconsideradoscomoválidos.Entendemqueavidaédireitofundamentalesoberano,nãoestandodisponívelasuavaloraçãoemdetrimentodeoutrosdireitoseprincípiosfundamentais.

Emrelaçãoàvida,defendemqueela inicia-secomaconcepção,estandopresenteapartir do momento em que o espermatozoide fecunda o óvulo, de modo que esseprodutodaconcepçãojáéumpretensoserhumanodetentordedireitos,inclusiveodenãosermorto.AdoutrinadaIgrejaCatólicasistematizaquatropontosemrelaçãoaoaborto,apresentadospelofilósofoIvanaldoSantos:1.asuspensãovoluntáriadavidaéalgo ilegítimoe imoral (discussãoéticaevisadefendero serhumanode todasasformasdeviolência);2.feredeformagraveomandamentodeDeus,“Nãomatarás”;3.avidadeveserabsolutamenterespeitadaeprotegidadesdeaconcepção;4.aplicaaexcomungação de quem defende, pratica e auxilia o aborto.No tocante ao terceiroponto,oCatecismodaIgrejaCatólicaafirmaoseguinte:

“Avidahumanadeveserrespeitadaeprotegidademaneiraabsolutaapartirdomomentodaconcepção.Desdeoprimeiromomentodesuaexistência,oserhumanodeveterreconhecidososseusdireitosdepessoa,entreosquaisodireitoinvioláveldetodoserinocenteàvida”(n2270).Alémdisso,deixabemclaroque“desdeoséculoI,aIgrejaafirmouamaldademoraldetodoaborto provocado. Este ensinamento não mudou. Continua invariável. Oaborto direto, quer dizer, querido como um fim ou como um meio, égravementecontrárioa leimoral”(n2271).Porfim,determinaqueofeto“deve ser tratadocomoumapessoadesdea concepção,o embriãodeveráserdefendidoemsuaintegridade,cuidadoecurado,namedidadopossível,como qualquer ser humano” (n 2273). (SANTOS, 2008, p. 14, grifo doautor)

Alémdisso,estudosmaisatuaiseaprimoradosemrelaçãoàembriologia,apresentamqueavidainicia-secomaconcepção,sendoagravidezumaparceriaondemãeefilhotrabalhamjuntosparaalcançaroobjetivofinal,oparto.Taisestudosacompanhamoprodutodaconcepçãoemtodasassuasfases,comprovandoquedesdeafecundaçãojáháatividadedoovoparagarantirociclodagestãoqueresultaránoseunascimentoequeesseprocessoocorreemtodasasformasdegravidez,independentedaformaçãodo sistema nervoso central ou se o feto possui graves anomalias. Nesse sentido,

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concluioginecologista,obstetraebiólogoLuizRobertoFontes(2009):

A gestação é uma parceria, em que mãe e filho interagem, os dois nocomando de suas respectivas funções. Se um dos dois falhar, a gestaçãoacaba.Porém,éoovo(célula-ovoouzigoto),recém-formadonaconcepção,quedeflagraoprocesso.Oconcepto(ovo,depoisembriãoemaistardefeto)mantém-se ATIVO nesse processo, do início da gravidez ao parto. Issoindepende de haver sistema nervoso, pois anencéfalos realizam omesmoprocesso, assim como fetos portadores de aberrações cromossômicas(síndromesdeDown,Patau,Edwardsetc.)comgravedisfunçãodosistemanervoso.

Dessemodo,paraessegrupo,apessoahumanaexistedesdeaconcepçãoeé,desdeessemomento,detentoradedireitos,inclusiveodeviver.Dworking(2003,p.12-13)aborda que “fetos são criaturas com interesses próprios desde o início, aí incluído,fundamentalmente,ointeressedepermanecervivo,equeportantoelestêmosdireitosque todos os seres humanos têm de proteger esses interesses básicos, inclusive odireito de não seremmortos.” Além disso, em que pese a Constituição Federal de1988nãopreveromomentonoqual inicia avida,oCódigoCivil asseguraemseuartigo2ºque“apersonalidadecivildapessoacomeçadonascimentocomvida;masaleipõeasalvo,desdeaconcepção,osdireitosdonascituro”,oquesustentaereforçaatese do grupo Pró-vida no ordenamento jurídico brasileiro, tornando o abortoinconcebívelemqualquerhipótese,inclusiveasconsideradaslegaisatualmente.

Pró-escolha

Ogrupofeministaéformadoporaquelesadeptosaoreconhecimentodosdireitosdasmulheres, colocando-as em pé de igualdade com os homens. Tem como princípiobasilar o direito à igualdade, demaneira que sejam eliminadas todas as formas dedescriminalização, garantindo a isonomia no âmbito político, social, econômico,cultural e civil, e o acesso à educação, ao trabalho, à saúde, à alimentação e aoplanejamentofamiliar.Muitasjáforamasconquistasdessegrupo,tendoemvistaqueamulhereraconsideradaextremamenteinferioresubordinadaaohomem,limitandosuavidaà servidãoaomaridoeà famíliacomumavidaessencialmentedoméstica,nãotendoparticipaçõesnosdemaisâmbitosestatais.

Atualmente, em que pese ainda haver tal disparidade, em muitos países,majoritariamente,osdemocráticos,jáforamreconhecidosdiversosdireitosegarantias

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àsmulheres,no intuitodediminuire sanarasdiferençasexistenciaisemrelaçãoaogênero.Destaca-se,ainda,aatuaçãodosorganismos internacionaisqueemdiversasconferênciasdiscutiramereconheceramváriosdosdireitosalmejados.

Emrelaçãoàdescriminalizaçãodoaborto,busca-seoincessantereconhecimentodosdireitossexuaisereprodutivosdamulher,sendo-lhegarantidaaescolhadeprosseguirou não com a gravidez e o planejamento familiar sem a interferência estatal.Reconhecendo,dessaforma,asuperioridadedosdireitosdamulheremdetrimentodavida intrauterina, a fim de que possa exercer sua autonomia e o livre exercício dasaúdereprodutiva.ConsideraqueoEstado,aocriminalizaroaborto,violaàdignidadedamulher,sujeitando-aaumaespéciedeescravidão,consoanteafirmaDworkin:

As leisqueproíbemoaborto,ouqueo tornammaisdifícilecaroparaasmulheres que desejam fazê-lo, privam as mulheres grávidas de umaliberdade ou oportunidade que é crucial para muitas delas. Uma mulherforçadaaterumacriançaquenãodesejaporquenãopodefazerumabortoseguropoucodepoisde ter engravidadonãoédonade seuprópriocorpo,poisaleilheimpõeumaespéciedeescravidão.Alémdomais,issoésóocomeço.Paramuitasmulheres,terfilhosindesejadossignificaadestruiçãodesuasprópriasvidas,porquenãomaispoderãotrabalhar,estudarouviverdeacordocomoqueconsideramimportante,ouporquenãotêmcondiçõesfinanceirasdemanterosfilhos.(DWORKIN,2003,p.143).

Osdireitos sexuais e reprodutivosdamulher são reconhecidos legitimamente comodireitos humanos e asseguradores da igualdade de fato e de direito entre homens emulheres. Para João Batista do Nascimento Filho (2013, p. 49), denominam-sedireitosreprodutivos“oconjuntodosdireitosbásicosrelacionadosaolivreexercíciodasexualidadeedareproduçãohumana”,devendooEstadopromoverosmeiosqueasseguremacessoà saúde, à informaçãoeameiosqueproporcionemocontroledanatalidadeedaprocriaçãosemriscosàsaúde.Defendeque tãosomenteamulheréquem arca com as consequências e suportará ônus da decisão entre a gravidez e acontracepção, sendo imprescindível que o Estado assuma e reconheça os direitossexuais e reprodutivos da mulher a fim de que seja garantida sua autonomia,autodeterminaçãoedignidade.

Dessaforma,ficademonstradoqueasfeministasalmejamexercerseudireitosexualereprodutivolivremente,semcontrolesecoerçõesimpostospeloEstado,cabendoaelaescolher quantos filhos deseja ter, quando ter e qual o intervalo entre um e outro.Além disso, almejam decidir soberanamente sobre a interrupção ou não de umagravidezindesejadaouquetenhacomoprodutodaconcepçãoumfetocomanomaliasgenéticas e má formação. Com a luta dos grupos feministas, tais direitos foram

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reconhecidos internacionalmentee ratificadopordiversospaíses, inclusiveoBrasil,comdestaqueparaacriação,em1979,pelasNaçõesUnidas,daConvençãosobreaEliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (CEDAW –Convention on the Elimination of All Forms of Discrimination Against Women), aSegunda Conferência Mundial dos Direitos Humanos de Viena, em 1993, aConferênciadoCairo,em1994,eadeBeijing,em1995,comoapontamEmmerick(2008)eNascimentoFilho(2013).

NaCEDAW,alémdeconteremseu texto formasdeeliminaçãodasdiscriminaçõespolíticas,sociaiseeconômicas,incluem-setambémnormasrelativasaosdireitoscivise de família e os compromissos a serem observados pelos Estados ratificadores doinstrumento. No entanto, um dos avanços mais importantes da Convenção, emrelaçãoàisonomia,vemexpressonanítidapossiblidadedeseaboliracriminalizaçãodoaborto,reconhecendoqueoexercíciododireitoàreproduçãoeàcontracepçãoéexclusivamentedamulher,alémdedefinirquecabeamulherdecidirsobrequantosfilhosgeraráeointervaloentreeles,conformeexplanaNascimentoFilho:

UmdosavançosmaisimportantesdaConvençãodizrespeitoàderrogaçãode todas as disposições legais que discriminem as mulheres112. Nesseponto, abriu-se a possibilidade concreta de se abolir, por exemplo, acriminalização do aborto, uma vez que o direito à reprodução ou àcontracepçãodeveserexercidoúnicaeexclusivamentepelasmulheres.

[…]

Abriu-se,ainda,espaçoparaqueamulherdecidissesobreaquantidadedefilhos que geraria e o intervalo de nascimento. (NASCIMENTO FILHO,2013,p.56-57)

AConferênciaMundial Sobre osDireitosHumanos deViena, de 1993, realizou-separaefetivare impulsionara importânciadosDireitosHumanos,dademocracia,dodesenvolvimento e das liberdades fundamentais, especificamente no que tange odireito fundamental da igualdade sem distinção de sexo. O exercício democráticoenvolve“opoderdedeterminarseusprópriossistemaspolíticos,econômicos,sociaiseculturaiscomplenaparticipaçãopopular,comapromoçãoeproteçãodosdireitoshumanosnoâmbitointernoeexterno”(NASCIMENTOFILHO,2013,p.61),sendoresguardado pela Conferência a plena participação das mulheres em condições deigualdade, na vida política, civil, econômica, social e cultural, aos níveis nacional,regionaleinternacional.

Alémdisso,enfatizou-seàépocaqueospaísesratificassemaCEDAWde1979,como

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formade implementação edebusca integral, pelos assinantes, demaneiras efetivasparaeliminaçãodasformasdediscriminaçãocontraamulher.Principalmentenoquedizrespeitoaoseuitem18,oqualconsagraque“osdireitoshumanosdasmulheresedas meninas são inalienáveis e constituem parte integral e indivisível dos direitoshumanosuniversais”.(EMMERICK,2008,p.73)

Em 1994, foi realizada a Conferência Internacional Sobre a População eDesenvolvimentodoCairo, esta, em relação a anterior, dispensoumais importânciaaosdireitosfemininos,umavezquetratoudiretamentedocontroledafecundidade,dodireitoàsexualidadeeàcontracepção.Assimcomotratoudodireitodocasalescolheromomentodareproduçãosexualseminterferênciasestataisedaimportânciadeaçõesgovernamentais voltadas à saúde reprodutiva e sexual na busca por redução dasmortesmaternaseneonatais.

Flávia Piovesan apud Nascimento Filho (2013, p. 67) denominou que a saúdereprodutivaengloba terumavida sexual satisfatóriae seguracom todososmeiosecondiçõesparao efetivoexercíciodessedireito, a fimdeque sejagarantidoobemestar físico, mental e social, tomando, livremente, todas as decisões em relação àreprodução.Nessesentido,oitem7.2doPlanodeAçãodoCairoestabelece:

7.2Asaúdereprodutivaéumestadodecompletobem-estarfísico,mentalesocial e não simples a ausência de doença ou enfermidade, em todas asmatériasconcernentesaosistemareprodutivoeasuasfunçõeseprocessos.Asaúdereprodutiva implica,porconseguinte,queapessoapossa terumavida sexual segura e satisfatória, tenha a capacidade de reproduzir e aliberdadededecidirsobrequando,equantasvezesodevefazer. Implícitonesta última condição está o direito de homens e mulheres de sereminformados e de ter acesso a métodos eficientes, seguros, permissíveis eaceitáveis de planejamento familiar de sua escolha, assim como outrosmétodos, de sua escolha, de controle da fecundidade que não sejamcontráriosà lei, eodireitodeacessoa serviçosapropriadosde saúdequedêem àmulher condições de passar, com segurança, pela gestação e pelopartoeproporcionemaoscasaisamelhorchancedeterumfilhosadio.

Nesse sentido, fica claro que os direitos à reprodutividade e à saúde sexual sãofundamentos inerentes ao ser humano, sendo que o Estado não deve interferirlivremente e de forma coercitiva na forma do exercício deles. O Estado, pelocontrário,deve investireprocurarmeiosdegarantirque taisdireitossejamgozadosdemaneiraplenaesatisfatória,afimdeassegurarobemestarfísico,mentalesocialdoserhumano.Ogozodessesdireitosseapresentanaformadeserexercidodemodoautônomo pelo ser humano, cabendo a ele dispor sobre a sua vida e saúde sexual,

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escolhendo,inclusive,aquantidadedefilhoseomomentodetê-los.Enessesentido,oartigo4ºdacitadaConferênciaelucidaapromoçãodaequidadeedaigualdadedossexoseosdireitosdamulher,deformaaeliminartodotipodeviolênciacontraelaegarantindo-lhe o controle de sua própria fecundidade, são a pedra angular dosprogramasdepopulaçãoedesenvolvimento.

Nessediapasão, a referidaConferênciabuscaqueosEstados ratificadoresdoPlanopromovam ações e políticas públicas para garantir o planejamento familiarreduzidoresdasgestaçõesindesejadas,permitindoquetodasaspessoaspossamtomardecisões livres e conscientes e tenham acesso à educação e à saúde reprodutiva esexual,paraqueasmulheresnãotenhamquerecorreraoaborto.Caberessaltarque,segundooPlanodeAçõesdoCairo,ainterrupçãovoluntáriadagravideznãoéumaformadeplanejamentofamiliar,masqueoabortoilegaleinseguroéumproblemadesaúdepública em todoomundo, haja vista ser umadas principais causas demortematerna, por isso a importância de ampliação e melhoria dos serviços deplanejamentofamiliar.(EMMERICK,2008.p.78-79).

Porfim,em1995,houveaQuartaConferênciaMundialSobreMulheresdeBeijing,aqual, além de enfatizar os pontos até aqui abordados, trouxe como meta maiorapresentar que o aborto ilegal, inseguro e clandestino é um problema de saúdepública.Oquelevaaumnúmeroaltodemortesmaternasanuais,alémdosproblemasfísicos e psíquicos deixados nas mulheres que se submetem a tal prática. Nessesentido,busca-sequesejamreconhecidososdireitosdamulher,umavezqueanãopromoçãodeaçõesparaqueessasmortessejamevitadaseseu índicede incidênciasejareduzidoviolamodireitoàdignidadedamulher.

Acitadaconferênciatemcomopontoprincipal,segundoNascimentoFilho(2013,p.69),arecomendaçãoparaque“ospaísesconsideremapossibilidadederevisarasleisqueestabelecemmedidaspunitivascontraasmulheresquepraticamabortosilegais.”.Afirma,ainda,queoabortonãoéumaquestãodepolícia,massim,política,devendohaverpolíticaspúblicaseproposiçõeslegislativasvoltadasparaasaúdedamulher,nointuitodereduzirtalprática.ConformeapresentaRulianEmmerick:

Outrograndeavançodizrespeito,especificamente,àquestãodoabortoedesua criminalização. A ordem internacional, consensualmente, reiterouque o aborto clandestino e inseguro é um grave problema de saúdepública e, portanto, deve ser encarado como um problema a sersolucionado com proposições legislativas e com políticas públicasvoltadas à saúde damulher, e não como um problema polícia, a serresolvidopelosistemapenal.Nestaperspectiva,oPlanodeAção,emseuparágrafo97enunciaque:“(...)Oabortoemcondiçõesperigosaspõeem

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perigo a vida de um grande número de mulheres, e representa umgrave problema de saúde pública, porquanto são as mulheres maispobresejovensasquecorremosmaioresriscos.” (EMMERICK,2008,p.81,grifodoautor)

Por conseguinte, apresentadas as conferências mundiais de maior importância emrelação às mulheres, tem-se que seus direitos e princípios fundamentais já foramdiscutidoseaprovadosamplamentenoâmbitointernacional.Notocanteaoaborto,háumconsensoemrelaçãoaosdireitosmoraisdamulher,especialmenteemrelaçãoàsuasaúdesexualereprodutiva,tendoelaacapacidadedeseautodeterminarefazerasescolhas referentes a esses direitos sem a interferência do Estado, devendo essepromover os meios para que esses fundamentos sejam melhor implementados noestadodemocráticodedireito,realizandopolíticaspúblicaserevendosuasleis.

No entanto, embora o Brasil tenha ratificado tais Planos de Ação, nem todas asmedidas foram implementadas na República Federativa e apenas algumas foramreconhecidaspelaCartaMagna.IssofazcomqueosgruposPró-escolhapressionemgovernantes, julgadores e parlamentares para que seus anseios sejam atendidos eadequadosaosmandamentosinternacionais.Alémdisso,afirmamqueoCódigoPenalBrasileiroestádesatualizadoenãomaisseadéquaaomomentosocial,alémdeque,ao tempodesuaedição,nãohavia tantosdireitosreconhecidosàsmulheresequeolegislador não dispunha de instrumentos que lhe permitissem implementar outrasformasdeabortolegal,comoénocasodoanencéfaloefetoscomgravesanomalias.Nessaperspectiva,oCódigoPenaléineficazemrelaçãoaoabortopoisnãoinibesuarealização,mas,porsercriminalizado,fazcomquemulheressesubmetamaabortosinseguros,levando-asagravesdanosfísicosepsíquicosouatéamorteadependerdocaso,devendosertratadocomoumproblemadesaúdepública.

DescriminalizaçãodoAbortonoBrasil

NoBrasil,oabortoilegaljáéconsideradocomoumproblemadesaúdepública,hajavista ser uma das principais causas de morte materna no país. A lei penal, queconsideradaoabortocrimeemseusartigos124a126,éineficazenãoproíbeasuaprática de forma potencial, dados os números estimativos de cerca de 1milhão deabortosanuais.Dessemodo,osgruposfeministaslutamparaqueessarealidadesejamudada, acompanham veemente e aguardam a aprovação do PLS 236/2012 quetramita no Congresso Nacional, o qual amplia as formas de aborto legal noordenamento jurídico brasileiro. Além disso, recentemente, conseguiram que fosse

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consideradoválidooabortodefetossemcérebro,pormeiodaADPFn.54/2004,noSupremoTribunalFederal.

Amortematernaéamortedeumamulherocorridaduranteagravidez,aborto,partoouaté42diasapósopartoouaborto,independentedaduraçãooudalocalizaçãodagravidez,atribuídasacausasrelacionadasouagravadaspelagravidezoupormedidastomadasemrelaçãoaela.ParaoOrganizaçãoMundialdeSaúde-OMS,oíndicedemortalidadematernapodeserreduzidosignificativamente,principalmenteemrelaçãoaoaborto,casosejadadamaioratençãoàeducaçãosexualereprodutivadamulher,aoaumento da escolaridade feminina, à melhoria na qualidade da saúde e aoinvestimentoemmétodoscontraceptivos.Mastal implementaçãoesbarranademoradetomadadessasmedidasporpartedoEstado,oqualdeveriacriarpolíticaspúblicasnesseâmbito,visandoareduçãodegestaçõesindesejadaseconsequentediminuiçãodosabortosinvoluntários.

SegundodadosdoMinistériodaSaúde(2007,p.170),noBrasilsãorealizadosentre750mila1milhãodeabortosanuais,noentanto, suamaioriaé realizadade formailegal e insegura. Por ser considerado crime,muitos dos abortos são realizados emcasaouemclínicasclandestinasesemnenhumpreparopararealizartalintervençãocirúrgica.Consequênciadisso,oabortoéconsideradoaquartacausadiretademortematerna no país, correspondente a 4,6% do total, considerando-se uma pandemiasilenciosa e semexpectativas de diminuição, sendoque asmulheres quenãovão aóbitopodemsofrersériasconsequências físicasepsicológicas, inclusiveemrelaçãoasgestaçõessubsequentes.Nessesentido,posiciona-seoMinistériodaSaúdeemsuaobrade2007,“SaúdeBrasil2007:umaanálisedasituaçãodesaúde”:

No Brasil o aborto configura-se um problema de saúde pública(2),sobretudo por qualificar-se entre as mais importantes causas de mortematerna(3), sendo esta, namaioria dos casos, umamorte evitável(4,5).Oaborto também tem relevância sobre as causas de morbidade hospitalarreferidas no capítulo XV da CID10, Gravidez, Parto e Puerpério. Asconsequênciasdoabortoinsegurosãograves:asmulheresquenãomorrempodem ter complicações sérias, comohemorragia, septicemia, peritonite echoque,podendolevarasequelasfísicas,comoproblemasginecológicoseinfertilidade. Ha também maior chance de complicações em gestaçõessubsequentes (6). As complicações se destacam entre as mulheres dascamadas mais pobres, que realizam o aborto em condições muitas vezesinseguras. Atualmente o aborto é considerado como uma pandemiasilenciosa que requer ações imperativas e urgentes no âmbito da saúdepública edosdireitoshumanos (7). (MINISTÉRIODASAÚDE,2007,p.170)

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Dessaforma,ficademonstradaaineficáciadanormapenalperanteatantoscasosdeaborto, não sendo adequada para solucionar os desajustes e conflitos da sociedadecontemporânea.ParaLuísRobertoBarroso(2013),“aideiadeefetividadeexpressaocumprimentodanorma,ofatorealdeelaseraplicadaeobservada,deumacondutahumana se verificar na conformidade de seu conteúdo”, e nesse aspecto talcriminalizaçãonão temtidoefeitoválido.Assim,umanormaque,aprincípio,deveprotegeravida,nãoofaz,massimfazcomqueelaseperca,tendoemvistaquenãohá somente amorte do feto,mas também amorte demilhares demulheres que sesubmetem ao aborto inseguro, em especial as de classes mais pobres. Portanto,conformedefendemEmmerick(2008)eNascimentofilho(2013),hánoordenamentojurídico brasileiro uma norma penal que não exerce o controle social, o qual teriacomofinalidade.

Observa-sequeacriminalizaçãodoabortonãotemforçasuficienteparaproibirasuaprática e, por ser ultrapassada, não mais se adequa ao momento social para suaaplicação,sendoparaKaramapudEmmerick(2008,p.37)umdiscursoenganosodacriminalizaçãodafalsacrençadoefetivocontrolesocial.AindaemrelaçãoaoCódigoPenal,ogrupoPró-escolhatrazque,aotempodesuaedição,olegisladornãopossuíaferramentas e tecnologias suficientes que pudessem atestar comprecisão anomaliasfetaise,poressemotivo,nãocontemploucomoabortolegalessescasos.Nessaseara,saltaaosolhosqueanormapenalnecessitaserrevistaparaseadequaraosinteressessociaisvigentesetambémcomaConstituiçãoFederal,aqualconsagrouemseutexto,diversosdispositivosemdetrimentoaoreconhecimentodosdireitosfeministas.

A Constituição Federal de 1988 foi ummarco para o reconhecimento dos direitosfeministas em geral, uma vez que tem como essência e fundamento norteador adignidadedapessoahumana,buscandoalcancemáximodaigualdadeentreindivíduose eliminação de todas as formas de discriminação. Quanto a isso, diversos são osdispositivospresentesnaCF,aexemplodoincisoIIIdoartigo1º,incisoIVdoartigo3º,bemcomooincisoIecaputdoartigo5º,osquaisdisciplinam,respectivamente,acerca da dignidade da pessoa humana; da promoção do bem de todos sempreconceitosouquaisquer formasdedescriminação; eda igualdadeentrehomensemulheres,sendoinvioláveisosdireitosàvida,àliberdade,àigualdade,àsegurançaeà propriedade. Além de prever em seus artigos 6º e 7º diversos direitos sociais etrabalhistasquevisamaigualdadeentregêneros.

Em relação aos direitos sexuais e reprodutivos, abordam Emmerick (2008) eNascimento filho (2013) que a CartaMagna teve grandes avanços. Em seu TítuloVIII,especificamentenosartigos196,201,203,226e227,protegeamaternidade,aseguridade social, a assistência social, a saúde (em especial a reprodutiva), aigualdade na sociedade conjugal e o planejamento familiar, antecipando-se, de

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sobremaneira, ao estabelecido nas Convenções de Viana, Cairo e Beijing. Nessesentido,explanaEmmerick,conformesesegue:

Especificamente no que diz respeito ao direito à saúde e aos direitosreprodutivos, em especial, à saúde da mulher, os avanços foramsignificativamente inovadores, antecipando-se, assim os consensos dasConferênciasdoCairo(1994)eBeijing(1995).Daleituradoartigo196daConstituiçãoFederalde1988,pode-seperceberqueoconceitosdesaúdefoiconcebidonão apenas comoumestadobiológico,mas em sentido amplo,considerandoosconceitoscontemporâneosdecidadaniaejustiçasocial,nosmesmos parâmetros das disposições internacionais, seja da OrganizaçãoMundialdaSaúde,sejadeoutrosdocumentosinternacionais,umavezque,deacordocomoreferidoartigo,asaúdedeveserpromovidaerecuperada,devendo seu acesso ser prestado de foram universal e igualitária,estabelecendoumconceitoamplodesaúde,queenglobaobem-estarfísico,mentalesocialdetodasaspessoas.29(EMMERICK,2008,p.86)

Cabe,nessemomento,destacaro§7ºdoartigo226daCF/88,queassimdispõe:

Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidaderesponsável,oplanejamento familiar é livredecisãodocasal, competindoao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercíciodesse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituiçõesoficiaisouprivadas.

Esse dispositivo apresenta de forma expressa o reconhecimento do direito daautodeterminação reprodutiva livre de qualquer coerção, cabendo ao Estado tãosomentepromoverosmeiosparaqueoplanejamentofamiliarsejaexercidodeformaplena.Dessemodo,élatenteaadequaçãoConstitucionalàsnormasinternacionaisdeproteçãoàmulherepromoçãodaeliminaçãodetodasasformasdediscriminação.

Outropontoimportanteaserdestacadonestetópico,emrelaçãoaosreconhecimentosdosanseiosdasmulheresnoordenamentojurídicobrasileiro,sendoatéumaformadedemonstraradesatualizaçãodacriminalizaçãodoaborto,éasuapermissãoemcasode fetosanencefálicos.Talhipótese foi implementadanoordenamento jurídicopeloSupremoTribunalFederalenãopelolegislador,valendo-sedodenominadoativismojudicial.AAçãodeDescumprimentodePreceitoFundamentaln.54,de2004(ADPFn. 54/2004) foi impetrada pelaConfederaçãoNacional dosTrabalhadores da Saúde(CNTS)noSTF,comointuitodepermitiraantecipaçãodopartodefetoanencéfalo,porescolhadagestante.

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AaçãotramitounoSupremopor8anosepassoupordiversasmovimentações,sendorealizadasaudiênciaspúblicas,comaparticipaçãodeentidadesgovernamentaisenãogovernamentais, bem como da Igreja Católica, a fim de se verificar as correntesfavoráveisounãoàinterrupçãovoluntáriadagravidez.Em12deabrilde2012,por8votos a 2, decidiu-se pela inconstitucionalidade das normas que consideravam aconduta ilícita,definindo-sea interrupçãodagestaçãocomoantecipação terapêuticadoparto,sendoaaçãoatípicapornãohaverpotencialidadedevidaeimpossibilidadedevidaextrauterina.Dessaforma,passou-separaagestanteaautonomiadodireitodeescolhadeprosseguircomagestaçãoounão,reconhecendoaprevalênciadosdireitosdamulhernessecaso.(NASCIMENTOFILHO,2013,p.124a127).

Diante de todo o exposto, verifica-se que a descriminalização do aborto no Brasilcaminhaapassos lentos,masqueaospoucosvaisendoreconhecidaeas formasdeimplementá-la vão surgindo. O ideal para as feministas, nesse momento, seria aaprovação do PLS n. 236/2012, que conforme já apresentado abarcaria demaneirapotencialosanseiosdessegrupo.Paraelas,acriminalizaçãodoaborto,aqualimpedeamulherdedecidirlivrementesobreainterrupçãoounãodagravidez,contrarianãosóasnormasdodireitointernacionalqueoBrasilésignatário,mastambémaprópriaConstituiçãoFederal,deformaqueosdireitosfundamentaisdamulhersãovioladospor meio de um controle discriminatório e injustificado do seu corpo, da suasexualidadeedoseudireitodereprodução.

Os grupos feministas defendem que o controle reprodutivo não se dá pormeio demedidas coercitivas, mas sim por medidas e políticas públicas que viabilizem oexercíciodessedireito,de formaquecabe tãosomenteamulherdecidir semantémuma gestação, seja por motivos econômicos, sociais ou morais, pois somente elasuportaráoônusdasuadecisão.Somentedessemodohaveráisonomiaeextinçãodasformasdediscriminação.Ressalta-seque,paraDworkin(2003,p.44a46),noqueserefereàposiçãoliberal,nãosepodedispordavidaimoderadamente,devendohaverummínimo justificável, ou seja, deve haver uma justificativa plausível demaneiraqueodireitotuteladosejasuperior.

Porfim,e tendocomobaseosdadosfornecidospeloMinistériodaSaúde(2007,p.170), tem-se que o aborto é um problema de saúde pública, levando milhares demulheres à morte. Nesse sentido, não se trata mais de um caso a ser tratadopenalmente, mas sim politicamente, devendo o Estado buscar formas para seminimizartalrealidade.Nessediapasão,asfeministasdefendemquealegalizaçãoéuma forma de diminuir a interrupção voluntária da gestação, uma vez que aimplementaçãodepolíticaspúblicasdeeducaçãosexual,reprodutivaecontraceptivasedeacessoàsaúdeeaoplanejamentofamiliarserãomaisefetivas,hajavistanãosermais uma conduta criminalizada, o que facilita a identificação de suas causas e a

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implementaçãodeestudosquefavoreçamaatuaçãogovernamental.Aexemplodisso,o Uruguai, após a legalização do aborto em outubro de 2012, não registrou, nosprimeirosseismeses,mortedemulheresqueabortarame tevequedanonúmerodeabortos voluntários, se tornando um dos países com taxas mais baixas do mundo,segundo afirmouSubsecretário doMinistério daSaúdePública doUruguai,LeonelBriozzo(SOARES,2013).

Assim,almejamqueoEstadorevejasuasnormasecondutas,deformaqueosdireitosinerentesàmulhersejamrespeitados,implementadoseasseguradosnoordenamentojurídicobrasileiro.Defendemaaplicaçãoda técnicadaponderaçãodosprincípiosefundamentosparaquesejamvaloradoseprepondereomaisadequadoemcadacaso,como,porexemplo,aautorizaçãojudiciáriadoabortodofetoanencefálico.

TécnicadaPonderação

Oprincípio da unidade da constituição elucida que não há hierarquia entre normasconstitucionais. Ocorre que Carta Magna está inundada de princípios e direitosfundamentais,osquaissãoexercidos individualmenteouporumacoletividade,masnemsempreestãoemharmonia,levandoaconflitosquedevemsersolucionadosparagarantir o bem-estar no Estado. Desse modo, por não haver hierarquia, há de severificar o valor de cada princípio ou direito no caso concreto, no intuito desolucionar a lide com definição de maior valoração a um. Tal procedimentodenomina-setécnicadaponderação.

No que se refere à interrupção voluntária da gravidez, apresentou-se nos tópicosanteriores,osdireitos eprincípios fundamentais invocadospor cadaumdosgruposconflitantes. De um lado o direito à vida do ser humano em formação, o qual édetentor de direitos desde a concepção, devendo o Estado exercer o seu papel decuidador dos direitos dosmais fracos.Dooutro, os direitos sexuais, reprodutivos econtraceptivos damulher, chamados para extinguir o controle coercitivo do Estadosobre o corpo damulher, devendo ter ela a autonomia para dispor do seu corpo edecidir sobre a interrupção ou não da gravidez, devendo oEstado prover osmeiosnecessários para o seu exercício, inclusive visando a redução dos níveis demortalidade materna. Ambos os fundamentos estão amparados pela ConstituiçãoFederaleportratadosinternacionaisqueoBrasilparticipa,levandoàsduasprimeirasetapasdatécnicadaponderação,asquaisconsistemnaidentificaçãodasnormaseoseventuaisconflitosentreelas,alémdosfatosrelevantesqueacompõem.

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ParaLuísRobertoBarroso (2013, p. 361), ponderação consiste na técnica jurídica,aplicávelaoscasosdifíceis,quandodoconflitoentrenormasdamesmahierarquiaoudesituaçõesqueenvolvamcolisõesdeprincípiosoudedireitosfundamentais.Éumatécnica de interpretação dotada de racionalidade e de controlabilidade que atribuipesos aos elementos em conflito, chegando-se a uma conclusão e opção por qualprincípiooudireitoprevaleceránocasoconcreto.Atécnicadeponderaçãopossuitrêsetapas,dasquaisasduasprimeiras(identificaçãodasnormaspertinenteeseleçãodosfatosrelevantes)nãodiferemmuitodasdemaisformasdeintegraçãododireito,tendocomodiferençacrucialaterceirafase:

Atéaqui,naverdade,nadafoisolucionado,nemsequerhámaiornovidade.Identificação das normas aplicáveis e compreensão dos fatos relevantesfazem parte de todo e qualquer processo interpretativo, sejam os casosfáceis, sejam os difíceis. É na terceira etapa que a ponderação irásingularizar-se,emoposiçãoàsubsunção.Relembre-se,comojáassentado,queosprincípios,porsuaestruturaenatureza,eobservadosdeterminadoslimites, podem ser aplicados commaior oumenor intensidade, à vista decircunstâncias jurídicas ou fáticas, sem que isso afete sua validade. Poisbem: nessa fase dedicada à decisão, os diferentes grupos de normas e arepercussãodosfatosdocasoconcretoestarãosendoexaminadosdeformaconjunta,demodoaapurarospesosquedevemseratribuídosaosdiversoselementosemdisputae,portanto,ogrupodenormaquedevepreponderarno caso. Em seguida, será preciso ainda decidir quão intensamente essegrupo de normas - e a solução por ele indicada – deve prevalecer emdetrimento dos demais, isto é: sendo possível graduar a intensidade dasolução escolhida, cabe aindadecidir qual deve ser ograu apropriado emqueasoluçãodeveseraplicada.Todoesseprocesso intelectual temcomofiocondutoroprincípiodaproporcionalidadeourazoabilidade (v.supra).(BARROSO,2013,p.362,grifodoautor).

Aaplicaçãodessatécnicabuscaefetivaroequilíbrionoordenamentojurídicoeparaser considerada válida, legítima e racional deve o intérprete observar três aspectospara promover máxima concordância prática entre os conflitos, quais sejam: a) avinculaçãoaumadecisãomajoritáriatantoparaoconstituintecomoparaolegislador;b)serparâmetroparaaplicaçãoacasosequiparáveis;c)preservar,omáximopossível,onúcleoessencialdosdireitos.Noentanto,emborapossuavalidadeeaplicabilidade,tal interpretação possui caráter subjetivo que poderá variar de acordo comcircunstânciaspessoais.(BARROSO,2013,p.363-364)

Paraqueodireitotorne-seobjetivo,háanecessidadedetransformaçãodaponderaçãoem regras por parte do legislador, estabelecendo-se condutas para garantia da

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segurançajurídica(principalvalorsubjacenteàsregras).Nessesentido,aponderaçãopassariaaexpressar“decisõespolíticastomadaspeloconstituinteoupelolegislador,queprocederamàsvaloraçõeseponderaçõesqueconsideraramcabíveis,fazendocomqueosjuízosporelesformuladossematerializassememumadeterminaçãoobjetivadeconduta.”Emcontrapartida,osprincípiosfuncionamcomoreferencialgeralparaointérprete,dandoidentidadeideológicaeéticaaosistemajurídico,buscando-se,comamparonosprincípios,amelhorsoluçãoparacadacaso,realizandooidealdejustiça.(BARROSO,2013,p.231-232).

A segurança jurídica e a justiça ideal, inseridos no ordenamento jurídico, sãoconsiderados valores necessários para se ter uma ordem jurídica democrática eeficientebaseadanoequilíbrioentreregraseprincípios,conformesustentaBarroso:

Como o direito gravita em torno desses dois grandes valores – justiça esegurança-,umaordemjurídicademocráticaeeficientedevetrazeremsioequilíbrio necessário entre regras e princípios. Um modelo exclusivo deregras supervalorizaria a segurança, impedindo, pela falta de abertura eflexibilidade, acomunicaçãodoordenamentocoma realidade, frustrando,em muitas situações, a realização da justiça. Um modelo exclusivo deprincípios aniquilaria a segurança jurídica, pela falta de objetividade eprevisibilidade das condutas e, consequentemente, de uniformidade nassoluções interpretativas.Como intuitivo,osdoisextremosseriamruins.Aadvertência é importante porque, no Brasil, a trajetória que levou àsuperaçãodopositivismojurídico–paraoqualapenasasregraspossuiriamstatusnormativo–foiimpulsionadaporalgunsexagerosprincipialistas,nadoutrinaenajurisprudência.(BARROSO,2013,p.232,grifodoautor).

Portanto, para quehaja um sistema jurídico e umestadodemocrático equilibrado énecessáriopromoverobemestardetodos,adequando-seosmandamentosnormativosao momento social. Para isso, os conflitos existentes devem ser solucionadoselegendo-se um princípio ou direito preponderante sem que o vencido perca suaessência.Nocasodadescriminalizaçãodoaborto, saltaaosolhosqueodispositivopenal nãomais se adequa aomomento social, bem como não tem efetividade paraprotegeravida,padecendotantoofetoquantoagestanteemalgunscasos,sendoumproblemadesaúdepúblicaetotaldescontrolesocial.

Dessa maneira, faz-se necessária a aplicação da técnica de ponderação ao caso.Devendo-seanalisartodasasformasalmejadasdelegalizaçãoeconfrontá-lascomosdireitosdoprodutodaconcepção,elegendo-se,emcadacaso,qualdireitoeprincípiofundamental prevalecerá. Ato contínuo, tal ponderação deverá ser materializada,compondo e inovando o ordenamento jurídico, no intuito de adequar a norma aos

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anseios e ao momento social vigente. Nesse aspecto, ressalta-se que haveria anecessidade de implementação de políticas públicas e ações governamentais quegarantissemaaplicaçãonanormaesuavigência.Tomandocomobasetalraciocínio,tudolevaacrerqueomodelomaisadequadoseriaalgosemelhanteaomodeloliberaltrazido por Dworkin (2003, p. 44-46), o qual exige uma justificativa moralmenteaceitávelparaqueagestaçãosejainterrompidavoluntariamente.

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Apresentação e definição dametodologiadepesquisaUniversodapesquisa

ApesquisaquecompõeestaobrafoielaboradaparaseraplicadaaopúbliconoâmbitodoDistritoFederaletemcomoobjetivoprincipalsaberqualéaopiniãodessegrupoemrelaçãoàpráticadoaborto.Dessa forma,apesquisa foiaplicadaaopúblicoemgeral com idade superior a 10 anos (idade média de início da vida sexual), semdistinçãoderaça,sexo,renda,estadocivil,localderesidência,religiãoeescolaridade.Sendo esses parâmetros utilizados tão somente para identificar o perfil dosentrevistados, a fimdeque apesquisa apresente como resultadoa concepçãodessegrupoacercadoassunto sem restrições.Obtendo-se,dessa forma,umaopiniãomasabrangente.

Ao abordar a pesquisa semdelimitação do perfil dos entrevistados buscou-se obtercomo resultado uma visão geral de qual é o verdadeiro anseio da sociedade emrelação a descriminalização do aborto.Dessa forma, procurou-se aomáximo evitarque o resultado da análise tivesse interferências ou superioridades de determinadosgrupos,oqueprejudicariaoobjetivoprincipaldotrabalho.

As questões que compõem a pesquisa foram propostas de forma a proporcionar aanálise dos diversos aspectos que integram a celeuma da legalização ou não dainterrupçãovoluntáriadagestação.Assim,procura-seanalisar,porexemplo,qualéaopinião dos entrevistados em relação à interferência religiosa na positivação dodireito, sob quais aspectos entendem que o aborto poderia ser legalizado, comoponderamdeterminadosvaloreseprincípios,quaisseriamosmeiosmaisadequadosaseremadotados,comovêemaaplicaçãodesoluçõesnoBrasil,quesãoeficientesemoutropaís.

Metodologia

Por se tratar de tema bastante polêmico e que dividemuitas opiniões, adotou-se ométodode aplicaçãodequestionário, oqual ficoubemabrangenteparapermitir aoentrevistadoampla liberdadeparaexpressar suaopinião, favorávelounão,emcadatópico, no intuito de, ao final, apresentar uma visão geral dos adeptos e não a tal

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prática.

Oquestionáriofoidivididoemduasbateriasdequestões,asprimeirasreferem-seaosdados dos entrevistados e a segunda ao questionário propriamente dito. Nas seteprimeiras são apresentadas questões que visam definir o perfil dos participantes,selecionandodadosreferentesaoestadocivil, rendamensal,sexo, raça/cor, localderesidência, escolaridade e idade. Já no segundo grupo, composto por 20questionamentos,sãoapresentadositensparaqueoentrevistadoopinesobreaspectosimportantes a serem considerados na resolução do conflito de princípios e direitosfundamentaisnasearadoaborto,havendoquestõesdemúltiplaescolhaedecaixadeseleçãoquepermiteaescolhademaisdeumaopção.

Foram colhidas 266 respostas, as quais foram compiladas e transformadas emrelatório. Da análise do relatório serão apresentados cada um dos aspectos daentrevista com a respectiva porcentagem de respostas, o que será apresentado nocapítuloseguinte.

Modelodequestionário

DignidadedaPessoaHumanaeoAborto

Trata-sedeformuláriodepesquisadecampoparacomporTrabalhodeConclusãodeCurso deDireito. A pesquisa busca obter como resultado a verdadeira opinião daspessoasresidentesnoDistritoFederalemrelaçãoalegalizaçãodoaborto.

*Obrigatório

Dadosdoentrevistado

1.EstadoCivil*

()Solteiro(a).

()Casado(a).

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()Outros.

2.Rendamensal*

()Nãodeclarar.

()R$0,00aR$724,00.

()R$724,00aR$1.448,00.

()R$1.448aR$2.172,00.

()R$2.172,00aR$2.896,00.

()AcimadeR$2.896,00

3.Sexo*

()Masculino.

()Feminino.

4.Raça/Cor*

()Amarela.

()Branca.

()Indígena.

()Negra.

()Parda.

()Semdeclaração.

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5.Ondevocêmora?*

()ÁguasClaras

()ÁguasLindas

()Brazlândia

()Candangolândia

()Ceilândia

()Cruzeiro

()Gama

()Guará

()Lago(SuleNorte)

()NúcleoBandeirante

()Octogonal

()Paranoá

()Planaltina

()PlanoPiloto(AsaSuleAsaNorte)

()RiachoFundo

()RecantodasEmas

()Samambaia

()SantaMaria

()SãoSebastião

()Sobradinho

()Sudoeste

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()Taguatinga

()ForadoDF

()Outro

6.Escolaridade*

()Semescolaridade.

()Nívelfundamentalincompleto.

()Nívelfundamentalcompleto

()Médioincompleto.

()Médiocompleto.

()Superior.

()Especialização.

()Mestrado.

()Doutorado.

7.Idade*

()10a19anos.

()20a29anos.

()30a39anos.

()40a49anos.

()acimade50anos.

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Questionário

8.Quandovocêachaqueseiniciaavidahumana?*

()Concepção–momentoemqueoespermatozoidefecundaoóvulo.

()Nidação–momentoemqueóvulofecundadoseprendeaoútero.

( ) FormaçãodoSistemaNervosoCentral – a partir do terceiromêsdegravidez,quandoconsidera-sequeofetopossuiconsciência.

()Outraspossibilidades.

9.Vocêconsideraqueaproibiçãopenaldapráticadoaborto temalgumainfluênciareligiosa,mesmoconsiderandoqueoBrasiléumpaíslaico(semreligião)?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei

()Nãoqueroresponder.

10.Marqueabaixoasformasdeabortoqueconsiderequepoderiamserpermitidasnoordenamentojurídicobrasileiro:*

ATENÇÃO:nesteitemvocêpodeescolhermaisdeumaopção.Marquetodasqueseaplicam.

()Nenhuma.

()Qualquerforma,salvoporterceirosemoconsentimentodagestante.

()Riscodevidaàgestante.

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()Estuproeoutrasformasdeviolaçãosexual.

()Anencéfalo(fetosemcérebro).

()Gravesanormalidadesoudoençasgraveseincuráveis.

()Vontadedagestanteatéa12ªsemana.

()Outras.

11.Emobservânciaaoprincípiodaigualdadeentrehomensemulheres,vocêententeque a mulher tem direito a dispor da sua liberdade de reprodução e sexualidade,cabendo a ela a escolha de abortar ou não, pormotivações econômicas,morais ousociais?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

12.SegundoMinistériodaSaúde,estima-sequesãorealizadosnoBrasilcercade750mil a 1 milhão de abortos por ano. Com base nesses dados, você concorda que atipificaçãodoabortocomocrimenoCódigoPenalBrasileiroevitasuaprática?*

()Discordototalmente.

()Discordoparcialmente.

()Indiferente.

()Concordoparcialmente.

()Concordototalmente.

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13.Vocêfazpartedealgummovimentopró-vida(contraoaborto)oupró-escolha(afavordoaborto)?*

()Pró-vida.

()Pró-escolha.

()Não.

14.VocêconsideraqueoEstado,aopreveroabortocomocrime:*

()protegeavidaintrauterina.

()controlaocorpofeminino.

()protegeavidaintrauterinaecontrolaocorpofeminino.

()NÃOprotegeavidaintrauterinaeNÃOcontrolaocorpofeminino.

()nãosei

15.Aproibição criminal do aborto não evita a sua prática ilegal, fazendo comquemilharesdemulheressesubmetamameiosnãosegurospara realiza-lo,oquepodecausardanospsíquicosefísicosirreparáveisouatéamorte.Frenteaessaafirmativa,vocêconsideraque:*

ATENÇÃO:nesteitemvocêpodeescolhermaisdeumaopção.

()Oabortodeveserlegalizadoparaqueosdanosfísicos,psíquicoseamortesejamevitados.

( )OEstadodevebuscarformasdemelhoraplicaraleiesuasançõesparaevitarapráticadoaborto.

()OEstadodeveflexibilizaranormaparaqueessasmulheressejamamparadas,masnãolegalizandototalmenteapráticadoaborto.

( ) O Estado deve desenvolver políticas de educação e orientação sexual, dereprodução, contracepção e planejamento familiar, a fim de reduzir o número de

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gravidezindesejadaeconsequentesabortos.

()Indiferente.

16.SegundooMinistériodaSaúde,oabortoéaquartacausademortematernanoBrasil.Issoocorreporqueasmulheressesubmetemaformasdeabortonãoseguras.Assim, considerando que o Uruguai, após a legalização do aborto, não registrounenhumamortedemulherporabortoem6meses,vocêacreditaquealegalizaçãodoabortonoBrasilpossareduziresseíndice.*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

17.Vocêconsideraqueavidaéobemmaispreciosoaserprotegido,deformaqueoEstadonãodevepermitirapráticadoabortoporvontadedamulher?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

()Nãoqueroresponder.

18. Para que o aborto fosse legalizado no ordenamento jurídico brasileiro, vocêentendequedeveriaserfeitaumaconsultaàsociedade,assimcomofoirealizadaem2005paraocomérciodearmasnopaís?*

()Sim.

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()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

19.Em2013,oConselhoFederaldeMedicina–CFM,entendeuserpossíveloabortoaté a 12ª semana de gestação, sem risco à vida da mulher, em respeito à suaautonomiadeescolha.Vocêconcordacomesseposicionamento?*

()Discordototalmente.

()Discordoparcialmente.

()Indiferente.

()Concordoparcialmente.

()Concordototalmente.

20.CasooabortofosselegalizadonoBrasil,vocêacreditaqueoEstadoteriaestruturapararealizarabortosseguroseresponsáveis?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

()Nãoqueroresponder.

21.EmrelaçãoaoamparodadopeloEstado,vocêconcordaqueoEstado investeosuficienteemprogramasparaaeducaçãoeorientaçãosexualereprodutiva,métodoscontraceptivos,prevençãodagravidezindesejada?*

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()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

22. Considerando que no Uruguai o número de abortos diminuiu após a suaaprovação, pois o governo passou a ter maior controle sobre essa prática, vocêconcordaquealegalizaçãonoBrasiltambémseriabenéfica?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

23.Vocêjáfezouconhecealguémquejáfezaborto?*

()Sim.

()Não.

()Nãoqueroresponder.

24.Vocêconsideraqueodireitoàliberdadesexualereprodutivadamulherdeveserconsideradomaisimportantequeodireitoàvida,deixandoparamulheraescolhadeabortar?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

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()Nãosei.

()Nãoqueroresponder.

25.Oquevocêconsiderariamaisimportanteemumconflitoentreodireitoàvidaeodireitoàliberdadesexualereprodutivadamulher?*

()Direitoàvida.

()Direitoàliberdadesexualereprodutivadamulher.

()Dependedecadacaso.

26.Vocêtemalgumareligião?*

()Agnóstico.

()Ateu.

()Afro–Brasileira(CandombléouUmbanda).

()Budista.

()Católico.

()Evangélico.

()Espírita.

()TestemunhadeJeová.

()Nãopossuoreligião.

()Nãoqueroresponder.

()Outra.

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27.SegundoàOrganizaçãoMundialdeSaúde,oabortoéumadasformasdemortematerna mais fácil de ser evitada, devendo o Estado investir métodosanticoncepcionais, educação sexual e reprodutiva, bem como em psicólogos eassistentes sociais que podem interferir na decisão da gestante.Você concorda queessapráticaémaisviáveldoquealegalizaçãodoaborto?*

()Discordototalmente.

()Discordoparcialmente.

()Indiferente.

()Concordoparcialmente.

()Concordototalmente.

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Apresentação dos resultados e análisedosdadosdapesquisaApresentaçãodosresultados

Dadosdoentrevistado

Os sete primeiros itens do questionário são referentes aos dados dos entrevistados.Tem como objetivo central analisar qual o perfil predominante entre os 266participantes.

1.EstadoCivil*

()Solteiro(a).

()Casado(a).

()Outros.

2.Rendamensal*

()Nãodeclarar.

()R$0,00aR$724,00.

()R$724,00aR$1.448,00.

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()R$1.448aR$2.172,00.

()R$2.172,00aR$2.896,00.

()AcimadeR$2.896,00

3.Sexo*

()Masculino.

()Feminino.

4.Raça/Cor*

()Amarela.

()Branca.

()Indígena.

()Negra.

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()Parda.

()Semdeclaração.

5.Ondevocêmora?*

()ÁguasClaras

()ÁguasLindas

()Brazlândia

()Candangolândia

()Ceilândia

()Cruzeiro

()Gama

()Guará

()Lago(SuleNorte)

()NúcleoBandeirante

()Octogonal

()Paranoá

()Planaltina

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()PlanoPiloto(AsaSuleAsaNorte)

()RiachoFundo

()RecantodasEmas

()Samambaia

()SantaMaria

()SãoSebastião

()Sobradinho

()Sudoeste

()Taguatinga

()ForadoDF

()Outro

6.Escolaridade*

()Semescolaridade.

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()Nívelfundamentalincompleto.

()Nívelfundamentalcompleto

()Médioincompleto.

()Médiocompleto.

()Superior.

()Especialização.

()Mestrado.

()Doutorado.

7.Idade*

()10a19anos.

()20a29anos.

()30a39anos.

()40a49anos.

()acimade50anos.

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Em relação ao perfil geral dos entrevistados, observado nas questões de 1 a 7,verificou-se que a maioria é, quanto ao estado civil, solteiros (56%), com umaporcentagemde36%e9%paracasadoseoutros, respectivamente.Quantoa renda,destacaram-se os que auferem renda superior a 4 (quatro) saláriosmínimos (61%),sendoosdemaisaquelesqueauferematé2(dois)ede2(dois)a4(quatro)saláriosmínimos,com18%e9%,concomitantemente,e12%nãodeclararam.

Emrelaçãoaosexodosparticipantes,obteve-seumaparticipaçãomaissignificativado feminino, sendo 64% de mulheres contra 36% de homens. Tal resultado é degrandevalia,tendoemvistaqueéumtemamaisvoltadoparaogrupofemininomasquecontémconsiderávelopiniãomasculina.Notocanteàraça/cor,destacaram-seosgruposdabranca(47%)eparda(42%),correspondentea89%dosentrevistados,comumpercentualbaixodenegros(5%)eamarelos(3%).

Levando-se em consideração que a pesquisa se realizara no âmbito do DistritoFederal,foiquestionadoaosentrevistadosqualolocaldemoradia,afimdeavaliar-seseoquestionáriodefatoabrangeriatodaregião.EmquepeseamaiorparteresidiremTaguatinga (36%), Águas Claras (12%) e Plano Piloto (11%), obteve-se tambémrepresentaçãoconsiderávelnascidadesdeCeilândia(8%),Guará(6%)eSamambaia(6%).Alémdisso,comexceçãodaOctogonal,ParanoáePlanaltina,todasasdemaislocalidades tiveram aomenos 1 representante, o que demonstra que a pesquisa foiaplicada praticamente em toda região do Distrito Federal, trazendo opiniões dediferentesgruposdasociedade.

Porfim,noqueserefereàescolaridade,93%dosentrevistadospossuemescolaridadeentre os níveismédio completo e especialização -médio completo (21%); superior(47%); especialização (25%), o que faz inferir que grande parte dos participantespossuemum conhecimentomédio para opinar sobre o assunto tratado, embora sejacontroverso e delicado.Quanto à idade, obteve-se um resultado variado, tendo boaparticipaçãoemtodasasfaixasetárias,sendo45%de20a29anos;22%de30a39anos;15%de40a49anos;10%acimade50anose8%de10a19anos.Ressalta-se

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que a faixa etária foi assim disposta para se equiparar ao modelo utilizado naspesquisas realizadaspeloMinistériodaSaúde (2007,p. 145-172), separando-seporfaixasde idade reprodutivas, iniciando-seaos10anospor seramédiade idadeemqueasmulheresiniciamavidasexual.

Dessaforma,tomandocomoparâmetroaanálisedosdadosoraapresentados,nota-seque,numavisãogeral,conseguiu-seintegrarnaspesquisasosmaisvariadosperfisdeparticipantese,consequentemente,umadiversidadedeopiniõesdistintas.Noentanto,embora haja uma diversidade de perfis, faz-se necessário destacar-se o que maissobressaiu, qual seja: solteiros, com renda superior a quatro salários mínimos,mulheres, brancos e pardos, com escolaridade entre os níveis médio completo eespecialização,comdiferentesidadesedediversaslocalidadesdoDistritoFederal.

Questionário

8.Quandovocêachaqueseiniciaavidahumana?*

()Concepção–momentoemqueoespermatozoidefecundaoóvulo.

()Nidação–momentoemqueóvulofecundadoseprendeaoútero.

( ) FormaçãodoSistemaNervosoCentral – a partir do terceiromêsdegravidez,quandoconsidera-sequeofetopossuiconsciência.

()Outraspossibilidades.

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Nessaquestão,buscou-sesaberqualaconcepçãodapopulaçãodomomentoemquese inicia a vida, por ser um tema controverso.Como já esperado, inclusive por seradotado pela maioria da doutrina, 58% acreditam que a vida inicia-se com aconcepção.Surpresaveionosdemaisresultados,umavezqueemseguidaentende-sequeháiníciocomaFormaçãodoSistemaCentral(22%)edepoisanidação(13%).Tal surpresa se dá pois esperava-se o contrário, tendo em vista que a nidação é omomentoemqueoCódigoPenalpassaaprotegeravida,conformedefendeMirabete,Fabbrine (2013) eGreco (2011).Destaca-se que umgrupomenor de pessoas (8%)entendequeavidainicia-seemoutromomentoquenãoaquelescitadosnaquestãoenocapitulo1,osquaissãomaisutilizadosefundamentadosnessacontrovérsia.

9.Vocêconsideraqueaproibiçãopenaldapráticadoaborto temalgumainfluênciareligiosa,mesmoconsiderandoqueoBrasiléumpaíslaico(semreligião)?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei

()Nãoqueroresponder.

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Na questão ora em comento, comprovou-se estatisticamente o apresentado porEmmerick (2008) no que se refere à evolução histórica do aborto no Brasil,apresentadonoCapítuloI.75%dosentrevistadosentendemque,emboraopaíssejalaico, há influência religiosa na tipificação penal da interrupção voluntária dagravidez, o quenãodeveria acontecer pois devehaver a laicidadedas normasparaque sejam aplicadas igualmente a todos, segundoBarroso (2013).Ademais, apenas14%responderamquenãoháinfluênciareligiosae2%nãosouberamresponder.

10.Marqueabaixoasformasdeabortoqueconsiderequepoderiamserpermitidasnoordenamentojurídicobrasileiro:*

ATENÇÃO:nesteitemvocêpodeescolhermaisdeumaopção.Marquetodasqueseaplicam.

()Nenhuma.

()Qualquerforma,salvoporterceirosemoconsentimentodagestante.

()Riscodevidaàgestante.

()Estuproeoutrasformasdeviolaçãosexual.

()Anencéfalo(fetosemcérebro).

()Gravesanormalidadesoudoençasgraveseincuráveis.

()Vontadedagestanteatéa12ªsemana.

()Outras.

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Essa questão é, se não amais, umadasmais importantes que integram a pesquisa,vistoqueéquestionadoquaisasrazõesquepodemserconsideradas legaisparaqueuma mulher opte pela interrupção da gravidez. Os resultados apresentaram que asformas legais existentes atualmente foram as mais “votadas” pelos participantes,estandoàfrenteareferenteàviolaçãosexual(70%),ouseja,quandoaconcepçãoforfrutodeumcrime,deumatobárbaro,injustoecruel.Logoemseguida,praticamenteempatados, vieram o anencéfalo e o risco à vida da gestante, com 62% e 61%,respectivamente. Expressivo foi o montante apresentado em relação às gravesanormalidades ou doenças graves e incuráveis, o valor de 42% demonstra que asociedade já está tendente, e deve ser um índice que possivelmente crescerá nospróximos anos, a considerar tal aborto legal. Observa-se que os números até aquiapresentadospossuemvalorsignificativodeaprovaçãodasociedadeemrelaçãoaosdireitosfeministas.

Oquinto índiceapresentado,com20%, refere-seaoabortoporvontadedagestanteaté12ªdegestação,esseaspectodizrespeitoàliberdadeeautonomiatotaldamulher.É considerado baixo em relação ao montante de entrevistados e, talvez, sejaexpressivoecomtendênciasaaumentar,tendoemvistaqueosdireitosdasfeministassão conquistados lentamente e o grupo defensor dessa posição é uma parcela nãomuitoaltada sociedadeemascensão.Emcontrapartida tem-seogrupodefensordaproibiçãototaldoaborto(18%),sendoumvalorconsideravelmentebaixo,hajavistaseradoutrinapregadapelaigreja,comoapresentadonoitem2.2,egrandepartedosentrevistados serem cristãos, como pode-se observar no gráfico da questão 26. Porfim,menos expressivas foram a legalização por qualquer forma, salvo por terceiro(8%)eoutrasformas(6%),osquaisrepresentamumaideologiade legalização total

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doaborto.

11.Emobservânciaaoprincípiodaigualdadeentrehomensemulheres,vocêententeque a mulher tem direito a dispor da sua liberdade de reprodução e sexualidade,cabendo a ela a escolha de abortar ou não, pormotivações econômicas,morais ousociais?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

Nesseitem,agrandemaioriaentendeu,com51%,quenãocabeamulheraescolhadeabortarporrazõeseconômicas,moraisousociais,dispondodasualiberdadesexualereprodutiva,ematençãoaoprincípiodaigualdade.Nãoobstante,houveumresultadosignificativo dos entrevistados adeptos a esse reconhecimento de igualdade entregêneros,obtendo-seumpercentualde34%afavor,sendoque13%entendemquetaldireito talvezpudesseser reconhecido.2%nãosouberamresponder. Issodemonstraque, embora tal direito seja discutido e assegurado internacionalmente, sendo umpreceito para a observância e exercício da igualdade, como defendem NascimentoFilho(2013)eEmmerick(2008), item2.3,osentrevistadosnãoadotamtal linhadepensamento.

12.SegundoMinistériodaSaúde,estima-sequesãorealizadosnoBrasilcercade750mil a 1 milhão de abortos por ano. Com base nesses dados, você concorda que atipificaçãodoabortocomocrimenoCódigoPenalBrasileiroevitasuaprática?*

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()Discordototalmente.

()Discordoparcialmente.

()Indiferente.

()Concordoparcialmente.

()Concordototalmente.

Emumaprimeiraanálise,aparentementeháumcertoequilíbrioentre trêsdascincoopções.No entanto, há de se destacar que amaioria dos entrevistados discordaramtotalmente (31%)ouparcialmente (27%)dapremissa,ouseja,agrossomodo,58%dosparticipantesentendemqueoCódigoPenaléineficazquantoàproibiçãodocrimede aborto.Numpanorama geral, 34% concordamque aLei Penal é capaz sim deevitaraocorrênciadessecrime,sendoque28%concordamempartee6%concordamtotalmente.7%demonstraram-seindiferentes.Nessequesito,comprova-sejuntamentecom os dados fornecidos pelo Ministério da Saúde a ineficácia da norma penal,conformedefendemEmmerick(2008),Karam(2004)eNascimentoFilho(2013).Ouseja, a norma é incapaz de exercer o controle social para o qual é vigente e não éadequada para solucionar os conflitos da sociedade contemporânea, não sendoaplicadanemobservada-definiçãotrazidaporBarroso(2013)paraaefetividadedalei.

13.Vocêfazpartedealgummovimentopró-vida(contraoaborto)oupró-escolha(afavordoaborto)?*

()Pró-vida.

()Pró-escolha.

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()Não.

Nesse quesito, observa-se que 89% dos participantes não fazem parte de nenhumgrupo,sejaPró-vida–percentualde9%-ouPró-escolha–percentualde2%.Porumlado, tal resultado é satisfatório, se a análise voltar-se para não interferência daideologiadeumououtromovimento,hajavistaque,corriqueiramente,aofazerpartede um desses grupos, adota-se sua ideologia, embora fosse esperado um númeromaiorderepresentantesdecadagrupo.Issodemonstraqueéumpercentualpequenodasociedadequeparticipadeumdosmovimentos.

14.VocêconsideraqueoEstado,aopreveroabortocomocrime:*

()protegeavidaintrauterina.

()controlaocorpofeminino.

()protegeavidaintrauterinaecontrolaocorpofeminino.

()nãoprotegeavidaintrauterinaenãocontrolaocorpofeminino.

()nãosei.

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O gráfico ora em análise mostra que 51% dos entrevistados julgam que o Estadobuscaprotegeravidaintrauterina.Noentanto,fazendoumcomparativocomoquartotópico(NÃOprotegeavidaintrauterinaeNÃOcontrolaocorpo),com19%,tem-seem relação ao primeiro tópico um percentual relativamente baixo referente aoobjetivo da norma (proteger a vida), em compensação, parte dos participantesentendem que a previsão não alcança nenhum nem outro ponto. Tal análise,demonstrapotencialmenteadescredibilidadeeinaplicaçãodanormapenalbrasileiraemrelaçãoaoaborto.Pergunta-se,senãoprotegeavidaenãocontrolaocorpo,qualofimdanorma?Alémdisso,tem-seque14%entendemqueoestadotantoprotegeavidacomocontrolaocorpo,9%nãosouberamrespondere7%entendemquecontrolaocorpofeminino.Emanáliseaessestrêsúltimosdados,verifica-sequeboapartedapopulaçãonãocorroboracomaperspectivaqueoEstadoaopreveroabortocontrolaocorpofeminino,comodefendemEmmerick(2008)eNascimentofilho(2013).

15.Aproibição criminal do aborto não evita a sua prática ilegal, fazendo comquemilharesdemulheressesubmetamameiosnãosegurospara realiza-lo,oquepodecausardanospsíquicosefísicosirreparáveisouatéamorte.Frenteaessaafirmativa,vocêconsideraque:*

ATENÇÃO:nesteitemvocêpodeescolhermaisdeumaopção.

()Oabortodeveserlegalizadoparaqueosdanosfísicos,psíquicoseamortesejamevitados.

( )OEstadodevebuscarformasdemelhoraplicaraleiesuasançõesparaevitarapráticadoaborto.

()OEstadodeveflexibilizaranormaparaqueessasmulheressejamamparadas,masnãolegalizandototalmenteapráticadoaborto.

( ) O Estado deve desenvolver políticas de educação e orientação sexual, dereprodução, contracepção e planejamento familiar, a fim de reduzir o número degravidezindesejadaeconsequentesabortos.

()Indiferente.

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Nessa questão, buscou-se extrair dos participantes as atitudes que deveriam sertomadaspeloEstadocomosoluçãoparaeficáciadaleipenalereduçãodosíndicesdemortesmaternasedanosfísicos,psíquico.79%dosentrevistadoscorroboramcomosditamesdasconvençõesinternacionais,posicionamentodosgruposPró-escolhaedoMinistériodaSaúde,noquese refereàcriaçãodepolíticaspúblicasdeeducaçãoeorientação sexual, de reprodução, contracepção eplanejamento familiar, como fatorinfluentena reduçãodonúmerodegestações indesejadas.TalpercentualdemonstracomoéfrágilepoucoexpressivooinvestimentodoEstadonesseâmbito,oqueserávistomaisàfrentenaquestão21.

Em seguida, no que se refere à flexibilização e aplicabilidade da norma, 40%defendemque sedevebuscar formasdemelhoraplicar anormae suas sançõesemrelação ao aborto, acompanhados por 36% que acreditam que a flexibilização danorma, mas não legalizando totalmente a prática, seria uma das opções a seremadotadaspeloEstado.Nessediapasão,saltaaosolhosoentendimento,jáconsolidadona população, da ineficácia da norma penal. Quanto à legalização total, nota-sepercentualsemelhanteaosanalisadosemgráficosanteriores,23%,indicandoque,dosentrevistados, o grupo dos adeptos a total descriminalização gira em torno dessemesmo percentual. Ademais, apenas 2% demonstraram-se indiferentes quanto aotópicoemanálise.

16.SegundooMinistériodaSaúde,oabortoéaquartacausademortematernanoBrasil.Issoocorreporqueasmulheressesubmetemaformasdeabortonãoseguras.Assim, considerando que o Uruguai, após a legalização do aborto, não registrou

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nenhumamortedemulherporabortoem6meses,vocêacreditaquealegalizaçãodoabortonoBrasilpossareduziresseíndice.*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

Noreferidoitem,trouxeumasoluçãorealemrelaçãoadescriminalizaçãodapráticaabortiva,implementadanoUruguaiem2012equeobtevecomoresultadoareduçãoazerodonúmerodemortesmaternasporcausadoaborto,emanáliseapresentadados6primeiros meses de vigência da lei. Ao questionar se tal situação se aplicaria aoBrasil, 44% entenderam que sim, seguidos por 29% dos que acreditam napossibilidade de se obter o mesmo resultado. Isso demonstra que, embora umpercentual baixo dos entrevistados seja favorável a legalização total do aborto, agrandemaioriaentendequeaadoçãodessasoluçãoseriapositivaparaoBrasil, emquepesenãoaprovaremaamplalegalização.Poroutrolado,apenas20%entenderamquetalmétodonãoseaplicariaànossapolíticae7%nãosouberamresponder.Assim,restaclaroquedefatoalegalizaçãodoabortoéumaopçãoefetivaparasereduziroelevadonúmerodemortesmaternas,conformepreceituaaConvençãodeBeijing,noentanto,nãodeveserliberadoemsuatotalidade.

17.Vocêconsideraqueavidaéobemmaispreciosoaserprotegido,deformaqueoEstadonãodevepermitirapráticadoabortoporvontadedamulher?*

()Sim.

()Não.

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()Talvez.

()Nãosei.

()Nãoqueroresponder.

Nesse item, foi questionado o ponto chave da celeuma em permitir ou não ainterrupçãovoluntáriadagravidez,a importânciadavidafrenteaoaborto.51%dosentrevistadosconsideramavidaobemmaispreciosoaserprotegido,nãodevendo-sepermitir o aborto voluntário tão somente pela vontade da mulher, sendo que 16%consideramquetalvezavidasejaobemmaisimportantenessecaso.Deoutraforma,29%nãoconcordaramcomoitem,entendendoqueavidanãoéobemmaispreciosoe que o estado deve liberar o aborto, apresentando mais uma vez percentualsemelhanteaosdemaisanalisadosnessequesito.Alémdisso,2%,cada,nãosouberamounãoquiseramresponder.Nessediapasão,tem-sequeavidadefatoéobemmaisimportante, conforme consideramosgruposPró-vida,masde forma absoluta comotrazem,aosefazeranáliseconjuntacomoutrasquestões,demodoquedefatodeve-sehaveraaplicaçãodatécnicadeponderaçãotrazidaporBarroso(2013).

18. Para que o aborto fosse legalizado no ordenamento jurídico brasileiro, vocêentendequedeveriaserfeitaumaconsultaàsociedade,assimcomofoirealizadaem2005paraocomérciodearmasnopaís?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

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ComoaRepúblicaFederativadoBrasiléumEstadoDemocráticodeDireito,ondeopoderemanadoPovo,conformepreceituaaConstituiçãoFederal,entende-sequetaltema deveria ser questionado a sociedade, a fim de se verificar qual a verdadeiraopiniãodamaioria,comoformadedirecionaraformalizaçãodanorma.Sabe-sequeoPLSn.236/2012tramitanoCongressoeconsultaspúblicassãorealizadasacercadostemastratados,inclusiveadescriminalizaçãodoaborto.Noentanto,nãohouveenemhá previsão para se questionar o público em geral. Quanto a isso, 57% dosparticipantesentenderamsernecessáriaumaconsultaàpopulação,comoporexemplooplebiscito, 28%entenderam ser desnecessária e 11%disseramque talvezdevesseser aplicado, além dos 3% que não souberam responder. Tais dados demonstram odescompassoentreasociedadeeolegislador.

19.Em2013,oConselhoFederaldeMedicina–CFM,entendeuserpossíveloabortoaté a 12ª semana de gestação, sem risco à vida da mulher, em respeito à suaautonomiadeescolha.Vocêconcordacomesseposicionamento?*

()Discordototalmente.

()Discordoparcialmente.

()Indiferente.

()Concordoparcialmente.

()Concordototalmente.

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Nessa questão, fica claro que a maior parte da população realmente não deseja alegalização totaldoaborto tãosomenteporopçãodamulher,modelodesejadopeloPró-escolhaeapresentadoporEmmerick(2008),NascimentoFilho(2013)eDworkin(2003).Dessemodo 55%discordaram totalmente (39%) ou parcialmente (16%) daafirmaçãodoCFM,contra37%queconcordaramtotalmente(17%)ouparcialmente(20%),ademais8%posicionaram-seindiferentes.Observa-senessetópicoqueháumsutilaumentodaquelesadeptosàdescriminalizaçãoporvontadedagestante,emboraamaiorpartetenhaconcordadoparcialmente.

20.CasooabortofosselegalizadonoBrasil,vocêacreditaqueoEstadoteriaestruturapararealizarabortosseguroseresponsáveis?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

()Nãoqueroresponder.

Em relação ao amparo dado pelo Estado para realização de abortos seguros e

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responsáveis,casoocorraalegalização,amaiorpartedosentrevistadosnãoacreditamque o país terá estrutura, 55%, sendo que 22% têm uma certa crença mas não acerteza. Por outro lado, 18% acreditam sim que haveria estrutura suficiente paraamparar as gestantes que optassem pela interrupção. Esses dados demonstram umcertodescréditodapopulaçãonosgovernantes,ecomrazão,hajavistaainsatisfaçãode alguns em relação às necessidades da sociedade. Ademais 5% não souberamresponder.Talestruturaéimprescindível,umavezquedenadaadiantarálegalizaçãosem suporte do Estado para se evitar asmortesmaternas e busca pela redução doaborto,comoconseguiuoUruguai.

21.EmrelaçãoaoamparodadopeloEstado,vocêconcordaqueoEstado investeosuficienteemprogramasparaaeducaçãoeorientaçãosexualereprodutiva,métodoscontraceptivos,prevençãodagravidezindesejada?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

Conforme apresentadono item6.3, aOMSentende que amortalidadematerna porabortoéumadasmaisfáceisdeserevitada,seaplicadasaspolíticasapresentadasnareferidaquestão.Aoquestionarasociedade,79%entendemqueEstadonãoinvesteosuficiente e programas para educação e orientação sexual e reprodutiva, métodoscontraceptivos e prevenção da gravidez indesejada, percentual esse idêntico aoapresentadonaquestão15emrelaçãoàaplicaçãodessapolíticacomosolução.Dosdemais,11%entendemqueoEstado investeosuficientenessesprogramas,8%quetalvez invista e 2% não souberam responder. Isso demonstra o quanto é frágil oinvestimentodogovernonesseaspecto,quandodeveriatertotalatenção,hajavistaser

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considerada um dosmelhoresmétodos de se evitar o abortos voluntários emortesmaternas.

22. Considerando que no Uruguai o número de abortos diminuiu após a suaaprovação, pois o governo passou a ter maior controle sobre essa prática, vocêconcordaquealegalizaçãonoBrasiltambémseriabenéfica?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

Nessegráfico, os entrevistadosdestoaramdovistonosdemais, umavezquehouvecerto equilíbrio na escolha das opções disponíveis. Apresenta a ideia de que osentrevistados,frenteadadosreaisdereduçãocomdescriminalização,questionaram-se e entenderam ser possível a aplicação de tal método no Brasil, dado 29% dosentrevistados terem selecionado a opção “talvez” e 30% entenderem que adescriminalização seria benéfica para o país. Por outro lado, 36% entendem que alegalizaçãonãoseriabenéfica,sendoumpercentualbaixoemcomparaçãoaosíndicesapresentadosnasdemaisquestõesemrelaçãoadescriminalização total.Alémdisso,5%nãosouberamresponder.

23.Vocêjáfezouconhecealguémquejáfezaborto?*

()Sim.

()Não.

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()Nãoqueroresponder.

Nessa questão fica claro que a lei penal não tem eficácia. Embora tenha se obtidopercentuais iguais49%,trata-sedevalormuitoelevadolevando-seemconsideraçãoqueoabortoéumapráticacriminosa.Pode-seavaliardaseguintemaneira:paracada2 entrevistados 1 fez ou conhece alguém que já fez aborto. Das pessoas querealizaram a interrupção voluntária da gravidez, provavelmente quase nenhuma, ounenhuma, foi penalizada pela prática, ou seja, a lei penal não é aplicada e nemobedecida, é ineficiente, corroborando como entendimento da doutrinamajoritária.Tais dados, apresentam também o quanto é alto o número de abortos no Brasil,convalidando os dados apresentados peloMinistério da Saúde (2007, p. 170), quetrataoabortoilegaleinsegurocomoumapandemiasilenciosa.

24.Vocêconsideraqueodireitoàliberdadesexualereprodutivadamulherdeveserconsideradomaisimportantequeodireitoàvida,deixandoparamulheraescolhadeabortar?*

()Sim.

()Não.

()Talvez.

()Nãosei.

()Nãoqueroresponder.

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Nessaquestão,inverteu-seofocodointeresseprincipaldodireitoàvidaparaodireitoàliberdadesexualereprodutivadamulher,emrelaçãoaoquefoiquestionadonoitem17.Interessantequenessecomparativomanteve-seopercentualdosqueescolheramaopção“talvez”,noentanto,houveumaumentode10%dosqueconsideramavidaobemmais importantee,consequentemente,reduçãodosqueoptampelosdireitosdamulher,apresentandopercentualde60%e19%,respectivamente.Issodemonstraqueaocolocarodireitoàvidaemumpatamarmaiselevadoeaplicaraeleumaexceção,hápessoasmaismaleáveisqueaceitamsuaponderaçãocomoutrosdireitos,tornando-se mais frágil. No entanto, ao se colocarem os direitos à liberdade sexual ereprodutiva em um nível mais elevado do que a vida, tornando-os regra, há umareprovabilidademaior.Dessaforma,aliberdadedamulhernãodevesertomadacomopreceito,massimcomoexceção,segundoodesejosocial,contradizendoodefendidopelosmanifestantesPró-vida.

25.Oquevocêconsiderariamaisimportanteemumconflitoentreodireitoàvidaeodireitoàliberdadesexualereprodutivadamulher?*

()Direitoàvida.

()Direitoàliberdadesexualereprodutivadamulher.

()Dependedecadacaso.

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Nesseitem,abriu-seumabrechaamaisparaoentrevistado,nãoodeixandoamarradoaescolherentreodireitoàvidaeosdireitosdamulher.Oresultadofoisatisfatórioedemonstra que boa parte da sociedade “realiza” a ponderação de direitosfundamentais ao entender que dependerá de cada caso qual deverá prevalecer. Opercentual referente à opção pelo direito à vida (53%) manteve-se praticamente omesmo comparado com questões anteriores, chamando atenção a reduçãosignificativa daqueles que optaram apenas pelo direito à liberdade sexual ereprodutiva damulher (7%). Dessa forma, verifica-se que a técnica da ponderaçãoapresentadaporBarroso (2013)de fatodeveria ser aplicadapara se solucionar essaceleuma.

26.Vocêtemalgumareligião?*

()Agnóstico.

()Ateu.

()Afro–Brasileira(CandombléouUmbanda).

()Budista.

()Católico.

()Evangélico.

()Espírita.

()TestemunhadeJeová.

()Nãopossuoreligião.

()Nãoqueroresponder.

()Outra.

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O referido questionamento, ao perguntar qual a religião do entrevistado, buscouverificar qual é a doutrina religiosa seguida por eles, o que, corriqueiramente,influencianasopiniões e atitudes.Constatou-sequeagrandemaioria é cristã (59%católico;16%evangélico;6%espírita),sendoquegeralmenteadoutrinaadotadaporessesseguimentoséavedaçãodapráticaabortivavoluntáriaeessênciaprimordialdavida,inclusiveaproibiçãopenaltemorigemnaIgrejaCatólica,comoapresentadonoitem5.2.Comparando-seessetotal(81%)comaosdemaisitensatéagoraanalisados,verifica-se que parte dos entrevistados entendem que deve haver uma ponderação,emboraseremseguidoresdedoutrinascontráriasàpratica.Nessesentido,ressalta-seo apresentado na questão 10, onde 4 das 7 previsões de interrupção voluntária dagravidez obtiveram percentual superior a 40 %. Além disso, quando aos demaisresultados,observou-sequeonúmerodaquelesquenãoacreditamemDeusouquenãohánecessariamenteumDeusounãopossuemreligiãoespecífica,verificou-seumpercentualrazoávelde14%,apresentandoqueas tendênciasreligiosas têmmudado,hajavistaoBrasilserumpaíspredominantementecristão.

27.SegundoaOrganizaçãoMundialdeSaúde,oabortoéumadasformasdemortematerna mais fácil de ser evitada, devendo o Estado investir métodosanticoncepcionais, educação sexual e reprodutiva, bem como em psicólogos eassistentes sociais que podem interferir na decisão da gestante.Você concorda queessapráticaémaisviáveldoquealegalizaçãodoaborto?*

()Discordototalmente.

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()Discordoparcialmente.

()Indiferente.

()Concordoparcialmente.

()Concordototalmente.

Emrelaçãoaesseitem,verificou-sequeagrandemaioriadosentrevistadosentendemqueémaisviávelimplementarpolíticaspúblicasdoquedescriminalizaroaborto.Dosentrevistados 75% concordaram com a questão total (43%) ou parcialmente (32%),apenas 17% discordaram total (5%) ou parcialmente (12%), além de 8%demonstrarem-se indiferentes.Assim,buscar-se-ia a reduçãodoabortopormeiodesuaefetivalegalização,massimcomadiminuiçãodasgestaçõesindesejadascomoinvestimento em métodos anticoncepcionais, educação sexual e reprodutiva e empsicólogoseassistentessociaisquepodeminterferirnadecisãodagestante,conformeacordado nas convenções internacionais e também defendido pela doutrina Pró-escolhaepeloMinistériodaSaúde.

Análisegeraldosdados

Aanálisegeraldosdadosdemonstraqueodireitoàvidaprevalecenoordenamentojurídicobrasileiro,deformaqueasociedadenãoaprovaalegalizaçãototaldoaborto.Evidenciaqueumaparcelapequenaaprovaa total liberação,noentanto,verifica-sequeatendênciadamaioriaéponderaredescriminalizarapráticaabortivaemalgunscasos.Para isso,devehaveratualizaçãodanormapenalparaqueseja retomadasuaeficácia.

Emrelaçãoaoanseiodosgrupos feministas, reconhecimentoe implementação totaldo direito à liberdade sexual e reprodutiva da mulher, cabendo a ela a escolha de

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interromper voluntariamente uma gestação, notou-se não haver aprovação dasociedade. Na pesquisa, um percentual baixo de entrevistados, em torno de 25%,demonstraram-se adeptos a essa ideologia.Nãoobstante, boaparte entendeque emalgunscasosdeve-seconsagraressesdireitosemdetrimentododireitoàvida,ouseja,faz-senecessáriorealizarumaponderaçãodessesprincípiosedireitosfundamentais,analisando-oscasoacaso,escolhendo-sequalprevaleceráemdeterminadassituações.Apósessadefinição,olegisladorpositivariaosmandamentosaseremobservadosnomundojurídico.

ParaLuizRobertoBarroso(2013,p.231), issoocorrepois“emumaordemjurídicapluralista, a Constituição abriga princípios que apontam em direções diversas,gerando tensões e eventuais colisões entre eles” e, no intuito de solucionar taischoques, aplica-se a técnica de ponderação dos princípios. Como visto, tal técnicaconsiste em aplicar valores aos direitos e aos princípios, que, por terem a mesmahierarquia,nãopodemseranalisadosemabstrato,aplicando-seacadacasoespecíficodeterminadavaloração.Especificamentenocasodoaborto,NascimentoFilho(2013,p.130)definequenoconflitoentrealiberdadedeautonomiareprodutivadamulhereavidado feto, aponderação levaà admissibilidadedaviolaçãodesse, conformesesegue:

Defenderodireitoàliberdadedeautonomiareprodutivadamulherconduz-nos, inexoravelmente, a admitir a violabilidade da vida do feto, numautênticoconflitoentredireitosfundamentais,significandoparaointérpreteanecessidadedeponderá-los,fazendocomqueocorraaprevalênciadeumdireito fundamental em detrimento do outro, sem que isso acarrete ainvalidadedequalquerdeles.(NASCIMENTOFILHO,2013,p.130)

Dessa forma, de fato deve-se aplicar a referida técnica, mas, na ponderação dosentrevistados,asformasaceitaseconsideradaslegaisseriam:riscodevidaàgestante;estuproeoutrasformasdeviolaçãosexuale;Anencéfalo(fetosemcérebro).Foramconsideradosessesporteremobtidopercentualsuperiora50%,ouseja,asformasjáautorizadasnoordenamento jurídico têm total aprovaçãoda sociedade.No entanto,destaca-seque,emrelaçãoaoabortoporgravesanormalidadesoudoençasgraveseincuráveis, obteve-se um bom percentual, 42%, embora não tenha alcançado amaioria, já tendo aceitabilidade em boa parte da sociedade. Destaca-se que osparticipantesnãocorroboraramcomaideiadeproibiçãooulegalizaçãototal.

Aplicadaareferidatécnica,deveolegisladortoma-lacomoparâmetroparasedefinireformularanorma,criandoregrasquematerializamaconduta,podendotomarcomobaseoaceitopelasociedade,umavezqueanormadeveserconstruídadeacordocomo momento social ao qual será aplicada. Por conseguinte, a conduta tornar-se-ia

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objetiva, fruto da valoração e da ponderação do legislador, o que daria segurançajurídicaaodispostonaleieabrangeriaoesperadopelasociedadenogeral,segundolecionaBarroso(2013,p.231-232).

Nessediapasão,observa-sequeprevaleceaproteçãododireitoàvida,iniciando-sedaconcepção, conforme define Capez (2012, p. 147), devendo ser o bem jurídicoprimordial(MORAES,2013),demodoqueosdireitosdamulherseriamexceçãoparaa sua violação. Não se vislumbra, portanto, que os direitos das mulheres sejamtomadoscomoprincípionorteadoremrelaçãoaoaborto,cabendoaelaaescolha.

No entanto, embora amaioria dos entrevistados sejam contrários a total liberação,observou-se,aoapresentardadosconcretoseeficazesdaaplicaçãodessasoluçãoemoutro país, que os entrevistados tendem a entender que ocorreria a diminuição daprática. Nesse sentido, questionou-se se a legalização seria capaz de diminuir asmortesmaternaseosnúmerosdeabortoscomoocorreunoUruguaieboapartedosparticipantesentenderamquesim,masquenãoaprovamessaaplicaçãonoBrasil.

Nota-seque,nesseaspecto,grandepartedasociedadedefatoentendequeaideologiadefendidapelogrupoPró-escolhadefatopoderiareduziramortalidadematernaeoaborto com a legalização, como expõem Emmerick (2008) e Nascimento Filho(2013).Masque,alémdedoutrinaremavidacomobemmaior,entendemquequeoBrasilnãotemenemteriaestruturaparaseaplicarsoluçãodetaldimensão.

QuantoaoCódigoPenalBrasileiro,considerou-onormadesatualizadaeineficaz.Emtodas as questões refertes à lei, notou-se seu total descrédito, sendo consideradanormaineficazquenãoalcançaafinalidadedeprotegeravidaeevitarapráticadoaborto.Talpráticajásetornoucomum,levando-seemconsideraçãooaltopercentualdepessoasquefizeramouconhecemalguémqueabortou,ouseja,anormapenalnãoérespeitada.Alémdisso,estademasiadamenteinfluenciadareligiosamente,oquenãodeveria ocorrer, já que oBrasil é umpaís laico,mas que tem ainda em sua normaherançadotempoemquepossuíareligiãooficial.

NascimentoFilho(2013,p.39)explanaque“osdireitoshumanosvariamconformesemodificamascondiçõeshistórias”eEmmerick (2008,p.26)coloca“queosistemapenaléilegítimoeineficazpararesolverosdesajusteseconflitossociais,oriundosdasociedadecontemporânea”.Assimrestaclaroqueanorma,de1940,nãomaisperfazaomomento social atual, não sendo imutável e absoluta, devendo ser alterada paragarantirseustatusdegarantidoradocontrolesocialporelaimposto:

Nãopodemosnosesquecer,ainda,queatipificaçãodeumacondutacomocrime não é algo natural, imutável e absoluto,mas é, antes de tudo, uma

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questãodepolíticacriminal.Umdeterminadocomportamentosocialpassaoudeixadesercrimedeacordocomosinteressesdominantesemdiferentesmomentoshistóricos.Issoporqueoconceitodeordem,desordem,crimeecastigo são conceitos dinâmicos, constituídos nos diferentes momentoshistóricos, de acordo com os interesses políticos e econômicos da classedominante, que em geral, tipificam como crime os atos que são maiscomumentepraticadospelosseguimentosdesprivilegiadosdasociedade.

Sendo assim, com base em estudiosos da criminologia crítica e doabolicionismo pela acreditamos que o sistema penal é um instrumentoformal de controle social e manutenção do status quo, que funciona deformaeficienteemseuobjetivoocultodeselecionar,excluirecontrolarosseguimentosdespossuídosda sociedade. (EMMERICK,2008, p. 27, grifodoautor)

Assim,énítidooentendimentodequedevehaveralteraçãoeatualizaçãodanormapara atender e se adequar ao momento social, devendo estar livre de influênciasreligiosas, possuindo a laicidade necessária para que a norma possa ser aplicadauniversalmente (BARROSO,2013,p.274).E,nãopor interpretaçãodadoutrinaoudosórgãosjurisdicionais,massimporpartedolegisladorquetemqueimplementá-laotorna-lavigentenoordenamentojurídico.Entendendoqueasalteraçõeseinovaçõesdanormadevemsersubmetidaàaprovaçãosocial,existindoparatantoosinstitutosdo plebiscito e do referendo. Para Barroso (2013, p. 112) são imprescindíveis aparticipaçãopopularparaoadequadofuncionamentodosmecanismosdemocráticos,sendoaparticipaçãopopular,meiosdecomunicaçãosocialàpolíticaeà legislação,umadinâmicaadequadaqueexigema representatividadee legitimidadedocorrentepoder.

No entanto, a inovação normativa não seria suficiente, devendo-se investir eminfraestrutura e políticas públicas.Amaioria dos participantes entendequeoBrasilnão teria estrutura para realizar abortos legais com segurança e responsabilidade.Nesse sentido, de nada adiantaria a legalização do aborto, se o Estado não seestruturasse para a sua implementação de forma correta. Além disso, para havereficáciafaz-senecessáriaacriaçãoe instauraçãodepolíticaspúblicaspelogoverno,entendendo a grande maioria que o Estado não investe o suficiente em políticasnecessárias para evitar a gravidez indesejada e, consequentemente, o aborto.Entendimento esse, firmadoentrediversasnaçõesnas convenções internacionais deViena, do Cairo e de Beijing, conforme apresentado por Emmerick (2008) eNascimentoFilho(2013).

Dessa maneira, entende-se que o primeiro passo para a redução de gravidez

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indesejada, abortos voluntários e mortes maternas, seria a criação de políticaspúblicas. Politicas essas de investimento em educação e orientação sexual ereprodutiva, emmétodos anticoncepcionais, bem como em psicólogos e assistentessociaisquepoderiaminterferirnadecisãodagestante.Inclusiveprefere-seessaopçãoàflexibilizaçãodasformasdeabortolegal.TalimplementaçãoétidapeloMinistériodaSaúde(2011)etambémpelaOrganizaçãoMundialdeSaúde(2010)comoaformamaiseficazparareduçãodasmortesmaternaseonúmerodeabortos.

Portanto, a pesquisa resultou num entendimento de que deve-se haver inovação danormapenal,afimdeadequá-laàsociedadequerege,hajavistatercomoessencialocontrole social. De modo que a alteração ampliaria as formas de aborto legal noCódigoPenal, sendoque,das formasprevistasnoPLS236/2012, aúnica anão teraprovação é a por vontade da gestante até a décima segunda semana de gravidez.Além disso, embora exista grandes manifestações, organizadas em geral porreligiosos, para que o aborto seja totalmente criminalizado, esse não é o desejo dasociedade, a qual vislumbra uma ponderação, valendo destacar que a maioria dosentrevistadospossuemreligião,emespecialcatólicoseevangélicos.

Por fim, além dessa atualização legislativa com vistas a amenizar os impactosnegativos do aborto provocado, deve-se criar políticas públicas que reduzam osíndices de gestações indesejadas, as quais muitas vezes resultam em interrupçõesvoluntárias.Alémdomais,casooabortosejalegalizado,deveogovernoinvestireminfraestrutura para garantir que os abortos sejam realizados de forma responsável,segura e aparado pelo Estado, a fim de que o problema seja resolvido e nãoprolongadoouagravado.

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ConclusãoApráticadoabortonemsempre foi tipificadacomocrimenoordenamento jurídicobrasileiro, sendo represada a princípio pela Igreja juntamente com Estado paragarantir os princípiosmorais damulher e a expansão territorial do Brasil Colônia,respectivamente.Domesmomodo, a inviolabilidade da vida intrauterina não era ofimprincipaldaproibição,passandoasersomenteem1940comaediçãodoCódigoPenalBrasileiro.Areferidanormapenaltipificouainterrupçãovoluntáriadagravidezcomocrime,protegendoavidaemformaçãodanidaçãoatéo iníciodopartoe,emalgunscasos,aincolumidadefísicaepsíquicadamulher,qualificandoocrimequandoocorrerlesãocorporalgraveoumortedagestante.

NoBrasil,aregraéanãopermissãodapráticaabortiva,tendocomoexceçãonaleioscasos de risco à vida da gestante ou gravidez decorrente de violação sexual. Noâmbito do Poder Judiciário passou-se a permitir o aborto terapêutico do fetoanencefálico.Não há permissão legal de nenhuma outra forma, o que faz comquemilharesdemulheressubmetam-seaabortosinseguroseilegais,osquaispodemtercomoconsequênciadanosfísicose/oupsíquicoseatéamortedagestante.Ocorrequea norma penal é ineficaz e não evita a prática no país, consequência disso, sãorealizadoscercade1milhãodeabortosporano,sendoaquartacausadireitademortematerna no Brasil, considerando-se um problema de saúde pública, uma pandemiasilenciosaquenãoconsegueresguardaravidaelevatantoofetoquantoagestanteàmorte.

Dessaforma,busca-seaflexibilizaçãodanormaeaguarda-seaaprovaçãodenovasformas de abortos legais, previstas no PLS n. 236/2012, que abarcaria de formasatisfatóriamuitosdosanseiosdosgruposfeministas.Osdireitosdeliberdadesexuale reprodutiva da mulher passariam a ser garantidos efetivamente pelo Estado,modernizando-se a norma penal que é desatualizada, tem fortes influências dasdoutrinas católicas e não se adequa ao momento social. Por conseguinte,reconhecendo-seosdireitosdamulher,estariaresguardasuadignidade.

Tais direitos estão resguardados pela CF/88 e também no plano internacional, noentanto não são efetivamente gozados pelas mulheres, o que faz com que semanifestem em busca desses direitos. Por outro lado, e também com direitosreconhecidosnosmesmosnormativos,osgruposPró-vidalutamparaquenãosejamaprovadas novas formas e entendem que, inclusive, as atualmente permitidasdeveriam ser proibidas.Têm tambémcomoprincípio basilar a dignidade da pessoahumana,notocanteàinviolabilidadedodireitoàvida.

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Frente a esse conflito, verificou-se na sociedade como tal celeuma deveria serdissolvida, que formas deveriam ser aprovadas pelo legislador para integrar oordenamento jurídico brasileiro, confortando-se a dignidade da pessoa humana e apráticadoaborto.Portrata-sedeconflitodeprincípiosedireitosfundamentais,faz-senecessárioousodatécnicadeponderação,masemcadacasoqualprevalece?

Nessediapasão,emquepeseodesejodosgruposPró-escolhaseralegalizaçãototaledosgruposPró-vidaaproibiçãototal,nenhumnemoutroentendimentoéoescolhidopela sociedade no geral. Tanto um quanto o outro obtiveram percentuais baixos epouco significativos. A população faz na verdade uma ponderação de ambos osvalores e optam pelas formas já permitidas no ordenamento jurídico brasileiro,considerandoodireitoàvidamaisimportantequeosdireitosreprodutivosesexuaisdamulher,sendoessesapenasexceçãoemalgunscasos.

Assim,das formasprevistasnoPLS236/2012,casohouvesseconsultaà sociedade,apenas as relacionadas ao risco de vida da gestante, ao estupro e outras formas deviolaçãosexualeaofetoanencéfaloseriamaprovadassocialmente.Caberessaltarquehátendência,também,àaprovaçãodoabortoquandoofetopossuirgravesanomaliase doenças incuráveis, havendo as mesmas motivações relacionadas ao feto semcérebro.

Assim, nota-se que de fato deve haver reformulação legislativa do Código Penal.Entretanto, essa alteração não atenderia de forma satisfatória os anseios dasfeministas, haja vista que uma das principais formas de aborto - por escolha dagestante até a 12ª semana por questões morais, sociais e econômicas – não seriaaprovada e implementada. Portanto, o número de abortos e mortes maternascontinuaria elevado, ou seja, não seria solucionado o problema de saúde públicaprovocadopeloaborto.

Umaalternativaseriaaimplementaçãodepolíticaspúblicasvoltadasparaessetemaconjugadacomasformasautorizadas.Estácomprovadoqueessaéamelhorsolução,umavezqueimplementando-sepolíticasvoltadasparaaeducaçãosexual,reprodutivaeplanejamentofamiliar,bemcomoparamétodoscontraceptivos,consegue-sereduzirdesobremaneiraonúmerodegestações indesejadase,consequentemente,onúmerodeabortos.Daí, ogoverno teriaquebuscarmeiospara solucionaros casos emquehouvergravidezeamulherdesejaabortar,mascomoimplementaraçõesparaatendermulheresquedesejamviolaranormapenal?

É por isso que a legalização total defendida pelas feministas temmais efetividade,uma vez que permite ao governante implementar estudos para se identificar aslocalidadeseascausasquelevamasmulheresàabortarem.Nessesentido,promovida

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a identificação do problema, mais fácil e efetiva é a implementação de políticas,podendo-seutilizarpsicólogoseassistentessociaisqueacompanhariamessagestantetendenteaabortarno intuitode fazê-ladesistir e apresentar-lhealternativasválidas.TalsoluçãofoiimplementadaeestádandocertonoUruguai,oqualreduziuonúmerodemortalidadematernaepassouaserumdospaísescomíndicedeabortomaisbaixodomundo.Ocorreque, amaiorpartedapopulaçãoentendequeoBrasilnão temenemteráestruturaparaimplementaçãototaldoabortoedetaispolíticas.

Conclui-se,porfim,quedefatoumalegalizaçãototaldoabortoemproldavidaseriaviável,aplicando-se,aomesmotempo,políticaspúblicaspararesolveresseproblemamundial.Noentanto,essenãoéoentendimentodasociedade,aqualtempreferênciapelodireitoàvidaeaceitaapráticadoabortoapenasemalgumashipóteses.

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