CORROSÃO DO AÇO-CARBONO: UMA ABORDAGEM DO COTIDIANO · PDF fileCORROSÃO...

download CORROSÃO DO AÇO-CARBONO: UMA ABORDAGEM DO COTIDIANO · PDF fileCORROSÃO DO AÇO-CARBONO: UMA ABORDAGEM DO COTIDIANO NO ENSINO DE QUÍMICA ... vapor forma uma lâmina de água que

If you can't read please download the document

Transcript of CORROSÃO DO AÇO-CARBONO: UMA ABORDAGEM DO COTIDIANO · PDF fileCORROSÃO...

  • Quim. Nova, Vol. 38, No. 2, 293-296, 2015

    Educ

    ao

    http://dx.doi.org/10.5935/0100-4042.20140313

    *e-mail: [email protected]

    CORROSO DO AO-CARBONO: UMA ABORDAGEM DO COTIDIANO NO ENSINO DE QUMICA

    Marcos V. F. Silva, Marinalda C. Pereira, Eduardo N. Codaro e Heloisa A. Acciari*Departamento de Fsica e Qumica, Faculdade de Engenharia, Universidade Estadual Paulista, UNESP, Campus de Guaratinguet, 12516-410 Guaratinguet SP, Brasil

    Recebido em 25/08/2014; aceito em 17/10/2014; publicado na web em 12/12/2014

    CARBON STEEL CORROSION: AN EVERYDAY APPROACH FOR CHEMISTRY TEACHING. In this paper, two simple ways of evaluating carbon steel sheet corrosion in a hydrochloric acid solution were presented as an experimental proposal for corrosion teaching. The first method is based on direct measurements of mass before and after corrosion tests. The second approach follows the principle of visual colorimetry by which soluble corrosion products are transformed into red complexes allowing monitoring of the products concentration according to increases in solution color intensity. Both methods proved able to determine the corrosion rate.

    Keywords: chemistry education; carbon steel; corrosion.

    INTRODUO

    A formao da ferrugem um dos espetculos desagradveis que o homem presencia no dia a dia e, apesar dele no entender bem como acontece, sabe que isso conduzir inevitavelmente repara-o ou troca do material metlico. Este fenmeno ocorre no ferro e em muitas ligas ferrosas como os aos-carbono quando expostos atmosfera ou submersos em guas naturais. Como estes aos so os materiais mais utilizados na forma de chapas, placas, barras e tubos, pelas indstrias metalomecnicas e da construo civil, resultam os exemplos mais claros do que se chama corroso.

    A corroso pode ser definida basicamente como a deteriorao de um metal ou liga, a partir de sua superfcie, pelo meio no qual est inserido. O processo envolve reaes de oxidao e de reduo (redox) que convertem o metal ou componente metlico em xido, hidrxido ou sal. Para entender melhor este processo necessrio iniciar o estudo conhecendo o material e o meio. Os aos-carbono comuns contm mais de 97% de Fe, at 2% de C e outros elementos remanescentes do processo de fabricao.1 O ar constitui o meio no qual os materiais esto mais frequentemente expostos e a oxidao do Fe(s) ocorre porque este elemento termodinamicamente instvel na presena de O2(g) (DGf0 FeO(s) = -251,5 kJ/mol, DGf0 Fe3O4(s) = -1014 kJ/mol e DGf0 Fe2O3(s) = -741,9 kJ/mol).2 Na atmosfera, a ao conjunta do O2(g) e H2O(g) torna o meio mais agressivo que reage com os aos-carbono formando uma camada porosa de produtos de cor-roso conhecida como ferrugem. Esta constituda principalmente por uma mistura de diferentes fases de FeOOH (amorfa, goetita, lepidocrocita, etc.), porm sua composio pode mudar de acordo com as condies climticas e o teor de poluentes (SO2, NO2, etc.).

    3 A reao de formao destes oxi-hidrxidos, assim como os hidr-xidos e sais bsicos, requer a presena de gua (equao 1) e neste sentido que a umidade relativa do ar cumpre uma funo importante na formao e crescimento da camada de ferrugem.

    2 Fe3O4(s) + O2(g) + 3 H2O(l) 6 FeOOH(s) (1)

    Em regies de mdia e alta umidade relativa, a condensao do vapor forma uma lmina de gua que cobre parcial ou totalmente a superfcie metlica gerando assim uma pilha de corroso. Como

    os potenciais-padro de reduo do Fe2+(aq)/Fe(s) (E0 = -0,44 V) e do

    Fe3+(aq)/Fe2+

    (aq) (E0 = 0,77 V) so menores que aquele para a reduo

    de oxignio em meio neutro O2(g)/OH-(aq) (E = 0,82 V),

    2 o Fe(s) pode ser oxidado pelo O2(g) dissolvido na gua. Para que essas reaes ocorram de forma simultnea, a transferncia de eltrons tem que ser atravs do ao, desde uma regio andica onde acontece a oxidao do Fe(s) (equao 2) at outra catdica onde acontece a reduo do O2(g) (equao 3). Logo, a formao de ferrugem pode ser sucintamente representada pela equao 4 e ilustrada pela Figura 1.4,5

    Fe(s) Fe2+(aq) + 2 e- (2)O2(g) + 2 H2O(l) + 4 e

    - 4 OH-(aq) (3)2 Fe2+(aq) + O2(g) + 4 OH

    -(aq) 2 FeOOH(s) + 2 H2O(l) (4)

    Embora a concentrao de O2(g) no ar possa ser considerada constante, a sua solubilidade em gua muito baixa (0,0014 mol L-1 H2O a 20 C),

    2 sendo este consumido rapidamente sobre a superfcie do ao. O O2(g) ser reposto naturalmente, mas este dever atravessar uma camada de ferrugem cada vez mais espessa para atingir uma rea exposta cada vez menor, diminuindo a velocidade de corroso no decorrer do tempo.

    Desta descrio fenomenolgica deduz-se que a superfcie dos aos-carbono deve ser sempre protegida da atmosfera e, caso isto no seja possvel, deve-se procurar um procedimento alternativo que dificulte o progresso da reao andica ou catdica, porque desta maneira diminuir a velocidade da reao de corroso. Em geral, os

    Figura 1. Representao esquemtica do processo de corroso atmosfrica do ao-carbono

  • Silva et al.294 Quim. Nova

    mtodos mais comuns de proteo consistem em cobrir a superfcie com um revestimento metlico, inorgnico, orgnico ou superposio destes com o intuito de isolar o material do meio.6

    Neste contexto real foi elaborada uma proposta didtica para ser desenvolvida em uma aula experimental de qumica, com o objetivo de: i) evidenciar a corroso de um ao-carbono em meio aquoso cido; ii) interpretar o processo mediante conceitos bsicos de ter-modinmica, cintica e eletroqumica; iii) calcular a velocidade de corroso (taxa de corroso). Para viabilizar esta proposta so descritas detalhadamente duas maneiras de conduzir a experincia, deixando a critrio do professor a opo mais adequada, de acordo com o curso, disciplina e infraestrutura pr-existente. Assim, foi escolhido o ensaio de imerso7 para avaliar a velocidade de corroso, porque este permite determinar a perda de massa do material (mtodo gravimtrico) e a quantidade de matria dissolvida a diferentes tempos de imerso (mtodo colorimtrico).8

    Nesta experincia, chapas de ao-carbono so introduzidas em tubos de ensaios contendo soluo diluda de HCl e depois retiradas a diferentes tempos de imerso. medida que suas massas diminuem, geram produtos solveis de Fe2+(aq) e Fe

    3+(aq) e praticamente insolveis

    como o H2(g) (equaes 5 e 6). 2

    Fe(s) + 2 H+

    (aq) -rpida Fe2+(aq) + H2(g) (5)Fe2+(aq) + O2(g) + H

    +(aq) -lenta Fe3+(aq) + H2O(l) (6)

    No mtodo gravimtrico, a perda de massa calculada pesando as chapas antes e aps cada ensaio, valor que na unidade de tempo representa a velocidade de corroso. No mtodo colorimtrico, a quantidade de Fe dissolvido calculada mediante comparao com padres de cor. Para tanto necessrio converter uma das espcies na outra, uma vez que a relao Fe2+(aq)/Fe

    3+(aq) desconhecida. As

    espcies de Fe2+(aq) so frequentemente oxidadas a Fe3+(aq) com soluo de MnO4

    -(aq), segundo equao 7.

    5 Fe2+(aq) + MnO4-(aq) + 8 H

    +(aq) 5 Fe3+(aq) + Mn2+(aq) + 4 H2O(l)

    K = 3,2 x 1062 (7)

    Apesar das espcies de Fe3+(aq) serem amareladas, solues de concentraes e pH baixos apresentam-se incolores e livres de pre-cipitados. Para revelar a presena deste on utiliza-se comumente a reao de complexao com o on SCN-(aq), a qual gera uma srie de complexos avermelhados, cujas tonalidades variam de acordo com a concentrao de Fe3+(aq) (espcie limitante). Nas condies deste trabalho (pH < 2,0 e [SCN-] = 0,2 mol L-1), a formao desses com-plexos pode ser representada pela equao 8, sendo as constantes de formao K1 = 138 e K2 = 2760 para n = 1 e n = 2, respectivamente.

    9-11

    Fe3+(aq) + n SCN-(aq) [Fe(SCN)n]3-n(aq) (8)

    A soluo resultante de cada tempo de imerso pode ser com-parada visualmente com uma escala de padres colorimtricos de [Fe(SCN)n]

    3-n(aq), cujas concentraes de Fe

    3+(aq) so conhecidas. Deste

    modo, uma cor mais intensa est associada a uma soluo mais con-centrada Fe3+(aq), como consequncia de uma maior perda de massa da chapa de ao-carbono.

    PARTE EXPERIMENTAL

    Materiais e reagentes

    Alm da instrumentao padro de um Laboratrio de Qumica, so necessrios os seguintes materiais e reagentes: 8 Chapas de ao--carbono 10061 ou similar de 200 8 0,3 mm; 1 Lixa de carbeto

    de silcio 320 ou menor; FeSO4.7H2O (99,0% m/m); HCl (37,0% m/m), KMnO4 (99,0% m/m) e KSCN (98,5% m/m); Acetona P.A. (99,5% m/m).

    Realizao dos ensaios de corroso

    Para maior organizao da aula prtica, recomenda-se a diviso dos alunos em 8 grupos, em consonncia com 8 tempos diferentes de imerso (10; 20; 30; 40; 50; 60; 70 e 80 minutos). Deste modo, cada grupo contribuir com um valor de perda de massa ou de concentrao de Fe3+(aq) na construo de um grfico, que por um mtodo ou outro, permitir a avaliao e discusso coletiva da velocidade de corroso.

    Mtodo gravimtrico

    Cada grupo deve pegar uma chapa de ao-carbono, lix-la se tiver ferrugem, limp-la com um algodo umedecido com gua destilada e posteriormente desengordur-la com outro umedecido com acetona. Uma vez seca, pes-la, introduzi-la num tubo de ensaio contendo 100 mL de soluo de HCl 0,50 mol L-1 e deix-la em imerso o tempo pr-estabelecido para o grupo (Figura 3a). Retirar a chapa e lav-la com gua destilada, sec-la com o auxlio de um secador de cabelos, pes-la novamente e calcular a perda de massa. Finalizado o experimento, transferir todas as solues para um frasco de resduos.

    Mtodo colorimtrico

    Para um melhor aproveitamento da aula prtica, recomenda-se que o professor prepare com antecedncia uma soluo-padro de 20 mg Fe3+(aq) L

    -1. Para isto, num balo volumtrico de 1000 mL contendo 500 mL de soluo de HCl 0,50 mol L-1 dissolver 0,0996 g de FeSO4.7H2O. Adicionar 10 mL de KMnO4 0,02 mol L

    -1 e agitar vigorosamente. Finalmente, acrescentar 100 mL de KSCN 2,0 mol L-1, 60 mL de acetona e compl