Crianças vamos sonhar?
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CRIANÇAS… VAMOS SONHAR?
Naquele dia, não se ouviam risos ou gargalhadas, ralhetes ou
reprimendas, nem sequer birras ou amuos… era um dia cinzentão,
feio, triste e sem graça nenhuma… nem uma flor aberta nos
jardins… e sem flores, claro está! Não se via nem uma borboleta,
nem uma abelhinha, e as andorinhas, essas rasavam os seus voos
bem baixo à procura, desesperadas, dos pontinhos coloridos no meio
da relva… mas sem sucesso!
O Sr. Joaquim passou a mão na farta cabeleira, coçou a
barba crescida e apoiou melhor a sua mão esquerda na sua
bengala…
- O que será que aconteceu? Estará o mundo de pernas para o
ar? Onde está a Alegria?
E decidiu ir ao cimo da montanha mais alta, pois só de lá
poderia fazer-se ouvir a quem tudo sabe: a sra. Nuvem Rainha do
Céu!
Caminhou todo o dia com muito esforço, os seus passos eram
vagarosos e faziam doer as costas e as solas dos pés…. Às sete
horas em ponto chegou ao seu destino! Sabia que eram sete horas e
não oito porque a sua barriga estava a “dar horas”… isso acontecia
sempre à hora do jantar! E o sr. Joaquim era um senhor com
muitos hábitos: nunca saía de casa sem colocar a chave no bolso
esquerdo do casaco, bebia sempre água na “Fonte da Magia” por
uma folha da nespereira que ficava bem perto, falava à dª Natália
que lavava a roupa no tanque da aldeia e jantava sempre, sempre
às sete horas em ponto!
Aprumou a farta cabeleira, ajeitou o casaco, puxou as calças
para cima e tentou falar com uma voz decidida (a sra. Nuvem
Rainha do Céu podia ser um pouco autoritária e ele não era
homem de mostrar medos ou vergonhas):
- Sra. Nuvem Rainha do Céu! Posso falar-lhe?
Esperou um longo momento… e mais outro… mas sabia que
não devia chamar de novo (a sra. Nuvem Rainha do Céu podia
ser um pouco impaciente também… e constava-se que sofria de
preguiça! Mas isso, era segredo para todos… - pensava ela).
Ouviu-se um roçar de nuvens, uma brisa soprou e desalinhou
a farta cabeleira do sr. Joaquim.
- O que me queres? – perguntou a sra Nuvem Rainha do Céu.
- Sabe… – hesitou um pouquinho – não sei o que se passa na
aldeia, não se ouviam risos ou gargalhadas, ralhetes ou
reprimendas, nem sequer birras ou amuos… está, está… não sei, está
tudo diferente!
- Ah! Já tinha percebido… hoje até o céu está triste, sabes? (a voz
da sra. Nuvem Rainha do Céu ficou mais baixa e quase num
sussurro…) Os sonhos foram-se embora! E quando os sonhos se vão
embora, as crianças não conseguem acordar, e quando isso
acontece, o mundo fica triste, cinzento, sem cores, sem músicas, sem
poesias, sem alegrias, o mundo fica de pernas para o ar começa a
encolher… fica tudo mais pequenino e apertado!
- Os sonhos?! Mas como?! O que posso fazer?!
- Hum… é simples… tão simples que pode ser muito difícil… (pronto!
Lá estava a sra. Nuvem Rainha do Céu a ficar teimosa e
complicada – pensou o sr. Joaquim - mas sabia que só ela o
podia ajudar…)
- Diga-me o que fazer… e farei!
A sra. Nuvem Rainha do Céu encheu os seus fofos montes brancos
de ar e soprou ao ouvido do sr. Joaquim:
- Olha, vai e embala todos os meninos e meninas… embala-os com
a tua ternura, com palavras doces, com mimos, abraços e beijos
ternos… só assim elas poderão sonhar!
O sr. Joaquim voltou o mais depressa que as suas pernas
cansadas conseguiam andar, pé ante pé, e percebeu com espanto que
voava sobre o chão como se asas tivesse! Nunca na sua vida se
sentira tão ansioso e sabia que tinha em mãos uma tarefa de
muita responsabilidade: devolver os sonhos a todos os meninos e
meninas, não deixar que a Alegria fugisse para não mais voltar!
Durante aquela noite, o sr. Joaquim foi a todas as casas, a
todas e não esqueceu nenhuma!
Em todas as casas havia um menino ou uma menina a quem
ele cantava doces melodias, recitava lindas poesias que nem ele
sonhava saber de cor, as suas mãos afagavam os seus cabelos com
uma ternura que ele nunca imaginara ter… e depois, ah! Depois!
Os meninos e meninas sorriam a dormir, com um sorriso de
mel e flores… e o sr. Joaquim chorava baixinho, como só os anjos
conseguem fazer….
Quando o sr. Joaquim acordou no dia seguinte, às sete horas
em ponto (era outro hábito seu…), correu para a janela… olhou para
o seu jardim… cheirou o ar da manhã… apurou os seus ouvidos…
tudo estava sereno e em paz!
O que era o mesmo que dizer que se ouviam risos e
gargalhadas, ralhetes e reprimendas, sequer birras e amuos… era
um dia azul e violeta, laranja e amarelo, rosa e lilás, um dia feito
de todas as cores do arco iris, lindo, alegre e cheio de vida! Viam-
se flores de mil cores, abelhas zumbiam em seu redor, borboletas
saltitavam para trás e para a frente e as andorinhas, essas
rasavam os seus voos, felizes pela natureza em plena vida!
As crianças sonharam! As crianças sonharam! As crianças
sonharam!
O sr. Joaquim parou de repente! As crianças… eu… quem foi
que sonhou? Não sabia…
Mas uma coisa o sr. Joaquim sabia: sem Crianças não há
sonhos… sem sonhos não há vida…
Voltou para dentro e escreveu num lindo cartaz de todas as
cores:
FELIZ DIA DA CRIANÇA !!!
Luísa Campos