Criminalização Das Lutas Sociais

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TITULO: CRIMINALIZAÇÃO DAS LUTAS SOCIAIS EM ESTADOS AUTOCRÁTICOS BURQUESES 1 , Apresentado no Congresso: Xº JORNADAS INTERESCUELAS/DEPARTAMENTOS DE HISTORIA, Rosário, 20 em 23 de setembro de 2005, [email protected] ; RESUMO: Discute-se os processos de violência perpetrados pelo estado autocrático tanto em períodos de ditadura quanto de distensões, contra a população encarcerada por crimes comuns e a demonização dos movimentos e lutas. Considera-se que, sendo este estado incapaz, por sua própria configuração autocrática e politicista, de atender ou mesmo reconhecer nestas lutas as demandas sociais, este reputa à estas manifestações a violência e a insegurança vigentes na sociedade e decorrentes da exclusão sócio-econômica e cultural. O tratamento desta temática nos remete ao universo dos estudos que tratam das relações entre violência e estado, entendido este comumentemente como o aparato institucional que rege a nação. Tais estudos podem ser tomados em dois âmbitos fundamentais: os que se referem aos períodos ditos democráticos e os que a analisam nos períodos ditatoriais ou “autoritários”. Nos períodos da ditadura a violência do Estado contra a população põe a nu a luta de classes e as bases de sustentação do regime que ameaça, coíbe, transgride e mata impunemente. Conforme diz o senso comum, é fácil reconhecer o inimigo e embora seja muito difícil contrapor ás forças armadas a reação social, esta se manifesta de inúmeras formas e qualquer fragilidade que demonstre este sistema 1 - Este artigo integra uma área de conhecimentos que vêm sendo analisada no GT: Trabalho, Ideologia e Poder, do Centro de Estudos de História latino-americana, pertencente ao Programa de Pós-graduação de História da PUC/SP. Integram estas discussões 08 mestrandos e 01doutorando. 1

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Trabalho que trata dos aparatos legais e das iniciativas que tendem a levar a uma criminalização dos movimentos sociais

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TITULO: CRIMINALIZAO DAS LUTAS SOCIAIS EM ESTADOS AUTOCRTICOS BURQUESES ,

TITULO: CRIMINALIZAO DAS LUTAS SOCIAIS EM ESTADOS AUTOCRTICOS BURQUESES,

Apresentado no Congresso:

X JORNADAS INTERESCUELAS/DEPARTAMENTOS DE HISTORIA, Rosrio, 20 em 23 de setembro de 2005, [email protected];RESUMO:

Discute-se os processos de violncia perpetrados pelo estado autocrtico tanto em perodos de ditadura quanto de distenses, contra a populao encarcerada por crimes comuns e a demonizao dos movimentos e lutas. Considera-se que, sendo este estado incapaz, por sua prpria configurao autocrtica e politicista, de atender ou mesmo reconhecer nestas lutas as demandas sociais, este reputa estas manifestaes a violncia e a insegurana vigentes na sociedade e decorrentes da excluso scio-econmica e cultural.

O tratamento desta temtica nos remete ao universo dos estudos que tratam das relaes entre violncia e estado, entendido este comumentemente como o aparato institucional que rege a nao. Tais estudos podem ser tomados em dois mbitos fundamentais: os que se referem aos perodos ditos democrticos e os que a analisam nos perodos ditatoriais ou autoritrios.

Nos perodos da ditadura a violncia do Estado contra a populao pe a nu a luta de classes e as bases de sustentao do regime que ameaa, cobe, transgride e mata impunemente. Conforme diz o senso comum, fcil reconhecer o inimigo e embora seja muito difcil contrapor s foras armadas a reao social, esta se manifesta de inmeras formas e qualquer fragilidade que demonstre este sistema viabiliza a reao permanentemente latente nos setores oprimidos, resultando em suas quedas.

No entanto, a violncia contra a populao pobre sob a justificativa de que constituem ameaa segurana social, que substitui o mote de que so ameaa segurana nacional, se mantm nos perodos de distenso ou de democratizao. Confundida com a violncia que tem crescido na mesma proporo do crescimento urbano, esta traduz a perpetuao da excluso scio, econmica e cultural que se mantm nestas sociedades.

As evidncias das violncias estampadas nos noticirios do presente e as comprovaes documentais que as relatam no passado perpassando pelas diversas formas como estes estados vm se configurando em pases latino-americanos comprovam a relevncia e a necessidade do aprofundamento de reflexes sobre o sentido que possuem, a ideologia que veiculam, a gnese da forma especfica que adquire nas sociedades latino-americanas e a funo social que cumprem.

Nos estudos mais recentes ganham relevncia as anlises e reflexes que tratam da violncia no mbito da cidadania, ou seja, relativa aos atos praticados quotidianamente pelo Estado, atravs de seu aparato policial que revidam com violncia atos infratores da ordem social, praticados por pessoas ou organizaes.

Denuncia-se o monoplio pblico da violncia legitimada (...) como ameaa ao desenvolvimento da sociedade democrtica, a que se contrapem as evidncias da fragilidade do exerccio da cidadania e a necessidade de se incrementar a apropriao dos direitos humanos pela maioria da populao, particularmente o direito e acesso justia e o carter discriminatrio das leis vigentes nestes pases, o que aumenta a marginalidade e amplia a violncia, constituindo-se assim um ciclo vicioso de culpabilizao mtua: manuteno de altos ndices de violncia coibidos por aparatos policiais e governamentais que atuam com violncia de que resultam sociedades violentas. Analisa-se a impotncia dos aparatos governamentais para coibir ou controlar a violncia reconhecida nos atos caracterizados como atentados segurana de indivduos ou sociedade, denominados crimes comuns e pequenos delitos cometidos por infratores sendo comuns as referncias sua gnese nas condies de excludncia econmica, social e civil. (PINHEIRO, 2004; VELHO, 1980; Observatrio de Violncias Policiais)

Nestes abundam as estatsticas sobre a miserabilidade e as desigualdades sociais, em termos de PIBs e a falta de acesso aos benefcios sociais. A desigualdade socioeconmica que afeta a regio e que, no Brasil atinge seus maiores ndices em decorrncia do denso contingente populacional e da altssima concentrada de renda, expressa-se tambm na falta de acesso do estado de direito, no interior do qual o preceito da igualdade de todos perante a lei se consolida na mxima dantoniana de que a lei garante as condies da desigualdade.

As prticas de tortura so comuns, infelizmente aceitas pela sociedade em geral e banalizadas pelos noticirios. No fosse a ao de algumas e poucas entidades a denunciarem tais arbitrariedades, esta impunidade passaria inclume. Tambm aqui se observa que, para tais autores, a prtica de obter confisses mediante tortura, a impunidade dos torturadores decorre de fatores vinculados ao prprio aparato coercitivo, ou seja, ao aparato aprisional, policial e o judicirio, associando tais prticas incapacidade do novo estado democrtico de erradicar os maus-tratos impostos a prisioneiros comuns. Preocupados com a defesa do estado democrtico, tendem a considerar que h diminuio da gravidade e do escopo da tortura com a diminuio da oposio poltica armada (RODLEY; BOLVAR, in: Pinheiro, 2004.), ou seja, acabam por reputar luta armada contra a ditadura parcelas da responsabilidade pela utilizao das torturas como interrogatrio.

So recorrentes as anlises sobre as evidncias do distanciamento entre a lei e a prtica, comprovadas pelos abusos dos direitos humanos cometidos pelas autoridades constitudas, que cometem publicamente crimes horrendos, relatados frequentemente pela mdia e pelos meios de comunicao, embora poucas referncias se encontre relativas anlise da impunidade dos infratores legalmente constitudos, alm da constatao das dificuldades em se comprovar a autoria destes crimes (BENEVIDES,1983)

Denuncia-se as desumanas das condies de encarceramento em cujas celas apinham-se pessoas condenadas ou no, de diversas faixas etrias, com vivncias distintas em termos de contravenes e por onde circulam quase que livremente drogas e os mais variados tipos de entorpecentes. A falta assistncia mdica e de sade, falta vigilncia sobre o quotidiano da vida destas pessoas, em principio sob a guarda do estado, que assim ficam submetidas violncia sexual e abusos de toda ordem.

Os constantes motins e rebelies so a prova mais cabal de que, mesmo encarcerados em condies degradantes onde se misturam presos por delitos comuns com assassinos contumazes e traficantes reconhecidos, estas pessoas preferem se expor morte no confronto desigual com policiais armados, com o intuito de chamar a ateno da sociedade para sua condio insustentvel. A reao das foras policiais a esses protestos tem-se traduzido, em vrios pases da regio, em massacres cometidos em nome da restaurao da ordem. Assim como no Brasil, conforme RODLEY, a priso na Amrica Latina o espao da desordem que vem tona por breves perodos de tempo como conseqncia das revoltas nas prises. (RODLEY, in: Pinheiro, 2005).

Estes estudos tendem a buscar a gnese deste estado de violncia em dois fundamentos bsicos: fragilidade das instituies democrticas, em particular do sistema judicirio e ao no exerccio de prticas cidads, propondo, a partir da, reformas que diminuam a corrupo e aumentem a segurana, assim como desenvolver aes para ampliar a conscincia social sobre os direitos humanos e o estado de direito.

Os sistemas judicirios, reputam os autores, alm de sua inoperncia, embora disponha, em muitos pases, de um corpo de leis extremamente progressista em termos de direitos humanos, mantm uma estrutura e um funcionamento nos termos fixados pelos perodos ditatoriais a que se acresce uma histrica conduta que expressa uma viso de mundo, uma ideologia que advm dos tempos coloniais. Estabelecem a relao entre a forma como se compem os autos processuais e a tortura impingida aos aprisionados pelo Estado que continua sendo a forma mais cabal de obteno da confisso das pessoas aprisionadas. Constatam tambm os altos salrios dos altos escales do poder judicirio que contrastam com as condies materiais e administrativas e tcnicas das delegacias de bairros e com os valores dos rendimentos dos policiais que atuam nas ruas, corroborando com uma situao que incentiva a corrupo. Tais autores consideram imprescindvel que se faa novas reformas nos sistemas judicirios, embora alertem tambm que esta no neutra em nenhuma sociedade, sofrendo a influncia de grupos com mais condies de atuarem junto aos poderes decisrios governamentais, ajustando-se ao fim a certos interesses sociais e subordinando-se muito freqentemente manipulao dos polticos.

Outros autores abordam esta questo pelo ngulo das evidncias de que se manifesta uma cultura preconceituosa contra a populao pobre, vigente tanto na polcia civil quanto na militar, associando-a desigualdade social, excluso socioeconmica atvica que assola estas sociedades. No entanto, ainda so poucos os estudos que resgatam em uma perspectiva histrica as evidncias das torturas e injustias judicirias (pois preso rico no torturado), bem como a abordagens humilhantes e chantageadoras, que facilmente se transformam em execues sumrias, como frutos, de um lado, da transposio de preconceito de classe, dos escravos para os pobres (a classe de baixo). A viso de mundo que governa as relaes entre ricos e pobres no pode integrar nem a idia de igualdade, nem muito menos a de fraternidade dentro da nao. Os pobres, sobretudo os que no se comportam bem no seu lugar de excludos na ordem, no so irmos, no so nacionais, so quase que uma outra etnia, um outro a atravancar o melhor do Brasil que so os brasileiros, o Brasil do futuro. Tortura e morte o que merecem (ALMEIDA, 1997). ;conforme diz ngela de Almeida em seu artigo sobre a mobilizao de funcionrios de uma instituio de encarceramento de crianas, jovens e adolescentes delinqentes de So Paulo

Como os defensores de direitos humanos bem sabem, h muita gente, entre jornalistas, polticos, militantes e mesmo autoridades governamentais ou judicirias, que encaram a tolerncia com o flagelo da tortura, como um problema cultural brasileiro, difcil de erradicar. (...) Ora, sabemos bem que no isso. (...) O que uma parte considervel da opinio pblica brasileira no tolera o crime dos pobres contra o patrimnio dos ricos. Nestes casos a tortura , ou ignorada como um no-acontecimento, ou tolerada, quando no incentivada abertamente. E ela s empregada contra os infratores pobres. (ALMEIDA,2004)

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Nesta tica os pobres so, em princpio, os perigosos e por isso deve-se exercer sobre eles permanente vigilncia e controle, colocando-se a salvo os que detm posses. Caracteriza-se assim, segundo estes estudos, um tratamento discriminatrio e desigual por parte da polcia e do sistema judicirio que vem a regra da lei como um obstculo, em vez de uma garantia efetiva, ao controle social; eles acreditam que o seu papel proteger a sociedade dos elementos marginais por qualquer meio disponvel. "A polcia e outras instituies do sistema da justia criminal tendem a agir como guardas de fronteiras, protegendo as elites dos pobres. (CHEVIGNY, in: Pinheiro, 2004).

A polcia torna-se uma ameaa populao, pois como qualquer pessoa suspeita a partir, muitas vezes, de sua aparncia fsica, as abordagens nos bairros mais afastados so freqentes e a qualquer movimento que se considere suspeito, atira-se para matar. so comuns as notcias e os depoimentos de familiares relatando assassinatos deste tipo cometidos pelas polcias civis e militares.

Segundo este mesmo autor, em alguns pases, a polcia tem tambm poderes especiais, que servem para enfatizar sua independncia das leis que governam o resto do sistema penal. Na Argentina, por exemplo, a policia federal pode deter uma pessoa por at trinta dias por vadiagem, bebedeira, ou mesmo travestismo. Na Venezuela, a polcia pode deter pessoas consideradas como ameaas sociedade por at cinco anos, confirmando, portanto, a crena de que a polcia basicamente tem a funo de controlar as pessoas pobres. (CHEVIGNY, in: Pinheiro, 2004). Ao que podemos acrescentar o fato de que, no Brasil o prisioneiro no pode expressar-se publicamente, sendo-lhes cerceado o direito de livre expresso, sob a alegao de que seus relatos sensibilizavam a opinio pblica quando expunham sua situao.

No Brasil, a constituio de 1988 que fixou os princpios da democracia no pas, no mudou a deciso tomada durante a ditadura militar de que crimes comuns cometidos pela polcia militar deveriam ser julgados por cortes da polcia militar. Estas cortes, constitudas de oficiais militares e fundamentadas por investigaes criminais imprecisas, freqentemente sancionam o uso excessivo da fora, inclusive o uso desnecessrio de fora letal, mantendo-se como enclaves ditatoriais em regimes ps ditaduras.

Tais evidncias nos remetem constatao do quanto as sociedades latino-americanas tendem a se apresentar como democracias liberais, mas a igualdade de todos perante a lei regularmente contestada por contribuio desigual de poder. Resulta da que para a maior parte da populao a lei ameaadora e um instrumento de opresso.

No entanto, estas abordagens tm dois pressupostos fundamentes que se evidenciam particularmente nas observaes dos autores sobre as solues possveis: a de que estes fatos expressam a fragilidade das instituies democrticas ainda em construo e que, portanto, as solues passam por alterar, no interior da mesma ordem vigente, as polticas que vm sendo gestadas.

Neste sentido, possvel constatar como tais anlises tendem a ficar circunscritas ao universo das polticas e denotam o ardil do politicismo conforme o diria Jos Chasin (CHASIN, 2000a). Pois, segundo ele, politicizar tomar e compreender a totalidade do real exclusivamente pela sua dimenso poltica e, ao limite mais pobre, apenas do seu lado poltico-institucional. Expulsa a economia da poltica, ou, no mnimo, torna o processo econmico meramente paralelo ou derivado do andamento poltico, sem nunca consider-los em seus contnuos e indissolveis entrelaamentos reais, e jamais admitindo o carter ontologicamente fundante e matrizador do econmico em relao ao poltico. Politicismo que se reproduz tambm nas anlises, mas que traduz uma condio inerente especificidade de nossa formao social. Pois, reduzida em sua possibilidade de atuar com autonomia e de cumprir sua funo de classe no regime liberal atendendo s demandas sociais (imprescindveis ao prprio desenvolvimento do capitalismo, sob pena de rompimento da sua prpria lgica), a governabilidade burguesa reduz sua ao dimenso do poltico, enquanto a ordem econmica gerencia a subordinao.

As polticas pblicas, fundadas na lgica da integrao da Amrica Latina aos pases hegemnicos, significam a permanncia dos vnculos sociais, polticos, econmicos, cientficos, culturais, diplomticos e militares na condio de subordinao. Nesta lgica, o Estado que, classicamente, aparenta ser distinto das foras sociais que o engendram gesta polticas que no s no atendem s necessidades sociais, mas se contrapem a elas, atingindo, por vezes, at mesmo os segmentos da burguesia que lhe do sustentculo.

Aos enclaves ditatoriais de toda ordem que se perpetuam, tanto institucionais quanto no iderio da populao, soma-se a incapacidade das polticas em atender as necessidades sociais em tempos democracia e o no reconhecimento da realidade autoritria do Estado autocrtico, resulta em que estas inoperncias passam a ser discutidas enquanto polticas ineficientes, reputando se poltica a determinao do desenvolvimento social. Observa-se, assim, a autonomizao do poltico e sua conseqente hiperacentuao, embora, de fato, isto expresse seu esvaziamento numa entidade abstrata, a perda de sua concretude e decorrentemente de sua potncia e eficcia (CHASIN, 2000, p. 8).

A mesma tnica pode ser referida aos estudos relativos s lutas sociais ideologicamente configuradas que explicitam suas demandas de forma organizada atravs de partidos e organizaes diversas e que j se configuram enquanto tradies em toda a Amrica latina, emergindo, submergindo e recrudescendo conforme as circunstncias e especificidades. Estas lutas e organizaes assim como suas aes, embora sendo objeto de estudos de vrios autores, se evidenciam como um tema nobre na historiografia, mantendo-se ainda tangenciais no escopo historiogrfico.

Tais lutas, denominadas de lutas polticas, de teor muito distinto das situadas at agora neste artigo, expressam suas demandas e possuem sua ideologia por reformas ou mudanas radicais na sociedade expressando-as em documentos que podem ser resgatados, ou na documentao escrita,ou analisando suas aes, ou recuperando as atravs do testemunho de seus protagonistas ou contemporaneamente aos dias atuais.

Apesar da significativa produo historiogrfica na dcada de 80, antes disso e nos dias atuais, a produo historiogrfica atesta, particularmente no Brasil, que este no tem sido considerado um tema nobre, merecedor de reflexes mais aprofundadas. Por outro lado, a divulgao que se obtm na imprensa expressa em si o antagonismo de classe inerente s circunstncias que os fazem emergir no cenrio regional, nacional ou local.

Demonizados nas ditaduras que chegam a elev-los como fatores determinantes dos golpes militares e objeto de suas doutrinas de segurana nacional, nos perodos de distenso social mantm a aura de ameaadores da ordem mesmo nos casos em que suas demandas sejam apenas por reformas necessrias viabilizao do prprio capitalismo.

Do que podemos deduzir do que at aqui foi exposto, so vrios os indicadores do que estes movimentos e lutas, assim como os atos registrados como crimes comuns so expresses de demandas sociais que, no sendo reconhecidas pelo Estado como tais, sofrem suas aes repressivas e arbitrrias, tanto em perodos de ditaduras, quanto nas pocas de distenso.

Sem entrar em maiores detalhes sobre o teor do Estado que assim se manifesta, cabe o questionamento que tambm no novo na historiografia: sobre a viabilidade da institucionalizao da democracia, mesmo nos moldes do preconizada pelas burguesias liberais, a partir dos fins do sculo XVIII.

Chasin, analisando estas circunstncias no caso brasileiro, comprova de que forma passa-se, ao longo da histria deste pas, da forma de dominao autoritria para as ditaduras, o que foi recuperado por Ivan Cotrin em artigo em que analisa a lgica que funda a teoria da dependncia.

Neste contexto e diferentemente do processo de ascenso da burguesia europia e ordenamento de seu aparato estatal, a burguesia nacional mostra-se incapaz de promover sua revoluo, pois isso demandaria unificar-se internamente e apoiar-se na foras sociais que exclui, esta classe, no limiar das necessidades de promover reformas, impostas pelo prprio desenvolvimento do capitalismo, mantm os enclaves ditatoriais dos perodos bonapartistas, consolidando a autocracia. Nasce, desse modo, uma categoria social cuja potncia auto-reprodutiva do capital extremamente restringida, uma burguesia que incapaz de exercer sua hegemonia e, com isso, incorporar e representar efetivamente os interesses das demais categorias sociais numa dinmica prpria. (RAGO, 2004).

Inverte-se, portanto o sentido da violncia, exatamente como j o ponderava Marx ao analisar a emergncia do estado prussiano e a contraposio entre o corpo de leis que era erigido e o direito consuetudinrio de explorao das florestas pelos lenhadores, quem faz o bandido o Estado. El gobierno del Estado moderno no es ms que una junta que administra los negocios comunes de la clase burguesa.(MARX, 1974:65)

Nem mesmo observamos aqui a ocorrncia do processo segundo o qual as leis no coagem os indivduos, impostas de cima para baixo, mas so a exteriorizao das vontades dos indivduos como um corpo nico como cidados, fazendo as leis e se reconhecendo neles.

No interior desta dinmica no se verifica no mbito do pensamento burgus nestas especificidades, o reconhecimento da impossibilidade de se instaurar a democracia, nem sequer nos termos assumidos pelos liberais do sculo XIX. A contradio entre o ideal desenvolvimentista liberal e a sociedade dividida em classes j percebida por Stuart Mill no incio do sculo XIX que o levou a propor que tal condio de explorao, impeditiva da realizao da democracia, poderia ser eliminada no apenas pelo processo poltico democrtico, como outros afirmavam, mas pelo desenvolvimento de institutos de integrao social, s muito recentemente tem sido reconhecida como uma necessidade imperiosa, embora sem que sejam adotadas deforma concreta os mecanismos para tanto. Apenas recentemente, e totalmente subordinada lgica do mercado, alm de desvinculada de outras medidas que visem reduzir a desigualdade social, se discute a questo educacional como o fator que reverter esta situao (VIEIRA, 2005).

Nestas circunstncias, contradio entre a democracia apregoada pelos iluministas do sculo XVIII e o liberalismo adotado no sculo XIX europeu acrescem-se, para os pases latino-americanos, os problemas da subordinao e da dependncia que se acentuaram como enclaves na conformao dos Estados nacionais e seus desdobramentos ao longo do sculo XX, adentrando o XXI.

O permanente aborto das radicalizaes burguesas que rompem com o conservadorismo e liberam as foras produtivas capazes de gestar uma nova ordem, interrompe a concretizao de uma processualidade semelhante na regio e, conseqentemente no gestado o iderio que o expresse.

Em nossa historicidade as leis continuam a ser estabelecidas pelo alto, mediante os acordos definidos em consensos ps-ditaduras que tm como preceito bsico, no o atendimento s demandas sociais, mas pelo contrrio, a rearticulao do bloco do poder de forma a apaziguar as demandas sociais latentes fortalecidas por recentes mobilizaes contra as ditaduras (apesar dos desfalques em suas lideranas cometidos pelas represses). Mas so, alm disso, como no passamos pela revoluo e os pases que a passaram as viram abortadas pelos consensos com o intuito de consolidarem a radicalizao, no fixamos culturalmente as bases dos princpios roussonianos.

Mantm-se o autoritarismo com os enclaves ditatoriais executivo mais forte que o legislativo cujos componentes subordinam os interesses individuais coisa pblica, mesmo que esta represente o interesse da iniciativa privada de forma mais ampla, acompanhando o desenvolvimento da manufatura e do comrcio que era a expresso da burguesia em ascenso. Por sua vez, o executivo, que, em princpio, seria o guardio da constituio, mas que fica subordinado ao primeiro, que se consolida no consenso, apesar do sistema eleitoral.

Observa-se assim a lgica do apadrinhamento, da fisiologia, no h a nao da representao dos interesses sociais e pblicos no sentido do desenvolvido pelos iluministas no bojo das revolues.

O parlamento (legislativo) funcionava na Inglaterra do sculo XVIII acompanhando o desenvolvimento das manufaturas e do comrcio, que era a burguesia em ascenso, dividindo poderes com a coroa apaziguadora.

No h em nossa formao escolar o exerccio da crtica iluminista, isto , o que incide sobre o objeto criticado, no de forma aleatria, mas fincada em suas razes sociais no bojo de guerras civis e revolues e contestaes s verdades dogmticas, fossem estas religiosas ou polticas.

Os processos de distenso que reinserem a autocracia aps os perodos ditatoriais bonapartistas ocorrem com muita semelhana entre os pases latino americanos submetidos ditaduras ou autoritarismos, pelas quais as lideranas concordam em manter os preceitos ditatoriais em nome da segurana nacional, da manuteno da ordem, dos compromissos internacionais assumidos (pagamento das dvidas nos mesmos moldes preconizados) preceitos constitucionais que garantiram impunidade aos torturadores, permitindo-lhes se manterem em postos e cargos pblicos da polcia civil, entre outros. Cooptadas as lideranas dos movimentos sociais, exclui-se a representao direta, com as lideranas integrando os colgios eleitorais que corroboram com as candidaturas nicas a serem referendas. So concertaciones chilenas, o colgio eleitoral brasileiro, o acordo para a modernizao mexicana.

No se trata apenas de uma composio, mas da permanente recomposio que se evidencia ao longo da historicidade de formaes que se caracterizam, conforme Chasin, pela via hiper-tardia que gesta o capital atrfico, no qual a burguesia, por sua incompletude de classes, se mostra incapaz de liderar as reformas necessrias ao desenvolvimento do prprio capitalismo fazendo alianas com as classes sociais excludas que lhe garantiriam a fora suficiente para atingir a radicalidade necessria consolidao da democracia, no nvel atingido pelas sociedades desenvolvidas.

Pois um estado em que as decises polticas sejam de ordem social, econmica ou cultural no conseguem atender as demandas sociais, que permanentemente reordena as mesmas foras dominantes no bloco do poder, mantendo os enclaves ditatoriais que caracterizam o cesarismo militar que no rompe com a institucionalidade autoritria, onde o acesso ao estado de direito fica restrito ao voto, em que os guardies da constituio legalmente constitudos se locupletam na defesa de interesses individuais em detrimento do interesse pblico, no pode ser chamado de democrtico, nem mesmo nos limites da ordem liberal.

Neste sentido, no se trata apenas de uma perspectiva autoritria que, conforme bem o aponta o autor, limita as presses dentro da ordem e exclui ou pacifica as presses contra a ordem, o que ocorreu tanto na esfera de representao direta de suas diversas fraes no interior da sociedade poltica, quanto na esfera de representao burocrtica, com o deslocamento dos militares da funo cesarista de direo poltica do Estado e do bloco no poder para a funo de tutela, permitindo a composio pelo alto. (MACIEL, 2004,319), mas sim de garantir a institucionalidade autoritria que caracteriza estas formaes sociais.

Enquanto o capital concluso pode contemplar, em sua autonomia estrutural, amplas parcelas das categorias subalternas, elevando-as no plano das condies materiais de vida; nas formas do capital inconcluso, as formaes tpicas da via colonial de objetivao capitalista, em face de seu retardo histrico, antepe de modo excludente, permanentemente, evolver nacional e progresso social. graas a esta determinao histrica, a sua incompletude de classe, que se constitui o capital atrfico e subordinado, com suas caractersticas egostica e exclusivista. (RAGO, 2004).

Esta composio pelo alto que, em face da mobilizao das classes excludas considera uma grande concesso a abertura representao eleitoral, no transita da ditadura para a democracia, mas sim da autocracia para as ditaduras quando, em face da necessidade de proceder s reformas demandas pelo prprio capitalismo sob pena do no reordenamento de sua inerente entropia.

Neste contexto o regime instaurado a partir de 1964, o crime erigido sob a forma de lei, no foi abatido por um amplo movimento de massas, articulado num projeto econmico alternativo da perspectiva do trabalho, porm - e esta foi sua grande vitria -, manteve em seus traos gerais a forma particular da organizao produtiva subordinada e induzida de fora. RAGO, 2004.

Da a necessidade de reexaminarmos o carter das ditaduras e a das apregoadas democracias que assolam o pas semelhana de outros pases latino-americanos, questionando as leituras de que se caracterizam como estados de exceo, mas refletindo sobre as especificidades que apresentam, cujos enclaves demonstram o quanto os segmentos da burguesia nacional detentora do poder do estado, subordinando seus interesses aos internacionais, opta pelas ditaduras que confere s reformas um carter altamente conservador, pois sempre aqum das possibilidades vigentes nas condies societrias em curso.

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REZENDE, Priscila. A harmonia propagada pelo despotismo: as ideologias do governo Vargas sustentadas pelo seu Ministrio da Guerra (1935 a 1940). ) (mestrado em andamento) orientao Vera Lucia Vieira. Integrante do CEHAL.

ROCA,Gustavo, Las dictaduras Militares del cono sur. Buenos Aires: El Cid, 1984.

SADER, Emir, Um rumor de botas. So Paulo: Polis, 1982.

VELHO, Gilberto. Violncia e Cidadania. in: Dados. Revista de Cincias Sociais, v. 2 3 n 3 1980.

VICRIO, Guido, Militares e poltica na Amrica latina. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira. 1979.

VIEIRA, Vera Lucia, Educao liberal em estados autocrticos burgueses, In: Revista UNICAMP,2005, (no prelo)

Entidades e associaes:

Observartrio de Violencias POliciais, SP, http://www.ovp-sp.org;

Centro Santo Dias de Direitos Humanos

Associao de Mes e Amigos da Criana e do Adolescente em Risco -AMAR

Ncleo de Estudo da Violncia da USP (NEV)

Petronella Boonen - Centro de Direitos Humanos e Educao Popular DHEP

Associao em Nome do Bem Comum

Desarquivando o Brasil. http://www.desaparecidospoliticos.org.br;

- Este artigo integra uma rea de conhecimentos que vm sendo analisada no GT: Trabalho, Ideologia e Poder, do Centro de Estudos de Histria latino-americana, pertencente ao Programa de Ps-graduao de Histria da PUC/SP. Integram estas discusses 08 mestrandos e 01doutorando.

REZENDE, Priscila. A harmonia propagada pelo despotismo: as ideologias do governo Vargas sustentadas pelo seu Ministrio da Guerra (1935 a 1940). ) (mestrado em andamento) orientao Vera Lucia Vieira. Integrante do CEHAL.

- Cadernos Adenauer II, n 1, A violncia do cotidiano, SP., Fundao Konrad Adenauer, maro 2001.

- Debruar-se sobre questes atuais como campo de estudos historiogrficos tm levado alguns historiadores a desenvolverem reflexes sobre a pertinncia e validade desta perspectiva do ponto de vista terico, considerando trata-se de processos em curso cuja anlise corre o risco de ser rapidamente superada pelos eventos que se sucedam, embora esta questo merea reflexes parte deste artigo. CALIL, Gilberto (CD:Anais do Simpsio Nacional de Histria (23:2005): Londrina, PR, ANPHU, Editorial Mdia, 2005). CHAUVEAU, Agns & TTART,Philippe (orgs.). Questes para a histria do presente. Baur: EDUSC, 1999.

- Constatando o aumento da violncia cotidiana no Brasil aps a dcada de 80, MESQUITA NETO demonstra que a resposta ao aumento da criminalidade e da violncia foi o aumento do nmero de agentes empregados em servios pblicos e privados de segurana e na quantidade de recursos investidos em servios de segurana. Apesar de no existir ameaas ao Brasil, no perodo de 1985 a 1995 o nmero de policiais militares e civis e guardas municipais aumentou 45,4%. O nmero de policiais civis aumentou 126,8% de 1982 a 2000 s no Estado de So Paulo, que o mais populoso do pas MESQUITA NETO, Paulo, Crime, violncia e incerteza poltica no Brasil. In: Cadernos Adenauer II, A violncia do cotidiano. n 1. SP. Fundao Konrad Adenauer, maro 2001, pg. 31/32. Tambm observam os autores o aumento dos gastos com militarizao no apenas das foras armadas, mas tambm da polcia civil. (COGGIOLA, 2001:37-38). Existem inmeros estudos sobre a violncia nos outros pases latino-americanos. Mas apenas a ttulo de exemplo, podemos citar o artigo de Pierre Salama, La violncia lationamericana vista por los economistas. In: Revista Ciclos, en la histria, la economia y la sociedad, n 24, ao 2002, Faculdad de Cincias Econmicas Univ. Buenos Ayres, 2002.

- Refiro-me ao debate mantido entre Danton e Robespierre no perodo da Conveno, no qual o primeiro questiona o preceito de que a igualdade seria garantida pelos preceitos legais, na ordem liberal.

- Muito recentemente e funcionando ainda de forma incipiente pode-se obter informaes e documentos e denuncias de torturas, impunidade e arbitrariedades policiais em alguns sites, como o caso do mantido pela entidade Observatrio de violncias policiais. Apenas a ttulo de ilustrao dentre os inmeros citamos alguns: Moa que tenta roubar xampu torturada dentro de carceragem sob responsabilidade da Secretaria de Segurana Pblica e perde o olho direito. 30 de junho de 2004. (...) Casal torturado em sua prpria casa, na Vila Arriete (zona sul de So Paulo) e depois o marido assassinado dentro do 99 Distrito Policial, de Campo Grande (zona sul de So Paulo. 24 e 26 de fevereiro de 2004 - Cinco jovens so torturados para confessar o roubo inexistente de um carro, em So Bernardo. 18 de fevereiro de 2004.(...) Morte por tortura, como queima de arquivo, de Fernando Dutra Pinto no CDP Chcara Belm 11 (zona leste de So Paulo). 2 de janeiro de 2002. in: Observatrio de violncias policiais HYPERLINK "http://www.ovp-sp.org/index.htm" http://www.ovp-sp.org/index.htm; Entidades e associaes: Centro Santo Dias de Direitos Humanos

Associao de Mes e Amigos da Criana e do Adolescente em Risco AMAR; Ncleo de Estudo da Violncia da USP (NEV); Petronella Boonen - Centro de Direitos Humanos e Educao Popular DHEP

Associao em Nome do Bem Comum.

- Chacina da Favela Jardim Portinari, Diadema (Grande So Paulo) - Me e dois filhos jovens so assassinados por um policial militar diante de cerca de 30 pessoas, com a ajuda e a passividade de mais seis colegas. 4 de julho de 2005. In: Observatrio de violncias policiais HYPERLINK "http://www.ovp-sp.org/index.htm" http://www.ovp-sp.org/index.htm;

- No obstante a passagem do poder aos civis, em 1985 boa parte do sistema repressivo continuou agindo, como o Sistema Nacional de Informaes (SNI) que s seria extinto no governo de Fernando Collor de Melo. A Agncia que o sucedeu, a ABIN, (...) no conta com mecanismos sociais de controle efetivo, atravs do congresso nacional, de suas atividades, e, de tempos em tempos, temos notcias de atividades escusas de espionagem do pas. FICO, Carlos, Espionagem, polcia poltica, censura e propaganda: os pilares bsicos da represso, in: FERREIRA, Jorge e NEVES, Lucilia de Almeida, O tempo da ditadura: regime militar e movimentos sociais em fins de do sculo XX, Rio de Janeiro, Civ. Brasileira, 2003.

- PETRINI, Luciana Aparecida, Homicdio entre a classe trabalhadora pobre em So Paulo nos anos de 1937 a 1945. (trabalho marginalizado) (mestrado em andamento) orientao Vera Lucia Vieira. Integrante do CEHAL.

- BENEVIDES, Maria Victoria, Violncia, povo e polcia (violncia urbana no noticirio de imprensa), So Paulo, Ed. Brasiliense, CEDEC, 1983.

- Este termo est aqui sendo utilizado com a conotao policial, isto , abordagens feitas pela polcia a pessoas, em geral pobres que, gratuitamente, considera suspeitas. Nos bairros pobres so, em geral, violentas, humilhantes, e intimidatrias.

De acordo com a Comisso da Pastoral da Terra, no Brasil, dos 1730 assassinatos de camponeses, trabalhadores rurais, lderes de sindicatos, trabalhadores religiosos e advogados, cometidos entre 1964 e 1992, apenas trinta casos resultaram em condenaes. Muito freqentemente, os camponeses, os trabalhadores rurais e os povos indgenas so colocados nessas categorias e no tm acesso s garantias do estado de direito. A polcia militar, com a incumbncia de policiamento, age como uma extenso da milcia de atiradores dos latifundirios.

- Comeam a se manifestar movimentos contra a manuteno destes enclaves ditatoriais, seja organizando-se em entidades que lutam por direitos humanos, sejam atravs de marchas que comeam a ser promovidas em alguns grandes centros urbanos do Brasil, (ex:Marcha Contra a Violncia do Estado e das Elites no Rio de Janeiro (16/04/2003), aos gritos de "chega de chacina, polcia assassina".Conforme um dos coordenadores de um destes movimentos, Mauricio Campos, ativista da frente popular, "a desigualdade, a concentrao de renda, a manuteno do aparato repressivo que foi montado durante em todo esse sculo e, em particular, durante a ditadura militar, hoje se reflete nessa violncia sistemtica e na corrupo policial". A manifestao foi organizada pela Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violncia, Movimento Posso Me Identificar. A data foi escolhida em funo da proximidade com outros genocdios. Em 16 de abril de 2003, quatro pessoas foram assassinadas pela polcia na comunidade do Borel, no Rio. No dia 17 do mesmo ms, h nove anos atrs, 21 trabalhadores rurais sem terra foram mortos no massacre de Eldorado dos Carajs, no Par. Alm disso, no ltimo dia 31, 30 pessoas foram vtimas de chacina promovida por policiais em Nova Iguau e Queimados, na Baixada Fluminense. Fonte: Centro de Mdia Independente - HYPERLINK "http://brasil.indymedia.org" http://brasil.indymedia.org; - 20/04/2005.

Da dcada de 60 dcada de 80 a Amrica latina vivenciou mais um longo perodo ditatorial em continuidade lgica autoritria que vm permeando a constituio das naes neste continente desde o sculo XIX. Tais ditaduras, orquestradas pelo intervencionismo norte-americano, podem ser consideradas abortos revolucionrios dado o carter das reformas propostas em diferentes pases latino americanos, atravs das intensas mobilizaes populares que expressavam as demandas sociais de diferentes teores, como era o caso, por exemplo das propostas de reformas de base no Brasil.

- J. CHASIN, Hasta Cuando? A Propsito das Eleies de Novembro, in Ib., p. 123.

- J. CHASIN, Hasta Cuando? A Propsito das Eleies de Novembro. In: RAGO, 2004.

- VIEIRA, Vera Lucia, Educao liberal em estados autocrticos burgueses. In: Revista Propostas, Faculdade de Educao, UNICAMP, Campinas (no prelo).

- no sculo XX na Amrica Latina e Caribe pode-se contabilizar desde a revoluo no Mxico de 1910-1954; a revoluo guatemalteca de 1944 a1954; a revoluo sandinista 1979, a revoluo civil com Fiqueires de 1948 na Colmbia, a revoluo boliviana 1952-1964; a revoluo cubana 1959. Alm das guerrilhas urbanas de El Salvador 1970, na Nicargua a Frente Sandinista de Libertao Nacional de 1961 a 1979, o Sendero Luminoso desde 1970 no Peru, guerrilhas de Granada desde 1982, as guerrilhas de 1961-1971 e a do Araguaia no Brasil, os Tupamaros no Uruguai de 1963 a 1984, os Montoneros na Argentina; at os governos militares (ditadura de Somoza 1934-1979 na Nicargua, as ditaduras intermitentes no Equador at 1978, na Bolvia de 1964 a1982, no Suriname desde 1980, no Peru de 1968-1980, no Chile de Pinochet de 1973-1990, no Brasil de 1930-1945 e de 1964 a 1985, no Uruguai de 1973 a 1985 na Argentina de 1976 a 1983.

- A respeito da trajetria historiogrfica das lutas ou movimentos sociais ver: COGGIOLA,Oswaldo Historiografia do movimento operrio-latino-americano. Revista Brasileira de Histria. So Paulo, v. 14, n. 28, 1994;

HYPERLINK "http://www.desaparecidospoliticos.org.br/" http://www.desaparecidospoliticos.org.br/;

Conforme Ivan Cotrin, recuperando Chasin: de forma sumria, temos que a autocracia burguesa institucionalizada a forma de dominao burguesa em tempos de paz, o bonapartismo a forma da dominao burguesa em tempos de guerra. E na proporo em que, na guerra de classes, a paz e a guerra sucedem-se continuamente, no caso brasileiro, no caso da objetivao do capitalismo pela via colonial, as formas burguesas de dominao poltica oscilam e se alternam entre diversos graus do bonapartismo e da autocracia burguesa institucionalizada, como toda a nossa histria republicana evidencia (Chasin, 2000, 128); o que expe com clareza a impossibilidade democrtica dessa burguesia. COTRIM, 2004, pg. 32.

- Analisando a abertura poltica encetada a partir de 1984 Maria Helena Moreira Alves constata que ficava cada vez mais claro que no excitem o Brasil um processo de transio para a democracia, mas sim uma tentativa de institucionalizao de estruturas de Estado visando ampliar o apoio poltico e ao mesmo tempo manter o controle bsico de classe (...) dado que no ocorreu a necessria ruptura fundamental com as estruturas de controle estabelecidas pelo Estado de Segurana Nacional em decomposio. No possvel formar mecanismos democrticos paralelos de poder superpostos aos mecanismos estruturais de controle social e poltico de uma sociedade organizada economicamente em termos de explorao. (ALVES, 2005:390) A autora situa a processualidade dialtica que determina as caractersticas das estruturas de coero caractersticas da organizao do Estado de Segurana Nacional. Para ela, a primeira a tendncia a perder o controle do crescimento burocrtico, em especial do aparato repressivo, que pde constituir sua prpria base de poder, independente do Executivo. Em segundo lugar, o Estado de Segurana Nacional incapaz de eliminar completamente a oposio; cada campanha repressiva contra determinado setor da oposio leva ao embate setores at ento no envolvidos, que protestam contra o uso da fora. Em terceiro lugar, a tentativa de eliminar a oposio pela fora ignora as injustias reais que esto na raiz do conflito; a dissenso no , assim, eliminada, mas simplesmente transferida de um para outro setor da sociedade civil. Por esta razo, finalmente, o Estado de Segurana Nacional intrinsecamente instvel, tendendo a um crescente isolamento. A longo prazo, o Estado tende a tornar-se territrio exclusivo de uma pequena elite que mantm a sociedade civil (e at seus prprios integrantes) sob controle, mediante o recurso cada vez mais freqente fora fsica. (...) Esta condio de permanente crise institucional acaba por minar a estabilidade do Estado. (ALVES, 2005: 33)

- As distenses ditatoriais que se observam nos pases latino-americanos ocorrem todas na dcada de 80- Brasil- movimento diretas j. 1982. Uruquai- plebiscito de 1981 contra o continusmo da ditadura. Chile- plebiscito de 1981 contra permanncia de Pinochet. Argentina- militares cedem lugar ao presidente eleito Ral Alfonsn.

- No Brasil, os militares garantiram sua participao orgnica direta no governo, nos ministrios militares; no Chile a oposio (includos o partido comunista e o partido socialista) aceitou governar com base na constituio pinochetista de 1980 e garantir 8 anos de mando de tropa para os comandantes designados por Pinochet; No Peru, a constituinte legislou sob o governo militar de Morles Bermudez. No Uruguai, o governo civil se baseou no Pacto do clube naval, que garantiu impunidade militar, reforada em plebiscito, na Argentina, as crises militares forma aproveitadas pelos governos civis para inocentar aos geneticidas militares por meio das leis de ponto final de obedincia devida. No Paraguai a mudana de regime nem sequer transcendeu os militares familiares da ditadura, pois o general democrata Andrs Rodrguez,que substituiu a ditadura era parente direto do ditador Stroessner.(COGGIOLA, 2001:95).

- No caso do Brasil, apenas para situarmos a ltima ditadura, desde 1985, aps 02 anos de distenso, a autocracia manifestava-se no somente pela composio entre os principais setores autocrticos, governistas e oposicionistas, realizando politicamente uma verdadeira composio pelo alto, (...) mas tambm por viabilizar o fim do cesarismo militar sem romper com a institucionalidade autoritria que dava sustentao. (FERNANDES, 1986, 22; in: MACIEL, 2004, 319).

- MARX, Carl, O Capital. Varias edies.

Em sua crtica marxista, J. Chasin especifica esse trao ontolgico: Desprovido de energia econmica e por isso mesmo incapaz de promover a malha societria que aglutine organicamente seus habitantes, pela mediao articulada das classes e segmentos, o quadro brasileiro da dominao proprietria completado cruel e coerentemente pelo exerccio autocrtico do poder poltico. Pelo carter, dinmica e perspectiva do capital atrfico e de sua (des)ordem social e poltica, a reiterao da excludncia entre evoluo nacional e progresso social sua nica lgica, bem como, em verdade, h muito de eufemismo no que concerne assim designada evoluo nacional. Cf. CHASIN, J. A sucesso na crise e a crise na esquerda. In: A Misria Brasileira. Santo Andr: Estudos e Edies Ad Hominem, 2000, p. 221. Grifos nossos. Publicado originalmente em Revista Ensaio 17/18. So Paulo: Ensaio, 1989, p. 49.

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