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GRADUAÇÃO 2016.2 CRIMINOLOGIA E EXECUÇÃO PENAL AUTOR: FERNANDA PRATES FRAGA

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GRADUAÇÃO 2016.2

CRIMINOLOGIA E EXECUÇÃO PENAL

AUTOR: FERNANDA PRATES FRAGA

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 13: 59-80 NOV. 1999

David GarlandNew York University

AS CONTRADIÇÕES DA “SOCIEDADE PUNITIVA”:O CASO BRITÂNICO1

RESUMO

Rev. Sociol. Polít., Curitiba, 13, p. 59-80, nov. 1999

O autor procura mostrar, examinando o caso britânico, como as políticas penais atuais são dilaceradas porduas tendências contraditórias: de um lado, a percepção da necessidade de enfrentar a criminalidade comoum aspecto constitutivo e inexpurgável da vida social contemporânea, o que resulta numa “criminologiado eu”, do criminoso como agente racional à nossa imagem e semelhança, e aponta para uma “administra-ção” desse fato social normal; e, de outro, a negação histérica dessa realidade, o que resulta numa“criminologia do outro”, do criminoso como monstro, e que aponta para um recuo a estratégias de combateao crime mais primitivas e de eficácia meramente simbólica.

PALAVRAS-CHAVE: sistema penitenciário; punição; criminalidade; penalogia.

I. INTRODUÇÃO

Um ponto de vista que Friedrich Nietzsche eÉmile Durkheim compartilham — certamente oúnico, nesses pensadores tão diferentes — é o deque os regimes politicamente fortes não têm amenor necessidade de apoiar-se em sanções es-pecialmente punitivas2. A repressão pode ser tidacomo um símbolo de força, mas ela também podeser interpretada como o sintoma da ausência deautoridade e como repressão inadequada(NIETZSCHE, 1956; DURKHEIM, 1974).

O fenômeno mais visível e mais marcante dapolítica penal recente na Grã-Bretanha é essa es-pécie de “punitividade” que doravante caracterizaimportantes aspectos da política governamental eda retórica política. Procurarei, aqui, identificaras fraquezas e os limites que estão na origem des-se fenômeno e chamarei a atenção para alguns

dos problemas sobre o poder e sobre a autoridadeque ele esconde.

Eu gostaria também de analisar as estratégiasbem diferentes, no campo da repressão criminal,que brotaram dessas mesmas fraquezas e queemergem, de forma um tanto discreta, ao lado dorecurso recorrente ao dispositivo punitivo: essasestratégias são “adaptações” à situação atual, ca-racterizada por uma forte repressão criminal, aopasso que a estratégia punitiva se apresenta antescomo “negação” simbólica dessa mesma situação.Esse tipo de repressão criminal dualista,ambivalente e freqüentemente contraditória é atra-vessado por uma forma de pensar a criminologiado mesmo modo dualista e ambivalente, dilacera-da entre o que eu designarei pelas expressões“criminologia do eu” e “criminologia do outro”.Esse dualismo contraditório expressa um conflitoque está no próprio coração da política contem-porânea, e não uma resposta logicamente diferen-ciada às diversas espécies de criminalidade.

É cada vez mais aceita, hoje em dia, a idéia deque, durante os anos 90, a Grã-Bretanha se tor-nou decididamente punitiva em sua resposta àcriminalidade, como o atesta, por exemplo, a li-nha política do recente Ministro do Interior,Michael Howard, que declarou repetidas vezes suaintenção de tornar o regime carcerário mais aus-tero, de construir prisões “de choque”, de fazerpassar leis que permitam apresentações imediatas

1 “Les contradictions de la ‘société punitive’ : le cas bri-tannique”. Actes de la Recherche, Paris, n. 124, p. 49-67, sept.1998. Tradução para o Francês: Brigitte David. Tradução doFrancês: Bento Prado de Almeida Neto. Revisão técnica:Pedro Rodolfo Bodê de Moraes e Adriano Nervo Codato.Agradecemos aos editores de Actes a autorizaçao para a pu-blicação deste artigo em Português.

2 Este artigo remete a duas publicações recentes: GAR-LAND, 1997 e GARLAND, 1996a. Meus agradecimentos aLoïc Wacquant por seus comentários e sugestões.

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para delinqüentes reincidentes (alguns delitos, serepetidos uma única vez, podendo levar à prisãoperpétua), que permitam limitar e eventualmentesuprimir as libertações antecipadas, e anunciar emalto e bom tom que “a prisão funciona”. Uma taldeclaração nutre-se da intenção de punir e de tor-nar inócuos os delinqüentes, ao invés de corrigi-los.

Talvez o exemplo mais extremo que ilustre essapolítica seja aquele programa de televisão ondepudemos assistir, em 1996, às tomadas de umafilmagem feita numa sala de partos, mostrandouma presa imobilizada por algemas e uma corren-te atando-a à sua guarda enquanto dava à luz oseu filho. Essa imagem de crueldade penal cho-cou inúmeros espectadores, os comentadores crí-ticos vendo nela um exemplo bem representativodo exagero atual em termos de segurança que pros-pera em detrimento das considerações humanitá-rias e de políticas de reabilitação3.

Tudo isso provocou inúmeros comentários nosjornais e nas revistas especializadas. Se algunscomentadores vincularam essa política punitiva aalguns políticos — no caso, o “efeito Howard”

—, outros viram nela o surgimento de uma “novapolítica da crueldade” sustentada pelo Primeiro-Ministro, John Major, para apaziguar a ala direitado Partido Conservador. Comentadores comoJohn Gray ou Will Hutton interpretaram essa novapolítica punitiva como a inevitável reação de socie-dades — e, aqui, os Estados Unidos representamo caso certamente mais exemplar — em que a ta-xa de criminalidade é muito alta, as divisões soci-ais tendem a agravar-se, a insegurança pessoal eeconômica é crescente e as soluções sociais exis-tentes caíram em descrédito. Nesse contexto, acompaixão para com os delinqüentes é cada vezmais suplantada por uma preocupação mais ex-clusiva com as vítimas, e os políticos de todos ospartidos vêem-se encorajados a tomar medidasfirmes, não desprovidas de conotações po-pulistas4.

Se esta análise pode parecer correta em suasgrandes linhas, resta que a punitividade é não maisque “uma dimensão” de um tipo de repressão cri-minal mais complexa e mais contraditória5 quenão se vincula exclusivamente a um regime políti-co e que cabe reinserir no quadro de uma evolu-ção mais ampla.

3 Ainda falta determinar se a política do governo do NewLabour vai diferir fundamentalmente daquela da administra-ção anterior, conservadora. Os primeiros indícios — espe-cialmente The Crime and Disorder Act, 1998 — apontam paraa ausência de mudanças.

4 Que se veja, por exemplo, o recente relatório do Ministé-rio do Interior (1996) e o do Ministério Escocês (1996).

PUNITIVIDADE E ESTRATÉGIA DE SEGREGAÇÃO PUNITIVA

O que é que faz com que uma nova lei de condenação, um regime carcerário, ou o trabalhopenitenciário sejam da ordem do “punitivo” ou, mais simplesmente, do “penal”? E o que é que poderiajustificar a descrição de uma trajetória da sociedade como “punitiva”?

A resposta é mais complexa do que parece. A “punitividade”, de fato, em parte é um juízo compa-rativo acerca da “severidade” das penas com relação às medidas penais precedentes, em partedepende dos objetivos e das justificativas das medidas penais, assim como também da maneirapela qual a medida é apresentada ao público. As novas medidas que aumentam o nível das penas,reduzem os tratamentos penitenciários, ou impõem condições mais restritivas aos delinqüentescolocados em liberdade condicional ou vigiada — e tais medidas tiveram um papel importante nalegislação recente no Reino Unido — podem ser consideradas “punitivas”, pois aumentam comrelação a um ponto de referência anterior.

As medidas que propõem objetivos distributivos antes que objetivos correcionais ou utilitáriospoderiam igualmente ser chamadas “punitivas”, ainda que tudo dependa da linguagem empregadapara apresentar a medida frente aos seus diferentes públicos. O trabalho penitenciário, por exemplo,é freqüentemente apresentado para o grande público como uma medida dura, vingadora, mas, frentea públicos profissionais mais sofisticados, ele é apresentado como uma fórmula barata de detençãocorrecional.

5 Diversos autores discutiram alguns aspectos desse esque-ma; em particular, M. Feeley e J. Simon, nos Estados Uni-dos, que apresentaram um modelo de nova penologia atuarial,que qualificaram posteriormente como “pós-moderna” emaspectos substanciais. Para uma discussão crítica desse mo-delo, veja-se GARLAND, 1995. Num ensaio recente,SIMON & FEELEY (1995) procuraram correlacionar odesenvolvimento da “nova penologia” com a manutençãode um discurso publico mais punitivo sobre o crime.

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II. A “NORMALIDADE” DAS TAXAS ELEVA-DAS DE CRIMINALIDADE

De uns trinta anos para cá, as taxas elevadasde criminalidade e de atentado à propriedade, semprecedentes históricos, deixaram de ser conside-radas anormalmente elevadas. Assim, a taxa atualde delitos declarados e registrados pela polícia naInglaterra e no país de Gales é dez vezes superiorao que era em 1950. Ainda que a taxa de cresci-mento na Escócia seja menor, ela foi no entantomultiplicada por cinco nesse período (SMITH,1995; YOUNG, 1996). Nesse mesmo espaço detempo, o aumento dos roubos de carro declara-dos multiplicou-se por 28 e o das lesões corpo-rais declaradas por 48. Comparadas a essa ten-dência acentuada, as leves quedas, em números,

Talvez os mais claros casos de medidas penais “punitivas” sejam aqueles a que uma linguagempenal mais antiga se refere quando fala de penas “exemplares” ou “aflitivas”. J. F. Stephen (1993, vol.2, p. 451) propunha a idéia de “castigos exemplares” para descrever medidas — como o enforcamentoou o açoite — que “justificavam categoricamente e satisfaziam o desejo de vingança do público comrelação a tais delinqüentes”. Durante uma boa parte do século XX, a expressão abertamente confessa-da do sentimento de vingança foi virtualmente tabu, pelo menos da parte dos representantes doEstado, mas, nesses últimos anos, tentativas explícitas de expressar a cólera e o ressentimento dopúblico tornaram-se um tema recorrente da retórica que acompanha a legislação penal e a tomada dedecisões. Os sentimentos da vítima, ou da família da vítima, ou um público temeroso, ultrajado, sãoagora constantemente invocados em apoio a novas leis e políticas penais. O castigo — no sentido deuma sanção significativa que apela para o sentimento do público — é uma vez mais um objetivo penalrespeitável, abertamente reivindicado.

Jeremy Bentham (s/d, p. 83) caracterizava como “penas infamantes” essas penas — como oscastigos corporais — nas quais “sempre se mistura uma parcela de ignomínia”. De modo indiscutível,todas as sanções criminais são “ignominiosas”, mas algumas carregam um fator de humilhaçãoparticularmente chocante. Medidas recentes como a reintrodução do grilhão em vários Estados ame-ricanos, ou o porte do uniforme listrado do preso, ou o fato, na Grã-Bretanha, de que os delinqüentessexuais libertados sejam sinalizados para a comunidade certamente poderiam ser ditas “punitivas”nesse sentido.

De fato, essas formas de mortificação e de humilhação públicas, que durante décadas foramconsideradas como obsoletas e extremamente aviltantes, são hoje valorizadas por seus partidáriosexatamente devido a seu caráter inequivocamente “punitivo”.

Caberia lembrar, no entanto, que todas as medidas penais têm uma qualificação polissêmica,concentrando objetivos, imagens e sentidos diferentes, significando coisas diferentes para pessoasdiferentes, inclusive as medidas que parecem ser (aos olhos de seus críticos) simples eindubitavelmente punitivas. Assim, a maior parte das medidas penais recentes engajadas em ummodo de ação significativo — punir para seu próprio bem, traduzir o sentimento do público, insistir nosobjetivos punitivos ou denunciadores — atestam ao mesmo tempo uma lógica mais instrumental.Cada medida opera em dois registros diferentes, um registro punitivo que emprega os símbolos decondenação e de sofrimento para entregar sua mensagem, e um registro instrumental mais adequa-do aos objetivos de proteção do público e de gestão do risco.

Os modos de expressão punitiva favoritos são também, e é importante notá-lo, modos de segrega-ção penal e de incapacitação. A preocupação política dos dias de hoje não é puramente punitiva (talque pudesse ser satisfeita por medidas como castigo corporal) nem puramente orientada para aproteção pública (o que, antigamente, levava a medidas de detenção preventiva que minimizavam seuconteúdo punitivo). Tem-se a preocupação de produzir sanções que combinem os dois modos de versob a forma de uma segregação e de uma incapacitação punitivas. O novo ideal penal é que o públicoseja protegido e que seus sentimentos sejam expressos. A segregação punitiva — penas de longaduração em prisões “sem frescuras” e uma existência estigmatizada, controlada de perto, para aque-les que são, finalmente, libertados — é cada vez mais a escolha que se impõe.

Gráfico 1. CRIMINALIDADE TOTAL REGISTRADANA INGLATERRA E NO PAÍS DE GALES, 1901-1992

Milhões de crime registrados

O crime registrado aumentou de forma significativa ao lon-go de algumas décadas.

Fonte: Estatísticas de criminalidade do Ministério do Interi-or (incluindo Londres).

0

1

2

3

4

5

6

19011905

19101915

19201925

19301935

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19801985

19901992

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do conjunto das formas de criminalidade que pu-deram ser constatadas no Reino Unido nos anos90 são totalmente insignificantes6.

Muito embora a criminalidade seja socialmen-te desigual na sua distribuição, o crime e o medodo crime são hoje em dia amplamente vividoscomo fatos da vida moderna. Pouco a pouco, ocrime tornou-se, para as gerações atuais, um ris-co cotidiano que deve ser avaliado e administradode forma rotineira — um pouco como nos com-portamos com relação aos riscos de acidentes viá-rios. Cartazes nos ônibus britânicos recomendama compra de travas de segurança, pois “ocorreum roubo de carro por minuto”. A publicidade deseguro de cartões de crédito proclama que “umcartão de crédito é perdido ou roubado a cada dezsegundos na Grã-Bretanha”. Enfim, o crime já fazparte do meio-ambiente cotidiano.

Se essas taxas de criminalidade elevadas sãoconsideradas “normais”, não é apenas porque nosacostumamos a elas, mas é também porque elassão consideradas como uma espécie de dado so-ciológico, como um traço distintivo de todas associedades similares em um estágio similar dedesenvolvimento7. Isto significa que elas não sãouma aberração de que nos pudéssemos livrar pelaaplicação de novas políticas ou por um reforçodas antigas, mas a contrapartida de nossas liber-dades individuais e de nossos mercados não re-gulamentados, a dimensão externa de nossas de-cisões econômicas, um derivado de nossos esti-los de vida mutáveis e de nossa cultura de consu-mo desenfreado, um efeito de nossa preferênciageral por um estilo de controle social não auto-ritário.

III. MUDANÇAS NO DISCURSO

Como os governos e os outros intermediáriosresponderam ao que é visto como um novo fatosocial8? A minha hipótese é a de que se produziu

uma série de transformações na percepção oficialdo crime, no discurso da criminologia, nos mo-dos de ação do governo e, finalmente, na estrutu-ra dos órgãos de justiça criminal.

Em primeiro lugar, o discurso oficial mudou.Se comparamos os documentos políticos do go-verno dos anos 50 e 60 com os de hoje, podemosdistinguir uma sutil mas importante transforma-ção. Documentos como o relatório de 1959, Prá-tica penal numa sociedade em transformação(MINISTÉRIO DO INTERIOR, 1959), ou o de1964, intitulado A guerra contra o crime (MINIS-TÉRIO DO INTERIOR, 1964), reconhe-cem quehouve um “recrudescimento do crime e da delin-qüência” a partir de meados dos anos 50. Masacreditava-se então que era apenas uma questãode tempo até que a tendência se invertesse, e nãose duvidava, na época, da capacidade do Estadoem administrar o problema. Pensava-se que oEstado “ganharia a guerra contra o crime” do mes-mo modo como havia ganho a “guerra contraHitler”.

Nos anos 80 e 90, o discurso oficial distan-ciou-se dessa atitude confiante. Fala-se muitomenos de “guerra contra o crime” — a expressãofoi simplesmente abolida no Ministério do Interiornos anos 80 — e, ainda que essa retórica tenhasido brevemente reavivada nos anos 90, ela tor-nou-se arcaica9. As declarações do Estado nocampo da repressão criminal tornaram-se maismodestas e mais hesitantes. Hoje, admite-se tran-qüilamente a existência de limites para o poder doEstado e cita-se com freqüência uma estatística,estabelecida por um departamento de pesquisa doMinistério do Interior, segundo a qual menos de3% de todos os delitos são de fato perseguidosjudicialmente até o fim, a grande massa das víti-mas e dos culpados permanecendo fora do alcan-ce do sistema (MINISTÉRIO DO INTERIOR,1995, p. 25).

6 Insignificante com relação ao argumento que estou apre-sentando. Para retornar ao nível de crime dos anos 50, essasreduções deveriam manter-se por décadas, e no entanto osindicadores mostram que elas não devem manter-se no anoque vem. Isso embora as reduções nas taxas de criminalidadeestabelecidas há mais tempo nos Estados Unidos sejam degrande interesse político.

7 Essa concepção de “fatos sociais normais” é proposta porE. Durkheim (1997b).

8 Em um artigo intitulado “Crime control and culture” (noprelo), exploro o modo pelo qual os indivíduos, os lares e as

organizações da sociedade civil se adaptaram às taxas eleva-das de criminalidade.

9 Houve uma volta a essa metáfora da guerra no ano passa-do e nos documentos políticos do Reino Unido; veja-se:MINISTÉRIO DO INTERIOR, 1959, e MINISTÉRIOESCOCÊS, 1996. Essa nova guerra contra o crime tem aresde ação de represálias, conduzida sob a urgência de afirmar asoberania e elidir toda tentativa de conciliação. A idéia deque se trata de uma guerra que se poderia ganhar não con-vence ninguém.

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* Dano criminoso; roubo de veículo motorizado; roubo de um veículo motori-zado (inclusive tentativa); roubo de bicicleta; roubos de domicílios; ferimento;estelionato; assaltos.

** As estimativas englobam os resultados adicionais de culpabilidade em cadatribunal de apresentação.Fonte: Estatísticas criminais, Inglaterra e País de Gales (HMSO e análises nãopublicadas) e Tendências do crime: resultados da investigação sobre o crime na GrãBretanha (resultados da pesquisa n.º 14).

Gráfico 2. DETERIORAÇÃO DO SISTEMA DEJUSTIÇA CRIMINAL

As estimativas ao lado mostram o número de delitos come-tidos, segundo o Relatório sobre a criminalidade britâni-ca, comparado ao número de indiciamentos/advertênciaspoliciais mostrados nas estatísticas oficiais. Nenhum ba-lanço foi feito com relação aos delitos de grupo (isto é,quando mais de um delinqüente é condenado por umaúnica infração), uma vez que não se dispõe de nenhumaavaliação séria a esse respeito.O gráfico abaixo não significa que apenas 2% dosdelinqüentes são considerados culpados. Vários dentreeles nesse mesmo grupo podem também ser responsá-veis por grande parte desses delitos que não desemboca-ram num indiciamento, seja porque o delito não foi declara-do à polícia ou não foi esclarecido, seja porque não houveevidências suficientes para uma condenação. Para oscrimes contra a pessoa e sua propriedade, 3% dos delitoscometidos desembocaram numa indiciamento ou numaadvertência policial.

100%

47%

27%

4,9%

2,7%

2,0%

Delitos cometidos

Delitos declarados

Delitos registrados

Delitos esclarecidos

Delitos desembocando em uma ad-vertência ou em um indiciamento**

Delitos desembocando em umindiciamento

Ocorrem variações, no entanto, em delitos como ferimentos, nos quais 14% dosdelitos desembocam em uma advertência ou em um indiciamento contra 2% nosroubos de domicílios e no vandalismo.

100%

69%

41%

8,4%

2,3%

2,0%

100%

27%

14%

2%

2,5%

1,6%

100%

54%

24%

19%

14,4%

10,6%

Roubosde domicílioFerimentos Vandalismo

Delitos registrados

Delitos declarados

Delitos cometidos

Delitos esclarecidosDelitos desembocandoem uma advertênciaou em um indiciamentoDelitos resultando emuma condenação

Porcentagem de delitos* cometidos

Essa situação, que é nova, tem implicaçõesprofundas. Admitir o caráter “normal” das taxasde criminalidade e os limites dos organismos dejustiça criminal, é pôr em questão um dos mitosfundadores das sociedades modernas, a saber, omito do Estado soberano capaz de garantir a se-gurança e a ordem e de reprimir o crime dentro desuas fronteiras. Esse repto lançado à lei do Estadoe à mitologia da ordem é tanto mais significativoque ele surge num momento em que a noção maisampla de “soberania do Estado” vê-se fortementeameaçada (HIRST, 1994; LASH & URRY, 1987;PATERSON, 1994).

O ESTADO CONFESSA SEUS LIMITES

“Cabe reconhecer o impacto limitado da ação policial sobre as causas do crime..”. (COMISSÃO DEINQUÉRITO: Helping With Enquires: Tacking Crime Effectively, 1993, p. 1).

“A polícia não pode ser responsabilizada pelo fato de que carros são fabricados sem muitapreocupação com a segurança ou se cidadãos não fazem por conta própria, como diria o Relatóriosobre a reforma da polícia, “tudo o que se pode razoavelmente esperar deles no sentido de protegersua própria propriedade” (idem, p. 7).

“Todo mundo concordará com o fato de que o sistema de justiça criminal, por si só, não podepretender conseguir inverter a tendência de alta dos números de criminalidade. As causas subjacentesdo crime residem na própria sociedade, mas se a inquietação do público pode transformar-se emação positiva, então muito pode ser feito” (Douglas Hurd, Ministro do Interior, nov. 1986, “Introdução” aCriminal Justice: A Working Paper. Londres, Ministério do Interior, 1986).

“A experiência dos últimos anos demonstrou não apenas a importância da confiança do público nosistema de justiça criminal, mas também os limites do sistema” (Ministério do Interior, Criminal Justice:

A partir de meados dos anos 80, tornou-secomum, nos documentos governamentais, nosrelatórios parlamentares, nos relatórios anuais dapolícia ou mesmo nos manifestos de partidos, res-saltar que os organismos governamentais não po-dem, isoladamente, conseguir controlar acriminalidade (MINISTÉRIO DO INTERIOR,1986; COMISSÁRIO DE POLÍCIA DAMETRÓPOLE, 1987; PARTIDO CONSERVA-DOR, 1987). A “guerra contra o crime” — assimcomo a Guerra Fria — já são águas passadas,mas continua-se a ouvir o discurso de guerra dealguns políticos. Todavia, os objetivos mudaram:propõem-se uma melhor gestão dos riscos e dosrecursos, uma redução do medo e dos custos dacriminalidade e da justiça criminal e um maioramparo às vítimas, todos objetivos pouco heróicose difíceis de expor na retórica clássica do discursopolítico.

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A Working Paper. Londres, Ministério do Interior, 1986, p. 3).

“Suponhamos que nós dupliquemos tanto a polícia, quanto as penas, quanto as prisões — digamos,até que as três atinjam o nível americano —, poderíamos então muito bem nos deparar com o nívelamericano de criminalidade e violência, bem maior que o nosso. Pois a polícia pode prender oscriminosos, as prisões podem encarcerá-los e tudo isto é necessário, mas não é suficiente, se há umfluxo regular de criminosos saindo de casa e das escolas... O bobby londrino, em média, é testemunhade um arrombamento uma vez a cada oito anos” (Douglas Hurd, Ministro do Interior, Discurso nocongresso do Partido Conservador, Brighton, 12 de outubro de 1988).

“Reconhece-se plenamente, hoje em dia, que não se pode prevenir o crime valendo-se apenas dapolícia e dos outros órgãos de justiça criminal, que são os organismos aos quais a comunidadetradicionalmente delegou sua responsabilidade” (Ministério do Interior, A Practical Guide to CrimePrevention for Local Partnerships, setembro de 1993, p. iii).

“Precisamos ter uma visão realista da natureza do crime e de nossa capacidade de ação nessecampo. O realismo sugeriria uma divisão do crime em duas categorias. Na primeira categoria caemos delitos mais sérios como o terrorismo, o assassinato, o estupro, o seqüestro, o roubo, o incêndiocriminoso e o roubo à mão armada. De modo perfeitamente razoável, o público espera da polícia queela tenha uma resposta profissional para esses delitos, que ela desempenhe o papel principal e queela obtenha um nível satisfatório de sucesso. De modo geral, a polícia responde a essa expectativa.Na segunda categoria caem os crimes mais aleatórios e os mais ocasionais, como os roubos deveículos, os arrombamentos, o vandalismo e os furtos diversos. Para delitos desse tipo, não é realistaesperar um nível muito alto de sucesso da ação isolada da polícia” (Relatório do Comissário de Policiada Metrópole para o Ano de 1986, p. 2).

A difícil situação que os governos têm queenfrentar reside no fato de que eles não podemmais ser a principal fonte da segurança e da repres-são criminal, ao mesmo tempo em que sabem quea curto prazo uma tal confissão pública tem todasas chances de ser politicamente desastrosa. Daíum esquema de ação política notavelmente ambi-valente: de um lado, a preocupação em enfrentaro problema e desenvolver novas estratégias quelhe sejam racionalmente adequadas; mas, de ou-tro, ao lado dessas novas e às vezes dolorosasadaptações, uma tendência recorrente a uma es-pécie de “negação” histérica e à reafirmação enfá-tica do velho mito da soberania do Estado. A ca-racterística distintiva do período atual não é a“punitividade”, mas antes a ambivalência. Ele os-cila de modo errático entre “adaptação” e “nega-ção”, entre tentativas de enfrentar a situação e ten-tativas de fazê-la desaparecer magicamente.

IV. AS “CRIMINOLOGIAS DA VIDA COTIDIA-NA”

Encontramos a mais explícita adaptação a essenovo estado de coisas num novo tipo de discursocriminológico, cada vez mais influente nos círcu-los governamentais do Reino Unido a partir demeados dos anos 70. Esse discurso foi montadoa partir de um conjunto de estruturas um tantosimilares e um tanto radicalmente teóricas, abar-cando a “teoria da escolha racional”, a “teoria daatividade de rotina”, o “crime como oportunida-de” e a “prevenção da criminalidade situacional”,conjunto que poderíamos caracterizar globalmentecomo “as novas criminologias da vida cotidiana”.Essas teorias são simples e insistem no fato deque os delinqüentes calculam suas ações, que amaior parte dos crimes são oportunistas e que amelhor resposta é a de tornar as coisas mais difí-ceis para os delinqüentes, aumentando os contro-les judiciários (CLARKE & CORNISH, 1986;HEAL & LAYCOCK, 1986; FELSON, 1994;CLARKE & MAYHEW, 1980).

TEORIAS CRIMINOLÓGICAS E RACIONALIDADES DA REPRESSÃO CRIMINAL

A idéia de Foucault de uma “racionalidade governamental” pode iluminar uma dimensãoperfeitamente peculiar da repressão criminal que, de outro modo, passa praticamente despercebida.A dimensão que é assim identificada não é exatamente a dos relatórios de polícia, nem a dos discursosde legitimação empregados pelas autoridades para valorizar a prática das instituições. Também nãoé propriamente o mesmo que as teorias criminológicas ou os programas de reforma que influenciamessas práticas. A idéia de “racionalidades governamentais” remete antes aos modos de pensar e aosestilos de raciocínio que se concretizaram numa determinada série de práticas. Ela nos orienta para

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as formas de racionalidade que organizam essas práticas e lhes fornecem seus objetivos, seu sabere suas formas de reflexão.

As racionalidades são, portanto, práticas, antes que entidades teóricas ou discursivas. Elas foramforjadas no campo da resolução dos problemas e na tentativa de fazer as coisas funcionarem. Emconseqüência, exprimem uma lógica da prática, antes que da análise, e tendem a trazer a marca daprática institucional de que provieram. Se nos valemos dessa idéia de “racionalidades” para pensar arepressão criminal, surgem questões como as seguintes: Como as autoridades compreenderam seupapel frente ao problema da criminalidade? Como foi problematizada e racionalizada a tarefa degovernar o crime? Por meio de que tecnologias e de que construções, e valendo-se de que formas desaber as autoridades exerceram seu modo de governar nesse campo?

Parece sensato sugerir que, nessas últimas décadas, chegou-se a problematizar o governo docrime a partir de novos critérios, em parte como reação às taxas cronicamente elevadas da criminalidadee ao fracasso dos controles judiciários, em parte sob a influência de mudanças mais amplas, que nosdistanciam dos estilos de governo de auxílio social e apontam para a direção neoliberal. Parecetambém plausível sustentar que, em resposta a esse campo emergente de problemas e de forçaspolíticas, se esboça uma nova racionalidade no governo do crime e da justiça criminal. Descritos emseus largos traços, trata-se de um estilo governamental que se organiza em torno de formas econômicasde raciocínio, contrastando com as formas sociais e legais predominantes na maior parte do séculoXX.

Por racionalidade “econômica”, não quero dizer simplesmente que as considerações da relaçãoqualidade/preço e de coerção fiscal tornaram-se, hoje em dia, excessivamente determinantes, aoponto de se explicitarem nos aspectos do discurso e da prática da repressão criminal — embora esteseja certamente um traço característico da cena contemporânea. Quero, com isso, chamar a atençãopara a dependência crescente para com uma linguagem analítica do risco, da racionalidade, daescolha, da probabilidade, da determinação de alvos, da oferta e da demanda de ocasiões — umalinguagem que transfere as formas “econômicas” de raciocínio e de cálculo para o campo dacriminologia; para a importância crescente de objetivos como a compensação, o controle do custo e aredução dos danos; e, enfim, para o recurso crescente a tecnologias como o audit, o controle fiscal, acompetição de mercado e a gestão restrita à tomada de decisão do controle penal. Por exemplo, aimagem, hoje em dia recorrente, do “criminoso racional”, e a preocupação de governar essepersonagem manipulando o reforço positivo e o negativo, reproduz os esquemas de pensamentosclássicos das análises econômicas. A imagem da vítima funciona, na mesma direção, como fornecedorde ocasiões criminais; e assim também a figura idealizada do homo prudens, tal como desenhadapela literatura de prevenção da criminalidade e dos contratos de seguro. Essas novas formas depensar, que fazem explodir os estratos sociológicos e psicológicos com os quais a criminologia doséculo XX recobria sua concepção do delinqüente criminal, procuram repensar as dinâmicas dacriminalidade e do castigo em termos pseudo-econômicos. Isto tem como efeito facilitar o recurso aum discurso moral simplificado sobre o crime e o castigo. Se o crime não é senão uma questão deescolha racional, então podemos “compreender menos e condenar mais”, como o Primeiro-MinistroJohn Major ressaltava em 1993.

Essa forma de pensamento desenvolveu-se de início no setor privado — nas práticas dascompanhias de seguro, das empresas de segurança privada e das empresas comerciais, preocupadasem reduzir os custos do crime que lhes pesam sobre os ombros. O pensamento comercial e fundadono seguro acerca da repressão criminal devota-se a reduzir ou deslocar os custos do crime na direçãoda prevenção antes que na do castigo e a minimizar o risco antes que garantir a justiça. Tentativascomerciais de controlar o “risco reativo”, o “perigo moral” e o “risco de indenização”, ou de pôr nabalança os custos do crime contra os custos — para a empresa — de sua prevenção ou de suapersecução judicial, conduziram à elaboração dessa forma de pensar o crime e sua repressão. Ésomente mais tarde, nos anos 80, que essa forma de pensamento começou a influenciar osorganismos e as práticas do Estado, as quais, na sua maior parte, estão sob o controle de gruposprofissionais vinculados a concepções sociais e legais do problema da criminalidade.

Essa forma de pensar invoca também outras fontes. Uma delas é o trabalho de Gary Becker e deoutros analistas econômicos do crime, cujas idéias foram recentemente transplantadas para alinguagem da política criminal. Outra delas é o conjunto das teorias criminológicas — teoria da escolharacional, teoria da atividade de rotina, e as abordagens variadas que vêem no crime uma questão deocasião —, que eu aqui descrevo como “as novas criminologias da vida cotidiana”. Contrastando com

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O que é surpreendente, nessas criminologias,é que elas brotam todas da premissa de que o cri-me é um aspecto normal, trivial, da sociedademoderna. De forma significativa, essa premissanão se apóia no sistema de justiça criminal, masem dados de pesquisas realizadas junto às vítimase em análises de testemunhos de maior enverga-dura. O crime é um acontecimento que não re-quer nenhuma motivação ou disposição especial,nenhuma patologia ou anormalidade, e que se ins-creve nas rotinas da vida econômica e social con-temporânea. Contrariamente às criminologias an-teriores, fundadas no postulado de que o crimeera um desvio da conduta normal, civilizada, quese explicava em termos de uma patologia indivi-dual, ou de uma má sociabilização, as novascriminologias vêem o crime como o prolongamentode uma interação social normal, explicável porreferência aos esquemas clássicos de motivação.O crime não é mais o signo de que algo deu erra-do, de que o indivíduo é sub-socializado ou estáperturbado, ou ainda tem um desvio de caráter: ocrime é doravante o que ocorre no curso normaldas coisas. Para o indivíduo incriminado, é umaocasião, uma escolha de carreira, um meio deconseguir emoções fortes ou de “vingar-se”. Paraa vítima ou para o público (que, desse ponto devista, são segmentos que coincidem em largamedida com o segmento dos delinqüentes), o cri-me é um “risco” que deve ser calculado ou um“acidente” a ser evitado, antes que uma aberraçãomoral que exija explicações especiais.

Essas teorias não vão sem conseqüências práti-cas. As normas de ação que delas decorrem nãose endereçam aos organismos do Estado como apolícia, os tribunais e as prisões, mas, “para além”do aparelho do Estado, endereçam-se àsorganizações, instituições e indivíduos da sociedadecivil. As teorias dão por estabelecida a capacidadelimitada do Estado. Os novos programas de açãoprocuram influenciar a conduta das vítimas po-tenciais, armar os alvos vulneráveis, melhorar a

segurança em zonas perigosas e reestruturar asrotinas da vida cotidiana que têm por conseqüên-cia desagradável propiciar ocasiões para o crime.Essa criminologia expeditiva visa, de fato, a mo-dificar as rotinas cotidianas da vida social eeconômica em direções que limitem a ocasião,redistribuam os custos e criem efeitos dissuasivos.Ela procura instaurar controles antes no seio dodesdobramento da interação normal do que numplano superior, na forma de um comando sobera-no10. Mas lá onde a idéia de repressão “interna”remetia ao domínio de si e à civilidade de huma-nos que participam de uma cena, recorre-se hojeàs tecnologias de segurança e de supervisão, queguiam e mantêm as pessoas longe da tentação(veja-se GARLAND, 1996b; DAVIS, 1990).

Assim, ao invés de confiar nas eventualidadesdas penas dissuasivas, na incerta capacidade dapolícia de prender os bandidos ou na vã esperan-ça de que se possa ensinar o domínio de si aosjovens cidadãos, essa nova abordagem dedica-sea substituir o dinheiro vivo por cartões de crédito,embutir travas nas colunas de direção dos auto-móveis, contratar vigias nos estacionamentos ecolocar circuitos internos de televisão nosshoppings, coordenar os horários de fechamentode discotecas rivais, oferecer ônibus de madru-gada, aconselhar os varejistas sobre segurança,estimular as autoridades locais a coordenar os di-ferentes organismos que lidam com a criminalidadee, claro, estimular os cidadãos a organizar rondasde quarteirão e outros grupos de autodefesa. Essanova abordagem não reivindica mais o papel prin-cipal no campo do controle da criminalidade. Elatampouco pretende um recrudescimento da re-pressão social e do domínio de si. Ao invés disso,ela procura promover um novo estilo de “enge-nharia situacional”, ali onde a “engenharia social”

10 Para uma discussão dessa espécie de controle social sub-terrâneo, veja-se SHEARING & STENNING, 1984.

as criminologias mais antigas, que pressupunham que fosse possível distinguir e corrigir a pessoado delinqüente, essas teorias têm uma visão do crime como acontecimento normal, banal, não exigindonenhuma disposição especial ou anormal por parte do delinqüente. O crime é visto como um fenômenode rotina, como algo que acontece no curso ordinário das coisas, antes que como uma perturbação danormalidade que requeira algum tipo especial de explicação. A conduta cotidiana na vida econômica esocial fornece infindáveis ocasiões de transações ilegítimas. Vistos em larga escala, os acontecimentoscriminais são regulares, previsíveis, sistemáticos — como os acidentes de trânsito. De onde se segueque a ação sobre o crime deveria deixar de ser antes de tudo uma ação sobre pessoas desviantespara tornar-se preferencialmente uma ação concebida para governar os hábitos sociais e econômicos.

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Fonte: Quadro de CLARKE, 1997, p. 18.

QUADRO 1. TÉCNICAS DE PREVENÇÃO DO CRIME SITUACIONAL

ELIMINAR ASDESCULPAS

AUMENTAR O ESFORÇOVISIVELMENTENECESSÁRIO

AUMENTAR OSRISCOS PERCEPTÍVEIS

REDUZIR ASVANTAGENS

ANTECIPADAS

1.Dificultar os alvosparquímetros sensíveis afraudes (slug rejecterdevice)trava de direçãovidro a prova de balas

5.Procedimentos de en-trada e saídacatracas automáticas comtíquetelocalização de bagagensmercadorias com dispositi-vo anti-furto

9. Eliminar o alvotoca-fitas de bandejarefúgio para mulherescartões de créditotelefônico

13. Estabelecer a regradeclaração na alfândeganormas relativas a assé-dio sexualregistro no hotel

2. Controle de acessoguarita de acesso aoestacionamentopátios cercadosinterfone

6. Vigilância formalcâmeras de controle develocidadealarmesguardas de segurança

10. Identificar a proprie-dademarcar a propriedadecarteira de motoristamarcar o gado

14. Estimular a consciên-cialombadas eletrônicas“exija nota fiscal”“beber ou guiar”

3. Afastar os delinqüenteslocalização dos pontos deônibuslocalização dos baresfechamento de ruas

7. Vigilância por funcioná-rioslocalização das cabinestelefônicasvigias de parquecircuito interno de TV

11. Reduzir a tentaçãoanuários sem o prenome(não indicam o sexo —gender-neutral listings)estacionamento privadoauto-socorro rápido

15. Controle dosdesinibidoresleis sobre idade e bebidatrava de igniçãobloqueador de canais deTV (V-chip )

4. Controlar osfacilitadorescartão de crédito com fotocontrole de armasidentificador de chamada

8. Vigilância naturalespaço defensáveliluminação das ruasrádio-taxi

12. Impedir os benefíciosmercadorias com anti-furto de tinta (ink-tags)aparelhos com códigopersonalizadolimpeza das pichações

16. Facilitar a conformi-daderegistro fácil nasbibliotecas banheirospúblicoscestas de lixo

A estratégia de responsabilização leva o Esta-do a tentar delegar sua responsabilidade na repres-

fracassou (CORNISH & CLARKE, 1986, p.4).

As novas criminologias da vida cotidiana tam-bém captam o criminoso de uma nova forma. Onão-adaptado sub-socializado, vítima de carênci-as afetivas e sociais, ou o indivíduo perigoso edeficiente, dão lugar a um consumidor hedonistaracional, isto é, perfeitamente comum, um “ho-mem situacional” inteiramente desprovido deparâmetros morais ou de controle interno, aforauma capacidade limitada para o cálculo racional ea procura do prazer. Trata-se simplesmente deuma versão depurada do indivíduo moderno, cuja“identidade” depende de uma escolha de consu-mo e de imagens de si antes que da formaçãomoral, de escolha de valores ou de autocontrole.

Oportunista, sensível às motivações situacio-nais e relativamente livre de controles internos ouexternos, ele (trata-se normalmente de um homem)pega o que consegue pegar, sem preocupar-se comos outros.

V. A ESTRATÉGIA DE “RESPONSABILIZA-

ÇÃO”

Se essas novas criminologias estão longe detransparecer na política do governo, já se podesentir, no entanto, o seu impacto. Em especial,desenvolveu-se uma nova maneira de governar ocrime — a estratégia de “responsabilização” —,que opera procurando impor e delegar responsabili-dades a grupos ou indivíduos que, antes, volta-vam-se para o Estado na procura de proteção con-tra o crime. Essa estratégia de responsabilizaçãoprocurar envolver o governo central numa açãocontra o crime que não se exerce mais diretamente,pela via dos organismos do Estado (polícia, tribu-nais, prisões, trabalho social etc.), mas indireta-mente, através da ação preventiva de organismose organizações não estatais. Várias organizaçõesde prevenção da criminalidade recentemente cria-das desempenham um papel-chave no desenvol-vimento dessa estratégia, constituindo uma boaparte do que se chama “a manutenção da ordemda comunidade” ou “a manutenção da ordem departicipação”11.

11 Veja-se BAYLEY, 1994. Acerca da manutenção da ordemde cooperação, veja-se HER MAJESTY’S INSPECTORA-TE OF CONSTABULARY, 1995, p. 3.

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A ESTRATÉGIA DE RESPONSABILIZAÇÃO

“Precisamos reduzir as ocasiões do crime [...] A repressão criminal é responsabilidade de todos.Devemos nos devotar todos à tarefa de produzir um ambiente em que o crime não possa prosperar”.

Sir Brian Cubbon, sub-secretário de Estado no Ministério do Interior. Citado em MINISTÉRIO DOINTERIOR, 1986, p. 8.

“É extremamente improvável que o grupo ou a pessoa moral que é privada de sua responsabilidadesaiba imediatamente que seus bens ou negócios constituem para a polícia um acréscimo considerávelde tensões, que ele aceite dessa mesma polícia que ela cumpra, por suas prerrogativas, seu dever derepressão criminal e que ela tome as medidas necessárias. A nosso ver, pode-se atribuir o fracassode numerosos esforços no campo da repressão criminal à ausência de meios de garantir que osmembros da comunidade envolvidos aceitem e se encarreguem efetivamente de suasresponsabilidades” (p. 452). ENGSTAD & EVANS, 1980, p. 6-7. (Os editores e autores trabalhavam, naépoca, na Unidade do Centro de Análise e de Planejamento do Ministério do Interior).

“Por muito tempo a expansão do Estado em cada esfera da vida nacional, social e econômicaserviu para enfraquecer a responsabilidade da pessoa moral. Parte da censura deve recair sobre aspolíticas educativas e sociais que freqüentemente tiveram como conseqüência a redução daresponsabilidade dos pais para com seus filhos e do sentido de responsabilidade dos filhos comrelação às suas próprias ações. O Ministro do Interior, o sr. Douglas Hurd, ressaltou a extremanecessidade de um reforço do sentido da responsabilidade, para reverter essas tendências nocivasdo pós-guerra. É essa abordagem que subjaz à abordagem conservadora daquilo que se reconheceser o aspecto mais crucial do problema — a saber, a necessidade de reinventar atitudes sociaisresponsáveis e engajar plenamente a população em uma campanha para dar fim ao crime” (p. 354).PROGRAMA DE CAMPANHA DO PARTIDO CONSERVADOR.

“O sr. Hurd ressaltou as responsabilidades que pesam sobre os membros da sociedade como umtodo, tanto no plano individual quanto no coletivo. Os planejadores e os gestores imobiliários, osprofessores e os assistentes sociais, os responsáveis pelos transportes comunitários, as grandesempresas locais e os grupos de voluntários em posições estratégicas, todos deveriam integrar essadimensão de prevenção do crime em seu trabalho” (PROGRAMA DA CAMPANHA DO PARTIDOCONSERVADOR, 1989, p. 366).

são criminal para as organizações privadas e paraos indivíduos, incitando-os a agir em direçõessuscetíveis de reduzir os delitos12. Fala-se em“movimentar as comunidades”, em estabeleceruma “cooperação entre organismos” e criar umanova geração de “cidadãos ativos”. A primeira eta-pa é a de “identificar as pessoas e as organizaçõesque têm a capacidade de reduzir de forma eficazas oca-siões criminais, e [...] avaliar [...] se estesestão autorizados a fazê-lo, e se é possível tornarisso obrigatório” (HOUGH, CLARKE &MAYHEW, 1980, p. 16). Em outras palavras, iden-tificar quem está em condições de controlar ver-

dadeiramente o crime, e inventar formas de obrigá-lo a fazê-lo.

A mensagem recorrente é a de que a respon-sabilidade da prevenção e do controle do crimenão recai mais apenas sobre o Estado, mas tam-bém sobre varejistas, sobre os industriais, os ur-banistas, as autoridades escolares, as empresasde transporte, empregadores, pais, etc. Uma talmensagem provoca muita resistência, dada a his-tória das pretensões de monopólio do Estado nes-se setor e a cultura de dependência que dela de-corre inevitavelmente13.

13 Essa dependência para com o Estado — ativamenteencorajada durante boa parte do século XX — criou aquiloque, no terreno econômico da análise do risco,freqüentemente se denomina de “compensação do risco” ou“risco moral”, isto é, a parte certa de estar perfeitamentecoberta pelo seguro desobriga-se de esforços no sentido deprevenir o mal. Desavisadamente, a polícia criou uma reaçãodesse tipo, em sua tentativa de assumir o controle dos riscosdo crime.

12 Essa estratégia de “responsabilização” foi elaborada etornada possível pelo ressurgimento, nos anos 70 e 80, deuma indústria de segurança privada e pela adoção ampla-mente disseminada de precauções rotineiras dos cidadãos edos lares. De fato, o governo procura endurecer e incrementarum leque de controles sociais dirigidos pelo setor privadoque se desenvolveu na sombra do sistema de justiça criminal— em larga medida como resultado dos limites e dos errosdesse sistema.

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Os críticos responderam a esses desdobra-mentos acusando o Estado de “passar adiante aresponsabilidade”, ou então de tentar “lavar asmãos” com relação à criminalidade. Há sem dúvi-da um pouco de verdade nessas alegações, masisto não nos deve cegar para o fato de que, traba-lhando e agrupando forças em torno dessa direção,o Ministério do Interior e os outros Ministérios doEstado atribuem-se um novo papel. Experimen-tam formas de ação à distância, a cessão de pode-res governamentais a organismos “privados”, acoordenação de interesses e o estabelecimento decadeias de ação cooperativa, sempre coisas maisdifíceis do que o método tradicional, que consisteem dar ordens aos funcionários do Estado14 .

Essas novas formas de repressão criminal im-plicam a reorganização do desdobramento da vidacotidiana no próprio seio do campo social. E ain-da que esses projetos sejam, na maior parte, mo-destos, moderados e limitados em seus objetivos,e que a “teoria” sobre a qual se fundam seja àsvezes de uma extrema banalidade, a estratégia é,em princípio, de grande envergadura e ambicio-sa. Ali onde o Estado já tentou transformar osdelinqüentes individuais, ele procura agora introdu-zir mudanças, por certo periféricas, mas efica-zes, nas normas, rotinas e na consciência de “cadaum”. Como afirma um documento governamen-tal recente, a prevenção do crime deveria tornar-se “parte integrante da prática e da cultura rotinei-

ra e cotidiana de todos os organismos e de todosos indivíduos” (HOME OFFICE, s/d, p.16).

Não se trata apenas de disseminação ou da“privatização” da repressão criminal, ainda queessa estratégia certamente se apóie em controlessociais de origem privada e, além disso, estimuleo mercado em expansão da segurança privada.Trata-se antes de uma nova forma de administrarà distância, uma nova forma de governar o crime,com suas formas próprias de saber, seus objetivospróprios, suas técnicas próprias e seus aparelhospróprios. Boa parte do que é apresentado hoje noReino Unido como criminologia não é mais do quea descrição anedótica de problemas concretospostos pela aplicação dessas estratégias15.

Essa estratégia deixa a máquina centralizadado Estado mais poderosa do que nunca, ao mes-mo tempo em que solapa a noção de Estado deBem-Estar Social, limita as atribuições dos servi-ços públicos, diminui os direitos sociais da cida-dania e incrementa a influência do mercado sobreos aspectos fundamentais da saúde e do bem-es-tar da população. A relação política entre o cida-dão e o governo é cada vez mais substituída porum contrato comercial entre comprador e forne-cedor. Nesse quadro, a linguagem do Direito, dosdireitos e da igualdade tem pouco alcance. Nocampo da repressão criminal, como nas políticasde “reforma da assistência social” dos anos 90, aresponsabilização dos indivíduos teve por efeito

15 Essa criminologia aplicada — descrita, às vezes, comouma “criminologia administrativa” — pertence àquilo quechamo de projeto “governamental”, que sempre pertenceu à“razão de ser” da criminologia. Para uma discussão a esserespeito e sobre o projeto lombrosiano na criminologia, veja-se GARLAND, 1994.

“A lei e a ordem não podem ser relegadas à polícia, aos tribunais e ao governo: cada um tem odever de ajudar na prevenção do crime. A prevenção do crime pode assumir formas diferentes, doensino às crianças da diferença entre o bem e o mal à participação nas guardas de quarteirão. Istomelhora a vida da comunidade, diminui o medo do crime e reduz o fardo da polícia. Um terço dosroubos de domicílio, por exemplo, são conseqüência de uma porta não trancada ou de uma janelapouco segura. 25% de todos os delitos relacionados a carros dão-se porque o proprietário não trancoua porta do carro. Uma grande responsabilidade pesa sobre cada membro da sociedade” (PROGRAMADA CAMPANHA DO PARTIDO CONSERVADOR, 1991, p. 463).

“As pessoas têm o dever de certificar-se de que estão efetivamente tomando todas as medidas deprevenção da criminalidade para aliviar o fardo da polícia e para melhorar a qualidade de vida dacomunidade” (PROGRAMA DA CAMPANHA DO PARTIDO CONSERVADOR, 1991, p. 479).

“O fato de passar por cima dos princípios só amplia a extensão dos problemas” (HER MAJESTYʼSINSPECTORATE OF CONSTABULARY, 1995, p. 173).

14 Acerca de “agir à distância”, veja-se LATOUR, 1987.Essas formas de exercer a regra e seus análogos em outroscampos da política social e econômica foram analisados comouma forma de “governamentalidade”. Veja-se BURCHELL,GORDON & MILLER, 1991; e BARRY, OSBORNE &ROSE, 1996.

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reduzir a dependência para com o Estado, mas elaaumenta, simultaneamente, a dependência paracom o mercado e o capital privado. O investi-mento na criminalidade e os dispositivos de segu-rança são, portanto, cada vez mais impostos an-tes pelas forças econômicas do que pela políticapública.

VI. DEFINIR O VIÉS DE BAIXA

A terceira adaptação consiste em definir o viésde baixa16, método que assume diversas formas:em primeiro lugar, o recurso amplamente dissemi-nado à advertência policial que, hoje, é freqüen-temente uma resposta normal à delinqüência demenores e dos jovens, mas representa tambémuma alternativa às persecuções judiciais (por exem-plo, na Escócia, o procurador já não recorre apersecuções senão em 50% dos casos que sãoobjeto de um relatório policial) (YOUNG, 1996);também a instituição de penas fixas e de brevesaudiências para delitos que eram perseguidos an-tigamente em níveis mais sérios; ou ainda o usode multas para crimes que teriam antigamente re-cebido penas de encarceramento e a descrimi-na-ção de condutas que foram, em outros tempos,regularmente perseguidas; finalmente, a nova po-lítica policial que decide que a polícia não tem maistempo para perder com investigações fadadas aofracasso.

Definindo o viés de baixa, tende-se a margina-lizar a criminologia crítica em proveito do Minis-tério das Finanças e da Comissão de Verificaçãodas Contas e das iniciativas de gestão financeirado governo — cuja preocupação é a de encontrarmeios para reduzir as despesas públicas e melho-rar o desempenho do governo. Assim, em um re-latório recente, a Comissão de Verificação de Con-tas advertiu o Executivo no sentido de evitar “am-pliar a malha”, segundo a expressão de Cohen —não porque isso traz mais pessoas para o sistemae aumenta a rede de repressão penal, mas porquetais práticas são pouco vantajosas do ponto devista financeiro (THE AUDIT COMMISSION,1989).

A despeito dessa tendência em definir o viésde baixa, os números que circularam nos círcu-los do aparelho de Estado aumentaram sensivel-

mente ao longo dos últimos vinte anos. Isto sedeve sobretudo ao nível crescente da criminalidadee ao fato de que a tendência sinalizando a baixa foicompensada por uma tendência oposta que defi-niu o viés “de alta”, mais especialmente no quediz respeito aos delitos de natureza sexual, os atosde violência ou os casos de drogas.

O último exemplo de adaptação reside na“redefinição do sucesso e do fracasso”. Os orga-nismos de justiça criminal reagiram às críticas jo-gando suas previsões para baixo, redefinindo seusobjetivos e procurando mudar os critérios a partirdos quais são julgados. A polícia, por exemplo,continua a proclamar seu sucesso no combate aocrime grave e na detenção de criminosos impor-tantes; ela exibe agora, no entanto, intenções maismodestas com relação ao controle da totalidadeque inclui o crime “normal”17. As autoridadescarcerárias insistem cada vez mais na sua capaci-dade de ministrar castigos e proteger o públicopelo simples fato de trancafiar os delinqüentes naprisão. Não se dão mais ao trabalho de se empe-nhar na reabilitação ou, se mantêm essa esperan-ça — como é freqüente no caso dos departamen-tos da prisão escocesa —, cuidam em não fazerdisso um indicador de desempenho18.

Simultaneamente, o discurso desses organis-mos desloca cada vez mais a responsabilidade dosresultados para os “clientes” com os quais lidam.Por exemplo, diz-se do preso — ou do “cliente”,como são agora chamados nas prisões escocesas— que ele pode dispor de toda ocasião de corri-gir-se que a prisão possa oferecer. Do mesmomodo, a polícia ressalta o fato de que cabe agir

17 Devem ser notadas as reações recentes contra essa posi-ção, surgidas nos departamentos de polícia de Nova Iorque.As reformas de que tanto se falou e que foram apresentadaspelo comissário William Bratton regrediram, como o indi-cam novos slogans policiais como “tolerância zero” e “Nãosomos multadores, somos a polícia!”. Veja-se BRATTON,1998 e KELLING & COLES, 1996. Caberia realmente de-terminar até que ponto uma polícia financiada pelos impos-tos e politicamente influenciável pode se mostrar “derrotista”face ao crime hediondo e à desordem.

18 Os programas terapêuticos e de reinserção foram manti-dos nas prisões britânicas ao longo dos anos 80 e 90; noentanto, eles são agora vistos como “serviços especializados”antes que como a ponta de lança de uma política geral dereabilitação, e essas características atípicas do regime já nãosustentam a ideologia geral do sistema.

16 Essa frase foi emprestada e adaptada de MOYNIHAN,1992.

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com cautela, e que é responsabilidade da vítimaproteger sua propriedade evitando situações peri-gosas.

Cada vez mais, essas organizações almejam seravaliadas a partir de objetivos internos, organiza-cionais, por elas controlados, antes que em fun-ção de objetivos externos ou sociais, como a re-dução das taxas de criminalidade ou a correção depresos, sempre coisas que implicam demasiadascontingências e um excesso de incerteza. Chega-se a apresentar os objetivos que eram, de início, a“razão de ser” da organização como inatingíveis.Os novos indicadores de desempenho medem as“saídas” antes que as “entradas”, o que a organi-zação “faz” antes que, na falta de melhor opção, oque ela “consegue”. Desse modo, os novosobjetivos da direção, em termos de racionaliza-ção, de rentabilidade e de relações com os clientesvão, pouco a pouco, substituindo o objetivo soci-al da redução da criminalidade, que era o objetivoinicial do sistema e de seu poder. Fracassando nosobjetivos que se havia proposto, o sistema, poruma espécie de defesa organizacional burocráti-ca, altera seus antigos objetivos e confere para simesmo novos objetivos, que lhe convêm melhore que ele pode atingir.

VII. A NEGAÇÃO

Essas respostas às crescentes dificuldades decontrole da criminalidade na sociedade contem-porânea caracterizam-se por um certo grau deracionalidade administrativa e de criatividadeorganizacional. Todavia, elas não são mais que umaparte de uma resposta bastante contraditória. Aomesmo tempo em que a “máquina administrativa”do Estado procurou adaptar-se a seus limites eacabar com realidades desconfortáveis, o “braçoarmado político” do Estado freqüentemente enve-redou por uma espécie de “negação” que se mos-tra cada vez mais “histérica” (no sentido clínicodo termo)19.

Uma das respostas à criminalidade consiste empenas severas20, em novos poderes conferidos à

polícia, em um recurso mais amplo ao encarcera-mento. Nesta linha, nos anos 80 e 90, governosfreqüentemente adotaram uma posição punitiva quevisa a reafirmar a aptidão do Estado a “governar”simplesmente pela exibição de seu poder de “pu-nir”. Essa mudança anuncia um novo realismo darepresentação, mas assinala também o modo peloqual a justiça criminal se desligou das ideologiasde solidariedade.

Essas políticas punitivas do tipo “lei e ordem”são, pelo menos em parte, uma manipulação mal-dosa e cínica dos símbolos do poder do Estado edas emoções de medo e de insegurança que con-ferem a esses símbolos o seu poder. Tais símbo-los mostram-se particularmente carregados desentido quando corre um sentimento geral de in-quietação — como é evidentemente o caso nonosso clima econômico e social. Michel Foucaultdescreveu o modo particularmente horrível peloqual o jovem regicida Robert Damiens foi execu-tado em 1757, por ter atacado o rei da Françacom uma faca (FOUCAULT, 1975). A partir daí,Foucault mostra como castigos duros eram em-pregues como demonstração pública de um po-der soberano, visando a reafirmar a força da lei eredourar o mito da soberania do Estado. O Pri-meiro Ministro, John Major, não é Luís XV, mas acada vez em que ele ou um de seus Ministros seaferram a uma postura de firmeza para com oscriminosos, “decidem tornar as prisões mais auste-ras” e “condenar mais e compreender menos”, acada vez em que eles acenam com novos poderespara enviar os delinqüentes em campos de traba-lho penitenciário, nas prisões de choque ou emprisões perpétuas, eles adotam deliberadamenteessa mesma estratégia arcaica. Emprega-se umademonstração de força punitiva contra o indiví-duo condenado para recalcar toda confissão daincapacidade do Estado de controlar o crime. A

19 Quero dizer, com isso, que o governo parece frearativamente a difusão de informações que ele sabe verdadei-ras e agir a partir daquilo que ele gostaria que fosse verdadei-ro, atitude que Freud identifica em seus paciente neuróticose que atualmente constitui um dos riscos da função de Mi-nistro do Interior no Reino Unido.

20 Temos todas as razões para crer que uma política de

encarceramento em massa, concebida para tornar delinqüentesinócuos em um número muito expressivo por períodos tam-bém expressivos, lograria reduzir as taxas de criminalidade,como talvez já venha ocorrendo nos Estados Unidos. Veja-se, a este respeito, MASSING, 1996; ZIMRING &HAWKINS, 1995. Os custos sociais e financeiros envolvi-dos na redução do crime por esses meios tornam poucoprovável o aparecimento de uma opção política séria noReino Unido de hoje. É, no entanto, perfeitamente possívelescorregar para um esquema de encarceramento em massasem que isto seja um objetivo político planejado.

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REAFIRMAR O PODER DE PUNIR“Iremos intensificar o combate contra o crime. Golpeá-lo cada vez mais forte”.

John Major, Primeiro-Ministro (Intervenção na conferência do Partido Conservador. Blackpool, 13 de outubro de1995).

“O governo declarou guerra ao crime e já ganhou batalhas importantes” (MINISTÉRIO ESCOCÊS, 1996).

“No coração desse Relatório, encontramos os detalhes das novas propostas de condenações radicais dogoverno. Elas só têm um objetivo: proteger a população dos criminosos perigosos e reincidentes” (Apresentação deMichael Howard, Ministro do Interior).

“Rejeitamos vigorosamente a concepção segundo a qual nada pode ser feito para deter a escalada do crime e asensação de impotência da sociedade. O governo crê que um sistema de justiça criminal forte e eficaz e que gozeda confiança das pessoas que respeitam as leis pode realmente fazer a diferença” (MINISTÉRIO DO INTERIOR, 1996,p.2).

“O governo crê firmemente que a prisão funciona. Em primeiro lugar, pondo os delinqüentes fora de circulação,ela os impede de cometer novos delitos. Além disso, a prisão protege a população dos criminosos perigosos.Finalmente, a prisão — e a ameaça do encarceramento — funcionam como elemento de dissuasão para criminosospotenciais” (idem, p.4).

“Com excessiva freqüência, no passado, os que mostraram alguma propensão a cometer delitos violentos ou deordem sexual cumpriram sua pena e bastou serem soltos para reincidir. O governo está decidido a fazer com que apopulação seja objeto de uma proteção particular contra os delinqüentes reincidentes violentos ou sexuais. Istosignifica que se pede aos tribunais impor uma condenação imediata indeterminada e apenas soltar o delinqüente se,e apenas se houver a certeza de que isto não apresenta nenhum perigo” (idem, p. 48).

“Apresentações obrigatórias já no caso de arrombamentos terão um poderoso efeito dissuasivo. Aqueles quepersistirem inconsideradamente serão postos fora de circulação durante um certo tempo, preservando assim apopulação de suas más ações. É um direito da população não esperar nada menos que isto” (idem, p.53).

“O mais vasto programa de construção de prisões desde o período vitoriano está agora em obras. Quando oprograma estiver concluído, em 1995, ele oferecerá 24 000 novas vagas de prisão, com um custo de mais de umbilhão de libras esterlinas. 28 novas prisões vão oferecer 15 000 vagas suplementares. A extensão de estabeleci-mentos já existentes contribuirão com outras 9 000 [...] O governo crê que empresas privadas podem contribuir nofornecimento de vagas nas prisões mais rápida e economicamente do que os serviços governamentais do setor”(PROGRAMA DE CAMPANHA DO PARTIDO CONSERVADOR, 1989, p. 364).

“As prisões deveriam ser lugares austeros [...]” (MANIFESTO DO PARTIDO CONSEVADOR ESCOCÊS, 1992, p.26).

“Há uma onda crescente de inquietação diante da criminalidade nesse país. Não tenho a intenção de ignorá-la, delivrar-me dela, ou de adorná-la de palavras. Passo à ação. Uma ação encarniçada”.

M. Howard, Ministério do Interior, Discurso na conferência do Partido Conservador. Blackpool, 6 de outubro de1993.

“A iniciativa ʻVolta ao essencialʼ do Primeiro Ministro repõe no coração das políticas governamentais os valorestradicionais, o bom senso e a preocupação com o cidadão. O governo está decidido a desafiar as teorias liberais quetanto mal fizeram à sociedade. Seu objetivo é o de certificar-se que o equilíbrio do sistema de justiça criminal nãopenda mais excessivamente para o lado do criminoso. Os interesses da vítima e da população que respeita a leidevem vir em primeiro lugar” (DEPARTAMENTO DE PESQUISA DO PARTIDO CONSERVADOR, 1994, p. 2).

“Há uma minoria de jovens criminosos durões sobre os quais as penas existentes são inócuas [...] É evidente quea população precisa e merece ser protegida desses jovens criminosos [...] O projeto de lei confere aos tribunais opoder de estabelecer uma nova forma de encarceramento para delinqüentes reincidentes que têm entre doze equatorze anos e nos quais outras formas de condenação não surtiram efeito” (DEPARTAMENTO DE PESQUISA DOPARTIDO CONSERVADOR, 1994, p. 4).

“A prisão realmente funciona. Ela funciona na medida em que protege a população dos criminosos. E ela funcionaao dissuadir os criminosos potenciais de cometer crimes, ao acenar claramente com a ameaça de possíveis castigosseveros” (DEPARTAMENTO DE PESQUISA DO PARTIDO CONSERVADOR, 1994, p. 14).

“Com nossa nova lei de justiça criminal, o criminoso violento, o estuprador, o ladrão à mão armada e o delinqüentevão passar mais tempo na cadeia. Ampliamos a pena por tentativa de estupro para prisão perpétua. Votamos penasimediatas de prisão perpétua em caso de assassinato. Os conservadores enfrentam os criminosos, não fazemacertos com eles”.

K. Baker, Ministro do Interior (Discurso na conferência do Partido Conservador. Blackpool, 6 de outubro de 1991).

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pressa em condenar a penas pesadas alguns indi-víduos esconde, na verdade, o fracasso da buscada segurança do conjunto da população.

Essa punitividade tem raízes complexas. Tem,hoje em dia, um aspecto profundamente arraiga-do na cultura britânica. Tentativas deliberadas dogoverno no sentido de modificar essa cultura —por exemplo, a tentativa de promover penas deinteresse social no fim dos anos 80 (veja-se MI-NISTÉRIO DO INTERIOR, 1988; MINISTÉRIODO INTERIOR, 1990; REES & HALL

WILLIAMS, 1991) — defrontaram-se com o re-crudescimento da demanda de penas duras deencarceramento: o público e os jornalistas da im-prensa popular pressionaram então o governo, naocasião das fugas de presos do IRA ou no casode delinqüentes violentos tais como Willie Horton,nos Estados Unidos, que são libertados condicio-nalmente, e depois reincidem no crime, ou aindaquando jovens delinqüentes parecem gozar de umacerta imunidade etc.

“Todos os criminosos provocam a cólera de seus concidadãos. Mas dois grupos (os jovens delinqüentesreincidentes e os vândalos) nos enraivecem a todos nós e nos põem em xeque”.

“Quero proteger a pessoa vulnerável e ajudar a vítima, e quero punir o grande criminoso, duramente”.

K. Baker, Ministro do Interior (Discurso na conferência do Partido Conservador. Blackpool, 6 de outubro de 1991).

“Velhos valores. Nova tecnologia. É desse modo que tenho a intenção de instalar o medo no coração doscriminosos e de trazer amparo para a vítima”.

“Fui asperamente criticado pela brigada politicamente correta que não crê no castigo. Muito se falou das razõesdo crime. Devemos fazer todo o possível para encontrá-las e tratá-las. Mas se vocês falarem com as vítimas, elasvos fornecerão em uma palavra a razão do crime: os criminosos. Quero que os criminosos sejam verdadeiramentepunidos”.

M. Howard, Secretário de Estado, 31 de março de 1995.

“Que mais pessoas acabem na prisão não me detém”.

“Não julgaremos mais o sucesso de nosso sistema judiciário pela queda da população carcerária”.

“Nossos opositores dizem que um excesso de pessoas é encarcerado. Concordo. Há um excesso de pessoasencarceradas em suas casas, amedrontadas frente à idéia de sair, de medo de serem atacadas ou de terem suascasas roubadas. São estas as pessoas que eu quero libertar”.

“Sejamos claros. A prisão funciona. Ela nos dá a segurança de estarmos protegidos dos assassinos, dosagressores e dos estupradores, e isto faz pensar duas vezes aquele que é atraído pelo crime”.

“Quero ter a certeza de que são os criminosos que têm medo, e não aqueles que respeitam a lei”.

M. Howard, Ministro do Interior, Discurso na conferência do Partido Conservador. Blackpool, 6 de outubro de1993.

CRIMINOLOGIA E “ORIENTALISMO”

Durante a maior parte de sua história, a criminologia foi um saber destinado ao poder — umassunto valorizado antes por sua utilidade do que por sua exatidão científica. É um saber que cresceuna sombra de práticas administrativas — na cela da cadeia e na investigação psiquiátrica prévia àcondenação —, onde o que está em jogo não é a compreensão dos seres humanos envolvidos, mastrata-se de conhecê-los para controlá-los.

Sob este aspecto, a criminologia tradicional pode ser comparada à literatura do “orientalismo” queEdward Said descreveu tão bem no livro de mesmo título. (E se essa comparação parece excessiva-mente exótica, lembremos que de início se caracterizava a criminologia como uma “antropologiacriminal” e se acreditava que os criminosos eram uma raça à parte). O orientalismo enquanto temasurge em meados do século XIX — aproximadamente ao mesmo tempo em que a criminologia —porque as relações geopolíticas entre Este e Oeste o tornavam útil (para nós, potências coloniais) paraa formação de um saber sistemático e prático acerca “deles” (isto é, os “orientais” de todo tipo, como

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O atrativo fundamental da resposta punitivaconsiste em que ela pode ser apresentada comouma intervenção autoritária para tratar de um pro-blema grave, gerador de angústia. Uma tal açãodá a ilusão de que “se está fazendo algo”, aqui eagora, de forma rápida e eficiente. Nenhuma ne-cessidade de cooperação, de negociação ou mes-mo de saber se isto funciona ou não. O castigo éum ato de demonstração do poder soberano, umaação eficaz que ilustra o que é realmente o poderabsoluto. De mais a mais, trata-se de um ato so-berano que visa a suscitar um largo apoio populara um preço relativamente baixo e, normalmente,com pouca oposição política genuína. Essa res-posta punitiva também não é um gesto anódino.Ela é, por exemplo, o raciocínio que está na baseda pena de morte. Aliás, os governos britânicosmantêm a pena de morte bem viva no discursopolítico ao autorizarem periodicamente votaçõesparlamentares acerca da questão de sua restaura-ção.

Além disso, ela tem um efeito direto e imedia-to sobre as taxas de encarceramento. Em socie-dades como as do Reino Unido e dos EstadosUnidos, onde há divisões sociais e raciais profun-das, onde as taxas de criminalidade e os níveis deinsegurança são elevados, onde as soluções soci-ais foram politicamente desacreditadas, onde hápoucas perspectivas de reintegração dos antigosdelinqüentes pelo trabalho ou pela família e onde,para finalizar esse quadro deprimente, um setorcomercial em expansão encoraja e favorece o au-mento do encarceramento, essa cultura punitiva

está provocando um encarceramento em massaem uma escala inédita em países democráticos, eraramente encontrada na maior parte dos paísestotalitários (CHRISTIE, 1993).

VIII. UMA CRIMINOLOGIA ESQUIZÓIDE

A retórica que acompanha essas políticas pu-nitivas impõe uma criminologia que parece dife-rente das “criminologias da vida cotidiana” de quefalamos acima. Ao invés de retratar o delinqüentecomo um oportunista racional, pouco diferentede sua vítima, a criminologia caracterizada pelaabordagem “punitiva” é bem mais lombrosiana,bem mais “orientalista” (ver quadro): o delinqüenteé “o outro, esse estrangeiro”, alguém que perten-ce a um grupo social e racial distinto, cujas atitu-des e cultura — e talvez mesmos os genes — nãoguardam mais que uma fraca semelhança com asnossas. É uma criminologia que se nutre das ima-gens, dos arquétipos, das angústias e da sugestãoantes que das análises prudentes e dos resultadosde pesquisa, é um discurso politizado do incons-ciente antes que uma forma racional de saberempírico. Esse discurso, que opera no contextodo debate político público, está submetido a re-gras semânticas muito diferentes da lógica analí-tica da investigação ou da administração.

As políticas punitivas fundam-se na caracte-rização dos delinqüentes como “marginais”, “pre-dadores”, “monstros sexuais”, “maus” ou “mal-vados”, membros de uma “sub-classe”, cada umdeles sendo o “inimigo marcado”, em uma cultu-ra dominante que exalta os valores da família, a

eram chamados). Nos textos acadêmicos dos orientalistas, a diversidade de milhões de seres huma-nos distintos, que viviam na Ásia, na Índia e no que se chamava de “Oriente Médio”, reduz-se a umpequeno número de traços raciais e estereótipos culturais. O “oriental” é retratado como um “outro”problemático, um estrangeiro exótico difícil de classificar e de controlar, mas do qual, no entanto, osexperts ocidentais podem falar com autoridade e compreensão científica. A descrição de sua inferiori-dade, de sua irracionalidade, de sua imaturidade emocional e de sua necessidade de ser governadovem nos confirmar, a nós, ocidentais, em nossa identidade de raça superior cujo domínio sobre asoutras é sancionada pela razão e pelo destino, e não apenas pela força das armas.

Tradicional, a criminologia “lombrosiana” modela-se de forma perfeitamente similar. Ela opera nointerior de uma estrutura de poder dominante que faz das pessoas delinqüentes objetos de adminis-tração problemática, e essa criminologia funda-se numa distinção fundamental, de variada expres-são, entre “eles” e “nós”, o criminoso e o não-criminoso. É essa estrutura de poder, o sistema penal,que torna possível e necessário dispor de um saber desse tipo. E, como o orientalismo, a criminologiatende ao estereótipo, à redução, à objetivação e à redução ao silêncio dos seres humanos que caemsob seu olhar.

Ali onde as “novas criminologias da vida cotidiana” normalizam o desviante, consideram odelinqüente como sendo essencialmente um de nós, o tropo recorrente das antigas criminologias é ode diferenciar, de tornar patológico, de acentuar a alteridade e seus perigos.

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iniciativa individual e os limites da assistência so-cial. Cada caso ilustra o que Mary Douglas cha-ma de “usos políticos do perigo” (DOUGLAS,1992, p. 10). Essas caracterizações sugerem umamaré montante da criminalidade, ameaçando en-golir nosso “modo de vida”, antes que uma ima-gem normalizada do crime como incômodo roti-neiro mas administrável. A iconografia sofre umabrusca mudança de gênero, passando do domés-tico para o demoníaco. Os delinqüentes são retra-tados como seres ameaçadores e violentos pelosquais não podemos ter simpatia e para os quaisnão há ajuda concebível. A única resposta práticaé colocá-los “fora de jogo” para a proteção dopúblico, o que, no Reino Unido, significa fazê-lossofrer pesadíssimas penas de prisão e, nos Esta-dos Unidos, a condenação à morte.

A criminologia oficial mostra-se, assim, cadavez mais dualista, polarizada e ambivalente. Há uma“criminologia do eu” que faz do criminoso umconsumidor racional, à nossa imagem e semelhan-ça, e uma “criminologia do outro”, do pária ame-açador, do estrangeiro inquietante, do excluído edo rancoroso. A primeira é invocada para banali-zar o crime, moderar os medos despropositadose promover a ação preventiva, ao passo que a se-gunda tende a satanizar o criminoso, a provocaros medos e as hostilidades populares e a sustentarque o Estado deve punir ainda mais.

Seria lógico que as autoridades adotassem umaperspectiva diferenciada e multicausal da condutacriminal, e que estabelecessem uma abordagemdiferenciada da sanção. De fato, essa “bifurca-ção” do raciocínio foi proposta para justificar asreformas, nos anos 80, instaurando “penas de in-teresse social”. Tais reformas endereçavam-seao público de uma forma extremamente sofistica-da, fundada numa análise diferenciada do proble-ma da criminalidade e da resposta penal adequa-da. Mas essa estratégia de reforma foi invertida,alguns meses após ter sido iniciada, em proveitode uma penologia ao mesmo tempo mais primiti-va e mais punitiva que solapou em larga medida aabordagem racionalmente diferenciada da gestãodo risco e dos recursos da criminalidade que aca-bava de ser adotada. O que vimos nos últimosanos não foi senão conflito e pensamento duplo— um criminologia esquizóide —, um raciocíniodiferenciado sem mediações.

IX. O PARADOXO DAS REFORMAS LIBERAISDOS ANOS 80

Esse pensamento duplo — e a situação so-cialmente estruturada que lhe subjaz — ajuda acompreender alguns traços da situação atual. Ex-plica o desenvolvimento, no Reino Unido, de umapolítica penal volátil e contraditória. Iniciativaspolíticas cuidadosamente planificadas, notadamen-te a lei de justiça criminal de 1991 (que introduziua proporcionalidade da multa à renda, que impôsos princípios de condenação em função do méritoe que estimulou as penas de interesse social antesque as de encarceramento), e o programa de refor-ma da prisão que seguia o relatório Woolf (quepropunha reduzir as penas de encarceramento emelhorar o regime dos presos), foram brusca-mente reduzidas a proporções mais modestas porsúbitas mudanças de humor político21 . Esforçoscombinados de reduzir os custos da repressãocriminal ou de reduzir as taxas de encarceramentoforam subitamente abandonados em proveito dedecisões punitivas que fizeram o processo regredirna sua totalidade. Num quadro conflituoso eambivalente, dados contingentes como escânda-los produzidos pela mídia, a nomeação de um novoMinistro ou a procura de uma vantagem política acurto prazo podem ter enormes efeitos.

Essa situação complexa pode ajudar a explicaro estranho paradoxo, de que as reformas liberaisdo fim dos anos 80, que reduziram radicalmenteas taxas de encarceramento e introduziram medi-das progressivas como a “unidade de multa” (unitfines), foram produzidas pela administração dedireita, politicamente segura de si, relativamenteforte, ao passo que as medidas punitivas que des-de então predominaram são a obra de um gover-no mais fraco e menos seguro de si em pratica-mente todos os campos.

As medidas que foram adotadas — ao mesmotempo preventivas e punitivas — fizeram surgirum discurso crítico de acompanhamento que co-meçou a identificar os problemas ocasionadosnesse novo esquema de pensamento e de ação.As razões que se opõem a uma volta à punitividademal precisam ser relembradas, uma vez que elasestão na base da penalogia liberal que dominou amaior parte do século XX. Mas o comentário crí-

21 Para os detalhes sobre essas reviravoltas políticas, veja-seREINER & CROSS, 1991; ASHWORTH & GIBSON,1994, p. 101-109; FAULKNER, 1993; LORD WIND-LESHAM, 1993.

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tico concernente a modos mais recentes de gover-no da criminalidade é importante, uma vez queidentifica perigos que talvez sejam menos eviden-tes (veja-se BLAGG & PEARSON, 1986; BOT-TOMS, s/d; KINSEY, LEA & YOUNG, 1986).

Um dos problemas que foi freqüentemente res-saltado é o de que a “responsabilização” de orga-nismos não estatais e o funcionamento rotineiroda prevenção da criminalidade podem provocarenormes disparidades no financiamento social ena rede de segurança. Uma vez que a “segurança”deixa de ser garantida para todos os cidadãos porum estado soberano, ela se torna um produto cujadistribuição está antes à mercê das forças do mer-cado do que sendo executada em função das ne-cessidades. Os grupos que mais sofrem acriminalidade tendem a ser os membros mais po-bres e menos poderosos da sociedade, que sãodesprovidos quer de recursos para comprar se-gurança, quer de flexibilidade para adaptar suasvidas cotidianas e se organizar de forma eficazcontra o crime. Essa disparidade entre ricos epobres — que coincide com a divisão entre asclasses detentoras da propriedade e os grupossociais que são considerados como uma ameaçapara a propriedade — tende a nos arrastar parauma sociedade fortificada, caracterizada pela se-gregação e o abandono de todo ideal cívico (veja-se BAUMANN, 1987; DAVIS, 1994; BOTTOMS& WILES, 1994).

Também se disse que as novas políticas deprevenção da criminalidade foram seriamente so-lapadas pelas políticas sociais e econômicas dasduas últimas décadas, assim como pelas trans-formações estruturais do mercado de trabalho eda estratificação social (veja-se SIMON, 1993;HALL & JACQUES, s/d). “Fazer agir” as comu-nidades, as famílias e os indivíduos torna-se mui-to menos plausível se estes foram enfraquecidose socialmente excluídos. Tanto mais que os hábi-tos de pensamento, estabelecidos de longa data ealimentados pelos organismos de Estado numa faseprecedente, monopolizante, preconizaram a admi-nistração dos problemas de desordem e de desvioúnica e exclusivamente pelos especialistas e as“autoridades competentes”.

Uma avaliação realista provavelmente haveriade reconhecer que as perspectivas da estratégiade responsabilização são, no presente momento,de fato muito medíocres. O Estado, na verdade,não opera bem à distância e não é nem mesmo

muito eficaz em conseguir que sua política sejaaplicada pelos seus próprios organismos. A des-peito de seus protestos, os governos dos anos 80e 90 não conseguiram decidir-se firmemente adelegar o poder ou a criar o tipo de democraciaassociativa que poderia ter tornado essas políti-cas realizáveis (HIRST, 1994; DURKHEIM,1974). Ao invés disso, tenderam a combinar osmovimentos de responsabilização com medidasconcebidas para reforçar o poder central, dirigin-do as ações dos outros de forma mais ou menoscoercitiva.

As perspectivas dessa estratégia tendem a pi-orar, na medida em que a criminalidade não é umaprioridade para a maior parte dos organismos nãogovernamentais capazes de fazer alguma coisanesse campo. Em conseqüência, essas organiza-ções tendem a optar por seguir seus objetivos prin-cipais (rentabilidade, distribuição etc.) sem se pre-ocupar de fato com as conseqüências criminais,pelo menos enquanto a experiência e os custos dacriminalidade não criarem uma interrupção diretae substancial de suas próprias atividades (PEASE,1994). Até agora, o Estado não avançou muito nadireção da redistribuição dos custos do crime emopções que modificassem esses cálculos, mas istotalvez mude consideravelmente, no futuro. De fato,nesse momento, a despeito dos discursos, a crimi-nalidade nada tem de prioritário, nem mesmo parao governo central, que continua a seguir políticasreconhecidamente criminógenas e fracassa em darsustentação às iniciativas de prevenção do crimeno grau em que seria necessário para torná-lasrealmente eficazes (SWENSON, 1986). Finalmen-te, o Estado está mais inclinado a recuar para es-tratégias punitivas (mais fáceis de serem enuncia-das) do que a sacrificar os objetivos econômicosou sociais em proveito da repressão criminal.

X. A ATUALIDADE DE ÉMILE DURKHEIM

Pode-se dizer, para concluir, que a Grã-Bre-tanha desenvolve uma criminologia oficial que con-vém à sua sociedade profundamente dividida e in-crivelmente angustiada. É a política de uma socie-dade bloqueada num período de transição. Umasociedade que reconhece o fracasso do antigo re-gime e que se aproxima, não sem alguma hesita-ção, de novos estilos e de novas formas de gover-no, mas que ainda não desenvolveu a vontadepolítica ou o contra-poder necessários para reali-zar as reformas radicais que aqueles exigem.

Todas as tentativas de criar novas instituições

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e novos modos de governo — quer no campo daprevenção criminal e da “responsabilização”, querem outros campos da reforma constitucional eeconômica — são solapadas pela recusa em aba-lar os pilares do antigo regime e transferir um poderefetivo às outras instituições, pelas políticaseconômicas e sociais que enfraquecem as redesdo controle social e que destróem a capacidadedas famílias e das comunidades de moralizar emotivar os seus membros. Toda tentativa é tam-bém solapada por uma economia de livre merca-do que exclui do trabalho remunerado massas depo-pulação e que nutre ativamente o crime, engen-drando desejos e expectativas de consumidor in-saciável ao lado de novos níveis de pobreza dacriança, de disfunção da família e de desigualdadesocial.

A análise de Durkheim, que já comemora umséculo, revela-se mais pertinente ainda em nossosdias (DURKHEIM, 1997a). Ele sustentava que osdispositivos de estilo punitivo eram um fenômenoautoritário e primitivo. Em compensação, ressal-ta-va nas sociedades modernas a importância daprevenção e da reparação para o controle do cri-me. Ele também previra que se tornaria cada vezmais impossível, para um Estado soberano cen-tralizado, governar sociedades complexas epluralistas com algum grau de autoridade ou desensibilidade moral.

Um simples código moral não poderia ser im-posto de cima, senão ao preço de uma repressãoe de um descontentamento maciços. Daí resul-tariam altos níveis de desvio (medido pelas taxasde crime e de suicídio, e Durkheim acrescentaria

hoje: o consumo de drogas), níveis baixos de de-tenções e um sentido amplamente disseminado deanomia moral. Como vemos agora, suas predi-ções revelaram-se por demais proféticas. A solu-ção de Durkheim era delegar mais poder às asso-ciações e às organizações da sociedade civil, apoiarseus esforços de autonomia de forma ao mesmotempo moralmente significativa e eficaz do pontode vista do comportamento, e desenvolver umEstado residual cujo trabalho consistisse em ga-rantir os direitos e as liberdades individuais, assimcomo os níveis de igualdade, o investimento e ofundo social necessários para transformar issonuma realidade. Acima de tudo, ele procurava in-troduzir cooperação e coerção moral na vidaeconômica, um objetivo que parece absurdo paraos pensadores do livre mercado, até o momentoem que eles começam a se perguntar pelas razõesque fazem com que países como a Suécia, a Ale-manha e o Japão ultrapassem em muito o ReinoUnido na maior parte dos indicadores econômicose sociais, inclusive o indicador da taxa de crimi-nalidade. A solução de Durkheim olhava para alémdo Estado centralizado. Ele procurava estabelecerformas de solidariedade e meios de governar quese adequassem às características da sociedademoderna e pluralista, garantindo que as pessoaslivres fossem ao mesmo tempo moralmente con-tidas e socialmente vinculadas. A tragédia de hojeé que os nossos governos começam finalmente asentir a necessidade desse tipo de organizaçãosocial, mas permanecem engajados numa políticae numa economia que a tornam impossível.

Recebido para publicação em abril de 1999.

David Garland ([email protected]) é Ph.D. pela Universidade de Edimburgo, Escócia.Atualmente é Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Nova York e também Professor deSociologia da Faculdade de Artes e Ciências da mesma Universidade. É autor de Punishment andModern Society: A Study in Social Theory (Chicago : University of Chicago Press, 1994) e de Punishmentand Welfare: The History of Penal Strategy (Ashgate Publishing Company, 1985).

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Sobre as Possibilidades de uma Penologia Crítica: Provocações

Criminológicas às Teorias da Pena na Era do Grande Encarceramento1

Sobre las Posibilidades de una Penología Crítica: Provocaciones Criminológicas a las Teorías de la Pena en la Era del Gran Encarcelamiento

On the Possibilities of a Critical Penology: Criminological Provocations of the Punishment Theories in the Age of the Great Incarceration

Salo de CarvalhoProfessor dos cursos de Graduação e de Pós-Graduação (Mestrado em Direito) do Centro Universitário

La Salle (Professor Permanente) e da Universidade Federal de Santa Maria (Professor Colaborador).

Professor Adjunto do Departamento de Ciências Penais da UFRGS (2010-2011). Professor Titular

do Departamento de Ciências Criminais e do Programa de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado)

da PUCRS (1997-2010). Graduado em Direito pela UNISINOS (1993). Mestre em Direito pela

Universidade Federal de Santa Catarina (1996). Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná

(2000). Pós-Doutor em Criminologia pela Universidad Pompeu Fabra (Barcelona, ES) (2010). Pós-

Doutorando em Criminologia, com bolsa de pesquisa aprovada pelo CNPq, na Universitá di Bologna

(Bologna, ITA) (2013-2014). Presidente do Conselho Penitenciário do Rio Grande do Sul (2001-2002).

E-mail: [email protected]

Resumo

A partir da percepção do vertiginoso aumento do número de pessoas presas nas últimas décadas,

especialmente no Brasil, a pesquisa procura indagar sobre o papel da teoria do direito penal. O

artigo parte do pressuposto de que a violência da prisionalização produz inevitáveis implicações

éticas, sociais e políticas na dogmática penal. Assim, procura indagar as relações entre as teorias

de justificação da pena e o fenômeno (empírico) do encarceramento em massa. As questões que

movem a reflexão são, portanto, a instrumentalidade das teorias da pena na expansão do po-

testas puniendi e as explicações que os modelos justificacionistas ofereceriam ao problema da

hiperpunitividade. A hipótese central do trabalho é a de que as tradicionais teorias da pena, em

razão de sua fundamentação (jurídica) contratual e de sua perspectiva (social) consensualista,

são incapacitadas de oferecer um modelo efetivamente redutor do punitivismo, situação que

somente pode ser superada com a adoção de critérios de interpretações fundados na ideia de

conflito – condições de possibilidade de uma penologia crítica.

Palavras-Chave: Punição; Teorias da pena; Penologia; Criminologia crítica

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Carvalho, S.

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Resumen

Desde la percepción del vertiginoso incremento en el número de personas presas en las últimas

décadas, especialmente en Brasil, la investigación busca indagar acerca del papel de la teoría

del derecho penal. El presente artículo parte del supuesto de que la violencia de la prisionaliza-

ción produce inevitables implicaciones éticas, sociales y políticas en la dogmática penal. Así,

busca indagar las relaciones entre las teorías de justificación de la pena y el fenómeno empírico

del encarcelamiento masivo. Las cuestiones que mueven la reflexión son, por lo tanto, la instru-

mentalidad de las teorías de la pena en la expansión de la potestas puniendi y las explicaciones

que los modelos justificacionistas brindarían al problema de la hiperpunitividad. La hipótesis

central del trabajo consiste en que las tradicionales teorías de la pena, sobre la base de su fun-

damentación (jurídica) contractual y su perspectiva (social) consensualista, están incapacitadas

para brindar un modelo efectivamente reductor del punitivismo, situación que sólo podrá supe-

rarse con la adopción de criterios de interpretación fundados en la idea de conflicto – condicio-

nes de posibilidad de una penología crítica.

Palabras clave: Punición; Teorías de la pena; Penología; Criminología crítica

Abstract:

Taking into consideration the perception of a great increase in the number of people imprisoned

in the last decade, the research seeks to question the role of criminal law studies. The article

makes the assumption that the violence of incarceration produces inevitable ethical, social and

political implications in criminal sciences. Thus, it seeks to question the relationship between

the theories of punishment and the (empiric) phenomenon of mass incarceration. Therefore,

the issues that move this reflection are the instrumentality of the theories of punishment in the

expansion of potestas puniendi and the explanations that the justify models could offer to the

problem of hyperpunishment. The core hypothesis of this work is that the traditional theories

of punishment, due to its contractual (legal) basis and its consensual (social) perspectives, are

unable to offer a model that reduces punishment effectively, a situation that can be overcome

with the adoption of interpretation criteria based on the idea of conflict – conditions that makes

possible a critical penology.

Keywords: Punishment; Theories of punishment; Penology; Critical criminology

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1. Ferrajoli (1998) esclarece que

a pergunta por que castigar? pode ser en-

tendida em dois sentidos diferentes: (a) por

que existe a pena? ou por que se pune? e

(b) por que deve existir a pena? ou por que

se deve punir?

O primeiro problema (por que existe

a pena?) seria de ordem científica e admi-

tiria somente respostas de caráter empírico

formuladas mediante assertivas verificá-

veis e refutáveis (verdadeiras ou falsas). A

segunda questão (por que deve existir a

pena?) revelaria um problema filosófico que

admitiria apenas respostas de caráter ético-

político, formuladas mediante proposições

normativas, nem verdadeiras nem falsas,

mas aceitáveis como justas ou injustas. Fer-

rajoli argumenta, pois, que a primeira inda-

gação estaria sustentada na existência do

fenômeno pena (fato punição) e traduziria

problemas de ordem histórica ou socioló-

gica (criminológica, sobretudo). A segunda

questão revelaria o dever-ser (jurídico) da

pena, isto é, do direito de punir, que reme-

teria às prescrições normativas (Ferrajoli,

1998:314).

Neste quadro, as ciências criminais,

forjadas desde a matriz do positivismo cien-

tífico, fragmentaram o estudo da pena em

dois campos distintos: (a) criminologia: re-

flexão sobre o fenômeno empírico da puni-

ção; (b) direito penal: investigação sobre o

dever jurídico da pena.

A impossibilidade de diálogo entre

os saberes (penal e criminológico) deriva

da máxima conhecida como Lei de Hume,

segundo a qual não é possível alcançar logi-

camente conclusões prescritivas ou morais

a partir de elementos descritivos ou fáticos.

Esta interdição positivista impediria que

fossem derivados valores de fatos objetivos,

determinando que um dever-ser não poderia

resultar de um ser e vice-versa.

A transposição da Lei de Hume às

ciências criminais vedaria, p. ex., que a crí-

tica criminológica, baseada em dados da re-

alidade da punição, invalidasse prescrições

normativas ou justificativas dogmáticas da

pena. Assim, a crítica válida seria apenas

aquela que se estabelece em sua própria

zona de intervenção: crítica dogmática ao

direito penal e crítica criminológica à crimi-

nologia.

Ao investigador caberia eleger um

determinado sistema de compreensão (di-

reito penal ou criminologia) e, a partir dos

princípios e categorias fundacionais daque-

le específico campo, pautar o debate sobre

a adequação dos fundamentos e a validade

das hipóteses.

2. A ruptura com a assepsia positi-

vista em sua inconsequente abstenção do

enfrentamento dos fenômenos da vida –

mormente em um campo de saber marcado

pela radicalidade das violências institucio-

nais – ocorre com a emergência da teoria

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crítica do direito (penal) e, em especial, da

criminologia crítica.

No campo da punição, a criminolo-

gia crítica evidenciou a profunda discrepân-

cia entre os discursos oficiais, elaborados

pelas teorias de justificação (dever-ser), e as

funções efetivamente exercidas pelas agên-

cias de punitividade (experiência fenomêni-

ca). A criminologia crítica operou, portanto,

uma espécie de revogação ou suspensão da

Lei de Hume, permitindo que o saber empí-

rico sobre o funcionamento do sistema pe-

nal servisse como instrumento de descons-

trução, de modificação e de transposição do

saber dogmático. Exatamente nesta linha foi

desenvolvida a perspectiva da criminologia

crítica como crítica do direito penal nos paí-

ses ocidentais de linhagem jurídica romano-

-germânica2, tradição distinta da crimino-

logia desenvolvida nos países da common

law.

Nesta perspectiva crítica, sustentam

Hassemer e Muñoz Conde “a importância

que, para evitar a cegueira frente à realida-

de que muitas vezes tem a regulação jurídi-

ca, o saber normativo, ou seja, o jurídico,

deva ir sempre acompanhado, apoiado e

ilustrado pelo saber empírico, isto é, pelo

conhecimento da realidade (...)” (Hassemer

& Muñoz Conde, 2001:05). No entanto no-

tam os autores que “a relação entre o sa-

ber normativo e o saber empírico, próprio

de cada uma destas formas de abordar a

realidade, não é, sem embargo, idílica, mas

conflituosa e tem, todavia, muitos pontos de

contato, onde às vezes entram em claro en-

frentamento a solução que propõe uma par-

te, a normativa, e a que propõe a outra, a

empírica, não sendo raro que, às vezes, esta

seja uma das causas da disfunção e ineficá-

cia das normas jurídico-penais na solução

de determinados conflitos ou que o próprio

saber empírico careça de influência na re-

gulação jurídica de um determinado proble-

ma” (Hassemer & Muñoz Conde, 2001:06).

Vera Batista, apropriando-se das advertên-

cias de Zaffaroni, sintetiza de forma precisa

o problema ao direcionar à sanção penal: “a

pena não pode ser pensada no ‘dever ser’,

mas sim na realidade letal dos nossos sis-

temas penais concretos” (Batista, 2011:91).

Neste aspecto, o presente trabalho

assume explicitamente aquilo que Ferrajo-

li designa como vício ideológico. A opção

pela criminologia crítica implica em aban-

donar a devoção à Lei de Hume em nome da

preocupação efetiva com a vida das pessoas

que sofrem nas intermitências criadas entre

as grandes narrativas teóricas de justificação

da pena e a experiência real da aflição puni-

tiva. Não por outra razão Zaffaroni postula

um sistema de compreensão do direito penal

construído a partir dos seus dados empíricos

e configurado com a finalidade exclusiva de

limitação do poder punitivo.3

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O objetivo do trabalho, portanto, é,

o de, a partir da experiência da prisionaliza-

ção das últimas décadas (a consolidação do

grande encarceramento), tensionar a relação

entre as teorias (normativo-filosóficas) de

justificação da pena e o fenômeno (empíri-

co) da punição. Sobretudo porque se parte

do pressuposto da necessidade do reconhe-

cimento da responsabilidade dos sistemas

teóricos sobre a realidade na qual operam.

Assim, as questões que se colocam são jus-

tificadas pela urgência de que a teoria (dog-

mática) do direito penal assuma um mínimo

de responsabilidade ética e social, ou seja,

que não se exima do real, não fique alheia

aos efeitos genocidas que os seus modelos

de legitimação produzem.

Neste confronto entre os discursos

de justificação e as consequências da cri-

minalização (prisionalização), é possível

perceber nitidamente o papel que as teorias

da pena desempenharam na expansão do

potestas puniendi. E a indagação latente,

que percorre o estudo, é a relativa às expli-

cações possíveis que as teorias da pena te-

riam a oferecer em relação ao problema da

hiperpunitividade e do encarceramento em

massa.

3. A proposta de um exercício teóri-

co sobre a pena a partir dos dados empíricos

de prisionalização procura inverter a tradi-

cional pergunta “por que punir?” e questio-

nar como a dogmática justificaria o sistema

punitivo concreto que legitima. Trata-se,

inegavelmente, de uma interpelação: se a

teoria do direito penal, sobretudo nos dois

últimos séculos, esforçou-se para atribuir

um sentido positivo à pena, parece lícito à

criminologia/penologia indagar como este

mesmo corpus teórico justifica as conse-

quências do seu ato de legitimação.

Importante dizer que não se trata

apenas de questionar os modelos teóricos

de justificação e verificar a validade de suas

propostas desde a lente da criminologia, re-

produzindo a clássica divisão de tarefas na

qual a dogmática permanece em uma evi-

dente zona de conforto. Mas, para além dos

papéis consolidados, provocar a doutrina

penal para que justifique ou ao menos expli-

que, a partir dos seus sofisticados recursos

teóricos, qual o impacto (positivo ou nega-

tivo) dos seus discursos de justificação no

fenômeno de hiperencarceramento contem-

porâneo.

O constante aumento do número de

pessoas presas deve, necessariamente, estar

na pauta dos modelos dogmáticos e crimi-

nológicos, mesmo que não tenham como

objetos diretos de investigação as violências

institucionais e as estratégias punitivas de

controle social. Frente à radicalidade desta

experiência de violência institucional, qual-

quer omissão é antiética.

No entanto a ciência ortodoxa do di-

reito penal, enclausurada nos postulados do

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positivismo, exime-se da responsabilidade,

justificando a sua omissão a partir das pres-

crições sintetizadas na Lei de Hume. A dog-

mática penal limita-se, pois, à proposição de

teses normativas de justificação, impedin-

do, em uma espécie de autismo científico,

que a realidade empírica do sistema sobre o

qual opera ingresse no seu campo de visão.

Ocorre que a experiência do encarceramen-

to em massa transforma este silêncio em um

ruído ensurdecedor.

Neste cenário, o problema que este

estudo procura apresentar pode ser sinteti-

zado na seguinte questão: o que as teorias

de justificação da pena (absolutas, relativas

e polifuncionais) têm a dizer sobre o grande

encarceramento?

A indagação procura convocar as

teorias da pena a uma reflexão ética, sus-

citando um juízo crítico sobre a sua pró-

pria funcionalidade (instrumentalidade) e

sobre o seu comprometimento e respon-

sabilidade sociais. Para além do idealismo

justificacionista, é fundamental questionar

(primeira indagação) como o direito penal

enfrenta a concretude da prisionalização,

visto ser o grande encarceramento uma

consequência direta dos discursos funda-

mentadores da pena. A atuação do sistema

punitivo é, pois, inegavelmente, um pro-

blema da ciência do direito penal e, des-

de o ponto de vista da crítica penológica,

os resultados concretos produzidos pelas

agências de punitividade são (também) de

responsabilidade da dogmática. Assim se a

teoria penal cria sofisticados instrumentos

que habilitam a intervenção punitiva, deve

ser interpelada sobre os efeitos que produz,

notadamente se postula como válida sua

pretensão de universalidade.

A segunda indagação diz respeito

às alternativas propostas pelo direito penal

ao fenômeno do encarceramento massivo,

tendo em vista que a estratégia de prisio-

nalização não vem obtendo os resultados

esperados de redução das taxas de crimi-

nalidade; pelo contrário, o sistema se re-

troalimenta e reproduz a violência (delito

– prisão – reforço da identidade crimi-

nosa – delito – prisão). Neste aspecto, é

razoável refletir se a saída para a crise da

pena é seguir apostando no encarceramen-

to, ou seja, mais justificação e mais prisio-

nalização.4

No atual estágio das ciências crimi-

nais, sobretudo após a irreversibilidade da

desconstrução realizada pela criminologia

crítica, parece não ser mais possível um mo-

delo teórico justificar abstratamente a pena

sem se preocupar com o impacto que esta

legitimação produz na realidade do sistema

penal. Do contrário, ao optar pela manu-

tenção do silêncio, a teoria do direito penal

perde completamente a sua capacidade de

(auto)crítica e, narcotizada pela vontade de

pureza, seguirá como uma ciência escrava

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(Bourdieu)5, uma técnica inocentemente útil

às demandas e às variáveis políticas.

Pavarini é preciso ao referir que no

divórcio entre filosofia e dogmática penal

os fins da pena acabaram não fazendo parte

das preocupações da ciência propriamente

penal (Pavarini & Giamberardino, 2012).

Em consequência, sustenta o autor que a

história dos modelos punitivos não passou

de uma história ideal, escrita pela metade,

em que há uma “(...) certa plausibilidade

argumentativa apenas se pressuposto que o

penalista dogmático tenha sempre sido um

‘útil idiota’, ao menos o suficiente para ter

acreditado, com boa fé, que as finalidades

da pena não fossem apenas retóricas do ar-

bítrio, mas princípios de ‘fundação do di-

reito de punir’” (Pavarini & Giamberardi-

no, 2012:30).

4. Em razão de as indagações acer-

ca dos déficits criminológicos (sociológicos)

que caracterizam as teorias da pena serem

direcionadas aos teóricos do justificacionis-

mo, evidentemente que não cabe à crítica

usurpar o seu direito de resposta. Todavia,

para além das possíveis tentativas de jus-

tificar a Lei de Hume na complexidade do

mundo contemporâneo, resta ainda ao crimi-

nólogo crítico procurar explicações sobre as

blindagens históricas que impediram que a

realidade do sistema punitivo ingressasse no

debate acerca das justificativas da punição.

Uma hipótese que parece ser bastan-

te razoável diz respeito à ausência de um ra-

dical questionamento sobre os fundamentos

da punição na consolidação da Modernida-

de, solo no qual emerge a forma carcerária

de punição e os seus discursos legitimado-

res. Parte significativa da responsabilidade

por esta ausência decorre de a doutrina do

direito penal aproximar (e em alguns casos

simplesmente confundir) dois problemas

nitidamente distintos: os fundamentos e as

justificativas da pena.

As teorias de justificação (teorias da

pena) operaram historicamente como dis-

cursos de racionalização do poder soberano

de coação direta. Se o Estado detém o mo-

nopólio da coação legítima (Weber), caberia

à teoria do direito penal justificar (raciona-

lizar) esta violência programada, atribuindo

determinados fins à sanção penal – retribui-

ção (pena justa) ou prevenção (pena útil)

(Pavarini, 1983).

No entanto, apesar de distintas em

termos de projeção das suas finalidades, é

possível perceber que as tradicionais teorias

da pena partem de um pressuposto político

comum, que é o do consenso acerca da le-

gitimidade da intervenção punitiva estatal.

Aliás, Baratta, ao propor as diretrizes car-

deais que formam o núcleo do pensamento

de defesa social – ideologia que “passou a

fazer parte da filosofia dominante na ciên-

cia jurídica e das opiniões, não só dos re-

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presentantes do aparato penal-penitenciá-

rio, mas também do homem de rua (ou seja,

every day theories)” (Baratta, 1997:42),

apresenta como postulado primeiro o prin-

cípio da legitimidade.6 O consenso acerca

da legitimidade induz uma natural aproxi-

mação dos fundamentos da punição com as

finalidades da pena.

Mir Puig, p. ex., ao discutir as ba-

ses funcionais do direito penal subjetivo,

afirma que “se está justificado castigar

ou impor medidas de segurança é por-

que é necessário realizar os objetivos que

se atribuem à pena ou às medidas de se-

gurança. Isso significa que o fundamento

do ius puniendi corresponde a sua função

(...)” (Mir Puig, 2003:98)7 No segundo

momento, quando analisa os fundamentos

políticos do ius puniendi, Mir Puig identifi-

ca de forma precisa o local de encontro no

qual são rompidas as fronteiras do debate

entre fundamentos e justificações: o con-

tratualismo como a sustentação primeira do

direito de punir.

A hipótese contratualista de justifi-

cação da pena se estabelece como o mito

fundante do direito penal na Modernidade.

Logicamente que a teoria do contrato so-

cial, independente de suas versões (Hobbes,

Locke ou Rousseau), remeterá o debate a

outras questões essenciais no que tange às

configurações do Estado moderno e as suas

relações com os indivíduos e a sociedade

civil.

A justificativa contratualista (me-

tafísica) da pena, porém, pressupõe alguns

consensos como a existência de direitos na-

turais do cidadão que são anteriores ao Es-

tado, direitos que não apenas legitimariam

o poder político mas que limitariam a sua

intervenção. Trata-se, pois, de um limite ex-

terno que preexiste à lei formal, fundado em

um jusnaturalismo antropológico.8

No entanto, após a consolidação do

Estado liberal e a formação de um modelo

político-econômico gerido pela classe social

detentora do capital e dos meios de produ-

ção (burguesia), “(...) o foco metodológico

para a fundamentação dos institutos jurídi-

cos deslocou-se da argumentação metafísi-

ca para a argumentação jurídica. Não eram

mais (ou não tanto) os direitos naturais que

forneciam o substrato legitimante para, em

específico, o direito estatal de punir, mas o

limites intrínsecos do próprio ordenamento

jurídico” (Schmidt, 2003:88).

Trata-se, em termos genéricos, da

transmutação do mito fundador da Moder-

nidade (a hipótese metafísica do contra-

to social) em um rito garantidor da ordem

(legalidade formal). Lyra Filho é preciso ao

demonstrar que “(...) chegando ao poder,

a burguesia descartou o seu jusnaturalis-

mo [antropológico], passando a defender

a tese positivista: já tinha conquistado a

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máquina de fazer leis e por que, então, ape-

lar para um Direito Superior [metafísico]?

Bastava a ordem estabelecida”(Lyra Filho,

1991:42).

Assim é forjada a ideia de a punição

constituir-se como um direito público sub-

jetivo do Estado que nasce com a prática do

delito. Com a violação livre e consciente do

pacto social, corporificado nas normas de

condutas positivadas (direito público obje-

tivo), é atribuído às instituições do sistema

punitivo o direito-dever de punir. Os únicos

limites impostos à atividade punitiva são

aqueles designados pelo próprio Estado.

Neste cenário são consolidadas as ideias de

direito de punir e de pretensão punitiva.

5. Embora a doutrina penal tenha re-

alizado importante crítica ao contratualismo

(perspectiva metafísica) a partir da tese de a

pena estar amparada em um direito público

subjetivo do Estado, as ideias fundacionais

representadas nas noções de direito de punir

e de pretensão punitiva se mantiveram vi-

gorosas. Inclusive após o giro copernicano

imposto, após a Segunda Guerra, pela teoria

dos direitos fundamentais e pelo novo cons-

titucionalismo, cujo efeito foi o da substan-

cialização da teoria da validade das normas

jurídicas – a construção de uma cadeia de

princípios potencialmente limitadores da

punibilidade provocou significativos refle-

xos na relação entre autoridade e indivíduo,

apesar de terem sido restritos os efeitos nas

teorias de fundamentação da pena.9

Aliás, é possível ser ainda mais in-

cisivo e sustentar que mesmo com a muta-

ção do modelo de Estado liberal em Estado

social e sua posterior crise – primeiro, com

o estabelecimento de novas economias de

intervenção punitiva (correcionalismo);

segundo, com as teorias funcionalistas e

os modelos de penologia fundamentalista

(Pavarini, 2009) –, o pressuposto de ordem

(mito) que tem orientado as teorias justifi-

cacionistas da pena segue sendo a hipótese

contratualista.

É importante perceber, para que

se possa efetivamente avançar e superar a

crise, que as tradicionais teorias da pena

– absolutas (teorias de retribuição ou teo-

rias da pena justa) ou relativas (teorias de

prevenção ou teorias da pena útil) – foram

edificadas sobre o mesmo fundamento

contratual. Sem perceber que os discursos

oficiais de justificação estão consolidados

em um modelo consensual de sociedade

que encontra na teoria do pacto social a

sua manifestação primeira (sua emergên-

cia ou sua invenção), o debate que envol-

ve as práticas punitivas e os seus discursos

legitimadores permanecerá estagnado. No

máximo será reduzido à revitalização dos

seus tipos ideais históricos, como ocorre

atualmente com os distintos vieses do ne-

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orretributivismo e do neoprevencionismo

(Carvalho, 2013a).

Neste quadro, é possível afirmar

que o fundamento contratualista definirá a

identidade do direito penal na Modernida-

de, moldando, conforme a expectativa tem-

poral, as teorias de justificação. Significa,

em outras palavras, que a mesma hipótese

contratual configurou os diversos modelos

punitivos oficiais, liberais (primeira mo-

dernidade penal), correcionalistas (segunda

modernidade penal) e funcionalistas (mo-

dernidade tardia ou pós-modernidade).

Não por outra razão Foucault des-

carta assinalar qualquer tipo de ruptura

entre os projetos punitivos liberal e corre-

cionalista. Percebe, na transposição da pri-

meira para a segunda Modernidades apenas

um continuum, pois identifica, com preci-

são, uma matriz comum no processo de for-

mação “epistemológico-jurídico” direcio-

nada a “colocar a tecnologia do poder no

princípio tanto da humanização da penali-

dade [Escola Clássica] quanto do conheci-

mento do homem [Escola Positiva]” (Fou-

cault, 1991:26). A matriz: a teoria geral do

contrato.

A hipótese que orienta a investiga-

ção, portanto, é a de que as novas economia

e tecnologia do poder de punir que emer-

gem na Modernidade e deflagram as gran-

des reformas penais nos séculos XVIII, XX

e início do XXI, estão assentadas em um

pressuposto de consenso segundo o qual a

sociedade, compreendida como um orga-

nismo homogêneo derivado da integração

dos seus membros, compartilha determina-

dos valores e interesses fundamentais que

representam as condições essenciais a sua

manutenção. Assim, nas lições de Baratta,

“os interesses protegidos pelo direito penal

são interesses comuns a todos os cidadãos”

(princípio do interesse social); “o delito é

um dano para a sociedade e o delinquente é

um elemento negativo e disfuncional para o

sistema social” (princípio do bem e do mal);

em outras palavras, “o delito é expressão

de uma atitude interior reprovável, porque

contrária aos valores e às normas” (princí-

pio da culpabilidade) e a criminalidade “é o

comportamento de uma minoria desviante”

(princípio da igualdade) (Baratta, 1997:42).

A violação da lei penal, desde os

pressupostos das teorias do consenso, impli-

caria, inclusive, na adesão do próprio infra-

tor à pena, conforme conclui Foucault: “su-

põe-se que o cidadão tenha aceito de uma

vez por todas, com as leis da sociedade,

também aquela que poderá puni-lo. O cri-

minoso aparece então como um ser juridi-

camente paradoxal. Ele rompeu o pacto, é,

portanto, inimigo da sociedade inteira, mas

participa da punição que se exerce sobre

ele. O menor crime ataca toda a sociedade;

e toda a sociedade – inclusive o criminoso –

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está presente na menor punição” (Foucault,

1991:82).

Assim, a ideia de direito de punir

(ius puniendi) é a consequência lógica de

um modelo que opera desde uma perspec-

tiva consensualista de sociedade, na qual

determinados valores morais seriam natu-

ralmente aceitos pelo corpo social; as nor-

mas representariam legitimamente estes in-

teresses; o desvio seria a expressão de uma

conduta anômala, episódica e disfuncional

que romperia com a ordem e o equilíbrio

(estado normal da sociedade); e as sanções

reestabeleceriam o consenso e a harmonia

como justa retribuição, coação psicológica,

reconversão do delinquente, preservação da

confiança e da fidelidade na ordem jurídica,

reforço das expectativas normativas frustra-

das pelo comportamento criminoso, dentre

outras finalidades.

Segundo Pavarini, a hipótese con-

sensual representa a sociedade como rela-

tivamente estável e bem integrada e cujo

funcionamento se funda no consenso da

maioria em relação a certos valores gerais.

No que diz respeito às relações entre in-

divíduo e autoridade, lei e sociedade, Pa-

varini enfatiza que os princípios de fundo

deste modelo podem ser sintetizados em

três perspectivas: (a) a lei reflete a vonta-

de coletiva: se os membros da sociedade se

encontram de acordo sobre as definições de

bem e mal, a lei não seria mais do que a

forma escrita deste acordo; (b) a lei é igual

para todos: se as formas legais refletem a

vontade coletiva, a lei não favorece e não

representa nenhum interesse particular; (c)

a violação da lei penal é ato de uma mi-

noria: se a maioria está de acordo com as

definições de bem e de mal, de justo e de

injusto, o pequeno grupo que pratica deli-

to deve possuir algum elemento em comum

que o diferencia da maioria que respeita a

lei (Pavarini, 1988:95).

No que diz respeito ao conteúdo do

direito de punir, todos os modelos teóricos

de justificação da pena, desenvolvidos a

partir da Ilustração, operam a partir desta

mesma fundação (teoria do contrato), cujo

pressuposto é um modelo de sociedade con-

sensual. E apenas neste contexto será lícito

ou possível referir um direito de punir (jus

puniendi) do Estado.

6. Se na primeira modernidade são

os teóricos do contrato que forjam as pers-

pectivas jurídicas consensuais, no campo

sociológico sua consolidação acontece a

partir das perspectivas funcionalistas na tra-

dição que se desdobra com Durkheim, Mer-

ton e Parsons.

Contrapõem-se, porém, às teorias

do consenso as teorias do conflito e o inte-

racionismo simbólico. Aliás, é importante

registrar que estas três distintas tradições

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sociológicas irão impactar diretamente a

construção das principais vertentes teóricas

na criminologia no século passado (teorias

liberais-funcionalistas, teoria do etiqueta-

mento e criminologia crítica).

Ao rejeitar a hipótese de que a so-

ciedade representa uma totalidade orgânica,

harmônica e consensual, na qual os desvios

são fatos ocasionais que permitem, através

das sanções, a recomposição da ordem vio-

lada e o reforço dos valores compartilha-

dos, as teorias do conflito enfatizam temas

relativos a desigualdades sociais, políticas

e econômicas e a questões concernentes à

disputa pelo poder e à institucionalização da

autoridade.

Os comportamentos disfuncionais

(crimes, desvios), portanto, não seriam pro-

blemas isolados, situações episódicas pro-

vocadas por uma minoria de sujeitos ou de

grupos sociais que não de adequam às re-

gras e aos valores universalmente aceitos.

Os conflitos emergem como disputas de

classes pelo poder político e econômico na

constituição e na manutenção das socieda-

des industriais (capitalistas). Nos termos de

Sabadell, “(...) as teorias do conflito partem

da existência de grupos sociais desiguais

com interesses divergentes e consideram

o controle social institucionalizado como

meio de garantia das relações de poder.

Tais relações são sempre assimétricas. Em

outras palavras, constata-se um desequi-

líbrio permanente entre os grupos sociais,

inexistindo o igual tratamento e a recipro-

cidade nas relações sociais” (Sabadell,

2010:160).

No clássico aforismo de Marx e En-

gels, na abertura do “Manifesto do Parti-

do Comunista”, o conflito entre as classes

constitui-se como o fato propulsor da mu-

dança e do desenvolvimento histórico – “a

história de toda a sociedade até agora exis-

tente é a história de luta de classes.” (Marx

& Engels, 1975:59). Os valores sociais for-

malizados nas leis não seriam, pois, a ra-

tificação natural de um pacto ao qual todo

corpo social adere voluntariamente, mas a

consolidação dos valores da classe que con-

quistou o poder e que, através dos mecanis-

mos burocráticos do Estado, procura nele se

eternizar.10

No campo da criminologia, no que

tange às questões relativas ao crime, à cri-

minalidade e ao controle social, a crítica

que emerge com as teorias do controle –

conjuntamente com as teorias do etiqueta-

mento fundadas no interacionismo simbó-

lico – permite perceber a redução que as

teorias funcionalistas realizam ao interpre-

tar as questões criminal e penal. Nos mo-

delos consensuais, o delito (a criminali-

dade) será percebido como um ato isolado

de uma minoria disfuncional, explicado a

partir de um processo causal (etiológico)

que o vincula aos problemas de socializa-

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ção (broken homes theories, p. ex.), às con-

dições de vida em determinadas áreas (hi-

póteses ecológicas, p. ex.), aos elos que se

estabelecem com outras pessoas ou grupos

desviantes (teorias da associação diferen-

cial e das subculturas criminais, p. ex.) ou

às tensões, frustrações ou traumas que são

gerados na estrutura social (hipóteses anô-

micas, p. ex.). Em sentido oposto, os teóri-

cos do conflito destacarão os processos de

criminalização, ou seja, enfatizarão as rela-

ções de poder que permitem que determi-

nadas condutas sejam consideradas delito,

as questões relativas ao controle social que

facilitam que determinadas classes sejam

imunizadas da incidência repressiva das

agências punitivas e as condições sócio-po-

líticas e econômicas que tornam certas pes-

soas ou grupos sociais vulneráveis à vio-

lência do sistema penal. Ademais, a crítica

às teorias do consenso permite perceber a

natureza estática do funcionalismo na in-

terpretação dos fenômenos desviantes, em

decorrência de congelar como imagem ou

tipo ideal do delito uma determinada espé-

cie de crime, mais especificamente os cri-

mes contra o patrimônio privado praticados

pelo lumpemproletariado, a partir da uni-

versalização de valores de uma respectiva

classe social.11

A partir do legado das teorias do eti-

quetamento e do conflito, a criminologia

crítica direcionará seu foco para as formas

estruturais e institucionais de (re)produção

da violência (Carvalho, 2013), tensionando

a desigual relação entre autoridade e indi-

víduo. O giro paradigmático proporcionado

pela crítica no pensamento criminológico

do século passado permite renunciar cate-

goricamente o fundamento consensual da

punição e, consequentemente abdicar da

percepção da sanção penal como um direi-

to exercido pelo Estado na representação da

sociedade lesada (direito de punir), enfati-

zando a pena como um ato de poder exer-

cido pelas agências do sistema penal (poder

punitivo).

7. Mudar o fundamento da punição,

assumindo a pena como uma manifestação

concreta do poder punitivo no marco de

sociedades conflitivas e heterogêneas, traz

significativas implicações teóricas à peno-

logia. Em primeiro plano, significa rejeitar

todos os modelos tradicionais de justifica-

ção – teorias absolutas (retributivas), relati-

vas (preventivas) e ecléticas; em segundo,

implica em reconhecer que os novos mo-

delos de justificação – teoria do justo mere-

cimento, teoria do cálculo racional, teorias

funcionalistas sistêmicas, teorias neocorre-

cionalistas e, inclusive, a teoria garantista

(utilitarismo reformado) (Carvalho, 2013)

– representam apenas a revitalização das

grandes narrativas penológicas da Moder-

nidade, em sua integralidade fundadas nos

modelos consensuais. Exatamente por isso,

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a dogmática penal pouco avança no sentido

de uma ruptura radical com os sentidos da

punição na contemporaneidade. Ruptura ne-

cessária em razão do dano genocida produ-

zido pelo punitivismo nas últimas décadas.

A condição de possibilidade de

uma penologia crítica pressupõe, portan-

to, abdicar das tradicionais teorias da pena

e, seguindo a perspectiva da criminologia

crítica12, integrar os legados das teorias do

etiquetamento e das teorias do conflito para

consolidar um corpo teórico capacitado para

(a) compreender e denunciar o fenômeno da

punição desde as perspectivas da violência

institucional (atuação das agências do siste-

ma penal) e da violência estrutural (simbio-

se entre estrutura política e controle social)

(pauta negativa) e (b) promover ações con-

cretas para a redução dos danos causados

pelo punitivismo e para a superação da lógi-

ca carcerária (pauta positiva).

Neste sentido, duas construções teó-

ricas superam os fundamentos consensuais

da pena e projetam perspectivas penológi-

cas críticas: (a) a teoria da retribuição equi-

valente; e (b) a teoria agnóstica da pena.

7.1. A teoria da retribuição equiva-

lente, desenvolvida a partir de uma críti-

ca materialista/dialética da pena criminal,

procura revelar a natureza real ou latente

da retribuição nas sociedades capitalistas.

Centrada em premissas distintas do mode-

lo clássico de retribuição – pois, nesta pers-

pectiva, “(...) não constitui fenômeno de

sobrevivência histórica de vingança retalia-

tória, nem resquício metafísico de expiação

ou compensação da culpabilidade” (San-

tos, 2005:19) –, procura demonstrar como

a pena criminal, sobretudo a partir dos pro-

cessos de industrialização, tem correspondi-

do aos fundamentos materiais e ideológicos

dos sistemas econômicos fundados na rela-

ção capital/trabalho assalariado. A respos-

ta punitiva do Estado, portanto, representa

uma equivalência jurídica derivada das rela-

ções de produção existentes nas sociedades

capitalistas contemporâneas.

O modelo de retribuição equivalen-

te, proposto por Pasukanis (Teoria Geral do

Direito e Marxismo, 1926), e desenvolvido

posteriormente por Rusche e Kirchheimer

(Pena e Estrutura Social, 1939), demonstra

que a pena desempenha uma função central

na manutenção dos sistemas de exploração

e de exclusão social. Conforme Juarez Ci-

rino dos Santos, se a estrutura material das

relações econômicas no capitalismo é base-

ada no princípio da retribuição equivalente

em todos os níveis da vida (trabalho-salá-

rio, mercadoria-preço, p. ex.), “no âmbito

da responsabilidade penal, a retribuição

equivalente é instituída sob forma da pena

privativa de liberdade, como valor de troca

do crime medido pelo tempo de liberdade

suprimida” (Santos, 2005:21). Na constru-

ção de Pasukanis, “a privação de liberdade

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Sobre as Possibilidades de uma Penologia Crítica: Provocações Criminológicas...

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com uma duração determinada através da

sentença do tribunal é a forma específica

pela qual o Direito Penal moderno, ou seja,

burguês-capitalista, concretiza o princípio

da reparação equivalente (...). Para que a

ideia da possibilidade de reparar o delito

através de uma multa pela liberdade tenha

podido nascer, foi necessário que todas as

formas concretas da riqueza social tivessem

sido reduzidas à mais abstrata e mais sim-

ples das formas, ao trabalho humano medi-

do pelo tempo” (Pasukanis, 1988:130).13

A perspectiva da retribuição equi-

valente permite compreender a instrumen-

talidade da pena nas conflitivas sociedades

capitalistas industriais, sobretudo o papel

latente da prisão na regulação do mercado

de trabalho através do controle do exceden-

te da força de trabalho (Rusche e Kirchhei-

mer) e na disciplinarização da mão de obra

com a criação de um exército industrial de

reserva formado por corpos dóceis (Fou-

cault). A concepção materialista/dialética

possibilita, inclusive, atualizar os signifi-

cados da punição nos sistemas capitalistas

neoliberais, nos quais o encarceramento

massivo adquire uma função específica de

controle das massas dissidentes e/ou exce-

dentes através da segregação, da neutraliza-

ção e da exclusão.

Mas para além destas funções espe-

cíficas desempenhadas nas versões do ca-

pitalismo industrial e neoliberal, é interes-

sante perceber como as questões criminal e

penal são atualmente ressignificadas neste

desdobramento cultural do sistema econô-

mico, que é a sociedade de consumo. A ló-

gica do consumo excessivo de bens, aliada à

intensa exploração da violência pela grande

mídia (agências de notícia e indústria do en-

tretenimento), criou uma cultura de puniti-

vidade na qual o crime, a pena e a prisão

foram transformados em produtos. O crime,

a pena e a prisão não serão apenas produtos

(consequências) de uma cultura que goza

com a punição; mas representarão, em si

mesmos, produtos (commodities) para con-

sumo, mercadorias comercializadas como

bens.14

7.2. A teoria agnóstica (ou nega-

tiva) da pena nega qualquer espécie de

justificação jurídica da sanção, conce-

bendo a punição como uma manifestação

concreta do poder político. A metáfora da

pena como guerra, no preciso resgate de

Tobias Barreto realizado por Zaffaroni

(1993; 1997), cria uma imagem da sanção

penal totalmente distinta daquela perspec-

tiva idílica na qual os cidadãos deliberam

livremente sobre a necessidade de punir

para manter íntegro o pacto social. O fun-

damento da teoria agnóstica, portanto, é

identificado com o mais radical dos con-

flitos, ou seja, com uma situação de guerra

na qual todos os direitos são suspensos e a

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violência adquire uma intensidade incon-

trolável.

Ao deslocar o fundamento da pena

do jurídico (direito de punir) para o político

(poder de punir), o modelo agnóstico evi-

dencia a função primeira da punição, que

é o exercício do controle social, presentifi-

cando o Estado através da concretização do

poder em formas programadas de violência.

Trata-se, pois, de um fenômeno incancelá-

vel que, nas sociedades atuais, passa a ser

relegitimado cotidianamente pelas ações

político-criminais populistas, situação que

aponta para uma densificação dos níveis de

encarceramento.

Assim, como consequência do re-

conhecimento do fundamento político da

pena, da sua função instrumental de contro-

le e da impossibilidade de o fenômeno puni-

tivo ser cancelado, a teoria negativa percebe

a sanção criminal “(...) como um fenômeno

da realidade que necessita ser contido (te-

leologia redutora) em razão de sua pulsão

violenta (tendência ao excesso)” (Carvalho,

2013a:149).

A partir da demonstração empírica

da seletividade do sistema penal e da vulne-

rabilidade de determinadas pessoas e grupos

à criminalização, esta constante tensão entre

Estado de polícia (poder de coação direta)

e Estado de direito (limitação do poder) in-

duz que sejam projetadas ações positivas no

sentido de redução da potentia punitiva (po-

testas puniendi).

8. A dogmática jurídica, conforme

foi possível perceber nos discursos funda-

mentadores e justificadores da pena, atuou,

ininterruptamente, como um discurso de ra-

cionalização do poder de punir. Exatamente

por esse motivo, mesmo as teorias da pe-

nas que se autoproclamam liberais ou ga-

rantistas pouco conseguiram em termos de

efetividade na contração do arquipélago pu-

nitivo. A armadilha da fundamentação con-

sensualista impede superar a ideia da pena

como um direito (natural) do Estado contra

o infrator que, no limite, é transformado em

um pária ou um inimigo a ser eliminado

com o objetivo de garantir a ‘paz’ e a ‘se-

gurança’.

Ao final, a questão que surge da

discussão é sobre a capacidade crítica da

dogmática jurídica em transpor este modelo

e construir novos referenciais para uma atu-

ação ética voltada para a redução das vio-

lências (públicas e privadas).

Juarez Cirino dos Santos, frente à

realidade letal do sistema punitivo, indaga:

“por que fazer dogmática penal?” Ensina

que o tipo de ação dependerá, inexoravel-

mente, do critério que informa o trabalho

do ator jurídico: “fazer dogmática penal

como critério de racionalidade do sistema

punitivo significa assumir o ponto de vista

do poder repressivo do Estado no processo

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de criminalização e de marginalização do

mercado de trabalho e da pobreza social,

em geral; ao contrário, fazer dogmática

penal como sistema de garantias em face

do poder punitivo do Estado, no sentido de

conjunto de conceitos capazes de excluir ou

reduzir o poder de intervenção do Estado

na esfera da liberdade individual – e, por-

tanto, capazes de impedir ou de amenizar

o sofrimento humano produzido pelas de-

sigualdades e pela seletividade do sistema

penal – constitui tarefa científica de gran-

de significado democrático nas sociedades

contemporâneas” (Santos, 2005:38).

Frente à dura realidade do controle

social punitivo contemporâneo e às conse-

quentes dificuldades em propor reais alter-

nativas às sanções penais – alternativas que

não sejam incorporadas pela lógica prisio-

nal e imediatamente transformadas em adi-

tivos –, a perspectiva redutora parece ser

uma estratégia viável para evitar o imobi-

lismo e salvar o máximo de vidas possíveis

dentre aquelas sequestradas pela máquina

carcerária.

Notas

1 O artigo apresenta os resultados parciais

da pesquisa de Pós-Doutorado realizado na

Scuola di Giurisprudenza, Università degli

Studi di Bologna (ITA), sob a orientação

do Prof. Massimo Pavarini, intitulada

“Esecuzione delle Pene e dele Misure di

Sicurezza nel Diritto Penale Brasiliano”,

financiada pelo Conselho Nacional de

Pesquisa (CNPq).2 Baratta (1997), ao configurar a

criminologia crítica como crítica ao direito

penal, postula a construção da sociologia

do direito penal, cujo objeto corresponde

a três categorias de comportamentos:

“a sociologia jurídico penal estudará,

pois, em primeiro lugar, as ações e

os comportamentos normativos que

consistem na formação e na aplicação

de um sistema penal dado; em segundo

lugar, estudará os efeitos do sistema penal

entendido como aspecto ‘institucional’ da

reação ao comportamento desviante e do

correspondente controle social. A terceira

categoria de ações e comportamentos

abrangidos pela sociologia jurídico-penal

compreenderá, ao contrário (a) as reações

não-institucionais ao comportamento

desviante, entendidas como um aspecto

integrante do controle social do desvio, em

concorrência com as reações institucionais

estudadas nos dois primeiros aspectos e

(b) em nível de abstração mais elevado,

as conexões entre um sistema penal dado

e a correspondente estrutura econômico-

social” (Baratta, 1997:23).3 “As leis se expressam através de palavras,

mas o fazem em um mundo onde ocorrem

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fenômenos físicos, sociais, culturais,

econômicos, políticos etc., em permanente

mudança, em uma realidade que flui

continuamente, protagonizada por pessoas

que interagem e se comportam conforme

certos conteúdos psicológicos. Todas estas

coisas são reais e sucedem deste modo e não

de outro, e as leis devem ser interpretadas

neste mundo e não em outro que não existe.

O impossível é neste mundo, tanto por

razões sociais como físicas. Se é impossível

caminhar sobre a água, igualmente é

ressocializar o preso” (Zaffaroni, Alagia &

Slokar, 2006:77).4 Sobre os equívocos da reiteração da punição

como solução ao problema da violência,

importantes as reflexões de Jacinto Coutinho

a partir da posição de Stippel (Coutinho,

2013).5 A partir de Bourdieu, Geraldo Prado

sustenta que é necessário escapar às

tentações narcotizantes da “ciência pura”

(alheias às necessidades sociais) e da

“ciência escrava” (submetida às demandas

político-econômicas). Exatamente por isso

procura problematizar os pontos de partida

não como dados, mas como construções. No

direito penal, um dos principais será o delito

– “as teorias penais surgiram nos séculos

XIX e XX para legitimar o funcionamento

do sistema criminal, conforme o discurso

da modernidade, não problematizando no

início um dos seus elementos principais, o

crime, que era considerado como um dado

social e não criação do próprio poder

político” (Prado, 2011:26).6 “O Estado, como expressão da sociedade,

está legitimado para reprimir a criminalidade,

da qual são responsáveis determinados

indivíduos, por meio de instâncias oficiais

de controle social (legislação, polícia,

magistratura, instituições penitenciárias).

Estas interpretam a legítima reação da

sociedade, ou da grande maioria dela,

dirigida à reprovação e condenação do

comportamento desviante individual e

reafirmação dos valores e das normas

sociais” (Baratta, 1997:42).7 Embora em momento imediatamente

posterior o autor conclua que os conceitos

de fundamento e de função não sejam

coincidentes e que seja necessária a

comprovação da utilidade da pena – “a

função [retribuição ou prevenção] é, pois,

a base do fundamento, mas ambos os

conceitos não coincidem, pois o fundamento

tem que provar a necessidade da função”

(Mir Puig, 2003:98) – acaba por designar à

criminologia a verificabilidade empírica dos

objetivos da pena atribuídos pela dogmática

penal.

Assim, o discurso do direito penal só

aparentemente vincula sua construção teóri-

ca com a realidade do sistema punitivo, pois

não apenas delega a análise da vida fenomê-

nica à criminologia como, na maioria das

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Sobre as Possibilidades de uma Penologia Crítica: Provocações Criminológicas...

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vezes, invocando a Lei de Hume, descarta

seus resultados na edificação dos seus siste-

mas. Desta forma, mesmo que de forma não

explícita, o real funcionamento das agências

do sistema penal é inescrupulosamente ex-

cluído das problematizações dogmáticas.8 Ensina Lyra Filho que a contestação da

ordem aristocrático-feudal pela burguesia

ocorreu através da reivindicação de um

jusnaturalismo de cunho antropológico, que

gira em torno do homem, em contraposição

ao de caráter teológico, voltado a Deus.

A nova classe político-econômica “(...)

recorreu, então, à forma de direito natural,

que denominamos antropológico, isto é, do

homem, que extraía os princípios supremos

de sua própria razão, de sua inteligência.

Estes princípios, e de novo não por mera

coincidência, eram, evidentemente, os que

favoreciam as posições e reivindicações da

classe em ascensão – a burguesia – e das

nações em que capitalismo e protestantismo

davam as maõs para a conquista do seu

‘lugar ao sol’” (Lyra Filho, 1991:42).9 Neste sentido, importante a revisão

realizada por Schmidt, na qual, a partir de

Antolisei (na crítica à doutrina clássica do

direito subjetivo do Estado) e, posteriormente

Ferrajoli (na definição dos pressupostos de

validade das normas jurídicas a partir dos

direitos fundamentais), a ideia de pretensão

punitiva do Estado (e, consequentemente,

de jus puniendi) é refutada e substituída

pela ideia de pretensão acusatória. Nas

palavras do autor, “é equivocado falarmos,

no Estado Democrático de Direito, numa

suposta pretensão punitiva do Estado

surgida no momento em que um crime é

praticado. Isso porque, em primeiro lugar, a

notícia da prática de um caso penal não faz

surgir, desde já, para o Estado, o ‘direito’

(subjetivo) ou ‘dever’ de punir o suposto

infrator, mas sim o dever fundamental de

movimentar a jurisdição criminal segundo

a estrutura operacional determinada na

Constituição e limitada por ela mesma. Por

enquanto, o máximo que se poderia falar,

nas palavras de Aury Lopes Júnior, é em

pretensão acusatória ou persecutória do

Estado, devidamente resistida pelo direito

de liberdade do acusado assegurado na

garantia de presunção de inocência. Esta

afirmação é complementada por outra,

de natureza organizacional: o monopólio

da jurisdição faz recair sobre um órgão

do Estado o dever de iniciar a persecução

penal (princípio da obrigatoriedade);

a outro órgão, o dever de decidir sobre

a matéria objeto do processo (princípio

da jurisdicionalidade); e, por fim, a um

terceiro, a tarefa de defender o acusado

(princípio da ampla defesa). Nessa etapa

do processo de conhecimento teríamos de

falar (impropriamente, frise-se), então,

em ‘pretensão’ acusatória, ‘pretensão’

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decisória e ‘pretensão’ defensiva” (Schmidt,

2003: 94).10 No Manifesto do Partido Comunista

(1848), texto seminal para a percepção dos

conflitos de classe na disputa pelo poder

político e do papel (revolucionário) da

burguesia na dilaceração do mundo feudal

e na edificação do Estado moderno, Marx e

Engels referem que “o executivo do Estado

moderno não é mais do que uma comissão

para administrar os negócios comuns de

toda a classe burguesa” (Marx e Engels,

Manifesto Comunista, p. 62). Mas se toda a

luta é luta de classe; e se toda a luta de classe é

uma luta política, “as leis, a moral, a religião

são outros tantos preceitos burgueses em

que se acoitam outros tantos preceitos

burgueses. Todas as classes anteriores que

se apoderaram do poder procuram proteger

uma posição social já alcançada, e para tal

submeteram toda a sociedade às condições

do seu lucro.” (Marx e Engels, 1975: 72).11 A redução da percepção do crime como atos

delitivos das classes baixas e a vinculação dos

valores sociais homogêneos aos interesses da

burguesia industrial das sociedades capitalistas

são nítidas na crítica às teorias da anomia e

das subculturas. Larrauri e Cid demonstra

que “(...) a teoria da anomia serve apenas

para explicar um setor da delinquência: a

delinquência das pessoas de classe baixa que

tem bloqueadas ou reduzidas as vias legítimas

para alcanças suas aspirações e que realizam

comportamentos delitivos como uma via

alternativa para logras tais êxitos” (Larrauri

e Cid, 2001:145).

Em relação a relatividade do conceito

de sociedade competitiva, a ingênua fé nas

regras do jogo, os limites teóricos das teorias

consensuais, a absolutização da ideologia

da classe média e o equívoco relativo ao

conceito de subcultura, fundamental a

contribuição crítica de Pavarini (1988).12 Se a teoria do etiquetamento promoveu a

superação da categoria criminalidade pela

ideia de criminalização e o reconhecimento

da seletividade do sistema penal a partir da

crítica das estatísticas criminais, as teorias do

conflito desnudaram as relações de poder que

influenciam os processos de criminalização

e a natureza política do direito penal. Não

por outro motivo, consolidam a base teórica

da criminologia crítica – “a criminologia

crítica emerge, portanto, como uma

perspectiva criminológica orientada pelo

materialismo (método) que, ao incorporar

os avanços das teorias rotulacionistas e

conflituais, refuta os modelos consensuais

de sociedade e os pressupostos causais

explicativos da criminalidade de base

microssociológica (criminologia ortodoxa)

e redireciona o objeto de investigação aos

processos de criminalização, à atuação das

agências do sistema penal e, sobretudo, às

relações entre estrutura política e controle

social” (Carvalho, 2013b:286).

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vi Pasukanis (1988) desenvolve, igualmente,

importante crítica às tradicionais teorias da

pena e o desdobramento politico da teoria da

retribuição equivalente.13 É possível notar que a indústria cultural

transformou a violência em um rentável

produto de entretenimento que se encontra

presente em uma série incontável de mídias

(rádio, cinema, televisão, jornais, games,

internet), inclusive em forma de arte

(música, filmes, literatura, artes plásticas,

fotografia, quadrinhos, publicidade). Neste

sentido, percebem Hayward e Young que “o

crime é embalado e comercializado para os

jovens como um romântico, emocionante,

cool e fashion símbolo cultural. E neste

contexto a transgressão torna-se opção de

consumo desejável” (Hayward & Young,

2007:109).

Mas se o delito é transformado em um

produto de consumo, a resposta ao crime

(pena) e as suas instituições igualmente são

convertidas em mercadorias. Em relação à

prisão, imprescindível o estudo de Christie,

A Indústria do Controle do Crime (1998).

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CRimiNOlOGiA E ExECUçãO PENAl

FGV DIREITO RIO 46

ww

Mulheres e crianças encarceradas: um estudo jurídico-social sobre a experiência da maternidade no sistema prisional do Rio de Janeiro

Luciana Boiteux, Maíra Fernandes Aline Pancieri, Luciana Chernicharo

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inin

as

do s

iste

ma

peni

tenc

iário

do

Rio

de J

anei

ro.

Perfi

l d

as

mu

lhere

s m

ães

e

grá

vid

as

en

carc

era

da

s n

o R

J

Pesq

uisa

: 41

mul

here

s en

trev

is-

tada

s, e

ntre

jun-

ago/

2015

, em

si

tuaç

ão d

e m

ater

nida

de n

a pr

isão

, em

dua

s un

idad

es d

o C

ompl

exo

Peni

tenc

iário

de

Ger

icin

ó: o

Pre

sí-

dio

Tala

vera

Bru

ce (T

B, q

ue a

brig

a as

pre

sas

gráv

idas

) e a

Uni

dade

M

ater

no In

fant

il (U

MI),

par

a on

de

esta

s sã

o tr

ansf

erid

as lo

go a

pós

o na

scim

ento

de

seus

filh

os a

té a

se-

para

ção

entr

e el

es p

or v

olta

de

seis

m

eses

dep

ois.

A

gra

nde

mai

oria

é d

e jo

vens

(ent

re

18 e

22

anos

), 78

% te

m a

té 2

7 an

os, 7

7% n

egra

s/pa

rdas

; so

ltei-

ras

(82%

), co

m b

aixa

esc

olar

idad

e (7

5,6%

não

pos

suem

o e

nsin

o fu

ndam

enta

l com

plet

o);

9,8%

não

sa

bem

ler

nem

esc

reve

r.Afir

mam

te

rem

des

istid

o da

esc

ola

porq

ue

não

se s

entia

m m

ais

mot

ivad

as a

es

tuda

r na

épo

ca. A

pena

s du

as

Luci

ana

Boite

ux (

FND

/UFR

J) e

M

aíra

Fer

nand

es (

OA

B/RJ

e IA

B)

Coo

rden

ador

as

Alin

e C

ruve

llo P

anci

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Lu

cian

a Pe

luzi

o C

hern

icha

ro

(LA

DIH

/UFR

J)Pe

squi

sado

ras

Brun

a Ba

nchi

k (B

olsi

sta

IC/

FAPE

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Bols

ista

de

Inic

iaçã

o C

ient

ífica

Julia

na d

os A

njos

Silv

a A

breu

Esta

tístic

a

Ayl

a V

ieir

aD

esig

ner

Grá

fica

Equ

ipe:

A q

uest

ão d

as m

ulhe

res

enca

rcer

adas

, esp

ecia

lmen

te a

quel

as q

ue e

x-pe

rimen

tam

a g

ravi

dez

e o

nasc

imen

to d

e se

us fi

lhos

na

pris

ão, c

onst

i-tu

i um

dos

asp

ecto

s m

ais

perv

erso

s da

opç

ão p

or u

ma

polít

ica

crim

inal

re

pres

siva

, com

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pre

fere

ncia

l na

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priv

ativ

a de

libe

rdad

e. S

e a

situ

ação

das

mul

here

s pr

esas

con

figur

a um

a du

pla

sanç

ão, p

or s

er e

la

cons

ider

ada

com

o “c

rimin

osa”

e a

inda

mai

s pe

lo e

stig

ma

de “

mul

her

crim

inos

a”, q

ue o

usou

vio

lar

a le

i dos

hom

ens

num

a so

cied

ade

pa-

tria

rcal

, no

caso

de

gráv

idas

e d

e m

ães

de fi

lhos

peq

ueno

s, e

stas

ain

da

rece

bem

mai

s um

a pu

niçã

o: s

ão ta

mbé

m p

rivad

as d

a co

nviv

ênci

a co

m

seus

filh

os, c

om to

das

as c

onse

quên

cias

soc

iais

que

dec

orre

m d

esse

di

stan

ciam

ento

.

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CRimiNOlOGiA E ExECUçãO PENAl

FGV DIREITO RIO 48

conc

luíra

m o

ens

ino

méd

io.

Met

ade

dela

s es

tava

trab

alha

ndo

na é

poca

em

que

foi p

resa

, em

em

preg

os p

reca

rizad

os(8

5% s

em

cart

eira

ass

inad

a), a

mai

oria

era

re

spon

sáve

l pel

o su

sten

to d

o la

r:

19%

inte

gral

men

te e

22%

em

par

te.

Pres

as p

rovi

sóri

as:

A g

rand

e m

aior

ia d

as g

rávi

das

e m

ães

no

cárc

ere

é de

pre

sas

caut

elar

es

(73,

2%),e

stan

do a

mai

or p

arte

de

las

(grá

vida

s) n

o TB

(83,

3%);

na

UM

I são

58,8

%. T

al d

ado

é su

perio

r ao

nac

iona

l (40

% d

os p

reso

s sã

o pr

ovis

ório

s), e

mui

to m

aior

do

que

o de

pre

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prov

isór

ias

regi

stra

do

no B

rasi

l, qu

e se

ria d

e 30

% (I

nfop

en

Mul

her

2014

).

Grá

vida

s: E

las,

em

sua

mai

oria

, fo

ram

pre

sas

gráv

idas

,alg

umas

de-

las

em e

stad

o av

ança

do, d

e se

te a

no

ve m

eses

de

grav

idez

.16

mul

he-

res

esta

vam

com

a g

esta

ção

de 6

a

9 m

eses

no

mom

ento

em

que

fora

m

pres

as, n

não

tend

o si

do s

ubst

ituíd

a pe

lo ju

iz a

pris

ão p

reve

ntiv

a pe

la

dom

icili

ar, c

omo

prev

ê o

art.

318,

IV

, CPP

Perfi

l: A

mai

oria

era

prim

ária

(7

0%),

cond

enad

a a

pena

s en

tre

5 e

9 an

os (4

4,4%

), se

ndo

que

33,3

%

cum

pria

m p

enas

de

até

4 an

os.

75,6

% ti

nham

alg

um p

aren

te p

reso

, se

ndo

que

quas

e m

etad

e de

las

tinha

o s

eu c

ompa

nhei

ro p

reso

(4

6,3%

), do

s qu

ais

52,6

% p

elo

cri-

me

de tr

áfico

.

Tipo

de

Cri

me:

Qua

se m

etad

e (4

6,3%

) afir

mou

est

ar s

endo

pro

ces-

sada

/ter

sid

o co

nden

ada

pelo

crim

e de

tráfi

co d

e dr

ogas

, sen

do e

ste

o de

lito

prep

onde

rant

e, s

egui

do d

o cr

ime

de r

oubo

. No

Bras

il, te

mos

58

% d

as m

ulhe

res

resp

onde

ndo

por

tráfi

co. E

ntre

as

gráv

idas

, 70,

9%

resp

onde

m p

or c

rimes

rel

acio

nado

s ao

tráfi

co d

e dr

ogas

.

Cri

me q

ue e

stá

sen

do c

on

den

ad

a/p

roce

ssa

da

Posi

ção

no T

ráfic

o e

Tipo

de

Dro

-ga

: 37

% d

as c

onde

naçõ

es d

elas

por

tr

áfico

env

olve

u co

caín

a e

22,2

%

mac

onha

, pre

pond

eran

do p

osiç

ões

suba

ltern

as. A

pena

s um

a m

ulhe

r ad

uziu

ter

sido

ger

ente

“da

boc

a”

e se

is d

elas

(14,

6%) f

oram

pre

sas

tent

ando

ent

rar

no p

resí

dio

port

an-

do d

roga

s.

Mot

ivaç

ão p

ara

o cr

ime:

A g

rand

e m

aior

ia d

as e

ntre

vist

adas

afir

mou

qu

e a

razã

o pe

la q

ual v

eio

a de

-lin

quir

se r

elac

iona

a d

ificu

ldad

es

finan

ceira

s.

Vio

lênc

ia:

41,5

% fo

ram

víti

mas

de

crim

e ou

vio

lênc

ia a

nter

ior

à pr

isão

do

s qu

ais:

agr

essã

o fís

ica

(35,

3%),

viol

ênci

a do

més

tica

(23,

5%),

estu

-pr

o/te

ntat

iva

(11,

8%),

atin

gida

por

tir

o (1

1,8%

) e b

riga

com

mar

ido

(5,9

%).

Fun

ção n

o t

ráfi

co

Ace

sso

a M

edic

amen

tos:

31,

7%

dela

s afi

rmar

am q

ue n

eces

sita

m d

e m

edic

amen

tos

regu

lare

s. D

esta

s,

53,8

% d

izem

não

rec

eber

med

ica-

men

tos

adeq

uada

men

te. P

robl

emas

m

aior

es e

stão

no

TB, o

nde

a m

aio-

ria d

elas

(75%

) ale

gou

não

rece

ber

rem

édio

s de

man

eira

ade

quad

a.

Ate

ndim

ento

Méd

ico:

Ent

revi

stad

as

do T

B afi

rmar

am q

ue a

s ag

ente

s se

mpr

e de

scon

fiava

m d

e se

us p

edi-

dos

de a

tend

imen

to m

édic

o e

med

i-ca

men

tos.

Na

UM

I, sã

o po

sitiv

as a

s re

ferê

ncia

s so

bre

aten

dim

ento

mé-

dico

/med

icam

ento

s. N

ão o

bsta

nte,

a

mai

oria

, 53,

7% d

elas

afir

mar

am

não

rece

ber

aten

dim

ento

gin

eco-

lógi

co. A

s pr

esas

afir

mar

am q

ue

real

izar

am o

pré

-nat

al d

e m

anei

ra

inco

mpl

eta:

fize

ram

som

ente

a

ultr

asso

nogr

afia

e ou

tras

ape

nas

os

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CRimiNOlOGiA E ExECUçãO PENAl

FGV DIREITO RIO 49

exam

es d

e sa

ngue

e u

rina.

Pro

ble-

mas

de

depr

essã

o fo

ram

apo

ntad

os

expr

essa

men

te p

or c

inco

del

as.

Vis

itas:

A m

aior

ia d

as e

ntre

vist

a-da

s afi

rmou

não

rec

eber

vis

itas

na

pris

ão (6

5,9%

). D

as q

ue r

eceb

em

visi

tas,

mai

or p

arte

rec

ebe

visi

tas

da

mãe

(50%

). M

arid

o/co

mpa

nhei

ro

corr

espo

ndem

a 1

4,3%

.

Filh

os:

A m

aior

ia d

elas

pos

sui 2

fil

hos

(31,

7%),

e 3

filho

s (2

6,8%

), m

as a

mai

oria

não

teve

a o

port

u -ni

dade

de

entr

ar e

m c

onta

to c

om a

su

a fa

míli

a no

mom

ento

da

pris

ão,

viol

ando

-se

norm

as in

tern

acio

nais

(n

. 2 d

as R

egra

s de

Ban

gkok

).

Tem

po d

e pe

rman

ênci

a do

filh

o na

pri

são:

A m

aior

par

te d

as p

resa

s ac

redi

ta q

ue a

mel

hor

opçã

o pa

ra o

se

u fil

ho é

est

ar c

om e

la n

a ca

deia

,

embo

ra u

ma

boa

part

e pr

efira

que

o

bebê

logo

sej

a se

para

do d

ela

para

não

viv

er e

ncar

cera

do. E

ste

delic

ado

assu

nto

pare

ce n

ão te

r re

spos

tas

pré-

defin

idas

sen

do r

eco-

men

dado

que

a m

ãe s

eja

sem

pre

ouvi

da n

esse

s ca

sos.

Que

m fi

cará

com

o fi

lho/

a? 6

1%

diss

eram

que

ser

á a

avó

quem

irá

cuid

ar d

e se

u fil

ho a

pós

os s

eis

mes

es r

egul

ares

na

UM

I. E

mbo

ra a

m

aior

ia d

elas

tenh

a afi

rmad

o qu

e o

pai d

a cr

ianç

a sa

be d

a gr

avid

ez,

não

serã

o el

es q

ue c

uida

rão

da

cria

nça.

Em

70,

3% d

os c

asos

das

pr

esas

com

filh

os, é

a a

vó q

uem

fic

a co

m a

gua

rda

dele

s.

Prin

cipa

is q

ueix

as:

Falta

d`á

gua

para

tom

ar b

anho

, má

qual

idad

e da

com

ida

e pr

ecár

ias

cond

içõe

s

Rece

beu

/ re

ceb

e a

ten

dim

en

to p

ré-n

ata

l

de h

igie

ne d

o lo

cal.

O a

tend

imen

to

méd

ico

foi u

m d

os a

ssun

tos

mai

s m

al a

valia

dos

pela

s m

ulhe

res.

Den

únci

as d

e A

gres

sões

e T

rans

-po

rte

de g

rávi

das

à m

ater

nida

de:

houv

e m

uita

s qu

eixa

s ac

erca

do

trat

amen

to r

eceb

ido

pela

s m

ulhe

res

pres

as p

or a

gent

es p

enite

nciá

rios

e ag

ente

s do

Ser

viço

de

Ope

raçõ

es

Espe

ciai

s da

SEA

P (S

OE)

: re

lato

s de

ag

ress

ões

físic

as e

ver

bais

, vio

laçã

o ao

dire

ito à

intim

idad

e da

s m

ulhe

-

res,

uso

inde

vido

de

alge

mas

, in-

clus

ive

no p

arto

, alé

m d

a de

mor

a e

da d

esco

nfian

ça n

os a

tend

imen

tos

quan

do s

olic

itado

s (h

ouve

cas

os d

e pa

rtos

den

tro

do T

B e

aind

a de

n-tr

o do

tran

spor

te).

Pala

vras

com

o “b

arrig

a de

lom

brig

a”, “

moc

reia

”,

“men

tiros

a”, “

pres

a nã

o te

m d

irei-

to”

fora

m n

arra

das

pela

s pr

esas

e

prat

icam

ente

toda

s as

mul

here

s de

-nu

ncia

ram

alg

um ti

po d

e vi

olaç

ão

de s

eus

dire

itos

dura

nte

o cu

mpr

i-m

ento

de

sua

pena

.

Situ

açã

o ju

ríd

ica

atu

al

mero

de e

ntr

evi

sta

s

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CRimiNOlOGiA E ExECUçãO PENAl

FGV DIREITO RIO 50

w

CONSELHO PENITENCIÁRIO

DO RIO DE JANEIRO (Gestão 2011-2015)

Apoio:

Realização: Grupo de Pesquisa em Política de Drogas e Direito Humanos do Laboratório de Direitos Humanos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ)

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CRimiNOlOGiA E ExECUçãO PENAl

FGV DIREITO RIO 51

Berkeley LawBerkeley Law Scholarship Repository

Faculty Scholarship

11-1992

The New Penology: Notes on the EmergingStrategy of Corrections and Its ImplicationsMalcolm M. FeeleyBerkeley Law

Jonathan SimonBerkeley Law

Follow this and additional works at: http://scholarship.law.berkeley.edu/facpubsPart of the Criminal Law Commons, and the Law Enforcement and Corrections Commons

This Article is brought to you for free and open access by Berkeley Law Scholarship Repository. It has been accepted for inclusion in FacultyScholarship by an authorized administrator of Berkeley Law Scholarship Repository. For more information, please contact [email protected].

Recommended CitationMalcolm M. Feeley and Jonathan Simon, The New Penology: Notes on the Emerging Strategy of Corrections and Its Implications, 30Criminology 449 (1992),Available at: http://scholarship.law.berkeley.edu/facpubs/718

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FGV DIREITO RIO 52

HeinOnline -- 30 Criminology 449 1992

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FGV DIREITO RIO 53

HeinOnline -- 30 Criminology 450 1992

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HeinOnline -- 30 Criminology 451 1992

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FGV DIREITO RIO 55

HeinOnline -- 30 Criminology 452 1992

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FGV DIREITO RIO 56

HeinOnline -- 30 Criminology 453 1992

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FGV DIREITO RIO 57

HeinOnline -- 30 Criminology 454 1992

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Citation: 36 Criminology 763 1998

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FERNANDA PRATES FRAGABacharel em Direito pela PUC/RJ. mestre em Ciências Penais pela Uni-versidade Cândido mendes. Doutora em Criminologia pela Universidade de montréal (Canada). Pos-doutora em Criminologia pela Universidade de Ottawa (Canada) . Advogada criminalista, membro do Conselho Pe-nitenciario e do Comité Estadual de Prevenção e Combate à Tortura.

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FICHA TÉCNICA

Fundação Getulio Vargas

Carlos Ivan Simonsen LealPRESIDENTE

FGV DIREITO RIO

Joaquim FalcãoDIRETOR

Sérgio GuerraViCE-DiRETOR DE ENSiNO, PESQUiSA E PÓS-GRADUAçãO

Rodrigo ViannaViCE-DiRETOR ADmiNiSTRATiVO

Thiago Bottino do AmaralCOORDENADOR DA GRADUAçãO

André Pacheco Teixeira MendesCOORDENADOR DO NÚClEO DE PRÁTiCA JURÍDiCA

Cristina Nacif AlvesCOORDENADORA DE ENSiNO

Marília AraújoCOORDENADORA ExECUTiVA DA GRADUAçãO