Cultura MS 2010 Alcinópolis

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Revista apresenta os sítios arqueológicos existentes em Alcinópolis MS. Alcinópolis é a capital da arte rupestre.

Transcript of Cultura MS 2010 Alcinópolis

  • 2 CULTURA EM MS - 2010 - N.32 CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    Antigamente se pensava no desenvolvimento de forma iso-

    lada e parcial. Falava-se de economia, sociedade e cultura como

    se fossem reas distintas. Apesar de a especializao ser neces-

    sria administrao, hoje sabemos que o desenvolvimento

    multidimensional e interdependente. A cultura no est isola-

    da dos avanos na educao, da pujana econmica ou de

    uma cidade limpa e bem-cuidada.

    Com essa conscincia, neste novo momento que iniciamos

    no s esperamos que a cultura seja beneficiada pelo cresci-

    mento e pela melhora da qualidade de vida em Mato Grosso

    do Sul, como tambm no esquecemos da cultura como fator

    de desenvolvimento social. Sabemos da importncia dessa rea

    como poltica de governo para um estado que est investindo

    no crescimento. Estimulando o setor cultural estamos fortale-

    cendo a cidadania, a qualidade de vida, a educao, a preser-

    vao da histria sul-mato-grossense. Tambm estamos refor-

    ando, ao mesmo tempo, a economia. Resguardando e difun-

    dindo valores e memrias, por meio de nosso patrimnio his-

    trico e cultural, enxergamos o potencial econmico de nosso

    teatro, cinema, msica, gastronomia, arquitetura, nosso

    patrimnio imaterial. Geradora de emprego e renda, a cultura

    tambm parte do processo econmico.

    Nesta viso, importante simultaneamente continuar as

    propostas fundamentais e bem-sucedidas e tambm estar aberto

    ao novo. Cultura criatividade e pensamento, e estar atento s

    novas demandas essencial para estimular os talentos em nos-

    sa terra. Mas, junto abertura ao que atual, necessrio

    consolidar o trabalho feito pela gesto cultural em atividade. A

    continuao da revista CULTURA EM MS uma ao que,

    mantida, promove dentro de suas pginas a comunicao en-

    tre a tradio e a ordem do dia no setor. Como falamos de

    interligao e interdependncia, vale destacar que a revista tam-

    bm propicia, por meio de informaes e debates, a

    capilarizao da cultura e a formao de seus agentes. Que

    seus leitores possam encontrar nestas pginas estmulo para a

    reflexo, a criatividade e a produo.

    2010 - N.3

    A interdependnciaentre cultura e desenvolvimento

    Andr Puccinelli

    Governador do Estado de Mato Grosso do Sul

    Fotos da capa e das pginas de abertura, por Fabio Pellegrini:

    Ingra Flores (do grupo boliviano Tikay) e Daniella Penrabel de Souza

    (do grupo paraguaio Tic Tac) fotografadas em frente ao Memorial da Cultura

    com a bandeira de MS e, ao alto, as da Bolvia e do Paraguai;

    Vista panormica do Parque Estadual das Nascentes do Rio Taquari - Alcinpolis-MS.

    Governador de Mato Grosso do Sul

    Andr Puccinelli

    Vice-governador

    Murilo Zauith

    Presidente da Fundao de Cultura de Mato Grosso do Sul

    Amrico Ferreira Calheiros

    Diretor Geral

    Jos Alberto Furlan

    Gerente de Patrimnio Histrico e Cultural

    Neusa Narico Arashiro

    Assessoria de Comunicao

    Gisele Colombo, Mrcio Breda e Rodrigo Ostemberg

    Comisso editorial

    Cultura em MS

    Amrico Calheiros, Arlene Vilela, Edilson Aspet, Maria Christina Flix,

    Neusa Arashiro, Soraia Rodrigues e Marlia Leite

    A revista Cultura em MS uma publicao do

    Governo do Estado de Mato Grosso do Sul por meio

    da Fundao de Cultura de Mato Grosso do Sul

    Memorial da Cultura e Cidadania - Av. Fernando Corra da Costa, 559

    Tel.: (67) 3316 9155 - Campo Grande-MS

    Edio: Marlia Leite (DRT/SP 10.885-78),

    Fabio Pellegrini (DRT/MS 116-06) e Moema Vilela (DRT/MS 09-05)

    Reportagem e redao: Andriolli Costa, Camila Emboava, Daniel Belalian,

    Fabio Pellegrini, Gabriela Kina, Gisele Colombo, Hellen Camara, Indiara Antunes,

    Las Camargo, Laryssa Caetano, Lu Tanno, Mrcio Breda, Marlia Leite,

    Mario Ramires, Moema Vilela, Rodrigo Ostemberg, Rozana Valentim

    Projeto grfico: Marlia Leite e Yara Medeiros; Edio de arte e finalizao

    de imagens: Lennon Godoi e Antnio Marcos Gonalves Francisco;

    Editorao eletrnica: Marlia Leite

    Reviso ortogrfica: Daniel Santos Amorin

    Fotografia: Fabio Pellegrini, Daniel Reino, Dbora Bah, Daniel Belalian e colaboradores

    Convidados: Albana Xavier Nogueira, lvaro Banducci Jnior, Daniela Ota,

    Edgar Rau F., Edson C. Contar, Evandro Higa, Fabio Anibal Jara Goiris,

    Jacira Helena do Valle Pereira, Lucia Salsa Corra, Mrcia Raquel Rolon, Marlei Sigrist,

    Miriam Ferreira de Abreu da Silva, Miska Thom, Regina Maura Lopes Couto Cortez,

    Rosangela Villa da Silva, Sara Cristiane Jara Grubert, Stael Moura da Paixo Ferreira

    e Tito Carlos Machado de Oliveira

    Agradecimentos: Ana Cristina Maricato, Gabriela Ferrite, Elis Regina Nogueira,

    Leoneida Ferreira, Lcia Villar Chaves, Maria de Lourdes Maciel e Paulo Moska

    Pr-impresso, impresso e acabamento: Grfica Editora Alvorada

    Contrato 16/2008 - Dezembro/2010

    Verso eletrnica da revista no site: www.fundacaodecultura.ms.gov.br

    Imagem da 3a

    capa:

    Borboletas, da artista plstica

    Antonia Hanemann.

    Foto da 4a

    capa:

    Bandeirolas do So Joo de Corumb,

    pela fotgrafa Gabriela Ferrite.

  • 3CULTURA EM MS - 2010 - N.3 3CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    JanelasMS brilha l fora, Aquidauana e seu passado,

    a partida de Rondo, crianas e msica,

    fotografias em movimento, tradio presente

    EspelhoO no-lugar de nossos artistas

    EntrevistaMarisa Bittar:

    compreendendo a criao de MS

    MsicaSons eruditos do Pantanal

    Livro e leituraAes para abrir novas pginas nessa histria

    Artes cnicasO palco das ruas

    ArtigoUrbanismo e cultura,

    por Regina Maura Lopes Couto Cortez

    Artes visuaisA arte que se faz ver dentro de um Salo

    Patrimnio ImaterialSaberes populares preservados

    PersonagemAraci Vendramini: mos que moldam

    a devoo aos povos indgenas

    CrnicaAblio Leite de Barros:

    De uma guerra que passou pela infncia

    Turismo culturalTesouros da pr-histria preservados em Alcinpolis

    Novas linguagensO festival que o maior fu entre os universitrios

    ArtesanatoPai e filho artesos transformam espetos

    para churrasco em presentes de luxo

    Sabor e culturaEspecialidades da fronteira

    Capilarizao da culturaProjetos itinerantes encantam o interior

    BalaioSugestes culturais

    SUMRIO

    CapaBolvia - Brasil - Paraguai

    Cultura sem fronteiras

    Identidade histrica

    preciso compreender para explicar

    Lucia Salsa Corra

    Um (rpido) olhar sobre a fronteira Brasil-Bolvia

    Tito Carlos Machado de Oliveira

    La identidad convergente entre el porteo y el corumbaense

    Edgar Rau F.

    As fronteiras com o Paraguai

    lvaro Banducci Jnior

    El hibridismo y las disquisiciones axiolgicas

    Fabio Anibal Jara Goiris

    Alteridade histrica

    Msica: Evandro Higa e Miska Thom

    Dana: Mrcia Raquel Rolon

    Lngua: Rosangela Villa da Silva

    Artes: Jacira do Valle Pereira e Miriam da Silva

    Religiosidade e Costumes: Marlei Sigrist

    Literatura: Edson Contar e Stael Moura

    Comunicao: Daniela Ota

    Novos olhares na fronteira

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    Anexo

    (p.81 a p.88)

    com ntegra de

    textos editados na

    verso impressa.

  • 4 CULTURA EM MS - 2010 - N.34 CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    Nos mares catarinenses, das lulas e siris, a piranha pantaneira

    costuma passar longe. Em junho de 2010, porm, em Florianpolis,

    o famoso caldo sul-mato-grossense e a caldeirada litornea se en-

    contraram, na segunda edio da Mostra de Cultura de Raiz. O

    evento rene gastronomia e arte para integrar a cultura de Mato

    Grosso do Sul, Paran, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Os quitutes

    tradicionais de cada estado, como o caldo de piranha de MS, o

    barreado paranaense e o caldo de frutos do mar barriga-verde, abrem

    o apetite para outras degustaes. Alm da feira gastronmica, h

    shows, exposio e comercializao de artesanato, palestras, contao

    de histrias e exibio de filmes.

    O evento promovido pelo Codesul Cultural, brao do Conselho

    de Desenvolvimento e Integrao Sul (Codesul). Para alm das aes

    desenvolvidas com o objetivo de fortalecer os estados na esfera eco-

    nmica, o grupo se uniu para buscar a articulao em torno da

    cultura. Em julho de 2008, em reunio na Fundao de Cultura de

    Mato Grosso do Sul, os secretrios de cultura e presidentes de fun-

    daes culturais Amrico Calheiros (MS), Vera Mussi (PR) e Anita

    Pires (SC), junto com assessores tcnicos, definiram como primeira

    ao a ser implantada a criao de um festival. Ele deveria englobar

    as manifestaes culturais de cada estado em torno da msica, apro-

    veitando a influncia da cultura de fronteira, rica e forte nos estados

    do Sul. A proposta foi tomando forma at chegar Mostra de Raiz.

    A primeira edio teve lugar em Curitiba, em outubro de 2009.

    No Canal da Msica, no bairro Mercs, apresentaram-se a Orquestra

    Revoada Pantaneira e a dupla Tosto & Guarany (MS). Do Paran, o

    grupo Viola Quebrada e o espetculo folclrico musical Nhengar

    Inami, de Lidio Roberto e Cris Lemos. J Santa Catarina levou os

    msicos Edson e Alisson Rodrigues e o Trio do Engenho. Os estados

    tambm marcaram presena com o artesanato e a culinria regio-

    Brasil, Mato Grosso do Sul, terra dos sonhos

    guaranis, cuja dificuldade de acesso aos grandes cen-

    tros brasileiros sedimentou o estreito contato com dois

    pases de lngua espanhola Paraguai e Bolvia , le-

    vando os sul-mato-grossenses a absorverem traos

    culturais das naes vizinhas, em especial nas reas

    prximas fronteira com o Paraguai, onde o sotaque

    carrega forte acento castelhano e ainda hoje so

    marcantes ritmos musicais como a polca e a guarnia.

    Cenrio da primeira Jornada Cultural Brasil-Paraguai,

    Asuncin foi o destino de uma expedio de artistas

    brasileiros de Mato Grosso do Sul. Fundada pelos espa-

    Era quase primavera

    quando segui para Assun-

    o, com um grupo de ar-

    tistas de Mato Grosso do

    Sul, para partilharmos nos-

    sa cultura com o povo

    paraguaio. Fui repleto de

    contentamento.

    O Paraguai pleno de

    msica, de histrias, de arte

    nos abraa fraterno e

    amoroso, como o rio imen-

    so que risca sua paisagem

    sem fronteiras.

    Trocas, pessoas daqui e de

    l: gente do teatro, da m-

    sica, das pinturas, das letras.

    Contar histrias nas escolas

    vivncia nica e ldica

    exerccio prazeroso da arte,

    da educao e da poesia.

    A capital paraguaia

    sempre uma surpresa e pro-

    picia o reencontro com a

    nossa histria, revelando-

    nos a alma guarani que com-

    pe a nossa culturalidade.

    Tudo por por l, tudo

    por por aqui.

    Emmanuel Marinho

    nhis na primeira metade do sculo XVI, uma das

    cidades mais antigas da Amrica do Sul. Conhecida

    como Madre de las Ciudades, poca converteu-se

    em um centro de toda a provncia. Colnias como San-

    ta Cruz de la Sierra, na Bolvia, e Corrientes, na Argen-

    tina, so tributrias desta vocao, pois dos portos de

    Asuncin navegaram suas expedies fundacionais. As

    edificaes e palcios coloniais de suas ruas contam

    parte dessa histria de esplendor e impressionam pelo

    grandioso efeito visual arquitetnico.

    Uma iniciativa da Embaixada do Brasil no Paraguai,

    em parceria com a Fundao de Cultura de Mato Gros-

    so do Sul, propiciou o encontro entre estes dois pases

    irmos, cujas marcas identitrias comuns atravessam

    fronteiras. Pelas galerias e auditrios da embaixada, os

    visitantes se encantaram com manifestaes artsticas

    diversas, msica, teatro, artes plsticas, artesa-

    nato, audiovisual e gastronomia.

    A jornada, que aconteceu de 15 a 18 de

    setembro de 2010, contou com participao

    de Emmanuel Marinho, Circo do Mato, Gui-

    lherme Rondon e Rodrigo Teixeira (Conexo Pan-

    tanal), Orquestra Revoada Pantaneira, Josu

    Florentin e Baiano (Chefs) e Maristela de Olivei-

    ra Franca (dir. op. SEBRAE/MS), alm de mos-

    tras audiovisuais, exposio de artesanato e ar-

    tes plsticas de MS. (Lu Tanno)

    AES DE PROMOO DA CULTURA DE MATO GROSSO DO SUL

    SE INTENSIFICAM, MOSTRANDO SEU RICO LEGADO EM OUTROS ESTADOS E PASES.

    Tudo por

    Jornada CulturalBrasil-Paraguai

    Caldo de cultura para integraonais. Mato Grosso do Sul levou a interveno potica de Ruberval

    Cunha e uma mostra de documentrios, exibindo filmes como Ca

    e Terra das guas, que retratam um pouco da cultura regional.

    Em 2010, na vez de Florianpolis sediar o evento, o Museu

    Histrico de Santa Catarina Palcio Cruz e Souza recebeu a pro-

    gramao. A msica sul-mato-grossense foi representada pela vio-

    la do cantor e compositor Aurlio Miranda e pela msica fronteiria

    de Ciriaco Benites. Na segunda edio da Mostra de Raiz foi mon-

    tado um estande de vendas de CDs e DVDs dos artistas do estado.

    A poesia ficou mais uma vez por conta de Ruberval Cunha. Do

    artesanato local, figurou a produo em palha de milho, de bana-

    neira e fibra de taboa, junto a doces em compotas e cristalizados

    de frutas tpicas, tecidos, crochs e bordados com motivos

    pantaneiros, modelagem em cermica e trabalhos em madeira, osso,

    bambu e cabaa, entre outros. (MV)

    A capital paraguaia foi o destino da expedio de artistas

    de MS em evento que contou com bom nmero de apreciadores.

    Catarinenses se deliciaram com o caldo de piranha pantaneiro e doces em

    compotas, alm de conhecerem o artesanato, a msica e a poesia de MS.

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  • 5CULTURA EM MS - 2010 - N.3 5CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    FOTO: ALEX REZENDE

    CComo dar o gostinho, Brasil afora e em um nico dia, da artesul-mato-grossense? Este foi o maior desafio da Fundao de Cultu-ra ao propor o Brasil Canta Mato Grosso do Sul. Para disseminar acultura regional, o projeto percorreu cinco estados do pas em no-

    vembro de 2010, levando um panorama da msica, das artes plsti-

    cas, do artesanato e da dana. O evento, com entrada franca, teve

    patrocnio do Ministrio da Cultura, por meio de emenda parlamentar

    da senadora Marisa Serrano, com contrapartida do governo estadual.

    Ao divulgar o potencial artstico do estado, buscamos fomentar a

    insero de MS nos grandes plos culturais do pas, destacou Amrico

    Calheiros, presidente da Fundao de Cultura de Mato Grosso do Sul.

    O carro-chefe do projeto a msica. Diferentes geraes de com-

    positores, instrumentistas e intrpretes se reuniram em um espetculo

    que transita pelos variados gneros fortes no estado, como a msica

    de raiz, a polca-rock, o chamam, a balada e a msica erudita. A ideia

    foi caracterizar a msica de Mato Grosso do Sul em sua diversidade e

    talento, em uma composio orgnica e integrada. Entre os cantores,

    Geraldo Espndola, Edineide Dias, Jerry Espndola, Gilson Espndola e

    Filho dos Livres (Guilherme Cruz e Guga Borba). Na banda de base,

    nomes admirados no cenrio local e nacional, como Alex Mesquita

    (baixo), Sandro Moreno (bateria), Marcos Assuno (guitarra, violo e

    viola), Adriano Magoo (teclados e sanfona) e Otvio Neto (teclados,

    samplers e violo). A esta turma, junta-se o quarteto de cordas e o

    maestro Eduardo Martinelli, com Ricardo dos Reis, Hbedes Vieira e

    Newton dos Reis, e as backing vocals Joelma Dias e Tatiane dos Reis.

    Msico e arranjador, Otvio Neto assumiu a direo musical e artstica

    do projeto. Para o repertrio, fiz uma pesquisa de inmeras

    composies feitas desde 1970, hoje tradicionais do estado. Ele tes-

    tou formato parecido no Planeta Msica MS, que foi apresentado no

    9 Festival de Inverno de Bonito, em 2008. Os artistas se revezam e

    tocam juntos as canes, com arranjos especiais.

    Como as saudades viajam tambm sobre todos os trilhos da ter-

    ra, as apresentaes atraram muitos sul-mato-grossenses fora de

    casa. Tambm sou baterista e decidi ir ao evento, a princpio, pra

    ver o Sandro Moreno tocar, admiro muito

    o trabalho dele. Chegando l, a

    qualidade do show me surpreendeu,

    conta Ravi Rauber, mestrando em cin-

    cia da computao na Universidade Fe-

    deral do Paran. Mas quem apostou na

    noite, sem conhecer nada da msica de

    MS, tambm se encantou. Ns ficamos maravilhados, no faza-

    mos ideia da qualidade!, comentou Michelle Lopes. Junto com o

    namorado e os pais, ela at ensaiou danar o chamam entre as

    poltronas do auditrio do Canal da Msica, em Curitiba. S conhe-

    camos algumas canes, como a Chalana e o Trem do Pantanal,

    mas que estavam diferentes do que a gente tinha ouvido.

    No Rio de Janeiro, os arranjos originais nas velhas canes no

    passaram batido ao olhar de um observador especial: o compositor e

    regente Joo Guilherme Ripper, que criou e coordenou em Campo

    Grande a Orquestra de Cmara do Pantanal, e agora dirige a Sala

    Ceclia Meirelles, o mais importante espao dedicado msica de

    concerto no Rio de Janeiro. O msico rasgou elogios. Gostei do

    formato, da seleo dos msicos, competentes e talentosos, grandes

    nomes na interpretao. Os arranjos foram de muito bom gosto,

    cuidado e capricho, de grande personalidade. Representou bem o

    leque aberto da rica msica de MS, mostrando como o estado talvez

    seja o maior celeiro da msica regional no pas.

    Entre as apresentaes musicais, performances de dana desem-

    penhadas por Franciella Cavalheri e Rose Mendona, integrantes do

    coletivo de dana contempornea Corpomancia e da companhia de

    hip-hop Danurbana. Nos foyers dos teatros, antes da apresentao

    musical, o visitante pde conferir as riquezas do artesanato regional,

    em suas bugras e onas de cermica, carros de boi e fazendas de

    madeira, alm de santos como o So Francisco Pantaneiro e Nossa

    Senhora do Pantanal. Foram expostas obras de Cludia Castelo, In-

    diana Marques, Mestre Elpdio, Famlia Alvareza, Denlson, Lorna,

    Cristina Orsi, Leslie, Ana Vitorino e Araqum. Nas artes plsticas,

    obras selecionadas do acervo permanente do Museu de Arte Con-

    tempornea (Marco) trouxeram telas, assemblages e painis de Ana

    Ruas, Buga, Cello Lima, Henrique Spengler, Humberto Espndola,

    Isaac de Oliveira, Jorapimo, Marise Anzoategui, Miska, Priscilla Paula

    Pessoa e Vnia Juc. Como na seleo dos msicos, artistas consa-

    grados exibiram seus trabalhos lado a lado s novas vozes das artes

    plsticas, para instigar este Brasil imenso a conhecer um pouco mais

    da diversidade de sua cultura.

    O Brasil Canta MS esteve em So Paulo, na Fundao Memorial da

    Amrica Latina (12 de novembro); no Rio de Janeiro, no Centro Cultu-

    ral Banco do Brasil (16), em Curitiba, no Canal da Msica RTVE (19);

    em So Jos, cidade metropolitana de Florianpolis, no Theatro Adolpho

    Mello (21) e em Porto Alegre, no Teatro Dante Barone, da Assembleia

    Legislativa do Rio Grande do Sul (24). (Moema Vilela)

    MS

    Juntas no palco, duas

    geraes da msica de

    MS cantando clssicos

    regionais: espetculo de

    qualidade para pblico

    exigente.

    BRASIL CANTA MS

  • 6 CULTURA EM MS - 2010 - N.36 CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    Em 2007, o Museu de Aquidauana, com a expectati-

    va de um novo fluxo de visitantes que em breve chega-

    riam com a reativao do Trem do Pantanal, passou por

    uma reformulao de acervo e espao que se fazia ne-

    cessria. Trs anos depois o museu ponto de visitao

    quase obrigatria, no s para os turistas que chegam

    pela linha frrea que voltou a funcionar em maio de 2009,

    mas para qualquer viajante que queira conhecer um pou-

    co da histria da cidade.

    Hoje denominado Museu de Arte Pantaneira Manoel

    Antnio Paes de Barros, em homenagem a um dos fun-

    dadores de Aquidauana, o local conta com espao para

    mostra do acervo de trabalho da Noroeste do Brasil, as salas do Homem Pantaneiro e das

    Comunicaes, uma ala dedicada aos povos indgenas e galerias separadas para exposio

    de obras de artistas locais e regionais.

    Na Sala das Comunicaes est exposto o primeiro disco gravado em Aquidauana. A produ-

    o dos anos 1960 e foi feita no Clube Feminino pelo grupo Os Brincalhes, formado por Nico,

    Pepeta, Brs, Rubo e Luizinho. No mesmo espao encontra-se tambm um rolo com o primeiro

    filme gravado no distrito de Piraputanga, Caadores de diamante, bem como um conjunto de

    48 curtas-metragens que at pouco tempo eram inteiramente desconhecidos, no constando,

    inclusive, da base de dados Filmografia Brasileira. Registrados originalmente em pelcula de 16

    milmetros por Dcio Corra de Oliveira fundador do Cine Glria entre os anos de 1949 e

    1970, esto agora recuperados por meio de parceria entre a Petrobras e a Cinemateca Brasileira.

    H tambm homenagens a Eldio Teles, fundador da Rdio Difusora, e a Rubens Alves

    Correa, ator e diretor de teatro aquidauanense que em 1963 recebeu o Prmio Molire de

    melhor ator por sua atuao na pea A escada, de Jorge Andrade.

    Rita Natlia, historiadora da Fundao de Cultura de Mato Grosso do Sul, coordenou a

    readequao dos espaos expogrficos, valorizando um patrimnio importante para a

    histria da cidade e do estado. Muitas peas estavam l h anos sem nenhuma informa-

    o de sua origem, explica Caciano Lima, coordenador do projeto que cuidou da docu-

    mentao museolgica, da ca-

    talogao de peas, dos inven-

    trios e dos termos de doao

    do acervo.

    Sediado em um belo edifcio

    que remete o visitante histria

    de Aquidauana, o Museu de

    Arte Pantaneira, vinculado Fun-

    dao Municipal de Cultura, est

    localizado na rua Cndido

    Mariano, 472, na rea central da

    cidade. (Mrcio Breda)

    Acervoredescoberto

    Em 25 de setembro passado, Mato Grosso do Sul despediu-se de um arteso de significativo trabalho no desenvol-

    vimento da artesania local. Jlio Csar Nunes Rondo, nascido em Guia Lopes da Laguna conhecido por sua produo

    de onas pintadas , faleceu aos 55 anos, deixando um legado que todos os sul-mato-grossenses iro guardar na

    memria, tendo contribudo com suas prprias mos para o fortalecimento da identidade cultural do estado.

    Autodidata, comeou a modelar com massinha escolar quando criana. J crescido, mesmo se dedicando a outros

    ofcios para sobreviver, sempre procurou conciliar o tempo disponvel com a atividade manual. A partir de 1989, resolveu

    dedicar-se exclusivamente ao artesanato, poca em que passou a produzir bichos do Pantanal, como jacars, capivaras e

    onas pintadas. Transformou a vocao em renda quando passou a comercializar seus produtos na Casa do Arteso de

    Campo Grande. A partir de 1990, foi se destacando e participou de eventos em outros estados, abrindo novos mercados.

    A ona pintada de Rondo, em argila, madeira e concreto, uma pea de referncia do artesanato sul-mato-

    grossense. A esposa, Joana Avalhaes, e seus cinco filhos ministram oficinas promovidas pela Gerncia de Atividades

    Artesanais da Fundao de Cultura de Mato Grosso do Sul, ensinando a tcnica aos interessados. A qualquer pessoa

    que se interessava pelo trabalho, ele repassava seu conhecimento. Vamos dar continuidade a seu legado como uma

    forma de homenagear sua experincia. Apesar das dificuldades pelas quais passava para produzir depois de sofrer

    um derrame em 2002, ele nunca deixou de dedicar-se ao artesanato sul-mato-grossense, diz a companheira.

    As ltimas peas produzidas pelo arteso podem ser encontradas na Casa do Arteso de Campo Grande, que fica

    na rua Calgeras, 2050, centro. Informaes pelo telefone (67) 3383-2633. (Gisele Colombo)

    JLIO CSAR NUNES RONDOO arteso das onas pintadas

    Aps reformulao, museu est recebendo

    considervel fluxo de turistas que chegam com

    o Trem do Pantanal. No acervo, peas e objetos

    antigos contam a histria da cidade.

    Rondo soube

    transformar vocao

    em renda por meio

    do artesanato e

    tornou-se referncia.

    FO

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    DANIEL REINO

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    MLIA

  • 7CULTURA EM MS - 2010 - N.3 7CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    Em Corumb, o vendedor exibe a fieira, fres-

    quinha, na esquina mesmo: peixes de couro es-

    querda, pescada direita. O ano de 1974 se mos-

    tra na moda das estampas, sandlias e calas boca-

    de-sino.

    Fotografias como esta, que registram cenas e

    momentos histricos das dcadas de 1970 e 1980

    em Mato Grosso do Sul, compem a exposio

    itinerante Cultura & Sociedade em MS. Projeto

    do Arquivo Pblico Estadual, j percorreu os mu-

    nicpios de Aquidauana, Aparecida do Taboado,

    Caarap, Campo Grande, Corguinho, Costa Rica,

    Dois Irmos do Buriti, Maracaju, Navira, Nioaque,

    Ponta Por, Ribas do Rio Pardo, Rio Brilhante,

    Terenos e Trs Lagoas.

    A proposta sensibilizar por meio da arte

    fotogrfica, contribuindo para o processo de

    ensino e aprendizagem da formao social e

    cultural de Mato Grosso do Sul, explica Caciano

    Lima, especialista em museologia. Com a fora

    que tem a imagem na sociedade contempor-

    nea, a fotografia pode ser boa fonte de inspirao

    para que o observador estabelea relaes e forme

    uma percepo mais completa e apurada sobre

    esse momento na histria do estado. Havia o

    sonho de tornar MS um paradigma nacional. A

    industrializao e a mecanizao das atividades

    agropecurias, a formao de pequenas cidades,

    o conflito entre modernidade e tradio, tudo

    isso transparece no conjunto de fotografias ex-

    postas, completa.

    A maior parte das obras de autoria de Roberto

    Higa, profissional campo-grandense com mais de

    40 anos dedicados fotografia. Outras foram ce-

    didas pelos acervos de Caarap, Corumb, Ponta

    Por e pela LuzAzul Produes.

    Junto com a exposio, o projeto Arquivo

    Itinerante realiza oficinas de gesto de documen-

    tos e assessora os arquivos municipais. Para capa-

    citar os gestores, o Arquivo Pblico Estadual ofe-

    rece os cursos de Introduo a Arquivologia e No-

    es Bsicas de Preservao e Conservao de Do-

    cumentos e Livros, entre outros ainda em

    elaborao. (MV)

    Ainda na barriga, a me acalma o beb s com a melodia da

    sua voz. Quem trabalha com musicalizao infantil sabe como

    essa sabedoria popular s uma das evidncias do poder da

    msica sobre as crianas para estimular seu desenvolvimento,

    percepo, coordenao motora e sociabilidade. Alm de ques-

    tes especficas de msica, durante as aulas trabalhada a ques-

    to psicossocial da criana e o fortalecimento do vnculo entre

    pais e filhos, conta a cantora Melissa Azevedo.

    Desde 2001, Melissa trabalha com musicalizao infantil, en-

    cantada com a disponibilidade, a facilidade e a aptido que toda

    criana tem para realizar msica. Hoje mantm no Centro Cultu-

    ral Jos Octvio Guizzo, em Campo Grande, a Oficina de

    Musicalizao para Bebs, com turmas que abrangem a faixa

    etria de oito meses a cinco anos.

    Nas aulas, a criana recebida em sala com uma msica de

    boas-vindas, cantada em roda e sempre com acompanhamento de teclado. Em se-

    guida, cantam-se e tocam-se sequncias de canes, com o objetivo de estimular a

    percepo rtmica e auditiva e a diferenciao de altura, durao, intensidade e tim-

    bre. So escolhidas canes folclricas e composies contemporneas de diversos

    educadores musicais que despertem na criana vontade de ouvir, reproduzir e

    criar, conta Melissa. Como estmulos para a criao, sugerem-se a produo de

    gestos faciais e percusso corporal e a reproduo de sons emitidos pelos animais, bem

    como danas e brincadeiras cantadas que possam desenvolver a psicomotricidade.

    Me de Davi e Eva, Melissa cantarolou para os filhotes, desde a barriga, can-

    tigas brasileiras e msicas eruditas infantis. Observei cedo neles uma sensibilida-

    de para questes musicais, como afinao e preciso rtmica, o que pode gerar

    controvrsias se tal sensibilidade se d devido gentica ou estimulao preco-

    ce ao procedimento musical. A criana reflexo do que os pais so e, musical-

    mente falando, do

    que eles ouvem. Por-

    tanto, oriento-os

    sempre a pesquisar

    sobre o que vo ofe-

    recer e a abrir mo

    de qualquer tipo de

    msica adulta. Exis-

    te um universo mui-

    to bom de msi-

    cas infantis, basta

    pesquisar com quem

    trabalha com o as-

    sunto. (MV)

    vivo

    Musicalizao para bebs

    DA

    NIE

    L R

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    Arquivo

    CANTORASClssicos da msica popular brasileira ganham um caldo diferente quando

    elas interpretam. So 35 meninas, entre 10 e 14 anos, que emprestam suas vozes

    para compor arranjos em escalas variadas. De Mercedita a Negro gato.

    necessrio ouvir!

    Criado pela Fundao Municipal de Cultura (Fundac) de Campo Grande em

    parceria com a Universidade Catlica Dom Bosco (UCDB) com a ideia de

    rearranjar clssicos da msica brasileira e de Mato Grosso do Sul, o Coral das

    Meninas Cantoras comeou a dar frutos neste ano. Inscries foram abertas a

    toda a comunidade, com a nica exigncia de que as participantes tivessem

    at 14 anos.

    Nos ensaios, atividades especficas para coro infantil e juvenil como aqueci-

    mento corporal e vocal, exerccios de respirao e sensibilizao musical, alm de

    formao do repertrio musical. Nas apresentaes, uma vontade enorme de sol-

    tar a voz especialmente em msicas regionais, que ganham arranjo jovial com a

    entonao das meninas.

    A primeira apresentao, em julho de 2010, encantou a plateia. O grupo, que

    at ento no possua nenhuma experincia musical, apresentou sem erros as

    composies ensaiadas. Agora o objetivo cumprir uma agenda de apresentaes

    e arrebanhar apreciadores da arte. (MB)

    Meninas

  • 8 CULTURA EM MS - 2010 - N.38 CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    Patronos

    1 - JOO SEVERIANO DA FONSECA

    2 - PAULO COELHO MACHADO

    3 - EDUARDO OLMPIO MACHADO

    4 - ALEIXO GARCIA

    5 - EMLIO SCHNOOR

    6 - MANUEL DA COSTA LIMA

    7 - ERNESTO GEISEL

    8 - NEWTON CAVALCANTI

    9 - JOO BATISTA DE SOUSA

    10 - MIGUEL PALERMO

    11 - TEMSTOCLES PAES DE SOUSA BRASIL

    12 - LUS ALBUQ. DE MELO P. E CCERES

    13 - JANGO MASCARENHAS

    14 - JOS DE MELO E SILVA

    15 - FREI MARIANO DE BAGNAIA

    16 - DEMSTENES MARTINS

    17 - HRCULES FLORENCE

    18 - JOS BARBOSA RODRIGUES

    19 - VESPASIANO MARTINS

    20 - VISCONDE DE TAUNAY

    21 - JOS GARCIA LEAL

    22 - HLIO SEREJO

    23 - ANTNIO JOO RIBEIRO

    24 - JOO DE BARROS CASSAL

    25 - GUIA LOPES DA LAGUNA

    26 - JOS ANTNIO PEREIRA

    27 - FERNANDO CORREIA DA COSTA

    28 - LUS ALEXANDRE DE OLIVEIRA

    29 - PEDRO CHAVES DOS SANTOS

    30 - PADRE JOO CRIPPA

    31 - ACYR VAZ GUIMARES

    32 - NGELO JAYME VENTURELLI

    33 - ROSRIO CONGRO

    34 - GUIDO BOGGIANI

    35 - JNIO QUADROS

    36 - D. ANTNIO BARBOSA

    37 - HARRY AMORIM COSTA

    38 - JOS OCTVIO GUIZZO

    39 - RICARDO FRANCO

    40 - SENHORINHA BARBOSA

    Tradio, em sua origem latina tradere, sugere transmisso. De

    conhecimentos, costumes e valores dos ancestrais que esclarecem o

    presente dos vivos e garantem a continuidade de uma sabedoria do

    passado. Em Mato Grosso do Sul, uma instituio trabalha justamen-

    te com essa misso: o Instituto Histrico e Geogrfico (IHG-MS).

    Fundado na poca da criao do estado, em 3 de maro de 1978,

    ele realiza, incentiva e divulga estudos histricos, geogrficos, artsti-

    cos, estticos, ambientais, tursticos e institucionais sobre Mato Grosso

    do Sul. Entre seus quarenta integrantes, figuram importantes nomes da

    poltica, das artes, das letras, da magistratura e do magistrio sul-mato-

    grossense. De profisses e origens distintas, os pesquisadores do Insti-

    tuto se unem no objetivo de contribuir na construo, preservao e

    difuso da cultura sul-mato-grossense.

    Uma das principais frentes de trabalho o resgate e a edio de

    documentos e obras de valor histrico. Entre as publicaes de des-

    taque esto as Obras Completas de Hlio Serejo (nove volumes), a

    srie Memria sul-mato-grossense (j com nove volumes) e Pelas

    Ruas de Campo Grande, do memorialista Paulo Coelho Machado

    que tambm fundou o Instituto. Se o assunto Mato Grosso e Mato

    Grosso do Sul, o IHG-MS se interessa. Um exemplo importante foi o

    trabalho realizado com o romance Inocncia, escrito por Visconde

    de Taunay e publicado em 1872 no Rio de Janeiro. Como os cen-

    rios naturais e alguns personagens so inspirados na regio que hoje

    Paranaba, o professor Hildebrando Campestrini refez o roteiro de

    Taunay pelo Bolso sul-mato-grossense e lanou uma obra que foi

    considerada a mais rica sobre o assunto, como destacou Francisco

    Leal de Queiroz, ex-presidente da Academia Sul-mato-grossense de

    Letras. Na edio, o leitor encontra informaes sobre em quem se

    inspirou o autor para criar cada personagem e a localizao dos

    ambientes, com fotos, mapas e ilustraes.

    Como Inocncia, livros importantes da historiografia local ti-

    nham sido divulgados apenas fora do estado, como Cana do Oes-

    te e Fronteiras Guaranis, de Jos de Melo e Silva, at a iniciativa

    Titulares

    VALMIR BATISTA CORREA

    IDARA NEGREIROS D. RODRIGUES

    VERA TYLDE CASTRO PINTO

    JOS COUTO VIEIRA PONTES

    CELSO HIGA

    VAGA

    VERA MARIA MACHADO PEREIRA

    ALISOLETE DOS SANTOS WEINGARTNER

    PAULO CEZAR VARGAS FREIRE

    WALTER CORTEZ

    CLEONICE BOULEGAT

    PAULO MARCOS ESSELIN

    REGINA MAURA LOPES COUTO

    YARA BRUM PENTEADO

    FREI ALFREDO SGANZERLA

    JOO PEREIRA DA ROSA

    HILDEBRANDO CAMPESTRINI

    LEDIR MARQUES PEDROSA

    MARCELO DE MOURA BLUMA

    RENATO RIBEIRO

    FRANCISCO LEAL DE QUEIROZ

    PAULO EDUARDO CABRAL

    MOYSS AMARAL

    ERON BRUM

    MAURA CATHARINA GABNIO E SOUZA

    EDSON CARLOS CONTAR

    ANTNIO LEMOS DE FREITAS

    JOO CAMPOS

    PEDRO CHAVES DOS SANTOS FILHO

    ARNALDO RODRIGUES MENECOZI

    JOS CORREA BARBOSA

    NGELA ANTONIETA ATHAN. LAURINO

    EURPEDES BARSANULFO PEREIRA

    VAGA

    CARLOS EDUARDO CONTAR

    FRANCISCO JOS MINEIRO JUNIOR

    HEITOR RODRIGUES FREIRE

    NGELO MARCOS V. DE ARRUDA

    LCIA SALSA CORRA

    WILSON BARBOSA MARTINS

    do Instituto de public-los e discuti-los em MS. Essas duas, como

    outras obras, foram digitalizadas e esto disponveis na biblioteca

    eletrnica do IHG-MS, no site http://www.ihgms.com.br.

    Outra iniciativa que aproveita as novas tecnologias a construo

    da Enciclopdia das guas e da Enciclopdia Virtual de Mato Grosso

    do Sul. Esta ltima tem como pblico-alvo o estudante mdio e uni-

    versitrio. Seu contedo abranger histria, geografia, artes, turismo e

    meio ambiente. O programa j est instalado e um conjunto de apro-

    ximadamente mil verbetes est pronto para ser inserido, com partici-

    pao voluntria e gratuita de associados e colaboradores.

    Alm da informatizao do seu acervo, os principais desafios que

    o IHG-MS enfrenta hoje so consolidar a credibilidade, dar institui-

    o organizao empresarial e concluir seus principais projetos:

    Memorial de Inocncia, Enciclopdia das guas e o Centro Histrico-

    Geogrfico de Mato Grosso do Sul, conta o professor Hildebrando

    Campestrini, que est na presidncia desde 2000.

    Com o lema testis temporum testemunha dos tempos a

    instituio tambm promove congressos, simpsios, seminrios, con-

    ferncias e palestras ligados s finalidades do Instituto. Para quem

    quiser conhecer melhor a agenda ou consultar o acervo da Instituio,

    a sede fica na avenida Calgeras, 3.000, e atende ao pblico no hor-

    rio comercial. (MV)

    IHG-MS . Cadeiras

    TradioInstituto Histrico e Geogrfico de MS

    presenteFA

    BIO

    PE

    LLE

    GR

    IN

    I

    Uma grande regio de Mato Grosso do Sul com potencial turstico e

    elevado valor geolgico e cultural deve receber em breve a chancela da

    Organizao das Naes Unidas para Educao, Cincia e Cultura (Unesco)

    para a criao do segundo geoparque brasileiro, o Bodoquena-Panta-

    nal. Uma minuta do projeto que j reconhecido por meio de decreto

    do governo estadual foi traduzida para o ingls e enviada no ms de

    outubro para avaliao e chancela.

    Mas afinal, o que um geoparque? Segundo Neusa Arashiro,

    gerente de Patrimnio Histrico e Cultural da Fundao de Cultura de

    Mato Grosso do Sul, trata-se de uma rea protegida, tanto em mbito

    federal quanto estadual, que contenha riquezas geolgicas e

    paleontolgicas de importncia cientfica, raridade e beleza, represen-

    Chancela da Unesco tando uma regio e sua histria geolgica eventos e processos.Geoparque engloba ainda conceitos de proteo, educao e desen-volvimento sustentvel.

    Para aprovar o Geoparque Bodoquena-Pantanal, a Unesco levar

    em conta o valor cientfico de rochas e fsseis, a contribuio para o

    desenvolvimento socioeconmico da regio e a possibilidade de con-

    tribuir para a formao de alunos nas geocincias.

    Segundo Margareth Ribas, superintendente do Instituto do

    Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (Iphan) em MS, o decreto do

    governo estadual e a busca da chancela oficial da Unesco para o

    Geoparque Bodoquena-Pantanal mostram o interesse na preservao

    de reas de riquezas geolgicas e podem estimular novos projetos. Man-

    tendo as discusses, podemos criar outros geoparques onde tambm

    h muita riqueza geolgica. Essa iniciativa valoriza e faz incrementar as

    polticas para geoparques em Mato Grosso do Sul. (MB)

  • 9CULTURA EM MS - 2010 - N.3 9CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    Meu pai marceneiro, arte-

    so e msico, e tem um esprito

    cigano. Sempre mudou de cida-

    de pelo menos a cada dois anos.

    Eu nasci em Amambai, e aos 15

    anos, morando em Rochedo, j

    era louco para ir a Campo Gran-

    de fazer teatro. No primeiro cur-

    so descobri que era aquilo que

    eu queria para toda a vida. Aos

    17 fui para o Rio de Janeiro cur-

    sar artes cnicas na Casa

    das Artes de Laranjeiras (CAL).

    Paralelamente, fiz Escola Nacio-

    nal de Circo (ENC) e comecei o

    bal para incrementar o corpo

    do ator. Ento comecei a traba-

    lhar nestas trs reas.

    Entrei no Ballet Stagium em

    2000 e tive que parar com o circo e com o teatro. Permaneci na escola por dois anos. Dali,

    participei do grupo XPTO, em So Paulo, que une as linguagens da dana, do teatro e do

    circo. Depois voltei ao Rio para entrar na companhia da Deborah Colker, que mistura circo e

    dana acrobtica em suas apresentaes. Na mesma poca, na Fundao Progresso, tam-

    bm fiz cursos de especializao em areos, de que gosto muito. Tudo que pra cima me

    agrada, a minha modalidade.

    Com algumas ideias e certa bagagem na rea circense, tendo passado pelos circos

    Marcos Frota (1999), Orlando Orfei (2003) e Beto Carreiro (2005), voltei a Campo Grande

    para fundar a Circo Escola Pantanal, em 2008. Comeamos com alguns projetos sociais,

    como o Circo Escola Especial, na Pestalozzi. Tambm trabalhamos o circo como uma opo

    de atividade fsica. Temos uma clientela bastante ecltica, de 18 a 65 anos. J o grupo de

    apresentao do Circo Escola Pantanal composto por mim, Luiz Claudio Chueda, Nelson

    Feitosa, Ademar Alvarenga e Natlia Alvarenga, com Ana Claudia Pinheiro na produo.

    Agora estou estruturando para oferecer cursos de artes cnicas para alunos da rede

    pblica e municipal de ensino, em 2011. Meu objetivo formar profissionais durante

    quatro anos, em atividades dirias de meio perodo.

    ULISSES NOGUEIRA

    circense, ator, bailarino e diretor da Circo Escola Pantanal

    A vontade de escrever brotou em mim mui-

    to precocemente. Aos 10 anos, ganhei um

    concurso de redao falando sobre Santos

    Dumont. Minha professora errou: Vai ser jor-

    nalista ou escritor! Acabei engenheiro e ad-

    vogado. Antes disso, aos 12 anos (no sei bem

    como), tudo comeou em um parque de diver-

    ses da ento avenida Marechal Deodoro de

    Campo Grande, hoje um trecho da Afonso Pena

    na regio do bairro Amamba, onde, atenden-

    do a pedidos dos recrutas e dos amigos do

    colgio General Malan, eu redigia recados apai-

    xonados destinados s donzelas, lidos na

    voz melosa do locutor do servio de alto-fa-

    lantes. As audaciosas promessas de muito

    amor e admirao jovem de trana usando

    vestido azul e casaco vermelho pagavam mi-

    nha paoca, meu guaran e minha pipoca.

    Na mocidade, o futebol quase no me dei-

    xou escrever. Limitava-me a mandar bilhetinhos

    com sonetos de Bilac, Varela e Almeida para mi-

    nhas paqueras. Nas universidades catlicas que

    frequentei, iludido com a enganosa mar ver-

    melha dos campi, dedicava minhas eloquentes

    estrofes pseudomarxistas para Fidel, MST,

    Guevara, Sendero Luminoso. Ca na real.

    Desengavetei meus contos. Meus livros mais an-

    tigos, As Bruxas de Campo Grande e O mist-

    rio do Festival de Bonito, contam estrias do

    Pantanal e da minha Cidade Morena, sempre

    misturando fico realidade. O recm-publica-

    do O lobisomem do trem do Pantanal, tam-

    bm. Outro atual, Como esquecer um grande

    amor?, dedicado a um pblico mais jovem, aler-

    ta para os prs e contras de uma relao amoro-

    sa entre pessoas de geraes diferentes.

    Em tempo: para quem visita Campo Grande,

    gosta de uma boa estria contada ou encenada

    e de msica em geral tudo ao ar livre , reco-

    mendo que d uma esticada at o Memorial da

    Cultura, no centro da cidade, sempre na ltima

    sexta-feira de cada ms. V se deleitar com o

    Espao da Poesia. Coisas boas acontecem por l.

    Vale mesmo a pena.

    JAIR BUCHARA

    advogado, engenheiro e escritor

    Eu estava trabalhando numa produtora, a Umas e

    Outras Produes, e comecei a me interessar por cine-

    ma. Para o trabalho de concluso de curso, queria

    escrever um livro e acabei juntando cinema e literatu-

    ra. Publiquei Salas de sonhos histria dos cinemas

    de Campo Grande, junto com Neide Fischer. A partir

    da as portas comearam a se abrir. medida que

    trabalhos de produo surgiam, vislumbrei que Sa-

    las de sonhos era um dos primeiros livros sobre cine-

    ma no estado e o interesse pelo tema cresceu. Em

    agosto de 2010, foi publicada a continuao dele,

    mapeando a histria das salas de cinema em cerca de

    40 cidades sul-mato-grossenses. Viajar pelo estado

    encontrando pessoas que abriram suas caixas de recordaes foi uma das coisas mais

    incrveis que me aconteceram. Para elas, foi muito nostlgico falar desses espaos onde

    viveram diversas experincias, onde puderam viajar pelo mundo por meio da stima arte.

    Agora, a cada nova aventura ou vivncia visualizo um filme, de curta ou longa-metragem.

    Fui selecionada para a Escola Internacional de Cinema e Televiso de San Antonio de los

    Baos, em Cuba. Em 2012, quando terminar o curso, quero voltar com um projeto de

    documentrio nas mos, para desenvolver em MS. preciso mais maturidade dos investido-

    res em cinema para reconhecer o potencial cinematogrfico que MS tem e a possibilidade

    de crescimento no setor.

    MARINETE PINHEIRO jornalista e estudante de cinema

    Eu nasci no Par, mas ainda criana vim para Trs Lagoas, morar com um senhor que transportava as

    tropas, e foi ele quem me ensinou a tocar o berrante. Durante cinco anos acompanhei as comitivas. Fiquei

    apaixonado! O berrante no serve s para tocar a boiada, tambm o jeito pelo qual o tropeiro se

    comunica. Dependendo de como a gente sopra, tem um significado diferente. Pode ser um toque para

    despertar o grupo, mudar de posio, parar para o almoo e at para demonstrar respeito como quando

    se passa na frente de uma igreja ou de um lugar onde um companheiro morreu. Em 1992, comecei a

    participar de concursos de berrante. No comeo s pela cidade mesmo, mas depois no Brasil inteiro. Em

    Barretos, a capital do rodeio, fiquei em segundo lugar em 2006, tocando Ave Maria no berrante, e em

    2009 consegui ser campeo. O berrante meu trabalho. J tenho at CD gravado. Hoje estou trabalhan-

    do num DVD que vai acompanhar a rotina de uma comitiva de gado. Eu acho que muito importante

    registrar essas imagens, porque aquilo fazia parte da nossa vida, n? O estado dependia muito da

    pecuria e a comitiva era fundamental para o transporte do boi. Hoje isso est mudando e ningum mais

    se lembra do trabalho dos tropeiros. A gente tem que manter essa histria viva na mente das pessoas no

    nosso Mato Grosso do Sul. , eu no nasci aqui, mas eu chamo de nosso. J sou sul-mato-grossense.

    NEGUINHO BERRANTEIRO

    (Edvaldo Castro Guimares) tocador de berrante

    o que sou, o que me contm

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  • 1 0 CULTURA EM MS - 2010 - N.31 0 CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    EV

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    Com formao em Engenharia Eltrica e em Cincias Econmicas,

    tenho, em paralelo s atividades profissionais, a mania de pesquisar. O

    hobby envolve assuntos ligados Estrada de Ferro Noroeste do Brasil

    (NOB), compositores dos anos 1930-60 da Msica Popular Brasileira,

    gibis, cinemas, as turmas de meninos de Campo Grande nas dcadas de

    1960 e 1970, figuras do cotidiano que se tornaram populares na Cida-

    de Morena e a imigrao japonesa, entre outros. O prazer de resgatar

    momentos to significativos e de pesquisar assuntos ligados cidade

    natal, pela qual sou apaixonado, encontra eco no vis nostlgico da

    comunidade. No se pode deixar que esses sentimentos se percam,

    preciso registr-los! De certa forma, a nostalgia traz o passado que

    perdemos...

    Minhas infncia e adolescncia foram vividas em outro ritmo de

    vida. Se antes tudo era mais calmo, a fase de transformao econmica

    global dos anos 1960 e 1970, o desenvolvimento dos grandes centros

    urbanos e o seu reflexo no interior do pas alteraram os valores e os

    costumes predominantes. Era uma poca em que o fornecimento de

    energia eltrica na regio sul do ento Mato Grosso era precrio, e as

    lmpadas da iluminao pblica mais pareciam um tomatinho de to

    fraca que era a luminosidade. No existiam as grandes redes de super-

    mercados e o abastecimento para a populao era feito por armazns,

    quitandas, bolichos, aougues e a feira central. A catao da fruta nati-

    va guavira nos campos e arredores era uma festana para a petizada.

    Tenho muitas saudades desses ricos momentos infantis, quando as

    prprias crianas elaboravam seus brinquedos quando os pais no ti-

    nham condies de comprar.

    Lembranas visuais e auditivas foram marcantes para a minha for-

    mao pessoal de livre pesquisador. A primeira pesquisa que tomou

    certo tempo para concluso e publicao foi a da passagem do compo-

    sitor Cartola por Campo Grande, em 1962, que foi homenageada pela

    msica Cidade Morena at hoje desconhecida pela maioria dos

    campo-grandenses. Entre as ltimas pesquisas em realizao est a

    investigao, nos cartrios de Corumb, Miranda, e Aquidauana, dos

    registros de bitos de japoneses que trabalharam na construo da

    Estrada de Ferro no perodo de 1908 a 1914, verificando o quantitativo

    e a saga desses imigrantes. Tambm iniciei um levantamento sobre os

    costumes das serenatas que os rapazes faziam para suas amadas.

    CELSO HIGA engenheiro e pesquisador

    Nasci em Campo Grande em 1958, mas desenvolvi minha formao acadmica e pro-

    fissional no Rio de Janeiro. Meu pai militar e foi transferido para l nos anos 1960, para

    fazer um curso de paraquedismo. O curso tinha durao de um ou dois anos, mas ele

    acabou ficando trinta. Fiz escola de Belas Artes e comecei a ter contato com a dana, no

    grupo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Essa participao me levou at a

    escola de ballet do Teatro Municipal do Rio de Janeiro e acabei me transformando em um

    profissional de dana.

    Vivi 25 anos de ballet. Um momento que marcou minha carreira foi quando dancei o

    Bolero de Ravel com o ballet de Stuttgart, em 1979, no Maracanzinho, para mais de

    trs mil pessoas. No dormi naquela noite. O espetculo terminava com Mrcia Hayde

    danando sobre uma mesa, e eu era um dos bailarinos que pulavam, ajoelhavam na mesa

    e caam aos ps dela.

    Trabalhar com Sergio Britto no final da dcada de 1980 na pera Carmen, de Bizet,

    tambm foi uma experincia muito rica. Imagine uma montagem que tem 150 pessoas

    em cena e Sergio Brito chamando todos pelo nome. Robson, voc entrou atrasado!

    Claudia, aqui pra direita! Renato, no a sua vez! Nos ensaios, quando Srgio contava

    a histria de Carmem, qualquer pessoa que estivesse ao lado jurava que a histria era

    verdica, que ela teria existido. O grande barato de tudo foi ter convivido com pessoas

    que somaram muito na minha vida, no s como artista, mas como ser humano.

    No clube Estoril atualmente exero a funo de diretor cultural, dirigindo o Grupo de

    Tradies Portuguesas.

    ROBSON SIMES DE ALMEIDA

    diretor cultural do Clube Estoril e bailarino

    Passei a primeira infncia na fazenda, no sudoeste da Bahia. Pelo

    rdio ouvamos de Luiz Gonzaga a Waldick Soriano. Meus pais faziam

    serenatas em dueto: seu Jaime pensando que era Nelson Gonalves,

    enquanto dona Santinha se via Inhana, a parceira do Cascatinha. E

    como danvamos nos forrs da Piabanha, luz do fif!

    Em frente de casa, em Montanha, moravam cinco meninas cujos

    nomes terminavam com ilca. A mais velha, Milca, nos chamava para

    brincar de drama. Tendo um lenol por cortina, improvisvamos

    algo que s muitos anos depois descobri que se chamava teatro.

    Na casa de Vitria da Conquista, aos 11 anos admirava o tio

    Britto reproduzindo quero-queros em vidro transparente. Usava

    nanquim, guache e, para dar um ar de obra nova s reprodues,

    mudava a cor do fundo. Na feira, via o trabalho de ceramistas anni-

    mos e o olhar cego dos violeiros repentistas. Adolescente, em

    Linhares arrisquei meus primeiros versos.

    Quando cursava Biologia, em Vitria (ES), o prato mais aguarda-

    do no restaurante universitrio era o grupo regional Chores da

    UFES, formado por jovens cinquentenrios. O cineclube e as cantorias

    no Centro Acadmico eram a sobremesa. Nesse caldeiro cultural,

    cantei no coral e participei de oficinas de literatura. De fato, a arte

    o alimento da alma!

    Mas a poesia, para mim, foi tambm o po verdadeiro, pois me

    ajudou a cursar a universidade. Naqueles tempos de mquina

    datilogrfica e mimegrafo, ser operrio da palavra no era fora de

    expresso: frequentemente imprimamos os livros artesanalmente. J a

    fotografia entrou na minha vida casualmente: em 1992, j residindo

    em Campo Grande e dando aulas na Universidade Federal de MS, pre-

    cisei registrar a reproduo do acar-bobo em aqurio num trabalho de

    concluso de curso de uma aluna de Biologia. A tcnica veio pelo m-

    todo da tentativa e erro e pelas dicas do sr. Maurcio Tibana e de seu

    filho Ricardo, do Higa e do saudoso Didi, no ento mais importante

    ponto de encontro de fotgrafos da cidade: Foto Universo.

    Sei o quanto as vrias formas de expresso artstica que vivenciei

    ajudaram na minha atuao tcnico-cientfica e na docncia. Por

    isso falo aos meus trs filhos: Sigam a profisso que quiserem, mas

    vocs tm sete artes disposio para que se expressem e no fi-

    quem bitolados. Escolham pelo menos uma!

    PAULO ROBSON DE SOUZA

    educador ambiental, poeta e fotgrafo

    GE

    RA

    LD

    O D

    AM

    AS

    CE

    NO

    JR

    .

  • 1 1CULTURA EM MS - 2010 - N.3 1 1CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    Histria em construo

    ENTREVISTA

    MARISA BITTAR

    Mato Grosso do Sul

    Como comeou seu interesse pela histria de Mato Grosso do Sul?

    Eu me interessei primeiro pela poltica. Depois comecei a estudar a educao

    pblica do estado e aprofundei meu interesse no doutorado, pesquisando a gnese

    de Mato Grosso do Sul, trabalhando com um tema indito, que gerou outros

    estudos e me realizou muito, pois tudo que eu no queria era abordar um assunto

    da moda ou que j fosse muito pesquisado.

    Que motivaes deram origem causa divisionista e o que a alimen-

    tou por quase um sculo?

    A motivao inicial foi a dificuldade de comunicao. Mato Grosso uno tinha

    uma configurao alongada no sentido norte-sul, com as duas regies isoladas

    uma da outra. Essa geografia fez do regionalismo um elemento intrnseco forma-

    o histrica de Mato Grosso do Sul, estava na base da sua concepo, mas ainda

    no era divisionismo. O divisionismo foi o recrudescimento do regionalismo e

    nasceu nas primeiras dcadas do sculo XX, em funo dos interesses dos grandes

    TRINTA ANOS DEPOIS, COMPREENDER AS VERDADEIRAS RAZES DA CRIAO DO ESTADO

    CONTINUA UM DESAFIO PARA A DEFINIO DE UM PROJETO COLETIVO DE LONGO PRAZO.

    1977. O regime militar impunha ao Brasil sua

    lgica de progresso, desenvolvimentismo e segu-

    rana nacional. Nesse contexto deu-se a diviso de

    Mato Grosso. Na poca, a jovem Marisa Bittar con-

    clua o curso de Histria em Campo Grande e logo

    comearia sua carreira docente. Crtica e engajada

    na luta pelo restabelecimento das liberdades demo-

    crticas e nos ideais de transformao poltica e so-

    cial, a pesquisadora elegeu como temas de sua car-

    reira acadmica a ditadura militar, a geopoltica, o

    regionalismo e o poder poltico. Em 2009, trinta

    anos depois da instalao de Mato Grosso do Sul,

    seu amor pela histria e pela terra onde ela e seus

    familiares, paulistas de Franca, recomearam a vida

    resultou em uma abrangente pesquisa da

    historiografia regional. A obra Mato Grosso do Sul:

    a construo de um estado, de sua autoria, investi-

    ga as causas da diviso e as trs primeiras dcadas

    de existncia de MS.

    Publicado em dois volumes, com mais de 900

    pginas, o livro comeou a ser pensado em 1992,

    quando Marisa conclua o mestrado em Educao

    na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

    (UFMS) e visualizava a chance de trabalhar o tema

    no doutorado em Histria na Universidade de So

    Paulo (USP). Foi uma dcada e meia de pesquisas

    com fontes raras e inditas e muita reflexo.

    O trabalho trouxe questes candentes para os

    sul-mato-grossenses, com concluses corajosas. O

    movimento divisionista seria demanda que sempre

    esteve vinculada s elites polticas e econmicas do

    sul de Mato Grosso? O estado, nascido sob a marca

    do autoritarismo, prescindira de participao e

    anseios populares? O luto do norte ilustraria me-

    lhor a diviso que a recepo no sul, evidenciando a

    deciso ditatorial? As foras polticas sul-mato-

    grossenses no conseguiram formular um projeto

    que justificasse a diviso?

    Nesse cenrio, a autora prope a reflexo sobre a

    herana recebida da histria e evidencia o desafio de

    se elaborar um novo sonho para o futuro do estado,

    a ser enfrenta-

    do, sobretudo,

    pelas novas ge-

    raes de sul-

    m a t o - g r o s -

    senses.

    Organizada em

    dois volumes, a

    obra foi publicada

    com incentivo

    do FIC/MS.

  • 1 2 CULTURA EM MS - 2010 - N.31 2 CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    proprietrios rurais, que tinham dificuldades para le-

    galizar suas terras. O problema vinha desde o final da

    guerra com o Paraguai (1864-1870) e gerou o ciclo

    das lutas armadas entre coronis. No antigo mapa

    Cuiab no ficava no norte e sim mais ao centro. Tanto

    que, depois da diviso, ficou no sul do atual Mato

    Grosso. Mas a expresso norte comeou a designar

    aquilo que o sulista no conseguia alcanar e, da em

    diante, o antagonismo ficou simplificado na expres-

    so norte-sul. A causa foi alimentada porque havia

    uma razo objetiva: o isolamento. No entanto, depois

    que Campo Grande se tornou o centro poltico do sul,

    a obsesso de sua elite era a de que a cidade se tor-

    nasse a capital, isso era mais importante do que dividir

    Mato Grosso. Paradoxalmente, a diviso aconteceu

    quando comeava a haver integrao, decorrente do

    modelo econmico do regime militar.

    O sonho divisionista foi mais uma causa

    de idealismo identitrio ou de interesses eco-

    nmicos?

    Eu acredito que, a partir de certo momento, foram

    as duas causas juntas. O estado tinha uma configura-

    o que facilitava o regionalismo. A ocupao do sul

    por mineiros, paulistas e gachos trouxe um compo-

    nente cultural diferente daquele que predominava no

    norte. A partir da dcada de 1930, a rivalidade com

    Cuiab comeou a se manifestar por meio da

    dicotomia progresso-atraso. O progresso identificado

    com o sul, principalmente com as fazendas moder-

    nas, ao passo que no norte, segundo divisionistas,

    nem cerca de arame existia. A base da comparao

    era a atividade econmica da classe latifundiria sulis-

    ta. O progresso tambm era associado formao

    cultural do sul, enquanto o atraso, aos hbitos cultu-

    rais do cuiabano, visto como no-empreendedor, vi-

    vendo da mquina do Estado. A partir da foi criada

    uma ideologia divisionista, que foi sendo propagada

    com o exagero desses elementos culturais, fazendo

    deles uma caricatura: o sulista representado como pes-

    soa de iniciativa prpria, que no precisava da ajuda

    do Estado para viver, enquanto o cuiabano, dado a

    festas e a viver beira do rio, sobrevivia s custas do

    clientelismo e do paternalismo. Essa viso foi passan-

    do de gerao a gerao e, conforme o sul se desta-

    cou como polo mais dinmico da economia mato-

    grossense, ela se entrelaou ao iderio divisionista.

    Portanto, a superioridade econmica da regio gerou

    uma viso sobre a relao norte-sul e a obsesso da

    oligarquia sulista em ter o governo estadual ali.

    fato que Mato Grosso do Sul deve tudo

    ao boi, como disse Paulo Coelho Macha-

    professora titular de Histria e Filosofia da Educao da Universidade Federal de

    So Carlos-SP, tendo coordenado a Ps-Graduao em Educao por trs anos. Foi

    fundadora e primeira presidente da Associao Nacional de Histria (ANPUH), ncleo

    de MS (1985-1989). Alm da obra em dois volumes Mato Grosso do Sul: a construo

    de um estado, autora de vrios livros, entre os quais Estado, educao e transio

    democrtica em Mato Grosso do Sul (Editora UFMS, 1998) e coautora de

    Proletarizao e sindicalismo de professores na ditadura militar (Editora Pulsar,

    2006). Tambm em parceria, escreveu De freguesia a capital: cem anos de educao

    em Campo Grande (1999). pesquisadora bolsista do CNPq e recebeu o Prmio

    CAPES por ter orientado a melhor tese da rea de Educao no Brasil em 2008.

    do em uma frase que consta de seu livro?

    Por qu?

    De certa forma, sim. O sul de Mato Grosso, hoje

    Mato Grosso do Sul, comeou a se distinguir econo-

    micamente por causa do timo desempenho dessa

    atividade. A partir de um pequeno plantel da raa nelore

    importado da ndia, especialmente aps 1930, a pe-

    curia alcanou um melhoramento gentico que su-

    perou a qualidade da prpria matriz. Nos anos 1960-

    70, novas iniciativas fizeram do nelore do estado um

    dos melhores, ou o melhor, do mundo. Com isso,

    aconteceu uma revoluo silenciosa na economia do

    estado e do pas. Hoje, por outro lado, a indstria

    comea a deslanchar e Mato Grosso do Sul um dos

    grandes produtores de gros do Brasil.

    Se a diviso surgiu como uma causa de inte-

    resse dos pecuaristas, em que medida e como

    se deu o envolvimento de outros setores so-

    ciais nessa questo?

    Por ser uma causa improvvel, nem mesmo entre os

    latifundirios ela obteve total adeso. Ningum nessa

    classe, caso exercesse cargo poltico, queria correr risco

    de perder votos. A diviso nunca foi uma causa popular

    e acabou dando certo por um triz. Quando foi decidi-

    da, em 1977, os divisionistas no estavam fazendo

    absolutamente nada por ela. Quanto aos outros setores

    sociais, a diviso, por ser uma bandeira da classe mais

    rica do sul de Mato Grosso, que exercia hegemonia na

    poltica, acabou se tornando uma ideia incorporada pela

    populao, como se os argumentos legitimassem a pr-

    pria causa. Mas a sociedade sul-mato-grossense nunca

    chegou a discutir essa questo, ela pairava como algo

    que talvez pudesse dar certo, especialmente depois que

    Campo Grande passou a aspirar condio de capital

    criou-se uma ideia meio difusa de que isso seria legti-

    mo, por ser a maior e mais rica cidade de Mato Grosso.

    Ento, a partir dos anos 1930, a ideia da diviso incor-

    porada por setores da poltica do sul do estado, ganha

    espao na imprensa escrita e vai se difundindo, mas

    sempre como algo que ficava no imaginrio coletivo,

    nada organizado. Uma possibilidade.

    Qual foi o papel da classe intelectual no

    processo da diviso?

    uma questo interessante. Os intelectuais do sul

    de Mato Grosso, nos anos 1930-40, eram muito pou-

    cos e geralmente ligados s letras, medicina, po-

    ltica. Nessa fase se destacou, por exemplo, Oclcio

    Barbosa Martins, embora ficasse mais conhecido

    Vespasiano Barbosa Martins, por ter liderado o sul de

    Mato Grosso a favor de So Paulo em 1932. Oclcio

    foi deputado e escreveu um livro que se tornou a

    bblia do divisionismo, alm de redigir documen-

    tos em nome da Liga Sul-Mato-Grossense. Os inte-

    lectuais daquela poca eram pessoas organicamente

    ligadas classe dos grandes proprietrios rurais, que

    tinham tido a oportunidade de estudar no Rio de Ja-

    neiro ou em So Paulo, como Paulo Coelho Macha-

    do, por exemplo. Por isso no tivemos intelectuais

    contra o divisionismo, s a favor. Intelectuais de ou-

    tras classes, fruto da urbanizao dos anos 1970, es-

    A CONJUGAO

    DO ASPECTO

    REGIONAL AO

    NACIONAL EXPLICA

    A DIVISO, MAS A

    CAUSA REGIONAL

    SOZINHA JAMAIS

    TERIA FORA PARA

    CONSEGUIR

    O FEITO.

    QUEM MARISA BITTAR

  • 1 3CULTURA EM MS - 2010 - N.3 1 3CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    tavam sintonizados com o contexto poltico nacio-

    nal, com a questo da redemocratizao do pas, no

    com a diviso do estado.

    A diviso acabou se concretizando no con-

    texto da geopoltica do governo militar. Por

    que Mato Grosso foi o estado escolhido para

    iniciar essa experincia?

    Porque existia uma manifestao histrica pela divi-

    so e, alm disso, o estado se enquadrava nas teses

    geopolticas do general Golbery do Couto e Silva. A

    geopoltica, em essncia, a poltica subordinada

    geografia. Os militares, desde os anos 1920, tinham

    estudos propondo dividir Mato Grosso porque acha-

    vam o territrio muito grande, dificultando a integrao.

    Outro fator foi o da segurana, pois acreditavam que

    tinham de evitar possveis focos de guerrilha em nossas

    fronteiras. Lembremos do caso Che Guevara. A diviso

    dinamizaria o desenvolvimento capitalista e evitaria ata-

    ques solertes do inimigo, conforme o jargo

    geopoltico. Para completar, o regime militar enfrentava

    uma crise poltica e o movimento democrtico crescia.

    Sabia-se que a restaurao das eleies diretas para go-

    vernadores no tardaria e o general Ernesto Geisel achou

    que seria o momento ideal para dividir o estado, pois

    teria mais uma unidade federativa para apoiar o regime.

    Em seu discurso sobre a diviso, disse que era preciso

    se prevenir para os dias de amanh. Que dias seriam

    esses? Em sntese, a conjugao do aspecto regional ao

    nacional explica a diviso, mas a causa regional sozi-

    nha jamais teria fora para conseguir o feito. Foi deci-

    so do regime militar.

    Se a diviso aconteceu por um ato da dita-

    dura militar, como saber se esse era mesmo

    o desejo da maioria da populao naquela

    poca?

    Ns nunca saberemos. No houve consulta, no

    h dados empricos. Ser que a maioria seria a favor?

    A populao do sul era maioria, mas a diviso no

    era consenso. No norte, presume-se que a maioria

    fosse contrria. Essa questo no tem soluo. Por

    isso, eu desenvolvi a seguinte reflexo: a diviso acon-

    teceu sem consulta s duas populaes interessadas.

    No dia 11 de outubro de 1977, a existncia de Mato

    Grosso do Sul passou a ser realidade. Quem no sul

    seria contra essa existncia, mesmo no tendo sido

    divisionista? Provavelmente quase ningum. No nor-

    te, houve resignao pela perda e ressentimento contra

    o governo da poca; no sul, o nascimento de um

    novo estado se sobreps ideia de diviso. Para as

    geraes atuais, o fato de no saberem se a maioria

    era contra ou a favor no faz sentido, uma no-

    questo: Mato Grosso do Sul existe e isso basta. Com

    o tempo, o sentimento que vai se sedimentando de

    que todos eram a favor. Mas uma questo que ficar

    sempre no terreno da histria, como uma marca de

    nascena de Mato Grosso do Sul.

    Por que no deu certo o estado-modelo

    projetado inicialmente para MS no primeiro

    governo, de Harry Amorim Costa?

    A causa divisionista,

    que teve incio ainda no

    sculo XIX, culminou, em

    1977, com a assinatura,

    pelo ento presidente

    Ernesto Geisel, da Lei

    Complementar no

    31, que

    criou Mato Grosso do Sul.

    1892

    1920

    1934

    1943

    1959

    1960

    1964

    1965

    1974

    1977

    1979

    1946 1892 at primeira dcada

    do sculo XX Ideias e anseios

    divisionistas surgem nos confron-

    tos armados entre coronis no

    sul de Mato Grosso.

    Dcada de 1920 No contex-

    to das lutas tenentistas, propo-

    sies de rediviso territorial do

    Brasil contemplam o sul de Mato

    Grosso.

    1932 O sul de Mato Grosso

    adere Revoluo Constitu-

    cionalista Paulista. Bertoldo

    Klinger nomeia, em Campo Gran-

    de, Vespasiano Barbosa Martins

    chefe do Governo Constitucio-

    nal de Mato Grosso, em apoio

    a So Paulo.

    Outubro-Dezembro de

    1932 Criao da Liga Sul-Mato-

    Grossense, que prope a divi-

    so de Mato Grosso.

    1943 Criao do Territrio

    Federal de Ponta Por

    1946 Deputados sulistas,

    entre os quais Italvio Coelho e

    Oclcio Barbosa Martins, pro-

    pem Assembleia Constituinte

    Estadual que a capital de Mato

    Grosso pudesse ser transferida

    de Cuiab em caso de calami-

    dade pblica. A proposio

    encarada como divisionismo e re-

    jeitada.

    1959 Sulistas divulgam car-

    taz sobre a diviso de Mato

    Grosso.

    1960 O candidato presi-

    dncia da Repblica, Jnio Qua-

    dros, sul-mato-grossense de nas-

    cimento, rejeita apoio diviso

    de Mato Grosso.

    1964 Golpe de Estado. Os

    militares assumem o poder. Go-

    vernava Mato Grosso Fernando

    Corra da Costa (UDN-sul).

    1965 Pedro Pedrossian (PSD-

    sul) eleito governador de Mato

    Grosso derrotando o candidato

    Ldio Martins Coelho (UDN-sul).

    1974-75 Estudos geopolticos

    do general Golbery do Couto e

    Silva embasam deciso do pre-

    sidente Ernesto Geisel de dividir

    Mato Grosso. O governador Jos

    Fragelli notificado.

    1977 Criada Comisso Espe-

    cial para supervisionar diviso de

    Mato Grosso e instalao de

    Mato Grosso do Sul.

    1977 Em Campo Grande,

    Paulo Coelho Machado reativa a

    Liga Sul-Mato-Grossense para

    apoiar a deciso de Geisel.

    14/9/1977 Aprovado no Con-

    gresso Nacional o Projeto de Lei

    sobre a diviso de Mato Grosso.

    11/10/1977 Geisel assina a

    Lei da Diviso de Mato Grosso.

    1o

    /1/1979 Instalao do pri-

    meiro governo de Mato Grosso

    do Sul.

    Nomeado por Geisel, Harry

    Amorim Costa toma posse como

    primeiro governador.

    1934 Assembleia Nacional

    Constituinte rejeita a proposio

    sobre a diviso de Mato Grosso.

    1932

  • 1 4 CULTURA EM MS - 2010 - N.31 4 CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    Porque enquanto se acreditava na possibilidade de

    um governo tcnico, os grupos polticos da Arena

    [Partido da Aliana Renovadora Nacional] sul-mato-

    grossense j tramavam sua queda, tanto que ele du-

    rou s seis meses. Alis, a luta desenfreada pelo poder

    comeou assim que Mato Grosso foi dividido. Por isso

    o presidente Geisel nomeou Harry, um nome de fora.

    Mas a fora de Pedro Pedrossian destituiu os dois pri-

    meiros governadores. Por isso, o estado j nasceu em

    crise poltica.

    Parece ser opinio de grande parte da popu-

    lao que o estado no alcanou o desenvol-

    vimento esperado. A que voc atribui isso?

    Essa percepo vem da herana do divisionismo,

    da disputa com o norte, mas precisamos ter outra

    compreenso de desenvolvimento. Mato Grosso su-

    perou Mato Grosso do Sul em nmero de munic-

    pios, populao e eleitores. Estava quase ultrapas-

    sando Mato Grosso do Sul no rebanho bovino quan-

    do conclu a pesquisa que deu origem ao meu livro.

    Mato Grosso do Sul apresentou grande crescimento

    na dcada de 1980; no manteve o ritmo, mas tem

    melhores ndices de alfabetizao e expectativa

    de vida. Deveria ter havido desenvolvimento com

    maior distribuio de renda, com qualidade em edu-

    cao pblica, sistema de sade, transporte coleti-

    vo, gerao de empregos, acesso a terra. Mas quan-

    do se fala nesse tema, ainda estamos condiciona-

    dos lgica da comparao com o norte. E como

    agora Mato Grosso cresce mais, fica essa frustra-

    o, esse sentimento de inferioridade. Interessante,

    no? o sentimento contrrio ao que moveu o sul

    pela diviso.

    Que papel desempenhou a imprensa do sul

    e do norte no divisionismo?

    No sul, o Correio do Estado, desde que surgiu, em

    1952, defendeu a bandeira divisionista e enalteceu o

    sul, principalmente a modernidade e o progres-

    so de Campo Grande, alm de publicar manifestos

    e matrias assinadas por divisionistas, como os arti-

    gos de Oclcio Martins e de Paulo Coelho Machado.

    Outra coisa: quando a causa estava morna, o jornal

    fazia alguma matria para reaquec-la. No norte, jor-

    nais como O Estado de Mato Grosso traziam uma

    viso completamente diferente, tratando o divi-

    sionismo como coisa de meia dzia de pessoas que

    queriam a transferncia da capital para Campo Grande.

    possvel notar a mesma diferena em 1932, quando

    os jornais do norte designavam os sulistas como trai-

    dores por terem apoiado So Paulo com intenes

    separatistas, enquanto os do sul debochavam dos nor-

    tistas por terem aderido a Vargas. Muito instigante

    essa pesquisa. Agora, preciso ter pacincia, viu,

    porque eu copiei quase tudo mo. E foram meses

    de consulta!

    Ao redigir sua tese voc j no residia em

    Mato Grosso do Sul. O distanciamento aju-

    dou ou dificultou o trabalho? Que vnculos

    voc mantm com o estado?

    Logo aps a

    comemorao da

    criao do estado,

    teve incio uma trajetria

    marcada por encontros e

    desencontros polticos

    em suas trs primeiras

    dcadas.

    Junho de 1979 Des-

    tituio do governador

    Harry Amorim Costa e no-

    meao de Marcelo

    Miranda Soares como se-

    gundo governador de

    Mato Grosso do Sul.

    Setembro de 1980

    Destituio de Marcelo

    Miranda Soares e nome-

    ao de Pedro Pedrossian

    como terceiro governador

    de Mato Grosso do Sul.

    1981 O governador

    Pedro Pedrossian garante

    ao presidente Joo Bap-

    tista Figueiredo a vitria

    do PDS (ex-ARENA) na

    primeira eleio para go-

    vernador que ocorreria em

    1982.

    1982 Primeira eleio

    para governador em Mato

    Grosso do Sul.

    Foram candidatos Wilson

    Barbosa Martins, Jos

    Elias, Antnio Carlos de

    Oliveira e Wilson Fadul.

    Eleito Wilson Barbosa

    Martins (PMDB).

    Maro de 1983 Posse

    do primeiro governador

    eleito de Mato Grosso do

    Sul.

    1984 Campanha das

    Diretas-J.

    1985 Fim do regime

    militar. Votao indireta

    de Tancredo Neves para

    presidente.

    1986 Pedro Pedrossian

    e Ldio Martins Coelho se

    unem no PTB para a cam-

    panha eleitoral. Marcelo

    Miranda Soares (PMDB)

    vence a eleio para go-

    vernador, derrotando

    Ldio.

    1990 Pedro Pedrossian

    eleito governador.

    1994 Wilson Barbosa

    Martins eleito governa-

    dor.

    1996 Andr Puccinelli

    eleito prefeito de Cam-

    po Grande. Jos Orcrio

    Miranda dos Santos (Zeca

    do PT) perde a eleio no

    segundo turno por 411

    votos.

    1998 Jos Orcrio

    Miranda dos Santos (Zeca

    do PT) eleito governador.

    2002 Reeleio de Zeca

    do PT para o governo es-

    tadual.

    2006 Andr Puccinelli

    eleito governador.

    2007 Trinta anos da

    diviso de Mato Grosso e

    da criao de Mato Gros-

    so do Sul.

    19791980

    1981

    1982

    1983

    1984

    1985

    1986

    1990

    1994

    1996

    1998

    2002

    2006

    2007

  • 1 5CULTURA EM MS - 2010 - N.3 1 5CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    Eu me mudei logo aps comear o doutorado e a

    soluo foi fazer a pesquisa viajando. Perdi a conta

    de quantas viagens fiz para realizar entrevistas, es-

    tar no Correio do Estado, na Assembleia Legislativa,

    no Arquivo Estadual em Cuiab ou para frequentar

    o escritrio do Paulo Coelho Machado, onde tive

    verdadeiras aulas sobre o nelore e sobre o governo

    Harry Amorim Costa. Alm dessa maratona, conse-

    gui atas do Senado Federal e alguma coisa da Esco-

    la Superior de Guerra. Gosto muito de lidar com

    diversidade de fontes no tenho preveno ideo-

    lgica, por isso me empenhei. Ento posso dizer

    que morar longe no me ajudou, mas tambm no

    me impediu. Sobre os vnculos que mantenho com

    o estado? So fortes. Tenho uma histria de militan-

    te poltica aqui, foi em Mato Grosso do Sul que

    descobri e compreendi o mundo, dediquei a minha

    juventude a uma causa, constru amizades duradou-

    ras, comecei a minha carreira e, sabe, tem o lado

    afetivo tambm. Este foi o estado que o meu pai

    escolheu para a nossa famlia recomear a vida. Por

    isso eu vivo uma parte do ano em So Carlos e ou-

    tra aqui. E continuo sendo eleitora sul-mato-

    grossense, nunca transferi meu ttulo.

    Seu trabalho relaciona um grande nmero

    de entrevistas com lideranas polticas que

    protagonizaram a fase de transio vivida pelo

    novo estado de MS. Como foram esses conta-

    tos? Houve resistncias? Quais as dificulda-

    des de trabalhar com uma histria em pro-

    cesso?

    difcil interpretar a histria em processo porque

    os efeitos do tempo ainda no agiram sobre ela, e

    quando a sombra da noite cai que podemos ver me-

    lhor o dia. Ou seja, o acontecimento do momento se

    faz compreensvel com os desdobramentos futuros.

    Tratar dos 30 anos de histria de Mato Grosso do Sul

    foi um desafio, mas isso no significa que no possa-

    mos compreender o processo no qual estamos inseri-

    dos. Quanto s entrevistas, consegui quase todas as

    de que precisei. O ex-governador Pedro Pedrossian no

    me recebeu em 1995, quando eu fazia a tese, mas

    acabei conseguindo um depoimento dele em 2006,

    ao realizar uma pesquisa para o Arquivo Histrico de

    Campo Grande sobre Euclydes de Oliveira, militante

    do Partido Comunista Brasileiro que, alis, foi o parti-

    do ao qual me liguei quando estudante. A entrevista

    que no consegui mesmo foi com o ex-governador

    Marcelo Miranda. As demais pessoas me receberam e

    contriburam muito com minha pesquisa, o que no

    significa que eu concordasse com seus pontos de vis-

    ta, ao contrrio, fao uma anlise crtica sobre o de-

    sempenho poltico da elite dirigente de Mato Grosso

    do Sul. A riqueza da pesquisa foi analisar o seu pensa-

    mento e sua prtica, alm de desvendar fatos que no

    haviam sido estudados.

    Outra fonte muito usada em sua pesquisa

    foi a das matrias de jornal. Que cuidados o

    historiador deve ter com esse tipo de fonte

    que, apesar de dar prioridade ao aspecto

    factual, pode ter posies poltico-ideolgi-

    cas disfaradas?

    O jornal necessrio quando um tema nunca foi

    escrito ou sistematizado em livro, quando no h uma

    primeira viso sobre ele ou quando nem mesmo uma

    cronologia dos acontecimentos est clara e voc pre-

    cisa tomar p da situao. Gosto de trabalhar com

    jornais, acho que enriquece o texto, d vida. Mas o

    historiador precisa partir do princpio de que ele um

    documento como os outros, tem autoria,

    intencionalidade e interesses. Pode inclusive desempe-

    nhar papel de porta-voz de partido poltico. Ento,

    necessrio que o historiador no o tome como garan-

    tia de verdade, ele tem de saber que trabalha com

    verses, no com a verdade. Cabe a ele submeter o

    jornal e suas matrias ao mesmo exame crtico que

    adota com outras fontes, descobrindo o que est nas

    entrelinhas ou o que no est escrito. s vezes, a sim-

    ples ausncia de um determinado assunto mais sig-

    nificativa que a sua presena. Outras vezes s ele dei-

    xa registrado determinado fato. Por exemplo, ningum

    se lembra que Campo Grande foi o primeiro nome do

    novo estado. Isso durou pouco, mas s nos jornais

    encontramos 12 de outubro, 1977. Campo Grande.

    Estado de Campo Grande.

    Em que pontos voc acha que seu trabalho

    mais inovou em relao ao que j existia at

    ento?

    Na abrangncia do tema, entrelaando a gnese de

    Mato Grosso do Sul prtica de suas elites polticas

    durante os primeiros trinta anos, e no uso das fontes,

    o que me permitiu dar interpretaes diferentes a ver-

    ses consagradas, especialmente quanto a pretensos

    heris da diviso. Alm disso, mostrei o fator decisivo

    da diviso: a geopoltica de Golbery.

    Muito se fala na importncia do sentimen-

    to de pertena para a consolidao de um

    grupo social. Que papel tiveram as diferenas

    culturais entre norte e sul no processo que

    culminou com a diviso?

    Culturalmente, o sulista no se identificava com sua

    capital. Ele no conhecia, no se sentia pertencente

    ao universo cultural cuiabano e o ridicularizava. Rejei-

    tava at o falar cuiabano, que mantinha caractersticas

    antigas da lngua portuguesa, devido ao isolamento

    da colonizao. Por causa disso, quanta gozao o

    cuiabano era obrigado a aguentar! Eu sei porque mo-

    rei l. O sulista se sentia superior at pela ferrovia no

    ter alcanado Cuiab. O fato que, tudo somado,

    alm da influncia cultural paraguaia, o sulista era mais

    identificado com o centro-sul do Brasil. Esse sentimento

    de no pertencer ao universo cultural cuiabano era um

    ingrediente divisionista, mas no foi determinante, nem

    poderia ser a razo da diviso.

    Qual sua opinio sobre propostas atuais de

    mudana do nome de Mato Grosso do Sul?

    Sou contra e j me posicionei publicamente. Na mi-

    nha opinio, trata-se de um equvoco gerado pela for-

    ma como aconteceu a diviso, que causou mal-enten-

    DIFCIL

    INTERPRETAR A

    HISTRIA EM

    PROCESSO

    PORQUE OS

    EFEITOS DO

    TEMPO AINDA

    NO AGIRAM

    SOBRE ELA [...]

    TRATAR DOS

    30 ANOS DO

    ESTADO FOI UM

    DESAFIO, MAS

    ISSO NO

    SIGNIFICA QUE

    NO POSSAMOS

    COMPREENDER

    O PROCESSO NO

    QUAL ESTAMOS

    INSERIDOS.

  • 1 6 CULTURA EM MS - 2010 - N.31 6 CULTURA EM MS - 2010 - N.3

    didos, coisas mal-

    resolvidas. Quando se ale-

    ga que devemos mudar o

    nome do estado porque

    ningum votou nesse

    nome, respondo: Nin-

    gum votou na prpria

    diviso! Por isso devera-

    mos ser contra a existn-

    cia de Mato Grosso do

    Sul? uma questo sem

    sentido. Outro equvoco

    o de associar o nome do

    estado imposio de

    uma oligarquia. O nome

    de um estado, pas ou cidade transcende esse aspecto

    e, na maioria das vezes, perde o sentido original. Outras

    vezes surge de uma suposio errada, como foi o caso

    do Rio de Janeiro. O nome de Mato Grosso do Sul

    ideal porque sintetiza a trajetria divisionista, a gnese

    do prprio estado, e faz parte da sua identidade. o

    nico que abrange e representa toda a populao do

    estado e, alm disso, eu acho um nome bonito. Ele

    precisa de divulgao, no de substituio.

    O estudo do processo de diviso do antigo

    estado de Mato Grosso pode contribuir com

    as discusses acerca de novas redivises do

    territrio brasileiro?

    Pode contribuir ao levantar questes que vo alm

    de se passar uma rgua no mapa e separar uma regio

    de outra. Eu procurei trazer baila a questo do senti-

    mento de pertena, do apego a uma regio que, de

    repente, sem que voc seja consultado, deixa de fazer

    parte da sua histria pessoal. Discuti os interesses po-

    lticos e econmicos de uma parte da sociedade se

    sobrepondo s demais, a questo de se criar novas

    estruturas administrativas para satisfazer grupos polti-

    cos, a iluso de se estar criando modelos, quando

    na verdade se est reproduzindo o que j existe. Con-

    clu que diviso territorial assunto muito srio e deli-

    cado, pode gerar expectativas no realizadas, provo-

    car ressentimentos, crises de identidade, desagrega-

    o. Diviso lida com pessoas, sentimentos, com o

    passado dos povos e sua histria, arriscando um futu-

    ro possvel. No coisa trivial.

    Com todas essas ponderaes, voc, afinal,

    concorda ou no com a criao de Mato Gros-

    so do Sul, com a rediviso territorial? Teria

    sido melhor Mato Grosso e Gois continua-

    rem como eram antigamente?

    Em geral, tenho reservas quanto s divises dessa

    natureza. Concretamente, porm, so dois casos di-

    ferentes. Mato Grosso do Sul nasceu de uma divi-

    so imposta e, politicamente, sou contra decises

    assim. Sentimentalmente, no gostei da diviso,

    estranhei. Minha famlia tinha morado em Cuiab e

    criamos vnculos afetivos l. s vezes me flagro co-

    gitando sobre as possibilidades que hoje teramos

    se Mato Grosso tivesse permanecido uno. No en-

    tanto, objetivamente, passei a aceitar a diviso como

    um fato consumado porque, apesar dessa marca de

    nascena autoritria, Mato Grosso do Sul existe,

    ele o nosso estado e a histria no volta atrs. Quanto

    diviso de Gois, pelo menos houve participao

    e consulta s populaes interessadas, pois o pro-

    cesso que originou Tocantins ocorreu depois da di-

    tadura militar.

    Em seu livro voc coloca em questo a tese

    do estado-modelo que Mato Grosso do Sul

    seria aps a separao e fala da incapacidade

    das foras polticas sul-mato-grossenses em

    formular um projeto de estado que justificas-

    se a diviso. A partir dessa herana histrica,

    que desafio se apresenta para as atuais gera-

    es de sul-mato-grossenses?

    Decidi chamar a ateno para essa questo porque na

    minha pesquisa lidei com trs geraes polticas: a

    do ciclo das lutas armadas, com a qual nasceu a se-

    mente separatista; a gerao seguinte, que fez de Cam-

    po Grande o centro poltico do sul de Mato Grosso e

    transformou o regionalismo em divisionismo, conse-

    guiu a criao de Mato Grosso do Sul e foi vitoriosa

    nessa causa; e a terceira, que era jovem quando a

    diviso aconteceu e teve papel importante na cons-

    truo de Mato Grosso do Sul, seja na poltica, nas

    artes, no jornalismo, nas pesquisas acadmicas, par-

    ticipando dessa construo no contexto da rede-

    mocratizao do Brasil. Caberia agora gerao que

    nasceu junto com o estado dar continuidade a essa

    construo, compreender erros e acertos, assumir

    causas, renovar as lideranas polticas, concretizar a

    ideia de que Mato Grosso do Sul pode ser o sonho

    de todos. Quando estava concluindo meus estudos,

    li uma entrevista do ex-governador Jos Fragelli que

    me impressionou pela coragem da autocrtica. O t-

    tulo era A nossa gerao falhou e confirmou a mi-

    nha anlise de que no havia projeto para Mato Grosso

    do Sul. O que fazer, ento? Bem, se a Histria um

    campo de possibilidades e est em construo, cabe

    a ns o desafio desse projeto.

    Que contribuies a cultura pode dar para a

    construo dos prximos 30 anos de Mato Gros-

    so do Sul?

    Muitas. A cultura tem fora e capacidade de agrega-

    o, difuso e promoo de valores humanistas. Acre-

    dito que avanamos nesse setor. A cultura de Mato

    Grosso do Sul forte, resultado de elementos diversos,

    povos diversos, incluindo os indgenas e as migraes

    estrangeiras, que ajudaram a construir o estado. Temos

    uma histria interessantssima, fomos palco de uma

    guerra trgica, uma parte do estado foi Paraguai, per-

    tencemos a Mato Grosso, depois nos separamos. Te-

    mos esse passado singular, alm da geografia, que nos

    favoreceu com o Pantanal, Bonito, o Rio Paraguai, as

    duas fronteiras estrangeiras. Temos uma bela msica,

    artes plsticas marcantes, culinria diversa, a maravi-

    lhosa c