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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ FELIPE CAVALCANTE MARCELO BLADE RUNNER E A CRISE DA MODERNIDADE: ANÁLISE FÍLMICA E INTERPRETAÇÃO CURITIBA 2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

FELIPE CAVALCANTE MARCELO

BLADE RUNNER E A CRISE DA MODERNIDADE: ANÁLISE FÍLMICA E

INTERPRETAÇÃO

CURITIBA

2011

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FELIPE CAVALCANTE MARCELO

BLADE RUNNER E A CRISE DA MODERNIDADE: ANÁLISE FÍLMICA E

INTERPRETAÇÃO

Monografia apresentada à disciplina de Estágio

Supervisionado em Pesquisa Histórica como requisito

parcial à conclusão do Curso de História, Setor de

Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade

Federal do Paraná.

Orientador: Prof.º Dr.º Dennison de Oliveira.

CURITIBA

2011

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente aos meus pais, Fernando Alves Marcelo e Marisa Cavalcante

Brasil, e ao meu irmão, Lucas Cavalcante Marcelo, pelo apoio, convivência diária e por sua

contribuição para minha formação como pessoa. Enfatizo o agradecimento à minha mãe pelo

apoio às minhas dificuldades enfrentadas, e que ampliou nossas relações de afeto e valorizou

ainda mais o presente trabalho pelo esforço empregado. Também devo agradecer a meu tio,

José Antônio Cavalcante, pelas conversas que compartilhamos e pelas discussões sobre

diversos temas e assuntos que nos interessam.

Agradeço ao professor Dennison de Oliveira pela pronta orientação recebida, quando

cogitada a hipótese de se desenvolver essa pesquisa, por estar sempre acessível e pelas

importantes referências bibliográficas sugeridas. Agradeço ao professor Renan Frighetto pelas

várias conversas ao longo da graduação e pela sua disposição em sempre escutar seus alunos,

que, com certeza, ajudaram muito a aumentar minha experiência acadêmica. Ao professor

Carlos Lima também agradeço por diversas conversas que tivemos, assim como pela sua

disposição para discussões, abrindo oportunidades fundamentais para meu aprendizado.

Muitas vezes uma conversa com um professor no corredor é tão produtiva e necessária quanto

uma aula na sala.

Agradeço à professora Rosane Kaminski pelas valiosas sugestões teóricas e pelas

possibilidades de se analisar o filme escolhido. Também me recebeu com pronta disposição,

mesmo não sendo eu seu orientando. Por fim, agradeço aos amigos da graduação, embora

sejam muitos e impossível de se citar todos, mas que mais estiveram próximos de mim e

ajudaram de certa forma na concretização desse trabalho: Murilo Pagotto, Rafael José Bassi,

Janelize Marcelle Diok Rodrigues, Bruno Quadros e Quadros, Ana Cláudia Magalhães Pitol,

Camila Dabrowski de Araújo Mendonça e Fernanda Micoski da Costa.

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II.

O MEU OLHAR é nítido como um girassol.

Tenho o costume de andar pelas estradas

Olhando para a direita e para a esquerda,

E de vez em quando olhando para trás...

E o que vejo a cada momento

É aquilo que nunca antes eu tinha visto,

E eu sei dar por isso muito bem...

Sei ter o pasmo essencial

Que tem uma criança se, ao nascer,

Reparasse que nascera deveras...

Sinto-me nascido a cada momento

Para a eterna novidade do Mundo...

Creio no mundo como um malmequer,

Porque o vejo. Mas não penso nele

Porque pensar é não compreender...

O Mundo não se fez para pensarmos nele

(Pensar é estar doente dos olhos)

Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...

Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,

Mas porque a amo, e amo-a por isso,

Porque quem ama nunca sabe o que ama

Nem sabe por que ama, nem o que é amar...

Amar é a eterna inocência,

E a única inocência não pensar...

Alberto Caeiro.

I've seen things you people wouldn't

believe. Attack ships on fire off the

shoulder of Orion. I watched C-beams

glitter in the dark near Tannhäuser Gate.

All those moments will be lost in time

like tears in rain. Time to die.

Roy Batty

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RESUMO

O presente trabalho objetivou produzir uma análise fílmica e interpretação do filme Blade

Runner (1982), dirigido por Ridley Scott. Fundamentando-se nas relações entre cinema e

História, a abordagem sócio-histórica do filme buscou analisá-lo enquanto produto cultural,

localizado na história, nas artes e na indústria cultural. Nesse sentido, os procedimentos

teórico-metodológicos basearam-se na análise interna e externa do filme, buscando identificar

seus sentidos literais de acordo com os elementos que estruturam a linguagem fílmica, e as

relações com as diversas variáveis e condicionantes referentes à produção, exibição e

recepção da película que exerceram influência na construção e significado do filme. Assim, as

fontes utilizadas para o trabalho foram o documentário intitulado Dangerous Days (2007),

dirigido por Charles de Lauzirika, baseado fundamentalmente em depoimentos da equipe de

produção e dos financiadores sobre todo o processo de elaboração, exibição e recepção do

filme; e o site IMDbPro, que contém uma significativa base de informações relacionadas a

diversos aspectos do filme. A partir dessa análise, foi realizada uma interpretação sobre a

película, segundo a qual Blade Runner constitui uma representação fílmica da crise do projeto

da modernidade, o qual formulava a emancipação do Homem pela razão, tendo como base

teórica a Teoria da Modernidade de Jürgen Habermas. As conclusões parciais obtidas foram

de que tal interpretação é possível, com base na pesquisa realizada, bem como o filme

confirma o princípio de que toda narrativa fílmica dialoga com sua época de produção.

Palavras-chave: Cinema e História; Blade Runner; projeto da modernidade.

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ABSTRACT

This study aimed to produce a film analysis and interpretation of the film Blade Runner

(1982), directed by Ridley Scott. Basing on the relations between cinema and History, the

socio-historical approach of the film tried to analyze it as a cultural product, located in

history, in arts and in cultural industry. In this sense, the theoretical and methodological

procedures were based on internal and external analysis of the film, seeking to identify their

literal meanings according to the elements that structure the filmic language, and relations

with many variables and constraints related to the production, exhibition and reception of the

film that had an influence in the construction and meaning of the film. Thus, the sources used

for the study were the documentary titled Dangerous Days (2007), directed by Charles de

Lauzirika, based primarily on the testimony of the production team and funders about the

whole process of preparation, display and reception of the film, and the site IMDbPro, which

contains a significant base of information related to the various aspects of the film. From this

analysis, it was performed an interpretation of the film, according to which Blade Runner is a

filmic representation of the crisis of modernity, which formulated the emancipation of human

genre by reason, with the theoretical basis of Theory of Modernity by Jürgen Habermas. The

partial conclusions obtained were that such an interpretation is possible, based on research

carried out, and that the film confirms the principle that every filmic narrative speaks to its

time of production.

Key-words: Cinema and History; Blade Runner; project of modernity.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................8

2 CINEMA E HISTÓRIA: UMA INTRODUÇÃO..............................................................10

2.1 O FILME: ENTRE A HISTÓRIA, A ARTE E A INDÚSTRIA CULTURAL..................10

2.2 ASPECTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DA ANÁLISE FÍLMICA........................15

3 BLADE RUNNER............................................................................................................. 20

3.1 O FILME: SINOPSE E COMENTÁRIOS.........................................................................20

3.2 A OBRA A PARTIR DE DANGEROUS DAYS E DO IMDbPro.....................................27

3.3 A OBRA DE PHILIP DICK E O FILME DE RIDLEY SCOTT.......................................31

3.4 ANÁLISE FÍLMICA..........................................................................................................35

4 BLADE RUNNER E A MODERNIDADE....................................................................43

4.1 MODERNIDADE E PÓS-MODERNIDADE: UMA DISCUSSÃO...............................43

4.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DE JÜRGEN HABERMAS....................................................46

4.3 BLADE RUNNER: UMA CRISE DA MODERNIDADE? ...............................................48

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................54

REFERÊNCIAS......................................................................................................................55

ANEXO 1: FICHA TÉCNICA DE BLADE RUNNER........................................................59

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho objetiva analisar o filme Blade Runner a partir de uma abordagem

sócio-histórica. Nessa perspectiva o filme será discutido em função do exame de sua natureza

literal; das implicações e articulações com elementos da conjuntura histórica em que foi

produzido e de sua recepção. Preliminarmente, portanto, será conceitualizado o filme

enquanto produto cultural para, a posteriori, avançar nas considerações referentes ao

significado da obra em relação ao seu contexto de produção.

O filme é um artefato cultural; é arte, mas também faz parte da indústria cultural nos

termos de Adorno e Horkheimer. Seu status pode não ser tão claro em um primeiro momento,

mas sua relevância como meio de comunicação e entretenimento nas sociedades

contemporâneas é significativo. A relação entre cinema e História busca ampliar a análise do

objeto-filme, de modo a construir explicações, ou antes, interpretações, em função do exame

das condições sociais de produção da obra, além dos elementos da linguagem fílmica. Essa

metodologia, portanto, não se limita a uma crítica conteudista e apenas interna do filme, mas

antes o reinsere em seu contexto de produção de modo a abordá-lo de forma mais adequada.

A diferença do presente estudo, em relação à maioria dos trabalhos nessa tendência, é

que Blade Runner não constitui um filme histórico, reconhecidamente como tal. Ou seja, não

remete, do ponto de vista do senso comum, a um tema histórico identificável na memória

histórica coletiva. Pelo contrário, o filme, em parte por ser atribuído ao gênero da ficção

científica, trata do futuro. Dessa forma, ao analisar seu contexto de produção e a relação com

seu conteúdo, será possível identificar preocupações e representações comuns do início da

década de 1980, data em que o filme foi produzido, e não necessariamente da Los Angeles de

2019, ano em que se desenvolve a história. Assim, é certamente válido o argumento que

defende que a ficção científica diz mais sobre sua época, de produção, do que sobre o futuro

construído na diegese. Assim, o futuro atua como figura de linguagem para a discussão do

presente.

Nesse sentido, o primeiro capítulo, intitulado Cinema e História: uma introdução,

pretendeu discutir o quadro teórico-metodológico geral no qual o presente estudo se insere,

bem como conceitualizar o filme e brevemente sua história. O segundo capítulo, intitulado

Blade Runner, possui um exame detalhado do objeto de análise e de suas condições sociais de

produção. Efetivamente, trata da análise fílmica. O terceiro capítulo, intitulado Blade Runner

e a Modernidade, objetivou realizar uma interpretação do filme, a partir do pensamento

filosófico de Jürgen Habermas sobre a modernidade. Dessa forma, identificou-se uma

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representação fílmica da crise do projeto da modernidade na medida em que a película

apresenta elementos que apontam para uma falência na crença de emancipação do Homem

pela razão, com o objetivo de alcançar o progresso e a felicidade universais. Por fim, as

Considerações finais referem-se às conclusões parciais a que foram possíveis chegar,

articulando os resultados da análise, assim como propostas de estudos possíveis.

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2 CINEMA E HISTÓRIA: UMA INTRODUÇÃO

2.1 O FILME: ENTRE A HISTÓRIA, A ARTE E A INDÚSTRIA CULTURAL

O marco inicial recorrentemente atribuído ao surgimento do cinema remete às

projeções públicas dos filmes dos irmãos Auguste e Louis Lumière ocorridas em 1895, em

Paris. Um dos pequenos filmes, por sua intensa impressão de realidade, assustou os

espectadores que não haviam presenciado aquele tipo de experiência, quando viram a imagem

de um trem em movimento em sua direção. A história do cinema, entretanto, estende-se muito

além desse breve momento.

É arbitrário estabelecer marcos cronológicos para o surgimento do cinema1. Este

resultou de diversos experimentos científicos e esteve vinculado a um grande número de

tecnologias visuais muito populares no século XIX europeu2. Uma das mais conhecidas foi a

lanterna mágica, inventada por Christian Huygens em 16593, e que realizava a projeção de

imagens bordeadas na luz. Tal mecanismo originou diversos outros instrumentos que

operavam sob semelhante processo.

Dentre outras contribuições, o cinema possui uma dívida com Edward Muybridge e

sua fotografia instantânea, descoberta em 18704, criada como um instrumento para capturar

instantes que estavam além da capacidade do olho humano na observação do galopar dos

cavalos (uma experiência científica além da contribuição de Thomas Alva Edison, o qual

esteve muito mais interessado em seu potencial de lucros). Além disso, havia o interesse de

ilusionistas, industriais e oportunistas na síntese efetuada pelos projetores5. Sendo assim, as

“fotografias animadas”, denominação também utilizada em sua época de surgimento,

oscilavam entre um novo padrão de representação realista e a apresentação de um sentido de

irrealidade, ou mesmo fantasia6.

Nesse sentido, para compreender de forma adequada o cinema, é necessário também

adotar uma concepção não-linear de sua história, de modo a evitar fatalismos ou

1 MIUCCI, Carla. História do cinema: um breve olhar. Disponível em:

<http://www.mnemocine.com.br/cinema/historiatextos/carla2int.htm> Acesso em: 22 set. 2009. 2 GUNNING, Tom. “”Fotografias animadas”: contos do esquecido futuro do cinema”. In: XAVIER, Ismail

(org.). O cinema no século. Rio de Janeiro: Imago, 1996, p.26. 3 Idem, ibidem, p.28.

4 Idem, ibidem, p.34.

5 MIUCCI, Carla, op.cit.. Para uma introdução à história do cinema com maiores detalhes, cf. SKLAR, Robert.

História social do cinema americano. São Paulo: Cultrix, 1978. 6 GUNNING, Tom, op. cit., pp.25-26.

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reducionismos explicativos7. Logo, o funcionamento do filme utiliza basicamente a ilusão de

movimento entre as imagens. Em sua primeira década de existência, não havia ainda uma

linearidade nas estórias e roteiros, ou seja, não existia uma linguagem para uma narrativa

visual autônoma8. Os filmes geralmente eram curtos e retratavam situações cômicas e

espetáculos de circo.

Além desses aspectos, o cinema desde o início atraiu a atenção do público proletário

que via nessa atração um dos mais acessíveis meios de entretenimento em suas horas vagas,

em parte pelo desconhecimento do idioma9, já que muitos eram imigrantes

10. Em função dessa

audiência, o sucesso desse tipo de lazer aumentou gradativamente, pois também não exigia

um tipo de instrução intelectual mais avançada, como a leitura de textos literários. Evidencia-

se, assim, a facilidade da comunicação por meio de imagens e o surgimento de um meio de

comunicação de massas.

Na medida em que o cinema se tornou cada vez mais popular, além de provável fonte

de lucros econômicos, a produção cinematográfica se aperfeiçoou, tanto tecnicamente, como

narrativamente. Até a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), os gêneros mais comuns de

filmes eram as comédias e os teatros filmados11

. Nessa época, as companhias

cinematográficas encontravam no teatro e no romance fontes de legitimidade para suas

produções, a fim de alcançar a classe média e a pequena burguesia como platéia12

.

Os franceses tornaram-se pioneiros no cinema industrial e artístico, ao mesmo tempo

em que companhias surgiam em outros países industrializados. A concorrência econômica

entre os produtores aumentava e, em decorrência da Grande Guerra, os EUA despontaram na

liderança da produção de filmes13

. Nessa conjuntura, David Wark Griffith (1875-1948)

assume significativa relevância ao criar elementos expressivos do cinema estadunidense,

como o uso de grandes planos; montagem paralela (típico de filmes com cenas de

perseguição); flashbacks; filmes épicos com conflitos individuais e momentos dramáticos da

história em seus principais filmes: The Birth Of A Nation (1915) e Intolerance (1916) 14

. Tais

contribuições influenciaram a produção cinematográfica desse pólo e constituíram um modelo

7 Idem, ibidem, p.24.

8 MIUCCI, Carla, op. cit.

9 Idem, ibidem.

10 SKLAR, Robert. O advento da cultura cinematográfica. Op. cit., pp.7-64; Idem. O cinema na era da cultura de

massa. Op. cit., pp.85-167. 11

NAPOLITANO, Marcos. Elementos da linguagem e história do cinema. In: ______. O cinema na sala de

aula. São Paulo: Contexto, 2006, p.69. 12

MIUCCI, Carla, op. cit. 13

NAPOLITANO, Marcos, op. cit., p.69; SKLAR, Robert, op. cit., pp.7-64. 14

No entanto, é necessário lembrar que a montagem já teve o produtor Edwin S. Porter (1870-1941) como um de

seus precursores. Cf. SKLAR, Robert, op. cit., pp.7-64.

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paradigmático para a época. Paralelamente, surgem os grandes estúdios de produção nos EUA

(Paramount, RKO, MGM, Twentieth Century Fox, Warner Bros.), que vieram a se tornar

mundialmente conhecidos15

.

Além do crescente número de filmes produzidos em escala industrial, a linguagem

fílmica começa a apresentar modificações gradativas, técnicas e narrativas, que contribuíram

para intensificar sua ilusão de realismo. Inicialmente ocorre a divisão do filme em planos

consecutivos, de modo a constituir uma estória linear e estruturada, semelhante às narrativas

literárias. Atualmente, isso pode parecer óbvio, mas no final do século XIX e início do século

XX esse tipo de ordenação era inexistente. Os filmes começam a constituir um discurso com

uma estrutura mais complexa. Já a sonorização e edição sonora surgem no final dos anos

1920. A primeira obra falada data de 1927 e se intitula The Jazz Singer, uma produção da

Warner Bros.16

. Nessa trajetória, surge a tecnologia da imagem colorida, o que enfatiza ainda

mais o realismo da estética fílmica, embora ocorram também desafios na viabilização

econômica desse processo17

.

Em termos de linguagem, o filme utiliza imagens retiradas/captadas da realidade

concreta e objetiva. Isso lhe confere o qualificativo de arte do real18

, pois a imagem possui

uma grande carga de verdade, seja na ficção ou na não-ficção. No entanto, esse aspecto não

impede uma instauração estética19

, já que os fragmentos da realidade são organizados e

ordenados em função de uma estória contida no roteiro. Assim, o filme torna-se um

instrumento que permite penetrar nos seres em função de sua linguagem flexível e rica20

.

Além disso, uma obra fílmica contém sons, iluminação, cenários, figurino e diversos

elementos que tendem a criar uma realidade semelhante, ou não, ao mundo dito concreto.

Entretanto, torna-se uma falácia a afirmação de que o filme pode refletir o real. Este, assim

como a literatura, a pintura e o teatro, são representações e construções artísticas que

produzem uma visão do mundo objetivo. Logo, o realismo fílmico constitui uma concepção

estética e subjetiva do mundo21

, como também pode ser um filme de fantasia ou de realismo

mágico.

15

NAPOLITANO, op. cit., p.70. 16

SKLAR, Robert. A casa que Adolph Zukor construiu. Op. cit., pp.179-180. 17

OLIVEIRA, Dennison de. O cinema como fonte para a História. Disponível em:

<http://www.poshistoria.ufpr.br/fonteshist/Dennison.pdf>. Acesso em: 23 set. 2009. 18

MARTIN, Marcel. Introdução. In: ______. A linguagem cinematográfica. Belo Horizonte: Editora Itatiaia,

1963, p.13. 19

Idem, ibidem, p.15. 20

Idem, ibidem, p.16. 21

Idem, ibidem, p.13.

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A partir do ponto de vista estético, Marcel Martin elege seis principais caracteres da

imagem fílmica. O primeiro é a carga de verdade. Como já citado, o fato de as imagens terem

como fonte a realidade aparente, torna-a com mais credibilidade do que outros sistemas de

representação. O segundo aspecto é que toda imagem fílmica está no presente, pois oferece-se

à percepção do espectador no momento em que é assistida, independente da época em que foi

produzida. A terceira característica define o filme como “realidade artística”, como

mencionado, e, por isso, uma visão estética de representação da natureza. O quarto aspecto

refere-se ao papel intensamente significante do filme, ou seja, tudo que aparece na tela possui

um significado, primário ou secundário. A quinta característica designa-se pela “unicidade

representativa”. Isto define o potencial da imagem de apreender aspectos precisos dos objetos

e pessoas filmadas, diferentemente da palavra escrita, que proporciona maior liberdade para

especulação e interpretação do leitor, embora também acabe por ser uma limitação. O sexto

caractere da imagem constitui a plasticidade, a qual se expressa em um duplo contexto: a

imagem integrada em uma sequência temporal que lhe imprime significado e o “contexto

mental” do espectador. A partir disso, é natural a possibilidade de existir uma multiplicidade

de recepções e/ou interpretações de quem assiste 22

.

Nesse sentido, a partir do desenvolvimento da linguagem fílmica e do sucesso do

cinema nas sociedades do século XX, iniciaram-se discussões entre teóricos e críticos acerca

da natureza desse novo tipo de manifestação cultural: se constituía uma forma de arte ou

apenas um conjunto de imagens em sucessão. Martin realiza uma breve abordagem do debate

e conclui que o filme compõe uma linguagem, com seus elementos específicos e potencial de

comunicação entre os indivíduos23

. Entretanto, a crítica cultural da chamada “Escola de

Frankfurt” formulou proposições que inseriam a arte na conjuntura histórica e sociológica dos

anos 1930, a partir da abordagem do marxismo, da filosofia e da psicanálise. Alguns de seus

representantes que se posicionaram nessa discussão foram Walter Benjamin, Theodor Adorno

e Max Horkheimer.

Benjamin defende que, inicialmente, toda obra de arte sempre foi reprodutível. Os

métodos eram utilizados a fim de produzir reproduções manuais dos originais. No entanto, a

reprodução técnica da obra de arte, em sua época, era relativamente recente e produzia

mudanças significativas nessa relação24

. Nesse processo, o domínio global da autenticidade

subtrai-se na cópia e esta adquire, em função de sua aparência idêntica, maior autonomia que

22

Idem, ibidem, pp.22-27. 23

Idem, ibidem, p.14. 24

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. Disponível em:

<http://www.dorl.pcp.pt/images/SocialismoCientifico/texto_wbenjamim.pdf>. Acesso em: 22 set. 2009.

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a reprodução manual e pode ampliar sua circulação em diversos contextos. Essa questão

torna-se clara ao se considerar que, tradicionalmente, a recepção da arte esteve vinculada a

seu valor de culto (objetivo primeiro da produção artística) e ao valor da exposição da obra.

Nesse sentido, “a reprodutibilidade técnica da obra de arte emancipa-a, pela primeira vez na

história do mundo, da sua existência parasitária no ritual” 25

.

Nessa perspectiva, a abordagem benjaminiana enfatiza a recepção da obra de arte

original, que possui uma aura, elemento vinculado ao “aqui e agora” de sua exposição e que

não pode ser reproduzido. Desse modo, a arte abandona o império da “bela aparência” ao

mesmo tempo em que altera sua relação com as massas e torna-se muito mais próxima da

lógica capitalista. O filme, por sua vez, inscreve-se nesse contexto com sua profusão de

imagens em sequência, estabelecendo uma distinção na recepção. Enquanto os quadros

convidam o observador à contemplação e às associações subjetivas, a narrativa fílmica

impede tal tipo de postura por exibir diversas imagens em uma continuidade. Nesse caso, não

há o valor de culto, tradicionalmente vinculado à representação pictórica26

.

Já Adorno e Horkheimer formularam o conceito de indústria cultural. Esse termo

designa, por sua vez, um sistema composto pelo cinema, rádio e revistas, conformando um

mercado de bens culturais, os quais são consumidos passivamente como produtos comerciais,

criando-se um monopólio da cultura de massas sob o poder de uma elite econômica dirigente.

Tais bens possuem como objetivo a diversão, são produzidos apenas para um consumo

passivo e não para o esclarecimento, tampouco para a formação de um pensamento crítico27

.

A indústria cultural, dessa forma, representa a meta do liberalismo econômico,

enquanto sua ideologia constitui um instrumento de dominação por meio da racionalidade

técnica28

. A produção cultural, mercadificada, fundamenta-se sua utilidade no valor de troca29

.

Portanto, o sistema atua na mistificação das massas transformando as obras de arte em

mercadorias, enquanto a concepção de arte livre de imperativos e imposições econômicas

tende a entrar em decadência.30

Existem, no entanto, outras abordagens da produção cultural

que levam em consideração elementos não apenas vinculados à lógica capitalista. Mas, ainda

assim, o conceito de indústria cultural torna-se mais visível à condição da obra de arte na

contemporaneidade.

25

Idem, ibidem. Tal fato vincula-se à relação que estabelece que o valor singular da obra de arte autêntica

fundamenta-se no ritual em que adquiriu seu valor de uso original e primeiro. Cf. BENJAMIN, Walter, op. cit. 26

Idem, ibidem. 27

ADORNO, T.; HORKHEIMER, M. A indústria cultural: o esclarecimento como mistificação das massas. In:

______. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Zahar, 1985, pp.113-156. 28

Idem, ibidem, pp.123,138,114. 29

Idem, ibidem, p.148. 30

Idem, ibidem, pp.113-156.

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2.2 ASPECTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DA ANÁLISE FÍLMICA

Após um quarto de século, o cinema torna-se a mais recente forma de arte31

. A

linguagem fílmica continua envolvida na expansão e diversificação de seus elementos,

constituindo uma trajetória de amadurecimento32

. No entanto, o fenômeno da identificação

produzido pelos filmes permanece praticamente além de uma explicação racional, com seu

poder de sedução e catarse33

. O cinema engloba, logo, um conjunto de técnicas de filmagem e

produção que, no entanto, possuem grande potencial para criação e manipulação de diferentes

estados emocionais e psicológicos, em função também de sua semelhança com a realidade

concreta.

Ainda assim, algumas considerações se fazem necessárias. Embora filme e cinema

sejam utilizados recorrentemente como sinônimo, a definição mais adequada desse talvez seja

a que o “remete a uma instituição, no sentido jurídico-ideológico, a uma indústria, a uma

produção significante e estética, a um conjunto de práticas de consumo, para nos atermos a

alguns aspectos essenciais” 34

. O filme, portanto, constitui uma narrativa visual e sonora

composta por diversos elementos que a estruturam na forma de um discurso articulado, que

produz sentidos explícitos e implícitos, ao representar uma estória por meio de seu conteúdo

diegético. Um filme torna-se coerente, do ponto de vista da linguagem, ao estabelecer uma

continuidade narrativa.

Para essa finalidade, a montagem figura como uma operação fundamental. Existem

diversas teorias e definições da montagem, mas pode-se defini-la, basicamente, como um

processo de combinação e organização dos planos, trechos de filmes existentes entre dois

cortes, a fim de construir uma idéia, tese ou ponto de vista. André Bazin (1918-1958), crítico

e teórico francês, afirma que existiram no mínimo duas opiniões/atitudes dos cineastas frente

ao filme: o discurso fílmico como um fim artístico em si mesmo, e como instrumento, ou

meio, de restituição da realidade concreta e objetiva. A partir desses posicionamentos, a

montagem também foi discutida em relação à sua relevância e função na produção de um

filme, originando duas concepções distintas: a montagem como elemento dinâmico e

31

CARRIÈRE, Jean-Claude. Algumas palavras sobre uma linguagem. In: ______. A linguagem secreta do

cinema. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, p.18. 32

Idem, ibidem, pp.19 e 22. 33

Idem, ibidem, pp.75 e 99. Xavier afirma que os mecanismos que basicamente produzem o efeito de

identificação com o público são o shot/reaction shot, ou seja, o campo-contracampo, movimento de câmera

típico dos diálogos; e a câmera subjetiva, imagem filmada a partir do olhar de um personagem. Cf. XAVIER,

Ismail. A decupagem clássica. In: ______. O discurso cinematográfico: entre a opacidade e a transparência.

Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984, p.26. 34

AUMONT, Jacques et al.. Introdução. In: ______. A estética do filme. Campinas: Papirus, 1995, p.17.

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essencial do cinema e a montagem definida enquanto instrumento submetido à instância

narrativa35

. Essa última noção vincula-se à concepção de “transparência”, de que o filme torna

invisível o seu processo de produção, sugerindo um discurso neutro e que sustenta a

ilusão/impressão de realidade. Tal característica fundamenta o naturalismo hollywoodiano, o

qual possui uma pretensão de constituir um efeito de janela, em parte por sua fluência

narrativa, ocultando a condição de representação artística do filme36

. Essa concepção tornou-

se um paradigma cinematográfico, tendo vigorado como modelo entre 1919 e 1938, segundo

Ismail Xavier37

, embora continue exercendo significativa influência nas produções atuais,

mesmo ao lado de correntes mais críticas desse modo de representação.

Como todo produto de natureza cultural, seja associado a uma escala industrial ou não,

o filme, portanto, possui um conjunto de vínculos com a sociedade na qual foi produzido. Ao

mesmo tempo possui historicidade, e o conhecimento desta contribui para compreendê-lo de

forma adequada. De modo geral, uma análise deve levar em conta o sentido literal da obra,

seu conteúdo, bem como sua linguagem, e suas condições sociais de produção, incluindo

diversas variáveis externas à narrativa em si.

O interesse pelos filmes por parte de historiadores profissionais como objetos de

estudo torna-se visível apenas a partir de 1960 e 1970, na historiografia européia, no âmbito

do movimento de renovação surgido na França, que destacava a importância da diversificação

das fontes a serem utilizadas pela História38

. No início do século XX, segundo Ferro, o filme

não fazia parte do universo mental do historiador, sendo considerado pelos intelectuais apenas

uma forma de entretenimento das massas, deixando de constituir uma manifestação cultural

relevante para a pesquisa histórica. Nessa época, as fontes escritas já estavam consolidadas

como documentos apropriados para os historiadores, sendo visto com certo preconceito a

investigação de fontes imagéticas39

.

No entanto, com o notável e rápido desenvolvimento e popularização do cinema na

primeira metade do século XX, o filme começa a adquirir maior visibilidade além de seu já

tradicional público-alvo. Dessa forma, o filme começa a perder muito da carga pejorativa a

35

AUMONT, Jacques et al.. A montagem. Op. cit., p.71. 36

XAVIER, Ismail. Do naturalismo ao realismo crítico. Op. cit., p.35. 37

Idem, ibidem, p.34. 38

KORNIS, Mônica Almeida. História e cinema: um debate metodológico. Estudos Históricos, Rio de Janeiro,

vol.5, n.10, 1992, p.7. Disponível em: <

http://www.cliohistoria.110mb.com/videoteca/textos/historia_cinema.pdf> Acesso em: 10 maio 2011; RAMOS,

Alcides Freire. Introdução. In: ______. Canibalismo dos fracos. Cinema e História do Brasil. São Paulo:

EDUSC, 2002, p.16. 39

FERRO, Marc. O filme: uma contra-análise da sociedade? In: LE GOFF, J.; NORA, P. (orgs.). História:

novos objetos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976, pp.199-201.

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17

que estava associado e torna-se objeto de interesse por parte de historiadores. Inicialmente,

esse interesse esteve vinculado ao fato de os filmes constituírem provas irrefutáveis de

eventos, já que captavam objetivamente as cenas desejadas40

. A importância, nesse caso,

reside em seu aspecto puramente documental, de indício sem mediações, diferente dos textos

escritos, embora já fosse conhecida a possibilidade de fraudes e adulterações no material

fílmico41

.

Entretanto, essa visão começa a se modificar, na medida em que se percebe o valor

que o filme possui enquanto representação histórica de uma época. Rosenstone afirma que,

inicialmente, a relação entre cinema e História nas pesquisas acadêmicas não constituía um

campo definido, mas antes uma tendência. Além disso, as primeiras abordagens desse tipo de

objeto foram a História do filme e o filme como documento42

. As possibilidades dessa

narrativa como fonte para a História, ainda assim, geraram intensos debates, com

posicionamentos favoráveis e desfavoráveis43

.

O filme, segundo Ferro, independente do que seja, é história, pois mesmo fiscalizado

ou censurado, testemunha e muitas vezes pode ser um ato involuntário. Nesse sentido, a

narrativa fílmica possui lapsos que figuram como mecanismos reveladores de sentidos e

significações, que não necessariamente fazem parte do objetivo do produtor, diretor ou

roteirista. A partir desse princípio, as imagens fílmicas produzem uma contra-análise da

sociedade44

. Ao congregar diferentes sentidos, um filme geralmente possui um conteúdo

aparente, o qual é literalmente compreendido, e um conteúdo latente, que pode ser

identificado por meio da vinculação com a conjuntura na qual a obra foi produzida. Assim,

“um filme, qualquer que seja, sempre excede seu conteúdo” 45

.

Atualmente, “a história que vivemos é condicionada pela imagem”, afirma Pierre

Sorlin46

. Num mundo em que as imagens adquiriram importância significativa, é necessário,

em relação aos filmes, identificá-las e compreendê-las a partir de sua linguagem própria, de

seu sistema de signos. Como já citado, ao pressupor que o filme possui um conjunto de

40

KORNIS, Mônica Almeida, op. cit., p.4. 41

FERRO, Marc, op. cit., pp.201-202. 42

ROSENSTONE, Robert. Introduction. Personal, Professional, and (a little) theoretical. In: ______. Visions of

the past. The challenge of film to our idea of history. Cambridge: Harvard University Press, 1995, p.3.

Cumpre lembrar, entretanto, que atualmente já está disponível uma relevante bibliografia dedicada à relação

entre cinema e História, assim como essa tendência de estudos tem se fortalecido significativamente. 43

Para uma abordagem dessa discussão, cf. GUYNN, William. Introduction. Facing the skepticism of historians.

In: ______. Writing history in film. New York: Routledge, 2003, pp.1-22. 44

FERRO, Marc, op. cit., pp.203, 202, 204. 45

Idem, ibidem, pp.209 e 213. 46

SORLIN, Pierre. Indispensáveis e enganosas, as imagens, testemunhas da História. Estudos Históricos, Rio

de Janeiro, vol.7, n.13, 1994, p.11. Disponível em: <http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/138.pdf>. Acesso em:

22 set. 2009.

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elementos com suas respectivas significações, não há como apenas considerar as variáveis

externas a fim de obter uma análise e compreensão integral da obra. Em suma, considerando o

filme como documento histórico, cumpre adotar uma metodologia que permita a realização de

uma crítica interna da narrativa fílmica e uma crítica externa, que busque discutir e articular

as diversas variáveis, fatores ou condicionantes que envolvam a produção, exibição e

recepção, bem como a visão de mundo e influência dos produtores, roteiristas, diretores e

realizadores, a fim de construir uma análise fílmica47

. De acordo com a reduzida dimensão do

presente estudo, no entanto, fora realizado um breve estudo da recepção do filme Blade

Runner, mas que pode ser ainda mais aprofundado.

A prática de analisar filmes possui alguns obstáculos inerentes à sua atividade. De

ordem material, pode-se comentar o fato de que o texto fílmico é impossível de ser citado

assim como o texto escrito. Além disso, é necessário anotar redes de observação em função

dos eixos escolhidos para a investigação, bem como produzir sistemáticas anotações. Já do

ponto de vista psicológico, a análise implica assumir uma postura científica, de modo tal que

se evite um olhar excessivamente pessoal e subjetivo da obra, embora isso em alguma medida

ocorra, sendo preciso, ao menos, um esforço analítico. Paralelamente, a análise fílmica

trabalha o próprio filme, pois mexem-se seus significados, mas também o analista, já que este

pode reconsiderar suas hipóteses48

.

Do ponto de vista operacional, o processo de análise do filme possui basicamente duas

etapas: decompor a obra em seus elementos constitutivos e reconstruí-lo. Esse procedimento

significa desconstruir o filme para analisá-lo tecnicamente, e empreender uma reconstrução de

acordo com o eixo de idéias que fundamenta a pesquisa ou investigação. Tais etapas, no

entanto, alteram-se incessantemente no texto, que contém a análise49

. Aliás, cabe lembrar,

toda pesquisa científica inicia-se, teoricamente, a partir da motivação originada por uma

problemática e suas hipóteses. O sentido de um filme, por sua vez, está vinculado, no mínimo,

a três instâncias: o autor; o texto e o leitor. Vanoye e Goliot-Lété recomendam a postura de

Umberto Eco ao defenderem, inicialmente, o recurso ao “sentido literal”, ou seja, o que está

explícito na obra50

, a fim de partir, a posteriori, para um determinado tipo de interpretação.

A abordagem sócio-histórica, além dos pressupostos já referidos ao longo do presente

texto, aplica-se a filmes de qualquer gênero cinematográfico, pois considera-se a hipótese de

47

KORNIS, Mônica Almeida, op. cit., p.7. 48

VANOYE, Francis; GOLIOT-LÉTÉ, Anne. Introdução. In: ______. Ensaio sobre a análise fílmica. São

Paulo: Papirus, 1994, pp.10, 11, 18, 12, 13. 49

Idem, ibidem, pp.15-16. 50

Idem, ibidem, pp.53-54.

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que o discurso fílmico sempre dialoga e refere-se ao seu presente. A partir disso, cabe analisar

o mundo representado e construído diegeticamente, que, por sua vez, possui relações

complexas com o mundo histórico e objetivo. Para isso, alguns elementos podem ser

utilizados para nortear a análise, como: os esquemas culturais e “lugares” da sociedade

presentes no filme; os tipos de lutas e papéis ou grupos sociais; a organização e/ou relações

sociais; a maneira de perceber e mostrar fatos e eventos; como se concebe o tempo e o espaço;

e “o que se solicita do espectador” 51

.

Nesse quadro teórico-metodológico conceitualizado também podem ser inseridos

alguns outros elementos relevantes. Além de refletir sobre a relevância social, cultural e

científica do filme, é possível identificar o tipo de história contada, bem como o que se

mostra, o que se omite e a forma como se delimita o tema; a ligação, ou não, com a realidade

na qual foi produzido; a comparação com discursos audiovisuais que possuem o mesmo tema

e a comparação com obras existentes na forma escrita, assim como as possibilidades e limites

de cada uma dessas linguagens. Portanto, em síntese, a abordagem e interpretação sócio-

histórica permitem a análise fílmica a partir da historicidade do objeto, mas também das

características dos elementos da linguagem, que compõem e estruturam o filme,

considerando-se as variáveis da narrativa com a conjuntura histórica na qual foi produzida,

com sua exibição e recepção do público e crítica especializada.

51

Idem, ibidem, pp.55-57.

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20

3 BLADE RUNNER

3.1 O FILME: SINOPSE E COMENTÁRIOS

O filme Blade Runner, dirigido por Ridley Scott e lançado nos EUA em 1982,

constitui uma das obras de ficção científica mais importantes e emblemáticas da década de

1980. Articulando elementos de film noir, de gênero policial e da ficção científica, a obra tem

como roteiro uma história de perseguição, mesclando questionamentos filosóficos,

existenciais e uma expectativa anti-utópica, ou distópica, do futuro. Baseado na obra de Philip

Dick (1928-1982), Do Androids Dream Of Electric Sheep?, de 1968, a estória de Blade

Runner é ambientada na cidade de Los Angeles de novembro de 2019. A metrópole apresenta

como principais características uma superpopulação e um alto nível de urbanização, constante

chuva ácida decorrente dos desequilíbrios ambientais e da excessiva poluição, bem como uma

desorganização social e econômica mais intensa do que a dos grandes centros urbanos

atuais52

.

Assim, no início do século XXI, uma empresa chamada Tyrell Corporation evolui sua

produção de andróides para a fase Nexus-6, cujas criaturas apresentam características

aparentemente indistinguíveis dos seres humanos, mas com capacidades físicas e intelectuais

superiores, e são conhecidos como Replicantes. Tais andróides são utilizados na conquista e

exploração de outros planetas e após algumas revoltas acabam por serem considerados ilegais

na Terra. Cria-se, então, uma divisão policial especial, os blade runners, encarregada de

eliminar os Replicantes clandestinos. A isso se atribui a designação de “aposentadoria” e não

de assassinato53

. Logo, após um motim no espaço, os andróides Nexus-6 Roy Batty (Rutger

Hauer), Pris (Daryl Hannah), Leon (Brion James) e Zhora (Joanna Cassidy), liderados por

Roy, sequestram uma nave e partem em direção a Terra para encontrar seu criador e reverter

seus prazos de vida previamente fixados em quatro anos, que havia sido implantado como

uma medida de segurança.

Nesse momento, Rick Deckard (Harisson Ford), um ex-blade runner, é chamado para

a missão de eliminar os Replicantes fugitivos e acaba conhecendo uma Replicante especial

52

Blade Runner (Blade Runner, 1982, EUA). Dir.: Ridley Scott. 53

Tal termo é utilizado no filme, já que os Replicantes, embora idênticos aos seres humanos, eram robôs

humanóides e, logo, não seria um assassinato ou homicídio no sentido estrito da expressão. Isso remete

claramente à questão da humanidade, e do que a define, presente na narrativa fílmica. Cf. SUPPIA, Alfredo Luiz

Paes de Oliveira. Esboço para uma história do cinema internacional de ficção científica. In: ______. Limite de

Alerta! Ficção científica em atmosfera rarefeita – Uma introdução ao estudo da FC no cinema brasileiro e

em algumas cinematografias off-Hollywood. Campinas, 2007. 449f. Tese (Doutorado em Multimeios) –

Instituto de Artes, UNICAMP, p.66.

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chamada Rachel (Sean Young). Deckard cumpre sua missão, aposentando os andróides a que

foi incumbido. Destaca-se, no entanto, a perseguição de Roy que acaba se invertendo, e o

protagonista passa a ser perseguido por ele. Nessas cenas, próximas do final do filme, Roy

não mata Deckard e, além disso, o salva de cair de um edifício. O blade runner durante toda

as caçadas acaba se questionando sobre a legitimidade de seu trabalho e sobre sua própria

natureza, enquanto se apaixona por Rachel, recusando-se a eliminá-la e vindo a fugir com ela

no final54

.

O filme teve diferentes versões após o lançamento do original. O total de edições

chega a sete55

. A versão lançada nos cinemas dos EUA em 25 de junho de 198256

é conhecida

como U.S. Theatrical Cut. Nela destacam-se principalmente a narração em voice-over

realizada por Deckard e o final feliz (happy ending), quando o casal Deckard e Rachel foge de

carro por entre uma paisagem de montanhas com neve, em relação às demais versões. No

mesmo ano foi lançada uma edição destinada à exibição fora dos EUA, intitulada

International Theatrical Cut, a qual apenas apresentava um pouco mais de violência em

comparação à versão estadunidense57

.

Em 1993 é lançada em DVD a edição originalmente concebida por Ridley Scott,

embora não tenha tido a participação direta do diretor. Conhecida como Director’s Cut, a

versão apresenta maiores ambigüidades, tornando mais provável a possibilidade de Deckard

ser também um Replicante. Uma das cenas incluídas é a do sonho que o caçador de andróides

tem com um unicórnio. Tal fato, ao lado dos origamis que representam o mesmo animal feitos

pelo policial Gaff ao longo do filme, além de outros indícios, fornecem base para essa

hipótese. A mesma edição também não contém a narração do protagonista, nem as últimas

cenas da fuga, originalmente incluídos por decisão da produtora Tandem Productions com o

objetivo de tornar o filme mais comercial e menos complexo ao público.

Por fim, é lançada uma versão mais recente, de 2007, remasterizada e com tratamento

de imagens e efeitos especiais avançados em comparação com o filme exibido nos cinemas

dos EUA. Essa última versão é muito parecida com a Director’s Cut, embora tenha tido

algumas cenas estendidas e até mesmo uma breve refilmagem da cena em que a Replicante

Zhora foge de Deckard. Há ainda mais três edições produzidas do filme, que não apresentam

54

Idem, ibidem, p.66. 55

Disponível em: <http://amemoriadotempo.blogspot.com/2011/05/blade-runner-historia-de-um-filme-

culto.html>. Acesso em: 15 jun. 2011. 56

Disponível em: < http://www.imdb.com/title/tt0083658/releaseinfo>. Acesso em: 24 maio 2011. 57

Disponível em: <http://www.omelete.com.br/cinema/blade-runner-o-cacador-de-androides/>. Acesso em: 24

maio 2011.

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significativa relevância, já que possuem apenas algumas alterações superficiais58

. As quatro

versões referidas, cabe ressaltar, foram lançadas no mercado na forma de um DVD triplo em

edição especial. Acompanha os filmes o documentário Dangerous Days, que retrata o

processo de produção, exibição e recepção da versão original, com base em diversos e

extensos depoimentos de membros da equipe responsável pela realização do filme.

O cineasta Ridley Scott nasceu em 30 de novembro de 1937 em South Shields,

nordeste da Inglaterra. Seu irmão, Tony Scott, também é diretor de cinema, e ambos perderam

outro irmão, que foi vítima de um câncer em 1980. Ridley originou-se de família

conservadora de classe média e recebeu uma educação liberal, em função da qual desenvolveu

talentos e habilidades. Uma delas descobre ainda quando criança: o desenho. Essa prática terá

grande importância na produção de seus filmes. Scott, além de não ser do tipo acadêmico,

ingressa no West Hartlepool College Of Art em 1954. Nesse período de estudo interessa-se

por fotografia e design gráfico. Em 1958 forma-se e ingressa na Royal College Of Art (RCA),

onde estuda mais aprofundadamente seu segundo interesse59

.

Após sua formação universitária e alguma experiência profissional, Scott ingressa na

BBC, em 1962, como diretor de arte para desenhar sets de programas televisivos, trabalho que

lhe rende grande aprendizado, e também começa a se envolver com comerciais. Nessa época

adquire importância seu estilo de iluminação nas produções que realizava, o que se torna sua

marca. Além de possuir grande preferência em trabalhar com comerciais, sai da BBC, torna-se

um respeitado diretor publicitário e funda em 1965 a Ridley Scott Associates (RSA), sua

produtora. Assim, entre as décadas de 1960 e 1970 trabalha incessantemente com direção e

produção de comerciais para televisão60

.

Em sua trajetória profissional, conhece a revista francesa de quadrinhos Metal Hurlant

(traduzida para o inglês como Heavy Metal), cujo um dos artistas era Jean Giraud, o Moebius.

A indicação da revista para Scott ocorreu por meio de Ivor Powell, amigo e profissional do

cinema. As concepções visuais desses desenhos influenciarão intensamente Scott, o que se

pode notar nitidamente em Blade Runner, entre outros. Um dos seus principais filmes e

primeiro sob essa influência estética, por sua vez, foi Alien (1979), um thriller de ficção

científica mesclado com terror tradicional e horror gótico. O filme recebe o Oscar de efeitos

especiais em 1980 e teve destaque no design de produção. Já no final da década de 1970,

58

Ibidem. 59

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Anexos. In: ______. A metrópole replicante: de Metropolis a

Blade Runner. Campinas, 2002. 314f. Dissertação (Mestrado em Multimeios) – Instituto de Artes, UNICAMP,

pp.261-264. 60

Idem, ibidem, pp.267, 269 e 271.

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Scott começa a trabalhar no projeto de Duna (1984), mais uma obra de ficção científica, mas

acaba abandonando-o e se envolvendo com Blade Runner, do qual se torna diretor61

.

Michael Deeley, por sua vez, é um produtor e roteirista britânico62

. Produziu mais de

30 filmes, entre eles os clássicos The Italian Job (1969), The Deer Hunter (1978) e Blade

Runner. Trabalhou para diversas companhias, como Universal, Paramount, Twentieth

Century Fox, Warner Brothers, Columbia, United Artists, EMI, HBO, CBS e NBC. Deeley

entrou na indústria cinematográfica em 1952, com o cargo de editor assistente. Em 1958, foi

diretor de distribuição de filmes de televisão na Grã-Bretanha na empresa MCA Universal; em

1964 foi administrador geral e produtor da Woodfall Films e no final dos anos 1960 trabalhou

como produtor independente de filmes para a Paramount. Também foi diretor e, mais tarde,

dono da British Lion Films em 1973, mas em meados da mesma década, vende a empresa

para a EMI e se torna diretor e presidente da EMI Films Ltd. Um de seus momentos de

destaque foi ter recebido o Oscar de 1979, como produtor de The Deer Hunter. No entanto,

ainda assim o maior filme de sua carreira foi Blade Runner. Entre 1985 e 1990 foi chefe de

produção da Consolidated Entertainment Inc., sendo responsável por numerosos filmes para

televisão. Atualmente, Deeley é vice-presidente da The British Screen Advisory Council63

.

Hampton Fancher é roteirista, diretor e ator64

, cresceu na região leste de Los Angeles e

dedicou-se ao flamenco ainda a partir da adolescência, tornando-se dançarino depois de

abandonar a escola. Após abandonar essa carreira e trabalhar como ator, Fancher começa a

escrever com objetivo de produzir roteiros. Tentou adaptar vários livros de Charles Bukowski

para as telas e obter os direitos de Naked Lunch, escrito por William Burroughs, mas não

conseguiu. No entanto, logrou sucesso ao comprar os direitos de Do Androids Dream Of

Electric Sheep?, escrito por Philip K. Dick, e adaptou para o cinema, que veio a ser Blade

Runner. Fancher afirma que quando terminou o quarto rascunho do roteiro, não havia nada

originalmente do livro, exceto o teste Voight-Kampff. Além disso, Fancher também trabalhou

como diretor do filme The Minus Man (1999) 65

. Já David Peoples, roteirista, editor e diretor

norte-americano66

, é conhecido por ser trabalho com Blade Runner e Twelve Monkeys (1995).

Durante um período em 1992, teve três de seus filmes nos cinemas ao mesmo tempo:

61

Idem, ibidem, pp.275, 276 e 278. 62

Disponível em: <http://pro.imdb.com/name/nm0214303/>. Acesso em: 27 jan. 2011. 63

Disponível em: <http://pro.imdb.com/name/nm0214303/bio>. Acesso em: 27 jan. 2011 64

Disponível em: <http://pro.imdb.com/name/nm0266684/maindetails>. Acesso em: 24 jan. 2011. 65

Disponível em: <http://gettingit.com/article/14>. Acesso em: 20 maio 2011. 66

Disponível em: <http://pro.imdb.com/name/nm0672459/>. Acesso em: 27 jan. 2011.

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Accidental Hero (1992), uma reedição de Blade Runner e, o vencedor do Oscar, Unforgiven

(1992) 67

.

O título do filme, por sua vez, passou por algumas mudanças. Originalmente

denominado Dangerous Days, o roteiro escrito por Hampton Fancher agradou ao produtor

Michael Deeley, que inclusive atribuiu esse título, e a Ridley Scott, embora esse tivesse

rejeitado o projeto depois de ler o primeiro roteiro, intitulado Android68

. No entanto, Deeley

sugere o uso do título Blade Runner69

, por sua vez retirado da obra Blade Runner: a movie

(1979), escrito por William Burroughs. Assim, houve a necessidade de se comprar o uso do

termo do escritor.

Posteriormente, entretanto, descobriu-se a existência de uma obra anterior, intitulada

The Bladerunner (1974), escrita por Alan Nourse. A estória desse livro constitui uma ficção

científica, na qual contrabandistas chamados de blade runners abasteciam com órgãos uma

sociedade empobrecida e com escassez de recursos médicos. Assim, a obra de Burroughs

consistia em uma adaptação cinematográfica escrita do livro de Nourse. Scott, paralelamente,

interessou-se pelo título Gotham City, mas não obteve autorização do uso do termo por parte

do produtor de Batman. Por fim, Deeley conseguiu regularizar a licença de utilização da

expressão com Nourse e tornou-se o título definitivo do filme70

.

De fato, Blade Runner é considerado ainda hoje um filme suscetível a diversas

interpretações, em função de seu roteiro complexo e sua formulação de uma expectativa

realista, distópica e factível do futuro. Tal aspecto reforça sua relevância social e cultural

como não apenas no campo do cinema, mas também nas ciências humanas enquanto possível

objeto de estudo sob diferentes perspectivas de abordagem, e enquanto objeto de reflexão

sobre as mudanças na sociedade. Entre as diversas leituras possíveis dessa narrativa fílmica,

podem-se eleger alguns tópicos de discussões pertinentes.

O debate que o filme apresenta sobre as relações entre ser humano e Replicante é

perceptivelmente claro, criando uma reflexão existencial-filosófica sobre as semelhanças

entre esses dois seres quanto à vontade de viver e à expectativa de vida. Dada a existência

limitada dos andróides fixada em apenas quatro anos, eles não possuem tempo suficiente para

ter experiências emocionais. Logo, figura também a importância da memória na constituição

67

Disponível em: <http://www.imdb.com/name/nm0672459/bio>. Acesso em: 20 maio 2011. 68

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Sinopses e comentários. In: ______. A metrópole replicante: de

Metropolis a Blade Runner, pp.16-17. 69

Literalmente, a expressão significa: “aquele que corre por sobre o fio de uma navalha”. 70

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira, op. cit., p.17.

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da identidade e na orientação temporal dessas criaturas, além da construção de expectativas

sobre o devir.

A partir dessa questão, também pode-se discutir e analisar o Replicante como

simulacro do ser humano. Ou seja, uma cópia idêntica, mas que vai mesmo além em força

física, bem como apresenta, no mínimo, tanta inteligência quanto os engenheiros genéticos

que o produziram. Esses seres são apresentados em uma condição de escravidão, embora

sejam totalmente autoconscientes e portadores de uma humanidade rara, não identificada nos

personagens humanos, além da condição humana lhes ser vetada por razões legais71

. Sobre

esses personagens e sua busca por maior tempo de vida, Menezes afirma:

Os replicantes buscam, em todo o seu tempo, uma humanidade-identidade-tempo-

memória perdida, não só para eles, mas perdida no próprio homem que vive em um

mundo cujo sentido não é mais visível e imediato, onde tudo o que parecia ser fácil

transforma-se em indagações que escorrem inquestionavelmente por entre os nossos

dedos72

.

A temática clássica vinculada à ficção científica da relação entre criador humano e

criatura artificial também emerge no filme, constituindo uma das tensões que fundamenta a

trama. A criatura, nesse caso, revolta-se contra seu criador, em função da vontade de ter mais

tempo de vida. Subjacente à produção em série de robôs humanóides para conquista e

colonização espacial está a lógica de uma nova forma de imperialismo em estágio avançado, a

qual alcançou mesmo um nível interplanetário. Já na Terra, a imigração patente e a

globalização geraram um cenário urbano multicultural e de intensa diversidade étnica, em que

um grande número de indivíduos, asiáticos, norte-americanos, etc., convive em um espaço

eclético, em função da quantidade de influências culturais.

As empresas, por sua vez, existem em grande quantidade, apontando para uma

supremacia do capitalismo pós-industrial sobre a qualidade de vida e a organização social.

Nesse mesmo contexto, constitui-se uma superpopulação, que habita construções antigas, ao

lado de edifícios recentes, abandonadas por indivíduos que partiram para as off-world

colonies: as colônias de moradia existentes no espaço, e que parecem configurar mesmo uma

“Nova América”73

.

71

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. A Construção da Lenda. In: ______. A metrópole replicante: de

Metropolis a Blade Runner, p.175. 72

MENEZES, Paulo. Blade Runner – entre o passado e o futuro. Tempo Social, Rev. Sociol. USP, São Paulo,

11(1): 154, maio de 1999. 73

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Arquitetura da Metrópole: Metropolis 2026; Los Angeles 2019. In:

______. A metrópole replicante: de Metropolis a Blade Runner, p.45.

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26

Além disso, a poluição ambiental e a preocupação ecológica no filme, quando se faz

referência aos animais que são, na maioria, artificiais, exemplifica mais um viés de análise e

mais um aspecto dessa sociedade futurista. Também é possível notar a hegemonia de um

poder e sistema tecnológico, representado pelas grandes corporações, e a aparente ausência de

instituições do Estado, com exceção da polícia, o único aparelho ainda em funcionamento, e

que existe como órgão a favor dos monopólios. Por fim, e a partir dessas possíveis discussões,

pode-se identificar na sociedade descrita pelo filme uma crise dos valores e do projeto do

iluminismo de conduzir o Homem à emancipação, por meio da razão, à felicidade e ao

progresso.

Quando lançado nos cinemas dos EUA, Blade Runner não foi positivamente recebido

pelos espectadores, nem pela crítica especializada, vindo a permanecer desfavorável à opinião

pública geral. De fato, o público se identificou melhor com filmes mais otimistas da mesma

época, como E.T.: The Extra-Terrestrial (1982)74

, entre outros. No entanto, gradativamente

passa a exercer uma intensa ressonância cultural ao tornar-se um ícone da ficção científica

cinematográfica. Além de ser um dos mais documentados e cultuados em uma quantidade

considerável de sites, a narrativa fílmica obteve lucro a longo prazo, financeiramente e em

termos de crítica, tornando-se um cult movie e vindo a representar significativa influência

para diversas outras produções culturais75

, como jogos de computador e video-game com

personagens do filme; videoclipes de bandas musicais e até mesmo uma enciclopédia

dedicada ao Blade Runner na internet76

.

Ainda em termos de recepção, uma reportagem da BBC afirma que um relatório da

ONU sugere grande precisão apresentada pelo filme quanto às mudanças no meio ambiente.

O texto aponta que alguns aspectos descritos em Blade Runner são ou podem se tornar

realidade, efetivamente. O surgimento de idiomas híbridos baseados no inglês, uma língua de

alcance global atualmente, como, por exemplo, o Spanglish e o Singlish, fornece um indício

de paralelo com o cityspeak, dialeto urbano apresentado no filme, que mescla japonês,

74

Dangerous Days – Making Blade Runner (Dangerous Days – Making Blade Runner, 2007, EUA). Dir.:

Charles de Lauzirika. 75

Segundo Alfredo Suppia, o filme “Também ganhou freqüentes reexibições em cinemas alternativos e

cineclubes e, no meio acadêmico, tornou-se um dos filmes mais pesquisados ou citados em todos os tempos.

Essa retomada de Blade Runner garantiu-lhe espaço entre os chamados cult movies, filmes que mantêm um

público cativo no decorrer do tempo, com surtos regulares de interesse e influência sobre a sua e também outras

espécies de mídia”. Cf. SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Sinopses e comentários. In: ______. A

metrópole replicante: de Metropolis a Blade Runner, p.20. Pode-se citar aqui um dos mais conhecidos sites:

BladeZone: The Online Blade Runner Fan Club and Museum. Disponível em: <http://www.bladezone.com>.

Acesso em: 14 jun. 2011. 76

FILHO, Antonio Gonçalves. Sonho replicante. Vinte anos depois, Blade Runner, o Caçador de Andróides

permanece atual. Época, 21 jan. 2002. Disponível em: <http://epoca.globo.com/edic/20020121/cult1a.htm> .

Acesso em: 19 fev. 2010.

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27

espanhol e alemão. Além disso, dirigíveis têm sido sugeridos como perfeitas plataformas para

servir como mastros de telefones móveis e o desenvolvimento do SoloTrek, um protótipo de

helicóptero utilizado nas costas, representam mais uma possível realização de especulações

presentes no filme77

.

3.2 A OBRA A PARTIR DE DANGEROUS DAYS E DO IMDbPro

As fontes utilizadas para a presente pesquisa foram o documentário Dangerous Days –

Making Blade Runner78

e o site IMDbPro (Internet Movie Database)79

. De fato, a primeira

fonte forneceu um volume mais significativo de informações e dados a respeito de Blade

Runner, seu processo de produção, exibição e recepção, de modo a produzir uma

contextualização adequada e necessária para a análise fílmica, enquanto os dados

provenientes do IMDbPro foram mais pontuais. O documentário Dangerous Days – Making

Blade Runner, produzido e dirigido por Charles de Lauzirika e lançado em 2007, trata de

todas as etapas do processo de produção do filme Blade Runner. Ao final, inclusive, há uma

parte dedicada à recepção que o filme sofreu e ao legado que deixou. Fundamentalmente, a

narrativa fílmica é composta e baseada em depoimentos de pessoas que fizeram parte da

produção do filme e também dos responsáveis pelas companhias cinematográficas que

financiaram o projeto, os quais exerceram significativa influência sobre a versão original do

filme, de 1982.

Charles de Lauzirika, por sua vez, é um documentarista premiado, diretor e produtor

de filmes em DVD. Além de ter trabalhado como editor de entretenimento, foi colaborador do

periódico escolar semanal El Vaquero. Lauzirika graduou-se em 1994 na School Of Cinematic

Arts da University Of Southern California. Durante a época em que estudava, chegou mesmo

a trabalhar em diversas companhias cinematográficas, como Lucasfilm Ltd., Lighstorm

Entertainment, Warner Bros., Silver Productions e Scott Free Productions. Após ter

trabalhado com os irmãos Ridley e Tony Scott, Lauzirika fora escolhido pelo primeiro para

produzir DVD’s de edições especiais de seus filmes clássicos. Em 2008, recebeu dois Saturn

Awards, pelo DVD de Blade Runner, na categoria de Best DVD Special Edition, e por Twin

77

How much of Blade Runner has come true? BBC News, 6 fev. 2001. Disponível em:

<http://news.bbc.co.uk/2/hi/uk_news/1154662.stm>. Acesso em: 19 fev. 2010. 78

Dangerous Days – Making Blade Runner (Dangerous Days – Making Blade Runner, 2007, EUA). Dir.:

Charles de Lauzirika. 79

Disponível em: <https://secure.imdb.com/signup/index.html?d=IMDbTabNB> . Acesso em: 20 maio 2011.

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28

Peaks, como Best Retro Television Release. Além de produtor, Lauzirika tem atuado como

diretor em seus próprios projetos80

.

Além dos depoimentos filmados, o documentário alterna com freqüência os planos dos

entrevistados com planos médios e curtos de cenas do próprio filme e também passagens de

manking of, assim como músicas originais da trilha sonora. A partir disso, constrói-se a

história da produção da obra de Ridley Scott. No entanto, é necessário lembrar da discussão

sobre ficção e não-ficção nesse caso. Paulo Menezes afirma que o documentário representa a

verdade na visão do grande público, ou seja, que seu conteúdo é confiável, diferente do caso

da ficção, conferindo maior credibilidade. Todavia, Menezes defende que esse gênero de

filme constitui antes de tudo um discurso e, assim, uma construção, parcial, direcionada e

interpretativa81

. Desse modo, deve-se manter um distanciamento com relação ao

documentário e reconhecê-lo como tal, a fim de produzir uma visão crítica e sem equívocos.

Segundo o autor:

Nesta acepção, os filmes mais ficcionais são justamente os documentários, os

sociológicos, os antropológicos e os etnográficos, pois são filmes que escondem em

seus próprios nomes os esquemas valorativos que presidem seus esquemas

conceituais construtivos, os sistemas relacionais que constituem, e que omitem, por

meio de suas imagens82

.

Especificamente, a organização do documentário está estruturada em 8 capítulos. O

primeiro intitula-se Incept Date – 1980: Screenwriting and dealmaking83

(Data de Início –

1980: Acordos e Roteiros Refeitos) e trata dos antecedentes do projeto do filme. Hampton

Fancher, roteirista por volta da década de 1970, conhece o livro de Philip Dick, Do Androids

Dream Of Electric Sheep?, por meio de um amigo. Fancher não gostou da obra, inicialmente,

mas decide produzir um filme a partir dela, já que a estória era comercial e lógica, começando

pela produção de um roteiro. Michael Deeley, produtor de cinema na mesma época, lê o

trabalho escrito por Fancher, mas não o aprova de imediato, e vem a se interessar seriamente

pela segunda versão do mesmo autor. Deeley entra em contato com Ridley Scott e o apresenta

esse último texto, o qual a princípio não o interessa, já que estava terminando de produzir

Alien (1979). Scott, todavia, interessa-se posteriormente pelo projeto e passa a integrar a

equipe de produção.

80

Disponível em: <http://pro.imdb.com/name/nm1361273/bio>. Acesso em: 27 jan. 2011. 81

MENEZES, Paulo. Representificação: as relações (im)possíveis entre cinema documental e conhecimento.

Revista Brasileira de Ciências Sociais, vol.18, n.º51, São Paulo, fev.2003, p.8. Disponível em: <

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69092003000100007>. Acesso em: 14 jul. 2008. 82

Idem, ibidem, p.8. 83

00:02:53-00:30:28.

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O financiamento do empreendimento, após os realizadores terem deixado a Filmways

em função dos problemas financeiros que a empresa enfrentava, torna-se, em parte,

responsabilidade da Warner Bros., por meio de Alan Ladd Jr.. Este adquiriu por 7 milhões de

dólares os direitos de distribuição do filme nos cinemas. Jerry Perenchio e Bud Yorkin da

Tandem Productions financiaram os 7 milhões restantes necessários ao orçamento estipulado

para o projeto e receberam os direitos para televisão, DVD e outros. Posteriormente, em

função de desentendimentos com o diretor, Fancher tem de sair da equipe, sendo substituído

por David Peoples.

A segunda parte do documentário, intitulada Blush Response: Assembling the

Cast84

(Resposta Tímida: Reunindo o Elenco), resgata o processo de seleção dos atores que

integrariam o elenco do filme, mostrando as possibilidades de pessoas indicadas para os papéis

criados e como finalmente ficou organizado. Já na terceira parte, designada como A Good

Start: Designing the Future85

(Um Bom Começo: Desenhando o Futuro), são mostradas as

dificuldades em enfrentar o desafio de formular o design do set de filmagem. Scott tinha de

aproveitar as construções que já existiam na cidade cenográfica devido à limitação do

orçamento que se tinha a disposição. A técnica utilizada foi o retrofitting, que consiste

basicamente na “readaptação de construções antigas por intervenções contemporâneas” 86

. O

design, de modo geral, era formulado de acordo com as decisões do diretor e, posteriormente,

era organizado pelo Departamento de Arte da equipe. Nessa parte do documentário também

são evidenciadas algumas das concepções artísticas de Scott quanto ao cenário, a importância

desse como personagem do filme e sua presença na trama.

Eye of the Storm: Production Begins87

(Auge da Tempestade: Produção I) aborda o

início da produção do filme, após os planejamentos iniciais, bem como trata do estilo de

trabalho de Scott e o início de desentendimentos com os financiadores. Para o diretor era

importante o uso da noite, de água e fumaça na atmosfera do filme, de modo a economizar

dinheiro. É interessante perceber, nesse sentido, como diversas necessidades materiais e

concepções estéticas de Scott acabaram por convergir na estética própria de Blade Runner.

Living in Fear: Tension on the Set88

(Vivendo com Medo: Produção II) mostra o que talvez

constituiu alguns dos momentos mais críticos de toda a produção: os problemas de

84

00:30:42-00:53:03. 85

00:53:31-01:19:45. 86

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Conclusão. In: ______. A metrópole replicante: de Metropolis a

Blade Runner, p.241. 87

01:20:01-01:48:34. 88

01:48:51-02:17:48.

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relacionamento de Scott e dos realizadores com os financiadores em relação ao aumento do

orçamento e obstáculos na finalização do projeto.

Já Beyond the Window: Visual Effects89

(Além da Janela: Efeitos Visuais) refere-se a

um aspecto significativo de Blade Runner: a concepção visual. São destacadas as técnicas

utilizadas nos efeitos visuais, como se desenvolveu esse trabalho, bem como o fato de o filme

poder ser considerada uma das últimas obras analógicas do gênero de ficção científica. In

Need of Magic: Post-production problems90

(Precisando de Magia: Edição e Narração)

enfatiza o processo posterior às filmagens e, consequentemente, a finalização do filme.

Aspectos como seleção de cenas e cor das imagens são trabalhadas nesse momento, enquanto

a pressão dos financiadores fez incluírem a narração em voice-over e o final feliz (happy

ending) contra a vontade do diretor e sua equipe. Por último, To Hades and Back: Reaction

and Ressurrection91

(Retorno do Inferno: Reação e Ressurreição) aborda a recepção imediata

que o filme sofreu na época de seu lançamento; o período de fracasso comercial e a

sobrevivência e volta como um cult movie. O documentário, portanto, constitui a principal

fonte para o presente estudo.

A segunda fonte utilizada, como já referido, foi o site IMDPro (Internet Movie

Database). Trata-se de uma extensa base de dados, que é propriedade da empresa

Amazon.com, atualizada diariamente, e contendo diversas modalidades de informação sobre

mais de 1 milhão de filmes e cerca de 2,3 milhões de nomes de artistas relacionados a filmes,

programas de televisão, seriados, etc.92

O IMDb surgiu após a publicação, por seu fundador

Col Needham, de uma série de roteiros que permitiram aos usuários da internet realizar

pesquisas numa lista de créditos colecionada pelo grupo chamado rec.arts.movie93

. A maior

parte dos dados coletados e atualizados pelo sítio origina-se da contribuição de usuários,

pessoas vinculadas à indústria cinematográfica, colaboradores e é constantemente verificada,

de modo a garantir sua autenticidade94

.

Nesse sentido, o site constitui uma fonte de com maior número de informações

atualizadas tanto sobre filmes, programas de televisão e outros, como sobre artistas e pessoas

envolvidas na indústria cinematográfica, sendo também um suporte privilegiado para contatos

profissionais nessa área de atuação95

. Logo, representa um importante canal, onde se podem

89

02:18:14-02:46:42. 90

02:47:02-03:09:51. 91

03:10:08-03:32:07. 92

Disponível em: <http://pro.imdb.com/help/show_leaf?inforsource> . Acesso em: 21 jun. 2010. 93

Disponível em: <http://www.imdb.com/help/show_leaf?history> . Acesso em: 21 jun. 2010. 94

Disponível em: <http://pro.imdb.com/help/show_leaf?infosource > . Acesso em: 13 jun. 2010. 95

Disponível em: <http://pro.imdb.com/help/show_leaf?profeatures> . Acesso em: 21 jun. 2010.

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obter informações que de outra forma seriam mais difíceis de encontrar. Para a presente

pesquisa foi realizado um amplo levantamento de dados relacionados a Blade Runner, sua

produção, distribuição e exibição, bem como sobre seus créditos e ficha técnica, a fim de

constituir uma ferramenta de credibilidade para consulta.

3.3 A OBRA DE PHILIP DICK E O FILME DE RIDLEY SCOTT

Philip K. Dick (1928-1982) foi um escritor de ficção científica que marcou o gênero,

assim como uma época. Sua produção concentrou-se entre o fim dos anos 1950 e a metade

dos anos 1960, sendo associado a um movimento caracterizado por teóricos como New Wave

Of Science Fiction. Tal designação define a influência das temáticas de efervescência cultural

dos anos 1960, a experimentação de drogas e o rock’n’roll na literatura de ficção científica.

Além disso, predominava também o interesse no pensamento tecnológico em relação à

existência humana e a construção de narrativas que envolviam heróis angustiados com

questões existenciais96

. O cerne da obra de Dick, especificamente, é constituído por um

pessimismo em relação à tecnologia, ao futuro e ao próprio ser humano. No entanto, a

redescoberta do autor e de sua importância ocorre principalmente nos anos 1980, a partir de

adaptações cinematográficas de seus livros e contos97

. Dick também é considerado antecessor

do gênero cyberpunk e do estilo technoir 98

.

A definição lato sensu (ampla) de ficção científica implica em sempre que um

discurso ou procedimento científico, ou artefato tecnológico, forem elementos centrais na

narrativa e constituírem componentes influentes no desenvolvimento da estória 99

. De fato, tal

enfoque é por demais abrangente. Assim, para o presente estudo foram privilegiados os

elementos distópicos de Blade Runner e como se articulam na representação de uma

sociedade futurista. A ficção científica, de modo geral, vincula-se indiretamente a diversas

96

AMARAL, Adriana. Blade Runner, Total Recall e Minority Report: cinema distópico e cyberpunk de Philip

Dick. Sessões do Imaginário, n.º 11, julho 2004, Famecos/PUCRS, p.38. Disponível em: <

http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/famecos/article/viewFile/809/615>. Acesso em: 3 dez. 2010. 97

Idem, ibidem, p.37. 98

Idem, ibidem, pp.39-40. O cyberpunk é considerado, basicamente, uma subcultura, um sub-gênero da ficção

científica e uma visão de mundo. A definição do termo remete à um imaginário, que é produto dos anos 1980,

calcado na ficção científica e na cultura pop. Reunindo hackers e pessoas vinculadas ao universo da internet e

presente em diversos campos culturais, suas narrativas literárias apresentam imagens de tecnologias avançadas

mescladas a cenários futuristas distópicos. Já o technoir, do qual Blade Runner é um exemplo emblemático,

representa um estilo cinematográfico que mistura elementos tecnológicos avançados e influências do film noir.

Cf. AMARAL, Adriana. Visões perigosas: para uma genealogia do cyberpunk. Os conceitos de cyberpunk e sua

disseminação na comunicação e na cibercultura. UNIrevista, vol.1, n.º3, julho 2006. 99

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Cinema de Ficção Científica: métodos de abordagem e definição. In:

______. Limite de Alerta! Ficção científica em atmosfera rarefeita – Uma introdução ao estudo da FC no

cinema brasileiro e em algumas cinematografias off-Hollywood, p.9.

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formas de literatura fantástica100

. Embora existam diferentes subgêneros e estilos, com

temáticas mais específicas, esse tipo de narrativa geralmente apresenta um confronto com o

Outro e uma tensão entre o conhecido e o desconhecido101

.

Mas o que talvez explique melhor a especificidade do gênero seja a proposição de que

o compromisso da ficção científica existe com a imaginação e a fantasia, embora utilize muita

matéria-prima da ciência102

. Esta, por sua vez, assume um papel mesmo de personagem nas

estórias. Tal afirmativa, entretanto, não exclui questões e/ou temáticas reais e que

efetivamente são plausíveis e passíveis de serem aplicadas na prática como, por exemplo, o

desenvolvimento da biotecnologia e engenharia genética em níveis avançados, o que pode se

observar em Blade Runner. Assim, a ficção científica discute as inovações científicas e

tecnológicas operadas na sociedade, bem como, na maioria das vezes, as projeta no futuro.

Nesse sentido, Asimov afirma:

Podemos definir a ficção científica como o ramo da literatura que trata da reação

humana às mudanças a nível da ciência e da tecnologia – entendendo que as

mudanças seriam racionais, acompanhando o que era concebido sobre a ciência, a

tecnologia e as pessoas. A verdadeira ficção científica não poderia ter sido escrita

antes do século XIX, pois foi somente com a chegada da Revolução Industrial... que

a velocidade da mudança tecnológica se tornou grande o bastante para ser notada

durante uma vida. Frankenstein de Mary Shelley, publicado em 1818 é a primeira

verdadeira história de ficção científica... Julio Verne foi o primeiro escritor

profissional de ficção científica103

.

Já a obra Do Androids Dream Of Electric Sheep?, publicada em 1968, apresenta

uma estória sobre a perseguição e caça de andróides da unidade cerebral Nexus-6 pelo

“caçador de cabeças a prêmio” Rick Deckard, policial do Departamento de Polícia de São

Francisco. Esse trabalho compõe a continuação do que Dave Holden, também policial do

mesmo órgão, executava, quando acabou por ser ferido por um dos oito andróides que se

rebelaram em uma revolta, após ter aposentado dois deles. Nesse sentido, Deckard parte na

caçada aos seis “andros” restantes, quais sejam: Garland, Luba Luft, Polokov (russo, que

também é chamado de Kadalyi), Pris Stratton, Roy e Imgard Batty.

A busca é realizada tendo em vista o prêmio de mil dólares para cada robô aposentado,

além do salário regular de policial. Deckard, desde o inicio da perseguição, pretende comprar

100

TAVARES, Bráulio. FC, Fantasia, Mitologia. In: ______. O que é ficção científica. 2ª edição. São Paulo:

Brasiliense, 1992, p.12. 101

Idem, ibidem, pp.16, 13 e 17. 102

TAVARES, Bráulio. FC e Ciência. In: ______. O que é ficção científica, p.24. 103

ASIMOV, Isaac. O melhor da ficção científica do século XIX. São Paulo: Melhoramentos, 1988, pp.9-10

apud OLIVEIRA, Dennison de. História e audiovisual: o caso da minissérie “O túnel do tempo”. In: ______

(coord.). O túnel do tempo: um estudo de história & audiovisual. Curitiba: Juruá, 2010, p.11.

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com o dinheiro do prêmio um animal autêntico, posse que é extremamente valorizada ao

longo da obra, pois diversos animais já se encontram em extinção em função do ambiente

poluído resultante da GMT (Guerra Mundial Terminus), e que criou uma permanente poeira

radioativa sobre São Francisco. Assim, o protagonista, ao fim da estória, acaba por realizar

seu trabalho aposentando os andróides restantes e chega mesmo a comprar uma cabra

autêntica, mas que é jogada de cima de seu apartamento por Rachel Rosen. Ao final, Deckard

descansa próximo à sua esposa, após ter encontrado um sapo supostamente verdadeiro, mas

que se revela artificial, enquanto parece se resignar com a situação104

.

O livro apresenta uma preocupação ecológica patente com os animais, representando

uma condenação social por parte dos personagens a maus-tratos ou morte desses. Assim,

proliferam-se animais artificiais, simulacros, a fim de suprir tal escassez. Por isso, a posse de

um animal autêntico adquiri um significado de status social elevado. Um exemplo ocorre

quando Deckard negocia uma coruja supostamente verdadeira com Eldon Rosen, presidente

da Rosen Associations. Além da questão ecológica, o protagonista utiliza a escala Voigt-

Kampff em suas buscas: um teste de empatia que analisa respostas emocionais, de forma a

identificar os andróides, já que esses não possuem empatia por outros indivíduos.

O filme Blade Runner apresenta algumas semelhanças com relação ao argumento

central e equivalência aos personagens do livro de Dick, embora com algumas modificações.

A narrativa fílmica apresenta uma perseguição dos Replicantes pelo protagonista,

delimitando-se fundamentalmente em função das semelhanças entre essas criaturas e os seres

humanos. De fato, é possível ver no filme uma discussão sobre a empatia. Os personagens

principais e mais representativos são: Holden, Leon Kowalski, Rick Deckard, Dr.º Eldon

Tyrell, Rachel, Bryant, J. F. Sebastian, Roy Batty, Pris e Zhora. Holden é o policial que, sob

as ordens do inspetor Bryant, aplica o teste Voight-Kampff em Leon em sua investigação para

encontrar algum Replicante rebelado na Tyrell Corporation.

Leon, por sua vez, é o primeiro Replicante a aparecer no filme, guarda fotos em seu

apartamento como forma de ter um registro de sua existência e história, responde às perguntas

de Holden, mas atira nele com uma arma quando o policial pergunta sobre sua mãe, questão

complexa para ele, já que é um andróide. Rick Deckard é um ex-blade runner. Afastado do

trabalho e desiludido, acaba sendo chamado por Bryant para capturar os quatro (na verdade,

104

DICK, Philip K. O caçador de andróides. 4ª edição. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989. Consuelo da

Luz Lins afirma que tanto no livro quanto no filme, “a recorrência à estrutura narrativa do filme noir americano

dos anos quarenta é evidente”. Cf. LINS, Consuelo da Luz. A ficção científica contemporânea. In: ______.

Blade Runner e Brazil, the film: um corte no cinema de ficção científica. Rio de Janeiro, 1988. 60f.

Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Escola de Comunicação, UFRJ, p.11.

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no filme é dito seis) Replicantes que fugiram para a Terra. Parece cético, sem perspectivas e

assemelha-se ao detetive dos filmes noir 105

.

Eldon Tyrell é um cientista, provavelmente, grande empresário da área de

biotecnologia e dono da Tyrell Corporation, instituição de engenharia genética que produz a

geração Nexus-6 de andróides. De aparência excêntrica, óculos grandes e com lentes grossas,

e impessoal, mostra ser um indivíduo determinado e obcecado fundamentalmente na meta de

sua empresa: o comércio. Rachel, sua funcionária, é uma Replicante. Como revelado ao final

do filme, ela é especial, pois não possui prazo de validade (four year-life span). Além disso,

carrega implantes de memória da sobrinha de Tyrell, que criam, nas palavras do empresário,

um ambiente aconchegante para os Replicantes, já que esses não possuem experiências

emocionais como os seres humanos. Já Bryant é um comissário da polícia de Los Angeles.

Seu perfil associa-se ao estereótipo do xerife estadunidense; Deckard diz mesmo que ele é o

xerife que nas histórias xinga os negros de niggers (termo pejorativo em inglês).

J. F. Sebastian, por sua vez, é um engenheiro genético solitário que não foi aprovado

no exame médico e por isso permaneceu na Terra ao invés de ir para as off-world colonies.

Trabalha na Tyrell Corporation e vive sozinho com seus brinquedos em forma de robôs, os

quais ele mesmo constrói. Além disso, sofre de uma doença chamada Síndrome de

Matusalém, que se caracteriza pelo envelhecimento rápido das glândulas. Assemelha-se aos

Replicantes em sua condição e parece representar a literalização da decadência, a falta de

expectativas de um indivíduo da era pós-industrial e pós-moderna106

.

Roy Batty é o líder dos Replicantes que se revoltaram, e o que mais demonstra

vontade de viver. O conflito com Deckard no final do filme parece ser diluir anulando, assim,

a perseguição. Representa a criatura que persegue seu criador e luta pela própria existência.

Pris, do mesmo modo que os outros andróides, busca uma tentativa de aumentar a duração de

sua vida, enquanto mantém também um relacionamento com Roy. Para isso, torna-se amiga

de Sebastian, a fim de se aproximar de Tyrell. Já Zhora, trabalha no bar de Taffey Lewis

como dançarina e acaba sendo encontrada, caçada e aposentada por Deckard em algumas das

cenas que mais suscitam remorso ao policial.

105

As principais características são: o “detetive ingênuo ou desavisado, as mulheres fatais, o vilão ambíguo ou

psicologicamente complexo, o crime, a iluminação low key, contrastes de massas, uma cidade tortuosa,

sorumbática e misteriosa, etc.”. Cf. SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Arquitetura da Metrópole:

Metropolis 2026; Los Angeles 2019. In: ______. A metrópole replicante: de Metropolis a Blade Runner,

p.77. 106

BRUNO, Giuliana. Ramble City: Postmodernism and “Blade Runner”. October, vol.41 (summer, 1987),

p.65.

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35

De imediato, é possível destacar uma diferença básica nas duas tramas: no livro,

Deckard pretende obter o dinheiro do prêmio para comprar um animal autêntico, enquanto no

filme ele cumpre a função de blade runner, ou seja, policial. Também nota-se uma tensão

maior entre a Rosen Associations, que corresponde à Tyrell Corporation no livro, e a polícia

de São Francisco em relação à caça de andróides. De modo geral, enquanto o filme apresenta

maior densidade e reflexões existenciais, o livro aparenta ter mais ações de perseguição, mas

em ambos o sentimento de Deckard em relação a aposentar os robôs humanóides é patente.

De fato, as obras constituem linguagens diferentes: a escrita e o audiovisual; as quais

possuem limites e potencialidades. O filme, por ser uma representação visual e sonora,

impede uma maior imaginação e abstração do espectador, pois a imagem já está veiculada. No

entanto, seu modo de representação é realista e possui a capacidade de produzir realidades em

um nível muito próximo da realidade objetiva. Isso não ocorre, por sua vez, com o livro, já

que esse sistema utiliza apenas palavras, embora seus potenciais sejam imensos, dado que a

imaginação e subjetividade do leitor possuem maior liberdade107

.

3.4 ANÁLISE FÍLMICA

O filme Blade Runner possui muitas e diversas influências tanto em seu roteiro como

em sua concepção visual e estética. Do ponto de vista de sua estrutura e linguagem, não há

grandes inovações, sendo essas reservadas à sua composição arquitetural. Os planos médios

são os mais utilizados ao longo da narrativa, de modo a identificar os indivíduos nos cenários

em que estão, mas também se destaca um número significativo de planos gerais, que

enfatizam o olhar sobre a cidade, uma das personagens da trama por seu protagonismo e

importância, segundo afirmação do próprio diretor108

. A metrópole futurista de Los Angeles

de 2019 possui um aspecto decadente, híbrido, caótico e obscuro, sendo a arquitetura eclética

um aspecto fundamental no filme. Essa configuração fornece um sentido simbólico

significativo do pessimismo e ceticismo na diegese. Acompanham o excesso de poluição e

população; a desorganização; a flexibilidade social e econômica; a constante chuva e a

escuridão. Apenas nos poucos momentos otimistas, como no final, aparece associado aos

personagens um cenário com uma paisagem inspirada na natureza.

107

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Diferenças entre a FC literária e a cinematográfica. In: ______.

Limite de alerta! Ficção científica em atmosfera rarefeita – Uma introdução ao estudo da FC no cinema

brasileiro e em algumas cinematografias off-Hollywood, p.446. 108

00:53:31-01:19:45.

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36

Nota-se o amálgama da cidade com seus prédios altos e diversos outdoors com marcas

de grandes empresas ao lado de construções antigas destruídas ou abandonadas. Há mesmo

um dirigível, que aparece com grande freqüência exibindo anúncios comerciais e das off-

world colonies. O filme também apresenta em seus cenários locações como forma de

reverência a Los Angeles por serem ícones da cidade e atuarem na relação entre o velho e o

novo109

. A divisão dos planos ocorre geralmente em alternância com planos médios, assim

como com os diálogos em que existe o mecanismo convencional do campo-contracampo. As

imagens possuem um tom de saturação que implica em um intenso escurecimento das cenas,

assim como existem muitos objetos e pessoas compondo os quadros nos planos internos e

externos.

Articulado às imagens, os sons, divididos entre ruídos naturais e humanos110

, estão

naturalmente presentes e articulados à trilha sonora de Vangelis, que confere, por sua

profundidade, uma oscilação entre leveza e suspense, de acordo com a tonalidade das cenas.

Os ruídos são realistas e referem-se às situações naturais, como à chuva, carros em

movimento, pessoas conversando, etc. Já o conjunto de efeitos especiais é significativo e

fundamental para o filme. As viaturas policiais em movimento, a sequência inicial com

explosões e taxis voando (Hades Landscape), os disparos da arma de Deckard e a

movimentação urbana de veículos são alguns exemplos. O fato de ser um filme futurista de

ficção científica também torna previsível o uso desse tipo de efeito.

O roteiro basicamente apresenta a história de um policial que persegue um objetivo, no

caso a caça aos Replicantes, em uma investigação, mas que acaba se envolvendo com uma

mulher, embora seja também uma andróide, e sendo caçado por um deles ao final do filme.

Após concluir sua missão, o protagonista foge junto com sua femme fatale resolvendo os

conflitos anteriores a que esteve sujeito. Além disso, pode-se afirmar que a interpretação dos

atores é adequada de acordo com os acontecimentos da trama. No entanto, destaca-se a

atuação de Rutger Hauer por meio de seu personagem Roy Batty. Talvez por ser o líder dos

Replicantes rebelados e, principalmente, pelas cenas finais, sugira grande identificação com o

espectador. Já a angulação no filme predomina na altura normal dos personagens e, nas cenas

da cidade e da Tyrell Corporation, nota-se um contre-plongèe e plongèe a fim de conferir

109

Os principais locais citados de Los Angeles são: a Ennis-Brown House, residência de arquitetura modernista

projetada em 1924 por Frank Lloyd Wright; o Bradbury Building, edifício datado de 1892; a Union Station,

estação ferroviária fundada em 1939; o Wilthern Theatre, casa de espetáculos construída em 1931; o Million

Dollar Hotel, criado em 1918 e o Second Street Tunnel, um dos túneis mais filmados do mundo, marca e ícone

da cidade. Cf. SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Arquitetura da Metrópole: Metropolis 2026; Los Angeles

2019. In: ______. A metrópole replicante: de Metropolis a Blade Runner, pp.39-42. 110

MARTIN, Marcel. Os fenômenos sonoros. In: ______. A linguagem cinematográfica, p.99.

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maior ênfase ao cenário e sua monumentalidade. A iluminação, por sua vez, geralmente é

reduzida, sendo que praticamente todo o filme se passa a noite. No entanto, existem muitas

luzes difusas provenientes de outdoors, do dirigível, lojas e carros, inclusive na forma de

neons, o que fornece, por sua vez, a luminosidade do filme.

O figurino se destaca por seu ecletismo, pois existem diferentes tipos de roupas, desde

os mais convencionais, como o sobretudo típico de detetive de Deckard, até os mais futuristas,

como a vestimenta de plástico da Replicante Zhora. Embora também existam influências,

nesse aspecto, do film noir, a variabilidade de estilos se associa à diversidade étnica e social

da população, entre os quais se encontram punks, comerciantes asiáticos, policiais,

dançarinas, hare krishnas e outros. Acima de tudo, a montagem do filme é fundamentalmente

narrativa, baseada no padrão naturalista de representação fílmica, sem incorrer em inovações

experimentais nessa característica. A fluência narrativa é um aspecto essencial da estória, de

modo a garantir o desenvolvimento do enredo de forma contínua.

De modo geral, o filme incorpora diversas concepções estéticas e visuais, como já

referido. Scott foi influenciado pelo quadrinhista iugoslavo Enki Bilal, pelo desenhista

Mentor Huebner, por Lawrence Paull e, talvez principalmente, por Syd Mead. Este fora uma

figura central no design de produção do filme. Mead possuía experiência como artista

comercial a serviço da Ford Motor Company e da Phillips Eletronics e era especializado no

desenho de automóveis111

. Além das influências já citadas, é possível identificar vários

elementos presentes no filme. Entre eles, pode-se destacar o nítido hermetismo produzido

pelo espaço da narrativa; a verticalidade da metrópole; a referência à metáfora do labirinto por

meio da cidade; a citação do mito da Torre de Babel, embora retrabalhada sob a estética

cyberpunk e o embate e amálgama entre o arcaísmo e as tecnologias avançadas112

. A

concepção visual do filme é marcada, fundamentalmente, pelo “layering”, ou “manipulação

em camadas”, expresso pela variedade de componentes antigos e recentes na arquitetura

híbrida da metrópole, e também pelo gótico e terror em seus elementos estéticos113

. Quanto ao

escuro, à presença de chuva e fumaça, por sua vez, já se pode identificá-los em Alien (1979).

Evidentemente, a referência à cidade de Los Angeles, amplamente conhecida como

grande metrópole, é clara pela indicação no início do filme por meio do texto: Los Angeles,

novembro de 2019. Embora o contexto de produção do filme tenha sido o da Guerra Fria, não

existem referências, aparentemente, a esse conflito, à URSS (citada no livro), nem a questões

111

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira, op. cit., pp.104, 84 e 85. 112

Idem, ibidem, p.48. 113

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Conclusão. In: ______. A metrópole replicante: de Metropolis a

Blade Runner, p.236.

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políticas. Em certa medida, a obra torna-se escapista ao não tratar dessa questão, embora seja

um filme crítico. Por outro lado, o caos, as tecnologias avançadas e a distopia são explícitas

por si só. A população multicultural da cidade, por sua vez, apresenta imigração em grande

escala, nomeadamente asiática.

Sean Purdy afirma que a falta de trabalhadores jovens forçou os EUA a permitirem o

aumento da imigração no final do século XX. De fato, latino-americanos e asiáticos

constituíram os grupos mais numerosos de imigrantes. Estima-se que até 1997, 14% da

população total do país possuía ascendência latino-americana e que pessoas provenientes da

China, Vietnã, Tailândia, Coréia, Índia e Filipinas representavam 4% da população114

. O

mesmo autor afirma ainda que:

Cidades grandes, como Los Angeles, Nova York, Chicago e Miami, tornaram-se

cada vez mais multiculturais, trazendo novas contribuições à sociedade americana e

fomentando debates sobre o impacto dos „novos americanos‟ na educação, no

trabalho e na cultura115

.

Logo, nota-se mais uma vez como o futuro imaginado por Scott estava impregnado de

questões de seu presente. Já sobre a conjuntura do pós-1945 nos EUA, David Harvey afirma:

Aceito amplamente a visão de que o longo período de expansão de pós-guerra, que

se estendeu de 1945 a 1973, teve como base um conjunto de práticas de controle do

trabalho, tecnologias, hábitos de consumo e configurações de poder político-

econômico, e de que esse conjunto pode com razão ser chamado de fordista-

keynesiano. O colapso desse sistema a partir de 1973 iniciou um período de rápida

mudança, de fluidez e de incerteza116

.

Nesse sentido, ainda em termos de contexto, as políticas keynesianas haviam se

mostrado inflacionárias na medida em que as despesas públicas aumentavam e a capacidade

fiscal estagnava. O regime fordista de produção não desapareceu em absoluto: ainda existem

elementos que permaneceram. No entanto, até 1973 havia sido gerado elevação dos padrões

de vida e ambientes relativamente estáveis para os lucros corporativos. Nesse sentido,

segundo Harvey, entre 1965 e 1973 começa a se tornar mais evidente a incapacidade do

fordismo e do keynesianismo para solucionar as contradições naturais do sistema capitalista.

Tal incapacidade pode ser expressa pelo termo rigidez. A partir da comparação do imediato

114

PURDY, Sean. McGlobalização e a Nova Direita: 1980-2000. In: KARNAL, Leandro et al. História dos

Estados Unidos: das origens ao século XXI. São Paulo: Contexto, 2007, pp.263-264. 115

Idem, ibidem, p.264. 116

HARVEY, David. A transformação político-econômica do capitalismo do final do século XX. In: ______.

Condição pós-moderna. Uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 12ª edição. São Paulo:

Edições Loyola, 2003, p.119.

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pós-guerra e do final do século XX quanto às mudanças significativas nas práticas político-

econômicas, Harvey defende a ocorrência de uma passagem do fordismo para o regime de

acumulação flexível117

.

Essa nova configuração, por sua vez, confronta-se com a rigidez fordista e baseia-se

na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, produtos e padrões de

consumo, surgimento de setores novos de produção, novas maneiras de fornecimento de

serviços financeiros, novos mercados e, principalmente, taxas intensificadas de inovação

comercial, tecnológica e organizacional. Existe, ainda assim, uma gama extensa de inovações.

Além desses processos, o individualismo constituiu também uma condição necessária da

referida transição e evidenciou-se, paralelamente, um aumento da competição e da cultura do

empreendedorismo. Associadas a essas mudanças está a redução do tempo de giro no

consumo (menor durabilidade dos produtos), as modas fugazes e a constante indução de

necessidades, provocando alterações substanciais nas formas culturais118

. De fato, tais

mudanças podem ser claramente identificadas no filme em questão.

A conjuntura histórica da produção de Blade Runner também foi marcada por altos

níveis de inflação e desemprego, em 1980. Segundo Divine, “A inflação, decorrente do

segundo choque do petróleo da década de 1970, chegou a 3,3 por cento ao ano em 1979” 119

.

A partir desse contexto, inicia-se o primeiro governo Ronald Reagan e com ele inaugura-se a

era do neoliberalismo nos EUA. Basicamente, sua administração promoveu uma política de

desregulamentação da economia, liberando os negócios de intervenções governamentais. Essa

medida produziu como resultados, em síntese, recessão, crescimento rápido, aumento do

déficit federal em função do corte nos impostos, e a redução da inflação120

.

Los Angeles, por sua vez, desde o início de seu surgimento não possuiu um

planejamento urbano adequado, e sofreu intensos processos de industrialização121

. Além do

fato de a cidade ter se destacado para a indústria imobiliária, com incorporações e etc., passou

por uma onda de investimento de capital japonês no final do século XX. Mike Davis

identifica mesmo uma submissão dos EUA ao capitalismo nipônico122

. O autor afirma, sobre

a condição de trabalho dos negros nos anos 1980, que:

117

Idem, ibidem, pp.157, 134, 135 e 119. 118

Idem, ibidem, pp.140, 161 e 148. 119

DIVINE, Robert et al.. A Era Reagan. In: ______. América: passado e presente. Rio de Janeiro: Editorial

Nórdica, 1992, p.720. 120

Idem, ibidem, pp.722, 730 e 731. 121

DAVIS, Mike. Sol brilhante ou noir? In: ______. Cidade de quartzo: escavando o futuro de Los Angeles.

Campinas: Scritta Editorial, 1993, pp.29-96. 122

Idem. Linhas de poder. Op.cit., p.136.

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A onda de fechamento de fábricas de 1978-1982, no rastro da penetração das

importações japonesas e da recessão, a qual deixou inativas dez das doze maiores

fábricas fora do setor aeroespacial da Califórnia Meridional e desalojou 75 mil

trabalhadores industriais, apagou os ganhos efêmeros dos negros do setor industrial

conseguidos entre 1965 e 1975123

.

De fato, essas referências confirmam o fenômeno da imigração e da progressiva

presença do capital japonês na cidade de Los Angeles. A escolha desses temas atribui-se a

Ridley Scott, o qual afirmou o desejo de tratar dessas questões da época de produção do

filme124

. A partir do excerto de Davis, também se pode identificar a ausência de negros em

Blade Runner, que historicamente fizeram parte daquele contexto.

No filme, os grupos sociais e os “lugares” sociais do mundo construído são também

facilmente identificáveis. Entre eles, se destacam, além da grande massa de indivíduos, a

polícia; a grande corporação, representada pela Tyrell Corporation, e a própria cidade,

ambiente fundamental para toda a trama. As lutas desses grupos também são claras na

narrativa: os comerciantes negociam em meio à multidão; os policiais aparecem nas ruas

trabalhando, embora sejam poucos; a busca da Tyrell Corporation por mais lucros em seus

empreendimentos e a jornada dos Replicantes para conseguir maior tempo de vida. Nesse

contexto, é possível notar também a diluição e flexibilidade das relações sociais, o que difere

de uma organização rígida e funcional da cidade, em meio também a lixos espalhados pelas

ruas e calçadas. Assim, formam-se identidades difusas construídas pelo filme graças à

globalização e às tecnologias informáticas125

.

Os acontecimentos ocorridos no filme, por sua vez, tendem a enfatizar a configuração

social, econômica, cultural e espacial da metrópole pós-industrial, assim como as condições

de existência de sua população. Também se destaca a perseguição aos Replicantes, a sua

condição de vida, o domínio corporativista capitalista da Tyrell Corporation e, subjacente a

toda essa sociedade representada, uma especulação sobre um possível futuro breve. O tempo,

no entanto, é concebido de forma linear, sem grandes lapsos ou cortes, embora existam ações

paralelas. Já o espaço varia entre cenários internos, como apartamento, delegacia de polícia, a

corporação fabricante de Replicantes, e externos, principalmente as ruas.

Em suma, o filme solicita do espectador inicialmente uma tensão sobre a perseguição

dos Replicantes, já que esses parecem perigosos e são mesmo uma preocupação para a

123

Idem. O martelo e a rocha. Op.cit., p.269. 124

Dangerous Days – Making Blade Runner (Dangerous Days – Making Blade Runner, 2007, EUA). Dir.:

Charles de Lauzirika. 125

MARTINS, Francisco E. Menezes. Homem, técnica e devir no imaginário Blade Runner. Sessões do

Imaginário, Porto Alegre, n.º8, agosto 2002, FAMECOS/PUCRS, p.42. Disponível em:

<http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/famecos/article/viewFile/776/587> . Acesso em: 14 jun. 2011.

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polícia. No entanto, as cenas finais de luta entre Deckard e Roy, quando este ao invés de

deixá-lo morrer o salva e reflete sobre sua própria vida, contribuem para uma mudança de

ponto de vista sobre os andróides: eles são parecidos com os seres humanos e, como tais,

possuem praticamente a mesma vontade de viver. Talvez essa seja a principal questão de

destaque que se coloca para o espectador, além, evidentemente, da reflexão, presente em todo

o filme, sobre a possibilidade desse ser uma representação do mundo do futuro.

Blade Runner também constitui uma distopia, gênero já consolidado na literatura e no

cinema, que se define por narrativas construídas com base num pensamento projecional e de

antecipação. Podem ser definidas fundamentalmente como projetos profundamente críticos à

idéia de utopia e seus valores, embora esses estejam presentes em sua estrutura, mas de forma

inversa. Nesse sentido, representam uma visão cética e pessimista, na qual as promessas e

desejos humanos, entre eles as imemoriais liberdade e igualdade, não se concretizaram e, ao

invés disso, se transformaram em mundos opressivos e desumanos. Pode-se refletir,

entretanto, se tais narrativas não constituem uma espécie de artifício ou instrumento para

alertar os leitores do que é possível ocorrer no futuro, ferramenta bastante presente na ficção

científica, de forma geral. Nesse sentido, Blade Runner, com sua estética retro-futurista,

representa questões intensificadas de seu presente126

, como já citado, reiterando o mecanismo

projecional das anti-utopias.

A quantidade de filmes distópicos é significativamente extensa. No entanto, podem-se

citar algumas narrativas que possuem interfaces com Blade Runner. Fundamentalmente, a

principal influência na concepção visual, arquitetural e estética foi Metropolis (1927), dirigido

por Fritz Lang. Assim, muitas características da Metropolis de 2026 são citadas e reelaboradas

sob os anos 1980 para formar a Los Angeles de 2019127

. Já as temáticas de marginalidade e

ruínas são influências menos explícitas de Stalker (1979), do diretor Andrei Tarkovsky.

Clockwork Orange (1971), de Stanley Kubrick, apresenta, além de “dialetos futuristas”, um

aspecto de deterioração em sua estória, constituindo uma importante influência.

Especificamente quanto à concepção visual, pode-se citar a relevância de Alphaville (1965),

dirigido por Jean-Luc Godard, o qual articula elementos de film noir com ficção científica; e

Escape From New York (1981), também com suas características de ruínas, sujeira e

deterioração128

. Portanto, a partir da presente análise foi possível identificar a importância de

126

LINS, Consuelo da Luz. Conclusão. In: ______. Blade Runner e Brazil, the film: um corte no cinema de

ficção científica, p.47. 127

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Introdução. In: ______. A metrópole replicante: de Metropolis a

Blade Runner, p.9. 128

Idem. Arquitetura da Metrópole: Metropolis 2026; Los Angeles 2019. Ibidem, pp.108-109.

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Blade Runner a partir de sua composição estética, mas também de seu argumento, e como se

articula à sua época de produção.

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4. BLADE RUNNER E A MODERNIDADE

4.1 MODERNIDADE E PÓS-MODERNIDADE: UMA DISCUSSÃO

Os anos 1980 foram marcados pelo nível mais intenso dos debates em torno do pós-

modernismo. Ocorreram conflitos estéreis às vezes, assim como uma proliferação de

concepções sobre o significado do termo e argumentos para negar sua existência129

. Com

efeito, fora também uma discussão intensa vinculada a diversas perspectivas das ciências

humanas. Inicialmente, se faz necessário um breve esclarecimento sobre os conceitos de

moderno e modernismo, e seus derivados, de modo a contextualizar o referencial teórico do

presente estudo. O termo modernidade designa um período histórico com início em meados

do século XVIII, durante a Revolução Industrial na Europa, na configuração de uma nova

sociedade, pautada por valores e referências da cada vez mais influente burguesia, e distintas

da época anterior.

No entanto, David Harvey, que não estabelece uma separação estrita entre

modernidade e modernismo, utiliza a definição de modernidade de Baudelaire, a qual

significa o transitório e o fugidio; uma parte da arte, sendo a outra o eterno e o imutável. De

fato, muitos autores modernos identificaram abundantes evidências sobre a insegurança na

modernidade e sua inclinação para o caos totalizante. Jürgen Habermas utiliza a expressão

projeto da modernidade, o qual teria entrado em foco durante o século XVIII. Esse projeto,

por sua vez, buscava basicamente usar o conhecimento em busca da emancipação humana e

do enriquecimento da vida diária. Essa proposição fundamenta-se no pensamento iluminista,

que cria uma ruptura com a história e a tradição130

.

O modernismo, entretanto, caracteriza-se por um amplo movimento e fenômeno

artístico-cultural vinculado a tais transformações históricas. Harvey afirma que: “Por

conseguinte, desde o começo, o modernismo se preocupava com a linguagem, com a

descoberta de alguma modalidade especial de representação de verdades eternas” 131

. Assim,

embora esse fenômeno seja complexo e muitas vezes contraditório, marcou boa parte do

século XX. Harvey também destaca mudanças na configuração dessa corrente: enquanto o

modernismo anterior à Primeira Guerra Mundial representou uma reação às novas condições

129

JÚNIOR, Renato Luiz Pucci. Cinema pós-moderno. In: MASCARELLO, Fernando (org.). História do

cinema mundial. Campinas: Papirus, 2006, p.361. 130

HARVEY, David. Modernidade e modernismo. In: ______. Condição pós-moderna. Uma pesquisa sobre

as origens da mudança cultural, pp.21-23. 131

Idem, ibidem, p.30.

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de produção econômica, de circulação e de consumo, o “alto” modernismo, vigente com vigor

no pós-1945, deixou de buscar um mito, por causa das decepções do período entre-guerras,

em função do estabelecimento de um sistema de poder internacional estável. Nessa

conjuntura, o modernismo deixa de ser um antídoto revolucionário e insere-se na ideologia

cultural dominante. A partir daí, as manifestações da contracultura dos anos 1960,

constituíram uma oposição e crítica aos valores desse modernismo132

.

É, por sua vez, nesse contexto, entre os anos 1960 e 1970, que se costuma atribuir o

surgimento ou início da pós-modernidade133

. Esse conceito define também um momento

histórico134

para Harvey, que o associa à passagem do sistema econômico fordista-keynesiano

para o regime de acumulação flexível no capitalismo135

. Nesse sentido, essa mudança

implicou modificações não apenas econômicas, mas em diversos campos da atividade

humana, como arquitetura, produção cultural, arte, filosofia, literatura e ciências humanas. O

pós-modernismo, por sua vez, constitui, grosso modo, a cultura ou campo cultural dessa

época136

.

O pensamento pós-moderno funda-se em uma crise moral que representa uma crise do

pensamento iluminista. Além disso, enfatiza a natureza fragmentada do mundo e do

conhecimento humano e a crítica a quadros interpretativos “totalizantes” (marxismo,

freudismo) de uma razão teoricamente universal137

. Embora o pós-modernismo represente

uma reação ou afastamento ao modernismo, a crítica à razão iluminista não é tão recente, o

que pode motivar o questionamento de quão diferentes são essas correntes culturais, ou se

são, na verdade, apenas uma continuidade. Adorno e Horkheimer já formulavam em Dialética

do esclarecimento, publicado em 1944, que a lógica oculta da racionalidade iluminista é a

lógica da dominação e da opressão138

.

Sobre o pós-modernismo, Harvey escreve:

A crise moral do nosso tempo é uma crise do pensamento iluminista. Porque,

embora esse possa de fato ter permitido que o homem se emancipasse „da

comunidade e da tradição da Idade Média em que sua liberdade individual estava

submersa‟, sua afirmação do „eu sem Deus‟ no final negou a si mesmo, já que a

132

Idem, ibidem, pp.33, 36, 42 e 44. 133

HARVEY, David. A transformação político-econômica do capitalismo do final do século XX. Op. cit.,

pp.117-184; WOOD, Ellen M. O que é a agenda “pós-moderna”? In: WOOD, Ellen M.; FOSTER, John B. Em

defesa da história. Marxismo e pós-modernismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1999, pp.7-22. 134

JÚNIOR, Renato Luiz Pucci, op. cit., p.361. 135

HARVEY, David, op. cit., pp.117-184. 136

JÚNIOR, Renato Luiz Pucci, op. cit., p.361. 137

WOOD, Ellen M., op. cit., p.14; HARVEY, David. Pós-modernismo. In: ______. Condição pós-moderna.

Uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural, pp.49-50. 138

HARVEY, David. Modernidade e modernismo. Op. cit., p.24.

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razão, um meio, foi deixada, na ausência da verdade de Deus, sem nenhuma meta

espiritual ou moral 139

.

Ellen Wood afirma, por sua vez, que o pós-modernismo atual descende da geração de

1960 e de seus estudantes. Assim, embora as terríveis guerras e experiências totalitárias

tenham abalado a crença otimista na razão durante o século XX e fomentado a crítica dos pós-

modernistas, essa teve nas maravilhas da tecnologia moderna e nas riquezas do capitalismo

consumista sua definição básica140

. Isso ocorre, pois tais inovações que aumentaram o bem-

estar humano influenciaram/motivaram o surgimento de um maior ceticismo político.

Acompanhado desse princípio, destaca-se também o relativismo epistemológico.

A partir de uma perspectiva marxista, Wood defende que as críticas do pós-

modernismo não representam nenhuma novidade, mas antes têm uma história tão antiga

quanto a própria filosofia. Pelo fato de os pós-modernistas rejeitarem a idéia de progresso, já

que é linear e totalizante, abandonam assim todo sentido de continuidade e memória

histórica141

. Por essa razão, Wood ressalta a impressionante insensibilidade à história

compartilhada pelos pós-modernistas142

.

Em suma, a autora sintetiza:

Mas, no mínimo, o pós-modernismo implica uma rejeição categórica do

conhecimento „totalizante‟ e de valores „universalistas‟ – incluindo as concepções

ocidentais de „racionalidade‟, idéias gerais de igualdade (sejam elas liberais ou

socialistas) e a concepção marxista de emancipação humana geral143

.

Embora a autora critique o pós-modernismo, não nega, entretanto, a importância de

seus temas144

. De fato, questões de alteridade145

das minorias sociais, e outras, por exemplo,

tiveram nesse campo cultural uma fonte de legitimação na reivindicação de seus direitos e

identidade. Os pós-modernistas, nesse sentido, interessam-se por questões vinculadas a

linguagem, cultura e discurso. Para alguns, os seres humanos e as relações sociais são

constituídos de linguagem, enquanto outros, no mínimo, defendem a construção social do

conhecimento146

.

139

Idem. Pós-modernismo. Op. cit., p.47. 140

WOOD, Ellen M., op. cit., pp.9 e 16. 141

HARVEY, David, op. cit., p.58. 142

WOOD, Ellen M., op. cit., p.14. 143

Idem, ibidem, p.12. 144

Idem, ibidem, p.17. 145

HARVEY, David, op. cit., p.53. 146

WOOD, Ellen M., op. cit., p.11.

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46

O pós-modernismo, entretanto, destacou-se em três posições/campos: nas ciências

humanas e literatura, com Jean François Lyotard e Umberto Eco; nas artes visuais, cuja

proeminência ocorre nos EUA; e no discurso da e sobre a arquitetura147

. Historicamente, o

termo começou a ser utilizado como qualificativo para um determinado tipo de literatura

norte-americana nos anos 1960. Na mesma época, é direcionado para caracterizar uma

arquitetura que se opunha aos modelos funcionais do modernismo e baseava-se no ecletismo

de estilos e numa estética de sobreposições. No campo das artes, o conceito foi atribuído à

Pop Art, de Warhol e Liechtenstein, que passou a incorporar elementos da cultura de massa às

expressões artísticas da época. Por fim, as designações do pós-modernismo chegaram à crítica

cinematográfica na virada para a década de 1980, na caracterização de filmes que não se

inseriam nos gêneros fílmicos vigentes inicialmente148

.

O momento crucial da discussão, no contexto intelectual, ocorre com a publicação de

A Condição Pós-moderna, de Lyotard, em 1979. O autor, além de associar o quadro cultural

da época à “incredulidade quanto às metanarrativas”, que pressupõem uma emancipação da

humanidade, defende a idéia cética de que a verdade seria inalcançável e que os jogos de

linguagem definiriam a realidade. Michel Foucault também realizava críticas a esses temas

aproximadamente na mesma época. Já Fredric Jameson, como David Harvey, aceita a idéia de

pós-modernismo sem, no entanto, desconsiderar uma visão marxista da história. Para o autor,

as condições econômicas estão profundamente vinculadas às formações culturais e, nesse

sentido, o pós-modernismo constituiria a lógica cultural do capitalismo avançado149

. Portanto,

é possível compreender a diversidade de concepções sobre o pós-modernismo, os vínculos

existentes com as mudanças históricas e suas conseqüências em diversos campos culturais e a

relevância dessa discussão nos estudos de História.

4.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DE JÜRGEN HABERMAS

Jürgen Habermas, por sua vez, nasceu em 18 de junho de 1929, em Düsseldorf. Entre

1949 e 1954 estudou Filosofia, História, Psicologia, Economia e Literatura alemã nas

universidades de Göttingen, Zurique e Bonn, sendo nessa última que obteve o doutorado em

1954, com uma tese intitulada “O Absoluto na História – Um estudo sobre a Filosofia das

Idades do Mundo, de Schelling”. Já em 1961, recebe a livre-docência pela Universidade de

147

BRUNO, Giuliana, op. cit., p.61. 148

JÚNIOR, Renato Luiz Pucci, op. cit., p.363-364. 149

Idem, ibidem, pp.365, 366, 368 e 369; HARVEY, David, op. cit., p.65.

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47

Marburgo, com uma tese sobre as “Mudanças Estruturais do espaço público”. Habermas

assumiu o cargo de assistente de pesquisa no Instituto para Pesquisas Sociais, de Frankfurt

(1956-59), e a partir dessa época dedicou-se às atividades acadêmicas. Além disso, entre 1961

e 1964 foi professor de Filosofia e Sociologia da Universidade de Frankfurt. Em 1971, foi

professor-visitante da Universidade de Princeton. Atualmente, o filósofo ocupa o cargo de

Diretor do Instituto Max Planck150

.

De fato, Habermas é considerado o último representante da teoria crítica da sociedade.

Entretanto, de qualquer modo, o filósofo não pertence à geração de Theodor Adorno e Max

Horkheimer, já que não compartilhou da experiência do exílio, ocorrida com esses autores.

No entanto, seu vínculo formal ao Instituto ocorreu apenas à época em que lecionou, entre

1964 e 1971151

. A partir dos comentários de Freitag e Rouanet, é possível apresentar uma

abordagem geral sobre a produção textual de Habermas, de modo a construir uma base teórica

para a posterior interpretação de Blade Runner. Segundo os autores, o tema da mediação entre

teoria e prática permeia toda a obra do filósofo alemão e pode ser discutida em torno de três

complexos temáticos: a perspectiva epistemológica; a perspectiva político-cultural e a teoria

da competência comunicativa.

A abordagem epistemológica é discutida em vários escritos, entre livros e artigos, cujo

traço comum é a crítica do positivismo. O destaque ocorre na obra intitulada Lógica das

Ciências Sociais, na qual a crítica incide, dentro da metodologia das ciências humanas, nas

insuficiências do empirismo puro e cede espaço para outros tipos de reflexão, como a

hermenêutica de Gadamer, que buscam substituir um enfoque objetivista por uma

compreensão que insira o analista em seu objeto de estudo. Já em Conhecimento e Interesse,

Habermas formula a unidade indissociável de conhecimento e interesse, em que este assume a

função de a priori do conhecimento tanto nas ciências naturais, quanto nas ciências histórico-

hermenêuticas. Nesse livro, também se encontram os fundamentos de sua teoria dos interesses

cognitivos152

.

A perspectiva político-cultural, por sua vez, baseia-se na crítica do Estado e da

sociedade. Nesse sentido, a relevância para essa discussão está nas obras intituladas Técnica e

ciência como ideologia; Os problemas de legitimação do capitalismo tardio; alguns

ensaios da coletânea Cultura e Crítica; e o livro Reconstrução do materialismo histórico.

O tema central nesses textos é a caracterização do capitalismo tardio. Dessa forma, entre

150

FREITAG, Bárbara; ROUANET, Sérgio Paulo. Introdução. In: ______. Habermas. São Paulo: editora Ática,

2001, pp.9-10. 151

Idem, ibidem, pp.10-11. 152

Idem, ibidem, pp.12-13.

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outras questões diretamente relacionadas, discute-se a necessidade de dependência das

sociedades do capitalismo tardio ante a crescente intervenção do Estado na estrutura

econômica para a sua própria reprodução. Nesse contexto, o Estado configura-se como

promotor do progresso e do bem-estar coletivo, amparado na ciência e técnica, que se

tornaram mesmo sua ideologia. A ideologia tecnocrática, especificamente, nega a estrutura da

ação comunicativa ao impedir a problematização do poder existente por meio da supressão

das normas. Assim, o poder obedece a regras técnicas que se esperam que sejam eficazes e

não justas. Nessa discussão, a despolitização das massas emerge como conseqüência e

requisito da nova forma de dominação, legitimada pelo poder de coação da racionalidade

técnica153

.

A teoria da competência comunicativa, por sua vez, tenta reconstituir as condições

universais para a produção de enunciados (ações lingüísticas). Dentre as questões trabalhadas,

está o fato de que uma sentença pode possuir sentido distinto sob forma de promessa, ordem,

afirmação, etc.. Assim, para cada situação da fala existem quatro “expectativas de validade”:

de que os conteúdos transmitidos são compreensíveis; de que os interlocutores são verazes; de

que os conteúdos proposicionais são verdadeiros e de que o locutor, ao praticar o ato

lingüístico, agia de acordo com normas que se lhe afiguravam justificadas.

Habermas também estabelece que uma afirmação problematizada é debatida num

discurso teórico, enquanto uma norma problematizada é debatida num discurso prático. Já

para distinguir o verdadeiro consenso do ilusório, o filósofo propõe a situação lingüística

ideal, que, em linhas gerais, caracteriza-se pela ausência de efeitos externos e coações da

própria estrutura de comunicação. Num contexto de comunicação, por sua vez, uma afirmação

verdadeira é uma afirmação considerada válida num processo de argumentação discursiva154

.

Portanto, a partir dessa introdução às principais idéias de Habermas, pode-se manter uma

proximidade mais adequada com a Teoria da Modernidade do autor.

4.3 BLADE RUNNER: UMA CRISE DA MODERNIDADE?

De acordo com o que foi discutido até essa parte, está clara a influência que Blade

Runner exerceu sobre as questões vinculadas a um imaginário de um projeto humano de

progresso. O que se destaca, entretanto, é como o filme configura-se no oposto desse projeto,

ao construir um futuro distópico. Sobre a obra, Suppia observa que “o filme retrata cruamente

153

Idem, ibidem, pp.14-16. 154

Idem, ibidem, pp.17, 18, 19 e 21.

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49

uma espécie de revés iluminista, e as referências a mitos de origem são colocadas de forma

crítica ou irônica” 155

.

Douglas Kellner et al. afirmam que visões de pesadelos sobre sociedades futurísticas

(distopias) já foram um gênero maior na ficção científica dos anos 1970 e que tal fenômeno

representa um signo de uma crise na ideologia dos EUA. Assim, “A maioria dos filmes de

Hollywood pós-1970 sobre o futuro retrata mundos que contém extrema poluição ambiental,

superpopulação, cidades violentas, administração burocrática, e exploração econômica” 156

.

Blade Runner, por sua vez, tenta produzir um amálgama de ideologias diversas que se

relacionam, por sua vez, com a ausência de uma ideologia monolítica157

.

Em parte, isso pode sugerir que o conflito ideológico caracterizava os EUA

contemporâneo, fato também que pode explicar os elementos individualistas e escapistas do

filme como sintomas de um pessimismo cultural e de uma crise. Assim, seu estudo pode

revelar um medo nos EUA sobre a perda de identidade e liberdade. Blade Runner também

compartilha um individualismo familiar liberal, mas contém uma crítica ao capitalismo

corporativista. Um bom exemplo é o seu final, com a natureza representando um mundo de

paz que rejeita a violência e a exploração vistas durante todo o filme158

.

Já Giuliana Bruno discute a película como metáfora da condição pós-moderna,

utilizando os conceitos de esquizofrenia e pastiche de Jameson. O primeiro produz, em função

da quebra da linguagem e da temporalidade, um presente perpétuo, a partir da leitura que

Jameson faz de Lacan. Assim, a vida do Replicante caracteriza-se por uma experiência

extremamente intensa, fato que se explica pelas últimas palavras do Replicante Roy, antes de

morrer, e que constitui talvez algumas das melhores cenas do filme: “I've seen things you

people wouldn't believe. Attack ships on fire off the shoulder of Orion. I watched C-beams

glitter in the dark near Tannhäuser Gate. All those moments will be lost in time like tears in

rain. Time to die”159

.

O pastiche significa a estética de citação de diversas influências utilizadas na

composição visual do filme, configurando um filme pós-moderno, também por esse aspecto,

na opinião da autora. Bruno também destaca que a figura da mãe é necessária para a

afirmação de uma história, existindo uma forte ligação teórica entre fotografia, mãe e

155

SUPPIA, Alfredo Luiz Paes de Oliveira. Conclusão. Op. cit., p.237. 156

Tradução livre. 157

KELLNER, D.; LEIBOWITZ, F.; RYAN, M.. Blade Runner – A diagnostic critique. Disponível em:

<http://www.ejumpcut.org/archive/onlinessays/JC29folder/BladeRunner.html>. Acesso em: 22 set. 2009. 158

Idem, ibidem. 159

“Vi coisas nas quais vocês nunca acreditariam. Naves de ataque em chamas perto da borda de Orion. Eu vi

raios-C cintilar no escuro perto do portal de Tannhäuser. Todos esses momentos se perderão no tempo como

lágrimas na chuva. Hora de morrer.” Tradução livre, baseada nas legendas em português.

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50

história160

, no caso dos Replicantes e que, dessa forma, fica claro que: “O passado tornou-se

uma coleção de imagens fotográficas, fílmicas ou televisivas” 161

. Baseando-se nessa tese,

Harvey analisa Blade Runner como uma parábola de ficção científica que apresenta temas

pós-modernos no contexto capitalista da acumulação flexível e da compressão do espaço-

tempo162

.

Nesse sentido, será utilizado como eixo de análise nesse estudo o pensamento de

Habermas sobre a modernidade para interpretar a película e identificar possíveis conexões

entre tal projeto e o devir pessimista representado no filme. A Teoria da Modernidade em

Habermas não constitui uma teoria afirmativa, e sim representa um produto da análise crítica

de autores que fizeram reflexões sobre a modernidade163

. Nesse sentido, na medida em que

faz parte da “Teoria da Ação Comunicativa” é uma teoria sistemática e na medida em que é

parte de uma Teoria da Evolução das formações societárias, constitui uma teoria

diacrônica164

. A Teoria da Modernidade habermasiana “procura explicar a gênese da moderna

sociedade ocidental, diagnosticar as suas patologias e buscar soluções para sua supressão” 165

.

No modelo explicativo proposto pelo filósofo alemão, as sociedades contemporâneas são

diferenciadas entre o mundo do trabalho (mundo da reprodução material) e o mundo da

interação (mundo da reprodução simbólica). Ao primeiro se aplica o conceito de sistema,

enquanto ao segundo se aplica o termo “mundo vivido” 166

.

O “mundo vivido” (Lebenswelt) se caracteriza pelas experiências comuns a todos os

atores e possui a faceta da continuidade e das “certezas intuitivas”; e a faceta da mudança e do

questionamento, graças à ação comunicativa. Já o sistema, além de complementar o “mundo

vivido”, é composto por dois subsistemas: a economia e o Estado. Ambos produziram

mecanismos auto reguladores (às vezes chamados pelo autor de medium): o dinheiro e o

poder, respectivamente. Enquanto a economia e o Estado asseguram a reprodução material e

institucional da sociedade, o dinheiro e o poder garantem a “integração sistêmica”. Nesse

sentido, o sistema é regido pela razão instrumental167

.

Habermas, além disso, distingue dois processos na Teoria da Modernidade: a

modernização societária e a modernidade cultural. O primeiro enfatiza os processos de

racionalização ocorridos nos subsistemas econômico e político, enquanto que o segundo se

160

BRUNO, Giuliana, op. cit., pp.67 e 71. 161

Idem, ibidem, p.73. 162

JÚNIOR, Renato Luiz Pucci, op. cit., p.368. 163

FREITAG, Bárbara. Habermas e a Teoria da Modernidade. Cad. CRH., Salvador, n.22, jan./jun. 1995, p.146. 164

Idem, ibidem, p.159. 165

Idem, ibidem, p.139. 166

Idem, ibidem, p.141. 167

Idem, ibidem, pp.141-142.

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caracteriza pela autonomização, no interior do “mundo vivido”, das “esferas de valor”168

. O

Lebenswelt é composto por três subsistemas: a cultura, a sociedade e a personalidade, os quais

são regulados por mecanismos de integração social (controle social, socialização e

aprendizado). Assim, a modernidade cultural refere-se a transformações no subsistema

cultural, que se diferencia nas esferas: científica, ética e estética. Essas, por sua vez, se

autonomizam e passam a ser regidas por parâmetros próprios de verdade, moralidade e

expressividade169

.

Além desse modelo teórico explicativo apresentado, Habermas reflete também a

respeito das patologias da modernidade. Segundo o autor, haveria duas: a Entkoppelung

(desengate) e a Kolonisierung (colonização). A primeira faz com que os homens se submetam

às leis do mercado e à burocracia estatal. Já a segunda, que decorre da primeira, caracteriza-se

pela imposição da lógica própria do sistema ao “mundo vivido” 170

. Nesse sentido, a solução

para tais patologias seria reverter os processos de “desengate” e “colonização”, além de

promover um “reacoplamento” do sistema ao “mundo vivido”, de modo a manter a

integridade e complexidade do todo171

.

Segundo Habermas, a discussão sobre a crise do pensamento iluminista seria uma

tendência que influenciara muitos críticos e que ficou conhecido, entre outras designações,

como pós-modernidade172

. Assim, o que se observa em tal momento é um descontentamento

geral que possui raiz em profundas reações contra o processo de modernização da sociedade.

Em outras palavras, Habermas sustenta que, “sob a dinâmica do crescimento econômico e das

relações organizacionais do Estado, a modernização social penetra mais fundo em modos

anteriores de vida173

”.

No entanto, a tese central de Habermas é que o projeto da modernidade ainda não se

cumpriu174

. Tal projeto fora formulado pelos filósofos iluministas do século XVIII e que

defendia uma esperança na promoção do domínio das forças naturais, assim como a

compreensão do universo e da consciência conduzidos ao progresso moral, à justiça das

instituições e à felicidade humana por meio do desenvolvimento das artes e ciências175

. Em

outros termos, a emancipação do Homem pela razão. Assim, Habermas reconhece que houve

168

Idem, ibidem, pp.140-141. 169

Idem, ibidem, pp.142-143. 170

Idem, ibidem, p.145. 171

Idem, ibidem, p.146. 172

HABERMAS, Jürgen. “Modernity – An Incomplete Project”. In: FOSTER, Hal. Postmodern Culture.

London: Pluto Press, 1985, p.3. 173

Idem, ibidem., p.8. 174

Idem, ibidem, p.13. 175

Idem, ibidem, p.9.

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uma realização deturpada da razão na história e reafirma a necessidade do projeto iluminista

original, embora reformulando a razão como razão comunicativa. Além disso, resgata a idéia

de perfectibilidade humana, individual e social, e defende a noção de liberdade e emancipação

de cada um na sociedade, introduzindo os vários níveis da ação comunicativa176

.

O termo moderno, por sua vez, surgiu no final do século V d.C. como forma de

descrever o presente que havia se tornado oficialmente cristão, em oposição ao passado

bárbaro e pagão. No entanto, a partir de então o léxico passou a ser utilizado para designar o

resultado de transição de uma época antiga para uma nova. Nesse sentido, Habermas afirma

que a modernidade se revolta contra as funções normativas da tradição e vive na experiência

de se opor ao que é normativo. Em relação à crise da modernidade, o autor afirma que a

quebra do otimismo ocorreu com a separação da hermenêutica da comunicação do dia-a-dia,

resultando em uma cultura de especialização e técnica. O posicionamento efetivo do filósofo

revela-se na afirmação de que ao invés de desistir da modernidade e de seu projeto,

deveríamos aprender com os erros dos extravagantes programas que tentaram negar a

modernidade. Assim, propõe que o mundo da vida tem de se tornar hábil para desenvolver

instituições fora de si mesma que coloquem limites às dinâmicas e imperativos internos de um

quase autônomo sistema econômico e seus complementares administrativos177

.

Embora a pós-modernidade possa conter especificidades de sua época histórica, a

crítica à racionalidade e seus resultados indesejáveis já foi alvo de Adorno e Horkheimer. Os

autores afirmam que o objetivo do esclarecimento é livrar os homens do medo e substituir a

imaginação pelo saber. Seu programa, assim, consiste no desencantamento do mundo sendo

que o desconhecido constitui uma fonte de angústia. A razão, no entanto, passou a ser

utilizada como instrumento universal e tornou-se uma razão instrumental, na medida em que o

pensamento perdeu o elemento de reflexão sobre si mesmo178

.

Diante do exposto, é possível realizar algumas considerações com maior

embasamento. Assim, embora Habermas defenda que o projeto da modernidade ainda não se

realizou em sua plenitude, é possível identificar uma crise desse projeto no filme Blade

Runner na medida em que sua narrativa trabalha os principais conceitos atribuídos à cultura

pós-moderna. A partir da discussão entre os diferentes autores aqui citados e, principalmente,

pelo pensamento habermasiano sobre o tema, essa proposição tornou-se bastante plausível.

176

FREITAG, Bárbara, op. cit., 161. 177

HABERMAS, Jürgen, op. cit., pp.3, 5, 9, 12 e 13. Cf. HABERMAS, Jürgen. O conteúdo normativo da

modernidade. In: ______. O discurso filosófico da modernidade: doze lições. São Paulo: Martins Fontes,

2000, pp.467-509. 178

ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max. O conceito de esclarecimento. Op. cit., pp.19, 40, 42 e 48.

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O filme, por todas as suas características, seja no enredo e na concepção visual, com

sua cidade de arquitetura pós-moderna e pós-industrial, vinculada a diversas transformações

econômicas, sociais e humanas, sua formulação de uma projeção distópica do futuro, expressa

uma representação dessa crise. Portanto, a partir do modelo teórico de Habermas, pode-se

afirmar essa tese. Além do mais, é possível notar mesmo as próprias patologias da

modernidade, que o filósofo discute, no filme. A kolonisierung, por exemplo, é parte essencial

dessa Los Angeles de 2019, na medida em que a metrópole é fundamentalmente pautada por

um sistema capitalista flexível e desorganizado e pelas transformações que tais fatores

influenciam na cultura.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo objetivou realizar uma análise fílmica e interpretação do filme

Blade Runner, pelo viés de uma abordagem sócio-histórica. Isso significa, evidentemente, que

a investigação atribuiu significativa relevância não apenas ao objeto de análise em seu

conteúdo e forma de expressão, mas também às condições sociais de produção da película,

bem como a diversos outros fatores de importância metodológica que envolveram a produção,

exibição e recepção do filme.

Nesse sentido, foi possível concluir que Blade Runner constitui uma representação da

crise do projeto da modernidade, formulado pelos filósofos iluministas no século XVIII, na

medida em que apresenta uma sociedade futurista que não alcançou a realização plena desse

projeto, mas, ao contrário, produziu desorganização, caos, exclusão social e desequilíbrios

ambientais. Logo, o modelo explicativo de Habermas, que constituiu a base teórica para essa

interpretação, permite identificar essa crise, embora o autor ainda assim acredite que tal

projeto está inacabado. Nesse estudo, especificamente, não foi discutido se o referido projeto

ainda está por ser implantado, mas antes procurou-se explicitar como o filme representa uma

crise.

Além disso, pode-se reafirmar a tese de que um filme sempre dialoga com sua época

de produção, em maior ou menor medida. Tanto o que os filmes mostram, como o que

omitem, possuem significados e, à luz de seu contexto, podem ser melhor compreendidos. No

caso de Blade Runner, é evidente por si só, após a pesquisa, o fato de refletir

significativamente as ansiedades e temores do início da década de 1980. Assim, o trabalho

insere-se numa perspectiva ainda mais ampla: a relação entre filmes e sociedades.

Entretanto, as possibilidades de análise e interpretação do filme, a partir das mais

variadas perspectivas de abordagem, ainda são enormes. Sua riqueza e o legado que deixou já

representam parte considerável dessas possibilidades. Assim, pode-se citar a relevância de se

fazer um estudo de recepção do filme, a partir tanto da crítica cinematográfica, quanto do

grande público. Outra oportunidade emerge ao tratar de uma análise comparativa entre as

diferentes versões do filme, considerando suas mudanças em função de condicionantes de

suas respectivas épocas de produção. Também é possível, ainda assim, produzir um estudo

que busque analisar o processo de adaptação cinematográfica do livro de Philip Dick para o

filme de Ridley Scott. Por fim, pode-se afirmar que Blade Runner constitui, a partir do que foi

discutido no presente trabalho, uma contra-análise da sociedade, nos termos de Marc Ferro.

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REFERÊNCIAS

FONTES

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https://secure.imdb.com/signup/index.html?d=IMDbTabNB (IMDbPro)

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FILMOGRAFIA

Alien, o Oitavo Passageiro (Alien, 1979, EUA). Dir.: Ridley Scott.

Blade Runner (Blade Runner, 1982, EUA). Dir.: Ridley Scott.

Blade Runner – Versão do Diretor (Blade Runner – Diretor’s Cut, 1991, EUA).

Blade Runner – Versão Final (Blade Runner – Final Cut, 2007, EUA).

Metropolis (Metropolis, 1927, ALE). Dir.: Fritz Lang.

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ANEXO 1 – FICHA TÉCNICA DE BLADE RUNNER

BLADE RUNNER (1982) 179

EUA

Cor, 117 min.

Obs.: Theatrical Cut, 1982.

Directed by

Ridley Scott

Writers

Screenplay

Hampton Fancher and

David Peoples

Based on the novel by

Philip K. Dick

Producers

Michael Deeley ... producer

Charles de Lauzirika ... producer (2007 Final Cut version)

Hampton Fancher ... executive producer

Brian Kelly ... executive producer

179

Disponível em: < http://pro.imdb.com/title/tt0083658/fullcredits>. Acesso em: 27 jan. 2011.

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Ivor Powell ... associate producer

Paul Prischman ... associate producer (2007 Final Cut version)

Jerry Perenchio ... co-executive producer (uncredited)

Ridley Scott ... co-producer (uncredited)

Run Run Shaw ... co-executive producer (uncredited)

Bud Yorkin ... co-executive producer (uncredited)

Cast - in credits order (verified as complete)

Harrison Ford ... Rick Deckard

Rutger Hauer ... Roy Batty

Sean Young ... Rachael

Edward James Olmos ... Gaff

M. Emmet Walsh ... Bryant

Daryl Hannah ... Pris

William Sanderson ... J.F. Sebastian

Brion James ... Leon Kowalski

Joe Turkel ... Dr. Eldon Tyrell

Joanna Cassidy ... Zhora

James Hong ... Hannibal Chew

Morgan Paull ... Holden

Kevin Thompson ... Bear

John Edward Allen ... Kaiser

Hy Pyke ... Taffey Lewis

Kimiko Hiroshige ... Cambodian Lady

Robert Okazaki ... Howie Lee

Carolyn DeMirjian ... Saleslady

Other credited cast listed alphabetically

Ben Astar ... Abdul Ben Hassan (uncredited)

Judith Burnett ... Ming-Fa (uncredited)

Leo Gorcey Jr. ... Louie - Bartender (uncredited)

Sharon Hesky ... Bar Patron (uncredited)

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Kelly Hine ... Showgirl (uncredited)

Tom Hutchinson ... Bartender (uncredited)

Charles Knapp ... Bartender (uncredited)

Rose Mascari ... Bar Patron (uncredited)

Jirô Okazaki ... Policeman (uncredited)

Steve Pope ... Policeman (uncredited)

Robert Reiter ... Policeman (uncredited)

Alexis Rhee ... Geisha #1 (uncredited)

Original Music

Vangelis

Cinematographers

Jordan Cronenweth (director of photography)

Editors

Marsha Nakashima

Casting Directors

Jane Feinberg

Mike Fenton

Marci Liroff (uncredited)

Production Designers

Lawrence G. Paull

Art Directors

David Snyder

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Set Decorators

Linda DeScenna

Leslie Frankenheimer

Tom Roysden

Peg Cummings (uncredited)

Costume Designers

Michael Kaplan

Charles Knode

Make Up Department

Shirley L. Padgett ... hair stylist

Marvin G. Westmore ... makeup artist

John Chambers ... prosthetic makeups (uncredited)

Bridget O'Neill ... makeup artist: Joanna Cassidy (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Production Managers

C.O. Erickson ... executive in charge of production

John W. Rogers ... unit production manager

Second Unit Directors or Assistant Directors

Newton Arnold ... first assistant director

Morris Chapnick ... second assistant director

Peter Cornberg ... first assistant director

Don Hauer ... second assistant director

Victoria Rhodes ... dga trainee

Richard Schroer ... second assistant director

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Art Department

Stephen Dane ... assistant art director

Mentor Huebner ... production illustrator

Sherman Labby ... production illustrator

Terry Lewis ... property master

Buzz Lombardo ... standby painter

Syd Mead ... visual futurist

James F. Orendorf ... construction coordinator

David Quick ... assistant property master

John A. Scott III ... assistant property master

Arthur Shippee Jr. ... assistant property master

Tom Southwell ... production illustrator

James T. Woods ... painting coordinator

John Alvin ... poster artist (uncredited)

William Apperson ... construction foreman (uncredited)

William Apperson ... model maker (uncredited)

Charles Breen ... set designer (uncredited)

Marco A. Campos ... propmaker (uncredited)

Robert Clark ... sculptor (uncredited)

Carmine Goglia ... stand-by painter (uncredited)

Peter J. Hampton ... production designer: additional scenes (uncredited)

Steven Ladish ... props (uncredited)

Edward T. McAvoy ... scenic artist (uncredited)

Curtis A. Schnell ... set designer (uncredited)

Kevin Shanks ... drapery man/floor covering (uncredited)

William Ladd Skinner ... set designer (uncredited)

Drew Struzan ... poster artist (uncredited)

Michael Taylor ... leadman (uncredited)

Gary Zink ... carpenter (uncredited)

Gary Zink ... propmaker (uncredited)

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Sound Department

Bud Alper ... sound mixer

Eugene Byron Ashbrook ... boom operator

Christopher Assells ... sound effects editor (2007 Final Cut version)

Beau Baker ... cable person

Karen Baker Landers ... supervising sound editor (2007 Final Cut version)

Peter Baldock ... assistant dialogue editor

Ron Bartlett ... sound re-recording mixer (2007 Final Cut version)

Dino R. Dimuro ... sound effects editor (2007 Final Cut version)

Joe Gallagher ... assistant sound editor

Per Hallberg ... supervising sound editor (2007 Final Cut version)

Graham V. Hartstone ... chief dubbing mixer

D.M. Hemphill ... sound re-recording mixer (2007 Final Cut version)

Michael Hopkins ... dialogue editor

Gerry Humphreys ... chief dubbing mixer

Maryjo Lang ... foley mixer (2007 Final Cut version)

Alyson Moore ... foley artist (2007 Final Cut version)

Scott Morgan ... foley recordist (2007 Final Cut version)

Philip D. Morrill ... assistant sound editor (2007 Final Cut version)

Tony R. Negrete ... assistant sound editor (2007 Final Cut version)

Peter Pennell ... sound editor

John Roesch ... foley artist (2007 Final Cut version)

Jon Title ... sound effects editor (2007 Final Cut version)

Joel Fein ... sound recording mixer (uncredited)

John Hayward ... sound re-recording mixer (uncredited)

Nicolas Le Messurier ... sound re-recording mixer (uncredited)

Gordon K. McCallum ... sound mixer (uncredited)

Special Effects Department

William G. Curtis ... special effects technician

Logan Frazee ... special effects technician

Terry Frazee ... special floor effects supervisor

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Steve Galich ... special effects technician

Robert Cole ... special effects action property foreman (uncredited)

Robert DeVine ... special effects (uncredited)

Ken Estes ... special effects foreman (uncredited)

Scott Forbes ... special effects technician (uncredited)

Visual Effects Department

Timothy E. Angulo ... additional green screen photography: New Deal Studios (2007

Final Cut version)

Michael Bakauskas ... assistant effects editor: EEG

Robert Bailey ... matte photography: EEG

Don Baker ... camera operator: EEG

Philip Barberio ... optical line-up: EEG

Jill Bogdanowicz ... digital restoration: Technicolor Digital Intermediates (2007 Final

Cut version)

Christian Boudman ... visual effects enhancement: SPI (2007 Final Cut version)

Tom Burton ... digital restoration: Technicolor Digital Intermediates (2007 Final Cut

version)

Diane Caliva ... visual effects enhancement: The Orphanage (2007 Final Cut version)

Charles Cowles ... camera operator: EEG

Tom Cranham ... effects illustrator: EEG

Lisa Deaner ... visual effects enhancement: SPI (2007 Final Cut version)

Debbie Denise ... visual effects enhancement: SPI (2007 Final Cut version)

David Dryer ... special photographic effects supervisor

Syd Dutton ... visual effects enhancement: Illusion Arts (2007 Final Cut version)

Bud Elam ... special engineering consultant: EEG

Mike Fink ... action prop supervisor

Linda Fleisher ... action prop consultant

Collin Fowler ... visual effects enhancement: Illusion Arts (2007 Final Cut version)

Joyce Goldberg ... production office manager: EEG

David Grafton ... special engineering consultant: EEG

Robert Hall ... optical photography supervisor: EEG

David Hardberger ... camera operator: EEG

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Alan Harding ... special camera technician: EEG

Jack Hinkle ... film coordinator: EEG

Richard Hollander ... computer engineering: EEG

Richard R. Hoover ... visual effects enhancement: SPI (2007 Final Cut version)

Karen Krause ... digital restoration: Technicolor Digital Intermediates (2007 Final Cut

version)

Ronald Longo ... camera operator: EEG

Fumi Mashimo ... visual effects enhancement: Illusion Arts (2007 Final Cut version)

Timothy McHugh ... camera operator: EEG

Kelvin McIlwain ... visual effects enhancement: Illusion Arts (2007 Final Cut version)

Greg McMurray ... electronic engineering: EEG

Virgil Mirano ... still lab: EEG

Thomas Nittmann ... visual effects enhancement: Lola Visual Effects (2007 Final Cut

version)

Luke O'Byrne ... visual effects enhancement: The Orphanage (2007 Final Cut version)

Joshua Pines ... digital restoration: Technicolor Digital Intermediates (2007 Final Cut

version)

Thom Polizzi ... digital restoration: Technicolor Digital Intermediates (2007 Final Cut

version)

George Polkinghorne ... cinetechnician: EEG

Gary Randall ... gaffer: EEG

Richard Ripple ... optical line-up: EEG

Jonathan Rothbart ... visual effects enhancement: The Orphanage (2007 Final Cut

version)

David Sanger ... additional green screen photography: New Deal Studios (2007 Final

Cut version)

Georgia Scheele ... visual effects coordinator (2007 Final Cut version)

John Scheele ... visual effects supervisor (2007 Final Cut version)

Bob Spurlock ... miniature technician: EEG

Mark Stetson ... chief model maker: EEG

Dave Stewart ... director of photography: EEG

Diana Stulic Ibanez ... visual effects enhancement: SPI (2007 Final Cut version)

Catherine Sudolcan ... visual effects enhancement: Illusion Arts (2007 Final Cut

version)

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Tama Takahashi ... matte photography: EEG

David Takayama ... visual effects enhancement: SPI (2007 Final Cut version)

Bill Taylor ... visual effects enhancement: Illusion Arts (2007 Final Cut version)

Douglas Trumbull ... special photographic effects supervisor

Pat Van Auken ... key grip: EEG

James Warren ... digital restoration: Technicolor Digital Intermediates (2007 Final Cut

version)

John Wash ... animation and graphics: EEG

Evans Wetmore ... electronic and mechanical design: EEG

Edson Williams ... visual effects enhancement: Lola Visual Effects (2007 Final Cut

version)

Matthew Yuricich ... matte artist: EEG

Richard Yuricich ... special photographic effects supervisor

Ryan Zuttermeister ... visual effects enhancement: Lola Visual Effects (2007 Final Cut

version)

Daphne Apellanes-Ackerson ... rotoscope artist: The Orphanage (2007 Final Cut

version) (uncredited)

Thomas Baker ... motion control camera (uncredited)

Dana Basinger ... film I/O coordinator: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Jerry Castro ... editorial supervisor: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Craig Chandler ... optical effects (uncredited)

Steve Cho ... lead compositor: The Orphanage (2007 Final Cut version) (uncredited)

Trent Claus ... digital compositor (2007 Final Cut version) (uncredited)

Joe C. D'Amato ... resource manager: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Tim Dobbert ... matchmove supervisor: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Rama Dunayevich ... public relations: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Leslie Ekker ... model maker (uncredited)

Bill George ... miniature design and construction (uncredited)

Rocco Gioffre ... matte artist (uncredited)

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Julieta Gleiser ... digital production manager: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Daniel Gloates ... senior staff: The Orphanage (2007 Final Cut version) (uncredited)

Joanna Goldfarb ... post production supervisor: The Orphanage (2007 Final Cut

version) (uncredited)

Monique Gougeon ... human resources: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Rich Grande ... rotoscope artist: The Orphanage (2007 Final Cut version) (uncredited)

Timothy Gross ... systems administration: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Sunghwan Hong ... rotoscope artist: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Jeffrey Jasper ... digital artist: New Deal Studios (2007 Final Cut version) (uncredited)

Michelle Kater ... rotoscope artist: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Bill Kent ... camera operator: special photographic effects (uncredited)

Benjamin Kutsko ... Flame artist (2007 Final Cut version) (uncredited)

Ivan Landau ... visual effects editor: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Diana K. Lee ... roto/matchmove coordinator: The Orphanage (2007 Final Cut

version) (uncredited)

Soyoun Lee ... rotoscope artist: The Orphanage (2007 Final Cut version) (uncredited)

Stuart T. Maschwitz ... senior staff: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Michael McMillen ... model maker (uncredited)

Dan McNamara ... senior staff: The Orphanage (2007 Final Cut version) (uncredited)

Michele Moen ... matte artist: EEG (uncredited)

Jarrod Nesbit ... visual effects coordinator: SPI (2007 Final Cut version) (uncredited)

Brian Nugent ... Flame artist (2007 Final Cut version) (uncredited)

Tom Pahk ... model maker (uncredited)

Christine Peterson ... roto/paint artist: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Aaron Rhodes ... compositing supervisor: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

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Christopher S. Ross ... miniature design and construction (uncredited)

Marc Sadeghi ... executive visual effects producer: The Orphanage (2007 Final Cut

version) (uncredited)

Jonathan Seay ... visual effects camera (uncredited)

Carsten Sørensen ... senior staff: The Orphanage (2007 Final Cut version) (uncredited)

Scott Squires ... visual displays: DQI (uncredited)

Scott Charles Stewart ... senior staff: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Bee Jin Tan ... rotoscope artist: The Orphanage (2007 Final Cut version) (uncredited)

George Trimmer ... model maker (uncredited)

Ryan Tudhope ... compositor: The Orphanage (2007 Final Cut version) (uncredited)

Sean Wallitsch ... Flame artist (2007 Final Cut version) (uncredited)

Tiffany Wu ... roto/matchmove coordinator: The Orphanage (2007 Final Cut version)

(uncredited)

Hoyt Yeatman ... visual displays: DQI (uncredited)

Gene Young ... model construction (uncredited)

Stunts

Gary Combs ... stunt coordinator

Ray Bickel ... stunts (uncredited)

Janet Brady ... stunts (uncredited)

Diane Carter ... stunts (uncredited)

Ann Chatterton ... stunts (uncredited)

Gilbert B. Combs ... stunts (uncredited)

Tony Cox ... stunts (uncredited)

Rita Egleston ... stunts (uncredited)

Gary Epper ... stunts (uncredited)

Jeannie Epper ... stunts (uncredited)

James M. Halty ... stunts (uncredited)

Jeff Imada ... stunts (uncredited)

Gary McLarty ... stunts (uncredited)

Karen McLarty ... stunts (uncredited)

Beth Nufer ... stunts (uncredited)

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Roy K. Ogata ... stunts (uncredited)

Bobby Porter ... stunts (uncredited)

Lee Pulford ... stunt double: Joanna Cassidy (uncredited)

Ruth A. Redfern ... stunts (uncredited)

George Sawaya ... stunts (uncredited)

Charles A. Tamburro ... stunts (uncredited)

Jack Tyree ... stunts (uncredited)

Mike Washlake ... stunts (uncredited)

Michael Zurich ... stunts (uncredited)

Camera and Electrical Department

Albert Bettcher ... camera operator

Dick Colean ... camera operator

Mike Genne ... first assistant camera

George D. Greer ... second assistant camera

Carey Griffith ... key grip

Dick Hart ... lighting gaffer

Steven Poster ... additional photographer

Steve Smith ... first assistant camera

Robert Thomas ... camera operator

Brian Tufano ... additional photographer

Stephen Vaughan ... still photographer

Michael B. Corbett ... lighting technician (uncredited)

Adam Glick ... set lighting technician (uncredited)

Dan Greer ... assistant camera (uncredited)

Ernest Holzman ... film loader (uncredited)

Michael E. Matteson ... key grip (uncredited)

James Nordberg ... generator operator (uncredited)

Jeff Paynter ... second unit focus puller (uncredited)

Peter Santoro ... second assistant camera (uncredited)

Bernie Schwartz ... grip (uncredited)

Haskell Wexler ... additional photographer (uncredited)

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Costume and Wardrobe Department

Winnie Brown ... costumer: women

Bobby E. Horn ... costumer: men

James Lapidus ... costumer: men

Linda A. Matthews ... costumer: women

Jan Ferris ... designer/sculptor: jewelry and metalwork for costumes (uncredited)

Jerry Herrin ... costumer supervisor: day crew (uncredited)

Editorial Department

Les Healey ... first assistant editor

Gillian Hutshing ... editor (2007 final cut version)

Karen Rasch ... assistant editor (2007 final cut version)

Terry Rawlings ... supervising editor

William Zabala ... assistant editor

Music Department

Gail Laughton ... composer: additional music

Stephanie Lowry ... music editor (2007 Final Cut version)

Vangelis ... music: arranged, performed and produced by

Transportation Department

Howard Davidson ... transportation captain

Mario Simon ... transportation (uncredited)

Miscellaneous Crew

Vickie Alper ... production coordinator

Kurt P. Galvao ... restoration consultant (2007 Final Cut version)

Katherine Haber ... production executive

Linda Hess ... production assistant

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Saul Kahan ... publicist

Michael Knutsen ... craft service

Jerry Perenchio ... presenter

Anna Maria Quintana ... script supervisor

David Scharf ... electron microscope photography

Sir Run Run Shaw ... presenter

Steve Warner ... production controller

Bud Yorkin ... presenter

Brian O. Haynes ... production assistant (uncredited)

Jeffrey A. Humphreys ... studio utility (uncredited)

Roland Kibbee ... voice-over engineer (uncredited)

Michael Neale ... location manager (uncredited)

Nancy Ramey ... assistant accountant (uncredited)

Jasmine Sabu ... horse trainer (uncredited)

Charles A. Tamburro ... helicopter pilot (uncredited)

Thanks

William S. Burroughs ... thanks: for the use of the title "Blade Runner"

Philip K. Dick ... dedicated to the memory of

Benjamin Ford ... special thanks (2007 Final Cut version)

Rob Hummel ... special thanks (2007 Final Cut version)

Jeffrey Jasper ... special thanks (2007 Final Cut version)

Teresa Kelly ... special thanks (2007 Final Cut version)

Alan E. Nourse ... thanks: for the use of the title "Blade Runner"

John Yanez ... special thanks (2007 Final Cut version)