Curso de Direito Constitucional - L. a. D. Araújo & v. S. Nunes Júnior

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17

ARAUJO, L. A. D; NUNES JUNIOR, V. S. Curso de Direito Constitucional. 5. ed. So Paulo: Saraiva, 2001.

ndice

Parte 1

DISPOSIES GERAIS

Captulo 1

CONSTITUIO

1. Conceito 13

2. Constituio: suas classificaes 15

2.1. Quanto origem 15

2.2. Quanto mutabilidade 15

2.3. Quanto forma 16

2.4. Quanto ao contedo 16

2.5. Quanto sistemtica 17

2.6. Quanto ideologia 17

3. Elementos da Constituio 18

4. O Poder Constituinte 18

4.1. Introduo 19

4.2. A titularidade do Poder Constituinte 19

4.3. As caractersticas do Poder Constituinte 20

4.4. O Poder Constituinte Derivado 20

4.5. O Poder Constituinte Decorrente 22

4.5.1. Princpio da simetria 24

5. A recepo, a repristinao e a desconstitucionalizao no direito constitucional 25

5.l.A recepo 25

5.2. A repristinao 26

5.3. A desconstitucionalizao 26

6. A eficcia das normas constitucionais 27

6.1. A classificao de Jos Afonso da Silva 27

6.2. A classificao de Celso Ribeiro Bastos 30

6.3. A classificao de Maria Helena Diniz 31

7. O controle de constitucionalidade dos atos normativos 32

7.1. Introduo 32

7.2. O controle preventivo 33

7.3. O controle repressivo 35

7.3.1.A via difusa 35

7.3.2. O controle concentrado 39

7.3.2.1. Ao direta de inconstitucionalidade ADIn 42

7.3.2.2. Ao declaratria de constitucionalidade 51

7.3.2.3. Argio de descumprimento de preceito fundamental 52

7.4. O controle constitucional da omisso 55

7.5. O controle de constitucionalidade de mbito estadual 58

8. Os princpios constitucionais 61

9. A interpretao da Constituio 64

10. A estrutura da Constituio Federal e o seu prembulo 67

11. Os princpios fundamentais 68

12. Breve histrico das Constituies brasileiras 70

12.1. A Constituio Poltica do Imprio do Brasil 70

12.2. A Constituio da Repblica dos Estados Unidos do Brasil de 1891 70

12.3. A Constituio da Repblica dos Estados Unidos do Brasil de 1934 71

12.4. A Constituio dos Estados Unidos do Brasil de 1937 72

12.5. A Constituio da Repblica dos Estados Unidos do Brasil de 1946 72

12.6. A Constituio de 1967 73

Parte 2

DIREITOS E GARANTIAS

FUNDAMENTAIS

Captulo 1

DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS

E COLETIVOS

1. Conceitos bsicos 75

1.1 Questo terminolgica 75

1 2 Direitos e garantias 75

1 3 Caractersticas dos direitos fundamentais 76

1.3.1. Historicidade 77

1.3.2. Universalidade 77

1.3.3. Limitabilidade 77

1.3.4. Concorrncia 79

1.3.5. Irrenunciabilidade 79

1.4. Direitos fundamentais dispersos na Constituio 79

1.5. A evoluo dos direitos fundamentais 80

1.5.1. Direitos fundamentais de primeira gerao 81

1.5.2. Direitos fundamentais de segunda gerao 81

1.5.3. Direitos fundamentais de terceira gerao 82

1.6. Destinatrios dos direitos fundamentais 82

1.7. Diviso dos direitos e garantias fundamentais no texto cons titucional 83

2. Os direitos individuais e coletivos 83

2.1. Princpio da isonomia 83

2.1.1. A discriminao positiva 85

2.2. Princpio da legalidade 86

2.2.1. O princpio da estrita legalidade 87

2.2.2. O princpio da reserva legal 87

2.3.Direito vida 88

2.4. Proibio da tortura 89

2.5. Direito de opinio 90

2.5.1. Direito de escusa de conscincia 90

2.6. Liberdade de crena religiosa 91

2.7. Direito de expresso 92

2.8. Direito de informao 92

2.9. Direito de antena 93

2.10. Direito de informao jornalstica 94

2.1. Direito de resposta 96

2. Direito de informao pblica 97

2.13 Direito de intimidade e direito de privacidade 98

2.13.1. Sigilo bancrio e fiscal 99

2.14. Direito honra 100

2.15. Direito imagem 101

2.16. Inviolabilidade de domicilio 102

2.17. Inviolabilidade de correspondncia 103

2.18. Liberdade de profisso 106

2.19. Direito de locomoo 106

2.20. Direito de reunio 107

2.21. Direito de associao 108

2.22. Direito de propriedade 110

2.23. Direito de petio 115

2.24. Direito de certido 116

2.25. Princpio da inafastabilidade da jurisdio 117

2.26. Limites retroatividade da lei 118

2.27. Princpio do juiz natural 120

2.28. Princpio do devido processo legal 121

2.29. Princpio da presuno de inocncia 123

2.30. Pressupostos constitucionais para a privao da liberdade 123

2.31 A garantia constitucional do jri 124

2.32. Princpio da no-extradio 124

2.33. Proibio da priso civil 123

3. Remdios constitucionais 127

3.1. Mandado de segurana 127

3.2. Mandado de segurana coletivo 130

3.3. Habeas corpus 133

3.4. Mandado de injuno 134

3.5. Habeas data 138

3.6. Ao popular 140

4. Os tratados internacionais e os direitos fundamentais 143

Captulo 2

DIREITOS SOCIAIS

1. Introduo 145

2. Direitos sociais individuais 145

3. Direitos sociais coletivos 150

3.1. A liberdade de associao profissional ou sindical 150

3.2. Direito de greve 151

3.3. Direito de representao 152

Captulo 3

NACIONALIDADE, DIREITOS POLTICOS

E PARTIDOS POLTICOS

1. Nacionalidade 152

2. Direitos polticos 155

2.1. Direito de Sufrgio 156

2.1.1. Natureza e conceito 156

2.1.2. Direito de votar 157

2.1.3. Direito de ser votado 158

2.1.3.1. As inelegibilidades 158

2.2. Sistemas eleitorais 159

2.3. Perda e suspenso dos direitos polticos 162

3.Partidos Polticos 163

1

Captulo

TEORIA GERAL

1. Introduo 164

2. As formas de Estado 164

2.1. Estado Unitrio 165

2.2. Estado Federal 165

2.2.1. Repartio constitucional de competncias e rendas 166

2.2.2. Possibilidade de auto-organizao por uma Constituio prpria 169

2.2.3. Rigidez constitucional 170

2.2.4. Indissolubilidade do vnculo 170

2.2.5. Participao da vontade das ordens parciais na elaborao da norma geral 170

2.2.6. Existncia de um tribunal constitucional 171

2.2.7. Interveno federal nos Estados 172

Captulo 2

O FEDERALISMO BRASILEIRO

1. Introduo 173

2. Requisitos caracterizadores do Estado Federal aplicados ao direito constitucional positivo brasileiro 174

2.1. Repartio constitucional de competncias 174

2.2. Repartio constitucional de rendas 180

2.3. Constituies Estaduais 180

2.4. Rigidez constitucional 180

2.5. Indissolubilidade do pacto federativo 181

2.6. Representao pelo Senado Federal 181

2.7. O Supremo Tribunal Federal como guardio da Constituio 181

2.8. Interveno federal nos Estados-membros 181

Captulo 3

A UNIO FEDERAL

1. Perfil constitucional 182

2. Bens da Unio 182

2.1. Terras devolutas 183

2.2. Mar territorial 183

2.3. Plataforma continental e zona econmica exclusiva 183

2.4. Terrenos de marinha 184

3. Competncias da Unio 184

Captulo 4

OS ESTADOS FEDERADOS

1. Autonomia 186

1.1. Capacidade de auto-organizao 187

1.2. Capacidade de autogoverno 188

1.3. Capacidade de auto-administrao 188

1.4. Capacidade legislativa 189

2. Bens dos Estados-membros 190

3. Criao de Estados-membros 191

4. O Poder Executivo 191

5. O Poder Legislativo 192

6. O Poder Judicirio 192

Captulo 5

OS MUNICPIOS

1. Natureza jurdica 193

2. A criao dos Municpios 193

3. A auto-organizao 194

4. Competncias 197

5. A fiscalizao financeira do Municpio 197

Captulo 6

O DISTRITO FEDERAL E OS TERRITRIOS

1. Distrito Federal 198

2. Territrios 199

Captulo 7

INTERVENO

1. Interveno federal 200

2. Interveno estadual 203

Parte 4

DIVISO ORGNICA DO PODER

Captulo 1

TEORIA GERAL

1. As funes do Estado 205

2. A independncia e a harmonia entre os Poderes 205

3. Funes tpicas e atpicas 207

Captulo 2

REGIMES DE GOVERNO

1. Formas de governo 209

2. Parlamentarismo 210

3. Presidencialismo 211

Captulo 3

O PODER EXECUTIVO

1. Chefia de Estado e chefia de governo 211

2. Funes do Poder Executivo 212

3. O Presidente da Repblica 214

4. O Vice-Presidente 215

5. Os Ministros de Estado 215

6. Conselho da Repblica 216

7. Conselho de Defesa Nacional 216

Captulo 4

A RESPONSABILIDADE DO PRESIDENTE DA REPBLICA

E DE OUTRAS AUTORIDADES FEDERAIS

(A INFRAO POLTICO-ADMINISTRATIVA)

1. Introduo 217

2. Conceito 217

3. Crimes de responsabilidade 217

4. As autoridades passveis de impeachment 217

5. Os crimes comuns do Presidente da Repblica 218

Captulo 5

ADMINISTRAO PBLICA

1. Introduo 219

2. Princpios constitucionais da Administrao Pblica 219

2.1. Princpio da legalidade 219

2.2. Princpio da moralidade 220

2.3. Princpio da impessoalidade 223

2.4. Princpio da publicidade 225

2.5. Princpio da eficincia 225

2.6. Princpios constitucionais implcitos 226

3. Agentes e cargos pblicos 227

3.1. Igual acessibilidade aos cargos pblicos 227

3.2. Contratos de gesto 229

3.3. Associao sindical 230

3.4. Direito de greve 230

3.5. Pessoas portadoras de deficincia 231

3.6. Improbidade 231

4. Servidores pblicos 231

5. Militares 232

Captulo 6

O PODER LEGISLATIVO

1. Estrutura 233

1.1. Cmara dos Deputados 233

1.2. Senado Federal 233

1.3. Mesas Diretoras 234

1.4. Comisses parlamentares 234

2. Funcionamento 235

3. Garantias parlamentares 237

4. Processo legislativo ordinrio 240

4.1. Iniciativa 241

4.2. Discusso 242

4.3. Deliberao 243

4.4. Sano ou veto 244

4.5. Promulgao 245

4.6. Publicao 245

5. As espcies normativas 246

5.1. Emenda constitucional 246

5.2. Lei complementar 247

5.3. Lei ordinria 248

5.4. Medida provisria 248

5.5. Lei delegada 250

5.6. Decreto legislativo 251

5.7. Resoluo 252

6. A funo fiscalizatria 252

Captulo 7

O PODER JUDICIRIO

1. Jurisdio 254

2. Estatuto da Magistratura 254

3. Garantias 255

4. rgos do Poder Judicirio 257

4.1. Supremo Tribunal Federal 258

4.2. Superior Tribunal de Justia 260

4.3. Tribunais Regionais Federais e juzes federais 261

4.4. Tribunais e juzes dos Estados 262

4.5. Tribunais e juzes do trabalho 262

4.6. Tribunais e juzes eleitorais 263

4.7. Tribunais e juzes militares 263

5. Precatrios judiciais 264

Captulo 8

O PERFIL CONSTITUCIONAL DO MINISTRIO PBLICO

1.Termo 267

2. Origens histricas 267

3. O Ministrio Pblico na Constituio de 1988 267

3.1. Princpios institucionais 268

3.2. Autonomia 269

3.3. Garantias e vedaes 270

3.4. O princpio do promotor natural 271

3.5. O Chefe do Ministrio Pblico 271

3.6. Funes institucionais do Ministrio Pblico 272

Captulo 9

A ADVOCACIA

1. Disposies gerais 273

Parte 5

A DEFESA DO ESTADO E DAS

INSTITUIES DEMOCRTICAS

Captulo 1

O ESTADO DE DEFESA E O

ESTADO DE STIO

1. Introduo 275

2. O estado de defesa 277

3. O estado de stio 278

4. Disposies comuns 279

Captulo 2

DAS FORAS ARMADAS

1. Disposies gerais 279

Captulo 3

DA SEGURANA PBLICA

1. Introduo 280

2. Polcias da Unio 281

3. Polcias estaduais 281

4. Guardas municipais 282

Parte 6

TRIBUTAO E ORAMENTO

Captulo 1

SISTEMA CONSTITUCIONAL

TRIBUTRIO

1. Os tributos e suas espcies 282

2. Capacidade contributiva 283

3. Lei complementar 284

4. Emprstimos compulsrios 285

5. Contribuies sociais 286

Captulo 2

DAS LIMITAES AO PODER DE TRIBUTAR

1. Introduo 286

2. Princpio da legalidade 286

3. Princpio da igualdade tributria 287

4. Princpio da irretroatividade da lei tributrio 287

5. Princpio da anterioridade 288

6. Princpio da proibio de tributos com efeito confiscatrio 289

7. Princpio da proibio de limites ao trfego de pessoas ou bens 290

8. Princpio da uniformidade 290

9. Princpio da no-discriminao tributria, em razo da procedncia ou destino dos bens 290

10. As imunidades tributrias 290

Captulo 3

DOS IMPOSTOS

1. Impostos da Unio 291

2. Impostos dos Estados e do Distrito Federal 291

3. Impostos dos Municpios 291

Captulo 4

REPARTIO DAS RECEITAS TRIBUTRIAS

1. Disposies gerais 292

Captulo 5

FINANAS E ORAMENTO

1. Normas gerais 292

2. Oramento 294

2.1. Oramento anual 294

2.2. Lei de diretrizes oramentrias 296

2.3. Plano plurianual 296

2.4. Processo legislativo das leis oramentrias 297

Parte 7

ORDEM CONSTITUCIONAL ECONMICA

Capitulo 1

A ORDEM ECONMICA

1. A constitucionalizao da economia 298

2. Fundamentos da ordem econmica 299

2.1. Livre iniciativa 299

2.2. Valor social do trabalho humano 301

3. Princpios da ordem econmica 301

3.1. Soberania nacional 301

3.2. Propriedade privada e funo social da propriedade 302

3.3. Livre concorrncia 302

3.4. Defesa do consumidor 303

3.5. Defesa do meio ambiente 303

3.6. Reduo das desigualdades sociais e regionais 304

3.7. Tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte 304

4. Interveno estatal na economia 304

4.1. O Estado como agente econmico 304

4.2. O Estado como agente normativo e regulador da economia 306

4.2.1.A funo de fiscalizao 306

4.2.2. A funo de incentivo 307

4.2.3. A funo de planejamento 307

Parte 8

ORDEM CONSTITUCIONAL SOCIAL

Captulo 1

A ORDEM SOCIAL

1. Princpios gerais 308

2. Seguridade social 308

2.l.A sade 310

2.1.1. O princpio do acesso universal e igualitrio 310

2.1.2. O Sistema nico de Sade 310

2.1.3. O fornecimento de remdios 311

2.2. A previdncia social 312

2.3. A assistncia social 313

3. A educao na Constituio Federal 313

4. Desporto 317

5. Direito cultura 318

6. A proteo das pessoas portadoras de deficincia 318

7. O regramento da comunicao social 322

8. A proteo constitucional do meio ambiente 235

9. A proteo da famlia, da criana, do adolescente e do idoso 328

10. A proteo constitucional dos ndios 331

Bibliografia 333

Parte 1

DISPOSIES GERAIS

Captulo 1

CONSTITUIO

1. CONCEITO

Em primeiro lugar, devemos enfrentar a problemtica da definio do termo constituio. Sem ela, estaramos trabalhando com conceitos varia dos, sem objetivos precisos, esmaecendo as fronteiras jurdicas que devem caracterizar a presente abordagem.

A palavra constituio apresenta sentido equvoco. Sua origem re monta ao verbo constituir, que tem o significado de ser a base de; a parte essencial de; formar, compor, empregado em expresses triviais, como a constituio de uma cadeira ou a constituio de uma mesa.

Logo, intuitivo que a palavra constituio traz em si uma idia de estrutura, de como se organiza.

No entanto, pela leitura dos manuais de direito constitucional j pode mos antever algumas dificuldades para a escolha de uma definio.

Para Jos Celso de Mello Filho, por exemplo, Constituio o nomen juris que se d ao complexo de regras que dispem sobre a organizao do Estado, a origem e o exerccio do Poder, a discriminao das competncias estatais e a proclamao das liberdades pblicas

O referido autor, entretanto, aponta a existncia de significados diferentes entre os termos Constituio e Carta Constitucional, sustentando que Carta Constitucional deriva de um ato arbitrrio e ilegtimo, de inspirao autoritria, que se traduz na outorga.3

1. Caldas Aulete, Dicionrio contemporneo da lngua portuguesa, 3. ed., Ed. Deita, v.2,p.816.

2. Constituio Federal anotada, 2. ed., Saraiva, 1986, p. 6-7.

Jos Afonso da Silva, indicando a multiplicidade de sentidos da palavra constituio, elenca vrios de seus significados, para, afinal, concluir que A Constituio do Estado, considerada sua lei fundamental, seria, ento, a organizao dos seus elementos essenciais; um sistema de normas jurdicas, escritas ou costumeiras, que regula a forma do Estado, a forma de seu governo, o modo de aquisio e o exerccio do poder o estabeleci mento de seus rgos e os limites de sua ao4.

H necessidade, portanto, de tentar separar juridicamente um conceito de constituio, porque o tema consente abordagem plrima e sob diferentes ngulos.

Assim, vamos apresentar os diversos enfoques do termo para que possamos ter a clara idia dessa pluralidade conceitual.

Num sentido poltico, Constituio algo que emana de um ato de poder soberano, pois, no dizer de Carl Schmitt, o que existe como magnitude poltica , juridicamente considerado, digno de existir Assim, esse ato de poder soberano, fazendo-se prevalecente, determinaria a estrutura mnima do Estado, ou seja, as regras que definem a titularidade do poder, a forma de seu exerccio, os direitos individuais etc., dando lugar Constituio, em sentido prprio. Outras regras, mesmo que constantes do documento poltico, no teriam a mesma importncia, motivo pelo qual seriam genericamente denominadas leis constitucionais.

Em outra concepo, podemos encontrar o sentido sociolgico. Ferdinand Lassaile, em seu livro O que uma Constituio?, aponta a necessidade de ela ser o reflexo das foras sociais que estruturam o poder, sob pena de encontrar-se apenas uma folha de papel. Assim, se inexistir coincidncia entre o documento escrito e as foras determinantes do poder, no estaremos diante de uma Constituio.

Nesse sentido, Aristteles explica a Constituio de um Estado como o fim especial, o modo de ser de cada sociedade. Por isso, averba como objeto de qualquer Constituio a organizao das magistraturas, a distribuies de soberania.6

3. Jos Celso de Mello Filho, Constituio Federal anotada, cit., p. 7.

4. Curso de direito constitucional positivo, 5. ed., Revista dos Tribunais, p. 37.

5. Teora de la Constitucin, trad. Francisco Ayala, Ed. Alianza Universidad Textos, p. 46.

6. A poltica, Rio de Janeiro, Ediouro, 1994.

No sentido formal (tambm jurdico), a Constituio o conjunto de normas que se situa num piano hierarquicamente superior a outras normas. Dessa forma, pouco importa o contedo, mas a formalizao (em posio hierrquica superior) desse conjunto de normas.

Como se v, diversos so os enfoques e diferentes so os sentidos atribudos Constituio enquanto instituto sociolgico, poltico e mesmo jurdico.

O mais importante, entretanto, buscar um conceito jurdico que, a um s tempo, consiga delimitar seu alcance e explicar seu contedo.

Para tanto, fundamental que recuperemos algumas noes bsicas. A primeira delas a de que a Constituio o documento bsico de um Estado, vale dizer, a sua constituio. Ajustada a esse enfoque, sua finalidade h de compreender, ao menos, a regulamentao dos elementos estruturantes do Estado, ou seja, territrio; governo, povo e finalidade.

Ao lado desses fatores constitutivos do Estado, ingnta noo de Constituio a fixao de limites que estabeleam qual o mbito de atuao do Estado e qual a esfera do domnio individual. Assim, qualquer Constituio deve abrigar as normas definidoras dos direitos fundamentais do indivduo, pena de desfigurao de sua prpria razo de existir.

Fixados esses parmetros, podemos definir Constituio como a organizao sistemtica dos elementos constitutivos do Estado, atravs da qual se definem a forma e a estrutura deste, o sistema de governo, a diviso e o funcionamento dos poderes, o modelo econmico e os direitos, deveres e garantias fundamentais, sendo que qualquer outra matria que for agrega da a ela ser considerada formalmente constitucional.

2. CONSTITUIO: SUAS CLASSIFICAES

importante notar que a forma e o contedo das diversas Constituies tomaram operantes algumas classificaes, que no possuem outra finalidade seno realar caractersticas do texto constitucional segundo valores determinados, como, por exemplo, a origem, a mutabilidade, a forma e o contedo.

As classificaes podem variar de autor para autor, dependendo, evidente, do corte escolhido para a separao dos conceitos. De qualquer forma, podemos apresent-las de acordo com o que segue.

2.1. QUANTO ORIGEM

Promulgada ou votada aquela que fruto de um processo democrtico e elaborada por um Poder Constituinte exercido por uma Assemblia Constituinte. No Brasil, temos como exemplos as Constituies de 1891, 1934, 1946 e 1988.

Outorgada a que fruto do autoritarismo, geralmente imposta por um grupo ou pelo governante. So exemplos, no Brasil, a Constituio do Imprio de 1824, a de 1937 e a de 1967 (apesar de, quanto a esta, a doutrina apresentar alguma divergncia). Estas, como j visto, seriam chamadas de Cartas Constitucionais por alguns autores Jos Afonso da Silva traz ainda as constituies cesaristas, que so aquelas preparadas por um ditador, mas submetidas a um plebiscito para sua validao 8.

2.2. QUANTO MUTABILIDADE

Flexvel a Constituio que no exige, para sua alterao, qualquer processo mais solene, tendo-se em vista o critrio da lei ordinria.

Rgida a Constituio que exige para sua alterao um critrio mais solene e difcil do que o processo de elaborao da lei ordinria. Exemplo de Constituio rgida a brasileira. Essa rigidez pode ser verificada pelo contraste entre o processo legislativo da lei ordinria e o da emenda constitucional. Enquanto aquela se submete s regras da iniciativa geral (art. 61 da CF) e aprovao por maioria simples, a outra reclama iniciativa restrita (art. 60 da CF) e aprovao por maioria qualificada de trs quintos. V- se, por esse e por outros aspectos, que muito mais fcil aprovar uma lei ordinria do que uma emenda constitucional.

Semi-rgida ou semiflexvel a Constituio que apresenta uma parte que exige mutao por processo mais difcil e solene do que o da lei ordinria (rgida) e outra parte sem tal exigncia, podendo ser alterada pelo sistema previsto para a lei ordinria. Exemplo desse tipo a Constituio do Imprio de 1824.

H Constituies que tm um ncleo material imutvel, vale dizer, que no pode ser alterado mesmo por emendas constitucionais, composto pelas chamadas clusulas ptreas. Alguns autores entendem que esse ncleo material imutvel traduziria um grau mximo de rigidez 9.

7. Jos Celso de Mello Filho, Constituio Federal anotada, cit., p. 6-7.

8. Cf. Curso de direito constitucional positivo, cit., p. 45.

9. Cf. Michel Temer, Elementos de direito constitucional, 10. ed., Malheiros Ed. No pensamos assim. Rigidez qualidade do que altervel. No caso, rigidez critrio de classificao quanto mutabilidade. Se h norma imutvel, entendemos que no pode haver imutabilidade e rigidez. As clusulas ptreas estariam fora do conceito de rigidez, servindo de objeto para outra classificao.

2.3. QUANTO FORMA

Escrita ou dogmtica aquela que representada por um texto completo e organizado, como a da maioria dos pases. Podemos citar a Constituio brasileira de 1988 e a Constituio da Repblica Argentina, dentre outras.

Costumeira ou histrica aquela que formada a partir de textos esparsos, sendo sedimentada em costumes derivados das decises, sempre tendo como fundamento os documentos histricos que serviram de base. Exemplo atual a Constituio da Inglaterra.

2.4. QUANTO AO CONTEDO

Material partindo do conceito poltico de Constituio, podemos identificar matrias tipicamente constitucionais. De acordo com tal doutrina, so normas materialmente constitucionais aquelas que identificam a forma e a estrutura do Estado, o sistema de governo, a diviso e o funciona mento dos Poderes, o modelo econmico e os direitos, deveres e garantias fundamentais. Assim, seriam materialmente constitucionais, dentre outros, os arts. l (que identifica o titular do Poder Constituinte), 2 (que enumera as funes do Estado, garantindo independncia e harmonia) e 18 (que identifica as unidades autnomas da Federao).

Formal as normas que so colocadas no texto constitucional, sem fazer parte da estrutura mnima e essencial de qualquer Estado, so denominadas normas formalmente constitucionais. O grupo delas, juntamente com as normas materialmente constitucionais (se existentes), formar a constituio em sentido formal, ou seja, o grupo de normas (materialmente constitucionais ou no) que ocupa uma posio hierarquicamente superior a outras normas.

Portanto, encontraremos, na constituio formal, normas que, apesar de sua importncia, poderiam ser dispensadas do conceito de estrutura mnima do Estado, como o art. 231 da Constituio Federal, que trata dos ndios:

Art. 231. So reconhecidos aos ndios sua organizao social, costumes, lnguas, crenas e tradies, e os direitos originrios sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo Unio demarc las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

Com efeito, em rpida leitura do dispositivo transcrito verifica-se que a norma, no obstante de grande importncia, no essencial compreenso mnima do Estado brasileiro. Bem por isso denominada formalmente constitucional, pois, embora assentada na Constituio, no responde a um chamado de identificao com seu ncleo essencial.

Todavia, conveniente destacar que, para a anlise constitucional brasileira, como alerta Michel Temer, tal distino fica sem sentido, j que, como ser visto adiante, para efeito de emenda constitucional, inexiste diferena entre norma material ou formalmente constitucional, ficando todas elas submetidas ao mesmo processo de reforma, sem distino. H, isso sim, normas que so imutveis, mas no pela particularidade de serem material ou formalmente constitucionais, mas porque o constituinte entendeu de petrific-las. Logo, a distino no tem interesse prtico no ordena mento jurdico brasileiro.

Portanto, diante das classificaes acima, podemos afirmar que a Constituio brasileira de 1988 escrita, rgida, formal e promulgada.

Ainda podemos mencionar a classificao de Manoel Gonalves Ferreira Filho, que traz a notcia de outros trs tipos de Constituio:

a) Constituio-garantia aquela que visa garantir a liberdade, limitando o poder;

b) Constituio-balano enquanto a Constituio-garantia defende limites ao poder do Estado, esta reflete um estgio do compromisso socialista. Assim, a cada novo degrau da evoluo socialista, haveria um novo texto constitucional. O autor cita as Constituies soviticas de 1924, 1936 e 1977;

c) Constituio-dirigente aquela que traz um projeto de Estado, apresenta compromissos sociais e fornece meios para sua execuo. A Constituio portuguesa de 1976, segundo o autor, tem tal caracterstico.

Por fim, Pinto Ferreira, alm das j citadas, ensina que as Constituies podem ser classificadas de acordo com a diviso a seguir exposta.

2.5. QUANTO SISTEMTICA

Reduzida quando representada por um cdigo nico, sistematizado.

Variada quando os textos esto espalhados em diversos diplomas legais. Exemplo: a Constituio belga de 1830 ou a Constituio francesa de 1975.

10. Curso de direito constitucional, 22. ed., Saraiva, 1995, p. 13.

2.6. QUANTO IDEOLOGIA

Ortodoxa aquela que formada por uma s ideologia. Exemplo: as Constituies soviticas de 1923, 1936 e 1977

Ecltica quando informada por diversas ideologias conciliatrias. Exemplo: a Constituio brasileira de 1988.

3. ELEMENTOS DA CONSTITUIO

A Constituio, enquanto documento estruturante do Estado, tem natureza polifactica, j que sua finalidade s pode ser concretizada com a reunio de normas de contedo, origem e finalidade substancialmente di versos. Assim, conquanto representem um todo orgnico e sistemtico, as normas constitucionais buscam a concretizao dos mais diversificados valores. Essa dessemelhana entre os dispositivos constitucionais fez com que a doutrina buscasse classific-los segundo sua finalidade regulamentar, passando a tratar dos elementos de uma Constituio.

J. H. Meirelles Teixeira j apontava os elementos formativos de uma Constituio, traando classificao e elencando quatro categorias de ele mentos constitucionais, a saber: os orgnicos, os limitativos, os programtico-ideolgicos e os formais ou de aplicabilidade.

A classificao mais completa, porm, a oferecida por Jos Afonso da Silva que define os elementos de uma Constituio da seguinte forma:

a) elementos orgnicos aqueles que regulam os Poderes do Estado, definindo a respectiva estrutura. Exemplos: Ttulos III (Da Organizao do Estado) e IV (Da Organizao dos Poderes e do Sistema de Governo);

b) elementos limitativos so, basicamente, as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais. Denominam-se limitativos porque seu objetivo regulamentar reside em restringir a atividade do Estado, traando linhas divisrias entre seu mbito de atuao e a esfera do indivduo. Como exemplo, podemos citar as regras constantes do art. 5 da Constituio da Repblica;

c) elementos socioideolgicos os que revelam o compromisso en tre o Estado individual e o Estado social, desenhando o perfil ideolgico daquele Estado. A ordem econmica e os direitos sociais so exemplos (respectivamente, arts. 170 e s., 6 e 7Q da Lei Maior);

11. Curso de direito constitucional, Forense Universitria, 1991, p. 183-4.

12. Curso de direito constitucional positivo, cit., p. 43-4.

d) elementos de estabilizao constitucional destinados a garantir a paz social, recompondo o Estado a sua normalidade. Constituem instrumentos de defesa do Estado. So exemplos os arts. 34 a 36 (interveno federal), 102, 1, a (controle direto da constitucionalidade), 136 e 137 (esta do de defesa e estado de stio) etc.;

e) elementos formais de aplicabilidade traam regras referentes ao modo de aplicao das Constituies. Exemplos: prembulo, disposies transitrias e 12 do art. 52

4.0 PODER CONSTITUINTE

4.1. INTRODUO

J vimos, nas classificaes das Constituies, que, quanto origem, podem ser promulgadas ou outorgadas, de acordo com o processo de sua elaborao.

De qualquer forma, a elaborao de um novo texto com obra do Poder Constituinte.

A idia de um poder que cria a Constituio nasceu, ao tempo da Revoluo Francesa, com o pensamento jurdico de Emmanuel Sieys, o abade de Chartres, num pequeno panfleto denominado Que o terceiro Estado?.

Nesse escoro, Sieys sustentou que a formao da sociedade poltica podia ser separada em trs estgios distintos, O primeiro, caracterizado pela existncia de indivduos isolados, aos quais, entretanto, somente pela vontade de desejarem reunir-se, deveriam ser atribudos os direitos de uma nao. O segundo, peculiarizado por uma espcie de democracia direta, onde os indivduos, reunidos, deliberariam sobre os assuntos de interesse comum. E o terceiro, em que a deliberao das questes de interesse comum seria delegada a representantes, escolhidos dentre os membros dessa sociedade. Nessa terceira fase, a instrumentalizao da representao de mandaria a estruturao de rgos de governo, tornando necessria a existncia de uma Constituio.

Sieys posicionou a Constituio como documento criador do Estado e, por via de conseqncia, ponto inaugural do sistema jurdico. Destarte, o

poder que cria a Constituio no encontra limites de qualquer espcie,

13. Que s el tercer Estado?, Madrid, Aguilar, 1973, apud Celso Bastos, Curso de direito constitucional, 14. ed., Saraiva, 1992, p. 21.

seno no direito natural. Estabeleceu, assim, uma diviso linear entre o Poder Constituinte que cria a Constituio e o Poder Constitudo rgos e funes criados pela Constituio. O Poder Constituinte seria ilimitado, autnomo e incondicionado. O Poder Constitudo, contrariamente, restrito e condicionado.

O Poder Constituinte tambm foi objeto das elucubraes de Carl Schmitt que o concebia como fruto de uma deciso poltica fundamental e o entendia como a vontade poltica cuja fora fosse capaz de adotar a concreta deciso sobre o modo e a forma do Estado, criando a Constituio.

Nesse sentido, salientava que uma Constituio no se apia em uma norma cuja justia seja seu fundamento de validade, mas em uma deciso poltica, surgida de um ser poltico, acerca do modo e da forma do prprio ser.

Na articulao das foras sociais, e no no direito natural ou em outro pressuposto de legitimidade, que repousa o Poder Constituinte, para Carl Schmitt.

4.2. A TITULARIDADE DO PODER CONSTITUINTE

A definio da titularidade do Poder Constituinte no est livre de controvrsias. Entretanto, acompanhando Pedro de Vega quando se admite o princpio democrtico da soberania popular no se tem dvidas de que a titularidade do Poder Constituinte pertence ao povo.

Em que pese o acerto de tal afirmao, convm notar que, embora a titularidade do Poder Constituinte pertena ao povo, o seu exerccio pode, muitas vezes, afastar-se do controle democrtico. Por isso, costumam-se distinguir duas formas de exerccio do Poder Constituinte: a) a revoluo, caso em que o grupo revolucionrio, que se tornou hegemnico, edita uma Constituio; b) a Assemblia Constituinte, que, ainda, pode tomar o cuidado de submeter vontade popular direta (plebiscito e referendum) as suas concluses.

4.3. AS CARACTERSTICAS DO PODER CONSTITUINTE

O ato de criao da Constituio produto da manifestao do chamado Poder Constituinte Originrio.

14. Teora de la Constitucin, cit.

15. La reforma constitucional y la problemtica dei poder constituyente, Tecnos, 1995 (3 reimpr.).

Como inaugura uma ordem jurdica, atribuem-se ao Poder Constituinte Originrio algumas caractersticas que demarcariam seu perfil. Diz-se, por isso, que o Poder Constituinte Originrio :

a) inicial inaugura uma nova ordem jurdica, revogando a Constituio anterior e os dispositivos infraconstitucionais anteriormente produzidos e incompatveis com ela;

b) autnomo s ao seu exercente cabe determinar quais os termos em que a nova Constituio ser estruturada;

e) ilimitado no se reportando ordem jurdica anterior, compe novo arcabouo jurdico, sem limites para a criao de sua obra;

d) incondicionado no se submete a nenhum processo predeterminado para sua elaborao.

Tem natureza poltica e um poder de fato, mas institui um diploma jurdico. Assim, o Poder Constituinte Originrio um poder poltico que impe um poder jurdico: a Constituio.

4.4.0 PODER CONSTITUINTE DERIVADO

Ao lado do Poder Constituinte Originrio, temos o Poder Constituinte Derivado, Reformador ou Secundrio. E que as Constituies, quando elaboradas, pretendem-se eternas, mas no imutveis. H que se prever, no texto constitucional, um processo para sua alterao. Nesse passo, surge o Poder Constituinte Secundrio ou Derivado, ou, como pretende Michel Temer a competncia reformadora.

Nesse sentido, em contraposio ao Poder Constituinte Originrio, o Poder Constituinte Derivado apresenta os seguintes caractersticos:

a) limitao a Constituio impe limites a sua alterao, criando determinadas reas imutveis. So as clusulas ptreas, que, em nosso sis tema, encontram-se indicadas no art. 60, 4Q, da Constituio Federal;

b) condicionalidade a modificao da Constituio deve obedecer ao processo determinado para sua alterao (processo de emenda). Assim, para que se possa modificar a Constituio, algumas formalidades devem ser cumpridas, condicionando o procedimento. Em nosso caso, a regra con siste na dificuldade maior da iniciativa (art. 60, 1, II e III), no quorum eleva do em relao lei ordinria ( 2 do art. 60), em dois turnos de votao ( 2 do art. 60) e na impossibilidade de reapresentao de projeto de emenda na mesma sesso legislativa ( 52 do art. 60), quando a lei ordinria pode ser reapresentada, desde que por pedido da maioria absoluta de qualquer das Casas (art. 67).

16. Afirma o autor na obra j citada que no se pode falar em Poder, mas em competncia recebida do texto constitucional, com o que concordamos. Cf. Elementos de direito

constitucional, cit., p. 35.

Diversamente do Poder Constituinte Originrio, que poltico, o Derivado jurdico, pois apenas revela o exerccio de uma competncia reformadora.

Apesar de voltarmos ao assunto quando estudamos as emendas Constituio, desde logo impe-se anunciar os limites ao Poder Constituinte Derivado:

a) materiais so as matrias petrificadas pelo art. 60, 42, da Constituio da Repblica, que, em seus incisos 1 a IV, torna imutveis a forma federativa de Estado, o voto direto, secreto, universal e peridico, a separao dos Poderes e os direitos e garantias individuais;

b) circunstanciais elenca determinadas circunstncias em que no pode haver trmite de emenda constitucional, justamente diante da necessidade de tranqilidade social. Esto presentes no 12 do art. 60 (vigncia de interveno federal, estado de defesa ou estado de stio);

c) procedimentais durante o processo de emenda, se esta for rejeitada ou tida como prejudicada, s poder ser reapresentada na sesso legislativa seguinte.17

Alm dos limites explcitos acima anunciados, h alguns implcitos.

Ocorre que, por decorrncia do sistema, algumas mudanas constitucionais no podem ser toleradas, apesar de no estarem previstas de forma clara.

Se modificssemos o processo do art. 60 (previsto para alterao do texto constitucional), estaramos mudando a vontade do Poder Constituinte Originrio de tal maneira que a competncia reformadora seria exercida de forma diferente da determinada pelo Poder Inicial.

Da mesma forma se alterssemos o rol de matrias imutveis previsto no 42 do art. 60. Tudo isso sem falar dos princpios constitucionais (objetivos e fundamentos do Estado brasileiro, constantes, respectivamente, do art. 32 e dos incisos do art. l da CF), que so intocveis por via de emenda.

17. O conceito de sesso legislativa vem previsto no art. 57 da Constituio Federal (perodo anual entre 15 de fevereiro e 30 de junho e 1 de agosto e 15 de dezembro).

Todos esses dispositivos, em que pese a ausncia de indicao expressa, no podem ser alterados. So as chamadas vedaes implcitas.

Falamos na forma ordinria de mudana constitucional, qual seja, a emenda. Em qualquer tempo, a competncia reformadora (Poder Constituinte Derivado) poderia exercer sua tarefa (salvo, como j visto, diante das vedaes circunstanciais e procedimentais). No entanto, o constituinte de 1988 tratou de estabelecer uma forma de alterao constitucional extraordinria, denominada reviso.

A reviso no se submete ao rigor do processo de emenda regular. Trata-se de hiptese constitucional prevista no art. 3 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias da Constituio da Repblica, que estabelece:

A reviso constitucional ser realizada aps cinco anos, conta dos da promulgao da Constituio, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sesso unicameral.

Desde logo verificam-se algumas diferenas entre o Poder Constituinte Derivado e o Revisional. Aquele no tem limitao temporal, deve observar o rito previsto no art. 60 da Carta da Repblica e o seu exercente o Congresso Nacional. Jo Poder Constituinte Revisional apresenta limitao temporal, pois s pode ser exercido uma vez, passados, no mnimo, cinco anos da promulgao. A oportunidade ficou a cargo do Congresso Nacional, que logo entendeu de proceder reviso. O quorum de aprovao mais fcil, ou seja, maioria absoluta, e o exercente do Poder Constituinte Revisional o Congresso Nacional, mas em composio unicameral, o que facilita sensivelmente a aprovao de qualquer matria.18

Pelo fato de o Congresso Nacional reunir-se em sesso unicameral, as emendas de reviso (de numero 1 a 6) foram promulgadas pela Mesa do Congresso Nacional e no pelas Mesas da Cmara dos Deputados e do Senado Federal, como determina o 3Q do art. 60 da Constituio Federal.19

18. Havia corrente entendendo que o Poder Constituinte Revisional era ilimitado, o que no foi aceito pela maioria doutrinria. Outro grupo entendia que a reviso s ocorreria se vence dor o plebiscito sobre a monarquia e o parlamentarismo, previsto no art. 2 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias. Ambas as correntes no foram aceitas pela maioria da doutrina. As teses monrquica e parlamentarista foram derrotadas, e a reviso instalou-se da mesma forma, pautando-se pelos limites constitucionais do Poder Constituinte Derivado.

19. Art. 60, 3 A emenda Constituio ser promulgada pelas Mesas da Cmara dos Deputados e do Senado Federal, com o respectivo nmero de ordem.

A reviso j ocorreu e j produziu seus efeitos (foram efetuadas 6 emendas). E, como o art. 32 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias falava em apenas uma reviso, no se pode mais utilizar a via revisional para mudana da Constituio. Assim, qualquer alterao s poder ser feita pela via da emenda.

4.5. O PODER CONSTITUINTE DECORRENTE

Ao lado do poder de rever a Constituio da Repblica, seja por meio de emendas, seja da via revisional, surge o chamado Poder Constituinte Decorrente, cuja misso reside na funo de estruturar a organizao das unidades componentes do Estado Federal.

No dizer de Anna Cndida da Cunha Ferraz, tem o Poder Constituinte Decorrente um carter de complementariedade em relao Constituio; destina-se a perfazer a obra do Poder Constituinte Originario nos Estados Federais, para estabelecer a Constituio dos seus Estados componentes

O Poder Constituinte Decorrente nasce com o pacto federativo, que apresenta como uma de suas peculiaridades a capacidade de auto-organizao por Constituies prprias das unidades federadas. Esse poder de auto-organizao, por meio de Constituies Estaduais, d lugar ao Poder Constituinte Decorrente.

Nesse sentido, cumpre destacar que o Poder Constituinte Decorrente, como espcie do Poder Constituinte Derivado, apresenta as mesmas caractersticas deste, dizer, a limitao e o condicionamento que se materializam pelo dever genrico de observncia dos princpios contidos na Constituio Federal e pela atuao restrita no mbito prprio da competncia constitucionalmente reservada aos Estados-membros.

Convm sublinhar que, por fora do disposto no art. 11 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias da Constituio Federal, o exerccio do Poder Constituinte Decorrente foi atribudo s Assemblias Legislativas, aspecto denotador de mais um condicionamento desse Poder.

20. Poder constituinte do Estado-membro, Revista dos Tribunais, 1979, p. 19.

21. O Ato das Disposies Constitucionais Transitrias, em seu art. 11, imps aos Estados-membros, no exerccio de seu poder constituinte, a estrita observncia dos princpios consagrados na Carta da Repblica. O poder constituinte decorrente, asseguradas as unidades da Federao, , em essncia, uma prerrogativa institucional juridicamente limitada pela normatividade subordinante emanada da Lei Fundamental (STF, Medida Cautelar em ADIn 568, Rei. Mi Celso de Mello, JUIS, n. 7, 1 trim. 1997; RTJ, 138(1):64).

Com o advento da Constituio de 1988, os Municpios foram alados condio de componentes do Estado Federal, ensejando questionamentos quanto existncia de um Poder Constituinte Decorrente, de mbito municipal, voltado para a criao das chamadas leis orgnicas.

O Poder Constituinte Decorrente, conferido aos Estados-membros da Federao, no foi estendido aos Municpios, como se constata de mera leitura do art. 29 do nosso Texto Maior. Enquanto aos Estados foi conferida organizao por Constituies, aos Municpios cogitou-se de leis orgnicas, as quais, de sua vez, deveriam guardar fidelidade no s Constituio da Repblica, mas tambm respectiva Constituio do Estado, revelando- se assim que o mais alto documento normativo municipal no adviria de um Poder Constituinte, mas de mero rgo legislativo: a Cmara dos Vereadores.

Com efeito, a tnica do Poder Constituinte Derivado, do qual o De corrente espcie, reside no fato de derivar diretamente dos comandos instaurados pelo Poder Constituinte Originrio. Ora, se as leis orgnicas de vem obedincia simultnea Constituio Federal e Constituio do respectivo Estado, no possuem, de evidncia, esse predicado. Da, com razo, dentre outros, o pronunciamento do Tribunal de Justia do Estado de So Paulo no reconhecendo a existncia de Poder Constituinte na rbita dos Municpios A Constituio Estadual deve respeitar os princpios fixados na Constituio Federal. A lei orgnica, por seu turno, obedecer aos princpios estabelecidos na Constituio Federal e Estadual. Portanto, obedece a dois graus de imposio legislativa constitucional.

Art. 29. O Municpio reger-se- por lei orgnica, votada em dois turnos, com o interstcio mnimo de dez dias, e aprovada por dois teros dos membros da Cmara Municipal, que a promulgar, atendi dos os princpios estabelecidos nesta Constituio, na Constituio do respectivo Estado e os seguintes preceitos.

4.5.1. Princpio da simetria

O princpio da simetria, segundo consolidada formulao jurisprudencial, determina que os princpios magnos e os padres estruturantes do Estado, segundo a disciplina da Constituio Federal, sejam,

22. Cf. TJSP, ADIn 20.894.0/5, Rei. Mm. Lus de Macedo,j. em 10-4-1995.

tanto quanto possvel, objeto de reproduo simtrica nos textos das os constituies estaduais.

Exemplo dessa situao reside na regra de iniciativa reservada do Chefe do Poder Executivo Federal (Presidente da Repblica), que deve ser aplicada, obrigatoriamente, no que couber, ao Chefe do Poder Executivo Esta ra dual (Governador do Estado), por fora do art. 61, l c/c o art. 25 da Lei da Maior.23

Nesse mesmo parmetro a imposio, no processo legislativo estadual, da regra que veda emendas que aumentem a despesa em projetos de lo- iniciativa exclusiva do Presidente da Repblica, a teor do que estabelece o de art. 63, 1, da Constituio da Repblica.24

A exigncia de respeito aos princpios fixados na Constituio Federal, entre eles o da separao de Poderes (art. 2 da Lei Magna), faz com que o constituinte estadual no se afaste do quorum para rejeio de veto ris- do Chefe do Poder Executivo, ou seja, maioria absoluta, em escrutnio secreto (art. 66, 42). Portanto, o constituinte estadual dever, na elaborao do processo legislativo estadual, respeitar o quorum da maioria absoluta, e em escrutnio secreto, sob pena de estar ferindo o princpio da separao de Poderes, aumentando ou diminuindo o papel do Chefe do Poder Executivo no plano estadual.

23. STF, ADIn 276, Rei. Mi Seplveda Pertence, DJ, 19 dez. 1997, p. 20, ementa: 1. Processo legislativo: modelo federal: iniciativa legislativa reservada: aplicabilidade, em ter mos, ao poder constituinte dos Estados-membros. 1. As regras bsicas do processo legislativo federal so de absoro compulsria pelos Estados-membros em tudo aquilo que diga respeito como ocorre s que enumeram casos de iniciativa legislativa reservada ao princpio fundamental de independncia e harmonia dos poderes, como delineado na Constituio da Repblica. 2. Essa orientao malgrado circunscrita em princpio ao regime dos poderes constitudos do Estado-membro de aplicar-se em termos ao poder constituinte local, quando seu trato na Constituio estadual traduza fraude ou obstruo antecipada ao jogo, na legislao ordinria, das regras bsicas do processo legislativo, a partir da rea de iniciativa reservada do executivo ou do judicirio: o que se d quando se eleva ao nvel constitucional do Estado-membro assuntos midos do regime jurdico dos servidores pblicos, sem correspondncia no modelo constitucional federal, a exemplo do que sucede na espcie com a disciplina de licena especial e particularmente do direito sua converso em dinheiro (JUS n. 19).

24. STF, ADIn 805, ReI. Mi Seplveda Pertence, DJ, 12 mar. 1999, p. 47, ementa:

Processo legislativo: emenda de origem parlamentar, da qual decorreu aumento da despesa e- prevista, a projeto do Governador do Estado, em matria reservada a iniciativa do Poder Executivo: inconstitucionalidade, visto serem de observncia compulsria pelos Estados as regras bsicas do processo legislativo da Constituio Federal entre as quais as atinentes reserva de iniciativa dada a sua implicao com o princpio fundamental da separao e independncia dos Poderes (JUIS, n. 19).

Trata-se, por fora da aplicao do princpio da simetria, de regra obri gatria no processo legislativo estadual e municipal.

Originrio (inicial, autnomo, ilimitado e incondicionado)

Poder de reviso ou de reforma

Constituinte constitucional realiza

competncia reformadora

por meio de emenda

constitucional e de reviso

Derivado (institudo,limitado e condicionado)

decorrente cria a

Constituio Federal

5. A RECEPO REPRISTINAO E A DESCONSTITU CIONALIZAAO NO DIREITO CONSTITUCIONAL

Questo que adquire relevo, aps o estudo do Poder Constituinte, diz respeito ao equacionamento jurdico de todos os atos normativos infraconstitucionais produzidos sob a gide da Constituio revogada.

A nova Constituio tem o condo de revogar a anterior. Isso significa que todas as normas infraconstitucionais produzidas sob a gide da antiga Constituio perdem sua validade?

5.1. A RECEPO

A supervenincia de uma nova Constituio significa que o alicerce de legitimao de todo o sistema jurdico foi modificado. Essa alterao do cume da pirmide no implica a revogao automtica de toda legislao infraconstitucional. E que grande parte dessas normas se mantero compatveis com a nova Constituio.

Destarte, ocorre um processo de ressignificao do direito infraconstitucional compatvel com a nova Constituio. que, com a alterao das normas inaugurais do sistema, todas as- leis vigentes e que permaneceram compatveis com o texto atual vm a ter novo fundamento de validade, que condicionam a sua interpretao e o seu significado a novos parmetros.

Diz-se, desse modo, que foram recepcionadas pela nova Constituio.

Em outras palavras, mais do que simplesmente recebidas, foram incorpora das ao novo parmetro constitucional, com as necessrias adequaes.

Exemplo da situao exposta o Cdigo Tributrio Nacional, que, sob a gide da Constituio anterior, foi aprovado como um decreto-lei, figura que deixou de existir com a Constituio de 1988, que, ademais, em seu art. 146, prescreveu que as matrias tratadas pelo Cdigo Tributrio Nacional so reservadas lei complementar.

A recepo do Cdigo Tributrio Nacional significa, de um lado, sua compatibilidade material com a atual Constituio e, de outro, a sua adequao ao novo sistema, que lhe reservou espao e status diferenciado, vale dizer, o de uma lei complementar, de tal modo que, como tal, a partir da nova Constituio, dever ser considerado.

Importante destacar, dentro dessa linha de raciocnio, que a no-recepo de uma norma infraconstitucional pela vigente Constituio traduz hiptese de revogao hierrquica, regrada pelo chamado direito intertemporal (lei posterior revoga a anterior com ela incompatvel), no sendo admitido em nosso sistema a chamada inconstitucionalidade superveniente.

Dirimindo dvidas, a lio de Jos Celso de Mello Filho, em aresto do Supremo Tribunal Federal:

A incompatibilidade vertical superveniente de atos do Poder Pblico, em face de um novo ordenamento constitucional, traduz hiptese de pura e simples revogao dessas espcies jurdicas, posto que lhe so hierarquicamente inferiores

5.2. A REPRISTINAO

A repristinao apresenta importncia exclusivamente terica, visto que antigo e consolidado entendimento jurisprudencial e doutrinrio nega aplicao ao instituto.

No prisma constitucional, ela significa a revalidao de norma revogada pela Constituio anterior, mas que viesse a apresentar compatibilidade com a atual.

Figure-se a hiptese de uma norma editada sob a gide da Constituio de 1946, que tenha sido revogada, por incompatibilidade, pela Constituio de 1967. Admitir a repristinao significaria que, caso essa norma fosse compatvel com a atual Constituio, ela estaria automaticamente revalidada, o que, como se disse, no possvel, pois essa norma j desapareceu, no podendo, assim, ser ressuscitada sem previso expressa.

25. STF, Medida Cautelar em ADIn 129, DJ, 28 ago. 1992, p. 13450, JUIS, fi. 7.

5.3. A DESCONSTITUCIONALIZAO

Outro fenmeno que merece, ao menos, citao a desconstitucionalizao. Imaginemos a hiptese de uma norma constitucional existente na Constituio de 1967 que no tenha sido frontalmente contestada por nenhuma norma do texto de 1988. Poder-se-ia afirmar que a norma constitucional anterior teria vigncia como lei ordinria no novo sistema constitucional (essa ocorrncia recebe o nome de desconstitucionalizao). Tal afirmativa no correta, diante do nosso sistema constitucional, pois o primeiro e mais forte efeito de uma nova Constituio revogar a anterior, revogao que ocorre de forma integral. Assim, todas as normas constitucionais anteriores seriam revogadas pela nova Constituio.

6. A EFICCIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

Em tema de eficcia das normas constitucionais, antes de qualquer apresentao, conveniente estabelecer a correta acepo do que se chama de eficcia jurdica. E que a norma possui duas espcies de eficcia. A eficcia social, tambm denominada efetividade, que designa o fenmeno da concreta observncia da norma no meio social que pretende regular, e a eficcia jurdica, que, no dizer de Jos Afonso da Silva, designa a qualidade de produzir, em maior ou menor grau, efeitos jurdicos, ao regular, des de logo, as situaes, relaes e comportamentos de que cogita; nesse sentido, a eficcia diz respeito aplicabilidade, exigibilidade ou executoriedade da norma, como possibilidade de sua aplicao jurdica. O alcance dos objetivos da norma constitui a efetividade. Esta , portanto, a medida da extenso em que o objetivo alcanado, relacionando-se ao produto final

A eficcia jurdica das normas constitucionais conhece, por sua vez, dois nveis de manifestao: o sinttico e o semntico. Aquele diz respeito s relaes de coordenao e subordinao das normas constitucionais. Este, ao predicado que investe a norma da capacidade de gerar direito subjetivo ao respectivo titular. A norma constitucional, quando menos, possu eficcia

26. Aplicabilidade das normas constitucionais, 3. ed. rev., ampl. e atual., Malheiros Ed., 1998, p. 66.

sinttica, gerando a inconstitucionalidade de todos os atos normativos infraconstitucionais incompatveis com ela, condicionando a interpretao do direito infraconstitucional, revogando os atos normativos a ela anteriores e com ela incompatveis e, por fim, servindo de limite para a interpretao das demais normas constitucionais que com ela venham a se chocar.

A doutrina apresenta diversas classificaes quanto eficcia jurdica, como ser visto a seguir.

6.1. A CLASSIFICAO DE JOS AFONSO DA SILVA

Vamos reproduzir a classificao de Jos Afonso da Silva, citando outras27 a ttulo de ilustrao.

O autor faz uma classificao das normas constitucionais quanto a sua eficcia. Vejamos.

Normas de eficcia plena. So aquelas que no necessitam de qual quer integrao legislativa infraconstitucional. Produzem todos os seus efeitos de imediato. Podemos elencar, entre essas normas, as dos arts. 21, 22 e 24 da Constituio. Tambm so normas de eficcia plena, alm de outras, os arts. 19 (imposies Unio, Estados, Distrito Federal e Municpios), 20 (bens da Unio) e 28, todos da Constituio Federal. Versando o tema, Jos Afonso da Silva define as normas de eficcia plena como aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituio, produzem, ou tm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situaes que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular.28

So, portanto, normas fortes, quanto sua eficcia, no podendo ser enfraquecidas quer pelo legislador ordinrio, quer pela Administrao Pblica Normas de eficcia contida. So as dotadas de eficcia prospectiva ou, em outras palavras, as que, mngua de legislao infraconstitucional integradora, possuem eficcia total e imediata, porm, o advento legislativo faz com que seu

27. Adotamos a classificao de Jos Afonso da Silva por se tratar da mais conhecida e aceita, inclusive, recentemente, pelo Supremo Tribunal Federal, que julgou o Mandado de Injuno n. 438-2-GO, DJU, 16 ago. 1995, RT, 723:231-8.

28. Aplicabilidade das normas constitucionais, cit., p. 101.

29. O Supremo Tribunal Federal considerou de eficcia plena o art. 7, que reconheceu licena-maternidade, sem necessidade de qualquer fonte de custeio especfica (cf. RE 220.613, Rei. Mm. limar Galvo). Tambm de eficcia plena o art. 8, IV, que trata da contribuio confederativa, obrigando-a, no entanto, apenas aos filiados entidade sindical (RE 176.696-SP, Rel. Mi Celso de Meilo, RTJ, 170:648-50).

campo de abrangncia fique restrito, contido. Exemplo dessa situao o inciso XIII do art. 5 da nossa Lex Major, que possui a seguinte redao:

XIII livre o exerccio de qualquer trabalho, ofcio ou pro fisso, atendidas as qualificaes que a lei estabelecer.

Como se v, falta de lei ou leis que regulamentem o dispositivo, vige a regra geral de liberdade absoluta, O advento legislativo, indicando qualificaes necessrias a essa ou aquela profisso, tem a aptido de conter, restringir, o mbito de eficcia da norma. Como complementao restritiva, surge, no caso, a Lei n. 8.906/94, que, em seu art. 8 IV, determina que requisito para a inscrio no quadro da Ordem dos Advogados do Brasil a aprovao no Exame da Ordem30.

Em resumo, so normas fortes, quanto sua eficcia, mas que podem ser reduzidas pelo legislador infraconstitucjonal. Jos Afonso da Silva, em sua obra Aplicabilidade das normas constitucionais, afirma que a reduo tambm pode ocorrer diante de um conceito vago, como ordem pblica, bons costumes, segurana nacional. A reduo, nesse caso, ser efetivada pela Administrao Pblica, ficando o eventual conflito a ser solucionado pelo Poder Judicirio.

O legislador infraconstitucional (ou o administrador pblico, como afir ma o autor), no entanto, no recebe uma autorizao ilimitada de reduo do comando constitucional. Deve sempre preservar um contedo mnimo do direito, sob pena de estar descaracterizando a norma constitucional. A legislao restritiva (autorizada constitucionalmente) deve limitar-se ao contedo mnimo, sob pena de sufocar o direito garantido constitucionalmente.31

So tambm de eficcia contida os arts. 5Q, VJI XXIV e XXV, 37, 1, e 15, IV, entre outros.

Normas de eficcia limitada. O ltimo grupo de normas o de eficcia limitada. So aquelas que no produzem todos os seus efeitos de imediato, necessitando de um comportamento legislativo infraconstitucional ou da ao dos administradores para seu integral cumprimento.

30. Art. 8. Para inscrio como advogado necessrio: ... IV aprovao em Exa me de Ordem... 1 O Exame de Ordem regulamentado em provimento do Conselho Federal da OAB.

31. Figure-se a hiptese absurda de o legislador infraconstitucional, ou mesmo o Conselho Federal da OAB, fixar o Exame da Ordem em dez fases anuais e eliminatrias. Nesse caso, o exerccio profissional s poderia ser exercido depois de dez anos de trmino do curso de cinco anos. Evidentemente, o direito ao livre exerccio profissional estaria sufocado pela legislao infraconstitucional.

As normas de eficcia limitada s portanto, normas de eficcia fraca, podendo, no entanto, ser fortalecidas pelo legislador infraconstitucional e pelo administrador pblico. O Supremo Tribunal Federal entendeu que a regra dos juros reais mximos de 12% ao ano (art. 192, 3) necessita de conceituao pela legislao complementar prevista no caput do art. 192, tornando invivel a sua imediata aplicao, o que a caracteriza como norma de eficcia limitada.

Para o referido autor, as normas de eficcia limitada dividem-se em dois grupos: normas constitucionais de princpio institutivo e normas constitucionais de princpio programtico. Vejamos cada uma delas.

Normas constitucionais de princpio institutivo. So normas de princpio institutivo, porquanto contm esquemas gerais, um como que incio de estruturao de instituies, rgos ou entidades, pelo que tambm poderiam chamar-se normas de princpio orgnico ou organizativo Pode mos apontar, como exemplo, o art. 224 da Constituio Federal, que prev a criao de um Conselho. So tambm normas de eficcia limitada, instituidoras de princpio organizativo, o art. 33, o 2 do art. 90, o art. 113, o art. 161,1, entre outros.

Normas constitucionais de princpio programtico. Programticas so normas constitucionais atravs das quais o constituinte, em vez de regular, direta e imediatamente, determinados interesses, limitou-se a traar- lhes os princpios para serem cumpridos pelos seus rgos (legislativos, executivos, jurisdicionais e administrativos), como programas das respectivas atividades, visando realizao dos fins sociais do Estado So exemplos claros das normas constitucionais programticas os arts. 196 (direi to sade), 205 (educao), 215 (cultura) e 227 (proteo da criana) e 35

As normas de eficcia limitada antes de sua complementao pela via integrativa infraconstitucional produzem os seguintes efeitos:

32. Jos Afonso da Silva, Aplicabilidade das normas constitucionais, cit., p. 122.

33. Jos Afonso da Silva, Aplicabilidade das normas constitucionais, cit., p. 138, baseando-se em Meirelles Teixeira.

34. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Mandado de Injuno n. 438-2-GO (RT, 723:231-8), entendeu que a norma constitucional do art. 37, VII, de eficcia limitada. Portanto, at que surja a lei complementar determinada pelo artigo, o direito de greve dos servidores pblicos est inviabilizado.

35. O Supremo Tribunal Federal entendeu que a norma do inciso I (j modificado pela EC n. 20) do art. 202 no se reveste de auto-aplicabilidade, necessitando de interposio legislativa. No entanto, considerou como de eficcia plena e auto-aplicvel a regra do mesmo artigo constante do 1 (dispositivo tambm revogado pela EC n. 20).

a) estabelecem um dever para o legislador ordinrio;

b) condicionam a legislao futura, com a conseqncia de serem in constitucionais as leis ou atos que as ferirem;

c) informam a concepo do Estado e da sociedade e inspiram sua ordenao jurdica, mediante a atribuio de fins sociais, proteo de valo res da justia social e revelao dos componentes do bem comum;

d) constituem sentido teleolgico para a interpretao, integrao e aplicao das normas jurdicas;

e) condicionam a atividade discricionria da Administrao e do Judicirio;

f) criam situaes jurdicas subjetivas de vantagem ou desvantagem.

Concluindo com o autor, podemos ainda afirmar que as normas de eficcia limitada revogam a legislao infraconstitucional preexistente que fira o programa proposto. O Supremo Tribunal Federal entendeu que, pela via de controle da ao direta de inconstitucionalidade, no possvel verificar se seria inconstitucional uma norma ordinria que tivesse descumprido um programa constitucional (extinguindo rgos da sade, p. ex.), pois, para tanto, haveria necessidade de confronto da norma impugnada com a legislao infraconstitucional existente, o que causaria um ferimento reflexo e no direto Lei Maior. No entendemos assim. O Supremo Tribunal Federal est deixando de utilizar, via ao direta de inconstitucionalidade, importantssimo instrumento para controlar os preceitos constitucionais e seu cumprimento. Sob o fundamento do ferimento reflexo e no direto, a Corte formula uma poltica de absteno em tema de grande importncia, que exigiria participao forte e decidida do Pretrio Excelso, ou seja, o controle das normas infraconstitucionais por descumprimento de programas previstos na Lei Maior.36

Como dissemos, existem outras classificaes pertinentes eficcia e aplicabilidade das normas constitucionais. Dessas, sobressaem com maior pujana as seguintes.

6.2. A CLASSIFICAO DE CELSO RIBEIRO BASTOS

Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto, versando o tema, oferece ram a classificao a seguir exposta.

36. Conferir ADIn 2.065 Rei. Mm. Moreira Alves, j. em 17-2-2000, Boletim Informativo STF, n. 178.

Normas de aplicao. So aquelas que esto aptas a produzir todos os seus efeitos. Dividem-se em:

a) normas irregulamentveis so as que incidem diretamente sobre os fatos regulados, impedindo qualquer regramento intercalar. So normas cuja matria insuscetvel de tratamento, seno no nvel constitucional. Exemplo: art. 2 da Constituio Federal, artigos que distribuem competncia etc.;

b) normas regulamentveis os autores apontam determinadas normas que permitem apenas regulamentao, sem qualquer restrio do contedo constitucional. Tais normas receberiam da legislao infraconstitucional uma mais adequada regra de cumprimento. Importante frisar que no haveria amesquinhamento da regra constitucional, mas sua regulamentao. No se trata de integrao, mas regulamentao.

Normas de integrao. Tm por trao distintivo a abertura de espao entre o seu desiderato e o efetivo desencadear dos seus efeitos. No seu interior, existe uma permanente tenso entre a predisposio para incidir e a efetiva concreo. Padecem de visceral impreciso, ou deficincia instrumental, e se tornam, por si mesmas, inexeqveis, em toda a sua potencialidade. Da por que se coloca, entre elas e a sua real aplicao, outra norma integradora de sentido, de modo a surgir uma unidade de contedo entre as duas espcies normativas.37

Os autores dividem as normas de integrao em dois grupos: normas completveis e normas restringveis. O primeiro formado por aquelas que exigem uma legislao integrativa para a produo integral de seus efeitos. O segundo, as restringveis, permite que o legislador infraconstitucional reduza o comando constitucional. Enquanto isso no ocorre, no entanto, as normas produzem todos os seus efeitos de forma total.

6.3. A CLASSIFICAO DE MARIA HELENA DINIZ

Maria Helena Diniz, em primorosa monografia traou inovadora classificao das normas constitucionais segundo a eficcia, definindo-as em quatro categorias. Vejamos.

37. Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto, Interpretao e aplicabilidade das normas constitucionais, Saraiva, 1982, p. 48.

38. A autora, em Norma constitucional e seus efeitos, Saraiva, 1989, classifica as normas constitucionais em normas supereficazes ou com eficcia absoluta, normas com eficcia plena, normas com eficcia relativa restringvel, normas com eficcia relativa complementvel ou dependente de complementao legislativa. Estas ltimas subdividem- se em normas de princpios institutivos e normas programticas.

Normas supereficazes ou com eficcia absoluta. So as dotadas de efeito paralisante de todas as legislaes com elas incompatveis, constitudas pelas chamadas normas ptreas.

Normas com eficcia plena. So aquelas que, por reunirem todos os predicados necessrios produo imediata dos efeitos previstos, no de mandam legislao integradora para surtirem eficcia.

Normas com eficcia restringvel. Correspondem s normas de eficcia contida, na classificao proposta por Jos Afonso da Silva.

Normas com eficcia relativa complementvel ou dependente de complementao legislativa. So aquelas cuja capacidade de produo de efeitos reclama a intermediao de ato infra-ordenado. Podem revestir a forma de normas de princpio institutivo e programtico.39

7.0 CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DOS ATOS NORMATIVOS

7.1. INTRODUO

Nos pases que possuem Constituies rgidas ou seja, aquelas que prevem, para sua prpria alterao, um procedimento legislativo mais gravoso do que o estipulado para as leis ordinrias, institui-se uma espcie de pirmide normativa, em cujo pice se localiza a Constituio.

Dessa maneira, todos os atos normativos infraconstitucionais devem, por princpio, guardar com a respectiva Constituio. Perfilhando o mesmo entendimento, alis, o esclio de Jorge Miranda:

Na verdade, o critrio desta distino para o seu grande autor, James Bryce, a distino principal a fazer entre todas as Constituies est na posio ocupada pela Constituio perante as chamadas leis ordinrias. Se ela se coloca acima destas, num plano hierrquico superior, e encerra caractersticas prprias, considera-se rgida; ao invs, se se encontra ao nvel das restantes leis, sem um poder ou uma forma que a suportem em especial, flexvel. Apenas as Constituies rgidas, e no tambm as Constituies flexveis, so limitativas, porque ultrapassam as leis e prevalecem sobre as suas estatuies.40

39. Ver, tambm, Jos Afonso da Silva, Aplicabilidade das normas constitucionais, cit.; Maria Helena Diniz, Norma constitucional e seus efeitos, cit.; Celso Ribeiro Bastos e Carlos Ayres Britto, Interpretao e aplicabilidade das normas constitucionais, cit.

40. Contributo para uma teoria da inconstitucionalidade, Coimbra Ed., 1996, p. 37.

Assim sendo, a existncia de uma Constituio rgida cria uma relao piramidal entre esta e as demais normas do mesmo ordenamento jurdico, que com ela devem guardar relao de necessria lealdade.

Esse dever de compatibilidade vertical com a Carta Magna obedece, porm, a dois parmetros: um e outro material.

O parmetro formal diz respeito as regras constitucionais referentes ao processo legislativo, dizer, aos meios constitucionalmente aptos a introduzir normas no sistema jurdico. A inobservncia dessas regras procedimentais gera a inconstitucionalidade formal ou nomodinmica desse ato normativo.

O parmetro .material refere-se ao contedo das normas constitucionais. Assim, o contedo de uma norma infra-ordenada no pode ser antagnico ao de sua matriz constitucional. Por exemplo, em nosso pas, onde a Constituio prescreve o direito vida, a cominao de pena de morte para o cometimento de um crime (salvo a hiptese constitucionalmente prevista na alnea a do inciso XLVII do art. 5)41 , por evidente, inconstitucional. Essa a chamada inconstitucionalidade material ou nomoesttica.

Importante notar, nessa linha de raciocnio, que, uma vez flagrada a inconstitucionalidade de um ato normativo, deve ele ser reconhecido como invlido, impedindo-se a existncia de contradio no sistema.42

Bem por isso, a Constituio da Repblica criou o controle de constitucionalidade dos atos normativos, cujo objetivo consiste, num primeiro mo mento, em instituir barreiras introduo de normas inconstitucionais no cenrio jurdico. Caso, no entanto, essas barreiras revelem-se ineficazes, estar armada uma segunda etapa do controle, onde a meta passar a ser o reconhecimento da inexistncia da norma inconstitucional no sistema.

41. Art. 5 XLVII: no haver penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX.

42. Apesar de o Supremo Tribunal Federal reconhecer que ato normativo inconstitucional invlido, como ser visto adiante, este pode dar, excepcionalmente, efeitos ex nunc deciso, para preservar situaes j constitudas ou prestigiar o princpio da segurana jurdica. A regra, no entanto, ofertar ao julgamento do controle concentrado efeitos ex tunc. A Lei n. 9.868, de 10 de novembro de 1999, em seu art. 27, explicitou tal possibilidade, que vinha sendo aplicada pelo Supremo Tribunal Federal, exigindo, no entanto, maioria de dois teros para restringir os efeitos da declarao ou decidir que ela s tenha eficcia a partir de seu trnsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado. Dessa manei ra, apesar de invlido, o ato recebe validade pelo quorum qualificado de dois teros dos membros do Supremo Tribunal Federal, para permitir o aproveitamento, em homenagem segurana jurdica. Os efeitos, portanto, com o quorum especial de dois teros podero ser ex nunc ou a partir do momento escolhido pela deciso do Supremo.

7.2. O CONTROLE PREVENTIVO

O controle preventivo isto , o mtodo pelo qual se previne a introduo de uma norma inconstitucional no ordenamento, ocorre ou processo legislativo.

No prprio exerccio da iniciativa legislativa, os detentores do poder de deflagrar o processo devem analisar a regularidade do projeto, compatibilizando-o com o texto constitucional.

Superada a fase de iniciativa, o projeto submetido, em primeira mo, s Comisses Legislativas, em especial Comisso de Constituio e Justia, onde o tema constitucionalidade volta a lume, podendo participar ainda da fase de discusso do projeto em plenrio.

As Comisses de Constituio e Justia entre outras finalidades devem verificar a adequao do projeto de lei ou de emenda constitucional Constituio Federal, quer no que se refere aos aspectos formais do pro cesso legislativo, quer no que diz respeito ao contedo desses projetos e sua harmonia com o Texto Maior.

O parecer dessas Comisses de Constituio e Justia, no entanto, pode no ser terminativo.

O art. 54, 1, do Regimento Interno da Cmara dos Deputados preconiza que o parecer da Comisso de Constituio e Justia e de Redao ser terminativo quanto constitucionalidade ou juridicidade da matria. Porm, os arts. 132, 2 e 137, II, b, ambos igualmente pertencentes ao cita do Regimento Interno, prevem a possibilidade de recurso para o plenrio dessa deliberao.

De igual modo o l do art. 101 do Regimento Interno do Senado Federal, que dispe da seguinte forma: Quando a Comisso emitir pela inconstitucionalidade e injuricidade de qualquer proposio ser esta considerada rejeitada e arquivada definitivamente, por despacho do Presidente do Senado, salvo, no sendo unnime o parecer, recurso inter posto nos termos do artigo 254.

A fase final do processo legislativo indica ao Presidente da Repblica a possibilidade de duas condutas: a sano ou o veto. Este, de sua vez, pode

43. O art. 32, III, do Regimento Interno da Cmara dos Deputados utiliza a expresso Comisso de Constituio e Justia e de Redao. O art. 72, n. 3, do Regimento Interno do Senado Federal emprega a denominao Comisso de Constituio, Justia e Cidadania.

44. Ver art. 32, III, do Regimento Interno da Cmara dos Deputados e art. 101 do Regimento Interno do Senado Federal.

ter dois fundamentos, vale dizer, a contrariedade ao interesse pblico ou a inconstitucionalidade do projeto.

Tendo o projeto superado todos esses obstculos e, dessa forma, caminhado para a promulgao e publicao, encerra-se a fase preventiva do controle de constitucionalidade, que, em princpio, no jurisdicional.

O Supremo Tribunal Federal, no entanto, tem entendido que o controle preventivo pode excepcionalmente ocorrer pela via jurisdicional quando existe vedao na prpria Constituio ao trmite da espcie normativa. Cuida-se, em outras palavras, de um direito-funo do parlamentar de participar de um processo legislativo juridicamente hgido. Assim, o 4 do art. 60 da Constituio Federal veda a deliberao de emenda tendente a abolir os bens protegidos em seus incisos. Portanto, o Supremo Tribunal Federal entendeu que os parlamentares tm direito a no ver deliberada uma emenda que seja tendente a abolir os bens assegurados por clusula ptrea. No caso, o que vedada a deliberao, momento do processo legislativo. A Mesa, portanto, estaria praticando uma ilegalidade se colocasse em pauta tal tema46. O controle nesse caso, e pela via de exceo em defesa de direito de parlamentar.

Podemos afirmar que as ocasies mais eficazes do controle preventivo so o parecer da Comisso de Constituio e Justia e o veto sendo este, certamente, o momento de maior eficcia, porque exige, para sua derruba da, a maioria absoluta dos membros de cada Casa Legislativa.

7.3. O CONTROLE REPRESSIVO

O controle repressivo de constitucionalidade das leis e demais atos normativos exercido junto ao Poder Judicirio e processa-se por duas vias.

45. Cf. art. 66, 1 da Constituio da Repblica.

46. A deciso foi tomada no Mandado de Segurana n. 20.257-DF, assim ementada; Mandado de segurana contra ato da Mesa do Congresso que admitiu a deliberao de pro posta de emenda constitucional que a impetrao alega ser tendente abolio da repblica. Cabimento do mandado de segurana em hipteses em que a vedao constitucional se dirige ao prprio processamento da lei ou da emenda, vedando a sua apresentao (como o caso previsto no pargrafo nico do artigo 57) ou a sua deliberao (como na espcie). Nesses casos, a inconstitucionalidade diz respeito ao prprio andamento do processo legislativo, isso porque a Constituio no quer em face da gravidade dessas deliberaes, se consumadas que sequer se chegue deliberao, proibindo-a taxativamente. A inconstitucionalidade, se ocorrente, j existe antes de o projeto ou de a proposta se transformar em lei ou em emenda constitucional, porque o prprio processamento j desrespeita, frontalmente, a Constituio (RTJ, 99:1031-41). Recorde-se que os artigos citados so referentes ao texto constitucional anterior, pois o julgamento ocorreu em 1980.

Uma difusa, tambm chamada de indireta, de exceo ou de defesa que consiste basicamente na argio de inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo dentro de um processo judicial comum. Outra coisa tambm denominada direta ou de ao ou ainda de controle abstrato, cujas caractersticas bem se resumem na existncia de uma ao cujo propsito nico e exclusivo seja a declarao de inconstitucionalidade de uma norma.

Convm destacar, a propsito, que o art. 97 da Constituio da Repblica consolida regra geral, vlida tanto para a via difusa como para a concentrada, pela qual os tribunais s podem declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou de outro ato normativo pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou do respectivo rgo especial.

7.3.1. A via difusa

Nesta forma de controle, discute-se o caso concreto Deve haver uma situao concreta onde o interessado pea a prestao jurisdicional para escapar da incidncia da norma. Os efeitos dessa deciso operam-se apenas entre as partes. Por tal razo, conhecida como via de porque excepciona o interessado (dentre toda a comunidade) do cumprimento da regra.

A forma processual utilizada a mais variada. Ao ordinria, embargos execuo, mandado de segurana, enfim, qualquer dos meios processuais colocados disposio do indivduo.

O interessado que pede a prestao jurisdicional no precisa estar no plo passivo da lide, podendo ser o autor da ao. Por tal razo, a expresso significa que o interessado est defendendo-se de uma norma inconstitucional e no, obrigatoriamente, ocupando o plo passivo da ao.

O foro competente para discusso da medida o ordinrio. Assim, qualquer juiz poder, diante do caso concreto, declarar a inconstitucionalidade da norma.

A deciso do Poder Judicirio para o caso concreto ser sempre incidenter tantum, ou seja, pressuposto para a procedncia ou improcedncia da ao, que apreciar a tutela concreta do interesse. O juiz reconhece a inconstitucionalidade de determinada norma e, por via de conseqncia julga o feito procedente ou improcedente. A declarao de inconstitucionalidade antecede o mrito da questo.

O debate da inconstitucionalidade pela via de exceo pode chegar at o Supremo Tribunal Federal, desde que a parte interessada assim faa, quer pela competncia originria da Suprema Corte, quer pela via recursal adequada.

O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a matria, trata de reconhecer, ou no, a inconstitucionalidade do tema, fato que, por si, no determina a expulso da norma do sistema, pois, no caso, a coisa julgada restringe-se s partes do processo em que a inconstitucionalidade foi argida.

Entretanto, o Supremo Tribunal Federal deve comunicar a deciso ao Senado Federal, que, utilizando a competncia do art.52, X, da Constituio Federal, tem a faculdade de, por meio de resoluo, suspender a execuo da norma.47

No h mais dvida de que o Senado Federal exerce poder discricionrio, podendo ou no suspender a e da norma declarada inconstitucional por deciso de do Supremo Tribunal Federal. O momento do exerccio da competncia do art. 52, X, ato de poltica legislativa ficando, portanto, ao crivo exclusivo do Senado. No se trata de dar cumprimento sentena do Supremo Tribunal Federal, que decidiu pela via de exceo. Na verdade, a deciso do Senado Federal no sentido de estender a sentena do Supremo, pertinente inconstitucionalidade (no prestao de fundo do pleito caso concreto), para todos. Os efeitos da resoluo, portanto, so sempre a partir de sua ou seja, ex nunc.

O entendimento, contudo, no pacfico.

Gilmar Ferreira Mendes e Clemerson Merlin Clve perfilham a concluso de que a citada Resoluo produziria efeitos erga omnes e ex tunc. Quanto quele efeito, no existe controvrsia. Preconizando como finalidade de tal Resoluo a suspenso eficcia da lei considerada inconstitucional por deciso do Supremo Tribunal Federal, inegvel que o art. 52, X, da Constituio Federal atribua a essa deliberao do Senado efeito erga ornnes.

Afigura-se-nos, porm, sem menoscabo do pensamento dos ilustres constitucionalistas, que a deliberao da aludida Casa de Leis no seria retroeficaz, mas que, nesse sentido, possuiria exclusivamente efeito ex nunc.

47. O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, elaborado em 1985, assim disciplina em seu art. 178: Declarada, incidentalmente, a inconstitucionalidade, na forma prevista nos arts. 176 e 177, far-se- a comunicao, logo aps a deciso, autoridade ou rgo interessado, bem como, depois do trnsito em julgado, ao Senado Federal, para os efeitos do art. 42, VII, da Constituio. Verifica-se que o artigo atual o 52, X competncia privativa do Senado Federal para suspender a execuo, no todo ou em parte, de deciso definitiva do Supremo.

48. O controle incidental de normas no direito brasileiro, RT, 760:11-39.

49. A fiscalizao abstrata de constitucionalidade no direito brasileiro, Revista dos Tribunais, 1995, p. 97.

Realmente, tal Resoluo, na espcie, tem carter discricionrio, o que faz com que sua edio fique a depender do critrio de oportunidade e convenincia do Senado Federal.

incontroverso, por outro lado, que no mago de qualquer ordena mento reside o objetivo de segurana das relaes jurdicas.

Fincados nesse pressuposto, entendemos que o carter discricionrio dessa deliberao legislativa incompatvel com sua pretendida atribuio de retro eficcia.

Cuidando-se de ato discricionrio, o Senado avalia a convenincia e a oportunidade da suspenso da eficcia do ato normativo tachado de inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Assim sendo, pode deixar de determinar, ou mesmo postergar, a seu exclusivo critrio, a sua suspenso.

Sustentar a retroeficcia dessa deliberao implica afirmar que o Senado pode postergar o momento de edio da Resoluo, para, em seguida, atribuir invalidade a todos os atos jurdicos praticados sob a gide dos atos normativos impugnados anteriores edio desta, inclusive aqueles que" vieram a lume no perodo em que o ato normativo submeteu-se ao juzo discricionrio do Senado, que, dessa feita, prorrogaria a eficcia de uma. norma, legitimando um sem-nmero de atos jurdicos, que preconcebia invlidos e, portanto, predestinados ao desfazimento.

Onde a estabilidade das relaes jurdicas?

A retroeficcia dessa deliberao s seria compatvel com um pressuposto carter vinculado da manifestao do Senado, que, ento, passaria a funcionar como uma espcie de "executor de ordens" do Supremo Tribunal Federal, o que, por evidente, maltrataria o princpio da tripartio constitucional de funes.

A deliberao, assim, tem carter discricionrio. Logo, no pode ser dotada de retroeficcia.

No fosse essa a linha correta de interpretao da Constituio, estaria descartada a pretenso finalstica de segurana nas relaes jurdicas, bem como o princpio da responsabilidade do Estado, visto que estar-se-ia atribuindo ao Senado o poder de postergar uma deciso, permissiva da produo de atos que seriam invalidados - num segundo momento - pela prpria deciso postergada.

Se a Constituio Federal atribuiu discricionariedade deliberao do Senado, quis, evidentemente, que este determinasse o momento a partir do qual a norma impugnada deixasse de gerar efeitos. Caso contrrio, no haveria por que falar em discricionariedade, visto que a retroeficcia predetermina no termo a quo de vigncia da norma a oportunidade em que esta deixaria de produzir efeitos vlidos.

O objetivo da Resoluo pacificar as relaes sociais abaladas por uma norma declarada inconstitucional, extraindo-se, ainda uma vez, que a deciso do Senado s produz efeitos a partir de sua publicao.

Regina Maria Macedo Nery Ferrari, versando o tema, tece o seguinte comentrio:

"Ora, parece-nos claro, dentro de tal colocao de idias, que s a partir dessa suspenso que a lei perde a eficcia, o que nos leva a admitir o seu carter constitutivo. A lei at tal momento existiu e, portanto, obrigou, criou direitos, deveres, com toda sua carga de obrigatoriedade, e s a partir do ato do Senado que ela vai passar a no obrigar mais, j que, enquanto tal providncia no se concretizar, pode o prprio Supremo, que decidiu sobre sua invalidade, alterar seu entendimento, conforme manifestao dos prprios ministros do Supremo, em voto proferido na deciso do Mandado de Segurana 16.512, de maio de 1966"5.

Jos Afonso da Silva tambm concorda com o efeito ex nunc da deciso, pois afirma que a lei existia, revelou eficcia e produziu validamente seus efeitos, j que a deciso do Senado implica suspenso da eficcia do ato normativo e no sua revogao51.

A deciso do Supremo Tribunal Federal, porque deferida em via de exceo, exige uma prestao jurisdicional concreta (devoluo de um tributo pago indevidamente, no-incidncia de determinado tributo, determinao de certa alquota etc.), dividida em duas partes: o reconhecimento da inconstitucionalidade (incidenter tantum) e, como conseqncia, a procedncia ou improcedncia da ao. O Senado Federal suspender apenas a execuo da norma impugnada. No poder ordenar que o tributo seja tambm devolvido. Apenas determinar que a norma fique sem execuo.

Para finalizar, conveniente repisar que, tambm no controle difuso, s se declara a inconstitucionalidade de uma norma pelo voto da maioria absoluta dos membros dos tribunais ou dos respectivos rgos especiais. Essa regra vale tanto para o Supremo Tribunal Federal como para os demais tribunais, trazendo conseqncias prticas para a trarnitao dos processos. No Estado de So Paulo, por exemplo, esse incidente de inconstitucionalidade encontra-se disciplinado, de forma modelar, pelos arts. 657 e 658 do Regimento Interno do Tribunal de Justia, que possuem a seguinte redao

50. Efeito da declarao de inconstitucionalidade, 4. ed. rev., atual. e ampl., Revista

dos Tribunais, 1999, p. 152.

51. Curso de direito constitucional positivo, cit., p. 57.

:"Art. 657. Se, por ocasio do julgamento de qualquer feito, pela Seo Criminal, pelas turmas especiais de uniformizao de jurisprudncia, grupos de cmaras ou cmaras isoladas, for acolhida, de ofcio ou a requerimento de interessado, a argio de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Pblico, ser lavrado o acrdo, a fim de ser submetida a questo ao rgo Especial, para fins do art. 97 da Constituio da Repblica.

Art. 658. Proclamada a constitucionalidade do texto legal ou do ato normativo questionado, ou no alcanada a maioria prevista no dispositivo constitucional, a argio ser julgada improcedente.

1 Q Publicadas as concluses do acrdo, os autos sero devolvidos ao rgo judicante que suscitou o incidente, para apreciar a causa, de acordo com a deciso da matria prejudicial"52.

O Supremo Tribunal Federal decidiu que o quorum qualificado do art. 97 (reserva de plenrio) para outros Tribunais fica dispensado quando o prprio Supremo Tribunal Federal j tenha decidido pela inconstitucionalidade, mesmo pela via de exceo53.

7.3.2. O controle concentrado

O controle concentrado de inconstitucionalidade processa-se por meio da ao direta de inconstitucionalidade, da ao dec1aratria de constitucionalidade e pela argio de descumprimento de preceito fundamental, nonnatizada pela Lei n. 9.882/99. Por uma questo de apresentao cronolgica do tema, vamos arrolar os caractersticos do controle da constitucionalidade, tendo em vista os instrumentos que j constavam do sistema e que j haviam sido operacionalizados pelo legislador infraconstitucional, ou seja, a ao direta de inconstitucionalidade e a ao de descump