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1 POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO DIREITORIA DE ENSINO ESCOLA SUPERIOR DE SOLDADOS “CORONEL PM EDUARDO ASSUMPÇÃO” CURSO SUPERIOR DE TÉCNICO DE POLÍCIA OSTENSIVA E PRESERVAÇÃO DA ORDEM PÚBLICA MATÉRIA 01: DIREITOS HUMANOS UD 03: AÇÕES AFIRMAT IVAS E IGUALDADE RACIAL Departamento de Ensino e Administração Divisão de Ensino e Administração Seção Pedagógica Setor de Planejamento APOSTILA ATUALIZADA EM ABRIL DE 2009 PELO 1°T EN PM RODRIGUES ALVES DA ESSd

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POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO

DIREITORIA DE ENSINO

ESCOLA SUPERIOR DE SOLDADOS

“CORONEL PM EDUARDO ASSUMPÇÃO”

CURSO SUPERIOR DE TÉCNICO DEPOLÍCIA OSTENSIVA E PRESERVAÇÃO

DA ORDEM PÚBLICA

MATÉRIA 01: DIREITOS HUMANOSUD 03: AÇÕES AFIRMATIVAS E

IGUALDADE RACIAL

Departamento de Ensino e AdministraçãoDivisão de Ensino e Administração

Seção PedagógicaSetor de Planejamento

APOSTILA ATUALIZADA EM ABRIL DE 2009 PELO 1°T EN PM RODRIGUES ALVES DA ESSd

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ÍNDICE

FUNDAMENTOS DA DISCIPLINA1. Introdução 2

DESENVOLVIMENTO DO CURSOA HISTÓRIA DO NEGRO NO BRASIL

2.1.1. Uma vida a serviço dos brancos 32.1.2. A dualidade atual: preconceito racial ou preconceito de classe s? 42.1.3. Conclusões 5

CONCEITOS BÁSICOS SOBRE AS TEMÁTICAS RELACIONADAS À COR2.2.1. Raça, racialismo, racismo, preconceito, discriminação, apartheid 62.2.2. Preconceito de marca e preconceito de origem 72.2.3. Sobre o racialismo no Brasil 82.2.4. O mito da democracia racial brasileira 92.2.5. A cor como fator preponderante de sucesso na vida 102.2.6. Alguns dados estatísticos e situacionais das populações de cor 112.2.7. Conclusões 12LEIS CONTRA A DISCRIMINAÇÃO RACIAL E SOBRE AÇÕES AFIR MATIVAS2.3.1. O combate ao racismo nas leis brasileiras: Constituições 122.3.2. O combate ao racismo nas leis brasileiras: demais legislações

vigentes12

2.3.3. Na prática, o que ocorre com a aplicação das leis? 142.3.4. Racismo no Estado Democrátic o de Direito: estado de exceção? 152.3.5. Sobre ações afirmativas 152.3.6. Conclusões 17

O SEGMENTO NEGRO E A SEGURANÇA PÚBLICA – RELAÇÕES2.4.1. A Polícia Militar na aplicação da lei 182.4.2. Polícia Militar: lugar de brancos, pardos e negros? 192.4.3. Conclusões 19

DISCRIMINAÇÕES E PERCONCEITOS DE OUTRAS ORDENS2.5.1. Discriminações e preconceitos outros 202.5.1.1. Preconceito de classes 202.5.1.2. Preconceito de gênero 20

APÊNDICES2.6.1. Tabelas e quadros úteis 222.6.2. Leis vigentes 24

BIBLIOGRAFIA 29

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1. IntroduçãoEstabelecida a partir do Currículo 2005 -2006 do Curso de Formação de Soldados, a

Unidade Didática Ações Afirmativas e Igualdade Racial tem como premissas, ao integrar a Área de“Direitos Humanos”, emergi r constatações históricas e críticas a respeito do uso da raça e seusdesdobramentos reais (preconceito, discriminação e apartheid) na vida social das pessoas, especialmentedentro da realidade nacional, bem como seus efeitos nas normas e práticas públicas e privadas daatualidade.

Pela ordem mais específica, visa a inserir no contexto de formação dos funcionáriospúblicos responsáveis pela aplicação da lei, policiais militares, o conhecimento sobre a temática da raça e,de forma mais restrita, do negro/da negritude no contexto nacional e sobre as políticas públicas deinteração com as comunidades atingidas pelas conseqüências do uso da raça, entre elas a comunidadenegra.

Assim, trata-se de uma disciplina preocupada com a visão crítica a respeito da abordag eme preocupação do Estado com as minorias raciais, étnicas, de gênero – em uma palavra: os “outsiders”, naacepção primorosa de Norbert Elias, ou os excluídos da sociedade.

Por exclusão, deve-se entender o distanciamento às citadas minorias da participaçã ocidadã à vida em sociedade, desde a exclusão do direito à saúde, educação, moradia, saneamento básico,transporte de qualidade, políticas públicas, participação política, a temas mais trabalhados como a inserçãono mundo moderno como pessoas dotadas de d ireitos e deveres, de forma consciente e autônoma.

Pela restrição pedagógica, os segmentos negro e pardo (ou mulato, mestiço, moreno, etc.)terão maior valorização durante o curso, posto sua identidade arraizada com a construção histórica doBrasil, a notória exclusão sofrida desde os tempos da Colônia do País e a discussão atual e contínua sobreas políticas de inserção desses grupos ao contexto globalizado e à vida digna na nação.

Ressalte-se, antes de qualquer abordagem que, para um curso profícuo, algum as pré-noções, idéias pré-concebidas, dogmas, verdades incontestáveis devem ser minoradas, haja vista o amplodomínio público dessa área do conhecimento, possibilitado pelos meios televisivos e mídia em geral, queengana pela produção de um conhecimento de senso comum, afastado das teorias científicas que, de formatão árdua, buscam trabalhar o tema de acordo com a necessária racionalidade e objetividade, delimitar osconceitos de forma imparcial e determinar as políticas ideais, longe do discurso político de tribuna.

Portanto, antes de desacreditar nas abordagens e nas temáticas, como se já houvesseprofundo conhecimento e desnecessário aprofundamento, primaz se torna despir -se da roupagem de idéiasjá estabelecidas pela atenção sensitiva aos conhecimentos científicos do tema raça para uma discussãofavorável à produção de saberes competentes.

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2. DESENVOLVIMENTO DO CURSO

A HISTÓRIA DO NEGRO NO BRASIL

2.1.1. Uma vida a serviço dos brancos

Dentre as diversas influências do Reino Portug uês na colonização do Brasil, pode -sedestacar a implementação do uso da mão -de-obra escrava negra oriunda da África. Raymundo Campos,historiador, relata que tal atividade de uso dos serviços gratuitos do escravo africano já era cotidiana emPortugal, antes da chegada ao Brasil. Por aqui, alguns fatores motivaram ainda mais essa prática.Primeiramente, a grande razão da entrada colonizadora era a promessa de um local de grandes e férteisextensões de terra para a produção de matérias -primas (basicamente da agricultura e da exploraçãomineral) que seriam vertidas à Metrópole para o comércio. Para tanto, havia a necessidade de utilização demão-de-obra que não fosse custosa à produção, pois encareceria o produto e tiraria as possibilidades demaior venda na Europa e alhures. A primeira população a ser escravizada, os índios brasileiros, mostrou -se renitente e avessa às condições de trabalho pelas suas características culturais de sobrevivência, quenada possuíam de comum com as atividades dos portugueses – isso inclusive rendeu aos índios a fama depreguiçosos, quando na verdade o ponto principal de não adaptação ao trabalho estava na condição deidentidade que eles próprios defendiam.

Assim, excluído pela dizimação maciça, não pode contar, o português, com a populaçãoíndia. O negro africano já era utilizado com sucesso na Europa. A empreitada marítima portuguesa possuíaamplas condições de retirá-los da nação de origem, África, e remetê -los à nova e próspera colônia.

Mas, se o índio não serviu, ante seu modo de vida particular, tribal e distante daquelemundo econômico europeu, por que então os africanos couberam no serviço escravocrata, já que tambémviviam distanciados da realidade portuguesa e “ocidental”, vivendo em tribos? Vários aspectos respondemessa questão: o tráfico de mão-de-obra escrava passou, a partir do fim do século XV, a ser um negócio delucro, pois ganhavam tanto o comprador europeu que tinha para si um objeto de domínio que lhe renderiaprodução a baixo custo e os chefes das tribos african as que vendiam os seus iguais de outras tribos,dominados após uma guerra ou invasão. Apenas perdia sua liberdade e sua vida o escravizado que,destituído de tudo e de todos, inclusive da possibilidade de se alimentar, não tinha qualquer outra medida arealizar a não ser trabalhar nas lavouras de cana -de-açúcar, de algodão, de café e na exploração das jazidasde ouro, diamantes e outros metais em troca de moradia forçada na senzala, um pouco de comida e menoscastigos, caso exercesse suas funções de acordo com as regras do proprietário das terras e proprietário desua liberdade.

Essa história de servidão perdurou mais de três séculos, até as primeiras medidas delibertação, no Brasil, dos escravos, ocorridas durante o séc. XIX. O quadro abaixo oferece uma id éia daintensidade do comércio (tráfico) de negros africanos escravizados:

Escravos desembarcadosEuropa e ilhas do Atlântico Nas Américas

Média anual

Até 15001501-16001601-17001701-1800Após 1810

33.500116.40025.100

--

-125.000

1.280.0006.265.0001.628.000

6702.400

13.00057.00027.000

TOTAL 175.000 9.298.000Do total geral, 98,15% dos escravos foram para as Américas. Fonte J.D. Fage. A History of West África,apud Cardoso, Ciro Flamarion.

É notório que se tratam de números que se aproxim am da realidade, posto queverdadeiramente são números de controles oficiais: resta a enormidade de contrabandos de mão -de-obranão registrados e dos acidentes de percurso ocorridos. Vale destacar um deles: ficou famosa a ação damarítima portuguesa nas décadas de 1840 – 1860, quando a grande nação hegemônica dos mares, aInglaterra, passou a impor restrições ao tráfico de mão -de-obra escrava: os navios, abarrotados de escravosem direção à América portuguesa (Brasil) para utilização na nova promessa de riq uezas, o café, ao

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perceberem a aproximação da frota inglesa de fiscalização, lançava vivos ou mortos sua carga de escravosao mar, buscando olvidar sua atividade e proteger a embarcação da apreensão pelo povo estrangeiro.

Assim, é no século XIX, pressionad os pela Inglaterra, que desejava novos mercadoscompradores de seus produtos e maior competitividade da massa trabalhadora, os países da AméricaCentral e do Sul iniciam seus trabalhos em prol da abolição da escravidão. Leis como a do Ventre livreque dava a filhos de escravos nascidos no Brasil o direito à liberdade, e a do Sexagenário que impunha alibertação compulsória por limites de idade, anteciparam a Lei Áurea, de 1888, que proclamavasubitamente a libertação da gente escrava no Brasil.

Subitamente porque não seguiu uma política de inserção do negro escravo à sociedadecomercial e capitalista que emergia, como veremos mais à frente; porque não teve ideais econômicosligados ao necessário fim do comércio de escravos, custoso, que poderia ser substituí do pelo fomento àimigração de europeus, mão-de-obra gratuita, e à compra de produtos importados; porque não realizoueficazmente o ideal de liberdade posto que muitos ex -escravos, sem mínimas condições de sobrevivência,retornaram, ou nem saíram, da condi ção de escravos, seja por vontade própria, seja por vontade de seusproprietários.

De forma singela, esta é a história da escravidão do negro africano até o fim do Império.Na República, os negros, sejam africanos, descendentes diretos dos africanos ou des cendentes damiscigenação natural das pessoas, passaram, pelas agruras da tentativa de sobrevivência numa sociedadeque os excluía das condições mínimas de sobrevivência: para tanto, passaram a povoar as regiões deperiferia das cidades ou regiões afastada s das grandes fazendas, buscando subempregos. Esse foi o legadoda colonização portuguesa aos negros: peça principal do sucesso tricentenário do comércio de plantationno Brasil, na sua liberdade estava a continuidade de sua escravidão por outros meios: ag ora, proprietáriode sua vida e de sua liberdade, fora jogado à sua própria sorte, sem qualquer atenção ou cuidado.

E é real a não preocupação com a inserção de ex -escravo no mercado de trabalho, poishouve a partir de 1860 a implantação de políticas fede rais de motivação à imigração ao Brasil, mão -de-obra gratuita, que com sua chegada era imediatamente lançada às atividades de trabalhador, em detrimentodo aproveitamento da própria massa escrava que passava à alforria sem trabalho. Além disso, havia aideologia que uma população branca no Brasil, às semelhanças com a européia, traria desenvolvimento,portanto a necessidade de se “branquear” a população brasileira, excluindo o negro dessa população pelagenética.

Percebe-se, então, caminhos avessos entre o branco e o negro brasileiros: caminhos que seentrecruzam no cotidiano da nação de forma intranqüila, pela diferenciação criada desde sempre.

2.1.2. A dualidade atual: preconceito racial ou preconceito de classes?

Nos dias atuais, essa realidade histórica se p erdeu na memória dos livros e dos cientistas,posto que não mais se enxerga essa aversão, principalmente porque não há pessoa que não tenha medo ouaversão de se dizer preconceituosa em razão de atributos físicos relacionados à cor.

Kabengele Munanga, antropólogo, descreve que, entre as atitudes que podem serclassificadas como preconceituosas em relação à cor das pessoas, podem ser encontradas situaçõesmanifestas ou latentes, ou seja, claras ações de discriminação ou situações escondidas; também podem serconscientes, pois visam alguma finalidade, ou inconscientes, pois introjetadas no imaginário socialapreendido pelos indivíduos; nesta classificação, o negro ou o preto sofrem de discriminação desde aproibição a freqüência de alguns lugares, a inúmeras a bordagens policiais, até as piadinhas e frases feitaspara desqualificação do sujeito de cor. Mas, tão importante quanto o ato de discriminar, de vilipendiar onegro, são os efeitos dessa discriminação que, nos dias atuais, confunde -se bastante com umadiscriminação dada pelas condições das classes sociais.

De um passado histórico que lhe deixou a roupa do corpo e a necessidade de sobreviver aum novo mundo, agora livre, o negro foi deixado às circunstâncias de seu esforço individual num mundoque lhe destituía de tudo. Não mais fático do que sua condição, no mundo capitalista, então, de pobre, seminstrução, sem profissionalização, sem técnica. Portanto, há uma relação histórica entre a escravidão e apobreza atual dos negros e pardos que faz confundir uma discriminação anterior ligada à raça e umadiscriminação atual ligada à classe, com a raça nela imbutida. Florestan Fernandes disserta sobre essetema em “A integração do negro na sociedade de classes” e, entre suas conclusões, destaca que uma das

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razões pelas quais a revolução burguesa no Brasil não teve término eficaz foi a exclusão de uma massapotencial de consumidores (os negros).

Longe das condições de consumo satisfatório, aos negros foram deixados: o subconsumo,a dependência às políticas estatais, a tentativa de compreensão pelo branco de sua condição histórica deexcluído (com todas as aberrações discriminatórias internas), a sua capacidade de sobrevivência.

E a confusão atual entre uma discriminação não mais ao negro, mas ao pobre esconde asconseqüências nefastas da discriminação racial: “o coitado não é mais o negro, mas o pobre”; pobre que,em sua maioria, é negro, pardo.

Portanto, nos dias atuais, diante dessa dualidade, são necessárias políticas de inclusão quepercebam a inserção do pobre, mas que não escondam a necessidade de inserção dos “de cor” que sempreforam estigmatizados.

E o Estado tem papel imprescindível nesse rearranjo social, não só através dapromulgação de leis, mas na preparação de seus homens e mulheres em cargos públicos p araconscientização dessa problemática e implementação segura de políticas que incluam, eqüitativamente,negros, pardos, mulatos, brancos, cafuzos, mamelucos, mulheres, índios, estrangeiros, numa vida socialjusta e digna.

2.1.3. ConclusõesNecessárias são as novas concepções que o estudo que antecipa este item tenham feito:

uma releitura da história da posição social do negro na sociedade brasileira e as conseqüências até os diasatuais das diferenciações ocupacionais.

O Brasil, e o Estado de São Paulo, em espec ífico, é país multirracial, de difícil separaçãoconsensual entre quem é melhor ou pior segundo características físicas relacionadas à cor da pele, portantourge estabelecer o fim das práticas raciais, através da conscientização, pois somente a imposição l egal nãoé suficiente.

E neste ponto, a Polícia Militar, com o codinome de Polícia Cidadã, comprometida com aconstrução de um país democrático, que busca a obediência das pessoas a direitos e deveres, tem papelimportante no debelo, primeiramente, interno das concepções preconceituosas e discriminatórias eposteriormente na socialização que promove no seu dia -a-dia operacional junto à comunidade paulista.

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CONCEITOS BÁSICOS SOBRE AS TEMÁTICAS RELACIONADAS À COR

2.2.1. Raça, racialismo, racismo, preconceito, discriminação, apartheid

Intentando distanciar das idéias de senso comum a respeito de conceitos como raça epreconceito racial, uma leitura mais aprofundada das teorias e pesquisas a respeito desses temas énecessária, para afastar paradigmas e conquistar uma compreensão ideal da sociedade brasileira.

Raça, tal como nação e etnia, são discursos relacionados a essências, portanto, buscam,cada um por si, determinar todas as demais qualidades de uma pessoa segundo a classificação ; ou seja,determinou-se a raça de alguém, determinam-se as demais características; historicamente, raça é umconceito que veio da Biologia, que buscava defender uma pureza genética dos seres vivos; conquistousucesso em alguns tipos animais, mas é absurda em termos humanos; ocorre que sua base de conceituaçãosão as diferenças inatas, portanto, que se verificam segundo uma endodeterminação; Elis Cashmorepropõe uma conceituação:

“A indeterminação de ‘raça’ (e, por conseguinte, de todos ossignificantes) possibilita a sua polissemia ou abertura para váriasinterpretações (o termo polissemia é preferido ao ambigüidade, quesugere somente um duplo sentido). ‘Raça’ é um significante mutável quesignifica diferentes coisas para diferentes pessoas em diferentes l ugaresna história e desafia as explicações definitivas fora de contextosespecíficos.”Ellis Cashmore (2000) p. 451)

Portanto, a delimitação do conceito de raça está diretamente ligada à finalidade de seu usoem cada local e época específicos. Mas basicam ente é uma tentativa de agrupamento de pessoas, segundoidentidades visíveis ou interiores, com um determinado fim. Portanto, o conceito sai da Biologia e vempovoar o dia-a-dia das pessoas.

Já o termo racialismo diz respeito às teorias, tidas por alguns c omo racionais ecientíficas, que defendem a existência de raças humanas e a separação dos indivíduos segundo suascaracterísticas. E racismo nada mais é do que o racialismo utilizado para justificar diferenças que visamhierarquizar, monopolizar posições e prerrogativas, delimitar relações de poder e de subordinação,reproduzindo uma ordem das desigualdades pautada em qualidades individuais ou grupais. O racismopode aparecer na vida social através da simples aceitação, da imposição, da dominação segundo as raças.

Preconceito pode ser definido como atitudes e opiniões desfavoráveis em relação aooutro, como crenças ou valores que predispõem um grupo a possuir medo/estranhamento de outrosgrupos; e preconceito racial está diretamente ligado à definição acima somado ao fator determinante daraça.

Discriminação é mais clara que preconceito, pois se trata do tratamento oucomportamento desigual dado a pessoas que pertencem a determinado grupo e, portanto visa,majoritariamente, à agressão ou ao impedimento do ‘ou tro’ de ampliar seus espaços; é racial quandoenvolve determinante racial.

Já o apartheid, que ficou historicamente famoso pela sua implantação semprecedentes na África do Sul, é a discriminação pública de separação de espaços de convivência eparticipação da vida pública e privada; apesar de clarividente na República Sul -africana, existiu e existeem outras partes do mundo, como por exemplo, a periferização dos marroquinos na França, os bairros‘negros’ dos EUA (Bronx, Harlem) e a proibição am alguns clu bes esportivos paulistas da inserção denegros em seu quadro de associados.

Conforme disse Hanna Arendt, o racismo científico foi utilizado como instrumento dedominação, ou seja, a partir da rotulação do ‘outro’ como portador de características que o tor nam inferior,os superiores estão por si mesmos autorizados a flagelá-los, dominá-los, expurgá-los.

É necessário que se compreenda que a mistura dos povos pelas mais diversas razões(colonização, escravização, mutualismo, nomadismo, globalização) deixou ca da vez mais distante oideário da pureza étnica ou racial e transformou o mundo em um locus multifacetado de pessoas decaracterísticas tão distintas que não cabe mais uma discussão sobre identidade racial. Portanto, o termo é

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mais usado para justificar a diferença, a superioridade e garantir que posições aspiradas por todos sejam depredomínio de apenas alguns grupos.

A raça se coliga a diferenciações, na maioria das vezes, físicas e de fácil visualização;já seus instrumentais de operacionalização, preco nceito e discriminação, são a materialização do conceitona vida social. São apontadas como causas gerais do preconceito:

- competição e conflitos políticos e econômicos;- o uso do ‘bode expiatório’;- fatores de personalidade;- causas sociais do preconceito: a aprendizagem social, conformidade e

categorização socialPortanto, nos dias atuais, apesar da existência minoritária de algumas pesquisas que

ainda defendem as divisões raciais, o termo ‘raça’ perdeu seu foco científico e racional, mas é sobret udoutilizado no cotidiano das pessoas, com funções perversas na maioria das vezes.

2.2.2. Preconceito de marca e preconceito de origem

Um trabalho teórico de grande valia para a compreensão do uso e crença da ‘raça’ noBrasil foi realizado por Oracy Nogueira quando buscou comparar o preconceito em voga no Brasil e nosEstados Unidos e percebeu gritantes diferenças de fundamento, apesar de similitudes em sua utilização.

O quadro abaixo delimita, em síntese, suas conclusões:

BRASIL EUAPRECONCEITO DE MARCA PRECONCEITO DE ORIGEM

Individual coletivoCor “raça”

Fenótipo genótipoAparência biologia

Oracy Nogueira: Preconceito de marca: relações raciais em Itapetininga, 1998, Edusp

Nos Estados Unidos, as pessoas que sofriam preconceito racial basicamentedependiam de suas origens, ou seja, de seus descendentes serem ou não norte -americanos, determinandosua raça norte-americana ou não; portanto, dependia do “genótipo” ser ou não da terra da democracia, comfundamentos instalados na Biologia.

No Brasil o preconceito era de outra ordem: era verificado pelos aparelhos sensitivos,em especial, a visão; sendo branco participaria da vida dos brancos, independentemente de sua origem;sendo de cor diversa do branco – amarela, parda, morena, mulata, jambo, preta, n egra – seria destituídodessa convivência com os brancos ou dificultada sua inclusão; por isso a valorização da fenotipia(características externas) e, portanto, da visibilidade da diferença.

Essa distinção é importante para revelar que o termo raça e sua s designações na vidasocial (preconceito, discriminação, apartheid) dependem do lugar e tempo em que são colocados, todaviaseu emprego visa a afastar aqueles que são determinados diferentes das posições de poder e sucesso navida social (econômica, polít ica, cultural).

Ora, um latino nos E.U.A. pode ou deve ter as possibilidades de chegar ao poderdificultadas; o mesmo ocorre com o negro no Brasil.

Sempre é bom a ressalva de que o preconceito e a discriminação são fundamentadosem complexos de superioridade e inferioridade; o racismo sempre foi lido e usado como um ato de defesaque justifica a agressão . Na Grécia antiga, havia preconceito e discriminação dos gregos, donos dasletras e do conhecimento, aos bárbaros, povo, segundo eles, retrógrado e primiti vo, diante da pobrezacultural que possuíam e seu característico nomadismo, o que impossibilitava a criação e construção deuma civilização; Na Idade Média, diante da prevalência da Igreja Católica nas decisões políticas, haviauma discriminação acirrada em desfavor dos não-cristãos; nos dias atuais, as discriminações epreconceitos variam de gênero, cor, etnia (origem), nacionalidade, cor de cabelos e, principalmente, raça.O racismo, portanto, sempre esteve ligado à idéia de incapacidade e natural subserv iência dos inferiores e,

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com isso, justificaria a precedência dos superiores nas decisões e no comando político dos grupos,comunidades e nações.

2.2.3. Sobre o racialismo no Brasil

Por outro lado, surgiu no Brasil, uma corrente contrária às terminações de igualdaderacial, encabeçada por Oliveira Vianna, autor de diversos livros que defendiam a superioridade da raçabranca aos negros e mestiços, que buscava justificar o atraso brasileiro diretamente à falta de civilizaçãocaracterística dos negros. Essa visão, alicerçada em bases pseudocientíficas, tem seus adeptos até os diasatuais, pessoas que irracionalmente defendem o branqueamento da população como forma de assemelhar -se às grandes nações do Mundo e alavancar o processo de crescimento nacional. Tal teoria de afirmaçãodo branco e negação do negro serviu para mascarar mais ainda o preconceito e a discriminação noterritório brasileiro, pois realçava a condição de inferioridade dos negros e a sua culpa histórica pelotravamento no desenvolvimento bras ileiro. Entre suas assertivas, transcreve -se abaixo um trecho para quese note sua linha de pensamento:

“O negro puro, portanto, não foi nunca, pelo menos dentro do campo histórico emque o conhecemos, um criador de civilizações. Se, no presente, os vemo s sempre subordinados aos povosde raça branca, com os quais entraram em contato; se, nos seus grupos mais evoluídos das regiões dasgrandes planícies nativas, são os elementos mestiços, são os indivíduos de tipo negróide, aqueles quetrazem doses sensíveis de sangue semita, os que ascendem às classes superiores, formam a aristocracia edirigem a massa de negros puros; como não o seriam também nestas épocas remotas, em que seassinalam estes grandes focos de civilização?

Que os estudos do passado e as inves tigações dos arqueólogos assinalam a existênciados grandes centros de cultura nas regiões centrais da África, é o que não ponho em dúvida; mas queestas civilizações sejam criações da raça negra, é o que me parece contestável. Não sei se o negro érealmente inferior, se é igual ou mesmo superior às outras raças; mas julgando pelo que os testemunhosdo presente e do passado demonstram, a conclusão a tirar é que, até agora, a civilização tem sidoapanágio de outras raças que não a negra; e que, para que os n egros possam exercer um papelcivilizador qualquer, faz-se preciso que eles se caldeiem com outras raças, especialmente com as raçasarianas e semitas. Isto é: percam a sua pureza.” (Oliveira Viana – 1932, p. 206)

Oliveira Viana defendia a eugenia (Ciênci a do aperfeiçoamento humano – de raças)como forma do real aprimoramento das pessoas, o predomínio do sangue branco sobre o negro comoúnico modo possível de constituição da nação brasileira. Sua tese de branqueamento da população vinhaancorada às políticas públicas nacionais desde a época do Império de fomento à imigração, já que haviaesperança de que o emprego do branco europeu na economia nacional motivaria o crescimento e odesenvolvimento nacionais, pela história já vista em sua terra natal.

Ressalte-se, nestes termos, a análise de Walnice Nogueira Galvão sobre o pensamentodominador no final do século XIX, após a entrada do Brasil na república:

(...)“ Porque as teorias avançadas nessa mesma parte assim o exigem: toda mistura

entre a raça branca, superior, e as outras raças, que só podem lhe ser inferiores, provoca adegenerescência do componente superior; (...) os trezentos anos de miscigenação teriam resultado numa‘subcategoria étnica já constituída’. O mestiço, é antes de tudo, tratado de deseq uilibrado e comparadoao histérico, acusado de hibridez moral, chamado de dispersivo e dissolvente, além de oscilar entreinfluxos opostos de legados discordes. A mestiçagem é enfaticamente qualificada como perniciosa. Oíndio é declarado incapaz de compre ender as mais simples concepções de um estado mental superior. Onegro não consegue alçar-se ao nível intelectual médio do indo -europeu.

(...)A exaltação do branco como raça superior era corrente nas teorias do segundo

imperialismo europeu, nas últimas dé cadas do século XIX, teorias produzidas, evidentemente, peloseuropeus. O que é mais difícil de compreender, para o caso do pensamento brasileiro da mesma época,

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é que o racismo seja aceito e aprovado precisamente por aqueles que ele discrimina ” (In: Mota – 2004,pp. 162-3)

Portanto, essas teses defendem que o histórico das raças negras e mestiças é suainferioridade e, portanto, sozinhas, não auxiliariam no crescimento do país, todavia seriam dignas devivência se buscassem a integração ao mundo dos bran cos. Ocorre que, num processo de socializaçãonacional, a integração não só é necessária como natural. O problema é que o lugar dos negros e mulatos nasociedade brasileira já está colocado, mesmo de forma subliminar e suas oportunidades dificultadas oumesmo ceifadas.

2.2.4. O mito da democracia racial brasileira“Nos Estados Unidos, o negro tem uma pistola

apontada para sua cabeça. No Brasil, para suascostas. A diferença é a comodidade de quem segura apistola, no segundo caso” – Santos, 1984, p. 46

Segundo Sérgio Buarque de Holanda, em “Raízes do Brasil”, o povo brasileiro temcomo uma de suas características mais marcantes a cordialidade, um abrandamento de emoções esentimentos, que o torna um povo amistoso, pacífico, receptivo e distanciado de argume ntos ligados àdesigualdade e distinção entre pessoas. Apesar da incomparável defesa teórica realizada, essacaracterística, tida como verdadeira até os dias atuais, esconde qualidades negativas dos sentimentosindividuais e coletivos desse povo, pois find a por considerar que tudo pode ser mediatizado, mediado pelacordialidade natural do brasileiro.

Uma das perversões dessa cordialidade seria o notório e continuado acervo deinstrumentos utilizados para olvidar (esconder) a prática de preconceitos e discri minações raciais. É fatoque o brasileiro sempre afirma não ser preconceituoso, não usar da discriminação. É fato que todosafirmam conviver bem entre quaisquer grupos de cor de pele, sem nenhuma distinção. Mas, isso, narealidade, não acontece. O preconce ito e a discriminação emergem em situações “escondidas”, longe dosolhos daqueles que possam criticar tais atitudes. Surge nas conversas de bar, em meio a grupos sociaiscomo torcidas e rede de trabalhadores de uma empresa, nas discussões familiares, nos r edutos de pessoas,ou seja, sem qualquer declaração pública. Alguns cientistas como Roger Bastide e Florestan Fernandesque estudaram a fundo a questão racial no Brasil afirmam que o preconceito à brasileira é mais cruel,porque não determina realmente o l ugar daqueles tidos como “inferiores” na sociedade, aceitando enegando o tempo todo a convivência harmoniosa pela aproximação e distanciamento.

Exemplos nefastos dessa atuação às escondidas não faltam: as piadas encetadas contrapessoas de cor ou de etnias específicas, que não buscam a desqualificação como partem do pressuposto deque os envolvidos são pessoas menores: quando o serviço não está bem feito é serviço de preto; quandopreto não faz na entrada, faz na saída. Situações como a colocação das pesso as de cor em “seu devidolugar”: é estranho ver um negro ou pardo na chefia de uma empresa ou Comandante de Unidade, mas émenos estranho vê-los como choferes, empregadas domésticas, soldados. Ou a simples negativa derelacionamento: “minha filha não vai namorar um cara desses” , são formas cotidianas abrasileiradas deemersão do preconceito e da discriminação.

Defendida pelos formadores de opinião, a suposta democracia racial brasileira temsuas razões:

a. o racismo é algo que pertence ao passado de escravi dão e segregação legal e,portanto, não é algo importante do presente;

b. que a melhor maneira de enfrentar o racismo sobrevivente é ignorá -lo, posto que setrata apenas de resquício de um passado que será inelutavelmente superado pelo modo de vida moderno ;

c. que a melhor tática para combater o racismo é apagar de nossas mentes a noção de‘raça’ proscrevendo-a;

d. que o melhor que um negro tem a fazer é agir como um indivíduo,desembaraçando-se dos familiares ou vizinhos (seu passado) que ficaram para trás ;

e. que qualquer política pública, para ser anti -racista, precisa ser universalista e color-blind (cega nas cores).

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Todavia, a análise mesmo superficial dos índices de sucesso pessoal e profissionaldos brasileiros dá ampla margem ao questionamento dessa alegada democracia racial, posto que asposições mais altas, em níveis de renda e qualidade de vida, estão preenchidas pelos brancos ou pelaspessoas mais próximas do branco, enquanto que aos pardos e negros estão reservadas as posições maisbaixas da estratificação social, no Brasil.

Ora, democracia racial se faria pelo fato de que não haveria diferenças patentes deposições sociais e nem dificuldades na mobilidade social: entretanto, o que se verifica é que, ao branco, aascensão social está facilitada, e nquanto que ao pardo/negro estão reservadas as maiores dificuldades decrescimento individual e coletivo.

Por isso, a corrente majoritária das ciências humanas prescreve que a democraciaracial brasileira é um mito, pois nunca se concretizou e pior: aument ou as diferenças entre os grupos depessoas, segundo sua cor.

À guisa de efetivo convencimento, Santos (1984) estabelece cinco grandesmodalidades de racismo à brasileira, para demonstrar como se esconde o preconceito e a discriminaçãoraciais:

“- acostumamo-nos a ver, e a tratar, o povo como bichos;- achamos, sinceramente, que os homens brancos são melhores que os não -brancos;- temos uma idéia negativa das pessoas de cor;- temos a idéia fundamentada de que não somos racistas;- olhamos os não-brancos como não brasileiros.”

2.2.5. A cor como fator preponderante de sucesso na vida“Se me discriminam, pior para eles” Louis Armstrong

Pesquisas realizadas demonstram a colocação dos brasileiros segundo sua cor.Conforme afirma Carlos Hasenbalg, que realizou diversos estudos sobre a situação de brancos, pardos epretos no cenário nacional, apesar do crescimento econômico que o Brasil conhecer no século XX,principalmente na segunda metade, as desigualdades econômicas e sociais entre brasileiros brancos e nãobrancos não se alteraram. A cor das pessoas é um determinante importante das chances de vida, e adiscriminação racial parece estar presentes em todas as fases do ciclo de vida individual.

E aos afros descendentes está reservada a necessária exigência de qu e, para vencer,necessitam imitar os brancos, para seu aprimoramento, posto que a cultura branca é melhor que a culturanão-branca. E, no caso brasileiro, os afros descendentes devem demonstrar, a todo o momento, sua realeficiência e capacidade, muito mai s do que os brancos.

2.2.6. Alguns dados estatísticos e situacionais das populações de cor

Seguindo as pesquisas mais atuais a respeito da colocação dos afros descendentes nasdiversas posições da vida social brasileira, alguns dados quantitativos e prop orcionais devem serdispostos, para verificação das desigualdades, da importância que a cor de pele exerce no dia -a-dia e dapermanência de uma hierarquização pré -fixada.

Os dados mais recentes demonstram que o Brasil responde pela segunda maiorpopulação negra do mundo, atrás apenas da Nigéria. São 76,4 milhões de afros descendentes(independentemente da designação: pretos, negros, pardos, mulatos, morenos), ou seja, 45 % da populaçãonacional. Sua distribuição geográfica é bastante desigual, pois são os e stados de São Paulo (13%), Bahia(13%), Minas Gerais (11%), Rio de Janeiro (8%), Ceará (8%) e Pernambuco e Pará (6%) que estãolocalizadas as maiores populações negras, respondendo esses estados por 65 % de todo o montante.Conforme as primeiras aulas do c urso, há uma explicação para essa distribuição. São Paulo registra amaior população: são 10,1 milhões de afros descendentes. Pelo menos 1/3 da população paulista éconstituída desse segmento populacional.

As Pesquisas Nacionais por Amostragem de Domicíli os (PNAD), que são realizadaspelo IBGE, de 2001 e 2003 dão notas sobre a real situação desigual entre brancos e não brancos no Brasil,principalmente nas áreas de renda individual, mercado e educação; em 2001, um brasileiro branco médioresidia em um domicílio cuja renda mensal per capita era de R$ 482,00, enquanto que um brasileiro negro

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médio percebia R$ 205,00 mensais (menos da metade); a maior preocupação é a constância dessadiferença, pois é estável desde 1995 (momento em que as pesquisas sobre desig ualdades raciais tomaramvulto); já em 2003, em nova pesquisa, verificou -se que a renda mensal média individual estava nosseguintes parâmetros:

Indivíduo Renda Mensal Média IndividualHomem branco R$ 931,10Mulher branca R$ 554,60Homem negro R$ 428,30Mulher negra R$ 279,70

São notórias as desigualdades que advém de preconceito e discriminação resultantesdo racismo e do gênero. Não só visíveis no enquadramento de renda, mas também situações de mercado:enquanto 41% dos brancos têm empregos formai s (carteira assinada ou funcionário público), 33 % dosnão brancos gozam da mesma situação; o desemprego assola as populações de cor mais do que as brancas,já que a diferença é sempre de três pontos percentuais (ou mais) desde 1999, somente considerada avariável cor; ou seja, há uma discriminação considerável nas relações empregatícias e o fator cor de pele éimportante quando de trata da contratação de pessoas e da seriedade do contrato. Mesmo nos casos em quese supõe uma igualdade de condições, trabalh adores autônomos proprietários de seu próprio negócio, osbrancos chegam a ganhar 60% a mais que os negros.

Na educação a realidade não é diversa. É real o baixo acesso dos negros àescolaridade, pautado pela continuidade, desde a década de 1990, do fato d e que os negros não conseguemalcançar mais do que 70% da média de anos de estudo dos brancos, fato que afasta ainda mais apossibilidade de os não brancos auferirem posições importantes no mercado de trabalho. Poderia -seinclusive argumentar que os negros possuem escolaridade média inferior por advirem de pais com poucaescolaridade (e outras desigualdades históricas), o que dificultaria a valorização da educação e do ensinoformal, todavia, a simulação estatística promovida por Jaccoud e Beghin (2002), de signa que essadiferença só é explicada por essa variável num nível de até 37%; os restantes 63% estariam diretamenterelacionados ao fator cor.Obs: Há um quadro anexo ao final da apostila que resume alguns quantitativos sobre característicassocioeconômicas segundo a cor.

2.2.7. ConclusõesApós cientes dos conceitos de raça, racismo, preconceito e discriminações raciais,

seus fundamentos de utilização nas sociedades contemporâneas e os efeitos nefastos na realidade, atravésda desigualdade patente entre brancos e não brancos, especialmente na sociedade brasileira, necessário sefaz refletir sobre as reais medidas de extirpação desse mal, principalmente porque o Brasil se orgulha deser um Estado Democrático de Direito, estado esse que prima pelos princípi os universais do homem e docidadão, entre eles o direito à igualdade de oportunidades e condições. A responsabilidade não seria, comoalguns alegam, apenas do Estado. Mas como vimos, é também de cada brasileiro, pois o racismo e suasformas de materialização são construídas por cada um de nós, segundo interesses pessoais de poder,defesa e impedimento do outro. Portanto, se o racismo se perpetua não apenas nos dados estatísticos, mastambém na realidade cotidiana, a reflexão se torna introspectiva a ponto de indagar a responsabilidade decada cidadão brasileiro, seja policial, padre, empresário, pai de família.

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LEIS CONTRA A DISCRIMINAÇÃO RACIAL E SOBRE AÇÕES AFIRMATIVAS

2.3.1. O combate ao racismo nas leis brasileiras: Constituições

O histórico constitucional brasileiro sobre o combate à discriminação e ao preconceitoé interessante, pois não seguiu uma construção uniforme durante os períodos de promulgação, sendo quesó se preocupou com a questão racial em 1967. O Código Penal do Império, 1924, considerava crime aperseguição por motivo de religião, se respeitada a religião do Estado e não ofendesse a moral pública,atribuindo a esses crimes a pena simbólica de um a três meses de detenção.

Já a primeira Constituição republicana, de 1891, promulg ou como princípioconstitucional o direito de todos à igualdade e defendeu a liberdade dos indivíduos de professarem públicae livremente seu culto, desde que não ofensivos à moral e à lei públicas.

Em 1934, a primeira Constituição da Era Vargas ratificou o direito à igualdade, bemcomo acresceu aos indivíduos o direito à inviolabilidade da liberdade de consciência e crença. Três anosdepois, a Constituição de 1937, chamada de Polaca determinou a liberdade de culto e de crençasseculares, suprimindo, tacitamente, os demais direitos; a Constituição pós -ditadura, de 1946, que tinhacomo auspícios ideais democráticos, declamou a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença,garantindo o livre exercício dos cultos religiosos.

Apenas em 1967, com a promulgação da primeira Constituição da Ditadura Militar,declara-se fielmente o princípio de igualdade de todos perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho,credo religioso e convicções políticas; e finalmente constitucionaliza o crime de preconceit o de raça.

A Constituição vigente, de 1988, advinda na era democrática, traz, entre seusprincípios, os seguintes termos:

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros reside ntes no País a inviolabilidade do direito à vida, àliberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade nos termos seguintes: (...)

VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livreexercício dos cultos religiosos e garanti da, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suasliturgias;

(...)X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,

assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;(...)XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades

fundamentais;XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à

pena de reclusão, nos termos da lei;

Pela primeira vez, há um determinante co nstitucional privilegiando a punição contraatos de racismo, autorizador de legislação que torne criminosos atos de racismo; essa evolução segue alinha internacional ocidental de defesa da igualdade humana e do combate às formas injustas dediscriminação e preconceito. Todavia, como alerta Hédio Silva Jr., há um distanciamento entre a lei e aordem estabelecida quando se trata do combate às formas de racismo, pois “a técnica da força tende aatacar apenas o resultados (discriminação) sem tocar nas causas ( o preconceito, o estereótipo, aintolerância, o racismo)”(sic) . Definindo as situações de práticas reais de racismo, notadamente, adiscriminação, outras formas obscurecidas nas relações sociais acabam por não terem punição. Nesteponto há um diálogo direto com a cultura das pessoas, que acabam por naturalizar situações racistas,consciente ou inconscientemente.

2.3.2. O combate ao racismo nas leis brasileiras: demais legislações vigentes

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Pela patente necessidade de condensação, houve uma supressão do es tudo dalegislação nacional a respeito do combate à discriminação e ao preconceito raciais, optando -se pelodestaque às principais normas históricas e pelas vigentes.

A criminalização dos atos decorrentes da discriminação racial tomou forma na LeiAfonso Arinos, Lei nº 1390, de 03 de julho de 1951, pois transformou em contravenções penais a práticade atos resultantes de preconceito de raça ou de cor, todavia, a penalização era simbólica, poisdeterminava detenção de 1 a 3 meses e multa.

Não houve alterações da matéria até a promulgação da Constituição de 1988,Constituição cidadã, que traz entre seus princípios fundamentais, mais especificamente nos objetivosfundamentais do País, artigo 3º, inciso IV:

“IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de orig em, raça, sexo, cor, idade equaisquer formas de discriminação.”

Também elenca, dentre os princípios que regem as relações internacionais brasileiras:“Art. 4º (...)VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo”E no inciso XLII do art. 5º, que registra os di reitos e deveres individuais e coletivos:“XLII – a prática de racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à

pena de reclusão, nos termos da lei”

Nesse contexto, no ano seguinte a promulgação da Constituição foi promulgada a Leinº 7.716 de 05 de janeiro de 1989, alterada pela Lei nº 9.459, de 15 de maio de 1997, cuja redação segueao final desta apostila. Sua propriedade está em realmente tornar crimes e estipular punições graves a atosoriundos de discriminação de raça ou de cor – representa, portanto, essa lei, um marco positivado decombate às formas de discriminação racial, apesar da inobservância de criminalização de práticas outrasde racismo, principalmente o preconceito. A lei em questão também se destaca pela abrangência de suaproteção, pois não protege apenas as vítimas de discriminação e preconceito racial, mas também aquelasque sofreram atentados em virtude etnia, religião e procedência nacional. E somada aos ditamesconstitucionais, torna os crimes de preconceito e discrim inação raciais inafiançáveis e imprescritíveis.

Ressalte-se, no âmbito jurídico dessa lei, que os crimes tipificados tem como tiposubjetivo o dolo, ou seja, toda ação ou omissão prescrita deve ser conseqüência de ato racional econsciente de lesionar dire ito de pessoa em virtude de sua cor ou raça (categoria pressuposta); portanto, háofensa de direitos pessoais subjetivos e objetivos segundo uma posição marcadamente racista.

Além dessa lei, destacam-se outras relacionadas ao preconceito de cor, raça, orig em,etnia ou religião.

A Lei nº 9.459, de 13 de maio de 1997, trouxe ainda adimplemento ao Código Penal,nos seguintes termos:

“Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo -lhe a dignidade ou o decoro:Pena – detenção, de 1 (um) a 6 (seis) meses, ou multa.(...)§ 3º - Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia,

religião ou origem:Pena – reclusão de 1(um) a 3 (três) anos e multa.”

O agravamento penal de condutas racistas é uma das formas concretas de tentativa decombate ao preconceito e a discriminação raciais, além de demonstrar a conquista de movimentos anti -racismo brasileiros e internacionais, através da norma.

Ancoradas nessa perspectiva de combate ao racismo, podem ser citadas várias outrasleis. Entre elas, a Constituição do Estado de São Paulo que prescreve que a educação, inspirada nosprincípios de liberdade e solidariedade, tem, entre seus fins, a condenação de qualquer tratamento desigualpor motivo de convicção filosófica, política ou religiosa, bem como de quai squer preconceitos de classe,raça ou sexo (inciso VII – art. 237). Ainda sobre a ótica da legislação paulista, encontram -se, entre outras:

- Lei nº 5466, de 24 de novembro de 1986 que dispõe sobre o Conselho deParticipação e Desenvolvimento da Comunidade Negra;

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- Lei nº 7576, de 27 de novembro de 1991, que cria o Conselho Estadual de Defesados Direitos da Pessoa Humana, na qual integra a Comunidade Negra;

- Lei nº 10.639, de 09 de janeiro de 2003, que estabelece o dia 20 de novembro comoo “Dia da Consciência Negra”;

- Decreto nº 36696 de 23 de abril de 1993, que cria a Delegacia Especializada deCrimes Raciais;

- Lei Estadual nº 10.237, de 12 de março de 1999, que estabelece a política desuperação da discriminação racial no Estado de São Paulo (texto na íntegra em anexo).

E, finalmente, para citar o envolvimento dos três níveis do Estado, entre outraslegislações, destaca-se a Lei Municipal nº 11.995 de 16 de janeiro de 1996, que veda qualquer forma dediscriminação no acesso aos elevadores de todos os e difícios públicos municipais ou particulares,comerciais, industriais e residenciais multifamiliares existentes no Município; e seu artigo 3º, quedeterminação a fixação de cartazes com os seguintes dizeres:

“É vedado, sob pena de multa, qualquer discrimi nação em virtude de raça, sexo, cor,origem, condição social, porte ou presença de deficiência física e doença não contagiosa por contatosocial no acesso aos elevadores.”

Portanto, há uma vasta gama de disposições legais que penalizam atuações racistas,seja em nível nacional, estadual e municipal, todavia deve -se questionar a amplidão de aplicação dessasnormas, posto que, apesar de ninguém poder se abster do cumprimento da lei pela alegação de nãoconhecê-la (L.I.C.C.), o racismo e suas práticas pouco s e alteraram nesse período, haja vista as situaçõessocioeconômicas já enfatizadas a respeito de brancos e não brancos.

2.3.3. Na prática, o que ocorre com a aplicação das leis?

Conforme predito, há uma inquestionável lacuna e lei formal e sua aplicaçãosubstantiva. A primeira prova é a permanência, apesar de mais de dezesseis anos da Lei nº 7716/89, decondições socioeconômicas desiguais entre brancos e não brancos, principalmente quando referidos àdiferença de renda individual e posição de trabalho.

As leis surgiram objetivando por em prática o princípio constitucional da igualdade,indistinto de gênero, cor ou raça, e amenizar diferenças reais no cotidiano democrático. Todavia, oprocesso de equitatividade ou é lento ou realmente não se concretizou. O fato é que nas camadas maispobres da população brasileira estão mais negros e pardos, enquanto que nas posições mais altas, ascitadas classes A e B econômicas, prevalecem os brancos.

O quadro de desigualdade racial descortina o drama da marginalização ec onômica einjustiça social que afeta os afros descendentes no Brasil. E exclusão socioeconômica a que estásubmetida à população negra produz perversas conseqüências. De um lado, a permanência dasdesigualdades raciais naturaliza a participação diferenciad a de brancos e negros nos vários espaços da vidasocial, reforçando a estigmatização sofrida pelos negros, inibindo o desenvolvimento de suaspotencialidades individuais e impedindo -os do usufruto da cidadania por parte dessa parcela de brasileirosà qual é negada a igualdade de oportunidades que deve o país oferecer a todos. De outro lado, o processode exclusão vivido pela população negra compromete a evolução democrática do país e a construção deuma sociedade mais coesa.

Entre os atos da pessoa cidadã e stá o acesso as leis; também está o respeito aosdireitos insculpidos nas leis; ora, se à população afro descendente, pela sua medida posicional nasociedade brasileira, são reservados os lugares mais baixos e, portanto, mais restritos ao acesso dosinstrumentos e mecanismos democráticos, também lhe é negada ou dificultada a observância da lei e oacesso à justiça. Prova concreta foi o fato de que, apesar de instalada em São Paulo, através do Decreto nº36.696, de 23 de abril de 1993, a Delegacia Especializ ada de Crimes Raciais foi fechada, em virtude daausência de denúncias mínimas que justificassem sua manutenção – será que realmente o Brasil é um paísde democracia racial, haja vista que, apesar de existir um delegacia que recebe notificações de crimesoriundos de praticas raciais, eles não são suficientes para fazer a delegacia continuar a trabalhar? Naverdade, conforme já citado acima, o Brasil viveu e vive um preconceito que dificilmente dá suas caras,

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mormente porque surge nos vãos e hiatos da vida e m sociedade, sempre obscurecidos, e tem um povo quese autoproclama tolerante, sem prenoções, preconceitos. Um crime denunciado de discriminação racial,portanto, se torna esdrúxulo, além do que a prática do racismo à brasileira, por ser sempre olvidado,carece de publicidade e de testemunhos, sempre ficando frente a frente apenas a vítima e o autor, comversões contrárias. E na condição posta, em que se tem a idéia de que se o negro ou pardo denuncia práticaracista, racista é ele por admitir que o ato con tinha resquícios de discriminação racial, a vítima se acua;ademais, o praticante do racismo costuma se encontrar numa posição social superior e com melhorescondições de provar sua inocência.

Assim, considerando que o processo de exclusão a que está subme tida à populaçãonegra na sociedade brasileira está diretamente relacionado ao fenômeno da discriminação racial, somenteo peso da lei no combate ao preconceito não é ou será suficiente para debelar atos racistas.

2.3.4. Racismo no Estado de Democrático d e Direito: Estado de exceção?

Chama-se estado de exceção todo momento em que uma comunidade vive sobre oarrepio do descumprimento das normas vigentes. Conforme visto, o racismo é realidade e se encontraemanharado na tessitura social brasileira, ditando características das pessoas, direitos individuais ecoletivos, formas de interação e relacionamento entre iguais. Todavia, é arduamente combatido pelalegislação pátria em diferentes frentes, bem como é mote de inúmeros grupos anti -racistas, além de que énegado pelas pessoas.

Jaccoud e Beghin designam que racismo e preconceito racial são as frentes delegitimação da discriminação, sendo que esta se subdivide em discriminação direta e discriminaçãoindireta. A discriminação direta é aquela descrita nas lei s, ações ou omissões claras, reais e visualizáveis.Já a discriminação indireta, que guarda correlação com o preconceito racial, pouco abordada pelos juristase legisladores, se trata, do “aspecto cultural, psicológico, que faz com que certas práticasdiscriminatórias ingressem no imaginário coletivo, ora tornando -se banais, e portanto, indignas deatenção salvo por aqueles que dela são vítimas, ora se dissimulando através de procedimentocorriqueiros, aparentemente protegidos pelo Direito” (Joaquim Barbosa, apud Jaccoud e Beghin, p. 21);tais condutas passam desapercebidas, não sendo questionadas, mas trazem consigo a legitimaçãoinconteste da prática racista; também é olvidado da lei a condição histórica de submissão ouescalonamento inferior dos afros desc endentes. É no esteio da proteção das populações não brancas, emvista da discriminação indireta, do preconceito racial e da tirânica histórica de subserviência aos brancosque surgem as ações afirmativas.

Assim, o estado de exceção é subliminar, pois no d iscurso cotidiano as pessoas nãovencem porque não são capazes ou porque não desejaram; não é o preconceito e a discriminação raciaisque determinariam o sucesso ou fracasso das pessoas – pelo menos é o que se constata no senso comum;mas é nítida a atitude de estranhamento do branco ao ver alguém não branco ocupando uma posição dedestaque social; comum e não estranho é vê -lo nas posições subalternas; difícil ver uma heroína (ou herói)de novela ou filme não branca, com a louvável exceção das produções sob re escravidão e similares – fácilé vê-la como empregada ou vê-lo como trabalhador braçal; esse é o legado da dita raça branca; execra -seHitler, mas se age como ele.

2.3.5. Sobre ações afirmativas

O debate brasileiro sobre ações afirmativas se iniciou n a década de 1990 e elas são aforma plausível encontrada para se obter resultados positivos ante a processos de discriminação racialindireta ou preconceito racial, que, conforme verificado, não são tão visualizáveis quanto os atos oriundosda discriminação direta. Ocorre que o entendimento do que sejam ações afirmativas está longe doconsenso e, em amplos setores, são identificadas como a simples concessão de cotas para afrosdescendentes.

O fundamento de criação de ações afirmativas é uma crítica ao idea l de igualdade dedireitos como instrumento eficaz para a promoção da igualdade, haja vista que nem sempre o que está nalei se verifica em realidade – para tanto, são necessárias ações que concretizem essa igualdade.

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Conforme a Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as formas deDiscriminação Racial , promulgada no Brasil em 1969, prescreve no artigo 2º - Os Estados signatáriostomarão medidas de ação afirmativa conforme necessário para garantir o desenvolvimento e a proteçãodos indivíduos pertencentes a certos grupos raciais, com a finalidade de garantir -lhes o pleno e igualdesfrute dos direitos humanos.

Portanto, o assento das ações afirmativas é uma demanda concreta de igualdade: aigualdade de oportunidade, ou seja, um tratamento diferenc iado e preferencial àqueles historicamentemarginalizados. Sumariamente, poderia ser concebido da seguinte forma: em igualdade de condições eoportunidades, um branco e um não branco disputando uma vaga no mercado de trabalho, seria atribuída avaga ao não branco; todavia, como não há assimetria de oportunidades e condições, as ações afirmativasviriam proteger os mais despossuídos de vantagens, com algumas vantagens que o colocariam em pé deigualdade aos estabelecidos, retornando a uma inigualável acepção de Norbert Elias.

O objetivo primaz das ações afirmativas é buscar garantir a igualdade deoportunidades adotando um tratamento preferencial para permitir que grupos historicamentediscriminados alcancem um nível de competitividade similar aos demais grup os sociais, por meio depolíticas que:

a. aumentem a qualificação dos desprivilegiados;b. promovam a melhoria de seu acesso ao mercado de trabalho;c. apoiem empresas (públicas e privadas) que promovam a diversidade;d. garantam sua inserção e participaçã o nos meios de comunicação.Ou seja, não são as cotas para não brancos nas escolas públicas de nível superior e nas

empresas as únicas ações afirmativas possíveis. O amplo debate público sobre outras propostas deve serpromovido, a fim de que reais possibi lidades de inserção do negro na sociedade de classes se realize.

E também não adianta a promoção de ações afirmativas sem positividade real:conforme dito, estabelecer que 10% do elenco de um programa televisivo deve ser preenchidoobrigatoriamente por não brancos não garante os objetivos da ação, pois os não brancos podem estarcolocados em posições sociais inferiores quando da atuação em personagens, como domésticas, motoristasparticulares, seguranças, taxistas, vendedores ambulantes e donos de pequenos comércios; também não semolda uma ação afirmativa ao garantir que 40% das vagas de uma universidade irão para os afrosdescendentes se não se preserva um ensino fundamental e médio de qualidade para que, na faculdade,possam realmente adquirir uma formaçã o mínima.

A literatura admite quatro argumentos básicos levantados contra a adoção de políticasde ação afirmativa:

- ela fere o princípio da isonomia, pois não trata a todos igualitariamente;- ela retira o critério do mérito pessoal, tão importante nas s ociedades que se gerem

pela competitividade;- ela esconde o real problema do mundo: a pobreza e a necessidade de políticas para

combatê-la;- ela é de difícil implementação em virtude do grau de miscigenação da população

brasileira, complicando a definiçã o de quem é branco e quem não é.Inobstante esse movimento contrário à prática das ações afirmativas, podem ser

relacionadas algumas já adotadas no País, como a construção de Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN)para as séries fundamentais que valorizem a população negra e a contribuição cultural dos afrosdescendentes; a celebração de convênios para fomento da produção e divulgação de documentários sobrea vida e ações de personagens negros; reavaliação dos livros didáticos que continham preconceitos nabusca da valorização da pluralidade cultural brasileira; Programa Diversidade na Universidade queobjetiva a criação de propostas e estratégias de promoção de acesso ao ensino superior dosdesprivilegiados; apoio técnico a programas de alfabetização e cur sos supletivos dirigidos aos não brancose as despossuídos, entre outros.

Nessa linha de raciocínio, a criação, conforme citado na Introdução, da disciplina“Ações Afirmativas e Igualdade Racial” no currículo do Curso de Formação de Soldados, é um exemplode ação afirmativa voltada para a conscientização e preparação dos Profissionais de Segurança Pública nasquestões sobre racismo e suas práticas, sua prevenção e sua superação.

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2.3.6 Conclusões

Pautadas as análises sobre a situação das populações de cor nas leis brasileiras e suareal (ou não real) proteção, questionou -se e questiona-se, neste momento, sua eficácia: até que pontoresolveram as desigualdades advindas das práticas racistas, determinando um novo lugar aos não brancos?Até que ponto povoaram as mentes e consciências dos cidadãos brasileiros ao tema racismo de formainquestionável?

Vive o Brasil a mudança, de caráter mundial, em relação ao preconceito e àdiscriminação raciais e o estado está ancorado no caminho mundial de extirpação de ester eótipos públicosrelacionados a cor, raça, gênero, etnia e origem nacional. O problema agora está no imaginário social, queinsiste em manter as caracterizações prévias das pessoas segundo esses condicionantes.

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O SEGMENTO NEGRO E A SEGURANÇA PÚBLICA – RELAÇÕES

2.4.1. A Polícia Militar na aplicação da lei“A equação que está armada hoje, nas metrópolesbrasileiras, é a seguinte: as pessoas desconfiam umas dasoutras, todos desconfiam da polícia e a polícia desconfi a detodos. Este é um círculo vicioso a romper” – Cel Res PMCarlos Alberto de Camargo – Ex-Cmt G PM

À Polícia Militar incumbe a preservação da ordem pública e a polícia ostensiva; trata -se, majoritariamente, do órgão público que primeiro tem contato dire to com as pessoas, in loco, quando seaciona um serviço público; se o crime está acontecendo, a Polícia Militar é, na maioria das vezes,acionada; se pelas vias circulam pessoas em atitude suspeita (potenciais autores de crimes), é a PolíciaMilitar que realiza a prevenção, abordando-as, vistoriando-as; se há uma queixa-crime a ser realizada,dificilmente o cidadão recorre instantaneamente à Delegacia de Polícia – aciona a Polícia Militar, pormeio do telefone 190. Estas circunstâncias determinam que é a Po lícia Militar que provavelmenteatenderá, primeiramente, uma queixa ou denúncia de crime de preconceito ou de discriminação racial.Caberá ao Policial Militar verificar a situação e adotar as medidas pertinentes: prender o autor emflagrante ou não, relacionar-se com as pessoas envolvidas, interagir com a vítima, com o autor, com astestemunhas, encaminhá-las aos órgãos competentes, registrar a ocorrência, entre outras providências. Sãonestes momentos que deve primar, o servidor público militar, pelo respe ito às pessoas, principalmentequanto à dignidade. E, majoritariamente, é na atuação cotidiana de polícia que se estabelece a relaçãoentre a polícia e a comunidade não branca – cotidiana, mas crucial, pois é nela que deve emergir oprincípio da igualdade entre as pessoas e se afastar de qualquer ato de preconceito, discriminação outratamento desigual.

Esse é o local, por excelência, de inserção da Polícia paulista na efetivação de açõesantidiscriminatórias: na prevenção e na repressão imediata. Deve -se buscar, portanto, a aplicaçãoeqüitativa da lei às pessoas.

Algumas pesquisas levadas a efeito sobre a questão do tratamento policial aos gruposnão brancos, bem como a visão destes grupos da polícia, determinam que o medo, a desconfiança, a açãoabusiva são mais constantes em grupos não brancos, do que dos brancos. Uma das pesquisas a respeito dapolícia, efetuada em 1995, pela Data Folha, que argüiu as pessoas sobre qual a primeira idéia que vinha acabeça quando se falava da polícia delimitou que 69% das respostas se associava a aspectos negativoscomo falta de preparo, ineficiência, corrupção, violência e abuso de poder. Também se constatou que osbrancos se referiam mais à problemas relacionados à ineficiência e à corrupção, os negros, em maioria,determinavam problemas relacionados à questão da violência policial – 11% dos brancos admitiu ter medoda polícia, enquanto que a porcentagem dos negros foi de 20%; em grande medida, esse diferencial podeser explicado pela própria experiência dos não brancos c om a polícia e pelo conhecimento do tratamentoem relação aos negros e pardos.

A exorbitância da discriminação racial da polícia pode ser revelada em outroquestionamento, sobre quantas vezes a pessoa foi parada e abordada pela polícia: em pesquisa efetiv adapelo Data Folha e ILANUD (Instituto Latino Americano das Nações Unidas para a Prevenção ao Delito eTratamento do Delinqüente) em 1997, dos entrevistados brancos, 34% admitiram ter sido parados, aomenos uma vez pela polícia, taxa que cresceu para 46% dos pardos/mulatos e para 48% dos negros – érelevante que a polícia tem uma suspeita sistemática pelos não brancos, se consideradas que praticamentemetade da população paulista é de brancos e a outra metade de não brancos.

As tabelas 2 e 3 no apêndice de monstram mais qualificadamente os dados daspesquisas e são alvo das seguintes conclusões, entre outras:

a. a imagem dos pretos e pardos quanto à polícia é de medo, desconfiança, tratamentodesigual;

b. os brancos possuem, estatisticamente, menos medo das polícias;c. a opinião desfavorável de pretos e pardos, em maior número, a ações repressivas

como a pena de morte e a ação de esquadrões da morte é resultante do medo e da certeza de serão osprimeiros a sofrê-las.

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Por outro lado, no que tange à avaliação do trabalho, os negros costumam ser maisrigorosos: quando questionados se a polícia vinha fazendo um bom trabalho em sua região, 34 % dosbrancos disseram que sim, contraditos a 28% dos negros que taxam positivamente o trabalho da polícia.

2.4.2. Polícia Militar: lugar de brancos, pardos e negros?

Um lugar comum das propostas de extermínio de práticas racistas e preconceituosasnas instituições públicas é fazer com que os funcionários sejam deslocados, conforme seu grupo de cor, àscomunidades em que predominem os grupos relativos, como forma de minimizar embates relacionados àdiscriminação racial.

A promoção de campanhas anti -racistas nas corporações, de cursos e palestras sobre opreconceito e discriminação raciais e seu combate, de ações afirmativas n o cotidiano policial são formasde conscientizar os policiais de seu papel imprescindível na consolidação democrática e na extirpação decondutas racistas.

Da mesma com que a criminalidade é um problema mais social que policial, aviolência e a discriminação racial da polícia é também, em boa parte, reflexo de uma cultura espraiada nasociedade; ou seja, reproduz condutas e comportamentos arraigados no seio social. Conforme predisse oGrupo de Pesquisa da Discriminação (GPD), “A polícia apenas reproduz uma visão ‘lombrosiana’ docrime que existe na própria sociedade, marcada por estereótipos contra os cidadãos negros e pobres”(Túlio Khan, 1996).

Todavia essa reprodução, conforme largamente explicitado, é racista e preconceituosae deve ser afastada, já que à polícia incumbe proteger a aplicação da lei, que por sua vez prenuncia a odireito da igualdade a todos.

Por fim, visando levantar questionamento sobre a ‘democracia’ no âmbito da PolíciaMilitar paulista, reproduz-se, no apêndice, a tabela 4, que traz a composição do efetivo paulista segundosua cor, cujos dados alicerçam uma divisão eqüitativa entre as populações de cor.

2.4.3 ConclusõesA relevância das questões de cor não podem ser olvidadas ao conhecimento e à

superação; e os órgãos policiais tem notória importância nesse circuito, pois são responsáveis pelapreservação da ordem nos quatro cantos do País e não podem apenas reproduzir em seus atos as práticas eidéias racistas: são instrumentos eficazes de positivação dos direitos humanos e da form ação de uma paísde igualdades raciais, de gênero, de etnia e de origem.

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DISCRIMINAÇÕES E PRECONCEITOS DE OUTRAS ORDENS

2.5.1. Discriminações e preconceitos outros

Apesar das restrições apresentadas no conteúdo programático da Unidade Didática, érelevante que se considere, na realidade brasileira, outras formas de discriminação e preconceito diversasdaquelas baseadas na raça, não apenas porque a principal legislação sobre discriminação e preconceitopreconiza distinções puníveis no q ue tange à nacionalidade, religião e etnia, mas também porque, no casobrasileiro, há atitudes preconceituosas e ações discriminatórias diversas apenas daquelas relacionadas àcor e à raça das pessoas.

2.5.1.1. Preconceito de classes

Provavelmente, dentre os tipos de preconceito, é o de classes o que parece mais clarona sociedade brasileira. Diz respeito ao preconceito sobre pessoas conforme sua renda, seu poderfinanceiro, seu capital social, na acepção de Pierre Bordieu. É notório a distinção que se fa z, no cotidiano,entre as pessoas que possuem dinheiro e aquelas que não possuem. Mais especificamente, se relaciona àostentação pública de pertences pessoais, como carros, imóveis, vestimentas, objetos de uso pessoal eoutros materiais que acabam por ide ntificar se a pessoa “é de posses ou não” .

Nestes termos, também servem de aparato para a diferenciação os lugares que apessoa freqüenta, seu rol de amizades e de convivência, seu grau de escolaridade, entre outros aspectos,que permitem, em nossa consciência, diferenciar o rico do pobre. Aquele, com poder de influência, visto asua capacidade de auto-gestão pessoal, dono das decisões, incluído na sociedade de classes, culto, beminformado, com vida material definida merece o cotejo das pessoas, o respeit o intrínseco em suasdecisões; enquanto que o pobre, pessoa destituída das garantias materiais mínimas de sobrevivência, pelasua suposta ignorância, sua incapacidade a preocupações não materiais, pela patente insuficiência dedinheiro, é a sagaz vítima do preconceito e da discriminação de classes na sociedade brasileira; notem, porexemplo, as pessoas que freqüentam shopping centers, principalmente quanto às suas vestes, quais são oslocus de concentração de moradia das pessoas de baixa renda, bem como as de renda nenhuma; a situaçãode classes se sustenta por si mesma: há os lugares os ricos, da classe média e da classe baixa; há asprofissões para cada uma delas; há todo um quadro de condutas e comportamentos esperados para cadauma delas; ao pobre não é dado o direito à freqüência, a não ser que se enriqueça, quando não será rico,mas um novo rico, terminologia utilizada para aqueles que ascendem, pela mobilidade social, aos estratosmais elevados da sociedade de classes.

2.5.1.2. Preconceito de gênero

Forma de preconceito que também se olvida na sociedade brasileira, o preconceito e adiscriminação relacionadas a gênero das pessoas existe, influi e determina as posições na sociedade.

Trata-se da forma de preconceito que separa, distingue homens de mulhe res,colocando espaços e capacidades para cada um deles. Como toda forma de preconceito, também servepara desqualificar as pessoas, minorando sua posição social, para assim justificar a supremacia ousubserviência de um pelo outro.

No caso brasileiro, o preconceito e a discriminação de gênero se apercebe nocotidiano e nas estatísticas sociais: é fato a preponderância masculina nos cargos, profissões e atividadesmais rendosas, em detrimento das mulheres.

No preconceito, emergem os famosos jargões depreci ativos: “lugar de mulher é nacozinha”, “minha mulher não tem que trabalhar, tem é que cuidar da casa e dos filhos”, “faculdade demulher é psicologia, pedagogia, turismo”, “Ihhh, é mãe solteira” que nada mais intentam do quedelimitar o lugar e o espaço da mulher, distante do homem e portanto que não o ameaça.

A História do Brasil é rica no que tange aos movimentos feministas, sendo que, aolongo dos anos, diversas conquistas foram auferidas pelas mulheres. Todavia, inexiste legislação quecuide especificamente do preconceito de gênero no Brasil; há leis que prescrevem a proteção da mulher,ao considerar sua condição de vítima do preconceito/discriminação e muitas vezes dependente do marido

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ou do pai, a quem não ousa desafiar, se queixar, denunciar, bem co mo em alguns Estados existem asDelegacias Especializadas de Proteção à Mulher, que, por serem constituídas de quadros femininos entreseus funcionários, facilitam e encorajam a denúncia de maus tratos, violência doméstica, submissão. Taiselementos são primazes na contribuição ao arrefecimento do preconceito e da discriminação de gênero.

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2.6. APÊNDICES2.6.1. Tabelas e quadros úteis

Tabela 1CorCaracterística socioeconômicas

Branca Preta PardaAnos de escolaridade 8,1 6,4 6,2Idade ao primeiro trabalho 12,66 12,20 12,01Renda familiar per capita 376,57 166,87 163,61Tamanho da família 3,70 4,05 4,18Residência urbana (%) 83,17 77,79 73,19Escolaridade do pai 2,96 1,33 1,57

Fonte: Nelson Valle da Silva (2000) e PNAD-2006

Tabela 2De quem você tem mais medo: da polícia ou dos bandidos (em %)

1995 1997Brancos Pardos Pretos Brancos Pardos Pretos

Dos bandidos 59 55 46 47 33 28Da polícia 15 16 28 19 32 35

Fonte: Data Folha, 1995 e 1997

Tabela 3Opiniões sobre violações aos direitos humanos:

Brancos Pardos PretosSou contra a pena de morte 43 44 52Sou contra a existência de esquadrão de morte dentro da polícia 76 74 80Pessoas suspeitas nunca devem ser torturadas 72 64 72

Fonte: Data Folha, 1995

Tabela 4Comparação entre a composição racial do efetivo da PMESP e a composição racial da população paulista.

Composição da PM paulista Número de PM % de PM População paulistaBranca 56.988 69,7 71,4Parda 21.665 26,5 21,7Preta 2613 3,1 3,6Amarela 380 0,4 1,3Outras 16 0,01 -Total 81662 100 100

Fontes: SRH-PMESP (1998) e IBGE (1991)

Tabela 5Distribuição nacional por cor de pele (em %)

REGIÃO / COR Branca Preta Amarela Parda IndígenaNORTE 29,7 5,1 0,2 63,5 1,6NORDESTE 32,1 7,6 0,2 59,8 0,4SUDESTE 62,4 6,6 0,8 30,0 0,2SUL 84,2 3,8 0,5 11,2 0,2CENTRO-OESTE 49,1 4,3 0,5 45,1 1,1BRASIL 53,8 6,2 0,5 39,1 0,4

Fonte: Censo Demográfico 2000 - IBGE

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Tabela 6Taxa de analfabetismoTaxa de analfabetismo funcional da s pessoas de 15 anos ou mais de idade, por cor ou raça, no Brasil – 2006

Branca 16,4%Parda 27,5%Preta 28,8%

Tabela 7Defasagem no mercado de trabalhoPorcentagem de negros e brancos em cada ocupação

100 85%

80

61% 59,1%

60 55% 46% 42% 55,4% 49,9% 50%43 % 40%

4026,2%

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Negro

Branca Negro

Branca

Negro

Branca

Negro Branca

Negro

Branca

Negro

Branca

0 Não remunerada Com carteira Sem carteira Conta própria Empregador Doméstico

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2.6.2. LEIS VIGENTES

LEI Nº 7.716, DE 5 DE JANEIRO DE 1989.

(Com alterações dadas pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o Congresso Nacion al decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religiãoou procedência nacional.

Art. 2º (Vetado).

Art. 3º Impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo da Administração Direta ou Indireta,bem como das concessionárias de serviços públicos.

Pena: reclusão de dois a cinco anos.

Art. 4º Negar ou obstar emprego em empres a privada.

Pena: reclusão de dois a cinco anos.

Art. 5º Recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando -se a servir, atender ou receber cliente oucomprador.

Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 6º Recusar, negar ou impedir a inscrição ou ingresso de aluno em estabelecimento de ensino público ou privado dequalquer grau.

Pena: reclusão de três a cinco anos.

Parágrafo único. Se o crime for praticado contra menor de dezoito anos a pena é agravad a de 1/3 (um terço).

Art. 7º Impedir o acesso ou recusar hospedagem em hotel, pensão, estalagem, ou qualquer estabelecimento similar.

Pena: reclusão de três a cinco anos.

Art. 8º Impedir o acesso ou recusar atendimento em restaurant es, bares, confeitarias, ou locais semelhantes abertos aopúblico.

Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 9º Impedir o acesso ou recusar atendimento em estabelecimentos esportivos, casas de diversões, ou clubes sociaisabertos ao público.

Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 10. Impedir o acesso ou recusar atendimento em salões de cabelereiros, barbearias, termas ou casas de massagem ouestabelecimento com as mesmas finalidades.

Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 11. Impedir o acesso às entradas sociais em edifícios públicos ou residenciais e elevadores ou escada de acesso aosmesmos:

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Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 12. Impedir o acesso ou uso de transportes públicos, como aviões, navio s barcas, barcos, ônibus, trens, metrô ouqualquer outro meio de transporte concedido.

Pena: reclusão de um a três anos.

Art. 13. Impedir ou obstar o acesso de alguém ao serviço em qualquer ramo das Forças Armadas.

Pena: reclusão de dois a quatro anos.

Art. 14. Impedir ou obstar, por qualquer meio ou forma, o casamento ou convivência familiar e social.

Pena: reclusão de dois a quatro anos.

Art. 15. (Vetado).

Art. 16. Constitui efeito da condenação a pe rda do cargo ou função pública, para o servidor público, e a suspensão dofuncionamento do estabelecimento particular por prazo não superior a três meses.

Art. 17. (Vetado)

Art. 18. Os efeitos de que tratam os arts. 16 e 17 desta Lei não sã o automáticos, devendo ser motivadamente declarados nasentença.

Art. 19. (Vetado).

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.(Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97 )

Pena: reclusão de um a três anos e multa.

§ 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que u tilizema cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação dequalquer natureza: (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

§ 3º No caso do parágrafo anterior, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério Público ou a pedido deste, ainda antes doinquérito policial, sob pena de desobediência: (Redação dada pela Lei nº 9.459, de 15/05/97)

I - o recolhimento imediato ou a busca e apreensão dos exemplares do material respectivo;

II - a cessação das respectivas transmissões radiofônicas ou televisiva s.

§ 4º Na hipótese do § 2º, constitui efeito da condenação, após o trânsito em julgado da decisão, a destruição do materialapreendido. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.459, de 15 /05/97)

Art. 21. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação

Art. 22. Revogam-se as disposições em contrário.

Brasília, 5 de janeiro de 1989; 168º da Independência e 101º da República.

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Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Mar ia da Penha)

Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da ConstituiçãoFederal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da ConvençãoInteramericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de ViolênciaDoméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outrasprovidências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

TÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1o Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos ter mos do § 8o doart. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, daConvenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionaisratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra aMulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Art. 2o Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade ereligião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo -lhe asseguradas as oportunidades e facilidades paraviver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.

Art. 3o Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, àalimentação, à educação, à cultura, à moradia , ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, àdignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

(...)

TÍTULO II

DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 5o Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada nogênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculofamiliar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentad os,unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente decoabitação.

Parágrafo único. As relações pessoais enunciad as neste artigo independem de orientação sexual.

Art. 6o A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos.

CAPÍTULO II

DAS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

CONTRA A MULHER

Art. 7o São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

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II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto -estima ou quelhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças edecisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilân cia constante, perseguição contumaz,insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo àsaúde psicológica e à autodeterminação;

III - a violência sexual, entendida como qualqu er conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexualnão desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquermodo, a sua sexualidade, que a impeça de usar q ualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, aoaborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seusdireitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total deseus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo osdestinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

(...)

Seção II

Das Medidas Protetivas de Urgência que Obrigam o Agressor

Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar co ntra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, deimediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:

I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22de dezembro de 2003;

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:

a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psic ológica da ofendida;

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviçosimilar;

V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

§ 1o As medidas referidas neste artigo não i mpedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que asegurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.

§ 2o Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando -se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6o daLei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidasprotetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de ar mas, ficando o superior imediato do agressorresponsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência,conforme o caso.

§ 3o Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da forçapolicial.

§ 4o Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei no 5.869,de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civi l).

Seção III

Das Medidas Protetivas de Urgência à Ofendida

Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:

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I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;

II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;

III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;

IV - determinar a separação de corpos.

Art. 24. Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juizpoderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:

I - restituição de bens indevidamen te subtraídos pelo agressor à ofendida;

II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvoexpressa autorização judicial;

III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao a gressor;

IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violênciadoméstica e familiar contra a ofendida.

(...)

TÍTULO VI

DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não seaplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.

LEI Nº 3.353, DE 13 DE MAIO DE 1888DECRETA A LIBERTAÇÃO DOS ESCRAVOS NO BRASIL

A PRINCESA IMPERIAL Regente em Nome de Sua Majestade o Imperador o Senhor D. Pedro II, Faz saber a todos

os súditos do IMPÉRIO que a Assembléia Geral Decretou e Ela sancionou a Lei seguinte:

Art. 1º - É declarada extinta desde a data desta Lei a escravidão no Brasil.

Art. 2º - Revogam-se as disposições em contrário.

Manda portanto a todas as autoridades a quem o conhecimento e execução da referida Lei pertencer, que a cumpram

e façam cumprir e guardar tão inteiramente como nela se contém.

O Secretário de Estado dos Negócios d'Ag ricultura, Comércio e Obras Públicas e Interino dos Negócios Estrangeiros

Bacharel Rodrigo Augusto da Silva do Conselho de Sua Majestade o Imperador, o faça imprimir, publicar e correr.

Dado no Palácio do Rio de Janeiro, em 13 de Maio de 1888 - 67º da Independência e do Império.

Carta de Lei, pela qual Vossa Alteza Imperial manda executar o Decreto da Assembléia Geral, que Houve por bem

sancionar declarando extinta a escravidão no Brasil, como nela se declara.

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