Cynthia Semíramis Vianna - Violência contra mulheres incentivada pela mídia
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8/9/2019 Cynthia Semramis Vianna - Violncia contra mulheres incentivada pela mdia
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Tera-feira, 28 de outubro de 2008
ISSN 1519-7670 - Ano 13 - n 509 - 28/10/2008
Feitos & Desfeitas
Incio > ndice Geral > Feitos & Desfeitas
CASO SANTO AN DR
Violncia contra mulheres incentivada pelamdia
Por Cynthia Semramis Machado Vianna em 28/ 10/ 2008
Em Santo Andr, na ltima semana, presenciamos um caso de crcere privado quedesnudou para todo o pas o machismo dos policiais e jornal istas, airresponsabilidade dos meios de comunicao e a insensibilidade nos casos em queas vtimas so mulheres. Um homem manteve como refns a ex-namorada e umaamiga dela porque estava inconformado com o fim do relacionamento.
O machismo, que utilizarei aqui como a concepo de mundo que considera oshomens superiores s mulheres e permite que eles possam impor sua vontade aelas, deve ser combatido. Especialmente em relacionamentos afetivos, no devehaver superioridade ou inferioridade de nenhuma das partes, mas igualdade narelao. Ningum pode tratar outra pessoa como propriedade, nem obrig-la a semanter num relacionamento. E, em hiptese alguma, pode-se admitir que sejam
cometidos crimes, com o fim de impor a vontade de uma pessoa sobre outra.
Horro r e decepo
No entanto, a maioria dos casos de violncia cometida contra mulheres decorre dainsatisfao do homem com o trmino do relacionamento e a tentativa de impor suavontade, agredindo-a para retomar a relao, ou matando-a, para que no se torne"propriedade" de mais ningum. Quem ama no mata, j diziam as feministas algunsanos atrs; hoje podemos acrescentar: quem ama no mata, no tortura, noagride, no mutila, no mantm em crcere privado. Qualquer defesa desses crimes,em nome de um pretenso sentimento amoroso, serve apenas para encobrir aviolncia contra uma pessoa que manifestou legitimamente a sua vontade de sair darelao.
No caso de Santo Andr, tanto as autoridades quanto os meios de comunicao
agiram de forma a desculpar o criminoso, minimizando suas aes e tratando-ocomo um jovem trabalhador em crise amorosa. Isso no deveria apagar o fato deque estava cometendo um crime para impor sua vontade ex-namorada. E aquicabe uma primeira crtica atuao dos meios de comunicao: por que no falar dohorror e decepo que uma jovem de 15 anos possa estar sentindo porque oprimeiro namorado dela preferiu cometer crimes para afirmar que ela propriedadedele, e por isso ela no poderia se separar?
Tpico crime de gnero
Se os jornalistas so to ciosos em mostrar "o outro lado", especialmente quando setrata de homens-pais-de-famlia-honestos-trabalhadores vtimas de crimes, por quese omitiram neste caso, em que a vtima principal era uma jovem-estudante-sria-responsvel com a vida toda pela frente? Temos um criminoso e temos quatrovtimas: dois homens que eram refns e foram libertados no primeiro dia (e no
tivemos mais notcias deles) e duas mulheres refns, sendo uma delas aex-namorada do agressor. Por que a empatia da mdia foi para o homem, e no paraas vtimas mulheres? praticamente impossvel pensar em alguma explicao almde machismo, pois bvio que neste caso os homens foram tratados comosuperiores e mais importantes que as mulheres.
Apesar de a Constituio da Repblica pregar a igualdade e vedar a discriminao,seja qual for a sua forma, o que foi visto na atuao das autoridades foi umadiscriminao de gnero. As refns, mulheres, foram ignoradas pelas autoridades
Cynthia SemramisMachado Vianna
Professora universitria,mestre em Direito pelaPUC-MG
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ervatrio da Imprensa http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=509FDS002
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(inclusive pelo Ministrio Pblico, que sempre atua cioso dos direitos das vtimas),que procuraram manter a integridade fsica de um homem que estava cometendoum crime. Foram divulgadas informaes de que o rapaz estava agredindo aex-namorada durante o crcere. Era um caso em que a atuao policial deveria sermais incisiva, de forma a proteger as vtimas o mximo possvel.
Mas a impresso passada populao foi a de que garantir a integridade fsica dohomem era mais importante do que impedir as agresses ex-namorada, ou impedirque uma refm j libertada voltasse ao cativeiro. O resultado tambm foi tpico decrimes relacionados a gnero: o homem saiu ileso; uma das mulheres (aex-namorada) morreu aps ser baleada no pbis (provavelmente para garantir oargumento machista "se no minha, no ser de mais ningum") e na cabea; aoutra mulher foi ferida no rosto e talvez precise de mais cirurgias para no ficar
desfigurada.
Falas estarrecedoras
A atuao dos meios de comunicao foi uma subverso de todos os valores quedevem reger a comunicao social, especialmente a dignidade da pessoa humana e ano-discriminao. Programas de televiso no respeitaram sequer a situaodelicada das vtimas e interferiram, ao vivo, conversando com algum que estavacometendo um crime. Como se a situao por si s no fosse absurda, optaram porno condenar a atitude do criminoso, tratando-o o tempo todo como se estivesseagindo corretamente. O rapaz, feliz por aparecer na televiso e tornar-secelebridade, sentiu-se estimulado e optou por estender o crcere privado at o limitepossvel, que foi o desfecho trgico.
Com essa postura, os meios de comunicao interferiram nas negociaes,
estimularam uma inverso de valores (quem, em s conscincia, torceria por algumque est cometendo um crime?) e agiram de forma escandalosa, violando o Cdigode tica dos Jornalistas (o art.11, pargrafo II, veda a divulgao de informaes decarter mrbido, sensacionalista ou contrrio aos valores humanos, especialmenteem casos de crime).
Uma dessas manifestaes televisivas, em especial, merece repdio. Trata-se doprograma de Snia Abro, no qual foi concedida extrema importncia ao criminoso,com um reprter entrevistando-o ao vivo e chamando-o de "querido". Ao final daligao, optou-se por conversar com especialistas sobre o caso. As falas de umadvogado foram estarrecedoras: ele ignorou o sofrimento da refm, considerou-seotimista, pretendeu que o caso terminasse em pizza e que houvesse um casamentofeliz entre vtima e carcereiro! Tamanha falta de respeito e empatia pela vtima deum crime jamais deveria ser incentivada por profissional algum, nem divulgada semressalvas.
Facilitando a impunidade
Todo este caso de extremo mau-gosto, pois mantm uma situao de violnciacontra mulheres. Uma mulher que esteja pensando em terminar o namoro oucasamento, aps acompanhar o noticirio, ficar em dvida sobre o que fazer. Orecado passado pela sucesso de acontecimentos da ltima semana claro: mostraque mulheres que fazem valer sua vontade correm grande risco de serem agredidase perderem a vida, enquanto os homens que as agrediram para impor umrelacionamento se tornam estrelas de televiso e recebem toda a simpatia dos meiosde comunicao.
Igualdade entre homens e mulheres pressupe um tratamento digno nos meios decomunicao, para que no sejam perpetuados atos machistas que dificultam edesvalorizam a vida das mulheres. Porm, quando a mdia opta por valorizar um
agressor de mulheres abre espao para a manifestao de outros agressores,justificando-os e facilitando a sua impunidade, j que no so vistos como oscriminosos que realmente so. No este o papel dos meios de comunicao em umEstado democrtico de direito e o mnimo que se espera da postura dos profissionaisda comunicao compreenderem o prprio machismo, a fim de evitar futurasabordagens to trgicas e ofensivas s mulheres quanto as do caso de Santo Andr.
Uma vidapela audincialvaro Luiz Alves da Silva28/10/2008
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A imprensa ajudoua matar Elo?Adamo Bazani28/10/2008
Ladeira abaixo,
de mos dadasLvia de Souza Vieira28/10/2008
A imprensa tambmtem sua culpaSimone Colombo Lopes28/10/2008
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