Da03 ponte

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Rui Cunha A construção da ponte pedonal sobreoCanalCentral,desejadapela Câmara de Aveiro no âmbito do Parque da Sustentabilidade (PdS), “apenas deve ser permitida se a mesma estiver expressamente prevista no Plano de Urbanização” (PU) do Polis. No entanto, essa tra- vessia entre o Rossio e o Alboi “não se encontra prevista” nesse docu- mento, que está “em vigor naquela área territorial”. Esta é a principal conclusão de um parecer redigido por Fernanda Paula Oliveira, pro- fessora da Faculdade de Direito de Coimbra, a pedido de um grupo de cidadãos de Aveiro que coloca objecções à construção da ponte. Caso a obra avance sem constar do PU do Polis, “a sua execução terá de se considerar em desconformi- dade com este instrumento de ges- tão territorial de ordem munici- pal”, considera a docente. O parecer, ontem divulgado numa sessão pública na Associa- ção Comercial com cerca de 60 pes- soas presentes, foi encomendado para averiguar a “eventual existên- cia de ilegalidades neste processo”. Segundo Fernanda Paula Oliveira, os documentos que lhe foram for- necidos “permitem formular, com algum grau de segurança, um juízo claro”sobreotema. O PU do Polis, conclui a profes- sora universitária, prevê a cons- trução de outra ponte a “meros 100 metros” da travessia proposta pela Câmara. A maioria PSD/CDS con- sidera que a ponte do PdS é “funda- mental” para permitir a ligação pedonal entre o Rossio e o Alboi. Sendo assim, avalia a autora do parecer, a construção teria de figu- rar no PU. “O que se retira da referi- da argumentação [da Câmara] é que a mencionada ponte assume um carácter estruturante (…). E se assim é, não vemos como não deva tal previsão constar do PU”, diz. Fernanda Paula Oliveira reco- nhecequeosplanosdeurbanização não são “instrumentos de regulação pormenorizada e precisa de ocupa- ção do solo”. No entanto, “não é menos certo que lhes cabe definir os elementos estruturantes do territó- rio, os quais devem ficar expressa- mente plasmados nas suas peças fundamentais”. “Outras desconformidades” O parecer, de 7 de Outubro, identi- fica “outras desconformidades” que provocam a “invalidade” da cons- trução da ponte no local sugerido pelo município. É o caso de a estru- tura e os seus acessos “ocuparem e condicionarem o espaço de reserva do canal que o PU prevê para a lin- ha do eléctrico de superfície”, com- prometendoasuaconstrução. Por outro lado, as escadas previs- tasnoprojectocolidemcomadispo- sição do PU que consagra a existên- cia de uma faixa de dez metros para a “livre fruição pública” do espaço. “Outro aspecto de não menor relevo”, acrescenta a docente, é a ausência de “discussão pública” do projecto, uma “obrigação” legal não atendida. “Atendendo às caracterís- ticas do projecto global do PdS, às suas implicações e impactos no ter- ritório e nas populações e ao valor monetário envolvido, o mesmo não pode (…) ser concretizado à margem da participação pública”, ajuíza Fer- nandaPaulaOliveira. Finalmente, a especialista reco- menda que se averigúe se a ponte atinge a zona de protecção da Casa Major Pessoa, um edifício de Arte Nova nas imediações. “Temos a percepção de que este valor patri- monial pode estar a ser afectado”, adverte. l 3 16 DE OUTUBRO DE 2012 TERÇA-FEIRA WWW.DIARIOAVEIRO.PT AVEIRO Parecer jurídico soma argumentos contra a ponte Movimento de cidadãos encomendou análise a uma docente da Faculdade de Direito de Coimbra sobre a travessia prevista pelo Parque da Sustentabilidade Parecer pedido por cidadãos feito graciosamente O parecer foi solicitado a Fernanda Paula Oliveira por um grupo de cidadãos de Aveiro, tendo sido ela- borado graciosamente na sequência de diligências pessoais feitas por um dos membros do movi- mento. O documento foi enviado na semana pas- sada ao Ministério Públi- co (do Tribunal Adminis- trativo e Fiscal de Aveiro) para ser anexo ao proces- so desencadeado em Feve- reiro para “esclarecimen- to de dúvidas sobre a legalidade do cumpri- mento dos instrumentos de ordenamento do terri- tório”. O parecer de Fer- nanda Paula Oliveira foi encomendado após um pedido de informação solicitado pelo Ministério Público em Junho. O PARECER foi ontem apresentado na Associação Comercial de Aveiro EDUARDO PINA PERFIL FERNANDA PAULA OLIVEIRA lecciona nas Facul- dade de Direito e de Economia da Universidade de Coimbra. Também já passou pela Secção Autónoma de Ciências Sociais, Jurídicas e Políticas da Universi- dade de Aveiro, entre 2001 e 2007, nas disciplinas Direito e Gestão Pública e Direito do Urbanismo. Doutorada em Direito pela Universidade de Coimbra, formadora do Centro de Estudos Judiciários e membro da comis- são nomeada para a revisão da Lei dos Solos, tem uma vasta obra editada em livro e outras publicações. PARECER DE FERNANDA PAULA OLIVEIRA IDENTIFICA VÁRIAS “DESCONFORMIDADES” QUE PROVOCAM A “INVALIDADE” DA CONSTRUÇÃO DA PONTE NO LOCAL SUGERIDO PELO MUNICÍPIO

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Rui Cunha

� A construção da ponte pedonalsobre o Canal Central, desejada pelaCâmara de Aveiro no âmbito doParque da Sustentabilidade (PdS),“apenas deve ser permitida se amesma estiver expressamenteprevista no Plano de Urbanização”(PU) do Polis. No entanto, essa tra-vessia entre o Rossio e o Alboi “nãose encontra prevista” nesse docu-mento, que está “em vigor naquelaárea territorial”. Esta é a principalconclusão de um parecer redigidopor Fernanda Paula Oliveira, pro-fessora da Faculdade de Direito deCoimbra, a pedido de um grupo decidadãos de Aveiro que colocaobjecções à construção da ponte.

Caso a obra avance sem constardo PU do Polis, “a sua execução teráde se considerar em desconformi-dade com este instrumento de ges-tão territorial de ordem munici-pal”, considera a docente.

O parecer, ontem divulgadonuma sessão pública na Associa-ção Comercial com cerca de 60 pes-soas presentes, foi encomendadopara averiguar a “eventual existên-cia de ilegalidades neste processo”.Segundo Fernanda Paula Oliveira,os documentos que lhe foram for-necidos “permitem formular, comalgum grau de segurança, um juízoclaro” sobre o tema.

O PU do Polis, conclui a profes-

sora universitária, prevê a cons-trução de outra ponte a “meros 100metros” da travessia proposta pelaCâmara. A maioria PSD/CDS con-

sidera que a ponte do PdS é “funda-mental” para permitir a ligaçãopedonal entre o Rossio e o Alboi.Sendo assim, avalia a autora doparecer, a construção teria de figu-rar no PU. “O que se retira da referi-da argumentação [da Câmara] éque a mencionada ponte assumeum carácter estruturante (…). E seassim é, não vemos como não devatal previsão constar do PU”, diz.

Fernanda Paula Oliveira reco-

nhece que os planos de urbanizaçãonão são “instrumentos de regulaçãopormenorizada e precisa de ocupa-ção do solo”. No entanto, “não émenos certo que lhes cabe definir oselementos estruturantes do territó-rio, os quais devem ficar expressa-mente plasmados nas suas peçasfundamentais”.

“Outras desconformidades”

O parecer, de 7 de Outubro, identi-fica “outras desconformidades” queprovocam a “invalidade” da cons-trução da ponte no local sugeridopelo município. É o caso de a estru-tura e os seus acessos “ocuparem econdicionarem o espaço de reservado canal que o PU prevê para a lin-ha do eléctrico de superfície”, com-prometendo a sua construção.

Por outro lado, as escadas previs-tas no projecto colidem com a dispo-

sição do PU que consagra a existên-cia de uma faixa de dez metros paraa “livre fruição pública” do espaço.

“Outro aspecto de não menorrelevo”, acrescenta a docente, é aausência de “discussão pública” doprojecto, uma “obrigação” legal nãoatendida. “Atendendo às caracterís-ticas do projecto global do PdS, àssuas implicações e impactos no ter-ritório e nas populações e ao valormonetário envolvido, o mesmo nãopode (…) ser concretizado à margemda participação pública”, ajuíza Fer-nanda Paula Oliveira.

Finalmente, a especialista reco-menda que se averigúe se a ponteatinge a zona de protecção da CasaMajor Pessoa, um edifício de ArteNova nas imediações. “Temos apercepção de que este valor patri-monial pode estar a ser afectado”,adverte.l

316 DE OUTUBRO DE 2012 TERÇA-FEIRAWWW.DIARIOAVEIRO.PT

AVEIRO

Parecer jurídico somaargumentos contra a ponteMovimento de cidadãos encomendou análise a uma docente da Faculdade de Direito de Coimbra sobre a travessia prevista pelo Parque da Sustentabilidade

Parecerpedido porcidadãos feitograciosamente

� O parecer foi solicitadoa Fernanda Paula Oliveirapor um grupo de cidadãosde Aveiro, tendo sido ela-borado graciosamente nasequência de diligênciaspessoais feitas por umdos membros do movi-mento. O documento foienviado na semana pas-sada ao Ministério Públi-co (do Tribunal Adminis-trativo e Fiscal de Aveiro)para ser anexo ao proces-so desencadeado em Feve-reiro para “esclarecimen-to de dúvidas sobre alegalidade do cumpri-mento dos instrumentosde ordenamento do terri-tório”. O parecer de Fer-nanda Paula Oliveira foiencomendado após umpedido de informaçãosolicitado pelo MinistérioPúblico em Junho.

O PARECER foi ontem apresentado na Associação Comercial de Aveiro

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PERFIL

� FERNANDA PAULA OLIVEIRA lecciona nas Facul-

dade de Direito e de Economia da Universidade de

Coimbra. Também já passou pela Secção Autónoma

de Ciências Sociais, Jurídicas e Políticas da Universi-

dade de Aveiro, entre 2001 e 2007, nas disciplinas

Direito e Gestão Pública e Direito do Urbanismo.

Doutorada em Direito pela Universidade de Coimbra,

formadora do Centro de Estudos Judiciários e membro da comis-

são nomeada para a revisão da Lei dos Solos, tem uma vasta

obra editada em livro e outras publicações.

PARECER DE FERNANDA PAULA OLIVEIRA IDENTIFICA VÁRIAS “DESCONFORMIDADES” QUE PROVOCAM A“INVALIDADE” DA CONSTRUÇÃO DA PONTENO LOCAL SUGERIDO PELO MUNICÍPIO