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DADOSDECOPYRIGHT

Sobreaobra:

ApresenteobraédisponibilizadapelaequipeLeLivroseseusdiversosparceiros,comoobjetivodeoferecerconteúdoparausoparcialempesquisaseestudosacadêmicos,bemcomoosimplestestedaqualidadedaobra,comofimexclusivodecomprafutura.

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OLeLivroseseusparceirosdisponibilizamconteúdodedominiopublicoepropriedadeintelectualdeformatotalmentegratuita,poracreditarqueoconhecimentoeaeducaçãodevemseracessíveiselivresatodaequalquerpessoa.Vocêpodeencontrarmaisobrasemnossosite:LeLivros.orgouemqualquerumdossitesparceirosapresentadosnestelink.

"Quandoomundoestiverunidonabuscadoconhecimento,enãomaislutandopordinheiroepoder,entãonossasociedadepoderáenfimevoluiraumnovonível."

IsaacAsimovÁTOMO

TraduçãodeLuísPinto

"Espantoso...Seprocuraumtextobásicosobreofuncionamentodoátomo,aquiestáele."Booklist

"Oautormostraoseuhabitualinstintoparaanteciparquestõesdosensocomumeparaasresponderdeformainteliqívelsemrecorreràmatemática.Anarrativaéaindaenriquecidapelosapartessobreanaturezadaciência.Recomendado."LibraryJournal

"Ofereceumasólidaintroduçãoàfísicaparaprincipiantes."TheWashingtonTimes

IsaacAsimov começa com uma simples pergunta aquele que é, provavelmente, o maisfascinante dos seus livros: até que ponto pode a matéria ser dividida? Mas, tal como outrasquestõeselementares,tambémestanosconduznumabuscaexaustivadeumarespostafinal,umabusca que se transforma numa série de estruturas muito bem elaboradas com base noconhecimento.

OlivrocomeçacomasprimeirasinvestigaçõesdosGregosedosRomanosevai,passoapasso,séculoapósséculo,traçandoocaminhodadescobertaquerevelaanaturezadoátomo,daluz, da gravidade, da força electromagnética - até mesmo a natureza e estrutura do universo.Átomo aborda também fenómenos como a luz e a electricidade; os protões, os neutrões e osquarks,quesãoasunidadesfundamentaisdouniverso;antipartículaseoutrosassuntosestranhosquedesafiamasnossasideiassobreaverdadeiranaturezadoespaçoedotempo.

Actuale incomparável,Átomo é um livro único no seu género, escrito por um autor derenome, cujo génio e capacidade de clarificar temas complexos de forma acessível einteressante,fizeramdeleumdosautoresmaisconsagradosdosnossosdias.

1.MATÉRIA

ADivisãodaMatériaImagineoleitorquetinhaàsuafrenteumagrandequantidadedepequenosseixos-ummontículo

commilharesdeseixos.Senãotivessenadademaisinteressanteparafazer,podiaentreter-seadividi-loem dois conjuntos mais pequenos, de dimensões aproximadamente iguais. Pondo de parte um deles,voltava a dividir o outro emdois.Desses doismontículos aindamais pequenos, punhade parte umeusavaooutroparanovadivisão,repetindooprocessovezessemconta.

O leitorperguntará: durantequanto tempo seriapossível fazê--lo?Para sempre?Sabemosbemque não. Ao fim de algum tempo, e independentemente da dimensão inicial do montículo de seixos,ficaria com um pequeno "montículo" constituído por apenas dois seixos. (Na verdade, essa situaçãoocorrecomsurpreendenterapidez.Mesmoquecomeçassecomummilhãodeseixos,ficariareduzidoadoisseixosapóscercadevintedivisões.)Sedividissemaisumavezomontículoconstituídopordoisseixos,sobrar-lhe-iaummontículoconstituídoporumseixoapenaseopassatempoterminariaaí.Nãoépossíveldividirumseixoaomeio.

Mas...altoaí!Oleitorpodiacolocaroseixosobreumabigornaedesfazê-locomummartelo.Oseixo ficaria reduzidoa fragmentos,quedividiria emconjuntos cadavezmaispequenosaté lhe restarapenasumfragmento.Depoistrituravaessefragmentodemodoaobterpóedividiaaspartículasdepóatésólherestarumaúnicapartículadepó,quaseinvisível.Oleitorpodia,deseguida,tentaresmagá-laeprosseguiratarefa.

Nãoseriacertamenteumpassatempomuitopráticoporqueéextremamentedifícilmanipularumgrão de pó e tentar pulverizá-lo mais ainda.Mas podemos sempre tentar imaginaro que sucederia.Suponhamosentãoqueconseguiadesfazeropóempartículasaindamaispequenas,queporsuavezeramdivididasempartículasmaispequenasainda.Eagora,leitor,pergunteasimesmo:seráqueesteprocessotemumfim?

Ainterrogaçãopodenãoparecermuitoimportante,ousequerpertinente,namedidaemquenãoexiste formaalgumaderealizar,naprática,aexperiência.Muitorapidamentesomosconfrontadoscomobjectosdemasiadopequenosparaseremvistos,peloquedeixamosdesabersecontinuamosounãoadividironossomontículo.Noentanto, alguns filósofosdaGréciaAntigacolocarama simesmosessaperguntae,aofazê-lo,iniciaramumacadeiadeideiaseraciocíniosqueaindahoje,vinteecincoséculosmaistarde,continuaaocuparoespíritodemuitoshomens.

OfilósofogregoLeucipo(490-?a.C.)éaprimeirapessoacujonomeconhecemosequesupomoster reflectido sobre este problema da divisão damatéria. Leucipo terá chegado à conclusão de que oprocessonãopodiacontinuarindefinidamente,sublinhandoque,maiscedooumaistarde,seobtinhaumfragmentodematériatãopequenoquenãoerapossíveldividi-loemalgodemaispequenoainda.

Umhomemmaisnovo,Demócrito(460-370a.C),queforaalunodeLeucipo,aceitouaideiadeque existiam fragmentos de matéria tão pequenos que eram indivisíveis. Demócrito designou taisfragmentosátomos,palavraque emgrego significa "indivisível".Nanossa língua, ficaramconhecidoscomo átomos. SegundoDemócrito, amatéria consistia numa colecção de átomos e, se existia espaçoentreeles,nãocontinhanada(erao"vazio").

Demócrito teráescritosessenta livrosemqueexpôsassuas teorias, incluindoasuaconcepçãodaquilo a que actualmente chamamos ato-mismo. Nesse tempo, porém, em que não havia imprensa e

todososlivrostinhamdesercopiadosàmão,nuncaexistiammuitosexemplaresdequalquerobra.Eoslivros de Demócrito não foram copiados muitas vezes, em parte devido à impopularidade das suasteorias. Ao longo dos séculos, muitas obras foram desaparecendo. Nenhum dos livros de Demócritosobreviveuatéaosnossosdias.

A maioria dos filósofos daquela época achava que não fazia sentido supor a existência depequenas partículas indivisíveis. E que era mais razoável imaginar que tudo podia ser dividido emfragmentoscadavezmaispequenos,numprocessosemfim.

Os filósofos gregos Platão (ca. 427-347 a.C.) eAristóteles (384-322 a.C), em particular, nãoaceitavam a noção de átomos. Como um e outro eram osmais profundos dos antigos filósofos, cujasreflexõesabrangiamummaiornúmerodedomínios,assuasopiniõesprevaleceram.Masoargumentonãocolhia a unanimidade. O influente filósofo grego Epicuro (341-270 a.C.) adoptou o atomismo comonúcleocentraldassuasteorias.Supõe-sequeEpicuroescreveutrezentoslivros(naAntiguidade,diga-sedepassagem,oslivroscostumavamserbastantecurtos),masnenhumchegouaténós.

Oepicuristamaisimportante,dopontodevistaquenosinteressanestelivro,foiumromano,TitusLucretiusCarus(96-55a.C),geralmenteconhecidoapenascomoLucrécio.Em56a.C.publicouumlongopoemaem latim intituladoDeRerumNatura (expressãoquesignificaDaNaturezadasCoisas),ondeexplicavaempormenoraconcepçãoepicuristadoatomismo.

A obra ficou famosa na época mas, alguns séculos mais tarde, depois do cristianismo se tertornadoumareligiãopopular,Lucréciofoiacusadodeateísmo.Oseulivrodeixoudesercopiadoeosexemplares que existiam foram destruídos ou perderam-se. Ainda assim, um exemplar (um apenas!)sobreviveuatéàIdadeMédia,tendosidodescobertoem1417.Olivrofoirecopiadoe,meioséculomaistarde,quandoa imprensacomeçoua serusada,opoemadeLucrécio foidasprimeirasobrasa seremimpressas.

OpoemafoidivulgadoportodaaEuropaOcidentaletornou-seaprincipalfontedeconhecimentosobreasantigasteoriasatomistas.OfilósofofrancêsPierreGassendi(1592-1655),queolera,adoptouaconcepçãoatomistaeescreveusobreotemadumaformapersuasiva,ajudandoaespalharadoutrina.

Contudo,nosdoismilanosquemedeiamentreLeucipoeGassendi,oatomismoeosargumentosafavorecontraadoutrinanãopassaramdetemaparadiscussõesintermináveisentresábios.Nãoexistiamprovasafavoroucontraadoutrina.Unseoutrosaceitavamourejeitavamosátomosdeacordocomopontodevistaquemaislhesagradava,ouquelhespareciamaissensato.Nãohaviamaneiraalgumadeconvencerpelaforçadosargumentosalguémquedefendessefirmementeopontodevistacontrário.Asescolhasdecadaqualerammeramentesubjectivas,eosgostosnãosediscutem.

Por essa altura, todavia, alguns sábios começaram a realizar experiências: a interrogar aNatureza, por assimdizer, e a estudar os resultados obtidos.Dessemodo tornou-se possível produzirprovasquese"impunham"dopontodevistacientífico;ouseja,provasqueforçavamoutrosaaceitarumpontodevistaquesubjectivamenterejeitavam(desdequefossemintelectualmentehonestos).

Oprimeiroa realizarexperiênciasque tinhamumarelaçãocomoproblemadoatomismofoiocientistabritânicoRobertBoyle(1627-1691),queforainfluenciadopelosescritosdeGassendieera,porisso,umatomista.

Numaexperiênciarealizadaem1662,Boyleutilizouumtubodevidroemformade"J".Obraçomaiscurtoestavafechado,omaislongoaberto.Boyleintroduziumercúrioporessaabertura,oqualsedepositou no fundo, aprisionando algum ar no braço mais curto. Depois verteu no dispositivo maismercúrio.Opesodestecomprimiuoarretidonobraçomaiscurto,reduzindoovolumeporeleocupado.

Aoduplicaraalturadacolunademercúrionobraçolongo,ovolumedearnobraçocurtoreduzia-seametade.Quandoomercúrioeraretiradoeapressãoaliviada,ovolumedoaraumentava.EstarelaçãodeproporcionalidadeinversaentrepressãoevolumeficoudesdeentãoconhecidacomoaleideBoyle.

Ocomportamentodoarsobpressãopodeserfacilmenteexplicadorecorrendoànoçãodeátomo.Suponhamosque-comosugeriraDemócrito-oaréconstituídoporátomosqueestãomuitoafastadosunsdosoutros,nãoexistindonadaentreeles.(Umatalhipóteseexplicaofactodumdeterminadovolumedearpesarmuitomenosqueigualvolumedeáguaoumármore,ondeosátomosestãoemcontactounscomosoutros.)Aaplicaçãodepressãosobreoarforçaosátomosaaproximarem-se,espremendo,porassimdizer,ovazioexistenteentreeles,eprovocandoumareduçãodovolume.Aoaliviarapressão,osátomospodemdenovoafastar-seunsdosoutros.

Pela primeira vez, o atomismo começava a levar amelhor.Alguns podiam achar que não erarazoável,outalvezestético,imaginaraexistênciadeátomos.Maseraimpossívelduvidardosresultadosda experiência de Boyle. Isto era tanto mais verdadeiro quanto qualquer pessoa podia realizar aexperiênciaefazerobservaçõesidênticas.

SeaceitarmosaexperiênciadeBoyle,entãooatomismoforneceumaexplicaçãológicaesimplesparaosresultadosobtidos.Aexplicaçãodosresultadossemrecorreraátomosémuitomaisdifícil.

Apartir dessa altura, umnúmero cada vezmaior de cientistas começou a aderir ao atomismo,emboraaquestãoaindanãoestivessetotalmenteresolvida.(Voltaremosafalardesteassuntoadiante.)

OsElementosOsfilósofosgregosdaAntiguidadeinterrogaram-sesobreaquilodequeerafeitoomundo.Era

óbvio que era feito de muitas coisas diferentes, mas os cientistas sempre sentiram necessidade desimplificar.Existiapor issoosentimentodequeomundoerafeitodummaterialbásico(oudeapenasalgunsmateriaisbásicos)dequetudoorestoeramvariações.

Tales(ca.640-546a.C.)foioprimeirofilósofogregoquesesupõetersugeridoqueaáguaeraamatériabásicaapartirdaqualtudoeraformado.Umoutrofilósofo,Anaxímenes(570-500a.C.)achavaqueeraoar.Outroainda,Heraclito(ca.535-475a.C.)pensavaqueeraofogo,eassimpordiante.

Não havia maneira de decidir entre estas teorias porque não existiam dados concretos queapontassemnumadirecçãoounoutra.OfilósofogregoEmpédocles(495-435a.C.)resolveuoproblemacomumasoluçãodecompromisso.Afirmouqueomundoeraconstituídoporváriassubstânciasbásicas:fogo,ar,águaeterra.AestalistaAristótelesacrescentouoéter(termoderivadodumapalavragregaquesignifica"fulgor"),umasubstânciaespecialdequeseriamconstituídososcorposcelestesluminosos.

Nanossalíngua,designamosestassubstânciasbásicaselementos,termoquederivadumapalavralatina de origem desconhecida. (Ainda hoje, a propósito das tempestades, falamos na "fúria doselementos"paranosreferirmosàáguaquecaiembátegas,aoarquesopraformandoturbilhõeseaofogodequeparecemfeitososrelâmpagos.)

Paraaspessoasqueaceitavamaideiadaexistênciadediversoselementosequeeramatomistas,faziasentidosuporquecadaelementoeraconstituídoporumtipodiferentedeátomos,demodoqueomundoseriaconstituídoporquatrotiposdiferentesdeátomos,comumquintotipoparaoéter.

MesmocomapenasquatrotiposdeátomoserapossívelexplicaragrandevariedadedeobjectosexistentenaTerra.Bastavaimaginarqueasdiversassubstânciaseramconstituídasporcombinaçõesdumnúmero diferente de diferentes tipos de átomos em arranjos diversos. Afinal, é possível construircentenasdemilharesdepalavrasdiferentes,sónanossalíngua,utilizandoapenasvinteetrêsletras(outão-sódoissímbolos,umpontoeumtraço).

No entanto, a doutrina dos quatro (ou cinco) elementos começou a perder força no precisomomentoemqueoatomismoganhavaterreno.Em1661,Boylepublicouumlivro,TheSkepticalChemist(OQuímicoCéptico),ondedefendiaserinútiltentaradivinharquaisassubstânciasbásicasconstituintesdomundo.Asuaidentificaçãoteriaderesultardeexperiências.Qualquersubstânciaquenãopudesseserdecomposta em substâncias mais simples, por meio de manipulações químicas, era um elemento.Qualquersubstânciaquepudesseserreduzidaacomponentesmaissimplesnãoeraumelemento.

Era um princípio incontroverso, mas difícil de pôr em prática. A decomposição de certassubstânciasemalgomaissimplespodianãoserpossível,levandoaquefossemconsideradaselementos.Mais tarde, porém, talvez os avanços da químicapermitissemafinal decompô-la.Alémdisso, quandoumasubstânciaéconvertidanoutra,nemsempreéfácildecidirqualdasduasémaissimples.

Aindaassim,apartirdaépocadeBoyleeaolongodetrêsséculos,osquímicosesforçaram-sepor identificar substâncias que pudessem ser classificadas como elementos.Ouro, prata, cobre, ferro,estanho, alumínio, crómio, chumbo e mercúrio são exemplos de substâncias conhecidas que foramreconhecidascomoelementos.Sãotambémelementosgasescomoohidrogénio,azotoeoxigénio.Oar,a

água,aterraeofogonãosãoelementos.Conhecem-seactualmente106elementos.Destes,oitentaetrêsocorremnaturalmentenaTerraem

quantidades razoáveis e os restantes vinte e três existem somente em quantidadesmínimas ou apenasdepois de terem sido produzidos em laboratório. Isso significa que existem 106 tipos diferentes deátomos.

OTriunfodoAtomismoAmaioriadassubstânciasexistentesnaTerranãosãoelementos,podendoserdecompostasnos

elementos que as constituem.As substâncias constituídas a partir duma combinação de elementos sãodesignadascompostos(daexpressãolatinaquesignifica"pôrjunto").

Gradualmente,osquímicoscomeçaramainteressar-sepeladeterminaçãodaquantidadedecadaelementoexistentenumdeterminadocomposto.Apartirde1794,oquímicofrancêsJosephLouisProust(1754--1826)resolveuestudaroproblemaefezumadescobertafundamental.Existeumcompostoaquechamamos actualmente carbonato de cobre. Utilizando uma amostra pura dessa substância, Proustconseguiu decompô-la nos seus três elementos constituintes: cobre, carbono e oxigénio. Em 1799,descobriu que em qualquer amostra, independentemente domodo de preparação, havia sempre quatropartes(empeso)deoxigénioeumapartedecarbonoparacadacincopartesdecobre.Se,aoprepararcarbonato de cobre, acrescentasse mais cobre à mistura, o material adicional ficava por usar. Serealizasse aoperaçãocomumadeficiência emcobre, apenas se combinavamcomeste asquantidadesproporcionaisdeoxigénioecarbono,ficandoorestoporutilizar.

Em 1799, Joseph Louis Proust decompôs uma amostra pura duma substância nos seus trêselementos constituintes: cobre, carbono e oxigénio. Descobriu que em cada amostra utilizada, haviasemprequatropartes(empeso)deoxigénioeumapartedecobreparacadacincopartesdecobre.Oselementosatómicosqueconstituemumcompostoestãosemprepresentesemproporçõesdefinidas.

Proustdemonstrouqueomesmosepassavacomoutroscompostos,concluindoque,emqualquerumdeles,oselementosconstituintesestavamsemprepresentesemproporçõesdefinidas.Esteprincípioficouconhecidocomoaleidasproporçõesdefinidas.

Aleiconstituiuumargumentomuitoforteafavordoatomismo.Suponhamos,porexemplo,queocarbonatodecobreéconstituídoporpequenosgruposdeátomos(designadosmoléculas,dumaexpressãolatinaquesignifica"massapequena").Equecadagrupoécompostoporumátomodecobre,umátomodecarbonoetrêsátomosdeoxigénio.Suponhamosaindaqueostrêsátomosdeoxigénio,consideradosemconjunto, sãoquatrovezesmaispesadosdoqueoátomodecarbono,equeoátomodecobreécincovezesmaispesadodoqueoátomodecarbono.Secadamoléculadocompostoforconstituídaporessacombinaçãodeátomos,ocarbonatodecobreserásempreconstituídoporcincopartesdecobre,quatropartesdeoxigénioeumapartedecarbono.

Se fossepossível incluirnamolécula11/2átomosdecobre,ou31/3átomosdeoxigénio,ouapenas5/6dumátomodecarbono,asproporçõesdastrêssubstânciaspoderiamvariardeamostraparaamostradecarbonatodecobre.Todavia,asproporçõesnãosealteram.Estefactonãosósustentaaideiadeátomos,masaprópriasugestãodeDemócritodequeosátomossãoindivisíveis.Osátomosexistemcomoentidadesindivisíveis,ounãoexistem.

Entre Demócrito e Proust havia, contudo, uma diferença: Demócrito formulara apenas umahipótese; Proust obtiveraprovas. (Tal não significa, necessariamente, que Proust foi um homemmaissábio oumais importante do que Demócrito. Proust beneficiou de vinte e um séculos de reflexões etrabalhos em que se pôde basear.Até se poderia afirmar que ter sidoDemócrito capaz de acertar naverdadetãocedoconstituiuumfeitomuitomaisnotável.)

Mesmocomaevidênciaexperimental,Proustnãoconvenceulogotodososseuscontemporâneos.

Afinal,erasemprepossívelqueassuasanálisesestivessemerradas,ouqueeleestivessetãointeressadoemdemonstraras suas ideiasque, inconscientemente, falseasseasobservações. (Oscientistas tambémsãosereshumanoseessascoisasacontecem.)

Um outro químico francês, Claude Louis Berthollet (1748-1822), contestou Proust ponto porponto.Bertholletinsistiaqueassuasanálisesprovavamqueoscompostospodiamserconstituídosporelementosemproporçõesvariáveis.Em1804, todavia,oquímico sueco Jõns JakobBerzellius (1779-1848)fezumconjuntodeanálisesminuciosasquereforçaramaideiadeProusteprovaramàcomunidadequímicaquealeidasproporçõesdefinidasestavacorrecta.

Pelamesmaépoca,oquímicoinglêsJohnDalton(1766-1844)dedicava-seigualmenteaoestudodeste problema. Dalton descobriu que diferentes compostos podiam ser constituídos pelos mesmoselementos emproporçõesmuito diversas.Assim, numdeterminadogás commoléculas comcarbono eoxigénio, a proporção era de três partes de carbono para quatro partes de oxigénio. Noutro gásconstituídoigualmentepormoléculascomcarbonoeoxigénio,aproporçãoeradetrêspartesdecarbonoparaoitopartesdeoxigénio.Tratava-se,contudo,dedoisgasesdiferentes,compropriedadesdistintase,emcadaumdeles,aleidasproporçõesdefinidasaplicava-se.

Daltonsugeriuque,numdosgases,asmoléculaseramconstituídasporumátomodecarbonoeumátomodeoxigénio,enquantoquenooutrotinhamumátomodecarbonoedoisátomosdeoxigénio.Maistardeveioaconfirmar-sequeDaltontinharazãoeosgasesreceberamosnomesdemonóxidodecarbonoedióxidodecarbono,respectivamente.(Oprefixomon-vemdapalavragregaquesignifica"um",edi-dotermogregopara"dois".)

Oquímicoinglêsdescobriuquetaleraigualmenteverdadeironoutroscasose,em1803,enunciouofactosobaformadaleidasproporçõesmúltiplas.Daltonsublinhouquealeiestavadeacordocomanoçãodeátomo,efoielequemusouaexpressãoátomos,regressandodeliberadamenteaovelhotermocomohomenagemaDemócrito.

Daltou afirmouque, para explicar as proporçõesdos elementosnos compostos, era necessárioadmitirquecadaelementoeraconstituídoporumdeterminadonúmerodeátomos, todoscomamesmamassa fixa; que elementos diferentes tinham átomos de massas diferentes; e que as moléculas eramconstituídasporumnúmeropequenoeconstantedediferentesátomosindivisíveis.

Em 1808, Dalton publicou uma obra intitulada New System 0 /Clie-mical Philosophy (NovoSistemadeFilosofiaQuímica),ondereuniutodasasprovasqueconseguirarecolherequesustentavamoatomismo,mostrandocomotudofaziasentidoàluzdeste.Comoseulivro,Daltonestabeleceuasbasesdamodernateoriaatómica-aquechamamosmodernaporoposiçãoàteoriadosGregos.

Acontecequeotermoteorianãoéadequadamenteentendidopelopúblicoemgeral,quetendeapensarnuma teoriacomosedum"palpite"se tratasse.Osprópriosdicionáriosnãoexplicamde formacorrectaaquiloqueapalavrasignificaparaoscientistas.

Umateoriaconsiste,abemdizer,numconjuntoderegrasbásicas,sustentadasnumgrandenúmerodeobservaçõesconfirmadaspormuitoscientistas,queexplicamedãosentidoaumgrandenúmerodefactosque,semateoria,pareceriamnãoestarrelacionados.Écomoseosfactoseasobservaçõesfossemumconjuntodepontos,representandocidades,edelinhas,representandolimitesterritoriaisefronteiras,distribuídosaoacasonuma folhadepapel, sem fazeremsentidoalgum.Uma teoria serácomoqueummapaquecolocacadapontoecadalinhanolugarcertoeque,aouni-los,criaumaimagemqueemquetudofazsentidoeserelaciona.

Asteoriasnãoestãonecessariamentecorrectasemtodososseusdetalhes,epodemmesmonunca

estar totalmentecorrectas,masestãosuficientementecorrectas(seforemboasteorias)paraguiaremoscientistasnacompreensãodoassuntoqueéobjectodateoria,naexploraçãodenovasobservaçõeseaténoaperfeiçoamentodaprópriateoria.

Cada uma das regras básicas que Dalton enunciou na sua teoria atómica não estavaabsolutamentecerta.Maistarde,veioadescobrir-sequeumelementopodeserconstituídoporátomosdediferentesmassas,quedoiselementospodemteralgunsátomoscomamesmamassa,equenemtodasasmoléculassãoconstituídasporumpequenonúmerodeátomos.Noentanto,asregrasenunciadasporDaltonestavamsuficientementepróximasdaverdadeparaseremdeenormeutilidade.E,comoveremosadiante,àmedidaqueosquímicosforamaprendendomaisemaissobreosátomos,tiveramoportunidadedeascorrigir.

Nenhuma teoria científica é imediatamente aceite por todos os cientistas. Existem semprecientistasquesuspeitamdetudoaquiloqueconstituinovidade-oqueatépodeserpositivo.Asteoriasnãodevemseraceitescomdemasiadafacilidade.Bempelocontrário,háquequestioná--lasetestá-lasvigorosamente.Dessaforma,torna-sepossívelidentificarosseuspontosfracose,talvez,torná-losmaisconsistentes.

Alguns dos químicos mais eminentes da época de Dalton manifestaram grandes dúvidas emrelaçãoàsuateoria.Noentanto,elarevelou-setãoútilnacompreensãodasobservaçõesdaquímicaque,gradualmente,todosacabaramporaderiraelaeacomunidadecientíficaconverteu-seaoatomismo.

ARealidadedosÁtomosPor melhor que funcionasse a teoria atómica, por muito engenhosos que fossem os seus

aperfeiçoamentos e por mais que ela apontasse o caminho para novas descobertas, havia um factoperturbantequenãopodiaserignorado:ninguémeracapazdeverátomosoudeosdetectar,fossedequemodofosse.Todasasprovasafavordaexistênciadeátomoseramdenaturezaindirecta.Inferia-seasuaexistênciadedeterminadosfactos,deduzia-sequeosátomosexistiamdestaoudaquelaobservação.Noentanto, todas essas inferências e deduções podiam estar erradas.Aparentemente, construíra-se com ateoriaatómicaumesquemaquefuncionava,masquepodianãopassardumsimplesmodelodealgo,naverdade,muitomaiscomplexo.Amaneiradetrabalhardoscientistasnaqueletempoassemelhava-seaumjogo de póquer com fichas.As fichas podem ser usadas para fazer apostas e para indicar o dinheiroganhoouperdidoe,nessesentido, funcionamdeformaabsolutamenterigorosa.Masas fichasnão sãodinheiro.Apenassimbolizamodinheiro.

Suponhamosentãoque anoçãode átomosmaisnão édoquebrincar àquímica com fichas.Oatomismofunciona,masosátomos representamapenasumaverdademuitomaiscomplicada.Passadoscem anos sobre a descoberta de Dalton, havia ainda alguns químicos que, conscientes dessapossibilidade,aconselhavamprudentementeaquenãoselevasseosátomosdemasiadoàletra.Usem-nos,diziam,masnãopensemqueexistemnecessariamentesobaformademinúsculasbolasdebilhar.Umdoscientistasquepartilhavaestepontodevistaeraoquímicorusso--germânicoFriedrichWilhelmOstwald(1853-1932).

No entanto, a resposta a tal problema há muito que se desenhava. E tudo começou com umaobservação que parecia nada ter que ver com átomos, feita por um cientista que não estava nelesinteressado. (É importante recordar que o conhecimento constitui um todo e que qualquer observaçãopoderevelarumaligaçãosurpreendenteeinesperadacomalgoaparentementenãorelacionado.)

Avibraçãodumgrãodepólennaáguaresultadosmovimentosdasmoléculasdeáguainvisíveisqueorodeiam.

Em1827,obotânicoescocêsRobertBrown(1773-1858),aousarummicroscópioparaestudargrãos de pólen suspensos em água, reparou que estes se moviam ligeiramente e de forma errática,primeironumadirecçãoedepoisnoutradiferente,comoseestivessematremer.Browncertificou-sequeofenómenonãosedeviaàpresençadecorrentesnaáguaouàevaporaçãodesta,tendoconcluídoqueaorigemdetaismovimentostinhadeseralgodediferente.

Brownfezexperiênciascomoutrostiposdepóleneconfirmouqueemtodososcasososgrãossemoviamdaquelamaneira, interrogando-sesobresetalnãosedeveriaaofactodeestaremanimadosdevida.Resolveurepetiraexperiênciacomgrãosdepólenobtidosdeherbáriosequetinhampelomenosum século de idade. Também estes se comportavam daquela forma. Depois usou pequenos objectosinanimados-minúsculospedaçosdevidro,carvãooumetal-etodosrevelaramomesmocomportamentoerrático.Ofenómenoficouconhecidocomomovimentobrownianoe,deinício,ninguémsoubeexplicá-lo.

No terceiroquarteldoséculoXIX,porém,omatemáticoescocêsJamesClerkMaxwell (1831-1879)tentouexplicarocomportamentodosgasesapartirdaideiadequeosátomosemoléculasqueosconstituemestãoemconstantemovimento.Osprimeirosatomistas tinhamsuspeitadodaexistênciadum

talmovimento,masMaxwellfoioprimeiroaconseguirformularumateoriamatemática.Omodocomoosátomosemoléculasemmovimentofaziamricocheteunsnosoutrosenasparedesdorecipientequeoscontinha, talcomomodeladomatematicamenteporMaxwell,explicavaperfeitamenteocomportamentodosgases.Explicava,porexemplo,aleideBoyle.

DostrabalhosdeMaxwellresultoutambémumanovainterpretaçãodatemperatura,quepassouaser vista como uma medida da velocidade média a que se deslocavam os átomos e moléculas quecompunham,nãoapenasosgases,mastambémoslíquidoseossólidos.Mesmonossólidos,ondeátomosemoléculasestãofixosnassuasposiçõesenãosepodemdeslocardumpontoparaoutro,elesvibramemtornodumaposiçãomédiaeavelocidademédiadessavibraçãorepresentaatemperatura.

Em1902,oquímicosuecoTheodorSvedberg(1884-1971)feznotarqueomovimentobrownianopodiaserexplicadosupondoqueumobjectocolocadoemáguaerabombardeadodetodososladospormoléculasdeáguaemmovimento.Emgeral,essebombardeamentoserá igualde todosos ladose,porisso,osobjectospermanecememrepouso.Mas,pormeroacaso,podeacontecerserememmaiornúmeroasmoléculasqueatingemumobjectodedeterminadadirecçãodoquedoutras.Porém,onúmerototaldemoléculasqueoatingemétãograndequeumpequenodesviodumasituaçãodeigualdadeexacta(duasoutrêsmoléculasembiliões)nãoproduzqualquerdeslocaçãomensurável.

Todavia,seoobjectosuspensoemáguaformuitopequeno,onúmerodemoléculasqueoatingemde todos os lados é comparativamente pequeno e, por isso, um pequeno desvio pode ter um efeitocomparativamenteimportante.Apartículareageaoempurrãodealgumasmoléculasadicionaisvindasdedeterminadadirecção,deslocando-seligeiraebruscamentenessadirecção.Nomomentoseguinte,surgemcolisõesadicionaisdoutradirecção,eapartículaéempurradaparaesselado.Apartículadesloca-sedeformaerrática,emrespostaaomovimentoaleatóriodasmoléculasquearodeiam.

Svedberg limitou-se a especular mas, em 1905, o matemático ger-mano-suíço Albert Einstein(1879-1955) aplicou a teoria deMaxwell ao bombardeamento pormoléculas de pequenas partículas,demonstrandodeformaconclusivaqueestassecomportavamexactamentecomoforaobservadonocasodos grãos de pólen. Por outras palavras, apresentou um conjunto de equações matemáticas quedescreviamomovimentobrowniano.

Em1908,ofísicofrancêsJeanBaptistePerrin(1870-1942)resolveuconfrontarasequaçõesdeEinstein com observações experimentais. Colocou sobre água um fino pó de goma-resina. Se nãoexistisse um bombardeamento por parte das moléculas de água, todas as partículas de goma-resinadeveriammergulharatéaofundodorecipienteeaípermanecer.Casocontrário,algumasdaspartículasseriamempurradasparacima,contrariandoaatracçãodagravidade.Taispartículasvoltariamaassentar,masseriamdenovoimpelidasparacima.Ealgumasdasquejáestavamemsuspensãoseriamempurradasparacimamaisainda.

Em qualquer momento, existiria uma distribuição vertical das partículas de goma-resina. Amaioria estaria no fundodo recipiente,masvárias estariamapequenadistânciadeste, algumas aumadistânciaumpoucomaioremenosaindaaumadistânciasuperior.

A equação matemática fojrmulada por Einstein permitia calcular o número de partículas quedeviam ser encontradas a determinadadistânciado fundo, em funçãodadimensãodaspartículas e dadimensão das moléculas de água que com elas colidiam. Perrin contou o número de partículasencontradasadiferentesdistânciaseverificouqueobedeciamrigorosamenteàequaçãodeEinstein.Apartirdaícalculouadimensãodasmoléculasdeáguaedosátomosqueasconstituíam.

Perrin publicou os seus resultados em 1913.Os átomos, segundo os seus cálculos, tinham umdiâmetrocorrespondenteacercadacentésimamilionésimapartedumcentímetro.Ditodoutromodo:uma

fieiracom100milhõesdeátomoscolocadosladoaladoteriaumcentímetrodecomprimento.Estaexperiênciafoiaquiloquemaisseaproximoudumaobservaçãodirectadeátomos.Seestes

nãopodiamservisualizados,erapossívelpelomenosobservarosefeitosdassuascolisõese,apartirdaí, calcular as respectivas dimensões.Os cientistasmais reticentes tiveram de dar o braço a torcer.MesmoOstwaldadmitiuqueosátomoseramreaisenãoapenasmodelosde"faz-de-conta".

Em1936,ofísicoalemãoErwinWilhelmMueller(1911-1977)imaginouumdispositivocapazdeampliarapontadumaagulhamuitofinadetalmaneiraquefossepossíveltirarfotografiasemqueeramvisíveisosátomosqueaconstituíam,alinhadoscomopequenospontosluminosos.Porvoltade1955,taisátomospuderamserrealmentevisualizados.

Aindaassim,aspessoascontinuamafalaremteoriaatómica,porqueédissomesmoquesetrata-dummapaintelectualdedomíniosmuitovastosdaciênciaquepodemserexplicadosdumaformaprecisae elegante pela existência de átomos. Uma teoria, recordo, não é um "palpite", e nenhum cientistacompetenteenoseuperfeitojuízoduvidadaexistênciadeátomos.(Esteaspectodaprovadaexistênciadeátomostambémseaplicaaoutrasteoriascientíficasbemestabelecidas.Ofactodeseremteoriasnãoas torna incertas,mesmoquandodiversospormenoressãoainda temadediscussãoentreoscientistas.Isso é particularmente verdadeiro no caso da teoria da evolução, que é constantemente atacada porpessoas que são ignorantes do ponto de vista científico ou, pior ainda, que permitem que as suassuperstiçõessesobreponhamaosconhecimentosquepossamteradquirido.)

AsDiferençasentreosÁtomosParece razoável supor que, se existem diferentes tipos de átomos, eles devem apresentar

diferenças nas suas propriedades. Se tal não sucedesse, e se todos os átomos tivessem as mesmaspropriedades,porquerazãohaveriamalgunsderesultaremouroeoutrosemchumbo,quandoreunidos?

A maior façanha intelectual dos Gregos na Antiguidade foi o desenvolvimento duma formarigorosadegeometria.Porisso,eranaturalquealgunspensassememformasquandoreflectiamsobreosátomosqueconstituíamosseus"elementos".ParaosGregos,osátomosdeáguapodiamserconcebidoscomocorposesféricosquedeslizavamunssobreosoutroscomfacilidade,razãopelaqualaáguapodiaservertidadumrecipienteparaoutro.Osátomosdeterraseriamcúbicoseestáveiseporissoaterranãofluía como a água.Os átomos de fogo eramdenteados e tinhamarestas afiadas, o que tornava o fogodoloroso.Eassimpordiante.

AideiadequeumtipodeátomonãosetransformavanoutrotambémaindanãoestavaclaranasmentesdosGregos.Issoeraespecialmenteverdadeseconsiderarmosqueoouroeochumboconstituíamduasvariedadesdoelementoterra.Talvezbastassesepararosátomosdeterranochumboerearranjá-losdoutraforma,oumodificá-losligeiramente,paraobterouro.

Durante cerca de dois mil anos, diversas pessoas, algumas bem intencionadas e com espíritocientífico,masnasuamaioriaaldrabõesecharlatães,procuraramtransformarmetaisdepoucovalor,taiscomoochumbo,nometalnobreouro.Esteprocessofoidesignadoportransmutação,daexpressãolatinaquesignifica"mudardelugar".Nuncaninguémfoibemsucedido.

ParaosGregosdaAntiguidade,osátomosdeáguapodiamserencaradoscomocorposesféricosquedeslizavamfacilmenteunssobreosoutros,razãopelaqualerapossívelverteraágua.

Umavez elaborada amoderna teoria atómica, tornou-se claro não apenas que os átomos eramdiferentes uns dos outros, mas que não se podiam transformar uns nos outros. Cada átomo apresentapropriedadesfixasepermanentese,porisso,umátomodechumbonãopodeserconvertidonumátomodeouro.(Maistarde,comoveremos,descobrir--se-iaquenãoerabemassim,masapenasemcondiçõesmuitoespeciais.)

Mas se diferentes tipos de átomos diferem uns dos outros, em que consiste exactamente essadiferença?Daltonraciocinoudoseguintemodo:seumamoléculadeáguaéconstituídaporoitopartesdeoxigénioparaumapartedehidrogénio, e se amolécula é constituídaporumátomodeoxigénio eumátomodehidrogénio,entãooátomoindividualdeoxigéniopesaoitovezesmaisqueoátomoindividualdehidrogénio. (Parasermosmaisprecisos,devíamosdizerqueoátomodeoxigénio temuma"massa"oitovezessuperiorà"massa"doátomodehidrogénio.OpesodumobjectorepresentaaforçacomqueaTerra o atrai, enquanto que a suamassa corresponde, grossomodo, à quantidade de matéria que elecontém.Dosdoisconceitos,odemassaéomaisfundamental.)

E claro queDaltonnão tinhamaneira de saber qual era amassa dos átomosde hidrogénioouoxigéniomas,fossequalfosseoseuvalor,adosegundoeraoitovezessuperioràdoprimeiro.Ora,sedissermosqueoátomodehidrogénio temumamassade1, semdizer1dequê,é lícitoafirmarqueoátomode oxigénio temumamassa de 8. (Na verdade, dizemos actualmente que amassa do átomodehidrogénioéde1dalton,emhomenagemaocientista,masgeralmentediz-seapenas1.)

Dalton estudou outros compostos com diferentes elementos e deduziu um sistema de númerosrepresentandoasmassas relativasde todos.Chamou-lhespesosatómicos,eadesignaçãoaindahojeéusada,emboradevêssemosfalaremmassasatómicas.(Éfrequenteoscientistascomeçaremporutilizarumdeterminadotermoe,temposdepois,concluíremqueoutroseriamaisadequado.Masnessaalturaédemasiadotardeparamudarporqueaspessoasjásehabituaramàpalavramenosapropriada.Aolongodolivro,encontraremosoutrassituaçõesdestetipo.)

OproblemadométodousadoporDaltonparadeterminarospesosatómicosresidenofactodeletersidoobrigadoapartirdepressupostosquefacilmentepodiamestarerrados.Daltonconsiderava,porexemplo,queamoléculadeáguaeraconstituídaporumátomodehidrogénioeumátomodeoxigénio,masnãotinhaquaisquerprovasdisso.

Emsituaçõesdestas,asprovassãoessenciais.Em1800,oquímicobritânicoWilliamNicholson(1753-1815)fezpassarumacorrenteeléctricaatravésdeáguaacidulada,obtendobolhasdehidrogénioedeoxigénio.Oestudodestefenómenopermitiuconcluirqueovolumedehidrogénioformadoeraduplododeoxigénio,emboraamassadeoxigéniolibertadofosseoitovezessuperioràdovolumeduplodehidrogénio.

Porquerazãoéqueeraproduzidoodobrodovolumedehidrogénio?Seriaporqueamoléculadeáguaeracompostapordoisátomosdehidrogénioeumátomodeoxigénio,emvezdeconterapenasumátomodecadatipo?Seriapossívelqueoátomodeoxigéniofosseoitovezesmaispesadodoqueambosos átomosdehidrogénio, oudezasseis vezesmaispesadodoqueumúnico átomodehidrogénio?Poroutraspalavras,seopesoatómicodohidrogénioera1,seriaopesoatómicodooxigénio16enão8?

Dalton recusou-seaaceitar esta ideia. (Acontecemuitasvezesumgrandecientistaquedeuumgigantescopassoemfrenterecusar-seadarospassosseguintes-comoseesseesforçoinicialotivesseesgotado-deixandoaoutrosatarefadeprosseguiremfrente.)

Neste caso, foiBerzelius quemdeu o passo seguinte, atribuindo ao hidrogénio o valor 1 e aooxigénioovalor16.Estecientistaestudouigualmenteoutroselementose,em1828,publicouumatabeladepesosatómicosmuitomelhordoqueaquelaqueforaelaboradaporDalton.OtrabalhodeBerzeliustornouclaroquecadaelementotinhaumpesoatómicodiferente,equetodososátomosdumdeterminadoelemento apresentavam o mesmo peso atómico. (Devo recordar de novo aos meus leitores que taisconclusões se viriama revelar não inteiramente correctasmas que, na altura, estavam suficientementecertas para terem sido da maior utilidade durante quase um século. À medida que foi crescendo oconhecimento, essas concepções foram sendo modificadas dum modo que alterou ligeiramente, efortaleceu consideravelmente, a teoria atómica.O aperfeiçoamento das teorias é um fenómeno que serepetevezessemcontanaciênciaequeconstituimotivodeorgulhoparaoscientistas.Suporqueissonãodevia acontecer e que as teorias deviam estar absolutamente correctas desde o início é omesmoqueimaginarqueumaescadaqueseestendeporcincoandaresdeviaserconstituídaporumúnicodegraucomaalturadoscincoandares.)

Dissemos atrás que o volume de hidrogénio produzido quando a água é decomposta nos seuselementosconstituintespelapassagemdumacorrenteeléctricaéduplodovolumedeoxigénio.Comoéque,apartirdaqui,deduzimosqueemcadamoléculadeáguaexistemdoisátomosdehidrogénioparaumapenas de oxigénio? Parece razoável supor tal coisa, mas Berzelius não estava absolutamente certo.Também aqui se tratava duma suposição, embora existissem mais indícios a suportá-la do que àsuposiçãodeDalton.

Em1811,ofísicoitalianoAmedeoAvogadro(1776-1856)apresentouumaconjecturadenaturezamais genérica, sugerindo que, para qualquer gás, um determinado volume contém sempre idêntico

númerodemoléculas.Seumgásocuparumvolumeduplodeoutro,oprimeirotemodobrodemoléculasdosegundo.EstaconjecturaficouconhecidacomohipótesedeAvogadro.(Umahipóteseéumasuposiçãoporvezesavançadaparaavaliarquaisseriamasconsequênciasdasuaaceitação.Seasconsequênciasestiverememcontradiçãocomobservaçõesconhecidas,ahipóteseestáerradaepodeserdescartada.)

Quando um cientista competente avança uma hipótese que pensa poder estar correcta, existemnaturalmente francas possibilidades da mesma se vir a revelar verdadeira. Uma forma de testar ahipótese de Avogadro, por exemplo, consiste em estudar um grande número de gases e determinar onúmerodediferentes tiposdeátomosexistentesnas respectivasmoléculas,admitindoqueahipóteseéverdadeira.

Seprocedêssemosdessemodoeacabássemosporviolarobservaçõesconhecidasouporproduziruma contradição - por exemplo, se um raciocínio baseado na hipótese revelasse que determinadamolécula tinha de apresentar determinada composição atómica e outro raciocínio sugerisse umacomposiçãoatómicadiferente-ahipótesedeAvogadroteriadeserabandonada.

Atéhoje,ninguémencontroucasoalgumemqueahipótesedeAvogadroestivesseemcontradiçãocomasobservaçõese,por isso,ela jánãoéconsideradaumahipótesemasumfacto,emboraexistamcondiçõesemquetemdesermodificada.Continua,noentanto,aserdesignadahipótesedeAvogadro,porqueosquímicossehabituaramachamá-laassim.

Todavia,quandoAvogadropropôsasuahipótese,poucosforamosquímicosquelheprestaramqualquer atenção. Não tinham ouvido falar nela, ou consideraram-na ridícula ou irrelevante. MesmoBerzelius não se serviu da hipótese, o que fez com que a sua tabela de pesos atómicos apresentassealgunserros.

Em1858,porém,oquímicoitalianoStanislaoCannizzaro(1826-1910)ouviufalarnahipótesedeAvogadro e compreendeu que ela era aquilo que faltava para determinar quantos átomos de cadaelementoexistiamnumcompostoeparaobterosvalorescorrectosdosrespectivospesosatómicos.

A leideAvogadro: igualvolumedequaisquergases sob idênticas condiçõesde temperatura epressãocontêmigualnúmerodemoléculas.Porexemplo,podesernecessário0,1gramadehidrogéniogasosoparaencherobalãodumacriança.Seriamnecessárioscercade1,6gramasdeoxigéniogasosopara encher um balão idêntico domesmo tamanho, mas ambos os balões contêm aproximadamente omesmonúmerodemoléculas.

Em1860,tevelugarumgrandecongressointernacionaldequímica(foioprimeirodogénero),noqual participaram cientistas de toda a Europa. Aí, Cannizzaro explicou a hipótese de forma muitoconvincente.

Talfactoreforçouimediatamenteanoçãodepesoatómico.Porvoltade1865,oquímicobelgaJean-Servai Stas (1813-1891) publicou uma nova tabela de pesos atómicos que eramelhor que a deBerzelius. Quarenta anos mais tarde, o químico norte-americano Theodore William Richards (1868-1928)fezobservaçõesaindamaisprecisaseobteveosmelhoresvaloresalgumavezalcançadosantesde(como veremos) toda a questão dos pesos atómicos ter sido modificada em resultado de novasdescobertas.NaépocadeRichardsjáseatribuíamPrémiosNobel,eelerecebeuodaquímicaem1914peloseutrabalhonadeterminaçãodepesosatómicos.

Oelementocomopesoatómicomaisbaixoéohidrogénio.Seaoseupesoatómicoatribuirmosarbitrariamenteovalor1,entãoopesoatómicodooxigénioéligeiramenteinferiora16.(Ofactodenãoser exactamente 16 é uma questão que abordaremos mais à frente.) Contudo, o oxigénio combina-sefacilmentecomdiversosoutroselementos,sendomuitomaisfácilcompararopesoatómicodequalquer

elemento com o do oxigénio do que com o do hidrogénio. É, por isso, conveniente atribuir ao pesoatómico deste elemento umvalor que corresponda a umnúmero inteiro.Esse valor não deverá ser 1,porque isso faria com que sete elementos tivessem pesos atómicos inferiores à unidade, o que seriapoucopráticodopontodevistadoscálculosquímicos.

Tornou-se,assim,habitualatribuiraopesoatómicodooxigénioexactamenteovalor16,oquefazcomqueopesoatómicodohidrogéniosejaligeiramentesuperiora1.Talsignificatambémquenenhumelementotemumpesoatómicoinferiora1.FoidestemodoqueStasconstruiuasuatabela,estabelecendoum modelo que seria seguido a partir daí. (No entanto, a situação alterou-se ligeiramente em anosrecentes,porrazõesqueserãoadianteexplicadas.)

Seoselementosforemapresentadosporordemcrescentedosrespectivospesosatómicos,torna-sepossíveldispô-losnumatabelabastantecomplexaquemostracomoalgumasdassuaspropriedadesserepetem periodicamente. Se os elementos forem disposto correctamente na tabela, os elementos compropriedades semelhantes pertencem a umamesma coluna.A tal tabela chamou-se tabela periódica, euma versão praticável da mesma foi primeiro apresentada pelo químico russo Dmi-tri IvanovichMendeleev(1834-1907)em1869.

Inicialmente, a tabela periódica apresentava um carácter bastante provisório, uma vez queMendeleevnãoconhecia todososelementos.Muitosaindanão tinhamsidodescobertos.Aoordenaratabelademodoaqueelementossemelhantesestivessemnascolunasadequadas,Mendeleevfoiobrigadoa deixar algumas posições por preencher. Ele teve a intuição de que elas correspondiam a elementosainda por descobrir e, escolhendo três dessas posições, anunciou em 1871 as propriedades doselementos por descobrir, que descreveu em pormenor. Por volta de 1885, os três elementos foramdescobertos e as previsões de Mendeleev revelaram-se correctas em cada um dos casos. Esseacontecimento constituiu uma provamuito forte de que a tabela periódica era um fenómeno legítimo,embora ninguém fosse capaz de explicar o porquê da sua razão de ser. (Voltaremos adiante a esteassunto.)

2.LUZ

PartículaseOndasSe estivermos preparados para admitir que toda a matéria é composta por átomos, então é

razoávelinterrogarmo-nossobreseexistealgumacoisanomundoquenãosejamatériaeque,porisso,nãosejaconstituídaporátomos.Aprimeirapossibilidadequenospoderáocorreréaluz.

Desdesemprepareceuóbvioquea luzé imaterial.Podemos tocarnossólidose líquidos:elestêmmassa(e,portanto,peso)eocupamespaço.Osgasesnãopodemserpercepcionadosdomesmomodoque os sólidos e líquidos,mas um gás emmovimento pode. Todos já experimentámos a sensação deventos fortes e sabemos perfeitamente o que um tornado pode fazer. O ar também ocupa espaço. Semergulharmosumcopo invertidovazio (na realidadecheiodear)num tanquedeágua, estanãoenchecompletamenteocopo,anãoserquedeixemosoarescapar-se.Em1643,ofísicoitalianoEvangelistaTorricelli (1608-1647)demonstrouqueoar tinhapesoequeessepesopodia suportarumacolunademercúriocom76centímetrosdealtura.

Aluz,porém,nãoapresentanenhumadestaspropriedades.Nãoapodemostactear,emborasejapossívelsentirocalorqueelaproduz.Nuncasedetectouquetivessemassaoupesoperceptíveis.Enãopareceocuparespaço.

Talnão significa,noentanto,quea luz,por ser imaterial, fosse consideradapouco importante.SegundoaBíblia,asprimeiraspalavrasproferidasporDeusforam:"Queexistaaluz!"Alémdisso,soba designação de fogo, constituía o quarto dos antigos elementos terrenos, a par dos três elementosmateriais-ar,águaeterra.

A luz solar foinaturalmenteconsiderada luzna sua formamaispura.Tratava-sede luzbranca,imutáveleeterna.Fazendoaluzatravessarumvidrocolorido,elaadquiriaacordovidro,mastaleraconsiderado uma impureza terrena. Quando os corpos ardiam na Terra e emitiam luz, esta podia seramarela, laranja ou vermelha. Nalguns casos, a luz podia mesmo tornar-se verde ou azul se fossemadicionadosaofogocertospós.Contudo,tambémaquieramimpurezasterrenasqueproporcionavamtaiscores.

A única entidade colorida que parecia nada ter de terreno era o arco--íris, suficientementedeslumbranteparadarorigemamitoselendas.Pensava-sequeeraaponteentreoCéueaTerra,umapontequeseriautilizadapelosmensageirosdivinos.(Omensageirodosdeusestem,namitologiagrega,onomedeíris,queéapalavragregapara"arco-íris".)Oarco-íriseratambémumagarantiadivinadequeomundonuncamais seriadestruídoporumdilúvio,aparecendono finaldas tempestadespara indicarqueDeusselembraradoshomensepararaachuva.

Em1665,todavia,ocientistainglêsIsaacNewton(1642-1727)produziuelemesmoumarco-íris.Newtonfezentrarumfeixedeluznumasalaàsescurasatravésdumorifícionumapersianaepassou-oatravés dum objecto triangular tridimensional de vidro chamado prisma.O feixe de luz dispersou-se,dando origem a uma banda de cores na parede branca situada no fundo da sala. As cores eram overmelho,laranja,amarelo,verde,azulevioleta,porestaordem-precisamenteaordememqueocorremnoarco-íris.

Oarco-íris,sabemo-loactualmente,éprovocadopelapassagemdaluzsolaratravésdasinúmerasgotículas de água que permanecemno ar após uma chuvada. Tais gotículas têm sobre os raios de luzefeitoidênticoaodoprismadevidro.

Pareciaentãoquealuzsolarnãoera,afinal,luz"pura".Asuabrancuraerasimplesmenteoefeitoproduzidonoolhoporumamisturadetodasaquelascores.Fazendoaluzpassarporumprismaedepoisporumprismacolocadonaposiçãoinversa,erapossívelfazercomqueascoressejuntassemoutravez,produzindodenovoluzbranca.

Uma vez que tais cores eram manifestamente imateriais, Newton resolveu chamar à bandacolorida espectro, da palavra latina para "fantasma".No entanto, o espectro deNewton colocava umproblema.Paraasdiferentescoressesepararemàpassagempeloprisma,Newtonachavanecessárioqueasuatrajectóriahabitualemlinharectafossecurvada(refractada)nomomentoemqueentravamesaíamdovidro.Cadacorseriaflectidademododiferente(curvaturamínimanocasodovermelhoemáximanocasodovioleta),paraquehouvesseseparaçãoeascoresficassemindividualmentevisíveisquandoaluzatingia aparede.Mas se as coisas sepassavamassim,dequeera feita a luz eoque explicavaa suaseparaçãoeaproduçãodumespectro?

SendoNewtonumatomista,eranaturalquelheocorresseaideiadequealuzeraconstituídaporpequenaspartículas, semelhantes aosátomosdematéria, comadiferençaqueaspartículasde luznãotinhammassa.Newtonnãopossuía,noentanto,umanoçãoclarasobreomodocomoaspartículasdeluzsedistinguiamumasdasoutrasearazãopelaqualalgumaserammaisrefractadasporumprismadoqueoutras.

Alémdisso,quandodois feixesde luzsecruzavam,nenhumeraafectadopelooutro.Seambosfossemconstituídosporpartículas,nãodeviamelascolidireressaltarumadasoutrasdemodoaleatório,tornandoofeixepouconítidoemaisdispersoapósascolisões?

OfísicoholandêsChristiaanHuygens(1629-1695)apresentouumasugestãoalternativa.Paraele,aluzeraconstituídaporpequenasondas.Em1678,demonstrouqueumconjuntodeondaspodiaavançarsegundoumalinharecta,talcomoumfeixedepartículas,equedoisfeixesconstituídosporondaspodiamcruzar-sesemqueumperturbasseooutro.

Oproblemadestahipóteseondulatóriaestavaemqueaspessoaspensavamemondasdotipodasqueseproduzemnaáguaquandodeixamoscairumapequenapedranumlago:àmedidaqueasondasdeágua se expandem, tendem a circundar um obstáculo como, por exemplo, um pedaço de madeira(difracção)eaunir-sedenovodooutrolado.Masseassimfosse,asondasluminosasdeviamtornearosobstáculosenãoproduzirsombrasou,então,produzirsombrasdecontornospouconítidos.Contudo,ecomoéconhecido,aluzdáorigemasombrasbemdefinidasseafonteluminosaforpequenaeconstante.Ora, tais sombras de contornos bem nítidos são exactamente aquilo que seria de esperar se a luzconsistissenumfeixedeminúsculaspartículas.EstefactofoiporissoconsideradoumargumentomuitofortecontraahipóteseondulatóriadeHuygens.

EinteressantereferirqueofísicoitalianoFrancescoMariaGrimaldi(ca.1618-1663)notaraqueum feixe de luz passando através de duas aberturas estreitas, uma a seguir à outra, se dispersavaligeiramente,oqueindicavaumapequeníssimadifracçãoàpassagempelosorifícios.AsobservaçõesdeGrimaldi foram publicadas em 1665, dois anos após a sua morte, mas passaram despercebidas. (Naciência,comoemmuitosoutrosempreendimentoshumanos,descobertasouacontecimentos importantesperdem-seporvezesnaconfusão.)

Huygens, contudo, mostrou que se a luz fosse constituída por ondas, podia muito bem incluirondas com diferentes comprimentos. As parcelas de luz com as ondas maiores seriam as menosrefractadas.Quantomais curtas fossemas ondas,maior seria a sua refracção.Desta forma tornava-sepossívelexplicaroespectro,considerandoqueovermelhotinhaasondasmaislongasequeolaranja,amarelo, verde e azul eram constituídos por ondas sucessivamente mais curtas, correspondendo ao

violetaoscomprimentosdeondamaiscurtos.Emtermosglobais,eolhandoretrospectivamenteparaaquestão,verificamosquepertenciama

Huygensosargumentosmaisfortes.MasareputaçãodeNewtonestavaacrescerrapidamente(eleera,semdúvida,omaiorcientistaquealgumavezvivera)etornava-seporissodifícildefenderumaposiçãocontrária à sua. (Os cientistas, sendo tão humanos como qualquer outra pessoa, deixam-se por vezesinfluenciarnãoapenaspelalógicamastambémpelaspersonalidades.)

Foiassimque,aolongodoséculoXVIII,amaioriadoscientistasaceitouaideiadequealuzeraconstituídaporpequenaspartículas.Talpoderáterajudadoàdisseminaçãodasconcepçõesatomistasdamatéria.E,àmedidaqueoatomismoseconsolidava,reforçavaporsuavezahipótesecorpusculardaluz.

Em 1801, todavia, o físico inglês Thomas Young (1773-1829) levou a cabo uma experiênciacrucial.Deixouquealuzincidissesobreumasuperfícieondeexistiamduasranhurasmuitopróximasumadaoutra.Cadaranhurafuncionavacomofontedumconedeluz,eosdoisconesproduzidossobrepunham-seantesdeatingiremumecrã.

Sealuzfosseconstituídaporpartículas,azonaondeexistiasobreposi-,çãodeveriareceberoimpactedepartículasprovenientesdasduasranhurase,porisso,apresentar-semaisiluminadadoqueaszonasqueapenasrecebiampartículasdumaououtradasranhuras.Masascoisasnãosepassaramassim.Aquilo que Young verificou foi que a zona de sobreposição consistia numa série de bandasalternadamentemaisclarasemaisescuras.

Parecianãohaverformadeexplicarestefenómenorecorrendoàhipótesecorpuscular.Admitindoaexistênciadeondas,pelocontrário,oproblemadesaparecia.Seasondasoriundasdumadasranhurasestivessememfasecomasoriundasdaoutraeassimsemantivessem,osaltosebaixos(ouospicoseconcavidades)dumconjuntodeondasseriamreforçadospelosdooutro,eaoscilaçãodosdoisconjuntoscombinadosseriamaisfortedoqueadequalquerumdelesindividualmente.Aluminosidadeaumentaria.

Em1801,ThomasYoung realizouumaexperiênciaemque fez incidir luz sobreumasuperfíciecontendo duas ranhuras muito próximas. Os cones de luz saídos de cada uma incidiam sobre umasuperfície,sobrepondo-se,edandoproduzindoumpadrãodebandasalternadamentemaisclarasemaisescuras.Nãopareciahaverformadeexplicarestefenómenorecorrendoàhipótesecorpuscular.

Pelocontrário,seasondasprovenientesdumadasranhurasnãoestivessememfasecomassaídasda outra - se um conjunto de ondas subisse enquanto o outro descia (ou se um apresentasse um picoquandoooutro tinhaumaconcavidade)-asduasondascancelar-se-iam,pelomenosparcialmente,easuacombinaçãoseriamaisfracadoquecadaumaindividualmente.Aluminosidadediminuiria.

Young conseguiu mostrar que, nas condições da sua experiência, os dois conjuntos de ondasestavamemfasenumaregião,foradefasenaregiãoseguinte,denovoemfasenaquese lheseguia,eassim por diante, alternadamente. As bandas claras e escuras que se observavam eram exactamenteaquiloqueseriadeesperardocomportamentodasondas.

Uma vez que um conjunto de ondas interfere com, e cancela, o outro conjunto em pontosespecíficos,asbandassãoconhecidascomopadrõesdeinterferência.Taispadrõesdeinterferênciasãoobservadosquando,numasuperfíciedeáguaemrepouso,umconjuntodeondasse justapõeaoutro.Ofenómenotambémseobservaquandodoisfeixesdesom(quesesabeseremconstituídosporondas)seintersectam.AnaturezaondulatóriadaluzpareciaassimtersidodemonstradaatravésdaexperiênciadeYoung(embora,comoseriadeesperar,talnãosignificassequeospartidáriosdaconcepçãocorpuscularsetinhamrendidofacilmente-porquenãoofizeram.)

Eraatépossível,apartirda larguradasbandasde interferência,calcularocomprimentoduma

única onda de luz (comprimento de onda). Verificou-se que as ondas luminosas apresentavamcomprimentosdaordemdosI/20000centímetros.Ocomprimentodeondadaluzvermelhaeraumpoucomaiordoqueisso,enquantoqueodaluzvioletaeraumpoucomenor.Talsignificaqueumraiodeluzcomcercadedoiscentímetrosemeiodecomprimentotemaproximadamente50000ondasdumextremoao outro. E que é possível colocar cerca de cinquenta átomos lado a lado, ao longo dum únicocomprimentodeondadeluz.

Fica assim explicado por que razão a luz, apesar de ser constituída por ondas, dá origem asombrasbemdefinidas.Asondassótorneiamosobstáculosquandoestesnãosãomuitomaislongosdoqueelas.Umaondanãocircundanadaquesejasubstancialmentemaislongodoqueoseucomprimento.Asondassonorassãomuitolongase,porisso,podemrodearamaioriadosobstáculoshabituais.

Noentanto,praticamentetudoaquiloqueconseguimosverémuitomaislongodoqueumaondaluminosa,peloqueofenómenoreferidoquasenãoocorreeassombrasproduzidassãobemdefinidas.Ele existe, ainda assim, de modo quase imperceptível, quando os objectos são bastante pequenos e,nessescasos,oslimitesdasombratendemamostrar-seumtantoouquantodifusos.ÉissoqueexplicaoefeitodedifracçãoqueGrimaldidescobrira130anosantesdeYoung.

Contudo,aquestãodaluznãoficaraaindaresolvida.Aspessoasconheciamdoistiposdeondas.Asondasdeágua,quesepropagamradialmenteeemqueaspartículasdeáguasemovemparacimaeparabaixonumadirecçãoperpendicularàdirecçãodepropagaçãodaonda.Essasondaseramchamadastransversais.Easondassonoras,quetambémsepropagamradialmentemasondeaspartículasdearsemovemparadentroeparafora,numadirecçãoparalelaàdirecçãodepropagaçãodaonda.Estasondaseramchamadaslongitudinais.

1.Asondasdeáguapropagam-seradialmenteeaspartículasdeáguamovem-separacimaeparabaixonumadirecçãoperpendicularàdirecçãodepropagaçãodaonda.Aestetipodeondaschamamosondastransversais.

2.Asondassonorastambémsepropagamradialmente,masaspartículasdeardeslocam-separadentro e para fora numa direcção paralela à direcção de propagação da onda. A este tipo de ondaschamamosondaslongitudinais.

De que tipo seria o comportamento das ondas luminosas? Quando propusera a hipóteseondulatória,Huygenspensaraque,sendoaluzeosomorigemdepercepções,deviamterumanaturezasemelhante.Uma vez que se sabia que o som resultava de ondas longitudinais, sugerira que a luz eraconstituída por ondas domesmo tipo.Young pensava domesmomodo, quando demonstrou a naturezaondulatóriadaluz.

Porém, vários anos antes, em 1669, o cientista dinamarquês Erasmus Bartholin (1625-1698)recebera da Islândia um cristal transparente dum material actualmente designado como espato daIslândia.E reparara queos objectos, quandovistos através dele, davamorigema umadupla imagem.Bartholinconcluíraquealuz,aoatravessarocristal,eraretractadasegundodoisângulosdiferentes,peloque uma parte dela emergia num determinado ponto e a restante num ponto ligeiramente diferente,produzindoumaimagemdupla.

Bartholinfoiincapazdeexplicararazãodeserdetalfenómeno,talcomoNewtonouHuygens.E,por isso, ele foi posto de lado e temporariamente considerado inexplicável. (Nem tudo pode serexplicadoemdeterminadoestádiodoconhecimento.Aatitudemaissensataconsisteemexplicaraquiloquepodeserexplicadoeesperarque,comoavançodoconhecimento,chegueodiaemqueaquiloqueétemporariamenteinexplicávelpodetambémserexplicado.)

Em1817,Youngcompreendeuqueaduplarefracçãonãopodiaserfacilmenteexplicadasealuzfosse constituída por partículas ou ondas longitudinais, mas sê-lo-ia admitindo que a luz eram ondastransversais.

OfísicofrancêsAugustinJeanFresnel(1788-1827)adoptouestepontodevistaelevouacaboumestudoteóricoaprofundadoecuidadosodaluzenquantofenómenoconsistindoemondastransversais,umainvestigaçãoquepermitiuexplicartudooquenaépocaseconheciaacercadocomportamentodaluz.O seu trabalho esclareceu de vez a questão. Durante os oitenta anos que se seguiram, os físicoscontentaram-secomaideiadequealuzconsistiaempequenasondastransversaisequenadamaishaviaparacompreender.

OsQuatroFenómenosRaramente uma resposta é completamente satisfatória e isso parece ser particularmente

verdadeironaciência,ondacadarespostaparecepôranuumaperguntamaissubtil.Seadmitirmosquealuzexistesobaformadeondas,talcomoosomeasuperfícieperturbadadumlago,ficaporesclarecerarazãopelaqualasondasluminosassedeslocamfacilmenteatravésdovácuo,aocontráriodoquesucedecomasondassonorasoudeágua.

Asondasdeáguaexistemporqueasmoléculasdeáguasedeslocamcomregularidadeparacimae para baixo. Se não existisse água, também não existiam ondas de água. As ondas sonoras existemporqueasmoléculasdear(ouasmoléculasdequalquermeioemqueosomsepropague)sedeslocamregularmenteparaafrenteeparatrás.Senãoexistiroarououtromeiodepropagação,asondassonorastambémnãoexistem.

Nocasodasondasluminosas,porém,oqueéqueseestáadeslocarparacimaeparabaixo?Nãopode ser uma formavulgar dematéria, umavez que as ondas luminosas se propagamnovácuoonde,aparentemente,nãoexistematéria.

Newtontinhaenfrentadoumproblemasemelhantequandoelaboraraaleidagravitaçãouniversalem 1687. O Sol mantinha a Terra sob a sua influência gravitacional à distância de 150 milhões dequilómetrosdevácuo.Comoéque tal efeito, fossequal fosse a suanatureza, podiaviajar atravésdovazio?

Newtonpensouquetalvezovácuonãofosseonada,masumtipodematériamaissubtildoqueamatériavulgare,porisso,nãofacilmentedetectável.Essamatériafoidenominada"éter",emhomenagemao"éter"queAristótelesimaginaraseroconstituintedoscorposcelestes.Aatracçãogravíticaexercia-sesobreoétereoefeitopropagava-sedumaparceladeéteràseguinteatéque,finalmente,oSolatraíaaTerra.

Talvezfosseesteéter(ououtrotipo)queondulavaparacimaeparabaixoaquandodapassagemdaluz.Eleteriadeocupartodooespaço,umavezqueconseguíamosveratéasestrelasmaisdistantes.Alémdisso,teriadeserumaformadematériatãofinaerarefeitaquenãointerferissecomomovimentodaTerraoudequalqueroutrocorpocelestepeloespaço,pormaislevequefosse.FresnelsugeriuqueoéterpermeavaaprópriaTerraetodososoutroscorposcelestes.

Noentanto,aodeslocarem-separacima,aspartículasdeéterdeviamficarsujeitasaumaforçarestaurativaqueasdeslocassedenovoparabaixo,paraládopontodeequilíbrioedepoisdenovoparacima.Quantomaisrígidoforummeio,maisrapidamentevibraparacimaeparabaixoemaisdepressaumaondasepropaganele.

A luz propaga-se à velocidade de 299 792 quilómetros por segundo. Este valor foi primeirodeterminadodumaformamuitoaproximada,em1676,peloastrónomodinamarquêsOlausRoemer(1644-1710).Parapermitiradeslocaçãodaluzatalvelocidade,oéterteriadesermaisrígidodoqueoaço.

Ora,aideiadumvácuofeitodematériatãofinaerarefeitaquepermitissealivrepassagemdoscorpos sem interferências mensuráveis e ao mesmo tempo mais rígida do que o aço causavaperplexidade.Masaoscientistasnãoparecia restarentãooutraalternativaquenão fosse suporqueascoisaserammesmoassim.

Paraalémdaluzedagravidade,conheciam-sedoisoutrosfenómenosquesefaziamsentiratravésdo vácuo: a electricidade e o magnetismo. Segundo a tradição, ambos haviam sido estudados pelaprimeiravezporTales,queinvestigaraumcertofragmentodeminériodeferroencontradopróximodacidade deMagnésia, namargem oriental doMar Egeu. Esse fragmento tinha a propriedade de atrairpedaços de ferro, contan-do-se que Tales lhe terá dado o nome de ho magnetes lithos ("a pedra deMagnésia").Desdeessaalturaquesechamamagnetesaoscorposqueapresentamapropriedadedeatrairoferro.

Talesdescobriu tambémque se esfregasse fragmentosde âmbar (uma resina fossilizada), estesatraíam, não o ferro em particular, mas qualquer objecto leve. Essa diferença de comportamentosignificava que a atracção não se devia ao magnetismo. A palavra grega para âmbar é elektron e ofenómenoficouconhecidocomoelectricidade.

AlguresduranteoséculoXI,descobriu-senaChina-emborasedesconheçamadata,oautoreascircunstânciasdadescoberta - queumaagulha feitademinériomagnético,oude açoque tivesse sidomagnetizado passando-o por minério magnético, deixada a rodar livremente, se alinhava segundo adirecçãonorte-sul.Alémdisso, seas respectivasextremidades fossemmarcadas,era sempreamesmaqueapontavaonorte.

Essaextremidadefoidesignadapólonortemagnéticoeaoutrapólosulmagnético.Em1269,osábiofrancêsPetrusPeregrinus(1240-?)realizouexperiênciascomtaisagulhasedescobriuqueopólonortemagnético duma era atraído pelo pólo sulmagnético de outra. Por outro lado, verificou que ospólosnortededuasagulhasmagnetizadasserepeliam,omesmosucedendocomosseuspólossul.Emsuma:ospólosmagnéticosiguaisrepeliam-se,enquantoqueospólosmagnéticosdiferentesseatraíam.

Em1785,ofísicofrancêsCharlesAugustindeCoulomb(1736-1806)mediuaforçacomqueumpólonortemagnéticoatraíaumpóloidênticoourepeliaumpólodiferente.Everificouqueaatracçãoourepulsãodiminuíamcomoquadradodadistância.Ou seja, se aumentasse adistânciaxvezes, a forçaentreospólospassavaaser1/ixl/x,oul/x2daquiloqueeraantes.QuandoNewtonestudaraagravitação,em1687, tambémmostraraquea forçadeatracçãogravíticavariavanarazão inversadoquadradodadistânciaentreoscorpos.

1. e 2. Uma agulha de ferro nãomagnetizada é atraída pelo pólo norte ou pelo pólo sul dummagnete.Contudo,umavezmagnetizada,umadassuasextremidadesserárepelidaeaoutraatraída.

3.Pólosdiferentes(N,S)atraem-se.4.Pólosidênticos(N,NouS,S)repelem-se.Assim,aLuaestáaumadistânciadocentrodaTerrasessentavezessuperioràdistânciaaque

deleseencontraasuperfíciedonossoplaneta.AatracçãogravíticaexercidapelaTerranaLuaéapenas1/60 x 1/60, ou 1/3600 do seu valor à superfície da Terra.No entanto, essa atracção é directamenteproporcionalaoprodutodasduasmassasenvolvidasetantoaTerracomoaLuasãotãomaciçasqueaatracçãoexercidapelaTerraéaindasuficientementegrandeaessadistânciaparamanteraLuaemórbita.

ÉporessemesmomotivoqueoSolmantémaTerraemórbita,aumadistânciaquase400vezessuperioràquevaidaTerraàLua.Tambémosenormesenxamesdegaláxias,queseestendemnoespaçopormilhõesdeanos-luz,sãomantidosjuntosporatracçõesdessetipo.

Contudo, e como se veio a verificar, a atracçãomagnética entre duas agulhasmagnetizadas ébiliõesdebiliõesdebiliõesdevezesmaisfortedoqueaatracçãogravíticaentreambas.Porqueseráentão que estamos tão conscientes das atracções gravíticas e praticamente não nos apercebemos dasatracçõesmagnéticas?Porquerazãoéqueosobjectosastronómicossãomantidosjuntospelagravitação,

masnuncaouvimosfalardedoiscorposmantidosjuntosporumaforçamagnética?Arespostaresidenofactodomagnetismoenvolvertantoumaatracçãocomoumarepulsão,ambas

de igual intensidade.Agravitação, pelo contrário, envolveapenasuma atracção.Não existe repulsãogravítica.

Omundoestácheiodemagnetes.Comoveremosadiante,cadaátomoéumpequenomagnete.OsmagnetesdoUniverso, todavia,estãoorientadosemtodasasdirecções,existindotantaspossibilidadesderepulsõescomodeatracções.Tudosomado,umaseoutrasanulam-seeficamoscomumUniversoemquenãoexistem,globalmentefalando,muitasatracçõesourepulsõesmagnéticas.

Agravitação, porém, que apenas envolveuma atracção, tende, por assimdizer, a acumular-se.Embora o efeito da atracção gravítica seja tão pequeno que passa despercebido no caso de objectosvulgares, ou mesmo de montanhas, ele torna-se enorme quando estamos a lidar com corpos com asdimensõesdaTerraoudoSol.

Ainda assim, omagnetismo desempenha uma função. Suponhamos que colocávamos uma folhadum papel rígido sobre uma barra de açomagnetizada. E que espalhávamos alguma limalha de ferrosobreopapel,permitindoàlimalhadeslocar-seeassumirposiçõesnaturaisrelativamenteaomagnete.Seprocedermosdomododescrito,alimalhaorganiza-senumconjuntodelinhascurvasquevãodumpólodomagneteaooutro.Peregrinusjátinhaobservadoestefenómenoe,em1831,ocientistainglêsMichaelFaraday(1791-1867)resolveudedicar-lheasuaatenção.

Faradayconsiderouqueainfluênciadomagnetesefaziasentirnoespaçoemtodasasdirecções,num campomagnético cuja intensidade diminuía com o quadrado da distância. Era possível desenharnesse campo umgrande número de linhas (linhas de forçamagnética) que indicavam regiões de igualintensidade do campo magnético. A limalha de ferro distribuía-se segundo essas linhas, tornando-asassimvisíveis.

Eessaa razãoporqueasagulhasmagnéticasdumabússolaapontamonorteeo sul.AprópriaTerra é ummagnete e as agulhas alinham-se segundo as linhas de forçamagnéticas que vão dum dospólosmagnéticosdaTerraparaooutro. (OspólosmagnéticosdaTerrasituam-seanorteeasul,masencontram-seaumadistânciaconsideráveldospólosgeográficosderotação.)Muitosoutrosfenómenosrelacionados comosmagnetes podem ser explicados através dos conceitos de campomagnético e delinhas de força, e essa ideia de Faradaymanteve-se válida desde então. (Existem igualmente camposgravíticoseeléctricos,comassuaslinhasdeforça.)

Equantoàelectricidade?OfísicoinglêsWilliamGilbert(ca.1544--1603)retomouostrabalhosdeTalessobreassubstânciaselectrificadas,ampliando-os.Numaobrapublicadaem1600,explicouqueoutras substâncias para além do âmbar eram igualmente capazes de atrair objectos leves, quandoesfregadas.Gilbertchamouataisobjectoseléctricos.

Em1733,oquímicofrancêsCharlesFrançoisdeCisternayDufay(1698-1739)fezexperiênciascombarrasdevidroederesinaquepodiamser"electrificadas"seesfregadas,tornando-secapazesdeatrairobjectosleves.Umaseoutrasconseguiamatrairpequenosfragmentosdecortiçaqueficavam,porsuavez,electrificados.

Umfragmentodecortiçaelectrificadopelovidroatraíaoutrofragmentoelectrificadopelabarrade resina. No entanto, dois fragmentos de cortiça electrificados pelo vidro repeliam-se e o mesmoaconteciacomdoisfragmentoselectrificadospelabarraderesina.Dufayconcluiuqueexistiamdoistiposdeelectricidade,cadaqualrepelindo-seasimesmomasatraindoooutrotipo,comosucediacomosdoistiposdepólosmagnéticos.

O cientista norte-americano Benjamin Franklin (1706-1790) deu o passo seguinte. Em 1747,sugeriuqueexistiaapenasumtipodeelectricidade,quetodaamatériapossuíanumaquantidadenormaleque não era detectável. Ao serem esfregados, no entanto, certos corpos perdiam alguma da suaelectricidade enquanto que outros a adquiriam. Os objectos que tinham um excesso de electricidadepodiamserconsideradoscomoestandopositivamentecarregados;aquelesqueapresentavamumdéficeestavamnegativamentecarregados.

Em tais circunstâncias, um corpo carregado positivamente atraía um corpo carregadonegativamente,umavezqueocontactoentreambospermitiaqueoexcessodecargadoprimeirofluísseparaosegundo,compensandoodéficequeexistianeste.Osdoisefeitoscancelavam-semutuamenteeoque restava eram dois objectos sem carga. (Isto foi observado por Franklin, nas experiências querealizou.) Por outro lado, dois objectos positivamente carregados repeliam-se, tal como sucedia comdoisobjectoscarregadosnegativamente,porquenãohaviaemnenhumdoscasoshipótesedacargafluirdumparaooutro.

Faltava apenas a Franklin determinar qual dos dois tipos de corpos carregados electricamentepossuíaumexcessoequalpossuíaumdéficedecarga.Naalturanãohaviaformaderesolveraquestão,peloqueFranklintomouumadecisãoarbitrária,considerandoqueovidroesfregadotinhaumexcessodecargaedeviaporissoserconsideradopositivo(+),enquantoqueasresinasesfregadastinhamumdéficedecargaedeviamserconsideradasnegativas(-).

Desde então, as pessoas que trabalham com correntes eléctricas consideram que estas sedeslocamdopositivoparaonegativo.Infelizmente,Franklintinhacinquentaporcentodeprobabilidadedeacertareenganou-se.Comefeito,eraabarraderesinaquetinhaumexcessodecargae,portanto,acorrente flui do negativo para positivo. Isso, porém, é irrelevante em engenharia electrotécnica. Osresultadossãoosmesmos,sejaqual forosentidoemqueconvencionarmosqueacorrentesedesloca,desdequetomemosumadecisãoenãomudemosdeideiasameiodosnossosraciocínios.

ACombinaçãodosFenómenosExistem, portanto, quatro fenómenos que se fazem sentir através do vácuo - luz, electricidade,

magnetismo e gravitação - e que naquele tempo se pensava que usavam o éter.Mas usariam todos omesmoéterouteriacadaqualoseupróprioéter?Nãohaviamaneiradesaber,masaluzeraporvezesdescritaemtermosdeondasquesedeslocavamnoéterluminífero,dumaexpressãolatinaquesignifica"transportandoluz".Existiriamtambémuméter"electrífero","magnetífero"ou"gra-vitífero"?

As diferenças entre os quatro fenómenos não eram todas damesma ordem.A luz parecia nãoatrairnemrepelir.Agravitaçãosóatraía.Aelectricidadeeomagnetismo,noentanto,atraíamerepeliam,fazendo-o de forma muito semelhante, repelindo iguais e atraindo diferentes. Destes dois últimosfenómenos,umpareciaterorigemnooutro.

Em1819,ofísicodinamarquêsHansChristianOersted(1777-1851)estavaadarumaaulasobreelectricidade e, à laia de demonstração (não sabemos exactamente aquilo que pretendia demonstrar),aproximou uma bússola dum fio metálico através do qual passava uma corrente eléctrica. Para suaenormesurpresa,aagulhadabússolareagiuimediatamente,apontandonumadirecçãoperpendicularàdacorrente.QuandoOerstedinverteuacorrenteeléctrica,aagulhadabússolarodou,apontandonadirecçãocontrária,denovoperpendicularmenteàcorrente.

Oested foi o primeiro a demonstrar a existência duma ligação íntima entre electricidade emagnetismo,masnãoprosseguiucomassuasinvestigações.Outros,noentanto,quetinhamouvidofalarnofenómeno,fizeram-noimediatamente.

Em 1820, o físico francês Dominique François Arago (1786-1853) demonstrou que um fiometálico onde passava uma corrente eléctrica funcionava como um magnete, sendo capaz de atrairlimalhadeferro.Issodeixavadeacontecerquandoacorrenteeléctricaerainterrompida.Umavezqueofiousadoeradecobre,talprovavaqueomagnetismonãoeranecessariamenteumatributoexclusivodoferro,masumapropriedadequepodiaexistiremqualquermatéria.Oscientistascomeçaramafalaremelectromagnetismo.

Nessemesmoano,umoutrofísicofrancês,AndréMarieAmpere(1775-1836)mostrouquedoisfiosmetálicosparalelosondepassavaumacorrenteeléctricanamesmadirecçãoseatraíammutuamente;seascorrentesquenelescirculavamtivessemdirecçõesopostas,osfiosrepeliam-se.

Setorcermosumfiometálicodando-lheaformadumahélice(àmaneiradumamoladecolchãodecama), e passarmos por ele uma corrente eléctrica, esta circulará em cada volta da hélice namesmadirecção.Todasasvoltasseatraiemumasàsoutrasecadaqualcriaumcampomagnéticoquereforçatodososoutros.Osolenóide(espiraldefiometálico)funcionacomoummagnetedebarra,comumpólonortemagnéticonumaextremidadeeumpólosulmagnéticonaoutra.

Em1823,ofísicobritânicoWilliamSturgeon(1783-1850)envolveucomfiometálicoumabarrade ferro em forma de U. O ferro intensificava o campomagnético e, quando a corrente eléctrica foiligada,transformou-senumelectromagnetesurpreendentementepoderoso.

Em1829,ofísiconorte-americanoJosephHenry(1797-1878)utilizoufiometálicoisolado(paraevitar curto-circuitos), fazendo-o passar centenas de vezes em volta duma barra de ferro. Com talprocedimento fabricou um electromagnete capaz de levantar quantidades fenomenais de ferro quando

faziapassarumacorrenteeléctricaatravésdofiometálico.Faradaypensoudepoisnapossibilidadeinversa.Seaelectricidadepodiacriarmagnetismo,seria

omagnetismo capaz de dar origem a electricidade? Faraday resolveu introduzir ummagnete de barravulgarnumsolenóidequenãoestavaligadoaqualquerpilha.Osolenóide,noentanto,eraatravessadoporumacorrenteeléctricaquandoomagneteera introduzidoeretiradodoseuinterior.Acorrentenãoexistiaquandoomagneteestavaemrepousoemqualquerpontonointeriordosolenóide.Aparentemente,a corrente apenas circulava através do fio metálico quando este atravessava as linhas de forçamagnéticas,deslocando-senumadirecçãoquandoomagneteeraintroduzidonosolenóideenadirecçãoopostaquandoaqueleeraretirado.

Em1831,Faraday concebeuum sistema emqueumdiscode cobregirava entre os pólos dummagnete.Criava-seumacorrenteeléctricanodisco,quefluíacontinuamenteenquantoodiscoestivesseagirar.Manteresteemmovimentoexigiaumcertoesforço,porqueeranecessáriorealizar trabalhoparafazerodiscoatravessaraslinhasdeforçadocampomagnético.Noentanto,setalfossefeitorecorrendoaforçahumanaouanimal,atravésdumaquedadeáguaoupelaforçadovaporproduzido.pelaqueimadecombustível,erapossíveltransformartrabalhomecânicoemelectricidade.

Desta vez, foi Henry quem pensou na situação inversa. Nesse mesmo ano inventou o motoreléctrico,emqueacirculaçãodeelectricidadefaziaumarodamover-se.

Todas estas descobertas serviram para electrificar o mundo (em sentido real e em sentidofigurado) e alteraram de forma radical a sociedade. Para os cientistas, porém, a importância de taisdescobertas residiu no facto de todas elas apontarem crescentemente para uma relação íntima entreelectricidadeemagnetismo.

Comefeito,houvequemcomeçasseapensarqueexistiaumúnicocampoelectromagnético,umcampoqueporvezesrevelavaasuafacetaeléctricae,outrasvezes,asuafacetamagnética.EssasideiasculminaramnostrabalhosdeMaxwellque,entre1864e1873,estudouasimplicaçõesmatemáticasdasnoções de campo e linha de força desenvolvidas por Faraday e da aparente ligação entre camposeléctricosecamposmagnéticos.Maxwellformulouquatroequaçõesmatemáticasrelativamentesimples(simples para os matemáticos, pelo menos) que descreviam todos os comportamentos conhecidos daelectricidadeedomagnetismo.EssasequaçõesficaramconhecidascomoasequaçõesdeMaxwell.

As equações de Maxwell (cuja validade foi confirmada por todas as observações realizadasdesde então) mostram que os campos eléctrico e magnético não podem existir separadamente. Naverdade, existe apenas um campo electromagnético com uma componente eléctrica e uma componentemagnéticadispostasperpendicularmente.

Seoscomportamentoseléctricoemagnéticofossemanálogosemtodasassuasmanifestações,asquatroequaçõesseriamsimétricas,comodoisparesdeimagensnoespelho.Há,contudo,umaspectoemqueos dois fenómenosnão se assemelham.Nos fenómenos eléctricos, as cargas positivas e negativaspodem existir independentemente umas das outras. Um corpo pode estar carregado positivamente ounegativamente. Nos fenómenos magnéticos, porém, os pólos magnéticos não existem separadamente.Qualquer corpo que apresente propriedadesmagnéticas temumpólo nortemagnético numponto e umpólosulmagnéticonoutro.Separtirmosaomeioumaagulhamagnetizada,comumpólonortemagnéticonumaextremidadeeumpólosulmagnéticonaoutra,ospólosnãoficamisolados.Ametadeque temopólonortemagnéticodesenvolveinstantaneamenteumpólosulmagnéticonolocaldaquebra,enquantoqueametadecomopólosulmagnéticodesenvolveumpólonortemagnéticonanovaextremidade.

Maxwellincluiuessefactonassuasequações,introduzindodessemodoumanotadeassimetria.Isso é algo que desde então tem incomodado os cientistas, que possuem uma preferência natural pela

simplicidadeesimetria.Esta"falha"nasequaçõesdeMaxwelléumassuntoaqueregressaremosmaisàfrente.

Maxwell mostrou como, a partir destas equações, se podia provar que um campo eléctricovariável produz inevitavelmente um campomagnético variável que, por sua vez, produz outro campoeléctricovariável, eassimpordiante, indefinidamente. Issoequivaleauma radiaçãoelectromagnéticaqueseexpandesobaformadumaonda,aumavelocidadeconstante.Avelocidadedessaradiaçãopodeser calculada, determinando o rácio entre unidades que exprimem fenómenosmagnéticos e outras queexprimemfenómenoseléctricos.Ovaloraquesechegaédeaproximadamente300000quilómetrosporsegundo,queéavelocidadedaluz.

Talnãopodiaserumameracoincidência.A luzera,aparentemente, radiaçãoelectromagnética.AsequaçõesdeMaxwellserviram,assim,paraunificartrêsdosquatrofenómenosquesesabiamseremcapazesdeatravessarovácuo:electricidade,magnetismoeluz.

Apenasagravitaçãoficaraforadestaunificação.Elaparecianadateremcomumcomosoutrostrês fenómenos. Em 1916, Albert Einstein elaborou a sua teoria da relatividade generalizada, queaperfeiçoouoconceitodegravitaçãodeNewton.NainterpretaçãodagravidadefeitaporEinsteinque,hojeemdia,éamplamenteaceiteeconsideradaessencialmentecorrecta,deveexistirradiaçãogravíticasob a formadeondas, análoga à radiação electromagnética.Taisondasgravíticas são, contudo,muitomais subtis, ténues e difíceis de detectar do que as ondas electromagnéticas. Apesar dalguns falsosalarmes, ainda não tinham sido detectadas à data da escrita deste livro. Ainda assim, não existepraticamentenenhumcientistadaespecialidadequeduvidedasuaexistência.

AExtensãodoEspectroAsequaçõesdeMaxwellnãocolocavamquaisquerlimitesaoperíododasoscilaçõesdocampo

electromagnético.Pode tratar-sedumaoscilaçãoporsegundooumenosainda,demodoquecadaondatem300000quilómetrosdecomprimentooumais.Tambémpodeseradécimapotênciadummilhãodeoscilações por segundo ou mais, de modo que cada onda tem um comprimento correspondente àbilionésimapartedabilionésimapartedumcentímetro.Eovalorpodeserqualquernúmeroentreestesdoisvalores.

Asondas luminosas,contudo, representamapenasumapequenapartedestaspossibilidades.Oscomprimentosdeondamaislongosdaluzvisívelcorrespondema0,0007milímetrosdecomprimentoeos mais curtos correspondem a cerca de metade desse valor. Significará isto que existe radiaçãoelectromagnéticaquenãovemos?

Ao longo de grande parte da história da humanidade, perguntar se existia luz que não éramoscapazesdeverteriaparecidoumacontradição.Aluzera,pordefinição,algoquesepodiaver.

Em 1800, o astrónomo germano-britânico William Herschel (1738--1822) foi o primeiro amostrarqueissonãorepresentava,afinal,umacontradição.Nessetempo,pensava-sequealuzeocalorquenoschegavamdoSoleramdoisfenómenosdistintos.Herschelquissaberseocalortambémproduziaumespectrosemelhanteaodaluz.

Eassim, emvezdeanalisarvisualmenteoespectro,oqueapenas lhepermitiaobservar a luz,Herschel resolveu estudá-lo com um termómetro emedir a temperatura. Colocando o termómetro emdiversospontosdaquele, registoua respectiva temperatura.Herschelesperavaquea temperatura fossemaisaltanomeiodoespectroequediminuíssenassuasextremidades.

Mas não foi isso que aconteceu. A temperatura crescia de forma constante à medida que seafastava do violeta, atingindo o seu valor mais elevado na extremidade vermelha do espectro.Surpreendido,Herschelinterrogou-sesobreaquiloquesucederiasecolocasseotermómetroparaládovermelho.Parasuagrandesurpresa,descobriuquea temperaturaeraaíaindamaiselevadadoqueemqualquerpontodoespectrovisível.Herschelpensouterdetectadoondasdecalor.

Algunsanosmais tarde,porém,quandosegeneralizouaaceitaçãoda teoriaondulatóriada luz,tornou-se possível interpretar melhor estes fenómenos. A luz solar é constituída por um conjunto decomprimentosdeondaquepodemserrefractadosporumprisma.Anossaretinareageacomprimentosdeondasituadosdentrodecertoslimites,masaluzsolarincluiaindaondasquesãomaislongasdoqueovermelhonoespectrovisíveleque,por isso, sesituampara ládasuaextremidadevermelha.Anossaretina não é sensível a tais ondas longas e, portanto, não as vemos. Contudo, elas estão lá. Sãodesignadasraiosinfravermelhos,sendooprefixooriundodumapalavralatinaquesignifica"porbaixo",umavezquepodemosencararoespectrocomoindodovioleta,notopo,aovermelho,embaixo.

A luz,quando incide sobreanossapele, é reflectidaouabsorvida.Quandoéabsorvida, a suaenergiaaceleraomovimentodasmoléculasqueaconstituemeesseefeitofaz-sesentirsobaformadecalor.Quantomaioresforemoscomprimentosdeonda,maisprofundaéapenetraçãonapeleemaisfáciléasuaabsorção.Eassim,emboranãopossamosveros infravermelhos, sentimo-loscomocaloreumtermómetropoderegistaroseuefeito.

UltravioletaVioletaAzulVerdeAmareloLaranjaVermelhoInfravermelho1.Luz Infravermelha.Em1800, quandoWilliamHerschel colocouo seu termómetro na região

escura situada para lá da extremidade vermelha do espectro, verificou com surpresa que era aí queregistavaastemperaturasmaiselevadas.

2.LuzUltravioleta.Em1770,KarlWilhelmScheeledescobriuquepapelembebidonumasoluçãodenitratodeprataescureciamaisdepressaquandoexpostoaluzvioleta.Em1801,JohnWilhelmRitterexpôsopapelna regiãoescuradoespectrosituadapara ládovioletaeopapelescureceuaindamaisdepressa.

Seriadamaiorutilidade,evidentemente,sepudéssemosdemonstrarqueosraiosinfravermelhossão ondas semelhantes às da luz, mas com comprimentos de onda maiores. Poderíamos porventurasobrepor dois feixes de raios infravermelhos e produzir padrões de interferência, mas ninguém seriacapazes de os ver. Talvez o fenómeno pudesse ser detectado por um termómetro, que registasse atemperaturaasubirdecadavezqueoinstrumentoatravessasseumazona"maisclara"eadescersemprequepassasseporumazona"maisescura".

Em 1830, o físico italiano Leopoldo Nobili (1784-1835) inventou um termómetro capaz derealizartaismedições.UmdosseuscolaboradoreseraofísicoitalianoMacedónioMelloni(1798-1854).Umavezqueovidroabsorviaumagrandepartedosraiosinfravermelhos,Melloniresolveuusarprismasdesal-gema,ummaterialtransparenteaosraiosinfravermelhos.Formaram-sepadrõesdeinterferênciaeotermómetrodeNobilidemonstrouasuaexistência.Porvoltade1850,Mellonitinhajámostradoqueosraiosinfravermelhosapresentavamtodasaspropriedadesdaluz-salvoquenãopodiamserobservadosàvistadesarmada.

Equantoàoutraextremidadedoespectro,quevaidovioletaaonegro?Essahistóriacomeçaem1614,quandooquímicoitalianoAngeloSala(1576-1637)reparouqueonitratodeprata,umcompostoabsolutamente branco, escurecia quando exposto à luz solar. Sabemos actualmente que isso sucedeporquealuzcontémenergiaeécapazdedecomporamoléculadenitratodeprata,dandoorigemapratafinamentedividida,quetemumaaparênciaescura.

Em 1770, o químico sueco Karl Wilhelm Scheele (1742-1786) estudou o assunto com maisatenção,utilizandooespectrosolar,quenãoeraconhecidonotempodeSala.Embebeuestreitastirasdepapelemsoluçõesdenitratodeprata,deixou-assecarecolocou-asemdiferentesregiõesdoespectro.Scheele descobriu que as tiras de papel escureciam mais devagar na região do vermelho e maisrapidamente na região do violeta. Isso acontece (sabemo-lo agora, e por razões que serão explicadasadiante)porqueaenergiadaluzaumentaàmedidaquesevaidovermelhoparaovioleta.

Uma vez descobertos os infravermelhos por Herschel em 1810, o químico alemão JohannWilhelmRitter(1776-1810)lembrou-sedeverificaroquesepassavanaoutraextremidadedoespectro.Em1801,embebeutirasdepapelnumasoluçãodenitratodeprataerepetiuaexperiênciadeScheele,masdestavezcolocoutirasparaládaregiãodovioleta,ondenãoeravisívelluz.Comosuspeitava,astiras de papel escureciam aí ainda mais depressa do que na região do violeta. Foi assim que sedescobriramosraiosultravioletas,umapalavracujoprefixoderivadolatimesignifica"paraláde".

Asradiaçõesinfravermelhaeultravioletaexistemnoslimitesdoespectrovisível.AsequaçõesdeMaxwellsugeriamaexistênciaderadiaçãobemparaládesseslimites.AsuadetecçãocorroborariaasequaçõesdeMaxwell,umavezquesemelasninguémteriasuspeitadodaexistênciadetalradiação.

Em1888,ofísicoalemãoHeinrichRudolfHertz(1857-1894)utilizouumfiometálicodeformarectangular,comumespaçonomeio,comodispositivodedetecção.Estabeleceunoseulaboratóriouma

corrente eléctrica variável.Amedida que a corrente eléctrica oscilava, deslocando--se primeiro numsentidoedepoisnooutro,deviaemitirradiaçãoelectromagnética,comaondaderadiaçãomovendo-separacima,enquantoacorrentesedeslocavanumsentido,edepoisparabaixo,quandoelasedeslocavanadirecçãocontrária.Umatalondaelectromagnéticadeviaapresentarumgrandecomprimentodeondaumavezque,mesmoqueacorrenteeléctricavariávelmudassededirecçãoacadafracçãodesegundo,aluzsedeslocariagrandesdistânciasentreduasmudançasdedirecção.

OfiometálicorectangulardeHertzadquiririaumacorrenteeléctricaseaondaelectromagnéticao atravessasse, e uma faísca atravessaria o espaço nele existente. Hertz observou essa faísca. Alémdisso,aodeslocaroseufiorectangularpelasalaonderealizavaaexperiência,obteveumafaíscasemprequeaondaestavamuitoaltaoumuitobaixa,masnenhumafaíscaentreestesdoisextremos.Dessemodo,pôdedeterminaraformadaondaeoseucomprimento.

Hertzdescobriraaquiloqueveioaserconhecidocomoondasrádio,quesesituambemparaládaradiaçãoinfravermelhaepodemtercomprimentosdeondadaordemdoscentímetrosouquilómetros.

Depoisdestadescoberta,ninguémmaispôsemcausaavalidadedasequaçõesdeMaxwell.Seexistiauméterluminífero,eletransportavatantoaelectricidadecomoomagnetismo.Eseexistiaoutrotipodeéter,eraapenasparaagravitação.

Em 1895, foi igualmente descoberta radiação electromagnética situada para lá do ultravioleta,comcomprimentos de onda extraordinariamente curtos.Mas falaremos dela adiante, depois de termosfaladodoutrosassuntos.

ADivisãodaEnergiaAelectricidade,omagnetismo,aluzeagravitaçãosãotodasformasdeenergia,entendendo-se

por energia tudo aquilo que é capaz de realizar trabalho. Estas formas de energia são evidentementediferentesumasdasoutras,maspodemserconvertidasumasnasoutras.Comojávimos,aelectricidadepodeserconvertidaemmagnetismoevice-versa,eumcampoelectromagnéticovariávelpodeproduzirluz.A gravitação pode provocar a queda de água, a qual faz rodar uma turbina que pode obrigar umelementocondutoraatravessarlinhasdeforçamagnéticasafimdeproduzirelectricidade.Asconversõesdeenergiaemtrabalhoevice-versasãoodomíniodeestudodatermodinâmica.

Tais conversões nunca são completamente eficientes. Há sempre alguma energia que se perdenessesprocessos.Porém,aenergiaperdidanãodesaparece,antessurgecomocalor,queéoutraformadeenergia. Se entrarmos em linha de conta com o calor, a energia nunca é totalmente perdida, tal comotambémnãoseformaapartirdonada.Poroutraspalavras,aquantidadetotaldeenergianoUniversoéconstante.

Chama-seaistoaleideconservaçãodaenergia,ouprimeiraleidatermodinâmica,umaleiquefoiformuladademodoclaroedefinitivo,em1847,pelofísicoalemãoHermannLudwigFerdinandvonHelm-holtz(1821-1894).

Numcertosentido,ocaloréa formamais fundamentaldeenergia,umavezquequalqueroutraforma de energia pode ser completamente convertida em calor, enquanto que o calor não pode serconvertidocompletamenteemenergianãocalorífica.Poressemotivo,ocalorconstituiofenómenomaisconveniente para estudar a termodinâmica.Uma expressão, diga-se de passagem, que vemdo grego esignifica"movimentodocalor".

Ocalorcomeçouaserestudadocomgrandeatençãopeloscientistasapartirdainvenção,peloengenheirobritânicoJamesWatt(1736-1819),daprimeiramáquinaavaporverdadeiramentefuncional,em1769.Umavezcompreendidaaleideconservaçãodaenergia,oestudodocalortornou-seaindamaisintenso.

Apósoadventodamáquinaavapor,surgiramduas teoriasacercadanaturezadocalor.Algunscientistasconsideravam-noumaespéciedefluidosubtilquepodiadeslocar-sedumaporçãodematériapara outra.Outros encaravam o calor como uma forma demovimento de átomos emoléculas, que sedeslocavamouvibravam.

Esta última sugestão, conhecida como teoria cinética do calor (em que a expressão "cinética"provém duma palavra grega que significa "movimento") foi finalmente reconhecida como estandocorrectanadécadade60doséculoXIX,quandoMaxwelleofísicoaustríacoLudwigEduardBoltzmann(1844-1906)adesenvolveramemtermosmatemáticos.Osdoiscientistasdemonstraramquetudoaquiloqueseconheciaacercadocalorpodiaserinterpretadodeformasatisfatóriasepensássemosemátomosemoléculas que se deslocavam ou vibravam. Tal como sucede com os gases, a velocidade média dadeslocaçãoouvibraçãodosátomosemoléculasconstituintessejadoque forconstituiumamedidadasua temperatura, se amassados átomos emoléculas também for considerada.Aenergia cinética total(quetememcontatantoamassacomoavelocidade)detodasessaspartículasemmovimentorepresentaocalortotaldasubstânciaemquestão.

Quantomaisfrioficaumcorpo,maislentosetornaomovimentodosseusátomosemoléculas.Se

ocorpoarrefecersuficientemente,asuaenergiacinéticaatingeumvalormínimo.Apartirdessepontonãopodebaixarmais,eatemperaturaencontra-senozeroabsoluto.Estanoçãofoipropostaeaclaradapelaprimeiravezem1848pelomatemáticobritânicoWilliamThomson (1824-1907),mais conhecidopelotítulocomqueseriaagraciadoLordKelvin.OnúmerodegrausCelsiusaqueumcorposeencontraacimadozeroabsolutoconstituiasuatemperaturaabsoluta.Seozeroabsolutoforiguala-273,15ºC,entãoa0ºCcorrespondem273,12ºK(deKelvin)ou273,15ºA(deabsoluta).

Qualquercorpoqueseencontreaumatemperaturasuperioràdasuavizinhança tendeaperdercalorsobaformaderadiaçãoelectromagnética.Quantomaiselevadaforatemperatura,maisintensaéaradiação.Em1879,ofísicoaustríacoJosephStefan(1835-1893)estabeleceuafórmulaqueexprimeessarelação. Stefanmostrou que a radiação total aumenta com a quarta potência da temperatura absoluta.Assim,seatemperaturaabsolutaduplicar,digamosde300ºKpara600ºK(ouseja,de27ºCpara327ºC),aradiaçãototalaumenta2 x 2 x 2 x 2 , istoé,16vezes.

Jáantes,porvoltade1860,ofísicoalemãoGustavRobertKirchhoff(1824-1887)mostraraquequalquer substância que esteja a uma temperatura inferior à da sua vizinhança absorve luz numcomprimentodeondaespecífico,emitindodeseguidanessemesmocomprimentodeondaquandoasuatemperaturaéaumentadaparaumvalorsuperioraodasuavizinhança.Daquiseconcluiqueseumcorpoabsorverradiaçãoemtodososcomprimentosdeonda(istoé,seforum"corponegro",namedidaemquenãoreflecteluzalguma),emitirátambémradiaçãoemtodososcomprimentosdeondaquandoaquecido.

Não existe, na verdade, nenhum corpo que absorva todos os comprimentos de onda da luz, naacepçãousualdapalavra,masumobjectoquepossuaumpequenoorifíciocomporta-sedemodomuitopróximo.Éimprovávelquequalquerradiaçãoquepenetrenoseuinteriorconsigasairdenovo,acabandoporserabsorvida.Quandoumcorpocomestaconfiguraçãoéaquecido,devemosportantoobterradiaçãodecorponegro-ouseja,emtodososcomprimentosdeonda-àsaídadoorifício.

EstaideiafoiprimeiropropostapelofísicoalemãoWilhelmWien(1864-1928)naúltimadécadadoséculoXIX.Aoestudararadiaçãodocorponegro,Wienverificouaexistênciaderadiaçãoemitidanuma ampla gama de comprimentos de onda, como seria de esperar, sendo reduzida a quantidade deradiaçãoemitidanoscomprimentosdeondamaiscurtosemaislongoseexistindoumpicoderadiaçãoalgures entre estes extremos. Wien descobriu ainda que tal pico se deslocava na direcção doscomprimentosdeondamaiscurtosàmedidaqueatemperaturasubia,tendopublicadoosseusresultadosem1895.

As leis estabelecidas por Stefan e por Wien estão de acordo com a nossa experiência.Imaginemosumobjectoqueestáaumatemperaturaligeiramentesuperioràdonossoprópriocorpo.Secolocarmosasnossasmãossobreesseobjecto,sentimosumligeirocalorporele irradiado.Amedidaqueatemperaturadoobjectoaumenta,aradiaçãotorna-semaisperceptíveleopicoderadiaçãoocorreaumcomprimentodeondamaiscurto.Secolocarmosanossamãojuntodumachaleiracomáguaaferver,elaemitiráumcalorconsiderável.Seaumentarmosatemperaturaaindamais,oobjectoemitiráradiaçãoperceptível,acomprimentosdeondasuficientementecurtosparapoderemserreconhecidospelanossaretinacomoluz.Vemosprimeiroluzvermelhaporquesetratadaluzcomocomprimentodeondamaislongo,equeéaprimeiraaseremitida.Dizemosentãoqueoobjectoestáincandescente.Amaiorpartedaradiação continua a situar-se naturalmente na região do infravermelho,mas o que vemos é a pequenafracçãoqueestánaregiãovisíveldoespectro.

Amedidaqueatemperaturadoobjectoaumenta,elebrilhadeformacadavezmaisintensa.Asuacortambémsemodifica,sendoemitidacadavezmaisradiaçãonaregiãodoscomprimentosdeondamaiscurtos.Oobjectovaificandocadavezmaisquente,torna-semaisclaroebrilhanteeasuacoraltera-sedenovo,àmedidaquevãosendoemitidasradiaçõesdecomprimentoscadavezmaiscurtos,tornando-se

laranja e depois amarelo. Quando algo atinge a temperatura da superfície do Sol, fica brancoincandescenteeopicodaradiaçãoemitidasitua-senaregiãovisíveldoespectro.Seoobjectoaqueceraindamais,adquireumatonalidadeazul-esbranquiçadae,nessaaltura,emboraestejamaisbrilhantedoquenunca(admitindoquepodíamosolharparaelesemaomesmotempodestruirmososnossosolhos),opicodaradiaçãoencontra-senaregiãodoultravioleta.

Estaprogressãocalor/luzcolocouumproblemaaoscientistasdoséculoXIX,porqueeradifícilexplicaraformadacurvadaradiaçãodocorponegro.Quasenofinaldoséculo,ofísicobritânicoJohnWilliamStrutt,LordRayleigh(1842-1919)resolveupartirdopressupostodeque,naradiaçãodumcorponegro, todososcomprimentosdeonda tinham igualprobabilidadedeserememitidos.Combasenessahipótese, chegou a uma equação que mostrava claramente o modo como a radiação aumentava deintensidadeàmedidaquesepassavadoscomprimentosdeondamuitograndesparaoscomprimentosdeonda mais pequenos. Essa equação não explicava, no entanto, a existência dum pico seguido dumdecréscimo,àmedidaquenosaproximávamosdecomprimentosdeondaaindamaiscurtos.

Em vez disso, a equação implicava que a intensidade continuava a crescer indefinidamenteenquanto que os comprimentos de onda diminuíam. Isso significava que qualquer corpo devia emitirradiação principalmente nos comprimentos de ondamais pequenos, libertando-se de todo o seu calornuma explosão de radiação violeta, ultravioleta e para lá disso. Esse acontecimento é por vezesdesignado"catástrofeultravioleta".Mascomonãoseobservavaessacatástrofeultravioleta,algodeviaestar errado no raciocínio de Rayleigh. O próprio Wien propôs outra equação que descrevia adistribuiçãodoscomprimentosdeondamaiscurtosdaradiaçãodocorponegro,masquenãoseajustavaaoscomprimentosdeondamaiores.Pareciaqueosfísicoseramcapazesdeexplicarumaououtrametadedacurva,masnãoambas.

OfísicoalemãoMaxKarlErnstLudwigPlanck(1858-1947)resolveuestudaroproblema.PlanckconsiderouquetalvezalgoestivesseerradonopressupostodeRayleighdequetodososcomprimentosdeondatinhamigualprobabilidadedeserememitidosporumcorponegro.Eseaprobabilidadedeserememitidosfossetantomenorquantomenorfosseocomprimentodeonda?

Ummododetornaresteraciocínioplausívelseriasuporqueaenergianãoécontínuaenãopodeserindefinidamentedivididaemquantidadescadavezmaispequenas.(AtéàépocadePlanck,osfísicosconsideravamanaturezacontínuadaenergiaumdadoadquirido.Nuncaninguémimaginaraqueaenergia,talcomoamatéria,podiaserconstituídaporpequenaspartículasindivisíveis.)

Planckconsiderouqueessaparcelafundamentaldeenergiaeratantomaiorquantomenorfosseocomprimentodeonda.Talsignificavaque,paraumadadatemperatura,aradiaçãoaumentavaàmedidaqueos comprimentos de onda se tornavammenores, tal como sugeridopela equaçãodeRayleigh.Noentanto,paracomprimentosdeondaaindamaispequenos,adimensãocrescentedaunidadedeenergiaaumentavaadificuldadedecolocarenergia suficientenumdeterminadopontoparaa irradiar.Haveriaassimumpicoe,àmedidaqueoscomprimentosdeondadiminuíssem,aradiaçãodecresciatambém.

Quando a temperatura aumentava e o calor era mais intenso, tornava-se mais fácil emitir asunidadesdeenergiamaioreseopicodeslocava--seemdirecçãoaoscomprimentosdeondamaiscurtos,talcomoexigidopelaleideWien.Emresumo:autilizaçãodasunidadesdeenergiapostuladasporPlackresolviacompletamenteoproblemadaradiaçãodocorponegro.

Planck designou tais unidades de energia quanta (quantum no singular), que é uma expressãolatinaquesignifica"quantidade".Oqueimportava,emúltimaanálise,noproblemadaradiaçãodocorponegro,erasaberquantaenergiaexistianosquantadosdiferentescomprimentosdeondaderadiação.

Planckpropôsem1900asuateoriaquânticaeaequaçãoquedescrevearadiaçãodocorponegro

(equeestavadeacordocomasobservaçõesrealizadas,tantoparaoscomprimentosdeondamaislongoscomoparaosmaiscurtos).Ateoriaveioarevelar-setãoimportante-muitomaisdoquePlanckpodia,naquela época, imaginar -, que todaa física anterior a1900é actualmentedesignada física clássica etodaa físicaposterioraessadata físicamoderna.Peloseu trabalhosobrea radiaçãodocorponegro,WienrecebeuumPrémioNobelem1911.Planckseriagalardoadoem1918.

3.ELECTRÕES

ADivisãodaElectricidadeNasprimeirasexperiênciascomelectricidade,oscientistaslidaramcomentidadesquepossuíam

cargas eléctricas relativamente pequenas. Em 1746, todavia, o físico holandês Pieter vanMusschen-broek (1692-1761), que trabalhava na Universidade de Leyden, inventou um dispositivo que ficouconhecido como garrafa de Leyden e que se podia encher com uma quantidade apreciável de cargaeléctrica.

QuantomaioréacarganagarrafadeLeyden,maioréapressãoparaasuadescarga.Setocarmoscomumobjectonodispositivo,aelectricidadefluiparaaqueleeagarrafaficadescarregada.(Seforumserhumanoatocarnagarrafa,apassagemdessacorrenteeléctricapodeserdolorosa.)

QuandoumagarrafadeLeydenestácarregadacomumacargaeléctricasuficientementegrande,ocontacto directo não é necessário. Em tais condições, se a garrafa for aproximada dum objecto queprovoqueasuadescarga,acargaeléctricaconseguepassardagarrafaparaesteatravésdoarexistenteentreambos.

Oresultadoéumclarãodeluzeumestalido.Aluznãocorrespondeàprópriaelectricidade.Oque sucede é que a electricidade, seja lá o que for, aquece o ar ao atravessá-lo e este fica durantemomentossuficientementequentepara irradiar luz.Ocalor tambémdilataoare,umavezconcluídaadescarga,oarcontrai-sedenovoproduzindootalestalido.

AlgumaspessoasrepararamnassemelhançasentrealuzeosestalidosobservadosnasgarrafasdeLeyden e os relâmpagos e trovões que se ocorrem nas nuvens durante as trovoadas. Seriam osrelâmpagosetrovõesoresultadodadescargadumagigantescagarrafadeLeydenexistentenoscéus?

Em1752,BenjaminFranklinprovouqueassimeraao fazervoarumpapagaiode sedaduranteuma trovoada.Essepapagaio transportou a cargados relâmpagos atravésdumacordade cânhamoatéumagarrafadeLeydennãocarregada.AgarrafadeLeydencarregadaquedaíresultoudemonstrouqueaelectricidaderecolhidanoscéustinhaasmesmaspropriedadesdaelectricidadeproduzidanaTerra.

Masoquesepassavacomaprópriaelectricidade,escondidanointeriordumcorpocarregadoouna luzproduzidapeloaraquecido?Umamaneirapossíveldedescobrira respostaseriaprovocarumadescarganovácuoparapôranuaelectricidadeeverqueaspectotinha.Em1706,umfísicoinglês,quetrabalhavacomobjectosmuitomenoscarregadosdoqueumagarrafadeLeyden,conseguiraproduzirumadescargaatravésdumrecipienteondeprovocaraovazio,obtendoluznoprocesso.

1.Sefossepossívelobservaronúcleodumátomodopontodevistadumelectrãoemórbita,onúcleoteriaoaspectodumpequenopontosituadoagrandedistância.

2.Apesardepossuircarga igualàdoprotão,emboradesinalcontrário,oelectrão temapenas1/1837dasuamassa.

Nessa época, no entanto, o processo de obtenção do vácuo num recipiente era ainda muitoimperfeito. Ficava sempre algum ar no seu interior, o suficiente para provocar uma luminescênciaaquando da passagem da electricidade. E isso não era a electricidade em simesma. Para pôr a nu aelectricidade, duas coisas se afiguravam necessárias: o vazio no interior do recipiente devia sersuficiente para que o ar remanescente não interferisse com a electricidade; e havia que encontrar ummododeforçarquantidadessignificativasdeelectricidadeatravésdumvácuoadequado.Umagarrafade

Leydenpodiaserusadaparaesseefeito,masadescarganelaobtidaduravaapenasuminstante.Haveriaalgumamaneirademanteraelectricidadeafluirduranteperíodosconsideravelmentemaislongos?

O segundo problema foi resolvido em 1800 pelo físico italiano Alessandro Giuseppe Volta(1745-1827).Voltamostrouqueerapossívelproduzirelectricidademergulhandodoismetaisdiferentesnuma solução salina. Esse procedimento era acompanhado duma reacção química e, enquanto estadurasse,produzia-seelectricidade.Sealgumadessaelectricidadefosseextraídausandoumfiometálico,elacirculariaporesteenquantoexistissereacçãoquímica.

Graças a esta descoberta, tornou-se possível produzir correntes eléctricas em vez de merascargas eléctricas estacionárias. Volta utilizou diversas combinações de dois metais imersos em águasalgada para produzir correntes eléctricas intensas. Chamamos pilha a qualquer dessas combinações.Voltaacabaradeinventarumapilhaeléctrica.

ApósoanúncioporVoltadasuadescoberta,oscientistascomeçaramaconstruirpilhascadavezmaiores emais perfeitas e, no espaço duma geração, Faraday tinha inventado ummétodomuitomaiseconómico de produzir uma corrente eléctrica mediante a queima dum combustível. A criação decorrentes eléctricas suficientemente fortes para se deslocarem através do vácuo deixou assim deconstituirumproblema-desdequefossepossívelproduzirumvácuoadequado.

OhomemqueresolveuesseproblemafoioinventoralemãoJohannHeinrich"WilhelmGeissler(1814-1879). Em 1855, Geissler inventou uma bomba de ar que constituiu um avanço significativorelativamente às bombas anteriormente utilizadas. Em vez de recorrer a dispositivos mecânicosconstituídosporcomponentesmóveis,Geisslerusouapenasníveisdemercúrioquesubiamedesciam.Acadaalteraçãodoseunível,omercúrioaprisionavaumapequenaporçãodearqueeraextraída.Tratava-sedumprocessolento,masestabombademercúriopermitiaextrair99,9porcentodoardumrecipiente.

Geissler, que era especialista no fabrico de objectos de vidro, concebeu recipientes destematerial evacuados e selados que incluíam duas pequenas placas demetal nas suas extremidades.Osdispositivos foramdesignados tubosdeGeisslerpeloseuamigoecolaborador,o físicoalemãoJuliusPlücker(1801-1868).Esteligouasduasplacasdemetalaosdoispólosdumequipamentodeproduçãodeelectricidade.Destemodo,umadasplacas, aque se chamouânodo, ficou carregadapositivamente.Aoutraadquiriuumacarganegativaefoidesignadacátodo.

Tais designações foram utilizadas pela primeira vez por Michael Faraday. O ânodo positivoderivaoseunomedumaexpressãogregaquesignifica"viasuperior",enquantoqueocátodonegativoprovém duma expressão que significa "via inferior". Desde o tempo de Benjamin Franklin que seacreditavaqueaelectricidadefluíadepositivoparanegativo,ouseja,doânodo(superior)paraocátodo(inferior),àmaneiradaáguaquefluidumnívelsuperiorparaumnívelinferior.

PlückerobrigouaelectricidadeaatravessarovácuocriadonumtubodeGeissleredestaveznãoexistiaaremquantidadesuficienteparaprovocarluminescência.Aindaassim,ofenómenofoiobservado.Tratava--se duma luminescência verde junto ao cátodo, sempre junto ao cátodo. Plücker anunciou asobservaçõesrealizadasem1858efoiessaaprimeiraindicaçãodequetalvezFranklinestivesseerradoeaelectricidadenãofluíssedoânodoparaocátodo,masnadirecçãocontrária.

Seria a luminescência esverdeada a própria corrente eléctrica? Plücker não tinha a certeza eadmitiuquesetratassedepequenaspartículasdemetalincandescentesquesetivessemlibertado.Ouquealuminescênciativessequevercomogásresidualquepermanecianotubo.

OfísicoalemãoEugenGoldstein(1850-1930)estudoucuidadosamenteofenómenoeconcluiqueeraindiferenteogáscomqueseencheraotuboantesdeneleproduzirumvácuo.Verificou,alémdisso,

queometaldequeeramfeitosânodoecátodo tambémnão importava.Aúnicacoisaquesemantinhaconstante em todos os casos era a corrente eléctrica, pelo queGoldstein conclui que a luminescênciaestava associada à própria corrente eléctrica. Em1876, chamou aomaterial que atravessava o vácuoraioscatódicos.

Estavaimplícitonestadesignaçãoqueacorrenteeraemitidapelocátodoeviajavaparaoânodo.Comefeito,ovidroficavaluminescentenoladodoânodo,comoseosraioscatódicosoatingissemelhetransmitissemenergia.

Em 1869, o físico alemão Johann Wilhelm Hittorf (1824-1914), que fora aluno de Plücker,mostrouquequandoumobjectosólidoeraencerradonotubodiantedocátodo,produziaumasombranaluminescênciaquesurgiadoladodoânodo.Pareciapoisevidentequealgoviajavadesdeocátodoeeraempartedetidopeloobjectosólido.

1.Em1858,JuliusPlückeranunciouterobservadoumaluminescênciaesverdeadajuntoaocátodocarregado negativamente no quasivácuo dum tubo de Geissler. Foi a primeira indicação de que asuposiçãodeBenjaminFranklinacercadadirecçãodacorrenteeléctricapodiaestarerrada.

2.Em1876,EugenGoldsteindefendeuquealuminescênciaestavaassociadaàprópriacorrente.Chamouaomaterialqueatravessavaovácuoraioscatódicos.Acorrentefluídocátodoparaoânodo.

OfísicobritânicoWilliamCrookes(1832-1919)concebeudispositivosaindamaisperfeitosparaobtervácuoe,em1878,criouochamadotubodeCrookes,ondeoarremanescenterepresentavaapenasI/75000daquelequeexistianostubosdeGeissler.(Todosestesdispositivosficariamconhecidoscomotubos de raios catódicos.) Tornou-se então mais fácil observar os raios catódicos e Crookes pôdedemonstrarquesedeslocavamemlinharectaequeerapossívelfazergirarumapequenarodacomeles.

Mas o que é que saía dos cátodos? Seriam os raios catódicos constituídos por partículas ouondas?Ambasaspossibilidadestinhamosseusdefensoresentreoscientistas,numarepetiçãododebateentreNewtoneHuygensapropósitodanaturezadaluz.Osargumentosafavordanaturezacorpusculardosraioscatódicoseramsemelhantesaosquetinhamsidousadosnapolémicasobrealuz,baseando-se,principalmente,nofactodosraioscatódicosproduziremsombrasbemdefinidas.

No entanto, o factoda concepção corpuscular ter sidodecisivamentederrotadano casoda luzlevoualgunscientistasahesitar,poisnãoqueriamservistosaapoiaraquelequepodiaserdenovooladoperdedor.(Osgeneraissãocomfrequênciaacusadosdeestaremsemprepreparadosparaaguerraanterior.Oscientistassãosereshumanosetambémserecordamdasbatalhastravadasnopassado.Porvezesrevelamumatendênciaparadeixarqueassuasexperiênciasanterioresinfluenciemainterpretaçãodenovosfenómenos.)

AvozquemaisaltoselevantouemdefesadanaturezaondulatóriadosraioscatódicosfoiadeHertz, que descobrira as ondas rádio. Em 1892, este cientista demonstrou que os raios catódicosconseguiam atravessar finas folhas demetal.Hertz considerava que partículas não eram capazes de ofazer, emboraomesmonão se passasse comondas, umavezque, se as folhas fossem suficientementefinas,atéasondasluminosasconseguiamatravessá-las.

PhilippEduardAntonvonLenard (1862-1947),umalunodeHertz, concebeuum tubode raioscatódicos com uma pequena e delgada "janela" de alumínio. Os raios catódicos podiam dispersar-seatravés da janela e sair do tubo. Se os raios catódicos fossem ondas de comprimento muito curto,deslocar-se-iamemlinharectaeproduziriamsombrasbemdefinidas,àmaneiradasondasluminosas.Noinício do século XIX, e durante algum tempo, a ideia de que os raios catódicos eram ondas gozou,portanto,degrandeaceitação.

E, todavia,seos raioscatódicosemergiamdocátodocarregadonegativamente,nãoeranaturalquetransportassemumacarganegativa?Seassimfosse,seriaumaindicaçãodequeosraiosnãoeramondas,umavezquenenhumasondasconhecidasnaqueletempotransportavamqualquercargaeléctrica,por mais pequena que fosse. Além disso, se os raios catódicos transportassem uma carga eléctrica,seriamafectadospelapresençadumcampoeléctrico.

Em1883,Hertz resolveu testaressahipótese, fazendopassar raioscatódicosentreduasplacasmetálicasparalelascarregadaspositivaenegativamente.Seosraioscatódicos tivessemcarga,deviamafastar-sedasuatrajectóriaemlinharecta,mastalnãoaconteceu.Hertzconcluiuqueosraiosnãotinhamcargaetambémissoconstituiuumargumentoafavordahipóteseondulatória.

AquiloqueHertznãocompreendeufoiqueosraioscatódicossedeslocavammuitomaisdepressado que imaginava e que, por conseguinte, passavam para além das placas metálicas muito antes depoderemalterarsignificativamenteasuatrajectória.Esseproblemapodiaserultrapassadoseasplacasestivessemsuficientementecarregadas,mastalnãosucedera.Agrandevelocidadedosraioscatódicoseas placasmetálicas fracamente carregadas tornavam imperceptível o desvio das trajectórias em linharecta e, por isso, a conclusão de Hertz não era válida. (As experiências científicas nem sempreconstituem a última palavra sobre determinado assunto. Uma experiência específica, mesmo queexecutadadeformahonestaeinteligente,podeproduzirumarespostaerradaporumamultiplicidadederazões. É por isso importante que as experiências sejam verificadas por outros cientistas, utilizandooutrosinstrumentos,outrascondiçõese,sepossível,outrasideias.)

Foiassimque,em1895,Perrin(oqual,nadécadaseguinte,haveriadedemonstraraexistênciados átomos) mostrou que os raios catódicos podiam induzir uma grande carga negativa num cilindrosobreoqual incidiam.Eradifícilcompreendercomoéqueosraioscatódicospodiamtransportarumacarga negativa desde o cátodo até ao cilindro sem que eles próprios estivessem negativamentecarregadosenquantosedeslocavam.EstadescobertafragilizouconsideravelmenteaconclusãodeHertz.

Algumtempomaistarde,ofísicobritânicoJosephJohnThomson(1856-1940)decidiurepetiraexperiência de Hertz com placas metálicas electricamente carregadas. Thomson tinha a vantagem deconhecer a velocidade a que se deslocavam os raios catódicos. Em 1894, determinara que estes semoviamàvelocidadede200quilómetrosporsegundo.Alémdisso,conseguiraproduzirnoseutuboumvácuomaisperfeitodoqueHertzeutilizavaplacascomumacargaconsideravelmentemaior.

Em1897,Thomson provocou uma descarga de raios catódicos entre duas placas carregadas edescobriuqueocampoeléctricocausavaumdesviosignificativodatrajectória,queseafastavadaplacacomcarganegativaeseaproximavadaqueestavapositivamentecarregada.Aexperiênciaconvenceu-o,e aos físicos dum modo geral, de que os raios catódicos eram constituídos por partículas que sedeslocavamagrandevelocidadeequetransportavam,cadaqual,umacargaeléctricanegativa.

Neste caso, o veredicto foi o oposto daquele que fora pronunciado para a luz. No que diziarespeito à luz, as ondas tinham levado amelhor sobre as partículas.No caso dos raios catódicos, aspartículas tinham ganho às ondas. (Como veremos adiante, nenhuma destas vitórias foi absoluta. Naciência,aescolhaentrealternativasnãoémuitasvezesumasituaçãotãopretonobrancocomoàprimeiravistapodeparecer.)

AsPartículasdosRaiosCatódicosA deflexão duma partícula carregada por um campo eléctrico depende de três coisas: da

magnitudedacargaeléctricatransportadapelapartícula,davelocidadeaqueapartículasedeslocaedasuamassa.Adeflexãodumapartículacarregadaporumcampomagnéticodependedestesmesmos trêsfactores,masdummododiferente.SeThomsonconseguissemedirambosostiposdedeflexãopoderia,apartirdosdoisconjuntosdemedições,calcularorácioentreacargaeamassadaspartículas.Umavezdeterminadoessevaloreconhecidaamagnitudedacargaeléctricadaspartículas,seriapossívelcalculararespectivamassa.

Tambémnãoeradetodoimpossívelcalcularacargaeléctrica.Faradayestudaradetalhadamenteo modo como as correntes eléctricas induziam reacções químicas e estabelecera as leis daelectroquímica em 1832. A partir destas, e de medições cuidadosas da quantidade de electricidadenecessária para obter a deposição duma determinadamassa demetal a partir duma solução dos seuscompostos, foi possível calcular a magnitude da carga eléctrica necessária para depositar um únicoátomodemetal.

Não pareceu aos cientistas demasiado arriscado supor que a carga eléctrica envolvida naalteraçãoquímicadumúnicoátomoeraamaispequenacargaeléctricaquepodiaexistir.Erapor issorazoáveladmitirqueumapartículadumraiocatódico transportasseestacargaeléctricamaispequena.Poroutraspalavras,queestaspartículas fossemparaaelectricidadeaquiloqueosátomos sãoparaamatéria-ou,comoseestavaemviasdedescobrir,oqueoquantumeraparaaenergia.

Partindo deste pressuposto e das medições das deflexões sofridas pelos raios catódicos napresençadumcampoeléctricoedumcampomagnéticodeintensidadesconhecidas,Thomsonfoicapazdecalcularamassadumapartículadumraiocatódico.Em1906,ser-lhe-iaatribuídooPrémioNobelporessefeito.

Os resultados foram surpreendentes. O átomo mais pequeno que se conhecia na época deThomson(enanossa também)eraoátomodehidrogénio.Naverdade, temosactualmenteacertezadeque o átomo de hidrogénio é omais pequeno átomo que pode existir. Contudo, as partículas do raiocatódico revelaram possuir umamassamuitomais pequena do que a dos átomos de hidrogénio.Comefeito,asuamassaéapenas1/1837dadomaispequenoátomo.

Duranteumséculo,oscientistastinhamacreditadoqueosátomoseramascoisasmaispequenasquepodiamexistireque,porisso,oátomomaispequenoeraamenorentidadequepossuíamassa.Masagora essa ideia estava feita em pedaços ou tinha, pelomenos, de sermodificada. Contudo, talvez amodificação nem precisasse de ser muito radical. Na sequência das experiências de Thomson, erapossívelcontinuaradefenderqueosátomoseramosmaispequenosconstituintesdematériaquepodiamexistir.Eargumentarqueaelectricidadenãoeramatéria,masumaformadeenergiamuitomaissubtil.Dessepontodevista,nãosurpreendiaqueaspartículasdosraioscatódicos,quepodiamserencaradascomo"átomosdeelectricidade",fossemmuitomaispequenasdoqueosátomosdematéria.

Eranareduzidadimensãodaspartículasdosraioscatódicosqueresidiatalvezaexplicaçãoparaofactodumacorrenteeléctricaconseguiratravessaramatéria,oudaspartículasconseguirematravessarfinas folhas metálicas. A passagem dos raios catódicos através de metais fora considerada um forteindício de que eles não podiam ser partículas, mas aquando da descoberta do fenómeno, ninguém

imaginava quão pequenas tais partículas eram. (As experiências podem induzir em erro mesmo osmelhorescientistas,quandofaltamalgunsdadosimportantes.)

Aspartículasdequesãoconstituídososraioscatódicossãodesignadaspartículassubatômicas,porseremmuitomaispequenasdoquequalquerátomo.Foramasprimeiraspartículasdestetipoaseremdescobertas, e as primeiras dum conjunto de partículas que iriam alterar completamente a nossaconcepção acerca da estrutura da matéria. A sua descoberta aumentou o nosso conhecimento,revolucionouastecnologiasetransformouradicalmenteonossomododevida.(Aquestãodatecnologianão é assunto deste livro, mas o facto merece ser referido. Por mais que as descobertas científicaspareçamserfeitasemtorresdemarfim,existesempreumapossibilidademuitorealdeelasnosviremaafectardemodomuitosignificativo.)

Que nome deveria ser atribuído às partículas dos raios catódicos? Nomear uma coisa nãoaumentaonossoconhecimentoacercadela,mastornamaisfácilreferi-laediscutirassuaspropriedades.Em 1891, o físico irlandês George Johnstone Stoney (1826-1911) sugeriu que a mais pequena cargaeléctricaquesepodiadeduzirdasleisdeFaradayfossedesignadaelectrão.Thomsongostoudonomeeaplicou-oàpartículaenãoàcargaqueelatransportava.Onomepegouetornou-sefamiliar,mesmoentreo público não científico (basta pensarem em todos os dispositivos electrónicos com que lidamosdiariamente, tais como televisões e gira-discos). Podemos por isso dizer que Thomson descobriu oelectrãoem1897.

OsRaiosXNo capítulo anterior, referi a descoberta da radiação que, no espectro electromagnético, se

situava bem para lá do ultravioleta, na direcção das ondas curtas. Não entrei então em grandespormenores,maséchegadaaalturadefalarmosmaisdemoradamentesobreela.

Na última década do século XIX, o físico alemão Wilhelm Konrad Roentgen (1845-1923)estudavaosraioscatódicosdumamaneiramuitoparticular.AocontráriodeHertzeThomson,nãoestavapreocupadocoma suanatureza, antes como seuefeito sobredeterminadoscompostosquímicos.Comefeito,aoincidiremsobreessescompostos,osraioscatódicosprovocavamfenómenosdeluminescência.Ouseja,taiscompostosadquiriamenergiaquedepoisperdiamdenovosobaformaderadiaçãodeluzvisível.

Um dos compostos que apresentava esse fenómeno de luminescência era uma substânciadenominadaplatinocianetodebário.Noseulaboratório,Roentgentinhafolhasdepapelrevestidascomessecomposto.

A luminescência produzida era bastante ténue e, para a observar melhor, Roentgen resolveuescurecer o seu laboratório e cobrir com pedaços de cartão negro o dispositivo experimental. Dessemodo,podia trabalharnumespaço totalmente escurecido.Quando ligava a corrente eléctrica, os raioscatódicos percorriamo tubo, atravessavama fina paredenumadas suas extremidades, incidiam sobreumafolhadepapelrevestidacomocompostoquímicoeprovocavamumfenómenodeluminescênciaqueRoentgenpodiaobservareestudar.

Nodia5deNovembrode1895,Roentgenligouacorrentee,aofazê-lo,reparoupelocantodoolhonumténueclarãoluminosoquenãoestavadentrododispositivoexperimental.Olhounessadirecçãoenotouque,aumadistânciaconsideráveldoaparelho,umadas folhascobertascomplatinocianetodebáriocintilava.

Roentgenresolveudesligaracorrenteeafolhadepapelrevestidaficouescura.Voltoualigá-laea folha voltou a iluminar-se. Levou a folha para outra sala, que colocou na obscuridade fechando asportadasdasjanelas.Quandoligoudenovootuboderaioscatódicos,afolhadepapelvoltouailuminar-senessasala.

Roentgenconcluiqueo tuboderaioscatódicosestavaaproduzirumaradiaçãoquenãoeraderaios catódicos - uma radiação capaz de atravessar cartão emesmo a parede entre as duas salas, aocontráriodaqueles.A28deDezembrode1895,publicouoprimeirorelatosobreestaradiação.Umavezquenãofaziaideiaalgumasobreasuanatureza,resolveuchamar-lheraiosX.Onomepegouearadiaçãopassou,desdeentão,aserassimdesignada.Pelasuadescoberta,RoentgenrecebeuumPrémioNobelem1901,oprimeiroanoemquetaisgalardõesforamatribuídos.

Levantaram-seemrelaçãoaosraiosXosmesmosproblemaseincertezasquetinhamsurgidocoma luzeos raioscatódicos.Alguns físicosadmitiamqueos raiosX fossemfeixesdepartículas,outrosachavam que eram ondas. Destes, alguns (como o próprio Roentgen) pensavam tratar--se de ondaslongitudinais, como as ondas sonoras. Outros acreditavam serem ondas transversais, como as ondasluminosas.Se fossemondas transversais,os raiosXpodiamserum tipode radiaçãoelectromagnéticacomcomprimentosdeondamuitomaiscurtosdoqueosraiosultravioleta,talcomoasrecém-descobertasondasrádioapresentavamcomprimentosdeondamuitomaioresdoquearadiaçãoinfra-vermelha.

O problema estava em decidir entre as duas alternativas. A luz revelara ter uma naturezaondulatóriapelofactodedarorigemafenómenosdeinterferência.Afimdedemonstraraocorrênciadetalfenómeno,fizera-sepassaraluzatravésdeduasranhurassituadasapequenadistânciaumadaoutra.Os efeitos de interferência podiam ser tornados aindamais pronunciados usando redes de difracção -placasdevidroemqueeramfeitasincisõesparalelasmuitopróximasumasdasoutras.Aluz,aopassaratravés dos intervalos entre as incisões, produzia fenómenos de interferência claramente observáveis,permitindomedircomgrandeprecisãooscomprimentosdeonda.

Contudo,quantomaiscurtos fossemoscomprimentosdeonda,maispequenos teriamdeserosespaços entre as incisões. As redes de difracção não poderiam ser usadas com os raios X, se estesfossemrealmenteondastransversaiscomcomprimentosdeondaextremamentecurtos.Foiporessaalturaque o físico alemãoMax Theodor Felix von Laue (1879-1960) compreendeu que não era necessáriotentarfabricarredesdedifracçãocomdistânciasimpossivelmentecurtasentreasincisões,umavezqueaNaturezajátinhaprovidenciadonessesentido.

Oscristaisconsistememátomosemoléculasdumasubstânciaeorganizadosdeummodoregularque se repete no espaço. Tal pode ser inferido das formas dos cristais e da sua tendência parafracturaremsegundocertosplanos,demaneiraaconservaremassuasformas.Naverdade,asfracturasocorremaolongodeplanossituadosentrecamadasadjacentesdemoléculas.LaueconsiderouqueseosraiosXpenetrassemnoscristais,entreascamadas,estespoderiamfuncionarcomoredesdedifracção,com "incisões" que não estariam mais espaçadas do que as suas camadas de átomos. E que um taldispositivopodiarevelarfenómenosdeinterferênciasdosraiosX.

Se os raios X atravessarem um corpo onde os átomos e moléculas estão dispostos de formadesorganizada, são dispersos de forma aleatória. Há um fenómeno uniforme de sombreamento, maisescuronocentroegradualmentemaisclaroàmedidaquenosafastamosdocentroemqualquerdirecção.

Mas se os raios X atravessarem um cristal constituído por camadas ordenadas de átomos emoléculas,ospadrõesdedifracçãodosraiosXsurgemeumachapafotográficarevelamanchasdeluzesombrabemdefinidas,formandoumpadrãosimétricoemtornodocentro.

Em1912,LaueexperimentoufazerpassarraiosXatravésdumcristaldesulfuretodezinco.Tudofuncionounaperfeição,eosraiosXcomportaram-secomoseriadeesperardeondastransversaismuitocurtas.AexperiênciaesclareceudevezaquestãoeLauerecebeuem1914umPrémioNobelpeloseutrabalho.

O físico britânico William Henry Bragg (1862-1942), juntamente com o seu filho, WilliamLawrenceBragg (1890-1971), estudantede física emCambridge, compreenderamqueadifracçãodosraios X podia ser usada para determinar o seu comprimento de onda desde que a distância entre ascamadasdeátomosnocristalfosseconhecida.Em1913,osBraggdeterminaramqueocomprimentodeonda dos raios X representava qualquer coisa entre I/50 e I/30 000 do comprimento de onda da luzvisível.Peloseutrabalho,partilharamumPrémioNobelem1915.

ElectrõeseÁtomosPareceóbvio,quandopensamosnoassunto,queoselectrõesexistemnamatéria.Consideremos

os primeiros estudos sobre a electricidade, quando uma carga eléctrica era produzida esfregandosimplesmente uma vareta de vidro ou pedaço de âmbar. Dever-se-ia isso ao facto dos electrões sedeslocarem do objecto esfregado para o objecto com o qual se esfregava, ou vice-versa? Qualquersubstância que receba electrões adicionais acumulará uma carga negativa, e qualquer substância quepercaalgunsdosseuselectrõesficarácomumacargapositiva.Aserassim,oselectrõestêmàpartidadeestarpresentesnamatéria,paraquepossamsertransferidosnumsentidoounooutro.

Por outro lado, uma corrente eléctrica pode consistir em electrões deslocando-se através domaterial onde essa corrente é criada.Assim, quandonum tubo de raios catódicos a corrente eléctricaalcançaocátodo,oselectrõesacumulam-se(conferindo-lheumacarganegativa,queéoquefazdessaextremidade um cátodo) e são forçados para o vácuo sob a forma dum feixe de partículas de raioscatódicos.

O impulso eléctrico desloca-se à velocidade da luz. Se tivermos fios eléctricos ligando umtelefoneemNovaIorqueaoutroemLosAngeles,umavozpodemodularnaprimeiradestascidadesumfluxo eléctrico, o qual irá depois reproduzir a voz na segunda cidade cerca de 1/60 de segundomaistarde.Ospróprioselectrões,todavia,colidemunscomosoutros,deslocando-semuitomaisdevagar.

A situação é análoga à queocorre quando, comumpiparote, lançamosumapeçadum jogodedamascontraumalongafieiradepeçassemelhantes.Assimqueanossapeçaatingeaprimeiradafieira,aúltima,naoutraextremidade,saidisparada.Aspeçassituadasnomeiopraticamentenãosemexem,maso impulso de compressão e expansão desloca-se ao longo da fieira de peças à velocidade do som,fazendosairaúltimadelas.

Apesardeaexistênciadoselectrõesnamatériaparecerbastanteprovável, considerava-sequeessas partículas de electricidade existiam independentemente dos átomos, que eram consideradosentidadesuniformeseindivisíveis.

Naverdade, as experiênciasquímicas realizadasduranteo séculoXIX tinhamdadoaentenderqueosátomoseramindivisíveis,masaafirmaçãodequeeramentidadesuniformesnãopassavadumasuposição.Contudo,oscientistassãosereshumanosenaciência,comonoutrosdomíniosdopensamento,umasuposiçãodefendidadurantemuitotempoassumeporvezesaforçadumaleicósmica.Aspessoastendemaesquecerquesetrataapenasdumahipóteseetêmdificuldadeemencararapossibilidadedelapoderestarerrada.

A este propósito, considerem o modo como uma corrente eléctrica pode passar através dealgumassoluçõesmasnãodeoutras.OfenómenofoiprimeiroestudadodemodosistemáticoporMichaelFaraday.

Assim,umasoluçãodesaldecozinha(cloretodesódio)conduziráaelectricidade,talcomoVoltadescobriraquandoconstruiuaprimeirapilhaeléctrica.Ocloretode sódioé,por isso,umelectrólito.Masumacorrenteeléctricanãoatravessaumasoluçãodeaçúcar.Esteéporissoumnão-electrólito.

Com base nas suas experiências, Faraday concluiu que algo na solução transportava cargasnegativasnumadirecçãoecargaspositivasnaoutra.Nãosabiaexactamenteoqueera,maspodiadar-lhe

umnome.E resolveu chamar a esses transportadores de carga iões, dumapalavra grega que significa"caminhantes".

Na penúltima década do século XIX, um jovem estudante sueco de química, Svante AugustArrhenius(1859-1927)abordouoproblemademodoinovador.Aáguapuratemumpontodecongelaçãofixo a 0o C.A água que tem um não-electrólito nela dissolvido (por exemplo, açúcar) congela a umatemperatura ligeiramente inferior.Quantomaisaçúcardissolvermosnaágua,maisbaixose tornaoseuponto de congelação. Na verdade, a redução do ponto de congelação é proporcional ao número demoléculas de açúcar nela dissolvidas. Isto é verdade também para outros não-electrólitos. Um igualnúmerodemoléculas de qualquer não-electrólito em solução reduz em idêntica proporçãoo ponto decongelaçãodaágua.

Comoselectrólitosasituaçãoédiferente.Sedissolvermoscloretodesódioemágua,areduçãodopontodecongelaçãoéduasvezesaquelaqueseriadeesperar,tendoemcontaonúmerodemoléculasqueseencontramemsolução.Porquerazãoéqueascoisassepassamassim?

Amoléculadecloretodesódioéconstituídaporumátomodesódio(Na)eumátomodecloro(Cl).Asuafórmulaé,porisso,NaCl.Arrheniussugeriuquequandoocloretodesódioeradissolvidoemágua,asmoléculassedissociavamnosseusdoisátomos,NaeCl.PorcadamoléculadeNaClforadasoluçãoexistiamemsolução,porassimdizer,duasmeiasmoléculas-NaeCl.Haviaportantoduasvezesmaispartículasemsoluçãodoqueseimaginavaeporissoareduçãodopontodecongelaçãoeradupladaprevista.(Asmoléculasconstituídaspormaisdedoisátomospodem-sedissociaremtrêsoumesmoquatro partes e originar uma redução do ponto de congelação que é três, ou mesmo quatro, vezes aesperada.)

Umamolécula de açúcar comum possui 12 átomos de carbono, 22 átomos de hidrogénio e 11átomos de oxigénio, num total de 45 átomos. Todavia, quando é dissolvida em água não se dissocia,permanecendo na sua forma molecular original. Por conseguinte, só existe em solução o número demoléculasesperadoeareduçãodopontodecongelaçãocorrespondeapenasaovalorprevisto.

Quandoocloretodesódiosedissocia,porém,nãopodedarorigemavulgaresátomosdesódioecloro. As propriedades destes são conhecidas e não se encontram numa solução salina. Algo tem deacontecer para queo sódio e cloro do cloreto de sódio dissociado sejamdiferentes do sódio e clorovulgares.

ParaArrhenius,arespostaresidianofactodecadafragmentodissociadodamoléculadecloretode sódio transportarumacargaeléctrica e serumdos iõesdequeFaraday falara.Tendoemcontaosresultados da experiência em que uma corrente eléctrica passava através duma solução de cloreto desódio,erafácilargumentarquecadapartículadesódioformadapordissociaçãotransportavaumacargapositivaeeraumiãosódioquepodiaser representadoporNa+,enquantoquecadapartículadeclorotransportavauma carganegativa e era um ião cloro, que se escreviaCl'.Eraprecisamenteporque oselectrólitos tinham tendência a dissociar-se e a dar origem a tais fragmentos com carga eléctrica queeramelectrólitosepodiamconduzircorrenteseléctricas.

Osiõessódioecloroapresentampropriedadesmuitodiferentesdasdosátomosdesódioecloro,quenãotêmcargaeléctrica.Eporissoqueumasoluçãodesalvulgarconstituiumasubstânciainócua,enquantoqueosódioeoclorosãoambostóxicos.Osnão-electrólitos,comooaçúcar,nãosedissociam,dandoorigemafragmentoscarregadoselectricamentequepossamtransportarumacargae,porisso,nãoconduzemacorrenteeléctrica.

1.e2.Quandosaldecozinhavulgar,cloretodesódio(NaCl),édissolvidoemágua,dissocia-seemiõesdesódiodecargapositivaNa*eiõescloretodecarganegativaCl'.

3.Átomosemsoluçãoeforadela.Em 1884, Arrhenius apresentou a sua teoria da dissociação tónica sob a forma duma tese de

doutoramento.Ojúrideexaminadoresrecebeu-acomfrieza,umavezqueosseusmembrosnãoestavampreparadospara aceitarqualquer teoriaque falassede átomos transportandocarga eléctricas.Comoéqueosátomospodiamtransportarcargaseléctricasseeramuniformeseimutáveis?(Osmembrosdojúriestavamirremediavelmenteprisioneirosdessepressuposto.)

Ojúrinãopodiarejeitaratese,umavezqueaargumentaçãodeArrheniuserasólidaetambémporqueelapermitiaexplicarmuitascoisasquedeoutromodoseriamincompreensíveis.Aindaassim,elefoiaprovadocomamaisbaixanotapossível.

Quando,trezeanosmaistarde,J.J.Thomsondescobriuoelectrão,tornou-sesubitamenteóbvioque os átomos podiam transportar um ou dois electrões a mais ou perder um ou dois daqueles quenormalmentepossuíam.Cadaanoquepassavatrazianovasdescobertasquetornavamessapossibilidademais certa e, em 1903, Arrhenius foi galardoado com o Prémio Nobel pela mesma tese com que,dezanoveanosantes,foraaprovadoàjusta.

Eclaroquededuzirapresençadeelectrõesunicamentedocomportamentodoselectrólitosnãoerainteiramentesatisfatório.Haveriaalgumamaneiradeobservardirectamenteoselectrõesnosátomos?Seriapossível,porexemplo,arrancarelectrõesaosátomosedetectá-los?

Em 1887, quando Herz fazia experiências com o dispositivo de detecção que lhe permitiriaprovaraexistênciadeondasrádionoanoseguinte,verificouquesurgiaumafaíscanoespaçoexistenteno seu dispositivo sempre que a electricidade o atravessava. Mas Hertz verificou ainda outra coisacuriosa:asfaíscasapareciamcommaisfacilidadequandosefaziaincidirluzsobreele.

Aparentemente,aluztinhaumqualquerefeitosobreadescargaeléctrica,eporissoofenómenoficouconhecidocomoefeitofotoeléctrico,tendooprefixo"foto-"origemnapalavragregaquesignifica"luz".

Noano seguinte,outro físicoalemão,WilhelmHallwachs (1859-1922),descobriuqueoefeitofotoeléctrico não era igual com os dois tipos de carga eléctrica. Um fragmento de zinco metálicocarregadonegativamenteperdiaasuacargaquandoexpostoaraiosultravioleta.Omesmofragmentodezinco, transportando uma carga positiva, não era de todo afectado pela radiação ultravioleta,conservandoasuacarga.Nãoexistiaumaexplicaçãoparaestefenómeno,atéThomsonterdescobertooelectrãoesecomeçaraacreditarquepodiamexistirelectrõesnamatéria.

Noprimeirodos fenómenosemquestão, surgiauma faíscanoespaçododispositivoporqueoselectrõeseram forçadosaabandonarumadas suasextremidadesmetálicas.Seporalguma razãoa luzprovocasse a ejec-ção de electrões, a faísca formava-se com mais facilidade. Analogamente, umfragmentodezincoqueestivessenegativamentecarregadotransportavaumexcessodeelectrões.Sealuzprovocasseaemissãodesseselectrões,ozincoperdiaasuacarga.Ozincoqueseapresentavacarregadopositivamentetinhaumadeficiênciadeelectrõese,umavezquenãoeradeesperarquealuzfornecesseelectrõesparasupriressadeficiência,acargapositivapermaneciainalterada.

Estaera,pelomenos,umaexplicaçãofácilparaasprimeirasobservaçõesdoefeitofotoeléctrico.Contudo, não correr precipitadamente atrás duma explicação fácil constitui uma prática recomendávelparatodososcientistas,porqueoslevaporvezesacairemarmadilhas(comoquandoalgunsconcluíramqueosraioscatódicosnãoeramconstituídosporpartículasporqueatravessavamfinasfolhasmetálicas).

E,porisso,ofactodehaverelectrõesarrancadosdamatérianão■significavanecessariamentequeelesexistiamoriginalmentenessamatéria.Em1905,Einsteindemonstrou,noâmbitodasua teoria

restrita da relatividade, que a massa era uma forma de energia. Amassa podia ser transformada emenergiaeaenergiaemmassa.

Aluzcontinhaenergia.Podiaentãodar-seocasodaenergiadaluz,aoatingirometalsobcertascondições,serconvertidanumpequenofragmentodemassa-umelectrão-quetransportavaconsigoumapequenapartedacarganegativadometal?Dessemodo,surgiriamelectrõesquenuncatinhamfeitopartedometal.

AteoriadeEinstein,porém,nãose limitavaaafirmarquemassaeenergiaeramintermutáveis.Apresentavaumaequaçãosimplesquemostravaquantamassaseriaconvertidaemquantaenergia,evice-versa.Ora,verifica-sequemesmoumapequenaquantidadedemassapodeserconvertidanumagrandequantidade de energia; e que, inversamente, é necessária uma grande quantidade de energia paraconstituirumapequenaquantidadedemassa.

Oelectrãoéumaporçãoparticularmentepequenademassa,mas,aindaassim,aquantidadedeenergianecessáriaparaoformarnãoestápresentenosraiosultravioletas,comoembreveseverificaria.Oefeitofotoeléctriconãopodia,portanto,seroresultadodacriaçãodeelectrõesapartirdeenergia-tinhadeseroresultadodaemissãodeelectrõesjápresentesnosátomosdometal.

Paraarrancardamatériaumelectrãoquejáexisteénecessáriamuitomenosenergiadoqueparacriarumelectrãoderaiz.Nestecaso,porconseguinte,aexplicaçãomaissimplesprovouseracorrecta(e,naverdade,éagradávelquetalsuceda,porvezes,naciência).

É claro que existia ainda a possibilidade de não serem electrões aquilo que era ejectado dometal. Podia tratar-se doutro tipo de partícuLa transportando uma carga negativa. Em 1889, todavia,Thomson aplicou campos magnéticos e eléctricos às partículas emitidas e verificou que possuíam amesmamassaecarganegativadoselectrões.Confirmadaacorrespondênciadessasduaspropriedades,pareciaóbvioqueaspartículasfotoeléctricaseramelectrõese,desdeentão,nenhumoutrofactosurgiuqueviesseabalaressaconvicção.

ElectrõeseQuantaPhilippLenardestudouoefeitofotoeléctricoem1902,mostrandoqueoselectrõesemitidospor

diversosmetais apresentavam sempre propriedades idênticas. Por outras palavras, embora existissemmuitosátomosdiferentes,todosestavamassociadosaumúnicotipodeelectrões.Tendoemcontaqueoscientistasadoramasimplicidade,essainformaçãofoimuitobemrecebida.

Poroutro lado,Lenarddescobriuquea luznãoera toda igualquandose tratavade induzirumefeito fotoeléctrico. Acontecia frequentemente a luz vermelha não provocar a emissão de electrões etornaraluzmaisintensanãoalteravaesseestadodecoisas.Pormaisintensaquefossealuz,nãoeramemitidosquaisquerelectrões.

Contudo, se ummetal específico fosse exposto a luz de comprimentos de onda cada vezmaiscurtos,acabavaporsechegaraumpontoondecomeçavamaseremitidoselectrões.Ocomprimentodeondaaquetalsucedeéconhecidocomovalorlimite.

Quando se atinge o valor limite, os electrões emitidos deslocam-se amuito baixa velocidade,como se a luz apenas dispusesse de energia suficiente para provocar a sua ejecção e nadamais. Setornarmosmais intensaa luznocomprimentodeondadovalor limite, serãoemitidosmaiselectrões -mastodoscontinuarãoamover-semuitolentamente.

Se o mesmometal for exposto a luz de comprimento de onda gradualmente inferior ao valorlimite, os electrões serão emitidos comvelocidade crescente.Avelocidadedos electrõesdependedocomprimento de onda, enquanto que o número de electrões emitidos depende da intensidade da luz.Metais diferentes apresentam valores limite diferentes, como se alguns estivessemmenos ligados aosseuselectrõesdoqueoutros.

Lenardfoiincapazdeexplicarestefenómeno,comoderestosucedeucomJ.J.Thomsonquandosobre ele se debruçou. A física tradicional do século XIX não parecia funcionar. Quando finalmentesurgiuasolução,elaveioatravésdateoriaquântica,concebidaporPlanckcincoanosantes.

Planckadmitiraquea radiaçãoelectromagnética existia soba formadequantadedeterminadadimensão.Quantomenorfosseocomprimentodeonda,maiorseriaoteorenergéticodumquantum.

Étambémverdadequequantomaiscurtoéumcomprimentodeonda,maioréonúmerodeondasquearadiaçãopodeproduzirporsegundo.Onúmerodeondasderadiaçãoporsegundoédesignadoporfrequência.Por isso,quantomaispequenoforocomprimentodeonda,maioréa frequência.Podemosassimdizerqueadimensãodumquantuméproporcionalàsuafrequência.

Até1905,anoçãodequantaapenasforausadaparaexplicararadiaçãodocorponegro.Seriaelaumahabilidadematemáticaqueexplicavaessefenómenoespecíficoenadamais?Existiriamosquantarealmente!

Einstein,cujostrabalhosteóricosde1905permitiriamdemonstrar,algunsanosmaistarde,queosátomosexistiamrealmente,resolveuatacar,nessemesmoano,aquestãodarealidadedosquanta.

Einsteinfoioprimeiroalevarateoriaquânticaasérioeaconsiderá--lamaisdoqueummeroartifícioquepermitiaresolverunicamenteoproblemadaradiaçãodocorponegro.Einsteindispôs-seaaceitarqueaenergiaexistiasempresobaformadequanta,fossemquaisfossemascondições,peloquequaisquerfenómenosenvolvendoenergia,enãoapenasaradiaçãodocorponegro,deveriamtambémtê-

losemconta.AhipótesedeEinsteinimplicavaquearadiaçãoexistiasobaformadequantaquandointeragia

comamatéria.Aradiaçãoatingiaamatériasobaformadequantae,seabsorvida,era-osobaformadequanta.Emqualquerlocalouinstante,essaabsorçãofazia-seporquantainteiros;nemmais,nemmenos.

Sealuzenvolvidanainteracçãotiverumcomprimentodeondalongoeumafrequênciabaixa,osquanta são de baixa energia.Umquantum, quando absorvido, pode não conter energia suficiente paraarrancarumelectrãoadeterminadoátomo.Nessecaso,oquantuméabsorvidosobaformadecaloreoelectrãopodevibrarmaisrapidamentemasnãoseliberta.Seforfornecidoumnúmerosuficientedessesquanta, umadeterminada substância pode absorver energia suficiente para se fundir,mas emmomentoalgumqualquerátomoindividualabsorveenergiasuficienteparaqueumelectrãoseliberte.

Amedida que o comprimento de onda diminui e a frequência aumenta, os quanta contêmmaisenergiaequandoéatingidoovalorlimite,aenergiachegaàjustaparalibertarumelectrão.Umavezquenão existe energia emexcesso que possa aparecer como energia cinética, o electrão desloca-semuitolentamente.

Com comprimentos de onda aindamais curtos e quanta aindamais energéticos, existe energiasuplementar para ejectar um electrão com uma velocidade considerável. Quanto mais curto ocomprimentodeondaemaisenergéticososquanta,maisrápidoéoseumovimento.

Oselectrõesestão ligadosmaisoumenosfortementeaosátomosemfunçãodanaturezadestes,necessitandoassimdequantamaisoumenosenergéticosparaserememitidos.Ovalorlimitevariaporissodeelementoparaelemento.

A teoria quântica explicava duma forma elegante e clara todos os factos observados que serelacionavamcomoefeitofotoeléctrico,oqueconstituíaumfeitoimpressionante.Quandoumateoriaquefoielaboradaparaexplicardeterminadofenómenose revelacapazdeexplicarumfenómenodiferente,aparentemente sem relação com o primeiro, surge a tentação de aceitá-la como representando arealidade.(Aquivemosumexemplodautilizaçãodumateoria:elaexplicacategoriasmuitodiferentesdeobservações.Semateoriaquântica,ninguémteriasidocapazdeseaperceberdaligaçãoentrearadiaçãodocorponegroeoefeitofotoeléctrico-paranãofalardemuitosoutrosfenómenos.)FoipelostrabalhosrealizadosnestedomínioqueEinsteinfoilaureadocomumPrémioNobelem1921.

OndasePartículasSealuzexistesobaformadequanta,esecadaquantumsedeslocaindividualmentepeloespaço,

então o comportamento destes assemelha--se ao de partículas. O quantum recebeu inclusivamente umnomedepartícula.Porcausadoelectrão,aspartículastêmsido,nasuamaioria,baptizadascomnomesterminados em -ão. E assim, em 1928, o físico norte-americano Arthur Holly Compton (1802-1962)chamoufotãoaessequantumemmovimento,dapalavragregapara"luz".

CalhoubemserComptonquemlhedeuonome,umavezqueforaelequem,em1923,demonstraraque a radiação se comportava como um conjunto de partículas, não apenas por ser constituída porentidadesdistintas,masporagircomopartículas.Quantomaiscurtofosseocomprimentodeondaemaisenergéticososquanta,maisprovável se tornavaestesdemonstrarempropriedadescorpuscularesenãoondulatórias.

ComptonestudouomodocomoosraiosXeramdifractadosporcristaisedescobriuquealgumadessa radiação, ao ser difractada, aumentava o respectivo comprimento de onda. Isso significava quepartedaenergiadosquantadosraiosXeratransmitidaaoselectrõesdocristal.

Em 1923, Arthur Holly Compton descobriu que os raios X se comportavam como partículas,perdendoenergiaquandoeramdifractadosporcristais.UmraioXcomporta-secomoumaboladebilharquechocacontraoutra:umaperdeenergiaeaoutraadquire-a.Quantomaiscurtoéocomprimentodeonda,emaisenergéticososquanta,maisprovávelsetornarevelarempropriedadescorpuscularesemvezdeondulatórias.

Comptonconsiderouqueofenómenopodiaserdenaturezacorpuscular,análogoaoquesucedequandoumaboladebilharchocacomoutra,perdendoenergiaqueéadquiridaporesta.Aoestabelecerumarelaçãomatemáticaquedescreviacomprecisãoaquiloquesepassava,descobriuqueassimeranaverdade.OfenómenoéactualmentedesignadoefeitoCompton.

PareciaafinalquetantoNewtoncomoHuygenstinhamestadoparcialmentecertosdoisséculosemeio antes. A luz consistia em algo que era simultaneamente onda e partícula. Isto parece um poucoconfuso.Nomundoquehabitualmentenosrodeia,existemondas,taiscomoasondasnaágua;eexistempartículas,taiscomopartículasdeareia.Enãoháqualquerconfusão.Ondassãoondasepartículassãopartículas.

Aquestãoestáemquealuznãoseassemelhaaosobjectosqueencontramosnormalmenteànossavolta,nãopodendosermetidaàforçaemcategoriasdefinidasdeacordocomasregrasqueaívigoram.Aluz,quandoestudadadedeterminadamaneira,revelafenómenosdeinterferência,comoasondasdeágua.Estudadadeoutrosmodos,noentanto,revelafenómenosdetransferênciadeenergia,àmaneiradasbolasde bilhar. Não existe, porém, qualquer observação capaz de mostrar a luz com-portando-sesimultaneamentecomoondaepartícula.Podemosestudaraluzcomoumaououtracoisa,masnuncaasduasaomesmotempo.

Naverdade,nãosetratadummistérioassimtãoextraordinário.Imagineoleitorqueestáaolhardeladoparaumconedegeladovazio,demodoqueapartemaislargaestejaemcimaeapontaembaixo.Operfiléodumtriângulo.Imagineagoraqueoobservadecima,comaaberturavoltadadirectamenteparasieapontadoladomaisafastado.Oquevêagoraéumcírculo.Sesólheforpermitidoobservaroconedessasduasmaneiras,vê-lo-á,oucomoumcírculo,oucomoumtriângulo,masnuncacomosendo

asduascoisasaomesmotempo.

Eclaroqueoleitorsepodeinterrogarsobreoperfilbidimensionalrealdocone,masarespostaa essa pergunta só poderá ser: "Depende domodo como o observar."Analogamente, o leitor poderáquerersabersealuzérealmenteumaonda,ourealmenteumapartícula.Earespostaaessaperguntaterádeser:"Dependedomodoparticularcomoforobservada."

Umimportanteefeitosecundáriodadescobertadanaturezacorpuscularda luz foique tornouoéterluminíferodesnecessário.Apósumséculodeexistêncianoespíritodoscientistas,duranteoqualanecessidade de explicar a sua existência e propriedades criou uma confusão crescente, o éterdesapareceucomosenuncativesseexistido-e,naverdade,nuncatinhaexistido.

Sealgoquepareciaserumaondarevelavacaracterísticasdepartícula,poderiadar-seocasodealgoquepareciaumapartícularevelarpropriedadesondulatórias?

OfísicofrancêsLouisVictordeBroglie(1892-1987)sugeriu,em1924,queassimera,defacto.BroglieutilizouasequaçõesdeEinstein,querelacionavammassaeenergia,eaequaçãodePlanck,querelacionavaadimensãodumquantumcomafrequênciadaradiação,paramostrarquetodaapartículasedeviacomportartambémcomoumaondacomdeterminadocomprimentodeonda.

Em 1925, o físico norte-americano Clinton Joseph Davisson (1881--1958) estava a estudar areflexãodeelectrõesprovocadaporumalvodeníquelencerradonumtuboondefizeraovácuo.Otubopartiu-seacidentalmenteeoníquelaquecidocombinou-secomooxigéniodoar,formandoumapelículadeóxidona superfície do alvo.Para a remover,Davisson tevede aquecer o níquel durante um longoperíodo. Uma vez terminada a operação, verificou que as propriedades de reflexão dos electrões dasuperfíciedeníquel se tinhamalterado.Antesdo acidente, a superfície era constituídaporumgrandenúmerodepequenoscristais;masagorarestavamapenasalgunscristaisdemaioresdimensões.

Davisson,quetinhaconhecimentodasugestãodeBroglie,pensouqueseriaútil irmais longeeprepararumasuperfíciedeníquelconstituídaporumúnicocristal.Umatalsuperfíciepermitiriatalvezrevelar eventuaispropriedadesondulatóriasdoselectrões.Davisson fez incidirum feixedepartículassobreumatalsuperfícieedescobriuqueoselectrõesnãosóeramreflectidoscomotambémdifractados,dandoorigemafenómenosdeinterferência.Oselectrõestinhammesmopropriedadesondulatórias.

Aindaem1925,ofísicobritânicoGeorgePagetThomson(1892--1975),filhodeJ.J.Thomson,realizou experiências em que electrões rápidos atravessaram películas muito finas de ouro, tendoobservado igualmente fenómenos de difracção. Na sequência de todos estes trabalhos, de Broglierecebeu um Prémio Nobel em 1929 por ter elaborado a teoria das ondas associadas aos electrões,enquantoqueDavissoneG.P.Thomsonpartilharamidênticoprémioem1937porteremdemonstradoasuaexistência.Asondasassociadasaoselectrões,diga-sedepassagem,nãosãoondaselectromagnéticasmas"ondasdematéria".

Hoje em dia, os físicos estão convencidos de que todas as coisas possuem características departículaedeonda,emboranãonecessariamenteemigualmedida.Quantomaismaciçaéumapartícula,mais importantes são as suas características de partícula e mais difícil se torna observar as suaspropriedades ondulatórias.Umabola de bilhar (ou a própriaTerra) possuemum aspecto ondulatório,maso seu comprimentodeondaé tãopequenoqueébempossívelquenuncavenhaa serobservado.Sabemos,emteoria,queexiste,masétudo.Mesmoumgrãodeareiapossuipropriedadesondulatóriasquesãocertamentedemasiadosubtisparapoderemserobservadas.Umelectrão,pelocontrário,possuiumamassatãopequenaqueoseucarácterondulatóriopodeserfacilmenteobservado,umavezrealizadaaexperiênciaadequada.

De modo análogo, quanto menos energética for uma onda, mais importante é o seu aspectoondulatório,emaisdifícilsetornaobservarassuaspropriedadescorpusculares.Umaondadeáguaétãofraca (se considerarmos apenas uma molécula de água) que não é de todo provável que possamosobservarassuascaracterísticasdecorpúsculo.Omesmoseaplicaàsondassonoras,emboraosfísicosfalem em fonões quando se referemao aspecto corpuscular das ondas sonoras, da palavra grega para"som".

Aspropriedadescorpuscularesdaradiaçãoelectromagnéticasãodifíceisdeobservarquandoosquanta são muito pequenos, como sucede com as ondas rádio. Somente quando os quanta se tornammaiores e os comprimentos de ondamais curtos, como sucede com os raios X, é que o seu aspectocorpuscularpodeserfacilmenteobservado.

Einstein mostrou que o campo gravítico produz ondas, tal como um campo electromagnético.Contudo,ocampogravíticoétãomenosintensodoqueoelectromagnéticoqueasondasgravíticassãoextremamente fracaseoseuaspectocorpuscularpraticamente impossíveldedetectar.Aindaassim,oscientistasfalamdasondasgravíticascomoconsistindoemgravitõesemmovimento.

Eapenasporquenomundoquenos rodeiaaspartículas sãomuitomaciçase asondas têm tãopoucaenergiaquepensamosnosdoisfenómenoscomoexcluindo-semutuamente.Nomundodosátomosedaspartículassubatômicas,talexclusividadedesaparece.

Diz-se,porvezes,queaciênciaproduzresultadosparadoxaisequevaicontraosensocomum.Éimportante lembrarqueo sensocomumsebaseia frequentementenasobservaçõesmuito limitadasquefazemosdomundoànossavolta.Ircontraosensocomumsignifica,porvezes,adoptarumavisãomaisamplaemaisrigorosadoUniverso.(Lembremo--nosdequeo"sensocomum"nosdisse,emtemposidos,queaTerraeraplanaeoSolgiravaàsuavolta.)

4.NÚCLEOS

InvestigandooÁtomoSuandooscientistascomeçaramasuspeitarqueoselectrõespodiamestarassociadosaosátomos,

surgiu um problema.Os electrões tinham uma carga eléctrica negativa,mas os átomos electricamenteneutros. O que significava que tinham de existir algures no átomo cargas eléctricas positivas queneutralizassemascargasdoselectrões.

Aserassim,quandoremovêssemoselectrõesdumátomo,apartesobranteficariacomumacargapositiva.Seacrescentássemoselectrõesaumátomo,oátomoeoselectrõesemexcessoteriamumacarganegativa.IstoexplicavaosiõespositivosenegativosdeFaradayeArrhenius.

J. J. Thomson, em 1898, foi o primeiro a sugerir uma estrutura atómica que tinha em conta aquestãodacargaeléctrica.Thomsondefendiaqueoátomoeraumapequenaesferauniforme, talcomohaviasidoimaginadoháséculos,mascomumacargapositiva.Enesseátomopositivamentecarregadoestavamembutidoselectrões(comopassasnumbolo)emnúmerosuficienteparaneutralizaracarga.

A estrutura atómica proposta por Thomson continuava a descrever os átomos como algo desólido,esemuitosdelesestivessememcontactoesealinhassemnastrêsdirecçõesdoespaço,osólidoassimformadoseriaexactamenteaquiloqueoseunomeindica-umsólido.

E,todavia,ascoisasnãopodiampassar-seassim.Lenardnotaraem1903queoselectrõesquesedeslocavamnumtuboderaioscatódicosatravessavamfinasfolhasmetálicas,oquepareciaindicarqueos átomos eram constituídos, pelomenos em parte, por espaço vazio. Lenard admitiu que os átomosfossem nuvens de pequenas partículas: algumas seriam electrões e outras partículas de dimensãosemelhantecarregadaspositivamente.Umapartículapositivaeoutranegativagirariamemtornoumadaoutra,constituindoumparqueseriaglobalmenteneutro.

Umconjuntomaiordetaisparespodiaentãocorresponderaumátomo,masentreessesparesenoseuinteriorexistiaespaçovazioatravésdoqualumapequenapartículacomoumelectrãoemmovimentopodiafacilmentepassar.

Masseassimfosse,osátomosdeviamperdercomigualfacilidadeumououtrotipodepartículas.Se a exposição à luz provocava a ejecção dummetal de electrões carregados negativamente, por querazãoéqueomesmonãosepassavacomaspartículaspositivas-nemquefosseocasionalmente?Alémdisso, seoselectrões saíamdumcátodo sobaacçãodumacorrenteeléctrica,porque razãoéquedoânodo não emergiampartículas carregadas positivamente? Parecia óbvio que as partículas carregadaspositivamente, a existirem, seriam de natureza bastante diversa da dos electrões. Teriam de ser, poralgumarazão,muitomenosmóveisdoqueestes.

Em1904,ofísicojaponêsHantaroNagaoka(1865-1950)sugeriuqueaporçãopositivadoátomonãoocupavaatotalidadedoseuvolume,talcomoThomsonpropusera,nemocupavatantoespaçocomooselectrões,comoforaavançadoporLenard.Nagaokapropôsumcompromisso.Eleacreditavaqueaporção do átomo carregada positivamente estava localizada no seu centro, sendo menor do que atotalidade do átomo.E que estava rodeada por electrões que giravam à sua volta e semantinham emórbita devido à atracção electromagnética, tal como os planetas giram em volta do Sol presos pelaatracçãogravítica.

AsugestãodeNagaokasignificavaqueumátomoeraneutroemcircunstânciasnormais,explicava

aproduçãodeiõespositivosenegativos,edeixavaespaçosvaziosporondepodiampassaroselectrõesemmovimento.Alémdisso,esclareciaporquerazãooselectrõespodiamserfacilmenteremovidosdosátomos, ao contrário do que sucedia com as partículas de carga positiva. Os electrões estavam, bemvistas as coisas, na periferia do átomo, enquanto que as partículas carregadas positivamente seencontravamprotegidasnoseucentro.

No entanto, nenhuma destas hipóteses teve grande aceitação. Todas não passavam deespeculaçõesenenhumaconseguiurealmenteimpor--se.Aquilodequeoscientistasprecisavameradedadosexperimentaisdirectossobreaestruturainternadoátomo.Mastaisdadosnãopareciamfáceisdeobter. Como é que alguém podia investigar o interior duma entidade tão pequena como o átomo? E,todavia,noprecisomomentoemqueThomson,LenardeNagaokaavançavamassuashipóteses,umtaldispositivoparainvestigarosátomosjáexistia.Ahistóriadasuadescobertaéoqueaseguirseconta.

AssimqueosraiosXforamdescobertosporRoentgen,outroscientistaspuseram-seaestudaranova radiação emuitos interrogaram-se sobre se amesmanãopodia ser encontrada noutras situaçõesondeantesnãoforadetectadaapenasporqueninguémselembraradeaíaprocurar.

O físico francês Antoine Henri Becquerel (1852-1908) interessou-se especialmente porcompostos fluorescentes,substânciasqueabsorvema luzsolar (ououtra radiaçãoenergética)edepoislibertamessaenergiaemitindoluzapenasnalgunscomprimentosdeonda.Afluorescênciaéumfenómenosemelhanteaodafosforescência,comadiferençadequeassubstânciasfluorescentesdeixamdeemitirluzassimquedeixamdeestarexpostasàradiação,enquantoqueassubstânciasfosforescentescontinuamaemitirluzduranteumcertotempoapósofimdaexposição.

Becquerel queria saber se as substâncias fluorescentes, para além de luz visível, emitiamigualmenteraiosX.Afimdetestartalhipótese,propôs-seenvolverchapasfotográficasempapelnegroeexporoconjuntoàluzsolarcomumcristaldumasubstânciaquímicafluorescentesobreele.Aluzsolarnãopodiaatravessaropapelnegro,omesmoacontecendocomqualquer luz fluorescenteemitidapelocristal. Se, todavia, o cristal emitisse raiosX, estes atravessariam o papel negro e sensibilizariam apelículafotográfica.

OscristaisusadosporBecquereleramdeuranilsulfatodepotássio,umasubstânciafluorescentebemconhecida.Cadamoléculadessecompostocontinhaumátomodometalurânio.

No dia 25 de Fevereiro de 1896, Becquerel realizou a sua experiência e confirmou oescurecimento da película fotográfica. O físico concluiu que o cristal emitia realmente raios X epreparou-se para repetir a experiência com nova película, a fim de se certificar do resultado obtido.Contudo,o tempoestevenebuladonosdiasquese seguiram.Becquerelcolocouapelícula fotográficaenvoltaempapelnegroeocristalnumagaveta,eesperoupeloregressodosol.

Nodia1deMarço,Becquerelcomeçouaficarimpaciente.Paranãoficardesocupado,ofísicodecidiurevelarapelícula,a fimdesecertificarque,naausênciadefluorescência,nadaatravessaraopapelnegro.Parasuasurpresa,descobriuquealgoestavaaatravessá-lo,eemgrandesquantidades.Achapaapresentava-se fortementeobscurecida.Oscristais tinhamestadoaemitirumaradiaçãoquenãodependiadaluzsolarnemtinhaquevercomafluorescência.Becquerelesqueceualuzsolarecomeçouaestudaranovaradiação.

Em breve compreendeu que a radiação emitida pelo uranilsulfato de potássio tinha origem noátomo de urânio, uma vez que outros compostos contendo urânio emitiam omesmo tipo de radiação,mesmo quando não eram fluorescentes. Em 1898, a física polaca-francesa Marie Curie (1867-1934)mostrou que existia outro metal, o tório, que também emitia tal radiação. Marie Curie chamouradioactividadea esse comportamentodourânio edo tório.TantoBecquerel comoCurie suspeitavam

quehaviamaisdumtipoderadiaçãoenvolvido.Em 1899, o físico de origem neo-zelandesa Ernest Rutherford (1871--1937) estudou o modo

comoaradiaçãoradioactivapenetravafolhasdealumínio.Edescobriuquepartedaradiaçãopodiaserdetida por 1/500 de centímetro de alumínio, enquanto que para a restante eram necessárias folhasconsideravelmente mais espessas. Rutherford designou o primeiro tipo de radiação raios alfa, daprimeiraletradoalfabetogrego,eosegundotiporaiosbeta,asegundaletradoalfabeto.Umterceirotipoderadiação,amaispenetrantedetodas,foidescobertaem1900pelofísicofrancêsPaulUlrichVillard(1860-1934)edesignadaraiosgama,daterceiraletradoalfabetogrego.

Nãopassoumuitotemposemqueestasdiferentesradiaçõesfossemquantificadas.Osraiosbetaeramdesviadosporumcampomagnéticode talmodoqueeraevidentequese tratavadepartículasdecarganegativa.Em1900,Becquereldeterminouamassaeacargadetaispartículas,verificandoque,talcomoosraioscatódicos,eramconstituídosporelectrõesemmovimento.Umelectrãoemmovimentoé,porisso,designadoàsvezescomoumapartículabeta.

Os raiosgamanãoeramdesviadosporcamposmagnéticos,oquesugerianãopossuíremcargaeléctrica.Rutherfordsuspeitouqueosraiosgamapudessemterumanaturezaelectromagnéticaeresolveufazê-los atravessar um cristal. A presença dum padrão de difracçãomostrou que se comportavam demodoanálogoaosraiosX,emboracomcomprimentosdeondaaindamaiscurtos.

Quantoaosraiosalfa,eramdesviadosporumímandetalmodoqueindicavamsercompostosporpartículascomcargapositiva.SeriamestasaspartículascarregadaspositivamentequeLenardsupunhaconstituíremosátomos,juntamentecomoselectrões?

Não.Lenard imaginarapartículasdecargapositivacompropriedadesemtudoanálogasàsdoselectrões,exceptonoquediziarespeitoànaturezadacarga.Aspartículasalfa,todavia,diferiammuitodoselectrõesnoutros aspectosquenãoapenasa cargaeléctrica.Em1906,Rutherfordmostrouqueaspartículasalfatinhamumamassamuitosuperioràdoselectrões.Actualmentesabemosqueasuamassaécercade7344vezesadoelectrão.

Assim que Rutherford descobriu a natureza particularmente maciça das partículas alfa,compreendeu também que elas constituíam o instrumento ideal para investigar o átomo. Um feixe departículas alfa que incidisse sobre uma folha metálica delgada penetrá-la-ia e o modo como essapenetraçãoseprocessassepoderiafornecerinformaçõesmuitoúteis.

Rutherford resolveu colocar um fragmento duma substância radioactiva numa caixa de chumbodotada dum orifício. As radiações eram incapazes de penetrar o chumbo mas um estreito feixe deradiaçãoemergiadoorifícioe,deslocando-seatravésdoespaço,incidiasobreumafinafolhadeouro.Atrásdesta,Rutherfordcolocaraumachapafotográficaqueseriasensibilizadaporquaisquerpartículasalfaqueatravessassemafolhadeouro.

Essafolhaeratãofinaqueerasemitransparentemas,mesmoassim,osátomossãotãopequenosque ela tinha uma espessura de cerca de 20 000 átomos de ouro. No entanto, as partículas alfaatravessaram-na como se esses 20 000 átomos não existissem, obscurecendo a chapa fotográficaprecisamentenolocalondeoteriamfeitoseafolhadeourolánãotivesseestado.

Ou quase. Rutherford reparou que algumas partículas alfa tinham sido desviadas da suatrajectória.Comefeito,eravisívelnachapafotográficaumlevehaloemtornodumpontonegrocentral.Essehalotornava-serapidamentemaisténuecomadistânciaaocentro,masnãodesapareciatotalmente.Cerca de 1 partícula alfa em cada 8 000 era desviada noventa graus oumais. De facto, parecia queocasionalmenteumapartículaalfaatingiaalgoesofriaumressalto.

Para explicar este fenómeno,Rutherford propôs, em 1911, o seu própriomodelo de átomo.Oátomo,segundoele,tinhaquasetodaasuamassaconcentradanumaentidadepequena,decargapositiva,situadanocentro.Naperiferiadoátomo,espalhadosporumvolumequeocupavaasuaquasetotalidade,existiam apenas electrões. Tratava-se duma sugestão semelhante ao modelo de átomo proposto porNagaoka,comadiferençadeque,noátomodeRutherford,aentidadedecargapositivasituadanocentroeramuitomaispequenaemaciça.

Alémdisso,Rutherford apoiava-se emobservações experimentais, algo que não sucedera comNagaoka.Aspartículasalfapenetravamnapartedoátomoondeseencontravamoselectrõescomoseelaestivessevazia,umavezqueerammuitomaismaciçasdoqueoselectrões.Quandoumapartículaalfaseaproximavadaentidadecentralmaciça,decargapositiva,eradesviadadasuatrajectóriaemvirtudedasuaprópriacarga.Apartirdamagnitudedosdesvios,Rutherfordpôdecalcularadimensãodonúcleo.Nagaokanãodispunhadedadosdessetipo.

É por isso que é aRutherford que, correctamente, se atribui o avanço conseguido.A entidadecentral é designada núcleo do átomo, duma expressão latina que significa "caroço", uma vez que seassemelhaaumpequenocaroçonointeriorduminvólucroatómicorelativamenteespaçoso.Umavezque,embiologia,ascélulastambémpossuementidadescentraisdesignadasnúcleos,osdosátomossãoporvezesreferidoscomonúcleosatómicos.Nestelivro,todavia,talqualificativonãoseráutilizado.

OmodelodoátomosugeridoporRutherfordrevelou-seinteiramentesatisfatório,emboramuitospormenoresfossemacrescentados,comoveremos,nostrêsquartosdeséculoqueseseguiram.Poresteeoutrostrabalhos,RutherfordfoilaureadocomumPrémioNobelem1908.(Oprémiofoi-lheatribuídonacategoriadaquímica,oquelhedesagradou,umavezqueseconsiderava,obviamente,umfísico.)

PartículasdeCargaPositivaAonúcleocorrespondequalquercoisacomo99,945a99,975porcentodamassadoátomoaque

pertence.Poressemotivo,oestudodonúcleoédamaiorimportância.Comefeito,quasesepoderiadizerque o núcleo constitui o "verdadeiro" átomo.No séculoXIX, a ideia que se tinha do átomo era queconsistia quase inteiramente em espaço vazio ou, pelo menos, em espaço preenchido com aspartículas/ondasmuitopoucosubstanciaisdoselectrões.Eraonúcleoquepodiacorresponderàpequenaporçãoúltimadematéria,esféricaesólida,primeiroimaginadaporLeucipoeDemócrito.

Apesardasuamassa,onúcleotemdimensõesreduzidas,comumdiâmetroqueéapenasl/ioo000doátomo.Porisso,éconsiderado,talcomooelectrão,umapartículasubatômica.

Umnúcleotemdeterumacargaeléctricapositivasuficientementegrandeparaneutralizaracargadetodososelectrõesquenormalmenteseencontramnoátomo.Noentanto,ahistóriadetaispartículassubatômicasdecargapositivanãocomeçacomRutherford.

Onúcleo de carga positiva contémquase toda amassa do átomo,mas temumdiâmetro que éapenas/l00.000deste.

Goldstein,que inventaraaexpressãoraioscatódicos,estava interessadoemverificarseexistiaqualquer radiação que se deslocasse na direcção oposta. Goldstein foi incapaz de detectar qualquerradiaçãoemitidapeloânodo.Contudo,em1886,ocorreu-lheconceberumcátodoquepermitisseaumaeventual radiação deslocar-se na direcção oposta. Foi o que tentou fazer quando usou um cátodoperfurado,quepossuíapequenosorifícios (ou"canais").Quandoum tal cátodoeraencerradonomeiodumtubonoqualsefizeraovácuoeseforçavaumacorrenteeléctricaaatravessareste,formavam-seraioscatódicos.Todavia,radiaçãodesinalpositivocomorigempróximadocátodopodiaatravessaroscanaisedeslocar-senadirecçãooposta.

Foi isso precisamente que Goldstein observou, tendo chamado a essa nova radiaçãoKanahtrahlen,queéumaexpressãoalemãquesignifica"raioscanal".

Em 1895, Perrin recolheu alguns desses raios canal num objecto colocado na sua trajectória,demonstrandoqueoobjectoadquiriacargapositiva.FoiissoquelevouJ.J.Thomsonapropor,em1907,queelesfossemdesignadosraiospositivos.

Em1898,Wiensubmeteu tais raiosacamposeléctricosemagnéticos, tendodescobertoqueaspartículasquecompunhamosraiospositivoserammuitomaismaciçasdoqueoselectrões.Comefeito,asua massa era análoga à dos átomos. Além disso, observou que a massa das partículas dos raiospositivosdependiadosvestígiosdegáspresentesnotuboondeseestabeleceraovácuo.Sesetratassedehidrogénio,aspartículasdosraiospositivosapresentavamamassadumátomodehidrogénio;nocasodeseroxigénio,asuamassaeraadumátomodeoxigénio,eporaífora.

Uma vez aceite a teoria de Rutherford acerca do átomo nuclear, os físicos compreenderamimediatamente em que consistiam as partículas dos raios positivos. Os electrões em movimento queconstituíamos raios catódicos colidiamesporadicamente comos átomosdispersos pelo tubode raioscatódicos-fossemelesdehidrogénio,oxigénio,azoto,etc.Oselectrõesnãotinhammassasuficienteparaperturbarosrespectivosnúcleosque,deresto,raramenteatingiam.Noentanto,chocavamcomelectrões,arrancando-os aos átomos a que pertenciam. Os átomos, sem esses electrões, transformavam-se em

núcleos com carga eléctrica positiva e deslocavam-se na direcção oposta à das partículas dos raioscatódicos.

Em1903,Rutherfordjátinhareconhecidoqueaspartículasalfaerammuitosemelhantesnassuaspropriedadesàspartículasdosraiospositivos.Porvoltade1908,estavacertodequeumapartículaalfatinha umamassa quase idêntica à dum átomo de hélio. Parecia-lhe por isso que devia existir algumarelação entre as partículas alfa e o hélio, uma vez que os minerais de urânio, que produziamconstantemente partículas alfa, pareciam conter também, de modo igualmente constante, pequenasquantidadesdehélio.

Em 1909, Rutherford colocou algum material radioactivo num recipiente com uma parede devidrodupla.Aparedeinternaerabastantefina,masaexterioreraconsideravelmentemaisespessa.Entreasduasestabeleceuovácuo.

As partículas alfa emitidas pelo material radioactivo conseguiam atravessar a parede maisdelgada,masnãoaparedeexterior,maisespessa.Aspartículasficavamassimaprisionadasnoespaçoentre as duas paredes. Ao fim de vários dias, as partículas entre as duas paredes constituíam umaquantidadequepodiaseranalisadae,quandotalfoifeito,detectou--sehélio.Tornava-seassimevidentequeaspartículasalfaeramnúcleosdehélio.Osoutrosraiospositivoseramnúcleosdeoutrostiposdeátomos.

Umadasdiferençasentreaspartículasconstituintesdosraiospositivoseoselectrõeseraofactodoselectrões teremtodosamesmamassaeamesmacargaeléctrica,enquantoqueasmassasecargaseléctricasdaspartículasdosraiospositivosvariavam.Osfísicosinterrogaram-senaturalmentesobreseseriapossíveldividirdealgumaformaaspartículasdosraiospositivosementidadesmaispequenasetalvezlocalizarumapartículapositivamuitopequenaquenãofossemaiordoqueoelectrão.

Rutherford foi um dos físicos que procuraram esse pequeno "electrão positivo", mas não oencontrou.Amaispequenapartículade cargapositivaque conseguiu encontrarpesava tanto comoumátomodehidrogénioedeviaporissoserumnúcleodehidrogénio.Em1914,Rutherforddecidiuqueessapartículadeviaseramaispequenapartículadecargapositivaquepodiaexistir.Apartículaapresentavaumacargaeléctricaexactamenteigualàdoelectrão(emboradesinalcontrário),mastinhaumamassaqueera-sabemo-loactualmente-1836,11vezessuperior.

Rutherforddesignouestapartículamaispequenadosraiospositivosumprotão,dapalavragregapara "primeira", uma vez que quando tais partículas eram listadas por ordem crescente de massa, oprotãoeraaprimeira.

NúmerosAtómicosComo disse anteriormente, os núcleos, que podem ser encarados como a parte essencial dos

átomos,diferementresiemdoisaspectos:amassaeamagnitudedasuacargapositiva.Istorepresentaumavançosignificativorelativamenteaumnívelanteriordeconhecimentos.DuranteoséculoXIX,nadasesabiaacercadascargaseléctricasexistentesnointeriordosátomoseaúnicadiferençaconhecidaeraentreasrespectivasmassas.Masamassa,porsisó,nãoerainteiramentesatisfatória.

Num capítulo anterior do livro referi que quando os elementos são organizados por ordemcrescentedamassados seus átomos (pesoatómico), épossível construiruma tabelaperiódica.Nessatabela, os elementos são organizados demodo a que elementos compropriedades análogas fiquemnamesmacoluna.

Umatabeladessetipo,baseadaapenasnospesosatómicos,apresentaalgunsproblemas.Ovalordadiferençademassavariaàmedidaqueseavançanatabela.Porvezes,adiferençademassaentreumátomo e o seguinte é pequenamas, por vezes, é bastante grande. Em três casos, o peso atómico dumelementoé,naverdade,umpoucomaiordoqueodoelementoqueselhesegue.

Comefeito,seamassafosseoúnicocritérioa teremconta,aposiçãodosdoiselementosnostrês casos atrás referidos devia ser invertida.Mas tal não é feito porque, dessemodo, cada um doselementosenvolvidosficariaafazerpartedumgrupocomoqualnãopartilhapropriedades.Men-deleev,que foi quemprimeiro teve a ideia duma tabela periódica, achouquemanter os elementos dentro dasfamílias respectivas era mais importante do que seguir cegamente a ordem crescente das massasatómicas,umpontodevistacomquemaistardeosquímicosviriamaconcordar.

Alémdisso,seamassafosseaúnicacaracterísticadistintiva,nuncasepoderiasaberquandoéqueeradescobertoumelementocomumpesoatómicosituadoentreosdedoiselementosjáconhecidos.JánaúltimadécadadoséculoXIX,todaumafamíliadeelementosatéaídesconhecidosfoidescobertaehouvenecessidade de acrescentar umanova coluna à tabela periódica.No entanto, talvez os aspectosconfusos da tabela periódica pudessem ser ultrapassados se fosse possível integrar a segundacaracterísticadistintivadosátomosrecém-descoberta,amagnitudedacargapositivadosseusnúcleos.

Essa possibilidade surgiu por via dos raiosX. (Quandoos raiosX foramdescobertos, não sepodiapreverqueviriamaserúteisparaatabelaperiódica.Contudo,oconhecimentoéumsó.Quandoumaluziluminadeterminadorecantodumasala,contribuiigualmenteparaailuminaçãogeraldamesma.Asdescobertascientíficastêmfornecido,vezessemconta,respostasaproblemassemqualquerrelaçãoaparentecomosfenómenosquederamorigemaessasdescobertas.)

Os raios X, detectados pela primeira vez por Roentgen, eram produzidos quando os raioscatódicos incidiam sobre o vidrodum tubode gás rarefeito.Os electrões emmovimento sofriamumadesaceleraçãosúbitaehaviaperdadeenergiacinética.Mastalenergianãoerarealmenteperdida,antesconvertida noutra formade energia; neste caso, em radiação electromagnética.A energia perdida numdadoinstanteeratãoelevadaqueseformavamfotõesinvulgarmenteenergéticosearadiaçãoeraemitidasobaformaderaiosX.

Uma vez entendido este fenómeno, os cientistas compreenderam rapidamente que se algomaisdensodoqueovidro,eformadoporátomosmaismaciços,fossecolocadonatrajectóriadoselectrõesem movimento, a sua desaceleração seria ainda mais brutal. Formar-se-iam desse modo raios X de

comprimentosdeondaaindamaiscurtoseenergiasmaiselevadas.Asoluçãoóbviapareciaserchapasmetálicasdediferentes tipos.Estaseramcolocadasno tubo,naextremidadeopostaàdocátodo,ondeeramatingidaspeloselectrões.Taisplacas foramdesignadasanti-cátodos,ondeaexpressãoanti-vemdumapalavragregaquesignifica"oposto".(Geralmente,colocam-seânodosdefrontedoscátodos,masparacriarespaçoparaosanticátodos,osânodoseramdispostoslateralmentenostubos.)

Em 1911, o físico britânico Charles Glover Barkla (1877-1944) reparou que os raios Xproduzidos por um anticátodo de determinado metal tendiam a penetrar as substâncias somente atédeterminadoponto.CadametalproduziaraiosXcomumpoderdepenetraçãoqueeraespecíficodessemetal.Quando,maistarde,oscientistascompreenderamqueosraiosXeramradiaçãoelectromagnética,o fenómeno foi interpretado como significando que cada metal produzia raios X com determinadocomprimentodeonda.Barklachamou-lhesraiosXcaracterísticosdecadametal.

Barkladescobriuaindaque,porvezes,oanticátododecertosmetaisproduziadoistiposdistintosderaiosX,cadaqualcomoseuprópriopoderdepenetração,massemqueexistisseoutraradiaçãoentreambos. Ao feixe mais penetrante chamou raios X K e ao menos penetrante raios X L. Mais tarde,descobriu-sequenalgunscasoseramproduzidosfeixesderaiosXaindamenospenetrantes,tendosidousadas as letras seguintes do alfabeto para os designar: raios XM, raios X N, etc. Pelos trabalhosrealizadonestedomínio,BarklafoigalardoadocomumPrémioNobelem1917.

As investigaçõesdeBarkla foramcontinuadasporumdos alunosdeRutherford,HenryGwyn-JeffreysMoseley (1887-1915).Em1913,Moseley estudou cuidadosamenteos raiosXcaracterísticos,utilizandoadifracçãoderaiosXporcristaisqueforarecentementedescobertapelosBragg.

Moseley descobriu que à medida que subia na lista de elementos da tabela periódica, ocomprimentodeondadosraiosXproduzidosdiminuíaregularmente.Quantomaioropesoatómicodosátomos no anticátodo, menor o comprimento de onda dos raios X. Além disso, a alteração nocomprimentodeondaeramuitomaisregulardoqueaalteraçãodopesoatómico.

Osfísicosestavamcertosdequeadesaceleraçãodoselectrõeseraprovocada,principalmente,pelamagnitudedacargapositivadonúcleoatómico,peloqueasobservaçõesdeMoseleyconstituíamumaindicaçãodequeamagnitudedessacargaaumentavamaisregularmentedoqueamassadonúcleoatómicoàmedidaquesesubianatabelaperiódica.

Moseley sugeriu, com efeito, que a magnitude da carga aumentava duma unidade com cadaposiçãoquesesubianatabela.Assim,ohidrogénio,oprimeiroelemento,tinhacomonúcleooprotão,comumacargade+1.Ohélio,segundoelemento,tinhaumnúcleo(apartículaalfa)comumacargade+2.Olítio,terceiroelemento,tinhaumacarganuclearde+3eassimpordianteatéaourânio,oátomomaismaciçoatéentãoconhecido,quetinhaumacarganuclearde+92.

Moseleychamouàmagnitudedacarganuclearonúmeroatómicodoelemento,eesseparâmetrorevelou-semaisimportantedoqueopesoatómico.Defacto,onúmeroatómicopermitiuresolvermuitosdos problemas da tabela periódica, à medida que os conceitos deMoseley foram sendo refinados edesenvolvidosporoutrosfísicos.

Assim,aquelescasosemque,aoavançarnatabelaperiódica,surgiaumelementocomumpesoatómicoligeiramentesuperioraoelementoqueselheseguia,deixavamdeconstituirumproblemase,emvezdesseparâmetro,seconsiderassemosrespectivosnúmerosatómicos.Umelementoquepareciaforade sítio por ter umpeso atómicomais elevadodoqueodo elemento seguinte, revelava ter afinal umnúmeroatómicomaisbaixo.Seosátomosfossemorganizadospelosseusnúmerosatómicos,todos,semexcepção,ficavamcolocadosnarespectivafamília,semnecessidadedeinversões.Alémdisso,quandodoiselementosadjacentestinhamnúmerosatómicosquediferiamnumaunidadeapenas,sabia-sequenão

podiaexistirnenhumelementoaindadesconhecidoentreambos.Em breve se tornou claro que todas as cargas eléctricas negativas erammúltiplos exactos da

cargadumelectrão,enquantoque todasascargaseléctricaspositivaserammúltiplosexactosdacargadum protão. É possível ter cargas nucleares de +16 e +17, mas não é possível ter cargas de+16,4ou+16,387.

Ondefaltavaumelementonatabelaperiódica,aalteraçãonocomprimentodeondadosraiosXcaracterísticos, quando se passava dum elemento para o elemento conhecido seguinte na tabela, era odobrodaquela que seria de esperar, o que constituía uma indicação seguradeque entre umeooutroexistiaumterceiroelemento.

NaépocaemqueMoseleypropôsoconceitodenúmeroatómico,existiamseteespaçosvaziosnatabela periódica, representando cada qual um elemento ainda desconhecido. Em 1948, todos essesespaços tinham já sido preenchidos. Os físicos tornaram-se capazes de criar átomos com númerosatómicossuperioresa92,usandométodosqueserãoadianteexplicados.Actualmente,conhecem-setodososelementoscomnúmerosatómicosentre1e106.(MoseleyteriaquasedecertezarecebidodaíaalgunsanosumPrémioNobelpeloseu trabalhomas,em1915,morreuemcombateemGallipoli,naTurquia,duranteaPrimeiraGuerraMundial.)

Onúmeroatómicoindica-nosamagnitudedacargapositivaexistentenonúcleo.Umavezqueumátomonormaléglobalmenteneutrodopontodevistaeléctrico, temdeexistirumelectrãonas regiõesexteriores do átomo para cada carga positiva existente no seu núcleo. Assim, e porque o hidrogéniopossuiumacargade+1nonúcleo,umátomonormaldesteelementotemdepossuirumelectrão.Ohélio,com uma carga nuclear de +2, tem de ter dois electrões em cada átomo; o oxigénio, com uma carganuclearde+8,temdeteroitoelectrões;ourânio,comumacarganuclearde+92,temdeternoventaedoiselectrões,etc.Emsíntese:onúmeroatómicoreflectenãoapenasamagnitudedacarganuclear,mastambémonúmerodeelectrõesnumátomonormal.

Faz sentido pensar que as reacções químicas têm lugar quando os átomos, querindependentemente, quer integrados emmoléculas, colidemuns comos outros. Se for esse o caso, ascolisõesocorremprincipalmenteentreoselectrõesdumátomoeoselectrõesdeoutro.Osnúcleosdosdoisátomosemquestãoencontram-sebemlonge,noseucentro,escondidospordetrásdoselectrões,nãosendoprovávelqueparticipemnasreacçõesquímicasousequerasinfluenciemdummododeterminante.

Esta suposição não só faz sentido (as coisas não são necessariamente como as imaginamos,apenas porque fazem sentido), mas parece decorrer de algo como a teoria da dissociação iónica deArrhenius.Aformaçãodeiõesé,aparentemente,oresultadodatransferênciadumoumaiselectrõesdumátomoparaoutro.

Nocasodumamoléculacomoadoaçúcar,aformaçãodeiõesnãopareceocorrer.Emvezdisso,osátomosexistentesnamoléculamantêm--se ligados, talvezporquepartilhemelectrõesenãopossam,porisso,separar-sefacilmenteeconservarasuaintegridadeenquantoátomos.Parecemexistir,portanto,situaçõesemqueatransferênciadeelectrõeséasituaçãomaisestável,eoutrasemqueoéapartilhadeelectrões.Porquê?

A resposta a esta questão começa a esboçar-se olhando para um grupo de seis elementosconstituídos por átomos que não apresentam tendência para transferir ou partilhar electrões, antespermanecendoátomosindividuais.Ostrêsátomosmaislevesdestegrupo-hélio,néoneárgon-nuncatransferemoupartilhamelectrões,pelomenostantoquantoosquímicosforamcapazesdeobservar.Ostrêsmais pesados - crípton, xénon e rádon - partilham electrões em circunstâncias excepcionais,masnuncademodomuitoestável.

Estesseiselementossãodesignadosgasesnobres("nobres"porquesão"altivos"enãotendemamisturar-se com a "ralé"). A razão da "nobreza" destes elementos pode ser melhor entendida seimaginarmosqueoselectrõesestãoorganizadosnumátomoemcamadasconcêntricas.Amedidaquenosafastamosdonúcleo,cadacamadaénaturalmentemaiordoqueaanteriorepodecontermaiselectrões.Assim,oátomodehéliotemdoiselectrões,queparecempreencheracamadamaisinterior.Talfactonãodevesurpreender-nos,tendoemcontaquesetratadacamadamaispróximadonúcleoeque,comotal,deveseramaispequenadetodas,capazdeconteromenornúmerodeelectrões.

Os químicos norte-americanos Gilbert Newton Lewis (1875-1946) e Irving Langmuir (1881-1957), trabalhando independentemente a partir de 1916, desenvolveram as noções de camada e detransferência, ou partilha, de electrões, uma vez que tais fenómenos pareciam capazes de explicaradequadamenteosprocessosquímicos.(Naverdade,estedomíniodoconhecimentoseriaenormementerefinadoemdécadasposteriores,masfalaremosdissoadiante.)

As camadas individuais estão associadas às séries de raios X característicos primeirodescobertas porBarkla.A sérieK de raiosX é amais penetrante e parece ter origemna camada deelectrõesmaispróximadonúcleo.AprimeiracamadaelectrónicaéporissodesignadacamadaK.

Seguindoesteraciocínio,acamadaquesesegueimediatamenteàcamadaKéacamadaL,umavezquepareceseraorigemdosraiosXmenospenetrantesdasérieL.AcamadaLseguem-seaM,aN,eassimpordiante.

Talvezosátomosdehéliosejamnobresenãotransferiramnempartilhemelectrões(e,porisso,não se envolvam em quaisquer reacções químicas) porque uma camada preenchida é particularmenteestável. A partilha ou transferência dum electrão iria diminuir a estabilidade da situação, e asestabilidades nunca diminuem espontaneamente. (E sempre necessária energia para forçar algo adesestabilizar-se;pelocontrário,aestabilizaçãoocorreporsisó.Estaspropriedadesestãoassociadasàquiloquesedesignaporsegundaleidatermodinâmica.)

Ogásnobreque se segueéonéon,que temdezelectrõesnos seusátomos.Osdoisprimeirospreenchema camadaK e os oito seguintes a camadaL, que émaior e pode contermais electrões.Opadrãoelectrónicodonéoné,porisso,2,8.ComumacamadaLpreenchidaeestável,onéonéumgásnobre.

Depoisdonéonvemoárgon,comdezoitoelectrõesnosseusátomos,queestãoorganizadosdoseguintemodo:doisnacamadaK,oitonacamaLeoitonacamadaM,ouseja,2,8,8.AcamadaM,sendomaiordoqueaL,podecontermaisdeoitoelectrões.Comefeito,podeconterdezoitoelectrões.Todavia,apresençadeoitoelectrõesnacamadamaisexterior (independentementedonúmeromáximoqueestapodeconter)éumaconfiguraçãoparticularmenteestável,oquefazdoárgonumgásnobre.

Aoárgonsegue-seocrípton,comtrintaeseiselectrões,organizadosassim:2,8,18,8.Depoisvemoxénon,comcinquentaequatroelectrões,dispostoscomosesegue:2,8,18,18,8.E,finalmente,orádon,comoitentaeseiselectrões,assimdistribuídos:2,8,18,32,18,8.

AcamadaK,amaisinterior,acamadaLintermédiaeacamadaMmaisexternadeelectrõesnogásnobreárgon.AssetasindicamaintensidaderelativadosraiosXproduzidosporcadacamadaquandoatingidosporraioscatódicos.

Aparentemente, os átomos interagem, sempre que possível, uns com os outros, de modo aalcançaremaconfiguraçãoelectrónicadumgásnobre.Osódiotemonzeelectrõesassimdispostos:2,8,1. O décimo primeiro electrão é o único existente na camadaM e é facilmente perdido. Quando talsucede,oátomodesódiotransforma-senumiãodesódio,comumacargapositiva,umavezqueacarga

de +11 no núcleo deixa de estar completamente neutralizada por apenas dez electrões nas regiõesexteriores.(Repare-sequeaperdadumelectrãonãotransformaosódioemnéon,quetambémtemdezelectrõesnosseusátomos.Oquecontaparaaidentidadedoátomoéacarganuclear,nãoonúmerodeelectrões.)

Poroutro lado,ocloro temdezasseteelectrões,distribuídosassim:2,8,7.Paraalcançarumaconfiguraçãodegásnobre,necessitadumelectrãoadicional.Temporissotendênciaaganharumelectrãoe a transformar-se num ião cloro de carga negativa, com dezoito electrões nos seus átomos quedesequilibramacarganuclearde+17.

É por esta razão que os átomos de sódio e cloro reagem facilmente uns com os outros. Atransferênciadumelectrãodáorigemaiõesdesódioedecloro,queseligamunsaosoutrosumavezqueascargaspositivasenegativasseatraem.Quandodissolvemossalemágua,aligaçãoentreosiõestorna-semaisténueeestespodemdeslizarunspelosoutros.Éporissoqueumatalsoluçãosalinaconduzumacorrenteeléctrica.

Dois átomos de cloro podem alcançar um outro tipo de configuração estável se cada qualcontribuircomumelectrão,porassimdizer,paraumfundocomum.Cadaátomopossuiseiselectrõesnasuacamadamaisexteriorquelhepertenceminteiramente,emaisdoiselectrõesquepartilhacomooutroátomo.Cadaumadascamadasmaisexterioresestácompletamentepreenchidaeéestável,desdequeosdoisátomospermaneçamemcontactoemantenhamentresiapartilhadosdoiselectrões.Oresultadoéaformaçãodumamoléculadeclorocomdoisátomos(Cl2),queémaisestáveldoqueosdoisátomosdecloroindividualmente.

Aointerpretaremdestemodoadistribuiçãodoselectrõesnosátomos,osquímicosdescobriramque eram capazes de compreender a razão porque a tabela periódica estava organizada como está -baseada em reacções químicas que, por sua vez, dependemdas configurações electrónicas na camadamais externa. Os químicos descobriram que podiam usar a distribuição dos electrões para explicarinúmeras reacções químicas que antes se tinham limitado a constatar, sem compreender o porquê dasmesmas.

Até aqui, podíamos encarar os electrões como minúsculas partículas sólidas que existem emdeterminadas configurações geométricas. Contudo, uma tal perspectiva é insuficiente para explicar aslinhasespectrais,outradascaracterísticasquetambémdistinguecadaelementodosdemais.

LinhasEspectraisUma vez demonstrada por Newton a existência do espectro luminoso, o mesmo foi estudado

atentamente pormuitos cientistas. Se, por exemplo, fizermos passar a luz solar através duma ranhuraestreitaantesdeatravessarumprisma,cadacomprimentodeondaproduzumaimagemdaranhuranumacor característica. Os comprimentos de onda dispõem-se muito próximos uns dos outros, parecendoformar uma banda contínua de cores que se vão gradualmente transformando umas nas outras (comoacontecenumarco-íris).Masoquesucedese,porqualquermotivo,algunsdoscomprimentosdeondanãoestiverempresentes?Nessecaso,existemporçõesdoespectroquenãoproduzemqualquerimagemcoloridaaoatravessaremaranhura,dandoorigemalinhasnegrasnoespectro.

Em1802,oquímicobritânicoWilliamHydeWollaston(1766-1828)observoutaislinhasescuras,masnãoinvestigouasuaorigem,comoderestoninguémofezdurantealgumtempo.

Em1814,todavia,oópticoalemãoJosephvonFraunhofer(1787--1826),quefabricavaprismaseoutrosequipamentosópticosdegrandequalidade,conseguiuobterespectrosmaisnítidosdoquealguémalguma vez fora capaz. Ao fazê-lo, verificou a existência de centenas de linhas escuras no espectro.Tomounota,cuidadosamente,dassuasposiçõeseimportânciarelativaemostrouquetaislinhassurgiamsemprenasmesmasposições,quersetratassedeluzsolar,doluaroudaluzprovenientedosplanetas.(ÉclaroquealuzquenoschegadaLuaedosplanetaséaluzdoSolporelesreflectida,peloqueofactonãoé,talvez,surpreendente.)

Apartirdeentão,aslinhasdeFraunhofer,comopassaramaserchamadas,foramcuidadosamenteestudadas, sendo embora consideradas pouco mais do que meras curiosidades. Até que, em 1859,Kirchhofffezumadescobertaimportante.

Kirchhoffverificouqueoselementos,aoseremaquecidos,produziamumespectroquenãoeracontínuocomoodoSol.Emvezdisso,emitiamluzemcomprimentosdeondaespecíficos,detalmodoqueoespectroformadoeraconstituídoporumconjuntodelinhasclarasseparadasporregiõesescuras.Alémdisso,fazendopassarluzsolaratravésdosvaporesarrefecidosdesseselementos,estesabsorviamapenas nos mesmos comprimentos de onda em que emitiam. De resto, cada elemento emitia, quandoquente, ou absorvia, quando arrefecido, em comprimentos de onda característicos. Deste modo, oselementos presentes num mineral específico podiam ser identificados pelos comprimentos de ondaemitidos quando o mineral era fortemente aquecido. E elementos até então ignorados podiam seridentificadosatravésdapresençadecomprimentosdeondaquenãoeramemitidosporqualquerelementoconhecido.OselementospresentesnoSolenoutrasestrelaspuderamassimseridentificadospelaslinhasescurasnosseusespectros.

Todosestesconhecimentosacercadas linhasespectrais tornaram-nasextremamente importantesparaosquímicoseastrónomos.Contudo,ninguémsabiaporquerazãoelementosdiferentesemitiamouabsorviamemdiferentescomprimentosdeonda.Umpassoimportantenaresoluçãodesseproblemafoidado pelo físico suíço Johann JakobBal-mer (1824-1898). Balmer interessara-se especialmente peloespectro do hidrogénio incandescente, que pareciamais simples do que o de outros elementos (o quefaziasentido,vistoserohidrogéniooelementomaislevee,presumivelmente,omaissimplesdetodos).

Oespectrodohidrogénioconsistenumasériedelinhas,comespaçamentosentresiquesãotantomenores quanto menor é o comprimento de onda. Em 1885, Balmer chegou a uma fórmula que lhe

permitia obter os comprimentos de onda de tais linhas. A fórmula incluía um símbolo que podia sersubstituído sucessivamente pelos quadrados de números inteiros: 1, 4, 9, 16, etc. Fazendo essasubstituição, era possível calcular os comprimentos de onda das sucessivas linhas do espectro dohidrogénio. Isto continuava a não explicar por que razão as linhas apareciam nas posições em queapareciam,maspelomenosdemonstravaaexistênciadumaregularidadeintrínsecanaslinhasquedevia,de algum modo, estar reflectida na estrutura do átomo. Porém, não havia maneira de avançar nestedomínio sem que se soubesse mais sobre a estrutura do átomo. Vejamos agora como é que essesconhecimentosforamadquiridos.

Umavezaceitepelosfísicosomodelonucleardoátomo,foinecessárioreflectirsobreaquiloquemantinhaoselectrõesligadosaonúcleo.Comefeito,seoselectrõestêmcarganegativaeonúcleoumacarga positiva, e se as cargas de sinal contrário se atraem, por que razão não caíam os electrões nonúcleo?OmesmosepoderiaperguntardaTerra-porqueéquenãocaisobreoSol,seosdoiscorposseatraemmutuamente?NocasodaTerra,arespostaéqueelaseencontraemórbita.ATerraestádefactoacairsobreoSol,masomovimentoadicionaldequeseencontraanimada,perpendicularaomovimentodequeda,mantém-naparasempreemórbita.

Houve por isso tendência a considerar que o átomo era uma espécie de sistema solar emminiatura,comoselectrõesgirandoemtornodonúcleo.Existiatodaviaumproblemacomtalsuposição.Équesesabiadateoriaelectromagnética(etinha-seobservadoexperimentalmente)queumcorpocomcarga eléctrica deslocando-se desse modo emitia radiação electromagnética, perdendo energia noprocesso.Eque,àmedidaqueperdiaenergia,descreviaummovimentoemespiral,acabandoporcairnonúcleo.

PorrazõesanálogastambémaTerra,aogiraremtornodoSol,emiteradiaçãogravitacionalevaiperdendoenergia.Tambémela,porisso,vaidescrevendoummovimentoemespiralemdirecçãoaoSol.No entanto, a gravitação é tão mais fraca do que o electromagnetismo que a quantidade de energiaperdidapelaTerranesteprocessoéextremamentereduzida,permitindo-lhegiraremtornodoSoldurantemilharesdemilhõesdeanossemqueaaproximaçãoentreosdoiscorposcelestessetorneapreciável.

Umelectrão,porém,sujeitoaumcampoelectromagnéticoqueémuitomaisintenso,perdetantaenergiasobaformaderadiaçãoqueasuaquedanonúcleopareceserumaquestãodetempo.E,todavia,nãoéissoquesucede.Osátomospermanecemestáveisduranteperíodosinfindos,comosseuselectrõesnasregiõesexteriores.

OfísicodinamarquêsNielsHenrikDavidBohr(1885-1962)tentouencontrarumasoluçãoparaoproblema.Bohrdecidiuquenãofaziasentidodizerqueumelectrãoemitiaenergiaaogiraremtornodumnúcleo,quandoeraóbvioqueissonãosucedia.Einsistiunaideiadequeumelectrãonãoemitiaenergiaenquantopermaneciaemórbita.

E, contudo,ohidrogénio, quandoaquecido, emitia energia e, quandoarrefecido, absorvia-a.OhidrogénioemitiaeabsorviaemcertoscomprimentosdeondaqueobedeciamàequaçãodeBalmer.Paraexplicarestesfactos,Bohradmitiu,em1913,queoelectrãonoátomodehidrogéniopodiaadoptarumade várias órbitas distintas a diferentes distâncias do núcleo.Quando se encontrava numa determinadaórbita,fossequalfosseoseutamanho,nãoadquirianemperdiaenergia.Noentanto,quandooelectrãomudavadeórbita,ouabsorviaenergiaseseafastavadonúcleo,ouemitiaenergia,sesedeslocavaparamaispertodeste.

Mas por que razão haveria um electrão que se encontrasse em determinada órbita de saltarsubitamenteparaaórbitaseguinte,maior,depoisdeabsorverenergia-semnuncairpararaumaórbitaintermédia?Bohrcompreendeuqueissotinhadeestarrelacionadocomateoriaquântica.Seoátomosó

fosse capaz de aceitar quanta de determinada magnitude, apenas poderia absorver luz com um certocomprimentodeondaeissoenviariaautomaticamenteoelectrãoparaaórbitaseguinte.

Bohr produziu uma série de cálculos quemostravam como era possível obter um conjunto deórbitas permitidas resultantes da absorção ou emissão de quanta de magnitude fixa (e, portanto, deradiação de comprimento de onda bemdefinido) e que explicavamperfeitamente os comprimentos deondacaracterísticosobservadosnaslinhasdoespectrodohidrogénio.

1.Quandoumelectrãopermaneceemdeterminadaórbita,nãoadquirenemperdeenergia.2.Quandopassaparaumaórbitamaiselevada,absorveenergia.3.Oelectrãoemiteenergiaquandosedeslocaparamaispertodonúcleo.AquiloqueBohrfezfoimostrarquenãoerapossívelesclareceraestruturadoátomotrabalhando

apenas nos limites da física clássica e que havia necessidade de utilizar a teoria quântica. Pelo seutrabalhofoigalardoadocomumPrémioNobelem1922.

Bohrtevedeusarnúmerosinteirosparaumdostermosdasuafórmula.Cadanúmerorepresentavaum conjunto diferente de linhas espectrais. A necessidade de usar números inteiros resultava dacircunstânciadaquelasimplicaremumnúmerointeirodequanta.Nãoerapossívelterfracçõesdequanta.Poressemotivo,osnúmerosusadosnafórmulaforamdesignadosnúmerosquânticos.

Embora a fórmula de Bohr reproduzisse os valores dos comprimentos de onda das linhasespectrais, não explicava tudo.Quando estas linhas foramestudadas com instrumentosmais sensíveis,verificou-sequecadalinhapossuíauma"estruturafina"-umconjuntodelinhasmaisfinassituadasmuitopróximasumasdasoutras.EracomosecadaumadasórbitasdeBohrconsistissenumconjuntodeórbitascompequeníssimasdiferençasentresi.

Em1916,o físicoalemãoArnold JohannesWilhelmSommerfeld (1868-1951) feznotarqueasórbitasdeBohreram todascirculares.Equeasórbitaspodiam igualmente ser elípticas, emmaioroumenor grau. Para levar em linha de conta estas novas órbitas, houve necessidade de introduzir umsegundonúmeroquântico.Estepodiaassumirqualquervalorinteiro,desdezeroatéumvalorinferioremumaunidadeaonúmeroquânticodeBohr.

SeonúmeroquânticodeBohr(ounúmeroquânticoprincipal)for1,ovalormaisbaixoquepodeassumir,onúmeroquânticodeSommerfeld(ounúmeroquânticoorbital)apenaspodetomarovalor0.Seonúmeroquânticoprincipalfor2,onúmeroquânticoorbitalpodeassumirosvalores0ou1,eassimpordiante.Epossívelreproduziraestruturafinadaslinhasespectraisseambososnúmerosquânticosforemconsiderados.

No entanto, continuavam a surgir complicações. Se os átomos fossem colocados num campomagnético, linhas que pareciam únicas dividiam-se em constituintes mais finos. Tanto Bohr comoSommerfeldtinhamimaginadoasórbitas(fossemelascircularesouelípticas)comoestandosituadasnumplanoúnico,demodoqueonúcleoetodasasórbitaspossíveisformavamumsistemaqueeratãoplanocomoumafolhadepapel.Contudo,erapossívelqueasórbitasseapresentasseminclinadasrelativamenteaesseplano,detalformaquetodaselas,consideradasemconjunto,sedistribuíssemsimetricamentenoespaçotridimensionaleoátomoapresentasseumcontornoesférico.Oqueatéfazsentido,umavezqueosátomossecomportam,emmuitascircunstâncias,comopequenasesferas.

Parateremcontaosistematridimensionaldeórbitas,houvequeacrescentarumterceironúmeroquântico-onúmeroquânticomagnético.Estenúmeropodeassumirqualquervalorpositivodesde0atéaovalordonúmeroquânticoprincipal,etodososvaloresnegativoscorrespondentes.Assim,seonúmeroquânticoprincipalfor3,onúmeroquânticomagnéticopodeassumirosvalores-3,-2,-1,0,+1,+2ou

+3.Uma vez consideradas as três dimensões do espaço, podia parecer que nada mais havia a

acrescentar.Todavia,continuavamaexistiralgumascaracterísticasintrigantesnaslinhasespectraisquelevaramofísicoaustro--suíçoWolfgangPauli(1900-1958)aacrescentarmaisumnúmeroquântico.Estenúmeroerasupostorepresentara rotaçãodoelectrãoemtornodoseueixo.Essarotaçãopodiadar-senum sentido ou no sentido inverso, isto é, em sentido horário ou anti-horário. Para que os cálculosestivessemdeacordocomosfactosobservadosnaslinhasespectrais,essenúmeroquânticoditodespin(rotação)tinhadeassumirovalor+1/2ou-1/2.

Paulidemonstrouaindaquenumátomonãopodiamexistirdoiselectrõescomosquatronúmerosquânticos idênticos. Esta constatação ficou conhecida como o princípio de exclusão, uma vez que, apartirdomomentoemqueumelectrãotematribuídososseusquatronúmerosquânticos,qualqueroutroelectrão é excluído da órbita específica representada por esses números. Pelos seus trabalhos nestedomínio,PaulirecebeuumPrémioNobelem1945.(Porvezes,umcientistatemdeesperarvinteanosou,emcasosraros,mesmocinquenta,parareceberumPrémioNobel.Ocasionalmente,levatempoatéqueaverdadeira importância duma descoberta seja compreendida. Se os prémios fossem atribuídosimediatamenteaalgoquepareceimportante,muitossê-lo-iamadescobertasqueacabamporserevelartriviaisoumesmoerradas.)

Em1926,ofísicoitalianoEnricoFermi(1901-1954)e,em1927,ofísicobritânicoPaulAdrienMaurice Dirac (1902-1984) conceberam um sistema matemático complexo que utilizava os quatronúmerosquânticoseoprincípiodeexclusãoparadescreveromodocomooselectrõessedistribuemnumátomo.Osistema,denominadoestatísticadeFermi--Dirac,aplica-seaqualquerpartículaquepossuaumspinde+1/2ou-1/2.Taispartículassãodesignadascolectivamentecomofermiões,donomedeFermi.Oelectrãoéumexemplodefermião.Talcomooprotão.

Existempartículascomspinsde0,1ou2.(Ofotão,porexemplo,temumvalordespinde1,eogravitão tem um spinde 2.) O princípio de exclusão não se aplica a tais partículas, cujo modo dedistribuição foi descrito pelo físico indiano Satyendra Nath Bose (1894-1974), em 1924. Einsteinelogiouo trabalhodeBose e, em1925,deuo seupróprio contributo.Este sistemaé conhecidocomoestatística de Bose-Einstein, e qualquer partícula com um valor de spin inteiro ou igual a zero, édesignadaumbosão,donomedeBose.

As órbitas propostas por Bohr para os electrões, embora constituíssem um enorme passo emfrente,nãoeramtodaviainteiramentesatisfatórias.Persistiaaimagemdoselectrõescomopartículasemmovimento,circulandonassuasórbitas.Eseassimera,continuavaanãoexistirumaexplicaçãoclarapara o facto dos electrões não emitirem energia e caírem sobre o núcleo. Era cómodo dizer que oselectrõesnãoemitiamenergiaenquantoseencontravamemórbita,masporquerazãoéqueissosucedia?Eafirmarqueapenaspodiamemitirquantadedeterminadamagnitudeeraumargumentopoderoso.Masporquê?Algoestavaafaltar.

Observado através duma lupa com aplicação máxima, o Universo revelaria a sua estruturagranular,nãocontínua.

O físico alemãoWernerKarlHeisenberg (1901-1976) achava que os problemas nunca seriamultrapassadosenquantotentássemosimaginaraestruturadoátomoemtermosdanossavidaquotidiana.Aquiloaqueestamoshabituados-planetasgirandoemtornodoSol,oubolasdebilharembatendoumasnasoutras-envolvemassastãograndescomparadascomasdosátomos,queospequenosquantadequeéconstituídaaenergiasãodemasiadopequenosparateremumefeitoobservávelsobretaiscorpos.Todasasnossasimagensmentaissão,porisso,dummundonão-quântico.Aolidarmoscomátomos,electrõese

radiação,todavia,estamosaentrarnummundoemqueosefeitosquânticosnãosãonegligenciáveise,porisso,asnossas imagensnãofuncionam.(Ateoriaquânticaé,numcertosentido,umsistemaqueafirmaqueoUniversotemumaestruturagranular,nãototalmentecontínua.Écomoumafotografiadejornal,queparece teruma superfícieuniformeporqueospequenospontosnegros ebrancosque a constituemsãodemasiado pequenos para serem visíveis. No entanto, se ampliarmos suficientemente a fotografia, asnossasimagensdomundoquotidianofalham.Tudooquevemossãopontos,quedeixamdeformarumaimagemperceptível.)

Quando lidamos com o mundo dos fenómenos em que os efeitos quânticos não sãonegligenciáveis, todas as nossas imagens convencionais falham. Se pensarmos no electrão como umaondaenãoumcorpúsculo,eleseráumcolaronduladoemvoltadonúcleodoátomo.

Heisenbergachavaquesedeviamusarapenasosvaloresobtidosdosespectros,manipulando-osde tal modo que os físicos pudessem obter respostas numéricas relevantes relacionadas com ocomportamentodosátomos,emvezdetentarinterpretaresteemtermosdeórbitas,elipses,inclinaçõesrelativamente a um plano, rotações, etc. Foi com essa finalidade que, em 1925,Heisenberg elaborouaquilo que ficou conhecido como mecânica das matrizes, uma vez que usava entidades matemáticasconhecidascomomatrizes.

Nessemesmoano,porém,Davissondemonstraraaexistênciadeondasassociadasaoselectrões,eocorreuaofísicoaustríacoErwinSchrõdinger(1887-1961)quetaisondaspodiamexplicaranaturezadasórbitasdoselectrões.

Seconsiderarmosumelectrãocomoumaonda,enãocomoumapartícula,podemosimaginarumaórbita em torno dum núcleo como tendo de consistir num número inteiro de comprimentos de onda.Depois,senosimaginarmosadesenharaondaemtornodonúcleo,verificamosqueoprincípioeofimdanossalinhasejuntamparaformaruma"trajectória"queseassemelhaaumcolarondulado.Aórbitamais pequena será a que consiste numúnico comprimento de onda.O electrão não pode cair sobre oprotãoporquenãopodeassumirumaórbitadecomprimentoinferioraodumaúnicaonda.Todasasoutrasórbitastêmdesesituaradistânciaseterformastaisquenelascaibaumnúmerointeirodeondas.Époresta razão que as órbitas se podem situar apenas a determinadas distâncias, em certas elipses, cominclinaçõesespecíficas,comrotaçõescaracterísticas,etc.

Schrõdingerconcebeuumtratamentomatemáticoque,aoteremcontaocarácterondulatóriodoselectrões,serevelavacapazderesolverumconjuntodeproblemas,eanunciou-oaomundoem1926.Oseu sistema é conhecido como mecânica ondulatória. Dirac também contribuiu para o seudesenvolvimentomatemáticoeambospartilharamumPrémioNobelem1933poressetrabalho.

Mais tarde, foi demonstrada a equivalência entre a mecânica ondulatória e a mecânica dasmatrizes.Umaeoutraproduzemosmesmos resultados.E,por isso,o sistemamatemáticoédesignadosimplesmentedemecânicaquântica.Comaintroduçãodemelhoramentoseaperfeiçoamentos,osistemarevelou-se perfeitamente satisfatório para lidar com electrões e, dummodo geral, com os fenómenossubatômicos.

Em1939,oquímiconorte-americanoLinusCarlPauling(1901--1994)aplicouosprincípiosdamecânicaquânticaaomodocomoosátomostransferemepartilhamelectrões.EstanovaabordagemveiosubstituiroantigosistemabaseadoempartículasdeLangmuireLewis.Onovosistemaémaissubtileexplica muitas coisas que o sistemamais antigo era incapaz de fazer. Pelo seu trabalho, Pauling foigalardoadocomumNobelem1954.

Jáantes,em1927,Heisenbergdemonstraraqueeraimpossível,mesmoemprincípio,fazercomexactidão determinados tipos de medições por causa da natureza granular do Universo implícita na

descrição que dele dá a mecânica quântica. Suponhamos, por exemplo, que tentávamos determinar aposiçãoexactadumapartícula,assimcomooseumomentolinear(quecorrespondeaovalordamassadapartícula multiplicado pela respectiva velocidade). Qualquer dispositivo usado para determinar aposiçãoalteraráavelocidadedapartículae,porconseguinte,oseumomentolinear.Qualquerdispositivousadoparadeterminarestemodificará,porsuavez,aposiçãodapartícula.Omelhorquesepodeobteréuma combinação da respectiva posição emomento linear, comuma pequena,mas inevitável incertezaassociada.A incerteza na posiçãomultiplicada pela incerteza nomomento linear, ambas consideradascomovalormínimoque se consegueobter, correspondeaumvalorqueestá intimamente relacionadocomumaconstantefundamentaldateoriaquântica.

O princípio de incerteza de Heisenberg afirma igualmente não ser possível determinarsimultaneamenteecomexactidãootempoeaenergia.Peloseutrabalho,HeisenbergrecebeuumPrémioNobelem1932.Oprincípiodeincertezaconstituiumadescobertamuitoimportante,explicandomuitosaspectos da física subatômica que de outro modo seriam misteriosos. No entanto, muitos cientistasmostraram relutância em adoptá-lo, uma vez que ele dava a entender existir um certo grau dealeatoriedade no Universo que nunca poderia ser eliminado. Einstein, por exemplo, nunca aceitou oprincípiodeincerteza,esempreconsiderouqueamecânicaquânticaeraumateoriaincompletaporsuacausa.

Contudo, o factode algunsnãoo aceitaremnãoo fazdesaparecer.Alémdisso, oprincípiodeincertezaparecedescreveroUniversotalcomoeleé,enãohávoltaadaraisso.

OmodelodeBohrdasórbitasdoselectrõespareciadescreverumapartícula-oelectrão-cujaposiçãoemovimentopodiam,edeviam,serconhecidosemcadainstante.AutilizaçãoporSchrõdingerdeondas,quefuncionamuitomelhor,nãofaz isso.Umaondaassociadaaumelectrãovaiparacimaeparabaixoealguresnelaencontra-seoelectrãonoseuaspectocorpuscular.Contudo,nãopodemosdizerexactamenteondeéqueapartículaseencontra.Numcertosentido,encontra-sedistribuídaumpoucoportodaaonda.Aalturadaondaindica-nosaprobabilidadedelaaíseencontrarnumdadoinstante,masissonão significa que tenha de estar aí. Desta forma, a mecânica quântica introduz a probabilidade e aincerteza-eisso,aoqueparece,éomododeserdoUniverso.

Oscientistasfalamem"estranhezaquântica"porqueateoriaquânticalidacomcoisasqueestãomuito longe daquilo a que estamos habituados no nosso quotidiano. Existem alguns aspectos tãoparadoxais que os cientistas não conseguempôr-se de acordo sobre o seu significado.Talvez umdianovas descobertas, novos conceitos, novas ideias venham esclarecer aquilo que hoje em dia pareceirremediavelmentemisterioso.

Ojogodaciêncianuncaacaba,porquenovosproblemassurgemquandoosproblemasantigossãoresolvidos. Mas será que alguém gostaria que fosse doutro modo? Se solucionássemos todos osproblemas o jogo terminaria e, emminha opinião, não existe nada na vida que possa compensar essaperdaintelectual.

5.ISÓTOPOS

EnergiaNuclearAdeterminaçãodomodocomooselectrõessedistribuemnosátomosera,numcertosentido,um

problemarelativamentesimples.Oselectrõessãotodosiguaise,atéhoje,nãosedescobriramentreelesquaisquer diferenças, seja quando se encontram num ou noutro tipo de átomo, seja quando existemindependentemente.Osátomosdistinguem-seunsdosoutrospelonúmerodeelectrõesquepossuem,masnãopelotipodosseuselectrões.

Equantoaosnúcleosdosátomos?Elesdiferemdeátomoparaátomo,tantonasuamassacomonacarga eléctrica. Serão partículas individuais de muitos tipos diferentes, um para cada elemento, oupossuirão uma estrutura interna? Terão um número variável de partículas mais simples e serão estasidênticasnosnúcleosdetodososátomos?Eainda:serãoestasquestõesparaasquaispodemosesperarencontrarumaresposta?Afinal,osnúcleossãoentidadesminúsculasescondidasnocentrodosátomos,porvezesatrásdecamadasecamadasdeelectrões.Comoéquepodemseralcançadoseestudados?

Asprimeirasindicaçõessobreaexistênciadumaestruturanuclearsurgiramcomadescobertadaradioactividade, quinze anos antes de ter sido demonstrada a existência de núcleos atómicos. Umaquestão que se levantou imediatamente em relação à radioactividade foi a de saber donde viria todaaquelaenergia.Ourâniopareciaemitirininterruptamenteradiaçãoalfa,queeraconstituídaporfeixesdenúcleosdehélio,eradiaçãobeta,queeramfeixesdeelectrões.Todasestaspartículassedeslocavamavelocidadesmuitoelevadas:aspartículasalfaacercadumdécimodavelocidadedaluzeaspartículasbetaacercadenovedécimosdavelocidadedaluz.Paraaspôremmovimentoataisvelocidadesapartirdo repouso era necessária uma energia considerável. (Afinal, os átomos de urânio não estão emmovimento.)Depoishaviaaindaosraiosgama,queeramconsideravelmentemaisenergéticosdoqueosprópriosraiosX.

A radiaçãoemitidapelourânionãoé apenasum fenómenoepisódico ede curtaduração.Umaamostra deste elemento emite radiação indefinidamente e a uma taxa aparentemente constante, e issoconstituíaumproblemasério.Pela leidaconservaçãodaenergia, sabe-sequeaenergianãopodesercriadadonadae,todavia,nofenómenodaradioactividadepareciaexistirenergiaqueestavaasurgirdonada.

Éclaroque sepodia admitirquea leidaconservaçãodaenergia estavaerradaouque sóeraválidasobdeterminadascondições.Noentanto,oscientistasconsideravamaleitãoútilnoutrosdomínioscientíficos que lhes repugnava pô-la de lado. O sentimento comum era de que havia necessidade deinvestigararadioactividadeeprocurarexplicá-lasemabandonaraleidaconservaçãodaenergia;equelei só devia ser abandonada em último recurso. (Eis um exemplo duma atitude inteligentementeconservadora dos cientistas. Uma teoria ou lei que foi posta à prova vezes sem conta não deve serabandonadadeânimoleve.Sê-lo-áapenassenãoexistiremalternativas,masénecessárioassegurarmo-nosprimeirodequeestasnãoexistemrealmente.)

Asituaçãocomplicou-serapidamentenosanosqueseseguiramàdescobertadaradioactividade.MarieCurieeoseumarido,PierreCurie(1859-1906)tinhamcomeçadoatrabalharcompecheblenda,uma rocha contendo urânio, donde esperavam extrair amostras do elemento puro para estudo. Edescobriram, surpreendidos, queapecheblendaeramais radioactivadoque seria se fosse constituídapor urânio puro. Era possível que contivesse elementos aindamais radioactivos do que o urânio.Asanálisestradicionaisnãorevelavamindíciosdetaiselementos,peloquedeviamexistiremquantidades

muitopequenase,assimsendo,teriamdesermuitoradioactivos.Em1898,apósumtrabalholongo,árduoefastidiosoquecomeçoucomtoneladasdepecheblenda

e terminou comquantidadesmínimas de pó radioactivo, osCurie isolaram dois elementos: o polónio(assimchamadoemhomenagemàterranataldeMarieCurie,aPolónia)eorádio(cujonomederivaderadioactividade).Amboseramconsideravelmentemaisradioactivosdoqueourânio.

Sealibertaçãodeenergiapelourânioerasurpreendente,quepensardorádio,queemitiaenergiaaumataxaquasetrêsmilhõesdevezessuperior?Em1901,PierreCuriemediuessaenergiaedescobriuqueumgramadoelementolibertavaenergiaaumataxade140caloriasporhora.Emsimesmo,ovalornãoeramuitogrande,masofenómenopareciaprolongar-seindefinidamente.Deondeéquevinhatodaessaenergia?

Algunscientistassugeriramquetalvezosátomosradioactivosabsorvessemenergiadoambienteàsuavoltaeaconvertessememenergiaderadiação.Talhipótese,noentanto,violariaasegunda leidatermodinâmicaeoscientistasmostraramtantarelutânciaemabandonarestaleicomotinhamreveladoemrelaçãoàprimeiralei(deconservaçãodaenergia).

Em1903,Rutherford sugeriuque todososátomospossuíamgrandesquantidadesdeenergianasuaestrutura.Essaenergianãoerageralmenteutilizada,peloqueaspessoasestavaminconscientesdasua existência. A radioactividade constituía, em seu entender, a libertação espontânea duma pequenapartedessaenergia.Tratava-sedumasugestãomuitoousada,masqueincendiouaimaginaçãodopúblico.Easpessoascomeçaramafalardeenergiaatómica,umaformanovaemaisconcentradadeenergiadoque alguma vez se conhecera. (O escritor inglês H. G.Wells chegou mesmo a referir-se a "bombasatómicas"nassuashistóriasdeficçãocientífica,quarentaanosantesdelasexistiremrealmente.)

E, todavia, a sugestão de Rutherford assemelhava-se ao tirar dum coelho duma cartola. Di ersimplesmente que o átomo continha energia não explicava nada. No entanto, em 1905, Einsteindemonstrou de forma convincente que a massa era uma forma muito concentrada de energia. Se assubstâncias radioactivas convertessemuma parcela, por pequena que fosse, da suamassa em energia,facilmenteseexplicariatodaaenergialibertadanofenómenoderadioactividade.

Umavezestabelecidoomodelonucleardoátomo, evistoqueaquase totalidadedamassadoátomo estava concentrada no núcleo, tornou--se claro que a perda demassa tinha necessariamente deocorreraí.Era,portanto,nointeriordonúcleoqueseencontravaafontedeenergiadaradioactividadee,assim,aspessoascomeçaramafalardeenergianuclearemvezdeenergiaatómica.

VariedadesNuclearesSeaenergiadaradioactividaderesultadaperdademassapelosnúcleosdecertosátomos,oque

équeaconteceaestesemconsequênciadoprocesso?Arespostacomeçouaesboçar-seantesmesmodese tercompreendidoqueonúcleodosátomoseraa fontedeenergia;ou sequerqueexistiaumnúcleoatómico.(Sucedefrequentementecertasobservaçõescientíficasforneceremoiníciodumarespostaaumaquestão,antesmesmodoestabelecimentodumateoriaabrangentequetragaordemelógicaadeterminadosector da ciência. Tais observações precoces são difíceis de compreender e, sem a teoria, oconhecimento avança lentamente. Porém, uma vez estabelecida aquela, as observações já feitasrapidamenteseencaixamnaexplicaçãoglobal.Osavançossãoentãorápidosatéoprogressocientíficoserdenovotravadopelaausênciadumacompreensãomaisprofundaemaisabrangentedoutrodomíniocientífico.)

Em 1900, Crookes, que então trabalhava com urânio, decidiu purificá-lo o mais possível,submetendo-o a um conjunto de processos químicos que permitiram separar aquilo que pareciam serimpurezas.Descobriuentão,parasuasurpresa,queourâniopurificadoquasenãoeraradioactivoeque,pelocontrário,asimpurezaseramacentuadamenteradioactivas.Crookesalvitrouquenãoseriaourâniooelementoradioactivomasalgoqueneleexistiacomoimpureza.

Noentanto,Becquerel,queprimeirodetectaraaradioactividadedourânio,nãoestavadispostoaabrirmãodasuadescobertadeânimoleve.(Efrequenteoscientistastrataremassuasdescobertascomosedosseusprópriosbebéssetratasse,defendendo-asvigorosamentedequalquertentativadeeliminação.Trata-sedumareacção tipicamentehumanamesmose, retrospectivamente,se revelarporvezeserrada.Nestecaso,todavia,Becquerelacabariaporterrazão.)Becquerelmostrouqueourânio,queapresentavadefactopoucaradioactividadequandopurificadosegundoométododeCrookes,acabavaporrecuperá-laaofimdealgumtemposefossedeixadoemrepouso.

Em1902,Rutherfordeumseucolaborador,oquímicobritânicoFre-derickSoddy(1877-1956)demonstraramqueomesmosepassavacomotório.Seestemetalfossepurificado,perdiaamaiorpartedasuaradioactividade,masamesmareapareciaquandoaamostraeradeixadaemrepouso.RutherfordeSoddysugeriramque,quandoumátomodeurânioemitiaradiaçõesradioactivas,alteravaasuanatureza,transformando-senumátomodoutroelementoqueeraaindamaisradioactivo.Estenovoelemento,sendoradioactivo,alterava-se também.Ourânionãoera,emsimesmo,muito radioactivo,masoselementosque dele resultavam eram-no.Quando se purificava o urânio, de talmodo que os elementos que deleresultavamearespectivaradioactividadeeramremovidos,estetornava-semuitomenosradioactivodoqueanteriormente.Porém,aospoucos,formavam-sedenovoquantidadesadicionaisdesseselementose,assim, a sua radioactividade voltava ao nível anterior. Parecia, portanto, que os átomos queapresentavam radioactividade sofriam um processo que podia ser descrito como uma desintegraçãoradioactiva.

Estaperspectivaveioarevelar-secorrecta.Tantoourâniocomootóriosedesintegramparadarorigemaoutroselementosque,porsuavez,sedesintegramtambématéproduziremumelementoquenãoé radioactivo.Destemodoobtém-se uma série radioactiva.Os cientistas começaram a procurar esseselementos intermédios nos processos de desintegração do urânio e do tório. O polónio e o rádio,detectados anteriormente pelos Curie, são dois desses elementos, juntamente com vários outros.Descobriu-se também que tanto o urânio como o tório, depois de sofrerem muitas alterações, se

transformamemchumbonãoradioactivo.Anoçãodedesintegraçãoradioactivafoiumchoqueparaoscientistas.Aideiadequeosátomos

eramimutáveisexistiadesdeostemposdeLeucipoeDemócrito-masnãopassavadumasuposição.Everdade que os átomos são imutáveis quando se trata de transformações químicas -, mas aradioactividade não é uma transformação química. As transformações químicas envolvem apenas oselectrões existentes nas camadas mais exteriores dos átomos. Um átomo pode adquirir uma cargaeléctrica,ouestabelecerumaligaçãocomoutroátomo,masasuaidentidadeessencial,quedependedonúcleo, permanece intacta. A radioactividade, todavia, envolve realmente o núcleo. Trata-se dumatransformaçãonucleare,seonúcleosofreumaalteração,émuitoprovávelquenoprocessoumátomosetransformenoutrodiferente.

(Umamudançadeperspectivatalcomoaquelaqueseacabadedescrevernãosignificaquesejanecessáriodeitar fora,porconterem informação inútil, todososmanuaisdequímica.Onovopontodevistaampliaonossoconhecimento, fornecendoexplicaçõesmaiscompletasemaisúteis.Os livrosdetextodo séculoXXI, por conseguinte, devem ter emconta a existência de transformações aonível donúcleodoátomomaspodem,seassimodesejarem,continuarafalardetransformaçõesquímicascomoofaziam antes, tratando os átomos como entidades imutáveis - que, na verdade são, no caso dastransformaçõesquímicas.)

Aprocuradoselementosintermédiosentreourânioeochumbo,eentreotórioeochumbofoiumêxito. Na verdade, foi demasiado bem sucedida, uma vez que se encontrou um número imenso deelementos.

Onúmeroatómicodourânioé92eodo tório90.Onúmeroatómicodochumboé82,eoutroelementoconhecido,obismuto,temnúmeroatómico83.Oselementosatéentãodesconhecidosequesesituavam no fim da tabela periódica tinham os números atómicos 84, 85, 86, 87, 88, 89 e 91. Eram,portanto,sete,aosquaishaviaqueretirarosrecentementedescobertospolónio(84)erádio(88),oquedeixavacinco.Entreourânioeochumbonãohaviaportantoquaisqueroutroselementosadescobrirparaalémdestescinco.Absolutamentenenhuns.IssoeraalgoqueficaradefinitivamenteesclarecidodesdeostrabalhosdeMoseley,em1914.

E, contudo, mais de trinta espécies intermédias tinham sido descobertas ainda no tempo deMoseley. Cada uma era claramente distinta das restantes, pelo menos no que dizia respeito às suaspropriedades radioactivas. Algumas emitiam uma partícula alfa, outras uma partícula beta. Algumasemitiamradiaçãogamacomousemumapartículaalfaoubeta.Mesmoquandoduasespéciesintermédiasemitiam,porhipótese,umapartículaalfa,umadelas fazia-ocommaiorenergiaevelocidadedoqueaoutra.

Soddyresolveuestudaresteproblema.Jáem1912e1913,antesaindadaformulaçãodoconceitode número atómico, ele descobrira que certas espécies intermédias possuíam propriedades químicasidênticas e não podiam ser separadas pelos procedimentos químicos usuais quando erammisturadas.Tratava-sedosmesmoselementos,eissosignificava(comoseveioacompreendermaistarde)queasuaconfiguração electrónica era idêntica, tal como o era a carga positiva dos respectivos núcleos. Noentanto,eporqueassuaspropriedadesradioactivaseramdistintas,algonosrespectivosnúcleos,quenãoasuacarga,eradiferente.

Atabelaperiódicabaseava-senaspropriedadesquímicasdoselementos.Issosignificavaquesedois átomos diferentes apresentassem asmesmas propriedades químicas e apenas diferissemnas suaspropriedadesradioactivas, representavamomesmoelemento(emtermosquímicos)e,porconseguinte,deviamocuparomesmolugarnatabela.

Soddyapresentouoresultadodassuasinvestigaçõesem1913,designandoestesdiferentestiposdeátomos-queeramdomesmoelementoeocupavamomesmolugarnatabelaperiódica-isótopos,daexpressãogregaque significa "mesmo lugar".Ocientista recebeuumPrémioNobel em1921por estetrabalho.

Eramais um abalo nas ideias hámuito aceites sobre os átomos.Leucipo,Demócrito eDaltonestavam convencidos de que todos os átomos dum mesmo elemento eram idênticos. E, até então,observação alguma invalidara essa suposição. Os cientistas que estudavam as espécies intermédiasradioactivas descobriram até cinco ou seis variedades dum mesmo elemento, cada qual compropriedadesradioactivasdistintas.

Umavezelucidadooconceitodenúmeroatómicoem1914,tornou--sepossívelcompreenderemdetalheomodocomoumtipodeátomosetransformavanoutro.Assim,porexemplo,oátomodeurâniotem um núcleo com um peso atómico de 238 e um número atómico de 92. Designamo-lo porU-238.Todavia,nasuatransformaçãoradioactiva,libertaumapartículaalfaquepossuiumpesoatómicode4enúmeroatómico2.Opesoatómicoeonúmeroatómicodapartículaalfadevemser subtraídosaosdonúcleodeurânio.Oqueficaentãoéumnúcleocomumpesoatómicode234enúmeroatómico90.(Umapartículaalfa,quandoéemitida,reduzsempreopesoatómicodonúcleoqueaemiteem4eorespectivonúmeroatómicoem2unidades.)

Quandodescobriuestadesintegraçãodonúcleodeurânio,CrookesresolveudesignaroprodutourânioX,queeraumamaneiradedizerquenãofaziaamenorideiadaquilodequesetratava.Masagora,comdados quantitativos, era fácil perceber que o novo átomo era de tório, um elemento comnúmeroatómico90.

O tório vulgar apresenta um peso atómico de 232 e é, por isso, Th--232. O produto dadesintegraçãodourânioapresentaumpesoatómicode234eéTh-234.Temosaquiumexemplodedoisisótopos.Ambospossuemnúmeroatómico90e,portanto,umacarganuclearde+90.Existe,todavia,umadiferençaentreassuasmassas.OTh-234temumamassasuperioremduasunidadesàdoTh-232.

Seráqueestadiferençaérealmenteimportante?Emtermosquímicos,não.TantooTh-232comoo Th-234, com uma carga nuclear de +90, possuem nos seus átomos 90 electrões identicamentedistribuídos, peloque as respectivas propriedadesquímicas são iguais.No entanto, dopontodevistaradioactivo,adiferençaésignificativa.Otório-232,otóriovulgarqueencontramosemminerais,emitepartículasalfa, enquantoqueo tório-234,oprodutodadesintegraçãodourânio, emitepartículasbeta.Além disso, os átomos de tório-234 desintegram-se cerca de 200milhares demilhões de vezesmaisdepressadoqueosdetório--232.Eissorepresentaumadiferençamuitoimportante.

Existem outros isótopos de tório que surgemnuma ou noutra série radioactiva. Esses isótoposincluemoTh-227,Th-228,Th-229,Th-230eoTh-231.Todossedesintegramdemodosdiferenteseataxasdiferentes,fazendo-omuitomaisrapidamentedoqueoTh-232.MasregressemosaoTh-234,umavezqueeleemiteumapartículabeta.Seráqueemconsequênciadissosealtera?

Umapartículabetaéumelectrão.Possuiumacargade-1e,porisso,podeserconsideradacomotendonúmeroatómico-1.Asuamassarepresenta1/1837dadumátomodehidrogénio,ouseja,cercade0,00054.Trata-sedumvalortãopequenoquenãocometeremosgrandeserrosnosnossoscálculosseoconsiderarmos igual a 0. O que significa que, quando um núcleo emite uma partícula beta, devemossubtrair0ao seupesoatómico -oqueodeixa inalterado.Devemos igualmente subtrair -1aonúmeroatómicodonúcleo.Orasubtrair-1éequivalenteaadicionar+1,peloqueonúmeroatómicoaumentaem1unidade.Assimsendo,onúcleodeTh-234comumnúmeroatómicode90eumpesoatómicode234transforma-se,aoemitirumapartículabeta,numnúcleocomnúmeroatómico91epesoatómico234.O

elementocomonúmeroatómico91éoproactínio,quefoipelaprimeiravezisoladoeidentificadoem1917 pelo químico alemãoOttoHahn (1879-1968) e pela sua colaboradora, a química austríacaLiseMeitner(1878-1968).Oquetemos,então,éumatransformaçãodoTh-234emPa-234.

Aemissãoderadiaçãogamaporumnúcleoatómiconãoalteraeste.Aradiaçãogamatemnúmeroatómico0porquenãotemcarga,epesoatómico0,porquenãotemmassa.Aoemitirradiaçãogama,umnúcleoperdesimplesmenteenergia.

Quandooscientistascompreenderamomodocomocadatipodeemissãoradioactivaalteravaosnúcleos atómicos, foram capazes de estabelecer a identidade exacta de todas as espécies intermédiasnumasérieradioactiva.

O conceito de isótopo não afectou a tabela periódica.Cada posição continuou a corresponderapenas a um tipo de átomo, no que se refere ao respectivo número atómico. O facto dos isótoposdiferirem no seu peso atómico não faz qualquer diferença quanto às propriedades químicas. Aimportânciaque isso temem termosda estrutura epropriedadesnucleares é algoqueveremosmais àfrente.

VidasMédiasAsdiversasespécies intermédiasnumasérie radioactivadesintegram--secom relativa rapidez.

Se observarmos uma determinada quantidade duma dessas espécies intermédias, verificamos que onúmero de desintegrações diminui com o tempo. A razão é óbvia. A medida que os átomos sedesintegram,vãorestandocadavezmenosexemplaresdavariedadeoriginalemenossão,portanto,asdesintegraçõesqueocorrem.

Omodocomodiminuiataxadedesintegraçãoéoqueseriadeesperardumprocessoanálogoaoqueosquímicosencontramemmuitasreacçõesquímicas.Trata-sedaquiloaquesechamaumareacçãodeprimeiraordem.Talsignificaquecadaátomoradioactivodedeterminadavariedadepossuiumacertaprobabilidadedesedesintegrar,equeessaprobabilidadenãosealteracomotempo.Oátomopoderáterumaprobabilidadeemduasdesedesintegrarnumdeterminadodia,massepassaremcemdiassemqueasuadesintegraçãoocorra,continuaráaterapenasumaprobabilidadeemduasdesedesintegrarno101ºdia.(Trata-sedumasituaçãosemelhanteàquelaqueocorrequandoatiramosumamoedaaoar.Existeumaprobabilidadeemduasdesaircara.Noentanto,seatirarmosamoedaaoarumacentenadevezesedecadavezsaircoroa,aprobabilidadedesaircarano101ºlançamentocontinuaaserdeapenasumaemduas-partindodoprincípio,evidentemente,dequesetratadumamoedaquenãofoifalsificada.Existemuitagentequecrê,erradamente,quequantasmaisvezessaíremcoroas,maioréaprobabilidadedesaircaranolançamentoseguinte.)

Não é possível prever quando é que determinado átomo se vai desintegrar. Contudo, seestivermos a lidar com um númeromuito grande de átomos, podemos calcular quantos é que se vãodesintegrarnodecursodumdiaoudumminuto.Nãosaberemosquaisosátomosqueirãodesintegrar-se,massaberemosquantos.Trata-sedumasituaçãoanálogaàquelaemqueosespecialistasemestatísticasãocapazesdepreveronúmerodeautomobilistasqueirãoprovavelmentemorreremdeterminadofim-de--semana prolongado, embora não sejam capazes de prever individualmente quais os automobilistasacidentados.

Avidamédiaéotempomédionecessárioparaquemetadedosátomosdumelementoradioactivosofradecaimentoradioactivo.

Oqueatrássedissesignificaquepodemoscalcularotemponecessárioparaquemetadedetodososátomospresentesnumaamostrasedesintegrem.Sucedeque,nocasodasreacçõesdeprimeiraordem,otemponecessárioparaquemetadedequalquerquantidadesedesintegreésempreomesmo.Ouseja,separtirmosde120gdedeterminadoisótopo,esefornecessárioumanoparaquemetadedosseusátomosse desintegre, será necessário outro ano para que metade dos átomos remanescentes se desintegretambém.Ditodeoutromodo:separtirmosde120gramas,teremos60gramasaofimdumano,30aofimdedois,15aofimdetrês,7,5aofimdequatro,eassimpordiante.Emteorianuncachegaremosazero,mas acabaremos por ficar apenas com um único átomo e, após um período de tempo imprevisível,tambémelesedesintegraráeonossoisótoporadioactivodesaparecerá.

Emmuitassituações,oscientistassãocapazesdecontaronúmeroefectivodepartículasalfaoubetaemitidasporunidadedetempo.Apartirdomodocomoessenúmerodiminui,podemdeterminaraquantidadede temponecessáriaparaquemetadedo isótopodesapareça. (Oscientistasdesenvolveramdiversosmétodosdedetecçãodepartículasalfaebeta,maseusófalareinestelivrosobreequipamentos

quandotalfornecessário.Aquiloquemeinteressaaquisãoasideiaseosconceitos.)Verifica-seassimqueoisótopodeprotactínioobtidopeladesintegraçãodourânio,Pa-234,perde

metade dos seus átomos em cerca de 70 segundos. Esta é a sua vida média, uma expressão que foiprimeiroutilizadaporErnestRutherford,em1904.

Eclaroque seoprotactínio-234existisse independentemente,desaparecerianumápicemesmoquedele existissem inicialmentegrandesquantidades.SeaTerra fosseconstituídaexclusivamenteporprotactínio-234, e se imaginarmos que os átomos se desintegravam semquaisquer outros efeitos, essaquantidade imensa do elemento desapareceria em cerca de três horas. (Na verdade, a energia geradaseriadetalordemqueaTerraexplodiriacomoumaenormebomba.)

E,todavia,oprotactínio-234existenosolodonossoplanetaepodeserisoladoemquantidadesmuitopequenas.Porquerazãoéquenãodesapareceu totalmente!Arespostaéque,emboraquaisquerátomosdoelementoquepudessemexistirquandoaTerraseformoutenhamdesaparecidoalgunsminutosmaistarde,novosátomosestãoaformar-sepermanentementeapartirdourânio.

Outrosisótopospossuemvidasmédiasmaislongas.Orádio-226(oisótopoisoladopelosCurieapartirdapecheblenda),queemitepartículasalfa, temumavidamédiabastante longa.Adiminuiçãodasuataxadedesintegraçãoédemasiadopequenaparapoderserobservadaemperíodosdetempocurtos.Contudo, seesperarmos temposuficiente,essadiminuiçãopodesermedida,verificando-sequeavidamédiadoisótopoéde1620anos.MasmesmoumvalordessaordemdegrandezanãoésuficienteparaqueorádioseconserveenquantoaTerraexistir.Sóencontramosrádioporqueestáconstantementeaserformadoapartirdourânio.

Orádioforma-semuitolentamente,umavezqueourâniopossuiumataxadedesintegraçãomuitolenta.Orádiodesintegra-seàmedidaqueseforma,deinício,muitolentamente,umavezqueexisteempequeníssimaquantidade.Amedidaquemaisrádioseacumula,asuadesintegraçãovai-sedandocadavezmaisrapidamente(istoécaracterísticodereacçõesdeprimeiraordem),acabandoporsedesintegraràmesmavelocidadeaqueseforma.Atinge-seassimumequilíbrioradioactivo.

Qualquer mineral que contenha urânio terá também rádio, sendo a quantidade de rádio muitomenordoqueadeurânioporcausadavidamédiamaiscurtadaquele.Issoacontecemesmoqueourânionãoproduzaorádiodirectamente,masatravésdediversosoutrospassosintermédios.

Comefeito,aconcentraçãodeurânioemminériodeurânioé2780000vezesmaiorqueadorádio,peloqueavidamédiadourânioé2780000vezessuperioràdorádio-226.Oquesignificaqueavidamédiadourânio-238édecercade4,51milharesdemilhõesdeanos.

EessaarazãoporqueaindaencontramosnaTerraurânioprimitivo.Onossoplanetaformou-sehácercade4,6milharesdemilhõesdeanoseincluiunasuacomposição,desdeoinício,umadeterminadaquantidade de urânio. Ao longo de todo esse período, apenas cerca demetade do urânio original sedesintegrou.Aoutrametadeaindaexiste.Serãonecessáriosoutros4,51milharesdemilhõesdeanosparaquemetadedaquiloquerestasedesintegre.Epelofactodourâniotersobrevividoestetempotodoqueasespécies intermédias da sua desintegração existem também, embora, evidentemente, em quantidadesmuitomenores.

Otório-232temumavidamédiaaindamaislongaqueadourânio:13,9milharesdemilhõesdeanos. Apenas cerca de 1/5 do tório primitivo existente na Terra teve até agora oportunidade de sedesintegrar.

Existeumisótopodeurânio-ourânio-235-quefoidescoberto,em1935,pelofísicocanadiano-americanoArthurJeffreyDempster(1886--1950).Nãoduratantotempocomoourânio-238ouotório-

232. A vidamédia do urânio-235 é de apenas 710milhões de anos. Trata-se, contudo, dum períodosuficientementelongoparapermitirqueumpoucomaisde1/70daquantidadeoriginalmentepresentenomomentodaformaçãodaTerracontinueaexistir.

VariedadesNuclearesEstáveisAdescobertaporSoddydeisótoposenvolveuapenasátomosradioactivos.Noentanto,elagerou

imediatamente suspeitas relativamente aos átomos não radioactivos. Já em 1905, o químico norte-americanoBertramBordenBoltwood(1870-1927),tendoreparadoqueosmineraisdeurâniopareciamincluir sempre chumbo, se interrogara sobre a possibilidade do chumbo ser o produto final dadesintegração radioactiva. As investigações realizadas vieram confirmar que assim era. O quesignificavaqueochumbo,emborasendoumelementonãoradioactivo,estava intimamenterelacionadocomaradioactividade.

Aúnicaformatípicadumátomoradioactivomudardepesoatómicoéatravésdaemissãodumapartículaalfa.Umapartículabetaafectaoseupesoatómicodemodo insignificanteea radiaçãogamanãoofazdetodo.Decadavezqueéemitidaumapartículaalfa,opesoatómicodiminuiquatrounidades.Isto é, se o átomo radioactivo tiver, originalmente, um peso atómico divisível por quatro, todas asespécies intermédias produzidas, sem excepção, terão igualmente um número atómico divisível porquatro - tal como sucede como átomode chumboque constitui o fimda série.Assim,o tório-232, oúnico isótopode tóriocomumavidamédiasignificativa,possuiumpesoatómicodivisívelporquatro(232=58x4).Àmedidaqueocorreasuadesintegração,perde6partículasalfacomumpesoatómicototalde24,ficandoaquiloquesobradoseunúcleocomumpesoatómicode208.Aemissãodessasseispartículas alfa também leva o tório-232 a perder um total de 12 cargas positivas. Contudo, ocorreigualmentealibertaçãode4partículasbeta,oquecancela4dascargaspositivasperdidas.Oresultadofinaléumaperdade8cargaspositivas.

Otóriotemnúmeroatómico90.Aperdade8cargaspositivasdáorigemaumátomocomnúmeroatómico82,queéochumbo.Seconsiderarmosumaperdadepesoatómicode24unidades,verificamosqueoprodutofinaldadesintegraçãodetório-232éochumbo-208,quenãoéradioactivo,masestável,equeexisteemquantidadeconsiderávelnaTerra-equesempreexistiu,esempreexistirá.

Atéaqui, tudobem.Masconsidereo leitorocasodourânio-238.Oseupesoatómico,quandodivididopor4,dáumrestode2(238=59x4+2).Seeleperderpesoatómicoatravésdaemissãodepartículas alfa, todos os seus produtos intermédios, bem como o produto final, darão um resto de 2quando divididos por 4. Um átomo de urânio-238, na sua desintegração, perde 8 partículas alfa e 6partículasbeta,queotransformamemchumbo-206.

Vejamosfinalmenteocasodourânio-235,cujopesoatómico,quandodivididopor4,dáumrestode3(235=58x4+3),talcomotodasassuasespéciesintermédiaseoprodutofinaldadesintegração.Cadaátomodeurânio-235emite7partículasalfae4partículasbeta,transformando-seemchumbo-207.(Existeumaquartasérieemquetodosospesosatómicos,quandodivididospor4,dãoresto1.Teremosoportunidadedefalardelamaisàfrente.)

Ficamos,portanto,comtrêsisótoposdiferentesdechumbo:chumbo-206,chumbo-207echumbo-208.Todoselessãoestáveiseapresentamaspropriedadeshabituaisdochumbo.Qualdelesexiste-seéquealgumexiste-naNatureza,independentementedaradioactividade?

Consideremosopesoatómicodochumbo.Tal comoé encontradonaNatureza, em rochas semquaisquer indícios de radioactividade, o chumbo apresenta um peso atómico de 207,19.Visto que osdiversos isótoposestáveisestãosemprepresentesnumaproporçãofixa,seráqueestevalor representa

simplesmenteumpesoatómicomédio?(Umavezqueosdiferentesprocessosgeológicosdependemdaspropriedadesquímicasdosváriosminerais,elesnãooperamaseparaçãodos isótoposdomodocomoseparam os diferentes elementos de acordo com as suas propriedades químicas. Assim sendo, taisprocessosdeixamsempreosisótoposmisturadosnasmesmasproporções.)

Procuremostestarahipóteseatrásformulada.Imaginemosquetemosumarocharicaemurânio.Paraalémdochumbooriginalmentepresente,haveráumacréscimolentomasconstantedechumbo-206echumbo-207, fazendo com que o peso atómico do chumbo nesta rocha seja apreciavelmente inferioràquelequemediríamosnumarochanãoradioactiva.Numarocharicaemtórioexistiráumaumentolentomas constante de chumbo-208, fazendo com que o peso atómico do chumbo nela presente seja maiselevadodoquenumarochanãoradioactiva.

Em1815,WilliamProutsugeriuquetodososátomoseramcombinaçõesdeátomosdehidrogénio.(1)Hidrogénio1(2)Carbono12(3)Oxigénio16(4)Enxofre32Em1914,Richardsmediuopesomoleculardochumboobtidodediversosminériosradioactivos.

Edescobriuqueosmineraisdetórioproporcionavamvaloresquepodiamatingir207,9paraochumbo,enquantoquenosmineraisdeurânioosvalorespodiamsertãobaixosquanto206,01.

Nomesmoano,portanto,emqueosnúmerosatómicossubstituíramospesosatómicosenquantoparâmetroessencialparaaconstruçãoda tabelaperiódica,oscientistascomeçaramaperceberqueospesosatómicosnãoeramafinalfundamentais.Podiamserapenasmédiasdepesosisotópicos(númerodemassa)queseriam,estessim,muitomaisimportantes.

Contudo,osisótoposdechumboobtinham-seporprocessosdedesintegraçãoradioactivae,porisso,talvezochumbofosseumcasoespecial.Quesepassariacomelementosquenadatinhamquevercom radioactividade? Existiam já algumas sugestões a esse respeito, antes mesmo dos trabalhos deRichardsteremdemonstradoaexistênciadeisótoposdechumbo.

Suponhaagoraoleitorqueconsiderávamosraiospositivos,quesãofeixesdeátomoscomcargapositiva possuindo um número inferior ao j normal de electrões. (Por vezes, os raios positivos nãocontêm electrões, sendo constituídos simplesmente por núcleos atómicos.) Se as partículas dos raiospositivos foremcolocadasemcamposelectromagnéticos, as suas trajectóriasafastam-seemcurvadaslinhas rectasquenormalmentedescrevem.Amaioroumenorcurvaturadessas trajectóriasdependedacargaeléctricadaspartículasedasuamassa.Seestivermosempresençadumelementoacujosátomosfoiretiradoummesmonúmerodeelectrões,todasaspartículasqueconstituemoraiopossuemidênticacargapositiva.Assimsendo,qualquerdesvionacurvaturadatrajectóriadoraioterádedever-seaumadiferençanamassadaspartículas-istoé,nosseuspesosatómicos.

Imaginemosagoraumtubocomgásnéon,cujosátomosapresentamtodosamesmacargapositiva.Setodostivessemtambémomesmopesoatómico(comosempreseconsiderara,desdeaformulaçãodateoriaatómica),todosdescreveriamtrajectóriascurvasidênticas.Colocandoumapelículafotográficanopercursodas partículas emmovimento, todas elas atingiriamapelícula nomesmoponto, criandoumapequenamanchadecontornosimprecisos.

Thomsonrealizouestaexperiência,em1912,edescobriuqueosiõesdenéonsensibilizavamumachapa fotográfica na posição esperada. Contudo, bem perto desse ponto havia uma segunda manchamenosvisível.Aposiçãodesta segundamancha era aquelaque seriade esperar para átomosdepesoatómico22.Umtalpesoatómiconãoeradetodoprevisível,masThomsonsugeriuquese,emcadadezátomosdenéon,novetivessemnúmerodemassa20eumnúmerodemassa22,amédiaponderadadeunseoutrosseria20,2,umvalorpróximodovalormedidoexperimentalmentedopesoatómicodonéontalcomo ocorre na Terra. Por outras palavras, o néon, que não tem nada que ver com processos

radioactivos, podia ser constituído por dois isótopos: néon-20 e néon-22. Esta possibilidade abriusubitamentenovasperspectivasnoqueserefereàestruturadosnúcleosatómicos.

Em 1815, nos primórdios da teoria atómica, o químico britânicoWilliam Prout (1785-1850)sugerira(anonimamente,umavezqueaideialheparecerademasiadoousadaparaseatreveraassociar-lhe o seu próprio nome) que todos os átomos eram combinações de átomos de hidrogénio. Os pesosatómicoscomeçavamentãoaserdeterminadosepareciamcorresponderanúmerosinteiros.Ouseja,ohidrogénio era 1, o carbono12, o oxigénio 16, o enxofre 32, e assimpor diante. Prout sugeriu que oátomo de carbono era constituído por 12 átomos de hidrogénio intimamente ligados uns aos outros, oátomodeoxigéniopor16átomosdehidrogénio,oátomodeenxofrepor32,etc.

Seumfeixede iõesdecargapositivadumelementoatravessarumcampoelectromagnético,osisótoposmenosmaciços sãomais facilmente desviados das suas trajectórias habituais em linha recta.Numespectrómetrodemassa, tal fenómenodáorigema linhasnegrasmuitopróximasumasdasoutrasnumachapafotográfica.Aposiçãodas linhaspermitecalcularonúmerodemassados isótopos.Asuaintensidadeindicaaquantidaderelativadecadaisótopo.

EstasugestãoficouconhecidacomohipótesedeProutquandoasuaautoriafoirevelada.Masnãoresistiumuito tempoumavezque,àmedidaqueospesosatómicos iamsendodeterminadoscommaisprecisão, se verificou que não eram todos números inteiros ou se aproximavam sequer de númerosinteiros.Odocloro,porexemplo,era35,456;odocobre63,54;odoferro55,85;odomagnésio24,31;odomercúrio200,59,eassimpordiante.

Aserverdadeira,ahipótesedeProutteriatornadoateoriaatómicamuitomaiselegante;ouseja,maissimpleseclara.Noentanto,asobservaçõesrealizadaslevaramaquefosseabandonadaduranteumséculo.Masagoravoltavaaestarnoespíritodemuitagente.

E se todos os pesos atómicos que não eram números inteiros representassem simplesmente asmédias dos números demassa de diversos isótopos - números demassa que eram, eles sim, númerosinteiros? A ser assim, os pesos atómicos podiam ser úteis nos cálculos químicos, mas o parâmetrorelevantedopontodevistadaestruturanuclearseriamosnúmerosdemassaisotópicos.

Em 1919, o químico britânico Francis William Aston (1877-1945), que fora aluno de J. J.Thomson,concebeuaquiloquedesignouporespectrógrafodemassa.Odispositivofaziacomqueiõescomcarga emassa idênticas se concentrassemnuma linha finanumaplaca fotográfica.Destemodo, apresençadeisótopospodiaserdetectadaatravésdaexistênciadumconjuntodelinhasescuraspróximasumasdasoutras.Aposiçãodumalinhapermitiacalcularonúmerodemassadoisótopocorrespondenteeasuaintensidadeaquantidaderelativadaquele.Comesteinstrumento,podiamobter-seresultadosmuitomaisprecisosdoqueosqueThomsonconseguiracomoseuinstrumentoinovadormasprimitivo.

A utilização dum espectrógrafo de massa permitiu detectar de modo inequívoco as linhascorrespondentesaonéon-20enéon-22,bemcomoalinhamuitoténuedonéon-21.Sabemosactualmenteque em cada 1000 átomos de néon, cerca de 909 são de néon-20, 88 de néon -22 e 3 de néon-21.Qualquerumdestestrêsisótoposéestáveleamédiaponderadadosseusnúmerosdemassaconfereaonéon, tal como é encontrado na Natureza, um peso atómico de 20,18. Aston foi galardoado com umPrémioNobelem1922pelosseustrabalhoscomoespectrógrafodemassa.

É claro que foram estudados outros elementos tendo-se descoberto que, namaioria dos casos,eram constituídos por vários isótopos. O cloro, por exemplo, consiste em dois isótopos: cloro-35 ecloro-37.Emcada1000átomosdecloro,755sãodecloro-35e245decloro-37,oquefazcomqueamédiaponderadadosrespectivosnúmerosdemassaestejamuitopróximadopesoatómicodocloro,talcomoexistenaNatureza. (Amédiaponderadanão correspondeexactamenteao peso atómicomedido

umavezque,comoveremos,osnúmerosdemassatambémnãosãorigorosamentenúmerosinteiros.)Porvezes,umdeterminadoisótopoéclaramentepredominante.Emcada1000átomosdecarbono,

porexemplo,989sãodecarbono-12e11decarbono-13.Emcada1000átomosdeazoto,996sãodeazoto-14e4deazoto-15.Emcada10000átomosdehidrogénio,9999sãodehidrogénio-1e1édehidrogénio-2.Emcadamilhãodeátomosdehélio, todosàexcepçãodumsãodehélio-4, sendoqueaexcepçãoéumátomodehélio-3.Emtodosestescasos,opesoatómicoaproxima-sedumnúmerointeiro.

Em1919, o químiconorte-americanoWilliamFrancisGiauque (1895-1982) descobriu que emcada10000átomosdeoxigénio,9976sãodeoxigénio-16,20deoxigénio-18e4deoxigénio-17.AquiloquetornouestadescobertaparticularmentesignificativafoiofactodooxigénioserusadocomopadrãoparaadeterminaçãodospesosatómicosdesdeotempodeBerzelius,tendo-seconvencionadoqueoseupeso atómico era exactamente igual a 16,0000. No entanto, verificava-se agora que o seu valor eraapenasumamédiaquepodiavariarmuitoligeiramentedeamostraparaamostra.Eassim,em1961,osfísicosequímicosacordaramoficialmenteemassociaropadrãoaumnúmerodemassaenãoaumpesoatómico.Estabeleceu-sequeonúmerodemassadocarbono-12eraexactamente12,0000,oquealteravaosantigospesosatómicosapenasmuitoligeiramente.Porexemplo,opesoatómicodooxigéniodeixoudeser16,0000epassouaser15,9994.

Alguns átomos existem naNatureza apenas numa variedade. Por exemplo, todos os átomos deflúorexistentesnaNaturezatêmnúmerodemassa19,todososátomosdesódio23,todososátomosdealumínio27,todososátomosdecobalto59,todososátomosdeouro197,etc.Paraestescasos,muitosfísicosconsideramqueapalavraisótoponãoéapropriada.Umisótoposignificaacoexistênciadepelomenosduasvariedadesatómicasnamesmaposiçãonatabelaperiódica.Dizerqueumelementopossuiumisótopoécomodizerqueumpaioumãetemumfilhogémeo.Foiporissoque,em1947,oquímiconorte-americanoTrumanPaulKohman(n.1916)sugeriuqueseutilizasseemvezdeleotermonuclido.Trata-sedumadesignaçãomuitoboa,masapalavraisótopotornou-sedemasiadofamiliarparapoderserpostadelado.

Existemoitentaeumelementos,cadaqualcompelomenosum isótopoestável.Destes,omaiscomplicadoéobismuto,quetemnúmeroatómico83.Todososseusátomostêmnúmerodemassa209.Oátomomaismaciçoeestávelé,portanto,odebismuto-209.

Nãoexistenenhumátomoestávelcomumnúmeroatómicomaiordoque83ouumpesoatómicosuperiora209.AúnicarazãoporqueexistemátomosmaismaciçosnaTerradeve-seaofactodourânio-238,urânio-232etório-232,emboraradioactivos,teremvidasmédiasmuitolongas.

Onúmerototaldeisótoposestáveisdosoitentaeumelementoséde272,umvalorsuficienteparadar trêsouquatro isótoposporelementos,seasuadistribuiçãofosseequitativa.Masascoisasnãosepassamassim.Oselementoscomumnúmeroatómicopartêm,dummodogeral,umnúmerodeisótopossuperioràmédia.Oestanho,comnúmeroatómico50,detémorecordecomdezisótoposestáveis,comosseguintesnúmerosdemassa:112,114,115,116,117,118,119,120,122e124.

Oselementoscomnúmeroatómicoímpartêm,geralmente,umoudoisisótoposestáveis.Existemdezanoveelementos(todos,àexcepçãodum,comnúmerosatómicos ímpares)quesãoconstituídosporumúnico isótopo estável.A excepção, comnúmero atómico par, é o berílio (número atómico 4), quepossuiumúnicoisótopoestável,oberílio-9.

Oleitorpoderáinterrogar-seporquerazãoexistemapenasoitentaeumelementoscomisótoposestáveis,seoselementosnúmeros82(chumbo)e83(bismuto)ostêm.Issosópodesignificarquenalistadeelementosentre1e83existemdoiselementosquenãopossuemtais isótoposestáveis.Eé issodefacto que se passa.Os elementos 43 e 61 (ambos números atómicos ímpares) não possuemquaisquer

isótopos estáveis ou quasi-estáveis. Nos anos 20, tais isótopos foram procurados com afinco e,ocasionalmente,surgiramnotíciasanunciandoteremsidoisoladosdumoudoutroelemento.Noentanto,tais anúncios revelaram--se infundados.Nenhumdos elementos foi realmente isolado até os cientistasteremaprendidoacriarno laboratórionúcleosquenãoexistemnaTerraemquantidadesmensuráveis.(Voltaremosaesteassuntomaisàfrente.)

Outroaspectopeculiaréofactodopotássio(númeroatómico19)seroúnicoelementodenúmeroatómico ímparcommaisdedois isótoposqueocorremnaturalmente.Comefeito,são trêsos isótopos,comnúmerosdemassa39,40e41.Destestrês,noentanto,opotássio-40sórepresenta1emcada10000átomosdepotássio.

Já em 1912 Otto Hahn notara que o potássio parecia ser ligeiramente radioactivo, e essaradioactividadeacabouporseratribuídaaopotássio-40.Opotássio-40 temumavidamédia longa,de1,3milharesdemilhõesdeanos.Trata-sedumvalorsuperioraodavidamédiadourânio-235.Menosdum décimo da quantidade desse isótopo existente na Terra quando esta se formou se conservaactualmente.Todavia,opotássioéumelementotãocomumnasrochasqueconstituemaTerraque,apesardeapenas1emcada10000átomosdepotássioserdepotássio-40,hámaispotássio-40nasrochasdoqueurânio-238eurânio-235combinados.

Masseassimé,porquemotivonãofoiaradioactividadedescobertaprimeironopotássioemvezdo urânio?A resposta é que, em primeiro lugar, o urânio emite partículas alfamuito energéticas e opotássio-40apenaspartículasbetacompoucaenergia.Emsegundolugar,ourâniodesintegra-separadarorigemaumalongasériedeespéciesintermédias,cadaqualmaisradioactivadoqueoprópriourânio.Opotássio-40,pelocontrário,produzdirectamenteumisótopoestável,oárgon-40,quandosedesintegra.

Opotássio-40nãoéoúnicoisótopoquasi-estávelentreaquelesquerefericomoestáveis.Existecercadumadúziadoutros,todoscomvidasmédiasmuitomaislongasdoqueadopotássio-40,oumesmodoqueadotório-232.Elesvivemtantotempoqueasuaradioactividadeépraticamenteimperceptível.Ovanádio-50,porexemplo,temumavidamédiadecercade600biliõesdeanos,ouseja,cercade130000vezessuperioràdourânio-238.Oneodímio-154temumavidamédiadecercade5000biliõesdeanos,eporaífora.Nenhumdestesisótoposquasi-estáveiscomnúmerosatómicosinferioresaodotório(90)dáorigemaumasérieradioactiva.Todos,àexcepçãodum,emitemumaúnicapartículabetaetransformam-seemisótoposestáveis.Aexcepçãoéosamário-147,queemiteumaúnicapartículaalfaesetransformaemneodímio-143,queéestável.

O facto dos números demassa dos isótopos serem todosmuitos próximosde números inteirostornava tentador pensar (comode resto sugerira Prout) que os núcleos são constituídos por partículasmaispequenas,equeestassãoapenasdealguns tiposdiferentes.Apossibilidadedesimplificardestemodo a natureza era muito apelativa e, nos anos 20, os físicos trabalharam arduamente para tentarelucidaraestruturadonúcleoatómico.

6.NEUTRÕES

ProtõeseElectrõesAbuscada simplicidadenãoconstituiuaúnicamotivaçãopordetrásdos trabalhosdos físicos

queestudavamaestruturanuclear.Aobservaçãodosmateriaisradioactivospareciaindicarclaramenteque alguns núcleos deviam,pelo menos, ter uma estrutura; ou seja, ser conjuntos de partículas maissimples.Comefeito,algunsnúcleosradioactivosemitiampartículasbeta(electrões),enquantoqueoutrosemitiampattículasalfa(núcleosdehélio).Aexplicaçãomaissimplesparataisemissõeseradequeosnúcleoscontinhamelesmesmosnúcleosmaissimpleseelectrõesque,poralgumarazão,eramporvezeslibertados.

Seaceitarmosa ideiadequealgunsnúcleos sãoconstituídospornúcleosmaispequenoseporelectrões,torna-sefácildaropassoseguinteesuporquetodososnúcleospossuemumatalestrutura.Porumaquestão de simplicidade, podemos igualmente supor que esses núcleosmais simples são osmaissimplespossíveis.

Onúcleomaissimplesqueseconheceéodohidrogénio-1,umnúcleocomnúmerodemassa1ecomumacargaeléctricade+1.Rutherfordbaptizaradeprotãoonúcleodohidrogénio-1e,nosanos20,existiaaconvicçãogeneralizadadequeoprotãoeraapartículamaispequenaemaissimplescapazdetransportarumacargapositiva.Surgiuassimateoriadequeosnúcleosdosátomoseramconstituídosporprotõeseelectrõesjuntosnumpequenovolume.

Aspartículasalfaquesãoemitidasporalgunsátomosradioactivostêmnúmerodemassa4,peloquepodiamserconstituídaspor4protões,cadaqualcomnúmerodemassa1.Noentanto,aspartículasalfa apresentam igualmente uma carga eléctrica de +2, e 4 protões possuem uma carga total de +4.Parecia,portanto,que,paraalémdos4protões,existiamnapartículaalfa2electrõesanulandoduasdascargaspositivas,aomesmo tempoquenãocontribuíamdemodosignificativoparaamassa total.Umapartículaalfaconstituídapor4protõese2electrõesteriaassimumamassade4eumacargade+2,comoderestoseobservava.

Estetipoderaciocíniopodiaserigualmenteaplicadoaoutrosnúcleos.Eusadoparaexplicarosisótopos.Onúcleodooxigénio-16,porexemplo,possuiumamassade16eumacargade+8,peloquedeviaserconstituídopor16protõese8electrões.Onúcleodooxigénio-17podiaserencaradocomopossuindoumparprotão-electrãoadicional,queaumentavaa respectivamassaem1unidade, sem,noentanto,alteraracarga.Umtotalde17protõese9electrõesresultamnumamassade17enumacargade+8.Analogamente,onúcleodooxigénio-18podiaservistocomopossuindomaisumparprotão-electrãoadicional,peloqueseriacompostopor18protõese10electrões,comumamassade18eumacargade+8.

Nosnúcleosexistemprotõeseneutrões.Esta teoria dos protões-electrões serviu durante algum tempo para os físicos explicarem a

estrutura nuclear, especialmente porque tornava o Universo extraordinariamente simples. Segundo ateoria,todososobjectosmateriaisexistenteseramconstituídosporcercade100tiposdeátomos,sendocadaátomoconstituídopor igualnúmerodedois tiposdepartículas subatômicas:protões e electrões.Todos os protões estavam localizados no núcleo, enquanto que alguns electrões estavam no núcleo eoutrosforadele.

Alémdisso,acoesãodoUniversopareciasergarantidapordoiscampos:acoesãodonúcleo,

pela atracção electromagnética entre protões e electrões; a do átomo, no seu conjunto, pela atracçãoelectromagnéticaentrenúcleoseelectrões.Haviadiversosátomosquesecombinavamparadarorigemamoléculas,cristaisouobjectossólidosdotamanhodeplanetas,atravésdatransferênciadeelectrõesdumátomoparaoutro,ouatravésdapartilhadeelectrões.Existiriaalgumacoisacujacoesãonãosedevesseacamposelectromagnéticos?Éclaroquesim.

Asmoléculasdosgasesexistemmuitoafastadasumadasoutras,estandoapenassujeitasaforçaselectromagnéticasmuito fracas. Se fossemestas as únicas forças que sobre elas actuam, asmoléculasdispersar-se--iampelaimensidãodoespaço.Contudo,osgasesmantêm-sejuntodoscorposdegrandesdimensõespelaacçãodealgodiferente:aatracçãogravítica.EporessemotivoqueaTerrapossuiumaatmosfera.

Noentanto,a fraca intensidadedocampogravíticoexigeumcorpodegrandesdimensõesparasegurarosgases.SeagravidadenãofossesuficientementefortenaTerra,oslíquidosdebaixopontodeebulição, por exemplo, evaporar-se-iam, dispersando-se as suas moléculas pelo espaço. É graças àatracção gravítica exercida pela Terra que possuímos um oceano. A Lua, por exemplo, não ésuficientementegrandeparapossuiráguanoestadolivreàsuasuperfície.

Oscorposquenoespaçoestãoseparadospordistânciasconsideráveistambémsemantêmjuntosgraçasacamposgravíticos:ossatélitesrelativamenteaosplanetas;osplanetasrelativamenteàsestrelas;asestrelasemrelaçãoumasàsoutrasparaformaremgaláxias;easgaláxiasemrelaçãoumasàsoutrasparaconstituíremenxames.Naverdade,acoesãodoUniversonoseuconjuntoégarantidapelaatracçãogravítica.

Seacrescentarmosaistoofactodocampoelectromagnéticoestarassociadoàradiaçãodefotõeseo campogravítico à radiaçãodegravitões, podemos talvez concluir que a totalidadedoUniverso éconstituída por apenas quatro tipos de partículas: protões, electrões, fotões e gravitões. Os protõespossuemnúmerodemassa1,cargade+1espinde+1/2ou-1/2.Oselectrõestêmnúmerodemassade0,00055,cargade-1espinde+1/2ou-1/2.Osfotõesapresentamnúmerodemassa0,carga0espinde+1ou-1.Osgravitõestêmnúmerodemassa0,carga0,espinde-2ou+2.

Que simples que tudo isto é!Mais simples ainda do que a teoria grega dos quatro elementosterrenos edumquinto elementoquedizia respeito aos corpos celestes.Naverdade,oUniversonuncamaisvoltouaparecertãosimplescomoduranteosanos20doséculopassado.

Na verdade, houvemesmouma tentativa ambiciosa para o tornar aindamais simples. Por querazão existiamdois campos, o electromagnético e o gravítico?Seriam eles dois aspectos apenas dummesmofenómeno?Seriapossívelconceberumconjuntodeequaçõesquedescrevessemambos?

Everdadequeosdoiscamposparecemserradicalmentediferentes.Ocampoelectromagnéticoafectaapenaspartículascomcargaeléctrica,enquantoqueocampogravíticoafectatodasaspartículasquepossuammassa,tenhamelascargaounão.Umenvolveatracçõeserepulsões,enquantoqueooutrotemqueverapenascomatracções.Paraumqualquerpardepartículasquesejamafectadasporambososcampos, o campo electromagnético é biliões de biliões de biliões de vezes mais intenso do que ocorrespondente campo gravítico. Por isso, ao considerar um par protão-electrão, basta considerar aatracção electromagnética entre ambas as partículas, uma vez que a atracção gravítica é,comparativamente,insignificante.

No entanto, tais diferenças não têm necessariamente de ser um entrave à unificação. Omagnetismo,aelectricidadeealuzpareciaminicialmenteconstituirtrêsfenómenosmuitodiferentes.E,todavia,Maxwellencontrouumconjuntodeequaçõesválidasparaostrêsedemonstrouqueeramfacetasdiferentesdummesmofenómeno.

FoinemmaisnemmenosqueopróprioEinsteinquempassouasúltimasdécadasdasuavidaatentar concluiro trabalhodeMaxwell e a encontrar equaçõesaindamais fundamentaisque incluíssemigualmenteocampogravítico,naquiloquefoidesignadocomoteoriadocampounificado.Einsteinfalhoumas,comoveremos,issonãopôsfimàstentativasdeunificação.

Oprópriomodelodoprotão-electrãoparaa estruturanuclearnãoduroumuito tempo,umavezquecontinhaumerrofundamental.

ProtõeseNeutrõesOnúcleopossuiumspin,talcomooselectrões,protões,fotõesegra-vitões.Oseuvalorpodeser

determinadoatravésdaanálisedaestruturafinadoespectroproduzidopelosnúcleos,eaindaporoutrosmétodos.

Seonúcleoforformadoporpartículastaiscomoosprotõeseelectrões,parecerazoávelsuporqueospintotaldonúcleoseráasomadosspinsdaspartículasconstituintes.Istodeve-seaofactodospinrepresentarmomento angular, e os físicos terem descoberto há jámuito tempo que existe uma lei deconservaçãodomomentoangular.Poroutraspalavras,nãoépossívelcriarspinapartirdonada,nemdestrui-lo.Elepodeapenassertransferidodumcorpoparaoutro.

Namedidaemquepodesertestada,estaleiéválidaparatodososcorposcomuns.Nocasodumobjectocomumanimadodummovimentoderotação(talcomoumamoedaquepomosagirarcomanossamão)pode-seficarcomaimpressãodequeoseuspinsurgiudonada.Noentanto,ele teveorigemnomovimentodanossamão,equandofazemosrodaramoeda,amão,orestodonossocorpo,etudoomaisaqueestivermosligados-umacadeira,ochão,oplanetaTerra-adquireumspininverso.(Omomentoangularpodeterumdedoissentidos,positivoenegativo,quesepodemanularmutuamente.Alémdisso,ummomento angular pode surgir a partir do nada se outro aparecer simultaneamente. Aquilo que seconservaéomomentoangulartotaí-istoé,aquelequeseobtémquandosesomamtodososdiferentesmomentosangulares,positivosenegativos.)

O valor do momento angular não depende apenas da velocidade de rotação, mas também damassadoobjectoqueestáagirar.Quandorodamosanossamãoparapôrumamoedaemmovimento,aTerra tem uma massa tão superior à da moeda que a sua rotação em sentido inverso ocorre a umavelocidade demasiado pequena para poder ser medida por qualquer método imaginável. E quando arotaçãodamoedaterminadevidoàfricçãocomasuperfíciesobreaqualestáagirar,ospininversodaTerra,incrivelmentepequeno,tambémcessa.

Nocasodepartículasanimadasdummovimentoderotação,ospinépotencialmenteeternosenãoexistirem interferências sobre as partículas. Tanto os protões como os electrões possuem spins, quepodemserrepresentadospelasfracções+1/2e-1/2.(Ospintotaléomesmoparaambasaspartículas,apesardadiferençaentreassuasmassas.Oselectrões têmumarotaçãomaisrápidaparacompensarasuamassamaisreduzida.Ospinpode,obviamente,sernumounoutrosentido.)

Seadicionarmososspinsdumnúmeropardeprotõeseelectrõesnumnúcleo,ospintotaltemdeserigualazeroouaumnúmerointeiro.

Osvaloresdosdoisspinspodemser,porexemplo,+1/2e+1/2,ou+1/2e-1/2,ou-1/2e+1/2,ou-1/2e-1/2.Assuassomassão,respectivamente,+1,0,0e-1.Seimaginarmosquatrospinscomvalor1/2ouseis,ouoito,ouqualqueroutronúmeropar,eosadicionarmossejacomquecombinaçãodesinais+e-for,asuasomaserásemprezero,umnúmerointeiropositivoouumnúmerointeironegativo.

Se tivermos um número ímpar de partículas, cada qual com um spin de 1/2, a sua soma serásempreumnúmerofraccionário,sejaqualforacombinaçãodesinais+e-queescolhermos.Setivermostrêspartículas,porexemplo,podemoster+1/2,+1/2e+1/2eumvalortotalde+11/2;ou+1/2,+1/2e-1/2eumvalortotalde+1/2.Sejaqualforaformacomodistribuirmosossinais+e-portrês,cinco,

sete ou qualquer outro número ímpar de partículas, a soma dos spins será sempre +1/2, -1/2, + umqualquernúmerointeiroe1/2ou-umqualquernúmerointeiroe1/2.

Eistoleva-nosdevoltaaoazoto-14,queestudosespectroscópicosrevelaramterumspinde+1ou-1.Onúcleodoazoto-14 temnúmerodemassa14ecargaeléctrica+7.Segundoomodeloprotão-electrãodaestruturanuclear,oseunúcleodeviaserconstituídopor14protõese7electrões,ouseja,umtotalde21partículas.Porém,sendo21umnúmeroímpar,ospintotaldestenúcleodeviaserumnúmerofraccionário.Asomadosspinsdessaspartículasnãopoderesultarnovalor+1ou-1.

Factos como este deixaram os físicos muito preocupados. Eles não queriam pôr de parte omodeloprotão-electrãodonúcleo,umavezqueeramuitosimpleseexplicavaimensascoisas.Mas,poroutrolado,tambémnãoqueriamabandonaraleidaconservaçãodomomentoangular.

Já em 1920, alguns físicos, como Ernest Rutherford, tinham encarado a possibilidade dacombinação protão-electrão ser uma única partícula. Esta teria a massa dum protão (ou uma massaligeiramentesuperiorporcausadacontribuiçãodoelectrão)eumacargaeléctricanula.

Eclaroqueuma talpartículanãopodiaservistacomoumasimples fusãodumprotãocomumelectrão.Uma vez que cada uma destas partículas contribuía com um spinde +1/2 ou -1/2 para essafusão,apartícularesultanteteriaumspinde0,+1ou-1.Ospindonúcleodeazotocontinuariaaserumnúmerofraccionário,querseconsiderassemosprotõeseelectrõesseparadamente,queremcombinaçõesunscomosoutros.

Emvezdisso,haviaquepensarnumapartículaquetivessemassa1,comooprotão,carga0espinde+1/2ou-1/2,poissóassimseexplicariamaspropriedadesdonúcleodeazoto.Em1921,oquímiconorte-americanoWilliamDraperHarkins(1871-1951)deuonomedeneutrãoauma talpartícula,umavezqueeraelectricamenteneutra.

Esta possibilidade manteve-se no espírito dos físicos ao longo dos anos 20, mas como ohipotético neutrão nunca foi detectado, era difícil levá-la muito a sério. O modelo protão-electrãocontinuoupor issoaserusado,apesardenãoseajustara todosos factosconhecidos. (Geralmenteoscientistas não abandonam uma ideia que lhes parece útil até estarem certos de terem encontrado umamelhorparaasubstituir.Trocaralgoqueéútilporcoisaalgumaouporalgodemuitovagonãoéboaideiaemciência.)

Em1930,ofísicoalemãoWalterW.G.F.Bothe(1891-1957)verificouquequandobombardeavaberílio,umelementoleve,compartículasalfa,obtinhaumaradiaçãodesconhecidaquepossuíaenormepoderdepenetraçãoenãoparecia tercargaeléctrica.Oúnicotipoderadiaçãoqueconheciacomtaiscaracterísticaseramosraiosgama,peloquesuspeitouqueeraissoqueestavaadetectar.

Em1932,ofísicofrancêsFrédéricJoliot-Curie(1900-1958)easuamulher, IreneJoliot-Curie(1897-1956), a filhadePierre eMarieCurie, descobriramque a radiaçãodeBothe, ao incidir sobreparafina, provocava a emissão de protões desta substância. Nunca tal fenómeno fora observado comraiosgama,masosJoliot-Curienãoconseguirampensarnoutraexplicação.

Nessemesmoano,porém,o físicobritânicoJamesChadwick (1891--1974) resolveu repetirasexperiências de Bothe e dos Joliot-Curie. Chadwick considerou que, para a radiação ser capaz deprovocaraemissãodumapartícula tãomaciçacomooprotão, tinhaelaprópriadeserconstituídaporpartículasmaciças.Uma vez que a radiação não possuía carga eléctrica, Chadwick concluiu estar napresençadatalpartículamaciçaeneutradequeosfísicosandavamàprocura-oneutrão.Comefeito,eradissomesmoquesetratavaeChadwickrecebeuumPrémioNobelem1935pelasuadescoberta.

Uma vez descoberto o neutrão, Heisenberg sugeriu imediatamente que o núcleo atómico era

constituído por uma massa densamente empacotada de protões e neutrões. O núcleo de azoto, porexemplo, seriacompostopor7protõese7neutrões,cadaqualcomnúmerodemassa1.Onúmerodemassatotaleraporisso14.Eumavezqueapenasosprotoestinhamcarga+1,sendoadosneutrões0,acargatotaldonúcleoerade+7,comodeviaser.Alémdisso,onúcleopossuíaagora14partículas-umnúmeropar-peloqueoseuspintotalpodiaserde+1ou-1,talcomoeramedidoexperimentalmente.

Omodeloprotão-neutrãoexplicavaospinnucleardetodososnúcleosatómicos,semexcepções,etambémtudoaquiloqueeraexplicadopelomodeloprotão-electrão(comumaúnicaexcepçãoquefoimaistarderesolvida,comoexplicareiadiante).Comefeito,nomaisdemeioséculoquedecorreudesdeadescobertadoneutrão,nadafoidescobertoqueviessepôremcausaomodeloprotão-neutrãodonúcleo,emboraestetenhasidoaperfeiçoado,assuntoqueabordareimaisàfrente.

Consideremos, por exemplo, a maneira simples como o novo modelo explica a existência deisótopos.Todososátomosdumdadoelementopossuemomesmonúmerodeprotõesnonúcleoe,porconseguinte,idênticacarganuclear.Noentanto,onúmerodeneutrõespodevariar.

Assim, o núcleo do azoto-14 é constituído por 7 protões e 7 neutrões,mas um em cada 3000núcleosdeazotocontém7protõese8neutrõessendo,porisso,azoto-15.Emboraonúcleodeoxigéniomaiscomumpossua8protõese8neutrões,oquefazdeleoxigénio-16,algunsnúcleostêm8protõese9neutrões,oumesmo8protõese10neutrões(sãooxigénio-17eoxigénio-18,respectivamente).

Mesmoohidrogénio,comumnúcleoconstituídoapenasporumprotão(hidrogénio-1)nãoescapaaestascoisas.Em1931,oquímiconorte-americanoHaroldClaytonUrey(1893-1981)mostrouque1emcada 7000 átomos de hidrogénio era hidrogénio-2, tendo sido galardoado com umPrémioNobel, em1934,peloseutrabalho.Onúcleodohidrogénio-2éformadopor1protãoe1neutrão,razãopelaqualéfrequentementedesignadodeutério,daexpressãogregaquesignifica"segundo".

Do mesmo modo, o urânio-238 possui um núcleo constituído por 92 protões e 146 neutrões,enquantoqueourânio-235temumnúcleocom92protõese143neutrões.Nãoexistequalquer isótopoquenãopossaserperfeitamentedescritopelomodeloprotão-neutrãodaestruturanuclear.

Os protões e neutrões estão ambos presentes no núcleo (sendo por vezes colectivamentedesignados nucleões), têm massas quase idênticas e tanto uns como outros podem, em determinadascircunstâncias,seremitidosdonúcleo.Noentanto,oprotãoforajáreconhecidocomopartículaem1914,enquanto que o neutrão teve de esperarmais dezoito anos até ser identificado. Por que foi que a suadescoberta levou tanto tempo?Aexplicação resideno factodacargaeléctricaserapropriedademaisfacilmentedetectáveldumapartículaedoprotãopossuirumacargaeléctrica,aocontráriodoneutrão.

Umdosprimeirosmétodosutilizadosparaidentificarpartículassubatômicasfoioelectroscópiodefolhas.Odispositivoconsisteemduasfolhasdeouromuitofinaselevesqueestãoligadasaumahasteeencerradasnuminvólucrodestinadoaprotegeroconjuntodascorrentesdear.Seahastefortocadaporumobjecto electricamente carregado, a carga é transmitida às folhas de ouro.Umavez que ambas asfolhasrecebemamesmacarga,repelem-seformandoumVinvertido.

Nãohavendooutrasinterferências,asfolhasdoelectroscópiopermanecemseparadas.Noentanto,qualquer fluxodepartículas comcarga eléctrica para o interior do electroscópio arranca electrões àsmoléculasdoar.Estefenómenodáorigemaelectrõesdecarganegativaeaiõescomcargapositiva(umacorrentedepartículascarregadaselectricamenteconstituiumexemploderadiaçãoionizante).Umasououtrasdestaspartículascarregadasneutralizamacarganumadasfolhasdeouro,fazendocomquevoltemlentamenteajuntar-se.Umacorrentedeneutrõesnãoé,todavia,umexemploderadiaçãoionizante,umavezqueosneutrões,nãopossuindocarga,nãoatraemnemrepelemoselectrõesdosátomosemoléculas,arrancando-os.Osneutrõesnãopodem,porisso,serdetectadoscomumelectroscópio.

Em1913,ofísicoalemãoHansWilhelmGeiger(1882-1945)inventouumdispositivoconstituídoporumcilindroquecontinhaumgássubmetidoaumadiferençadepotencialmuitoelevada,masnãotãoelevada que provocasse umadescarga de electricidade através daquele.Qualquer porção de radiaçãoionizantequeentrassenocilindrodavaorigemàformaçãodumião,queerapuxadoatravésdocilindropeladiferençadepotencialexistente,produzindomaisiões.

Mesmoumaúnicapartículasubatômicaproduziaumadescargaqueeraperceptívelsobaformadum estalido seco. O contador Geiger tornou-se famoso como dispositivo para contar partículassubatômicas.

Antesdisso, em1911,o físicobritânicoCharlesThomsonReesWilson (1869-1959) inventaraumacâmaradenevoeiro.Wilsonprovocouaexpansãodearhúmidosemquaisquerpoeirasnointeriordumcilindro.Amedidaqueexpande,oarvaiarrefecendoealgumadahumidadecondensaproduzindogotículas,desdequeexistampartículasdepoeiraquefuncionemcomocentrosdecondensaçãoemtornodosquaisasgotículassepossamformar.Naausênciadetaispartículas,aáguapermanecesobaformadevapor.Seumapartículasubatômicaentrarnacâmaradenevoeiro,formaiõesaolongodoseutrajecto,queactuamcomocentrosdecondensaçãodaágua.Emtornodecadaiãoforma-seumaminúsculagotadeágua.Destemodotorna-sepossíveldetectar,nãoapenasaspartículas,mastambémosseustrajectos.Seacâmaradenevoeiroforcolocadanumcampoeléctricooumagnético,umapartículacomcargaeléctricaemmovimento descreve uma trajectória curva, que pode ser visualizada.Wilson recebeu um PrémioNobel,em1927,pelainvençãododispositivo.

Em 1952, o físico norte-americano Donald Arthur Glaser (n. 1926) concebeu um aparelhosemelhante.Emvezdumgás e da formaçãodegotículas,Glaser usouum líquido à temperatura a queestavaprestesa formarbolhasdevapor.Taisbolhasproduziam-seao longodo trajectodaspartículasatómicasqueentravamnodispositivo.GlaserrecebeuumPrémioNobelem1960pelasua"câmaradebolha".

Todos estes dispositivos, emuitos outros de natureza análoga, reagem à formação de iões porradiaçãoionizante;istoé,atravésdepartículascomcargaeléctrica.Nenhumdelesfuncionacomneutrõesque,porassimdizer,entramesaemdetaisdispositivossemfazerembarulho.

Apresençadeneutrõessópodeserdetectadaindirectamente.Seumneutrãoformadonointeriordumdispositivodedetecçãopercorrerumacertadistânciaedepoiscolidircomumaoutrapartículaque,elasim,podeserdetectada-edesdequeoneutrãoaltereatrajectóriadaoutrapartículaoudêorigemapartículasnovas,detectáveis-existiráumhiatoentreotrajectoquemarcaaformaçãodoneutrãonumaextremidadeeacolisãodoneutrãocomalgodediferentenaoutra.Essehiatotemdeserpreenchidocomalgumacoisaedanaturezadosdoisconjuntosdetrajectosélógicodeduzirapresençadumneutrãoentreambos.

Os físicos que trabalham com detectores de partículas aprenderam a fotografar as trajectóriascomplexas deixadas em gotículas de água, bolhas de gás, linhas de descargas eléctricas, etc. e ainterpretartodosospormenorescomamesmafacilidadecomquelemosestelivro.

Éporosneutrõesnãodeixaremqualquer rastoem taisdispositivosqueasuadescoberta ficouadiadapor tantosanos.Noentanto,umavezdescobertos, revelaram-sedamaior importância.Éoqueveremosaseguir,recuandoumpouconotempo.

ReacçõesNuclearesAs inúmeras interacções de átomos e moléculas que envolvem transferência e partilha de

electrõessãodesignadasreacçõesquímicas.Até1896,asúnicasinteracçõesqueoscientistasconheciam,fossem elas namatéria viva ou inanimada, eram reacções químicas, embora a sua natureza não fosserealmentecompreendidaatéaestruturadosátomostersidoelucidada.

Nesse sentido, a radioactividade é diferente. As transformações associadas à radioactividadeenvolvemaejecçãodepartedonúcleo,oualteraçõesnanaturezadaspartículasqueoconstituem.Taiseventossãodesignados reacçõesnuclearese,dummodogeral, implicam trocasdeenergiamuitomaisintensasdoqueasreacçõesquímicas.

Aradioactividadeconstituiumareacçãonuclearespontânea.Senãoexistissemalgumasreacçõesnuclearesespontâneas,istoé,reacçõesquetêmlugarsemqualquerintervençãohumana,ébempossívelquenuncadescobríssemosaexistênciadetodaumasériedefenómenos.

Éque,paraossereshumanos,émuitomaisdifíciliniciaroucontrolarreacçõesnuclearesdoquereacçõesquímicas.Paraproduzir, impediroumodificarumareacçãoquímica,oscientistasnecessitamapenasdejuntarprodutosquímicos,deosaquecerouarrefecer,colocarsobpressão,passararatravésdelesoulevaracabooutrasoperaçõesrelativamentefáceisderealizar.Afinal,sãoapenasoselectrõesmaisexterioresqueestãoenvolvidos,eessesestãotãoexpostosqueéfácilfazermoscoisascomeles.

Asreacçõesnucleares,pelocontrário,têmlugarnospequenosnúcleos,nocentrodosátomos.Eos núcleos estão protegidos por diversos electrões. Os procedimentos utilizados para provocartransformações químicas não atingem ou afectam os núcleos atómicos. Com efeito, quando aradioactividade foi descoberta, os químicos ficaram perplexos ao verificarem que a taxa dedesintegração não se modificava com a temperatura. Ela permanecia constante, quer a substânciaradioactivafosseaquecidaatéàfusãoouarrefecidaemarlíquido.Ofactodesesubmeterumasubstânciaradioactivaaumatransformaçãoquímicatambémnãoaalterava.

Os neutrões colidem comos núcleos, provocando a emissão demais emais neutrões e dandoorigemaumareacçãonuclearemcadeia.

Haveria algum modo de interferir com aquilo que se passava no núcleo? A existir um talprocedimento,eleteriadesercapazdeatravessarabarreiradeprotecçãoelectrónicaeatingir,porassimdizer,opróprionúcleo.ForaprecisamentedessaformaqueRutherforddescobriraaexistênciadonúcleo.Elebombardearaátomoscompartículasalfamuitoenergéticas,queeramsuficientementemaciçasparaafastaroselectrõesesuficientementepequenaspararessaltaremdonúcleoquandodeleseaproximavam.

Em1919,Rutherfordcolocouumapequenaporçãodematerialradioactivonaextremidadedumcilindro fechado. A outra extremidade deste estava internamente revestida com sulfureto de zinco. Omaterial radioactivoemitiapartículasalfa.Semprequeumapartículaalfaatingiaosulfuretodezinco,perdiaasuaenergiacinética,queeraconvertidanumaminúsculacintilaçãoluminosa,aqualpodiaserobservadaseasalaondedecorriaaexperiênciafossemantidaàsescuraseoobservadorhabituasseosseusolhos à escuridão.Contandoospequenos lampejos,Rutherford eos seus colaboradorespuderamdeterminar o número de partículas que atingiam a extremidade revestida. O seu dispositivo ficouconhecidocomoumdetectordecintilações.

Se as partículas alfa atravessarem um cilindro onde foi criado um vácuo, as cintilações sãonumerosasebrilhantes.Se, todavia, introduzirmosumpoucodehidrogénionomesmo,surgemalgumascintilaçõesparticularmentebrilhantes.Istodeve-seaofactodaspartículasalfaatingiremocasionalmenteoprotãoqueconstituionúcleodoátomodehidrogénio.Sendoosprotõesmaislevesdoqueaspartículasalfa,podemserimpelidosparadianteaumavelocidadesuperior.Comonaenergiacinéticaavelocidadeconta mais do que a massa, protões deslocando-se a grande velocidade produzem cintilações muitobrilhantes.

Se introduzirmos oxigénio ou dióxido de carbono no cilindro, as cintilações tornam-semenosbrilhantesemaisraras.Osnúcleoscomparativamentemaismaciçosdosátomosdeoxigénioecarbono(commassasquatroetrêsvezessuperioresàdaspartículasalfa,respectivamente)tendemadesaceleraras partículas alfa, por vezes de forma tão acentuada que estas captam electrões e se transformam emvulgares átomos de hélio. Os núcleos maciços de carbono e oxigénio são impelidos lentamente paradiante,easpoucascintilaçõesobservadassãoporissopoucobrilhantes.

Se, todavia, colocarmos azoto no cilindro, surgem de novo os lampejos brilhantes que seobservamcomohidrogénio.Rutherford admitiuquenonúcleode azoto aspartículasnão estavam tãofortementeligadascomonosnúcleosdecarbonoouoxigénio.Aspartículasalfapodiamcolidircomosnúcleos de carbono ou oxigénio sem os afectarem, mas quando colidiam com um núcleo de azoto,arrancavamaesteumprotão,produzindoacintilaçãobrilhantehabitual.

Inicialmente tudo isto não passou de especulação mas, em 1925, o físico britânico PatrickMaynard Stuart Blackett (1897-1974) usou pela primeira vez a câmara de nevoeiro de Wilson pararepetir e confirmar as experiências deRutherford.Numa câmara de nevoeiro, bombardeou azoto compartículas alfa e tirou 20 000 fotografias, registando um total de mais de 400 000 trajectórias departículasalfa.Destas,apenasoitoenvolviamumacolisãoentreumapartículaalfaeumamoléculadeazoto.

Atravésdumestudodastrajectóriasanteseapósascolisões,BlackettdemonstrouqueRutherfordtinharazão,equeumprotãoforaarrancadoaonúcleodeazoto.Apartículaalfa,comumacargade+2,entraranonúcleoeumprotão,decarga+1,saíradomesmo.Oquesignificavaquehouveraumaumentoglobalnacargadonúcleode+1.Emvezdeser+7(azoto),passaraaser+8(oxigénio).Alémdisso,apartículaqueentraratinhanúmerodemassa4eoprotãoquesaíratinhanúmerodemassa1.Onúmerodemassadonúcleodeazotoaumentarade3unidades,de14para17.Oresultadofinaleraqueoazoto-14secombinaracomohélio-2(umapartículaalfa)paradarorigemaoxigénio-17ehidrogénio-1(umprotão).

Rutherfordfora,assim,oprimeiroaprovocarumareacçãonuclearemlaboratório.Ouseja,foraoprimeiroaconseguir transformarumelementonoutro-nestecaso,azotoemoxigénio-atravésdumaintervençãohumana.BlackettfoigalardoadocomumPrémioNobel,em1948,pelautilizaçãodacâmaradenevoeironestaenoutrasexperiências.

Destemodo,Rutherfordconseguiuaquiloaqueosalquimistashaviamchamadotransmutaçãodoselementos.Ehouvealgumaspessoasque,aosaberemdasuaexperiência,afirmaram:"Vêem,afinalosvelhosalquimistastinhamrazão.Aciênciamodernaerrouaorejeitá-loscomdesdém."Umtalpontodevista,contudo,estáerrado.Osalquimistasnãosóafirmaramquea transmutaçãoerapossívelcomoseconvenceramde que amesma podia ser obtida unicamente pormeios químicos - através demisturas,aquecimentos, destilações, etc.Nesse sentido, estavam enganados.A transmutação só pode ser obtidaatravésdereacçõesnucleares,algoqueestavapara ládaspossibilidadesemesmoda imaginaçãodosvelhosalquimistas.

Apartículaalfa,comnúmerodemassa4(b)penetraonúcleodeazoto(aeb),eumprotãocom

númerodemassa1éexpulso(c).Oresultadoglobaléqueazoto-14(a)secombinacomhélio-2(umapartículaalfa)(b)paraemitirhidrogénio-1(umprotão)(c),eproduziroxigénio-17(d).

Em suma: uma ideia não basta. É necessário que pormenores importantes estejam igualmentecorrectos antes que se possa dizer de alguém que "tinha razão". Com efeito, houve pessoas antes deNewtonquefalaramemviagensàLua,umaideiaqueera,emsimesma,razoável.FoiNewton,todavia,oprimeiroamostrarqueumaidaàLuasóerapossívelcomoprincípiodofoguetão.Eportantoaele,enãoaosseusantecessores,quecabeahonra,detertido,nãoummerosonho,masumsonhoqueincluíaumaindicaçãopráticadomodocomopodiaserconcretizado.

IsótoposArtificiaisRutherfordtransformaraumisótopoconhecidonaNatureza,oazoto-14,noutroisótopoconhecido,

o oxigénio-17.Umavez confirmada a possibilidade de obter tais transmutações no laboratório, foramproduzidas outras reacções nucleares através do bombardeamento de vários tipos de átomos compartículas,dasquaisresultaramoutrosisótoposconhecidos.

Mas teriam estas transformações de produzir sempre isótopos conhecidos? Ou poderiam asadiçõesesubtracçõesdepartículasdarorigemanúcleoscomnúmerosdemassaecargasdiferentesdosqueocorremnaturalmente?Em1932,oquímicoletão-americanoAristidV.Grosse(n.1905)sugeriuquetalerapossível.

Em 1934, o casal Joliot-Curie prosseguia o trabalho iniciado por Rutherford, bombardeandodiversoselementoscompartículasalfa.Emparticular,estavamabombardearalumínioeaarrancardosseusnúcleos,nãoapenasprotõescomotambém,nalgunscasos,neutrões.Quandoobombardeamentoerainterrompido, os feixes de protões e neutrões emitidos pelos núcleos de alumínio cessavamimediatamente.No entanto, os dois físicos descobriram, com surpresa, quehavia um tipode radiação(queseráabordadaadiantenolivro)quesemantinhaecujodeclíniocomotempoerasemelhanteàquelequeseriadeesperardaradiaçãoemitidaporumasubstância radioactiva.OsJoliot-Curieconseguirammesmocalcularavidamédiadetalradiação,queerade2,6minutos.

TodososátomosdealumínioqueexistemnaNaturezapossuemnúmeroatómico13enúmerodemassa27.Poroutraspalavras,osseusnúcleossãotodosconstituídospor13protõese14neutrões.Seacrescentarmosumapartículaalfa(2protõese2neutrões)ehouveraemissãodumprotão,onovonúcleocontém14protõese16neutrões,oquecorrespondeaosilício-30,umisótopobemconhecido.

Masoquesepassaránoscasosemqueumneutrãoéarrancadoaonúcleo?Seacrescentarmosumapartículaalfa(2protõese2neutrões)aumnúcleodealumínio(13protõese14neutrões)ehouveremissão dum neutrão, ficamos com um novo núcleo constituído por 15 protões e 15 neutrões. Istocorrespondeaofósforo-30.Contudo,esteisótoponãoocorrenaturalmente.TodososátomosdefósforoqueexistemnaNaturezasãodefósforo-31(15protõese16neutrões),queéoúnicoisótopoestáveldefósforo.Ofósforo-30éradioactivoedesintegra-serapidamente(atravésdumprocessoquedescrevereimaisàfrente),dandoorigemaosilício-30,queéestável.

Ofósforo-30foioprimeiro isótopo"artificial"aserproduzidoecomelesurgiuoconceitoderadioactividade artificial. Pelos trabalhos realizados neste domínio, o casal Joliot-Curie partilhou umPrémioNobelem1935.

DepoisdosJoliot-Curieteremabertoocaminho,muitosoutrosisótoposartificiaisforamobtidosatravés de diferentes reacções nucleares. Todos eram radioactivos, pelo que se passou a falar emisótoposradioactivosouradioisótopos.

Todosouquasetodososisótoposestáveisexistentespodemserencontradosnasrochasdonossoplaneta. Até agora, nenhum dos radioisótopos criados em laboratório revelou uma vida médiasuficientemente longa para que quantidadesmensuráveis dele se tenham conservado na Terra desde aorigemdesta.

Todososelementosconhecidospossuemradioisótopos.Mesmoohidrogénio,omaissimplesde

todos, possui um isótopo radioactivo, o hidrogénio-3, cujo núcleo é constituído por um protão e 2neutrões.Este isótopoéporvezesdesignado trítio,dumapalavragregaquesignifica"terceiro".Asuavidamédiaéde12,26anos.Otrítiofoiobtidopelaprimeiravezemlaboratório,em1934,pelofísicoaustralianoMarcusLaurenceElwinOliphant(1901-2000).

ApósostrabalhospioneirosdeRutherfordeduranteumquartodeséculo,oscientistasandaramabombardearátomosusandopartículasalfacomoprojécteis.Ométodo tinhaas suasvantagens.Porumlado,aspartículasalfaestavam,porassimdizer,sempreàmão.Ourânio,o tórioediversosprodutosresultantesdasuadesintegraçãoproduziam-nas,peloqueasfontesdepartículasalfanuncahaveriamdefaltar.

Noentanto,existiamtambémalgumasdesvantagens.Aspartículasalfapossuemcargapositiva,talcomoosnúcleosatómicos.(Afinal,umapartículaalfaé,elaprópria,umnúcleoatómico.)Oquesignificaqueunseoutrasserepeliamequeessarepulsãotinhadeserultrapassadaantesqueumapartículaalfaconseguisse colidir comoupenetrarnumnúcleoatómico.Parteda energiadapartícula era consumidanesse processo, o que reduzia a sua eficácia. Além disso, quanto mais maciços eram os núcleosbombardeados,maior era a repulsão.Apartir dumcertoponto, aspartículas alfadequeos cientistasdispunhamdeixavamdeconseguirpenetrarnosnúcleos.

Quando o neutrão foi descoberto, Enrico Fermi percebeu que tinha aí um novo projéctil comcaracterísticasúnicas.Sefossepossívelproduzirumfeixedeneutrões,porexemplo,fazendoumfeixedeprotões incidir sobreparafina, aqueles não seriam repelidospelos núcleos atómicosumavezquenãopossuíam carga. Se um neutrão se deslocasse na direcção dum núcleo, poderia atingi-lo e penetrá-lomesmoquepossuíssemuitopoucaenergia.Adescobertadoneutrãoveio,portanto,revolucionaratécnicadebombardeamentodeátomos.

Fermi descobriu que se fizesse um feixe de neutrões atravessar água ou parafina, muitos dosneutrões atingiam os núcleos mas ressaltavam, sem os penetrarem, perdendo neste processo algumaenergia. Tais neutrões acabavam por ficar apenas com a energia que seria de esperar de partículasvibrando e deslocando-se com a velocidade que possuem as partículas a determinada temperatura.Transformavam-se assim em neutrões térmicos ou lentos. Fermi descobriu também que esses neutrõeslentostinhammaiorprobabilidadedeserabsorvidospelosnúcleosdoqueosneutrõesrápidos.

Fermiconstatouaindaquequandoumneutrãopenetravanumnúcleo,erageralmenteemitidaumapartícula beta (um electrão). A adição dum neutrão aumentava em 1 unidade o número de massa donúcleo.Aemissãodumapartículabeta,correspondendoàsubtracçãode1carganegativa,aumentavaacarga nuclear (isto é, o número atómico) em 1 unidade. Por outras palavras, o bombardeamento comneutrõesdumdeterminadoelementoproduziageralmenteoelementoqueseencontravaimediatamenteaseguirnaescaladenúmerosatómicos.

Em1934,Fermipensouqueseria interessantebombardearurâniocomneutrões.Ourânio,comnúmero atómico 92, tinha o número atómico mais elevado que então se conhecia. Se o urânio fossebombardeadocomneutrõeseemitissepartículasbeta,nãoseriaelelevadoatransformar-senoelemento93,queeradesconhecidonaNatureza?

Fermi realizou a experiência e pareceu-lhe ter efectivamente produzido o elemento 93. Noentanto, os resultados dessa experiência foram complexos e confusos (como veremos adiante) edemoraramalgunsanosaesclarecertotalmente.

O físico italiano Emilio Segrè (1905-1989), que trabalhara com Fermi, concluiu que não eranecessário bombardear urânio com neutrões para criar um elemento desconhecido. Nessa época, emmeados dos anos 30, existiam quatro espaços na tabela periódica que permaneciam vazios e que

correspondiamaelementosdesconhecidos.Destes,aquelequeapresentavaonúmeroatómicomaisbaixoeraoelemento43.

Em 1925, um grupo de químicos alemães, que incluíaWalter Karl Friedrich Noddack (1893-1960)eIdaEvaTacke(1896-1978)anunciouadescobertadoelemento75,aquederamonomerénio,inspiradononomelatinodorioReno,naAlemanha.Comoseveioaverificar,tratava-sedoúltimodos81elementosestáveisaserdescoberto.Ogruporevelouigualmenteterencontradovestígiosdoelemento43,aquechamoumasúrio,donomelatinodumaregiãonaparteorientaldaAlemanha.

Esse anúncio, no entanto, revelar-se-ia infundado, e o elemento 43 continuou por descobrir.Assimsendo,pensouSegrè,porquenãobombardearoelemento42(molibdénio)comneutrões,paraverseoelemento43podiapelomenosserproduzido,senãomesmodescoberto.

Em1937,SegrèpartiuparaosEstadosUnidos,a fimdebombardearmolibdéniocomneutrõesutilizandoumanovatécnica(quedescrevereiadiante).E,naverdade,conseguiulocalizaroelemento43nomaterialbombardeado.Contudo,hesitouematribuir-lheumnome,umavezquenãoestavacertodequeumelementoproduzidoartificialmentefosseequivalenteàdescobertadumelementonaNatureza.Em1947, todavia, o químico germano-britânico Friedrich Adolf Paneth (1887-1945) defendeuvigorosamenteessaequivalênciaeoseupontodevistafoiaceite.Assimsendo,Segrèresolveuchamaraoelemento43tecnécio,dumapalavragregaquesignifica"artificial".

Dummodooudoutro,foipossívelproduzirumaquantidadesuficientedesteelementoparaqueassuaspropriedadespudessemserestudadas,tendo-sedescobertoquetrêsdosseusisótopostinhamvidasmédias bastante longas.Omais duradoiro é o tecnécio-97 (com um núcleo contendo 43 protões e 55neutrões), que tem uma vida média de 2 600 000 anos. A nossa escala, uma amostra deste isótopoparecerá eterna, uma vez que apenas uma sua fracção ínfima se desintegrará no decurso duma vidahumana. Contudo, não existem isótopos estáveis de tecnécio, e mesmo o mais estável de todos, otecnécio-97,nãotemumavidamédiasuficientementelongaparaseterconservadodesdeaformaçãodaTerra.Mesmoquenosprimórdiosdonossoplanetativessemexistidograndesquantidadesdoisótoponosolo,nadarestariaactualmente.Issoéespecialmenteverdadeiro,umavezquenãoexistenenhumisótopodetecné-cioqueseformeapartirdoutroelementoradioactivomaisduradoiro.

As três vagas na tabela periódica que permaneciam abertas nessa época eram as quecorrespondiamaoselementos61,85e87.Aidentificaçãodequalquerumdestestrêselementosnumounoutro mineral fora ocasionalmente anunciada. No entanto, tais notícias tinham-se revelado sempreinfundadas.

Em 1947, porém, o químico norte-americano Charles D. Coryell (1912-1971) e os seuscolaboradores identificaram o elemento 61 nos produtos da desintegração do urânio apósbombardeamentodestecomneutrões(umtemaaqueregressaremosmaisàfrente).Resolveramchamar-lhe promécio, em homenagem ao deus grego Prometeu que trouxera o fogo do Sol e o oferecera àhumanidade,umavezqueoelementoforadescobertonumareacçãonuclear-um"fogo"semelhanteaoquevaiconsumindooSol.Nenhumdosisótoposdopromécioéestável,e1mesmoomaisduradoiro,opromécio-145(61protõese84neutrões)temumavidamédiadeapenas17,7anos.

Em 1939, a química francesa Marguerite Perey (1909-1975) localizou alguns vestígios doelemento87nosprodutosdedesintegraçãodourânio-235.Tratava-sedumprodutomuitosecundário,aqueeladeuadesignaçãodefrâncioporcausadoseupaísdeorigem.Oisótopoqueelaidentificaraeraofrâncio-215(87protões,128neutrões).Asuavidamédiaempoucoexcedeummilionésimodesegundo,peloquePereynãodetectoucertamenteopróprioisótopo.Aquiloqueelaidentificouforamaspartículasalfamuitoenergéticasqueeleproduz(quantomaiscurtaéavidamédiadumprodutordepartículasalfa,

maior a energia destas). A partir daí, e recorrendo àquilo que já se conhecia sobre o processo dedesintegração, Perey foi capaz de deduzir qual o isótopo res- j ponsável. Mesmo o isótopo maisduradoirodofrâncio,ofrâncio-223(87protões,136neutrões),possuiumavidamédiadeapenas21,8minutos.

Em 1940, Segrè e outros produziram o elemento 85, mediante o bombardeamento de bismuto(elemento83)compartículasalfa.Oelemento85foidesignadoástato,dumapalavragregaquesignifica"instável", uma vez que, tal como todos os outros elementos descobertos desde 1925, essa eraprecisamenteumadas suas características.O seu isótopomaisduradoiro, ástato-210 (85protões, 125neutrões),temumavidamédiade8,1horas.

Em 1948, portanto, a tabela periódica estava preenchida do hidrogénio (1) ao urânio (92), etinham sidodescobertos elementospara lá deste.Fermi estava convencidoqueproduzira, em1934, oelemento 93, mediante o bombardeamento de urânio com neutrões, mas só em 1940 o elemento foiefectivamente isolado pelos físicos norte-americanosEdwinMattisonMcMillan (1907-1991) e PhilipHauge Abelson (n. 1913) em urânio bombardeado. Uma vez que o urânio fora assim chamado emhomenagemaorecentementedescobertoplanetaUrano,McMillanresolveuchamarneptúnioaoelemento93,porcausadeNeptuno,oplanetaquesesegueaUrano.

Oneptúnio-237constituioisótopomaisduradoirodesseelemento,comumavidamédiade2140000anos.Trata-sedumavidamédia razoavelmente longa,mas insuficienteparaque subsistaqualquervestígio de neptúnio na crosta terrestre, mesmo que nos primórdios da Terra ele tivesse existido emquantidade apreciável. Ainda assim, o neptúnio-237 é um isótopo interessante, uma vez que a suadesintegraçãoocorrecomaformaçãodumasériedeespéciesintermédias,talcomosucedecomourânio-238,urânio-235etório-232.

Comefeito,oneptúnio-237iniciaaquartasérieradioactivaatrásreferida.Oisótopoetodososseusprodutosdedesintegraçãopossuemnúmerosdemassadivisíveispor4,comresto1.Existemapenasquatrosériesradioactivaspossíveisnestaregiãodatabelaperiódica:tório-232(resto0),neptúnio-237(resto 1), urânio-238 (resto 2) e urânio-235 (resto 3). Destas, três existem actualmente, mas a doneptúnio-237extinguiu--se,umavezquemesmoomembromaisduradoirodasérienãopossuiumavidamédiasuficientementelongaparaqueoisótopoaindaexistaactualmente.

Umoutroaspectopeculiardasériedoneptúnio-237équesetratadaúnicasériequenãoterminanum isótopo estável de chumbo. A série termina com bismuto-209, que é o único isótopo estável dobismuto.

Em1940,ofísiconorte-americanoGlennTheodoreSeaborg(1912--1999)juntou-seaMcMillan,tendo ambos descoberto que alguns isótopos de neptúnio emitempartículas beta, transformando-se emisótoposcomomesmonúmerodemassa,mascomumnúmeroatómicoacrescidode1unidade.Foiassimquedescobriramoelemento94,quebaptizaramdeplutónio,porcausadoplanetaPlutão,aquelequesesegueaNeptuno.Oseu isótopomaisduradoiroéoplutónio-244(94protões,150neutrões),comumavidamédiade82000000anos.Em1951,McMillaneSeaborgpartilharamumPrémioNobelpelasuadescobertadumelementotransurânico(istoé,quevemdepoisdourânio).

McMillanresolveudedicar-seaoutrasactividades,masSeaborgeoutroscontinuaramaproduzirnovoselementos.Foramisoladososseguinteselementostransplutónicos:

-Oamerício(emhomenagemàAmérica),comnúmeroatómico95.Oseuisótopomaisduradoiroéoamerício-243(95protões,148neutrões),comumavidamédiade7370anos.

-Ocúrio(emhomenagemaosCurie),comnúmeroatómico96.Oseuisótopomaisduradoiroéocúrio-247(96protões,151neutrões),comumavidamédiade15600000anos.

-Oberquélio(deBerkeley,naCalifórnia,ondefoidescoberto),comnúmeroatómico97.Oseuisótopomaisduradoiroéoberquélio-247(97protões,150neutrões),comumavidamédiade1400anos.

- O califórnio (de Califórnia, o estado onde foi descoberto), com número atómico 98. O seuisótopomaisduradoiroéocalifórnio-251(98protões,153neutrões),comumavidamédiade890anos.

-Oeinstânio (emhomenagemaAlbertEinstein), comnúmeroatómico99.O seu isótopomaisduradoiroéoeinstânio-252(99protões,153neutrões),comumavidamédiade1,29anos.

- O férmio (em homenagem a Enrico Fermi), com número atómico 100. O seu isótopo maisduradoiroéoférmio-257(100protões,157neutrões),comumavidamédiade100,5dias.

-Omendeleévio(emhomenagemaDmitriMendeleev),comnúmeroatómico101.Oseuisótopomaisduradoiroéomendeleévio-258(101protões,157neutrões),comumavidamédiade56dias.

-Onobélio(emhomenagemaAlfredNobel,ocriadordosprémiosquelevamoseunome),comnúmeroatómico102.Oseu isótopomaisduradoiroatéagoradetectadoéonobélio-259(102protões,157neutrões),comumavidamédiadecercade58minutos.

-Olaurêncio(emhomenagemaErnestLawrence,dequefalareimaisàfrentenestaobra),comnúmeroatómico103.Oseuisótopomaisduradoiroatéagoradetectadoéolaurêncio-260(103protões,157neutrões),comumavidamédiade3minutos.

-Orutherfórdio(emhomenagemaErnestRutherford),comnúmeroatómico104-Oseuisótopomais duradoiro até agora detectado é o rutherfórdio-261 (104 protões, 157 neutrões), com uma vidamédiade65segundos.

-Ohânio(emhomenagemaOttoHahn),comnúmeroatómico105.Oseuisótopomaisduradoiroatéagoradetectadoéohânio-262(105protões,157neutrões),comumavidamédiade34segundos.

O elemento 106 foi encontrado,mas existemdois grupos que reivindicama sua descoberta.Aquestãoaindanãoestá resolvidaeaté issoacontecer,nãoexistenomeoficialparaele.Oseu isótopomaisduradoiro, até agoradetectado, temnúmerodemassa263 (106protões, 157neutrões), comumavidamédiade0,8segundos.

Nãosesabeaocertoquãomaislongeoscientistaspoderãoir.Amedidaqueosnúmerosatómicosaumentam,oselementossãomaisdifíceisdeproduzire,umavezqueassuasvidasmédiastendemasermenores, mais difíceis de estudar. No entanto, existe alguma pressão no sentido de se chegar aoselementos 110 e 114, visto que existem argumentos muito fortes que levam a supor que alguns dosisótoposdesseselementospoderãotervidasmédiaslongasoumesmoserestáveis.

7.DESINTEGRAÇÕES

PerdadeMassaTal como atrás se indicou, o padrão actualmente utilizado para medir pesos atómicos é o

carbono-12. O número de massa do carbono-12 é definido como sendo 12,0000 e todos os outrosnúmerosdemassa sãomedidosemrelaçãoaele.Ospesosatómicos,que sãomédiasponderadasdosnúmerosdemassadosisótoposdumdeterminadoelemento,sãotambémmedidosemrelaçãoaopadrãocarbono-12.

Oátomodecarbono-12possui12partículasnoseunúcleo:6protõese6neutrões.Emmédia,cadaumadaspartículasdeveriater,portanto,umamassade1,0000paraqueamassadasdozeperfizesse12,0000.Noentanto,osespectrómetrosdemassamodernos,capazesdemedirindividualmenteamassadosprotõesquedescrevemtrajectóriascurvasnumcampomagnéticodeintensidadeconhecida,indicamqueamassadoprotãonãoé1,0000mas1,00734.

Comonãopossuemcarga,osneutrõesnãodescrevemtrajectóriascurvasquandoatravessamumcampomagnético.Noentanto,asuamassapodesercalculadaporoutrosmétodos.Em1934,Chadwickmediu a quantidade exacta de energia necessária para separar o protão do neutrão num núcleo dehidrogénio-2.Amassadumnúcleodehidrogé-nio-2éconhecida.Selhesubtrairmosamassadoprotãoeadicionarmosamassadaenergianecessáriaparaodesintegrar(calculadaapartirdaequaçãodeEinsteinquerelacionamassaeenergia)obtemosamassadoneutrão.

Verificou-seassimqueamassadoneutrãoera1,00867.Poroutraspalavras,oprotãoeoneutrãonãopossuemexactamenteamesmamassa.Oneutrãoécercade1/7de1porcentomaismaciçodoqueoprotão(algoque,comoveremos,éimportante).

Se imaginarmos agora 6 protões e 6 neutrões, considerando-os partículas independentes, eadicionarmos as suas massas individuais, obtemos uma massa total de 12,096. No entanto, se osjuntarmosunsaosoutrosnumnúcleodecarbono-12,amassatotaléde12,0000.

Amassadonúcleodecarbono-12éinferiorem0,096aovalorqueteriaseasmassasindividuaisdas partículas que o constituem fossem adicionadas. Trabalhando com o seu espectrógrafo demassa,Aston descobriu, em1927, que todos os núcleos apresentavammassas ligeiramente inferiores àquelasque resultariamdasomadasmassas individuaisdaspartículasconstituintes.Astondesignoueste factoperdademassa.

Aquefracçãodamassa totaldocarbono-12correspondeaperdademassadestenúcleo?Essafracçãoédadapor0,096divididopor12,ouseja0,008.Paranãoteremdetrabalharcomnúmerostãopequenos,oscientistasmultiplicamvalorescomoestepor10000.Oresultadofinalé80,aquesechamafracçãodesíntesedocarbono-12.

1.Onúcleodocarbono-12éconstituídopor6protõese6neutrões.Assuasmassasindividuaissomadasdãoumvalorde12,096.

2.Quando as partículas estão juntas numnúcleo, amassa total é de apenas 12,000.Chama-seperdademassaaestefenómeno.

Se começarmos com o hidrogénio-1 e o seu núcleo constituído por um único protão e formosavançando na lista dos isótopos estáveis, verificamos que a fracção de síntese vai aumentando atéchegarmos ao ferro-56.O ferro-56 tem um núcleo constituído por 26 protões e 30 neutrões. Se estaspartículasforemconsideradasseparadamente,amassatotaléde56,4509.Ovalorexperimentaldamassa

donúcleodoferro-56é,todavia,55,9349.Aperdademassaéportantode0,5260(cercademetadedamassadumprotão).Afracçãodesíntese,queseobtémdividindo0,5260por55,9349emultiplicandopor10 000, é de 94,0. Nos isótopos estáveis que se seguem ao ferro-56, a fracção de síntese diminuigradualmente.Quandochegamosaourânio-238,afracçãodesínteseédeapenas79,4.

Oqueaconteceàmassaquedesaparecequandoprotõeseneutrõessejuntamnumnúcleo?Sólhepodeacontecerumacoisa:asua transformaçãoemenergia,deacordocomaequaçãodeEinstein.Poroutraspalavras,seumnúcleodecarbono-12seformarapartirde6protõese6neutrões,umapequenafracçãodamassa dessas partículas converte--se emenergia que se dissipa no espaço circundante.Osprocessos de dissipação de energia tendema ocorrer espontaneamente (embora nem sempre de formarápida). Isto significa que, sob condições adequadas, existe uma tendência para protões e neutrões secombinarem,formandonúcleos.

Por outro lado, é necessário fornecer uma determinada quantidade de energia a um núcleoatómicoparaodesintegrarnosseusprotõeseneutrõesconstituintes.Essaenergiaéexactamenteigualàenergiaqueédissipadanaformaçãodessemesmonúcleo.Mascomoéqueaenergiadissipadapodeserreunidadenovoeconcentradanovolumemínimodumnúcleo?Talnãosucede,exceptoemcircunstânciasmuito especiais; ou seja, os núcleos não tendem a desintegrar-se nos seus protões e neutrõesconstituintes. Dum modo geral, os núcleos conservam a sua identidade indefinidamente, uma vezformados.

Noentanto,umnúcleonãonecessitadesedesintegrarnaspartículasconstituintesparaperderasua identidade. O que acontece se adquirir ou libertar um protão ou neutrão? Um tal evento,possivelmente acompanhado duma dissipação adicional de energia, é suficiente para transformar umnúcleonoutro.Pode-seportantodizerquequandoumnúcleosetransformanoutro,comumafracçãodesíntesemaiselevada,existeumadissipaçãoadicionaldeenergiae,portanto,umacerta tendênciaparaessatransformaçãoocorrer.

Seriaassimdeesperarqueosnúcleoscomnúmerosdemassamuitobaixostivessemtendênciaatransformar-senoutroscomnúmerosdemassamaiselevados,enquantoqueosnúcleoscomnúmerosdemassamuitoelevadostenderiamatransformar-senoutroscomnúmerosdemassamaisbaixos.Osnúcleosnumaenoutraextremidadesdaescaladenúmerosdemassaconvergiriamassimparaoferro-56.Oferro-56,porsuavez,comovalormáximodafracçãodesíntese,exigiriaumsuplementodeenergiaparasetornarmaioroumaispequeno.

Umatendêncianãoprecisa,contudo,deserobservadanarealidade.Seestivermosnumdeclive,temos tendência para escorregar por ele abaixo. Mas se o terreno for pedregoso e irregular e nóscalçarmos sapatos com solas de borracha, a fricção que se gera impede-nos de deslizar, apesar datendência supracitada.Por outro lado, se o declive formais acentuadoou se a sua superfície gelar, africçãopoderánãosersuficienteparanosmanternomesmosítioeteremosdenovotendênciaadeslizarencostaabaixo.

Consideremosoutroexemplo:atendênciaqueopapeltemparaarder,ouseja,parasecombinarcomooxigéniodaatmosfera.Note-sequeastransformaçõesquímicasnecessáriasparaproduziroefeitodecombustãonãotêmlugaràtemperaturaambiente,sendonecessáriaumaenergiadeactivação.(Trata-sedumaespéciedefricçãoque impedeumatransformaçãoquímicaque"devia"ocorrernarealidade.)Noentanto, seopapel foraquecido,maisemaisenergiaé transferidaparaelee,por fim,ovalordaenergiadeactivaçãoéultrapassadoeopapelinflama-se.

Quandoumaporçãodopapelestáemchamas,gera-secalorsuficienteparaservirdeenergiadeactivaçãonasregiõesadjacentes,queseinflamamporsuavez,fazendoalastrarachama.Opapelpode

assim continuar a arder indefinidamente, sem que seja necessário fornecer do exterior energiasuplementar. O proverbial cigarro mal apagado que acaba por queimar uma floresta inteira é umasituaçãorealbemconhecida.Esteprocesso,emqueumareacçãoquímicaproduzaquiloqueénecessárioparaseauto-sustentar,édesignadoreacçãoemcadeia.

Nocasodosnúcleos,existemfactoresqueimpedemqueasuatendêncianaturalpara"deslizar"para o ferro-56 se concretize. Isso aplica-se, em particular, aos núcleosmais leves, pormotivos queserãoadianteexplicados.

No caso dos núcleos maciços, essa tendência concretiza-se mais facilmente. Na verdade, talsucedeatodososnúcleosconhecidosmaismaciçosdoqueobismuto-209.Osnúcleosmaismaciçostêmtendênciaparaemitirpartículasdetalformaqueosnovosnúcleosqueseformamsãomaispequenose,por conseguinte,possuemuma fracçãode síntesemais elevadadoqueonúcleooriginal.Destemodo,produz-seenergiaqueédissipada.

Quantomaiorforadissipaçãodeenergianatransformaçãodumnúcleonoutro,maisprováveléessatransformação,maisrapidamenteelatemlugaremaiscurtaéavidamédiadonúcleooriginal.Noscasosdotório-232,urânio-235eurânio-238,atransformaçãoinicialimplicaumadissipaçãodecalortãopequenaqueassuasvidasmédiassãomuitolongas.Noentanto,nemmesmonestescasosasvidasmédiassãoinfinitaseatransformaçãoreferidaacabaporocorrer,emboralentamente.(Atítulodeanalogia,note-sequeopapel,emboranãoseinflameàtemperaturaambiente,sofremuitolentamentealterações.Devezemquandopode ter lugar uma reacçãoquímica, apesar da energia de activaçãonão ser suficiente.E,dessemodo,aspáginasdumlivrovãocomfrequênciaficandomaisamareladasequebradiçasàmedidaque os anos passam, até se desfazerem numa cinza que é o resultado dessa "combustão"muito lenta.Podemos por isso dizer que as moléculas de papel possuem uma "vida média de combustão" àtemperaturaambiente,queserálongadopontodevistadoleitor,masqueémuitomaiscurtadoqueadourânio-238.)

Em resumo: o tipo de radioactividade natural descoberta na última década do século XIXtransformaosnúcleoscomnúmerosdemassaentre232e238noutroscomnúmerosdemassaentre206e208.Nessesprocessos,ovalordafracçãodesínteseaumenta,peloqueosprotõeseneutrõesnosnúcleosformadospossuemumamassaligeiramenteinferioràdosnúcleosoriginais.Amassaemfaltaédissipadasobaformadeenergia,ficandoassimexplicadaaorigemdaenergiaproduzidapelaradioactividade.

FissãoNuclearReferi anteriormente o facto deEnricoFermi ter, em1934, bombardeado urânio comneutrões

lentosa fimdecriaroelemento93 (identificadode formadefinitiva seisanosmais tardeebaptizadoneptúnio).

Fermipensavaterproduzidooelemento-oque,numcertosentido,eraverdade-masosestudosdourâniobombardeadorevelavamumamistura tãoconfusadepartículasqueeradifícil localizarnelacomprecisãooelemento93.(Aindaassim,FermifoigalardoadocomumPrémioNobelem1938peloseutrabalho.)

IdaTacke(umadasco-autorasdadescobertadoelementorénio)suspeitouqueonúcleodeurânioeratãocomplexoe,porconseguinte,tãoinstável,queaquiloquesucederanaexperiênciadeFermiforaque,aoabsorverumneutrão,aquelesedesintegraraemdiversosfragmentos.Todavia,umtalfenómenoera tão diferente de tudo quanto até então se observara nas desintegrações nucleares que ninguém lheprestoumuitaatenção.

Contudo, no início de 1937, a equipa de Hahn e Meitner, na Alemanha, resolveu estudar oproblema.(Meitnererajudia,masdenacionalidadeaustríaca,peloqueestavatemporariamenteasalvodeAdolfHitler (1889-1945) - que então governava aAlemanha - e das suas sinistras políticas anti-semitas.)

Hahnestavaconvencidodequeaquiloqueaconteceranocasodobombardeamentodourânioporneutrõeseraumaperdadeduaspartículasalfaemvezdeapenasuma.EraomaislongequeeleseatreviaaavançarnadirecçãodaideiadumafragmentaçãosugeridaporTacke.Aperdadeduaspartículasalfareduziriaem4unidadesonúmeroatómicodourânio,de92para88-ovalordorádio.SeasuposiçãodeHahn estivesse correcta, deveriam existir quantidades ligeiramente superiores de rádio no urâniobombardeadodoqueosvestígiosresultantesdastransformaçõesradioactivashabituais.

Comoéquetaisquantidadesmínimasderádiopodiamserdetectadaseasuaquantidademedida?MarieCurieisolaravestígiosderádioemminériodeurânio,mastrabalharacomtoneladasdeminério.HahneMeitnerpossuíamapenasumapequenaquantidadedeurâniobombardeado.

Ora acontece que, na tabela periódica, o rádio está colocado logo por baixo do bário, umelemento estável, possuindo os dois elementos propriedades químicasmuito semelhantes. Se o urâniobombardeadofordissolvidoemácidoeseadicionarmosbárioàsolução,épossívelrecuperardenovoobárioatravésdeprocedimentosquímicossimplesecomeleviráorádio.(Orádiocomporta-sedemodoanálogoaobário.)

Assim,seHahneMeitnerutilizassembárioperfeitamenteestáveleobtivessembárioclaramenteradioactivo,saberiamquecomeletinhasidoextraídorádio.Apartirdaquantidadederadioactividadepresente(efacilmentemensurável)podiamdeterminaraquantidadederádioobtida.Contudo,antesqueesta experiência pudesse ser realizada, aAlemanha nazi invadiu aÁustria, anexando-a emMarço de1938.Meitnerficouàmercêdoanti-semitismodeHitler,oquealevouaatravessarafronteiraparaosPaísesBaixoseaviajar,apartirdaí,paraEstocolmo,naSuécia.

Hahn prosseguiu o trabalho como químico alemãoFritz Strassman (1902-1980).Adicionarambárioestávelàsoluçãoeobtiverambárioradioactivo,apartirdoqualpuderamcalcularaquantidadede

rádioextraída.Depois,paraconcluíremademonstração,haviaquesepararorádiodobárioeproduzirumasoluçãocontendoapenasrádio.

No entanto, foi impossível obter tal separação. Todas as tentativas deHahn e Strassman paraseparar o rádiodobário falharam.Hahn conclui que seprocesso algumera capazde separar obárioestáveldorádioradioactivo,entãoosátomosradioactivosnãoeramderádio,masdebário-ou,maisprecisamente,dumradioisótopodebário.(HahnrecebeuumPrémioNobelem1944peloseutrabalho.)

Mascomoéqueourâniosepodiadesintegraredarorigemabário?Onúmeroatómicodobárioé56.Paratalsuceder,ourânio(númeroatómico92)teriadeemitir18partículasalfaoucindir-seemdois.AmbasasalternativaspareciamtãoimprováveisqueHahnnãoseatreveuaformulá-laspublicamente.

Na mesma altura, em Estocolmo, Meitner estava a chegar precisamente à mesma conclusãoquandorecebeuanotíciadequehaviamfalhadoastentativasdeseparaçãodosupostorádiodobário.EMeitnerresolveupublicarassuasideias.Comaajudadosobrinho,ofísicoOttoRobertFrisch(1904-1979),Meitner preparou uma carta, datada de 16 de Janeiro de 1939, que enviou à revista científicabritânicaNature.Frisch, que trabalhavano laboratóriodeBohr emCopenhaga, informoueste sobreoconteúdodamesma,antesaindadelaserpublicada.BohrpartiuparaosEstadosUnidosparaparticiparnuma conferência sobre física emWashington, D.C. a 26 de Janeiro de 1939 e, aí chegado, passoupalavra-tambémeleantesdapublicaçãodacarta.

Entretanto, na Grã-Bretanha, o físico húngaro Leo Szilard (1898--1964) - que, comoMeitner,fugiradaAlemanhaporserjudeu-reflectiasobreaquiloaqueH.G.Wellschamara,numaobradeficçãocientífica, uma bomba atómica. Szilard achava que uma tal bomba podia ser criada se um neutrãoatingisseumnúcleoatómico,provocandoumatransformaçãoquelevasseàemissãodedoisneutrões,osquais,atingindodoisoutrosnúcleos,provocariamaemissãodequatroneutrões,eassimpordiante.Onúmero de desintegrações por segundo e a energia libertada aumentariam rapidamente para valoresenormes, provocando uma gigantesca explosão. Szilard estava, na verdade, a visualizar uma reacçãonuclearemcadeia.

Szilardchegoumesmoapatentearoprocesso.Epediuajudaaoutrojudeu,obioquímicorusso-britânicoChaimWeizmann(1874-1952),quetentourealizarasexperiênciasnecessárias.Noentanto,nãofoibemsucedido.Osnúcleosapenasabsorviamneutrõesrápidosecommuitaenergia,libertandooutrosmaislentosquenãopossuíamenergiasuficienteparasustentarareacção.

FoientãoqueSzilardsoubedadesintegraçãodonúcleodeurânioemresultadodaabsorçãodumneutrão. (Esta divisão do núcleo em duas partes quase iguais ficaria conhecida como fissão, dumaexpressão latinaque significadividir.Falamos frequentementeda fissãodourânio,masosnúcleosdeurânio não são os únicos sujeitos a tal fenómeno, sendo por isso preferível usar a designação maisgenéricadefissãonuclear.)

Szilard percebeu imediatamente que com o urânio era possível realizar a reacção nuclear emcadeiaquevisualizara.Eraumneutrãolentoqueprovocavaacisãodonúcleodeurânioeembrevesedescobriuque,nesseprocesso,eramlibertadosdoisoutrêsneutrõeslentosporcadanúcleocindido.

Em 1940, Szilard conseguiu convencer os físicos americanos a imporem um regime deautocensura quanto às suas investigações no domínio da fissão nuclear, com receio de que os físicosalemães pudessem beneficiar dos seus trabalhos e dar a Adolf Hitler um novo tipo de bombaabsolutamentedevastador.(ASegundaGuerraMundial já tinhacomeçadoeaAlemanhasomavaêxitosnoscamposdebatalha,enquantoosEstadosUnidospermaneciamaindaneutrais.)

Em seguida, Szilard teve de persuadir o governo dos Estados Unidos a disponibilizar fundos

muitoconsideráveisparaostrabalhosdeinvestigação.Obteveparatalaajudadedoisoutroshúngarosfugidosaonazismo:EugenePaulWigner(1902-1995)eEdwardTeller(1908-2003).Em1939,ostrêsvisitaramAlbertEinstein,tambémeleumrefugiado.Einstein,comoúnicocientistacujaspalavrasseriamcertamenteescutadas,aceitouescreverumacartaaoPresidenteFranklinDelanoRoosevelt(1882-1945).Rooseveltrecebeuacarta,ponderouosargumentosexpostos,ficouconvencidoe,numsábadonofinalde1941, assinou o decreto presidencial que deu origem àquilo que ficou conhecido como ProjectoManhattan - um nome deliberadamente inócuo destinado a esconder os verdadeiros propósitos dainiciativa.

OsesforçosdeSzilard tinhamsidobemsucedidos,masporumaunhanegra.Comefeito,nãoécomfrequênciaquesetrabalhaaosábado.EseRoosevelttivesseadiadoparasegunda-feiraaassinaturadodecreto,ébemprovávelquenãootivessefeito-umavezqueosábadoemqueassinouaordemfoiodia6deDezembrode1941e,nodiaseguinte,osJaponesesatacaramPearlHarbour.Ninguémsabe,emtaiscircunstâncias,quandoéqueoPresidenteRooseveltteriacondiçõesparapensardenovonoassunto.Seja como for, o projecto avançou e, em Julho de 1945, estava pronta uma bomba atómica (ou,maiscorrectamente,umabombadefissãonuclear), jádepoisdaAlemanhatersidoesmagadaeHitlersetersuicidado.FoiusadaparadarogolpefinalnumJapãovirtualmentederrotado,nosdias6e8deAgostode1945.

Quandoumnúcleodeurâniosecinde,nãoofazsempredamesmamaneira.Afracçãodesínteseentreosnúcleosdedimensãomédianãovariagrandemente,eonúcleodeurâniopodebemcindir-sedummodo num determinado caso e dum modo ligeiramente diferente noutro. Por esse motivo, produz-sedurante a fissão do urânio uma mistura contendo uma grande variedade de radioisótopos. Estes sãocolectivamentedesignadosprodutosdefissão.

Existeumamaiorprobabilidadedadivisãoserligeiramentedesigual,comumapartemaismaciçacommassa entre135 a145, e umapartemenosmaciça commassa entre90 e100.Foi napartemaismaciçaqueoelementoproméciofoilocalizadoem1948.

Emresultadodumafissãonuclear,onúcleodeurâniosofreumareduçãomaisacentuadadasuafracçãodesíntesedoquenasuadesintegraçãoradioactivanaturalquedáorigemachumbo.Porisso,afissãodourâniolibertaconsideravelmentemaisenergiadoquearadioactividadenaturaldourânio.(Afissãonuclearpodetambémlibertaressaenergiamuitomaisrapidamenteseforemcriadasascondiçõespara uma reacção em cadeia. Nesse caso, a energia que a radioactividade natural do urânio levariamilharesdemilhõesdeanosalibertaré-onumafracçãodesegundo.)

Mas se na fissão nuclear é libertadamais energia do que na radioactividade natural, por querazãoéqueonúcleodeurânionãosedesintegranaturalmenteporfissão,emvezdeemitirumasériedepartículasalfaebeta?Arespostaéqueoprocessodefissãonuclearimplicaumaenergiadeactivaçãomaiselevada.Aenergiadeactivaçãonecessáriapodeserfornecidaseumneutrãopenetrarnumnúcleo,alterarasuanaturezaeopuseravibrar,masnãodeoutromodo.Pelomenos,quasenuncadeoutromodo.Apesardaenergiadeactivaçãoelevada,dá-semuitoocasionalmenteafissãoespontâneadumnúcleodeurânioque,dessemodo,atravessa,porassimdizer,abarreiradaenergiadeactivação.Noentanto,issosóacontecemuitoraramente.Umnúcleodeurânio-238sofreumafissãoespontâneaporcada220vezesquetaisnúcleosemitempartículasalfa.Estafissãoespontâneafoidetectadapelaprimeiravezem1941pelofísicosoviéticoGeorgiiNikolaevichFlerov(1913-1990).

Tal como existem núcleos radioactivos que possuem vidas médias muito mais curtas do queoutros, tambémexistemalgunsqueapresentamumamaiortendênciaparasecindiremespontaneamente.Os isótopos transurânicos, por exemplo, são muito mais instáveis: não apenas no que se refere àradioactividadenatural,mas tambémrelativamenteà fissãoespontânea.Enquantoqueavidamédiade

fissãoespontâneadourânio-238édecercadumbiliãodeanos,adocúrio-242éde7200000anoseadocalifórnio-250deapenas15000anos.

O urânio-238 cinde-se com tal dificuldade que mesmo um bombardeamento com neutrões éinsuficienteparaprovocarumafissãoemproporçõessignificativas.Sãonecessáriosneutrõesrápidosecom muita energia para obter esse efeito e como do processo apenas resultam neutrões lentos, umareacçãoemcadeiatorna-seimpossível.

Poucotempodepoisdofenómenodafissãotersidoidentificado,foiBohrquemchamouaatençãoparaofactode,emtermosteóricos,areacçãoemcadeiasedeveraourânio-235.Ourânio-235émenosestáveldoqueourânio-238.Ourânio-235 temumavidamédiaqueéapenas1/6dadourânio-238,emesmo um neutrão lento provoca a sua cisão. Na verdade, um dos aspectos mais difíceis nodesenvolvimentodabombadefissãofoiaseparaçãodourânio-235dourânio-238,umavezqueourânio,talcomoocorrenaNatureza,nãopossuiurânio-235emquantidadesuficienteparasustentarumareacçãoemcadeia.

Noentanto,épossívelbombardearurânio-238comneutrõesdemodoaformarprimeironeptúnio-239 e depois plutónio-239. O plutónio-239 possui uma vida média de mais de 24 000 anos,suficientemente longapor tantoparaque sepossaacumular emquantidades significativas.Tal comoourânio-235,oplutónio-239podesercindidocomneu-trõeslentos.

A fissão comneutrões lentos tambémnão é possível no casodo tório-232.Todavia, quandootório-232ébombardeadocomneutrões,podetransformar-seemtório-233queseconverte,porsuavez,emurânio-233.0urânio-233foi identificadopelaprimeiravezporSeaborgem1942.Possuiumavidamédiade160000anosepodesercindidocomneutrõeslentos.

Por outras palavras, todo o urânio e tório existentes no mundo podem, teoricamente, serconvertidosemnúcleoscindíveise,setalforfeitodemodocontrolado,gerarenergiaútilemvezdumasimplesexplosão.Otórioeourânionãosãoelementosmuitocomunsmas,seconsideradosemconjunto,podem potencialmente produzir dez vezesmais energia do que a totalidade das reservasmundiais decarvão,petróleoegásnatural.

Nos anos 50 começaram a ser construídos reactores nucleares que produzem energia sobcondiçõescontroladase,actualmente,umapercentagemsignificativadaenergiamundialégeradanessesreactores.Asegurançaconstitui,evidentemente,umapreocupação.(OacidenteemThree-MileIslandnosEstados Unidos, em 1979, e a catástrofe ocorrida em Chernobyl, na União Soviética, em 1986,provocaramalarmeconsiderável.)Existe,alémdisso,aquestãodaeliminaçãodequantidadescrescentesdeprodutosdefissão,quesãoperigosamenteradioactivos.Pelasrazõesexpostas,ofuturodaenergiadefissão parece actualmente problemático. Há, todavia, um outro tipo de energia nuclear que poderárevelar-setãoútilcomoafissãoequeéintrinsecamentemaisseguro.

FusãoNuclearTanto a radioactividade natural como a fissão nuclear afectamnúcleos comnúmeros demassa

elevados. Uma e outra correspondem a transformações que originam núcleos mais estáveis e comnúmeros demassa intermédios. Nesses processos existe perda demassa e produção e dissipação deenergia.Acombinaçãodenúcleoscomnúmerosdemassapequenos,ouasuafusão,paradarorigemanúcleosmaismaciços,tambémépossível.Esteprocessocorrespondeigualmenteaumatrans-formaçãoemquesãoproduzidosnúcleosmaisestáveisedenúmerosdemassaintermédios.Tambémnestecasoháperdademassaeproduçãoedissipaçãodeenergia.

Comefeito,seafracçãodesínteseaumentagradualmentequandosepassadosgrandesnúmerosdemassaparanúmerosdemassaintermédios,esseaumentoémuitomaisacentuadoquandosepassadospequenos números de massa para valores intermédios. Tal significa que a fusão nuclear é capaz deproduzirmaisenergiaapartirdumadadamassadematerialdoqueafissãonuclear.

Vejamoscomoéqueissofunciona,tomandocomoexemploumnúcleodehidrogénio-2(1protãoe1neutrão)que se fundecomoutronúcleodehidrogénio-2paradarorigemaumnúcleodehélio-4 (2protõesmais 2 neutrões).O número demassa do hidrogénio-2 é 2,0140 e o de dois núcleos 4,0280.Todavia,ohélio-4apresentaumafracçãodesínteseinvulgarmenteelevadaparaassuasdimensões,peloqueoseunúmerodemassaédeapenas4,0026.Areduçãodonúmerodemassaquandosepassadedoisnúcleos de hidrogénio-2 para um núcleo de hélio-4 é de 4,0280 - 4,0026 " 0,0254. Este valorcorresponde a 0,63 por cento da massa original de 4,028. Tal poderá não parecer grande coisa (aofundir-separadarorigemahélio-4,ohidrogénio-2sóperde5/8de1porcentodasuamassa)mas,naverdade,representaumaquantidadeconsiderável.Odeclínioradioactivonaturaldourânio-238,quedáorigemachumbo-206,resultanumareduçãodeapenas0,026porcentodamassaoriginal,enquantoqueafissão nuclear do urânio-235 resulta na perda de apenas 0,056 por cento da massa original. O quesignificaqueafusãodohidrogénioécapazdeproduzir,paraumamesmamassa,cercade24vezesmaisenergiadoquearadioactividadenaturale11vezesmaisdoqueafissãodourânio.

A energia que pode ser produzida emprocessos de fusão nuclear revelou-se crucial para umamelhor compreensão doUniverso, antes ainda dessa outra fonte de energia, a fissão nuclear, ter sidodescoberta.Ascoisaspassaram-secomoaseguirserelata.

Desdeaformulaçãodaleideconservaçãodaenergiaem1847queoscientistasseinterrogavamsobreaorigemdaenergiairradiadapeloSol.Aradiaçãosolaracompanharaahistóriadahumanidadeeosestudosgeológicosindicavamqueelajáexistiamuitoantesdoaparecimentodesereshumanos.

NenhumadasfontesdeenergiaconhecidasnoséculoXIXeracapazdeexplicarofactodoSolsetermantidoemcombustãodurantemaisdecemmilhõesdeanos,umvalorque,comoseveioarevelar,sópecavapordefeito.Duranteaprimeiradécadado séculoXX,oscientistascomeçaramadeterminaraidadederochasemeteoritosmedindoodeclínioradioactivoquenelesocorrera.Embrevechegaramàconclusãodequeonossosistemasolar(incluindoaTerraeoSol)tinhaumaidadedeváriosmilharesdemilhõesdeanos.Amelhorestimativaactualmentedisponívelapontaparaumaidadede4550000000anos.

Tanto a fissão, a cisão dum átomo (em cima), como a fusão, a junção de núcleos (em baixo),libertamenergia.Paraumamesmamassa,afusãodohidrogéniopodeproduzironzevezesmaisenergia

doqueafissãodourânio.Por volta de 1910, já se sabia que a energia nuclear era a forma de energia mais poderosa

conhecida.Em1920,oastrónomobritânicoArthurStanley Eddington (1882-1944) aventou a hipótese da energia do Sol resultar da fusão de

hidrogénioparadarorigemahélio.Essapossibilidadefoi-setornandocadavezmaisplausívelàmedidaqueadécadaavançava.QuandoAstonformulouoconceitodefracçãodesíntese,ficouclaroqueafusãodo hidrogénio para produzir hélio constituía a única reacção nuclear simples capaz de gerar energiasuficienteparaalimentaroSol.

Em 1929, o astrónomo norte-americano Henry Norris Russell (1877--1957) determinou acomposiçãoquímicadoSolatravésdumaanálisecuidadosadoseuespectroluminoso,tendodescobertoqueoastroeraconstituídomaioritariamenteporhidrogénio.Cercade90porcentodosátomosnoSolsãodehidrogénioe9porcentosãodehélio.Todososoutroselementosjuntosperfazemo1porcentoremanescente.Talsignificanãosóquea fusãodohidrogénioparadarhélioéaúnica reacçãonuclearsimplescapazdegerarenergiasuficiente,comoéaúnicareacçãonuclearsignificativaquepodeocorrernoSol.Ouéafusãodohidrogénio,ounãoénada.

Em1938,ofísicogermânico-americanoHansAlbrechtBethe(n.1906)propôsumadescriçãodosprocessosquedevem ter lugarnocentrodoSol, baseandoo seumodelonaquiloque se conheciadosestudos laboratoriais de reacções nucleares e em inferências astronómicas acerca das condições nocentrodoastro.Essestrabalhosvaleram-lheumPrémioNobelem1967.

Crê-seactualmentequeamaioriadasestrelasnormaisestãoconstantementeafundirhidrogénio,que pode servir de fonte de energia durante milhares de milhões de anos. As condições no centrodalgumas estrelas, sobretudo dasmaismaciças, acabampor se tornar tais que os núcleos de hélio sefundemporsuavezoriginandonúcleosmaismaciços,taiscomoosdecarbono,oxigénio,néon,silícioatéchegaraoferro(ondeoprocessopára,umavezqueafracçãodesínteseatingeoseuvalormáximo).

Afontedeenergiadasestrelasmuitomaciças,queforamtãolongequandopodiamnoprocessodefusão nuclear, começa então a falhar.As estrelas deixam de ser capazes de suportar o peso das suaspróprias camadas exteriores, sofrendo um colapso. Durante este processo, todo o hidrogénio aindaexistentenascamadasexteriores(juntamentecomoutrosátomosdenúmerodemassainferioraodoferro)funde-seduma sóvez.O resultado é a libertação súbitadumaquantidadegigantescade energia - umaenorme explosão que designamos supernova. Grande parte do material das estrelas que explodem écuspidoparaoespaçocircundantepelaprópriaexplosão,enquantoqueaporçãoremanescentecolapsaparadarorigemaumobjectodereduzidasdimensõesdenominadoestreladeneutrões,ouaumobjectomaispequenoaindachamadoburaconegro.

Hojeemdiapensa-seque,naalturaemquesurgiuoUniverso,seformaramunicamentenúcleosdehidrogénioehélio.Osnúcleosmaismaciços surgiramapenasnocentrodasestrelas, e foi somenteporquealgumasdessasestrelasmaismaciçasexplodiramquetaisnúcleossejuntaramaosgases,poeirase outros resíduos que povoam o espaço. Com efeito, quando se dá a explosão duma supernova, élibertadaumaquantidadetaldeenergiaqueosnúcleosdeferrosão"empurradosparacima"nosentidodaformaçãodenúcleosaindamaismaciços-núcleosquepodemiratéaoelementourânioeparaládele-equesãoigualmentedispersadosnoespaçocircundante.

A partir dos gases e poeiras interestelares, que contêm núcleos maciços dispersados pelasexplosões das supernovas, podem depois formar-se novas estrelas. Quando tal sucede, estamos napresençadeestrelasdesegundageração.Estasestrelaseosseusplanetascontêmgrandesquantidadesde

núcleosmaciços.OnossoSoléumadessasestrelasdesegundageração.ATerraenósprópriossomosconstituídos

quase inteiramente por núcleosmaciços que se formaramem tempos no centro duma estrela gigante eforamdepoisespalhadospeloespaçoemresultadodumaenormeexplosão.

Masseafusãodohidrogénioproduztantamaisenergiadoquearadioactividadenatural,porquerazãoéqueelanãoocorredemodoespontâneoemuitomaisrapidamentedoqueesta?NaTerra,ourânioeotóriodesintegram-selentamenteoriginandonúcleosmenosmaciçose,devezemquando,sofrematéfissão espontânea. O hidrogénio, pelo contrário, permanece estável e não dá quaisquer sinais de sefundir.

Nãoédifícilpercebera razãode talcomportamento.Osnúcleosmaciçoscomoosdeurânioetóriotêmtodososseusprotõeseneutrõesconcentradosnummesmoponto.Quaisquertransformaçõesquepossamocorrerentreelesacontecemmesmo.Nocasodafusãodohidrogénio,porém,doisnúcleosdehidrogénio-2,ouquatronúcleosdehidrogénio-1,queexistemafastadosunsdosoutros, têmdepossuirenergiasuficienteparavenceremabarreiraelectrónica,arepulsãomútuaentreosnúcleoseaindaparacolidirem com força suficiente e iniciarem um processo de fusão. À temperatura ambiente, osmovimentosdessesátomossópossuemumapequeníssimafracçãodaenergianecessária.

Comefeito,atemperaturatemdesermuitoelevada-daordemdosmilhõesdegraus-paraqueessa energia seja fornecida. Mesmo assim, é conveniente comprimir os átomos de hidrogénio paradensidadesmuitoelevadas,demodoaquehajaumnúmeroenormedecolisõesentrenúcleosmovendo-sedum ladopara o outro e separados por distâncias anormalmente pequenas.Tais condições existemnocentrodasestrelas.Em1926,EddingtondemonstroudeformaconvincentequeoSolera integralmentegasoso.NocentrodoSol,astemperaturasepressõessãotãoelevadasqueosátomossedesintegram.Oselectrõessãoesmagadosunscontraosoutroseosnúcleosaproximam-selivremente.

Crê-se actualmente que a temperatura no centro do Sol é de cerca de 15 000 000 ºC e a suadensidadedecercade160gramasporcentímetrocúbico,ouseja,cercade8vezesadensidadedoouro.(E, todavia, esse centro é gasoso porque os átomos estão desfeitos e os núcleos se deslocam tãolivrementecomoofazemátomosintactosnosgasescomuns.)Sobtaiscondições,têmlugarprocessosdefusãoàsuperfíciedapequenamassadehélioexistentenocentrodoSol,constituídapelohélioquefaziaoriginalmentepartedesteeporaquelequesefoiformandoporfusãodehidrogénioaolongodosúltimos4,55milharesdemilhõesdeanos.

Ora, se nós quisermos provocar uma reacção de fusão aqui na Terra, como é que devemosproceder?Comoéqueobtemosumatemperaturaepressãosuficientementeelevadas?

Umavezconstruídaabombadefissão,tornou-seóbvioqueessaeraumadasformaspossíveisdeobterastemperaturasepressõesnecessárias.Seabombadefissãoincluísseumadeterminadaquantidadedehidrogénio,fossesobqueformafosse,osprimeirosinstantesdareacçãodefissãopermitiriamelevaratemperaturaepressãodohidrogénioaosvaloresnecessáriosparaseiniciarumprocessodefusão.

Em 1952, tanto os EstadosUnidos como aUnião Soviética construíram com êxito bombas defusão nuclear, que ficaram popularmente conhecidas como bombas de hidrogénio ou bombas-H. Oengenho também é designado, por vezes, por bomba termonuclear, onde a expressão "termo-" vemdapalavra grega que significa "calor", já que a ignição duma bomba de fusão é provocada pelo calorextremoenãoporumbombardeamentocomneutrões.

Aenormeenergiadumabombade fusãopode fazê-laexplodircomumaviolência tremenda.Aexplosãoétãopotentequenumaqualquerguerraemquesefaçalivreusodetaisengenhos,acivilização

será por certo destruída quase instantaneamente. Tal sucederá, quase de certeza, com o grosso dahumanidadee,numasituaçãolimite,comgrandeparteoumesmotodaavida.

OpróprioSolé,naverdade,umagrandebombadefusãoque,noentanto,nãoexplode.Oastro,comumamassa333000vezessuperioràdaTerra,possuiumcampogravíticomuitointensoquegaranteasuaintegridadecontraaviolênciadaenergiadefusãonoseuinterior.Éporissoquepodemosgozaraluzeocalordestabombacósmica-que,felizmente,seencontraaumadistânciasegurade149,6milhõesdequilómetros.

Serápossíveliniciarumafusãonuclearecontrolá-la?Serápossívelobteraenergialentamente,dumaformautilizávelenãodestrutiva?Setalforpraticável,teremosumaformadeenergianuclearemqueocombustívelseráfácildeobteremanipular.Emvezdetermosdeextrairurânioetórioderochasondeexiste emquantidadesmínimas,poderemosobterohidrogénio-2dosoceanos. (Ohidrogénio-2émuitomaisrarodoqueohidrogéniovulgar,ohidrogénio-1.Noentanto,afusãodaqueleémaisfácile,apesardesercomparativamenteescasso,existeemquantidadesuficienteparadurarmilharesdemilhõesdeanos.)

Alémdisso, o processo de fissão exige quantidadesmínimas apreciáveis dematerial cindível,existindo sempre a eventualidade de reacções descontroladas e de fusões dos núcleos dos reactoresnucleares se o processo não for adequadamente vigiado. A energia de fusão pode ser obtida compequenas quantidades de combustível, o que elimina a possibilidade dum acidente de grandesproporções. Finalmente, o processo de fusão não gera as quantidades significativas de materiaisradioactivosproduzidospelafissão.

No entanto, para que se produza uma fusão nuclear controlada, é necessário submeter ohidrogénio-2atemperaturasepressõeselevadas.Todavia,aindanãosabemoscontrolartaispressõesetemosdeelevaraindamaisastemperaturasquejáconseguimosobter,enquantomantemosohidrogénioconfinadonointeriordumcampomagnético.

Hámaisdetrintaanosqueoscientistasprocuramobterumafusãocontrolada.Esseobjectivoestácadavezmaispróximo-masaindanãofoiatingido.

PartículasdeDesintegraçãoComoatrássereferiu,ohélio-4éumnúcleoparticularmenteestável.Poucodepoisdesurgiro

Universo,jásetinhamformadoosquatronúcleosmaissimples.Primeiroohidrogénio-1,porqueoseunúcleo é só um protão. Acrescentando-lhe um neutrão, transformou-se em hidrogénio-2 (1 protão, 1neutrão).Este,poradiçãodumprotão,converteu-seemhélio-3(2protões,1neutrão),oqual,commaisumneutrão,setransfoimouemhélio-4(2protões,2neutrões).Ohidrogénio-2eohélio-3,emborasejamnúcleosestáveis,possuemfracçõesdesínteserelativamentereduzidas,sendoessaarazãoporqueambosrevelaramumatendênciaapreciável,nascondiçõesexistentesnoiníciodoUniverso,paraseconverterememhélio-4,umnúcleoaindamaisestável.Oresultadoéque,actualmente,90porcentodosátomosnoUniversosãodehidrogénio-1e9porcentodehélio-4.Todososoutrosátomosjuntosperfazemorestante1porcento.

Alémdisso,nasuafaseinicial,oUniversonuncaultrapassouoníveldohélio-4.Ohélio-4étãoestávelquenãopossuivirtualmentetendênciaalgumaparaacrescentarumprotão,umneutrãoouparasejuntaraoutroátomodehélio-4.Osnúcleosqueseformariamemtaisprocessos- lítio-5(3protões,2neutrões),hélio-5(2protões,3neutrões)ouberílio-8(4protões,4neutrões) -são todos tão instáveisqueassuasvidasmédiassesituamentreumcentésimodebilionésimodesegundoemenosdummilésimode milionésimo dum bilionésimo de segundo. Por isso, todos os núcleos com números de massasuperiores a 4 se formaram (como referi anteriormente) nos centros de estrelas, onde as condiçõesexistentestornamtaisprocessosnãoapenaspossíveis,masprováveis.

Entre os núcleos com números demassamais elevados, aqueles que podem ser consideradoscomo constituídos por unidades de hélio-4 são particularmente estáveis. O carbono-12 (6 protões, 6neutrões - 3 unidades hélio-4) revela uma coesão apreciável, tal como o oxigénio-16 (8 protões, 8neutrões-4unidadeshélio-4).Ambosapresentamfracçõesdesínteseinferioresàsdosseusvizinhos.

Amedida que os núcleos se tornammaismaciços, este "efeito hélio-4" diminui.Ainda assim,núcleos como os do néon-20 (5 unidades hélio-4), magnésio-24 (6), sílício-28 (7), enxofre-32 (8) ecálcio-40(10)sãoespecialmenteestáveis.Todosestesnúcleos,dohélio-4aocálcio-40,representamosisótoposmaiscomunsdosrespectivoselementos.

Todavia, a unidade de hélio-4 parece perder o seu efeito estabilizador para lá do cálcio-40.Aparentemente,àmedidaqueonúmerodeprotõesnonúcleoaumenta,umnúmeroidênticodeneutrõesdeixadesersuficienteparatornaronúcleoestável.Énecessárioumexcessodeneutrões.

Assim,noferro-56,oisótopodeferromaiscomum,existem26protõese30neutrões,oquefazcom que o rácio neutrão/protão seja de 1,15. No estanho-118, o isótopo de estanho mais frequente,existem50protõese68neutrões,aquecorrespondeumrácioneutrão/protãode1,36.Noouro-197,oúnicoisótopoestáveldoouro,existem79protõese118neutrõeseumrácioneutrão/protãode1,49.Onúcleo mais maciço e estável é o do bismuto-209, com 83 protões e 126 neutrões e um rácioneutrão/protãode1,52.

Paraládobismuto-209,nãoexistenúmeroalgumdeneutrõescapazdetornarumnúcleoestável.Comefeito,ourânio-238possui92protõese146neutrões,aquecorrespondeumrácioneutião/protãode1,59, mas mesmo um excesso tão significativo de neutrões não é suficiente para tornar o núcleototalmenteestável.

A física germano-americanaMariaGoeppert-Mayer (1906-1972) tentou perceber a razão pelaqual algunsnúcleos estáveiso erammaisdoqueoutros.Esta cientista sugeriuqueexistemcamadas esubcamadasnucleares,talcomoexistemcamadasesubcamadaselectrónicas.Goeppert-Mayercalculouonúmero de protões e neutrões necessários para preencher tais camadas, concluindo que as camadaspreenchidasdavamorigemanúcleosmaisestáveis.

Onúmeronecessário para preencher uma camadanuclear é designadonúmerode camada e àsvezestambémnúmeromágico.(Estaúltimadesignaçãonãoémuitoapropriada,umavezquenãoexistenada de "mágico" na ciência.No entanto, os cientistas são tão dados a expressões enfáticas como osoutros seres humanos.) O físico alemão Johannes Hans Daniel Jensen (1907-1973), trabalhandoindependentementedeGoeppert-Mayer, chegou igualmenteà ideiadenúmerodecamadae,pelos seustrabalhos,estesdoiscientistaspartilharamumPrémioNobelem1963.

Quandoumnúcleomaciçoé tãograndequese tornainstável,existeumatendêncianaturalparaperderpartículas,afimdesetornarmenosmaciçoe,portanto,maisestável.Umaformaeficientedeoconseguiréatravésdaemissãodumapartículaalfa(umnúcleodehélio-4)sobaformadumapartículadedesintegração.Estenúcleodehélio-4étãocoesoquesetornafácilexpulsá-locomoumtodo.E,dessemodo,onúmerodemassareduz-seem4unidadesdumasóvez.Éporissoqueourânio-238,urânio-235,tório-232,rádio-226emuitosoutrosnúcleosmaismaciçosdoqueobismuto-209emitempartículasalfa.

Osnúcleosquesãomenosmaciçosdoqueobismuto-209nãoemitemgeralmentepartículasalfa.Oneodímio-114éonúcleomaislevequeofaz,masemitemuitopoucasdessaspartículas,umavezqueasuavidamédiaédecercade2000biliõesdeanos.

E claro que os átomos radioactivos emitem frequentemente partículas beta no decurso dumadesintegraçãoradioactiva,oquesuscitouumproblema.Nosanos20,aexistênciadepartículasbetaeraconsiderada uma indicação de que os núcleos continham electrões. Afinal, se umamoeda nos cai doporta-moedasissosóaconteceporqueelaláseencontravaanteriormente.

Contudo,estasanalogiascomarealidadedodia-a-dianemsemprefuncionam,razãopelaqualo"senso comum" é frequentemente um guia perigoso quando aplicado à ciência. Por volta de 1932, oscientistas já se tinham convencido de que o núcleo continha apenas protões e neutrões - mas nãoelectrões.Dondeprovinhamentãoaspartículasbeta?Senãoexistemelectrõesnonúcleo,temosdepartirdoprincípiodequeoselectrõessãoaíformadoseimediatamenteemitidos.Mascomoéqueissosucede?

Suponhao leitorqueoneutrão é consideradoumapartícula semcarga, nãoporquenãopossuicarga eléctrica mas porque tem duas cargas, uma positiva e outra negativa, que se neutralizammutuamente.Seacarganegativaforemitidasobaformadumelectrão,acargapositivapermaneceeoneutrão transforma-senumprotão. (Naverdade,a situaçãoémaiscomplicada,comoveremos,masdemomentoestaexplicaçãoésuficiente.)

Masporque razãohá-de tal transformação ter lugar?Elanãoocorrenosdiversosnúcleosqueverificamos serem estáveis. Nos anos 30 pensava-se que estes podiam permanecer inalterados porperíodos indefinidos de tempo, talvez mesmo eternamente. No entanto, existem núcleos que emitemelectrões-algunslentamente,outrosmaisdepressa-eporcadaelectrãoemitido,umneutrãodonúcleotransforma-senumprotão.Paratentarresponderàquestão,suponhamosqueumnúcleocomdeterminadonúmeroatómicotemdeconterumnúmerofixodeprotõesigualaessenúmeroatómico.Alémdisso,temdeconterumcertonúmerodeneutrõesparaserestável.Porvezes,apenasumdeterminadonúmerodeneutrõesgaranteessaestabilidade.Nocasodoflúor,porexemplo,qualquernúcleoatómico temde terexactamente9protõeseexactamente10neutrõesparaserestável.

Umneutrãonasuaposiçãoestávelnointeriordumnúcleopodeservistocomoumacombinação

neutradumprotãoeelectrão.Separadodonúcleo,oneutrãodesintegra-senumprotãoenumelectrão,comumavidamédiadedozeminutos.

Contudo,existeporvezesumacertaflexibilidadenoqueserefereaonúmerodeneutrões.Assim,

qualquernúcleodeazototemdeter7protões,maspodeter7ou8neutrõeseserestável.Cadanúcleodeoxigéniodeveter8protões,maspodeter8,9ou10neutrõeseserestável.(Nocasodoestanho,qualquerumdedeznúmerosdiferentesdeneutrõesgaranteaestabilidadedonúcleo.)

O que é que sucede então quando um núcleo tem demasiados neutrões para ser estável? Ohidrogénio-1,porexemplo,éestável,eoseunúcleoéconstituídoporumprotãoapenas.Omesmosepassacomohidrogénio-2,com1protãoe1neutrãononúcleo.Ohidrogénio-2émenosestáveldoqueohidrogénio-1,mas é, no entanto, estável - e assim permanecerá indefinidamente se for deixado à suasorte.

(Comoéqueumnúcleopodesermenosestáveldoqueoutroe,aindaassim,estável?Imagineoleitorumamoedaemrepousonocentrodumamesa.Senãolhemexermos,permaneceráindefinidamentenessaposição. Imagineagoraumaoutramoedacolocada juntoaobordodamesmamesa.Tambémelatenderá a permanecer aí para sempre.No entanto, sendo estável, émenos estável do que amoeda nocentrodamesa,umavezquebastaumapequenaperturbaçãoparaatirá-laparaforadaquela.Domesmomodo, tambémohidrogénio-2pode sofrer fusãomais facilmente doqueo hidrogénio-1, sendo essa arazãoporqueexistemuitomenoshidrogénio-2noUniversodoquehidrogénio-1, emboraambos sejamestáveis.)

Ohidrogénio-3,comoseunúcleoconstituídopor1protãoe2neutrões,nãoéumnúcleoestável.Existeumnúmeroexcessivodeneutrõesparaquetalpossaacontecer.Poder-se-iaesperarqueonúcleode hidrogénio-3 libertasse um neutrão, mas tal implicaria uma energia de activação muito elevada -energia de que o núcleo de hidrogénio-3 não dispõe em condições normais. Uma segunda alternativaconsiste na conversão dumdos neutrões do núcleo de hidrogénio-3 num protão, com a emissão dumapartícula beta. Tal processo envolve uma energia de activação bastante reduzida; a vida média dohidrogénio-3édeapenas121/4anos.Apósaemissãodumapartículabeta,onúcleopassaa terdoisprotõeseumneutrão,transformando-senoisótopoestávelhélio-3.

Tambémsóexistemdoisisótoposestáveisdecarbono:ocarbono-12(6protões,6neutrões)eocarbono-13(6protões,7neutrões).Em1940,obioquímicocanadiano-americanoMartinDavidKamen(1913-2002) identificou o carbono-14 (6 protões, 8 neutrões), que temumneutrão amais.A emissãoduma partícula beta, convertendo um dos neutrões num protão, dá origem ao azoto-14 (7 protões, 7neutrões),queéestável.Existemmuitosoutrosexemplosdestetipo.

Umneutrãotemumamassasuperioràdumprotãoeelectrãojuntos.Porisso,seumneutrãoforconvertidonumprotãoatravésdaemissãodumelectrão,existeglobalmenteumaperdademassaeumadissipação de energia. Será que um neutrão livre se pode converter espontaneamente num protão,libertandoumelectrãoaofazê-lo?

Deinício,foidifíciltestarestahipótese,umavezque,quandoseproduziaumfeixedeneutrões,eles colidiam com outros núcleos e eram por estes absorvidos, antes de terem oportunidade de sedesintegrar.

Essa dificuldade só foi ultrapassada em 1948, quando se fez um feixe intenso de neutrõesatravessarumrecipientecilíndricoondeforacriadoumvácuo.Emtornodorecipienteexistiaumcampoeléctrico,paraqueastrajectóriasdequaisquerelectrõesproduzidosfossemdesviadasparaumladoeasdos protões para o outro. A desintegração postulada pode então ser observada. Os neutrões

desintegravam-sedandoorigemaumprotãoeumelectrão,apresentandoumavidamédiadecercade12minutos.(Estanãoéumadescriçãocompletadaquiloqueacontece,masqueterádeservirporagora.)

Masseascoisassepassamassim,porquerazãoéqueosneutrõesnãosedesintegramemtodososnúcleos,aténãorestarnadanestesparaalémdeprotões?Aparentemente,osneutrõesexistentesnosnúcleosatómicosestãointimamenteassociadosaosprotõese,emtaiscircunstâncias,sãoestáveis,desdequeoseunúmeronãosejaexcessivamenteelevadooureduzido.(Adianteserãodadasmaisinformaçõessobreesteassunto.)

Asdesintegraçõesespontâneasdepartículasisoladas,quandoocorrem,parecemresultarsemprenuma redução de massa - o que significa que um neutrão pode dar origem, por desintegração, a umprotão, que tem umamassamenor, mas um protão não pode originar, por desintegração, um neutrão,partículamaismaciça.

Masnessecaso,porquemotivoéqueoprotãonãosedesintegraedáorigemaumelectrão,quetemumamassamenor,libertandotodamenos1/1836dasuamassasobaformadeenergia?Arespostaaessa pergunta é que existem leis de conservação que parecem ser sempre respeitadas. Existe, porexemplo,oprincípiodaconservaçãodacargaeléctrica,queafirma-afazerféeminúmerasobservaçõesem laboratório - que uma carga eléctrica positiva, deixada à sua sorte, não pode ser criada nemdestruída.Eomesmoseaplicaaumacargaeléctricanegativa.

Nosanos30, asduasúnicaspartículascomcargaque seconheciameramoprotão, coma suacargapositiva,eoelectrão,comcarganegativa.(Asituaçãoalterou-seentretanto,massuponhamosqueeramesmoassimetentemosresponderàperguntanessabase.Podemossemprerefinaranossarespostamaistarde.)Seaúnicaformadumprotãoperdermassaconsistenasuaconversãoemelectrão,entãoacargapositivadoprotãotemdeserdestruídaeacarganegativadoelectrãotemdesercriada.Nemumanemoutracoisasãopossíveis.Poressemotivo,oprotãonãosepodedesintegraredarorigemaoutrapartícula,umavezquenãoexistenenhumapartículademassainferiorquepossuaumacargapositiva(eraassim,pelomenos,quesepensavanaépoca).

Demodoanálogo,umelectrãonãosepodedesintegraredarorigemapartículasmaispequenas,umavezqueasúnicaspartículasmaispequenasconhecidasnosanos30eramofotãoeogravitão,amboscommassaecarganulas.Paraqueoelectrãosedesintegrasseedesseorigemaumadestaspartículas,teriaquehaverdestruiçãodasuacarganegativa-eissoéimpossível.Poressemotivo,umelectrãonãosepodedesintegrar.

Repare-sequequandoumneutrãosedesintegraedáorigemaumprotão(querestejamosapensarnumneutrão livreounumapartículaquefazpartedumnúcleo),seformanamesmaalturaumelectrão.Destemodo,oneutrãosemcarga(0)dáorigemaumacargapositiva(+1)eaumacarganegativa(-1).Asduas cargas, se consideradas emconjunto, continuama ter uma somanula: 0= (+1)+ (-1). (A lei daconservaçãodacargapermiteaproduçãooudestruiçãodeparesdecargasdesinaloposto,masnãoaproduçãooudestruiçãodumacargasemaoutra.)

Oleitorpoderáinterrogar-seporquerazãoumfotãonãosepodeconverternumgravitão,ouvice-versa.Nocasodestasduaspartículas,nãotemosdenospreocuparcomcargaseléctricas.Existe,todavia,aquestãodospinoumomentoangular.Aleidaconservaçãodomomentoangularestabelecequeestenãopodesercriadonemdestruído.Umfotãocomumspinde1nãopodedesintegrar-seedarorigemaumgravitãodespin2,ouvice-versa.Poderãoexistiroutrosfactoresqueimpedematransformação,masaconservaçãodospiné,porsisó,razãosuficiente.

No início da década de 30, portanto, conheciam-se apenas cinco partículas constituintes doUniverso. Quatro dessas partículas - protão, electrão, fotão e gravitão - eram estáveis. A quinta, o

neutrão,nãooera.MasestaimagemdoUniversonãoiriadurarmuitotempo.

8.ANTIMATÉRIA

AntipartículasAlistadepartículasqueconstituemoUniverso-protões,neutrões,electrões,fotõesegravitões-

temalgodepeculiar.Porquerazãoéqueascargaseléctricaspositivasresidemnosprotõeseascargaseléctricas negativas nos electrões, quando os primeiros têm uma massa 1836 vezes superior à dossegundos?

Asduaspartículas, demassas tãodiferentes, possuemcargas eléctricas que são absolutamenteiguais,emboradesinalcontrário.Sabemosqueassiméporqueoátomodehidrogénio,constituídoporumprotãonoseunúcleoeumelectrãoforadele,éabsolutamenteneutro.Nuncasedetectounesteátomoqualquerexcessodecarga,negativaoupositiva,pormaispequenoquefosse.

Alémdisso,oscientistasnuncadescobriramqualquerdiferençafundamentalentreosdois tiposdecargadogénerodaqueexisteentreasrespectivasmassas,equeoslevaaassociaroelectrãoaumamassamuitopequenaeoprotão aumamassamuitomaior.Poroutraspalavras, oprotão eo electrãoconstituemumparimprovávelesurpreendente.

As peças deste quebra-cabeças começaram a encaixar umas nas outras no final dos anos 20,quandoDirac resolveu estudar as propriedades do electrão através duma análisematemática das suascaracterísticas ondulatórias. Ele considerou que o electrão podia existir em um de dois estadosenergéticos que seriam o oposto um do outro. A primeira ideia deDirac foi, naturalmente, de que opróprioelectrãorepresentavaumdessesestadoseoprotãoooutro.Aserverdade,seriamaravilhoso,umavezquesimplificariaaindamaisaestruturadoUniverso:oelectrãoeoprotãoseriamsimplesmentedoisestadosdiferentesdumaúnicapartículafundamental.

Mas tal era bomdemais para ser verdade, eDirac cedo percebeu que as equações não eramverdadeiramentesatisfeitassalvoseosdoisestadosfossemexactamenteiguaisemtudoexceptonoquesereferiaàorientação.Teriamdeser,porassimdizer, imagensnoespelhoumdooutro,comoasduasmãosdoleitor,quesãoemtudoidênticasexceptoqueumaédireitaeaoutraesquerda.

Na imagemnoespelhodoelectrão, apenaso sinaldacargaeléctricapoderiavariar -positivonumestadoenegativonooutro.Tudoomaisteriadeseridêntico.Nãosóamagnitudedacargateriadeser igual nos dois estados, como também a respectiva massa. E assim, em 1930, Dirac postulou aexistênciadumapartículaexactamenteigualaoelectrãoemtodososaspectos,exceptoquepossuíaumacargaeléctricapositivaexactamentedamesmamagnitudedacarganegativadoelectrão.

Umargumentodomesmotipolevouàconclusãodequedeviaexistirumapartículaexactamenteigualaoprotãoem todososaspectos,àexcepçãodo factodepossuirumacargaeléctricanegativademagnitudeidênticaàcargapositivadoprotão.

O encontro duma partícula com a sua antipartícula é como o cancelamento de duas ondas emoposiçãodefase.Acargatotaldasduaspartículasé+1+-1,ouseja0.Nodecursodumaaniquilaçãomútua,amassadeambasétotalmenteconvertidaemenergiasobaformaderadiaçãogama.

Dum modo geral, uma partícula que é exactamente igual a outra excepto no seu aspectofundamental em que o seu oposto se designa antipartícula, expressão onde o prefixo anti- provém dapalavra grega que significa "oposto". O electrão de carga positiva seria assim um anti-electrão, e oprotãodecarganegativaumantiprotão.

Quandoumapartículaeasuaantipartículaseencontram,écomoseduasondasemoposiçãodefasesejuntassem(comumaairparacimaquandoaoutravaiparabaixo,evice-versa.)Talcomoduasondassepodemcancelar,originandoumalinharectaquenãovaiparacimanemparabaixo,demodoquedeixadeexistirqualqueronda,tambémumapartículaerespectivaantipartículasecancelamumaàoutra,deixandodeexistirqualquerpartícula.Aessefenómenochama-seaniquilaçãomútua.

Éinteressanteverificarqueofenómenonãoviolaa leidaconservaçãodacargaeléctrica,umavezque,quandopartículaeantipartículaseencontram,acargatotaldasduaspartículasé(+1)+(-1),ouseja0.Umavezconcluídaaaniquilaçãomútua,acargaeléctricaremanescentecontinuaaser0.Porisso,nãoexisteviolaçãodestaleideconservação.Apenasumacargapositivaounegativaisoladamentenãopodesercriadaoudestruída.Cargaspositivasenegativasemconjuntopodemsercriadasoudestruídasemqualquernúmero.

Note-sequeapenasacargaeléctricadesaparecenumaaniquilaçãomútua,umavezqueéaúnicacaracterística em que partícula e antipartícula apresentam propriedades opostas. A partícula e aantipartículapossuemmassasidênticas,eessamassaduplanãopodedesaparecer.Amassaconstitui,noentanto,uma formadeenergia, epodemudarde forma.Por isso,nodecursodumaaniquilaçãomútua,surge radiação gama com uma energia que é exactamente equivalente à massa que existia antes daaniquilação.

Também pode ocorrer o fenómeno oposto. Se for possível concentrar energia suficiente numapequena região, ela pode ser convertida emmatéria.No entanto, quando tal acontece, não é possívelformar-se apenas uma partícula ou uma antipartícula, visto que, num caso como no outro, uma cargaeléctrica seria criada a partir do nada. Só pode ocorrer a criação conjuntaduma partícula e da suaantipartícula,paraqueacargaeléctricatotalpermaneçaigualazero.Aistochama-seproduçãodepares.

AteoriadeDiracrevelou-seextremamenteinteressantedopontodevistamatemático.Noentanto,amatemática,pormaisinteressantequeseja,nãotemgranderelevânciasenãopudermosestabelecerasuacorrespondênciacomarealidade.Umexemplo:pordiversasrazõesdenaturezateóricaematemática,os cientistas estão certos da existência de gravitões (ou ondas gravíticas, dependendo do facto depensarmos em termos de partículas ou ondas). No entanto, a teoria diz-nos também que as ondasgravíticas possuem tão pouca energia que a sua detecção é praticamente impossível. (Seria umpoucocomotentarrecolherumapartículadepócomumachaveinglesa.Atarefarevela-seimpossívelanãoserquesejamoscapazesdeconceberumpardemandíbulassuficientementedelicadas.)

Eéprecisamenteissoqueoscientistasprocuramfazer.Apesardeestaremcertosdaexistênciadeondasgravíticas,existemunsquantosquededicamosseusesforçosàconstruçãodedispositivoscapazesdeasdetectarem.Háanosqueosesforçosserevelaminfrutíferos,masoscientistasestãoconfiantesdequeumdia serãobem sucedidos.Quando esse dia chegar, a teoria será rematadapor umconjunto deobservações experimentais, e tal significará uma grande alegria paramuitos e um prémioNobel paraaquelesquedetectaremasondas.

EraessaasituaçãodahipóteseformuladaporDiracrelativamenteàsantiparticulas.Quandoeleanunciouasuateoria,sabia-sequenomundoànossavoltaexistiaumnúmeroimensodeelectrões,masnunca tinham sido observados antielectrões.Até estes seremdetectados, o seu trabalho não podia serlevadototalmenteasério.Contudo,oantielec-trãofoiembreveidentificado,emcircunstânciasquenoslevam a crer que teria sido encontrado,mesmoqueDirac não tivesse publicado o resultado das suasinvestigações.Paravermoscomofoiquetalsucedeu,temosdevoltarumpoucoatrás.

RadiaçãoCósmicaUm electroscópio carregado, com as suas folhas de ouro bem afastadas uma da outra, tem

tendência a perder lentamente a sua carga, mesmo quando não existem materiais radioactivos nasproximidades. O facto não constituiu uma grande surpresa para os primeiros cientistas a realizaremexperiênciascomtaisdispositivos,umavezqueerabemprovávelqueestivessemdisseminadasnosolopequenas quantidades de materiais radioactivos. Mesmo que estas fossem demasiado pequenas parapoderem ser detectadas pelos métodos habituais, as partículas emitidas ocasionalmente iriam retirarpequenasporçõesdecargaaoelectroscópio,queacabariaporficartotalmentedescarregado.

Mas depois os investigadores descobriram que não havia maneira de impedir a descarga dodispositivo.Seoelectroscópiofossetransportadosobreáguaeparabemlongedeterrafirme,acargacontinuava a desaparecer lentamente.E se o dispositivo fosse protegidopor um invólucro de chumbocom espessura suficiente para bloquear a passagem de radiação, a carga mesmo assim desaparecia,emboramaislentamentedoqueantes.

OfísicoaustríacoVictorFranzHess(1883-1964)resolveuinvestigaroassunto,transportandoumelectroscópio para a atmosfera num balão de ar quente. Uma vez que se pensava que as fontes deradiaçãoseencontravamtodasnosolo,oenviododispositivoparabemlongedestedeviapermitirdeteroprocessodedescargamaiseficientementedoquequalqueroutroprocessoantesexperimentado.

Em1911,Hessrealizouaprimeiradedezascensõesembalão, levandooselectroscópiosparaumaaltitudedecercadenovequilómetrosemeioacimadasuperfíciedaTerra.Efoicomespantoqueverificouqueoelectroscópioperdiaasuacargatantomaisdepressaquantomaisaltosubia.Hessnãoencontrououtromododeexplicarestefactosenãopostularaexistênciadumaradiaçãomuitopenetranteprovenientedoespaço.AdescobertalevouofísicoaustríacoapartilharumPrémioNobelem1936.

Em1925,ofísiconorte-americanoRobertAndrewMillikan(1868--1953)interessou-seporessaradiação,aqueresolveuchamarradiaçãocósmica,umavezquepareciaterorigemalguresnocosmos.Millikanestavaconvencidodequesetratavadumaformaderadiaçãoelectromagnéticadecomprimentode onda ainda mais curto do que a radiação gama e, por conseguinte, com uma energia e poder depenetraçãosuperiores.

Por outro lado, Compton suspeitava que a radiação cósmica eram feixes de partículassubatômicas com carga eléctrica que, se se deslocassem com rapidez suficiente, podiam ser maispenetrantes do que os raios gama. (Isto faz lembrar o debate, na geração anterior, sobre a naturezacorpuscularouondulatóriadosraioscatódicos.)

Quando um electroscópio está carregado, as suas folhas de ouro repelem-se mutuamente,afastando-se.Quantomaispróximoodispositivoestádumafonteradioactiva,maisrapidamenteaquelasperdem a sua carga e regressam à posição inicial. Em 1911, Victor Franz Hess transportou umelectroscópionumbalãodearquente.Oobjectivoeraafastá-lodaradioactividadenaturaldosolo.Masdescobriuqueodispositivoperdiaacarga tantomaisdepressaquantomaisaltosubia.Na imagem,aslinhasverticaisrepresentamaradiaçãocósmica.

Comoéqueaquestãopoderiaserresolvida?Searadiaçãocósmicafosseumaformaderadiaçãoelectromagnética, comopensavaMillikan, não teria carga eléctrica e não seria portanto afectada pelocampomagnético daTerra. Se surgisse de todas as partes do céu com amesma intensidade, atingiria

todas as partes da superfície terrestre em igual quantidade. Se, todavia, a radiação cósmica fosseconstituídaporpartículascomcarga,estasseriamdesviadaspelocampomagnéticodaTerraeatingiriamo nosso planeta em quantidades tanto maiores quanto mais nos afastássemos do Equador e nosaproximássemosdospólosmagnéticos.Poroutraspalavras,quantomaiorfossealatitude,maiorseriaaconcentraçãoderadiaçãocósmica.Estefenómenofoidesignadoefeitolatitude.

Comptonviajouportodoomundo,medindoaincidênciadaradiaçãocósmicaaquieali,afimdeverificaraexistênciadoefeitolatitude.E,noiníciodosanos30,conseguiuprovarqueoefeitoerabemrealequearadiaçãocósmicaera,defacto,constituídaporpartículascomcargaeléctrica.

Em1930,ofísicoitalianoBrunoBenedettoRossi(1905-1993)concluiuque,seasuacargafossepositiva,haveriamais radiaçãocósmicaachegardeocidentedoquedeoriente.Sea suacarga fossenegativa, passar-se-ia o contrário. Em 1935, o físico norte-americano Thomas Hope Johnson (1899-1998)demonstrouquearadiaçãocósmicaeramaisintensavindadeocidenteeque,porconseguinte,assuaspartículaspossuíamumacargaeléctricapositiva.

Sabemosactualmentequearadiaçãocósmicaéconstituídapornúcleosatómicosemmovimentoprovenientesdasestrelas.Umavezqueasestrelas sãocompostasmaioritariamenteporhidrogénio, aspartículas que compõem a radiação cósmica são sobretudo núcleos de hidrogénio, ou seja, protões.Existemigualmentealgunsnúcleosdehélioeumapercentagemmínimadenúcleosmaismaciços.

O nosso Sol emite um fluxo constante de protões e outras partículas carregadas, tal como foidemonstradoporRossinosanos50.Ofenómenoéactualmentedesignadoventosolar.AsperturbaçõesparticularmenteviolentasdasuperfíciedoSol,comoaserupçõessolares,produzemumachuvadessaspartículascomumaenergiasuperioràhabitual.Quantomaioraenergia,maioravelocidade,equandoasvelocidades se aproximam da velocidade da luz, dizemos que são partículas da radiação cósmica.Ocasionalmente,oSolemitepartículasquepertencemaestacategoria.

As estrelas mais quentes e de comportamento mais violento do que o nosso Sol produzemradiaçãocósmicacommaiorabundância,easexplosõesdesupernovasconstituemfontesparticularmenteimportantesdessetipoderadiação.Umavezlançadasnoespaço,aspartículasconstituintesdaradiaçãocósmicapodemseraceleradaspeloscamposmagnéticosdasestrelasqueencontrampelocaminho,bemcomopelocampomagnéticodaprópriaGaláxia,adquirindodessemodomaisenergia.

Por isso,a radiaçãocósmicaémaisenergéticadoqueas radiaçõesqueseobtêmdemateriaisradioactivos,econstituiuumnovoemaispoderosoinstrumentoàdisposiçãodosfísicosnucleares,umavezque as suas partículas podemprovocar reacções nucleares que as radiações radioactivas não têmenergiasuficienteparainiciar.

Mas,emcontrapartida,aspartículasdaradiaçãocósmicanãosãotãofáceisdeutilizarcomoosmateriaisradioactivos,quepodemserconcentradoseusadosnoslaboratórios.Asradiaçõesradioactivaspodem ser obtidas sempre que necessário e orientadas cuidadosamente para alvos específicos. Aspartículasdaradiaçãocósmica,pelocontrário,chegamaténósdummodoquenãopodemoscontrolaresóseobtêmdeformamaisconcentradasubindoaumamontanhaouusandoumbalão.

O físico norte-americano Carl David Anderson (1905-1991), que estudara com Millikan,interessou-sepela radiação cósmica.Decidiuusarumacâmaradenevoeiro, na esperançadequeumaanálisedacurvaturadaslinhasdegotículasproduzidaspermitisseconcluiralgoacercadasuanatureza.No entanto, a radiação cósmica era tão energética que atravessava a câmara de nevoeiro demasiadodepressaparaquepudesse sofrerumaalteração significativada sua trajectória em resposta aocampomagnético.Andersonconcebeuporissoumacâmaradenevoeirocomumabarreiradechumbonocentro.Aradiaçãocósmicaqueatingisseochumboteriaenergiasuficienteparaoatravessarmas,noprocesso,

perderia energia suficiente para que, daí para a frente, a sua trajectória fosse deflectida de modoapreciávelpelocampomagnético.

Em1932,Andersonreparouquedabarreiradechumbosurgiaumatrajectóriacurvaquepareciatersidoprovocadaporumelectrãoemmovimento.Noentanto,atrajectóriacurvavanadirecçãoerrada!Andersonconcluiuqueestavaaobservaratrajectóriadumapartículasemelhanteaoelectrão,mascomcargapositiva.Tratava-sedoantielectrãocujaexistênciaforapostuladadoisanosantesporDirac.EstestrabalhosvaleramaAndersonumPrémioNobelem1936,quepartilhoucomHess.

A partícula encontrada por Anderson foi designada electrão positivo, ou positrão. Em minhaopinião, trata-se duma expressão que foi construída de forma errada, para além de ser uma escolhainfeliz.Aterminaçãocomumparaaspartículassubatômicasé-ão.Temosassim,porexemplo,oelectrão,neutrão, protão, fotão e gravitão. O r em electrão e neutrão pertence à raiz da palavra, tal como emelectricidadeeneutral.Poressemotivo,aatribuirumnomesubatômicoaoelectrãopositivo,devíamoschamar-lhepositão,semor,umavezqueapalavrapositivonãocontémnenhumr.Alémdisso,querodesignemospositãooupositrão,onomenãotornaclaraasuarelaçãocomoelectrão.Apartículadeviaserchamadaantielectrão,umavezqueparatodasasoutrasantipartícu-las,oprefixoanti-éacrescentado,semexcepção,aonomedapartículadequeconstituemooposto.Noentanto,onomepositrãovulgarizou-sedetalmaneiraquejánãoexisteesperançadeviraseralterado.

(Acontece com frequência atribuir-se inicialmente um nome pouco adequado a um objecto oufenómeno,por ignorânciaouemresultadodumadecisão infeliz.Porvezes,o tempoencarrega-sedeocorrigir.Mas,muitasvezes,essadesignaçãoimprópriaétãousadaporumnúmerotãograndedepessoasquesetornainconvenienteoumesmoimpossívelalterá-la.)

Aradiaçãocósmicapassa tãodepressaporumacâmaradenevoeiroquea trajectóriadassuaspartículasnãoéalteradasignificativamenteporumcampomagnético.CarlDavidAndersoncolocouumabarreiradechumbonointeriordacâmara,desacelerandoaspartículasosuficienteparapermitiroseuestudo.

Opositrão comporta-se exactamente comoprevisto na teoria deDirac.Sofre rapidamenteumaaniquilaçãomútuaquando encontra umdos numerosos electrões que existemna suavizinhança, dandoorigema radiaçãogamadeenergiaexactamente igualàdamassacombinadadoelectrãoeprotão.Embrevesedescobriutambémquequandopartículasalfaatingiamochumbo,algumadasuaenergiapodiaserconvertidanumparelectrão-positrão,queemergiadochumbosobaformadeduastrajectóriasqueeramdeflectidasemdirecçõesopostas.Oquenoslevadevoltaàquestãoanteriormentecolocada.Oqueéqueacontecequandotemosumisótoporadioactivoquecontémumnúmeroinsuficientedeneutrõesparaserestável?

Amaneiramaisfácildeproduzirumneutrãoadicionalnointeriordumnúcleoéconverterumdosseusprotõesnumneutrão.Desseprocesso resultaumnúcleocommaisumneutrãoe comumprotãoamenos,oquepoderásersuficienteparagarantirasuaestabilidade.

Ofósforo-30,porexemplo,tem15protõese15neutrõesnoseunúcleo.Oúnicoisótopoestávelde fósforo é o fósforo-31, com 15 protões e 16 neutrões. Por outras palavras, o fósforo-30 tem umnúmeroinsuficientedeneutrõesparaserestável.Suponhamos,noentanto,queumdosprotõesdofósforo-30eraconvertidonumneutrão.Acargapositivadoprotãonãopodeserdestruída(deacordocomaleideconservaçãodacargaeléctrica),peloquetemdeaparecersoboutraforma.Eseonúcleoemitirumpositrão, uma espécie de partícula beta positiva? Tal resolveria o problema da carga positiva. Se ofósforo-30emitirumpositrão,emvezdeter15protõese15neutrõesnoseunúcleo,ficacom14protõese16neutrões,oquecorrespondeaoisótopoestávelsilício-30.

Comefeito,quandoem1934osJoliot-Curiedescobriramaradioactividadeartificialsobaformadefósforo-30,estavamigualmenteaproduzirumnovotipoderadiaçãoquemaisnãoeradoqueumfeixedepositrões.Aíestavaumaformadeproduzirpositrõessemnecessidadedebombardearmaterialcomradiaçãocósmicaoupartículasalfa.Elestinhamcriadoumnúcleodeficienteemneutrõesedeixadoquesofressedecaimentoradioactivo.

A emissão dum positrão por um núcleo produz resultados que são o oposto daqueles quedecorremdaemissãodumelectrão.Enquantoqueaemissãodumelectrãofazcomqueonúmeroatómicoaumenteumaunidade,namedidaemqueseformaumprotãoadicionalapartirdumneutrão,aemissãodumpositrãofazonúmeroatómicodiminuirumaunidade,vistoqueseperdeumprotãoqueéconvertidonumneutrão.

Existe nisto algo que poderá parecer paradoxal. Uma vez que o neutrão tem uma massaligeiramentesuperioràdoprotão,eusublinheiatrásqueoneutrãodecaiespontaneamenteparaoriginarumprotão,masqueoprotãonãodecai"paracima"parasetransformarnumneutrão.

Isto, todavia, só é verdadeiro se estivermos a falar de partículas livres.Numnúcleo, onde osprotões e neutrões existem intimamente associados, aquilo que conta é a massa do núcleo na suatotalidade.Numnúcleodeficienteemneutrões,amassa totaldonúcleopodediminuirseumprotãosetransformar num neutrão, uma vez que isso faz aumentar a fracção de síntese. Por conseguinte, atransformaçãoatrásreferidapodeocorrer.

É isso que faz com que determinados isótopos sejam instáveis. Se a massa total dum núcleodiminuir em resultado da transformação dum protão num neutrão, ou dum neutrão num protão, atransformaçãoadequada terá lugar.Seum isótopo tiverumamassaqueaumentaquandoumneutrão setransforma num protão ou vice-versa, nenhuma das transformações ocorrerá e o isótopo permaneceráestável.

Quando existem 43 ou 61 protões num núcleo, e independentemente do número de neutrõespresentes,umatransformaçãoneutrão-pro-tão,numsentidoounooutro,provocasempreumareduçãodamassatotal.Eessaarazãoporquenãoexistemisótoposestáveisdetecnécio(43)oupromécio(61).

Outra forma de, num núcleo, um protão se transformar num neutrão, consiste na captura pelonúcleodumelectrão,neutralizandoassimacargaeléctricadumdos seusprotõeseconvertendo-onumneutrão. O electrão capturado pertence quase sempre à camada K, que é a camada electrónica maispróximadonúcleo.OprocessoéporissoconhecidocomocapturaK,efoiobservadopelaprimeiravezem1938pelofísiconorte-americanoLuisWalterAlvarez(1911-1988).Noentanto,aprobabilidadedeocorrerumprocessodestetipoémuitomenordoqueadeemissãodumpositrão.

Não existe qualquermotivo teórico para que o processo inverso da conversão de protão-em-neutrão não seja possível. Para converter um neutrão num protão, um núcleo, em vez de emitir umelectrão, teriadecapturarumpositrãonasuavizinhança.Aconteceque,namatériaqueencontramosànossavolta,nãoexistem,abemdizer,positrões,peloqueaprobabilidadedecapturadumatalpartículaénula.

AceleradoresdePartículasUmavezproduzidoeidentificadooantielectrão,oupositrão,oscientistaspassaramaacreditar

na existência também dum antiprotão. No entanto, a crença não basta. Era necessário observar essaantipartícula.

Acontece,porém,queosantiprotõesnãoexistemànossavoltacommaiorabundânciadosqueosantielectrões. Eles formam-se certamente na sequência duma qualquer reacção nuclear, o que deveriapermitirobservá-los.Masissoémaisfácildedizerdoquefazer.Umprotãotemumamassa1836vezessuperior à do electrão. Assim sendo, um antiprotão deve ter umamassa 1836 vezes maior que a doantielectrão.

Oscientistaseramcapazesdeformarpareselectrão-antielectrãofazendocolidirpartículasalfacom placas de chumbo. Contudo, para formar um par protão-antiprotão era necessário encontrarprojécteis com uma energia 1836 vezes superior à daquelas partículas. Infelizmente, não existempartículasalfacomtalenergia.

Naradiaçãocósmicahácertamentepartículascomenergiasuficiente,massãoemnúmeromuitoinferior aodas que têmenergia bastante para produzir positrões.Seria necessário esperar longamenteparaqueumadessasraraspartículasformasseumantiprotãonumlocalondeestepudesseserdetectado.

NofinaldasegundadécadadoséculoXX,todavia,osfísicoscomeçaramadedicar-seàtarefadecriar os seus próprios projécteis altamente energéticos. Para tal, é necessário dispor à partida departículasrazoavelmentemaciças,umavezqueaenergiadumapartículaemmovimentoaumentacomarespectivamassa.Oquesignificaalgopelomenostãomaciçocomoumprotão.Estapartículaconstituiuma escolha natural, uma vez que basta remover o electrão aos átomos de hidrogénio - um processorelativamente simples - para obter uma fonte de protões.As partículas alfa teriam evidentemente umamassa superior,mas estas formam-se a partir de átomos de hélio, uma substânciamais rara do que ohidrogénioeaqueémuitomaisdifícildearrancaraosrespectivoselectrões.

Obtidaumafontedeprotões,háquepassá-losporumcampomagnéticoparaosacelerar.Quantomais forte o campo magnético, maior a aceleração dos protões. Se lançarmos depois os protõesaceleradoscontraumnúcleoatómico,épossívelqueocorraumareacçãonuclear.Quandooscientistascomeçaramaconceberdispositivoscapazesdeproduzirumatalsequênciadeacontecimentos,osjornaisfalaramem"destruidoresdeátomos".Noentanto,adesignaçãotemumacargaexcessivamentedramática,sendomaiscorrectoutilizaraexpressãoaceleradoresdepartículas,queémaissóbriaefactual.

Oprimeiroaceleradordepartículas foiconcebidoem1929pelo físicobritânicoJohnDouglasCockcroft (1897-1967) epelo seu colaborador, o físico irlandêsErnestThomasSintonWalton (1903-1995).Usando protões energéticos, bombardearam núcleos de lítio-7 (3 protões e 4 neutrões).Nesseprocesso,umprotãocolidecomumnúcleoeaípermanece,formandoberílio-8(4protõese4neutrões).O berílio-8, todavia, é extremamente instável e ao fim de cerca dum milésimo de milionésimo dumbilionésimodesegundocinde-se,originandodoisnúcleosdehélio-4(2protõese2neutrões).Estafoiaprimeirareacçãonuclearproduzidanumaceleradordepartículase,peloseutrabalho,CockrofteWaltonforamgalardoadosem1931comumPrémioNobel.

Nos anos que se seguiram a esta primeira façanha foram desenvolvidos outros tipos deaceleradores de partículas. Aquele que produziu os resultados mais interessantes foi o dispositivo

concebidoem1930pelo físiconorte-americanoErnestOrlandoLawrence (1901-1958),queencontrouumasoluçãoparaoproblemadoscamposmagnéticoshabitualmenteutilizados,osquaisprovocavamaaceleraçãodosprotõesemlinharecta,fazendocomqueestesrapidamenteultrapassassemoslimitesdocampo e deixassem de ser acelerados. Para que a acção do campo prosseguisse, seria necessárioprolongá-loagrandesdistâncias.

Lawrenceconcebeuummododeinverterocampomagnético,forçandooprotãoadescreverumatrajectória curva num sentido e depois outra em sentido contrário, completando assim um "ciclo" emantendo--se sempre no interior do campo magnético. Repetindo este processo outra e outra vez, apartículadeslocava-seemcírculosquese iamlentamentealargando.Emboraaspartículas tivessemdecobrir distâncias cadavezmaiores, deslocavam-se suficientementemaisdepressapara completaremocircuitonomesmointervalodetempo,mantendo-seemfasecomocampoàmedidaqueestemudavadesentido.As partículas permaneciam no interior do campo durante um período de tempo considerável,emboraodispositivonãofosseemsimesmomuitogrande.Destemodo,umequipamentorelativamentepequeno podia produzir partículas com energias inesperadamente elevadas. Lawrence chamou aoaparelhociclo-trãoepeloseutrabalhorecebeuem1939umPrémioNobel.

Rapidamente se construíram ciclotrões maiores e mais poderosos. Foram usadas novasconfiguraçõesemqueocampomagnéticosetornavamaisforteàmedidaqueaspartículasaceleravam.Issopermitiaqueelassemovessememcírculosapertadossemsaíremdocampoenquantooscientistaspretendessem. Estes sincrotrões de protões produzem partículas ainda com maior energia. Tornou-sepossívelobterdoisconjuntosdepartículasdeslocando-seemcírculosemsentidosopostosquepodem,emdeterminadomomento,colidirfrontalmente.Umdispositivodestetipopermiteduplicaraenergiaqueépossívelobtercomumúnicofeixedepartículascolidindocomumobjectoestacionário.

Em1987,osEstadosUnidoscomeçaramaencararapossibilidadededispenderemcercadeseismilhares de milhões de dólares na construção dum dispositivo supercondutor para colisões entrepartículas-umaceleradoremqueaspartículaspercorreriamcercade84quilómetros,produzindodezvezesmaisenergiadoqueaquelaquepodeserobtidaemqualqueraceleradorexistente.(Maisàfrentetereiocasiãodereferiraquiloqueseesperadestedispositivoinimaginavelmentepoderoso.Eclaroquenaradiaçãocósmicasurgemmuitoocasionalmentepartículascomumaenergiaváriosmilhõesdevezessuperioràenergiaquemesmoesteaceleradorserácapazdeproduzir.Noentanto,ficaràesperaquetaispartículasapareçamserásempreumatarefamuitodemoradaepoucogratificante.)

Jánosanos50tinhamsidoconstruídosaceleradoresdepartículascapazesdeproduzirpartículascom energia suficiente para formarem pares protão-antiprotão. É claro que colidindo com um alvoadequado, essas partículas altamente energéticas provocavam todo o tipo de reacções nucleares eoriginavamaformaçãodetodootipodepartículas.Esseconjuntoenormeediversificadodepartículasera levado a passar através dum campomagnético. As trajectórias de todas as partículas com cargapositivadesviavam-senumadirecção,asdaspartículascomcarganegativanaoutra.Supunha-sequeaspartículas de carga negativa com maior massa eram os antiprotões e que as suas trajectórias eramportanto aquelas que sofriam uma menor deflexão. A uma distância considerável do alvo, todas aspartículas eramdeflectidaspara forado campo,noqual permaneciamapenasos antiprotões (supondoquesetinhamformadoalguns).

Em1955,Segrè,quedescobriraotecnécioeeraagoracidadãoamericano,localizoudestemodoantiprotões,emcolaboraçãocomo físiconorte-americanoOwenChamberlain (n.1920).Este trabalhovaleu-lhesumPrémioNobelem1959.

BariõesOsantielectrões(positrões),umavezformados,desaparecemquaseimediatamenteatravésduma

aniquilação mútua com o primeiro electrão que encontram. Apesar disso, faz sentido considerá-lospartículas estáveis. É que, tanto quanto sabemos, um antielectrão que não seja sujeito a influênciasexternaspermaneceindefinidamenteumantielectrão,nuncasetransformando,poriniciativaprópria,emalgodediferente.

A razão deste comportamento reside no facto de qualquer transformação espontânea dumapartículasubatômicaenvolverumaperdademassaeaconversãodestaemenergia.Contudo,oelectrãopermanece,quaseumséculoapóstersidodescoberto,oobjectomenosmaciçoqueconhecemoscapazdetransportar uma carga eléctrica negativa, enquanto que o antielectrão é o objecto menos maciço queconhecemoscapazdetransportarumacargaeléctricapositiva.Osúnicosobjectosmenosmaciçosdoqueumelectrãoouantielectrãosãopartículasque,tantoquantosabemosactualmente,nãopossuemqualquermassa-enenhumadelastransportaumacargaeléctrica.Porisso,aleideconservaçãodacargaeléctricaimpede que electrões ou antielectrões sofram quaisquer transformações espontâneas, embora possamaniquilar-semutuamenteatravésdocancelamentodasrespectivascargas.

Mas por que razão é o protão estável? Enquanto o antielectrão não era conhecido, podia-seargumentarqueoprotãoeraapartículamenosmaciçaconhecidacapazdetransportarumacargaeléctricapositiva. Tinha, por isso, de ser estável pela lei de conservação da carga eléctrica. No entanto, talargumento deixou de ser válido a partir de 1932. Por quemotivo é que um protão não podia decairoriginandoumantielectrão?Acargaeléctricapositivacontinuariaaexistirepraticamentetodaamassado protão seria convertida em energia. E, pelamesma ordem de razões, por quemotivo não podia oantiprotãodarorigemaumelectrãopordecaimento?Arespostaésimplesmente"porquenão"(eaindabemqueassimé,ouoUniversocomasuaestruturaactualnãopoderiaexistir,enóstambémnão).

Tendo em conta que estas partículas não sofrem esse tipo de decaimento, e também os dadosrelativosatodasasreacçõesnuclearesestudadasaolongodedécadas,desdequeforamidentificadasasprimeiras partículas subatômicas, parece razoável concluir que aquilo que tornaos protões estáveis éuma lei de conservação. Se não se trata de conservação da carga eléctrica, então tem de ser aconservaçãodequalqueroutracoisa.

Oselectrõesepositrõessãoexemplosdeleptões(dumapalavragregaquesignifica"pequeno")poispossuemmassaspequenas.Osprotões,neutrõeseantiprotõessãobariões(dumapalavragregaquesignifica"pesado").Todostêmmassasmuitosuperioresàsdosleptões.Aleideconservaçãoquetornaos protões estáveis é a lei de conservação do número bariónico, e funciona do seguintemodo.A umprotãoeaumneutrãoéatribuídoonúmerobariónico+1,eaumantiprotãoonúmerobariónicode-1.Umavezqueoelectrãoeoantielectrãonãosãobariões,atribui-seacadaumadestaspartículasonúmerobariónico0.Umprotão eumantiprotão, considerados emconjunto, têmumnúmerobariónico total dé(+1) + (-1) = 0. Assim, podem sofrer aniquilação mútua, de que resulta a ausência dum protão ouantiprotão, situação a que corresponde o número bariónico 0, valor que é idêntico ao que existia àpartida.A lei de conservação do número bariónico não é violada.Demodo análogo, uma quantidadeconsideráveldeenergiapodedarorigemaumparpro-tão-antiprotão-tambémaquionúmerobariónicoé0antesedepoisdoacontecimento,ouseja,nãoexisteviolaçãodestaleideconservação.(Emambososcasos,nãoexisteigualmenteviolaçãodaleideconservaçãodacargaeléctrica.Aobservânciadumalei

de conservação não significa que as outras não devam ser igualmente respeitadas. Todas as leis deconservação têmde ser respeitadas, sempreque foremaplicáveis.Veremos casos, no entanto, emqueumaleideconservaçãopodenãoseraplicável.)

Um neutrão (número bariónico +1) pode desintegrar-se e dar origem a um protão de massaligeiramenteinferior(númerobariónico+1)eaumelectrão(númerobariónico0),semquehajaviolaçãodaleideconservaçãodestenúmerooudacargaeléctrica.

Todavia, umprotão (númerobariónico+1)por si sónãopodedesintegrar-separaoriginarumpositrão(númerobariónico0)semquehajaviolaçãodaleideconservaçãodonúmerobariónico.Umatal transformação não parece, por isso, ser possível. A lei de conservação da carga eléctrica não éviolada,masissonãobasta.Domesmomodo,umantiprotão(númerobariónico-1)nãosedesintegranumelectrão(númerobariónico0).

Podemosevidentementeinterrogar-nossobreoporquêdaexistênciadumatalleideconservação.Demomento,oscientistassãoincapazesderesponderaessaquestão.Tudoquantosabemdizeréqueaobservação das reacções nucleares mostra que uma tal lei de conservação existe. (Em anos maisrecentes,contudo,têmsidolevantadasalgumasdúvidassobreseestaleideconservaçãotemumcarácterabsolutooupode,emdeterminadascircunstâncias,serviolada.)

O protão é estável porque é o barião com a mais pequena massa possível, incapaz de sedesintegrar sem perder a sua natureza bariónica. O antiprotão é estável porque é o antibarião com amenormassa possível. É claro que sempre que temos uma lei de conservação, é necessário estarmosatentosaaparentesviolaçõesdamesmaquepossamrevelarumfactonovoousugerirumamodificaçãonecessáriadaleiparaquefiquemoscomumaimagemdoUniversomaisadequada(istoé,"maisjusta"e"maisbela").

Em1956, por exemplo, foi detectadaumapossível violaçãoda lei de conservaçãodonúmerobariónicoquandoumgrupode físicosdescobriuque semprequeumprotãoeumantiprotãopassavampróximosumdooutro semcolidirem,havia apossibilidadedas suas cargas eléctricas se cancelarem,deixandonoentantoorestodaspartículasaparentementenamesma.

Sem as respectivas cargas eléctricas, tanto o protão como o antiprotão se tornam partículasneutras.Assimsendo,élegítimosuporqueambasforamconvertidasemneutrões.Mastalnãoépossível.Oprotãoeoantiprotãoemconjuntopossuemnúmerobariónico0, enquantoquedoisneutrões têmumnúmerobariónicototalde+2.Comoéqueissopodeser?

A resposta está emsuporquequandoas cargas eléctricas se cancelam,oprotão se transformanum neutrão (número bariónico +1), enquanto que o antiprotão se transforma um antineutrão (númerobariónico -1). O par protão-antiprotão (número bariónico 0) converte-se portanto num par neutrão-antineutrão(númerobariónico0),oquegaranteanãoviolaçãodaleidaconservaçãodestenúmero.

Mas como é que pode existir um antineutrão?O antielectrão tem uma carga eléctrica de sinalcontrárioàdoelectrão,eoantiprotãotemumacargaeléctricadesinalcontrárioàdoprotão.Todavia,nemoneutrão,nemoantineutrão,possuemcargaeléctrica.Oqueéque,então,permitedistinguirumapartículadaoutra?

Emboranenhumadelas, em termosglobais,possuacargaeléctrica, ambas têmpequenascargaslocalizadas, aqui e ali, que se cancelam na totalidade da partícula (como veremos adiante). Tanto oneutrãocomooantineutrãoestãoanimadosdummovimentoderotaçãoeoefeitodestasobreaspequenascargas eléctricas localizadas é o de criar um pequeno campo magnético. No neutrão, o pólo nortemagnético aponta numa determinada direcção e num antineutrão com uma rotação idêntica aponta na

direcção oposta. E a direcção dos camposmagnéticos que é oposta, não a sua rotação, e é isso quedistingueoneutrãodoantineutrão.

Osprotões,neutrõeseelectrõessãoosconstituintesdosátomos,dosplanetas,dasestrelas-detodaamatériaqueconhecemos.Seosantiprotões,antineutrõeseantielectrõesexistissememquantidadeapreciávelnumadeterminadaregião,desempenhariamaíindubitavelmentetodasasfunçõesdosprotões,neutrões e electrões. Estas antipartículas poderiam formar antiátomos, antiplaneta, antiestrelas e, dummodogeral,antimatéria.

Istonãoéumaespeculaçãopuramenteteórica.Existemalgumasobservações(semdúvidamuitosimples) que suportam tal ideia. Em 1965, um antiprotão e um antineutrão foram combinados paraproduzirem um núcleo de anti-hidrogénio-2. Posteriormente, dois antiprotões e um antineutrão foramcombinados dando origem a um núcleo de anti-hélio-3. (Na verdade, tratou-se apenas, em ambos oscasos,deformarantinúcleos.)

Seconsiderarmosasdiversasleisdeconservação,concluiremosque,sejaqualforomodocomoamatériadoUniverso foi criada,umaquantidade idênticadeantimatéria tevede se formarnamesmaaltura.Seassimé,ondeestáela?

Temos a certeza de que a Terra é constituída unicamente por matéria. Na verdade, podemosafirmarcomsegurançaqueonossosistemasolar,emesmoanossagaláxia,sãoformadosexclusivamentepormatéria.Aantimatéria,aexistir,estápresenteapenasemquantidades insignificantes.Seassimnãofosse,haveriaocasionalmente interacçãoentreamatériaeaantimatéria, comaproduçãoconstantederadiação gama. No entanto, não detectamos radiação gama proveniente do espaço exterior com aintensidadequeseriadeesperarseagaláxiacontivessequantidadesapreciáveisdeantimatéria.

Alguns cientistas pensam que a matéria e antimatéria "originais" se separaram após a suaformação. O que significaria que, actualmente, existem ainda enxames de galáxias constituídas pormatériaeenxamesdegaláxiasconstituídaspotantimatéria.Unseoutrosmanter-se-iamseparados,nãodandoportantoazoàproduçãodeníveissignificativosderadiaçãogama.Noentanto,estepontodevistaparece pouco plausível, uma vez que, a ser assim, deveriam existir quantidades significativas deantiprotõese,dummodogeral,deantinúcleos,naradiaçãocósmica,algumadaqualsabemosterorigemnoutrasgaláxias-oquenãoacontece.

Podeatédar-seocasodeseteremoriginalmenteformadodoisUniversos,umdematériaeoutrodeantimatéria(um"antiuniverso"),entreosquaisacomunicaçãonãoépossível.Semdúvidaque,emtaiscircunstâncias, os habitantes dotados de inteligência do antiuniverso, a existirem, considerariamo seupróprioUniversocomosendoconstituídopormatériaeonossoporantimatéria.Eteriamtantodireitoaafirmá-locomonósdeafirmarocontrário.

Emanosrecentes,porém,surgiramnovasperspectivassobreestaquestão,comoiremosver.Oscientistas estão dispostos a considerar a possibilidade de matéria e antimatéria não se teremoriginalmenteformadoemquantidadesiguais.

9.NEUTRINOS

SalvarasLeisdeConservaçãoTodas as leis de conservação são importantes na compreensão das reacções nucleares e do

comportamentodaspartículas subatômicas.Qualquer eventoquedesafieuma leideconservaçãoéumeventoquenãodeveacontecer,oquenosdeixaapenasumnúmerolimitadodepossibilidades.Poroutraspalavras, as leis de conservação evitam a anarquia total e indicam aos cientistas aquilo que devemprocurar.

Um fenómeno que pareça violar uma lei de conservação é, por conseguinte, algo de muitoperturbador. Isso é especialmenteverdadeiro se a lei emquestão for considerada amaisbásica,maisimportantee,porconseguinte,maisinviolável.Estamosafalardaleideconservaçãodaenergiaque,nosanos20,pareciatersidopostaemcausa.

Aspartículassubatômicascomportam-se,emgeral,deacordocomestalei.Seumelectrãoeumpositrãoseaniquilaremmutuamente,aenergiaproduzida,sobaformaderadiaçãogama,éexactamenteigualàenergiaqueestavapresentenamassadessasduaspartículasmaisarespectivaenergiacinéticanomomentodacolisão.Omesmosepassaquandoumprotãoeumantiprotãoseaniquilammutuamente.

Quandoumnúcleosofreumadesintegraçãoradioactivaeemiteumapartículaalfa,onovonúcleoeapartículaalfapossuemumamassatotalligeiramenteinferioràdonúcleooriginal.(Essaé,deresto,arazãoporqueonúcleooriginal sedesintegraespontaneamente.)Odecréscimonamassaaparece sobaformadeenergiacinéticadapartículaalfaemitida.

Isto significa que todos os núcleos dum determinado isótopo que se desintegram através daemissãodepartículasalfaproduzempartículasquesedeslocamàmesmavelocidadeesão igualmenteenergéticas e penetrantes.Asmedições feitas pelos cientistas revelam que há sempre conservação daenergianaproduçãodestaspartículas.

Porvezes,umnúcleoquesofreumatransformaçãoradioactivaproduzdoisoumaisconjuntosdepartículasalfaquesedeslocamavelocidadesdiferentesepossuemenergiasdistintas.Talimplicaque,nessascircunstâncias,onúcleopossaexistiremdoisoumaisníveisdeenergia.Onúcleonosníveismaiselevados produzirá partículas alfa que se deslocam a velocidades superiores às das que são emitidaspelosnúcleosnonívelmaisbaixo.

Asituaçãoéconsideravelmentediferentequandose tratadepartículasbeta.Quandoumnúcleoemiteumapartículabeta (ou seja, umelectrão), onovonúcleo e apartículabetapossuemumamassaligeiramente inferior à do núcleo original. A diferença nas massas deveria ser atribuível à energiacinéticadapartículabeta.

Porvezes,apartículabetadesloca-se tãorapidamentequepossuiaenergiacinéticanecessáriaparacompensaràjustaaperdademassa.Umapartículabetanuncasedeslocamaisrapidamentedoqueisso, ou seja, nunca produz energia cinética superior àmassa perdida. Se assim fosse, estaria a criarenergiadonada,oqueconstituiriaumaviolaçãodaleideconservaçãodaenergia.

Contudo,aspartículasbetadeslocam-segeralmentemuitomaisdevagar,possuindomenosenergiacinética do que a necessária para compensar a perda demassa. Isto constitui uma violação da lei deconservaçãodaenergia,vistoqueumapequenadiferençaétãogravecomoumagrande.Quandonúcleosdomesmotiposedesintegramemitindopartículasbeta,estasapresentamvaloresdevelocidadeeenergia

cinética diferentes que se situam dentro dum intervalo de valores. Emmédia, a energia cinética daspartículas beta representa apenas cerca dum terço do valor correspondente à perda de massa. Aoscientistasqueprimeiroestudaramofenómenopareceu-lhesqueaenergia,puraesimplesmente,nãoseconservava.

Durantevinteanos,essagamadevaloresdevelocidadenocasodaradiaçãobetafoiobservadaeestudada, mas permaneceu um completo quebra-cabeças. Ela incomodava tanto Niels Bohr que estechegou a sugerir o abandono da lei de conservação da energia, pelomenos no que dizia respeito àspartículasbeta.Noentanto,poucoseramosfísicosdispostosafazê-lo.(Umaregrageralqueseaplicaatodasassituaçõesexceptoumaquenãodeveserabandonadaatéteremsidofeitostodososesforçosparaexplicaraexcepção.)

Em1930,Paulipropôsumateoriaparaexplicaroproblemadaconservaçãodaenergianocasodasemissõesbeta.Estefísicosugeriuque,quandoumnúcleoemitiaumapartículabeta,emitiatambémumasegundapartículaquetransportavatodaaenergiaquenãoestavanoelectrão.Aenergiacinéticadeambas as partículas, quando consideradas em conjunto, compensava exactamente a perda de massaresultante da produção da partícula beta. Só havia um problema com a hipótese de Pauli: se eraproduzida uma segunda partícula, por quemotivo nunca era detectada?A resposta era que o electrãotransportava todaacarganecessárianaconversãodumneutrãonumprotão.Asegundapartícula tinha,portanto,deserelectricamenteneutra,easpartículasdeste tiposãomuitomaisdifíceisdedetectardoqueaspartículascarregadas.

Oneutrão jáhaviasidodetectado:eraumapartículaneutra,maciça,capazdearrancarprotõesdosnúcleos.Tinhamsidoestaspropriedadesquehaviamajudadooscientistasaidentificá-la.NocasodanovapartículapropostaporPauliparaasemissõesbeta,apequenaquantidadedeenergiatransportadaservia à justa para explicar a sua velocidade, pelo que a respectiva massa teria de ser mínima. Naverdade,algumaspartículasbetasãoemitidasaumavelocidadequechegaapenasparajustificartodaaenergiaperdidaparaonúcleo,peloqueapartículaporelepostuladanãopodiatermassaalguma.

Uma partícula sem carga eléctrica nem massa pode parecer difícil de detectar, mas existe oexemplodofotão,quenãotemcargaeléctricanemmassaeémuitofácildeencontrar.Noentanto,ofotãoéumaespéciedepacotedeondasdecontornospoucodefinidosque interage facilmentecomqualquerporçãodematériaqueencontrepelocaminho.Eseapartículacompanheiradapartículabetafosseumapartículaínfimaquenãointeragiacomamatéria?

Em1934,Fermiresolveudedicar-seaoestudodessapartícula,aquedeuonomedeneutrino(daexpressão italiana para "pequeno neutrão"). Começou por determinar, teoricamente, as suaspropriedades. Fermi estava convencido de que a partícula era de facto uma entidade semmassa, semcargaeléctricaepraticamentesemtendênciaparainteragircomamatéria.Erauma"partícula-nada",ou,comopor vezes então se dizia, uma partícula-fantasma.Dadas as suas características, a existência ouinexistência do neutrino parecia ir dar no mesmo. Só que a partícula servia para preservar a lei deconservaçãodaenergia-umpontodevistaquenãoeraparticularmentealiciante.Podia-seargumentar(ehouvequemofizesse)queoneutrinoforainventadoapenasparasalvarasaparências.Seaúnicamaneiradesalvaraleideconservaçãodaenergiaerainventarumapartícula-fantasma,entãoaleinãomereciaserresgatada.Contudo,oneutrinopermitiusalvaroutrasleisdeconservação.

Quandoumnúcleoemiteumapartículabeta,a somadasmassasdonovonúcleoedapartículabeta é ligeiramente inferior à massa do núcleo original. A diferença de massas, que não pode sertotalmenteatribuídaàenergiacinéticadapartículabeta,éexplicadacomuma"partícula-fantasma",quaseindetectável,oneutrino.

Consideremos,porexemplo,umneutrãoemrepouso.Asuavelocidadeénula;porconseguinte,oseu momento linear (que é igual ao produto da massa pela velocidade) é zero. Existe uma lei deconservação domomento linear que os cientistas compreenderam antes mesmo de terem entendido oalcancedaleideconservaçãodaenergia.Poroutraspalavras,sejaoqueforquesucedaaumneutrãoemrepouso,omomentolineartotaldaspartículasaqueelederorigemdevepermanecerigualazero-desdequenãohajainterferênciasdorestodoUniverso.

Ao fim de algum tempo, o neutrão em repouso desintegrar-se-á num protão e num electrão.Oelectrão partirá numa qualquer direcção a grande velocidade, tendo por isso um momento linearconsiderável.Oneutrão,agora transformadonumprotão,recuaránadirecçãoopostaaumavelocidademuitomenor,mas terá umamassamuito superior.Numa situação ideal, omomento linear do electrão(massapequenaxvelocidadeelevada)seráigualaodoprotão(massaapreciávelxvelocidadereduzida).Seasduaspartículaspartirememdirecçõesdiametralmenteopostas,umateráummomentolinear+xeaoutra-x.Estesdoisvalores,seadicionados,dão0.Aserassim,oprocessoobedeceàleideconservaçãodomomentolinear.

Mas issonãoéoque sucede realmente.Omomento lineardoelectrãoé, emgeral,demasiadoreduzido,eestapartículaeoprotãonãosedeslocamemdirecçõesdiametralmenteopostas.Existeumaparte do momento linear que não está contabilizada. Se, todavia, supusermos que o neutrino existe,podemosimaginarqueelesedeslocanumadirecçãotalquejustifiquenãosóaenergiacomotambémomomentolinearemfalta.

Por outro lado, sabemos que o neutrão tem um spin de +1/2 ou -1/2. Suponhamos que sedesintegraoriginandoumprotãoeumelectrão,enadamais.Oprotãopossuiumspinde+1/2ou-1/2,talcomooelectrão.Ospindoprotãoedoelectrão, consideradosemconjunto, será sempre+1,-1ou0,dependendodossinaisdosspinsdasduaspartículas.Oprotãoeoelectrão,emconjunto,nuncapodemterumspintotalde+1/2ou-1/2,comosucediacomoneutrãoquelhesdeuorigem.Oquesignificaquealeideconservaçãodomomentoangular(outraleideconservaçãoqueosfísicosconheciammuitobemequeerarigorosamenterespeitadanosfenómenosatéaíobservados)éviolada.

Se,todavia,adesintegraçãodoneutrãoproduzirumprotão,umelectrãoeumneutrino,partículasquepossuem todas elas spinsde+1/2ou -I/2, a somados respectivosvalores (+1/2, +1/2 e -1/2, porexemplo) será +1/2, que é o spindo neutrão original. Em tais circunstâncias, haverá conservação domomentoangular.

Existeumaquartaleideconservação,quefoidescobertamuitomaistardedoqueasoutras:aleideconservaçãodonúmeroleptónico.Osneutrõeseprotõespossuemnúmeroleptónico0,enquantoqueoselectrõespossuemnúmeroleptónico+1eospositrões-1.

Imaginemosentãoumneutrãocomnúmerobariónico+1enúmeroleptónico0.Sesedesintegrarnum protão (número bariónico +1, número leptónico 0) e num electrão (número bariónico 0, númeroleptónico + 1), existe conservação do número bariónico mas o mesmo não sucede com o númeroleptónico.

Agorasuponhamosquenadesintegraçãoseformaigualmenteumneutrinocomnúmeroleptónico-1.Nesse caso, oneutrão (númerobariónico+1, número leptónico0)dáorigemaumprotão (númerobariónico + 1, número leptónico 0), um electrão (número bariónico 0, número leptónico + 1), e umneutrino (númerobariónico0,número leptónico -1).Ouseja,partimosdumneutrão (númerobariónico+1, número leptónico 0) e acabamos com três partículas com um número bariónico total de +1 e umnúmeroleptónicototalde0.Nessascircunstâncias,existeconservaçãotantodonúmeroleptónicocomodonúmerobariónico.

Eclaroqueparaoneutrinopossuirumnúmeroleptónicode-1deve,pordireito,seraimagemnoespelho (antineutrino) dapartícula,mas é issomesmoque sucede.Umantineutrino respeita as leis deconservaçãodaenergia,cargaeléctrica,momentolinearemomentoangulartãorigorosamentecomoumneutrino.Oantineutrinotambémconservaonúmeroleptónico.

A ideia duma partícula indetectável concebida simplesmente para salvar uma única lei deconservaçãonãoémuitoconvincente.Anoçãodequatropartículasindetectáveis,diferentes,concebidasparapreservarquatro leisdeconservaçãodistintaséaindamenosconvincente.Contudo,a ideiadumaúnicapartícula indetectávelque,por si só,permitepreservarquatro leisdeconservação -daenergia,momentolinear,momentoangularenúmeroleptónico-éumaideiamuitoatraente.Eassim,àmedidaqueos anos iam passando, um número crescente de físicos foi admitindo a existência do neutrino eantineutrino,independentementedeteremounãosidodetectados.

ADetecçãodoAntineutrinoContudo,osfísicosnãoficaramcompletamentesatisfeitosaténeutrinoeantineutrinoteremsido

detectados. (Geralmente, e por uma questão de simplicidade, a designação neutrino inclui também oantineutrino.)

Paraserlocalizado,oneutrinoteriadeinteragircomoutrapartículaeessainteracçãoteriadeserdetectáveledistintadoutrasinteracções.

Ouseja,serianecessárioreconhecerquedeterminadainteracçãoforaprovocadaporumneutrinoepornadamais.

Issonãoconstituíaumatarefafácil,umavezqueoneutrinopraticamentenãointeragecomoquequerqueseja.Tipicamente,calcula-sequeumneutrinosejacapazdeatravessar3500anos-luzdechumbosólidoantesdeserabsorvido.

Mas estamos a falar aqui do neutrino típico. O acaso pode levar certos neutrinos,individualmente,aevitaremcolisõesdirectasdurantemuitomais tempoeadeslocarem-seadistânciasque podem ser o dobro ou ummilhão de vezes aquela que foi indicada, antes de serem absorvidos.Outros,pelocontrário,podemsofrerumacolisãoapós teremviajadoapenasmetadeouamilionésimapartedessadistânciamédia.Oquesignificaqueseestivermosalidarcomumfeixecontendobiliõesebiliõesdeneutrinoseosfizermosatravessarumacertaquantidadedematérianolaboratório,umououtropoderãocolidircomalgumapartículanessamatériaeinteragir.

Paratermosqualquerpossibilidadededetectarneutrinosprecisamos,portanto,dumafontemuitorica nosmesmos.Quando foramconcebidos os reactores nucleares, baseados na fissão de núcleos deurânio,criaram-seigualmentefontesabundantesdeneutrinos.

Osnúcleosdeurânio,sendomuitocomplexos,precisamdumnúmeromuitoelevadodeneutrõesparaapresentaremalgumaestabilidade,porpequenaqueseja:nocasodourânio-235,143neutrõespara92 protões.Quando um núcleo de urânio se desintegra em dois fragmentosmais pequenos, cada qualnecessita dum menor número de neutrões para ser estável, pelo que algumas destas partículas sãoemitidas. Com o passar do tempo, muitas delas desintegram-se, originando protões e libertandoigualmenteantineutrinos.Umreactorde fissão típicopode facilmenteemitirummilhardemilhãodummilhardemilhãodeantineutrinosporsegundo.

Tendoumafontedeantineutrinos,põe-seoproblemadesaberoqueesperardeles.Sabemosqueos neutrões se desintegram produzindo um protão e emitindo um electrão e um antineutrino. Seriapossível inverter este processo, forçando um protão a absorver ao mesmo tempo um electrão e umantineutrinoparasetransformardenovonumneutrão?

Issoseriapedirdemasiado.Aprobabilidadedumantineutrinocolidircomumprotãoéjámuitoreduzida.Esperarqueessacolisão tenha lugaraomesmo tempoqueumelectrãocolidecomomesmoprotãoéexcessivo.Tratar-se-iadumfenómenotãoraroqueseriaimpraticável.Contudo,acolisãodumelectrãocomumprotãoéequivalenteàemissãodumpositrãoporumprotão.(Écomodizerquedarem-nos um dólar é equivalente a pagarem uma nossa dívida nesse valor. Seja de quemodo for, o nossopatrimónioaumentanumdólar.)

Talsignificaqueépossívelterumacolisãoentreumantineutrinoeumprotão,quedepoisemite

um positrão, convertendo-se num neutrão. Esta transformação respeita a conservação do númerobariónico, uma vez que o protão se transforma num neutrão e ambas as partículas possuem númerobariónico+1.Existeigualmenteconservaçãodonúmeroleptónico,vistoquedesapareceumantineutrinoe surgeumpositrão, que têmambosnúmero leptónico -1.Há tambémconservaçãoda carga eléctrica,poisdesapareceumprotãoeécriadoumpositrão,amboscomumacargade+1.Asleisdeconservaçãodaenergia,momentolinearemomentoangularsãoigualmenteconservadas.

Suponhamos então que um antineutrino colide com um protão, produzindo um neutrão e umpositrão.Comoéquepodemossaberqueatransformaçãoocorreurealmente?Trata-sedumfenómenoquesóacontecemuitoraramentee,entretanto,acontecemoutrostiposdeinteracçõesqueencobremaacçãodoneutrino.Massehouverproduçãodumneutrãoeumpositrão,esteúltimoiráforçosamentecombinar-secomqualquerelectrãoqueencontrenumintervalodummilionésimodesegundo,dequeresultaráasuaaniquilaçãomútua.Nesteprocesso,formam-sedoisraiosgamadeigualintensidade,quesedeslocamemdirecçõesopostas, comumaenergia total equivalente àmassadasduaspartículas.Quanto aoneutrão,podeser rapidamenteabsorvidopelonúcleodumátomodecádmio(seexistiremátomosdesse tiponavizinhança).Nodecursode tal transformação,onúcleoadquiriráenergiasuficienteparaemitir trêsouquatrofotõescomumaenergiatotaldevalorfixo.

Nãoexistenenhumaoutrainteracçãoqueproduzaexactamenteesteresultado.Porconseguinte,selocalizarmos fotões emitidos todos no mesmo instante, nas direcções e com as energias adequadas,saberemosquedetectámosainteracçãodumneutrinocomumprotão,enenhumoutrofenómeno.

Em1953,umaequipadefísicosnorte-americanoslideradaporFre-derickReines(1918-1998)eClyde Lorrain Cowan (1919-1974) começou a estudar o problema dessa perspectiva. Utilizando umreactor de fissão, a equipa concebeu um dispositivo experimental que permitia que o maior númeropossíveldeantineutrinospenetrasseemgrandes tanquesdeáguacontendobiliõesebiliõesdeprotõesnosnúcleosdosátomosdehidrogénioeoxigéniodasmoléculasdeágua.Nestaforadissolvidocloretodecádmio, servindo o núcleo de cádmio para capturar quaisquer neutrões libertados. O dispositivoexperimentalincluíaaindadetectoresderadiaçãogama,capazesdedeterminarasdirecçõeseenergiasdos fotões. Uma vez o dispositivo assim montado, restava aos cientistas envolvidos na experiênciaesperarpelacombinaçãocertadefotões.

Éevidenteque,paradetectaremacombinaçãocerta,tinhamdesercapazesdeeliminaromaiornúmeropossíveldecombinaçõeserradas.Para isso,odispositivoexperimental foi sendoblindadodemodo cada vez mais eficiente, à medida que a experiência prosseguia. Por fim, praticamente nadaconseguia penetrá-lo excepto antineutrinos. A equipa de físicos consegui por fim eliminar suficiente"ruídodefundo"para teracertezadequeaquiloqueestavaadetectareramas interacçõesocasionaisdumantineutrinocomumprotão.Em1956,vinteeseisanosapósa formulaçãodahipóteseporPauli,ReineseCowananunciaramterdetectadoumantineutrino.

Outroscientistastentaramimediatamenterepetiraexperiênciaouversõesmodificadasdamesma.Enão restavamdúvidas.Desdequedispusessedoequipamentoadequado,qualquerumpodiadetectarantineutrinos.Estes tinhamdeixadodeserpartículas-fantasma;correspondendoexactamenteàpartículaquePauli eFermi tinhamconcluído sernecessáriaparaexplicara radiaçãobetaeadesintegraçãodoneutrão.(Estaexperiênciaconstituiumbeloexemplodovalorquetemautilizaçãodalógicaemciência.Ela mostra também quão importante é atermo--nos a uma boa teoria - como as diversas leis deconservação-enquantotalforrazoável.Éclaroquepodesempresurgirummomentoemqueumateoriaqueatéaípareciafirmecomooaçotemdeserabandonada-mesmotratando-sedumaleideconservação-ehaveremosdeencontrarcasosdesses.Ofactodaciênciasecorrigirocasionalmenteasimesma,pormaior que seja a relutância dos seus praticantes, constitui a sua coroa de glória. Nenhuma outra

actividadeintelectualhumanadispõedummecanismointernoidênticoparaofazer.)

ADetecçãodoNeutrinoTalcomooprocessodefissãoproduzgrandequantidadedeantineutrinos,porcausadonúmero

elevadodeconversõesdeneutrõesemprotõesquenelaocorrem,tambémafusãogeraumgrandenúmerodeneutrinosdevidoàsconversões igualmentemaciçasdasmesmaspartículas.Na fusãodohidrogéniopara dar hélio, por exemplo, quatro núcleos de hidrogénio, constituídos por quatro protões, sãoconvertidosnumnúcleodehélioformadopordoisprotõesedoisneutrões.Nodecursodesseprocessoformam-sedoispositrõese,comestes,doisneutrinos.

Embora já existam reactores de fissão em funcionamento que nos fornecem grande número deantineutrinos, não dispomos ainda de reactores de fusão que produzam quantidades significativas deneutrinos.A fusão não controlada duma bomba de hidrogénio produz durante algum tempo um grandenúmerodeneutrinos,masnãoseafiguramuitopráticotrabalharnasproximidadesdumatalexplosãoparaaproveitaressafonteabundantedeneutrinos.Todavia,dispomosdumaenormebombadehidrogénioemcontínua"explosão"acercade150milhõesdequilómetrosdedistância-oSol.Esteastroproduzumnúmeroincrivelmenteelevadodeneutrinosporsegundohámaisdequatromilharesdemilhõesdeanos.

NocentrodoSol,ondetêmlugarosprocessosdefusão,sãoproduzidosfotões.Estesinteragemprontamentecomamatéria,sendoabsorvidos,emitidosdenovo,reabsorvidosnovamente,eassimpordiante.Osfotõeslevamumtempoimensoadeslocar-sedocentrodoSolatéàsuasuperfície,dondesãolançadosparaoespaço,acabandoalgunsdelesporalcançaraTerra.Noentanto,sucedeutantacoisaaestesfotõesduranteasuaviagempelointeriordoSolquepouconospodemdizersobreaquiloquesepassanocentrodoastro.

Comosneutrinos,ocasomudadefigura.Estaspartículasinteragemtãopoucocomamatériaque,apósasuaformação,sedeslocamdocentrodoSolatéàsuasuperfícieempoucomaisdedoissegundos.(Visto que os neutrinos não possuem massa, deslocam-se à velocidade da luz, tal como os fotões egravitões.)Umavezalcançadaasuperfíciesolar,osneutrinosprosseguemasuaviageme,nocasodesedeslocarememdirecçãoàTerra,alcançamonossoplanetaaofimdeoitominutos.

UmavezqueosneutrinoschegamaténósdirectamentedocentrodoSol,existepelomenosumapossibilidadede,apartirdassuaspropriedades,conseguirmosobterinformaçõessobreessaregiãoque,deoutromodo,nãopoderiamserobtidas.Detectarneutrinosdeorigemsolarrepresenta,porisso,muitomaisdoqueprovarsimplesmenteasuaexistência.EumaformadeinvestigaroSol.

Sequisermosdetectarneutrinostemosdeusarumainteracçãoentrepartículasinversadaquefoiutilizadaparadetectarantineutrinos.Paradetectarantineutrinos,fazemoscomquecolidamcomprotõesafimdeproduziremneutrõesepositrões.Paraosneutrinos,temosdefazercomquecolidamcomneutrõespara darem origem a protões e electrões.Necessitamos, portanto, dum alvo rico em protões, como aágua,paraadetecçãodeantineutrinos.Paraosneutrinosprecisamosdumalvoricoemneutrõese,paraisso,temosdeusarnúcleosondetaispartículasabundem.

OfísicoitalianoBrunoM.Pontecorvo(1913-1993)propôsautilizaçãodumelementoquepossuiumnúcleoparticularmentericoemneutrões-ocloro-37,com17protõese20neutrões.Seocloro-37capturar um neutrino, um dos seus neutrões é transformado num protão, originando a emissão dumelectrão.

Masporquêutilizarestenúcleoricoemneutrõesenãooutroqualquer?Arazãoésimples:quando

onúcleodecloro-37perdeumneutrãoeganhaumprotão,transforma-seemárgon-37(18protõese19neutrões), um gás que pode ser facilmente separado do material que contém cloro-37. Por isso, adetecçãodestegásseráumindíciodacapturadumneutrinoedenenhumoutroprocesso.

Oleitorpoderápensarqueamelhorformadeobterumalvodecloro-37éusaroprópriocloro.Noentanto,esteelementoéumgáseseriamuitodifícilseparardelequantidadesmuitopequenasdoutrogás. Uma alternativa seria liquefazer o cloro (tendo em conta que o árgon continua a ser um gás àtemperaturaaqueocloroficalíquido),masissoimplicariaumprocessoderefrigeração.Assimsendo,épreferível utilizar um composto que seja líquido à temperatura ambiente e cujasmoléculas contenhammuitosátomosdecloro.

Opercloroetilenoéumcompostocomessascaracterísticas:cadamoléculaéconstituídapordoisátomosdecarbonoequatrodecloro.Trata-sedumcompostoquímicoutilizadocomummentenalimpezaa seco e que é relativamente barato. Mesmo que na transformação sejam produzidos apenas algunsátomosdeárgon-37,elespodemserremovidosdolíquidoutilizandohélioedepoisdetectados,vistoqueoárgon-37éradioactivoepodeseridentificado,mesmoemquantidadesínfimasporcausadoseumodocaracterísticodedesintegração.

Foidestaforma,utilizandoainteracçãoqueacabámosdedescrever,queofísiconorte-americanoRaymondE.Davisconseguiuprovaraexistênciadoneutrino.

Apartirde1965,Reines,umdosdescobridoresdoantineutrino,começouatrabalharnadetecçãodeneutrinosdeorigemsolar.Utilizoupara talgrandes tanquesdepercloroetilenoenterradosno fundodumamina,acercadumquilómetroemeiodasuperfície.Asrochascircundantesserviamparaabsorvertoda a radiação,mesmo as partículas da radiação cósmica,à excepçãodos neutrinos, que conseguemfacilmente atravessar aTerra. (Havia também a possibilidade de seremdetectadas algumas partículascomorigemnomaterialradioactivodasrochasnavizinhançaimediatadodispositivoexperimental.)

EestranhopensarquehávantagensemestudarmosoSolumquilómetroemeioabaixodosolo,mas foi isso mesmo que Reines decidiu fazer. Contudo, por mais que melhorasse a sua técnicaexperimentaleaumentassea sensibilidadedosseus instrumentos,nuncaconseguidetectarmaisdoquecercade1/3dosneutrinosesperados.

Porquê!1Talvezomododerealizarasobservaçõessejadesadequado;ouexistamfactosacercadosneutrinosqueaindaignoramos;ouasnossasteoriassobreosprocessosquetêmlugarnointeriordoSolestejamerradas.Nãoháaindaumarespostaparaeste"mistériodosneutrinosdesaparecidos".Masquandoelasurgir,serácertamentemuitoexcitante.

SeoSolproduzneutrinos,omesmoacontececertamentecomoutrasestrelas.Noentanto,aestrelamaispróximadenós,AlfaCentauri(umsistemaconstituídoporduasestrelassemelhantesaonossoSoleumaestrela-anãnãomuitobrilhante),estáaumadistância270000vezessuperioràquenosseparadoSol. O número de neutrinos que chegam até nós provenientes de Alfa Centauri será, na melhor dashipóteses,acinquenté-simapartedummilhardemilhãodonúmerodosquesãofornecidospeloSol.Umavez que a detecção de neutrinos emitidos pelo Sol está no limite daquilo que é experimentalmentepossível, é nula a possibilidade de detectarmos neutrinos provenientes de quaisquer outras estrelasnormais.

Contudo,nemtodasasestrelassãonormais.Devezemquando,umaestrelaexplodeoriginandouma gigantesca supernova.Nessas ocasiões, as radiações emitidas aumentam centenas demilhares demilhõesdevezes.

EmFevereirode1947, surgiuumadessas supernovasnaGrandeNuvemdeMagalhães, a uma

distânciade150000anos-luzdonossoplaneta.Adistânciaaqueseencontravaera33000superioràque nos separa de Alfa Centauri, mas a torrente de neutrinos produzida compensava largamente essadiferença.Foiasupernovaquesurgiumaispróximodenósemquase400anoseaprimeiraparaaqualdispúnhamosde"telescópiosdeneutrinos"dotipodaquelequeforaconcebidoporReines.

Um desses telescópios foi colocado sob os Alpes. Uma equipa de asttónomos italianos esoviéticos detectou um pico súbito de sete neutrinos na noite anterior àquela em que a supernova setornou visível a olho nu. Podemos pois concluir que, à medida que os astrónomos aumentam a suacapacidadeparadetectareestudarneutrinos,vãoaprendendomais,nãoapenassobreaquiloquesepassanocentrodoSolmastambémsobreosprocessosqueocorremduranteascolossaisexplosõesestelarese,talvezmesmo,sobreoutrosaspectosdaastronomia.

OutrosLeptõesFalámosatéagoradequatro leptões:electrão,positrão,neutrinoeantineutrino.Assuascargas

eléctricassão, respectivamente, -1,+1,0e0.Assuasmassassão (considerandoovalordamassadoelectrãocomosendoiguala1)1,10e0.Osseusspinssãode+1/2ou-1/2.Eestemeiospinquefazdetodas estas partículas fermiões. (Os fotões e gravitões possuemmassa 0 e carga eléctrica 0,mas têmspinsde1e2,respectivamente.Ofactodeleserumnúmerointeirofazdeambasaspartículasbosões.)

Eraestaasituaçãoemfinaisde1936,quandooneutrino,antineutrinoegravitãonãotinhamaindasidodetectadosmasasuaexistênciapareciasegura.Nessaépoca,conheciam-setambémquatrobariões:protão,neutrão,antiprotãoeantineutrão.

Sejuntarmosaestaspartículasofotãoeogravitãotemosumtotaldedezpartículas,quepareciamcapazesdeexplicar todaamatériaexistentenoUniverso,assimcomotodasas interacçõesobservadaspelos cientistas. Seria bom se as coisas tivessem ficado por aí, uma vez que um Universo com dezpartículaséumUniversorelativamentesimples.

Noentanto,em1936,Anderson,quedescobriraopositrãoquatroanosantesequecontinuavaaestudar a radiação cósmica no cimo de montanhas, identificou trajectórias de partículas com umacurvatura invulgar. As curvas eram menos acentuadas do que as dos electrões, pelo que tinham decorresponderapartículascomumamassamaior(partindodoprincípiodequeanovapartículapossuíaumacargaeléctricaidêntica).Ascurvaseram,noentanto,maismarcadasdoqueasdosprotões,peloqueas partículas tinhamde sermenosmaciças do que estes.Alémdisso, havia trajectórias deste tipo emambas as direcções que em tudo omais eram idênticas, o que indicava que nuns casos se estava napresençadepartículasenosoutrosdeantipartícuias.

Oscientistasconcluíramqueexistiampartículaseantipartículasdemassaintermédiaentreasdosleptõesebariõesconhecidos.Asmediçõesefectuadasrevelaramqueasnovaspartículaspossuíamumamassa207vezessuperioràdoelectrãoe,portanto,igualacercade1/9damassadumprotãoouneutrão.

Andersoncomeçoupordesignaranovapartículamesotrão,ondeoprefixomesoprovémdogregoe significa "meio" ou "intermédio". Repare-se, de novo, na terminação incorrecta -trão. Desta vez,felizmente, o nome não pegou e a designaçãomesão passou a ser usada genericamente para todas aspartículas de massa intermédia. A partícula de Anderson revelou-se apenas uma dum conjunto departículasdemassaintermédia,peloquehouvenecessidadedeasdistinguirumadasoutras.ApartículadeAndersonfoidesignadamesãomu,ondemuéumaletradoalfabetogregocujosoméequivalenteaonossom.Noentanto,ecomotereiocasiãodeexplicarmaisàfrente,veioadescobrir-sequeomesãomudiferiadasoutraspartículasdemassaintermédianumaspectofundamental.Eassim,ousodaexpressãomesãoacabouporserestringiràsoutraspartículas,nãoincluindoomesãomu.ApartículadeAndersonédesignadaactualmentemuão.

Omuãofoiaprimeirapartículaaserdescobertaquenãotinhaumpapelóbvionaestruturadosátomos,ouparasalvarasleisdeconservaçãooucomomediadordeinteracçõessubatômicas.Conta-seaté que o físico austro-americano Isidor Isaac Rabi (1898-1988), ao ouvir falar de muões, teráexclamado:"Masquemfoiqueosencomendou?"

Omuãopossuicargaeléctrica-1,precisamenteadoelectrão,enquantoqueoantimuãotemcargaeléctrica +1, que é a do positrão. Com efeito, o muão negativo é idêntico em todos os aspectos ao

electrão, à excepção da suamassa e duma outra propriedade, omesmo se passando com o antimuãorelativamente ao positrão. Isto é verdade no que se refere a aspectos como a carga eléctrica, spin ecampomagnético. Ummuão negativo pode até substituir um electrão num átomo, dando origem a umátomomuónicodevidamuitobreve.

Para que haja conservação do momento angular, um muão deve possuir um momento angularidênticoaodoelectrãoquesubstitui.Umavezqueomuãotemumamassamuitosuperioràdoelectrão,oquecontribuiparaaumentarorespectivomomentoangular,apartículatemdesedeslocarmaispertodonúcleodoqueoelectrãoparaqueoseuvalorsejamenor.Tambémpodemospensarnosseguintestermos:umavezqueomuão,comumamassamuitosuperioràdoelectrão,temassociada'umaondamuitomaiscurta,cabenumaórbitamuitomaispequena.

Vistoqueosátomosmuónicos são,pelomotivoatrás referido,muitomaispequenosdoqueosátomoselectrónicos,doisátomosdoprimeirotipopodemaproximar-semuitomaisdoquepodemfazê-looselectrões.Osnúcleosdosátomosmuónicostêm,assim,umatendênciamuitomaiorafundir-sedoqueosdosátomoselectrónicosvulgares.Osátomosmuónicosparecem,portanto,constituirumaviapossívelparaobternapráticaumafusão-emboraexistaumproblematremendoaquemereferireiadiante.

Ummuãonegativoéidênticoaumelectrão,exceptonasuamassaenumaoutrapropriedade.Podeatésubstituirumelectrãonumátomo,originandoumefémeroátomomuónico.

Osmuõeseantimuõespodemaniquilar-semutuamente,libertandonesseprocesso207vezesmaisenergiadoqueos electrões epositrões.Demodoanálogo, se concentrarmosnumapequena regiãodoespaço207vezesmaisenergiadoqueanecessáriaparaformarumparelectrão-posi-trão,podemoscriarumparmuão-antimuão.

Masoqueaconteceráseummuãoforproduzidosemoseuanti-muão,comosucedequandoumelectrãoseformasemopositrãocorrespondentepordesintegraçãodumneutrão?Existempartículasdecarganegativa (deque falareimaisà frente)quepossuemmassasuperioràdomuãoesedesintegramparadarorigemaeste,semquese forme tambémumantimuão.Analogamente,hápartículasdecargapositivaqueoriginamantimuõessemqueseformemmuões.

Estefactonãoconstituiumaviolaçãodaleideconservaçãodacargaeléctrica.Noentanto,etalcomosucedianocasodadesintegraçãodosneutrões,háviolaçãodasleisdeconservaçãodaenergiaedomomento linear.Alémdisso, aspartículasmaismaciçasque sedesintegramproduzindomuõesnãosão,elasmesmas,bariõesouleptões,emboraomuãosejaumleptão.Porisso,emboraadesintegraçãonãoviolea leideconservaçãodonúmerobariónico,violaa leideconservaçãodonúmero leptónico,umavezqueresultaaparentementenaformaçãodumleptãoapartirdonada.Tambémaqui,comonocasodadesintegraçãodosneutrões,aformaçãosimultâneadeneutrinoseantineutrinospermitepreservarasleisdeconservação,emboracomumacomplicaçãoadicionalaquemereferireiadiante.

Podemos pensar num muão como sendo simplesmente um electrão de grande massa e numantimuãocomosendoumpositrãomaciço.Masporquerazãohaveriamambosdeexistir,eporquerazãohão-deterumamassa207vezessuperioràmassadoelectrãooudopositrão,enãooutrovalorqualquer?

Utilizemosumaanalogia. Imagineo leitorqueumelectrãoéumaboladegolfe em repousonofundo dum vale de energia. Não existe qualquer modo dela descer mais ainda, pelo que permaneceindefinidamentenessaposição.Noentanto,selheforfornecidaenergiaadicional(comosucederiaseabola fosse batida comum taco de golfe), a bola sobe a encosta do vale.Atinge uma alturamáxima edepoisdeslizadenovoparaofundo,libertandoaenergiaqueadquiriunesseprocesso.

Quantomaior for a forçadapancada,mais altoabola subirápelaencostaantesdecomeçara

descer.Seabolaforatingidacomforçasuficiente,poderásubirosuficienteparaalcançarumpatamarnaencosta,ondepermanecerá.Abolacontinuaaserumaboladegolfe(istoé,umelectrão),masadquiriuenergiasuficienteparapermanecernumaposiçãobemacimadasuaposiçãohabitualnofundodovaleou,emtermossubatômicos,adquiriumuitomaismassadoquetinhanofundodovale.

Acontecequeessepatamar se situaaumníveldeenergiaequivalentea207vezesamassadoelectrão.Porquê?Nãoosabemos,masanossaincapacidadeparaencontrarumaexplicaçãonãoconstituiumdrama.(Aciêncianãoconseguiuexplicartudoacercadequalquerdomíniodoconhecimentoetalveznunca consiga fazê-lo. Os cientistas têm descoberto inúmeras respostas, ou respostas aparentes, paramúltiplos problemas, mas cada resposta traz consigo problemas novos, mais subtis e, quem sabe, desoluçãomaisdifícil.)

PartículasInstáveisOelectrão,comosabemos,éumapartículaestável.Estávelnãosignifica,noentanto,quenadalhe

possa acontecer. Se um electrão se encontrar com um positrão, as duas partículas aniquilam-semutuamente,convertendo-seemfotões.Seumelectrãocolidircomoutrapartículaquenãoumpositrão,podesofreroutrostiposdetransformações.

Contudo, seumelectrãoestiver isoladonoespaçoenãoencontrarquaisqueroutraspartículas,permanecerá (tanto quanto sabemos) indefinidamente no mesmo estado, sem alteração das suaspropriedades.

Omesmosepassacomopositrão,neutrinoeantineutrino.Osquatroleptõesqueeramconhecidosantesdadescobertadomuãosãotodospartículasestáveis. (Asituaçãoé idênticanoqueserefereaosdoisbosõesidentificadosnosanos30-ofotãoeogravitão.)

Daspartículasquenãosãoleptõesequeeramconhecidasantesdadescobertadomuão-ouseja,o protão, antiprotão, neutrão e antineutrão - as duas primeiras parecem ser estáveis (embora existamactualmentealgumasdúvidasquantoaisso,comoveremos).

Oneutrãoeoantineutrãonãosãoestáveis.Seumneutrãoforisoladodequalqueroutrapartícula,acabará, ainda assim, por se desintegrar, originando um protão, um electrão e um antineutrino. Umantineutrino,porsuavez,daráorigemaumantiprotão,umpositrãoeumneutrino.Contudo,trata-sedumprocessorelativamentelento,quedemora,emmédia,váriosminutos.Alémdisso,quandoumneutrãofazpartedumnúcleonãoradioactivo,éestável,podendoaípermanecerparasempreinalterado.Osmuões,no entanto, desintegram-sequasede imediato, produzindo electrões.Ummuão típicodesintegra-se emapenasI/500000dumsegundo,senãoexistiremoutrasinteracções.

Porquerazãohá-deomuãodurartãopoucotempo?Consideremosnovamenteaanalogiadehápouco, em que um electrão era lançado pela encosta acima e ficava a repousar num patamar querepresentava207vezesamassanofundodovale.Podemosimaginarqueessepatamaréestreitoequeomuãoficaaíavibraroutremer.Emresultadodessavibração,omuãoacaba,maiscedooumaistarde,porcairdopatamar,deslizandopelovaleabaixoetransformando-sedenovonumelectrão.Porcausadapequenadimensãodopatamaredamagnitudedasvibrações,esse"maiscedooumaistarde"revelou-seiguala1/500000dumsegundo.

Todososobjectos,incluindooleitoreeupróprio,exibemumcertotipodevibração,queresultado factodamecânicaquânticamostrar que existeumaonda associada aqualquer corpo.Nocasodosobjectosmaiscomuns,essavibraçãoétãoínfimaquepodeserdesprezada.Noentanto,quantomenoréuma massa, maior é a vibração relativamente às dimensões do objecto. As partículas subatômicaspossuem umamassa tão pequena que a vibração assume uma importância considerável e tem de serlevadaemcontaemqualquerestudodasrespectivaspropriedades.

O electrão também possui uma vibração associada - na verdade,mais acentuada do que a domuão.Contudo,oelectrãoencontra-senofundodovale.Daínãopodecairparaladoalgumeporissoapartículaéestável.

Em1975,ofísiconorte-americanoMartinPerl(n.1927)detectounamiríadedepartículasqueseobtêm nos aceleradores quando se produzem colisões uma que era semelhante ao electrão mas

apresentavaumamassamaioraindaqueadomuão.Chamouaessapartículaleptãotau,emquetauéumaletradoalfabetogregoequivalenteaonossot.Apartículatambémédesignadaumtauão.

O tauão partilha todas as suas propriedades, à excepção de duas, com o electrão e o muão.Dessasduas,umaéamassa.Otauãoéumelectrãosuper-maciço,comumamassaqueécercade3500vezesadoelectrãoequase17vezessuperioràdomuão.Possuiumamassaquasedupladadoprotãooudoneutrãoe,todavia,oseucomportamentoindicaclaramentequeéumleptão,emboraestadesignaçãoseja usada sobretudo para partículas bem mais conhecidas de pequena ou nenhuma massa. (Poderáparecer confusoe contrário ao sensocomumqueumnomeque implicapequenez sejausadocomumapartícula de grande massa, mas considere o leitor a seguinte analogia. Os répteis, incluindo oscrocodilos, anacondas e os extintos dinossáurios, são muito maiores do que os insectos, seconsiderarmos cada grupo de animais como um todo. Existem, no entanto, escaravelhos gigantes dotamanhodumpunhohumanoelagartostãopequenosquecabemnapontadosnossosdedos.E,todavia,oescaravelhoéuminsectoeolagartoumréptil.)

A segunda característica que distingue o tauão das outras partículas referidas é a suainstabilidade.Comefeito,émuitomais instáveldoqueomuão,umavezquesedesintegraemapenascincobilionésimosdumsegundo.Aofazê-lo,transforma-senummuãoque,porsuavez,seconvertenumelectrão.

Podemos imaginarqueo tauãoresultadumganhodeenergiaque levaapartículaasubirmuitopelanossaencostaacima.Apartículaatingeumpatamarmuitomais altoe estreitodoqueaquelequealcançaraomuão.Otauãopermanecenessepatamarumafracçãoínfimadetempo,antesdevoltaracair.Seráentãoquedevemosesperaradescobertadeoutrosleptões,maismaciçoseinstáveisaindadoqueotauão? Existirá um número infinito de patamares na encosta da nossa analogia, cada qualmais alto eestreitoqueoanterior?

Aparentementenãoéassim.Osfísicostêmrazõesparaacreditar,combasenalgumasobservaçõesrecenteseraciocíniosbastantecomplexos,que trêséo limiteeque já identificámospor isso todososleptõesexistentes.

Osátomostauónicos,aexistirem,seriamaindamaispequenosdoqueosátomosmuónicose,porconseguinte, aindamais fáceis de fundir. Por esta altura, o leitor já percebeu provavelmente qual é oproblema com tudo isto. Tais leptões pesados são demasiado instáveis para poderem ser usados napráticaemfusõesnucleares,umavezquedesaparecemantesdepodermosfazercomelessejaoquefor.

VariedadesdeNeutrinosAnalisemoscomalgumdetalheadesintegraçãodosmuões,umavezqueexistenesseprocessoum

problemaqueestárelacionadocomasleisdeconservação.Suponhamosqueomuãosedesintegranumelectrãoenumantineutrino.Nesseprocessoexisteconservaçãodacargaeléctricaedomomentolinear.No entanto,nãohá conservaçãodomomento angular.Omuãopossui um spinde +1/2 ou -1/2, o quetambém acontece com o electrão e o antineutrino. Um electrão e um antineutrino, considerados emconjunto,têmumspinde+1,0ou-1,emfunçãodossinaisdosrespectivosspins.Osdoisnãopodem,portanto,apresentarumspintotalde+1/2ou-1/2.

Por que razão é que a desintegraçãodomuãopareceviolar a lei de conservaçãodomomentoangular,mesmo levando em conta um antineutrino, quando isso não acontece com a desintegração doneutrão?Taldeve-seaofactodoneutrãosedesintegrardandoorigematrêspartículas-umprotão,umelectrãoeumantineutrino-etrêsvaloresde1/2sepoderemadicionarparadarumvalortotalde1/2.Adesintegraçãodomuão,talcomoadescrevemosatéagora,produzapenasduaspartículas-umelectrãoeumantineutrino-easomadedoisvaloresde1/2sópodedarumnúmerointeiro,nuncaumvalorde1/2.Poroutraspalavras,temosdeadmitirqueomuão,aodesintegrar-se,dáorigemtambématrêspartículas-umelectrãoetalvezdoisantineutrinos.

Infelizmente, isso não garante necessariamente o respeito pelas leis de conservação. O muãopossuinúmero leptónico+1.Oelectrãoeoantineutrinopossuem,cadaqual,umnúmero leptónico+1,pelo que começamos com+1 e terminamos com+2, violando assim a lei de conservação do númeroleptónico. Se acrescentarmos um segundo neutrino, começamos com +1 e terminamos com +3, o queainda é pior. Suponhamos, no entanto, que o muão, ao desintegrar-se, dá origem a um electrão, umantineutrinoeumneutrino.Oneutrinotemnúmeroleptónico-1,peloqueastrêspartículasproduzidastêmnúmeros leptónicosde+1,+1e -1, cuja somaé+1,oque correspondeaonúmero leptónicodomuãooriginal. Se admitirmos, por conseguinte, que um muão, ao desintegrar-se produz, para além dumelectrão,tambémumneutrinoeumantineutrino,todasasleisdeconservaçãosãorespeitadas.

Um final feliz? Sim, à excepção dum pequeno pormenor. Todas as interacções que os físicostinhamobservadoatéàdescobertadomuãoequeproduziamneutrinos,originavamumneutrinoouumantineutrino.Adesintegraçãodomuãoéinvulgarporquedáorigemaumneutrinoeaumantineutrino.

Será que isso significa que existem dois tipos de neutrinos? Um tipo produzido apenas porelectrões e outro apenas pormuões, de talmodo que se possa falar de neutrinos (e antineutrinos) deelectrãoedeneutrinos(eantineutrinos)muónicos?Seráquequandoomuãosedesintegraedáorigemaumelectrão,omuãoeoelectrãoproduzemcadaqualasuavariedadedeneutrinoequeéissoqueexplicaa razão porque a desintegração do muão envolve dois neutrinos? Esta questão é conhecida como oproblemadosdoisneutrinos.

Seumneutrinodeelectrãoeumneutrinomuónicoforemdiferentesnasuanatureza,issodever-se-áaalgumadiferençanassuaspropriedades-algoqueosfísicosnãoconseguiramdetectaratéagora.Oestudodosneutrinosproduzidospormuõeséaindamaisdifícildoqueaquelesqueresultamdeelectrõesmas,tantoquantoosfísicossãocapazesdedizer,osdoistipossãoidênticos.Ambospossuemcarga0,massa0,spinde+1/2ou-1/2,eporaífora.

Seráque isto resolveoproblema?Éclaroquenão.Podemuitobemacontecerqueexistauma

diferençanumqualqueraspectoemquecientistaalgumpensouatéagoraeque,porisso,nuncaninguémtentoumedir(partindodoprincípiodequedispomosdedispositivospararealizartalmedição).

Contudo, se não podemos detectar quaisquer diferenças directamente, talvez possamos fazê-loindirectamente, forçandoaspartículasadecidirem-seelasmesmas.Suponhamos,porexemplo,queumantineutrino produzido por um electrão encontra um neutrino produzido por um muão. Se as duaspartículasforemidênticasemtodososaspectos,àexcepçãodeconstituíremaimagemnoespelhoumadaoutra,deverãoaniquilar-semutuamente,dandoorigemaumpulsoínfimodeenergia.Seelasdiferirememqualqueraspectoquenãoapenasofactodeseremimagensnoespelhoumadaoutra,aaniquilaçãomútuanãodeveráocorrer.Esenãohouveraniquilação,seráporqueaspartículasreconhecemasuadiferença,eparanóstalserásuficiente.Aceitaremososeujuízo,mesmoignorandoemqueconsisteessadiferença.

Contudo, os neutrinos são partículas tão ínfimas e não reactivas que a probabilidade de duasdelasseencontraremépraticamentenula.Emesmoquetalsuceda,aenergiaproduzidapodemuitobemser demasiado pequena para que a consigamos detectar. Existe, no entanto, outra forma de obrigar osneutrinosa revelaremasuanatureza.Seumelectrãoproduzirapenasneutrinosdeelectrãoeummuãoneutrinosmuónicos,eseasinteracçõesforeminvertidas,oneutrinodeelectrãodeverádarorigemapenasa electrões e o neutrino muónico apenas a muões. Todavia, se os dois neutrinos forem realmenteidênticos,produzirãoelectrõesemuõesemigualquantidade.

A experiência atrás descrita foi realizada em 1961 por uma equipa dirigida pelo físico norte-americanoLeonMaxLederman(n.1922).Oscientistascomeçaramporfazercolidirprotõesaltamenteenergéticoscomumalvodometalberílio.Ascolisõesderamorigemagrandenúmerodepartículas,entreasquaismuõesdealtaenergiaquedecaíram,produzindoneutrinosmuónicosdeelevadaenergia.Estaenormemisturadepartículasfoidepoislançadacontraumaplacadeaçocom12metrosdeespessuraquetudoabsorveuàexcepçãodosneutrinos(queatravessamtodaamatéria).Dooutroladodaplacadeaço,ofeixedeneutrinosmuónicospenetravanumdispositivocapazdedetectarcolisõesdeneutrinos.Éclaroqueestasnuncaseriamemgrandenúmero,masaolongodumperíododeoitomesesforamobservadas56etodaselasproduzirammuões.

Esteresultadotornouclaroqueumneutrinomuóniconãopodiaproduzirumelectrãoeque,porconseguinte, era diferente nalguma característica (independentemente de a conhecermos ou não) dumneutrinodeelectrão.Peloseutrabalho,LedermanfoigalardoadocomumPrémioNobelem1988.

A experiência deLedermanmostrouque a conservaçãodo número leptónico é umpoucomaiscomplicadadoquesepensava.Existemleisdeconservaçãodonúmeroelectrónicoedeconservaçãodonúmeromuónicodistintas.Assim,umelectrãotemnúmeroelectrónico+1eumpositrão-1.Umneutrinodeelectrãotemnúmeroelectrónico+1eumantineutrinodeelectrão-1.Todospossuemnúmeromuónico0.Analogamente,ummuãotemnúmeromuónico+1eumantimuão-1.Umneutrinomuónicotemnúmeromuónico+1eumantineutrinomuónico-1.Todospossuemnúmeroelectrónico0.

Quandoummuão,comnúmeromuónico+1enúmeroelectrónico0sedesintegra,dáorigemaumelectrão(númeroelectrónico+1,númeromuónico0),aumantineutrinodeelectrão(númeroelectrónico-1,númeromuónico0)eaumneutrinomuónico(númeroelectrónico0,númeromuónico+1).Somadas,astrês partículas que resultam da desintegração têm númeromuónico +1 e número electrónico 0, que étambémaquiloque sepassacomomuão inicial.Na transformaçãohá,portanto, conservação tantodonúmeroelectrónicocomodonúmeromuónico.

Otauão tambémdáorigemaumneutrino,queatéagorafoipoucoestudadomasqueos físicossuspeitampossuirtodasaspropriedadesóbviasdosoutrosdoisneutrinos,emborasejadealgummododiferentedeles.Parecepois inevitável suporqueexistealgocomouma leideconservaçãodonúmero

tauónico.Osfísicosfalamactualmentenaexistênciadetrês"sabores"deleptões.Equesão:(1)oelectrão

eoneutrinodeelectrão,(2)omuãoeoneutrinomuónico,e(3)otauãoeoneutrinotauónico.Existemigualmente três,saboresdeantileptões: (1)oantielectrão(positrão)eoantineutrinodeelectrão, (2)oantimuãoeoantineutrinomuónico,e(3)otauãoeoantineutrinotauónico.(Otermosaboré,numcertosentido,umaescolhainfeliz.Nalinguagemcorrente,apalavraéutilizadaparadistinguirascoisaspeloseupaladar,comosucedecomosdiferentessaboresdosgelados.Nãoécorrectodaràquelesquenãosãocientistas a ideia de que as diferenças entre partículas subatômicas constituem "matizes" em vez dediferenças absolutas, mensuráveis. Todavia, os cientistas também são seres humanos e por vezesescolhemexpressões teatrais oumesmo cómicas. Por exemplo, os núcleos de alguns átomos sãomaisfáceisdeatingircomprojécteissubatômicosdoqueoutros.Algunscientistasbem-humoradosresolveramdizer que era tão fácil acertar neles "comona parte lateral dum celeiro" [as the side of a bam].Emresultadodessabrincadeira,asecçãoeficazdumnúcleo,umamedidadafacilidadecomqueestepodeseratingido,émedidanumaunidadedesignadabam)

Existe, portanto, um total de doze leptões e antileptões. São partículas fundamentais (ou pelomenos consideram-se actualmente como tal), uma vez que não se desintegram espontaneamente empartículasmais simples.O tauão e omuãodesintegram-se emelectrões, enquanto que o antitauão e oantimuãoproduzempositrões.Oelectrão,opositrão,ostrêsneutrinoseostrêsantineutrinosnãoparecemdesintegrar-sedetodo.

Porquerazãohádozeleptões,seoUniversosóparececonterelectrõeseneutrinosdeelectrõesem quantidades apreciáveis? Os antineutrinos de electrões só são produzidos no decurso detransformaçõesradioactivasque,noconjuntodoUniverso,sãopouconumerosas.Ospositrõessurgememalgumas transformações radioactivas,masmais raramente ainda que os antineutrinos de electrões.Osleptõesmaispesadoseosseusneutrinos,tantoquantosabemos,sósãoproduzidosemlaboratórioatravésdeprocessoscomoobombardeamentocomradiaçãocósmica.

Masaserassim,porquerazãoéqueoUniversonãofuncionaapenascomelectrõeseneutrinosde electrões? Para quê complicar desnecessariamente as coisas? Porque, diz-me o meu instinto, ascomplicações não são desnecessárias. O Universo está construído de tal modo que cada interacçãodesempenhaoseupapel.Podemosnãosercapazesdecompreenderarelevânciadotauão,porexemplo.Noentanto,estouconvictodequeaexistênciadotauãoéessencialparaqueomecanismodoUniverso,sejaelequalfor,funcione.EquesemotauãooUniversonãoseriaaqueleemquevivemosetalveznãopudessesequerexistir.

10.INTERACÇÕES

AInteracçãoForteEsqueçamospormomentososleptões.Oquesepassacomosbariões,ouseja,comaspartículas

queconstituemosnúcleosatómicos?Apartirdomomentoemqueoneutrãofoidescobertoeaestruturaprotão-neutrão foipropostaparaonúcleo, estaspartículaspassarama representarumproblemasério,quepodeserresumidonaseguintepergunta:"Oqueéquemantémonúcleocoeso?"

Até1935,conheciam-seapenasdois tiposde interacçãocapazesdemanteremcorpos juntos: agravíticaeaelectromagnética.Dasduas,aprimeiraétãofracaquepodesercompletamenteignoradanomundodaspartículassubatômicas.Ainteracçãogravíticasósefazsentirdeformasignificativaquandoestão presentes grandes massas. É uma interacção importante quando se trata de satélites, planetas,estrelasegaláxias,masnãonocasodosátomosepartículassubatômicas.

Resta portanto a interacção electromagnética. A atracção entre cargas eléctricas positivas enegativas serveperfeitamente para explicar comoé que asmoléculas semantêm juntas nos cristais, acoesão dos átomos nas moléculas e a ligação entre electrões e núcleos nos átomos. No entanto, oscientistasdepararamcomumproblemaquandocomeçaramaestudaronúcleoatómico.

Enquantoestiveramconvencidosdequeosnúcleoseramconstituídosporprotõeseelectrões,nãohouveproblemaalgum.Osprotõeseelectrõesatraíam-sefortemente.Naverdade,atraíam-secomtantamaisforçaquantomaispróximosseencontravam.E,nosnúcleos,unseoutrosestavamvirtualmenteemcontacto.Osprotõestambémestavamvirtualmenteemcontactounscomosoutros,talcomooselectrões.E entre objectos com idêntica carga eléctrica existe uma repulsão tão forte como a atracção entreentidadescomcargasdesinalcontrário.

Eraportantodeesperarque,nointeriordumnúcleo,osprotõesserepelissemunsaosoutrosequeomesmosucedessecomoselectrões.Massupunha-se,osdoistiposdepartículasestavammisturadosedispostosdetalmodoqueasatracçõeserammaiseficazesdoqueasrepulsões.Istoeraverdadenocasodoscristais,frequentementeconstituídosporumamisturadeiõesdecargaspositivasenegativas,comascargas de sinal contrário distribuídas de tal modo que as atracções se sobrepunham às repulsões,garantindoacoesãodoscristais.Emsuma:nointeriordumnúcleo,oselectrõesfuncionavamcomoumaespéciedecimentoparaosprotões,evice-versa.Eaintegridadedonúcleoeraasseguradapelaacçãodestesdoiscimentos.

Contudo,anaturezadospinnucleareanecessidadedeconservaçãodomomentoangularpuseramemdúvidaavalidadedomodeloprotão--electrãoparaaestruturanuclear.Comadescobertadoneutrão,tornou-serapidamenteevidentequehavianecessidadedeconsiderarumaestruturaprotão-neutrão,aqualpermitia resolver todas as dificuldades relacionadas com o anterior modelo - à excepção duma. Ocimentodesaparecera.

Seconsiderarmosapenasainteracçãoelectromagnética,aúnicaforçacapazdesefazersentirnointeriordumnúcleoconstituídoporprotõeseneutrõeséarepulsãoextremamenteforteentrecadaprotãoe todososoutros.Osneutrões, quenãopossuemcarga eléctrica, não atraemnem repelemosprotões.São,porassimdizer,merastestemunhasoculares.Aintensarepulsãoprotão-protãodeveriasersuficienteparafazerosnúcleosexplodirinstantaneamentenumamiríadedeprotõesindividuais.

E, contudo, isso não sucede. Os núcleos atómicos mantêm a sua integridade, apresentam umaestabilidadeconsiderável,nãoexistindosinaisdumarepulsãomútuadestrutivaentreosprotões.Mesmo

nocasodosnúcleosradioactivos,asexplosõesocorremdentrodelimitesmuitoestritos,transformandoumprotãonumneutrão,ouvice-versa,eliminandoumapartículaalfacomdoisprotõesedoisneutrõesou,emcasosextremos,partindoosnúcleosaomeio.Tudo istoacontecedemodorelativamente lento,porvezes excessivamente lento.Nuncanúcleo algum explode instantaneamente libertando os seus protõesindividuais.

A conclusão natural que temos de extrair deste facto é que existe uma qualquer interacçãoenvolvida,quenãoédenaturezagravíticanemelectromagnética.Umtipodeinteracçãoquenuncaforaimaginado,muitomenosestudado,equeasseguraacoesãodosnúcleos.Trata-seduma interacçãoquepodemosdesignarcomointeracçãonuclear.

Estainteracçãonuclear,sejaqualforasuanatureza,deveserresponsávelporumaforçaatractivaintensa - uma força muito superior à força repulsiva produzida pelas cargas eléctricas positivas dosdiferentes protões. Com efeito, e como se veio a verificar, a interacção nuclear produz uma forçaatractivacomuma intensidademaisde100vezes superioràda interacçãoelectromagnética.Elaé,naverdade,a forçamaispoderosaquesabemosexistirentrepartículassubatômicas (e, segundosecrê,amaisfortequepodeexistir).Porisso,égeralmentedesignadainteracçãoforte.Masemqueconsisteestainteracçãoforte?Ecomofunciona?

OprimeiroapensarnapossívelexistênciadainteracçãofortefoiHeisenberg(1901-1976)que,em1932,foratambémquemprimeirosugeriraumaestruturadeprotõeseneutrõesparaonúcleo.Oquenão é, em si mesmo, surpreendente. Quando um cientista propõe uma ideia inovadora que resolvediversosproblemas,masqueapresentaumafalhaóbvia,sente-secomoqueobrigadoafazerospossíveisporremediá-la.Afinal,ésuaprópriacriaçãoqueestáemcausa.

Heisenbergconcebeuanoçãodeforçasdetroca.Trata-sedumconceitodesconhecidodafísicaclássica, istoé,do tipode físicaqueexistiaantesdoadventodamecânicaquântica,equeaquelanãoseriacapazdecompreender.Noentanto,seusarmosamecânicaquântica,asforçasdetrocatornam-sepossíveiseactuantes.

Paraexplicarmosoconceitosemrecorreràmatemática,podemosimaginarosprotõeseneutrõescomoestandoconstantementeatrocaralgoentresi.Admitamosqueaquiloquetrocam(comoHeisenbergcomeçouporsugerir)écargaeléctrica.Issosignificaqueascargaseléctricaspositivasnointeriordumnúcleoestãoa serconstantemente transferidasdumapartículaquepossuiumacargapositivaparaumapartícula que a não tem. O que significa que cada barião é um protão ou um neutrão numa sucessãoextremamente rápida.Nenhum protão poderá sentir uma repulsão uma vez que, antes de ter tempo dereagiraesta,jáseterátransformadonumneutrão.(Écomopassarumabatataquenterapidamentedumamãoparaaoutraafimdeevitarqueimaduras.)

Umatalforçadetrocacriariaumaatracçãopoderosaeassegurariaaintegridadedonúcleo.Noentanto,umaanálisemaisdetalhadarevelouqueasugestãodeHeisenbergera,infelizmente,incorrecta.Foi então que o físico japonêsHidekiYukawa (1907-1981) decidiu atacar o problema.Começou porconsiderarqueseas forçasde trocaactuavamno interiordonúcleoparaa interacçãoforte, tinhamdeexistir também para todas as outras interacções. Yukawa aplicou a mecânica quântica à interacçãoelectromagnéticaeconcluiuqueaquiloqueera trocadoeraumadeterminadapartícula,o fotão.Oqueproduziaainteracçãoelectromagnéticaeraatrocacontínuaeextremamenterápidadefotõesentreduasquaisquer partículas com carga eléctrica. Entre partículas com amesma carga, a troca produzia umarepulsão;entrepartículasdecargaoposta,produziaumaatracção.

Entre quaisquer duas partículas com massa existia igualmente uma troca rápida de gravitões.(Estaspartículasnunca foramdetectadasporquesão tãopoucoenergéticasquenenhumdispositivoaté

agoradesenvolvidoésuficientementesensívelparademonstrarasuaexistênciademodoinequívoco.Noentanto,físicoalgumduvidadasuaexistência.)Umavezquepareceexistirapenasumtipodemassa,ainteracçãogravíticaproduzapenasumaatracção.

No interior dum núcleo, portanto, teria de haver uma outra partícula de troca que seriacontinuamente transferida entre os seus protões e neutrões. Existia, contudo, uma diferença. Tanto ainteracção electromagnética como a gravítica são efeitos a longa distância, cuja intensidade diminuiapenaslentamentecomesta.Oefeitodoelectro-magnetismo,ondeexisteumaatracçãoeumarepulsão,fica um tanto ou quanto escondido, mas podemos ver claramente o que isso significa no caso dagravidade, onde as massas podem ser muito grandes e existe apenas atracção. A Terra mantémfirmementeaLuasobasuainfluência,mesmoaumadistânciadecercade400000quilómetros.OSolseguraaTerra,aumadistânciade150000000quilómetros.Asestrelasmantêm--sejuntasemgaláxiaseasgaláxiasemenxamesadistânciasdemilharesemesmomilhõesdeanos-luz.

A interacção forte, todavia,diminuide intensidadecomadistânciamuitomais rapidamentedoqueagravidadeouomagnetismo.Seduplicarmosadistância,aintensidadedestasduasforçasdiminuipara um quarto. No caso da interacção forte, contudo, a redução é para menos de 1 por cento daintensidadeoriginal.Issosignificaqueestaúltimatemrealmenteumalcancemuitocurto,nãosefazendosentirdemodomensurávelexceptonavizinhançaimediatadapartículaquelhedáorigem.

Comefeito,oalcanceefectivodainteracçãoforteédeapenasdezbi-lionésimosdecentímetro,ou cerca de l/ioo 000 do diâmetro dum átomo. Assim sendo, a única forma dos protões e neutrõessentiremoefeitoatractivodainteracçãoforteconsisteemmanterem-sepróximosunsdosoutros.Éestaarazão pela qual os núcleos atómicos são tão pequenos. Eles têm o tamanho suficiente para que ainteracção forte se faça sentir. Na verdade, os maiores núcleos conhecidos possuem diâmetros tãograndes que esta interacção tem dificuldade em se fazer sentir à distância necessária, existindo umatendênciaparasofreremocasionalmenteumafissão.

Éporcausadestadiferençaemtermosdorespectivoalcancequeapenasasinteracçõesgravíticaeelectromagnéticafazempartedaexperiênciacomumdossereshumanos.AquelaéconhecidadesdeosprimórdiosdahumanidadeeestadesdeostemposdaGréciaAntiga.Ainteracçãoforte,queapenassefazsentiradistânciasnucleares,nuncapoderiatersidoobservadaatéàdescobertadonúcleoeàelucidaçãodasuaestrutura-ouseja,atéaosanos30doséculoXX.

Masporquerazãoexisteestadiferençadealcance?Usandoosprincípiosdamecânicaquântica,Yukawaconcluiuqueumainteracçãoagrandedistânciaimplicavaaexistênciadumapartículadetrocasemmassa.Umavezqueofotãoeogravitão,duaspartículassemmassa,estavamassociadosaforçaselectromagnéticas e gravíticas que actuavam a grande distância, a interacção forte tinha de estarassociadaaumapartículadetrocacommassa,vistoquesefaziasentirapenasadistânciasmuitocurtas.Comefeito,Yukawacalculouqueamassadapartículade trocaeracercade200vezes superioràdoelectrão.

Nessa época não eram conhecidas partículas commassas dessa ordem de grandeza eYukawaficoucomaterrívelsensaçãodequeasuateoriaestavaerrada.Aindaassim,publicouoresultadodosseus trabalhos em 1935. Mas quase de seguida Anderson descobriu o muão, cuja massa se situavaprecisamentenagamadevaloresprevistaporYukawaparaamassadasuapartícula.EéclaroquetodaagentepensouqueapartículadeYukawatinhasidodescoberta.Ointeressepelasuateoriacresceu.

No entanto, foi sol de pouca dura.Omuão não revelou qualquer tendência para interagir comprotõeseneutrões,peloquenãopodiaserapartículaemquestão.Comefeito,nãoestavadetodosujeitoàinteracçãoforte,eessafoi,aliás,aprincipalrazãoporquefoiclassificadocomoumleptão.Nenhum

dosleptõesestásujeitoàinteracçãoforte.Naverdade,assimqueoscientistasreconheceramqueomuãonãopassavadumelectrãomaciço,compreenderamtambémque,talcomooelectrão,nãopodiaserumapartículadetroca.

Masadesilusãonãodurouparasempre.OfísicobritânicoCecilFrankPowell(1903-1969),queestudava o efeito da radiação cósmica sobre os átomos e moléculas da atmosfera decidiu, tal comoAnderson, fazê-lo a partir demontanhas elevadas.NosAndes bolivianos, por exemplo, estava a umaaltitude suficientemente elevada para que a intensidade da radiação cósmica (proveniente do espaçoexteriorenãoabsorvidapelascamadasmaisbaixasdaatmosfera terrestre) fossedezvezessuperioràque se registava ao nível do mar. Powell utilizou instrumentos especiais por si concebidos e maissensíveis que os de Anderson, tendo detectado, em 1947, trajectórias curvas de partículas de massaintermédia.

Apartirdasuacurvatura,calculou-sequeanovapartículapossuíaumamassa273superioràdoelectrão(oqueestavapróximodaprevisãodeYukawa),sendocercadumterçomaismaciçaqueomuão.Anovapartícula revelou-se tão instável comoeste, desintegrando-se, emmédia, ao fimde1/400000dumsegundo.

No entanto, tais semelhanças não passavam de pura coincidência, uma vez que existia umadiferençafundamentalentreambasaspartículas.ApartículadePowellnãoeraumleptão.Estavasujeitaàinteracçãoforteeinteragiafacilmentecomprotõeseneutrões.Naverdade,tratava--sedapartículadetrocaprevistaporYukawa.

Anovapartículafoidesignadamesãopi(sendopiumaletradoalfabetogregocorrespondenteaonossopeque,suponho,tinhaquevercomPowell).Constituiuaprimeiradumanovaclassedepartículas,todas submetidas à interacção forte, denominadas mesões (uma designação inicialmente atribuída aomuão,masdepoisretiradaquandoseverificouqueapartículaeraumleptão.)Apesardomesãopipoder,de direito próprio, ser chamadomesão, o seu nome é frequentemente abreviado, por uma questão deconveniência,parapião.

Existe evidentemente um pião positivo, com uma carga exactamente igual à dum protão oupositrão,eumantipiãonegativo,comumacargaexactamenteigualàdumantiprotãoouelectrão.Opiãodesintegra-seproduzindoummuãoeumantineutrinomuónico,eoantipiãodesintegra-seoriginandoumantimuãoeumneutrinomuónico,oqueasseguraaconservaçãodonúmeromuónico,umavezqueomuãoeoantineutrinomuónicotêmnúmerosmuónicos+1e-1,respectivamente,enquantoqueoantimuãoeoneutrino muónico têm números muónicos -1 e +1, respectivamente. Visto que os piões têm númeromuónico0,estepermaneceiguala0antesedepoisdadesintegração.

Existe também um pião neutro, que não possui carga eléctrica e tem umamassa que é apenas29/30damassadospiõescomcarga.Trata-sedumapartículamenosestávelqueospiõescarregados,que existe em média apenas cerca dum milionésimo dum milésimo de milionésimo de segundo,desintegrando-se para originar dois raios gama. O pião neutro é uma das poucas partículas que, àsemelhança do fotão e do gravitão, não possui antipartícula. Ou, olhando para a questão doutraperspectiva,queconstituiasuaprópriaantipartícula.

Osmesões,diga-sedepassagem,apresentamspin0e,porisso,nãosãofermiões.Nãoexisteumaleideconservaçãodonúmeromesónico.Osmesõespodemapareceredesaparecerlivremente.

AYukawafoiatribuídoumPrémioNobelem1949peladescobertadainteracçãoforte,ePowellrecebeuidênticogalardãoem1950.

AInteracçãoFracaEmboraadescobertadainteracçãoforteconstituísseummomentoparticularmentedramáticona

históriadafísica,elanãofoiaprimeirainteracçãonovaaseridentificadanosanos30.Em1933,Fermi,que haveria mais tarde de bombardear urânio com neutrões (com consequências que tiveram enormeimportância), interessou-sepelos trabalhosdeDirac sobrea interacçãoelectromagnética.Aoprocurardescreveromodocomoos fotõeseramemitidosnas interacçõeselectromagnéticas,Dirac formularaanoçãodeantimatéria.

Fermi achava que a emissão de electrões e neutrinos pelos neutrões podia ser tratadamatematicamente de modo análogo ao que fora usado para descrever a emissão de fotões pelaspartículas.Ele conclui que, dopontodevistamatemático, as coisasbatiamcerto,masque em termosfísicos isso indicava a existência dum tipo de interacção que era muito diferente da interacçãoelectromagnética que governava a emissão de fotões. Esta nova interacção, inicialmente designadainteracçãodeFermi,eramuitomaisfracadoqueaquela.Comefeito,asuaintensidadeeraapenascercadumcentésimodummilésimodemilionésimodainteracçãoelectromagnética.(Ecorrespondiaapenasaumdécimodumbilioné-simodaintensidadedainteracçãoforte,descobertamaistarde.)

A interacçãodeFermi tinha umalcancemuito curto, fazendo-se sentir apenas a distâncias quecorrespondiam a cerca da milésima parte do diâmetro dum núcleo atómico. Assim sendo, nãodesempenhava qualquer papel no núcleo, sendo todavia importante no caso de partículas individuais.Tratava-se duma segunda interacção nuclear (no sentido em que era uma segunda interacção de curtoalcance, envolvendo apenas partículas subatômicas). Uma vez aceite a teoria de Yukawa, os físicospassaram a falar na interacção nuclear forte e na interacção nuclear fraca, designação que substitui aanteriorexpressãointeracçãodeFermi.

Masdepois, suponhoqueporumaquestãodeeconomiadepalavras, aexpressão"nuclear" foiabandonadaeoscientistascomeçaramareferir-sesimplesmenteàinteracçãoforteeàinteracçãofraca.

(Estaúltimadesignaçãonãoé,emminhaopinião, totalmenteadequada,poisemborasejamuitomenos intensa do que as interacções forte e electromagnética, a interacção fraca é, ainda assim, dezmilharesdebiliõesdebiliõesdevezesmaisintensadoqueainteracçãogravítica.Éestaúltimaque,dedireitopróprio,poderiaserchamadainteracçãofraca.

E, contudo, posso estar errado. Visto que apenas conhecemos verdadeiramente a interacçãogravíticarelacionadacomaenormemassadaTerraedoutroscorposcelestes,nãopodemosconsiderá-lafracanumsentidoprático,quenãosubatômico.Bastacairmospara imediatamenteafastarmosdonossoespíritoqualquerideiadefraquezarelacionadacomainteracçãogravítica.Naverdade,seforpossívelconcentrar num volume suficientemente pequeno uma quantidade de massa suficientemente grande, aintensidadedocampogravíticoproduzidotorna-sesuperioratudooquepossamosimaginar-tãograndequenema interacção forte se lhe consegueopor. Se deixarmosde pensar nesses termos, a interacçãofracaérealmenteamaisdébildasinteracções,pelomenosnaformacomohabitualmenteaencontramos.E,portanto,talvezadesignaçãonãosejaafinaltãodesajustadacomoisso.)

Algumaspartículassofremtransformações-comoasdesintegraçõesouinteracçõesumascomasoutras -que sãomediadaspela interacção forte.Outras sofrem transformaçõesque sãomediadaspelainteracçãofraca.Oseventosdoprimeirotipoocorremnaturalmentecommuitomaiorrapidezdoqueos

segundos,domesmomodoqueumaboladebasebolsedeslocamuitomaisrapidamenteseatiradaporumlançadorprofissionaldoqueporumacriançadecincoanos.

Em geral, os eventos mediados pela interacção fraca ocorrem em cerca dum milionésimo desegundo, enquanto que aqueles que envolvem a interacção forte demorammenos dum bilionésimo desegundo-porvezes,duramapenasalgunsbilionésimosdumbilionésimodesegundo.

Osbariõesemesõessãoafectadostantopelainteracçãofortecomopelainteracçãofraca,masnocaso dos leptões apenas esta é relevante. (Os bariões, mesões e leptões reagem à interacçãoelectromagnéticase,esóse,possuíremcargaeléctrica.Osneutrões,piõesneutroseneutrinosnãosãoafectadospor esta interacção.)Éesta a razãopelaqualos eventos leptónicos, comoodecaimentodopiãoparaproduzirummuão,odesteparadarumelectrão,ouaproduçãoradioactivadepartículasbeta,tendema ocorrer naquilo que, à escala subatômica, parece "câmara lenta".Opião neutro, que não sedesintegraemmuões,éafectadopelainteracçãofortee,porisso,desintegra-semuitomaisrapidamentedoqueospiõesquepossuemcargaeléctrica.

Ainteracçãofracadiferedosoutrostrêstiposdeinteracçãopelofactodeseraúnicaquenãoéresponsávelporumaforçadeatracçãoóbvia.Ainteracçãogravíticamantémjuntososcorposcelestesegarante a existência do sistema solar. A interacção electromagnética assegura a coesão dos átomos emoléculasegaranteaexistênciadaTerra.Ainteracçãoforteprendeosbariõesegaranteaexistênciadosátomos.

Ainteracçãofracanãomantémjuntooquequerqueseja.Elemedeiasimplesmenteaconversãodedeterminadaspartículasnoutraspartículas.Noentanto,talfactonãodeveserdesvalorizado.Porumlado,porqueéelaqueservedeintermediárianosprocessosatravésdosquaisosprotõessejuntamparaproduzirnúcleosdehélio.E,recordemos,éesseprocessodefusãonuclearquemantémoSolabrilharetornapossívelavidanaTerra.

Contudo,ainteracçãofracalevantaumproblema.Seasoutrastrêsinteracçõesexercemosseusefeitos através de partículas de troca, então a interacção fraca deve possuir igualmente uma partículadessetipo.Eporqueelatemumalcancemuitocurto,asuapartículadetrocadevepossuirmassa.Comefeito, sendooalcanceda interacçãofracaconsideravelmentemenorqueoda interacçãoforte,aqueladeveriaestarassociadaaumapartículaconsideravelmentemaismaciçadoqueopião.

Umateoriapropostapelaprimeiravezem1967(eaquefareireferênciaadiante)propunhaquefossemtrêsaspartículasdetrocaassociadasàinteracçãofraca-umadecargapositiva,outradecarganegativa e uma terceira neutra.Essa teoria indicava que as partículas deviampossuir umamassa 700vezessuperioràdopiãoe100vezessuperioràdoprotão.

As partículas de troca foram designadas partículas W (de weak, fraco/a em inglês): as quepossuíamcargaeléctricasãoreferidascomoW+eWeapartículaneutracomoZº.

A identificaçãode taispartículasera importante,nãoapenasparaasacrescentaràcolecçãodepartículasconhecidasdoscientistas,mastambémporqueasuaexistênciapermitiriacorroborarateoriaquepostulavaasuaexistência.Estaseriainequivocamenteverdadeiraseasmassasencontradasfossemrealmentetãograndescomoateoriasugeria.Estaera,comoveremos,umateoriaimportante,eadetecçãodaspartículasdetrocatinhaumaimportânciavital.

Adificuldaderesidia,porém,nasmassasenormesdetaispartículas.Eramnecessáriasenergiasimensasparacriarpartículasquepudessemserdetectadas.Sóem1955ficoudisponívelumdispositivocapazdegerarenergiasuficienteparaproduzirepermitirdetectaroantiprotão.FazeromesmoparaaspartículasWexigiaaconcentraçãode,pelomenos,cemvezesmaisenergia.

Apenasnosanos80foramconcebidosaceleradoresdepartículascapazesdeforneceraenergianecessária.UmgrupodecientistasamericanosnoFermilab,emBatavia,Illinois,lançou-senabuscadaspartículasW,omesmosucedendocomumgrupodecientistaseuropeusreunidosnoCentroEuropeudeInvestigaçãoNuclear(CERN),próximodeGenebra,naSuíça.

As dificuldades destes dois grupos não tinham apenas que ver com energia. Se as partículassurgissem, teriam uma vida excessivamente curta para poderem ser detectadas directamente. Seriaportantonecessário identificá-las atravésdos seusprodutosdedesintegração (muõeseneutrinos),quehaveriaqueencontrarporentreumgrandenúmerodoutraspartículasformadasnamesmaaltura.

Acompetiçãoentreosdoislaboratóriosera,porisso,difícil.SucedequeoFermilabficousemdinheiro e possuía equipamentos menos adequados. O CERN, por sua vez, era liderado pelo físicoitaliano-incrivelmenteenérgico-CarloRubbia(n.1934)eacabouporganharacorrida.

Rubbia modificou os dispositivos experimentais em função do objectivo da sua equipa e, em1982, obteve 140 0000 eventos que podiam ter resultado na produção de partículasW.Recorrendo acomputadores, foi possível reduzir esse número a apenas cinco eventos que somente podiam serexplicados com partículasW em quatro casos eW+ no outro. Além disso, os cientistas conseguirammedir a energia dessas partículas e, a partir daí, calcular a respectiva massa, que era precisamenteaquelaqueforaprevistapelateoria.

Osresultadosforamanunciadosa25deJaneirode1983.RubbiacontinuouaprocurarapartículaZº,queera15porcentromaismaciçadoqueaspartículasWe,porisso,maisdifícildedetectar.EstapartículafoifinalmenteencontradaemMaiode1983eoanúnciodadescobertafeitoemJunho.Em1984,RubbiafoigalardoadocomumPrémioNobelpeloseutrabalho.

Háumaoutrapartículaquepodeexistirrelacionadacomateoria.Trata-sedapartículadeHiggs,assimdesignadaemhomenagemao físicobritânicoPeterHiggs (n.1929)queprimeiropostuloua suaexistência. A teoria não é clara sobre a sua massa e restantes propriedades. Pensa-se que seráconsideravelmentemaismaciçadoqueaspartículasW.Assimsendo,ninguémsabequandoéquepoderáserdetectada.Permaneceumdesafioparaofuturo.

AInteracçãoElectrofracaAnalisámos já quatro interacções: forte, electromagnética, fraca e gravítica, por ordem

decrescentedeintensidade.Seráqueexistemoutras?Amaioriadoscientistaspensaquenão.Mas será que é mesmo assim? Afinal, até aos anos 30 os cientistas conheciam apenas duas

interacções-aelectromagnéticaeagravítica-edepoissurgiramasduasinteracçõesnucleares.Contudo,asnovasinteracçõesnãoconstituíramumasurpresatotal.Ofenómenodaradioactividadeeraintrigante,vistoserpordemaisevidentequenemagravidadenemoelectromagnetismoeramcapazesdeoexplicar.Umavezdesvendadaaestruturadonúcleoatómico,passouaexistirumanecessidadeprementedealgodenovo.

Asituaçãoactualébastantediferente.Nomeioséculoquedecorreudesdeadescobertadasduasinteracções nucleares, todos os aspectos da física subatômica têm sido intensamente exploradosrecorrendo a uma panóplia de instrumentos comuma potência e sensibilidade sem precedentes.Alémdisso, os cientistas começaram a investigar omundo à nossa volta e o Universo com instrumentos edispositivosqueninguémteriasidocapazsequerdeimaginarnosanos30.

Têmsidofeitasmuitasdescobertasqueninguémpodiaterprevisto,sendoóbvioque,nodomíniodainvestigaçãocientífica,seavançoumaisnosúltimoscinquentaanosdoquenosmilharesdeanosqueosprecederam.

E,todavia,ostrabalhoscientíficosdoúltimomeioséculonãoidentificaramumúnicofenómeno,seja à escala do Universo ou do neutrino, que não possa ser explicado através duma das quatrointeracções.Anecessidadedumaquintainteracçãonuncasefezsentir,eéissoquelevaoscientistasaacreditarqueelassãorealmenteemnúmerodequatro.

Eum factoque,no finaldosanos80, se faloudumaquinta interacçãoque seriamenos intensaaindadoqueagravidadeepossuiriaumalcance intermédioentreodas interacçõesnucleareseodasoutrasduas interacções.Esta interacçãovariariacomacomposiçãoquímicadosmateriais implicados.Durantealgumtempo,aideiasuscitouumcertointeresse,masaspropriedadesdessasupostainteracçãoeramdumatalcomplexidadequeamim,pelomenos,asuaexistênciamepareceudesdesemprealtamenteimprovável.Naverdade,ointeresserapidamentesedesvaneceu.

ÉclaroqueexisteapossibilidadedesedescobriremnovosaspectosdoUniversoqueestãoparalá do nosso conhecimento actual. E isso, a acontecer, será uma surpresa completa (como o foi adescoberta da radioactividade em 1896). Uma tal descoberta poderá levar os cientistas a conceberinteracçõesadicionaisqueserãorelevantesemcondiçõesqueatéagoranuncativemosoportunidadedeestudar.Contudo,époucoprovávelqueissovenhaaacontecer.

Assimsendo,aperguntarelativamenteaonúmerodeinteracçõesnãodeveser"Porquerazãonãoexistemmais interacções?"mas "Porquê quatro?".Os cientistas acreditam que existe um princípio deeconomia,porassimdizer,naestruturadoUniverso.Queoseufuncionamentoéomaissimplespossível:ou seja, queduas tarefas não são realizadas de duas formas completamente diferentes se puderem serrealizadasdummodoúnicoadequadamentemodificadoparaseadaptaraambasassituações.

Até1870, pareciamexistir quatro fenómenosdiferentesque se faziam sentir atravésdovácuo:luz,electricidade,magnetismoegravidade.Osquatropareciammuitodiferentesunsdosoutros.Ainda

assim,ecomojáseexplicouanteriormente,Maxwell,numadasgrandesintuiçõescientíficasdetodosostempos, elaborou um conjunto de equações que regiam tanto a electricidade como o magnetismo edemonstravamqueambososfenómenosestavamintimamenterelacionados.Alémdisso,combinandooscampos eléctrico emagnético num campo electromagnético, verificava-se que a luz era uma radiaçãoíntimaeinextricavelmenterelacionadacomeste.Comasuaintuição,Maxwellfoicapazdeprevertodoum conjunto de radiações semelhantes à luz - das ondas rádio à radiação gama - que apenas seriamefectivamentedetectadasumquartodeséculomaistarde.

Parecia portanto natural tentar alargar o trabalho deMaxwell de modo a incluir a interacçãogravítica.Einsteindedicouoúltimoterçodasuavidaaestatarefamasnãofoibemsucedido,comoderesto todos os que também procuraram fazê-lo. Depois, nos anos 30, a situação complicou-se com adescobertadasduas interacçõesnucleares, a forte e a fraca.Aciência encontrava-sedenovoperantequatrocampos.Issonãosignificou,porém,queoscientistasdesistissemdedescrevertodososcamposcomumúnicoconjuntodeequações (uma teoriadocampounificado).DemonstrarqueoUniversoéomaissimplespossíveléumatentaçãodemasiadoforteparapoderserignorada.

Em 1967, o físico norte-americano Steven Weinberg (n. 1933) desenvolveu um conjunto deequaçõesquedescreviaasinteracçõeselectromagnéticaefraca.Asduaspareciamsermuitodiferentese,todavia,FermidesenvolveraateoriadainteracçãofracautilizandoaformulaçãomatemáticausadaporDiracparaasinteracçõeselectromagnéticas,peloquedeviaexistiralgumasemelhança.

Weinberg propôs um tratamento matemático que colocava as duas interacções sob ummesmotelhado,demonstrandoquetinhamdeexistirquatropartículasdetrocaparaaquiloquesepodiadesignarcomointeracçãoelectrofraca.Umadestasnãopossuimassaeéindubitavelmenteofotão.Asoutrastrêstêmmassa, umamassamuito significativa, e foramdesignadaspartículasW+,WeZº. (Existe ainda apartículadeHiggs,masquantoaissohámenoscertezas.)

Mais ou menos pela mesma época, o físico paquistanês-britânico Abdus Saiam (1926-1996)elaborou, independentemente,uma teoriaquase idêntica. (Talnãodeve surpreender-nos.Muitasvezes,quando a informação atinge um certo nível num determinado domínio científico, há progressossignificativosqueestãomesmoapedirpara serem feitos - a situaçãoestámadura,por assimdizer.Eacontece mais duma pessoa responder a esse apelo. O caso mais conhecido deste tipo de situaçãoocorreuem1859,quandoCharlesRobertDarwineAlfredRusselWallaceprepararamparapublicação,independentementeeemsimultâneo,ateoriadaevoluçãobiológicaporselecçãonatural.)

Ainteracçãoelectrofracanãofoiimediatamentereconhecidaeaplaudida.Haviaalgunsaspectosda sua formulação matemática que estavam incompletos e que só alguns anos mais tarde foramaperfeiçoadospelofísicoholandêsGerard'tHooft(n.1946).

A existir a interacção electrofraca, devia haver correntes neutras. Por outras palavras, deviamocorrer interacções entre partículas envolvendo uma partícula de troca da interacção fraca que nãoimplicassemumatransferênciadecargadumapartículaparaoutra.EraporcausadestacorrenteneutraqueapartículaZºeranecessária.Em1973,taiscorrentesforamefectivamentedetectadase,subitamente,a teoria electrofraca começou a parecer muito interessante. Em 1979,Weiberg e Saiam receberam oPrémioNobelpelosseustrabalhos.Adetecçãodaspartículasdetroca,ocorridaem1983,foioelementoquefaltavaparacorroborarateoria.

Existindoumaúnicainteracçãoelectrofraca,oleitorpoderáinterrogar-seporquerazãoassuasfacetas de interacção electromagnética e de interacção fraca são tão diferentes. Aparentemente, issoresultado factodevivermosabaixas temperaturas.Sea temperatura fossesuficientementealta (muitomaisaltadoqueaquelasqueencontramosactualmenteànossavolta),existiriarealmenteumainteracção

apenas. À medida que a temperatura diminui, porém, os dois aspectos da interacção separam--se.Continuamaconstituirumasóinteracção,masmanifestam-sedeformassubstancialmentediferentes.

Podemosusarumaanalogiaparaexplicaristo.Aáguaexisteemtrêsestados:águalíquida,geloevapor. A seres que desconhecessem o nossomundo, eles dariam a impressão de corresponder a trêssubstânciastotalmentediferentes,semqualquerrelaçãoentresi.

Suponhamos agora que a temperatura era suficientemente elevada para que toda a água seencontrassesobaformadevapor.Aáguaseriaclaramenteumaúnicasubstânciacomumúnicoconjuntodepropriedades.Masseatemperaturadescesse,algumaáguacondensar-se-iaemágualíquida,easfasessólida e líquida ficariam em equilíbrio. Haveria agora aparentemente duas substâncias, com doisconjuntosdepropriedadesmuitodiferentes.

Se a temperatura descesse mais ainda, alguma da água transformar--se-ia em gelo. Teríamosassim gelo, água e vapor, em equilíbrio; os três com aspecto e propriedades bastante diferentes e,todavia,fundamentalmenteamesmasubstância.

Existe portanto a ideia de que, quando o Universo se formou, a sua temperatura eraextraordinariamenteelevada-qualquercoisacomodezmilhõesdebiliõesdebiliõesdebiliõesdegraus.Nesse instante, e sob essas condições, existia apenasuma interacção.Amedidaque a temperatura foidiminuindo (oque aconteceumuito rapidamente, pelanossa escalade tempo), a gravidade separou-secomointeracçãodistinta,tornando-semenosintensacomadescidadatemperatura.Depoisfoiavezdainteracçãoforteseseparare,finalmente,asinteracçõesfracaeelectromagnéticadivergiram.

Esta sequência de eventos leva-nos naturalmente a supor que o processo pode ser invertidomatematicamente e que as quatro interacções podem ser colocadas sob ummesmo telhado. Têm sidoapresentadasdiversassugestõesparaunificarasinteracçõeselectrofracaeforteemuitoscientistasestãoconfiantesqueserápossíveldesenvolvercomêxitouma"grandeteoriaunificada".Noentanto,todasastentativas para incluir também a gravidade falharam até agora. O fenómeno continua a constituir umproblemairredutível(tereimaisadizersobreeleadiante).

11.QUARKS

OZooHadrónicoConsideremosasdiversaspartículassubatômicasdescritasatéagora.Emprimeiro lugar, temos

os leptões, que estão sujeitos à interacção fraca e, no caso de terem carga eléctrica, à interacçãoelectromagnética, mas não à interacção forte. Os leptões parecem ser partículas fundamentais, nuncatendo sido possível demonstrar a existência de qualquer estrutura interna. Incluem três sabores: oelectrão e o seu neutrino, omuão e o seu neutrino, e o tauão e o seu neutrino. Para cada uma destaspartículas existe igualmente uma antipartícula, o que dá um total de doze leptões. Os cientistas nãoesperamencontrarmaispartículasdestetipo.

Depois,existemaspartículasquesão trocadasnasquatro interacções:ogravitãona interacçãogravítica, o fotão na interacção electromagnética, as partículasW na interacção fraca e o pião comopartícula de troca deYukawa na interacção forte. O gravitão e o fotão são partículas únicas,mas aspartículas W e o pião existem em versões com carga positiva, negativa e neutra. Isto significa queexistem,aotodo,oitopartículasdetroca.Oscientistastambémnãoesperamencontrarmaispartículasdogénero.

Restam as partículas que estão sujeitas à interacção forte. Aquelas que se conhecem há maistemposãoosbariões-ouseja,protõeseneutrões-cujaexistêncialadoaladononúcleoatómicofoiopretexto para a elaboração da teoria da interacção forte.Além disso, há os piões, que sãomesões etambémestãosujeitosàinteracçãoforte.

As partículas sujeitas à interacção forte - bariões emesões - são agrupadas sob a designaçãocomumdehadrões,dumaexpressãogregaquesignifica"espesso"ou"forte".Oshadrõesconstituempoisumbomcontrapontoaos leptõesque,comoexpliqueianteriormente, receberamoseunomedapalavragregapara"fraco".

Se o protão, o neutrão e as suas antipartículas, mais os três piões, fossem os únicos hadrõesexistentes,seriamaotodosete,umnúmerorazoável.Umavezqueostrêspiõespodemserconsideradospartículasdetroca, issosignificaqueleptões,partículasdetrocaehadrões, tantonasuaformanormalcomonasuaantiforma,representam,emconjunto,apenasvinteequatropartículas,umnúmeroaceitávelparaoscientistas,nopressupostodequeaestruturadoUniversoésimples.

Noentanto,àmedidaqueosaceleradoresdepartículassetornarammaioresemaiseficientes,osfísicosdescobriramque a energiadisponível coalescia, por assimdizer, emnumerosaspartículas quenãoexistiamexceptosobcondiçõesdealtaenergia.Todasessaspartículassãoextremamenteinstáveis,existindonomáximoduranteummilionésimodesegundoe,namaiorpartedoscasos,duranteperíodosmuitomaiscurtos.

Asnovasdescobertasincluemotauãoeoseuneutrino,entreosleptões,easpartículasWentreaspartículasdetroca,sendomuitasdasoutrasdescobertasrelativasahadrões.

Em 1944, por exemplo, foi descoberta uma nova partícula, identificada como um mesão. ÉdesignadamesãoK ou, frequentemente, kaão. A suamassa é três vezes emeia superior à do pião eaproximadamentemetadedadoprotão.

Em1947,foidescobertoumprimeirogrupodepartículasmaismaciçasqueoprotãoouneutrão.Aspartículasforamchamadashiperões,dumapalavragregaquesignifica"paraláde",umavezqueas

suasmassassesituavamparaládasdoprotãoouneutrãoque,atéentão,eramconsideradasaspartículasdemaiormassa.

Asdescobertascontinuaramasuceder-se,tendosidoidentificadamaisdumacentenadehadrõesdistintos,oque implicavaaexistênciadumacentenadediferentesanti-hadrões.Algunsdestesexistemapenas durante alguns bilionésimos dum bilionésimo de segundo antes de se desintegrarem,mas são,aindaassim,partículas.

Os físicos ficaramdeveras preocupados.Até então, todos os sinais tinham apontado para umasimplicidadesatisfatóriadoUniverso.Masagora,o"zoohadrónico"reduziradenovoascoisasaumacomplexidadeaparentementesemsentido.Naturalmente,fizeram-setentativasparaencontrarordementretodosesseshadrões,ouseja,paraosagrupardummodoquefizessesentido.Seissopudesseserfeito,nãoserianecessáriolidarcomtantasespéciesindividualmente,masapenascomalgunsgrupos.

Já em 1932, por exemplo, Heisenberg mostrara que, ignorando a respectiva carga eléctrica,protão e neutrão podiam ser encarados como uma única partícula em dois estados diferentes. Eraimpossíveldescreveressadiferençaemtermosdosensocomum,masbastavachamaraumdosestadospositivoeaooutronegativo.

Em 1937, o físico húngaro-americano Eugene Paul Wigner propôs que o protão e o neutrãofossemconsideradossemelhantesa isótoposna tabelaperiódicadoselementos.Equeosdoisestadosfosseminterpretadoscomoumaespéciedespin,sendoquedoisspinsdiferentesexplicavamadiferençade estado.Wigner designou os estados deHeisenberg spin isotópico, uma designação que foi depoissimplificadaparaisospin.Em1938,ofísicorussoN.Kemmerdemonstrouqueostrêspiões-positivo,negativoeneutro-podiamsertratadoscomoumamesmapartículacomtrêsisospinsdistintos.

O isospin é um conceito importante, em primeiro lugar porque permite agrupar algumas daspartículasereduziracomplexidadehadrónica.Depois,porqueseconservaentreoshadrões.Estefactoajudaacompreendermelhorozoohadrónico,vistoquetodasessaspartículasnãosofremalteraçõesouinteragem de modo aleatório, antes conservam certas propriedades, o que limita o número detransformaçõespermitidas.Quantomaiorforonúmerodepropriedadesquesejapossíveldemonstrarquese têm de conservar, mais numerosas são as restrições impostas às partículas e mais fácil se tornacompreenderaquiloquesepassa.

Oskaõeseoshiperões,porexemplo,duramumtemposurpreendentemente longo.Énecessárioummilionésimode segundo para os kaões se desintegrarem, e quase ummilésimodemilionésimodesegundo para que omesmo suceda comos hiperões.Omodo como são produzidos indica claramentetratar-sedeprocessosmediadospelainteracçãoforte.Porisso,devemdesintegrar-sedamesmamaneira-numafracçãoínfimadumbilionésimodesegundo.

Mas não é isso que acontece.As partículas durammilhares oumesmomilhões de vezesmaistempo do que deviam e, portanto, o seu decaimento deve ocorrer através da interacção fraca. Isto,inicialmente,pareceuestranhoe,naverdade,estaspartículasforamdesignadaspartículasestranhas.

Em 1953, o físico norte-americano Murray Gell-Mann (n. 1929) sugeriu a existência dumapropriedadequeseriapossuídapelaspartículasestranhasmasnãopelosoutroshadrões.Naturalmente,Gell-Manndesignouessapropriedade"estranheza".

Oprotão,neutrãoediversospiões têm,cadaqual,umaestranheza iguala0,masomesmonãosucedecomoskaõesehiperões.Aestranhezaconserva-sena interacçãoforte.Oskaõeseoshiperõesnão podemdesintegrar-se por intermédio da interacção forte, uma vez que seriamproduzidos piões eprotõescomestranhezazero,oquesignificariaodesaparecimentodaestranhezae,portanto,aviolação

dumaleideconservação.Oskaõesehiperões têm,por isso,desedesintegrarpormeioda interacçãofraca,naqualaestranhezanãoéconservada.Êestaarazãoporqueaspartículasestranhasduramtantotempo.

Osestudosdoshadrõesnemsemprepermitemestabeleceroupreservarleisdeconservação.Numcaso,oscientistasforammesmoforçadosareveralei.

Já em 1927Wigner propusera uma lei de conservação da paridade.A paridade não pode serexplicada literalmente, mas podemos usar uma analogia, recorrendo aos números pares e ímpares. Asomadedoisnúmerosparesésempreumnúmeropar;easomadedoisnúmerosímparesésempreumnúmero par.Contudo, a soma dum número par com um número ímpar é sempre um número ímpar. Seconsiderarmosalgumaspartículaspareoutras ímpar,as transformaçõespermitidasdevemobedeceràsmesmasregras:par+par=ímpar+ímpar=par;eímpar+par=par+ímpar=ímpar.

Contudo, no início dos anos 50, descobriu-se que existia entre os kaões uma variedade queapresentavaumaformadeenfraquecimentopeculiar.Porvezesdavaorigemadoispiões,outrasvezesatrês.Osdoispiõesdavamumresultadoqueerapar,masostrêsdavamumresultadoímpar.Aquestãoquesepunhaeraadesabercomoéqueokaãotantopodiaserparcomoímpar.

A solução mais simples era supor que existiam duas partículas muito semelhantes, uma comparidadepareaoutraímpar.Asduaspartículasforamdesignadasmesãotauemesãoteta,donomededuasletrasdoalfabetogrego.Istopareciaresolveraquestão,nãofossedar-seocasodenãoserpossíveldistinguirumapartículadaoutra.

A situação não era, no entanto, dramática. O neutrino muónico não pode ser distinguido doneutrino de electrão por qualquer propriedade mensurável, mas somente pelo comportamento dum edoutroemdiversasinteracções.Talvezomesmosepassassecomomesãotaueomesãoteta.

No caso dos dois neutrinos, porém, parecia não haver alternativa a aceitar a existência dumadiferençaindistinguível.Nocasodosdoismesões,havia.Eseaparidadenãoseconservassesempre?

Osfísicossino-americanosChenNingYang(n.1922)eTsung-DaoLee(n.1926)deduziramasconsequênciasteóricasdissomesmoem1956,nopressupostodequeaparidadenãoseconservava,pelomenosnasreacçõesmediadaspelainteracçãofraca.Mascomoéquetalpodiaserdemonstrado?

A resposta resideno factode, numcerto sentido, a conservaçãodaparidade ser equivalente ànoçãodesimetriaesquerda-direita.Poroutraspalavras,seaparidadeforconservadaeumadeterminadareacção produzir um feixe de partículas, estas deslocar-se-ão para a esquerda e para a direita emquantidadesiguais.Se,contudo,aparidadenãoseconservar,aspartículasirãoapenasparaaesquerdaouapenasparaadireita.(Umdosmotivosporqueoscientistastinhamtantadificuldadeemaceitarqueaparidade não se conservava residia no facto de não verem razão para o Universo estabelecer umadistinçãoentreesquerdaedireita.)

Paraesclarecerdevezaquestão,foiconcebidanaUniversidadedeColúmbiaumaexperiência,dirigida por uma física sino-americana, Chien Shung Wu. Nela foi usada uma amostra do isótoporadioactivocobalto-60,quesedesintegraproduzindopartículasbeta,numprocessoqueémediadopelainteracçãofraca.Essaspartículasbetasãoemitidasemtodasasdirecções,oquesedeveemparteaofacto dos próprios átomos estaremorientados em todas as direcções.Wu resolveu por isso colocar omaterial num campomagnéticomuito intenso, demodo a que os átomos ficassem todos alinhados namesma direcção. Isto permitia que emitissem radiação beta numa única direcção, se de facto nãohouvesseconservaçãodaparidade.Éclaroque,àtemperaturaambiente,osátomosvibramemdiferentesdirecções,apesarde sujeitosaumcampomagnético.Wudecidiu,por isso,arrefecerocobalto-60até

umatemperaturapróximadozeroabsoluto.Seaparidadenãoseconservasse,aspartículasbetaseriamemitidasapenasparaumlado.Em

Janeiro de 1957, já não restavam quaisquer dúvidas aos cientistas: as partículas beta estavam a seremitidas apenas numa direcção, o que significava que a paridade não se conservava nas interacçõesfracas.Nessemesmoano,YangeLeereceberamumPrémioNobel.'

Aparidadeconserva-senosoutrostiposdeinteracçõese,mesmonocasodainteracçãofraca,épossível formularuma leideconservaçãomaisgenérica.Seumadeterminadapartícula for"esquerda"emtermosdeparidade(P),asuaantipartículacomcargaoposta(C)é"direita".Oquesignificaquesepartícula e antipartícula forem consideradas em conjunto, a propriedade CP (que considera tanto aparidadecomoacarga)éconservada.

Contudo, em 1964, os físicos norte-americanos Val Logsdon Fitch (n. 1923) e JamesWatsonCronin(n.1931)demonstraramquenemmesmoCPerasempreconservadaequeeranecessáriojuntar-lhe a propriedade tempo (T). Se CP não se conservar numa direcção do tempo, não se conserva nadirecçãooposta.Crê-seactualmentequeaquiloqueseconservanasinteracçõesfracaséasimetriaCPT.Peloseutrabalho,CronineFitchpartilharamumPrémioNobelem1980.

Em 1981, Gell-Mann usou um conjunto de propriedades que se conservavam para agrupar oshadrões em polígonos de forma simétrica contendo oito, nove ou dez itens. Deste modo, conseguiuconstituirfamíliasdepartículasecriaralgosemelhanteàtabelaperiódicadoselementos.Nessaépoca,ofísicoisraelitaYuvalNe'eman(n.1925)trabalhavaigualmentesobreideiassemelhantes.

OscientistastiveramdificuldadeemlevarosarranjosdeGell-Mannasério,talcomo,umséculoantes,lhestinhacustadoaceitaratabelaperiódicadoselementosdeMendeleev.Mendeleev,noentanto,conseguiraconvencerosseusparesusandoatabelaparapreveraspropriedadesdeelementosaindanãodescobertos-eacertandonelas.

Gell-Mannconcebeuumtriângulodedezpartículas,organizadasdetalmodoqueosvaloresdasdiferentespropriedadesconservadasvariavamdeformafixaeregulardepontoparaponto.Contudo,aoseuvérticesuperiornãocorrespondianenhumapartículaconhecida.

Oesquemaindicaqueapartículaemfaltapossuipropriedadespeculiares,incluindoumamassainvulgarmente grande e uma estranheza também invulgarmente elevada. Essa partícula foi designadaómegamenos,emboraasuaexistênciafosseencaradacomalgumcepticismo.

Apartirdanaturezadaspropriedadesdapartículaómegamenos,Gell-Mannconcluiuqueelaeraproduzidapelainteracçãodumkaãonegativocomumprotão.Estesteriamdeserfeitoscolidiraenergiassuficientementealtasparaoriginaremumapartículacomamassainvulgarmentegrandeatribuídaàómegamenos.

Gell-Manntevedeconvenceroresponsávelporumgrandeaceleradordepartículasarealizaraexperiência.EmDezembrode1963,aequipaquetrabalhavanoaceleradordeBrookhaven,LongIsland,começouafazercolidirmesõesKcomprotões.Nodia31deJaneirode1964,foidetectadoumeventoquesópodiaserexplicadopelapresençadumapartículaómegamenos,vistotersurgidoumapartículaquerevelavaprecisamenteaspropriedadesprevistasporGell-Mann.Estefoigalardoadoem1969comum Prémio Nobel pelo seu trabalho. A partir de então, os agrupamentos de hadrões de Gell-Mannpassaramaserlevadosasério.Ozoohadrónicocomeçavafinalmenteaficarmaisarrumado.

NoInteriordosHadrõesMasdividiroshadrõesemgruposeconstruirumaespéciedetabelaperiódicasubatômicanãoera

suficiente.AorganizaçãodatabelaperiódicadeMendeleevnãotiveraumaexplicaçãosatisfatóriaatétersidoelucidadaaestruturainternadosátomosecompreendidaaimportânciadosdiferentesarranjosdoselectrõesnassuascamadas.

Gell-Mann considerava que os hadrões deviam ter uma estrutura interna que explicasse aexistênciadosgrupos.Nãose tratavadumaideia insustentável.Os leptõessãopartículas fundamentaisque se comportam como simples pontos no espaço, sem estrutura interna, mas isso não eranecessariamenteverdadenocasodoshadrões.

Eleimaginouumgrupodepartículasqueseriamtalvezfundamentais,compropriedadesque,seagrupadasdemodoadequado,produziamtodososdiferenteshadrõescomasrespectivaspropriedades.Umacombinaçãodariaoprotão,outraoneutrão,outraaindaosdiferentespiões,etc.

Gell-Mann lançoumãos à obra e embreve descobriu que a tarefa não era possível se ficasseagarrado ao princípio de que cada partícula tinha de ter uma carga eléctrica de magnitude igual oumúltipla da carga do electrão ou protão. Em vez disso, descobriu que as partículas constituintes doshadrõestinhamdepossuircargasqueeramfracçõesdaquela.

Perante uma tal perspectiva, Gell-Mann hesitou. Desde que os cientistas trabalhavam compartículas com carga eléctrica, o que remontava às experiências de Faraday no domínio daelectroquímica realizadas cerca de século emeio antes, que as cargas eléctricas pareciam existir emmúltiplosdumaunidademaispequena(eaparentementeindivisível)-oelectrão.

Em 1963, porém, Gell-Mann decidiu publicar as suas ideias. E sugeriu a existência de trêspartículasfundamentaisconstituintesdoshadrões,edetrêsantipartículasqueformariamosanti-hadrões.Cada hadrão seria constituído por duas ou três dessas partículas fundamentais. Os mesões seriamformadosapartirdeduaseosbariõesdetrês.

Gell-Mann decidiu chamar quarks a essas partículas fundamentais. (Trata-se duma bizarriaretiradadaobradeJamesJoyce,FinnegansWake,ondeaexpressãoaparecenafrase"TfireequarksforMuster Mark". Sempre entendi isto como querendo dizer, em linguagem joyceana, "Três quartilhos(quarts) para o Sr. (Mister) Mark". E sempre imaginei que se tratava dum pedido de cerveja. AinterpretaçãodeGell-Mannparecetersidooutra:"ThreequarksforMusterHadron"(trêsquarksparaagrupar[muster]oshadrões).Emminhaopinião,adesignaçãonãodeviatersidoconservada,umavezquenão é elegante.No entanto, o nomepegou, provavelmente para surpresa dopróprioGell-Mann, eagoraéincontornável.)

Gell-Mannpropôsaexistênciadetrêstiposdequarks,queforamextravagantementedesignadoscomoquarkdecima(up),quarkdebaixo(down)equarkestranho(strange).(Estesadjectivosnãodevemsertomadosàletra.Podemosfalaremquarku,quarkdequarksousimplesmenteemu,des.Porvezesdiz-sequeos significa"de lado" (sideways)paracriarumacertacoerênciacomoupeodown,masestranhoémelhorporqueémaisexpressivo.)

Oquarkutemumacargaeléctricade2/3eoquarkdde1/3.(Comoseriadeesperar,oantiquarku tem uma carga de -2/3 e o antiquark d de + 1/3.) Cada tipo de quark tem uma série de números

representandoasdiversaspropriedadesqueconserva.Osquarkstêmdesercombinadosdetalmodoqueohadrãoaquedãoorigempossuatodososnúmeroscorrectosparaassuaspropriedades.

Naturalmente,écomascargas fraccionariasquedevemos termaiscuidado.Osquarks tambémdevem ser combinados de modo a garantir que a carga eléctrica total do hadrão é +1, -1 ou 0. Porexemplo:umprotãoéconstituídopordoisquarksueumquarkd;asuacargatotalédadapor+2/3e+2/3e-I/3,ouseja+1.Umantiprotãoéformadopordoisantiquarksueumantiquarkd(-2/3e-2/3e+1/3),paraumacargatotalde-1.Umneutrãoéconstituídoporumquarkuedoisquarksd(+2/3e-1/3e-I/3),paraumacargatotalde0.Eumantineutrãoécompostoporumantiquarkuedoisantiquarksd(-2/3e+1/3e1/3),paraumacargatotalde0.

Umpiãopositivoéconstituídoporumquarkueumquarkd(+2/3e+1/3),paraumacargatotalde+1.Eumpiãonegativoécompostoporumantiquarkueumquarkd(-2/3e-I/3),paraumacargatotalde-1.

Oquarksentranaconstituiçãodaspartículasestranhas,dasquaisaliásrecebeuadesignaçãos.Temcargaeléctrica-I/3eestranheza-1.Oantiquarkspossuicargaeléctrica+1/3eestranheza+1.

OmesãoKpositivocontémumquarkueumantiquarks(+2/3e+1/3),paraumacargatotalde+1eumaestranhezade-1.OmesãoKnegativoconsistenumantiquarkuenumquarks(-2/3e-I/3),paraumacargatotalde-1eumaestranhezade-1.

Umapartículalambda(umhiperãoneutro)consistenumquarku,numquarkdenumquarks(+2/3e1/3e-I/3),paraumacargaeléctricade0,enquantoqueapartículaómegamenoséconstituídaportrêsquarkss(-I/3e-I/3e-I/3),paraumacargatotalde-1.Ambassãopartículasestranhas.

Destemodo se compõemosdiversoshadrões,nãohavendoqualquer combinaçãopossívelquenãoresultenumacargatotalde0,+1ou-1.

Masseráquetudoistoérealmenteverdade?Seráqueosquarksexistemmesmooutudonãopassadumacontabilidadeengenhosa?Afinal,umanotadedólarvaleomesmoqueinúmerascombinaçõesdemoedas - meios-dólares, quarters (vinte e cinco cêntimos), dimes (dez cêntimos), nickels (cincocêntimos)epennies(umcêntimo).Masseanotadedólarforrasgadaempedaços,nãohámoedascujovalorsejaequivalenteaqualquerpartedasuaestrutura.

Suponhamosentãoqueabríamosumhadrãoaomeio.Seráquesaíamládedentroquarks?Outudoistosãoapenascontas?Infelizmente,ninguémconseguiuatéagoradespedaçarumhadrãoouproduzirdeformainequívocaumquarklivre.Setalacontecesse,seriafácilidentificarapartículaporcausadasuacarga fraccionaria. No entanto, existem cientistas que acreditam que é impossível, mesmo em teoria,extrair um quark dum hadrão. E mesmo que fosse possível, não dispomos ainda de energiassuficientemente elevadas para o conseguir. Contudo, existem provas indirectas da existência real dosquarks.

Em1911,Rutherforddescreveuasexperiênciasemquebombardearaátomoscompartículasalfa.Nasuamaioria,atravessaramosátomoscomoseeles fossemapenasespaçovazio.Algumas,contudo,foramdispersadas.Ocasionalmente,elascolidiamcompequenasentidadesnointeriordosátomoseassuas trajectórias eram deflectidas. Foi a partir deste facto que Rutherford concluiu que existia umpequenopontomaciçonointeriordosátomos-oseunúcleo.

Seriapossívelbombardearprotõescomelectrõesdealtaenergiae,destemodo,provocarasuadispersão?Dosresultadosdumatalexperiênciatalvezsepudesseconcluirquehaviapontosdentrodosprotõesqueprovocavamadispersãoe,portanto,queosquarksexistiamrealmentenointeriordaqueles.

AexperiênciafoiefectivamenterealizadaporJeromeFriedman(n.1930),HenryKendall(1926-

1999)eRichardTaylor(n.1939)noaceleradorlineardaUniversidadedeStanfordnoiníciodosanos70,tendoostrêsrecebidooPrémioNobeldafísicapelosseustrabalhosem1990.Osresultadosforamadequadamenteinterpretadospelofísiconorte-americanoRichardPhillipsFeynman(1918-1988),quejáforagalardoadocomumNobelem1965poralgoaquemereferireiadiante.Em1974,tornara-seclaroqueosquarksexistiamrealmente,mesmosenuncaeramencontradosnoestadolivre.

Feynmanchamoupartõesàspartículasexistentesdentrodosprotões.(Emminhaopinião,trata-sedumadesignaçãomuitomelhordoquequarks.OuFeynmanachava,comoeu,queotermoquarképoucoharmonioso,ouentãoconsideravaqueateoriadeGell-Mannnãoestavaabsolutamentecorrecta.)

Mashaviaagoraapossibilidadedesurgiremnovasdificuldades.Quandoestudámososátomosverificámosqueexistiam tantos tiposdiferentesquea simplicidade seperdeu.Descemosaoníveldaspartículassubatômicaspararestauraressasimplicidade,masdescobrimosqueestaseramemtãograndenúmeroqueasimplicidadeseperdeuumasegundavez.Agoraqueestamosaoníveldosquarks,seráquevamosconcluirqueexistemmuitostiposdiferentes?

Haviaquempensassequedeviaexistirpelomenosmaisumquark.Eraocasodo físiconorte-americano Julian Seymour Schwinger (n. 1918), que partilhara o Nobel com Feynman em 1965.Schwinger considerava que os quarks eram partículas fundamentais, como os leptões. E que erampartículas pontuais, sem estrutura interna (com diâmetro igual a zero, tanto quanto podemosmedi-lo),devendoexistirumasimetriaentreessesdoistiposdepartículas.

Conheciam-se então dois sabores de leptões - o electrão e o seu neutrino, e o muão e o seuneutrino - e, por conseguinte, dois sabores de antileptões. Deviam, por isso, existir dois sabores dequarks.Umeraoquarkueoquarkd(eosseusantiquarks,evidentemente).Ooutroeraoquarksequemais?Seexistiaumquartoquark,aindanãotinhamsidoencontradaspartículasqueocontivessem,mastalpodiadever-seaofactodessequarkedessaspartículasseremtãomaciçasqueasuaproduçãoexigiaumaenergiaconsiderável.

Em 1974, uma equipa dirigida pelo físico norte-americano Burton Richter (n. 1931) usou opoderoso anel acelerador de positrões-electrões da Universidade de Stanford para produzir umapartículaextremamentemaciça -naverdade, trêsvezesmaismaciçadoqueumprotão.Umapartículacom tais características devia desintegrar-se numa fracção ínfima dum segundo,mas não foi isso queaconteceu.Porconseguinte,tinhadeconterumnovoquark-umque,talcomooquarks(massendomuitomaismaciçodoqueeste),impediaasuadesintegraçãoatravésdainteracçãoforte.

A nova partícula foi designada uma partícula com charme pelo facto de durar tanto tempo econter,presumivelmente,um"quarkcharme"ouquarkc-oquartoquarkqueSchwingerprocurava.Era,comefeito,umapartículamaismaciçadoqueasoutrastrês.EmBrookhaven,ofísiconorte-americanoSamuelChaoChungTing(n.1936)chegouàsmesmasconclusões.RichtereTingpartilharamumPrémioNobelem1976.

Porestaaltura,noentanto,foradescobertoumterceirosabordeleptões,sobaformadotauãoedo neutrino tauónico (e respectivas anti-partículas). Significaria isso que existia um terceiro sabor dequarks?

Naverdade,umaquintapartículafoidescobertaem1978,tendosidobaptizadadequarkdefundoouquarkb(bottom).Temdeexistirumasextapartícula,aqueos físicoschamamdequarkde topoouquark t (top).Ainda não foi localizada, provavelmente porque é extraordinariamentemaciça. (Algunscientistasachamquebetdevemsignificar"beleza"[beauty]e"verdade"[trutk].)

CromodinâmicaQuânticaTemosportantotrêssaboresdequarks,talcomotemostrêssaboresdeleptões.Emcadasaborhá

doisleptões,ouquarks,edoisantileptõesouantiquarks.Oquesignificaqueexistem,aotodo,12leptõese12quarks.São24partículasque,juntamentecomaspartículasdetroca,compõemoUniverso(ou,pelomenos, é assim que as coisas actualmente parecem ser).O que nos faz regressar a uma simplicidadetolerável-pelomenos,poragora.Comoexplicareiadiante,estasituaçãopoderáalterar-se.

As semelhanças entre os dois tipos de partículas são interessantes. No caso dos leptões, oprimeirosaborconsistenumelectrãocomcarga-1enumneutrinodeelectrãocomcarga0.Estepadrãorepete-senosoutrosdoissabores:ummuãocomcarga-1eumneutrinomuónicocomcarga0;eumtauãocom carga -1 e um neutrino tauónico com carga 0. A situação inverte-se, naturalmente, no caso dosantileptões,ondeostrêssaborestêmcargasde+1e0.

No caso dos quarks, o primeiro sabor inclui o quark u (+2/3) e o quark d (-I/3). Este padrãorepete-senosegundoeterceirosabores,comoquarkc(+2/3)eoquarks(-V3);ecomoquarkt(+2/3)eoquarkb(-1/3).Maisumavez,asituaçãoinverte-senocasodosantiquarks.

E evidente que a comparação não é exacta.Os leptões incluempartículas comcargas que sãonulasounúmerosinteiros.Oquenãosucedenocasodosquarks,quesótêmcargasfraccionarias.

Asmassasdaspartículasaumentamcomosabornocasodosleptõescomcarga(osneutrinossemcarganãopossuemmassa).Seconsiderarmosamassadoelectrãoiguala1,amassadumuãoé207eado tauãocercade3500.Amassa tambémaumentacomosabornocasodosquarks,masnãoexistemquarkssemmassa,talvezporquetambémnãoexistemquarkssemcarga.

Nocasodoprimeirosabordosquarks(continuandoaconsideraramassadoelectrãoiguala1),oquarku,queéomenosmaciçode todos, temmassa5,eoquarkd temmassa7.Nocasodosegundosabor,oquarkstemumamassadecercade150eoquarkcdecercade1500.Oquarkcéquasetãomaciçocomoumprotão, sendoestaa razãoporqueénecessária tantaenergiaparaproduzirpartículascomcharme,oquelevouaqueasuadescobertaocorressetãotardiamente.

Oterceirosaborcorrespondeamassasaindamaiores.Oquarkbtemumamassadecercade5000,ouseja,quasetrêsvezesamassadoprotão.Éporissoquefoidescobertoaindamaistardequeoquarkc.Quantoaoquark t, nãoexistemvalores fiáveispara a respectivamassa,umavezquenão foiaindaidentificado,masasestimativasapontamparaquesejapelomenos25vezesmaismaciçodoqueoprotão,razãopelaqualasuadescobertatarda.

Nãobasta,evidentemente,fazerumalistadetodososquarks.Énecessárioelucidaromecanismodoseufuncionamento.Em1947,porexemplo,trêsfísicostrabalhandoindependentementetinhamdescritodemododiferente aquilo que sucede na interacção entre electrões e fotões, explicando dessemodo ainteracçãoelectromagnética.Astrêsexplicaçõeseramválidaseessencialmenteequivalentes.

Dois desses físicos eram Schwinger e Feynman. O terceiro era o japonês Sin-itiro Tomonaga(1906-1979). (É possível queTomonaga fosse o primeiro,mas a SegundaGuerraMundial estava emcursoeoscientistasjaponesesestavamisolados.Tomonagasópôdepublicarosseustrabalhosdepoisdofimdaguerra.)OstrêspartilharamumPrémioNobelem1965.

Ateoriaédesignadaelectrodinâmicaquânticaerevelou-seumadasteoriasmaisbemsucedidas

de sempre. Foi capaz de prever com extraordinária precisão fenómenos envolvendo a interacçãoelectromagnética,edesdequefoiformuladanãohouvenecessidadedeaaperfeiçoar.

Oscientistaspensaram,naturalmente,queastécnicasusadasnaelectrodinâmicaquânticapodiamser usadas para descrever o funcionamento das interacções forte e fraca.Mas as primeiras tentativasforamdecepcionantes.Porfim,WeinbergeSaiamconseguiramunificarasinteracçõeselectromagnéticaefraca,masainteracçãofortecontinuouaapresentardificuldades.

Por exemplo: os quarks têm spins fraccionários e são por isso fermiões, tal como os leptões.Existeumprincípiodeexclusão,formuladoporPauliem1925,quedizquedoisfermiõesnãopodemseragrupados nomesmo sistema se todas as suas propriedades quânticas forem idênticas. Temde existirsempreumadiferençanosrespectivosnúmerosquânticos.Setentarmosjuntardoisfermiõescomnúmerosquânticos idênticos, gera--se entre eles uma repulsão muito mais intensa do que a repulsãoelectromagnética.Noentanto,verifica-sequeemalgunshadrõestrêsquarksidênticospodemserjuntosnum mesmo hadrão, como se o princípio de exclusão não existisse. A partícula ómega menos, porexemplo,éconstituídaportrêsquarkss.

Oscientistastinham,porém,granderelutânciaempôrdeladoesseprincípiodeexclusãoqueseaplicavaemtodososoutrosdomíniosdafísicasubatômica.Epretendiamquesemantivesseválidonocasodosquarks.Talvez existisse algumadiferença entrequarksque eramaparentemente idênticos.Seexistissem, por exemplo, três variedades de quarks s, era possível juntar uma partícula de cada numhadrãosemviolaroprincípiodeexclusão.

Apartirde1964,diversosinvestigadores-entreosquaisOscarGreen-bergnaUniversidadedeMaryland,ofísiconipo-americanoYoichiroNambu(n.1921)naUniversidadedeChicago,eMoo-YoungHan(n.1934)naUniversidadedeSyracuse-começaramatrabalharsobreestaquestãodasvariedadesdequarks.

Concluíram que as variedades não eram análogas a coisa alguma na física subatômica, e nãopodiam, na verdade, ser descritas.Apenas se lhes podia atribuir umnome e descrever omodo comooperavam.Onomeescolhidofoicor.

Éclaroque,numcertosentido,setratadumamáescolha,porqueosquarksnãopossuemcornaacepçãocomumdapalavra.Poroutrolado,adesignaçãoéperfeita.Nafotografiaetelevisãoacores,ébemsabidoqueovermelho,verdeeazulsecombinamparadaraimpressãodeausênciadecor,ouseja,debranco.Se todososquarksexistiremnasvariedadesvermelha,verdee azul, umacombinaçãodumquark de cada resultará num desaparecimento da cor, ou seja, em branco. Todas as combinações dequarksnoshadrões têmdeproduzirumresultadobranco.Nãoseconhecequalquerhadrãoondeexistacorporarespectivacomposiçãodequarkssercromaticamentedesequilibrada.

Issoexplicaporquerazãohátrêsquarksparacadabarião,edoisquarks(ouantes,umquarkeumantiquark)emcadamesão.Estassãoasúnicascombinaçõesincolores.

Umavezcompreendidaanoçãodecor,diversasobservaçõesquesemoconceitoteriamparecidoanómalas revelaram-se absolutamente coerentes. Por esse motivo, a ideia de quarks coloridos foirapidamenteaceitepelacomunidadecientífica.

Claroque sehá seis quarks e seis antiquarksdiferentes entre os três sabores, e se cadaquarkpode ter uma de três cores, então existem ao todo trinta e seis quarks coloridos. Isto aumenta acomplexidade da situação, mas dá aos cientistas uma ferramenta para construir uma teoria docomportamentodessaspartículasqueseaproxime,emvalor,daelectro-dinâmicaquântica.Anovateoriaé designada cromodinâmica quântica, onde o prefixo cromo- vem da palavra grega para "cor". Gell-

Mann,queforaquemprimeiropropuseraoconceitodequark,foiumdosquemaiscontribuíramparaoseudesenvolvimentonosanos70.

Ainteracçãoforteéessencialmentea interacçãoentrequarks.Oshadrões,quesãoconstituídospor quarks, estão secundariamente sujeitos à interacção forte, precisamenteporque são feitos de taispartículas.Ospiões,queparecemserapartículadetrocaparaessainteracçãosecundáriadoshadrões,sãopartículas de troca apenasporque, tambémeles, são constituídospor quarks.Por outras palavras,todaaênfasepostanainteracçãofortefundamentaldevesercolocadaagoranosquarks.

Setentarmosseparardoisquarks,onúmerodegluõestrocadosentreambosaumenta.Trata-sedaforçadeatracçãoentrequarks,queaumentacomadistância.Porisso,osquarkssósepodemdeslocarlivrementenointeriordoshadrões.Oscientistassuspeitamquenuncaserápossívelisolarquarkslivresparaestudo.

Aserassim,deveexistirumapartículadetrocaaoníveldosquarks.FoiGell-Mannquempropôsumnomeparaestanovapartícula.Resolveuchamar-lhegluão,porseracola(gíue)quemantémjuntososquarks.

Os gluões têm propriedades invulgares. No caso das outras partículas de troca, por exemplo,quanto maior for a distância entre partículas sujeitas à interacção, menor é o número de partículastrocadasentreelasemenosintensaéainteracção.Asinteracçõesgravíticaeelectromagnéticadiminuemde intensidadecomoquadradodadistânciaentredoisobjectosaelassujeitos.A interacçãofracaeainteracção forte secundária entre hadrões diminuem ainda mais rapidamente de intensidade com adistância.

Nocasodosquarksegluões, todavia,passa-seprecisamenteocontrário.Se tentarmosseparardoisquarks,onúmerodegluõestrocadosentreelesaumenta.Istoéomesmoquedizerqueaforçadeatracçãoentreosquarksaumentacomadistância.

Nointeriordoshadrões,osquarksdeslocam-selivrementeecomfacilidade.Seforemseparados,porém, "endurecem". O que significa que os quarks estão confinados às partículas, apenas existindoconfortavelmente dentro dos hadrões. Por estemotivo, os físicos suspeitam que nunca conseguiremosestudarquarksnoestadolivre.Nãohámaneiradeosfazersairdoshadrões.Estespodem,evidentemente,transformar-seunsnosoutros,transportandoconsigoasuacargadedoisoutrêsquarks(quepodem,elespróprios,mudardecor).

Háoutroaspectoemqueosgluõessãomaiscomplexosdoqueasoutraspartículasdetroca.Osgravitõessãotrocadosentrepartículascommassamasnãopossuem,elespróprios,massa.Osfotõessãotrocadosentrepartículascomcargaeléctricamasnãopossuem,elespróprios,carga.Osgluões,quetêmcor, são trocados por partículas com cor. Por isso, os gluões podem ficar juntos. Esta é outra razãoporqueonomegluãofoiumaboaescolha.(Parasereferiremaumpardegluõesqueficamjuntos,algunsfísicosfalamemboladecola[gluebali].)

Ogluãotemacapacidadedemudaracordumquark(masnãooseusabor).Existeumgluãoquetransformaumquarkvermelhonumverdedomesmosabor,outroqueconvertevermelhoemazul,eassimpordiante.Têmdeexistiroitogluõesdiferentesparadarcontade todasas transformaçõescromáticaspossíveis. Tal constitui uma complexidade adicional. Com uma partícula de troca gravítica, umaelectromagnética,trêsdainteracçãofracaeagoraoitodainteracçãoforte,temosaotodotrezepartículasdetroca.

Mesmoassim,aelectrodinâmicaquânticabaseadaemquarkscomtrêssaboresetrêscores,comoito gluões coloridos (quarenta e quatro partículas, no total) constitui uma teoria bem sucedida e os

cientistasacreditamquecontinuaráaexplicartodasascaracterísticasdoshadrõeseseucomportamento.

12.OUNIVERSO

OMistériodaMassaemFaltaAsobservaçõeseexperiênciasqueoscientistas têmfeitonodomínioda físicasubatômicasão

realizadas, maioritariamente, aqui na Terra. Como é que sabemos que os resultados obtidos sãoaplicáveisaoutrosmundos-àsestrelasouaoUniversoemgeral?

TemosvindoaestudardirectamenteasuperfíciedaLua,deMarteedeVénus,bemcomooutroscorposdonossosistemasolar,atravésdesondas,utilizandoparatalinstrumentossofisticados-mesmoquando não há contacto físico. Também dispomos de pedaços dematéria extraterrestre que chegam àTerrasobaformademeteoritos.Nenhumdessesestudosrevelouquaisquersurpresasanívelsubatômico.Oscientistasestãoconvencidosdequetodososcorposplanetáriosnosistemasolarsãofeitosdamesmamatériaeque,porisso,obedecemàsmesmasregras.

MasquantoaoSol,queparece tãodiferentede todososoutroscomponentesdosistemasolar?Bem, há partículas carregadas electricamente que chegamaté nós vindas doSol, sobretudoprotões, etambémneutrinos,eunseoutrossãotalqualesperávamosquefossem.

EquantoaoUniversoparaládosistemasolar?Recebemosneutrinosdasupernovaqueexplodiuem1987naGrandeNuvemdeMagalhães,erecebemosradiaçãocósmica(sobretudoprotõesepartículasalfa)doUniversoemgeral.AmbososfenómenosindicamqueoUniversosecomportasegundoasregrasqueelucidámosaquinaTerra.

AinformaçãomaisimportantesobreoUniversochegageralmenteaténóssobaformadefotões.Naverdade, conseguimosveroSol e as estrelas, e até galáxias que estão à distância demilhares demilhões de anos-luz. Também conseguimos detectar fotões que são demasiado ou insuficientementeenergéticosparaqueosnossosolhososvejam-raiosgama,raiosX,radiaçãoultravioleta,infravermelhaeondasrádio.

Osfotõesqueconseguimosdetectarfornecem-nosindicaçõesprecisassobreaestruturaquímicadoscorposqueosemitem.OsastrónomosestãoconvencidosdequeoutrasestrelasegaláxiassãofeitasdematériaanálogaàqueconstituionossopróprioSol.EesteéfeitodematériatalcomoaqueexistenaTerra(comadiferençadequeastemperaturassãomuitomaiselevadasnoSol).

Masseráquevemos,oudetectamos,umaamostrarepresentativadetodososfotõesqueexistem?HaveráalgumacoisanoUniversoquenãoemitafotões?Naverdade,nãohá.QualquercorpoqueestejarodeadoporespaçoàtemperaturamédiadoUniverso(cercadetrêsgrauacimadozeroabsoluto)-eissosignificapraticamentetodososcorpos-emitefotões.Algumadaradiação,todavia,éinsuficientementeintensaouenergéticaparapoderserdetectada.

Existemmuitasestrelasquesãotãodébeisquenãoasconseguimosver,mesmocomosmelhoresinstrumentosdisponíveis,anãoserqueestejambastantepertodenós.Algunsplanetasnoutrossistemassolarespossuemsuperfícies tãofriascomosdonossoprópriosistemae,por isso,asondasrádioqueemitemsãodemasiadoténueseperdem-senofulgordaradiaçãoqueéemitidapelasestrelasemtornodasquaisorbitam.

Aindaassim,oscientistasachamquefazsentidosuporqueamaiorpartedamassadoUniversoestáconcentradaemestrelasequeaparcelademassaquenãoconseguimosver,porestardemasiadofriaeasuaradiaçãoserdemasiadodébil,nãoésignificativa.Nonossosistemasolar,porexemplo,todosos

planetas,asteróides,cometas,meteoritosepoeirasqueorbitamemtornodoSolperfazemapenas0,1porcentodamassatotal.Osrestantes99,99porcentodamassaestãoconcentradosnoSol.Hápoisrazõesparasuporque,dummodogeral,asoutrasestrelas tambémpredominamdestemodosobreosobjectosqueorbitamemtornodelas.

PodemnaturalmenteexistirregiõesnoUniversoondeascondiçõessãotãoextremasqueasleisda natureza que conhecemos não funcionam. As regiões onde émais provável que tal suceda são osburacosnegros,ondeamatériacolapsoueseencontranumasituaçãodedensidadequaseinfinita,criandoàsuavoltaumapequenazonadeintensidadegravíticaquaseinfinita.Nãopodemosestudarosburacosnegrosempormenore,atéagora,nãoidentificámosumsequerdemodocompletoe inequívoco.Aindaassim,epartindodoprincípiodequeexistem,estasentidadespoderãosergovernadasporleisquenãoaquelasqueconhecemos.

Um outro domínio de incerteza diz respeitos aos primeiros instantes após o aparecimento doUniverso,quandoascondiçõeseramtãoextremasquetalvezasnossasteoriasfísicasnãoseaplicassem.(Terei algumas palavras a dizer sobre este assunto adiante.) E, todavia, nada parece estar isento desurpresas. Todos os fotões do Universo exterior que estudamos são o produto de interacçõeselectromagnéticas,mas as surpresas vieram--nos dos efeitos da gravidade, a outra interacção a longadistância.

Nãopodemosdetectargravitões,maspodemosdetectaroefeitodagravidadesobreomovimentodasestrelasegaláxias.Podemosmediravelocidadederotaçãodasgaláxiasemdiferentesregiõesdasuaestrutura,epartimosdoprincípiodequeessarotaçãoéprovocadaporforçasgravíticasnointeriordagaláxia,talcomoarotaçãodosplanetasdosistemasolarédeterminadapelainfluênciagravíticadoSol.

Umavezque99,9porcentodamassadosistemasolarestãoconcentradosnoSol,a influênciagravíticasolarsobrepõe-seatodooresto.Seexceptuarmosalgumascorrecçõesmínimas,essaéaúnicainfluência a ter em conta.Quantomais longe um planeta estiver do Sol,menos intensa é a influênciagravíticadestesobreaquele,emaislentamenteoplanetasedesloca.Omodocomoomovimentovariacomadistânciafoiprimeiroelucidadoem1609peloastrónomoalemãoJohannesKepler(1571-1630)eexplicadopelaleidagravitaçãouniversal,formuladaem1687porNewton.

Talcomoosistemasolar,asgaláxiastêmasuamassaconcentradanocentro,emboranãodumaforma tão extrema. Podemos ver como as estrelas se tornam mais numerosas à medida que nosaproximamosdocentrodumagaláxia,epareceporissorazoávelconcluirquecercade90porcentodamassadetodasasgaláxiasestácontidanumvolumerelativamentepequenonoseuâmago.Portanto,seriadeesperarqueasestrelasgirassemcadavezmaislentamenteemtornodocentrodumagaláxiasàmedidaqueaumentaasuadistânciaaeste.Masnãoéissoqueacontece.Aparentemente,asestrelasdeslocam-sepraticamenteàmesmavelocidadeàmedidaquandonosafastamosdocentrodagaláxia.

Nenhumcientistaestádispostoaabandonara leidagravitação(quefoimodificadaealargada,mas não substituída, pela teoria da relatividade generalizada de Einstein), uma vez que nenhuma leialternativaparececapazdeexplicaraquiloquesepassa,emgeral,noUniverso.Porisso,énecessáriosuporqueamassadagaláxianãoestáconcentradanoseucentromasdistribuídademodomaisuniformeportodaela.Contudo,comoéquepodeserassim,senósvemosqueamassa,sobaformadeestrelas,estáconcentrada?

Aúnicaconclusãopossívelédequeexistematériaforadazonacentralquenósnãovemos.Trata-se de "matéria negra"que não emite quaisquer fotões que possamos detectai mas que exerce a suainfluênciagravítica.Comefeito,somosforçadosapresumir,dopontodevistadagravidade,queamassadumagaláxiapodesermuitasvezessuperioràquelaquecalculamosapartirdosfotõesqueirradia.Até

seremfeitosestudossobreasrotaçõesdasgaláxias,estávamosaparentementeapassaraoladodamaiorpartedamassadestas.

Outroponto:asgaláxiasexistememenxames.Dentrodosenxames(quepodemserconstituídospor dezenas ou milhares de galáxias), as galáxias individuais deslocam-se incessantemente, comoabelhasnumacolmeia.Acoesãodosenxamesdegaláxiaségarantidapelaatracçãogravíticamútuadasgaláxiasqueosconstituem.Masasmassasdasgaláxias-afiarmo-nosapenasnaquiloquepodemosver,através dos fotões que podemos detectar - não são suficientes para proporcionar a atracção gravíticanecessáriaparamanterosenxamesjuntos.E,todavia,osenxamesnãosedesfazem.Maisumavezdeveexistir massa que não detectamos. Quanto maior o enxame, maior a quantidade de massa que nãoconseguimos quantificar. Pode existir até 100 vezes mais massa no Universo do que aquela queconseguimosver.Estefenómenoéconhecidocomoo"mistériodamassaemfalta".Oqueéquesepassa?

A resposta mais fácil é supor que todas as galáxias contêm miríades de pequenas estrelas,planetasenuvensdepoeirasmuitoténues.Oproblemaéque,daquiloqueconhecemosdoUniverso,nãoérazoávelimaginarqueessematerialexisteemtaisquantidadesqueasuamassaéumacentenadevezessuperioràdasestrelasqueconseguimosver.

Passemosentãoaomundosubatômico.Tantoquantosabemos,cercade90porcentodamassadoUniversoéconstituídaporprotões.Asúnicasoutraspartículassubatômicascujonúmerosecomparaouexcedeodeprotõessãooselecttões,queexistememigualnúmero,eosfotõeseneutrinosdeelectrões,que podem existir em quantidades milhares de milhões de vezes superiores ao número de protões.Contudo,oselectroespossuemmassasdiminutas,eosfotõeseneutrinosdeelectrõesnãotêmqualquermassa intrínseca. Os electtões, fotões e neutrinos de electrões estão todos emmovimento e possuemenergiacinéticaequivalenteàsrespectivasmassas.Porém,asmassasquedãoorigematalenergiasãoextremamentepequenas- tãopequenasquepodemserdesprezadas.OquedeixaapenasoprotãocomocomponentequecontribuicommassaparaoUniverso.

Seráqueamassaemfaltaéconstituídaporprotõesadicionaisquedesconhecemos?Arespostaparecesernão!OsastrónomostêmformasdecalcularadensidadedeprotõesnoUniversoe,assim,dedeterminarquantospodemexistir,detectadosounão,nasregiõesocupadaspelasgaláxiasoupelosseusenxames.Aquantidadedeprotõespresentescorresponde,nomáximo,aapenas1porcentodamassaemfalta.Portanto,sejaoqueforquecorrespondeàmassaemfalta,nãopodemserprotões.

Eissodeixa-noscomoselectrões,fotõeseneutrinosdeelectrões.Temosquaseacertezadequeoselectrõesefotõesnãopodemcontribuirparaamassaemfalta,masjánãoestamostãocertosquantoaosneutrinosdeelectrões.

Em 1963, um grupo de cientistas japoneses sugeriu que o neutrino de electrão podia ter umamassaminúscula,apenasumapequenafracçãodadoelectrão.Aserassim,oneutrinomuónicopodiaterumamassaligeiramentemaioreoneutrinotauónicoumamassamaiorainda.Todasestasmassasseriammuitopequenas,masnãonulas.

Seforesseocaso,osneutrinosdeslocar-se-ãoaumavelocidadeinferioràdaluz-emboranãomuitoinferior-ecadaumdosneutrinosviajaráaumavelocidadeligeiramentediferente.Porisso,ostrêssaboresdeneutrinooscilarão,sucedendo-seunsaosoutrosrapidamente.

TalsignificaqueseumfeixedeneutrinosdeelectrõespartirdoSol,cercadeoitominutosmaistarde,tendoconcluídoasuacorridade150milhõesdequilómetrosatéàTerra,surgiránonossoplanetasob a forma dum feixe contendo iguais quantidades de neutrinos de electrões, neutrinos muónicos eneutrinostauónicos.

Isso seria muito interessante, namedida em que Reines, que há décadas se dedica a detectarneutrinosprovenientesdoSol,utilizadispositivosqueapenasfuncionamcomneutrinosdeelectrões.Seos neutrinos estiverema oscilar, ele recebe um feixe constituídopor apenas um terço de neutrinos deelectrão,emvezdeinteiramenteconstituídoporneutrinosdeelectrão.Ouseja,Reinesestaráadetectarapenas um terço das partículas, o que explicaria por que razão a contagem de neutrinos de electrãorecebidosésempretãobaixa.

Em1980,Reines anunciou que realizara experiências que o levavam a acreditar que havia defacto oscilações e que os neutrinos tinham de facto uma pequeníssima massa. A ser assim, ficariamexplicadosnãoapenasosneutrinosemfaltaprovenientesdoSol,comotambémomistériodamassaemfalta.ExistemtantosneutrinosespalhadospeloUniversoquemesmoquecadaumtivesseumamassaquefosseapenasl/io000dadoelectrão,talseriasuficienteparaqueamassatotaldosneutrinosfossecemvezes superioràmassade todososprotõesdoUniverso.Alémdisso,estesneutrinoscomuma ligeiramassa poderiam ser usados para explicar a formação das galáxias, um problema que actualmente dágrandesdoresdecabeçaaosastrónomos.

Apossibilidadedaexistênciadeneutrinoscomumaligeiramassaquaseresolverumconjuntodeproblemas leva-nosaansiarparaque talsejaverdade.OúnicoproblemaéqueninguémconfirmouosdadosdeReines.Eexisteaconvicçãogeneralizadadequeeleseenganou.Pormaiseleganteedesejávelqueumateoriapossaser,eladeveserabandonadasenãoseadequaraoUniverso.

Mas mesmo que a massa em falta não seja constituída por protões e neutrinos, ela parecerealmente existir.Deque é feita, então?Emanos tecentes, os físicos têm tentado elaborar teoriasqueunifiquema interacção forte e a electrofraca.Algumasdessas teorias exigema invençãodepartículasnovas e exóticas. Talvez sejam essas partículas, nunca observadas e que, para já, existem apenas noespíritosdalgunscientistas imaginativos,queexpliquemamassaemfalta.Temosportantodeaguardarobservaçõesquesuportemessassofisticadasteorias.

OFimdoUniversoParaumobservadorocasional,oUniverso,quersejaobservadoàvistadesarmadaouusandoum

demuitosinstrumentos,podeparecerimutável.Asmudançasqueobservarserãoprovavelmentecíclicas.Sealgumasestrelasexplodem,outrasseformam.Dir-se-ia,portanto,nãohaverrazãoparapensarqueoUniversotemnecessariamenteumfimouumprincípio,senãofosseumfactoavassaladorquepoderánãoserdenaturezacíclica:oUniversoestáemexpansão.

Essaéumahistóriaqueseiniciouem1912,quandooastrónomonorte-americanoVestoMelvinSlipher (1875-1969) começou a estudar os espectros de certas nebulosas. Trata-se, na verdade, degaláxiasdistantessituadasbemlongedanossaprópriaViaLáctea,masissoeradesconhecidonaépoca.Analisando os espectros, Slipher podia verificar se as linhas espectrais estavam deslocadas para aextremidadevioletadoespectro(oquesignificariaqueanebulosaseestavaaaproximardenós)ouemdirecçãoàextremidadevermelha(oqueindicariaqueseestavaaafastardenós).

Porvoltade1917,Slipherconcluíraquedasquinzenebulosasestudadas, todas,àexcepçãodeduas,apresentavamumadeslocaçãoparaovermelhoestando,portanto,aafastar-se.Outrosastrónomoscontinuaramoseutrabalhoequandofinalmentesereconheceuqueasnebulosaseramgaláxiasdistantes,verificou-se que, com as duas excepções referidas por Slipher (e que correspondiam a galáxiasinvulgarmentepróximasdenós),todasasoutrasestavamaafastar-se.Alémdisso,quantomenosvisívelagaláxiaera,maisrapidamenteseafastava.

1. As linhas espectrais da luz proveniente duma galáxia próxima (que se afasta) estão apenasligeiramentedeslocadasparaaextremidadevermelhadoespectro.

2.Aslinhasespectraisdaluzprovenientedumagaláxiadistante(queseafastarapidamente)estãosignificativamentedeslocadasparaaextremidadevermelhadoespectro.

Nofinaldosanos20,oastrónomonorte-americanoEdwinPowellHubble(1889-1953)recolheradadossuficientesparapoderafirmarqueoUniversoestavaemexpansãoequeosenxamesdegaláxiasqueoconstituemestavamaafastar-seunsdosoutros.

Isto fazia sentido à luz da teoria. Em 1916, Einstein apresentara a sua teoria da relatividadegeneralizada, que descrevia a gravitação demodomais rigoroso do queNewton fizera.As equaçõesformuladasporEinsteinparaadescreverconstituem,comefeito,osalicercesdaciênciadacosmologia(oestudodoUniversonoseuconjunto).

Inicialmente, Einstein considerou que o Universo era globalmente imutável e ajustou as suasequaçõesaessepressuposto.Em1917,oastrónomoneerlandêsWillemdeSitter(1872-1934)mostrouque as equações não ajustadas, se resolvidas adequadamente, implicavam que o Universo estava emexpansão.AsobservaçõesdeHubbleprovaramqueestateoriaestavacorrecta.

Aquestão,agora,éaseguinte:durantequantotempoéqueoUniversocontinuaráaexpandir-se?Aatracçãogravíticamútuadetodasassuasparteséumfactorquecontrariaaexpansão.Estadesenvolve-se, portanto, contra a atracção gravítica, tal como umobjecto lançado ao ar a partir da superfície daTerrasedeslocacontraaatracçãodesta.

A nossa experiência comum diz-nos que um objecto lançado ao ar em circunstâncias normaisacabaporserderrotadopelaatracçãogravíticadonossoplaneta.Asuavelocidadedeascensãoreduz-se

gradualmenteazero,apósoqueoobjectocomeçaaserdenovoatraídoparaaTerra.Quantomaiorforaforçacomqueinicialmenteélançadoaoar-e,portanto,quantomaiorforasuavelocidadeascensionalinicial-maisaltoelesobeemaistempodecorreatécomeçaracair.

Seumobjecto for lançadodaTerracomforça suficiente (velocidade inicial suficiente),nuncavoltaacair.AatracçãogravíticadaTerravaidiminuindoàmedidaqueoobjectoseafastamaisemaisdocentrodaquela.Seoobjectofizerumaascensãosuficientementerápida(11quilómetrosporsegundo),a atracção gravítica, que diminui com a distância, nunca será suficientemente grande para o trazer devolta. Tal significa que 11 quilómetros por segundo é a velocidade de escape da atracção gravíticaterrestre.

Podemos então interrogarmo-nos sobre se a velocidade de expansão do Universo contra aatracção gravítica em sentido contrário atingiu o valor de escape. Se a velocidade de expansão forsuperior à velocidade de escape, o Universo expandir-se-á para sempre. Será portanto um Universoaberto. Todavia, se a velocidade de expansão for inferior à velocidade de escape, a expansão irágradualmente abrandar e, em certo momento, cessará. Depois, o Universo começará a contrair-se.EstaremosnestecasoperanteumUniversofechado.

OfactodoUniversoserabertooufechado,determinarcomoumaboladematériaeternamenteemexpansãoecadavezmaisrarefeitaou,pelocontrário,cadavezmaispequenaedensa,nãoafectaráasnossasvidasindividuaisousequeraexistênciadonossosistemaplanetário.Acuriosidadedoscientistas,porém,égrande.Eparachegaremaumaconclusão,têmprocuradodeterminaravelocidadedeexpansão.TambémtêmsidofeitastentativasparacalcularadensidademédiadamatérianoUniverso,oquepoderádar uma ideia da atracção gravítica que se opõe à expansão. Ambos os cálculos são difíceis, e osresultadosapenasaproximados.Contudo,aconclusãoédequeadensidadedoUniversoésomentecercade1porcentodaquiloqueserianecessárioparainterromperaexpansão.PareceriaassimqueoUniversoéabertoeestáparasempreaexpandir-se.

Mas,altoaí!AdeterminaçãodadensidadedamatérianoUniversobaseia-senaquiloquesomoscapazesdedetectar-equantoàmatérianegra?SeforverdadequeamatérianegranoUniverso-aquelamatériacujanaturezaaindanãodeterminámos-podeseratécemvezesmaismaciçadoqueamatériaqueconseguimosdetectar,issoserátalvezsuficienteparafecharoUniverso.Ficamos,assim,semsaberseoUniversoéabertooufechado.

E também possível que exista noUniverso apenasmatéria negra suficiente para o colocar nolimiarentreabertoefechado(oumuitopróximodisso),oquesignificariaqueoUniversoé"plano".Talseriaumacoincidênciaextraordinária,eosentimentogeneralizadoédeque,seassimfor,deveráexistirumarazãoparaisso.

Oleitorpercebeassimporquemotivoétãoimportante,dopontodevistacosmológico,saberseamatérianegraexisterealmentee,emcasoafirmativo,dequeéfeita.Aresposta,quandochegar,deveráemergir do domínio das partículas subatômicas. Vemos pois como o avanço do conhecimento éverdadeiramente unitário. O conhecimento do maior objecto que conhecemos, o Universo, dependedaquiloquesoubermossobreosmaispequenoscorposconhecidos,aspartículassubatômicas.

Há outro aspecto em que as partículas subatômicas podem afectar o fim do Universo, e queresulta da tentativa de unificação das interacções forte e electrofraca. Os primeiros esforços nessesentido surgiram em 1973, quando Saiam, o co-fundador da teoria electrofraca, resolveu atacar oproblema.

Ainteracçãoelectrofracaenvolveosleptõeseainteracçãoforteosquarks.Porisso,umateoriaunificadaimplicanecessariamenteaexistênciadumasemelhançabásica,subjacente,entreosdoistipos

de partículas. Ou que, em determinadas circunstâncias, umas se possam converter nas outras. Opressuposto natural é de que os quarks podem ser convertidos em leptões, uma vez que isso vai nadirecçãodareduçãodamassaeenergia.

Suponhamosentãoqueumquarknointeriordumprotãoeraconvertidonumleptão.Estedeixariadeserumprotão,desintegrando-seempartículasmenosmaciçascomokaões,piões,muõesepositrões(tudopartículasdecargapositiva,oquerespeitariaaconservaçãodacargaeléctrica).Oskaões,piõesemuões acabariam por decair originando positrões, o que significaria que, globalmente, os protões setransformavamempositrões.

Um tal processo violaria a lei da conservação do número bariónico. Porém, todas as leis deconservação são meras deduções a partir de observações realizadas. Nunca observámos qualquertransformaçãoquealtereonúmerobarióniconumsistemaisolado,peloquepartimosdoprincípiodequeuma tal transformação não pode ocorrer - e é isso que nos dá a lei de conservação. Mas por maispoderosaseconvenientesquesejamasleisdeconservação,elaspermanecemsuposições,eoscientistasdevemestarpreparadospara,ocasionalmente,aceitarofactodealgumadelasnãoserválidaemtodasassituações concebíveis. Foi isso que aconteceu no caso da lei de conservação da paridade, comoexpliqueianteriormente.

Ainda assim, os físicos vêm estudando intensamente os protões há muitas décadas e nuncaassistiram a decaimento algum dessas partículas. Por outro lado, uma vez que estão convencidos daimpossibilidade de tal transformação, nunca se esforçaram em descobrir se as coisas se passamrealmenteassim.

Alémdisso, aunificaçãodas interacçõesexistentes (existemdiversasvariedades) indicaqueavidamédiadoprotãoéextremamentelonga.SãonecessáriosIO31anos(dezmilhõesdebiliõesdebiliõesde anos) para quemetade dos protões em qualquer amostra dematéria se desintegre.Uma vez que oUniversosótemcercade15milharesdemilhõesdeanos,avidamédiadoprotãorepresentaquase70milhares de milhões de biliões de vezes a idade do Universo. O número de protões que se terãodesintegradodesdequeoUniversoexisteseráassimumafracçãoinsignificantedototal.

Masnãoseráigualazero!Secomeçarmoscom1031protões,queéaquantidadequeencontramosnumtanquecomcercade20toneladasdeágua,existeapossibilidadedeocorrerumadesintegraçãonodecursodumano.Detectaresseúnicoprotãoem20toneladasdeáguaeidentificarasuadesintegraçãocomodevendo-seàtransformaçãodumquarknumleptãonãoseráumatarefafácil,eoscientistas,quejáfizeramalgumastentativasiniciaisnessesentido,aindanãoconseguiramdetectartaldesintegração.

Um êxito ou um fracasso são importantes. Um êxito contribuirá significativamente paraestabeleceravalidadedaunificaçãodasinteracções,achamadagrandeteoriaunificada.Umfracassopô-la-áemdúvida.

PenseoleitortambémnoimpactequetalteriasobreodestinodoUniverso.Seesteforabertoeestiver para sempre em expansão, irá perdendo muito lentamente os seus protões. Acabará por setransformar numa nuvem inimaginavelmente vasta e rarefeita de leptões - electrões e positrões (e,evidentemente,fotõeseneutrinos).

Eclaroque tambémsuspeitamosque, àmedidaqueoUniverso forenvelhecendo,maisemaisporções dele serão concentradas em buracos negros - e não fazemos qualquer ideia sobre as leis danaturezaqueseaplicamnocentrodestes.Haveráaíalgumtipodehadrões?Eseráquedecaem,muito,muitolentamente,mascomtodaacerteza,equeosburacosnegrosacabampordesaparecer?Oquebra-cabeçascontinua-econtinuaráprovavelmenteparasempre.

OIníciodoUniversoO Universo está actualmente em expansão. Independentemente de ser aberto ou fechado, o

Universoestápresentementeaexpandir-se.Oquesignificaqueeramaispequenooanopassadodoqueéagora,emaispequenoaindanoanoanterior,eassimpordiante.

Se olharmos para o futuro, a sua "infindabilidade" é pelo menos concebível, uma vez que oUniversopode ser abertoe expandir-separa sempre.Mas seolharmospara trás,paraopassado,nãoexisteessapossibilidadede"infindabilidade".OUniversoécadavezmaispequenoenumdeterminadomomentonopassadodistante,podemosimaginá-locomoestandoreduzidoàsuadimensãomínima.

A primeira pessoa a estudar isto com algum pormenor foi o astrónomo belga George HenriLemaitre(1894-1966).Em1927,elesugeriuque,olhandoparaopassado,haviaummomentoemqueamatéria e energia do Universo estavam literalmente esmagadas e concentradas numa massaextraordinariamentedensa,aquechamouovocósmico.Lemaitreconsideravaesseovoinstável.Eleteriaexplodido naquilo que só podemos imaginar como a mais gigantesca e catastrófica explosão que oUniverso foicapazdeproporcionar.Osefeitosdessaexplosãoaindaestãoconnoscosoba formadumUniversoemexpansão.Ofísicorusso--americanoGeorgeGamow(1904-1968)resolveuchamar-lhebigbangeonomeficou.

Houve, naturalmente, alguma resistência à ideia dum big bang. Foram propostos cenáriosalternativos para explicar a expansão doUniverso. A questão só ficou resolvida em 1964, quando ofísico germano-ameri-canoArnoAllanPenzias (n. 1933) e o físico norte-americanoRobertWoodrowWilson(n.1936)resolveramestudarasondasrádioquenoschegavamdoespaço.

Quandoelesperscrutavamsuficientementelongenoespaço,fossequalfosseadirecçãoemqueolhassem,detectavamradiaçãoqueestavaaviajarhátantosmilharesdemilhõesdeanosquesópodiatertidoorigemnoprópriobigbang,sealgumavezexistiutalacontecimento.PenziaseWilsondescobriramumaténueradiaçãodefundoconstituídaporondasrádioqueapresentavamidênticaintensidadeemtodasas direcções do firmamento, e que consideraram representar o "eco" distante do big bang.Os físicosconsideraramqueadescobertavalidavaateoriadobigbangeosseusautoresforamgalardoadoscomumPrémioNobel,em1978,peloseutrabalho.

A teoria do big bang apresenta, evidentemente, algumas dificuldades. Por exemplo, quando foiqueaqueleocorreu?UmmododedeteiminaressemomentoémediravelocidadeaqueoUniversoseestáactualmenteaexpandiredepoistrabalharparatrás,levandoemlinhadecontaoaumentodaatracçãogravíticaàmedidaqueoUniversosetornamaispequenoedenso.

Isso,porém,émuitomais fácildedizerdoquefazer.Existemdiversosmodosdedeterminaravelocidadedeexpansão,demedira idadedasestrelasmaisantigasedecalcularadistânciaaqueseencontram os corposmais longínquos que conseguimos ver (e, portanto, o tempo que a radiação comorigemnelesdemorouachegaraténós).

Actualmente,osradio-astrónomospodemaindaescutaro"eco"distantedobigbang.Osresultadostendemacontradizer-se,easestimativassobreotempoquedecorreudesdeobig

bangvariamentre10e20milharesdemilhõesdeanos.GeralmenteaspessoasfazemamédiaentreosvaloreseconsideramqueaidadedoUniversoéde15milharesdemilhõesdeanos,maseususpeitoque

overdadeirovalorestámaispróximodos20milharesdemilhões.Existemoutrasdificuldadesmaissubtis.AradiaçãodefundodetectadaporPenziaseWilsoné

extremamente uniforme em todas as partes do céu, e representa uma temperatura média global doUniverso de três graus acima do zero absoluto. Tal facto é surpreendente, porque para existir umasituaçãoemquea temperaturaé igualemtodoo lado,égeralmentenecessárioquehajaalgumtipodecontactoentreasdiversaspartes,demodoaqueocalorpossafluirdumladoparaooutroigualizandoatemperatura. Mas isso não pode ter sucedido no Universo porque há diferentes regiões que estãoseparadaspordistânciassuperioresàquelaquealuzpodeterpercorridodesdequeeleexiste.Umavezquenadaviajamaisrápidodoquealuz,oqueteráigualizadoatemperatura?Ou,poroutraspalavras,oqueéquetornaoUniversotãohomogéneo?

Umoutroproblemaéprecisamenteoinverso.SeoUniversoéhomogéneo,porquerazãoéquenão se conservou assim? Por que razão não é apenas uma massa informe de partículas subatômicaseternamente em expansão? Por que foi que as partículas se condensaram em aglomerados que setransformaramemenxamesdegaláxias, e as galáxias se condensaramederamorigema estrelas?Poroutraspalavras,porqueéoUniversotãohomogéneonumcertosentidoetãogranularnoutro?

Existemaindaoutrosproblemas,mastodoseles-aidade,ahomogeneidade,anaturezagranular,etc. - dependem daquilo que aconteceu no início doUniverso, nos primeiros instantes após a grandeexplosão.Naturalmenteninguémestavaláparaver,masoscientistasprocuramperceberoquesepassouapartirdaquiloqueconhecemsobreoestadoactualdoUniverso, edaquiloqueaprenderamsobreaspartículassubatômicas.

E, assim, partem do princípio que, à medida que recuamos no tempo e nos aproximamos domomentodobigbang,atemperaturaaumentaeadensidadedaenergiaécadavezmaior.OscientistasconsideramquenãoépossívelfalardeinstantesinferioresaIO45segundo(ummilésimodemilionésimodumbilionésimodumbilionésimodumbilionésimodesegundo)apósobigbang.Parainstantesinferioresaisto,ascondiçõessãotãoextremasqueopróprioespaçoetemponãotêmsentido.

Contudo, o Universo arrefeceu rapidamente em apenas algumas fracções dum segundo.Inicialmentenãopassavadummardequarks,queexistiamlivrementeporquenadamaisexistia,eporquepossuíamdemasiadaenergiaparasequerestabilizaremosuficienteesecombinaremunscomosoutros.

QuandoaidadedoUniversojáeradummilionésimodesegundo,porém,osquarksjásetinhamseparadonosquarkseleptõesqueconhecemosactualmente,eaquelestinhamarrefecidoosuficienteparase poderemcombinar e formar bariões emesões.Nuncamais se viramquarks livres.As interacções,inicialmente dum tipo apenas, começaram a separar-se nas quatro que nós reconhecemos. Quando oUniversotinhaumsegundodeidade,jáestavaatalpontorarefeitoqueosneutrinosdeixaramdeinteragircom as outras partículas, passando a existir numa total indiferença pelo restante Universo, e assimpermanecendodesdeentão.QuandoaidadedoUniversochegouaostrêssegundos,começaramaformar-seosnúcleosatómicosmaissimples.

Apósuma centenademilhar de anos, os electrões começarama orbitar em tornodos núcleos.Formaram-seátomos.Depois,amatériacomeçouacondensar-seeadarorigemagaláxiaseestrelaseoUniversocomeçouatomaroaspectoquelheconhecemos.

Aindaassim,oscientistasnãopuderamdeixardepensarnomomentozero,noinstanteemqueobigbangrealmenteocorreu,antesdolimitedo10'45segundo.Dondeveioomaterialqueconstituíaoovocósmico?

Sepensarmosnasituaçãoqueexistiaantesdaformaçãodoovocósmico,podemosvisualizaruma

vastidãovazia,semlimites.Aparentemente,porém,essanãoseráumadescriçãoadequadadaquiloqueexistia.Essevaziocontinhaenergia.Nãoerabemumvácuoporque,pordefinição,ovácuonãocontémnada.Opré-Universo,todavia,possuíaenergia,eemboratodasassuasoutraspropriedadesfossemasdovácuo, é designado um falso vácuo.Nesse falso vácuo surgiu um pontominúsculo dematéria onde aenergia, pelas forças cegas das transformações aleatórias, ficou suficientemente concentrada para oefeito. Na verdade, podemos imaginar esse falso vácuo sem limites como uma massa borbulhante eespumosaondesurgiamporçõesdematériaaquiealém,talcomoasondasdomarproduzemespuma.

Algumas dessas porções de matéria terão desaparecido imediatamente no falso vácuo dondetinhamsurgido.Outras,porém,seriamsuficientementegrandesouter-se-iamformadosobtaiscondiçõesque sofreramuma rápidaexpansão,de talmodoqueé certoqueoUniverso se formoue sobreviverá,possivelmente,pormuitosmilharesdemilhõesdeanos.

Éportantopossívelquehabitemosumdumnúmeroinfinitodeuniversosemdiferentesestádiosdedesenvolvimento,presumivelmenteregidospordiferentesconjuntosdeleisfísicas.Contudo,nãoexistemodoalgumdecomunicarmoscomqualqueroutrouniverso,eestamosporissoparasempreconfinadosao nosso, tal como um quark está confinado a um hadrão. Tal facto não deverá entristecer-nosdesnecessariamente.Bemvistasascoisas,onossopróprioUniversoésuficientementevasto,variadoesurpreendente.

Ofísiconorte-americanoAlanGuth(n.1947),quedefendeuminíciodestetipoparaoUniverso,sugeriu, em 1980, que no estádio inicial do Universo existiu uma fase "inflacionária" rápida. EssemodeloédesignadodoUniversoinflacionário.

Édifícilcompreenderquãobrevefoiesseperíodoinflacionárioequãoenormeainflação.Estainiciou-secercadeIO'35segundo(dezbilionésimosdumbilionésimodumbilionésimodumsegundo)e,deseguida,oUniversoduplicoudevolumeacada10'35segundo.Apósummilhardeduplicações(apenas10'32 segundo após o big bang), a inflação terminou. Esta diferença de tempo (dez milésimos dummilionésimodumbilionésimodumbilionésimodesegundo)foi,contudo,suficienteparaqueoUniversocrescesse1050emvolume.Nofinaldoperíodoinflacionário,oUniversotinhaumvolumequeeracembiliõesdebiliõesdebiliõesdebiliõesdevezesaquelequepossuíanoinício.Alémdisso,aoaumentarde volume, integroumais falso vácuo e a energia deste, aumentando desse modo enormemente a suamassa.Épossíveldemonstrarquefoiessa inflaçãorápida inicialquetornouoUniversohomogéneo,epraticamenteplano,possuindoadensidadedemassasuficienteparasesituarentreumUniversoabertoeumUniversofechado.

OUniverso inflacionário de Guth não explica todas as propriedades do Universo tal como oconhecemos.Oscientistastêmvindoamodificarateoriaparaqueeladescrevamelhoraquiloquenosrodeia,especialmentenoquedizrespeitoàformaçãodasgaláxias.

Para que tal seja possível, é necessáriamais uma unificação. É preciso juntar sob ummesmotelhado,nãosóainteracçãoforteeaelectrofraca,mastambémagravitação.Estatemresistidoatéagoraatodasastentativasdeintegração,masoscientistasestãoatrabalharcomalgoaquechamamateoriadassupercordas,quetambémdesignamcomoa"teoriadetudo".

Não se trata apenas de juntar bariões e leptões como dois exemplos diferentes de algo maisfundamental,masosfermiõesebosõessãounificadoseconsideradosdoisexemplosdiferentesdealgomais fundamental. Foi postulada a existência dum novo grupo de partículas em que existem novosfermiõessemelhantesaosnossosbosões,enovosbosõesanálogosaosnossosfermiões.

Aonde isto nos levará, não sei. Não faz sentido tentar esboçar as teorias e modelos que sãoactualmente discutidos pelos cientistas, uma vez que umas e outros vão sendo modificados quase

diariamente.Alémdisso,nãoexistemquaisquerobservaçõesqueossuportem,peloquepermanecemnodomíniodapuraespeculação.

Ainda assim, persiste o sonho dum único conjunto de equações capaz de abranger todas aspartículasqueexistemnoUniverso,bemcomotodasassuas interacções.Precisamosdelepara termosumaimagemconsistentedumUniversoquecomeçoucomumúnicotipodepartículagovernadoporumsótipodeinteracção-umapartículaque,àmedidaquearrefecia,sedividiuoriginandoagrandevariedadedeefeitosqueactualmentepodemosobservar.

E tudo começou quando algunsAntigos se questionaram sobre a divisão damatéria e até quepontoelapodiaprosseguir.Oquemostraaquiloquepodeacontecerquandofazemosasperguntascertas.

FIM

IsaacAsimovnasceuem1920emPetrovichi,naRússia,ecomapenastrêsanosdeidadeemigroucomafamíliaparaosEUA.

Em 1939 licenciou-se em Química na Columbia University,tendo posteriormente feito odoutoramentoemBioquímica,disciplinaqueleccionouduranteváriosanosnaUniversidadedeBoston.Começou a publicar as suas primeiras histórias de ficção científica em 1939 e o seu primeiro livro,PebbleintheSky,foieditadoem1950.

Ao longoda suavida, escreveu centenasdeobras de ficção e ensaio, que abrangemáreas tãodiversascomoaciência,ahistória,asciênciassociaiseamatemática,afirmando-seassimcomoumdosmaioresdivulgadorescientíficosdoséculoXX.MorreuemNovaIorque,em1992.

NaCampodasLetrastemtambémpublicadooGuiadaTerraedoEspaço.