DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos...

10
INFLUÊNCIA DOS MÚSCULOS NA CARACTERIZAÇÃO DO CAMPO DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO 1. A. Simões’, M. A. Vaz2, J. 5. Gomes2, A. 1. Marques2 1 Secção Autónoma de Engenharia Mecânica da Universidade de Aveiro 2 Departamento de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial da Universidade do Porto Este estudo teve como objectivo a análise da distribuiçilo das extensões no periósteo do fémur intacto. Á análise foi efectuada recorrendo à extensometria eléctrica e usando um modelo femural sintético. Os resultados obtidos permitem concluir que ofémur é normalmente sujeito a um estado de tensão (deformação) característico de uma solicitação de compressão, o que contraria a opinião de diversos autores que indicam a flexão como solicitação predominante. Uma distribuição de extensões característica de compressão no fémur pode ser obtida simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e é consistente com a geometria t;ica do fémur. 1. INTRODUÇÃO O estudo da biomecânica humana, nomeadamente da articulação da anca, é bastante complexo. Imensos estudos foram realizados para simular o sistema de forças envolvidas nesta articulação. A simulação das forças na locomoção do corpo, principalmente quando este é apoiado por uma perna, é a situação mais estudada. Dos mais variados estudos publicados sobre a biomecânica da anca, verifica-se que existe uma variedade de diferentes simulações, tornando-se dificil seleccionar qual a que simula correctamente, ou mais aproximadamente, o sistema de forças relevantes da articulação da anca. Muitos estudos foram realizados para determinar as forças que actuam e são transmitidas pelas diferentes estruturas anatómicas do esqueleto humano. Parte destes foram feitos sobre a anca (Olson et ai., 1972; Paul, 1965; Pohtilla, 1969; Seireg et ai., 1973; 1975; Sorbie et ai., 1964), no entanto, muito poucos foram os autores que obtiveram resultados quantitativos de forças que actuam no sistema muscular da anca (Jensen et ai., 1971; Olson et ai., 1972; Pohtilla, 1969; Sorbie et ai., 1964). Parte destes estudos, são limitados a um único plano anatómico, normalmente o plano frontal, incluindo também poucos músculos (Inman, 1947; Olson, 1972; Paul, 1965; Pohtilla, 1969; Sorbie et ai., 1964). $eireg et ai. (1973; 1975) foram provavelmente os primeiros a descreverem um modelo tridimensionai do sistema muscular do membro inferior. Estes autores apresentaram dados sobre os pontos de fixação de quinze músculos retirados de ilustrações anatómicas. Dostai et ai. (1981) apresentaram o estudo mais completo sobre a biomecânica da anca. Neste estudo os autores apresentaram um modelo tridimensional da orientação de vinte sete músculos com as respectivas coordenadas de localização no fémur e na pélvis. A maioria dos estudos in vitro sobre a biomecânica da anca foram realizados com RESUMO 19

Transcript of DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos...

Page 1: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

INFLUÊNCIA DOS MÚSCULOS NA CARACTERIZAÇÃO DO CAMPODAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO

1. A. Simões’, M. A. Vaz2, J. 5. Gomes2, A. 1. Marques21 Secção Autónoma de Engenharia Mecânica da Universidade de Aveiro

2 Departamento de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial da Universidade do Porto

Este estudo teve como objectivo a análise da distribuiçilo das extensões no periósteo dofémurintacto. Á análise foi efectuada recorrendo à extensometria eléctrica e usando um modelofemural sintético. Os resultados obtidos permitem concluir que ofémur é normalmente sujeitoa um estado de tensão (deformação) característico de uma solicitação de compressão, o quecontraria a opinião de diversos autores que indicam aflexão como solicitação predominante.Uma distribuição de extensões característica de compressão no fémur pode ser obtidasimulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e éconsistente com a geometria t;ica dofémur.

1. INTRODUÇÃO

O estudo da biomecânica humana,nomeadamente da articulação da anca, ébastante complexo. Imensos estudos foramrealizados para simular o sistema de forçasenvolvidas nesta articulação. A simulaçãodas forças na locomoção do corpo,principalmente quando este é apoiado poruma só perna, é a situação mais estudada.Dos mais variados estudos publicadossobre a biomecânica da anca, verifica-seque existe uma variedade de diferentessimulações, tornando-se dificil seleccionarqual a que simula correctamente, ou maisaproximadamente, o sistema de forçasrelevantes da articulação da anca. Muitosestudos foram realizados para determinar asforças que actuam e são transmitidas pelasdiferentes estruturas anatómicas doesqueleto humano. Parte destes foramfeitos sobre a anca (Olson et ai., 1972;Paul, 1965; Pohtilla, 1969; Seireg et ai.,1973; 1975; Sorbie et ai., 1964), no

entanto, muito poucos foram os autoresque obtiveram resultados quantitativos deforças que actuam no sistema muscular daanca (Jensen et ai., 1971; Olson et ai.,1972; Pohtilla, 1969; Sorbie et ai., 1964).Parte destes estudos, são limitados a umúnico plano anatómico, normalmente oplano frontal, incluindo também poucosmúsculos (Inman, 1947; Olson, 1972; Paul,1965; Pohtilla, 1969; Sorbie et ai., 1964).$eireg et ai. (1973; 1975) foramprovavelmente os primeiros a descreveremum modelo tridimensionai do sistemamuscular do membro inferior. Estes autoresapresentaram dados sobre os pontos defixação de quinze músculos retirados deilustrações anatómicas. Dostai et ai. (1981)apresentaram o estudo mais completo sobrea biomecânica da anca. Neste estudo osautores apresentaram um modelotridimensional da orientação de vinte setemúsculos com as respectivas coordenadasde localização no fémur e na pélvis. Amaioria dos estudos in vitro sobre abiomecânica da anca foram realizados com

RESUMO

19

Page 2: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

o fémur solicitado predominantemente emflexão, sem que os autores justificassem oporquê desta consideração. A intensidade eorientação das forças também é, de certaforma, arbitrária. Na maioria dos estudos, ofémur é simplesmente solicitado com aforça reactiva da articulação e, nalgunscasos, com a força dos músculos dosabductores, induzindo um campo detensões típicamente de flexão (Tensi et ai.,1989; Prendergast e Taylor 1990; Huiskes1990; Verdonschot et ai., 1993). Estesestudos sugerem que a configuração deforças estudada pode não ser realísticanuma condição in vivo. Os resultadosdestes autores mostram que o fémur ésubmetido a elevadas tensões decompressão no aspecto medial e de tracçãono aspecto lateral, estas ligeiramenteinferiores às de compressão. Verifica-setambém que as tensões na parte anterior eposterior do fémur são praticamente nulas,contrariando a lei de Wolff (Wolff, 1989),que diz que o osso se reconstitui de forma auniformizar os níveis de tensão.

Por este motivo, a análise da possibilidadeda acção dos músculos reduzir o momentoflector foi estudada por muitos autores.Rohlmann et ai. (1983) combinaram ométodo dos elementos finitos com umestudo experimental e verificaram que otrato ílio-tibial reduzia a flexão no planofrontal do fémur. Munih et ai. (1992)confirmaram com um estudo in vivo que osmúsculos actuam de modo a reduzir acomponente de flexão. Mittlemeier ei’ ai.(1994) combinaram o método doselementos finitos com um modelo deremodelação do tecido ósseo ecompararam os resultados obtidos comsecções transversais de férnurs ex vivos.Estes autores obtiveram uma excelentecorrelação de resultados aplicando osmúsculos abductores em conjunto comforças de compressão e torção, econcluiram que os músculos sãoimportantes na determinação damorfologia característica do fémur.

Taylor et ai. (1995) efectuou um estudopor elementos finitos onde mostra que ofémur é predominantemente solicitado emcompressão. Neste estudo é comparada adistribuição das deformações na diáfise dofémur intacto solicitado em compressão eem flexão. A solicitação predominante decompressão foi realizada usando osabductores, o vasto lateral e o ilíaco-psoas.Este trabalho permitiu concluir que ocampo das deformações obtido emcompressão é mais consentâneo com ageometria característica do fémur.

O objectivo do estudo apresentadoconsistiu na análise do campo dasextensões características no periósteo dofémur, solicitando este com umaconfiguração de forças provocando flexãoe compressão.

2. FÉMUR DE MATERIALCOMPÓSITO

O presente estudo foi realizado commodelos femurais sintéticos de materialcompósito. Este tipo de modelos têm sidoutilizados na realização de estudosexperimentais (Szivek et ai., 1990; Otaniet ai., 1993; Pawluk et ai., 1984;Cristofolini et ai., 1995), e foram

adquiridos à Sawbones® Europe. Trata-sede réplicas de fémurs com comprimento de480mm e cerca de 3Omm de diâmetromédio da diáfise. Nestes modelos, o ossocompacto é constituído por um materialcompósito de fibra de vidro, sob a formade tecido balanceado, impregnado emresina de epóxido, com cerca de 5mm deespessura média. O osso esponjosoconsiste numa resina de poliuretano.Algumas propriedades mecânicas destesmodelos, segundo dados do fabricante, sãosemelhantes às de fémurs in vivo. Natabela 1 são apresentadas as característicasmecânicas dos fémurs compósitosutilizados neste estudo.

20

Page 3: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

Na figura i é apresentado o corte frontal deum fémur compósito utilizado no estudo,onde se pode observar a razoávelsemelhança em termos de geometria comum fémur natural, embora a espessura naregião de fixação do médio glúteo epequeno glúteo seja maior que o normal.

Tabela 1 - Propriedades mecânicas dofémur compósito (dados do fabricante).

fibra de vidro com resina epúxido (Osso compacto)

Resina de poliuretano (Osso esponjoso)

Módulo em tracção (GPa) 7.0Resistência em tracção (MPa) 3.4 - t0.3Resistência em compressão (MPa) 4.8 - 13.8

3. INSTRUMENTAÇÃO DO FÉMUR

vinte extensómetros, cinco em cadaaspecto do fémur (medial, lateral, anterior

e posterior). As zonas de colagem dosextensómetros foram lixadas com uma lixafina (vulgar lixa de água), edesengorduradas posteriormente comálcool etílico. A colagem dosextensómetros foi realizada com uma colado tipo cianoacrilato (methyl-2-cyanoacrylate). Simultaneamente foiefectuada a colagem dos elementos desuporte de soldadura dos cabos destinadosà transmissão de sinais eléctricos para aponte. A figura 2 mostra o modelo femuralinstrumentado utilizado no estudo.

Na figura 3 é esquematicamenteidentificada a localização dosextensómetros. As letras A, L, P e Mdesignam os extensómetros coladosrespectivamente na parte anterior, lateral,posterior e medial do fémur. O nível dalocalização dos extensómetros é indicadopor números, por ordem crescente, da zonaproximal à distal, como se indica na figura3, e foram colocados de forma queficassem alinhados com o linha axial dadiáfise do osso. Por fim estes foramligados a um sistema de aquisição de dados($olartron SI 359513 IMP) da SolartronInstruments. A estabilidade do sinal decada extensómetro foi testada, tendo-severificado uma variação de +2JtE em cercade 2 horas, valores perfeitamente

Módulo em tracção (GPa)Resistência em tracção (MPa)Resistência em flexão (MPa)Módulo em flexão (GPa)Dureza (Shore)Coeficiente de Poisson

18.617227514.2D800.3

Instrumentou-se um fémur compósitointacto com extensómetros do tipo CEA06-1251JN-350, com “gauge factor’ de2.105, da Micro-Measurements Divison,Measurements Group, mc. Foram colados

aceitáveis.

Figura 1 - Corte frontal de um fémur compósito ecadavérico.

Figura 2 - Modelo femural instrumentado.

21

Page 4: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

4. SIMULADOR DA BIOMECÂNICADA ANCA

Para a realização do estudo projectou-se econstruiu-se um simulador da biomecânica

Ai

\ LI

A211.2

P3Li

A4

1.4

A5 P5L5

Figura 3 - Desenho esquemático da Localização dosextensómetros no fémur.

da anca. O simulador é composto por uma

estrutura metálica de perfis tubulares desecção quadrada com elevada rigidez,como se representa na figura 4. O suportede fixação do fémur pelos côndilos foiidealizado de modo a restringir o seumovimento, mas permitindo variar o seuposicionamento relativamente à forçaexercida na articulação. Para exercer asforças musculares, foi montada umaestrutura reticulada com roldanas e cabosde aço, através dos quais se transmitiam asrespectivas forças ‘musculares. As forçasnos cabos eram exercidas por gravidade,recorrendo à suspensão de pesos dechumbo, como se pode observar na figura4.

A força da articulação era controladaatravés de uma célula de carga projectada edimensionada para o efeito. A forçaexercida era determinada através dasmicroextensões (p.E) medidads na parededa célula de carga por quatroextensómetros, dois colocados na direcçãoaxial e outros dois na direcção

circunferencial. Os extensómetros forammontados em meia ponte de Wheatstone deforma a eliminar qualquer efeito de flexão.Na compensação de temperatura utilizou-se um extensómetro montado num fémuridêntico aos usados nos ensaios.

5. SIMULAÇÃO DO SISTEMA DEFORÇAS MUSCULARES

Este estudo foi baseado em trabalhosrealizados por diversos autores. Trêsconfigurações distintas de forças foramutilizadas. A primeira configuração decargas simulada foi idêntica aos estudospublicados por Tensi et ai. (1989), Huiskes(1990), Prendergast e Taylor (1990),Verdonschot et ai. (1993) e Taylor et ai.(1995a). No primeiro caso, o sistema decargas era constituído pela força daarticttlação e pelos abductores aplicados nogrande trôncanter. Na segundaconfiguração ‘de forças analisadas, o ânguloda força na articulação foi aumentado de13° para 21°, e foram incluidas também asforças dos músculos vasto lateral e doilíaco-psoas (Taylor et ai., 1995a). Porúltimo, a terceira configuração de cargasfoi simulada com o fémur posicionadonum ângulo de adução de 20°. Na figura 5é ilustrada esquematicamente as forças dasegunda configuração implementada noestudo experimental. Na tabela 2 sãoapresentadas as coordenadas vectoriais das

Figura 4 - Simulador experimental da biomecânicada anca.

22

Page 5: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

forças relativamente ao referencial dafigura 5.

Coordenada X Y Z Resultante (N)

CONFIGURAÇÃO i

Articulação -0 171 -2.8 -1)61 2872

Abductores O 1. 6 O 43 1237

CONFIGURAÇÃO

Articulação -0.13 -2.8 -I 062 2997

Abductores 1) 1 16 -1)43 1237

Vasto lateral II — 1.2 1) 12))))

Psoas-ilíaco 056 1)525 11 078 771

CONFIGURAÇÃO 3

Articulação -1) 171 -2.8 -11.6) 2872

Para orientar os cabos segundo a forçamuscular, determinou-se a intersecção deuma recta com origem no ponto deinserção do músculo e direcção do vectorforça com a parte superior (ilíaco-psoas eabductores) ou inferior (vasto lateral) dosimulador. Os ensaios foram realizadosconsiderando as três configurações decargas definidas. A primeira configuração

de cargas provoca no fémur um campo detensões predominantemente de flexão. Asegunda configuração provoca um campode tensões de compressão. A terceiraconfiguração de cargas foi simulada paraaferir se a hipótese de que aumentando oângulo de adução da carga na articulaçãopermite obter um campo de tensõesidêntico ao obtido usando os músculosabductores. Todos os ensaios foramrealizados com uma força na articulação de700 N. As forças exercidas pelos músculosforam determinadas em função da força daarticulação. Na tabela 3 pode ver-se aintensidade valor das forças utilizadas paracada configuração de cargas.

Tabela 3 - Forças musculares simuladas.Arttculação Abductores Vasto lateral Psoas-tliaco

(N)

Configuração 1 700 300 — —

Configuração 2 700 280 280 170

Configuração 3 700 — —

A figurasimuladacargas.

Na figura 7 ilustra-se a distribuição dasextensões obtida para a parte medial,lateral, anterior e posterior do fémur e paraas diferentes configurações de cargas.

A análise do campo das extensões obtidopara as diferentes configurações de cargasmostra-nos a relevância dos músculos nadiminuição do valor das extensões.Efectivamente, nota-se uma acentuadadiminuição das extensões quando se incluio efeito dos músculos abductores. Esteefeito é ainda mais notório quando seinclui na simulação o vasto lateral e opsoas-ilíaco. Tendo em consideração osmaiores valores das extensões na partemedial, lateral, posterior e anterior dofémur, a tabela 4 mostra-nos, em termospercentuais, o aumento das extensões nofémur para as configurações de cargas 1 e

ty axt

Fabd

pOt. -

z

Fpa

Fvl art - articulaçãoabd - abductorespi - psoas-ilíacovi - vasto lateral

Figura 5 - Sistema de forças musculares utilizadasna segunda configuração de cargas do estudo

experimental.

Tabela 2 - Coordenadas vectoriais dasforças simuladas.

6 ilustra aa segunda

forma como foiconfiguração de

23

Page 6: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

3 relativamente às extensões verificadaspara a segunda configuração de cargas.

Tabela 4 — Aumento percentual dasextensões no fémur relativamente à

segunda configuração de cargas.

Configuração 1 Configuração 3

Medial 24% 43%

Lateral 14% 52%

Posterior 27% 33%

Anterior 41% 37%

Comparando as extensões obtidas entre asconfigurações de cargas 1 e 3, verificam-seque são semelhantes em termos dedistribuição. No plano sagital do fémur,são quantitativamente muito aproximadas.Esta observação em parte valida opressuposto de que o aumento do ângulode adução do fémur permite introduzir oefeito dos músculos abductores nacaracterização do campo das extensões noperiósteo do fémur (Panjabi et ai., 1985;Diegel et ai., 1989; Delecrin et ai., 1989;Weinans et ai., 1990; Huiskes, 1990;McKellop et ai., 1991), contrariando oconcluído por Cristofolini et ai. (1995). Afigura 8 ilustra a comparação dadistribuição das extensões nos quatroaspectos do fémur para cada configuraçãode cargas simulada. Verifica-se que ainclusão do vasto lateral e do psoas-ilíaco

diminui significativamente as extensões, econsequentemente, a componente de flexãodas cargas a que o fémur é normalmentesujeito. Assim, a configuração do sistemade forças simulado de acordo com oespecificado na configuração 2 é maisconsentâneo, de acordo com a lei de Wolff,com a geometria típica do fémur (Taylor etai., 1995). Como a diferença relativa entreas extensões em cada aspecto do fémur émenor, parece-nos ser esta a situação maisprovável in vivo. Taylor et ai. (1995a),usando o método dos elementos finitos esimulando o osso in vivo, obteveconclusões similares às verificadas nesteestudo. O efeito do vasto lateral e doilíaco-psoas provoca a aproximação dadistribuição das extensões no plano frontale sagital do fémur.

As extensões geradas pela configuraçãocargas de flexão provocam um estadotensão-deformação não fisiológico.extensões medidas na parte medialfémur foram de -1200 O único estudoem que foram feitas medidas de extensõesin vivo foi realizado por Lanyon et ai.(1975). Neste estudo, os autoresdeterminaram valores de extensões deaproximadamente -450 numa tíbiahumana. Lanyon et ai. (1975) tambéminstrumentaram animais, e determinaramextensões principais da ordem de -1161em locomoção normal. Estes valores,medidos in vivo, sugerem uma distribuiçãode tensão (deformação) provocadamaioritariamente por compressão.

A análise mostra que embora os músculosseleccionados para a simulação contribuampara a diminuição dos momentos de flexão,não os eliminam totalmente. Comoexemplo, o vasto lateral reduziu a flexãono plano frontal, mas continuou aobservar-se uma acentuada flexão dofémur. O aumento do ângulo da carga naarticulação de 13° para 20° permitiu aobtenção de um estado de tensão-deformação mais uniforme. O valor de 20°

Figura 6 - Simulação do sistema de forças daconfiguração 2.

dedeAsdo

24

Page 7: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

Configuração 1Configuração 2

— Configuração 3

Figura 7 — Distribuição das extensões no fémurintacto.

é mais próximo do medido por Davy et ai.(198$) e Bergmann et ai. (1993).Bergmann colocou uma série de implantestelemétricos e observou que a amplitude daforça de reacção na articulação era de 17° a25° (Taylor et ai., 1995). Isto sugere-nosque o ângulo da força reactiva naarticulação, para além de variar de pessoapara pessoa, actua mais horizontalmente,

(ANTERIOR)

ao contrário do verificado na maioria dosestudos experimentais e analíticos.

A evidência do estudo realizado sugere queo ângulo da força na articulação influênciafortemente a distribuição das tensões nofémur intacto. Para uma representaçãomais realística de condições in vivo, énecessário utilizar uma carga naarticulação mais próxima da horizontal.

(MEDIAL)

Extensão ( w) -1000-800-600 -400 -200 O Extensão ( .jg)

(POSTERIOR)

Extensão ( g)O 300 600 900 1200 1500

(LATERAL)

-100Extensão ( 11)

É convenienteefectuado foiinstante donomeadamente

salientar que o estudofeito considerando umciclo de locomoção,

a fase de repouso. Uma

25

Page 8: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

pergunta que fica é se será correcto assumirque o fémur é mantido em compressão emtodo o ciclo de locomoção, porque háforças dinâmicas que podemeventualmente alterar o campo dadistribuição das tensões-deformações.Pauwels sugeriu que os momentosflectores se mantém invariantes emqualquer tipo de actividade, e os estudosapresentados por Davy et ai. (1988) e porBergmann et ai. (1993) concluem omesmo.

-1500-

-2000 -

1500-

1000.

500-

0-

-500

-1000

-1500

-2000

Figura $ - Distribuição de extensões no fémur paraas três configurações de cargas simuladas.

A distribuição das extensões observadaspara o fémur solicitado com os “músculos’abductores, o vasto lateral e o ilíaco-psoas,é mais consistente com a geometria dadiáfise do fémur. De acordo com a lei deWolff, oportunamente descrita, as elevadase baixas extensões no plano frontal esagital respectivamente, observadas com ofémur solicitado com os abductores

produziriam secções não circulares nofémur, contrariando a geometria típicadeste osso. Uma grande variação do estadode tensão-deformação entre o piano frontale sagital do fémur sugeria uma espessuravariável do cortex ou uma diferenciaçãopronunciada das propriedades do tecidoósseo mas, mais uma vez, isto não éverificado na geometria do fémur.

Uma configuração de cargaspredominantemente de flexão produziriamnecessariamente um grande momentoftector no plano frontal, que teria de sersuportado pelo ligamento lateral colateraldo joelho. Este ligamento teria de gerar umforça de aproximadamente 2.5 vezes opeso do corpo, o que parece poucoprovável (Taylor et ai., l995a). Este valoré idêntico ao determinado por Pauwels(1980) na sua análise teórica. Ummomento demasiado grande no pianofrontal tenderia a rodar o fémurmedialmente, transferindo grande parte dacarga através do côndilo medial. Estasolicitação abriria a articulação entre ofémur e a tíbia na parte lateral, nãotransferindo qualquer carga por essa zona.Esta conclusão entra em contradição com ageometria do joelho, que sugere que umaestado de pressão uniforme é transferidoatravés de ambos os côndilos. Assim sendoparece-nos, pelo que foi descrito, que ofémur é predominantemente solicitado emcompressão.

7. CONCLUSÕES

O estudo realizado permite-nos questionarse as forças que provocam um estado detensão-deformação característico de flexãorepresentam as verdadeiras condições invivo. Embora as forças utilizadas nesteestudo possam não representar a carga naarticulação e as forças musculares in vivo,leva-nos todavia a concluir que énecessário ter especial cuidado nadefinição do sistema de forças dabiomecânica da anca, e saber até que pontoestas influenciam o campo da distribuição

1500

1000L

5

‘ooa)

-500

-1000-

Configuração 2

P

Configuração 3

26

Page 9: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

das tensões-deformações no fémur. Osinvestigadores não devem só considerarque músculos a aplicar no fémur proximal,mas também devem considerar o efeitodestes na parte distal do fémur, e ter emconta se as forças reactivas provocadas porestas sobre as outras estruturas anatómicassão fisiologicamente aceitáveis.

8. REFERÊNCIAS

Bergmarm, G., Graichen, f., Rohlmann,A., “Hip joint loading during walking andrunning measured in two patients”, J.Biomech., 26, pp. 969, 1993.

Cristofolini, L, Viceconti, M., Toni, A.,Giunti, A., “Influence of thigh muscles onthe axial strains in a proximal femur duringearly stance in gait”, 1. Biomech., 28, 5, pp.617, 1995.

Davy, D. 1., Kotzar, G. M., Brown, R. H.,Heiple, K. G., Goldberg, V. M., Heiple, Jr,K. G., Berilia, J., Burnstein, A. H.,“Teiemetric force measurements across thehip afier total arthroplasty”, J. Bone JointSurg., 70A, pp. 45, 1988.

Delecrin, J., Passutti, N., Rover, J., Rogez,J. M., Bainvel, J. V., “Extensometrie etancra.ge primaíre d’implants femoraux.Etude de l’appui endocompactométaphysaire supérior de l’implant sansciment 3. P. R.”, Acta Othop. Belgica, 55,pp. 150, 1989.

Diegel, P. D., Daniels, A. U., Dunn, H. K.,“Initial effect of coflarless stem stiffness onfemoral bone strain”, J. Orthop., 4, 2, pp.173, 1989.

Dostal, W. F., Andrews, J.dimensional biomechanicalmusculature”, J. Biomech.,1981.

Huiskes, R., “The various stress patterns ofpress-fit, ingrown and cemented femoralstems”, Clin. Orthop. Rei. Res., 261, pp.27, 1990.

Inman, V. 1., “Functional aspects of theabductor muscles ofthe hip”, J. Bone Joint.Surg., 29A, pp. 607, 1947.

Jensen, R. H., Smidt, G. L., Johnston, R.C., “A technique for obtainingmeasurements of force generated by hipmuscies”, Arch. Phys. Med. Rehabil., 53,pp. 207, 1971.

Lanyon, L. E., Paul, 1. L., Reuben, C. L,Thrasher, E. L., Delura, R., Rose, R. M.,Radin, E. L., “in vivo strain measurementsfrom bone and prosthesis following totalhip replacement”, J. Bone Joint Surg., 63A,pp. 989, 1975.

McKellop, H., Ebramzadeh, E., Niederer,P. G., Sarmiento, A., “Comparison of thestability of press-fit hip prosthesis femoralstems using a synthetic model femur”, J.Orthop. Res., 9, pp. 297, 1991.

McNamara, 3. P., Viceconti, M.,Cristofolini, L., Toni, A., Taylor, D.,“Experimental and numerical prfe-clinicalevaluation relating to total hiparthroplasty”, Second InternationalSymposium on Computer Methods inBiomechanics and BiomedicalEngineering, J. Middleton (Ed. ), Gordon eBeach, lhe Netherlands, pp. 1, 1996.

Mittlemeier, T., Mattheck, C., Dietrich, F.,“Effects of mechanical loading on theprofile of human femoral diaphysealgeometry”, Med. Eng. Phys., 16, pp. 75,1994.

Munih, M., Kralj, A., Bajd, T., “Bendingmoments in lower extremity bones for twostanding postures”, J. Biomed. Eng., 14,pp. 293, 1992.Olson, V. L., Smidt, G. L, Johnston, R. C.,“The maximal torque generated by theeccentric, isometric and concentriccontractions of the hip abductor muscles”,Phys. Ther., 52, pp. 149, 1972.

Otani, T., Whiteside, L. A., White, 5. E.,“Strain distribution in the proximal femur

G., “A threemodei of hip14, pp. 803,

27

Page 10: DAS DEFORMAÇÕES NUM FÉMUR COMPÓSITO … · simulando a acçiio do grupo de músculos abductores, vasto lateral e psoas-ilíaco, e ... uma recta com origem no ponto de inserção

with flexible composite and metallicfemoral components under axial andtorsional loads”, J. Biomed. Mat. Res., 27,

pp. 575, 1993.

Panjabi, M. M., Trumbie, 1., Hult, J. E.,Southwick, W., ‘Effect of femoral stemlength on stress raisers associated withrevision hip arthroplasty”, 1. Orthop. Res.,3,pp. 447, 1985.

Paul, J. P., “Bio-engineering studies of theforces transmitted by joints: (II)Engineering analysis”, Proc. of Symposiumon Biomechancis and Related BioEngineering Topics, Glasgow, pp. 369,1965.

Pauwels, F., “Biomechanics of thelocomotor apparatus”, Springer Verlag,Berlin, Heidelberg, New York, 1980.

Pawluk, R. J., Greer, J., Tzitzikalakis, G. 1.,Michelsen, C. B., ‘lhe effects ofexperimental modeis on femoral straindistribution”, Trans. 3Oth Annual ORS,Atlanta, GA, pp. 54, 1984.

Pohtilla, V. F., “Kinesiology of the hipextensores at selected angles ofpelvifemoral extension”, Arch. Phys. Med.Rehabi., 50, pp. 241, 1969.

Prendergast, P. J., Taylor, D., “Stressanalysis of the proximo-medial femur aftertotal hip replacement”, J. Biomed. Eng.,12, pp. 379, 1990.

Rohlmann, A., Mossner, U., Bergmann, O.,Hees, G., Kolbel, R., “Effects of stemdesign and materials properties on stressesin hip endoprostheses”, J. Biomed. Engng.,9, pp. 77, 1983.Seireg, A., Arvikar, R. J., “A mathematicalmodel for evaluation of forces in lowerextremities of the musculoskeletal system”,J. Biomech., 6, pp. 313, 1973.

Seireg, A., Arvikar, R. 1., “lhe predictionof muscular load sharing and joint forces in

the lower extremities during walking”, J.Biomech., 8, pp. 89, 1975.

Sorbie, C., Zalter, R., “Bio-engineeringstudies of the forces transmitted by joints:(1) lhe phasic relationships of the hipmuscles in walking”, In Proc. ofSymposium on Biomechanics and RelatedBio-Engineering Topics, Glasgow, pp. 359,1964.

Szivek, J. A., Weng, M., Karpman, R.,“Variability in the torsional and bendingresponse of a commercially availablecomposite femur”, J. Applied Biomaterials,1, pp. 183, 1990.

Taylor, M., lanner, E., Freeman, M. A. R.,“Canceilous bone stresses surrounding thefemoral component of a hip prosthesis: Anelastic-plastic finite element analysis”,Medical Engineering and Physics, 17 (7),pp. 544, 1995.

Tensi, H. M., Gese, H., Aschrel, R., “Nonlinear three dimensional finite elementanalysis of a cementless hip prosthesis”,Proc. Instn. Mech. Engrs., 203H, pp. 215,1989

Verdonschot, N. J. J., Huiskes, R.,Freeman, M. A. R., “Pre-clinical testing ofhip prosthetic designs: a comparison offinite element calculations and laboratorytests”, Proc. Instn. Mech. Engrs., 207H, pp.149, 1993.

Weinans, H., Huiskes, R., Grootenboer, H.J., “Trends of mechanical consequencesand modeling of a fibrous membranearound femoral hip prostheses”, J.Biomech., 23, pp. 991, 1990.

Wolff, J., “The law of bone remodelling(book review)”, J. Biomechanics, 22, 2, pp.185, 1989.

28