De geração para geração

2
A Comunidade Cruz fica localizada a cerca de cinco quilômetros de Castelo do Piauí, na estrada que liga Castelo a São Miguel do Tapuio. Nela mora Ivan Rodrigues da Silva, sua esposa, Maria Creusa Alves da Silva, e seus filhos, em uma propriedade de 50 hectares. Nela tem plantio de cana-de-açúcar, mandioca, macaxeira, fruteiras, casa de farinha, moinho de cana e criação de pequenos animais. A história do seu Ivan começou em 26 de dezembro de 1957, quando seu Abdias e dona Otacília se casaram e vieram de Crateús, no Ceará, para morar no Piauí, refugiados da seca. Seu Abdias era tropeiro e já conhecia a localidade, pois fazia muitas entregas na região. Conhecendo as potencialidades da terra, seu Abdias decidiu comprar um pedaço de chão e começou o plantio da cana-de-açúcar e produção de rapadura, cultura que seus filhos, como o seu Ivan, “aprenderam a fazer fazendo”. Tradição de família, seu Ivan aprendeu a mexer com o moinho da cana ainda bem jovem, quando os moinhos ainda eram movidos a tração animal, o famoso moinho de boi. Somente em 1979 que ele substituiu o velho moinho por um engenho de ferro, movido por um motor a óleo diesel. Apesar de ser próxima à cidade e de fácil acesso (fica na beira da estrada) a comunidade ainda não possui energia elétrica. Seu Ivan já reformou o velho moinho três vezes para adequá-lo ao beneficiamento da cana. Em uma dessas reformas, montou também uma casa de farinha para aproveitar a plantação de mandioca. Ele conta que a casa de farinha é algo que serve toda a comunidade, pois as outras famílias arrendam a casa e pagam da forma que podem. Toda a cana do seu Ivan é plantada em 12 hectares da terra e o cultivo inicia no mês de maio, mas a colheita é feita somente no ano seguinte, nos meses de julho a outubro. Durante a colheita os trabalhadores, quando vão fazer os “feixes”, retiram a palha da cana e deixam no local para proteger o solo como um tipo de Piauí Ano 1 | nº 05 | setembro | 2008 Castelo do Piauí - PI Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas De geração para geração Apesar das dificuldades, seu Ivan aposta na cana-de-açúcar como gerador de renda 1 Cana sendo moída no engenho movido a óleo diesel Projeto Piloto Processo de fabricação da rapadura

description

 

Transcript of De geração para geração

Page 1: De geração para geração

A Comunidade Cruz fica localizada a cerca de cinco quilômetros de Castelo do Piauí, na estrada que liga Castelo a São Miguel do Tapuio. Nela mora Ivan Rodrigues da Silva, sua esposa, Maria Creusa Alves da Silva, e seus filhos, em uma propriedade de 50 hectares. Nela tem plantio de cana-de-açúcar, mandioca, macaxeira, fruteiras, casa de farinha, moinho de cana e criação de pequenos animais.

A história do seu Ivan começou em 26 de dezembro de 1957, quando seu Abdias e dona Otacília se casaram e vieram de Crateús, no Ceará, para morar no Piauí, refugiados da seca. Seu Abdias era tropeiro e já conhecia a localidade, pois fazia muitas entregas na região. Conhecendo as potencialidades da terra, seu Abdias decidiu comprar um pedaço de chão e começou o plantio da cana-de-açúcar e produção de rapadura, cultura que seus filhos, como o seu Ivan, “aprenderam a fazer fazendo”.

Tradição de família, seu Ivan aprendeu a mexer com o moinho da cana ainda bem jovem, quando os moinhos ainda eram movidos a tração animal, o famoso moinho de boi. Somente em 1979 que ele substituiu o velho moinho por um engenho de ferro, movido por um motor a óleo diesel. Apesar de ser próxima à cidade e de fácil acesso (fica na beira da estrada) a comunidade ainda não possui energia elétrica.

Seu Ivan já reformou o velho moinho três vezes para adequá-lo ao beneficiamento da cana. Em uma dessas reformas, montou também uma casa de farinha para aproveitar a plantação de mandioca. Ele conta que a casa de farinha é algo que serve toda a comunidade, pois as outras famílias arrendam a casa e pagam da forma que podem.

Toda a cana do seu Ivan é plantada em 12 hectares da terra e o cultivo inicia no mês de maio, mas a colheita é feita somente no ano seguinte, nos meses de julho a outubro. Durante a colheita os trabalhadores, quando vão fazer os “feixes”, retiram a palha da cana e deixam no local para proteger o solo como um tipo de

Piauí

Ano 1 | nº 05 | setembro | 2008Castelo do Piauí - PI

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

De geração para geraçãoApesar das dificuldades, seu Ivan aposta na

cana-de-açúcar como gerador de renda

1

Cana sendo moída no engenho movido a óleo diesel

Projeto Piloto

Processo de fabricação da rapadura

Page 2: De geração para geração

cobertura natural. Isso ajuda a nutrir o solo para a próxima safra e garantir as 150 toneladas de cana produzidas a cada ano, as quais geram renda não só para a família, mas para toda a comunidade.

Toda a mão-de-obra utilizada na colheita da cana é de contratação de trabalhadores da própria região que são pagos por produção e não pelo sistema de diárias. Seu Ivan aposta nisso como uma forma de incentivo ao trabalho honesto e sem exploração, pois os trabalhadores vão ganhar pelo que colheram como se fosse uma porcentagem na venda do produto.

De toda a cana retirada por ano, ele conta que somente 10 toneladas são usadas para a produção de rapadura, mel, batida, alfinim e tijolinho, produtos que são produzidos por seu Ivan no moinho. Todo o restante (140 toneladas) é vendido para a fábrica da Cachaça Mangueira, que fica próxima à comunidade, por uma quantia de 50 reais a tonelada.

Segundo ele, vender para a fábrica da Mangueira ainda é a única saída que os agricultores têm para a venda da produção, pois falta de concorrência faz com que os produtores locais tenham que repassar o produto muito barato. Além disso, o mercado local ainda não absorve toda a produção e não há como vender em outros locais, pois os custos de transporte são altos.

No processo de fabricação da rapadura e dos outros produtos da cana, seu Ivan contrata mais oito trabalhadores. Todo o processo começa com a moagem da cana para a extração da “garapa” que será aquecida em tachos de ferro e bronze até ficar no ponto de ir para a gamela e para as fôrmas. Ele explica que para cada 20 litros de garapa são produzidas aproximadamente 14 rapaduras, e, ao final do dia, a produção pode chegar a 400 unidades.

A fabricação da rapadura e de outros derivados pelo pequeno produtor é feita somente no período de uma semana durante o Cachaça Fest, festividade turística que é realizada todos os anos pelo município. Nessa época, a propriedade recebe muitos visitantes que aproveitam a oportunidade para comprar o produto.

A vontade do seu Ivan era poder viver da comercialização da rapadura, mas os programas de governo não garantem a compra da produção e o dinheiro para a manutenção da mão-de-obra enquanto aquilo que já foi produzido é comercializado. Segundo ele o custo diário com pagamento dos trabalhadores e manutenção de equipamentos (com a compra do combustível para movimentar as máquinas) chega a 180 reais, um orçamento alto para um pequeno produtor.

Mas seu Ivan quer ir além. Para os próximos anos ele pretende aproveitar o grande número de cajueiros da propriedade para começar a fazer cajuína. E com a chegada de mais água na comunidade através de poços tubulares e programas como o P1MC e o P1+2, ele pretende plantar hortaliças, melancia e outras culturas para o consumo da família e comercialização na região. “Os encontros da ASA tem ajudado muito para conhecer a realidade de outras famílias e saber que, com vontade, é possível fazer as coisas”, finalizou.

2

O bagaço é usado para acender o fogo da fornalha

www.asabrasil.org.br

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Projeto PilotoPiauí

O PROJETO PILOTO DO P1+2 ESTÁ SENDO DESENVOLVIDO COM OS SEGUINTES APOIOS:

Ministério doDesenvolvimento Social

e Combate à Fome

Secretaria de Segurança Alimentar

e Nutricional

CENTRO REGIONAL DE ASSESSORIA E CAPACITAÇÃO