Decisão da comarca de Bonito

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Poder Judiciário do Estado de Pernambuco Juízo de Direito da Comarca de Bonito SENTENÇA PROCESSO N. 18-47.2004.8.17.0320 REQUERENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO REQUERIDO: MARIA LÚCIA HERÁCLITO DE SOUZA LIMA EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DIVERSOS ATOS DE IMPROBIDADE. COMINAÇÃO DE SANÇÕES PARA OS ATOS INDIVIDUALMENTE. PROCEDÊNCIA EM PARTE. INDISPONIBILIDADE IMEDIATA DOS BENS. - Ao administrador público cabe à função sacrossanta de gerir o dinheiro público, de forma impessoal, pública, legal, eficaz e moral. A falta de observância de qualquer destes princípios administrativos constitucionais implica no cometimento de ato de improbidade administrativa. - O judiciário, diante da instigação do Ministério Público não pode quedar-se silente da má gestão da coisa pública, devendo agir e responder à sociedade que clama por medidas sensíveis a situação de descaso e imoralidade. - Longo lastro probatório documental que permite a apreciação antecipada da lide, que se encontra madura. - Condenação da Demandada em quase todos os atos apontados, não havendo provas suficientes quanto ao cometimento de alguns, motivo pelo qual a procedência é parcial. - Análise individual das punições para cada ato de improbidade. - Ao fim, demonstrado o perigo da demora e a fumaça do bom direito, cabível medida liminar,na sentença, para fins de indisponibilizar bens suficientes ao pagamento da grande quantia a qual fora condenada. Vistos. I - Relatório: Cuida-se de Ação de Improbidade Administrativa interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO, fundada em ato de improbidade administrativa, contra a ex- prefeita da cidade de Bonito – MARIA LÚCIA HERÁCLITO DE SOUZA LIMA, para o que alega o representante ministerial, em resumo: 1) realização de despesas sem comprovação de recursos do município e do FUNDEF; 2) utilização de recursos do FUNDEF para pagamento de bolsas escolares sem comprovação de falta de vagas nas escolas públicas; 3) extrapolamento de valores autorizados pela Lei Orçamentária; 4) obras pagas em excesso; 5) despesas de combustível com veículos particulares; 6) diversas despesas sem comprovação; 7) doações de recursos financeiros; 8) despesas com doações de medicamentos e ataúdes; 9) despesas com refeições; 10) renúncia de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza; 11) restos a pagar baixados sem comprovação; 12) restos a pagar indicados em valor inferior; 13) não prestação de contas referente ao Convênio 734/97; 14) não prestação de contas de recursos recebidos em razão do FNDE; 15) não prestação de contas referente a valores recebidos para combate à Leishmaniose, provenientes do Ministério da Saúde; 16) falta de fiscalização em obra realizada; 17) pagamento de serviços não executados; 18) substituição de material contratado em construção por outro de qualidade inferior; 19) descumprimento de normas técnicas de engenharia em construção. Juntamente com a exordial vieram diversos documentos, sobretudo cópias de vários processos em face da acionada (fls. 44/210). Damião Severiano de Sousa Juiz de Direito Exercício Cumulativo 1

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SENTENÇA

PROCESSO N. 18-47.2004.8.17.0320

REQUERENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO

REQUERIDO: MARIA LÚCIA HERÁCLITO DE SOUZA LIMA

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DIVERSOS ATOS DE IMPROBIDADE. COMINAÇÃO DE SANÇÕES PARA OS ATOS INDIVIDUALMENTE. PROCEDÊNCIA EM PARTE. INDISPONIBILIDADE IMEDIATA DOS BENS.

- Ao administrador público cabe à função sacrossanta de gerir o dinheiro público, de forma impessoal, pública, legal, eficaz e moral. A falta de observância de qualquer destes princípios administrativos constitucionais implica no cometimento de ato de improbidade administrativa.- O judiciário, diante da instigação do Ministério Público não pode quedar-se silente da má gestão da coisa pública, devendo agir e responder à sociedade que clama por medidas sensíveis a situação de descaso e imoralidade.- Longo lastro probatório documental que permite a apreciação antecipada da lide, que se encontra madura.- Condenação da Demandada em quase todos os atos apontados, não havendo provas suficientes quanto ao cometimento de alguns, motivo pelo qual a procedência é parcial.- Análise individual das punições para cada ato de improbidade.- Ao fim, demonstrado o perigo da demora e a fumaça do bom direito, cabível medida liminar,na sentença, para fins de indisponibilizar bens suficientes ao pagamento da grande quantia a qual fora condenada.

Vistos.

I - Relatório:

Cuida-se de Ação de Improbidade Administrativa interposta pelo MINISTÉRIO

PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO, fundada em ato de improbidade administrativa, contra a ex-

prefeita da cidade de Bonito – MARIA LÚCIA HERÁCLITO DE SOUZA LIMA, para o que alega o

representante ministerial, em resumo: 1) realização de despesas sem comprovação de recursos do município e do

FUNDEF; 2) utilização de recursos do FUNDEF para pagamento de bolsas escolares sem comprovação de falta

de vagas nas escolas públicas; 3) extrapolamento de valores autorizados pela Lei Orçamentária; 4) obras pagas em

excesso; 5) despesas de combustível com veículos particulares; 6) diversas despesas sem comprovação; 7)

doações de recursos financeiros; 8) despesas com doações de medicamentos e ataúdes; 9) despesas com refeições;

10) renúncia de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza; 11) restos a pagar baixados sem comprovação; 12)

restos a pagar indicados em valor inferior; 13) não prestação de contas referente ao Convênio 734/97; 14) não

prestação de contas de recursos recebidos em razão do FNDE; 15) não prestação de contas referente a valores

recebidos para combate à Leishmaniose, provenientes do Ministério da Saúde; 16) falta de fiscalização em obra

realizada; 17) pagamento de serviços não executados; 18) substituição de material contratado em construção por

outro de qualidade inferior; 19) descumprimento de normas técnicas de engenharia em construção.

Juntamente com a exordial vieram diversos documentos, sobretudo cópias de vários

processos em face da acionada (fls. 44/210).

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Às fls. 212/218 habita decisão da magistrada à época, na qual reconhece a competência do

foro para conhecer do feito, declarando, incidentalmente a inconstitucionalidade da Lei 10.828/2002 e determina a

notificação da parte demandada para apresentação de manifestação escrita, antes de receber a exordial.

Notificada, apresentou a acionada resposta às fls. 229/244, alegando: 1) tempestividade da

resposta; 2) incompetência do juízo; 3) ilegitimidade ativa; 4) ilegitimidade passiva; 5) inexistência de justa causa

para deferimento da liminar; 6) improcedência do pleito. Juntou documentos de fls. 245/285.

Falou o MP sobre a manifestação preliminar às fls. 293/303.

Há requerimento de terceiro par atuar como assistente do Ministério Público às fls. 312.

Fora recebida a exordial Às fls. 351/352.

Contestação da parte ré às fls. 353/368.

Réplica do MP às fls. 373/380.

Manifestou-se o Município de Bonito às fls. 389/392.

Por fim, às fls. 394 o representante ministerial requereu o julgamento antecipado da lide.

Assim vieram-me conclusos para análise.

Relatado, DECIDO:

II - Discussão:

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II-I. DA POSSIBILIDADE DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE

NOS FEITOS QUE BUSQUEM CONDENAÇÃO POR COMETIMENTO DE

ATOS ÍMPROBOS

Permite o Código de Processo Civil o julgamento antecipado da lide quando ocorra revelia,

ou então quando a matéria discutida já esteja sobejamente comprovada nos autos, através de documentos. No

presente caso, o pedido de reconhecimento de cometimento de ato de improbidade por parte da ré substancia-se

em procedimento do TCE, ou seja, extremamente documentado, assim como em processos executivos e falta de

prestação de contas de convênios realizados. Enfim, matérias precipuamente documentais, tendo em vista que

discussão testemunhal neste sentido é inócua, uma vez que há documentos relevantes.

Esta é a letra do Código Adjetivo Civil, no que diz respeito ao julgamento antecipado da

lide:

Art. 330. O juiz conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença: (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

I - quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)

Não há necessidade de produção de provas em audiência, por outro lado, foram dados às

partes todos os momentos possíveis de defesa e contradição, havendo nos autos reposta escrita por parte da

demandada, manifestação do requerente quanto à resposta preliminar, em seguida, após o recebimento da

exordial, fora aberto prazo para contestação, sendo em seguida apresentada réplica.

Não havendo prejuízo à ampla defesa, nem ao contraditório, e ainda mais por estarem

presentes os requisitos do art. 330, I do CPC, observo possível o julgamento antecipado da lide:

AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISPENSA DE LICITAÇÃO. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. PARTICIPAÇÃO DESONESTA DO RECORRENTE. COMPROVAÇÃO. LESÃO AO ERÁRIO. SÚMULA 7/STJ. I - A despeito de cuidar-se de ação de improbidade administrativa, visando a apuração de responsabilidade decorrente de dispensa de licitação injustificada, entendendo o magistrado que a documentação dos autos se mostra suficiente, em se tratando de matéria de direito, é possível julgar antecipadamente a lide. Precedentes: REsp nº 436.232/ES, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 10.03.2003, AgRg no Ag nº 565.695/MG, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJ de 31.05.2004. II - Incide o óbice sumular 7/STJ ao inconformismo, no tocante à alegação de que não houve participação desonesta do recorrente no caso em tela, uma vez que o aresto

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recorrido constatou o dolo dos requeridos. III - O recorrente alega que o dano ao erário não pode ser presumido, mas tal alegação não é pertinente aos autos, na medida em que o Tribunal a quo, mantendo o entendimento de primeira instância, entendeu devidamente configurado e até mesmo determinado o dano. Qualquer discussão a respeito também esbarra na vedação contida na Súmula 7/STJ. IV - Recurso não conhecido. (REsp 977.252/PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02.10.2007, DJ 12.11.2007 p. 198)

II-II. DA COMPETÊNCIA DO JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU DA

JUSTIÇA ESTADUAL PARA CONHECER DE FEITOS DESTA NATUREZA

Quanto à preliminar de incompetência, é sabido e ressabido, por jurisprudência

sedimentada do STJ, que no caso de feitos de improbidade administrativa, como não há pessoas jurídicas da

União integrando o feito, a competência é da Justiça Estadual (súmula 209 STJ) principalmente pelo fato de tratar-

se de cobrança dos valores alegados, que dizem respeito a convênios com o Governo Federal, pois, demonstra-se

que tais já foram incorporados à municipalidade.

Eis o que afirma a jurisprudência do STJ, no corpo de voto exarado em julgamento que

reconheceu a competência da Justiça estadual para feito similar a este:

CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA AJUIZADA POR MUNICÍPIO CONTRA EX-PREFEITO. CONVÊNIO ENTRE MUNICÍPIO E ENTE FEDERAL. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS PÚBLICOS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.

1. Trata-se de ação de improbidade administrativa proposta por Município contra ex-prefeito, por suposto desvio de verba – já incorporada pela Municipalidade – sujeita à prestação de contas perante órgão federal, no caso, a FUNASA (fundação pública vinculada ao Ministério da Saúde).

2. Nos termos inciso I, do art. 109, da CRFB⁄88, a competência cível da Justiça Federal define-se pela natureza das pessoas envolvidas no processo – rationae personae –, sendo desnecessário perquirir a natureza da causa (análise do pedido ou causa de pedir), excepcionando-se apenas as causas de falência, de acidente do trabalho e as sujeitas às Justiças Eleitoral e do Trabalho.

3. Malgrado a demanda tenha como causa de pedir – a ausência de prestação de contas (por parte do ex prefeito) de verbas recebidas em decorrência de convênio firmado com órgão federal – situação que, nos termos da Súmula 208⁄STJ, fixaria a competência na Justiça Federal (já que o ex gestor teria que prestar contas perante o referido órgão federal), não há, no pólo passivo da ação, quaisquer dos entes mencionados no inciso I do art. 109, da CF. Assim, não há que se falar em competência da Justiça Federal.

4. Corrobora o raciocínio, o entendimento sedimentado na Súmula 209⁄STJ, no sentido de fixar na Justiça Estadual a competência para o processo e julgamento das causas em que as verbas recebidas pelo Município, em

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decorrência de irregularidades ocorridas no Convênio firmado com a União, já tenham sido incorporadas à Municipalidade – hipótese dos autos.

5. Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo de Direito de Marcelância⁄MT, o suscitado.

VOTO: [...] Assim, extrai-se da inicial duas situações de fato:

Primeiro, tratar-se de demanda proposta contra ex-prefeito por suposto desvio de verba sujeita à prestação de contas perante órgão federal, no caso, a FUNASA (fundação pública vinculada ao Ministério da Saúde). No caso, o dever de prestar de contas encontra-se previsto na cláusula segunda, inciso II, alínea "g", do Convênio colacionado às fls. 15-22.

Segundo, que as verbas recebidas em virtude do alegado desvio praticado pelo ex-prefeito já foram creditadas e incorporadas à municipalidade, já que houve pedido de devolução dos valores ao erário.

O Superior Tribunal de Justiça editou duas súmulas que regulamentam as duas hipóteses fáticas. Com relação à primeira situação determinou-se a competência da Justiça Federal e, quanto à segunda, fixou-se a Justiça Estadual. Confiram-se os enunciados:

Súmula 208⁄STJ "Compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal";

Súmula 209⁄STJ: "Compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal."

Aparentemente, a coexistência das duas situações poderia gerar dúvidas quanto à competência para o processo e julgamento da ação.

A controvérsia resolve-se pela interpretação do artigo 109, inciso I, da Constituição da República, que ora se reproduz:

"Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho" (grifos nossos).

Nos termos inciso I, do art. 109, da CRFB⁄88, a competência cível da Justiça Federal define-se pela natureza das pessoas envolvidas no processo – rationae personae –, sendo desnecessário perquirir a natureza da causa (análise do pedido ou causa de pedir). As exceções a essa regra encontram-se na parte final do dispositivo (causas de falência, de acidente do trabalho e as sujeitas às Justiças Eleitoral e do Trabalho).

Malgrado a demanda possua como causa de pedir – a ausência de prestação de contas (por parte do ex prefeito) de verbas recebidas em decorrência de convênio firmado com órgão federal – situação que, nos termos da Súmula 208⁄STJ, fixaria a competência na Justiça Federal (já que o ex gestor teria que prestar contas perante o referido órgão federal), não há, no pólo passivo da demanda, quaisquer dos entes mencionados no inciso I do art. 109, da CF.

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Com efeito, embora a Fundação Nacional de Saúde -FUNASA seja o órgão perante o qual o ex-gestor teria que prestar as referidas contas, em nenhum dos juízos conflitantes houve a inclusão desse ente federal no processo.

Tanto é assim que, se o Município e a Funasa tiverem que "dirimir quaisquer dúvidas fundadas neste Convênio", a causa deverá ser apreciada no "foro da Justiça Federal – Seção Judiciária do Distrito Federal, com renúncia expressa a outros, por mais que privilegiados que forem", consoante foro de eleição estipulado na última cláusula da avença (fl. 22).

Dessa forma, compete à Justiça Estadual processar e julgar as ações em que se postule o ressarcimento de recursos ao erário municipal ou a prestação de contas, quando a demanda tiver como partes apenas Município e ex-prefeito . [...] (STJ - CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 100.507 - MT (2008⁄0232471-7). DJe 25/05/2009).

Pois bem, observa-se que os atos referentes às verbas federais foram apresentados a este

juízo posteriormente à prestação de contas da municipalidade ao ente da União, o que por si só já demonstra a

incorporação dos valores estipulados ao domínio da municipalidade, motivo pelo qual, competente à Justiça

estadual, uma vez que a competência da Justiça Federal se apresenta apenas quando não ocorre tal

incorporação ao patrimônio do Município.

Quanto à competência deste juízo de primeiro grau, invoca a parte demandada a aplicação

do art. 84 do CPP, §1º e 2º, os quais foram julgados inconstitucionais pelo STF:

COMPETÊNCIA. Ratione muneris. Foro especial, ou prerrogativa de foro. Perda superveniente. Ação de improbidade administrativa. Mandato eletivo. Ex-prefeito municipal. Cessação da investidura no curso do processo. Remessa dos autos ao juízo de primeiro grau. Ofensa à autoridade da decisão da Rcl nº 2.381. Não ocorrência. Fato ocorrido durante a gestão. Irrelevância. Reclamação julgada improcedente. Agravo improvido. Inconstitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 84 do CPP, introduzidos pela Lei nº 10.628/2002. ADIs nº 2.797 e nº 2.860. Precedentes. A cessação do mandato eletivo, no curso do processo de ação de improbidade administrativa, implica perda automática da chamada prerrogativa de foro e deslocamento da causa ao juízo de primeiro grau, ainda que o fato que deu causa à demanda haja ocorrido durante o exercício da função pública. (STF. Rcl 3021 AgR / SP - SÃO PAULO. DJe-025 DIVULG 05-02-2009 PUBLIC 06-02-2009)

Sendo assim, tendo em vista que o foro privilegiado deve ser previsto na Constituição, e

que tal é prescrito no texto fundamental para os crimes de responsabilidade, dos quais não se inclui a figura do

prefeito (ex-prefeita no presente caso), cabe ao juízo de primeiro grau da justiça estadual conhecer e julgar o

pleito:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA – SÚMULA 284/STF – EX-PREFEITO – APLICAÇÃO DA LEI

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8.429/1992 – COMPATIBILIDADE COM O DECRETO-LEI 201/1967 – OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – DESNECESSIDADE DE DANO MATERIAL AO ERÁRIO – APLICAÇÃO DA PENA DE MULTA – SÚMULA 7/STJ. 1. Ação civil por ato de improbidade, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra o ex-Prefeito e outras pessoas por desvio de verba pública 2. Contratação de "agentes de saúde" que nunca realizaram atividade relacionada à saúde. 3. Ao alegar violação ao art. 535 CPC, deve o recorrente indicar com precisão em que consiste a omissão, contradição ou obscuridade do julgado. Aplica-se a Súmula 284/STF quando forem genéricas as alegações. 4. Não há antinomia entre o Decreto-Lei 201/1967 e a Lei 8.429/1992. O primeiro trata de um julgamento político próprio para prefeitos e vereadores. O segundo submete-os ao julgamento pela via judicial, pela prática do mesmo fato. 5. O julgamento das autoridades – que não detêm o foro constitucional por prerrogativa de função para julgamento de crimes de responsabilidade –, por atos de improbidade administrativa, é da competência dos juízes de primeiro grau. 6. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o ato de improbidade por lesão aos princípios administrativos (art. 11 da Lei 8.249/1992), independe de dano ou lesão material ao erário. 7.. Hipótese em que o Tribunal a quo, com base na análise do conjunto fático-probatório dos autos, aplicou a pena de multa correspondente a 20 (vinte) vezes os vencimentos dos réus, auferidos à época dos fatos (art. 12, III, da Lei 8.429/1992). 8. Modificar o quantitativo da sanção aplicada pela instância de origem enseja reapreciação dos fatos e da prova, obstaculado nesta instância especial - Súmula 7/STJ. 9. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido. (STJ. REsp 1119657 / MG. DJe 30/09/2009).

Sendo assim, supero as preliminares de incompetência da Justiça estadual e do Juízo

de Primeiro Grau, declarando-me competente para apreciar o feito, nos termos da legislação vigente e com

arrimo na consolidada jurisprudência dos Tribunais de cúpula do Judiciário pátrio, ao mesmo tempo em que deixo

de apreciar o pleito de declaração de inconstitucionalidade incidente feito por parte do autor, pela

prejudicialidade, tendo em vista que os dispositivos alvos de seu requerimento foram declarados inconstitucionais

pelo STF em controle concentrado de constitucionalidade.

II-III. DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA

PROPOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM FINALIDADE DE PUNIÇÃO

PELA PRÁTICA DE ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Alega a demandada, em sede contestatória a ilegitimidade ativa do Ministério Público

estadual, para, por via de Ação Civil Pública, requerer sua condenação pela prática de atos que configurem

improbidade administrativa. Por sua vez, o MP afirma ser legitimado para tanto, colacionando diversos julgados.

Pois bem, o Ministério Público exerce função essencial à Justiça, assim devidamente

previsto na Constituição Federal, que possui natureza de defensor dos interesses públicos, no mais puro sentido da

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promoção da Justiça, seja através da punição, seja por via da defesa dos jurisdicionados, para salvaguarda de

penalidade injusta.

Possui o Parquet, na sua atuação institucional, face sua relevante natureza, diversas

atribuições, previstas na própria Constituição Federal e em leis esparsas, as quais inclusive regulamentam os

instrumentos para atuação ministerial.

No presente caso, está-se diante de ação civil pública, instrumento sacramental de atuação

ministerial, com o fito de apuração de atos que podem se configurar como ímprobos, ou seja, que ferem a

moralidade administrativa, preceito constitucional que rege a administração pública. A atuação ímproba fere o

patrimônio público, trazendo prejuízos ao Estado, no presente caso, em esfera municipal. Neste diapasão,

importante observar que cabe ao MP, nos termo do art. 129 da CF:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

[...]

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;

A Carta Fundamental é explícita ao afirmar ser função ministerial a promoção de ação civil

pública para proteção do patrimônio público. Ora, está-se diante de atos que ferem o patrimônio público, logo,

passíveis ataque pelo ente ministerial. Não bastasse a disposição constitucional, outras normas inferiores preveem

e regulamentam a atuação ministerial nestes casos (Lei 8.625/93):

Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público:

[...]

IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:

[...]

b) para a anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas administrações indiretas ou fundacionais ou de entidades privadas de que participem;

A própria lei de improbidade administrativa prevê a possibilidade de atuação ativa do

Ministério Público:

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Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

[...]

§ 3o No caso de a ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se, no que couber, o disposto no § 3o do art. 6o da Lei no 4.717, de 29 de junho de 1965. (Redação dada pela Lei nº 9.366, de 1996); § 4º O Ministério Público, se não intervir no processo como parte, atuará obrigatoriamente, como fiscal da lei, sob pena de nulidade.

Sendo assim, é reconhecida a legitimidade ativa do Ministério Público via ação civil

pública, para impugnar atos ímprobos, e buscar punição para o agente que praticou tais atos, motivo pelo

qual refuto a preliminar de ilegitimidade ativa do Parquet, suscitada pela parte demandada:

ADMINISTRATIVO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – MINISTÉRIO PÚBLICO COMO AUTOR DA AÇÃO – DESNECESSIDADE DE INTERVENÇÃO DO PARQUET COMO CUSTOS LEGIS – AUSÊNCIA DE PREJUÍZO – NÃO OCORRÊNCIA DE NULIDADE – RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO PÚBLICO – POSSIBILIDADE EM SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS NÃO PRESENTES NO CASO CONCRETO – AUSÊNCIA DE RESPONSABILIZAÇÃO DO PARECERISTA – ATUAÇÃO DENTRO DAS PRERROGATIVAS FUNCIONAIS – SÚMULA 7/STJ. 1. Sendo o Ministério Público o autor da ação civil pública, sua atuação como fiscal da lei não é obrigatória. Isto ocorre porque, nos termos do princípio da unidade, o Ministério Público é uno como instituição, motivo pelo qual, o fato dele ser parte do processo, dispensa a sua presença como fiscal da lei, porquanto defendendo os interesses da coletividade através da ação civil pública, de igual modo atua na custódia da lei. (STJ. REsp 1183504 / DF. DJe 17/06/2010).

II-IV. DA LEGITIMIDADE PASSIVA DA EX-PREFEITA PARA

RESPODER PELAS SANÇÕES PREVISTAS NA LEI DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA

No que se refere à ilegitimidade passiva, não merece melhor sorte.

A lei de improbidade administrativa veio para regulamentar o art. 37 da Constituição

Federal, descrevendo o que seria, até então o termo vago ínsito no texto Constitucional como moralidade

administrativa. Pois bem, é essa a função nobre da Lei 8.429/92, a qual, em seus primeiros dispositivos aponta seu

alvo:

Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de

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qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.

Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.

Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.

Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.

Neste sentido, afirma a parte demandada que, por ser objeto dos crimes de

responsabilidade, não responderia perante atos ímprobos, alegando possível punição reiterada sobre o mesmo fato.

O que ocorre é que as punições da improbidade administrativa não se afiguram como sendo de natureza criminal,

mas sim civil, enquanto que os crimes de responsabilidade possuem natureza delituosa, logo, não há que se afastar

a aplicação da lei de improbidade administrativa aos agentes políticos. Este é o entendimento firmado pelo STF,

no julgamento da questão de ordem entabulada pela Petição 3923 QO / SP - SÃO PAULO, devidamente

publicada no DJe-182 em 26-09-2008:

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATVA. LEI 8.429/1992. NATUREZA JURÍDICA. CRIME DE RESPONSABILIDADE. PREFEITO POSTERIORMENTE ELEITO DEPUTADO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE. PRERROGATIVA DE FORO. INEXISTÊNCIA. PROCESSO EM FASE DE EXECUÇÃO. INCOMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. REMESSA DOS AUTOS AO JUÍZO DE ORIGEM. Deputado Federal, condenado em ação de improbidade administrativa, em razão de atos praticados à época em que era prefeito municipal, pleiteia que a execução da respectiva sentença condenatória tramite perante o Supremo Tribunal Federal, sob a alegação de que: (a) os agentes políticos que respondem pelos crimes de responsabilidade tipificados no Decreto-Lei 201/1967 não se submetem à Lei de Improbidade (Lei 8.429/1992), sob pena de ocorrência de bis in idem; (b) a ação de improbidade administrativa tem natureza penal e (c) encontrava-se pendente de julgamento, nesta Corte, a Reclamação 2138, relator Ministro Nelson Jobim. O pedido foi indeferido sob os seguintes fundamentos: 1) A lei 8.429/1992 regulamenta o art. 37, parágrafo 4º da Constituição, que traduz uma

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concretização do princípio da moralidade administrativa inscrito no caput do mesmo dispositivo constitucional. As condutas descritas na lei de improbidade administrativa, quando imputadas a autoridades detentoras de prerrogativa de foro, não se convertem em crimes de responsabilidade. 2) Crime de responsabilidade ou impeachment, desde os seus primórdios, que coincidem com o início de consolidação das atuais instituições políticas britânicas na passagem dos séculos XVII e XVIII, passando pela sua implantação e consolidação na América, na Constituição dos EUA de 1787, é instituto que traduz à perfeição os mecanismos de fiscalização postos à disposição do Legislativo para controlar os membros dos dois outros Poderes. Não se concebe a hipótese de impeachment exercido em detrimento de membro do Poder Legislativo. Trata-se de contraditio in terminis. Aliás, a Constituição de 1988 é clara nesse sentido, ao prever um juízo censório próprio e específico para os membros do Parlamento, que é o previsto em seu artigo 55. Noutras palavras, não há falar em crime de responsabilidade de parlamentar. 3) Estando o processo em fase de execução de sentença condenatória, o Supremo Tribunal Federal não tem competência para o prosseguimento da execução. O Tribunal, por unanimidade, determinou a remessa dos autos ao juízo de origem.

Sobretudo, o entendimento mantém-se no que diz respeito ao ex-prefeito:

ADMINISTRATIVO – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – PROMOÇÃO PESSOAL – PROPAGANDA COM CARÁTER NÃO-EDUCATIVO – EX-PREFEITO – SUJEIÇÃO À LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. O ex-prefeito submete-se ao rito das ações de improbidade administrativa. Esses agentes, porque destituídos de seu munus, não se acham enquadrados nos termos da Lei n. 1.070/1950, que dispõe sobre os crimes de responsabilidade. Sua participação no processo de improbidade é legítima. Precedente: (REsp 764.836/SP, Relator Ministro José Delgado, Relator p/ acórdão Ministro Francisco Falcão, DJ 10.3.2008). Agravo regimental improvido. (STJ. AgRg nos EDcl no REsp 1080234 / RO. DJe 29/06/2009).

Dessarte, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva, entendendo ser completamente

possível a atuação no polo passivo de ex-prefeito, no que diz respeito aos feitos de improbidade

administrativa.

Vencidas as preliminares, passo à análise do mérito da demanda, o qual faria de forma

partida, tendo em vista as longas alegações e imputações presentes na inicial e à extensa matéria de defesa

apresentada pela demandada, com o fito de tornar a decisão mais didática e organizada.

II-V. CONSIDERAÇÕES SOBRE OS ATOS DE IMPROBIDADE

ADMINSITRATIVA E SUAS PUNIÇÕES

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Importante fazer menção ao presente feito no que diz respeito à via eleita e às

conseqüências advindas de possível condenação, assim como os requisitos para que este magistrado possa vir a

reconhecer e aplicar as sanções ao autor do ato ímprobo.

A ação civil pública propriamente dita possui feição, assim como a ação para

reconhecimento de improbidade administrativa, de defesa do interesse público, armas combatentes da corrupção e

da imoralidade na administração daquilo que é de todos. Diversificam-se no que diz respeito aos objetivos que

almejam, enquanto à Ação Civil Pública busca a obrigação de fazer ou não fazer em sua natureza estrita, ou

pagamento de quantia, a de improbidade administrativa, além desses fins, pune o autor do ato ímprobo com

restrições de direitos, inclusive políticos, ou seja, possui reflexo muito mais gravoso.

É neste sentido de gravidade que cabe ao juiz averiguar os requisitos para a condenação em

atos de improbidade administrativa, os quais são mais rígidos, tendo em vista a natureza das sanções civis

aplicadas. Com estas considerações, está sedimentado na jurisprudência pátria que para a configuração do ato

ímprobo, faz-se mister o dolo, inclusive o genérico, ou, ao menos, a culpa grave, aquela que demonstra a total

negligência ou imprudência ou imperícia, ao conduzir-se de forma a prejudicar o patrimônio público, por conduta,

que aos olhos do homem comum, demonstrar-se-ia a possibilidade de prejudicar a interesse de todos.

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. RESSARCIMENTO DE DANO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. CONTRATAÇÃO DE SERVIDORES SEM CONCURSO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO E DE MÁ-FÉ (DOLO). APLICAÇÃO DAS PENALIDADES. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. DIVERGÊNCIA INDEMONSTRADA. 1. O caráter sancionador da Lei 8.429/92 é aplicável aos agentes públicos que, por ação ou omissão, violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, lealdade às instituições e notadamente: a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário público (art. 10); c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11) compreendida nesse tópico a lesão à moralidade administrativa. 2. A exegese das regras insertas no art. 11 da Lei 8.429/92, considerada a gravidade das sanções e restrições impostas ao agente público, deve se realizada cum granu salis, máxime porque uma interpretação ampliativa poderá acoimar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa, posto ausente a má-fé do administrador público, preservada a moralidade administrativa e, a fortiori, ir além de que o legislador pretendeu. 3. A má-fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal e ímprobo e a ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-intenção do administrador. 4. À luz de abalizada doutrina: "A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial da Constituição, que pune o ímprobo com a suspensão de direitos políticos (art. 37, §4º). A probidade administrativa consiste no dever de o "funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas

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decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer". O desrespeito a esse dever é que caracteriza a improbidade administrativa. Cuida-se de uma imoralidade administrativa qualificada. A improbidade administrativa é uma imoralidade qualificada pelo dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem(...)." in José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2005, p-669. 5. O elemento subjetivo é essencial à caracterização da improbidade administrativa, in casu, inexistente, por isso que a ausência de dano ao patrimônio público e de enriquecimento ilícito dos demandados, tendo em vista a efetiva prestação dos serviços, consoante assentado pelo Tribunal local à luz do contexto fático encartado nos autos, revelam a desproporcionalidade da sanção imposta à parte, ora recorrente, máxime porque não restou assentada a má-fé do agente público, ora Recorrente, consoante se conclui do voto condutor do acórdão recorrido: "Baliza-se o presente recurso no exame da condenação do Apelante em primeiro grau por ato de improbidade, em razão da contratação de servidores sem a realização de concurso público. Com efeito, a tese do Apelante está adstrita ao fato de que os atos praticados não o foram com dolo ou culpa grave, mas apenas decorreram da inabilidade do mesmo, além de não terem causado prejuízo ao erário (..)" 6. Consectariamente, o Tribunal local incidiu em error in judicando ao analisar o ilícito somente sob o ângulo objetivo. 7. A lei de improbidade administrativa prescreve no capítulo das penas que na sua fixação o ?juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.? (Parágrafo único do artigo 12 da lei nº 8.429/92). 8. A aplicação das sanções previstas no art. 12 e incisos da Lei 8.429/92 se submetem ao prazo prescricional de 05 (cinco) anos, exceto a reparação do dano ao erário, em razão da imprescritibilidade da pretensão ressarcitória (art. 37, § 5º, da Constituição Federal de 1988). Precedentes do STJ: AgRg no REsp 1038103/SP, SEGUNDA TURMA, DJ de 04/05/2009; REsp 1067561/AM, SEGUNDA TURMA, DJ de 27/02/2009; REsp 801846/AM, PRIMEIRA TURMA, DJ de 12/02/2009; REsp 902.166/SP, SEGUNDA TURMA, DJ de 04/05/2009; e REsp 1107833/SP, SEGUNDA TURMA, DJ de 18/09/2009. 9. Ressalva do entendimento do relator no sentido de que: (2.1) A Ação Civil Pública e a Ação Popular veiculam pretensões relevantes para a coletividade; (2.2) Destarte, hodiernamente ambas as ações fazem parte de um microssistema de tutela dos direitos difusos onde se encartam a moralidade administrativa sob seus vários ângulos e facetas. Assim, à míngua de previsão do prazo prescricional para a propositura da Ação Civil Pública, inafastável a incidência da analogia legis, recomendando o prazo quinquenal para a prescrição das Ações Civis Públicas, tal como ocorre com a prescritibilidade da Ação Popular, porquanto ubi eadem ratio ibi eadem legis dispositio. Precedentes do STJ: REsp 801.846/AM, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJ de 12/02/2009; REsp 910625/RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Rel. p/ Acórdão Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 04/09/2008; REsp 1063338/SP, Rel. Ministro Fancisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 15/09/2008; REsp 890552/MG, Relator Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ de 22.03.2007; e REsp 406.545/SP, Relator Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJ 09.12.2002; (2.3) A Medida Provisória 2.180-35 editada em 24/08/2001, no afã de dirimir dúvidas sobre o tema, introduziu o art. 1º- C na Lei nº 9.494/97 (que alterou a Lei 7.347/85), estabelecendo o prazo prescricional de cinco anos para ações que visam a obter indenização por danos causados por agentes de pessoas jurídicas de direito público e privado prestadores de serviço público, senão vejamos:"Art. 4o A Lei no 9.494, de 10 de setembro de 1997, passa a vigorar acrescida dos seguintes artigos: "Art. 1.º-C. Prescreverá em cinco anos o direito de obter indenização dos danos causados por agentes

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de pessoas jurídicas de direito público e de pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos." (NR); (2.4) A Lei 8.429/92, que regula o ajuizamento das ações civis de improbidade administrativa em face de agentes públicos, dispõe em seu art. 23:"Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas: I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança; II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego (...)" (2.5) A exegese dos dispositivos legais atinentes à questão sub examine conduz à conclusão de que o ajuizamento das ações de improbidade em face de agentes públicos eleitos, ocupantes de cargo em comissão ou de função de confiança, submetem-se ao prazo prescricional de 5 anos, cujo termo a quo é o término do mandato ou do exercício funcional, consoante a ratio essendi do art. 23, inciso I, da Lei 8429/92. 10. O exame dos autos revela que o término do mandato do agente público, ora Recorrente, ocorreu em 31 de dezembro de 1998 e o Ministério Público ajuizou a ação de improbidade administrativa (15 de junho de 1999), portanto, muito antes do prazo limite estabelecido pelo art. 23 da Lei 8.429/92, que é de cinco anos. 1. Ademais, a adoção do novel entendimento desta Corte, no sentido da imprescritibilidade da pretensão de ressarcimento ao erário, conduz ao desprovimento da pretensão recursal quanto à ocorrência da prescrição para a propositura da ação ab origine. 12. A admissão do Recurso Especial pela alínea "c" exige a comprovação do dissídio na forma prevista pelo RISTJ, com a demonstração das circunstâncias que assemelham os casos confrontados, não bastando, para tanto, a simples transcrição das ementas dos paradigmas.Precedente desta Corte: AgRg nos EREsp 554.402/RS, CORTE ESPECIAL, DJ 01.08.2006. 13. Recurso Especial provido. (STJ. RESP 200602698785. DJE DATA:22/04/2010.)

Pois bem, feitas essas considerações, adianto, de antemão, que o que passará a ser

analisado, daqui em diante, por este julgador, é o cometimento de fatos que se demonstrem como civilmente

típicos.

Por outro lado, o que se passará a observar é se houve culpa, e qual o grau da culpa das

condutas da demandada, ou ainda se houve o dolo genérico, aquele no qual resta indubitável que o agente afrontou

volitivamente norma estipulada, de forma genérica, sem intença de alcançar fim específico.

II-VI. PROCESSO (1) TC 9940073-0 e (2) TC 40037-3

Assevera o agente ministerial que em razão do processo TC 9940073-0, resultado da

apreciação das contas do exercício financeiro de 1998, proveniente do Tribunal de Contas deste Estado, a

demandada teria prestado contas de forma a apontar débito de R$ 384.555,41 (trezentos e oitenta e quatro mil,

quinhentos e cinquenta e cinco reais e quarenta e um centavos), tal desfalque seria proveniente de a.1) realização

de despesa com combustível de veículos particulares; b.1) despesas sem qualquer comprovação; c.1)

pagamento de bolsas escolares sem comprovação de ausência de vagas em escolas públicas; d.1) pagamento

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de despesas com Restos a Pagar em valor superior ao efetivamente realizado e autorizado pela Lei

Orçamentária; e.1) pagamento em excesso a obras e serviços de engenharia.

Em sua defesa alegou a parte demandada que tal decisão do TCE estava sub judice, tendo

em vista seu questionamento perante à 3ª Vara da Fazenda Pública em Recife-PE.

Eis que em busca no sistema JudWin, observei que o questionamento alegado pela parte

demandada está tombado sob o nº 0018968-91.2004.8.17.0001, e foi julgado sem apreciação do mérito por

abandono da causa em 02/02/2010, sendo arquivado definitivamente em 07/05/2010.

Pois bem, a alegada prejudicialidade da decisão administrativa, a qual fez coisa julgada

administrativa (nomenclatura apreciada pela doutrina, apesar de imprecisa), uma vez que não houve recurso,

inexiste, estando em pleno vigor, e, diante dos atributos dos atos administrativos, gozando de presunção de

veracidade.

Por outro lado, o processo TC 40037-3, alvo do processo judicial acima descrito, hoje

extinto, apontou outras irregularidades nas contas apresentadas pela demandada, referente ao exercício financeiro

de 1999, quais sejam: a.2) realização de despesas com veículos particulares; b.2) realização de despesas sem

comprovação; c.2) doações de recursos financeiros, medicamentos e ataúdes; d.2) inscrição a menor de

restos a pagar; e.2) excesso no pagamento de obras de engenharia.

Observo que entre as imputações feitas à requerida, algumas se repetem nos exercícios

financeiros de 1998 e 1999, quais sejam: a.1 e a.2 (despesas de combustível com veículos particulares); b.1 e

b.2 (despesas sem qualquer comprovação); e.1 e e.2 (pagamento em excesso em obras de engenharia).

No caso a.1 e a.2 houve a utilização de recursos públicos para a aquisição de combustível

por particulares, esta conduta se coaduna ao prescrito no art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

[...]

III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistenciais, bens, rendas, verbas ou valores

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do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie;

Ora, tendo sido o combustível pago com dinheiro público e destinado a veículos

particulares, houve uma doação sem qualquer justificativa, dilapidando o patrimônio público e enriquecendo o

particular.

De outro lado, ao que se refere aos fatos e.1 e e.2, houve pagamento em excesso, em total

desconformidade com o valor devido, sendo assim, incorreu a requerida no tipo ímprobo previsto no art. 10 da Lei

de Improbidade:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;

[...]

VI - realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares ou aceitar garantia insuficiente ou inidônea;

[...]

IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;

[...]

XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular;

[...]

XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;

Uma vez demonstrada a subsunção dos atos praticados aos “tipos ímprobos”, previstos na

Lei de Improbidade Administrativa, necessário se estipular com que animo agiu a demandada.

Observo que até o presente momento averigüei condutas repetidas nos exercícios

financeiros de 1998 e 1999, ou seja, condutas ilícitas e reiteradas, mesmo tendo sido a administradora advertida da

prática de tais atos na primeira administração. Conforme já adiantei, dos autos não se verifica prova do dolo, até

porque tal prova é de difícil averiguação e comprovação, pois se trata da intenção da conduta, a qual é ínsita ao

agente.

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As condutas de abastecimento de veículos particulares pela demandada demonstram uma

ação, de forma a gastar o dinheiro público com os particulares, com fins ignorados no presente feito. O dinheiro

público é voltado para o povo, e não para carros particulares, sendo claro que à vista do homem comum, abastecer

carros com dinheiro público se demonstra ilícito.

Ressalte-se que à época o Município de Bonito, assim como hoje, era estruturado,

possuindo procurador municipal nomeado pela demandada, com setor jurídico instituído, e assessoria de

secretários e servidores que acompanhavam (e ainda acompanham) e aconselhavam (e ainda aconselham) a

atividade executiva. Não bastasse isto, as leis são de conhecimento público, devendo o administrador conduzir-se

com o cuidado e em observância estrita aos ditames legais, enquanto o particular age livremente, havendo

restrições legais, o administrador público age restritamente, só fazendo o que a lei permite (legalidade).

Ora, como poderia a demandada, ao utilizar recursos municipais para abastecer carros

particulares agir simplesmente pela ingênua culpa leve ou levíssima, sem saber que o que fazia era ilícito. Sabido

e ressabido que o dinheiro público deve ser destinado ao Público, como falei, ou seja, a todos, não sendo

permitido que seja destinado a uma, duas ou uma quantidade de pessoas determinadas, sem motivo devidamente

previsto em legislação.

A sociedade, diante da inércia judicial sob os auspícios da separação dos poderes, que por

muito tempo fez o Judiciário se eximir de reprimir as condutas administrativas, não mais tolera atos impuníveis,

sob os mantos dos conceitos jurídicos abertos e mutáveis, de forma a permitir a impunidade de uns ou de outros.

De fato, sabido e ressabido, que o dinheiro público destinado a fim particular é prática intolerável, imoral,

ímproba, não havendo que se falar em ingenuidade, ou seja, culpa leve, mero desleixo na prática do ato. Bem pelo

contrário, agir de forma a abastecer veículos particulares com o dinheiro público é conduta proibida pelo senso

comum, ou seja, qualquer um sabe que o dinheiro de todos não pode ser utilizado para beneficiar um e outros (ou

os carros de um e de outros). Logo, resta configurada a grave culpa da demandada, a qual, imprudentemente,

ordenou despesas no sentido de permitir o abastecimento de veículos privados com combustível pago pelo

dinheiro público.

EMBARGOS INFRINGENTES. DIREITO PÚBLICO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AQUISIÇÃO DE COMBUSTÍVEIS AUSENTE LICITAÇÃO. ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PROVA. ÔNUS. (TJRO - Apelação Cível: AC 10000220060124391 RO 100.002.2006.012439-1. Julgamento: 26/02/2009).

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Se o fato de adquirir combustível sem licitação, o que também ocorrera no presente caso, já

configura improbidade administrativa, o que o dirá distribuir a particulares.

No que diz respeito aos casos b.1 e b.2, a demandada eximiu-se de prestar contas do que

deveria fazer, incorrendo, pois, na previsão legal abaixo descrita:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

[...]

VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;

Ora, doando combustível para carros particulares, não podia, de fato, haver prestação de

contas. Como prestaria contas a demandada no presente caso, uma vez que em ambos os exercícios financeiros

houve doação de combustível? Não bastasse isto, como veremos a seguir, há mais fatos que dilapidaram as verbas

repassadas. Como, pois, haveria hígida prestação de contas neste caso? A meu ver, resta mais que configurada a

intenção da demandada em não prestar contas, justamente no intento de encobrir as irregularidades na aplicação

da verba pública.

Não falo aqui, destarte, em qualquer espécie de culpa, omissão, imperícia ou imprudência,

mas sim no intento próprio de não prestar contas. A prestação de contas é preceito constitucional, ainda mais no

que diz respeito a verbas oriundas de outro ente estatal (União), pois sabedora a Ré de que a não prestação de

contas escorreita bloqueará a possibilidade de outros repasses. Não pode o administrador eximir-se de prestar

contas, é ínsito à atividade do administrador, público e até privado, porque cuida do que não é seu.

Estou convencido de que no presente caso, até pelas irregularidades que examinei e pelas

que ainda irei examinar, a omissão na prestação de contas fora intencional, com a vontade frontal de infringir a lei,

de modo a encobrir o desvio nas verbas repassadas. E concluo, quanto ao presente fato, que a omissão na

prestação de contas de terminadas despesas, concernentes aos fatos b.1 e b.2, foi ato doloso omissivo da ex-

administradora. A obrigação de prestar contas é clara e indubitável, pois resta o administrador em ordenar gastos

com dinheiro que não é seu, o que implica, necessariamente no esclarecimento quanto a suas contas. Em pleno

século XX, é inaceitável que o administrador furte-se a prestar devidamente contas, mesmo tendo sido notificado

sobre os defeitos no esclarecimento sobre os gastos, e não apresentando complementação pertinente.

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PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE IMPROBIDADE. LITISPENDÊNCIA. OMISSÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS.

1. Não pode haver litispendência de ação civil pública por ato de improbidade administrativa, ajuizada contra ex-Prefeito que se omitiu de prestar contas de recursos federais recebidos para realização de obras de interesse da União Federal, com ação proposta com a mesma causa de pedir e mesmo pedido perante Juízo Estadual, por ser esse absolutamente incompetente.

2. A omissão de prestação de contas constitui ato de improbidade (Lei 8.429/92, art. 11, inciso VI). (TRF1 - APELAÇÃO CIVEL: AC 25403 BA 2005.33.00.025403-1. Publicação: 24/04/2009 e-DJF1 p.34).

Quanto aos itens e.1 e e.2 que dizem respeito ao pagamento a maior de valores de obras de

engenharia, observo, que, consoante o posicionamento supra, não se pode aceitar do administrador público, ao

fixar contrato para obras de engenharia, ao final do trato realizar pagamento a maior, em descumprimento à lei e

ao acordado no contrato, configurando-se, pois, ato de improbidade administrativa.

REGISTRO DE CANDIDATO - DEPUTADO ESTADUAL - IMPUGNAÇÃO - CANDIDATO QUE OCUPOU O CARGO DE PRESIDENTE DE CÂMARA DE VEREADORES - CONTAS REJEITADAS PELO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SANTA CATARINA - INFRINGÊNCIA AO DISPOSTO NO ART. 1º, INCISO I, ALÍNEA G, DA LEI COMPLR N. 64/1990 COM A NOVA REDAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR N. 135/2010 - CONCESSÃO DE DIÁRIAS PARA VEREADORES PARTICIPAREM DE EVENTO PARTIDÁRIO, PAGAMENTO A MAIOR DE SUBSÍDIO A VEREADORES E DISPENSA INDEVIDA DE PROCEDIMENTO LICITATÓRIO - IRREGULARIDADES INSANÁVEIS QUE CONFIGURAM ATO DOLOSO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - INELEGIBILIDADE - INDEFERIMENTO DO REGISTRO. (TRE-SC - REGISTRO DE CANDIDATO: RECA 878442 SC. Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 09/08/2010).

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANOS AO ERÁRIO DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO. AÇÕES ÍMPROBAS DE AGENTES PÚBLICOS. PAGAMENTOS EFETUADOS A MAIOR PELA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COLETA E TRANSPORTE DE RESÍDUOS. ESTORNO DESSES VALORES PELA EMPRESA. AUSÊNCIA DE CORREÇÃO MONETÁRIA NO CÁLCULO DO VALOR ESTORNADO. CARACTERIZAÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OFENSA AO ART. 11 DA LEI 8.429/92 NÃO CONFIGURADA. APLICAÇÃO DE PENAS (ART. 12, PARÁGRAFO ÚNICO, LEI 8.429/92). PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DE DIVERSOS PRECEITOS LEGAIS. SÚMULAS 282/STF E 211/STJ. NÃO-CONHECIMENTO DO RECURSO PELA APONTADA VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO-DEMONSTRADA. (STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 742538 SP 2005/0062212-4. DJ 25.09.2006 p. 235.)

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Para encerrar a análise das condutas reiteradas nos exercícios financeiros de 1998 e 1999,

observo que a culpa se torna mais gritante ainda face à própria reiteração, tratando-se de conduta contumaz por

parte da demandada, a qual, mesmo cientificada pelo TCE para apresentação de defesa, agiu improbamente no

exercício financeiro seguinte, o que qualifica sua culpa como ex-administradora municipal, apontando, inclusive

para o dolo genérico na vontade da Ré ter cometido o ilícito de improbidade.

De outro lado, passo a observar a conduta c.1, bolsas escolares sem comprovação de falta

de vagas nas escolas públicas. Não é permitido ao ente público financiar a atividade privada educacional uma vez

que possui altos gastos para manter rede de ensino público. Neste passo é que a demandada, conforme o processo

TC 940073-0, doou bolsas de estudo a alunos daquele município sem justificar tal atitude, ou seja, sem comprovar

que as escolas públicas não tinham mais vagas. Ora, a doação de qualquer coisa pública, que onere a

administração, deve ser feita com justificativa salutar e com observância dos ditames legais. Sequer a doação com

fins educacionais é permitida:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

[...]

III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie;

Desta feita, resta comprovado o cometimento de ato de improbidade administrativa. Por

outro lado, quanto à apuração da culpa, é lídimo que o dinheiro público deve servir ao serviço público e ao

interesse de todos, não sendo possível à administração pública eximir-se de prestação de serviço estritamente

público, como o é o ensino. Desta feita, não é coerente a qualquer administrador agir de forma a subsidiar, com o

dinheiro público, bolsas de estudo em escolas particulares, sem comprovar, sequer, a necessidade do ato, e ainda

mais, simplismente doando as bolsas sem nenhum critério. Eis que fora dada oportunidade de justificativa de tal

ato, não havendo explicações por parte da demandada, o que faz presumir que a mesma o fez por mera vontade,

havendo vagas nas escolas públicas. Tal ato demonstra uma imprudência chocante, na qual, sem nenhum critério,

a administração municipal doou bolsas de estudos em escolas particulares a determinada pessoas. Logo, resta

configurada a culpa grave, pois não se aceita, do homem comum que trate como se fosse seu o dinheiro público,

eximindo-se de observar as normas legais, e doando bolsas de estudo para particulares.

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Poder Judiciário do Estado de PernambucoJuízo de Direito da Comarca de Bonito

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

Prefeito. Submissão dos agentes políticos à Lei 8429/92, a despeito do Decreto-lei 201/67. Entendimento pacífico do STJ. Bolsa de estudos concedida ao próprio filho e outra aluna,fora dos limites e condições da autorização legal. Conivência da esposa do Prefeito, então Diretora do Departamento de Assistência Social, que fazia a indicação dos bolsistas à Universidade. Improbidade bem caracterizada.Desrespeito à ordem cronológica dos pagamentos de precatórios judiciais.Violação ao mandamento constitucional e ao princípio da impessoalidade por beneficiar algum credor a detrimento de outros. Empenho irregular à conta do FUNDEF. Valor pequeno. Possibilidade de erro. Improbidade não evidenciada. Interesse pecuniário a motivar a concessão irregular de bolsas de estudos a justificar, além das sanções impostas pela sentença, também a multa civil de uma vez o valor do dano e a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios, pelo prazo legal de cinco anos.Provido o recurso do autor e não provido o dos réus. (TJSP - Apelação: APL 994080704668 SP. Publicação: 26/07/2010.)

Reitero, aqui, o entendimento do dolo quanto ao cometimento dos atos b.1 e b.2, os quais

possuem caráter omissivo doloso, pois, como prestaria contas daquilo que gastou irregularmente? Portanto,

reconsubstancio meu convencimento, o qual está intimamente formado, e devidamente fundamentado, quanto a

indubiedade de que a demandada, ao deixar de prestar contas, assim o fez com dolo.

O item d.1, que diz respeito ao pagamento de despesas com restos a pagar em valor

superior ao previsto em lei orçamentária, demonstra a falta de respeito para com a legislação vigente, ferindo todo

o sistema de legalidade ao qual se submete a administração pública. Ora, se é votada e aprovada uma lei que deve

direcionar (e de fato direciona) a atividade financeira administrativa durante todo o exercício financeiro daquele

ano, e não há observância por parte do administrador público, não há que se falar em imprudência simples em

suas ações, mas sim em um descuido grave, e mais que isso, o intento geral de desvirtuar a utilização do dinheiro

comunitário, ainda mais quando alem de gastar diversamente do determinado, gasta em valor superior ao que

deveria, ou seja, incorreu em duas condutas repreensíveis, ferindo a Lei Orçamentária por dois viés.

A Lei Orçamentária é a bíblia do administrador, a qual deve ser seguida estritamente, pois

se trata de instrumento garantidor dos freios e contrapesos impostos pelo legislativo municipal no sentido de

cercear a atividade administrativa, garantindo a separação dos poderes, e a fiscalização financeira do legislativo

sobre o executivo, função constitucional e fundamental ao Estado Democrático de Direito.

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Tal preceito, como afirmei, é constitucional, de conhecimento e vedação pelo senso

comum, o qual veda a ação em desacordo com a lei e a não possibilidade de gastar desconforme o que está

obrigado, e ainda mais, gastar além do que se tem.

Como pode o administrador possuir uma norma que lhe estabelece limites para gastar

valores, e os gasta como bem quer, sem observar a norma estipuladora confeccionada pelo poder que exerce

função fiscalizadora?

Neste sentido, estou convencido que a demandada agiu imbuída de dolo genérico, tendo em

vista que descumpriu a lei orçamentária, utilizando os Restos a Pagar para quitar despesas estranhas, e sobretudo,

em valor superior ao efetivamente previsto na Lei Orçamentária, sendo conhecedora que agia em

desconformidade com o direito, fato que não a inibiu de dilapidar o erário, dando destino desejado, e ilegal ao

dinheiro público, ferindo o Estado Democrático de Direito, e a separação dos poderes, fato ao qual o Judiciário,

uma vez acionado, não pode ficar silente, ou omitir-se, sob pena de referendar o ato ímprobo, e sobretudo, à

fraude frontal aos princípios fundamentais do Estado Brasileiro.

Desta feita, agindo como agiu, a requerida recaiu na figura descrita na Lei de Improbidade

administrativa que reconhece o cometimento de ato de improbidade que fere os princípios da administração

pública, qual seja:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

Agiu a demandada em desconformidade com a Lei Orçamentária, realizando gastos a

maior, motivo pelo qual incidiu no ato ímprobo acima descrito:

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

Ordenação de despesas sem lastro orçamentário. Contabilizadas em"restos a pagar" Deliberado desrespeito à vedação legal Improbidade configurada. Sanções conformes com a lei e com a gravidade da conduta Ressarcimento, no entanto,que deve ser limitado aos encargos da mora, pela falta de pagamento no tempo devido e aos ônus da sucumbência nos casos em que houve cobrança judicial e o Município ficou vencido. Isto porque as despesas foram feitas no interesse do Município. Demanda parcialmente procedente. Recurso

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parcialmente provido. (TJSP - Apelação: APL 994071238684 SP. Publicação: 27/04/2010).

Já a condução da demandada conforme o item c.2, doação de recursos financeiro,

medicamentos e ataúdes, demonstra o desrespeito para com o que é do povo. Ora, o dinheiro público não é meio

de se realizar benevolências com intenções quaisquer que sejam (provavelmente eleitoreiras, como muito ocorre

nas cidades do interior deste Pernambuco), mesmo que por mera bondade, o que se afigura difícil de acreditar. O

dinheiro público, em sentido mais amplo possível, deve ser aplicado conforme a lei, sem escolher beneficiários,

possuindo requisitos objetivos se é que é para existirem meras doações. Ressalto que não houve qualquer estado

de calamidade ou necessidade prementes no período das doações realizadas pela demandada, conforme os autos.

No presente caso, a demandada doou medicamentos, ataúdes e até recursos financeiros.

Tal atitude, assim como as demais, possui caráter reprimível e inaceitável, não há que se falar em simples culpa,

mas sim culpa em grau elevado, tendo em vista que as doações públicas sem observância dos critérios de lei são

repudiáveis, por ferirem a legalidade, a moralidade e a impessoalidade administrativas, assim como a eficiência,

todos princípios constitucionais. Ressalto ainda que a reiteração dos atos de improbidade, conforme venho

analisando ao longo desta extensa decisão, imprime, ao menos, um grau elevadíssimo de culpa no ânimo da ação

da ex-administradora.

Não bastasse isto, observo que a doação não foi um acaso, mas sim prática recorrente da

demandada, a qual no exercício financeiro de 1998 já havia agido de forma similar, ao doar bolsas de estudo sem

qualquer explicação e realizado gastos com combustível para veículos particulares. Assim como, em “aplicar” o

dinheiro público para abastecer veículos particulares. Pois bem, trata-se de atitude costumeira da demandada, o

que agrava mais ainda seu intento de agir, demonstrando, sobretudo, a falta de respeito e cuidado com o dinheiro

público, fazendo da Prefeitura Municipal um recinto particular de doações e benesses particulares, o que é

inaceitável em um Estado Democrático de Direito, como o é o Brasil, que cinge a atividade administrativa

sobretudo na moralidade.

Convencem-me, pois, as provas dos autos, que agindo da maneira que agiu a demandada

esteve imbuída no mínimo de uma culpa de grau elevadíssimo, gravíssima, sendo imprudente, repito, em um juízo

de valor benevolente, ao extremo. Quando se está diante de casos como a doação de medicamentos e ataúdes há

uma certa sensibilidade, tendo em vista que possuem um caráter de saúde pública, o que muitas vezes leva os

julgadores a entender pela boa-fé da ação do administrador que cometeu o ato ilícito, de forma a afastar a

improbidade do ato. Contudo, conforme ressalto, no momento em que as condutas doadoras da ex-prefeita se

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realizaram, a Cidade de Bonito e suas vizinhanças não estavam em nenhuma situação de calamidade ou perigo de

saúde pública. Por outro lado, não se fala apenas em medicamentos e ataúdes, mas também em verbas públicas,

repito, doação de verbas públicas!

AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DO ADMINISTRADOR PÚBLICO. 1. A Lei 8.429/92 da Ação de Improbidade Administrativa, que explicitou o cânone do art. 37, § 4º da Constituição Federal, teve como escopo impor sanções aos agentes públicos incursos em atos de improbidade nos casos em que: a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9º); b) que causem prejuízo ao erário público (art. 10); c) que atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11), aqui também compreendida a lesão à moralidade administrativa. 2. Destarte, para que ocorra o ato de improbidade disciplinado pela referida norma, é mister o alcance de um dos bens jurídicos acima referidos e tutelados pela norma especial. 3. No caso específico do art. 11, é necessária cautela na exegese das regras nele insertas, porquanto sua amplitude constitui risco para o intérprete induzindo-o a acoimar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa, posto ausente a má-fé do administrador público e preservada a moralidade administrativa. 4. In casu, evidencia-se que os atos praticados pelos agentes públicos, consubstanciados na alienação de remédios ao Município vizinho em estado de calamidade, sem prévia autorização legal, descaracterizam a improbidade strictu senso, uma vez que ausentes o enriquecimento ilícito dos agentes municipais e a lesividade ao erário. A conduta fática não configura a improbidade. 5. É que comprovou-se nos autos que os recorrentes, agentes políticos da Prefeitura de Diadema, agiram de boa-fé na tentativa de ajudar o município vizinho de Avanhandava a solucionar um problema iminente de saúde pública gerado por contaminação na merenda escolar, que culminou no surto epidêmico de diarréia na população carente e que o estado de calamidade pública dispensa a prática de formalidades licitatórias que venha a colocar em risco a vida, a integridade das pessoas, bens e serviços, ante o retardamento da prestação necessária. 6. É cediço que a má-fé é premissa do ato ilegal e ímprobo. Consectariamente, a ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-fé do administrador. A improbidade administrativa, mais que um ato ilegal, deve traduzir, necessariamente, a falta de boa-fé, a desonestidade, o que não restou comprovado nos autos pelas informações disponíveis no acórdão recorrido, calcadas, inclusive, nas conclusões da Comissão de Inquérito. 7. É de sabença que a alienação da res pública reclama, em regra, licitação, à luz do sistema de imposições legais que condicionam e delimitam a atuação daqueles que lidam com o patrimônio e com o interesse públicos. Todavia, o art. 17, I, b, da lei 8.666/93 dispensa a licitação para a alienação de bens da Administração Pública, quando exsurge o interesse público e desde que haja valoração da oportunidade e conveniência, conceitos estes inerentes ao mérito administrativo, insindicável, portanto, pelo Judiciário. 8. In casu, raciocínio diverso esbarraria no art. 196 da Constituição Federal, que assim dispõe: "A saúde é considerada dever do Estado, o qual deverá garanti-la através do desenvolvimento de políticas sociais e econômicas ou pelo acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.", dispositivo que recebeu como influxo os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), da promoção do bem comum e erradicação de desigualdades e do direito à vida (art. 5º, caput), cânones que remontam

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às mais antigas Declarações Universais dos Direitos do Homem. 9. A atuação do Ministério Público, pro populo, nas ações difusas, justificam, ao ângulo da lógica jurídica, sua dispensa em suportar os ônus sucumbenciais, acaso inacolhida a ação civil pública. 10. Consectariamente, o Ministério Público não deve ser condenado ao pagamento de honorários advocatícios e despesas processuais, salvo se comprovada má-fé. 11. Recursos especiais providos. (STJ. REsp 480387 SP 2002/0149825-2. DJ 24/05/2004 p. 163).

Pois bem, diferentemente do julgado supra, a ação da demandada não possui boa-fé, pois

inexiste situação fática que justifique tal prática como existia no caso do julgado supra. As doações foram mera

deliberação da demandada, por vontade própria, não existindo situação fática justificadora. Por outro lado, ressalto

que houve doação de verbas públicas, o que em nenhum momento se justifica, restando demonstrada a culpa

gravíssima e a inexistência de ato de boa-fé por parte da demandada:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - DOAÇÃO DE IMÓVEIS PERTENCENTES A MUNICÍPIO, EM AFRONTA AOS DITAMES LEGAIS - INOBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS NORTEADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO PÚBLICO - FATO IRRELEVANTE NO QUE TANGE À CARACTERIZAÇÃO DA IMPROBIDADE - RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - Apelação Cível: AC 5421454 PR 0542145-4. Julgamento: 13/10/2009. Publicação: DJ: 274).

Sendo assim, se doar imóveis é ato de improbidade, muito mais grave é a doação de

recursos públicos, medicamentos e ataúdes, estes últimos por mera deliberação, e aos que bem interessava ao

poder público municipal, muito provavelmente, seus eleitores fiéis.

Por fim, no que diz respeito à análise dos fatos previstos nos processos administrativos

provenientes do Tribunal de Contas de Pernambuco, resta analisar a não inscrição de restos a pagar no valor

escorreito, d.2.

O Estado lida com o dinheiro público, e, por isso, está condicionado a agir conforme a lei

exige. Por sua vez, a norma busca regulamentar a ação do administrador, que é representante do Estado, de forma

a garantir a higidez na utilização do dinheiro público, tanto quanto aos gastos, como aos pagamentos, para que o

dinheiro público não seja mal aplicado, ou o Estado não desonre suas obrigações. Algumas despesas devidamente

realizadas pelo Estado podem não vir a ser pagas no exercício financeiro em curso, sendo repassadas como Restos

a Pagar para o exercício subsequente. Pois bem, a inscrição para o pagamento dos Restos a Pagar deve ser

realizada nos termos da lei, espelhando a realidade, tendo em vista a necessidade de publicidade e veracidade dos

atos administrativos, e sobretudo do Planejamento que o município necessita para honrar suas obrigações.

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Posto isto, observo que a demandada, nos termos que restaram comprovados no processo

administrativo, inscreveu Restos a Pagar em valor menor que o real, prejudicando as atividades municipais, e

em desacordo com a lei de Responsabilidade Fiscal, a qual prevê o seguinte:

Art. 1o Esta Lei Complementar estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição.

§ 1o A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar.

Art. 55. O relatório conterá:

[...]

III - demonstrativos, no último quadrimestre:

a) do montante das disponibilidades de caixa em trinta e um de dezembro;

b) da inscrição em Restos a Pagar, das despesas: 1) liquidadas; 2) empenhadas e não liquidadas, inscritas por atenderem a uma das condições do inciso II do art. 41; 3) empenhadas e não liquidadas, inscritas até o limite do saldo da disponibilidade de caixa; 4) não inscritas por falta de disponibilidade de caixa e cujos empenhos foram cancelados;

Sendo assim, a não inscrição integral dos restos a pagar fere a ordem jurídica vigente,

infringindo a parte ré diretamente a norma jurídica, incorrendo, pois, em ato de improbidade que viola os

princípios da administração pública:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência; (Lei de Improbidade Administrativa).

Quanto ao elemento volitivo da ação da demandada, faço, inicialmente um breve resgate de

tudo que aqui já fora dito, salientando que foram atos comuns da demandada, durante sua administração, a doação

de bolsas de estudo para escolas particulares, sem qualquer justificativa ou demonstração de necessidade ou ainda

critério para distribuição das bolsas; doação de combustível, abastecendo carros particulares com verbas públicas;

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doação de medicamentos, ataúdes e até recursos públicos; a ex-prefeita também já teve problemas com prestação

de contas, assim como destinou, em outrora, restos a pagar com fins diversos da lei orçamentária. Ora, no presente

caso a ex-administradora deixou de inscrever restos a pagar, qual será seu elemento volitivo?

Estou convencido de que a demandada agiu frontalmente contra a lei, mesmo sabedora de

suas obrigações, com intento ilícito, na busca de garantir suas reiteradas irregularidades que se desenvolveram

durante todo o período de sua administração. A inscrição de restos a pagar é obrigação legal, sua omissão fere o

planejamento municipal, assim como torna inverídico o ato administrativo, o qual deve refletir a verdade, tendo,

pois, em sua conduta dolosa omissiva, a demandada ferido estes preceitos.

Ressalto que na oportunidade de defesa da parte demandada, esta apresentou alegações

genéricas, sem combater ponto a ponto as imputações ministeriais, cingindo-se a dizer que havia processo que

discutia o mérito das decisões administrativas (o qual fora extinto por abandono de causa, conforme

afirmado supra), e afirmando genericamente que os atos eram inverídicos.

Alegações genéricas são inservíveis à contestação, a qual deve combater todos os

argumentos especificamente e apresentar toda a defesa neste momento, inclusive apresentando provas, o que não

fora feito também pela parte demandada (art. 300 do CPC).

Sendo assim, observo que tecnicamente ocorreu a revelia, contudo, tendo em vista tratar-se

de ação que pode vir a atingir direitos indisponíveis, não há que se falar nos efeitos da revelia, motivo pelo qual,

nos passos da jurisprudência sedimentada, esta decisão que julga antecipadamente a lide possui fundamentação

extensa quanto ao convencimento deste magistrado, refutando o principal efeito da revelia: a presunção de

verdade do alegado na exordial.

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - REVELIA - INOCORRÊNCIA DOS EFEITOS PREVISTOS NO ART. 319 DO CPC - DIREITOS INDISPONÍVEIS - PRODUÇÃO DE PROVAS - NECESSIDADE - AGRAVO PROVIDO. I - Na ação de improbidade administrativa, considerada a gravidade das sanções a serem impostas em caso de procedência do pedido, o autor tem obrigação de comprovar os fatos imputados ao réu, afastando-se, em face da indisponibilidade dos interesses envolvidos nessa espécie de demanda, a incidência de presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor, decorrente da revelia, a teor dos arts. 319 e 320, II, do CPC. II - O Código de Processo Civil descortina dois caminhos, em caso de decretação de revelia, sem o seu efeito material de presunção de veracidade dos fatos afirmados pelo autor. Um, para que o autor especifique as provas que pretenda produzir em audiência (art. 324 do CPC).

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Outro, para que o Juiz conheça diretamente do pedido, quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir prova em audiência (art. 330 do CPC). III - Na hipótese vertente, o réu-agravante apresentou defesa prévia, ocasião em que requereu a produção de provas pericial, testemunhal e documental, sendo certo que algumas das condutas tipificadas como ímprobas exigem, segundo o colendo STJ, a prova do dolo, devendo o ressarcimento do dano ser proporcional ao efetivo prejuízo sofrido pelo Erário. IV - Há penas previstas na Lei 8.429/92, como a que suspende direitos políticos, que atingem direitos e garantias extrapatrimoniais ou públicos constitucionalmente assegurados. Há sanções que, para serem aplicadas, consoante a jurisprudência do egrégio STJ, exigem a comprovação do dolo ou da culpa, o que certamente só se apura mediante a garantia da ampla defesa e do contraditório, sendo imprescindível a persecução da verdade real, isso porque os direitos e interesses tutelados, na ação de improbidade administrativa, a despeito de serem de natureza cível, têm interfaces com o direito penal. Precedentes da Turma e do colendo STJ. V - Incabível o julgamento antecipado da lide, sem dar oportunidade, ao requerido/agravante, de produzir as provas requeridas, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo das alegações do autor, considerando-se a indisponibilidade dos direitos e interesses que dimanam da ação de improbidade administrativa. VI - Agravo provido, para determinar a regular instrução do feito, assegurada a produção de provas ao agravante. (TRF1 - AGRAVO DE INSTRUMENTO: AG 8950 BA 2008.01.00.008950-4. Publicação: 07/11/2008 e-DJF1 p.63).

II-VII. DOS ATOS RELATIVOS AO CONVÊNIO 0734/97, 2º TERMO

ADITIVO

Consta nos autos que o Município de Bonito, na gestão da ora demandada, firmou convênio

com o Ministério da Saúde com o fito de combate para erradicação do mosquito aedes aegypti, sendo tal convênio

aditado em 10 (dez) de dezembro de 2001. O aditamento fora no valor de R$ 68.124,00 (sessenta e oito mil e

cento e vinte e quatro reais).

Feito o aditamento, e chegado o período de prestação de contas, a gestora municipal

acionada eximiu-se da obrigação legal de prestar contas ao concedente do convênio, tendo o município passado à

inadimplência e sendo inscrito no órgão restritivo oficial (fls. 97/99).

A prestação de contas é obrigação constitucional do gestor municipal, que ao administrar

dinheiro público, deve seguir os ditames legais e ao fim demonstrar que assim o fez, com a devida prestação de

contas. A prestação de contas é, pois, atestado de cumprimento das normas legais às quais está adstrito o gestor

público. Tal obrigação é de cunho primordial, e sua falta demonstra desídia do administrador para com a

sociedade e, diretamente, para com o concedente do convênio.

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Não bastasse isto, a não prestação de contas implica na inadimplência do município perante

o órgão concedente e à inscrição nos órgãos restritivos de repasses.

Sendo obrigação proveniente do próprio cargo de administrador, o qual não possui motivos

para se eximir de tal dever, salta aos olhos que a omissão da demandada, ressaltado o fato de que foi constatada a

irregularidade na prestação de contas, o concedente do convênio pede explicações, sendo dado ao administrador

corrigir algum erro ou justificar a falha, o que não houve no presente caso por parte da demandada, demonstra a

frontal intenção ilegal da ex-prefeita, configurando sua atuação consciente e persistente para com o ilícito.

Não merece vitória o argumento contestatório, uma vez que alega que suas contas

relativas ao referido convênio foram devidamente prestadas e inclusive aprovadas, com impropriedades.

Observo que ás fls. 257/260 consta realmente aprovação das contas, com impropriedades, apresentadas no

que se refere ao convênio 734/97. Todavia, tais documentos referem-se tão somente ao convênio em seu

texto original e ao aditivo 1º, sem englobar o 2º aditivo, no valor acima descrito, e alvo da presente ação

civil por ato de improbidade.

Ora, mais uma vez nada provou a parte demandada, enquanto que o representante

ministerial trouxe documentos oficiais aos autos que demonstram que não fora prestada contas ao segundo

aditivo do convênio indicado.

Sendo assim, agindo como agiu a demandada deixou de cumprir obrigação legal (prestar

contas), motivo pelo qual cometeu ato de improbidade por ferir os princípios administrativos, (art. 11, VI da Lei

de Improbidade administrativa). A negativa na prestação de contas é ato cometido volitivamente, que possui

conhecimento de infringência frontal à norma jurídica, ou seja, com dolo genérico reconhecido.

ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EX-PREFEITO MUNICIPAL. CONVÊNIO. OMISSÃO NA PRESTAÇÃO DE CONTAS. ART. 11, VI DA LEI Nº 8.429/92.

I. Pratica ato de improbidade administrativa o gestor municipal que deixa de prestar contas de convênio celebrado com a União, não se tratando de mera irregularidade administrativa. Incidência do art. 11, VI da Lei nº 8.429/92 ao caso, pois a responsabilidade incide sobre o Prefeito, ainda que os recursos sejam repassados à pessoa jurídica de direito público por ele administrada.

II. A figura do art. 11, VI da Lei de Improbidade Administrativa perfaz-se com a simples omissão do Prefeito em cumprir seu dever, como corolário do

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princípio da moralidade, sendo dispensável a verificação de enriquecimento ilícito e dano ao erário.

III. Precedentes: AC nº 399350/PE, Segunda Turma, Rel. Francisco Wildo, DJ 17/06/2009; AC nº 469748/CE, Quarta Turma, Rel. Margarida Cantarelli, DJ 29/07/2009.

IV. Apelação improvida. (TRF5 - Apelação Civel: AC 479579 SE 0006579-23.2005.4.05.8500. Publicação: Fonte: Diário da Justiça Eletrônico - Data: 12/11/2009 - Página: 921 - Ano: 2009).

Ressalto que o presente caso não se trata de mero atraso na prestação de contas, com

execução perfeita dos fins do convênio, motivo pelo qual configurado o ato ímprobo:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITOS. POSSIBILIDADE. CONVÊNIO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ATRASO. REGULARIDADE NA EXECUÇÃO DAS OBRAS. AUSÊNCIA DE DESONESTIDADE OU MÁ-FÉ. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA. - Os prefeitos e ex-prefeitos municipais sujeitam-se à Lei de Improbidade Administrativa. Inaplicabilidade da Reclamação n. 2138. Ausência de eficácia erga omnes e efeito vinculante. Precedentes do STF, do STJ e deste Tribunal. - O art. 11, VI, da Lei n. 8.249/92 prevê que a falta de prestação de contas configura improbidade administrativa, não o mero atraso no seu encaminhamento ao órgão competente. Contudo, considerando que as situações especificadas nos incisos desse dispositivo legal são exemplificativas, e não taxativas, o atraso na prestação de contas pode configurar improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública, desde que tenha havido violação aos deveres "de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições". - O mero atraso de quatro meses no envio da prestação de contas de convênio, sem que haja qualquer indício de desonestidade ou má-fé, até porque o objeto do convênio foi integralmente executado, como atestado por equipe técnica do órgão federal competente, não implica em ato de improbidade administrativa. - Apelação provida. Condenação do município-apelado ao pagamento de honorários advocatícios de R$ 2.000,00. (TRF5 - Apelação Civel: AC 436928 RN 0001518-93.2005.4.05.8400. Publicação: Fonte: Diário da Justiça Eletrônico - Data: 21/01/2010 - Página: 122 - Ano: 2010).

Tal citação poderia, equivocadamente, levar à conclusão do julgado acima, mas o que de

fato houve foi ausência do ato necessário (prestação de contas), o que implicou severas conseqüências ao

município de Bonito, e por conseqüência restou demonstrada a prática de ato de improbidade, o qual se configura

independentemente do comprovado dano ao erário.

II-VIII. ATOS PRATICADOS NO QUE SE REFERE ÀS VERBAS

PROVENIENTES DO PNAE-2000

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Consta dos autos que o município de Bonito fora beneficiado, no ano de 2000, por repasse

de verbas Federais, provenientes do Programa de Alimentação Escolar – PNAE, mais precisamente pelo período

de 24/02/2000 até 31/08/2001.

Eis que não houve prestação de contas também destes valores, o que implicou em sanções

ao Município de Bonito, nos termos do item supra.

A prestação de contas é ato obrigatório ao administrador público, o qual deve tornar pública

sua atividade e os gastos públicos, sendo tal dever proveniente de lei.

Enfim, falar mais que isso me tornaria repetitivo, tendo em vista que já fiz todas as

considerações possíveis e imagináveis quanto à ausência de prestação de contas na seção imediatamente supra.

Observo, apenas, que há reiteração contumaz da demandada em praticar atos ímprobos da mesma espécie.

Não merece guarida a argumentação da demandada quando afirma que o processo para

apuração da prestação de contas ainda está em andamento, quando na verdade não houve prestação de contas,

conforme se deflui das fls. 141/145, como poderia está aberto o processo de prestação de contas se esta inexiste?

Busca aqui, como o fez na seção anterior, apenas ludibriar o convencimento do magistrado como tentou fazer na

seção supra, afirmar que as contas estavam aprovadas, reportando-se a contas estranhas ao feito. O que está em

aberto é a própria prestação de contas!

O que há de novo a se afirmar é que se tratava de ato, como mencionei, costumeiro da

demandada não só as doações das coisas públicas, como também a não prestação de contas do dinheiro público

perante os órgãos concedentes, o que assevera ainda mais a gravidade de suas condutas, e afasta qualquer

possibilidade de boa-fé ou culpa leve ou grave em suas condutas. Apesar de a atividade administrativa estar

fundada na legalidade, ao meu ver a administração da demandada firmou-se sobretudo na ilegalidade, e muitas

vezes na própria improbidade, a qual se configura como uma ilegalidade qualificada.

Sendo assim, agindo como agiu, mais uma vez a demandada feriu o art. 11, inciso VI da Lei

de Improbidade Administrativa, tendo cometido novo ato ímprobo que vai de encontro aos princípios que regem a

administração pública. Quanto a seu intento volitivo, resta caracterizado o mesmo da seção anterior, ainda mais

pela reiteração do ato. Não se pode cair na ingenuidade, ou nos conceitos vagos do direito, de forma a

desconhecer a reprovabilidade qualificada da ação da ex-administradora. Eis que a falta de prestação de contas é

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informada ao administrados público, para que o mesmo providencie e regularize a situação, o que não ocorrera no

presente caso, mesmo sabedora da irregularidade, permaneceu a demandada na inércia do esclarecimento de como

gastou o dinheiro repassado. Tal atitude comprova seu desejo mais íntimo de ferir o disposto na lei, sobretudo pela

reiteração dos atos já cometidos, inclusive da mesma espécie ímproba.

II-IX. QUANTO AOS ATOS PRATICADOS PELA DEMANDADA NO QUE

DIZ RESPEITO A CONVÊNIO COM O FNDE, PARA IMPLEMENTAÇÃO

DE CONTROLE DA LEISHMANIOSE

Alega o representante ministerial que em convênio realizado com FNDE, com o fito de

implementar controle da leishmaniose, não teria a demandada prestado contas de parte do valor repassado, motivo

pelo qual, teria incorrido no mesmo ato ímprobo dos acima mencionados.

A parte ré nega, afirmando que os valores que supostamente não foram prestados conta

teriam sido alvo de restrição judicial

Observo que o debate é inconsistente, tendo em vista que não há provas nos autos de que

inexistiu prestação de contas. O representante ministerial cingiu-se a juntar cópia de petição inicial de cobrança do

valor não esclarecido, documento que não possui caráter comprobatório que leve este magistrado a um juízo de

valor concreto.

Não entendo que a simples cópia de petição inicial de outro feito seja suficiente para

comprovar o ato de improbidade, não havendo qualquer outro documento que demonstre o cometimento do ato

ímprobo.

Por tal motivo, por falta de provas de que não houve prestação de contas de parte de valor

conveniado com o FNDE, não reconheço qualquer cometimento de atos de improbidade no presente fato,

relativamente ao referido convênio.

II-X. CONSTRUÇÃO DA CAIXA D’ÁGUA DO DISTRITO DE BEM-TE-VI

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Apresenta o Ministério Público em sua peça de ingresso possíveis atos de improbidade

administrativa cometidos pela parte demandada na construção de uma caixa de água no distrito de Bem-te-vi. Pois

bem, imputa à ré o cometimento dos seguintes atos: a.3) não apresentação de documentação solicitada; b.3)

falta de fiscalização da obra executada; c.3) pagamento de serviços não executados; d.3) substituição de

material contratado por material de menor custo; e.3) inexistência de projetos executivos; f.3)

descumprimento de normas técnicas de engenharia.

Inicialmente, quanto aos fatos acima descritos, cingiu-se a demandada a afirmar que

intentou ação de reparação de danos em face da empresa contratada para realizar a obra, e informou a

irresponsabilidade do ordenador de despesas no presente caso, tratando-se, pois, de alegação genérica e sem

combater fato por fato.

Para facilitar a análise dos atos, entendo que a utilização de materiais de menor

qualidade (d.3) e descumprimento de normas de engenharia (f.3) restam englobados pelo ato de falta de

fiscalização da obra, b.3, motivo pelo qual passarei a analisar este em conjunto com os citados, tendo em

vista serem conseqüência lógica do último.

Há nos autos documento de inspeção e análise minuciosamente confeccionado pela

Coordenadoria de Controle Externo, da Inspetoria Regional de Bezerros, subordinada ao Tribunal de Constas

deste Estado, no qual teve como objeto da análise a construção de uma caixa de água no distrito de Bem-te-vi.

O relatório apresentado pelo órgão do TCE informou que a obra foi completamente

desprovida de fiscalização. A obra fora tão realizada ao relento dos olhos administrativos municipais que foram

utilizados materiais de menor qualidade que o contratado (d.3) e não foram obedecidas normas técnicas de

engenharia (f.3), vindo a ruir posteriormente, em breve lapso temporal.

Nos contratos administrativos, a fiscalização é obrigação da própria administração, ou seja,

do representante do Poder que realizou o contrato. Não necessariamente precisa fiscalizar pessoalmente, contudo

deve instituir meios de fiscalização, mesmo que por outra pessoa. No presente caso, o que se teve foi uma total

falta de fiscalização da obra, a qual chegou a desmoronar. A falta de instituição de meios de fiscalização efetiva

da obra, é frontal descumprimento da lei, tendo em vista que a Lei 8.666/93 prevê o seguinte:

Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:

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I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado;

II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei;

III - fiscalizar-lhes a execução;

IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste;

V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo.

Pois bem, há norma expressa que prevê a necessidade de fiscalização da obra. Por outro

lado, a mera apresentação de ação de reparação de danos em face da construtora não exime o administrador da

culpa pela má execução da obra. Ainda mais no presente caso, em que, segundo os documentos de fls. 172/186,

resta demonstrado que houve total desídia na fiscalização da construção. De fato, a mera fiscalização falha ou

insuficiente é capaz de afastar a gravidade da culpa, contudo, a falta de fiscalização nos termos presentes,

configura desídia absurda, que caracteriza a omissão qualificada do demandado.

APELAÇÃO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONVÊNIO. TRANSFERÊNCIA DE RECURSOS FEDERAIS. AMPLIAÇÃO DA COBERTURA DOS SERVIÇOS DE COLETA E TRATAMENTO DE ESGOTO. CONSTRUÇÃO DE SISTEMAS DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. IRREGULARIDADES NO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. CONSTRUÇÃO DE CHAFARIZES EM LOCAL DIVERSO DO PACTUADO. PERFURAÇÃO DE POÇO SEM PRÉVIO ESTUDO GEOLÓGICO. RESPONSABILIDADE DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. INVIABILIDADE. DESVIO DOS RECURSOS. CONTRATAÇÃO DE CAMINHÕES-PIPA. CONDUTAS IMPROBAS FARTAMENTE COMPROVADAS. CONTAS DO PREFEITO APROVADAS PELO TCE/PE. ARGUMENTO SUPERÁVEL A CONTA DO ART. 21, INC. II, DA LEI Nº 8.429/92. REPARAÇÃO DOS DANOS AO ERÁRIO. QUANTUM APLICADO EM EQUÍVOCO NA V. SENTENÇA. 1. A situação funcional de um Prefeito na administração de pequenas comunas é envolta de maior proximidade no trato do bem público, revelando, como consectário, a possibilidade de efetivo controle da gestão do bem público. Ao caso, o apelante, na qualidade de ordenador de despesas, bem assim representante da municipalidade pelo convênio, firmou o Contrato de Repasse nº 0119015-73/2001/SEDU/CAIXA, objetivando a execução de ações relativas ao Programa "MORAR MELHOR", revelando, pois, responsabilidade pelos consectários da respectiva obra, nos termos ajustados. 2. As incorreções apontadas, em abundância, no processo ora examinado, de forma alguma são descaracterizadas pela ausência de fiscalização da Caixa, nos termos desenhados na peça recursal. Ao revés, o recorrente agiu em desconformidade com a lei de regência das licitações e contratos administrativos, descuidou do salutar acompanhamento da execução do contrato e, no que pertine ao ponto controverso, não tomou precauções das mais comezinhas na ocasião da escolha do local de perfuração dos poços. Outrossim, cabível apontar a correta atitude do ente financeiro ao oficiar a Edilidade para que esta regularizasse o contrato, no prazo de 30 dias, no que pertine à utilização de caminhões-pipa, ou, caso descumprida a avença,

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requestou a devolução do montante creditado em vista do convênio. 3. A alegação vaga de discricionariedade na eleição do local de perfuração dos poços, em descompasso com as regras postas em contrato, sem ao menos colocar em elenco as devidas motivações técnicas ou ainda sociais, colocam em evidência o efetivo desrespeito à probidade administrativa. 4. Os contratos de abastecimento do sistema de chafarizes por caminhões-pipa, os quais, diga-se de passagem, consumiram quase 70% dos recursos do convênio (as três contratações de caminhões-pipa alcançaram o montante de R$ 168.318,79, quando o convênio totalizou R$ 244.255,46, somadas as quantias referentes aos valores aplicados pela União e a contrapartida do município). Ora, o recorrente enveredou a aplicação de verbas destinadas a uma solução definitiva para o abastecimento de água do município em uma resposta imediatista. Nem se fale em gastos a conta de situação emergencial, haja vista os contratos de abastecimento por carros-pipa duraram longa data, por mais de 2 anos. Outro fato curioso, é que a administração do recorrente ostentou, em informativo publicitário, a perfuração de mais de 60 poços artesianos para pequenos produtores, fato esse a colocar em destaque o efetivo conhecimento da técnica de construção de poços, colocado a disposição da Edilidade. 5. O recorrente aplicou irregularmente verbas públicas federais, permitiu a realização de despesas não autorizadas no convênio, como, outrossim, negligenciou a conservação do patrimônio público. 6. Acerca da aprovação das contas do réu pelo TCE/PE, é de ser rememorado a disposição expressa no art. 21 da Lei n.º 8.429/92, a qual assevera a referida aprovação não constitui óbice à ação de improbidade, 7. A composição dos cálculos dos valores referentes ao dano efetivamente causado ao Erário, e por derivação, o quantum da multa civil, afiguram-se equivocados, visto considerar parcelas em duplicidade. O valor total do convênio foi de R$ 244.255,46, discriminado em R$ 150.000,00 liberado pelo Ministério das Cidades e de R$ 94.225,46, referente à contrapartida do município. Somou-se ao quantum R$ 13.518,79, valor que fez frente a termo aditivo ao contrato, para a contratação de carros-pipa. Ou seja, o dano ao Erário é de R$ 257.774,25, e não de R$ 506.799,71, tal como disposto na sentença. Nessa toada, de rigor a correção do ressarcimento para o valor de R$ 257.774,25, e, de consequência, o valor da multa civil em metade desse patamar. Apelação parcialmente provida para adequar o valor referente ao ressarcimento do dano ao Erário, bem assim o valor da multa civil. (TRF5 - Apelação Civel: AC 422534 PE 0004027-69.2006.4.05.8300. Publicação: Fonte: Diário da Justiça - Data: 16/06/2009 - Página: 219 - Nº: 112 - Ano: 2009).

Agindo, pois, como agiu, feriu a demandada a probidade administrativa, conforme descreve

o art. 11, I da Lei de Improbidade Administrativa, ferindo frontalmente a norma legal, com intento ilícito, através

de omissão total na fiscalização da obra, que resultou na utilização de materiais de menor qualidade e

desobservância de normas de engenharia, e, por fim, com a ruína da obra.

Sobrelevo ainda, que a desídia fora tão imensa, que a obra fora construída com os seguintes

defeitos gritantes: falta de adensamento de concreto, o que ocasionou a aparência do metal utilizado, prejudicando

o lapso de existência do material; presença de madeira no concreto, o que diminui a resistência da obra, por

ocasionar infiltrações; rompimento de laje e viga inferior; vazamentos generalizados, por falta de

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impermeabilização da caixa de água (!); flexão da laje superior, ocasionando acúmulo de água na superfície e

prejuízo à estrutura; argamassa de baixa qualidade.

Por outro lado, o órgão de fiscalização informou que lhe foram negados documentos

requisitados ao Poder Público Municipal, no que diz respeito ao procedimento licitatório e de cumprimento do

contrato administrativo em questão.

A administração pública rege-se pela publicidade dos atos administrativos, não sendo

permitido ao gestor municipal negar documentos aos solicitantes, muito menos ao TCE, o qual possui função

fiscalizadora externa.

A negativa de apresentação de documentos é no mínimo suspeita, de quem deseja se eximir,

por esconder, de possível cometimento de ato impertinente, ainda mais pela situação fática que a obra em questão

está envolvida, e que, decerto, a documentação, uma vez apresentada, demonstraria de forma materializada as

irregularidades reconhecidas pelo órgão de fiscalização. Neste sentido, previu a Lei de Improbidade

Administrativa o seguinte:

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

[...]

IV - negar publicidade aos atos oficiais;

O fato por si só de negar tais documentos quando devidamente requerido por autoridade

fiscalizadora, como o é o Tribunal de Contas, demonstra a ma-fé e a intenção frontal em negar meios para que o

órgão de fiscalização atinja seus fins, buscando, aparentemente, garantir a impunidade. Tais fatos configuram o

dolo genérico, ou seja, o conhecimento direto da afronta à norma legal estipulada, de forma que, tendo

conhecimento das diversas irregularidades presentes na documentação pretendida, buscou escondê-los e não

apresentá-los ao órgão de fiscalização, negando publicidade aos atos municipais, atuando com o dinheiro e

interesse públicos como se privados fossem, o que não pode ser permitido e tolerado. Sobretudo, negando meios

de fiscalização aos entes constitucionalmente instituídos para tanto.

Sobrelevo ainda o fato de que à demandada fora solicitada duas vezes os documentos, não

tendo apresentado-os até setembro de 2000, tendo sido o último pedido de junho daquele ano.

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De outro lado, afirma o laudo apresentado pelo órgão de fiscalização, que realizou os

estudos sobre o contrato administrativo que desaguou na mal fadada construção da caixa de água, que não houve

confecção de projeto executivo para a contratação da empresa empreendedora da obra (e.3), condição para a

realização do processo licitatório. Prevê a norma licitatória que para a realização do ato impessoal faz-se mister,

quando da construção de obras, atender-se à seguinte ordem:

Art. 7o As licitações para a execução de obras e para a prestação de serviços obedecerão ao disposto neste artigo e, em particular, à seguinte seqüência:

I - projeto básico;

II - projeto executivo;

III - execução das obras e serviços. (Lei das Licitações)

Pois bem, há imperiosa exigência legal para a realização da licitação de procedimentos

preparatórios, os quais são de natureza estritamente essenciais para a higidez do processo licitatório. Ora, até pelo

senso comum demonstra-se que resta impossível abrir-se um procedimento de concorrência, na busca de

contratar-se uma empresa para realizar uma obra ao menor preço, sem se ter o projeto da obra e sua forma de

execução. O procedimento licitatório sem a definição do projeto e da execução resta inócuo, e isto é base do

conhecimento comum de qualquer cidadão comprometido com o dinheiro de outros, ou seja, público. Impossível

se abrir um processo licitatório daquilo que não está sequer projetado e com execução prevista.

A atuação do agente público deve seguir a lei, ser conforme as normas, ou seja, pautar-se na

legalidade. A não observância da legalidade deságua no âmbito da ilegalidade, contudo, caso haja a gravidade da

autuação ilegal, configura-se a improbidade administrativa.

Neste caso, a demandada teria infringido o art. 11, I da Lei de Improbidade, sendo

necessária, para configurar-se a tipicidade em seus estritos termos, a demonstração do ânimo da atuação da ex-

administradora. Conforme afirmei, iniciar o procedimento licitatório sem cumprir as exigências legais configura

ato que destoa do senso comum, o que por si só configura a falta grave. Contudo, para os tipos ímprobos descritos

no art. 11 da correlata lei, faz-se mister, conforme a jurisprudência consolidada, a visualização do dolo, mesmo

que genérico, o que no presente caso, pela falta de provas não posso aferir. Decerto, houve uma culpa grave na

conduta da demandada, todavia, a jurisprudência nos presentes casos apenas aceita a improbidade caso haja dolo,

mesmo que genérico, o que impossibilita o reconhecimento do ato de improbidade, pois não se demonstrou, nos

autos, o intento ilegal da demandada, como em tantos outros momentos desta decisão.

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Por fim, quanto à construção da caixa de água, observo que há nos autos pedido de

reconhecimento de ato de improbidade administrativa por pagamento a mais do que o contratado para a efetuação

da obra, mais especificamente por serviços não executados, c.3.

Tal alegação é genérica, assim como o próprio relatório apresentado pelo Tribunal de

Contas não especifica qual seria o serviço pago e não realizado, muito menos o valor. Apenas afirma que haveria

sido realizado pagamento de serviço não efetuado.

Esta afirmação genérica, e não especificada, não acompanhada também de provas de tais

fatos, não me leva a um juízo de valor, apenas a meras alegações as quais são inservíveis em feitos que buscam a

condenação em atos de improbidade. Quanto às más qualidades dos equipamentos utilizados, aos quais talvez se

refira o presente pedido, observo que já os analisei acima, motivo pelo qual deixo de fazer considerações neste

sentido.

Pois bem, feitas as considerações, mesmo contrapondo ponto a ponto das alegações das

partes, demonstrando a fonte de meu convencimento, lastreado na ordem legal em vigência, sinto a necessidade de

fazer ainda algumas considerações.

O dinheiro público deve ser cuidado com zelo e carinho, pois se trata de fonte lídima de

toda a boa existência social, são águas que vêm do seio comunitário para regar as vidas das pessoas de forma a

frutificar a sobrevivência comunitária, sempre na busca de consagrar os objetivos constitucionais, e como um bom

jardineiro, o administrador público deve fazer proveitoso uso dessas águas, regando todo o pomar social, na busca

de melhorar suas vidas.

Sabido, porém, que essas verbas surgem de uma carga tributária alta, paga em sua maioria

pelo esforço da população de menor renda, a qual possui o menor grau de retribuição estatal, longe da presença do

poder público. Isto, todavia, é uma discussão social que não me cabe aprofundar aqui. Onde quero, contudo,

chegar, é, enfim, no administrador destes valores públicos.

Diante de uma sociedade sofrida e espoliada por grande carga tributária, o administrador

possui papel salutar, de modo a conduzir o dinheiro público com pulso firme, seriedade, idoneidade, bom-senso e

sobretudo moralidade.

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Neste espírito foi que nascera a Lei de Improbidade administrativa, mecanismo salutar de

controle dos atos administrativos, e punição aos maus administradores, assim como de ressarcimento ao erário

público dos valores subtraídos.

Neste ínterim, como bem observado ao início desta decisão, não basta apenas a observância

da conduta do agente subsumir-se ao tipo civil da improbidade. Faz-se mister, também, que haja uma conduta

dolosa ou em alguns casos meramente culposa, desde que com caráter grave. Ressalto que independe, todavia, que

haja prejuízo ao erário para que os atos ímprobos sejam configurados.

O processo que analiso, por outro lado, possui volumosidade e caráter documental

imperioso, tratando-se de atuação ministerial na defesa do patrimônio público municipal, tendo, o Parquet

diligenciado de forma incessante na busca de angariar as difíceis provas que arrimam o presente feito, acionando o

Judiciário para que dê uma resposta imediata e satisfatória diante dos fatos apresentados.

Há documentos das mais diversas espécies, desde relatório investigativo do Tribunal de

Contas do Estado de Pernambuco, que concluem pelo cometimento de atos atentatórios à improbidade, assim

como documentos de diversos Ministérios do Governo Federal, que comprovam irregularidades nas contas

prestadas. Longe de objetivar a redundância, reafirmo que as provas são fartas e as condutas são muitas.

O procedimento civil público, instrumento paladínico de atuação ministerial, fora o meio

utilizado pelo representante do órgão promotor da Justiça para agir, demonstrando, irrefutavelmente diversas

condutas ilegais, algumas ímprobas, outras meramente contra legem, as quais são diferentes em sua natureza.

Nos autos resta configurado o cometimento de mais de 10 (dez) atos de improbidade, afora

outras condutas que, pelo elemento volitivo, não restaram provados o cometimento dos atos ímprobos, mas apenas

a mera ilegalidade dos atos.

São atos, conforme já analisei, dos mais diversos, desde a não prestação de contas,

caminhando pela não publicidade de atos praticados, até o pagamento exacerbado em valores contratados e

estipulados para execução de obras. Não bastasse isto, ainda se fala em doação de recursos públicos!

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A ilicitude existe, assim como a improbidade, em grau elevadíssimo, pelo cometimento

reiterado de diversas condutas com os mais variados ânimos, desde a culpa grave para alguns, até o dolo genérico

para outros, os quais são agravados pela reiteração das condutas ímprobas. Não se pode cair na ingenuidade

mascarada pelo formalismo legal dos termos jurídicos vagos a ponto de desqualificar as condutas, diante de

contumaz reiteração da improbidade e da ilegalidade.

Os fatos provados nos autos trazem à tona o total desrespeito e descuido para com o que é

público, utilizado de forma inidônea, às margens da legalidade, ferindo de morte a fonte cristalina do dinheiro

público, e demonstrando a falta de aptidão da administradora para semear os embriões das verbas públicas no seio

da comunidade local, bem pelo contrário, mais atuou, diante dos fatos comprovados, como uma devastadora

praga, acometendo a Prefeitura Municipal das mais diversas ilegalidades em sentido amplíssimo. Como uma má

jardineira, a demandada deixou a escassa água escoar por entre o pomar, prejudicando o regar do seio social.

É neste sentido que as culpas e dolos da demandada possuem grau elevado, qualificados aos

olhos deste Julgador, estando convicto do cometimento dos atos de improbidade acima descritos e devidamente

narrados.

Observo ainda que apesar de ter natureza civil, os atos de improbidade possuem

contraposição legal severa, com perda inclusive dos direitos políticos, os quais são previstos constitucionalmente e

possuem caráter de cidadania, ou seja, direitos que dizem respeito à esfera pública e sua restrição comporta-se

perante a excepcionalidade, motivo pelo qual a convicção acima exposta foi feita de caráter didático e minucioso,

buscando dois viés: um primeiro de pedagogicidade, na qual a presente decisão precisa repercutir de modo a punir

quem tenha agido de forma ímproba; e um segundo, no qual a sentença em elaboração seja mecanismo hábil de

influencia para esta sociedade de que cabe ao Judiciário punir e corrigir os erros dos administradores, e da

demonstração que cometer tais ilícitos qualificados não vale à pena.

II-XI. REPARAÇÃO AOS COFRES PÚBLICOS

Quanto à reparação dos danos causados ao erário, em nem todos os atos de improbidade

reconhecidos há a estipulação comprovada do valor do dano causado. No que diz respeito ao processo TC

9940073-0, observo que o valor do dano perfaz R$ 384.555,41 (trezentos e oitenta e quatro mil, quinhentos e

cinquenta e cinco reais e quarenta e um centavos), fl. 51 dos autos.

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Por outro lado, observo que os atos acima examinados, no que diz respeito ao processo TC

40037-3, custaram ao erário o valor de R$ 946.361,82 (novecentos e quarenta e seis mil, trezentos e sessenta e

um reais e oitenta e dois centavos), conforme decisão administrativa definitiva do TCE-PE, fls. 66/67.

Quanto ao convênio 734/97 com o Ministério da Saúde, não houve prestação de contas de

R$ 68.120,00 (sessenta e oito mil e cento e vinte reais), relativo ao segundo aditamento do convênio.

No que diz respeito ao convênio firmado com o PNAE, a demandada deixou de prestar

contas do montante de R$ 206.061,77 (duzentos e seis mil, sessenta e um reais e setenta e sete centavos).

Já aos demais atos, ou não foram reconhecidos como ímprobos por este magistrado, ou não

foi possível individualizar o dano causado, como no caso da construção da caixa de água em Bem-te-vi, tendo em

vista que decerto houve dano ao erário, mas não há estipulação escorreita de quanto fora este dano.

III - Dispositivo:

ISTO POSTO, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pleito ministerial para

reconhecer o cometimento de atos de improbidade administrativa pela Sra. MARIA LÚCIA HERÁCLITO

DE SOUZA LIMA, devidamente qualificada na exordial, na qualidade de ex-prefeita do Município da

Cidade de Bonito-PE, por infringir os seguintes dispositivos da lei de improbidade administrativa: art. 10,

I, III, VI, IX, XI e XII e art. 11, I, IV e VI, todos da Lei 8.429/92, o que faço com arrimo nos dispositivos

citados e nos art. 269, I do Código Adjetivo Civil e art. 12, II e II da Lei de Improbidade Administrativa,

assim como em seu art. 1º, e no caput do art. 37 da Constituição Federal do Brasil.

III-I. APLICAÇÃO DAS PENAS CIVIS REFERENTES À IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA

O art. 12 da Lei de Improbidade administrativa prevê as punições aos maus

administradores, que devem ser aplicadas pelo magistrado isolada ou cumulativamente, devendo o julgador ser

razoável na aplicação das punições civis. Desta feita, de modo a tornar a presente decisão a mais fácil possível de

ser compreendida, passo à análise partida dos atos e das penas a serem aplicadas, adiantando que cumularei a

punição de reparação de danos ao erário com outras, pois em todos os atos ímprobos houve dano ao erário

determinado (exceto no caso da Caixa d’água Bem-te-vi, pois não houve individualização do dano nos autos),

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entendendo que mais que uma punição, a reparação dos danos é mera responsabilidade civil no termo mais natural

da expressão. Afirmo ainda que, a punição da lei é feita sobre os atos de improbidade, necessária a observância de

ato a ato, com o fim de se valorar a punição a ser aplicada.

III-I-I. DA REPARAÇÃO AO ERÁRIO

Quanto às punições civis, de plano, tendo em vista que todos os atos aos quais foi

condenada a demandada houve prejuízo à municipalidade, condeno-a ao ressarcimento do Erário Público em

todos os atos ímprobos reconhecidos, restando montante a ser ressarcido no total de R$ 1.605.942,83 (um

milhão, seiscentos e cinco mil, novecentos e quarenta e dois reais e oitenta e três centavos) , valor

correspondente à condenação aos atos de improbidade referentes aos Processos TC 9940073-0 (R$ 384.555,41) e

TC 40037-3 (R$ 946.361,82), PNAE de 2000 (R$ 206.901,60) e Convênio 0734/97 (R$ 68.124,00). Deixo de

arbitrar reparação no que diz respeito à Caixa d’água do distrito de Bem-te-vi por não haver nos autos prova do

efetivo prejuízo ao erário, tudo nos termos do item II-IX desta decisão, no qual os danos foram devidamente

analisados, assim como ao transcorrer desta extensa sentença.

III-I-II. DAS PENAS INDIVIDUALIZADAS POR ATO ÍMPROBO COMETIDO

- Processo TC 940073-0 (Item II-VI desta decisão): Observo que foram cinco os atos

ímprobos cometidos neste fato. Inicialmente fora observado que a demandada (a.1) realizou despesas com

veículos de particulares, (b.1) realizou despesas sem qualquer comprovação; (c.1) pagou bolsas escolares

sem comprovação de ausência de vagas em escolas públicas; (d.1) pagou despesas com Restos a Pagar em

valor superior ao efetivamente realizado e autorizado pela Lei Orçamentária; (e.1) pagou em excesso a

obras e serviços de engenharia, desta feita, tratando-se de condutas referentes ao mesmo fato, que englobam atos

puníveis pelo art. 12, II e III (no caso do inciso III os atos b.1, d.1) da Lei de Improbidade, conforme veremos,

motivo pelo qual entendo plausível o pagamento de multa no valor de R$ 192.277,70, a qual corresponde a ½ do

valor do dano causado ao erário municipal, a título de punição civil em caráter cumulativo, pela prática dos atos

a.1, c.1 e e.1. Por outro lado, tendo em vista que os atos retro mencionados possuem a mesma natureza,

demonstrando reiteração na conduta ímproba da demandada, a qual, por seus atos, demonstra que utilizava a

prefeitura como um verdadeiro “doadouro”, entendo ser razoável a suspensão de seus direitos políticos em 05

(cinco) anos, como punição a ser aplicada em cumulação por ter doado bolsas escolares particulares sem qualquer

justificativa (c.1). Por outra banda, quanto aos descumprimentos à legislação, passível de punição pelo inciso III

do art. 12, cumulo a punição já aplicada de ressarcimento ao erário, com a proibição de contratar com o Poder

Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por

intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três) anos, no que se refere ao ato

b.1 e suspensão dos direitos políticos por 03 (três) anos, no que diz respeito ao ato d.1, por entender que a afronta

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ao princípio da legalidade e da moralidade administrativa, assim como à afronta às normas infraconstitucionais

foram absurdas, e reiteradas.

- TC 40037-3 (Item II-VI desta decisão): Observo que foram cinco os atos ímprobos

cometidos neste fato. Inicialmente fora observado que a demandada: (a.2) realização de despesas com veículos

particulares; (b.2) realização de despesas sem comprovação; (c.2) doações de recursos financeiros,

medicamentos e ataúdes; (d.2) inscrição a menor de restos a pagar; (e.2) excesso no pagamento de obras de

engenharia. Da mesma forma que no parágrafo supra, tratam-se de condutas referentes ao mesmo fato, que

englobam atos puníveis pelo art. 12, II e III (no caso do inciso III os atos b.2, d.2) da Lei de Improbidade, motivo

pelo qual entendo plausível o pagamento de multa no valor de R$ 473.180,91, a qual corresponde a ½ do valor do

dano causado ao erário municipal, a título de punição civil em caráter cumulativo, pela prática dos atos a.2, c.2 e

e.2. Por outro lado, tendo em vista que os atos retro mencionados possuem a mesma natureza, demonstrando

reiteração na conduta ímproba da demandada, não só no presente fato, mas também nos acima descritos a.1, b.1 e

c.1, utilizando a demandada a Prefeitura como um estande de doações, entendo ser razoável a suspensão de seus

direitos políticos em 05 (cinco) anos, como punição a ser aplicada em cumulação por ter doado bolsas escolares

particulares sem qualquer justificativa (c.2). Por outra banda, quanto aos descumprimentos à legislação, passíveis

de punição pelo inciso III do art. 12 (b.2 e c.2), cumulo a punição já aplicada de ressarcimento ao erário, com a

proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três)

anos, no que se refere ao ato d.2 e suspensão dos direitos políticos por 03 (três) anos, no que diz respeito ao ato

b.2, por entender que a afronta ao princípio da legalidade e da moralidade administrativa, assim como à afronta às

normas infraconstitucionais foram absurdas, e reiteradas, inclusive por condutas em momentos anteriores (caso do

processo TC 940073-0.

- Convênio 734/97, 2º termo aditivo (Item II-VII desta decisão): na presente conduta, a

demandada deixou, mais uma vez de prestar contas, ou seja, não informou em que foi aplicado o dinheiro

repassado à municipalidade. Sendo assim, entendo razoável cumular a reparação ao erário pelos danos causados à

proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três)

anos, tendo em vista que uma pessoa que não consegue prestar contas na qualidade de agente político estatal, não

o será capaz de fazer caso seja beneficiado com verbas ou incentivos públicos (art. 12, III da Lei de Improbidade).

- Verbas provenientes do PNAE-2000 (Item II-VIII desta decisão): no presente ato,

mais uma vez a demandada deixou de prestar contas das verbas repassadas em favor do município de Bonito,

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prejudicando a municipalidade, que ficou restringida de receber novos benefícios federais. Afora isto, trata-se de

conduta reiterada, demonstrando a contumácia da demandada em cumprir a lei, motivo pelo qual entendo

pertinente a suspensão dos direitos políticos da requerida em 04 (quatro) anos, em cumulação à obrigação de

reparação dos danos causados ao erário (art. 12, III da Lei de Improbidade).

- Caixa d’água de Bem-te-vi (Item II-X desta decisão): quanto aos fatos ocorrido na

queda da referida obra, observa-se que a administradora municipal, à época, deixou de fiscalizar completamente a

obra, a qual fora desenvolvida com irregularidades gritantes, inclusive material de baixa qualidade e métodos de

engenharia discutíveis, vindo a construção a ruir, e trazendo trágicos danos ao Município de Bonito. Observo que

não fora aplicada ainda nenhuma sanção quanto a este ato ímprobo, tendo em vista que não houve

individualização do dano para reparação. Sendo assim, diante da grave omissão, e da gravidade das

conseqüências, com arrimo no art. 12, III da Lei de Improbidade, suspendo os direitos políticos da demandada

pelo prazo de 05 (cinco) anos, assim como a proíbo de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou

incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja

sócio majoritário, pelo prazo de 03 (três) anos.

III-I-III. RESUMO DAS PENAS APLICADAS

Sendo assim, observo que restou à demandada as seguinte punições, de forma global: A)

reparação de danos ao erário no valor de R$ 1.605.942,83 (um milhão, seiscentos e cinco mil, novecentos e

quarenta e dois reais e oitenta e três centavos); B) multa no valor final de R$ 665.458,61 (seiscentos e

sessenta e cinco mil, quatrocentos e cinquenta e oito reais e sessenta e um centavos); C) suspensão dos

direitos políticos por 25 (vinte e cinco) anos, somadas todas as suspensões aplicadas aos atos ímprobos

individualmente; D) 12 (doze) anos proibida de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou

incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da

qual seja sócio majoritário, resultado da soma dos anos aplicados a cada ato ímprobo já analisado.

Assevero que a unificação das penas civis e políticas aplicadas foi feita com arrimo no que

dispões os art. 75 do CPB e 111 da LEP, por falta de legislação própria, e conforme o entendimento da

jurisprudência pátria:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEI 8.429⁄92. SUSPENSÃO DE DIREITOS POLÍTICOS. MULTIPLICIDADE DE CONDENAÇÕES. SOMATÓRIO DAS PENAS. TRÂNSITO EM JULGADO. ART. 20, LEI 8429⁄92. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. DETRAÇÃO. ART. 11 DA LEI 7.210⁄84. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO CONFIGURADA.

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1. O cumprimento de sanções políticas concomitantes, por atos de improbidade administrativa contemporâneos (art. 20 da Lei 8.429⁄92), deve observar as disposições encartadas no art. 11 da Lei 7.210⁄84.

2. É que a inexistência de legislação específica acerca da forma de cumprimento das sanções políticas, por atos de improbidade administrativa contemporâneos, deve ser suprida à luz das disposições encartadas no art. 11 da Lei 7.210⁄84, que instrui a Lei de Execuções Penais, verbis:

"Art. 111. Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição.Parágrafo único. Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á a pena ao restante da que está sendo cumprida, para determinação do regime."3. Embargos de declaração acolhidos, apenas, para esclarecer que cumprimento das sanções políticas, por atos de improbidade administrativa contemporâneos, deve observar as disposições encartadas no art. 11 da Lei 7.210⁄84, mantendo incólume o acórdão de fls. 383⁄423. (STJ. EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 993.658 - SC (2007⁄0232844-9). DJe: 23/03/2010)

III-II. DA INDISPONIBILIDADE DOS BENS DA DEMANDADA DE

FORMA LIMINAR

O feito fora inaugurado por peça de ingresso do MP que, afora a condenação da promovida

nos atos de improbidade administrativa, requestrava medida liminar com fito de serem bloqueados os bens da

demandada a fim de garantir-se o feito.

Pois bem, o processo fora iniciado em 2004, e até o presente momento não fora analisado o

pedido, que possui fulcro no art.7º da Lei de Improbidade:

Art. 7° Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá a autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.

Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito.

A indisponibilidade dos bens é medida plausível a garantir a eficácia final da decisão

judicial, a qual, em sendo procedente, como bem o é no presente caso, traz forte cunho reparatório ao Erário

Público.

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Apesar do dispositivo supra apontar que a indisponibilidade dos bens dar-se-á pela mera

observância da verossimilhança da alegada improbidade, que feriu o Erário municipal, a jurisprudência tem fixado

a necessidade de também serem apreciados os requisitos da medida liminar, previstas no CPC, quais sejam, a

conhecida fumaça do bom direito e o perigo da demora:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE. INDISPONIBILIDADE DE BENS. ART. 7º DA LEI 8.492/92. PERICULUM IN MORA E FUMUS BONI IURIS. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO.

I. A indisponibilidade de bens a que se refere o art. 7º da Lei n. 8.492/92 não é consequência imediata da propositura de ação civil pública que verse sobre improbidade administrativa, porquanto a decretação da medida acautelatória exige a presença dos requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, o qual não se presume.

II. Se não há notícia de fatos que indiquem a efetiva intenção dos agravados em dilapidar seu patrimônio, ou mesmo transferi-lo a terceiros, com o escopo de impossibilitar o cumprimento de eventual condenação em ação civil pública, então está ausente o periculum in mora e descabe a decretação da indisponibilidade de bens. III. Agravo a que se nega provimento. (TRF1 - AGRAVO DE INSTRUMENTO: AG 48098 MT 2007.01.00.048098-0. Publicação: 17/04/2009 e-DJF1 p.325)

Pois bem, sendo assim, lastreado na jurisprudência dominante, como bem foi feito ao longo

desta decisão, além de meu íntimo convencimento, passo a analisar passo a passo os requisitos necessários à

concessão da liminar no presente feito.

A fumaça do bom direito diz respeito à verossimilhança do alegado, ou seja, se o que consta

na exordial de fato está condizente, ao menos em juízo raso, com a realidade dos fatos. Ora, as provas foram todas

analisadas, constatando, na presente decisão, ao longo de todo o capítulo de discussão (II), a ocorrência de

incontáveis atos de improbidade administrativa, os quais feriram o Erário, e os ditames principiológicos

constitucionais da Administração Pública, convencendo-se ao fim este magistrado que a Demandada havia

praticado atos que feriram a moralidade administrativa.

Desta feita, mais que um mero juízo de verossimilhança, a este momento apresento um

juízo de certeza, por estar intimamente convencido, conforme os fundamentos apresentados, de que a Requerida

praticou os atos narrados na exordial, ferindo a moralidade administrativa, e causando danos incontáveis ao

Município de Bonito, maculando os interesses sociais. Logo, a fumaça do bom direito, no presente caso, a meu

ver, é o próprio fogo do bom direito, o qual é alimentado pelas provas irrefutáveis trazidas pelo órgão ministerial

aos autos do processo, e devidamente analisadas por este Juiz.

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Por outro lado, observo que o feito encontra-se em curso desde 2004, ocorrendo diversos

contratempos no transcurso normal do processo.

Como um primeiro motivo da mora na prestação jurisdicional, observo que o magistrado à

época, Severino Coutinho, era suspeito para atuar em todos os feitos em que a Demandada figurasse como parte, o

que por si só já prejudica por demais o caminho normal do feito, ainda mais pelo fato de que o magistrado

substituto encontrava-se há mais de 20 km de distância da Comarca de Bonito, ou seja, quem ficou responsável

por responder pelo feito fora o magistrado de Bezerros, tendo assumido a presidência do feito apenas em 2008.

Não bastasse isto, atualmente a Comarca de Bonito (Vara Única) possui acervo de

aproximadamente 6.000 processos, dos quais, no fim de 2009, mais de 1.000 encontravam-se conclusos ao

magistrado, o qual acabou sendo afastado da atividade judicante, momento no qual passou a Comarca a ser

responsabilidade de juízes em atividade cumulativa.

Pois bem, observa-se que o longo lapso de percurso do processo deu-se por situações

internas da Comarca, problemas vividos que terminaram por delongar o percurso do feito e a análise de suas

nuances.

Digo isto, com o fito de espancar qualquer argumento no sentido de que o longo lapso entre

a propositura do feito afastaria o perigo da demora.

O ressarcimento ao erário público fere o patrimônio particular do administrador ímprobo, o

que por se só possui caráter urgentíssimo, sob duas facetas; a primeira, o fato de que a perda do patrimônio não

agrada a ninguém, ainda mais ao administrador que fez da prefeitura seu recanto de doações; a dois, a questão de

que o patrimônio público a ser ressarcido deve ser garantido imediatamente, tendo em vista que o interesse

público não pode ser engolido pelo interesse particular.

No presente caso, os valores destinados ao Erário são altos, motivo pelo qual se qualifica a

necessidade da imediata indisponibilidade dos bens: R$ 2.271.401,44 (dois milhões, duzentos e setenta e um

mil, quatrocentos e um reais e quarenta e quatro centavos), valor correspondente à reparação e à multa

aplicada.

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A não indisponibilidade imediata dos bens da demandada prejudica seriamente a eficácia da

decisão apresentada, sendo premente tal medida para garantir o prestígio da justiça e de suas decisões, as quais

passam por verdadeiro momento de descrédito social.

Por outro lado, o longo lapso de latência judicial implicou à Demandada forte juízo de

impunidade, que possibilita ao Judiciário agir a este momento de forma a garantir a eficácia de sua decisão. A

impressão de impunidade da requerida não pode em nenhum momento ser confundido com sua convalescência

para com o pagamento espontâneo dos valores ao qual foi condenado, pois suas condutas demonstram que a

legalidade não é sua forma de conduzir-se.

Logo, resta demonstrada a necessidade da imediata indisponibilidade dos bens da

demandada, apresentando-se, pois, o perigo na demora da prestação jurisdicional.

Por fim, importante mencionar que, ao analisar-se a fumaça do bom direito, no presente

caso, verdadeiras chamas de direito demonstrado, observou-se os requisitos específicos previstos no art. 7° da Lei

de Improbidade Administrativa.

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. AQUISIÇÃO ANTERIOR AO ATO ÍMPROBO. POSSIBILIDADE.

1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme em que a decretação de indisponibilidade dos bens decorrente da prática de atos de improbidade administrativa deve limitar-se a garantir as bases patrimoniais da futura sentença condenatória, podendo incluir bens adquiridos anteriormente à prática do suposto ato administrativo.

2. Agravo regimental improvido. (STJ. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO: AgRg no Ag 1144682 SP 2009/0004330-1. Publicação: DJe 06/11/2009).

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 7º da LEI 8.429/1992. INDISPONIBILIDADE DE BENS. 1.

A indisponibilidade de bens -em Ação de Improbidade Administrativa ou em Cautelar preparatória -serve para garantir todas as conseqüências financeiras (inclusive multa civil) da conduta do agente, independentemente de o patrimônio ter sido adquirido antes da prática do ato investigado. Precedentes do STJ. 2. Recurso Especial não provido. (STJ - RECURSO ESPECIAL: REsp 637413 RS 2004/0037412-4. Publicação: DJe 21/08/2009)

Isto posto, diante das razões expostas, defiro a medida liminar, para fins de

indisponibilizar tantos bens quantos sejam suficientes a garantir o valor correspondente à reparação ao

Erário Municipal e à multa aplicada à Demandada, devendo, para tanto, serem oficiados os Cartórios de

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Registro de Imóveis desta Comarca, de seu termo e de Recife, assim como o DETRAN-PE, e tomadas as demais

medidas necessárias a fim de indisponibilizar bens suficientes a garantir a condenação, inclusive mediante

utilização dos sistemas BACENJUD e RENAJUD.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Cumpra-se.

Bonito, 09 de novembro de 2010.

Dia de São Teodoro.

Damião Severiano de Sousa

Juiz de Direito

Exercício Cumulativo

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