Deficientes: vantagens da inclusão

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CADERNO ESPECIAL DE RH talento ESTRATÉGIA DEFICIENTES As vantagens da inclusão Entidades como a Avape preparam deficientes para o mercado de trabalho

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Matéria sobre a inclusão no mercado de trabalho de pessoas com deficiência. Reportagem realizada para a edição de abril/2007 da revista Supermercado Moderno.

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defiCientes

as vantagens da inclusão

entidades como a avape preparam deficientes para

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Estratégia Defi cientes SMRH

A LEI DE COTAS PARA DEFICIENTES PODE SER CUMPRIDA SEM TRAUMAS. BASTA PLANEJAR AS CONTRATAÇÕES E QUALIFICAR OS PROFISSIONAIS.

Defi cientes

As vantagens da inclusão

POR FERNANDO SALLES

É lei. Todas as empresas com mais de 100 funcionários devem reservar um percen-

tual de vagas para portadores de defi ciência (veja quadro). A multa por descumprir a norma é de R$

�VOCÊ GANHA DIVERSIDADE NO AMBIENTE DE TRABALHO

1.156,93 por vaga não preenchida. A fiscalização é forte, tanto que desde meados de 2006 o Ministério do Trabalho e Emprego computou 19.978 vagas para defi cientes gera-das depois que empresas foram no-tifi cadas e receberam um prazo para se adequar e não receber multa.

Mas o cumprimento da lei é apenas um dos pontos a serem ob-servados no processo de inclusão de defi cientes. Na hora de contratá-los, não se pode esquecer que toda em-presa precisa dar lucro, e para isso os profi ssionais devem ser capaci-tados. A difi culdade de encontrar defi cientes qualifi cados, porém, é queixa comum entre as empresas. A falta de preparo da equipe para lidar com o portador de necessidades especiais também é fato recorrente.

As empresas devem criar regras específi cas para a contratação de portadores de defi ciência e investir na capacitação deles para o trabalho

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Somam-se a isso pro-blemas nas condições de acessibilidade e au-sência das ferramentas necessárias para os de-fi cientes desenvolverem seu trabalho.

Mas para tudo há solução. É o que mos-tra a rede paranaense Festval, que apostou na inclusão de deficientes e conquistou ótimos resultados. A empresa mantém o programa “Os especiais do Superespecial”, pelo qual contrata defi cientes em parceria com diversas instituições locais de ensino. Atualmente, dos 572 colaboradores da empresa, 65 são portadores de algum tipo de defi ciência, o que representa o triplo do exigido por lei. A iniciativa é elogiada até pelos clientes da rede.

Todos os deficientes entram no Festval como empacotadores e, conforme se destacam, vão ganhan-do promoções. Jefferson Luiz Gon-çalves, portador de defi ciência mo-tora, passou por um curso teórico e Entenda o que é

�A INCLUSÃO DE

DEFICIENTES MELHORA A

IMAGEM DA EMPRESA

E RENDE ELOGIOS DOS

CONSUMIDORES

Tire suas dúvidas sobre a legislaçãoA Lei 8.213/91 garante reserva de cotas aos profi ssionais com defi ciência nas empresas com mais de 100 funcionários. Na fi scalização, se fi car constatado que o supermercado não está cumprindo a legislação, receberá um prazo para se adequar. Vencido o prazo, se o problema persistir, é aplicada multa de R$ 1.156,93 por vaga não preenchida. Veja o percentual de funcionários defi cientes que sua empresa deve ter:

• 100 a 200 funcionários: 2% do total

• 201 a 500 funcionários: 3% do total

• 501 a mil funcionários: 4% do total

• acima de mil funcionários: 5% do total

prático para aprender a função de empacotador e hoje é encarregado da seção de hortifrútis de uma das lojas. Outro dado interessante é a baixa rotatividade entre os defi cientes. Em 2006, apenas três deles deixa-

ram a empresa. Para Maria Cristina Bachiega,

chefe de uma das unidades da Avape, ONG que trabalha pela valorização dos excepcionais, o baixo turnover não é exclusividade do Festval.

– Outro funcionário pode per-der a paciência com um trabalho repetitivo como o de empacotador. Já um defi ciente mental vai se sen-tir valorizado nessa atividade, sem considerá-la maçante – diz.

Para repetir o sucesso do Festval

na sua loja são necessários alguns cuidados na hora da contratação.

– Um bom começo é estabelecer regras específi cas para recrutamento e seleção dos defi cientes – explica Andréa Goldschmidt, sócia da Apoe-na Social, empresa especializada em projetos de responsabilidade social.

Em muitas empresas, exige-se que o deficiente tenha o mesmo nível de escolaridade, a mesma expe-riência e as mesmas competências dos demais trabalhadores. Mas a maioria dos defi cientes não dispõe de oportunidades de formação pro-fi ssional, seja pela origem pobre, ou pelas difi culdades de transporte e acessibilidade. Os defi cientes com escolaridade e qualificação geral-mente são pessoas que adquiriram limitações na vida adulta, por doen-ça ou acidente.

É no contato com as

diferenças que as pessoas

aprendem. Se todos fossem iguais e

pensassem da mesma forma, não haveria evolução pessoal e nem profi ssional.

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Quando uma empresa solicita a capacitação de defi cientes, a Avape mapeia as habilidades e competên-cias necessárias para o exercício da função e promove ofi cinas como as de perfumaria, papelaria e redação empresarial. Nelas, os portadores treinam as habilidades e competên-cias específi cas para o cargo que vão exercer. Trabalham também pontos fundamentais para qualquer profi s-sional, como relação interpessoal, assiduidade, pontualidade e apre-sentação pessoal. Assim eles chegam à empresa com mais preparo e têm mais chances de se destacar.

Outra preocupação da entidade é a de preparar o ambiente de tra-balho para receber os deficientes. Eliana Victor, gerente da divisão de reabilitação profissional, destaca que é comum os outros funcionários temerem a demissão depois que um defi ciente é contratado, ou acharem que vão acumular seu próprio traba-lho e mais o do defi ciente.

– A empresa deve informar sua estratégia de contratação de defi -cientes, além de mostrar que aquele profi ssional foi contratado por suas competências e que será cobrado como qualquer outro – diz Eliana.

A Apoena Social tem reali-zado trabalhos de sensibilização das equipes, com palestras e workshops. Nos exercícios, os funcionários simulam as defi -ciências e passam a entender e a respeitar as necessidades dos portadores. A empresa também desenvolveu uma cartilha com dicas de convívio com os portadores de necessida-des especiais (veja box nesta página).

Outro trabalho da Apoena Social é o de mapear os car-gos para os quais há condições de se contratar deficien-

veja

�o que fazerA EQUIPE DEVE SER

PREPARADA PARA

CONVIVER COM OS

DEFICIENTESDicas de convivência com defi cientesAndrea Goldschmidt, da Apoena Social, destaca que as empresas e os colegas de trabalho devem enxergar os defi cientes por suas habilidades e não por suas limitações. Para ajudar no convívio, a consultoria desenvolveu uma cartilha sobre como agir em situações do cotidiano. Veja alguns exemplos.

● Defi cientes Físicos: Sempre peça permissão para mover ou conduzir a cadeira de rodas e nunca se apóie nela. Ela é considerada uma parte do corpo do cadeirante.

● Defi cientes Auditivos: Mesmo que a pessoa esteja com um “tradutor”, fale diretamente com ela, não cometa a indelicadeza de ignorá-la.

● Defi cientes Visuais: Ao sair do ambiente onde se encontra a pessoa cega, avise-a, pois ela não vai gostar nem um pouco de

falar com as paredes.

● Defi ciente Mental: Trate as pessoas com defi ciência mental normalmente, como você trata qualquer pessoa, de

acordo com sua idade.

● Para todos os tipos de defi ciência: Não fi nja que a defi ciência não existe, pois assim você ignora uma característica

muito importante da pessoa.

Para abrir espaço à maioria dos defi cientes, o Grupo Pão de Açúcar fl exibilizou as exigências no recru-tamento. Embora tenha como regra contratar pessoas com no mínimo o Ensino Médio completo, resolveu aceitar defi cientes que tenham ape-nas concluído o Fundamental.

– Colocamos esses profi ssionais em funções operacionais e passamos a incentivá-los a estudar – garante Judith Berenstein, coordenadora da área de diversidade da companhia.

A mesma linha é seguida pelo Carrefour, que reduziu requisitos mínimos para contratação, como faixa etária e grau de escolaridade. A empresa mantém parcerias com entidades como Apae, Centro de Solidariedade ao Trabalhador e Gel-re, que auxiliam na busca por esses profi ssionais. Já no Wal-Mart, mes-mo defi cientes sem nenhuma expe-riência profi ssional são contratados. A empresa oferece treinamentos e acompanhamento para esses profi s-sionais e hoje conta com portadores de defi ciência mental e física. Eles atuam em cargos como auxiliar de limpeza, operador de telemarketing, operador de caixa, auxiliar adminis-trativo, demonstradora, gerentes e até encarregados.

A Avape (Associação para Va-lorização e Promoção de Excep-cionais) realiza em suas unidades cursos para os portadores de ne-cessidades especiais, simulando o ambiente de trabalho. Eles têm ho-rário para entrar, sair, tomar lanche e almoçar, exatamente como nas empresas. Quando se destacam, re-cebem gratifi cações em dinheiro.

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Estratégia SMRH

JUDITH BERENSTEIN, COORDENADORA DA ÁREA DE DIVERSIDADE

DO GRUPO PÃO DE AÇÚCAR

Pense nisso

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� “Nas nossas lojas há oportunidades para portadores de todos os tipos de defi ciência. Mesmo aqueles que concluíram apenas o Fundamental têm espaço na empresa. Eles entram em funções operacionais e recebem incentivos para que estudem”.

tes, processo no qual até os meios de acessibilidade são considerados. Nesse ponto, Andrea Goldschmidt, sócia da Apoena, destaca que os su-permercados levam certa vantagem, já que tiveram de se adaptar para receber defi cientes, exigência legal para todos os locais públicos.

Outros setores também têm ex-periências bem-sucedidas para rela-tar. A Serasa, que atua no segmento de análise e informações de crédito, desde 2001 mantém um processo de empregabilidade para defi cientes. Os participantes do programa fa-zem um curso com duração de seis meses. Nos primeiros 60 dias eles conhecem detalhes do trabalho da Serasa e treinam pontos como senso de urgência e relacionamento inter-pessoal. Nos outros quatro meses, o treinamento ocorre no próprio de-partamento em que irão trabalhar. Para que a integração seja plena, passam a contar com um mentor, ou seja, um profi ssional do próprio setor que os ajudará no aprendizado das funções rotineiras. João Ribas, coordenador do projeto, explica que a idéia deu tão certo que já atrai a atenção de outras empresas.

– Cerca de 95% dos alunos aca-bam efetivados na própria Serasa. Fora isso, já fomos procurados por outras empresas, que solicitavam indicações de profi ssionais treina-dos porém não aproveitados por nós – comemora.

Ribas explica que a Serasa ofe-rece todas as condições de aces-sibilidade ao deficiente. Quando há necessidade, fornece também ferramentas específi cas de trabalho,

como o software Virtual Vision, que lê as informações da tela do com-putador para os defi cientes visuais. Tudo para que o defi ciente tenha as mesmas condições de trabalho de todos os outros colaboradores.

– Igualadas as condições, ele é exigido e avaliado exata-mente da mesma forma que os demais funcionários. Aqui não tem paternalismo e nem assis-tencialismo – garante.

Mais do que obedecer à lei, as iniciativas citadas mos-tram que as empresas assu-

mem, cada vez mais, seu papel na inclusão social dos portadores. E fazem isso com a tranqüilidade de saber que, por trás da defi ciência, existem inúmeros talentos.

Uma dessas habilidades é a de melhorar o ambiente de trabalho, fazendo com que os demais funcio-nários se espelhem no exemplo dos portadores de defi ciências e, dessa forma, aprendam a lidar melhor com as adversidades que venham a acontecer na própria vida e com suas limitações e as de seus colegas.

MAIS INFORMAÇÕES

Apoena Social: (11) 3079-0312

Avape: (11) 4433-5000

Carrefour: www.carrefour.com.br

Festval: www.superfestval.com.br

Ministério do Trabalho: (61) 3317-6000

Pão de Açúcar: www.grupopaodeacucar.com.br

Wal-Mart: www.walmartbrasil.com

EMPRESAS DE OUTROS SETORES, COMO

A SERASA, TÊM BONS EXEMPLOS PARA MOSTRAR.

SEU PROGRAMA DE INCLUSÃO É CONSIDERADO

MODELO E É COPIADO POR OUTRAS COMPANHIAS.

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