Demasiadamente humano: um olhar sobre War Before Civilization, de Lawrence H. Keeley

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  • Mendes, Flvio Pedroso. Demasiadamente humano: um olhar sobre War Before Civilization, de Lawrence H. Keeley

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    Demasiadamente humano: um olhar sobre War Before Civilization, de Lawrence H.

    Keeley

    Flvio Pedroso Mendes1

    A guerra, ou o intercurso poltico pela fora, mesmo no sendo a regra

    nos relacionamentos interestatais, uma possibilidade sempre presente e

    terrivelmente recorrente. Isso torna a poltica internacional um dos campos

    cujas atividades se do sombra de algo que , espacial e temporalmente,

    uma exceo. Entretanto, quando a exceo uma constante potencial com

    corolrios dramticos para o destino de sociedades inteiras, no de

    surpreender que isso se d. Essa trgica realidade das relaes internacionais

    tornada possvel pelo fato de no haver nada, para alm das prprias

    dinmicas polticas balanceamento de poder e barganha -, que impea que

    um lado recorra fora para obrigar outro a fazer a sua vontade. Mas ter a

    guerra surgido como instrumento poltico a partir de algum desenvolvimento

    histrico, algum marco tecnolgico ou organizacional das sociedades

    humanas? Ou ser a guerra intrnseca aos relacionamentos humanos desde

    nossa constituio como espcie? com o propsito de responder a essas

    perguntas que Lawrence H. Keeley escreveu o seu War Before Civilization,

    publicado em 1996. Trata-se de um trabalho ambicioso que margeia os

    Estudos Estratgicos, a Histria, a Cincia Poltica e a Antropologia, com lies

    que convidam a repensar no s os milnios de (pr-)histria humana, mas

    tambm os dilemas e desafios colocados s sociedades contemporneas. A

    relevncia da obra de Keeley, somada sua pouca difuso no meio acadmico

    brasileiro, deram o impulso formulao deste ensaio de reviso.

    O estudo da guerra em sociedades primitivas encontra imediatamente

    um problema: menos de 0,05% da histria humana est retratado por escrito.

    Para Keeley, os arquelogos e antroplogos, profissionais que possuem as

    ferramentas para decifrar o passado desconhecido e para conhecer

    1 Professor do curso de Relaes Internacionais da Universidade Federal de Uberlndia, mestre em Estudos

    Estratgicos pela Coppe/UFRJ e doutorando em Relaes Internacionais pela USP.

  • Leviathan Cadernos de Pesquisa Poltica, n. 2, pp. 152-160, 2011.

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    efetivamente a realidade de sociedades que ainda vivem em estgio primitivo,

    tm feito, no mximo, muito pouco para entender a guerra na pr-histria e

    entre povos atuais afastados da civilizao. Essa negligncia foi responsvel

    pela popularizao de mitos sobre as formas de vida primitivas, cujos extremos

    retratam as noes de progresso humano e de passado beato, que

    encontram nas discusses de Hobbes e Rousseau as melhores construes na

    modernidade.

    A etnografia do sc. XX, com o desenvolvimento do mtodo da

    observao participativa, fez crescer a crena de que a guerra, quando

    praticada por sociedades primitivas, no eram (so) empreendimentos srios,

    arriscados e temerrios como as guerras travadas por sociedades civilizadas.

    Haveria ali uma diferena expressiva e qualitativa, tanto nos meios quanto nas

    motivaes. Guerras primitivas seriam menos racionais, mais motivadas por

    fatores pessoais e psicolgicos e seriam, portanto, uma matria menos sria e

    decisiva para os rumos dos povos que as travavam.

    Para Keeley, o resultado foi a transposio de um vago preconceito para

    um status quase terico que apresentava as sociedades primitivas e pr-

    histricas como particularmente pacficas e que ignoravam a guerra como uma

    atividade poltica e social importante. O autor busca contestar com veemncia

    essa tese, em duas direes: primeiro, demonstrando como as abordagens de

    pacificao do passado sistematicamente negligenciam fortes evidncias, em

    sua maioria arqueolgicas, que apontam para uma realidade significativamente

    mais bruta e truculenta; segundo, avaliando os mritos das guerras primitivas

    em seus prprios termos, ou seja, em termos de sua intensidade, de sua

    efetividade e de seu risco relativo. Em outras palavras, Keeley pretende

    demonstrar que as concluses anteriores se devem a julgamentos estticos de

    forma e estilo e no condizem com a observao sria e sistemtica do

    fenmeno.

    Mediante observao de uma srie de estudos arqueolgicos que

    abarcam grandes pores do planeta, e munido de um espectro que contempla

    as sociedades humanas em diferentes nveis de organizao e complexidade

    (desde bandos at os Estados modernos), Keeley deriva algumas concluses

    fundamentais: (i) a guerra uma prtica universalmente comum e usual,

    independentemente do nvel de complexidade das sociedades; (ii) a frequncia

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    com que povos primitivos lutam uns com os outros significativamente maior

    que a verificada inclusive entre as sociedades civilizadas mais belicosas

    (romanos); (iii) mesmo com o alto grau de mobilizao das sociedades

    contemporneas, particularmente a partir da introduo do alistamento

    obrigatrio, povos primitivos tendem a organizar um percentual ainda maior de

    seus homens adultos para atividades combatentes (Keeley, 1996, pp. 27-39).

    Quanto conduo das guerras primitivas, a principal linha

    argumentativa dos antroplogos pacifistas avana que o combate se d de

    forma ritualizada, conscientemente moderada e projetada para minimizar

    danos, resultando em pouca efetividade ttica. Tratar-se-ia, em outras

    palavras, no de luta para a imposio de uma vontade, mas de uma

    manifestao de elementos sociais e culturais mais amplos2. A ineficincia

    seria a principal caracterstica das guerras primitivas, resumida por uma srie

    de fatores identificados por Keeley nas principais argumentaes:

    i. Participao voluntria, resultando em baixa capacidade de

    mobilizao;

    ii. Precrio nexo logstico;

    iii. Impossibilidade de conduo de longas campanhas (diante de i e

    de ii);

    iv. Ausncia de treinamento e de organizao das foras como

    unidades;

    v. Baixa capacidade de comando e controle;

    vi. Disciplina e moral fracos;

    vii. Baixa especializao de armamentos e ignorncia da arte de

    construir fortificaes;

    viii. Inexistncia de especializao em formas de luta (armas);

    ix. Ineficcia ttica e falta de conhecimento de princpios bsicos da

    estratgia (Keeley, 1996, p. 11).

    Keeley, a partir de uma avaliao dos aspectos mais gerais de

    organizao poltica e scio-econmica das sociedades primitivas, acredita que

    2 O representante contemporneo mais destacado dessa corrente Keegan (2006), que elaborou uma

    pseudoteoria da guerra como fenmeno cultural.

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    todas as supostas deficincias tticas, estratgicas e logsticas so funo

    direta do tipo de autoridade dos lderes, de uma estrutura social igualitria, de

    baixo excedente produtivo e de menor densidade populacional3. Assim, no se

    trata de reconhecer somente que assim que sociedades primitivas lutam, mas

    tambm que assim que elas vivem. Qualquer sociedade possui limites

    colocados por sua demografia, economia e sistema social, e no h por que

    esperar que isso seja diferente nas sociedades primitivas. Aqui, Keeley clama

    razoavelmente por um olhar proporcional e relativista sobre os esforos

    realizados na guerra diante do que uma sociedade primitiva, tendo em vista

    sua organizao poltica e scio-econmica, capaz de produzir e de oferecer.

    Keeley prope ainda uma tipologia que apresenta gradativamente os

    nveis de intensidade dos combates travados por sociedades primitivas

    (Keeley, 1996, pp. 59-69). Com o menor nvel de intensidade figuram as

    emboscadas, a forma mais frequente e utilizada, em que pequenos grupos de

    indivduos furtivamente invadem o territrio de grupos rivais, causando algumas

    vtimas e pilhando parte de seus recursos. Os danos individuais relativamente

    pequenos seriam compensados pela alta frequncia dessa prtica, que

    cumulativamente poderia gerar uma corroso insupervel a uma populao

    diminuta. No nvel mais extremo de violncia esto os massacres, ataques-

    surpresas articulados e em grande escala, cujo propsito aniquilar por

    completo uma populao rival. Apesar de raros, os massacres eram

    possibilidades sempre presentes e que atestam o potencial destrutivo das

    guerras primitivas.

    Em um dos pontos mais contra-intuitivos do argumento, o autor afirma

    que dificilmente os choques das formas de luta dos civilizados e dos primitivos

    podem atestar a superioridade decisiva dos primeiros sobre os segundos.

    Partindo de exemplos como os encontros entre romanos e povos celtas e

    germnicos, entre os brancos e nativos norte-americanos e entre europeus e

    colonos africanos, Keeley acredita haver ampla evidncia de que as formas e

    instrumentos civilizados de combate se mostravam muitas vezes incapazes de

    subjugar povos primitivos, devendo os colonizadores recorrer a aliados locais

    3 O argumento histrico sobre a importncia da densidade populacional para a organizao e

    especializao das primeiras sociedades humanas cuidadosamente construdo e demonstrado em Diamond (2006).

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    primitivos, adotar eles mesmos formas de luta primitivas ou, em ltima

    instncia, prevalecer devido sua maior capacidade econmico-produtiva e

    aos seus nexos de transporte e logsticos mais elaborados4 (Keeley, 1996, pp.

    71-81). Numa passagem curiosa e certamente controversa, Keeley afirma:

    Mas ao mesmo tempo em que verdade que a civilizao europeia se

    estendeu firme e dramaticamente at os ltimos confins da terra durante os

    quatro sculos passados, no de modo algum claro que essa expanso

    consequencia de armamentos superiores ou de tcnicas militares

    especializadas (Keeley, 1996, p. 71; traduo nossa).

    O problema da eficincia, como aludido anteriormente, para Keeley s

    pode ser julgado em termos relativos, contrastando resultados com esforos

    empregados. Em anlise comparativa, o autor conclui que o nmero

    proporcional de baixas e o grau de deteriorao social em guerras primitivas

    so expressivamente mais elevados do que em guerras civilizadas, o que pode

    ser atribudo a: (i) grande frequncia da ocorrncia de guerras; (ii) grande

    proporo de indivduos engajados em atividades combatentes; (iii) prtica de

    massacres totais, porm raros; (iv) aniquilao de prisioneiros; (v) e

    atrocidades cometidas contra crianas e mulheres de povos vencidos (Keeley,

    1996, pp. 83-97).

    Um dos argumentos centrais que afirmam haver uma diferenciao

    qualitativa entre guerras primitivas e civilizadas avana que os motivos que

    levam povos primitivos guerra so de maior imaterialidade e frivolidade, se

    comparados s causas das guerras civilizadas, e que nascem de estmulos

    psicolgicos e irracionais. Keeley contesta, apontando inicialmente a

    indistino dos efeitos materiais da conduo mesma das guerras primitivas e

    civilizadas: em ambos os casos, h a tendncia pilhagem e apropriao de

    bens dos vencidos. Ademais, para o autor h ampla evidncia de variao

    espacial entre tribos que ocupam ou ocupavam uma dada regio, sugerindo um

    status territorial para suas confrontaes, anlogo ao das conquistas

    imperialistas europeias e no oeste dos EUA. Guerras aparentemente motivadas

    pela criao de uma zona tampo (buffer zones) entre sociedades distintas

    parecem ser tambm empreendimentos comuns (Keeley, 1996, pp. 99-112).

    4 pertinente mais uma vez citar a importncia da discusso de Diamond (2006), que demonstra como o contato

    prematuro com doenas epidmicas constituiu uma vantagem decisiva dos europeus sobre os povos colonizados,

    particularmente nas Amricas. A esse respeito, ver tambm Mcneill (1976).

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    Entretanto, Keeley sugere grande reserva e precauo no

    estabelecimento de causas isoladas para as guerras: se as guerras civilizadas

    possuem uma multiplicidade de causas e motivos ambguos, por que presumir

    que guerras em sociedades tribais, em que no h governo centralizado ou

    registros volumosos, podem precisamente ser reduzidas a um motivo nico e

    incontroverso? (Keeley, 1996, p. 114). Para Keeley, a nica motivao que

    parece estar definitivamente fora do escopo de guerras tribais a de subjugar

    e explorar populaes rivais, por ausncia de mecanismos institucionais e

    administrativos que permitam a dominao hegemnica e a extrao de

    tributos. Afora isso, benefcios materiais e econmicos essencialmente

    similares aparecem igualmente no escopo de guerras primitivas e civilizadas.

    A investigao no aponta nenhuma correlao decisiva entre

    densidade populacional e propenso ocorrncia de guerras entre sociedades

    primitivas, contrariando uma noo altamente intuitiva; porm uma

    constatao, desta vez contra-intuitiva, brota da anlise dos dados: povos

    primitivos tendem a ir guerra com mais frequncia justamente com seus

    parceiros mais estreitos de troca e intercmbio. (Keeley, 1996, pp. 121-126).

    Esse poderoso golpe contra a perspectiva da paz democrtica/liberal5 pode ser

    tentativamente explicado por diversas razes, entre as quais a maior

    probabilidade de ocorrncia de atritos e crises com a maior intensidade e

    frequncia dos contatos e a natural propenso a tomar aquilo que no se tem,

    mas que se valoriza, atributos logicamente encontrados em objetos de trocas

    comerciais.

    Com relao a elementos conjunturais com potencial influncia sobre a

    propenso ocorrncia de guerras entre sociedades primitivas, Keeley

    reconhece a presena de grupos particularmente agressivos quaisquer que

    sejam as causas dessa especial agressividade como algo que exerce uma

    forte presso para que os demais estejam sempre preparados e dispostos a

    fazer a guerra. Aqui, tem-se uma analogia clara com o mundo desenhado por

    Hobbes e expressado pela passagem do realismo poltico, que apregoa que,

    num tal contexto, o estabelecimento unilateral da paz equivale a cometer

    suicdio6. Keeley ainda arregimenta evidncias que derrubam outra crena

    5 Para uma apresentao mais recente e articulada dessa perspectiva, ver Oneal e Russet (2001).

    6 A elaborao recente mais consistente do argumento se encontra em Mearsheimer (2001).

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    largamente avanada por antroplogos, a saber, de que regies fronteirias

    entre unidades tnicas e scio-econmicas distintas seriam particularmente

    pacficas. Trs variveis parecem contribuir para o contrrio: (i) a j

    mencionada propenso ao conflito entre parceiros de trocas; (ii) a inexistncia

    de laos culturais e sociais mais fortes para produzir a resoluo pacficas de

    controvrsias; (iii) e a exposio direta a incurses e pilhagem (Keeley, 1996,

    pp. 130-139). As condies para a guerra tambm parecem mudar em funo

    de desastres naturais que causem grande provao, em que a lgica da

    sobrevivncia passa a ditar com ainda mais fora as necessidades.

    Para Keeley, o fato de a belicosidade ser a norma, no a exceo,

    mesmo entre sociedades to distintas, no significa que a violncia esteja

    impressa indelevelmente na natureza humana. Ao contrrio, o autor apresenta

    argumentos fortes de que a guerra pelo menos to depreciada entre tribos

    primitivas quanto entre cidados modernos. A explicao da aparente

    insuperabilidade de uma situao que , no obstante, condenada, Keeley

    parece encontrar em parte no nvel estrutural: a paz inevitavelmente rara

    onde no h uma instituio com autoridade moral e poder fsico para mant-la

    [...]7 (Keeley, 1996, p. 161). O autor identifica tambm uma natural relao

    custo-benefcio, donde resulta concebivelmente que uma determinada paz

    pode ser muito custosa para ser mantida. Entretanto, algumas lies gerais so

    derivadas da investigao e podem, para Keeley, influenciar a propenso ao

    conflito: (i) a existncia de isolamento geogrfico; (ii) o peso amargo e doloroso

    de uma derrota devastadora; (iii) a presena de um efetivo terceiro ator com

    capacidade de mediao; (iv) algum nvel de respeito e compartilhamento de

    valores e costumes; (v) e esforos para evitar o monoplio da produo de

    bens que outras sociedades julguem essenciais (Keeley, 1996, pp. 143-161).

    Em suma, Keeley acredita ter demonstrado que arquelogos e

    antroplogos do sc. XX derivaram concluses sobre guerra e paz entre

    sociedades primitivas em direo claramente contrria s evidncias. Explicar

    o porqu dessa discrepncia no apenas curioso, mas se apresenta como

    um imperativo intelectual para o tratamento dos dilemas da produo de

    conhecimento no futuro. Aparentemente no se tratou de pura desonestidade,

    7 O argumento estrutural encontra sua mais slida e influente construo na teoria das relaes internacionais em Waltz (1979).

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    mas da mltipla influncia de fenmenos e tendncias que transcendiam

    academia e construo do saber, tais como os horrores das duas guerras

    mundiais, culminando na detonao de artefatos nucleares; o fim do

    imperialismo e do seu imperativo moral; o desaparecimento (e consequente

    afastamento) da figura do primitivo; e a perda de f no progresso (Keeley,

    1996, pp. 163-171). Mas Keeley julga que a cincia, contudo, quando

    plenamente desenvolvida, deve ter mecanismos prprios para proteger-se, na

    medida do possvel, contra esse tipo de externalidade:

    Como verdade com respeito s ideias em todos os lugares, o entendimento

    cientfico est normalmente enraizado em valores e atitudes de uma era e de

    uma cultura particular. O que salva as proposies cientficas de serem

    apenas modismo intelectual sua habilidade de se submeter a testes contra

    evidncias crticas (Keeley, 1996: 170; traduo nossa).

    Keeley conclui inequivocamente que guerras primitivas so guerras em

    sua essncia, no menos importantes e decisivas para o futuro das sociedades

    envolvidas. uma pena, contudo, que a essa importante e fundamentada

    concluso tenha se seguido uma injustia descomunal. Ao atestar a

    insuficincia de tratamentos anteriores do fenmeno da guerra, supostamente

    incapazes de dar conta de que a guerra envolve sociedades em sua

    completude, no apenas foras combatentes no teatro de operaes, Keeley

    inclui Clausewitz como um dos tericos que contriburam para o entendimento

    incompleto e militarista do fenmeno. No entanto, foi o prprio Clausewitz

    (1993) que incorporou cientificamente na sua teoria da guerra o elemento

    povo, ao lado das foras armadas e seu comandante e da liderana poltica,

    como um dos elementos da trindade esquisita8 que compe essencialmente o

    fenmeno da guerra. parte disso, no obstante, e talvez sem que o prprio

    autor a reconhea plenamente, uma das contribuies mais importantes de

    Keeley, como se acredita ter ficado claro, foi justamente demonstrar a tese

    clausewitziana fundamental de que a guerra, em qualquer tempo e lugar,

    uma manifestao integralmente poltica.

    8Traduo proposta e justificada em Diniz (2002).

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    Referncias Bibliogrficas

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    Diamond, Jared. (2006) Armas, Germes e Ao: os Destinos das Sociedades Humanas. Rio de

    janeiro: Record.

    Diniz, Eugenio. (2002). Clausewitz, o Balano Ataque-Defesa e a Teoria das Relaes

    Internacionais. (Tese de Doutorado) Rio de Janeiro: PEP/COPPE/UFRJ. Mimeo.

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    Keeley, Lawrence H. (1996) War Before Civilization. New York: Oxford University Press.

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    Mearsheimer, John J. (2001) The Tragedy of Great Powers Politics. New York: Norton &

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    Oneal, John; Russet, Bruce. (2001). Triagulating Peace - Democracy, Interdependence and

    International organizations. New York: Norton & Company.

    Waltz, Kenneth N. (1979) Theory of International Politics. New York: McGraw-Hill.