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QUEIROZ, V.M.; SALUM, M.J.L. Ensaios para uma nova abordagem em Enfermagem em Saúde Coletiva: resistindo às armadilhas da globalização subordinada e construindo a globalização da solidariedade social em direção à sociedade do tipo novo. FASM em Revista. n. 1, vol. especial, p.11-31, 2001. 1 Ensaios para uma nova abordagem em Enfermagem em Saúde Coletiva: resistindo às armadilhas da globalização subordinada e construindo a globalização da solidariedade social em direção à sociedade do tipo novo a Vilma Machado de Queiroz b Maria Josefina Leuba Salum c 1. Considerações introdutórias Este final de século veio sendo assaltado pelo recrudescimento e disseminação dos princípios liberais consolidados, sobretudo nos países dependentes como o Brasil, por um processo de destruição criadora sob o projeto de globalização subordinada 1 . Este projeto, encaminhado através da proposta de monetarização e desregulamentação da economia, fraturou o Estado provedor e as estratégias de proteção social, redefinindo as hierarquias e os espaços de exercício dos Estados nacionais. 2 A resistência, a coragem e a obstinação de seus defensores em levar ao limite da desumanidade a construção da nova ordem social às custas da desigualdade e da exclusão social nos atiçam a fazer como eles fizeram: a remar contra a corrente, a reafirmar princípios e a recusar-se a aceitar a inevitabilidade dos fatos sociais, em busca da reversão da fragmentação e dualização social que abatem o mundo contemporâneo. 3 É preciso dar um basta para a nossa subserviência e co-optação a pretensas novas propostas para velhos e novos problemas, travestidas de humanitárias mas, de fato, inscritas no conjunto de encaminhamentos sociais públicos destinados a abrandar as tensões sociais e com isso proporcionar o tempo e o espaço necessários para dar o pulo do gato. Na área da saúde e na enfermagem, especificamente, já são poucos os que reservaram energias para estes anos de vacas magras que vêm consumindo paulatinamente as conquistas alcançadas, em nosso meio, no plano jurídico-político e institucional nas duas últimas décadas do século XX. a Este texto é produto da revisão de artigo original que fundamentou a participação das autoras na MESA REDONDA: GLOBALIZAÇÃO ECONÔMICA E A APARTAÇÃO NA SAÚDE: REFLEXÃO CRÍTICA PARA O PENSAR/FAZER NA ENFERMAGEM, durante o 48º Congresso Brasileiro de Enfermagem em outubro de 1996 e publicado em Anais do Congresso, de restrita circulação aos congressistas (QUEIROZ, V.M.; SALUM, M.J.L. Globalização econômica e a apartação na saúde: reflexão crítica para o pensar/ fazer na enfermagem. In: 48º Congresso Brasileiro de Enfermagem. Anais, 06 a 11 de outubro de 1996. São Paulo, 1997, p. 190-207). Foi recentemente apresentado aos Congressos Latinoamericano de Medicina Social, 8º e Internacional de Políticas Públicas, 11º, de 1 a 7 de julho em La Habana, Cuba, devendo ser divulgado em disquete distribuído aos congressistas e que acumulará as Memórias dos referidos eventos. b Enfermeira de Saúde Pública, Mestre e Doutor em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP, Professor Doutor Inativo do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da EEUSP.

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QUEIROZ, V.M.; SALUM, M.J.L. Ensaios para uma nova abordagem em Enfermagem em Saúde Coletiva:

resistindo às armadilhas da globalização subordinada e construindo a globalização da solidariedade social em

direção à sociedade do tipo novo. FASM em Revista. n. 1, vol. especial, p.11-31, 2001.

1

Ensaios para uma nova abordagem em Enfermagem em Saúde Coletiva: resistindo

às armadilhas da globalização subordinada e construindo a globalização da

solidariedade social em direção à sociedade do tipo novoa

Vilma Machado de Queirozb

Maria Josefina Leuba Salumc

1. Considerações introdutórias

Este final de século veio sendo assaltado pelo recrudescimento e disseminação dos

princípios liberais consolidados, sobretudo nos países dependentes como o Brasil, por um

processo de destruição criadora sob o projeto de globalização subordinada1. Este projeto,

encaminhado através da proposta de monetarização e desregulamentação da economia,

fraturou o Estado provedor e as estratégias de proteção social, redefinindo as hierarquias e

os espaços de exercício dos Estados nacionais. 2 A resistência, a coragem e a obstinação

de seus defensores em levar ao limite da desumanidade a construção da nova ordem social

às custas da desigualdade e da exclusão social nos atiçam a fazer como eles fizeram: a

remar contra a corrente, a reafirmar princípios e a recusar-se a aceitar a inevitabilidade dos

fatos sociais, em busca da reversão da fragmentação e dualização social que abatem o

mundo contemporâneo. 3

É preciso dar um basta para a nossa subserviência e co-optação a pretensas novas

propostas para velhos e novos problemas, travestidas de humanitárias mas, de fato, inscritas

no conjunto de encaminhamentos sociais públicos destinados a abrandar as tensões sociais

e com isso proporcionar o tempo e o espaço necessários para dar o pulo do gato. Na área

da saúde e na enfermagem, especificamente, já são poucos os que reservaram energias

para estes anos de vacas magras que vêm consumindo paulatinamente as conquistas

alcançadas, em nosso meio, no plano jurídico-político e institucional nas duas últimas

décadas do século XX.

a Este texto é produto da revisão de artigo original que fundamentou a participação das autoras na MESA REDONDA:

GLOBALIZAÇÃO ECONÔMICA E A APARTAÇÃO NA SAÚDE: REFLEXÃO CRÍTICA PARA O PENSAR/FAZER NA

ENFERMAGEM, durante o 48º Congresso Brasileiro de Enfermagem em outubro de 1996 e publicado em Anais do

Congresso, de restrita circulação aos congressistas (QUEIROZ, V.M.; SALUM, M.J.L. Globalização econômica e a

apartação na saúde: reflexão crítica para o pensar/ fazer na enfermagem. In: 48º Congresso Brasileiro de Enfermagem.

Anais, 06 a 11 de outubro de 1996. São Paulo, 1997, p. 190-207). Foi recentemente apresentado aos Congressos

Latinoamericano de Medicina Social, 8º e Internacional de Políticas Públicas, 11º, de 1 a 7 de julho em La Habana,

Cuba, devendo ser divulgado em disquete distribuído aos congressistas e que acumulará as Memórias dos referidos

eventos. b Enfermeira de Saúde Pública, Mestre e Doutor em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP,

Professor Doutor Inativo do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da EEUSP.

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Mas é preciso reinventar o novo para superar a degradação da realidade social e de

saúde, resultado daquele que inevitavelmente representa o último suspiro - quase um

estertor - das “velhas” relações sociais de produção4. É preciso reinventar o novo,

especialmente se não nos deixamos passar ao largo do entendimento de que "a globalização

constitui (...) a finalidade última do economicismo: construir um homem 'global', esvaziado de

cultura, de sentimento e de consciência do outro. E impor um pensamento único ao

planeta."5

Diante dessas premissas, desde os primeiros anos da década de 90, temos buscado

sistematizar os conteúdos pedagógicos e o trabalho de pesquisa e extensão em Saúde

Coletiva em torno da compreensão acerca da evolução e do impacto das transformações

contemporâneas nas sociedades capitalistas, das particularidades atuais da produção de

serviços de saúde e sua inserção na economia nacional, tendo como ponto de partida a

defesa de que as práticas sociais em saúde têm como tarefa assegurar os direitos sociais,

esfera perversamente tocada pela regressão e falência do Estado.6

Temos defendido à exaustão que repensar o saber/fazer da enfermagem implica

reconhecer os meandros que se interpuseram e que se interpõem no seu percurso numa

sociedade contaminada pelo projeto da globalização do capital e, que, nas suas idas e

vindas, instaurou, manteve e transformou todos os setores da produção, particularmente o

setor terciário e a produção de serviços sociais, entre eles a produção de serviços de saúde.

Implica remeter a nossa fala ao entendimento de que não se pode gerar

transformações no saber/fazer da enfermagem desarticuladas das transformações da

sociedade capitalista neoliberal - excludente e geradora da exclusão - tampouco do

movimento que, desde a década de 70, busca fecundar a produção de serviços de saúde no

solo da universalidade, da equidade e da integralidade, reconstruindo o “novo” objeto da

intervenção em saúde: a totalidade da população brasileira, decodificada no jargão: “Saúde,

c Enfermeira de Saúde Pública, Mestre e Doutor em Fisiologia pelo Instituto de Ciências Biomédicas da USP,

Professor Doutor do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da EEUSP.

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direito de todos e dever do Estado”. Em poucas palavras, a enfermagem não vai se

transformar “olhando para o próprio umbigo e a partir do próprio umbigo”. Eqüivale dizer que

não se faz a crítica da prática se não se fizer a crítica da economia capitalista7 hoje

estruturada em torno das relações sociais de produção, aqui entendidas como as relações

da esfera produtiva e as relações de “todas as esferas necessárias para a reprodução do

capital, como a circulação, a distribuição e o consumo”.8

O neoliberalismo que aqui está não é eterno nem imutável, ele pode e deve ser

combatido. Para tanto, tomamos de empréstimo os encaminhamentos do Prof. Perry

Anderson: “Se olharmos as perspectivas que poderiam emergir mais além do neoliberalismo

vigente, como deveríamos orientar-nos na luta política contra o neoliberalismo, não devemos

esquecer três lições básicas, dadas pelo próprio neoliberalismo.

Primeira lição: não ter nenhum medo de estar absolutamente contra a corrente

política do nosso tempo. (...)

Segunda lição: não transigir em idéias, não aceitar nenhuma diluição de

princípios.(...)

Terceira lição: não aceitar nenhuma instituição estabelecida como imutável". 9

Nesse sentido, pautando-nos nessas três lições que nos ensinam a resistir com

coragem e obstinação, encaminhamos a nossa proposta de trabalho e estudo - seja no

âmbito do ensino, da pesquisa ou da extensão de serviços à comunidade - em torno de três

momentos de análise: a) a situação e as perspectivas da sociedade capitalista neoliberal

brasileira, b) a situação e as perspectivas da produção de serviços de saúde no Brasil

enquanto situação de saúde e de assistência à saúde, e c) a situação e as perspectivas da

enfermagem brasileira.

2. Situação da sociedade capitalista neoliberal e perspectivas para uma sociedade do

tipo novo

2.1. A contemporaneidade

O neoliberalismo, movimento que se opôs ao projeto do capitalismo fundamentado

no Estado de Bem Estar Social, foi moldando seu espaço e seu peso remando contra a

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maré (Estado de Bem Estar Social), baseando sua prática num movimento simultâneo de

resistência e de ação contra-ideológica durante cerca de 30 anos. Na resistência e na ação,

diante das vulnerabilidades que o processo histórico favorecia, encontrou na crise dos anos

70 (estagnação econômica e inflação, a estagflação) a possibilidade de se consolidar como

movimento dominante e de ser operacionalizado através das políticas e práticas econômicas

e políticas e práticas sociais pelas grandes potências capitalistas. Na Inglaterra ganhou vulto

com Tatcher, nos EEUU com Reagan, na Alemanha com Khol, minando inclusive os

governos euro-socialistas da França, Espanha, Portugal e Grécia. Na América Latina, foi o

Chile de Pinochet, na análise de Perry Anderson, o “laboratório do neoliberalismo da história

contemporânea”; sucessivamente aderiram ao padrão de acumulação10 neoliberal Bolívia,

México, Argentina e Perú. O Brasil foi o último país latino-americano a entrar "no circuito de

submissão (...), a qualquer custo, inserindo-se de forma subordinada no novo quadro

financeiro mundial."11

O ideário do neoliberalismo está fundado na desigualdade como valor fundamental

para estimular a vitalidade da concorrência da qual depende a prosperidade de todos .

Abole a democracia como valor central pois a vontade democrática da maioria é

incompatível com a liberdade individual dos agentes econômicos.12 Utiliza o processo de

globalização do capital para veicular e expandir seu ideário e sua prática pelos diferentes

continentes, que viajam “pelo mundo à velocidade quase da luz” 13.

A conversão desse ideário em prática, veio se traduzindo: a) na marcha acelerada de

reversão das nacionalizações efetuadas no pós-guerra; b) na crescente desregulamentação

das atividades econômicas e sociais pelo Estado; c) na reversão dos padrões universais de

proteção social estabelecidos em diversos países, no pós-guerra, pelos Estados de Bem

Estar Social.14 Concretamente, essa prática se encaminhou para consolidar um Estado forte,

que fosse capaz de “romper com o poder dos sindicatos e [o] controle do dinheiro, mas parco

em todos os gastos sociais e nas intervenções econômicas. A estabilidade monetária [veio

sendo] a meta suprema de qualquer governo. Para isso (...) uma disciplina orçamentária

com contenção dos gastos com bem-estar, e a restauração da taxa ‘natural’ de desemprego,

ou seja, a criação de um exército de reserva de trabalho para quebrar os sindicatos.

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Ademais, reformas fiscais [foram e vêm sendo] imprescindíveis, para incentivar os agentes

econômicos. Em outras palavras (...) reduções de impostos sobre os rendimentos mais altos

e sobre as rendas [de modo que] uma nova e saudável desigualdade (...) [dinamize] as

economias avançadas”15.

O Brasil implantou seu projeto neoliberal, seguindo o mesmo receituário; para nós,

hoje, por mais que nos violente, não mais nos estranha conviver com expressões como:

privatização e quebra de monopólios estatais (todas elas feitas por valores abaixo dos do

mercado, que converte em capital privado o investimento público financiado pela sociedade

como um todo durante décadas)16; Estado Mínimo (é mínimo na intervenção e regulação

do mercado, é mínimo no alcance das políticas sociais, porém é máximo no financiamento

e na garantia da acumulação do capital privado, o que faz o Prof. Wanderley Guilherme dos

Santos cunhá-lo como Estado mini-max17); Comunidade Solidária (como expressão do

descompromisso do Estado com os movimentos sociais, com as conquistas sociais

arduamente adquiridas como trabalho registrado, e um pseudo-compromisso com a horda

dos excluídos sociais - simbolicamente denominados de apartados sociais18 - que o próprio

Estado mini-max patrocinou).

Muitos outros termos nossos conhecidos como flexibilização das relações

trabalhistas, qualidade total, livre iniciativa, trabalho autônomo, gente que faz,

cunhados pelo neoliberalismo, também mereceriam ser denunciados, mas fugiríamos aos

limites do conteúdo desta nossa fala.19 “Trata-se, na verdade de uma metamorfose de

conceitos sem, todavia, alterar-se fundamentalmente as relações sociais que mascaram”,

como bem assinala o Prof. Gaudêncio Frigotto.20

A despeito da destruição avassaladora que fez do patrimônio social, dos homens e

das instituições, lamentavelmente, como assinala o Prof. José Paulo Neto, “a proposta

neoliberal, nos seus vários matizes, tem encontrado legitimação por via democrática”21. A

eleição de vários representantes deste projeto nos Estados e Municípios brasileiros são

demonstrativos dessa realidade.

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Além de vivenciarmos essa situação na condição de cidadãos comuns, enquanto

trabalhadores de saúde - na verdade, executores da política pública de saúde -

dramaticamente convivemos com a reversão dos padrões de proteção social (que no nosso

caso brasileiro já era quase que inexpressivo) explicitados pela adoção de políticas públicas

que se caracterizam pela sustentação de que “(...) pertence[m] ao âmbito privado, e que

suas fontes ‘naturais’ são a família, a comunidade e os serviços privados. Por isso, o Estado

só deve intervir com o intuito de garantir um mínimo para aliviar a pobreza e produzir

serviços que os privados não podem ou não querem produzir, além daqueles que são, a

rigor, de apropriação coletiva.(...) Propõem uma política de beneficência pública ou

assistencialista com um forte grau de imposição governamental sobre que programas

instrumentar e quem incluir, para evitar que se gerem ‘direitos’. Além disso, para se ter

acesso aos benefícios dos programas públicos, deve-se comprovar a condição de indigência.

Rechaça-se o conceito dos direitos sociais e a obrigação da sociedade de garanti-los através

da ação estatal. Portanto, o neoliberalismo opõe-se radicalmente à universalidade,

igualdade e gratuidade dos serviços sociais”(...).22

Na transposição do ideário neoliberal para o patamar das políticas públicas, a Profa.

Asa Cristina Laurel elenca as seguintes estratégias que o concretizam: privatização do

financiamento e da produção de serviços; corte dos gastos sociais, eliminando-se

programas e reduzindo-se benefícios; canalização dos gastos sociais públicos em

programas seletivos contra a pobreza; descentralização em nível local.23

E é nesse sentido que a Profa. Laura Tavares Ribeiro Soares destaca que “o perfil

neoliberal adotado pelas políticas de ajuste é responsável tanto pelo agravamento das

condições sociais, como pela deterioração dos programas sociais pré-existentes nos países

latino-americanos (...) [que] no caso brasileiro (...) [combina a desestruturação] (...) de

políticas já consolidadas (Previdência), ou em vias de consolidação dentro de um novo

padrão (Saúde), como na de desmantelar programas frágeis e dispersos (Assistência Social

e Alimentação e Nutrição)”24

2.2. O projeto utópico para a sociedade

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Ao estabelecer as perspectivas para uma nova sociedade, reiteramos a necessidade

de conceber a sociedade como totalidade, como totalidade concreta e articulada nas suas

partes, sem o que incorreríamos no erro de analisar a parte - setor saúde - e a ela propor

soluções endógenas. A resistência e a ação revolucionária em direção ao projeto neoliberal,

devem ser construídas a partir de um projeto geral da sociedade que queremos, da

construção de uma nova utopia - uma sociedade do tipo novo - que encaminhe ao

estabelecimento de novos laços de solidariedade, da busca da liberdade e da igualdade,

utopia, compreendida como uma antevisão da sociedade que queremos, porém com os pés

fincados na realidade a ser transformada. Pressupõe não somente estar em contradição com

a realidade presente mas também romper os liames da ordem existente25, fundamentando,

na perspectiva do vir-a-ser, a nossa prática transformadora no cotidiano.

2.2.1 A primeira lição

Vamos começar integrando a primeira lição ao nosso trajeto: não ter nenhum medo

de estar absolutamente contra a corrente política do nosso tempo .

1) Integrá-la, significa vislumbrar o patrimônio histórico que queremos entregar às

futuras gerações. Significa construir aquilo que Antonio Gramsci chamava de momento

“catártico”, em que, passando do momento meramente egoístico-passional, os homens

constróem o momento ético-político, “afirma[m] sua liberdade em face das estruturas sociais,

revelando que - embora condicionado[s] pelas estruturas e, em particular, pelas estruturas

econômicas - [são] capaz[es], ao mesmo tempo, de utilizar o conhecimento dessas

estruturas como fundamento para uma práxis autônoma, para a criação de novas estruturas,

ou, como ele diz, para ‘gerar novas iniciativas’. 26

2) Integrá-la só será possível porque, ao viver os impactos da corrente política de nosso

tempo, não hesitaremos em manter a nossa indignação diante do que há de mais perverso!

Quem pode negar que o neoliberalismo “conseguiu acentuar, multiplicar, estender o

processo de fragmentação social de nossas sociedades [?] (...) a heterogeneidade social,

especialmente entre as classes subalternas é cada vez maior. As diferenças entre as

formas de reprodução de suas condições de vida entre um e outro trabalhador e entre o

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mesmo trabalhador num mês e no mês seguinte, são cada vez mais acentuadas.” 27

“Nos países-com-maioria-rica, criou-se uma sociedade de abundância, ao mesmo tempo

em que o desemprego e a falta de perspectivas [jogam] na marginalidade uma parcela

da população, especialmente de jovens. Nos países-com-maioria-pobre, a situação é

muito mais grave, porque, ao lado da riqueza de uma elite minoritária, que muitas vezes

supera a ostentação dos ricos dos países-com-maioria-rica, observa-se um

empobrecimento ainda mais drástico da população, que se antes não consumia bens

industriais, agora nem ao menos come (...)."28

Quem há de voltar os olhos para esta realidade que traduz “o objetivo do liberalismo

clássico - isto é, reduzir as pessoas à sua individualidade, à sua atomização no

mercado, dificultando a afirmação dos laços sociais, dos conflitos sociais expressos de

forma coletiva, dificultando [mesmo] a resistência social ao neoliberalismo [?].(...) O

neoliberalismo voltou a dar vigor ao argumento da desigualdade como fator positivo. (...)

A idéia de justiça social é substituída (...) pela idéia de oportunidade. O que a sociedade

deveria fazer é dar oportunidade às pessoas [o que] na perspectiva do neoliberalismo

significa ‘se virar’ no mercado.(...) [No plano das idéias] o neoliberalismo conseguiu

tentar caracterizar a sua solução como a única solução possível. (...) O mercado voltaria

a ser o melhor alocador de recursos e praticamente o único alocador equilibrado de

recursos na sociedade. [ Do ponto de vista político] o neoliberalismo [que] havia se

iniciado na extrema direita (...) [contaminou a social democracia européia e os partidos

progressistas latino-americanos que] (...) fizeram sua reconversão neoliberal.”29.

2.2.2 A segunda lição

Se estes são os eixos para que integremos a primeira lição, como cumprirmos a

segunda lição que é - Não transigir em idéias, não aceitar nenhuma diluição de

princípios?

1) Na perspectiva da construção de uma sociedade do tipo novo significa defender um

ideário - um conjunto de idéias e de princípios - que serão a base fundante dessa nova

sociedade, tais como:

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a construção do “homem novo” como “ponto máximo atingido pela historicidade da

essência humana objetivada; o indivíduo “(...) cujo comportamento ético-político é

orientado por necessidades radicais de transcendência”30;

a reconquista do trabalho como “ponto de partida do processo de humanização do ser

social”, superando a alienação do trabalho sob o capitalismo. Aqui, uma frase de Marx

explicita claramente o conceito: “Meu trabalho seria livre projeção exterior de minha vida,

portanto desfrute de vida. Sob o pressuposto da propriedade privada (em troca) é

estranhamento de minha vida, posto que trabalho para viver, para conseguir os meios

de vida. Meu trabalho não é vida." 31

a defesa do direito ao trabalho como a real possibilidade do aperfeiçoamento da

qualidade de vida32;

a reconquista - no espaço da subjetividade - do desejo e da paixão, que, articulados à

vontade e à razão33 - no espaço da racionalidade - encaminharão o projeto de

transformação tanto das “pessoas, dos seus valores, da sua cultura ou ideologia, quanto

(...) no funcionamento das instituições sociais” 34.

2) Integrar essa segunda lição só será possível porque, ao tomar consciência de que

somos, como trabalhadores públicos, os executores da política pública de saúde, não

poderemos nos furtar a restituir para a sociedade o investimento que em nós ela depositou

ao financiar indiretamente nossa formação e nossos espaços de trabalho. Será preciso pois

que nos exercitemos a reconhecer que "superar a alienação econômica é condição

necessária, mas não suficiente, para a realização integral das potencialidades abertas pela

crescente socialização do homem; essa realização implica também o fim da alienação

política, o que, no limite, torna-se realidade mediante a reabsorção dos aparelhos estatais

pela sociedade que os produziu e da qual eles se alienaram."35

Como deixar de reconhecer as evidências de que estamos construindo a

desumanização na corrosão do caráter, na perda de controle de nossas vidas,

na constituição de laços frouxos e, enfim, de uma vida social em que ninguém

mais se torna testemunha a longo prazo da vida de outra pessoa, produtos da

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subtração insidiosa da possibilidade de confronto duradouro e cotidiano com o

objeto de trabalho, conseqüências da flexibilização e da reengenharia dos

processos de trabalho?36

Quem há de negar que, contemporaneamente, declina-se o indivíduo na mesma

fábrica da sociedade global em que se inseriu e que ajudou a criar e a recriar

continuamente (...) [pois] ela agora é o cenário em que desaparece ?37

Quem há de fechar os olhos para as perversidades geradas na progressiva e

refinada degradação da classe-que-vive-do-trabalho, que, sob fogo cruzado,

desempregou-se, fragmentou-se, precarizou-se, subproletarizou-se? 38

Quem há de negar a construção de sociedades de linhagens recessivas

massificadas e exterminadas lentamente pela condição de exclusão social a que

vêm sendo sujeitos aqueles que não interessam ao novo projeto do capital?

Quem há de negar que as bases da esperança, da indignação e da resistência

vêm sendo virulentamente atacadas, sob a disseminação da idéia de que tudo

deve ficar como está, porque este é o fim da história?39

3) É reafirmando a construção da humanização do homem, da dignidade e

emancipação humanas e dos laços de solidariedade social que demonstraremos nossa

intransigência e nossa densidade de valores e princípios.

2.2.3 A terceira lição

Vamos, finalmente, para a terceira lição - Não aceitar nenhuma instituição

estabelecida como imutável.

1) Integrá-la implica perspectivar coletivamente a construção do Estado que

queremos, entendendo o Estado não como uma entidade em si, mas como uma relação de

todas as forças sociais presentes na sociedade política e na sociedade civil, de modo que se

tornem “no terreno estratégico que é o Estado, os centros efetivos de poder real (...)

[concebendo então] (...) uma transformação radical do Estado mediante a articulação entre a

ampliação e o aprofundamento das instituições da democracia representativa (...) e a

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explicitação das formas de democracia pela base e a proliferação de focos auto-

gestionários”40.

2) Integrá-la implica não sucumbir ao equívoco de que as políticas sociais "são uma

rua de mão única: somente a burguesia teria interesse num sistema educacional universal e

gratuito, numa política pública de seguridade, etc. (...) também a esfera das políticas sociais

é determinada pela luta de classes (...) nada está decidido a priori (...) [pelo que] (...) é mais

uma vez necessária a intensificação das lutas pela realização da cidadania, com o

estabelecimento de correlações de forças favoráveis aos segmentos sociais efetivamente

empenhados nessa realização."41

3) Integrá-la implica reconhecer que "a cidadania não é dada aos indivíduos de uma

vez para sempre, não é algo que vem de cima para baixo, mas é resultado de uma luta

permanente, travada quase sempre a partir de baixo, das classes subalternas, implicando

assim um processo histórico de longa duração."42 Assim sendo, integrar essa terceira lição

só será possível porque não nos furtaremos a lutar:

pela ampliação dos "novos institutos democráticos, expressões da auto-organização

popular, [que] fazem parte do que Gramsci chamou de 'sociedade civil': são os

partidos de massa, os sindicatos, as associações profissionais, os comitês de

empresa e de bairro, as organizações culturais, etc. É por meio deles que as massas

populares, e em particular a classe operária, organizam-se de baixo para cima, a

partir das bases, constituindo o que poderíamos chamar de sujeitos políticos

coletivos"43.

especificamente no que se refere ao movimento sindical, pela reconstrução dos

movimentos que aglutinam a classe-que-vive-do-trabalho, de modo a: romper com as

barreiras que separam os trabalhadores estáveis inseridos formal e qualificadamente

no mercado de trabalho daqueles instáveis, precários, com inserção informal e

desqualificada; romper também com o corporativismo de caráter fragmentado e

heterogêneo da classe trabalhadora, aglutinando, numa ação solidária, os grandes

contingentes de trabalhadores excluídos da representação sindical; reorganizar as

comissões de fábricas e empresas no sentido de controlar a cooptação dos

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trabalhadores; instaurar o “sindicalismo horizontalizado” que aglutine a “classe-que-

vive-do-trabalho”, superando o “sindicalismo verticalizado”; romper com “a excessiva

institucionalização e burocratização” que têm caracterizado o movimento sindical;

finalmente, criar um movimento sindical que “resgate ações no sentido de buscar o

controle social da produção”(...) . O sindicalismo mais combativo (...) será capaz de

participar e auxiliar na elaboração de um modelo econômico alternativo, (...) que, ao

mesmo tempo, se fundamente em um avanço tecnológico com bases reais,

nacionais, verdadeiras, e que não seja regido por uma lógica de um sistema produtor

de mercadorias, destrutivo e excludente, responsável pelas explosivas taxas de

desemprego estrutural que hoje estão presentes em escala global (...)."44

pela reconquista da escola unitária e pública dentro de uma perspectiva político-

pedagógica que parta da diversidade cultural e social das crianças e jovens, o que

“no plano teórico, político, filosófico e ético (...) [implica em] não reduzir os processos

educativos a uma concepção unidimensional, mas alargá-los na perspectiva

omnilateral [que desenvolva ao máximo as potencialidades dos indivíduos] e/ou

politécnica que expressa as múltiplas necessidades do humano”, instrumentalizando

os educandos para participar da gestão dos interesses sociais45;

pela conquista (e reconquista) do atendimento de todos direitos sociais, tendo

clareza de que a miséria, a violência, a pobreza e a exclusão que convivem com a

abundância, com a riqueza e a inclusão, são produtos do movimento da economia,

“esfera da vida social onde, fundamentalmente, se realiza a exclusão social e a

política." 46

3. Situação da produção de serviços de saúde no Brasil e perspectivas da forma de

produzir serviços de saúde no encaminhamento de uma sociedade do tipo novo

3.1 A contemporaneidade na saúde

A Profa. Asa Cristina Laurell caracteriza as condições que concretizam o padrão de

acumulação neoliberal no setor saúde em torno das seguintes evidências:

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redução de investimentos no setor saúde, que sucateia propositalmente o serviço público

de saúde, de modo a desmoralizá-lo e desacreditá-lo; isso serve como justificativa para,

por um lado, privatizar as atividades consideradas rentáveis do setor e, por outro, induzir

a população a legitimar o serviço privado como a única alternativa eficaz e eficiente para

resolver seus problemas de saúde;

estratificação da “população em função da sua capacidade de pagamento e

probabilidade de adoecer (...) [constituindo-se] dois sistemas paralelos de administração

de fundos e prestação de serviços - o privado e o público. (...) Essa situação leva o

sistema público a um círculo vicioso de deterioração, ao assistir, com seus recursos

limitados, tanto os pobres como os velhos e os mais doentes, enquanto o sistema

privado floresce e obtém lucros elevados.”47

estratégia de centralizar os gastos sociais em programas seletivos dirigidos aos pobres.

“Teoricamente, ninguém pode se opor a uma política que canalize recursos aos que

menos ou nada têm, mas adquire um significado diverso quando, concretamente, tal

política implica remercantilizar os benefícios sociais, capitalizar o setor privado, deteriorar

e desfinanciar as instituições públicas.(...) [Tais programas] (...) têm como objetivo

declarado garantir níveis mínimos de alimentação, saúde e educação para a população

carente (...) [porém] (...) estão muito longe de alcançar seus objetivos. (...) tendem a ser

manipulados (...) pelo Poder Executivo (...) [e atendem] (...) a um objetivo oculto:

assegurar uma clientela política em substituição ao apoio popular baseado num pacto

social amplo,(...) uma tentativa de evitar o problema de ter de se dirigir para uma

economia desregulamentada de livre-mercado, sem com isso provocar processos

políticos contrários que anulem o projeto”.48

Chegamos ao ponto de alcançar a universalização excludente em que se colocou à

disposição daqueles que não são cobertos pelos programas compensatórios, um bufê de

planos de saúde privados, gestando-se, na nossa sociedade, “uma outra dinâmica [que

modernizou] o modelo médico-privatista, resegmentou clientelas e cristalizou desigualdades

no acesso aos serviços de saúde”.49 No entendimento da Profa. Carmem Teixeira e do Prof.

Jairnilson Paim, convivemos não com um único SUS, mas com quatro SUS, a saber: “a) o

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SUS democrático desenhado pelo projeto da Reforma Sanitária Brasileira; b) o SUS formal,

juridicamente estabelecido pela Constituição (...); c) o SUS real, refém da área econômica

do governo, do clientelismo, da incompetência e da inércia burocrática; d) o Sus-para-

pobres, uma medicina simplificada para gente simples e uma saúde pública focalizada, tal

com recomenda o Banco Mundial. (...) Assumir o SUS democrático e o SUS formal significa

não apenas a coerência com o projeto da Reforma Sanitária mas, especialmente, por

permitir uma discussão política sobre o desdém que as elites brasileiras exibem a respeito

dos próprios pactos em que participa (...) e contra os projetos que interessam a maioria do

povo. (...) Cabe, portanto, denunciar o engodo do SUS para pobres e a esperteza do SUS

real que nos querem impor por inércia, ao tempo em que possamos criar novas alternativas

político-culturais para um SUS mais orgânico a um projeto autenticamente democrático”.50

Em outras palavras, o projeto neoliberal desloca o coletivo como objeto do novo

padrão de produção de serviços de saúde preconizado pelo SUS. Vai mais além: faz uso

privado do espaço público, aquele que foi financiado pela sociedade, mas que diante da

ordem neoliberal, assiste o seqüestro de seus bens para uso privado, para a acumulação do

capital. Isso se evidencia na análise da produção de serviços de saúde realizada pelo Prof.

Paulo Elias. “ (...) a rede brasileira de estabelecimentos de saúde qualifica-se como sendo

voltada fundamentalmente para a assistência básica de saúde, sendo o setor público

responsável preponderantemente pelos serviços de atenção primária, geralmente

incorporador de tecnologia de baixo custo, enquanto o setor privado concentra-se

preferencialmente no segmento hospitalar, tradicionalmente incorporador de tecnologia de

maior custo (...). Acresce-se a isso o fato de que os hospitais com grande incorporação de

tecnologia, portanto demandantes de grandes investimentos de capital, geralmente

pertencem ao setor público (...) a lógica da produção de serviços não é a mesma do

financiamento, uma vez que o Estado constitui sem dúvida no principal agente financiador,

cobrindo boa parte do pagamento da produção dos serviços hospitalares, tanto públicos

como privados, enquanto a prestação dos serviços hospitalares é preponderantemente

privada, salvo nos serviços de alta complexidade, em que o setor público responde por uma

fatia expressiva da oferta de serviços. (...) Resulta disso tudo um Sistema de Saúde restritivo

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quanto à cobertura oferecida, extremamente segmentado na produção e no acesso aos

serviços, iníquo no atendimento das necessidades sociais, e absolutamente desigual no

tratamento dispensado aos usuários, tornando na prática letra morta os preceitos

constitucionais aprovados em 1988 e boa parte das leis que compõe o arcabouço legal do

SUS. (...) De um lado, os cerca de 40 milhões que constitui a parcela dos incluídos, tendo

acesso a uma rede de serviços de saúde subsidiada de várias maneiras pelo Estado, e que

nos segmentos de ponta é tecnicamente comparável a dos países com economia de

mercado consolidada. No outro extremo, a grande massa da população que constitui os

excluídos, com precário acesso a um sistema de saúde deteriorado em função do relativo

desinvestimento público no setor e do desequilíbrio entre a demanda e a oferta de serviços,

apresentado disparidades e problemas no acesso aos serviços e na qualidade da assistência

prestada”51.

3.2. O projeto utópico para a produção de serviços de saúde

Ao estabelecer as perspectivas para a produção de serviços de saúde, reiteramos os

nossos compromissos com a constituição do campo da Saúde Coletiva e com o projeto

político que reavivou o conhecimento epidemiológico, trazendo para o centro da produção de

serviços em saúde a necessidade de se integrar a clínica e a epidemiologia, a promoção, a

cura e a recuperação, as ações intra, inter e transetorais, estruturadas em torno de

programas que “permitam elevar a qualidade do trabalho e do consumo, a proteção do meio

ambiente, a relação intergenérica, a consciência (...) [humanizando] todos os espaços do

trabalho social.”52 Assim, na perspectiva de concretizar a resistência contra o neoliberalismo

na saúde e, mais do que isso, concretizar ações práticas que concretizem a construção do

novo, voltemos às lições do Prof. Perry Anderson, agora aplicadas ao setor saúde.

3.2.1 A primeira lição

Como integrar a primeira lição ao nosso trajeto no redimensionamento da produção

de serviços de saúde?

Não ter nenhum medo de estar absolutamente contra a corrente política do

nosso tempo significa resistir ao “canto da sereia” de que a eficiência e a eficácia em saúde

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só serão alcançadas com a privatização do setor, que consequentemente lhe imprimirá

maior produtividade e melhor qualidade, na ingenuidade de que, sob as “rédeas da

regulação Estatal, dominaremos a voracidade do setor privado”.

3.2.2 A segunda lição

Integrar a segunda lição - Não transigir em idéias, não aceitar nenhuma diluição

de princípios - ao nosso trajeto no redimensionamento da produção de serviços de saúde

significa:

não trair a base empírica e a fundamentação teórica essencial que caracteriza a

determinação social do processo saúde-doença, sob pena de estarmos a abolir os

pilares que sustentam essa concepção - as formas específicas de se inserir no momento

da produção social - formas de trabalhar - e as formas específicas de se inserir no

momento da reprodução social - formas de viver - determinam os diferentes gradientes

do processo saúde-doença; estar sim, abertos a incorporação de novas categorias

(variáveis) mediadoras do tipo explicativo, recolocando as questões da qualidade de vida,

da ecologia, dos movimentos das minorias - que envolvem consciência e conduta -

subordinadas às relações sociais de produção.53

insistir na assunção da responsabilidade que nos cabe, enquanto setor público da saúde

e enquanto trabalhadores de saúde, pelo monitoramento das condições de saúde do

coletivo que compõe o Município e/ou a parcela delimitada do território, traduzindo no

projeto interventivo, os princípios da eqüidade, da universalidade e da integralidade e

operacionalizando-os através da Regionalização, Descentralização, Hierarquização,

insistindo no caráter complementar do setor privado, conveniado e filantrópico,

ampliando o espaço da participação popular para exercer seu real papel de controle

social;

não sucumbir a projetos que fragmentam a intervenção pública em saúde, fragmentação

esta com a face público/privado, com a face regulamentação estatal/execução privada

maquiada pelo discurso Estatal/Público/Social/Privado;

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não perder a perspectiva de que a reorganização do setor saúde em torno de um

Sistema Único de Saúde recoloca a necessária transformação nos conteúdos de nossas

práticas profissionais, como desafio iminente para nos desanquilosar da nossa aparente

ineficiência. A ineficiência está na forma como se concretizaram as relações sociais de

produção no setor saúde e não na nossa competência. Nesse sentido, o movimento é o

de recuperar a dignidade do trabalhador de saúde que, a duras penas, vem resistindo à

demolição avassaladora e ao sucateamento dos equipamentos públicos de saúde.

Recuperada a dignidade, recuperar também o compromisso do trabalhador de saúde de

servir à sociedade que o financia - servir ao público e não à instituição.54

3.2.3 A terceira lição

Para cumprir, enfim, a terceira lição do Prof. Perry Anderson - Não aceitar nenhuma

instituição estabelecida como imutável - no redimensionamento da produção de serviços

em saúde, será preciso que reconheçamos, com honestidade e coragem, que:

a despeito de termos construído desde o início do século a nossa base de intervenção

em torno dos programas focais e verticais, é hora mais do que emergente de re-situá-los

na lógica geral que engendra a compreensão do processo saúde-doença e que situa

nas relações sociais de produção o estopim, as raízes, de suas manifestações. Os

programas não são imutáveis. Assim sendo, os programas focais e verticais devem se

submeter ao projeto de monitoramento das condições de trabalho/ vida e saúde do

coletivo, entendido na sua totalidade, nos grupos sociais homogêneos que o compõem e

na sua singularidade - indivíduo e família; 55

não poderemos nos furtar a criar formas de operacionalizar o conceito de coletivo que

superem as suas atuais formas de reconhecimento, ou, enquanto totalidade, ou,

enquanto somatória das singularidades. A nosso ver, fundamentadas nos estudos da

Profa. Asa Cristina Laurel, do Prof. Jaime Breilh e do Prof., Luís Augusto Facchini, o

que caracteriza a heterogeneidade do coletivo para a saúde é a forma específica como

os determinantes do processo saúde-doença se expressam nos grupos sociais,

compondo grupos sociais homogêneos não só na expressão nos perfís específicos de

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morbi-mortalidade mas, sobretudo na expressão homogênea de suas formas de

trabalhar e de viver;56

se durante todo este século as nossas intervenções vêm sendo focadas no controle da

morbi-mortalidade e na demanda, municiados pelo conceito da determinação social do

processo saúde-doença e pelos princípios e diretrizes originais de nosso Sistema Único

de Saúde, projetemos nossas intervenções nos determinantes e nos resultados. Não

temos sequer captado de modo sistemático os determinantes, muito menos temos

projetadas intervenções para eles. Acresce que nossa intervenção só atinge o pico do

iceberg: a morbi-mortalidade, parcela dos resultados. Operacionalizar uma nova

intervenção em saúde requer que se amplie o espectro dos resultados e, para além

deles, "o modo de organizar socialmente as ações em saúde para a produção e

distribuição efetiva dos serviços será não apenas resposta a necessidades, mas

imediatamente contexto instaurador de necessidades". 57

na “reinvenção” das nossas instituições de saúde, “rediscutir sua burocratização,

emperramento e ineficiência, propondo alterações radicais nos seus padrões de

financiamento. Da mesma forma, chegou o tempo de inventarmos novos modos de

"organizar as práticas clínicas e da Saúde (...) [Coletiva], superando o criticismo em que

se atolou o pensamento de esquerda nas décadas de 60 e 70. Por outro lado, ao

mesmo tempo, temos que criar movimentos, situações e contextos, que favoreçam a

constituição de sujeitos coletivos, ainda que inacabados, e sempre presos a diversas

contradições e limitações, mas maduros o suficiente tanto para realizar as mudanças

indicadas como para sustentá-las e renová-las no curso da vida”58.

Por tudo o que foi dito até agora, resistindo à desqualificação da saúde como direito

social e público, reafirmando os princípios da construção humanizada e solidária da

produção de serviços de saúde e superando os limites dos projetos convencionais de

intervenção em saúde, encaminhamos a considerar que:

na prática intervir em saúde hoje significa assumir a responsabilidade pelo

monitoramento/acompanhamento das condições de saúde da totalidade da população

de um determinado espaço geo-social;

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intervir em saúde implica em fazer parte de um processo de produção de serviços de

saúde que comporta diferentes processos de trabalho articulados entre si (trabalho

coletivo/ trabalhador coletivo) para atender a finalidade do processo;

assumir a responsabilidade pela saúde dos habitantes deste espaço geo-social

implica em que o setor público de saúde deve assumir o controle de saúde da

totalidade dos habitantes, com a complementariedade do setor privado, conveniado e

filantrópico de saúde;

monitorar/acompanhar as condições de saúde da totalidade dos habitantes significa

exercer o mintoramento do coletivo, na sua totalidade, nos seus grupos sociais

homogêneos e na sua singularidade, caracterizando os perfís epidemiológicos - perfís

de reprodução social e perfís saúde-doença dos grupos sociais homogêneos que

compõem o coletivo - e neles intervindo visando ao aperfeiçoamento do processos

saúde-doença de todos os habitantes;

como as diferentes práticas profissionais em saúde são parcelas dos quatro processos

de trabalho (assistência, gerenciamento, ensino e investigação) que compõem o

processo de produção de serviços de saúde, seu objeto e sua finalidade são idênticos

aos do processo de produção a que se articulam e, assim, o projeto de intervenção

(assistência) em Saúde Coletiva é único e incorpora o monitoramento das

condições de trabalho, de vida e de saúde.59

4. Situação do saber/saber fazer da enfermagem hoje e as perspectivas da

enfermagem brasileira dentro da sociedade do tipo novo que queremos e da saúde

que queremos entregar como patrimônio histórico para as futuras gerações dessa

nova sociedade60

4.1 A contemporaneidade

Por compor a maior parcela numérica do conjunto dos trabalhadores de saúde, a

enfermagem (e a enfermagem aqui entendida como a prática social exercida por um

universo heterogêneo de trabalhadores em que os enfermeiros são a menor parcela) convive,

simultaneamente com o recrudescimento do modelo de atenção individual, bem

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caracterizado pelo Prof. Ricardo Bruno Mendes Gonçalves como modelo clínico, e com a

crescente municipalização dos serviços de saúde, teoricamente centrada no modelo

epidemiológico, que foi a contraposição ao modelo clínico por ele caracterizada.61

De um lado, os enfermeiros convivem, concomitantemente, com encaminhamentos

contraditórios em assumir o cuidado do corpo individual na rede hospitalar e a gerência dos

serviços da rede básica, capitaneados por movimentos deflagrados nas academias e nas

redes articuladas de integração escola-serviço, fomentadas pelas agências de saúde

internacionais. De outra parte, o grande contingente da força de trabalho em enfermagem

subsidia o modelo dominante de recuperação e cura do corpo individual subordinado à

ordem institucional, sob o comando dos enfermeiros que representam os interesses da

ordem instituída.

A prática da enfermagem hoje, se situa muito mais no nível da execução dos

projetos de saúde seja sob a ótica clínica, seja sob a ótica epidemiológica do que no nível de

co-participação de sua construção. Sua especificidade se caracteriza muito mais por

oferecer infra-estrutura para a prática médica, ou executando prática suplementar à prática

médica, ou procedimentos elementares para complementar tal prática, ou ainda, para o

gerenciamento burocrático das instituições de saúde, reproduzindo o conteúdo fortemente

arraigado que historicamente a institucionalizou na sociedade brasileira, a despeito das

rupturas que vieram sendo deflagradas na esteira do movimento da Reforma Sanitária.

Pensando que está se modernizando, a enfermagem tem se sujeitado a participar na

operacionalização de projetos rotulados como progressistas, que reiteram como objeto da

produção de serviços de saúde, grupos focais, os mesmos grupos de excluídos sociais aos

quais as políticas públicas gestadas pelo modelo neoliberal se orientam. Assim é que,

especialmente na rede básica de serviços, os enfermeiros têm oferecido a sua força de

trabalho para compor, numa pretensa equipe multiprofissional, projetos de intervenção

dirigidos a famílias de excluídos ou a grupos de risco biológico, que na verdade são grupos

de risco social, em outras palavras, que ameaçam a ordem social. Nesses projetos, o

enfermeiro se dispõe por vezes, a qualificar - entre aspas - os agentes sanitários ou de saúde

para ser o interlocutor do setor saúde com os, como ele, excluídos sociais, operacionalizam o

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“SUS-de-pobres-para-pobres”; por outro lado, se dispõe a qualificar os trabalhadores

formais, reconhecidos de fato como trabalhadores de enfermagem, na rede pública, que a

seguir quase sempre migram - após qualificação - para os serviços da rede privada.

As escolas de enfermagem, por sua vez, acabam por direcionar a formação dos

enfermeiros, ora, às exigências do mercado de trabalho (e não do “mercado dos problemas e

necessidades de saúde”), ora, tomando como eixo da sua formação os princípios e diretrizes

do SUS, inscritos nas diretrizes gerais do novo Currículo Mínimo do Curso de Graduação em

Enfermagem. Essas mesmas escolas de enfermagem, dificilmente se responsabilizam pela

formação dos auxiliares e técnicos de enfermagem, nem ainda co-participam da elaboração

de diretrizes gerais para essa formação, nem articulam a formação dos três níveis de ensino.

Por outro lado, a pós-graduação em enfermagem se debate ainda entre qualificar os pós-

graduandos para serem pesquisadores (que se responsabilizarão pela produção de saber

em enfermagem), ou então para serem docentes (que se responsabilizarão pela reprodução

- e produção - do saber em enfermagem) ou ainda, para qualificar os enfermeiros de serviço

na perspectiva de progressivamente assumam os projetos de transformação da prática da

enfermagem.

Como resultados dessa pós-graduação, temos a produção de um saber -

evidenciado nas publicações científicas, monografias e teses - que nos leva perceber “que

temos feito ciência para nós mesmos, receosos de tocar em assuntos mais gerais, por

exemplo, sempre tendo que falar exclusivamente da enfermagem, sem enxergar suas

interrelações, sem falar delas e sem compreender o que de fato outros pesquisadores estão

fazendo . (...) [Essa produção está muito mais centrada na necessidade de] dar conta de um

imperativo institucional, mais de que a um compromisso com a sociedade (...), alguns

pesquisadores [se apropriando] de idéias de outros como se fossem suas, muitos

[avolumando] seus currículos com publicações de baixa qualidade, muitas vezes meras

variações de um trabalho anterior, muitos [opinando] como se [es]tivessem fazendo ciência,

muitos [descrevendo] sem preocupação com a compreensibilidade de seus temas, muitos

[desperdiçando] dinheiro público sem gerarem novas idéias, muitos ainda se [atrevendo] a

estudar tudo, sem aprofundamento em nenhum dos assuntos, e muitos [fazendo] dezenas

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de pesquisas ao mesmo tempo, aproveitando-se da mão de obra de seus orientandos, ou

achando que isto pode determinar qualidade por si só”.62

4.2 O projeto utópico para o reordenamento da enfermagem

Ao estabelecer as perspectivas para uma nova enfermagem, vamos “tocar num

assunto muito constrangedor, [façamos] um exercício de humildade, porque não [nos

colocamos] além destas questões, mas muitas vezes (...) [ somos] empurradas por elas”63.

Não será o temor do seu enfrentamento que deve nos atingir, mas o compromisso em

reproduzir ao menos o legado histórico certamente mais relevante do projeto nightingeliano:

ousar sermos homens e mulheres do nosso tempo que não se submetem ao aqui e agora,

mas que confiam na reconhecida possibilidade do humano em intervir e mudar os rumos da

realidade.

4.2.1 A primeira lição

Integrar a primeira lição - Não ter nenhum medo de estar absolutamente contra a

corrente política do nosso tempo – implica reconhecer que:

ainda que já tenhamos exaustivamente debatido e compreendido as determinações

históricas que levaram à constituição de um corpo tão heterogêneo no conjunto dos

trabalhadores de enfermagem, temos sido mancos em superar a desumanização das

relações de poder entre enfermeiros e demais trabalhadores de enfermagem, que nos

afasta e que consagra as relações de dominação/submissão na chamada ‘equipe de

enfermagem’. É preciso, pois, construir uma trajetória comum em que os trabalhadores

de enfermagem qualificados, os semi-qualificados e os não qualificados, construam,

conjuntamente, um projeto político para a enfermagem, subordinado ao projeto maior de

uma sociedade de tipo novo e ao novo projeto da saúde;

mas não é só isso que tem caracterizado a corrente política da enfermagem hoje, e que

precisa ser superado. Submissos às relações de poder que historicamente se forjaram

sob o modelo médico de atenção à saúde, especialmente os enfermeiros se muniram de

um ‘espírito de corpo, de corporação’, consolidando relações que mais favorecem o

distanciamento e não a composição com os demais trabalhadores na construção do

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projeto comum para a saúde. Esse movimento corporativo consagra a enfermagem

como um fim em si mesma (falácia da autonomia) ao invés de se colocar como um

instrumento, ao lado das demais práticas da saúde, para o aperfeiçoamento das

condições de saúde do coletivo. Recuperando o encaminhamento do Prof. Gastão

Wagner de Sousa Campos, temos que nos aliar aos movimentos que favoreçam a

construção do trabalhador coletivo em saúde para progressivamente romper com o

corporativismo;

ainda, é preciso não ter medo de estar contra a corrente política do nosso tempo, agora

sob a capa da necessidade de assistir/cuidar da demanda de forma imediata - que nos

parece muito mais encobrir um imediatismo do tipo pronto atendimento e pronto. Há

que se recolocar a necessidade de assistir sim, mas não só a demanda e não só o

imediato, temos que deixar de ser ‘os bombeiros da saúde’ e assumirmos, em conjunto

com as outras práticas sociais, um modelo de atenção que tenha, no monitoramento

horizontal do processo saúde doença do coletivo, a possibilidade de transformar e

aperfeiçoar esse processo;

além disso, estar contra a corrente política do nosso tempo, significará revermos e

superarmos os equívocos na busca da especificidade do enfermeiro - hoje consagrada

como sendo ora o cuidar, ora o gerenciar a unidade de enfermagem. Também pela

história, conhecemos as raízes da enfermagem, a divisão do trabalho entre as lady

nurses e nurses. O cuidar é característico da enfermagem - mas não do enfermeiro; o

gerenciar é característico do enfermeiro - não da enfermagem. Ora, se queremos buscar

a especificidade do enfermeiro e dos demais trabalhadores da enfermagem, devemos

buscar tal especificidade, na perspectiva de uma nova forma de produzir serviços de

saúde. Nesse caso, ela se dará, no confronto do objeto com a finalidade do processo de

produção de serviços de saúde: o cuidar deverá ser resituado na perspectiva de sua

integração num trabalho coletivo que transforma o seu objeto - perfis epidemiológicos -

mediado por estratégias de monitoramento das condições de trabalho/ vida e saúde do

coletivo;

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não ter medo de, ao ir contra a corrente de nosso tempo, negar o encaminhamento

contemporâneo de que a enfermagem se constrói sobre um processo de trabalho que

lhe é próprio. A enfermagem, ao compor parcela do trabalho coletivo de saúde e seus

integrantes parcela do trabalhador coletivo de saúde, não tem um processo próprio de

trabalho, tampouco um objeto que lhe é específico. Como as outras práticas sociais, ela

tem responsabilidade de desenvolver sua especificidade nos processos de trabalho

(assistência, gerenciamento, investigação e ensino) do processo de produção, processos

de trabalho estes aos quais as demais práticas sociais também se conectam com suas

especificidades. Esses processos de trabalho, por sua vez, dizem respeito ao processo

de produção de serviços de saúde; são eles que articulam as diferentes práticas

profissionais e é por isso que estas práticas terão o mesmo objeto e a mesma finalidade

e não objetos e finalidades distintas a cada prática profissional. Assim posto, é preciso

que se redefina a parcela de trabalho da enfermagem em cada um dos processos de

trabalho, a saber64:

1) participação da enfermagem no processo de trabalho de assistência à saúde: o

objeto e a finalidade são os mesmos do processo de produção de serviços de saúde -

objeto - perfís epidemiológicos do coletivo (enquanto totalidade, enquanto grupos sociais

homogêneos e enquanto singularidade -indivíduos/famílias); finalidade - aperfeiçoar os

referidos perfís. Os instrumentos de trabalho é que dão a especificidade da

enfermagem, dentre eles o saber e a tecnologia de enfermagem construídos sobre o

modelo clínico e o modelo epidemiológico, mas revisitados de modo a fundamentar o

cuidar do coletivo, dos grupos sociais e dos indivíduos famílias durante seu processo

social e biológico de existência. O trabalho em si se caracteriza principalmente pela

presença constante da enfermagem junto ao objeto, acompanhando (diretamente ou à

distância) o objeto mesmo no cuidar das outras práticas de saúde.

2) participação da enfermagem no processo de trabalho de gerenciamento da

produção da assistência à saúde: de igual forma, são o objeto e a finalidade do

processo de produção de serviços de saúde que vão orientar o recorte do objeto e a

parcela que cabe à enfermagem para atingir tal finalidade. Assim, o objeto do processo

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de trabalho de gerenciamento da produção da assistência - no recorte da enfermagem -

é a dinâmica de como se processa a assistência de enfermagem na sua aderência e

articulação com os perfís epidemiológicos do coletivo (que articula as metodologias de

assistência, e a complementariedade da prática de enfermagem com as demais práticas

sociais) e a finalidade específica é a de compatibilizar essa dinâmica às necessidades de

transformação dos perfís epidemiológicos. Dentre os instrumentos de trabalho, podemos

destacar, entre outros, os modelos e os métodos gerenciais, o processo de educação

continuada; o trabalho em si se dá sob a orientação do Plano Diretor para a Saúde do

Município e pelo plano diretor para a assistência de enfermagem à ele subordinado.

3) participação da enfermagem no processo de trabalho de investigação (de

produção de saber): de igual forma, são o objeto e a finalidade do processo de

produção de serviços de saúde que vão orientar o recorte do objeto e a parcela que cabe

à enfermagem para atingir tal finalidade. Assim, o objeto do processo de trabalho de

investigação - no recorte da enfermagem - diz respeito ao estado da arte que caracteriza

o saber/saber fazer da enfermagem atual para conformação e transformação do

objeto/finalidade do processo de produção de serviços de saúde; sua finalidade é a de

recriar/elevar o estado da arte a patamares que constituam um saber/saber fazer cada

vez mais aderente ao objeto/finalidade do processo de produção de serviços de saúde.

Dentre os instrumentos damos destaque aos referenciais teórico-metodológicos e aos

métodos e técnicas que amparam os projetos de investigação científica; o trabalho em

si se caracteriza pela operacionalização de projetos de investigação, vinculados a

projetos tipo guarda chuva - projetos matrizes, que articulam a produção de saber nos

municípios e nas redes de integração escola-serviço.

4) participação da enfermagem no processo de trabalho de ensino (de qualificação

formal da força de trabalho em saúde): de igual forma, são o objeto e a finalidade do

processo de produção de serviços de saúde que vão orientar o recorte do objeto e a

parcela que cabe à enfermagem para atingir tal finalidade; assim o objeto do processo de

trabalho de investigação - no recorte da enfermagem - é o conhecimento que os

ingressantes nos diferentes níveis da carreira de enfermagem têm acerca do

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objeto/finalidade do processo de produção de serviços de saúde, bem como de seus

meios e instrumentos e do trabalho em si. A finalidade é a de reproduzir o conhecimento

que permita a real qualificação da força de trabalho em enfermagem de modo a

possibilitar a sua inserção nos projetos descentralizados e hierarquizados de saúde;

dentre os instrumentos damos destaque aos currículos e aos métodos pedagógicos e o

meio eleito para desenvolver tal processo de trabalho deve ser o próprio espaço social da

produção de serviços de saúde, além das salas de aula. O trabalho em si se caracteriza

pela aproximação e real parceria das redes de integração ensino-serviço.65

no nível da educação formal, há que se encaminhar um projeto político que articule

escola e serviço numa relação de parceria e não numa troca de interesses; que articule

os três níveis de ensino de enfermagem (básico, médio e superior) e os programas de

requalificação da força de trabalho da enfermagem, resituando as instituições de ensino

no processo de produção de serviços de saúde. São elas, no nosso entender,

instrumentos deste processo e sua finalidade precípua é produzir e reproduzir um saber

para qualificar a força de trabalho que atenda às demandas da população em termos de

suas necessidades e problemas de saúde. E se a questão contemporânea na relação

Estado x Universidade é a do Estado avaliador, é necessário que façamos uma releitura

de como deve ser encaminhada a questão dos mecanismos de avaliação, em termos de

qualidade e rendimento. “Não se trata aqui de defender controles burocráticos sobre a

vida acadêmica. Pelo contrário, devem ser promovidas formas voluntárias de auto-

avaliação por parte das próprias instituições, desde que sejam acompanhadas por

procedimentos de avaliação externa, de modo que (...) possa tornar-se publicamente

responsável diante da sociedade que o apoia, e que aprenda continuamente com suas

próprias experiências, êxitos e fracassos. (...) criar-se (...) uma maior capacidade de

credenciamento público das novas instituições que se formem e dos novos programas

que se desejem estabelecer, única forma de assegurar que os estabelecimentos sejam

dignos da fé pública que neles se deposita”.66 Ainda, há necessidade de que as redes de

integração ensino-serviço sejam o solo que assenta a formulação de linhas de pesquisa

que amarrem o projeto de aperfeiçoamento dos conteúdos e da prática de enfermagem.

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4.2.2 A segunda lição

Os encaminhamentos da enfermagem contemporânea - ao menos da enfermagem dos

enfermeiros que é a que mais de perto vivemos - vêm guardando forte aderência com o

ideário do Movimento da Reforma Sanitária e de seus desdobramentos na academia e nos

serviços. Em torno deles, a enfermagem vem se debatendo na construção de seu projeto

político e de sua inserção nas instituições. Dessa forma, na perspectiva de reconstruir o

saber/saber fazer da enfermagem, orientados pela segunda lição do Prof. Perry Anderson -

não transigir em idéias e nem aceitar nenhuma diluição de princípios - é alinhar-se

aos demais trabalhadores da saúde numa frente que insista na manutenção das

mesmas idéias e princípios de que tratamos quando discutimos a situação e

perspectivas da produção de serviços de saúde no Brasil.

4.2.3 A terceira lição

Convictos de que seremos capazes de, coletivamente, romper com a desumanização

de nossas relações, com o corporativismo, com o imediatismo e com os equívocos presentes

nos conteúdos de nossas práticas assistencial e educacional, como dar conta da terceira

lição - Não aceitar nenhuma instituição estabelecida como imutável?

1) Integrá-la, implica que, imbuídos da compreensão da processualidade do

desenvolvimento social e das práticas sociais, olhemos agora não como imutáveis, mas

muito mais passíveis de transformação, os processos e produtos das nossas instituições

de enfermagem. Assim, a Lei do Exercício, o Código de Ética, os Currículos Mínimos,

não devem ser amarras que cristalizem nossas práticas e relações sociais; as

determinações expressas nestes produtos, por sua vez, devem refletir os

encaminhamentos do movimento já construído na Enfermagem e se ajustar às

características do nível local e regional. Não aguardemos o “Messias”, ou a “receita que,

de cima para baixo”, atropela as potencialidades e as demandas que os níveis local e

regional nos apresentam.

2) Integrá-la implica não aceitar o uso que, através da enfermagem, vem sendo feito da

educação para a saúde, como potencialmente transformadora da realidade de saúde,

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mas que na verdade percorreu um trajeto em que, sob uma ótica, veicula um receituário

universal para se adquirir saúde; sob outra ótica transfere um saber técnico, a título de

compartilha, mas que de fato responsabiliza o usuário dos serviços pelo auto-cuidado e,

simultaneamente, desresponsabiliza o serviço de saúde pela saúde de quem é educado.

Ao não compactuarmos com essas formas de educação para a saúde, recuperamos os

ensinamentos do Prof. Jaime Breilh que encaminha à releitura da educação popular sob

a ótica da “instrumentalização da inteligência popular” que reconheça os determinantes

de seus processos saúde-doença, utilizando este conhecimento como base estruturante

de suas lutas e do uso do espaço de exercício do controle social.

3) Integrá-la implica que nos desvistamos da capa da neutralidade para recompor o nosso

ideário, fundamentando o novo naquilo que até hoje soubemos fazer: só que o fizemos a

serviço das instituições. A perspectiva é redirecionar o compromisso social da

enfermagem – com o coletivo - calcado na transformação dos perfís epidemiológicos.

Retomando e parafraseando Gramsci, é preciso que ousemos percorrer o momento

“catártico”, em que, passando do momento meramente egoístico-passional, construamos

o momento ético-político, afirmando nossa liberdade em face das estruturas sociais,

revelando que - embora condicionados pelas estruturas e, em particular, pelas estruturas

econômicas - seremos capazes, ao mesmo tempo, de utilizar o conhecimento dessas

estruturas como fundamento para uma práxis autônoma, para a criação de novas

estruturas, ou, como ele diz, para ‘gerar novas iniciativas’.

4) Finalmente, integrar a terceira lição, implica em que tenhamos a coragem de

desmistificar - recolocando na sua dimensão real - tanto a “consulta de enfermagem”

quanto os “métodos (sistemas) de assistência de enfermagem”. A consulta de

enfermagem, analisada “com base em alguns parâmetros de eficiência, permite-nos

concluir que, sua utilização enquanto instrumento da assistência de enfermagem, revela

um baixo desempenho e está longe da possibilidade de causar impacto na saúde da

população, entendido este como mudanças no quadro (...) epidemiológico, produzida

pelos serviços de saúde”. Assim, “não se trata de ‘ser ou não ser’ a Consulta de

Enfermagem. Trata-se de considerá-la não numa perspectiva corporativa dos interesses

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específicos da profissão, mas como uma das possíveis formas de prestar assistência de

enfermagem, necessária à integralidade da atenção à saúde”67. Com relação aos

métodos de assistência de enfermagem, eles têm sido utilizados mais como “um fim em

si mesmo”, haja vista o apelo que a eles se faz como eixo da construção da

cientificidade, da especificidade e da autonomia da “enfermagem do enfermeiro”. Da

mesma forma, não se trata de ‘ser ou não ser’ dos métodos de assistência de

enfermagem. Trata-se sim de perceber que o seu desencadeamento guarda identidade

com o desencadeamento de qualquer outro método de intervenção; que o espaço

primeiro que ocupa é de intermediador na transformação do objeto, através do

saber/tecnologia próprios da enfermagem - este sim que garante a especificidade da

prática profissional, pois que o método é a forma, e o saber/saber fazer, o conteúdo que

aproxima a enfermagem do objeto.

5. Considerações finais

Projetar uma nova enfermagem requer que nos engajemos na construção da

solidariedade social, conscientes de que, se o projeto da modernidade nos instrumentalizou

do ponto de vista científico e tecnológico para aperfeiçoar o humano, o projeto da pós-

modernidade nos colocou diante da produção da exclusão desses mesmos recursos para a

grande maioria daqueles que sobrevivem em sociedades subordinadas como a nossa.

Projetar uma nova enfermagem implica recuperar a nossa indignação com a destruição

humana; implica fortalecer em cada um de nós, individualmente, e no conjunto de todos os

membros da sociedade, a convicção de que seremos capazes de construir o novo e re-

instaurar o direito à saúde como direito social e público.

Implica participar da reconstrução do Estado, centrando nossos esforços na busca de

um movimento que priorize o nosso envolvimento no reerguimento dos movimentos sociais e

na formulação de políticas sociais que desmistifiquem a compreensão de que a construção

da cidadania e a garantia dos direitos sociais podem ser alcançadas com a “expansão dos

serviços assistenciais” , resituando-as no “jogo histórico das relações e contradições entre

capital e trabalho, tal como se manifesta na particularidade da formação social brasileira (...),

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apreendendo, na plenitude de suas dimensões históricas, o próprio fenômeno que as

engendra”.

Conscientes de que, no ideário neoliberal, a economia e a política caminham em rumos

separados - uma no espaço privado e a outra no espaço público - implica reconhecer que

não se reorientam o projeto do Estado e as políticas sociais, nossos conhecimentos e

práticas, sem tocar o dedo nas feridas que já não conseguimos mais ocultar e que permeiam

as relações entre capital e trabalho e as relações de poder que delas decorrem, sob pena de

nos debruçarmos sobre uma “falsa questão”.68 Implica reavivar e recuperar o movimento

social que engendrou o novo projeto para a saúde, implica reavivar as potencialidades da

nossa participação no processo histórico que instituiu e formalizou a produção de serviços de

saúde, reconhecendo que “quem desiste, degrada-se. Quem persiste, quem insiste salva-se

da ignomínia ainda que nem sempre do sofrimento, capacitando-se, contudo, para

sobreviver, depois, com um mínimo de saúde mental e auto-estima”.69

Aos nossos alunos, nossa palavra final70:

1. Ao graduar-se em Enfermagem, selem definitivamente um compromisso com a área da

saúde: imbuam-se de que estão integrando uma das categorias profissionais que, sem

espírito corporativo, deverá contribuir decisivamente para a consolidação do Sistema

Único de Saúde nos próximos 30 anos em que pertencerão com densidade ao mundo

do trabalho. Não pensem que não serão tentados a fazer outra coisa: por isso tenham

bem claro diante de vocês a convicção de que a mudança é possível. A partir de

relações solidárias e consistentes com os demais trabalhadores da saúde e da

enfermagem, empenhem-se em participar dos projetos de planificação das ações de

saúde, recusando a atividade burocrática que tanto nos tem seduzido, mas superando

também a nossa histórica e dominante participação quase que focalizada na execução

das ações de saúde.

2. Promovam uma reviravolta na enfermagem, reorientando a parcela que nós enfermeiros,

devemos cumprir quando cuidamos em enfermagem. Ao lado dos tradicionais trabalhos

que a enfermagem realiza para dar conta do cuidar, disponham-se a participar

ativamente da gerência do controle de saúde das populações, pois a realidade tem nos

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ensinado, mais do que os livros, que este espaço vem sendo progressivamente ocupado

pelos enfermeiros.

3. Há muitos em quem se inspirar: por motivos inequívocos, recomendamos que inspirem-

se na resistência, na coragem e na obstinação de Florence Nightingale, que, há um

século e meio, não relutou em ser uma mulher do seu tempo, esgotando os limites de

suas possibilidades para consolidar o hospital como instituição de cura e reabilitação

daqueles que representavam a força de trabalho e o trabalho de enfermagem como eixo

deste processo.

4. Sejam homens e mulheres de seu tempo, nutram-se corajosa e obstinadamente pelo

projeto da resistência, mas de alegria e de esperança em restituir a nossa sociedade a

salvaguarda do investimento que ela depositou nas mãos do Estado para garantir seus

direitos sociais: coloquem os seus conhecimentos e práticas em movimento,

compreendendo que estarão intervindo no mundo, querendo bem à sociedade e, por

isso mesmo, deverão exigir de vocês empenho em aliar à sua competência técnico-

científica, a competência ético-política –, não a ética do mercado e das instituições que

por ele são comandadas – mas a ética do humano e do solidário.71 Mas, na sua

reviravolta na enfermagem, superem Nightingale: hoje, ela certamente faria diferente,

pois estaria diante de outras provocações.

5. Empenhem-se em reconstruir as relações no interior do trabalho da enfermagem e as

relações da enfermagem com os demais trabalhos da saúde, não tendo nenhum pudor

em reconhecer o nosso inacabamento, as nossas limitações e os nossos equívocos.

6. Cultivem a disponibilidade para o diálogo, confiem no bom senso, o bom senso do

humano e não do mercado. Realizem essa tarefa, como nos ensinou o Prof. Paulo

Freire, cultivando-a com a humildade e a tolerância, ensinando e aprendendo com os

companheiros de trabalho o respeito aos outros, a coerência, a capacidade de

aprender e viver com o diferente, não permitindo que o mal-estar com o outro os façam

acusá-lo do que não fez42.

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7. Busquem romper com as relações de poder e dominação que tanto têm caracterizado a

nossa prática, construindo uma trajetória comum em que todos os trabalhadores de

enfermagem reordenem conjuntamente um projeto político para a enfermagem,

subordinado ao novo projeto da saúde.

8. Aliem-se aos movimentos que têm favorecido a construção do trabalhador coletivo em

saúde e não tenham medo em romper com a falsa idéia de que somos trabalhadores

sobre-humanos e únicos para resolver os problemas de saúde.

9. Sejam críticos e rigorosos, cultivem a autoridade de quem sabe reconhecer o que sabe

e o que não sabe. Inspirem-se nos bons e nos maus exemplos que cada um de nós,

professores, certamente deixou transparecer ao longo do convívio na Escola:

aperfeiçoem o que foi bom, superem o que foi ruim.

10. Finalmente, não se deixem paralisar pelas observações tão disseminadas no mundo

contemporâneo de que tudo está como está e não há como mudar, de que quem

propõe a mudança é jurássico e de que a ética e a solidariedade são coisas de um

passado a ser congelado nos museus. Olhem para trás e para a frente, revejam a

história e aprendam com aqueles que conduzem os grandes e pequenos projetos de

mudança da realidade que a mudança é a obstinação daqueles que se permitem ser

livres, mas comprometidos com seus ideais e seus projetos éticos. Aprendam que o

tempo da mudança é um tempo longo e contínuo! Mais do que isso, é um tempo em

processo e um processo que, se de um lado, supera o que foi ruim, deve

inquestionavelmente resguardar o que foi bom. Como conclui o Prof. Emir Sader em seu

livro O ANJO TORTO72: participem da reinvenção concreta de uma nova sociedade, de

um novo projeto para a saúde e para a enfermagem, baseada na justiça, na

solidariedade, na realização prática dos direitos de cidadania sem qualquer tipo de

exclusão. Não se furtem a lutar e concretizar um mundo de educação, de cultura, de

autonomia individual, mas de realização social. Realizem, enfim, o sonho de quem

acalenta os desejos de felicidade perseguidos pelos homens e mulheres ao longo da

história.

NOTAS BIBLIOGRÁFICAS

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1 É assim que a Profa. Maria Conceição Tavares tão bem qualifica o movimento de globalização do

capitalismo que traduz, de fato, "a iniciativa de uma potência dominante, os EUA, que se propõem a

exercer um papel hegemônico em relação aos seus parceiros e competidores (...) [deixando] um rastro

de desorganização sem precedentes na vida econômica nacional (...) [resultando em] prejuízos

consideráveis aos trabalhadores (...) [contribuindo] (...) para um maior desequilíbrio patrimonial líquido

das instituições públicas de crédito e da própria União, que são os grandes perdedores deste jogo

vergonhoso. (...) Como no século XII, os nossos modernos usurários mais uma vez ficam com a bolsa

e, a custa da sociedade, alongam sua vida, com a vantagem de sequer precisarem passar pelo

Purgatório. Este se reserva aos trabalhadores, a quem correspondem os sacrifícios e as incertezas de

um futuro obscuro, dominado pelo desemprego, a supressão de direitos sociais, a precarização dos

serviços básicos e a degradação salarial (TAVARES, M.C. Destruição não criadora: memórias de um

mandato popular contra a recessão, o desemprego e a globalização subordinada. Rio de Janeiro,

Record, 1999, p. 7, 23, 163, 190)".

2 Imprescindível estudar as primorosas análises compiladas no texto de TAVARES, M.C.; MELIN, L.E.

Mitos globais e fatos regionais. In: FIORI, J. L.; LOURENÇO, M. S. de; NORONHA, J. C. de

Globalização: o fato e o mito. Rio de Janeiro, EDUERJ, 1998 e, indiscutivelmente a crítica do Prof.

Perry Anderson, professor da Universidade da Califórnia, Los Angeles, ANDERSON, P. Balanço do

neoliberalismo. In: SADER, E.S.; GENTILLI, P. (orgs.) Pós-neoliberalismo: as políticas sociais e o

estado democrático. São Paulo, Paz e Terra, 1995, cap. I.. Além destes, vários outros têm tratado com

clareza e competência do vendaval neoliberal. Entre eles, citamos: ARRIGHI, G. O longo século XX.

São Paulo, UNESP, 1996; BIONDI, A. O Brasil privatizado: um balanço do desmonte do Estado. 3a

reimpressão, São Paulo, Fundação Perseu Abramo, 1999; BOURDIEU, P. Contrafogos: táticas para

enfrentar a invasão neoliberal. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1998; FREITAS, M. C. (org.) A

reinvenção do futuro: trabalho, educação, política na globalização do capitalismo. São Paulo,

Cortez, 1996; LESBAUPIN, I. (org.) O desmonte da nação: balanço do governo FHC. Petrópolis,

Vozes, 1999; LIMA, L. C. Começar do novo: a moderna escravidão capitalista e a “velha” libertação

do trabalho. São Paulo, GET, 1997; MATTOSO, J. O Brasil desempregado: como foram destruídos

mais de 3 milhões de empregos nos anos 90. São Paulo, Fundação Perseu Abramo, 1999;

MÉSZÁROS, I. Produção destrutiva e estado capitalista. 2a.ed., São Paulo, Ensaio, 1996;

OLIVEIRA, de; PAOLI, M. C.(orgs.) Os sentidos da democracia: políticas de dissenso e

hegemoniania global. Petrópolis, Vozes; Brasília, NEDIC, 1999; POCHMANN, M. O trabalho sob

fogo cruzado: exclusão, desemprego e precarização no final do século. São Paulo, Contexto, 1999;

SADER, E. (org.) O Brasil do real. Rio de Janeiro. EDUERJ, 1996; SADER, E.S.; GENTILLI, P. (orgs.)

Pós-neoliberalismo II: que Estado para que democracia. Petrópolis, Vozes, 1999; SANTOS, W. G.

dos Décadas de espanto e uma apologia democrática. Rio de Janeiro, Rocco, 1998; SOARES,

L.T.R. Ajuste neoliberal e desajuste social na América Latina. Rio de Janeiro, UFRJ, 1999;

TAVARES, M. da C.; FIORI, J. M. L. Desajuste global: e modernização conservadora. Rio de

Janeiro, Paz e Terra, 1993.

3 Como veremos a seguir estão delineadas aqui as recomendações do Prof. Perry Anderson

(ANDERSON, P. (1995), op. cit.) para enfrentar o receituário neoliberal, lições estas que não somente

nós, mas também o Prof. Atilo Borón tomou o cuidado de retomar quando discutiu os rumos da

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QUEIROZ, V.M.; SALUM, M.J.L. Ensaios para uma nova abordagem em Enfermagem em Saúde Coletiva:

resistindo às armadilhas da globalização subordinada e construindo a globalização da solidariedade social em

direção à sociedade do tipo novo. FASM em Revista. n. 1, vol. especial, p.11-31, 2001.

34

sociedade após o dilúvio neoliberal. (BORON, A. A. Os “novos leviatãs” e a pólis democrática:

neoliberalismo, decomposição estatal e decadência da democracia na América Latina. In: SADER,

E.S.; GENTILI, P. (orgs.) (1999), cap. 1

4 A esse respeito, remetemos à análise do Prof. Francisco de Oliveira, Prof. Titular de Sociologia do

Departamento de Sociologia da FFLCH da USP, divulgada inicialmente na revista Novos Estudos

Cebrap em 1988, e que compõe o elenco de capítulos do livro A reinvenção do futuro, publicado, em

1996, pela Cortez Editora. (OLIVEIRA, F. de Globalização e antivalor: uma antiintrodução ao valor. In:

FREITAS, M.C. de (org.) (1996), op. cit., cap. 2

5 A esse respeito, consultar o texto de Ignacio Ramonet, Diretor de Le Monde Diplomatique, e os

textos-debate que a ele se seguem em RAMONET, I. O pensamento único e os regimes globalitários.

In: FIORI, J. L.; LOURENÇO, M. S. de; NORONHA, J. C. de Globalização: o fato e o mito. Rio de

Janeiro, EDUERJ, 1998, p. 57.

6 Cf. TAVARES; MELIN, op. cit., 1998.

7 Insistimos nessa orientação analítica, especialmente alentadas por MENEZES (1993). Retomando a

análise das políticas de assistência pública, em sua dissertação de mestrado em Serviço Social da

UERJ sob a orientação da Profa. Marilda Villela Iamamoto, Maria Thereza C. G. de Menezes, toca na

produção dos intelectuais progressistas, entre eles José Carlos S. de Braga e Sérgio G. de Paula,

Sonia Miriam Draibe, Vicente de Paula Faleiros, Aldaiza Sposati e Sonia Maria Fleury Teixeira,

destacando que “a linha teórica dos estudos [por eles realizados] exclui as políticas sociais de

assistência do jogo histórico das relações e contradições entre capital e trabalho (...) [e por isso] não

conseguem apreender o próprio fenômeno que as engendra (...) [debruçando-se] sobre uma ‘falsa

questão’ (Cf. MENEZES, M.T.C.G. Em busca da teoria: políticas de assistência pública. São Paulo,

Cortez, 1993, p. 129).

8 Cf. OLIVEIRA , F. (1996) ,op. cit., p. 101.

9 Cf. ANDERSON, P. Além do neoliberalismo. In: SADER, E. S.; GENTILI, P. (orgs.) (1995), op. cit.,

cap. V, p. 197-8.

10 Esta é a acepção que fundamenta a análise do Prof. José Carlos Valenzuela Feijóo, professor da

Universidade Autônoma do México, ao analisar o Estado neoliberal no México. (FEIJÓO, J .C.V. O

Estado neoliberal e o caso mexicano. In: LAURELL, A.C. (org.) Estado e políticas sociais no

neoliberalismo. São Paulo, Cortez, 1995.

11 Cf. ANDERSON, P. (1995), op. cit., e TAVARES, M.C.; MELIN, L.E. (1998), op. cit., p. 51.

12 Cf. ANDERSON, P. (1995), op. cit. O recente livro publicado pela Cortez de autoria do Prof. Carlos

Nelson Coutinho, professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, constitui leitura

obrigatória também para compreender a incompatibilidade entre democracia e as formações

capitalistas liberais (COUTINHO, C.N. Contra a corrente: ensaios sobre democracia e socialismo.

São Paulo, Cortez, 2000).

13 É assim que o Prof. Francisco de Oliveira bem designa a cruzada da massa de capitais nas

operações financeiras que caracterizam o padrão de reprodução do capital no mundo contemporâneo.

Cf. OLIVEIRA, F. (1996), op. cit., p. 81.

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resistindo às armadilhas da globalização subordinada e construindo a globalização da solidariedade social em

direção à sociedade do tipo novo. FASM em Revista. n. 1, vol. especial, p.11-31, 2001.

35

14

São estes os três pilares fundamentais do neoliberalismo indicados pelo Prof. Luis Fernandes da

Universidade Federal Fluminense quando comenta a intervenção do Prof. Perry Anderson.

(FERNANDES, L. Neoliberalismo e reestruturação capitalista. In: SADER, E. S.; GENTILI, P. (orgs.)

(1995), op. cit., cap. II.

15 Cf. ANDERSON, P., (1995), op. cit., p. 11.

16 Imprescindível o estudo do texto de BIONDI, A. (1999), op. cit.

17 “(...) mínimo para os de baixo e máximo para os de cima.” (SADER, E. Poder, estado e hegemonia.

In: SADER, E.S. (org.) (1996), op. cit., p.13.

18 É assim que o Prof. Christovan Buarque, ex-reitor da UNB, sociólogo, ex-governador do Distrito

Federal, traduz sua inquietação com o processo de depuração social que o neoliberalismo engendrou

ao promover o processo de dominação levado adiante pelos EUA, desde a década de 70 (BUARQUE,

B. A revolução nas prioridades: da modernidade técnica à modernidade ética. São Paulo, Paz e

Terra, 1994).

19 Além dos autores já mencionados, remetemos ao estudo do Prof. Ricardo Antunes, professor da

Universidade Estadual de Campinas, ANTUNES, R. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as

metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. São Paulo, Cortez, 1995; ANTUNES, R. Os

sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo, Boitempo,

1999;

20 Indiscutivelmente, o Prof. Gaudêncio Frigotto, professor do Programa de Educação da Universidade

Federal Fluminense, é referência obrigatória para aqueles que se dedicam ao ensino em todos os

níveis. O texto de onde extraímos esta fala, tese para obtenção do título de Prof. Titular, é um marco

na análise das questões educacionais contemporâneas. (FRIGOTTO, G. Educação e a crise do

capitalismo real. São Paulo, Cortez, 1995, p.55).

21 Esta é advertência do Prof. José Paulo Netto, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro

ao comentar a intervenção do prof. Perry Anderson. (NETTO, J.P. Repensando o balanço do

neoliberalismo. In: SADER, E. S. GENTILI, P. (orgs.) (1995), cap. I, p.29).

22 Esta é a análise na expressão da Profa. Asa Cristina Laurell, professora-pesquisadora do Mestrado

em Medicina Social da Universidade Autônoma do México, remetendo o lei tor às fontes bibliográficas

que tomou como base. (LAURELL, A. C. Avançando em direção ao passado: a política social do

neoliberalismo. In: LAURELL, A.C. (org.) (1995), p. 163).

23 Cf. LAURELL, A. C. (1995), op. cit., p. 163.

24 Extraído da tese de doutoramento da Profa. Laura Tavares Ribeiro Soares, orientada pelo Prof.

Wilson Cano, que parte do entendimento de que “políticas deliberadas de ajustamento fazem com que

haja um determinado nível de deterioração dos serviços públicos sociais” (SOARES, L.T.R. Ajuste

neoliberal e desajuste social na América Latina. Tese (doutorado), Campinas, 1995. Universidade

Estadual de Campinas, p.410-11). O trabalho já está publicado em livro, SOARES, L. T. R. Ajuste

neoliberal e desajuste social na América Latina. UFRJ, Rio de Janeiro, 1999.

25Extraído do verbete Utopia por MAFFEY, A. In: BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G.

Dicionário de Política, Brasília, DF, Editora da Universidade de Brasília, 1991, p.1284-90.

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resistindo às armadilhas da globalização subordinada e construindo a globalização da solidariedade social em

direção à sociedade do tipo novo. FASM em Revista. n. 1, vol. especial, p.11-31, 2001.

36

26

Trecho extraído da análise do Prof. Carlos Nelson Coutinho, referência impar para aqueles, que

trabalhando sob a perspectiva histórica, querem compreender a complexidade de que se reveste a

constituição do Estado (COUTINHO, C.N. Marxismo e política: a dualidade dos poderes e outros

ensaios. São Paulo, Cortez, 1994, p. 106)

27 Extraído do texto que serviu de base para palestra do Prof. Emir S. Sader, professor do

Departamento de Sociologia da FFLCH da USP e Coordenador do Programa de Pós-Graduação em

Políticas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, proferida no Congresso do Conselho Nacional

do Serviço Social, Salvador em julho de 1995, e que fundamentou a discussão de uma das temáticas

componentes da disciplina Temas Avançados em Saúde Coletiva do Programa de Pós-Graduação em

Enfermagem - Área de Concentração em Enfermagem em saúde Coletiva, 1996. - SADER, E. S.

Neoliberalismo e políticas sociais no Brasil. Salvador, Congresso do Conselho Nacional do Serviço

Social, 1995, p. 1 (mimeografado).

28 Extraído do texto do Prof. Cristovam Buarque, BUARQUE, C. A cortina de ouro: os sustos do final

do século e um sonho para o próximo. São Paulo, Paz e Terra, 1995, p.32.

29 Cf. SADER, E. S.; GENTILI, P. (orgs.), 1995, op. cit., p.2.

30 Extraído do artigo da Profa. Iray Carone, professora do Instituto de Psicologia da USP, que relata o

produto de pesquisa realizada sob a orientação da filósofa Agnes Heller. (CARONE, I. Necessidade e

individuação. Trans/Form/Ação, São Paulo, 15: 85-111, 1992, p. 94 e 96)

31 As considerações aqui expressas estão desenvolvidas no trabalho do Prof. Ricardo Antunes, que,

partindo da polêmica contemporânea que advoga a extinção do mundo do trabalho, recompõe nas

metamorfoses do projeto neoliberal, a centralidade do mundo do trabalho. (ANTUNES, R. (1995) , op.

cit., p.123-5)

32 Remetemos o leitor à aguda análise elaborada pelo Prof. Arturo Campaña sobre a perspectiva

contemporânea do conceito de qualidade de vida e que nos auxilia a reconhecer que a busca da

saúde como qualidade de vida está impregnada do mesmo pragmatismo que valoriza o consumo de

bens e serviços como estruturantes do atendimento das necessidades humanas e não o

desenvolvimento pleno e solidário das potencialidades humanas na esfera da produção e do

consumo. O professor, ao lado do Prof. Jaime Breilh, é um dos pesquisadores do Centro de Estudios

e Asesoria em Salud (CEAS) do Equador (CAMPAÑA, A. Em busca da definição de pautas atuais

para o delineamento de estudos sobre condições de vida e saúde. In: BARATA, R. B. (org.)

Condições de vida e situação em saúde. Rio de Janeiro, ABRASCO, 1997, cap. 5).

33 " (...)é importante ressaltar que a ordem das paixões é dirigida pela faculdade de desejar. A paixão

eclode quando a adesão a um desejo se intensifica a ponto de mobilizar todas as forças da vontade e

da razão para a realização do objeto do desejo" LEVY, N. Desejo... o lugar da liberdade: um ensaio

ético-prático. São Paulo, Brasil Debates Editora, 1991)

34 No entendimento de que o processo de mudança pode sempre começar “aqui e agora”, o Prof.

Gastão Wagner de Sousa Campos, encaminha com extrema clareza as mudanças na saúde, tendo

como referência a crítica acirrada ao projeto neoliberal. (Cf. CAMPOS, G. W. S. Considerações sobre

a arte e a ciência da mudança: revolução das coisas e reformas das pessoas. O caso da saúde. In:

CECÍLIO, L.C.O. (org.) Inventando a mudança na saúde. São Paulo, Hucitec, 1994.)

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37

35

Cf. COUTINHO, C.N. (2000), op. cit., p. 29.

36 Julgamos de todo necessário percorrer a história de Enrico e de seus pais traduzidas na análise

comovente e inquietante do Prof. Richard Sennet (SENNET, R. A corrosão do caráter:

conseqüências pessoais do trabalho no novo capitalismo. Rio de Janeiro, Record, 1999).

37 Resistente e convictamente humano, o Prof. Otávio Ianni nos auxilia a desmistificar o projeto da

globalização do capital, abrindo nossos olhos para o mais dramático desafio do nosso tempo.

38 Cf. ANTUNES, A., op. cit. (1995) e POCHMAN, M., op. cit. (1999).

39 A esse respeito, remetemos aos comentários do Prof. Francisco de Oliveira expressos no texto de

SADER, E. S.; GENTILI, P. (orgs.), op. cit. (1995).

40 Estas são as considerações sobre a concepção de Poulantzas sobre o Estado, concepção esta

inspirada em Gramsci na análise do Prof. Carlos Nelson Coutinho (Cf. COUTINHO, C. N., (1994), op.

cit., p. 66-8.)

41 Cf. COUTINHO, C.N. (2000), op. cit., p. 65.

42 Cf. COUTINHO, C.N. (2000), op. cit., p. 51.

43 Cf. COUTINHO, C.N. (2000), op. cit., p. 25.

44ANTUNES, R, (1995), op. cit. p. 68-70.

45 FRIGOTTO, G. (1995), op. cit., p.203.

46 Destaque dado pela Profa. Marilda Villela Iamamoto ao apresentar o texto de MENEZES, M.T.C.G.

(1993), op. cit. p. 10.

47 Cf. LAURELL, A.C., op. cit., p. 170-1.

48Cf. LAURELL, A.C., op. cit., p.172-3.

49Esta é uma consideração fundamental de um grupo de pesquisadores da Escola Nacional de Saúde

Pública/FIOCRUZ (GIOVANELLA, L.; DRUMOND, J.; SKABA, M. M.F.; OLIVEIRA, R. G.; SÁ, V.M.

Eqüidade em saúde no Brasil. Saúde em Debate, 49/50: 13-22, dez/95/mar/96.)

50 Extraído do artigo dos Profs. Carmem Fontes Teixeira e Jairnilson Silva Paim, professores do

Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, em que consideram um dos grandes

desafios para a Reforma Sanitária: a constituição de sujeitos sociais capazes de viabilizar o SUS.

(TEIXEIRA, C. F.; PAIM, J. S. Políticas de formação de recursos humanos em saúde: conjuntura atual

e perspectivas. Divulgação em Saúde para Debate, 12: 19-23, 1996. p. 20-21.)

51 Os curtos trechos aqui reproduzidos extraídos do texto do Prof. Paulo Elias, professor do

Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP, são parcelas da síntese de

uma análise criteriosa sobre a produção de serviços de saúde no Brasil. (ELIAS, P. E. Estrutura e

organização da atenção à saúde no Brasil. In: COHN, A.; ELIAS, P. E. Saúde no Brasil: políticas e

organização de serviços. São Paulo, Cortez, 1996, p.76 e 92.)

52 A esse respeito, consultar o texto recente do Prof. Jaime Breilh (BREILH, J. Reforma: democracia

profunda, no retrocesso neoliberal. In: CEAS Reforma en salud: lo privado o lo solidario. Ecuador, Ed.

CEAS, 1997, cap. 4, p. 70).

53 A base teórica da compreensão da determinação social do processo saúde-doença está

extensivamente discutida nos primeiros trabalhos da Profa. Asa Cristina Laurell (citamos

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direção à sociedade do tipo novo. FASM em Revista. n. 1, vol. especial, p.11-31, 2001.

38

exemplarmente o texto em que publicou ao lado de seu orientador em que apresenta os produtos de

sua Tese de Doutorado - LAURELL, A.C.; NORIEGA, M. Processo de produção e saúde: trabalho e

desgaste operário. São Paulo, Hucitec, 1989 - e na contínua produção do Prof. Jaime Breilh,

exemplarmente citando BREILH, J. Nuevos conceptos y técnicas de investigación: guía pedagógica

para un taller de metodología. Quito, CEAS, 1994. O capítulo do saudoso Prof. Ricardo Lafetá Novaes

- professor da Faculdade de Medicina da USP - merece atenção, pois introduz o debate acerca da

progressiva integração do social à compreensão da saúde-doença - NOVAES, R.L. Do biológico e do

social: um pequeno balanço. In: FLEURY, S. (org.) Saúde e democracia: a luta do CEBES. São

Paulo, Lemos, 1997, parte IV, cap.1.

54 A esse respeito remetemos o leitor ao trabalho de CAMPOS, G.W.S, (1994) op. cit. p. 45.

55 Esta compreensão foi também encaminhada pelo Prof. Eugênio Vilaça Mendes, da Escola de

Saúde de Minas Gerais, quando discutiu a operacionalização da Vigilância à Saúde no

desenvolvimento da Disciplina Temas Avançados em Saúde Coletiva do Programa de Pós-Graduação

em Enfermagem - Área de Concentração em Enfermagem em saúde Coletiva, 1996.

56 Além dos trabalhos clássicos de Laurell e Breilh, consultar também o texto que reproduz a tese de

doutorado do Prof. Luis Augusto Facchini, da Universidade Federal de Pelotas, sob orientação do Prof.

Cesar Victora (FACCHINI, L.A. Trabalho materno e ganho de peso infantil. Pelotas, UFPel/Editora e

gráfica, 1995 )

57 SCHRAIBER, L.B.; MENDES-GONÇALVES, R.B. Necessidades de saúde e atenção primária. In:

SCHRAIBER, L.B.; NEMES, M.I.B.; MENDES-GONÇALVES, R.B. Saúde do adulto: programas e

ações na Unidade Básica. São Paulo, Hucitec, 1996, cap. 1, p. 30.

58Cf. CAMPOS, G. W. S. (1994), op. cit, p.34.

59 Adaptado de QUEIROZ, V.M.; SALUM, M.J.L. Reconstruindo a intervenção de enfermagem em

saúde coletiva face a vigilância à saúde. Trabalho apresentado ao 48º Congresso Brasileiro de

Enfermagem. São Paulo, 1996.

60 A análise e os encaminhamentos aqui expressos se amparam numa ampla gama de textos de

enfermagem e na base empírica que reorientou a formulação do arcabouço teórico-metodológico por

nós construído, no trabalho com alunos de graduação, pós-graduação, enfermeiros e trabalhadores da

saúde. A produção em enfermagem, sob os pressupostos do materialismo histórico e dialético, da

década de 80 é referência fundamental (são exemplares os trabalhos de: GERMANO, R. Educação e

ideologia da enfermagem no Brasil, 2.ed., São Paulo, Cortez, 1985, ALMEIDA, M.C.P.; ROCHA,

J.S.Y. O saber de enfermagem e sua dimensão prática. São Paulo, Cortez, 1986, MELLO, C. M. M.

de Divisão social do trabalho e enfermagem. São Paulo, Cortez, 1986, REZENDE, A. L.M. Saúde:

dialética do pensar e do fazer. São Paulo, Cortez, 1986, ROCHA, S.M.M. Puericultura e enfermagem.

São Paulo, Cortez, 1987, NAKAMAE, D. D. Bases para o encaminhamento do ensino de

enfermagem. São Paulo, Cortez, 1987, CASTELLANOS, B.E.P. O trabalho do enfermeiro: a procura e

o encontro de um caminho para o seu estudo - da abordagem mecânico-funcionalista à pesquisa

emancipatória. São Paulo, 1987. Tese (Doutorado) - Escola de Enfermagem da USP, PIRES, D.

Hegemonia médica na saúde e a enfermagem. São Paulo, Cortez, 1989, SILVA, G.B. Enfermagem

profissional: análise crítica. São Paulo, 2.ed., Cortez, 1989, de fato produzida como tese em 1984).

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resistindo às armadilhas da globalização subordinada e construindo a globalização da solidariedade social em

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39

Damos destaque também aos trabalhos que subsidiaram a discussão dos Temas Oficiais do 41º

Congresso Brasileiro de Enfermagem em 1989 e aos Documentos (três) da Comissão Permanente de

Serviço de Enfermagem da Associação Brasileira de Enfermagem, Brasília, 1991 e 1992.

61 A produção exaustiva do Prof. Ricardo Bruno, marco na análise do trabalho em saúde, remete a

toda uma discussão fecunda sobre a reorganização das práticas de saúde e na sua articulação diante

do modelo clínico e epidemiológico.

62 Extraído do documento da Profa. Maria Tereza Leopardi Rosa, da Escola de Enfermagem da

Universidade Federal de Santa Catarina. (ROSA, M.T.L. Um olhar para o século XXI: perspectivas de

impacto. Fórum de Coordenadores de Pós-Graduação Stricto Sensu em Enfermagem, 1º .

Florianópolis, 1996, p.1)

63 ROSA, M.T.L. op. cit. p.1.

64 Estão aqui lançadas as bases da versão preliminar sobre a participação da enfermagem nos

diferentes processos de trabalho do processo de produção de serviços de saúde e que tem servido de

fundamento para as nossas discussões com alunos, docentes e enfermeiros de serviço.

65 Aqui não está incluída da participação da enfermagem no Processo de Trabalho de Apoio ao

Processo de Produção de Serviços de Saúde que, no nosso entender, tem como objeto as

necessidades de produção e como finalidade a resposta às necessidades de produção, cuja

decomposição, sob a ótica do Processo de Produção na Universidade, está apresentada no

documento SALUM, M.J.L.; QUEIROZ, V.M. O processo de produção na USP e os processos de

trabalho do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da EEUSP: delineamento preliminar.

Fórum do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva da EEUSP. São Paulo, novembro de

1994.

66 Texto extraído do Prof. Luiz Antônio Cunha, Prof. da Faculdade de Educação da Universidade

Federal Fluminense. (CUNHA, L.A. Avaliação universitária na América Latina: dois projetos nacionais

de legislação. In: FREITAS, M.C. de (org.) (1966), op. cit., cap. 5. p. 148-9).

67 Considerações feitas pela Profa. Maria Jenny Silva Araújo, da Escola de Enfermagem da

Universidade Federal da Bahia. - ARAÚJO, M.J.S. A consulta de enfermagem no contexto da prática

de enfermagem. In: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ENFERMAGEM. Comissão Permanente de

Serviço de Enfermagem. Organização da Assistência de Enfermagem. Brasília, ABEn, 1991. (Série

Documento 1), p. 35, 38.

68Cf. MENEZES, M. T. C. G. (1993), op. cit., p. 129

69 Cf. CAMPOS, G. W. S. (1994) , op. cit, p.31.

70 Lições extraídas do discurso por elaborado e proferido, na qualidade de Paraninfa da 53

a. Turma de

Formandos da Escola de Enfermagem da USP, em 20/1/2000, pela Profa. Maria Josefina leuba Salum. 71

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo, Paz e

Terra, 1997. 72

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