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FACULDADE DE LETRAS E CIÊNCIAS SOCIAIS Departamento de Sociologia Já me chamaram de fantasma”: Um estudo sobre a construção do indivíduo a partir das pessoas com albinismo na cidade de Maputo 2016. Supervisanda: Atineja Cândida Jorge Gune Supervisora: Prof. Doutora Naír Teles Maputo, Agosto de 2017

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A F

FACULDADE DE LETRAS E CIÊNCIAS SOCIAIS

Departamento de Sociologia

“Já me chamaram de fantasma”: Um estudo sobre a construção do indivíduo a

partir das pessoas com albinismo na cidade de Maputo 2016.

Supervisanda: Atineja Cândida Jorge Gune

Supervisora: Prof. Doutora Naír Teles

Maputo, Agosto de 2017

UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE

Faculdade de Letras e Ciências Sociais

Departamento de Sociologia

Trabalho de licenciatura em Sociologia

Atineja Cândida Jorge Gune

“ Já me chamaram de fantasma”: Um estudo sobre a construção do

indivíduo a partir das pessoas com albinismo na cidade de Maputo

2016.

Monografia apresentada em cumprimento parcial dos

requisitos para obtenção do grau de licenciatura em

Sociologia na Universidade Eduardo Mondlane,

Supervisionada pela Prof. Doutora Naír Teles

UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE

Faculdade de Letras e Ciências Sociais

Departamento de Sociologia

Atineja Cândida Jorge Gune

“ Já me chamaram de fantasma”: Um estudo sobre a construção do

indivíduo a partir das pessoas com albinismo na cidade de Maputo

2016.

O júri

O supervisor O presidente O oponente

_____________ _______________ __________________

i

DECLARAÇÃO

Eu, Atineja Cândida Jorge Gune, declaro por minha honra que este trabalho nunca foi

apresentado na sua essência para obtenção de qualquer grau académico e que constitui o

resultado da minha investigação pessoal, estando indicadas no texto e na bibliografia as

fontes que utilizei para a elaboração do mesmo.

__________________________________________________________

Atineja Cândida Jorge Gune

ii

DEDICATÓRIA

Esta monografia é dedicada aos meus pais e a eles agradeço pela pessoa que sou hoje.

iii

Agradecimentos

Todo este trabalho não seria uma realidade sem a sabedoria, coragem e protecção contra

todas as forças do mal que o Senhor todo poderoso concedeu, a ele agradeço em

primeiro lugar.

A minha supervisora, professora Doutora Nair Teles, vai uma palavra de profundo e

sincero reconhecimento e agradecimento por ter aceitado orientar esta pesquisa, e ter

disponibilizado precioso tempo para partilhar comigo a sua sabedoria com sugestões, e

recomendações que constituíram uma mais valia para a edificação deste trabalho. Muito

obrigado.

Os docentes do departamento de Sociologia, vai o meu profundo agradecimento e

reconhecimento pelos ensinamentos, pela paciência, e pelo acompanhamento durante a

minha formação.

A todos entrevistados, pela disponibilidade e vontade em ajudar, mas principalmente

por partilhar as suas experiencias comigo, sem a vossa colaboração este trabalho não

seria uma realidade.

Agradeço a minha família no geral, e em especial, aos meus pais Jorge David Gune e

Cândida Amélia Samuel, meus irmãos Heocádia Gune, Tomás Fuel, e prima Leopoldina

pelo apoio moral durante todo o percurso académico, principalmente nos momentos

mais difíceis durante a minha formação e elaboração deste trabalho.

Ao meu companheiro Armando Osvaldo Mussá que sempre falava e zangava toda vez

que eu dizia que não seria capaz de elaborar este trabalho. Muito obrigada pela força e

acima de tudo por ter confiado em mim até no momento em que eu mesma duvidei das

minhas capacidades. Mas do que meu companheiro foi meu grande amigo que sempre

descontava minhas frustrações. Nunca esquecerei. Vai o meu profundo agradecimento!

Os meus amigos, aqueles que me desconcentravam e os que ajudaram e acima de tudo

os que foram compreensíveis nos momentos que não foi possível me juntarem a vocês

em várias ocasiões, falo de Signa, Rafael, Maximiano, Pelecida, Elves, Arcanjo

obrigada meus amigos pela força.

iv

Aos meus colegas de turma do curso licenciatura em Sociologia (2013-2016), Dircy,

Shamila, Débora, Agnaldo, Osvaldo, Libério, e tantos outros, que não foram só colegas,

mas durante estes 4 anos tornaram-se meus amigos. “ A luta continua”.

v

RESUMO

O presente trabalho busca compreender como as pessoas com albinismo se constroem

enquanto indivíduos tendo em conta a forma como são vistos por parte da sociedade,

como “diferentes” resultante de suas características físicas. O estudo se estrutura a partir

da perspectiva da pessoa com albinismo e assim, tem como objectivos: Descrever como

os albinos vêem a diferença em relação as pessoas não albinas; identificar as estratégias

usadas pelos albinos para a superação do estigma; e por fim aferir como as pessoas com

albinismo se constroem com vista a equidade.

Para tal, optamos como teoria de base a construtivista de Berger e Luckmann (2004),

na obra intitulada“A construção social da realidade”. E como auxiliar optamos pelo o

interaccionismo simbólico de Erving Goffman (1988) mas particularmente a obra

Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada, pois a partir dela foi

possível compreender de que forma os indivíduos com albinismo, que carregam uma

marca depreciativa, ou seja, são discriminados e estigmatizados acabam por gerir suas

vidas e adoptam mecanismos, com vista a garantir a sua inclusão social.

Metodologicamente, recorreu-se á abordagem qualitativa. A técnica escolhida para a

recolha de dados foi a entrevista semi-estruturada, dirigida a 6 indivíduos com

albinismo dos quais 3 homens e 3 mulheres residentes na cidade de Maputo.

Os resultados demonstram que são diversos os desafios enfrentados desde o nascimento

à vida adulta, passando por vários constrangimentos, falta de informação, estigma,

preconceitos, discriminação e tendo a efectivação dos seus direitos humanos fragilizada

na maioria das vezes.

As entrevistas evidenciaram que estes indivíduos estão inseridos socialmente. O

preconceito que existe em torno do albinismo faz com que sejam diferenciados mas não

exclusos pois pode-se perceber também que em função do estigma que carregam

adoptam estratégias com vista a garantir uma vida social integral. Este grupo social se

vê como “normais”, o olhar do outro é que é diferente. Assim sendo, as pessoas com

albinismo se constroem enquanto indivíduos a partir da forma como se vêem e vêem o

outro.

Palavras - chaves: Albinismo, Estigma, Discriminação, Inclusão social.

vi

ABSTRACT

The present work as the main purpose of understanding how people living with albinism

see themselves as human beings, taking into consideration the fact that they are seen by

some people of the society as “different” due to their physical characteristics. The basis

of this study is the perspective of the person living with albinism, therefore, its objective

is to describe how they see this difference with the people without albinism; identify the

strategies they use to overcome the stigma and finally see how people living with

albinism put themselves together towards social equity.

Unto that, we have chosen the constructivist theory by Berger & Luckman (2004), in

their book titled “A construção social da realidade”. And as auxiliary book we have

chosen the Symbolic Interactionism by Erving Goffman (1988), but particularly the

book “Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada”, as it was

throughout this one that was possible to understand how people with albinism, that

carry a depreciative mark, in other words, are discriminated and stigmatized end up

finding their way and adopting mechanisms in order to be assure social involvement.

Methodologically, we have resorted to the qualitative approach throughout the

monographic method. The chosen technic for data collection was the semi-structured

interview, with the participation on 6 people with albinism, where 3 where men and 3

woman living in Maputo City.

The results show that there are lots of difficulties they pass through from their birth to

their old age, predicaments, constraints, no access for information, stigma,

preconception, discrimination and having their rights weakened most of the times.

The interviews showed that these people are socially involved, in other words, they are

not excluded but discriminated. The preconception around the albinism causes the

differentiation but not exclusion, because from what can be seen is that according to the

stigma they carry they adopt strategies to assure a socially involved life. This social

group sees itself as “normal”, the way other look is what they find different. So, the

people with albinism build themselves as human being and individuals by the way they

see themselves and they see others.

Keywords: Albinism, Stigma, Discrimination, Social Involvement.

vii

“ Nunca houve no mundo duas opiniões iguais, nem dois fios de cabelo ou grãos. A

qualidade mais universal é a diversidade” (Montaigne).

viii

ÍNDICE

1. CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO ............................................................................. 1

2. CAPÍTULO 2. DA REVISÃO DE LITERATURA Á FORMULAÇÃO DO

PROBLEMA ................................................................................................................... 5

2.1. Albinismo a luz do campo biológico ................................................................. 5

2.2. Albinismo como uma deficiência ...................................................................... 6

2.3. Tráfico de órgãos humanos e o albinismo ......................................................... 8

2.4. Direitos Humanos e albinismo ......................................................................... 11

3. CAPÍTULO 3. QUADRO TEÓRICO E CONCEPTUAL ................................ 14

3.1. Definição de conceitos ..................................................................................... 17

4. CAPÍTULO 4. METODOLOGIA ....................................................................... 22

5. CAPÍTULO 5. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE DADOS ........................ 24

5.1. Perfil sócio demográfico .................................................................................. 24

5.2. Ser albino ......................................................................................................... 25

5.3. Como o Albino vê a diferença ......................................................................... 26

5.4. Estratégias usadas para superação do estigma ................................................. 30

5.5. Construção da equidade ................................................................................... 33

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 36

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 38

8. ANEXOS ................................................................................................................ 42

1

1. CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho, foi realizado com o propósito da obtenção do grau de licenciatura

cujo tema é “ Já me chamaram de fantasma”: Um estudo sobre a construção do

indivíduo a partir das pessoas com albinismo na cidade de Maputo 2016. Foi objecto de

reflexão compreender como é que as pessoas com albinismo se constroem enquanto

indivíduos. Teve-se em conta que estes têm características físicas diferentes do padrão

socialmente estabelecido, e em função disso são vistos como “estranhos” e

consequentemente sofrem preconceito e estigma.

O aprofundamento do conhecimento da realidade é um passo obrigatório que requer um

exercício analítico constante. Embora não tenha uma abordagem pragmática oferecendo

soluções para os problemas que enfrentam as sociedades, é consenso que qualquer

decisão para mudar o curso dos acontecimentos, requer uma sistematização do

conhecimento na base do qual com fiabilidade, podem ser desencadeadas acções

consequentes.

O corrente trabalho tem como inspiração para sua realização a crescente “perseguição”

que se verificou nos últimos anos contra os indivíduos com albinismo principalmente no

ano 2015, nas regiões norte e centro do país. Já se convive há algum tempo com a ideia

de que alguns indivíduos são aliciados e traficados para países vizinhos. Nos últimos

anos a onda de “caça” aos albinos suplanta qualquer capacidade imaginativa dos limites

da ambição e prática do mal de que se pode imaginar. A título de ilustração tem-se a

notícia publicada no jornal notícias em que a Polícia da República de Moçambique

(PRM) deteve três indivíduos acusados de desenterrar ossadas de um cidadão falecido

em 2011, que em vida sofria de albinismo, em Malova, no município da Massinga, na

província de Inhambane. Os detidos desenterraram as ossadas e preparavam-se para

embarcar com destino ao distrito de Chiúre, na província de Cabo Delgado, onde iriam

vender.1

Em muitos países da África, como Moçambique, Tanzanía, Zimbabwé, Malawi, as

pessoas com albinismo são estigmatizadas e impedidas de viver condignamente em

1 Jornal Notícia publicado a 02 de Novembro de 2015.

2

sociedade. Este grupo, é sujeito a vários estereótipos, e é alvo de prática de rituais

mágicos para fins múltiplos.2

A crença significativa em feitiçaria envolvendo partes de corpo humano é segundo

Cabral (2002) uma prática cultural, histórica e espiritual que antecede o tempo colonial.

Vários relatos têm apontando para o recrudescimento da procura de partes de corpo

humano para fins mágico-religiosos que resulta na perseguição e mortes de albinos.

Nesta conformidade, o relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) do ano 2013

revela que a Tanzânia, (país fronteiriço com Moçambique), detém o maior registo de

raptos de albinos, seguido do Burundi, Quénia, Suazilândia, e África do Sul.

Não obstante, existe um crescimento na consciencialização voltada para a aceitação das

pessoas com albinismo nos mais diversos segmentos sociais. Esse processo fez com que

surgisse uma mentalidade cidadã, expressada pelas exigências com que os diferentes

sujeitos políticos sentem e convivem com a necessidade de mudança, em torno do

acesso e da utilização de espaços e serviços públicos.

Porém a pessoa com albinismo foi, e ainda continua pertencendo a um grupo

discriminado socialmente embora haja uma crescente “reivindicação” destes pela

observância dos seus direitos (educação, saúde, emprego, etc.) reivindicada por exemplo

pela Associação Amor á Vida, e outras. A falta de tolerância, de respeito às

2 BASSO, Carmem, Daiane; NINA, Odenir Dias Teixeira. Albinismo, um olhar digital sobre a África e o

Brasil. [artigo] – FAMPER. Ampère/PR, 2010.

Andres Cruz-Inigo, Barry Ladizinski, Aisha Sethi. Albinism in Africa: Stigma, Slaughter and Awareness

Campaigns. Dermatol Clin. 2011; 29: 79-87

Esther Hong, Hajo Zeeb, Michael Repacholi. Albinism in Africa as a public health issue. BMC Public

Health. 2006; 6:212

Wei A, Wang Y, Long Y, Wang Y, Guo X, Zhou Z et al. (2010) A Comprehensive Analysis Reveals

Mutational Spectra and Common Alleles in Chinese Patients with Oculocutaneous Albinism J Invest

Dermatol 130 (3):716-24.

3

diversidades, fez com que minorias fossem tratadas de forma relativamente agressiva

excludente, seja sendo rotulada, segregada e expulsa do convívio social, seja

vivenciando processos de discriminação social em espaços distintos como no trabalho,

na escola, na universidade, e até mesmo no convívio familiar.

A ausência de informação é uma das principais causas, ou a mais importante,

encontrada por nós durante o estudo e que contribui de forma massiva para o

desconhecimento e para a ignorância sobre o tema, alavancando o preconceito

estabelecido no país. Com este trabalho pretendemos por um lado contribuir de forma a

suscitar questões sobre os problemas que este grupo social sofre, e principalmente

contribuir para eliminar a pretensa invisibilidade de que são vítimas. Por outro lado,

participar na diminuição do actual cenário de escassez de estudos na área das ciências

sociais sobre a temática.

A nossa abordagem é relevante na medida em que procura compreender como é que as

pessoas com albinismo se constroem enquanto indivíduos tendo em conta os vários

constrangimentos sociais. A análise sociológica é uma importante contribuição no

entendimento da visão social humana, na medida em que uma clara apreensão da

realidade social serve para transformar visões de mundo.

Com isto, o objectivo geral do trabalho é compreender como as pessoas com albinismo

se constroem enquanto indivíduos. E para alcançar este objectivo, temos como

objectivos específicos: a) Descrever o perfil das pessoas com albinismo; b) Relatar

como as pessoas com albinismos vêem a diferença com relação as pessoas não albinas;

c) Identificar as estratégias usadas pelos albinos para a superação do estigma; e d)

Aferir como as pessoas com albinismo se constroem com vistas a equidade.

O trabalho foi orientado pretendendo responder a seguinte pergunta de partida: de que

forma as pessoas com albinismo se constroem enquanto indivíduos? Teve-se como

resposta prévia, que as pessoas com albinismo se constroem enquanto indivíduos a

partir da forma como se vêem e vêem o outro.

Metodologicamente o trabalho é qualitativo. A técnica escolhida para a recolha de

dados foi a entrevista semi-estruturada, dirigida a 6 indivíduos com albinismo dos quais

3 homens e 3 mulheres, entre os 18 e 26 anos de idade, residentes na cidade de Maputo.

4

O trabalho obedece a seguinte estrutura: a introdução onde apresentamos e explicamos o

que se pretende com o estudo; revisão de literatura que consistiu na apresentação das

ideias principais dos trabalhos feitos em torno do albinismo; o quadro teórico e

conceptual; a metodologia onde explicamos detalhadamente os passos usados para a sua

materialização; a análise e interpretação dos dados onde expomos todo material obtido

no campo; as considerações finais; as referências bibliográficas e por fim os anexos.

5

2. CAPÍTULO 2. DA REVISÃO DE LITERATURA Á FORMULAÇÃO DO

PROBLEMA

Na presente secção procedemos com a revisão de literatura, que consiste numa

apresentação geral sobre estudos acerca de albinismo para que a partir dessa reflexão se

possa apresentar a relevância e actualidade do tema. Primeiro trazemos em forma de

síntese o debate que há sobre o albinismo no campo biológico. De seguida

apresentamos os trabalhos sobre albinismo como sendo uma deficiência. Na sequência

destacamos os trabalhos sobre o tráfico de órgãos humanos, na medida em que as

pessoas com albinismo são as primeiras vítimas dessa actividade ilícita e criminosa. A

posterior, relacionamos os direitos humanos, as vivências das pessoas com albinismo,

bem como dos esforços a partir de políticas públicas, para a melhoria da qualidade de

vida deste grupo social.

2.1. Albinismo a luz do campo biológico

Os vários trabalhos sobre o albinismo abordam sobre o que ele é, como se caracteriza,

as causas, os tipos e os possíveis tratamentos. O debate sobre o tema cujo enfoque são

os factores biológicos e genéticos [ (Moreira et al., 2007; Rocha; Moreira, 2007; Freitas

et al., 2005; Cavalcante, 2012)], apontam como sendo uma condição rara, genética que

inibe, ou reduz de forma acentuada a produção de melanina no organismo. Essa

substância é um pigmento que dá cor a pele, aos cabelos, e aos olhos, protegendo-os da

radiação ultra-violeta emitida pelo sol ou por dispositivos artificiais, causando não só

desconforto mas transtornos e doenças graves como o câncer de pele.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2015) o albinismo constitui-se em um

grupo de anomalias genéticas do sistema de pigmentação melânica, e que deve ter uma

série de cuidados ao longo da sua vida, tornando necessária a reflexão de quais são as

reais limitações e quais são as dificuldades para que se possa ter uma vida digna em

igualdade e direitos como os demais indivíduos.

As causas do albinismo variam de caso para caso, assim como a intensidade dos seus

efeitos. Geralmente é causado pela falha ao acaso (aleatório), ou herdadas em um ou

mais genes que regulam a produção da melanina. Uma pessoa pode ser portadora do

gene que causa a doença ou seja, é preciso que receba o gene de ambos os progenitores.

6

Na fecundação se os dois genes que contém a mutação se juntarem, as células do novo

ser em formação não serão programadas para produzir a melanina, ou seja, duas pessoas

podem ser portadores dos genes da doença, mas não serem albinos, e eventualmente

poderão ter filhos albinos (Marquito et al, 2009).

Destacam-se três tipos de albinismo: oculocutâneo (completo ou total); parcial; e ocular.

O primeiro tipo caracteriza-se pela falta completa de melanina e, afecta não somente a

pele (que fica branca ou rosada), mas os cabelos (que ficam brancos ou amarelados) e a

íris dos olhos (que se tornam avermelhadas ou azuis). No segundo grupo, a falta de

melanina sujeita uma ou mais áreas do corpo como os olhos, a pele ou o cabelo. E por

fim o albino ocular atinge somente a área dos olhos (Rocha. & Moreira, 2007).

Com o albinismo podem surgir vários problemas, sendo o principal deles a baixa visão,

problemas de pele causados pelo sol como, por exemplo, queimaduras na pele,

envelhecimento precoce (causado por factores ambientais, principalmente a exposição

aos raios ultra-violetas) e, em casos mais graves, lesões pré-malignas e malignas,

podendo ocorrer desde a infância (idem).

No que concerne ao tratamento, não existe nenhuma maneira de adicionar a melanina ou

de fazer com que o corpo produza. Porém, existem tratamentos para possíveis

complicações decorrentes. É cientificamente comprovado que o nascimento de pessoas

albinas é “pouco provável de acontecer” e tal facto os inclui no grupo de “minorias

sociais” (Moreira, 2009)

Nota-se que através dos aspectos supramencionados, a pessoa nasce albina, ou seja, é

uma característica inerente a sua condição. Entretanto, ainda há em torno dela toda uma

discussão sobre ser ou não uma deficiência, o que passamos a seguir a apresentar.

2.2. Albinismo como uma deficiência

Uma das primeiras definições sobre “deficiência” aparece em um documento editado

pela Organização da Nações Unidas - ONU (1975) intitulado Declaração dos Direitos

das Pessoas Deficientes. A expressão “pessoas deficientes” referia-se a “qualquer

pessoa incapaz de assegurar-se por si mesma, total ou imparcialmente, as necessidades

de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congénita

ou não, em suas capacidades físicas ou mentais”.

7

Em 1981 a ONU elege como o “Ano Internacional das Pessoas Deficientes”, quando a

partir dos debates surgiu o conceito de pessoas deficientes. E a reflexão continua para a

partir de 1988 enveredar-se pelo uso do termo Pessoas Portadoras de Deficiência (PPD),

significando que apenas uma parte do corpo tinha restrições e não todo ele. Ou seja, são

considerada PPD os indivíduos que têm alguma deficiência física, auditiva, visual,

mental ou múltipla, e que se caracteriza pela perda total ou parcial de uma estrutura ou

função psicológica, fisiológica, ou anatómica que gere incapacidade para o desempenho

de actividades diárias realizadas comumente. (idem).

Porém, o uso da expressão “portador de deficiência” vem sendo questionada pois o

termo “portador” traz a ideia de carregar, e a deficiência não é algo que se porte e que a

qualquer momento a pessoa possa desfazer dela. A deficiência não pode ser descartada

como algo alheio a pessoa. Portanto o indivíduo possui uma deficiência como parte

integrante do seu ser (Cerignini & Rodrigues, 2005).

Seguindo o mesmo raciocínio, Figueiredo (1997) defende que o termo deficiência

representa a ideia de ausência, e, assim sendo seria contraditório o termo portador de

deficiência, pois se refere a ideia de alguém carregar consigo uma ausência. Sendo o

albinismo uma condição genética em que o individuo nasce com ela e é inata á ele, não

pode-se considerar pessoas portadoras de albinismo, porque não portam o albinismo,

mas sim pessoas com albinismo. O entendimento proveniente da Convenção da ONU

(2007) sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, corrobora com a ideia proposta

da mudança de perspectiva médica - assistencial para a dos direitos fundamentais. O

termo “pessoa com deficiência” dá mais ênfase ao indivíduo em detrimento de uma

adjectivação, trata-se da negação da visão médica pois traz associada a noção de

enfermidades.

Sendo assim, o modelo social da deficiência3 reconhece que a pessoa com albinismo

deve ser reconhecida como sujeito de direitos orientados pela dignidade da pessoa

humana. Este modelo tem como objectivo debater as limitações sociais vividas para

além das questões individuais e principalmente médicas. Assim, na perspectiva de

3 Ao compreender a deficiência como uma construção social, o modelo subsidiou a luta pela integração

social das pessoas com deficiência. O Modelo Social origina-se da necessidade de crítica ao entendimento

maioritário sobre a deficiência, o Modelo Médico (compreende como um fenómeno biológico), entende

como universal e neutro, sendo assim também percebido socialmente devido à sua proximidade com o

senso comum.

8

França (2013), a definição de deficiência, compreende como um estilo de vida imposto

às pessoas com determinadas lesões marcado, principalmente pela exclusão e opressão.

Um estudo desenvolvido no Brasil por Borcat & Severino (s/d) questiona se o albinismo é ou

não uma deficiência num artigo intitulado “As pessoas com albinismo e o novo conceito de

deficiência sob o enfoque do princípio da igualdade à luz do direito a diferença”. Os autores

entendem que devem ser enquadradas no conceito de pessoa com deficiência. Porém, para fins

legais somente aqueles cujo hipopigmentação da íris e da retina ocasione problemas visuais

inferior a 30%, ou seja a ênfase é dada ao deficit de visão e não a cor da pela.

Assim, as pessoas com albinismo enquadram-se no conceito advindo da Convenção da

ONU ou seja, “aquelas que possuem impedimento de longo prazo de natureza física,

mental, intelectual ou sensorial, as quais, em interacção com diversas barreiras, podem

impossibilitar sua participação plena e efectiva na sociedade em equidade de condições

com as outras pessoas” (ONU, 2009). Como já salientado os indivíduos com albinismo

precisam de cuidados especiais, e faz-se necessário uma análise de quais são realmente

as limitações desse grupo para que tenham garantido um tratamento e atenção dignos e

igualitários. Essa colectânea de perspectivas remete á uma visão mágica dos albinos que

muitas das vezes leva ao tráfico de órgãos humanos.

2.3.Tráfico de órgãos humanos e o albinismo

O albinismo é encarado de diferentes formas em alguns países como Moçambique. É

considerado como algo que incapacita e também é visto sob um olhar místico, como

seres detentores de poderes mágicos, que trazem boa sorte se oferecidos em sacrifícios

ou como algo que traz o mal e por este motivo, deve ser eliminado da convivência

social.

Meneses (2008) aponta que as acusações e suspeitas de práticas de feitiçaria, associadas

ao tráfico de órgãos humanos, têm conhecido uma importância. Em Moçambique, o

fenómeno foi amplamente divulgado devido à repercussão dos casos ocorridos no

centro e norte do país, em 2015. A Liga dos Direitos Humanos acompanhou o caso,

divulgado nos meios de comunicação social, de uma criança de 9 anos vítima de

tentativa de extracção dos seus órgãos genitais na província de Manica. A criança

sobreviveu e as pessoas envolvidas no crime foram identificadas e presas.

9

A região norte (Nampula, Cabo Delgado e Niassa) registou nos últimos quatro anos

(2013, 2014, 2015, 2016) diversos casos de raptos de albinos. Oito pessoas com

problemas de pigmentação da pele foram raptadas e mortas nas províncias de Niassa e

Nampula. Trata-se de um crime no qual partes dos corpos das vítimas são retiradas e

supostamente utilizadas para fins ilícitos. Segundo o porta-voz do comando geral da

Polícia da República de Moçambique - PRM4, este tipo de crime tem origem na

Tanzânia e os Moçambicanos estão a ser “enganados ao envolver-se nestes casos”

(Jornal O País, 25 de Março de 2015). Um outro facto aconteceu na província de Cabo-

Delgado, em que três indivíduos que trabalhavam numa mineradora foram detidos

acusados de profanarem o túmulo de um albino para retirar os ossos. Estes cidadãos

pretendiam vender os ossos a 4 milhões de meticais a um Tanzaniano (Jornal Noticiais,

2 de Novembro de 2015).

Os rumores, boatos e acusações de tráfico de órgãos e partes do corpo humano

constituem uma imagem da vulnerabilidade e violência que ocorre no país. A análise

destes boatos, no contexto do tráfico, constitui uma porta de entrada para a compreensão

da complexidade do fenómeno. Mariano, et al (2016), salientam que os factores

económicos são o pano de fundo do tráfico de órgãos. Predomina o recurso à magia e á

utilização de órgãos humanos como meio de se obter e/ou incrementar os já parcos

recursos financeiros.

De acordo com Faz- Tudo (2013), mitos relacionados a sorte, azar e poderes mágicos,

resultantes do albinismo, são bastante frequentes no imaginário popular, o que leva

estas pessoas a sofrerem torturas em rituais de feitiçaria (são mutiladas vivas,

acreditando que os gritos darão maior resultados), assassinatos e comercialização de

seus órgãos. Barros & Tajú (1999), concluem que existem alguns factores culturais que

influenciam a violência, mas que estes não actuam de modo independente. Eles abrem a

porta para que a pobreza acirre a violência já existente.

Na obra o “Filhos da Lua” de Andereggen e Santos citados por Faz-tudo (2013), através

de histórias de pessoas estigmatizadas e marginalizadas, explora principalmente os

4 Jornal O País, 25 de Março de 2015.

10

preconceitos que rodeia o albinismo, pois a perseguição a essas pessoas segundo os

autores, é baseada na crença de que parte de seus corpos transmitem poderes mágicos.

No seu estudo Cabral (2004:2) procurou interpretar o sentido das afirmações sobre os

albinos e, ao mesmo tempo, propôs uma nova maneira de olhar para crenças deste tipo.

Segundo o autor, “essas crenças têm uma função de retenção, ou seja, suportam áreas

de crença inteiras pelo facto de fornecerem ambientes de crença simbolicamente

organizados o que chamou de visões do mundo”. Assim, as crenças são

interdependentes, constituindo assim um conjunto integrado em rede que lhes dão

sentido como seu conjunto.

No caso em questão acaba por ser características através de mecanismos de fixação e

transmissão duma visão do mundo marcada por diferenças étnicas. Referem-se à divisão

entre “preto”/”branco” vigente hoje na África (Cabral, 2004). Normalmente, forma-se

crenças na base de outras constituindo uma estrutura que tende para “formamos os

hábitos de construção de crenças da mesma maneira que formamos os nossos outros

hábitos, excepto que, no referente aos hábitos de construção de crenças, há ainda

menos lugar para idiossincrasias” (Quine & Ullian 1970: 59).

Estas situações relacionadas com as práticas costumeiras, cultura, crenças e tradições

perpetuam a violência contra os albinos. Podemos perceber que o objectivo do uso de

partes do corpo é estimulado por uma medicina tradicional baseada parcialmente em

partes humanas. A tal prática tem propósitos diversos, como por exemplo curar doenças,

ajudar a progredir economicamente ou prejudicar os “inimigos”. Existe enraizada a

convicção de que partes de corpo são vitais para que o tratamento funcione. Assim, os

albinos são traficados os seus órgãos, e extraídos para serem utilizados em vários rituais

consoante o fim desejado (Mariano, et al 2016).

Feita a exposição dos estudos sobre albinismo no referente ao tráfico órgãos humanos,

pode-se perceber que estes são vítimas deste crime porque acredita-se que partes dos

seus órgãos possuem benefícios para quem os trafica. Essa abordagem nos leva a defesa

dos direitos da pessoa humana que pretendemos aprofundar a seguir.

11

2.4.Direitos Humanos e albinismo

Os direitos humanos são entendidos como um instrumento indispensável na promoção

da dignidade humana. Todas as pessoas com albinismo são indivíduos de direitos

devendo o Estado eliminar as barreiras e os obstáculos que as impedem de ter uma vida

digna em igualdade as demais pessoas, e concomitantemente ter suas diferenças

respeitadas, sendo que o tratamento igual deve ser efectivado na medida de suas

especificidades. Os direitos civis, económicos, políticos, sociais e culturais, são

obrigações que um Estado tem de respeitar, proteger, promover e garantir. Essa

responsabilidade faz com que se tome medidas legislativas, administrativas, judiciais e

práticas a fim de assegurar que os direitos sejam implementados na maior extensão

possível (Cristóvam, 2012).

Na vida quotidiana o albino além de ser discriminado e sofrer com o preconceito, é

invisível para o Estado pois é ignorado nas políticas públicas5; encontram-se a margem

da sociedade ainda sem âmparo efectivo. A importância da criação de políticas públicas

permite assegurar os direitos e reconhecer a marginalização das pessoas com albinismo

e incluí-las efectivamente dentro da sociedade dando-lhes o suporte necessário para a

sua efectiva inserção. O albinismo é uma característica, é um traço peculiar, e é função

do Estado criar mecanismos para que sejam devidamente protegidas e inseridas sócio -

economicamente.

Como destacado acima, a pessoa com albinismo sofre não apenas a discriminação,

como também é vítima de atrocidades, onde enfrenta trágicas violações dos seus

direitos. Em Moçambique, foi criada a Associação Defendendo Nossos Direitos

(ADODS)6 que visa enfrentar os desafios colocados, vencer o estigma e a discriminação

com vistas a serem percebidas como pessoas “normais”.

5 Políticas públicas são: o conjunto de planos e programas de acção governamental voltados á intervenção

social por meio dos quais são traçadas as directrizes e metas a serem atingidas pelo Estado, sobretudo na

implementação dos objectivos e direitos fundamentais dispostos na constituição do país.(Cristóvam,

2012).

6 A associação Defendendo os nossos direitos é uma associação de âmbito nacional criada a 30 de Março

de 2009, sem fins lucrativos e com sede em Maputo. Foi criada com intuito de lutar pelos direitos das

pessoas com albinismo.

12

Assim sendo, procura despertar a sociedade para a “problemática do albinismo” e dos

cuidados a ter em conta com este grupo social, através da difusão de informação julgada

pertinente para o efeito, defender e promover os seus direitos que têm sido vítimas de

vários tipos de discriminação. Com efeito, a ADODS, promove palestras, seminários,

programas de entretenimento e publica trabalhos, brochuras e folhetos sobre os diversos

problemas enfrentados, desafios, histórias do dia-a-dia e alguns conselhos para os

portadores de albinismo.

Em Moçambique, inexistem normas específicas que levem em consideração as

necessidades dos albinos embora em 2015 o governo tenha aprovado um plano de

acção7 voltado para pessoas com deficiência e nelas se inclui os portadores de

albinismo. O objectivo geral é assegurar o cuidado e assistência a albinos, bem como

prevenir actos criminosos. As acções incluem medidas de sensibilização, educação

cívica e estudos sócios antropológicos, mas também medidas que permitam maior

celeridade na tramitação dos processos envolvendo as questões as quais esse grupo

defronta.

A falta de informação existente sobre albinismo também auxilia na propagação dos actos

discriminatórios, fazendo com que a população crie mitos e superstições. Com isso, algumas

pessoas acham que o albinismo afecta a capacidade cognitiva, é uma aberração ou tem poderes

mágicos. A ausência de informação é uma das principais causas, ou a mais importante, que

contribui de forma massiva para o desconhecimento e para a ignorância do problema,

alavancando o preconceito estabelecido no país.

Portanto, é fundamental a possibilidade do convívio social lembrando que o processo de

aprendizagem depende da relação com o outro. Ser albino possivelmente limite a

possibilidade de convívio de forma ampla pois hábitos simples como andar livremente

em um dia de sol pode lhes causar danos a saúde e tornar actividades rotineiras

desgastantes. A não discriminação, juntamente com a igualdade perante a lei, constitui

um princípio básico e geral para a protecção dos direitos humanos. O princípio da

igualdade requer que o Estado realize acções positivas a fim de diminuir ou mesmo

eliminar as condições que causem ou estimulam a perpetuação da discriminação.

7 O plano faz a promoção dos direitos das pessoas com deficiência, também são criadas condições de

acesso aos serviços, sabendo que as pessoas com albinismo, requerem da necessidade de saúde, no que

diz respeito a dermatologia, e também, é feito um trabalho, a nível das famílias, para evitar que as pessoas

albinas sejam rejeitadas.

13

As sociedades julgam as pessoas que apresentam alguma diferença, excluindo-as muitas

das vezes de seu convívio. Assim, a relação existente entre estigmatizados e os ditos

“normais” é dolorosa e complexa. Deve-se também levar em conta as reacções da

pessoa estigmatizada: muitas se deprimem, outras buscam “correcção” para sua

deficiência, e, na maioria das vezes, perdem a motivação para viver. Tal acontece com

as pessoas com albinismo, que devido a sua condição física, são vistos como

“diferentes” e incapazes de exercer actividades quotidianas. Este grupo encontra no seu

dia-a-dia várias dificuldades para um real enquadramento, sendo-lhes recusada a

dimensão de igualdade.

Com este estudo, pretende-se compreender como é que em meio a todas estas

dificuldades os albinos se constroem enquanto indivíduos, reflectindo sobre como vêem

a diferença tendo em conta que tem características diversas do padrão socialmente

estabelecido. Em função disso são percebidos como “estranhos” e consequentemente

sofrem o preconceito, e estigma.

14

3. CAPÍTULO 3. QUADRO TEÓRICO E CONCEPTUAL

Assim como afirma Serra: “Evitai, confundir imaginação com investigação. Se vos

dizem que um ponto de vista é uma investigação, que uma investigação dispensa teoria

ou que uma teoria dispensa comprovação, duvidai e investigai”(Serra, 2003:23-24).

Pretendemos nesta secção, apresentar a teoria que serve de lente para compreendermos

a realidade social em causa.

Assim sendo, optamos pela teoria construtivista de Berger e Luckmann (2004), na obra

intitulada“A construção social da realidade”. E como auxiliar optamos pelo o

interaccionismo simbólico de Erving Goffman (1988) mas particularmente a obra

Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada, pois a partir dela foi

possível compreender de que forma os indivíduos com albinismo, que carregam uma

marca depreciativa, ou seja, são discriminados e estigmatizados gerem ou adoptam

mecanismos, com vista a garantir a sua inclusão social.

Berger & Luckman (2004), estavam preocupados com a dinâmica entre a dimensão

subjectiva, e as formas estruturais e institucionais da realidade social. Para eles, cada

sociedade apreende a vida diária como uma realidade ordenada e objectiva que lhes

impõe, orientando os seus esquemas de acção. Os actores sociais embora envolvidos no

processo de construção da realidade social não percebem, tal processo acabando por

assumir a realidade como “naturalmente” ordenada.

Segundo Berger e Luckmann (op.cit), a construção social da realidade deriva de um

processo dialético entre indivíduo e sociedade, e como tal passa por 3 momentos: (1)

interiorização, (2) exteriorização, e (3) objectivação.O primeiro momento caracteriza-se

pela interiorização do mundo social como uma realidade objectiva. A exteriorização

refere-se a realidade objetivada subjectivamente. E a objectivação é o momento em que

a exteriorização se impõe aos indivíduos, constrangendo-os.(idem)

Com isto, a apreensão da realidade social não resulta de criações autónomas de

significados por indivíduos isolados, mas começa com o indivíduo a “assumir” o mundo

no qual os outros já vivem. Portanto, só depois de ter alcançado esse grau de

interiorização é que o indivíduo se torna membro da sociedade. Podemos afirmar que, a

interiorização corresponde ao processo de socialização, no qual o indivíduo introduz na

sua consciência um conjunto de conhecimento sobre o mundo objectivado e o quadro

normativo. A interiorização constitui a base, para a compreensão entre indivíduos, e

15

para a apreensão do mundo como realidade significativa e social (Berger & Luckman,

2004).

Os indivíduos têm comportamentos que são condicionados por uma série de factores

sociais económicos, políticos e, culturais, pela individualidade que se desenvolve a

partir de um processo dinâmico e interactivo de inculcação de regras e valores que

podem estar em conflito com o contexto que se vive. Nesse sentido, podemos afirmar

que os preconceitos, estereótipos a discriminação são factores de ordem social.

A sociedade estabelece um modelo de conduta e relaciona as pessoas de acordo com as

características consideradas comuns e adequadas aos membros de determinadas

categorias. Assim, pode-se dizer que a sociedade determina um padrão externo que

presume ao indivíduo a classe, a identidade e as relações com o meio no qual este deve

estar inserido.

Berger & Luckmann (2204), referem que a construção do Eu é um fenómeno que deriva

da relação dialéctica entre um indivíduo e a sociedade. Os autores explicam que a

formação e conservação das identidades são condicionadas por processos sociais

determinados pelas estruturas sociais. Uma vez fixada, é mantida, modificada ou mesmo

remodelada pelas relações sociais. Desse modo, a identidade não diz respeito apenas aos

indivíduos. Todo grupo apresenta uma identidade que está em conformidade com

definição social que o situa no conjunto social.

Assim, a identidade é ao mesmo tempo inclusão pois, só fazem parte do grupo aqueles

que são idênticos sob certo ponto de vista e exclusão, visto que sob o mesmo ponto de

vista são diferentes de outros. No entanto, somente o contexto relacional pode explicar,

por exemplo, porque num determinado momento uma identidade é afirmada ou

reprimida. Por conseguinte, a sua construção realiza-se no interior de contextos sociais

que determinam a posição dos agentes e, por isso mesmo, orientam suas representações

e suas escolhas.

Os indivíduos com albinismo são construtores quotidianos da sua realidade social.

Nesta ordem de ideias a forma com eles se vêem e vêem o outro aparece como

naturalizada em função da interiorização que fazem fruto da convivência social. Com

esta teoria pretendemos perceber como os indivíduos compreendem e dão significado

as suas realizações, ou seja, como estes constroem o seu mundo. Pois partimos de

16

pressuposto que estes não são totalmente passíveis em relação à realidade em que eles

vivem, daí há necessidade de procurar apreender a forma pela qual, eles interpretam e

constroem a sua realidade. A discussão desenvolvida possibilita entender que o ser

albino é construído na relação que o indivíduo estabelece com o outro. Ou seja, a

identidade é construída em oposição a outras e também a partir das expectativas

estabelecidas pelos grupos sociais.

Analisando o processo de construção do Eu, (Goffman, 1988), reforça o argumento de

que a identidade de um determinado indivíduo é construída a partir dos parâmetros e

expectativas estabelecidas pelo meio social. Para ele, os meios de categorizar as pessoas

e o total de atributos considerados como “comuns” e “naturais” para os membros de

cada uma das categorias são determinados socialmente. Entretanto, as rotinas de relação

social em ambientes determinados nos possibilitam contactos com outras pessoas

previstas sem atenção ou reflexão particular. Então, quando um “estranho” nos é

apresentado, os primeiros aspectos nos permitem prever a sua categoria e os seus

atributos, a sua identidade, para usar um termo melhor do que “status social”, já que

nele se incluem atributos como honestidade, da mesma forma que atributos estruturais

como ocupação.

Ainda na óptica deste autor, aquele que demonstra pertencer a uma categoria com

atributos incomuns ou diferentes é pouco aceite pelo grupo social, que não consegue

lidar com o diferente e em situações extremas o converte em indivíduo perigoso,

incapaz, transforma-se em desprovido de potencialidades, este indivíduo é

estigmatizado e excluído socialmente (Idem). Dito de outra forma os albinos enquanto

detentores de um estigma pertencem a uma categoria desvalorizada, fora dos padrões

exigidos pela sociedade que em última instância torna-os desviantes.

As pessoas tomam atitudes específicas sobre um dado estigma afectando portanto, a

forma pela qual um indivíduo estigmatizado é integrado num grupo ou excluído

socialmente. Assemelha-se a isto as crenças que são socialmente construídos em torno

das pessoas com albinismo, e a partilha destas, influência naquilo que é a condição

social do albino, é percebida nas barreiras por eles enfrentados.

Entretanto esta teoria permitiu-nos compreender os sentimentos da pessoa estigmatizada

(albino) sobre si e a sua relação com os “normais”, bem como as estratégias que os

17

estigmatizados adoptam para lidar com a rejeição alheia e a complexidade de tipos de

informação sobre si que projectam nos outros. Ou seja, como indivíduos estigmatizados

socialmente criam estratégias para garantir a sua integração social. Possibilitou também

compreender como se processa a relação com os “normais” tendo em conta que os

albinos carregam um estigma visível que interfere em suas interacções com o meio

social.

3.1.Definição de conceitos

No presente subcapítulo, procuramos definir dos principais conceitos que orientaram o

nosso trabalho. Assim sendo, apresentamos os conceitos estigma, discriminação e

inclusão social.

3.1.1. Estigma

Originalmente, o termo estigma foi cunhado na Grécia antiga, para designar marcas

físicas produzidas artificialmente no corpo de uma pessoa (com cortes ou ferro em

brasa), para sinalizar o status moral inferior dela, indicando que se tratava de uma

pessoa moralmente manchada e com a qual devia evitar contacto, especialmente em

locais públicos.

Esse conceito percorreu uma longa trajectória, da Grécia antiga à actualidade. Na Idade

Média, o termo estigma era utilizado com referência a sinais físicos presentes no corpo

de alguém e que era interpretado como sinal de graça divina recebida por ele. Era

também utilizado na acepção médica, como sinais físicos do corpo que indicavam a

presença de alguma doença. Goffman (1988) faz referência a palavra estigma entre os

gregos onde esta era definida como"signos corporales, sobre los cuales se intentaba

exhibir algo malo y poco habitual en el status moral de quien los presentaba"

(Goffman, 1988:11). O estigma representa algo de mal, uma identidade deteriorada, um

atributo que produz um descrédito na vida do sujeito, pois ele estabelece uma relação

impessoal com o outro; o sujeito não surge como uma individualidade empírica, mas

como representação circunstancial de certas características típicas da classe do estigma,

com determinações e marcas internas e externas que podem sinalizar um desvio, mas

também uma diferença de identidade.

18

Na actualidade, a palavra estigma é utilizada com um sentido semelhante ao original,

porém refere-se à própria condição social de desgraça e descrédito, e não mais à

evidência corporal de inferioridade moral. Trata-se, portanto, da marca social de

inferioridade social. Esse descrédito social resulta de julgamentos mais ou menos

consensuais das pessoas da comunidade na qual ocorre esse fenómeno. Na discussão

sobre a questão do estigma, frequentemente tem sido apontado como sendo o atributo

que torna alguém diferente de pessoas comuns, com um profundo sentido depreciativo,

caracterizando-o como um ser inferior.

Ainlay, Coleman & Becker (1986), definem estigma como uma construção social, onde

os atributos particulares que desqualificam as pessoas variam de acordo com os

períodos históricos e a cultura, não lhes propiciando uma aceitação plena social. Deste

modo, as pessoas são estigmatizadas somente num contexto, o qual envolve a cultura,

os acontecimentos históricos, políticos, económicos, e uma dada situação social, ou

seja, a estigmatização não é uma propriedade individual (Siqueira e Cardoso, 2011).

Para Becker & Arnold (1986), estigma é a condição de não possuir atributos

considerados importantes por um grupo social. Os indivíduos estigmatizados tornam-se

rapidamente cientes da forma que os outros os vêem. Assim, aquele que é estigmatizado

pode sofrer um complexo processo de normatização, o qual se dá pela forma que o

indivíduo estigmatizado se adapta a sociedade, a fim de reduzir sua diferença das

normas culturais.

Na linha do pensamento dos autores supracitados, neste trabalho o estigma deve ser

compreendido como um atributo depreciativo, construído socialmente e imputados as

pessoas albinas resultante de suas características físicas, em função do contexto social

ao qual encontram-se inseridos.

3.1.2. Discriminação

Na concepção de Gaeschlin (2010), por muitas vezes confunde-se preconceito com

discriminação e vice-versa pois, embora estes dois conceitos estejam relacionados, são

distintos razão pela qual é pertinente compreender primeiramente o que é preconceito a

fim de que se possa evitar contradições.

19

Na óptica do autor supracitado, preconceito é todo tipo de ideia que faz um julgamento

pré-estabelecido em relação a alguém que se considera a comprovação factual. Este é

sempre um julgamento de valor que produz uma relação de superioridade -

inferioridade. O objectivo do preconceito é justificar uma situação de dominação,

exclusão, omissão, privilegio, perseguição, violência, eliminação, entre outros, de uma

categoria social em relação a outra.

A discriminação é sempre um acto que geralmente se baseia em um preconceito.

Designa as distinções feitas na vida social em detrimento de certos grupos, que são

julgadas inaceitáveis pela maioria, porque violam as normas sociais e o princípio da

igualdade perante a lei, ao mesmo tempo que certos subgrupos da população as

justificam. Pode fundar-se na raça, na religião, na origem nacional ou na cultura. Os

critérios de discriminação variam segundo as sociedades e épocas (Yinger 1965).

Assim, o preconceito não pressupõe o acto de tratar diferentemente uma pessoa, pode

simplesmente fazer parte de uma estrutura mental. A discriminação é a concretização

dessa forma de pensamento.

No entender de Bobbio (2002:108-109) discriminação é a diferenciação injusta ou

ilegítima porque vai contra o princípio fundamental de justiça, segundo o qual devem

ser tratados de modo igual todos aqueles que são iguais. Comporta uma diferenciação

injusta e arbitrária que tem na sua base a crença de que indivíduos pertencentes a

determinadas categorias de maior probabilidade de possuir características indesejáveis.

Discriminação é toda e qualquer forma de promoção da distinção ou da exclusão levada

a efeito com fulcro em critérios como a raça, a descendência, origem étnica, o género, a

opção sexual, a idade, religião, entre outros, que tenha por fim anular ou impedir o

reconhecimento ou o gozo de direitos humanos em pé de igualdade em qualquer âmbito

da vida pública ou privada. Verifica-se em todos ambientes sociais, e em todos eles

constitui conduta grave, dotada de sérias consequências, sobretudo em razão de seus

principais efeitos que são a exclusão social e a negação do princípio da igualdade (Cruz

2001).

Contudo, neste trabalho discriminação deve ser entendida como a maneira de tratar

desigualmente os indivíduos com albinismo destruindo ou comprometendo os seus

direitos fundamentais, no seu contexto social, económico, cultural ou político.

20

3.1.3. Inclusão social

Este conceito é usado de forma genérica e para entender o seu significado é preciso

compreender antes o seu oposto, a exclusão social. Sendo assim, este refere-se a

impossibilidade de poder partilhar da sociedade e leva a vivência da privação, da recusa,

do abandono e da expulsão, inclusive com a violência, de uma parte significativa da

população (Sposati, 199:13).

Exclusão social “ é um processo através do qual certos indivíduos são empurrados para

a margem da sociedade e impedidos de nela participarem plenamente em virtude da

sua pobreza ou da falta de competências básicas e de oportunidades de aprendizagem

ao longo da vida, ou ainda em resultado de discriminação” (Com, apud Borda & Lima,

2011:22).

Mazza (2008), define como um processo dinâmico, multidimensional, por meio do qual

se nega aos indivíduos por motivos de raça, etnia, género e outras características que os

definem, o acesso a oportunidades e serviços de qualidade que lhes permitam viver

produtivamente fora da pobreza (Idem).

Sendo assim, neste trabalho concebemos a exclusão social como sendo a

impossibilidade e/ou barreiras sociais que a sociedade impõe aos indivíduos com

albinismo consequente das suas características físicas e em função disto são impedidos

de participar nas principais instituições da sociedade. A partir da definição do conceito

exclusão social, passamos a seguir a definir a inclusão social.

Inclusão social é compreendida como “o processo pelo qual a sociedade se adapta para

poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com diferenças étnicas,

religiosas, linguísticas, de género, com necessidades especiais e, simultaneamente,

estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade. A inclusão social constitui,

então, em um processo bilateral no qual as pessoas, ainda excluídas, e a sociedade

buscam em parceria equacionar problemas, decidir sobre soluções e efectivar a

equiparação de oportunidades para todos” (Sassaki, 1997:3).

É o processo que visa promover a inclusão dos segmentos em vulnerabilidade social,

destacando a cidade, a escola, o emprego e a protecção social Borda & Lima (2011).

Para Com, a forma que garante que as pessoas em risco de pobreza e exclusão social

acedam às oportunidades e aos recursos necessários para participarem plenamente nas

21

esferas económica, social e cultural e beneficiem de um nível de vida e bem-estar

considerado normal na sociedade em que vivem (Idem).

Desta feita neste trabalho, inclusão social deve ser entendida como o processo que visa

envolver os indivíduos com albinismo nas diferentes esferas da sociedade com vista a

garantir a igualdade no usufruto dos seus direitos com as demais pessoas.

22

4. CAPÍTULO IV. METODOLOGIA

Para a materialização do trabalho foram adoptadas algumas linhas de orientação

metodológica que permitiram realizá-lo. Segundo Macamo (2004), o trabalho

académico baseia-se em premissas aprovadas cientificamente. Na prática essas

premissas dizem respeito a metodologia. É através dos procedimentos metodológicos

que se procura explicar os fenómenos e/ou fatos sociais observáveis. Assim sendo, para

a sua realização é necessário identificar as técnicas que possibilitam a sua verificação

(Gil, 2007).

Diante do objectivo o presente estudo é de natureza qualitativa, procurou-se perceber a

argumentação e a lógica das ideias apresentadas pelas pessoas entrevistadas. De acordo

com Crespi (1997), a pesquisa qualitativa busca compreender os significados vividos e

comunicados, levando em consideração a intenção dos actores sociais e as influências a

que estão submetidos. Esta metodologia trabalha “com o universo de significados,

motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais

profundo das relações, dos fenómenos que não podem ser reduzidos à

operacionalização de variáveis” (Minayo, 2002: 21-22).

Não recorremos a abordagem quantitativa pois ela é muito utilizada no desenvolvimento

das pesquisas descritivas nas quais se procura descobrir e classificar a relação entre

variáveis, assim como, na investigação da relação de causalidade entre os fenómenos.

Esta abordagem difere do qualitativo pelo facto de empregar dados estatísticos como

centro do processo (Martinelli, 1999: 46).

A técnica escolhida foi a entrevista semi-estruturada, que consiste na elaboração de um

guião de questões a serem feitas ao entrevistado com a possibilidade de ao longo da

entrevista serem colocadas perguntas acessórias decorrentes das respostas dadas. Pelo

seu carácter flexível permite aceder a informações mais detalhadas, incluindo as

dimensões relativas aos objectivos do estudo. Além de conter questões fechadas e

directas inclui um número de perguntas abertas, nas quais o entrevistador se utiliza de

certa “liberdade” (Gauthier, 1998:31).

As entrevistas foram gravadas, transcritas, e analisadas com recurso do programa

NVIVO, que possibilita a análise de dados qualitativos, sistematizando as informações

de modo que se considere a sua totalidade, facilitando sua análise.

23

Foram entrevistados 6 indivíduos com albinismo, com idade entre 18 e 26 anos

escolhidas a partir de uma amostragem não probabilística intencional. Neste tipo de

amostra o pesquisador está interessado na opinião de determinados indivíduos de um

grupo social específico, mas que não são necessariamente representativos dela. Assim

sendo, entrou-se em contacto com uma pessoa conhecida com albinismo, e esta por sua

vez indicou as demais. As entrevistas foram feitas na casa dos entrevistados, lugar

escolhido por eles como sendo mais seguro e confortável.

No que concerne a questões éticas da pesquisa, todos os entrevistados assinaram o

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), como forma de garantir que

nenhuma informação será usada para qualquer outro fim que não seja para a presente

pesquisa. Foram respeitados a privacidade e confidencialidade, sendo assim, todos os

nomes usados são fictícios, como forma de preservar a identidade daqueles (as) que

participaram.

Na realização da presente pesquisa, deparamos com alguns constrangimentos, devido ao

tema em causa. Primeiro, houve algumas dificuldades para se aproximar e obter a

confiança dos (as) entrevistados (as) devido o medo, uma vez que temiam ser uma

estratégia para serem sequestrados (as) ou sofrerem algum tipo de violência. Segundo,

durante uma entrevista, uma das entrevistadas emocionou-se ao contar suas experiências

com relação ao preconceito que sofre e chorou ao responder uma das questões.

No referente as limitações do estudo, deparamo-nos com a escassez de material que

aborda especificamente da condição social dos albinos no geral e particularmente em

Moçambique, principalmente na área das ciências sociais que é o foco. Foi possível

encontrar no campo das ciências naturais, mais concretamente da saúde. Daí recorreu-

se a literatura internacional para podermos nos situar sobre o que já foi escrito a

respeito.

Feita a apresentação dos métodos e técnicas utilizadas na realização do trabalho, a

seguir passamos a apresentar as informações obtidas no trabalho de campo.

24

5. CAPÍTULO 5. ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE DADOS

A análise e a interpretação dos dados são dois processos distintos mas que estão

relacionados. Afinal, como afirma Gil (1986) ” a análise tem como objectivo organizar

e sumariar os dados de tal forma que possibilitem o fornecimento de respostas ao

problema proposto para investigação”. E a interpretação pretende procurar o “sentido

mais amplo das respostas, o que é feito mediante sua interligação a outros

conhecimentos anteriormente adquirido” (Gil, 1986:133).

Assim, e tendo em vista aquilo que nos colocamos como objecto de reflexão que é

compreender como as pessoas com albinismo se constroem enquanto indivíduos tendo

em conta os vários constrangimentos sociais, apresentamos primeiramente, o perfil dos

entrevistados construído com base nas variáveis sócio - demográficos (idade, sexo, local

de residência, agregado familiar, nível académico, profissão e o estado civil).

De seguida, reflectimos como elas significam o conceito da diferença, uma vez que eles

e elas são vistos (as) pela sociedade como pessoas diferentes num lugar onde não se é

negro nem tampouco branco. Esta percepção faz com que estes indivíduos sejam

estigmatizadas, rotulados de forma depreciativa tais como: “pessoas com albinismo não

morrem, simplesmente desaparecem”; que “o albinismo é uma condição contagiosa” e

“que estes indivíduos são mentalmente retardados”; ou ainda, que “os albinos não são

seres humanos mas sim fantasmas”. Diante desse breve panorama é nossa intenção

identificar as estratégias usadas pelos participantes do estudo para superar o estigma, e

por fim aferir como estes se constroem com vista a equidade. Para tal, as respostas

foram agrupadas a partir dos seguintes eixos: ser albino; como o albino vê a diferença;

estratégias usadas para superação do estigma; e construção da equidade.

5.1. Perfil sócio demográfico

Foram entrevistados 3 homens e 3 mulheres maiores de idade, todos (as) vivem com os

seus familiares, e dos seis, somente um vive na zona urbana (bairro Central), sendo os

restantes cinco moradores de bairros periféricos da cidade de Maputo nomeadamente:

Malhazine, Zimpeto, Marracuene, Luís Cabral. No que tange ao trabalho, apenas um

dos cinco entrevistados é independente financeiramente dos pais, os restantes estão

desempregados razão pela qual contam com o apoio dos seus familiares. Com relação

25

ao nível académico, dois deles tem o ensino superior incompleto, e os restantes quatro

tem o ensino básico (secundário). Acreditamos que a escolarização influi no acesso ao

emprego e na renda, e acrescenta-se o facto de serem albinos que segundo os (as)

entrevistados (as) pode ter uma influência negativa no acesso ao emprego.

No que concerne ao estado civil, todos são solteiros, embora dois (2) estejam numa

relação estável, ainda não oficializada, e sem filhos. Quanto ao agregado familiar, de

modo geral, todos vivem com suas famílias, dos quais, três (3) vivem com os pais, em

famílias constituídas por pai, mãe e irmãos; dois (2) vivem com tios e primos e um (1)

vive com os avós.

5.2. Ser albino

Ser albino significa sentir-se um ser humano, mas com uma particularidade que decorre

de alguns factores. Por outro lado é ter uma vida incerta, cheia de medo e com

capacidade de se defender face aos vários desafios vivenciados. Por exemplo, no

contexto Moçambicano em que a maioria da população é negra, quando nasce alguém

que é muito branco gera-se do ponto de vista social um fenómeno de contraste. As

sociedades normalmente procuram explicações desse contraste, porque é que nós somos

negros e os outros nascem brancos, com uma certa raridade. Essas explicações que as

pessoas procuram, as suas respostas dependem muito do nível de conhecimento, de

informação que as pessoas têm sobre o que é albinismo.

….”é difícil ser albino porque é uma vida cheia de medo dor, porque eu sei que sou

pessoas mas são poucas as pessoas que sabem também, olham para mim como se eu

fosse de outro planeta e isso é muito chato (Carlos, 24 anos)”.

“Eu sei que se me acham diferente porque sou branca então dizem como é possível eu

ter essa cor enquanto somos negros e até meus pais são negros….daí olham para e

dizem que só posso ser fantasma porque pessoa não sou (Miguel, 26 anos) ”.

Em sociedades onde os níveis de desconhecimento são maiores, os educacionais são

frágeis, do ponto de vista de cultura letrada e de conhecer e interpretar os fenómenos do

ponto de vista científico do mundo, nestas circunstâncias as respostas nem sempre são

as mais apropriadas. Então, o albino enfrenta essa dura realidade social da diferença e

26

dos contrastes. Vive nesse ambiente que gera preconceitos e estereótipos, alguns menos

bons e outros que fortalecem o lado social do albino.

“Pessoas ignorantes sabes que não estudam não lêem e nem gostam de ouvir. São

cabeças duras essas sim é que nos vêem como pessoas estranhas, mas existem agora

campanhas mesmo nas escolas que explicam que os albinos também são

pessoas….(Joana, 24 anos) ”.

…”ufff bem antigamente sim as pessoas não eram informadas só se baseiavam em ouvir

dizeres e começavam a espalhar para o mundo parecendo verdade. Hoje em dia já há

mais pessoas estudadas e informadas que já sabem o que é albinismo essas coisas mas

nos lugares onde há menos educação ainda não sabem (Marisa, 18 anos)”.

O albinismo é um fenómeno biológico que acontece nos seres humanos e até nas

plantas, e animais. Quanto aos homens ele enfrenta dois problemas, um de ordem física,

e outro de ordem subjectiva. Os de ordem subjectiva têm a ver com essa dimensão dos

preconceitos, os estereótipos, em que um albino quando nasce tanto pode constituir uma

desgraça para a família, como uma bênção, uma graça ou uma sorte. E isso faz com que

na sociedade predomine o preconceito em relação aos albinos, e o sofrimento é maior

pois acaba afectando a auto - estima, a auto - imagem e a própria identidade.

5.3.Como o Albino vê a diferença

De acordo com as entrevistas feitas, pôde-se perceber que antes de mais eles se vêem

como indivíduos iguais a quaisquer outros, com as mesmas capacidades, habilidades,

sonhos, direitos e deveres e que a única coisa que os diferencia dos demais é a cor da

pele. Os albinos, encaram as suas diferenças fisiológicas como quaisquer outras que

existem, por exemplo, a cor da pele, o formato dos olhos, altura, o tipo de corpo, a cor

dos cabelos, etc. Para eles, ter a pele mais clara, cabelos e olhos claros, não lhes faz

sentir “anormais”. Muito pelo contrário, para eles as pessoas são diferentes na cor, mas

iguais em tudo. Os depoimentos abaixo ilustram:

“Olho para mim e vejo uma pessoa diferente como qualquer outra pessoa, porque

todos somos diferentes. O albinismo é a ausência ou falta de pigmentação. Não acho

que seja doença como tal. Assim como existe negro, branco, alto, baixo, existe o albino

(Ana, 22 anos). ”

27

“ Desde criança me ensinaram que ser albino é ser uma pessoa normal como

qualquer outra pessoa e que a única coisa que nos diferencia das outras pessoas é a

cor, porque tudo que as outras pessoas fazem, nós também podemos fazer e até melhor.

Tenho uma rotina normal como a dos outros (vou a escola, namoro, me divirto). Ser

albino é uma qualidade porque onde estou consigo me destacar. (Miguel, 26 anos). ”

Além disso, percebe-se que ter essa diferença para o grupo é uma “dádiva” e é algo

positivo, pois os dá destaque em relação às demais pessoas. Eles conseguem assim

perceber pela forma como são olhados, na curiosidade que as pessoas têm ao aproximar-

se para ver se são pessoas “reais” ou não.

“Quando saio para rua as pessoas olham para mim porque sou muito bonita, não que

eu não goste, mas as vezes, me incomoda porque olham como se eu fosse muito

diferente querem me tratar como se eu fosse muito frágil, querem me tocar, me

abraçar… (Joana, 24 anos).”

“…olham para mim curiosas com olhares de dúvida se sou ou não pessoas, outras me

tocam pedem tirar fotos e quando é assim vejo que é bom (Mauro, 25 anos).”

Porém, para o grupo entrevistado, há vários constrangimentos sociais, principalmente

referente ao facto da maioria das pessoas não aceitarem essa diferença, suas vidas são

mais “complicadas” que as demais. Há que se fazer face aos vários desafios como o

preconceito, o estigma, levando até a ter alguma dificuldade nos relacionamentos. Esta

não-aceitação os faz viver uma situação de vulnerabilidade e em casos extremos chegam

a sofrer algum tipo de violência.

“Sofri preconceito ainda novo porque não estava consciente de que ser albina é uma

deficiência. Esta fase da minha vida foi a que mais dificuldades passei, porque ainda

não sabia nada acerca do albinismo (Joana, 24 anos).”

Já fui para uma festa e quando cheguei olharam torto para mim uns afastaram-se

outros sentiram medo de se aproximar e conversar comigo. Essa maneira de agir me

fez sentir que eu estava a encomodar coma minha presença ai eu voltei para casa. Na

verdade são poucas pessoas que se relacionam querem ser meus amigos (Marisa, 18

anos). ”

28

Nesse momento salientamos o trabalho de Goffman (1982), quando chama atenção para

o facto de que um indivíduo que poderia ter sido facilmente recebido na relação social

quotidiana possui um traço que acaba por impôr a atenção e afastar aqueles que ele

encontra, destruindo a possibilidade de atenção para os outros atributos seus. O estigma

se constrói numa relação impessoal com o outro, ou seja, o sujeito não nasce como uma

personalidade empírica, mas como aspecto circunstancial de determinadas

características peculiares que o levam à categoria do estigma, com deliberações e

marcas internas que podem sinalizar um desvio, e também uma diferença social.

A discriminação e o preconceito como assinalado, estão presentes no seu quotidiano,

uma vez que as características físicas os fazem distinguirem-se também

“negativamente” a partir do olhar de estranhamento do outro, gerando tensões no

processo de interacção quotidiana. Essas tensões são provocadas principalmente pelos

“não albinos”, que não aceitam as diferenças e os procuram excluir socialmente. Não

obstante essa dificuldade eles, com maior ou menor superação, conseguem relacionar-

se, tem amigos, namorados, uma vida social pois percebem-se como mais um no meio

de tantos outros que também têm características diversas do padrão socialmente

estabelecido seja branco, ou seja negro, etc.

…aahhh meus amigos me tratam bem até eu esqueço que sou albina, nenhum momento

me deixaram triste fizeram eu me sentir mal pela minha cor da pele. Até as vezes falam

mesmo somos iguais você só é mais clara e isso para mim é bom (Carlos, 24 anos). ”

“Ainda não sou casada mas sinto que um dia vou casar. Apesar de algumas pessoas me

porem em baixo meu namorado não tem vergonha de mim, mesmo onde declamo meus

poemas me elogiam e apreciam muito minhas qualidades (Marisa, 18 anos). ”

De acordo com Goffman (1988), as sociedades estabelecem os meios de categorizar as

pessoas e o total de atributos considerados como comuns e naturais para cada uma

dessas categorias. Nessa situação acabamos por retirar ou não aceitar alguma qualidade

ou capacidade a alguém que tenha uma característica incomum, podendo mesmo retirar-

lhe a sua essência ou seja desqualificá-la. Na perspectiva de Mazula (1998), a

desqualificação do outro acontece diariamente; acontece no quotidiano, algumas vezes

de forma despercebida, não nos damos conta, porque ela está presente na vida

quotidiana. Achamo-la “normal”; “naturalizamo-la”; não nos passa pela cabeça

29

questioná-la. O quotidiano caracteriza-se pela vivência dos factos e acontecimentos,

nem sempre reflectidos; por reacções espontâneas que temos na altura, mas não

percebidas não vemos porque estamos envolvidos.

“Quanto a mim não tenho problemas, consigo me relacionar bem com os não albinos.

Tenho muitos amigos não albinos e temos boa relação. O problema muita das vezes não

é da minha parte, mas algumas pessoas não querem se relacionar comigo (Mauro, 25

anos). ”

“Tem sido normal a minha relação com as pessoas que não são albinas. Porque temos

conversas saudáveis em que todos tem oportunidade de opinar ou expôr suas ideias,

converso de igual para igual com uma pessoa de pele escura, mulata, branca. Do

mesmo jeito que duas pessoas de pele escura dizem bom dia é do mesmo jeito que digo

e sou correspondido. Não há diferença, talvez por eu ser único albino na família nunca

tive dificuldades para me relacionar com os outros não albinos (Miguel, 26anos). ”

Não obstante, a família contribui no apoio a superação das dificuldades diárias. Desde

criança, os pais procuram informar-se acerca do albinismo, como forma de poder ajudá-

los (as) a ter uma vida “normal” a de qualquer outra pessoa. O ambiente familiar

demonstrou ser o lugar onde mais a vontade se sentem pois recebem o carinho, a

atenção, o apoio e principalmente a aceitarem-se como são. A discriminação é notória

no espaço da rua, em lugares públicos como escola, mercados, até no caminhar pelas

ruas. A rejeição é manifestada quando as pessoas chegam a proferir algumas palavras

pejorativas como “ Xidjana” (albino), “Bolada” (negócio), ou indirectamente quando é

percebida através de olhares, afastamentos ou actos de discriminação.

“A vida do albino é frágil porque tem que ter certos cuidados com o corpo, e existem os

preconceitos. Sinto-me muito bem em casa porque meus pais não me olham estranho,

me tratam bem e me ajudam todos os dias em como me cuidar e a ignorar o que me

falam nas ruas. (Ana, 22 anos). ”

“…tem sítios que não gosto de ir principalmente mercados porque lá tem muita gente e

muitas não escolarizadas, olham muito, falam muito… (Mauro, 25 anos). ”

30

Quando o estigma de determinada pessoa é bastante perceptível como no caso em

estudo, o simples contacto com o outro o deixará aparente a informação que os outros

têm do estigmatizado que pode ser fundamentada nos rumores ou em relações

anteriores. O que se pode extrair desta abordagem é que os estigmas não existem em si

mesmos, eles se estabelecem a partir de uma relação que se dá entre os padrões sociais e

todo o resto que a eles não se coadunam (Goffman, 1988). Diante das experiências

vividas, os (as) entrevistados (as) destacam técnicas e estratégias usadas como forma de

suplantar as dificuldades.

5.4.Estratégias usadas para superação do estigma

O estigma8 que o albino carrega traz marcas e simbolismos negativos que os

transformam aos olhos do outro em pessoas “incapazes” de exercer as mesmas

actividades dos não albinos. A forma com que sua imagem é fixada e associada à

figuras “estranhas” como fantasmas, filhos do diabo, marca suas vidas como indivíduos

que “não deveriam fazer parte da sociedade”.

“Tudo que um ser humano tem vontade de fazer faz com um albino, mas as pessoas

acham o albino um ser anormal, que se dependesse deles não fariam parte dessa

sociedade (Carlos, 24 anos). ”

“..sim sou albina mas não vejo problema nenhum nem, eu ando, falo, converso, estudo,

cozinho e faço isso e muitas outras coisas bem e muito bem. Agora eu sou claro ou

branco mas isso não constitui nenhum impedimento. Eu tenho orgulho de mim muito

mesmo (Ana, 22 anos). ”

De acordo com Berger & Luckman (2004) vida quotidiana apresenta-se como uma

realidade interpretada pelos homens e subjectivamente dotada de sentido para eles na

medida em que formam um mundo coerente. Os autores avançam afirmando que, o

mundo da vida quotidiana se origina no pensamento e na acção dos indivíduos sendo

afirmado como real por eles. Sendo assim, as objectivações dos processos (e

significações) subjectivas graças as quais é construído o mundo intersubjectivo do senso

8 As sociedades definem os atributos considerados “naturais” e “comuns” dos indivíduos que fazem parte

delas. O que Goffman chama de identidade social virtual. O (a) estigmatizado (a) é aquele (a) cuja

identidade real inclui características que vão de encontro as expectativas daquilo que é definido

socialmente como sendo “normal”. ( Goffman, 1988)

31

comum. Neste caso constamos que as interpretações do senso comum sobre o albinismo

são subjectivamente intencionais por meio de significados atribuídos a este grupo

social.

Com objectivo de superação de tal realidade são criadas algumas estratégias que servem

como fio condutor e forma de luta pelo reconhecimento social como indivíduos plenos.

Em primeiro plano destacam a importância da auto - aceitação, isto é, de acordo com os

entrevistados para que os outros possam os aceitar, independentemente da aparência

física, antes de mais nada, há que se aceitar, gostar se si como é. Para o grupo só assim

os outros os aceitarão.

“ Eu tenho que me aceitar primeiro e ser feliz por ser albino. Ter a liberdade de fazer

as coisas mediante as minhas capacidades para mim, eu sou o tal, não tenho problemas

com ninguém, já pus na minha mente que eu não sou estranho (Carlos, 24 anos). ”

“No inicio foi meio complicado porque eu vi que era clara no meio de pessoas escuras

mas depois me habituei e acostumei como minha cor e me aceito assim como sou a

vontade. Eu até pensei se eu não gostar de mim quem ira nem….(Miguel, 26 anos).”

A aquisição do conhecimento acerca do albinismo, lhes coloca numa zona de conforto

pois, á medida que a informação e o conhecimento aumentam as pessoas vão superando

os preconceitos. Além disso, estes percebem que não são os únicos a serem

discriminados na sociedade. Por sua vez, a falta desse saber tem sido a força motriz por

trás das situações negativas vividas.

“Procuro acreditar em mim, confiar naquilo que sei e ignorar as coisas que falam

sobre albinismo. Eu sei que tudo não passa de mentira (Mauro, 25anos).”

“Ignoro as pessoas porque eu sei que não sou a única a ser discriminada. Ser albino é

uma qualidade porque onde estou consigo me destacar. As pessoas discriminam outras

pessoas, todo mundo sofre discriminação então eu me sinto mas uma no meio de todas

outras pessoas que são descriminadas outras porque são magras, gordas, pobres, do

mesmo (Ana, 22 anos). ”

Entretanto quando olham para si mesmos e vêem que a pele, os olhos e os cabelos

claros são bonitos, pois são atributos incomuns que os diferenciam, os fazem sentir

32

destacados no meio de aparências semelhantes. O se sentir ser belo os faz superar

obstáculos. O grupo demonstrou ter segurança sobre aquilo que o albino é e aquilo que

pode ser independentemente de ser considerado ou não “anormal”. Essa segurança

advém do conhecimento adquirido e, na verdade, não se preocupam muito com que os

outros possam falar.

“Quando tentam me pôr em baixo ignoro e mostro que estou bem comigo mesmo por

mais que falem qualquer coisa não conseguem me atingir. Eu criei em mim que quando

saio para rua sou o tal por mais que alguém tente me desprezar eu nem percebo ou até

percebo mas não levo em consideração porque eu sei que sou o tal (Carlos 24 anos).”

De acordo com Goffman (1982), uma pessoa estigmatizada pode dedicar um grande

esforço individual no domínio de actividades consideradas geralmente “fechadas”,

devido as condições físicas, numa tentativa de romper com a realidade de seus atributos,

empregando uma interpretação não convencional do seu Eu. Este desempenho ou

esforço foi possível notar nas pessoas com albinismo, onde procuram demonstrar o seu

valor, rompendo deste modo com o que é socialmente previsto. Nas entrevistas foi

igualmente destacado a importância de se estar engajado em actividades artísticas,

nomeadamente, música, teatro, moda, fotografia, entre outras. Acredita-se que são

meios de fazer transmitir suas experiências, seus sentimentos, e principalmente de

sensibilizar a sociedade. Segundo o grupo, há que se ver e sentir como uma pessoa

“normal” e gostar daquilo que está a ver sem se importar com as diferenças que as

separam uma das outras.

“Uso a música, nos meus shows interpreto na música para ver se as pessoas aprendem

o que é albinismo de verdade (Joana, 24 anos). ”

“A poesia é o meu refúgio e me fortalece. Eu faço poema e uso para sensibilizar as

pessoas e quando faço poemas me ajuda a ignorar. Tento transmitir a todos que somos

todos iguais e temos os mesmos direitos de sermos inseridos na sociedade e não a

exclusão. (Marisa, 18 anos). ”

É nesse sentido, torna-se fundamental empreender, exigir do Governo e da sociedade

civil acções que garantam a igualdade e justiça social.

33

5.5.Construção da equidade

O estigma possui duas categorias interligadas: o estigma sentido e o estigma sofrido. O

primeiro, consiste na depreciação e exclusão pela pessoa que possui características e

condições socialmente desvalorizadas. Já o segundo está ligado as acções, atitudes ou

omissões concretas que provocam danos ou limitam os benefícios das pessoas

estigmatizadas (Goffman, 1988).

Os entrevistados exemplificaram situações através de constante superação e destacaram

a igualdade entre as diferenças. Segundo o grupo, a dificuldade do reconhecimento por

grande parte da sociedade dificulta a inclusão social. Dentre as mais importantes é a

invisibilidade social a que são lançadas, considerados como doentes, aberração, e

portadores de poderes mágicos etc., e assim discriminados na condição de indivíduos

com plenos direitos e deveres. Essa discriminação, acontece de duas formas, a primeira,

intrinsecamente, quando o próprio indivíduo se auto-discrimina, isto é, ele aceita de

certa forma, a convenção social que lhe faz ver como diferente dos outros; a segunda,

extrinsecamente, quando a sociedade os estigmatiza e limita, suas acções dificultando a

execução de suas actividades quotidianas.

Goffman (1988), fala da “visibilidade”, “ perceptibilidade”, ou ainda “evidenciabilidade

” do defeito ou marca (a cor da pele, dos olhos e cabelo neste caso) onde os albinos

tendem a ser fortemente estigmatizados em grande medida porque o seu “defeito” é

facilmente identificável ou como explica o autor, quando o estigma de um indivíduo é

muito visível, o simples fato de que ele entre em contacto com os outros levará o seu

estigma a ser conhecido e com isso as barreiras impostas a eles.

“Evitam estar com albinos, a maneira como nos olham. Na sociedade as pessoas olham

e ti julgam pela aparência antes de saber o que podes fazer e depois quando mostras o

que fazes ti olham diferente. Nos todos somos iguais, mas existem crenças que falam

sobre nós, mas não são reais porque os albinos também são seres humanos (Miguel, 26

anos) ”.

“Do mesmo jeito que duas pessoas de pele escura dizem bom dia é do mesmo jeito que

digo e sou correspondido. Não há diferença, talvez por eu ser único albino na família

nunca tive dificuldades para me relacionar com os outros não albinos (Carlos, 24

anos).”

34

As várias percepções que se tem em torno do albinismo, tem uma influência na

construção de estereótipos sobre esse grupo social e que serve de base para que o albino

seja visto como um indivíduo sem raça, um ser que não morre, uma bênção ou maldição

pautando as interacções. Assim sendo, eles (as) têm, no seu dia-a-dia, dificuldades de

um enquadramento de facto na sociedade devido às diversas atitudes discriminatórias

que criam fronteiras artificiais de pertença, os exclui socialmente, sendo-lhes recusada

as dimensões da igualdade e justiça.

...”nos todos somos iguais, mas essas crenças que falam não são reais porque os

albinos também são seres humanos. Pessoas ignorantes que ainda acreditam que é

possível ser rico, ter mais vida se matarem um albino. Porque eu particularmente não

sei porque fazem isso mas não faz sentido (Miguel, 26anos).”

As barreiras e os obstáculos que vivenciam diuturnamente lhes faz lembrar o quanto,

parte da sociedade, lhes rejeita reforçando a imagem que se tem do outro, das pessoas

com albinismo como incapazes e prejudiciais á sociedade, e assim não deveriam

pertencer á ela. Uma das estratégias comuns adoptadas pelo grupo face aos

constrangimentos vivenciados é a de “provar” para “os normais” que eles são iguais

tentando superar limites que lhes são impostos.

“Tudo que um ser humano tem vontade de fazer faz com um albino mas as pessoas

acham o albino um ser anormal, que se dependesse deles não fariam parte dessa

sociedade. Já metí vários currículos e já me disseram que não vão me aceitar. Uma vez

já me disseram na cara que o patrão daqui não vai ti dar emprego porque é muito

racista. Logo que disse isso percebi que é o factor de eu ser albino. (Carlos, 24 anos).”

Existem muitos desafios na rua, para apanhar o chapa acabam nos arranhando,

pisando, nos chamam nomes. As dificuldades nas amizades porque são poucas mas são

verdadeiros perante a tantos insultos e injustiças contra os albinos (Marisa, 18 anos).”

Por causa da diferenciação causada pela não pertença aos padrões socialmente aceitos

para se definir o cidadão “normal”, o albino vivencia situações de violência psicológica

e física. Alguns casos ocorrem de forma oculta, dentro das casas, nos locais de trabalho,

na comunidade onde vivem, outros forçados a se manterem em silêncio. A violência

diluída no tecido social, cultural e económico é a que mais lhes é sentida como por

exemplo, aquela vivida no espaço da escola. Ai deveria ser um lugar onde as pessoas

35

apreendem a ser e estar em sociedade para além do aprendizado, entretanto tem

demonstrado ser um lugar de perpetuação e fortalecimento da violência e inequidade. O

depoimento abaixo ilustra:

“já tive dificuldades em participar nas aulas porque tive uma professora que nunca

aceitava eu resumir a aula pelo facto de eu ser albina. Sempre que eu me voluntariasse

ela dizia outra pessoa ate que um dia eu perguntei e ela disse porque você é albina.

(Mauro, 25anos).”

...”várias vezes já me bateram na escola, me chutaram me deram chapadas com

colegas da escola dizendo que não sou pessoa sou fantasma (Marisa, 18anos).”

36

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

No trabalho apresentado, foi objectivo geral compreender como as pessoas com

albinismo se constroem enquanto indivíduo. Para o alcance deste objectivo teve-se

como específicos, descrever o perfil das pessoas com albinismo; relatar como as pessoas

com albinismo vêem a diferença com relação as pessoas não albinas; identificar as

estratégias usadas pelos albinos para a superação do estigma; e por fim aferir como as

pessoas com albinismo se constroem com vistas a equidade.

A partir do material obtido no terreno, pôde-se concluir que são diversos os desafios

enfrentados pelos albinos desde o seu nascimento à vida adulta, passando por

constrangimentos, falta de informação, estigma, preconceitos, discriminação e tendo a

efectivação dos seus direitos fragilizada na maioria das vezes. Com os depoimentos

ilustrados, foi possível perceber que a condição albina é um “sofrimento” para as

pessoas que a tem. Ser um “estranho”, significa ser capaz de viver uma invisibilidade e

ambivalência constante, ou seja, existe uma tensão entre as pessoas com albinismo e as

pessoas “normais”.

Parte da sociedade associa o albinismo com alguma perda cognitiva e/ou como pessoas

incapazes de exercer as mesmas actividades, reforçando o preconceito e falta de

informação. Nesse sentido, este grupo luta constantemente pelo seu reconhecimento e,

principalmente para sair da condição de invisíveis, através da reivindicação dos seus

direitos.

As discriminações mais recorrentes baseiam-se no fato de serem considerados

diferentes. Entretanto, através das entrevistas, pôde-se perceber que as pessoas com

albinismo se vêem como pessoas “normais”, embora tenham a pele, os olhos e os

cabelos mais claros. Essa diversidade fisiológica é encarada pelo grupo, como uma

dentre as várias diferenças que existentes na sociedade. Porém, devido a forma como

são vistos, discriminados, estigmatizados, acaba-se criando diversas barreiras sociais.

O estigma e a discriminação são acentuados em ambientes diversos, principalmente nos

espaços públicos como, rua, escola, local de trabalho, e em menor escala no ambiente

familiar, até porque este demonstrou ser o lugar onde mais a vontade se sentem com o

apoio dos seus familiares. Para fazer face a estes constrangimentos sociais, este grupo

adopta estratégias de superação, que como verificamos ao longo do trabalho, estes têm

37

ajudado a levar a cabo as suas capacidades como indivíduos plenos, e assim saírem da

categoria dos invisíveis. A existência de infinitas diferenças entre os indivíduos é

constante, e não se deve estranhar em princípio a sua ocorrência uma vez que os

diversos tipos de identidade são construções sociais e historicamente determinadas nas

quais se mantém relações de poder assimétricas.

Contudo, confirmamos a hipótese levantada neste trabalho segunda a qual, as pessoas

com albinismo se constroem enquanto indivíduos a partir da forma como se vêem e

vêem o outro. De referir que estes indivíduos estão inseridos socialmente. O preconceito

que existe em torno do albinismo faz com que sejam diferenciados mas não exclusos

pois pôde-se perceber também que em função do estigma que carregam adoptam

estratégias com vista a garantir uma vida social integral.

38

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http://portal. mj.gov.br/sedh/ct/legis_intern/ddh_bib_inter_universal.htm >.

http://www. pessoasalbinas.blogspot.com/feeds/posts/default, acessado aos 10.04.2017

http://www.pordentrodaafrica.com/ciencia/onu-pede-medidas-de-prevencao-contra-

ataques-a-albinos

ROCHA, Luciane de Melo; MOREIRA. Diagnóstico laboratorial do albinismo

oculocutâneo. Jornal Brasileiro de Patologia e Medicina Laboratorial, Rio de Janeiro, v.

43, nº 1, fev. 2007. Disponível em: < http://www.scielo.br/scielo.php?pid=

S167624442007000100006&script=sci_arttext>. Acesso em: 04.04 2017.

42

8. ANEXOS

GUIÃO DE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA PARA O GRUPO-ALVO

ABRANGIDO PELA PESQUISA

Saudação, apresentação do entrevistador e informação sobre os objectivos do trabalho a

fim de situar o entrevistado.

Esta investigação insere-se no âmbito da realização do trabalho de licenciatura em

Sociologia na Universidade Eduardo Mondlane. No entanto, comprometemo-nos, por

razões éticas e profissionais, a fazer uso dos dados recolhidos somente para fins da

presente investigação, manter-se-á o sigilo.

I. Perfil sócio - demográfico

Dados pessoais

1.Idade

a)18 a 20 anos ( ) b) 21 a 25 anos ( )

c) 26 a 30 anos ( ) d) 31 a 40 anos ( )

e) A cima de 40 anos ( )

2.Género:

a) Masculino ( ) b) Feminino ( )

3. Local de residência……………

3.1. a) Própria ( ) b) alugada ( )

4. Renda

a) Pessoal ( ) b) familiar ( )

5. Com quem reside

a) Família ( ) b) amigo ( ) c) sozinho ( )

6.Nivel Académico:

a) Primário ( ) b) Técnico ( )

c) Secundário ( ) d) Superior completo ( )

e) Superior incompleto ( ) f) Mestrado ( )

g) Doutorado ( )

43

7.Profissão

a) Por conta própria ( )

b) Funcionário do aparelho de Estado ( )

c) Funcionário do sector privado ( )

d) Desempregado ( )

8.Estado civil

a) Casado ( )

b) Solteiro ( )

c) União marital ( )

e) Divorciado ( )

II. Secção de perguntas abertas.

1. Na sua opinião, o que é ser albino?

2. Poderia nos dizer como é a vida de um albino?

3. Pode nos descrever a tua rotina diária?

4. Participa de algum grupo voltado para albinos?

5. O que entendes por discriminação?

6. Sentes que a sociedade discrimina os Albinos? Se sim de que forma consegue perceber

essa discriminação?

7. Você já foi rejeitado (a) por alguém próximo? Desconhecido?

8. Acha que foi pelo facto de você ser albino?

9. Em qual espaço você se sente mais discriminado?

10. Alguma vez já foi proibido (a) de frequentar algum espaço público por ser albino?

11. Já teve alguma dificuldade para ter acesso a alguns serviços (saúde, transporte,

educação, trabalho) por ser albino(a)? Se sim, o que foi e qual foi a sua reacção?

12. Como tem sido a sua relação com as pessoas não albinas?

13. Alguma vez já foi agredido (a) (física ou verbal) por ser albino?

14. O que você faz para contornar ou superar essa discriminação e/ou rejeição?

15. Você conhece alguma crença em Moçambique sobre os albinos? Se sim, como você lida

com isso?

16. E com relação ao tráfico de albinos, você acha que tem uma relação com as crenças?

44

17. O que você sente diante desses factos?

18. Quais são as estratégias que você usa para lidar com essas vivências?

Muito obrigado pela sua disponibilidade em responder as questões reiterando a

confidencialidade dos dados e tratamento das informações para fins desta pesquisa.

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TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

Prezado participante,

Você está sendo convidado(a) a participar da pesquisa de trabalho de fim de curso

desenvolvida pela estudante Atineja Cândida Jorge Gune, aluna do curso de Sociologia

da Universidade Eduardo Mondlane.

O objectivo central do estudo é compreender como as pessoas portadoras de albinismo

se constroem enquanto indivíduo.

Sua participação é voluntária, isto é, ela não é obrigatória, e você tem plena autonomia

para decidir se quer ou não participar, bem como retirar sua participação a qualquer

momento. Você não será penalizado(a) de nenhuma maneira caso decida não consentir

sua participação, ou desistir da mesma. Contudo, ela é muito importante para a

execução da pesquisa.

Serão garantidas a confidencialidade e a privacidade das informações por você

prestadas. Qualquer dado que possa identificá-lo(a) será omitido na divulgação dos

resultados da pesquisa, e o material será armazenado em local seguro.

A qualquer momento, durante a pesquisa, ou posteriormente, você poderá solicitar do

pesquisador informações sobre sua participação e/ou sobre a pesquisa.

A sua participação consiste em conceder uma entrevista que durará em média, 60

minutos e será gravada, a princípio, para que possamos registar todos os detalhes

importantes.

As entrevistas serão transcritas e armazenadas, em arquivos digitais, mas somente terão

acesso às mesmas a pesquisadora. A gravação será destruída.

Os benefícios são indirectos, ou seja, sua participação poderá contribuir para que

profissionais ou não entendam as suas demandas. Também irá contribuir para que os

governos ouçam suas vozes.

Os riscos que você corre são mínimos, e de ordem emocional. Ao contar sua história,

fatos pessoais desagradáveis poderão ser lembrados, e dizê-los ao pesquisador pode

causar desconforto. Mas tudo o que for dito no encontro manter-se-á em sigilo.

Ninguém contará que você participou da pesquisa.

Os resultados serão divulgados em relatórios individuais para os entrevistados e artigos

científicos.

Este termo é redigido em duas vias, sendo uma para você e outra para o pesquisador e as

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assinaturas deverão constar no final do Termo.

______________________________________

LOCAL E DATA

Declaro que entendi os objectivos e condições de minha participação na pesquisa e

concordo em participar.

_________________________________________

Assinatura do participante da pesquisa

Nome do participante:

Autorizo a gravação da entrevista.

Não autorizo a gravação da entrevista.