DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO … · Regulamentação do art. 192 da...
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CÂMARA DOS DEPUTADOS
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REVISÃO DE COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
COMISSÃO ESPECIAL - SISTEMA FINANCEIRO NACIONALEVENTO: Audiência Pública N°: 000540/01 DATA: 07/06/2001INÍCIO: 10h33min TÉRMINO: 12h17min DURAÇÃO: 1h44minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 1h48min PÁGINAS: 41 QUARTOS: 22REVISORES: VÍCTOR, ROSA ARAGÃOSUPERVISÃO: LETÍCIA, NEUSINHACONCATENAÇÃO: MÁRCIA
DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃOBEATRIZ AZEREDO — Diretora do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social —BNDES;CLARA STEINBERG — Presidenta do Banco da Mulher;VALDI DE ARAÚJO DANTAS — Diretor Executivo do Centro de Apoio aos PequenosEmpreendimentos — CEAP;ARY BURGER — Presidente da Cooperativa de Crédito Porto Sol.
SUMÁRIO: Exposição e debate sobre o tema “Propostas do Sistema de Microcrédito em faceda regulamentação do art. 192 da Constituição — Sistema Financeiro Nacional”.
OBSERVAÇÕES
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Sistema Financeiro NacionalNúmero: 000540/01 Data: 07/06/01
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Ricardo Berzoini) – Declaro abertos os
trabalhos da presente reunião da Comissão Especial – Sistema Financeiro Nacional.
Aguardaremos alguns minutos até que seja solucionado um problema técnico
no computador. (Pausa.)
Para compor a Mesa convido a Dra. Beatriz Azeredo, Diretora do BNDES.
Registro a presença da Dra. Clara Steinberg, Presidenta do Banco da Mulher; do
Dr. Ary Burger, Presidente da Cooperativa de Crédito Porto Sol; do Dr. Valdi de
Araújo Dantas, Diretor Executivo do Centro de Apoio aos Pequenos
Empreendimentos — CEAP; do Dr. Jorge Hilário Gouveia Vieira, Presidente da Viva
Credi; do Dr. Henry Jackelen, representante residente adjunto do PNUD —
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento; e do Dr. Paulo Fernando
Lima, Gerente Nacional de Microcrédito da Caixa Econômica Federal.
Tema da palestra: “Propostas do Sistema de Microcrédito em face da
Regulamentação do art. 192 da Constituição — Sistema Financeiro Nacional”.
Vale registrar que o Governo quer acabar com esse artigo. Portanto, teremos
de aguardar sua regulamentação. Como essa é uma discussão política, com certeza
deixaremos para outro momento.
Concedo a palavra a Dra. Beatriz Azeredo, Diretora do BNDES.
A SRA. BEATRIZ AZEREDO – Bom dia a todos. O BNDES sente-se
agradecido por poder apresentar os principais resultados do programa de
microfinanças. Contamos hoje com a presença de vários companheiros que
participam desde 1996 desse trabalho sobre o acesso aos microempreendedores
informais de baixa renda.
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O BNDES começou a trabalhar nesse assunto em 1996. Naquele momento,
tratávamos de um problema que vinha ocorrendo desde a década de 80: o crescente
contingente de trabalhadores no chamado mercado informal, com grande número de
pequenos empreendedores, dependendo dessas atividades para sua sobrevivência
e, portanto, do acesso ao crédito.
Em 1986, falávamos de um sistema financeiro no País extremamente
desenvolvido, regulado e pouco interessado na questão do microcrédito. Apesar de
existirem algumas experiências históricas bem-sucedidas no País naquele momento,
elas não foram suficientes para dar capilaridade a esse microcrédito, devido à
demanda. Falamos em apenas 8 milhões de reais mobilizados em 1996 para esse
tipo de serviço financeiro à população empreendedora de baixa renda.
Diante desse cenário — aí vale lembrar a atuação do programa Comunidade
Solidária, que, desde 1995, adotou o tema microcrédito como um dos temas de
trabalho e solicitou explicitamente ao BNDES que colaborasse —, o Banco
desenhou uma estratégia de atuação que permanece até hoje. A primeira questão é
o envolvimento do Banco em institucionalizar as microfinanças. Daí a importância de
estarmos presentes nesta reunião. Falamos de política, legislação e normas para
esse segmento. Ainda que o Banco tenha começado a trabalhar com organizações
não-governamentais em 1996, desde aquele momento, havia a perspectiva
fundamental de crescimento desse setor, com a inserção dessas instituições no
sistema financeiro nacional. Aquele não era um ponto de partida, mas um objetivo,
um ponto de chegada de toda a estratégia do BNDES.
Naquele momento, tratava-se também de promover a multiplicação desses
modelos já bem-sucedidos que ainda eram insuficientes. Como multiplicar essas
ONGs de microcrédito, como formar uma rede de instituições profissionalizadas
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capaz de entender a necessidade desse microempreendedor e conceder-lhe
crédito? Além do papel tradicional de prover financiamento para essas instituições, o
BNDES engajou-se num trabalho de estruturação, de apoio à criação,
profissionalização e ao treinamento dessas instituições. Vale ressaltar essa atitude
porque demonstra a vontade de criar. Em outras palavras, não bastava o BNDES
lançar um programa e dizer que havia uma linha de financiamento para as
instituições concederem crédito ao microempreendedor, porque simplesmente havia
poucas instituições. O trabalho do Banco foi ajudar a multiplicar essa experiência no
Brasil.
Ainda na nossa estratégia de atuação, exatamente porque a idéia era
multiplicar essas instituições, o Banco envolveu-se diretamente na sistematização de
uma metodologia, para capacitar aqueles trabalhadores das ONGs de microcrédito,
os agentes de crédito, pessoas capazes de irem até a casa do microempreendedor,
na favela ou num bairro, entender o negócio, porque muitas vezes não há sequer um
papel para mostrar qualquer resultado palpável, o negócio está apenas na cabeça
do microempreendedor. Enfim, é um trabalhador diferente capaz de sentar com esse
pequeno empreendedor, para saber se é ou não possível conceder-lhe crédito para
execução do projeto.
Não estamos falando de política social no sentido tradicional, mas de um
serviço financeiro com elevado impacto social, dada a população de baixa renda que
atinge. Na sua concepção, não é assistencialista, não conta com subsídio,
paternalismo, é apenas uma análise de crédito feita por um agente treinado, para
interagir com o cliente na sua grande maioria informal.
Enfatizo esse aspecto porque, de fato, até 1996, tínhamos algumas
experiências no Brasil muito bem-sucedidas e corporações internacionais que
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traziam para cá sua metodologia e voltavam com ela para seu país de origem. Quer
dizer, em 1996, não contávamos em nosso País com uma metodologia capaz de
capacitar agentes de crédito e trabalhar com esse segmento do mercado de
trabalho. Portanto, essa etapa inicial foi fundamental para um treinamento massivo
de agentes de crédito e deu sustentação a um processo vigoroso de criação de
organizações não-governamentais voltadas para esse segmento de 1997 para cá.
Vale a observar que, no caso brasileiro, temos uma peculiaridade em relação
a esse assunto, porque basicamente no mundo inteiro ele é bastante calcado em
iniciativas da sociedade civil. No caso do Brasil, temos, além da sociedade envolvida
em criar essas instituições, principalmente as Prefeituras municipais, traço peculiar
da experiência brasileira. Em particular, a partir de 1997, observamos em todas as
campanhas eleitorais a questão do emprego, do desemprego, mercado de trabalho,
e as Prefeituras muito empenhadas em como posso fazer para ter nas cidades uma
instituição de microcrédito. Portanto, os Governos municipais se engajaram nessa
estratégia, não para ter uma organização não-governamental, mas para estimular —
esse era um modelo do Banco — uma rede — auto-sustentável, profissionalizada e
autônoma e com controle por parte da sociedade. Então, muitas dessas instituições
foram criadas a partir de uma iniciativa, um apoio muito firme das Prefeituras que
doaram recursos inicialmente para o fundo dessas instituições, ajudaram na sua
estruturação, pagaram a capacitação de agente de crédito, mas essas Prefeituras
hoje têm um voto no conselho dessas instituições e não há qualquer dependência de
recursos do Tesouro, recursos orçamentários. Esse é um ponto crucial nesse nosso
modelo que tem papel importante dos Governos municipais.
Voltando a nossa estratégia, fizemos essa capacitação de profissionais, essa
premissa de auto-sustentabilidade e controle social da rede com a parceria
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fundamental do Poder Público e o papel tradicional do Banco, aí o banco de
segunda linha, provendo recursos financeiros.
Passado esse tempo, de 1996 para cá, podemos dizer que o Banco hoje já
tem uma estratégia, dois programas relativos a microfinanças. O primeiro deles é a
provisão de recursos para — que é o Programa de Crédito Produtivo Popular — a
criação dessa rede, o estímulo a essa rede. Basicamente estamos falando de ONGs
ou mais recentemente de OCIPs e mais recentemente ainda de SCM. São os
clientes do Banco no âmbito desse programa. Clientes para quê? Para receber
recursos do BNDES reembolsáveis ou contrato de administração de recursos, no
caso das ONGs, ou um contrato de financiamento, no caso das SCMs, e elas
operam então lá na ponta provendo crédito ao microempreendedor principalmente
do segmento informal.
Vou voltar a falar de SCM que acho que é um ponto central da discussão de
hoje, mas vou passar pelos nossos resultados até agora. Estamos falando de uma
rede, portanto construída de 1996 para cá, de 27 instituições em carteiras, algumas
delas já existentes antes de 1996, a maioria criada a partir desse trabalho do
BNDES. Essas instituições têm uma carteira ativa de 32 milhões, o BNDES já
aprovou 47,8 milhões e observamos aí a evolução, não só do valor emprestado
como também do número de créditos concedidos. Começando por esse último, no
ano passado essas instituições concederam 74 mil créditos na ponta. Não significa
necessariamente 74 mil empreendedores, porque a idéia do microcrédito é que ele
volta, ele pega e ele volta, tem o crédito consecutivo, então, tem aí um pedaço que é
renovação de crédito. Até maio deste ano tem-se 26 mil créditos concedidos.
Estamos falando de instituições que atuam em dezesseis Estados e cobrem na sua
expansão regional, na sua regionalização, atualmente 268 Municípios.
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Quero observar que trouxemos um folder do Banco que tem todos esses
dados arrumados e essa apresentação também está disponível; o disquete vai ficar
aí e tem uma cópia da apresentação para o Presidente da Comissão.
Para termos uma idéia de que perfil de crédito é esse que está sendo
concedido por essas 27 instituições, estamos falando de um valor médio de 1.164
reais, um prazo de 4,4 meses. A idéia do curto prazo de renovação é a de que se
tem uma linha de crédito que se estende para esse empreendedor, que ele vai
pagando e voltando e pegando um pouco mais e volta; faz parte da própria filosofia,
da metodologia de se trabalhar com essa clientela. Tem uma faixa de encargos
média mensal de 3 a 5,8% ao mês. Vale a pena chamar a atenção que ainda é
muito caro o microcrédito, comparado com o que poderia ser barato, mas ele já é
barato em relação, primeiro, ao acesso que muitas vezes sequer tem esse
microempreendedor. Costumamos dizer que o crédito mais caro é aquele que não
existe, antes de mais nada. Então há um primeiro movimento em que o crédito está
sendo concedido e por que ele é caro? Porque ele custa caro. Tem-se uma
metodologia bastante trabalhosa, um custo operacional alto, uma provisão de perdas
que é fundamental assim como se tem uma taxa de capitalização que também é
fundamental, porque estamos falando de uma rede autônoma auto-sustentável
crescendo, que, portanto, não tem subsídio, não tem recurso do Tesouro. Ela tem de
ter uma taxa de capitalização e permanece aí a questão do custo baixo como
objetivo. Do ponto de vista do BNDES, é um objetivo de longo prazo. Este é um
ponto central. O baixo custo do microcrédito não é uma premissa para o Banco, é
um objetivo que tem que ser buscado a partir do crescimento dessa rede, do
aumento da produtividade dessa rede, da capacidade de ela gerar recursos e,
portanto, lá na ponta, baixar o seu custo operacional e poder cobrar mais baixo. Mas
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eu diria que é crucial que essas instituições possam cobrar na ponta o suficiente
para crescer e ter autonomia em termos de taxa de capitalização.
Ainda no perfil desse crédito que está sendo concedido, estamos falando de
93% voltados para o chamado capital de giro, que é a grande e primeira
necessidade desse microempreendedor. Quando ele vai renovar, já pensa num
capital, no equipamento usado, lá na terceira rodada, no equipamento novo e por aí
vai, mas há sempre o capital de giro como a necessidade número um desse
empreendedor e necessidade permanente, e o crédito está aí para atender a essa
demanda. Basicamente os microcréditos estão concentrados no setor de comércio e
serviços; 77% foram concedidos para os empreendedores informais. Está aí o foco
desse programa, dessas instituições voltadas para esse segmento que, muitas
vezes, não tem sequer conta em banco e mais ou menos um equilíbrio com o
público masculino e feminino de empreendedores.
Em relação à inadimplência, estavam ali apontados 4,6 de inadimplência,
créditos com atrasos acima de trinta dias. Esse ponto aqui é central porque se
costuma dizer: “Ah, a inadimplência é zero; a inadimplência não existe, é baixa; o
pobre paga”. Há certas vezes fantasia em relação ao microcrédito.
Primeiro ponto: a inadimplência é baixa, sim, comparada com o sistema
financeiro nacional como um todo. Agora, ela é baixa porque essas instituições
trabalham com uma metodologia extremamente adequada a essa clientela. O
empreendedor de baixa renda paga, porque sabe que ali terá uma linha de crédito
permanente e há todo um tratamento técnico, dado na hora da concessão do
crédito. O agente de crédito é treinado para ter uma carteira, um portifólio de baixa
inadimplência. Portanto, ele tem que olhar aquele crédito sob a perspectiva de
sustentabilidade, de viabilidade e tem de ser treinado para dizer também ”não”.
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Não é uma concessão em aberto, análise de risco de crédito como outra
qualquer, com toda a peculiaridade de se trabalhar com empreendedor que não vai
ter nenhum papel, não vai ter garantia real, não vai ter balanço para mostrar, enfim,
não vai ter nenhum instrumento tradicional no sistema comercial, bancário, de
crédito. É crucial que estejamos sempre apontando para instituições altamente
profissionalizadas, que têm um conjunto significativo de produtos e serviços e
tecnologias de concessão de crédito adequadas a essa clientela, para sustentar um
crescimento com a baixa inadimplência, que é buscada através de um método de
trabalho muito rigoroso.
Eu tinha chamado a atenção para o fato de que temos dois programas,
apenas uma forma de apresentar nossa estratégia de atuação. O primeiro deles
prover esse funding de empréstimos a instituições, trabalhar junto com elas, e ter
esse programa mais genérico que chamamos de desenvolvimento institucional. O
Banco continua acreditando que é fundamental, não adianta apenas prover funding,
por exemplo, através do BNDES ou de outras instituições financeiras oficiais federais
sem a preocupação do crescimento dessa indústria de microfinanças, como
chamamos. É fundamental que isso tenha uma sustentabilidade do seu crescimento.
No limite para nós, no BNDES, é muito importante que essas instituições lá na
frente possam até prescindir dos recursos do Banco, que elas sejam capazes de
captar no mercado — vou falar um pouquinho disso aí —, de serem autônomas,
sustentáveis e de poderem crescer até sem o recurso do Banco. O Banco, portanto,
teria a função de estar estimulando o nascimento e a estruturação dessa indústria de
microfinanças.
O Programa de Desenvolvimento Institucional dá seqüência a essa agenda de
trabalho que começou em 1996/1997, que mencionei, com a sistematização de uma
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metodologia de capacitação de agente de crédito. O que fizemos naquele momento?
Sistematizamos a metodologia, ajudou na aplicação de centenas de agentes de
crédito e disponibilizou essa metodologia para qualquer instituição do mercado que
queira trabalhar com esse assunto. Então, isso aí está disponibilizado na rede, em
disquete, em papel para qualquer instituição.
A idéia aqui é exatamente a mesma: que outros serviços e produtos que
possam aumentar a produtividade, a profissionalização dessas instituições devem
ser desenvolvidos e disponibilizados para o mercado em geral. O que temos aí?
Temos um convênio com o BID, que, em absoluta consonância, convergência de
princípios com o BNDES e vice-versa, decidiu deixar de apoiar individualmente as
instituições de microcrédito no Brasil e aportar um volume de recursos, entendendo
ser muito importante o chamado desenvolvimento institucional. Estamos falando de
recursos não reembolsáveis nesse caso.
Já estou antecipando alguns resultados dele, de instituições que tiveram
acesso a esse recurso, mas eu passaria para a seguinte, apenas para dar uma idéia
do que estamos pretendendo e já estamos fazendo com esses recursos. É a
sistematização ou a criação de produtos novos. Por exemplo: um credit-score para
ajudar o agente de crédito na ponta e aumentar a sua produtividade.
Quanto ao microcrédito rural, o Banco sequer mergulhou nessa agenda. Toda
aquela rede que eu mencionei é de microcrédito urbano.
No que se refere à governabilidade dessas instituições, a regionalização, a
medida do sucesso também são essas ONGs saírem das suas cidades de origem e
começarem a abrir novas agências, não só nas cidades como também nos
Municípios vizinhos. Como sustentar esse crescimento de regionalização?
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Mais a seguir, falarei sobre a transformação ou a criação por parte de
algumas ONGs de uma Sociedade de Crédito ao Microempreendedor dentro do
sistema financeiro nacional. Quanto aos sistemas de informações gerenciais, é
fundamental ter sistemas bem desenvolvidos e adequados para essa atividade para
um maior controle, visibilidade e produtividade dessas instituições.
Quanto aos procedimentos de auditoria, não temos um sistema de auditagem
de contas adequado a essa atividade. A auditoria é muito nova e também tem que
ser desenvolvida no sentido de como auditar essas contas, esse fundo rotativo de
crédito dessas instituições. Isso já está sendo desenvolvido.
No que se refere ao sistema de rating institucional, é fundamental também
que possamos olhar esse horizonte, 27, 30, 40 lá na frente, e entender que
instituições são essas, de quais parâmetros vamos dispor para julgar a
profissionalização, a competência, a produtividade, a confiabilidade, o desempenho
de uma instituição de microcrédito. Hoje, não temos esses elementos, então, a idéia
é que possamos ter no País um sistema de rating institucional que nos permita a
cada momento avaliar o que está acontecendo e principalmente permita aos
investidores no sistema financeiro escolher as instituições em que eles podem estar
investindo.
Quanto ao mecanismo de gestão de uma instituição microfinanceira, é um
conjunto bastante detalhado, tem o propósito de mostrar o seguinte: não há mágica
para se fazer no microcrédito, não basta provisão de recursos, infelizmente não é só
recurso para funding de microcrédito. Temos que fazer o investimento pesado, de
alta complexidade em tecnologias de microcrédito. É um serviço para pobre, para
população empreendedora de baixa renda, mas é um serviço altamente complexo,
sofisticado e que não existe no mercado. Estamos criando no Brasil essa
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experiência, essa indústria, e há que se fazer muito desenvolvimento técnico de
produto, há que se formar um mercado. O que adianta termos, por exemplo,
sistemas de informação gerencial, de auditoria, se as instituições não estão
preparadas para prestar esse serviço? Então, aqui a idéia é ter esses serviços,
esses produtos sistematizados, desenvolvidos, disponibilizá-los para o mercado,
mas pensando na demanda por esses serviços e também na oferta. Que instituições
são essas que hoje não existem no mercado que serão capazes de, com esses
produtos em mãos, poder prestar esses serviços para as instituições de
microcrédito? É isso que está em jogo e, portanto, estamos falando de uma agenda
de longo prazo, mais uma vez, de resultados absolutamente ainda lentos em relação
à demanda que existe por esse serviço no País; mas é o único caminho para uma
rede sustentável de mircrofinanças.
Com isso encerraria, passando rapidamente pela agenda do BNDES para
este ano. Estamos, em primeiro lugar, em relação às instituições já em carteira,
estimulando a sua profissionalização através desse PDI — Programa de
Desenvolvimento Institucional. Portanto, com recursos não reembolsáveis e a sua
regionalização. Várias instituições que já pegaram os recursos do PDI — por
exemplo, a Porto Sol está aqui presente, a Blue Sol é outra, Viva Credi é do Rio de
Janeiro, Visão Mundial — já estão num terceiro crédito com o BNDES.
Simultaneamente, estamos provendo recursos não reembolsáveis nesse convênio
com o BID para desenvolvimento institucional e também — para usar aí uma
expressão mais informal — dando linha, dando funding para essas instituições
crescerem, concedendo-lhes mais recursos. Já estamos aí na terceira rodada de
aportes de recursos para essas instituições.
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Estamos muito preocupados com a distribuição regional desses serviços.
Como sempre, como garantir que as Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste
tenham também essa capilaridade em termos de instituições especializadas em
microempreendedores.
Também é possível começar a falar — e essa é uma agenda um pouquinho
mais para frente — em políticas públicas a partir dessas instituições. O tempo todo
estamos cobrando autonomia, auto-suficiência dessas instituições, mas por que não
para aquelas instituições mais autônomas, mais avançadas, começarmos a pensar
em atraí-las a partir de um funding do BNDES para regiões menos desenvolvidas,
em que o risco seja maior, para trabalhar com novos produtos financeiros para essa
clientela? Por que não financiar o chamado primeiro negócio? Sabemos que essas
instituições hoje estão preparadas para baixa inadimplência, sempre para um
negócio já existente, mas sabemos que a demanda é grande também para o crédito
para um primeiro negócio.
É um pouco aqui a idéia, por exemplo, de o Banco trabalhar com uma
agenda de desenvolvimento local, em alguns Municípios da Região Norte e
Nordeste. Por que não levar essas ONGs já bastantes desenvolvidas para trabalhar
nessas Regiões com essa clientela? Esse é o tipo da coisa de que só podemos falar
quando a ONG já tem uma velocidade suficiente para suportar um pedaço da
carteira de maior risco, de uma clientela que ainda não foi alcançada.
Finalmente, estamos falando em fortalecer esse modelo da Sociedade de
Crédito ao Microempreendedor. Isso daí é bastante recente. Considera-se no País
que é apenas o primeiro passo, o primeiro marco legal do microcrédito, que foi
lançado em junho de 1999. No final do ano passado, o BNDES aprovou as duas
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primeiras operações com esses SCMs. Portanto, naquela rede ali de 27, temos 25
ONGs e duas SCMs.
A grande questão, voltando ao início, é garantir a inserção dessa atividade no
sistema financeiro sob a regulação do Banco Central. Estamos pensando,
sobretudo, em garantir recursos estáveis, em volumes significativos, para o
crescimento dessa atividade. Costumamos dizer — e quem observa esse assunto
no País — que as ONGs têm uma armadilha do sucesso. Se elas conseguem um
certo grau de profissionalização, ficam dependendo de doação. Elas não podem
fazer nenhuma captação ou de um funding, por exemplo, do BNDES ou doação da
Prefeitura ou organismo multilateral. Há aí uma armadilha do bom desempenho
dessas instituições.
Por que não termos a possibilidade — e a SCM oferece isso — de atrair
investidores, capital, a essas instituições? Quer dizer, isso daí é um negócio, é
rentável, pode haver instituições dentro do sistema financeiro que tenha esse
funding de investidores, mas atendam a essa clientela.
A questão é dupla, é simultaneamente atrair novos atores para esse mercado,
mas, ao mesmo tempo, atrair aquelas instituições-modelo — e nós sabemos que há
muitas nessa rede que são bastante bem-sucedidas — que possam migrar para o
sistema financeiro nacional. Por que não uma ONG — isso está previsto nessa
regulamentação — vir a constituir uma Sociedade de Crédito ao
Microempreendedor?
O que ganhamos com esse movimento? Ganhamos duas coisas: a
possibilidade de essa instituição, essa ONG, que abre uma SCM, atrair investidores,
e, portanto, novos recursos para essa atividade, e simultaneamente começamos a
contaminar esse sistema financeiro com a cultura de microfinanças que a ONG está
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trazendo. Essa é uma questão crucial. Também não é automático achar que o
sistema financeiro por si só vai dar conta desse assunto tão específico.
Temos que pegar a experiência dessas ONGs e fazer com que haja vasos
comunicantes com esse sistema financeiro.
Há ainda os números deste ano, que estão no folder que vai ser distribuído.
O Banco está falando em mais sete SCMs para essa rede, mais cinco ONGs, mais
27 milhões aprovados, totalizando 70 milhões. Imaginem também se chegar a
dezenove Estados, e portanto mais três, e 360 Municípios.
Finalmente, aí, essa frase com a visão do futuro no sentido de que estamos,
portanto, vislumbrando e trabalhando na direção de um mercado em que os
microempreendedores e clientes de baixa renda possam ter acesso a serviços
financeiros, ofertados por instituições integradas ao sistema financeiro nacional.
Estamos vislumbrando num futuro próximo um grande número de instituições
reguladas pelo Banco Central, especializadas nesse segmento, competindo entre si
para prover crédito a esses microempreendedores, principalmente aos informais.
O SR. DEPUTADO EDINHO BEZ – Sr. Presidente, peço a palavra pela
ordem.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Com a palavra o Relator,
Deputado Edinho Bez.
O SR. DEPUTADO EDINHO BEZ – Inicialmente, quero cumprimentar a Dra.
Beatriz Azeredo. Sei pelo menos da filosofia do BNDES, no sentido de atender o
microempresário, somente o pequeno e até mesmo pessoa física.
Nesta Comissão, temos discutindo, Dra. Beatriz, exatamente a possibilidade de
priorizar e fazer com que o pequeno empresário tenha acesso ao crédito.
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Vejo aqui o avanço nesse sentido. Mas faço apenas uma observação: o
pequeno empresário não pode pagar uma taxa de juros de 3% a 5.8% ao mês. Isso
não é ajudar o pequeno, isso é ajudar a dificultar ainda mais a iniciativa.
Claro que avançamos bastante nessa iniciativa. Temos conversado bastante
sobre isso e gostaríamos de receber mais à frente sugestões a esta Comissão. Na
qualidade de Relator, digo que serão bem-vindas sugestões com o objetivo de fazer
com que o pobre tenha acesso ao crédito, porque a única forma que temos de
alavancar o desenvolvimento deste País é realmente fazer com que, em nível
regional e local, haja acesso ao crédito ao pobre, para que sua iniciativa, sendo
competente, não seja castrada.
Fiz essa interferência, Sr. Presidente, aos nobres Parlamentares, porque hoje
vou ter que me retirar, mas está sendo gravada esta reunião. Vou receber a fita, que
será estudada, sem nenhum prejuízo, e conto com a aquiescência dos presentes.
Quero parabenizá-los por ter vindo à nossa Comissão e nos colocar também à
disposição. Tenho um encontro em Florianópolis, em âmbito nacional, no qual serei
palestrante e preciso estar lá às 19h.
Quero parabenizá-los, colocar-me à disposição. Irei analisar depois junto com
os demais membros da Comissão toda a gravação dos assuntos aqui discutidos.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – A Dra. Beatriz, após as
outras perguntas, retornará a usar a palavra.
Com a palavra agora a Dra. Clara Steinberg, Presidente do Banco da Mulher.
V.Sa. tem cinco minutos.
A SRA. CLARA STEINBERG – Sr. Presidente, prefiro até que seja informal,
porque o tempo é pequeno. Não me preparei para falar em pouco tempo. Eu poderia
falar uma hora. É mais fácil falar uma hora do que cinco minutos.
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O SR. DEPUTADO EDINHO BEZ – Está convidada a voltar a esta Comissão.
A SRA. CLARA STEINBERG – Estamos representando uma das mais
antigas instituições com idéia de microcrédito, porque ela surgiu em 1975 no
encontro da ONU em que se deduziu que o problema da mulher, visto que estamos
falando do Banco da Mulher, de não se desenvolver, de não crescer, em termos
econômicos, era pela dificuldade, especialmente na área empresarial, de ter esse
acesso, e na própria educação. Até hoje, há países que não a admitem até em
escolas, e por aí afora.
O pessoal do Brasil que assistiu ao encontro, inclusive lá estava presente
uma das nossas arquitetas que trabalhava no BNH, ficou muito entusiasmado e
trouxe a idéia. O Brasil chegou a participar do primeiro encontro, que foi quatro anos
mais tarde, em 1979, em que se fundou a Fundação WWB, ou seja, Women World
Banking, que é o Banco Mundial das Mulheres. E o Brasil ficou entusiasmado e
procurou uma solução. Mas a legislação não permitia esse tipo de banco no Brasil.
Nem banco médio. Isso foi muito depois. Estamos falando da década de 80. Em
1983, estudamos muito o assunto e transformamos a idéia então para uma
associação, que se chama Associação Brasileira para Desenvolvimento da Mulher,
mas, como subnome, o nome Banco da Mulher.
Realmente, hoje estou dando os parabéns a Beatriz, porque ela apresentou
de forma maravilhosa todo o processo que deveria ter sido feito. Mas, infelizmente,
não tínhamos base, nem mesmo a WWB tinha. Chegamos a fazer um congresso
internacional, em 1986, no Rio de Janeiro — acho que ninguém sabe disso —, em
que veio a Presidente mundial do banco e muitas autoridades.
Estamos com muitas dificuldades, porque não é fácil realizar esse trabalho
sem metodologia. Começamos a executar a idéia por todo o Brasil na medida do
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possível. E os primeiros Estados que entraram já com o trabalho de microcrédito
foram a Bahia, o Amazonas e o Paraná. Depois, o Rio Grande do Sul. Naturalmente,
foram buscando por si mesmas a forma de obter esses créditos. Nesse tempo, o
WWB não dava, mas agora ele está dando alguma ajuda.
A solução foi o BID, que só deu financiamento para o Nordeste. Não dava
para o Sul. Procuramos, então, entrar em contato com o banco BAMERINDUS, por
exemplo, que dava o financiamento. Mas ficamos responsáveis. Quer dizer, se a
cliente não pagava, nós pagávamos. Nós quem? As pessoas voluntárias que
estavam fazendo esse trabalho. Foi muito difícil.
Esse trabalho andou pouco. Acho que a Beatriz esteve conosco uns quatro
anos ou mais. Fizemos também um encontro — como sempre falou muito bem —,
mas o BNDES não tinha chegado a esse ponto. Por isso dou os parabéns ao
BNDES, porque realmente cresceu muito com o “S” final.
Creio que essa é a grande solução para o País.
Estamos com dez regionais, algumas no Estado, porque queríamos que cada
Estado tivesse um comando, por exemplo, nas capitais. Mas houve alguma
dificuldade, e estamos aceitando mudanças também, porque às vezes é a capital
que não consegue. Estamos com dez funcionando; a maior parte, com muita
dificuldade, porque um inicial o BNDES também não dá. Desculpe, no Rio de
Janeiro, parece que agora foi aprovado. Conseguimos arrumar, com esforço
enorme, quem fornecesse uma base. Quer dizer, pessoas particulares. A Prefeitura
se comprometeu, mudou o Prefeito, não tinha saído o crédito. Não sei se hoje foi a
Prefeitura ou o BNDES que o liberou sozinho.
Quer dizer, não é muito fácil. Tenho a impressão de que esse é um trabalho
talvez dos mais importantes do BNDES. Não adianta o progresso de algumas sem
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que o País o acompanhe. No caso da mulher, por exemplo, merece até depois fazer
mais considerações. O tempo é curto.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Pode falar mais um
pouco.
A SRA. CLARA STEINBERG – Vou pedir uma atenção especial. Tenho um
trabalho — até o entreguei para Jaína, e, se for possível tirar uma cópia agora —,
um trabalho apresentado num congresso de energia, mas que também está tendo
interesse social. Hoje, o mundo inteiro está percebendo que a humanidade não se
está desenvolvendo num caminho correto. Mais de 60% recebem menos de dois
salários mínimos e mais de 30%, menos de um salário mínimo. Então, não é nem de
sobrevivência. Na maior parte da humanidade, cada vez mais está havendo uma
distinção entre ricos e pobres dentro dos países.
Esse trabalho é para melhorar a deficiência de um desenvolvimento que tem
levado à criminalidade e a outros problemas. E a mulher é a base, porque ela é a
mãe, é ela que educa. Se ela sai para trabalhar como empregada doméstica ou
faxineira, abandona a casa, os filhos. Estou fazendo um outro trabalho, em que
constato que há muito problema de os pais acompanharem as crianças. Em geral, a
mãe, em quase 30% dos lares, especialmente na faixa pobre, em que o único
sustento é a mulher.
O trabalho que ela pode fazer em casa, pode fazer com apoio, pode fazer
quando pode, sem perder as crianças, é de grande importância social.
Acredito que essa é a oportunidade de se levar em conta a diferença. Sei que
50% de clientes são mulheres também, mas a forma de trabalho do Banco da
Mulher está sendo — não são todas —, em cada regional, da forma que ela achar
melhor, assumindo um trabalho. É ainda uma experiência, mas acho que ocorre no
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mundo e aqui no Brasil também. Estamos procurando educar também ao mesmo
tempo, melhorar o trabalho, para elas compreenderem a qualidade também, porque
senão não conseguem competir. Então, fazem um trabalho que se perde. Elas não
têm às vezes noção de custo.
Temos procurado também orientar como vender. Quer dizer, estamos
ajudando mais porque é o lugar mais fraco.
Para encerrar, vou citar só uma frase do Yunes, que hoje é o papa no
assunto. Até comentei com o Deputado Coriolano Sales. Diz o seguinte: “O crédito é
um dos principais direitos humanos do homem e, principalmente, da mulher”. Tanto
que ele enveredou praticamente todo o empréstimo para as mulheres. Se V.Exas.
No livro do Prêmio Nobel de 1998 na área de Economia, Amartya Sen , um indiano,
há o seguinte: “Liberdade com ...” Agora não me lembro da frase completa. Tenho o
livro, eu o li, mas não me lembro da frase. Ele tem exatamente um capítulo grande
sobre desenvolvimento com liberdade. E tem um capítulo sobre a mulher,
mostrando exatamente isso: está comprovada a participação do trabalho da mulher
em relação à educação, em relação à modalidade infantil, a todos esses fatores
sociais. No Brasil, o IBGE também forneceu estatísticas, já há anos, com crianças e
adolescentes, constando que o principal é o nível de escolaridade da mulher.
Estamos falando em educação como base do desenvolvimento.
Isso tudo nos leva a ver que é importante. O trabalho dele é grande sobre
esse assunto, mostrando essa diferença. O Amartya Sen e outra pessoa estão
fazendo estudos sobre esse índice de desenvolvimento humano, que é algo
importante também.
Tenho a impressão de que a humanidade está mudando um pouco. A
globalização, a competitividade têm que ser um pouco consideradas nessa questão.
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Nesse momento, eu pediria mais tempo, quando houvesse, para que
pudéssemos discutir um pouco mais essa situação. Devemos voltar ao assunto. Há
vários pedidos de Brasília, mas há falta de recursos. Esse recurso básico para
começar, ninguém dá. Ainda mais naquela época que não se conhecia o assunto,
quando foi criado. Agora, corajosamente, resistentemente, a Bahia está trabalhando
há doze anos. E fui na festa dos dez anos. Paraná, também. E uma que entrou nova
conseguiu porque exatamente entrou no sistema novo, Prefeitura, SEBRAE. Quando
o SEBRAE ajuda, já melhora. Mas o SEBRAE nem sempre, porque ele também é
independente. Cada Estado tem uma forma diferente de trabalhar. Mas creio que
esse caso merece — e agora que a Beatriz está ao meu lado, vou conversar melhor
com ela no Rio — um estudo de como o BNDES pode ajudar-nos melhor. O Rio vai
recomeçar, está um pouco parado, está trabalhando com favelas. Mas, na
inadimplência, quem paga? Por mais que se faça, não fica nem nos 3%. Pois até
agora nós pagamos, nós, as valorosas mulheres que fazem um trabalho de
voluntárias. Eu já paguei muito. E as outras todas também. Quer dizer, com
sacrifício, tem sido feito todo esse trabalho. Então, agora, estou certa de que nosso
banco também vai fazer parte desse desenvolvimento social com apoio do BNDES.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Agradecemos a Dra.
Clara. Esperamos revê-la aqui em uma oportunidade bastante breve.
Informo aos palestrantes que a diminuição do tempo ocorreu devido ao
pedido de alguns participantes que têm compromisso ainda logo após a reunião.
Passo a palavra agora ao Dr. Valdi de Araújo Dantas, Diretor-Executivo do
CEAP.
Antes, registramos, com muito prazer, a presença da Sra. Estelita, do Banco
da Mulher da Bahia e da Dra. Jane Barcellos, Gerente do Porto Sol, de Porto Alegre.
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O SR. VALDI DE ARAÚJO DANTAS – Hoje, o sistema CEAP está presente
em doze Estados da Federação, trabalha em cerca de 205 Municípios e conta com
um corpo de agentes de microcrédito de cerca de 230 funcionários. Começamos
esse trabalho em 1986 com a primeira iniciativa no Rio Grande do Sul, criando o
Centro Ana Terra, que depois veio a ser o CEAP do Rio Grande do Sul. E, a partir
dessa experiência, estendeu-se principalmente para o Nordeste do Brasil.
Em meados dos anos 80, a hoje chamada indústria do microcrédito passava,
no mundo, por um processo de transformação dos seus conceitos, mas ainda existia
possibilidade do que hoje podemos chamar de antigo modelo. Os CEAPs nasceram
com recursos doados durante vários anos pelo Fundo das Nações Unidas para a
Infância e, no momento seguinte, com recursos do Banco Interamericano de
Desenvolvimento.
A partir de 1996, com o ingresso do BNDES — que marca no País uma nova
etapa do microcrédito —, passamos a trabalhar e a integrar a rede de instituições
que estão nesse esforço junto com o BNDES. Eu queria, para recuperação de
história e de memória, ir um pouco além de 1996, quando se iniciou o CEAP no Rio
Grande do Sul, e evocar a primeira experiência de microcrédito no Brasil, e talvez no
mundo, que foi em 1973, quando se criou a primeira ONG especializada em
microcrédito, chamada União Nordestina de Assistência a Pequenas Organizações.
Esta ONG teve uma atuação por cerca de quinze anos nos Estados de Pernambuco
e da Bahia. Já disse isso em outras reuniões, e vou repetir agora; tenho o prazer de
estar aqui com duas figuras que são testemunhas dessa época: uma é um ator
direto desses atos, Ary Burger, que chegou a ser Presidente da ITEC, que era
afiliada a uma ONG americana e, exatamente junto com empresários
pernambucanos e baianos, criaram a UNO; e também o Henry Jackelen, que hoje
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está aqui como representante do PNUD e que, mais ou menos em 1981, foi
avaliador do programa UNO, em Caruaru.
Essa experiência é muito emblemática, para não perdermos de vista o que
está posto hoje para o microcrédito, que a Beatriz traduziu muito bem tanto do ponto
de vista dos conceitos do microcrédito, como da sua institucionalidade.
Evidentemente, essa história de 20, 25 anos que o microcrédito tem
internacionalmente e também no Brasil permitiu chegar-se a isso hoje. Mas é
fundamental e está sendo o grande esforço do BNDES, que iniciemos desse novo
patamar, dessa nova qualidade da institucionalidade do microcrédito, porque é a
partir daí que vamos garantir o desenvolvimento desse serviço, dessa indústria tão
importante para o País.
Naquela época, até para ensaiar, para demonstrar que era viável fazer crédito
a uma pessoa física que tinha uma atividade econômica informal, que esse crédito
era produtivo, benéfico, que essa pessoa honrava seu compromisso, era necessário
e se justificava dinheiro a fundo perdido de agências internacionais, etc. Nessa
época era possível uma ONG pensar e não ter como trabalhar, e não ter a
sustentabilidade como uma filosofia, mais do que uma meta. Isso foi muito
importante porque permitiu dar essa demonstração, mostrar o impacto que isso
trazia, fomentar essa metodologia e apontar as deficiências, as fraquezas.
Exatamente por isso, mesmo a UNO pagou esse preço como entidade pioneira e
dezenas de outras no Brasil e na América Latina, que, apesar de fazerem um bom
trabalho, cinco, dez, quinze anos depois desapareceram porque tinham dependência
do crédito doado; desapareceram porque a idéia assistencialista do subsídio ao
crédito era muito forte. Pensava-se que o acesso do pobre a esse crédito tinha de
ser subsidiado. Isso demonstrou a inviabilidade desses conceitos e nos fez caminhar
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para os conceitos de institucionalidade a que a Beatriz se referiu, hoje a concepção
e o trabalho que o BNDES está fazendo.
Para que trilhemos um caminho seguro no sentido de expandir a
microfinança, o microcrédito no Brasil, é preciso que as iniciativas tanto de governo
como privadas adotem e defendam esses princípios, porque o maior beneficiário
será o pequeno empreendedor, aquele pequeno empresário que estamos querendo
beneficiar. É um desserviço começar uma iniciativa de microcrédito, abrir essa
possibilidade ao pequeno empreendedor e depois essa instituição não ter a
possibilidade, a capacidade, pela sua autogestão, de continuar prestando esse
serviço e até de acompanhar o crescimento desse empresário.
Queria enfatizar esse aspecto, reforçando todos os conceitos que a Beatriz
expôs: o crédito, o juro real, a capacidade de sustentabilidade das instituições, o
modelo institucional que permita a penetração no mercado financeiro.
Tenho mais de uma década participando da criação e trabalhando com ONGs
no setor de microcrédito, mas hoje é preciso reconhecer que esse modelo
institucional já não é adequado ao desafio da microfinança no País. Numa hora
oportuna foi institucionalizada a SCM e estamos num esforço comum — Banco
Central, BNDES, Banco do Brasil, enfim, várias instituições — tratando de
aperfeiçoar esse modelo. É esse o caminho da institucionalidade do microcrédito. Os
exemplos que temos na América Latina de entidades que conseguiram responder
melhor à necessidade do pequeno empreendedor é exatamente o modelo muito
próximo ou diretamente dentro do mercado financeiro.
Acho que a grande contribuição que todo o movimento, todas as pessoas,
todas as instituições que estiveram envolvidas com o microcrédito nessas últimas
décadas puderam oferecer para o desenvolvimento do nosso País é uma alternativa
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de modelo de instituição financeira, mas dentro do mercado financeiro, para atender
a esse segmento.
Faço um apelo a esta Casa que, ao pensar em legislar para facilitar esse
processo, fique muito atenta a essa realidade.
Essa concepção e essa institucionalidade estão muito bem trabalhadas e
coordenadas no País por meio do trabalho que o BNDES está desenvolvendo. É
muito fino o negócio de emprestar, de dar pequenos empréstimos, de receber, voltar
a emprestar, com negócios que são relativamente frágeis, que estão na base da
economia. Isso requer processos muito profissionais, tecnologias complexas,
instituições que tenham capacidade de auto-sustentação, que possam enfrentar isso
como um negócio. É uma coisa fantástica, é uma atividade econômico-financeira
que tem um impacto social extremamente elevado, extremamente positivo no
desenvolvimento dessas famílias e do país em que estão situadas. Mas exatamente
pela sua importância, pela sua vitalidade no sentido de criar um processo de
desenvolvimento mais harmônico, requer toda essa sofisticação, esses cuidados e
esse profissionalismo para que esse trabalho, o que já está desenvolvido não sofra
solução de continuidade, como outras experiências que, por não atacar essas
debilidades — e era natural naquilo que estava nascente —, por não ter essa visão,
não puderam hoje continuar no cenário como ator ativo e dar a sua contribuição.
Eram estas as minhas palavras.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Agradecemos ao Dr.
Valdi de Araújo Dantas sua exposição.
Passamos a palavra ao Dr. Ary Burger, Presidente da Cooperativa de Crédito
Porto Sol.
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O SR. DEPUTADO CORIOLANO SALES – É uma instituição comunitária de
crédito.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Registramos a presença
do Dr. Israel Testa, do Programa de Providência da Arquidiocese de Brasília.
O SR. ARY BURGER – Queria, antes, responder ao Deputado sobre o custo
do crédito nas empresas que estão financiando microcrédito.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Pois não.
O SR. ARY BURGER – Há um conceito errado com relação a isso. O
pequeno não está interessado na taxa de juros, mas no dinheiro. O giro comercial
dele é muito rápido; ele tem que pagar no fim de semana, então, precisa de um giro
financeiro que acompanhe isso. Se não tem o dinheiro, ele vai para o agiota, que lhe
cobrará bem mais caro do que estamos cobrando. O problema é que temos que
satisfazê-lo na sua necessidade de ter o dinheiro na hora certa; de poder, se
possível, em dois ou três dias dispor do dinheiro. Esta é a grande experiência que,
creio, todos nós que estamos nisso sabemos.
Estou envolvido com o problema do pequeno empresário desde 1963. Nesse
ano tinha ajudado a organizar o BRDER, no Rio Grande do Sul, e estava sendo o
seu segundo Presidente, em seguida. E li um livro de um grande professor em
Harvard, chamado “Activing Society” — Sociedade de Resultados —, que diz algo
muito importante: não são as universidades que fazem empresários. Empresários
saem do cadinho onde a pequena empresa vai mostrar se são capazes ou não.
Há um problema humano no desenvolvimento que temos de enfrentar. A
pequena empresa é de onde sai o empresário. Aqueles pequenos a quem, no
BRDER, demos os financiamentos são as tramontinas, as marco polos, as recrosul
de hoje; são as grandes empresas do Rio Grande do Sul. Eram pequeninas e demos
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a elas o primeiro recurso. Não se trata de um favor social, mas de se cumprir uma
necessidade. Quero, primeiramente, chamar a atenção para isso.
Acho que a Dra. Beatriz apresentou muito bem como está sendo feito e o que
se está realizando. Preocupa-me uma coisa: nós, brasileiros, temos que nos unir e
trabalhar juntos. Creio que precisamos de uma legislação sobre isso. Agora, chamo
a atenção para o fato de que estamos experimentando, como muito bem disse a
Dra. Beatriz. Creio que, como somos um País extenso, com culturas diferentes, com
experiência já existente, deveríamos ter uma legislação que não fosse casuística,
que estabelecesse regras gerais e que deixasse lugar a que a regulamentação fosse
modificando. Para isto, deveria haver um órgão que se encarregasse de fiscalizar,
de colher essa experiência e aprimorá-la.
Neste ponto, tenho que citar o BNDES, que está fazendo um brilhante
trabalho, e a Caixa Econômica Federal, que está tentando alguma coisa. Na
Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (FIERGS) há um grupo
que se preocupa com o problema do financiamento aos empresários, principalmente
os menores. Os grandes têm lá suas formas de obter recursos.
A Caixa Econômica Federal pretende não fazer o papel de redistribuição do
BNDES, mas, utilizando suas agências, está fazendo um trabalho necessário.
Estamos indo lá na ponta, no bem pequeno. Quem vai cuidar do médio e do
pequeno empresários? Isto é importante.
Por exemplo, estamos desenvolvendo uma experiência, com grande apoio do
BNDES, de como montar uma rede estadual que não vá complicar, que vá ser
efetiva, eficiente. Vejam bem, se criarmos, em cada Estado, trinta a cinqüenta
pequenas Porto Sol ou a experiência do Nordeste, essa gente terá de captar
recursos. Chegará um momento em que elas terão que buscar recursos. Se cada
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uma delas tiver que ter uma pessoa para buscar recursos, vai haver um problema
sério, porque será oneroso; de outro lado, será um problema para o BNDES atender
tanta gente sem alguém que faça antes uma peneira disso. Por isso, o BNDES está
conosco nos ajudando a criar uma rede estadual.
Estou chamando a atenção para isto porque é muito importante. Uma coisa é
uma unidade, outra é criar uma série de unidades que tenham uma coordenação,
uma maneira de trabalhar em conjunto.
Desculpem-me estar-me entusiasmando. Não sei se estou indo demais.
Então, o que digo é o seguinte: estamos indo para o caminho certo. Precisamos de
uma legislação. Mas, vejam bem, a fiscalização não deveria ficar no Banco Central.
Iríamos onerar demasiadamente o Banco Central com uma infinidade de pequenas
instituições. Deveria haver um órgão que se encarregasse dessa fiscalização.
Aliás, fui do Banco Central e, na época, batalhei contra a fiscalização dentro
do banco, porque havia uma rivalidade entre o redesconto, que tratava e via o
problema de cada dia dos bancos, e a fiscalização, que vinha com aquela dureza.
Não funciona. É um órgão independente, como é nos Estados Unidos, na Alemanha,
na França, Itália e Inglaterra.
Acho que a fiscalização disso que estamos fazendo deve ser alguma coisa
diferente do que ter um órgão que fiscalize e outro órgão que crie as regras.
Creio que já falei demais. A Porto Sol agradece a oportunidade. Agradeço a
oportunidade de estar junto com meus amigos lá do Nordeste e outros aqui,
principalmente contando com a presença do BNDES aqui conosco.
Obrigado.
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Agradecemos ao Dr. Ary
Burger e passamos a palavra ao Deputado Coriolano Sales, para que faça suas
considerações.
O SR. DEPUTADO CORIOLANO SALES – Sr. Presidente, inicialmente,
quero agradecer a presença a diversas instituições que foram convidadas e registrar
que este é um momento muito importante que esta Comissão está vivendo de colher
subsídios e informações dessas representações financeiras, do BNDES e das
demais instituições que acudiram ao nosso requerimento.
Como V. Exa. sabe, acompanho essa questão do cooperativismo de crédito e
das políticas de microcrédito e tenho um vivo interesse por isso, porque acho que o
verdadeiro combate à pobreza e à miséria está nessa política. O Brasil precisa de
um plano contra a miséria, contra as condições de pobreza em que vive a sua
população, cerca de 60 milhões de pessoas.
Não vamos fazer isso com cesta básica, com assistencialismo, nada disso.
Vamos fazer isso principalmente com políticas firmes de educação e de crédito. É
claro que o combate à pobreza e à miséria não vai resumir-se a isso, mas há outras
medidas, como reforma agrária, política habitacional consistente, política de saúde
firme, profunda, mas acho que, principalmente, nessas duas políticas é que o
Governo deveria centrar o seu esforço, as suas ações.
Acho que o microcrédito é de fundamental importância para o Brasil. É algo
novo, no sentido de que a regulamentação começa a se dar agora, com a SCM, com
a sua inserção dentro do sistema financeiro. Mas, efetivamente, se percebe que há
uma preocupação no País, porque, como disseram aqui o representante do CEAPE
e o Presidente da Porto Sol, se chegarmos a um momento em que houver duas mil
ONGs de crédito no Brasil, como é que se opera isso, como se fiscaliza, como se
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audita? Porque onde há crédito, há problema de acompanhamento, de
administração, de gerenciamento.
No momento em que se está pensando em regulamentar o Sistema
Financeiro Nacional, é preciso dar uma oportunidade mais firme ao setor de
microfinanças, para que tenha uma inserção mais apropriada na indústria das
finanças no Brasil.
Não vamos resolver os problemas do Brasil com os grandes bancos. Isso está
dito. O Dr. Roberto Setúbal disse aqui outro dia nesta Comissão, com todas as
letras: os grandes bancos privados não são instrumentos indutores do
desenvolvimento econômico e social do Brasil. Pelo menos agora eles não são. Eles
estão preocupados com outra faceta. E é até legítimo que eles estejam
preocupados, porque o dinheiro deles tem que render juros, não há dúvida em
relação a isso.
Entretanto, nós, políticos, temos que ter um outro nível de preocupação,
evidentemente. Temos visto por aí que a questão central dessas políticas está na
verticalidade. O cooperativismo de crédito do mundo inteiro só se estabilizou com a
verticalidade, com instituições cooperativas na base, cooperativas centrais de crédito
nos Estados e órgãos de cúpula para comandar o processo de administração de
crédito e o processo de auditoria e de fiscalização.
Deveremos debater um pouco mais essa questão. Não vamos resolver isso
numa única reunião, mas temos visto no mundo inteiro que só com a verticalidade
podemos administrar crédito, fiscalizar e auditar com absoluta segurança. O BNDES
poderia exercer e continuar exercendo o seu papel, que é muito positivo, diga-se de
passagem; e a liderança jovem da Dra. Beatriz Azeredo tem realizado um papel que
reputo da maior importância para o desenvolvimento das microfinanças no Brasil.
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Quanto ao sistema, não sei ainda como isso poderia ser resolvido, porque a
SCM já está inserida dentro do sistema financeiro. É claro que o Banco Central não
vai ter condição de fiscalizar uma SCM no interior do Brasil. Hoje são dezessete
SCMs já autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil. No dia em que houver
mil, duas mil, ele não terá condição, absolutamente, de exercer a fiscalização. Aí
seria preciso, talvez, um instituto de cúpula, tipo DG Bank, na Alemanha, que tem
nome de banco mas não é um banco no sentido formal, é um instituto de
verticalização para exercer as políticas de crédito, de auditoria e de fiscalização.
No nosso caso, do microcrédito, temos, além da SCM, as ONGs de crédito e
as OCIPs. Seria o caso de verificar como se organizam as ONGs de crédito. Deveria
haver um órgão de cúpula das ONGs de crédito, reunindo todas as ONGs de crédito
para facilitar os serviços e até as vendas de outros produtos financeiros, ajudando a
melhorar o seu papel. Deveriam as ONGs de crédito ter quadro social aberto para
facilitar o sistema de constituição de um fundo. Poderiam ser instituições de crédito
com natureza jurídica de entidade financeira, inseridas no sistema financeiro.
São questões que precisariam ser devidamente examinadas. E talvez
tivéssemos aqui até uma explanação mais longa sobre essas preocupações que se
inserem hoje nas instituições de microcrédito no Brasil.
Não é a preocupação com o crédito em si, embora eu ache que essas
instituições também devessem se aprofundar um pouco mais na questão do crédito
para produção. A miséria do povo na base da sociedade está muito vinculada a isso.
As pessoas não têm como trabalhar, não têm recursos. É muito difícil que essas
pessoas tenham acesso ao mercado tradicional do crédito bancário. Quase não têm.
Temos hoje 1.800 Municípios no Brasil que não têm uma agência bancária. Isto é
extremamente grave para um país com as dimensões do Brasil.
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Não somos um país qualquer, somos um grande País. Infelizmente, estamos
manietados num processo em que só sobrevivem os grandes.
É muito importante termos uma legislação flexível, que permita a constituição
dessas entidades de forma organizada, mais simples, mas que garanta que o crédito
seja repassado pelo BNDES, pela Caixa Econômica ou por outras instituições que
se insiram num processo de financiamento, como é o caso das SCMs, em que
percebemos claramente que há outras entidades financeiras do sistema tradicional
interessadas em aportar recursos. Mas é preciso que isso se faça dentro de uma
linha de absoluta segurança.
Esse modelo precisaria ser aperfeiçoado para garantir uma certa
verticalidade, para que o CEAPE, em Pernambuco, por exemplo, tenha condições de
abrir cinqüenta CEAPEs no Estado. Mas se ele não tiver como administrar isso por
meio de um órgão de cúpula que lhe garanta fiscalização, auditoria, serviços, buscar
o crédito para repassá-lo, dificilmente se avançará nesse processo. Claro que se
avançará, mas muito devagar, muito lentamente. E a população brasileira já está
extremamente sacrificada. Temos cerca de 60 milhões de pessoas vivendo abaixo
da linha de pobreza. E isso é incompreensível num País tão rico de recursos
naturais como é o nosso País, que é o quinto maior do mundo. Não somos um país
qualquer.
Deveríamos buscar — e esta Comissão está aberta para isso — sugestões
concretas dos senhores e das senhoras sobre como poderíamos fazer isto avançar
na legislação financeira que vem aí. O Governo está propenso a modificar os
critérios para a regulamentação do Sistema Financeiro. Presumia-se que fosse uma
lei complementar única, mas já se sabe que o Governo está esposando um outro
critério: ou várias leis complementares ou até leis ordinárias. Ninguém sabe se se vai
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revogar por inteiro o art. 192 da Constituição Federal ou deixar como foi aprovado no
Senado Federal para ser, obviamente, o sistema regulamentado por várias leis
complementares. Ainda não sabemos ao certo.
O que transparece de maneira clara é que o Governo deu sinais de como
deseja fazer essa regulamentação. Estou preocupado com a questão da
governabilidade do sistema. Acho que é preciso pensar nessa governabilidade de
forma a permitir ao sistema crescer com tranqüilidade, com segurança, com solidez.
Mas crescer com esses elementos — é claro — exige auditoria, fiscalização,
organização, administração de cúpula, administração vertical.
Poderíamos ter o BNDES e a Caixa Econômica como grandes agentes
financeiros, e outros órgãos internacionais que venham para nos ajudar, como o
PNUD, o BID e várias entidades internacionais que trabalham nessa linha de
microcrédito, que também podem repassar recursos. E isso seria facilitado na
medida em que tivéssemos os órgãos de cúpula para fazer o processo de
administração.
Recentemente, estivemos na Itália, juntamente com os Deputados Ricardo
Berzoini, Danilo de Castro e Edinho Bez, que é o Relator desta Comissão. Lá vimos
que a Itália tem 538 bancos de crédito cooperativo. Esses 538 bancos, que são
bancos comunitários, operam dentro de uma determinada jurisdição. Mas eles têm
um órgão vertical, de cúpula, que provê toda a política de administração de crédito e
de serviços.
Há um outro banco, chamado Banco Popular, que é muito grande, dispõe de
cerca de 120 bilhões de dólares de ativos financeiros, que têm também a sua
estrutura apartada.
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No mundo inteiro, isso funciona com órgãos de cúpula, com política vertical. O
cooperativismo de crédito no Brasil só começou a andar quando criou os seus
órgãos de cúpula para fazer a administração de crédito, prover serviços. Começa a
avançar um pouco. Antes não havia nada, agora está chegando a 2 bilhões de
dólares de ativos financeiros. Sem isto não há como caminhar, porque adiante,
quando crescer, as instituições quebram, porque não há um sistema de organização
capaz de prover auditoria, de prover serviços, de prover crédito e, afinal, de traçar as
políticas necessárias.
Esta é a minha sugestão.
Na área do sistema cooperativo de crédito no Brasil, queremos criar, dentro
da lei financeira, uma superintendência de fiscalização e de regulação para o
cooperativismo de crédito, até porque pretendemos fazer uma proposta ao Governo
de criação de bancos de crédito cooperativos intra-regionais para avançar nessa
questão de crédito no Brasil. Somos um país extraordinário. Não podemos viver na
pobreza e na miséria o tempo todo. Isso dá vergonha quando chegamos lá fora. Se
já estamos envergonhados aqui dentro, imaginem quando chegamos lá fora. As
pessoas não entendem como o Brasil, um país tão extraordinário, tem 60 milhões de
pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza.
Há essa questão da governabilidade. É uma coisa muito importante. Na área
do cooperativismo de crédito, estamos pensando em encaminhar desta maneira.
Estamos fazendo um debate interno com setores do cooperativismo de crédito, que
estiveram aqui na semana passada, no dia 31 de maio, e vamos agora desdobrar
com eles uma proposta. Mas gostaríamos que os senhores pudessem reunir-se, as
trinta, quarenta instituições, para fazer um debate sobre esta questão e formatar
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uma proposta concreta e objetiva para chegarmos a um bom termo e fazermos uma
formulação dentro desta Comissão.
Agradeço, Sr. Presidente, o tempo que me foi concedido. Essas são minhas
preocupações básicas com a organização do microcrédito em nosso País.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Agradecemos, Deputado
Coriolano Sales, pela costumeira competência e entusiasmo com que participa dos
trabalhos desta Comissão.
Passamos a palavra ao Deputado Ricardo Berzoini.
O SR. DEPUTADO RICARDO BERZOINI – Sr. Presidente, senhores
palestrantes, serei bastante breve. Farei um registro mais crítico.
Cumprimento pela exposição a Diretora do BNDES, que considero bastante
competente. Mas acho que, infelizmente, o problema não é da competência dos
dirigentes dos nossos bancos oficiais. O problema é de definição de política
governamental.
A impressão que tenho do BNDES nessa área de microcrédito é mais ou
menos como a de um banco multinacional que ajuda uma creche. Não é prioridade.
Se sobra um pouquinho de recurso e de tempo, cuida dessa área. Mas não é
prioridade. Chamam isso de programa social para mostrar naquele balanço de final
de ano os programas sociais realizados. E também com uma visão, com é de hábito
do Governo Fernando Henrique, neoliberal. Primeiro, há a visão de que tem que ser
completamente auto-sustentável.
O programa de microcrédito no Brasil só vai avançar quando tivermos dez ou
quinze anos de recursos a fundo perdido para financiar o crescimento desse
sistema. Isso é decisão de Governo. Se o Governo não tomar a decisão, isto não se
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torna viável. Temos uma questão objetiva, hoje: o Governo atua no sentido de coibir
ou de restringir, de constranger o crescimento do cooperativismo de crédito no
Brasil. É óbvio que cooperativismo de crédito não se confunde, necessariamente,
com microcrédito, mas uma boa parte do papel que o microcrédito acaba buscando
desempenhar é por falta de uma legislação que garanta o incentivo e a proteção ao
cooperativismo de crédito.
Como disse o Deputado Coriolano Sales, quando vamos aos países mais
desenvolvidos do mundo, vemos uma rica estrutura de cooperativas de crédito em
que se tem a possibilidade, inclusive, do cruzamento dessa estrutura com bancos
cooperativos e instituições de prestações de serviços vinculados ao crédito
cooperativo. Isso é verdade nos Estados Unidos, no Canadá, na Alemanha, na
França, na Itália, na Espanha e em Portugal. Mas no Brasil a lógica é a seguinte:
toda a proteção aos bancos privados e alguma proteção aos bancos públicos,
quando não são privatizados, e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES) teve um lucro de 866 milhões de reais. Parabéns para o BNDES! Só
queria entender qual é a finalidade de um banco de desenvolvimento econômico e
social ter um lucro de 866 milhões de reais. Não estou propondo que tenha prejuízo.
Algum lucro é importante que tenha. Mas quando tem um lucro desse montante,
lamento muito, fugiu à sua finalidade essencial, que o próprio nome já diz:
desenvolvimento econômico e social.
No Brasil, as taxas de juros mensais, não apenas o microcrédito, em todo o
sistema extrapolam as taxas de juros anuais da Europa e dos Estados Unidos.
Como vamos entrar na ALCA com o sistema tributário que temos, que arrebenta
com as empresas — o Governo Fernando Henrique não quis fazer a reforma
tributária possível fazer nesta Casa, se tivesse vontade — e com o sistema
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financeiro que temos? É inviável. As empresas brasileiras não terão condições de
competir. Vamos voltar a uma situação pré-colonial no Brasil se entrarmos na ALCA
com esse tipo de situação.
Fico até feliz de o BNDES ter um programa de microcrédito, mas precisamos
avançar muito rapidamente, e é preciso ter decisão política para isso. O Governo
gasta 80 bilhões de reais por ano pagando juros da dívida interna. Temos de ter
claro que a dívida interna está legitimamente fundada em títulos, portanto, não há
que se questionar o seu pagamento. Mas há que se questionar a maneira como ela
foi construída, com juros escorchantes. E há que se questionar mais: a continuidade
dessa política de juros que leva 80 bilhões por ano do nosso Orçamento. Sr.
Presidente, são 80 bilhões por ano do nosso Orçamento! Dinheiro que sai da Saúde,
da Educação e de programas de incentivo ao crescimento econômico como, por
exemplo, um programa mais amplo de incentivo ao microcrédito. Acho que esta é
uma questão fundamental.
Como bancário, a questão do crédito habita as minhas preocupações há mais
de vinte anos. E tenho certeza de que todo brasileiro sonha ver chegar o dia em que
não terá de explicar, sempre que for a outro país, por que existem 60 milhões de
brasileiros abaixo da linha de pobreza, por que há tanta criança de rua sendo
explorada e assassinada no Brasil, por que há tanta miséria em nossas grandes
metrópoles.
Nós, com certeza, precisamos de uma decisão política. Essa decisão política
terá que vir — e aí é uma questão que não cabe, evidentemente, ao BNDES
responder, porque os dirigentes do BNDES estão lá para cumprir metas
governamentais. Mas essa decisão política, Sr. Presidente, terá que vir de uma
decisão dos Deputados, dos Senadores, do Presidente da República, dos seus
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Ministros. É inaceitável que continuemos com esse quadro de exclusão social que
temos no Brasil e essas perfumarias do Governo, libera dinheiro aqui hoje para se
criar um banco de crédito cooperativo, mas com muitas restrições ainda. Começa
um programa no BNDES de microcrédito. Pessoalmente, sou um defensor ardoroso
do microcrédito e do cooperativismo de crédito. Acho que não podemos ser
paternalistas. No caso do microcrédito, deve haver uma fase não de paternalismo,
mas de incentivo pesado, vamos gastar dinheiro com isso, vamos gastar o dinheiro
da Nação. Em vez dos 15 bilhões que o PROER ainda não resgatou, ainda há 7
bilhões no Banco Econômico e 7 bilhões no Banco Nacional e mais uns pingadinhos
em outros bancos. Em vez de gastar 15 bilhões com isso, vamos gastar dinheiro
para desenvolver aquilo que gera emprego, gera renda e combate a exclusão social
e as diferenças sociais em nosso País.
Esta é a minha expectativa. Acho que o BNDES deveria, como contribuição,
de 2001 para 2002, quem sabe, multiplicar esse orçamento por dez. Quem sabe o
BNDES possa lucrar um pouco menos que os 866 milhões! Vamos imaginar que o
seu lucro seja de 400 milhões. Já é um lucro maravilhoso. Obtendo margens
menores, pode incentivar mais a economia e garantir que o Brasil volte a crescer.
Ou, por exemplo, financiar a energia elétrica que não temos hoje, obrigando as
empresas a reduzir a produção, a demitir funcionários. Recebi a notícia agora de
várias demissões em fábricas de São Paulo por conta do racionamento de energia
elétrica.
Mais uma vez, parabenizo a Diretora do BNDES e a Diretora do Banco da
Mulher pelas competentes exposições aqui apresentadas.
Eram essas as minhas considerações.
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Agradeço a participação
do Deputado Ricardo Berzoini.
O SR. DEPUTADO RICARDO BERZOINI - Sr. Presidente, desculpe-me. É
muito deselegante falar e sair, mas está havendo votação e preciso registrar a minha
posição.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Pois não, Deputado.
Concedo a palavra à Dra. Beatriz Azeredo.
A SRA. BEATRIZ AZEREDO – Sr. Presidente, tenho talvez duas ou três
observações. Em primeiro lugar, em relação às considerações do Deputado sobre a
necessidade de aprofundarmos melhor toda uma discussão técnica —parece-me —
em relação a essa regulamentação e colocar o BNDES à disposição para participar
dessas discussões, dividir o conhecimento do Banco especificamente em relação ao
microcrédito. Em particular, essa primeira regulamentação do microcrédito foi feita a
partir de um grupo de trabalho com representantes do Banco Central, Ministério da
Fazenda e BNDES. Portanto, o BNDES vem participando desde o início dessa
discussão e o seu corpo técnico está à disposição para estar também colaborando
com esta Casa no aspecto da regulamentação.
Acho que há um tema central abordado por vários Parlamentares, ligado à
questão da sustentabilidade. Quando se reclama, por exemplo, por que não se
multiplicar por dez o que se investe em microcrédito, por que não se dar maior
velocidade a isso, acho que está ligado exatamente a conceitos básicos. Uma opção
que se pode fazer sempre é caminhar pela linha da política social, política
assistencial e absoluta dependência de recursos orçamentários, com todos os riscos
que conhecemos dessa história no País. Quer dizer, a descontinuidade de
programas sociais, se já é dramática em programas típicos de saúde, educação e
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por aí afora, que dirá num programa de microcrédito, que não é a política social,
quer dizer, é um desserviço e é um prejuízo à população empreendedora de baixa
renda montar uma rede de instituições no País que tenham uma dependência
orgânica com recursos orçamentários. Sabemos da instabilidade que isso causa e
que quebra qualquer filosofia de sustentabilidade de instituições provendo serviços
financeiros.
O SR. DEPUTADO CORIOLANO SALES – Não proponho isso.
A SRA. BEATRIZ AZEREDO – Desculpe, Deputado. Não estou respondendo
a sua argüição. Estou mais centrada na última consideração do Deputado Ricardo
Berzoini, que precisou ausentar-se, da idéia de multiplicar por dez. Estava apenas
me referindo a V.Exa. na primeira consideração de o Banco estar à disposição.
Continuando, não há registro no mundo de experiência de microcrédito que
tenha dado certo, num longo prazo, com dependência de recurso orçamentário.
Este é um ponto central. Voltando à questão do Deputado que se ausentou, o
Banco não considera isso uma política social, isso não faz parte de um balanço
social do BNDES, faz parte de uma política, de uma agenda de prioridade do Banco
para a pequena, média e microempresa, em que na ponta se insere a questão do
microempreendedor.
Então, só para lembrar e deixar aqui registrado, o Banco, para a pequena,
média e microempresa, destinou, no ano passado, 4,4 bilhões. Neste ano a
estimativa é de que 5,2 bilhões sejam destinados a esse segmento. Isto significa
20% do orçamento do BNDES. Há uma longa agenda pela frente, mas os números
já alcançados pelo Banco para esse segmento são significativos.
Em relação ao microcrédito especificamente, que está numa outra ponta, vale
mencionar, primeiro, que o Banco não tem nenhuma restrição orçamentária quanto a
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isso. O Banco não trabalha com teto, quer dizer, o tamanho da linha de
financiamento do Banco hoje é o tamanho desse mercado. Então, só para voltar ao
ponto inicial da minha fala, estamos ajudando a construir no País esse mercado,
essa rede de instituições.
Hoje as instituições capazes, auto-sustentáveis, que possuem algum nível
técnico para começar, não do ponto de partida, a ser auto-sustentável, mas em
algum momento alcançar esse ponto de equilíbrio, toda e qualquer instituição tem
acesso ao crédito do BNDES sem nenhum limite orçamentário. Então, o limite para
crescer o aporte de recursos do Banco não é o orçamento do Banco, é o tamanho
desse mercado e é a situação atual dessas instituições no País. Este é um ponto
central que desejo destacar.
O custo que o Banco cobra dessas instituições, a rigor, é o custo mais barato
que existe dentro do BNDES, é TJLP pura, que significa a remuneração que o
Banco deve dar aos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador — o Banco
movimenta uma significativa parte desse recurso.
Então, o Banco cobra dessas instituições exatamente o custo de
remuneração desses recursos que deve ao FAT.
Eram estas as minhas considerações.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Danilo de Castro) – Agradecemos a todos a
presença, em especial aos nossos palestrantes, que, sem dúvida, muito contribuíram
para que possamos fazer o relatório que toda a sociedade brasileira espera sobre o
Sistema Financeiro Nacional.
Agradecemos a presença à Dra. Beatriz Azeredo, à Dra. Clara Steinberg, ao
Dr. Valdi de Araújo Dantas e ao Dr. Ary Burger.
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Nada mais havendo a tratar, vou encerrar os trabalhos da presente reunião da
Comissão Especial do Sistema Financeiro Nacional.
Está encerrada a reunião.