Derivadas de funções complexas

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23 Capítulo 3 Derivadas de funções complexas 3.1. Introdução O primeiro estudo sistemático das funções complexas e das suas aplicações a problemas de análise, hidrodinâmica e cartografia deve-se a L. Euler, em 1776-77. Contudo, funções deste tipo tinham sido anteriormente consideradas por outros matemáticos, com destaque para J. d’Alembert 1 que utilizou funções complexas em 1752, no âmbito do estudo do movimento de fluidos. Euler obteve, então, condições necessárias para a diferenciabilidade de uma função complexa, embora não as tenha explorado completamente. Estas condições resultam da forma especial das funções lineares complexas, dado que a diferenciabilidade de uma função num ponto corresponde a poder ser aproximada por uma função linear numa vizinhança desse ponto. Por volta de 1825, A.L. Cauchy 2 deu um sentido preciso à noção de derivada de uma função, tornando rigorosa a noção de limite da sua razão incremental, na sequência de uma ideia de d’Alembert cerca de 1752. Cauchy deu passos decisivos no estudo das funções complexas com base nas condições necessárias de diferenciabilidade obtidas por Euler, mas só com o trabalho de B. Riemann 3 , em 1851, é que estas condições são plenamente exploradas. Ficaram conhecidas por “condições de Cauchy-Riemann”. Podem ser expressas por equações que relacionam as derivadas parciais das partes real e imaginária da função. Estabelecem que a diferenciabilidade de funções complexas 1 Jean le Rond d’Alembert (1717-1783). 2 Augustin Louis Cauchy (1789-1857). 3 Bernhard Riemann (1826-1866).

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23

Capítulo 3

Derivadas de funções complexas

3.1. Introdução

O primeiro estudo sistemático das funções complexas e das suas aplicações a

problemas de análise, hidrodinâmica e cartografia deve-se a L. Euler, em 1776-77.

Contudo, funções deste tipo tinham sido anteriormente consideradas por outros

matemáticos, com destaque para J. d’Alembert1 que utilizou funções complexas em

1752, no âmbito do estudo do movimento de fluidos. Euler obteve, então, condições

necessárias para a diferenciabilidade de uma função complexa, embora não as tenha

explorado completamente. Estas condições resultam da forma especial das funções

lineares complexas, dado que a diferenciabilidade de uma função num ponto corresponde

a poder ser aproximada por uma função linear numa vizinhança desse ponto.

Por volta de 1825, A.L. Cauchy2 deu um sentido preciso à noção de derivada de

uma função, tornando rigorosa a noção de limite da sua razão incremental, na sequência

de uma ideia de d’Alembert cerca de 1752. Cauchy deu passos decisivos no estudo das

funções complexas com base nas condições necessárias de diferenciabilidade obtidas por

Euler, mas só com o trabalho de B. Riemann3, em 1851, é que estas condições são

plenamente exploradas. Ficaram conhecidas por “condições de Cauchy-Riemann”.

Podem ser expressas por equações que relacionam as derivadas parciais das partes real e

imaginária da função. Estabelecem que a diferenciabilidade de funções complexas

1 Jean le Rond d’Alembert (1717-1783). 2 Augustin Louis Cauchy (1789-1857). 3 Bernhard Riemann (1826-1866).

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24 Derivadas de funções complexas

implica fortes restrições de interligação das suas partes real e imaginária, ausentes na

diferenciabilidade de funções de ℝ 2 em ℝ 2 .

As transformações lineares definidas pelas derivadas de funções complexas

diferenciáveis num conjunto aberto correspondem a relações geométricas de semelhança

do domínio para o contradomínio, isto é, transformações que preservam ângulos entre

rectas e expandem (ou contraem) comprimentos uniformemente em todo o espaço. Como

as derivadas de uma função definem transformações lineares que são boas aproximações

locais da função, as propriedades referidas tendem a ser satisfeitas pela função, no limite

quando se tende para um ponto de diferenciabilidade. Euler chamava-lhes

“transformações infinitesimamente semelhantes” para traduzir a ideia de, na vizinhança

de cada ponto, tenderem a definir transformações de semelhança no sentido da geometria

elementar (triângulos semelhantes têm ângulos correspondentes iguais e lados

correspondentes proporcionais com a mesma constante de proporcionalidade). Estas

transformações foram consideradas nos trabalhos de Euler de 1777 sobre cartas

geográficas da Rússia, de cuja elaboração foi encarregado pela Academia das Ciências de

S. Petersburgo. Na verdade, um aspecto essencial para o uso prático de mapas é que o

“traçado de rumos” definindo um ângulo de direcção de percurso com uma direcção de

referência (por exemplo, com o Norte magnético ou celeste) possa ser feito marcando o

mesmo ângulo numa carta plana, o que exige a preservação de ângulos na construção de

mapas planos da superfície do globo terrestre e, portanto, a propriedade de

corresponderem a “transformações infinitesimamente semelhantes”. A designação

“transformações conformes”, utilizada para transformações do plano com as

propriedades geométricas referidas, foi introduzida apenas em 1789 por S. Schubert,

académico de S. Petersburgo.

3.2. Diferenciabilidade e derivadas de funções complexas

Seja :f ℂ uma função definida num conjunto aberto não-vazio ℂ. Diz-

se que f é diferenciável num ponto 0z se existe o limite da razão incremental de

f entre z e 0z quando 0zz :

0

00

)()(lim)(

0 zz

zfzfzf

zz

.

A )( 0zf chama-se a derivada de f em 0z . Se f é diferenciável em todos os pontos do

conjunto aberto que contém um conjunto não-vazio S , diz-se que f é holomorfa

em S . O conjunto de todas as funções holomorfas em S designa-se por )(SH . Chama-

se função inteira a uma função que é holomorfa em ℂ , isto é, o conjunto das funções

inteiras é (H ℂ) .

(3.1) Exemplos:

1. A função complexa 2||)( zzf só é diferenciável no ponto 0z . Na verdade, com ierh , ,0r ℝ , obtém-se

Page 3: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 25

ii erzezh

hhzhhz

h

zzhzhz

h

zfhzf

2))(()()(

.

Como zezerzez iii

r

22

0)(lim , verifica-se que para 0z este limite4 varia

com , pelo que hzfhzfh

/))()((lim0

não existe, e para 0z o limite existe e é

zero. Portanto a derivada de f só existe no ponto 0z e, neste caso, é nula.

2. As funções complexas constantes czf )( são holomorfas em ℂ e têm derivada nula

em todos os pontos. Na verdade,

0lim)()(

lim)(00

h

cc

h

zfhzfzf

hh .

3. A função identidade zzf )( é holomorfa em ℂ e tem derivada 1)( zf em todos

os pontos. Na verdade,

11lim)(

lim)()(

lim000

hhh h

zhz

h

zfhzf .

4. As funções potência de expoente inteiro positivo, nzzf )( , com n ℕ, são

holomorfas em ℂ e têm derivada 1)´( nznzf em todos os pontos. Na verdade, da

fórmula binomial de Newton5 obtém-se

h

hzhnzhnn

zhn

h

zhz

h

zfhzfnnnn

nn

1221

2

)1()()()(

e, portanto,

1221

00 2

)1(lim

)()(lim)( nnnn

hhhzhnzh

nnzn

h

zfhzfzf 1nzn .

As derivadas nos exemplos anteriores foram calculadas directamente a partir da

definição, como limites de razões incrementais. Contudo, da definição de derivada de

funções complexas resultam propriedades de diferenciação de operações de funções

análogas às da diferenciação de funções reais e que se estabelecem de forma idêntica. Na

verdade, as somas, produtos e quocientes (com denominadores não nulos) de funções

complexas diferenciáveis num ponto são diferenciáveis nesse ponto e as composições de

funções complexas diferenciáveis em pontos correspondentes são diferenciáveis. As

regras de derivação associadas são:

gfgf )( , gfgffg )( , 2g

gfgf

g

f

, ggfgf )()( .

Portanto, as somas, produtos, quocientes (com denominadores que não se anulam) e

composições de funções holomorfas são funções holomorfas. Mais precisamente, com

S ℂ , se )(, SHgf tem-se )()(),( SHfggf e )( }0{\)/( 1 gSHgf ; se

4 O limite indicado é a derivada direccional da correspondente função em ℝ

2 no ponto zyx ),(

segundo o vector )sin,(cos . 5 Isaac Newton (1642-1727).

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26 Derivadas de funções complexas

))((),( SgHfSHg tem-se )()( SHgf . Em particular, o conjunto das funções

holomorfas num conjunto S ℂ é um espaço linear complexo com a soma e a

multiplicação por escalares complexos usuais.

(3.2) Exemplos

1. As funções polinomiais

n

k

k

k zazP0

)( são funções inteiras, visto que são somas

de produtos de constantes por potências de expoentes inteiros não negativos, as quais são

funções inteiras. As regras de derivação de operações de funções dão

1

0 1)1()(n

k

k

k zakzP . Assim, a derivada de uma função polinomial de grau n é

uma função polinomial de grau 1n .

2. As funções racionais )(/)( zQzP , onde QP, são funções polinomiais e Q não é o

polinómio zero, são holomorfas no seu domínio, isto é, no conjunto de pontos onde o

denominador )(zQ não é zero, dado que são quocientes de funções inteiras. As derivadas

de funções racionais podem ser calculadas pela regra de derivação do quociente de

funções e a fórmula de derivação de polinómios do exemplo anterior.

Note-se que a função definida por

(3.3)

0

0

0

000

0

se,0

se,)()()()(

),(

zz

zzzz

zzzfzfzf

zzE

satisfaz 0),(lim 00

zzEzz

. Por outro lado, a função :0zT ℂℂ, com zzfzTz )()( 00

, é

uma transformação linear no espaço linear complexo ℂ. Assim, dada a correspondência

entre pontos de ℂ e de ℝ 2 , a diferenciabilidade de uma função complexa ),( vuf num

ponto ),( 000 yxz ℂ corresponde à diferenciabilidade da função ),( vu , definida em

pontos do espaço linear real ℝ 2 e com valores neste espaço, no ponto ),( 00 yx , com

derivada dada por uma transformação linear em ℝ 2 que corresponde a uma

transformação linear no espaço linear complexo ℂ. Designando )(),( 0zfBA , pode-se

escrever a transformação linear 0zT na forma

),()()()).((),(0

AyBxByAxAyBxiByAxyixBiAyxTz .

A representação matricial da correspondente transformação linear em ℝ 2 , na base

canónica, coincide com a matriz Jacobiana da função ),( vu no ponto ),( 00 yx e é

y

v

x

v

y

u

x

u

AB

BA .

Portanto, há consistência com a observação em Álgebra Linear das representações

matriciais das transformações lineares em ℝ 2 que correspondem a transformações

lineares complexas em ℂ serem, na base canónica de ℝ 2 , as matrizes 22 de

Page 5: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 27

componentes reais com as duas componentes na diagonal principal iguais e as outras

duas componentes simétricas uma da outra.

Ficou provado o resultado seguinte.

(3.4) Teorema (equações de Cauchy-Riemann): Se Sf : ℂ , com S ℂ , é

diferenciável num ponto Sz 0 e ),( vuf , então no ponto 000 ),( zyx verifica-se

y

v

x

u

,

x

v

y

u

.

Além disso, a derivada f é dada por cada uma das fórmulas seguintes:

x

f

x

vi

x

uf

def

,

y

fi

y

ui

y

vf

def

,

y

ui

x

uf

,

x

vi

y

vf

.

É claro que as equações de Cauchy-Riemann estabelecem fortes restrições de

interligação das partes real e imaginária de funções complexas diferenciáveis, mas

também estabelecem restrições às próprias partes real e imaginária, o que é concretizado

com casos particulares nos exemplos seguintes.

(3.5) Exemplos:

1. Seja ),( vuf uma função complexa holomorfa numa região ℂ, cuja parte real é 22),( yxyxyxu . A equação de Cauchy-Riemann xuyv // é, neste caso,

yxyxyv 2),(/ . Primitivando em ordem a y obtém-se ),( yxv )(2/2 2 xKyxy ,

onde a constante de primitivação em ordem a y se representa por )(xK dado que pode

depender de x . A outra equação de Cauchy-Riemann, xvyu // , também tem de

ser satisfeita, o que equivale a )(22 xKyyx e, portanto, a xxK )( , ou

seja, 2/)( 2xxK +c, onde c é uma constante real. Assim, uma função holomorfa

numa região com a parte real dada tem necessariamente de ter parte imaginária da forma

cyxyxyxv 2/22/),( 22 , onde c é uma constante real.

2. Seja ),( vuf uma função complexa definida num conjunto aberto ℂ, cuja parte

real é 22),( yxyxu . Procedendo de forma análoga obtém-se xyxyv 2),(/ ,

)(2),( xKxyyxv , )(22 xKyy , o que é impossível. Portanto, não há funções

complexas holomorfas com parte real 22),( yxyxu .

A diferenciabilidade de uma função complexa num ponto corresponde aos

acréscimos dos valores da função numa vizinhança do ponto em relação ao valor nesse

ponto serem bem aproximados por uma função linear complexa, no sentido dos erros de

aproximação convergirem para zero quando os pontos no domínio convergem para o

ponto considerado. Geometricamente, esta situação corresponde ao gráfico da função em

ℝ 2 associada à função complexa admitir um plano tangente (não vertical) no ponto

correspondente ao ponto considerado. Esta tangência a um plano não vertical (gráfico de

Page 6: Derivadas de funções complexas

28 Derivadas de funções complexas

uma função contínua em ℝ 2 ) implica que a função seja contínua no ponto de

diferenciabilidade.

(3.6) Teorema: Se ℂ é um conjunto aberto e :f ℂ é diferenciável num ponto

0z , então f é contínua em 0z .

Dem. Com ),( 0zzE definida para z numa vizinhança de 0z pela fórmula (3.3), tem-se

),()()()()( 0000 zzEzzzfzfzf . Como 0),(lim 00

zzEzz

, é 0)()(lim 00

zfzfzz

,

pelo que f é contínua em 0z . Q.E.D.

As equações de Cauchy-Riemann num ponto são necessárias para a

diferenciabilidade nesse ponto. O exemplo seguinte mostra que não são suficientes.

(3.7) Exemplo: Considera-se a função complexa ||)( xyzf , onde zyx ),( . Com

fvu ),( , verifica-se 0)0,( xu , 0),0( yu e 0),( yxv , pelo que 0)0,0)(/( xu ,

0)0,0)(/( yu , 0)/( xv , 0)/( yu . Portanto, as equações de Cauchy-Riemann

são satisfeitas no ponto zero. Por outro lado, com ierh , ,0r ℝ , tem-se

i

ie

er

r

h

fhf

2

|2sin||))(sin(cos|)0()(.

Os valores desta função variam com , por exemplo, o valor da função é zero para

0 , e é (1/2,-1/2) para 4/ . Portanto, hfhfh

/))0()((lim0

não existe. Segue-

se que f não é diferenciável no ponto zero, mas as equações de Cauchy-Riemann

verificam-se nesse ponto.

Sabe-se do estudo de funções em ℝ 2 que uma condição suficiente para a

diferenciabilidade de uma função num conjunto aberto não-vazio é que as duas

componentes reais da função sejam 1C nesse conjunto, isto é, as suas derivadas parciais

existam e sejam contínuas no conjunto. Esta propriedade permite estabelecer condições

em que as equações de Cauchy-Riemann são necessárias e suficientes para

diferenciabilidade de uma função complexa.

(3.8) Teorema: Seja ℝ 2 um conjunto aberto não-vazio e :,vu ℝ funções 1C .

Então a função complexa ),( vuf é holomorfa em se e só se as equações de

Cauchy-Riemann se verificam em .

Dem. Nas condições dadas, a função )),(),,((),( yxvyxuyx em ℝ 2 é diferenciável em

. A derivada é uma transformação linear em ℝ 2 que corresponde a uma transformação

linear no espaço linear complexo ℂ se e só se a sua matriz Jacobiana, na base canónica

de ℝ 2 , tem as componentes na diagonal principal iguais e as outras duas componentes

simétricas, ou seja, se e só se são satisfeitas as equações de Cauchy-Riemann. Q.E.D.

Page 7: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 29

(3.9) Equações de Cauchy-Riemann em coordenadas polares

Em certos casos é útil considerar as equações de Cauchy-Riemann em coordenadas

polares. As relações entre coordenadas cartesianas yx, e coordenadas polares ,r são

sin,cos ryrx . A transformação de coordenadas no domínio de funções

),(),,( yxvyxu pode ser expressa na forma

),()sin,cos(),( rUrruyxu , ),()sin,cos(),( rVrrvyxv .

Com a regra de derivação da função composta, obtém-se

cossin

sincos

r

r

y

v

x

v

y

u

x

u

V

r

V

U

r

U

As equações de Cauchy-Riemann em coordenadas cartesianas são

Ay

v

x

u def

, B

y

u

x

v def

,

pelo que

)sincos(cossin

)cossin(sincos

BArBA

BArBA

V

r

V

U

r

U

e, portanto, as equações de Cauchy-Riemann em coordenadas polares são

(3.10) r

Ur

V

,

r

Vr

U

.

(3.11) Exemplos

1. Considera-se a função complexa zezf )( . Com ),( vuf e ),( yxz , verifica-se

)sin(cos yiyee xz , pelo que yeyxu x cos),( e yeyxv x sin),( . Tem-se

yex

u x cos

, ye

y

u x sin

, ye

x

v x sin

, ye

y

v x cos

.

Estas funções são contínuas e satisfazem as equações de Cauchy-Riemann em ℂ.

Conclui-se do teorema (3.8) que ze é uma função inteira. A sua derivada é

zxxz eyeiyex

vi

x

ue

sincos)( .

Portanto, tal como no caso real, a derivada da exponencial é ela própria.

2. As funções complexas coseno e seno foram definidas por

2cos

zizi eez

,

i

eez

zizi

2sin

.

Como somas, produtos e composições de funções inteiras são inteiras, conclui-se que as

funções complexas coseno e seno também são funções inteiras. As suas derivadas são

zieieee

zzizizizi

sin22

)(cos

, zi

ieie

i

eez

zizizizi

cos22

)(sin

.

Page 8: Derivadas de funções complexas

30 Derivadas de funções complexas

Portanto, tal como para as correspondentes funções reais, a derivada do coseno complexo

é o simétrico do seno e a derivada do seno complexo é o coseno.

A tangente complexa é )/(cos)(sintan zzz . Como é um quociente de funções inteiras,

esta função é holomorfa no seu domínio, isto é, no conjunto onde o denominador não se

anula, ℂ\ z{ ℂ kkz ,2/: ℤ}. A derivada é

zz

zzz

22

22

cos

1

cos

sincos)(tan

.

Também neste caso, permanece válida a fórmula da derivação da tangente real.

3. De forma análoga, conclui-se que as funções complexas coseno hiperbólico e seno

hiperbólico são funções inteiras e que as suas derivadas são zz sinh)(cosh ,

zz cosh)(sinh . A tangente hiperbólica é holomorfa no seu domínio. A sua derivada é

zz 2cosh/1)(tanh .

4. Como se viu na secção 2.6, o logaritmo complexo pode ser definido por escolhas em

infinitos valores, mas podem considerar-se funções dadas por cada ramo do logaritmo

zln , por exemplo, (||ln iz Arg )2 kz , com k ℤ fixo. Cada um destes ramos do

logaritmo complexo está definido em ℂ\{0} e é descontínuo no semieixo real negativo,

com a parte imaginária a aproximar-se de )12( k quando os pontos do domínio se

aproximam deste semieixo pelo semiplano complexo superior (Im 0z ) e de )12( k

quando os pontos do domínio se aproximam deste semieixo pelo semiplano complexo

inferior (Im 0z ) . As partes real e imaginária de cada um destes ramos são, em

coordenadas polares ,r com zer i e )12(,)12( kk , respectivamente

rrU ln),( e ),(rV . Verifica-se rrU /1/ , 0/ U e 0/ rV ,

1/ V . Estas funções são contínuas e satisfazem as equações de Cauchy-Riemann

em coordenadas polares no conjunto )12(,)12(,0),( kkr , o qual

corresponde em coordenadas cartesianas a ℂ\ )0,{(x ℂ }0: x . É claro que a

continuidade de ),(),,( rVrU no conjunto indicado implica a continuidade das partes

real e imaginária ),(),,( yxvyxu de cada ramo do logaritmo considerado no conjunto

ℂ\ )0,{(x ℂ }0: x . Conclui-se do teorema (3.8) que cada uma destas funções

logaritmo é holomorfa no conjunto referido. A sua derivada pode ser facilmente

calculada pela regra de derivação da função composta, derivando ze z ln . Obtém-se

1)(lnln ze z e, portanto, zz /1)(ln , o que generaliza a fórmula análoga para a

derivada da função real logaritmo.

5. As potências complexas de base complexa foram definidas na secção 2.7 por zww ezz ln , para z ℂ }0{\ e w ℂ \ ℚ. Para z ℝ , wz pode ser escolhido de

infinitos valores, tal como zln , e, para z ℝ , convencionou-se tomar para zln o

logaritmo real, o que dá uma única possibilidade para os valores de wz que corresponde

ao valor principal do logaritmo complexo. Cada um dos ramos do logaritmo complexo

zln acima considerados corresponde a um ramo da potência complexa wzz , o qual é

uma função complexa definida em ℂ\ )0,{(x ℂ }0: x , tal como o correspondente ramo

de zln . A fórmula acima dá cada ramo de wzz como composição de funções

Page 9: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 31

holomorfas, pelo que também é uma função holomorfa no seu domínio. A derivada de

cada ramo f de wzz , nos pontos de ℂ\ )0,{(x ℂ }0: x , calcula-se facilmente pelas

regras da derivação de operações entre funções diferenciáveis, obtendo-se

)(zf 1lnln

wzwzww zw

z

weez ,

o que generaliza a fórmula análoga para a derivada da função real potência definida para

bases positivas.

Para z ℂ }0{\ e w ℚ, com qpw / em termos mínimos, p ℤ, q ℕ }1{\ ,

temos zwwqp ezz ln/ , pelo que as conclusões anteriores também se aplicam neste

caso. A situação de potências inteiras positivas, w ℕ foi considerada no exemplo

(3.1.4), dando a mesma fórmula de derivação, e para potências inteiras negativas w ℕ

obtém-se 1212 /)()()/(1)/1()( wwwwwww zwzzwzzzz , também em

concordância com a fórmula de derivação anterior.

6. As exponenciais complexas de base complexa foram definidas na secção 2.7 por zww ezw ln , para wz, ℂ, com 0z . Considerando a função potência complexa

wzwf )( definida em ℂ por um dos ramos do logaritmo, de acordo com a fórmula

acima, verifica-se que esta função é uma composição de funções inteiras e, portanto,

também é uma função inteira. A sua derivada calcula-se facilmente pelas regras da

derivação de operações entre funções diferenciáveis, obtendo-se

,)(lnln)( lnln wzwzww zzzeezwf

o que generaliza a fórmula análoga para a derivada das exponenciais reais de bases

positivas.

7. Na secção 2.8 obteve-se a relação )()( 22 1ln1lnarccos zizizziz .

Para definir uma função correspondente a um ramo desta relação há que escolher o sinal,

escolher um ramo da raiz quadrada que aparece na última parcela da expressão e um

ramo do logaritmo. Podemos escolher o valor principal do logaritmo, o ramo da raiz

quadrada definido no plano sem o semieixo real negativo e que assume valores de parte

imaginária positiva e o sinal negativo na expressão acima. Para que 21 z não esteja no

semieixo real negativo, temos de excluir do domínio os números reais z da união de

intervalos ,11, . Se 21 ziz pertence ao semieixo real negativo,

atendendo a que 21 ziz é o seu recíproco, também este pertence ao semieixo real

negativo e a sua soma z2 é um número real negativo. Como já se excluiu o intervalo

1, , resta verificar que para 0,1z é 01 2 z e 21 ziz não é real, para

concluir que podemos considerar a função )1ln(arccos 2ziziz definida na

região ℂ ,11,\ , considerando o valor principal do logaritmo (ver

Figura 2.20). É de notar que esta função dá para números reais 1,1z o valor da

função real usual arccos que tem contradomínio ,0 . A função fica definida por

composições, produtos e somas de funções holomorfas, pelo que é uma função

holomorfa em . A derivada desta função zarccos calcula-se facilmente pela regra de

derivação de operações entre funções diferenciáveis, obtendo-se

Page 10: Derivadas de funções complexas

32 Derivadas de funções complexas

22

2

222 1

1

1

1

111

1)(arccos

zz

ziz

ziz

i

z

zi

ziz

iz

.

Para zz arccos2/arcsin pode-se tomar o ramo de zarccos acima

considerado. Como se trata de uma diferença de funções holomorfas em , conclui-se

que também é holomorfa em . A sderivada obtém-se aplicando as regras de derivação:

21

1arccos2/)(arcsin

zzz

.

O resultado seguinte dá algumas condições simples que implicam que uma função

holomorfa numa região seja constante em toda essa região. Ilustram, mais uma vez, que a

existência de derivada de uma função complexa numa região impõe restrições fortes de

interligação entre as suas partes real e imaginária, e os seus módulo e argumento.

(3.12) Teorema: Seja f uma função holomorfa numa região ℂ . Se a derivada de

f é nula em , então f é constante em . O mesmo acontece se é constante em

qualquer das funções seguintes: a parte real, a parte imaginária, o módulo ou o

argumento de f .

Dem. Se a derivada de ),( vuf é nula, então yvxvyuxu /,/,/,/ são todas

nulas em . Segue-se que as funções u e v são constantes em todos os segmentos de

recta contidos em e paralelos aos eixos coordenados. Como é um conjunto aberto

e conexo, qualquer par dos seus pontos pode ser ligado por uma linha poligonal contida

em cujos segmentos são paralelos a um dos eixos coordenados. Conclui-se que tanto

u como v são constantes em e, portanto, o mesmo acontece a f .

Se u (ou v ) é constante em , então é 0// yuixuf (ou

0// xviyvf ) , pelo que f é constante em .

Se || f é constante em , então 22 vu também é constante em . Derivando

esta expressão em ordem a x e em ordem a y , e aplicando as equações de Cauchy-

Riemann a esta última equação obtém-se

0

x

vv

x

uu , 0

y

vv

y

uu , 0

x

uv

x

vu .

O sistema de duas equações constituído pela primeira e a última destas equações é

equivalente à equação matricial

0

x

ux

u

uv

vu

O determinante da primeira matriz é )( 22 vu . Se 22 vu se anula num ponto, como é

constante em anula-se em toda esta região e f é igual a zero em . Se 22 vu não

se anula em , então a primeira matriz na equação matricial acima é não-singular em

todos os pontos de e, em consequência, 0// yuxu em , o que implica

0// yuixuf em , pelo que f é constante em .

Page 11: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 33

Se o argumento de f é constante em , então ou v é nula em e

0// xviyvf em implica que f é constante em , ou existe uma

constante c ℝ tal que cvu em . Neste último caso, a parte real da função

))(1()1( ivuicfic é cvu =0 em , pelo que 0)1( fic . Como 0)1( ic ,

resulta que f é igual a zero em . Q.E.D.

A consequência seguinte das equações de Cauchy-Riemann é muito útil para a

representação geométrica de funções holomorfas (podia já ter sido observada no caso

particular do exemplo (2.1)). Mais uma vez, verifica-se que a diferenciabilidade de uma

função complexa num conjunto aberto impõe fortes restrições de interligação entre as

suas partes real e imaginária, neste caso com uma expressão geométrica muito simples.

(3.13) Teorema: Se )(),( Hvuf , então as curvas de nível de u e de v

intersectam-se ortogonalmente (ver Figura 3.1).

Dem. Das equações de Cauchy-Riemann resulta que o produto interno dos gradiantes de

u e de v satisfaz

0,,

x

u

x

v

x

v

x

u

y

v

y

u

x

v

x

u

y

v

x

v

y

u

x

uvu .

Portanto u e v são ortogonais, o que é equivalente à ortogonalidade das curvas de

nível de u e de v . Q.E.D.

Page 12: Derivadas de funções complexas

34 Derivadas de funções complexas

Figura 3.1: Intersecção ortogonal das curvas de nível das partes real (traço grosso) e ima-

ginária (traço fino) de funções holomorfas (exemplos: 2z , z/1 , ze , ztan , zln , zarccos )

3.3. Transformações conformes

Para analisar a forma como transformações definidas num plano deformam o

espaço, é útil observar o seu efeito em curvas contidas nos domínios das transformações.

As noções de curva e de caminho em subconjuntos de ℂ são análogas às

correspondentes noções em subconjuntos de ℝ 2 . Em particular, um caminho em ℂ

é uma função contínua definida num intervalo limitado e fechado de números reais com

valores em . Chama-se curva * em ao contradomínio de um caminho em .

Um caminho regular é um caminho 1C cuja derivada nunca se anula. Para um caminho

regular ba,: ℂ, a derivada 0)( t é um vector tangente à curva * no ponto

)(t , para todo bat , .

Figura 3.2: Transformação de curvas por uma função holomorfa

Seja ℂ um conjunto aberto, )(Hf e ba,: um caminho regular.

Então f também é um caminho. A curva correspondente é a imagem pela função

f da curva representada pelo caminho (Figura 3.2). Da regra de derivação da função

composta obtém-se )()()( ttft , para bat , . Portanto, sendo f 1C , é um

caminho regular se e só se 0)( zf , para *z . Além disso,

)(arg)(arg)(arg ttft , para bat , com 0)( tf .

Assim, se 0)( 0 zf o ângulo entre as tangentes dirigidas )( 0t e )( 0t ,

respectivamente, ao caminho em )( 00 tz e ao caminho em )( 00 zfw , é igual

a )(arg 0zf . Portanto, caminhos regulares que formam um ângulo em 0z são

Page 13: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 35

transformados pela função f em caminhos que formam o mesmo ângulo em 0w

(Figura 3.3). Também se tem

|)(|||

|)()(|lim 0

0

0

0

zfzz

zfzf

zz

,

pelo que pequenos segmentos de recta com origem em 0z são, no limite quando 0zz ,

contraídos ou expandidos na razão |)(| 0zf . Assim, a mudança de escala em 0z

resultante da transformação f é independente da direcção (Figura 3.3). Quando uma

função satisfaz estas duas propriedades diz-se que é uma transformação conforme.

As observações anteriores ilustram que as funções holomorfas satisfazem restrições

geométricas muito fortes, o que já se tinha notado quando se observou que as curvas de

nível das partes real e imaginária de uma função holomorfa se intersectam

ortogonalmente.

Figura 3.3: Preservação de ângulos e mudança de escala em cada ponto

independente da direcção sob transformações definidas por funções holomorfas

É claro que os dois tipos de conformidade em 0z , para uma função

:f ℂ, implicam que )( 0zf existe: o seu módulo é a razão de contracção ou

expansão de pequenos segmentos com origem em 0z , e o seu argumento é, para cada

caminho regular que passa por 0z , a diferença entre os argumentos das tangentes

dirigidas do caminho f em )( 00 zfw e do caminho em 0z .

Na verdade, como se vê no resultado seguinte, sob a hipótese adicional de

existência e continuidade das derivadas parciais yfxf /,/ , com zyx ),( numa

vizinhança de 0z , o primeiro tipo de conformidade por si só já implica a existência de

)( 0zf . Por outro lado, sob a mesma hipótese, o segundo tipo de conformidade implica a

existência de )( 0zf ou da derivada )()( 0zf da conjugada de f .

(3.14) Teorema: Seja )( 0zBr ℂ um círculo aberto centrado num ponto 0z ℂ e

)(: 0zBf r ℂ uma função tal que nos pontos )(),( 0zByxz r as derivadas

yfxf /,/ existem e são contínuas. Então:

1) A condição de conformidade de preservação dos ângulos entre caminhos regulares

em 0z é equivalente à existência de derivada de f em 0z diferente de zero.

2) A condição de conformidade de uma razão de expansão (ou contracção) constante de

pequenos segmentos de recta com origem em 0z , no limite quando os comprimentos dos

Page 14: Derivadas de funções complexas

36 Derivadas de funções complexas

segmentos tendem para zero, é equivalente à existência de derivada de f , ou da sua

conjugada, em 0z diferente de zero (no último caso f preserva os valores absolutos de

ângulos entre caminhos regulares que se intersectam em 0z mas inverte os seus

sentidos).

Dem. Já se sabe que a existência de derivada de f em 0z diferente de zero implica a

validade das duas condições de conformidade. Como os valores absolutos de complexos

conjugados são iguais e os ângulos definidos por complexos conjugados não nulos são

iguais em valor absoluto mas de sentidos contrários, a existência de derivada de f em

0z diferente de zero implica a validade das duas condições de conformidade, tendo em

consideração que a preservação de ângulos é com inversão de sentidos.

Do teorema (3.8) sabe-se que, nas condições da hipótese do presente teorema, a

existência de derivada de f (ou f ) em 0z é equivalente à validade das equações de

Cauchy-Riemann de f (ou f ) em 0z , pelo que basta mostrar que, separadamente, cada

uma das condições de conformidade implica a validade das equações de Cauchy-

Riemann em 0z e a não anulação da derivada de f (ou f ) em 0z .

Observe-se que para um caminho regular baz ,: , com 00 )( ztz ,

)())(),(( tztytx e ))(()( tzftw , é 2/)( zzx , 2/)()2/()( zziizzy ,

zy

fi

x

fz

y

fi

x

fy

y

fx

x

fw

2

1

2

1,

onde as derivadas parciais de f são calculadas em 0z e as derivadas de wzyx ,,, são

calculadas em 0t .

Se os ângulos entre caminhos regulares em 0z são preservados por f , então

(3.15) z

z

y

fi

x

f

y

fi

x

f

z

w

2

1

2

1

deve ser diferente de zero e ter argumento independente de z . Quando z percorre todos

os possíveis valores complexos, o quociente zz / percorre a circunferência do plano

complexo de raio 1 e centro na origem, pelo que os valores de (3.15) percorrem a

circunferência com centro em 2/)//( yfixf e raio 2/)//( yfixf . Ora a

única situação em que o argumento permanece constante corresponde ao raio ser nulo,

isto é, a yfixf // . Com fvu ),( , esta equação equivale a yvxu // e

yuxv // que são as equações de Cauchy-Riemann. Portanto, neste caso, f é

diferenciável em 0z . Como a expressão (3.15) tem de ser diferente de zero, o seu

segundo termo é zero e yfixf // , resulta que a expressão (3.15) é igual a

xf / e, das fórmulas para a derivada de f no teorema (3.4), concluiu-se

0/)( 0 xfzf .

Por outro lado, se pequenos segmentos de recta com origem em 0z são, no limite

quando os seus comprimentos tendem para zero, expandidos (ou contraídos) numa razão

constante, segue-se que ||/|| zw é diferente de zero e independente de z , pelo que o

valor absoluto de (3.15) tem de permanecer constante quando z percorre todos os

possíveis valores complexos. Como os valores de (3.15) percorrem uma circunferência,

Page 15: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 37

os seus módulos só permanecem constantes se o raio da circunferência é nulo ou o centro

está na origem. Como se viu acima, a primeira situação implica a validade das equações

de Cauchy-Riemann e, portanto, a diferenciabilidade de f em 0z . Por seu lado, a

segunda situação corresponde a yfixf // , ou seja a yfixf // , o que

implica a validade das equações de Cauchy-Riemann da conjugada de f e, portanto, a

sua diferenciabilidade em 0z . O facto de 0//)()( 0 xfxfzf prova-se de

forma idêntica ao caso anterior. Q.E.D.

(3.16) Exemplos:

As funções holomorfas que foram consideradas em secções anteriores fornecem

exemplos de transformações conformes. Em seguida, consideram-se três exemplos

específicos mais detalhadamente.

1. A transformação exponencial

Considera-se a função exponencial )sin(cos)( yiyeezf xz , com zyx ),( .

Como a exponencial é uma função periódica de período 2i , cada faixa horizontal do

plano complexo com largura 2 é transformada em todo o contradomínio da

exponencial, isto é, em ℂ }0{\ .

/

2

/

2

Figura 3.4: Transformação do plano definida pela exponencial complexa

As rectas verticais ax são transformadas em circunferências de centro na

origem e raio ae (Figura 3.4). Em particular, o eixo imaginário é transformado na

circunferência de raio 1, as rectas verticais do semiplano direito são transformadas em

circunferências de raio maior do que 1 e as rectas verticais do semiplano esquerdo são

transformadas em circunferências de raio menor do que 1.

Por outro lado, as rectas horizontais by são transformadas em semirectas com

extremidade na origem, mas não a contendo, que fazem o ângulo b com o semieixo real

positivo (Figura 3.4).

Page 16: Derivadas de funções complexas

38 Derivadas de funções complexas

/

/

Figura 3.5: Transformação de um rectângulo definida pela exponencial complexa

Uma vez que as rectas horizontais são ortogonais às rectas verticais, as suas

imagens têm de ser curvas ortogonais, pois 0)( zz ee para todo z ℂ, o que é

confirmado pelo facto das semirectas que passam pela origem serem ortogonais às

circunferências de centro na origem.

Em particular, a função exponencial transforma rectângulos de altura inferior a 2

em sectores de coroas circulares, definindo uma correspondência biunívoca entre os dois

conjuntos (Figura 3.5). Por outro lado, rectângulos de altura superior a 2 são

transformados em coroas circulares, não sendo injectiva a correspondência definida entre

os dois conjuntos.

2. Transformações de Möbius

Chama-se transformação de Möbius6 a uma função da forma

dcz

bazzf

)( ,

com dcba ,,, ℂ e 0bcad (o exemplo (2.2) é o caso particular com ,0a

1,1 dcb ). Veremos num dos capítulos finais que estas transformações

desempenham um papel fundamental no esclarecimento da diversidade possível das

transformações conformes.

Note-se que

22 )()(

)()()(

dcz

bcad

dcz

bazcdczazf

,

desde que 0 dcz . Assim, se 0c a derivada existe e é diferente de zero em

ℂ }/{\ cd ; se 0c a derivada existe e é diferente de zero em ℂ. Portanto, as

6 August Ferdinand Möbius (1790-1868). As transformações de Möbius também são conhecidas por

transformações homográficas, transformações lineares fraccionárias ou transformações bilineares

fraccionárias.

Page 17: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 39

transformações de Möbius com 0c são conformes em ℂ, e com 0c são conformes

em ℂ }/{\ cd .

Começa-se por observar que f é invertível e a sua inversa satisfaz

acw

bdwwf

)(1 ,

com 0))(( bcadcbda , pelo que a inversa de uma transformação de Möbius

também é uma transformação de Möbius.

Um caso particular especialmente simples de analisar obtém-se com

1,0 cbda , nomeadamente a função recíproco

zzR

1)( ,

cujo domínio e contradomínio são iguais a ℂ }0{\ . Note-se que izizR )( , pelo que

conhecendo a imagem de um certo conjunto de pontos S , a imagem da rotação de

ângulo 2/ deste conjunto é o resultado da rotação de ângulo 2/ da imagem do

conjunto S . Vamos ver como esta função transforma rectas e circunferências. As rectas e

as circunferências têm equações cartesianas que, com zyx ),( , podem ser escritas

(3.17) 022 DCyBxyxA .

Obtêm-se rectas para 0,0 BA e 0,0 CA . Por outro lado, com 0A ,

completando quadrados de somas, pode-se escrever a equação anterior na forma

2

2222

4

4

22 A

ADCB

A

Cy

A

Bx

,

pelo que (3.17) representa circunferências para 04,0 22 ADCBA , e estas têm

raio |2|/422 AADCB e centro em )( )2/(),2/( ACAB .

Com as substituições

i

wwv

wwuwwvuivu

zw

i

zzy

zzxzzyx

2,

2,,

1,

2,

2, 2222

,

a equação (3.17) transforma-se sucessivamente em

022

Di

zzC

zzBzzA ,

011

2

11

2

1

D

wwi

C

ww

B

wwA ,

022

wwDi

wwC

wwBA ,

(3.18) 022 ACvBuvuD .

Ora, se (3.17) representa uma recta é 0,0 BA e 0,0 CA e, portanto, (3.18)

representa uma recta que passa na origem se 0D , e uma circunferência que passa na

origem se 0D . Se (3.17) representa uma circunferência, então 0A e

Page 18: Derivadas de funções complexas

40 Derivadas de funções complexas

0422 ADCB , pelo que (3.18) representa uma recta que não passa na origem se

0D , e uma circunferência se 0D .

Em particular, rectas verticais Dx (da forma (3.18) com 1,0 BCA )

transformam-se na recta 0u se 0D , ou em circunferências 0)( 22 uvuD se

0D . Por analogia com (3.17), estas circunferências têm raio |2|/1 D e centro em

)0),2/(1( D (Figura 3.6).

( )/ /

Figura 3.6: Transformação de uma recta vertical pela transformação de Möbius zz /1

Da análise anterior conclui-se que uma grelha de rectas verticais e rectas

horizontais é transformada pela função zzR /1)( numa grelha constituída por

circunferências tangentes aos eixos coordenados na origem intersectando-se

ortogonalmente e pelos próprios eixos coordenados (Figura 3.7).

Figura 3.7: Transformação do plano definida por uma transformação de Möbius

Para analisar o caso geral, note-se que se 0c então

c

a

dczc

adbc

dcz

bazzf

1)( .

Assim, em geral, uma transformação de Möbius )(zfw resulta da composição de três

transformações 21 ,, ARA , na forma )()( 12 zARAw , onde

dczzzA 11 : (homotetia e rotação centradas na origem seguidas de translação)

Page 19: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 41

1

21

1:

zzzR

222 : zwzA (homotetia e rotação centradas na origem seguidas de translação),

onde cadbc /)( e ca / . 1A e 2A são funções afins e R é a função recíproco

considerada anteriormente. Por outro lado, se 0c , bzdazf )/()( é uma função

afim, pelo que corresponde a uma homotetia e rotação seguidas de uma translação.

3. Transformação de Joukovski

A transformação de Joukovski7 é a função

zzzJ

1

2

1)( .

O seu domínio é ℂ }0{\ . Trata-se de uma função racional e, portanto, é holomorfa no seu

domínio. A derivada desta função é

2

11

2

1)(

zzJ ,

pelo que se anula nos pontos 1 e 1 , e apenas nestes pontos ( 1 são pontos fixos da

transformação pois 1)1( J ). Assim, a transformação de Joukovski é uma

transformação conforme na região ℂ }1,0,1{\ . Note-se que )()/1( zJzJ , pelo que a

imagem de um ponto 0z coincide com a do seu recíproco.

Se iez é cos2/)()( ii eezf . Portanto, a circunferência de raio 1 e

centro na origem é transformada no segmento de recta no eixo real entre os números 1

e 1 (Figura 3.9). Pares conjugados de pontos da circunferência são transformados num

mesmo ponto do intervalo 1,1 , igual à parte real dos pontos considerados.

Para identificar a imagem da circunferência de raio 1r , toma-se irez e

calcula-se

(3.19)

sin1

2cos

1

2

1

2

1

rr

i

rr

r

eererfiYX

iii ,

pelo que

11

4

11

4

12

2

2

2

rr

Y

rr

X .

Portanto, a circunferência de raio 1r e centro na origem é transformada na elipse de

semieixos 2/)/1( rr e 2/|/1| rr ao longo do eixo real e do eixo imaginário,

respectivamente. Os gráficos das funções 2/)/1( rr e 2/|/1| rr em função de 0r

são como esboçados na Figura 3.8. Segue-se que toda a região exterior à circunferência

de raio 1 e centro na origem é transformada no complementar em ℂ do segmento de

recta no eixo real de extremos nos números 1 e 1 , o mesmo acontecendo com o

7 Nicolai Joukovski (1847-1921).

Page 20: Derivadas de funções complexas

42 Derivadas de funções complexas

complementar da origem na região limitada pela circunferência de raio 1 e centro na

origem.

Figura 3.8: Gráficos das funções 2/)/1( rr e 2/|/1| rr

Por outro lado, de (3.19) obtém-se também, para tal que 0cos e 0sin ,

1sincos 2

2

2

2

YX ,

pelo que as rectas de declive com valor absoluto igual a |cos|/|sin| que passam na

origem são transformadas na hipérbole de semieixos |sin| , |cos| ao longo do eixo

real e do eixo imaginário, respectivamente (ver Figura 3.9). Estas hipérboles são

ortogonais às elipses acima consideradas, uma vez que são imagens de curvas ortogonais

por uma transformação conforme.

Conclui-se também que o eixo real (excluindo o zero) é transformado na união das

semirectas que se obtêm retirando ao eixo real o segmento de recta com extremos nos

números 1 e 1 , enquanto que cada semieixo imaginário é transformado em todo o

eixo imaginário (ver Figura 3.9), com os conjuntos }1:{ yiy e }01:{ yiy a

serem transformados no semieixo imaginário negativo e os conjuntos }10:{ yiy e

}1:{ yiy a serem transformados no semieixo imaginário positivo.

Page 21: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 43

Figura 3.9: Transformação de Joukovski

Com )(zfw , obtém-se

2

2

2

1

1

12

12

2)/1(

2)/1(

1

1

z

z

zz

zz

zz

zz

w

w.

Como )1/()1( www é uma transformação de Möbius cuja inversa é

)1/()1( , a transformação de Joukovski )(zJw resulta da composição de

três transformações, ))(( 1 zMQMw , onde

1

1: 1

z

zzzM , 2

121: zzzQ , 1

1:

2

22

1

z

zwzM .

M e 1M são transformações de Möbius e Q é a função potência de expoente 2 .

Verifica-se (HM ℂ })1{\ , (HQ ℂ ) e (1 HM ℂ })1{\ . Como estas transformações

são conformes preservam os ângulos entre curvas regulares em todos os pontos dos seus

domínios. A transformação Q duplica os argumentos em relação ao ponto 01 z , o qual

corresponde ao ponto do domínio 1)0(1 Mz . Com a função recíproco zzR /1)( ,

obtém-se que a transformação de Joukovski também é a composição ))(( 1 zMQMRw .

A função R é uma transformação de Möbius holomorfa em ℂ }0{\ e conforme no seu

domínio. Assim, as transformações 1,, MMR preservam os ângulos entre curvas

regulares em todos os pontos dos seus domínios, e a transformação Q duplica os

argumentos em relação ao ponto 01 z , o qual corresponde, neste caso, ao ponto do

domínio 1)0()0()( 11 MMz . Portanto, a transformação de Joukovski duplica tanto

os argumentos em relação ao ponto 1z , como em relação ao ponto 1z .

Page 22: Derivadas de funções complexas

44 Derivadas de funções complexas

Figura 3.10: Transformação de Joukovski da região delimitada por duas

circunferências tangentes em 1 , com uma delas a passas no ponto 1 .

Qualquer circunferência S que passe nos pontos 1 e 1 d o plano complexo

tem centro num ponto ia do eixo imaginário e raio 21 a , com 1a . A imagem do

arco de S que está no semiplano complexo inferior pela transformação zzR /1)( é um

arco de circunferência que passa nos pontos 1 e 1 e pertence ao semiplano complexo

superior, ou seja, é o arco da circunferência S pertencente ao semiplano complexo

superior. Como JRJ , é claro que a imagem do arco de S no semiplano complexo

inferior coincide com a imagem do arco de S no semiplano complexo superior. Pode-se

verificar que esta imagem é um arco de uma circunferência C que passa nos pontos 1

e 1 . Designando por 0 o ângulo da tangente a S no ponto 1 com a semirecta

com origem neste ponto contida no semieixo real positivo (Figura 3.10), obtém-se que a

transformação de Joukovski J é uma função bijectiva conforme do interior do círculo

delimitado por S para o conjunto U ℂ C\ e que o arco de circunferência C faz um

ângulo 2 com a semirecta de origem neste ponto contida no semieixo real positivo.

Conclui-se, também, que J é uma função bijectiva conforme do exterior desse círculo

para U . Observa-se, ainda, que a transformação de Joukovski transforma a região

delimitada pela circunferência S e por uma outra qualquer circunferência tangente a S

no ponto 1 numa região semelhante ao perfil clássico da asa de um avião planador,

como é ilustrado na Figura 3.10.

Os exemplos anteriores mostram que as propriedades de conformidade podem ser

úteis para obter o traçado das imagens de certas curvas do plano complexo que resultam

da aplicação de uma dada função holomorfa. Pode-se assim conseguir uma ideia

geométrica da forma como essa função deforma regiões do plano complexo.

Além disso, o estudo de transformações conformes tem grande interesse tanto de

um ponto de vista estritamente matemático como para aplicações em diversas outras

áreas. Por exemplo, as transformações de Möbius foram usadas em electrotecnia no

estudo de variações de impedância de circuitos quando certos componentes do circuito

são alterados, e a transformação de Joukovski foi usada em 1906 para calcular a força de

sustentação de um perfil de asa de avião e constituiu a base do primeiro método de

cálculo da aerodinâmica de asas de aviões.

Page 23: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 45

Este último exemplo é um caso particular de uma situação de interesse mais geral

que ocorre na resolução de certas equações diferenciais parciais, nomeadamente no

âmbito da hidrodinâmica, aerodinâmica, elasticidade e electroestática. Em certos casos

de interesse prático é possível resolver com relativa facilidade uma dada equação

diferencial numa região adequada, como por exemplo num rectângulo ou num círculo, e

usando transformações conformes apropriadas, obter soluções da equação diferencial

noutras regiões por simples mudanças de variáveis.

Exercícios 3 .1 . Det e r m in e o co n ju n t o o n d e a fu n çã o co m p lexa d a d a é h o lo m o r fa :

a ) )1(22),( 22 xyixyyxyxf b ) )s i n(co s),( xixeyxf y c) 2222 2),( yxiyxyxf .

3 .2 . Det e r m in e o s p o lin ó m io s d e d u a s va r iá ve is em q u e t o d o s o s t e r m o s sã o d e gr a u 4 e n ã o en vo lvem m o n ó m io s p r o p o r cio n a is a 22 yx q u e a d icio n a d o s à p a r t e r ea l e à p a r t e im a gin á r ia d a fu n çã o em 3 .1 .c) d ã o u m a fu n çã o in t e ir a .

3 .3 . Det e r m in e a fu n çã o h o lo m o r fa ),( vuf t a l q u e 323)( yxiyxv , yx, ℝ, e 1)0( f .

3 .4 . Se ja ℂ a b e r t o . Pr o ve : )(Hf se e só se )(Hg co m )()( zfzg .

3 .5 . Defin a u m a fu n çã o n u m a r egiã o a p r o p r ia d a q u e se ja a so m a d e u m a r a iz q u a d r a d a d e z1 co m u m a r a iz q u a d r a d a d e z1 , co m z co m p lexo , p r o cu r a n d o u m a r egiã o t ã o gr a n d e q u a n t o p o ssíve l. De t e r m in e o co n ju n t o o n d e a fu n çã o é h o lo m o r fa .

3 .6 . Reso lva o exe r cício a n t e r io r , m a s p a r a u m a co m p o siçã o d e d o is lo ga r it m o s co m p lexo s.

3 .7 . Se ja ℂ u m a r egiã o e )(Hf t a l q u e 1|1| 2 f em . Mo st r e q u e 0fRe o u 0fRe em .

3 .8 . Diz-se q u e u m a fu n çã o d e va lo r e s r ea is u é h arm ó n ica n u m co n ju n t o a b e r t o ℂ se sa t isfa z a equ ação d e Lap lace em ca d a p o n t o ),( yx , is t o é , se

0// 2222 yuxuu .

a ) De t e r m in e a s fu n çõ es p o lin o m ia is d e d u a s va r iá ve is r ea is em q u e t o d o s o s t e r m o s t êm gr a u 3 q u e sã o fu n çõ es h a r m ó n ica s em ℂ.

b ) Pr o ve : u é h arm ó n ica em se e só se )()( zuzv é h arm ó n ica em .

c) Pr o ve : A s p art e s real e im agin ária d e u m a fu n ção h o lo m o rfa co m d eriv ad a co n t ín u a n u m co n ju n t o ab ert o são h arm ó n icas n esse co n ju n t o .

3 .9 . Mo st r e q u e se nzzz ,,, 21 ℂ e st ã o sit u a d o s d o m esm o la d o d e u m a r ect a q u e p a ssa n a o r igem , en t ã o

n

k kz1

0 , e q u e se

n

k kz1

1 0 en t ã o o s p o n t o s n ã o p o d em est a r sit u a d o s d o m esm o la d o d e u m a r ect a q u e p a ssa n a o r igem .

3 .1 0 . Pr o ve : T o d o s o s z e ro s d a d er iv ad a d e u m a fu n ção p o lin o m ial )()( 1 k

n

k zzzP p e r t en cem ao en v ó lu cro co n v exo d o s z e ro s d essa fu n ção p o lin o m ial, i.e ., a o m en o r co n ju n t o co n vexo 8 q u e o s co n t ém (n est e ca so é u m p o lígo n o co n vexo em q u e o s vé r t ice s sã o ze r o s d a fu n çã o p o lin o m ia l co n sid e r a d a ) .

3 .1 1 . Pr o ve q u e zz n ã o é u m a t r a n sfo r m a çã o d e Mö b iu s.

3 .1 2 . Det e r m in e u m a t r a n sfo r m a çã o d e Mö b iu s q u e t r a n sfo r m a o s p o n t o s ii ,,0 , r e sp ect iva m en t e , n o s p o n t o s 0,1,1 .

3 .1 3 . Det e r m in e u m a t r a n sfo r m a çã o co n fo r m e q u e t r a n sfo r m a a in t e r secçã o d o s cír cu lo s d o p la n o co m p lexo 1|| z e 1|1| z n o cír cu lo 1|| z .

3 .1 4 . Det e r m in e u m a t r a n sfo r m a çã o co n fo r m e q u e t r a n sfo r m a a r egiã o en t r e a s cir cu n fe r ên cia s d o p la n o co m p lexo 1|| z e 2/1|2/1| z n o sem ip la n o 0zmI .

3 .1 5 . Mo st r e q u e u m a t r a n sfo r m a çã o d e Mö b iu s t em 0 e co m o ú n ico s p o n t o s fixo s se e só se é u m a exp a n sã o u n ifo r m e . Mo st r e q u e u m a t r a n sfo r m a çã o d e Mö b iu s t em co m o ú n ico p o n t o fixo se e só se é u m a t r a n sla çã o .

3 .1 6 . Se ja T u m a t r a n sfo r m a çã o d e Mö b iu s d ife r en t e d a id en t id a d e . Pr o ve : Um a t ran sfo rm ação d e M ö b iu s S co m u t a co m T se t em o s m esm o s p o n t o s f ixo s d e T .

8 Diz-se q u e S ℂ é u m co n ju n to co n ve xo se t o d o s o s se gm e n t o s d e r e ct a co m e xt r e m id a d e s e m S e st ã o t o t a lm e n t e co n t id o s e m S .

Page 24: Derivadas de funções complexas

46 Derivadas de funções complexas

3 .1 7 . Id en t ifiq u e a s t r a n sfo r m a çõ es d e Mö b iu s co r r e sp o n d en t e s a r o t a çõ es d a su p e r fície e sfé r ica d e Riem a n n (exe r cício 1 .1 6 ) em t o r n o d e d iâ m e t r o s.

3 .1 8 . Pr o ve : Para cad a p ar o rd en ad o d e t e rn o s ),,( 321 zzz e ),,( 321 www d e p o n t o s d ist in t o s d e ℂ e x ist e u m a e só u m a t ran sfo rm ação d e M ö b iu s q u e t ran sfo rm a cad a kz em kw , p ara 3,2,1k .

( Su ge st ão : Co m e ce p o r m o st rar q u e p ara cad a t e rn o ),,( 321 zzz e x ist e u m a e só u m a t ran sfo rm ação d e M ö b iu s q u e t ran sfo rm a cad a u m d e st e s p o n t o s n o s p o n t o s ,1,0 , re sp e ct iv am e n t e ) .

3 .1 9 . Diz-se q u e *, zz ℂ sã o p o n to s sim étrico s em re lação a u m a circu n ferên cia C se sã o co lin ea r e s co m o cen t r o d e C e o p r o d u t o d a s su a s d ist â n cia s a o cen t r o d e C é igu a l a o q u a d r a d o d o r a io d e C . Ch a m a -se sim etria em re lação a C à fu n çã o q u e t r a n sfo r m a ca d a p o n t o z n o seu sim é t r ico *z em r e la çã o a u m a cir cu n fe r ên cia C .

a ) Pr o ve : *, zz ℂ são p o n t o s sim é t r ico s em re lação a u m a circu n fe rên cia C se e só se t o d a a circu n fe rên cia q u e p assa p e lo s d o is p o n t o s é o r t o go n al a C .

b ) Mo st r e q u e é vá lid a a segu in t e co n st r u çã o geo m ét r ica sim p les: o sim é t r ico *z d e u m p o n t o z n o in t e r io r d o cír cu lo d e lim it a d o p o r C em r e la çã o a C é

a in t e r secçã o d a r ect a r q u e p a ssa p o r z e p e lo cen t r o d e C co m a t a n gen t e a C n o p o n t o d e in t e r secçã o d e C co m a r ect a p e r p en d icu la r a r q u e p a ssa p o r z (Figu r a 3 .1 1 ) ; v ice ve r sa , o sim é t r ico z d e u m p o n t o *z n o ext e r io r d o cír cu lo d e lim it a d o p o r C em r e la çã o a C é a in t e r secçã o d a r ect a r q u e p a ssa p o r *z e p e lo cen t r o d e C co m a su a p e r p en d icu la r q u e p a ssa n o p o n t o d e t a n gên cia a C d e u m a r ect a q u e p a ssa p o r *z ; o sim é t r ico d e ca d a p o n t o d e C é e le p r ó p r io .

c) Pr o ve : T o d a a t ran sfo rm ação d e M ö b iu s t ran sfo rm a p o n t o s sim é t r ico s em re lação a u m a circu n fe rên cia o u a u m a rect a em p o n t o s sim é t r ico s em re lação à im agem d a circu n fe rên cia o u rect a ( p ro p ried ad e d e co n serv ação d a sim e t r ia) .

z

z*r

C

Figu r a 3 .1 1 : De t e r m in a çã o geo m ét r ica d e p o n t o s sim é t r ico s em r e la çã o a u m a

cir cu n fe r ên cia

Exercício s co m ap licaçõ es a h id ro d in âm ica, e lectro estática e p ro p agação d e calo r em equ ilíbrio

3 .2 0 . Co n sid e r a -se u m esco a m en t o h id r o d in â m ico p la n o e st a cio n á r io . Ist o sign ifica q u e o ca m p o d e ve lo cid a d es ),( vu d o flu id o n ã o va r ia co m o t em p o , e st á d e fin id o n u m a r egiã o ℂ e é co n st a n t e em p o n t o s n u m a m esm a p e r p en d icu la r a o p la n o co m p lexo . Su p õ e -se q u e o ca m p o d e ve lo cid a d es é 1C e é lam e lar o u irro tacio n al, is t o é , 0)//,0,0()0,,(rot yuxvvu , e so len o id al, is t o é , 0//)0,,(div yvxuvu . A p r im e ir a co n d içã o co r r e sp o n d e à cir cu la çã o d o ca m p o d e ve lo cid a d es em ca m in h o s fech a d o s q u e d e lim it a m su b co n ju n t o s d e se r ze r o (n ã o h á vó r t ice s t o t a lm en t e co n t id o s em ) e a segu n d a co n d içã o co r r e sp o n d e a u m p r in cíp io d e co n se r va çã o (h á co n se r va çã o d e m a ssa e o flu id o é in co m p r essíve l) . Se é sim p lesm en t e co n exa exist em ca m p o s e sca la r e s p o ten ciais e t a is q u e ),( vu e

),( uv . Ch a m a -se p o ten cial d o cam p o d e ve lo cid ad es à fu n çã o . Nu m a cu r va d e n íve l cyx ),( d e , o n d e 0/ yu , fica d e fin id a im p licit a m en t e y em fu n çã o d e x d e t a l fo r m a q u e 0)/)(/()/( dxdyyx , p e lo q u e

),)(/)/(()/,/( vuudtdxdtdydtdx e , p o r t a n t o , a cu r va d e n íve l é u m a lin h a d e co rren te o u lin h a d e flu xo , r a zã o p e la q u a l se ch a m a a fu n ção d e co rren te o u fu n ção d e flu xo . Ch a m a -se p o ten cial co m p lexo d o ca m p o d e ve lo cid a d es à fu n çã o co m p lexa ),( f .

Um cam p o e le ct ro e st át ico n u m co n ju n t o se m cargas e lé ct r icas t am b é m é irro t acio n al e so le n o id al, p e lo q u e a cad a sit u ação q u e se co n sid e re d e u m e sco am e n t o h id ro d in âm ico p lan o e st acio n ário co m cam p o d e v e lo cid ad e s irro t acio n al e

Page 25: Derivadas de funções complexas

3.3. Transformações conformes 47

so le n o id al co rre sp o n d e u m a sit u ação an álo ga e m e le ct ro e st át ica p lan a n u m co n ju n t o se m cargas e lé ct r icas e v ice -v e rsa.

A sit u ação é an álo ga e m p ro p agação d o calo r e m e q u ilíb r io , su b st it u in d o o p o t e n cial d o cam p o d e v e lo cid ad e s p o r t e m p e rat u ra e as lin h as d e f lu x o d o f lu id o p o r lin h as d e f lu x o d e calo r .

a ) Mo st r e : Um a fu n ção co m p lexa f d e f in id a e 1C em é o p o t en cial co m p lexo d e u m cam p o irro t acio n al e so len o id al se e só se )(Hf .

b ) De t e r m in e o p o t en cia l co m p lexo , a s lin h a s d e co r r en t e e a ve lo cid a d e d e u m esco a m en t o p la n o d e p r o fu n d id a d e in fin it a so b r e u m le it o p la n o co m u m o b st á cu lo ve r t ica l d e a lt u r a h p e r p en d icu la r a o le it o e ve lo cid a d e n o in fin it o p e r p en d icu la r a o p la n o d o o b st á cu lo e co m m a gn it u d e 1 (Figu r a 3 .1 2 ) .

Est e p o t e n cial t am b é m d e t e rm in a o cam p o e lé ct r ico n a m e sm a re gião q u an d o a f ro n t e ira é u m iso lad o r e lé ct r ico p e rf e it o e a in t e n sid ad e d o cam p o e lé ct r ico n o in f in it o é p e rp e n d icu lar ao p lan o d a b arra co n d u t o ra n a v e r t ical e t e m m agn it u d e 1 . N e st e caso , o p o t e n cial é o sim é t r ico d o p o t e n cial e lé ct r ico e as lin h as d e co rre n t e são as lin h as d e f lu x o d o cam p o e lé ct r ico . Po r o u t ro lad o , o cam p o e lé ct r ico n a m e sm a re gião co m in t e n sid ad e n o in f in it o igu al a 1 , m as e m q u e a f ro n t e ira é u m co n d u t o r p e rf e it o , t e m p o t e n cial p ro p o rcio n al à f u n ção d e co rre n t e e as lin h as d e f lu x o d o co rre sp o n d e n t e cam p o e lé ct r ico são as lin h as d e n ív e l d o p o t e n cial d o cam p o d e v e lo cid ad e s.

(Su ge st ão : Co n sid e re o e sco am e n t o n o se m ip lan o su p e rio r co m p le x o e o o b st ácu lo co m o u m se gm e n t o d e v e r t ical n o e ix o im agin ário d e co m p rim e n t o h a p art ir d a o r ige m . De t e rm in e u m a t ran sfo rm ação co n fo rm e d o d o m ín io n o se m ip lan o su p e rio r . M o st re q u e as lin h as d e f lu x o sat isfaz e m 2/12

0

22

0 ))/(1( xhy ) .

= constante h

Re

Im= constante

Figu r a 3 .1 2 : Esco a m en t o so b r e u m le it o p la n o co m u m o b st á cu lo ve r t ica l

3 .2 1 . Co n sid e r e zzf arccos)( co m o p o t en cia l co m p lexo (ve r exe r cício a n t e r io r ) em e lect r o est á t ica , m o st r e q u e a s lin h a s eq u ip o t en cia is e a s lin h a s d e co r r en t e sã o a s r ep r e sen t a d a s n a Figu r a 3 .1 3 e d escr eva co m o est e p o t en c ia l p e r m it e o b t e r ca d a u m d o s ca m p o s e léct r ico s segu in t e s: 1 . Ext e r io r a u m co n d u t o r cilín d r ico d e secçã o o r t o go n a l e líp t ica ca r r ega d o ,

in clu siva m en t e n o ca so lim it e d e u m a fit a co n d u t o r a ; 2 . En t r e d u a s su p e r fície s co n d u t o r a s cilín d r ica s co m secçõ es o r t o go n a is

e líp t ica s co n fo ca is, o u en t r e u m a d est a s su p e r fície s e a fit a co n d u t o r a d e secçã o igu a l a o segm en t o en t r e o s fo co s;

3 . En t r e fo lh a s co n exa s d e d u a s su p e r fície s co n d u t o r a s cilín d r ica s co m secçõ es o r t o go n a is h ip e r b ó lica s co n fo ca is, o u en t r e u m a d est a s e u m sem ip la n o co n d u t o r co m a r e st a a p a ssa r p e lo fo co e p e r t en cen t e a o p la n o d e sim e t r ia d a su p e r fície cilín d r ica ;

4 . En t r e d o is sem ip la n o s co n d u t o r e s co m p la n a r es d e a r e st a s sep a r a d a s p a r a le la s;

5 . En t r e u m p la n o e u m sem ip la n o o r t o go n a l d e a r e st a p a r a le la a o p la n o e n ã o o in t e r sect a n d o .

Re

Im

i

Figu r a 3 .1 3 : Lin h a s d e n íve l d a s p a r t e s r ea l e im a gin á r ia d e zzf arccos)(

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48 Derivadas de funções complexas