DESAFIOS E FRAGILIDADES DO TRABALHO SOCIAL NO … · Aos meus amigos, que me ajudaram durante toda...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS
URBANOS E REGIONAIS
SARA JUDY CHRISTIE DE OLIVES
DESAFIOS E FRAGILIDADES DO
TRABALHO SOCIAL NO
PROGRAMA MINHA CASA MINHA
VIDA NA REGIÃO METROPOLITANA
DE NATAL
Natal | RN
2017
SARA JUDY CHRISTIE DE OLIVES
DESAFIOS E FRAGILIDADES DO
TRABALHO SOCIAL NO
PROGRAMA MINHA CASA MINHA
VIDA NA REGIÃO METROPOLITANA
DE NATAL
Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Estudos Urbanos e Regionais, do Centro de
Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte, como parte dos requisitos para obtenção
do título de Mestre em Estudos Urbanos e Regionais.
Área de concentração: Dinâmicas Urbanas e Regionais e
Políticas Públicas.
Orientador: Prof. Dr. Robério Paulino
Natal | RN
2017
Olives, Sara Judy Christie de. Desafios e fragilidades do trabalho social no Programa MinhaCasa Minha Vida na região metropolitana de Natal / Sara JudyChristie de Olives. - 2017. 142f.: il.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grandedo Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programade Pós-Graduação em Estudos Urbanos e Regionais. Orientador: Prof. Dr. Robério Paulino Rodrigues.
1. Habitação de Interesse Social - Natal (Rio Grande doNorte). 2. Programa Minha Casa Minha Vida. 3. Trabalho Social.4. Região Metropolitana - Natal (Rio Grande do Norte). I.Rodrigues, Robério Paulino. II. Título.
RN/UF/BS-CCHLA CDU 351.778.532(813.2)
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRNSistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes -CCHLA
Dedicatória
Aos meus amados avós,
Afonso Bernardino e Maria Raimunda (in memorian)...
Aos meus pais, Maria Cristina e Nabucodonosor, por todo apoio e amor...
Aos meus irmãos, pela compreensão e carinho...
Agradecimentos
Agradecer é sentir ou mostrar gratidão por algo que temos recebido. Eu tenho
muito a agradecer a muitas pessoas que me acompanharam, sem saber, neste
longo e árduo trabalho, que com palavras de apoio reconfortaram o meu coração
e me incentivaram a não desistir dos meus sonhos e metas de vida.
Agradeço a Deus, mestre e âncora das nossas vidas.
Aos meus pais, Nabucodonosor e Maria Cristina, que me deram a vida e sempre
estão presentes! É o maior de todos os agradecimentos.
Aos meus irmãos, Sophya, Paloma e Philyps, que são parte da minha vida e que
compartilham das alegrias e desafios! Sei que sempre estarão presentes!
Aos meus avós, Afonso Bernardino e Maria Raimunda de Oliveira, (in memorian).
Apesar de não estarem mais conosco, quero lembrar-me deles como meus anjos
da guarda, já que sempre os amarei.
Ao meu namorado e companheiro de vida, David Esteban Diaz. Obrigada por
seu amor, cumplicidade, cuidado e amizade! Obrigada por estar comigo e
acreditar em mim! Estamos juntos nesta caminhada! Eu o amo muito!
Agradeço à família Diaz Taquez! Sou agradecida a Deus por ter a oportunidade
de ter uma família muito linda na Colômbia. Muitíssimo obrigada pelo carinho e
pela estadia neste país maravilhoso!
Às minhas amigas argentinas: Mariela Delgado e Yamila Katz. Obrigada pela
amizade de vocês! Eu as amo muito!
Agradeço à minha querida amiga, Jasmine Besinger. Obrigada por seu carinho,
espero que um dia eu possa revê-la em terras colombianas ou americanas.
À minha amiga Mariana Brimdjam. Obrigada, nêga, por tudo!
Quero agradecer ao meu irmão colombiano e Mineiro, Daniel Santos. Obrigada
por tudo, eu o amo bastante.
Ao meu ilustre orientador, Prof. Dr. Robério Paulino, por sua amizade, paciência,
dedicação e conselhos, perante a condução da minha vida acadêmica.
Obrigada, Professor Robério!
Agradeço as minhas amigas do mestrado, Suzana Dutra, Milenna Nicoletti e
Renata Leão. Obrigada, meninas!
Aos professores do Departamento de Políticas Públicas da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, pelos ensinamentos transmitidos e pelas amizades
construídas!
Aos companheiros da turma do Mestrado em Estudos Urbanos e Regionais –
UFRN. Obrigada!
Aos professores do Mestrado em Estudo Urbanos e Regionais! Muita gratidão
pelos ensinamentos compartilhados!
Aos meus amigos, que me ajudaram durante toda a trajetória do curso e que
estiveram ao meu lado, sempre compartilhando os bons momentos da vida.
Aos meus queridos amigos da turma de “Gestão de Políticas Públicas 2010.2”
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, pelo companheirismo e força
que me passaram durante estes anos na Universidade.
À Universidade Federal do Rio Grande do Norte e à Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, pelo ensino de qualidade, bem como pelos professores dos quais
tive a oportunidade e a honra de ser aluna.
E a todos e todas que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização
deste árduo trabalho.
Obrigada!
Resumo
Este trabalho analisa o trabalho social do Programa Minha Casa Minha Vida
(PMCMV), Faixa 1, na Região Metropolitana de Natal (RMN), nas cidades de
Natal, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante. Metodologicamente, o estudo
trata-se de uma pesquisa qualitativa, no qual foram utilizados os seguintes
procedimentos metodológicos: revisão bibliográfica, análise documental, análise
de dados secundários e primários, diário de campo, observação participante,
entrevistas semiestruturadas e grupos focais que evidenciaram as percepções
dos principais atores sociais que estão diretamente relacionados com a
implementação do trabalho social nos empreendimentos do PMCMV na RMN.
Foram definidos três empreendimentos para a realização desta investigação: o
Residencial Vivendas do Planalto I, II, III, IV, na cidade de Natal (Capital); o
Residencial Ilhas do Atlântico, em Parnamirim; e o Residencial Ruy Pereira, no
Município de São Gonçalo do Amarante. A pesquisa apontou para a pouca
efetividade da implementação do trabalho social pré/pós-ocupacional e da
gestão condominial nos empreendimentos do PMCMV na RMN. Ademais, as
Secretarias de Habitação dos municípios estudados possuem baixa capacidade
técnica na elaboração dos Projetos de Trabalho Social (PTS), escassez de
quadro de técnicos qualificados em projetos de habitação de interesse social,
alta rotatividade de profissionais e fragilidades quanto à forma de contratação
das Equipes Técnicas Sociais (ETS). Por fim, a pesquisa constatou que o
trabalho social é permeado por interesses econômicos e políticos em todas as
fases de execução, por diversos atores sociais e políticos.
PALAVRAS-CHAVES: Trabalho Social, Programa Minha Casa Minha Vida,
Habitação de Interesse Social, Região Metropolitana de Natal.
Abstract
This work aims to analyze the social work of the Programa Minha Casa Minha
Vida (PMCMV), track 1, in the Metropolitan Region of Natal (RMN), in the cities
of Natal, Parnamirim and São Gonçalo do Amarante. Methodologically, the study
is a qualitative research, based on the dialectical-critical method, which
evidences the perceptions of the main social actors that are directly related to the
social work in PMCMV ventures. In this way, the following methodological
procedures were used: bibliographic review, documentary analysis, analysis of
secondary and primary data, semi-structured interviews, field diary and focus
groups. Three projects were set up to carry out this research: the Residencial
Villas do Planalto I, II, III, IV, in the city of Natal (Capital); The Residencial Ilhas
do Atlântico, in Parnamirim; And the Residencial Ruy Pereira, in the Municipality
of São Gonçalo do Amarante. In addition to the scarcity of studies in the area,
the research pointed to little effectiveness of the implementation of pre/post-
occupational social work and condominial management in PMCMV ventures in
NMR. In addition, the housing departments of the municipalities studied have a
low technical capacity in the elaboration of social work projects and a shortage of
skilled technicians in projects of social interest housing, high turnover of
professionals and weaknesses as to their way of hiring the Technical Teams
(ETS). Finally, the research found that social work is permeated by economic and
political interests in all stages of implementation, by various social and political
actors.
KEYWORDS: Programa Minha Casa Minha Vida, social work, housing of social
interest, Metropolitan Region of Natal.
Lista de Figuras
Figura 1: Mapa da Região Metropolitana de Natal | RN (2017)..........................61 Figura 2: Localização dos Empreendimentos do PMCMV por faixa e Fase na
RMN...................................................................................................................65
Figura 3: Espacialização dos Empreendimentos do PMCMV Faixa 1 na
RMN...................................................................................................................68
Figura 4: Empreendimento São Pedro (PMCMV/Faixa-1), em Natal-RN...........71
Figura 5: Obras do Empreendimento Village de Prata (PMCMV/Faixa-1), em Natal...................................................................................................................72 Figura 6: Obras do Empreendimento Padre João Maria e as Dez (PMCMV/
PAC), em São Gonçalo do Amarante/RN..........................................................74
Figura 7: Localização do Empreendimento Vivendas do Planalto (I a IV)..........78
Figura 8: Foto (a) Tipologia do Empreendimento Vivendas do Planalto; Foto (b)
Blocos de Apartamentos....................................................................................80
Figura 9: Equipamentos Comunitários do Residencial Vivendas do Planalto
(Quadra Poliesportiva e Academia ao Ar Livre)..................................................81
Figura 10: Mapa da Espacialização dos Equipamentos Públicos Existentes no
Entorno do Empreendimento Vivendas do Planalto...........................................82
Figura 11: Mapa das Áreas de Risco e Assentamentos Precários do Entorno do
Empreendimento Vivendas do Planalto..............................................................84
Figura 12: Foto (a) Vista Aérea do Assentamento Precário 08 de Outubro; Foto
(b): Habitações da Comunidade 08 de Outubro..................................................85
Figura 13: Foto (a) Vista Aérea do Assentamento Precário Anatália, Foto (b):
Registro Fotográfico das Habitações da Comunidade Anatália..........................86
Figura 14: Foto (a) Vista aérea do Assentamento Precário Monte Celeste, no
detalhe em Amarelo; Foto (b): Registro fotográfico da favela Monte Celeste......86
Figura 15: Percentual da Origem das Demandas Fechada (assentamento) e
Aberta (sorteio) do Residencial Vivendas do Planalto I a IV................................88
Figura 16: Foto (a) Registro Fotográfico da Mudança no Assentamento Anatália;
Foto (b) Chegada das Famílias no Residencial Vivendas do Planalto................93
Figura 17: Foto (a): Líder do MLB na Reunião do CONHABINS; Foto (b):
Advogados Representantes do Banco do Brasil Explicando o Processo de
Reintegração de Posse do Residencial Morar Bem Pajuçara............................95
Figura 18: Registro Fotográfico Atual dos Condomínios do Residencial Vivendas
do Planalto (2016)..............................................................................................98
Figura 19: Localização do Residencial Ilhas do Atlântico –
Parnamirim/RN................................................................................................101
Figura 20: Foto: (a) Faixada do Empreendimento Ilhas do Atlântico; Foto: (b)
Blocos de Apartamentos do Residencial Ilhas do Atlântico...............................102
Figura 21: Renda Familiar do Residencial Ilhas do Atlântico, em Parnamirim -
RN....................................................................................................................107
Figura 22: Foto (a): Seminário de Encerramento do PTS; Foto (b): Oficina de
Contação de Histórias......................................................................................109
Figura 23: Localização do Empreendimento Ruy Pereira - São Gonçalo do
Amarante.........................................................................................................112
Figura 24: Foto (a): Imagem do Residencial Ruy Pereira I; Foto (b): Bloco de
Apartamentos...................................................................................................114
Figura 25: Foto (a): Via de Acesso para o Residencial Ruy Pereira I; Foto (b):
Via de Acesso pela BR 406..............................................................................114
Figura 26: Foto (a): Sorteio dos Apartamentos e Blocos do Residencial Ruy
Pereira VI; Foto (b): Famílias Beneficiárias Aguardando a Definição dos
Apartamentos...................................................................................................116
Figura 27: Foto (a): Mobilização dos Moradores; Foto (b): Atividade de Terapia
Comunitária com as Famílias Moradoras do Residencial Ruy Pereira VI.........121
Figura 28: Renda Média Mensal das Famílias do Residencial Ruy Pereira
VI......................................................................................................................123
Lista de Quadros e Tabelas
Quadro 1: Etapas, Instrumentos de Planejamento e Atividades do Trabalho
Social.................................................................................................................46
Quadro 2: Programa Minha Casa Minha Vida: Modalidades, Faixas e Fontes de
Recursos............................................................................................................................54
Tabela 1: Programa Minha Casa Minha Vida: Metas e Contratações................58
Tabela 2: Programa Minha Casa Minha Vida: Unidades Contratadas, Unidades
Entregues e Valor de Investimentos por Região e Estado do Brasil....................59
Tabela 3: Dados Populacionais e Densidade Demográfica por Município da RMN
(2010 e 2016).....................................................................................................62
Tabela 4: Déficit Habitacional Total por faixa de rendimento (%) nos Municípios
de Natal, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante (2010).................................63
Tabela 5: Déficit Habitacional por Município da RMN (2010).............................64
Tabela 06: Produção Habitacional Total (Empreendimentos e Unidades) do
PMCMV por Municípios estudados da RMN.......................................................66
Tabela 7: Déficit Habitacional e a relação com a Produção PMCMV Faixa 1 nos
Municípios de Natal, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante (2013)...............68
Tabela 8: Quantidade de Unidades Produzidas por Faixa de Renda e Fase na
RMN até 2014....................................................................................................69
Tabela 9: Quantidade de empreendimentos por Faixa 1, fases do PMCMV, nos
municípios estudados e na Região Metropolitana de Natal................................70
Tabela 10: Informações do Residencial Vivendas do Planalto I a IV..................79
Lista de Siglas e Abreviaturas
AEIS Área Especial de Interesse Social.
BB Banco do Brasil.
BNH Banco Nacional de Habitação.
BID Banco Interamericano de Desenvolvimento.
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BIRD Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento.
BPC Benefício de Prestação Continuada.
CF/88 Constituição Federal de 1988.
COTS Caderno de Orientação Técnica Social.
COHAB Companhia de Habitação.
CONHABINS Conselho Municipal de Habitação de Interesse Social de Natal.
CEF Caixa Econômica Federal.
CAS Central de Atendimento Social.
CRAS Centro de Referencial em Assistência Social.
CADÚNICO Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
CEB Comunidades Eclesiais de Base.
DC Desenvolvimento Comunitário.
DASPE Departamento de Ação Social e Projetos Especiais.
ETS Equipe Técnica Social.
ESA Educação Sanitária e Ambiental.
ESPES/TREINAT Estudos e Pesquisas/Treinamento e Assistência Técnica
FNHIS Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social.
FCP Fundação da Casa Popular.
FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.
FPC Fundo de Participação Comunitária.
FUNCERN Fundação de Apoio à Educação Tecnológica do Rio Grande do
Norte.
FHC Fernando Henrique Cardoso.
FNRU Fórum Nacional de Reforma Urbana.
FJP Fundação João Pinheiro.
FICAM Programa de Financiamento da Construção, Aquisição ou
Melhoria da Habitação de Interesse Social
FCPC Fundo Comunitário de Programas Cooperativos.
FAR Fundo de Arrendamento Residencial.
FDS Fundo de Desenvolvimento Social.
GER Geração de Trabalho e Renda.
GIDUR Gerências de Desenvolvimento Urbano.
GIHAB Gerência de Habitação
HBB Habitar Brasil/ BID.
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
INOCOOP Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais.
IFRN Instituto de Tecnologia do Rio Grande do Norte.
IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano.
ISS Imposto Sobre Serviços
ITIV Imposto de Transmissão Intervivos.
MNRU Movimento Nacional de Reforma Urbana.
MDU Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente.
MOC Mobilização e Organização Comunitária.
MLB Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas
ONU Organização das Nações Unidas.
OGU Orçamento Geral da União.
ONG Organização Não Governamental.
PPEUR Programa de Pós-Graduação em Estudos Urbanos e Regionais.
PMCMV Programa Minha Casa Minha Vida.
PITTS Plano de Intervenção de Trabalho Social.
PTTS Projeto de Trabalho Técnico Social.
PTS Projeto de Trabalho Social.
PDST Plano de Desenvolvimento Sócioterritorial.
PNH Plano Nacional de Habitação.
PAC Programa de Aceleramento do Crescimento.
PRODEC Programa de Desenvolvimento Comunitário
PDST Plano de Desenvolvimento Sócio e territorial.
PNHS Política Nacional de Habitação e Saneamento.
PLANHAP Plano Nacional de Habitação Popular.
PROFILURB Programa de Financiamento de Lotes Urbanizados.
PIB Produto Interno Bruto.
PSH Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social.
PROMORAR Programa de Erradicação da Sub-habitação.
PPI Projetos Prioritários de Investimentos.
PNHU Programa Nacional de Habitação Urbana.
PNHR Programa Nacional de Habitação Rural.
PROSANEAR Programas de Saneamento para População de Baixa Renda.
PAR Programa de Arrendamento Residencial.
QCI Quadro de Composição de Custo.
PT Partido dos Trabalhadores.
PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro.
RMN Região Metropolitana de Natal.
RN Rio Grande do Norte.
SM Salário Mínimo.
SNHIS Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social.
SEHAB Secretaria de Habitação, Regularização Fundiária e Saneamento.
SFH Sistema Financeiro de Habitação.
SERFHAU Serviço Federal de Habitação e Urbanismo.
SEHARPE Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e
Projetos Estruturantes de Natal.
SBPE Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo
SUDEC Subprograma de Desenvolvimento Comunitário.
TS Trabalho Social.
TAC Taxa de Apoio Comunitário.
UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Sumário
1 Introdução................................................................................................. 19
2 Histórico do Trabalho Social na Política Habitacional
Brasileira....................................................................................................... 25
2.1 Aspectos Históricos do Trabalho Social no BNH (1964-1986)........ 25
2.2 Trabalho Social em Habitação no Período Pós-redemocratização (1985
- 1999)................................................................................................................34
2.3 Trabalho Social e o Ministério das Cidades (2003): metodologias e
diretrizes........................................................................................................... 41
3 Desafios e Avanços do Programa Minha Casa Minha
Vida.................................................................................................................51
3.1 O Programa Minha Casa Minha Vida no Brasil....................................... 51
3.2 Problemática habitacional e a Implementação do PMCMV na Região
Metropolitana de Natal.................................................................................... 60
4 Análise do Trabalho Social no Programa Minha Casa Minha
Vida na RMN................................................................................................. 77
4.1 Trajetória do Trabalho Social no Empreendimento Vivendas do Planalto
(I a IV) em Natal................................................................................................ 77
4.1.1 Seleção dos Beneficiários do Vivendas do Planalto I a IV................................... 83
4.1.2 Trabalho Social de Pré/pós-ocupação Condominial no Vivendas do Planalto I a
IV...................................................................................................................................89
4.2 Experiência do Trabalho Social no Residencial Ilhas do Atlântico em
Parnamirim/RN.................................................................................................
100
4.3 Dificuldades do Trabalho Social no Residencial Ruy Pereira VI no
Município de São Gonçalo do Amarante..................................................... 111
Considerações Finais.............................................................................125
Referências Bibliográficas................................................................... 128
Apêndice.....................................................................................................137
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1 Introdução
Historicamente, as ações do Estado brasileiro que visam a produção de políticas
públicas habitacionais evidenciam os desafios do Brasil em lidar, principalmente, com
diversos problemas sociais, tais como: o déficit habitacional, a precariedade das
moradias, o alto índice de favelização das cidades brasileiras, bem como a ocupação
desordenada de áreas de risco. A política habitacional brasileira passou por um longo
processo de reconfigurações, alternando-se por momentos de ampliação ou redução
da atuação do Estado, sendo influenciada por conjunturas sociais e econômicas do
Brasil, assim como pelo cenário internacional.
Segundo Maricato (2001), no Brasil, as iniciativas das políticas públicas de
habitação de interesse social, nas últimas décadas do século XX, caracterizam-se pela
descontinuidade e, sobretudo, pela falta de articulação com as demais políticas sociais.
Para Maricato (2001), as principais intervenções estatais na área da habitação social
pouco atenderam à população urbana de baixa renda, como os grandes conjuntos
habitacionais construídos por meio do Banco Nacional de Habitação (BNH). Para
Cardoso (2012), desde a extinção do BNH, em 1986, as políticas públicas destinadas
à habitação social permaneceram por um longo período em uma situação subalterna
na agenda das políticas sociais do país.
Com as transformações recentes no campo das políticas habitacionais no Brasil,
especialmente com a criação do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), em
2009, instauraram uma nova ordem de demandas, tanto por parte do Estado, quanto
dos atores sociais, privados e políticos envolvidos com a implementação desta política
pública. Com a formulação do PMCMV, houve um aumento de debates fundamentais
acerca da moradia social, com destaque para os seus impactos sobre as cidades e
sobre a vida das famílias beneficiadas.
O Programa foi lançado há sete anos, alcançando, até o ano de 2016, a marca
de mais 4,2 milhões de unidades habitacionais contratadas em todas as faixas desta
política pública, sendo que mais de 2,6 milhões já foram entregues às famílias. Em
média, até 2016, o PMCMV já havia beneficiado mais de 10,4 milhões de pessoas, com
um investimento total, segundo o Ministério das Cidades, que ultrapassa o valor de R$
294 bilhões (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2016).
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Com o lançamento do PMCMV, diversos municípios da RMN aderiram
imediatamente ao Programa. No Rio Grande do Norte, as produções habitacionais do
Programa, segundo dados do Ministério das Cidades, até o ano de 2016, foram
contratadas 100.243 unidades habitacionais em todas as faixas do Programa e 71.339
imóveis já foram entregues, sendo investidos pelo Governo Federal R$ 6,919 bilhões
em todo o RN.
Assim, a necessidade de garantir o acesso digno à moradia para amplos
contingentes populacionais implica em lidar com a questão da provisão habitacional por
meio do PMCMV, em seus mais diversos aspectos. Pois, o combate ao déficit
habitacional não está restrito à construção de casas, mas deve pressupor a garantia do
direito à moradia, o direito à cidade e o acesso aos novos patamares de cidadania e
qualidade de vida. É importante compreender que as políticas públicas de habitação de
interesse social necessitam de uma visão multidimensional das realidades, superando
os limites da ação localizada, buscando não somente inserção urbana dos
empreendimentos, mas a inserção social destas famílias nestes novos territórios.
Como respostas a estas questões que vão para além da edificação de moradias,
ao longo da história da política habitacional brasileira podemos observar avanços no
que se refere à institucionalização do trabalho social (TS) a partir da criação do
Ministério das Cidades, em 2003, e sua introdução como componente da Política
Nacional de Habitação (PNH). Em suma, o trabalho social tem o seu fundamento na
Política Nacional de Habitação, onde suas diretrizes (BRASIL, 2014) visam a promover
a autonomia e o protagonismo social das famílias atendidas pelas políticas
habitacionais. O trabalho social é planejado para criar mecanismos capazes de
viabilizar a participação dos beneficiários nos processos de decisão, implantação e
manutenção dos bens e serviços, adequando-os às necessidades e à realidade dos
grupos sociais atendidos, além de incentivar a gestão participativa para a
sustentabilidade dos empreendimentos habitacionais (BRASIL, 2014).
As intervenções do trabalho social na área da habitação popular devem funcionar
como um indutor da inclusão social, da garantia do direito à cidade e dos demais
políticas públicas sociais, além de estimular a participação das famílias em todo o
processo de implementação. Atualmente, o trabalho social em programas e projetos de
habitação de interesse social do Ministério das Cidades é normatizado pela Portaria N°
21, de 22 de janeiro de 2014. Com essa Portaria, o trabalho social passa a ser
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reconhecido como um componente “obrigatório” e “estratégico”, com recursos próprios
destinados para a sua execução nas políticas e programas de desenvolvimento urbano
e habitacional.
O interesse por esta pesquisa ocorreu devido a minha inserção profissional,
como Gestora de Políticas Públicas na área de elaboração e implementação de projetos
de habitação de interesse social e reassentamento de favelas na Cidade do Natal/RN
e também em projetos de reassentamento e assessoria jurídica e fundiária na cidade
do Porto Alegre, em 2013. Atuando como profissional na área do planejamento urbano,
pude refletir acerca das múltiplas determinações que norteiam a prática dos gestores
públicos envolvidos com a política urbana.
A partir da minha experiência em projetos de urbanização e reassentamento de
favelas, assim como na implementação do Programa Minha Casa Minha Vida
(PMCMV), na cidade do Natal, cuja população está estimada em 877.662 habitantes e
que concentra 65% do déficit habitacional1 da Região Metropolitana de Natal (RMN),
me possibilitou observar as dificuldades dos municípios na gestão e na execução
técnico-operativa do trabalho social e das ações propostas pelo PMCMV. Desta forma,
esta pesquisa desenvolveu um estudo sobre o trabalho social no Programa Minha Casa
Minha Vida (Faixa 1), nos municípios da Região Metropolitana de Natal/RN.
Como problemática de pesquisa, partimos dos seguintes questionamentos:
efetivamente, os municípios da RMN têm conseguido implementar o trabalho social do
PMCMV? Quais são os desafios da efetivação do trabalho social do PMCMV na RMN?
Respondendo a estas perguntas, o estudo parte da hipótese de que os municípios
possuem um papel importante na gestão e implementação do trabalho social nos
projetos de habitação do PMCMV Faixa 1, porém, a baixa capacidade técnica de gestão
eficaz dos municípios da RMN são fatores que têm contribuído para o insucesso na
efetivação do trabalho social junto aos beneficiários do PMCMV.
O estudo tem como objetivo geral analisar a implementação do trabalho social
do PMCMV Faixa 1, considerando as diretrizes nacionais do Ministério das Cidades e
a sua implementação nos municípios da RMN. Compreendendo os seguintes objetivos
específicos: a) identificar os principais atores sociais, estatais e privados, envolvidos
1 Dados estatísticos sobre o Déficit Habitacional Brasileiro, segundo, a Fundação João Pinheiro (FJP) em
parceria com o Ministério das Cidades, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em 2013.
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com a implementação do trabalho social do PMCMV; b) verificar a natureza dos
serviços que são oferecidos junto às famílias beneficiárias pelo Programa; c) relacionar
as diretrizes nacionais do trabalho social do PMCMV com as ações que estão sendo
executadas pelos municípios; d) compreender o processo de implementação do
trabalho social do PMCMV junto às famílias beneficiárias; e) analisar o contexto
organizacional e institucional de implementação do trabalho social; f) identificar os
desafios da implementação, assim como dos agentes implementadores do trabalho
social.
Para o desenvolvimento da pesquisa empírica, fez-se um recorte territorial,
estabelecendo um universo de três municípios da RMN (Natal, Parnamirim e São
Gonçalo do Amarante), por concentrarem os maiores índices de déficit habitacional do
Estado que, segundo a Fundação João Pinheiro (FJP), em 2013, estava em torno de
45.716 imóveis. Além disso, essas cidades possuem os maiores números de unidades
habitacionais contratadas pelo PMCMV Faixa 1.
Definiu-se como critérios norteadores para a escolha dos empreendimentos a
serem analisados os seguintes parâmetros: a) empreendimentos da Faixa 1; b)
tipologia habitacional (optou-se por escolher 1 empreendimento de cada munícipio,
considerando a sua tipologia – condomínio vertical, fechado e aberto); c) prazo de
entrega do empreendimento (superior a 6 meses da data de pós-ocupação). Com base
nesses critérios, foram definidos três empreendimentos para a realização deste estudo:
o Residencial Vivendas do Planalto I, II, III, IV, na cidade de Natal (Capital); o
Residencial Ilhas do Atlântico, em Parnamirim e o Residencial Ruy Pereira IV, no
Município de São Gonçalo do Amarante.
Com o objetivo principal de desenvolver estudos de natureza qualitativa acerca
do trabalho social desenvolvido junto às famílias beneficiárias do PMCMV na RMN,
alguns empreendimentos foram selecionados como base empírica para análise,
investigando-se aspectos relativos à efetivação ou não da sua implementação nesses
locais.
Metodologicamente, para a realização desta investigação, optou-se pela
abordagem do tipo qualitativo, tal metodologia nos permitiu uma análise do trabalho
social nos projetos de habitação social do PMCMV, investigando os fatores políticos,
econômicos e sociais que contribuem ou não para sua efetivação, já que o Programa é
permeado por interesses conflitantes em sua implementação junto aos beneficiários.
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Para a realização da pesquisa, diversas técnicas metodológicas foram utilizadas,
tais como: revisão bibliográfica, análise documental e de conteúdo da legislação
pertinente ao tema, análise de dados secundários e primários, entrevistas
semiestruturadas e realização de grupos focais com moradores dos empreendimentos
escolhidos do PMCMV na RMN. Em um primeiro momento, foi realizada uma revisão
da literatura sobre o histórico do trabalho social dentro da política habitacional brasileira.
Em seguida, foi feito um levantamento documental dos principais documentos e
portarias federais que regulamentam o PMCMV e o trabalho social presente nas
páginas do Ministério das Cidades e da Caixa Econômica Federal.
Através dos grupos focais, foi levantada a percepção de moradores dos
conjuntos habitacionais visitados. Foram realizados 3 grupos focais com os
beneficiários de cada empreendimento escolhido por município (Residencial Ilhas do
Atlântico – Parnamirim; Residencial Ruy Pereira – São Gonçalo do Amarante;
Residencial Vivendas do Planalto – Natal).
Além disso, optou-se por realizar entrevistas semiestruturadas com os principais
atores envolvidos no processo de implementação do trabalho social no PMCMV, como:
os Gestores das Secretarias de Habitação; Coordenadores dos Projetos de Trabalho
Social (PTS/PMCMV) de cada empreendimento selecionado; Técnicos Sociais
responsáveis pela implementação do trabalho social; Técnicos da GIHAB (Gerência
Executiva de Habitação) da Caixa Econômica Federal, sendo este os últimos
responsáveis por verificar a viabilidade técnica dos empreendimentos habitacionais,
como as exigências relativas aos diversos processos construtivos e às várias etapas
do Projeto de Trabalho Social. A utilização destas estratégias tem como finalidade
compreender os (in) sucessos do trabalho social no Programa. Por fim, foi realizada a
análise, tabulação e interpretação dos dados e informações.
Esta dissertação compõe-se de distintos capítulos. Depois desta Introdução, o
primeiro capítulo (Perspectivas Históricas do Trabalho Social na Política Habitacional
Brasileira) visa a analisar a trajetória histórica do trabalho social nas políticas públicas
habitacionais brasileiras.
O segundo capítulo (O Programa Minha Casa Minha Vida e o Trabalho Social no
Brasil) traz uma breve análise do Programa, buscando entender o contexto em que ele
foi formulado e o estágio atual de implementação. Ainda neste capítulo, é realizada uma
apresentação dos conceitos e metodologias do trabalho social em habitação, com
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destaque para os normativos e diretrizes desta política pública, através da análise da
Portaria Nº 021, de 22 de janeiro de 2014, que aprova o Manual de Instruções do
Trabalho Social nos Programas e Ações do Ministério das Cidades.
Por fim, no último capítulo (Implementação do Trabalho Social do PMCMV na
Região Metropolitana de Natal), é analisado em que medida o trabalho social foi ou não
efetivamente implementado, identificando os fatores de sucesso ou fracasso na sua
execução.
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2 Histórico do Trabalho Social na
Política Habitacional Brasileira.
As intervenções do trabalho social no campo da habitação de interesse social
remontam a décadas anteriores à criação do Ministério das Cidades, em 2003. Assim,
a forma como o trabalho social se apresenta, na atualidade, tem como referência as
concepções e práticas adotadas em anos anteriores na história da política habitacional
brasileira. Daí a relevância do recorte histórico, uma vez que, para conhecer a realidade
presente, é necessário mergulhar na trajetória histórica do trabalho social dentro da
política habitacional. Desta forma, procuraremos, neste capítulo, discutir a trajetória do trabalho social
em habitação. Para isso, recorreremos à construção de uma linha do tempo,
destacando a integração do trabalho social nas principais políticas públicas de
habitação e suas concepções, em três momentos da história brasileira: a) o período de
1964 a 1986, em que se analisa o trabalho social executado nos programas do Banco
Nacional de Habitação (BNH), durante o regime militar brasileiro; b) o período de 1987
a 1999, fase pós-regime militar, que revela a dificuldade dos governos em formular uma
política habitacional efetiva, com a criação apenas de programas habitacionais
pontuais, nos quais havia a exigência do trabalho social pelo Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID); e c) o período de 2003 até a atualidade, sendo esta fase
marcada pela institucionalização definitiva do trabalho social dentro da Política Nacional
de Habitação e a criação do Programa de Aceleramento do Crescimento (PAC) e o
PMCMV.
2.1 Aspectos Históricos do Trabalho Social no BNH (1964-1986).
Ao longo da história da política habitacional brasileira nos deparamos com
diversos fatos que marcam a forma de planejamento e implementação de políticas
públicas para as cidades. Apesar do trabalho social ser regulamentado a partir da
criação do Banco Nacional de Habitação (década de 1960), é importante salientar que
nos anos finais da década de 30 e início da década de 40 verificam-se intervenções
sociais pontuais em áreas de moradia da classe trabalhadora, principalmente em
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morros e favelas. De acordo com Valladares (2000), durante este período é possível
observar a atuação de Assistentes Sociais na realização de trabalhos sociais a
população empobrecida das favelas do Rio de Janeiro.
Tudo indica que a prática da assistência social, com suas regulares idas e vindas à favela, maior assiduidade e intimidade no contato com as famílias, teria contribuído para o avanço na descoberta da favela durante a longa fase que precedeu o advento das ciências sociais. As assistentes sociais, mais que qualquer outro agente, tinham entrada garantida na casa dos pobres. No entanto, nem por isso conseguiram desvencilhar-se de uma imagem negativa, cheia de clichês, que por muito tempo marcou a maneira de as elites nacionais conceberem a pobreza e os pobres: pobreza igual a vadiagem, vício, sujeira, preguiça, carregando ainda a marca da escravidão; pobre igual a negro e a malandro (VALLADARES, 2000, p, 14).
Valladares (2000) esclarece que o trabalho social desenvolvido nas favelas pelas
Assistentes Sociais tinha um caráter de um Serviço Social tradicional implementado
através de ações direcionadas em uma perspectiva de controle e disciplinamento dos
segmentos pauperizados.
Não seria exagerado dizer que de certo modo, as assistentes sociais funcionavam como a mão direita da administração municipal na gestão da pobreza: entre a proteção social e o controle dos pobres. Assim, administrar a favela significa também “pilotar”, “direcionar” sua população. A educação dos pobres era a chave de entrada que justificava a presença desses agentes nos bairros onde essa população morava. Era necessário educá-los, não apenas estimular bons hábitos como, igualmente, fornecer-lhes os elementos necessários à sua promoção social. As assistentes sociais sabiam que era fundamental conhecer a população para realizar um trabalho social eficaz (VALLADARES, 2000, p. 21).
De acordo com Borges (2015), até os anos de 1960, a forma de intervenção do
Serviço Social tradicional passa a ser questionada no interior da profissão, culminando
no Movimento de Reconceituação na América Latina, que tinha como questão central,
a “funcionalidade profissional na superação do subdesenvolvimento”. Para a autora,
havia um questionamento por parte das Assistentes Sociais sobre o seu papel
profissional frente as manifestações da questão social.
Com o golpe militar de 1964, instaura-se o regime militar no Brasil, no mesmo
ano, cria-se o BNH, o Sistema Financeiro da Habitação (SFH), o Serviço Federal de
Habitação e Urbanismo (SERFHAU), institui-se a correção monetária nos contratos
imobiliários, bem como cria-se o Plano Nacional de Habitação, através da Lei Nº 4.380,
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de 21 de agosto de 19642. O modelo implementado a partir da criação do BNH, nos
anos 1960, segundo Cardoso (2008, p. 1), “deixou marcas importantes na estrutura
institucional e na concepção dominante de política habitacional nos anos que se
seguiram”.
Segundo Azevedo (1988), durante a ditadura militar, a principal motivação para
a criação do BNH foi de ordem política. O projeto de criação do BNH incluía
implicitamente a ideia de que a casa própria poderia desempenhar um papel ideológico.
Segundo os mentores do BNH, o desempenho marcante na produção de casas populares deveria permitir ao regime militar emergente obter a simpatia de largos setores das massas que constituíram o principal apoio social do governo populista derrubado em 1964. Nesse projeto, igualmente encontrava-se implícita a ideia de que a casa própria poderia desempenhar um papel ideológico importante, transformando o trabalhador de contestador em ‘aliado da ordem' (AZEVEDO, 1988, p. 109).
O trabalho social em projetos habitacionais tem sua institucionalização
regulamentada a partir da criação do BNH (1964) e da Política Nacional de Habitação
e Saneamento (1968) (BORGES, 2015). Durante a existência do banco, entre os anos
de 1964 a 1986, o trabalho social era realizado nos principais conjuntos habitacionais
e nos programas de habitação de interesse social.
O BNH foi o órgão central do SFH, controlador do Sistema Brasileiro de
Poupança e Empréstimo (SBPE) e gestor do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço
(FGTS), sendo o principal agente da política habitacional do governo militar até 1986
(NALIN, 2013). Sua importância devia-se a funcionar como um banco central dos
agentes financeiros, garantindo os créditos e depósitos dos financiamentos do setor
imobiliário.
Sendo o primeiro órgão de alcance nacional a instituir uma política habitacional
para todo o país, o BNH tinha como base o SFH, que captava recursos advindos de
duas fontes principais: I) do FGTS, um tipo de poupança compulsória constituída por
depósitos correspondentes a 8% dos salários dos trabalhadores, formalizado para
financiar moradias destinadas à população de baixa renda; e II) do SBPE, um fundo de
2Segundo Nalin (2013), o SFH era composto pelos seguintes instituições : a) BNH; b) órgãos federais,
estaduais e municipais, inclusive sociedades de economia mista com participação majoritária do poder público (tais como as Caixas Econômicas Estaduais e Federal e as chamadas COHABS; c) Sociedades de Crédito Imobiliário; d) fundações, cooperativas e outras formas associativas para a construção ou aquisição de casa própria, sem finalidade de lucro (tais como as Associações de Poupança e Empréstimo, Cooperativas Habitacionais e Institutos de Previdência Social).
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poupança voluntária para financiar o setor de classes média e alta (AZEVEDO e
ANDRADE, 1982). Rolnik (2015) aponta que o FGTS se transformou na principal fonte
de recursos para a política habitacional brasileira ao longo da história. Para a autora:
A magnitude dos recursos do FGTS alçou o BNH à condição de segundo estabelecimento bancário do país, desde a sua criação até o início dos anos 1970, e o fundo é, até os dias de hoje, a grande fonte de recursos da política habitacional (ROLNIK, 2015, p. 284).
O atendimento aos beneficiários do BNH, em termos de financiamento
habitacional, era realizado por Faixas de mercados, segundo estratos de renda. As
Companhias Estaduais ou Municipais de Habitação (COHABs) atendiam as camadas
mais carentes, que recebiam até cinco salários mínimos, denominadas de mercado
popular. Além da aquisição de imóveis, nas COHABs eram ofertados aos mutuários
ações do trabalho social.
Majoritariamente, o trabalho social desenvolvido nas COHABs era realizado por
Assistentes Sociais, a partir dos recursos da Taxa de Apoio Comunitário (TAC), criada
em 1973. De acordo com Paz e Taboada (2010), este recurso do TAC tinha como
destinação a manutenção dos conjuntos habitacionais e seus equipamentos
comunitários, assim como o pagamento de Assistentes Sociais que atuavam nos
conjuntos habitacionais, executando um Plano de Serviço Social, custo este que era
embutido no preço da habitação que era financiada ao mutuário.
De acordo com Nalin (2013), neste período é interessante observar que já havia
uma composição de equipes multidisciplinares, já que em algumas situações as
Equipes Técnicas Sociais (ETS) eram formadas por Sociólogos, Psicólogos,
Pedagogos e Assistentes Sociais. No entanto, não havia uma prática linear ou comum
a seguir sobre uma metodologia do trabalho social entre as equipes sociais.
As abordagens das equipes sociais junto à população beneficiária eram diferentes, de acordo com a filosofia do agente com relação ao programa habitacional e de seus objetivos. Os programas direcionados às comunidades pobres focavam as seguintes frentes: “educação, saúde, capacitação profissional, treinamento de lideranças e cultura geral” [...]. Exemplo disso pode ser dado por meio da COHAB de Santa Catarina, em que o Serviço Social na década de 1970 realizou um amplo trabalho de desenvolvimento comunitário nos seus conjuntos habitacionais, com vistas a sua recuperação física, administrativa e social [...] (NALIN, 2013, p. 142).
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Para Borges (2015), o trabalho social daquela época tinha um caráter
meramente “administrativo”, pois, de uma forma geral, havia preocupação somente com
a seleção dos beneficiários, com o acompanhamento da adimplência dos mutuários e
com a organização comunitária, especialmente com a constituição de associações de
moradores para que estes pudessem administrar os espaços comunitários construídos
nos conjuntos habitacionais (centros comunitários através de comodatos).
Em relação aos estratos médios, também chamados de “mercado econômico”,
que recebiam entre cinco a dez salários mínimos, estes constituíam-se na clientela
preferencial das Cooperativas Habitacionais, assessoradas em suas atividades pelos
Institutos de Orientação às Cooperativas (INOCOOP)3. A Faixa salarial entre um e três
salários mínimos que, no início, foi a principal razão para a criação do BNH, passou a
ser cada vez menos atendida nos novos conjuntos habitacionais, concentrando-se a
ação nas Faixas mais altas, entre três a cinco salários. Cardoso (2008, p. 2) revela que
o BNH:
Um primeiro elemento diz respeito ao que talvez seja a questão central nas críticas à atuação do BNH: sua incapacidade em atender à população de mais baixa renda (entre 0 e 3 salários mínimos). Essa incapacidade decorria das contradições intrínsecas aos dois grandes objetivos da política habitacional: o de alavancar o crescimento econômico e o de atender à demanda habitacional da população de baixa renda. Ao priorizar o financiamento para as camadas de mais alta renda, que se configuravam como demanda efetiva e que atraíam a preferência dos setores empresariais ligados à área, a atuação do Banco conseguiu de fato produzir um novo boom imobiliário, gerando efeitos multiplicadores relevantes.
Além do trabalho social desenvolvido nas COHABs, havia também o trabalho
social realizado nos INOCOOP, criados em todas as regiões do país, em 1966. O papel
do trabalho social no INOCOOP tinha o caráter de orientar as Cooperativas
Habitacionais através de elaboração de projetos, regularização jurídica e fundiária,
seleção dos candidatos, construção e entrega das obras, assessoria técnica e social,
destacando-se entre eles a presença de Assistentes Sociais. O trabalho social tinha
como objetivo o acompanhamento dos trabalhadores desde a constituição da
3As Faixas de renda mais alta, acima de dez salários mínimos, formavam o mercado a ser atendido pelo
Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). O mercado popular e o mercado econômico eram também chamados de interesse social, e por isso, eram atendidos com recursos oriundos do FGTS (NALIN, 2013).
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cooperativa, contratação e execução das obras, até a mudança para a nova moradia.
Para Borges (2015, p. 89):
Em 1972, o BNH por meio do Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais (INOCOOPs), definiu diretrizes e uma proposta metodológica do trabalho social em habitação, passando, a partir de então, a ser exigência nos programas financiados e executados por esse órgão. Essas diretrizes propunham a execução do trabalho em equipes constituídas com forte presença da interdisciplinaridade. Em relação à proposta metodológica pautou um trabalho social com caráter menos burocrático, orientado para a promoção do mutuário como cidadão com consciência de seus direitos e deveres e a importância de sua participação.
Durante a existência do BNH, havia nas Carteiras de Cooperativas Habitacionais
um departamento voltado para o Desenvolvimento Comunitário (DC), inicialmente sem
estrutura ou plano de ação. No 1º Encontro dos INOCOOP, realizado em 1972, houve
a sinalização do compromisso do BNH em dar suporte ao trabalho social desenvolvido
pelas equipes sociais. A partir deste momento, se inicia a estruturação de equipes, a
definição de diretrizes, a formulação de normativo e o arcabouço metodológico voltado
para o trabalho social em habitação. Em relação a este fato, segundo Borges (2015, p.
89): “Interessa salientar que essas orientações ocorreram dentro de um quadro político
repressivo. As mudanças na orientação do trabalho social introduzem a discussão de
direitos e deveres dos moradores das unidades habitacionais do BNH contrariamente
à perspectiva posta pela conjuntura política ditatorial”.
Em termos de metodologia, o trabalho social desenvolvido nos INOCOOP, previa
algumas fases que antecediam às obras e continuavam durante e posteriormente às
obras. Segundo Paz (2015), na fase anterior às obras eram realizados o
assessoramento e constituição das Cooperativas Habitacionais. Para a autora, essa
atividade era desenvolvida por profissionais da área jurídica e social e tinha como
objetivos discutir o cooperativismo, a legislação, as formas de ação para que os grupos
de interessados nos sindicatos visitados formassem as cooperativas habitacionais e,
assim, adquirissem sua casa própria de forma mais barata.
Paz (2015) esclarece que a partir da estruturação do trabalho social na década
de 70, foi criado o Subprograma de Desenvolvimento Comunitário (SUDEC), em 16 de
janeiro de 1975, através da Resolução de Diretoria 40/75, que institucionalizou o
trabalho social nacionalmente em todos os programas geridos e ofertados pelo BNH.
De acordo com Paz e Taboada (2010), o SUDEC encontrava-se no âmbito dos projetos
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e programas do setor de Estudos e Pesquisas/Treinamento e Assistência Técnica
(ESPES/TREINAT) e daí advinham os seus recursos.
No BNH houve a implantação do Programa de Desenvolvimento Comunitário
(PRODEC) que tinha como vistas o desenvolvimento do trabalho social e o incentivo à
organização, participação e ao desenvolvimento comunitário, por meio de ações que
contribuíam para a integração das famílias beneficiárias ao espaço urbano. Os recursos
para financiamento do trabalho social do PRODEC vinham de um valor embutido no
custo do Programa, que se constituiu em um “fundo rotativo”, especialmente criado em
setembro de 1980 e chamado de Fundo de Participação Comunitária (FPC), para os
programas e projetos ligados às COHABS. Em março de 1981, foi criado o Fundo
Comunitário de Programas Cooperativos (FCPC), através da Resolução BNH Nº
104/81, para os Programas e Projetos da Carteira de Habitação (PAZ, 2015).
O planejamento do trabalho social e a sua programação eram realizados nas
Companhias Habitacionais e nos Institutos de Orientação, aprovados e monitorados
pelo Banco, nas suas várias unidades descentralizadas. A experiência do SUDEC e,
posteriormente, do PRODEC, obteve um baixo nível de eficiência, através do fundo
rotativo. Mais tarde, com o fim do BNH, a Caixa Econômica Federal (CEF), sucessora
do Banco, manteve a sua execução até o ano de 1991 (PAZ, 2015).
Em relação às intervenções à população de baixa renda, durante a gestão do
BNH, houve algumas iniciativas desenhadas pelo banco para responder à questão do
acesso à terra e à moradia, cujo público alvo eram famílias com rendimento mensal de
até três salários mínimos, considerados programas4 alternativos, como o Programa de
Lotes Urbanizados (PROFILURB), Programa de Financiamento da Construção,
Aquisição ou Melhoria da Habitação de Interesse Social (FICAM); Programas de
Erradicação da Sub-habitação (PROMORAR) e João de Barro, bem como nos
Programas de Saneamento para População de Baixa Renda (PROSANEAR)
(SILVEIRA E MALPEZZI, 1991; SANTOS, 1999).
Estes programas visavam a obras de urbanização, melhorias nas habitações
pré-existentes, equipamentos urbanos, regularização de lotes e apoio a autoconstrução
e acompanhamento do trabalho técnico social, mas não tinham como prioridade a
4 O Programa de Erradicação de Sub-habitação (PROMORAR) foi criado em 1979. O Programa de
Financiamento de Lotes Urbanizados (PROFILURB) teve a sua instituição em 1975. Já o Programa João de Barro foi criado em 1984. Esses programas visavam a obras de urbanização, melhorias nas habitações pré-existentes, equipamentos urbanos, regularização de lotes e apoio à autoconstrução, mas não tinham como prioridade a produção de novas unidades habitacionais.
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produção de novas unidades habitacionais. De qualquer forma, os resultados desses
programas não foram significativos, em face da produção habitacional no período BNH.
De uma forma geral, apesar do caráter repressivo do regime militar e do
cerceamento do debate político, o trabalho social desenvolvido junto às famílias dos
mutuários do BNH tinha como objetivos a discussão dos direitos e deveres dos
cidadãos que adquiriam uma unidade habitacional, o acompanhamento da construção
dos conjuntos habitacionais, a preparação para a mudança, o apoio na organização da
nova comunidade, a capacitação para viver em condomínio (no caso de construções
verticalizadas), o apoio à organização e à constituição de associações de moradores,
assim como a discussão do uso e manutenção dos equipamentos comunitários e a
integração da comunidade entre si e com o entorno (PAZ e TABOADA, 2010).
No início dos anos 80, durante o governo do ex-presidente João Figueiredo
(1979-1985), o Brasil enfrentou um alto processo inflacionário que conduziu a uma
grave recessão econômica. O governo passou a adotar uma política contra a crise
econômica, com o objetivo de diminuir o processo inflacionário que chegou a 110% em
1980, 211% em 1983 e níveis superiores a 200% em 1984 (SILVA, 1989). O arrocho
salarial do trabalhador brasileiro, o aumento do índice de desemprego e o
empobrecimento da população marcaram este obscuro período.
Em 1984, dos 4,5 milhões de mutuários existentes do BNH, 1,1 milhões se
encontravam em atraso; desses, 30% já estavam em insolvência (mais de três parcelas
não pagas). Entre os inadimplentes, havia beneficiários que eram ex-moradores de
favelas e pessoas da classe média (SILVA, 1989). Como já mencionado e amplamente
retratado pela literatura (AZEVEDO, 1988; BONDUKI, 1998; VALENÇA, 2014), na
época da extinção do BNH (em 1986), o país encontrava-se em recessão econômica,
com alta inflação, desemprego, saques progressivos da poupança e do FGTS.
Consequentemente, diminuíram-se os recursos para investimentos, o que levou à
falência tanto do SFH quanto do BNH.
Nos anos do governo do ex-presidente José Sarney (1985-1990), o BNH
enfrentou uma grave crise institucional, apresentava baixo desempenho social, alto
nível de inadimplência, baixa liquidez do sistema e manifestações de protesto dos
mutuários. Apesar de várias tentativas para reverter o quadro deficitário, em 1986,
durante a presidência de José Sarney, as operações do BNH foram encerradas. Em
relação a este cenário, Valença (2014, p. 3) aponta que:
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O fechamento do BNH foi motivado pela grave crise do endividamento externo do início dos anos 1980, que afetou o fluxo de caixa das fontes de recursos do sistema, e pela inadimplência das COHABS, devido a intervenções políticas de governadores e prefeitos. Porém, era também importante, no contexto da redemocratização do país, livrá-lo de instituições emblemáticas das políticas “sociais” dos governos militares, sendo o BNH a mais importante delas. Estranhamente, o banco foi fechado, mas os ordenamentos do SFH, a causa de suas disfunções econômicas, não foram substancialmente alterados, passando a Caixa Econômica Federal a operar a política habitacional do país desde então.
A partir do Decreto Lei Nº 2.291, de 21 de novembro de 1986, o BNH passa a
ser incorporado à Caixa Econômica Federal, que herda todos os seus direitos e
obrigações, permanecendo a área de habitação vinculada ao Ministério do
Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (MDU). Quanto a este último, sua
competência abrangia a política habitacional, o saneamento básico, o desenvolvimento
urbano e o meio ambiente, enquanto a Caixa Econômica Federal passava a ser
vinculada ao Ministério da Fazenda (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2006).
Ao longo da sua existência, o Banco realizou diversos projetos padronizados em
todo o país. Segundo Azevedo (1988), em termos quantitativos, os resultados do BNH
não foram totalmente insatisfatórios. Cardoso (2008, p. 3) revela que cerca de “4,5
milhões de unidades habitacionais foram construídas, com 48,8% do total destinadas
aos setores médios, e 33,5% formalmente destinadas aos setores populares”.
Além de insuficientes e inadequados em relação à demanda que se propunham
a atender, os programas populares financiados pelo BNH caracterizaram-se pela
construção de enormes conjuntos nas periferias das grandes cidades ou em áreas
rurais, não dotadas de infraestrutura mínima, na tentativa de viabilizar soluções de mais
baixo custo. Sobre isso, Maricato (1987, p. 45) indica que:
É surpreendente que experiências tenham sido levadas a cabo de norte a sul do Brasil e só depois de muitos fracassos, que resultaram em custos sociais muito altos, as autoridades responsáveis começaram a reconhecer a inviabilidade do BNH, de servir à população de renda mais baixa, mantendo as regras do jogo.
Porém, Cardoso (2008) esclarece que os conjuntos habitacionais da época do
BNH não consideravam as particularidades regionais e não atendiam à população de
mais baixa renda (entre 0 e 3 salários mínimos). Além disso, conforme o autor, o
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crescimento das periferias é apontado como consequência do fracasso e da ineficácia
das ações do BNH.
2.2 Trabalho Social em Habitação no Período Pós-redemocratização
(1985 - 1999).
No final da década de 80, com a crise do SFH e a extinção do BNH, segundo
Cardoso (2008), o país encontrava-se em um processo de mudanças do regime militar
para o democrático. Após 21 anos de repressão, o regime ditatorial acabou quando
José Sarney assumiu a presidência (em um governo transitório), o que deu início ao
período conhecido como Nova República que culminou com a promulgação da
Constituição Federal de 1988 (CF/88), restituindo as bases democráticas do país.
Nos anos seguintes, observou-se uma desestruturação da política habitacional,
não sendo introduzidos novos mecanismos de financiamento para a habitação popular,
trazendo insegurança para o poder público e o mercado. Rolnik (2015, p. 286) relata
que:
A paralisação do sistema armado pelo BNH, assim como o período de recessão e estagnação econômica dos anos 1980, representou uma retração da atividade imobiliária e do financiamento habitacional. Esse cenário só começa a mudar a partir de meados dos anos 1990, quando reformas tanto no modelo de regulação do crédito habitacional quanto na estrutura e composição do capital das empresas envolvidas no mercado imobiliários residencial passam a
ser implementadas.
Durante a década de 80, através de uma desarticulação progressiva e
fragmentação institucional, houve uma perda da capacidade decisória e redução
significativa dos recursos federais para a área habitacional (CARDOSO, 2008). Assim,
durante os anos que vão da extinção do BNH até 1995 (quando tem início uma
reestruturação mais consistente do setor), a política habitacional foi direcionada para
vários órgãos que se sucederam ao longo do período, sem alcançar resultados
positivos no enfrentamento das principais problemáticas habitacionais (ARRETCHE,
1996).
No Brasil, os movimentos sociais urbanos que lutavam pelo direito à moradia,
regularização fundiária, saúde e saneamento básico se organizaram ainda no regime
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militar, durante a década de 1970, tendo os setores progressistas da igreja católica um
forte papel na condução deste processo. Nos anos seguintes, os movimentos sociais
no campo da moradia da década de 1980 articularam-se com outras organizações da
sociedade (sindicatos, universidades, organizações não governamentais), em um
cenário de reorganização da sociedade civil e ampliaram a luta do direito à moradia
para o direito à cidade, constituindo-se uma rede de reforma urbana aglutinada no
Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU).
As organizações envolvidas com o Movimento Nacional de Reforma Urbana
(MNRU) constituíram o Fórum Nacional de Reforma Urbana. Inicialmente, o Fórum
continha três principais objetivos, sendo eles: a incorporação do direito à moradia na
CF/88, a aprovação de uma lei federal que regulamentasse os capítulos constitucionais
da política urbana e, por último, a aprovação do Fundo Nacional de Habitação de
Interesse Social (FNHIS). Ao mesmo tempo, o FNRU também reivindicou a criação pelo
governo federal de um aparato institucional adequado, em nível nacional, que tornasse
o planejamento e a política urbana no país como política de Estado.
Neste período, as inúmeras conferências internacionais e nacionais
influenciaram os Assistentes Sociais que implementavam o trabalho social em
habitação a participarem do MNRU e do FNRU. Os técnicos sociais passaram a
assessorar diversos movimentos locais, por meio de organizações não
governamentais, somando-se a outras categorias profissionais e movimentos sociais
na defesa à moradia digna (NALIN, 2013).
De acordo com Paz e Taboada (2010), a atuação das equipes técnicas sociais
envolvidas em projetos habitacionais passou a ter como eixo central o apoio às
reivindicações e à organização popular das famílias. A ação destes profissionais, que
atuavam na execução das políticas públicas habitacionais, incentivava a organização
de comissões de moradores, de grupos de mulheres que reivindicavam creches e
equipamentos públicos, de movimentos de resistência e ocupação de áreas públicas e
privadas. Os movimentos de moradia passam a identificar os técnicos sociais como
aliados de suas lutas, em um contexto mais amplo de lutas pela redemocratização do
país.
As políticas neoliberais adotadas em vários países da América Latina,
especialmente no Brasil, a partir da década de 1980, agravaram o cenário de crise
habitacional e urbana, decorrente da redução de gastos nas políticas sociais e do
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desemprego em massa. Durante os anos de 1980 e 1990, os problemas de moradia
tornavam-se ainda mais dramáticos, agravados pela crise econômica e pelo
empobrecimento da população que marcaram estas décadas (VALENÇA, 2001).
A drástica limitação da oferta de recursos federais para programas habitacionais
e urbanos, diversos municípios e estados encontraram alternativas para solucionar os
problemas de financiamento utilizando recursos orçamentários próprios e assumindo
contratos de financiamento junto a organismos internacionais (BRASIL, 2010). Sobre
este fato, Ferreira (2015, p. 71) revela que:
Deu-se início, então, a um esforço direcionado para a redução do déficit qualitativo sobretudo nas metrópoles brasileiras. Nesse período, as agências multilaterais de fomento, a exemplo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD) e do Banco Mundial (BID), financiaram diversos programas e projetos de urbanização de assentamentos precários e de desenvolvimento institucional em várias cidades brasileiras, a exemplo do Habitar Brasil/BID e do PAT-Prosanear. Mesmo assim, apesar de limitações financeiras e institucionais, os municípios começaram a atuar de maneira mais ativa no processo de planejamento e gestão da política habitacional.
Agências multilaterais tornaram-se parceiras nesta nova fase de intervenções
sobre as questões de moradia no Brasil. O Banco Mundial, o Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID), Banco Mundial, a União Europeia e a Cities Alliance
influenciaram na formatação desses programas, com diretrizes para recuperação de
custos, redução da remoção de famílias, participação da população, adoção de
instrumentos de monitoramento e avaliação, critérios de sustentabilidade ambiental e
exigência de regularização fundiária dos assentamentos (BRASIL, 2010). Neste
período, o trabalho social passou a ser um elemento importante nas intervenções
públicas de urbanização de favelas, saneamento e construção de novas unidades
habitacionais.
Nos anos que se seguem à gestão de Itamar Franco (1993-1994) foram
instituídos dois programas habitacionais destinados à população de baixa renda: o
Programa Habitar Brasil (1994), onde o trabalho social passa a ser admitido como
contrapartida dos estados e municípios e o Programa Morar-Município, alimentados
com os recursos do Orçamento Geral da União (OGU).
Ao final da primeira gestão FHC, a partir de 1999, foi criado do Programa Habitar
Brasil/BID que tinha o intuito de elevar a capacidade dos governos municipais em
solucionar os problemas urbanos, principalmente na condução de melhorias de
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assentamentos precários, o qual era destinado a famílias de até três salários mínimos,
além de seguir rigorosas exigências impostas pelo BID, incluindo a realização do
trabalho social através de um projeto específico denominado Trabalho de Participação
Comunitária (TPC).
Segundo Marchi (2004), nos programas habitacionais financiados por
empréstimos internacionais do BID, a participação social passou a ser exigidos como
garantia de eficácia e efetividade da aplicação dos recursos. Para atender as exigências
do Banco, o Conselho curador do FGTS aprovou a inserção do trabalho social como
item obrigatório e de investimento nos programas. Desta forma, a CEF passou a contar
com uma equipe técnica social, composta por profissionais de nível superior, com
habilitações específicas e comprovada experiência em Projetos de Mobilização e
Organização Comunitária (MARCHI, 2004; CERVELIN, 2006). Para Cervelin (2006, p.
41):
A partir dessa exigência, em 1996, a CAIXA passa a contar com o cargo de Técnico Social em seu quadro técnico, que teve por atribuição básica realizar as atividades sociais especializadas, decorrentes da implementação de projetos de participação comunitária, que deveriam ser ocupados por funcionários de carreira, com formação superior em Serviço Social, Psicologia, Sociologia ou Pedagogia.
O Programa Habitar Brasil/BID foi inovador para o trabalho social, pois
apresentava uma série de requisitos novos para a sua implementação. De acordo com
Paz (2016), o programa previa que fossem realizados diagnósticos com o intuito de
reconhecer a realidade com dados primários, assim como o consentimento das famílias
aos projetos, tendo que ser assinado um termo de adesão e compromisso de pelo
menos 80% da população alvo.
Além do TPC, o Programa previa o desenvolvimento de diagnósticos que
incluíssem objetivos, cronogramas de atividades e de desembolso de recursos,
metodologias e prazos claramente definidos. Havia também a exigência de um plano
de reassentamento da população, explicitado, debatido e aprovado pelas famílias, e a
comprovação da existência de cadastro das famílias para impedir que fossem
contempladas mais de uma vez.
Segundo Paz (2015), foi a partir deste programa que se exigiu pela primeira vez
a existência de um profissional de Serviço Social ou de Sociologia, com experiência
profissional comprovada, para responder tecnicamente pelos projetos. No caso de
terceirização do trabalho social, as empresas deveriam ser especializadas na área.
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O Habitar Brasil/BID previa que, no desenvolvimento do trabalho técnico social,
as ações deveriam ser norteadas pelos eixos de: a) Mobilização e Organização
Comunitária (MOC); b) Educação Ambiental e Sanitária (ESA); e c) Geração de
Trabalho e Renda (GER). O foco do trabalho social passou a incluir a temática
ambiental e a sustentabilidade através de metodologias que foram trabalhadas com as
famílias beneficiarias do Habitar Brasil/BID. Além disso, durante esta fase, inicia-se a
discussão de programas de geração de trabalho e renda e projetos de educação
ambiental associados ao trabalho social na habitação de interesse social.
Para Paz e Taboada (2010), a discussão destes temas inclusos no trabalho
social passa ser uma preocupação não somente dos Assistentes Sociais, mas de um
grupo de técnicos constituído por profissionais de várias formações (Urbanistas,
Arquitetos, Psicólogos, Assistentes Sociais, Economistas e Sociólogos). Eles sabiam
que as mudanças advindas da urbanização das favelas traziam uma elevação dos
gastos das famílias, que necessitavam de estímulo e apoio para fazer frente a esses
novos gastos e, assim, permanecer no novo território e na nova moradia.
Os monitoramentos dos projetos de urbanização do Programa HBB/BID eram
realizados trimestralmente através da elaboração dos relatórios trimestrais, que eram
encaminhados para a CEF, onde eram transformados nos relatórios de
acompanhamento semestrais enviados ao BID (PAZ, 2015). Para Pimentel (2012, p.
12):
O BID, através do Subprograma de Urbanização de Assentamentos Subnormais, estabeleceu um modelo para o trabalho social, então chamado de “Participação Comunitária”. Este modelo passou a ser adotado nas ações ligadas à urbanização de favelas e dos chamados assentamentos subnormais em vários municípios brasileiros.
A CEF tinha como responsabilidade o monitoramento do trabalho social
executado pelas Prefeituras e empresas terceirizadas (consultorias), pois recebia
mensalmente os relatórios de medição que ensejava a liberação de recursos para
pagamento das atividades realizadas. De acordo com Paz (2015, p, 34):
Também foi neste Programa que se orientou pela primeira vez, a não liberação de recursos de obras se o trabalho social não fosse executado. Durante o processo de sua implementação, o HBB produziu uma discussão nacional sobre Avaliação do Programa, com participação da academia, Prefeituras, Estados e Caixa, que resultou numa Matriz de Indicadores de valor inestimável e que foi utilizada pela maioria dos 119 projetos contratados.
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Com o lançamento do PAC, em 2007, os projetos do HBB que ainda estavam
em execução e que não haviam sido concluídos foram redirecionados para os Projetos
Prioritários de Investimentos (PPI), do PAC. Assim, os proponentes conseguiriam obter
recursos para sua conclusão, pois as regras e normativos continuavam sendo as do
regulamento operacional do programa e de seus manuais. Oficialmente, o HBB foi
encerrado em 2008, quando se realizou em Brasília um seminário de avaliação e de
encerramento do Programa, conforme previsto no acordo de empréstimo do BID.
Durante a gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), podemos
ressaltar dois principais programas habitacionais, sendo eles: o Pró-Moradia e o
Programa de Arrendamento Residencial (PAR). O Programa Pró-Moradia, que
concedia financiamento aos governos estaduais e municipais, objetivava a produção
de moradia para a população com renda até três salários mínimos. No Programa Pró-
Moradia, o trabalho social estava entre as exigências de enquadramento dos
municípios. De acordo com Cardoso e Aragão (2013, p. 24):
Entre 1994 e 2002, a ocorrência de crises financeiras internacionais que atingiram a economia brasileira levou o governo federal à adoção de medidas de austeridade fiscal, seguindo as prescrições do Fundo Monetário Internacional, incluindo-se aí a limitação ao endividamento do setor público. Isso teve como consequência forte restrição dos empréstimos do FGTS para a produção de moradias por estados e municípios, o que levou à redução quase absoluta dos financiamentos previstos no Programa Pró-Moradia, que se delineava, até 1997, como o principal programa para apoio à atuação dos governos locais no setor habitacional.
Já o Programa de Arrendamento Residencial era constituído como uma forma
distinta de acesso à moradia, por meio de arrendamento, ou leasing. Através do PAR,
o imóvel, que faz parte do patrimônio do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR),
permanece sob a “propriedade fiduciária” da Caixa Econômica Federal, que é a gestora
do fundo e representa o arrendador ativa e passivamente.
Assim, a propriedade do imóvel é do FAR, enquanto o arrendatário paga uma
taxa de arrendamento mensal, por um período de 15 anos, quando poderá obter o
direito de optar pela aquisição do imóvel, mediante o pagamento ou o financiamento do
saldo devedor, se houver. O PAR era destinado apenas àquela população com renda
mensal até seis salários mínimos, podendo chegar a oito salários, para pessoas ligadas
à atividade da segurança pública (segmento conhecido como PAR 1).
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O PAR, como muitos outros programas no passado, visava, no seu início, atender a uma população de renda mais baixa (até 6 salários mínimos) e tem por meta construir 200.000 unidades habitacionais, nas regiões metropolitanas, onde o problema é mais concentrado. Uma exigência do programa é que as áreas beneficiadas já sejam servidas por infraestrutura básica, o que força as Prefeituras a implementarem a infraestrutura antes da construção das unidades habitacionais. Tal exigência, porém, beneficia as Prefeituras mais ricas (VALENÇA, 2001, p.40).
O trabalho social realizado no PAR tinha como foco a gestão condominial e
patrimonial, uma vez que os seus empreendimentos eram de propriedade da CEF.
A inovação era o que o governo federal passava a incluir nos custos do empreendimento a ser contratado, recursos para o desenvolvimento do trabalho social, sendo que parte destes recursos era a fundo perdido, ou seja, a custo zero, para os municípios e estados. O limitador neste caso estava na dependência de aprovação dos recursos através de emendas parlamentares. O Governo Federal também ofertava, através de empréstimo de recursos do FGTS, o Programa Pró-Moradia, onde o trabalho social estava entre as exigências de enquadramento. Neste caso, o limitador era a capacidade de endividamento de estados e municípios (PAZ, 2015, p. 31).
Nos anos 2000, as Prefeituras municipais tinham muitas dificuldades em efetivar
o trabalho social e permitir aos técnicos da CEF o acompanhamento regular, da mesma
forma que era feito o acompanhamento das obras. Diante desta situação, foi
incorporado aos itens de investimentos dos projetos de desenvolvimento urbano um
valor especifico para o trabalho social.
Diante deste cenário, o fato é que a política habitacional brasileira ficou relegada
a programas pontuais, não solucionando o grande déficit habitacional e o alto índice de
favelização das cidades brasileiras. Como indica Valença (2001), o conjunto de ações
desenvolvidas durante a os governos de Figueiredo, Sarney, Collor, Itamar Franco e
FHC não resolveram os problemas habitacionais da população mais empobrecida do
país, as intervenções estatais, ao longo da história, atenuaram o quadro de
desigualdades sociais e de exclusão social da população mais carente ao acesso à
terra urbana e à moradia digna.
Página | 41
2.3 Trabalho Social e o Ministério das Cidades (2003): Metodologias
e Diretrizes.
A partir do governo do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, percebe-se uma
nova articulação das políticas de desenvolvimento urbano com as políticas públicas
habitacionais brasileiras, principalmente com a criação de um Ministério das Cidades,
em 2003.
Com a criação do Ministério das Cidades foi possível vislumbrar um cenário
diferente como lançamento da Política Nacional de Habitação (PNH), em 2004,
regulamentada pela Lei Nº 11.124/2005, o que possibilitou a criação do Conselho das
Cidades, do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS) e do Fundo
Nacional de Habitação de Interesse Social (FNHIS). A nova institucionalidade da
política habitacional é considerada uma grande conquista, pois o seu projeto de lei foi
resultado de uma ampla mobilização nacional por parte dos movimentos sociais que
lutam pelo direito à moradia nos anos 80 e 90.
Com a PNH, ampliou-se a concepção e o reconhecimento da importância do
trabalho social, tendo a sua exigência estendida para todos os projetos de habitação
de interesse social e para os demais programas do Ministério das Cidades que
possuem recursos a fundo perdido da União e naqueles obtidos através de
empréstimos a estados e municípios (PAZ, 2015).
A partir de então, as orientações, normativas e diretrizes para o trabalho social
vêm sendo desenvolvidas pelo Ministério das Cidades e pela Caixa Econômica Federal
para os mais diferentes programas e projetos de habitação de interesse social, onde se
destacam: o respeito às conquistas importantes dos movimentos sociais de moradia,
como o direito das famílias em permanecerem na área ocupada, minimizando ao
máximo o número de famílias a serem removidas, a necessária infraestrutura urbana e
a participação durante a execução do empreendimento.
Com as intervenções das políticas públicas de desenvolvimento urbano
implementadas nos últimos anos no país, principalmente as relacionadas com o
Programa de Saneamento Ambiental Integrado, o PAC e o PMCMV, aumenta-se a
importância da efetivação do trabalho social. Em suma, são ações fundamentais a
serem realizadas com as famílias beneficiárias das políticas públicas do Ministério das
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Cidades. Este tipo de trabalho envolve uma diversidade de atividades, que vão desde
o processo de preparação das famílias para as intervenções das obras físicas até o
processo de pós-ocupação das novas moradias.
Com a implementação de diversas políticas públicas, em 2009, o Ministério das
Cidades regulamentou o trabalho social em projetos de intervenções urbanísticas e
habitacionais, estabelecendo normas gerais para a sua implementação nos municípios,
através da Instrução Normativa Nº 08, de 26 de março de 2009. Deste modo, as
orientações para o trabalho social eram aplicadas aos programas de provisão
habitacional5 e de intervenções de urbanização e reassentamento de favelas6. Segundo
o trabalho social define-se como:
Um conjunto de ações que visam promover a autonomia, o protagonismo social e o desenvolvimento da população beneficiária, de forma a favorecer a sustentabilidade do empreendimento, mediante a abordagem dos seguintes temas: mobilização e organização comunitária, educação sanitária e ambiental, e geração de trabalho e renda (BRASIL, 2009b, p. 03)
A partir da análise da Instrução Normativa Nº 08/2009, Paz (2015) afirma que as
regras para contratação e execução do trabalho social pelos agentes públicos foram
baseadas em conceitos, metodologias e eixos de atuação definidos anteriormente pelo
Manual do Trabalho Social do Programa HBB/BID. Para a autora, com a criação da
Instrução Normativa Nº 08/2009, não houve uma preocupação do Ministério das
Cidades em formular uma nova metodologia do trabalho social para os Programas do
PAC e PMCMV.
Assim, os conceitos e metodologias apresentados pela Instrução Normativa N°
08/2009 se revelaram inadequadas ou insuficientes, tendo em vista que as
5As orientações normativas para a implementação do trabalho social em intervenções de provisão
habitacional, que constam no anexo I, aplicam-se às seguintes ações: a) Programa Habitação de Interesse Social – Ação Apoio à Provisão Habitacional de Interesse Social, do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social - HIS/FNHIS; b) Programa de Atendimento Habitacional através do Poder Público – PRÓ-MORADIA – Modalidade Produção de Conjuntos Habitacionais (BRASIL, 2009b, p. 03).
6Segundo a Instrução normativa Nº 08, de 26 de março de 2009, o Trabalho Social era obrigatório,
principalmente nas intervenções de urbanização de assentamentos precários, dos seguintes Programas: a) Programa Urbanização Regularização e Integração de Assentamentos Precários; Projetos Prioritários de Investimentos (PPI); b) Empreendimentos de Saneamento Integrado em Assentamentos Precários em municípios de Regiões Metropolitanas, de Regiões Integradas de Desenvolvimento Econômico ou Municípios com mais de 150 mil habitantes; c) Programa de Apoio à Melhoria das Condições de Habitabilidade de Assentamentos Precários, do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social - UAP/FNHIS; d) Programa de Atendimento Habitacional através do Poder Público – PRÓ-MORADIA – Modalidade Urbanização de Assentamentos Precários; e e) Projetos Multissetoriais Integrados – PMI (BRASIL, 2009b, p. 01-02).
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características dos projetos, especialmente o PAC, são distintas do HBB/BID,
principalmente em relação à sua escala, tipologias de intervenções urbanas e aos
volumes de recursos envolvidos. Assim, Paz (2015, p. 40) revela que, “as orientações
para o trabalho social construídas no HBB atendiam ao escopo de um programa para
áreas menores e também para um universo menor de famílias".
O trabalho social passa a trazer novos desafios com a implementação de
grandes obras do PAC e do PMCMV. Nesse cenário, as referências normativas e
metodológicas divergem da nova realidade apresentada por tais políticas públicas. De
acordo com PAZ (2016), as concepções, as metodologias e os instrumentos de atuação
do trabalho social para grandes projetos habitacionais e/ou intervenções urbanas
deveriam ter sido revistos em função destas novas realidades das políticas de
desenvolvimento urbano do país.
Diante destas lacunas da instrução normativa N° 08/2009, em 2014, como
resposta aos novos desafios das políticas de desenvolvimento urbano, o Ministério das
Cidades ampliou as diretrizes e modificou a metodologia para a implementação do
trabalho social ao lançar a Portaria Nº 021/2014. Com o novo manual de instruções
para o trabalho social, o Ministério das Cidades mudou as principais orientações para
a execução do trabalho social nos programas PMCMV, PAC e Saneamento Integrado.
Desta forma, o Ministério das Cidades (2014), através da Portaria Nº 021/2014,
modificou o conceito de trabalho social e estabeleceu que:
O Trabalho Social compreende um conjunto de estratégias, processos e ações, realizado a partir de estudos diagnósticos integrados e participativos do território, compreendendo as dimensões: social, econômica, produtiva, ambiental e político-institucional do território e da população beneficiária, além das características da intervenção, visando promover o exercício da participação e a inserção social dessas famílias, em articulação com as demais políticas públicas, contribuindo para a melhoria da sua qualidade de vida e para a sustentabilidade dos bens, equipamentos e serviços implantados. (BRASIL, 2014, p. 5).
Com as novas diretrizes do trabalho social (BRASIL, 2014), todas as ações são
voltadas para os novos eixos7de: a) Mobilização, Organização e Fortalecimento Social;
7Segundo a Portaria 021/2014 do Ministério das Cidades, os eixos do trabalho social são referentes a:
a) “Mobilização, organização e fortalecimento social – prevê processos de informação, mobilização, organização e capacitação da população beneficiária visando a promover a autonomia e o protagonismo social, bem como o fortalecimento, a constituição e a formalização de novas representações e novos canais de participação e controle social.
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b) Acompanhamento e Gestão Social da Intervenção; c) Educação Ambiental e
Patrimonial; e d) Desenvolvimento Socioeconômico). Assim, o trabalho social passa a
ter como objetivo a promoção “da participação social, a melhoria das condições de vida,
a efetivação dos direitos sociais dos beneficiários e a sustentabilidade da intervenção”
(BRASIL, 2014, p. 5).
As diretrizes do trabalho social orientam que as intervenções devem levar em
consideração, na elaboração e desenvolvimento do Projeto de Trabalho Social (PTS),
as recomendações da Política Nacional de Habitação. Neste sentindo, Paz e Taboada
(2010, p. 71) dimensionam que:
As intervenções públicas na área de habitação devem ser acompanhadas por um trabalho social sistemático e que objetive a promoção da inclusão social, do acesso à cidade e aos serviços públicos, e que estimule a participação cidadã. Os processos e ações implementados pela via do trabalho social que dão ancoragem e direção a programas de enfrentamento à desigualdade social e sustentabilidade dos programas de Habitação de Interesse Social (HIS).
Em relação à implementação do trabalho social firmado no âmbito do PMCMV,
com recursos com Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) para municípios com
população acima de 50 (cinquenta) mil habitantes, o manual de instruções estabelece
os papeis de todos os atores envolvidos na execução do trabalho social. Esses papeis
podem ser descritos através da interação entre seis grandes atores: 1) Ministério das
Cidades; 2) governos estaduais e/ou municipais; 3) Caixa Econômica Federal; 4)
instituição financeira que funciona como gestora dos recursos do Governo Federal; 5)
Equipes técnicas sociais (formadas normalmente por Assistentes Sociais, Psicólogos,
Pedagogos e Educadores Ambientais); 6) empresas terceirizadas responsáveis pela
b) Acompanhamento e gestão social da intervenção – visa a promover a gestão das ações sociais necessárias para a identificação, encaminhamento e solução de problemas construtivos ou de manutenção referentes ao empreendimento, em articulação com a construtora, os Entes Públicos e as concessionárias de acordo com as respectivas competências.
c) Educação ambiental e patrimonial – visa a promover mudanças de atitude em relação ao meio ambiente, ao patrimônio e à vida saudável, fortalecendo a percepção crítica da população sobre os aspectos que influenciam sua qualidade de vida, além de refletir sobre os fatores sociais, políticos, culturais e econômicos que determinam sua realidade, tornando possível alcançar a sustentabilidade ambiental e social da intervenção.
d) Desenvolvimento Socioeconômico – objetiva a articulação de políticas públicas, o apoio e a implementação de iniciativas de geração de trabalho e renda, visando à inclusão produtiva, econômica e social, de forma a promover o incremento da renda familiar e a melhoria da qualidade de vida da população, fomentando condições para um processo de desenvolvimento socioterritorial de médio e longo prazo”.
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execução do trabalho social, representantes do setor privado; e 7) beneficiários. Desta
forma, para Pimentel (2012, p. 148), os atores envolvidos no trabalho social são:
O ente público, aquele que contrata o programa a ser executado, em geral administração municipal; a Caixa Econômica Federal, agente operacional financeiro dos programas; o corpo técnico de profissionais que executam o trabalho social, sendo dividido por aqueles que atuam na gestão e gerenciamento dos projetos sociais (Assistentes Sociais, Sociólogos, em grande parte, historiadores e psicólogos, em número menor) profissionais com formação única especializada e de nível superior, e aqueles que estarão na linha de frente da execução – que compreende os profissionais acima citados e também os agentes comunitários, educadores, oficineiros etc.; população alvo do trabalho social; e as empresas que possam vir a ser contratada para a realização do Trabalho Social.
Um ator bastante importante na condução do trabalho social é a Caixa
Econômica Federal, como um órgão financeiro e agente operador do Programa. A CEF
possui as atribuições de analisar, acompanhar, avaliar e atestar a execução do trabalho
social nos empreendimentos do PMCMV. No entanto, um elemento bastante
controverso é o de que a CEF, como gestor dos recursos federais, associa o controle
do desenvolvimento do trabalho social com metas e rotinas e burocracias típicas de um
banco, ocasionando uma série de divergências no processo de execução do trabalho
social. Para Cardoso et al (2015, p. 99):
[...] o TTS passa a ser igualado e ‘medido’ temporal e metodologicamente de acordo com as intervenções físicas, como se fosse uma ‘obra’. Essa metodologia pressupõe que as fases do Trabalho Técnico Social sigam uma linearidade, que, na prática, não existe.
Em termos de planejamento, anteriormente, a responsabilidade técnica da
execução do trabalho social dos projetos habitacionais era atribuída a um profissional
do Serviço Social ou Ciências Sociais. Com a Portaria N° 21/2014, houve uma
redefinição neste quesito, sendo que o coordenador e/ou responsável técnico deverá
“preferencialmente” ser formado em Serviço Social ou Sociologia, mas abrindo a
possibilidade para qualquer outra profissão de nível superior, desde que tenha
experiência em ações socioeducativas em intervenções de saneamento e de habitação
(PAZ, 2015).
Assim, as fases de planejamento, implementação e avaliação do
empreendimento, em especial, na elaboração dos Projetos de Trabalho Social, deverá
incluir diagnósticos sociourbanísticos, construção de relatórios de demanda por
Página | 46
equipamentos e serviços públicos e urbanos, além da matriz de responsabilidades.
Deverá, ainda, ocorrer de forma integrada com todos os atores envolvidos com o TS,
inclusive as famílias beneficiárias. Para o Ministério das Cidades e a CEF, o
planejamento do trabalho social deverá acontecer em três etapas, constituídas, no
mínimo, por:
Quadro 1: Etapas, Instrumentos de Planejamento e Atividades do Trabalho Social.
Fases 1. Pós-
assinatura do Convênio TS
2. Pré-contratual com o
Beneficiário
3. Pós–contratual com o beneficiário/Pós-obra
Marcos
Temporais
Da assinatura do
convênio TS até a
entrega do PTS à
IF, com duração até
12 meses ou até a
obra atingir 65% de
execução.
Da aprovação do
PTS pela IF até a
assinatura do
contrato com o
beneficiário, devendo
ser iniciado 8 meses
antes da mudança
das famílias.
A partir da mudança das
famílias com duração até
12 meses
Instrumento de
Planejamento
PTS-P PTS PDST
Atividades
-Cadastro, seleção
E hierarquização da
demanda.
-Elaboração e
aprovação do PTS.
-Desenvolvimento
das
ações/atividades.
-Elaboração e
aprovação do PDST.
-Execução das
ações/atividades descritas
no PDST.
Fonte: Ministério das Cidades, Portaria 021/2014.
A partir da fase de planejamento do trabalho social, acompanhado pelo agente
operador financeiro (CEF ou BB), a opção metodológica, a escolha do instrumental, as
estratégias e as técnicas a serem utilizadas para a implementação do trabalho social é
da competência dos estados e municípios, que deverão levar em conta, além dos
aspectos técnicos e o tipo de intervenção, as peculiaridades culturais, sociais,
econômicas e ambientais, identificadas a partir da caracterização e diagnóstico da área
de intervenção e dos beneficiários e do diagnóstico socioterritorial da macro área de
intervenção (BRASIL, 2014).
Porém, em muitos Projetos de Trabalho Social do PMCMV existe um
descompasso entre a realidade identificada nos diagnósticos socioterritoriais e as
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ações desenvolvidas pelo TS. Em muitas ocasiões, a formulação dos projetos não leva
em consideração a participação das famílias, bem como as principais questões sociais
e as características dos territórios que serão alvo de intervenção. Percebe-se que existe
uma padronização dos projetos sociais do PMCMV, ou seja, em muitas situações os
estados e os municípios utilizam o mesmo PTS (apenas mudando algumas
informações) em todos os empreendimentos do PMCMV. O trabalho social é visto
apenas como uma etapa obrigatória de cumprimento dos prazos junto à Caixa
Econômica Federal e ao Ministério das Cidades, para não ocasionar a suspensão junto
ao FAR.
Em relação à composição de custo do trabalho social, os recursos financeiros
para sua execução são repassados para os entes públicos, mediante formalização de
convênio entre o poder público executor e a instituição financeira responsável pela
contratação do empreendimento, logo após a aprovação do Projeto de Trabalho Social
– Preliminar (PTS-P).
Assim, os recursos do FAR para a execução do Projeto de Trabalho Social
correspondem a 1,5% do valor da obra dos empreendimentos tanto na forma de
condomínio (verticalizados ou horizontais) como para os empreendimentos na forma
de loteamento de casas. O valor de aquisição da unidade habitacional é exclusivamente
proveniente do FAR. Os recursos do trabalho social são liberados após a aprovação
dos relatórios pelo agente operador financeiro (CEF ou BB), em conformidade com as
metas e cronogramas do PTS-P, PTS e PDST (BRASIL, 2014).
Com a destinação de recursos específicos para o trabalho social, podemos
observar um grande avanço nos normativos que sustentam a definição de que ele é um
componente necessário da Política Nacional de Habitação. A implementação do
trabalho social, atualmente, conforme a Portaria 021/2014, deve ser executada
diretamente ou de forma mista, ou seja, o trabalho social poderá ser implementado por
empresas terceirizadas, o que em muitas situações abre caminho para a precarização
nas formas de contratação profissional dos técnicos sociais.
Quando o Projeto de Trabalho Social prevê a forma mista de execução do TS, a
equipe técnica deve ser integrada, ao menos parcialmente, por servidores do quadro
do estado ou município, sendo vedada a possibilidade de adoção de regime de
execução do trabalho social exclusivamente indireto. No entanto, em alguns casos de
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excepcionalidade, essa ação é possível desde que seja comprovada a necessidade de
total terceirização dos serviços ao Ministério das Cidades.
Nas situações em que o estado ou município optar por terceirizar as suas
atividades, a empresa/instituição contratada deverá ter reconhecida experiência na
temática e ser contratada por meio de processo licitatório específico, distinto do
utilizado para a contratação das obras (BRASIL, 2014). Em muitas Prefeituras, observa-
se que as licitações do trabalho social admitem a contratação de consórcio de
empresas, fundações e Organizações Não Governamentais (ONGs) para a execução
do trabalho social.
Como amplamente relatado pela literatura (ROLNIK e NAKANO, 2009;
CARDOSO e ARAGÃO, 2013; MARICATO, 2014), em um primeiro momento, a
formulação do PMCMV fez parte de um grande pacote de medidas econômicas que
visava a impulsionar a economia a partir de inúmeros setores envolvidos com a cadeia
produtiva da construção civil. Além dessa cadeia produtiva, o PMCMV oportunizou a
promoção de um nicho de mercado para as empresas de consultorias de execução do
trabalho social. Com a possibilidade de contratar empesas terceirizadas para a
execução do trabalho social, o desenho institucional adotado pelo Programa favorece
uma lógica econômica, onde as empresas buscam ao máximo a racionalização das
ações do trabalho social, além de reduzir custos, com vistas à obtenção do lucro e,
consequentemente, afetando a qualidade e a efetividade das ações oferecidas pelo TS.
Como o Ministério das Cidades define um teto para o financiamento dos PTS, as
empresas terceirizadas criam estratégias de maximização de seus ganhos. Ou seja,
em muitos municípios em que o trabalho social do PMCMV é terceirizado, as empresas
contratadas solicitam a reprogramação dos Projetos de Trabalho Social à CEF, a fim
de modificar as atividades, as metodologias, diminuir a quantidade de profissionais das
equipes sociais e o tempo de execução do trabalho social pós-ocupacional. Paz (2015,
p. 46) alerta que “o volume de recursos (1,5% sobre o valor da obra) gera disputas entre
os diversos agentes e merece um olhar detalhado sobre a qualidade dos serviços por
Estados”. Para além da ideia de desenvolvimento da cidadania, o trabalho social do
PMCMV veio responder às necessidades “econômicas” imediatas das empresas de
consultoria do trabalho social.
No que se refere ao monitoramento e avaliação, a instituição financeira possui
um papel importante nesta fase. Por meio de relatórios de atividades apresentados pelo
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ente público, o agente operador financeiro avalia todas as atividades constantes no
PTS aprovado de acordo com a fase a que se refere, sendo, neste caso, justificadas as
atividades previstas e não realizadas, quando for o caso.
Os referidos relatórios são instrumentos pelos quais são apresentadas as
medições das atividades/ações desenvolvidas no trabalho social e que ensejam o
desbloqueio de recursos financeiros para pagamento pela instituição financeira ao
proponente do projeto. No entanto, o fato de serem feitos relatórios mensais do trabalho
social desenvolvido não comprova a efetividade das ações. Os relatórios de
acompanhamento do trabalho social são mais um mecanismo de comprovação da
eficácia do cumprimento das metas, objetivos e resultados pretendidos do PTS, mas
não medem a real efetividade do alcance do trabalho social nas vidas das famílias.
Segundo a Portaria 021/2009, a não realização do trabalho social impede que
os estados e municípios efetuem novas contratações com recursos do FAR. O trabalho
social, por ser obrigatório, em muitas situações é visto como uma ação secundária
dentro do processo de implementação do PMCMV. Em muitos casos, a sua prática é
visualizada como realização de meras reuniões que antecedem a entrega do
empreendimento com os moradores, com vistas a explicar as regras do programa e de
convivência em condomínio. Assim, em muitas situações, não há uma preocupação
real dos entes públicos em realizar um trabalho social efetivo com as famílias.
Cardoso et al (2015) indicam que é um avanço na política habitacional brasileira
o reconhecimento do trabalho social como um direito do cidadão, integrando a questão
social aos programas habitacionais. No entanto, por outro lado, o trabalho social na
prática assume o papel de ditador de regras de convivência, que visa prioritariamente
à manutenção do patrimônio. Desta forma, a implementação do trabalho social passa
a ser realizada através de ações e estratégias fragmentadas, efetivadas diretamente
ou terceirizadas, por municípios que, na sua maioria, ainda entendem que o trabalho
social tem uma função mais assistencialista do que educativa, excluindo, desta forma,
o entendimento do mesmo enquanto processo contínuo que leva ao desenvolvimento
da cidadania (CARDOSO et al, 2015).
Para Carvalho (2014), o trabalho social é a medição necessária a toda política
pública, que se comprometa com a busca da equidade enfretamento das desigualdades
sociais. Para a autora, o trabalho social “[...] envolve uma reflexão sobre a gestão social
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com seus novos arranjos e especificidades próprias à condução da política pública em
sociedades que são cada vez mais complexas” (CARVALHO, 2014, p. 7).
Todo trabalho social implica rupturas com concepções regadas na tutela e no autoritarismo para se poder avançar e concretizar o fortalecimento e a emancipação dos chamados grupos excluídos. Isto porque ele possibilita mobilizar e fortalecer a população para que suas demandas adentrem na agenda pública como prioridade, e conquistem pertencimento as cidades (CARVALHO, 2014, p. 7).
A implementação do trabalho social é permeada de contradições, limites e
desafios, pois ainda serão necessárias grandes mudanças sobre a forma de concepção
do trabalho social em projetos de habitação de interesse social. No próximo capítulo,
será realizada uma análise do PMCMV no Brasil, assim como da problemática
habitacional e a sua implementação na Região Metropolitana de Natal.
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3 Desafios e Avanços do Programa
Minha Casa Minha Vida.
O Capítulo I inicia-se com uma breve análise do Programa Minha Casa Minha
Vida no Brasil, com vistas a evidenciar em que conjuntura o Programa foi formulado e
a sua atual realidade de implementação. Este capítulo segue apresentando e discutindo
as problemáticas habitacionais da RMN e de como o PMCMV atua para reduzir o déficit
habitacional metropolitano e atender ao mercado de construção civil e imobiliário.
3.1 O Programa Minha Casa Minha Vida no Brasil.
O PMCMV foi formulado, em 2009, como um Programa econômico anticíclico e
com uma política fiscal expansiva. Tinha como objetivo central ser um impulsionador
do setor da construção civil e do mercado imobiliário brasileiro, afetados, como o
conjunto da economia, pela crise econômica internacional de 2008. Cardoso e Aragão
(2013, p. 37) relatam que essa crise surgiu a partir dos “problemas sistêmicos
financeiros provocados pela crise dos mercados secundários de títulos lastreados em
hipotecas, envolvendo os chamados subprimes”.
Neste contexto de crise internacional, o Brasil foi duramente afetado,
ocasionando recessão econômica, diminuição no Produto Interno Bruto (PIB), além de
outros efeitos. Como dimensionam Cardoso e Aragão (2013), a reação do governo do
ex-presidente Lula frente à crise internacional foi rápida, pois o país não poderia
permanecer em tal situação por um longo período.
Diante daquele cenário, as medidas adotadas para o enfrentamento da crise
previam a expansão do crédito pelos bancos públicos (Banco do Brasil, BNDES e CEF),
com o objetivo de mitigar a retração do setor privado e dos demais setores em
dificuldades. Tais providências tinham um caráter anticíclico, pois segundo Cardoso e
Aragão (2013, p. 37), “o governo manteve os investimentos em infraestrutura previstos
no âmbito do PAC e mobilizou a Petrobrás no sentido de que também mantivesse os
investimentos previstos”.
Como parte do conjunto de medidas do Governo Federal, em março de 2009, o
PMCMV foi lançado com o claro objetivo de criar condições de ampliação do mercado
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habitacional para o atendimento das famílias com renda de zero a dez salários mínimos,
dinamizando a cadeia de produção da construção civil e de outros setores da economia.
Tanto para Cardoso e Aragão (2013), Maricato (2014), como para Rolnik e Nakano
(2009), o PMCMV tem uma forte inspiração nas políticas habitacionais implementadas
em outros países da América Latina, como México e Chile. Para Rolnik e Nakano (2009,
p. 131):
Em linhas gerais, essas experiências promoveram um modelo de inclusão pelo consumo, em que a moradia para a população de baixa renda deve ser ao mesmo tempo uma mercadoria a ser acessada por meio de relações de mercado e uma oportunidade de negócio para empresas privadas. Assim como no caso do PMCMV, essas políticas habitacionais tiveram como aspectos fundamentais a produção em grande escala por empresas privadas e a concessão de subsídios governamentais diretos ao comprador para viabilizar a compra da casa própria por grupos que estariam fora do mercado.
Para Amore (2015), esta nova política pública habitacional foi formulada pelos
Ministérios da Casa Civil e pelo Ministério da Fazenda, em diálogo com os setores da
construção civil e imobiliário. Através da medida provisória (Nº 459/2009),
posteriormente transformado na Lei Nº 11.977/2009, o Programa foi formulado como
uma forma declarada de enfrentamento da crise dos subprimes norte-americanos, que
tinha provocado a quebra de bancos e impactado diretamente a economia
financerizada mundial. A respeito disso, Amore (2015, p. 18) afirma que:
O contexto da crise econômica, junto com o enfraquecimento do Ministério das Cidades no seu papel de formulador e condutor da política urbana, levou o governo acolher a proposta do setor da construção civil, apostando no potencial
econômico da produção de habitação em massa.
O PMCMV não foi criado somente com o objetivo de enfrentar o déficit
habitacional brasileiro, mas, centralmente, de atender as demandas do mercado, que
se encontrava em crise. De acordo com Cardoso et al (2015), o Programa, ao longo
dos seus sete anos de existência, não apenas ficou restrito à provisão de moradias. Os
autores esclarecem que:
Sua importância transcende a questão habitacional e sua implementação envolve uma trama complexa de agentes e interesses, atravessada por uma série de disputas, conflitos, arranjos, articulações e contrassensos, fato que ficou evidente já mesmo na sua origem (CARDOSO et al 2015. p. 73).
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Com a criação do PMCMV, previa-se a construção de mais de 1 milhão de
moradias, com um investimento de 34 bilhões de reais, oriundos do Orçamento Geral
da União e do FGTS, alocados no FAR, operados pela Caixa Econômica Federal. Em
suma, o Programa não previa somente a provisão de unidades habitacionais, mas, por
ter um caráter anticíclico, visava a gerar empregos e, consequentemente, renda, em
um setor da economia capaz de mobilizar diversos outros setores associados: desde a
indústria extrativista e produtora dos materiais básicos da construção civil até a indústria
moveleira e de eletrodomésticos8, que eram ativadas no momento da entrega das
chaves (AMORE, 2013).
O PMCMV ilustra bem a possibilidade e as contradições da ação pública do
Estado em relação à formulação e implementação de políticas sociais de habitação no
país. Maricato (2014, p. 75) indica que: “o PMCMV retoma a política habitacional com
interesse apenas na quantidade de moradias e não na sua fundamental condição
urbana”. Como a provisão habitacional ficou a cargo basicamente do mercado, os
estados e municípios criaram uma certa “dependência” em relação ao PMCMV na
construção de novas moradias.
No âmbito municipal, em muitas ocasiões, as políticas públicas habitacionais
ficaram restritas a ações de regularização fundiária e urbanização de assentamentos
precários. Segundo Cardoso e Aragão (2011), o papel do Estado na promoção de
habitação de interesse social ficou delimitado em dois tipos de atuação: 1) o poder
público é o agente promotor (modelo de execução do SNHIS); e 2) o setor privado é o
agente executor (modelo de implementação do PMCMV).
Em linhas gerais, o PMCMV é formado por dois subprogramas: o Programa
Nacional de Habitação Urbana (PNHU) e o Programa Nacional de Habitação Rural
(PNHR). O PNHR tem por objetivo subsidiar a produção ou reforma de imóveis aos
trabalhadores rurais, agricultores familiares, comunidades tradicionais (como
quilombolas, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos e indígenas) e
reassentados do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), cuja
renda familiar anual bruta não ultrapasse R$ 60.000,00. O PNRH é composto por duas
fontes de recursos advindos do OGU e de recursos do FGTS, onde as unidades
8 Os beneficiários do Minha Casa Minha Vida tinham à disposição uma linha de crédito, que segundo o Ministério das Cidades era em torno de R$ 18,7 bilhões para a compra de móveis e eletrodomésticos para as novas unidades habitacionais. O anúncio do financiamento foi denominado de “Minha Casa Melhor”. As famílias poderiam financiar até R$ 5 mil, com taxas de 5% ao ano, e o prazo de pagamento era até 48 meses e desconto de 5% em relação aos preços à vista.
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habitacionais poderiam ser contratadas na zona rural de qualquer município,
independentemente do seu número de habitantes.
Em relação ao Programa Nacional de Habitação Urbana, este tem por objetivo a
produção ou aquisição de novas unidades habitacionais ou a requalificação de imóveis
urbanos para famílias com renda mensal de até R$ 5.000,00 reais. O PNHU visa à
compatibilização da prestação da casa própria com a capacidade de pagamento da
família, onde é estabelecida modalidade segundo o porte do município e a Faixa de
renda da família beneficiária. Em linhas gerais, o PNHU é composto por cinco
modalidades: PMCMV empresas, municípios, oferta pública, entidades e FGTS
(Quadro 2).
Quadro 2: Programa Minha Casa Minha Vida: Modalidades, Faixas e Fontes de
Recursos.
FAIXA
RENDA
FAMILIAR
MODALIDADES
CARACTERÍSTICA
FONTE
1
Até R$
1.800,00
Empresas/FAR
Entidades/FDS
Municípios com até 50
mil hab.
Rural grupo 1
Até 90% de subsídio do
valor do imóvel. Pago em
até 120 prestações mensais
de, no máximo, R$ 270,00,
sem juros.
OGU
1,5
Até R$
2.350,00
FGTS
Rural 2
Até R$ 45.000,00 de
subsídio, com 5% de juros
ao ano.
-
2
Até R$
3.600,00
FGTS
Rural 2
Até R$ 27.500,00 de
subsídio, com 6% a 7% de
juros ao ano
OGU +
FGTS
3
Até R$
6.500,00
FGTS
Rural 3
8,16% de juros ao ano
FGTS
Fonte: Ministério das Cidades, 2016.
Tanto o PMCMV Empresas, como os Municípios, a Oferta Pública e as Entidades
são destinadas para as famílias com renda até 1.800,00 reais, na qual a fonte de
recursos do OGU, sendo estes distribuídos pela CEF a partir de avaliação dos projetos
submetidos pelas empresas ou entidades.
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Desta forma, o PMCMV articula-se entre três grandes linhas de atuação, do qual
permite agrupar os beneficiários por Faixas de renda familiar. Na Faixa 1, são
participantes famílias com renda até R$ 1.800,00 reais9, onde estão concentrados os
maiores subsídios aportados pelo Programa, atendidos pelo FAR. Nesta Faixa, o
PMCMV, possui modalidade voltada para entidades, o que permite que famílias
organizadas de forma associativa, por uma Entidade Organizadora (Associações,
Cooperativas e outros) habilitada, produzam suas unidades habitacionais, com
recursos oriundos do Fundo de Desenvolvimento Social (FDS).
Na Faixa 2 são atendidas famílias pela modalidade financiamento via FGTS, com
renda familiar até R$ 3.600,00. Os beneficiários que são enquadrados nesta Faixa de
renda assumem um financiamento habitacional, com taxas de juros e valor de seguros
inferiores as praticadas no mercado. Para atuar no PMCMV/FGTS, as construtoras
apresentam propostas à CEF, que, Segundo Cardoso e Aragão (2013):
[...] realiza pré-avaliação e autoriza o lançamento e comercialização. Após a conclusão da análise e comprovação da comercialização mínima exigida, é assinado o Contrato de Financiamento à produção. A comercialização é feita pelas construtoras ou através dos “feirões” da Caixa, havendo a possibilidade de que os pretendentes à aquisição consigam uma carta de crédito na Caixa para ir ao mercado buscar uma moradia para aquisição (Cardoso e Aragão, 2013, p. 39).
Conforme Cardoso e Aragão (2013), diferentemente dos empreendimentos
Faixa 1 que utilizam o FAR, onde não há qualquer risco de comercialização ou
inadimplência para as construtoras, as operações realizadas com recursos do FGTS
configuram-se como “de mercado”, ainda que em condições de baixo risco para as
construtoras. Por fim, a Faixa 3 possui semelhanças com a Faixa 2, porém, são
atendidas as famílias com renda até R$ 6.500,00, os beneficiários que estão
enquadrados neste limite poderão adquirir um financiamento habitacional com taxa de
juros e valor de seguro inferior às praticadas no mercado, mas sem uso do subsídio
complementar.
Em seu desenho de política pública, segundo Bonduki (2009), o PMCMV não
segue as orientações propostas pelo SNHIS, assim como do Plano Nacional de
Habitação e do FNHIS. Conforme Rolnik et al. (2015, p. 131), “as normas que orientam
9 Em 2009, o valor era de R$ 1.395, o que equivalia a três SMs; em 2012, o valor da renda familiar passou
a ser de R$ 1.600, que equivalia a 2,57 SMs. Atualmente, com o lançamento do PMCMV 3, a Faixa de renda é de até R$ 1,800,00 reais.
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sua implementação não foram pautadas pelas estratégias de enfrentamento do déficit
habitacional contidas na política de habitação recém-elaborada, mas por uma agenda
atrelada aos fatores macroeconômicos e setoriais”.
Diante disso, o mercado passa a ser o principal agente promotor de execução
do Programa, pois as empresas construtoras e incorporadoras passam a ter a iniciativa
de produzir, escolher os terrenos, a tipologia do empreendimento (casa, apartamento,
condomínio fechado ou aberto), as tecnologias construtivas, o número de unidades
habitacionais, a qualidade dos materiais, ou mesmo a Faixa de renda a qual o
empreendimento será destinado (CARDOSO et al, 2015). A respeito disto, Cardoso e
Aragão (2011, p. 92) vão evidenciar que:
Um dos impactos mais imediatos sobre os programas desenvolvidos no âmbito do SNHIS diz respeito à eliminação dos repasses para as ações de provisão habitacional. Desde o lançamento do PMCMV, o FNHIS passou a concentrar os seus recursos nas ações de urbanização de assentamentos precários e de desenvolvimento institucional.
Além do que foi exposto até aqui, o Programa Minha Casa Minha Vida segue
uma lógica de reprodução do padrão periférico da moradia da população de baixa renda
do Brasil. Segundo Cardoso e Aragão (2011, p. 90), “a produção de novos
empreendimentos passa a ser definida segundo mecanismos de mercado, o que tem
fortes impactos sobre a localização dos empreendimentos e sobre a qualidade dos
projetos”. Além disso, como relatado por Rolnik et al. (2015), a atuação das construtoras
na promoção de projetos e na seleção de terrenos relega a inserção urbana dos
empreendimentos a uma questão de relevância secundária, senão inexistente, em
muitos municípios. Neste aspecto, Ronilk et al. (2015, p. 132) indicam que:
[...] o Programa consolida um modelo em que a oferta de habitação se transforma fundamentalmente num negócio, sendo orientada por uma lógica em que a maximização dos ganhos das empresas se torna a principal condicionante do modo como os terrenos são escolhidos e de como os projetos são elaborados.
Por outro lado, conforme Cardoso et al (2015), a implementação do Programa
relegou aos municípios apenas o papel de aprovar os projetos dos empreendimentos,
de modificar ou flexibilizar as legislações urbanísticas e ambientais em relação às
demandas geradas para a implantação do Programa, além de selecionar os
beneficiários (demanda fechada e aberta) de formular e executar o trabalho social
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durante a construção das unidades habitacionais e após a ocupação dos
empreendimentos de Faixa 1. Em relação ao agente financeiro operador do PMCMV,
a Caixa Econômica Federal, através de suas Gerências de Desenvolvimento Urbano
(GIDUR) e da Gerência de Habitação (GIHAB), é responsável por avaliar se as
propostas dos projetos de empreendimentos, assim como os Projetos de Trabalho
Social, estão de acordo com as normas e parâmetros técnicos do Ministério das
Cidades.
Sendo assim, Cardoso et al (2015) revelam que em muitas situações há uma
baixa articulação dos diferentes agentes envolvidos, seja os municípios, as empresas
ou a Caixa Econômica, pois, na implementação do Programa, há uma variação nos
contextos políticos e institucionais nas realidades estaduais e municipais. De acordo
com os autores acima citados: “cabe dizer que em cada caso específico o processo de
implementação do PMCMV assume nuances e particularidades que dependem
diretamente da atuação in loco de qualquer um dos agentes envolvidos” (CARDOSO et
al 2015, p. 75).
Após setes anos de sua implantação, o PMCMV encontra-se atualmente em sua
terceira fase, mas, devido ao processo de impeachment da ex-presidenta Dilma
Rousseff (Partido dos Trabalhadores - PT) e a nomeação de Michel Temer (Partido do
Movimento Democrático Brasileiro - PMDB) como presidente, o PMCMV passou por
uma restruturação nas novas regras do programa habitacional, no qual houve um
reajuste das faixas de renda e também do limite de financiamento.
A Tabela 1, a seguir, apresenta os números referentes ao total de metas e
contratações do PMCMV em suas duas fases de atuação. Apresenta, também, alguns
dados do PMCMV Faixa 1 referentes à quantidade de unidades habitacionais
contratadas, unidades já entregues e investimentos destinados para a implantação do
Programa.
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Tabela 1: Programa Minha Casa Minha Vida: Metas e Contratações.
1° FASE 2° FASE
Marços (2009 – 2010) (2011 – 2014)
Meta 1 milhão Meta 2,75 milhões
UH contratadas 1.005.128 UH contratadas 2.758.471
UH entregues 830.777 UH entregues 1.195.052
Fonte: Ministério das Cidades. Posição: Dez/2014
Na Tabela 2, podemos observar que, nas regiões Norte e Sul do Brasil (exceto
o Estado da Bahia), percebe-se que os valores investidos do PMCMV são relativamente
baixos em comparação às outras regiões do país. Estes dados podem nos revelar que
ainda persiste, no Brasil, uma concentração de investimentos no eixo Sul e Sudeste.
Apesar disso, o PMCMV, em seu desenho, prevê que a distribuição de investimentos
para a construção de empreendimentos por regiões do país deve seguir as estimativas
aproximadas do déficit habitacional em cada uma dessas regiões. No entanto, em
relação a este aspecto sobre a concentração de investimentos nas regiões Sul e
Sudeste, Cardoso e Aragão (2013, p. 60) demonstram que,
Essa relação de dependência do Programa para com a dinâmica imobiliária, fruto da hegemonia conferida ao setor privado, pode gerar problemas distributivos, já que os governos estaduais e municipais não controlam diretamente os meios necessários para garantir que os recursos estabelecidos na cota sejam efetivamente transformados em contratos. É possível que algumas administrações locais, com maior experiência em política habitacional, possam atuar como “facilitadoras” das iniciativas privadas, como parece ter acontecido em alguns casos, mas mesmo essa “competência” específica traz como consequência uma acentuação da desigualdade. Ou seja, aqueles municípios ou estados que já têm recursos (financeiros ou administrativos) atrairão mais recursos enquanto aqueles mais pobres e com baixa qualificação não conseguirão atingir as suas cotas.
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Tabela 2: Programa Minha Casa Minha Vida: Unidades Contratadas, Unidades
Entregues e Valor de Investimentos por Região e Estado do Brasil.
REGIÃO
ESTADO
UNIDADES
CONTRATADAS
UNIDADES
ENTREGUES
INVESTIMENTO
EM BILHÕES
NORDESTE
RN 100.243 71.339 R$6,919
PB 102.750 69.152 R$7,785
PE 145.653 79.340 R$8,714
AL 117.590 74.119 R$6,776
SE 58.768 30.297 R$3,421
BA 298.315 175.395 R$17,02
PI 84.738 50.806 R$4,216
CE 124.601 124.601 R$8,390
MA 167.248 84.363 R$8,579
NORTE
TO 30.167 15.702 R$ 1,500
PA 141.912 64.897 R$7,974
AP 10.195 2.858 R$539 (milhões)
AM 46.000 20.869 R$ 2,437
RR 9.628 7.836 R$502 (milhões)
AC 9.348 7.167 R$486 (milhões)
RO 44.202 19.693 R$2,679
SUDESTE
MG 435.292 313.714 R$32,215
ES 54.776 26.320 R$3,818
RJ 223.101 104.486 R$16,703
SP 775.915 457.454 R$61,399
CENTRO-
OESTE
DF 50.634 14.050 R$3,737
GO 244.979 181.737 R$19,477
MT 101.232 58.675 R$6,337
MS 80.363 57.384 R$5,825
SUL
PR 303.414 240.624 R$23,519
SC 169.221 128.297 R$13,535
RS 289.081 210.273 R$20,012
Fonte: Ministério das Cidades, 2016.
Assim, considerando o funcionamento do Programa (bem como o de qualquer
outra política pública), o PMCMV depende diretamente da atuação de uma diversidade
de atores para a sua implementação. Em seu desenho institucional, o PMCMV, no
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entanto, não permite que os municípios tenham um papel protagonista como promotor
e gestor do empreendimento, pois a instituição financeira (Caixa Econômica Federal),
por um lado, e as empresas, por outro lado, ganham centralidade em detrimento dos
órgãos e instituições responsáveis pelas políticas urbanas e habitacionais (RUFINO,
2015).
Portanto, diante do que foi exposto nesta sessão, para uma melhor compreensão
do PMCMV, podemos inferir que o Programa contratou em apenas cinco anos de
existência quase 80% das unidades que o BNH financiou nos seus 22 anos de
existência. Ambas tiveram em comum a participação do setor da construção civil e
dupla orientação, visando não só ao objetivo social de superar o déficit de moradia para
segmentos de baixa renda, mas, igualmente, com objetivos econômicos. Segundo
Amore (2015), os dois programas, também, não conseguiram inserir a política
habitacional em um quadro mais amplo de uma reforma urbana com mudanças mais
estruturais e de longo prazo.
3.2 Problemática habitacional e a Implementação do PMCMV na
Região Metropolitana de Natal.
Durante décadas, as cidades brasileiras conviveram com diversas problemáticas
habitacionais, como o crescimento urbano desigual, a elevação do déficit habitacional
e o aumento da pobreza urbana. A Região Metropolitana de Natal10 (com 1.577,072
habitantes, o que corresponde a 45,38% da população do RN, em 2016) apresenta
muitos desafios no enfrentamento do déficit habitacional na faixa de interesse social (0
a 3 SM), com insuficiência de políticas públicas de habitação social.
Devido ao crescimento populacional e urbano da RMN, muitos problemas
relacionados com o aumento do déficit habitacional, com a favelização e a ocupação
de áreas de riscos tornam-se desafios para os gestores públicos. Muitos municípios
apresentam deficiências em sua capacidade de formular e implementar políticas
10A Região Metropolitana de Natal (RMN) foi criada formalmente em 1997, pela Lei Complementar
Estadual Nº 152/97. Atualmente, é composta por 14 Municípios: Arês, Ceará-Mirim, Extremoz, Goianinha, Ielmo Marinho, Macaíba, Maxaranguape, Monte Alegre, Natal (Capital), Nísia Floresta, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante e São José do Mipibu.
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públicas para o enfretamento destas problemáticas, ocasionando uma dependência
financeira e técnica das políticas federais para a atender a demanda habitacional.
Figura 1: Mapa da Região Metropolitana de Natal | RN (2017).
Fonte: Ferreira, 2016.
.
Em todas as cidades da RMN, nos últimos anos, houve um crescimento
populacional expressivo. Municípios como Natal, Parnamirim, São Gonçalo do
Amarante e Macaíba, por possuírem os maiores quantitativos de habitantes (Tabela 3),
também apresentam os maiores indicadores relacionados com o aumento da pobreza,
da precariedade das habitações, da favelização e expansão urbana para as áreas
periféricas das cidades.
Página | 62
Tabela 3: Dados Populacionais e Densidade Demográfica por Município da RMN (2010
e 2016).
MUNICÍPIOS POPULAÇÃO
2000
POPULAÇÃO
2010
DENSIDADE
DEMOGRÁFICA
2010 (HAB./Km²)
Arês 11.323 12.924 111,89
Ceará-Mirim 62.424 68.141 94,07
Extremoz 19.572 24.526 176,03
Goianinha 17.661 22.481 116,92
Ielmo Marinho 10.249 12.171 39,01
Macaíba 54.883 69.467 136,00
Maxaranguape 8.001 10.441 79,51
Monte Alegre 18.874 20.685 98,07
Natal 712.317 803.739 4.805,24
Nísia Floresta 19.040 23.784 77,126
Parnamirim 124.690 202.456 1.639,70
São Gonçalo
do Amarante
69.435 87.668 351,91
São José do
Mipibu
34.912 39.776 137,00
Vera Cruz 8.522 10.719 127,77
Total RMN 1.171.903 1.411.975 -
Fonte: Censo do IBGE, 2000, 2010. (Elaboração própria da autora).
Dentre os municípios selecionados para esta investigação, Natal e Parnamirim
são as únicas cidades da RMN consideradas 100% urbanizadas e que possuem maior
dinâmicas de evolução da mancha urbana. São Gonçalo do Amarante, em 2016,
possuía 84,52% dos seus habitantes residindo na área urbana e somente 15,48% da
população na zona rural, em um grande contraste com o ano de 2000, ano no qual
85,89% da população habitava no campo. Este processo de crescimento urbano de
São Gonçalo do Amarante pode ser explicado tanto pela migração do campo para à
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cidade, como pela transformação de áreas rurais em áreas de expansão urbana e pelo
próprio desenvolvimento industrial e econômico do município.
Em relação às necessidades habitacionais presentes nos municípios da RMN, o
déficit habitacional contabiliza os domicílios inadequados, que apresentam
adensamento excessivo, carência e precariedade de infraestrutura e condições de
habitabilidade inadequadas. De acordo com Silva et al (2015, p. 266):
O conceito de necessidades habitacionais abarca duas categorias distintas: o déficit habitacional e a inadequação da moradia. O primeiro refere-se à necessidade de construção de novas moradias, já o segundo diz respeito à qualidade de vida dos moradores em virtude de residirem em moradias inadequadas. Na realidade, aquele conceito permite uma leitura mais ampliada da problemática habitacional, uma vez que possibilita identificar aspectos relacionados à qualidade da moradia.
Na Região Metropolitana de Natal, os Municípios de Parnamirim e São Gonçalo
do Amarante apresentam os maiores indicies relativos ao déficit habitacional, segundo
dados da Fundação João Pinheiro. Em 2010, a FJP indicava que o déficit habitacional
relativo da RMN estava estimado em 53.501 unidades, o que equivale a 14,74% da
quantidade total de domicílios particulares permanentes dessa região.
Tabela 4: Déficit Habitacional Total por faixa de rendimento (%) nos Municípios de
Natal, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante (2010).
Município
Déficit
Habitacional
(DH) Total
DH para
domicílios
com
rendimento
(0-3 SM)
DH para
domicílios
com
rendimento
(3-6 SM)
DH para
domicílios
com
rendimento
(3-6 SM)
DH para
domicílios
com
rendimento
(10 ou
mais SM)
Déficit
Habitacional
Relativo
Natal
64,90 62,46 62,05 74,16 76,88 14,70
Parnamirim 14, 59 15,97 11,49 12,13 12,15 12,90
São
Gonçalo
Do
Amarante
5,96 6,07 8,64 4,36 2,55 13,00
Fonte: Ferreira (2016), com base nos dados do Déficit habitacional Municipal do Brasil, 2010, Fundação João Pinheiro – Ministério das Cidades (2013). (Adaptado pela autora).
Para Silva et al (2015), nos municípios da RMN que possuem maior integração
com o polo Natal, respondem sozinhos por 54,31% do déficit habitacional relativo da
Página | 64
região. O que significa, em termos quantitativos, uma necessidade de incremento do
estoque de 13,67%. Analisando o déficit habitacional por intrafaixas, 62,3% (35.519) do
déficit na RMN situa-se na faixa de interesse social (0 a 3 salários mínimos). Natal
concentra sozinha quase 65,24% do déficit habitacional total, decorrente do passivo
existente no Município em termos de produção e/ou aquisição de unidades
habitacionais.
O quadro descrito anteriormente reflete não apenas o processo de elevação do
índice do déficit habitacional no espaço metropolitano, mas destaca, em particular, a
dificuldade das cidades de produzir habitação formal e bem localizada, em razão do
auto custo da terra decorrente da valorização do solo urbano.
Tabela 5: Déficit Habitacional por Município da RMN (2010).
MUNICÍPIOS % EM RELAÇÃO
AO DÉFICIT TOTAL
DÉFICIT RELATIVO
Arês - -
Ceará-Mirim 4,56 14,05
Extremoz 1,66 13,59
Ielmo Marinho - -
Goianinha - -
Macaíba 3,89 10,65
Monte Alegre 0,98 9,10
Maxaranguape - -
Natal 65,24 14,74
Nísia Floresta 0,95 7,89
Parnamirim 15,27 12,90
São Gonçalo do Amarante 5,99 13,05
São José do Mipibu 2,06 10,15
Vera Cruz 0,53 10,15
Total RMN 100,00 13,67
Fonte: Elaboração própria da autora, com base no Déficit Habitacional Municipal no Brasil 2010 (Fundação João Pinheiro/Ministério das Cidades, 2013). Obs.: Os dados ausentes são de cidades que ingressaram recentemente na RMN.
Página | 65
Com o lançamento do PMCMV, em 2009, diversos municípios da RMN aderiram
imediatamente ao Programa com o objetivo de diminuir o déficit habitacional, reassentar
favelas e atender, principalmente, ao mercado da construção civil e imobiliário. Houve
uma expansão da construção de empreendimentos e loteamentos, destinados para
todas as faixas de mercado no RN. Com isso, no Rio Grande do Norte, segundo dados
do Ministério das Cidades, até o ano de 2016 foram contratadas, em todas as Faixas
do Programa, cerca de 100.243 unidades habitacionais e, destas, 71.339 já foram
entregues, tendo sido investidos R$ 6,919 bilhões.
No que se refere a produção habitacional do PMCMV, entre os anos de 2009 a
2014, nas duas fases do Programa (Fase 1 e 2), foram contratados 370
empreendimentos (Faixa 1) em toda Região Metropolitana de Natal (FERREIRA, 2016).
Figura 2: Localização dos Empreendimentos do PMCMV por faixa e Fase na RMN.
Fonte: Ferreira (2016).
Página | 66
Dos municípios selecionados para esta investigação, de acordo com Ferreira
(2016), as cidades de Natal e Parnamirim concentram os maiores quantitativos de
empreendimentos na RMN por faixa de renda (Faixas 1, 2 e 3) e fase do referido
Programa. Em conjunto, os municípios de Natal e Parnamirim respondem por 48,38%
dos empreendimentos e 62,95% do total de unidades habitacionais em todas as fases
do Programa na Região Metropolitana de Natal. Para Ferreira (2016), estes dados
demonstram que estas cidades possuem uma dinâmica imobiliária mais intensa e um
mercado de habitação mais consolidado que favoreceu o alcance dos percentuais
relacionados à produção habitacional entre os anos de 2009 a 2014.
Em São Gonçalo do Amarante é possível observar que somente recentemente
que o município tem apresentado um avanço no setor imobiliário, devido a
implementação de projetos estruturantes do governo federal na cidade, como a
instalação do Aeroporto Internacional de São Gonçalo do Amarante, em 2014 e os
investimentos do PRODEUTUR – NE e investimentos do governo estadual em
infraestrutura vial, como revela Ferreira (2016). Além disso, os recursos do PMCMV
têm possibilitado o município alcançar avanços no setor imobiliário. Sobre este tema,
Ferreira (2016, p.182) revela que: “com efeito, o PMCMV contribuiu para desconcentrar
espacialmente a produção em relação aos ciclos imobiliários anteriores, assim como
para ampliar o espaço metropolitano periférico, abrindo novas frentes de expansão”.
Na tabela a seguir são apresentados os dados referentes ao total de
empreendimentos e unidades habitacionais contratados nos municípios selecionados
para esta investigação.
Tabela 06: Produção Habitacional Total (Empreendimentos e Unidades) do PMCMV
por Municípios estudados da RMN.
RECORTE TERRITORIAL
EMPREENDIMENTOS
UNIDADES
Natal 75 7.083
Parnamirim 104 13.471
São Gonçalo Do Amarante 72 4.030
TOTAL 251 24.584
Fonte: Ferreira (2016), com base nos dados do SIAFI – PMCMV/CEF (2015), 2016. (Adaptado pela autora).
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Para Silva et al (2015), os dados referentes à produção habitacional do PMCMV
indicam que, dos 370 empreendimentos contratados até 2014 cerca de 28,7% estão
localizados na Região Metropolitana de Natal, totalizando 32.651 unidades
habitacionais, representando 80,34% dos recursos, num total de investimentos federais
de R$ 1.135.010.915,35.
Com relação a produção habitacional do PMCMV na RMN, Bentes et al (2015,
p. 347) revelam que:
A produção do PMCMV na RMNatal, representou, entre outros um aumento de intensidade na produção da moradia social (faixa 1) e o reposicionamento do mercado imobiliário para os segmentos médios (faixa 2 e 3), atualmente na escala metropolitana, com efeitos na escala intraurbana. Tais efeitos de escala representam, ao mesmo tempo, a continuidade e o acirramento das tendências de ocupação do solo urbano (extensiva e intensivamente) pré-existentes, em especial nas áreas contiguas ao polo (Natal). Em primeiro plano, tais características podem sugerir inovação, originada pelo PMCMV nas características socioespaciais da RMNatal; entretanto, a presentes pesquisa compreender que, de fato, há dois sentidos aparentemente contraditórios dessa produção – por um lado, a intensidade referente à faixa 1, em municípios metropolitana, responde aos interesses de uma estrutura fundiárias herdada das etapas da segregação e da desigualdade, historicamente desenvolvidas na metrópole; por outro lado, aproximou o tema da moradia social dos grupos sociais mais vulneráveis, em espacial daqueles que estavam fora do mercado.
Tabela 7: Déficit Habitacional e a relação com a Produção PMCMV Faixa 1 nos
Municípios de Natal, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante (2013).
MUNICÍPIO
DÉFICIT
HABITACIONAL
(%) TOTAL
DÉFICIT
HABITACIONAL
(0 - 3 SM)
PRODUÇÃO
PMCMV (0 –
3 SM)
% PRODUÇÃO
EM RELAÇÃO
AO DÉFICIT
HABITACIONAL
(0 A 3 SM)
Natal
64,90 22.185 2.864 12,91
Parnamirim 14, 59 5.671 5.488 96,77
São
Gonçalo Do
Amarante
5,96 2.155 2.115 97,77
Fonte: Bentes (2015), com base nos dados da Caixa Econômica Federal – Base de Dados PMCMV, 2015. (Adaptado pela autora).
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De acordo com Ferreira (2016), com relação as unidades habitacionais da Faixa
1, os dados da CEF (2015) indicam que na RMN foram produzidas 15.143 habitações.
Quando comparados, Parnamirim e Natal apresentam os maiores índices de déficit
habitacional e também os maiores quantitativos de unidades habitacionais Faixa 1 do
Programa, respectivamente 5.488 (43,24%) e 2.864 (22,56%).
Para Bentes et al (2015), na RMN houve uma concentração de investimentos do
Programa nos Municípios de Parnamirim, Ceará-Mirim, Extremoz, São Gonçalo do
Amarante, Macaíba e Natal. Por serem as maiores cidades da RMN e por possuírem
um mercado imobiliário mais dinâmico, observa-se que os empreendimentos e
loteamentos de casas foram construídos em áreas periféricas, para atender,
principalmente, o setor da construção civil e imobiliário.
Figura 3: Espacialização dos Empreendimentos do PMCMV Faixa 1 na RMN.
Fonte: Ferreira (2016).
Como se pode observar na Tabela 5, abaixo, durante a primeira fase, do
Programa na RMN, que vai de 2009 a 2014, foram construídas 11.887 unidades e, na
segunda fase, que vai de 2014 até hoje, 16.397, somando 28.284 unidades
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habitacionais. Silva et al (2015) apontam que, das unidades habitacionais contratadas
na primeira fase na RMN, percebe-se uma maior produção na Faixa 1 do Programa.
Para esses autores, a principal explicação está relacionada ao fato de “[...] que os
empreendimentos destinados às famílias de interesse social são de grande porte, em
geral possuindo uma média de 281 unidades por empreendimento” (SILVA et al 2015,
p. 286).
Tabela 8: Quantidade de Unidades Produzidas por Faixa de Renda e Fase na RMN
até 2014.
FASES DO
PMCMV FAIXA DE RENDA DO PMCMV
Faixa 1 Faixa 2 Faixa 3 Total
PMCMV 1
7.018 3.549 1.320 11.887
PMCMV 2
3.734 11.106 1.557 16.397
TOTAL 10.752 14.655 2.877 28.284
Fonte: Bentes et al. (2015), com base nos dados da Caixa Econômica Federal – Base de Dados PMCMV, 2013. (Adaptado pela autora).
De acordo com Bentes et al (2015), a partir de uma análise comparativa entre as
duas fases do PMCMV, na fase 1 do programa houve um maior quantitativo de
empreendimentos construídos nas Faixas 1 e 2. Já na fase 2, houve uma redução do
número de unidades construídas nas Faixas 1 e 3 e um aumento significativo na Faixa
2 do Programa, conforme pode ser visualizado na Figura 2.
Os Municípios de Natal e Parnamirim concentraram 98,09% da produção
habitacional do Programa Minha Casa Minha Vida na Faixa 3. Para Bentes et al (2015,
p. 44), “a principal explicação para essa concentração é a existência de um mercado
imobiliário consolidado nesses municípios, o que favorece a oferta de produtos voltados
para famílias com rendimento de 6 a 10 salários mínimos”.
De acordo com Ferreira (2016), na RMN foram produzidos 370
empreendimentos, ou seja, totalizando 32.651 unidades habitacionais, até 2015. Entre
os municípios estudados (Natal, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante), somente a
cidade de Parnamirim, quantitativamente, conseguiu construir unidades habitacionais
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equiparados ao seu déficit habitacional em todas as faixas. Os demais municípios da
RMN não produziram um quantitativo superior ao déficit na faixa de 0 a 3 salários
mínimos.
Tabela 09: Quantidade de empreendimentos por Faixa 1, fases do PMCMV, nos
municípios estudados e na Região Metropolitana de Natal.
EMPREENDIMENTOS DO PMCMV FAIXA 1
MUNICIPIO
FASE 01 FASE 02 TOTAL
Natal - 13 13
Parnamirim 8 5 13
São Gonçalo Do Amarante 1 6 7
RMN 21 30 51
Fonte: Ferreira (2016), com base nos dados do SIAFI – PMCMV/CEF (2015), 2016. (Adaptado pela autora).
Nos municípios selecionados para a presente investigação, em Natal, a
contratação de unidades do PMCMV Faixa 1 aconteceu somente na fase 02 do
Programa. Dos 13 empreendimentos contratados em Natal (Residencial Vivendas do
Planalto I a VI, Residencial Morar Bem Pajuçara, Residencial São Pedro e o Complexo
Habitacional Village de Prata), apenas 5 foram entregues às famílias. Em 2014, foi
entregue o Vivendas do Planalto (I a IV), o qual está localizado no Bairro do Guarapes
(Zona Oeste), próxima ao assentamento Leningrado.
Em 2016, o município de Natal realizou o reassentamento11 de 200 famílias
oriundas das comunidades Maruim, Jacó e outras, que se encontravam no Programa
de Auxílio Moradia, para o empreendimento São Pedro, cujas obras fazem parte da
conjugação entre os Programas PAC e PMCMV (Figura 4). De acordo com informações
da SEHARPE, foi realizado todo o processo de preparo das famílias para as novas
habitações através do trabalho social.
O empreendimento Morar Bem Pajuçara conta com 176 apartamentos que estão
sendo construídos no Bairro de Pajuçara, Zona Norte de Natal. Porém, o residencial foi
11Em 2013, a Secretaria Municipal de Habitação e Regularização Fundiária realizou uma nova proposta
ao Ministério das Cidades e Caixa Econômica Federal, na qual se conjugou a Reurbanização da área ocupada da comunidade Maruim, com o Reassentamento das famílias para um Empreendimento do PMCMV, em terreno doado pela Prefeitura, no Bairro da Ribeira/Natal-RN.
Página | 71
invadido, em 2015, e desde então encontra-se em processo de reintegração de posse
e retomada das obras, pois a construtora responsável rescindiu contrato com a CEF.
Figura 4: Empreendimento São Pedro (PMCMV/Faixa-1), em Natal-RN.
Fonte: Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes, 2016.
Além disso, no Bairro do Guarapes (Zona Oeste), encontra-se em fase de obras
o Complexo Habitacional Village de Prata (Figura 4), com 1.792 apartamento. O
empreendimento terá 50% das unidades habitacionais destinadas ao reassentamento
das favelas do Cambuim, 8 de março e famílias remanescentes da favela do Alemão.
Durante a investigação, a Secretaria de Habitação de Natal ainda não tinha realizado o
sorteio de definição das famílias e não tinha iniciado o trabalho social com as famílias
da demanda fechadas. Na Figura 5 é possível observar as obras do complexo
habitacional Village de Prata, no Bairro do Guarapes:
Página | 72
Figura 5: Obras do Empreendimento Village de Prata (PMCMV/Faixa-1), em Natal.
Fonte: Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes, 2016.
Em todos os empreendimentos do PMCMV, no Município de Natal, o Programa
foi utilizado, fundamentalmente, como um instrumento para o amplo processo de
remoção de favelas na Capital. Ao total, através do PMCMV, em Natal foram
reassentadas 4 favelas (8 de outubro, Anatália, Monte Celeste, Maruim e famílias que
residiam em áreas de risco da Comunidade São José do Jacó). Ademais, a previsão é
a de que, nos próximos empreendimentos do Village de Prata e Morar Bem Pajuçara,
sejam removidas as favelas Cambuin, 8 de março, remanentes da favela do Alemão e
famílias da Comunidade África que são alvo do Programa de Mobilidade Urbana Pró-
Transporte, do Governo do Estado do RN.
O reassentamento de favelas para os condomínios verticalizados do PMCMV
Faixa1, reproduz um modelo em que o Estado não leva em consideração as
características socioeconômicas destas famílias e as relações com o território.
A remoção destas famílias para estes conjuntos habitacionais, em Natal, de certa
forma reproduziu o processo de segregação socioespacial, tendo em vista que a
maioria dos residenciais foram construídos na periferia da cidade, que apresenta graves
Página | 73
problemas de acesso à infraestrutura e aos serviços urbanos, não garantindo a
efetivação do direito à cidade e moradia às famílias beneficiárias.
A cidade de Parnamirim é a cidade que possui a maior quantidade de unidades
habitacionais contratadas no PMCMV na RMN, cerca de 56% nas duas fases do
Programa. Na Figura 5, é possível visualizar a espacialização dos empreendimentos
do PMCMV Faixa 1, em Parnamirim. No total, o Município recebeu 13
empreendimentos do Programa na Faixa 1, atendendo cerca de 21.952 pessoas. Sobre
isso, Silva et al, (2015, p. 286), comentando o crescimento anual da cidade afirmam
que:
Essa produção mantém estreita correlação com o próprio processo de crescimento do Município, pois, comparando os Censos de 2000 e 2010, verifica-se que dos municípios que integram a RMNatal, Parnamirim foi o que mais cresceu, tendo uma taxa de crescimento de quase 5% no período em tela.
De acordo com informações da Secretaria Municipal de Habitação e
Regularização Fundiária (SEHAB), como forma de incentivo à realização de parcerias
com a iniciativa privada, a Prefeitura encaminhou um projeto de lei à Câmara de
Vereadores de Parnamirim, com a proposta de isenção de Imposto Sobre Serviços
(ISS) e parcelamento do Imposto de Transmissão Intervivos (ITIV), durante o prazo da
obra, para os empresários da construção civil que tivessem interesse em construir na
cidade. Para as famílias beneficiárias com renda entre zero e três salários mínimos, o
benefício proposto foi a isenção do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) durante
10 anos e do ITIV, principalmente para o PMCMV Faixa 1.
Em relação ao Município de São Gonçalo do Amarante, para Bentes et al. (2015),
este vem passando por importantes transformações na sua dinâmica socioespacial e
econômica. Conforme os autores, estas transformações ganharam celeridade e
expressividade também em virtude dos investimentos decorrentes do PMCMV.
Segundo Bentes et al (2015, p. 73), “[...] têm contribuído para a continuidade da
dinâmica do setor habitacional iniciada com os investimentos do imobiliário turístico em
São Gonçalo do Amarante”.
Por outro lado, por estar localizado próximo à cidade do Natal, o Município tem
apresentado crescimento demográfico desordenado, consequência do
transbordamento da mancha urbana da capital do Estado sobre seu território. Esse
processo desordenado de uso e ocupação do solo tem gerado alguns problemas para
Página | 74
os dois municípios, principalmente, de ordem territorial, provocando a formação de
novas periferias e assentamentos precários.
Para enfrentar essa situação, em parceria com o Governo Federal, foi
construído, por meio do PMCMV, o empreendimento Jomar Alecrim, com 305 casas,
distante 2,5 Km da área central da cidade.
Além do empreendimento Jomar Alecrim, o Município também abriga duas
grandes obras do PMCMV. A Área de Interesse Social (AEIS) Padre João Maria e as
Dez, que segundo o Plano Diretor, está situada em uma zona isofônica (ruído), por
estar próxima ao Aeroporto Internacional Aluísio Alves, também é alvo de intervenções
do Programa. Através da conjugação do PAC e do PMCMV, cerca 344 casas foram
construídas para atender às famílias reassentadas da AEIS, cujas obras foram
custeadas com recursos do Governo Federal, da ordem de R$ 29 milhões (Figura 6).
Figura 6: Obras do Empreendimento Padre João Maria e as Dez (PMCMV/ PAC), em
São Gonçalo do Amarante/RN.
Fonte: Prefeitura Municipal de São Gonçalo do Amarante, 2016.
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Ainda para atender às necessidades habitacionais do Município, em 2013, o
Ministério das Cidades aprovou a contratação de 1.800 unidades habitacionais através
do PMCMV (Faixa 1). Composto por 6 conjuntos residenciais de 300 apartamentos, o
Residencial Ruy Pereira, atualmente, é o maior empreendimento habitacional do Rio
Grande do Norte. A construção do Residencial Ruy Pereira ainda não supre as
necessidades habitacionais do Município, pois a cidade de São Gonçalo do Amarante
encontra-se em elevado processo de crescimento, conforme relato da Coordenadora
do PMCMV da SEHAB:
[...] que até, então, ainda é pouco para o déficit habitacional. Porque nós somos uma região metropolitana que cresceu muito e que está crescendo muito! Antes éramos uma cidade dormitório, hoje nós não somos mais, porque está vindo muitas empresas. Veio o aeroporto, agora está vindo o Açaí, está vindo o Hiper Queiros. Então assim, SGA vai ser um polo industrial muito forte, aqui na Região Metropolitana. As pessoas estão vindo habitar, porque moram perto do trabalho, é até uma sugestão própria do empresário, a questão da demanda de moradia. Então assim, na hora que você abre uma empresa, os trabalhadores precisam morar próximo ao trabalho, então o déficit habitacional do Município vai aumentar. Então a gente, temos o maior empreendimento do RN, que está em fase de construção (Coordenadora do PMCMV da SEHAB, em São Gonçalo do Amarante, setembro de 2016).
Os dados apresentados revelam um panorama geral sobre as características do
PMCMV Faixa 1 na RMN, ao qual está relacionado, principalmente, como atendimento
ao setor imobiliário e à construção civil, o enfrentamento do déficit habitacional e as
necessidades dos municípios de reassentar populações de assentamentos precários,
com ampla repercussão sobre a estruturação do espaço urbano e metropolitano.
No entanto, esta dinâmica de construção de novas moradias pelo PMCMV, como
dimensionam Silva et al (2015) está levando a expansão urbana “sem urbanidade”. Isso
significa que existe uma baixa cobertura de infraestrutura urbana, com ausência de
equipamentos sociais, como escolas, creches, postos de saúde, segurança pública e
transporte público nas áreas que estão sendo ocupadas pelos beneficiários do
Programa. Silva et al (2015, p. 265) revelam que esses processos de espraiamento das
novas manchas urbanas apresentam:
[...] ao mesmo tempo em que se verifica uma expansão da metrópole pela produção de solo semiurbanizado (na maior parte das vezes apenas com abastecimento de água e eletrificação), dispersando a metrópole, recrudesce o quadro da inadequação habitacional nas áreas internas a Natal e periféricas à metrópole.
Página | 76
Para Moura (2014), a construção dos empreendimentos Faixa 1 do PMCMV na
RMN aponta para uma crescente expansão da periferia metropolitana, o que está
relacionado, inicialmente, com a indisponibilidade de áreas de baixo custo para os
investimentos imobiliários deste porte. De acordo com Bentes et al. (2015, p. 14),
quando se trata das intervenções do Programa, os autores destacam que “essas
intervenções atuam de modo a reforçar a centralidade de Natal como polo
metropolitano, enquanto o PMCMV evidencia um movimento de reforço aos processos
de fragmentação do espaço urbano, com expansão das periferias”. Em síntese, o
PMCMV tem muitos impactos sociais e econômicos na RMN, principalmente no que se
refere às dinâmicas de produção e consumo de moradia. Todavia, após sete anos de
sua criação, o Programa se tornou a única forma de intervenção habitacional em
contexto local.
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4 Análise do Trabalho Social no
Programa Minha Casa Minha Vida na
RMN.
O presente capítulo tem por objetivo investigar como se encontra o trabalho
social no âmbito do PMCMV/FAR, na Região Metropolitana de Natal, apontando os
principais dificultadores para sua execução ou facilitadores de sua efetividade.
Inicialmente, serão abordados os resultados da investigação do trabalho social do
PMCMV Faixa 1, apontando como se deu o processo de seleção e hierarquização das
famílias beneficiárias e o trabalho social pré/pós-ocupacional do PMCMV na RMN. Será
analisado como a gestão condominial dos empreendimentos tem apresentado
fragilidades na sua execução e como o trabalho social tem atuado nesta problemática.
Para a realização deste estudo, optou-se por fazer um recorte espacial,
considerando três municípios pertencentes à Região Metropolitana de Natal (Natal,
Parnamirim e São Gonçalo Amarante), focalizando os seguintes empreendimentos: o
Residencial Vivendas do Planalto I, II, III, IV, na cidade do Natal (Capital); o Residencial
Ilhas do Atlântico, em Parnamirim e, por fim, o Residencial Ruy Pereira, no Município
de São Gonçalo do Amarante.
4.1 Trajetória do Trabalho Social no Empreendimento Vivendas do
Planalto (I a IV) em Natal.
Os Residenciais Vivendas do Planalto I, II, III e IV, construídos com recursos do
PMCMV Faixa 1, foram inaugurados em 2014 no Bairro do Guarapes, Zona Oeste de
Natal (Figura 6). A Região Administrativa Oeste, onde eles estão situados, é a segunda
zona mais populosa do Município, com 218.405 habitantes (IBGE, 2010), o que
equivale a 27,17% da população da cidade de Natal, sendo também a segunda maior
área territorial. Possui o maior quantitativo de assentamentos precários existentes na
capital, totalizando 31, de um universo de 70, reconhecidos oficialmente pela Prefeitura.
O local onde está situado o empreendimento é caracterizado pela existência de
vazios urbanos, formados por grandes porções de glebas. De acordo com Bentes et al
Página | 78
(2015), a área recebeu projetos de urbanização integrada12, com recursos do PAC, para
reassentar famílias que residiam em áreas de risco, sobretudo, nos bairros Planalto e
Guarapes.
Figura 7: Localização do Empreendimento Vivendas do Planalto
(I a IV).
Fonte: Google Maps, 2017. Elaboração própria da autora.
O Residencial Vivendas do Planalto I a IV é composto por 4 empreendimentos
contíguos, cuja tipologia é do tipo condomínio verticalizado aberto. Cada
empreendimento possui 224 apartamentos, totalizando 896 unidades habitacionais e
uma população estimada de 3.584 habitantes.
12 No âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC I), foi realizado o Projeto Habitacional
Planalto/DETRAN. Segundo a SEHARPE, o Projeto Planalto II reassentou comunidades em situação de risco localizadas em diversos bairros da cidade e que se contavam com ações judiciais. Assim, foram reassentados 06 assentamentos precários: Via Sul, Luiz Gonzaga (conhecida como Sopapo), Alagamar, Pião, 8 de Outubro e parte do assentamento DETRAN.
Página | 79
O valor destinado de repasse do Ministério das Cidades previsto para a
execução do trabalho social nos quatros residenciais foi da ordem de R$ 672.000,00
reais, ou seja, para cada empreendimento, o valor do Projeto de Trabalho Social (PTS)
é estimado em R$ 168.000,00 (repasse). Em contrapartida, a Prefeitura utilizou
recursos próprios que são mensurados no quadro de composição de custos do PTS.
No total, foram investidos pelo Governo Federal, na construção do residencial, R$
44.800.000,00 (Tabela 10).
Tabela 10: Informações do Residencial Vivendas do Planalto I a IV.
EMPREENDIMENTO
UNIDADES VALOR (R$) CONSTRUTORA
VALOR (R$)
TRABALHO
SOCIAL
Vivendas do
Planalto I
224 11.200.000,00 Tecnart Engenharia
Comércio e
Indústria LTDA
168.000,00
Vivendas do
Planalto II
224 11.200.000,00 Zeta Engenharia
168.000,00
Vivendas do
Planalto III
224 11.200.000,00 Marco Engenharia
e Consultoria
LTDA
168.000,00
Vivendas Do
Planalto IV
224 11.200.000,00 Construtora Monte
Neto 168.000,00
Total 896 44.800.000,00 - 672.000,00
Fonte: Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes.
Elaboração da autora.
De acordo com as informações da Secretaria Municipal de Habitação,
Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes (SEHARPE), cada apartamento tem
uma área interna de 43,18 m² com sala, dois quartos, banheiro social, hall e cozinha
conjugada com área de serviço; área frontal para estacionamento e local para depósito
de lixo (Figura 8). Dos 896 apartamentos, 96 unidades habitacionais possuem uma área
de 47,16 m², por serem adaptadas e destinadas a famílias com pessoas com deficientes
(principalmente cadeirantes). Na parte central do empreendimento, com uma área total
de 4.000 m², foi construído um centro comunitário, além de uma praça urbanizada, com
diversos equipamentos comunitários, como quadra poliesportiva, playground,
academia ao ar livre, áreas arborizadas e o centro comunitário (Figura 9).
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Figura 8: Foto (a) Tipologia do Empreendimento Vivendas do Planalto; Foto (b) Blocos
de Apartamentos.
(a) (b) Fonte: foto (a): Marcelo Barroso; foto (b): http://www.marcoengenharia.com.br/vivendas-do-planalto
Figura 9: Equipamentos Comunitários do Residencial Vivendas do Planalto (Quadra
Poliesportiva e Academia ao Ar Livre).
(a) (b) Fonte: Foto (a): http://www.marcoengenharia.com.br/vivendas-do-planalto, Foto (b): Prefeitura do Natal, 2014.
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Segundo dados do Censo 2010 (IBGE), o setor censitário onde está localizado
o Residencial Vivendas do Planalto (I a IV) possuía 701 domicílios particulares
permanentes. Com a implantação deste empreendimento na região, houve um
incremento na quantidade de domicílios, passando de 701 para 1.587, mais que o
dobro, conforme Bentes et al (2015). A área onde está situado o residencial possui
elevado percentual de inadequação de infraestrutura quando comparado com a média
verificada no Bairro do Guarapes. Diferentemente do restante da localidade, o
empreendimento ainda conta com infraestrutura de vias e acessos, abastecimento de
água, captação e drenagem de águas pluviais, além de praça urbanizada com diversos
equipamentos comunitários.
Por ser um programa habitacional de construção de moradias em grande escala,
em muitas ocasiões, nos empreendimentos do PMCMV Faixa 1, a qualidade da obra
revela uma lógica de produção na qual as empresas buscam, ao máximo, racionalizar
a gestão dos canteiros, diminuir os tempos da obra, além de reduzir os custos com os
materiais de construção. No Residencial Vivendas do Planalto não foi diferente, já que
os condomínios foram entregues às famílias com vários problemas de vícios de
construção, apresentando diversas patologias construtivas, principalmente nas paredes
e pisos, desde o momento da entrega das chaves.
Durante as visitas de campo ao residencial, foi identificado que a maioria dos
condomínios possui graves problemas de esgotamento sanitário, pois as residências
foram construídas com o sistema de fossas sépticas e algumas delas apresentam
defeito estrutural, não comportando o volume de dejetos de todos os apartamentos.
Isso acaba ocasionando infiltrações e entupimentos constantes, prejudicando a saúde
das famílias moradoras.
Segundo relatos dos moradores (titulares), a CEF já havia sido notificada quanto
aos problemas de vícios de construção e os defeitos estruturais nas fossas sépticas.
No entanto, não obtiveram respostas positivas para a solução destes problemas.
Recentemente, a área foi alvo do Projeto de Saneamento Básico do Governo do Estado
do RN, mas não foram realizadas as ligações intra-domiciliares dos apartamentos ao
sistema de esgotamento sanitário. Assim, os moradores estão fazendo ligações
clandestinas, conforme relato abaixo:
As fossas estão todas cheias, estamos fazendo ligação clandestinas! Porque já passou o saneamento, mais as fossas estão todas cheias, porque eles
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fizeram o saneamento, mas não fizeram as ligações. Então, estamos fazendo clandestinos, porque ninguém vai ficar morrendo com esse cheiro ruim! (Morador do Residencial Vivendas do Planalto, novembro de 2016).
Na Figura 10, é possível visualizar a espacialização dos equipamentos públicos
na região e sua distância do empreendimento. No entanto, o residencial encontra-se
em uma localização periférica em relação às áreas centrais do Município de Natal. Para
Bentes et al. (2015, p. 108) isso vem
[...] evidenciando graves problemas de acesso aos serviços e equipamentos urbanos pelos moradores. Para além de uma Escola de ensino fundamental localizada nas proximidades do Conjunto, não foi identificado nenhum outro serviço e equipamento urbano na área.
Figura 10: Mapa da Espacialização dos Equipamentos Públicos Existentes no
Entorno do Empreendimento Vivendas do Planalto.
Fonte: Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes. 2013.
Em relatos dos moradores, a falta de acesso à infraestrutura urbana é um dos
grandes dificultadores para o alcance da garantia do Direito à Cidade e à inserção
urbana das famílias. Com uma população estimada de 3.584 habitantes, do ponto de
vista da escala, segundo os dados do Observatório das Metrópoles, o empreendimento
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apresenta uma densidade demográfica de 497,77 hab./km ². Para Bentes et al (2015,
p. 108): “esse porte, possibilitado pela estratégia de contiguidade na implantação das
diferentes etapas, quando relacionado à precariedade da infraestrutura urbana, agrava
os problemas de inserção urbana do Conjunto”.
Mesmo após três anos de ocupação, o empreendimento continua apresentando
diversos problemas relacionados ao acesso aos equipamentos públicos e precariedade
da infraestrutura urbana, com o problema de transporte, pois a área conta apenas com
duas linhas de ônibus. Isso dificulta o acesso dos moradores a outras partes da cidade.
4.1.1 Seleção dos Beneficiários do Vivendas do Planalto I a IV.
Uma parte importante da implementação do trabalho social pré-ocupação está
relacionada às etapas de seleção e hierarquização das famílias, definidas pela Portaria
021/2014. Na fase que antecede a entrega das unidades habitacionais, o trabalho social
é uma estratégia importante na condução da seleção e definição das famílias. Segundo
a SEHARPE, os beneficiários do Residencial Vivendas do Planalto I a IV foram
definidos com base nas diretrizes do Ministério das Cidades, através da Portaria Nº
610, de 26 de dezembro de 2011, cuja normatização dispõe sobre os parâmetros de
priorização e o processo de seleção dos beneficiários do PMCMV.
Todo o processo de cadastramento, seleção, hierarquização e habilitação, tanto
da demanda aberta13 (sorteados), quanto da fechada14 (assentados), no âmbito do
Município, ficou sob a responsabilidade da SEHARPE, com execução e gestão
vinculada ao Departamento de Ação Social e Projetos Especiais (DASPE). Neste
sentido, a Técnica Social da Secretaria de Habitação responsável pelo trabalho social
do Vivendas (I a IV) nos informou que:
13Demanda aberta dos empreendimentos do MCMV no âmbito do Fundo de Arrendamento Residencial
(FAR) deve ser selecionada a partir de cadastro público efetuado pelo Município, Distrito Federal ou Estado, nas condições estabelecidas pela Portaria do Ministério das Cidades Nº 595/2013 (BRASIL, 2014).
14 A demanda fechada dos empreendimentos do PMCMV é identificada previamente no momento da
contratação no âmbito do Fundo de Arrendamento Residencial (FAR). Ou seja, até 50% das unidades produzidas no município podem ser destinadas a “um grupo de famílias provenientes de um mesmo assentamento irregular, em razão de estarem em área de risco, terem sido desabrigadas por motivo de risco ou outros motivos justificados em projetos de regularização fundiária e que tiverem que ser realocadas” (BRASIL, 2011, p.2).
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O Programa no Município de Natal, os apartamentos foram definidos via sorteio! Foi construído o banco de dados do sistema do PMCMV. Então, o sorteio para demanda aberta se dá via inscrição, mas a demanda fechada também tem que está inscrito e a partir desta inscrição é que é feito todo o processo de habilitação (Responsável Técnica Social do Vivenda do Planalto I a IV, outubro de 2016).
Figura 11: Mapa das Áreas de Risco e Assentamentos Precários do Entorno do
Empreendimento Vivendas do Planalto.
Fonte: Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes, 2013.
Os moradores são originários de dois grandes grupos identificados como
sorteados (demanda aberta) e assentados (demanda fechada, limitada a 50% do total
de unidades habitacionais do empreendimento), conforme deliberação do Conselho
Municipal de Habitação de Interesse Social de Natal/RN (CONHABINS)15.
15 Resolução CONHABINS N° 005/2014, de 14 de fevereiro de 2014. “Art. 1° - Fica retificado para até
50% (cinquenta por cento) o percentual para atendimento a famílias a serem beneficiadas, em cumprimento ao disposto nos itens 3.3, 3.3.1 e 3.3.2 da Portaria n° 595/2013 do Ministério das Cidades, para o Empreendimento Vivendas do Planalto I, II, III e IV.
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Para se chegar à definição dos assentamentos a ser erradicados, a SEHARPE
identificou um total de 12 ocupações irregulares (Planalto, Urubu, Sitio Guarapes, Alto
do Guarapes, Alta Tensão, Fio, Alemão, Barreiros, Anatália, 08 de Outubro, Monte
Celeste e 08 de Março) localizadas num raio de 2,5 km do Empreendimento (Figura
11).
Além dos critérios da Portaria do Ministério das Cidades, Nº 610/2011, vigente à
época, considerou-se, juntamente com o Conselho, alguns critérios locais que
nortearam a análise e escolha dos assentamentos precários, sendo eles: maior tempo
de existência do assentamento; elevados níveis de insalubridade/risco; observância ao
critério de territorialidade; nenhuma intervenção anterior; existência de demanda
judicial; não inserção em outros projetos. Por fim, depois da análise destes critérios, a
SEHARPE, conjuntamente com o Conselho, definiu os seguintes assentamentos
precários a serem reassentados no empreendimento Vivendas16: Monte Celeste (115
famílias), 08 de Outubro (133 famílias) e Anatália (240 famílias). Nas figuras, a seguir,
é possível visualizar os assentamentos precários reassentados no Residencial
Vivendas do Planalto:
Figura 12: Foto (a) Vista Aérea do Assentamento Precário 08 de Outubro; Foto (b):
Habitações da Comunidade 08 de Outubro.
(a) (b) Fonte: Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes, 2013
16 Resolução CONHABINS N° 015/2013, de 19 de julho DE 2013. “Art. 1° - Aprovar a indicação dos
Assentamentos Precários denominados Monte Celeste e 8 de Outubro e Anatália como beneficiários do empreendimento Vivendas do Planalto I, II, III e IV [...]”.
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Figura 13: Foto (a) Vista Aérea do Assentamento Precário Anatália, Foto (b): Registro
Fotográfico das Habitações da Comunidade Anatália.
(a) (b) Fonte: Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes. 2013.
Figura 14: Foto (a) Vista aérea do Assentamento Precário Monte Celeste, no detalhe
em Amarelo; Foto (b): Registro fotográfico da favela Monte Celeste.
(a)
(b)
Fonte: Secretaria Municipal de Habitação, Regularização Fundiária e Projetos Estruturantes, 2013.
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Definidos os assentamentos precários, a Secretaria de Habitação de Natal, em
2013, contratou uma empresa de consultoria especializada para realizar o
congelamento e o selamento dos imóveis de todos os assentamentos. Esta etapa
consiste em realizar um diagnóstico socioterritorial das favelas com o objetivo de se
obter informações sobre as condições de vulnerabilidade social e habitabilidade, sobre
o perfil das famílias, assim como cadastrar todos os imóveis dos moradores. De acordo
com o Manual de Instruções do Trabalho Social (BRASIL, 2014, p.31):
O cadastro é atividade in loco que se faz para a identificação e o registro dos moradores do território que serão afetados pelo projeto habitacional. Esse processo é constitutivo do diagnóstico social. Mas não é só! É um processo estratégico no estabelecimento de relações de proximidade, de acolhimento dos moradores e apresentação da proposta de intervenção habitacional.
Durante a fase de seleção das famílias, a Caixa Econômica Federal tem um
papel fundamental na análise e habilitação dos moradores. Como gestora dos recursos
do Governo Federal, a CEF possui a responsabilidade de realizar a análise financeira
de todos os beneficiários. Em relação a isso, a Técnica Social da SEHARPE informou
que “o acompanhamento da CEF foi na parte da análise, o que cabe a ela na parte da
análise financeira do processo de habilitação das famílias [...]”.
Segundo aquela mesma Técnica Social, durante todo o processo de habilitação
dos beneficiários, após o congelamento dos imóveis17, houve diversas denúncias ao
Ministério Público sobre beneficiários que não residiam nos assentamentos e que
possuíam residências em outras localidades ou de falsas coabitações de famílias que
mentiam para receber uma unidade habitacional. Assim, todas as famílias eram
acompanhadas por uma Equipe Técnica Social (Assistentes Sociais) que realizava
visitas domiciliares com o objetivo de averiguar todas as denúncias de falsas
coabitações, de famílias que não residiam nas comunidades ou que possuíam outros
imóveis.
Segundo informações colhidas junto ao DASPE, cada participante concorreu
com um número de inscrição recebido quando de sua efetivação no Banco de
Cadastrados do PMCMV no Município. As inscrições eram realizadas na página do
17 A partir de visitas e entrevistas a todas as residenciais que serão alvo de algum projeto urbano, o
“congelamento” ou a “selagem” da área é um mecanismo utilizado para se controlar o número de famílias beneficiadas, tentando restringir um aumento de adensamento da favela, o que provavelmente prejudicaria a implementação de um projeto (ABIKO E COELHO, 2009).
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PMCMV no site da Prefeitura de Natal ou na própria sede da Secretaria de Habitação.
É importante ressaltar que a Cidade de Natal é um dos poucos Municípios da RMN que
possui um banco de dados de inscrições do PMCMV informatizado, cujas inscrições
podem ser atualizadas ou realizadas virtualmente.
Em agosto de 2013, foi realizado um sorteio, através da extração da Loteria
Federal, do qual participaram todas as pessoas inscritas no banco de dados do
PMCMV18. A partir do sorteio, com base nos critérios nacionais19 e locais20,
normativamente previstos, foram feitas a pré-seleção, a hierarquização e a composição
dos grupos de candidatos (titulares e reservas).
Figura 15: Percentual da Origem das Demandas Fechada (assentamento) e Aberta
(sorteio) do Residencial Vivendas do Planalto I a IV.
Fonte: Cadastro único e Banco de Cadastrados PMCMV-Natal.
18 A metodologia de seleção foi publicada na Portaria 031/2013, de 19 de julho de 2013 da SEHARPE.
19 De acordo com a Portaria 610/2011 do Ministério das Cidades, os critérios nacionais para seleção das
famílias foram: a) famílias residentes em áreas de risco ou insalubres ou que tenham sido desabrigadas; b) famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar e c) famílias das quais façam parte pessoas com deficiência.
20 Para complementar os critérios nacionais, o Conselho de Habitação de Natal, em abril de 2013, definiu
os seguintes critérios locais (Resolução CONHABINS N° 003/2013, de 15 de abril de 2013), para a seleção da demanda aberta: a) famílias com renda per capita igual ou inferior a R$ 70,00 reais; b) territorialidade (considerados os endereços localizados em um raio de 2,5 km do empreendimento); c) filho menor de 18 anos.
54%
16% 16%14%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
Sorteio Assentamento 8 deOutubro
Assentamento Anatália Assentamento MonteCeleste
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O primeiro grupo foi composto por candidatos com cinco a seis critérios de
classificação (75% das vagas). Já o segundo grupo formado por candidatos por até
quatro pré-requisitos (25% das vagas). Além dos grupos formados por idosos e pessoas
com deficiência. Depois de aprovados em todas as etapas, os candidatos sorteados
foram habilitados a participar do sorteio das unidades habitacionais e posterior
assinatura de contrato de financiamento com a CEF. Após a definição das famílias
beneficiárias, o Residencial Vivendas do Planalto ficou constituído por 54% de famílias
oriundas de sorteio e 46% de famílias provenientes de assentamentos precários (Figura
15).
Segundo a SEHARPE, 35% das famílias são originarias do Bairro do Guarapes,
18% pertenciam ao Bairro de Planalto e 17% do Bairro de Felipe Camarão. Estes dados
revelam que a maioria dos beneficiários do Programa tinha a sua anterior moradia na
Zona Oeste de Natal, em função do critério local de “territorialidade”.
No que se refere às características dos titulares dos apartamentos, cerca de 83%
são mulheres e apenas 17% corresponde ao sexo masculino. Essa informação
evidencia a importância de as mulheres responderem pela maioria das escrituras no
PMCMV. O próprio Programa da prioridade para que as mulheres chefes de famílias sejam as
titulares dos imóveis. De acordo com o Governo Federal, atualmente, as mulheres são
proprietárias de 89% das moradias do PMCMV (Faixa 1).
4.1.2 Trabalho Social de Pré e pós-ocupação Condominial no Vivendas do
Planalto I a IV.
O trabalho social pré e pós-ocupação tem sua importância revelada quando um
empreendimento do PMCMV possui uma diversidade de realidades sociais de famílias
que possuem um histórico de exclusão social e que necessitam de acompanhamento
do TS. Em 2014, o Residencial Vivendas do Planalto recebeu inúmeras famílias
oriundas de assentamentos precários e sorteio.
A pesquisa identificou que na etapa que antecedeu a entrega das unidades
habitacionais a Secretaria de Habitação de Natal realizou o trabalho social pré-
ocupacional, principalmente com as famílias dos assentamentos precários, e, apesar
de não ter formulado o PTS-P e enviado à CEF, a SEHARPE desenvolveu atividades
referentes a esta etapa. Quando foi questionada sobre o trabalho social pré-ocupação,
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a Responsável Técnica Social do Residencial Vivendas do Planalto informou que:
Nós fizemos o trabalho com as famílias que eram demanda fechada (assentamento), a parte de cadastramento, de acompanhamento, de orientação. Então, toda essa parte de orientação das famílias do cadastramento até mesmo a questão de documentação nós acompanhamos (Responsável Técnica Social do Residencial Vivenda do Planalto I a IV, outubro de 2016).
Uma realidade constada em diversos Municípios do país é à baixa capacidade
administrativa das Secretarias de Habitação em formular e implementar políticas
públicas de habitação de interesse social. Durante a investigação, foi possível observar
que, no Município de Natal, fatores como a falta de uma equipe Técnica mais completa,
as limitações da infraestrutura e de capacitação administrativa e de planejamento da
Secretaria de Habitação são apontadas como alguns dos dificultadores para a
execução do trabalho social dos empreendimentos habitacionais.
De acordo com informações da Responsável Técnica Social do Residencial
Vivendas, na época que antecedeu a entrega do empreendimento, em 2013:
A equipe sempre foi muito reduzida, principalmente nessa época da implementação do trabalho no Vivendas do Planalto. [...] éramos apenas três Assistentes Sociais na época e precisamos fazer parceria com a Casa do Menor Trabalhador para poder contratar jovens que pudessem nos auxiliar nesse processo de habilitação das famílias, na parte de recebimento da documentação (Responsável Técnica Social do Residencial Vivenda do Planalto I a IV, outubro de 2016).
Apesar dessa situação, o DASPE realizava acompanhamento das famílias
através de atendimentos técnico-sociais, visitas domiciliares e reuniões com os líderes
comunitários das favelas. Para a Técnica Social, o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas
e Favelas (MLB) foi um parceiro importante na condução do trabalho social pré-
ocupacional com as famílias dos assentamentos, conforme relato:
O MLB foi um aliado importante no processo. Porque nós tínhamos as três comunidades a serem reassentadas. Teve também a líder comunitária Dona Fátima, que era do Monte Celeste que já não era uma relação tão amistosa, era uma relação bem mais conflituosa, mas, de um modo geral, nós temos uma boa relação de trabalho com os movimentos sociais (Responsável Técnica Social do Residencial Vivenda do Planalto I a IV, outubro de 2016).
O MLB atuava como forte articulador entre a instituição e os beneficiários do
Programa. Nos assentamentos liderados pelo MLB (8 de Outubro e Anatália), havia
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uma forte integração comunitária, diferentemente do Monte Celeste, onde havia
desarticulação da comunidade e resistência entre as famílias moradoras, sendo isso
dificultador na atuação da equipe social da Prefeitura. Apesar dos conflitos existentes,
a Prefeitura de Natal tenta manter uma boa relação com os movimentos sociais de luta
pela moradia existentes na Capital, conforme descrito pela Técnica Social do Vivendas
do Planalto.
Os conflitos, eles existem, embora a Prefeitura tenha uma boa relação com o MLB, mas são muitos conflitos de ordem que saem do coletivo, tratam de algumas questões específicas dentro do assentamento, como as questões políticas e visões dentro do próprio da própria comunidade. A Prefeitura tem um diálogo que acaba sendo favorável com aos movimentos sociais. Então isso, facilita no momento da execução do trabalho social nas comunidades que foram reassentadas (Responsável Técnica Social do Residencial Vivenda do Planalto I a IV, outubro de 2016).
Como se percebe no caso estudado, a existência de movimento sociais
previamente organizado tem contribuído para facilitar o desenvolvimento do trabalho
social nos projetos de habitação, pois esses acabam estabelecendo uma colaboração
com os técnicos responsáveis por esta tarefa. Contribuem também para evitar que o
vácuo institucional seja preenchido por organizações ligados ao crime. Foram relatadas
situações inclusive, nas quais esses movimentos organizados montaram esquemas de
segurança para evitar a invasão dos apartamentos e o domínio pelo tráfico de droga.
Muitas ocasiões, as famílias organizadas pelo MLB faziam plantões de vigílias com o
tal objetivo.
Em relação ao trabalho social com as famílias da demanda aberta, a SEHARPE
realizou poucas atividades, segundo relatos dos morardes (sorteados). Foram
realizados apenas atendimentos sociais (quando eram necessários), operacionais
(montagem de dossiês) e, nas reuniões de sorteio dos apartamentos, as assinaturas
contratos e a entrega das chaves dos apartamentos.
Com relação à participação das famílias durante todo o processo de recebimento
das unidades habitacionais, foi realizado um trabalho mais participativo com as famílias
de assentamentos, com reuniões e assembleias. Além disso, o próprio MLB era
integrante do Conselho Municipal de Habitação de Interesse Social e havia a
participação das famílias do assentamento mobilizadas pelo movimento nas reuniões
do Conselho.
No entanto, não havia uma maior participação das famílias oriundas de sorteio.
Isto se deve ao fato de que a Secretaria de Habitação não fomentava a participação
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destas famílias. Os primeiros contatos com essas famílias ocorreram apenas no
processo de montagem de dossiês. E depois nas reuniões de sorteio de definição dos
endereços, na assinatura dos contratos e entrega das chaves dos apartamentos. No
que se refere a participação das famílias, a Técnica Social informou que:
A participação da demanda aberta é uma demanda bem direcionada, porque são selecionados, já vem direcionado para a questão da entrega de documentação, para saber se realmente o sorteado vai ser habilitado ou não, porque ele entra no processo de habilitação do Programa. Então é bem mais simples a questão da participação. Porém, a questão do reassentamento das famílias da demanda fechada, ela se torna bem mais complexa. Então, a gente faz o trabalho social com a comunidade, fazemos reunião com elas. Damos as orientações necessárias com relação a essa nova mudança para esse empreendimento (Responsável Técnica Social do Residencial Vivenda do Planalto I a IV, outubro de 2016).
No depoimento dos moradores, é possível observar que existe um sentimento
de descaso com as famílias, pois em nenhuma parte do processo elas foram
convidadas a participar da construção do PTS ou de outras etapas do processo. Um
morador afirmou:
A gente que era de sorteio éramos desprezados. A CAIXA abandonou nós! Só teve uma reunião da CAIXA, que foi no dia de assinar os contratos. Antes de entregarem, eles fizeram uma reunião aqui! Porque veio prefeito, vereador; veio só por boniteza. Só veio nesse dia e pronto. Falaram no dia de assinatura dos contratos que com um mês iriam fazer fiscalização nos apartamentos. Até hoje, nada! Vai fazer 2 anos que estamos aqui e eles nunca vieram! (Morador do Residencial Vivendas do Planalto, novembro de 2016).
Como se ver, o trabalho social nestes empreendimentos é precário ou até
inexistente. A maior parte das famílias é praticamente “jogada”, sem qualquer
acompanhamento nas unidades habitacionais. Enquanto isso, políticos da localidade,
aproveitam-se para fazer atos políticos na entrega dos apartamentos, com objetivos
eleitorais, sem, no entanto, terem qualquer compromisso com as famílias no sentido de
melhorar a infraestrutura e os serviços públicos nos bairros onde estes estão instalados.
Após a etapa do trabalho social preliminar, o Município tem a responsabilidade
de acompanhar as famílias no trabalho social pós-ocupacional, em conformidade com
a Portaria N° 021/2014. As primeiras mudanças das famílias e a erradicação dos
assentamentos precários ocorreram em maio de 2014.
O trabalho social pós-ocupacional do Vivendas não foi efetivo e permeado de
conflitos. Por alguns meses, a SEHARPE desenvolveu um plantão social no Centro
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Comunitário do empreendimento, com assistentes sociais e estagiários. O plantão tinha
como objetivo principal o atendimento técnico social individualizado, auxiliando as
famílias nas mudanças, ou seja, ser um ponto de apoio para o processo de adaptação,
assim como esclarecer possíveis dúvidas quanto às regras do Programa e de
convivência e realizar a troca das chaves dos apartamentos.
Figura 16: Foto (a) Registro Fotográfico da Mudança no Assentamento Anatália; Foto
(b) Chegada das Famílias no Residencial Vivendas do Planalto.
.
(a) (b)
Fonte: Prefeitura de Natal, 2014.
Por diversos fatores, a SEHARPE não conseguiu dar continuidade ao trabalho
social pós-ocupacional no empreendimento. Para a Técnica Social Responsável, houve
muitos fatores que foram determinantes para a precariedade do trabalho social. Como
já foi citado, o Residencial Vivendas do Planalto recebeu o reassentamento de 3
comunidades. Junto com a mudança das famílias, o novo residencial também foi
cenário de muita violência, disputa de território pelo tráfico de drogas, homicídios,
invasão de apartamentos e roubos. Pela falta de segurança pública na região, diversas
famílias foram alvos da constante violência.
Nos primeiros meses, após a ocupação do empreendimento, diversos
apartamentos foram ocupados irregularmente ou roubados, pois havia uma milícia que
invadia os apartamentos e falsificava os contratos da CEF para vender a terceiros. Para
a SEHARPE, a Prefeitura não possui nenhuma responsabilidade sobre este assunto,
pois a Caixa Econômica Federal, normativamente, possui a obrigação de reaver os
apartamentos por processo judicial, solicitando a reintegração de posse dos imóveis.
Página | 94
Segundo relato da Responsável Técnica Social do Residencial Vivenda do Planalto, as
invasões e vendas de apartamentos constituem um dos principais fatores para a não
realização do trabalho social. Segundo ela:
[...]. É um território que tem milícias e onde alguns realmente acabaram invadindo os apartamentos. E a gente teve toda uma dificuldade de realizar esse trabalho social, porque dentro dessa situação de invasão, a CAIXA deveria ter tomado um posicionamento que era a reintegração de posse. E não ocorreu! E aí, até hoje a gente está tentando ver como a gente consegue desenvolver esse trabalho social, para poder atender às famílias que ainda estão para receber as suas unidades habitacionais. Acho que chega em torno de 40 famílias (Responsável Técnica Social do Residencial Vivenda do Planalto, outubro de 2016).
A demora da reação da Caixa Econômica Federal contra as invasões e a
comercialização ilegal dos apartamentos do Vivendas do Planalto, com a demora dos
pedidos de reintegração de posse, abre caminho para a insegurança e para as práticas
ilegais e criminosas nos condomínios. Aqui claramente se revela a falta de presença de
autoridade do poder público nestas regiões periféricas das cidades onde estes
empreendimentos são instalados. Muitas vezes, o que predomina a lei do mais forte,
inclusive conflitos armados na ocupação ilegal dos apartamentos. Há relatos inclusive
de milícias armadas envolvidas neste comercio ilegal, que falsificam contratos de
compra e venda, impedem a posse das famílias contempladas e revendem os
apartamentos.
Como regra do PMCMV, as unidades habitacionais pertencem à União durante
10 anos e, após este período, é que as famílias recebem as escrituras públicas dos
imóveis. Até o momento, a Secretaria não possui o quantitativo de apartamentos
invadidos ou comercializados indevidamente e a CEF não realizou a reintegração de
posse dos imóveis. Os moradores relatam insatisfação quanto à atuação da CEF e da
Prefeitura na resolução do problema das invasões:
A Prefeitura e a CAIXA não fizeram nada sobre essas invasões! Tem muita gente aqui que mora de posse! E o secretário foi uma vez no assentamento, antes de entregar isso aqui e falou que com o mês a fiscalização da CAIXA vai ficar em cima. E até hoje esperamos por essa fiscalização! Dois anos que já foi entregue isso aqui e nada da parte da Prefeitura e da CAIXA! (Morador do Residencial Vivendas do Planalto, novembro de 2016).
O MLB, como membro integrante do Conselho de Habitação de Interesse Social
de Natal, solicitou uma reunião extraordinária (15 de setembro de 2015) do
Página | 95
CONHABINS, com o objetivo de discutir os problemas de invasões dos apartamentos
no Vivendas do Planalto e Morar Bem Pajuçara. Nessa ocasião, foram convidados
representantes da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil (agente operador
financeiro responsável pela contratação do empreendimento Morar Bem Pajuçara) para
dar explicações sobre os processos de reintegração de posse dos apartamentos
invadidos e comercializados indevidamente. Porém, somente compareceram à reunião
do CONHABINS os advogados representantes do Banco do Brasil (Figura 17).
Figura 17: Foto (a): Líder do MLB na Reunião do CONHABINS; Foto (b): Advogados
Representantes do Banco do Brasil Explicando o Processo de Reintegração de Posse
do Residencial Morar Bem Pajuçara.
(a) (b)
Fonte: Foto (a): acervo pessoal da autora, outubro de 2015; Foto (b): Rosa de Fátima, outubro de
2015.
Além das invasões dos apartamentos, a equipe técnica também foi ameaçada e
os equipamentos da Secretaria de Habitação foram roubados do centro comunitário,
onde eram realizadas as ações do trabalho social. Diante destes acontecimentos, a
Secretaria parou as atividades do trabalho social, assim que todas as chaves dos
apartamentos foram destrocadas. Logo após, a ETS da SEHARPE deixar de frequentar
o residencial, o centro comunitário foi ocupado por três famílias que viviam em situação
de coabitação. Desde então, a SEHARPE encontra dificuldades em acessar novamente
o território e dar continuidade ao trabalho social no empreendimento. Para um morador:
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Foi só na entrega mesmo! As assistentes sociais ficaram aqui somente um mês! Para terminar de ajeitar e entregar as chaves de todo mundo! Mas, depois disso, foram embora! Para não dizer que não tem acompanhamento, o pessoal do CRAS teve aqui, fez uma lista porque para receber a cesta básica tem que passar fome! Então, elas vieram para fazer o cadastro, fazer o Bolsa Família e atualizar o Cadastro Único. O pessoal do CRAS só veio para isso mesmo (Moradora do Residencial Vivendas do Planalto).
A recorrentemente violência e o tráfico de drogas aparecem como um dos
problemas mais graves do conjunto, na visão de seus moradores. A percepção da
violência no residencial está particularmente associada à presença do tráfico de drogas,
ao risco de arrombamentos e invasões dos apartamentos, assim como à ausência de
policiamento. Com muita frequência, o residencial é noticiado, na mídia policial, como
local de homicídios, roubos e outros delitos.
No que se refere à gestão condominial e patrimonial do Residencial Vivendas do
Planalto, segundo relatos da Técnica Social responsável pelo trabalho social, a CEF
ficou com a responsabilidade de executar toda a gestão condominial do
empreendimento. A CEF contratou uma empresa terceirizada para realizar a tarefa de
formalização dos condomínios e eleição de síndico, por meio de um modelo de gestão
condominial realizado em condomínios de classe média. Neste sentido, Paz; Rodrigues
e Blanco (2015) esclarecem que:
Outra questão central diz respeito ao modelo de gestão condominial, inspirado nos condomínios do mercado de classe média, que tem se revelado inadequado para o modo de vida da população de baixa renda. O modelo reproduz o autoritarismo, a centralização e não favorece o convívio, a participação e a sociabilidade
Ou seja, a forma de organização da gestão condominial do PMCMV Faixa 1 é
inspirada nos moldes de conjuntos habitacionais de classe média e não levam em
consideração a cultura e o modo de organização das famílias oriundas de áreas de
favelas, ocupações e loteamentos irregulares. A implementação da gestão condominial
no Residencial Vivendas do Planalto foi permeada de muitos conflitos, pois os
moradores rejeitaram as ações da empresa contratada pela CEF. Conforme relato da
Técnica Social:
Parte desde a questão da gestão condominial que ficou a cargo da Caixa Econômica Federal. A CAIXA contratou uma empresa para a gestão de condomínio e a empresa não fez o trabalho a contento. Aí, a gente teve toda uma dificuldade de desenvolver o trabalho social (Responsável Técnica Social do Residencial Vivendas do Planalto, outubro de 2016).
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Como se ver, a tendência dos técnicos sociais é responsabilizar a CEF a não
realização do trabalho social, se, no entanto, perceber que a responsabilidade por este
trabalho recai para as Prefeituras. Houve muitos conflitos entre os moradores no
processo de formação dos condomínios, principalmente na definição dos síndicos, da
taxa de condomínio e na criação do regimento interno. Em geral, os moradores
desconhecem os motivos pelos quais são necessárias regras de convivência
condominial, pois muitas famílias são oriundas de assentamentos precários e
loteamentos informais ou residiam em imóveis alugados. Segundos relatos de
moradores, atualmente, muitos condomínios não possuem síndicos os moradores não
pagam as taxas condominiais.
Fala 1: Não tivemos nenhuma atividade, não tivemos nada! Estamos aqui abandonados! Para não falar que teve uma reunião, veio um senhor aqui para tentar fazer as eleições de síndicos. Veio da Caixa da Econômica, ele veio para gestão condominial! A gente tentou fazer, mas tinha gente que aceitava ter sindico, tinha gente que não aceitava e ele também abandonou o trabalho! Fala 2: A gente não aceitou porque era R$ 30,00 reais e não tínhamos para mal comer e pagar apartamento! A gente não vai ter para pagar sindico por boniteza! (Moradores do Residencial Vivendas do Planalto, novembro de 2016.)
Alguns moradores e lideranças comunitárias informais estão realizando o
voluntariamente o trabalho de formação dos condomínios, eleição de sindico. Ou seja,
de forma informal e autogestionaria de alguns condomínios, os moradores estão
instituindo a gestão condominial, conforme relato abaixo:
A gente mesmo que se organizou! Porque no meu bloco é assim! Eles chegaram com essa proposta do síndico e cada morador pagando 30,00 reais ao síndico. Como uma moradora se disponibilizou como sindica não precisamos mais pagar esse valor (Morador do Residencial Vivendas do Planalto, novembro de 2016.)
Com relação a infraestrutura comum deste condomínio, percebe-se que as áreas
de uso coletivas e comunitárias estão bastante deterioradas, pois durante um período
o centro comunitário foi ocupado por três famílias. Atualmente, algumas lideranças
comunitárias reocuparam o espaço e o transformaram em uma associação de
moradores, com funcionamento de alguns projetos sociais. Os equipamentos de
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esporte e lazer encontram-se bastantes depredados, em função de não comportarem
o volume de pessoas do residencial e por não possuírem manutenção.
O Residencial foi registrado como condomínio do tipo aberto. Porém, as famílias
construíram muros em torno de cada bloco, transformado as áreas em condomínios
fechados (Figura 18). Como citado pelos moradores durante o grupo focal:
Nós sentimos total abandono! Nós preferíamos que o condomínio fosse fechado, e estamos fechando os condomínios. Quando a gente chegou aqui era fechado, com placas das construtoras. Porque para a gente entrar aqui, tínhamos que mostrar o contrato, mas depois de um mês, tiraram tudo! A gente não podia sair porque se não os apartamentos eram arrombados, ou se não, quando a gente saísse por 15 dias, já tinha gente morando e arrombado o apartamento! (Morador do Residencial Vivendas do Planalto, novembro de 2016).
Figura 18: Registro Fotográfico Atual dos Condomínios do Residencial Vivendas do
Planalto (2016).
Fonte: Acervo pessoal da autora, outubro de 2016.
Com a não realização do trabalho social e a falta de organização da gestão
condominial, percebe-se nas falas dos moradores que isto foi um dificultador para o
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processo de adaptação a nova moradia, como relatado por uma moradora: “[...] eu,
sinceramente, eu gostaria que eles tivessem feito o que foi prometido! A assistência
social antes, durante e depois! Já era de bom tamanho! ”
O residencial recebeu muitas famílias em situação de vulnerabilidade social, que
antes viviam em condições precárias de habitabilidade, em coabitação ou aluguel. O
acesso à nova moradia não foi suficiente para a garantia do direito à cidade ou aos
demais direitos sociais. O trabalho social no âmbito dos projetos de habitação de
interesse social deveria funciona como uma ponte entre as políticas públicas e o
alcance e usufruto efetivo dos serviços e programas sociais. O trabalho social pode ser
um mecanismo para o desenvolvimento de oportunidades de cidadania da população.
O Conselho de Habitação de Habitação de Natal até que vem tentando fiscalizar
e exigir a realização do trabalho social nos projetos de habitação de interesse social da
Capital. Os assuntos relacionados chegam a ser discutidos no CONHABINS. Apesar
dos esforços do CONHABINS, mesmo após três anos, as famílias do residencial ainda
aguardam as intervenções do trabalho social na comunidade. Uma Técnica Social da
SEHARPE relata que todas as discussões relacionadas ao trabalho social foram feitas
no Conselho.
As discussões e as deliberações todas foram no Conselho. Aí, dentro da parte do Conselho, as deliberações foram todas normatizadas através das resoluções. Para que a gente pudesse ter o direcionamento no trabalho social, de como proceder seguindo todo esse normativo, essa legislação especifica do Programa (Responsável Técnica Social do Residencial Vivenda do Planalto I a IV, 2016).
De acordo com a SEHARPE, o Projeto de Trabalho Social ainda se encontra em
processo de formulação. A proposta da SEHARPE é realizar uma licitação pública
assim que o PTS seja aprovado pela CEF, de modo a contratar uma empresa
especializada na execução de trabalho social em projetos de habitação de interesse
social.
Existem muitos motivos que levaram à baixa ou à quase nenhuma efetividade
das ações do trabalho social da Prefeitura no Vivendas do Planalto I a IV. Fatores como
a baixa capacidade técnica, a escassez de profissionais para a execução das ações, a
violência no território e tantos outros podem ser enumerados. Tanto a Prefeitura, como
a CEF e o Ministério das Cidades são responsáveis pelos problemas enfrentados pelas
famílias que moram no residencial.
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A falta da presença do Estado nos territórios abre espaço para o aparecimento
da violência e da insegurança dos condomínios. Pelo que se ver no noticiário, o que
acontece no Residencial Vivendas do Planalto, na verdade parece ocorrer em grande
parte dos empreendimentos do PMCMV Faixa 1 no país. A presença de milicianos e do
tráfico de drogas são problemas que devem ser enfrentados pelos governos Estaduais
através da política de segurança pública, seja de forma preventiva ou ostensiva.
Durante a nossa investigação, os moradores do Vivendas do Planalto
demonstraram um profundo sentimento de abandono por parte do Estado, não somente
pelo fato de não ter sido realizado o trabalho social, mas por não terem acesso aos
principais serviços públicos na região. Isso, no entanto, não os leva a negar a conquista
que tiveram ao obterem suas novas moradias. Nos discursos é possível ver que a vida
melhorou do ponto de vista de habitabilidade, pois muitas famílias não moram mais em
casas precárias ou pagam aluguel. Porém, expressam claramente o sentimento de
severa privação de outros direitos sociais.
4.2 Experiência do Trabalho Social no Residencial Ilhas do Atlântico
em Parnamirim/RN.
Com o lançamento do PMCMV, em 2009, a Prefeitura de Parnamirim aderiu ao
Programa imediatamente e iniciou o processo de inscrição das famílias. Inicialmente,
foram inscritas 16.485 mil pessoas (6.629 pela internet e 9.856 nas escolas municipais),
no período entre 8 de maio a 19 de junho/2009. O número de inscrições foi superior ao
total do déficit habitacional do Município, estimado na época pelo Plano Municipal de
Habitação de Interesse Social em 7.819 domicílios.
Em 2016, o Residencial Ilhas do Atlântico21 (com 496 apartamentos) foi o nono
empreendimento do PMCMV Faixa 1 inaugurado na cidade de Parnamirim (Figura 19).
O residencial está situado no Bairro Liberdade e foi construído pela construtora M&K
Comércio e Construções LTDA, com recursos do FAR, na ordem de R$ 20.333.105,07.
21 Cada unidade habitacional possui uma área útil de 37,39 m², tendo um valor de construção de R$
40.994,16. As instalações físicas do empreendimento são compostas por sala de estar/jantar, cozinha, área de serviço, banheiro social, 2 quartos. Em relação aos equipamentos coletivos, o empreendimento conta com área de lazer, sendo constituída de: churrasqueira, 2 banheiros (masculino/feminino), 2 piscinas (infantil e adulta) e Salão de Festas, uma guarita; casa de lixo e quadra de esportes.
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Figura 19: Localização do Residencial Ilhas do Atlântico – Parnamirim/RN.
Fonte: Google Maps, 2017. Elaboração própria da autora.
O residencial é um dos poucos empreendimentos do Programa que possui
piscinas e calçamento com piso tátil no RN. Isto se deve ao fato do condomínio ter sido
inicialmente planejado e construído para o público do Faixa 2 (renda familiar de R$
2.351,00 e R$ 3.600,00). No entanto, segundo informações da Secretaria Municipal
de Habitação e Regularização Fundiária de Parnamirim (SEHAB), a CEF não aprovou
a medição financeira da obra, alegando que a construção estava abaixo do padrão
construtivo da Faixa 2 do Programa.
A solução encontrada pela Prefeitura e pelo Conselho Municipal de Habitação
de Interesse Social de Parnamirim foi aprovarem a desoneração fiscal para reduzir o
preço dos imóveis, em um acordo entre CEF e a construtora, para que as unidades
habitacionais fossem destinadas às famílias da Faixa 1 do Programa.
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Figura 20: Foto: (a) Faixada do Empreendimento Ilhas do Atlântico; Foto: (b) Blocos
de Apartamentos do Residencial Ilhas do Atlântico.
(a) (b) Fonte: foto (a): Disponível em: <http://www.novojornal.jor.br/cotidiano/contemplados-com-o-ilhas-do-atlantico-receberao-chaves-de-seus-imoveis>, acesso em fevereiro de 2017. Foto (a): Disponível em: <http://giraparnamirim.com.br/arq/geral/3393-ilhas-do-pacifico-esta-na-reta-final-para-a-entrega.html>.Acesso em fevereiro de 2017.
Diferentemente dos empreendimentos implantados nas periferias da RMN, a
área onde encontra-se localizado Residencial Ilhas do Atlântico é uma região dotada
com boa oferta de infraestrutura urbana, com a oferta de serviços públicos e está a
poucos quilômetros de distância do centro da cidade. Percebe-se que a região
encontra-se processo de crescimento imobiliário, pois diversos loteamentos e
empreendimentos estão sendo implantados na área. Com a construção deste
residencial no Bairro Liberdade, houve no setor censitário um aumento na quantidade
de imóveis, de 329 domicílios para 825 residências, representando um crescimento de
150,75% (IBGE, 2010).
Com relação à seleção dos beneficiários do Residencial Ilhas do Atlântico, os
normativos seguidos para os critérios22 de seleção e hierarquização das famílias
22Para a seleção das famílias, foram utilizados os seguintes critérios nacionais da Portaria N° 140/2010:
a) famílias residentes ou que tenham sido desabrigadas de áreas de risco ou insalubres; e b) famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar. De forma a complementar os critérios nacionais, o Conselho Municipal de Habitação de Interesse Social (CMHIS) de Parnamirim estabeleceu os seguintes critérios adicionais de seleção: a) participantes em Programas Sociais do Governo Federal (ser participante em quaisquer programas sociais do Governo Federal com base no Cadastro Único); b)
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estavam contidos na Portaria N° 140, de 5 de março de 2010, do Ministério das
Cidades, vigente na época de contratação do empreendimento. A Coordenadora do
PMCMV em Parnamirim explicou como funcionavam o Programa no Município e os
critérios de participação:
Em 2009, foram lançados o Programa e as inscrições. O trabalho social mesmo aconteceu no final de 2010 e início de 2011. Então, o Programa Minha Casa, Minha Vida é destinado para famílias com renda de 0 a 3 salários mínimos. A Faixa de renda, você tinha que ter até R$ 1.600,00 reais na época. Com a nova portaria, a renda é até R$ 1.800,00 reais. Como prioridade, nós temos portarias que nos regem. A mais atual é a 412, que aí tem alguns critérios adicionais do programa. Os três principais são: ter renda familiar compatível com a lei, porque foi mudado em 2016; [...] segundo não ser proprietário de imóveis, ou seja, não pode ter um imóvel no nome; pessoas com deficiências; famílias que possuem como responsáveis familiares mulheres e principalmente famílias que moram em áreas de risco, aí entram os assentamentos precários, favelas, pessoas que moram em área de risco (Coordenadora do PMCMV da SEHAB de Parnamirim, novembro de 2016).
O sorteio dos apartamentos foi realizado em 2011, mas somente após cinco anos
os apartamentos foram entregues às famílias sorteadas. A demora na entrega dos
apartamentos e a morosidade da CEF e da Prefeitura são fatores que contribuíram para
a pouca efetividade do trabalho social com as famílias do Ilhas do Atlântico.
Devido à demora na entrega dos apartamentos, o trabalho social pré-
ocupacional, que deveria permitir analisar antecipadamente o perfil dos moradores e
prepará-los para a mudança, promovendo reuniões de esclarecimentos, orientações,
assembleias, sorteio das unidades habitacional etc, não foi realizado. Ou seja, o
trabalho social pré-ocupação com as famílias se resumiu apenas a realização de um
seminário de integração e reuniões de entrega das chaves.
O fato da Prefeitura ter contratado uma empresa para executar o trabalho social
pós-ocupação não exclui a responsabilidade do ente público de implementar o TS na
etapa pré-ocupação. Nos relatos dos moradores, foi apontado que durante cinco anos
as famílias cobraram da Prefeitura e da CEF um posicionamento sobre a razão pela da
não realização do trabalho social pré-ocupacional e os problemas relacionados com a
demora da assinatura dos contratos e a entrega do condomínio. Estes problemas
Existência de dependentes de 0 a 6 anos; c) Territorialidade (o candidato inscrito deveria residir próximo à região do empreendimento).
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também ficam evidentes na própria fala da Coordenadora do PMCMV da SEHAB, que
relata as dificuldades da não realização do trabalho social pré-ocupação:
Então, sempre foi um quesito que a gente se preocupava, porque meio que não acontecia como deveria. Como a questão do tempo e dos normativos eram atropelados, já chegava assim ‘vai ser entregue o empreendimento! ’ Então essa pré-ocupação não ocorreu como deveria ter ocorrido, entendeu? Porque já se iniciava o trabalho social no seminário de Integração e era nesse seminário que a gente já ia mostrando, sensibilizando e orientando. O ideal é que pelo menos uns 3 meses antes já fossem trabalhando. Lá em Parnamirim, no meu tempo, não houve essa execução do trabalho social pré-ocupação (Coordenadora do PMCMV da SEHAB, novembro de 2016).
Devido a quantidade de empreendimentos implantados no Município, a SEHAB
não realizou um Projeto de Trabalho Social individual para cada residencial, mas optou
pela criação de um Plano de Intervenção de Trabalho Técnico Social (PITTS) para
todos os conjuntos habitacionais do Programa, com a finalidade de traçar as diretrizes
básicas gerais para as ações do trabalho social junto às famílias beneficiárias.
Durante a investigação, foi possível constatar que a falta de estrutura técnica da
SEHAB e a alta rotatividade de profissionais são pontos desaforáveis para
implementação do trabalho social nos projetos de habitação no Município. De uma
forma geral, a Secretaria de Habitação de Parnamirim dispõe de mais funcionários
comissionados do que de (que em muitas ocasiões, não são contratados por
capacidades técnicas, mas para atender interesses políticos da gestão municipal)
profissionais estatutários capacitados da área social.
Por este motivo, a SEHAB utilizou como justificativa a contratação de uma
empresa terceirizada para executar o trabalho social. A Fundação de Apoio à Educação
e ao Desenvolvimento Tecnológico do RN (FUNCERN), do Instituto de Educação
Tecnológica do Rio Grande do Norte (IFRN), foi a vencedora da licitação do trabalho
social em Parnamirim. Desde 2013, a equipe técnica da FUNCERN é responsável por
formular e implementar o trabalho social pós-ocupacional nos residenciais entregues
em Parnamirim. Sobre este assunto, a Coordenadora do Trabalho Social da FUNCERN
no Residencial Ilhas do Atlântico nos informou que:
Em Parnamirim, foram 13 empreendimentos! Foram entregues 9 empreendimentos, mas quando iniciou a execução do trabalho social em Parnamirim, foram 8 de uma vez. Aí, teve um, esse eu fiquei em campo, que foi o Ilhas do Atlântico! Então eu tinha a responsabilidade de coordenar todas as equipes e a parte normativa, burocrática dentro da Secretaria de Habitação do Município nessa relação com a CAIXA. Como eu era de lá, eu coordenava
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todas as equipes da FUNCERN (Coordenadora do Trabalho Social da FUNCERN, novembro de 2016).
Com a inauguração do residencial, em 2016, a equipe técnica da FUNCERN deu
início ao trabalho social pós-ocupacional. Com uma equipe composta por Psicólogos,
Assistentes Sociais, Técnico em Meio Ambiente e estagiários das respectivas áreas, a
ETS também era formada por profissionais de consultoria condominial. As atividades
do trabalho social no condomínio foram desenvolvidas no prazo de sete meses, com
redirecionamento dos recursos financeiros do FAR através da reprogramação do PTS
de R$ 280.766,68. O Projeto de Trabalho Social do Ilhas do Atlântico tinha como
objetivo:
Realizar ações socioeducativas de organização, capacitação e qualificação dos beneficiários com vistas à organização comunitária, apropriação/ manutenção do ambiente construído, permanência no imóvel e sustentabilidade das famílias/empreendimento (PREFEITURA DE PARNAMIRIM, p. 3, 2016).
No PTS no condomínio, os propósitos das ações estavam voltados para permitir
a integração e a participação dos beneficiários e demais atores envolvidos, favorecendo
o fortalecimento da identidade, socialização, entretenimento e assimilação dos
processos educativos informais. Na fala da Responsável Técnica Social da FUNCERN
do Residencial Ilhas do Atlântico, o trabalho social iniciou-se com a finalidade de:
Primeiro de tudo foi mostrar aos beneficiários os seus direitos e deveres, essa nova realidade que eles iriam passar a ter um apartamento e a viver em condomínio. Porque a gente tem várias realidades, a gente tem assentamentos precários, tem situações de muita vulnerabilidade de famílias que vão morar em um condomínio fechado e apartamento (Técnica Social da FUNCERN Responsável pelo PTS do Ilhas do Atlântico, novembro de 2016).
Quanto à intersetorialidade do TS, no processo de implementação do PTS do
Ilhas do Atlântico, segundo informações da equipe da FUNCERN, foi necessário
realizar parcerias intersetoriais com as Secretarias de Educação, Saúde, Centro de
Referência em Assistência Social (CRAS) e o Central de Atendimento Social (CAS),
visando atender as principais demandas dos moradores. A intersetorialidade com
outras políticas públicas se apresenta fundamental para a efetivação do trabalho social
em projetos de habitação de interesse social. Sobre isso, Junqueira (1999, p. 27) afirma
que:
A qualidade de vida demanda uma visão integrada dos problemas sociais. A gestão intersetorial surge como uma nova possibilidade para resolver esses
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problemas que incidem sobre uma população que ocupa determinado território. Essa é uma perspectiva importante porque aponta uma visão integrada dos problemas sociais e de suas soluções. Com isso busca-se otimizar os recursos escassos procurando soluções integradas, pois a complexidade da realidade social exige um olhar que não se esgota no âmbito de uma única política social.
Durante a pesquisa empírica, foi possível observar as limitações na execução do
trabalho social conforme recomendados pela Portaria N° 021/2014. Devido ao curto
prazo de tempo (setes meses) de implementação do TS pós-ocupacional, as atividades
foram insuficientes para atender aos requisitos de todos os eixos exigidos pelo
Ministério das Cidades.
Dentre os eixos da Portaria N° 021/2014, a Educação ambiental e Patrimonial e
Mobilização e a Organização e Fortalecimento Social foram as mais desenvolvidas no
condomínio. Quanto ao eixo “Desenvolvimento Socioeconômico”, existe uma falta de
articulação de políticas públicas e iniciativas de geração de trabalho e renda que visem
a inclusão produtiva, econômica e social das famílias beneficiárias, de forma a
promover o incremento da renda familiar e a melhoria da qualidade de vida.
Em Parnamirim, foram realizados oficinas e cursos de geração de emprego e
renda. No entanto, pelo fato de serem apenas oficinas de confecção de pufs com
garrafas PET e confecção de sabão com óleo de cozinha, elas foram direcionadas,
principalmente, para o público feminino. Ou seja, não houve ações efetivas de geração
de emprego e renda destinadas para as famílias no Residencial.
O desenvolvimento de atividades de geração de emprego e renda revela-se
importante quando se tem em conta que, dentro de um universo de 1.984 beneficiários,
43% dos titulares encontram-se desempregados, 74% das famílias são beneficiárias do
Programa Bolsa Família e 47% dos moradores possuem renda familiar entre R$ 17,00
a R$ 500,00 (Figura 21).
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Figura 21: Renda Familiar do Residencial Ilhas do Atlântico, em Parnamirim - RN.
Fonte: Cadastro Único/SEHAB, 2016.
As ações de geração de emprego e renda deveriam incluir vários passos como
o mapeamento das vocações profissionais dos beneficiários, o encaminhamento aos
serviços de intermediação de mão de obra, o direcionamento aos serviços de formação
de núcleos associativos de produção e de microcrédito produtivo e a execução de
projetos de capacitação profissional.
Estas ações são consideradas fundamentais e devem levar em consideração o
perfil socioeconômico das famílias atendidas, pois em geral elas vêm de longo histórico
de exclusão e vulnerabilidade social. São pessoas com baixa escolaridade e que
apresentam dificuldade de acessar o mercado de trabalho formal e até mesmo de
participar de iniciativas de microcrédito. Infelizmente, as ações do trabalho social nesta
área ainda são pouco efetivas.
Para Inês Magalhães (2011), não é mais aceitável que sejam apenas ofertados,
pelo trabalho social, alguns cursos de capacitação, sem articulação intersetorial com as
demais políticas públicas. Para além de atividades pontuais voltadas para a geração de
emprego e renda, a intersetorialidade nesta temática é de fundamental importância,
pois com a apoio de políticas públicas de promoção do microcrédito,
empreendedorismo, cooperativismo e cursos técnicos profissionalizantes, é possível
descobrir e desenvolver as potencialidades dessas famílias e, consequentemente,
melhorar sua qualidade de vida.
47%
35%
15%
3%
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
R$ 17,00 a R$ 500,00 R$ 500,00 a R$ 1.000,00 R$1.000,00 a R$ 1.600,00 Sem renda
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Em relação às particularidades e diferenças na execução do trabalho social pós-
ocupacional com as famílias oriundas da demanda fechada (assentamentos precários)
e aberta (sorteio), a Técnica Social da FUNCERN relatou que são muitos desafios, pois
são famílias oriundas de diferentes contextos sociais e diversas realidades, com suas
próprias formações, histórias de vida e educação. A partir do momento em que essas
famílias passam a morar em apartamentos e condomínios fechados, elas
experimentam uma grande transformação de vida e, em muitas situações, esse
processo de adaptação se torna bastante conflituoso. Sobre esse assunto, a Técnica
Social da FUNCERN discorre que:
É um desafio muito grande, os públicos são de diversas realidades. No início, com a questão da renda que era de R$ 0,00 a R$ 1.600 [...]. Então, você tem uma família sorteada, você imagina as diversas realidades e tem a questão dos assentamentos. Tem os desafios por questões, primeiramente de renda em si, que conta muito e a própria formação, o histórico de vida, a educação. Então existe esses embates, existe essas dificuldades na relação de vizinhança. Por isso, que a gente trabalha muito essa questão do convívio, porque é diferente! É muito diferente! Eu vejo que seja um dos desafios do trabalho social, são essas realidades bem distintas (Técnica Social da FUNCERN responsável pelo PTS do Ilhas do Atlântico, novembro de 2016).
Em relação à participação dos beneficiários no processo de implementação do
PTS, a pouca participação dos beneficiários pode ser explicada pelo desacreditamento
das famílias com o TS e com a CEF e Prefeitura. No entanto, ao entrevistar a Técnica
Social da FUNCERN acerca da participação das famílias na condução do TS no
Residencial Ilhas do Atlântico, ela define como positiva, apesar de não ser uma
participação expressiva em comparação com o quantitativo de pessoas residindo no
condomínio:
Olha, normalmente é bem positivo, mas claro, normalmente os participantes sempre são o mesmo grupo, a gente nunca teve 100% ativo dos participantes do trabalho social. Variava muito de um condomínio para outro. Vou falar do último condomínio que eu estava em campo! Nós tivemos uma boa participação porque não tínhamos ainda os 496 beneficiários e acho que a gente chegou a ficar com uns 250 no máximo 300 beneficiários já morando! Que é outro fator delicado que essa demora de eles se mudarem e ainda tem a questão dos apartamentos fechados. Eu vejo a participação boa, claro no universo total do empreendimento quantitativa é pouco, mas pela realidade que a gente vê a forma de vida, estilo e histórico, eu vejo bem. Porque quando participam de verdade (Técnica Social da FUNCERN responsável pelo PTS do Ilhas do Atlântico, novembro de 2016).
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Figura 22: Foto (a): Seminário de Encerramento do PTS; Foto (b): Oficina de
Contação de Histórias.
(a) (b)
Fonte: FUNCERN, 2016.
Em relação à gestão condominial, segundo informações da Equipe Técnica da
FUNCERN, essa também foi permeada de conflitos, pois a construtora não realizou
todos os trâmites cartoriais e o condomínio ainda não foi legalizado. Todo esse
transtorno gera muitos problemas para os moradores, já que a falta de compromisso
da CEF, da construtora e da Prefeitura demonstra que a preocupação maior era apenas
entregar rapidamente os apartamentos, o que habilita as construtoras os pagamentos
do Programa, sem ao menos ter legalizado o condomínio e feito as ligações hidráulicas
e elétricas.
De forma paliativa, durante o seminário de integração apenas a eleição de
representantes de blocos do condomínio, segundo depoimento da Técnica Social
Responsável pelo Ilhas do Atlântico:
Nesse empreendimento Ilhas do Atlântico, teve reuniões do grupo gestor. O que aconteceu nesse, como ainda não está legalizado o condomínio, foi intitulado representantes de blocos no seminário de integração! Então, a partir destes representantes de bloco, eles passaram a representar o condomínio [...] no caso desse condomínio eram 11 blocos, então são 11 representantes. Então, se fazia reunião mensal com eles, chamávamos para a Secretaria de Habitação para fazer essa ligação da Secretaria com eles e CAIXA. A CAIXA participava das reuniões! Isto eles gostavam e sempre pediam. [...] A gente sempre tinha um olhar diferenciado, porque via que são múltiplos atores (Técnica Social da FUNCERN Responsável pelo PTS do Ilhas do Atlântico, novembro de 2016).
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Diferentemente dos outros municípios estudados (Natal e São Gonçalo do
Amarante), aqui neste caso a CEF não ficou responsável por executar a gestão
condominial. De acordo com a Coordenadora da Equipe de campo da FUNCERN, a
equipe é composta por um consultor em gestão condominial. Ela informa também que,
futuramente, será desenvolvido o curso de Gestão Condominial para os síndicos,
representantes de blocos, conselho fiscal e equipe técnica do PTS de Parnamirim. Já
para a Técnica Social do Ilhas do Atlântico, são vários dificultadores que
impossibilitaram a realização da gestão condominial:
Olha, são vários! Cada empreendimento é diferente! Outra parte bastante burocrática é a documentação legal, toda essa parte que leva muito tempo para resolver, como CPJ do condômino, isso dificulta também, regimento interno, tudo isso dificulta. No Ilhas do Atlântico que teve essa mudança! Nos outros, foram pelo projeto! Só que tem outra particularidade que a documentação desse condomínio não saiu, ainda está nos trâmites, entendeu? Tanto é que a gente terminou a execução agora em outubro, quando for tudo resolvido da parte legal, a parte da consultoria condominial vai voltar para lá, para finalizar o trabalho social 100%. Eu penso que esses dois fatores, assim, a gestão condominial e a parte burocrática para o condomínio existir legalmente, são os dificultadores, sabe? (Técnica Social da FUNCERN Responsável pelo PTS do Ilhas do Atlântico, novembro de 2016).
Nos depoimentos dos moradores, o tema da gestão condominial gera muitos
conflitos e transtornos, em virtude de o empreendimento não ter sido registrado no
cartório após um ano da entrega dos apartamentos. Por esse fato, os moradores são
impossibilitados de realizar eleições de síndico, definir o regimento interno, o conselho
fiscal e a taxa de condomínio. De acordo com um morador:
Eu creio que para um empreendimento como esse, pelo tempo que estávamos esperando, foi ruim porque esperamos muito, mas eu creio que, de certa forma, hoje, nós estamos vendo que não foi organizado altura. Por exemplo, eu preferia que tivesse demorado mais e que hoje nós tivéssemos tudo organizado e que tivesse síndico. O Projeto Minha Casa Minha Vida do Ilha do Atlântico tivesse entregue já com síndico, como é em todos os empreendimentos. Até hoje, não temos síndico, quase um ano depois e não temos! (Morador do Residencial Ilhas do Atlântico, novembro de 2016).
Para os moradores, a solução encontrada provisoriamente pela CEF e Prefeitura
de eleger representantes de blocos não está funcionando já que, por não haver síndico
e regimento interno, os moradores não pagam a taxa de condomínio:
A obra foi terminada desde 2012, eles estão cozinhando esse tempo todo, [...] pós-entrega e não temos síndico! Porque faz um ano que estamos aqui e
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precisamos de um sindico! Não tem como nos organizar! Na verdade, a gente organiza, mas acabamos que sempre estamos desorganizados. Aqui se junta todo mundo na boca a boca e fazemos um mutirão. No quesito limpeza, segurança e organização, quem está quebrando o galho é o representante de bloco e não é fácil! Você assumir uma conta que não é nossa! A luz do hall ainda está vindo no nome da empresa, enquanto o empreendimento já está no
nome dos moradores. Não existe taxa de condomínio para fazer a
manutenção, nós fazemos com uma taxa voluntária para a questão da segurança do condomínio (Morador do Residencial Ilhas do Atlântico, novembro de 2016).
Esse problema afeta diretamente os equipamentos de uso coletivo (piscina,
quadra, salão de festas e churrasqueiras), uma vez que não possuem manutenção.
Essas questões acabam gerando muitos transtornos, pois a empresa contratada fica
impedida de realizar a gestão condominial, o que acarreta no prejuízo ao condomínio.
A cidade teve um tempo maior para aprender a implementar o trabalho social do
Programa. Mesmo assim, pode-se perceber que, de maneira geral, o TS do Ilhas do
Atlântico foi pouco efetivo, em função de haver uma distância entre o que define as
diretrizes do Ministério das Cidades e o que foi executado. A não realização do trabalho
social pré-ocupacional, o curto prazo de tempo de execução e os problemas com a
gestão condominial são apresentados como impedimentos para a efetividade neste
empreendimento.
4.3 Dificuldades do Trabalho Social no Residencial Ruy Pereira VI
no Município de São Gonçalo do Amarante.
O Município de São Gonçalo do Amarante tem apresentado rápido crescimento
urbano e populacional. Entre os anos 2000 e 2010, o Município teve um crescimento
urbano de 70,41%, com 84,52% da sua população sendo hoje urbana. Tal crescimento
foi impulsionado pela instalação do Aeroporto Internacional Governador Aluízio Alves
(construído para operar como um hub de distribuição de mercadorias para a América
Latina), juntamente com a disponibilidade atual de rodovias federais e estaduais que
colocam o Município em posição privilegiada quanto ao planejamento logístico e
empresarial das empresas já instaladas na cidade. Essas características servem como
importantes atrativos para novas empresas que buscam instalar-se na região.
Com alto nível de integração metropolitana, São Gonçalo do Amarante, tem
apresentado nos últimos anos, diversos problemas decorrentes da evolução urbana e
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populacional. Para solucionar as demandas habitacionais, a Prefeitura aderiu ao
PMCMV com o intuito de reduzir o déficit habitacional do Município.
Com a construção do Residencial Ruy Pereira IV a VI23 (Figura 25), a Prefeitura
de São Gonçalo do Amarante pretendeu diminuir o seu déficit habitacional relativo que
está estimado pela FJP em 13,05%. Atualmente, o empreendimento é considerado o
maior empreendimento habitacional do PMCMV Faixa 1 no RN, com 1.800 unidades
habitacionais.
Figura 23: Localização do Empreendimento Ruy Pereira - São Gonçalo do Amarante.
Fonte: Google Maps, 2017. Elaboração própria da autora.
23 O Residencial Ruy Pereira possui os seguintes equipamentos de uso coletivo: 1 salão de festas com
163,95m² de área construída, composto de: copa, depósito, circulação, 02 banheiros (masculino e feminino) e 1 banheiro adaptado para pessoas com deficiência, 1 campo de futebol society e 1 quadra de voleibol, ambos com piso de areia, 1 parque infantil, com piso de areia, guarita com WC e depósitos de lixos.
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Cada apartamento24 possui uma área útil de 45,27 m², com um valor de
construção de R$ 61.000 mil. Composto por 06 conjuntos de 19 blocos, com 300
apartamentos e com uma população estimada de 7.200 pessoas, o residencial foi
construído pela construtora Borges e Santos S/A, com investimentos do Governo
Federal de mais de 110 milhões, segundo a Prefeitura. Para a realização da pesquisa
empírica, selecionamos o condomínio Ruy Pereira VI, por se tratar do conjunto
habitacional com maior tempo de pós-ocupação e por aí estar sendo implementado o
Projeto Trabalho Social com os moradores.
De acordo com os relatos dos moradores e dos líderes comunitários do
empreendimento, a região é totalmente desprovida de linhas de ônibus e o atendimento
do serviço de transporte público é realizado por uma van e alguns mototaxistas de forma
irregular na localidade. O conjunto habitacional encontra-se localizado em uma área
não dotada de infraestrutura urbana (escolas, postos de saúde, transporte público etc.),
com grandes parcelas de vazios urbanos e loteamentos.
Por estar situado na periferia da cidade, a região apresenta acentuado processo
de transformação de áreas rurais em áreas de expansão urbana, com baixa articulação
com o restante do tecido urbano do Município. Esta problemática também é presente
em diversos empreendimentos do PMCMV Faixa 1 nos Municípios da RMN. Por se
tratar de um megaempreendimento habitacional, a sua construção traz grandes
consequências socioespaciais para a cidade, como falta de inserção urbana e a baixa
urbanidade (SILVA el at, 2015)
Com o aumento populacional e de residências na área, de acordo com o IBGE
(2010), na localidade, existiam 617 domicílios particulares permanentes. Com a
construção de 1.800 novas unidades habitacionais, a área passou a conta com 2.417
domicílios, havendo um crescimento de 391%, em uma região que não foi preparada
para receber tamanho influxo de novos habitantes. Na região foi observado uma rápida
elevação do preço dos terrenos.
24 Cada apartamento é composto por: 1 sala, 2 quartos, 1 banheiro, cozinha e área de serviço e 1 vaga
de garagem descoberta e interna.
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Figura 24: Foto (a): Imagem do Residencial Ruy Pereira I; Foto (b): Bloco de
Apartamentos.
(a) (b)
Fonte: Prefeitura de São Gonçalo do Amarante, 2016.
Figura 25: Foto (a): Via de Acesso para o Residencial Ruy Pereira I; Foto (b): Via de
Acesso pela BR 406.
(a) (b)
Fonte: Acervo pessoal da autora, 2016.
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Em relação ao trabalho social do Residencial Ruy Pereira IV, o processo de
seleção das famílias seguiu os critérios25 nacionais estabelecidos pela Portaria
610/2011 do Ministério das Cidades e três critérios locais26, através da Lei Municipal Nº
1.402 de 17 de janeiro de 2014.
Diferentemente dos Municípios de Natal e Parnamirim, segundo informações da
SEHAB de São Gonçalo do Amarante, o condomínio não possui famílias oriundas de
assentamentos precários. Ou seja, o empreendimento foi 100% ocupado por famílias
selecionadas através de sorteio realizado pela CEF. Ainda sobre este assunto, a
Coordenadora do PMCMV da SEHAB esclarece que:
Pela demanda ser muito grande, em função do déficit habitacional, para fazer a seleção, usamos os critérios nacionais e os critérios locais. Para os critérios locais, a gente botou mães chefe de famílias, com filhos menores de 18 anos, porque a gente tem muito isso aqui na região. Colocamos um percentual de 3% dos idosos e 5% dos deficientes. Então, como a demanda era muito grande, procuramos o Ministério Público, né? Assim, nós achamos melhor fazer o trabalho do sorteio, porque a gente não tinha, no universo de 10.000 inscritos, selecionar 2.300 famílias. Porque poderíamos estar sendo omissos algumas situações, por isso que nós solicitamos a questão do sorteio. Para sermos mais democráticos (Coordenadora do PMCMV da SEHAB de São Gonçalo do Amarante, setembro de 2016).
Durante a pesquisa empírica, observamos a falta de transparência na construção
dos cadastros e no processo de sorteio das famílias para o Residencial Ruy Pereira.
Diante da falta de transparência pública e indícios de corrupção, o Ministério Público
Federal abriu um inquérito para investigar supostos “pagamentos de propinas” e
doações de casas do PMCMV para pessoas ligadas a SEHAB. O inquérito encontra-se
em segredo de justiça e não foi possível obter os resultados da investigação.
Mas a falta de transparência e informações sobre o Programa no Município,
também ficou destacado nos depoimentos dos moradores, pois muitas famílias
25 De acordo com a SEHAB, para a seleção/hierarquização dos beneficiários do residencial, foram utilizados os critérios nacionais, conforme a Portaria 610/2011 do Ministério das Cidades estabelece: a) famílias residentes em áreas de risco ou insalubres ou que tenham sido desabrigadas; b) famílias com mulheres responsáveis pela unidade familiar; e c) famílias de que façam parte pessoas com deficiência (titular ou integrante do grupo familiar beneficiado). 26 De forma a complementar os critérios nacionais, o Município estabeleceu os seguintes critérios adicionais de seleção, através da Lei Municipal Nº 1.402 de 17 de janeiro de 2014: a) indicação de um grupo de famílias oriundas de um mesmo assentamento irregular, sem aplicação de hierarquização e seleção, até o limite máximo definidos de 50%; c) famílias com filhos menores de 18 (dezoito) anos; d) territorialidade; vulnerabilidade Social (famílias com renda per capita familiar igual ou inferior a meio salário mínimo).
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inscreveram-se na Prefeitura acreditando que seriam construídas casas, como no
Programa de Habitação Social (PSH), porém, não houve esclarecimento sobre o
empreendimento e a sua tipologia, conforme relato dos moradores:
[...] eu morava em uma casa emprestada e eu fiz inscrição para uma casa, não foi para o apartamento. O cidadão chegou lá, fez a inscrição, não tenho moradia, tudo bem! Vocês vão colocar no PSH, muitas inscrições eram para isso aí. A maioria que foi inscrito acreditava que receberia casa. Ninguém aqui sabia que era para receber um apartamento. Aí, depois, em 2014, que houve o sorteio. Em maio de 2014 foi avisado que seria apartamentos. Até então, a gente não sabia (Morador do Residencial Ruy Pereira VI, setembro de 2016).
Figura 26: Foto (a): Sorteio dos Apartamentos e Blocos do Residencial Ruy Pereira
VI; Foto (b): Famílias Beneficiárias Aguardando a Definição dos Apartamentos.
(a) (b)
Fontes: Figura (a) <http://wendelljefferson.com.br/?p=3289>. Figura (b): Prefeitura de São Gonçalo do
Amarante, 2015.
O sorteio dos apartamentos foi realizado em 2014 e, após dois anos de espera,
as famílias assinaram os contratos com a CEF e realizaram o sorteio de definição de
endereço. No entanto, durante a pesquisa de campo, diversas famílias relataram que
no período do sorteio dos apartamentos não houve a priorização das unidades
habitacionais adaptados e do térreo para pessoas com deficiência e idosos, conforme
depoimento dos moradores:
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Fala 1: Foi sorteio! Quem ficou no terceiro ficou, não podia trocar ou negociar. Que acredito que quem saiu prejudicado no sorteio foram os idosos e deficientes, porque eles deveriam ter ficado nos andares de baixo. Todos os apartamentos de baixo são preparados para pessoas com necessidades especiais, tanto idosos quanto crianças.
Fala 2: Aqui no Bloco 7, nós temos um problema disso. A minha filha tem deficiência e a descoberta da deficiência foi antes dos apartamentos e tem laudo médico no dossiê. Depois disso, eu procurei a Secretaria, mas eles falaram que foi sorteio e que eu tinha que ficar no lugar em que eu fui sorteada (Moradores do Residencial Ruy Pereira IV, setembro de 2016).
Diferentemente dos discursos dos moradores, segundo informações da SEHAB,
5% das unidades habitacionais adaptadas foram destinadas aos titulares ou familiares
que possuem algum tipo de deficiência e 3% das unidades habitacionais do térreo,
preferencialmente, foram reservadas às pessoas idosas e que foram sorteadas por este
critério. Entretanto, muitas famílias inscritas, por desconhecimento das regras do
Programa e por falta de orientações da Secretaria de Habitação, não declararam essa
condição no momento da inscrição e não comprovam os critérios “deficiência” ou
“idoso”. As famílias que possuíam estes critérios e não declararam participaram do
sorteio geral das unidades habitacionais, não sendo possível troca posteriormente os
apartamentos.
Além da falta de transparência e de informação sobre o processo de seleção dos
beneficiários do PMCMV, em São Gonçalo do Amarante, a pesquisa identificou que o
Município não realizou o trabalho social pré-ocupacional com as famílias do residencial.
De acordo com a Portaria 021/2014 do Ministério das Cidades, após o sorteio e
definição das famílias, a Prefeitura deverá planejar e realizar o Projeto de Trabalho
Social Preliminar (PTS-P). Nos relatos dos moradores, não houve nenhum tipo de
intervenção do trabalho social por parte da Prefeitura que antecedesse a ocupação dos
apartamentos. Ou seja, a Prefeitura apenas realizou uma reunião com as famílias no
dia da assinatura dos contratos a fim de explicar e orientar sobre as regras do Programa
e a convivência em apartamentos.
A falta de compromisso do Município em desenvolver o trabalho social pré-
ocupação revela a omissão da CEF em fiscalizar e cobrar a atuação da Prefeitura no
TS durante as obras. De uma forma geral, tanto a CEF, quanto o Município possuem
uma preocupação maior apenas com construção do empreendimento, com a celeridade
de entregar o mais rápido possível, colocando em segundo o plano o trabalho social
com as famílias.
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A inexistência do trabalho social pré-ocupação traz consequências irreparáveis
para a efetividade do PMCMV Faixa 1. São famílias que irão residir em apartamentos
e condomínios fechados com o mínimo de instrução sobre as regras que permeiam
estes espaços, prejudicando a adaptação e o convívio dos moradores.
Quanto ao trabalho social pós-ocupacional, a Coordenadora do PMCMV da
SEHAB informou que foi realizado o Projeto de Trabalho Social, cuja responsabilidade
técnica ficou a cargo da empresa terceirizada licitada para sua execução. Como em
outras realidades dos outros Municípios investigados por esta pesquisa, a Secretaria
de Habitação de São Gonçalo do Amarante não possui profissionais suficientes. Em
função disso, a Secretaria necessitou contratar uma empresa terceirizada para executar
o trabalho social de todos os empreendimentos do PMCMV do Município, conforme
relato da entrevistada:
O Município não tem profissionais suficientes, pois as Assistentes Sociais estão locadas nas Secretarias de Saúde, Educação, Habitação etc. Na hora que você tira uma equipe multidisciplinar de uma Secretaria dessa, aquele serviço vai ficar desfalcado (Coordenadora do PMCMV da SEHAB de São Gonçalo do Amarante, setembro de 2017).
A falta de profissionais na Secretaria levou a Prefeitura a realizar uma licitação
(concorrência pública) para a contratação de uma empresa terceirizada para a
execução do trabalho social em todos os conjuntos habitacionais do empreendimento
Ruy Pereira. A empresa licitada para implementação do trabalho social foi a Start
Consultoria. Ao ganhar a licitação, nos primeiros meses de atuação, a Start solicitou a
reprogramação do PTS junto à Prefeitura e à CAIXA a fim de modificar as atividades,
as metodologias e o Quadro de Composição de Custo (QCI) do PTS. Durante a
entrevista com a Coordenadora do TS da Start, foi possível observar os interesses
financeiros que permeiam o trabalho social do PMCMV:
Nós já tivemos uma reunião com o pessoal da CAIXA [...] e assim, a Start está começando agora. Tudo é novidade, ainda não sabíamos o caminho das pedras, tínhamos muitas dúvidas com questões de contratação de pessoal, de como gastar o dinheiro que tem previsto no PTS. E começou uma confusão, porque para a empresa o dinheiro era pouco para o que tinha previsto para ser feito no PTS, para contratação dos profissionais que estavam sendo exigidos no QCI, o dinheiro não dava. Aí, vem a questão do lucro da empresa, enfim! (Técnica Social da Start Consultoria responsável pelo PTS do Residencial Ruy Pereira VI, setembro de 2016).
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Como informado pela Coordenadora do PMCMV, a reprogramação do PTS
ainda encontra-se em fase de aprovação pela CAIXA, mas a equipe social contratada
já iniciou o trabalho social no residencial desde setembro de 2016, com uma equipe
multidisciplinar, formada por 11 profissionais (Pedagogos, Psicólogo social, Educador
Físico, Assistentes Sociais, Educador Ambiental e Estagiários de Serviço Social). A
ETS se reserva para executar o trabalho social nos dois condomínios já entregues: o
Ruy Pereira I e o VI. O trabalho social possui duração de 10 meses, com o valor total
do PTS de R$ 274.500,00. Para a Coordenadora do PMCMV da SEHAB:
O trabalho social foi licitado. A Start está executando o Projeto de Trabalho Social, que foi aprovado pela Caixa Econômica Federal. Dentro deste projeto existe várias atividades, várias demandas, de acordo com as necessidades dos moradores. Assim, nós fizemos um questionário, nós aplicamos este questionário com todos os moradores para fazer a identificação das principais demandas da população. Então, de acordo com este questionário, foi identificado algumas situações para a equipe técnica executar o trabalho social. Então, o trabalho social é realizado por uma equipe multidisciplinar, pois tem psicólogo, pedagogo, a gente trabalha com crianças, com adolescente. A equipe é composta por 11 profissionais e pelo projeto deveria ser uma equipe para cada condomínio. Entregamos dois empreendimentos, então estes 11 profissionais estão atendendo estes dois. Quando entregarmos mais empreendimento será outra equipe, porque cada empreendimento tem 300 apartamentos, então deve ter uma média de 1200 pessoa. [...] então, é uma demanda bem expressiva, por isso que ficou uma equipe para cada empreendimento (Coordenadora do PMCMV da SEHAB de São Gonçalo do Amarante, setembro de 2017).
No que se refere à atuação do agente operador financeiro no processo de
implementação do trabalho social do PMCMV no residencial, a CAIXA possui a
responsabilidade de orientar, monitorar, avaliar e liberar os recursos do trabalho. Assim,
a CAIXA realizou mais um empreendimento de orientação de gestão do trabalho social
com os técnicos sociais contratados para executar o TS em São Gonçalo do Amarante,
conforme relato abaixo de um técnico social da empresa:
Com relação ao trabalho social, a Técnica Social da CAIXA prestou algumas orientações, passou algumas direções do que estava dando certo e o que deveria continuar, o que não deu certo em outros empreendimentos e o que a gente deveria mudar neste momento. Mas assim, as orientações da CAIXA foram muito voltadas, neste primeiro momento, para estas questões financeiras, de organização e de gestão do PTS (Coordenadora do PMCMV da SEHAB de São Gonçalo do Amarante, setembro de 2017).
A participação é um dos grandes dificultadores para a efetivação do TS. Durante
a elaboração do Projeto de Trabalho, a Coordenadora do PMCMV da SEHAB informou
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que não houve participação dos beneficiários no processo de construção do PTS.
Quando os moradores foram questionados sobre a participação na elaboração do PTS
e das obras, foi esclarecido que:
Não participamos! Foi uma surpresa, pois fizeram as inscrições e não avisaram o que era isso aqui (empreendimento). Sortearam e jogaram a gente para cá. Vocês vão morar num canto e nunca disseram o que era, quem tivesse as suas perninhas viesse descobrir. Então foi assim que descobrimos este canto aqui. Não chegaram dizer o que é! E nunca participamos de nada, nem da obra e nem desse projeto social (Morador do Residencial Ruy Pereira IV, setembro de 2016).
Ao justificar a não participação dos moradores no processo de construção do
PTS, a Coordenadora do PMCMV da SEHAB informou que:
Não houve participação no processo de elaboração do PTS. Nós fizemos o projeto social de acordo com os cadastros que tínhamos na Secretaria. Então, a gente analisou a demanda e fizemos o Projeto de Trabalho Social. Com relação à execução, os beneficiários participaram, porque houve o seminário de apresentação. Então, muitas coisas foram ditas, muitas ideias foram trocadas e os moradores sugeriram, né? Na execução do trabalho social, sim, há uma participação dos beneficiários, mas na elaboração não houve participação (Coordenadora do PMCMV da SEHAB de São Gonçalo do Amarante, setembro de 2017).
Estes depoimentos evidenciam a necessidade de se modificar a concepção das
práticas participativas em projetos de habitação de interesse social, pois ainda persiste
o caráter meramente consultivo, com profissionais coletando informações. Porém, a
realidade mudou e se faz necessário desenvolver um modelo de participação mais
“cooperativo”, onde os moradores participem ativamente de forma efetiva no processo
de elaboração do projeto e da obra. De acordo com Carvalho (2014), é durante a fase
de pré-ocupação que ocorre a discussão de todo o projeto integrado, que precisa contar
com interlocução efetiva por parte de todos os atores envolvidos, inclusive da
comunidade, no sentido de conhecimento do território, dos seus moradores, da
realidade socioeconômica etc. Para Carvalho (2014, p. 32):
Já não se tolera mais a produção de planos e diagnósticos elaborados tão somente pela equipe técnica com posterior apresentação à população. Quer-se, ao contrário, a participação proativa desta no diagnóstico e formulação do projeto social. Considera-se que a equipe em campo e familiarizada com as dinâmicas sociais locais e seus moradores pode induzir de forma efetiva a participação da população já no processo de coleta de informações e diagnóstico.
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Figura 27: Foto (a): Mobilização dos Moradores; Foto (b): Atividade de Terapia
Comunitária com as Famílias Moradoras do Residencial Ruy Pereira VI.
(a) (b) Fonte: Acervo pessoal da autora, 2016.
Quanto à participação dos moradores no trabalho social pós-ocupacional,
percebe-se que muitas famílias encontram-se em situação de vulnerabilidade social e,
devido a este fato, diversas famílias participam mais ativamente das atividades, pois
visualizam no trabalho social uma ponte ou caminho para terem acesso aos direitos
sociais. Daí a importância da execução do trabalho social após a ocupação das novas
moradias. Na pesquisa de campo, foi verificado que durante a implementação do TS,
os próprios moradores buscam a equipe social para atuarem conjuntamente nas
atividades. A respeito da diferença entre as participações dos moradores nos conjuntos
habitacionais do Ruy Pereira I e VI, a Técnica Social da Start informou que:
Outra dificuldade que a gente percebe é com relação à participação. Nós temos sofrido bastante, principalmente no Residencial Ruy Pereira I. É uma baixa participação dos moradores. No condomínio I, temos esta dificuldade, mas no condomínio VI não temos este problema. O que a gente percebe, é que no condomínio VI identificamos mais problemas sociais, todos os tipos de problemas. As pessoas possuem baixo nível de escolaridade, as questões de desemprego são maiores, a vulnerabilidade social é maior, as pessoas possuem mais necessidades no condomínio. Nós atribuímos a estas questões [...]. Então, eles estão participando, estão mais próximos da Equipe Social, pois os moradores enxergam na gente um caminho, uma ponte para buscar os seus direitos. Já o condomínio I, não. O condomínio I [...]. Nós saímos para
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mobilização, uma grande parte dos condomínios estão fechados. E a gente sempre está perguntando quem está em casa [...], a gente vê esta diferença que causa dificuldades (Técnica Social da Start Consultoria responsável pelo PTS do Residencial Ruy Pereira VI, setembro de 2016).
No grupo focal, realizado no residencial (em 20 de outubro de 2016),
questionamos os moradores sobre a compreensão deles acerca do trabalho social em
habitação. Nos depoimentos, percebemos que os moradores associam o trabalho
social às regras de convivência no condomínio. Isso demonstra que a herança dos
antigos normativos do trabalho social da época do BNH ainda se faz presente nas falas
dos beneficiários e de muitos técnicos sociais.
Esse discurso de que o trabalho social é uma ação desenvolvida para moldar
comportamentos e criar regras de convivência comunitárias para as famílias, mesmo
com a mudança de metodologias do TS realizado pelo Ministério das Cidades, ainda
se faz presente. Para os moradores, o trabalho social:
Fala 01: É a socialização das pessoas, de como conviver em comunidade, entendeu? É poder conscientizar a convivência comum sobre como não incomodar, o que você pode fazer para melhorar o convívio. O convívio entre os moradores e os vizinhos, eu entendo assim (Morador do Residencial Ruy Pereira, setembro de 2016). Fala 02: O projeto de trabalho social é o projeto que deve ser instalado em uma comunidade. [...] que tem comunicação como o sistema de adaptação e educação [...] porque o projeto traz para trazer educação para o cidadão, para trazer essa cultura (Morador do Residencial Ruy Pereira, setembro de 2016).
Sobre a gestão condominial e patrimonial do empreendimento, esta ficou a cargo
da CEF. Segundo a Coordenadora do PMCMV, a gestão condominial no residencial
Ruy Pereira VI é realizada por uma empresa terceirizada pela CEF de Curitiba. Acerca
da gestão condominial, foi esclarecido pela Coordenadora do PMCMV da SEHAB que:
A gestão condominial ficou a cargo da Caixa Econômica Federal. A CAIXA fez a licitação destas empresas e ganharam cinco empresas. Cada empresa é responsável pela gestão condominial e atende todos os empreendimentos do RN. A gestão condominial é totalmente responsabilidade CAIXA e empresa, o Município não interfere. Então, a empresa se apresenta e faz de acordo com o normativo da CAIXA para gestão condominial (Coordenadora do PMCMV da SEHAB de São Gonçalo do Amarante, setembro de 2016).
Em comparação com os outros Municípios estudados (Natal e Parnamirim), o
trabalho de gestão condominial tem surtido efeitos positivos. Segundo a líder
comunitária do residencial, a partir da constituição do condomínio e do recebimento da
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taxa condominial, foi possível contratar 5 funcionários, que são moradores do
condomínio, para realizar a limpeza das áreas comuns e vigilância do residencial. Com
referência à atuação da empresa de gestão condominial terceirizada, os moradores
informaram que:
Tem uma pessoa que é o seu Tinoco. Digamos assim, é uma empresa terceirizada e ele representa essa empresa e a Caixa Econômica nesses interesses aqui. O objetivo dele é orientar a gente na forma de mostrar as regras, as leis em que o condômino está coberto, como se desenvolve a questão de gestão condominial, eleição de síndico. E ele explicou tudo isso sim (Morador do Residencial Ruy Pereira IV, setembro de 2016).
Durante a visita de campo in loco para a realização do grupo focal com os
moradores, houve diversos relatos sobre a gestão condominial. Para os moradores,
este tema é colocado como o maior dificultador para o processo de integração
comunitária no residencial. Muitos moradores reclamam do alto valor da taxa do
condomínio, pois, apesar de não mais pagarem aluguel, na nova moradia, houve um
incremento nas despesas familiares com o financiamento, taxa de condomínio, água,
luz, transporte etc.
Figura 28: Renda Média Mensal das Famílias do Residencial Ruy Pereira VI.
Fonte: Start Consultoria, setembro/ 2016.
Ademais, cerca de 63% das famílias são beneficiárias do Programa Bolsa Família,
e isso indica que grande parte dos moradores possuem baixo rendimento familiar
2%
30%
35%
28%
2% 2%
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
Nenhuma renda Menos de 1salário Mínimo
1 salário mínimo até 2 saláriosminímos
Acima de 2salários mínimos
Não sabeinformar
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(Figura 27). Como revelado por um morador: “[...] a taxa de condômino é só confusão,
é muito conturbado essa questão. No caso, são poucos que têm o interesse de levar
em frente de pagar [...]”.
Além disso, apesar de o residencial estar registrado como condomínio aberto,
após ocuparem os apartamentos, os moradores optaram por não retirar o muro que
está em volta do residencial, alegando questões de segurança. Sendo assim, pelo fato
de o condomínio estar fechado, alguns serviços fornecidos pela Prefeitura (iluminação
pública e limpeza) não podem ser feitos, já que estes não são realizados dentro de
áreas particulares, como condomínio fechado. Desta forma, as despesas com
zeladores e limpeza do residencial entram na conta do residencial e aumenta o valor
da taxa de condomínio.
Apesar de todos os problemas que estão presentes no PMCMV, diversas famílias
obtiveram a chance de realizar uma grande mudança de vida a partir do momento em
que recebem uma nova moradia. No entanto, a falta de inserção urbana e social dos
empreendimentos demonstra a existência de inúmeros obstáculos para a sua real
efetividade como política pública de habitação.
A cidade de São Gonçalo do Amarante possui o maior empreendimento do
PMCMV Faixa 1 do RN. Com a grande dimensão que o Residencial Ruy Pereira
apresenta, o trabalho social pré-ocupação e pós-ocupação apresenta diversas
fragilidades em sua implementação.
Muito mais do que realizar um trabalho social na perspectiva de assegurar a
apropriação da moradia ou de ser um elo entre as intervenções físicas e a população a
ser atendida, o TS deverá ser uma das vias para o desenvolvimento social destas
famílias. Porém, a pesquisa pontou que o trabalho social desenvolvido no Residencial
Ruy Pereira é permeado de interesses políticos e econômicos, onde a empresa
terceirizada contratada visa ao lucro sobre a execução do TS e o ente púbico utiliza a
moradia e o TS como moeda de troca política.
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Considerações Finais
O PMCMV foi um Programa de dimensões gigantescas, de imenso impacto
social, disponibilizando residências a baixo custo para milhões de famílias brasileiras.
No entanto, como não tinha apenas um objetivo social, mas também um sentido
econômico, de funcionar como uma política econômica anticíclica de enfrentamento
dos efeitos da crise financeira global deflagrada em 2008 no Brasil, terminou por
atender em grande medida os interesses das empresas construtoras. Por isso, pouco
levou em conta a necessidade de evitar reproduzir os padrões de segregação
socioespaciais já observados nos conjuntos habitacionais do antigo BNH. Como pôde
ser comprovado em nosso trabalho empírico, os empreendimentos foram construídos,
em geral, em regiões periféricas das cidades, sem uma infraestrutura de serviços
adequada para receber tantas novas famílias, o que terminou por reproduzir o padrão
de segregação socioespacial das cidades brasileiras.
Apesar de o Manual de Instruções indicar que o trabalho deveria ser um
componente essencial da política habitacional e urbana no PMCMV, na medida em que
promoveria o exercício da participação e do protagonismo social das famílias
beneficiárias, não foi isso o que se encontrou em nossa investigação. Com o trabalho
social, se executado de forma efetiva, pretende-se fortalecer as potencialidades dos
diversos grupos sociais, fomentando o diálogo e a mediação entre os diferentes atores
(agentes públicos e privados) e a população beneficiária dos projetos. Infelizmente,
nossa investigação comprovou a nossa hipótese, de que o trabalho social nos
empreendimentos não é efetivo.
Percebeu-se também que a não realização ou a precariedade da consecução do
trabalho social deveu-se à pressa com a qual esses empreendimentos foram entregues,
de forma a possibilitar o recebimento dos pagamentos pelas empresas construtoras,
secundarizando a realização daquele trabalho junto as famílias.
A partir dos resultados da pesquisa qualitativa sobre o trabalho social em
projetos de habitação, foram identificados os principais desafios para sua execução.
Durante o processo investigativo, a pesquisa revelou que, nos municípios estudados,
as ações educativas e estruturantes do trabalho social na fase que antecede as obras
e na fase de pós-ocupação apresentou fragilidades, sendo que em muitas ocasiões
elas não ocorrem ou foram descontinuadas.
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Os principais dificultadores para a execução do TS com os moradores após a
ocupação dos imóveis foram a inadequação na composição ou qualificação das
equipes municipais, a pouca valorização do trabalho social pelas gestões dos
municípios, a violência, o tráfico de drogas nos empreendimentos, assim como as
invasões e a comercialização de imóveis ilegalmente. Foi observado também que os
principais problemas para a efetivação do trabalho social derivam da carência de
articulação com outras políticas públicas, principalmente no que se refere à geração de
trabalho e renda e à pouca efetividade nas ações de apoio à gestão condominial.
Durante a pesquisa, foi constatado que a falta de estrutura das Secretarias de
Habitação dos municípios estudados e a insuficiência de profissionais qualificados na
área social levam as prefeituras a terceirizar estes trabalhos para empresas de
consultorias ou ONGs. Além disso, como o FAR passou a disponibilizar recursos
próprios para a realização do trabalho social nos empreendimentos do PMCMV,
observa-se que muitas empresas privadas, que foram contratadas para executar o
trabalho social, visam exclusivamente o lucro financeiro sobre este novo nicho de
mercado, sem um real compromisso com um trabalho social efetivo.
Com o PMCMV, não somente houve um incremento de recursos destinados às
construtoras, mas diversas empresas de consultorias e ONGs passaram a oferecer
estes “novos serviços” e a disputar as licitações dos Estados e Municípios. Contudo, a
falta de experiência destas empresas acaba ocasionando baixa efetividade das ações
do trabalho social nestes territórios. Observou-se que o trabalho social também é
permeado de interesses políticos e econômicos. Em alguns municípios, a realização do
trabalho social funciona como moeda de troca eleitoral.
No que se refere à gestão condominial dos empreendimentos, constatou-se a
existência de diversos problemas no processo. Essas dificuldades estão diretamente
relacionadas com a forma de implementação da gestão condominial. Em muitos
residenciais, identificou-se a falta de capacitação dos novos síndicos e o seu
despreparo para a realização de operações básicas de um condomínio, como a
cobrança e o recebimento da taxa condominial, a definição dos regimentos internos,
eleição do conselho fiscal etc. Constatou-se também uma incompatibilidade entre o
perfil socioeconômico e cultural das famílias atendidas e o modelo de gestão
condominial, típico de classe média, adotado pela CEF.
Página | 127
É necessário repensar o trabalho social na forma como atualmente vem sendo
implementado nos empreendimentos do PMCMV Faixa 1. Os projetos de habitação do
deste Programa, marcados pela construção em massa de moradias, em
megaempreendimentos nas periferias das cidades, fazem emergir diversos problemas
relacionados com inserção urbana e social destes novos contingentes populacionais,
como revela Silva et al (2015). A inexistência ou a má condução do trabalho social
tende a agravar-se com a desarticulação entre as políticas urbana, habitacional e as
demais políticas públicas que se presencia hoje no Brasil.
O trabalho social, quando implementado de forma efetiva, deveria ser utilizado
como um forte indutor para plena integração dos beneficiários do Programa ao novo
ambiente social no qual estão sendo inseridos. Com o intuito a minimizar eventuais
impactos negativos desse processo, o trabalho social deveria contribuir para a melhor
fixação desses beneficiários nas novas unidades habitacionais, fortalecendo o seu
sentimento de pertencimento ao novo território. Mas não foi isso que se constatou na
presente investigação.
O trabalho social em projetos de habitação deveria ir para além de atividades
pontuais com os moradores. Deve pressupor um processo mais participativo, de
empoderamento dos beneficiários. Não pode se restringir somente ao recebimento de
um apartamento. Pelo contrário, o trabalho social deveria estar integrado com outras
políticas públicas, visando não somente o direito à moradia, mas o direito à cidade e a
um conjunto de outros direitos sociais.
Página | 128
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Página | 137
APÊNDICE
Página | 138
Apêndice 01
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO NORTE
IDENTIFICAÇÃO
Nome:
Cargo/função: Terceirizado
1. Sim( ) 2. Não( )
Servidor público ( )
Comissionado ( )
Município:
Período em que trabalhou no PMCMV:
Responsabilidade no desenvolvimento do PMCMV:
Roteiro para entrevistas com os Gestores Públicos
Municípios de Natal, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante.
1. Fale sobre o contexto de implementação do PMCMV no seu Município.
2. O que motivou o Município aderir ao PMCMV?
3. Quantos empreendimentos do PMCM foram entregues no Município? Quantos estão
em fase de construção?
4. Existe algum sistema do PMCMV no Município?
5. Como é realizado o processo de seleção e habilitação das famílias beneficiadas?
6. Fale dos critérios utilizados para realizar a seleção do empreendimento?
7. Como foi realizado o processo de definição da demanda aberta (sorteio) das famílias
beneficiadas?
8. Como é definida o percentual de 50% da demanda fechada (reassentamento) das
famílias beneficiárias?
9. Qual é o papel do Conselho Municipal de Habitação no processo de implementação do
trabalho social do PMCMV?
10. Existiu a participação de algum movimento social urbano no processo de definição da
demanda fechada?
Página | 139
11. (Caso responda sim na pergunta 15). Qual é o papel do movimento social para o
processo de implementação do trabalho social do PMCMV?
12. Fale brevemente sobre a implementação do trabalho social do PMCMV?
13. Comente sobre as fases de execução do trabalho social (pré-obras, durante e pós-
ocupação) realizados.
14. Qual o tamanho da equipe que executa o trabalho social na secretaria?
15. Qual a formação destes profissionais?
16. Houve contratação de empresa terceirizada para execução do trabalho social?
17. (Caso responda sim na pergunta 17). Por qual motivo houve a contratação? Qual o
nome da empresa contratada para executar o trabalho social no Município?
18. Que tipos de atividades e ações a empresa terceirizada é responsável por executar o
Trabalho social?
19. O trabalho Social realizado pela terceirizada alcançou as metas estabelecidas no PTS?
20. Como se dá a interlocução da Secretaria de Habitação com à CFE no processo de
implementação do trabalho social do PMCMV?
21. De que forma a execução dos empreendimentos foi acompanhada pela CEF, em
relação aos procedimentos/metodologias para implementação do trabalho social?
22. De que forma são esclarecidos aos beneficiários sobre as normas e condições do
Programa? Em quem fase do trabalho social isto é realizado? Como é desenvolvido
este processo informativo?
23. Como são atribuídas as moradias aos beneficiários (escolha, sorteio, instrumentos e
estratégias utilizadas)?
24. Houve participação dos moradores durante o desenvolvimento do trabalho social? (Cite
elementos facilitadores e dificultadores da participação).
25. De que forma é realizado o Projeto de Trabalho Social? As famílias beneficiárias
participam do processo de construção do PTS?
26. Como é realizado o processo de monitoramento e avaliação do trabalho social do
PMCMV?
27. Como você avalia o trabalho social do Município?
Página | 140
Apêndice 02
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO NORTE
IDENTIFICAÇÃO
Nome:
Cargo/função: Terceirizado
2. Sim ( ) 2. Não ( )
Servidor público ( )
Comissionado ( )
Município: Período em que trabalhou no PMCMV:
Responsabilidade no desenvolvimento do PMCMV:
Roteiro para entrevistas com os Técnicos Sociais que implementam o
Trabalho social do PMCMV.
Municípios de Natal, Parnamirim e São Gonçalo do Amarante.
I - Contexto geral do processo de implementação do trabalho social.
1. Na experiência de implementação do trabalho social no empreendimento _________,
quais foram as competências e responsabilidades da equipe social do PTS?
2. Foi distinto dos normativos do trabalho social do PMCMV/CEF?
3. Como se deu a realização do trabalho social com os beneficiários, em relação a etapa
de pré-obras, durante e pós-ocupação?
4. Houve particularidades (diferenças) na execução do trabalho social com a demanda
fechada e aberta (sorteio)?
5. Quais foram estas particularidades?
6. Qual é o papel da Caixa Econômica Federal no processo de implementação do
trabalho social?
7. Qual o maior dificultador no processo de execução do trabalho social?
8. Como se deu o processo de construção do Projeto de Trabalho Social? E quais são os
maiores dificultadores neste processo?
9. Quais são ações do trabalho social para o desenvolvimento da gestão condominial e
patrimonial foram realizadas? Cite exemplos.
Página | 141
II - Participação dos beneficiários na execução do trabalho social.
10. Como se deu a participação dos moradores durante o desenvolvimento das obras?
11. Como se deu a participação dos beneficiários no processo de construção do Projeto
de Trabalho Social?
12. Cite elementos facilitadores e dificultadores no processo de participação das famílias
beneficiadas na definição do projeto, no processo de mudança e no pós-ocupacional?
13. Que atividades foram desenvolvidas para constituição e fortalecimento de grupos
representativos da população moradora nos conjuntos habitacionais?
14. Foram discutidos com os moradores regras de convivência coletiva? Como se deu
este processo de discursão?
15. Houve conflitos: sim ou não? E quais foram as formas de enfrentamento destes
conflitos?
III – estratégias de ocupação das unidades habitacionais.
16. Como se deu o processo de escolha das unidades habitacionais (sorteio, ou escolha e
os instrumentos de discussão).
17. Justifique a alternativa escolhida (por que foi a melhor)?
18. Como se deu o processo de reassentamento das famílias da demanda fechada?
19. Os moradores foram orientados quanto as possibilidades de modificações/melhorias
na UHs? Como se deu esse processo de orientação?
20. Tem ocorrido venda, invasões nos empreendimentos?
IV - Estratégias de informações
21. Os moradores foram esclarecidos quanto as normas e condições do Programa? Em
quais momentos?
22. Como se deu o processo informativo para as famílias beneficiarias? Quais foram as
estratégias utilizadas?
V – Articulação
23. O trabalho social foi realizado de forma integrada com outras secretarias ou serviços?
Cite exemplos desenvolvidos?
24. Como se da articulação do trabalho social com as demais políticas públicas?
25. Observações complementares.
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Apêndice 03
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO NORTE
IDENTIFICAÇÃO
Nome
Cargo/função: Terceirizado
3. Sim ( ) 2. Não ( )
Servidor público ( )
Comissionado( )
Período em que trabalhou no PMCMV:
Responsabilidade no desenvolvimento do PMCMV:
Roteiro de entrevistas com os Técnicos Sociais do Trabalho Social da Caixa Econômica Federal.
1. Qual é o papel da Caixa Econômica Federal no processo de implementação do
trabalho social do PMCMV?
2. Qual o tamanho de abrangência da atuação da CAIXA no processo de execução de
gestão social do PMCMV?
3. Existe diferença entre o trabalho social do PMCMV em relação ao trabalho social das
demais políticas públicas de habitação de interesse social?
4. Existe capacitações aos Municípios quanto a gestão social do PMCMV?
5. Discorra sobre a atuação da CAIXA no processo de implementação do trabalho social
do PMCMV realizado na RMNATAL?
6. Discorra sobre a contratação de empresas terceirizadas para execução do Trabalho
social.
7. Como é realizado o monitoramento e avaliação do Trabalho social pela CAIXA?
8. Em sua experiência e visão, quais são as maiores dificuldades dos Municípios no
processo de implementação do Trabalho Social?
9. Qual o papel do CAD ÚNICO dentro do Trabalho social?
10. Como você avaliar o trabalho social executado pelos Municípios de Natal, Parnamirim
e São Gonçalo do Amarante?
11. Como você analisa o cenário atual do trabalho social?
12. Observações complementares.
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Apêndice 04
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO
GRANDE DO NORTE
IDENTIFICAÇÃO
Empreendimento:
Endereço:
Município: N° de participantes:
Roteiro de perguntas para o grupo focal com os moradores dos
empreendimentos do PMCMV (Faixa 1) dos Municípios de Natal, Parnamirim e
São Gonçalo do Amarante.
1. Vocês são oriundos de assentamento ou sorteio?
2. Qual o nome dos assentamentos e bairros em que vocês eram oriundos?
3. Como era antiga moradia? Vocês participaram de algum movimento social urbano?
4. Explique como foi o processo de habilitação para o recebimento do apartamento do
PMCMV?
5. Vocês consideram que houve muita dificuldade (burocracia) para o recebimento do
apartamento?
6. Como se seu a escolha do apartamento?
7. Para vocês, o que é trabalho social?
8. Vocês sabem o que projeto de trabalho social?
9. Vocês participaram do processo de construção do projeto de trabalho social?
10. Vocês realizaram acompanhamento da obra do empreendimento?
11. Vocês foram esclarecidos sobre as normas e condições do Programa? Em que
momentos? Como foi desenvolvido esse processo informativo?
12. Como vocês avaliação a atuação da Prefeitura na condução da entrega dos
apartamentos?
13. Houve atividades/ações da Prefeitura após a entrega do empreendimento em relação a
geração de trabalho e renda?
14. (Obs. Caso responda Sim). Exemplifique?
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15. Houve atividades/ações da Prefeitura após a entrega do empreendimento em relação a
educação ambiental e sanitária?
16. (Obs. Caso responda Sim). Exemplifique?
17. Após a entrega da Prefeitura houve atividades e ações em relação a gestão
condominial?
18. Como foi realizado o processo de definição de sindico?
19. Existem problemas com o pagamento do condomínio (inadimplência)?
20. Como se deu a atuação das assistentes sociais no processo de adaptação da nova
moradia?
21. Houve por parte da Prefeitura o fortalecimento da organização comunitária? (Obs. Caso
responda Sim). Exemplifique?
22. Existe alguma associação de moradores e conselho comunitário?
23. Como vocês avaliam atuação da CAIXA no processo anterior ao recebimento dos
apartamentos e posterior?
24. Como vocês avaliam atuação da Prefeitura no processo anterior ao recebimento dos
apartamentos e posterior?
25. Que tipo de atividades e ações poderiam ter sido realizadas para a melhor condição
adaptação da nova moradia?
26. O que mudou na vida de vocês a partir do recebimento da nova moradia?