Desempenho dos métodos de Runge-Kutta 4-4 e ... Desempenho dos métodos numéricos com relação à...
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Desempenho dos métodos de Runge-Kutta 4-4 e Rosenbrock em função da
posição do cλ crítico em sistemas rígidos
Guilherme G. Loch
1, Joyce S. Bevilacqua,
Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP)
Departamento de Matemática Aplicada
Rua do Matão, 1010 - Butantã
05508-090, São Paulo, SP
E-mail: [email protected], [email protected]
Orlando Rodrigues Jr
Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN-CNEN/SP)
Av. Professor Lineu Prestes, 2242 - Butantã
05508-000, São Paulo, SP
E-mail: [email protected]
Resumo: Modelos n-compartimentais lineares são representados por um sistema de equações
diferenciais ordinárias com coeficientes constantes, que representam as taxas de transferência entre
os compartimentos. Quando uma das taxas de transferência, o c crítico, apresenta ordem de
grandeza muito diferente das demais, o problema torna-se rígido e se faz necessário o uso de
métodos numéricos específicos para esta classe de problemas. Este trabalho apresenta uma
comparação dos desempenhos do método clássico Runge-Kutta 4-4 e do método de Rosenbrock para
problemas compartimentais rígidos, considerando como exemplo a modelagem por compartimentos
da série de decaimento natural do Urânio-235. Por meio da avaliação do desempenho dos métodos
em função da posição do c crítico na cadeia de compartimentos foi possível perceber que quanto
mais próximo do final da cadeia ele estiver, maior será o número de iterações realizadas pelo
Rosenbrock para alcançar a precisão requerida. Porém, conforme previsto pela teoria, mesmo nos
casos mais críticos o método de Rosenbrock apresenta desempenho superior, já que é um método
projetado especificamente para problemas rígidos.
1. Modelos Compartimentais Rígidos
A modelagem matemática é uma ferramenta fundamental para a análise e compreensão de
problemas complexos oriundos de diversas áreas do conhecimento e, em muitos casos, a
representação do problema real é um sistema rígido de equações diferenciais ordinárias (EDO’s). A
rigidez de um sistema aparece quando algumas das componentes de sua solução decaem mais
rapidamente do que outras [2]. Problemas que envolvem sistemas de reações químicas, circuitos
elétricos, vibrações e oscilações configuram alguns exemplos que podem apresentar rigidez [1]. Além
destes, podemos citar os problemas que envolvem séries de decaimento radioativo e são modelados
por uma cadeia fechada de compartimentos.
Este trabalho considera um modelo n-compartimental linear, onde cada compartimento ix ,
ni ,...,1 , está relacionado aos seus adjacentes por meio de taxas de transferência 0i , ni ,...,1 ,
representado por um sistema de equações diferenciais ordinárias com coeficientes constantes:
00
'
xx
txAtx,
(1)
1 Bolsista de Mestrado CNPq
713
sendo [,[ 0 tt , as componentes do vetor x(t) representando cada compartimento, as condições
iniciais dadas por Tnxxxx 0
2
0
1
00 e a matriz A dos coeficientes, que representam as taxas de
transferência entre os compartimentos, contendo elementos somente na diagonal e nas posições
imediatamente abaixo dela. Havendo ramificações no modelo, a matriz A continua sendo triangular
inferior, porém surgem elementos não nulos fora das posições anteriormente citadas.
Um sistema linear com coeficientes constantes é rígido quando todos os autovalores i ,
ni ,...,1 , da matriz dos coeficientes A tiverem parte real 0)Re( i e a sua taxa de rigidez , dada
por:
,)Re(
)Re(
1
1
ini
ini
min
max
(2)
for muito grande [2].
Observe que para o modelo compartimental considerado, as taxas de transferência são
exatamente os autovalores da matriz dos coeficientes A. Dessa forma, quando uma das taxas de
transferência, a qual será chamada de c crítico, apresentar ordem de grandeza muito diferente das
demais, o problema é considerado rígido.
A comparação do desempenho dos métodos numéricos de Runge-Kutta 4-4 e Rosenbrock para
problemas rígidos aparece como escopo principal deste trabalho. Apresentamos um exemplo de
aplicação à área nuclear, considerando a série de decaimento natural do Urânio-235, que é modelada
por um sistema n-compartimenal, onde cada compartimento representa a concentração de um dado
nuclídeo e as taxas de transferência, que têm ordens de grandeza entre 10-12
e 1001
, são as constantes
de decaimento. Também realizamos uma análise das soluções numéricas em função da posição do c
crítico na cadeia de compartimentos.
2. Solução Analítica
Supondo que no instante inicial 00 t existe apenas uma quantidade 0
11 )0( xx e não são
consideradas recirculação, perdas e acréscimos de quantidades durante a dinâmica do sistema (1), é
possível escrever a solução do problema analiticamente da seguinte forma:
.1,1 ,1
10
1 )()(
n
n
i
n
ijj
ijj
t
i
n
nie
xtx
(3)
onde os 0i , ni ,...,1 , são exatamente as taxas de transferência entre os compartimentos e
correspondem aos autovalores da matriz A.
Para modelos onde existem ramificações, ainda é possível utilizar a solução analítica dada pela
equação (3) realizando o desdobramento e considerando cada ramo da cadeia separadamente como
um modelo compartimental linear.
Mesmo que a existência e a unicidade da solução exata sejam garantidas, quando pelo menos
duas taxas de transferência são iguais ou muito próximas, surgem indeterminações no cálculo da
solução analítica dada pela equação (3), de modo que alguns denominadores tornam-se nulos ou
aproximam-se de zero. Neste caso, se faz necessário o uso de estratégias para que estas
indeterminações sejam removidas, tornando-se imperativo o uso de técnicas semi-analíticas ou
numéricas.
714
3. Soluções Numéricas
Independente da existência de soluções analíticas, soluções numéricas permitem adaptações na
modelagem ou em ajustes de dados com maior facilidade. No entanto, sistemas rígidos usualmente
geram instabilidades numéricas, exigindo cautela na escolha do método numérico. Métodos implícitos
como os Rosenbrock e os BDF (Backward Differentiation Formulae) apresentam desempenho muito
superior do que os métodos explícitos [1]. Em geral, para manter a estabilidade dos algoritmos
explícitos é necessário um passo de integração muito pequeno, gerando, consequentemente,
simulações muito lentas. Porém, existem casos em que os métodos explícitos não apresentam
dificuldades na resolução desta classe de problemas.
A proposta deste estudo é comparar o desempenho do método clássico de Runge-Kutta 4-4 com o
do Rosenbrock, que é mais adequado para sistemas rígidos.
Os métodos numéricos foram implementados em Fortran 90 e os algoritmos executados em uma
máquina com processador Intel® Core™ i5 e Windows® 7 64-bit.
3.1 Método de Runge-Kutta 4-4 e a estimativa do passo de integração
O método de Runge-Kutta 4-4 é um método explícito de passo único, de 4ª ordem e 4-estágios,
obtido pelo truncamento da série de Taylor. O método foi implementado de forma que sua
estabilidade e convergência fossem garantidas para uma precisão pré-fixada e o tempo de integração
em aberto.
O tamanho do passo de integração h para que o erro absoluto cometido pelo método de Runge-
Kutta 4-4 no tempo final ft seja inferior a uma precisão 0 pré-fixada foi estimado através da
delimitação do seu erro de discretização global. Sabendo que não existe recirculação, perda e
acréscimo de quantidades durante a dinâmica do sistema, realizando algumas maximizações e
substituições adequadas ao problema e considerando valores para h dentro da região de estabilidade
do método, o tamanho do passo de integração deve satisfazer: 41
0
11
5
120
xAth
f
. (4)
3.2 Método de Rosenbrock
Os métodos de Rosenbrock, também conhecidos como métodos de Runge-Kutta linearmente
implícitos, surgiram como uma alternativa para resolver equações implícitas, que geralmente eram
resolvidas por processos iterativos [1]. O método Rosenbrock implementado para este trabalho é de 3ª
ordem e 4-estágios, utiliza uma mudança de variáveis para reduzir os gastos computacionais e uma
fórmula embutida de 2ª ordem para controle do passo de integração.
4. Simulações e Resultados
4.1 Decaimento Natural do Urânio-235
Considerando os sete primeiros elementos da série de decaimento natural do Urânio-235,
conforme apresentado na Figura 1, é possível visualizar um exemplo de problema rígido, onde a taxa
de rigidez é da ordem de 1013
.
Enquanto a constante de decaimento do 235
U é da ordem de 10-12
, a do 223
Fr é da ordem de 1001
.
Essa grande diferença entre as ordens de grandeza se traduz em uma matriz dos coeficientes A quase
singular, cujo valor do determinante é aproximadamente 2510140,9 .
715
A solução analítica e as aproximações numéricas para o problema proposto foram construídas
considerando que no instante inicial existem 100 unidades de 235
U e que o inventário dos demais
elementos da série é nulo.
Figura 1. Série de decaimento natural do Urânio-235 com taxas de decaimento em dia-1
[3].
A Tabela 1 apresenta a solução analítica para o problema proposto após terem sido percorridos
1006
dias a partir do instante inicial e os erros absolutos cometidos pelos métodos, dada uma precisão 0410 . O tamanho do passo de integração utilizado para o método de Runge-Kutta 4-4 foi
05105 h dia, estimado pela equação (4). Este mesmo valor foi utilizado como passo inicial para o
método de Rosenbrock e os passos mínimo e máximo utilizados, calculados por meio da estratégia de
controle do passo, foram, respectivamente, 05105 dia e aproximadamente 3.781 dias.
Elemento Solução Analítica Erro Absoluto do
Runge-Kutta 4-4
Erro Absoluto do
Rosenbrock
235U 9,99997300003644E+01 1,4E-05 9,9E-14
231Th 4,14196627908533E-10 5,9E-17 2,0E-26
231Pa 2,62322611868427E-04 6,2E-11 5,1E-17
227Ac 1,72402403970940E-07 4,1E-14 3,4E-20
227Th 4,05986467670791E-10 5,5E-12 5,5E-12
223Fr 1,40090679162464E-13 1,4E-13 1,4E-13
223Ra 3,53799074572466E-10 1,1E-10 1,1E-10
Tabela 1. Solução analítica para o problema e erros absolutos após 1006
dias.
Para que a solução aproximada atingisse a precisão pré-fixada, foram necessárias 10102 e 415
iterações para os métodos de Runge-Kutta 4-4 e Rosenbrock, respectivamente. O método de
Rosenbrock mostrou um desempenho superior ao método de Runge-Kutta 4-4 em função da
velocidade com a qual as soluções são calculadas, uma vez que apresentou soluções convergentes e
consistentes com um número de iterações cerca de 1008
vezes inferior.
716
4.2 Desempenho dos métodos numéricos com relação à posição do cλ crítico
O impacto da posição do c crítico foi estudado para uma cadeia linear composta por 7
compartimentos, na qual todas as taxas de transferência são iguais a 1, com exceção do c , que varia
de 10-06
a 10-12
. Para a posição do c crítico na cadeia foram consideradas três situações: na posição
inicial ( 1 ), na posição intermediária ( 4 ) e na posição final (7 ). As aproximações numéricas para o
problema proposto foram construídas para o tempo final 0610ft , considerando Tx 001000 .
Observe que a taxa de rigidez do sistema varia entre 1006
e 1012
conforme a variação do c , o que
comprova a rigidez do problema.
Em todas as situações consideradas, sabendo que 321
5 A e fixando uma precisão 0410 , o
passo de integração que garante a convergência e a estabilidade do método de Runge-Kutta 4-4,
estimado por meio da equação (4), é 0310h , o que corresponde a 1009
iterações do método.
A análise do desempenho do método de Rosenbrock de acordo com a posição Pi do c foi
realizada usando 0310h como passo de integração inicial. Os tamanhos mínimo (hmin) e máximo
(hmax) para os passos de integração utilizados e calculados pela estratégia de controle do passo, bem
como o número de iterações (n) necessárias para que o método encontrasse soluções convergentes e
consistentes para o problema são apresentados na Tabela 2.
Pi 0610i 0910i 1210i
hmin hmax n hmin hmax n hmin hmax n
1 5,7E-04 3,6E+01 35.084 1,0E-03 3,6E+04 770 1,0E-03 5,0E+04 98
4 4,8E-06 3,6E+01 360.062 4,8E-06 3,6E+04 332.401 4,8E-06 5,0E+04 332.393
7 4,8E-06 3,6E+01 447.734 4,8E-06 3,6E+04 420.074 4,8E-06 5,0E+04 420.066
Tabela 2. Desempenho do Rosenbrock em função da variação da posição Pi e do valor do c crítico.
A Figura 2 mostra a variação do tamanho do passo de integração e o número de iterações
realizadas pelo método de Rosenbrock de acordo com a posição do c crítico no caso em que ele vale
10-06
.
É possível perceber a partir das situações consideradas que o método de Rosenbrock é bastante
sensível a mudanças na posição do c crítico. Quando o elemento crítico está na posição P1, o
número de iterações do Rosenbrock é significativamente inferior ao número de iterações nos casos em
que ele está nas posições P4 e P7.
Quanto mais próximo do final da cadeia estiver posicionado o c crítico, maior será o número de
iterações necessárias para o método de Rosenbrock obter soluções convergentes e consistentes, já que
para manter a estabilidade do método, o tamanho do passo de integração é reduzido. Porém, mesmo
na pior das situações, em que o c crítico vale 10
-06 e está na posição P7, o método de Rosenbrock
continua em vantagem com relação ao método de Runge-Kutta 4-4 no que diz respeito ao número de
passos realizados, já que para gerarem soluções com mesma precisão, o primeiro requer 447.734
iterações enquanto o segundo necessita de 1009
iterações.
Novamente, o método Rosenbrock teve um desempenho superior ao Runge-Kutta 4-4, atingindo
a mesma precisão com um número significativamente inferior de passos, devido ao fato de ser um
método especificamente projetado para equações rígidas.
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Figura 2. Tamanho e número de passos do Rosenbrock em função da posição Pi do c crítico.
5. Conclusão
Foram comparados os desempenhos dos métodos de Runge-Kutta 4-4 com passo fixo e
Rosenbrock de 3ª ordem com passo adaptativo para a resolução de problemas rígidos.
A modelagem da série de decaimento natural do Urânio-235 foi considerada como exemplo de
aplicação para comparação dos métodos. O método de Rosenbrock mostrou desempenho superior,
apresentando soluções convergentes e consistentes com um número de iterações cerca de 1008
vezes
menor.
O desempenho do método de Rosenbrock fica condicionado à posição, na cadeia, do
compartimento que tem taxa de transferência com ordem de grandeza muito diferente das demais, de
modo que quanto mais próximo do final da cadeia ele estiver, maior será o número de iterações
realizadas pelo Rosenbrock para alcançar a precisão requerida. Porém, mesmo nos casos mais críticos,
o Rosenbrock apresenta soluções com mesma precisão do que o método de Runge-Kutta 4-4
realizando um número de iterações cerda de 1004
vezes inferior.
Para trabalhos futuros, a proposta é analisar os casos em que ocorrem retiradas e/ou acréscimos
de quantidades nos compartimentos durante a dinâmica do sistema, o que permite considerar
aplicações na produção de radiofármacos.
Referências
[1] E. Hairer, G. Wanner, “Solving Ordinary Differential Equations II (Stiff and Differential-
Algebraic Problems)”, Springer, Berlin, 1996.
[2] J. D. Lambert, “Numerical methods for ordinary differential systems: the initial value problem”,
John Wiley & Sons, New York, 1991.
[3] G. F. Thomas, D. H. Barber, Stiffness in radioactive decay chains, Ann. Nucl. Energy, vol 21 (5),
pp.309–320, (1994).
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