Desenvolvimento de um sistema de polarização por contacto...
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Universidade do Minho
Escola de Engenharia Departamento de Electrónica Industrial
Desenvolvimento de um sistema de polarização por contacto de materiais electroactivos
Fernando José Ribeiro Maia
Dissertação submetida à Universidade do Minho para a obtenção do grau de Mestre em Electrónica Industrial e Computadores
Novembro de 2008
Dissertação realizada sob a orientação científica do Doutor José
Gerardo Vieira da Rocha, Professor Auxiliar do Departamento de
Electrónica Industrial da Universidade do Minho e sob co-
orientação científica do Doutor Senentxu Lanceros-Méndez,
Professor Associado do Departamento de Física da Universidade
do Minho.
A ti e aos meus pais, por tudo…
Toda a nossa ciência, comparada com a
realidade, é primitiva e infantil e, no
entanto, é a coisa mais preciosa que temos.
Albert Einstein
vii
Agradecimentos
Ao longo dos últimos meses durante os quais esta dissertação foi desenvolvida,
várias pessoas foram surgindo na minha vida, contribuindo com o seu conhecimento e
ajuda. Sem estas a conclusão e respectiva escrita desta dissertação não seria possível,
como tal não posso deixar de expressar aqui o meu mais sincero agradecimento:
Ao meu orientador Doutor José Gerardo Vieira da Rocha agradeço a orientação
dada, não só durante este projecto, mas durante um maior projecto que foi a
conclusão do Mestrado Integrado. Seus sábios conselhos, sugestões e
esclarecimentos foram fundamentais para a conclusão desta dissertação.
Agradeço também a valiosa ajuda na revisão final.
Ao Doutor Senentxu Lanceros-Méndez do Departamento de Física da
Universidade do Minho e meu co-orientador, sem dúvida uma das melhores
pessoas e mais marcante, que tive o prazer de conhecer por frequentar esta mui
nobre academia. Agradeço pela sua infindável disponibilidade, incentivo e
confiança que sempre demonstrou em mim. Agradeço também todos os
conselhos, orientações e sempre úteis sugestões que me deu bem como pela
ajuda na revisão final desta dissertação.
A todos os colegas do departamento de física que sempre prestaram toda a ajuda
que necessitei.
A todos os meus colegas e amigos do Núcleo Estudantil do IEEE da
Universidade do Minho, agradeço toda a ajuda prestada e valiosas sugestões.
A todas as pessoas que de alguma forma contribuíram positivamente para a
realização desta dissertação.
À doutora Sara Silva minha futura esposa, agradeço todo o incentivo e apoio que
me deu nos bons e maus momentos, mas acima de tudo por sempre ter
acreditado em mim e nas minhas capacidades.
Por último mas não menos importante aos meus pais, agradeço profundamente o
esforço financeiro feito ao longo destes anos para que eu me pudesse formar e
poder sonhar com um futuro melhor. Por todo o apoio que me deram ao longo
de toda a minha vida académica e não só.
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ix
Resumo
O processo de polarização - activação de materiais electroactivos pela aplicação
de um campo eléctrico - é um dos passos mais importantes e delicados na preparação de
materiais piezoeléctricos para as múltiplas aplicações baseadas neles.
A presente dissertação insere-se neste âmbito e tem como objectivo preparar
uma montagem experimental que permitirá tanto polarizar os materiais como optimizar
este processo através do conhecimento dos mecanismos físicos envolvidos.
O projecto baseia-se essencialmente na implementação de uma montagem que
consta de uma fonte DC e um picoamperímetro. Sendo esta montagem de natureza
simples, o desafio essencial foi a programação conjunta destes elementos para poder
fazer uma polarização flexível (em diferentes condições), monitorizando os parâmetros
essenciais a esta.
Deste modo, o programa controla a fonte de tensão para poder efectuar um
varrimento a uma determinada frequência (e.g. 0.003 Hz), entre dois valores pré-
determinados (e.g. de -1000 V até 1000 V), com um passo controlado e durante um
determinado número de ciclos.
Durante esse procedimento é monitorizada a tensão eléctrica aplicada em função
do tempo, assim como a corrente eléctrica em função do tempo e a corrente eléctrica em
função da tensão eléctrica aplicada, para obtenção da curva de histerese. Estes valores
serão guardados em forma de tabela e mostrados no ecrã em forma de gráfico.
Foram efectuados testes em todos os passos do processo e foi verificado o
correcto funcionamento do sistema desenvolvido através da aplicação num determinado
material: zirconato titanato de chumbo.
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Abstract
The poling process – activation of electroactive materials trough the application
of an electric field – is one of the most important and delicate steps in the preparation of
piezoelectric materials for its multiple applications.
This thesis deals with the development of an experimental set-up which will
allow the polarisation of the materials and also to improve the poling process through
the investigation of the physical mechanisms involved.
The project is essentially based in the implementation of an experimental set-up
that comprises a DC source and a picoammeter. Being this an easy set-up, the challenge
was essentially the programming of these elements to allow a flexible poling (in
different conditions), monitoring the parameters involved.
In this way, the software controls the DC source so it can perform a sweeping at
a given frequency (e.g. 0.003 Hz), between two predetermined voltage values (e.g. from
–1000V to +1000V), with a controlled step and during a predetermined number of
cycles.
During this procedure the voltage applied and current are recorded as a function
of time, as well as the evolution of the voltage as a function of the electric current in
order to plot a graph of hysteresis. These values are saved into a file, printed in the form
of a table and plotted as a graph.
Tests were conducted in every step of the process to ascertain the correct
behaviour of developed system through the application to a material: the piezoelectric
lead zirconate titanate.
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xiii
Índice:
Resumo ............................................................................................................... ix
Abstract ............................................................................................................... xi
Índice de Figuras ............................................................................................. xviii
Índice de Tabelas .............................................................................................. xxii
Lista de Acrónimos e Termos ............................................................................ xxiii
Lista de Símbolos .............................................................................................. xxv
Convenção dos Eixos ........................................................................................ xxvii
Capítulo 1 - Introdução ......................................................................................... 1
1.1 História da Piezoelectricidade ............................................................................................. 1
1.2 Propriedades Electroactivas ................................................................................................ 3
1.3 Ferroelectricidade ............................................................................................................... 4
1.4 O Efeito Piezoeléctrico ........................................................................................................ 6
1.5 Coeficientes Piezoeléctricos ................................................................................................ 8
1.5.1 Coeficiente de Acoplamento Electromecânico:.................................................. 9
1.5.2 Coeficiente de Carga: ........................................................................................ 9
1.5.3 Coeficiente de Diferença de Potencial ou coeficiente “g”: ................................. 9
1.5.4 Constantes elásticas: ....................................................................................... 10
1.6 Objectivos da Dissertação ................................................................................................. 10
1.7 Organização da Dissertação .............................................................................................. 11
Bibliografia ............................................................................................................................. 13
Capítulo 1 - Introdução
xiv
Capítulo 2 - Materiais Piezoeléctricos ................................................................. 15
2.1 Materiais Cristalinos ......................................................................................................... 15
2.1.1 Quartzo (SiO2): ............................................................................................... 15
2.1.2 Niobato de lítio (LiNbO3) e tântalo de lítio (LiTaO3): ......................................... 16
2.2 Semicondutores ............................................................................................................... 18
2.3 Materiais Cerâmicos ......................................................................................................... 20
2.3.1 Titanato de Bário (BaTiO3) e Titanato Zirconato de Chumbo (PZT): .................. 20
2.3.2 Titanato de chumbo modificado com cálcio (PTCa): ........................................ 21
2.4 Materiais Poliméricos........................................................................................................ 22
2.4.1 Poli(fluoreto de vinilideno) ou PVDF: ............................................................... 23
2.5 Copolímeros ..................................................................................................................... 24
2.5.1 Poli(fluoreto de vinilideno trifluoretileno): ...................................................... 25
2.6 Materiais Compósitos ....................................................................................................... 26
Bibliografia ............................................................................................................................. 29
Capítulo 3 - Estado da Arte ................................................................................. 31
3.1 Histerese .......................................................................................................................... 31
3.2 Métodos de Polarização de Materiais Electroactivos:.......................................................... 33
3.2.1 Método das Placas Paralelas: .......................................................................... 33
3.2.2 Método de Bauer: ........................................................................................... 33
3.2.3 Método de Polarização por Corona: ................................................................ 34
3.3 Campo Eléctrico Aplicado no Processo de Polarização ...................................................... 36
3.3.1 Aplicação de uma tensão eléctrica sinusoidal: ................................................. 36
3.3.2 Aplicação de ciclos Bipolares/Unipolares: ........................................................ 38
Bibliografia ............................................................................................................................. 42
Capítulo 4 - Sistema Desenvolvido ....................................................................... 43
4.1 Descrição geral do sistema desenvolvido ........................................................................... 43
4.2 Barramento GPIB ............................................................................................................. 44
4.2.1 Origem: ........................................................................................................... 45
4.2.2 Controlador: ................................................................................................... 46
4.2.3 Endereços dos dispositivos GPIB: .................................................................... 46
4.2.4 Barramento GPIB e conversor USB – GPIB: ...................................................... 46
Capítulo 1 - Introdução
xv
4.3 Fonte de tensão DC (Keithley 248).................................................................................... 47
4.3.1 Operação remota da fonte de alimentação DC: ............................................... 49
4.3.2 Alta tensão: ..................................................................................................... 50
4.4 Picoamperimetro .............................................................................................................. 51
4.5 Relé ................................................................................................................................. 52
4.6 Circuito comutador de tensão ........................................................................................... 53
Bibliografia: ............................................................................................................................ 57
Capítulo 5 - Programa Informático de Controlo ................................................... 59
5.1 Ciclos Bipolares ................................................................................................................ 60
5.1.1 Varrimento Crescente: .................................................................................... 64
5.1.2 Varrimento Decrescente: ................................................................................ 65
5.1.3 Amostragem: .................................................................................................. 66
5.1.4 Conclusão: ...................................................................................................... 68
5.2 Ciclos Unipolares .............................................................................................................. 69
5.3 Gráficos finais ................................................................................................................... 69
Capítulo 6 - Resultados Experimentais ................................................................ 71
6.1 Tensão eléctrica aplicada .................................................................................................. 71
6.2 Tensão eléctrica aplicada e corrente lida ........................................................................... 73
6.3 Conclusão ........................................................................................................................ 78
6.4 Trabalho futuro ................................................................................................................. 78
Capítulo 1 - Introdução
xvi
Capítulo 1 - Introdução
xvii
Índice de Figuras
Figura 1: Eixos ortogonais convencionados em que 3 é a direcção da espessura;
1 e 2 são as direcções laterais; 4, 5 e 6 são as direcções rotacionais [8]. ... xxvii
Figura 2: Amostras Piezoeléctricas; a) Amostra piezoeléctrica cúbica;
b) Amostra piezoeléctrica cilíndrica [8]. .................................................. xxvii
Figura 3: a) Representação esquemática dos dipolos eléctricos de um material
piezoeléctrico; b) Efeito piezoeléctrico directo; c) Efeito piezoeléctrico
inverso [12]. .................................................................................................. 2
Figura 4: Relação entre a simetria e as propriedades electroactivas dos materiais [6]. .. 4
Figura 5: Ciclo de Histerese típico de um material ferroeléctrico [8]. ........................... 6
Figura 6: Modelo molecular simples para explicação do efeito piezoeléctrico; a)
Molécula não perturbada; b) molécula sujeita a uma força externa,
e c) Efeito de polarização na superfície do material [10]. ............................... 7
Figura 7: Polarização do material piezoeléctrico; a) Dipolos aleatórios;
b) Polarização, e c) Polarização remanescente [10]. ....................................... 7
Figura 8: Exemplos de efeitos piezoeléctricos [10]....................................................... 8
Figura 9: Terminologia utilizada nos parâmetros piezoeléctricos [12]. ......................... 8
Figura 10: Ilustração da resposta segundos os diferentes coeficientes ij [8]. ............... 10
Figura 11: Cortes característicos de cristais de quartzo para ressonâncias [1]. ............ 16
Figura 12: Cortes característicos de cristais de niobato ou tântalo de lítio [1] ............. 17
Figura 13: Formas de interligações para compósitos de dois componentes. As setas
indicam a direcção em que cada componente está conectado [2]. .............. 28
Figura 14: Curva de histerese num material piezoeléctrico [10].................................. 32
Figura 15: Método de polarização de Bauer: 4 e 5 – Eléctrodos; 1 – Folha de
material a polarizar; 2 e 3 – Filmes de material ferroeléctrico [2]. ............. 33
Figura 16: Sistema de polarização pela técnica de corona [5]. .................................... 35
Figura 17: Gráfico de Polarização por campo eléctrico (a preto) e de corrente por
campo eléctrico (a vermelho) [9]. .............................................................. 37
Figura 18: Relaxação dos dipolos à medida que o campo aplicado é reduzido [9]....... 39
Figura 19: Efeito da resistência eléctrica não linear [13]. ........................................... 39
Capítulo 1 - Introdução
xviii
Figura 20: Fotografia do sistema desenvolvido. ......................................................... 43
Figura 21: Esquema geral do hardware utilizado na polarização de materiais
piezoeléctricos. ......................................................................................... 44
Figura 22: Barramento GPIB ..................................................................................... 47
Figura 23: Conversor USB GPIB ............................................................................... 47
Figura 24: Visão do painel traseiro da fonte de alimentação de alta tensão [2]. ........... 48
Figura 25: Visão do painel frontal da fonte de alimentação de alta tensão [2]. ............ 48
Figura 26: Impedância equivalente de entrada quando o Zero Check está activo [2]. .. 51
Figura 27: Esquema eléctrico do relé utilizado. .......................................................... 53
Figura 28: Circuito comutador de tensão. ................................................................... 53
Figura 29: DAQ a enviar um sinal de 0V e leitura de 5kV na saída. ........................... 55
Figura 30: DAQ a enviar um sinal de 5V e leitura de -5 kV na saída. ......................... 56
Figura 31: Interface do software de controlo .............................................................. 59
Figura 32: Sequência usada na idealização do software. ............................................. 60
Figura 33: Condição de paragem do ciclo bipolar....................................................... 61
Figura 34: Como enviar dados por GPIB para a fonte de alta tensão. ......................... 61
Figura 35: Configuração do picoamperímetro para fazer leituras. e desactivação
do Zero Check........................................................................................... 62
Figura 36: Inicializações da tensão final, número de ciclos unipolares, número
de ciclos bipolares, amplitude dos passos de tensão e número total de
amostras.................................................................................................... 62
Figura 37: Cálculo do número de amostras por varrimento de tensão. ........................ 63
Figura 38: Inquirição de tensão. ................................................................................. 63
Figura 39: Varrimento crescente de tensão. ................................................................ 65
Figura 40: Varrimento decrescente de tensão. ............................................................ 66
Figura 41: Bloco usado na recolha de amostras de tensão e corrente. ......................... 67
Figura 42: Bloco de leitura do valor da corrente. ........................................................ 68
Figura 43: Leitura dos ficheiros de tensão e corrente e apresentação dos gráficos
finais. ........................................................................................................ 69
Capítulo 1 - Introdução
xix
Figura 44: Ciclo de tensão bipolar aplicada. ............................................................... 72
Figura 45: Ciclos de tensão unipolar aplicados ........................................................... 72
Figura 46: Ciclos bipolares e unipolares aplicados. .................................................... 73
Figura 47: Gráfico da corrente lida que atravessa a amostra. ...................................... 73
Figura 48: Gráfico da amplitude das amostras obtidas pelo software. ......................... 74
Figura 49: Gráfico do ciclo de tensão bipolar por corrente lida durante esse ciclo. ..... 75
Figura 50: Gráfico de um ciclo de tensão unipolar por corrente lida durante esse
ciclo. ......................................................................................................... 75
Figura 51: Gráfico dos três ciclos de tensão unipolares e por respectiva corrente
lida durante esses ciclos. ........................................................................... 76
Figura 52: Gráfico de um ciclo de tensão bipolar e um ciclo de tensão unipolar
por respectiva corrente lida durante esses ciclos. ....................................... 77
Figura 53: Gráfico completo dos ciclos bipolar e unipolares aplicados e
respectivas correntes lidas. ........................................................................ 77
Capítulo 1 - Introdução
xx
Capítulo 1 - Introdução
xxi
Índice de Tabelas
Tabela 1: Coeficientes electromecânicos característicos para cristais de quartzo......... 16
Tabela 2: Coeficientes electromecânicos característicos para cristais LiNbO3
e LiTaO3 . ................................................................................................... 18
Tabela 3: Coeficientes dieléctricos e piezoeléctricos de semicondutores
piezoeléctricos . .......................................................................................... 19
Tabela 4: Coeficientes electromecânicos característicos para cerâmicas
piezoeléctricas............................................................................................. 22
Tabela 5: Valores típicos para coeficientes electromecânicos de polímeros
piezoeléctricos ........................................................................................... 25
Tabela 6: Tabela com um sumário dos comandos possíveis de realizar por barramento
GPIB ........................................................................................................... 49
Tabela 7: Algumas características da amostra utilizada. ............................................. 71
Capítulo 1 - Introdução
xxii
Capítulo 1 - Introdução
xxiii
Lista de Acrónimos e Termos
Acrónimo / Termo Designação
MHz Megahertz
mHz Milihertz
DC Corrente Contínua
kV Quilovolt
Pr Polarização Remanescente
Ps Polarização de Saturação
Ec Campo Coercivo
Labview Laboratory Virtual Instrument Engineering Workbench
Qm Qualidade Mecânica
CT Coeficiente de Temperatura
SAW Ondas Acústicas de Superfície
CVD Chemical Vapour Deposition
PZT Titanato Zirconato de Chumbo
BT Titanato de Bário
PVDF Poli(fluoreto de vinilideno)
Mbps Megabit por segundo
NF Normalmente Fechado
NA Normalmente Aberto
DAQ Placa de aquisição de dados
Capítulo 1 - Introdução
xxiv
Capítulo 1 - Introdução
xxv
Lista de Símbolos
Símbolo Descrição Unidade
Tc Temperatura de Curie K
c Temperatura de Curie – Weiss K
Permitividade Dieléctrica F/m
T Temperatura K
kij Coeficiente de Acoplamento -
dij Coeficiente de Carga C/N
gij Coeficiente de Diferença de Potencial (V/m)/(N/m2)
Capítulo 1 - Introdução
xxvi
Capítulo 1 - Introdução
xxvii
Convenção dos Eixos
A seguinte convenção de eixos foi usada ao longo desta dissertação:
Figura 1: Eixos ortogonais convencionados em que 3 é a direcção
da espessura; 1 e 2 são as direcções laterais; 4, 5 e 6 são
as direcções rotacionais [8].
Figura 2: Amostras Piezoeléctricas; a) Amostra piezoeléctrica cúbica; b) Amostra
piezoeléctrica cilíndrica [8].
Capítulo 1 - Introdução
xxviii
1
Capítulo 1
Introdução
Na fase inicial deste capítulo faz-se uma breve introdução histórica sobre a
piezoelectricidade, quem a descobriu, quando a descobriu e em que contexto histórico
se insere. Após introdução histórica segue-se uma análise sobre os objectivos desta
dissertação, do ponto de vista do estudo de cristais, polímeros e cerâmicas
electroactivas, da polarização dos mesmos e do efeito piezoeléctrico em geral.
Numa última fase deste capítulo faz-se uma exposição da organização geral
desta dissertação.
1.1 História da Piezoelectricidade
O efeito piezoeléctrico foi descoberto em 1880 por Pierre Curie (1859 – 1906) e
Jacques Curie (1856 – 1941) quando estudavam o efeito da pressão na geração de carga
eléctrica pelos cristais como o quartzo, a turmalina e o sal de Rochelle. Não parece ter
sido uma descoberta casual visto que Pierre Curie havia previamente estudado a relação
entre a piroelectricidade e a orientação das cadeias cristalinas, este estudo parece ter
orientado os irmãos Curie a procurarem não só da electrificação devido à pressão mas
também a preverem em que direcção essa pressão deveria ser aplicada e em que classe
de cristais este efeito devia ser esperado [1]. Desde então tem motivado inúmeras
investigações para o desenvolvimento de sistemas transdutores electromecânicos.
O efeito consiste basicamente na conversão de energia mecânica (do grego
piezein que significa espremer ou pressionar) em eléctrica [2], a este se denominou
“efeito piezoeléctrico directo” (figura 3 b)). Posteriormente, em 1881, por análises
termodinâmicas, Gabriel Jonas Lippmann (1845 – 1921, Prémio Nobel da Física em
Capítulo 1 - Introdução
2
1908 por ter produzido a primeira chapa fotográfica a cores) previu a existência do
“efeito piezoeléctrico inverso” (figura 3 c)), que consiste no aparecimento de uma
deformação do material quando submetido a um campo eléctrico. [3].
Após a sua descoberta, o efeito piezoeléctrico não mais foi usado até à Primeira
Grande Guerra Mundial quando Paul Langevin (1872 – 1946) tentou aplicar o cristal de
quartzo como meio de localizar submarinos alemães desenvolvendo um sonar que usava
esse cristal como elemento piezoeléctrico. Em 1917 numa conferência organizada pelo
National Research Council, Paul Langevin anuncia ter gerado ondas ultra-sónicas por
recurso a um transdutor constituído por cristais de quartzo organizados em mosaico e
colados entre duas placas de aço, montado num compartimento apropriado para
submersão, a este foi apelidado de transdutor do tipo Langevin e acabou sendo a
aplicação original da piezoelectricidade em engenharia de ultra-sons [1].
O sucesso deste sonar levou ao desenvolvimento de dispositivos piezoeléctricos
ressonantes e não-ressonantes tais como:
Osciladores de quartzo na ordem dos MHz com o intuito de serem utilizados
como estabilizadores de frequência;
Novos testes de materiais usando a propagação de ondas ultra-sónicas, que
permitiram determinar com relativa facilidade as propriedades elásticas e
viscosas dos líquidos e dos gases;
Sensores que permitiam a medição de pressões transientes, tornando possível o
estudo de explosivos e motores de combustão interna, assim como vibrações,
acelerações e impactos que até então eram imensuráveis. [4]
Figura 3: a) Representação esquemática dos dipolos eléctricos de um material piezoeléctrico;
b) Efeito piezoeléctrico directo; c) Efeito piezoeléctrico inverso [12].
Capítulo 1 - Introdução
3
Entre 1941 e 1947, nos EUA, USSR e Japão, a partir de uma série de estudos, entre
os quais o de Shepard Roberts, descobriu-se que cerâmicas ferroeléctricas de Titânio de
Bário (TiO3Ba) polarizadas, apresentam boas propriedades piezoeléctricas marcando o
início da geração das piezocerâmicas.
Os estudos de soluções sólidas de Pb(Zr-Ti)O3, por Jaffe et. al [5] nos anos 50,
resultaram na obtenção de cerâmicas de titanato de zirconato de chumbo (PZT), que
passaram a ser objecto de frequentes investigações para optimização de suas
propriedades ou como motivação para o desenvolvimento de novos compostos
cerâmicos [5]. Com estes materiais disponíveis, os fabricantes desenvolveram diversos
tipos de filtros de sinal piezocerâmicos, que eram dirigidos às necessidades emergentes
da televisão, rádio e do mercado das comunicações. Também foram desenvolvidos
isqueiros piezocerâmicos a serem usados para a ignição de gás natural/butano.
Actualmente os materiais piezoeléctricos são utilizados como elementos
sensores e/ou actuadores em aplicações tecnológicas que recorrem a baixas frequências
(na faixa dos Hz) até frequências mais elevadas (na faixa dos 109 Hz). Em baixas
frequências são usados sobretudo materiais policristalinos (cerâmicos, polímeros ou
compósitos). Em aplicações de frequências mais elevadas usam-se cristais e filmes
finos.
1.2 Propriedades Electroactivas
As propriedades eléctricas tais como a piroelectricidade, piezoelectricidade e
ferroelectricidade estão intimamente associadas às estruturas cristalinas e químicas dos
materiais.
Das trinta e duas classes pontuais de simetria diferentes em que todos os
materiais cristalinos podem ser classificados, onze possuem um centro de simetria e são
designados por centrossimétricos, os restantes vinte e um que não possuem centro de
simetria são chamados de não-centrossiméctricos. Dentro desta classe, a dos não-
centrossiméctricos, vinte exibem piezoelectricidade e destes, apenas dez exibem
piroelectricidade. Um material piezoeléctrico exibe polarização (carga eléctrica) na
aplicação de uma tensão mecânica, ou, quando sujeito a um campo eléctrico externo, o
material piezoeléctrico exibe uma expansão ou uma contracção. Uma vez que possuem
um único eixo polar, estes cristais polares são espontaneamente polarizados na direcção
Capítulo 1 - Introdução
4
desse eixo. A amplitude da polarização espontânea e as variações eléctricas que
ocorrem com a alteração da temperatura é designada por efeito piroeléctrico.
Nos materiais ferroeléctricos, um campo eléctrico aplicado externamente pode
inverter o sentido de polarização espontânea, logo, todos os materiais ferroeléctricos são
piroeléctricos, mas nem todos os materiais piroeléctricos são ferroeléctricos. Muitos
materiais piroeléctricos são ambos ferroeléctricos e piezoeléctricos, contudo, enquanto
todos os materiais ferroeléctricos são piezoeléctricos, apenas alguns piezoeléctricos são
ferroeléctricos [6].
A figura 4 ilustra a relação entre as classes de simetria e as propriedades
electroactivas.
1.3 Ferroelectricidade
Um ferroeléctrico é um material piroeléctrico cuja aplicação de um campo
eléctrico pode inverter a direcção da polarização espontânea ou seja, no estado
Figura 4: Relação entre a simetria e as propriedades electroactivas dos materiais [6].
Capítulo 1 - Introdução
5
ferroeléctrico, o centro das cargas positivas não coincide com o centro das cargas
negativas. Assim, um cristal ferroeléctrico exibe um momento dipolar mesmo na
ausência de campo eléctrico aplicado, logo possui uma polarização espontânea [7]. Os
materiais ferroeléctricos possuem ainda a característica de se poder alterar o sentido
dessa mesma polarização. Assim, se um material ferroeléctrico for exposto a um campo
eléctrico de intensidade elevada, os dipolos vão alinhar gradualmente com o campo
eléctrico até, se possível, todos os dipolos estarem paralelos atingindo a saturação da
polarização.
Uma característica intrínseca a muitos materiais ferroeléctricos é que perto de
uma determinada temperatura, conhecida por temperatura de Curie Tc, há uma forte
dependência da permitividade dieléctrica com a temperatura, de modo que acima de
Tc, obedece à seguinte equação:
(1.1)
O comportamento descrito pela equação (1.1) é válido para T> Tc. Para T <Tc, o
material polariza-se espontaneamente, ou seja, cria-se no material uma polarização
eléctrica sem a ajuda de um campo eléctrico externo. Quando T= Tc, ocorre uma
transição de uma fase com polarização zero. Para uma fase ferroeléctrica em que existe
uma polarização diferente de zero, esta cresce à medida que a temperatura desce até
atingir a um valor de saturação.
A polarização remanescente (Pr) distingue-se da polarização espontânea (Ps) no
sentido em que Pr é originada pela polarização, enquanto Ps é um valor conceptual que
se refere à polarização que o cristal ferroeléctrico possui espontaneamente.
Laboratorialmente, Pr é a intersecção do ciclo da histerese com o eixo de polarização
(eixo das ordenadas da figura 5). Para se eliminar Pr, tem que se aplicar um campo
eléctrico com uma direcção oposta, denominado por campo coercivo (Ec).
Associado à ferroelectricidade está a piezoelectricidade que relaciona a
polarização com a tensão mecânica/deformação de um material [8].
Capítulo 1 - Introdução
6
1.4 O Efeito Piezoeléctrico
Como já foi dito, a piezoelectricidade descreve o fenómeno de gerar uma carga
eléctrica superficial num material quando sujeito a uma deformação mecânica e
inversamente, uma deformação quando sujeito a um campo eléctrico.
A figura 6 mostra um modelo molecular simples para explicação do efeito
piezoeléctrico; é explicada a polarização eléctrica como resultado de uma força aplicada
sobre o material. Previamente à aplicação de uma força externa sobre o material, o
centro de gravidade das cargas positivas e das cargas negativas em cada molécula
coincidem, fazendo com que o efeito das cargas positivas e das cargas negativas se
cancele mutuamente, como resultado, é obtida uma molécula electricamente neutra.
Quando é exercida uma pressão sobre o material, a estrutura molecular sofre
uma deformação, causando a separação dos centros de gravidade das cargas positivas e
das cargas negativas, gerando pequenos dipolos (figura 6 b)). Os pólos internos do
material são mutuamente cancelados e uma distribuição de cargas é gerada à superfície
do material (figura 6 c)), nesta situação o material diz-se polarizado. Esta polarização
gera um campo eléctrico que pode ser usado na transformação da energia mecânica,
através da deformação do material, em energia eléctrica [9].
Figura 5: Ciclo de Histerese típico de um material ferroeléctrico [8].
Capítulo 1 - Introdução
7
Figura 6: Modelo molecular simples para explicação do efeito piezoeléctrico; a) Molécula não
perturbada; b) molécula sujeita a uma força externa, e c) Efeito de polarização na
superfície do material [10].
Em determinados materiais, para produzir o efeito piezoeléctrico, os momentos
dipolares devem ser alinhados sob o efeito de um campo eléctrico forte. Este força todos
os dipolos do cristal a alinharem preferencialmente na direcção e sentido do campo
aplicado (figura 7).
O campo eléctrico que provoca o alinhamento dos dipolos depende das
características e constituição físico-química dos materiais. No caso dos polímeros
piezoeléctricos é tipicamente superior a 2 kV/mm.
Depois de polarizar o material pode ser observado o efeito piezoeléctrico. Este
pode observar-se de diversas formas como fica demonstrado pela figura 8. A figura 8 a)
mostra o material polarizado sem estar sujeito a nenhuma força ou campo eléctrico, na
figura 8 b) o material polarizado é comprimido por acção de uma força, nesta situação
Figura 7: Polarização do material piezoeléctrico; a) Dipolos aleatórios; b) Polarização, e
c) Polarização remanescente [10].
Capítulo 1 - Introdução
8
Figura 8: Exemplos de efeitos piezoeléctricos [10].
desenvolve-se uma tensão eléctrica com sentido idêntico ao do eixo de polarização, a
figura 8 c) é similar à anterior mas verifica-se quando surge uma descompressão, nesta
situação a tensão gerada tem sentido oposto ao do eixo de polarização. De forma
inversamente similar, quando se aplica uma tensão eléctrica com sentido inverso ao do
eixo de polarização, o material vai expandir-se (figura 8 d)), se a tensão eléctrica
aplicada tiver o mesmo sentido que o do eixo de polarização o material vai comprimir-
se (figura 8 e)). Por último, caso seja aplicada uma tensão eléctrica alternada sinusoidal,
o material vai vibrar com uma frequência igual à do sinal eléctrico aplicado (figura 8 f))
[10].
1.5 Coeficientes Piezoeléctricos
Figura 9: Terminologia utilizada nos parâmetros piezoeléctricos [12].
Capítulo 1 - Introdução
9
1.5.1 Coeficiente de Acoplamento Electromecânico:
O coeficiente de acoplamento electromecânico é definido como a razão da
energia mecânica acumulada em resposta a um campo eléctrico aplicado e vice-versa. A
relação da energia convertida de um só modo (eléctrico ou mecânico) para o segundo
tipo (mecânico ou eléctrico) é definida como o quadrado do coeficiente de acoplamento.
Efeito directo (2.1)
Efeito inverso (2.2)
1.5.2 Coeficiente de Carga:
O coeficiente de carga piezoeléctrico, d, é definido pela razão das cargas
eléctricas geradas por unidade de área em resposta à força aplicada. Os coeficientes dij
são normalmente expressos em Coulombs/metro quadrado por Newton/metro quadrado
ou seja, [(C/m2)/(N/m2)]. Quando a força aplicada é distribuída pela área que está
totalmente coberta por eléctrodos (mesmo que isso seja só uma parte da superfície
total), as unidades de área anulam-se e os coeficientes são expressos em termos de carga
por unidade de força (Coulombs por Newton) [C/N].
(2.3)
1.5.3 Coeficiente de Diferença de Potencial ou coeficiente “g”:
As constantes piezoeléctricas relacionadas com o campo eléctrico produzido por
uma tensão mecânica, são denominadas de potencial ou coeficiente “g”. As unidades
podem ser expressas em Volts/metro por Newton/metro quadrado, ou seja,
[(V/m)/(N/m2)]. A tensão de saída é obtida multiplicando o campo eléctrico pela
espessura do material piezoeléctrico entre os eléctrodos. [11]
(2.4)
Capítulo 1 - Introdução
10
As variáveis ij indicam o sentido da polarização e da força, as mais usuais são:
ij = 33 figura 10 a), quando a tensão é medida no sentido do eixo de polarização
e a força é aplicada no mesmo sentido;
ij = 31 figura 10 b), quando a tensão é medida no eixo de polarização e a força
aplicada tem o sentido perpendicular a este.
ij = 15 figura 10 c), quando a tensão é medida no sentido perpendicular aos
eixos e a força é de torção.
1.5.4 Constantes elásticas:
O módulo de Young, Y, descreve a rigidez mecânica de um material e é
expresso pela razão da tensão pela deformação. Num material piezoeléctrico, a tensão
mecânica produz uma resposta eléctrica que se opõe à deformação resultante. O valor
do módulo de Young depende da direcção da tensão aplicada, da deformação e das
condições eléctricas. O inverso do módulo de Young é a elasticidade do material, s,
definido pelas equações 2.5 e 2.6.
(2.5)
(2.6)
1.6 Objectivos da Dissertação
Esta dissertação tem como principal objectivo a preparação de uma montagem
experimental que permitirá polarizar materiais electroactivos, permitindo a obtenção de
melhores características desses materiais bem como a melhor compreensão do processo
Figura 10: Ilustração da resposta segundos os diferentes coeficientes ij [8].
Capítulo 1 - Introdução
11
de polarização. O método de polarização utilizado na montagem experimental foi o de
polarização por contacto (Método das Placas Paralelas) usando ciclos de polarização
bipolar e unipolar que serão explicados ao longo desta dissertação. Fez-se também um
estudo aprofundado de outros métodos de polarização tal como o Método de Bauer e o
Método de Polarização por Corona (ou Corrente Constante).
A montagem consiste numa fonte DC (Keithley modelo 248) que faz
varrimentos de tensão entre 0 e 5kV e de um picoamperímetro para efectuar
amostragens da corrente de polarização. Como forma de melhor polarizar os materiais
electroactivos, estes foram sujeitos a campos eléctricos em ciclos bipolares (-5kV a
5kV) e unipolares (0 a 5kV). Para tal foi necessário efectuar a montagem de um circuito
eléctrico que permitisse que a fonte DC fizesse varrimentos de tensões negativas.
Todo esse processo é controlado remotamente por computador, para tal foi
elaborado um software recorrendo a uma ferramenta da National Instruments que é o
Labiew. Este software permite escolher os limites de tensão eléctrica, o tempo de cada
passo (normalmente usam-se 10ms como tempo de passo) e o número de ciclos
bipolares/unipolares, e apresenta gráficos em tempo real da tensão aplicada na amostra,
da corrente lida e de histerese (tensão eléctrica por corrente eléctrica). Desta forma e
através dos gráficos de histerese é possível observar a polarização remanescente e o
campo coercivo.
1.7 Organização da Dissertação
A organização desta dissertação está estruturada em seis capítulos. De seguida
encontra-se uma breve descrição de cada capítulo.
No capítulo 1 fez-se uma introdução aos materiais piezoeléctricos, fala-se sobre
história da piezoelectricidade, sua descoberta e aplicações imediatas bem como as
relações entre a sua descoberta e o desenvolvimento de sonares durante a Segunda
Grande Guerra mundial, após esta introdução histórica, apresentou-se um
desenvolvimento sobre as propriedades electroactivas tais como ferroelectricidade,
piezoelectricidade e piroelectricidade e associação destas às estruturas cristalinas. De
seguida fez-se um estudo sobre a ferroelectricidade, característica intrínseca a muitos
materiais piezoeléctricos e piroeléctricos, nesta explica-se a polarização remanescente,
polarização espontânea e campo coercivo. Por último, fez-se uma descrição sobre o
Capítulo 1 - Introdução
12
efeito piezoeléctrico e sobre os coeficientes piezoeléctricos, explicando mais
detalhadamente como surge este efeito, como provocar o alinhamento dos dipolos para
polarizar o material e observar o efeito piezoeléctrico. Falou-se também aqui do
Coeficiente de Acoplamento Electromecânico, do Coeficiente de Carga, do Coeficiente
de Diferença de Potencial e das constantes elásticas. Para finalizar este capítulo
descreveram-se os objectivos desta dissertação.
No capítulo 2 debatem-se os materiais piezoeléctricos. Começando pelos
cristais, nomeadamente o quartzo por ter sido ao estudar estes cristais que Pierre Curie
descobriu a piezoelectricidade. Após os cristais surgem os semicondutores, e surgem
após os cristais devido à ligação que existe entre ambos. De seguida fala-se sobre as
cerâmicas piezoeléctricas e obviamente do PZT, uma das soluções sólidas que melhores
propriedades piezoeléctricas apresenta. Os materiais mais utilizados na actualidade
serão talvez os filmes de PVDF, é lógico então apresentar neste capítulo um resumo
sobre os polímeros e copolímeros. Para finalizar o capítulo 2, fala-se dos compósitos,
descobertos segundo a necessidade de alcançar propriedades específicas num material.
No capítulo 3 fala-se mais detalhadamente sobre a polarização e sobre os vários
métodos de polarização, nomeadamente o Método das Placas Paralelas, o Método de
Bauer e o Método de Polarização por Corona. Faz-se também um estudo sobre o estado
da arte, ou seja, que métodos de polarização são usados na actualidade.
No capítulo 4 mostra-se todo o sistema desenvolvido, desde a fonte DC,
picoamperímetro, relé para comutação da tensão DC, MOSFET controlado por um
DAQ da National Instruments que serve de interruptor do relé e porta amostras para
polarização por contacto (Método das Placas Paralelas).
No capítulo 5 mostra-se o software elaborado com recurso a uma ferramenta de
programação gráfica originária da National Instruments denominada Labview
(acrónimo para Laboratory Virtual Instrument Engineering Workbench). Explica-se
também algumas partes do código de forma a melhor se compreender como é feito o
varrimento de tensão eléctrica e as leituras de corrente eléctrica bem como, de que
forma é efectuada a apresentação dos gráficos em tempo real.
No sexto e último capítulo apresentam-se os resultados experimentais, sobre a
forma de vários gráficos dos ciclos bipolares e unipolares por correntes lidas e tiram-se
as conclusões relativas a todo sistema desenvolvido.
Capítulo 1 - Introdução
13
Bibliografia
[1] Ikeda, Takuro, “Fundamentals of Piezoeléctricity”, Oxford Science Publications,
Oxford University Press, 1996.
[2] Consultado em 08 de Outubro de 2008, http://pt.wikipedia.org/wiki/Piezoeléctrico
[3] J. Eiras, “Materiais Piezoeléctricos”, Departamento de Física da Universidade
Federal de São Paulo.
[4] History of Piezoelectricity, Piezo Systems Inc, http://www.piezo.com/
tech4history.html
[5] B. Jaffe, R. S. Roth, e S. Marzullo, J. Appl. Phys. 25, 809 (1954).
[6] V. Sencadas, Influência das condições de processamento na morfologia e fases
cristalinas do PVDF e nas transições de fase do copolímero P(VDF-TrFE), 2006.
[7] H. S. Nalwa, Recent Developments in Ferroelectric Polymers, JMS – Rev.
Macromol. Chem. Phys., C31 (4), 1991, pp. 341 – 432.
[8] R. M. M. Marat-Mendes, “Desenvolvimento de um Transdutor Piezoeléctrico para
Medição da Aceleração Angular”, Lisboa, Portugal, 2000
[9] A. Arnau, D. Soares, Piezoeléctric Transducers and Applications, Springer, 2004,
1-5.
[10] P. F. A. Rocha, “Geração de energia a partir de materiais piezoeléctricos integrados
em sapatos”, Guimarães, Portugal, 2007.
[11] Consultado em 10 de Outubro de 2008, http://www.arauto.uminho.pt/pessoas/
lanceros/ProjectoPiezo/introdu%E7%E3o.html
[12] H.F. Castro, “Sensores e Actuadores Baseados em Polímeros Piezoeléctricos”,
Guimarães, Portugal, 2006.
Capítulo 1 - Introdução
14
15
Capítulo 2
Materiais Piezoeléctricos
Neste capítulo apresentam-se alguns dos materiais piezoeléctricos mais
utilizados na actualidade em aplicações tecnológicas bem como uma descrição desses
mesmos materiais.
2.1 Materiais Cristalinos
2.1.1 Quartzo (SiO2):
Os cristais de quartzo que apresentam a fase α em temperaturas inferiores a
573ºC, possuem simetria trigonal e pertencem ao grupo pontual 32, têm coeficientes
piezoeléctricos d11 = - d12, d14 = -d25, d26 = -2×d11, e11 = -e12, e14 = -e25 e e26 = -e11. Como
se verifica, o quartzo possui apenas coeficientes piezoeléctricos, d ou e independentes.
Em 573 ºC o quartzo na fase α sofre uma transformação da fase α para a fase β,
que pertence ao grupo pontual 622 em que o coeficiente d14 = -d25 quase triplica. Para as
aplicações práticas em que estes cristais são actualmente utilizados, procura-se que estes
tenham modos de vibração puros, alto factor de qualidade mecânica Qm e baixo, ou
preferencialmente nulo, coeficiente de temperatura CT. Para que estas condições sejam
alcançadas, são efectuados diversos cortes práticos para os cristais de quartzo, como se
pode ver na figura 11 [1,2]. Na tabela 1, poderá ver-se alguns dos coeficientes
característicos destes cristais.
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
16
Tabela 1: Coeficientes electromecânicos característicos para cristais de quartzo.
Corte Modo c/c0 k d (p.C.N-1
) e (C.m-2
) N (Hz.m)
Quartzo 0ºX TE 4,6 0,10 2,3 0,17 2850
0ºX LE 4,6 0,10 -2,3 2750
-18,5 ºX LE 4,6 0,095 -2,3 2550
0ºY TS 4,6 0,14 -4,6 -0,17 1925
AT TS 4,6 0,09 -3,4 -0,095 1660
AC TS 4,6 0,10 -3,7 -0,11 1650
2.1.2 Niobato de lítio (LiNbO3) e tântalo de lítio (LiTaO3):
Niobato e tântalo de lítio são cristais isomorfos que apresentam simetria trigonal
e pertencem ao grupo pontual 3m, na fase ferroeléctrica, quando abaixo das suas
Temperaturas de Curie (Tc (LiNbO3) 1210 ºC e Tc (LiTaO3) 660 ºC). Nessa fase
ferroeléctrica apresentam polarização espontânea paralela ao eixo c da sua estrutura. O
niobato de lítio apresenta os coeficientes piezoeléctricos d33= 6 e d15= 68 pC/N, o
Figura 11: Cortes característicos de cristais de quartzo para ressonâncias [1].
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
17
tântalo de lítio apresenta menores valores de coeficientes piezoeléctricos (d33= 8 e
d15=26 pC/N) e de coeficiente de temperatura, como tal, é preferencialmente usado em
aplicações onde se deseja grande estabilidade.
Os cortes mais importantes nas aplicações do niobato de lítio estão apresentados
na figura 12. O Niobato de lítio e o tântalo de lítio são muito utilizados como filtros
electromecânicos (apresentam coeficientes de acoplamento electromecânico nulos),
detectores de vibrações e especialmente em aplicações com ondas acústicas de
superfície (SAW – surface acoustic wave) [1].
Os cristais de niobato de lítio ou os de tântalo de lítio, podem ser acrescidos do
material fundido em composições contendo entre 46% de niobato e 50% de lítio para o
LiNbO3 ou de 44% de tântalo e 54% de lítio para o LiTaO3. A fusão congruente ocorre
para concentração de aproximadamente 48,6% de lítio para o LiNbO3 e entre 48,8% e
49,2% de lítio para o LiTaO3. Para ambos cristais, observa-se um aumento da
Temperatura de Curie quando se aumenta a concentração de lítio [2].
Figura 12: Cortes característicos de cristais de niobato ou tântalo de lítio [1]
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
18
Na tabela 2 apresentam-se os coeficientes característicos para cristais de niobato
de lítio e tântalo de lítio [1].
Tabela 2: Coeficientes electromecânicos característicos para cristais LiNbO3 e LiTaO3 [1].
LiNbO3 LiTaO3 LiNbO3 LiTaO3
[103 kg.m
-3] 4,7 5,3 d33
[10
-12 C.N
-1] 6 8
11T/
0 84 51 d31 -1 -2
33T/
0 30 45 d22 21 7
c11E [1011 N.m
-2] 2,03 2,33 d15 68 26
c33E 2,45 2,75 e33 [C.m
-2] 1,3 1,9
c12E 0,53 0,47 e31 0,2 0,0
c13E 0,75 0,80 e22 2,5 1,6
c14E 0,09 -0,11 e15 3,7 2,6
c55E 0,60 0,94 k33 0,17 0,19
c66E 0,75 0,93 k31 0,03 0,05
kt 0,16 0,18
k15 0,68 0,43
2.2 Semicondutores
Materiais semicondutores com estrutura do tipo wurzita, simetria 6mm,
apresentam o efeito piezoeléctrico e valores de coeficientes adequados para certas
aplicações. Entre esses materiais destacam-se o óxido de zinco (ZnO), o sulfeto de
cádmio (CdS) e o nitreto de alumínio (AlN). Em aplicações mais importantes, estes
materiais são por norma preparados na forma de filmes finos e são usados como
geradores ultra-sónicos de alta frequência. O óxido de zinco é o mais utilizado em
aplicações que envolvam detecção/geração de ondas acústicas de superfície (SAW) [2].
Filmes finos de óxido de zinco são obtidos por evaporação ou sputtering do
material, em substratos de safira apropriados para obter orientações adequadas no filme.
Embora o filme seja policristalino, é possível obter uma orientação preferencial do eixo
c da sua estrutura cristalina e perpendicular à superfície do substrato. A deposição de
filmes finos de AlN é feita frequentemente por deposição química de vapor (CVD) ou
por sputtering [15].
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
19
Cristais de óxido de zinco podem ser acrescidos recorrendo a processos
hidrotérmicos, enquanto os cristais de nitreto de alumínio são bastante difíceis de
crescer.
Na tabela 3 apresentam-se alguns coeficientes característicos dos principais
semicondutores piezoeléctricos.
Tabela 3: Coeficientes dieléctricos e piezoeléctricos de semicondutores piezoeléctricos [1].
BeO ZnO Cds CdSe AlN
[103.kg.m
-3 ] 3,009 5,675 4,819 5,684 3,26
11T/ o 8,50 9,35 9,70 9,0
33T/ o 7,66 10,9 10,3 10,6 10,7
d33 [10-12
C.N-1
] 0,24 12,4 10,3 7,8 5,0
d31 -0,12 -5,0 -5,2 -3,9
d15 -8,3 -14,0 -10,5
e33 [C.m-2
] 1,57 0,44 0,35 1,55
e31 -0,36 -0,24 -0,16 -0,58
e15 -0,36 -0,21 -0,14 -0,48
c33E [10
11 N.m
-2 ] 2,11 0,94 0,84
c11E 2,10 0,91 0,74 3,95
c55E 0,43 0,15 0,13 3,45
c33D 2,29 0,96 0,85 1,18
c11D 2,15 0,91 0,74
c55D 0,47 0,16 0,13
v31 [km.s-1
] >12 6,40 4,50 3,86 11,35
v1t 2,95 1,80 1,54
k33 0,019 0,48 0,262 0,194 0,31
k31 0,009 0,182 0,119 0,084 0,14
k3t 0,38 0,154 0,124 0,25
k15 0,196 0,188 0,130 0,15
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
20
2.3 Materiais Cerâmicos
Desde que Roberts [3] descobriu que cerâmicas de titanato de bário (BaTiO3)
podiam ser polarizadas e apresentar o efeito piezoeléctrico, os materiais cerâmicos
passaram a ser os mais usados como elementos piezoeléctricos na grande maioria das
aplicações tecnológicas, marcando assim esta descoberta o início da era das
piezocerâmicas.
As cerâmicas, para serem utilizadas como elementos piezoeléctricos, devem ser
polarizadas através da aplicação de um campo eléctrico DC normalmente na ordem dos
quilovolts por milímetro (kV/mm). Como são ferroeléctricas, permitem que se reoriente
a polarização espontânea na direcção do campo de polarização. Em geral, as
piezocerâmicas comerciais incorporam mais de um elemento dopante nas suas
composições básicas, de forma a controlar ou intensificar determinadas propriedades
físicas [2]. Na tabela 5 apresentam-se alguns valores típicos para coeficientes
electromecânicos de algumas cerâmicas piezoeléctricos.
2.3.1 Titanato de Bário (BaTiO3) e Titanato Zirconato de Chumbo
(PZT):
Desde que Jaffe et. al [4] constatou que soluções sólidas de Pb(Zr-Ti)O3 (PZT)
apresentam excelentes propriedades piezoeléctricas, o PZT passou a ser mais utilizado
que o BT em transdutores piezoeléctricos, com uma constante dieléctrica elevada, de
2900 e um coeficiente piezoeléctrico elevado, de 529 pC/N, o que faz com que seja
particularmente útil para sensores de alta sensibilidade.
A substituição progressiva do BT por PZT ocorreu pois o PZT apresenta as
seguintes vantagens:
Maiores coeficientes electromecânicos;
Temperatura de Curie mais elevada (Tc 360ºC) para a maioria das
composições;
É mais fácil de polarizar;
É possível incorporar uma grande variedade de dopantes, o que permite alterar
de forma controlada muitas das suas propriedades electromecânicas.
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
21
Muitos trabalhos de investigação foram efectuados em redor das piezocerâmicas
de PZT, entre os mais importantes estão os realizados por M. Takahashi et. al [5] e S.
Takahashi et. al [6] e num breve resumo pode-se tirar as seguintes conclusões:
A adição de elementos de menor valência, elementos aceitadores (Fe3+
, Al3+
por
substituição de Zr4+
e Ti4+
respectivamente) é compensada pela formação de
lacunas de oxigénio, que passam a formar um defeito complexo 20 (com o Zr4+
ou Ti4+
). Esta incorporação de elementos aceitadores causa um aumento do
campo coercivo e do factor de qualidade mecânica, por outro lado provoca uma
diminuição da constante dieléctrica, da polarização remanescente e das perdas
dieléctricas. PZT’s com estas características são utilizados como elementos
piezoeléctricos em transdutores de alta potência usados em sonares e soldadores.
A adição de catiões de maior valência, elementos doadores, é compensada pela
formação de lacunas de chumbo. Elementos doadores (Nb5+
, W6+
por
substituição de Zr e Ti respectivamente, ou La3+
por substituição do Pb2+
)
diminuem o campo coercivo e o factor de qualidade mecânica, por outro lado
aumentam a constante dieléctrica, a polarização remanescente e o factor de
acoplamento electromecânico. PZT’s com estas características são usados em
hidrofones, transdutores ultra-sónicos de diagnóstico (usados em medicina) que
funcionam como emissores e receptores e em sensores.
Elementos como o manganésio e o cromo (Mn2+
e Cr3+
respectivamente) actuam
como estabilizadores das propriedades.
2.3.2 Titanato de chumbo modificado com cálcio (PTCa):
O titanato de chumbo modificado com cálcio (PTCa) é outro dos materiais
bastante utilizados em aplicações tecnológicas. Possui um elevado coeficiente
piezoeléctrico, vasta selecção de constantes dieléctricas, temperatura de Curie ajustável
segundo a composição, baixas perdas dieléctricas, boas propriedades térmicas e factores
de acoplamento electromecânico com valores de kt entre 0,4 e 0,5 [7].
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
22
Tabela 4: Coeficientes electromecânicos característicos para cerâmicas piezoeléctricas [1].
PZT-4A PZT-6A PZT-8 PCM-32 PbTiO3
(k0 5Na0 5)
NbO3
[103.kg.m
-3] 7,5 7,45 7,6 7,7 7,87 4,46
Tc [ºC] 328 335 300 220 470 420
33T/
0
1300 1050 1000 930 170 496
11T/
0 1475 1290 230 938
kp 0,58 0,42 0,51 0,55 0,07 0,45
k31 0,33 0,25 0,30 0,34 0,04 0,27
k15 0,71 0,55 0,70 0,28 0,645
kt 0,51 0,39 0,48 0,46 0,46
d31
[10-12
C.N-1
] -123 -80 -97 -104 -4,4 -51
g31
[10-3
V.m.N-1
] -10,7 -8,6 -10,9 -12,6 -2,9 -11,6
N1
[Hz.m] 1650 1770 1700 2050 2570
Nt
[Hz.m] 2000 2140 2070 2270 2070
Envelhecimento
[% /década] +1,5 <0,1 1,0
Qm 500 1300 1000 2050 1100 240
2.4 Materiais Poliméricos
A superioridade dos polímeros em relação aos restantes materiais reside na sua
versatilidade e na possibilidade de fabricar dispositivos com formas e cortes bastante
invulgares dependendo da aplicação para a qual se destinam. As principais vantagens
dos polímeros em relação aos demais materiais são:
Leves, flexíveis e robustos;
Obtidos na forma de filmes finos ou ultra finos, fibras ou como cristais líquidos;
Facilmente transformados na configuração desejada;
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
23
Facilmente controlados num amplo intervalo devido às suas propriedades
físicas, através de apropriadas modificações químicas;
Biocompatíveis (pelo menos alguns deles).
Por outro lado como têm a desvantagem de terem uma baixa temperatura de
fusão a sua aplicação fica um pouco restringida [9].
2.4.1 Poli(fluoreto de vinilideno) ou PVDF:
A descoberta da piezoelectricidade em polímeros deve-se a H. Kawai [8], que
observou que o poli(fluoreto de vinilideno) ou PVDF, polarizado em elevados campos
eléctricos (~300 kV/cm), apresenta coeficientes piezoeléctricos superiores aos do
quartzo. O PVDF é um polímero semicristalino (apresenta uma cristalinidade de 40% a
50%) que cristaliza geralmente numa estrutura esferulítica. As esferulites são
constituídas por um conjunto de lamelas que durante a cristalização crescem
radialmente a partir de um centro comum [10].
Apresenta um processo de relaxação e uma transição de fase, a primeira ocorre
por volta dos -34ºC (denominada temperatura de transição vítrea, Tg), a segunda ocorre
a uma temperatura mais elevada, designada por temperatura de fusão, Tf, que se situa
entre 160 ºC e 190ºC, dependendo vincadamente das condições de processamento e da
fase cristalina presente no material [9].
Foi apresentado por Furukawa et al [11] um estudo detalhado da histerese do
PVDF realizando medidas num campo eléctrico muito elevado. Neste estudo, Furukawa
et al. observou que o valor da polarização remanescente diminui ligeiramente com o
aumento da temperatura, como se verifica nos materiais ferroeléctricos tradicionais.
Observou também que o valor do campo coercivo aumenta rapidamente com a
diminuição da temperatura. A existência do ponto de Curie [12], evidência adicional da
existência de ferroelectricidade num material, está ausente no PVDF mas aparece nos
copolímeros de PVDF com trifluoretileno (TrFE). A histerese dieléctrica, medida à
temperatura ambiente, é independente da frequência do campo aplicado (normalmente a
rondar os 10 mHz)
Embora o PVDF seja motivo de inúmeros estudos nas últimas décadas, existem
ainda aspectos como a caracterização da dependência da polarização ferroeléctrica com
o campo, que merecem ser estudados e que são fundamentais para o entendimento
básico do PVDF. Foram medidas em PVDF, a polarização espontânea (Ps) e a
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
24
polarização remanescente (Pr) [13]. A polarização remanescente é oriunda da
polarização ferroeléctrica e a polarização espontânea, que parece ser de menor
intensidade, relaxa no tempo depois do campo eléctrico polarizador ser removido. A
análise dos efeitos da condução eléctrica através das amostras é também um factor
importante a analisar.
O PVDF apresenta no mínimo quatro fases cristalinas conhecidas por α, β, γ e δ.
Devido a este polimorfismo, o PVDF apresenta uma morfologia muito variada, que
depende essencialmente e como já foi visto das condições de processamento. Pode-se
considerar como a principal fase do PVDF a β, pois esta apresenta melhores
características ferroeléctricas, piroeléctricas e piezoeléctricas, como tal será a única fase
investigada no âmbito desta dissertação.
2.4.1.1 PVDF na fase β:
Por ser a fase que melhores características ferroeléctricas, piroeléctricas e
piezoeléctricas apresenta é a mais desejável para aplicações tecnológicas como
sensores, actuadores e transdutores. Existem dois processos para a obtenção do
polímero PVDF na fase β, um dos processos consiste no estiramento mecânico de
filmes na fase α a temperaturas inferiores a 100 ºC e com razão de estiramento (relação
entre o comprimento final e o inicial da amostra) maior ou igual a 4. Os filmes na fase β
obtidos por este processo têm a peculiaridade de uma pequena percentagem de material
permanecer a fase α não estando o material completamente na fase β. Outro processo de
obtenção da fase β consiste na cristalização de uma solução de PVDF com
dimetilformamida (DMF) ou dimetilacetamida (DMA) a temperaturas inferiores a 70ºC.
Os filmes obtidos por este processo de cristalização têm uma percentagem de material
na fase β superior a 95% [14,15].
2.5 Copolímeros
O interesse no PVDF (fortemente compatível com uma grande variedade de
compostos macromolécolares como o trifluoretileno alargou-se a um sem número de
copolímeros de VDF com outros fluorocarbonos (TrFE) e o tetrafluoretileno (TFE). A
copolimerização com outros fluorocarbonos acrescenta mais átomos de flúor na cadeia
do polímero, as propriedades eléctricas destes copolímeros podem variar num vasto
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
25
intervalo de valores por uma simples variação das percentagens de VDF. Estes
copolímeros possuem a vantagem de cristalizarem directamente na configuração planar
em zig-zag, similar à estrutura da fase β do PVDF [14].
Na tabela 5 apresentam-se alguns valores típicos para coeficientes
electromecânicos de alguns polímeros e copolímeros piezoeléctricos.
Tabela 5: Valores típicos para coeficientes electromecânicos de polímeros piezoeléctricos [1].
Polímero Copolímeros
PVDF P(VDF-TrFE) P(VDF-TeFE) P(VDCN-VAc)
[103 kg.m
-3] 1,78 1,88 1,90 5,5
33/ 0 6,2 6,0 5,5 30
Tan δ 0,25 0,15
d31 [pC.N-1
] 28 12,5 8
e33 [C.m-2
] -0,16 -0,23 0,18
g33 [10-3
Vm.N-1
] -320 -380 26
kt 0,20 0,30 0,21 0,07
c33D [10
9N.m
-2] 9,1 11,3 26,6
v31 [km.s-1
] 2,26 2,4 2,2
Qm 10 20
Z0 [106 kg.m
-2.s
-1] 4,0 4,5 4,4 12,1
Tc [ºC] 170 130 141
Pr [C.m-2
] 0,055 0,082 0,071
Ec [kV.mm-1
] 45 38 39
ρ [μC.m-2
.K-1
] 35 50 40
2.5.1 Poli(fluoreto de vinilideno trifluoretileno):
Os copolímeros de fluoreto de vinilideno com trifluoretileno quando em
conveniente relação molar de VDF e TrFE, cristalizam a partir da fusão ou por solução
directamente numa fase polar e ferroeléctrica constituída por cadeias transplanares (TT)
semelhantes à fase β do PVDF e nestas condições, apresentam propriedades
piezoeléctricas semelhantes às do β-PVDF.
Este copolímero quando se encontra na fase polar, possui capacidade de
polarização de 2ª ordem apresentando propriedades ópticas não lineares possibilitando a
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
26
sua utilização como modelador e comutador para comunicação óptica. Do ponto de
vista tecnológico é maioritariamente utilizado:
Como isolante activo em estruturas MIS (metal-isolador-semicondutor) de
memórias não voláteis;
Transdutores de pressão integrados em pastilhas semicondutoras;
Sensores de temperatura;
Células solares.
2.6 Materiais Compósitos
Com a necessidade de alcançar propriedades específicas num material, que não
podem ser encontradas em materiais com uma única fase, surgiu a motivação para o
desenvolvimento de materiais piezoeléctricos compósitos. Exemplos dessas
propriedades são:
A obtenção um melhor casamento acústico com a água;
O aumentar a sensibilidade piezoeléctrica de transdutores electromecânicos;
A necessidade de diminuir a densidade do elemento piezoeléctrico;
Para obter elementos mecanicamente flexíveis para poder acoplá-los a
superfícies curvas.
Estas propriedades podem ser tremendamente difíceis de obter num material
monofásico. Um material compósito é um material que possui dois ou mais
componentes e que apresenta propriedades físico-químicas resultantes dos componentes
que o constituem.
As primeiras investigações em materiais compósitos foram realizadas com o
intuito de obter hidrofones para aplicações submarinas [16,17,18]. Um hidrofone é um
transdutor ou microfone usado na detecção de ondas acústicas subaquáticas. A
sensibilidade deste é determinada pela voltagem produzida numa onda de pressão
hidrostática, que está associada ao coeficiente de voltagem hidrostático gh. Outro
coeficiente usado para avaliar um hidrofone é o coeficiente hidrostático de deformação
dh (dh=gh/ 0.k, sendo 0 a permissividade do vácuo e k a constante dieléctrica).
Como foi dito anteriormente, cerâmicas como o PZT são muito utilizadas em
transdutores porque possuem elevados coeficientes piezoeléctricos. Neste caso para
aplicação em hidrofones, apresenta algumas desvantagens pois possui elevados
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
27
coeficientes piezoeléctricos d33, e d31, logo o seu coeficiente hidrostático dh é muito
baixo ou até mesmo nulo (dh=d33+2.d31, este último possui sinal inverso ao d33, logo se
d33 for positivo, d31 será negativo e vice versa). A isto ainda se acrescenta o facto de que
o PZT tem uma constante dieléctrica elevada (> 1000) e densidade também ela elevada
(ρ=7,9 kg/m3, comparada com a da água), o que resulta num baixo coeficiente gh e
acrescida dificuldade em conseguir um acoplamento acústico com a água.
Polímeros como o PVDF apresentam várias vantagens (como a baixa constante
dieléctrica, baixa densidade e flexibilidade) para aplicações em hidrofones. Por isso,
embora tenham baixos coeficientes d33 e dh comparativamente com o PZT, o coeficiente
gh do PVDF é demasiado elevado devido à sua baixa constante dieléctrica, o que
dificulta também a construção de circuitos de detecção (devido à sua baixa capacitância)
[2].
Foi devido a este cenário de desvantagens apresentado tanto pelas cerâmicas
como pelos polímeros piezoeléctricos que se desenvolveram os compósitos
piezoeléctricos. A forma como os materiais componentes se encontram interligados
num compósito denomina-se de conectividade [19]. Para compósitos com dois
componentes existem dez conectividades: 0–0, 1–0, 2–0, 3–0, 1–1, 2–1, 3–1, 2–2, 3–2 e
3–3. Os números de 1 a 3 referem-se aos eixos ortogonais que indicam as direcções em
que cada componente está interligado ou se é contínuo.
Os compósitos piezoeléctricos são geralmente compostos de cerâmicas e
polímeros, como tal e por convenção, normalmente o primeiro número refere-se à
cerâmica e o segundo ao polímero. Na figura 13 encontra-se uma representação
esquemática das dez conectividades.
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
28
Os compósitos mais estudados para a construção de elementos electromecânicos
são provavelmente aqueles com ligação 1-3 (palitos de PZT e polímero) e 0-3
(partículas de PZT dispersas em polímero). As suas principais vantagens são a baixa
impedância acústica (que possibilita melhores casamentos com componentes que têm
impedância acústica inferior à da cerâmica), alta flexibilidade mecânica e baixo factor
de qualidade mecânica (o que permite detecção num vasto espectro de frequência). Os
compósitos 1-3 possuem elevado factor de acoplamento electromecânico kt,
aproximadamente igual ao factor de acoplamento electromecânico k33 da cerâmica.
Figura 13: Formas de interligações para compósitos de dois componentes. As setas
indicam a direcção em que cada componente está conectado [2].
Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
29
Bibliografia
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Oxford University Press, 1996.
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[3] S. Roberts, Phys. Rev. 71, 890-895 (1947).
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[13] Giacometti, J.A.; Ribeiro, P.A; Raposo, M.; Marat-Mendes, J.N.; Campos, J.S.C;
DeReggi, A.S. Study of Poling Behavior of Biaxially Stretched Poly(Vinylidene
Fluoride) Films Using the Constant-Current Corona Triode. J. Appl. Phys. vol.78,
n.9, pg.5597-5603, 1995.
[14] V. Sencadas, Influência das condições de processamento na morfologia e fases
cristalinas do PVDF e nas transições de fase do copolímero P(VDF-TrFE), 2006.
[15] Bruno Alberto Forte Silva, “Filtro optico ajustável de Fabry-Perot com cavidade
baseada em polímero piezoeléctrico”, Guimarães, Portugal, 2008.
[16]. K. A Klicker, J. V. Biggers, and R. E. Newnham, J. Am. Cer. Soc. 64, 5 (1981).
[17]. T. R. Gururaja, W. A Schulze, L. E. Cross, and R. E. Newnham, IEEE Trans.
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Capítulo 2 – Materiais Piezoeléctricos
30
[18]. J. R. Giniewicz, R. E. Newnham, and Safari, Ferroelectrics 66, 135 (19860.
[19]. R. E. Newnham, D. P. Skinner, and L. E. Cross, Mat. Res. Bull. 13, 525 (1978).
31
Capítulo 3
Estado da Arte
Um dos aspectos fundamentais no estudo de um material piezoeléctrico é a
activação ou polarização do material, portanto torna-se fundamental conhecer o seu
vector polarização ou P.
Neste capítulo fala-se sobre as diversas formas usadas na actualidade, de activar
um material piezoeléctrico. É geral recorrer à aplicação de campos eléctricos elevados
para efectuar a polarização de um material electroactivo, não sendo a aplicação dos
ditos campos um processo trivial, exigindo um controlo elevado sobre o método de
polarização a utilizar. Nesta dissertação, foi usado o método de polarização das placas
paralelas com ciclos de tensão bipolares e unipolares por ser um método simples e não
exigir material muito complexo ou dispendioso.
3.1 Histerese
Como o principal objectivo desta dissertação passa pelo estudo da polarização de
materiais electroactivos, é neste âmbito, importante falar sobre o ciclo de histerese de
um material electroactivo, primeira evidência da ferroelectricidade e muito importante
forma de estudar a caracterização destes materiais.
A histerese exibida pela polarização num material ferroeléctrico é uma
consequência da resistência para trocar a direcção dos domínios ferroeléctricos. Este
comportamento, ilustrado na figura 14 deve-se à aplicação de um campo eléctrico na
ordem dos kV/mm (para que se tenha uma orientação dos domínios ferroeléctricos), que
resulta num aumento bastante acentuado da polarização P com o aumento do campo
eléctrico E que, a título de curiosidade, resulta numa elevada permissividade dieléctrica.
Capítulo 3 – Estado da Arte
32
A polarização num material ferroeléctrico aumenta exponencialmente até atingir
a sua polarização de saturação PSAT, que corresponde ao grau máximo de orientação
possível de um domínio ferroeléctrico. Ao diminuir o campo até zero, alguma
polarização será perdida, mas fica no material uma polarização remanescente. Ao
inverter a direcção do campo eléctrico aplicado, e à medida que o valor do campo
eléctrico aumenta em módulo, a polarização diminui até ser removida. O valor do
campo cuja polarização é igual a zero é conhecido por campo coercivo EC. Após o
campo coercivo, a polarização aumenta novamente até atingir a saturação do material.
Optimizar o tamanho e a forma da curva de histerese para melhorar propriedades
como a birrefringência óptica e a constante dieléctrica é um aspecto importante para a
engenharia dos materiais ferroeléctricos. As características desejadas num material
ferroeléctrico são muito específicas, para cada tipo de aplicação tem-se uma
optimização de determinadas características. Uma memória óptica ferroeléctrica requer
uma mudança na orientação dos domínios bem definida, se a mudança na orientação dos
domínios for difícil de ocorrer, as aplicações podem ser limitadas [1,6].
Figura 14: Curva de histerese num material piezoeléctrico [10].
Capítulo 3 – Estado da Arte
33
Um factor adicional também muito importante está na microestrutura do
material. Policristais geralmente possuem uma curva de histerese menor e menos
enquadrada que a correspondente para monocristais.
3.2 Métodos de Polarização de Materiais Electroactivos:
3.2.1 Método das Placas Paralelas:
O método das placas paralelas consiste na introdução da amostra a polarizar
entre duas placas condutoras e aplicar uma tensão crítica V (tipicamente 5kV) entre as
placas. Este método torna-se vantajoso pela sua simplicidade, não sendo necessário
recorrer a material muito dispendioso para polarizar uma amostra de material
piezoeléctrico. Por outro lado, é uma técnica muitas vezes posta em causa quando o
material possui impurezas ou defeitos (material muito poroso), não sendo nesses casos
um método ideal de polarização devido à facilidade de ocorrerem arcos eléctricos entre
as placas.
Em muitos casos existe a necessidade da aplicação de eléctrodos depositados
sobre a área a polarizar de forma a uniformizar a polarização na amostra e optimizá-la.
3.2.2 Método de Bauer:
O método de Bauer é utilizado na polarização de folhas de material de
dimensões elevadas e revela-se bastante eficaz nesta situação. A figura 15 demonstra a
representação esquemática deste método:
Figura 15: Método de polarização de Bauer: 4 e 5 – Eléctrodos; 1 – Folha de material
a polarizar; 2 e 3 – Filmes de material ferroeléctrico [2].
Capítulo 3 – Estado da Arte
34
Este método de polarização consiste em:
Colocar filmes de material ferroeléctrico (2 e 3) entre as faces (1ª e 1b) da folha
de material a polarizar (1). Estes filmes ferroeléctricos deverão ter uma
espessura específica, determinada pelos campos coercivos do material a
polarizar e dos filmes de material ferroeléctrico;
Colocar os eléctrodos (4 e 5) por cima dos filmes ferroeléctricos. Será entre estes
eléctrodos que se irá aplicar uma tensão crítica V (normalmente de 5 kV).
Este método tem como principal vantagem, além da polarização de folhas de
material de elevadas dimensões, permitir uma óptima uniformização da polarização no
material, sendo possível desmultiplicar este sistema e assim polarizar várias folhas de
material simultaneamente. De acrescentar que este método tal como o anterior, não
requer equipamento excessivamente complexo ou dispendioso.
Como principal desvantagem, pode referir-se que à semelhança do método das
placas paralelas, a uniformidade da polarização poderá ser posta em causa e revelar-se
muitas vezes ineficiente quando o material a polarizar possui demasiadas impurezas ou
defeitos (material muito poroso), não sendo nesses casos um método ideal de
polarização.
Este método destina-se quase unicamente a polarizar material em forma de
folha, sendo bastante limitativo em relação à forma de material que se pode polarizar
[2].
3.2.3 Método de Polarização por Corona:
A descarga de corona é produzida num gás quando é aplicado um potencial
eléctrico elevado (na ordem dos 5 kV) entre dois eléctrodos assimétricos, uma ponta ou
fio, e um plano, por exemplo.
A secção de ionização da descarga por corona remete-se a uma pequena região
perto da ponta ou fio onde se carregam electricamente as moléculas de ar, produzindo
iões e moléculas excitadas bem como uma movimentação do gás que gera inúmeras
colisões entre partículas carregadas e as moléculas neutras. Uma outra região que se
estende desde a ponta do fio até ao plano (zona de vento de corona) é caracterizada pela
presença de portadores de carga de apenas uma polaridade, com mobilidade da ordem
Capítulo 3 – Estado da Arte
35
de alguns cm2.V
-1.s
-1 [3,4]. Dependendo da polaridade da corona, são produzidos iões
positivos ou negativos.
A interacção entre os iões produzidos por corona com a superfície é considerada
uma absorção assistida pelo campo eléctrico aplicado. Os iões de corona não penetram
no interior, mas transferem a sua carga para a superfície. O excesso de carga fornecida
pelos iões de corona, ou reside na superfície em defeitos e impurezas que se encontram
ao longo desta, ou é injectada e aprisionada em defeitos que se encontram no interior do
material a polarizar.
Este método de polarização é bastante vantajoso relativamente aos dois métodos
previamente descritos, entre essas vantagens de referir que:
A polarização pode ser realizada sem a deposição de eléctrodos, ou apenas pela
deposição de um eléctrodo numa das superfícies;
São conseguidos campos eléctricos mais elevados do que no caso da polarização
pelo método de Bauer;
Filmes finos são polarizados mesmo que estes contenham demasiadas impurezas
ou defeitos (material muito poroso) pois o fenómeno destrutivo de rotura
eléctrica está limitado a pequenas áreas da amostra [5].
A figura 16 representa um sistema de polarização por corona.
Figura 16: Sistema de polarização pela técnica de corona [5].
Capítulo 3 – Estado da Arte
36
Este sistema consiste na aplicação de uma elevada tensão Vc na ponta de corona
(P), que irá criar a ionização de moléculas de ar (tipicamente CO3– para coronas de
polaridade negativa e (H2O)nH+ para polaridade positiva). A tensão VG numa grelha
(G), colocada sobre o porta amostras (também ele um eléctrodo cuja corrente I(t) será
controlada), servirá unicamente para controlar a tensão VC.
Quando ocorre uma descarga na ponta de corona, as moléculas de ar ionizadas
irão embater na superfície do material provocando uma transferência de carga para esta,
permitindo o alinhamento dos dipolos e consequente polarização.
A grelha, colocada imediatamente sobre a amostra, permitirá uma melhor
uniformização do campo eléctrico de polarização após a descarga na ponta de corona.
Essa grelha, permite também que a tensão eléctrica sobre a amostra seja controlada tal
como a corrente I(t). Mantendo essa corrente constante ao longo do tempo através do
ajuste do potencial VG (daí este método ser também conhecido por método da corrente
constante) e sabendo que = VG – V(t), é possível verificar que é constante. É
então possível retirar V(t) a partir do valor de VG.
Como se pode verificar, através deste método é possível controlar o processo de
polarização através do controlo de vários parâmetros do processo, sendo portanto
considerado um método de polarização altamente controlado.
De referir que com este método é também possível polarizar materiais com
várias formas geométricas bem como materiais que contenham demasiadas impurezas
ou defeitos (material muito poroso). Como desvantagens, a zona do material
directamente abaixo da ponta de corona exibe-se mais fortemente polarizado, podendo
representar uma deficiência na uniformidade da polarização, e é um método com
tempos de polarização elevados de aproximadamente cinco minutos por amostra,
dependendo do material a polarizar. É um método que requer algum equipamento
dispendioso, de forma a se poder controlar todo o processo [2].
3.3 Campo Eléctrico Aplicado no Processo de Polarização
3.3.1 Aplicação de uma tensão eléctrica sinusoidal:
Bauer [7] desenvolveu uma técnica de polarização por histerese na qual a tensão
aplicada na amostra varia sinusoidalmente com o tempo e a corrente resultante é
monitorizada. Fazendo um gráfico da corrente em ordem à tensão aplicada, fornece um
Capítulo 3 – Estado da Arte
37
ciclo de histerese corrente/tensão. A figura 17 mostra um ciclo de histerese para uma
densidade de corrente redimensionada por campo eléctrico. e também um gráfico de
polarização por campo eléctrico.
A corrente redimensionada significa que esta foi reduzida para um ciclo de
tempo unitário multiplicando a corrente pelo ciclo de tempo.
A resposta de um material ferroeléctrico a uma tensão aplicada é dada no caso
mais simples por:
(3.1)
Onde i é a corrente, C a capacitância das placas paralelas (dada por
com 0 sendo a permissividade do meio, a constante dieléctrica da amostra, A a área L
a espessura da amostra), V a tensão aplicada, t o tempo, P a polarização ferroeléctrica e
R a resistência eléctrica da amostra. Estes três termos da equação 3.1 são a resposta
capacitiva, a ferroeléctrica e a resistiva.
Figura 17: Gráfico de Polarização por campo eléctrico (a preto) e de corrente por campo
eléctrico (a vermelho) [9].
Capítulo 3 – Estado da Arte
38
No caso sinusoidal, , onde f é a frequência do ciclo de
histerese e t o tempo. O uso de um varrimento sinusoidal faz com que nos
extremos dando tempo suficiente para .
Assumindo que R é independente da tensão eléctrica, R pode ser calculada pela
corrente i+ e i
- medida nos extremos da tensão eléctrica V
+Max e V
–Max através da
equação:
(3.2)
Onde i0 é a corrente de offset, estimada como a corrente média no sentido
positivo e negativo quando a tensão eléctrica é nula.
Na ausência de comutações eléctricas e efeitos resistivos, a corrente medida é
. No caso ideal, fazer o gráfico da corrente por uma tensão eléctrica
sinusoidal equivale a fazer o gráfico de pelo . A
representação de tal gráfico seria uma elipse da qual C, e daí , podem ser estimados.
C e R podem variar significativamente por todo intervalo de valores do campo
eléctrico aplicado. No caso de C, o termo capacitivo da equação 3.1, daria uma elipse
distorcida. Por outro lado, R, o termo resistivo, é não linear, adicionando um termo
aproximadamente cúbico à equação da elipse.
Posteriormente, à medida que o campo eléctrico aplicado é removido e os
dipolos alinhados por este campo relaxam, ficarão contribuições não remanescentes da
polarização [9].
3.3.2 Aplicação de ciclos Bipolares/Unipolares:
Os problemas surgem quando os dados gerados sinusoidalmente não estão em
conformidade com uma elipse devido ao efeito das cargas espaciais, à relaxação dos
dipolos (à medida que o campo eléctrico aplicado é reduzido,), figura 18, ou a efeitos
resistivos não lineares, figura 19. No exemplo da figura 18, o material não foi
polarizado no campo coercivo ou acima deste, contudo, este efeito poderá também
surgir em amostras ideais se o campo máximo aplicado não for suficientemente elevado
(aproximadamente duas ou três vezes superior ao campo coercivo). Os efeitos resistivos
presentes na figura 19 podem ser causados por uma espécie de cargas móveis no
material.
Capítulo 3 – Estado da Arte
39
Figura 18: Relaxação dos dipolos à medida que o campo aplicado é reduzido [9].
Figura 19: Efeito da resistência eléctrica não linear [13].
Capítulo 3 – Estado da Arte
40
Para o caso em que não é linear, Lee et al. [8] estimou um factor de
correcção baseado na suposição que a parte não linear é relacionada exponencialmente
com a tensão aplicada.
Como a tensão aplicada é controlada remotamente por computador, a sequência
pode facilmente ser alternada entre ciclos bipolares e unipolares mantendo ao mesmo
tempo constante. O uso de ciclos bipolares seguido de ciclos unipolares permite
separar a contribuição que a polarização remanescente tem no sinal de outras
contribuições. Assim, sem assumir quaisquer formas funcionais, podem extrair-se os
valores do campo coercivo e da polarização remanescente.
O computador é programado para gerar um conjunto de ciclos de histerese
bipolares, usando uma tensão linear variável no tempo. Nestes ciclos bipolares, a
polarização vai alternar duas vezes à medida que os campos coercivos positivo e
negativo são ultrapassados.
No final do ciclo bipolar, o computador foi programado para gerar três ciclos de
tensão eléctrica unipolar. No primeiro ciclo unipolar, a polarização remanescente é
invertida da sua orientação anterior para que os dipolos alinhem com a nova orientação.
No segundo ciclo unipolar, a polarização remanescente não se altera. O terceiro e último
ciclo unipolar é efectuado para certificar que a polarização inverteu no primeiro ciclo. O
campo coercivo é estimado pela razão entre as tensões individuais e a corrente que
circula para cada uma delas. A definição clássica de campo coercivo vem da integração
do ciclo de corrente e corresponde ao ponto no eixo do campo eléctrico em que a
polarização remanescente é zero. A definição correspondente em ciclos unipolares é o
campo que corta a área do pico de polarização [9]. No caso do pico de polarização ser
aproximadamente simétrico ao campo coercivo, constam-se as seguintes definições de
campo coercivo:
Campo no qual a máxima corrente flui;
Campo médio aplicado com cada valor do campo relacionado pela corrente que
flui nesse campo.
A relaxação dos dipolos à medida que o campo eléctrico aplicado é reduzido
como se pode ver na figura 17, distorce a elipse corrente/tensão produzida por um
comportamento capacitivo ideal, como tal, uma elipse não é a descrição adequada da
resposta em corrente à tensão eléctrica aplicada. Contudo, a polarização decorrente
destes dipolos é por definição não remanescente e será evidente em cada ciclo. Em
Capítulo 3 – Estado da Arte
41
particular, esta contribuição não sobreviverá à subtracção do segundo ciclo unipolar
pelo primeiro. O resultado da subtracção conterá apenas contribuição remanescente das
quais a polarização remanescente e o campo coercivo poderão ser calculados como
descrito acima.
O efeito detalhado das cargas espaciais é actualmente desconhecido, mas
claramente, apenas uma parte das cargas espaciais, associada à polarização
remanescente, sobreviverá ao processo subtractivo. Os efeitos das cargas espaciais que
estão presentes em cada ciclo serão descartados pelo processo subtractivo [9].
Capítulo 3 – Estado da Arte
42
Bibliografia
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externo”, Maringá, Brasil, 2006
[7] F. Bauer, Ferroelectrics 49, 213 (1983).
[8] J. W. Lee, Y. Takase, B. A. Newman, and J. 1. Scheinbeim, J. Polym. Sci. Polym.
Phys. 29, 273 (1991).
[9] B. Dickens, E. Balizer, A. S. DeReggi, and S. C. Roth, “Hysteresis measurements of
remanent polarization and coercive field in polymers”, Polymers Division, National
institute of Standards and Technology* Guithersburg, Maryland 20899.
43
Capítulo 4
Sistema Desenvolvido
4.1 Descrição geral do sistema desenvolvido
Como ilustra a figura 20, o sistema desenvolvido é composto por uma fonte de
tensão DC Keithley modelo 248, um picoamperímetro também da Keithley modelo
6485, um relé para inversão da polaridade da fonte de alimentação DC (por forma a
poderem ser feitos varrimentos de tensão de -5 kV a +5kV) e um DAQ (Data
Acquision) da National Instrument, modelo NI USB-6009, usado para activar
remotamente por computador a relé de inversão da tensão eléctrica aplicada.
Figura 20: Fotografia do sistema desenvolvido.
Capítulo 4 – Hardware Experimental
44
Na figura 21 pode-se ver um esquema geral do funcionamento do hardware. O
software de controlo comunica com a fonte DC através um conversor USB para GPIB, e
com o picoamperímetro através de um barramento GPIB ligado à fonte de tensão DC.
A fonte de tensão DC está ligada ao circuito comutador de tensão para que seja
possível obter níveis de tensão eléctrica negativa usada na polarização pelo método das
placas paralelas com tensões bipolares/unipolares. A saída do circuito comutador liga
directamente ao eléctrodo do porta-amostras. A corrente é lida pelo picoamperímetro à
saída do porta-amostras.
4.2 Barramento GPIB
O standard ANSI/IEEE 488.1-1987, também conhecido por General Purpose
Interface Bus (GPIB), descreve um standard de interface de comunicação entre
instrumentos e controladores de diferentes fabricantes. O mesmo contém informação
acerca de especificações eléctricas, mecânicas e de funcionamento da interface. O
barramento GPIB tem as seguintes características:
Permite ligar até 14 instrumentos ou dispositivos a serem controlados por
computador, sendo cada um identificado por um endereço único (N° inteiro);
Taxa de transferência especificada de 1 Mbps;
Modo de transferência de dados: paralelo com 8 bits.
Figura 21: Esquema geral do hardware utilizado na polarização de materiais piezoeléctricos.
Capítulo 4 – Hardware Experimental
45
4.2.1 Origem:
O barramento GPIB foi inventado pela Hewlett-Packard Corporation em 1974,
com o objectivo de simplificar as comunicações entre instrumentos de medida e
computadores. Nessa altura, os computadores não possuíam portas standard de ligação.
Por outro lado, apenas um número muito restrito de instrumentos de medida apresentava
conectores com linhas de saída BCD paralelas, para ligação a impressoras ou plotters. O
controlo remoto dos instrumentos estava limitado a um pequeno número de linhas de
entrada num conector, existente na retaguarda dos mesmos, permitindo a selecção de
um número reduzido de funções ou gamas de medida. Como tal, um interface especial
com o computador teria que ser desenvolvido para cada instrumento, presente na
montagem experimental. Tal implicava geralmente meses de trabalho, mesmo para os
sistemas menos complexos.
Um novo barramento, HP-IB do inglês Hewlett-Packard Instrument Bus,
concebido pela Hewlett-Packard passaria a utilizar um cabo standard de modo a
interligar vários instrumentos de medida ao computador. Cada instrumento teria a sua
própria interface electrónica e um conjunto standard de respostas a comandos vindos do
computador. O sistema seria facilmente expansível, ligando múltiplos instrumentos
através de conectores especiais (piggyback cables). O número máximo de instrumentos
ligados desta maneira estava limitado a 14 e o comprimento do cabo a 20 metros. O
barramento HP-IB foi proposto às organizações internacionais de standards em 1974,
sendo adoptado pelo comité IEC na Europa em 1975. Devido a objecções levantadas
nos EUA por outra grande companhia sobre o nome do barramento, foi criado o novo
nome: General Purpose Instrument Bus (GPIB). O barramento GPIB foi formalmente
adoptado com o standard IEEE- TD 488, em 1978.
Existem três tipos de dispositivos que podem ser ligados ao barramento IEEE
488 GPIB: Podem ser talkers, listeners ou controladores. Um talker envia mensagens de
dados para o barramento. Por seu lado, um listener recebe mensagens de dados do
barramento, no caso desta dissertação, a fonte DC seria um listener pois apenas recebe
ordens do controlador, e o picoamperímetro um talker pois envia informações, neste
caso, os valores das correntes lidas. O controlador, geralmente o computador, gere o
fluxo de informação no barramento GPIB, i.e., controla as ligações de comunicação e
envia comandos GPIB para os diferentes dispositivos. Alguns dispositivos podem
desempenhar mais do que uma função. Por exemplo, um voltímetro digital pode
desempenhar as funções de listener e talker [1].
Capítulo 4 – Hardware Experimental
46
4.2.2 Controlador:
Os controladores (neste caso será o computador) têm a capacidade de enviar
comandos, escrever dados (talk) para o barramento e ler dados (listen) dos instrumentos
de medida. Os instrumentos, por seu lado, podem ter a capacidade de escrever e ler
dados. É possível ter mais do que um controlador no sistema GPIB, mas apenas um dos
controladores, num dado instante, pode ser o controlador activo ou controler-in-charge
(CIC). O CIC pode estar num de dois estados possíveis, activo ou inactivo (standby). O
controlo pode ser passado do CIC para qualquer instrumento com capacidade de
controlo (controlador em estado de espera). No entanto, apenas o controlador do
sistema, normalmente uma interface GPIB para PC, pode assumir a função de CIC [1].
4.2.3 Endereços dos dispositivos GPIB:
A comunicação entre os vários dispositivos faz-se normalmente recorrendo ao
endereçamento, dispondo os dispositivos talkers e listeners de uma opção de atribuição
de um endereço (Address). Todos os dispositivos e interfaces (placas) GPIB devem ter
um endereço único. Um endereço GPIB é constituído pelas seguintes duas partes:
endereço primário e um endereço secundário (optional). O endereço primário é
representado por um número inteiro no intervalo 0-30. O controlador do sistema gere as
comunicações no barramento GPIB, usando estes endereços de modo a colocar os
vários dispositivos no modo listener ou talker, num dado instante. O endereço 31
corresponde ao endereço unlisten ou untalk. Apesar de existirem 31 endereços primários
(0-30) disponíveis, os controladores IEEE 488 apenas podem controlar 14 dispositivos
físicos. Os mesmos dispositivos podem ter um endereço secundário, que pode ser
utilizado para aceder a determinadas funções dos mesmos [1].
4.2.4 Barramento GPIB e conversor USB – GPIB:
Os barramentos GPIB standard podem ser adquiridos num vasto leque de
fabricantes, incluindo os principais fabricantes de placas GPIB. Encontram-se à venda
com o conector piggyback standard em ambas as extremidades (figura 22) ou com o
conector directo (straight-in connector) numa das extremidades. Devem utilizar-se
cabos de qualidade, de modo a evitar problemas de ruído com origem em EMI/RFI
(ElectroMagnetic Interference/RadioFrequence Interference). A figura 23, mostra o
conversor USB – GPIB usado nesta dissertação [1].
Capítulo 4 – Hardware Experimental
47
4.3 Fonte de tensão DC (Keithley 248)
O modelo 248 da fonte de alimentação de alta tensão foi desenhado para ser
usado em laboratórios. Permite o ajuste dos valores da tensão de saída de uma forma
muito precisa tendo também a possibilidade de alterar a polaridade por ajuste de um
selector na parte traseira, como se pode ver na figura 24. Apresenta também excelente
regulação e baixo ripple da tensão de saída. No âmbito desta dissertação, esse selector
Figura 22: Barramento GPIB
Figura 23: Conversor USB GPIB
Capítulo 4 – Hardware Experimental
48
de polaridade não foi usado, mantendo-se sempre a polaridade positiva, pois só é
possível alterar a polaridade com a fonte desligada e no âmbito desta dissertação, a
inversão da polaridade deverá ser feita remotamente e por computador.
O indicador frontal fornece leituras precisas de tensão e corrente eléctrica bem
como ajustes manuais da tensão de saída, de configurações do instrumento como o
endereço de GPIB ou a selecção dos filtros existentes (figura 25). A tensão de saída
pode ser ajustada no painel frontal ou via remota por um controlador usando protocolo
GPIB, podendo também os valores de tensão e corrente ser monitorizados remotamente
[2].
Figura 24: Visão do painel traseiro da fonte de alimentação de alta tensão [2].
Figura 25: Visão do painel frontal da fonte de alimentação de alta tensão [2].
Capítulo 4 – Hardware Experimental
49
4.3.1 Operação remota da fonte de alimentação DC:
Segue-se abaixo uma tabela com os comandos possíveis de realizar remotamente
por computador usando o barramento GPIB
Tabela 6: Tabela com um sumário dos comandos possíveis de realizar por barramento GPIB [2]
Tipo Comando Descrição
Controlo de
Saída
HVOF Desliga alta tensão
HVON Liga alta tensão
IOUT? Ler valor de corrente de saída
VOUT? Ler valor da tensão de saída
Controlo de
Parâmetros
*RCL <n> Evocar parâmetros armazenados
*SAV <n> Armazenar parâmetros
*ILIM(?) <n> Ajuste limite de corrente
ITRP(?) <n> Ajuste do possível excesso (trip) de corrente.
SMOD? Inquirir o modo de VSET
TCLR Limpa os excessos (trips) de tensão ou corrente.
TMOD(?) <n> Ajuste do modo de reposição de excessos (trips).
VLIM(?) <n> Ajuste do limite de tensão.
VSET(?) <n> Ajuste da tensão de saída.
FILT(?) <n> Escolha do filtro a usar.
Controlo de
Interface
*RCL Restaura configurações por defeito.
*IDN? Ler identificação do dispositivo
*WAI Comando de pausa para sincronizar
Relato de
Estado
*CLS Limpa registos de estado
*ESE(?) <n> Ajusta o byte de estado
*ESR? [<n>] Lê o registo de estado
*PSC(?) <n> Ajusta o estado do clear bit
*SRE(?) <n> Ajusta a permissão de solicitação de serviço
*STB? [<n>] Lê o byte de estado
Um ponto de interrogação entre parênteses (?) significa que o comando existe na
opção de leitura, caso não esteja entre parênteses significa que o comando é apenas de
Capítulo 4 – Hardware Experimental
50
leitura, um comando precedido de um asterisco indica que é um comando comum do
protocolo IEEE-488.2 [2].
4.3.2 Alta tensão:
Como se foi acima descrito, a fonte Keithley modelo 248, é uma fonte de alta
tensão podendo esta tensão variar até um máximo de 5 kV. A definição exacta de alta
tensão varia, mas o IEE define-a como qualquer tensão eléctrica em corrente alternada
acima de 1000 V, entretanto, o U.S. 2005 National Electrical Code (NEC) define no
artigo 490.2 que alta tensão é qualquer tensão acima de 600 V. Logo, sempre que se
manipula tensões com um valor tão elevado deve-se proceder com elevada precaução
[5]. No caso desta fonte, e embora atinja tensões elevadas, a corrente eléctrica nunca é
superior a 5,25 mA, tendo protecções que não deixam que a corrente eléctrica exceda
esse valor, e baixando imediatamente a tensão eléctrica caso a corrente pedida seja
elevada. Costumam associar-se os danos que o choque pode causar com o nível de
tensão, porém o correcto é que depende da intensidade da corrente eléctrica que
atravessa o corpo da pessoa durante o choque e do caminho percorrido pela corrente
eléctrica ao longo do corpo.
Certamente que quanto maior for a tensão, maior é a probabilidade de ocorrer
um dano físico à pessoa, tendo em vista que pela lei de Ohm o aumento da corrente é
directamente proporcional ao da tensão e inversamente proporcional ao da resistência
eléctrica, ou seja, para a mesma resistência do corpo humano, que é relativamente
constante (entre 1300 e 3000 ohms para a tensão de 127 V), se a tensão aumentar,
consequentemente a corrente aumentará, daí a fonte Keithley ter protecção contra o
aumento de corrente não permitindo que esta exceda os 5,25 mA, sendo (teoricamente)
menos provável que ocorram danos físicos ao operador [6].
O único cuidado que se teve na montagem do sistema desenvolvido foi em usar
cabos condutores com um isolamento eléctrico bastante grosso. Técnicos com
experiência nesta área, aconselham o uso de um condutor com uma espessura do
isolamento de pelo menos 1 mm por cada 1000 V.
Capítulo 4 – Hardware Experimental
51
4.4 Picoamperimetro
O modelo 6485 da Keithley é um picoamperímetro de alta resolução
programável por um barramento RS – 232 ou IEEE – 488. Entre outras, apresenta as
seguintes especificações:
Oito gamas de corrente de 20 mA até 2nA, sendo a gama de 2 nA a que contém
menor ruído;
Tensão analógica de saída escalada, que permite transmitir medições a
dispositivos como DMMs, placas de aquisição de dados e osciloscópios;
220V de protecção de sobrecarga, permitindo desta forma sobrecargas abusivas;
Funções que podem ser facilmente configuradas pelo toque de um botão,
dispensando menus demasiado complicados;
Um interface Trigger Link, que simplifica o sincronismo com outros
instrumentos. Este interface permite escolher entre seis modos de disparo
independentes;
Interfaces RS – 232 e IEEE – 488 que facilitam a integração deste modelo em
sistemas de medida e automação.
Um interruptor que permite desligar o ecrã para usar em testes de componentes
sensíveis à luz, como fotodíodos.
Funções REL e LOG, que permitem visualizar o valor relativo da corrente ou o
valor logarítmico absoluto da corrente medida;
Entrada BNC no painel posterior fácil de usar e barata ao contrário de outros
cabos como o triax que são bastante mais dispendiosos.
Este picoamperímetro contém um Zero Check que reconfigura o amplificador de
entrada para curto-cicuitar o sinal como mostra a figura 26, este tem de estar activo
sempre que se liga ou desliga sinais de entrada pois funciona como uma protecção [4].
Figura 26: Impedância equivalente de entrada quando o Zero Check está activo [2].
Capítulo 4 – Hardware Experimental
52
4.5 Relé
Os relés são componentes electromecânicos capazes de controlar circuitos
externos de grandes correntes a partir de pequenas correntes ou tensões (conferindo por
exemplo, a capacidade de ser alimentando por uma pilha e controlar um motor que
esteja alimentado a 220 volts ou até mais). O funcionamento dos relés é bem simples:
quando uma corrente circula pela bobina, esta cria um campo magnético que atrai um
contacto (podendo mesmo ter vários contactos), fechando ou abrindo circuitos. Quando
se desliga a alimentação da bobina o campo magnético deixa de existir, fazendo com
que os contactos voltem para a posição original por intermédio de uma mola.
Os relés podem ter diversas configurações quanto aos seus contactos: podem ter
contactos normalmente abertos (NA), normalmente fechados (NF) ou ambos. Os
contactos NA são os que estão em circuito aberto enquanto a bobina não está alimentada
e que fecham, quando se alimenta a bobina. Os NF abrem-se quando a bobina é
alimentada, num efeito oposto ao dos contactos NA. O contacto central (C) é o comum,
ou seja, quando o contacto NA fecha é com o contacto C que se estabelece a condução e
o contrário com o NF. A principal vantagem dos relés em relação aos tirístores SCR e
aos Triacs é que o circuito de carga está comportamentalmente isolado do circuito de
controlo, podendo inclusive trabalhar com tensões com terras diferentes entre controlo e
carga. A desvantagem é o factor de desgaste, pois em todo o componente mecânico há
uma vida útil. Devem ser observadas as limitações dos relés quanto às correntes e
tensões máximas admitidas entre os seus terminais. Se não forem observados estes
factores, a vida útil do relé estará comprometida, ou até a do circuito controlado.
No âmbito desta dissertação, o relé utilizado é da OMROM modelo G2R-2, com
dois contactos NA e dois contactos NF. A tensão máxima deste relé é de 250V e a
alimentação da bobina é feita com 6V. Embora a tensão máxima do relé seja de 250V,
serviu perfeitamente para o sistema desenvolvido pois, embora este sistema opere com
tensões máximas de 5 kV, a comutação dos contactos do relé é efectuado quando estes
contactos se encontram próximos de 0 V no varrimento efectuado de –5 kV a 5 kV.
A figura 27 mostra o esquema dos contactos deste relé que pode ser visto no
datasheet da OMROM.
Capítulo 4 – Hardware Experimental
53
4.6 Circuito comutador de tensão
Como a fonte de alta tensão não permite a alteração remota da polaridade da
tensão de saída, apenas permite essa alteração através do ajuste de um selector de
polaridade na parte traseira da fonte, foi necessário elaborar um circuito eléctrico (figura
26) que permitisse a alteração remota da polaridade.
Figura 28: Circuito comutador de tensão.
Figura 27: Esquema eléctrico do relé utilizado.
Capítulo 4 – Hardware Experimental
54
Inicialmente estava previsto que o DAQ alimentasse directamente a bobina do
relé, sendo apenas necessário o software enviar um valor digital correspondente a 5V
para o relé abrir os contactos normalmente fechados (NF) e fechar os contractos
normalmente abertos (NA). Tal não sucedeu pois o DAQ não fornece corrente
suficiente para alimentar a bobina do relé (obrigando a tensão de saída do DAQ a baixar
dos 5V para aproximadamente 1,3V). Como tal foi necessário elaborar um circuito
eléctrico que permitisse a comutação da polaridade da fonte de alimentação de alta
tensão, alimentando simultaneamente o relé que permite essa comutação, tudo
remotamente por computador.
Decidiu-se alimentar a bobina do relé via porta USB, esta permite uma tensão de
saída de 5V com uma corrente superior a 1A, sendo perfeitamente suficiente para o
desejado. Ainda assim e resolvido o problema da alimentação da bobina do relé, era
necessário que a abertura e fecho dos contactos NF e NA do relé, fosse efectuada
remotamente por computador, como tal, resolveu-se alimentar um MOSFET 2N7000
com a alimentação oriunda da porta USB e usar a tensão eléctrica do DAQ para
controlar a condução eléctrica do MOSFET, ou seja, aplicando uma tensão eléctrica de
0V na gate do MOSFET (enviando um sinal analógico ou digital de 0V, via DAQ),
implica a existência entre a source e o drain de dois díodos com polaridades opostas.
Um dos díodos é formado pela junção pn entre a região n+ do drain e o substrato p,
sendo o outro díodo formado pela junção pn entre o substrato p e a região n+ da source.
Estes dois díodos com polaridades opostas evitam qualquer condução de corrente entre
o drain e a source mesmo na presença de uma tensão VDS. De facto, nestas condições a
resistência entre o drain e a source é da ordem dos 1012
[3], mantendo os contactos
NF, fechados, e os contactos NA, abertos. Quando é aplicada uma tensão positiva na
gate (enviando um sinal analógico ou digital de 5V, via DAQ), como a source está
ligada á terra e é aplicada uma tensão positiva na gate, a tensão aplicada na gate aparece
efectivamente entre este terminal e a source e é denotada de VGS. O potencial positivo
da gate faz, em primeira instância, com que as lacunas (que se comportam como cargas
positivas) sejam afastadas da zona do substrato por baixo da gate (a região do canal).
Essas lacunas são empurradas para o interior do substrato, deixando na região do canal
uma zona sem cargas livres, dita de depleção. Esta zona vai ser povoada pelos electrões
em excesso das regiões n+ uma vez que as lacunas que os neutralizavam foram
empurradas para o interior do substrato. Do mesmo modo, o potencial positivo da gate
Capítulo 4 – Hardware Experimental
55
atrai electrões livres (provenientes sobretudo das regiões n+ onde estes são abundantes),
para a região do canal. Quando um número significativo de electrões fica acumulado
perto da superfície do substrato, por baixo da gate, é criada efectivamente uma região
do tipo n, interligando a source e o drain. Se for então aplicada uma tensão entre as
regiões do drain e da source, irá fluir uma corrente através desta nova região n induzida,
transportada pelos electrões móveis [3]. Pode então dizer-se que a região n induzida
forma um canal para a corrente fluir do drain para a source permitindo então que a
bobina do relé seja alimentanda convenientemente, fechando os contactos NA e abrindo
os contactos NF.
Em forma de resumo, quando o DAQ envia um sinal de 0V, os contactos
normalmente fechados (NF) da bobina mantêm-se normalmente fechados e os
normalmente abertos (NA) mantêm-se abertos, sendo a tensão eléctrica à saída do relé
positiva (entre 0V e 5kV). Quando o software envia uma sinal de 5V pelo DAQ, a
bobina do relé é alimentada, fechando os contactos normalmente abertos e abrindo os
contactos normalmente fechados, sendo a tensão eléctrica à saída do relé negativa, ou
com polaridade invertida (-5kV a 0V). Em baixo poderá ver duas figuras, uma com o
DAQ a enviar 0V, lendo-se 5kV na saída (figura 29), outra com o DAQ a enviar 5V,
lendo-se –5 kV na saída (figura 30).
Figura 29: DAQ a enviar um sinal de 0V e leitura de 5kV na saída.
Capítulo 4 – Hardware Experimental
56
Figura 30: DAQ a enviar um sinal de 5V e leitura de -5 kV na saída.
Capítulo 4 – Hardware Experimental
57
Bibliografia:
[1] C. Vinhais, C. Abreu, DAQ_Cap8_GPIB.pdf, DEFI / ISEP.
[2] Keithley model 248 datasheet.
[3] J.G.V. Rocha, Mosfets e Amplificadores Operacionais, Netmove Comunicação
Global LDA, 2005.
[4] Keithley model 6485 datasheet.
[5] Consultado em 27 de Outubro de 2008, http://pt.wikipedia.org/wiki/Alta_tensão
[6] Consultado em 27 de Outubro de 2008, http://pt.wikipedia.org/wiki/Choque_elétrico
Capítulo 4 – Hardware Experimental
58
59
Capítulo 5
Programa Informático de Controlo
Como já foi visto, recorreu-se a uma ferramenta de programação gráfica
originária da National Instruments denominada Labview para desenvolver o software
que controla todo hardware descrito no capítulo anterior (capítulo IV). O interface final
pode ser visto na figura 31.
Este software foi desenvolvido seguindo o esquema da figura 32. Poderia ter
sido desenvolvido de inúmeras formas diferentes, partindo de inúmeras ideias
diferentes. Esta foi a forma idealizada segundo os requisitos desta dissertação, como tal,
toda a descrição detalhada sobre o software tem como base o pretendido nesta
Figura 31: Interface do software de controlo
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
60
dissertação, ou seja, efectuar um predeterminado número de ciclos bipolares, após a
conclusão desses ciclos, efectuar predeterminado número de ciclos unipolares,
apresentando em tempo real os gráficos das amostras de tensão e da corrente retiradas
durante todo processo de polarização, e finalizar com a apresentação do gráfico de
histerese e dos gráficos de tensão e corrente. Este gráfico final da tensão, representa a
tensão aplicada na amostra (tensão de polarização) que foi sendo lida e escrita num
ficheiro durante o processo de polarização. Como tal, após idealizar o software
resolveu-se usar uma sequência como mostra na figura 32, onde na primeira parte da
sequência são enviados os valores dos endereços GPIB para comunicação com os
instrumentos, esses mesmos instrumentos são iniciados e começa-se os ciclos bipolares
predeterminados pelo operador. Na segunda parte da sequência são efectuados os ciclos
unipolares predeterminados pelo operador, e como já foi dito, finaliza-se com a
apresentação dos gráficos.
5.1 Ciclos Bipolares
O número de ciclos bipolares é definido pelo operador num controlo numérico e
é a condição de paragem do ciclo while em que está inserido (figura 33).
Figura 32: Sequência usada na idealização do software.
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
61
Para comunicar com a fonte de alta tensão é necessário converter os valores
decimais para strings (por exemplo o valor máximo da tensão será um valor decimal a
ser convertido para string) e após essa conversão, concatena-se esse valor convertido
com a string que indica o comando que se deseja enviar para o instrumento, finaliza-se
enviando essas strings concatenadas usando o GPIB Write.vi. Este envia dados para um
instrumento ligado por GPIB definido pela string de endereço, como por exemplo, na
figura 34 é enviado para a fonte de alta tensão o valor zero que será o valor inicial da
tensão usando o comando VSET (ajusta a tensão).
No caso do picoamperímetro é um pouco diferente, é necessário inicializá-lo
recorrendo ao inicialize.vi, configurá-lo usando o config meas.vi, e, ainda mais
importante, desactivar o Zero Check porque como já foi explicado no capítulo anterior,
este picoamperímetro utiliza uma função Zero Check como protecção, e para se fazer
medidas é necessário desactiva-la. Para tal, utiliza-se o KE6485.vi com um comando
booleano false na opção Zero Check Elabled como se pode ver na figura 35. Mais à
frente ver-se-á como se fazem as leituras de corrente.
Figura 33: Condição de paragem do ciclo bipolar
Figura 34: Como enviar dados por GPIB para a fonte de alta tensão.
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
62
É também nesta fase que o operador inicializa todos os valores como o da tensão
final, número de ciclos unipolares, número de ciclos bipolares, amplitude dos passos de
tensão, número total de amostras e frequência de polarização (ou como foi usado neste
caso, tempo de transição entre passos) como demonstra a figura 36.
Nesta fase e como se pode ver na figura anterior, criou-se um vi denominado
sample.vi, neste é calculado o número de amostras a efectuar em cada varrimento de
tensão, recorrendo ao número total de amostras predefinido pelo operador. A figura 37
ilustra o interior desse sample.vi criado.
Figura 35: Configuração do picoamperímetro para fazer leituras. e
desactivação do Zero Check
Figura 36: Inicializações da tensão final, número de ciclos unipolares, número de
ciclos bipolares, amplitude dos passos de tensão e número total de
amostras.
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
63
O número de ciclos bipolares é multiplicado por 4 pois nestes ciclos são
efectuados quatro varrimentos de tensão, o primeiro de zero até à tensão máxima, o
segundo da tensão máxima até zero, o terceiro de zero até à tensão máxima negativa
(amplitude igual à positiva mas com sinal contrário) e o quarto e último da tensão
máxima negativa até zero. Assim, a predefinição de por exemplo dois ciclos bipolares
implica oito varrimentos de tensão eléctrica. Os ciclos unipolares processam-se de
forma idêntica mas sem a componente negativa, ou seja, serão apenas dois varrimentos,
daí se multiplicar por 2. Somam-se os varrimentos bipolares e unipolares e o total é
dividido pelo número total de amostras em valor absoluto, obtendo assim, o número de
amostras por varrimento de tensão que é colocado num indicador como variável de
saída.
Todos estes valores, bem como os endereços, são colocados numa nova
sequência. Na primeira fase desta nova sequência, são lidos os valores de tensão da
fonte de alta tensão através de um vi criado com o intuito de fazer uma inquirição
(sinalizado pelo sinal de ponto de interrogação no final do comando) à fonte de alta
tensão, esse vi está ilustrado na figura 38.
Figura 37: Cálculo do número de amostras por varrimento de tensão.
Figura 38: Inquirição de tensão.
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
64
Este vi recebe como parâmetro de entrada o endereço da fonte de tensão, envia
um comando de inquirição da tensão à fonte de alta tensão e faz controlo dos erros de
entrada e saída. Os únicos parâmetros de saída são o endereço da fonte de alta tensão e o
erro de saída.
Na segunda fase dessa nova sequência, é lido o valor de tensão enviado pelo
instrumento como consequência da inquirição feita anteriormente. Esse valor é lido
usando um GPIB read.vi, esse valor é lido num formato do tipo string, que tem então de
ser convertido para o tipo decimal antes de ser gravado no ficheiro que contém os
valores de tensão lidos. Essa gravação é efectuada usando um vi denominado de Write
Meas File.vi (acrónimo de Write to Measurement File – Escrita em Ficheiro de
Medidas). Tal como no anterior, é feito um controlo dos erros de entrada e saída e o
único parâmetro de entrada/saída é o endereço da fonte de alta tensão.
Estas duas fases iniciais desta sequência são iguais para os quatro varrimentos de
tensão bipolar, com a diferença de que no terceiro e quarto varrimento (tensões
negativamente polarizadas pelo relé) o valor lido da fonte de alta tensão é multiplicado
por –1 antes de ser gravado em ficheiro, para que os valores de tensão nesses
varrimentos sejam gravados com valores negativos.
A terceira e última fase desta sequência é talvez a mais importante. Nesta é
incrementado o valor de tensão a enviar para a fonte de alta tensão, é controlado o
tempo entre cada passo e é efectuada a amostragem da tensão e da corrente eléctrica.
Para controlar quando são efectuadas as amostragens de corrente e tensão (para elaborar
o gráfico de histerese numa fase mais avançada) recorreu-se a um bloco de programação
em linguagem C.
5.1.1 Varrimento Crescente:
O varrimento crescente de tensão, ou seja, o varrimento de tensão de zero volts
até à tensão máxima é efectuado como ilustra a figura 39. Este recebe o valor da tensão
inicial (zero volts), o valor da amplitude dos passos e o valor final de tensão. O número
de iterações (na figura 39 um i de cor azul no interior de um quadrado da mesma cor) do
ciclo while (contorno cinza) é incrementado, a este multiplica-se a amplitude dos passos
para se obter o valor de incrementação de tensão (por exemplo, se a amplitude dos
passos for 2, o i terá os valores 0, 1, 2, 3, 4, … n, logo, e como a amplitude dos passos é
2, o valor de tensão a incrementar será de 0, 2, 4, 6, 8, … , 2n), soma-se a este valor
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
65
obtido, o valor inicial de tensão (que no âmbito desta dissertação será uma constante
fixa, de valor 0) para que a incrementação de tensão seja feita a partir desse valor
inicial.
O valor de tensão incrementada é comparado com o valor de tensão final, o ciclo
while é contínuo até que o valor de tensão incrementado seja superior ao valor máximo
de tensão, aí o ciclo while termina. Durante todo este processo, esses valores de tensão
incrementados são enviados pelo bloco GPIB write.vi, para a fonte de alta tensão da
forma que já aqui foi descrito.
5.1.2 Varrimento Decrescente:
Analogamente ao processo de varrimento crescente de tensão, o varrimento
decrescente de tensão começa por receber o valor da amplitude dos passos, multiplica
este pelo número de iterações incrementado do ciclo while, para obter o valor do
varrimento decrescente de tensão, como descrito no tópico anterior. Recebe também
inicialmente o valor final de tensão (igual ao anterior, ou seja o valor máximo de tensão
predefinido pelo operador) que vai ser subtraído ao valor de tensão decrescente até
atingir o valor zero que será a condição de paragem deste ciclo while. A figura 40 é
ilustrativa deste varrimento decrescente de tensão.
Figura 39: Varrimento crescente de tensão.
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
66
5.1.3 Amostragem:
Na figura 41 pode-se ver o esquema utilizado para obter as amostras de tensão e
corrente. A variável a será o número de amostras por varrimento, a variável b, será uma
variável de controlo da amostragem, ou seja, se b for igual, por exemplo a 10, isso
significa que de 10 em 10 incrementos/decrementos de tensão deve ocorrer uma
amostragem. Para isso, pega-se no valor máximo da tensão e divide-se pelo número de
amostragens a ser efectuadas num varrimento, desta forma obtém-se a informação sobre
de quando em quando é necessário efectuar uma amostragem (apenas a parte inteira
desta divisão interessa), e multiplica-se por y como descreve a equação 5.1.
(5.1)
y é o valor de b incrementado que será transportado numa espécie de shift
regster para fora do bloco de programação em C e da sequência para entrar novamente
nestes com a denominação de y, isto é feito pois como todo processo está inserido num
ciclo while, não é possível inicializar variáveis pois caso contrário sempre que há uma
nova iteração todas as variáveis seriam reinicializadas.
Figura 40: Varrimento decrescente de tensão.
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
67
Quando c, ou seja o valor da iteração actual for igual ao valor calculado pela
equação 5.1, x é igualado a 0, indicando à estrutura case, que se encontra acima do
bloco de programação, que deve efectuar o case 0, ou seja, efectuar uma leitura de
corrente (através de um vi efectuado com a finalidade de ler correntes que será
explicado mais adiante), apresentá-la num gráfico em tempo real, escrever o valor da
tensão nessa iteração e apresentar o gráfico em tempo real das amostras de tensão.
Caso contrário, a x é atribuído o valor 1 correspondente ao case 1 em que nada
acontece.
As leituras de corrente são efectuadas num bloco denominado amp.vi que se
criou de forma a não se repetirem blocos (aumentando a densidade de código) sempre
que seja necessário efectuar uma leitura de corrente, funcionando como uma função em
linguagem C, que se pode evocar sem necessitar de repetir todo código. O bloco de
leitura de corrente está ilustrado na figura 42.
Figura 41: Bloco usado na recolha de amostras de tensão e corrente.
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
68
Este bloco utiliza um vi denominado KE6485 read.vi que recebe como
parâmetros de entrada as configurações (instrument handle) do picoamperímetro
enviadas pelo KE6485 Config Meas.vi descrito anteriormente, e como parâmetro de
saída o valor da corrente lido. As configurações são também postas na saída para serem
utilizadas por um bloco denominado KE6485 close.vi que encerra a conectividade entre
o computador e o picoamperímetro. Durante todo este processo é feito um controlo de
erros.
5.1.4 Conclusão:
Todo o processo descrito anteriormente serve apenas para os varrimentos
positivos de tensão, ou seja, de zero até à tensão máxima e da tensão máxima para zero.
Os varrimentos negativos são feitos exactamente da mesma forma, residindo a única
diferença nos valores de tensão que devem ser multiplicados por – 1 antes de serem
escritos no ficheiro, pois o controlo da polarização da tensão de saída é feito por um relé
e não pela fonte de alta tensão. Os valores da corrente não necessitam de ser
multiplicados por – 1 pois este picoamperímetro lê valores negativos de corrente e
guarda-os em ficheiro com o sinal negativo.
Figura 42:Bloco de leitura do valor da corrente.
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
69
5.2 Ciclos Unipolares
Os ciclos unipolares são efectuados exactamente da mesma forma (sendo o
número de ciclos também controlado pelo operador), que os ciclos bipolares, com a
única diferença a residir no facto de apenas serem efectuados varrimentos positivos, ou
seja de zero até à tensão máxima pretendida pelo operador e dessa tensão máxima para
zero.
5.3 Gráficos finais
A fase final da sequência descrita no inicio deste capitulo é a leitura dos
ficheiros com a informação das tensões lidas (tensão de amostragem e tensão de
polarização) e apresentação dos gráficos com a tensão de polarização e de histerese
(gráfico das amostras de corrente por amostras de tensão) como mostra a figura 43.
Figura 43: Leitura dos ficheiros de tensão e corrente e apresentação dos gráficos finais.
Capítulo 5 – Programa Informático de Controlo
70
71
Capítulo 6
Resultados Experimentais
A amostra utilizada na obtenção dos resultados experimentais foi de PZT pois
como já foi referido no capítulo 2, o PZT tem sido a escolha standard, devido ao seu
elevado coeficiente piezoeléctrico e à grande variedade de tipos de PZT que têm sido
formulados para servir às exigências de larga escala de frequências e amplitudes. Na
tabela 7 encontram-se algumas das características do material utilizado.
Tabela 7: Algumas características da amostra utilizada.
Propriedades Unidades PZT (Zr/Ti=52/48)
Densidade 103 Kg/m3 7.5
Permitividade Relativa ε/ε0 850
Constante d31 (10-12) C/N 110
Constante g31 (10-3) Vm/N 10
Constante k31 a 1 kHz 30
6.1 Tensão eléctrica aplicada
Nas figuras 44, 45 e 46, podem ver-se os gráficos das tensões eléctricas
aplicadas pela fonte Keithley 248, lidos pelo software desenvolvido, como o software
gravava os valores lidos da fonte num ficheiro, estes foram inseridos numa tabela do
MS Excel de modo a melhor serem visualizados. Na figura 44 pode-se ver o ciclo de
tensão bipolar aplicado, na figura 45, os três ciclos de tensão unipolares, e na figura 46,
o conjunto dos ciclos bipolares e unipolares, como foi visto no capítulo 3, o método de
Capítulo 6 – Resultados Experimentais
72
polarização utilizado ao longo desta dissertação foi o Método das Placas Paralelas com
a aplicação de um ciclo bipolar e três ciclos unipolares.
Figura 44: Ciclo de tensão bipolar aplicada.
Figura 45: Ciclos de tensão unipolar aplicados
Capítulo 6 – Resultados Experimentais
73
6.2 Tensão eléctrica aplicada e corrente lida
Foi aplicada uma tensão eléctrica com um ciclo bipolar e três ciclos unipolares
variando entre –1000 V e 1000V sendo recolhidas duzentas amostras de tensão e
corrente pelo software desenvolvido. Esses valores são amostrados em tempo real no
software e gravados em ficheiro. Os valores de tensão e corrente foram inseridos numa
tabela no MS Excel de modo a melhor serem visualizados. Na figura 47 pode-se
observar o gráfico das duzentas amostras de tensão obtidas pelo software realizado e na
figura 48 as correspondentes duzentas amostras de corrente lidas no picoamperímetro.
Figura 46: Ciclos bipolares e unipolares aplicados.
Figura 47: Gráfico da corrente lida que atravessa a amostra.
Capítulo 6 – Resultados Experimentais
74
De seguida é feita uma apresentação dos gráficos da tensão aplicada por corrente
lida que, tal como os anteriores, foram inseridos no MS Excel de forma a melhor serem
visualizados, estes foram inseridos no MS Excel em quatro formas diferentes, na
primeira inseriram-se apenas os valores das amostras de tensão bipolar e respectivas
correntes, no segundo inseriram-se os valores das amostras de um ciclo unipolar, na
terceira, inseriram-se os valores das amostras de três ciclos unipolares e por fim, o total,
ou seja, as duzentas amostras obtidas durante o ciclo bipolar e os três ciclos unipolares e
respectivas correntes. Nestes gráficos são perfeitamente visíveis os laços de histerese
que se pretendia obter com o sistema que foi implementado, podendo desta forma
observar-se que o sistema desenvolvido funciona correctamente.
Na figura 49 pode-se observar o gráfico do ciclo bipolar de tensão pela corrente
lida. Pode-se observar (linha do gráfico interrompida) o que aparenta ser uma falha na
corrente lida ou na tensão aplicada mas trata-se apenas de um erro de inserção no MS
Excel pois a próxima amostra, de tensão e corrente, obtida já se encontra no primeiro
ciclo unipolar. Na figura 50, pode ser observado o gráfico de um ciclo de tensão
unipolar pela respectiva corrente lida.
Figura 48: Gráfico da amplitude das amostras obtidas pelo software.
Capítulo 6 – Resultados Experimentais
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Figura 49: Gráfico do ciclo de tensão bipolar por corrente lida durante esse ciclo.
Figura 50: Gráfico de um ciclo de tensão unipolar por corrente lida durante esse ciclo.
Capítulo 6 – Resultados Experimentais
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Na figura 51, pode-se observar o gráfico dos três ciclos de tensão unipolar e
respectivas correntes lidas durante a aplicação desses ciclos.
Na figura 52 pode-se observar o ciclo de tensão bipolar e o primeiro ciclo de
tensão unipolar por respectivas correntes lidas. Por último, na figura 53 pode-se ver o
gráfico completo dos ciclos bipolar e unipolares aplicados e respectivas correntes lidas.
Figura 51: Gráfico dos três ciclos de tensão unipolares e por respectiva corrente lida
durante esses ciclos.
Capítulo 6 – Resultados Experimentais
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Figura 52: Gráfico de um ciclo de tensão bipolar e um ciclo de tensão unipolar por
respectiva corrente lida durante esses ciclos.
Figura 53: Gráfico completo dos ciclos bipolar e unipolares aplicados e respectivas
correntes lidas.
Capítulo 6 – Resultados Experimentais
78
6.3 Conclusão
Após um estudo dos diferentes processos de polarização, optou-se por um
sistema de polarização pelo Método das Placas Paralelas, que permite a aplicação de
ciclos bipolares e unipolares de forma flexível. Sendo que o objectivo desta dissertação
era o desenvolvimento de um sistema para optimizar a polarização de materiais
electroactivos, permitindo a obtenção de melhores características desses materiais bem
como a melhor compreensão do processo de polarização, pode-se afirmar que nesse
sentido o sistema cumpriu as expectativas e foram obtidos resultados bastante
promissores.
O bom funcionamento do sistema desenvolvido, foi testado na polarização de
um material piezoeléctrico, o zirconato titanato de chumbo e os resultados demonstram
que os objectivos propostos inicialmente foram atingidos. Seria agora de todo interesse
uma exploração sistemática do sistema desenvolvido aplicando-o em vários materiais e
aplicando o campo eléctrico em diferentes condições.
6.4 Trabalho futuro
O trabalho realizado pode ser alvo de melhoramentos futuros. Como tal
enumeram-se aqui alguns deles:
Utilização de uma fonte de alta tensão bipolar de forma a eliminar tempos de
transição, que ocorrem no relé (quando se alimenta ou se retira a alimentação da
bobina deste) e tornar o sistema mais seguro e simples;
Não sendo possível a realização desta dissertação com uma fonte de alta tensão
bipolar, utilizar um contactor no lugar da relé, pois existem modelos de
contactores com tempos de transição menores que os do relé e têm melhor
isolamento eléctrico o que torna o sistema mais seguro;
Aplicar o sistema desenvolvido a vários materiais e em materiais preparados em
diferentes condições, recorrendo preferencialmente à aplicação de um campo
eléctrico com tensões mais elevadas, se possível usando varrimentos bipolares e
unipolares até aos 5 kV
Capítulo 6 – Resultados Experimentais
79
Adicionar ao sistema desenvolvido, a possibilidade de controlo de um sistema
de aquecimento para estudar o processo de polarização em função da
temperatura.