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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO
CRISTINA ARGILES SANCHES
DESENVOLVIMENTO REGIONAL A PARTIR DE CLUSTERS PRODUTIVOS:
O CASO DA AGROINDÚSTRIA DA SOJA NO OESTE DA BAHIA
SALVADOR 2008
CRISTINA ARGILES SANCHES
DESENVOLVIMENTO REGIONAL A PARTIR DE CLUSTERS PRODUTIVOS:
O CASO DA AGROINDÚSTRIA DA SOJA NO OESTE DA BAHIA
Tese apresentada ao Núcleo de Pós-graduação em Administração, Escola de Administração, Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do grau de Doutora em Administração Orientador: Prof. Dra. Maria Teresa Franco Ribeiro
SALVADOR 2008
Revisão e Formatação: Vanda Bastos
Ficha catalográfica
Elaborada por CRB
TERMO DE APROVAÇÃO
CRISTINA ARGILES SANCHES
DESENVOLVIMENTO REGIONAL A PARTIR DE CLUSTERS PRODUTIVOS:
O CASO DA AGROINDÚSTRIA DA SOJA NO OESTE DA BAHIA
Tese aprovada como requisito parcial para a obtenção do grau de Doutor em Administração, do Núcleo de Pós-graduação em Administração da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca examinadora.
Salvador, 29 de junho de 2007
Prof. Dra. Maria Teresa Franco Ribeiro – Orientadora Escola de Administração – Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Aos meus filhos, Felipe e Júnior,
pelas diárias lições pedagógicas,
me ensinando a ensinar e a aprender.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer, inicialmente, à paciência e dedicação da minha orientadora, Prof. Maria Teresa, sem a qual eu não teria concluído este trabalho. Com a sua competência, conduziu a orientação de forma muito incentivadora, apesar de todas as dificuldades que se apresentaram, inclusive por questões pessoais de minha parte. Á FAPESB – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia, pelo financiamento concedido, viabilizando a pesquisa de campo, e sem a qual teria sido impossível a sua realização.
Ao Prefeito de Luis Eduardo Magalhães, Sr. Oziel Oliveira; À Deputada Estadual Sra. Jusmari Oliveira, por todo o apoio logístico e de infra-estrutura oferecido durante a pesquisa de campo; Ao Secretário de Agricultura de Luís Eduardo Magalhães, Sr. Eduardo Yamashita, pela assistência dada em tempo integral aos pesquisadores em campo; Ao Assessor de Agronegócios da AIBA – Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia, Sr. Ivanir Maia, pela grande colaboração na estrutura de apoio para a aplicação dos questionários e presteza nos contatos com os entrevistados; Aos pesquisadores José Roberto Dantas e Manoel Duarte, pela dedicação na coleta e tabulação dos dados. A todos os professores, colegas e funcionários do doutorado, pela saudável convivência. Gostaria de citar, em especial, os colegas Romilson Cabral, Fábio Guedes e Ênio Resende, pelas produtivas discussões. À colega e amiga Vera Spínola, o meu sincero agradecimento pelos comentários e apoio na coleta de dados secundários. Por fim, mas não menos importante, gostaria de fazer um especial agradecimento a toda a minha família, pela compreensão e apoio nos momentos mais difíceis, ao tempo em que peço desculpas pelas muitas ausências em função deste trabalho.
Amar...
RESUMO
Este trabalho trata do desenvolvimento regional a partir de clusters produtivos, tomando como estudo de caso a agroindústria da soja no Oeste da Bahia, a partir de uma metodologia teórico-empírica, buscando articular a dimensão produtiva à institucional, integrando-as para tratar a questão do desenvolvimento. Aborda a economia regional como aporte teórico para definir o aglomerado em estudo enquanto um cluster, bem como para analisar a sua contribuição na questão do desenvolvimento; e a economia institucional, que inclui a economia dos custos de transação e a teoria evolucionista, para analisar a evolução das instituições, as estruturas de governança que se definem no cluster e os seus aspectos tecnológicos e processos de inovação. Partindo do pressuposto do desenvolvimento como resultado de uma co-evolução produtiva e institucional, constata, através do levantamento de alguns indicadores socioeconômicos, uma melhora significativa no nível de desenvolvimento na região, muito embora os indicadores ligados à produção e à dinâmica tecnológica do cluster tenham sido significativamente superiores aos socioeconômicos; e, a partir da análise histórica da formação de alguns dos principais municípios que compõem o cluster, que a consolidação econômica contou com programas de incentivo por parte do governo, bem como com financiamentos direcionados especificamente ao custeio da lavoura da soja, respaldando a questão institucional como determinante para o desenvolvimento regional. Destaca: o controle exercido pelas processadoras em relação à dinâmica da cadeia, definindo uma estrutura hierárquica com os produtores; a governança institucional exercida pela Associação de Agricultores e Irrigantes do Oeste da Bahia (AIBA), principal associação de produtores local, pela grande representatividade e atuação que desempenha a favor dos associados; e, ainda, que a articulação com outros elos da cadeia, é fundamentalmente forte entre os atores do cluster. No que diz respeito à inovação, identifica que a tecnologia para esmagamento e refino de óleo, bem como para a produção de insumos, máquinas agrícolas e bens de capital, ocorre de forma incremental, enquanto para a produção de sementes, a denominada biotecnologia, de forma radical, desenvolvendo-se, esses dois processos de P&D, fora da região, quase sempre por multinacionais, destacando a atuação da Fundação BA, ligada à AIBA. Assim, a pesquisa indica que existe, aliada à estrutura produtiva da soja, uma infra-estrutura institucional na região, caracterizando o que foi denominado de co-evolução produtiva e institucional na compreensão do conceito de desenvolvimento, identificando que as principais necessidades dizem respeito à infra-estrutura da região, Ressalta, ainda, que o papel das políticas públicas, de forma articulada e estratégica, é imprescindível para que essa co-evolução se difunda para a região, cabendo um esforço conjunto entre o governo federal e estadual, no desenvolvimento de políticas públicas para o setor, visando a potencialização dessa dinâmica. Palavras-chave: Desenvolvimento regional; Clusters; Agroindústria; Soja; Bahia.
ABSTRACT
The current work deals with the regional development under the conception of productive clusters, taking as case study the soybean agro-industry located in the West of the State of Bahia/Brazil, under a theoretical-empiric methodology, as it tries to combine a productive to an institutional dimension when dealing with the development issue. As theoretical framework, it takes the Regional Economics approach to defining a production concentration as a cluster, as well as to analyzing the contribution of this concentration to the development process. It also discusses the Institutional Economics approach, including the Transaction Cost Economics and the Evolutionist Theory, for analyzing the evolution of the institutions, the governance structures that are drawn within the cluster, its technological aspects and the innovation processes. In this way, taking the assumption that the development results from a productive and institutional co-evolution, it shows through the evaluation of some social-economic indicators that there has been a significant improvement in the region’s development level. Nevertheless the indicators that were related to the production and technological development of the cluster were significantly higher than the social-economic indicators found. It is made a historical analysis of some of the main towns that are part of the cluster. It is found that the economic base counted on tax programs from the government side, as well as loans specifically directed to financing the cost of the soybean crops, showing that the institutional issue was determinant to the regional development. Among the governance structures evaluated, it can be highlighted the control held by the grain processors that establishes a hierarchical structure among the producers within the supply chain dynamics, as well as the institutional governance played by the main association of producers, AIBA (Associação de Agricultores e Irrigantes do Oeste da Bahia), due to its remarkable performance in favor of its associates, as well as its relation with the other actors of the cluster. In regards to the innovation issue, it can be noticed incremental developments in the technology for processing and refining the soybean oil, producing inputs, agricultural machines and capital goods; and radical developments for producing seeds, the so called bio-technology. Both R&D processes that end up by being incorporated to the region, took place out of it, most likely conducted by multinational firms, with the support of Fundação BA (Bahia Foundation) that is linked to AIBA. Therefore, the results of the current research indicate that there is an institutional infra-structure in the region that is linked to the soybean productive structure, which can be identified as the so called institutional and productive co-evolution for understanding the development conception. It can also be noticed that the role of the public policies in a strategic and integrated way is essential for this co-evolution to take place in the region. It requires a joint effort of the federal and state governments for establishing public policies focused on the sector, aiming at reinforcing this dynamics. Keywords: Regional development; Clusters; Agro-industry; Soybean; Bahia
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Territórios de identidade do Estado da Bahia – 2007 ..............……. 25
Figura 2 Extremo Oeste Baiano …………………………...…………...……….. 25
Figura 3 Grade Analítica ..……….................................................................... 65
Figura 4 Municípios produtores de soja no Oeste da Bahia …....……………. 92
Figura 5 Delimitação do sistema agroindustrial (SAG) da soja no Brasil ....... 95
Figura 6 Etapas do processo de produção na indústria de esmagamento e derivados de óleo de soja ................................................................. 97
Figura 7 Principais utilizações do óleo de soja ............................................... 98
Figura 8 Produtos derivados do grão de soja ................................................. 100
Figura 9 Produtos derivados do óleo de soja ................................................. 101
Figura 10 Produtos derivados do farelo de soja ............................................... 101
Figura 11 Delimitação do sistema agroindustrial (SAG) da soja no Oeste da Bahia ........................................................................................... 137
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Síntese Metodológica: questões, conceitos e variáveis de
análise …………………………………….........................…….…. 67Quadro 2 Linhas estratégicas da indústria de processamento de soja ….. 109
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 Principais países produtores de soja no mundo, 2006-2007 .......... 23Gráfico 2 Área plantada de soja, Bahia e Nordeste, 2000/2006 ……....…..... 85Gráfico 3 Produção de grãos, Bahia e Nordeste, 2000/2006 ....................... 86Gráfico 4 Área plantada e colhida de soja nos principais municípios
produtores na Região Oeste do Estado da Bahia, 1990-2006 .… 93Gráfico 5 Quantidade produzida de soja nos principais municípios
produtores na Região Oeste do Estado da Bahia, 1990-2006 ….. 93Gráfico 6 PIB per capita, 1999-2004 (em R$) ................................................ 155Gráfico 7 Consumo residencial, rural e urbano de energia elétrica,
1997-2006 (em kWh) …………………………………………...…… 162
LISTA DE TABELAS Tabela 1 Número de questionários aplicados a produtores de soja,
segundo área das propriedades, Região Oeste do Estado da Bahia, 12 Set – 01 Out 2004 ........................................................... 70
Tabela 2 Produção mundial das principais oleaginosas e dos principais farelos protéicos e óleos vegetais, 2004/05 …….………….….…… 71
Tabela 3 Dados mundiais da soja, 2000/01-2006/07 ...………………………. 72Tabela 4 Produção mundial de soja por países, 2006/07 ……….…….…...… 72Tabela 5 Dados mundiais da soja, 2006/07 ................................................... 73Tabela 6 Projetos do Prodecer, por Estado, área e investimento .................. 75Tabela 7 Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da
produção dos principais cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de valor da produção, Brasil, 2006 ............ 78
Tabela 8 Embarques do Complexo Soja, Brasil, 2000 – 2007 ...................... 79Tabela 9 Exportações do Complexo Soja, Brasil, 2000/2006 (Ano civil) ....... 79Tabela 10 Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da
produção dos principais cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de área colhida, Brasil, 2006 ..................... 80
Tabela 11 Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de área colhida, Região Nordeste do Brasil, 2006 ..................................................................................... 80
Tabela 12 Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de área colhida, Estado da Bahia, 2006 .........
80Tabela 13 Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da
produção de soja (em grão), Grandes Regiões e Estados do Brasil, 2006 ..................................................................................... 81
Tabela 14 Área plantada de soja no Brasil, por regiões e Estados, 2005/06–2006/07 ............................................................................ 82
Tabela 15 Produtividade da soja no Brasil, por regiões e Estados, 2005/06–2006/07 ............................................................................ 83
Tabela 16 Produção de soja no Brasil, por regiões e Estados, 2005/06–2006/07 ........................................................................................... 84
Tabela 17 Área plantada de soja/Participação Relativa, Estado da Bahia, Região Nordeste e Brasil, 2000/01–2006/07 .......................…….... 85
Tabela 18 Produção de grãos de soja/Participação Relativa, Estado da Bahia, Região Nordeste e Brasil, 2000/01–2006/07 ....................... 86
Tabela 19 Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais municípios produtores de cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de valor da produção, considerando uma ordem de classificação nacional, Estado da Bahia, 2006 .................................................................... 91
Tabela 20 Área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais municípios produtores de soja, em ordem decrescente de valor da produção, considerando uma ordem de classificação nacional, Estado da Bahia, 2006 ............... 91
Tabela 21 Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção de soja, segundo as Mesorregiões, Microrregiões e os Municípios produtores do Estado da Bahia, 2006 .......................... 92
Tabela 22 Comparação entre atributos de qualidade de lotes de soja em grãos no mercado internacional, oriundos dos Estados Unidos, Argentina e Brasil ............................................................................ 103
Tabela 23 Número de empregos registrados do setor da agroindústria da soja nos principais municípios produtores de soja, segundo CNAE, Região Oeste do Estado da Bahia, 2005 ............................ 114
Tabela 24 Número de empregos registrados nos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2005 ........ 114
Tabela 25 Número de questionários aplicados por área total da propriedade e por área plantada em soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 .................................................................... 121
Tabela 26 Grau de verticalização de matéria-prima dos produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ............................... 122
Tabela 27 Grau de verticalização do processo produtivo da soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 .................................................... 122
Tabela 28 Origem dos principais equipamentos utilizados no processo produtivo da soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004.......... 123
Tabela 29 Ano de aquisição dos principais equipamentos utilizados no processo produtivo da soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ..................................................................................... 124
Tabela 30 Condições de oferta de infra-estrutura física e serviços públicos segundo os produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ..................................................................................... 124
Tabela 31 Principais canais de comercialização adotados pelos produtores, por níveis de importância, segundo os produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ........................................ 125
Tabela 32 Políticas governamentais que poderiam contribuir para o aumento da competitividade dos produtores, por níveis de importância, segundo os produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ..................................................................................... 125
Tabela 33 Fatores determinantes para manter a capacidade competitiva na produção de soja, por níveis de importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ..................... 148
Tabela 34 Principais inovações adotadas pelos produtores nos produtos e nos processos produtivos a partir da década de 90, por níveis de importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 .................................................................... 148
Tabela 35 Principais fontes de informação utilizadas pelos produtores para promover inovações de produto ou de processo, por níveis de importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ................................................................................ 149
Tabela 36 Formas de incorporação de inovações tecnológicas, por níveis de importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ................................................................................ 150
Tabela 37 Evolução das relações de cooperação com as demais empresas do arranjo nos últimos cinco anos, por intensidade das relações, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ................................................................................ 151
Tabela 38 Forma de interação dos produtores com associações de classe, sindicatos e outros tipos de organizações de representação coletiva, por importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ............................................................... 151
Tabela 39 PIB do agronegócio, Brasil e Bahia, 1999–2004 ............................ 154Tabela 40 PIB das principais lavouras, Bahia, 1999–2004 .............................. 155Tabela 41 Desigualdade de renda no Brasil – Índice de Gini – 1991 e 2000 .. 156Tabela 42 Estrutura setorial da Bahia, de Salvador e dos principais
municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004 ..................................................................................... 157
Tabela 43 Pessoal ocupado no comércio, indústria e serviços, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/1995 ........................................................... 157
Tabela 44 Número total de estabelecimentos ou unidades locais de comércio, indústria e serviços, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/1995 ....................................................................................... 158
Tabela 45 Renda média familiar per capita dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/1991 ....................................................................................... 159
Tabela 46 Financiamentos concedidos a produtores e cooperativas para o custeio da lavoura de soja, Brasil, 1999/2005 ............................. 160
Tabela 47 Financiamentos concedidos a produtores e cooperativas para o custeio da lavoura de soja, Bahia, 1999/2005 ............................. 160
Tabela 48 Financiamentos rurais concedidos pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), para custeio da lavoura da soja, Brasil e Bahia – 1999/2055 ............................. 161
Tabela 49 Receita tributária dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2001–2005 .............................. 163
Tabela 50 Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) decenal do Brasil, Bahia, Salvador e principais municípios produtores de soja da Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/2000 ............................... 164
Tabela 51 Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de Salvador e dos principais municípios produtores de soja e sua classificação no Estado, Região Oeste do Estado da Bahia, 1991/2000 .................. 164
Tabela 52 Pobreza (% de pessoas pobres) dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/2000 ....................................................................................... 165
Tabela 53 Número de leitos dos principais municípios produtores de soja conveniados ao SUS, Região Oeste do Estado da Bahia, 1996–2004 ...................................................................................... 165
Tabela 54 Quantidade de hospitais conveniados ao SUS, segundo a dependência administrativa, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1996–2004 ................ 166
Tabela 55 Evolução da esperança de vida ao nascer dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia e Salvador – 1970/2000 ........................................................ 167
Tabela 56 Evolução da Mortalidade infantil (por mil nascidos vivos) dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia e Salvador, 1970/2000 ......................................... 167
Tabela 57 Evolução das pessoas analfabetas com 15 anos e mais dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia e Salvador, 1970/2000 ......................................... 168
Tabela 58 Evolução do número de domicílios com água canalizada na rede geral, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia,1970/2000 ............................................ 168
Tabela 59 Evolução do número de domicílios com iluminação elétrica, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/2000 ........................................................... 169
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Abiove Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais
ACC Adiantamento de Contrato de Câmbio
AIBA Associação de Agricultores e Irrigantes do Oeste da Bahia
ANDEF Associação de Defensivos Agrícolas
ASTABAHIA Associação dos Técnicos Agrícolas da Bahia
BASENBANCO Banco de Desenvolvimento da Bahia
BC Banco Central
BEA Bureau of Economic Analysis
BEC Batalhão de Engenharia e Construção
BRASAGRO Companhia Brasileira de Participação Agroindustrial
CAC Cooperativa Agrícola de Cotia
CAMPO Companhia de Promoção Agrícola
CBOT Bolsa de Chicago
CEE Comunidade Econômica Européia
CEPAL Comisión Económica para América Latina y el Caribe
CI Soja Centro de Inteligência da Soja
CIAC Companhia de Ações Independentes do Cerrado
CM-G Contrato de Mercadoria com Emissão Garantida
CMN Conselho Monetário Nacional
CNAE Classificação Nacional de Atividade Econômica
COACERAL Cooperativa Agrícola do Cerrado Brasil Central Ltda
CODEVASF Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco
COMESF
Cooperativa Agrícola Mista dos Projetos de Irrigação do Médio
São Francisco
Conab Companhia Nacional de Abastecimento
COPERGEL Cooperativa dos Produtores de Grãos dos Gerais
COPROESTE Cooperativa Agrícola do Oeste da Bahia Ltda
CPMF Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira
CPR Cédula de Produto Rural
Desenbahia Banco de Desenvolvimento do Estado da Bahia
EBDA Empresa Baiana de Desenvolvimento Agropecuário
ECT Economia dos Custos de Transação
Embrapa Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
FAAHF Faculdade Arnaldo Horácio Ferreira
FAEP Federação da Agricultura do Estado do Paraná
FAO Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
FASB Faculdade São Francisco de Barreiras
FED Federal Reserve Board
FILEM Faculdade Luis Eduardo Magalhães
FMI Fundo Monetário Internacional
FUNDEAGRO Fundo para o Desenvolvimento do Agronegócio do Algodão
HHm Hirschman-Herfindahl modificado
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBPT Instituto Brasileiro de Planejamento tributário
IC Índice de Concentração
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
ICMS Imposto sobre Circulação de Mercadorias
IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
JADECO Japan-Brazil Agricultural Development Corporation
JICA Japan International Cooperation Agency
Mab Anticorpos Monoclonais
MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
NEI Nova Economia Institucional
NPGA Núcleo de Pós-graduação em Administração
OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OECD Organisation for Economic Cooperation and Development
OECF The Overseas Economic Cooperation Fund (Fundo de Cooperação
Econômica Ultramarina)
PGPM Programa de Garantia de Preços Mínimos
PIB Produto Interno Bruto
PR Indicador de Potencialidade
PROALBA Programa de Incentivo à Cultura do Algodão
PRODECER Programa de Cooperação para o Desenvolvimento dos Cerrados
PRONAZEM Programa Nacional de Armazenagem
QL Quociente locacional
RAIS Relação Anual de Informações Sociais
SAG Sistema Agroindustrial
SEAGRI Secretaria de Agricultura do Estado da Bahia
SNCR Sistema Nacional de Crédito Rural
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ……………………………....………………...…….……....... 22
1.1 JUSTIFICATIVA ……………………….………………….....…......…......…… 26
1.2 QUESTÕES ………………………………………...........………..…............… 26
1.3 HIPÓTESE ……………………………………………………...…….............… 27
1.4 OBJETIVOS …………………………………………......….....…..…...........… 27
1.5 METODOLOGIA .......................................................................................... 28
2 ABORDAGEM TEÓRICO-METODOLÓGICA ……………......…….... 31
2.1 ABORDAGENS TEÓRICAS …………………………………........……......… 31
2.1.1 DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO ……………………...………............ 32
2.1.2
ECONOMIA REGIONAL: O DEBATE SOBRE AGLOMERAÇÕES
ESPACIAIS E O DESENVOLVIMENTO ……...........................................33
2.1.2.1 OS DISTRITOS INDUSTRIAIS ........................................................................ 34
2.1.2.2 TEORIAS DE DESENVOLVIMENTO DESEQUILIBRADO ..................................... 35
2.1.2.3 AGLOMERAÇÃO/CLUSTER: A BUSCA DA ESPECIALIZAÇÃO PRODUTIVA .......... 41
2.1.3 ECONOMIA INSTITUCIONALISTA ……………........…………………....... 46
2.1.3.1 NOVA ECONOMIA INSTITUCIONAL ............................................................... 47
2.1.3.1.1 ECONOMIA DOS CUSTOS DE TRANSAÇÃO ................................................ 52
2.1.3.1.2 TEORIA EVOLUCIONISTA ......................................................................... 59
2.1.4 GRADE ANALÍTICA ……….........................................................……....... 64
2.2 METODOLOGIA ………………….…………….........………………..……...... 66
2.2.1 PESQUISA DE CAMPO …………………….............................………....... 67
2.2.2 DEFINIÇÃO DA AMOSTRA ……............................................................... 69
3 SISTEMA AGROINDUSTRIAL DA SOJA ……………………............ 71
3.1
CONTEXTUALIZAÇÃO INTERNACIONAL E NACIONAL DA CULTURA DA SOJA ……………………….............................………….......
71
3.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO OESTE BAIANO ……………….........……...... 86
3.3 ATORES, ARTICULAÇÕES NA CADEIA E COMPETITIVIDADE ............. 94
3.3.1 MAPEAMENTO DAS TRANSAÇÕES …..……………......…….......……… 94
3.3.2 ANÁLISE DO AMBIENTE COMPETITIVO …………..............…….......…. 102
3.3.3 ESTRATÉGIAS COMPETITIVAS ………………………….......…….......… 108
4
RESULTADOS: PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS E INTER-RELAÇÕES DA DIMENSÃO PRODUTIVA E INSTITUCIONAL NO CLUSTER DA SOJA NO OESTE DA BAHIA ……….........… 111
4.1
IDENTIFICAÇÃO DO CLUSTER: ÍNDICE DE CONCENTRAÇÃO (MEDIDA DE UM AGLOMERADO) E INTERAÇÃO DE ATORES ............ 112
4.2
CARACTERÍSTICAS E DINÂMICA DOS PRINCIPAIS ATORES DO AGLOMERADO DA SOJA DO OESTE DA BAHIA ……...........…....... 118
4.2.1
PRODUTORES DE INSUMOS QUÍMICOS PARA AGRICULTURA
E INDÚSTRIA ….............…....................................................................… 119
4.2.2 PRODUTORES DE SEMENTES …………….............................……........ 120
4.2.3 PRODUTORES DE SOJA ……………………….…..................………....... 121
4.2.4 INDÚSTRIA ESMAGADORA E DE SUB-PRODUTOS ….......…….......… 126
4.2.5 AGENTES DE INOVAÇÃO TECNOLÓGICA ……........………….......…… 130
4.2.6 COOPERATIVAS E ASSOCIAÇÕES ………......................……….......…. 132
4.3
ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA DO AGLOMERADO DA SOJA DO OESTE DA BAHIA …………......................................………….....…….
136
4.3.1
TRANSAÇÕES ENTRE DISTRIBUIDORES E INDÚSTRIAS
PROCESSADORAS ….............…......................…………………….......… 136
4.3.2
TRANSAÇÕES ENTRE INDÚSTRIAS DE ESMAGAMENTO/REFINO,
E INDÚSTRIAS DE DERIVADOS …............…………….......…................. 137
4.3.3
TRANSAÇÕES ENTRE INDÚSTRIAS DE ESMAGAMENTO,
E INDÚSTRIAS DE RAÇÃO ………………………….....................…….… 138
4.3.4
TRANSAÇÕES ENTRE INDÚSTRIAS PROCESSADORAS, E
ORIGINADORES /PRODUTORES ……......................................…......… 138
4.3.5
TRANSAÇÕES ENTRE TRADINGS, E INDÚSTRIAS
PROCESSADORAS /MERCADO EXTERNO ….....…......……......……… 141
4.3.6 TRANSAÇÕES ENTRE PRODUTORES E INDÚSTRIA DE INSUMOS .. 142
4.4
FORMAS DE COOPERAÇÃO E ESFORÇO DE CAPACITAÇÃO PARA INOVAR ……..............................................................…………........ 143
4.4.1 PRODUTORES DE SEMENTES ….............………………,,,,,….......…… 143
4.4.2 INDÚSTRIA ESMAGADORA E DE SUBPRODUTOS …......….......……. 146
4.4.3 PRODUTORES DE SOJA ……………………………..........................…… 147
4.4.4 COOPERATIVAS, ASSOCIAÇÕES E FUNDAÇÕES ……................…… 152
4.5
COMPREENDENDO MELHOR A DINÂMICA REGIONAL: UM OLHAR ALÉM DO CLUSTER A PARTIR DE ALGUNS INDICADORES SOCIOECONÔMICOS …….....................................……...
153
CONSIDERAÇÕES FINAIS ………....…………………………………............ 170
REFERÊNCIAS …………………………………………………………..….......… 176
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO ……........…………………………….........… 184
ANEXO A – DADOS SECUNDÁRIOS …........….……………………….........…
22
1 INTRODUÇÃO
A soja é hoje a oleaginosa de maior expressão econômica entre os países
produtores e exportadores, sendo uma das mais importantes commodities do
mercado internacional de mercadorias e futuros. Na Bahia, representa o motor do
agronegócio do Oeste, gerando, como principais produtos, a soja-grão, o farelo e o
óleo. A cultura foi introduzida nos cerrados do Oeste baiano, na década de 1980, por
gaúchos, tornando-se o carro-chefe da agricultura explorada na região.
Até a década de 70, os cerrados brasileiros, situados no centro geográfico
do país (do Sul do Maranhão, passando pelo Oeste da Bahia, Tocantins, até o Mato
Grosso do Sul), não eram cultivados. Havia o entendimento de que essas terras
seriam impróprias para explorações agropecuárias, mas o crescimento geral do país,
a exemplo do crescimento populacional, articulado à expansão da acumulação e
reprodução do capital no agronegócio, que estava concentrado no sul e sudeste,
favoreceu a expansão da fronteira agrícola em direção aos cerrados, contando, para
isso, com o apoio governamental. A ocupação dos cerrados do Oeste da Bahia se
deu, principalmente, a partir da construção de Brasília e da abertura das rodovias
federais BR-242 (Salvador-BA/Brasília) e BR-020/BR-135 (Picos-PI/Barreiras-
BA/Brasília).
No início da década de 1980, como política governamental de incentivo
ao cultivo dessas terras, surgiu o Programa de Cooperação para o Desenvolvimento
dos Cerrados (PRODECER), uma parceria entre brasileiros e japoneses, tendo
como principal instrumento o crédito supervisionado com acompanhamento técnico.
Outros programas de incentivo também foram implementados na região, tais como
financiamentos direcionados ao custeio da lavoura da soja.
Os dados da cultura da soja são muito representativos tanto no âmbito
internacional quanto nacional. O Brasil é o segundo maior produtor mundial de soja
23
do mundo, participando com 26%, sendo o primeiro, os Estados Unidos, com 37%, e
o terceiro, a Argentina, com 19% (Gráfico 1)1
Gráfico 1 – Principais países produtores de soja no mundo, 2006-2007 Fonte: CI Soja, 2007
Conforme veremos de forma mais detalhada no Capítulo 3, nas
informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) acerca da
produção agrícola municipal de 2006 destacam-se alguns dados interessantes: no
Brasil, a soja em grão representa o principal produto em área plantada, área colhida,
quantidade produzida e valor da produção, seguida do milho e do feijão; no
Nordeste, a soja representa o terceiro principal produto em área plantada e área
colhida, porém o primeiro em quantidade produzida e valor da produção; já no
Estado da Bahia, cuja principal região produtora localiza-se na Região Oeste,
considerando a área plantada, temos uma representação de 58,63% em relação ao
Nordeste, e 3,95% em relação ao Brasil. (BRASIL, 2007).
Assim, este trabalho assume importância em três panoramas:
internacional, nacional e regional. Em nível internacional, a soja é uma commodity
comercializada por vários países da América Latina, Europa, Estados Unidos, China,
dentre outros, e nesse contexto, o Brasil, como já foi dito, ocupa o segundo lugar na
produção mundial, com uma participação de 26%, além de ser o principal exportador
de farelo de soja.
Em nível nacional, a produção da soja que, em 1960, era de apenas 200
mil toneladas, poderá atingir quase 58 milhões, na safra 2006/07, de acordo com
dados previstos pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB)2. Segundo
1 Para consultar os dados, verificar a Tabela 60 (Anexo A). 2 Ver Tabela 61 (Anexo A).
24
essa mesma fonte, a Bahia deverá ter uma participação relativa de 58,48% de área
plantada, em relação ao Nordeste, e de 4,12%, em relação ao Brasil, conforme
dados previstos também para o período 2006/073. (BRASIL, 2006).
Dentre os principais municípios produtores do Estado da Bahia,
destacam-se Barreiras, Formosa do Rio Preto, Luis Eduardo Magalhães e São
Desidério, localizados na Região Oeste; esses quatro municípios representam,
juntos, 74% da área plantada com soja na Bahia, segundo dados da Produção
Agrícola Municipal 2006 do IBGE. (BRASIL, 2007).
Assim, dada a importância nacional e internacional da cultura da soja e a
participação da Bahia em relação ao Nordeste e ao Brasil, a Região Oeste baiana,
identificada como área número 11 nos territórios de identidade do mapa da Figura 1,
e destacada na Figura 2, para efeito de maior visualização, torna-se o cenário deste
estudo.
Essa é uma região de alta potencialidade e com grandes perspectivas,
ainda, de crescimento econômico, em função da própria cultura da soja. Assim,
deve-se buscar instrumentos que indiquem concretamente a sua potencialidade e a
necessidade de se apoiar o desenvolvimento regional a partir desta agroindústria,
para o que este trabalho pretende contribuir.
O problema levantado por essa pesquisa refere-se ao desenvolvimento
dessa região promovido pelo cluster da soja, considerando, no seu conceito, o
envolvimento de diversos atores e a articulação da dimensão produtiva à
institucional. Ao mesmo tempo, apesar do grande desenvolvimento regional
verificado a partir dos anos 80, identifica-se, ainda, um grande descompasso social
na região, quando se analisa alguns indicadores socioeconômicos locais.
Logo, este trabalho busca compreender o processo recente de expansão
da soja no Oeste da Bahia, avaliar a sua contribuição para o desenvolvimento
regional, pretendendo, ainda, contribuir para a reflexão e a aplicação de teorias de
desenvolvimento regional e institucional, bem como para a compreensão da
dinâmica regional e, quiçá, servir de referência para a construção de políticas
públicas.
3 Ver Tabela 62 (Anexo A).
25
Figura 1 – Territórios de identidade do Estado da Bahia – 2007
Figura 2 – Extremo Oeste Baiano
Fonte: http://commons.wikimedia.org.
26
A seguir são destacados, em relação a este trabalho, a justificativa, as
questões, a hipótese, os objetivos, e a metodologia.
1.1 JUSTIFICATIVA
Este trabalho se justifica pela sua contribuição enquanto agregador de
conhecimento. Nesse sentido, o instrumental analítico aqui desenvolvido, construído
com base em um referencial teórico com aportes de Economia Regional e de
Economia Institucional e pressupondo que o desenvolvimento é o resultado de uma
co-evolução produtiva e institucional, é aplicado ao aglomerado da soja no Oeste da
Bahia, caracterizando, enquanto constatação/avanço do conhecimento:
a) o cluster para o desenvolvimento local é limitado pelos grandes
descompassos sociais e estruturais da região;
b) a articulação das dimensões produtiva e institucional como um
importante fator de desenvolvimento;
c) a importância das instituições na questão do desenvolvimento
regional;
d) a definição das diferentes formas de estruturas de governança, a partir
da análise da relação entre os atores; e
e) a análise dos aspectos tecnológicos inerentes ao cluster, dos quais os
mais importantes se dão a partir da integração da questão institucional
com a produtiva.
1.2 QUESTÕES
Este trabalho apresenta duas principais questões de pesquisa a serem
desenvolvidas:
A Questão 1 – Qual é o tipo de aglomeração existente no complexo
agroindustrial da soja no Oeste da Bahia? – será respondida com a ajuda do cálculo
de um indicador que mede o índice de concentração (IC) de atividades produtivas na
região, identificando a aglomeração, e pela análise da interação de diversos atores
ligados a esse aglomerado.
Na Questão 2 – Qual é a contribuição desse aglomerado para o
desenvolvimento da região? –, essa contribuição será avaliada a partir do
levantamento de alguns indicadores socioeconômicos referentes aos principais
27
municípios produtores de soja que compõem a região, já que esta é a atividade
econômica dominante local, fazendo-se uma análise da evolução histórica desses
indicadores procurando perceber as dinâmicas produtiva e institucional e a
integração entre elas.
Além dessas duas questões, os objetivos específicos remetem, ainda, a
mais três questões secundárias da pesquisa a serem desenvolvidas:
Questão 3 – Como evoluíram as instituições no Oeste da Bahia?
Questão 4 – Como são definidas as estruturas de governança nesse
aglomerado?
Questão 5 – Como se dá o processo de inovação ao longo da cadeia e
qual é a sua contribuição para a dinâmica endógena do desenvolvimento?
1.3 HIPÓTESE
Considerando o pressuposto geral do trabalho, destacado a seguir,
define-se, também, a hipótese deste trabalho:
Pressuposto Geral – O desenvolvimento é o resultado de uma co-
evolução produtiva e institucional.
Hipótese 1 – A aglomeração da soja no Oeste da Bahia se configura
como um cluster.
1.4 OBJETIVOS
Dada a grande concentração de produtores que se instalou no Oeste da
Bahia devido à cultura da soja e o conseqüente surgimento de vários outros agentes
econômicos ligados à agroindústria da soja, caracterizando o adensamento da
cadeia, este trabalho se desenvolve com dois objetivos principais:
a) identificar o tipo de aglomeração existente no complexo agroindustrial
da soja no Oeste da Bahia; e
b) avaliar a contribuição desse aglomerado para o desenvolvimento da
região.
Busca, portanto, analisar o potencial de desenvolvimento regional a partir
de aglomerações produtivas, tomando como estudo de caso a cadeia produtiva da
soja no Oeste da Bahia. Daí derivam outros objetivos:
c) caracterizar a evolução do aparato institucional no Oeste da Bahia;
28
d) identificar a existência de governança e os seus fatores determinantes,
procurando compreender a dinâmica da coordenação; e
e) analisar o processo de inovação ao longo da cadeia.
1.5 METODOLOGIA
A metodologia utilizada neste trabalho pode ser caracterizada como
teórico-empírica. Para tanto, é feita uma revisão da literatura, para estruturar a grade
analítica, bem como um trabalho de pesquisa de campo para levantamento de
dados primários. Além disso, são coletados diversos indicadores socioeconômicos
sobre a região, a partir de dados secundários, a fim de complementar a análise do
trabalho.
Assim, neste estudo, a partir da abordagem teórica, juntamente com os
dados primários e secundários, busca-se responder às questões da pesquisa. Para
as duas principais questões levantadas, é definido o tipo de aglomeração que se dá
no complexo agroindustrial da soja no Oeste da Bahia, a partir do cálculo de um
indicador que mede o índice de concentração na região e de uma análise da
interação de diversos atores; bem como a contribuição desse aglomerado para o
desenvolvimento da região, a partir da análise histórica dos principais indicadores
socioeconômicos dos municípios produtores de soja que se destacam na região.
As outras três questões também são respondidas tendo como base a
fundamentação teórica que foi definida e a pesquisa de campo realizada. Assim,
analisa-se como evoluíram as instituições no Oeste da Bahia, avaliando-se como foi
criada essa aglomeração, com base na sua formação histórica, incentivos, etc., e as
condições locais iniciais favoráveis à concentração geográfica; em seguida é feita
uma análise das estruturas de governança definidas no aglomerado, abordando a
coordenação e os custos de transação entre os agentes que formam a cadeia
produtiva dessa agroindústria; por fim, é feita uma abordagem sobre como se dá o
processo de inovação ao longo da cadeia e a sua contribuição para a dinâmica
endógena do desenvolvimento.
Como o objetivo da pesquisa é compreender a contribuição do
aglomerado na questão do desenvolvimento em uma perspectiva dinâmica, as
teorias escolhidas privilegiam essa dinâmica. Conforme já foi citado, parte-se do
pressuposto de que o desenvolvimento ocorre a partir de uma co-evolução produtiva
29
e institucional; daí a preocupação em compreender essas dimensões e a sua
integração.
Com o fim de responder às questões da pesquisa, o desenvolvimento da
grade teórica é definido a partir de duas abordagens: economia regional e economia
institucionalista: em relação à Economia Regional, é feito um recorte das principais
teorias de desenvolvimento regional, extraindo conceitos e indicadores que permitam
definir qual o tipo de aglomeração existente no complexo agroindustrial da soja no
Oeste da Bahia, bem como a contribuição desse aglomerado para o
desenvolvimento da região. Em relação à Economia Institucionalista, a abordagem é
feita a partir das contribuições da Nova Economia Institucional (NEI), tendo como
base a Economia dos Custos de Transação (ECT) e a Teoria Evolucionista.
A Nova Economia Institucional trata da importância das instituições na
formação do aglomerado; a Economia dos Custos de Transação, com base no
conceito de custos de transação, permite estudar as estruturas de governança e o
nível de verticalização da cadeia; e a Teoria Evolucionista permite analisar a
trajetória tecnológica desenvolvida pelo aglomerado, estudando de que forma se dão
as inovações e o processo de aprendizado, ao longo da cadeia. Essas abordagens
são complementares, com preocupação no processo dinâmico (e não estático, como
faziam os neoclássicos).
Complementando a questão do método, este trabalho apresenta um
estudo de caso, aplicando o instrumental analítico extraído das abordagens teóricas
ao objeto de estudo, especificamente ao caso da agroindústria da soja no Oeste da
Bahia. Nesse contexto, são estudados os principais atores dessa agroindústria
encontrados na região, na pesquisa de campo primária: produtores de máquinas,
insumos e sementes; agricultores; indústria esmagadora; indústria de subprodutos;
agentes de inovação tecnológica; e fundações, cooperativas e associações.
No próximo capítulo, o Capítulo 2, é feita uma abordagem teórico-
metodológica para dar suporte à análise empírica. As abordagens teóricas utilizadas
são de Economia Regional e de Economia Institucionalista, das quais são extraídos
os principais conceitos que serão articulados com as questões de pesquisa a serem
desenvolvidas no trabalho. Também nesse capítulo é descrita a metodologia do
trabalho, no que se refere à pesquisa de campo e à definição da amostra.
O Capítulo 3 faz uma contextualização da cultura da soja, em três
dimensões: internacional, nacional e regional (da Região Oeste da Bahia). Nesse
30
capítulo é feito um mapeamento das transações existentes entre os atores do
aglomerado, considerando as suas articulações na cadeia e o ambiente competitivo.
No Capítulo 4, são apresentados os resultados da pesquisa, em cinco
partes, destacando as principais características e as inter-relações da dimensão
produtiva e institucional do cluster da soja no Oeste da Bahia. Inicialmente aplica-se
o Índice de Concentração (IC) para quantificar a aglomeração e, juntamente com a
análise da interação de diversos atores, identificar o cluster; a seguir são analisadas
as características e a dinâmica dos principais atores do aglomerado, sendo, também
analisadas as transações entre esses principais atores a fim de definir as estruturas
de governança existentes; em seguida é feita uma análise das formas de
cooperação e esforço de capacitação para inovar, por parte desses atores; e, por
fim, são levantados alguns indicadores secundários sobre a região em estudo, a fim
de verificar o seu desenvolvimento socioeconômico.
Finalmente, no Capítulo 5, são apresentadas as conclusões, quando são
respondidas as questões do trabalho levantadas ainda nesta introdução.
31
2 ABORDAGEM TEÓRICO-METODOLÓGICA
O referencial teórico utilizado para desenvolver este trabalho foi
construído a partir de uma grade analítica com aportes de economia regional e da
economia institucionalista, de forma a contextualizar uma abrangência maior do
estudo proposto. Metodologicamente, trata-se, também, de articular essa grade
analítica com um estudo de caso, o que o caracteriza como um trabalho teórico-
empírico, que tem como objeto de estudo a agroindústria da soja no Oeste da Bahia.
A seguir, são apresentadas as dimensões teórica e metodológica exploradas por
esta pesquisa.
2.1 ABORDAGENS TEÓRICAS
As abordagens teóricas desenvolvidas neste trabalho envolvem dois
enfoques, como já dito: Economia Regional, para identificar o tipo de aglomeração
existente no complexo agroindustrial da soja no Oeste da Bahia, bem como a
questão da contribuição desse aglomerado para o desenvolvimento regional; e a
Economia Institucionalista, para dar suporte à questão institucional, articulada à
produção, permitindo analisar a evolução das instituições no Oeste da Bahia, as
estruturas de governança existentes nesse aglomerado, como, também,
compreender o processo de inovação ao longo da cadeia.
Após serem apresentadas e articuladas essas duas vertentes teóricas, é
então construída uma grade analítica, que incorpora os conceitos e as variáveis de
análise teóricas inerentes a cada uma buscando relacioná-las com as questões a
serem trabalhadas nesta pesquisa. Essa grade pretende sintetizar a estrutura teórica
e analítica do trabalho.
32
Entretanto, antes de tratar das abordagens teóricas, cabe discutir sobre
como a questão do desenvolvimento regional é privilegiada neste trabalho. Esta
compreensão é de fundamental importância, visto que o conceito de
desenvolvimento pode ser definido de várias maneiras, como tem diversamente sido
tratado na literatura econômica. Neste trabalho, especificamente, conforme foi
tratado no pressuposto geral, o desenvolvimento é compreendido como o resultado
de uma co-evolução produtiva e institucional, conforme apresentado a seguir.
2.1.1 DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
A temática do desenvolvimento econômico regional tem sido muito
discutida ao longo do tempo, a partir da contribuição de diferentes autores, de forma
que a literatura econômica tem tratado o significado de desenvolvimento sob
distintos enfoques. Entretanto, não é propósito deste trabalho fazer uma revisão da
literatura a esse respeito, e sim tratar a discussão a partir de um dado enfoque.
Nesse sentido, a abordagem aqui trabalhada respalda-se na discussão sobre o
conceito de desenvolvimento que incorpora a dimensão “institucional” à “produtiva”.
Sabe-se que as instituições são boas quando facilitam o funcionamento
do livre mercado, que envolve democracia, burocracia eficiente, judiciário
independente, dentre outros. (FERRAZ et alii, 2003). Entretanto, as instituições
também são específicas com relação ao tempo e ao lugar em que são aplicadas,
bem como ao estágio de desenvolvimento da nação ou da região em análise, de
forma que o bom funcionamento de qualquer instituição, em qualquer localidade,
não é determinado apenas pelo seu formato, mas sim pelo meio onde esta se insere.
Assim, o resgate da temática do desenvolvimento implica em aceitar a
multidisciplinaridade do tema, incorporando as abordagens econômica, política,
institucional, social e cultural e entendendo o desenvolvimento, também, como um
processo historicamente determinado, como o resultado de forças político-culturais,
não se resumindo, portanto, à simples manipulação de variáveis econômicas. Desta
forma, o desempenho econômico de um país ou de uma região não é autônomo em
relação ao seu arcabouço institucional pois a forma como a sociedade se articula,
em seus mais variados níveis, a partir dos mais variados agentes econômicos,
determina e limita o seu projeto de desenvolvimento.
Entretanto, a importância da articulação dos contextos histórico e
institucional é ainda pouco explorada na literatura para o entendimento da questão
33
do desenvolvimento. Apesar disso, e também como forma de contribuir nesse
sentido, o conceito de desenvolvimento entendido neste trabalho parte de um ponto
de vista evolutivo, de que o desenvolvimento decorre da co-evolução das dimensões
institucionais e produtivas, o que depende da trajetória anterior (é path dependence),
e que é afetada por especificidades nacionais, apresentando novos problemas,
continuamente, de modo que o passado não pode ser abolido e a História nunca
descansa. (ERBER, 2003). É esse o conceito de desenvolvimento econômico
trabalhado por esta pesquisa, aquele considerado como decorrente da co-evolução
de estruturas institucionais e produtivas que se incorporam ao contexto de análise
de forma articulada.
2.1.2 ECONOMIA REGIONAL: O DEBATE SOBRE AGLOMERAÇÕES
ESPACIAIS E DESENVOLVIMENTO
Na literatura econômica, não existe uma definição única, universalmente
aceita para o conceito de “região”. Como existem muitas, o conceito empregado em
cada caso vai depender do enfoque proposto para o objeto de estudo. Nesse
sentido, articular o conceito de desenvolvimento econômico ao de região, a fim de
trabalhar o conceito mais amplo de desenvolvimento econômico regional, não é
tarefa fácil.
Diversas teorias vêm sendo trabalhadas ao longo do tempo, por diversos
autores, buscando dar conta desses conceitos, inclusive, inspirando políticas
públicas de desenvolvimento regional. Sistematizando, podemos afirmar que,
historicamente, identificam-se duas grandes correntes de pensamento sobre o tema:
a) o conjunto de teorias clássicas de localização, que evoluiu de forma
mais ou menos contínua a partir de Von Thunen, em 1926, até Isard,
em 1956; e
b) o conjunto de teorias de desenvolvimento regional enfatizando os
fatores de aglomeração, inspiradas em Marshall e em Keynes, a partir
da década de 1950, incorporando espaços subnacionais trabalhados
por Perroux, em 1955, Myrdal, em 1957, e Hirschman, em 1958.
(CAVALCANTE, 2002).
Como este trabalho se insere no contexto da economia regional,
buscando resgatar a importância da discussão da dimensão espacial e abordando a
economia de aglomeração para o desenvolvimento será explorado apenas o
34
segundo conjunto de teorias acima apresentado que começaram a ser
desenvolvidas a partir dos anos 50, enfatizando algum tipo de mecanismo dinâmico
de auto-reforço resultante de externalidades decorrentes da aglomeração,
contrapondo-se ao grupo das teorias clássicas de localização citadas no primeiro
conjunto.
Ao final desta discussão de Economia Regional, após fazer uma revisão
das principais teorias de desenvolvimento regional, é apresentado um modelo, a fim
de identificar a existência de aglomeração do complexo agroindustrial da soja no
Oeste da Bahia que, articulado à análise da interação de diversos outros atores, vai
permitir que se caracterize ou não esse aglomerado como um cluster. Mais adiante,
esse modelo é aplicado empiricamente a partir de dados de emprego formal
levantados para os principais municípios produtores de soja da região.
2.1.2.1 OS DISTRITOS INDUSTRIAIS
Existe um consenso na literatura econômica de que o primeiro autor a
trabalhar a questão da aglomeração de atividades como um fator de localização de
novas atividades e, portanto, de crescimento econômico, foi Alfred Marshall, em
1890, trazendo a discussão do conceito de distritos industriais.
Marshall (1985) ainda não se preocupava com as indústrias correlatas,
mas a sua principal preocupação era com a proximidade de empresas e com as
relações sociais4, tendo desenvolvido o conceito de indústrias localizadas. Segundo
ele, esses distritos possuíam as seguintes características:
a) especialização;
b) desintegração produtiva;
c) serem formados por pequenas e médias empresas; e
d) cooperação decorrente da localização.
Esses distritos industriais apresentavam uma variedade de situações e
experiências que representavam fontes de aprendizagem e valor econômico,
introduzindo o conceito de eficiência econômica, no sentido de produzir riqueza em
médio e longo prazo, incluindo o problema da reprodução das condições
econômicas e sociais que permitem manter o processo produtivo.
4 Essas relações sociais eram por ele denominadas de “atmosfera favorável”. (MARSHALL, 1985).
35
Além dos ganhos de escala internos à firma, Marshall (1985) tratou
também da questão das externalidades. Para ele, a existência de economias locais
externas à firma e internas à aglomeração dos produtores eram elementos que
justificavam a importância da concentração geográfica das firmas.
As economias externas representam todos os ganhos obtidos por uma
firma, independentemente de sua ação, ou seja, as vantagens econômicas
decorrentes da redução do seu custo em virtude de sua instalação junto a outras
unidades produtivas. Já as economias internas dizem respeito aos ganhos obtidos
por uma firma a partir de sua própria ação, como no caso das economias de escala
ou retornos crescentes de escala, que possibilitam a obtenção de vantagens em
termos de redução de custos, dada a intensificação na utilização de algum fator
produtivo ou pelo aumento da sua escala de produção.
Nessa questão, Marshall (1985) considera duas externalidades
pecuniárias e uma tecnológica, conforme destacado por Krugman (1998, apud
CAVALCANTE, 2002, p. 13):
a) a possibilidade oferecida por um grande mercado local de viabilizar a
existência de fornecedores de insumos com eficiência de escala;
b) as vantagens decorrentes de uma oferta abundante de mão-de-obra; e
c) a troca de informações que ocorre quando empresas do mesmo setor
se aglomeram.
É consenso que um dos elementos fundamentais que explicam as
vantagens competitivas das firmas é justamente a capacidade de se apropriar de
ganhos oriundos da aglomeração dos produtores. Assim, Marshall (1985) destaca o
papel das vantagens obtidas da aglomeração de atividades produtivas, as chamadas
economias externas, pois, quando várias empresas de um mesmo setor se
concentram em um mesmo local, ganhos são gerados e internalizados por essas
empresas; por outro lado, em localizações dispersas essas vantagens não se
verificam.
2.1.2.2 TEORIAS DE DESENVOLVIMENTO DESEQUILIBRADO
Alguns autores da área de Economia Regional desenvolveram teorias que
posteriormente foram denominadas de “desenvolvimento desequilibrado”. A esse
respeito, aqui é feita uma breve abordagem sobre as principais idéias de três dos
autores mais representativos: Perroux, Myrdal e Hirshman.
36
Trabalhando a questão do desenvolvimento, Perroux (1964) propõe
explorar as relações que se estabeleceriam entre as indústrias que ele denominou
motrizes, que são aquelas que têm a capacidade de aumentar as vendas e as
compras de serviços de outras, e as movidas, aquelas que têm suas vendas
aumentadas em função das indústrias motrizes, com o argumento de que o
crescimento não ocorreria de forma homogênea no espaço, mas, sim, em pontos ou
pólos de crescimento, expandindo-se por diversos canais, com intensidades e
efeitos finais variáveis sobre toda a economia.
Desta forma, para Perroux, a indústria motriz, além da sua contribuição ao
crescimento global do produto, também leva a um crescimento em seu ambiente,
que pode ser atribuído às relações que estabelece com as indústrias movidas. Os
pólos industriais complexos seriam capazes de modificar o seu “meio geográfico
imediato”, e mesmo a “estrutura inteira da economia nacional em que estiver
situado”, uma vez que nos pólos em que se verificam aglomerações industriais e
urbanas “registram-se efeitos de intensificação das atividades econômicas” devido
ao surgimento e encadeamento de novas necessidades coletivas. (PERROUX,
1964, p. 154).
Assim, Perroux (1964) desenvolveu a “Teoria dos Pólos” que, aplicada à
teoria da localização ou aos modelos inter-regionais, mostra como o crescimento
ocorre de forma não difusa por todo o espaço, estabelecendo-se de modo
concentrado e variando em sua intensidade, com certa descontinuidade, no espaço
e no tempo, resultando em taxas diferenciadas, o que se opõe a muitos modelos
neoclássicos que supõem um crescimento equilibrado em todas as regiões.
As críticas de Perroux (1964) aos modelos neoclássicos são feitas com
base nas seguintes hipóteses:
a concorrência perfeita dos mercados não acontecia, pois a produção
se organizava em termos oligopolistas;
a inexistência de progresso técnico era totalmente inadmissível, pois a
inovação é intrínseca ao modo de produção capitalista; e
os rendimentos constantes de escala eram uma possibilidade, mas
não se deveria ignorar a possibilidade, também, de obtenção de
economias de escala pela firma a partir da intensificação do uso de
algum fator.
37
Na visão desse autor, o crescimento é particular e intrínseco às áreas
favorecidas pela localização e ação de uma indústria em particular, de forma que a
essência do seu modelo está no papel da indústria motriz no processo de
concentração de capitais sob um mesmo domínio. A partir de então, toda a região
cresce economicamente, em razão da localização concentrada de atividades
econômicas, sob a influência da indústria motora. Essa indústria influencia não
somente os fornecedores diretos e indiretos da região, mas também a instalação de
novas empresas, clientes ou mesmo fornecedores.
Essa capacidade dinamizadora da empresa lhe confere elementos de
continuidade e de transformação das relações econômicas e sociais. Alguns desses
elementos emergem do próprio sistema, gerando setores baseados em novos
padrões de acumulação; outros se apresentam autônomos, mas alimentam o
anterior.
Assim, ainda para o mesmo autor, na medida em que a indústria motriz é
capaz de gerar e difundir efeitos diretos e indiretos sobre o restante da economia,
através do surgimento de pólos secundários nas regiões periféricas, tem-se o
crescimento econômico, o que ocorre porque o pólo industrial atrai outras atividades
que, apesar de não manterem nenhuma relação direta com a indústria, instalam-se
ali devido às economias externas de aglomeração.
Perroux (1964) identifica, ainda, uma região central, a partir de três
características: as aglomerações urbanas; as indústrias motoras nela instaladas; e
as indústrias novas que vão surgindo. Essa região não apenas se modifica pela
atividade motora, como também pode transformar a estrutura das localidades
próximas a ela.
Quanto aos efeitos irradiados pelo pólo principal em direção à periferia,
segundo esse autor, a sua materialização ocorre em dois níveis:
Spead effects – efeitos propulsores: surgem do crescimento do pólo e de
seu encadeamento com o restante do país ou região. Assim, devido ao pólo principal
e ao seu dinamismo, na região vizinha, surgem pólos secundários que se articulam
àqueles fornecendo alimentos, matérias-primas, insumos industriais e outros bens
de consumo final.
Pode-se dizer que a expansão econômica de uma região se propaga para
outras regiões através da ampliação da demanda que impulsiona o fluxo de
investimento de atividades comerciais, bancárias, de infra-estrutura, etc. Mas a
expansão verificada em um determinado centro também pode resultar no
38
aparecimento de efeitos regressivos sobre outras localidades, a partir da troca
desigual entre as regiões.
Backwash effects – efeitos regressivos: para Perroux (1964), se uma
região é mais desenvolvida e, portanto, mais beneficiada, nas demais, ditas
periféricas, verifica-se uma deterioração associada a deficiências na infra-estrutura,
no ensino, na distribuição de renda, etc. Essas deficiências se constituem em um
fator de repulsão de atividades produtivas, de forma que os movimentos de capital e
de comércio aprofundam as desigualdades a partir de empreendimentos localizados
em determinados espaços que foram atraídos pelas economias de aglomeração.
Como resultado, o investimento, o comércio, o nível de demanda e as condições
sociais são inferiores nas regiões periféricas e tendem a ser ampliados quando o
centro de expansão produz efeitos regressivos.
A partir dessa análise, tendo em vista a questão da polarização, Perroux
(1964) ressalta a importância de políticas públicas estatais que visem à redução das
desigualdades regionais através da concessão de incentivos fiscais diversos e
gastos públicos diferenciados, por setores e regiões, a fim de fazer com que os
efeitos propulsores superem os regressivos.
Analisando fenômenos relacionados com o processo circular de caráter
cumulativo, Myrdal (1957) detectou a existência de um movimento circular que
poderia variar positiva ou negativamente. Esse movimento corresponderia a um
círculo vicioso no qual as forças, positivas ou negativas, exerceriam uma pressão de
cima para baixo, sendo, ao mesmo tempo, causa e efeito, de forma que haveria uma
inter-relação causal e circular nos fatores ligados à questão do desenvolvimento.
Quando se consideram os efeitos do processo de causação circular e
cumulativa como explicativos não apenas da heterogeneidade observada no
desenvolvimento de países mas também das desigualdades regionais dentro de um
país, Myrdal (1957, p. 42) argumenta que “o jogo das forças de mercado opera no
sentido da desigualdade”, o que o coloca na contramão das teorias neoclássicas, de
acordo com as quais haveria um processo natural de convergência de renda inter-
regional nos países ou regiões.
Segundo esse autor, no caso de efeito positivo, a região ou país se
tornaria cada vez mais rica, gerando riqueza; e no caso de efeito negativo, ocorreria
o inverso, e as forças de pobreza contribuiriam para a extensão do estado de
pobreza. O resultado disto é o aumento incessante das desigualdades, aumentando
39
o desequilíbrio, tendo em vista o caráter dinâmico do sistema econômico de se
movimentar, expandindo ou contraindo suas atividades de forma cumulativa.
Também tratando do conceito de indústria motriz como fonte geradora de
desigualdades, Myrdal (1957) destaca as seguintes características:
a) apresentar uma taxa de crescimento superior à média da indústria
nacional;
b) dispor de várias ligações de insumo-produto, materializadas nas suas
relações de compra e venda com outras indústrias; e
c) representar uma atividade inovadora de grande dimensão e com
estrutura de mercado oligopolista.
Com o crescimento ocorrendo em apenas alguns pontos ou pólos e com
intensidade variável, caracteriza-se um processo desigual e desequilibrado. Para
que esse crescimento possa se estender a outros espaços, torna-se imprescindível a
existência de canais que filtrem os efeitos provenientes dos centros de expansão,
garantindo o encadeamento desses efeitos sobre a produção e o emprego dos
demais setores e regiões, de forma que os resultados finais desse processo sejam
variados, mas distribuídos por toda a economia. É com base nessa constatação que
Myrdal (1957) defende a intervenção do Estado para conter as forças de mercado
que, de outra forma, tenderiam a acentuar os níveis de desigualdade regional.
Deve-se destacar também as referências feitas pelo autor a elementos de
natureza não-econômica, tais como a qualidade dos fatores de produção e a
eficiência da produção como determinantes do desenvolvimento, referindo-se a
variáveis como qualificação da mão-de-obra, comunicação, consciência de
crescimento, vizinhança e espírito empreendedor, lidando com variáveis que
somente muito mais tarde ganhariam espaço na literatura da economia regional.
(1957, p. 35).
Partindo do princípio de que a indústria motriz teria a capacidade de gerar
uma dinâmica espacial no sistema econômico através de seus efeitos motores,
Hirschman (1958) desenvolveu os modelos de linkages. Para ele, a sugestão básica
para alavancar o crescimento econômico seria a implantação de uma indústria
estratégica, capaz de gerar dois movimentos:
Backward linkages – efeitos para trás: que representam a capacidade da
indústria de criar efeitos de demanda sobre os estágios anteriores da cadeia
produtiva; e
40
Forward linkages – efeitos para a frente: cujos efeitos se dão para as
etapas posteriores da cadeia produtiva.
Os efeitos para trás são a forma encontrada por Hirschman (1958) para
expressar as externalidades decorrentes da implantação de indústrias, pois, estas,
aumentando a demanda de insumos no setor a montante, viabilizariam suas escalas
mínimas de produção em determinada região. Os efeitos para frente, por sua vez,
resultariam da oferta de insumos, que tornaria viáveis os setores que se
posicionassem a jusante.
Assim, para esse autor, as indústrias que deveriam ser incentivadas pelos
programas de crescimento seriam aquelas produtoras de bens intermediários, com
alto potencial de difusão dos efeitos de demanda. A depender da sua área de
influência, o resultado seria o crescimento da região, pois, sendo capaz de irradiar
efeitos encadeados sobre o sistema econômico, a amplitude conceitual da indústria
motriz se daria de forma que quanto maior a sua taxa de crescimento, maior o
crescimento das atividades polarizadas.
Um pólo de crescimento corresponde a um complexo industrial localizado,
constituído de atividades interdependentes e apresentando, pelo menos, uma
indústria motriz, segundo Hirschman (1958). Esses pólos podem ser locais,
regionais, nacionais e internacionais, a depender do seu grau de irradiação e de
encadeamento. Entretanto, quando existe uma concentração dos efeitos dinâmicos
do pólo de crescimento sobre a estrutura produtiva e social local sem que ocorram
desvios significativos de seus efeitos para outras áreas, caracteriza-se um pólo de
desenvolvimento.
Assim, defende o autor que a implantação de um pólo industrial que seja
articulado com o restante do tecido econômico contribui para a localização de
diversas outras atividades que buscam se beneficiar das economias de
aglomeração. As firmas que dele fazem parte caracterizam-se pelo grande porte de
suas unidades produtivas, possibilitando o aparecimento de pólos secundários, que
convivem harmoniosamente com os grandes centros e desempenham a função de
ligar e filtrar os efeitos de encadeamento vindos dos pólos principais. Nesse contexto
é que surge uma divisão regional marcada por contradições: um centro principal,
desenvolvido com grande concentração de atividades econômicas, principalmente
indústrias, e populacional, em oposição a uma periferia basicamente rural e
subdesenvolvida.
41
Argumenta Hirschman que “os recursos e circunstâncias cuja existência
se demonstrava necessária ao desenvolvimento econômico não são tão escassos
nem tão difíceis de obter desde que o desenvolvimento econômico primeiro se
manifeste”. Assim, o desenvolvimento econômico seria embaraçado pelo que ele
denominou de “uma série de círculos viciosos entrelaçados”. Como solução de
planos de desenvolvimento, ele propõe que se desempenhem “pressões e
processos de incentivo que farão eclodir e mobilizar o maior número possível de
recursos escassos, tais como capital e atividade empreendedora”. (1958, p. 18).
2.1.2.3 AGLOMERAÇÃO/CLUSTER: A BUSCA DA ESPECIALIZAÇÃO PRODUTIVA
É sabido que as escolhas locacionais buscam usufruir as vantagens da
aglomeração gerando uma expansão do processo de concentração e centralização
das decisões produtivas, em determinadas regiões ou países. Dada a importância e
abrangência do tema, diversos autores têm discorrido sobre essa questão na
literatura econômica.
Por exemplo, resgatando Marshall, que foi o primeiro autor a tratar dessa
questão, Krugman (1991) considera três fatores, que ele denomina de
externalidades marshallianas, para explicar o fenômeno da localização industrial,
dando especial atenção à proximidade espacial e aos fatores relacionais: a) a
concentração do mercado de trabalho; b) os insumos intermediários; e c) as
externalidades tecnológicas. O conjunto dessas variáveis viabilizaria a formação dos
aglomerados. Entretanto, na sua análise, Krugman (1991) não considera o papel dos
atores locais na organização dos fatores e na coordenação do processo cumulativo
do aglomerado, embora considere o papel da história, que ele denomina de
“condições iniciais”, como um importante fator determinante no desenvolvimento,
enveredando, portanto, pela questão institucional.
Em uma abordagem mais recente, o principal autor a merecer destaque
nesse tema é Porter, que conceitua clusters da seguinte forma:
Clusters são concentrações geográficas de companhias e instituições inter-relacionadas num setor específico. Os clusters englobam uma gama de empresas e outras entidades importantes para a competição, incluindo, por exemplo, fornecedores de insumos sofisticados, tais como componentes, maquinário, serviços e fornecedores de infra-estrutura especializada. Os clusters, muitas vezes, também se estendem para baixo na cadeia produtiva até os
42
consumidores, e lateralmente até manufaturas de produtos complementares e na direção de empresas com semelhantes habilidades, tecnologia, ou mesmos insumos. Finalmente, muitos clusters incluem órgãos governamentais e outras instituições – tais como, universidades, agências de padronização, think tanks, escolas técnicas e associações de classe – que promovem treinamento, educação, informação, pesquisa e suporte técnico. (PORTER, 1998, p. 78). .
Estabelece, então, uma definição para o conceito de cluster, que passa a
ser amplamente utilizado por diversos outros autores e a ser assumido neste
trabalho. A sua principal especificidade é a presença de indústrias correlatas e de
apoio, como uma das externalidades mais importantes verificadas nos aglomerados,
envolvendo maquinário, matérias-primas, peças, serviços, etc., de forma que a
proximidade geográfica entre os produtores e seus fornecedores estimula a
manutenção de relações interativas entre eles, formando uma rede de relações que
contribui para o processo de aperfeiçoamento dos produtos e para o aprendizado.
Além disso, um cluster produtivo não será competitivo se a região onde
opera não for igualmente competitiva em termos da qualidade de sua infra-estrutura
econômica, social e político-institucional. Incorpora-se, então, a esse conceito, as
dimensões da competitividade a nível de macro, meso e microrregiões. Desta forma,
o conceito de cluster pode perfeitamente ser articulado à percepção da questão do
desenvolvimento enquanto uma co-evolução produtiva e institucional, conforme
concebido anteriormente.
Nessa mesma linha de análise, de acordo com Amaral Filho (2001), a
política de investimento em infra-estrutura é importante para uma região porque cria
condições favoráveis à formação de aglomerações de atividades mercantis, mas ela
não é suficiente, em si, para criar um processo dinâmico de endogeneização do
excedente econômico local e para atrair excedentes de outras regiões, ampliando as
atividades econômicas, o emprego, a renda, etc.
Assim, para que produza efeitos multiplicadores crescentes sobre o
produto e a renda, segundo Amaral Filho (2001), a política de investimento deve
estar articulada no contexto de uma estratégia global de desenvolvimento da região,
evitando a aglomeração de indústrias desprovidas de coerência interna nas suas
interconexões, que não propiciaria tais efeitos.
43
Nesta abordagem, merece destaque, também, a análise feita por Diniz
(2001), articulando a questão da inovação tecnológica ao desenvolvimento regional.
Para ele, as regiões devem estar preparadas para prover infra-estrutura específica
que possa facilitar o fluxo de conhecimento, idéias e aprendizado e, ao mesmo
tempo, ter capacidade de governança local. Como o processo de inovação possui
fortes componentes tácitos, cumulativos e localizados, os atributos regionais são
decisivos, tornando-se a proximidade elemento chave, não só pelos aspectos
geográficos como, também, pelos aspectos institucionais.
Entretanto, de acordo com esse autor, a proximidade geográfica, por si
só, não é suficiente para assegurar o sucesso das experiências de geração de
conhecimento. Além da importância da lógica cognitiva, as regiões têm história, de
forma que cada território é diferente do outro pelo seu conteúdo imaterial, além do
que não se pode esperar que todas as regiões gerem conhecimento de fronteira.
Logo, o desenvolvimento está enraizado nas condições locais e a decisão locacional
da empresa passa a ser um elemento decisivo para a sua capacidade de
competição, que depende da combinação das suas competências individuais e dos
atributos ou ativos locais.
Segundo Haddad (2001), os clusters consistem em indústrias e
instituições que têm ligações particularmente fortes entre si, tanto horizontal quanto
verticalmente. Para ele, a organização de um cluster inclui:
a) empresas de produção especializada;
b) empresas prestadoras de serviços;
c) instituições de pesquisas; e
d) instituições públicas e privadas de suporte fundamental.
Mas o cluster tem, também, que ser contextualizado espacialmente. Por
exemplo, o cluster de soja do Oeste do Paraná é diferente do cluster de soja do
Oeste da Bahia, dentre outros motivos, por causa do nível organizacional dos
produtores, da qualidade da mão-de-obra, da logística de transporte, dos
indicadores de desenvolvimento sustentável, dos insumos de conhecimentos
científicos e tecnológicos. (HADDAD, 2001).
Outros autores também têm desenvolvido vários trabalhos com essa
abordagem. Por exemplo, um cluster também pode ser entendido, como entendem
Suzigan et alli (2002a), como uma aglomeração de organizações produtivas que
envolve economias externas locais, concentração de mão-de-obra especializada,
cooperação privada, equilíbrio entre competição e cooperação e apoio público, de
44
forma que envolve concorrência e cooperação simultânea com empresas de
diferentes segmentos de determinada cadeia produtiva, concentradas
geograficamente.
Como forma de mensurar quantitativamente a existência ou não de um
aglomerado, torna-se importante a aplicação do índice de concentração (IC), a partir
do modelo desenvolvido por Crocco et alli (2003), originalmente utilizado para a
identificação de arranjos produtivos locais potenciais, cuja análise tem sido utilizada
por outros autores, na literatura econômica, no dimensionamento de aglomerações
produtivas5.
Nesse modelo, o IC é constituído de três parcelas: a primeira visa medir a
especificidade de um setor dentro de uma região, através do quociente locacional
(QL); a segunda, o seu peso em relação à estrutura produtiva da região, através do
índice Hirschman-Herfindahl modificado (HHm); e a terceira, a importância do setor,
nacionalmente, através do indicador de potencialidade (PR). Assim, o modelo
matemático é apresentado da seguinte forma: IC = QLij + HHmij + PRij
Vejamos a descrição de cada uma dessas parcelas:
a) Quociente locacional (QL)
Eij/Ej
QLij = ------------- Ei
BR / EBR
Onde:
Eij = empregos registrados do Setor i, na Região j
Ej = empregos registrados na Região j
EiBR = empregos registrados do Setor i, no Brasil
EBR = empregos registrados no Brasil
Quando QL > 1, significa que existe uma especialização do Setor i. na
Região j.
5 A esse respeito, consultar Ribeiro & Spínola (2003), que fazem uma aplicação do modelo para a
indústria baiana de transformação de resinas plásticas.
45
b) Índice Hirschman-Herfindahl modificado (HHm)
HHmij = (Eij / Ei
BR) – (Ej / EBR)
Onde:
Eij = empregos registrados do Setor i, na Região j
Ej = empregos registrados na Região j
EiBR = empregos registrados do Setor i, no Brasil
EBR = empregos registrados no Brasil
Quando HHmij > 0, provavelmente existe uma especialização, indicando
que a contribuição do setor para o Brasil é menor do que a contribuição
da região para o Brasil. Se HHmij < 0, possivelmente não há
especialização, indicando que a contribuição, para o Brasil, do setor é
maior que a contribuição da região.
c) Indicador de Potencialidade (PRij)
PRij = Eij / Ei
BR
Onde:
Eij = empregos registrados do Setor i, na Região j
EiBR = empregos registrados do Setor i, no Brasil
Este indicador mostra a contribuição do Setor i, na Região j, para o Setor
i, no Brasil.
Apresentadas cada uma das parcelas que compõem o IC – índice de
concentração – retomemos a sua forma original: IC = θ1QLij + θ2HHmij + θ3PRij
Onde:
θ1 + θ2 + θ3 = 1, sendo θ1 = peso do QLij, θ2 = peso do HHm e θ3
= peso do PRij6
6 Para o cálculo desses pesos, Crocco et alli (2003) recomendam que se faça uma análise
multivariada.
46
Calculado o resultado, se IC > 0, está acima da média nacional, havendo
indícios de concentração, e, então, recomenda-se o desenvolvimento de políticas
públicas para o setor; se IC < 0, a aglomeração é frágil; e se IC = 0, os três
indicadores se combinam e a média nacional é igual à média daquela amostra.
Este modelo será empregado empiricamente mais adiante, com o objetivo
de constatar a existência ou não do aglomerado da agroindústria da soja no Oeste
da Bahia. Na seqüência, vejamos a abordagem teórica institucionalista.
2.1.3 ECONOMIA INSTITUCIONALISTA
Tendo em vista que este trabalho considera o desenvolvimento como o
resultado de uma co-evolução produtiva e institucional, torna-se imprescindível fazer
uma leitura sobre a Economia Institucionalista. Esta é tratada, nesta pesquisa, a
partir da Nova Economia Institucional (NEI), envolvendo as abordagens da
Economia dos Custos de Transação (ECT) e a Teoria Evolucionista.
É importante ressaltar que, neste trabalho, assim como das contribuições
recentes abordadas sobre a Economia Regional, esta pesquisa parte, na sua
concepção, de um posicionamento crítico em relação à teoria neoclássica da firma e
de sua expansão. Essas abordagens vão ressaltar o papel das demais instituições, e
não só do mercado, no processo de desenvolvimento econômico.
Segundo Schumpeter (1988), por exemplo, a inovação é o elemento que
surge como propulsor do desenvolvimento e da competitividade da firma. Nesse
contexto, torna-se importante destacar que, no século XXI, esta passa por um novo
processo de transformações, devido à incorporação de novas tecnologias
organizacionais, e com a globalização dos mercados, a buscar competitividade,
combinando novas estratégias, inovações tecnológicas e organizacionais.
As tecnologias de informação têm um papel central neste processo de
transformação, sendo, ao mesmo tempo, causa e conseqüência das novas formas
de organização da produção. A informática e as comunicações contribuem não
apenas para inovações em produtos e processos, como também para a
reestruturação da organização das empresas e de sua relação com o mercado.
Segundo Tigre (1998), esse processo caracteriza a mudança do
paradigma fordista para o paradigma baseado nas tecnologias da informação,
levando à reformulação da Teoria Econômica, dados o novo quadro de organização
interna da firma, bem como as novas formas de articulação com o mercado.
47
Desta forma, a seguir, realiza-se uma abordagem da Nova Economia
Institucional, sendo esta subdividida em Economia dos Custos de Transação e
Teoria Evolucionista.
O objetivo de buscar o diálogo entre estas duas teorias, conforme já foi
dito, é dar conta de uma análise mais complexa para compreender a dinâmica do
complexo agroindustrial da soja no Oeste da Bahia e a sua contribuição para o
desenvolvimento regional.
2.1.3.1 NOVA ECONOMIA INSTITUCIONAL
Ronald Coase publicou, em 1937, um artigo intitulado “The nature of the
firm”. Até então, admitia-se que os custos associados às transações econômicas
eram negligenciáveis, de forma que os únicos custos realmente considerados eram
os de produção. Ele argumentou que a teoria econômica tratava com detalhes os
custos de produção enquanto os custos de transação, que são os custos que os
agentes enfrentam toda vez que recorrem ao mercado, eram negligenciados.
(COASE, 1988).
Nesse contexto, o principal autor a trabalhar as instituições relacionadas
ao desenvolvimento econômico, Douglass North, que questiona a teoria neoclássica
que admite as instituições como dadas, ao tentar explicar as diferenças no
desenvolvimento econômico dos países, ao longo do tempo, analisa fatores que
convergem ou divergem em termos de desempenho e chega à conclusão de que a
resposta está na evolução das instituições.
Segundo North (1998), as instituições compreendem regras formais,
limitações informais (normas de comportamento, convenções e códigos de conduta
auto-impostos) e os mecanismos responsáveis pela eficácia da interação entre os
indivíduos em uma sociedade que, a partir da eficácia do sistema de fiscalização do
cumprimento de tais normas, constituem o arcabouço imposto pelo ser humano ao
seu relacionamento com os outros e afetam os custos de transação e de produção,
representando a regra do jogo, enquanto as organizações representam os jogadores
(firmas, partidos políticos, órgãos governamentais, escolas, faculdades, etc.).
As limitações impostas pelo contexto institucional definem o conjunto de
oportunidades e, portanto, o tipo das organizações criadas. Conforme a sua função
objetiva, que pode ser a maximização de lucros, a vitória eleitoral, a regulamentação
de empresas, a formação de alunos, etc., a organização busca adquirir
48
conhecimentos e especialização que reforcem suas possibilidades de sobrevivência
em um ambiente competitivo.
Ainda para North (1998), os agentes de mudança são os empresários
políticos ou econômicos, que são aqueles que decidem nas organizações. As suas
percepções subjetivas, que derivam de modelos mentais, determinam as opções
adotadas. Estejam certas ou erradas, as percepções são as fontes básicas de
mudança; são as oportunidades percebidas pelos agentes. As oscilações nos preços
relativos têm sido, para o autor, as fontes externas mais comuns de mudanças
institucionais ao longo da história.
O processo de mudança institucional é gradativo, pois as relações
existentes na matriz institucional em relação a regras formais, restrições informais e
características de execução, geralmente, distorcem os custos e benefícios,
favorecendo escolhas coerentes com o arcabouço existente. (NORTH, 1998). Assim,
a mudança institucional ocorrerá nos setores considerados mais flexíveis em termos
do poder de barganha entre as partes interessadas.
Quanto à direção da mudança, esta é determinada a depender do curso
adotado, pois as organizações políticas e econômicas que derivam de determinada
matriz institucional distorcem a mudança para favorecer os interesses das
organizações existentes – cujos interesses produzem a dependência da trajetória
adotada – e os modelos intelectuais dos empresários – que produzem ideologias,
“racionalizam” a matriz institucional vigente, influenciando os atores no sentido de
apoiar as políticas concebidas no interesse das organizações existentes.
Assim, segundo North (1998), as instituições são formadas para reduzir
incertezas por meio da estruturação das interações humanas, pois a racionalidade e
as características das transações impedem que os atores atinjam, em conjunto, o
resultado ideal de um modelo de custo de transação zero.
As instituições constituem as regras e limitações informais impostas às
unidades políticas que moldam o desempenho das economias de todo o mundo. Daí
decorrem as fontes de disparidades entre as nações, pois, em uma economia, as
políticas definem regras formais e direitos de propriedade e é preciso haver
instituições que ampliem o leque de oportunidades para promover o surgimento das
organizações necessárias.
Por sua vez, diferentes estruturas institucionais e modelos mentais dos
atores resultam de variações das estruturas organizacionais. Esses modelos mentais
originam-se em parte da cultura, da experiência e do aprendizado. Assim, incorpora-
49
se a dimensão tácita do conhecimento. A cultura refere-se à transferência, de uma
geração para outra, de conhecimentos, valores e outros fatores que afetam o
comportamento, variando entre grupos étnicos e sociedades; a experiência tem uma
conotação local, sendo específica de determinado entorno, variando de um ambiente
para outro.
As organizações são dirigidas por empresários que buscam viabilizar seus
próprios interesses, assim como os políticos são formados pelos grupos de interesse
que representam. Desta forma, as relações são muitas vezes conflitantes, levando a
uma situação muito distante das características de eficiência que existiriam em uma
estrutura de custo de transação zero.
Segundo o autor, uma condição básica para a criação de organizações
eficientes e para o aprendizado, nos países em desenvolvimento e nas economias
antes centralizadas, é a evolução de um arcabouço institucional que ofereça os
incentivos necessários. O arcabouço institucional ideal deve possuir uma eficiente
capacidade de adaptação, com estados democráticos e economias de mercado
descentralizadas e com regimes de direitos de propriedade bem definidos e
aplicados.
É a partir dessa análise que North (1998) explica porque algumas nações
prosperam e outras não, tendo sempre como base que a história importa, pois é a
partir dessa formação que se constroem instituições fortes ou fracas, as quais, assim
como a história, importam. Sob essa perspectiva, ele busca explicar o
subdesenvolvimento de nações periféricas em relação às nações desenvolvidas,
tomando como exemplos a história da Inglaterra e da Espanha e suas respectivas
colônias, demonstrando como a evolução depende da trajetória escolhida.
O autor discorre sobre vários casos. Na Inglaterra, a evolução das
garantias e direitos de propriedade representou o caminho da democracia política e
do crescimento econômico sustentado, modelo este reproduzido e ampliado na
América do Norte inglesa. Já no caso da Espanha, a burocracia era forte e
centralizada, tendo como objetivo satisfazer os interesses da Coroa, a fim de criar a
potência imperial mais importante desde Roma; como conseqüência, o modelo de
burocracia centralizada, com rígido controle sobre o Estado e a economia, gerou três
séculos de desenvolvimento esporádico desigual, além de instabilidade política.
Assim, embora simplifique os fatores que influenciam as trajetórias de
desenvolvimento, North (1998) aponta para a importância das relações sociais e das
instituições nesse processo.
50
Uma vez criadas as instituições, os mecanismos auto-reforçantes fazem
com que as economias fiquem locked in7 em determinadas estruturas institucionais,
mesmo que essas reforcem atividades improdutivas, impedindo o desenvolvimento
das produtivas, ou seja, que essas melhorem o seu desempenho. Assim, a história
pregressa das instituições e a dimensão produtiva são importantes para a
determinação da estrutura institucional presente que influenciará a matriz
institucional futura. A ligação do passado com o presente e o futuro é dada pela
história e significa que as instituições apresentam características de path
dependence. (NORTH, 1998)
Existe, portanto, uma dependência da trajetória e a reversão dessa
trajetória institucional passa pela mudança das instituições e das percepções
ideológicas de seus membros. Os atores modificam suas ideologias ou modelos
mentais quando os resultados são incompatíveis com as expectativas, o que, por si
só, não garante aumento de produtividade. (NORTH, 1998). E haverá, ainda, um
impedimento se os custos de “transição” necessários para reverter as trajetórias
institucionais produzirem uma reação política que impeça ou distorça essa transição.
A esse respeito, podemos ainda citar Polanyi (2000), que apresenta a
idéia de que os fenômenos econômicos são embeddedness, ou seja, imbricados no
todo social do qual fazem parte. E é esse caráter de imbricação que dificulta e
condiciona as mudanças institucionais a serem feitas em uma matriz institucional
formada.
Retornando a North (1998), a mudança institucional lenta e gradual será
sabotada pela criação de “direitos de corrupção” entre a burocracia vigente, de
maneira que as reformas ficarão distorcidas. Por outro lado, alterações radicais de
política devem vir acompanhadas de uma reestruturação radical da burocracia e,
mesmo assim, trarão comoção social e política, porque as limitações informais e as
percepções ideológicas não mudam repentinamente.
As regras formais podem ser rapidamente mudadas, mas as informais
apresentam maior estabilidade, ao longo do tempo, porque estão ancoradas em
traços culturais e, portanto, levam mais tempo para serem modificadas. A relação
entre as regras formais e informais e suas diferenças também são importantes para
explicar as mudanças institucionais; modificações rápidas nas regras formais podem
7 O significado desta expressão refere-se ao fato de que a economia fica “presa”, ou seja,
fortemente articulada às estruturas institucionais historicamente formadas por ela, ainda que sejam ineficientes.
51
ser, muitas vezes, difíceis de serem cumpridas pela sociedade quando as informais
são ainda úteis para resolver problemas de troca econômica, social e política entre
os indivíduos.
Assim, segundo North (1998), as mudanças institucionais são
incrementais: a estrutura institucional vai se alterando no tempo, fruto de inúmeras
pequenas mudanças que vão ocorrendo nos incentivos que as pessoas recebem do
ambiente, modificando, aos poucos, tanto as regras formais como as informais.
Existem também períodos rápidos de mudanças, em decorrência de guerras,
revoluções e desastres naturais, sendo que os dois primeiros casos ocorrem pela
ausência de instituições que acomodem as divergências entre as partes.
Nessa perspectiva, a estabilidade das instituições se dá pela sua
preservação e reprodução, enquanto a mudança se deve a alterações nos
incentivos, devidas, principalmente, a modificações nos preços relativos, que
requerem novos arranjos institucionais, os quais dependem de uma compatibilização
entre regras formais e informais, que vão se modificando lentamente ao longo do
tempo. Este caráter incremental da mudança institucional enfatiza o caráter de path
dependence da matriz institucional e tem implicações fundamentais para a
explicação das diferenças de desenvolvimento entre as economias.
Dessa forma, até o desempenho persistentemente pobre dos países do
Terceiro Mundo é explicado pela evolução de suas matrizes institucionais, pois um
país pobre possui instituições frágeis, que não conseguem reduzir muito os custos
de transação. (NORTH, 1998). Partindo da suposição de que os mercados são
imperfeitos, as instituições são criadas para que as incertezas sejam reduzidas e os
indivíduos consigam melhorar seus resultados, identificando as melhores
alternativas; se a estrutura institucional é pouco desenvolvida ou frágil, as incertezas
são maiores, os indivíduos não conseguem identificar as melhores alternativas e,
assim, não podem melhorar seus resultados.
A conseqüência dessa evolução institucional, em termos de desempenho
econômico, é que a matriz institucional dos países do Terceiro Mundo favoreceu o
desenvolvimento de organizações rent-seeker8 e desestimulou organizações
capazes de elevar a produtividade da economia (NORTH, 2001).
A partir dessa abordagem teórica que acaba de ser exposta, as variáveis
chave conceituais que serão utilizadas para explicar a evolução das instituições no
8 Refere-se a organizações que obtêm rendas reduzidas em relação aos investimentos feitos.
52
Oeste da Bahia são, portanto, formação histórica, desenvolvimento econômico,
incentivos, direitos de propriedade, contratos, normas de comportamento, etc.
Agora vejamos, as contribuições da Economia dos Custos de Transação e
da Teoria Evolucionista, consideradas como parte da abordagem institucionalista.
2.1.3.1.1 ECONOMIA DOS CUSTOS DE TRANSAÇÃO
As idéias de Coase foram desenvolvidas por Williamson (1985), dando
origem à Economia dos Custos de Transação (ECT). Nesta teoria, discute-se a firma
como um conjunto de contratos: por exemplo, é feita a análise de quando é mais
interessante produzir sob a direção de uma hierarquia e quando é mais interessante
deixar que o Mercado, através do mecanismo de preços, coordene a produção.
Assim, a natureza e a estrutura das relações interfirmas, estabelecidas ao
longo de uma determinada cadeia produtiva, por exemplo, podem ser vistas como
formas de resolver o problema da organização e coordenação das atividades, dentro
da lógica de redução dos custos de transação.
Desta forma, a ECT abandona a hipótese da microeconomia neoclássica
de simetria de informação, segundo a qual os custos de elaboração e
implementação de contratos se tornam desprezíveis. A teoria neoclássica não
envolve esses custos porque a hipótese de simetria de informação diz que tanto o
comprador como o vendedor conhecem todas as características relevantes do objeto
da troca, em qualquer transação, o que não é real. Os custos de transação são os custos que os agentes enfrentam para
negociar, redigir e garantir o cumprimento de um contrato, toda vez que recorrem ao
mercado. Esses custos podem se dar ex ante9, com o estabelecimento de
mecanismos que balizarão a transação, ou ex post10, devido ao oportunismo de uma
das partes, podendo gerar dificuldades na negociação e manutenção do acordo.
(WILLIAMSON, 1985).
Custos de transação ex ante – são relacionados aos custos de esboçar,
redigir, negociar, salvaguardar e proclamar um contrato. O grau de detalhamento do
contrato se dá em função dos limites cognitivos dos atores, no processamento de
todas as informações necessárias à redação contratual. Além disso, os contratos
9 Refere-se aos custos que são gerados antes de se consolidar uma determinada transação. 10 Refere-se aos custos que são gerados depois de se consolidar uma determinada transação.
53
podem também ser intencionalmente incompletos de forma que suas lacunas sejam
preenchidas à medida que as eventuais contingências se manifestem.
Custos de transação ex post – envolvem relações sociais mais complexas
e com maior potencial de mutações, que podem ser, segundo Williamson (1985), de:
a) má adaptação resultante de distorções entre o planejamento e a
execução das transações, podendo gerar paralisações produtivas,
defeitos nos produtos, etc.;
b) negociação e correção do desempenho das transações;
c) montagem e manutenção de estruturas de gestão que gerenciem
as transações; e
d) efetivação de compromisso, criando garantias contra
comportamentos oportunistas.
A ECT tem como fundamento dois pressupostos comportamentais
básicos, a racionalidade limitada e o oportunismo (WILLIAMSON, 1985), intrínsecos
ao ser humano, que são incorporados à análise, buscando entender o efeito dos
custos de transação sobre as diversas formas organizacionais e seus conseqüentes
impactos sobre a eficiência das relações econômicas. Vejamos, a seguir, cada um
deles.
a) Racionalidade limitada
Em relação à racionalidade limitada, observa-se que os agentes
econômicos sempre buscarão, de forma consciente, a maximização de seus
objetivos; entretanto, existem limites cognitivos por parte dos atores em termos do
perfeito processamento das informações. Além disso, nem sempre as informações
necessárias às tomadas de decisão e às formulações estratégicas estão disponíveis,
seja por inexistência em si ou pelo custo de aquisição, de forma que os atores são
obrigados a restringir ainda mais o uso de suas já limitadas capacidades cognitivas,
obtendo, conseqüentemente, um conjunto de soluções compatíveis às restrições
encontradas. (WILLIAMSON, 1985).
Visto que com essas soluções incompletas, os contratos formulados
serão, também, incompletos, os agentes, cientes das limitações ex ante, incluem
salvaguardas contratuais para lidar com eventuais desvios ex post. Muitas dessas
cláusulas, decorrentes da incapacidade de obtenção e do processamento das
informações, podem se constituir em fatores alavancadores de custos de transação,
54
tanto ex ante, em termos de esforços adicionais para a redação do contrato, quanto
ex post, no que se refere às tensões geradas pelo entendimento de uma das partes
sobre o não cumprimento do que foi prescrito contratualmente.
Se a racionalidade humana fosse ilimitada, os contratos poderiam
incorporar cláusulas antecipando qualquer circunstância futura. Mas o
comportamento humano, embora intencionalmente racional, enfrenta limitações
neurofisiológicas (acúmulo e processamento de informações) e de linguagem
(transmissão de informações). (WILLIAMSON, 1985).
A racionalidade limitada não teria interesse analítico se o meio ambiente
onde se processam as decisões fosse previsível e simples; entretanto, existem
condições de complexidade e incerteza. Ambientes simples, mesmo com
racionalidade limitada, não oferecem dificuldades, porque as restrições de
racionalidade dos agentes não são atingidas. Em ambientes complexos, as decisões
se tornam custosas, impedindo os agentes de especificar antecipadamente o que
deveria ser feito em cada circunstância.
b) Oportunismo
O oportunismo refere-se ao fato de que os atores envolvidos em uma
transação nem sempre são fiéis aos compromissos assumidos e, portanto, o
cumprimento do que foi acordado nem sempre ocorre sem a existência de custos
adicionais. Assim, a ECT assume que todos os indivíduos são oportunistas e como
forma de amenizar os problemas decorrentes desse tipo de conduta e,
conseqüentemente, de viabilizar as transações, concebem instituições e incluem
salvaguardas contratuais ex ante.
De uma forma geral, o conceito de oportunismo está ligado a esforços
calculados para distorcer, esconder ou ofuscar fatos, contribuindo para a geração de
assimetrias de informação entre os agentes, referindo-se à transmissão de
informação seletiva, distorcida e promessas “autodesacreditadas” sobre o
comportamento futuro do próprio agente, o que quer dizer que ele sabe, a priori, que
não irá cumprir com o compromisso estabelecido. Assim, para a ECT, os indivíduos
são todos oportunistas e podem não se valer da ética no balizamento de suas
condutas, podendo utilizar oportunisticamente informações privilegiadas ex ante,
com o objetivo de maximizar os seus resultados. (WILLIAMSON, 1985).
55
Analisados esses dois pressupostos, vejamos agora os três atributos,
definidos também por Williamson (1985), pelos quais a ECT dimensiona as
transações: especificidade de ativos, freqüência e incerteza.
a) Especificidade de ativos
O conceito de especificidade de ativos está ligado à idéia de algo que não
é facilmente reutilizado para uma outra finalidade além da originalmente proposta.
Portanto, podem ser entendidos como aqueles que, no caso de término ou
interrupção de um contrato, não são facilmente reempregáveis, a não ser com
perdas de valor.
Ativos específicos, segundo Williamson (1985), são aqueles
especializados, que não podem ser reempregados sem sacrifício do seu valor
produtivo, no caso de interrupções ou encerramentos prematuros dos contratos,
gerando, assim, forte dependência mútua. Uma vez que tenha sido feito o
investimento em um ativo específico, comprador e vendedor passam a se relacionar
de uma forma exclusiva ou quase exclusiva, uma situação que pode dar origem ao
que se chama de “problema do refém”, que ocorre quando a parte que realizou o
investimento no ativo específico torna-se vulnerável a ameaças, da outra parte, de
encerramento da relação.
Em um mundo em que os contratos são incompletos em decorrência da
racionalidade limitada dos agentes e no qual se observa a manifestação de condutas
oportunistas desses mesmos agentes, o investimento em ativos específicos é sujeito
a riscos, pois quem arca com esse tipo de investimento não tem a certeza de que
seus esforços serão recompensados no futuro, tendo em vista eventuais problemas
de adaptação contratual. Para tanto, salvaguardas são levantadas a fim de propiciar
a proteção dos investimentos realizados, e é quando surgem os custos de
transação.
Williamson (1985) distingue algumas formas de ativos específicos:
Locacional – quando a proximidade entre os elos da mesma cadeia
produtiva contribui para a diminuição dos custos de transporte e
inventário.
Físico – que diz respeito às instalações especializadas necessárias à
produção de um componente.
56
Humano – relacionado aos recursos humanos necessários à execução de
algum processo em particular.
Marca – ligado à imagem que a marca de uma empresa possui no
mercado.
Dedicado – que diz respeito à necessidade de investimento para
transacionar com um cliente/fornecedor em particular.
Temporal – que serefere à transação que, por motivos tecnológicos, tem,
no tempo, um fator crítico.
b) Freqüência
Os custos de transação serão atenuados na medida em que as
transações ocorram de forma recorrente; daí a importância da freqüência como
dimensão analítica. Segundo Williamson (1985), o aumento da freqüência das
transações possibilita, através de economias de escala e de escopo, além da
diminuição dos custos de transação, a redução dos custos de produção. Essa
importância se manifesta em dois aspectos: na diluição dos custos de adoção de um
mecanismo complexo por várias transações e na possibilidade de construção de
reputação por parte dos agentes envolvidos na transação.
A reputação influencia positivamente aspectos ligados à confiança e à
lealdade entre as partes envolvidas, em uma dada relação econômica, contribuindo
para a redução dos custos de transação. Pela transparência e boa imagem, os
custos de se transacionar com uma firma com reputação positiva são menores, pois
a reputação construída por meio de transações recorrentes desestimula ações
oportunistas. (WILLIAMSON, 1985). Além disso, os custos associados a um eventual
comportamento auto-interessado podem ser altos a ponto de fazer com que a
reputação construída ao longo dos anos se dissipe rapidamente.
c) Incerteza
A ligação entre a dimensão incerteza e o pressuposto comportamental de
racionalidade limitada é umbilical, pois a incerteza provoca maiores dificuldades
quando da elaboração dos contratos. Assim, a incerteza impõe que as firmas sejam
mais rigorosas, no que se refere à decisão de realizar investimentos, principalmente
em ativos específicos. (WILLIAMSON, 1985).
57
Analisados os três atributos que dimensionam as transações, bem como
os pressupostos comportamentais, pode-se definir a forma organizacional mais
eficiente para governar uma transação. As partes envolvidas, a fim de se protegerem
de comportamentos oportunistas, minimizam os custos de transação, formalizando
suas obrigações por meio de um contrato que expresse os termos negociados,
contratos esses que caracterizam como se dá a estrutura de governança de
determinada transação, conforme definiu Williamson (1985).
A especificidade das transações reduz a vantagem que o mercado
oferece, as economias de escala, porque crescem os custos de transação, derivados
de negociar, redigir, implementar e verificar a execução das cláusulas contratuais. É
a partir dessa relação entre economias de escala e custos de transação que se
determina a forma institucional mais adequada para a organização da transação: via
mercado ou via estrutura hierárquica da empresa, segundo Williamson (1985).
Se o ativo for pouco específico, os custos de transação tendem a ser
pouco expressivos, pois não envolvem complexidade e incerteza, de forma que a
negociação e a redação dos contratos não pressionam a racionalidade limitada dos
agentes. As transações se dão em grande número, limitando os riscos de atitudes
oportunistas, pois existem outros fornecedores e outros clientes para transacionar o
ativo. O mesmo ativo pode ser oferecido a vários clientes, a um preço mais baixo do
que o custo que o demandante teria caso produzisse o ativo apenas para si mesmo.
Se o ativo for específico, por exemplo, ele é produzido segundo as
necessidades peculiares do demandante, de forma que desaparecem as vantagens
em termos de escala de produção, tornando-se mais barato para o demandante
produzir ele mesmo o ativo do que recorrer a uma transação via mercado. Assim, o
empresário compara o custo de produzir o insumo (integração vertical) – perdendo
as escalas de produção de mercado – e o custo de adquirir o insumo no mercado –
custos de transação. E o fator chave para esta escolha está na especificidade dos
ativos. Neste caso, observa-se que a verticalização tende a ocorrer quanto maior for
a especificidade e complexidade da transação.
Entretanto, o que leva diferentes etapas do processo produtivo a serem
integradas verticalmente dentro de uma empresa é o fato de que as trocas entre
essas etapas envolvem um custo que não pode ser negligenciado e, portanto, os
custos de recorrer ao mercado são significativos entre as etapas do seu processo de
produção.
58
Em função das diferentes especificidades dos ativos, existem diferentes
formas de implementar as transações, cada uma com suas características, de forma
que, para assegurar a realização das transações, foram desenvolvidos vários tipos
de estruturas de governança. (WILLIAMSON, 1985). Assim, uma estrutura de
governança é o arcabouço institucional no qual a transação é realizada, ou seja, o
conjunto de instituições e tipos de agentes diretamente envolvidos na realização da
transação e os instrumentos desenvolvidos para a garantia de sua execução.
De acordo com Suzigan (2002b), estrutura de governança é a matriz
institucional que dá suporte à transação. Os supostos comportamentais
(oportunismo e racionalidade limitada) e o ambiente institucional e organizacional
(direitos de propriedade, costumes, tradições, etc.) afetam a estrutura de governança
estabelecida, pois alteram os níveis de especificidade dos ativos, freqüência e
incerteza envolvidos na transação, o que se torna um parâmetro de mudança nos
custos de transação.
Assim, as estruturas de governança têm a função de coordenar as
transações e podem ocorrer de três formas distintas, segundo Williamson (1985): Mercado – refere-se à contratação da transação no mercado, o que tende
a ocorrer quando o ativo for pouco específico. A governança pelo mercado é a forma
adotada em transações não específicas, eficaz no caso de transações recorrentes.
Não há esforço para sustentar a relação e, na avaliação de uma transação, as
partes precisam consultar apenas a sua própria experiência.
Híbrida – representa um meio termo, como contratos de terceirização, de
licenciamento, sistemas de franchising, etc. A governança híbrida exige a
especificação ex ante de uma terceira parte, tanto na avaliação da execução da
transação quanto para a solução de eventuais litígios. É mais adequada em
transações ocasionais, sejam elas de caráter misto ou específico.
Hierárquica – representa a verticalização da transação no processo
produtivo, o que tende a ocorrer quando o ativo for muito específico. O fato dos
ativos transacionados não envolverem padronização aumenta o risco da transação e
a possibilidade do surgimento de conflitos de solução custosa e incerta. Quanto mais
as transações forem recorrentes, maior a possibilidade de cobrir os custos derivados
da constituição de um arcabouço institucional específico para a transação, caso em
que a empresa integra verticalmente o que ela transacionaria no mercado.
Essas são as três formas de estrutura de governança possíveis para a
coordenação das transações.
59
Entretanto, deve-se ressaltar que a existência de um contrato não
representa nenhuma garantia de que os termos acordados serão cumpridos, sendo
necessárias as instituições, como forma de garantir os compromissos contratuais e
de assegurar os investimentos eventualmente realizados.
Ainda segundo Williamson (1985), a economia de custos de transação,
quando comparada com outras abordagens metodológicas, difere nos seguintes
itens:
a) no seu caráter de orientação microanalítica e no embasamento de
seus pressupostos comportamentais;
b) na introdução e no desenvolvimento do conceito de especificidade de
ativos;
c) na importância dada às analises comparativas institucionais;
d) na consideração das firmas como sendo estruturas de governança, em
detrimento do conceito de firmas como função de produção; e
e) no papel conferido à negociação ex post, com ênfase na utilização de
mecanismos privados de disputa, em detrimento da resolução via
justiça.
Para esta pesquisa, as variáveis chave utilizadas nesta abordagem
teórica – racionalidade limitada, oportunismo, especificidade de ativos, incerteza,
coordenação e estruturas de governança – buscam explicar como são definidas as
estruturas de governança no complexo agroindustrial da soja no Oeste da Bahia.
A seguir, vejamos de que forma a Teoria Evolucionista trata a questão da
inovação cujo arcabouço será utilizado mais adiante para interpretar o processo
inovativo que se dá no objeto estudo de caso desta pesquisa.
2.1.3.1.2 TEORIA EVOLUCIONISTA
Os neo-schumpeterianos, na busca, também, de superar os limites da
teoria neoclássica, avançam na perspectiva de construção de uma Teoria
Evolucionista que rejeita a noção de equilíbrio geral e valoriza as mudanças
qualitativas, a incerteza da decisão de produzir, a descontinuidade e a
heterogeneidade dos agentes, sendo a inovação tida como o motor do
desenvolvimento econômico.
O termo evolucionista busca caracterizar o processo evolutivo, com base
na idéia da evolução das espécies, que se dá, na teoria darwiniana, por meio de
60
mutações genéticas submetidas à seleção do meio ambiente. (POSSAS, 1989).
Analogamente, as mudanças econômicas, entendidas tanto no aspecto técnico-
produtivo (processos e produtos) quanto na estrutura e dinâmica dos mercados
(concentração, diversificação, rentabilidade e crescimento), têm origem na busca
incessante, por parte das firmas, como unidades básicas do processo competitivo,
de introduzir inovações de processos e produtos que são submetidas aos
mecanismos de seleção inerentes à concorrência e ao mercado.
Para a corrente evolucionista, as vantagens comparativas em relação aos
concorrentes dependem, em grande parte, do acúmulo de capacitações técnicas e
econômicas no âmbito da firma. Essas capacitações possuem um caráter tácito, ou
seja, incorporado nas pessoas e nas rotinas de operação de cada firma, sendo,
portanto, não-transmissíveis em manuais de procedimentos. São também
específicas a esta, na medida em que a materialização dos princípios tecnológicos
depende de características técnicas e econômicas acumuladas ao longo da sua
história e da história das pessoas, pois as pessoas é que aprendem. Esse acúmulo
de conhecimento tácito e específico é denominado aprendizado. Assim, nas
aplicações particulares de qualquer tecnologia sempre existe, em maior ou menor
grau, um conteúdo de conhecimentos tácitos e específicos que são chamados
idiossincráticos. (NELSON; WINTER, 1982).
O conteúdo tácito refere-se àqueles elementos do conhecimento que são
necessários à utilização minimamente eficiente da tecnologia e que estão
incorporados às pessoas ou às rotinas de operação da firma. Este conteúdo, que
não pode ser adquirido ou transferido via manuais ou outras formas codificadas de
transmissão de conhecimento, não pode, portanto, ser inteiramente difundido, seja
sob a forma de informação pública seja de propriedade privada. Ao mesmo tempo, a
materialização desses princípios assume, necessariamente, formas concretas
distintas, que nunca se repetem em condições contextuais idênticas, o que lhes
confere, necessariamente, um caráter específico.
Dessa forma, o conhecimento tecnológico, que possui um caráter
idiossincrático, dados os aspectos tácitos e específicos da tecnologia incorporados
às pessoas e rotinas da firma, impossíveis de serem codificados ou transferidos,
provoca uma diversidade tecnológica permanente entre firmas de um mesmo
segmento, o que se reflete em assimetrias. Além disso, as inovações radicais e
incrementais resultantes do progresso técnico, alteram o ambiente competitivo
61
gerando, também, assimetrias entre as firmas que são, ao mesmo tempo, causa e
conseqüência do próprio progresso técnico e o principal fator de mudança estrutural.
Para os neo-schumpeterianos, a mudança tecnológica é interna à
dinâmica da firma, na medida em que o processo de inovação depende da
capacitação por ela acumulada. Cada empresa é um conjunto de conexões entre
tecnologia, pessoas, informações, rotinas, etc., que não pode ser transformado com
tanta rapidez e facilidade.
Para Dosi (1984), o conhecimento conjunto de algumas condições
estruturais e regras de comportamento permite analisar, aproximadamente, variáveis
de desempenho e sentidos de mudança, reconhecendo a existência de
relacionamentos complexos e biunívocos entre estrutura de mercado, conduta das
firmas e o seu desempenho no mercado, de forma dinâmica. Admitindo que o
progresso técnico é o elemento indutor da criação/transformação das estruturas de
mercado, esta abordagem busca identificar as características da inovação
tecnológica que a tornam fator de mudança econômica estrutural. (POSSAS, 1989).
Nesse sentido, a inovação apresenta dimensões econômicas e
tecnológicas, cada uma com suas especificidades. No que se refere à dimensão
econômica, são três as características:
a) a oportunidade de introdução de avanços tecnológicos relevantes e
rentáveis;
b) a cumulatividade inerente aos padrões de inovação e à capacidade
das firmas de inovar; e
c) a apropriabilidade do progresso técnico dada pelo retorno econômico.
Quanto à dimensão tecnológica, temos o conceito de paradigmas
tecnológicos. Cada paradigma envolve a definição dos problemas relevantes que
devem ser tratados, o material tecnológico a ser usado, os tipos de artefatos básicos
a serem desenvolvidos, etc. (DOSI; ORSENIGO, 1988). Assim, um paradigma
tecnológico define contextualmente a necessidade em questão, os princípios
científicos a serem utilizados e a tecnologia substancial a ser usada. Em outras
palavras, pode ser definido como uma “norma” para a solução de problemas tecno-
econômicos selecionados.
O progresso técnico inerente a um determinado paradigma tecnológico é
denominado de trajetória tecnológica e constitui o modo ou o padrão “normal” de
realizar a formulação e a solução de problemas específicos no interior daquele
paradigma tecnológico.
62
Para Dosi (1984), os paradigmas são modelos para solucionar problemas
tecnológicos selecionados, baseados em princípios científicos e tecnológicos
também selecionados; e as trajetórias, definidas pelo paradigma, indicam o
“caminho”, o sentido para o qual se orientam os processos de busca de inovações
no que diz respeito a produtos, processo, organização da produção e administração.
O surgimento de novos produtos ou processos suficientemente
diferenciados dos existentes, constituindo uma descontinuidade no aparelho
produtivo, caracteriza uma inovação radical e inaugura um novo paradigma. A partir
deste, têm-se as trajetórias das inovações incrementais de aperfeiçoamento/
adaptação de processos e produtos.
O conhecimento inovativo é, ainda, local e específico, pois ele é limitado
por um paradigma, ocorre ao longo de trajetórias particulares e é distribuído com
diferentes competências e graus de sucesso por todos os agentes econômicos que
operam naquela tecnologia particular. (DOSI, 1988). Por outro lado, na medida em
que cada conhecimento é, também, local e cumulativo, no que se refere a firmas
individuais, é possível observar, ainda, trajetórias específicas de cada firma,
envolvendo o desenvolvimento cumulativo e a exploração das competências
tecnológicas.
Segundo Canuto (1992), os processos de aprendizado são locais e
específicos às firmas, mas também envolvem (e desenvolvem) capacidades
tecnológicas de aplicação coletiva, quer ao nível de setores ou grupo de setores,
quer ao nível do aparelho produtivo como um todo (informações de caráter geral,
qualificação geral da mão-de-obra, experiências generalizáveis, etc.).
Dosi (1988) destaca o aprendizado como fundamental no processo de
difusão das inovações, podendo ocorrer por três mecanismos:
Investimento em P&D – que é, economicamente, o mais importante meio
de aprendizado, por envolver dispêndios significativos e por representar,
geralmente, o principal mecanismo cumulativo de aprendizado, através da
acumulação tácita de conhecimentos que realimentam o processo de
busca de inovações e aperfeiçoamento de produtos e processos;
Processos informais de acumulação de conhecimento tecnológico dentro
das firmas – learning by doing e learning by using – que não envolvem
destinação específica de recursos e um formato organizacional definido,
mas podem ser de extrema importância no desenvolvimento de novos
produtos e processos que já tenham sido incorporados; e
63
Desenvolvimento de externalidades intra e interindustriais – que inclui
difusão de informação, mobilidade de mão-de-obra especializada e
crescimento de serviços especializados.
Nesse contexto, a difusão incorpora aspectos endógenos, cumulativos e
assimétricos. No que se refere aos processos informais de difusão das inovações,
eles podem se dar pela experiência acumulada na produção contínua da inovação
(learning by doing), pelo uso da inovação (learning by using) e, ainda, pela interação
e troca de informações entre fornecedor e usuário da inovação (learning by
interacting). Este último, tratado por Lundvall (1988), pressupõe uma contínua troca
de informações entre os agentes, o que exige uma comunicação eficiente entre eles,
através dos canais de informação, ou seja, por onde a informação passa, e dos
códigos de informação, que se referem à compreensão da mensagem.
Assim, a definição das estratégias das firmas se desenvolve a partir de
acordos que visam a reciprocidade não apenas econômica, como também, a
construção de canais de informações. A incorporação do aprendizado na construção
de estratégias vai implicar em trajetórias distintas e arranjos particulares, a cada
acordo. Segundo Dosi (1984), a trajetória tecnológica vai ser o padrão de evolução
não linear do progresso técnico, dentro de um determinado paradigma, ao longo da
qual se tenta consolidar inovações no mercado.
A implementação da inovação gera assimetrias entre as firmas do
segmento que se confrontam, no processo competitivo, com as formas já existentes.
Mas como toda inovação passa por um processo de difusão, a firma corre o risco de
sofrer um processo de imitação e de atração de novas firmas para o mercado, se a
inovação demonstrar maiores lucros para a firma inovadora. Isso vai depender do
grau e da magnitude das barreiras à entrada existentes. Quando ocorre a imitação,
as assimetrias são reduzidas, dissipando os lucros. Assim, a sua manutenção
depende da capacidade da firma inovadora de gerar contínuas inovações
incrementais e de criar e ampliar barreiras à entrada e à mobilidade, visando
proteger as inovações da imitação.
A Teoria Evolucionista analisa, portanto, a dinâmica ou o aspecto
evolutivo do evento, que se dá em um mundo incerto e em mudança, sendo limitada
a racionalidade do processo da decisão. Os evolucionistas sugerem a existência de
uma coerência nas corporações como sendo uma interação complexa entre
aprendizado, padrão de dependência, oportunidades tecnológicas e
64
complementaridade dos ativos, considerando o custo de transação e o papel e
características dos ativos como implícitos à abordagem.
Apresentada esta teoria, os seguintes conceitos são explorados para
contribuir com a interpretação do processo inovativo que se dá ao longo da cadeia
do aglomerado da soja no Oeste da Bahia: inovação, competências, diversidade
tecnológica, aprendizado, paradigma tecnológico, trajetória tecnológica e difusão
tecnológica.
A seguir, é definida uma grade analítica para o desenvolvimento desta
pesquisa, com base nas teorias apresentadas e nas questões levantadas, tentando
articular conceitos e variáveis de análise exploradas no trabalho, para responder às
referidas questões.
2.1.4 GRADE ANALÍTICA
A Figura 3, a seguir, apresenta a Grade Analítica deste trabalho que,
agregando tudo o que foi discutido até então, é a base da interpretação dos
resultados obtidos na pesquisa, a partir de dados primários e secundários, com o
objetivo de trabalhar as respostas para as questões aqui levantadas. A partir desse
referencial é feita a análise da dinâmica produtiva e institucional do complexo
agroindustrial da soja no Oeste da Bahia, de forma articulada, considerando o
pressuposto do desenvolvimento enquanto uma co-evolução produtiva e
institucional.
Figura 3 – Grade Analítica
2.2 METODOLOGIA
A metodologia aplicada neste trabalho pode ser caracterizada como
teórico-empírica, pois utiliza a construção de um referencial teórico analítico,
respaldado empiricamente por um estudo de caso, “o caso da agroindústria da soja
no Oeste da Bahia”, que serve de objeto de estudo para analisar as questões
levantadas no trabalho. A base teórica para este estudo, com a definição dos
principais conceitos, assim como as questões de pesquisa, articuladas às
respectivas variáveis de análise, já foram definidas a partir da Grade Analítica
apresentada na Figura 3.
Quanto à análise empírica, utilizam-se dados qualitativos e quantitativos,
tanto primários quanto secundários.
Os dados primários foram obtidos diretamente através de uma pesquisa
de campo, com a aplicação de questionários aos agricultores de soja do Oeste da
Bahia (Apêndice A), bem como através de entrevistas estruturadas abrangendo os
demais atores da cadeia produtiva encontrados na região – produtores de máquinas,
insumos e sementes; indústria esmagadora; indústria de subprodutos; agentes de
inovação tecnológica; e fundações, cooperativas e associações – para cuja
elaboração foram articulados os conceitos chave e as variáveis de análise, com base
na Grade Analítica definida (Figura 3) e considerando os objetivos propostos.
Para a obtenção dos dados secundários foi realizada uma coleta das
informações publicadas por órgãos públicos e privados, seja em meio eletrônico ou
em meio físico, tendo-se, sempre, a preocupação de trabalhar com instituições
reconhecidamente fidedignas, apresentando respeitável caráter técnico-acadêmico.
Estes dados são incorporados ao trabalho a fim de corroborar/complementar a
análise feita a partir dos dados primários.
Nesse contexto, procurou-se articular as questões às variáveis de análise
obtidas das abordagens teóricas e através dos dados secundários e essas
informações serviram de base para a construção dos questionários aplicados e para
a estruturação das entrevistas realizadas na pesquisa de campo. (Quadro 1).
67
QUESTÕES CONCEITOS E VARIÁVEIS DE ANÁLISE
Qual é o tipo de aglomeração existente no complexo agroindustrial da soja no Oeste da Bahia?
Economia Regional: aglomerado, cluster (emprego – RAIS) Aplicação do modelo Crocco et al. (2003) para avaliar o índice de concentração de unidades produtivas na região, buscando identificar um cluster
Qual é a contribuição desse aglomerado para o desenvolvimento da região?
Economia Regional: cooperação, economias de escala, vantagens competitivas, integração, externalidades (renda, emprego, IDH, consumo de energia elétrica, analfabetismo, etc.)
Como evoluíram as instituições no Oeste da Bahia?
Economia Institucional: formação histórica, desenvolvimento econômico, incentivos, direitos de propriedade, contratos, normas de comportamento (crédito, financiamentos, análise histórica, etc.)
Como são definidas as estruturas de governança nesse aglomerado?
Economia dos Custos de Transação: racionalidade limitada, oportunismo, ativos específicos, incerteza, coordenação, estruturas de governança (análise das relações entre os atores)
Como se dá o processo de inovação ao longo da cadeia e qual é a sua contribuição para a dinâmica endógena de desenvolvimento?
Teoria Evolucionista: inovação, competências, diversidade tecnológica, aprendizado, paradigmas e trajetórias tecnológicas, difusão tecnológica (análise de aspectos tecnológicos ao longo da cadeia, como P&D, etc.)
Quadro 1 – Síntese Metodológica: questões, conceitos e variáveis de análise
2.2.1 PESQUISA DE CAMPO
A pesquisa de campo foi realizada com o objetivo de levantar os dados
primários do trabalho.
Os atores do aglomerado em estudo são: a) produtores de maquinaria
para agricultura e indústria; b) produtores de insumos químicos para a agricultura e
indústria; c) produtores de sementes; d) agricultores; e) indústria esmagadora; f)
indústria de subprodutos; g) agentes de inovação tecnológica; h) cooperativas; e i)
associações, dos quais a região do Oeste da Bahia apenas não apresenta
produtores de maquinaria para agricultura e indústria. Os demais agentes estão
todos presentes, representando, assim, o modelo de análise, sendo, portanto, objeto
desta pesquisa, através da aplicação de questionários e da realização de
entrevistas, tendo como fundamentação teórica as abordagens aqui apresentadas, a
partir das variáveis de análise levantadas.
Considerando o quantitativo dos agentes do arranjo, optou-se por fazer a
pesquisa em duas etapas: uma, somente com os produtores, com a aplicação de
questionários, e outra com os demais atores, através de entrevistas. Desta forma, na
primeira fase, os pesquisadores aplicaram os questionários com uma determinada
68
amostra de produtores de soja da região; e, na segunda fase, foram feitas as
entrevistas com os demais componentes da cadeia produtiva da soja.
A primeira fase ocorreu no período entre 12 de setembro e 1º de outubro
de 2004 e foi dividida em duas etapas: a primeira realizada na cidade de Barreiras e
a segunda na cidade de Luís Eduardo Magalhães, ambas realizadas por
pesquisadores de campo contratados para a pesquisa.
Na cidade de Barreiras, utilizou-se como estratégia trabalhar em estreita
articulação com a Associação de Agricultores e Irrigantes do Oeste da Bahia (AIBA),
através da sua assessoria de agronegócios. Já na cidade de Luís Eduardo
Magalhães, o apoio foi dado pela Secretaria de Agricultura do Município (SEAGRI),
com o envolvimento direto do próprio Secretário e, em menor escala, do Sindicato
dos Produtores Rurais. Nesta cidade, a AIBA se fez representar também por meio do
seu escritório local.
Em ambas as etapas, foram muitas as dificuldades encontradas. Na
cidade de Barreiras, primeira etapa do levantamento, foi grande a resistência dos
produtores em participar da pesquisa, basicamente por não saberem que se tratava
de um trabalho eminentemente acadêmico, sem qualquer interesse de colher
informações consideradas sigilosas.
Na cidade de Luís Eduardo Magalhães, as dificuldades foram bem mais
acentuadas pois, tendo em vista que o local de apoio para contatos com os
produtores era a sede da SEAGRI e tendo sido a pesquisa realizada em período
pré-eleitoral (faltavam duas semanas para a eleição), o engajamento dos membros
da Secretaria ficou bastante comprometido.
O Sindicato Rural forneceu uma listagem dos produtores de soja, embora
incompleta, contendo apenas o nome e telefone de 120 produtores, sem os
respectivos endereços. Outra dificuldade decorreu de que um grande número de
produtores fica a maior parte do tempo nas suas propriedades, geralmente longe do
perímetro urbano, o que torna o acesso até eles ainda mais difícil.
Para a aplicação dos questionários, a pesquisa contou com a participação
de alguns alunos do Curso de Agronegócios da Faculdade Unyhana (Campus de
Luís Eduardo Magalhães). Este envolvimento se justificou na medida em que
representou uma possibilidade de aprendizado para esses alunos, sobretudo para
aqueles que pretendiam incursionar pelas áreas de ensino e pesquisa.
Uma outra estratégia definida em comum acordo com a SEAGRI e a AIBA
foi a presença dos pesquisadores no local da realização do “Agroeste Bahia – 5º
69
Seminário Nacional de Grãos e Fibras”, realizado no período de 21 a 23 de setembro
de 2004, em Luís Eduardo Magalhães. Todavia, esse recurso ficou aquém do
esperado, tendo em vista que a presença dos produtores de soja, prevista em mais
de cem participantes, acabou se traduzindo em um número inferior a vinte pessoas.
Diante deste quadro, buscou-se outras fontes de informações que
pudessem facilitar o acesso dos pesquisadores aos produtores de soja, dentre as
quais as empresas fornecedoras de matérias-primas (sementes, fertilizantes e
defensivos), que indicaram vários nomes de produtores que poderiam ser visitados,
além de alguns produtores que, já tendo sido entrevistados, se dispuseram a
elaborar uma pequena lista a partir da sua agenda pessoal, de forma que esses
produtores acabaram atuando como elementos multiplicadores.
Na segunda fase, realizada logo em seguida por meio de entrevistas
também concentradas nas localidades de Barreiras e Luís Eduardo Magalhães,
outras dificuldades foram enfrentadas, principalmente em relação à disponibilidade
de agenda dos entrevistados. Adotou-se, então, como critério entrevistar pelo menos
um representante de cada tipo de agente presente no aglomerado, conforme
definido anteriormente, já que estes são encontrados em número reduzido na região,
muitas vezes somando apenas dois atores em cada categoria a ser estudada.
2.2.2 DEFINIÇÃO DA AMOSTRA
É importante destacar que, metodologicamente, tendo em vista as
enormes dificuldades relatadas em relação à pesquisa de campo, definiu-se uma
amostra por acessibilidade tanto para a aplicação de questionários quanto para as
entrevistas com os agentes do aglomerado. Os questionários foram aplicados com
os produtores, alcançando aproximadamente 10% deles, e as entrevistas foram
realizadas com os demais agentes, buscando-se entrevistar, pelo menos, um
representante de cada categoria pertencente ao aglomerado.
Na primeira fase da pesquisa, a amostra de produtores aos quais foram
aplicados os questionários, envolveu 98 agricultores, de uma população de
aproximadamente mil11, ou seja, em torno de 10% da população, englobando áreas
cultivadas de diferentes dimensões, conforme pode ser observado na Tabela 1, a
seguir.
11 Estimativa de produtores de soja na região, fornecida pela AIBA.
70
Tabela 1 – Número de questionários aplicados a produtores de soja, segundo área das propriedades, Região Oeste do Estado da Bahia, 12 Set – 01 Out 2004
PROPRIEDADES Nº DE QUESTIONÁRIOS APLICADOS ÁREA FÍSICA (em ha)
QUE CULTIVAM SOJA(em %)
POR ÁREA TOTAL DA PROPRIEDADE
POR ÁREA PLANTADA EM SOJA
Até 499 15 14 25 De 500 a 1999 40 46 51 De 2000 a 4999 30 23 19 Acima de 5000 15 15 3 Total 100 98 98 Fonte: Elaboração própria, a partir de dados fornecidos pela AIBA
A partir da estratificação indicada na área física, procurou-se manter uma
relativa proporcionalidade entre o número de questionários aplicados e o percentual
de propriedades que cultivam soja na região. Nesse critério, obteve-se mais sucesso
na pesquisa no número de questionários em relação à área total da propriedade do
que em relação à área plantada em soja. Os 98 questionários aplicados com os
produtores de soja na região do Oeste da Bahia foram tabulados utilizando-se o
software aplicativo SPHINX – Soluções em Pesquisa e Análise de Dados.
Na segunda fase da pesquisa, as entrevistas foram feitas por
amostragem, pois, muitas vezes, os demais agentes envolvidos no aglomerado eram
em número de um ou dois em cada categoria, de forma que as entrevistas foram
pontualizadas, tendo-se adotado o critério de entrevistar pelo menos um
representante de cada uma dessas categorias.
71
3 SISTEMA AGROINDUSTRIAL DA SOJA
3.1 CONTEXTUALIZAÇÃO INTERNACIONAL E NACIONAL DA CULTURA DA SOJA
Dentre as oleaginosas produzidas no mundo, a soja é a que tem a maior
representatividade econômica e protéica. Segundo a Associação Brasileira das
Indústrias de Óleos Vegetais (ABIOVE), pelos dados referentes ao biênio 2004/05, a
soja corresponde a 59% da produção total mundial, ficando as demais com
percentuais em torno de 10% ou menos (Tabela 2). A importância dessa oleaginosa
reflete-se não só ao consumo direto como alimentação, bem como através do seu
processamento, quando são produzidos farelo e óleo.
Tabela 2 – Produção mundial das principais oleaginosas e dos principais farelos protéicos e óleos vegetais, 2004/05
PRODUÇÃO MUNDIAL OLEAGINOSAS (%)
FARELOS PROTÉICOS (%)
ÓLEOS VEGETAIS (%)
Soja 59 69 32 Colza 11 11 14 Algodão 11 7 4 Amendoim 9 3 5 Girassol 6 5 8 Palma – – 28 Outros 4 5 9 Total 100 100 100
Fonte: ABIOVE , 2007
Uma visão mais detalhada do Complexo Soja, a nível mundial, pode ser
conseguida através da Tabela 3, a seguir, onde são apresentados diversos itens em
relação à cultura, com dados que vão de 2000/01 a 2006/07. Observa-se um
72
considerável aumento em todas as variáveis, com tendência sempre crescente ao
longo do tempo, refletindo a importância desta oleaginosa.
Tabela 3 – Dados mundiais da soja, 2000/01-2006/07
(em milhões de toneladas) ITENS 2000/01 2001/02 2002/03 2003/04 2004/05 *2005/06 **2006/07
Estoque Inicial 28,02 30,71 32,18 40,50 38,80 48,45 53,79Produção 175,06 184,87 197,31 186,26 215,74 219,93 233,49Importação 55,15 54,15 62,87 54,25 63,71 64,00 68,70Esmagamento 146,81 157,98 164,91 163,84 175,68 184,53 194,87Consumo Total 171,82 183,96 190,57 189,96 205,16 214,52 225,51Exportação 55,50 53,59 62,07 55,86 64,64 64,07 69,46Estoque Final 30,71 32,18 40,50 38,80 48,45 53,79 61,02Estoque/Consumo 17,80 17,50 21,20 20,40 23,60 25,10 27,00
Fonte: FAEP, 2007 * Estimativa; ** Projeção
Cabe aqui agora, desagregar os números relativos à importância da soja
no âmbito internacional, por países, a fim de se poder verificar a participação relativa
dos mais importantes. Nesse sentido, o Centro de Inteligência da Soja (CI Soja)
apresenta dados atuais para os principais países produtores, para 2006/07: a
liderança é dos Estados Unidos, que respondem por 37% da produção mundial; o
Brasil ocupa o segundo lugar, com 26%; e o terceiro lugar é ocupado pela Argentina,
com 19%. Observa-se, assim, a importância do Brasil nesse processo. A Tabela 4
indica, ainda, as produções para 2005/06 e 2004/05.
Tabela 4 – Produção mundial de soja por países, 2006/07 (em milhões de toneladas)
PAÍS SAFRA 2006/07 PARTICIPAÇÃO PAÍS SAFRA 2005/06 SAFRA 2004/05
EUA 86,77 37 83,37 85,01AMÉRICA DO SUL 113,06 48 103,44 99,50
Brasil 59,81 26 56,20 52,90Argentina 45,10 19 41,00 40,00Paraguai 5,75 2,0 3,64 4,04Bolívia 1,80 1,0 2,05 2,06Uruguai 0,60 0,0 0,55 0,50
CANADÁ 3,50 1,0 3,16 3,04UE 0,75 0,0 0,70 0,65RÚSSIA 0,90 0,0 0,69 0,56CHINA 16,20 7,0 16,35 17,40ÍNDIA 7,30 3,0 6,30 5,85INDONÉSIA 0,82 0,0 0,83 0,83OUTROS 4,71 2,0 5,09 2,90Total 234,01 – 219,93 215,74
Fonte: CI Soja, 2007
73
Outra fonte de dados é a Federação da Agricultura do Estado do Paraná
(FAEP) que indica, para 2006/07, em relação aos principais países produtores de
soja, a quantidade de produção, consumo, exportação e estoque final, além desses
mesmos totais para o mundo. Observa-se que o Brasil, a nível mundial, é o segundo
produtor, com 58,8 milhões de toneladas, o terceiro consumidor, com 31,9 milhões
de toneladas, e o segundo exportador, com 26,1 milhões de toneladas. (Tabela 5).
Tabela 5 – Dados mundiais da soja, 2006/07 (em milhões de toneladas)
PAÍSES PRODUÇÃO CONSUMO EXPORTAÇÃO ESTOQUE FINAL Estados Unidos 87,0 53,0 29,0 17,0Brasil 58,8 31,9 26,1 17,6Argentina 45,5 36,5 7,5 19,6Mundo 233,5 225,5 69,5 61,0
Fonte: FAEP, 2007
Esse desempenho do Brasil na cultura da soja remete ao início deste
século, quando imigrantes japoneses a introduziram no Brasil, mais precisamente no
Rio Grande do Sul. Entretanto, a sua produção em bases comerciais somente passa
a ter representatividade a partir do final da década de 50, com a crise na produção
de trigo que precedeu a plantação de soja.
Havia já algum tempo uma agricultura mecanizada, organizada em torno
do trigo, vinha substituindo a antiga estrutura agrária gaúcha, caracterizada por
grandes explorações de pecuária extensiva e algumas pequenas propriedades
centradas em culturas de subsistência. Entretanto, em 1955, segundo Uderman
(1992), a produção de trigo do Rio Grande do Sul passou a concorrer com o trigo
americano, a baixo preço, decorrente de um acordo assinado com os Estados
Unidos que assegurava o fornecimento de trigo a crédito de longo prazo,
comprometendo a sua rentabilidade.
Aliado a este fato, a política de substituição de importações em vigor,
buscando garantir o fornecimento de alimentos baratos e estimular a
industrialização, acentuou esta crise na produção de trigo, de forma que, neste
contexto, a soja surgiu como a cultura complementar ideal, por utilizar os mesmos
equipamentos e contar com uma demanda mundial crescente.
Assim, a cultura da soja foi adquirindo importância e, já na década de 70,
passou a se constituir como um complexo agroindustrial nacional, inclusive com
investimentos tecnológicos patrocinados pelo Estado, direcionados para processos
74
de beneficiamento nacionais, além da incorporação de novas etapas produtivas à
cadeia da soja, a nível internacional, levando a um incremento na produção nacional
de produtos oriundos dos seus primeiros estágios de beneficiamento.
Desta forma, os derivados da soja foram conquistando parcelas
crescentes do consumo nacional de óleos e farelos, deixando em segundo plano
produtos oriundos da transformação do amendoim e do algodão que, até o início da
década de 70, se destacavam no mercado de gorduras vegetais e como fontes
protéicas de rações.
Nessa época, diversos planos governamentais direcionados para a
agricultura beneficiaram a cultura da soja no Brasil. Como exemplos, temos,
segundo Uderman (1992): o Programa de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) que,
em 1967, tem a soja como principal beneficiária; o Sistema Nacional de Crédito
Rural (SNCR) que, a partir de 1967, passa a contar com a fonte de recursos dos
bancos privados; a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
(EMBRAPA), em 1973, desenvolvendo estudos de correção técnica e de
produtividade; o Programa Nacional de Armazenagem (PRONAZEM), em 1975,
buscando suprir a lacuna decorrente da falta de infra-estrutura básica, na questão do
armazenamento; e o Programa de Cooperação para o Desenvolvimento dos
Cerrados (PRODECER), implementado em 1978.
Em relação ao PRODECER, o Programa foi idealizado em 1974,
negociado entre os governos do Brasil e do Japão durante cinco anos, e
implementado a partir de 1978. De acordo com Marouelli (2003), o Programa teve
como coordenador político-institucional o Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento (MAPA) e, como coordenadora de implementação, a Companhia de
Promoção Agrícola (CAMPO), empresa de capital binacional, criada para esta
finalidade, com 51% das ações pertencentes ao Brasil, representadas pela
Companhia Brasileira de Participação Agroindustrial (BRASAGRO), e 49% das
ações pertencentes ao Japão, representadas pela Japan-Brazil Agricultural
Development Corporation (JADECO) sendo que, em ambas as partes, existe a
participação governamental e privada.
O programa foi financiado pelos Governos do Brasil e do Japão – Japan
International Cooperation Agency (JICA) e o Fundo de Cooperação Econômica
Ultramarina The Overseas Economic Cooperation Fund (OECF) –, e por bancos
privados japoneses, e é desprovido de formas de subvenção e/ou doação. As
diretrizes do PRODECER são as seguintes:
75
1. Programa baseado na assinatura de Acordos Bilaterais; 2. Método de Desenvolvimento de Pólos colonizados por agricultores de porte médio (crescente preocupação com o Meio Ambiente, infra-estrutura sócio-econômica por meio de governos municipais e estaduais); 3. Criação da CAMPO, como órgão coordenador da execução do Programa; 4. Método de colonização via cooperativas (seleção de produtores); 5. Programa de Cooperação Econômica articulada com Cooperação Técnica (financiamento e tecnologias agrícolas); 6.Esquema de Financiamento: financiamento da produção a juros baixos (recursos diretos do Banco Central). Brasil assumiu os riscos cambiais. (CAMPO, s/d).
Foram implantadas três fases do PRODECER (P-I, a partir de 1979; P-II,
a partir de 1985; e P-III, a partir de 1995), totalizando um montante de US$
570.000.000,00 (quinhentos e setenta milhões de dólares), incorporando ao
processo produtivo uma área de 350.000 hectares de cerrado, englobando sete
Estados brasileiros, conforme Tabela 6, a seguir:
Tabela 6 – Projetos do Prodecer, por Estado, área e investimento ESTADO PROJETOS ÁREA TOTAL
(em ha) INVESTIMENTO
(em US$) FASES DO PRODECER
Minas Gerais 11 projetos + 3 empresas
151.250 239.000.000,00 P-I e P-II/Piloto P-II/Expansão
M. Grosso Sul 1 projeto 22.000 26.000.000,00 P-II/Expansão Mato Grosso 2 projetos 35.320 50.000.000,00 P-II/Piloto Goiás 3 projetos 30.000 50.000.000,00 P-II/Expansão Bahia 2 projetos 31.430 67.000.000,00 P-II/Piloto Tocantins 1 projeto 40.000 69.000.000,00 P-III/Piloto Maranhão 1 projeto 40.000 69.000.000,00 P-III/Piloto Total 21 projetos 350.000 570.000.000,00 Fonte: Campo, 2003
As principais características de cada uma das três fases são as seguintes
1. Prodecer I – piloto (1979/83)
a) Foram selecionadas três áreas em Minas, incorporando 60 mil
hectares para soja, milho, arroz e café.
b) Foi implantada uma fazenda de 5 mil hectares diretamente
administrada pela CAMPO para produção de sementes e duas
empresas agrícolas (plantations).
76
c) Foram assentadas 92 famílias, predominando o método de
colonização agrícola.
2. Prodecer II – piloto (1985/90); e expansão (1985/93)
a) Foram implantados quatro projetos-piloto em duas áreas de
cerrado: Mato Grosso e Bahia (semi-árido).
b) Foram assentadas 165 famílias, e 65 mil hectares foram
incorporados a atividades de pecuária, culturas perenes e culturas
de soja e milho.
c) Algumas cooperativas fizeram a aquisição e repasse de terras aos
colonos.
d) O projeto expansão, com recursos de financiamentos de projetos
do JBIC, abriu onze novas áreas em Minas Gerais, Goiás e Mato
Grosso do Su.
e) Na expansão 380 famílias foram assentadas, em um segmento de
140 mil hectares.
3. Prodecer III – piloto (1995/01)
a) Foi implantado no Tocantins (Pedro Afonso) e no Maranhão
(Balsas).
b) Houve consolidação de tecnologias de administração rural e
introdução de irrigação.
c) Foram incorporados 80 mil hectares, com 80 famílias assentadas
(áreas de 1.000 hectares – o dobro dos projetos anteriores).
d) Foi feita uma reserva natural de 50% das áreas, sendo que
anteriormente eram constituídas somente de 20%, e foram
agrupadas em áreas de reserva coletiva.
Desta forma, a primeira fase beneficiou a região sul dos cerrados,
especificamente o Estado de Minas Gerais; a segunda, a área central dos cerrados,
nos Estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Bahia;
atualmente, a terceira está em fase de implantação com a consolidação de dois
projetos na área norte dos cerrados, sendo um em Pedro Afonso, no Tocantins, e
outro em Balsas, no Maranhão.
Segundo informações da CAMPO, o PRODECER beneficiou, até o
momento, 758 colonos. Áreas que eram despovoadas ou pequenas vilas
transformaram-se em importantes pólos regionais com a implantação dos projetos.
77
O principal instrumento do Programa é o crédito supervisionado, com
linhas de crédito abrangentes, prevendo empréstimos fundiários para investimentos,
despesas operacionais e assistência ao colono.
O público beneficiário é constituído de médios agricultores associados a
cooperativas, com características de capacidade de adoção tecnológica tanto
gerencial quanto de produção, espírito empreendedor, dentre outras, que conduzam
os projetos de forma a atingir os objetivos do programa que tem como proposta
desenvolver, paralelamente à produção, a infra-estrutura econômica e social, em um
apoio logístico à competitividade dos cerrados, portanto, um enfoque de
desenvolvimento regional. (MAROUELLI, 2003).
Segundo o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA):
Os Acordos de Projetos encerraram-se em 29/03/01, enquanto os de Empréstimos tem seu cronograma de amortização previsto para o PRODECER II até 2005 e para o III até 2014. Por esta razão, a ação de Financiamento para a Expansão Agrícola do Cerrado extinguiu-se na mesma data, permanecendo a de Prestação de Assistência Técnica aos Beneficiários. Este fato, gerou a elaboração de Termos de Referência do Estudo de Impacto do Programa em suas diferentes fases entre a JICA e o MAPA em 26/10/2000. Esta avaliação foi concluída no início de 2002, com indicativos de obtenção dos objetivos propostos. Foram implementados 21 (vinte e um) projetos nos estados de MG, GO, MS, MT, BA, MA e TO totalizando 353.748 (trezentos e cinqüenta e três mil e setecentos e quarenta e oito) hectares, beneficiando 758 (setecentos e cinqüenta e oito) colonos, nas culturas de Soja, Milho, Feijão, Algodão, Arroz, Trigo, Café, Frutíferas e Olerícolas. Existem 16.182 (dezesseis mil cento e oitenta e dois) hectares irrigados e 20.093 (vinte mil e noventa e três) irrigáveis [...] O intercâmbio técnico viabilizou a vinda ao Brasil de 72 (setenta e dois) especialistas japoneses, assim como a ida para lá de 62 (sessenta e dois) pesquisadores brasileiros, nas ações de interesse mútuo, assim como equipar 5 (cinco) laboratórios de análises, inclusive de biotecnologia Entretanto, existem problemas a serem superados, como o descompasso entre a rentabilidade da agricultura e a taxa de juros praticada pelo mercado, levando beneficiários ao endividamento, a conclusão de obras coletivas de irrigação, a adoção de culturas “nobres” destinadas a aumentar a renda dos interessados, e a racionalização dos meios de escoamento das safras para diminuir os custos. [...] No entanto, continua sob a responsabilidade de gestão do MAPA a Assistência Técnica aos Beneficiários, enquanto perdurar o vínculo financeiro originado pela parceria Brasil/Japão.(BRASIL, 2003).
78
Deve-se ressaltar que esse Programa, conforme apresentado, permitiu a
alavancagem da agricultura nos cerrados do Brasil, até então consideradas área
impróprias para a prática do cultivo, destacando-se, dentre as principais culturas
desenvolvidas, a cultura da soja.
Atualmente, a soja corresponde a 44,3% da produção de cereais,
leguminosas e oleaginosas do Brasil, segundo dados de 2006 do IBGE.
Considerando os principais produtos cultivados no país, a soja ocupa o lugar de
maior área plantada, maior área colhida e maior quantidade da produção de cereais,
leguminosas e oleaginosas, correspondendo a praticamente 50%, em cada uma
dessas variáveis, em relação ao total do Brasil (Tabela 7).
Tabela 7 – Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de valor da produção, Brasil, 2006 PRINCIPAIS PRODUTOS
ÁREA PLANTADA
(ha)
ÁREA COLHIDA
(ha)
QUANTIDADE PRODUZIDA
(ton)
VALOR DA PRODUÇÃO
(R$ mil) Total Geral 46.628.909 45.686.525 117.260.821 40.961.681 Soja (em grão) 22.082.666 22.047.349 52.464.640 18.470.711 Milho (em grão) 12.996.355 12.612.077 42.662.578 9.955.217 Arroz (em casca) 3.008.695 2.969.444 11.524.434 4.304.182 Feijão (em grão) 4.242.159 4.033.068 3.455.918 3.555.058 Algodão Herbáceo (em caroço) 910.382 898.008 1.826.194 2.831.274
Trigo (em grão) 1.770.945 1.560.178 2.464.936 991.602 Fonte: IBGE, 2006
O processamento de soja no Brasil, assim como as exportações para os
três produtos, grão, farelo e óleo12, tem apresentado uma tendência crescente, ano a
ano. Observa-se que, para os casos de grão e óleo, as exportações, praticamente,
dobraram, do biênio de 2000/01 para o de 2006/07, conforme podemos conferir na
Tabela 8. Desta forma, a cultura da soja tem proporcionado crescentes superávits na
balança comercial do Brasil, consolidando-se como uma das mais importantes
commodities de exportação.
12 Para uma serie histórica desses dados a partir de 1995, mês a mês, consultar as Tabelas 63, 64,
65 e 66, respectivamente, no Apêndice B.
79
Tabela 8 – Embarques do Complexo Soja, Brasil, 2000–2007 (em mil toneladas)
PRODUTOS 2000/ 2001
2001/ 2002
2002/ 2003
2003/ 2004
2004 /2005
2005/ 2006
2006/ 2007*
Grão 11.778 15.522 16.074 19.987 19.257 22.799 24.768Farelo 9.864 11.128 12.783 13.542 14.567 14.226 12.275Óleo 1.134 1.612 2.100 2.405 2.531 2.742 2.315Fonte: ABIOVE , 2005 * Previsão
Os valores monetários dessas exportações são apresentados na Tabela
9.13 Nesse período, o grão de soja, principal item de exportação do complexo, em
US$ milhões, passou de 2.188, em 2000, para 5.665, em 2006, portanto, mais que o
dobro do valor. Ressalta-se que, nesse mesmo período, o valor do óleo de soja
quase quadruplicou, passando de US$ 359 milhões para US$ 1.200 milhões. Esses
dados refletem a importância da cultura da soja para a economia brasileira.
Tabela 9 – Exportações do Complexo Soja, Brasil, 2000-2006 (Ano civil)
GRÃO FARELO ÓLEO ANO VOLUME
1000 ton VALOR
US$ milhõesVOLUME 1000 ton
VALOR US$ milhões
VOLUME 1000 ton
VALOR US$ milhões
2000 11.517 2.188 9.364 1.648 1.073 359
2001 15.676 2.726 11.271 2.065 1.625 506
2002 15.970 3.032 12.517 2.199 1.934 778
2003 19.890 4.290 13.602 2.602 2.486 1.233
2004 19.248 5.395 14.486 3.271 2.517 1.382
2005 22.435 5.345 14.422 2.865 2.743 1.267
2006 24.956 5.665 12.332 2.418 2.419 1.200Fonte: ABIOVE , 2005
Com o objetivo de demonstrar a importância que a soja representa não
apenas em termos de valor de produção mas, também, em área cultivada, para o
Brasil, Nordeste e Bahia, respectivamente, podemos analisar as Tabelas 10, 11 e
12, a seguir, que indicam área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor
da produção para os principais cereais, leguminosas e oleaginosas produzidos no
Brasil, Nordeste e Bahia, por ordem decrescente de área colhida, para 2006, nas
13 Para uma serie histórica a partir de 1992, referente aos três produtos, por volume de exportações,
e por valor por tonelada e valor total das exportações, por ano, ver a Tabela 67 (Apêndice B).
80
quais se observa que, no que se refere ao Brasil e à Bahia, a soja é a principal
oleaginosa cultivada, ficando em terceiro lugar apenas quando avaliada em relação
à região Nordeste.
Tabela 10 – Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de área colhida, Brasil, 2006
ÁREA PRODUÇÃO PRINCIPAIS PRODUTOS PLANTADA
(ha) COLHIDA
(ha) QUANTIDADE
(ton) VALOR
(R$ mil) Soja (em grão) 22.082.666 22.047.349 52.464.640 18.470.711Milho (em grão) 12.996.355 12.612.077 42.662.578 9.955.217Feijão (em grão) 4.242.159 4.033.068 3.455.918 3.555.058Arroz (em casca) 3.008.695 2.969.444 11.524.434 4.304.182Trigo (em grão) 1.770.945 1.560.178 2.464.936 991.602Algodão herbáceo (em caroço) 910.382 898.008 2.898.721 2.831.274Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2006 (BRASIL, 2007)
Tabela 11 – Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de área colhida, Região Nordeste do Brasil, 2006
ÁREA PRODUÇÃO PRINCIPAIS PRODUTOS PLANTADA
(ha) COLHIDA
(ha) QUANTIDADE
(ton) VALOR
(R$ mil) Milho (em grão) 2.867.101 2.722.256 3.168.720 1.074.870Feijão (em grão) 2.347.132 2.173.986 1.043.412 1.030.796Soja (em grão) 1.488.313 1.487.915 3.467.918 1.215.575Arroz (em casca) 733.443 714.898 1.110.479 451.440Algodão herbáceo (em caroço) 309.186 302.758 885.996 872.234Mamona (baga) 146.310 138.382 83.223 49.408Fonte: IBGE. Produção Agrícola Municipal, 2006. (BRASIL, 2007)
Tabela 12 – Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de área colhida, Estado da Bahia, 2006
ÁREA PRODUÇÃO PRINCIPAIS PRODUTOS PLANTADA
(ha) COLHIDA
(ha) QUANTIDADE
(ton) VALOR
(R$ mil) Soja (em grão) 872.600 872.600 1.991.400 712.002Milho (em grão) 798.896 720.898 1.126.295 347.520Feijão (em grão) 738.640 636.939 357.625 311.224Algodão herbáceo (em caroço) 242.066 242.066 810.253 808.198Mamona (baga) 116.278 108.835 68.558 41.117Sorgo Granífero (em grão) 48.105 47.284 70.213 17.755Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2006 (BRASIL, 2007)
81
A Tabela 13 indica a área plantada, área colhida, quantidade produzida e
valor da produção de soja, segundo as grandes regiões e os Estados do Brasil para
2006. Observa-se que a Bahia participa com 3,95% do total da produção nacional
em área plantada. Em relação ao valor da produção total do Brasil, o Norte participa
com 2,5%, o Nordeste com 7%, o Sudeste com 9%, o Sul com 38,4% e o Centro-
Oeste com 44%; merecem destaque, ainda, os Estados do Mato Grosso, com 24%,
e Paraná, com 21%.
Tabela 13 – Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção de soja (em grão), Grandes Regiões e Estados do Brasil, 2006
ÁREA PRODUÇÃO BRASIL, GRANDES REGIÕES E ESTADOS PLANTADA
(ha) COLHIDA
(ha) QUANTIDADE
(ton) VALOR
(R$ mil) BRASIL 22.082.666 22.047.349 52.464.640 18.470.711NORTE 517.943 508.238 1.262.418 465.446 Rondônia 103.110 103.110 273.701 101.817 Acre 20 20 24 12 Amazonas 2.258 2.208 5.138 1.329 Roraima 11.000 11.000 30.800 12.936 Pará 72.335 70.810 209.864 80.325 Tocantins 329.220 321.090 742.891 269.028NORDESTE 1.488.313 1.487.915 3.467.918 1.215.575 Maranhão 383.284 382.886 931.142 304.820 Piauí 232.009 232.009 544.086 197.920 Ceará 300 300 1.026 701 Alagoas 120 120 264 132 Bahia 872.600 872.600 1.991.400 712.002SUDESTE 1.665.966 1.661.713 4.102.075 1.622.905 Minas Gerais 1.009.366 1.005.113 2.453.975 964.585 São Paulo 656.600 656.600 1.648.100 658.320SUL 8.131.849 8.126.984 17.721.001 7.089.975 Paraná 3.931.721 3.931.721 9.362.901 3.861.527 Santa Catarina 331.627 331.537 798.809 334.978 Rio Grande do Sul 3.868.501 3.863.726 7.559.291 2.893.470CENTRO-OESTE 10.278.595 10.262.499 25.911.228 8.076.809 Mato Grosso do Sul 1.907.688 1.903.852 4.153.542 1.462.176 Mato Grosso 5.822.867 5.811.907 15.594.221 4.442.820 Goiás 2.494.060 2.492.760 6.017.719 2.114.002 Distrito Federal 53.980 53.980 145.746 57.812
Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2006 (BRASIL, 2007)
O levantamento de área plantada e da produtividade, além de volume de
produção da soja, para o Brasil, por regiões e Estados, é feito também pela Conab,
do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. A Tabela 14, a seguir,
82
mostra os dados mais recentes de área plantada: nota-se que houve uma queda na
safra 2006/07 para todas as regiões, exceto para o Sul, que apresenta uma
expansão de 1,2%, representado principalmente pelo Estado de Santa Catarina.
Essa queda geral está articulada ao contexto do mercado internacional e à
tendência de queda nos preços das commodities. A Bahia apresentou uma redução
relativamente pequena, de 2,5%.
Tabela 14 – Área plantada de soja no Brasil, por regiões e Estados, 2005/06–2006/07
(em mil hectares) REGIÃO/UF SAFRA 20005/06 SAFRA 2006/07 VARIAÇÃO %
NORTE 517,5 496,5 -4,1 RR 20,0 20,0 – RO 106,4 94,7 -11,0 AM 1,9 1,9 – PA 79,7 79,7 – TO 309,5 300,2 -3,0NORDESTE 1.487,1 1.465,3 -1,5 Ma 382,5 382,5 – PI 232,0 232,0 – BA 872,6 850,8 -2,5CENTRO-OESTE 10.353,6 9.015,4 -12,9 MT 5.891,5 5.007,8 -15,0 MS 1.919,1 1.765,6 -8,0 GO 2.489,0 2.190,3 -12,0 DF 54,0 51,7 -4,3SUDESTE 1.717,5 1.433,4 -16,5 MG 1,060,9 908,1 -14,4 SP 656,6 525,3 -20,0SUL 8.153,6 8.249,6 1,2 PR 3.928,5 3.967,8 1,0 SC 339,5 376,8 11,0 RS 3.885,6 3.905,0 0,5NORTE/NORDESTE 2.004,6 1.961,8 -2,1CENTRO-SUL 20.224,7 18.698,4 -7,5BRASIL 22.229,3 20.660,2 -7,1
Fonte: CONAB. Avaliação da Safra Agrícola 2006/2007 (BRASIL, 2006)
A produtividade da cultura da soja no Brasil também é um importante
indicador a ser analisado, pois se reflete na competitividade do produto. A Tabela 15
indica percentuais de produtividade da soja entre as duas últimas safras produzidas
no Brasil, por regiões e Estados, onde se destaca a situação do Paraná, um antigo
produtor, como o Estado que teve o maior percentual de crescimento de
83
produtividade, provavelmente pela introdução de novos métodos e processos
produtivos mais intensivos, decorrentes de estudos e pesquisas voltados para a
cultura da soja, desenvolvidos ao longo dos anos. Destacam-se, ainda, Piauí e Mato
Grosso do Sul, com incrementos de produtividade significativos, apontando para
novas áreas de expansão. Na Bahia, a produtividade da soja teve um incremento de
5,2%.
Tabela 15 – Produtividade da soja no Brasil, por regiões e Estados, 2005/06–2006/07
(em kg/ha) REGIÃO/UF SAFRA 20005/06 SAFRA 2006/07 VARIAÇÃO %
NORTE 2.480 2.666 7,5 RR 2.800 2.800 – RO 2.660 2.950 10,9 AM 3.000 2.786 -7,1 PA 2.987 2.845 -4,8 TO 2.263 2.520 11,4NORDESTE 2.395 2.528 5,6 Ma 2.680 2.680 – PI 2.347 2.750 17,2 BA 2.282 2.400 5,2CENTRO-OESTE 2.588 2.845 9,9 MT 2.695 2.920 8,3 MS 2.280 2.740 20,2 GO 2.570 2.755 7,2 DF 2.699 2.900 7,4SUDESTE 2.359 2.621 11,1 MG 2.340 2.680 14,5 SP 2.390 2.520 5,4SUL 2.174 2.459 13,1 PR 2.390 2.915 22,0 SC 2.400 2.520 5,0 RS 1.935 1.990 2,8NORTE/NORDESTE 2.416 2.563 6,1CENTRO-SUL 2.402 2.657 10,6BRASIL 2.403 2.648 10,2Fonte: CONAB. Avaliação da Safra Agrícola 2006/2007 (BRASIL, 2006)
Na Tabela 16, podemos analisar a variação percentual da produção de
soja no Brasil, por regiões e Estados, entre as duas últimas safras. Observa-se que
o Estado do Piauí, com uma variação de 17,2%, e o Mato Grosso do Sul, com
10,6%, podem estar representando uma nova fronteira agrícola para a cultura da
soja no país. Em relação à Bahia, temos um baixo crescimento, de apenas 2,5%,
84
podendo indicar uma fase de maturidade da cultura. Destacam-se, ainda, Paraná e
Santa Catarina, com incrementos na produção de 23,2% e 16,5%, respectivamente,
decorrentes do alcance de uma maior produtividade, conforme analisado na Tabela
15, para o caso do Paraná, e de uma maior área plantada, para o caso de Santa
Catarina, na Tabela 16.
Tabela 16 – Produção de soja no Brasil, por regiões e Estados, 2005/06–2006/07 (em mil toneladas)
REGIÃO/UF SAFRA 20005/06 SAFRA 2006/07 VARIAÇÃO %
NORTE 1.283,2 1.323,9 3,2 RR 56,0 56,0 – RO 283,0 279,4 -1,3 AM 5,7 5,3 -7,0 PA 238,1 226,7 -4,8 TO 700,4 756,5 8,0NORDESTE 3.560,9 3.705,0 4,0 Ma 1.025,1 1.025,1 – PI 544,5 638,0 17,2 BA 1.991,3 2.041,9 2,5CENTRO-OESTE 26.795,5 25.644,7 -4,3 MT 15.877,6 14.622,8 -7,9 MS 4.375,5 4.837,7 10,6 GO 6.396,7 6.034,3 -5,7 DF 145,7 149,9 2,9SUDESTE 4.051,8 3.757,5 -7,3 MG 2.482,5 2.433,7 -2,0 SP 1.596,3 1.323,8 -15,6SUL 17.722,5 20.286,6 14,5 PR 9.389,1 11.566,1 23,2 SC 814,8 949,5 16,5 RS 7.518,6 7.771,0 3,4NORTE/NORDESTE 4.844,1 5.028,9 3,8CENTRO-SUL 48.569,8 49.688,8 2,3BRASIL 53.413,9 54.717,7 2,4Fonte: CONAB. Avaliação da Safra Agrícola 2006/2007 (BRASIL, 2006)
Analisando, especificamente, a Bahia em relação ao Nordeste, a
participação da área plantada de soja corresponde a 58,48% para o período
2006/07, representando uma redução, se comparada ao período 2000/01, que era
de 73,45%. Isto poderia apontar para uma fase de maturidade da cultura, após a
fase de expansão, que teve início nos anos 80, quando os produtores iniciam a
85
diversificação da produção. (Tabela 17)14. Observa-se que, tanto em relação ao
Nordeste quanto em relação ao Brasil, esta participação relativa tem caído ao longo
dos anos, o que pode ser explicado pelo aumento de área plantada em outras
regiões do País.
Tabela 17 – Área plantada de soja/Participação Relativa, Estado da Bahia, Região Nordeste e Brasil, 2000/01–2006/07
(em mil hectares) ANO BAHIA NORDESTE BRASIL % BA/NE % BA/BR
2000/2001 690,6 940,2 13.685,2 73,45 5,05
2001/2002 800,0 1.125,1 16.324,4 71,10 4,90
2002/2003 850,4 1.236,9 17.956,3 68,75 4,74
2003/2004 821,5 1.323,3 21.375,8 62,08 3,84
2004/2005 870,0 1.442,1 23.301,1 60,33 3,73
2005/2006* 872,6 1.487,1 22.749,4 58,68 3,84
2006/2007** 850,8 1.454,9 20.639,5 58,48 4,12Fonte: Elaboração própria, a partir de dados da CONAB * Preliminar **Previsão
* Preliminar **Previsão Fonte: Elaboração própria a partir de dados da CONAB. Avaliação da Safra Agrícola 2006/2007. (BRASIL, 2006). Gráfico 2 – Área plantada de soja (em mil hectares), Bahia e Nordeste – 2000/2006
A mesma análise pode ser feita em relação à produção de grãos de
soja.15 A participação da Bahia em relação ao Nordeste teve uma redução de
71,84% no período 2000/01, para 60,52% no período 2006/07. (Tabela 18)
14 Para analisar o período de 1976-2007, ver Tabela 62 do Apêndice B. 15 Para analisar o período de 1976-2007, ver Tabela 61 do Anexo A.
86
Tabela 18 – Produção de grãos de soja/Participação Relativa, Estado da Bahia, Região Nordeste e Brasil, 2000/01–2006/07
(em mil toneladas) ANO BAHIA NORDESTE BRASIL % BA/NE % BA/BR
2000/2001 1.450,3 2.018,8 37.218,3 71,84 3,892001/2002 1.464,0 2.096,0 41.906,9 69,85 3,492002/2003 2.041,0 2.968,6 49.647,3 68,75 4,112003/2004 2.218,1 3.538,9 49.792,7 62,68 4,452004/2005 2.401,2 3.953,1 51.452,0 60,74 4,662005/2006* 1.991,3 3.560,9 55.027,1 55,92 3,622006/2007** 2.297,2 3.795,8 58.039,9 60,52 3,96Fonte: Elaboração própria, a partir de dados da CONAB * Preliminar **Previsão
* Preliminar; ** Previsão Fonte: Elaborada pela autora a partir de dados da CONAB, 2006.
Gráfico 3 – Produção de grãos de soja (em mil ton), Bahia e Nordeste – 2000/2006
Vejamos, agora, a contextualização da cultura da soja, especificamente,
no Oeste da Bahia, objeto de estudo desta pesquisa, inclusive com uma análise
histórica da sua formação enquanto aglomerado.
3.2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO OESTE BAIANO
Os povoados do Oeste da Bahia foram incorporados à dinâmica da
economia colonial durante o século XVIII, quando a descoberta de metais e pedras
preciosas, em Minas Gerais e Goiás, promoveu a criação de uma importante rota
87
comercial interligando as zonas de garimpo e mineração a Salvador. Este fato
favoreceu um movimento populacional e uma estruturação territorial até então não
vista na região, transformando o cenário da época. Assim, os povoados do Oeste
baiano encontraram perspectivas de desenvolvimento comercial devido à sua
localização estratégica.
No início do século XIX, com a crise da economia mineira, a região do
Oeste da Bahia passa a se desenvolver a partir da atividade de navegação fluvial,
no sentido de distribuição das populações e atividades locais, com o incremento das
comerciais. Cidades portuárias como Barreiras, Formosa do Rio Preto e Santa Maria
da Vitória, que até então eram apenas vilas, começaram a se desenvolver,
centralizando o comércio de mercadorias vindas de Salvador para o sertão de Goiás,
e a organizar o transporte dos produtos pecuários aí produzidos até os centros
consumidores, localizados em Barra e Jacobina. (UDERMAN, 1992).
Nessa época, a ocupação econômica dos cerrados estava vinculada
também à criação extensiva de gado bovino, com predominância de atividades de
produção rural, a exemplo do látex da mangabeira, que era utilizado como matéria-
prima para a produção da borracha. Esta atividade se desenvolveu na década de
1880 incorporando áreas até então utilizadas apenas para a exploração de madeira.
No final do século XIX, ao lado da pesca, caça, artesanato, comércio de
peles e das culturas de subsistência dos vales (feijão, milho e mandioca), a
produção de matérias-primas agroindustriais ajudou a definir um novo perfil para a
economia local, que começou a se diversificar através do beneficiamento de
produtos agropecuários. Além disso, a primeira atividade industrial local decorreu da
implantação de uma indústria têxtil, apoiada na produção local de algodão arbóreo.
Entretanto, segundo Uderman (1992), nenhuma dessas atividades
chegou a produzir um surto de desenvolvimento regional, de forma que a ocupação
econômica dos cerrados apresentou um ritmo de expansão vagaroso e a articulação
dos povoados à dinâmica da economia regional se deu de modo específico,
obedecendo a determinações históricas que fazem das atividades agrárias o centro
de acumulação de capital local.
Durante a Segunda Guerra Mundial, a construção de um aeroporto
internacional em Barreiras, financiada pelos Estados Unidos por objetivos
estratégicos do conflito, veio proporcionar a comercialização de látex em maior
escala. Barreiras passa, então, a ser um centro de distribuição do correio para áreas
88
vizinhas. Além disso, a implantação de uma agência do Banco do Brasil estimula
transações econômicas intra e inter-regionais. (UDERMAN, 1992).
A construção de Brasília, concluída em 1960, também veio promover uma
nova forma de integração do Oeste da Bahia à lógica de funcionamento da
economia nacional. A implantação de uma malha rodoviária que visava aproximar
Brasília de área vizinhas, bem como das capitais dos principais estados brasileiros,
atrelou o desenvolvimento do Oeste baiano à ocupação econômica do Brasil
Central.
Inicia-se uma nova fase, de grandes investimentos, em 1966, com a
inauguração da hidrelétrica de Correntina. Em 1969, o governo instala em Barreiras
o 4º Batalhão de Engenharia e Construção (BEC), com diversos projetos, inclusive
de novas estradas, incrementando o mercado de trabalho regional e gerando um
fluxo de renda até então não visto na região.
Em meados dos anos 70, a Companhia de Desenvolvimento do Vale do
São Francisco (CODEVASF), uma autarquia federal, implanta o perímetro de
irrigação Barreiras–São Desidério, contribuindo para o desenvolvimento do mercado
local de produtos e serviços. Esse desenvolvimento se dá de forma mais intensa na
cidade de Barreiras, privilegiada na distribuição de gastos públicos e no traçado da
nova malha viária.
No início da década de 80, a 90 km da cidade de Barreiras, a implantação
de um posto de gasolina, com o nome de Mimoso, dá origem ao distrito de Mimoso
do Oeste que, mais tarde virá a se emancipar com o nome de Luis Eduardo
Magalhães. Até então, a localidade era praticamente desabitada, devido à pouca
valorização das terras, mas, com a instalação do posto, deu-se início à construção
das primeiras casas no seu entorno.Com o desenvolvimento da agricultura moderna,
especialmente do cultivo da soja, em plena expansão na década de 80, de acordo
com Silva & Silva (2003), o proprietário do posto, natural de Goiás, percebeu a
necessidade da criação de uma agrovila próxima à fronteira agrícola, e planejou o
loteamento Rancho Grande, em uma área de 5.450m2, com espaços reservados
para escolas, hospitais, rodoviária, posto telefônico, agência bancária, igreja; tudo o
que uma comunidade necessitasse para viver bem.
A Prefeitura de Barreiras aprovou o loteamento, reservando, ainda, uma
área de 216.380,55m2 para áreas verdes, praças, bosques e jardins, que seria
incorporada ao patrimônio municipal. Em 1986, um decreto municipal alterou o seu
89
nome de “Rancho Grande” para “Mimoso do Oeste”, nome pelo qual já era
conhecido.
De acordo com Silva e Silva (2003), o sucesso da nova fronteira agrícola
fez com que esse povoado, em pouco tempo, adquirisse configuração de cidade,
primeiro, porque já nascera planejado e, segundo, porque as pessoas que para lá
foram, de um modo geral, tinham ido para ficar, um dado de grande importância
porque, como moradores, essas pessoas passaram a reivindicar a implantação e
instalação de equipamentos urbanos capazes de proporcionar o máximo de bem
estar possível na nova localidade onde viviam.
Em 1997, o povoado foi elevado à categoria de distrito; em 1998, o distrito
de Mimoso do Oeste passou a se chamar Luis Eduardo Magalhães; e em 2000,
considerado como um dos mais ricos do Brasil, foi então emancipado, nascendo o
município de Luis Eduardo Magalhães.
Ainda no final dos anos 70, se deu a introdução da sojicultura no Oeste da
Bahia, região de cerrados, definindo um intenso processo de reestruturação da
economia local. A difusão das modernas técnicas de produção de soja ocorreu de
forma muito rápida, surgindo facilidades, até então inexistentes, na organização
econômica regional, decorrente, em grande parte, da eficiência com a qual
entidades cooperativas e empresariais, que se instalaram na região, conduziram o
processo de reestruturação das normas produtivas vigentes. (UDERMAN, 1992).
Atraídos pelo, ainda baixo, preço das terras no Oeste da Bahia e
estimulados pelo sucesso da produção de soja em áreas de cerrado próximas, a
exemplo de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, alguns agricultores da Região Sul
do Brasil começaram a chegar à região ainda carente da infra-estrutura mínima que
viabilizasse a sua permanência em caráter mais definitivo.
Na década de 80, entretanto, dentre os programas governamentais
voltados para o desenvolvimento da agricultura nos cerrados do Brasil, o que mais
teve influência sobre o Estado da Bahia, conforme já foi analisado, foi o
PRODECER. Através desse Programa, a Bahia foi beneficiada com dois projetos no
Oeste, ambos em Formosa do Rio Preto, que privilegiaram a cultura da soja.
De acordo com a Campo os dois projetos desenvolvidos pelo
PRODECER na Bahia, com as principais características de cada um, são os
seguintes:
90
a) Projeto de Colonização Brasil Central
Localização: Formosa do Rio Preto Cooperativa: COOPERATIVA AGRÍCOLA DO CERRADO BRASIL CENTRAL LTDA. (COACERAL).
Características do projeto: Área Total: 15.028 hectares Produtores Assentados: 38 Produção / ano: 24.500 toneladas Valor da Produção: US$ 6.370.000,00 Geração de Impostos: US$ 1.115.000,00 Geração de Empregos: diretos - 2.000 / indiretos - 4.000 Valor do Investimento: US$ 24.000,00 Agente Financeiro: Banco de Desenvolvimento da Bahia (BASENBANCO) Área Irrigada: Potencial para 1.800 hectares.
Infra-estrutura: Silos Graneleiros para 24.200 toneladas, Armazém de Insumos com 3.000 metros quadrados, Unidade Beneficiadora de Sementes com capacidade para 50.000 sacas, Balança Rodoviária, Secadores, Máquinas de Pré-Limpeza, Escritório, Residências.
b) Projeto de Colonização Ouro Verde
Localização: Formosa do Rio Preto Cooperativas: COOPERATIVA AGRÍCOLA DE COTIA (CAC) – COOPERATIVA CENTRAL e COOPERATIVA AGRÍCOLA DO OESTE DA BAHIA LTDA (COPROESTE)
Características do projeto: Área Total: 16.404 hectares Produtores Assentados: 48 Produção / ano: 26.830 toneladas Valor da Produção: US$ 6.700.000,00 Geração de Impostos: US$ 1.170.000,00 Geração de Empregos: diretos - 1.600 / indiretos - 3.200 Valor do Investimento: US$ 26.000.000,00 Agente Financeiro: Banco do Brasil S/A. Área Irrigada: 846 hectares.
Infra-estrutura: Silos Graneleiros para 24.200 toneladas, Armazém de Insumos com 3.000 metros quadrados, Unidade Beneficiadora de Sementes com capacidade para 50.000 sacas, Balança Rodoviária, Secadores, Máquinas de Pré-Limpeza, Escritório, Residências.
Assim, considerando o resultado dessa experiência do PRODECER,
verifica-se um considerável impulso à agricultura tanto brasileira quanto a do Oeste
da Bahia, o que viabilizou, também, um grande desenvolvimento da agroindústria.
Apesar disso, conforme será analisado adiante, existe ainda um grande
descompasso entre as dimensões produtiva, de infra-estrutura e institucional.
91
A importância atual do Oeste baiano na produção nacional de oleaginosas
pode ser visualizada na Tabela 19, que indica área plantada, área colhida,
quantidade produzida e valor da produção de cereais, leguminosas e oleaginosas,
em ordem decrescente de valor da produção, segundo os principais municípios
produtores do Brasil, em 2006, onde foram destacados os municípios pertencentes
ao Oeste do Estado da Bahia, com a respectiva classificação de cada um deles.
Observa-se que cinco municípios da Bahia estão entre os trinta principais municípios
produtores de oleaginosas do Brasil.
Tabela 19 – Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais municípios produtores de cereais, leguminosas e oleaginosas, em ordem decrescente de valor da produção, considerando uma ordem de classificação nacional, Estado da Bahia, 2006
ÁREA PRODUÇÃO
OR
DEM
PRINCIPAIS MUNICÍPIOS PLANTADA
(ha) COLHIDA
(ha) QUANTIDADE
(ton) VALOR
(R$ mil) 01 São Desidério 428.340 427.090 1.038.342 659.26910 Barreiras 220.507 219.832 535.214 302.17920 Luis Eduardo Magalhães 172.320 171.820 420.165 208.15726 Formosa do Rio Preto 138.760 138.560 325.828 169.67630 Correntina 142.343 142.193 360.545 156.046Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2006 (BRASIL, 2007)
Esses mesmos municípios são apresentados a seguir, na Tabela 20, com
os respectivos dados referentes à cultura da soja. Dentre eles, o que mais se
destaca é São Desidério, que ocupa o nono lugar na produção nacional.
Tabela 20 – Área colhida, quantidade produzida e valor da produção dos principais municípios produtores de soja, em ordem decrescente de valor da produção, considerando uma ordem de classificação nacional, Estado da Bahia, 2006
PRODUÇÃO
ORDE
M PRINCIPAIS MUNICÍPIOS
ÁREA COLHIDA
(ha) QUANTIDADE
(ton) VALOR
(R$ mil) 09 São Desidério 270.870 617.583 221.09522 Barreiras 147.400 336.072 120.31427 Luis Eduardo Magalhães 128.470 292.912 104.86239 Correntina 103.043 234.938 84.10841 Formosa do Rio Preto 99.160 226.085 80.938Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2006 (BRASIL, 2007)
É importante destacar que a produção desses municípios corresponde, na
Bahia, à quase totalidade da produção de soja que se dá no Extremo Oeste (Tabela
92
21). Considerando Barreiras, Formosa do Rio Preto, Luis Eduardo Magalhães e São
Desidério como os quatro principais municípios produtores de soja no Oeste da
Bahia, alcança-se uma área de 645.900ha, o que corresponde a 74% da produção
total de soja da Bahia.
Tabela 21 – Área plantada, área colhida, quantidade produzida e valor da produção de soja, segundo as Mesorregiões, Microrregiões e os Municípios produtores do Estado da Bahia, 2006
ÁREA PRODUÇÃO MESORREGIÕES, MICRORREGIÕES E MUNICÍPIOS
PLANTADA (ha)
COLHIDA (ha)
QUANTIDADE (ton)
VALOR (R$ mil)
BAHIA 872.600 872.600 1.991.400 712.002EXTREMO OESTE BAIANO 870.000 870.000 1.983.600 709.389 Barreiras 725.000 725.000 1.653.000 591.774 Baianópolis 10.200 10.200 23.256 8.326 Barreiras 147.400 147.400 336.072 120.314 Formosa do Rio Preto 99.160 99.160 226.085 80.938 Luis Eduardo Magalhães 128.470 128.470 292.912 104.862 Riachão das Neves 68.900 68.900 157.092 56.239 São Desidério 270.870 270.870 617.583 221.095 Cotegipe 400 400 912 326 Cristópolis 400 400 912 326 Santa Maria da Vitória 144.600 144.600 329.688 117.289 Cocos 1.000 1.000 2.280 816 Correntina 103.043 103.043 234.938 84.108 Jaborandi 40.557 40.557 92.470 32.365VALE SÃO-FRANCISCANO BAHIA 2.600 2.600 7.800 2.613
Bom Jesus da Lapa 2.600 2.600 7.800 2.613 Serra do Ramalho 2.600 2.600 7.800 2.613Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal, 2006 (BRASIL, 2007)
A Figura 4, a seguir, ilustra a distribuição espacial das regiões produtoras
de soja no Oeste da Bahia, destacados os principais municípios produtores.
Fonte: Rede Baiana de Biocombustíveis
Figura 4 – Municípios produtores de soja no Oeste da Bahia
93
Os dados mostram que as áreas plantada e colhida desses municípios
têm apresentado uma tendência crescente dos anos 90 em diante, após a
consolidação ocorrida nos anos 80, embora Barreiras tenha apresentado uma queda
a partir de 2000, até então não recuperada (Gráfico 4).16 Merece destaque o
crescimento da área de São Desidério, com uma média muito acima da regional.
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE. Produção Agrícola Municipal. (BRASIL, 2007)
Gráfico 4 – Área plantada e colhida de soja nos principais municípios produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 1990-2006 (em ha)
Refletindo o gráfico anterior, no Gráfico 5, observamos, para esses
mesmos municípios, os dados referentes à quantidade produzida que podem estar
sinalizando a inflexão de um ciclo de expansão entre 2005 e 2006, quando todos os
municípios apresentam redução da quantidade produzida17, o que pode também
estar articulado com a queda dos preços internacionais.
Gráfico 5 – Quantidade produzida de soja nos principais municípios produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 1990-2006 (em ton.) Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IBGE. Produção Agrícola Municipal. (BRASIL, 2007)
16 Para uma análise mais detalhada destes dados, incluindo também área plantada e colhida da
Bahia, Nordeste e Brasil, para este mesmo período, consultar as Tabelas 68 e 69 (Anexo A). 17 Para verificar a quantidade produzida de soja no Brasil, no Nordeste e na Bahia, para esse mesmo
período, consultar a Tabela 70 no mesmo anexo.
94
É importante destacar que, em relação à quantidade produzida de soja,
em 1990, o Nordeste participava com 1,13% da produção do Brasil, e a Bahia, com
97,74% da produção do Nordeste. Entretanto, em 2006, o Nordeste aumentou a sua
participação relativa para 6,61%, em relação ao Brasil, mas o percentual da Bahia
em relação ao Nordeste reduziu para 57,42.18 Este fato é explicado pelos dados da
última safra, conforme demonstrado na Tabela 16, na qual se pode verificar que o
Piauí apresentou um crescimento de 17,2% em relação ao ano anterior, o que pode
estar significando o surgimento de uma nova fronteira agrícola, enquanto a Bahia
cresceu, apenas, 5,2%, levando, portanto, a uma diminuição relativa de sua
participação em relação ao Nordeste.
A seguir é apresentada a estrutura do complexo de soja, para que se
possa compreender como se dá a articulação entre os atores da cadeia, definindo o
tipo de transação que se caracteriza entre eles. Esta análise dá suporte, também, ao
estudo do tipo de governança que se apresenta em cada caso. Mais adiante, essa
estrutura é aplicada ao caso da agroindústria da soja no Oeste da Bahia, objeto de
estudo desta pesquisa.
3.3 ATORES, ARTICULAÇÕES NA CADEIA E COMPETITIVIDADE
Tomando como base o complexo agroindustrial brasileiro da soja,
pretende-se aqui abordar algumas questões genéricas inerentes a esse complexo,
para, mais adiante, tecer um comparativo com o estudo de caso, no Oeste da Bahia.
Assim, a seguir, é feito um mapeamento das transações da agroindústria da soja;
em seguida, uma análise do ambiente competitivo desse complexo; e, finalmente,
são desenhadas as estratégias competitivas identificadas.
3.3.1 MAPEAMENTO DAS TRANSAÇÕES
Analiticamente, o sistema agroindustrial da soja é aqui estudado a partir
dos atores e articulações que se desenvolvem ao longo da cadeia. Esta análise
toma como base o estudo “Competitividade do sistema agroindustrial da soja” de
Lazzarini & Nunes (1998), que mapeou a referida cadeia produtiva e os seus atores,
18 Ver Tabela 70 (Apêndice B).
95
em abrangência nacional, e que é aplicado, mais adiante, para o Oeste da Bahia,
onde foram encontrados esses mesmos atores e articulações.
Na Figura 5, a seguir, cada segmento é representado por “caixas” e
interligado por transações sucessivas (T1, T2, T3...). Desta forma, analisemos a
representação esquemática do complexo agroindustrial da soja a partir dos seus
principais atores:
Figura 5 – Delimitação do sistema agroindustrial (SAG) da soja no Brasil Fonte: Lazzarini & Nunes (1998)
a) Indústria de insumos agrícolas
Representa a indústria de fertilizantes, defensivos, sementes, máquinas, e
similares e se relaciona diretamente com a produção agrícola. (Transação T1).
Com mais de 4.000 funcionários, 250 agrônomos e 60 mil clientes, a
principal empresa representativa dessa indústria no Brasil é a Bunge Fertilizantes,
que atua em todas as etapas da produção. Suas operações começam na mineração
de rocha fosfática e calcário, passam pelo processamento químico e vão até a
entrega do produto final: fertilizantes, calcário para correção do solo e componentes
para nutrição animal.
As suas jazidas estão localizadas em Cajati, São Paulo, e em Araxá,
Minas Gerais, extraindo por ano 1,4 milhão de toneladas de rocha fosfática. As 38
unidades industriais da Bunge Fertilizantes estão estrategicamente localizadas para
96
melhor atender às demandas crescentes de fertilizantes, seja nos grandes centros
produtores ou nas plantações que formam as novas fronteiras agrícolas.
b) Produção Representa o segmento agrícola propriamente dito, transacionando “para
trás” com a indústria de insumos (T1) e “para frente” com indústrias esmagadoras
(T2), tradings (T3), cooperativas (T4) e outros intermediários – corretores,
armazenadores, etc. – (T5).
c) Originadores Esse neologismo designa a função de algumas empresas de
coordenação do suprimento de matéria-prima. Refere-se a tradings, cooperativas,
corretoras e armazenadores que atuam em contato direto com os produtores, no
processo de aquisição, armazenagem e distribuição de produtos. Na maioria dos
casos o estágio de “originação” encontra-se verticalmente integrado ao de
esmagamento (T8).
Tradings assumem função especial porque coordenam a transferência
física de produtos no mercado nacional e internacional, transacionando com
produtores/cooperativas, de forma a adquirir matéria-prima (T3) e efetuar vendas
para o mercado externo (T9), podendo atuar também como prestadoras de serviço
para indústrias esmagadoras (T7) e cooperativas (T6), nas suas vendas
internacionais (T9), embora muitas dessas organizações apresentem departamentos
internos de trading.
Já as corretoras e os armazenadores atuam mais fortemente como
prestadores de serviços a indústrias esmagadoras e, até mesmo, tradings, na
formação de lotes de matéria-prima para venda oriunda do segmento produtivo (T5).
d) Indústria esmagadora, refinadoras e produtores de derivados de óleo
Com uma tonelada de soja se produz, aproximadamente, 0,78 ton. de
farelo e 0,19 ton. de óleo. Parte do farelo é exportado pelas indústrias, seja por meio
de tradings (T7), seja diretamente, por meio de seus departamentos comerciais
97
internos – a transação T11 representa a possibilidade de importação de soja em
grãos em regime de draw back19. O farelo remanescente é vendido, no mercado
interno, para a indústria de rações (T12), muitas vezes integrada verticalmente à
indústria de carnes e, mesmo, em alguns casos, à indústria processadora de soja.
No caso do óleo, o seu processamento, a partir da soja, segue
basicamente as seguintes etapas: esmagamento, degomagem e refino (envolvendo
os estágios de neutralização, branqueamento e desodorização), sendo que o óleo
parcialmente refinado pode ser transformado por meio de hidrogenação em produtos
mais elaborados, como margarinas, maionese e gorduras vegetais (Figura 6). A
Figura 7 indica as principais utilizações do óleo de soja.
Tais produtos, incluindo o óleo de soja refinado, são mais fortemente
direcionados ao mercado interno, por meio de distribuidores atacadistas e varejistas
(T17). Algumas indústrias apresentam todos estes estágios na sua planta industrial,
e, portanto, neste caso, a transação com o segmento de derivados de óleo (T10) se
dá internamente (integração vertical).
Figura 6 – Etapas do processo de produção na indústria de esmagamento e derivados de óleo de soja Fonte: Lazzarini & Nunes (1998)
19 Diretamente do mercado externo para as esmagadoras.
98
Figura 7 – Principais utilizações do óleo de soja Fonte: Câmara (2006)
Produtos processados podem também ser direcionados a outras
indústrias (T15), como, por exemplo: óleo e gorduras, para as indústrias de
alimentos em geral e para a indústria química e farmacêutica; lecitina de soja (obtida
a partir de fosfolipideos do óleo), para a indústria de alimentos – chocolates,
margarinas, biscoitos, suplementos dietéticos, etc. – sendo também direcionada para
outras indústrias, como a química e farmacêutica; e óleo, para fins energéticos (o
chamado “biodiesel”), e assim por diante.
A Bunge Alimentos20, uma das mais importantes empresas do setor, atua
desde a aquisição do grão até a produção de alimentos para o consumidor final.
Presente no Brasil desde 1905, é a mais importante empresa na industrialização de
soja e trigo, líder na comercialização de grãos como soja, trigo, milho, sorgo, girassol
e semente de algodão e, também, na exportação brasileira, no agronegócio.
Presente em dezesseis Estados brasileiros, com unidades industriais, de
armazenamento, moinhos, centros de distribuição, escritórios e terminais portuários,
sua sede fica em Gaspar, Santa Catarina. Apresenta um faturamento anual em torno 20 É a maior processadora de trigo da América Latina, comprando e beneficiando cerca de dois
milhões de toneladas do grão por ano.
99
de R$ 12 bilhões e emprega diretamente, aproximadamente, 7.000 pessoas. A
Bunge Alimentos compra de mais de trinta mil produtores rurais um volume em torno
de 15 milhões de toneladas de soja, além de trigo, milho e caroço de algodão, e se
relaciona regularmente com clientes em quase trinta países.
A cadeia da soja produz farelo, óleo degomado, óleo refinado especial
para as indústrias e para o consumidor final, margarinas, maioneses e vários tipos
de formulação de gorduras vegetais para as indústrias de alimentação. A empresa é
líder no mercado nacional de óleos vegetais, margarinas, gorduras vegetais, farinhas
industriais e pré-misturas para panificação.
Os principais produtos da Bunge Alimentos são, tendo em vista a sua
clientela:
Consumidor final – Óleos vegetais refinados: Soya (soja), Primor (soja) e
Salada (soja, canola, girassol, milho, caroço de algodão); Azeite de oliva:
Salada (puro e extra-virgem); Margarinas: Delícia, Primor, Mila e Soya;
Maioneses: Delicia, Primor e Soya
Panificação e Food Service – Pré-mistura: Bunge Pró (pré-mescla) e
Bentamix; Margarinas: Bunge Pró (Suprema, Cukin e Rica); Margarinas
Soya e Primor; Maioneses: Soya e Primor; Farinhas de trigo: Bunge Pró
(massas, biscoitos e panificação); Farinha de soja: Prosan; Proteína
texturizada: Soya Maxten
Especialidades – Óleo bruto de soja; Óleo degomado de soja; Lecitinas
Tocoferol; Ácidos graxos; Gorduras vegetais; Gérmen de trigo; Línter
(celulose e fibras de caroço de algodão)
Ingredientes de nutrição animal – Farelo de soja (incluindo o de alto
teor de proteína); Farinha de soja; Casquinha de soja; Casquinha de
algodão; Farelo de algodão; Óleo de caroço de algodão; Farelo de trigo;
Farelo remoído de trigo; Milho em grão; Sorgo em grão
Rações animais – Vitosan; Sano
A Cargill é outra empresa esmagadora presente no Brasil desde 1965. A
empresa tem raízes ligadas ao segmento do agronegócio, mas é também uma das
mais importantes indústrias de alimentos do país. A sua matriz fica em São Paulo,
mas possui fábricas e escritórios em mais de 160 cidades, com cerca de 6.500
funcionários. O seu faturamento anual, para 2003, foi de aproximadamente R$ 10,8
bilhões.
100
Atualmente, a Cargill comercializa várias linhas de produtos voltados ao
consumidor final. No Brasil, os produtos são os seguintes:
Óleos Liza: soja, milho, girassol, canola e Liza Nutriplus; Molhos para Salada Liza;
Óleo de Canola Purilev; Molhos para Salada Purilev; Óleo de Milho Mazola; Óleo de
Soja Veleiro; Linha Olívia; Azeites Gallo; Azeites La Espanola; Azeite Quinta dos
Olivais
No que se refere à Unidade de Negócios do Complexo Soja:
[...] a Cargill tem uma estrutura de comercialização de grãos integrada por terminais portuários, unidades processadoras, armazéns e unidades de compra localizadas nos maiores centros produtores. São mais de 120 filiais de compra de soja espalhados pelas regiões do Brasil, através dos quais a empresa adquire os grãos que são processados em suas fábricas ou exportados através de seus terminais. Com o processamento da soja são produzidos óleo bruto, óleo degomado, óleo refinado e farelo de soja.21
As Figuras 8, 9 e 10, a seguir, demonstram, respectivamente, os produtos
derivados do grão, do óleo e do farelo.
Figura 8 – Produtos derivados do grão de soja Fonte: Câmara (2006)
21 Dados disponíveis em: <http://www.cargillsoja.com.br/Quem%20somos/default.aspx>.
101
Figura 9 – Produtos derivados do óleo de soja Fonte: Câmara (2006)
Figura 10 – Produtos derivados do farelo de soja Fonte: Câmara (2006)
102
É importante destacar que, no Brasil, grandes empresas de carnes
apresentam unidades industriais internas que lidam com o processamento de soja a
fim de suprir a fabricação de rações para produtores em troca da entrega futura de
um determinado número de aves ou suínos, por exemplo; isto ocorre com a Sadia,
Perdigão, Ceval, Granja Rezende, etc. (LAZZARINI & NUNES, 1998).
a) Distribuidores Representados pelos segmentos atacadista e varejista, efetuam a ponte
entre a indústria esmagadora e de derivados de soja (T17) e os consumidores finais
(T18), recebendo também, indiretamente, outros produtos de soja por meio da
indústria de rações/carnes (T14) e de outras indústrias em geral (T16).
b) Consumidores finais Envolvem tanto compradores industriais nas vendas externas de tradings
e indústrias processadoras, quanto consumidores finais de derivados de óleo e
carnes, no mercado interno.
3.3.2 ANÁLISE DO AMBIENTE COMPETITIVO
Caracterizando o sistema agroindustrial (SAG) da soja para fins de
análise do ambiente competitivo, em termos gerais, temos, que os produtos dele
derivados podem ser agrupados em quatro tipos conforme Lazzarini & Nunes (1998):
a) Commodities para o mercado externo São os produtos menos diferenciados e comercializados em grandes
volumes no mercado internacional, destacando-se o farelo de soja, a soja em grãos
e o óleo bruto e refinado. Apesar do crescimento das exportações de grãos, o farelo
é a principal commodity a se destacar no comércio internacional, enquanto o óleo é
mais direcionado para o consumo interno, muito embora uma parte significativa seja
exportada, especialmente, na forma de óleo bruto.
103
Os mercados para essas três commodities apresentam particularidades,
porém as regras de competição são basicamente as mesmas, fundamentadas em
aspectos de preços e arbitragem inter e intramercados. O referencial internacional
de preços é a Bolsa de Chicago (Chicago Board of Trade), permitindo a montagem
dos mais diversos tipos de operação envolvendo compra e venda física das
commodities associadas a negociações de contratos derivativos.
Entretanto, apesar da competitividade com base em preços, determinados
padrões qualitativos têm recebido crescente atenção no cenário internacional. Por
exemplo, com base em lotes de soja recebidos no Japão e na Europa, estudos
evidenciaram que os produtos oriundos do Brasil apresentam vantagens qualitativas
relacionadas a um maior teor de óleo e proteína e um menor teor de impurezas,
quando comparados a lotes da Argentina e dos Estados Unidos, conforme dados da
Tabela 24, a seguir. Entretanto, apresentam desvantagens associadas a maiores
teores de umidade e ácidos graxos livres, que são prejudiciais ao processo de refino,
e a grãos avariados.
Tabela 22 – Comparação entre atributos de qualidade de lotes de soja em grãos no mercado internacional, oriundos dos Estados Unidos, Argentina e Brasil ATRIBUTOS (em %) ESTADOS UNIDOS ARGENTINA BRASIL
Teor de Óleo 19,0 18,8 20,2Teor de Proteína 35,3 35,4 35,9Impurezas 2,0 0,8 0,7Ácidos Graxos Livres 0,6 0,8 1,2Umidade 11,4 11,7 11,8Grãos e Avariados 1,4 N/d 3,2Fonte: Lazzarini & Nunes (1998) Obs.: Os dados de Brasil e Argentina indicam valores estatisticamente diferentes dos Estados Unidos a um nível de significância de 1%. Obs.: Os atributos foram mensurados com base em dados de embarque para o Japão e Europa (Oeste), no período de 1988-92, com exceção dos grãos avariados que foram mensurados com base em dados de embarques para o Japão, no período de 1972-92.
Outro aspecto que deve ser levado em consideração, diz respeito à
necessidade de identificação da origem do produto e do padrão tecnológico
envolvido, principalmente no caso de soja com genes modificados, oriunda de
biotecnologia, que não tem sido muito bem aceita em mercados internacionais.
Assim, a identificação da origem do produto e a adequação das suas características
qualitativas mostram-se, cada vez mais, como variáveis chave de competição, até
104
mesmo no mercado de commodities, onde o preço costuma imperar sobre outras
variáveis de concorrência.
No mercado de grãos, a atratividade das vendas externas não se dá
apenas pela política protecionista de países desenvolvidos privilegiando a
importação de matérias-primas vis-à-vis à de produtos processados. Na verdade, a
atratividade das exportações de grãos pode ser explicada, em grande parte, pela
própria ineficiência de muitas processadoras nacionais – capacidade ociosa,
logística desfavorável, etc. – além do alto custo de carregamento de estoques de
soja no Brasil e dos juros elevados, etc. Assim, a adição de valor ao produto por
meio de processamento pode não necessariamente gerar margens adicionais ao
setor. Daí surgem as oportunidades de arbitragem em mercados internacionais.
No caso do farelo, estima-se um aumento da demanda mundial,
principalmente em função do consumo no Leste Asiático onde, pelo estímulo à
produção doméstica de carnes, deverá haver um aumento na demanda de farelo,
por ser um produto da demanda derivada das carnes. Ao mesmo tempo, havendo
uma redução do protecionismo na Comunidade Econômica Européia (CEE) sobre a
produção de carnes, espera-se um crescimento significativo na competitividade da
carne brasileira e, conseqüentemente, do farelo no consumo interno.
Outro fator que deve ser levado em consideração é a pressão competitiva
dentro do mercado de farelos protéicos, pois existem limitações nutricionais ao uso
de farelos alternativos ao da soja, como algodão e amendoim, para aves e suínos,
que respondem por grande parte do consumo de rações em nível mundial. Essa é
uma grande fonte de vantagem comparativa da soja em relação a outras
oleaginosas.
Já o mercado de óleo de soja tem uma competição intensa de produtos
substitutos. O crescimento do mercado de óleos “saudáveis”, com menor teor de
ácidos graxos saturados, como os óleos de canola e girassol, tem acirrado o
ambiente competitivo para o óleo de soja.
Entretanto, a maior pressão competitiva deve vir de óleos produzidos a
um custo mais baixo, como o de palma, que apresenta maior rendimento de óleo,
embora tenha menor rendimento de farelo. Países do Leste Asiático têm investido na
produção de óleo de palma, como Malásia e Indonésia. Assim, no mercado
internacional, o óleo de soja brasileiro encontra-se ameaçado pela pressão de
preços do óleo de palma e pelos atributos qualitativos dos óleos de canola e
girassol.
105
b) Commodities para o mercado interno Destacam-se a soja em grãos, o farelo, direcionado para a indústria de
rações/carnes, e o óleo bruto e refinado, direcionados para posterior
reprocessamento.
A recuperação do poder aquisitivo dos consumidores brasileiros deverá
induzir a um aumento na demanda por bens com participação restrita na cesta de
consumo, como é o caso de carnes. Isto deverá impulsionar a indústria de
rações/carnes, para um aumento na demanda derivada de farelo. Assim, a recente
redução nas exportações de farelo pode não ser atribuída unicamente a uma
possível perda de competitividade do produto no mercado externo mas, também, a
um aumento na demanda interna. Em uma situação como a pós-Plano Real, por
exemplo, com demanda interna aquecida, juros elevados, câmbio desfavorável, etc.,
o mercado doméstico possibilitava maiores margens, em comparação ao mercado
externo, de forma que as exportações de farelo eram realizadas fundamentalmente
para realizar captação de recursos a juros mais baixos por meio de adiantamento de
contrato de câmbio (ACC).
A dinâmica da indústria de rações/carnes está cada vez mais impactante
na competitividade do sistema agroindustrial da soja no Brasil, em relação ao
mercado de farelo. Várias indústrias de carnes apresentam plantas próprias de
processamento de soja, e esse acirramento da competição interna tem induzido a
uma tendência de especialização de empresas em setores distintos.
No caso da commodity óleo, por exemplo, destinada ao mercado interno,
grande parte das empresas esmagadoras busca adicionar valor a este produto por
meio de refino, sendo que pouco mais de 50% da produção de óleo refinado destina-
se ao enlatamento ou transformação de derivados, sendo o restante vendido para
outras indústrias, especialmente alimentícias. (LAZZARINI; NUNES, 1998).
Entretanto, o mercado de óleo de soja, mesmo com marca, é altamente
competitivo e com pouco espaço para diferenciação. O aumento da oferta de óleo
para consumo final por parte das esmagadoras e refinadoras, associado à
característica altamente competitiva deste mercado, pode acabar gerando uma
tendência de redução de preços reais do produto, como aconteceu no período pós-
Plano Real.
106
De acordo com Lazzarini & Nunes (1998), o nível de consumo de óleo no
Brasil, na década de 90, ficou estagnado em torno de 13 kg per capita, muito inferior
ao nível internacional que é de 20 kg. Uma explicação para este fato pode ser,
também, cultural, pois se as pessoas não tivessem o hábito de reutilizar o óleo,
poderia haver um crescimento considerável nesse mercado.
c) Produtos elaborados (de maior valor agregado) para o mercado interno
Refere-se aos produtos mais elaborados oriundos do óleo, geralmente
com maior grau de diferenciação (marca), como margarinas, halvarinas, cremes
vegetais, maioneses, molhos prontos, etc.
Com a perspectiva de aumento da renda da população, deverá haver uma
tendência à aquisição de hábitos de consumo de estratos superiores, em detrimento
de outros produtos menos diferenciados. Nesse sentido, tem-se já observado uma
tendência de aumento do consumo de produtos mais elaborados à base de óleo,
como, por exemplo, margarinas e maioneses.
Tem crescido, também, o mercado para óleos diferenciados, pelo
desenvolvimento de óleo de soja com menor teor de ácidos graxos saturados, além
da oferta de outros tipos de óleos, como canola e girassol, como linha de produtos
complementar das indústrias. A demanda por esses produtos advém de uma maior
sofisticação por parte dos consumidores com respeito a aspectos de saúde e
nutrição.
No mercado de margarinas, distinguem-se três tipos de produtos: as
margarinas propriamente ditas, os cremes vegetais e as halvarinas, que se
diferenciam, basicamente, pelo percentual de gordura que apresentam, girando em
torno de 82%, 63% e 43%, respectivamente, de acordo com Lazzarini & Nunes
(1998).
Assim, produtos com menor teor de gorduras, especialmente as
halvarinas, são tidos como os de maior potencial de mercado. Entretanto, as
inovações, incluindo a adequação de produtos a diferentes gostos de segmentos
específicos, é muito grande, pois, por exemplo, algumas empresas desenvolvem
margarinas para atender à cultura de uma determinada região.
107
As maioneses também representam um mercado em expansão na linha
de produtos mais elaborados e prontos para o consumo. Embora as maioneses
tradicionais sejam dominantes no mercado, produtos light e com condimentos
especiais têm crescido.
Os molhos prontos (salad dressings) apresentam sinergias tecnológicas
com a produção de maioneses e também perspectiva de consumo crescente, porém
este é um mercado muito mais restrito e direcionado a consumidores de renda mais
elevada – grande parte desses molhos prontos é, ainda, importada.
Tanto no caso de maioneses quanto no de molhos prontos, algumas
empresas passam a focar canais de distribuição específicos, destinados a
restaurantes, redes de fast food, hotéis, etc., acondicionando os produtos em
embalagem de consumo único.
d) Outros produtos Refere-se a usos alternativos a partir da soja, com mercado de menor
dimensão e/ou ainda pouco definido, como as lecitinas; os derivados de soja para
uso em indústria alimentícia; derivados de soja para consumo humano final;
derivados para uso em indústria química; e para uso energético (biodiesel). A lecitina é resultante da extração e purificação de fosfolipídios do óleo de
soja. Este produto é utilizado como aditivo para outros alimentos (margarinas,
biscoitos, chocolates, suplementos dietéticos, leite em pó), bem como para ração
animal e outros produtos, como cosméticos e tintas.
O mercado mundial de lecitina se divide em dois: o de lecitina básica e
modificada, que é o maior mercado, porém o menos diferenciado e o mais
competitivo; e o da lecitina fracionada (obtida por meio da separação de frações de
fosfolipídios), um mercado mais diferenciado e de maior valor agregado, mas de
tamanho muito restrito, pois é direcionado para a indústria farmacêutica e cosmética.
Assim, pode-se avaliar o mercado de lecitina como de crescimento potencial.
A indústria de alimentos à base de soja pode ser dividida em vários
segmentos: gorduras vegetais hidrogenadas, usadas como componentes de vários
produtos alimentícios como biscoitos, pães, sorvetes, doces, chocolates, etc.; a
farinha desengordurada, usada como ingrediente para panificação, massas, cereais,
bebidas, etc., sendo também útil para certos processos industriais; as proteínas
isoladas (concentrado e isolado protéico), utilizadas como aditivo, especialmente
108
para embutidos de carne; derivados de soja integral, como a farinha engordurada,
dentre outros.
O mercado de soja para o consumo humano tem crescido em países
desenvolvidos, envolvendo especialmente concentrados protéicos para consumo
final, molhos, leite de soja, bebidas e, até mesmo, grãos de soja. No Brasil, é um
mercado ainda restrito mas com potencial de crescimento.
Na indústria química, óleos e gorduras de soja têm características
químicas similares ao petróleo. Assim, atualmente, vêm sendo desenvolvidos
produtos derivados da soja para a indústria química com o “apelo” de serem de
origem biológica, portanto biodegradáveis e/ou resultantes de recursos naturais
renováveis. É o caso de plásticos, adesivos, solventes, lubrificantes, etc. Também
deve ser citada a peroxidase, obtida a partir da soja, que tem sido utilizada como
substituto orgânico de algumas substâncias em processos na indústria de papel e
celulose.
O biodiesel é resultante de óleos vegetais por meio de um processo
tecnológico relativamente simples chamado transesterificação. Além de ser oriundo
de fonte renovável, o biodiesel reduz sensivelmente problemas de emissão de
poluentes durante a combustão. Entretanto, segundo Lazzarini & Nunes (1998), o
potencial de óleos vegetais como fonte energética é discutível, pelo seu alto custo,
além de que outras oleaginosas, com maior teor de óleo, como a canola e a palma,
devem ser mais eficientes para essa produção.
3.3.3 ESTRATÉGIAS COMPETITIVAS
A indústria de processamento de soja no Brasil pode ser identificada,
segundo Porter (1986), com relação às estratégias competitivas, a partir de duas
linhas, liderança no custo e diferenciação de produtos, ambas definidas a partir do
tipo de mercado no qual a empresa atua, definindo ações específicas para ganhos
de competitividade, de forma que uma empresa pode apresentar os dois tipos de
linhas estratégicas, caracterizando uma situação intermediária, podendo dar um
maior direcionamento para uma das duas. (Quadro 2).
109
LIDERANÇA EM CUSTOS DIFERENCIAÇÃO Características do mercado / produto
Poucos aspectos passíveis de diferenciação
Escolha direcionada por preços Importância de mercados
industriais
Demanda menos elástica Produtos de maior valor adicionado Atributos de qualidade específicos Mercados de consumo final
Produtos Commodities: grãos, farelo, óleo bruto, óleo refinado a granel, etc.
Produtos mais elaborados: margarinas, cremes vegetais, maionese, óleos diferenciados, etc.
Ações estratégicas
Busca de economias de escala Baixa capacidade ociosa Logística eficiente Inovação de processos
Segmentação de mercados Promoção (importância da marca) Inovação de produtos
Quadro 2 – Linhas estratégicas da indústria de processamento de soja Fonte: Lazzarini & Nunes, 1998
Assim, no caso de produtos com poucos aspectos passíveis de
diferenciação (commodities), geralmente direcionados para compradores industriais
e onde a escolha se dá via preços, a linha estratégica preponderante passa a ser a
liderança em custos, determinada por quatro ações:
Escala – os custos médios de esmagamento decrescem à medida que
aumenta o tamanho da planta industrial.
Capacidade ociosa – a sua redução contribui para a queda dos custos
médios, pela menor participação relativa dos custos fixos associados a
uma determinada planta. Essa é uma das principais fontes de ineficiência
da maior parte das indústrias, no Brasil, atualmente, provavelmente
decorrente da política de incentivos para a instalação de fábricas,
principalmente no fim da década de 70 e início da década de 80, com
vantagens tributárias e linhas de crédito subsidiadas. Isto provocou um
excessivo aumento da capacidade instalada em detrimento das
perspectivas de evolução da produção de soja no Brasil. Assim, é um
problema que pode ser caracterizado como de excedente instalado e não
de capacidade ociosa.
Logística – assume papel decisivo na eficiência do processo de aquisição
de matérias-primas e insumos e também no processo de escoamento de
produtos.
Inovação de processos – novos processos que viabilizem a redução dos
custos.
A estratégia da diferenciação volta-se para mercados de demanda menos
elástica, geralmente mais próximos dos consumidores finais, caracterizados por
110
produtos de maior valor adicionado e com atributos específicos de qualidade. Nesse
sentido, desenvolvem-se três ações estratégicas:
Segmentação de mercados – permite ajustar os produtos de acordo com
os gostos e preferências dos consumidores, agrupados por meio de
critérios relacionados ao nível de renda, região, faixa etária, cultura, etc.
Por exemplo, foi desenvolvida uma linha de óleos contendo atributos tidos
pelos consumidores como mais saudáveis, como canola e girassol, em
contraposição ao óleo de soja tradicional, destinado a um mercado mais
amplo.
Promoção – envolve publicidade, merchandising, degustações em pontos
de venda, etc., visando a associação à construção e manutenção de uma
ou mais marcas.
Inovação de produtos – é uma ação constante apoiada na estratégia de
segmentação de mercados, a partir das pesquisas de identificação de
gostos e preferências ainda não supridos pelos concorrentes.
111
4 RESULTADOS: PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS E INTER-RELAÇÕES DA DIMENSÃO PRODUTIVA E INSTITUCIONAL NO CLUSTER DA SOJA NO OESTE DA BAHIA
Os resultados desta pesquisa abordando a dimensão produtiva e
institucional do objeto de estudo são apresentados em cinco partes: a primeira, com
o fim de constatar a existência, ou não, de um cluster, no Oeste da Bahia, em
relação à agroindústria da soja, trata da aplicação de um modelo já apresentado, no
Capítulo 2, para a identificação do aglomerado, aliada à análise da interação de
diversos atores; a segunda demonstra as principais características dos principais
atores do aglomerado, buscando perceber a dinâmica da estrutura produtiva e das
relações organizacionais; a terceira estuda as estruturas de governança do
aglomerado; a quarta analisa as formas de cooperação e esforço de capacitação
para inovar que ocorrem no aglomerado; e a quinta explora alguns indicadores
socioeconômicos da região em estudo na perspectiva de perceber a influência do
crescimento do cluster nos diferentes setores da economia da região.
A partir da Grade Analítica (Figura 3), apresentada no Capítulo 2, e dos
conceitos selecionados, este capítulo discute a contribuição do aglomerado para o
desenvolvimento regional a partir da análise do desenvolvimento institucional,
organizacional e da dinâmica produtiva do objeto de estudo.
A seguir, a partir da aplicação do índice de concentração (IC), para a
região do Oeste da Bahia, visando identificar a existência ou não do aglomerado de
soja, e da análise da interação de diversos atores ligados a esse aglomerado,
realiza-se a identificação do cluster.
112
4.1 IDENTIFICAÇÃO DO CLUSTER: ÍNDICE DE CONCENTRAÇÃO (MEDIDA DE UM AGLOMERADO) E INTERAÇÃO DE ATORES
O conceito de cluster tratado neste trabalho é aquele definido por Porter
(1998), já explicitado no Capítulo 2. Este conceito parte de uma aglomeração de
empresas e instituições inter-relacionadas, em um setor específico, denominada pelo
autor de “concentrações geográficas”. A partir daí, o cluster pode incluir
fornecedores, manufaturas de produtos complementares, empresas com
semelhantes habilidades, tecnologia ou mesmo de insumos, além de órgãos
governamentais, universidades, escolas técnicas e associações de classe que
promovam treinamento, pesquisa e suporte técnico.
Assim, inicialmente, conforme apresentado, também, no Capítulo 2, será
calculado, para o Oeste da Bahia, o índice de concentração desenvolvido por
Crocco et alli (2003), que visa identificar aglomerações locais potenciais. O objetivo
da aplicação desta metodologia é verificar a existência do aglomerado da soja do
Oeste da Bahia. Após esta identificação, serão agregados os demais atores para a
identificação do cluster.
Os dados necessários para a aplicação do modelo referem-se a emprego,
sendo aqui utilizados aqueles registrados pela Relação Anual de Informações
Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho, competência 2005, com base na
Classificação Nacional de Atividade Econômica (CNAE). Para tanto, foram
selecionados os CNAE’s referentes ao agronegócio da soja, conforme especificados
a seguir:
CNAE 01155 – cultivo de soja
CNAE 01198 – cultivo de outros produtos de lavoura temporária
CNAE 15318 – produção de óleos vegetais em bruto
CNAE 15326 – refino de óleos vegetais
CNAE 15857 – preparação de especiarias, molhos, temperos e
condimentos
CNAE 15890 – fabricação de outros produtos alimentícios
CNAE 51110 – representantes comerciais e agentes do comércio de
matérias-primas
CNAE 51217 – comércio atacadista de matérias-primas agrícolas e
produtos semi-acabados
113
CNAE 51322 – comércio atacadista de cereais e leguminosas,
farinhas, amidos e féculas
CNAE 51390 – comércio atacadista de outros produtos alimentícios,
não especializados
De posse dos CNAE’s, foram pesquisados os respectivos números de
emprego registrados na região referente ao agronegócio da soja.
Para a delimitação espacial desta região, foram considerados os quatro
principais municípios produtores de soja do Oeste da Bahia, conforme já foi
explicado, que são Barreiras, Formosa do Rio Preto, Luis Eduardo Magalhães e São
Desidério, e que concentram as duas principais processadoras de beneficiamento do
grão no Oeste da Bahia.
Para o cálculo do índice de concentração (IC), inicialmente são
encontrados o Quociente Locacional (QL), o Índice Hirschman-Herfindahl modificado
(HHm), e o Indicador de Potencialidade (PR), como a seguir:
a) Quociente locacional (QL)
Eij/Ej
QLij = -------------
EiBR / EBR
Onde:
Eij = empregos registrados do Setor i, na Região j
Ej = empregos registrados na Região j
EiBR = empregos registrados do Setor i, no Brasil
EBR = empregos registrados no Brasil
Para encontrar Eij, que representa os empregos registrados do setor
(agroindústria da soja), nos referidos municípios, utilizou-se a base de dados da
RAIS, conforme já dito, a partir dos CNAE’s selecionados anteriormente (Tabela 23).
O cálculo dos empregos registrados na região (Ej) foi feito conforme indica a Tabela
24.
114
Tabela 23 – Número de empregos registrados do setor da agroindústria da soja nos principais municípios produtores de soja, segundo CNAE, Região Oeste do Estado da Bahia, 2005 CNAE
BARREIRAS
FORMOSA DO RIO PRETO
LUIS EDUARDO MAGALHÃES
SÃO DESIDÉRIO
TOTAL
01155 1.003 549 211 798 2.56101198 175 1 44 78 29815318 133 0 0 9 14215326 181 0 0 0 18115857 0 0 0 0 015890 0 0 0 0 051110 19 0 4 0 2351217 20 0 49 23 9251322 12 16 0 0 2851390 28 0 22 0 50TOTAL 1.571 566 330 908 3.375Fonte: Relação Anual de Informações Sociais (RAIS): base de dados: competência 2005.
Tabela 24 – Número de empregos registrados nos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2005
SEGMENTOS BARREIRAS
FORMOSA DO RIO PRETO
LUIS EDUARDO MAGALHÃES
SÃO DESIDÉRIO TOTAL
Indústria 1.425 16 516 158 2.115Construção Civil 467 4 180 86 737Comércio 5.461 63 2.164 176 7.864Serviços 6.041 421 1.731 990 9.183Agropecuária 3.009 1.044 1.421 3.134 8.608Outros 0 0 0 0 0TOTAL 16.403 1.548 6.012 4.544 28.507Fonte: Relação Anual de Informações Sociais (RAIS): base de dados: competência 2005.
Da mesma forma, consultando a base de dados da RAIS, constata-se
que, no Brasil, em 2005, existiam 33.238.617 empregos formais (EBR) e que o
número referente ao setor da agroindústria da soja (EiBR) era de 360.403.
Assim, aplicando a fórmula, temos:
3.375 / 28.507 0,1184 QLij = ------------------------------ = ----------- = 10,96 360.403 / 33.238.617 0,0108
Como o resultado foi QL > 1, significa que existe uma especialização do
setor da agroindústria da soja na região composta pelos quatro principais municípios
produtores no Oeste da Bahia.
115
b) Índice Hirschman-Herfindahl modificado (HHm)
HHmij = (Eij / Ei
BR) – (Ej / EBR)
Onde:
Eij = empregos registrados do Setor i, na Região j
Ej = empregos registrados na Região j
EiBR = empregos registrados do Setor i, no Brasil
EBR = empregos registrados no Brasil
Substituindo os dados na fórmula, temos:
HHmij = (3.375 / 360.403) – (28.507 / 33.238.617) = 0,0094 – 8,5765 = -8,5671
Como HHmij < 0, interpreta-se que, possivelmente, há especialização na
região, indicando que a contribuição do setor para o Brasil é maior que a
contribuição da região para o Brasil.
c) Indicador de Potencialidade (PRij)
PRij = Eij / Ei
BR
Onde:
Eij = empregos registrados do Setor i, na Região j
EiBR = empregos registrados do Setor i, no Brasil
Substituindo, temos:
PRij = 3.375 / 360.403 = 0,0094
Este indicador mostra a contribuição do setor da agroindústria da soja na
região para o setor no Brasil.
Retomando, então, o cálculo do índice de concentração, temos:
IC = θ1QLij + θ2HHmij + θ3PRij
116
Vale salientar que optou-se, neste trabalho por considerar θ1 + θ2 + θ3 =
1/3, conforme feito por Ribeiro & Spínola (2003), atribuindo o mesmo peso aos três
indicadores22, sendo:
θ1 = peso do QLij
θ2 = peso do HHm
θ3 = peso do PRij
Substituindo, temos:
IC = (1/3) x 10,96 + (1/3) x -8,5671 + (1/3) x 0,0094 = 3,6533 – 2,8557 + 0,0031 = 0,8007
Assim, sendo o IC > 0, acima da média nacional, há indícios de
concentração.
Com estes resultados podemos, então, considerar que existe um
aglomerado da soja no Oeste da Bahia. Além disso, com o IC > 0, recomenda-se o
desenvolvimento de políticas públicas para o setor na região, a fim de potencializar o
referido aglomerado quanto à sua competitividade.
Constatada a aglomeração, para que esta seja caracterizada enquanto
um cluster, conforme definido por Porter (1998), comprovando o que foi definido na
Hipótese 1 deste trabalho, torna-se necessário compreender a inter-relação entre os
diversos atores e a dinâmica desse cluster, compreendendo trajetórias econômicas,
sociais, políticas, tecnológicas, etc., nas dimensões econômica e institucional. Nesse
contexto, busca-se analisar também, neste trabalho, a contribuição desse cluster
para a questão do desenvolvimento.
A interação desses atores se dá, de fato, em diversos níveis da cadeia e é
explicitada ao longo deste capítulo, que trata dos resultados da pesquisa. A
articulação da dimensão econômica à institucional nasce dessa interação,
destacando-se como um importante fator de desenvolvimento regional.
Conforme veremos adiante, os principais atores identificados no
aglomerado da soja no Oeste da Bahia, objetos desta pesquisa com a aplicação de
questionários e entrevistas estruturadas, são:
22 A análise multivariada sugerida para o cálculo destes pesos não foi feita por se considerar que não
alteraria significativamente os resultados deste estudo de caso, da mesma forma que admitido por Ribeiro & Spínola (2003).
117
a) Produtores de insumos químicos para agricultura e indústria;
b) Produtores de sementes;
c) Produtores de soja;
d) Indústria esmagadora e de subprodutos;
e) Agentes de inovação tecnológica; e
f) Cooperativas e associações.
É importante destacar que, através das associações de classe,
principalmente a AIBA, conforme será detalhado mais adiante, dá-se o repasse de
treinamento; em parceira com a Fundação Ba. e outros órgãos governamentais,
como a EMBRAPA e a Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola S. A. (EBDA),
dentre outras, desenvolve-se pesquisa; e, ainda, se oferece suporte técnico aos
associados.
Essas questões de treinamento, pesquisa e suporte técnico são inerentes
ao conceito de cluster, proposto neste trabalho, corroborando, portanto, o tipo de
interação aqui analisado como um cluster com associações de classe.
Além disso, existem muitas organizações sociais além da AIBA – outras
associações, cooperativas e sindicatos – que são tratadas no item 4.2.6, e que
interagem diretamente com o aglomerado, articulando o social ao produtivo. Essa
interação se dá em diversas frentes, como orientações técnicas, treinamentos,
negociações patronais com os empresários, coordenação de programas específicos
de melhorias de cultivares, parcerias com o setor público, etc., tendo sempre como
meta a defesa dos interesses dos seus associados. A depender do tipo de
organização, os associados são empresários do setor ou seus trabalhadores, cujos
interesses são antagônicos.
Nesse mesmo sentido, de suporte ao aglomerado, oferecendo
capacitação de nível superior, inclusive, de pós-graduação e, também, interagindo
com o aglomerado, nas mais diversas dimensões, existem universidades e
faculdades presentes na região, tanto públicas quanto privadas. As principais delas,
com os respectivos cursos que oferecem, são:
Universidade Federal da Bahia (UFBa) – Campus Edgar Santos,
Barreiras
Cursos: Engenharia Sanitária e Ambiental; Geografia; Geologia;
Química; Biologia; e Administração
118
Universidade do Estado da Bahia (UNEB) – Campus IX, Barreiras
Cursos: Engenharia; Pedagogia; Ciências Contábeis; Letras; Biologia;
e Matemática
Faculdade São Francisco de Barreiras (FASB), Barreiras
Cursos: Administração; Agronomia; Ciências Contábeis; Comunicação;
Direito; Enfermagem; Educação Física; Fisioterapia; Pedagogia;
Psicologia; e Normal Superior
Faculdade Luis Eduardo Magalhães (FILEM), Luis Eduardo Magalhães
Graduação: Sistemas de Informação; Pedagogia; e Direito
Pós-Graduação: Direito Empresarial; Logística; Direito e Gerência de
Cidades; Sistemas de Produção de Grãos e Fibras; e Ensino de
Ciências e Matemática
Associação Educacional Unyhana, Barreiras
Cursos: Administração; Direito; e Ciências Econômicas
Associação Educacional Unyhana, Luis Eduardo Magalhães
Curso: Administração
Faculdade Arnaldo Horácio Ferreira (FAAHF), Luis Eduardo
Magalhães
Cursos: Administração; Agronomia; Ciências Contábeis; Direito;
Engenharia da Produção; Letras; e Pedagogia
Assim, conforme será comprovado ao longo deste capítulo, a interação
entre esses atores se dá de forma dinâmica com o aglomerado, articulando as
dimensões econômica e institucional e considerando trajetórias tecnológicas,
políticas, sociais, etc. Nesse sentido, podemos considerar, de acordo com o conceito
proposto, que o aglomerado em estudo caracteriza-se como um cluster. Vejamos, a seguir, as informações levantadas acerca das principais
características dos atores do cluster da soja identificados no Oeste da Bahia.
4.2 CARACTERÍSTICAS E DINÂMICA DOS PRINCIPAIS ATORES
Aqui são apresentadas as características dos principais atores estudados
no cluster da soja no Oeste da Bahia, analisando-se cada um deles a partir dos
dados primários levantados em pesquisa de campo, através da aplicação de
questionários e de entrevistas. Esses atores, identificados na região em estudo, são:
produtores de insumos químicos para agricultura e indústria;
119
produtores de sementes;
produtores de soja;
indústria esmagadora e de subprodutos;
agentes de inovação tecnológica; e
cooperativas e associações.
4.2.1 PRODUTORES DE INSUMOS QUÍMICOS PARA AGRICULTURA E
INDÚSTRIA
A região possui as duas maiores indústrias de fertilizantes do país, que
compõem a cadeia produtiva da soja, a Bunge Fertilizantes, localizada na cidade de
Barreiras, e a Galvani Fertilizantes, localizada na cidade de Luís Eduardo
Magalhães, além de outras de menor expressão, caracterizando, assim, uma
estrutura de mercado oligopolista, considerando-se, ainda, a forte presença de uma
grande multinacional do setor, ao que aponta para uma dinâmica capitalista que
privilegia o capital dominante em nível global.
A Bunge, presente no Brasil desde 1905, é uma das principais empresas
de agribusiness e alimentos do país, atuando de forma integrada em toda a cadeia
produtiva. Por meio de suas subsidiárias integrais, a Bunge Fertilizantes e a Bunge
Alimentos, produz fertilizantes e ingredientes para nutrição animal, processa e
comercializa soja, trigo e outros grãos, fornece matéria-prima para a indústria de
alimentos e food-service, além de produzir alimentos para o consumidor final. Assim,
a Bunge atua em fertilizantes, grãos e alimentos.
A Bunge Fertilizantes possui marcas de reconhecida qualidade e
referência no meio rural, como Iap, Serrana e Ouro Verde, reunindo pioneirismo e
inovação. É uma empresa verticalizada na produção e comercialização de
fertilizantes e suplementos minerais para nutrição animal, procurando oferecer as
melhores soluções para os mais de sessenta mil consumidores de suas marcas.
Está envolvida em todas as etapas da produção de fertilizantes, desde a mineração
da matéria-prima, até a criação e venda de produtos no varejo e aplicativos
avançados.
Também comercializa nutrientes para nutrição animal, como fosfato
bicálcico, extraído de uma das minas com fósforo mais puro do mundo, ideal para
esta utilização. Os produtos de nutrição animal são os seguintes: Foscalcio, Enxofre
70 S, MCPD e Carbocalcio. Os produtos fertilizantes são:
120
Iap – Fertiap, Minigran e Superfosfato Simples e outros produtos
tradicionais
Manah – Fosmag, Superfosfato Simples e demais produtos
tradicionais
Ouro Verde – Arad (fosfato natural reativo), Ourofós e Ouropasto e
também a linha tradicional complementar
Serrana – Turbo, Classic, Microgran, Superfosfato Simples, Serrana
Cobertura, Serrana Líquidos e demais produtos tradicionais
No Oeste da Bahia, a Bunge Fertilizantes está localizada na cidade de
Barreiras e conta com 238 funcionários diretos e 60 terceirizados.
Galvani Fertilizantes – A outra indústria da região está localizada na
cidade de Luís Eduardo Magalhães, e emprega 250 funcionários diretos e 150
terceirizados, produzindo quatorze marcas diferentes de fertilizantes.
4.2.2 PRODUTORES DE SEMENTES
Existem vários produtores de sementes na região como por exemplo, a
Sementes Líder que possui uma tecnologia das mais modernas, mantendo-as
climatizadas e desenvolvendo um campo de sementes com os produtores. Além
desta, existem ainda: Sementes Oilema, Dow, Bayer, Morinaga, dentre outras. É
importante, ainda, observar que muitos produtores utilizam semente própria.
Vejamos o caso da empresa Sementes Oilema, fundada em 1999, que
produz sementes de altíssima qualidade, localizada na Fazenda Irmãos Gatto,
Distrito de Placas, BA-825, Km 70, na cidade de Barreiras.
Os sócios da empresa são três irmãos gaúchos, os irmãos Valter, Luiz
Carlos e Clair Gatto, que chegaram em Barreiras, no Oeste da Bahia, em 1981, com
grandes dificuldades. Hoje controlam 12,5 mil hectares do chamado anel da soja,
uma das regiões mais produtivas do pais, tendo cinco mil hectares cobertos de soja
e milho e 500 hectares de pés de algodão, a fábrica de sementes Oilema e uma
usina de beneficiamento de algodão.
Em entrevista, um dos sócios da Sementes Oilema afirma comercializar
80% da sua produção na própria região e os restantes 20% nos Estados do Piauí,
Maranhão e Mato Grosso.
121
A empresa produz sementes em parceria com a Monsoy, além de ter uma
parceria informal com a Fundação Ba. A EBDA realiza um experimento próximo a
Barreiras, mas é pouco importante para o cultivo da soja.
O tipo de semente é que vai determinar a variedade da soja. Existe a
semente precoce ou de ciclo curto (120 dias) e a tardia ou de ciclo longo (140 dias).
Muitos agricultores utilizam, ainda, a semente salva, que é aquela remanescente da
última safra, nem sempre a mais apropriada para uma cultura de qualidade.
4.2.3 PRODUTORES DE SOJA
De acordo com a pesquisa de campo realizada através da aplicação dos
questionários, obteve-se a informação de que 52% dos produtores de soja da região
se instalaram no período de 1980 a 1990, que coincide com o período de
implantação do PRODECER (v. Capítulo 3).
Os benefícios concedidos por programas de incentivo para os produtores
no sentido de promover o desenvolvimento agrícola dessa região de cerrados, já
estava indicado no trabalho de Uderman (1992). Além disso, conforme foi analisado,
crédito e financiamento são variáveis ligadas ao conceito de incentivos que,
articulados aos contratos e direitos de propriedade, podem definir a base do
desenvolvimento econômico da região, de forma que a análise da sua formação
histórica contextualiza essa característica. (NORTH, 1998).
Algumas características da amostra estão apresentadas na Tabela 25 que
indica o número de questionários aplicados e o respectivo percentual em relação ao
total, por área total da propriedade e por área plantada em soja. Observa-se que a
grande maioria da pesquisa foi realizada com proprietários de áreas de até 1.999 ha.
Tabela 25 – Número de questionários aplicados por área total da propriedade e por área plantada em soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 200423
QUESTIONÁRIOS APLICADOS ÁREA FÍSICA (em ha) POR ÁREA TOTAL DA PROPRIEDADE POR ÁREA PLANTADA EM SOJA Nº % Nº % <499 14 14,3 25 25,5De 500 a 1999 46 46,9 51 52,0De 2000 a 4999 23 23,5 19 19,4> 5000 15 15,3 3 3,1Total 98 100,0 98 100,0
23 Todas as tabelas cuja fonte foram elaboradas com base nos dados da pesquisa de campo.
122
De acordo com a pesquisa, a grande maioria dos produtores, em torno de
60%, tem de 1 a 10 trabalhadores dos quais, aproximadamente, 80% recebem
salários que variam de um salário mínimo a R$ 999,00. Em relação aos funcionários
fixos, observou-se que 95,9% têm nível escolar apenas de ensino fundamental.
Quanto ao grau de verticalização da matéria-prima pela análise da Tabela
26 verifica-se que, para a matéria-prima sementes, acima de 50% da produção é
integrada por aproximadamente 50% dos produtores; e para fertilizantes e
defensivos, até 10% é integrada por 97% dos produtores. Isto significa que
fertilizantes e defensivos são contratados para acima de 50% da produção, mas no
caso de sementes, metade dos produtores produz 50% e contratam os outros 50%.
Esta alta integração vertical se explica, no caso das sementes, por uma questão de
logística e de custos de produção, visando obter vantagens competitivas em relação
ao mercado, conforme a análise dos custos de transação. (WILLIAMSON, 1985).
Tabela 26 – Grau de verticalização de matéria-prima dos produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
SEMENTES FERTILIZANTES DEFENSIVOS INTEGRADA SUBCONTRATADA INTEGRADA SUBCONTRATADA INTEGRADA SUBCONTRATADA
PRODUÇÃO (em %)
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % <10 45 45,9 26 26,5 95 96,9 1 1,0 95 96,9 1 1,0De 11 a 50 3 3,0 15 15,3 1 1,0 0 0,0 1 1,0 0 0,0> 50 49 50,0 56 57,2 1 1,0 96 98,0 1 1,0 96 98,0Não sabem 1 1,0 1 1,0 1 1,0 1 1,0 1 1,0 1 1,0Total 98 100,0 98 100,0 98 100,0 98 100,0 98 100,0 98 100,0
Tabela 27 – Grau de verticalização do processo produtivo da soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
SEMENTES FERTILIZANTES DEFENSIVOS INTEGRADA SUBCONTRATADA INTEGRADA SUBCONTRATADA INTEGRADA SUBCONTRATADA
PRODUÇÃO (em %)
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % < 10 1 1,0 94 95,9 0 0,0 94 94,5 9 9,2 87 88,8De 11 a 50 1 1,0 0 0,0 1 1,0 0 0,0 0 0,0 1 1,0> 50 95 96,9 3 3,0 96 97,9 3 3,0 88 89,8 9 9,2Não sabem 1 1,0 1 1,0 1 1,0 1 1,0 1 1,0 1 1,0Total 98 100,0 98 100,0 98 100,0 98 100,0 98 100,0 98 10,00
A Tabela 27 traz o grau de verticalização do processo produtivo e mostra
que, em relação: ao preparo do solo, 96,9% dos produtores integram acima de 50%
da produção; ao plantio, 97,9% dos produtores, acima de 50% da produção; e à
colheita, 89,8% dos produtores, acima de 50% da produção. Isto quer dizer que,
123
para a grande maioria da produção, as três etapas do processo produtivo são
integradas pelos produtores. Logo, podemos dizer que existe uma tendência à
verticalização em, praticamente, todo o processo produtivo na região, evitando
custos de transação no mercado e obtendo vantagens competitivas. (WILLIAMSON,
1985).
Em relação ao tipo de contrato para o principal subcontratado,
aproximadamente 84% dos produtores formalizam o contrato de forma escrita,
reduzindo as incertezas e, conseqüentemente, os custos de transação, e 96% deles
assinam esses contratos sem exclusividade, já que a especificidade do ativo é baixa
entre produtores e subcontratados. (WILLIAMSON, 1985).
Outro dado importante é que a capacitação tecnológica do principal
subcontratado é superior à do produtor em 97% dos casos, caracterizando um
significativo controle do contratado sobre o produtor. Entretanto, esta relação se
justifica, em termos tecnológicos, na região, visto que a contratação se traduz em um
esforço de cooperação e de capacitação para inovar, caracterizando um processo
de subcontratação e de não verticalização, no que se refere à questão tecnológica.
Em relação à origem dos principais equipamentos utilizados no processo
produtivo na região, podemos analisar a Tabela 28, onde se pode verificar que a
grande maioria dos produtores, em média 90%, adquirem mais da metade de
tratores, colheitadeiras e implementos agrícolas localmente, sendo baixas (menos de
10%) as aquisições desses equipamentos fora da região, ou seja, nacionalmente.
Este dado demonstra que, na articulação da cadeia produtiva da região, a oferta de
equipamentos utilizados no processo produtivo atende quase que integralmente às
necessidades dos produtores, não havendo uma integração inter-regional que se
justifique para a aquisição de equipamentos.
Tabela 28 – Origem dos principais equipamentos utilizados no processo produtivo da soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
TRATORES COLHEITADEIRAS IMPLEMENTOS AGRÍCOLAS LOCAL NACIONAL LOCAL NACIONAL LOCAL NACIONAL
ORIGEM (em %)
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % <10 8 8,1 85 86,7 9 9,2 82 83,7 3 3,1 87 88,8De 11a 50 0 0,0 1 1,0 1 1,0 1 0,0 0 0,0 2 2,0> 50 89 90,8 11 11,3 85 86,7 12 12,2 93 94,89 7 7,2Não sabem 1 1,0 1 1,0 3 3,1 3 3,1 2 2,0 2 2,0Total 98 100,0 98 100,0 98 100,0 98 100,0 98 100,0 98 100,0
124
A Tabela 29 indica que a grande maioria dos equipamentos utilizados no
processo produtivo foram adquiridos a partir de 2000, provavelmente em busca de
uma modernização e/ou aumento de produtividade para o segmento, coincidindo
com a fase de consolidação do Complexo, bem como da maior capitalização dos
produtores em função dos financiamentos concedidos para a cultura da soja na
região, conforme será tratado mais adiante.
Tabela 29 – Ano de aquisição dos principais equipamentos utilizados no processo produtivo da soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
TRATORES
COLHEITADEIRAS
IMPLEMENTOS AGRÍCOLAS
ANO DE AQUISIÇÃO
Nº % Nº % Nº % De 1980 a 1989 5 5,10 3 3,06 2 2,04De 1990 a 1999 10 10,20 9 9,18 4 4,08De 2000 a 2004 65 66,33 67 68,36 74 75,51Não sabem 18 18,36 19 19,40 18 18,36Total 98 100,00 98 100,00 98 100,00
Com relação às condições de oferta de infra-estrutura física e de serviços
públicos, apontadas pelos produtores, os dados indicam uma insuficiência de
energia elétrica (70,4%), de estradas (89,8%) e de telecomunicações (71,4%)
(Tabela 30). Esse problema já era apontado, embora de forma menos contundente,
por Uderman (1992), e até o período desta pesquisa não tinham sido realizados os
investimentos públicos necessários para resolver esses gargalos na região, de forma
a potencializar a sua dinâmica, dando suporte à produção e ao seu escoamento.
Tabela 30 – Condições de oferta de infra-estrutura física e serviços públicos segundo os produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
ÁREA P/ INSTALAÇÃO DE EMPR. INDUSTRIAIS ENERGIA ELÉTRICA
ESTRADAS TELECOMUNICAÇÕES
CONDIÇÕES DE OFERTA
Nº % Nº % Nº % Nº % Insuficiente 5 5,1 69 70,4 88 89,8 70 71,4Satisfatória 65 65,3 28 28,6 10 10,2 27 27,6Excepcional 29 29,6 1 1 0 0 1 1Total 98 100 98 100 98 100 98 100
Quanto aos canais de comercialização, a Tabela 31 sintetiza as respostas
dos produtores. Foi destacado como muito importante (50%) e importante (32,7%), a
comercialização sob encomenda. Isto se explica porque a soja é uma commodity,
um ativo de baixa especificidade (WILLIAMSON, 1985), além de que, na região, as
125
processadoras negociam com os produtores as safras, por antecipação, muitas
vezes financiando a produção, conforme será analisado mais adiante. Neste caso,
caracteriza-se uma estrutura de governança hierárquica, representando a
verticalização da transação no processo produtivo, como forma de controle das
processadoras sobre a dinâmica da cadeia, conforme definido por Williamson
(1985).
Tabela 31 – Principais canais de comercialização adotados pelos produtores, por níveis de importância, segundo os produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
SOB ENCOMENDA GRANDES VAREJISTAS ESCRITÓRIOS DE EXPORTAÇÃO NÍVEL DE IMPORTÂNCIA Nº % Nº % Nº %
Sem importância 8 8,2 64 65,3 69 70,4Pouco importante 9 9,2 5 5,1 10 10,2Importante 32 32,7 17 17,3 14 14,3Muito importante 49 50 12 12,2 5 5,1Total 98 100 98 100 98 100Fonte: Elaborada a partir da pesquisa de campo
Questionados sobre as políticas governamentais que poderiam contribuir
para o aumento da competitividade, os produtores de soja da região consideraram
importantes e muito importantes (Tabela 32): os programas de capacitação
profissional e treinamento técnico (90,8%); melhorias na educação formal (89,8%);
linhas especiais de crédito (96,9%); incentivos fiscais (94,9%); melhoria da infra-
estrutura de conhecimento (89,8%); e melhoria na infra-estrutura física (91,8%).
Esses altos percentuais indicam uma grande carência na região de políticas
governamentais específicas, que alavanquem a estrutura potencialmente instalada,
viabilizando um maior processo de crescimento e desenvolvimento econômico.
Tabela 32 – Políticas governamentais que poderiam contribuir para o aumento da competitividade dos produtores, por níveis de importância, segundo os produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
PROGRAMAS DE CAPACITAÇÃO
PROFISSIONAL E TREINAMENTO
TÉCNICO
MELHORIAS NA EDUCAÇÃO
FORMAL (1º, 2º E 3º GRAU)
LINHAS ESPECIAIS DE CRÉDITO (P&D, IMPORTAÇÃO/ EXPORTAÇÃO)
INCENTIVOS FISCAIS (P&D,
IMPORTAÇÃO/ EXPORTAÇÃO)
MELHORIA DA INFRA-
ESTRUTURA DE CONHECIMENTO
MELHORIA DA INFRA-
ESTRUTURA FÍSICA
NÍVEL DE IMPORTÂNCIA
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Sem importância 1 1 1 1 0 0 1 1 0 0 1 1 Pouco importante 8 8,2 9 9,2 3 3,1 4 4,1 10 10,2 7 7,1 Importante 48 49 57 58,2 29 29,6 29 29,6 55 56,1 12 12,2 Muito importante 41 41,8 31 31,6 66 67,3 64 65,3 33 33,7 78 79,6 Total 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100
126
4.2.4 INDÚSTRIA ESMAGADORA E DE SUBPRODUTOS
Na Região Oeste da Bahia, existem duas grandes representantes da
indústria esmagadora e de subprodutos da agroindústria da soja: a Bunge
Alimentos, na cidade de Luís Eduardo Magalhães, e a Cargill, na cidade de
Barreiras. Além dessas duas, existem outras de menor porte, como a Mauricéia
Alimentos, localizada em Luís Eduardo Magalhães.
Esta situação caracteriza uma estrutura de mercado oligopolista, onde
poucas empresas dominam o mercado, ditando regras. Some-se a isso o fato de que
ambas representam grandes multinacionais, atendendo aos interesses de grandes
capitais. De fato, o estudo constatou que as processadoras encomendam, por
antecipação, as safras aos produtores, na maioria das vezes financiando a produção
e ditando o preço a ser negociado, caracterizando uma estrutura de governança
hierárquica (WILLIAMSON, 1985) e representando a verticalização da transação no
processo produtivo.
Na Bunge Alimentos de Luís Eduardo Magalhães, instalada em 1991, o
gerente industrial de crushing foi entrevistado. Ele é responsável pelo recebimento e
esmagamento da soja e faz parte de um comitê formado na empresa, que se reúne
periodicamente para a tomada das principais decisões. Além dele, formam o comitê:
o gerente de refino, responsável pelo óleo; o gerente de originação, responsável
pela compra da soja; e o gerente administrativo, responsável pelo apoio.
A soja é adquirida totalmente na região. Logo na entrada da unidade
industrial, existe um laboratório terceirizado da Suíça, que faz testes com uma
amostra de cada caminhão de soja que chega ao local. Se for identificada a soja
geneticamente modificada (transgênica), o caminhão não entra na fábrica.
Esse laboratório também faz a classificação da soja, analisando a variável
impureza nos seguintes níveis: aceitável, 1%; avariada, 8%; e umidade, 14%. Acima
desses percentuais, a soja é comprada com desconto.
A compra de soja é feita via contratos formais, sendo que a maior parte
dessa produção é financiada pela própria empresa, de modo que os produtores
recebem dinheiro e adubo antes da venda e antes da produção, definindo uma
estrutura de governança hierárquica na região (WILLIAMSON, 1985). Os contratos
de exportação são feitos pela matriz, em Santa Catarina.
A Bunge Alimentos recebe 20.000 toneladas de soja por dia. Possui
quatro tombadores de caminhão para receber o produto, sendo que cada caminhão
127
demora seis minutos para descarregar a soja. A empresa possui 236 funcionários
próprios e 170 terceirizados e uma área construída de 76.000m2. As máquinas
funcionam 24 horas e somente param em fevereiro, durante vinte e cinco dias, no
período de entressafra, quando não há soja.
A capacidade de armazenamento, para estoque de soja, é de 400.000
ton., divididas em três armazéns, de 100.000 toneladas cada um, e outros seis
menores. A armazenagem é feita por até um ano, sendo que os armazéns possuem
um sistema de resfriamento automático. Já o armazém de farelo de soja tem uma
capacidade de 30.000 toneladas.
A produção diária da unidade de Luís Eduardo Magalhães da Bunge
Alimentos é a seguinte: 4.000 toneladas de esmagamento de soja; 750 toneladas de
óleo refinado (maior produção do Brasil); e 2.900 toneladas de farelo de soja. Além
disso, é produzida uma parte de farelo de soja com 48% de proteína, para ração
animal. Outro tipo de produto é a lecitina de soja, substância utilizada no preparo de
alimentos para dar consistência, produzida em 250 toneladas por mês.
Do total de farelo de soja produzido, 95% é exportado para a Europa, e o
óleo produzido é quase que totalmente destinado ao mercado interno do Nordeste,
sendo uma parte encaminhada para o Rio de Janeiro e outra parte exportada para a
Venezuela. A embalagem PET utilizada para envasar o óleo é fabricada na própria
empresa, a partir de uma resina importada da Rhodia, resina esta que já começa a
ser produzida na Bahia; e o rótulo utilizado na embalagem vem de Salvador e de
São Paulo. Da lecitina de soja produzida, 100% é exportada para a Europa.
Quanto ao escoamento, o farelo, 80.000 toneladas, é exportado por mês
através do Porto de Ilhéus e o óleo, 19.000 toneladas, é comercializado por mês via
carretas, já como produto final, engarrafado em PET.
Outra indústria esmagadora de soja na região, localizada em Barreiras, é
a Cargill, atuando onde antigamente funcionava a Olvebasa que foi arrendada à
Cargill, por onze anos, em 1996; em 1998, começou a funcionar a parte operacional;
e em 1999, houve a expansão da fábrica, de uma capacidade de 900 toneladas para
1.600 toneladas de moagem por dia.
Duas pessoas foram entrevistadas na Cargill da cidade de Barreiras: o
Gerente Regional e o Gerente Industrial da empresa. Existem 156 funcionários
diretos na fábrica e 80 terceirizados, sendo que este número sobe para 130, no
período da safra.
128
A Cargill funciona 24 horas, parando apenas uma vez por ano. Com um
consumo de água diário de 1.400 m3, a capacidade de processamento da empresa é
de 450.000 toneladas de soja por ano, sendo que 80% correspondem ao farelo de
soja, com 360.000 toneladas por ano, e 20% corresponde ao óleo de soja. A fábrica
produz também farelo com 46% de proteína. Esta unidade empresarial não produz
lecitina de soja.
Do total da produção de óleo, 50% é refinado, correspondendo a um total
de 90 toneladas por ano, e os outros 50% é degomado (bruto, não refinado, que
serve para misturar com ração animal).
O óleo é engarrafado na própria empresa, tanto em embalagem PET
quanto em lata, ambas as embalagens preparadas na própria fábrica. Para a
embalagem PET, a matéria-prima e o rótulo vêm de São Paulo e, na fábrica, é feita a
sopragem e o envasamento; no caso da embalagem em lata, a matéria-prima vem,
também, de São Paulo e a montagem é feita na fábrica.
Do farelo de soja, 80% é exportado, sendo que, deste total, 10% vai para
a Ásia e 90% para a Europa. Quanto ao óleo refinado, 90% é exportado para a Ásia,
Europa e China, e os restantes 10% são consumidos no mercado interno,
representado por todo o Nordeste, principalmente a Bahia. Como o escoamento é
feito somente pelo Porto de Ilhéus, não existe a possibilidade de exportar uma
quantidade maior de soja.
A Cargill trabalha, também, com soja transgênica, e como não existe um
percentual mínimo que obrigue a rotular o produto, 100% do farelo produzido é
rotulado como transgênico. Além disso, a soja recebida é classificada na origem
para fazer o comparativo quanto a umidade, impureza, avariados e verde.
A empresa tem a capacidade de descarregar 4.500 toneladas de soja por
dia mas, atualmente, vem descarregando cem caminhões diários, sendo que cada
carreta possui 27 toneladas de soja. Quanto à estocagem, dispõe de um armazém
para soja com capacidade para 90.000 toneladas e outro para farelo, com
capacidade para 8.000 toneladas; além disso, possui oito unidades apenas para
armazenamento, em um raio de 300 Km2.
A relação com os produtores é de financiamento da produção: 70% dos
fornecedores são financiados pela empresa. Existem alguns produtores “cativos”,
desde 1994, que são clientes com crédito rotativo, ou seja, aberto automaticamente.
O financiamento anual da empresa pode chegar a cem milhões de reais, mas no ano
129
de 2004, por exemplo, o valor financiado foi de quarenta milhões de reais24.
Observa-se, assim, a importância deste tipo de transação na definição do tipo de
governança que prevalece no cluster. (WILLIAMSON, 1985)
Esta transação é feita através de um contrato de compra e venda com os
produtores, com cédula de produto rural (CPR) de garantia do grão, aval e garantia
real. O preço é definido pela Bolsa de Chicago, sendo que o contrato é feito em reais
com a taxa do dia e depois convertido pelo dólar PTAX, ou seja, no momento do
pagamento, o preço é convertido.
Assim, observa-se que a empresa esmagadora define as regras,
controlando a dinâmica da cadeia. Entretanto, não existem grandes articulações
dessas empresas com outros agentes do arranjo; apenas com a Associação de
Agricultores e Irrigantes do Oeste da Bahia (AIBA), existe alguma troca de
informações, principalmente no que se refere à “ferrugem asiática”, além de alguma
colaboração na forma de patrocínio. Com os produtores de sementes não existe
qualquer articulação, a não ser o pagamento direto quando solicitado pelo produtor.
A empresa possui a Fundação Cargill, através da qual faz o lançamento
de edições técnicas agrícolas, contratando consultores que desenvolvam
melhoramentos, tecnologia de produção de sementes, tecnologia de controle de
pragas, etc., tendo uma parceria com a Embrapa Soja. A Fundação desenvolve o
“Projeto Fura Bolo”, um projeto social que tem uma equipe técnica com escritores
que fazem livros destinados da estudantes da Primeira à Quarta Séries, visando
estimular a leitura das crianças.
Outra ação é o Programa De Grão em Grão, feito em parceira com o
Fome Zero, presente na região através da esmagadora Cargill, onde agrônomos
responsáveis fazem hortas em escolas municipais para a melhoria da merenda, o
que pode estar contribuindo para a redução dos indicadores de analfabetismo. Em
Luis Eduardo Magalhães, a Fundação mantém parcerias com duas escolas, através
de uma área com estrutura e montagem de uma estufa para o desenvolvimento de
mudas de plantas nativas.
Existe ainda uma preocupação da Fundação com a questão ambiental,
atendendo a programas legais de “lenha de manejo” em áreas de reflorestamento,
que tem como objetivo estimular um maior número de consumidores de lenha para a 24 Merece destaque o fato de que existem possibilidades financeiras para incrementar a produção na
região, o que esbarra na necessidade de melhorias na infra-estrutura local. Além disso, alguns indicadores socioeconômicos levantados sobre a região, e mais adiante apresentados, também respaldam esta análise.
130
alimentação de caldeiras sem usar madeira de desmate. Outro programa, também
de cunho ambiental, diz respeito ao destino da água usada, através do seu
tratamento para irrigação.
4.2.5 AGENTES DE INOVAÇÃO TECNOLÓGICA
Poucos são os agentes de inovação tecnológica ligados à cadeia
produtiva da soja, localizados na região. A organização de maior destaque nesse
sentido é a Fundação de Apoio à Pesquisa e Desenvolvimento do Oeste da Bahia
(Fundação Bahia), sem fins lucrativos, que surgiu em 1997, em decorrência da
necessidade da pesquisa para o desenvolvimento de cultivares de soja e algodão
adaptadas às condições de clima e solo, resistentes a pragas e doenças, buscando
suprir a crescente demanda por informações conforme o aumento da área cultivada.
Portanto, para este caso, o tipo de inovação que prevalece neste elo da
cadeia é a incremental, através de processos de conhecimento do tipo learning by
doing e learning by using. (DOSI, 1988). As informações geradas a partir dos
trabalhos de pesquisa são transmitidas aos associados da Fundação Bahia e da
AIBA, através de seminários, reuniões de divulgação de resultados, circulares
técnicas e dias de campo. Em 2004, por exemplo, os dias de campo de milho, soja e
algodão reuniram mais de três mil participantes entre produtores, técnicos,
pesquisadores, estudantes e profissionais do agronegócio regional e de estados
vizinhos.
A instituição conta, atualmente, com 26 sócios cotistas e 1.130 produtores
associados, que juntos cultivam 1,3 milhão de hectares. Em diversos projetos, conta
com a parceria da Embrapa Algodão, da Embrapa Soja, e da Empresa Baiana de
Desenvolvimento Agropecuário (EBDA).
Dentre os projetos de pesquisa desenvolvidos em relação à soja, a
Fundação mantém uma parceria com a Embrapa Soja, através do Programa de
Melhoramento Genético de Soja Convencional e Soja Transgênica. Como resultado
deste trabalho, em apenas cinco anos de pesquisas, foram lançadas três variedades
de cultivares adaptadas às condições do oeste da Bahia: a BRS Barreiras (safra
2000/01), a BRS Corisco (safra 2002/03) e a BRS Diferente (safra 2003/04).
Prevalecem, nestas relações com os laboratórios, o formato de contrato híbrido.
(WILLIAMSON, 1985).
131
Assim, a Fundação Bahia é uma entidade de pesquisa que reúne um
grande número de produtores, para melhoramento genético e adaptação de
tecnologias. O Presidente da Fundação foi entrevistado e enfatizou um convênio que
está articulando com as empresas de fertilizantes, negociando um percentual no
preço do adubo para formar um fundo privado para os produtores, em parceria com
a Fundação Ba., a AIBA, a Associação dos Engenheiros Agrônomos, a Secretaria de
Agricultura do Estado da Bahia (SEAGRI), a EMBRAPA, a Associação de
Defensivos Agrícolas (ANDEF) e o Sindicato das Industrias de Adubo do Nordeste
(SIACAN). Observa-se, assim, que existem importantes relações institucionais na
região, mas não se sabe, porém, o nível de comprometimento das partes e a
regularidade das atividades.
Dentre os principais objetivos da Fundação, foram citados:
a) pesquisa agrícola;
b) melhoramento de variedades;
c) teste do material desenvolvido pela Embrapa Soja;
d) fertilidade; e
e) ação contra a ferrugem asiática
Para potencializar a atuação da Fundação Ba., de forma a atender à
crescente demanda por pesquisa e desenvolvimento, em janeiro de 2003, todos os
sócios da AIBA foram admitidos, também, como sócios da Fundação. Assim, cada
associado da AIBA, ao pagar a sua anuidade, contribui automaticamente para o
custeio dos trabalhos de pesquisa. Entretanto, os indicadores são de que 60% dos
sócios estão inadimplentes, dificultando certas ações. Como dificuldade estrutural, o
Presidente da Fundação fez questão de citar os portos e estradas como o principal
gargalo para o maior desenvolvimento da região, influenciando, inclusive, no preço
da soja.
Existe também uma sede da EBDA, na cidade de Barreiras. Esta entidade
desenvolve excelentes trabalhos, entretanto, para a cultura da soja na região, é de
pouca importância. Ainda assim, a sua presença na região provavelmente
potencializa ações e parcerias que beneficiam essa cultura.
Além disso, podemos citar, também, o “Clube do Plantio Direto”, que
reúne um número pequeno de produtores e faz parceria com a Embrapa, por
132
exemplo, buscando adaptações tecnológicas voltadas para o plantio direto25,
reforçando mais uma vez a preocupação com a questão ambiental.
4.2.6 COOPERATIVAS E ASSOCIAÇÕES
Segundo Uderman (1992), demandando um alto grau de mecanização e a
incorporação de grandes quantidades de elementos químicos para a correção e
preparo do solo, a sojicultura transforma componentes industriais e condições de
financiamento em fatores indispensáveis à produção regional, articulando relações
produtivas que até então ocupavam uma posição marginal no cenário local.
Para esse autor, é a incapacidade da maior parte dos produtores de
cumprir as exigências da modernização que faz com que a cooperativa se torne uma
opção generalizada face à alternativa do assalariamento, enquanto que os elos que
se formam entre a produção agrícola regional e elementos comerciais, industriais e
financeiros externos praticamente impõem a sua mediação. Assim, a cooperativa vai
se firmando como forma institucional adequada à reprodução do produtor rural,
substituindo relações tradicionais de arrendamento e parceria, propiciando
condições de trabalho mais eficientes e viabilizando ligações essenciais com
instâncias extra-agrícolas localizadas fora das fronteiras regionais.26
Atualmente, as cooperativas e associações, além de sindicatos,
encontrados na região em estudo são vários. Deve-se ressaltar que a pesquisa
indicou que praticamente todas essas instituições se articulam com a dimensão
produtiva, favorecendo um maior desenvolvimento regional. Dentre essas principais
organizações, destacam-se:
a) Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (AIBA): situada em
Barreiras e com escritório em Luís Eduardo Magalhães;
b) Cooperativa Agropecuária do Oeste da Bahia (COPROESTE) – antiga
Cotia: localizada em Luís Eduardo Magalhães e em Barreiras;
25 O plantio direto é um sistema de reaproveitamento dos resíduos orgânicos da lavoura anterior,
buscando combater a erosão, reduzir as perdas e melhorar a fertilidade do solo; o cultivo é feito sem aração do solo, mantendo em sua superfície uma camada de vegetação para protegê-lo
26 Uderman (1992) cita algumas cooperativas agropecuárias identificadas à época da sua pesquisa: Cooperativa Agrícola Mista dos Projetos de Irrigação do Médio São Francisco (COMESF), criada em 1976; a Cooperativa Agrícola Mista do Rio Corrente (COARC), criada em 1974; a Cooperativa dos Produtores de Grãos dos Gerais (COPERGEL), criada em 1981; e a Cooperativa Agrícola dos Cerrados do Brasil Central (COACERAL), criada em 1984.
133
c) Sindicato dos Produtores Rurais: um sindicato patronal situado em
Luís Eduardo Magalhães;
d) Associação dos Agrônomos: localizada em Barreiras e em Luís
Eduardo Magalhães; e
e) Associação dos Técnicos Agrícolas da Bahia (ASTABAHIA): situada
em Luís Eduardo Magalhães.
De todas estas instituições, a mais importante, por ser de maior
representatividade, é a AIBA. Essa associação surgiu em agosto de 1990, com o
objetivo de suprir a necessidade que os produtores irrigantes da região sentiam de
ter uma entidade que os representasse. É uma organização não governamental,
representando os agricultores da Bahia, contando com 1.130 associados que,
juntos, cultivam 1,3 milhão de hectares, produzindo 4,9 milhões de toneladas e uma
receita bruta de R$ 4,5 bilhões, na safra 2003/04. Além de agricultores, integram,
ainda, o quadro de sócios, pecuaristas e empresas ligadas ao agronegócio.
Assim, a AIBA congrega um grupo de entidades ligadas ao agronegócio,
sendo a principal fonte de geração e difusão de informações agrícolas no oeste da
Bahia, promovendo e participando de eventos para a difusão de tecnologia, além de
atuar como interlocutora entre os produtores e o Estado, em todos os níveis de
governo.
Além do suporte aos produtores associados, a AIBA procura participar da
formulação de políticas públicas para a agricultura, buscando viabilizar convênios e
diversas ações que beneficiem diretamente o setor produtivo. As ações
desenvolvidas por esta instituição representam um amplo leque e buscam dar
suporte aos produtores e realizar elos de articulação produtiva e institucional. Dentre
as principais, destacam-se:
a) inserção na legislação de dispositivos que viabilizaram a permanência
e a inclusão de inúmeros produtores na atividade, a partir da
renegociação das dívidas rurais;
b) aproveitamento dos créditos de Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS) de insumos mediante anuência da
Associação;
c) criação do primeiro fundo de aval privado do país, uma parceria com o
Banco do Nordeste, permitindo aos produtores que não dispõem de
garantia real o acesso ao crédito de custeio agrícola com recursos do
FNE);
134
d) importante papel na coordenação e implantação do “Programa
estratégico de manejo da ferrugem asiática da soja”, programa este
que garantiu o incremento de 660 mil toneladas na safra 2003/04 em
relação à safra anterior;
e) participação na implantação e gestão da Central Campo Limpo, que
retira do meio ambiente as embalagens de agroquímicos, gerando 23
empregos diretos, elevando o Estado da Bahia ao primeiro lugar em
percentual de embalagens recolhidas x consumo (86,1%);
f) instalação do “Viveiro central de mudas nativas e exóticas”, com
capacidade de produzir 2 milhões de mudas por ano para
recomposição de áreas degradadas;
g) parcerias com concessionárias de serviços públicos e com o Estado na
viabilização de infra-estrutura básica para o setor produtivo: ampliação
da rede elétrica, implantação de sistemas de telefonia, e manutenção
de estradas;
h) participação, junto ao Governo do Estado, para a criação da
Companhia de Ações Independentes do Cerrado (CIAC), pela Policia
Militar, com melhoria na segurança regional;
i) proposta e implantação do Programa de Incentivo à Cultura do
Algodão (PROALBA) e Fundo para o Desenvolvimento do Agronegócio
do Algodão (FUNDEAGRO), que incentivaram a expansão da
cotonicultura na Bahia, tornando o Estado o segundo maior produtor
nacional;
j) participação nos trabalhos de elaboração do sistema de concessão de
crédito presumido de ICMS, junto à Secretaria da Fazenda, que
simplifica e democratiza o acesso ao crédito; e
k) articulação para a integração das instituições representativas do
agronegócio da Bahia.
A gestão da AIBA é exercida por um Conselho Diretor multissetorial.
Assim, os segmentos que possuem entidades representativas encaminham suas
demandas e participam nas tomadas de decisão, sendo representados pelos seus
respectivos presidentes. O Conselho Diretor tem como suporte: o Conselho Fiscal,
constituído por seis membros, sendo três titulares e três suplentes; o Conselho
Técnico, formado por quatro integrantes; e o Conselho Consultivo, composto por
quinze pessoas.
135
A Associação conta com 38 colaboradores: nove, na sede, em Barreiras,
um, no escritório de Luís Eduardo Magalhães, um, no escritório de Rosário
(Correntina – Ba.), 23 na Central Campo Limpo, e quatro no Campo Experimental de
Café.
Em 1999, foi adquirida a sede própria, em Barreiras, com área de 3.800
m2, onde estão instalados o escritório central e a área social. Esta sede é
compartilhada com outras instituições parceiras, como a Fundação Ba., com o
objetivo de dinamizar e fortalecer ainda mais as relações entre as entidades
institucionais e o setor produtivo.
Na AIBA, foi entrevistado o Assessor de Agronegócios que destacou que
a Associação não se envolve com a parte comercial; participa da parte político-
institucional da comercialização. Ele referendou que a instituição trabalha em defesa
do produtor, desenvolvendo ações em nível federal e estadual, contribuindo para os
seus interesses. Como conquistas, foram citados a institucionalização do crédito e o
primeiro fundo de aval privado no Brasil, onde o Banco do Nordeste empresta e a
AIBA garante. Além disso, enfatizou os seminários e congressos realizados como
difusão do conhecimento, caracterizando um processo de difusão do aprendizado do
tipo learning by interacting (LUNDVALL, 1988).
Como gargalo ao escoamento da produção, o entrevistado citou a
deficiência de estradas, ressaltando a necessidade de uma ação conjunta do Estado
e prefeituras no setor. Quanto ao modelo de gestão, afirmou ter havido uma melhoria
nos dois últimos anos, pois os produtores de soja se tornaram “sojicultores”,
produzindo também algodão, e aumentaram os seus cuidados em função da cultura
do algodão, que necessita de mais procedimentos do que a soja.
Por fim, o entrevistado citou a importância da Fundação Bahia na difusão
tecnológica e de pesquisa – a Fundação é uma entidade à parte, mas o associado
paga a AIBA e a Fundação conjuntamente. Assim, merece destaque o papel dessas
organizações na construção de parcerias para resolver problemas de infra-estrutura
e estímulo à pesquisa e inovação. Iniciativas como essas apontam articulações
importantes entre a dimensão produtiva, institucional e tecnológica, fundamental
para a construção de bases endógenas de desenvolvimento e para a estruturação
do cluster, considerando o conceito de desenvolvimento concebido nesta pesquisa.
136
4.3 ESTRUTURAS DE GOVERNANÇA DO AGLOMERADO DA SOJA DO OESTE DA BAHIA
Tomando como base a estrutura do sistema agroindustrial da soja no
Brasil, a Figura 11, a seguir, traz uma representação desse sistema aplicada ao
Oeste da Bahia. Assim, vejamos as principais relações identificadas no sistema
agroindustrial da soja nesta região, que permitam definir as estruturas de
governança existentes no aglomerado.
4.3.1 TRANSAÇÕES ENTRE DISTRIBUIDORES E INDÚSTRIAS
PROCESSADORAS
Na região existem apenas duas indústrias processadoras, a Bunge e a
Cargill, empresas multinacionais, caracterizando uma estrutura de mercado
oligopolista. Ambas se relacionam diretamente com os distribuidores que fazem com
que o produto, nas suas mais variadas derivações, chegue ao consumidor final.
É importante destacar que produtos direcionados para distribuidores,
principalmente supermercados, apresentam elevada especificidade associada à
marca, no caso de empresas fortemente orientadas para a linha de diferenciação.
Desta forma, atributos de qualidade específicos, definidos pelas estratégias de
segmentação de mercado, passam a incrementar adicionalmente o nível de
especificidade física dos produtos, como no caso do óleo de soja.
Alguns produtos derivados da soja, como o óleo, mostram-se com poucos
atributos passíveis de diferenciação, caracterizando um produto com especificidade
física baixa (WILLIAMSON, 1985). Nesse contexto, a baixa perecibilidade dos
derivados de soja, de forma geral, determina um baixo nível de especificidade
temporal, com exceção da margarina, que exige sistemas refrigerados, sendo ainda
um produto menos problemático do que lácteos e carnes, por exemplo. A freqüência
das transações é elevada, porém o número elevado de fornecedores de derivados
de soja acaba atenuando o efeito desse atributo.
137
Figura 11 – Delimitação do sistema agroindustrial (SAG) da soja no Oeste da Bahia Fonte: Elaboração própria a partir de Lazzarini & Nunes (1998)
Nesse sentido, dada uma situação de especificidade de média a baixa, a
estrutura de governança que ocorre na transação entre a indústria de derivados e os
distribuidores (T14) é o mercado, segundo Williamson (1985). Indústrias e
distribuidores negociam continuamente, inexistindo, na maioria dos casos, vínculos
de longo prazo mais sólidos além das relações tradicionais de “clientes”. O aumento
do poder de barganha dos distribuidores, em detrimento da indústria, acaba também
induzindo uma baixa propensão ao estabelecimento de relações de mais longo
prazo, pois os distribuidores podem, de forma autônoma, buscar mais facilmente as
melhores oportunidades de preços e margens pagas, incluindo importações.
4.3.2 TRANSAÇÕES ENTRE INDÚSTRIAS DE ESMAGAMENTO/REFINO, E
INDÚSTRIA DE DERIVADOS
As duas esmagadoras encontradas na região internalizam a indústria de
derivados à atividade de esmagamento. Trata-se da transação T10 da Figura 4, que
é normalmente realizada, inclusive no Brasil, internamente, ou seja, via integração
vertical (WILLIAMSON, 1985). Entretanto, não existem especificidades acentuadas
no produto adquirido pela indústria de derivados de óleo de soja, uma vez que a
exigência de determinados padrões qualitativos não é elevada para a produção de
derivados como margarinas, maionese, molhos prontos (salad dressings), etc.
Essa especificidade pode aumentar se forem exigidos óleos com balanço
definido de ácidos graxos ou com atributos nutricionais específicos, porém não em
um nível que justifique a integração vertical. A recorrência e a incerteza das
138
transações não são propriamente limitantes devido ao número elevado de ofertantes
de óleo bruto e refinado, porém pode se tornar um aspecto crítico à medida que
aumente a concentração, na indústria de esmagamento, dando espaço a ações
oportunistas por parte do ofertante, como um aspecto de barganha. Ainda assim,
seriam estruturas de governança de cunho mais autônomo, como formas híbridas ou
de mercado. (WILLIAMSON, 1985).
A ocorrência da integração vertical nesta transação pode ser explicada
pela própria evolução histórica da indústria, buscando explorar economias de
escopo com novos produtos e adicionar valor à matéria-prima óleo, visando margens
adicionais. Entretanto, essas margens não significam necessariamente maior
rentabilidade, a depender do nível de investimentos necessários para a adição de
valor, incluindo constituição de marca no novo mercado, principalmente, no caso de
mercados altamente intensivos em promoção, como o das margarinas e maioneses.
4.3.3 TRANSAÇÕES ENTRE INDÚSTRIAS DE ESMAGAMENTO E
INDÚSTRIAS DE RAÇÃO
No Oeste da Bahia, as duas principais esmagadoras encontradas na
região internalizam a indústria de ração à atividade de esmagamento (T12), ou seja,
esta transação é realizada internamente às firmas, via integração vertical.
(WILLIAMSON, 1985).
4.3.4 TRANSAÇÕES ENTRE INDÚSTRIAS PROCESSADORAS E
ORIGINADORES/ PRODUTORES
Na região existem duas principais indústrias processadoras: a Bunge e a
Cargill. Estas recebem o grão diretamente dos produtores e/ou dos distribuidores,
também chamados de originadores. Na maioria dos casos, as próprias
processadoras financiam a produção a ser realizada diretamente com os produtores,
ditando, portanto, o preço de compra do produto, e caracterizando uma estrutura de
governança hierárquica segundo Williamson (1985).
São contratos de curto prazo, envolvendo uma única safra, não se
caracterizando em uma forma de governança visando a continuidade da transação
no longo prazo. Assim, é uma relação contratual bastante complexa, pois engloba,
em uma só transação, três aspectos distintos: a transferência física do produto, o
139
financiamento (crédito) do fornecedor e o processo de transferência de riscos.
Indústrias e originadores estão interessados basicamente na transferência física do
produto e, portanto, a indução de contratos é resultante primordialmente do desejo
de garantir um nível adequado de utilização das capacidades industriais e/ou uma
quantidade mínima de movimentação de produtos para cobrir custos fixos.
Nesses contratos envolvendo fornecimento de crédito, os compradores
efetuam adiantamento de capital de giro aos produtores, antes do plantio, em troca
da entrega de um determinado número de sacas de soja, na época da colheita;
esses contratos são conhecidos como “soja verde”. As empresas exportadoras têm
utilizado recursos via adiantamento de contrato de câmbio (ACC) e linhas externas,
a juros inferiores aos praticados no mercado interno, que tendem a ser repassados
em parte aos produtores.
Dada a intensa competição por aquisição de soja, na maioria das regiões
brasileiras, a política de fornecimento de crédito ao produtor acaba se tornando um
diferencial a mais para garantir a compra da matéria-prima. Historicamente, a partir
da década de 80, o volume de recursos governamentais destinados ao crédito da
cultura da soja foi reduzido27, de forma que o setor industrial foi assumindo o papel
de agente financeiro para a produção, atrelando o produtor diretamente à indústria.28
Além disso, existe o efeito da especificidade temporal da soja na época
da colheita, quando aumenta a competição pela aquisição do produto e, também, o
efeito da especificidade locacional, decorrentes de questões logísticas, bem como
tributárias, como em alguns casos em que ocorrem entraves associados ao ICMS.
Deve-se observar que as transações originador-indústrias (T2) e produtor-
originadores (T3, T4 e T5) são marcadas por elevadas incertezas associadas ao
preenchimento da capacidade das fábricas (no caso de indústrias) e à necessidade
de movimentação de uma quantidade mínima de produto para cobrir os custos fixos
(no caso de originadores).
O que ocorre no Oeste da Bahia é o mesmo que ocorre no Brasil, pois
existem algumas dificuldades nesses tipos de contratos no que se refere à
inadimplência sofrida pelas indústrias por parte dos produtores. Assim, como
alternativa, surgiram também novos contratos com mecanismos mais sólidos de
garantia contra risco de crédito, como a Cédula de Produto Rural (CPR), que é um 27 Segundo Lazzarini & Nunes (1998), no período 1980-90, o volume de recursos destinados a
Empréstimos do Governo Federal (EGFs) para a cultura da soja reduziu-se em cerca de 83%, demonstrando uma redução de disponibilidade de crédito para o segmento agrícola.
28 Para uma análise dos financiamentos concedidos na região, ver item 4.5.
140
ativo financeiro (letra de câmbio) endossável, para entrega futura de produto
agrícola; e o Contrato de Mercadoria com Emissão Garantida (CM-G), um contrato
mercantil de compra e venda, garantido por fiança bancária ou seguradora.
(LAZZARINI; NUNES, 1998). Mas o uso desses contratos acarreta altos custos
envolvidos no aval ou na fiança bancária, além dos custos de registro e
transferência, o que ainda restringe o seu uso.
A ocorrência desses contratos também é determinada pelo desejo de
transferência de riscos. Quanto à fixação de preços, existem contratos denominados
“a fixar”, nos quais não ocorre acerto de preço da soja no momento do empréstimo,
e os contratos com “preços fixos”, nos quais a indústria efetua o empréstimo e o
produtor se compromete a entregar um determinado número de sacas de soja no
futuro, caracterizando um processo de transferência de riscos de preços por meio de
contratos específicos. Esse tipo de contrato é denominado “a termo”, embora não se
trate do modelo tradicional em que o preço é fixado em uma data e o pagamento é
realizado em um momento posterior a esta, mas utiliza-se esta denominação para
ressaltar que tais contratos atuam como substitutos para os contratos futuros, que
são padronizados e negociados em bolsa, na transação entre produtores e
indústrias.
Os produtores tendem a fixar preços quando o nível destes encontra-se
elevado e/ou quando acreditam que haverá futura redução, efetuando contratos com
“preços fixos” com indústrias, tradings ou cooperativas, envolvendo, também,
transferência física. Fechado o contrato com o produtor, muitas vezes, indústrias e
tradings realizam operações simultâneas de venda na Bolsa de Chicago (CBOT).
Outra alternativa para os produtores seria realizar o processo de
transferência de riscos por meio de contratos futuros negociados em bolsas, que têm
maior nível de garantias, mas os contratos a termo são mais convenientes porque
envolvem transferência física, que não é objetivo dos contratos futuros, pelo fato das
identidades das partes serem conhecidas e pela maior simplicidade operacional.
Além disso, contratos a termo não exigem depósito de margem de garantia inicial e
de variação (pagamento de “ajustes diários”), como no caso das bolsas, o que é
vantajoso para produtores mais descapitalizados, considerando que o preço se
mantenha.
Entretanto, existem custos de transação nos contratos a termo, tanto ex
ante (procura de compradores e vendedores, negociação e avaliação inicial do risco
de crédito) quanto ex post (necessidade de monitoramento mais intenso e maior
141
possibilidade de má-adaptação, principalmente quanto à inadimplência, de acordo
com Williamson (1985). Esses custos tendem a ser menores nas bolsas para os
produtores, devido à centralização dos negócios e à existência da clearinghouse, um
órgão responsável por coletar depósitos de garantia dos participantes para reduzir o
risco de crédito no mercado.
O mesmo movimento em relação à referência para a precificação do
sistema agroindustrial da soja no Brasil ocorre no Oeste da Bahia, através dos
preços na CBOT, muito embora não ocorra um paralelismo perfeito entre os preços
externos e os locais. Mas a elevada liquidez do mercado da CBOT faz com que a
maioria das indústrias e tradings realizem operações de hedging naquela bolsa, em
detrimento de bolsas locais no Brasil, como a Bolsa de Mercadorias & Futuros
(BM&F). Esta, por apresentar um contrato futuro desenhado de forma específica
para o mercado brasileiro, tende a gerar maior nível de proteção contra variações
dos preços da soja, ou seja, maior efetividade de hedging. Entretanto, grandes
hedgers tendem a trocar tal vantagem pela maior liquidez no mercado da CBOT,
uma vez que a operação de grandes lotes em mercados pouco líquidos, como é o
caso dos futuros agrícolas em bolsas brasileiras, tende a gerar custos elevados de
transação devido ao “impacto de mercado” das ordens de compra ou venda.
(LAZZARINI & NUNES, 1998).
4.3.5 TRANSAÇÕES ENTRE TRADINGS E INDÚSTRIAS PROCESSADORAS
/ MERCADO EXTERNO
No caso de indústrias de maior escala, com possibilidade de constituir
departamentos internos de trading, as vendas de produtos para o mercado externo
são normalmente conduzidas pela própria firma. Este é o caso das esmagadoras
presentes na região, a Bunge e a Cargill.
A existência de departamentos internos de trading permite um maior
aproveitamento das oportunidades de mercado. Desta forma, quanto mais definida
for a linha estratégica da empresa para a liderança em custos orientada para
commodities de mercado global, maior tende a ser a escala de operação e o nível de
especificidade dos ativos humanos e físicos necessários para potencializar as
vendas externas e, até mesmo, compras, como no caso de importações em regime
de draw back (T11). Este aspecto, associado à elevada freqüência das vendas e
compras externas, acaba justificando a integração vertical nas transações entre as
142
esmagadoras e as tradings (T7), havendo, portanto, um relacionamento direto com o
mercado internacional (T9).
4.3.6 TRANSAÇÕES ENTRE PRODUTORES E INDÚSTRIA DE INSUMOS
Na região em estudo, assim como no Brasil, de uma forma geral, a
natureza dos ativos envolvidos na transação entre o segmento de insumos e o de
produção agrícola é a mais variada possível. Produtos como fertilizantes e corretivos
apresentam especificidade baixa, enquanto sementes se apresentam como ativos
mais específicos à cultura.
Assim, de uma forma geral, verifica-se a ocorrência de transações via
mercado juntamente com modalidades contratuais conhecidas por “troca-troca”: a
promessa de um determinado número de sacas de soja a serem entregues no futuro
em troca de insumos antes do plantio, por meio de contratos firmados com
produtores. Em vários casos, esses insumos são vendidos por meio de “pacotes”
envolvendo fertilizantes, defensivos e sementes.
Muitas vezes essas operações são coordenadas por cooperativas,
tradings e indústrias que atuam como “ponte” entre o produtor e a indústria de
insumos. Na fase de plantio, o fornecimento de crédito por meio de “troca-troca”
parece ser mais comum; na condução da cultura, o crédito tende a ser realizado
mais na forma de fornecimento de capital de giro. Assim, esses contratos são
explicados menos pelos atributos dos insumos propriamente ditos e mais pela
necessidade de crédito por parte dos produtores e pelo ímpeto de adicionar serviços
à ação comercial da indústria de insumos e de processadores/originadores.
No caso de sementes, a transação T1 pode ocorrer de três formas:
integração vertical, quando o sojicultor destina parte da produção para o plantio na
safra seguinte; contratos, quando as sementes são contempladas em operações
“troca-troca”; e mercado, quando o sojicultor adquire de forma independente as
sementes de empresas especializadas.
Entretanto, o uso de semente própria deve se reduzir à medida que a
qualidade superior da semente oriunda de empresas especializadas for se tornando
aspecto diferenciador da produtividade obtida. A venda de “pacotes” representaria
uma tendência, visando explorar a complementaridade de produtos, como a soja RR
e o glifosate, e a possibilidade de fornecer serviços de suporte aos produtores, tais
como a transferência de novas tecnologias e crédito.
143
4.4 FORMAS DE COOPERAÇÃO E ESFORÇO DE CAPACITAÇÃO PARA INOVAR
No complexo agroindustrial da soja no Oeste da Bahia, assim como no
restante do Brasil, no que se refere à introdução de inovações, estas são feitas
principalmente pelos produtores de sementes, de insumos, de máquinas agrícolas e
pelo segmento industrial, por inovações incorporadas aos bens de capital.
Assim, as inovações em insumos, máquinas agrícolas e bens de capital
se dão de forma incremental29 e as inovações radicais ocorrem no segmento de
sementes, com a difusão da chamada biotecnologia de terceira geração nas
empresas sede, já que se tratam de empresas multinacionais.
É importante destacar que esse processo de P&D é desenvolvido fora da
região, em nível nacional e internacional, e é então trazido e adaptado localmente
(CANUTO, 1992). Nesse caso, podemos afirmar que a tecnologia apresenta um
conteúdo de conhecimentos tácitos e específicos, denominados idiossincráticos
(NELSON; WINTER, 1982).
Nesse processo de difusão do conhecimento, conforme foi analisado, a
Fundação Ba. desenvolve pesquisas agrícolas, como melhoramento de variedades
de cultivares, testa materiais desenvolvidos pela Embrapa Soja, promove ações
contra a ferrugem asiática, estudos de fertilidade, etc. É nesse sentido de articulação
entre as dimensões produtiva e institucional, conforme pressuposto desta pesquisa,
que são criadas condições para que a região se desenvolva.
4.4.1 PRODUTORES DE SEMENTES
A biotecnologia pode ser dividida em três gerações ou fases de
desenvolvimento segundo Lazzarini & Nunes (1998). A primeira refere-se à
utilização de microorganismos, principalmente nos processos de fermentação, na
fabricação de bebidas alcoólicas e de pães sendo mais um conjunto de técnicas do
que a aplicação do conhecimento científico, representando práticas muito antigas.
A segunda geração da biotecnologia surgiu na década de 30, com o
advento da petroquímica e dos antibióticos, como a penicilina. Nesta fase, foram
29 As inovações incrementais ocorrem no sentido de adaptar os produtos ou processos às
necessidades do usuário, interagindo com ele, sendo também uma fonte de aprendizado e inovação.
144
investigados produtos biológicos naturais que foram modificados artificialmente por
processos químicos ou por radiação.
A terceira geração, também denominada de nova biotecnologia, teve
início nos anos 70, com a proposta de realizar modificações no padrão genético das
espécies por meio de técnicas como DNA recombinante (rDNA) e anticorpos
monoclonais (Mab). Assim, esta geração fundamenta-se no conhecimento científico
e em grandes investimentos no desenvolvimento de produtos específicos.
Nos anos 70, as inovações em biotecnologia eram geradas por
instituições de pesquisa nas universidades. Já nos anos 80, com o surgimento de
instrumentos legais específicos para a proteção dos direitos de propriedade
intelectual, grandes empresas com atividades relacionadas à biotecnologia de
segunda geração, principalmente as indústrias químico-farmacêutica e de sementes
passaram a investir na pesquisa de espécies modificadas geneticamente. Assim, por
seus impactos nos mercados mundiais, a competência em biotecnologia é
considerada uma variável competitiva chave.
As oportunidades abertas pela biotecnologia de terceira geração referem-
se à possibilidade de produzir as commodities existentes a custos mais baixos ou
dotá-las de características novas e melhores tanto para o consumidor final quanto
para as etapas intermediárias de transformação industrial.
A soja apresenta características reprodutivas que dificultam a apropriação
da inovação com o lançamento de novas variedades, pois a reutilização dos grãos
colhidos como semente não traz perda significativa de produtividade, como no caso
de materiais híbridos, que é o caso do milho. Desta forma, é comum que os
produtores reaproveitem parte da safra como semente, na safra seguinte, o que se,
por um lado, traz limitações para a apropriabilidade de investimentos em P&D na
indústria de sementes para a soja, por outro lado os agricultores não ficam presos
(locked-in) a essas indústrias.
A maior parte dos materiais genéticos para a cultura da soja era oriunda
de organizações públicas, como a EMBRAPA. Entretanto, algumas empresas
privadas também desenvolveram variedades de soja, como a FT Sementes, que
lançou a FT Cristalina, material de elevada produtividade. Para atenuar a reutilização
de grãos na safra seguinte como sementes, empresas privadas buscaram
continuamente lançar novos produtos, de forma a gerar obsolescência nos materiais
antigos e tornar o agricultor dependente da empresa.
145
Nesse processo, o banco de germoplasma de soja da FT Sementes foi
adquirido pela multinacional Monsanto, no final de 1997, constituindo-se em uma
nova empresa especializada em genética agrícola, a Monsoy. Essa aquisição foi
uma estratégia da Monsanto para ganhar mercado na área de sementes, de forma
que após pesados investimentos em P&D de biotecnologia, foi desenvolvida a “soja
transgênica” RR (Round-up Ready), resistente ao herbicida ainda responsável por
grande parte das receitas da empresa, o glifosate, garantindo a manutenção dos
ganhos decorrentes da comercialização desse produto. Assim, a Monsanto construiu
um “pacote tecnológico” completo para a cultura, vendendo conjuntamente a soja
RR e o herbicida glifosate, gerando uma maior garantia no controle do material
genético e potencializando a venda dos produtos.
Além disso, outras empresas também já estão desenvolvendo novas
famílias de genes modificados, a exemplo da Novartis, Sow, DuPont, etc.
(LAZZARINI; NUNES, 1998). Entretanto, apesar dos ganhos esperados com esse
uso de genes modificados (transgênicos), deve-se observar que existem entraves
associados a consumidores receosos por esta nova tecnologia, tanto a nível
nacional quanto internacional.
De uma forma geral, as pesquisas em genética da soja no Brasil têm sido
feitas com objetivos de aumento de produtividade e de redução de custos, além da
busca de resistência a pragas e doenças, tais como o cancro da haste, o nematóide
do cisto e fungos danosos no processo de colheita. Existem também algumas
pesquisas direcionadas para promover variações no ciclo produtivo da cultura, no
sentido de alongamento do ciclo visando facilitar o planejamento do manejo cultural,
bem como buscando maior precocidade para regiões de maior latitude (fronteiras
agrícolas), permitindo o cultivo da “safrinha”30.
Com isso, desenvolvem-se melhoramentos em alguns aspectos
qualitativos do grão, como o teor de proteína, teor de óleo, qualidade do óleo (com
menor percentagem de ácidos graxos saturados e maior estabilidade oxidativa),
aumento do teor de determinados aminoácidos (lisina, metionina), redução de
determinados fatores antinutricionais do farelo (como oligassacarídeos), etc.
O teor de proteína é o fator que tem sido mais observado, embora existam
evidências de que um aumento nesse atributo no grão tende a reduzir o teor de óleo,
e, talvez, até a produtividade da cultura. Portanto, a decisão de mercado depende
30 Cultura desenvolvida em situação de entressafra.
146
dos preços relativos de cada um desses atributos. Assim, havendo uma tendência
de mercado mais favorável ao farelo (valorizando, portanto, a proteína como atributo
qualitativo), surge a necessidade de um avanço tanto nas pesquisas tecnológicas
quanto nos estudos econômicos, visando avaliar se as possíveis perdas em
produtividade poderão ser compensadas pela maior vantagem qualitativa do farelo.
É importante fazer uma diferenciação entre o agente que realiza
pesquisas genéticas de cunho mais genérico, como a EMBRAPA e outros agentes
internacionais, e o agente que realiza adaptações regionais das variedades, tendo
em vista especificidades locacionais; nesse sentido, existe a Fundação BA, no Oeste
da Bahia. Entretanto, é válido salientar que existe uma importante inter-relação entre
esses dois tipos de instituições, no sentido de articular as pesquisas às
necessidades locais, e é a partir desse aprendizado que se dá o processo inovativo
neste elo da cadeia, criando competências a partir do que Lundvall (1988)
denominou de learning by interacting.
Desta forma, os investimentos em P&D são coordenados, através da
articulação entre indústrias processadoras e empresas de pesquisa, ou seja, as
dimensões produtiva e institucional, visando a competitividade do sistema
agroindustrial, e refletindo no desenvolvimento da região.
4.4.2 INDÚSTRIA ESMAGADORA E DE SUBPRODUTOS
Quanto às tecnologias de esmagamento e refino do óleo, estas são
amplamente difundidas, não constituindo barreira à entrada de novas firmas. Mas,
do mesmo modo que na produção agrícola, a biotecnologia pode representar novas
oportunidades de ganhos tecnológicos para o segmento industrial.
As inovações tecnológicas trazidas para a indústria de esmagamento e
refino são em grande parte exógenas, trazidas por empresas especializadas em
equipamentos, máquinas, insumos, sistemas de informação e automação, etc. Pode-
se dizer que é um setor de tecnologia dominado pelo ofertante, onde predominam as
inovações incrementais, envolvendo um processo contínuo de aprimoramento e
adaptação de produtos às exigências do mercado. Assim, não existem barreiras
significativas para o acesso a estas tecnologias, limitando, portanto, tentativas de
ganho de poder de mercado por meio de desenvolvimento tecnológico específico,
por parte das indústrias.
147
O processo tecnológico de extração de óleo por meio de solvente
(hexano) é o dominante e não se vislumbra, a médio e longo prazo, uma ruptura
tecnológica nesse sentido. Entretanto, como esse insumo é originário de fonte não
renovável, o petróleo, existem estudos em termos de alternativas tecnológicas, como
a extração com o uso de etanol, CO2 e enzimática, pois a biotecnologia tem amplo
potencial de uso na modificação de características físicas e químicas de gorduras e
óleos. (LAZZARINI; NUNES, 1998).
No que diz respeito às inovações em processo, existe alguma
diferenciação entre empresas, principalmente em relação ao desenvolvimento de
sistemas de qualidade total, logística e automação dos processos industriais.
Quanto à concepção de produtos para consumo final, alguns aspectos
tecnológicos merecem ser destacados, principalmente no que diz respeito à
embalagem desses produtos. No caso do óleo, por exemplo, novas embalagens
plásticas, do tipo PET, à base de polietileno tereftalado, vêm ganhando espaço no
mercado, principalmente para óleos mais nobres, como canola e girassol. Existem
também estudos para a introdução de embalagens cartonadas (tetra brik), pois
apresentam as vantagens de um menor custo e da durabilidade do óleo ser
semelhante à das latas. Considera-se que o custo da embalagem chega a
representar cerca de 15% dos custos totais de esmagamento, refino e envase.
(LAZZARINI; NUNES, 1998)
4.4.3 PRODUTORES DE SOJA
Em relação às novas tecnologias de produção, os avanços decorrentes
de estudos desenvolvidos com genética devem trazer impactos favoráveis sobre a
produtividade. Além disso, a tecnologia de plantio direto tem permitido maior
racionalização do uso do solo e economias no processo produtivo.
Alguns fatores determinantes foram apontados os produtores de soja do
Oeste da Bahia, na pesquisa de campo, no sentido de manter a capacidade
competitiva da produção. Através da Tabela 33, podemos destacar como: muito
importante, a qualidade da matéria-prima (57,1%). a tecnologia dos equipamentos
(73,5%) e variação na taxa de câmbio (59,2%); e importante, a qualidade da mão-
de-obra (59,2%) e o seu custo (57,1%); novas estratégias de comercialização (50%);
e custo de financiamento (50%).
148
Como forma de buscar essa competitividade, os produtores indicaram as
principais inovações adotadas em produto e processo, conforme indica a Tabela 34,
a seguir. Em termos de produto merecem destaque as alterações de características
técnicas, consideradas de importante a muito importante (91,8%), como a busca de
novas variedades resistentes a pragas, alterações de teores protéicos, etc.; além
disso, as inovações citadas em novos produtos referem-se a novas cultivares como
forma de diversificação.
Em termos de processo, foi considerada muito importante a incorporação
de novos equipamentos (78,6%), a exemplo de implementos agrícolas mais
modernos; e a introdução de novas matérias-primas (43,9%), como novos tipos de
sementes.
Tabela 33 – Fatores determinantes para manter a capacidade competitiva na produção de soja, por níveis de importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
QUALIDADE DA
MATÉRIA- PRIMA
QUALIDADE DA
MÃO-DE-OBRA
CUSTO DA MÃO-DE-
OBRA
TECNOLOGIA DOS
EQUIPAMENTOS
NOVAS ESTRATÉGIA
S DE COMERCIALI
ZAÇÃO
VARIAÇÃO NA
TAXA DE CAMBIO
CUSTO DE FINANCIAMEN
TO NÍVEL DE IMPORTÂNCIA
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Sem importância 2 2 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 Pouco importante 0 0 5 5,1 22 22,4 0 0 3 3,1 2 2 3 3,1 Importante 40 40,8 58 59,2 56 57,1 26 26,5 49 50 38 38,8 49 50 Muito importante 56 57,1 35 35,7 20 20,4 72 73,5 46 46,9 58 59,2 46 46,9 Total 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100
Tabela 34 – Principais inovações adotadas pelos produtores nos produtos e nos processos produtivos a partir da década de 90, por níveis de importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
INOVAÇÕES DE PRODUTO INOVAÇÕES DE PROCESSO PRODUTIVO
ALTERAÇÕES DE CARACTERÍSTICAS
TÉCNICAS
NOVO PRODUTO
INCORPORAÇÃO DE NOVOS EQUIPAMENTOS
INTRODUÇÃO DE NOVAS MATÉRIAS-PRIMAS
NÍVEL DE IMPORTÂNCIA
Nº % Nº % Nº % Nº %Sem importância 5 5,1 17 17,3 0 0 9 9,2Pouco importante 3 3,1 9 9,2 2 2 8 8,2Importante 55 56,1 34 34,7 19 19,4 38 38,8Muito importante 35 35,7 38 38,8 77 78,6 43 43,9Total 98 100 98 100 98 100 98 100
Para promover essas inovações, as principais fontes de informação
utilizadas pelos produtores estão indicadas na Tabela 36. Foram consideradas muito
149
importantes as consultorias especializadas locais (33,7%); importante, a aquisição
de novos equipamentos fornecidos localmente (54,1%), as publicações
especializadas (37,8%), a troca de informações com clientes (58,2%), com
fornecedores (48%), com empresas do setor na região (49%) e congressos e feiras
comerciais e industriais do setor no país (40,8%).
Tabela 35 – Principais fontes de informação utilizadas pelos produtores para promover inovações de produto ou de processo, por níveis de importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
DEPA
RTAM
ENTO
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P&D
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LOCA
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NÍVEL DE IMPORTÂNCIA
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Sem importância 92 93,9 25 25,5 62 63,3 93 94,9 48 49 73 74,5 90 91,8 8 8,2Pouco importante 3 3,1 7 7,1 18 18,4 3 3,1 26 26,5 9 9,2 4 4,1 4 4,1Importante 0 0 32 32,7 13 13,3 1 1 13 13,3 14 14,3 3 3,1 53 54,1Muito importante 2 2 33 33,7 4 4,1 0 0 10 10,2 1 1 0 0 32 32,7Não sabem 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1Total 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100
continua
conclusão
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NÍVEL DE IMPORTÂNCIA
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Sem importância 27 27,6 23 23,5 7 7,1 9 9,2 12 12,2 37 37,8 22 22,4 Pouco importante 32 32,7 11 11,2 5 5,1 5 5,1 7 7,1 20 20,4 18 18,4 Importante 22 22,4 37 37,8 57 58,2 47 48 48 49 33 33,7 40 40,8 Muito importante 16 16,3 26 26,5 28 28,6 36 36,7 30 30,6 7 7,1 17 17,3 Não sabem 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 Total 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100
Observa-se, então, que, sendo as inovações mais importantes as
referentes à incorporação de novos tipos de sementes e equipamentos, estas são
realizadas por outros elos da cadeia, o que aponta para uma forte integração com
elos a montante e a jusante da produção. Essa forma de incorporar a pesquisa e a
inovação pode explicar o fato de os produtores considerarem sem importância os
150
departamentos de P&D e a Universidade para produzirem inovações. A
Universidade tem pouca articulação nesse processo, uma vez que as empresas e os
institutos envolvidos realizam essa tarefa.
Já a troca de informações é considerada importante e muito importante
pelos produtores, caracterizando um processo de aprendizado do tipo learning by
interacting, conforme definido por Lundvall (1988).
Destaca-se a importância da consultoria. Na verdade, o grupo de
consultores é, geralmente, o mesmo em todo o Brasil, e isso faz com que as
inovações, práticas e processos sejam difundidos quase que simultaneamente. Os
congressos e feiras são considerados importantes porque funcionam como um
elemento de start no processo, através da articulação de grupos que atendem aos
interesses das empresas, tradings, etc., de forma que funcionam como verdadeiros
difusores das inovações (DOSI, 1988).
As formas de incorporação de inovações tecnológicas pelos produtores
estão destacadas na Tabela 36. Merecem destaque, citadas como importante, a
aquisição de máquinas no mercado nacional (57,1%), a cooperação com
fornecedores de equipamentos (57,1%) e com fornecedores de insumos (54,1%),
caracterizando um processo de aprendizado denominado por Dosi (1988) de
learning by doing e learning by using.
Tabela 36 – Formas de incorporação de inovações tecnológicas, por níveis de importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
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NÍVEL DE IMPORTÂNCIA
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Nº %
Sem importância 3 3,1 7 7,1 6 6,1 30 30,6 23 23,5 10 10,2 30 30,6Pouco importante 1 1 19 19,4 19 19,4 32 32,7 36 36,7 37 37,8 28 28,6Importante 56 57,1 57 57,1 53 54,1 26 26,5 33 33,7 25 25,5 35 35,7Muito importante 38 38,8 16 16,3 20 20,4 10 10,2 6 6,1 26 26,5 5 5,1 Total 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100
Os produtores também responderam à questão sobre a evolução das
relações de cooperação com as demais empresas da cadeia, nos últimos cinco
151
anos. O resultado encontra-se na Tabela 37, merecendo destaque o percentual de
78,6% para o aumento da intensidade das relações na questão da troca de
informações, caracterizando, mais uma vez, um processo de learnig by interacting.
(LUNDVALL, 1988). Ressalta-se a estabilidade e a importância da ação conjunta de
marketing, que é muito bem conduzida localmente pela AIBA.
Tabela 37 – Evolução das relações de cooperação com as demais empresas do arranjo nos últimos cinco anos, por intensidade das relações, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
TROCA DE INFORMAÇÕES
ENSAIOS PARA DESENVOLVIMENTO E
MELHORIA DE PRODUTOS
AÇÕES CONJUNTAS PARA CAPACITAÇÃO
DE RH
AÇÕES CONJUNTAS DE MARKETING
INTENSIDADE DAS RELAÇÕES
Nº % Nº % Nº % Nº % Forte diminuição 0 0 6 6,1 2 2 3 3,1Diminuição 0 0 10 10,2 1 1 3 3,1Estável 17 17,3 36 36,7 58 59,2 79 80,6Aumento 77 78,6 37 37,8 37 37,8 11 11,2Forte aumento 4 4,1 9 9,2 0 0 2 2Total 98 100 98 100 98 100 98 100
A Tabela 38, a seguir, mostra a forma de interação dos produtores com
associações de classe, sindicatos e outros tipos de organizações de representação
coletiva na região. Foram considerados como muito importante, cursos e seminários
(55,1%); e importante, contatos e troca de informações (49%) e a realização de
eventos ou feiras (53,1%). Isso mostra uma postura interativa e de interesse dos
produtores em se manterem atualizados, pois são formas importantes de
aprendizado que fortalecem os elos, incorporando práticas e processos na região,
conforme especificado por Dosi (1988) e Lundvall (1988).
Tabela 38 – Forma de interação dos produtores com associações de classe, sindicatos e outros tipos de organizações de representação coletiva, por importância, segundo os produtores, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
CURSOS E SEMINÁRIOS
NEGOCIAÇÕES COLETIVAS
APOIO NA AQUISIÇÃO DE
INSUMOS
CONTATOS E TROCA DE
INFORMAÇÕES
REALIZAÇÃO DE EVENTOS OU FEIRAS
NÍVEL DE IMPORTÂNCIA
Nº % Nº % Nº % Nº % Nº % Sem importância 0 0 30 30,6 50 51 1 1 0 0 Pouco importante 0 0 9 9,2 1 1 5 5,1 0 0 Importante 32 32,7 18 18,4 4 4,1 48 49 52 53,1 Muito importante 55 55,1 12 12,2 5 5,1 3 3,1 20 20,4 Não sabem 12 12,2 29 29,6 38 38,8 41 41,8 26 26,5 Total 98 100 98 100 98 100 98 100 98 100
152
Assim, quanto às formas de cooperação e esforço de capacitação para
inovar, por parte dos produtores, existe uma grande preocupação com a tecnologia
dos equipamentos utilizados, bem como com a utilização de novos tipos de
sementes. Na busca dessas informações, são utilizadas fontes as mais variadas, a
exemplo de publicações especializadas e articulações com clientes e fornecedores.
Essas condutas, conforme já analisado, decorrem da incorporação de inovações que
são exógenas à região, mas que são trazidas e implementadas por empresas
nacionais e multinacionais e são adaptadas, ou seja, incorporadas ao processo
produtivo local.
Torna-se importante, neste sentido, retomar Dosi (1988), que afirma que o
conhecimento inovativo é local e específico, limitado por um paradigma e que ocorre
ao longo de trajetórias particulares, sendo distribuído com diferentes competências e
graus de sucesso por todos os agentes econômicos que operam naquela tecnologia
particular. Além disso, na medida em que cada conhecimento é, também, local e
cumulativo ao nível de firmas individuais, é possível observar também trajetórias
específicas de cada firma, envolvendo o desenvolvimento cumulativo e a exploração
das competências tecnológicas.
4.4.4 COOPERATIVAS, ASSOCIAÇÕES E FUNDAÇÕES
De uma forma geral, as instituições formatadas como cooperativas,
associações e fundações, têm características mais ligadas ao processo de
originação do que aos estágios mais próximos do consumidor final. Elas têm um
papel fundamental no processo de cooperação e esforço de capacitação para
inovar, e isso fica muito claro no estudo da região do Oeste da Bahia.
Dentre as encontradas na região31, a AIBA, por exemplo, articulada à
Fundação BA, exerce importante papel nesse sentido, desenvolvendo diversas
pesquisas, conforme já foi explicado anteriormente. Ressalta-se, neste contexto, a
importância da articulação deste aparato institucional com a dimensão produtiva, no
sentido de promover o desenvolvimento regional.
31 V. página 132.
153
4.5 COMPREENDENDO MELHOR A DINÂMICA REGIONAL: UM OLHAR ALÉM DO CLUSTER A PARTIR DE ALGUNS INDICADORES SOCIOECONÔMICOS
Neste item são analisados alguns indicadores socioeconômicos da região,
destacando os principais municípios produtores de soja no Oeste da Bahia,
conforme definidos anteriormente. O objetivo deste item é analisar a evolução
socioeconômica da região, a partir de determinados indicadores, para perceber as
principais transformações que podem estar relacionadas com a dinâmica introduzida
pelo cluster da soja, verificando até que ponto a presença de grupos importantes da
agroindústria, instituições de pesquisa, etc., têm contribuído para melhorar o padrão
geral de vida na região.
O levantamento destes dados é feito totalmente a partir de fontes
secundárias, procurando perceber historicamente a evolução ou não do crescimento
econômico da região, e quiçá do seu desenvolvimento. Assim, são analisados os
seguintes itens: a) PIB do agronegócio; b) PIB das principais lavouras; c) PIB per
capita; d) estrutura setorial; e) pessoal ocupado; f) número de estabelecimentos de
comércio, indústria e serviços; g) renda média familiar per capita; h) financiamentos;
i) consumo de energia elétrica; j) receita tributária; l) IDH; pobreza; m) número de
leitos; n) quantidade de hospitais conveniados ao SUS; o) esperança de vida; p)
mortalidade infantil; q) analfabetismo; r) número de domicílios com água canalizada;
e s) número de domicílios com iluminação elétrica.
É importante destacar que esses dados não dão conta da complexidade
do que se entende por desenvolvimento regional, mas podem sinalizar a tendência
de um determinado processo de desenvolvimento, ou a falta deste, conforme
discutido no Capítulo 2. Os indicadores podem sinalizar, por exemplo, a falta de
estratégia de desenvolvimento, como apontado por Hirshman (1958), que tende a
acentuar os desequilíbrios. Como o desenvolvimento é, por natureza,
desequilibrado, daí a importância da ação institucional e Estatal para reduzir esses
efeitos que acabam rebatendo sobre a população excluída dos elos do cluster.
a) PIB do agronegócio O PIB do agronegócio indica a representatividade desse segmento da
economia para uma determinada localidade. Para uma análise do Brasil e da Bahia,
154
no período de 1990 a 2004, observa-se que, para o ano de 2004, o PIB do
agronegócio do Brasil corresponde a 29,9% do PIB brasileiro e, da mesma forma, o
PIB do agronegócio da Bahia corresponde a 31,68% do PIB baiano, tendo sido esta
a tendência histórica desde a década de 90 (Tabela 39). Ressalta-se que, de 1990 a
2004, enquanto o PIB da Bahia aumentou em torno de 50%, o PIB do agronegócio
do Estado mais que duplicou nesse período, indicando a importância deste
segmento para a economia baiana.
Tabela 39 – PIB do agronegócio, Brasil e Bahia, 1999–2004 (em R$ milhões )
ANOS PIB BRASIL PIB AGRONEGÓCIO BRASIL PIB BAHIA
PIB AGRONEGÓCIO
BAHIA 1990 1.246.264 346.038 60.665 12.8711991 1.259.127 349.788 59.748 13.2121992 1.252.277 345.102 60.806 13.5621993 1.313.948 356.303 62.704 13.4511994 1.390.851 387.979 64.957 14.4661995 1.449.598 399.302 65.624 15.0471996 1.488.137 408.005 67.378 15.4421997 1.536.820 403.102 71.799 16.6201998 1.538.847 406.472 73.012 17.2481999 1.550.934 413.794 74.605 18.3342000 1.618.565 430.165 77.506 20.9512001 1.639.810 443.382 78.274 21.8222002 1.671.406 482.434 79.209 25.0132003 1.680.515 513.961 81.423 26.5552004 1.726.860 527.090 89.496 28.348Fonte: Giulhoto & Ichihara, 2006.
b) PIB das principais lavouras Analisando o PIB das principais lavouras do Estado da Bahia, verificamos
que, especificamente em relação à cultura da soja, a evolução, de 1999 a 2004, foi
de 156%. Dentre as principais culturas, conforme podemos observar na Tabela 40, a
soja ficou atrás do algodão, da mamona e da silvicultura. Todas, entretanto, tiveram
um crescimento expressivo e importante para a região.
155
Tabela 40 – PIB das principais lavouras, Bahia, 1999–2004 (em R$ milhões de 2004)
Produtos 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Variação % 99-04
Algodão em caroço 101 227 262 203 503 1.156 1.045Cacau 504 328 419 768 646 559 11Coco da Bahia 217 227 157 254 229 252 16Mamona 20 80 56 55 78 137 585Mandioca 681 771 694 934 1.005 1.397 105Manga 114 100 112 119 137 218 91Milho 280 346 279 341 480 491 75Silvicultura 156 283 183 430 905 438 181Soja 551 648 669 918 1.006 1.411 156Fonte: Elaboração própria, a partir de Giulhoto & Ichihara, 2006
c) PIB per capita A análise do PIB per capita dos principais municípios produtores de soja
do Oeste da Bahia, conforme definidos anteriormente (Barreiras, Formosa do Rio
Preto, Luis Eduardo Magalhães e São Desidério), demonstra uma enorme
concentração de riqueza na região, descompassada do restante do país. Observa-
se uma evolução em todos os municípios, com dados de 1999 a 2004, merecendo
destaque Luis Eduardo Magalhães, que apresenta um valor de aproximadamente R$
51.600,00 por pessoa, para 2004, que é exageradamente alto para a realidade do
país; e São Desidério, que passa de R$ 7.677,02 em 1999 para R$ 30.025,66 em
2004. 32
Gráfico 6 – PIB per capita, 1999-2004 (em R$) Fonte: Elaborada a partir de dados da SEI
32 Para uma análise mais detalhada destes valores, consultar a Tabela 12, no Anexo A.
156
O Gráfico 6, onde se observam valores muito aquém para Salvador, Bahia
e Brasil permite a visualização destas distorções. O Brasil, por exemplo, em 2004,
apresentou um PIB per capita de R$ 10.692,00. O PIB per capita de Luis Eduardo
Magalhães representa aproximadamente US$ 28.70033, podendo ser comparado
com o PIB per capita de países como a Espanha, Singapura e Nova Zelândia, que
apresentam um PIB per capita de US$ 27.074, US$ 26.481 e US$ 26.291,
respectivamente, para o ano de 2005.34
A fim de corroborar este quadro de desigualdade de renda, foi pesquisado
o índice de Gini35, mas, infelizmente, só foram obtidos dados dos anos de 1991 e
2000, período em que ainda não se observava tal concentração e quando o
Município de Luis Eduardo Magalhães não havia ainda sido emancipado. De
qualquer forma, podemos analisar os demais municípios, destacando-se, desde
então, uma grande concentração de renda em Formosa do Rio Preto (Tabela 41).
Estima-se que, em função dos dados de PIB per capita analisados, essa
concentração seja muito grande, atualmente, para os municípios de Luis Eduardo
Magalhães e Formosa do Rio Preto.
Tabela 41 – Desigualdade de renda no Brasil – Índice de Gini – 1991 e 2000 MUNICÍPIO 1991 2000 Salvador 0,651 0,658 Barreiras 0,615 0,630 Formosa do Rio Preto 0,721 0,795 Luis Eduardo Magalhães – – São Desidério 0,582 0,560 Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
d) Estrutura setorial Quanto à estrutura setorial do PIB de cada um desses municípios, para o
ano de 2004, conforme demonstra a Tabela 42, a seguir, observa-se que os mais
intensivos em agropecuária são Formosa do Rio Preto e São Desidério, merecendo
destaque o setor industrial de Luis Eduardo Magalhães, com 57,25%, acima dos
33 Considerou-se uma taxa de conversão para o dólar de 1,8. 34 Informação disponível em: <http://pt.wikipedia.org>. 35 O índice de Gini mede o grau de desigualdade existente na distribuição de indivíduos segundo a
renda domiciliar per capita. Seu valor varia de 0, quando não há desigualdade (a renda de todos os indivíduos tem o mesmo valor), a 1, quando a desigualdade é máxima (apenas um indivíduo detém toda a renda da sociedade e a renda de todos os outros indivíduos é nula).
157
48,51% para a Bahia, provavelmente decorrente do beneficiamento da soja, com a
presença da Bunge, caracterizando, juntamente com a Cargill, uma estrutura de
mercado oligopolista na região.
Tabela 42 – Estrutura setorial da Bahia, de Salvador e dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2004
SETORES ESTADO/MUNICÍPIOS AGROPECUÁRIA (%) INDÚSTRIA (%) SERVIÇOS (%)
BAHIA 10,70 48,51 40,79 SALVADOR 0,14 25,01 74,86 Barreiras 31,06 27,24 41,70 Formosa do Rio Preto 67,39 2,30 30,31 Luis Eduardo Magalhães 17,85 57,25 24,90 São Desidério 78,13 3,38 18,48 Fonte: Elaboração própria a partir de dados da SEI
e) Pessoal ocupado
De acordo com a análise do pessoal ocupado nesses municípios,
Barreiras é a cidade que mais emprega, principalmente no comércio, por ter sido
historicamente a cidade que pioneiramente se formou na região. Das quatro cidades
em estudo, Barreiras é a que apresenta menor renda per capita, então a maior base
de emprego formal se reflete em uma renda menor, embora superior à do Estado. O
detalhamento por município e por setores pode ser analisado na Tabela 43, para o
período de 1970 a 1995.
Tabela 43 – Pessoal ocupado no comércio, indústria e serviços, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/1995
MUNICÍPIOS ANO/SETOR BARREIRAS FORMOSA DO RIO
PRETO LUIS EDUARDO MAGALHÃES
SÃO DESIDÉRIO
Comércio 365 50 – 33Indústria 100 13 – 7
1970
Serviços 176 20 – 22Comércio 490 68 – 71Indústria 183 16 – 32
1975
Serviços 422 28 – 42Comércio 889 45 – 29Indústria 303 34 – 18
1980
Serviços 600 10 – 10Comércio 1.663 125 – 67Indústria 382 29 – 85
1985
Serviços 855 84 – 32Comércio 4.638 73 – 65Indústria 1.037 9 – 28
1995
Serviços 1.411 12 – 49Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
158
f) Número de estabelecimentos de comércio, indústria e serviços
Quanto ao número de estabelecimentos de comércio, indústria e serviços,
dos principais municípios produtores de soja no Oeste da Bahia, observa-se, na
Tabela 44, que o maior destaque, de 1970 para 1995, é para a cidade de Barreiras
nos três segmentos analisados, assim como ocorreu com pessoal ocupado. Isto se
explica pelo fato de que Barreiras é, historicamente, a principal metrópole da região,
agregando atividades de comércio, indústria e serviços.
Tabela 44 – Número total de estabelecimentos ou unidades locais de comércio, indústria e serviços, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/1995
MUNICÍPIOS ANO/SETOR BARREIRAS FORMOSA DO RIO
PRETO LUIS EDUARDO MAGALHÃES
SÃO DESIDÉRIO
Comércio 225 41 – 29Indústria 46 18 – 7
1970
Serviços 102 16 – 12Comércio 256 49 – 34Indústria 34 27 – 8
1975
Serviços 175 17 – 19Comércio 218 25 – 13Indústria 46 6 – 13
1980
Serviços 141 6 – 3Comércio 374 55 – 23Indústria 71 8 – 12
1985
Serviços 227 29 – 7Comércio 1.344 37 – 44Indústria 172 3 – 9
1995
Serviços 230 5 – 6Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
g) Renda média familiar per capita
Fazendo uma análise da renda média familiar per capita dos principais
municípios produtores de soja no Oeste da Bahia, de 1970 a 1991, observa-se, na
Tabela 45, uma grande evolução deste indicador nos três municípios pesquisados,
considerando que o município de Luis Eduardo Magalhães ainda não existia. Merece
atenção o caso de São Desidério que, de 1980 para 1991, reduziu a renda média
familiar per capita. Entretanto, como o município apresentou um PIB per capita
crescente entre 1999 e 2004, variando de R$ 7.677,02 para R$ 30.025,66 no
159
período, conforme já foi visto, supõe-se que a renda média familiar per capita
também deva ter aumentado nesses anos mais recentes, considerando, ainda, que
não tenha havido aumento da concentração de renda.
Tabela 45 – Renda média familiar per capita dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/1991
(em salário mínimo de set/91) MUNICÍPIO 1970 1980 1991
Barreiras 0,21 0,90 0,94Formosa do Rio Preto 0,12 0,57 0,60Luis Eduardo Magalhães – – –São Desidério 0,10 0,43 0,40
Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
Nesta análise, podemos citar Perroux (1964) para quem existiriam pólos
de crescimento, que seriam indutores de desenvolvimento. No caso da agroindústria
da soja em estudo, as processadoras são empresas de muito peso no pólo
(indústrias motrizes), nas localidades onde estão instaladas, tendo, portanto, a
capacidade de incrementar os negócios de outras empresas (indústrias movidas),
impulsionando variáveis socioeconômicas ligadas ao crescimento e ao
desenvolvimento econômico.
Assim, as indústrias processadoras estimulam a criação de outros
negócios no Oeste da Bahia. Nesse sentido, Uderman (1992) afirma que a
internalização de processos agroindustriais aprofunda a dinâmica de reestruturação
em andamento, estimulando o desenvolvimento de atividades comerciais e de
serviços de apoio, ao mesmo tempo que incentiva a implantação de indústrias não
diretamente vinculadas à sojicultura. Surgem, então, ao lado das atividades
acopladas à cadeia da soja, empresas não ligadas de forma direta à sojicultura, que
nascem em resposta ao crescimento da renda regional viabilizado por essa
produção.
h) Financiamentos
O crédito é um importante indicador de crescimento de uma determinada
região. Para analisar os financiamentos concedidos a produtores e cooperativas
para o custeio da lavoura de soja no Brasil e na Bahia, de 1999 a 2005, temos as
Tabelas 46 e 47, respectivamente.
160
Observa-se que, enquanto o número de contratos, o valor financiado e a
área financiada no Brasil diminuíram ao longo do tempo, na Bahia houve um
aumento significativo nessas mesmas variáveis e nesse mesmo período de tempo.
Enquanto, em 1999, o valor concedido a financiamento para a cultura da soja
representava 1,97% do valor do financiamento no Brasil, em 2005, essa participação
passa a ser de 5,34%, representando um crescimento significativo. Além disso, para
o Brasil, tanto o valor quanto a área financiados sofreram uma redução de valores
em 2004 e 2005, enquanto para a Bahia houve aumento. Caracteriza-se, portanto,
uma política de incentivo ao setor, por parte do governo, para o Estado da Bahia,
contribuindo para o crescimento da Região Oeste, onde está concentrada a
produção de soja.
Tabela 46 – Financiamentos concedidos a produtores e cooperativas para o custeio da lavoura de soja, Brasil, 1999/2005
ANO NÚMERO DE CONTRATOS
VALOR FINANCIADO (R$)
ÁREA FINANCIADA (em há)
1999 96.712 1.274.292.971,55 4.859.371,882000 47.677 1.236.334.287,36 5.164.757,532001 93.013 1.990.200.544,68 8.259.203,932002 98.875 2.765.267.094,04 8.617.675,022003 130.992 4.323.194.300,76 10.414.129,072004 139.688 5.360.892.218,75 9.194.975,212005 79.939 3.583.198.744,04 6.239.230,64Fonte: Banco Central. Anuário Estatístico do Crédito Rural, 1999 a 2005 Tabela 47 – Financiamentos concedidos a produtores e cooperativas para o custeio da lavoura de soja, Bahia, 1999/2005
ANO NÚMERO DE CONTRATOS
VALOR FINANCIADO (R$)
ÁREA FINANCIADA (em há)
1999 339 18.759.056,49 72.915,372000 446 25.641.557,32 125.725,712001 605 46.911.442,15 180.476,602002 620 69.410.310,07 211.122,562003 749 87.228.529,13 216.528,742004 1.105 139.334.308,33 214.231,862005 1.546 191.320.601,01 349.021,33Fonte: RAIS. Base de dados, 2005
Este estudo dos financiamentos para a região requer agora que a análise
seja desagregada pelos principais municípios produtores de soja no Oeste da
161
Bahia.36 Para todos os municípios, os maiores valores são destinados para custeio
ao invés de investimento, e a grande maioria para a atividade agrícola ao invés de
pecuária. Dos quatro municípios em análise, merece destaque, de 1999 a 2005, o
custeio agrícola destinado para o município de São Desidério, relativamente muito
maior do que o destinado aos demais municípios.
Para o ano de 2005, por exemplo, o financiamento de custeio agrícola
concedido ao município de São Desidério alcançou o valor de R$ 227.459.120,75
seguido de Barreiras com R$ 91.554.993,47. Isto se reflete no fato de que, conforme
vimos no item 3.2, São Desidério apresentou a maior área colhida da região em
2006, com 270.870 ha, seguido de Barreiras com 147.400 ha.
Quanto ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
(PRONAF), do Governo Federal, especificamente para custeio da lavoura da soja,
os dados mostram que os financiamentos concedidos não foram direcionados para a
Bahia, de 1999 a 2005 (Tabela 49). Desta análise decorre que os créditos
concedidos à região nesse período foram feitos diretamente aos produtores, sem os
incentivos deste programa, havendo um esforço interno de investimento na
produção.
Tabela 48 – Financiamentos rurais concedidos pelo Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), para custeio da lavoura da soja, Brasil e Bahia – 1999/2055
BAHIA BRASIL ANO NÚMERO DE
CONTRATOS TOTAL FINANCIADO
(EM R$) NÚMERO DE CONTRATOS
TOTAL FINANCIADO (EM R$)
1999 4 11.155,20 63.648 111.786.686,112000 0 0,00 56.432 103.178.534,542001 44 42.905,00 63.471 122.292.309,422002 0 0,00 72.224 196.886.349,592003 0 0,00 81.130 255.397.492,702004 0 0,00 112.418 514.484.454,342005 0 0,00 102.667 500.214.372,80Fonte: Banco Central. Anuário Estatístico do Crédito Rural 1999 a 2005
i) Consumo de energia elétrica
Buscando complementar a análise, foram levantados dados de consumo
de energia elétrica, que se traduz em um importante indicador de crescimento
36 Para um estudo mais detalhado, consultar as Tabelas 13 a 19, no Anexo A, que tratam desses
dados para os principais municípios produtores de soja no Oeste da Bahia, de 1999 a 2005.
162
econômico.37 Assim, de acordo com dados fornecidos pela Coelba referente ao
consumo agregado residencial, rural e urbano de energia elétrica, nos quatro
principais municípios produtores de soja no Oeste da Bahia, de 1997 a 2006,
observa-se, conforme podemos verificar no Gráfico 7, uma tendência crescente de
consumo para todos os municípios no período, com destaque para Luis Eduardo
Magalhães, que passou de 8.686 kWh em 2001 para 15.622.240 kWh em 2006.38
Gráfico 7 – Consumo residencial, rural e urbano de energia elétrica, 1997-2006 (em kWh) Fonte: Elaborada a partir de dados fornecidos pela Coelba.
j) Receita tributária Outro indicador a ser analisado em relação ao crescimento econômico da
região é a evolução da receita tributária desses quatro municípios. Para dados de
2001 a 2005, conforme indicado na Tabela 49, observa-se que, em Barreiras e
Formosa do Rio Preto, os valores praticamente dobraram, mas em São Desidério
esse crescimento foi muito maior, passando de R$ 147.882,00, em 2001, para R$
1.565.364,00, em 2005, representando um crescimento de mais de 1.000% no
período.
37 A autora gostaria de fazer um agradecimento aos gestores da Coelba, que gentilmente
designaram um técnico para desagregar, no sistema, as informações solicitadas acerca dos municípios em estudo.
38 Para uma análise mais detalhadas destas informações, consultar a Tabela 79 no Apêndice B.
163
Tabela 49 – Receita tributária dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 2001–2005
MUNICÍPIO 2001 2002 2003 2004 2005
Barreiras 3.368.769 – 5.048.585 6.833.317 7.925.258Formosa do Rio Preto 523.650 629.865 947.479 1.964.892 930.215Luis Eduardo Magalhães – – – – –São Desidério 147.882 602.767 827.724 1.307.405 1.565.364Obs.: Essa receita tributária inclui IPTU, ISS e outros tributos. Fonte: Elaborada a partir de dados do Ipeadata.
l) IDH-M– índice de desenvolvimento humano municipal39
O índice de desenvolvimento humano (IDH) é um importante indicador de
desenvolvimento; como o seu resultado varia de zero a um, interpreta-se que,
quanto mais próximo de zero estiver, menos desenvolvimento, e quanto mais
próximo de um, mais desenvolvimento na região.
Dada a sua representatividade na análise deste trabalho, foram
levantados esses indicadores para os principais municípios produtores de soja no
Oeste da Bahia, bem como para Salvador, Bahia e Brasil, para fins comparativos. A
pesquisa só encontrou disponibilidade desses dados, decenalmente, de 1970 a
2000, entretanto, observa-se que todos os indicadores são crescentes, indicando
melhorias significativas para as cidades da região (Tabela 50).
Para todos os municípios em estudo no Oeste da Bahia, nesse período,
com exceção de Luis Eduardo Magalhães, que ainda não havia sido emancipado
nessa época, o indicador mais que dobrou, o que pode estar associado a programas
sociais implementados pelo Governo Federal. Ressalta-se, entretanto, que o IDH
tem tido melhorias para todo o Brasil, conforme indica a tabela, para o caso da Bahia
e do Brasil.
39 Metodologicamente, o IDH – índice de desenvolvimento humano computa o PIB per capita, depois
de corrigi-lo pelo poder de compra da moeda de cada país, e leva em conta dois outros componentes: a longevidade e a educação. Para aferir a longevidade, o indicador utiliza números de expectativa de vida ao nascer, e o item educação é avaliado pelo índice de analfabetismo e pela taxa de matrícula em todos os níveis de ensino. A renda é mensurada pelo PIB per capita, em dólar PPC (paridade do poder de compra, que elimina as diferenças de custo de vida entre os países). Essas três dimensões têm a mesma importância no índice, que varia de zero a um. (wwww.pnud.org.br)
164
Tabela 50 – Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) decenal do Brasil, Bahia, Salvador e principais municípios produtores de soja da Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/2000 LOCALIDADE 1970 1980 1991 2000
BRASIL 0,462 0,685 0,696 0,766BAHIA 0,332 0,515 0,590 0,688Salvador 0,580 0,742 0,751 0,805Barreiras 0,307 0,550 0,628 0,723Formosa do Rio Preto 0,290 0,442 0,558 0,646Luis Eduardo Magalhães – – – –São Desidério 0,251 0,367 0,489 0,610Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
Na Tabela 51, podemos verificar a classificação desses municípios no
Estado da Bahia, para os anos de 1991 e 2000. Observa-se que Barreiras ocupa a
11ª posição da Bahia, em 2000, tendo saído da 15ª posição, em 1991, passando a
representar uma excelente posição a nível estadual. Comparativamente, entretanto,
Formosa do Rio Preto teve uma piora na sua classificação estadual, provavelmente
decorrente de melhorias proporcionalmente maiores em outros municípios da Bahia.
Tabela 51 – Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de Salvador e dos principais municípios produtores de soja e sua classificação no Estado, Região Oeste do Estado da Bahia, 1991/2000
1991 2000 MUNICÍPIOS IDH CLASSIFICAÇÃO IDH CLASSIFICAÇÃO
Salvador 0,751 1 0,805 1Barreiras 0,627 15 0,723 11Formosa do Rio Preto 0,554 89 0,646 118Luis Eduardo Magalhães – – – –São Desidério 0,491 282 0,610 253Fonte: Elaboração própria a partir do Censo Municipal 2000, SEI
m) Pobreza A análise do indicador de pobreza dos moradores dos principais
municípios produtores de soja no Oeste da Bahia é também uma importante
referência de estudo. Os dados pesquisados estão apresentados na Tabela 52, para
o período de 1970 a 2000. Observa-se que as informações apontam para uma
redução da pobreza em todas as cidades pesquisadas e destaca-se que Barreiras
foi o município que mais reduziu a pobreza nesse período. Entretanto, nota-se que,
em todos os casos, o índice ainda se apresenta elevado, principalmente em
165
Formosa do Rio Preto e São Desidério, o que acena para uma concentração de
renda, quando cruzamos esta informação com o PIB per capita anteriormente
analisado desses municípios.
Tabela 52 – Pobreza (% de pessoas pobres) dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/2000 MUNICÍPIO 1970 1980 1991 2000 Barreiras 92,21 61,63 50,39 37,40Formosa do Rio Preto 98,65 73,63 78,19 76,41Luis Eduardo Magalhães – – – –São Desidério 99,51 79,95 76,47 63,27Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA Obs. 1: 1970 e 1980 - % de pessoas com renda familiar per capta inferior a 50% do salário mínimo de setembro de 1991. Obs. 2: 1991 e 2000 - % de pessoas com renda domiciliar per capta inferior a 50% do salário mínimo de agosto de 2000.
n) Número de leitos hospitalares
Um estudo da evolução histórica do número de leitos em hospitais
oferecidos nos principais municípios produtores de soja no Oeste da Bahia, que
representa um importante indicador de acesso dos moradores à rede hospitalar,
aponta para uma situação geral de não melhoria para a população local. Os dados
indicam até uma redução do número de leitos em Barreiras, considerada a
metrópole da região, bem como em São Desidério, conforme podemos observar na
tabela 53, referente ao período de 1996 a 2004.
Entretanto, Formosa do Rio Preto passa a oferecer 16 leitos, em 2003, o
que ocorre tardiamente, já que, até então, nenhum leito era oferecido na cidade,
aumentando para 29, em 2004; o mesmo ocorre para Luis Eduardo Magalhães, que
passa a oferecer 18 leitos, em 2004. Deve-se ressaltar que estes dados não são
compatíveis, socialmente, com os altos índices de concentração de renda
observados anteriormente nesses municípios e nesse mesmo período, indicando
uma situação social desfavorável à população local.
Tabela 53 – Número de leitos dos principais municípios produtores de soja conveniados ao SUS, Região Oeste do Estado da Bahia, 1996–2004 MUNICÍPIO 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 Barreiras 346 346 346 346 364 364 381 339 321*Formosa do Rio Preto – – – – – – – 16 29Luis Eduardo Magalhães – – – – – – – – 18São Desidério 26 26 26 26 26 26 26 26 24Fonte: Elaboração própria a partir de dados da SEI * Deste total, apenas 280 são conveniados ao SUS
166
o) Quantidade de hospitais conveniados ao SUS A quantidade de hospitais conveniados ao SUS, nos principais municípios
produtores de soja no oeste da Bahia, de 1996 a 2004, pode ser analisada na
Tabela 54, a seguir. A evolução que houve nesse período ocorreu em Barreiras, que
passou de dois hospitais particulares para três, nesse período; Formosa do Rio
Preto que, a partir de 2003, passou a ter um hospital municipal; e Luis Eduardo
Magalhães que, a partir de 2004, passou, também, a ter um hospital municipal
conveniado ao SUS.
O aumento de hospitais privados aponta para o atendimento a classes
mais abastadas. Como houve um grande aumento da renda per capita nesses
municípios, nos últimos dez anos, isto indica uma reprodução do modelo de
desenvolvimento regional concentrado e excludente como o brasileiro.
Tabela 54 – Quantidade de hospitais conveniados ao SUS, segundo a dependência administrativa, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1996–2004 MUNICÍPIO/ DEPENDÊNCIA ADM. 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Est. 1 1 1 1 1 1 1 1 1Mun. 1 1 1 1 1 1 1 1 1
Barreiras
Priv. 2 2 2 2 3 3 3 3 3Formosa do Rio Preto Mun. – – – – – – – 1 1Luis Eduardo Magalhães Mun. – – – – – – – – 1São Desidério Mun. 1 1 1 1 1 1 1 1 1Fonte: Elaboração própria a partir de dados da SEI
p) Esperança de vida A esperança de vida desses municípios também foi pesquisada mas,
infelizmente, os dados encontrados estão disponíveis de forma incompleta
historicamente. A Tabela 55 demonstra esses dados, de 1970 a 2000, onde se pode
observar que, em todos os casos, houve avanço nesse sentido, o que
provavelmente foi também uma evolução de tendência nacional. Deve-se ressaltar
que Luis Eduardo Magalhães ainda não havia sido emancipado no período indicado.
167
Tabela 55 – Evolução da esperança de vida ao nascer dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia e Salvador – 1970/2000 MUNICÍPIO 1970 1980 1991 2000
Barreiras – – 57,64 59,99Formosa do Rio Preto – – 60,83 64,77Luis Eduardo Magalhães – – – –São Desidério 48,77 53,45 58,00 63,23Salvador 46,94 56,17 62,49 66,53Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
q) Mortalidade infantil A mortalidade infantil é também um importante indicador de
desenvolvimento. O levantamento dos dados feito nesta pesquisa está consolidado
na Tabela 56 que, apesar de incompleta, indica uma redução da mortalidade infantil
para os principais municípios produtores de soja no Oeste da Bahia, de 1970 a
2000, apontando para uma melhoria das condições de vida locais. Esse indicador
apresentou melhoria significativa, que pode estar ligada a projetos de saúde pública,
vacinação, etc.; entretanto, os dados ainda são muito superiores aos encontrados
em Salvador.
Tabela 56 – Evolução da Mortalidade infantil (por mil nascidos vivos) dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia e Salvador, 1970/2000 MUNICÍPIO 1970 1980 1991 2000
Barreiras – – 80,85 61,56Formosa do Rio Preto – – 64,51 43,11Luis Eduardo Magalhães – – – –São Desidério 151,22 114,02 78,90 48,62Salvador 167,25 94,82 56,89 37,20Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
r) Analfabetismo Com relação ao analfabetismo, que é parte do IDH, conforme já foi
explicado, esta pesquisa observou uma redução nesta variável, analisando os
principais municípios produtores de soja no Oeste da Bahia, de 1970 a 2000 (Tabela
57). Observa-se que não existem dados para o município de Luis Eduardo
Magalhães, pois o mesmo ainda não havia sido emancipado.
168
Entretanto, entende-se que esta evolução não é particular da região em
estudo, mas sim uma tendência nacional, que pode estar associada a programas
sociais do governo federal, como o Bolsa Escola, com os quais o Brasil tem
conseguido reduzir o analfabetismo. Além do mais, esses indicadores encontram-se,
ainda, muito acima dos identificados em Salvador, por exemplo, principalmente em
Formosa do Rio Preto e São Desidério.
Tabela 57 – Evolução das pessoas analfabetas com 15 anos e mais dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia e Salvador, 1970/2000
(em %) MUNICÍPIO 1970 1980 1991 2000 Barreiras 52,80 36,30 26,30 15,6Formosa do Rio Preto 61,20 50,00 47,20 32,30Luis Eduardo Magalhães – – – –São Desidério 67,70 70,70 60,70 38,1Salvador 17,60 13,70 9,40 6,30Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
s) Domicílios com água canalizada Na Tabela 58, a seguir, observa-se a evolução do número de domicílios
com água canalizada desses municípios, de 1970 a 2000, onde fica evidente a alta
taxa de crescimento, à exceção de Luis Eduardo Magalhães, que ainda não existia
enquanto município. Isto pode estar sinalizando uma inclusão da população nesse
benefício, já que a renda desses municípios, conforme já foi analisado, é bastante
elevada, justificando tal incremento. É importante destacar que essa é uma questão
diretamente relacionada com a saúde pública, refletindo melhorias nesse sentido.
Tabela 58 – Evolução do número de domicílios com água canalizada na rede geral, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia,1970/2000 MUNICÍPIO 1970 1980 1991 2000
Barreiras 845 2.976 9.214 27.494Formosa do Rio Preto 0 179 747 2.058Luis Eduardo Magalhães – – – –São Desidério 86 109 765 2.137Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
169
t) Domicílios com iluminação elétrica A evolução do número de domicílios com iluminação elétrica nesses
municípios apresenta também uma alta taxa de crescimento, para esse mesmo
período de 1970 a 2000. Esta variável se articula com o indicador anterior, passando
pelo mesmo tipo de análise, no sentido do alto nível de renda concentrado nessas
localidades. Para um melhor detalhamento, ver a Tabela 59.
Tabela 59 – Evolução do número de domicílios com iluminação elétrica, dos principais municípios produtores de soja, Região Oeste do Estado da Bahia, 1970/2000 MUNICÍPIO 1970 1980 1991 2000
Barreiras 1.221 3.259 14.965 29.197Formosa do Rio Preto 71 278 1.234 2.044Luis Eduardo Magalhães – – – –
São Desidério 0 253 1.345 2.681Fonte: Elaboração própria a partir de dados do IPEA
De uma maneira geral, os indicadores escolhidos para verificação do nível
de desenvolvimento regional apresentaram uma melhoria importante, sinalizando
que o crescimento econômico pode ter tido rebatimento nas condições de vida da
região, mas ainda é evidente o nível de exclusão social, principalmente nos dados
de saúde.
Cabe apenas ressaltar que os indicadores analisados são gerais, de
forma que, para um maior aprofundamento, seria preciso fazer um estudo mais
detalhado de outros aspectos, como meio ambiente, nível de nutrição, participação
política, perspectivas sociais, relações de poder, governança territorial, etc., para
caracterizar um processo de desenvolvimento. Entretanto, com os elementos aqui
levantados, pode-se afirmar que houve uma certa sintonia entre o crescimento
econômico e os indicadores analisados, bem como da expansão produtiva e
institucional. Deve-se destacar, porém, que pouco se pesquisou sobre o nível de
integração das instituições e de participação das populações nesse processo, o que
não estava proposto neste trabalho.
170
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa buscou analisar os impactos do cluster da soja no
desenvolvimento regional do Oeste da Bahia, através de uma metodologia teórico-
empírica, com base em um estudo de caso da agroindústria da soja existente na
região. Para tanto, partiu-se do pressuposto de que o desenvolvimento é resultado
de uma co-evolução produtiva e institucional, adotando como aportes teóricos as
abordagens de economia regional e de economia institucional. Assim, destaca-se
que, de todo o trabalho realizado, após a identificação do aglomerado enquanto um
cluster, o maior esforço esteve justamente em articular a dimensão produtiva à
institucional, integrando essas dinâmicas para tentar compreender a questão do
desenvolvimento.
Com base no estudo empírico realizado, a partir de dados primários e
secundários, as questões de pesquisa definidas foram articuladas a determinados
conceitos e variáveis, de forma que a abordagem da economia regional foi utilizada
para ajudar a definir o aglomerado em estudo como um cluster, bem como para
analisar a contribuição desse aglomerado na questão do desenvolvimento; e a
abordagem institucional, incluindo aí a economia dos custos de transação e a teoria
evolucionista, foi utilizada para analisar a evolução das instituições, as estruturas de
governança que se definem no cluster e os seus aspectos tecnológicos e processos
de inovação.
Também se deve ressaltar a dificuldade encontrada no levantamento de
dados. Na pesquisa de campo foram inúmeros os empecilhos, desde a aplicação
dos questionários com os produtores, até as entrevistas realizadas com os demais
integrantes do cluster, pela pouca disponibilidade e difícil acesso aos respondentes.
Quanto aos dados secundários, muitas vezes foram encontradas informações
defasadas, apenas até o ano de 2000, comprometendo a qualidade da análise, já
171
que um dos municípios estudados, Luis Eduardo Magalhães, foi emancipado em
2000, ficando, portanto, sem parâmetros analíticos e comparativos em muitas das
variáveis utilizadas. Neste caso, a análise foi respaldada apenas nos dados da
pesquisa de campo.
A partir da problemática levantada no trabalho, algumas questões foram
formuladas e respondidas ao longo do seu desenvolvimento. Inicialmente, foi
levantada a questão sobre qual o tipo de aglomeração existente no complexo
agroindustrial da soja no Oeste da Bahia. Para tanto, a partir dos estudos de
Economia Regional, aplicou-se, inicialmente, o modelo desenvolvido por Crocco et
alli (2003), como forma de mensurar quantitativamente a existência do aglomerado,
a partir do que ele denominou de índice de concentração.
Para o cálculo do IC, foram utilizados dados de emprego, da base de
dados da RAIS, referentes aos quatro principais municípios produtores de soja da
região em estudo: Barreiras, Luis Eduardo Magalhães, Formosa do Rio Preto e São
Desidério. Como o resultado foi maior do que zero, interpreta-se que o índice de
concentração está acima da média nacional, representando indícios de
concentração. Também é importante destacar que o cálculo do HHmij, como parte do
IC, foi menor do que zero, o que leva à interpretação de que, possivelmente, há
especialização na região, indicando que a contribuição do setor para o Brasil é maior
que a contribuição da região para o Brasil.
Posteriormente, constatada a existência do aglomerado, e com base no
conceito de cluster desenvolvido por Porter (1998), desenvolveu-se a análise da
interação de diversos atores com o referido aglomerado, caracterizando esse
aglomerado em estudo enquanto um cluster. Com base nos resultados encontrados,
recomenda-se o desenvolvimento de políticas públicas para o setor, no sentido de
potencializar a sua dinâmica na região. Conforme a pesquisa de campo realizada, as
maiores necessidades encontram-se na questão da infra-estrutura, cabendo um
esforço conjunto entre os governos federal e estadual para suprir essas demandas.
Outra questão diz respeito à contribuição desse aglomerado para o
desenvolvimento da região. A esse respeito, foram pesquisados diversos indicadores
socioeconômicos referentes aos principais municípios produtores de soja, com o
objetivo de avaliar a sua evolução nos últimos anos. Considerando a complexidade
que cerca o conceito de desenvolvimento, constatou-se, de uma forma geral, uma
melhora significativa nos indicadores escolhidos para avaliar esse nível de
172
desenvolvimento na região, embora os dados referentes à saúde deixem muito a
desejar.
Pode-se afirmar que, nesse período estudado, houve uma mesma
tendência de crescimento entre os indicadores produtivos, institucionais,
tecnológicos e socioeconômicos, decorrentes da cultura da soja. Entretanto, os
indicadores ligados à produção e à dinâmica tecnológica do cluster foram
significativamente superiores aos demais.
Quanto à evolução das instituições no Oeste da Bahia, a análise foi feita a
partir de uma abordagem institucionalista, considerando uma análise histórica da
formação de alguns dos principais municípios que compõem o cluster. Das quatro
principais cidades que o formam, Barreiras é a mais desenvolvida, considerada a
metrópole da região.
Isso se explica porque, desde o século XIX, consagrou-se como uma
cidade portuária comercial, centralizando a distribuição de todo o comércio da
região. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi escolhida para a construção de um
aeroporto, financiado pelos Estados Unidos por questões estratégicas ligadas à
guerra e, a partir de então, incrementa ainda mais a sua economia. Além disso, com
a inauguração de Brasília, em 1960, e as conseqüentes novas malhas viárias
desenvolvidas, o município integra-se ao Brasil Central e à lógica da economia
nacional. Consideram-se, ainda, os investimentos realizados localmente, pelos
governos federal e estadual, em relação à construção de novas estradas e projetos
de irrigação. Atualmente, é a localidade da região que apresenta os melhores
indicadores socioeconômicos, prevalecendo a atividade econômica comercial,
devendo-se destacar também que lá se instalou a Cargill, uma grande indústria
esmagadora de grãos.
No caso de Luis Eduardo Magalhães, a cidade nasceu a partir de um
planejamento privado, que teve início com a construção de um posto de gasolina,
cujo distrito passou a ser denominado de Mimoso do Oeste. A sua ascensão
enquanto centro urbano teve o apoio da esfera municipal, à época Barreiras, e mais
tarde se emancipou. Integrado à dinâmica da economia local desde então, o
município é hoje um dos principais produtores de soja da região, abrigando a Bunge
Alimentos, uma multinacional processadora de grãos, além de outras menores.
Deve-se ressaltar que o PIB per capita desta cidade é tão elevado que pode ser
comparado ao da Espanha. Esse elevado padrão de renda, entretanto, não é
identificado nas variáveis socioeconômicas pesquisadas.
173
O município de Formosa do Rio Preto é também um dos maiores
produtores de soja da região. Em 1985, deu-se início à implantação de dois projetos,
nessa localidade, viabilizados pelos incentivos repassados aos produtores através
do programa denominado PRODECER, financiado pelos Governos do Brasil do
Japão. Este programa impulsionou a ocupação e a modernização da cultura da soja
na região, assim como para o restante dos cerrados do Brasil.
Quanto a São Desidério, a pesquisa mostrou que foi o município que mais
recebeu financiamentos concedidos a produtores e cooperativas do Oeste da Bahia,
de 1999 a 2005, especificamente para a produção da soja. Como resultado, é o
município que apresentou a maior área colhida em 2006.
Desta forma, podemos afirmar, a partir de uma análise histórica desses
municípios, que as instituições no Oeste da Bahia evoluíram e se consolidaram
economicamente, em parte, a partir de programas de incentivo por parte do governo,
bem como de financiamentos direcionados principalmente ao custeio da lavoura.
Assim, essas variáveis, dentre outras, respaldam a questão institucional
como determinante para o desenvolvimento regional, com a criação de fortes raízes
dos agricultores que chegam à região, trazendo a história da cultura da soja do sul,
que trouxe não apenas competências produtivas, mas aspectos culturais e
institucionais, como a cooperação e participação.
Uma outra questão aborda como são definidas as estruturas de
governança nesse aglomerado. A pesquisa indicou que, de uma forma geral, existe
um controle exercido pelas processadoras em relação à dinâmica da cadeia,
ressaltando-se que este é o ator que controla os ativos de maior especificidade.
Mas, na análise da interação entre os atores, definem-se também outras estruturas
de governança, específicas em determinadas relações. As principais transações
analisadas, considerando a especificidade dos ativos envolvida em cada uma delas,
foram:
a) Entre distribuidores e indústrias processadoras - a estrutura de
governança se dá via mercado;
b) Entre indústrias de esmagamento/refino e indústria de derivados -
ocorre a integração vertical;
c) Entre indústrias de esmagamento e indústrias de ração - ocorre a
verticalização;
d) Entre indústrias processadoras/originadores e produtores - ocorre uma
estrutura de governança hierárquica;
174
e) Entre tradings e indústrias processadoras – considerando o mercado
externo, ocorre uma estrutura de governança via mercado; e
f) Entre produtores e indústria de insumos – vão ocorrer variadas formas
de estrutura de governança.
Nesta questão de governança, cabe enfatizar que as processadoras
exercem o que podemos chamar de governança produtiva, em função do controle da
dimensão produtiva do processo, enquanto a AIBA, a principal associação local,
exerce o que podemos chamar de governança institucional, pelo importante papel de
intervenção que desempenha junto a órgãos públicos e a outras organizações na
defesa dos produtores. Desta forma, dá-se a integração entre as dimensões
produtiva e institucional, que é fundamentalmente forte entre os atores do cluster,
estando grande parte da população à margem desse processo.
Por fim, questionou-se como se dá o processo de inovação ao longo da
cadeia, e qual é a sua contribuição para a dinâmica endógena de desenvolvimento.
A pesquisa se deu com diversos agentes locais, constatando que a introdução de
inovações ocorre pelos produtores de sementes, de insumos, de máquinas agrícolas
e pelas indústrias, por inovações incorporadas aos bens de capital.
No que se refere à tecnologia de esmagamento e refino do óleo, esta é
bastante difundida, não constituindo barreira à entrada de novas firmas. As
inovações tecnológicas trazidas para essa indústria de esmagamento e refino do
óleo são também exógenas, já que são dominadas por multinacionais,
caracterizando estruturas de mercado oligopolistas. Assim, essas tecnologias são
desenvolvidas na área de equipamentos, sistemas de informação e automação, etc,
caracterizando-se como um setor de tecnologia dominada pelo ofertante,
prevalecendo as inovações incrementais.
Para a produção de insumos, máquinas agrícolas e bens de capital, a
inovação se dá de forma incremental; e para a produção de sementes a inovação se
dá de forma radical, pela denominada biotecnologia, desenvolvida por empresas
multinacionais. É importante destacar que esse processo de P&D é desenvolvido
fora da região, e é então trazido e incorporado à especificidade da região.
Entretanto, nesse processo, identificou-se uma contribuição importante da Fundação
BA, ligada à AIBA, na pesquisa de novas cultivares, melhoramento de variedades,
ações contra pragas, etc., mais uma vez constatando-se uma importante integração
da questão institucional com a produtiva.
175
Conforme pode ser observado, a pesquisa indicou que existe, no Oeste
da Bahia, aliada à estrutura produtiva da soja, uma infra-estrutura institucional na
região. Este contexto pode explicar os indícios de desenvolvimento que foram
levantados a partir de indicadores socioeconômicos, caracterizando o que foi
denominado de co-evolução produtiva e institucional, que é o cerne da compreensão
do conceito de desenvolvimento aqui abordado.
Nesse aspecto, como apontam as contribuições teóricas utilizadas, o
papel das políticas públicas, de forma articulada e estratégica, seria imprescindível
para que essa co-evolução dos processos produtivos e institucionais do cluster de
soja se difundisse para a região, pois o padrão de desenvolvimento é ainda muito
excludente.
Como esse conceito de desenvolvimento é bastante amplo e complexo,
com diversos aspectos a serem considerados, fica aqui a sugestão, como uma
agenda de trabalhos futuros, de novos estudos para um maior aprofundamento do
tema.
176
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