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VEJA E ÉPOCA NA COPA DO MUNDO 1 um olhar sobre os dispositivos de enunciação estabelecidos pelos semanários durante o Mundial VEJA E ÉPOCA IN THE WORLD CUP a look at the enuciation devices established for weeklies during the World Cup Juliano Vasconcelos Magalhães Tavares 2 Resumo O objetivo deste artigo é identificar e analisar os dispositivos de enunciação, isto é, os contratos de leitura estabelecidos pelas revistas Veja e Época, nas edições posteriores à abertura da Copa do Mundo 2014 e à derrota do Brasil contra a Alemanha, momentos escolhidos por serem considerados os mais significativos no período. A enunciação, ou seja, os “modos de dizer” desses semanários foram analisados por meio de suas capas e títulos, bem como a articulação desses elementos junto a imagens. De maneira geral, observou-se especialmente como a cobertura do Mundial foi politizada pelos meios citados acima, cada qual estabelecendo suas formas de contratos com o leitor. Palavras-chave: Copa do Mundo. Contrato de leitura. Veja. Época. Política. Abstract The goal of this article is identify and analyze the enunciation devices, that is, the reading contracts established by both magazines Veja and Época, in later editions to the opening of the World Cup 2014 and Brazil`s defeat against Germany, chosen moments for being considered significant in the period. The 1 Trabalho apresentado no GT [Dispositivos e textualidades midiáticas]. 2 PUC Minas, Programa de Pós-graduação em Comunicação Social ([email protected] ) VIII Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais https://ecomig2015.wordpress.com/ | [email protected]

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VEJA E ÉPOCA NA COPA DO MUNDO1

um olhar sobre os dispositivos de enunciação estabelecidos pelos semanários durante o Mundial

VEJA E ÉPOCA IN THE WORLD CUP

a look at the enuciation devices established for weeklies during the World Cup

Juliano Vasconcelos Magalhães Tavares2

Resumo

O objetivo deste artigo é identificar e analisar os dispositivos de enunciação, isto é, os contratos de leitura estabelecidos pelas revistas Veja e Época, nas edições posteriores à abertura da Copa do Mundo 2014 e à derrota do Brasil contra a Alemanha, momentos escolhidos por serem considerados os mais significativos no período. A enunciação, ou seja, os “modos de dizer” desses semanários foram analisados por meio de suas capas e títulos, bem como a articulação desses elementos junto a imagens. De maneira geral, observou-se especialmente como a cobertura do Mundial foi politizada pelos meios citados acima, cada qual estabelecendo suas formas de contratos com o leitor.

Palavras-chave: Copa do Mundo. Contrato de leitura. Veja. Época. Política.

Abstract

The goal of this article is identify and analyze the enunciation devices, that is,  the reading contracts established by both magazines Veja and Época, in later editions to the opening of the World Cup 2014 and Brazil`s defeat against Germany, chosen moments for being considered  significant in the period. The enunciation, or “ways of saying” of these weeklies were analyzed by covers and titles as well as these elements articulation along with pictures. In general, it was observed especially as the World coverage has been politicized by the media mentioned above, each establishing their ways of contracts with the readers.

Keywords: World Cup. Reading Contract. Veja. Época. Politics.   

1 Introdução

Sem dúvida, a Copa do Mundo no Brasil ficará na história do país, não só pela magnitude

do evento, mas também pelo contexto quase caótico em que teve início e pelo resultado contra a

1 Trabalho apresentado no GT [Dispositivos e textualidades midiáticas].

2 PUC Minas, Programa de Pós-graduação em Comunicação Social ([email protected]) VIII Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais

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Alemanha, jamais esperado por nenhum brasileiro. Partindo desses pressupostos, iniciou-se este

artigo tratando das relações entre a Copa do Mundo e o contexto em que ocorreu, atentando para

questões políticas e econômicas.

Na segunda parte do trabalho, foi realizada uma discussão acerca do dispositivo de

enunciação “contrato de leitura” (VERÓN, 2004), com o objetivo de dar embasamento à análise

feita posteriormente. Outra questão exposta no artigo é a caracterização dos meios a serem

analisados, os semanários Veja e Época.

Já na análise, realizada junto a reportagens das revistas, mais especificamente nas edições

que cobriram a abertura da Copa do Mundo e a derrota contra a Alemanha, aplicou-se o método

do pesquisador argentino. Atentando para essas edições, fica claro que as duas revistas

utilizaram-se de estratégias para capturar o leitor e estabelecer, por meio de seus diferentes

modos de dizer, uma relação com o receptor.

2 Copa do Mundo 2014: contexto e questões político-eleitorais

O clima realmente era de festa. Tudo parecia estar caminhando de forma muito positiva.

Um estudo encomendado pelo governo brasileiro ao Instituto FSB Pesquisa (MELLO, 2013)

expunha o bom momento otimista que a nação estava vivendo, com reflexos inclusive na mídia

no exterior. Essa pesquisa foi realizada entre os dias 22 de outubro e 15 de dezembro de 2012. Ao

todo, de acordo com Mello (2013), foram ouvidos 100 jornalistas em 10 países, na Europa, América

Latina e Estados Unidos. Todos esses locais foram escolhidos pela própria equipe de

Comunicação do Ministério do Esporte. A pesquisadora explica que, entre outras questões,

perguntou-se a esses profissionais da informação que imagem eles tinham dos principais

organizadores do Mundial no Brasil: “Que imagem você tem do governo brasileiro/ da

Confederação Brasileira de Futebol (CBF), da Federação Internacional de Futebol (FIFA) /do

Comitê organizador local da Copa no Brasil: positiva ou negativa?” (MELLO, 2013, pg. 9). Pelas

respostas obtidas no estudo, a avaliação parece inclusive ter superado as expectativas. Como

expõe Mello, a pesquisa revelou que:

entre os atores responsáveis pela Copa do Mundo, a maior avaliação positiva é, de longe, a do Governo Brasileiro, com 86% de respostas “positivas”. Depois aparecem a CBF (57%) e o Ministério do Esporte (55%). A FIFA tem a imagem mais negativa (60%), seguida pela CBF (29%) e pelo COL (26%). Ministério do

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Esporte e COL têm os maiores índices de desconhecimento (40% e 32%, respectivamente). (MELLO, 2013, p.9).

Tal resultado fazia todo o sentido. De acordo com Lopes e Pereira (2014), estimava-se

que o país do futebol viesse a receber 600.000 turistas estrangeiros em visita às doze cidades-

sede da Copa. Seria uma oportunidade única para que o Brasil expusesse suas potencialidades

turísticas, bem como viesse a modernizar vários segmentos de sua estrutura.

No entanto, em 2013, em plena Copa das Confederações, o cenário brasileiro e,

consequentemente, o clima de otimismo geral foi completamente modificado, especialmente

entre os brasileiros. Mobilizados por suas próprias insatisfações e atentos ao excesso de gastos

públicos realizados com vistas aos megaeventos, milhares foram às ruas para protestar. De

acordo com Ricci (2014), algum tempo após a Copa das Confederações, mais especificamente

no final de 2013, os Comitês Populares da Copa (os doze enfeixados na Articulação Nacional

dos Comitês, a Ancop) criaram um slogan que acabou ganhando impacto e sendo utilizado em

muitos protestos pelo país: “Não vai ter Copa”.

O que teria ocorrido? Certamente muitas foram as razões que provocaram os protestos e

insatisfação que tiveram seu auge em 2013, mas que, considerando nuances e o nível de

intensidade, ocorreram em 2014 e vêm ocorrendo em 2015. Para Ricci:

muito se alardeou nos últimos anos sobre os 40 milhões de brasileiros que deixaram a margem da sociedade – viviam abaixo da linha da pobreza – para serem incluídos pelo consumo. Não foram incluídos pelos direitos ou pela política, o que geraria um efeito político e social distinto do que efetivamente ocorreu. (RICCI, 2014, p.10).

Apenas para esclarecer, de acordo com o pesquisador:

a inclusão pelo direito, como a luta social organizada numa estrutura sindical ou num movimento social, fortalece o espírito coletivo e a noção de cidadania ativa. A inclusão pela política, derivada da conquista pelo voto ou pela militância partidária, também fortalece o espírito coletivo e as instituições de representação. (RICCI, 2014, p.11).

Como o país não passou por esses processos, ele explica que o Brasil teria vivido um

período de consolidação acelerada de um grande mercado consumidor interno e 2010 teria sido o auge

dessa trajetória (RICCI, 2014). Certamente, esse clima de otimismo motivado por um período de bonança

na economia refletiu-se na forma de condução do governo, especialmente no que diz respeito aos trâmites e

obras relacionados aos megaeventos que seriam sediados no país. No entanto:

o que não se disse é que vivíamos lastreados nos investimentos chineses. Segundo estudo da China Global Investment Tracker, o Brasil foi principal beneficiário de investimentos chineses em 2010: US$ 13,7 bilhões [...] Em 2013, este volume se

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reduziu a 20%. E, pior, a China decidiu competir com o Brasil na venda de produtos à Argentina, o terceiro maior importador de produtos brasileiros (atrás de China e EUA). (RICCI, 2014, p.11).

Todas essas questões, reunidas a outras, provocaram uma grande rejeição à Copa. Com efeito,

algumas semanas antes do início do evento o clima polêmico era tão evidente que algo inusitado

para o país do futebol ocorreu. De acordo com Lati:

segundo levantamento feito pela Editora Abril, nove em cada dez brasileiros temem que a Copa deixe uma impressão negativa do seu país. Apenas 13% acham que o evento deixará coisas positivas para o Brasil, 87% dizem que estão insatisfeitos com o fato de sediarmos a competição e mais da metade usou a palavra "vergonha" para descrever seus sentimentos face ao evento. (LATI, 2014, p.10)3.

Não só o governo na condução do Mundial, mas também a mídia, deram sua contribuição

para que a rejeição chegasse a esse ponto, especialmente no que diz respeito aos agendamentos

midiáticos no período. Como afirmam Oliveira e Figueira:

[...] tanto o grande sistema midiático enfatizou mais os aspectos negativos do que os positivos, quanto houve falhas do governo federal ao não divulgar para o cidadão brasileiro quais benefícios ele teria com a realização do certame no país (só poucos meses antes do evento o governo iniciou campanha publicitária com essa finalidade, provavelmente tarde demais para reverter a onda de opinião). (OLIVEIRA; FIGUEIRA, 2014, p.24).

Considerando as questões apontadas acima, entre outras, era de se esperar que a Copa

viesse a ser relacionada a questões políticas e eleitorais. Como afirmam Telles, Sampaio e

Baptista:

durante todo o mandato, o governante e os seus opositores travam disputa para controlar a forma como a opinião pública julga o desempenho do governo. Essa disputa passa pela imputação de responsabilidade ao presidente e pelo destaque dado a determinados temas em detrimento de outros. (TELLES; SAMPAIO; BAPTISTA, 2014, p.4).

E sem dúvida, a avalanche de agendamentos críticos à Copa, bem como as manifestações

de 2013, produziram um reflexo direto na opinião pública. “A presidente Dilma viu a sua

popularidade ter uma queda considerável desde o ano passado, mas a oposição ainda não

conseguiu atrair este contingente de descontentes.” (OLIVEIRA; FIGUEIRA, 2014, p.25).

Com efeito, o Mundial acabou tornando-se, de certa forma desconfortável para o governo, que

3 según uma encuesta generada por la Editora Abril, nueve de cada diez brasileños temen que el Mundial de 2014 deje uma impresión negativa de su país. Em tanto, apenas el 13% destaca que el certamen legará cosas positivas a Brasil, 87% señala que no esta satisfecho con albergar la competición y más de la mitad utiliza la palavra “verguenza” para calificar su sentir de cara al evento.(Tradução nossa)

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viu seus índices de aprovação despencarem na medida em que o evento se aproximava (LATI,

2014).

No entanto, embora a estratégia do governo de sediar o Mundial tenha criado uma

situação “desconfortável” tanto no que diz respeito ao contexto como ao resultado - uma

inesquecível derrota do Brasil contra a Alemanha que fez com que o clima de Copa no país do

futebol tenha durado pouco menos de um mês - a presidente Dilma se manteve à frente das

pesquisas e foi reeleita em 2014. Em relação a essa questão, Silva realizou um estudo sobre a

relação entre pleitos e resultados nas eleições e chegou à seguinte conclusão:

considerados os anos de 1994, 1998, 2002, 2006 e 2010, o sucesso ou fracasso em campo não pode ser apontado como a única causa para a vitória ou a derrota do governo nas urnas. Vemos, então, que os dois últimos títulos da seleção aconteceram, indistintamente, em anos em que o governo ganhou e que o governo perdeu a eleição; em três outras copas na qual a seleção não logrou a conquista do campeonato, o governo ainda assim conseguiu eleger o seu candidato. (SILVA, 2014, p.51).

3 Contratos de leitura: discutindo o conceito

Para Verón, a terceira geração da semiologia (1980) é capaz de integrar “[...] o processo

que vai da produção de sentido até a ‘consumação’ de sentido, sendo a mensagem o ponto de

passagem que sustenta a circulação social das significações.” (VERÓN, 2004, p.216).

No mesmo artigo, o autor discorre sobre o conceito de enunciação e diferencia: o

enunciado é da ordem do conteúdo, já a enunciação reflete o dizer e suas modalidades, os modos

como se é dito. É a partir disso que o autor chega ao conceito de contrato de leitura, um

dispositivo de enunciação que todo suporte de imprensa possui. (VERÓN, 2004).

Por meio desse dispositivo de enunciação, o autor (2004) explica que o produtor do

discurso não só constrói seu lugar ou seus lugares, mas também define o seu destinatário, afinal,

um mesmo conteúdo pode ser enquadrado por modalidades muito diferentes. Ainda a este

respeito, Viggiano esclarece que:

o papel do enunciador é importante e o que ele “fala” constitui uma dimensão importante do contrato. Mas a efetividade ou não de um dispositivo de enunciação não se mede, nesta proposta, pelo que é dito (conteúdo), mas pelas formas como o conteúdo é dito. E é pelo estudo do contrato de leitura que se pode perceber as características

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específicas de um suporte e valorizá-las em comparação com os seus concorrentes. (VIGGIANO, 2010, p.45).

Discutindo acerca da produção e da recepção, Fausto Neto (1992) tece considerações por

meio das quais afirma que a recepção não é apenas uma elaboração sociológica. Ela seria

constituída no interior do próprio processo discursivo. O autor ressalta, no entanto, que essa é

uma hipótese principal e que, com isso, não está desconsiderando a existência de um “receptor

social”. Nesse contexto, Natansohn explica que:

os contratos estruturam-se a partir da bagagem cultural do receptor (sem a qual não haveria contato possível), mas também contém formas de enunciação que classificam, hierarquizam, quantificam, formulam, ordenam o discurso dado, definindo, ao mesmo tempo, distâncias e relações de poder entre emissores e receptores reais, empíricos. (NATANSOHN, 2005, p.3).

Fausto Neto chega a citar os estudos dos meios de comunicação para conhecer o perfil dos

grupos, bem como a adoção de estratégias para “capturar” o receptor e conclui que, “nesses

termos, o estatuto do campo da recepção é definido por ‘manobras’ previamente realizadas pela

esfera da produção, criando assim uma verdadeira ‘escala de receptores [...]’”. (FAUSTO NETO,

1992, p.195).

O autor cita como exemplo as revistas semanais de comportamento Carícia, Destino,

Guia Astral e Carinho, cujo público principal, em termos socioculturais, é jovem e feminino. No

entanto, essa definição se desdobra no processo de construção/hierarquização das matérias, o que

acaba por estruturar vários receptores que derivam dessa matriz sociológica. “O receptor é

‘imaginarizado’ de maneira singular, por diferentes contratos de leituras estabelecidos pelo

campo da emissão, no interior de um mesmo suporte”. (FAUSTO NETO, 1992, p.196).

Em seu estudo sobre contratos de leitura em revistas e periódicos, Verón (2004) sugere

que eles são estabelecidos logo na capa, parte em que o leitor tem seu primeiro contato com a

publicação e onde já encontra traços de um estilo próprio do veículo e uma posição diante

dos acontecimentos. O que certamente ocorre com as revistas a serem analisadas. Ambas

semanais, Veja e Época possuem, à primeira vista, um mesmo teor informativo, mas estabelecem

diferentes contratos de leitura. Daí a proposta deste artigo de analisar as coberturas desses

suportes durante a Copa no Brasil em ano de eleições.

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Fausto Neto (1992) ressalta, ainda, que da mesma forma que o leitor é conhecido segundo

um imaginário discursivo, ele recebe “propostas” para agir segundo determinadas formas de

contrato, para trabalhar no interior e conforme as regras do contrato. Nesse sentido, tanto Veja

como Época certamente fazem propostas aos seus leitores, o que ocorreu fortemente naquele

período, conforme se verificará mais adiante, nas análises.

Na TV não é diferente. Natansohn (2005) descreveu os contratos de leitura de dois

programas. Uma das conclusões de sua pesquisa é que um deles, o Note e Anote constrói um

contrato baseado na cumplicidade e se dirige a uma audiência feminina com certa intimidade e

confiança típicas de relacionamentos amistosos. Já o Conversa Franca desenvolve uma relação

pedagógica e distanciada, não só pelas estratégias verbais e discursivas, mas também pelos

recursos cênicos e personalidade de seus enunciadores.

Finalmente, o potencial de um contrato de leitura pode ser ilustrado, por exemplo, na

despedida de Fátima Bernardes do Jornal Nacional. Fausto Neto e Sgorla (2012) desenvolveram

um artigo no qual explicitam todo o aparato criado pela Rede Globo para dar tal notícia ao

telespectador. Não bastou o Jornal Nacional, foram necessários 10 dispositivos pertencentes ao

“Sistema Globo”. Assim, a despedida de Bernardes transformou-se num acontecimento. O ritual

escolhido para a noite de despedida foi um bate-papo ao vivo protagonizado por ela, Willian

Bonner e Patrícia Poeta. Além disso, o blog JN Especial expunha os bastidores, já o

telespectador/internauta também podia “fazer parte” do fato não só assistindo, mas despedindo-se

e até comentando a saída de Fátima pela internet (FAUSTO NETO; SGORLA, 2012).

4 Revistas Veja e Época: enxergando os semanários pela lupa

No que diz respeito à revista Veja, da editora Abril, Velasquez e Kushnir (2009) afirmam

que o semanário foi lançado em São Paulo, no dia 11 de setembro de 1968. “Eram diretor e editor

da Abril, Vítor Civita, diretor de publicações, Roberto Civita e  Mino Carta, diretor de redação.

Embora sempre tenha sido chamada apenas de Veja, de seu número 1 até o 351, de 28 de maio de

1975, exibiu na capa o título Veja e leia”. (VELASQUEZ; KUSHNIR, 2009).

Discorrendo acerca das características editoriais da revista, as autoras expõem detalhes

acerca da distribuição de matérias e seções que, segundo elas, foram adotados dois anos depois VIII Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais

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que o semanário passou a circular e são utilizados, em sua maioria, até hoje. De acordo com

nossas próprias observações, todos os itens citados abaixo (apontados pelas autoras) ainda fazem

parte da revista:

[...] com a abertura composta por uma entrevista (que passou a ser impressa em páginas amarelas), destaques da semana, cartas, o editorial (“Carta ao leitor”) e uma grande matéria de resumo da semana, normalmente de pauta política. Nas últimas páginas, os temas culturais: cinema, livros, música etc. Fechando a revista, uma página de opinião assinada”. (VELASQUEZ; KUSHNIR, 2009).

Além de uma das mais tradicionais revistas do país, Veja é também a mais vendida.

Segundo a Associação Nacional dos Editores de Revistas (ANER)4, de janeiro a setembro de

2014, a circulação média do semanário chegou a 1.167.928 exemplares, muito acima da segunda

colocada, também a ser analisada por nós: a Época, com 390.709 exemplares. Em relação ao

perfil do leitor, a primeira mostra que 22% vêm da classe A, 49% da B, 26% da C e 3% das

classes D/E5, enquanto a segunda expõe que 72% pertencem à classe AB, ao passo que 25% dos

seus leitores está na classe C6. Entre esses, 79% do público de Veja é assinante7, enquanto na

Época tal número chega a 91% dos exemplares8. Já no que diz respeito ao número de leitores

alcançados, dados apontados pela Abril apontam 8.614.529 leitores. Por sua vez, a revista da

editora Globo atinge cerca de 2.759.000 leitores.

Segundo Portela (2009), o número de exemplares faz de Veja a terceira maior revista

semanal do mundo, perdendo apenas para as americanas Time e Newsweek. “Inclusive, foram as

duas que inspiraram o surgimento de Veja, inaugurando no Brasil o gênero das newsweeklies

(revistas semanais de informação)”. (PORTELA, 2009, p.13). Com efeito, segundo o FSB

Comunicações, Veja “é uma das publicações mais influentes do país. A elite política está atenta a

ela, que é indicada como uma das três revistas preferidas por mais de 70% dos deputados

federais, muito acima de suas concorrentes”. (FSB apud BIROLI; MIGUEL, 2010, p.5).

4 http://aner.org.br/dados-de-mercado/circulacao/

5 http://www.publiabril.com.br/marcas/veja/revista/informacoes-gerais

6 http://editora.globo.com/midiakit/epoca/arquivos/MidiaKit_Epoca.pdf

7 http://www.publiabril.com.br/marcas/veja/revista/informacoes-gerais

8 http://editora.globo.com/midiakit/epoca/arquivos/MidiaKit_Epoca.pdfVIII Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais

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De acordo com Biroli e Miguel, as classes médias veem a revista como uma importante

fonte de informação. No entanto:

Veja adota um estilo de jornalismo que rompe ostensivamente com os cânones da objetividade. Sua adjetivação é agressiva, suas antipatias são explícitas, sua predileção por determinados temas da agenda é indisfarçada – características que se acentuaram nos últimos anos. As personagens de suas matérias são tratadas com pesos e medidas bem diferenciados, conforme a posição que possuem. Os muitos adversários da revista não se cansam de denunciar o “antijornalismo” que ela adota, muitas vezes apresentando evidências de contaminação do noticiário por interesses políticos [...]. Mesmo assim, Veja permanece numa das posições centrais da imprensa brasileira. (BIROLI; MIGUEL, 2010, p.5).

Já a revista Época nasceu no dia 25 de maio de 1998. De acordo com Mesquita (2008), no

que diz respeito aos temas retratados pela revista, nota-se o interesse especialmente por

entretenimento e utilidades. Além disso, as reportagens chamadas “frias”, no jargão jornalístico,

geralmente costumam ser bastante enfocadas pelas revistas. Ao realizar uma pesquisa com os

temas abordados nas capas da revista durante o ano de 2006, o pesquisador observou que, mesmo

sendo um ano eleitoral, não houve grande recorrência de questões políticas:

das 52 edições do ano de 2006, 35 trazem na capa temáticas afeitas a variedades, como beleza, férias, ecologia, dieta, religião e vários outros temas. Outras sete edições destacam temas polêmicos, como a aids, o esquema criminoso paulista Primeiro Comando da Capital (PCC) e problemas da aviação e da aeronáutica brasileira. […] apenas dez destacaram o governo, o candidato Lula e os outros candidatos à presidência, dentre outras abordagens políticas. (MESQUITA, 2008, p.57)

No que diz respeito a nossas observações, notamos uma forte relação da revista com a

Copa do Mundo 2014, um megaevento que não deixa de ser um espetáculo de entretenimento.

Vale lembrar, ainda, que a revista pertence à Globo, emissora que transmitiu o Mundial para todo

o Brasil, ou seja, muito mais que cumplicidade, estavam em jogo interesses comerciais.

No que tange ao perfil do leitor, Época intenciona, em seu mídia kit, demonstrar que seu

público possui um bom nível financeiro. Mesmo tendo fins principalmente comerciais,

acreditamos que vale a pena expor alguns dados: um em cada nove leitores pretende comprar um

carro 0 km; 94% têm automóvel no lar e, destes, 69% são proprietários; mais da metade possui

algum tipo de seguro; 76% têm cartão de crédito; 61% têm computador em casa; 90% tem acesso

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à internet no lar, sendo que 90% desses possuem banda larga e, finalmente, mais de 496 mil

leitores comprarão eletroeletrônicos em 12 meses9.

5 Considerações metodológicas

Considerando Verón (2004) e aplicações de Fausto Neto (1992), neste artigo pretende-se

apontar como os contratos de leitura foram construídos pelas revistas semanais Veja e Época

durante a Copa do Mundo em 2014. Dentro desse período, foram escolhidas duas coberturas

específicas, a da abertura da Copa e da derrota do Brasil contra a Alemanha. A razão se dá

especialmente pela importância desses dois momentos no evento, ambos amplamente divulgados

pelas revistas mencionadas.

Para compor o corpus da pesquisa, esclarece-se que foram escolhidas as capas, bem como

títulos das reportagens relacionadas à Copa nas edições 837 e 841 da revista Época e as edições

2378/2382 da revista Veja. Vale ressaltar que as reportagens foram agrupadas nos sintagmas

“Copa” (Veja) e “Momento Esportivo” (Época), o que ocorreu durante praticamente todo o

Mundial. Com a derrota do Brasil para a Alemanha, tais sintagmas foram alterados para “Brasil”

e “Especial”, respectivamente.

6 Análise dos contratos

Segundo Verón (2004), as modalidades de enunciação na capa são um fator crucial na

construção do contrato: “a capa pode mostrar de um modo simultaneamente condensado e preciso

a natureza do contrato, ou então, ser mais ou menos incoerente com este último.” (VERÓN,

2004, p.221).

Esta análise terá início pela capa da edição 2378 da revista Veja, a Figura 1. No alto da

página, a seleção durante o “Hino”, um gesto de patriotismo que marca o início da Copa do

Mundo no Brasil. No meio da página, a imagem de Neymar, o craque da seleção brasileira, logo

após ter feito um dos dois gols. Logo abaixo, a figura da presidente Dilma junto ao vice-

presidente Michel Temer, sob o título “Vaia”, expondo o momento em que a chefe de estado foi

vaiada durante a abertura dos jogos. No “cabeçalho” da página, com menos destaque, mas ainda

assim em amarelo da seleção “canarinho” a chamada “Os três destaques da abertura da Copa

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mostram que para os brasileiros pátria não é governo e a paixão pelo futebol não combina com

política”. A chamada pré-ordena, intencionando o destinatário, quais foram os destaques da

abertura. Além disso, embora o título diga que o “futebol não combina com política”, a revista

trava essa relação tanto na capa como no título da reportagem principal, que inclusive dá mais

ênfase às vaias: “O hino, as vaias e Neymar”.

Figura 1 - capa Veja edição 2378

Fonte: revista Veja (18.06.2014)

Portanto, aparece, nessa capa, a figura do enunciador pedagógico que não apenas informa

como também ordena e cria uma forte articulação entre os elementos presentes. De acordo com

Verón (2004, p.230), “a posição de enunciação pedagógica define o enunciador e o destinatário

como desiguais: o primeiro mostra, explica, aconselha, o segundo olha, compreende, tira

proveito”.

A edição de cobertura da derrota do Brasil contra a Alemanha por 7X1, exposta na Figura

2, passa pelo mesmo processo. Com o título “Vai sobrar para ela?”, a revista articula uma relação

entre o resultado e uma possível derrota da presidente nas eleições a serem realizadas em outubro

daquele ano. O assunto será discutido por especialistas. Já a imagem mostra a presidente

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comemorando antes do “desastre” contra a Alemanha, que por sinal só aparece em imagens bem

opacas ao fundo.

Figura 2 - capa Veja edição 2382

Fonte: revista Veja (16.07.2014)

Tomando por base que a revista pré-ordena como o leitor deve pensar, assume, sem

dúvida, novamente uma posição de enunciação pedagógica.

O título principal da capa da revista Época, a Figura 3, traz a seguinte chamada: “O

craque que une o Brasil” junto ao rosto de Neymar como que dividido em dois: uma parte limpa e

outra pintada pela bandeira do Brasil. A princípio, a revista parece buscar uma forte

cumplicidade, mas ao analisar a capa como um todo, percebe-se o tom de enunciação

“distanciada”, isso porque parece querer induzir “[...] uma certa simetria entre o enunciador e o

destinatário: o primeiro, mostrando uma maneira de ver as coisas, convida o destinatário a adotar

o mesmo ponto de vista [...].” (VERÓN, 2004, p. 230).

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Figura 3 - capa Época edição 837

Fonte: revista Época (16.06.2014)

O subtítulo “O brasileiro se curva aos pés de Neymar – e mostra que aprendeu a separar

futebol de política”, além do rosto “dividido”, num fundo justamente de cor branca, reflete

exatamente o momento que o Brasil vivia até aquele período: um contexto de até então rejeição à

Copa. Como veículo pertencente ao conglomerado Globo, que retransmitiu os jogos, fica claro o

interesse por restabelecer o clima de “paz” e fortalecer os laços do torcedor patriota com a Copa.

Ainda na mesma capa, a revista traz um título quase desencontrado com o discurso principal:

“Por que o Mineirão se tornou um mico para o contribuinte”.

Já a edição da Época que cobriu os 7X1 parece ter realmente chegado à enunciação de

cumplicidade (Figura 4). Envolto por um clima de luto, o rosto de um torcedor pintado de verde e

amarelo chorando é a “chamada” principal da capa. Os textos trazem a data e o local onde

ocorreu o que a revista chama de vexame em sua “Edição Especial”. Nas palavras de Verón

(2004, pg.231), “[...] enunciador e destinatário se reencontram na cumplicidade criada pela

partilha de certos valores culturais”.

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Figura 4 - capa Época edição 841

Fonte: revista Época (14.07.2014)

Passando à análise dos títulos, observamos que, para a construção dos contratos de leitura,

vários deles são estruturados de acordo com o “[...] conjunto de elementos e referências do

próprio estoque simbólico e cultural do receptor” (FAUSTO NETO, 1992, p.205). Observemos

os títulos a seguir:

Veja

Edição 2378 “O hino, as vaias e Neymar”

Edição 2382 “O bom e o mau humor”

Época

Edição 837 “A redenção nos pés do craque” “O oportunismo dos sindicatos e movimentos sociais”

Edição 841 “Um projeto imperfeito” “Uma mistura de futebol e política”

Observa-se que todos eles utilizam de outros campos discursivos que não o futebol ou a

Copa do Mundo como “matéria-prima”, em especial dos terrenos econômico, político e social nos

quais o Mundial estava inserido. Três desses títulos: “O hino, as vaias e Neymar”, “O bom e o

mau humor” e a “A redenção nos pés do craque” foram temas nas capas, ou seja, eram

reportagens principais. Os dois primeiros articularam uma forte relação entre futebol e política, VIII Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação de Minas Gerais

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inclusive com imagens da presidente já na abertura das reportagens. Já “A redenção nos pés do

craque” cita o governo Dilma no subtítulo, o que sugere um discurso montado “em paralelo”, mas

utiliza, como destaque da reportagem, uma cena em que Neymar fazia seu primeiro gol.

Terrenos discursivos também são ativados com base no universo cultural popular

brasileiro:

Veja

Edição 2378 “Pegaram o touro à unha”

Época

Edição 837 “O Carnaval dos gringos”, “Sairemos bem na foto?” e o regionalista “A broa mais cara de Minas”

Mas o que claramente ocorreu, nas edições de cobertura dos 7X1, foi um apelo dessas

revistas, sendo na Época de forma mais explícita (grande parte dos títulos), ao universo

emocional do torcedor brasileiro, reforçando a enunciação de cumplicidade já exposta na capa.

Veja

Edição 2382 “Milhões de vitoriosos” “Um pesadelo para todo o sempre”

Época

Edição 841 “O vexame” “Os erros” “Um futebol sem majestade” “Um time de meninos” “Uma ilusão que teimamos em acreditar” “As lições” “Um exemplo argentino” “E, apesar de tudo...”

Ironicamente, considerando as quatro edições, apenas cinco títulos voltam-se para o

universo discursivo do futebol em si:

Veja

Edição 2378 “‘A bola é redonda’”, “No calor da partida”, “O exílio do cartola”

Época

Edição 841 “Um técnico obsoleto e confuso” “Uma organização que nos prende ao passado”

Uma última questão a ser levantada diz respeito à dosagem de elementos informativos e

não informativos nestes semanários (VERÓN, 2004). Observou-se que quase todos os títulos são

relativamente vagos, ou seja, o enunciador pressupõe que o leitor já possua algum conhecimento

sobre o assunto. As únicas exceções são “O oportunismo dos sindicatos e movimentos sociais” e

“Uma mistura de futebol e política”, ambos da Época.

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7 Considerações finais

Pode-se dizer que ambas revistas politizaram suas coberturas durante a Copa do Mundo,

mas fizeram isso de maneira bastante diferente. Ao atentar-se para as edições analisadas da

revista Veja, observou-se uma posição de enunciação pedagógica e uma forte articulação entre os

elementos futebol e política, tanto na capa como nos títulos, uma tentativa clara de guiar o leitor:

enunciador e destinatário ganharam posicionamentos desiguais. Já a Época parece tentar

construir uma certa cumplicidade já na edição de abertura da Copa, mas traça mesmo uma

enunciação distanciada na qual convida o destinatário a adotar um mesmo ponto de vista e

produz, mesmo que discretamente, discursos “em paralelo” (futebol x política). Finalmente, na

edição da cobertura dos 7X1, o enunciador constrói uma forte relação de cumplicidade junto ao

torcedor.

Destaca-se, ainda, que a maioria dos títulos das reportagens se apropria de outros campos

discursivos que não o futebol, entre eles o político, o econômico e cultural popular. Além disso,

em geral pressupõem que o leitor já possui algum conhecimento prévio sobre o assunto, ou seja,

são opacos, carregados de elementos não informativos.

Percebeu-se, finalmente, que a revista Veja apropriou-se tanto da questão política em suas

enunciações que, em alguns momentos, isso chegou a superar a cobertura da realização da Copa

em si. A Época, por sua vez, também levantou questões políticas, mas adotou um posicionamento

muito mais voltado para o evento e, sem dúvida, mais cúmplice do torcedor brasileiro.

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