Diálogo- David Bohm - Peter Garrett - Donald Factor

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Diálogo – uma Proposta David Bohm, Donald Factor e Peter Garrett Tradução: Arnaldo Bassoli, da Escola de Diálogo de São Paulo O Diálogo, do modo como estamos escolhendo usar a palavra, é um caminho para examinar as raízes das diversas crises que a humanidade enfrenta nos dias de hoje. Através do diálogo é possível investigar e compreender aqueles processos que fragmentam e interferem na comunicação real entre indivíduos, entre nações e até entre diferentes partes de uma mesma organização. Na nossa cultura moderna, os homens e mulheres interagem de muitas formas — podem facilmente cantar, dançar ou brincar uns com os outros. Mas quando falam sobre assuntos que têm importância e profundidade, parece que sempre surgem disputas, divisões e até mesmo violência. Em nossa visão, essa condição aponta para um defeito profundo e abrangente no processo do pensamento humano. No Diálogo, um grupo de pessoas pode investigar os pressupostos, idéias, crenças e sentimentos, tanto individuais quanto coletivos, que sutilmente controlam as suas interações. Ele nos oferece uma oportunidade de participar em um processo que evidencia os sucessos e falhas

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Texto sobre a proposta de um diálogo mais autêntico.

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Dilogo uma Proposta

Dilogo uma PropostaDavid Bohm, Donald Factor e Peter GarrettTraduo: Arnaldo Bassoli, da Escola de Dilogo de So Paulo

O Dilogo, do modo como estamos escolhendo usar a palavra, um caminho para examinar as razes das diversas crises que a humanidade enfrenta nos dias de hoje. Atravs do dilogo possvel investigar e compreender aqueles processos que fragmentam e interferem na comunicao real entre indivduos, entre naes e at entre diferentes partes de uma mesma organizao. Na nossa cultura moderna, os homens e mulheres interagem de muitas formas podem facilmente cantar, danar ou brincar uns com os outros. Mas quando falam sobre assuntos que tm importncia e profundidade, parece que sempre surgem disputas, divises e at mesmo violncia. Em nossa viso, essa condio aponta para um defeito profundo e abrangente no processo do pensamento humano.No Dilogo, um grupo de pessoas pode investigar os pressupostos, idias, crenas e sentimentos, tanto individuais quanto coletivos, que sutilmente controlam as suas interaes. Ele nos oferece uma oportunidade de participar em um processo que evidencia os sucessos e falhas da comunicao. Pode revelar os padres de incoerncia muitas vezes desconcertantes que levam o grupo a evitar certas questes ou, por outro lado, levam-no a insistir de modo totalmente irracional na defesa de determinadas opinies quanto a certos assuntos.O Dilogo uma maneira de observar coletivamente o controle exercido por valores e intenes ocultos sobre o nosso comportamento, e de conscientizarmo-nos que diferenas culturais no percebidas podem colidir sem que percebamos o que est acontecendo. Assim, pode ser visto como uma arena em que acontece o aprendizado coletivo, na qual pode surgir um senso maior de harmonia, companheirismo e criatividade.Como a natureza do Dilogo investigativa, seu significado e mtodos continuam a se revelar. No se pode estabelecer regras rgidas para a conduo do Dilogo porque ele essencialmente aprendizagem no como resultado do consumo de um corpo de informaes ou uma doutrina comunicada por uma autoridade, nem como meio de examinar ou criticar uma particular teoria ou programa, mas como parte de um processo de participao criativa entre pares que est em contnuo desenvolvimento. No entanto, sentimos que importante que esse significado e seu pano de fundo sejam compreendidos.Nossa abordagem a esta forma de Dilogo surgiu de uma srie de conversas iniciadas em 1983, em que refletimos sobre a sugesto de David Bohm de que as infindveis crises que afetam a humanidade tm como causa essencial uma incoerncia amplamente disseminada no processo do pensamento humano. Isso nos levou, nos anos seguintes, a iniciar uma srie de conversaes e seminrios, em diversos pases e com vrios grupos humanos, que comeou a tomar a forma de dilogos. medida que seguamos, ficava cada vez mais claro para ns que este processo de Dilogo um meio poderoso de compreender como funciona o pensamento. Percebemos que vivemos em um mundo que quase inteiramente produzido pelo pensamento e pelo empreendimento humanos. A sala onde estamos sentados, o idioma em que estas palavras so escritas, as fronteiras da nossa nao, os nossos sistemas de valores, e at mesmo aquilo que pensamos ser as nossas percepes diretas da realidade, so essencialmente manifestaes do modo como os seres humanos pensam e pensaram. Percebemos que se no nos dispusermos a investigar esta situao para obter uma profunda viso e conhecimento sobre ela, no conseguiremos confrontar as crises reais do nosso tempo, nem encontraremos mais do que solues temporrias para a vasta coleo de problemas humanos com que nos defrontamos agora.Ao usar aqui o termo pensamento, queremos referir-nos no apenas aos produtos do nosso intelecto, mas tambm aos nossos sentimentos, emoes, intenes e desejos. Inclumos aqui, alm disso, as manifestaes sutis e condicionadas da aprendizagem, como as que nos permitem dar sentido a uma sucesso de cenas separadas de um filme de cinema, ou traduzir os smbolos abstratos nas placas de sinalizao das estradas. Acrescente-se tambm os processos tcitos e no-verbais usados no desenvolvimento de habilidades como, por exemplo, andar de bicicleta. Do modo como usamos a palavra, o pensamento essencialmente a resposta ativa da memria em cada fase da vida. Virtualmente todo o nosso conhecimento produzido, exibido, comunicado, transformado e aplicado no pensamento.Para esclarecer mais esta abordagem, fazemos a seguinte proposio: observado com um pouco mais de ateno, at aquilo que chamamos de pensamento racional pode ser visto como sendo extensamente formado por respostas condicionadas, e influenciado ou enviesado por pensamentos prvios, anteriores. Ao olharmos cuidadosamente para aquilo que geralmente tomamos por realidade, comeamos a perceber que ela inclui uma srie de conceitos, memrias e reflexos coloridos pelas nossas necessidades, medos e desejos pessoais, todos limitados e distorcidos pelas fronteiras da linguagem e hbitos da nossa histria, sexo e cultura. extremamente difcil decompor essa mistura ou chegar a alguma certeza sobre se o que percebemos ou o que pensamos sobre essas percepes tem qualquer preciso ou exatido.O que torna essa situao to sria o fato de que o pensamento geralmente oculta esses problemas da nossa percepo imediata gerando a idia de que a maneira pela qual cada um de ns interpreta o mundo o nico modo sensato de faz-lo. necessrio um procedimento pelo qual possamos desacelerar o processo de pensamento para poder observ-lo enquanto acontece em tempo real.Nossos corpos fsicos tm essa capacidade mas, aparentemente, o pensamento no. Ao levantar seu brao, voc sabe que esse um ato voluntrio seu, e que nenhuma outra pessoa est fazendo esse movimento. Podemos perceber as aes e movimentos corporais enquanto esto ocorrendo, mas no domnio do pensamento geralmente essa habilidade nos falta. Por exemplo, no notamos que a nossa atitude para com algum pode ser profundamente afetada pelos sentimentos e reaes que temos frente a uma outra pessoa que tem certos traos em comum com a primeira podem ser certos comportamentos que ela tem, ou at mesmo a sua aparncia. Em vez disso, partimos do pressuposto de que a nossa atitude surge diretamente da sua conduta mesma. O problema do pensamento que, ao que parece, o tipo de ateno que requerida para notar essas incoerncias raramente est disponvel nos momentos em que mais necessria.Por Que Dilogo?O Dilogo oferece um espao no qual essa ateno pode acontecer. Ele permite a exposio do pensamento e do significado que tornam possvel um tipo de propriocepo coletiva, e uma devoluo imediata tanto do contedo do pensamento quanto das estruturas dinmicas menos aparentes que o governam. No Dilogo isso pode ser experimentado tanto individual quanto coletivamente. Cada ouvinte pode devolver a quem expe e ao resto do grupo a sua percepo sobre os pressupostos e implicaes no verbalizados que esto subjacentes ao que est sendo expresso, e tambm aquilo que percebe que est sendo evitado. Cada participante, com isso, tem a oportunidade de examinar os preconceitos, as concepes prvias e padres caractersticos que subjazem aos seus pensamentos, opinies, crenas e sentimentos, bem como aos papis que habitualmente desempenha. E o Dilogo oferece ainda a oportunidade de compartilhar esses insights.A palavra dilogo deriva de duas razes: dia, que significa atravs de, e logos, que significa palavra, ou, mais particularmente, o significado da palavra. A imagem aqui a de um fluxo de significado que acontece entre os participantes e por meio deles. Podem-se envolver tantas pessoas quantas se queira no Dilogo pode-se at ter um Dilogo consigo mesmo mas o tipo de Dilogo que sugerimos prope um grupo de vinte a quarenta pessoas, sentadas em crculo para conversar.Pode-se encontrar algo similar ao significado de um Dilogo assim nos relatos de grupos de caadores, mais ou menos nesse nmero, que se renem para conversar, sem uma agenda explcita ou propsito pr-determinado. Ao que parece, esses encontros, mesmo com essas caractersticas, criam e mantm laos muito coesos, muita camaradagem, fazendo com que os participantes saibam o que se espera deles sem que tenham recebido instrues para isso e sem muita troca verbal. Em outras palavras, emerge dentro do grupo o que se pode chamar de uma cultura coerente de significado compartilhado. possvel que essa coerncia tenha existido no passado, nas comunidades humanas, antes que a tecnologia comeasse a mediar a nossa experincia do mundo vivo.Dr. Patrick de Mare, um psiquiatra de Londres, fez um trabalho pioneiro muito semelhante, em condies modernas. Criou grupos mais ou menos desse mesmo porte, com o propsito de realizar o que chamou de scio-terapia. Para ele, uma causa primeira da profunda e penetrante doena da nossa sociedade pode ser encontrada no nvel scio-cultural, e grupos assim podem servir como micro-culturas em que possvel expor a fonte da enfermidade da nossa grande civilizao. Nossa experincia nos levou a estender essa noo de Dilogo enfatizando e dando especial ateno ao papel fundamental da atividade do pensamento na origem e manuteno desse conflito.Como um microcosmo dessa grande cultura, o Dilogo permite que se revele um amplo espectro de relacionamentos possveis. possvel expor o impacto da sociedade no indivduo e o do indivduo na sociedade. possvel mostrar como o poder assumido ou no, e quo penetrantes so as regras no-percebidas do sistema que constitui nossa cultura. Mas o Dilogo est mais profundamente interessado em compreender a dinmica de como o pensamento origina tais conexes.Ele no est interessado em deliberadamente tentar alterar ou transformar o comportamento, e nem em fazer com que os participantes se dirijam a uma determinada meta ou objetivo. Qualquer tentativa assim distorce e obscurece os processos que o Dilogo se prope a investigar. Mesmo assim, mudanas de fato ocorrem, porque o pensamento observado se comporta diferentemente do no-observado. Assim, o dilogo pode tornar-se uma oportunidade para dar livre curso aos pensamentos e sentimentos, num contnuo de significado mais profundo ou mais geral. Qualquer tema pode ser includo e no se exclui nenhum contedo. Uma atividade assim muito rara na nossa cultura.Propsito e significadoNormalmente as pessoas se renem ou para realizar uma tarefa ou para se divertir, sendo que ambas as atividades podem ser categorizadas como propsitos predeterminados. Mas pela sua prpria natureza o Dilogo no compatvel com nenhum propsito alm do interesse dos seus participantes em revelar e evidenciar os significados coletivos mais profundos. Estes podem, s vezes, ser divertidos, esclarecedores, levar a novos insights ou encaminhar problemas existentes. Mas, surpreendentemente, o Dilogo, em seus estgios iniciais, levar freqentemente experincia da frustrao.Um grupo de pessoas convidadas a dar seu tempo e ateno sria a uma tarefa que no tem objetivo aparente e que no est sendo conduzida em alguma direo perceptvel pode rapidamente descobrir-se vivenciando muita ansiedade ou achando tudo isso muito maante... e alguns possivelmente tero desejo de encerrar o grupo, ou de tentar exercer controle sobre ele e dar-lhe uma direo. Propsitos previamente desconhecidos revelam-se. Sentimentos fortes so expostos, junto com os pensamentos subjacentes a eles. As pessoas podem tomar posies fixas, e freqentemente ocorrem polarizaes. Tudo isso parte do processo. o que sustenta o Dilogo e o mantm constantemente criativo em novos domnios. Numa reunio com vinte a quarenta participantes podem ocorrer extremos de frustrao, raiva, conflito ou outras dificuldades; mas com este tamanho de grupo pode-se dar continente a tais problemas com relativa facilidade. Na realidade, eles podem se tornar o foco central da investigao, no que pode ser compreendido como um tipo de meta-dilogo, que tem como objetivo clarificar o prprio processo do Dilogo. medida que aumentam a experincia e a sensibilidade, emerge uma experincia de significado compartilhado, em que as pessoas no se opem umas s outras, e tambm no esto simplesmente interagindo. O aumento da confiana entre os membros do grupo e no prprio processo leva expresso dos pensamentos e sentimentos normalmente mantidos em segredo. Nenhum consenso imposto, e nem ocorre qualquer tentativa de evitar conflitos. Nenhum indivduo ou sub-grupo capaz de conseguir predominncia, porque todos os temas, inclusive a dominncia e a submisso, sempre podem ser colocados em foco.Os participantes descobrem que esto envolvidos em um lago de significado comum, sempre mutvel e em desenvolvimento. Emerge um contedo compartilhado de conscincia, permitindo um nvel de criatividade e insight que normalmente no possvel para indivduos ou grupos que interagem de maneiras mais conhecidas. Isso revela um aspecto do Dilogo que Patrick de Mare chamou de koinonia, uma palavra que significa a antiga forma de democracia ateniense em que todos os homens livres da cidade reuniam-se para governarem a si prprios. medida que essa camaradagem se torna experincia, comea a ter precedncia sobre o contedo mais aberto da conversao (sic). um estgio importante do Dilogo, um momento em que a coerncia cada vez maior, o grupo capaz de ir alm dos bloqueios e limitaes que identifica e entrar num territrio novo. Mas tambm um ponto em que um grupo pode comear a relaxar e acomodar-se no barato que acompanha a experincia. Este o ponto em que normalmente h alguma confuso entre o Dilogo e algumas formas de psicoterapia. Os participantes podem querer manter o grupo unido para preservar o agradvel sentimento de segurana e de pertencimento que acompanha esse estado. Isso similar ao sentimento de comunidade freqentemente atingido em grupos de terapia ou workshops de team building, e tomado como prova do sucesso do mtodo usado. Alm desse ponto, entretanto, h reinos ainda mais significativos e sutis da criatividade, inteligncia e compreenso, que s podem ser atingidos pela persistncia no processo de investigao e arriscando re-entrar em reas em que h uma incerteza potencialmente catica ou frustrante.O que o Dilogo no O dilogo no discusso, palavra que tem a mesma raiz de percusso e concusso, ambas ligadas a quebrar, fragmentar. Tambm no debate. Essas formas de conversao contm uma tendncia implcita de dirigir-se para uma meta, martelar um acordo, tentar resolver um problema ou fazer a prpria opinio prevalecer. Tambm no conversa de salo, uma forma de encontro informal e freqentemente se caracteriza por ter a inteno de divertir, trocar amizades, fofocas e outras informaes. Apesar do termo dilogo comumente ser usado com significado parecido, seu significado raiz, mais profundo, indica que ele no est primordialmente interessado em nenhuma destas modalidades de encontro. Dilogo no um novo nome para T-grupos ou sensitivity training, ainda que seja superficialmente similar a estas e outras formas relacionadas de trabalho de grupo. Suas conseqncias podem ser psicoteraputicas, mas ele no tenta focar na remoo de bloqueios emocionais de qualquer participante nem ensinar, treinar ou analisar. No entanto, uma arena em que o aprendizado e a dissoluo de bloqueios podem acontecer e freqentemente acontecem. No uma tcnica de resoluo de problemas ou conflitos, ainda que muitos problemas possam ser solucionados ao longo do processo de Dilogo, ou talvez depois, como resultado de uma compreenso e companheirismo maiores que se estabelecem entre os participantes. , como enfatizamos, primeiramente um modo de explorar o campo do pensamento.O Dilogo lembra vrias outras formas de atividade em grupo e pode s vezes incluir alguns aspectos delas, mas de fato algo novo para a nossa cultura. Acreditamos que uma atividade que pode muito bem vir a provar-se vital para a futura sade da nossa civilizao.Como iniciar um DilogoSuspensoA suspenso de pensamentos, impulsos, julgamentos, etc. o corao do Dilogo. um dos seus aspectos novos mais importantes. No fcil de atingir porque ao mesmo tempo sutil e pouco familiar. Suspenso implica em ateno, ouvir e ver, e essencial investigao. Falar necessrio, claro, pois sem falar haveria pouco a explorar no Dilogo. Mas o processo real de investigao ocorre durante o ouvir no apenas aos outros, mas a si mesmo. A suspenso implica em expor as prprias reaes, impulsos, sentimentos e opinies de maneira tal que possam ser vistos e sentidos em nossa prpria psique, e tambm ser refletidos de volta por outros no grupo. No quer dizer reprimi-los ou suprimi-los, e nem mesmo adi-los. Significa simplesmente dar-lhes a nossa total ateno para que as suas estruturas possam ser percebidas no prprio momento em que acontecem. Se voc for capaz de prestar ateno, digamos, aos fortes sentimentos que podem acompanhar a expresso de um determinado pensamento (seu ou dos outros) e conseguir manter essa ateno, a atividade do processo de pensamento tende a desacelerar. Com isso, voc pode comear a ver os significados mais profundos subjacentes ao seu processo de pensamento e sentir a estrutura muitas vezes incoerente de qualquer ao que, de outro modo, voc realizaria automaticamente. Da mesma maneira, se um grupo capaz de suspender tais sentimentos e prestar ateno a eles, o processo geral que flui do pensamento para o sentimento, e da para o acting-out dentro do grupo, pode tambm desacelerar e mostrar seus sentidos mais sutis e mais profundos, junto com as suas distores implcitas, levando ao que poderia ser descrito como um novo tipo de inteligncia coletiva e coerente. Suspender o pensamento, o impulso, o julgamento, etc. requer sria ateno ao processo geral que consideramos em ns prprios e dentro do grupo. Isso implica em algo que parece primeira vista um tipo de trabalho rduo. Mas se conseguirmos mant-lo, a nossa capacidade de prestar esse tipo de ateno se desenvolve continuamente, e cada vez necessrio menos esforo.NmerosUm Dilogo funciona melhor com 20 a 40 participantes, sentados em crculo. Um grupo desse tamanho permite o surgimento e observao de diferentes subgrupos ou subculturas que podem ajudar a revelar alguns desvios em que o pensamento coletivo opera. Isto importante porque as diferenas entre essas subculturas so muitas vezes a causa no reconhecida de conflitos e falhas na comunicao. Grupos menores, por outro lado, no tm a necessria diversidade para revelar essas tendncias e possivelmente enfatizaro papis e relacionamentos mais pessoais e familiares. Em alguns grupos tivemos at sessenta participantes, mas com um nmero elevado assim o processo se torna praticamente invivel. So necessrios dois crculos concntricos para acomodar todos de maneira a poderem ver e ouvir uns aos outros. Isso coloca os que esto sentados atrs em desvantagem, e menos participantes tm a oportunidade de falar.Pode-se mencionar aqui que alguns participantes tendem a falar muito, enquanto outros tm dificuldade em expressar-se em grupos. Vale lembrar, no entanto, que a palavra participao tem dois sentidos: compartilhar e fazer parte de. Ouvir pelo menos to importante quanto falar. Muitas vezes os participantes mais silenciosos comeam a falar mais medida que se familiarizam com a experincia do Dilogo, e os indivduos mais dominadores descobrem-se falando menos e ouvindo mais.DuraoUm Dilogo necessita algum tempo para pr-se em andamento. uma forma incomum de participar com os outros e necessrio fornecer alguma forma de introduo em que o significado todo da atividade possa ser comunicado. Mas mesmo com uma introduo clara, ao comear a falar o grupo passa por muitos momentos de confuso, frustrao, e uma preocupao inibidora sobre se esto ou no praticando Dilogo. Seria muito otimista assumir que um Dilogo comece e atinja alguma grande profundidade no primeiro encontro. importante ressaltar que preciso perseverana.Ao iniciar Dilogos til, no comeo, entrar em um acordo quanto durao da sesso, e encarregar algum de marcar o tempo no final do encontro. Descobrimos que cerca de duas horas um tempo timo. Sesses mais longas arriscam o fator fadiga, que tende a diminuir a qualidade da participao. Muitos T-grupos usam extensas maratonas que usam essa fadiga para quebrar algumas das inibies dos participantes. O Dilogo, por outro lado, est mais interessado em explorar os construtos sociais e inibies que afetam as nossas comunicaes do que tentar desviar deles.Quanto mais regularmente o grupo se encontrar, mais profundo e significativo ser o territrio explorado. Usa-se freqentemente o fim-de-semana para fazer vrias sesses em seguida, mas se o desejo fazer Dilogo por um tempo mais longo, sugerimos que haja ao menos uma semana de intervalo entre uma sesso e outra, para que haja tempo para as reflexes e aprofundamentos individuais. No h limite para o tempo de durao de um grupo de Dilogo e para a sua investigao. Mas seria contrrio ao esprito do Dilogo que ele se torne fixo ou institucionalizado. Isso demanda abertura constante mudana de membros, de horrios ou outras manifestaes de uma atitude sria no sentido de evitar que uma rigidez implcita possa se estabelecer. Ou, at, abertura para a dissoluo do grupo aps um certo perodo.LideranaUm Dilogo essencialmente uma conversao entre iguais. Qualquer autoridade controladora, no importa quo cuidadosa ou sensivelmente aplicada, tende a inibir e atrapalhar a livre manifestao do pensamento e os sentimentos muitas vezes delicados e sutis que de outro modo seriam compartilhados. O Dilogo vulnervel manipulao, mas seu esprito no compatvel com ela. No h lugar, no Dilogo, para hierarquias.No entanto, nos estgios iniciais alguma liderana necessria para ajudar os participantes a perceberem as sutis diferenas entre o Dilogo e outras formas de processo de grupo. essencial a presena de pelo menos um, ou preferivelmente dois, facilitadores experientes. O papel destes facilitadores ocasionalmente indicar situaes que aparentemente estejam indicando ao grupo pontos paralisadores, ou, em outras palavras, ajudar o processo de propriocepo coletiva. Mas essas intervenes nunca devem ser manipuladoras ou obtrusivas. Os lderes so participantes como quaisquer outros. A liderana, quando for sentida como necessria, deve tomar a forma de liderar nos bastidores e preservar a inteno de ser dispensvel assim que for possvel.No entanto, essa proposta no substitui a presena de facilitadores experientes. Sugerimos, mesmo assim, que este texto seja lido com o grupo no seu encontro inicial, de modo que todos os participantes possam ficar seguros de que esto embarcando no mesmo experimento.A questo do temaO Dilogo pode comear com qualquer tpico de interesse para os participantes. Se alguns membros do grupo sentem que certas trocas ou temas so perturbadores ou inadequados, importante que expressem esses pensamentos no Dilogo. Nenhum contedo deve ser excludo.Muitas vezes os participantes faro fofocas ou expressaro a sua insatisfao ou frustrao aps um encontro, mas exatamente esse tipo de material que oferece o solo mais frtil para levar o Dilogo a reinos mais profundos de significado e a uma coerncia situada alm da superficialidade de um pensamento de grupo, das boas maneiras ou de uma conversa de jantar.Dilogo em organizaes j existentesAt aqui estivemos examinando principalmente Dilogos que renem indivduos de vrios backgrounds diferentes, e no de organizaes j existentes. Mas o seu valor tambm pode se sentir em membros de uma organizao, como modo de aumentar e enriquecer a criatividade corporativa.Nesse caso o processo de Dilogo muda consideravelmente. Membros de uma organizao assim j tero desenvolvido vrios tipos de relacionamento entre companheiros de trabalho e com a sua organizao como um todo. Aqui pode haver uma hierarquia pr-existente, ou pode ocorrer uma necessidade de proteger os colegas, o grupo ou o departamento. possvel que haja medo de expressar pensamentos que sejam vistos como crticas aos que esto acima na organizao, ou s normas da cultura organizacional. Talvez certos indivduos sintam ameaadas as suas carreiras ou a aceitao social que tm, ao participarem em um processo que enfatiza a transparncia, a abertura, a honestidade, a espontaneidade e o tipo de interesse profundo pelos outros que pode trazer tona reas vulnerveis s vezes mantidas ocultas por muito tempo.Em uma organizao j existente, o Dilogo provavelmente ter que comear por uma investigao sobre todas as dvidas e medos que a participao certamente eliciar. Talvez o incio acontea com uma agenda mais ou menos especfica, que futuramente poder ser mudada. Isso difere da abordagem usada com grupos formados por pessoas que participam voluntariamente, ou apenas uma vez, e que esto livres para comear a partir de qualquer tema. Mas, como mencionamos, nenhum contedo deve ser excludo porque o impulso para excluir um tema em si um rico material para investigao.Muitos organizadores tm propsitos e metas implcitos e predeterminados que raramente so questionados. De incio, essas idias tambm podem parecer incompatveis com o jogo livre e aberto do pensamento que to intrnseco ao processo do Dilogo. No entanto, esse inconveniente tambm pode ser superado ajudando os participantes desde o incio a perceberem que examinar esses temas pode se provar essencial para o bem-estar da organizao. Lev-los em conta, alm disso, tambm pode ajudar a melhorar a auto-estima desses participantes, e o respeito com que so vistos pelos outros.O potencial criativo do Dilogo grande o bastante para permitir uma suspenso temporria de quaisquer estruturas e relacionamentos constituintes de uma organizao.Finalmente, queremos deixar claro que no propomos o Dilogo como uma panacia, nem como mtodo ou tcnica para substituir as outras formas de interao social. Nem todos o acharo til, e ele no o ser em todos os contextos. H grande valor em muitos mtodos psicoteraputicos e h muitas tarefas que exigem liderana firme e uma estrutura organizacional muito bem formada.Muito do tipo de trabalho que descrevemos aqui pode ser realizado independentemente, e estimulamos esse proceder. Vrias das idias desta proposta so ainda temas da nossa investigao contnua. No aconselhamos que sejam tomadas como fixas, mas que tambm sejam questionadas, como parte do seu prprio Dilogo.O esprito do Dilogo brincar e jogar livremente, um tipo de dana coletiva da mente que, entretanto, tem imenso poder e revela um propsito coerente. Uma vez comeado, torna-se uma aventura contnua que pode abrir caminho para uma mudana criativa e cheia de significado.Nota de direitos autoraisCopyright 1991 David Bohm, Donald Factor e Peter GarrettOs detentores dos direitos autorizam a cpia deste material e a sua distribuio para fins no-comerciais, incluindo discusso, pesquisa, crtica e como ajuda para montar grupos de Dilogo, desde que ele no seja alterado e que esta nota seja includa. Todos os outros direitos reservados.Se voc ler a nota de direitos autorais em Dilogo uma Proposta (reproduzida acima) ver que desejamos que sua mensagem seja distribuda o mais amplamente possvel. Assim, se h listas de discusso ou sites FTP ou WWW em que este texto possa ser til, por favor divulgue. Gostaramos de saber onde ele vai parar, se isso for possvel. Queremos manter a nota de direitos intacta porque afirma que ele no deve ser usado sem permisso expressa para qualquer propsito comercial.