Dialogos Com Jovens Estudantes

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    Traduo e ilustrao original de:Amadeu Duarte

    1 Dilogo realizado emSaanen, 21 Julho 1970

    K- suposto isto ser um encontro com os mais jovens.Gostaria de os ver sentados frente... Comearia porlhes perguntar (aos mais jovens, e no aos da minhaidade) sobre o que gostariam de conversar nestamanh, a fim de o podermos empreender juntos.

    P- Ser que o estado de completa ateno implicar umatotal indiferena por tudo aquilo que nos rodeia excepo daquilo com que nos defrontamos?

    K- Se a ateno implica indiferena total para com todasas coisas que ocorrem ao nosso redor...

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    P- No, para com todas as coisas com que no nosdefrontamos no momento.

    K- sobre isso que querem conversar? Est bem, noimporta. Deixemos que sejam colocadas uma meiadzia de questes e depois logo veremos o que daresultar.

    P- Penso que uma grande parte de ns se preocupa comproblemas sociais, no somente o problema da fomemas igualmente muitos outros de carcter urgente-pessoas capazes de construir bombas para destruir osoutros, a atitude dos homens com relao aos negcios

    e indstria... Todos esses problemas, necessitam desolues urgentes, penso eu. Mas ser que podemosrealmente esperar at que todos passem por umarevoluo pessoal, a fim de procedermos a um outrognero de revoluo?

    K- H demasiada necessidade de reformas a nvel social. Omundo dos negcios completamente corrupto, ainjustia social e variados outros problemas dasociedade que se espera possam aguardar at que

    cada indivduo- vs- seja livre das suas prpriaslimitaes, tristezas e sofrimento... Mais algumaquesto?

    P- Bem, ser que um indivduo completamente diferente,quer dizer, um indivduo completamente ntegro,poder perceber um mesmo facto, do mesmo modo, ouessa sua percepo ser diferente?

    K- Se um indivduo livre ser diferente de outro, ou se

    diferir nas suas actuaes. Mais alguma?

    P- H um problema com que alguns de ns se debatem: oque fazer das nossas vidas.

    K- Alguns de ns preocupam-se com o que fazer dasnossas vidas. Somos novos e comeamos a ter noodas dificuldades e da corrupo, das vrias formas deluta que ocorrem no mundo, etc. Que havemos defazer? isso?

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    P- O senhor fala em destruir a brecha existente entre nse o mundo a fim de anularmos a distino entre oobservador e o observado, ou o pensamento, que pornatureza divisivo. Alm disso falou sempre em termosde viso, que penso pretender referir os sentidos-aquele que mais propicia a distncia. Encontramo-nosmuito perto de determinada coisa e se pudermostocamo-la ou cheiramo-la, ou provamo-la, ou entoolhamo-la. Porm, interrogo-me se poderemos encurtartambm a brecha, excepto na actuao- quandocompreendemos o mundo da aco- ao invs de nosretirarmos para olhar essa coisa. Olhar obriga-nossempre a uma retirada.

    K- Corrigi-me se repito a questo de modo errado, porfavor: Se a anulao da brecha existente entre oobservador e o observado no implicar um certo tipode retiro do mundo. Se no ser muito mais fcil e maisexacto, determinante envolver-nos com uma aco quenos conduza face a face com essa diviso. Alm dissopodemos observar- j que a minha viso mais difcil-se no ser mais fcil estabelecer uma ponte entre oobservador e o observado quando existe contactodirecto do que pela aco directa. Exactamente, no

    ser? Haver quem queira colocar mais questes?

    P- No existir perigo na questo da cessao dopensamento? No poder falar sobre isso do ponto devista da funcionalidade biolgica?

    K- Se no poderemos discutir a questo da cessao dopensamento e das suas actividades, na relao que temcom o funcionamento biolgico, ou seja com a actualexistncia fsica. Certo?

    P- Por vezes, quando sinto ter conseguido algumaconscincia, quase parece que as relaes sociaisperdem o sentido... (Inaudvel)

    K- Peo desculpa mas no compreendi a pergunta.

    P- Eu simplifico. Quando por vezes me sinto desperto econsciente, tenho noo de que as inter-relaes sociaisso bastante destitudas de sentido...

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    K- Ou seja, quando sinto ter uma maior conscincia ouateno- diz o interlocutor- sinto que as inter-relaessociais so destitudas de sentido. J no chega?

    P- Tratemos da questo daquilo em que consiste a beno.Gostaria de saber se, neste mundo com toda a suabrutalidade, no ser possvel vivermos o tempo todonesse estado de conscincia.

    K- Se uma pessoa poder viver neste mundo, com toda asua brutalidade, violncia, contradio, desordemsocial, etc. em completo estado de beno. Certo? Nopoderemos comear, antes de mais, por essa questo edeixar que o resto seja considerado a seu tempo? No

    poderemos comear por: "O que havemos de fazer danossa vida" e deixar que gradualmente as demaisquestes venham discusso, o que procurarei fazer medida que formos avanando?

    P- No poderemos tambm conversar sobre a naturezados relacionamentos?

    K- Ah, ele deseja falar acerca das relaes entre os sereshumanos, e entre ele e a natureza. Comecemos ento.

    Que coisa vou fazer da minha vida, sendo novo como sou? medida que vejo o estado em que o mundo se encontra,e a necessidade de ganhar a vida- pois no possosimplesmente ir por a a pedir esmola- talvez na ndiapudessem, se envergassem um robe de sannyasi, demonge, pois l tradio andar de terra em terra e seralimentado, vestido e tratado por caridade...

    P- Mas porque razo no poderemos viver de esmola?

    K- Porque no? Se gostarem, no vejo porque no possam!No h nada que os possa proibir disso ou que possaevitar de o fazerem. Com excepo da lei de certospases onde no permitem a vagabundagem, etc. Masisso l convosco. Isso no certo nem errado. Nandia tradio comum ir de casa em casa a pediresmola. Mas nem por isso algum pensa mal; antespelo contrrio, faz parte da tradio religiosa.

    P- E aqui?

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    K- Ah. Venham-me falar disso aqui na Sua;experimentem faz-lo!

    P- Eu j vivi durante quatro anos de esmola.

    K- Muito bem, senhor. Perfeito!

    P- Porque razo no o poderemos fazer?

    K- Esperem l. A questo ser a de apurarem porque no ofao, porque no ando por a a pedir? Como sabeis queno o fao? (risos) Esperem l. Olhem, no faam dissouma questo de diverso. No possuo dinheiro prprio,as pessoas do-me roupas ou seja o que for. E j vivo

    assim h quarenta e cinco anos ou mais. O que queestou para aqui a dizer? H j sessenta anos.Exactamente. Portanto continuemos.

    Que farei, sendo novo como sou, cheio de vida,fisicamente bastante activo e algo inteligente- que hei defazer neste mundo? Esta questo tem sido colocada portodo o mundo; deverei tornar-me num homem denegcios, um juiz, um mdico, ou adoptar algumaprofisso dependente das exigncias da sociedade? Asociedade exige tantos ou tantos engenheiros, mdicos,

    negociantes, polticos, vigaristas, isto e aquilo. Portanto,ser que devo encaixar numa dessas categorias? Essa aquesto. Que hei de fazer da minha vida? Certo?

    Vocs no sabem o que significa uma vocao, pois no?Um chamado- vocare em latim- como quando umindivduo diz ter tido um chamado divino para integrar aIgreja- isso uma vocao. No quero dizer que devaisjuntar-vos Igreja. O desejo de fazermos algo da nossavida, at ao fim, algo que corresponda verdade do que

    sentimos, algo completamente valioso e significativo, issojamais trar amargura nem frustrao nem ansiedade poisser algo que faremos por vocao. Isso ser toda a nossavida.Por favor, acompanhem-me com cuidado porque aoresponder a esta questo estaro a responder s restantesquestes que aqui forem colocadas. Vero num curtoespao de tempo como tudo est relacionado. Nonecessitam ter uma vocao definitiva, nem quernecessariamente dizer que devamos mudar, mas fazer

    alguma coisa momento a momento, alguma forma deocupao. Tornem-se jardineiros por um ano, e depois a

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    vocao essa que no dependa das exigncias dasociedade, em que consistir a vossa relao com osdemais? Vamos l, respondam a isso, senhores.

    P- Como pode falar de uma vocao que no seja impostapela sociedade? Como haveremos de saber se se tratada nossa vocao?

    K- Vejam bem, como haveremos de saber se se trata deum chamado ou de uma vocao? Como? Pode muitobem ser alguma coisa imposta inconscientemente pelasociedade, e vocs pensarem que se trata da vossavocao, do vosso chamado. Podeis enganar-vos e dizerque "isso constitua a vossa directriz, a vossa linha de

    orientao, a vossa vocao, que havereis de seguir atao fim"- e isso no passar de um acto de puro auto-engano,

    E no final de uma dezena de anos, podem dizer: "MeuDeus, que asneira eu fui fazer, quando aquilo que deviater feito era ser talhante, soldado, ou ter-me unido Igreja". Assim, investiguem bem esse problema. Apergunta foi: " como haverei de saber se estou a seguir avocao certa, que no seja uma imposio da sociedade,nem seja uma resposta ao meu condicionamento

    inconsciente?

    Portanto, tm de ser activos, sensveis e suficientementelivres para poderem investigar, e procurar a vossa prpriaestrutura, descobrir se aquilo a que chamam de vossavocao poder ser uma imposio da sociedade, ou seser a vossa inclinao pessoal. Tm de investigar. Masvocs dizem que no possuem tempo! Antes pelo

    contrrio, vocs possuem tempo suficiente para poderinvestigar, para procurar e descobrir, e se foremverdadeiramente srios e honestos podero faz-lo deforma a descobrir a vossa orientao num s dia, seaplicarem toda a vossa ateno ao assunto. Observemtodo esse condicionamento, e as influncias que vosforam impostas, os vossos prprios desejos e inclinaes,tudo. Porque, s aquele que for srio poder descobrir asua vocao e no o indivduo que se deixa levar pelacorrente e diz: "Bem, vou fazer isto ou aquilo".

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    P- Tenho dvidas que se trate realmente de uma questosria porque eu no sou talhante, nem um artista nempoltico, eu sou um homem, e tudo isso constituemrestries.

    K- No, espere l. um homem, e no um talhante, isto ouaquilo. um homem, porm tem de fazer algo na vida.

    P- Porqu?

    K- Porqu?, Porque ter de fazer alguma coisa na vida eno limitar-se apenas a viver? Espere l. Escute, quesignifica isso? Viver de acordo com os padres dasociedade, ou de acordo com a vossa prpria inclinao,

    de acordo com o prprio prazer; de acordo com osvariveis estados de espirito, diverso, imaginao,suposies e formulas?

    P- Porque no?

    K- Porque no? Vejamos porque no. No final, o que serde vs? Ficaro ao sabor da corrente, no ?

    P- Como o sabe?

    K- Como o sei? Eu mostro-lhes. No estou a procurarconvence-los, esclarea-se bem isso; no estou a tentarpersuadi-los a aceitar aquilo que digo. Mas que coisaacontecer ao homem que diz: "No me importo com oque possa acontecer, mas tratarei de viver a vida dia adia, ao acaso"? Isso pode estar muito certo enquanto se novo e nos divertimos. Mas medida quecomeamos a envelhecer, comeamos a perceber. No assim? Os dentes comeam a cair-nos. Vejam se no

    assim. Olhem, a maior parte das pessoas vive dessemodo, ao sabor da corrente- ficam presos numemprego, e quando esse emprego deixa de ossatisfazer mudam para outra coisa qualquer. assimcom a maioria.

    P- E o senhor, no anda a vaguear pela vida?

    K- Eu diria que sim. O cavalheiro pergunta se me encontroa vaguear ao sabor da corrente.

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    P- No, eu estou a perguntar com toda a seriedade. Serque vive ao sabor da corrente?

    K- Porque faz essa pergunta?

    P- Porque talvez no exista diferena.

    K- Diferena entre o qu?

    P- Entre mim ou outra qualquer pessoa.

    K- Mas eu no sei nada a seu respeito, senhor. Estamos afalar do tipo que vive ao sabor da corrente, e que levauma vida muito superficial, certo? Trata-se de um tipo

    de pessoa bastante insatisfeito, que se divorcia e voltaa casar e a divorciar novamente- para voltar a casar denovo; os filhos, as responsabilidades, o sustento, e Deusl sabe o que mais. o que a maior parte das pessoasfaz; perfeitamente frustradas, infelizes, amargas. Quecoisa faro, portanto?

    P- Temos de decidir isso j?

    K- Sim, se puderem decidi-lo, tudo bem. No decidir,

    porque no se trata de decidir mas de perceber.

    P- Certo. Mas existir vocao aparte da vida humana?

    K- Penso que no escutou o que estive a dizer. Perdoe-mepor o dizer.

    P- Mas no atendeu minha pergunta.

    K- Eu ouvi a pergunta porm ela j foi respondida.

    P- Aquilo que foi dito foi que talvez as pessoas andem deriva e o que o senhor faz seja introduzir algum tipode disciplina. Algo do gnero: "para eu no me desviartenho que impor a mim mesmo certa disciplina".

    K- Penso que no compreendeu aquilo que estive a dizer.Absolutamente. Mas, olhe senhor, no vantajoso estara repeti-lo outra vez. Ns explicamos cuidadosamentetoda a questo da disciplina no outro dia. Explicamos

    aquilo que ela envolve. No vamos voltar ao mesmoneste momento.

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    Devemos prosseguir. No vamos recuar por uma coisaque discutimos uma dezena de vezes. Vamos l.

    Que havemos de fazer? Que que faro? Perguntaramcomo havero de decidir j, sendo ainda to novos. No que tenham de decidir, mas temos de ter conscincia doque est a ocorrer no mundo, e da vossa funo, da vossaresponsabilidade para com o mundo. Devem terconscincia de vs e do vosso relacionamento com omundo, e das vossas relaes com os demais, certo? E emque consiste esse vosso relacionamento com os outros,como ele de facto? Ser que possumos umrelacionamento com os outros? E se possumos, o quesignifica o termo relacionamento? Aprofunde isso, por

    gentileza.Esto em relao com a vossa esposa, com a vossanamorada, ou seja l quem for. Mas para vs, o que quesignifica- na pratica e no na teoria- esse relacionamentoentre vs e a outra pessoa? Estar essa relao baseadano prazer? Estar baseada no sentimento de solido, edesse modo no constituir uma exigncia decompanheirismo? Ser essa relao fundada com basenum sentimento de frustrao e portanto de dependnciado outro por uma questo de realizao? Pode ser que

    tenham uma concluso e ajam de acordo com essaconcluso, ao se relacionarem. Ou podem possuir umaimagem de vs mesmos e do outro, e agir e sentir porintermdio dessa imagem. Tudo isso est envolvido noprocesso de relacionar-nos, no ser? Mas, de queaspecto se tratar?

    Relacionar-se significa estar em relao, em contacto,no somente sentindo no sangue como no nvel fsico deigual modo, estar em contacto ntimo, as mentes atrabalhar juntas, a criar e a trabalhar juntas. Isso implica

    uma comunicao constante entre si, e no o isolamentoda pessoa, que procura tentar estabelecer uma relaocom o outro. Portanto, temos de descobrir por nsmesmos, pelo questionar, em que consiste o nossorelacionamento, e se, nas nossas actividades noestaremos a isolar-nos. Compreendem? Se tiverem aambio de alcanar determinado objectivo ou posio,prestgio, ento o vosso relacionamento ser como queinexistente, porque todo o vosso propsito estar novoltar-se numa s direco. Aquele que for ambicioso e

    competitivo provavelmente no poder manter umrelacionamento, e pode at ser que case e tenha filhos e

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    tudo o mais, porm isso no passar de uma convenosocial. Assim, quando falamos da questo dorelacionamento humano, tudo isso est envolvido: abusca do amor- porque em vs mesmos no possuemamor- a busca de companheirismo- por no conseguiremsuportar a vossa solido- a procura de realizao no outro-por no saberem viver por vs mesmos com inteireza e demodo completo. Todas essas coisas esto implicadasquando se falamos sobre o relacionamento.

    Portanto, estaro em relao com o mundo e comoutra pessoa? Tendo presente que o relacionamentoimplica ausncia de todas as barreiras, sejam intelectuaisou emocionais, a inexistncia de qualquer barreira ouseparao, diviso- vs com os vossos problemas, as

    vossas ambies e preocupaes e desespero, e ela ou elecom os dele ou dela. S ento estareis em relacionamento.

    Vm como difcil, senhores? E por isso ser difcil,satisfazemo-nos com uma forma de relacionamentosuperficial que nos conduz a uma imensa tristeza. Noconcordam?

    P- Mas, parece que quando nos ocupamos ou sentimosuma vocao qualquer, ficamos presos numa espcie

    de conflito, em que uma parte diz que temos de noslibertar primeiro para podermos fazer aquilo quequisermos, enquanto que uma outra parte diz quedevemos fazer o que tivermos de fazer porque noslibertaremos atravs disso.

    K- Existem estas duas partes em mim; uma que diz quedevo libertar-me primeiro e depois actuar, e a outraparte diz que o prprio fazer constitui o verdadeiro actoda libertao. Mas prestem ateno questo. A

    primeira diz: libertem-se de todo o caos desordem econfuso em que se encontram; e a outra diz que alibertao se acha na prpria compreenso daconfuso, da tristeza, da luta, do conflito, do desespero;diz que se acha na compreenso disso. A prpriacompreenso disso essa libertao. Mas, porquedividimos ambos esses aspectos?

    P- A compreenso a aco.

    K- Eu entendo isso. Mas vejam, por que dividem isso? Serque libertarmo-nos em primeiro lugar constitui algum

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    tipo de aco, ou seja, existir nisso algum tipo deaco? Porque vs s vos estais a preocupar convosco.

    P- Mas a aco no somente compreenso.

    K- E isso significa o qu? Que s posso obter compreensona relao e no no isolamento. No posso esperar irat ao cume do monte, sentar-me de pernas cruzadas eobter a compreenso de mim mesmo, pois s possocompreender-me em meio aco, no relacionamentoe no avano do movimento. Porque a ento possoobservar as prprias reaces, no ser? Possoobservar o modo como penso, sinto e actuo. Portanto, oisolamento, ou seja, dizer para comigo que antes de

    mais devo libertar-me, est de parte porque isso conduza um isolamento crescente e, portanto, excluso. Ealm disso, no isolamento e na excluso no podereiscom certeza compreender o relacionamento, nem a vsmesmos, pela observao das vossas reaces. Essasreaces produzem certas aces, e desse modo vspodeis observar essas mesmas aces. Assim, trata-sede um movimento constante das oscilaes do crebroe da mente- que o pensamento. Observais os vossossentimentos e dessa forma isso torna-se a nica via

    para a libertao da mente, do seu prpriocondicionamento. A libertao isso.Agora, em que consiste essa vossa relao? Isso muitoimportante porque se colocarem essa questo tornar-se-oconscientes. Esto a perceber? Conscientes daquilo quefizerem, do vosso prprio estado, daquilo que a menteestiver a experimentar.

    P- Com respeito a essa questo da relao, penso que issofez parte de todas as eras. Esteve presente na

    preocupao pela estrutura da famlia, da aldeia, e datribo, mas hoje em dia a sociedade est a tornar-seannima devido s cidades se terem tornado tograndes. O que lamentvel, porque perdemos umacerta qualidade de relao. Devamos descobrir umnovo aspecto da sociedade e recriar essa condio.

    K- Senhor, voltemos atrs. Houve uma altura em que afamlia era importante, assim como a nao e o grupo.Mas depois, que que aconteceu?

    P- As cidades cresceram demasiado.

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    K- Ento as cidades cresceram para l da medida e oindivduo tornou-se annimo e acabou por sersuprimido. E por isso temos de achar um modo de viverque no seja tribal nem annimo, que no sejasuprimido pela sociedade, annimo. Encontrar ummodo de vida que no seja nem uma nem outra coisa.

    P- Uma nova forma de sociedade.

    K- Primeiro, tentem perceber como esto maisinteressados na sociedade nova. Mas a nova sociedades surgir quando descobrirem o correctorelacionamento com os demais. Porque a sociedade

    relacionamento. Mas baseia-se na forma de serelacionar de cada um, no desespero, na contradio,nos propsitos, nas ambies, no conflito e tudo o mais.Portanto, a sociedade como existe agora, corrupta.Mas para se criar uma sociedade nova, tm dedescobrir o relacionamento entre vocs e o outro, e apartir da surgir essa nova sociedade. Concordam?Uma sociedade que no seja burocrtica e tudo mais.Portanto, ao colocar essa questo, percebam onde issoconduz. Primeiro formularam a questo do que

    havemos de fazer. Eu sugeri aquilo que poder ser avossa vocao; descubram isso sem se desviarem, einvestiguem-no despendendo o vosso tempo nisso.Empenhem-se com toda a vossa energia e vitalidade,com toda a vossa paixo por descobrir. No significaisso que se disciplinem- nem sequer que possam tornar-se alguma outra coisa. Despertem a conscincia disso,descubram-na. A partir desse ponto tero conscinciade que precisamos ter ateno para com o nossorelacionamento, e portanto tornam-se conscientes.

    Portanto, comeam a descobrir o significado de serconsciente, no s nas vossas relaes como tambmna forma como se comportam, como pensam, como seevadem, etc., comeam a compreender-se em meio relao, e por seu intermdio. Certo? Por isso, a atenono uma questo de prtica nem de seguir umsistema particular com o fim de obter conscincia, mastermos ateno por aquilo que fazemos, o modo comocortamos o po, como se olham ao espelho, a vossaconscincia diurna, como observam o prprio rosto, os

    vossos gestos, os movimentos do pensar- olhar isso

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    somente, sem o corrigir, de modo que essa ateno setorne extraordinariamente vigorosa, certo?

    Agora, a questo que da deriva : ser que podemos viverneste mundo providos dessa ateno? Esta foi uma dasquestes colocadas, que implica a interrogao sobre sepoderemos obter essa estranha forma de beno- e paratal devemos aprofundar toda a questo da beno e doprazer.

    P- Desviemo-nos simplesmente do aspecto da beno.

    K- Se podemos viver neste mundo com essa qualidade deateno. Mas, quem lhes dir se o podero ou nofazer? Eu digo que se pode. Digo que possvel que

    outra pessoa possa possivelmente viver desse modo,mas vocs no precisaro de o descobrir por vsprprios?

    P- Com certeza. Mas no- procurar tentar consegui-lo aomesmo tempo que nos tornamos insensveis com osoutros. Como que supondo que sejamos completamentediferentes, pelo que passamos a tentar ver algo queno somos.

    K- Nesse caso, que hei de fazer? Veja senhor, que hei defazer com relao guerra que ocorre no MdioOriente, no Vietnam e as outras guerras? Que hei defazer enquanto ser humano que possui conscincia e sensvel, e que observa o fenmeno da carnificina dasduas ltimas terrveis guerras. Que hei de fazer? Diga-me!

    P- Que foi que fez durante a ltima guerra?

    K- Que que fiz durante a ltima guerra? Se isso lheinteressa eu digo-lhe, senhor. Viajei por todo o mundo,como de costume, indo de um lado para o outro.Quando eclodiu a guerra estava na Califrnia. E comoera estrangeiro, fui chamado diante de um Concelho, ouo que quer que fosse- que procurava gente apta para ocombate- mas como tivessem percebido que eu nopassava de um pobre pago que nem sequer era capazde empunhar uma espingarda, nem sabia por que razohaveria de matar outro indivduo, mandaram-me

    embora. E assim eu... Mas ser que isto vos interessa?

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    Audincia- Claro.

    K- Ordenhava as vacas, olhava pelas galinhas, cuidava dojardim e tudo o mais, at poder afastar-me daCalifrnia, e recomear a viajar de novo para todo olado. Mas lavei pratos, esfreguei soalhos, etc.

    Mas esperem l. Vejam onde isso nos conduziu. Estvamosa interrogar-nos sobre o que ser esse percebimento,sobre essa qualidade de ateno, essa qualidade deconscincia que por si s constitui uma grande beno-porque significa liberdade; uma pessoa assim livre eatenta pode cometer um erro, mas corrige-o semarrependimento, e sem dizer: "Deus meu, que coisahorrvel eu fui cometer. Que hei de fazer?" Prossegue-se,

    entendem? Se for possvel corrigimos ou eliminamos oserros, mas prosseguimos. Portanto, perguntvamos se nopoderemos viver neste mundo com uma conscincia, euma qualidade de beno assim. Claro, senhores. Eu digo-lhes que podem. Todavia para vs isso no vale como umaresposta. De que valer que outra pessoa lhes diga quepodem comer, quando esto com fome? bvio queprecisaro comer! No adianta leva-los a um restaurante emostrar-lhes a comida, quando no podem comer.Entendem? H de ser a vossa vocao- ora a est! H de

    ser a vossa vocao a descobrir de que forma viver nestemundo com uma conscincia assim atenta.

    P- Isso bastante encorajador.

    K- O cavalheiro aqui diz que isto muito encorajador. Nose deixem encorajar por ningum, porque, nesse casotambm qualquer pessoa os poder desapontar. Mas seperceberem aquilo que possvel ento isso libertaruma tremenda energia, compreende senhor? O que for

    possvel. Portanto, a partir dessa qualidade deconscincia, ou ateno, que no consiste em seguirum mtodo nem sistema nem disciplina, masobservao- observar como nos sentamos, observar ainquietao do corpo, o nervosismo dos dedos atamborilar, etc. Certo? Alm disso h a investigaobiolgica, a observao do corpo, compreende senhor?Observar o corpo, no quer dizer orienta-lo nem dizerque se deve ou no, mas observ-lo, porque quandoobservarem o vosso corpo de forma to desperta vero

    que o corpo se torna muito calmo.

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    P- Mas isso s possvel principalmente se vivermos numgrupo religioso.

    K- S ser possvel se vivermos no seio de um gruporeligioso?

    P- No s, mas principalmente, porque se tivermos deviver em sociedade deve ser bastante difcil.

    K- Se no ser muito difcil se tivermos de viver emsociedade, de tal modo corrupta e irreligiosa ela , parao conseguirmos. Tudo difcil, senhor!

    P- No, senhor, eu pratiquei isso durante muito tempo.

    K- Eu acabei de lhe dizer que no pratiquem nada.Imploro-lhe, senhor, no pratique coisa nenhuma.Escute aquilo que estou a dizer. No pratiquem nada.Porque se praticarem a vossa mente tornar-se-mecnica.

    P- Eu estava s a fazer emprego da palavra, no querdizer que seja exactamente assim. As palavras somuito limitativas.

    K- Eu sei senhor.

    P- Se a prpria estrutura da sociedade confunde, devemosir em frente e tentar...

    K- Olhe, senhor, conheo to bem como toda a gente, atremenda carga que a sociedade nos impe. Asociedade o vosso pai, a vossa me, o vizinho, opoltico e todo o resto. Eu estou ciente dos perigos disso

    e todos temos conscincia disso; da criminalidade detudo isso. Mas pergunto a mim prprio o que haverei defazer numa sociedade assim. Fugir disso? Juntar-me aalgum grupo religioso? Evadir-me em alguma fantasiaou tornar-me simplesmente comunista ou socialista, esabe-se l o que mais? Eu expliquei isso tudo.

    P- Porque identifica a mudana da sociedade com o tornar-se comunista?

    K- Eu no o fao. Eu no identifico a mudana dasociedade com os comunistas, nem com os Catlicos,

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    nem com o partido Trabalhista, ou o que quer que seja.Porque quando nos identificamos com um grupo nopodemos mudar a sociedade.

    No outro dia algum veio ver-me sem que saiba bemporqu, e disse que finalmente se achava livre por se terligado Igreja Catlica. Verdade! Porque para eles aliberdade sinnimo de liberdade de escolha.Acompanhem isso. Investiguem isso, senhores. Liberdadede escolha, certo? Quando que escolhemos? Quando nosachmos confusos e indecisos e dizemos: "eu escolhoassim", certo? Porm quando vemos a coisa com toda aclareza no se trata mais de uma questo de escolha.Somente quando a mente est confusa escolhe, poisquando possui clareza no h escolha. Mas investiguem.

    Assim, estavam a perguntar se no poderemos viver nestemundo com clareza e sem escolha alguma, com totalconhecimento ou conscincia, certo? Faam-no, senhores,faam-no. Vero assim a imensa possibilidade da coisa.Somente quando pensam que tm de mudar de acordocom um padro determinado, de acordo com umdeterminado objectivo, de acordo com um certo princpio, que esto perdidos. Mas se se observarem, sabem-experimentem isso enquanto conversam ou vo a

    conduzir, observem o modo como conduzem, ou estocom a boca aberta. Observem-no enquanto estiverem aconversar ou a bisbilhotar. Sabem, essa uma dasmelhores maneiras de desperdiar o nosso tempo,bisbilhotar acerca de A ou B. Observem isso de forma quea vossa mente se torne surpreendentemente sensvel poisessa inteligncia sensvel que actuar. Certo?

    P- Ser que o pensar compatvel com a conscincia?

    K- Se o pensar e a conscincia so compatveis? Temconscincia de estar a pensar? Coloquem esta questoa vs prprios, p. f. Estou a colocar-vos essa questo.Quando esto a pensar tm conscincia? No merespondam. Investiguem-no porque essa umaquesto verdadeiramente interessante. Pesquisem-na.A questo que tinha sido colocada era se haveriacompatibilidade entre o pensar e ter conscincia. Mas aminha pergunta se tm conscincia de estar a pensar.Sendo essa conscincia observar sem distoro

    nenhuma, sem correco nenhuma nem justificao.Observar somente.

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    P- Por um momento.

    K- No faam isso num momento ou noutro. Olhe isso,senhor. Tem conscincia de estar a pensar? Ou ser opensar imediato? Vocs pensam. Eu pergunto-vos algumacoisa e surge uma resposta imediata. Mas se investigaremisso um pouco vero algo interessante. O crebro "velho",que se acha cheio de lembranas conhecimento eexperincia, esse crebro "velho" responde de modoinstantneo a qualquer desafio. No ? Eu digo-vos quesois feio e vs dizeis que no. Entendem? A resposta instantnea, a resposta que procede do crebro "velho",certo? Porm se tiverem conscincia de haver um hiato de

    tempo, um intervalo entre a resposta do crebro "velho",talvez assim possa ocorrer uma resposta nova. Entendemaquilo que estou a dizer? Esto a acompanhar isto tudo?No? Est bem.

    Olhem, vocs podem observar isso tudo em vsprprios se simplesmente se derem ao trabalho, pois isso melhor que qualquer livro alguma vez escrito por umindivduo qualquer, incluindo a Bblia ou outro qualquer. Sese observarem percebero que o crebro possui umaqualidade que pertence sempre ao que "velho", velha

    tradio, ao condicionamento velho; a que qualquerdesafio- que sempre novo, tem de ser porque de outromodo no seria um desafio- o crebro "velho" respondecom rapidez. Certo? "Eu sou Cristo"- isso imprime luta.Entendem? "Eu sou comunista" ou o que for- issoresponder de acordo com o meu condicionamento. Agora,se tiverem conscincia vero que o crebro "velho" noprecisa necessariamente responder de imediato. H umabrecha, um intervalo.E nesse intervalo a mente nova pode responder.

    Experimentem-no, e vero. Entendem o que estou a dizer?No esto demasiado cansados? Se o penetrarem veroque isso muito importante. Espantoso.

    Porque o nosso crebro "velho", que se encontra nosbastidores- eu no estou muito familiarizado com isso- ocrebro "velho" responde sempre de acordo com o prazer,com a dor, etc. etc. E como est sempre a responder nopode haver nenhuma resposta nova. Est certo? Aresposta do "novo" s poder ocorrer quando o crebro"velho" estiver suficientemente imvel. Mas para que essa

    imobilidade possa surgir tem de haver uma conscinciaem que no haja nenhuma justificativa nem condenao

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    nem identificao. Entendem? Uma conscincia em que ocrebro velho se torna um pouco mais dormente, de modoque o novo possa actuar. Vejam se no ser assim.

    Essa a razo porque toda a questo do sono e dosonho, e tudo isso faz parte disto. Talvez investiguemostudo isso numa outra altura, agora no.

    P- Eu estava a pensar se o senhor no poderia traar umretracto verbal daquilo que o mundo poderia ser setodos fossem indivduos por inteiro.

    K- Ele gostaria que eu trace um quadro verbal de comoseria o mundo se todos os seres humanos fossemindivduos por inteiro. Mas receio que eu no seja a

    pessoa indicada para poder dar-lhe uma imagemverbal, porque isso pura perda de tempo. O modocomo possa vir a ser no tem importncia, o que importante aquilo que .

    P- Mas, to logo tomo conscincia de mim prprio, procurofugir a essa conscincia. Assim que tomar conscinciado meu pensar, ou o que for, trato de o alterar, e mudo-o.

    K- No momento em que me torno consciente eu tenho odesejo de mudar seja a minha expresso facial, ou omeu modo particular de pensar- no momento em quetomo conscincia h uma resposta instantnea demudana, ou exigncia de mudana. o que estou adizer. A resposta instantnea para a mudana faz partedo crebro "velho" que diz: "isto no est certo, deviaser daquele modo". Aquietar o crebro "velho" significaficar atento sem escolha nenhuma. Ter conscincia dasarvores, senhores. Olhem, vocs tm conscincia

    daqueles montes, mas ser que podem fazer algumacoisa com respeito a eles? Podem? Eles esto acol, asua silhueta, a sua altitude, a sua beleza, os vales- tmsimplesmente conscincia disso. Do mesmo modotenham conscincia de vs mesmos, sem querer alteraressa conscincia. Ento, a resposta do crebro novoproduz uma qualidade de mudana totalmentediferente, algo completamente novo.

    P- (Inaudvel)

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    K- No, senhora, no momento em que surge a divisoentre o crebro velho e o novo- oh, meu Deus, noacredito que estou novamente s voltas com isto. Olhesomente para isso, senhor. Existe uma diviso entre nse o outro, entre ns e a arvore, entre ns e o monte,entre nos e o marido, a esposa, os filhos e tudo mais.Essa diviso existe. Mas ela existe por existirpermanentemente um censor- vocs j sabem, o censorque diz que "isto est certo", ou "est errado", "issodevia ser assim" ou "no devia", isso faz parte do nossocondicionamento, faz parte da nossa estrutura, danossa sociedade, esse ajuizar de imediato faz parte danossa cultura. Agora, ter conscincia desse juzo... Setivermos conscincia dele sem o emprego de

    nenhuma forma de escolha, deixar de existir divisonessa ateno.

    P- A prpria especulao disso...

    K- No se trata de especulao nenhuma, senhor.

    P- (Inaudvel)

    K- Tambm j o dissemos, senhor. Se se aproximarem de

    todo esse problema de modo intelectual, ento issotorna-se um pesadelo. E, se se abeirarem dele tal comoele ... Vejam, se se aproximarem dele como ele , issosignifica que foram condicionados pela cultura em quevivem. No ser? Isso um facto, no?

    P- Quando fao a experincia da liberdade isso nuncadecorre da observao, nem de nenhuma forma deincitamento nem esforo. (Inaudvel)

    K- Ah, isso somente...

    P- Bem, isso est constantemente a ocorrer maioria daspessoas a cada passo.

    K- Olhe, senhor. Eu no sei o que acontece maioria daspessoas a cada passo. Mas o que digo que, comoseres humanos, nos achamos completamentecondicionados no padro do xito, seja dos negcios,seja da religio ou qualquer outra coisa; estamos

    condicionados pelo xito. Agora se tomaremconscincia desse condicionamento, podero descobrir

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    por intermdio dessa ateno- se esto a escolher, ouse dizem que no devemos procurar o xito, porquenesse caso estaremos a bloquear-nos, e isso provocarum conflito enorme.

    P- (Inaudvel)

    K- Eu sei, senhor. Se tivermos conscincia desse processode modo definitivo, ento essa ateno, essaconscincia, modificar o padro. No posso dizer-lhesmais nada. Estou sucessivamente a repetir-me. E j sfaltam dez minutos para o meio dia.

    P- No poderia pronunciar-se com relao cessao do

    tempo, e simultaneamente quanto chama dodescontentamento?

    K- Olhem, j s falta um quarto de hora para as doze. Masesperem. No est um outro encontro marcado? Nodesejam?

    Audincia: Sim.

    K- Vem o quanto tenho estado a trabalhar?

    P- Ter disposio para outro encontro?

    K- Se terei disposio? Eu perguntei-lhes se vocs queriame vocs perguntam-me se eu quero, e se eu tenhodisposio? Se forem verdadeiramente srios euestarei disposto

    P- E ns no somos?

    K- Isso cabe a vs decidir! Se forem srios de verdade equiserem penetrar com profundeza toda esta matriaeu posso dispor de um dia convosco. Compreendesenhor? Temos a prxima sexta feira, s dez e umquarto.

    2 Dilogo

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    31 de Julho de 1970 em Saanen

    K- Que querem debater esta manh? Suponho que cabea vs, gerao mais jovem a tarefa de colocar asquestes. Alm disso espero que perdoem ao orador,que bem mais velho, de se sentar aqui em cima(plataforma). Ento, de que querem falar? Penso queseria bastante interessante e proveitoso destacarmosum assunto que fosse de matria vital para todos aquipresentes e que passssemos a explor-lo juntos eexpusssemos todos os detalhes, se possvel sem

    tropearmos em concluses (o que seria pssimo) eexpusssemos tudo o que essa questo encerrar, demodo a podermos perceber por ns prprios todas asimplicaes envolvidas. E quando a tivermos percebidona sua inteireza, com todas os seus aspectosintrincados e questes ento no formularemosnenhuma escolha nem deciso e seremos capazes deperceber a sua natureza toda, exposta diante de ns.Ou o empreendemos ou no; no podemos dizer paraconnosco: "ser que devo ou no?" enquanto ficamos

    espera que isso produza a deciso esperada. Seperceberem a coisa com bastante clareza, poderosempre dizer para convosco: "Eu no vou empreendertal coisa porque no sinto interesse." Porm, se paravs isso tiver um significado vital, ento no podereisevitar empreender o que isso exige, porque far parteintrnseca da vossa vida. Isso seria o mesmo quedecidirmos deixar de utilizar o brao direito.

    Portanto sobre que querem conversar esta manh, deforma que no s exponhamos os aspectos intrincados do

    problema como pela compreenso do problema possamosexpor-nos atravs dele? Um assunto ou questo poderepresentar uma coisa externa, verbal, o que possuirmuito pouco sentido, porm, se nos deixarmos envolverpor ela e deixar que se torne parte de ns expondo-nosdessa forma ( no aos outros mas a ns prprios) nessecaso penso que valer a pena investigarmos com toda afacilidade e satisfao possveis esse problema, se ele forvital e do interesse geral.

    P- Ns comunicamos no s atravs do uso da palavra edo smbolo mas tambm por meio das roupas que

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    envergamos e pelo nosso modo de ser. Mas essessmbolos e at mesmo o modo como comunicamosatravs das nossas roupas prevalece como um meio deverdadeira comunicao. No poderamos tratar aquesto da comunicao?

    K- O interrogante pergunta se podemos debater aquesto da comunicao. Ns utilizamos palavras,gestos, smbolos e vez por outra ficamos em silnciomas de qualquer modo isso no dever parecer muitoapropriado nem muito significativo, nem sequerconseguir dar a entender o sentido pleno daquilo quequeremos transmitir. No mesmo?

    P- Certo. Mas com respeito aos smbolos de que falou, nsfomos condicionados por eles, condicionados a us-los.

    K- Somos condicionados pelos smbolos que usamos econdicionamos esses mesmos smbolos de acordo como nosso prprio condicionamento. Todos sabemos disso.Mas vocs querem debater isso? De certeza?

    P- Ontem afirmamos possuir dificuldade para tomardecises, o que d a revelar o quanto estamos

    confusos. Assim, gostaria de saber como se instalou emns tal confuso e de que forma poderemos sair dela.

    K- Ontem, afirmaram que uma deciso significa escolhamas pretendem saber como chegamos a ficar confusosno incio. isso que pretendem saber.

    P- E de que forma haveremos de sair da confuso.

    K- Pois, como poderemos sair dessa condio. isso?

    P- Ser que o ser humano pode alcanar a liberdade, ano dualidade, a beno ou suposto no deixarmos deoscilar entre os altos e baixos da vida?

    K- Ser que podemos manter-nos o tempo todo nodomnio da liberdade, da beno e da no-dualidade ouno deixaremos de oscilar entre os altos e baixos da vida?

    P- Ontem afirmou que o crebro deve permanecer em

    silncio. Eu gostava de saber se ele poder permanecernesse estado quando tem de trabalhar.

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    K- Ontem dissemos que o crebro deve estar em silncioquando tem de trabalhar e tem de usar o pensamento. isso?

    P- Podemos debater a questo das nossas exigncias desegurana?

    K- Se poderemos falar juntos sobre a nossa necessidadede segurana...

    P- Podemos conversar sobre a tirania que a menteexerce?

    K- Sobre a tirania da mente...P- Depois da questo da comunicao o senhor disse:

    "agora vou colocar-lhes a questo de como poderemoschegar junto a uma pessoa que vive de modocompletamente insensvel, de forma que o yoga de quese fala seja completamente posto de lado". De queforma poderemos chegar junto de tal pessoa?

    K- Como poderemos comunicar com uma pessoa que est

    completamente em baixo e se mostre desinteressada einsensvel para com o que foi debatido; de que jeitopoderemos comunicar com essa pessoa? No podemos!Mas, esperem l. Que havemos de fazer? J foramcolocadas tantas perguntas... Por qual devemos comear?Por favor decidam vocs para podermos avanar para aexplorao dela e ficarmos bem esclarecidos e da noresulte nenhum problema e no final no tenham queperguntar: "Eu gostaria de colocar outra pergunta acercadessa." Certo? Ento devemos comear a aprofundar uma

    questo que importe e se mostre significativa?

    P- A questo da tirania que a mente exerce.

    K- A tirania da mente.

    P- A questo da confuso, que parece ter tido incioontem. Parece que tudo se relaciona com essa questo

    K- Ento vamos debater a questo da confuso? ptimo.

    Bom, vamos conversar como dois amigos. Eu lamento terde me sentar nesta plataforma que confere um certo

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    sentido de autoridade, todavia eu no possuo autoridadenenhuma e sento-me aqui simplesmente por uma questode convenincia, exclusivamente. Podia muito bem sentar-me no cho e conversar junto convosco; assim que sefaz na ndia. Habitualmente sento-me numa plataformacomo esta quando estou diante de uma audincia deumas oito mil pessoas, porque tenho de o fazer, seno deoutro modo...Assim, pois, estamos a conversar juntos como dois amigosque nutrem interesse pelo problema, de modo imparcial,problema que no abandonam por falta de interesseporque vs estais envolvidos e viveis isso; queremosdescobrir de que modo surge essa confuso e se serpossvel ver-nos livres dela.

    Quando falamos sobre a confuso, que coisa pretendemossignificar com o termo? Ao empreg-la que queremosdizer? No somente de acordo com o significado dodicionrio mas essencialmente para vs, de forma noverbal, entendem? Se tivermos presente que a palavrano a coisa, nem a descrio corresponde quilo que descrito, tampouco a explicao corresponde coisaexplicada, como que chegam a ter noo ou a sentir-seconfusos?

    P- Quando no sabemos o que fazer, ou aquilo quesomos.

    K- Quando no sabemos o que fazer, ou o que somos,nem que relao temos com a sociedade, quecomprometimento deveremos empreender, etc. Quandono mundo, entre os polticos, os sacerdotes e osfilsofos que nos rodeiam existe tanta confuso,injustia, infelicidade, neurose, que coisa poderemosfazer? No mesmo? Mas, o que que despoleta esta

    palavra "confuso"- de que forma tm conscincia deestar confusos?

    P- Provavelmente porque somos incapazes de tomardecises.

    K- No, no. A minha pergunta completamentediferente. Chegaro l mas primeiro iniciem devagar.Como sabem estar confusos? No ser atravs darelao com qualquer coisa, ou por quererem fazer algo

    e dizerem: "eu no sei", desse modo descobrindo porque razo esto confusos? Por favor, avancem bem

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    devagar neste terreno, porque bastante importanteque o compreendam. Querem fazer algo e descobremque se acham num estado de confuso. Por isso tmnoo da prpria confuso com relao a determinadacoisa. Esperem! Se aquilo com que se relacionarem fordivertido e tiverem conhecimento sobre o que fazer,nesse caso haver confuso? Entendem a minhapergunta?

    Eu sinto-me feliz, tenho dinheiro e tudo o que quero fao ameu modo. Assim digo para comigo: "Porque est para aa falar de confuso quando eu no tenho confusonenhuma?" No entanto tal pessoa est confusa. Agora,percebem a diferena. No com relao a determinadacoisa. Eu j toco nesse aspecto. Como sabero se esto

    confusos se no tomaram nenhuma aco- como apergunta sobre o que devem fazer? Percebem a diferena?Eu pergunto a mim mesmo se a percebem.

    P- No ser durante a aco que percebemos quandoestamos ou no confusos?

    K- No, senhor. Antes de mais avancemos devagar.Aprofunde esse aspecto de verdade; mas para opodermos penetrar com suficiente profundidade temos

    de avanar milmetro a milmetro, ou centmetro acentmetro. No podemos saltar para uma concluso.Agora, como que eu tenho conhecimento de me sentirconfuso? Como sei que tenho fome? Esperem, esperem.Escutem com ateno, um minuto. Como sabem se tmfome? No devido a que a refeio que vou fazerestimule o apetite. Trata-se da sensao de fome. Asinto vontade de certos alimentos e digo: "vou comeristo ou aquilo". Antes de mais existe a sensao defome. Podero, do mesmo modo, saber se esto

    confusos? Ou s o sabem com relao a determinadacoisa? Devem dizer, semelhana do homem que temtudo o que quer- posio, prestgio, etc. "de queconfuso est a falar? Eu no me sinto nada confuso".Mas, por debaixo da pele ele acha-se num estadotremendo de confuso. Todavia, para uma pessoa assimno existe confuso; j convosco, quando querem fazeralguma coisa e se vem numa confuso, dizem: "Euestou confuso". Percebem a diferena?

    E depois h uma outra coisa. Tm conhecimento de

    estarem confusos por si s, de per se? Percebem adiferena existente entre estas trs categorias?

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    P- Eu diria que, em certa medida o conhecemos mas, naverdade, s chegamos a tal conhecimento quando temosde agir, porque a temos de escolher.

    K- S tm conhecimento de estar verdadeiramenteconfusos quando tm de agir, porque nesse caso tm deescolher. No mesmo? Alm disso, segundo a formacomo actuarem, na necessidade de definir o que fazer, que revela a confuso. Certo? Porm, se essa aco forsuficientemente satisfatria, que faro? Diro: "tudobem, no me sinto confuso". No sei se esto aentender. Percebem? Tratemos de explorar esta questoum pouco mais, juntos. No ser que obtm noo de se

    acharem confusos por desconhecerem somente o quedevero fazer? Ou melhor, deixem que lhes coloque aquesto nos seguintes termos: vocs tomamconhecimento de tudo o que ocorre no mundo- toda aconfuso poltica, nacionalista, econmica, a injustiasocial, os preconceitos de raa de cada um, e dacorrupo que existe na sociedade e no indivduo- tantono ser humano como em face a este constante tumultode guerra- e tudo isso d origem confuso, no ser?Portanto, na relao que mantm com essa vasta

    confuso generalizada, ser que percebem igualmenteque esto confusos ou s percebem o tipo de aco quedevem empreender ou o que devem fazer a respeito?No estou muito certo de o perceberem.

    P- Se me adapto por efeito da confuso ou se no odeva fazer, isso?

    K- No meu caro senhor, desculpe-me. Preste atenosomente. Veja bem, o mundo acha-se imerso na

    confuso e ao observar essa confuso generalizadapercebo igualmente que me acho igualmente confuso.Ainda no se trata da questo de agir. Mas, porque a queo mundo se acha neste estado de confuso, eu estouigualmente confuso; porm, no momento em que digoque tenho que fazer qualquer coisa a respeito, aoperceber a minha prpria confuso, ento nesse casoessa confuso h de ser o resultado de querer descobriro que fazer. Percebe a diferena? Veja bem, voc sentefome e ningum precisa de lho dar a conhecer, nem tem

    que sair procura de restaurantes nem consultar osmenus etc.; a nica questo que sente fome. Agora,

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    ser que tm conhecimento de se acharem confusos,exactamente nos mesmos moldes?

    P- Por vezes tenho.

    K- Ento trate de descobrir se essa confuso no estem relao com a questo da confuso global, porquenesse caso a sua actuao dever ser completamentedistinta. Vamos devagar, senhor. Eu sinto-me confuso- omundo est uma confuso e como ser humano que temde viver neste mundo, eu descubro que estou confuso.No digo: "que hei de fazer com relao confusoreinante", mas antes: "Tambm me sinto confuso- nocom relao a um procedimento; trata-se unicamente de

    sentir que estou confuso".A sua questo era: "Eu s me sinto confuso quandotenho de tomar uma atitude"- o que completamentedistinto de sabermos que estamos confusos.Pergunto-me se estarei a explorar suficientemente aquesto. No se deixem entediar com esta questo.

    P- Eu tambm gostava de saber de que forma cheguei aficar confuso.

    K- Eu j l chego.

    P- Quero dizer, os psicanalistas - sinto-me confusoporque j passei por inmeros...

    K- No, esqueam os analistas.

    P- Como que fiquei neste estado de confuso?

    K- Tenha pacincia, j iremos descobrir de que forma

    camos neste estado, mas antes de mais, percebam adiferena que existe entre a confuso relacionada com aquesto de " como actuar" e a confuso em si mesma,certo? Ser que percebem a diferena existente entreambos os aspectos? Nesse caso direi para comigo no oque devo fazer com relao sociedade, mas, " de queforma se instalou essa confuso em mim, na qualidadede ser humano. Essa que a questo e no o que fazercom relao sociedade. Porque se eu no estiverconfuso poderei agir e dessa forma afectar

    correctamente a estrutura social. Mas percebam a

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    diferena. Porque, se a perceberem, ento formularo aquesto assim: como que eu ca nesta confuso?

    P- Trata-se de uma confuso de anos, de forma que onosso problema actual no deve ser...

    K- Espere a, senhor. Eu j l chego. De que forma,enquanto ser humano que sou, ca nesta terrvelconfuso? a isso que se est a referir; como podeacontecer que me veja neste estado de confuso?

    P- No ser algum complexo...

    K- Espere, por ora vamos dar ateno ao seguinte; eu

    recuso-me a aceitar a possibilidade de se tratar de umcomplexo, ou uma nova forma de complexo analtico. Jiremos investigar isso um pouco mais adiante. Tomosimplesmente conscincia disso, e fao-o no comrelao a determinada actuao que deva empregar;logo, a minha pergunta passa a ser: como que eu-como um ser vivo que habita este mundo, cheguei a cairneste estado? Ser culpa da sociedade? Ser daeducao? Ser da estrutura econmica, das crenasreligiosas, temores e tudo o mais? Ou tratar-se- da

    herana de uma confuso que recebemos desde o incio?Percorram todas essas interrogaes; no varram comelas para o lado. Assim, quando refiro se no se tratarde um erro da sociedade- tomo isso como um incio deaco- se no ser o resultado da sociedade- sendo quepor sociedade entendo a educao, a religio, a culturageral, os absurdos generalizados, as supersties, asdesigualdades, a injustia social, os preconceitos, onacionalismo, a falsidade da educao, tudo enfim, o quepodemos colocar numa simples palavra- sociedade. No

    empreguem mais nenhuma. Portanto, dever tratar-seda sociedade ter criado este resultado em mim, comoum facto- o que implica que eu deva ser diferente dessasociedade? O que implica que eu seja inocente, umaentidade malevel, meiga, e que essa sociedade metenha moldado, simples facto esse que me tenha trazidoesta confuso? O que implica que eu seja diferente dessasociedade... Por isso, no posso culpar a sociedade.Certo? Porque, vejam bem, no podem nem culpabilizaro meio nem a alimentao que ingerem. Entendem?

    Portanto, estava a perguntar se isso no ser culpa dasociedade, porque eu sou essa sociedade. Eu criei-a e

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    vejo-me agora aprisionado nela. Mas no a terei criado?Vejam se esto perfeitamente seguros disso.

    P- No.

    K- Diz que no. No a ter criado por meio da suaambio pessoal?

    P- Ela j existia.

    K- J existia de antemo, diz ele- criada por outros;foram os meus trisavs que criaram esta sociedade, peloque no posso ser responsabilizado- prestem toda avossa ateno- razo porque no posso ser

    responsabilizado. Ao estivermos bastante certos, no mesmo- se eu possuir bastante clareza, ento nosentirei qualquer confuso. E, se os meus trisavs e asgeraes passadas produziram esta terrvel desordem eisso for culpa inteiramente sua- de forma que eu notenho nada a ver com isso- ento nesse caso eu nosentirei qualquer confuso. No ser assim?

    P- Claro.

    K- Mas eu estou confuso!

    P- Mas isso deve-se ao facto de ter sido marcado.

    K- Espere a; j l chegamos. Portanto, diz voc que eufui marcado e moldado pela sociedade. Fui marcado,moldado e empurrado para o canto pela sociedade.Vocs no foram?

    P- Talvez no colocados margem, mas marcados,

    seguramente.

    K- Marcados. Portanto, o que significar isso?. Forammarcados, moldados, aprisionados. Mas quem iroculpar? Ser que podem culpabilizar algum?

    P- No.

    K- Correcto. isso. Vocs autorizaram que osmarcassem, antes que soubessem o que quer que fosse

    a respeito, enquanto eram crianas, rapazes, raparigas, medida que iam crescendo com as marcas da

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    sociedade- por isso no podem censurar a sociedade.No culpabilizem ningum; nem o vosso av nem av,tampouco se revoltem contra os vossos pais!

    P- Podemos continuar?

    K- Esperem, eu estou a faz-lo. Desse modo diro: "Noh ningum contra quem eu me possa revoltar, nemsequer contra a sociedade posso invectivarculpabilidade. Eu estou marcado e confuso." No se tratade saber o que tenha criado essa confuso; o facto queestou confuso. Posso muito bem arranjar explicaespara essa confuso, dizer que foi o meu av ou asociedade actual- isso, porm, sero simples

    explicaes, ao passo que o facto que nos achamosconfusos. Agora, podemos continuar? No culpabilizemningum; tampouco adianta dizer: "como que issoacontece?", nem os complexos- trata-se simplesmentedisso. Certo? E assim, a nossa posio torna-secompletamente diferente anterior, em queculpabilizava as pessoas.

    P- Eu posso no as culpabilizar, porm, sinto revolta.

    K- Pode revoltar-se, mas isso uma forma deculpabilizao.

    P- No.

    K- Ao revoltar-se tambm est a rejeitar a coisa toda.

    P- Mas eu no o desejo.

    K- No o deseja... Avancemos bem devagar. Mas se o

    no deseja, e a despeito disso ainda actua dessa forma,age com base na sua confuso, de modo que incrementaessa mesma confuso. Mas de momento no estamosconcentrados em "como agir" mas antes a esmiuar aconscincia de nos sentirmos confusos, e ningum poderser culpabilizado, no ? Acontece. Aconteceu eu nascerna ndia, pelo que no posso simplesmente culpabilizaros indianos por l ter nascido, por no ter um tom depele mais atractivo- mais claro; mas, de que adiantaculpar algum quando isso um facto? Posto isto,

    continuemos.

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    Assim agora tomo conscincia de estar confuso e de queisso no culpa nem resultado de nenhuma confusoexterior. um facto. Assim, que hei de fazer?Vejam a forma como progredimos na investigao do quepodemos fazer. Eu tenho conscincia de me acharconfuso, portanto, que hei de fazer?

    P- Temos que ter a certeza de que no procuraremosescapar ao facto.

    K- J vamos investigar isso, senhor; avancemos devagar,juntos. Que havemos de fazer? Agora, eu digo de mimpara comigo- "quem que coloca esta questo?" Estoumergulhado na confuso e acho que devo actuar com

    relao ao facto, mas- quem que coloca tal questo?Ser ela induzida ou referida por algum que se achelivre da confuso? Respondam a isso; tentem descobri-lo,se fazem o favor. Esta questo estar a ser colocada porum fragmento exterior confuso? Ser? Nesse caso,quem que a est a levantar?

    P- A prpria confuso.

    K- Ao referirem tratar-se da prpria confuso, percebam

    o que esto a dizer; como poder isso suscitar talquesto: a questo de acabar por sair do problema, ou aquesto de actuar sobre ele? Tentem perceber aimportncia disso; investiguem-no e percebam-lhe aimportncia.Tomo conscincia de me achar confuso; todavia, sesubsistir em mim um lado que diga que eu deva sairdesse estado e acabar com esta confuso- de que partede mim se tratar? Ser ainda a parte mergulhada naconfuso, ou ser algo que no ter qualquer relao

    com essa confuso: algum agente externo, superior ouinferior? Ou tratar-se-- por favor senhores, prestem bemateno- ou existir alguma parte de mim que se sintaconfusa e diga: "Por amor de Deus, saiamos disto paraum nvel melhor"?

    P- Ainda a mesma coisa.

    K- Exacto. Assim, ainda a confuso a levantar essaquesto? No ser? Tomo conscincia, com toda a

    clareza, de me achar confuso. E a surge a questo: devolivrar-me desta confuso. Mas eu digo c para comigo-

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    "quem que coloca tal questo? Ser ainda a confusoou tratar-se- de algum agente exterior a essa confuso,Deus, ou o que quer que seja?"Se for levantada pela parte em confuso, ento talquesto dever ser irrelevante e destituda de valor. Porfavor, acompanhem isto com toda a ateno. Se aquesto for levantada por uma entidade assim, ento talraciocnio dever estar a ser motivado por algum factorou agente qualquer.

    P- No poderemos dizer que se trata da parte de nsque permanece saudvel e livre de confuso a levantartal pergunta?

    K- Nesse caso, ainda que lhe chamem parte saudvelainda devero estar a sugerir a existncia de uma partede ns que no esteja confusa. No ser?

    P- Que a mesma parte.

    K- Estaro a sugerir a existncia de uma parte de nsque se ache livre da confuso, de modo que a questodeva ser levantada por ela. Mas ento- vejam s,percebam o que esto a acabar de afirmar: que uma

    parte de ns no se acha confusa. Isso o que asreligies tm vindo a dizer. E ns deixamo-nos cativarpor isso; todas as religies referiram a existncia desseDeus, desse agente externo, Eu Superior, Atman, etc.

    P- No exterior.

    K- Que existe em ns.

    P- Com certeza.

    K- O que d exactamente no mesmo. Ou seja, temexistncia em ns mas encontra-se ao abrigo daconfuso. Vejam de quanto ardil usamos para connoscoprprios. Relativamente existncia de uma parte dens que permanece livre do alcance, de forma a podercolocar tal questo, tomo conscincia da forma como nosestamos a trapacear. De modo que, ao tomarconscincia disso, digo: "Por Deus, olha s o queestvamos a fazer". Mas o que todas as religies

    propuseram exactamente isso; o que implica aexistncia de uma dualidade, a existncia de um conflito

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    entre a parte ilesa e o resto da confuso. Por isso achoque se trata de um contra-senso, razo porque abandonotudo isso e no levantarei qualquer outra questo.

    P- Mas, desse modo, no me verei incapacitado para sairda confuso?

    K- Espere, espere. Eu vou mostrar-lhe j isso, senhor;vamos devagar. Vocs so muito impacientes.

    P- que estas interrupes so demasiado confusas.

    K- No, estas interrupes tm razo para eclodir, domesmo modo que as questes. Todavia, avancem passo

    a passo e sero capazes de colocar as questesadequadas. Avance com facilidade e segurana, senhor.Olhe, eu sinto-me confuso e no culpabilizo quem querque seja. Certo? Eu fui marcado, porm, esta marca no a marca de sociedade nenhuma, nem de cultura, deningum. A seguir, coloca-se a questo de sabermos deque modo haveremos de sair disto. Mas a, digo de mimpara comigo: "quem que coloca tal questo? Seralgum agente exterior ou alguma parte que no constituiqualquer agente externo, que se ache livre de toda essa

    confuso?" Existir alguma parte de mim que no estejasujeita a esta confuso? Se existir, ento nesse caso eladever actuar e vs no tereis que exercer qualquer tipode escolha. Porm, se existir realmente uma parte dens que no deva estar mergulhada nessa confuso,esto dever existir uma dualidade. E isso implicar aexistncia de uma sobreposio exercida por essa partesobre a outra, e sereis levados de volta para a questodo eu superior e do eu inferior; de Deus em oposio aodiabo, enfim...

    Por isso, afirmo que tal abordagem, tal questionrio estcompletamente errado, por conduzir a uma conclusoerrada, a um fim errado; eu no levantarei esse tipo dequestes. Permaneo somente confuso.Agora, que que fazem quando subitamente se vemconfusos, perdidos numa floresta, e se esqueceram ocaminho? Quando no est l mais ningum a quempossam pedir informaes, qual ser a primeira coisaque fazem?

    P- parar.

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    K- Param, no mesmo? Avancemos devagar! Agora, eusinto-me confuso, e deixo que se erga todo o tipo dequestes, afirmo isto e mais aquilo, tomei este e aquelerumo- porm, antes de poder compreender o que querque seja, tem que suceder uma paragem de toda aaco com relao confuso. Certo? A mente diz: "novou por aqui nem por ali; antes de mais devo deter-me"!Vocs faro tal coisa?Vocs esto mergulhados na confuso e no vislumbramnenhuma sada, apesar de terem perspectivadoinmeros caminhos rumo ao exterior dessa condio, deforma que agora diro: "Que absurdo! Por me acharconfuso, toda a aco que empreender dever resultardessa confuso". De modo que no agiro nem faro

    coisa nenhuma mas deter-se-o unicamente.J experimentaram deter todo esse processo?

    P- Uma parte de mim j o fez.

    K- No, nenhuma parte o fez. Veja bem, voc j rumou anorte, depois a noroeste, a sul, a oeste, este, etc. Voc jtomou cada um desses rumos com base nessa suaconfuso. Mas a, voc diz: "Por Deus, eu continuo nomesmo lugar; ainda me sinto confuso". De forma que, eu

    afirmo que a primeira coisa que devo fazer deixar deavanar, seja em que direco for.

    P- Mas, parar uma aco exterior.

    K- No . J o fez?

    P- A maior parte de ns ficou espera, desprovido deenergia.

    K- No, senhor. Tentem perceber uma coisa, por favor.Vocs possuem imensa energia. Quando se perdem nafloresta e experimentam descobrir o caminho de volta,somente para voltarem ao ponto de partida, dizem: "Peloamor de Deus, eu tenho de parar para ver o que sucede"no ser? Vocs detm-se. Mas, por acaso j detiveram oprocesso de procurar eliminar essa confuso?

    P- Quando nos detemos, deixa de haver confuso.

    K- Detenha-se, senhor, e descobrir algo completamentediverso. Eu desejaria que o fizessem. Ou seja, a mente

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    percebe que, estando confusa, o que quer que faa sdever conduzir a uma maior confuso, de modo que, aoperceber tal verdade, ela detm-se e deixa deperambular para c e para l. Assim, entender quequalquer movimento que brote do seu interior a fim deprocurar uma sada s far aumentar a confuso;perceb-lo- como um facto. Do mesmo modo quepercebemos que o sol se ergue a cada novo dia tambmpercebemos a verdade disso, pelo que a mente passa adeter-se. J experimentaram fazer isso? Deter todo esseprocesso sem qualquer conflito, essencialmente porperceberem que essa via no conduz a lado nenhum.Percebem? Meu Deus, por que razo hesitam tanto?

    P- Estar a referir-se a deixarmos de agir ou a pararmosde procurar um rumo para o exterior desta confuso?

    K- Ambas as coisas: de agir, e de procurar um rumo parafora. Porque, agir a partir dessa confuso s faraumentar a confuso; procurar uma sada da confusoimplica a existncia de uma entidade que no se acheconfusa e, portanto, dualidade, etc. Assim, todo omovimento se detm.

    P- Senhor, tenho que lhe perguntar o seguinte: Suponhao senhor, Krishnamurti, que se achava confuso; agora,iria manter um solilquio nos mesmos moldes em queest a faz-lo, ou simplesmente reconheceria o facto dese deter e mudar de rumo- olhar o "que " e continuar,simplesmente?

    K- Eu no me sinto confuso, e percebo com toda aclareza e simplicidade que uma pessoa que se acheconfusa deve, antes de mais, deter-se.

    P- Mas, o deter-se no constituir outra forma de aco?

    K- No. Veja bem, vocs esto a verbalizar ao invs deempreenderem a coisa.

    P- E isso, para si, no constituir uma aco?

    K- No, nenhuma. Veja bem, eu tenho andado a vagar ea tentar uns e outros rumos, mas agora percebo a

    futilidade de tudo isso, de modo que me detenho.

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    P- A auto-compreenso elimina a confuso.

    K- No, no tm que usar de auto-compreenso; ns jestamos a faz-lo, medida que vamos avanando. Isto,o auto-conhecimento, a percepo da forma como amente prega estas partidas sobre si prpria ao dizer queestamos confusos, que devemos sair disso, etc., fazparte da auto-compreenso. Senhor, quando um invisualprocura uma sada, experimenta vrias, depois magoa-sede encontro moblia e acaba por tomar conscincia deter que se deter; primeiro procura orientar-se e parar elogo ser de novo capaz de achar o caminho de volta,sem ter de avanar de encontro s coisas. Ns achmo-nos cegos e confusos, mas eu digo-vos: Olhem,

    detenham-se, por um minuto que seja, e tentemperceber ao vosso redor. No digam que tm de fazer oudeixar de fazer isto e mais aquilo, revoltar-se, etc.Entende, senhor?

    P- Mas algumas pessoas fazem uma paragem, s queem toda a linha do seu viver.

    K- Isso igualmente estupidificante. Algumas pessoasreferem no saber o que fazer, de forma que se detm e

    ficam prostradas, inertes. Porm, aquele que disser:"olhe, deve existir um caminho de sada, vou descobri-lo;j tentei isto e mais aquilo e no funcionou, de formaque, antes que faa alguma coisa mais, no efectuareinenhum movimento". Vocs procedero desse modo? Seno, a questo que puserem a seguir, deixar de fazerqualquer sentido.

    P- De que forma uma mente confusa obter conscinciada sada?

    P- No; como saber se existe uma sada?

    K- Eu estou a mostrar-lhes, senhor, exactamente de quemodo a mente confusa dever conhecer a sada.

    Portanto, antes de mais deve deter-se. Vocsdescobriro! Mas, por Deus, vocs abstm-se de o fazer.

    P- Ainda acho que existe uma entidade separada queno se acha confusa.

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    K- Voc no pode afastar-se dessa sensao deexistncia de uma entidade distinta que se ache livre daconfuso- o que significa a existncia de uma entidadeque possui clareza de esprito, impoluta, intocada eimaculada. Mas agora prestem ateno, por favor. Umavez que tenham compreendido isso, no mais voltaro alevantar tal questo.Agora, quando tm noo da existncia de uma entidadeseparada, de que forma tero noo disso? Tratar-se-duma sensao? Ser o resultado do vosso pensamento,do vosso desejo da existncia de algum tipo de sada, deforma que o tempo passe a inventar essa entidadedistinta, que dever achar-se intocada? Se conhecessemuma sada no haveria necessidade nenhuma de

    qualquer entidade separada, no ? Mas, devido a queno conheamos sada nenhuma que inventamos talentidade. Vamos l, senhores. Olhem, lamento que sesintam cansados e estejam a bocejar.

    P- Eu no estou.

    P- Diria que as privaes provocadas pelas diversastentativas constituam um pr-requisito necessrio?

    K- Entendo. Ou seja, se ser necessrio que passemospor todas estas diferentes tentativas para chegarmos aoponto de nos determos. Teremos de passar por tudo isto?Escutem com ateno. Tereis de vos embebedar parapoderdes conhecer a sobriedade? Tereis de experimentardrogas para poderdes conhecer a sua inutilidade? Oupercebereis a coisa?

    P- Penso que isso um pouco mais bvio. Mas, no casode uma pessoa que se torna adepta de uma sociedade,

    ou Igreja, etc. no constituir isso um pr-requisito?

    K- Olhe, senhor, eu declarei que os seres humanosexperimentam essas coisas- no pela adeso a umadelas- eles experimentam-nas e tomam conscincia deque uma tentativa suficiente porque, cada parte similar ao resto das partes; de forma que desse mododir: "rua"!

    P- Tinha referido que, antes de mais se devia parar -

    mas e depois?

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    K- Eu coloquei-lhes a questo, senhor; vocs pararam?

    P- Sim, por vezes.

    K- Pararam de colocar a questo ou de procurar umasada desta confuso? Agora, esta questo que se segue realmente bastante importante, se o tiveremempreendido. Se no, ento estaro meramente aentreter-se com simples palavras. Eu parei por percebera existncia de mltiplos caminhos e por ter reconhecidoa futilidade de passar sucessivamente por todas essascoisas. Foi por isso que parei. Agora, o prximo passo: deque forma tero conhecimento de terem feito umaparagem? De que forma tero conscincia- por favor,

    prestem muita ateno pois isto verdadeiramenteimportante- de terem feito uma paragem?

    P- Devido a que observemos os sentidos tornarem-sesilenciosos, depois de nos termos detido.

    K- Sim, senhor, Eu s estou a perguntar. Compreendo.Olhem, de que forma sabero que se detiveram?

    P- S teremos conhecimento de que no nos detivemos

    se nos percebermos a ns prprios no relacionamento.Ento saberemos que no nos detivemos.

    K- Exactamente, senhor.

    P- A mente torna-se silenciosa.

    K- Claro. Olhem, escutem com ateno e descubram.No se precipitem a afirmar que a mente se tornasilenciosa. H muita coisa envolvida nessa questo.

    P- Eu podia afirmar no me importar de me encontrarsempre na confuso.

    K- Bom, pode dizer isso, tudo bem, no tem problema.Do mesmo modo que aquele que pe de lado toda aconversa sobre a confuso quando possui tudo aquilo deque necessita. similar ao caso daquele que refere estarsempre em confuso sem se importar - no tem com oque se ralar.

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    P- O senhor est a tratar a questo da confuso, passo apasso. Mas recorrer a algum padro mental que esteja atentar estender-nos e que possamos seguir?

    K- Nenhum.

    P- Porque isso parece demasiado extenso e abstracto.

    K- Mas no nem longo nem abstracto; como subir acolina, em que temos que avanar passo a passo. Nopodemos subitamente chegar ao topo, temos de avanarprogressivamente. Pode at parecer extenso, porm, noo porquanto tereis chegado a um determinado pontoem que tereis posto de lado todas as coisas inventadas

    pelo homem, a fim de escapar da confuso- os seusdeuses, as suas sociedades, as suas diferentes culturas,as suas anlises; tereis posto tudo de parte. uma coisaespantosa. E ento, direis- por favor, prestem ateno:"De que forma poderei saber se deixei de estar confuso?"Esse estado de se deixar de sentir confusocompreender todo o meu ser? Compreendem? Toda aminha existncia ou somente um aspecto superficial?Porque se for superficial, no dever passar de umaconcluso intelectual, e nesse caso voltaremos ao

    mesmo. Porm, se se tratar de ambos os casos, tanto aonvel consciente como a todos os nveis mais profundos,dar-se- um completo cessar de todo o movimento, tantoneurolgico como emocional, tanto verbal como nombito do pensamento. Dar-se- uma completa cessaode todos os movimentos procedentes da confuso.

    P- Mas, l por cessarem, no creio que possamos aliviaro estado de confuso.

    K- Vocs vo descobri-lo.

    P- Mas, isso um argumento contra o facto de se tratarde uma questo de escolha, de uma ou de outra forma.

    K- No, meu amigo. J analisamos isso. Ficou dito que,onde houver questo de escolha, deveremos estarmergulhados na confuso. Olhe, senhor, quando no seique rumo tomar, sinto-me confuso; porm, se souber,deixo de sentir essa confuso. Acabemos com isso

    porquanto estamos de volta velha questo de:"enquanto subsistir a confuso, dever existir a escolha,

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    do mesmo modo que deciso". Ponto final. J falamosdisso ontem, mas possvel que c no tenha estado.

    P- Ser que se eu detiver todo o movimento em mimprprio, isso significar tambm a paragem de toda aaco?

    K- Descubram-no!

    P- Parece ilgico dizer que me controlo e fao umaparagem...

    K- Espere, senhor. No, voc percebeu que qualquer

    movimento procedente da confuso conduz somente amais confuso. Certo? E por isso voc diz: deixa-meparar, porque eu no posso avanar de modo nenhum,isto no tem sada, j tentei deste e daquele modo, eisso no conduz a lugar nenhum.

    P- Provavelmente eu no reconheo isso como umaparagem.

    K- Eu j l chego, senhor.

    P- Como que havemos de fazer essa paragem?Podemos perceber como este corpo foi deformado desdea infncia, e achamos difcil respirar, com todos os tiposde problemas psicossomticos...

    K- Ento, eu sinto medo, senhor. A pergunta : comopoder algum que sofreu danos psicossomticos pararde se sentir confuso? Esperem. A actividadepsicossomtica ter produzido essa confuso? Eu posso

    estar doente e ainda assim perceber que a confuso noresulta da minha enfermidade. Isso bastante simples,no ser? E posso sentir uma dor violenta, profunda, eainda assim perceber que a minha confuso temprosseguimento. Assim, a enfermidade, a doena,qualquer forma de deformao psicossomtica podemser distintas da confuso. Isso est bastante claro.Assim, avancemos: Eu percebo que estou confuso, e apartir dessa confuso qualquer escolha s acentuar aconfuso. Desse modo no tomo nenhuma deciso. Por

    me sentir confuso tentei isto e isto e mais aquilo, masagora percebo a futilidade disso tudo. A percepo da

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    futilidade de todo o movimento procedente da confuso,esse mesmo facto faz com que o movimento inteiro sedetenha. Agora, isso ocorreu consigo? Isso ocorreuconsigo? No? Porqu? Esperem. Algum lhe diz que isto um microfone e voc diz: eu no vejo isso assim,penso, ao invs, tratar-se duma rvore. Certo? Domesmo modo, ns passamos quase uma hora a tentarperceber todas as implicaes da confuso, que no falha nenhuma de quem quer que seja, mas queacontece fazer-se presente, e ns preocupamo-nos como facto de sabermos se a mente poder livrar-se disso.Nas suas tentativas para se livrar disso tente isso,senhor; observe-se a si mesmo - na sua tentativa de selivrar disso, tentou isto e mais aquilo, e disse: por Deus,

    isto no adianta nada, e detm-se. Se voc no sedeteve - quer dizer, eu no posso estar a repetir isto dezvezes - isso significa que voc no se associou, no sedeixou envolver com o que esteve a ser dito, vocsimplesmente esteve do lado de fora.Agora, ter a mente percebido que se deteve emabsoluto, e no superficialmente? No de forma verbal,nem experimental vou experimentar isto e ver o queacontece - mas a percepo de que qualquermovimento procedente da confuso s criar mais

    confuso; portanto, ver o prprio facto pe fim aomovimento. Certo? Voc fez isso, de todo em todo?Certo? E se voc o conseguiu, voc sentir-se- confuso?Entende? S quando nos mudamos nas vrias direcesprocedentes da confuso que temos noo deestarmos confusos. Mas quando vemos tal facto, e toda afutilidade desse movimento, que o prprio facto livra amente de qualquer movimento, ento a mente deixa deestar confusa. Oh, vocs no esto a perceber.

    P- Voltamos questo da sensibilidade.

    K- No, a mente deixa de se sentir confusa. A confusono tem volta. Voc descobriu algo, senhor. No que euesteja a descobrir isto por si, voc que o est adescobrir por si prprio, a rao sua. Ento livre. E apartir dessa mente isenta de confuso agimos. Se houveralgum engano, corrigimo-lo. Certo? Pensamos sentirperfeita clareza, e a partir dessa clareza, agimos. Essaaco no fragmentria, uma aco total - por favor

    escutem trata-se duma aco total, sem se achar sobo peso da presso de qualquer cultura, qualquer

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    sociedade, qualquer convico, ou do seu desejopessoal; uma aco total, por isso aco completa,no fragmentria, no contraditria. Certo? Logo, hliberdade. Mas podemos cometer um engano por setratar de algo novo que descobrimos e fizemos. Mas esseengano alterado imediatamente por percebermos issocomo um engano. Esto a acompanhar? Existe umavigilncia constante. Entendem? Vigilncia constante; sehouver um engano, alteramo-lo, e no o levamos naconta dum problema. Assim, quando a mente se detevepor completo, passa a existir determinada aco, devidoa que tenha percebido que qualquer movimentoprocedente da confuso implica mais confuso; por issonessa mesma paragem da amarra h claridade. E por

    isso tal aco inteiramente completa, e nesse casoaco que no produzir qualquer confuso adicional.Senhor, olhe o que est a acontecer no mundo, comoesto a tentar reunir os rabes e os israelitas, os russocom os seus prprios interesses conquistados no Egito, eos egpcios, e os israelitas com os seus prpriosinteresses. Assim, est a ocorrer uma baguna horrorosa,e eles vo criar ainda mais confuso. Obviamente.Vemos isso, mas no vemos que em ns prpriosestamos a fazer exactamente a mesma coisa. Espere,

    senhor. Estamos a tentar criar oposio a esta confusotoda por meio da intromisso de outra entidade que diz:paremos, vamos deitar mo a isto. a mesma coisaque eles esto a fazer no Mdio Oriente.Assim, percebemos que qualquer aco procedentedesta confuso representar confuso adicional. Entocolocamos uma questo verdadeiramente diferente que: vida aco. Vida - no se trata de vida e aco. Viver agir! No viver existe confuso, alm disso a aco geraconfuso. Assim, agora, voc coloca a seguinte questo:

    poder existir uma aco que seja sempre completa eno contraditria, que no crie mais problemas? Nsdizemos que existe, somente quando percebemos quequalquer aco procedente da confuso ser maisconfusa, de forma que a mente o percebe total ecompletamente. E da tremenda percepo desse factosimples resulta a existncia duma aco total. Sim,senhor, espere um minuto.

    P- O medo no ter uma parte preponderante nisso?

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    K- Claro. Se o medo no representar uma parte nessaconfuso? Medo confuso, certo? No representa umaparte - o medo produziu a confuso: Eu temo o quepodereis dizer, podem dizer que sou completamentetolo, enquanto que, por minha parte, penso que sou umgrande homem, e no quero ser contrariado, razoporque sinto medo, e assim estou a produzir confusotanto em mim como em vs igualmente. Certo, senhor?Assim o temor e a confuso andam de mo dada - no setrata do medo ser algo distinto da confuso, e aconfuso ser diferente do prazer - est tudo relacionado,esto a perceber?

    P- Eu penso que entendi. Consigo perceber por mim

    prprio o que voc disse, mas voc h pouco falou daspessoas que lutam umas contra as outras; quer dizer,isso algo que realmente temos que deter.

    K- Claro.

    P- perigoso.

    K- Claro. Eles esto a tentar pr cobro a isso. Mas, olhesenhor - os estudantes e os jovens so impacientes,

    querem resultados rpidos, e assim dizem que lanandouma bomba poderemos criar transtorno, mas a violnciaproduz mais violncia, a violncia produz represso,facto que est a decorrer - a polcia est a adquirir maisfora para dominar os outros... E esta luta prosseguesem termo vista. E h tambm uma estranha luta, umacoisa estranha que est a ocorrer na Amrica, aquelegrupo que se auto-intitulam os freaks de Jesus,entendem? Freaks que se dedicam a Jesus, e que so ooposto dos Hippies - vejam o que est a acontecer - que

    no deixam crescer o cabelo, no so promscuos, nobebem, no tomam remdios, no fumam e, ao contrriodos Hippies, esto a tentar convert-los para a sua causae assim por diante. Esto a acompanhar-me?

    P- Mas no nos encontraremos numa situao deemergncia?

    K- Claro que estamos. Esperem, esperem. Ns estamosconstantemente em estado de emergncia? Claro,

    senhor. No estamos? S permanecemos despertosquando a emergncia se torna observvel, quando a

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    bomba atinge a casa, ou o vosso banco; a dizemos:meu Deus! Mas as bombas esto a explodir o tempotodo ao nosso redor, facto para o qual no estamosatentos. A igreja constitui uma bomba! As religiesorganizadas constituem uma bomba. As naesrepresentam uma bomba porque dividem as pessoas. Opreconceito contra isto ou aquilo constitui uma bomba.Vocs no percebem estas coisas; s percebem quandouma bomba lanada como um acto imediato. Por issotemos de estar atentos - eu no vou estender-me sobreisso tudo.

    P- Senhor, que razes tero as emoes e ossentimentos que nos assaltam no nosso viver dirio?

    K- Espere, senhor. J terminamos com isto? No.

    P- Quem ver a confuso?

    K- Senhor, a pergunta : quem ver a confuso.Ningum. Espere, senhor, avance de modo lento, esta uma questo realmente importante, observe-a. Antesdizamos: estou confuso eu distinto da confuso;quero fazer algo em relao confuso, quero adquirir

    liberdade com relao a ela, quero ir alm dela, estousatisfeito como sou em meio confuso, tenho tudo oque eu quero e no estou confuso, absolutamente. amesma coisa. Assim quando dizemos, eu estouconfuso, nisso existe uma dualidade. Esperem. Essamesma dualidade, essa mesma diviso confuso;vocs no esto a perceber. Essa mesma diviso umproduto da confuso. A mente percebe essa divisocomo uma coisa venenosa, uma bomba.

    P- O que a mente?

    K- O que ser a mente? O que ser o crebro? Senhor, ocrebro, o pensamento diz: eu estou confuso. E opensamento diz: tenho que fazer algo com relao aisso. E ento passa a haver uma diviso. Certo? Essadiviso uma tremenda bomba atmica. Certo? Essadiviso a mais perigosa forma de diviso. Percebamisso, vejam a coisa. Como que a vm? Verbalmente,intelectualmente, ou vm isso como eu vejo e toco este

    microfone, quando estou em contacto com ele, e ocheiro? Esto a acompanhar-me? No fazemos nada

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    disso, por isso dizemos: meu Deus - expomos a mesmaquesto - quem que ir perceber que eu estou confuso.Que horas so?

    P- Passam vinte minutos.

    K- melhor pararmos. Vai haver um debate de domingoque vem, um dilogo. Mas no sei durante quantos dias.Algum far a gentileza de me dizer?

    P- Nove dias.

    K- Nove? No. Agora mesmo, vejam, observem aconfuso que se instalou! Ou sabem, ou no sabem. Se

    vocs souberem no haver confuso nenhuma. Comovai ser?

    P- De domingo a domingo.

    K- Domingo a domingo? Isso significa oito dilogos.Agora, vocs gostariam que, durante esses dilogos deoito dias, um ou dois fossem completamente dedicadosaos jovens? O que dizem senhores?

    P- Sim, sim.

    K- ptimo!