Direito Administrativo

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1 INTENSIVO I Direito Administrativo Profa. Fernanda Marinela www.marinela.ma Direito Administrativo editora Impetus. Fernanda Marinela Aula 1 (23 de julho de 2013) 1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS DE DIREITO ADMINISTRATIVO 1.1 Direito É o conjunto de normas coativamente postas pelo Estado e que disciplina a coexistência pacífica dos seres em sociedade. 1.2 Direito posto É aquele vigente em um dado momento histórico. O Direito é uno, mas subdividido em ramos por razões didáticas. 1.3 Direito Interno Preocupa-se com as relações dentro do território de um Estado. 1.4 Direito Internacional Disciplina as relações internacionais. São normas superiores, acatadas pelos demais Estados. 1.5 Direito Público Preocupa-se com a atuação do Estado, sempre protegendo o interesse público: ESTADO + INTERESSE PÚBLICO. Regra de Direito Público é sinônimo de regra de ordem pública? A regra de ordem pública é imperativa e inafastável pela vontade das partes (imodificável). Existe no Direito Público (ex: impostos, concurso público para provimento de cargos etc) e no Direito Privado (ex: impedimentos para o casamento, regras de capacidade civil etc).

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INTENSIVO I

Direito AdministrativoProfa. Fernanda Marinela

www.marinela.ma

Direito Administrativo editora Impetus. Fernanda Marinela

Aula 1 (23 de julho de 2013)

1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS DE DIREITO ADMINISTRATIVO

1.1 Direito

É o conjunto de normas coativamente postas pelo Estado e que disciplina a coexistência pacífica dos seres em sociedade.

1.2 Direito posto

É aquele vigente em um dado momento histórico. O Direito é uno, mas subdividido em ramos por razões didáticas.

1.3 Direito Interno

Preocupa-se com as relações dentro do território de um Estado.

1.4 Direito Internacional

Disciplina as relações internacionais. São normas superiores, acatadas pelos demais Estados.

1.5 Direito Público

Preocupa-se com a atuação do Estado, sempre protegendo o interesse público: ESTADO + INTERESSE PÚBLICO.

Regra de Direito Público é sinônimo de regra de ordem pública? A regra de ordem pública é imperativa e inafastável pela vontade das partes (imodificável). Existe no Direito Público (ex: impostos, concurso público para provimento de cargos etc) e no Direito Privado (ex: impedimentos para o casamento, regras de capacidade civil etc).

Toda regra de Direito Público é também regra de ordem pública, mas o inverso não é verdadeiro, pois se encontram regras de ordem pública também no Direito Privado. O conceito de ordem pública extrapola o de Direito Público.

1.6 Direito Privado

Cuida dos interesses dos particulares nas relações entre particulares.

1.7 Direito Administrativo

É Direito Público interno.

2 TEORIAS SOBRE O DIREITO ADMINISTRATIVO NÃO ACEITAS NO BRASIL

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2.1 Teoria legalista (exegética, empírica ou caótica)

O Direito Administrativo era um estudo puro e simples de lei seca. Estudo de lei vigente (direito posto), sem a consideração de principiologia.1

2.2 Teoria/escola do serviço público

O Direito Administrativo estuda o serviço público. Serviço público seria toda atividade do Estado: administrativa, empresarial, industrial etc. Se o Estado presta o serviço, trata-se de Direito Administrativo.

Não foi aceita pela doutrina brasileira, pois, assim, todos os ramos do Direito seriam Direito Administrativo. A teoria é ampla demais.

2.3 Critério do Poder Executivo

O Direito Administrativo preocupa-se, tão somente, com o estudo do Poder Executivo, e não com a atividade administrativa do Estado globalmente considerado.

Não foi aceita no Brasil, pois se estuda nesse âmbito jurídico a atividade administrativa do Executivo, Legislativo e Judiciário.

2.4 Critério das relações jurídicas

O Direito Administrativo preocupa-se com todas as relações jurídicas do Estado, excluindo os demais ramos do direito.

Por ser muito abrangente, tal critério não foi aceito no Brasil: estudam-se no Direito Administrativo apenas algumas relações do Estado.

3 TEORIAS SOBRE O DIREITO ADMINISTRATIVO ACEITAS NO BRASIL

3.1 Critério teleológico (Oswaldo Aranha Bandeira de Mello)

O Direito Administrativo é um conjunto de princípios e regras que regem a atividade do Estado na consecução de seus fins (actividade administrativa).

Critério aceito no Brasil, mas reputado insuficiente.

3.2 Critério residual ou negativo

O Direito Administrativo é estabelecido por exclusão. Retira-se a função jurisdicional e legislativa do Estado e o que sobrar é Direito Administrativo.

Critério aceito, mas que demanda um complemento: saber-se o que sobra.

3.3 Critério de distinção da atividade jurídica vs. atividade social/política do Estado

Separa-se o que é atividade jurídica do que é atividade social/política do Estado. O Direito Administrativo estuda a atividade jurídica, e não a social/política (ex: bolsa-escola, bolsa-gás etc).

Tal critério foi acolhido no Brasil, mas considerado insuficiente.

3.4 Critério da administração pública (Hely Lopes Meirelles)

É o critério mais aceito no Brasil.

1 A professora confunde lei com regra. Lei é texto, que pode produzir os dois tipos de norma: regra ou princípio.

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O Direito Administrativo é um conjunto harmônico de princípios e regras (regime jurídico administrativo) que rege os órgãos públicos, entidades e os agentes públicos no exercício da atividade administrativa do Estado – não importando qual Poder (Executivo, Legislativo ou Judiciário) exerça esta atividade –, tendente a realizar de forma direta, concreta e imediata os fins desejados pelo Estado.

• Realização direta: independe de provocação do interessado. O Direito Administrativo não se preocupa com a função indireta do Estado (função jurisdicional).

• Realização concreta: o Direito Administrativo não se preocupa com a atuação abstrata do Estado (função legislativa). Têm-se destinatários determinados.

• Realização imediata: a função mediata do Estado é a função social e a função imediata é a função jurídica.

O Direito Administrativo não estabelece os fins do Estado, mas executa os meios para atingir objetivos definidos pelo Direito Constitucional.

4 FONTES DO DIREITO ADMINISTRATIVO

4.1 Lei (em sentido amplo)

É toda espécie normativa. CF, LC, LO, …O ordenamento jurídico está organizado em uma estrutura escalonada ou

hierarquizada, guardando uma relação de compatibilidade vertical, ou seja, as normas inferiores devem ser compatíveis com a Constituição.

4.2 Doutrina

A falta de um código administrativo causa diversas divergências. A doutrina é o resultado do trabalho dos estudiosos.

4.3 Jurisprudência

É o que se extrai de julgamentos reiterados em um mesmo sentido. Quando se cristaliza, editam-se enunciados de súmula. Estes, de regra, não têm efeito vinculante, servindo apenas para orientação.

Súmulas vinculantes (EC 45/2004): criadas pelo STF, possuindo procedimento específico; os demais órgãos do Judiciário e do Executivo não podem ir de encontro a elas; representam uma forma de economia processual ao resolver de maneira mais célere grandes controvérsias.

Em razão da falta de codificação e da divergência doutrinária, a jurisprudência é bastante importante.

4.4 Costume

Prática habitual, com a crença na obrigatoriedade da conduta. Serve como fonte, mas não cria nem exime obrigação.

4.5 Princípios gerais do direito

Servem para todos os ramos do direito. Estão previstos na base da ciência e, muitas vezes, são implícitos no ordenamento.

5 SISTEMAS ADMINISTRATIVOS: MECANISMOS DE CONTROLE

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5.1 Contencioso administrativo (sistema francês)

Quando se pratica o ato administrativo, quem vai rever, em regra, é a própria Administração. Excepcionalmente, o Judiciário pode rever o ato, em situações ligadas: (i) ao estado e capacidade das pessoas; (ii) à atividade pública de caráter privado (exercida pelo Estado e que segue o regime privado); (iii) a questões de propriedade privada; (iv) a repressão penal.

5.2 Jurisdição única (sistema inglês)

Quem decide, controla ou revê o ato, em última instância, é o Poder Judiciário. A administração também pode julgar, mas suas decisões são revisáveis pelo Judiciário.

Sempre foi o sistema adotado no Brasil. Tentou-se, pela EC 07/77, introduzir o sistema de contencioso administrativo, sem sucesso.

É possível a criação de um sistema misto de controle? Não, pois a mistura já existe nos dois sistemas acima citados. O que distingue um do outro é a predominância do Judiciário (jurisdição única) ou da Administração (contencioso administrativo).

6 O ESTADO

O Estado é pessoa jurídica de Direito Público e, por ter personalidade, possui direitos e obrigações.

Não mais se aceita a teoria da dupla personalidade estatal, em que o ente seria pessoa de Direito Público quando em atividade pública, e pessoa de Direito Privado quando em atividade privada.

6.1 Elementos do Estado

Povo, território e governo. Este último é o comando, a direção da pessoa jurídica estatal. Para que o Estado seja independente, o governo tem de ser soberano.

Soberania significa independência na ordem internacional e supremacia na ordem interna.

6.2 Estado de Direito

Politicamente organizado e que obedece às suas próprias leis.O Brasil tem um governo soberano e constitui-se em Estado de Direito.

6.3 Funções do Estado

A grande função do Estado é o exercício de uma atividade em nome e no interesse de outrem (função pública: exercício de atividade em nome e no interesse do povo).

Funções do Estado: típica (é a função para a qual foi criado o Poder) e atípica (é a secundária).

6.3.1 Funções do Poder Legislativo

Funções típicas: legislar (função legiferante) e fiscalizar (Tribunais de Contas, CPI etc). Na função legiferante, o Poder Legislativo pode inovar no ordenamento jurídico. É uma função abstrata e geral (erga omnes).

Funções atípicas: administrar e julgar (ex: impeachment).

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6.3.2 Funções do Poder Judiciário

Função típica: solucionar conflitos aplicando de forma coativa o ordenamento jurídico. Diferencia-se por ditar a última palavra na resolução de problemas. Em regra, o Judiciário não tem o poder de inovar o ordenamento jurídico e a função jurisdicional é indireta (depende de provocação) e concreta.

Na função jurisdicional, há a produção de “intangibilidade jurídica” (imutabilidade jurídica, impossibilidade de mudança ou coisa julgada).

Funções atípicas: administrar e legislar (ex: regimentos internos).

6.3.3 Funções do Poder Executivo

Função típica: administrar, ou seja, aplicar o ordenamento vigente. Em regra, esta função não inova no ordenamento jurídico. É uma função concreta, direta (independe de provocação) e revisável pelo Poder Judiciário (não produz “intangibilidade jurídica”).

Função atípica: legislar (ex: medida provisória, decreto regulamentar autônomo etc).

Coisa julgada administrativa: decisão administrativa de que não cabe mais recurso na via administrativa (definitiva apenas na via administrativa, não impedindo discussão judicial).

6.3.3.1 Função de governo ou política (Celso Antônio Bandeira de Mello)

Demonstra-se em situações extraordinárias, não é administrar, julgar ou legislar: sanção ou veto a projeto de lei; declaração de guerra; celebração da paz; intervenção; estado de sítio; estado de defesa.

7 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Administração pública é o aparelhamento estatal, a máquina administrativa, a estrutura física do Estado. Pelo critério formal/orgânico/subjetivo, a Administração é máquina formada por órgãos, agentes, bens. Pelo critério objetivo/material, a administração é vista como atividade.

Aula 2 (31 de julho de 2013)

8 REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO: PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS

O regime jurídico administrativo é o conjunto harmônico de princípios e regras que regem o Direito Administrativo. Estas normas guardam entre si uma relação lógica (estão interligadas). São um sistema que compõem uma unidade. A expressão “regime jurídico administrativo” não era usada pelos autores antigos. Por isso, a doutrina moderna ainda não decidiu quais são precisamente os princípios administrativos.

Pode-se falar, no entanto, em duas “pedras de toque” (Celso Antônio Bandeira de Melo) do Direito Administrativo: (i) o princípio da supremacia do interesse público2 e (ii) o princípio da indisponibilidade do interesse público. São princípios que estão na base de todos os outros princípios de Direito Administrativo.

Interesse público é um conceito bastante divergente na doutrina. No geral, entende-se como o somatório dos interesses individuais dos seres considerados em sociedade, representando o interesse da maioria na sociedade.

2 Cf. BORGES, Alice Gonzales. Supremacia do interesse público (disponível em www.marinela.ma).

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O que é interesse público primário e interesse público secundário? E qual deles deve prevalecer? Interesse público primário é a vontade efetiva do povo: a vontade social. Interesse público secundário é a vontade do Estado enquanto pessoa jurídica.

O ideal é que os dois interesses coincidam; porém, se existir divergência entre eles, deve prevalecer o interesse primário.

É bom lembrar que não há princípio que sempre preponderará (absoluto). Em caso de conflitos, há uma ponderação. Já no caso de conflito de regras, uma exclui a outra.

8.1 Princípio da supremacia do interesse público

É um princípio indispensável para o convívio social. Se houvesse supremacia do interesse individual, a vida em sociedade seria impossível.

Supremacia é superioridade (sobreposição) do interesse público em face do interesse individual. Por exemplo, atos administrativos, poderes administrativos e contratos administrativos, intervenção na propriedade privada, etc. Outro exemplo, o direito de propriedade [interesse individual] pode submeter-se à desapropriação e requisição [interesse público]; os contratos administrativos podem ter cláusulas exorbitantes).

A supremacia não é superioridade do Estado, nem do administrador, nem da máquina administrativa, mas sim do interesse público/coletivo.

Em nome da supremacia do interesse público, os atos administrativos são autoexecutáveis (autoexecutoriedade). No caso de boate que emite sons em nível não adequado, a Administração pode fechar a boate sem necessidade de decisão judicial (poder de polícia).

A supremacia do interesse público significa prerrogativas, mas também significa algumas obrigações (ex: licitação, concurso público etc). A Administração não pode dispor do interesse público.

Alguns autores começaram a questionar a existência desse princípio, pois muitos administradores se aproveitavam dele para praticar atos ilícitos. Uma corrente minoritária da doutrina afirmou que o princípio servia para prática de atos ilícitos, de atos abusivos, devendo ser desconstituído ou desconstruído, ou seja, defendem apagar o princípio da supremacia do interesse público.

A corrente majoritária, de outra parte, afirma que de nada valerá retirar o princípio do ordenamento jurídico, pois não resolveria as ilicitudes praticadas pelos administradores. Esta corrente afirma que ele deve ser mantido e aplicado de forma verdadeira ou adequada.

8.2 Princípio da indisponibilidade do interesse público

Limita o princípio da supremacia, pois o administrador não pode abrir mão do interesse público.3

O princípio da indisponibilidade decorre do fato de o administrador exercer função pública, em nome e no interesse do povo. O direito não é do administrador, não possuindo ele liberdade sobre o que não lhe pertence. Ademais, o administrador não pode criar entraves, obstáculos a futuras administrações. Administrar é um múnus público.

O art. 37, caput, da CF, com a redação disposta pela EC 19/98 (reforma administrativa), positivou cinco princípios que a administração pública, direta e indireta das três esferas do Estado, tem de obedecer. Os princípios enumerados no dispositivo são chamados de princípios mínimos da administração pública. São eles: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (LIMPE).

3 Observação pessoal: discordo da professora quando afirma que o princípio da indisponibilidade do interesse público limita o princípio da supremacia, pois é justamente este último fator que fundamenta a indisponibilidade. São, na verdade, duas faces de uma mesma moeda: a de que o interesse público deve ser protegido face o privado, a fim de que se conviva harmonicamente em sociedade.

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CF, art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]

8.3 Princípio da legalidade4

A legalidade é prevista na CF em diversos artigos: art. 5º (direito fundamental); art. 37, caput (administração pública); art. 84, IV (decretos e regulamentos no limite da lei); art. 150, I (não há tributo sem lei anterior que o defina).

Estado de Direito é aquele politicamente organizado e que cria e obedece às suas próprias leis. Assim, o princípio da legalidade está na base do Estado de Direito.

O princípio da legalidade tem dois enfoques distintos: (i) legalidade para o Direito Privado (o particular pode tudo, salvo o que estiver vedado em lei – é o critério de não contradição à lei) e (ii) legalidade para o Direito Público (o administrador só pode fazer aquilo que a lei autoriza – é o critério de subordinação à lei).

Administrar é aplicar a lei de ofício: conceito de legalidade segundo Seabra Fagundes. O administrador não é um “boneco de olhos fechados”, pois, apesar de só poder fazer o que está na lei, ele tem liberdade nos limites da lei (discricionariedade).

O Controle de Legalidade é a verificação de compatibilidade de um determinado ato com a lei e com as regras e princípios constitucionais.

Existe uma diferença entre os princípios da reserva de lei e da legalidade:

Princípio da reserva de lei Princípio da legalidade

Selecionar uma matéria e reservar a determinada espécie normativa (LC, LO, DL, R,..). É a escolha de espécie normativa, conceito muito mais restrito do que o do princípio da legalidade.

Atualmente o princípio da legalidade vem sendo interpretado em sentido amplo. Significa a aplicação das leis e das normas constitucionais, das regras e dos princípios constitucionais.É fazer o que a lei (em sentido amplo) autoriza.

8.4 Princípio da impessoalidade

Concurso público e licitação são os grandes exemplos de impessoalidade expressos na CF. Nestes casos, o administrador escolhe o melhor candidato ou proposta.

Possui dois sentidos: (i) não buscar interesses pessoais (ausência de subjetividade); (ii) os atos administrativos são impessoais, não são dos agentes que os praticam, são atos da Administração, da pessoa jurídica, do ente a que eles pertencem (art. 37, § 6º, da CF). Por isso que, causado dano, o Estado responde pelos atos dos seus agentes.

CF, art. 37, § 6º. As pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Outros dispositivos expressos da impessoalidade na CF são a previsão de licitação e concurso público.

Para Bandeira de Melo, “A Administração tem que tratar a todos os administrados sem discriminações, benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo nem perseguições são toleráveis. Simpatias ou animosidades pessoais, políticas ou ideológicas

4 ARRUDA, Jacinto. Estabilização dos efeitos do ato (disponível no material de apoio).

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não podem interferir na atuação administrativa e muito menos interesses sectários, de facções ou grupos de qualquer espécie. O princípio em causa não é senão o próprio princípio da igualdade ou isonomia” (10ª edição, 1998).

Há uma importante diferenciação entre os princípios da impessoalidade e da finalidade:

1ª corrente (tradicional) 2ª corrente (moderna)

Hely Lopes Meirelles.

Impessoalidade, imparcialidade e finalidade são sinônimos.

O princípio da impessoalidade veio para substituir o velho princípio da finalidade/imparcialidade.

Celso Antônio Bandeira de Mello.

Impessoalidade e finalidade são princípios autônomos e não se confundem.

Impessoalidade: ausência de subjetividade.

Finalidade: busca do espírito (vontade maior) da lei.

Para esta corrente, não é possível separar a lei do seu espírito. O princípio da finalidade está ligado ao princípio da legalidade.

Enquanto princípio autônomo, tem fundamento no art. 2º da Lei nº 9.784/99 (A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência).Atualmente, é a posição que prevalece.

8.5 Princípio da moralidade

Tem um conceito indeterminado, vago. A doutrina ainda não chegou a um consenso sobre o seu conceito. Esse conceito vago traz grande dificuldade para o Poder Judiciário na sua aplicação.

Raramente, o Judiciário retira um ato administrativo do ordenamento jurídico por violação à moralidade, pois afirma que é um princípio muito vago ou aberto. Desta forma, o judiciário sempre agrega outro princípio à moralidade para justificar a invalidação de um ato administrativo, pois tem dificuldade de aplicar este princípio isoladamente.

Apesar de ter um conceito vago, está ligado à ideia de honestidade, lealdade, boa-fé, obediência aos padrões éticos (condutas éticas), probidade administrativa, correção de atitudes. A violação à moralidade está ligada à prática de ato de improbidade administrativa (art. 11 da Lei nº 8.429/92).

Espécies de moralidade: (i) comum (é a correção de atitude); (ii) administrativa (é mais rigorosa, pois exige correção de atitudes e que o administrador seja também um bom administrador: correção de atitudes + boa administração). Boa administração é administração eficiente: tendo pela lei liberdade para agir, o administrador tem de escolher a melhor alternativa. Liga-se, pois, ao princípio da eficiência.

Proibição do nepotismo no Brasil representa aplicação de quais princípios? O nepotismo começa a ser mais discutido a partir da EC 45/04, com a criação do CNJ e do

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CNMP5, que são órgãos de controle da atividade administrativa. O CNJ e o CNMP proibiram o nepotismo no Judiciário e no MP (Resoluções nº 7, 9 e 21 do CNJ; Resoluções nº 1, 21 e 28 do CNMP).

O parentesco só é problema se não for por concurso. Foi proibido o parentesco nos cargos por comissão, contratações temporárias e contratações diretas sem licitação (dispensa e inexigibilidade). Após, o CNJ e o CNMP proibiram o nepotismo cruzado. Houve grande resistência dos tribunais. Desta forma, o CNJ afirmou que se o tribunal não exonerasse, o próprio CNJ exoneraria (e o fez, exonerando muitas pessoas).

O assunto chegou ao STF por meio da ADC 12. O tribunal decidiu que a proibição do nepotismo é constitucional; que é competência do Conselho exonerar nessas condições (pois o CNJ e o CNMP foram criados para isso: fiscalizar a atividade administrativa); que o conselho pode disciplinar tais situações por resolução, pois resolução é ato normativo (matéria baseada na CF); que são princípios constitucionais que fundamentam estas exonerações a impessoalidade, a moralidade, a eficiência e a isonomia.

Após, o STF editou o enunciado de súmula vinculante nº 13, a fim de resolver de vez a matéria. Infelizmente, o enunciado depende de interpretação mais robusta, o que não é adequado. O vínculo de parentesco incluiria cônjuge, companheiro, parente em linha reta e colateral, sanguíneo ou por afinidade, até o 3º grau (incluído este).

Enunciado nº 13 da súmula vinculante: A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

Cargo em comissão é o de livre nomeação e exoneração (exoneração ad nutum). Qualquer pessoa6 pode exercê-lo, servindo para direção, chefia e assessoramento. Função de confiança é a exercida por titulares de cargos efetivos (concurso público). Recebe a remuneração do cargo e mais uma gratificação de confiança. Também serve para direção, chefia e assessoramento.

O nepotismo configura hipótese de improbidade administrativa.O enunciado da súmula não se aplica aos agentes políticos.

Aula 3 (12 de agosto de 2013)

8.6 Princípio da publicidade

O administrador tem que dar ciência dos seus atos ao titular do direito. Dar conhecimento significa transparência, significa clarividência.

A publicação é condição de eficácia, requisito para a produção de efeitos. O ato será válido, mas não produzirá efeitos sem a publicação (art. 61, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93).

Lei nº 8.666/93, art. 61, parágrafo único. A publicação resumida do instrumento de contrato ou de seus aditamentos na imprensa oficial, que é condição indispensável para sua eficácia, será providenciada pela Administração até o quinto dia útil do mês seguinte ao de sua assinatura, para ocorrer no prazo de vinte dias daquela data, qualquer que seja o seu valor, ainda que sem ônus, ressalvado o disposto no art. 26 desta Lei.

5 Já a Lei nº 8.112/90 previa a proibição do nepotismo.6 A constituição prevê que lei reservará um mínimo para ser preenchido por servidor de carreira.

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Publicidade significa início de contagem de prazo, pois o prazo para defesa só pode correr a partir do conhecimento. Publicidade também é mecanismo de controle, instrumento de fiscalização. A modalidade de licitação “convite” tem publicidade (fixação da carta-convite na repartição), mas não publicação. Publicação é uma das formas de publicidade.

Publicar é dever do administrador. A CRFB/88 menciona em diversos dispositivos:

• art. 37, caput;• art. 5º, XXXIII (direito à informação: todos têm direito a receber dos

órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade [...] – cabível mandado de segurança), XXXIV (direito de certidão: são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: [...] a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal), LXXII (direito a habeas data – cabível para obter ou corrigir informações pessoais).

Se o administrador descumprir o dever de publicar, incorrerá em improbidade administrativa (art. 11 da Lei nº 8.429/92: constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente: [...] negar publicidade aos atos oficiais; [...]).

A regra é publicar, mas há exceções na CRFB/88: (i) quando colocar em risco a segurança da sociedade ou do Estado (art. 5º, XXXIII); (ii) quando violar a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas (art. 5º, X: são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação); (iii) nos atos sigilosos na forma da lei (art. 5º, LX: a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem). Para uma corrente minoritária, incluído Celso Antônio, apenas a hipótese (ii) é exceção à regra de publicar.

A Lei nº 12.527/11 disciplina o direito à informação.Também se aplica a dispensa de publicidade no âmbito administrativo, não

apenas no âmbito jurisdicional. Ex: procedimento ético-disciplinar para apurar erro médico (só se torna público após a decisão definitiva para não acabar com a carreira do profissional).

O habeas data somente serve para obter ou corrigir informações sobre a própria pessoa. Se as informações forem do interesse do requerente, mas a respeito de terceiro, o remédio cabível é o mandado de segurança,

Veda-se a promoção pessoal na publicidade (CF, art. 37, § 1º: a publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos).

Segundo o STJ, para se falar em promoção pessoal tem que haver uma análise com bom senso. Deve haver real intenção de fazer propaganda pessoal. O simples fato de constar em uma placa o nome do administrador não significa necessariamente promoção pessoal e, portanto, improbidade. A jurisprudência tem abrandado a proibição do art. 37, § 1º, da CF.

Significa, porém, promoção pessoal e, por conseguinte, improbidade administrativa: símbolo de campanha nos carros da administração; utilização de cores específicas usadas na campanha para promoção do administrador.

É mecanismo de condição de eficácia, de início da contagem de prazos e mecanismo de controle/fiscalização.

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8.7 Princípio da eficiência

Ganhou “roupagem” de princípio constitucional expresso a partir da EC 19/987. Todavia, antes da EC 19, a Administração já devia obedecer à eficiência (princípio constitucional implícito), sendo inclusive prevista expressamente na legislação infraconstitucional: Lei nº 8.987/95, art. 6º (Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato. § 1o Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas).

Sentidos: ausência de desperdício; produtividade; agilidade, presteza; economia (gastar o menos possível para obter o melhor possível). O serviço público deve ser eficiente quanto aos meios e eficiente quanto aos resultados.

O constituinte modificou a estabilidade do servidor público, atrelando-o ao princípio da eficiência (avaliação periódica).

CF, art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público. § 1º O servidor público estável só perderá o cargo: I - em virtude de sentença judicial transitada em julgado; II - mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa; III - mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa. § 2º Invalidada por sentença judicial a demissão do servidor estável, será ele reintegrado, e o eventual ocupante da vaga, se estável, reconduzido ao cargo de origem, sem direito a indenização, aproveitado em outro cargo ou posto em disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo de serviço. § 3º Extinto o cargo ou declarada a sua desnecessidade, o servidor estável ficará em disponibilidade, com remuneração proporcional ao tempo de serviço, até seu adequado aproveitamento em outro cargo. § 4º Como condição para a aquisição da estabilidade, é obrigatória a avaliação especial de desempenho por comissão instituída para essa finalidade.

Aquisição: (i) nomeação para cargo efetivo (prévia aprovação em concurso); (ii) três anos de exercício no cargo; (iii) avaliação especial de desempenho (condição para aferição da eficiência). Perda: (i) sentença judicial transitada em julgado; (ii) processo administrativo com ampla defesa; (iii) avaliação periódica de desempenho com ampla defesa.

Racionalização da máquina administrativa:

CF, art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar. § 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. § 2º Decorrido o prazo estabelecido na lei complementar referida neste artigo para a adaptação aos parâmetros ali previstos, serão imediatamente suspensos todos os repasses de verbas federais ou estaduais aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios que não observarem os referidos limites. § 3º Para o cumprimento dos limites

7 A EC 20/98 trata apenas de previdência social.

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estabelecidos com base neste artigo, durante o prazo fixado na lei complementar referida no caput, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios adotarão as seguintes providências: I - redução em pelo menos vinte por cento das despesas com cargos em comissão e funções de confiança; II - exoneração dos servidores não estáveis. § 4º Se as medidas adotadas com base no parágrafo anterior não forem suficientes para assegurar o cumprimento da determinação da lei complementar referida neste artigo, o servidor estável poderá perder o cargo, desde que ato normativo motivado de cada um dos Poderes especifique a atividade funcional, o órgão ou unidade administrativa objeto da redução de pessoal. § 5º O servidor que perder o cargo na forma do parágrafo anterior fará jus a indenização correspondente a um mês de remuneração por ano de serviço. § 6º O cargo objeto da redução prevista nos parágrafos anteriores será considerado extinto, vedada a criação de cargo, emprego ou função com atribuições iguais ou assemelhadas pelo prazo de quatro anos. § 7º Lei federal disporá sobre as normas gerais a serem obedecidas na efetivação do disposto no § 4º.

Não pode o administrador gastar tudo com funcionalismo público. Há limites:

LC nº 101/00. art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados: I - União: 50% (cinqüenta por cento); II - Estados: 60% (sessenta por cento); III - Municípios: 60% (sessenta por cento). § 1º Na verificação do atendimento dos limites definidos neste artigo, não serão computadas as despesas: I - de indenização por demissão de servidores ou empregados; II - relativas a incentivos à demissão voluntária; III - derivadas da aplicação do disposto no inciso II do § 6º do art. 57 da Constituição; IV - decorrentes de decisão judicial e da competência de período anterior ao da apuração a que se refere o § 2º do art. 18; V - com pessoal, do Distrito Federal e dos Estados do Amapá e Roraima, custeadas com recursos transferidos pela União na forma dos incisos XIII e XIV do art. 21 da Constituição e do art. 31 da Emenda Constitucional nº 19; VI - com inativos, ainda que por intermédio de fundo específico, custeadas por recursos provenientes: a) da arrecadação de contribuições dos segurados; b) da compensação financeira de que trata o § 9º do art. 201 da Constituição; c) das demais receitas diretamente arrecadadas por fundo vinculado a tal finalidade, inclusive o produto da alienação de bens, direitos e ativos, bem como seu superávit financeiro. § 2º Observado o disposto no inciso IV do § 1º, as despesas com pessoal decorrentes de sentenças judiciais serão incluídas no limite do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20.

Só se pode gastar com folha de pagamento até o limite de cinquenta por cento para a União e sessenta por cento para estados e municípios. Se já estiver acima dos limites dispostos no art. 19 da LRF, o administrador tem de reduzir na seguinte ordem (art. 169, § 3º da CRFB/88): 1º) cargo em comissão e função de confiança (mínimo de 20%); 2º) servidores não estáveis; 3º) servidores estáveis (neste caso, há direito a indenização).

Só se pode passar a cortar cargos de uma categoria para a seguinte se já houver esgotado a hipótese legal de “enxugamento” da categoria anterior.

Todas as hipóteses acima dispostas são de exoneração. Demissão é pena por falta grave e precisa de procedimento administrativo disciplinar com obediência à ampla defesa para ser efetuada.

8.8 Princípio da isonomia

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Tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual, na medida de suas desigualdades.

É um princípio de difícil caracterização. É preciso identificar o fator de discriminação e verificar se está compatível com o objetivo. Se não houver conformidade com o objetivo da norma, há ofensa ao princípio da isonomia.

O STF decidiu que limite de idade em concurso público é constitucional, desde que (i) compatível com as atribuições do cargo, (ii) estabelecido na lei da carreira e (iii) previsto no edital.

O mesmo raciocínio aplica-se a outras discriminantes. Exemplos: (a) limite mínimo de altura e polícia de SP – fere o princípio da isonomia; (b) concurso para polícia feminina e vedação de homens – não fere o princípio da isonomia; (c) delegado federal e barras (homens x mulheres) – não viola o princípio da isonomia; (d) tempo de aposentadorias distintos entre homem e mulher – não fere o princípio da isonomia (compleição física distinta); (e) limite de idade em concurso público – não viola o princípio da isonomia, desde que compatível com as atribuições do cargo e previsto na lei da carreira; (f) concurso para gari e quantidade de dentes – viola a isonomia; (g) exame psicotécnico e concurso público – só se existirem parâmetros objetivos e houver direito a recurso (além de estar prevista na lei da carreira, no edital do concurso e for compatível com o objetivo do cargo).

8.9 Princípios da razoabilidade e proporcionalidade

A maioria da doutrina brasileira afirma que o princípio da proporcionalidade está embutido no princípio da razoabilidade. Razoabilidade significa agir de forma lógica, coerente, congruente. Proporcionalidade significa equilíbrio. O administrador tem que agir de forma equilibrada. Equilíbrio entre os atos e as medidas inerentes a eles. Equilíbrio significa ponderar os benefícios e os prejuízos dos atos e medidas inerentes aos atos.

Os princípios da razoabilidade e proporcionalidade estão implícitos na CF/88, mas expressos na legislação infraconstitucional? Verdadeiro. Há utilização da palavra razoável no art. 5º, LXXVIII da CRFB/88, denotando, contudo, respeito à celeridade do processo: A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

Os princípios em tela estão expressos na lei ordinária (lei 9.784/99, art. 2º: A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência).

A razoabilidade e a proporcionalidade limitam a liberdade do administrador. Qualquer ato administrativo pode ser revisto pelo judiciário no que tange ao controle de legalidade em sentido amplo. Ato administrativo não pode ser revisto pelo judiciário no que diz respeito ao controle de mérito (conveniência e oportunidade). Este é um posicionamento padrão para provas objetivas. Nas provas discursivas, pode-se fazer uma crítica a essa posição, pois em muitas vezes o controle de legalidade penetra na questão de mérito.

Mérito significa discricionariedade, juízo de valor do administrador (liberdade do administrador). O juiz não pode substituir o juízo de valor do administrador sob pena de ofender o princípio da separação dos poderes. Porém, se o administrador faz juízo de valor desproporcional ou desarrazoado poderá o judiciário controlá-lo. Neste caso, o controle é de legalidade, pois proporcionalidade e razoabilidade são princípios implícitos da CF, e estes estão incluídos no controle de legalidade em sentido amplo.

Todavia, de forma indireta, acaba restringindo a liberdade do administrador e, por consequência, atingindo o mérito do ato administrativo (mas é controle de legalidade). Ex: se o administrador resolve construir uma praça em um município que precisa de escola e hospital, poderá o Poder Judiciário controlar o ato, já que se mostra irrazoável e desproporcional. Já no caso de o município precisar de escola e hospital, havendo apenas verba para um deles, o administrador escolhe fazer um hospital, essa decisão não viola nenhum dos princípios, e não poderá o Judiciário rever o ato.

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Ver ADPF 45.

8.10 Princípio do contraditório e da ampla defesa

CF, art. 5º, LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Esses princípios estão sedimentados na via judicial. Não se imagina, atualmente, o processo sem a citação das partes ou sem produção de provas. Porém, na via administrativa, isso não era realidade, pois sua introdução no processo administrativo foi inovação da CRFB/88.

O STF vem coibindo severamente a ausência desses princípios no âmbito do processo administrativo, via de regra, com a declaração da nulidade dos processos administrativos que não obedeçam a eles.

Contraditório significa ciência da existência do processo. Constitui a bilateralidade da relação jurídica processual (quando se chama a parte demandada ao processo). Oportunidade de defesa pelo demandado. Ampla defesa significa a oportunidade de fazer sua defesa. Se a parte vai ou não exercer sua defesa é outro problema, mas ela tem o direito de ter a oportunidade.

Para que a ampla defesa ocorra, é necessário algumas exigências ou condições (desdobramentos da ampla defesa – Odete Medauar). São elas:

• Defesa prévia: a parte tem de se defender antes da aplicação da sanção final. Para que a defesa prévia seja efetiva, é necessário pena pré-determinada e procedimento pré-determinado.

• Garantia de informação/acesso ao processo: segundo o STJ, a parte não tem direito a cópias grátis do processo administrativo, mas a Administração tem de viabilizar tal reprodução. A parte tem que arcar com as cópias8.

• Produção de provas: a parte deve ter a possibilidade de produção de prova e o administrador deve analisar todas as provas produzidas para construir seu convencimento.

• Defesa técnica: a Lei nº 8.112/90 dispõe que a presença do advogado é facultativa (art. 156: é assegurado ao servidor o direito de acompanhar o processo pessoalmente ou por intermédio de procurador, arrolar e reinquirir testemunhas, produzir provas e contraprovas e formular quesitos, quando se tratar de prova pericial). Contudo, a lei é de 1990. Depois dela, a jurisprudência do STJ entendeu a presença do advogado como imprescindível ao processo administrativo, por ser processo e não mais procedimento (CF, art. 5º, LV). Nesse sentido, o STJ editou o enunciado de súmula nº 343 (É obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar), o qual afirma que a presença do advogado é obrigatória em todas as fases do processo administrativo disciplinar. Consoante o enunciado, todos os servidores demitidos em processo administrativo disciplinar sem a presença de advogado poderiam considerar seus processos nulos. Assim, quando a matéria chegou ao STF, o tribunal editou o enunciado de súmula vinculante nº 5 (A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição), afirmando que a falta de advogado em processo disciplinar não ofende a Constituição. Esta decisão foi de encontro à súmula do STJ. Marinela afirma que este último enunciado

8 Não se faz carga de processo administrativo, pois ele não pode sair da repartição pública.

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foi um retrocesso para o processo administrativo, destruindo a realidade construída em todos os anos após a Lei nº 8.112/90. O enunciado nº 343 da súmula do STJ não foi cancelado, mas superado.

• Direito de recurso: o recurso administrativo pode ser impetrado independentemente de previsão específica. Pode ser impetrado mesmo que não exista um recurso específico. Ex: edital de concurso dispondo que de alguma das fases não cabe recurso ofende a ampla defesa. O espelho de prova é indispensável para a impetração do recurso, sob pena de ofender a ampla defesa: para recorrer, é necessário saber a motivação da decisão. Ver enunciado nº 21 da súmula vinculante do STF: É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo. O STF e o STJ (enunciado nº 373 de sua súmula) entendem que a exigência de depósito prévio para recorrer (recurso administrativo) ofende a ampla defesa, sendo inconstitucional. Foi decisão em processo administrativo tributário, mas o entendimento pode ser estendido a todos os processos administrativos.

Quem será atingido negativamente pela tomada de decisão em processo administrativo deve participar do processo:

Enunciado nº 3 da súmula vinculante: Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão.

Esse enunciado abrange duas situações diferentes:• Atos já acabados que chegam ao Tribunal de Contas para serem

controlados: quando a discussão puder implicar anulação ou revogação e prejudicar direitos de alguém, a parte tem direito de participar.

• Ato que concede aposentaria, reforma ou pensão depende de duas manifestações de vontade (ato complexo). O Tribunal de Contas não exerce controle, mas participa da formação do ato (Administração + Tribunal de Contas): neste caso, não há necessidade de contraditório e ampla defesa. O contraditório não será exercido no Tribunal de Contas, mas no âmbito da Administração. Como só existe um ato, somente há uma oportunidade de contraditório e ampla defesa. Quando o TCU se manifesta não está retirando direito do servidor, porque o direito não estava aperfeiçoado ainda.

O STF determinou que o TCU deve prolatar sua parte no ato de concessão (inicial de aposentadoria, reforma ou pensão) em até 5 anos; caso contrário, deverá abrir um

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novo processo com contraditório e ampla defesa (MS 251169; RE 26053). Ver vídeo youtube “Temperando a súmula vinculante nº 3”, de Marinela.

A base lógica do princípio é a bilateralidade da relação processual e a base política que traz a idéia de que ninguém pode ser julgado sem ter ciência do processo.

8.11 Princípio da continuidade

O serviço público há de ser prestado de forma ininterrupta. Para Celso Antônio Bandeira de Melo, este princípio decorre do dever ou da obrigatoriedade de prestar serviço público. Se se tem o dever de prestar serviço, deve-se fazê-lo de forma contínua.

Os servidores públicos têm direito de greve, na forma da lei específica (CRFB/88, art. 37, VII: o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica). Este direito depende de lei ordinária, consoante a EC 19/98. Antes da EC, dependia de lei complementar. Até hoje, a lei ordinária específica não foi editada.

O STF reconheceu que o art. 37, VII, da CRFB/88 é uma norma de eficácia limitada. Desta forma, como não havia lei, a greve era ilegal (o que geraria desconto dos dias não trabalhados e compensação de horas).

Entretanto, a simples greve não gerava demissão (que é uma sanção por falta grave), pois se estaria a exercer um direito (mesmo que não regulamentado). Se o grevista quebrasse materiais ou aparelhos da Administração, poderia ser demitido. Da mesma forma, o grevista não poderia ser demitido por abandono de cargo se se afastasse por mais de 30 dias, haja vista a ausência do animus de abandono (abandono de cargo: abandono por mais de 30 dias + animus de abandono).

Diversos mandados de injunção chegaram ao STF, que comunicava a inexistência de lei ao Congresso, o qual continuava inerte. Em uma oportunidade, o STF

9 EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NEGATIVA DE REGISTRO A APOSENTADORIA. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. 1. O impetrante se volta contra o acórdão do TCU, publicado no Diário Oficial da União. Não exatamente contra o IBGE, para que este comprove o recolhimento das questionadas contribuições previdenciárias. Preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada. 2. Infundada alegação de carência de ação, por ausência de direito líquido e certo. Preliminar que se confunde com o mérito da impetração. 3. A inércia da Corte de Contas, por mais de cinco anos, a contar da aposentadoria, consolidou afirmativamente a expectativa do ex-servidor quanto ao recebimento de verba de caráter alimentar. Esse aspecto temporal diz intimamente com: a) o princípio da segurança jurídica, projeção objetiva do princípio da dignidade da pessoa humana e elemento conceitual do Estado de Direito; b) a lealdade, um dos conteúdos do princípio constitucional da moralidade administrativa (caput do art. 37). São de se reconhecer, portanto, certas situações jurídicas subjetivas ante o Poder Público, mormente quando tais situações se formalizam por ato de qualquer das instâncias administrativas desse Poder, como se dá com o ato formal de aposentadoria. 4. A manifestação do órgão constitucional de controle externo há de se formalizar em tempo que não desborde das pautas elementares da razoabilidade. Todo o Direito Positivo é permeado por essa preocupação com o tempo enquanto figura jurídica, para que sua prolongada passagem em aberto não opere como fator de séria instabilidade inter-subjetiva ou mesmo intergrupal. A própria Constituição Federal de 1988 dá conta de institutos que têm no perfazimento de um certo lapso temporal a sua própria razão de ser. Pelo que existe uma espécie de tempo constitucional médio que resume em si, objetivamente, o desejado critério da razoabilidade. Tempo que é de cinco anos (inciso XXIX do art. 7º e arts. 183 e 191 da CF; bem como art. 19 do ADCT). 5. O prazo de cinco anos é de ser aplicado aos processos de contas que tenham por objeto o exame de legalidade dos atos concessivos de aposentadorias, reformas e pensões. Transcorrido in albis o interregno qüinqüenal, a contar da aposentadoria, é de se convocar os particulares para participarem do processo de seu interesse, a fim de desfrutar das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (inciso LV do art. 5º). 6. Segurança concedida. (MS 25116, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 08/09/2010, DJe-027 DIVULG 09-02-2011 PUBLIC 10-02-2011 EMENT VOL-02461-01 PP-00107)

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decidiu (MI 670, 70810, 712) que servidor público poderia fazer greve tendo como respaldo a lei de greve do trabalhador da iniciativa privada (Lei nº 7.783/89). A priori, o MI teria efeitos inter partes; porém, o STF admitiu que a decisão servia para os demais servidores (efeitos erga omnes). MI 670/708

Apesar da decisão importante do STF, quem está a frente das decisões sobre o direito de greve é o STJ. Não cabe demissão como sanção para a greve. Se houver cometimento de falta grave durante a greve, deve haver processo administrativo para apuração, podendo culminar em demissão. O STJ já decidiu que não cabe desconto nos vencimentos dos servidores no caso de greve, como ocorre no caso da CLT.

10 EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. GARANTIA FUNDAMENTAL (CF, ART. 5º, INCISO LXXI). DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS (CF, ART. 37, INCISO VII). EVOLUÇÃO DO TEMA NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO NO ÂMBITO DA JUSTIÇA FEDERAL E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS TERMOS DO ART. 37, VII, DA CF. EM OBSERVÂNCIA AOS DITAMES DA SEGURANÇA JURÍDICA E À EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL NA INTERPRETAÇÃO DA OMISSÃO LEGISLATIVA SOBRE O DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS, FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA QUE O CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nos 7.701/1988 E 7.783/1989. 1. SINAIS DE EVOLUÇÃO DA GARANTIA FUNDAMENTAL DO MANDADO DE INJUNÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). 1.1. No julgamento do MI no 107/DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 21.9.1990, o Plenário do STF consolidou entendimento que conferiu ao mandado de injunção os seguintes elementos operacionais: i) os direitos constitucionalmente garantidos por meio de mandado de injunção apresentam-se como direitos à expedição de um ato normativo, os quais, via de regra, não poderiam ser diretamente satisfeitos por meio de provimento jurisdicional do STF; ii) a decisão judicial que declara a existência de uma omissão inconstitucional constata, igualmente, a mora do órgão ou poder legiferante, insta-o a editar a norma requerida; iii) a omissão inconstitucional tanto pode referir-se a uma omissão total do legislador quanto a uma omissão parcial; iv) a decisão proferida em sede do controle abstrato de normas acerca da existência, ou não, de omissão é dotada de eficácia erga omnes, e não apresenta diferença significativa em relação a atos decisórios proferidos no contexto de mandado de injunção; iv) o STF possui competência constitucional para, na ação de mandado de injunção, determinar a suspensão de processos administrativos ou judiciais, com o intuito de assegurar ao interessado a possibilidade de ser contemplado por norma mais benéfica, ou que lhe assegure o direito constitucional invocado; v) por fim, esse plexo de poderes institucionais legitima que o STF determine a edição de outras medidas que garantam a posição do impetrante até a oportuna expedição de normas pelo legislador. 1.2. Apesar dos avanços proporcionados por essa construção jurisprudencial inicial, o STF flexibilizou a interpretação constitucional primeiramente fixada para conferir uma compreensão mais abrangente à garantia fundamental do mandado de injunção. A partir de uma série de precedentes, o Tribunal passou a admitir soluções "normativas" para a decisão judicial como alternativa legítima de tornar a proteção judicial efetiva (CF, art. 5o, XXXV). Precedentes: MI no 283, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 14.11.1991; MI no 232/RJ, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 27.3.1992; MI nº 284, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. para o acórdão Min. Celso de Mello, DJ 26.6.1992; MI no 543/DF, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 24.5.2002; MI no 679/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 17.12.2002; e MI no 562/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 20.6.2003. 2. O MANDADO DE INJUNÇÃO E O DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS NA JURISPRUDÊNCIA DO STF. 2.1. O tema da existência, ou não, de omissão legislativa quanto à definição das possibilidades, condições e limites para o exercício do direito de greve por servidores públicos civis já foi, por diversas vezes, apreciado pelo STF. Em todas as oportunidades, esta Corte firmou o entendimento de que o objeto do mandado de injunção cingir-se-ia à declaração da existência, ou não, de mora legislativa para a edição de norma regulamentadora específica. Precedentes: MI no 20/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 22.11.1996; MI no 585/TO, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 2.8.2002; e MI no 485/MT, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 23.8.2002. 2.2. Em alguns precedentes(em especial, no voto do Min. Carlos Velloso, proferido no julgamento do MI no 631/MS, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 2.8.2002), aventou-se a possibilidade de aplicação aos servidores públicos civis da lei que disciplina os movimentos grevistas no âmbito do setor privado (Lei no 7.783/1989). 3. DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES

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O corte de serviço público é possível? A maioria doutrinária admite a possibilidade de corte do serviço público e usa como fundamento do art. 6, § 3º, da Lei nº 8.987/95 (concessões e permissões), nos casos de emergência ou com prévio aviso.

Lei nº 8.987/95, art. 6º, § 3º: Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando: I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e, II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.

Desta forma, autoriza-se a descontinuidade em três situações: em caso de urgência (independentemente de comunicação prévia); dependendo de comunicação prévia,

PÚBLICOS CIVIS. HIPÓTESE DE OMISSÃO LEGISLATIVA INCONSTITUCIONAL. MORA JUDICIAL, POR DIVERSAS VEZES, DECLARADA PELO PLENÁRIO DO STF. RISCOS DE CONSOLIDAÇÃO DE TÍPICA OMISSÃO JUDICIAL QUANTO À MATÉRIA. A EXPERIÊNCIA DO DIREITO COMPARADO. LEGITIMIDADE DE ADOÇÃO DE ALTERNATIVAS NORMATIVAS E INSTITUCIONAIS DE SUPERAÇÃO DA SITUAÇÃO DE OMISSÃO. 3.1. A permanência da situação de não-regulamentação do direito de greve dos servidores públicos civis contribui para a ampliação da regularidade das instituições de um Estado democrático de Direito (CF, art. 1o). Além de o tema envolver uma série de questões estratégicas e orçamentárias diretamente relacionadas aos serviços públicos, a ausência de parâmetros jurídicos de controle dos abusos cometidos na deflagração desse tipo específico de movimento grevista tem favorecido que o legítimo exercício de direitos constitucionais seja afastado por uma verdadeira "lei da selva". 3.2. Apesar das modificações implementadas pela Emenda Constitucional no 19/1998 quanto à modificação da reserva legal de lei complementar para a de lei ordinária específica (CF, art. 37, VII), observa-se que o direito de greve dos servidores públicos civis continua sem receber tratamento legislativo minimamente satisfatório para garantir o exercício dessa prerrogativa em consonância com imperativos constitucionais. 3.3. Tendo em vista as imperiosas balizas jurídico-políticas que demandam a concretização do direito de greve a todos os trabalhadores, o STF não pode se abster de reconhecer que, assim como o controle judicial deve incidir sobre a atividade do legislador, é possível que a Corte Constitucional atue também nos casos de inatividade ou omissão do Legislativo. 3.4. A mora legislativa em questão já foi, por diversas vezes, declarada na ordem constitucional brasileira. Por esse motivo, a permanência dessa situação de ausência de regulamentação do direito de greve dos servidores públicos civis passa a invocar, para si, os riscos de consolidação de uma típica omissão judicial. 3.5. Na experiência do direito comparado (em especial, na Alemanha e na Itália), admite-se que o Poder Judiciário adote medidas normativas como alternativa legítima de superação de omissões inconstitucionais, sem que a proteção judicial efetiva a direitos fundamentais se configure como ofensa ao modelo de separação de poderes (CF, art. 2o). 4. DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS. REGULAMENTAÇÃO DA LEI DE GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL (LEI No 7.783/1989). FIXAÇÃO DE PARÂMETROS DE CONTROLE JUDICIAL DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELO LEGISLADOR INFRACONSTITUCIONAL. 4.1. A disciplina do direito de greve para os trabalhadores em geral, quanto às "atividades essenciais", é especificamente delineada nos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Na hipótese de aplicação dessa legislação geral ao caso específico do direito de greve dos servidores públicos, antes de tudo, afigura-se inegável o conflito existente entre as necessidades mínimas de legislação para o exercício do direito de greve dos servidores públicos civis (CF, art. 9o, caput, c/c art. 37, VII), de um lado, e o direito a serviços públicos adequados e prestados de forma contínua a todos os cidadãos (CF, art. 9o, §1o), de outro. Evidentemente, não se outorgaria ao legislador qualquer poder discricionário quanto à edição, ou não, da lei disciplinadora do direito de greve. O legislador poderia adotar um modelo mais ou menos rígido, mais ou menos restritivo do direito de greve no âmbito do serviço público, mas não poderia deixar de reconhecer direito previamente definido pelo texto da Constituição. Considerada a evolução jurisprudencial do tema perante o STF, em sede do mandado de injunção, não se pode atribuir amplamente ao legislador a última palavra acerca da concessão, ou não, do direito de greve dos servidores públicos civis, sob pena de se esvaziar direito fundamental positivado. Tal premissa, contudo, não impede que, futuramente, o legislador infraconstitucional confira novos contornos acerca da adequada configuração da disciplina desse direito constitucional. 4.2 Considerada a omissão legislativa alegada na espécie, seria o caso de se acolher a pretensão, tão-somente no sentido de que se aplique a Lei no 7.783/1989 enquanto a omissão não for devidamente regulamentada por lei específica para os servidores públicos civis (CF, art. 37, VII). 4.3 Em razão dos imperativos da continuidade dos serviços

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quando de desobediência das normas técnicas que comprometam o serviço e em caso de inadimplemento.

Em caso de inadimplemento, corrente minoritária entende que não é possível o corte, usando como fundamento o CDC (arts. 22 e 42).

CDC, art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.

públicos, contudo, não se pode afastar que, de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto e mediante solicitação de entidade ou órgão legítimo, seja facultado ao tribunal competente impor a observância a regime de greve mais severo em razão de tratar-se de "serviços ou atividades essenciais", nos termos do regime fixado pelos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Isso ocorre porque não se pode deixar de cogitar dos riscos decorrentes das possibilidades de que a regulação dos serviços públicos que tenham características afins a esses "serviços ou atividades essenciais" seja menos severa que a disciplina dispensada aos serviços privados ditos "essenciais". 4.4. O sistema de judicialização do direito de greve dos servidores públicos civis está aberto para que outras atividades sejam submetidas a idêntico regime. Pela complexidade e variedade dos serviços públicos e atividades estratégicas típicas do Estado, há outros serviços públicos, cuja essencialidade não está contemplada pelo rol dos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Para os fins desta decisão, a enunciação do regime fixado pelos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989 é apenas exemplificativa (numerus apertus). 5. O PROCESSAMENTO E O JULGAMENTO DE EVENTUAIS DISSÍDIOS DE GREVE QUE ENVOLVAM SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS DEVEM OBEDECER AO MODELO DE COMPETÊNCIAS E ATRIBUIÇÕES APLICÁVEL AOS TRABALHADORES EM GERAL (CELETISTAS), NOS TERMOS DA REGULAMENTAÇÃO DA LEI No 7.783/1989. A APLICAÇÃO COMPLEMENTAR DA LEI No 7.701/1988 VISA À JUDICIALIZAÇÃO DOS CONFLITOS QUE ENVOLVAM OS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS NO CONTEXTO DO ATENDIMENTO DE ATIVIDADES RELACIONADAS A NECESSIDADES INADIÁVEIS DA COMUNIDADE QUE, SE NÃO ATENDIDAS, COLOQUEM "EM PERIGO IMINENTE A SOBREVIVÊNCIA, A SAÚDE OU A SEGURANÇA DA POPULAÇÃO" (LEI No 7.783/1989, PARÁGRAFO ÚNICO, ART. 11). 5.1. Pendência do julgamento de mérito da ADI no 3.395/DF, Rel. Min. Cezar Peluso, na qual se discute a competência constitucional para a apreciação das "ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios" (CF, art. 114, I, na redação conferida pela EC no 45/2004). 5.2. Diante da singularidade do debate constitucional do direito de greve dos servidores públicos civis, sob pena de injustificada e inadmissível negativa de prestação jurisdicional nos âmbitos federal, estadual e municipal, devem-se fixar também os parâmetros institucionais e constitucionais de definição de competência, provisória e ampliativa, para a apreciação de dissídios de greve instaurados entre o Poder Público e os servidores públicos civis. 5.3. No plano procedimental, afigura-se recomendável aplicar ao caso concreto a disciplina da Lei no 7.701/1988 (que versa sobre especialização das turmas dos Tribunais do Trabalho em processos coletivos), no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa específica da lacuna ora declarada, nos termos do inciso VII do art. 37 da CF. 5.4. A adequação e a necessidade da definição dessas questões de organização e procedimento dizem respeito a elementos de fixação de competência constitucional de modo a assegurar, a um só tempo, a possibilidade e, sobretudo, os limites ao exercício do direito constitucional de greve dos servidores públicos, e a continuidade na prestação dos serviços públicos. Ao adotar essa medida, este Tribunal passa a assegurar o direito de greve constitucionalmente garantido no art. 37, VII, da Constituição Federal, sem desconsiderar a garantia da continuidade de prestação de serviços públicos - um elemento fundamental para a preservação do interesse público em áreas que são extremamente demandadas pela sociedade. 6. DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO DO TEMA NO ÂMBITO DA JUSTIÇA FEDERAL E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS TERMOS DO ART. 37, VII, DA CF. FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA QUE O CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nos 7.701/1988 E

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CDC, art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

A corrente majoritária diz que o corte do serviço do inadimplente é, na verdade, preservação ao princípio da continuidade, pois, do contrário, a empresa poderá fechar e comprometer o serviço do adimplente. É possível, ainda que para serviços essenciais (princípio da supremacia do interesse público). Ademais, o inadimplente e o adimplente são desiguais, devendo ser tratados desigualmente, sob pena de ferir o princípio da isonomia. Ainda, em respeito aos princípios da supremacia do interesse público e o da continuidade para o pagador.

7.783/1989. 6.1. Aplicabilidade aos servidores públicos civis da Lei no 7.783/1989, sem prejuízo de que, diante do caso concreto e mediante solicitação de entidade ou órgão legítimo, seja facultado ao juízo competente a fixação de regime de greve mais severo, em razão de tratarem de "serviços ou atividades essenciais" (Lei no 7.783/1989, arts. 9o a 11). 6.2. Nessa extensão do deferimento do mandado de injunção, aplicação da Lei no 7.701/1988, no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa específica da lacuna ora declarada, nos termos do inciso VII do art. 37 da CF. 6.3. Até a devida disciplina legislativa, devem-se definir as situações provisórias de competência constitucional para a apreciação desses dissídios no contexto nacional, regional, estadual e municipal. Assim, nas condições acima especificadas, se a paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma região da justiça federal, ou ainda, compreender mais de uma unidade da federação, a competência para o dissídio de greve será do Superior Tribunal de Justiça (por aplicação analógica do art. 2o, I, "a", da Lei no 7.701/1988). Ainda no âmbito federal, se a controvérsia estiver adstrita a uma única região da justiça federal, a competência será dos Tribunais Regionais Federais (aplicação analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988). Para o caso da jurisdição no contexto estadual ou municipal, se a controvérsia estiver adstrita a uma unidade da federação, a competência será do respectivo Tribunal de Justiça (também por aplicação analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988). As greves de âmbito local ou municipal serão dirimidas pelo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição sobre o local da paralisação, conforme se trate de greve de servidores municipais, estaduais ou federais. 6.4. Considerados os parâmetros acima delineados, a par da competência para o dissídio de greve em si, no qual se discuta a abusividade, ou não, da greve, os referidos tribunais, nos âmbitos de sua jurisdição, serão competentes para decidir acerca do mérito do pagamento, ou não, dos dias de paralisação em consonância com a excepcionalidade de que esse juízo se reveste. Nesse contexto, nos termos do art. 7o da Lei no 7.783/1989, a deflagração da greve, em princípio, corresponde à suspensão do contrato de trabalho. Como regra geral, portanto, os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento aos servidores públicos civis, ou por outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de trabalho (art. 7o da Lei no 7.783/1989, in fine). 6.5. Os tribunais mencionados também serão competentes para apreciar e julgar medidas cautelares eventualmente incidentes relacionadas ao exercício do direito de greve dos servidores públicos civis, tais como: i) aquelas nas quais se postule a preservação do objeto da querela judicial, qual seja, o percentual mínimo de servidores públicos que deve continuar trabalhando durante o movimento paredista, ou mesmo a proibição de qualquer tipo de paralisação; ii) os interditos possessórios para a desocupação de dependências dos órgãos públicos eventualmente tomados por grevistas; e iii) as demais medidas cautelares que apresentem conexão direta com o dissídio coletivo de greve. 6.6. Em razão da evolução jurisprudencial sobre o tema da interpretação da omissão legislativa do direito de greve dos servidores públicos civis e em respeito aos ditames de segurança jurídica, fixa-se o prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso Nacional legisle sobre a matéria. 6.7. Mandado de injunção conhecido e, no mérito, deferido para, nos termos acima especificados, determinar a aplicação das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis. (MI 708, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206 DIVULG 30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-02339-02 PP-00207 RTJ VOL-00207-02 PP-00471)

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Exceção à regra acima seria no caso do inadimplente que depende da energia para sobreviver (máquina respiratória, p. ex). Neste caso, o serviço não deverá ser cortado, por imperativo de vida. A jurisprudência entende que caso a Administração não pague a energia (Estado inadimplente) poderá ter sua energia cortada, salvo nos logradouros públicos, hospitais etc.

8.12 Princípio da presunção de legitimidade/legalidade/veracidade

A doutrina afirma que este princípio deve ser lido como presunção de legitimidade (consoante as regras morais), presunção de legalidade (consoante as regras legais) e presunção de veracidade.

É uma presunção relativa, pois admite prova em contrário (iuris tantum). O ônus da prova é do administrado (que alega a ilegitimidade/ilegalidade/falsidade).

A presunção decorre do dever de legalidade da Administração. A consequência prática dessa presunção é a aplicação imediata dos atos administrativos. Analogamente, as leis são aplicadas de imediato por sua presunção de constitucionalidade.

8.13 Princípio da autotutela

Os atos administrativos podem ser revistos pela Administração em razão de legalidade (retirado por anulação) ou conveniência/oportunidade (retirado por revogação).

Enunciado nº 346 da súmula do STJ: A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PODE DECLARAR A NULIDADE DOS SEUS PRÓPRIOS ATOS.

Enunciado nº 473 da súmula do STF: A ADMINISTRAÇÃO PODE ANULAR SEUS PRÓPRIOS ATOS, QUANDO EIVADOS DE VÍCIOS QUE OS TORNAM ILEGAIS, PORQUE DELES NÃO SE ORIGINAM DIREITOS; OU REVOGÁ-LOS, POR MOTIVO DE CONVENIÊNCIA OU OPORTUNIDADE, RESPEITADOS OS DIREITOS ADQUIRIDOS, E RESSALVADA, EM TODOS OS CASOS, A APRECIAÇÃO JUDICIAL.

Há previsão legal da revisão dos atos no art. 53 da Lei nº 9.784/99.Segundo Maria Sylvia Di Pietro, a autotutela também significa o dever de

zelo/cuidado da Administração, tanto com relação aos bens (patrimônio) quanto no tocante aos interesses públicos.

8.14 Princípio da especialidade

Pessoas jurídicas da administração direta (União, Estados, DF, Municípios, ou seja, os entes políticos) criam as pessoas jurídicas da administração indireta, necessariamente através de lei (ou autorizam a criação).

Pessoas jurídicas da administração indireta: autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista. A lei que cria ou autoriza a criação dessas pessoas jurídicas automaticamente define a finalidade da entidade criada ou autorizada.

Concessionárias e permissionárias não compõem a Administração Pública, pois são pessoas jurídicas de Direito Privado que prestam serviço público por delegação.

Especialidade: as pessoas jurídicas da administração indireta estão vinculadas às finalidades para as quais foram criadas. Hoje em dia, esse princípio também é utilizado para os órgãos da administração direta criados.

É possível modificar a finalidade da pessoa jurídica da administração indireta? O que a lei determinou o administrador não pode modificar. Só a lei pode modificar a finalidade dessas pessoas jurídicas.

9 ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: CARACTERÍSTICAS GERAIS

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Formas de prestação da atividade administrativa: em regra, a atividade administrativa é prestada pelo centro da administração (núcleo), ou seja, na maioria dos casos, o serviço é prestado pela Administração Direta. É a prestação centralizada do serviço público (feita pela Administração Direta).

Para uma maior eficiência, o Estado retira a atividade do centro e repassa para outras pessoas fora da Administração Direta. É a prestação descentralizada do serviço público, realizada pela Administração Indireta ou por particulares (ex: permissão, concessão, autorização, autarquia, fundação pública, sociedade de economia mista, empresa pública).

Descentralização política ocorre quando há distribuição de competências políticas entre entes políticos (repartição de competências). É regulada pela CRFB/88, não interessando ao Direito Administrativo. Desconcentração significa deslocamento dentro da mesma pessoa jurídica (ex: serviço “x” sai do ministério A para o B).

Desconcentração Descentralização administrativa

Deslocamento na mesma pessoa jurídica. Existe uma relação de hierarquia.

Deslocamento para outra pessoa jurídica ou física. Relação de controle (sem hierarquia, subordinação).

É possível descentralização de serviço público à pessoa física? Sim. A permissão/autorização de serviço pode ser feita à pessoa física ou jurídica. Não é a regra. Quanto à permissão, há disposição legal; já quanto à autorização, a doutrina afirma que ela pode ser feita à pessoa física. A regra é a descentralização de serviço público à pessoa jurídica.

9.1 Descentralização administrativa

9.1.1 Outorga

Entrega da titularidade e do dever de execução do serviço.Transferir titularidade significa transferir a propriedade do serviço. A outorga

de serviço público deve ser feita por meio de lei (compatível com a gravidade do ato). Como a titularidade não pode sair das mãos da Administração, a outorga só pode ser feita para a Administração Indireta de Direito Público: autarquias e fundações públicas de Direito Público (posição majoritária da doutrina).

9.1.2 Delegação

A administração transfere só a execução do serviço (descentralização por colaboração).

A delegação pode ser realizada por lei (às pessoas da administração indireta de Direito Privado [Empr. Públ., S.E.M, Fund. Públ. Dir. Priv.]), por contrato (ao particular [ex: concessão e permissão]) ou por ato administrativo unilateral (ao particular [ex: autorização de serviço de táxi]).

A concessão de serviço público é a delegação de serviço feita ao particular? Verdadeiro.

A Administração pode outorgar serviço público ao particular? Verdadeiro. A CRFB/88 (arts. 21 e 175) faz menção muitas vezes à palavra outorga no sentido vulgar e não técnico. Sentido vulgar de outorga: transferir, ceder, dar, fazer.

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9.2 Teorias da vontade do Estado

A relação entre Estado e agente é de que natureza? Correntes doutrinárias:• Teoria do mandato. Estado e agente celebram contrato de mandato.

Todo o poder do agente decorre do contrato de mandato entre o agente e o Estado. Esta teoria não pode ser aplicada no Brasil, pois o Estado não tem como manifestar sua vontade sem a presença do agente; assim, não poderia sequer assinar o contrato.

• Teoria da representação. Toda relação Estado-agente ocorre como na tutela e na curatela. O representante pratica os atos em nome do incapaz. Não pode ser aplicada, pois o Estado não pode ser concebido como sujeito incapaz conforme a CRFB/88, sendo o ente responsável (responde pelos atos de seus agentes).

• Teoria do órgão ou da imputação. A vontade do Estado está nas mãos do agente e o agente representa a vontade do Estado porque a lei imputou a ele este poder. A relação entre Estado e agente decorre de determinação legal. Quando o agente se manifesta no exercício do serviço público, sua vontade está manifestando a vontade do Estado. Neste caso, a vontade do Estado é a vontade do agente, ou seja, a vontade do agente e a vontade do Estado se misturam, formando uma única vontade. É por isso que o Estado responde pelos atos de seus agentes no exercício da função pública. Quando o agente estiver de folga, sua vontade não se confunde com a do Estado. É a teoria adotada no Brasil. É o Princípio da Imputação Volitiva.

9.3 Órgão público

É o centro especializado de competência. Núcleo de competência. Está presente na Administração Direta e Indireta. Art. 1º da Lei nº 9.784/99: a unidade de atuação integrante da estrutura da Administração Direta e da estrutura da Administração Indireta.

O órgão público não tem personalidade jurídica. Assim, não tem aptidão para ser sujeito de direitos e obrigações. A responsabilidade será da pessoa jurídica. Ex: órgão público não pode ser parte no contrato. Não pode celebrar contrato. O órgão faz a licitação e gestão do contrato; porém, quem celebra o contrato é o Estado (é a pessoa jurídica).

Geralmente, quem assina contrato é o prefeito, o governador ou o presidente, mas pode acontecer de a assinatura ser delegada a agente do órgão (por meio de lei). Contudo, quem celebra é sempre o Estado. A única ressalva contida no ordenamento está prevista no art. 37, § 8º da CRFB/88 (EC 19/98 – contratos de gestão): A autonomia gerencial, orçamentária e financeira dos órgãos e entidades da administração direta e indireta poderá ser ampliada mediante contrato, a ser firmado entre seus administradores e o poder público, que tenha por objeto a fixação de metas de desempenho para o órgão ou entidade, cabendo à lei dispor sobre: I - o prazo de duração do contrato; II - os controles e critérios de avaliação de desempenho, direitos, obrigações e responsabilidade dos dirigentes; III - a remuneração do pessoal. Permite a celebração entre entes da administração, entre órgãos ou entre administradores. A doutrina afirma que, na parte que autoriza o contrato entre órgãos e entre administradores (contrato entre particulares), este dispositivo é inconstitucional. O contrato de gestão entre órgãos ou entre administradores nunca foi regulamentado.

O fato de um órgão possuir CNPJ não significa que tenha personalidade jurídica. O CNPJ serve apenas para fins de fiscalização orçamentária (se não tiver fluxo orçamentário não precisa de CNPJ – Instrução Normativa nº 1.210/11 da Receita Federal, art. 11: São também obrigados a se inscrever no CNPJ: I - órgãos públicos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Poderes Executivo e Legislativo dos Municípios, desde que se constituam em unidades gestoras de orçamento; [...] § 1º Para os fins do disposto no inciso I, considera-se unidade gestora de

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orçamento aquela autorizada a executar parcela do orçamento da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios).

Em regra, por não ter personalidade jurídica, o órgão público não pode ir a juízo; porém, excepcionalmente, pode demandar em busca de prerrogativas constitucionais (em busca de direitos ligados à sua função). Para a maioria da doutrina, o órgão só pode ir a juízo como sujeito ativo. Ex: a Câmara pode ir a juízo para exigir o repasse do duodécimo em face do prefeito (que tem obrigação de fazer o repasse) – prerrogativa profissional. Pode o órgão ter um representante próprio para ir a juízo? Sim. Pode haver um representante na própria Câmara, mas isso irá depender da organização da administração.11

9.3.1 Classificação dos órgãos públicos

9.3.1.1 Quanto à posição estatal

Órgãos independentes: são aqueles que estão no topo da estrutura estatal, que gozam de independência. Têm total liberdade, não sofrem qualquer relação de subordinação (estão sujeitos apenas a controle constitucional de um poder sobre o outro). Ex: Presidência da República, governadorias, prefeituras; casas legislativas; tribunais e juízos monocráticos.

Órgãos autônomos: são aqueles que gozam de autonomia. Têm grande autonomia, mas estão subordinados aos órgãos independentes. Para os administrativistas, o MP e o TC são órgãos autônomos. Ex: ministérios; secretarias estaduais; secretarias municipais.

Órgãos superiores: são aqueles que têm poder de decisão restrito, sendo subordinados aos órgãos autônomos e aos órgãos independentes. Ex: gabinete da presidência, dos ministros; procuradorias.

Órgãos subalternos: são órgãos de execução, sem poder de decisão. Ex: almoxarifado; departamento de RH; zeladoria.

A classificação quanto à posição estatal dependerá do tamanho (extensão) da Administração. Por isso, um órgão pode ser classificado às vezes em uma classe, às vezes em outra.

9.3.1.2 Quanto à estrutura

Órgão simples: é aquele que não tem ramificação, não tem outros órgãos agregados à sua estrutura. Ex: gabinetes.

Órgão composto: é aquele que tem ramificações, tendo outros órgãos agregados à sua estrutura. Ex: delegacia de ensino e as escolas vinculadas àquela delegacia; hospital e posto de saúde frente à secretaria de saúde.

Não existe órgão complexo. Ou o órgão é simples ou é composto.

9.3.1.3 Quanto à atuação funcional

Órgãos singulares (unipessoais): a tomada de decisão tem um único agente. Ex: presidência da república; juízo monocrático.

Órgão colegiado: a tomada de decisão é feita por mais de um agente, coletivamente. Ex: casas legislativas; tribunais.

9.4 Administração indireta

9.4.1 Características gerais

11 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Personalidade judiciária. Disponível em: www.marinela.ma.

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Servem para todas as pessoas da administração indireta: autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista.

9.4.1.1 Personalidade jurídica própria

As pessoas jurídicas da administração indireta gozam de personalidade jurídica própria.

Possuem patrimônio e receita próprios, respondendo, desta forma, pelos seus próprios atos. Independentemente da origem do patrimônio, se “caiu no bolso” da autarquia, o recurso é dela (sofre fiscalização).

Possuem autonomia administrativa, autonomia técnica e autonomia financeira: não gozam de autonomia/capacidade política (poder de legislar), nem mesmo as agências reguladoras, pois sua capacidade normativa decorre da lei (é apenas de regulamentar a lei).

9.4.1.2 Criação e extinção da pessoa jurídica da Administração Indireta

CRFB/88, art. 37, XIX: somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação.

Lei específica significa que cada pessoa jurídica tem a sua própria lei. Cada lei vai cuidar do assunto específico. Cada autarquia tem a sua lei (lei ordinária). Lei específica é aquela que serve unicamente para aquela finalidade.

Existindo a lei, existe a autarquia (basta a existência de uma lei). Extinção só se dá via lei (princípio do paralelismo das formas).

A lei autoriza a criação para o caso de empresa pública, sociedade de economia mista e fundação pública de Direito Privado. Mesmo existindo a lei que autoriza a sua criação, sua efetiva criação dependerá de registro no cartório de registro de pessoas jurídicas ou na junta comercial (depende da natureza da pessoa jurídica). É obrigatório o registro para as entidades que têm a criação autorizada por lei. Extinção autorizada por lei (princípio do paralelismo das formas).

Assim, se a lei cria, a lei extingue; se a lei autoriza a criação, a lei autoriza a extinção (princípio do paralelismo das formas). Lei complementar definirá o rol de possíveis finalidades que uma fundação pública pode ter.

Fundação é um patrimônio destacado por um fundador para uma finalidade específica. É patrimônio personalizado (universitas bonorum, ou seja, reunião de bens).

Classificação das fundações de acordo com seu instituidor: (i) fundação privada – instituída pelo particular (não compõe a Administração Indireta); (ii) fundação pública – instituída pelo Poder Público (compõe a Administração Indireta).

De acordo com doutrina e jurisprudência majoritárias, o Poder Público pode constituir fundação pública com dois regimes diferentes: FP de Direito Público e FP de Direito Privado.

A fundação pública de Direito Público é uma espécie de autarquia (autarquia fundacional). Como é espécie do gênero autarquia, lei cria esta fundação, sem necessidade de registro. Todas as características das autarquias se aplicam a estas.

Todavia, se o Poder Público desejar, poderá criar uma fundação pública de Direito Privado (fundação governamental). Segue o mesmo regime da empresa pública e da sociedade de economia mista. Não é espécie de EP e SEM, mas apenas tem o mesmo regime, pois as finalidades são diferentes. Desta forma, a lei autoriza a criação de fundação pública de Direito Privado, havendo necessidade de registro. É a prevista no art. 37, XIX da CRFB/88.

Lembre-se que, para Hely Lopes Meirelles, toda fundação pública é de Direito Privado. Para Celso Antônio Bandeira de Mello, toda fundação pública é de Direito Público.

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9.4.1.3 Não há finalidade lucrativa

As pessoas jurídicas da Administração Indireta não têm fins lucrativos, mas isso não significa que não podem ter lucro. Só não podem ter sido criadas com a finalidade de lucro.

EP e SEM são criadas com duas finalidades (CRFB/88, art. 173): (i) prestação de serviço público e (ii) exploração de atividade econômica, quando imprescindível à segurança nacional ou ao relevante interesse público. O Estado não pode buscar o lucro, mesmo quando explorar uma atividade econômica.

9.4.1.4 Finalidade específica

Cada pessoa jurídica da Administração Indireta tem uma finalidade específica (princípio da finalidade). Para mudar a finalidade, somente por meio de lei. Por causa do princípio do paralelismo das formas, criada ou autorizada por lei, a modificação de sua finalidade só pode ser feita ou autorizada por lei.

9.4.1.5 Relação de controle com a Administração Direta

Entre a Administração Direta e a Administração Indireta não existe hierarquia, apenas existe controle.

Poder legislativo: tribunais de contas, CPI. Atualmente, os tribunais de contas controlam todas as pessoas da Administração Indireta (até 2005, o STF não admitia este controle para as SEM).

Poder judiciário: várias ações. Poder executivo: supervisão ministerial. Quem faz o controle é o ministério

relacionado à atividade da entidade da Administração Indireta. Objeto do controle: controle de finalidade; controle de receitas e despesas; controle da nomeação de dirigentes da entidade da Administração Indireta.

Nomeação de dirigente de entidade da Administração Indireta pela Administração Direta, através da supervisão ministerial: normalmente, o presidente da república nomeia e exonera ad nutum (regra geral). Compromete um pouco a independência da Administração Indireta.

Excepcionalmente, o presidente da república não nomeia de forma livre, dependendo de prévia autorização do Senado. Ex: BACEN e agências reguladoras. Fundamento: art. 52, III, d e f da CRFB/88: Compete privativamente ao Senado Federal: [...] III - aprovar previamente, por voto secreto, após argüição pública, a escolha de: [...] d) presidente e diretores do banco central; [...] f) titulares de outros cargos que a lei determinar; [...].

Aula 6 (21 de agosto de 2013)

10 AUTARQUIA

É uma pessoa jurídica de Direito Público. Presta atividades típicas de Estado (só o Estado pode exercer estas atividades). Tais atividades não podem ser concedidas a qualquer pessoa, tal como um particular.

O regime da autarquia é praticamente o mesmo da Administração Direta: (i) tem as mesmas prerrogativas e obrigações; (ii) é tratada como Fazenda Pública; (iii) a diferença é que a Administração Direta é formada por entes políticos e a autarquia é ente administrativo.

10.1 Regime jurídico

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Os atos praticados pela autarquia são atos administrativos. Toda pessoa jurídica de Direito Público age por meio de atos administrativos. Sendo atos administrativos, os atos das autarquias gozam de: (i) autoexecutoriedade; (ii) presunção de legitimidade; (iii) tipicidade; (iv) imperatividade.

Os contratos celebrados pela autarquia seguem o regime de Direito Público, sendo contratos administrativos. Características dos contratos administrativos (e, portanto, dos contratos das autarquias):

• Dever de licitar (CRFB/88, art. 37, XXI e art. 1º, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93).

CRFB/88, art. 37, XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Lei nº 8.666/93, art. 1º. Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

• Presença de cláusulas exorbitantes (art. 58 da Lei nº 8.666/93)

Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de: I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado; II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei; III - fiscalizar-lhes a execução; IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste; V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo. §1 As cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos administrativos não poderão ser alteradas sem prévia concordância do contratado. §2  Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual.

A autarquia submete-se à responsabilidade jurídica do Estado. Portanto, está sujeita ao art. 37, § 6º, da CRFB/88: As pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

A responsabilidade civil do Estado segue, como regra, a teoria objetiva. Porém, a jurisprudência majoritária admite a teoria subjetiva, excepcionalmente, de forma que ambas as teorias coexistem pacificamente. Nas ações (condutas comissivas), a

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responsabilidade é objetiva. Nas omissões (conduta omissiva), a responsabilidade é subjetiva.12

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

Quanto à culpa

Objetiva Subjetiva

Ação.Elementos: (i) conduta; (ii) dano; (iii) nexo causal.

Omissão.Elementos: (i) conduta; (ii) dano; (iii) nexo causal; (iv) elemento subjetivo (dolo ou culpa).

A vítima deverá demandar contra a autarquia diretamente. Se a autarquia não tiver patrimônio para indenizar a vítima, esta pode demandar contra o Estado de forma subsidiária.

Para cobrar do Estado de forma subsidiária, a responsabilidade continua sendo objetiva, no caso de ato comissivo (a subsidiariedade não altera a natureza da responsabilidade quanto à culpa).

Sempre que o Estado tem o dever de prestar um serviço e decide descentralizá-lo (transferir a outro ente), ele continua sendo responsável pelo serviço, mas de forma subsidiária. Ex: concessionária, empresa pública, autarquia etc.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

Quanto à ordem de preferência para pagar a indenização

Solidária Subsidiária

Não há ordem de preferência. Há ordem de preferência.Teoria acolhida no Brasil.

10.2 Bens autárquicos

Para a doutrina majoritária, todo bem pertencente a uma pessoa de Direito Público é bem público. Assim, os bens autárquicos são bens públicos.

Características dos bens públicos: (i) inalienabilidade (relativa); (ii) impenhorabilidade; (iii) impossibilidade de oneração; (iv) imprescritibilidade.

10.2.1 Inalienabilidade relativa

12 Atualização pessoal (22/05/2013): EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Estabelecimento de ensino. Ingresso de aluno portando arma branca. Agressão. Omissão do Poder Público. Responsabilidade objetiva. Elementos da responsabilidade civil estatal demonstrados na origem. Reexame de fatos e provas. Impossibilidade. Precedentes. 1. A jurisprudência da Corte firmou-se no sentido de que as pessoas jurídicas de direito público respondem objetivamente pelos danos que causarem a terceiros, com fundamento no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, tanto por atos comissivos quanto por omissivos, desde que demonstrado o nexo causal entre o dano e a omissão do Poder Público. 2. O Tribunal de origem concluiu, com base nos fatos e nas provas dos autos, que restaram devidamente demonstrados os pressupostos necessários à configuração da responsabilidade extracontratual do Estado. 3. Inadmissível, em recurso extraordinário, o reexame de fatos e provas dos autos. Incidência da Súmula nº 279/STF. 4. Agravo regimental não provido. (ARE 697326 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 05/03/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-078 DIVULG 25-04-2013 PUBLIC 26-04-2013)

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A inalienabilidade é relativa, de forma que, preenchidas algumas condições, os bens são alienáveis (alienabilidade condicionada). Inalienabilidade relativa = alienabilidade condicionada (José dos Santos Carvalho Filho).

Para alienar um bem público é preciso que seja realizada sua desafetação e sejam preenchidos os requisitos do art. 17 da Lei nº 8.666/93.

10.2.2 Impenhorabilidade

Os bens públicos não podem ser objeto de penhora, arresto ou sequestro. Penhora é restrição que acontece dentro de uma ação judicial de execução (garantia do juízo). Arresto e sequestro são cautelares típicas.

O arresto e o sequestro servem para proteger uma futura penhora. Só existe sequestro de bens determinados. O arresto é feito sobre bens indeterminados.

A impenhorabilidade é resultado da inalienabilidade, pois, se o bem público não pode ser alienado, ao final da execução não teria sentido penhorá-lo. O fim da penhora é garantir fundos ao final da execução, pela alienação dos bens em garantia, via hasta pública ou adjudicação. O fim do arresto e do sequestro é acautelar uma possível penhora e, como não pode haver penhora, ficam aqueles prejudicados.

10.2.3 Impossibilidade de oneração

Bem público não pode ser objeto de direito real de garantia (penhor, hipoteca e anticrese). Penhor é o direito real de garantia sobre bens móveis fora do juízo. Hipoteca é o direito real de garantia sobre bens imóveis. Penhor é garantia fora do juízo; penhora é garantia em juízo. O que era um penhor ou hipoteca (fora do juízo), tornar-se-á penhora quando de possível ação de execução (os bens públicos não podem ser penhorados; logo, não podem ser onerados, por total ausência de finalidade).

10.2.4 Imprescritibilidade

Os bens públicos não podem ser usucapidos (imprescritibilidade aquisitiva contra o Estado), mas o Estado pode usucapir bens de particulares.

10.3 Débitos judiciais da autarquia

A garantia de que o credor vai receber o seu crédito é o regime de precatórios (CRFB/88, art. 100).

Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 2º Os débitos de natureza alimentícia cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou sejam portadores de doença grave, definidos na forma da lei, serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para os fins do disposto no § 3º deste artigo, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de

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apresentação do precatório. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 3º O disposto no caput deste artigo relativamente à expedição de precatórios não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em leis como de pequeno valor que as Fazendas referidas devam fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 4º Para os fins do disposto no § 3º, poderão ser fixados, por leis próprias, valores distintos às entidades de Direito Público, segundo as diferentes capacidades econômicas, sendo o mínimo igual ao valor do maior benefício do regime geral de previdência social. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 5º É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de Direito Público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 6º As dotações orçamentárias e os créditos abertos serão consignados diretamente ao Poder Judiciário, cabendo ao Presidente do Tribunal que proferir a decisão exequenda determinar o pagamento integral e autorizar, a requerimento do credor e exclusivamente para os casos de preterimento de seu direito de precedência ou de não alocação orçamentária do valor necessário à satisfação do seu débito, o sequestro da quantia respectiva. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 7º O Presidente do Tribunal competente que, por ato comissivo ou omissivo, retardar ou tentar frustrar a liquidação regular de precatórios incorrerá em crime de responsabilidade e responderá, também, perante o Conselho Nacional de Justiça. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 8º É vedada a expedição de precatórios complementares ou suplementares de valor pago, bem como o fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução para fins de enquadramento de parcela do total ao que dispõe o § 3º deste artigo. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 9º No momento da expedição dos precatórios, independentemente de regulamentação, deles deverá ser abatido, a título de compensação, valor correspondente aos débitos líquidos e certos, inscritos ou não em dívida ativa e constituídos contra o credor original pela Fazenda Pública devedora, incluídas parcelas vincendas de parcelamentos, ressalvados aqueles cuja execução esteja suspensa em virtude de contestação administrativa ou judicial. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 10. Antes da expedição dos precatórios, o Tribunal solicitará à Fazenda Pública devedora, para resposta em até 30 (trinta) dias, sob pena de perda do direito de abatimento, informação sobre os débitos que preencham as condições estabelecidas no § 9º, para os fins nele previstos. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 11. É facultada ao credor, conforme estabelecido em lei da entidade federativa devedora, a entrega de créditos em precatórios para compra de imóveis públicos do respectivo ente federado. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 12. A partir da promulgação desta Emenda Constitucional, a atualização de valores de requisitórios, após sua expedição, até o efetivo pagamento, independentemente de sua natureza, será feita pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança, e, para fins de compensação da mora, incidirão juros simples no mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência de juros compensatórios. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 13. O credor poderá ceder, total ou parcialmente, seus créditos em precatórios a terceiros, independentemente da concordância do devedor, não se aplicando ao cessionário o disposto nos §§ 2º e 3º. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 14. A cessão de precatórios somente produzirá efeitos após comunicação, por meio de petição protocolizada, ao tribunal de origem e à entidade devedora. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 15. Sem prejuízo do disposto neste artigo, lei complementar a esta

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Constituição Federal poderá estabelecer regime especial para pagamento de crédito de precatórios de Estados, Distrito Federal e Municípios, dispondo sobre vinculações à receita corrente líquida e forma e prazo de liquidação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009). § 16. A seu critério exclusivo e na forma de lei, a União poderá assumir débitos, oriundos de precatórios, de Estados, Distrito Federal e Municípios, refinanciando-os diretamente. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009).

Precatório é a ordem cronológica de apresentação dos créditos transitados em julgado contra o Estado. Precatório constituído até 1º de julho de um ano será pago no ano seguinte. Após esse período, somente será pago no ano seguinte ao próximo exercício financeiro. Cada autarquia tem sua própria fila de precatório. Alimentos têm fila própria de precatórios.

10.3.1 Prescrição em face das autarquias

Para a doutrina majoritária, o prazo prescricional para se cobrar da autarquia é de 5 anos (Fazenda Pública).

Dec. 20.910/1932Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em (cinco) anos, contados da data do ato ou fato do qual se originarem.Art. 2º Prescrevem igualmente no mesmo prazo todo o direito e as prestações correspondentes e pensões vencidas ou por vencerem, ao soldo e ao montepio civil e militar ou a quaisquer restituições ou diferenças.Art. 3º Quando o pagamento se dividir por dias, meses ou anos, a prescrição atingirá progressivamente as prestações, à medida que completarem os prazos estabelecidos pelo presente decreto.Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, no reconhecimento ou no pagamento da dívida, considerada líquida, tiver as repartições ou funcionários encarregados de estudar e apurá-la. Parágrafo único. A suspensão da prescrição, neste caso verificar-se-á pela entrada do requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas, com designação do dia, mês e ano. [...]

A polêmica está presente no caso de reparação civil: o art. 10 do Dec. 20.910/32 diz que o prazo será de 5 anos, se não existir outro prazo mais benéfico. Com o advento do novo Código Civil, veio à tona o prazo de 3 anos para a reparação civil (art. 206, § 3º do CC). O STF e o STJ vêm fixando, desde o ano passado, uma posição de que o prazo seria de 5 anos. Contudo, não é, ainda, uma questão pacífica.

10.4 Procedimentos financeiros das autarquias

As autarquias estão sujeitas à Lei de Contabilidade Pública (Lei nº 4.320/64) e à Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/2000).

Lei nº 4.320/64Art. 107. As entidades autárquicas ou paraestatais, inclusive de previdência social ou investidas de delegação para arrecadação de contribuições parafiscais da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal terão seus orçamentos aprovados por decreto do Poder Executivo, salvo se disposição legal expressa determinar que o sejam pelo Poder Legislativo. Parágrafo único. Compreendem-se nesta disposição as empresas com autonomia financeira e administrativa cujo capital pertencer, integralmente, ao Poder Público.

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Art. 108. Os orçamentos das entidades referidas no artigo anterior vincular-se-ão ao orçamento da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, pela inclusão: I - como receita, salvo disposição legal em contrário, de saldo positivo previsto entre os totais das receitas e despesas; II - como subvenção econômica, na receita do orçamento da beneficiária, salvo disposição legal em contrário, do saldo negativo previsto entre os totais das receitas e despesas. § 1º Os investimentos ou inversões financeiras da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, realizados por intermédio das entidades aludidas no artigo anterior, serão classificados como receita de capital destas e despesa de transferência de capital daqueles. § 2º As previsões para depreciação serão computadas para efeito de apuração do saldo líquido das mencionadas entidades.Art. 109. Os orçamentos e balanços das entidades compreendidas no artigo 107 serão publicados como complemento dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal a que estejam vinculados.Art. 110. Os orçamentos e balanços das entidades já referidas, obedecerão aos padrões e normas instituídas por esta lei, ajustados às respectivas peculiaridades. Parágrafo único. Dentro do prazo que a legislação fixar, os balanços serão remetidos ao órgão central de contabilidade da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, para fins de incorporação dos resultados, salvo disposição legal em contrário.

Lei Complementar nº 101/2000, art. 1º Esta Lei Complementar estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, com amparo no Capítulo II do Título VI da Constituição. § 1º A responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar. § 2º As disposições desta Lei Complementar obrigam a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. § 3º Nas referências: I - à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, estão compreendidos: a) o Poder Executivo, o Poder Legislativo, neste abrangidos os Tribunais de Contas, o Poder Judiciário e o Ministério Público; b) as respectivas administrações diretas, fundos, autarquias, fundações e empresas estatais dependentes; II - a Estados entende-se considerado o Distrito Federal; III - a Tribunais de Contas estão incluídos: Tribunal de Contas da União, Tribunal de Contas do Estado e, quando houver, Tribunal de Contas dos Municípios e Tribunal de Contas do Município.

10.5 Privilégios tributários das autarquias

Um ente político não pode cobrar imposto de outro ente político (somente para impostos, não alcançando taxas e contribuições). É a imunidade tributária recíproca (CRFB/88, art. 150, VI, a: Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; [...]).

A imunidade recíproca é extensível às autarquias (CRFB/88, art. 150, § 2º: A vedação do inciso VI, "a", é extensiva às autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes), no que tange à sua finalidade específica.

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A imunidade de impostos das autarquias restringe-se apenas à sua finalidade específica, de forma que se recebe uma doação de alguma pessoa física será contribuinte dos impostos relacionados.

10.6 Privilégios processuais das autarquias

A autarquia tem tratamento de Fazenda Pública: (i) prazos dilatados; (ii) direito a reexame necessário.

Prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer (art. 188 do CPC: Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer quando a parte for a Fazenda Pública ou o Ministério Público). Se o procedimento é o geral, vale o art. 188 do CPC; se o procedimento é específico (ex: MS, ACP, Ação Popular), é este procedimento que deve ser observado e seus prazos.

Para as autarquias, a regra é o reexame necessário (duplo grau de jurisdição obrigatório ou recurso de ofício).

CPC, art. 475: Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: I - proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de Direito Público; II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI). § 1o Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los. § 2o Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor. § 3o Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente.

Não haverá a necessidade do duplo grau de jurisdição quando o assunto já tiver sido julgado pelo pleno do STF ou tenha valor de até 60 salários mínimos (§§ 2º e 3º do art. 475 do CPC). A decisão que não for submetida ao reexame necessário quando este for obrigatório não transita em julgado (observando-se a segurança jurídica caso a caso em face da demora).

10.7 Regime de pessoal da autarquia

Quem trabalha na autarquia é servidor público, pois a autarquia é pessoa jurídica de Direito Público.

Texto original da CRFB/88: os servidores públicos eram sujeitos a regime jurídico único (art. 39: A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas). Significava que em cada pessoa jurídica só era possível um único regime. Não havia obrigatoriedade de regime estatutário, havia apenas a preferência por este regime.

EC 19/98: houve a alteração da regra, abolindo-se o regime jurídico único e passando-se a admitir o regime múltiplo (na mesma pessoa jurídica poderia haver os dois regimes – celetista e estatutário). A escolha entre cargo e emprego era feita pela lei.

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STF (2007) – ADI-MC 213513: a regra do art. 39 da CRFB/88, modificada pela EC 19/98, foi objeto de controle de constitucionalidade no STF pela ADI 2135. Nesta ADI, o STF declarou o art. 39 inconstitucional por vício de formalidade. Assim, o regime múltiplo foi retirado do ordenamento jurídico, voltando a valer para os servidores públicos o regime jurídico único. O STF ainda não julgou o mérito da ADI; assim, ainda não definiu as consequências para aqueles que adotaram o regime múltiplo.

Atualmente, o regime dos servidores da União é o estatutário (Lei nº 8112/90); porém, a CRFB/88 não obriga toda a Administração a utilizar este regime. Poderia ter sido adotado exclusivamente o celetista. Mas preferencialmente deve-se adotar o regime estatutário.

É possível que ainda existam empregados na Administração Pública Federal, pois durante o período entre 1998 e 2007 empregos públicos foram criados. Até o julgamento final da ADI 2135 o que será vedado é a criação de novos empregos públicos.

10.8 Autarquias territoriais (Territórios)

A natureza jurídica dos territórios é de autarquia. Não é um ente político. Território é uma autarquia com uma face diferente, pois autarquia é ente administrativo e território não é (é muito parecido com um ente político, mas não o é, stricto sensu).

Finalidade da autarquia: administrativa; finalidade do território: política.O assunto encontra-se “em suspenso”, pois, atualmente, não existem

territórios.

13 MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PODER CONSTITUINTE REFORMADOR. PROCESSO LEGISLATIVO. EMENDA CONSTITUCIONAL 19, DE 04.06.1998. ART. 39, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. SERVIDORES PÚBLICOS. REGIME JURÍDICO ÚNICO. PROPOSTA DE IMPLEMENTAÇÃO, DURANTE A ATIVIDADE CONSTITUINTE DERIVADA, DA FIGURA DO CONTRATO DE EMPREGO PÚBLICO. INOVAÇÃO QUE NÃO OBTEVE A APROVAÇÃO DA MAIORIA DE TRÊS QUINTOS DOS MEMBROS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS QUANDO DA APRECIAÇÃO, EM PRIMEIRO TURNO, DO DESTAQUE PARA VOTAÇÃO EM SEPARADO (DVS) Nº 9. SUBSTITUIÇÃO, NA ELABORAÇÃO DA PROPOSTA LEVADA A SEGUNDO TURNO, DA REDAÇÃO ORIGINAL DO CAPUT DO ART. 39 PELO TEXTO INICIALMENTE PREVISTO PARA O PARÁGRAFO 2º DO MESMO DISPOSITIVO, NOS TERMOS DO SUBSTITUTIVO APROVADO. SUPRESSÃO, DO TEXTO CONSTITUCIONAL, DA EXPRESSA MENÇÃO AO SISTEMA DE REGIME JURÍDICO ÚNICO DOS SERVIDORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RECONHECIMENTO, PELA MAIORIA DO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, DA PLAUSIBILIDADE DA ALEGAÇÃO DE VÍCIO FORMAL POR OFENSA AO ART. 60, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RELEVÂNCIA JURÍDICA DAS DEMAIS ALEGAÇÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL E MATERIAL REJEITADA POR UNANIMIDADE. 1. A matéria votada em destaque na Câmara dos Deputados no DVS nº 9 não foi aprovada em primeiro turno, pois obteve apenas 298 votos e não os 308 necessários. Manteve-se, assim, o então vigente caput do art. 39, que tratava do regime jurídico único, incompatível com a figura do emprego público. 2. O deslocamento do texto do § 2º do art. 39, nos termos do substitutivo aprovado, para o caput desse mesmo dispositivo representou, assim, uma tentativa de superar a não aprovação do DVS nº 9 e evitar a permanência do regime jurídico único previsto na redação original suprimida, circunstância que permitiu a implementação do contrato de emprego público ainda que à revelia da regra constitucional que exige o quorum de três quintos para aprovação de qualquer mudança constitucional. 3. Pedido de medida cautelar deferido, dessa forma, quanto ao caput do art. 39 da Constituição Federal, ressalvando-se, em decorrência dos efeitos ex nunc da decisão, a subsistência, até o julgamento definitivo da ação, da validade dos atos anteriormente praticados com base em legislações eventualmente editadas durante a vigência do dispositivo ora suspenso. 4. Ação direta julgada prejudicada quanto ao art. 26 da EC 19/98, pelo exaurimento do prazo estipulado para sua vigência. 5. Vícios formais e materiais dos demais dispositivos constitucionais impugnados, todos oriundos da EC 19/98, aparentemente inexistentes ante a constatação de que as mudanças de redação promovidas no curso do processo legislativo não alteraram substancialmente o sentido das proposições ao final aprovadas e de que não há direito adquirido à manutenção de regime jurídico anterior. 6. Pedido de medida cautelar parcialmente deferido.

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10.9 Conselhos de classe

Surgiram no ordenamento jurídico com natureza de autarquia profissional. Em 1998, a Lei nº 9.649 (Art. 58. Os serviços de fiscalização de profissões regulamentadas serão exercidos em caráter privado, por delegação do poder público, mediante autorização legislativa. [...]) deu aos conselhos de classe a natureza de pessoa jurídica de Direito Privado. Desta forma, o conselho de classe, que exerce poder de polícia, estaria nas mãos de particular.

O STF, julgando a ADI 171714, decidiu que não é possível existir poder de polícia nas mãos do particular, não podendo os conselhos de classe possuir natureza jurídica de Direito Privado, voltando a ter natureza de autarquia.

Características dos conselhos de classe como autarquias: (i) contabilidade pública; (ii) controle pelo Tribunal de Contas; (iii) concurso público; (iv) anuidade com natureza tributária (contribuição) e seu não pagamento gera execução fiscal.

No caso da OAB, o seu estatuto previa que a anuidade não teria natureza tributária, logo: (i) a execução dos débitos das anuidades seria comum e, não, fiscal; (ii) não haveria necessidade de contabilidade pública, nem controle pelo Tribunal de Contas.

Lei nº 8.906/94, art. 46. Compete à OAB fixar e cobrar, de seus inscritos, contribuições, preços de serviços e multas. Parágrafo único. Constitui título executivo extrajudicial a certidão passada pela diretoria do Conselho competente, relativa a crédito previsto neste artigo.

O art. 79 do Estatuto da OAB ainda previa que o quadro de funcionários da OAB seria celetista: Aos servidores da OAB, aplica-se o regime trabalhista. § 1º Aos servidores da OAB, sujeitos ao regime da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, é concedido o direito de opção pelo regime trabalhista, no prazo de noventa dias a partir da vigência desta lei, sendo assegurado aos optantes o pagamento de indenização, quando da aposentadoria, correspondente a cinco vezes o valor da última remuneração. § 2º Os servidores que não optarem pelo regime trabalhista serão posicionados no quadro em extinção, assegurado o direito adquirido ao regime legal anterior.

Em face das disposições do Estatuto da OAB, o PGR ajuizou uma ADI para que o STF fizesse uma interpretação conforme do art. 79 do Estatuto. Nesta ADI 302615, o

14 EMENTA: Direito Constitucional E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Estando prejudicada a Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a Ação Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art. 58. 2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5°, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime.15 EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 1º DO ARTIGO 79 DA LEI N. 8.906, 2ª PARTE. "SERVIDORES" DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. PRECEITO QUE POSSIBILITA A OPÇÃO PELO REGIME CELESTISTA. COMPENSAÇÃO PELA ESCOLHA DO REGIME JURÍDICO NO MOMENTO DA APOSENTADORIA. INDENIZAÇÃO. IMPOSIÇÃO DOS DITAMES INERENTES À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA. CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). INEXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO PARA A ADMISSÃO DOS CONTRATADOS PELA OAB. AUTARQUIAS ESPECIAIS E AGÊNCIAS. CARÁTER JURÍDICO DA OAB. ENTIDADE PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO INDEPENDENTE. CATEGORIA ÍMPAR NO ELENCO DAS PERSONALIDADES JURÍDICAS EXISTENTES NO DIREITO BRASILEIRO. AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DA ENTIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A Lei n. 8.906, artigo 79, § 1º, possibilitou aos "servidores" da OAB, cujo regime outrora era estatutário, a opção pelo regime celetista. Compensação pela escolha:

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STF afirmou que a OAB é um serviço público independente, não sendo uma autarquia especial. Assim: (i) seria uma pessoa jurídica “ímpar”; (ii) não está na Administração Direita, nem na Administração Indireta; (iii) não precisa de concurso público para escolher seus funcionários; (iv) não tem função apenas corporativa, mas também institucional; (v) quem julga a OAB?

Segundo o STF, a OAB continua com os privilégios das autarquias, mas não compõe a Administração Direta nem a Indireta, não sendo autarquia de regime especial e nem se confunde com os demais conselhos de classe.

No entendimento do STF, na OAB, a anuidade não é tributária. A OAB não cobra via execução fiscal. Cobra via execução comum. O Tribunal de Contas não controla a OAB e sua contabilidade não é pública. A competência para o julgamento das causas da OAB ainda não foi definida. Permanece, na prática, na Justiça Federal.

10.10 Autarquias de regime especial

É um tipo de autarquia com regras especiais. A expressão “autarquia de regime especial” já era usada no Brasil para definir as universidades públicas (especialmente as federais).

As universidades públicas já entravam neste conceito por duas razões: (i) escolha especial de seus dirigentes, feita por eleição (e, não, nomeação ou exoneração pelo chefe do executivo, que é a regra); (ii) autonomia pedagógica (liberdade de criação da grade curricular).

A partir de 1995, o governo brasileiro inicia a política nacional das privatizações: enxugamento da máquina administrativa a fim de alcançar maior eficiência. Duas formas: privatização e desestatização.

POLÍTICA NACIONAL DAS DESESTATIZAÇÕES

Privatização Desestatização

indenização a ser paga à época da aposentadoria. 2. Não procede a alegação de que a OAB sujeita-se aos ditames impostos à Administração Pública Direta e Indireta. 3. A OAB não é uma entidade da Administração Indireta da União. A Ordem é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro. 4. A OAB não está incluída na categoria na qual se inserem essas que se tem referido como "autarquias especiais" para pretender-se afirmar equivocada independência das hoje chamadas "agências". 5. Por não consubstanciar uma entidade da Administração Indireta, a OAB não está sujeita a controle da Administração, nem a qualquer das suas partes está vinculada. Essa não-vinculação é formal e materialmente necessária. 6. A OAB ocupa-se de atividades atinentes aos advogados, que exercem função constitucionalmente privilegiada, na medida em que são indispensáveis à administração da Justiça [artigo 133 da CB/88]. É entidade cuja finalidade é afeita a atribuições, interesses e seleção de advogados. Não há ordem de relação ou dependência entre a OAB e qualquer órgão público. 7. A Ordem dos Advogados do Brasil, cujas características são autonomia e independência, não pode ser tida como congênere dos demais órgãos de fiscalização profissional. A OAB não está voltada exclusivamente a finalidades corporativas. Possui finalidade institucional. 8. Embora decorra de determinação legal, o regime estatutário imposto aos empregados da OAB não é compatível com a entidade, que é autônoma e independente. 9. Improcede o pedido do requerente no sentido de que se dê interpretação conforme o artigo 37, inciso II, da Constituição do Brasil ao caput do artigo 79 da Lei n. 8.906, que determina a aplicação do regime trabalhista aos servidores da OAB. 10. Incabível a exigência de concurso público para admissão dos contratados sob o regime trabalhista pela OAB. 11. Princípio da moralidade. Ética da legalidade e moralidade. Confinamento do princípio da moralidade ao âmbito da ética da legalidade, que não pode ser ultrapassada, sob pena de dissolução do próprio sistema. Desvio de poder ou de finalidade. 12. Julgo improcedente o pedido.

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Transferência, para o particular, da propriedade, dos serviços e bens públicos.

Transferência de custos do Estado para o particular, sem a transferência da propriedade, dos serviços e bens públicos. Transferência de execução. O serviço continua público.

Em face da política nacional das privatizações, surgiram as agências reguladoras para fiscalizar e regular os serviços realizados pelo particular. Atualmente, a expressão “autarquias de regime especial” é utilizada para as agências reguladoras.

Agências reguladoras são autarquias de regime especial. Todas as características estudadas para as autarquias em geral aplicam-se aqui. A função das agências reguladoras é uma função nova para o Estado? Não, pois o Estado fiscaliza mesmo nas áreas em que não há agências reguladoras.

O regime especial das agências reguladoras decorre de três características: • Normatização; regulação; controle; fiscalização. As agências apenas

definem normas técnicas complementares à lei, ou seja, sua atividade de normatizar é restrita em face da lei.

• Nomeação ou investidura especial dos dirigentes: aprovação do senado (mediante sabatina) + nomeação pelo chefe do executivo. CRFB/88, art. 52: Compete privativamente ao Senado Federal: [...] III - aprovar previamente, por voto secreto, após arguição pública, a escolha de: [...] f) titulares de outros cargos que a lei determinar; [...].

• Dirigentes possuidores de mandato com prazo fixo: o chefe do executivo não pode exonerá-los ad nutum. Só saem dos cargos, antes do final do mandato, por condenação judicial ou renúncia. Atualmente, seus mandatos dependem da lei de cada agência. Encerrado o mandato, há um prazo de quarentena: não pode o ex-dirigente ir para a iniciativa privada no ramo de atividade ligado à agência. Normalmente, o prazo é de quatro a doze meses. Durante a quarentena, o ex-dirigente continua recebendo a remuneração do cargo.

Regime jurídico das agências reguladoras: há duas regras do regime jurídico que exigem atenção especial:

• Licitação: como possuem natureza jurídica de autarquias, as agências reguladoras devem licitar. Em 1997, foi aprovada a Lei nº 9.472 (Lei das Telecomunicações – instituiu a ANATEL). Esta lei estabeleceu três regras: (i) que as agências reguladoras estariam fora do âmbito de validade da Lei nº 8.666/93; (ii) cada agência definiria seu próprio procedimento de licitação; (iii) agências reguladoras teriam modalidades específicas de licitação: pregão e consulta. A Lei nº 9.472/97 foi levada ao STF (ADI 1668) e o tribunal afirmou que não há sentido em as agências reguladoras fugirem às normas gerais de licitação e contratos. Dispôs que é inconstitucional afastar a Lei nº 8.666/93, bem como os procedimentos próprios de licitação. Entretanto, o STF afirmou serem constitucionais as modalidades específicas “pregão” e “consulta”. Qual é a modalidade de licitação específica das agências reguladoras? Até 2000, eram o pregão e a consulta. Em 2000, o pregão foi previsto como modalidade para a União. Em 2002, todos os entes puderam fazer pregão. Assim, atualmente, a modalidade específica da agência reguladora é a consulta.

• Regime de pessoal: pela Lei nº 9.986/2000 (norma geral das agências reguladoras – ler para AGU) as agências reguladoras teriam seus

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quadros preenchidos por contratos temporários com regime celetista. O contrato temporário não precisa de concurso público, bastando um processo seletivo simplificado. Assim, esta matéria foi levada ao STF (ADI 2310). Nesta ação, o STF, em sede de cautelar, afirmou que os contratos temporários eram inconstitucionais, devendo ser adotado o regime de cargo com estatuto. Neste caso, a contratação temporária feria a regra geral da necessidade e urgência para a celebração dos contratos temporários. Os contratos temporários que estavam em andamento seriam mantidos até seu termo final, devendo as agências reguladoras se preparar para passar a realizar concursos públicos para preenchimento dos cargos. Após o julgamento pelo STF, o presidente da república editou uma medida provisória para alterar a Lei nº 9.986/2000, criando cargos públicos e regime estatutário para as agências reguladoras (MP 155/2003). Os cargos deveriam ter sido criados por lei e não por MP. Tal medida provisória foi convertida na Lei nº 10.871/04. Desta forma, a ADI 2310 foi extinta sem julgamento de mérito em face da perda do objeto, ou seja, a mudança no texto da Lei nº 9.986/2000. Após isto, o presidente vem editando MPs prorrogando os contratos temporários (desde 2004 até hoje). O presidente, ao prorrogar contratos via MP (convertidas em lei), não procedeu à prorrogação dos contratos para todas as agências reguladoras. Mesmo naqueles contratos não prorrogados (estão sem lei) ainda existem pessoas que continuam trabalhando para a Administração Pública. A matéria mais uma vez foi levada ao STF (ADI 3678), aguardando-se decisão.

Exemplos de agências reguladoras: • Serviços públicos: ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica);

ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações); ANS (Agência Nacional de Saúde); ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária); ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres); ANTAC (Agência Nacional de Transportes Aquaviários); ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil).

• Petróleo: ANP (Agência Nacional de Petróleo).• Bem público: ANA (Agência Nacional de Águas).• Fomento: ANCINE (Agência Nacional de Cinema).

Não são agências reguladoras:• Com natureza de autarquia: ADA – Agência de Desenvolvimento da

Amazônia; ADENE – Agência de Desenvolvimento do Nordeste; Ambas têm status de agência executiva; AEB – Agência Espacial Brasileira.

• Entidade com nome de agência, mas que é órgão da Administração Direta: ABIN (Agência Brasileira de Inteligência).

• Entidade que é agência reguladora, mas não tem nome de agência: CVM (Comissão de Valores Mobiliários).

10.11 Agência executiva

Nasceu pela Lei nº 9.649/1998.A natureza das agências executivas ou é de autarquia ou de fundação

pública. Algumas dessas autarquias e fundações públicas encontravam-se ineficientes. Para se tornarem eficientes, esses entes elaboraram um Plano Estratégico de Reestruturação (PER). Com esse plano, a pessoa jurídica ineficiente celebrava com a Administração Direta um contrato de gestão, a fim de materializar o PER. Com isso, a pessoa jurídica ganhou mais autonomia e mais recursos financeiros.

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O contrato de gestão surgiu no nosso ordenamento jurídico para definir aquele contrato celebrado entre dois entes da Administração: autarquia/fundação e Administração Direta. Atualmente, o legislador banalizou a expressão contrato de gestão, uma vez que deu esse nome a vários contratos inominados. Há até contrato de gestão celebrado com particular. Artigo 37, p. 8º, CF.

Quando a autarquia ou fundação pública celebra contrato de gestão com a Administração Direta, ela ganha status de agência executiva, por meio de um decreto do presidente da república. É um status temporário, pois cumprido o PER, ele desaparece, ou seja, o status de agência executiva só tem validade enquanto valer o contrato de gestão. Terminado o contrato de gestão, volta a agência a ser somente autarquia ou fundação pública.

O contrato de gestão vai dar à autarquia/fundação pública: (i) mais autonomia Exemplo de autonomia: dispensa de licitação; (ii) mais recursos públicos;(iii) reestruturação (melhoria do serviço, redução dos custos, optimização dos recursos).

Lei nº 8.666/93, art. 24. É dispensável a licitação: I - para obras e serviços de engenharia de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso I do artigo anterior, desde que não se refiram a parcelas de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente; II - para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez. Parágrafo único. Os percentuais referidos nos incisos I e II do caput deste artigo serão 20% (vinte por cento) para compras, obras e serviços contratados por consórcios públicos, sociedade de economia mista, empresa pública e por autarquia ou fundação qualificadas, na forma da lei, como Agências Executivas.

Regra geral: 10% do limite da modalidade convite: 15 mil (obras e serviços de engenharia para modalidade convite); 8 mil (se não for serviço de engenharia). Porém, autarquias e fundações qualificadas como agência executiva têm limite dobrado para dispensa de licitação: 30 mil (engenharia), ou seja, 20% do limite da modalidade convite; 16 mil (se não for serviço de engenharia).

Exemplos de agências executivas (ver no site do Ministério do Planejamento): ADA, ADENE, INMETRO.

A doutrina critica as agências executivas, pois beneficiam entes ineficientes. Também porque não poderia o contrato de gestão dar mais autonomia do que a lei que as criou ou autorizou.

11 EMPRESAS ESTATAIS

São aquelas empresas das quais o Estado faz parte. Entre elas estão as empresas públicas e as sociedades de economia mista, quando adotarem as regras próprias dessas pessoas jurídicas.

11.1 Empresa pública (EP)

É pessoa jurídica de Direito Privado. Segue um regime híbrido: em parte público e em parte privado. Seu nome está ligado ao seu capital e não à sua natureza jurídica. Tem capital exclusivamente público (daí surge o nome “empresa pública”).

Ter capital exclusivamente público não significa ser exclusivamente de um único ente. Pode ter capital derivado de mais de um ente, desde que todos públicos (União e Estado; autarquia e município etc).

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Uma empresa pública pode ter duas finalidades: (i) prestar serviço público; (ii) explorar atividade econômica. Pode ser constituída por qualquer modalidade empresarial, inclusive S/A de capital fechado.

11.2 Sociedade de economia mista (SEM)

É pessoa jurídica de Direito Privado. Segue regime híbrido. Seu capital é misto (público e privado). A maioria do capital votante tem que estar nas mãos do Poder Público. Este deve estar no comando.

Pode ter duas finalidades: (i) prestar serviço público; (ii) explorar atividade econômica. Só pode ser constituída na forma de Sociedade Anônima.

Exemplo: Petrobrás e Bancos Estaduais e do Brasil.11.3 Características de EP e SEM

Características:• Capital: EP – exclusivamente público; SEM – misto.• Constituição: EP – qualquer forma societária; SEM – S/A.• Competência para o julgamento das ações (art. 109 da CRFB/88: Aos

juízes federais compete processar e julgar: I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho; [...]): EP federal – Justiça Federal; SEM federal – Justiça Estadual. EP ou SEM estadual ou municipal – Justiça Estadual. Se a União for interessada numa ação que envolve SEM federal, o processo será deslocado para a Justiça Federal. Súmulas 517 e 556 do STF.

• Regime jurídico híbrido: (i) se prestam serviço público prevalece o regime público; (ii) se exploram atividade econômica prevalece o regime privado.

O Estado só pode explorar atividade econômica por meio destas entidades quando for imprescindível ao interesse coletivo ou segurança nacional (art. 173, CRFB/88).

Essas pessoas jurídicas poderão, por meio de lei específica, ter estatuto próprio (art. 173, § 1º da CRFB/88). Até hoje o estatuto não foi editado. Assim, deve ser aplicada a regra geral.

CF, art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade; II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública; IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários; V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores.

11.3.1 Regime jurídico das EP e SEM

11.3.1.1 Licitação

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Estão sujeitas à licitação pelo art. 37, XXI, CRFB/88 e pelo art. 1º da lei 8.666/93.

CF, art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Lei nº 8.666/93, art.1º: Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Quando as EP e SEM prestam serviço público não há divergência: têm de realizar licitação. Quando as EP e SEM exploram atividade econômica, a CRFB/88, no art. 173, §1º, III, afirma que poderão ter estatuto próprio (que não foi editado). Por isto, terão que seguir as normas gerais (Lei nº 8.666/93).

Mas, por que, na prática, esses entes escapam da licitação? Porque a própria Lei nº 8.666/93 traz dispensas e inexigibilidades. Exemplo de dispensa: art. 24, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93. Exemplo de inexigibilidade: art. 25 da Lei nº 8.666/93.

Lei nº, art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes; II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. § 1 Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato. § 2 Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis.

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Para que a competição seja viável é preciso que haja pressuposto jurídico: proteger o interesse público. Se a licitação prejudicar o interesse público será inviável, pois lhe faltará pressuposto jurídico.

Se a licitação prejudicar a atividade fim da EP ou da SEM, estará prejudicando o serviço público, a segurança nacional ou o interesse coletivo. Tal inexigibilidade da atividade fim está mais relacionada à exploração de atividade econômica, pois são atividades nas quais se precisa de agilidade para a competição no mercado privado.

Quanto à Petrobrás, ver MS 2588816.O celeuma se refere à necessidade de licitação. Em razão da Lei 9478/97 (Institui a

ANP), em seu artigo 67, afirma que a Petrobrás deve realizar um processo simplificado de licitação

16DECISÃO: Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida liminar, impetrado pela Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRÁS, contra ato do Tribunal de Contas da União, consubstanciado em decisão que determinou à impetrante e seus gestores que se abstenham de aplicar o Regulamento de Procedimento Licitatório Simplificado, aprovado pelo Decreto n° 2.745, de 24/08/1998, do Exmo. Sr. Presidente da República. Consta da petição inicial que o Tribunal de Contas da União, ao apreciar o processo TC n° 008.210/2004-7 (Relatório de Auditoria), determinou que a impetrante (Acórdão n° 1.498/2004): a) justifique, de modo circunstanciado, a aplicação das sanções previstas no art. 87 da Lei n° 8.666/93, garantindo prévia defesa da contratada e mantendo no respectivo processo administrativo os documentos que evidenciem tais procedimentos; b) obedeça ao estabelecido nos arts. 22 e 23 da Lei n° 8.666/93 no que se refere às modalidades de licitação e seus respectivos limites, tendo em vista o valor estimado de contratação (fl. 48) . Contra essa decisão, a impetrante interpôs recurso de reexame (fls. 98-105), alegando que seus procedimentos de contratação não estariam regulados pela Lei n° 8.666/93, mas sim pelo Regulamento de Procedimento Licitatório Simplificado aprovado pelo Decreto n° 2.745/98, do Exmo. Sr. Presidente da República, o qual possui lastro legal no art. 67 da Lei n° 9.478/97. Sustentou, ainda, que o Parecer AC-15, da Advocacia-Geral da União, aprovado pelo Exmo. Sr. Presidente da República, vinculante para a administração pública federal, conclui que a Petrobrás e suas subsidiárias devem se submeter às regras do citado Decreto n° 2.745/98. Ao analisar o pedido de reexame, o TCU negou-lhe provimento (fls. 29-42), com base nos seguintes fundamentos (Acórdão n° 1.767/2005): a) o Parecer da AGU vincula tão-somente os órgãos do Poder Executivo, não se estendendo ao TCU; b) na Decisão n° 633/2002 (fls. 121-177), o TCU já havia declarado a inconstitucionalidade do art. 67 da Lei n° 9.478/97 e do Decreto n° 2.745/98, determinando que a Petrobrás observasse os ditames da Lei n° 8.666/93; c) segundo a Súmula 347 do STF, "o Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das Leis e dos Atos do Poder Público". A Petrobrás interpôs embargos de declaração, os quais não foram acolhidos pelo TCU (Acórdão n° 39/2006) (fls. 23-27). Contra essa decisão do TCU (Acórdão n° 39/2006), a Petrobrás impetra o presente mandado de segurança, alegando que: a) o Tribunal de Contas de União não possui competência para declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo. A Súmula 347 do STF foi editada em 1963, tendo como base o art. 77 da Constituição de 1946, há muito revogado. A regra do Regimento Interno do TCU, que prevê essa competência, não pode se sobrepor à Constituição; b) a Petrobrás, empresa integrante da Administração Indireta, está submetida ao princípio da legalidade e, portanto, deve cumprir o art. 67 da Lei n° 9.478/97 e o Decreto n° 2.745/98, que permanecem vigentes, e determinam que os contratos celebrados pela impetrante, para aquisição de bens e serviços, serão precedidos de procedimento licitatório simplificado, afastando a aplicação da Lei n° 8.666/93. c) por força do § 1o do art. 40 da LC n° 73/93, a Petrobrás está obrigada a cumprir o Parecer AC-15, da Advocacia-Geral da União, que conclui que "a inaplicação (do Decreto n° 2.745/98) - por alegada inconstitucionalidade do regime simplificado - à todo o Grupo Petrobrás, esbarra no respeito ao princípio da presunção de constitucionalidade das leis e da legalidade dos atos da administração até que sobrevenha decisão judicial em contrário, sendo insuficiente a opinião do TCU, a quem cabe tão só julgar a regularidade das contas". d) após a Emenda Constitucional n° 9/95, que alterou o § 1o do art. 177 da Constituição, a impetrante passou a atuar na exploração do petróleo em regime de livre concorrência com outras empresas. Com isso, o art. 67 da Lei n° 9.478/97 determinou a submissão da impetrante a um procedimento licitatório simplificado, afastando a aplicação da Lei n° 8.666/93, que estabelece um regime de licitação e contratação inadequado para a atuação da empresa num ambiente de livre competição. Quanto à urgência da pretensão cautelar, a impetrante sustenta que "o não cumprimento da prefalada decisão acarretará na aplicação das mais diversas penalidades, tais como multas, inabilitação para o exercício de cargo ou função, e arresto de bens, como estampado,

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definido pelo PR por Decreto Executivo. Trata-se do Decreto 2745/98. O TCU interveio e afirmou que não pode uma lei dar somente a uma empresa um procedimento simplificado, mas sim a mesma lei a todas as EP. Assim, o TCU, no Acórdão 39, entendeu que o Decreto é inconstitucional e suspendeu o procedimento.

Irresignada, a Petrobrás levou a matéria ao STF pelo MS aqui exposto, que julgou em sede de liminar (até agora sem decisão de mérito) que o TCU não pode realizar o controle concentrado de constitucionalidade e que a Petrobrás pode continuar fazendo o procedimento simplificado.

11.3.1.2 Responsabilidade civil do Estado

v.g, nos arts. 45, § 1o, inc. III, 58, incs. II, IV, VII e § 1o, 60 e 61, todos da Lei n° 8.443/92" (fl. 10). Assim, a impetrante requer, em sede de medida liminar, a suspensão da decisão proferida pelo Tribunal de Contas da União (Acórdão n° 39/2006) no processo TC n° 008.210/2004-7 (Relatório de Auditoria). É o relatório. Passo a decidir. Existe plausibilidade jurídica no pedido. A EC n° 9/95, apesar de ter mantido o monopólio estatal da atividade econômica relacionada ao petróleo e ao gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos, acabou com o monopólio do exercício dessa atividade. Em outros termos, a EC n° 9/95, ao alterar o texto constitucional de 1988, continuou a abrigar o monopólio da atividade do petróleo, porém, flexibilizou a sua execução, permitindo que empresas privadas participem dessa atividade econômica, mediante a celebração, com a União, de contratos administrativos de concessão de exploração de bem público. Segundo o disposto no art. 177, § 1o, da Constituição, na redação da EC n° 9/95: "§ 1º A União poderá contratar com empresas estatais ou privadas a realização das atividades previstas nos incisos I a IV deste artigo, observadas as condições estabelecidas em lei". Dessa forma, embora submetidas ao regime de monopólio da União, as atividades de pesquisa, lavra, refinação, importação, exportação, transporte marítimo e transporte por meio de conduto (incisos I a IV do art. 177), podem ser exercidas por empresas estatais ou privadas num âmbito de livre concorrência. A hipótese prevista no art. 177, § 1o, da CRFB/88, que relativizou o monopólio do petróleo, remete à lei a disciplina dessa forma especial de contratação. A Lei n° 9.478/97, portanto, disciplina a matéria. Em seu artigo 67, deixa explícito que "os contratos celebrados pela Petrobrás, para aquisição de bens e serviços, serão precedidos de procedimento licitatório simplificado, a ser definido em decreto do Presidente da República". A matéria está regulamentada pelo Decreto n° 2.745, de 1998, o qual aprova o regulamento licitatório simplificado da Petrobrás. A submissão legal da Petrobrás a um regime diferenciado de licitação parece estar justificado pelo fato de que, com a relativização do monopólio do petróleo trazida pela EC n° 9/95, a empresa passou a exercer a atividade econômica de exploração do petróleo em regime de livre competição com as empresas privadas concessionárias da atividade, as quais, frise-se, não estão submetidas às regras rígidas de licitação e contratação da Lei n° 8.666/93. Lembre-se, nesse sentido, que a livre concorrência pressupõe a igualdade de condições entre os concorrentes. Assim, a declaração de inconstitucionalidade, pelo Tribunal de Contas da União, do art. 67 da Lei n° 9.478/97, e do Decreto n° 2.745/98, obrigando a Petrobrás, conseqüentemente, a cumprir as exigências da Lei n° 8.666/93, parece estar em confronto com normas constitucionais, mormente as que traduzem o princípio da legalidade, as que delimitam as competências do TCU (art. 71), assim como aquelas que conformam o regime de exploração da atividade econômica do petróleo (art. 177). Não me impressiona o teor da Súmula n° 347 desta Corte, segundo o qual "o Tribunal de Contas, o exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público". A referida regra sumular foi aprovada na Sessão Plenária de 13.12.1963, num contexto constitucional totalmente diferente do atual. Até o advento da Emenda Constitucional n° 16, de 1965, que introduziu em nosso sistema o controle abstrato de normas, admitia-se como legítima a recusa, por parte de órgãos não-jurisdicionais, à aplicação da lei considerada inconstitucional. No entanto, é preciso levar em conta que o texto constitucional de 1988 introduziu uma mudança radical no nosso sistema de controle de constitucionalidade. Em escritos doutrinários, tenho enfatizado que a ampla legitimação conferida ao controle abstrato, com a inevitável possibilidade de se submeter qualquer questão constitucional ao Supremo Tribunal Federal, operou uma mudança substancial no modelo de controle de constitucionalidade até então vigente no Brasil. Parece quase intuitivo que, ao ampliar, de forma significativa, o círculo de entes e órgãos legitimados a provocar o Supremo Tribunal Federal, no processo de controle abstrato de normas, acabou o constituinte por restringir, de maneira radical, a amplitude do controle difuso de constitucionalidade. A amplitude do direito de propositura faz com que até mesmo pleitos tipicamente individuais sejam submetidos ao Supremo Tribunal Federal mediante

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CRFB/88, Art. 37, § 6º - As pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

EP e SEM estão sujeitas ao art. 37, § 6º da CRFB/88? Depende. Só quando forem prestadoras de serviço público. Assim, em regra, a responsabilidade será objetiva. Em caso de EP e SEM prestadoras de serviço público, o Estado pode ser chamado à responsabilidade (responsabilidade subsidiária e – ainda- objetiva), pois o serviço continua sendo do Estado.

A responsabilidade estatal por ato de EP e SEM prestadoras de serviço público é objectiva tanto para usuário quanto para não usuários. RE 591874

Se a EP ou SEM prestarem atividade econômica, não incidirá o art. 37, § 6º da CRFB/88. Nestes casos, aplica-se o direito civil: responsabilidade subjetiva, em regra; o Estado não responde subsidiariamente (posição majoritária).

11.3.1.3 Bens

Em regra, os bens das empresas públicas são privados (são pessoas jurídicas de Direito Privado). Desta forma, regra geral, os bens podem ser penhorados. Exceção: bens que estão diretamente ligados à prestação do serviço público. Esses bens não podem ser penhorados.

Só estão protegidos aqueles bens que, se retirados, comprometeriam a continuidade do serviço (princípio da continuidade do serviço público).

Se a pessoa jurídica é pública, os bens são públicos. Bem de empresa pública prestadora de serviço público é penhorável? Sim. Só serão impenhoráveis se estiver diretamente ligados ao serviço público, de forma que, se retirados, comprometa-se a continuidade do serviço público.

O STF já decidiu que a Empresa de Correios e Telégrafos (ECT), que é uma empresa pública, tem tratamento de Fazenda Púbica. Por prestar serviço com exclusividade17, possui tal prerrogativa. Assim, TODOS os seus bens são impenhoráveis. O regime é público. Está sujeita a regime de precatório. Ver ADPF 46.

11.3.1.4 Regime tributário

Regra geral, as EP e SEM exploradoras de atividade econômica não gozam de privilégios tributários, a não ser que a iniciativa privada os possua.

ação direta de inconstitucionalidade. Assim, o processo de controle abstrato de normas cumpre entre nós uma dupla função: atua tanto como instrumento de defesa da ordem objetiva, quanto como instrumento de defesa de posições subjetivas. Assim, a própria evolução do sistema de controle de constitucionalidade no Brasil, verificada desde então, está a demonstrar a necessidade de se reavaliar a subsistência da Súmula 347 em face da ordem constitucional instaurada com a Constituição de 1988. A urgência da pretensão cautelar também parece clara, diante das conseqüências de ordem econômica e política que serão suportadas pela impetrante caso tenha que cumprir imediatamente a decisão atacada. Tais fatores estão a indicar a necessidade da suspensão cautelar da decisão proferida pelo TCU, até o julgamento final deste mandado de segurança. Ante o exposto, defiro o pedido de medida liminar, para suspender os efeitos da decisão proferida pelo Tribunal de Contas da União (Acórdão n° 39/2006) no processo TC n° 008.210/2004-7 (Relatório de Auditoria). Comunique-se, com urgência. Requisitem-se informações ao Tribunal de Contas da União e à Advocacia-Geral da União. Após, dê-se vista dos autos à Procuradoria-Geral da República. Publique-se. Brasília, 22 de março de 2006. Ministro GILMAR MENDES Relator (MS 25888 MC, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 22/03/2006, publicado em DJ 29/03/2006 PP-00011)

(MS 25888 MC, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, julgado em 22/03/2006, publicado em DJ 29/03/2006 PP-00011)

17 Segundo o STF, exclusividade é diferente de monopólio. Este último acontece no caso de atividade econômica. A primeira acontece em caso de serviço público.

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CF, art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...] VI - instituir impostos sobre: [...] a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros; [...] § 3º - As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.

CF, art. 173, § 2º: As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensíveis às do setor privado.

EP e SEM prestadoras de serviço público com exclusividade: boa parte da doutrina reconhece que estas empresas poderão ter imunidade recíproca; porém, deve-se avaliar se repassa ou não a carga tributária ao usuário. Se não repassar, terá imunidade tributária.

Assim, essas entidades podem ter imunidade recíproca caso não repassem o valor do tributo ao usuário. Todavia, é muito difícil comprovar que não há repasse. Assim, na prática, acabam sempre sendo tributadas. A ECT, como tem tratamento de Fazenda Pública, goza de privilégios tributários.

11.3.1.5 Regime falimentar

As EP e SEM não estão sujeitas ao regime falimentar.

11.3.1.6 Regime de pessoal

Só existe servidor público em pessoa jurídica de Direito Público. No caso de EP e SEM, o pessoal é empregado público celetista. São agentes públicos Servidores de Entes Governamentais de Direito Privado (SEGDP).

Apesar de não serem servidores públicos, os trabalhadores das EP e SEM equiparam-se aos servidores públicos em alguns aspectos: (i) exigência de concurso público para ingresso na carreira; (ii) sujeitos ao regime da não acumulação de cargos (como regra geral); (iii) estão sujeitos ao teto remuneratório (exceção: se forem entidades autônomas, sem necessidade de repasse de recursos da Administração Direta para seu custeio, não precisam observar o teto remuneratório); (iv) estão sujeitos à lei de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/92); (v) são servidores públicos para fins penais (art. 327 do CP: Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. [...]); (vi) cabe a utilização de remédios constitucionais em face de seus atos, se prestadoras de serviço público (ex: MS, ação popular etc).

Os empregados nas EP e SEM não se equiparam aos servidores públicos para fins de dispensa, haja vista que esta pode ser imotivada.

Enunciado nº 390 da súmula do TST: ESTABILIDADE. ART. 41 DA CF/1988. CELETISTA. ADMINISTRAÇÃO DIRETA, AUTÁRQUICA OU FUNDACIONAL. APLICABILIDA-DE. EMPREGADO DE EMPRESA PÚBLICA E SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. INAPLICÁVEL (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 229 e 265 da SBDI-1 e da Orientação Jurisprudencial nº 22 da SB-DI-2) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005 I - O servidor público celetista da administração direta, autárquica ou fundacional é beneficiário da estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988. (ex-OJs nºs 265 da SBDI-1 - inserida em 27.09.2002 - e 22 da SBDI-2 - inserida em 20.09.00) II - Ao empregado de empresa pública ou de sociedade de economia mista, ainda que admitido mediante aprovação em

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concurso público, não é garantida a estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988. (ex-OJ nº 229 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001)

CF, art. 41. São estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público. § 1º O servidor público estável só perderá o cargo: I - em virtude de sentença judicial transitada em julgado; II - mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa; III - mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa. § 2º Invalidada por sentença judicial a demissão do servidor estável, será ele reintegrado, e o eventual ocupante da vaga, se estável, reconduzido ao cargo de origem, sem direito a indenização, aproveitado em outro cargo ou posto em disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo de serviço. § 3º Extinto o cargo ou declarada a sua desnecessidade, o servidor estável ficará em disponibilidade, com remuneração proporcional ao tempo de serviço, até seu adequado aproveitamento em outro cargo. § 4º Como condição para a aquisição da estabilidade, é obrigatória a avaliação especial de desempenho por comissão instituída para essa finalidade.

OJ 247 da SDI-I do TST: considerando que os empregados das EP e SEM não têm estabilidade (art. 41 da CRFB/88), sua dispensa pode ser imotivada. O STF também já decidiu nesse sentido. Os empregados da ECT não têm estabilidade, no entanto a dispensa tem que ser motivada (RE 589998). Atualmente já há um movimento, inclusive no STF, para mudar essa posição. A OJ 247 ainda faz a ressalva da Empresa de Correios e Telégrafos (ECT).

OJ 247 do TSTServidor público. Celetista Concursado. Despedida imotivada. Empresa pública ou sociedade de economia mista. Possibilidade. A despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato motivado para sua validade. A validade do ato de despedida do empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) está condicionada à motivação, por gozar a empresa do mesmo tratamento destinado à Fazenda Pública em relação à imunidade tributária e à execução por precatório, além das prerrogativas de foro, prazos e custas processuais.

Razões do tratamento diferenciado da ECT: desde 1969, pelo Decreto nº 509, a ECT, apesar de empresa pública, ganhou regime de Fazenda Pública, por ter exclusividade de serviço (ADPF 46).

Decreto 509/69Art. 1º - O Departamento dos Correios e Telégrafos (DCT) fica transformado em empresa pública, vinculada ao Ministério das Comunicações, com a denominação de Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT; nos termos do artigo 5º, ítem II, do Decreto Lei nº.200 (*), de 25 de fevereiro de 1967. Parágrafo único - A ECT terá sede e foro na Capital da República e jurisdição em todo o território nacional.Art. 2º - À ECT compete: I - executar e controlar, em regime de monopólio, os serviços postais em todo o território nacional; II - exercer nas condições estabelecidas nos artigos 15 e 16, as atividades alí definidas.[...]Art. 11 - O regime jurídico do pessoal da ECT será o da Consolidação das Leis do Trabalho, classificados os seus empregados na categoria profissional de comerciários.Art. 12 - A ECT gozará de isenção de direitos de importação de materiais e equipamentos destinados aos seus serviços, dos privilégios concedidos à Fazenda Pública, quer em relação a imunidade tributária, direta ou indireta,

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impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços, quer no concernente a foro, prazos e custas processuais.[...]Art. 18 - A ECT procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contratos e convênios, condicionado esse critério aos ditames de interesse público e às conveniências da segurança nacional.[...]Art. 20 - A ECT enviará ao Tribunal de Contas da União as suas contas gerais relativas a cada exercício, na forma da legislação em vigor.

Os bens são impenhoráveis. O regime é o de precatórios. Ter tratamento de Fazenda Pública significa que terá privilégios de regime público (similar ao regime das autarquias). Goza de imunidade recíproca. A dispensa dos empregados tem que ser motivada. Essa questão já foi objeto de repercussão geral no STF (RE 589998).

Como dito, os empregados da ECT não são estáveis, mas a dispensa tem que ser motivada.Com o advento da CRFB/88 (art. 21, X), compete à União prestar o serviço

postal. Porém, a CRFB/88 não falou da possibilidade de prestá-lo de forma indireta. Assim, entendeu-se que o Estado não poderia transferir esse serviço. Ocorre que quem prestava esse serviço já era a ECT.

A associação das empresas que prestam serviço de correios (VaspEx; FedEx etc) ajuizou a ADPF 46 para que o STF reconhecesse a não exclusividade (o termo monopólio é para actividade económica) do serviço de correios e telégrafos.

Desde 1994, o TCU chamou a ECT à responsabilidade para resolver qual regime teria, pois a mesma, em face da necessidade de crescer e o Estado não ter dinheiro para aumentar a sua rede, passou a realizar franquias com particulares (o que não deveria ocorrer em face de sua natureza pública).

Por medida provisória, as franquias vinham sendo prorrogadas. A Lei nº 11.668/08 determinou que a ECT deve fazer licitação, concessão de serviço (em vez de franquias). Ocorre que essa mesma lei prorrogou os contratos de franquia por mais 24 meses.

Foi ajuizada uma ADI para discutir a Lei nº 11.668/08 (ADI 4155), aguardando-se decisão.

12 CONSÓRCIOS PÚBLICOS

A doutrina classifica como componente da Administração Pública.Os consórcios ou convênios estão previstos no Brasil desde a Lei nº 8.666/93.

São resultado da união de esforços para uma finalidade comum. Ex: União e universidades federais realizando convênios para estágios.

Ocorre que em 2005 foram criados os novos consórcios públicos (Lei nº 11.107/05). Esses consórcios públicos nascem da união de entes políticos com finalidade comum. Apenas a União, estados, municípios e DF podem compor consórcio público. Esses entes políticos celebram um contrato de consórcio (natureza contratual). Na verdade, consórcio público é apenas um contrato. Por essa razão, alguns autores tratam de consórcios públicos dentro do tema "contratos".

Da celebração do contrato de consórcio nasce uma nova pessoa jurídica que ganha o nome de associação. Essa associação, para a doutrina majoritária, faz parte da Administração Indireta. O regime dessa associação, em face de reunir entes políticos, deveria ser público. Porém, a associação pode ter tanto o regime público (espécie de autarquia) como do regime privado, semelhante ao da EP e SEM (regime híbrido previsto na Lei nº 11.107/05).

13 ENTES DE COOPERAÇÃO

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Não compõem a Administração, mas a auxiliam, cooperam com o Estado. Os setores da sociedade são divididos de acordo com o direcionamento da economia: 1º setor: Estado atuando; 2º setor: iniciativa privada atuando; 3º setor: Organizações Não Governamentais (ONG); 4º setor: economia informal, inclusive pirataria.

As ONGs podem ajudar o Estado, colaborando com o mesmo para a consecução das finalidades públicas. Quando uma ONG coopera com o Estado torna-se um ente de cooperação (Terceiro Setor). Nem toda ONG é ente de cooperação.

Os entes de cooperação são chamados de entes paraestatais. Ente paraestatal é aquele que está ao lado do Estado, portanto, fora da Administração. SEM e EP não são ente paraestatais, pois fazem parte da Administração Indireta. Os entes de cooperação são pessoas jurídicas de Direito Privado. Os entes de cooperação não têm fins lucrativos: não foram criados para o lucro, mas podem ter lucro.

13.1 Entidades de Apoio

Criada pelos próprios servidores das universidades públicas ou hospitais públicos sob forma de fundação, associação ou cooperativa. Não prestam serviços públicos. São pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos. O vínculo jurídico com a universidade/hospital é dada mediante convénio.

Universidade pública não pode cobrar por curso de pós-graduação (STF). Neste caso, quem recebe o pagamento são as entidades de apoio. O mesmo ocorre com as bolsas para alunos de mestrado e doutorado.

Entidades de apoio têm natureza de fundação (privada) ou de associação. É constituída pelos próprios servidores.

Elas têm por objetivo maior incentivar, financiar e estimular a pesquisa. As entidades de apoio surgem como um socorro pelo fato de as universidades não terem mais recursos para pesquisa. Como entidade privada, ela pode arrecadar fundos para suprir as necessidades da universidade.

As entidades realizam um convênio com a universidade ou hospital. O problema das entidades de apoio é que elas funcionam dentro das universidades. Seus funcionários são os servidores da própria universidade que trabalham (pagos pela própria universidade).

Utilizam-se dos bens da universidade (salas, cadeiras, computadores etc). A grande crítica é que são entidades privadas que arrecadam como privadas, mas usam servidores públicos, bens públicos. Seria um ser dentro de outro ser, sendo um público e outro privado. Ademais, não precisam licitar, fazer concurso público, não seguem regime público, etc. A Lei nº 8.958/94 regula as entidades de apoio nas universidades (só há esta lei em relação às entidades de apoio).

Podem receber dotações orçamentárias.No site do Ministério do Planejamento há uma lista com as entidades que são

entidades de apoio. Ex: FINATEC, FUSP, FAPEX, FUNDEPES.

13.1 Serviço social autônomo (sistema “S”)

Ex: SEBRAE, SENAI, SENAC, SESC etc.A criação é feita pelas confederações.São pessoas jurídicas de Direito Privado, criadas para fomentar as diversas

categorias profissionais. Ex: curso de qualificação profissional, assistência médica, assistência odontológica etc.

Não prestam serviços públicos propriamente ditos, apenas desenvolvendo atividade de interesse público. Não podem ter fins lucrativos. Seus recursos advêm de dotações orçamentárias e contribuição parafiscal (são beneficiários da parafiscalidade, é a aptidão para cobrar e arrecadar os tributos [art. 149 CF]).

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Competência tributária é competência para criar tributos e esta competência é indelegável. Somente os entes políticos a têm. Capacidade tributária é a capacidade para cobrar tributos e é delegável.

Parafiscalidade é a delegação da capacidade tributária. São beneficiárias da parafiscalidade as pessoas jurídicas de Direito Público e as pessoas jurídicas de Direito Privado perseguidoras de interesse público. O sistema “S” tem a prerrogativa da parafiscalidade, e cobra a chamada contribuição parafiscal. Como lida com dinheiro público e cobra tributos (tem capacidade tributária), está sujeito ao controle pelo Tribunal de Contas.

13.1.1 Regime licitatório

Já que são controlados direta ou indiretamente pelo Poder Público, estão obrigados a licitar.

Lei nº 8.666/93, art. 1º: Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Apesar de estar sujeito à licitação, o sistema “S” seguirá um processo simplificado de licitação, em virtude de orientação do TCU (procedimento simplificado do sistema “S”). O dever de licitar decorre do controle e da aplicação dos recursos públicos.

13.1.2 Regime de pessoal

Seus empregados seguem o regime celetista. São empregados privados. Não se exige concurso público, mas é possível que haja um processo selectivo. Respondem por improbidade administrativa.

Se equiparam a servidores públicos para fins penais.

13.1.3 Regime processual e tributário

Não possuem privilégios nesses âmbitos.

13.1.4 Competência para julgamento

Justiça comum estadual

13.2 Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP)

Definida pela Lei nº 9.790/99. É pessoa jurídica de Direito Privado e celebra seu vínculo com o Estado por meio de um termo de parceria. Apesar do nome, a doutrina diz que a natureza desse termo é contratual, pois a OSCIP apresenta um projeto de modernização e o Estado entra com os recursos necessários. É um contrato realizado para um projeto determinado, específico.

Não têm fins lucrativos; prestam serviços sociais (serviços não exclusivos do Estado).

A OSCIP, para celebrar termo de parceira, tem que existir há pelo menos um ano no ramo de atividade (experiência de pelo menos um ano no ramo de atividade). É possível no meio ambiente, cultura, assistência social, desenvolvimento econômico e social e patrimônio histórico e cultural. Na OSCIP, a gestão é privada, não havendo interferência

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de administradores públicos. É uma pessoa privada que realiza projetos específicos na administração pública. Não há bens ou servidores públicos.

É presente em projectos de assistência social, vultura, património histórico e artístico, meio ambiente, etc. Exemplos de OSCIP: Instituto Joãozinho 30; Instituto Asas; Organização Ponto Terra; Instituto Arte Vida.

13.3 Organização Social (OS)

Está prevista na Lei nº 9.637/98. Surge da extinção de estruturas da Administração e transferência da atividade para a Organização Social.

Pessoa jurídica de direito privado criado por particular; não integra a a Administração Pública; não tem fins lucrativos; prestam serviços públicos não exclusivos do Estado.

Para que a OS exista no mundo jurídico ela precisa firmar com o Poder Público um contrato de gestão (vínculo jurídico). O órgão anterior é extinto a partir do contrato de gestão; passa de um órgão/entidade para o particular. Desta forma, antes mesmo de existir, ela já celebra um contrato. O contrato de gestão é condição de existência da OS. Por isso que Maria Sylvia as denomina de “Entidades Fantasma”, já que celebram contrato mesmo antes de existir.

Após o contrato de gestão, o cumprimento dos requisitos e a aprovação do registro e, assim, o registro no órgão competente (da Adm. Públ.).

O contrato de gestão transfere para a OS a utilização de bens públicos, cessão de servidores e dotação orçamentária, que eram da Administração (da estrutura extinta). É um contrato inominado que tomou o nome de contrato de gestão. Não é exigida como requisito experiência anterior. A entidade nasce com o contrato de gestão.

O Conselho de Administração da Organização Social é formado por particulares e por administradores públicos. Os administradores continuam na Administração Pública, mas passam a fazer parte também da OS.

Pode haver Organização Social para o ensino, saúde, pesquisa, desenvolvimento tecnológico, meio ambiente. Sua finalidade é realizar atividades ligadas a serviços não exclusivos do Estado. A regra é o exercício de actividades de natureza privada, contudo, com a extinão do órgão, é possível que leve a actividade pública junto.

A Organização Social, em face do art. 24, XXIV, da Lei nº 8.666/93, nos contratos decorrentes do contrato de gestão, tem dispensa de licitação: É dispensável a licitação: [...] XXIV - para a celebração de contratos de prestação de serviços com as organizações sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de gestão.

Tem dotação orçamentária específica; uso de bens públicos, permissão de uso; cessão de servidores públicos; controle dos Tribunais de Contas.

O TCU diz que a Administração, para constituir o contrato de gestão, deveria licitar; porém, da forma como a Lei nº 9.637/98 definiu a OS, há um impedimento para que a licitação aconteça, pois as OS ainda nem sequer existem quando da formação do contrato de gestão. As OS já nascem “contratadas”.

Toda essa matéria esta sendo discutida no STF (ADI 1923).Exemplos de OS: Associação Brasileira de Tecnologia; Instituto de

Matemática Pura e Aplicada; Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, Centro de Estudos e Gestão Estratégicas.

ENTES DE COOPERAÇÃOConceito Características Principais Regras Exemplos

Serviço Social Autônomo“Sistema S”

Rótulo atribuído às P. Jur. Dir. Privado, da iniciativa privada

Não prestam serviços públicos delegados pelo Estado, mas exercem ativ. de interesse público.Podem ser constituídas por

Beneficiário da parafiscalidade; pode cobrar contribuições. Podem receber dotações orçam. Não goza de privilégios adm., pocessuais e

SESI, SENAI, SESC, SEBRAE, APEX-Brasil, ABDI.

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meio de instituições particulares convencionais, como fundações, sociedades civis, associações ou outras formas peculiares previstas em lei.

tributários

Entidades de Apoio

Rótulo atribuído às P. Jur. Dir. da iniciativa privada que exerce, sem fins lucrativos, atividade social, serviços sociais não exclusivos do Estado, relacionados à ciência, pesquisa, saúde e educação. Normalmente atua junto a hospitais públicos e universidades.

Pode ser criada na forma de fundação, associação ou cooperativa. É instituída diretamente por servidores públicos, porém, em nome próprio e com recursos próprios para exercerem atividades de interesse socal relativas aos serviços prestados pelas entidades estatais em que esses servidores públicos atuem.O vínculo jurídico é o convênio.

FUNDEPES, FAPEX, FCPC, FINATEC

Organização Social (OS)

P. Jur. Dir. Priv. sem fins lucrativos. É criada por particulares para a execução, por meio de parcerias, de serviços públicos não exclusivos do Estado.

O principal vínculo jurídico é o contrato de gestão que lhes permite a aquisição de dotação orçamentária de bens públicos, mediante permissão de uso, sendo dispensadas licitação e a cessão de servidores públicos. Há tratamento especial p/ procedim. licitatório.

Associação Brasileira de Tecnologia Luiz Síntrocon, Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, Instituto de Matemática Pura e Aplicada.

Organização da Sociedade Civil de Interesse Publico (OSCIP)

P. Jur. Dir. Priv., instituída por particular, sem fins lucrativos, para a prestação de serviços sociais não exclusivos do Estado (“socialmente úteis”), sob incentivo e fiscalização estatal e que consagrem em seus estatutos uma série de normas sobre estrutura, funcionamento e prestação de contas.

Não podem ser OSCIPs: sociedades comerciais, organizações sociais, instituições religiosas, sindicatos, além de outras. O vínculo jurídico é o termo de parceria.

Instituto Joãozinho Trinta, Agência de Produção e Gestão Cultural e Artística,

Aula 8 (29 de março de 2012)

14 PODERES DA ADMINISTRAÇÃO

Poderes da administração significam prerrogativas necessárias à busca do interesse público, concretizando-se com a prática de atos administrativos. Por serem prerrogativas e instrumentos (poderes de polícia, hierárquico, disciplinar e regulamentar) da Administração, não conformam a estrutura e organicidade do Estado, isto é, não se confundem com os poderes estatais, quais o legislativo, o judiciário e o executivo.

São prerrogativas de exercício obrigatório, por isso chamadas de poderes-deveres (ou deveres-poderes, como quer Celso Antônio Bandeira de Melo, com ênfase no dever). São irrenunciáveis, pois representam encargo do administrador, que exerce munus público. São, também, restritos aos limites da lei: a prerrogativa deve ser praticada com respeito à competência, à proporcionalidade e à eficiência. Todas essas características decorrem do princípio da indisponibilidade do interesse público, cabendo responsabilização pelo desrespeito a tais regras.

Abuso de poder

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Excesso de poder: ocorre quando a autoridade pública ultrapassa os limites de sua competência. Desvio de finalidade ou desvio de poder: é o vício ideológico (defeito na vontade), isto é, o ato é externamente perfeito, mas realizado com finalidade diversa da legal (ex: esperar um indivíduo chegar ao seu casamento para prendê-lo).

14.1 Poder vinculado

A doutrina moderna critica a divisão em poderes vinculado e discricionário, afirmando que o poder não sofre essa caracterização, mas sim os atos administrativos que são praticados no exercício do poder. Ademais, não há exercício puramente vinculado ou discricionário: o que há é preponderância de um ou outro.

Segundo a doutrina tradicional, o poder vinculado não permite juízo de valor (conveniência e oportunidade) por parte do administrador público. Preenchidos os requisitos legais, o administrador é obrigado a praticar o ato (ex: concessão de aposentadoria, licença para dirigir etc).

14.2 Poder discricionário

Segundo a doutrina tradicional, o poder discricionário permite juízo de valor quanto à oportunidade e conveniência do ato. Contudo, discricionariedade é liberdade nos limites da lei: não é liberdade plena. Se o administrador extrapola as previsões legais, será conduta ilegal.

Haverá discricionariedade (i) se a lei define competência, mas não diz como o administrador deve praticar o ato, e (ii) quando a norma utiliza conceitos indeterminados, pois estes deverão ser preenchidos através de valoração do administrador.

14.3 Poder hierárquico

Existe quando o Estado define uma estrutura hierárquica em determinado âmbito da Administração, gerando relação de subordinação entre órgãos. É o escalonamento e organização dos quadros da Administração.

Assim, estabelecida a hierarquia, nasce a subordinação, que inclui os poderes-deveres de fiscalização, controle e revisão (provocada ou de ofício) dos atos do subordinado pelo seu superior hierárquico.

Há, também, a possibilidade de instauração de processo para punição: a aplicação de sanção por ato infracional é prerrogativa do superior hierárquico, mas também caracteriza exercício do poder disciplinar, que acaba sendo desdobramento do poder hierárquico.

Por fim, no exercício do poder hierárquico incluem-se também as possibilidades de delegação e avocação de funções.

14.4 Poder disciplinar

Permite que o Poder Público aplique sanção em razão de infração funcional, praticada por agente público. Atinge aquele que está na intimidade da administração, não o particular administrado. Assim, p. ex., multa aplicada a empresa privada contratada pela Administração Pública não é resultado do poder disciplinar, mas do poder de polícia. O descumprimento de contrato administrativo não dá ensejo ao poder disciplinar, pois a relação é contratual, daí advindo suas consequências.

Para Hely Lopes Meirelles, o poder disciplinar é, em regra, discricionário. No entanto, modernamente exige-se a instauração de processo em face de suspeita de ato infracional, sendo providência vinculada. É a definição da conduta infracional, muitas vezes, que caracteriza decisão discricionária, por que conceitos vagos da lei exigem juízo de valor.

Assim, na definição de “conduta escandalosa” haverá grande carga de discricionariedade. Não, contudo, na aplicação da penalidade, que é ato vinculado, pois

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previsto na lei. A jurisprudência moderna afirma que o poder disciplinar não é completamente discricionário, somente o sendo no caso da definição da sanção, quando houver conceitos indeterminados. A instauração de processo e a aplicação da pena são providências vinculadas.

14.5 Poder regulamentar

Para Maria Sylvia Zanella di Pietro, melhor expressão seria poder normativo, pois serve para normatizar os atos administrativos, complementando a disposição legal e buscando sua fiel execução. Exemplos de atos regulamentares/normativos são os regulamentos, as resoluções, os regimentos, as instruções normativas, as deliberações e as portarias.

14.5.1 Regulamento

O regulamento é o conteúdo de um decreto. Por isso, é mais seguro falar-se em decreto regulamentar. Nem todo decreto possui como conteúdo um regulamento (ex: nomeação de servidor). O decreto regulamentar é realizado pelo chefe do executivo, não havendo procedimento pré-fixado nem a participação popular representativa, como há na criação de uma lei.

O regulamento executivo é aquele que complementa a lei, buscando sua fiel execução. Não inova o ordenamento jurídico, pois tem fundamento de validade na lei e não extrapola os seus limites. É a regra no Brasil: CF, art. 84, IV (Compete privativamente ao Presidente da República: [...] IV – sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução; [...]).

Já o regulamento autônomo exerce o papel de lei, pois tem seu fundamento de validade na Constituição e inova o ordenamento jurídico. A posição majoritária na doutrina e na jurisprudência é a de que, a partir da EC 32/2001, que alterou o art. 84, VI, da CF, admite-se o decreto regulamentar autônomo no Brasil: Compete privativamente ao Presidente da República: [...] VI – dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos; [...]). Assim, o decreto regulamentar autônomo é exceção autorizada, em determinadas situações, pela Constituição.

14.6 Poder de polícia

O poder de polícia é prerrogativa da Administração Pública tendente a compatibilizar interesses de particulares e Poder Público, em busca do bem comum. Significa compatibilizar interesse público com interesse privado, visando ao bem-estar social. Nesse sentido, restringe-se a atuação do particular que possa prejudicar o interesse social (ex: multa de trânsito, limitações ao número de andares de um edifício etc).

No exercício do poder de polícia limitam-se, basicamente, os direitos de liberdade e propriedade do particular. Não há, contudo, anulação de tais direitos, mas mera limitação que não enseja direito a indenização, pois apenas define a forma de exercício do direito. Tem por fundamento a supremacia do interesse público sobre o privado, não necessitando haver relação jurídica específica entre o Estado e o sujeito privado. Aliás, a existência de relação especial afasta o poder de polícia, aplicando-se o hierárquico ou o disciplinar.

O poder de polícia pode ser (i) preventivo (previne o evento danoso), (ii) repressivo (reprime o dano gerado), (iii) fiscalizador (foco na fiscalização). É prerrogativa que se materializa, principalmente, em atos administrativos. Entretanto, especialmente na espécie preventiva, o poder de polícia poder valer-se de atos normativos, havendo, neste caso, exercício de poder regulamentar e de polícia.

O poder de polícia não incide diretamente sobre pessoas, mas sim sobre bens, direitos e atividades. É uma prerrogativa, em regra, negativa, porque exige normalmente

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uma abstenção. Ademais, não pode ser delegada ao particular, sob pena de atentar contra a segurança jurídica. Contudo, o simples ato material de polícia pode ser delegado ao particular: são os atos materiais, portanto não decisórios (ex: implosão de obra irregular por empresa privada)18.

O poder de polícia é discricionário, sendo apenas excepcionalmente vinculado: a licença é exemplo de ato vinculado; a autorização, de ato discricionário. Outra característica é a autoexecutoriedade, isto é, a possibilidade de prática do ato independentemente de controle prévio do Poder Judiciário. Para a maioria dos autores a autoexecutoriedade divide-se em (i) exigibilidade (execução indireta sem jurisdição) e (ii) executoriedade (execução direta sem jurisdição).

A exigibilidade é prerrogativa de todo ato de polícia: é a própria decisão da Administração. A executoriedade ocorrerá apenas nas hipóteses previstas em lei e nos casos de urgência. Assim, nem todo ato de polícia é autoexecutável: havendo exigibilidade, mas faltando executoriedade, a Administração terá de procurar o Judiciário (ex: cobrança de multa).

Por fim, a coercibilidade pode ser tida como característica autônoma, significando obrigatoriedade, imperatividade.

14.6.1 Taxa de polícia

CTN, art. 78: Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder.

A taxa de polícia é cobrada em razão do exercício do poder de polícia. Taxa é tributo vinculado a uma contraprestação estatal. A taxa de polícia corresponde ao custo da diligência. O poder de polícia é exercido pela polícia administrativa, que não deve ser confundida com a polícia judiciária.

Aula 9 (13 de abril de 2012)

15 ATOS ADMINISTRATIVOS

18 EMENTA: Direito Constitucional E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Estando prejudicada a Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a Ação Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do mesmo art. 58. 2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5°, XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre com os dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime. (ADI 1717, Relator(a):  Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 07/11/2002, DJ 28-03-2003 PP-00061 EMENT VOL-02104-01 PP-00149)

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Se os efeitos do fato jurídico atingem o âmbito do Direito Administrativo, o fato é adjetivado pelo termo “administrativo”: fato administrativo. Ex: falecimento de servidor é um fato administrativo, pois produz vacância de um cargo na Administração.

O ato administrativo, ao contrário do fato, é uma manifestação de vontade que produz efeitos na seara do Direito Administrativo (ex: nomeação de servidor). Fato é acontecimento independente da vontade; ato é acontecimento produzido pela vontade.

Há uma diferença entre ato administrativo e ato da Administração. Ato da Administração é todo aquele produzido pela Administração. Quando, no entanto, tais atos seguem o regime público, são novamente etiquetados, desta feita de “atos administrativos”.

Há atos administrativos, isto é, atos que seguem o regime público, que não são produzidos pela Administração, mas por concessionárias ou permissionárias, por exemplo. Estes são atos administrativos que não são atos da Administração, mas de particular. Assim, qualquer ato produzido pela Administração é “ato da Administração”; alguns atos da Administração são “atos administrativos” (regime público); outros atos administrativos são produzidos por particular, por isso não são atos da Administração.

Ato administrativo, pois, nada mais é do que uma manifestação de vontade do Estado ou de quem lhe faça as vezes, que, atentando a regras de Direito Público, cria, modifica ou extingue direitos, produzindo efeitos na órbita jurídica que sempre tenderão a proteger o interesse público. É complementar e inferior à lei, estando sujeito a controle de legalidade pelo Poder Judiciário.

Segundo Hely Lopes Meirelles, há ainda um conceito de ato administrativo em sentido estrito: é o ato em sentido amplo ao qual se adicionam duas características, quais (i) concretude e (ii) unilateralidade. Ato bilateral é, por exemplo, um contrato administrativo, que é ato administrativo em sentido amplo, mas não em sentido estrito. De outra sorte, uma normatização é ato abstrato, por isso não é ato administrativo em sentido estrito.

15.1 Elementos ou requisitos de validade do ato administrativo

De acordo com a doutrina majoritária, a Lei nº 4.717/65 traz os requisitos de validade do ato administrativo: sujeito competente, forma, motivo, objeto e finalidade.19

Lei 4.717/65, art. 2º: São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência; b) vício de forma; c) ilegalidade do objeto; d) inexistência dos motivos; e) desvio de finalidade. Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas: a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato; c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultado obtido; e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.

15.1.1 Sujeito competente

É aquele que exerce a função pública: agente público. Pode-se exercer a função pública de forma temporária ou permanente, com ou sem remuneração. Não é todo agente público, mas apenas o agente competente, conforme as regras de competência.

A competência terá sua fonte na lei e na CRFB/88, gerando vinculação ao agente (dever-poder): a competência é irrenunciável e imodificável pela vontade do administrador; também é inegociável, imprescritível (não desaparece pelo mero decurso do

19 Ver posição de Celso Antônio Bandeira de Mello.

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tempo) e improrrogável (não há, como no processo judicial, prorrogação de competência relativa).

É possível, no Brasil, a delegação de competência administrativa? Sim, mas não é a regra. Deve ser uma exceção e sempre deve ser justificada. Consiste em transferir uma competência para outrem.

Na delegação de competência, as duas autoridades continuam competentes. Há uma competência cumulativa. No âmbito federal, a delegação é proibida em três situações: (i) em caso de competência exclusiva; (ii) em caso de atos normativos; (iii) em caso de decisão em recurso administrativo.

É possível, no Brasil, a avocação de competência administrativa? Da mesma forma que é possível a delegação, a avocação também o é, mas de forma extraordinária e sempre justificada. Consiste em trazer para si a competência de um subordinado.

Lei nº 9.784/99.Art. 11. A competência é irrenunciável e se exerce pelos órgãos administrativos a que foi atribuída como própria, salvo os casos de delegação e avocação legalmente admitidos.Art. 12. Um órgão administrativo e seu titular poderão, se não houver impedimento legal, delegar parte da sua competência a outros órgãos ou titulares, ainda que estes não lhe sejam hierarquicamente subordinados, quando for conveniente, em razão de circunstâncias de índole técnica, social, econômica, jurídica ou territorial. Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo aplica-se à delegação de competência dos órgãos colegiados aos respectivos presidentes.Art. 13. Não podem ser objeto de delegação: I - a edição de atos de caráter normativo; II - a decisão de recursos administrativos; III - as matérias de competência exclusiva do órgão ou autoridade.Art. 14. O ato de delegação e sua revogação deverão ser publicados no meio oficial. § 1o O ato de delegação especificará as matérias e poderes transferidos, os limites da atuação do delegado, a duração e os objetivos da delegação e o recurso cabível, podendo conter ressalva de exercício da atribuição delegada. § 2o O ato de delegação é revogável a qualquer tempo pela autoridade delegante. § 3o As decisões adotadas por delegação devem mencionar explicitamente esta qualidade e considerar-se-ão editadas pelo delegado.Art. 15. Será permitida, em caráter excepcional e por motivos relevantes devidamente justificados, a avocação temporária de competência atribuída a órgão hierarquicamente inferior.

15.1.2 Forma

A vontade que produz o ato administrativo deve ser exteriorizada de determinada forma prevista em lei. Há de se cumprir formalidades específicas, valendo o princípio da solenidade.

Como regra, o ato administrativo deve ser praticado por escrito. Excepcionalmente, podem existir atos administrativos não escritos (ex: indicação de um guarda de trânsito para que um carro pare numa blitz; contrato administrativo verbal nos casos de pronta entrega e pronto pagamento de até quatro mil reais)

Lei nº 8.666/93, art. 60, parágrafo único: É nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a Administração, salvo o de pequenas compras de pronto pagamento, assim entendidas aquelas de valor não superior a 5% (cinco por cento) do limite estabelecido no art. 23, inciso II, alínea "a" desta Lei, feitas em regime de adiantamento.

O silêncio administrativo é um nada jurídico, ou seja, não produz qualquer efeito, salvo o aposto pela lei. Pode ser discutido na esfera judicial, pois gera lesão ao direito líquido e certo de petição (art. 5º, XXXIV, CF). Uma vez recebido o MS, o juiz não pode

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responder no lugar do administrador, mas fixar prazo para que ele decida. O juiz não pode substituir o administrador: esta é a posição majoritária. Segundo Celso Antônio, nos casos de atos administrativos vinculados com mera conferência de requisitos (sem necessidade de juízo de valor), o juiz poderá decidir diretamente (posição minoritária).

Quanto aos vícios de forma, há os que caracterizam mera irregularidade (ex: defeito de padronização), não comprometendo sua validade; há os que ensejam anulação, mas são sanáveis; há os que ensejam nulidade, portanto insanáveis.

Para praticar ato administrativo, é preciso que exista processo administrativo prévio. Não há atos administrativos sem processo. Este deve estar de acordo com o novo modelo constitucional (art. 5º, LV, CF – contraditório e ampla defesa). Ex: anulação de concurso (ato administrativo) sem prévio contraditório é nula (desrespeitou condição de forma). O processo administrativo é documento e também mecanismo de legitimação de condutas, pois é no processo que o administrador vai fundamentar a sua atuação.

Motivação do ato administrativo: é a justificação, as razões que levam à prática do ato. É condição de forma do ato administrativo. É o raciocínio lógico que leva à prática do ato, ou seja, é a correlação lógica entre os elementos do ato administrativo e a previsão legal.

Todos os elementos do ato administrativo devem ser expostos, consoante as disposições legais. A motivação também é requisito de forma do ato. Doutrina minoritária (José dos Santos Carvalho Filho) entende que a motivação é facultativa, sendo obrigatória apenas em alguns casos (Lei nº 9.784/99, art. 50). Doutrina majoritária e o STF entendem ser a motivação obrigatória, com algumas exceções, como o caso de exoneração ad nutum. Os fundamentos para a obrigatoriedade são: CF, art. 1º, parágrafo único (o poder emana do povo) e inciso II (direito à cidadania); art. 5º, XXXIII (direito à informação) e XXXV (direito à jurisdição); art. 93, X (motivação dos atos administrativos do Poder Judiciário20); o art. 50 da Lei nº 9.784/99 tem um rol tão amplo que todos os atos encontram-se ali listados.

Lei nº 9.784/99, art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: I - neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses; II - imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções; III - decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública; IV - dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório; V - decidam recursos administrativos; VI - decorram de reexame de ofício; VII - deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais; VIII - importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo. § 1o A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato. § 2o Na solução de vários assuntos da mesma natureza, pode ser utilizado meio mecânico que reproduza os fundamentos das decisões, desde que não prejudique direito ou garantia dos interessados. § 3o A motivação das decisões de órgãos colegiados e comissões ou de decisões orais constará da respectiva ata ou de termo escrito.

15.1.3 Motivo

É o elemento objetivo, ou seja, o fato e o fundamento jurídicos que levam à prática do ato (ex: fechamento de fábrica por poluição ambiental; demissão de servidor por uma infração funcional grave). É o que provoca a prática do ato.

O motivo precisa ser legal para que o ato seja legal. Condições da legalidade do motivo: (i) veracidade/materialidade; (ii) compatibilidade do motivo declarado com o previsto em lei (ex: não se pode demitir servidor em razão de infração leve); (iii)

20 Se o judiciário, que, excepcionalmente, pratica atos administrativos, deve motivá-los, com muito mais razão deve o executivo fazê-lo.

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compatibilidade do motivo declarado com o resultado do ato (ex: falta grave por parte do servidor A, mas demissão do servidor B).

Teoria dos Motivos Determinantes

Vincula o administrador aos motivos declarados no ato, inclusive nos atos administrativos que não precisam de motivo. Uma vez declarados os motivos, a autoridade está vinculada a eles. Ex: em exoneração ad nutum, não se precisa de motivo, mas, se o administrador decidir declará-lo, terá que obedecer aos motivos declarados.

Exceção à teoria dos motivos determinantes: tredestinação, que é a mudança de motivo autorizada pela lei. Somente cabe em desapropriação, e desde que mantida uma razão de interesse público.

A ilegalidade do motivo compromete a teoria dos motivos determinantes? Se a teoria diz que se terá de obedecer aos motivos declarados e se estes motivos são ilegais, esta teoria fica comprometida pela ilegalidade do motivo. O motivo tem de ser legal para que se cumpra a teoria dos motivos determinantes.21

Aula 10 (4 de maio de 2012)

15.1.4 Objeto

É o resultado prático do ato administrativo, o ato considerado em si mesmo: o conteúdo, o que se atesta, o que se certifica, o que se determina. Para alguns doutrinadores, é o efeito jurídico imediato.

Celso Antônio Bandeira de Mello distingue objeto do ato de conteúdo do ato: o primeiro é sobre o que se decide, pressuposto de existência do ato administrativo; o segundo é a decisão, elemento do ato administrativo.

O objeto do ato administrativo deve ser lícito, possível e determinado. A licitude, para o Direito Público, é o objeto obrigatório por lei, e não meramente permitido. A possibilidade diz respeito à potencialidade material e jurídica de existência do objeto. A determinabilidade do ato é a sua clareza, sua precisão.

15.1.5 Finalidade

Deve ser, sempre, uma (ou mais) razão(ões) de interesse público. Finalidade é o bem jurídico que se pretende proteger, devendo, pois, ser de interesse público.

Desvio de finalidade é o vício ideológico, subjetivo, quanto a esse elemento do ato. É defeito na vontade. Na verdade, desvio de finalidade representa defeito na finalidade e no motivo, pois o administrador que pratica ato com finalidade viciada sempre busca camuflar o real motivo do ato. Este, pois, é, também, viciado.

Exemplo

Dissolução de passeata tumultuosa: (i) motivo: tumulto (o que provoca a prática do ato; está no passado); (ii) objeto: dissolução da passeata (o resultado prático do ato; está no presente); (iii) finalidade: ordem pública (bem protegido com a prática do ato; está no futuro).

15.2 Vinculação e discricionariedade

Diz respeito ao grau de liberdade na prática do ato administrativo. O ato vinculado não permite margem de liberdade valorativa ao

administrador: não há juízo de conveniência e oportunidade para a prática do ato.

21 Observação pessoal: isso não faz sentido.

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Preenchidos os requisitos legais, o administrador tem de praticar o ato. Alguns autores chamam de “atos regrados”.

O ato discricionário permite margem de liberdade valorativa ao administrador: há juízo de conveniência e oportunidade para a prática do ato. Preenchidos os requisitos legais (se estes houver, e que, neste caso, são normalmente vagos ou indeterminados, já trazendo alto grau de valoração pelo administrador), o administrador fará opção, de acordo com a conveniência e oportunidade para o serviço, de praticar, ou não, o ato. Há que se resguardar, contudo, os limites da lei: o ato praticado fora desses limites não é discricionário, mas arbitrário.

Elemento do ato/tipo de ato Ato vinculado Ato discricionário

Competência Elemento vinculado Elemento vinculado

Forma Elemento vinculado Elemento vinculado

Finalidade Elemento vinculado Elemento vinculado

Motivo Elemento vinculado Elemento discricionário

Objeto Elemento vinculado Elemento discricionário

Assim, há discricionariedade para a prática do ato quando o motivo e o objeto do ato são elementos discricionários. No ato vinculado, todos os seus elementos são vinculados. Para Celso Antônio Bandeira de Mello, contudo, a forma e a finalidade, excepcionalmente e somente quando lei o determinar (dando alternativas ao administrador), podem ser elementos discricionários.

O mérito do ato administrativo é a sua discricionariedade (conveniência e oportunidade). O motivo e o objeto são o “endereço” do mérito, o local onde ele se encontra. Nesse sentido, o ato vinculado é desprovido de mérito.22

Assim, pode o Poder Judiciário rever qualquer ato administrativo no que tange a sua legalidade, mas não o mérito do ato (o juízo do administrador quanto à conveniência e oportunidade do ato). O juiz pode rever qualquer elemento dos atos vinculados ou discricionário, inclusive motivo e objeto: quanto à legalidade, mesmo estes elementos podem ser revistos, até no caso de ato discricionário. A vedação é somente quanto ao mérito.

15.3 Atributos do ato administrativo

15.3.1 Presunção de legitimidade

A presunção é de legitimidade (de acordo com as regras morais), legalidade (de acordo com as regras legais) e veracidade (de acordo com a verdade). Tais presunções são juris tantum, admitindo prova em contrário por parte de quem alega a ausência de legitimidade, legalidade ou veracidade. O resultado prático dessas presunções é a aplicação imediata do ato, influenciando, portanto, no atributo da autoexecutoriedade.

15.3.2 Autoexecutoriedade

O ato administrativo independe do controle prévio do Poder Judiciário para a sua realização. Nem todo ato administrativo, contudo, é autoexecutável: sanções pecuniárias (multas) são exemplos de atos que exigem execução perante o Judiciário (possuem exigibilidade, mas não executoriedade).

22 Observação pessoal: entendimento deturpado sobre o que é mérito.

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Para a doutrina majoritária, a autoexecutoriedade divide-se em (i) exigibilidade e (ii) executoriedade. Quanto ao primeiro, atributo de todo ato administrativo, tem-se que é o poder de exigir a submissão ao ato; quanto ao segundo, atributo de alguns atos administrativos, tem-se que é o poder de sub-rogar-se à vontade de quem deve submissão ao ato (é a execução direta). A executoriedade está presente quando prevista em lei ou quando existir urgência.

15.3.3 Imperatividade (coercibilidade)

Diz com a obrigatoriedade do ato administrativo, que é realizado de forma impositiva. É atributo que só está presente em atos que estabelecem uma obrigação. A certidão, por exemplo, é ato administrativo desacompanhado de imperatividade.

15.3.4 Tipicidade

Cada ato tem uma aplicação específica, determinada. Ex: a advertência é para punir infração leve; a remoção é para deslocar servidor por necessidade do serviço; a revogação é para retirar ato inconveniente etc.

15.4 Classificações dos atos administrativos

15.4.1 Quanto aos destinatários

15.4.1.1 Atos gerais

Aplicáveis a toda a uma coletividade. São abstratos e impessoais. Normalmente prevalecem sobre os atos individuais (ex: regulamentos, instruções etc).

15.4.1.2 Atos individuais (especiais)

Aplicáveis a destinatário certo e determinado. São concretos e pessoais. Normalmente não prevalecem sobre os atos gerais. Podem ser singulares (um destinatário determinado) ou plúrimos (mais de um destinatário determinado).

15.4.2 Quanto ao alcance

15.4.2.1 Atos internos

Produzem efeitos dentro da Administração. Estabelecem padrões de operacionalização dos serviços administrativos.

15.4.2.2 Atos externos

Produzem efeitos dentro e fora da Administração.

15.4.3 Quanto ao grau de liberdade

Vinculados ou discricionários.

15.4.4 Quanto à formação

15.4.4.1 Atos simples

Completam-se com única manifestação de vontade.

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15.4.4.2 Atos compostos

Completam-se com mais de uma manifestação de vontade, que ocorrem dentro de um mesmo órgão, sendo uma principal e outra acessória (ratificadora).

15.4.4.3 Atos complexos

Completam-se com mais de uma manifestação de vontade, que ocorrem em órgãos diferentes, sendo de mesmo patamar (ex: concessão de aposentadoria; aprovação de dirigente de agência reguladora).

15.5 Formação, validade e eficácia dos atos administrativos

O ato administrativo é perfeito quando cumpre seu ciclo de formação; é válido quando cumpre todos os requisitos de validade; é eficaz quando está apto a produzir efeitos.

O ato perfeito pode ser inválido e eficaz; válido e eficaz; inválido e ineficaz; e válido e ineficaz. A publicação, por exemplo, é condição de eficácia do contrato administrativo (Lei nº 8.666/93, art. 61, parágrafo único: A publicação resumida do instrumento de contrato ou de seus aditamentos na imprensa oficial, que é condição indispensável para sua eficácia, será providenciada pela Administração [...]).

15.5.1 Efeitos dos atos administrativos

15.5.1.1 Típicos

São os efeitos principais: esperados e desejados.

15.5.1.2 Atípicos

São os efeitos secundários: inesperados.Podem ser reflexos ou preliminares (prodrômicos).Os primeiros atingem terceiros estranhos à relação em que o ato busca

intervir (ex: locatário que sofre com a desapropriação de imóvel).Já os efeitos atípicos preliminares aparecem nos atos que dependem de duas

ou mais manifestações de vontade (atos compostos ou complexos): é o dever de a segunda autoridade se manifestar quando a primeira já o fez (independem da vontade do agente emissor e não podem ser suprimidos).

15.6 Extinção dos atos administrativos

Hipóteses:• Desaparecimento do sujeito ou do objeto. Ex: a morte de servidor

extingue o ato de nomeação; desabamento de imóvel tombado extingue ato de tombamento.

• Cumprimento dos efeitos. Ex: a cessação das férias de servidor extingue o ato de concessão.

• Renúncia do titular. Ex: a renúncia às férias extingue o ato de concessão;

• Retirada pelo poder público: cassação, caducidade, contraposição, anulação, revogação.

Aula 11 (18 de maio de 2012)

15.6.1 Cassação, caducidade e contraposição

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Cassação é a retirada de um ato administrativo pelo descumprimento das condições inicialmente impostas (ex: licença para funcionar hotel e posterior transformação em motel, em área proibida para este).

A caducidade é a retirada de um ato administrativo pela superveniência de norma jurídica com ele incompatível (ex: permissão de uso para circo e posterior vigência de lei que proíbe tal atividade naquele lugar específico).

Contraposição é a eliminação dos efeitos de um ato administrativo anterior (ex: nomeação de servidor e posterior exoneração).

15.6.2 Anulação e revogação

Anulação é a retirada de um ato administrativo por ilegalidade. Tanto a Administração quanto o Judiciário podem anular ato administrativo (enunciados nº 346 e 473 do STF). A primeira tem o prazo de cinco anos para rever os próprios atos quando deles emanam efeitos favoráveis para o administrado.

Lei nº 9.784/99, art. 54: O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. § 1o No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento. § 2o Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.

Em regra, a anulação produz efeitos ex tunc. Para Celso Antônio Bandeira de Mello, contudo, algumas circunstâncias determinam a produção de efeitos ex nunc: se a anulação for benéfica ao administrado, é ex tunc; se maléfica, ex nunc.

Revogação é a retirada de um ato administrativo por inconveniência. Somente a Administração pode revogar ato administrativo. O Judiciário só pode revogar os seus próprios atos administrativos. Nunca, porém, em sede de controle judicial. Os efeitos produzidos pela revogação são ex nunc.

Não há limite temporal para a revogação, mas apenas limite material (de conteúdo): atos vinculados não são revogáveis; atos que produziram direitos adquiridos não são revogáveis; atos cuja eficácia já se exauriu não são revogáveis; atos que a lei declare irrevogáveis, obviamente, não são revogáveis; atos enunciativos não são revogáveis etc.

15.6.2.1 Convalidação e conversão do ato administrativo

Os atos que possuem vício sanável são anuláveis. A convalidação é a correção do defeito, tornando-o válido e evitando-se a anulação. Nesse caso, a convalidação é dever do administrador, mas só é possível se o defeito for na competência ou na forma.

Difere a convalidação da conversão (ou sanatória): a segunda é o aproveitamento do ato, transformando-o em outro mais simples, desde que seus requisitos estejam presentes.

Se o ato, contudo, tiver vício insanável, exige anulação, à vista do princípio da legalidade. No caso de outros princípios sobrepujando-se ao princípio da legalidade, pode-se, excepcionalmente, manter o ato viciado (estabilização dos efeitos do ato administrativo). Para o STJ, passados cinco anos, retirar o ato ilegal fere o princípio da segurança jurídica.

16 LICITAÇÃO

Licitação é o procedimento administrativo por meio do qual se escolhe proposta mais vantajosa ao interesse público, que nem sempre será a mais barata. Exercitam-se os princípios da impessoalidade e isonomia, dando a todos a oportunidade de participar, além do que se objetiva o desenvolvimento nacional sustentável.

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Lei nº 8.666/93, art. 3º: A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos. (Redação dada pela Lei nº 12.349, de 2010). [...]

É competência privativa da União legislar sobre normas gerais de licitações e contratos administrativos (CF, art. 22: Compete privativamente à União legislar sobre: [...] XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III; [...]). É legislação de âmbito nacional, a exemplo das Leis nº 8.666/93, 10.520/02, 8.987/95 e 11.099/04. A legislação específica é permitida aos demais entes políticos.

Na ADIN 92723, discutiu-se se a algumas alíneas do art. 17 da Lei nº 8.666/93 são, de fato, normas gerais. O STF deu interpretação conforme a tais dispositivos, considerando-os normas específicas de aplicação restrita ao âmbito federal.

16.1 Sujeitos da licitação

Lei nº 8.666/93, art. 1º, parágrafo único: Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

16.1.1 Empresa pública e sociedade de economia mista

Prestadora de serviço público Prestadora de atividade econômica

Regime mais público.Dever de licitar.

Se buscarem atividade econômica, podem ter estatuto próprio (art. 173, §1º, III da CRFB/88). Mas ainda não possuem; logo, têm de obedecer à Lei nº 8.666/93.

16.1.2 Fundos especiais

O legislador errou ao prever licitação para os fundos especiais. Fundo especial é uma destinação de recurso para finalidades assistenciais

(ex: recurso para ajudar os desabrigados das chuvas, produtores de leite etc). O fundo especial pode ter a natureza de: (i) órgão da administração direta; logo, não precisaria de previsão em separado; (ii) fundação pública; logo, não precisaria de previsão em separado; (iii) código para destinação orçamentária, previsto em lei; logo, não existem enquanto estrutura física, não precisando de licitação (pois não celebram contratos); (iv) os demais entes controlados direta ou indiretamente pelo Poder Público (ex: Serviços Sociais

23 EMENTA: CONSTITUCIONAL. LICITAÇÃO. CONTRATAÇÃO ADMINISTRATIVA. Lei n. 8.666, de 21.06.93. I. - Interpretação conforme dada ao art. 17, I, "b" (doação de bem imóvel) e art. 17, II, "b" (permuta de bem movel), para esclarecer que a vedação tem aplicação no âmbito da União Federal, apenas. Identico entendimento em relação ao art. 17, I, "c" e par. 1. do art. 17. Vencido o Relator, nesta parte. II. - Cautelar deferida, em parte. (ADI 927 MC, Relator(a):  Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/11/1993, DJ 11-11-1994 PP-30635 EMENT VOL-01766-01 PP-00039)

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Autônomos [Sistema S], Organizações Sociais [OS], Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público [OSCIP]).

Dica para saber se o ente é controlado ou não: saber se recebe dinheiro público, portanto, sofre controle pelo Tribunal de Contas (TC). Jurisprudência: (i) o Sistema S adota procedimento simplificado para licitações e contratos; (ii) as Organizações Sociais muitas vezes escapam de licitar (a própria lei traz isso); (iii) as OSCIPs estão sujeitas à licitação.

16.2 Princípios específicos

16.2.1 Vinculação ao instrumento convocatório

Em regra, o instrumento convocatório é o edital. O instrumento é norma da licitação, devendo estabelecer todas as regras. Não pode o administrador exigir mais ou menos do que está previsto no instrumento: não se podem liberar exigências ou exigir mais do que o previsto.

Lei nº 8.666/93, art. 41: A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada. § 1o  Qualquer cidadão é parte legítima para impugnar edital de licitação por irregularidade na aplicação desta Lei, devendo protocolar o pedido até 5 (cinco) dias úteis antes da data fixada para a abertura dos envelopes de habilitação, devendo a Administração julgar e responder à impugnação em até 3 (três) dias úteis, sem prejuízo da faculdade prevista no § 1o do art. 113. § 2o  Decairá do direito de impugnar os termos do edital de licitação perante a administração o licitante que não o fizer até o segundo dia útil que anteceder a abertura dos envelopes de habilitação em concorrência, a abertura dos envelopes com as propostas em convite, tomada de preços ou concurso, ou a realização de leilão, as falhas ou irregularidades que viciariam esse edital, hipótese em que tal comunicação não terá efeito de recurso. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 3o  A impugnação feita tempestivamente pelo licitante não o impedirá de participar do processo licitatório até o trânsito em julgado da decisão a ela pertinente. § 4o  A inabilitação do licitante importa preclusão do seu direito de participar das fases subseqüentes.

16.2.2 Julgamento objetivo

O instrumento deve definir de forma clara o critério de julgamento (tipo de licitação): técnica, técnica e preço, preço.

Lei nº 8.666/93, art. 45:  O julgamento das propostas será objetivo, devendo a Comissão de licitação ou o responsável pelo convite realizá-lo em conformidade com os tipos de licitação, os critérios previamente estabelecidos no ato convocatório e de acordo com os fatores exclusivamente nele referidos, de maneira a possibilitar sua aferição pelos licitantes e pelos órgãos de controle. § 1o  Para os efeitos deste artigo, constituem tipos de licitação, exceto na modalidade concurso: (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) I - a de menor preço - quando o critério de seleção da proposta mais vantajosa para a Administração determinar que será vencedor o licitante que apresentar a proposta de acordo com as especificações do edital ou convite e ofertar o menor preço; II - a de melhor técnica; III - a de técnica e preço. IV - a de maior lance ou oferta - nos casos de alienção de bens ou concessão de direito real de uso. (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994) § 2o  No caso de empate entre duas ou mais propostas, e após obedecido o disposto no § 2o do art. 3o desta Lei, a classificação se fará, obrigatoriamente, por sorteio, em ato público, para o qual todos os licitantes serão convocados, vedado qualquer outro processo. § 3o  No caso

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da licitação do tipo "menor preço", entre os licitantes considerados qualificados a classificação se dará pela ordem crescente dos preços propostos, prevalecendo, no caso de empate, exclusivamente o critério previsto no parágrafo anterior. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 4o  Para contratação de bens e serviços de informática, a administração observará o disposto no art. 3o   da Lei no   8.248, de 23 de outubro de 1991 , levando em conta os fatores especificados em seu parágrafo   2o  e adotando obrigatoriamento o tipo de licitação "técnica e preço", permitido o emprego de outro tipo de licitação nos casos indicados em decreto do Poder Executivo. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 5o  É vedada a utilização de outros tipos de licitação não previstos neste artigo. § 6o  Na hipótese prevista no art. 23, § 7º, serão selecionadas tantas propostas quantas necessárias até que se atinja a quantidade demandada na licitação. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998)

Escolhido o tipo da licitação, não se pode levar em conta elementos estranhos ao edital (ex: na licitação por melhor preço, não se deve utilizar a técnica como critério de julgamento).

16.2.3 Procedimento formal

O procedimento de licitação tem de cumprir as formalidades legais. O administrador não pode criar nova modalidade. Contudo, o STJ reconhece que o mero formalismo (ex: tamanho de envelope, cor de caneta etc) não é necessário.

16.2.4 Sigilo de proposta

As propostas são sigilosas até o momento de sua abertura em seção pública. Os licitantes devem apresentar suas propostas em envelopes lacrados: nem os demais licitantes nem a comissão devem conhecer o conteúdo antes da seção pública para abertura dos envelopes. O ferimento a tal regra é crime (Lei nº 8.666/93, art. 89) e ato de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/98, art. 10).

A única modalidade de licitação que excepciona o sigilo de proposta é o leilão, pois as propostas são verbais.

16.3 Modalidades de licitação

A escolha da modalidade é realizada à vista do critério de julgamento: valor e/ou qualidade do objeto.

Cada modalidade terá um prazo de intervalo mínimo entre a publicação do edital e a entrega dos envelopes (Lei nº 8.666/93, art. 21).

Lei nº 8.666/93, art. 21: Os avisos contendo os resumos dos editais das concorrências, das tomadas de preços, dos concursos e dos leilões, embora realizados no local da repartição interessada, deverão ser publicados com antecedência, no mínimo, por uma vez: (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) I - no Diário Oficial da União, quando se tratar de licitação feita por órgão ou entidade da Administração Pública Federal e, ainda, quando se tratar de obras financiadas parcial ou totalmente com recursos federais ou garantidas por instituições federais; (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) II - no Diário Oficial do Estado, ou do Distrito Federal quando se tratar, respectivamente, de licitação feita por órgão ou entidade da Administração Pública Estadual ou Municipal, ou do Distrito Federal; (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) III - em jornal diário de grande circulação no Estado e também, se houver, em jornal de circulação no Município ou na região onde será realizada a obra, prestado o serviço, fornecido, alienado ou alugado o bem, podendo ainda a Administração,

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conforme o vulto da licitação, utilizar-se de outros meios de divulgação para ampliar a área de competição. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 1o  O aviso publicado conterá a indicação do local em que os interessados poderão ler e obter o texto integral do edital e todas as informações sobre a licitação. § 2o  O prazo mínimo até o recebimento das propostas ou da realização do evento será: I - quarenta e cinco dias para: (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) a) concurso; (Incluída pela Lei nº 8.883, de 1994) b) concorrência, quando o contrato a ser celebrado contemplar o regime de empreitada integral ou quando a licitação for do tipo "melhor técnica" ou "técnica e preço";(Incluída pela Lei nº 8.883, de 1994) II - trinta dias para: (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) a) concorrência, nos casos não especificados na alínea "b" do inciso anterior; (Incluída pela Lei nº 8.883, de 1994) b) tomada de preços, quando a licitação for do tipo "melhor técnica" ou "técnica e preço"; (Incluída pela Lei nº 8.883, de 1994) III - quinze dias para a tomada de preços, nos casos não especificados na alínea "b" do inciso anterior, ou leilão; (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) IV - cinco dias úteis para convite. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 3o  Os prazos estabelecidos no parágrafo anterior serão contados a partir da última publicação do edital resumido ou da expedição do convite, ou ainda da efetiva disponibilidade do edital ou do convite e respectivos anexos, prevalecendo a data que ocorrer mais tarde. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 4o  Qualquer modificação no edital exige divulgação pela mesma forma que se deu o texto original, reabrindo-se o prazo inicialmente estabelecido, exceto quando, inquestionavelmente, a alteração não afetar a formulação das propostas.

16.3.1 Concorrência

Modalidade utilizada para valores altos: acima de um milhão e quinhentos mil reais para obras ou serviços de engenharia e acima de seiscentos e cinquenta mil reais para outros serviços.

Em algumas situações, a concorrência pode ser modalidade que utiliza como critério a qualidade do objeto: é o caso de aquisição ou alienação de imóvel, salvo o decorrente de decisão judicial ou dação em pagamento, quando se pode utilizar, além da concorrência, o leilão (Lei nº 8.666, art. 19).

É o caso, também, de concessão de direito real de uso de bem público ou de concessão de serviço, salvo se o serviço estiver previsto no Programa Nacional de Desestatização (pode-se utilizar leilão ou concessão); e de licitação internacional, salvo, nesta última hipótese, quando o valor do contrato corresponder ao da modalidade tomada de preços e a Administração possuir cadastro de empresa estrangeira, ou quando o valor corresponder ao da modalidade convite e inexistir fornecedor no país.

Lei nº 8.666/93, art. 19. Os bens imóveis da Administração Pública, cuja aquisição haja derivado de procedimentos judiciais ou de dação em pagamento, poderão ser alienados por ato da autoridade competente, observadas as seguintes regras: I - avaliação dos bens alienáveis; II - comprovação da necessidade ou utilidade da alienação; III - adoção do procedimento licitatório, sob a modalidade de concorrência ou leilão. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)

Aula 12 (6 de junho de 2012)

16.3.2 Tomada de preços

Modalidade utilizada em razão do valor: para obras e serviços de engenharia, valores acima de cento e cinquenta mil reais e até um milhão e quinhentos mil reais; para outras obras e serviços, valores acima de oitenta mil reais até seiscentos e cinquenta mil reais. Fica, pois, entre o valor máximo do convite e o valor mínimo da concorrência.

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É modalidade em que participam licitantes já cadastrados em banco de dados da Administração Pública: é uma habilitação prévia, que dá direito a um certificado de registro cadastral, substitutivo dos documentos habilitatórios previamente entregues.

Também podem participar dessa licitação os licitantes que preencherem os requisitos para o cadastramento até o terceiro dia anterior à data marcada para a entrega dos envelopes. Através de requerimento apresentado nesse prazo, com todos os documentos necessários para o cadastramento, pode o licitante comprovar os requisitos para participar da licitação.

Se o tipo da licitação for técnica ou técnica e preço, o prazo de intervalo mínimo é de trinta dias. Se o tipo de licitação for somente preço, o prazo de intervalo mínimo é de quinze dias. Se o legislador não indica que o prazo é contado em dias úteis, conta-se, sempre, em dias corridos.

Segundo o TCU, as alterações contratuais só podem acontecer dentro do limite de valor da modalidade escolhida. Nesse sentido, se o valor contratual já está próximo do limite superior, deve-se escolher a modalidade mais rigorosa, que dará margem a possíveis alterações contratuais.

16.3.3 Convite

É modalidade de licitação que utiliza o parâmetro valor: para obras e serviços de engenharia, valores de zero até cento e cinquenta mil reais; para outras obras e serviços, de zero até oitenta mil reais.

Podem participar do convite os licitantes convidados, cadastrados ou não, desde que respeitado o número mínimo de três convidados. Se, contudo, o mercado é restrito a menos de três entidades no ramo requerido, pode-se prosseguir com número inferior, desde que devidamente fundamentado. Também assim quando, em que pese convidados três ou mais entidades, somente apareçam duas ou uma.

Podem, ainda, participar da licitação as entidades cadastradas não convidadas que manifestarem interesse em até vinte e quatro horas de antecedência em relação à data designada para a entrega dos envelopes. Quanto ao ponto, dizem os doutrinadores que as entidades não convidadas e não cadastradas poderiam participar cadastrando-se até o terceiro dia anterior da data marcada para a entrega dos envelopes, utilizando-se de regra da tomada de preços.

O instrumento convocatório é a carta-convite, que não precisa ser publicada em diário oficial. Será encaminhada aos convidados e afixada no átrio da repartição. Ademais, o intervalo mínimo é de cinco dias úteis24 (úteis para a repartição, em que ela está funcionando).

Em regra, a comissão de licitação nas diversas modalidades é formada por três servidores. Contudo, na carta-convite, se a repartição possuir poucos servidores, de modo que a afetação de três deles para a comissão de licitação prejudique a continuidade do serviço, pode-se formá-la com apenas um servidor.

Segundo a lei, pode-se trocar a modalidade mais simples pela mais rigorosa, independentemente do valor do contrato. O inverso não é verdadeiro.

Se o valor do contrato for de até dez por cento do convite (quinze ou oito mil reais), pode-se dispensar a licitação.

Lei nº 8.666/93, art. 24. É dispensável a licitação: I - para obras e serviços de engenharia de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso I do artigo anterior, desde que não se refiram a parcelas de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e

24 Este é o primeiro prazo em dias úteis até agora referido.

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concomitantemente; II - para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez; [...].

Tal valor é dobrado (vinte por cento do convite) quando se tratar de empresas públicas, sociedades de economia mista, autarquias e fundações qualificadas como agências executivas e consórcios públicos da Lei nº 11.107/05.

Lei nº 8.666/93, art. 24, parágrafo único: Os percentuais referidos nos incisos I e II do caput deste artigo serão 20% (vinte por cento) para compras, obras e serviços contratados por consórcios públicos, sociedade de economia mista, empresa pública e por autarquia ou fundação qualificadas, na forma da lei, como Agências Executivas.

Os valores-limite das modalidades de licitação serão dobrados em casos de consórcios públicos (Lei nº 11.107/05) formados por até três entes, e triplicados quando possuírem mais de três entes.

Lei nº 8.666/93, art. 23, § 8º: No caso de consórcios públicos, aplicar-se-á o dobro dos valores mencionados no caput deste artigo quando formado por até 3 (três) entes da Federação, e o triplo, quando formado por maior número.

16.3.4 Leilão

É modalidade de licitação que serve para alienação:• de imóveis decorrentes de decisão judicial ou dação em pagamento,

podendo-se, também, utilizar a modalidade concorrência (Lei nº 8.666, art. 19);

• de bens móveis inservíveis (para o ente alienante), apreendidos ou penhorados. O legislador queria falar de bens empenhados (objetos de penhor) e, não, penhorados (objetos de penhora), mesmo porque o juiz não afasta o Código de Processo Civil para aplicar a lei de licitações neste ponto, alienando o bem penhorado através de leilão, o que não faz sentido.25

O intervalo mínimo é de quinze dias (corridos). Ademais, o responsável pelo leilão é o leiloeiro, que, normalmente, é servidor do quadro designado para realizar tal tarefa.

O procedimento do leilão não está na lei de licitações, pois segue a praxe administrativa, sem grandes formalidades.

16.3.5 Concurso

É modalidade que serve para a escolha de trabalho técnico, artístico ou científico, tendo como contrapartida um prêmio ou remuneração. Por isso, difere do concurso público, que tem como objetivo o preenchimento de cargo público.

O prazo de intervalo mínimo é de quarenta e cinco dias (corridos). A comissão do concurso é chamada “especial”, pois não precisa ser formada

por servidores públicos, podendo dela participar pessoa idônea com conhecimento na área.O procedimento do concurso também não está previsto na lei de licitações, mas no

regulamento próprio de cada concurso.

25 Em concursos que transcrevem a lei, deve-se responder bem penhorado. Caso contrário, bem empenhado, que é o correto.

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16.3.6 Pregão

É modalidade de licitação prevista na Lei nº 10.520/02. Contudo, a primeira regulamentação do pregão surgiu na Lei nº 9.472/97, que disciplinou a ANATEL, dispondo que, a partir daquele momento, para as agências reguladoras seria utilizada a modalidade pregão. Após, a MP nº 2.026/00 definiu que o pregão passaria a ser modalidade própria da União. Por fim, a Lei nº 10.520/02 permitiu a modalidade pregão para todos os entes políticos.

Serve para a aquisição de bens e serviços comuns, aqueles que podem ser previstos no edital como expressão usual de mercado (é o Decreto nº 3.555/00 que define os bens e serviços comuns.). No caso do pregão, não interessa o valor. Ademais, como o bem ou serviço é comum, não se utiliza o tipo técnica, mas apenas preço.

O pregão é realizado pelo pregoeiro, que é auxiliado por uma equipe de apoio na construção do certame.

O prazo de intervalo mínimo é de oito dias úteis.Pode o pregão ser presencial ou eletrônico (modalidade preferencial no âmbito

federal).

Somente pregão (oito dias) e convite (cinco dias) têm prazos contados em dias úteis (são os prazos menores).

16.4 Contratação direta

São as hipóteses de dispensa ou inexigibilidade de licitação.Deve ser demonstrada e comprovada, dependendo de processo

administrativo prévio: a contratação direta dispensa licitação, mas não dispensa processo administrativo (processo administrativo de justificação – Lei nº 8.666/93, art. 26).

Lei nº 8.666/93, art. 26. As dispensas previstas nos §§ 2o e 4o do art. 17 e no inciso III e seguintes do art. 24, as situações de inexigibilidade referidas no art. 25, necessariamente justificadas, e o retardamento previsto no final do parágrafo único do art. 8o desta Lei deverão ser comunicados, dentro de 3 (três) dias, à autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de 5 (cinco) dias, como condição para a eficácia dos atos. Parágrafo único.  O processo de dispensa, de inexigibilidade ou de retardamento, previsto neste artigo, será instruído, no que couber, com os seguintes elementos: I - caracterização da situação emergencial ou calamitosa que justifique a dispensa, quando for o caso; II - razão da escolha do fornecedor ou executante; III - justificativa do preço. IV - documento de aprovação dos projetos de pesquisa aos quais os bens serão alocados. 

16.4.1 Dispensa de licitação

Fala-se de dispensa de licitação quando a competição é possível/viável, mas, por determinação da própria lei, em rol taxativo, libera-se essa exigência.

A licitação pode ser dispensada ou dispensável. No primeiro caso, não pode o administrador licitar (Lei nº 8.666/93, art. 17); no segundo, a licitação fica a seu critério (Lei nº 8.666/93, art. 24).

Lei nº 8.666/93, art. 17. A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas: I - quando imóveis, dependerá de autorização legislativa para órgãos da administração direta e entidades autárquicas e fundacionais, e, para todos, inclusive as entidades paraestatais, dependerá de avaliação prévia e de licitação na modalidade de concorrência, dispensada esta nos seguintes casos: a)

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dação em pagamento; b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo, ressalvado o disposto nas alíneas f, h e i; (Redação dada pela Lei nº 11.952, de 2009) c) permuta, por outro imóvel que atenda aos requisitos constantes do inciso X do art. 24 desta Lei; d) investidura; e) venda a outro órgão ou entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo; (Incluída pela Lei nº 8.883, de 1994) f) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis residenciais construídos, destinados ou efetivamente utilizados no âmbito de programas habitacionais ou de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública; (Redação dada pela Lei nº 11.481, de 2007) g) procedimentos de legitimação de posse de que trata o art. 29 da Lei no 6.383, de 7 de dezembro de 1976, mediante iniciativa e deliberação dos órgãos da Administração Pública em cuja competência legal inclua-se tal atribuição; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) h) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis de uso comercial de âmbito local com área de até 250 m² (duzentos e cinqüenta metros quadrados) e inseridos no âmbito de programas de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública; (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007) i) alienação e concessão de direito real de uso, gratuita ou onerosa, de terras públicas rurais da União na Amazônia Legal onde incidam ocupações até o limite de 15 (quinze) módulos fiscais ou 1.500ha (mil e quinhentos hectares), para fins de regularização fundiária, atendidos os requisitos legais; (Incluído pela Lei nº 11.952, de 2009) II - quando móveis, dependerá de avaliação prévia e de licitação, dispensada esta nos seguintes casos: a) doação, permitida exclusivamente para fins e uso de interesse social, após avaliação de sua oportunidade e conveniência sócio-econômica, relativamente à escolha de outra forma de alienação; b) permuta, permitida exclusivamente entre órgãos ou entidades da Administração Pública; c) venda de ações, que poderão ser negociadas em bolsa, observada a legislação específica; d) venda de títulos, na forma da legislação pertinente; e) venda de bens produzidos ou comercializados por órgãos ou entidades da Administração Pública, em virtude de suas finalidades; f) venda de materiais e equipamentos para outros órgãos ou entidades da Administração Pública, sem utilização previsível por quem deles dispõe. § 1o Os imóveis doados com base na alínea "b" do inciso I deste artigo, cessadas as razões que justificaram a sua doação, reverterão ao patrimônio da pessoa jurídica doadora, vedada a sua alienação pelo beneficiário. § 2o A Administração também poderá conceder título de propriedade ou de direito real de uso de imóveis, dispensada licitação, quando o uso destinar-se: (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005) I - a outro órgão ou entidade da Administração Pública, qualquer que seja a localização do imóvel; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) II - a pessoa natural que, nos termos da lei, regulamento ou ato normativo do órgão competente, haja implementado os requisitos mínimos de cultura, ocupação mansa e pacífica e exploração direta sobre área rural situada na Amazônia Legal, superior a 1 (um) módulo fiscal e limitada a 15 (quinze) módulos fiscais, desde que não exceda 1.500ha (mil e quinhentos hectares); (Redação dada pela Lei nº 11.952, de 2009) § 2º-A. As hipóteses do inciso II do § 2o ficam dispensadas de autorização legislativa, porém submetem-se aos seguintes condicionamentos: (Redação dada pela Lei nº 11.952, de 2009) I - aplicação exclusivamente às áreas em que a detenção por particular seja comprovadamente anterior a 1o de dezembro de 2004; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) II - submissão aos demais requisitos e impedimentos do regime legal e administrativo da destinação e da regularização fundiária de terras públicas; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) III - vedação de concessões para hipóteses de exploração não-contempladas na lei agrária, nas leis de destinação de terras públicas, ou

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nas normas legais ou administrativas de zoneamento ecológico-econômico; e (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) IV - previsão de rescisão automática da concessão, dispensada notificação, em caso de declaração de utilidade, ou necessidade pública ou interesse social. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) § 2o-B. A hipótese do inciso II do § 2o deste artigo: (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) I - só se aplica a imóvel situado em zona rural, não sujeito a vedação, impedimento ou inconveniente a sua exploração mediante atividades agropecuárias; (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) II – fica limitada a áreas de até quinze módulos fiscais, desde que não exceda mil e quinhentos hectares, vedada a dispensa de licitação para áreas superiores a esse limite; (Redação dada pela Lei nº 11.763, de 2008) III - pode ser cumulada com o quantitativo de área decorrente da figura prevista na alínea g do inciso I do caput deste artigo, até o limite previsto no inciso II deste parágrafo. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005) IV – (VETADO) (Incluído pela Lei nº 11.763, de 2008) § 3o Entende-se por investidura, para os fins desta lei: (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998) I - a alienação aos proprietários de imóveis lindeiros de área remanescente ou resultante de obra pública, área esta que se tornar inaproveitável isoladamente, por preço nunca inferior ao da avaliação e desde que esse não ultrapasse a 50% (cinqüenta por cento) do valor constante da alínea "a" do inciso II do art. 23 desta lei; (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998) II - a alienação, aos legítimos possuidores diretos ou, na falta destes, ao Poder Público, de imóveis para fins residenciais construídos em núcleos urbanos anexos a usinas hidrelétricas, desde que considerados dispensáveis na fase de operação dessas unidades e não integrem a categoria de bens reversíveis ao final da concessão. (Incluído pela Lei nº 9.648, de 1998) § 4o A doação com encargo será licitada e de seu instrumento constarão, obrigatoriamente os encargos, o prazo de seu cumprimento e cláusula de reversão, sob pena de nulidade do ato, sendo dispensada a licitação no caso de interesse público devidamente justificado; (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 5o Na hipótese do parágrafo anterior, caso o donatário necessite oferecer o imóvel em garantia de financiamento, a cláusula de reversão e demais obrigações serão garantidas por hipoteca em segundo grau em favor do doador. (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994) § 6o Para a venda de bens móveis avaliados, isolada ou globalmente, em quantia não superior ao limite previsto no art. 23, inciso II, alínea "b" desta Lei, a Administração poderá permitir o leilão. (Incluído pela Lei nº 8.883, de 1994) § 7o (VETADO). (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)

Lei nº 8.666/93, art. 24.  É dispensável a licitação: I - para obras e serviços de engenharia de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso I do artigo anterior, desde que não se refiram a parcelas de uma mesma obra ou serviço ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente; II - para outros serviços e compras de valor até 10% (dez por cento) do limite previsto na alínea "a", do inciso II do artigo anterior e para alienações, nos casos previstos nesta Lei, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizada de uma só vez; III - nos casos de guerra ou grave perturbação da ordem; IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos; V - quando não acudirem interessados à licitação anterior e esta, justificadamente, não puder ser repetida sem prejuízo para a Administração, mantidas, neste caso, todas as

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condições preestabelecidas; VI - quando a União tiver que intervir no domínio econômico para regular preços ou normalizar o abastecimento; VII - quando as propostas apresentadas consignarem preços manifestamente superiores aos praticados no mercado nacional, ou forem incompatíveis com os fixados pelos órgãos oficiais competentes, casos em que, observado o parágrafo único do art. 48 desta Lei e, persistindo a situação, será admitida a adjudicação direta dos bens ou serviços, por valor não superior ao constante do registro de preços, ou dos serviços; VIII - para a aquisição, por pessoa jurídica de Direito Público interno, de bens produzidos ou serviços prestados por órgão ou entidade que integre a Administração Pública e que tenha sido criado para esse fim específico em data anterior à vigência desta Lei, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado; IX - quando houver possibilidade de comprometimento da segurança nacional, nos casos estabelecidos em decreto do Presidente da República, ouvido o Conselho de Defesa Nacional; X - para a compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das finalidades precípuas da administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia; XI - na contratação de remanescente de obra, serviço ou fornecimento, em conseqüência de rescisão contratual, desde que atendida a ordem de classificação da licitação anterior e aceitas as mesmas condições oferecidas pelo licitante vencedor, inclusive quanto ao preço, devidamente corrigido; XII - nas compras de hortifrutigranjeiros, pão e outros gêneros perecíveis, no tempo necessário para a realização dos processos licitatórios correspondentes, realizadas diretamente com base no preço do dia; XIII - na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos; XIV - para a aquisição de bens ou serviços nos termos de acordo internacional específico aprovado pelo Congresso Nacional, quando as condições ofertadas forem manifestamente vantajosas para o Poder Público; XV - para a aquisição ou restauração de obras de arte e objetos históricos, de autenticidade certificada, desde que compatíveis ou inerentes às finalidades do órgão ou entidade. XVI - para a impressão dos diários oficiais, de formulários padronizados de uso da administração, e de edições técnicas oficiais, bem como para prestação de serviços de informática a pessoa jurídica de Direito Público interno, por órgãos ou entidades que integrem a Administração Pública, criados para esse fim específico; XVII - para a aquisição de componentes ou peças de origem nacional ou estrangeira, necessários à manutenção de equipamentos durante o período de garantia técnica, junto ao fornecedor original desses equipamentos, quando tal condição de exclusividade for indispensável para a vigência da garantia; XVIII - nas compras ou contratações de serviços para o abastecimento de navios, embarcações, unidades aéreas ou tropas e seus meios de deslocamento quando em estada eventual de curta duração em portos, aeroportos ou localidades diferentes de suas sedes, por motivo de movimentação operacional ou de adestramento, quando a exiguidade dos prazos legais puder comprometer a normalidade e os propósitos das operações e desde que seu valor não exceda ao limite previsto na alínea "a" do incico II do art. 23 desta Lei: XIX - para as compras de material de uso pelas Forças Armadas, com exceção de materiais de uso pessoal e administrativo, quando houver necessidade de manter a padronização requerida pela estrutura de apoio logístico dos meios navais, aéreos e terrestres, mediante parecer de comissão instituída por decreto; XX - na contratação de associação de portadores de deficiência física, sem fins lucrativos e de comprovada idoneidade, por órgãos ou entidades da Admininistração Pública, para a prestação de serviços ou fornecimento de mão-de-obra, desde que o preço contratado seja compatível com o

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praticado no mercado. XXI - para a aquisição de bens e insumos destinados exclusivamente à pesquisa científica e tecnológica com recursos concedidos pela Capes, pela Finep, pelo CNPq ou por outras instituições de fomento a pesquisa credenciadas pelo CNPq para esse fim específico; XXII - na contratação de fornecimento ou suprimento de energia elétrica e gás natural com concessionário, permissionário ou autorizado, segundo as normas da legislação específica; XXIII - na contratação realizada por empresa pública ou sociedade de economia mista com suas subsidiárias e controladas, para a aquisição ou alienação de bens, prestação ou obtenção de serviços, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado. XXIV - para a celebração de contratos de prestação de serviços com as organizações sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de gestão. XXV - na contratação realizada por Instituição Científica e Tecnológica - ICT ou por agência de fomento para a transferência de tecnologia e para o licenciamento de direito de uso ou de exploração de criação protegida. XXVI – na celebração de contrato de programa com ente da Federação ou com entidade de sua administração indireta, para a prestação de serviços públicos de forma associada nos termos do autorizado em contrato de consórcio público ou em convênio de cooperação. XXVII - na contratação da coleta, processamento e comercialização de resíduos sólidos urbanos recicláveis ou reutilizáveis, em áreas com sistema de coleta seletiva de lixo, efetuados por associações ou cooperativas formadas exclusivamente por pessoas físicas de baixa renda reconhecidas pelo poder público como catadores de materiais recicláveis, com o uso de equipamentos compatíveis com as normas técnicas, ambientais e de saúde pública. XXVIII – para o fornecimento de bens e serviços, produzidos ou prestados no País, que envolvam, cumulativamente, alta complexidade tecnológica e defesa nacional, mediante parecer de comissão especialmente designada pela autoridade máxima do órgão. XXIX – na aquisição de bens e contratação de serviços para atender aos contingentes militares das Forças Singulares brasileiras empregadas em operações de paz no exterior, necessariamente justificadas quanto ao preço e à escolha do fornecedor ou executante e ratificadas pelo Comandante da Força. XXX - na contratação de instituição ou organização, pública ou privada, com ou sem fins lucrativos, para a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural no âmbito do Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária, instituído por lei federal. XXXI - nas contratações visando ao cumprimento do disposto nos arts. 3o, 4o, 5o e 20 da Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004, observados os princípios gerais de contratação dela constantes. Parágrafo único. Os percentuais referidos nos incisos I e II do caput deste artigo serão 20% (vinte por cento) para compras, obras e serviços contratados por consórcios públicos, sociedade de economia mista, empresa pública e por autarquia ou fundação qualificadas, na forma da lei, como Agências Executivas. 

É vedado o fracionamento de despesas, a fim de conseguir dispensa em casos que podem ser abarcados em alguma modalidade de licitação (Lei nº 8.666/93, art. 23, § 5º). Caracteriza improbidade administrativa.

16.4.2 Inexigibilidade de licitação

Ocorre quando a competição é inviável. É prevista no art. 25 da Lei de Licitações, que traz rol exemplificativo.

Lei nº 8.666/93, art. 25.  É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial: I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou

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representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes; II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública. § 1o Considera-se de notória especialização o profissional ou empresa cujo conceito no campo de sua especialidade, decorrente de desempenho anterior, estudos, experiências, publicações, organização, aparelhamento, equipe técnica, ou de outros requisitos relacionados com suas atividades, permita inferir que o seu trabalho é essencial e indiscutivelmente o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato. § 2o Na hipótese deste artigo e em qualquer dos casos de dispensa, se comprovado superfaturamento, respondem solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o fornecedor ou o prestador de serviços e o agente público responsável, sem prejuízo de outras sanções legais cabíveis.

Lembre-se que a inviabilidade da competição dá-se quando (i) o objeto ou o serviço é singular; (ii) quando a própria licitação prejudica o interesse público (ausência de pressuposto jurídico)26; (iii) ou quando falta interesse do mercado (ausência de pressuposto fático).

O objeto singular em caráter absoluto ocorre quando existe ele e somente ele, pois não houve produção em série. O objeto singular em caráter pessoal é o caso da pintura etc., em que há expressão da emoção do artista. Há, ainda, objeto singular que é assim classificado porque se destacou de alguma maneira (ex: capacete da última corrida de Ayrton Senna).

O serviço é singular não por que o fornecedor o presta de modo especial, mas por que: (i) está na lista do art. 13 da Lei de Licitações; (ii) há grande relevância para o Estado; (iii) há notória especialização do fornecedor (se o mercado reconhece mais de um, a escolha será feita pelo administrador).

Lei nº 8.666/93, art. 13. Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a: I - estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos; II - pareceres, perícias e avaliações em geral; III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias; IV - fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços; V - patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas; VI - treinamento e aperfeiçoamento de pessoal; VII - restauração de obras de arte e bens de valor histórico. VIII - (Vetado). § 1o Ressalvados os casos de inexigibilidade de licitação, os contratos para a prestação de serviços técnicos profissionais especializados deverão, preferencialmente, ser celebrados mediante a realização de concurso, com estipulação prévia de prêmio ou remuneração. § 2o Aos serviços técnicos previstos neste artigo aplica-se, no que couber, o disposto no art. 111 desta Lei. § 3o A empresa de prestação de serviços técnicos especializados que apresente relação de integrantes de seu corpo técnico em procedimento licitatório ou como elemento de justificação de dispensa ou inexigibilidade de licitação, ficará obrigada a garantir que os referidos integrantes realizem pessoal e diretamente os serviços objeto do contrato.

16.5 Procedimento licitatório

26 Por isso é inexigível licitação para atividade-fim de empresa pública ou sociedade de economia mista.

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16.5.1 Concorrência, tomada de preços e convite

16.5.1.1 Fase interna

Inicia-se com a formalização do processo, mediante autuação. Em seguida, demonstra-se a necessidade do serviço, obra, objeto etc. a ser contratado. Reserva-se, após, o recurso orçamentário para a contratação.27

Nomeia-se a comissão de licitação (Lei nº 8.666/93, art. 51). Após, a comissão elabora o edital (Lei nº 8.666/93, art. 40), com a minuta do contrato. O edital é submetido a parecer jurídico. Em seguida, submete-se o edital à autorização da chefia para publicação.

Aula 13 (12 de junho de 2012)

16.5.1.2 Fase externa

Inicia-se com a publicação do edital, que deve ser realizada, no mínimo, duas vezes em jornal oficial e uma vez em jornal de grande circulação (Lei nº 8.666/93, art. 21). A título de custas ou emolumentos, só se pode cobrar, pelo edital, valor referente ao custo da reprodução. Ademais, a obtenção do edital não é condicionante à participação na licitação.

A impugnação ao edital (Lei nº 8.666/93, art. 41) só pode ser realizada por cidadão (e, não, por qualquer pessoa) ou por potencial licitante (ex: empresa). O cidadão tem até o quinto dia útil anterior à data designada de entrega dos envelopes para impugnar o edital; o potencial licitante tem até o segundo dia útil anterior à data de entrega dos envelopes (prazos decadenciais). A comissão, no caso de impugnação por cidadão, deve realizar o julgamento da impugnação em três dias úteis; no caso de impugnação por potencial licitante, não há prazo.

A impugnação não possui natureza de recurso, não havendo efeito suspensivo: o processo licitatório segue normalmente. No caso de reconhecimento do erro pela Administração, deve ela alterar o edital por meio de aditamento, que deve ser publicado (só o aditamento) nos mesmos moldes do edital. Atente-se a que, se a alteração do edital importar criação, modificação ou extinção de obrigação, deve a Administração reabrir o prazo de intervalo mínimo.

Fase de recebimento dos envelopes: se o tipo da licitação for somente técnica ou somente preço, haverá dois envelopes, um com os documentos da empresa e outro com a proposta; se o tipo da licitação for técnica e preço, haverá três envelopes, um com os documentos da empresa, outro com a proposta técnica e outro com a proposta de preço.

Qualquer pessoa pode entregar os envelopes, desde que no momento do recebimento, ainda que este tenha atrasado: enquanto a comissão não declarar o fechamento, pode-se ainda entregar a proposta. Ademais, todos os envelopes, de todos os licitantes, devem ser rubricados por todos os membros da comissão e todos os demais licitantes (Lei nº 8.666/93, art. 43, § 2º). Quanto a este último ponto, contudo, a jurisprudência tem entendido que três licitantes podem ser escolhidos para rubricar em nome dos demais, se houver acordo entre todos quanto a isso.

Fase de habilitação ou qualificação: todos os documentos devem ser assinados por todos os membros da comissão e todos os licitantes (Lei nº 8.666/93, art. 43, § 2º). Após, analisam-se os documentos, que devem seguir o rol taxativo do art. 27 da Lei de Licitações (habilitação jurídica, qualificação técnica, qualificação econômico-financeira, regularidade fiscal e trabalhista, não haver trabalho de menor).

27 Essa reserva dá-se sobre a previsão do dinheiro que ainda será arrecadado. Se a previsão não se realizar, haverá atraso na contratação. Outras hipóteses de atraso é o desvio criminoso do recurso reservado ou a previsão falsa de arrecadação.

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No caso de todos os licitantes restarem inabilitados, aplica-se o disposto no art. 48, § 3º da Lei: suspensão da licitação e abertura do prazo de oitos dias úteis (concorrência e tomada de preços) ou três dias úteis (convite) para a complementação dos documentos. No caso da empresa que preencher todos os requisitos, estará ela habilitada/qualificada; se alguma empresa não preencher os requisitos, estará inabilitada/desqualificada. Se, mesmo com a abertura do novo prazo, todos continuarem inabilitados, deve-se abrir nova licitação.

Do julgamento da habilitação, abre-se a possibilidade de recurso, observando-se o art. 109 da Lei de Licitações: prazo de cinco dias úteis, salvo no caso do convite, cujo prazo é de dois dias úteis. Terá o recurso efeito suspensivo.

Fase de classificação e julgamento: a classificação é a verificação das formalidades da proposta e da compatibilidade do preço com o valor de mercado. Se todos os licitantes forem desclassificados, realiza-se a diligência do art. 48, § 3º da Lei de Licitações. Persistindo a desclassificação total (licitação fracassada)28, pode a Administração contratar diretamente, com dispensa de licitação.

Na hipótese de classificação de licitantes, segue-se a etapa de julgamento, selecionando-se a melhor proposta. Em caso de empate, observa-se o disposto na Lei nº 8.666/93, art. 3º, § 2º29. Persistindo o empate, utiliza-se do sorteio, que deve ser descrito em ata (Lei nº 8.666/93, art. 45). Após o julgamento, procede-se a nova classificação, pondo em ordem os licitantes, de acordo com a proposta. Abre-se a possibilidade de recurso (Lei nº 8.666/93, art. 109).

Fase de homologação: é a verificação de regularidade do processo pela autoridade superior, não participante da comissão de licitação. Existindo alguma ilegalidade, anula-se o processo.

Fase de adjudicação: declara o resultado final e dá ao licitante o status de vencedor. Tal status gera mera expectativa de fechar o contrato com a Administração. Possui, contudo, a garantia de não ser preterido. Todavia, o vencedor tem a obrigação de assinar o contrato, vinculado à sua proposta, se assim quiser a Administração. Desobedecendo tal obrigação, deve o licitante ser penalizado (Lei nº 8.666/93, art. 87). Haverá tal obrigação até sessenta dias da data em que enviar sua proposta, salvo se o edital estabelecer outro prazo (Lei nº 8.666/93, art. 64, § 3º).

Não querendo o vencedor assinar o contrato, os demais colocados, na ordem de classificação, serão chamados a assinar o contrato nos moldes da proposta vencedora, sem que haja obrigatoriedade, por óbvio. Não havendo licitantes para assinar o contrato, inicia-se nova licitação.

16.5.2 Pregão

A formalização do processo segue a regra supra. Também a publicação é realizada da mesma maneira já vista. No caso do pregão, haverá o recebimento de dois envelopes: um com os documentos da empresa e outro com a proposta.

Após, ocorre a inversão do procedimento: primeiro abre-se os envelopes com as propostas (fase de classificação e julgamento); depois, os envelopes com os documentos (fase de habilitação).

Na fase de classificação e julgamento existem duas subetapas: (i) análise das propostas escritas contidas nos envelopes, selecionando-se a melhor e todas as demais que não excedam dez por cento da melhor (não havendo mais de três, ignora-se o percentual e escolhe-se, além da melhor, as outras três melhores); (ii) lances verbais.

28 É diferente da licitação deserta, quando ninguém se interessa pelo edital. Neste caso, só haverá dispensa de licitação quando houver prejuízo à Administração.29 § 2o Em igualdade de condições, como critério de desempate, será assegurada preferência, sucessivamente, aos bens e serviços: I - (Revogado pela Lei nº 12.349, de 2010) II - produzidos no País; III - produzidos ou prestados por empresas brasileiras. IV - produzidos ou prestados por empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no País. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)

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Na fase de habilitação, analisam-se os documentos apenas da empresa vencedora. Aqui abre-se a possibilidade de recurso, que deve ser apresentado no momento, com juntada das razões em até três dias.

Após, segue-se a fase de adjudicação e, depois, de homologação. Na prática, adjudica-se e homologa-se ao mesmo tempo.

E se a empresa vencedora nas propostas for inabilitada? Será chamada a segunda colocada, com o seu próprio preço, e não com o preço da primeira colocada.

17 CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

Contrato administrativo difere de contrato da Administração. O contrato da Administração é aquele de que a Administração faz parte, mas que possui regime de Direito Privado. O contrato administrativo é o vínculo jurídico em que sujeito ativo e sujeito passivo comprometem-se a prestação e contraprestação, havendo a participação do Estado, com satisfação do interesse público, sob regime de Direito Público.

17.1 Características do contrato administrativo

Presença obrigatória da Administração; formalidade; consensualidade; comutatividade; personalismo; adesionismo.

A Administração deve estar presente em um dos polos do contrato, que apresentará formalidades específicas, aperfeiçoando-se no momento em que se manifesta a vontade (diferentemente do contrato real, que depende da entrega do bem)30. Ademais, prestação e contraprestação são equivalentes e predeterminadas, diferentemente do contrato aleatório, em que pode não haver equilíbrio ou predeterminação.

No mais, o contrato é personalíssimo porque leva em consideração as qualidades do contratado. A doutrina não aceita a subcontratação (sob o argumento de violação ao personalismo, ao dever de licitar e ao princípio da isonomia), mas a lei a permite, desde que (i) prevista no edital ou contrato e (ii) anuída pela Administração, com base no preenchimento dos requisitos exigidos na licitação. Demais disso, a subcontratação total é vedada: somente parte do contrato pode ser subcontratada. A subcontratação fora das exigências legais é causa de rescisão.

O contrato administrativo é contrato de adesão, significando dizer que uma das partes do contrato – a Administração – possui o monopólio da situação. Não há discussão de cláusula contratual.

17.2 Formalidades do contrato administrativo

• Exigência de licitação prévia: no caso de inexigibilidade ou dispensa, deve-se realizar processo de justificação para a contratação direta.

• Forma escrita: excepcionalmente, o contrato pode ser verbal, quando houver pronta entrega, pronto pagamento e limite de quatro mil reais (Lei nº 8.666/93, art. 60, parágrafo único).

• Publicação do contrato (Lei nº 8.666/93, art. 61, parágrafo único): é realizada pela Administração como condição de eficácia do contrato. Contrato não publicado é válido, mas ineficaz. Da data da assinatura do contrato, deve a Administração publicá-lo em até vinte dias, não podendo ultrapassar o quinto dia útil do mês seguinte ao da assinatura, mesmo antes dos vinte dias. O que se publica é o extrato do contrato, e, não, a sua íntegra.

• Instrumento de contrato (Lei nº 8.666/93, art. 62): o instrumento de contrato, que é o documento que detalha a relação contratual, é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de preços, bem

30 Nos contratos consensuais, a entrega do bem é mera execução.

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como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais (valor limite do convite) em que a Administração puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço. Se o valor for o do convite, mas a complexidade da relação não permitir que se faça de outra maneira, não haverá facultatividade de instrumento de contrato.

17.3 Cláusulas do contrato administrativo

As cláusulas necessárias ou essenciais estão dispostas no rol do art. 55 da Lei de Licitações. As cláusulas exorbitantes estão previstas no art. 5831 da Lei: são aquelas que extrapolam o comum dos contratos, dando à Administração prerrogativas, condição de desigualdade.

17.3.1 Cláusulas necessárias

Dentre as cláusulas necessárias, está a previsão de garantia e duração do contrato. No tocante à primeira (Lei nº 8.666/93, art. 56), deve a Administração exigi-la (a garantia), em que pese o teor literal da lei. Ainda, no que diz respeito à forma de prestar a garantia, a decisão é do contratado, dentre as opções da lei: caução em dinheiro, títulos da dívida pública, fiança bancária, seguro-garantia.

O valor da garantia é de até cinco por cento do valor do contrato: excepcionalmente, essa garantia pode chegar até dez por cento, se o contrato for de alta complexidade, de risco financeiro para o Estado ou de grande vulto.

Relativamente à cláusula (necessária) de duração do contrato (Lei nº 8.666/93, art. 57), veda o contrato com prazo indeterminado. O máximo de duração do contrato é o prazo do crédito orçamentário, contido na lei orçamentária anual: isto é, o prazo máximo é de doze meses.

Resguardam-se, contudo, os casos de objeto previsto no plano plurianual (definição de metas e ações do governo durante quatro anos), em que o prazo pode ultrapassar a duração do crédito orçamentário anual, chegando até os quatro anos do PPA. Também configura exceção a hipótese dos contratos de prestação contínua, que podem durar até sessenta meses, prorrogáveis por mais doze meses, em caso de excepcional interesse público.

Outra exceção é o aluguel de equipamentos e programas de informática, em que o contrato pode atingir quarenta e oito meses. Ainda, certos contratos podem durar até cento e vinte meses: é a hipótese de alguns incisos do art. 24 da Lei de Licitações. Por fim, fora do art. 57 da Lei nº 8.666/93, há exceções em leis específicas de serviços de concessionárias e permissionárias, além do caso de contrato sem desembolso pela Administração (neste caso, não há preocupação com a lei orçamentária).

17.3.2 Cláusulas exorbitantes

Lei nº 8.666/93, art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de: I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado; II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei; III - fiscalizar-lhes a execução; IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste; V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de

31 Decorar.

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acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo. § 1o  As cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos administrativos não poderão ser alteradas sem prévia concordância do contratado. § 2o Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual.

Lei nº 8.666/93Art. 78. Constituem motivo para rescisão do contrato: I - o não cumprimento de cláusulas contratuais, especificações, projetos ou prazos; II - o cumprimento irregular de cláusulas contratuais, especificações, projetos e prazos; III - a lentidão do seu cumprimento, levando a Administração a comprovar a impossibilidade da conclusão da obra, do serviço ou do fornecimento, nos prazos estipulados; IV - o atraso injustificado no início da obra, serviço ou fornecimento; V - a paralisação da obra, do serviço ou do fornecimento, sem justa causa e prévia comunicação à Administração; VI - a subcontratação total ou parcial do seu objeto, a associação do contratado com outrem, a cessão ou transferência, total ou parcial, bem como a fusão, cisão ou incorporação, não admitidas no edital e no contrato; VII - o desatendimento das determinações regulares da autoridade designada para acompanhar e fiscalizar a sua execução, assim como as de seus superiores; VIII - o cometimento reiterado de faltas na sua execução, anotadas na forma do § 1o do art. 67 desta Lei; IX - a decretação de falência ou a instauração de insolvência civil; X - a dissolução da sociedade ou o falecimento do contratado; XI - a alteração social ou a modificação da finalidade ou da estrutura da empresa, que prejudique a execução do contrato; XII - razões de interesse público, de alta relevância e amplo conhecimento, justificadas e determinadas pela máxima autoridade da esfera administrativa a que está subordinado o contratante e exaradas no processo administrativo a que se refere o contrato; XIII - a supressão, por parte da Administração, de obras, serviços ou compras, acarretando modificação do valor inicial do contrato além do limite permitido no § 1o do art. 65 desta Lei; XIV - a suspensão de sua execução, por ordem escrita da Administração, por prazo superior a 120 (cento e vinte) dias, salvo em caso de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra, ou ainda por repetidas suspensões que totalizem o mesmo prazo, independentemente do pagamento obrigatório de indenizações pelas sucessivas e contratualmente imprevistas desmobilizações e mobilizações e outras previstas, assegurado ao contratado, nesses casos, o direito de optar pela suspensão do cumprimento das obrigações assumidas até que seja normalizada a situação; XV - o atraso superior a 90 (noventa) dias dos pagamentos devidos pela Administração decorrentes de obras, serviços ou fornecimento, ou parcelas destes, já recebidos ou executados, salvo em caso de calamidade pública, grave perturbação da ordem interna ou guerra, assegurado ao contratado o direito de optar pela suspensão do cumprimento de suas obrigações até que seja normalizada a situação; XVI - a não liberação, por parte da Administração, de área, local ou objeto para execução de obra, serviço ou fornecimento, nos prazos contratuais, bem como das fontes de materiais naturais especificadas no projeto; XVII - a ocorrência de caso fortuito ou de força maior, regularmente comprovada, impeditiva da execução do contrato. Parágrafo único. Os casos de rescisão contratual serão formalmente motivados nos autos do processo, assegurado o contraditório e a ampla defesa. XVIII – descumprimento do disposto no inciso V do art. 27, sem prejuízo das sanções penais cabíveis. (Incluído pela Lei nº 9.854, de 1999)Art. 79. A rescisão do contrato poderá ser: I - determinada por ato unilateral e escrito da Administração, nos casos enumerados nos incisos I a XII e XVII do artigo anterior; II - amigável, por acordo entre as partes, reduzida a termo no processo da licitação, desde que haja conveniência para a Administração; III - judicial, nos termos da legislação; IV - (Vetado).

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(Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 1o A rescisão administrativa ou amigável deverá ser precedida de autorização escrita e fundamentada da autoridade competente. § 2o Quando a rescisão ocorrer com base nos incisos XII a XVII do artigo anterior, sem que haja culpa do contratado, será este ressarcido dos prejuízos regularmente comprovados que houver sofrido, tendo ainda direito a: I - devolução de garantia; II - pagamentos devidos pela execução do contrato até a data da rescisão; III - pagamento do custo da desmobilização. § 3º (Vetado).(Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 4º (Vetado).(Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994) § 5o Ocorrendo impedimento, paralisação ou sustação do contrato, o cronograma de execução será prorrogado automaticamente por igual tempo.

É dever da Administração fiscalizar a execução do contrato, e, não, mera faculdade. No caso da aplicação de sanções, deve-se observar o art. 87 da Lei de Licitações: advertência; multa, cujo valor irá depender da previsão do contrato; suspensão de contratar com o ente que aplicou a pena pelo prazo de até dois anos; declaração de inidoneidade, o que impede eventual contratação em relação a todos os entes públicos.

Para haver reabilitação da empresa, deve-se ultrapassar o prazo de dois anos e cumprir a obrigação de indenizar. A declaração de inidoneidade, por ser uma penalidade muito grave, segundo a doutrina, só deve ser aplicada em casos de conduta considerada crime contra a licitação.

Ocupação provisória de bens da contratada: aparece quando da rescisão do contrato administrativo, via processo administrativo (para dar à empresa o direito de se defender). Enquanto o processo administrativo estiver em curso, para que o serviço público não deixe de ser prestado, a Administração poderá prestar o serviço contratado.

Se a administração não tiver bens para a prestação do serviço, ela poderá ocupar provisoriamente os bens da contratada. Se houver a confirmação da rescisão do contrato após o processo administrativo, os bens ocupados provisoriamente poderão ser adquiridos pela Administração através do instituto da reversão. Só serão passíveis de ocupação e reversão os bens ligados à continuidade do serviço.

A indenização na ocupação e na reversão dependerá da previsão do contrato (é possível a indenização conforme a previsão do contrato).

Aula 14 (15 de junho de 2012)

A exceptio non adimpleti contractus é aplicável aos contratos administrativos? Sim, mas de forma diferenciada. Se a Administração não cumprir a sua parte dentro de noventa dias, a empresa não pode alegar a exceção, devendo manter o serviço (Lei nº 8.666/93, art. 78, XV). Tal exigência decorre do princípio da continuidade do serviço público.

Findo o prazo de noventa dias, a empresa poderá suspender o serviço, aplicando, a partir daí, a exceção do contrato não cumprido. Haverá, após noventa dias, não uma rescisão do contrato, mas sim uma suspensão. Para rescindir o contrato, a empresa deve ir à via jurisdicional.

Por tudo, a presença da exceptio em um contrato não significa ser ela cláusula exorbitante, pois pode constar de contratos comuns.

Alteração dos contratos administrativos (Lei nº 8.666/93, art. 65): a alteração unilateral é que se configura cláusula exorbitante: tal alteração contratual é vista com restrições, pois, dependendo da alteração, a Administração pode comprometer o dever de licitar.

A alteração contratual não pode ser uma fraude ao dever de licitar. A alteração contratual jamais poderá atingir a natureza do objeto do contrato (ex: contrato celebrado pela Administração para prestação de serviço de coleta de lixo por particular não pode ser modificado para tornar-se prestação de merenda escolar ou prestação de energia).

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Hipóteses de alteração unilateral: (i) alteração das especificações do projeto (alteração qualitativa); (ii) alteração quantitativa do objeto (que irá alterar o valor do contrato). O aumento quantitativo não pode fugir do valor unitário fixado no contrato (ex: se a Administração precisar de mais computadores, a empresa assume o risco de ter que prestar mais computadores pelo mesmo preço). Pode haver modificação unilateral da obrigação de prestação em até mais vinte e cinco por cento de acréscimo ou supressão (exceção: em caso de reforma, os acréscimos poderão chegar a cinquenta por cento).

Administração e contratado podem, ainda, de forma bilateral, modificar o contrato administrativo. Alteração bilateral não é cláusula exorbitante, pois pode estar presente nos contratos comuns: (i) regime de execução: é o planejamento da execução do contrato, ou seja, a definição de como será cumprido o contrato; (ii) substituição da garantia (as partes podem, de comum acordo, decidir pela substituição da garantia; (iii) forma de pagamento, que, contudo, nunca pode ser realizado antes do recebimento do objeto.

Equilíbrio econômico-financeiro do contrato: no momento em que se celebra o

contrato, constitui-se o equilíbrio econômico-financeiro. Para se arguir desequilíbrio contratual, é preciso alteração nas condições que existiam à época do contrato.

Teoria da imprevisãoVisa à alteração para recomposição do equilíbrio-econômico financeiro do

contrato. É o que permite tal recomposição. A imprevisão pode ser causa de rescisão do contrato sem culpa, quando a parte prejudicada não puder cumprir de nenhum modo as obrigações contratuais, ou de revisão contratual, quando o cumprimento ainda for possível. Para a sua aplicação, há que se ter a mudança do contexto da celebração do contrato (existência de fato novo imprevisto ou imprevisível).

Pode gerar recomposição de preço (custos), que é a alteração não prevista no contrato (decorre da imprevisão). Difere do reajustamento de preços na medida em que este é a alteração de custos já prevista no contrato (ex: empresa de transportes urbanos que prevê no contrato o aumento do valor do serviço todo mês de janeiro, por saber que neste mês há dissídio coletivo dos motoristas). Ambos diferem da correção monetária, em que não há alteração de custo.

Hipóteses:• Fato do príncipe: decorre da atuação do Poder Público, geral e

abstrata, que vai atingir o contrato de forma indireta e reflexa (ex: empresa de coleta de lixo que recolhe ISS com alíquota de 2% – no decorrer do contrato, a administração aumenta a alíquota para 5%).

• Fato da Administração: é uma atuação específica do Poder Público que vai atingir o contrato administrativo de forma direta (ex: desapropriação da área de execução do contrato).

• Interferências imprevistas: é a situação que já existe ao tempo da celebração do contrato, mas que só foi possível descobri-la quando da execução (ex: diversidade do solo).

• Caso fortuito e força maior: há autores que falam apenas em caso fortuito, outros falam apenas em força maior.

17.4 Extinção contratual

A extinção normal do contrato dá-se pela conclusão do seu objeto. A segunda hipótese normal é a extinção pelo advento do termo contratual.

Situações não normais são: (i) rescisão administrativa, realizada pela Administração de forma unilateral (cláusula exorbitante), podendo ocorrer em razão de interesse público (com dever de indenizar por parte da Administração)32 ou por descumprimento do contrato

32 Quando o contrato for de concessão, essa hipótese ganha o nome de encampação.

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por parte do particular (com dever de indenizar)33; (ii) rescisão consensual, que decorre de acordo amigável entre as partes; (iii) rescisão judicial, hipótese em que o contratado quer a rescisão, mas esta não interessa à Administração (não pode o particular rescindir unilateralmente, devendo procurar o Judiciário); (iv) rescisão de pleno direito, decorrente de circunstâncias estranhas à vontade das partes; (v) anulação, decorrente de ilegalidade.

18 SERVIÇO PÚBLICO

É a atividade estatal (na forma de obrigação) que visa a satisfazer utilidade ou comodidade material da coletividade em geral, variando de acordo com a necessidade histórica. Apesar de sua face coletiva, é fruível singularmente (cada administrado o faz a seu modo).

A prestação do serviço público pode ser realizada de forma direta ou indireta. Na primeira hipótese, o regime é totalmente público; na segunda, apenas parcialmente público, uma vez que há participação da iniciativa privada. Diz-se, pois, que o regime é de Direito Público, total ou parcial.

Elementos do serviço público: (i) substrato material (utilidade/comodidade; relevância geral; assunção pelo Estado); (ii) traço formal (regime jurídico público, total ou parcial).

18.1 Princípios do serviço público

Há divergência doutrinária quanto ao tema. Todos os princípios gerais de Direito Administrativo servem ao tema em questão (isonomia, eficiência etc). Ademais, o serviço público está sujeito aos princípios da (i) continuidade (não deve ser interrompido), (ii) generalidade (prestação para todos), (iii) segurança (não deve por em risco a integridade do administrado), (iv) atualidade (deve utilizar as técnicas e tecnologias mais modernas), (v) modicidade (tarifas mais baixas possíveis), (vi) cortesia (urbanidade no tratamento do administrado).

Lei nº 8.987/95Art. 6o Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato. § 1o Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas. § 2o A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço. § 3o Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando: I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e, II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.Art. 7º. Sem prejuízo do disposto na Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990, são direitos e obrigações dos usuários: I - receber serviço adequado; II - receber do poder concedente e da concessionária informações para a defesa de interesses individuais ou coletivos; III - obter e utilizar o serviço, com liberdade de escolha entre vários prestadores de serviços, quando for o caso, observadas as normas do poder concedente. (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998) IV - levar ao conhecimento do poder público e da concessionária as irregularidades de que tenham conhecimento, referentes ao serviço prestado; V - comunicar às autoridades competentes os atos ilícitos praticados pela concessionária na prestação do serviço; VI - contribuir para a permanência das boas condições dos bens públicos através dos quais lhes são prestados os serviços.

33 Quando o contrato for de concessão, essa hipótese ganha o nome de caducidade.

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Art. 7º-A. As concessionárias de serviços públicos, de direito público e privado, nos Estados e no Distrito Federal, são obrigadas a oferecer ao consumidor e ao usuário, dentro do mês de vencimento, o mínimo de seis datas opcionais para escolherem os dias de vencimento de seus débitos. (Incluído pela Lei nº 9.791, de 1999) Parágrafo único. (VETADO) (Incluído pela Lei nº 9.791, de 1999)Art. 8o (VETADO)Art. 9o A tarifa do serviço público concedido será fixada pelo preço da proposta vencedora da licitação e preservada pelas regras de revisão previstas nesta Lei, no edital e no contrato. § 1o A tarifa não será subordinada à legislação específica anterior e somente nos casos expressamente previstos em lei, sua cobrança poderá ser condicionada à existência de serviço público alternativo e gratuito para o usuário. (Redação dada pela Lei nº 9.648, de 1998) § 2o Os contratos poderão prever mecanismos de revisão das tarifas, a fim de manter-se o equilíbrio econômico-financeiro. § 3o Ressalvados os impostos sobre a renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa, para mais ou para menos, conforme o caso. § 4o Em havendo alteração unilateral do contrato que afete o seu inicial equilíbrio econômico-financeiro, o poder concedente deverá restabelecê-lo, concomitantemente à alteração.Art. 10. Sempre que forem atendidas as condições do contrato, considera-se mantido seu equilíbrio econômico-financeiro.Art. 11. No atendimento às peculiaridades de cada serviço público, poderá o poder concedente prever, em favor da concessionária, no edital de licitação, a possibilidade de outras fontes provenientes de receitas alternativas, complementares, acessórias ou de projetos associados, com ou sem exclusividade, com vistas a favorecer a modicidade das tarifas, observado o disposto no art. 17 desta Lei. Parágrafo único. As fontes de receita previstas neste artigo serão obrigatoriamente consideradas para a aferição do inicial equilíbrio econômico-financeiro do contrato.Art. 12. (VETADO)Art. 13. As tarifas poderão ser diferenciadas em função das características técnicas e dos custos específicos provenientes do atendimento aos distintos segmentos de usuários.

18.2 Classificação dos serviços públicos

18.2.1 Quanto à essencialidade

Segundo classificação de Hely Lopes, os serviços próprios, como segurança pública, são os essenciais. Os serviços impróprios, como serviço de telefonia, são os não essenciais. Com a política de desestatização, contudo, tal classificação caducou34, tornando-se regra a delegação.

18.2.2 Quanto aos destinatários

Serviços gerais ou indivisíveis: prestados à coletividade como um todo. Não se pode medir o quanto cada um utiliza do serviço. São mantidos pela receita geral do Estado (basicamente, a arrecadação dos impostos). Ex: segurança pública, iluminação pública.

Serviços individuais, específicos ou divisíveis: prestados a destinatários determinados, podendo-se medir o quanto cada um utiliza. São os (i) serviços compulsórios (mais importantes), mantidos por taxas e estando à disposição do contribuinte, sem que se possa recusá-los; e os (ii) serviços facultativos, pagos, se utilizados, por meio das tarifas (prestados, em regra, por concessionários e permissionários).

34 Mas ainda é objeto de concurso.

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Taxa de incêndio é cobrada pela fiscalização (poder de polícia) de apetrechos contra incêndio pelos prédios (é constitucional).

Taxa de bombeiro é paga a cada carnê de IPTU, mas o serviço de bombeiros é serviço geral e não poderia ser pago como taxa. O serviço deve ser mantido pela receita geral do Estado e não por taxas.

Taxa tapa-buraco vem junto com o carnê do IPVA, mas não dá para calcular individualmente (é inconstitucional). Pela mesma razão, a taxa de iluminação pública é inconstitucional (o que já foi decidido pelo STF). Foi criada, via emenda constitucional, uma contribuição de iluminação pública, também inconstitucional (o que ainda não foi reconhecido pelo STF), uma vez que a contribuição é tributo vinculado.

18.3 Determinação constitucional dos serviços públicos

A Constituição prevê um rol de serviços públicos que não é taxativo. No caso dos serviços que não estão previstos na CF, a competência será definida de acordo com a órbita de interesse dos entes políticos: União, para serviços de interesse nacional; estados-membros, para interesse regional; municípios, para interesse local.

Serviço funerário é serviço público? É serviço público, apesar de não estar previsto na CF. Há tratamento específico em cada região.

Na Constituição existem quatro tipos de serviços públicos:• Serviços públicos exclusivos do Estado: há obrigatoriedade e

exclusividade por parte do Estado. Ex: segurança pública, serviço postal etc. A EBCT, apesar de empresa pública, tem tratamento de Fazenda Pública (ADPF 46).

• Serviços públicos obrigatórios do Estado: há obrigatoriedade de prestação, mas, não, exclusividade. O particular também é titular desse tipo de serviço, não por transferência do Estado, mas por determinação constitucional. O fato, contudo, de ser titularizado pelo particular, não retira a natureza de serviço público. Ex: saúde e educação.

• Serviços públicos obrigatoriamente transferíveis pelo Estado: é o exemplo dos serviços de rádio e TV.

• Serviços públicos cuja transferência é facultativa: a prestação pode ser direta ou indireta. Prestação de forma indireta significa descentralização (transferência do serviço). Ex: transporte coletivo e telefonia. A descentralização pode acontecer por outorga (transfere a titularidade e a execução do serviço, por meio de lei) ou por delegação/colaboração (transfere apenas a execução do serviço).

18.4 Delegação de serviços públicos

É a hipótese do art. 175 da Constituição Federal: transferência apenas da execução do serviço público, sem perda da titularidade pelo Estado.

CF, art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II - os direitos dos usuários; III - política tarifária; IV - a obrigação de manter serviço adequado.

18.4.1 Concessão comum de serviço público (Lei nº 8.987/95)

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Concessão de serviço público é a delegação de serviço, com transferência apenas da execução, e, não, da titularidade. O concessionário deve ser pessoa jurídica ou consórcio de empresas; o concedente é o ente da administração direta que detém a competência/titularidade do serviço. As pessoas físicas não têm lugar na relação de concessão.

A concessão de serviço é formalizada por meio de contrato administrativo com prazo determinado. Os prazos estão previstos na lei específica do serviço: quanto maior o investimento, maior o prazo de concessão, a fim de permitir o lucro da pessoa jurídica ou consórcio. A prorrogação do prazo contratual é possível, desde que dentro do limite da lei específica.

A modalidade licitatória da concessão é a concorrência, em regra. Excepcionalmente, se o serviço estiver previsto no programa nacional de desestatização, haverá possibilidade de leilão (ex: telefonia, aeroportos). A concorrência segue o básico da Lei nº 8.666/93 e as especificidades da Lei nº 8.987/95 (lances verbais, procedimento invertido etc).

A concessão de serviço público precisa de autorização legislativa específica, que já está na lei específica do serviço. No tocante à remuneração da concessão, é a tarifa de usuário que a realiza, de acordo com a política tarifária definida ainda na fase da licitação. Serviços de rádio e TV, contudo, são custeados por meio de patrocínio, não de tarifa. É possível custear-se o serviço, ademais, com receitas alternativas (ex: propaganda em ônibus) ou com recurso público, abatendo-se da tarifa a diferença, com vistas à modicidade.

Em contrato de concessão, ao contrário de outros regimes de serviço, a concessionária assume o serviço por sua conta e risco, cabendo responsabilidade direta por eventual prejuízo causado ao administrado. Apenas subsidiariamente o Estado é chamado a assumir a responsabilidade. Como a concessionária é pessoa jurídica de Direito Privado prestadora de serviço público, aplica-se o art. 37, § 6º da CF (responsabilidade objetiva), independentemente de a vítima ser usuário, ou não, do serviço (ver RE 591874)35.

As hipóteses de extinção do contrato de concessão são: (i) advento do termo contratual; (ii) rescisão administrativa em razão de interesse público (encampação), necessitando de autorização legislativa e indenização ao particular, ou em razão de descumprimento de cláusula contratual por parte da empresa (caducidade), devendo esta indenizar o Estado; (iii) rescisão judicial por parte do particular; (iv) rescisão consensual; (v) anulação; (vi) falência ou desaparecimento da pessoa jurídica (extinção de pleno direito).

18.4.2 Concessão especial de serviço público – PPP (Leis nº 11.079/04 e 12.409/11)

É a parceria público-privada, que traz o investimento privado ao serviço com o intuito de amenizar a necessidade de investimento público, ademais aumentando a eficiência do serviço.

Duas são as modalidades de concessão especial:• Patrocinada: é uma concessão comum que, além da tarifa de usuário,

exige a presença de recursos públicos (obrigatoriedade do patrocínio do Estado). Acaba perdendo a característica de concessão comum em razão dessa obrigatoriedade de patrocínio e de prazos e tarifas diferenciados.

• Administrativa: a própria Administração é usuária do serviço, de forma direta ou indireta (ex: presídios). Sofre duras críticas da doutrina, pois, em verdade, configura-se em contrato com terceiro, não havendo necessidade de caracterizar como PPP.

35 EMENTA: CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO EM RELAÇÃO A TERCEIROS NÃO-USUÁRIOS DO SERVIÇO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. (RE 591874 RG, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, julgado em 23/10/2008, DJe-222 DIVULG 20-11-2008 PUBLIC 21-11-2008 EMENT VOL-02342-20 PP-04109 )

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Aula 15 (03 de julho de 2012)

Características da concessão especial: (i) necessariedade do financiamento privado; (ii) compartilhamento dos riscos: o particular investe dinheiro, mas, não conseguindo reaver o que gastou, o Estado o ajuda a arcar com uma parcela do prejuízo; (iii) pluralidade compensatória ou remuneratória: o Estado pode pagar o financiamento de várias maneiras, quais ordem bancária, transferência da utilização de bens públicos, transferência de créditos não tributários, outorga de direitos (ex: permissão para construir prédio acima do limite de andares, quando isto for legal).

A consulta pública é obrigatória na PPP.

Vedações à utilização de PPP: (i) o valor do contrato não pode ser inferior a vinte milhões de reais; (ii) o prazo não pode ser inferior a cinco anos nem superior a trinta e cinco anos; (iii) deve-se reunir ao menos dois dos seguintes elementos: obra, serviço e fornecimento.

Contratada a PPP, o Estado e o parceiro privado irão constituir a sociedade de propósitos específicos para gerir, controlar e fiscalizar o cumprimento do contrato. Tal sociedade é composta por membros do parceiro público e membros do parceiro privado.

18.4.3 Permissão de serviço público (Lei nº 8.987/95)

É a delegação realizada pelo poder concedente ao particular pessoa jurídica ou pessoa física. Permissão, seja de uso de bem público seja de serviço público, era originariamente constituída por ato unilateral. Contudo, em 1995, com o advento do art. 40 da Lei nº 8.987, a permissão de serviço público passou a ter natureza de contrato administrativo, enquanto a permissão de uso de bem continuou a ser realizada por ato unilateral.

A natureza jurídica da concessão de serviço é a mesma da permissão de serviço: contratual administrativa. Tal é o entendimento do STF

A permissão de serviço público deve ser precedida de licitação, em qualquer de suas modalidades (a depender dos requisitos específicos), não precisa de autorização legislativa específica e é precária, mas, por sua natureza contratual, possuindo prazo determinado, a retomada do serviço, a qualquer tempo, pela Administração, deve ser precedida de indenização.

18.4.4 Autorização de serviço público

A maioria admite a sua possibilidade apenas em situações excepcionais: pequenos serviços e situações urgentes (ex: serviço de táxi, serviço de despachante).

A autorização de serviço público se faz via ato unilateral, discricionário e precário, podendo ser retomado o serviço a qualquer tempo sem necessidade de indenização.

No mais, aplica-se, no que couber, a Lei nº 8.987/95.

19 AGENTES PÚBLICOS

Agente público é todo aquele que exerce função pública, temporária ou permanentemente, de forma gratuita ou remunerada.

19.1 Espécies de agentes públicos

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19.1.1 Agentes políticos

São os agentes públicos que estão no comando de cada um dos Poderes da República, representando a vontade do Estado. São os chefes do Poder Executivo, seus respectivos vices e seus auxiliares imediatos (ministros de Estado, secretários estaduais e secretários municipais), os membros do Poder Legislativo (congressistas, deputados estaduais e vereadores) e os membros do Poder Judiciário e do Ministério Público36.

Se os direitos do agente estão previstos na lei (regime jurídico administrativo) ou na Constituição, o regime é o legal ou estatutário. Se o regime é legal ou estatutário, o agente será titular de cargo. Só existe cargo na pessoa jurídica de Direito Público (não se fala de cargo em pessoa privada). Se os direitos do agente estão previstos em um contrato de trabalho, o regime é contratual ou celetista. Se o regime é contratual ou celetista, o agente terá emprego. O regime de emprego existe em pessoas jurídicas de Direito Público e Privado.

O agente político segue o regime estatutário/legal/de cargo, previsto normalmente não na Lei nº 8.112, mas em outras leis, como o Estatuto da Magistratura etc.

19.1.2 Servidores estatais

São todos aqueles que atuam no Estado, seja na administração direta seja na indireta. Subdividem-se em: (i) servidor público, que atua em pessoa jurídica de Direito Público, seguindo o regime estatutário; (ii) empregado público ou servidor de ente governamental de Direito Privado.

19.1.2.1 Servidores públicos

Atuam na Administração Direta, nas autarquias e nas fundações públicas de Direito Público.

O texto original da CRFB/88 dispunha que os servidores públicos estavam sujeitos a um regime jurídico único, significando um só regime no mesmo ente da federação. Preferencialmente, neste momento, foi escolhido o regime estatutário.

A EC nº 19/98 introduziu o regime múltiplo, sendo possíveis os dois regimes ao mesmo tempo na mesma pessoa jurídica (cargo e emprego). Quem definia se cargo ou emprego era a lei de criação da atividade.

A matéria foi levada ao STF por meio da ADI 2135. Até agora, o tribunal só discutiu a matéria em sede de cautelar, reconhecendo a inconstitucionalidade formal da EC nº 19/98, art. 39: ausência de obediência a formalidades no retorno à casa iniciadora do projeto após a modificação do projeto pela casa revisora. O STF decidiu, em sede de cautelar na ADI, com efeitos ex nunc, pela inconstitucionalidade formal daquele dispositivo.

Hoje, no Brasil, só pode haver um regime no mesmo ente (regime jurídico único), seja ele celetista ou estatutário. Preferencialmente, o regime é estatutário.

19.1.2.2 Empregado público

São os servidores estatais que atuam em pessoas jurídicas de Direito Privado (empresas públicas, sociedades de economia mista, fundação pública de Direito Privado).

São celetistas, titulares de emprego público: aqui, não se admite regime estatutário. São servidores estatais, mas não são servidores públicos, pois atuam em pessoas jurídicas de Direito Privado.

36 Quanto aos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público há divergência doutrinária, mas o STF entende que são agentes políticos, não pela investidura (que é meritória e não política) mas por formarem a vontade do Estado.

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Equiparam-se aos servidores públicos em alguns aspectos: (i) estão obrigados a prestar concurso público; (ii) estão sujeitos à regra da não acumulação (excepcionalmente será possível acumular); (iii) em regra, estão sujeitos a teto remuneratório (excepcionalmente não estão sujeitos ao teto)37; (iv) obedecem as regras de improbidade administrativa; (v) estão sujeitos aos crimes contra a administração (art. 327 do CP); (vi) estão sujeitos aos remédios constitucionais, exceto se explorarem atividade econômica (ex: MS, habeas data, ação popular etc).

No tocante à dispensa dos empregados públicos, há distinção em relação aos servidores públicos, baseada no enunciado nº 390 da súmula do TST e na OJ 247.

Súmula nº 390 - TST - Res. 129/2005 - DJ 20, 22 e 25.04.2005 - Conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 229 e 265 da SDI-1 e da Orientação Jurisprudencial nº 22 da SDI-2Estabilidade - Celetista - Administração Direta, Autárquica ou Fundacional - Empregado de Empresa Pública e Sociedade de Economia MistaI - O servidor público celetista da administração direta, autárquica ou fundacional é beneficiário da estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988. (ex-OJ nº 265 da SDI-1 - Inserida em 27.09.2002 e ex-OJ nº 22 da SDI-2 - Inserida em 20.09.00)II - Ao empregado de empresa pública ou de sociedade de economia mista, ainda que admitido mediante aprovação em concurso público, não é garantida a estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988. (ex-OJ nº 229 - Inserida em 20.06.2001)

OJ 247 da SDI - I"SERVIDOR PÚBLICO. CELETISTA CONCURSADO. DESPEDIDA IMOTIVADA. EMPRESA PÚBLICA OU SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. POSSIBILIDADE.1. A despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato motivado para sua validade;2. A validade do ato de despedida do empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) está condicionada à motivação, por gozar a empresa do mesmo tratamento destinado à Fazenda Pública em relação à imunidade tributária e à execução por precatório, além das prerrogativas de foro, prazos e custas processuais."

Assim, os empregados de pessoas privadas não gozam da estabilidade do art. 41 da CRFB/88, diferentemente dos empregados de pessoas públicas.

19.1.3 Particulares em colaboração

Colaboram com o Estado, exercendo função pública em determinado momento, mas não perdendo a qualidade de particular. Podem ser requisitados, que colaboram de forma compulsória (ex: jurados, mesários, serviço militar obrigatório etc); voluntários ou honoríficos ou de sponte propria, que colaboram por livre e espontânea vontade (ex: amigos da escola, médicos voluntários etc); delegados de função (não é delegação de serviço público!), que é o que ocorre com os serviços notariais, por exemplo; os que praticam atos oficiais, no exercício de serviço público que a Constituição reconhece como da titularidade tanto do Estado como do particular (ex: diretores de escolas particulares, de hospitais etc).

19.2 Acessibilidade

37 Quando as pessoas jurídicas vivem de sua própria arrecadação, ou seja, não recebem dinheiro de repasse para custeio, não precisam obedecer ao teto.

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Podem ser servidores públicos os brasileiros e os estrangeiros na forma da lei38.

A condição de acessibilidade ao serviço público no Brasil é a prestação de concurso público. Contudo, em algumas situações, o sujeito pode ser agente público sem prestar concurso público: (i) mandato eletivo (escolha política); (ii) cargos em comissão (de livre nomeação e livre exoneração); (iii) contratos temporários (prazo determinado, situação de anormalidade, excepcional interesse público); (iv) agentes comunitários de saúde e agentes de combate a endemias (CF, art. 198; EC nº 51; Lei nº 11.350/06 – o agentes do Programa Saúde da Família eram contratados temporariamente, mas, agora, exige-se processo seletivo simplificado, que não se confunde com concurso público); (v) ministros do STF (que não precisam ser formados em Direito); (vi) alguns ministros do STJ; (vii) vagas do quinto constitucional; (viii) ministros e conselheiros dos tribunais de contas.

19.2.1 Prazo de validade do concurso público

O prazo de validade do concurso público é de até dois anos, possível a prorrogação, uma única vez, por igual período. A prorrogação somente é possível se prevista no edital do concurso, mas, mesmo que prevista, é decisão discricionária do administrador. Prorrogando ou não, contudo, deve o administrador fundamentar o ato. Ademais, a prorrogação só é possível antes do término do prazo de validade.

O administrador, depois de prorrogado o concurso (decisão discricionária), pode voltar atrás e revogar a prorrogação? Segundo o STF, sim, desde que o prazo de prorrogação ainda não tenha começado a fluir. Se o prazo de prorrogação já começou, há direito adquirido dos candidatos.

Se houver prorrogação após o término do prazo de validade do concurso, com nomeação de candidatos, e, após, anulação da prorrogação e das nomeações dada a ilegalidade, tem de haver o devido processo administrativo, com direito ao contraditório e ampla defesa por parte dos prejudicados.

Enunciados da súmula do STF683: O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do art. 7º, XXX, da CF, quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido.684: É inconstitucional o veto não motivado à participação de candidato a concurso público.685: É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido.686: Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público.

Enunciado nº 266 da súmula do STJ: O diploma ou habilitação legal para o exercício do cargo deve ser exigido na posse e não na inscrição para o concurso público.

Enunciado nº 377 da súmula do STJ: O portador de visão monocular tem direito de concorrer, em concurso público, às vagas reservadas aos deficientes.

Súmula vinculante nº 13: A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo

38 Já existe regulamentação para os pesquisadores e professores estrangeiros em universidades públicas.

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em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.

Aula 16 (04 de julho de 2012)

Pode-se realizar novo concurso público dentro do prazo de validade do anterior, desde que respeitada a ordem de classificação deste último. Vencido o prazo do primeiro concurso, não poderá mais haver nomeação de seus aprovados.

19.2.2 Direito à nomeação

Como regra, o candidato aprovado em concurso público tem mera expectativa de direito pela nomeação. Exceções a tal regra são os casos em que haverá direito subjetivo à nomeação:

• quando o candidato é preterido na ordem de classificação (enunciado nº 15 da súmula do STF: Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação);

• quando a Administração realiza vínculos precários (ex: nomeação ad hoc, contratos temporários, cessão de servidores, desvio de função) em vez de nomear os candidatos aprovados, segundo jurisprudência do STJ e do STF;

• quando o candidato for aprovado no concurso dentro do número de vagas e no curso do prazo de validade (ver RE 598099). Tal direito, contudo, não é absoluto: se houver mudança de contexto em que, por razões de Direito Público, não se possa nomear ou não mais se necessite da nomeação, esta não será realizada.

19.2.3 Exigências do concurso público

A exigência tem de (i) estar prevista na lei da carreira39; (ii) estar prevista no edital do concurso; (ii) e ser compatível com a natureza do cargo. Preenchidas essas condições, o limite de idade é permitido, tanto no mínimo quanto no máximo. Assim também com relação ao exame psicotécnico, que, ademais, deve ter critérios objetivos e garantir direito de recurso.

19.3 Estabilidade dos servidores públicos

Prevista no art. 41 da Constituição de 1988, com a modificação da EC nº 19/98.Efetividade é característica do cargo, em que há nomeação em caráter definitivo com

prévio concurso público; estabilidade é característica do servidor.Estabilidade é a garantia de permanência no serviço, requerendo-se, para tanto, a

aprovação em concurso público, a nomeação, a ocupação de cargo efetivo, o cumprimento do prazo de três anos de exercício no cargo e a aprovação em avaliação especial de desempenho (pressupostos da estabilidade).

O texto original da Constituição previa a aprovação em concurso público e dois anos de exercício, não diferenciando cargo ou emprego. Nesse teor, tinham direito à estabilidade o titular de cargo e o titular de emprego público. No contexto, o TST publicou o enunciado nº 390 de sua súmula, dispondo que o empregado de pessoa jurídica de Direito Público possuía estabilidade, o que não ocorria com o empregado de pessoa jurídica de Direito Privado.

39 Não pode ser outro diploma de hierarquia inferior, ainda que recepcionado pela Constituição de 1988.

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Com o advento da EC nº 19/98, o servidor, para adquirir estabilidade, precisaria de cargo efetivo, três anos de exercício e aprovação em avaliação de desempenho. Assim, a partir da vigência da emenda, os novos empregados públicos de pessoa jurídica de Direito Público40 não possuem estabilidade.

A avaliação especial de desempenho, como ainda não foi regulamentada, não é realizada, o que não impede a aquisição da estabilidade.

Ocorrerá a perda da estabilidade por meio de (i) processo administrativo; (ii) processo judicial transitado em julgado; ou (iii) avaliação periódica de desempenho (dependendo da lei da carreira para disciplinar essa avaliação). A avaliação periódica sempre existiu no Brasil, mas não tinha a força de causar a perda da estabilidade. Segundo o art. 169 da CF e o art. 101/00, quando houver excesso de despesas, pode-se exonerar servidores estáveis para racionalização da máquina administrativa.

Estágio probatório

O texto original da Constituição de 1988 exigia, para a estabilidade, a aprovação em concurso público e o exercício de dois anos. Regulamentando tal disposição, o art. 20 da Lei nº 8.112/90 fala em estágio probatório de vinte e quatro meses. Com o advento da EC nº 19/98, passou-se a exigir três anos de exercício para a aquisição da estabilidade, não falando a Constituição, como já não falava, no termo “estágio probatório”.

Nesse sentido, somente aludindo a “estágio probatório” a Lei nº 8.112/90, e entendendo-se, portanto, que é instituto independente da estabilidade (que pressupõe, segundo a Constituição, o “exercício”), pode-se dizer que foi recepcionado pelo novo texto constitucional (entendimento do Congresso Nacional).

Se, contudo, entende-se que os institutos são dependentes, o art. 20 da Lei nº 8.112/90 não foi recepcionado pela alteração constitucional, e o “estágio probatório” passa a ser de três anos (entendimento da AGU, do STJ, do CNJ [Pedido de Providência nº 822], e de algumas decisões do STF).

19.3 Sistema remuneratório

19.3.1 Modalidades

• Remuneração ou vencimentos, formada por duas parcelas, uma fixa (vencimento) e outra variável, consoante a condição do servidor, as vantagens pessoais etc.

• Subsídio: criado pela EC nº 19/98, na forma de pagamento realizado em uma única parcela.

Recebem subsídio: chefes do Executivo e auxiliares imediatos (ministros e secretários estaduais e municipais); membros do Legislativo (congressistas, deputados estaduais e vereadores); membros do Judiciário; membros do Ministério Público; advogados da União, procuradores federais e estaduais (não os municipais); defensores, ministros e conselheiros dos tribunais de contas; policiais.

O que pode ser pago fora do subsídio? Algumas garantias do trabalhador comum (CF, art. 7º), que foram estendidas aos servidores públicos (CF, art. 39, § 3º – adicional noturno, um terço de férias, décimo terceiro salário), e as verbas indenizatórias (diárias, ajudas de custo, transporte etc).

Em regra, toda remuneração tem de ser prevista em lei stricto sensu. A iniciativa é de quem pagará a conta. Excepcionalmente, a fixação da remuneração não é será realizada por lei, nos seguintes casos: (i) decreto legislativo do Congresso Nacional

40 Segundo a orientação do TST, já comentada, os empregados públicos de pessoas jurídicas de Direito Privado nunca possuíram estabilidade.

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(que não possui a etapa deliberativa executiva [sanção ou veto]), que fixa a remuneração do chefe do executivo federal, de seu vice, dos ministros de Estado e dos próprios parlamentares; e (ii) decreto legislativo da Câmara Municipal, que fixa a remuneração dos vereadores. Em todos os demais casos, haverá fixação por lei stricto sensu, inclusive remuneração de deputados estaduais, prefeitos e governadores.

19.3.2 Teto remuneratório

Introduzido pela EC nº 19/98, com a alteração da EC nº 41/03. O valor é o do subsídio de ministro do STF, fixado por lei de iniciativa do

próprio STF.EC nº 41/03: criou subtetos para cada ordem política (União, estados e

municípios). Para a União, o teto é o geral; para os estados, há três subtetos, o do Poder Executivo (subsídio do governador), o do Legislativo (subsídio do deputado estadual) e o do Judiciário, também servindo para os membros do MP, procuradores do estado e defensores públicos estaduais (subsídio do desembargador)41; para os municípios, o teto é o valor do subsídio do prefeito.

O teto do desembargador não pode ultrapassar 90,25% da remuneração do ministro do STF. Esta regra não foi declarada inconstitucional, mas foi objeto de controle pela ADI 3854, realizando-se interpretação conforme para dispor que os 90,25% é teto para o subsídio do cargo de desembargador, mas se ele receber outras verbas remuneratórias (magistério, competência eleitoral), a soma das parcelas poderá chegar até a remuneração do ministro do STF.

19.3.3 Acumulação de cargos e empregos

No Brasil, aplica-se o regime da não acumulação (regra geral), excepcionalmente sendo a acumulação possível nas hipóteses constitucionais dos arts. 37, XVI e XVII, e art. 38. A regra da não acumulação serve para cargos e empregos públicos da administração direta e indireta, mas não diz respeito a fontes privadas de remuneração.

Para membros do MP e da Magistratura, as resoluções do CNMP e CNJ definiram carga horária de 20 horas semanais como limite de atuação fora da atividade.

Regras de acumulação possível:• atividade + atividade: horários compatíveis; a soma das remunerações

não pode ultrapassar o teto remuneratório; professor + professor; professor + técnico-científico (juiz, promotor, médico, delegado, fiscal etc); ou dois cargos na área da saúde com profissão regulamentada por lei (ex: médico + médico, enfermeiro + dentista etc).

• aposentado + aposentado: se for possível a cumulação na atividade, também será na inatividade.

• aposentado + atividade: mesmas hipóteses permitidas para atividade + atividade.

• aposentado + mandato eletivo (qualquer um).• aposentado + cargo em comissão (qualquer um)• atividade + mandato eletivo: para mandatos federais, estaduais e

distritais, não pode haver acumulação, tendo o servidor que se afastar do primeiro e exercer o segundo, recebendo apenas a nova remuneração (CF, art. 38, I). Se o cargo for de prefeito, o servidor terá que se afastar do primeiro cargo e terá que exercer o segundo, mas

41 O quadro restante do MP, da Procuradoria e da Defensoria é submetido ao subteto do âmbito executivo (subsídio do governador).

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poderá escolher a remuneração. Para o cargo de vereador, se o horário for compatível, o servidor poderá cumular, exercendo os dois e ganhando os dois salários. Se o horário for incompatível, aplica-se a regra do prefeito (afasta-se do primeiro cargo, exerce o segundo e escolhe a remuneração).

Até a EC nº 20/98, se o sujeito estivesse aposentado em uma primeira atividade, ele poderia tudo em termos de teto. Com o advento dessa emenda constitucional, surgiu a proibição de qualquer cargo, somente sendo possível a cumulação nos casos enumerados acima.

EC nº 20/98, art. 11. A vedação prevista no art. 37, § 10, da Constituição Federal, não se aplica aos membros de poder e aos inativos, servidores e militares, que, até a publicação desta Emenda, tenham ingressado novamente no serviço público por concurso público de provas ou de provas e títulos, e pelas demais formas previstas na Constituição Federal, sendo-lhes proibida a percepção de mais de uma aposentadoria pelo regime de previdência a que se refere o art. 40 da Constituição Federal, aplicando-se-lhes, em qualquer hipótese, o limite de que trata o  § 11 deste mesmo artigo.

19.4 Competência para o julgamento de ações que envolvem servidores

As ações que envolvem servidores públicos são de competência da Justiça comum, federal ou estadual (a depender do vínculo), se o regime jurídico foi o legal/estatutário; ou da Justiça do Trabalho, se o vínculo for celetista.

No caso de contratado temporário, se se entende que a relação temporária é legal (regime administrativo), a competência é da Justiça comum; se se entende que a relação é celetista, a competência é da Justiça do Trabalho. O STF, reconhecendo que o regime é legal, determinou a competência da Justiça comum, federal ou estadual, independentemente da validade do vínculo (ver RE 573202)42. Se a Justiça comum definir a invalidade do vínculo, pode o juiz reconhecer direitos trabalhistas, sem declinar da competência para a Justiça do Trabalho.

19.5 Aposentadoria

Ver aula online.

(13/04/2013)CF, art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo. (Redação dada pela

42 EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REGIME ESPECIAL. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA REGIDA POR LEGISLAÇÃO LOCAL ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO DE 1988, EDITADA COM BASE NO ART. 106 DA CONSTITUIÇÃO DE 1967. ACÓRDÃO QUE RECONHECEU A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I - Ao reconhecer a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar a reclamação trabalhista, o acórdão recorrido divergiu de pacífica orientação jurisprudencial deste Supremo Tribunal Federal. II - Compete à Justiça Comum processar e julgar causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores submetidos a regime especial disciplinado por lei local editada antes da Constituição Republicana de 1988, com fundamento no art. 106 da Constituição de 1967, na redação que lhe deu a Emenda Constitucional no 1/69, ou no art. 37, IX, da Constituição de 1988. III - Recurso Extraordinário conhecido e provido. (RE 573202, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 21/08/2008, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-232 DIVULG 04-12-2008 PUBLIC 05-12-2008 EMENT VOL-02344-05 PP-00968 LEXSTF v. 30, n. 360, 2008, p. 209-245)

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Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 1º Os servidores abrangidos pelo regime de previdência de que trata este artigo serão aposentados, calculados os seus proventos a partir dos valores fixados na forma dos §§ 3º e 17: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) I - por invalidez permanente, sendo os proventos proporcionais ao tempo de contribuição, exceto se decorrente de acidente em serviço, moléstia profissional ou doença grave, contagiosa ou incurável, na forma da lei; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) II - compulsoriamente, aos setenta anos de idade, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) III - voluntariamente, desde que cumprido tempo mínimo de dez anos de efetivo exercício no serviço público e cinco anos no cargo efetivo em que se dará a aposentadoria, observadas as seguintes condições: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) a) sessenta anos de idade e trinta e cinco de contribuição, se homem, e cinqüenta e cinco anos de idade e trinta de contribuição, se mulher; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) (Vide Emenda Constitucional nº 20, de 1998) b) sessenta e cinco anos de idade, se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) § 2º - Os proventos de aposentadoria e as pensões, por ocasião de sua concessão, não poderão exceder a remuneração do respectivo servidor, no cargo efetivo em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) § 3º Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão consideradas as remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência de que tratam este artigo e o art. 201, na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005) I portadores de deficiência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005) II que exerçam atividades de risco; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005) III cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005) § 5º - Os requisitos de idade e de tempo de contribuição serão reduzidos em cinco anos, em relação ao disposto no § 1º, III, "a", para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) § 6º - Ressalvadas as aposentadorias decorrentes dos cargos acumuláveis na forma desta Constituição, é vedada a percepção de mais de uma aposentadoria à conta do regime de previdência previsto neste artigo. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) § 7º Lei disporá sobre a concessão do benefício de pensão por morte, que será igual: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) I - ao valor da totalidade dos proventos do servidor falecido, até o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, acrescido de setenta por cento da parcela excedente a este limite, caso aposentado à data do óbito; ou (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) II - ao valor da totalidade da remuneração do servidor no cargo efetivo em que se deu o falecimento, até o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, acrescido de setenta por cento da parcela excedente a este limite, caso em atividade na data do óbito. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 8º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente,

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o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 9º - O tempo de contribuição federal, estadual ou municipal será contado para efeito de aposentadoria e o tempo de serviço correspondente para efeito de disponibilidade. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) § 10 - A lei não poderá estabelecer qualquer forma de contagem de tempo de contribuição fictício. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) (Vide Emenda Constitucional nº 20, de 1998) § 11 - Aplica-se o limite fixado no art. 37, XI, à soma total dos proventos de inatividade, inclusive quando decorrentes da acumulação de cargos ou empregos públicos, bem como de outras atividades sujeitas a contribuição para o regime geral de previdência social, e ao montante resultante da adição de proventos de inatividade com remuneração de cargo acumulável na forma desta Constituição, cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração, e de cargo eletivo. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) § 12 - Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) § 13 - Ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público, aplica-se o regime geral de previdência social. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) § 14 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, desde que instituam regime de previdência complementar para os seus respectivos servidores titulares de cargo efetivo, poderão fixar, para o valor das aposentadorias e pensões a serem concedidas pelo regime de que trata este artigo, o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) § 15. O regime de previdência complementar de que trata o § 14 será instituído por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, observado o disposto no art. 202 e seus parágrafos, no que couber, por intermédio de entidades fechadas de previdência complementar, de natureza pública, que oferecerão aos respectivos participantes planos de benefícios somente na modalidade de contribuição definida. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 16 - Somente mediante sua prévia e expressa opção, o disposto nos §§ 14 e 15 poderá ser aplicado ao servidor que tiver ingressado no serviço público até a data da publicação do ato de instituição do correspondente regime de previdência complementar. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) § 17. Todos os valores de remuneração considerados para o cálculo do benefício previsto no § 3° serão devidamente atualizados, na forma da lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 18. Incidirá contribuição sobre os proventos de aposentadorias e pensões concedidas pelo regime de que trata este artigo que superem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 19. O servidor de que trata este artigo que tenha completado as exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no § 1º, III, a, e que opte por permanecer em atividade fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no § 1º, II. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 20. Fica vedada a existência de mais de um regime próprio de previdência social para os servidores titulares de cargos efetivos, e de mais de uma unidade gestora do respectivo regime em cada ente estatal, ressalvado o disposto no art. 142, § 3º, X. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003) § 21. A contribuição prevista no § 18 deste artigo incidirá apenas sobre as parcelas de proventos de aposentadoria e de pensão que superem o dobro do limite máximo

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estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 desta Constituição, quando o beneficiário, na forma da lei, for portador de doença incapacitante. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

Regime Geral de Previdência Social (RGPS)

Mantido pelo INSS e aplicado aos empregados privados, aos da Administração Pública direta e indireta e aos agentes com cargo em comissão. O cargo em comissão é estatutário, mas, de acordo com a CRFB/88, art. 41, § 13, o agente se aposenta pelo RGPS (pois sua situação é passageira).

Regime próprio dos titulares de cargo efetivo e vitalício dos entes políticos, suas autarquias e fundações

De acordo com o texto original da Constituição, para o servidor se aposentar, só havia o requisito do tempo de serviço, sem menção a tempo de contribuição.

A reforma trazida pela EC 20/98 substituiu o requisito do tempo de serviço por dois outros: tempo de contribuição e idade. A partir de então, passou-se a utilizar o regime contributivo.

No Brasil, todos os servidores pagam para um mesmo regime, de acordo com a esfera respectiva. Todos contribuem para um mesmo "bolso" e retiram do mesmo "bolso".

Modalidades de aposentadoria

• Por invalidez: a invalidez tem de ser permanente. A regra da invalidez é aposentadoria com proventos proporcionais, excepcionalmente integrais nos casos de moléstia profissional, acidente em serviço e doença grave, contagiosa ou incurável.

• Compulsória: aos 70 anos de idade, com proventos proporcionais, excepcionalmente integrais se atingido os 35 anos de contribuição (até a EC 41/03).

• Voluntária: os requisitos são 10 anos no serviço público e 5 anos no cargo; as condições são 60 anos de idade e 35 de contribuição, para homem, e 55 de idade e 30 de contribuição para mulher (proventos integrais, até a EC 41/03) ou 65 anos de idade para homem e 60 para mulher (proventos proporcionais).

• Aposentadoria especial: para professor do ensino infantil, fundamental ou médio, em regime de exclusividade no magistério (ADI 3772)43, a

43 EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE MANEJADA CONTRA O ART. 1º DA LEI FEDERAL 11.301/2006, QUE ACRESCENTOU O § 2º AO ART. 67 DA LEI 9.394/1996. CARREIRA DE MAGISTÉRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL PARA OS EXERCENTES DE FUNÇÕES DE DIREÇÃO, COORDENAÇÃO E ASSESSORAMENTO PEDAGÓGICO. ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 40, § 5º, E 201, § 8º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INOCORRÊNCIA. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE, COM INTERPRETAÇÃO CONFORME. I - A função de magistério não se circunscreve apenas ao trabalho em sala de aula, abrangendo também a preparação de aulas, a correção de provas, o atendimento aos pais e alunos, a coordenação e o assessoramento pedagógico e, ainda, a direção de unidade escolar. II - As funções de direção, coordenação e assessoramento pedagógico integram a carreira do magistério, desde que exercidos, em estabelecimentos de ensino básico, por professores de carreira, excluídos os especialistas em educação, fazendo jus aqueles que as desempenham ao regime especial de aposentadoria estabelecido nos arts. 40, § 5º, e 201, § 8º, da Constituição Federal. III - Ação direta julgada parcialmente procedente, com interpretação conforme, nos termos supra. (ADI 3772, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 29/10/2008, DJe-059 DIVULG 26-03-2009 PUBLIC 27-03-2009 REPUBLICAÇÃO: DJe-204

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idade e o tempo de contribuição são diminuídos de 5 anos. Os proventos são integrais (até a EC 41/03). Também há aposentadoria especial para deficiente físico e para quem exerce atividade de risco (MI 721 e 75844).

Lei nº 8.213/91, art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995) § 1º A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995) § 2º A data de início do benefício será fixada da mesma forma que a da aposentadoria por idade, conforme o disposto no art. 49. § 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social–INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995) § 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995) § 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício. (Incluído pela Lei nº 9.032, de 1995) § 6º O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inciso II do art. 22 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, cujas alíquotas serão acrescidas de doze, nove ou seis pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após quinze, vinte ou vinte e cinco anos de contribuição, respectivamente. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98) (Vide Lei nº 9.732, de 11.12.98) § 7º O acréscimo de que trata o parágrafo anterior incide exclusivamente sobre a remuneração do segurado sujeito às condições especiais referidas no caput. (Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.98) § 8º Aplica-se o disposto no art. 46 ao segurado aposentado nos termos deste artigo que continuar no exercício de atividade ou operação que o sujeite aos agentes nocivos constantes da relação referida no art. 58 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 9.732, de 11.12.98)

DIVULG 28-10-2009 PUBLIC 29-10-2009 EMENT VOL-02380-01 PP-00080 RTJ VOL-00208-03 PP-00961)44 MANDADO DE INJUNÇÃO - NATUREZA. Conforme disposto no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada. MANDADO DE INJUNÇÃO - DECISÃO - BALIZAS. Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada. APOSENTADORIA - TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - PREJUÍZO À SAÚDE DO SERVIDOR - INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR - ARTIGO 40, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral - artigo 57, § 1º, da Lei nº 8.213/91. (MI 758, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 01/07/2008, DJe-182 DIVULG 25-09-2008 PUBLIC 26-09-2008 EMENT VOL-02334-01 PP-00037 RDECTRAB v. 15, n. 174, 2009, p. 157-167)

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A EC 41/03 revogou a regra da integralidade (direito de se aposentar com toda a remuneração do momento da aposentadoria), substituindo-a pela regra da média da vida laboral (cálculo da média de tudo que o servidor recebeu enquanto contribuiu para a previdência, não contando os períodos sem contribuição).

Essa emenda também revogou o princípio da paridade, segundo o qual tudo o que fosse dado aos servidores ativos seria repassado aos inativos. Hoje, vigora o princípio da preservação do valor real do provento.

Criou, ainda, o teto de proventos do servidor público (mesmo do RGPS), cuja aplicação estava condicionada a um regime complementar, hoje instituído pela Lei nº 12.618, de 30 de abril de 2012, publicada em 02 de maio de 2012. Quanto ao ponto, ver tópico infra.

A emenda trouxe também o instituto do abono de permanência (CF, art. 49, § 19) para evitar a aposentadoria em massa dos servidores, diante da mudança no regime de previdência. O abono de permanência deixa de ter natureza de isenção, passando a ser uma remuneração paga como prêmio. A ideia é não prejudicar o cálculo da remuneração do servidor.

Veio, também, a contribuição dos inativos, com a alíquota mínima de 11% (estados e municípios podem fixar alíquotas maiores). A base de cálculo é aquilo que ultrapassar o teto do regime geral de previdência social (ADI 3105)45.

45 EMENTAS: 1. Inconstitucionalidade. Seguridade social. Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária. Ofensa a direito adquirido no ato de aposentadoria. Não ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Emenda Constitucional nº 41/2003 (art. 4º, caput). Regra não retroativa. Incidência sobre fatos geradores ocorridos depois do início de sua vigência. Precedentes da Corte. Inteligência dos arts. 5º, XXXVI, 146, III, 149, 150, I e III, 194, 195, caput, II e § 6º, da CF, e art. 4º, caput, da EC nº 41/2003. No ordenamento jurídico vigente, não há norma, expressa nem sistemática, que atribua à condição jurídico-subjetiva da aposentadoria de servidor público o efeito de lhe gerar direito subjetivo como poder de subtrair ad aeternum a percepção dos respectivos proventos e pensões à incidência de lei tributária que, anterior ou ulterior, os submeta à incidência de contribuição previdencial. Noutras palavras, não há, em nosso ordenamento, nenhuma norma jurídica válida que, como efeito específico do fato jurídico da aposentadoria, lhe imunize os proventos e as pensões, de modo absoluto, à tributação de ordem constitucional, qualquer que seja a modalidade do tributo eleito, donde não haver, a respeito, direito adquirido com o aposentamento. 2. Inconstitucionalidade. Ação direta. Seguridade social. Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária, por força de Emenda Constitucional. Ofensa a outros direitos e garantias individuais. Não ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Regra não retroativa. Instrumento de atuação do Estado na área da previdência social. Obediência aos princípios da solidariedade e do equilíbrio financeiro e atuarial, bem como aos objetivos constitucionais de universalidade, equidade na forma de participação no custeio e diversidade da base de financiamento. Ação julgada improcedente em relação ao art. 4º, caput, da EC nº 41/2003. Votos vencidos. Aplicação dos arts. 149, caput, 150, I e III, 194, 195, caput, II e § 6º, e 201, caput, da CF. Não é inconstitucional o art. 4º, caput, da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, que instituiu contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentadoria e as pensões dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações. 3. Inconstitucionalidade. Ação direta. Emenda Constitucional (EC nº 41/2003, art. 4º, § únic, I e II). Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária. Bases de cálculo diferenciadas. Arbitrariedade. Tratamento discriminatório entre servidores e pensionistas da União, de um lado, e servidores e pensionistas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de outro. Ofensa ao princípio constitucional da isonomia tributária, que é particularização do princípio fundamental da igualdade. Ação julgada procedente para declarar inconstitucionais as expressões "cinquenta por cento do" e "sessenta por cento do", constante do art. 4º, § único, I e II, da EC nº 41/2003. Aplicação dos arts. 145, § 1º, e 150, II, cc. art. 5º, caput e § 1º, e 60, § 4º, IV, da CF, com restabelecimento do caráter geral da regra do art. 40, § 18. São inconstitucionais as expressões "cinqüenta por cento do" e "sessenta por cento do", constantes do § único, incisos I e II, do art. 4º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, e tal pronúncia restabelece o caráter geral da regra do art. 40, § 18, da Constituição da República, com a redação dada por essa mesma

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A EC 47/05 trouxe menos mudanças, a exemplo das aposentadorias especiais pra deficientes físicos e agentes em atividade de risco.

Regime de previdência complementar do servidor federal (Lei nº 12.618/2012)

Aplicado para os servidores públicos titulares de cargo efetivo da União, suas autarquias e fundações, inclusive para os membros do Poder Judiciário, do Ministério Público da União e do Tribunal de Contas da União (art. 1º), que aderirem aos planos de benefícios (art. 2º, II).

Os servidores e os membros referidos acima que tenham ingressado no serviço público até a data anterior ao início da vigência do regime de previdência complementar poderão, mediante prévia e expressa opção, aderir ao novo regime (art. 1º, parágrafo único), até 24 meses de sua entrada em vigor (art. 3º, § 7º).

O início da vigência desse regime complementar deu-se em 5 de fevereiro de 2013, um dia depois de publicada a Portaria nº 44/2013, editada pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), aprovando os planos de benefícios e o Convênio de Adesão da União à Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp).

Aos servidores que tenham feito opção pelo novo regime é assegurado o direito a um benefício especial calculado com base nas contribuições recolhidas ao regime de previdência da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios de que trata o art. 40 da Constituição Federal, e o direito à compensação financeira de que trata o § 9º do art. 201 da Constituição Federal (art. 3º, § 1º).

Aplica-se o benefício especial ao servidor público titular de cargo efetivo da União, inclusive ao membro do Poder Judiciário, do Ministério Público e do Tribunal de Contas da União, oriundo, sem quebra de continuidade, de cargo público estatutário de outro ente da federação que não tenha instituído o respectivo regime de previdência complementar e que ingresse em cargo público efetivo federal a partir da instituição do regime de previdência complementar, considerando-se, para esse fim, o tempo de contribuição estadual, distrital ou municipal, assegurada a compensação financeira de que trata o § 9o do art. 201 da Constituição Federal (art. 22).

CF, art. 201, § 9º: Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei. (Incluído dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)

O benefício especial será equivalente à diferença entre a média aritmética simples das maiores remunerações anteriores à data de mudança do regime, utilizadas como base para as contribuições do servidor ao regime de previdência da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, atualizadas pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ou outro índice que venha a substituí-lo, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde a do início da contribuição, se posterior àquela competência, e o limite máximo dos benefícios do RGPS, multiplicada pelo fator de conversão (art. 3º, § 2º).

Esse fator de conversão é o produto (limitado ao valor 1) da quantidade de contribuições mensais efetuadas para o regime de previdência da União de que trata o art. 40 da Constituição Federal, efetivamente pagas pelo servidor ou membro até a data da opção, com os valores 455, 390 ou 325, respectivamente para homem, mulher ou professor de educação infantil e do ensino fundamental, e professora de educação infantil e do ensino fundamental (art. 3º, § 3º).

Emenda. (ADI 3105, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2004, DJ 18-02-2005 PP-00004 EMENT VOL-02180-02 PP-00123 RTJ VOL-00193-01 PP-00137 RDDT n. 140, 2007, p. 202-203)

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Assim, para o cálculo do benefício especial do optante são levados em consideração (i) o valor da remunerações do período contributivo do regime anterior; (ii) o limite máximo dos benefícios do RGPS; (iii) e um fator de conversão que tem por base (a) a quantidade de contribuições mensais ao regime anterior, (b) o sexo do optante e (c) se professor da educação infantil ou fundamental.

A concessão dos benefícios não programados (ex: invalidez, morte) aos participantes ou assistidos pela entidade fechada de previdência social é condicionada à concessão do benefício pelo regime próprio de previdência social (art. 12, § 5º).

O servidor com remuneração inferior ao limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social poderá aderir aos planos de benefícios da previdência complementar, sem contrapartida do patrocinador, cuja base de cálculo será definida nos regulamentos (art. 13, parágrafo único).

Fundação Pública (Funpresp), com personalidade jurídica de direito privado e fechada, administra e executa os planos de benefícios da nova previdência, com total autonomia administrativa, financeira e gerencial (art. 4º). O regime jurídico do seu pessoal é o celetista (art. 7º), e ela se submete à legislação federal sobre licitação e contratos administrativos; realização de concurso público para a contratação de pessoal, no caso de empregos permanentes, ou de processo seletivo, em se tratando de contrato temporário; e publicação contábil (art. 8º).

A fundação é mantida integralmente por suas receitas, oriundas das contribuições de patrocinadores, participantes e assistidos, dos resultados financeiros de suas aplicações e de doações e legados de qualquer natureza, observado o disposto no § 3º do art. 202 da Constituição Federal (art. 10).

A União, suas autarquias e fundações são responsáveis, na qualidade de patrocinadores, pelo aporte de contribuições e pelas transferências à Funpresp das contribuições descontadas dos seus servidores (art. 11).

Quanto às contribuições:

Art. 16. As contribuições do patrocinador e do participante incidirão sobre a parcela da base de contribuição que exceder o limite máximo a que se refere o art. 3o desta Lei, observado o disposto no inciso XI do art. 37 da Constituição Federal. § 1o Para efeitos desta Lei, considera-se base de contribuição aquela definida pelo § 1o do art. 4o da Lei no 10.887, de 18 de junho de 2004, podendo o participante optar pela inclusão de parcelas remuneratórias percebidas em decorrência do local de trabalho e do exercício de cargo em comissão ou função de confiança. § 2o A alíquota da contribuição do participante será por ele definida anualmente, observado o disposto no regulamento do plano de benefícios. § 3o A alíquota da contribuição do patrocinador será igual à do participante, observado o disposto no regulamento do plano de benefícios, e não poderá exceder o percentual de 8,5% (oito inteiros e cinco décimos por cento). § 4o Além da contribuição normal, o participante poderá contribuir facultativamente, sem contrapartida do patrocinador, na forma do regulamento do plano. § 5o A remuneração do servidor, quando devida durante afastamentos considerados por lei como de efetivo exercício, será integralmente coberta pelo ente público, continuando a incidir a contribuição para o regime instituído por esta Lei.(13/04/2013)

INTENSIVO II

Direito AdministrativoProfa. Fernanda Marinela

www.marinela.ma

Aula 1 (31 de julho de 2012)

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1 BENS PÚBLICOS

A expressão “domínio público”, em sentido amplo, significa o poder de dominação, controle, regulamentação que o Estado exerce sobre todos os bens, públicos ou privados. Em sentido estrito, diz respeito aos bens que estão destinados ao uso público, da coletividade: são também chamados de bens de uso comum do povo.

O conceito de bem público guarda certa divergência doutrinária, mas todos concordam que o bem pertencente à pessoa jurídica de Direito Público (Administração direta, autarquias e fundações públicas de Direito Público) é bem público, independentemente de sua destinação/afetação.

Já no caso do bem pertencente a pessoa jurídica de Direito Privado (empresa pública, sociedade de economia mista, fundação pública de Direito Privado), só será público, segundo doutrina majoritária, STF e STJ, se estiver diretamente ligado à prestação de serviço público (princípio da continuidade: se o bem for afastado, haverá descontinuidade?). Para José dos Santos Carvalho Filho, contudo, só é público o bem de pessoa jurídica de Direito Público.

A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – EBCT, por possuir tratamento de Fazenda Pública (ADPF 46), possui todos os seus bens protegidos pelo regime público, independentemente de estarem diretamente ligados à prestação de serviço público.

1.1 Classificações dos bens públicos

1.1.1 Quanto à titularidade

De acordo com esse critério, os bens podem ser federais, estaduais, distritais ou municipais. Os bens federais estão elencados na Constituição, em rol exemplificativo (art. 20)46. Os bens estaduais (e distritais) também estão enumerados na Constituição Federal, em rol exemplificativo (art. 26). Por fim, quanto aos bens municipais (e distritais), não há lista constitucional: não participam, em tese, da partilha constitucional de bens, fazendo parte apenas de previsão legal.

1.1.1.1 Bens da União

Estão previstos no art. 20 da CF/88, que traz um rol muito cobrado em concursos públicos:

• Os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos.

• As terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei. Terra devoluta é uma expressão que surgiu e passou a ser utilizada no Brasil a partir do fim do regime de capitanias hereditárias. As pessoas passaram a tomar para si as terras que eram capitanias, mas outras terras não foram apropriadas pelo particular. As terras não apropriadas foram chamadas de terras sem dono, de terras devolutas, as quais o Estado, em razão da falta de dono, apropriou para si. Terra devoluta é a terra que ainda não foi demarcada. A partir do momento em que a área é demarcada, deixa de ser terra devoluta e passa a ser terra pública normal, como qualquer outro bem do Estado. As terras devolutas, em regra, são bens dos estados-membros. Apenas as terras devolutas previstas na lista do art. 20 é que são bens da União: apenas

46 Decorar!

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excepcionalmente, portanto, é que as terras devolutas pertencem à União (hipóteses do art. 20, II, da CF/88).

• Os lagos, rios e quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhem mais de um Estado, sirvam de limites com outros países, ou se estendam a território estrangeiro ou dele provenham, bem como os terrenos marginais e as praias fluviais: a finalidade de estabelecer como bens da União os rios que banhem mais de um estado-membro é evitar conflito entre eles. Limites com outros países são assunto de segurança nacional e, como tal, de interesse da União. Rios que provenham de outros países também são da União, já que, por meio deles, é possível invadir o país, sendo assunto de segurança nacional (interesse da União). Os terrenos marginais e as praias que estejam nesses rios também pertencem à União. A ideia que norteia este inciso é a segurança nacional, que sempre é de interesse da União.

• As ilhas fluviais e lacustres nas zonas limítrofes com outros países; as praias marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras, excluídas, destas, as que contenham a sede de Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao serviço público e a unidade ambiental federal, e as referidas no art. 26, II: ilhas oceânicas são as que estão longe da costa, enquanto as ilhas costeiras são as que se encontram mais próximas ao continente.

• Os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva.

• O mar territorial. Até o mar territorial, o Brasil exerce poder total. Na zona contígua, o Brasil exerce o poder de polícia. De 12 a 200 milhas, é a zona econômica exclusiva (que abrange a zona contígua), onde, segundo a Constituição, os recursos naturais aí encontrados são da União. Alto-mar (a partir de 200 milhas) é terra de ninguém (é res nulius) Plataforma continental é a terra embaixo da água até as 200 milhas (tem limite no alto-mar).

• Os terrenos de marinha e seus acrescidos: o terreno de marinha foi demarcado no século anterior, por volta de 1850. Terreno de marinha corresponde à faixa de 33 metros a contar da preamar média (que é a média da maré alta) para dentro do continente. Em algumas regiões do país, o mar avançou, engolindo o terreno de marinha. Nesta situação, o terreno de marinha desaparece. Quando ocorre o contrário, isto é, quando o mar recua, o terreno de marinha aumenta, e

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essa faixa nova que surge é chamada de “acrescido de marinha”. A faixa de terreno de marinha pode ser utilizada pelos particulares, por meio da enfiteuse, e, neste caso, por exemplo, os donos de apartamentos (enfiteuta) na beira-mar têm de pagar o foro anual para a União (senhorio).

• Os potenciais de energia hidráulica.• Os recursos minerais, inclusive os do subsolo.• As cavidades naturais subterrâneas e os sítios arqueológicos e pré-

históricos.• As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios.

É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração (CF, art. 20, § 1º).

A faixa de até cento e cinqüenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, designada como faixa de fronteira, é considerada fundamental para defesa do território nacional, e sua ocupação e utilização serão reguladas em lei (CF, art. 20, § 2º). A faixa de fronteira não é necessariamente bem da União, mas bem cujo uso e ocupação serão disciplinados pela União.

O rol do art. 20 da CF/88 não é taxativo. Segundo a maioria dos autores, a Constituição pode atribuir outros bens à União, fora os do art. 20.

1.1.2 Quanto à destinação

De acordo com esse critério, os bens podem ser de uso comum do povo, de uso especial e bens dominicais.

1.1.2.1 Bens de uso comum do povo

Destinam-se à utilização geral pela coletividade (ex: ruas, praças, praias, mares, estradas etc): o uso é indiscriminado e sem necessidade de autorização, em regra. Se a utilização é fora da normalidade, necessita-se, em tese, de autorização. Ademais, o Poder Público pode regulamentar a utilização do bem de uso comum, ponderando interesses públicos e privados.

CF, art. 5º, XVI: todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente.

Para a utilização do bem fora da normalidade, a jurisprudência exige o prévio aviso, sem necessidade de autorização, mas a autoridade pública poderá vetar o local escolhido por razões de interesse público, indicando outro local de mesma visibilidade e repercussão.

1.1.2.2 Bens de uso especial ou do patrimônio administrativo

Destinam especialmente à prestação de serviço público, encontrando-se afetados. São considerados instrumentos (aparelhamento estatal) na prestação do serviço público (ex: repartições públicas, escolas públicas, hospitais públicos, mercados municipais, teatros e museus públicos, aeroportos, veículos oficiais, navios militares, terras de silvícolas etc).

O bem de uso especial não é aquele utilizado exclusivamente pelo Estado. Os particulares poderão utilizar tais bens, observando, por óbvio, determinadas condições (ex: hospitais, escolas, cemitérios etc).

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Tanto os bens de uso comum do povo quanto os bens de uso especial estão destinados/afetados a uma finalidade pública.

1.1.2.3 Bens dominicais

São os desafetados, definidos por exclusão: se não são de uso comum do povo ou de uso especial, são bens dominicais (ex: terras devolutas, prédios públicos desativados, bens móveis inservíveis, dívida ativa etc).

Para a maioria dos autores, bem dominical é sinônimo de bem dominial. Cretella Jr., contudo, entende que os bens dominiais são todos aqueles que estão sob o domínio do Estado, e bens dominicais são os não afetados.

1.2 Regime jurídico dos bens públicos

1.2.1 Alienabilidade condicionada

Quanto à alienabilidade, tem-se que os bens públicos são alienáveis de forma condicionada (ou inalienáveis de forma relativa). Se os bens estão afetados (uso comum do povo ou uso especial), são inalienáveis, em regra. Já os bens dominicais são alienáveis na forma da lei.

Para que os bens de uso comum e os de uso especial sejam alienados, devem ser desafetados (desconsagrados), isto é, livrados de sua destinação pública. Segundo doutrina majoritária, para a afetação (consagração) do bem não é necessária qualquer formalidade (ex: lei, ato administrativo ou simples uso). É que, independentemente de qualquer ato formal, a simples destinação pública já afeta o bem anteriormente dominical (primazia do interesse público).

O caminho inverso, contudo, não é verdadeiro, pois a desafetação retira a proteção do bem, e, consequentemente, há maior rigor em relação a essa hipótese: o simples não uso não desafeta o bem. A maioria dos autores faz a seguinte distinção:47

• se o bem era de uso comum e se transformou em dominical, a doutrina entende que esta hipótese é a mais rigorosa, pois se está retirando o bem da coletividade. Neste caso, é necessário lei ou, no máximo, um ato administrativo previamente autorizado por lei;

• já se o bem era de uso especial e se quer transformá-lo em dominical, tal hipótese não é tão grave quanto a anterior, pois, aqui, não se retira o bem diretamente do povo. Esta desafetação, portanto, pode, segundo a doutrina, ser feita por lei, por ato administrativo ou em razão de um fato da natureza (ex: uma escola é destruída por um terremoto).

Uma minoria doutrinária (Celso Antônio Bandeira de Mello) chama de afetação/desafetação também a hipótese de transformação de bem de uso comum em bem de uso especial e vice-versa.

A alienação de bem público está prevista no art. 17 da Lei nº 8.666/93. Sendo o bem imóvel, tais são as hipóteses:

• se o imóvel for pertencente a uma pessoa jurídica de Direito Público, o primeiro requisito é autorização legislativa. Se o imóvel for pertencente a empresa pública ou sociedade de economia mista (pessoa privada), não há esta condição;

• declaração de interesse público na alienação: o Estado tem de demonstrar que representa interesse público a alienação do bem;

47 Para José dos Santos Carvalho Filho, a desafetação não depende de formalidade.

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• avaliação prévia;• licitação: se é imóvel, a modalidade de licitação é, em regra, a

concorrência. Contudo, é possível utilizar outra modalidade: excepcionalmente, é possível utilizar concorrência ou leilão, mais precisamente, nas hipóteses do art. 19 da Lei de Licitações (bem imóvel decorrente de decisão judicial ou de dação em pagamento).

A regra é a licitação, mas, excepcionalmente, por força do art. 17, a licitação será dispensada. Hipóteses de licitação dispensada são: doação, permuta, dação em pagamento.

Se o bem é móvel, ele, para ser alienado, necessita dos seguintes requisitos:• declaração de interesse público;• avaliação prévia; e• licitação, nas seguintes modalidades: (i) para móveis inservíveis,

apreendidos e penhorados (na verdade, empenhados), a modalidade é leilão; (ii) para outros móveis de até R$ 650.000,00, também se utiliza leilão; (iii) para outros móveis acima de R$ 650.000,00, a modalidade é a concorrência.

O art. 17 da Lei de Licitações também prevê hipóteses de licitação dispensada para alienação de bens móveis.

Para concursos de Ministério Público e procuradorias, o tema alienação de bem público é muito importante, principalmente para segunda fase. Este tema tem sido muito cobrado atrelado a improbidade administrativa.

1.2.2 Impenhorabilidade

Os bens públicos não podem ser objeto de penhora (garantia em ação de execução), arresto (cautelar para bem indeterminado) ou sequestro48 (cautelar para bem determinado), já que a alienação em hasta pública é hipótese vedada no caso de bem público.

A garantia para o particular em face do Estado, já que inexiste a possibilidade de penhora, é o regime de precatórios (CF, art. 100), regulamentado pela Resolução nº 115 do CNJ49.

1.2.3 Impossibilidade de oneração

Os bens públicos não podem ser objeto de direito reais de garantia (penhor, hipoteca e anticrese), institutos previstos no art. 1.419 do CC/02 (Nas dívidas garantidas por penhor, anticrese ou hipoteca, o bem dado em garantia fica sujeito, por vínculo real, ao cumprimento da obrigação). Isto porque a garantia pode ser convertida em penhora no caso de ação de execução, e já se viu que o bem público é impenhorável.

1.2.4 Imprescritibilidade

A imprescritibilidade dos bens públicos significa que eles não podem ser objeto de prescrição aquisitiva (usucapião). Assim, o Estado pode usucapir, mas não sofrer usucapião.

A CF, arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único, além do enunciado nº 340 da súmula do STF, explicitam que não há qualquer hipótese de usucapião sofrida pelo Estado.

1.3 Formas de aquisição de bens públicos

48 Exceto no caso de desrespeito à ordem cronológica de precatórios.49 Importante para concursos de magistratura.

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Existem inúmeras maneiras pelas quais o Estado pode adquirir bens, a saber (exemplificativamente):

• contratos comuns de compra e venda, doação, permuta etc;• dação em pagamento, que pode ser objeto de contrato ou não;• usucapião;• desapropriação, que é forma de aquisição originária da propriedade;• direito hereditário, via testamento ou herança jacente;• acessão natural: alveo abandonado (leito do rio abandonado), aluvião

e avulsão. O leito abandonado ocorre quando o rio seca ou há mudança no seu curso, adquirindo-se a área por onde o rio passava. Aluviões são pequenas quantidades de terras que descem dos imóveis superiores, por meio das águas, e se fixam nos imóveis inferiores. Avulsão é o deslocamento de terra perceptível. A aluvião não gera indenização. Já no caso de avulsão, ou se devolve a terra deslocada ou se indeniza;

• execução judicial, via arrematação ou adjudicação do bem;• parcelamento do solo urbano: constituição de loteamentos (a área

pública do loteamento, como ruas, é registrada em nome do Poder Público);

• pena de perdimento de bens, que está prevista no art. 91 do Código Penal e na Lei nº 8.429/92;

• abandono de bens (art. 1.275 do CC/2002);• reversão de bens, que ocorre no caso de extinção contratual.

Aula 2 (xx de agosto de 2012)

1.4 Gestão dos bens públicos

Excepcionalmente, os bens públicos fogem do padrão normal, quando o Estado confere ao particular utilização de determinado bem público de maneira diversa do normal. Exemplo: fechar a rua para festa; reservar trecho da praia para realizar evento.

Por seu fim natural, a utilização do bem pode ser normal, quando o particular não precisa de autorização, isto é, não necessita do consentimento do Estado, ou anormal, hipótese em que o Poder Público deve referendar o pedido do particular de utilizar o bem (ex: ocupar parte da calçada com cadeiras do restaurante).

A utilização comum ou geral é aquela sem contraprestação por parte do particular (ex: entrada franca em museu público) ou sem qualquer outra condição. Na utilização especial, o Estado exige contraprestação (ex: cobrança para entrada em museu público, zona azul, pedágio etc), caso de utilização especial remunerada, ou permite a privatividade, caso de utilização especial privativa (ex: festa particular na praia).

Três são os instrumentos mais comuns que permitem a utilização privativa: • Autorização de uso de bem público (diferente da autorização por meio

da qual se transfere a execução de serviço público): utilizada para eventos ocasionais ou temporários (nem se repete todo dia nem dura para sempre). Exemplos: micareta, quermesse etc. A autorização de uso é um ato unilateral, o que significa que a Administração decide sozinha, autoriza se quiser (é um ato discricionário). Como se trata de um ato discricionário, ele é praticado de acordo com a conveniência e oportunidade do interesse público. Inclusive, no exemplo das micaretas, muitos municípios têm proibido ou transferido para outras localidades, haja vista o transtorno que causam para o local. A autorização é um ato precário, motivo pelo qual pode ser revogada a qualquer tempo, sem dever de indenização, nem mesmo se a autorização for dada por tempo determinado e revogada antes do fim do prazo (ao contrário do que ocorre com a permissão de uso de bem

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público). A autorização de uso é concedida tendo em vista a satisfação do interesse privado, e não do interesse público. Na autorização de uso, é o particular que se dirige ao Poder Público e requer a autorização. Resumo: interesse particular; ato precário, discricionário, unilateral e temporário.

• Permissão de uso de bem público: concedida como forma de satisfazer o interesse particular e o interesse público. A permissão de uso é para situações permanentes, e não ocasionais como ocorre na autorização. Embora seja para situações permanentes, a permissão pode ser desfeita a qualquer tempo com facilidade. Exemplo: permissão para um bar colocar mesas na calçada. Difere da permissão para execução de serviço público, realizada por meio de contrato. A permissão de uso de bem público é materializada por meio de ato administrativo unilateral, discricionário e precário. Não há dever de indenizar em caso de o ato de permissão ser retirado. Resumo: ato unilateral, discricionário, precário.

• Concessão de uso de bem público: se aplica às situações em que, sendo permanentes, para serem desfeitas, devem observar maiores formalidades. Exemplo: feira de artesanato (não aquela que é instalada em um simples galpão, mas aquela que é instalada com construção de bancadas, de banheiros etc). A concessão de uso de bem público é feita tendo em vista o interesse público, não o privado. Este instituto é utilizado, geralmente, quando é necessário maior investimento, tratando-se não de um ato unilateral da Administração, mas de um contrato administrativo. Portanto, a concessão de uso, constituída por contrato administrativo, é utilizada para situações com definitividade e em que há maior investimento. Como a concessão de uso de bem público é contrato administrativo, é temporário e exige pagamento de indenização em caso de rescisão contratual antes do termo final. Exemplos: restaurantes e lanchonetes em órgãos públicos.

Além dos institutos de Direito Público (autorização, permissão e concessão de uso de bem público), o Estado também pode conceder a utilização especial de um bem público por meio de institutos de Direito Privado, a exemplo da locação e do arrendamento.

A utilização compartilhada é a que ocorre quando o Estado e o particular usam, ao mesmo tempo, o mesmo bem. Exemplos: telefone público (orelhão), que, instalado na calçada, pertence à concessionária do serviço de telefonia; placa de rua no muro da casa etc. Nestas hipóteses, o Estado e o particular utilizam o bem ao mesmo tempo.

2 INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE PRIVADA

Esse tema não cai em todos os concursos. Contudo, uma vez constando do edital, com certeza será cobrado, principalmente desapropriação.

A Constituição garante o direito de propriedade; por isto, a intervenção do Estado na propriedade é uma exceção. O direito de propriedade está garantido na Constituição Federal, mais precisamente em seu art. 5º, XXII e XXIII.

O direito de propriedade é o direito de usar, gozar, fruir, dispor e reaver o bem. É exercido em caráter absoluto, exclusivo e perpétuo. O caráter absoluto da propriedade significa a liberdade com que o direito de propriedade é exercido: o proprietário faz o que quer na sua propriedade, tem total liberdade. O caráter exclusivo da propriedade significa que o dono da propriedade tem o uso exclusivo do seu bem. O caráter perpétuo significa que o bem pertence ao seu proprietário enquanto esta for a vontade dele (pode ser para sempre, se o proprietário assim desejar).

Quando se fala em direito de propriedade, essas três características estão presentes. Quando há intervenção na propriedade, um desses três caracteres é atingido (na

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desapropriação, atinge-se o caráter perpétuo; na servidão, atinge-se o caráter exclusivo; na limitação, atinge-se o caráter absoluto). É importante saber qual característica é atingida em cada modalidade, pois isso tem sido muito cobrado em concursos.

Na maioria dos casos de intervenção do Estado na propriedade, o Poder Público restringe parte desse direito (ora a exclusividade, ora o caráter absoluto, ora a perpetuidade), mas não a suprime. Na maioria dos casos, a intervenção é restritiva (o dono continua dono, a exemplo da limitação, ocupação, requisição, tombamento, servidão). A única hipótese em que o dono deixa de ser dono é a desapropriação, que, justamente por este motivo, é chamada de modalidade supressiva do direito de propriedade.

Muitos autores (a doutrina moderna) dizem que a intervenção na propriedade representa o exercício do poder de polícia, salvo no caso de desapropriação, que não é poder de polícia, já que se está tomando a propriedade (Celso Antônio, Maria Sylvia di Pietro). Poder de polícia é nada mais que a restrição da atuação do particular em nome do bem-estar social, para buscar o interesse público, para compatibilizar interesses.

Para a doutrina moderna, desapropriação não é exercício do poder de polícia, mas sacrifício de direito, pois, por meio dela, retira-se um direito, especificamente, a propriedade, do particular. Já para a doutrina clássica, o poder de polícia é fundamento apenas da limitação administrativa, e não de todas as hipóteses de intervenção na propriedade.

Se, na prova de concurso, afirmar-se que poder de polícia é fundamento da limitação administrativa, estará correta a assertiva. E também estará correta a assertiva que afirmar que poder de polícia é fundamento de todas as intervenções do Estado na propriedade, exceto a desapropriação.

Há dois fundamentos para a intervenção do Estado na propriedade:• Supremacia do interesse público: este fundamento aparece na maioria

das intervenções na propriedade. Assim, o Estado, na maioria dos casos, interfere na propriedade com base no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.

• Prática de ilegalidade: em algumas situações, a prática de uma ilegalidade é o fundamento da intervenção. Exemplos: desapropriação confiscatória em virtude do cultivo de plantas psicotrópicas; descumprimento da função social da propriedade urbana etc.

Assim, em regra, a intervenção ocorre com fundamento na supremacia do interesse público. Excepcionalmente, é possível que a intervenção do Estado na propriedade se fundamente na prática de uma ilegalidade.

2.1 Limitação administrativa

Exemplo: hipoteticamente, o Poder Público, em nome da ventilação da cidade, do meio ambiente, de regras urbanísticas, pode instituir uma limitação administrativa para determinar que os edifícios à beira-mar não tenham mais de 6 andares.

Essa atuação é de caráter geral ou individual? Evidentemente, é uma atuação de caráter geral. Se a limitação administrativa é de caráter geral, é imposta por meio de normas gerais e abstratas, isto é, aplicáveis a todos que estiverem na mesma situação.

A limitação administrativa atinge o caráter absoluto da propriedade, pois o que ela restringe é a liberdade no exercício do direito de propriedade. É uma restrição ao caráter absoluto.

O grande fundamento da limitação administrativa é o exercício do poder de polícia. Essa modalidade de intervenção está intimamente ligada ao direito de construir. Contudo, não é em absolutamente todos os casos que tem relação com o direito de construir, podendo dizer respeito a outros assuntos.

A limitação administrativa gera dever de indenizar? Em regra, a limitação administrativa não gera dever de indenizar. É que a limitação administrativa, em regra, gera efeitos apenas para o futuro (ex: não se determina a demolição de nenhuma obra, mas apenas os limites às construções futuras).

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É possível, contudo, que a limitação administrativa constitua obrigação para construções já concluídas, e, neste caso, gera dever de indenizar, decorrente do fato de que a limitação impõe obrigação para o passado.

Não se deve confundir a limitação administrativa com a limitação do Direito Civil. Basicamente, a diferença é o interesse protegido: na limitação civil, protege-se um interesse privado, enquanto na limitação administrativa protege-se um interesse público. Exemplo de limitação civil é o direito de vizinhança.

Aula 3 (29 de agosto de 2012)

2.2 Servidão administrativa

A servidão administrativa é direito real sobre coisa alheia. Se se fala em servidão administrativa como direito real sobre coisa alheia, significa que o bem não é do Estado, mas de um particular ou de outro ente político. Assim, se o bem sobre o qual recai a servidão administrativa é adquirido pelo ente interveniente, a servidão deixa de existir, pois a coisa deixa de ser alheia. A servidão é um direito que se constitui sobre bens dos outros.

A servidão administrativa, para se constituir, precisa ser transcrita no registro do respectivo imóvel: averba-se, na escritura do imóvel, a servidão. Logo, para formalizar/constituir a servidão, é necessário o registro.

Hoje, no Brasil, há servidões que não dependem de registro para serem constituídas. É que a servidão não é constituída só através do registro. Há três formas de constituição da servidão, quais sejam: (i) previsão legal; (ii) registro, quando oriunda de acordo; (iii) decisão judicial. O objetivo do registro é dar publicidade, protegendo terceiros de boa-fé. Se a servidão decorre de lei, não é necessário o registro, pois já existe a publicidade. Se decorrer de decisão judicial, tem de haver o registro.

Enquanto direito real, a servidão, assim como a propriedade, constitui-se com caráter perpétuo: existirá enquanto for da vontade do Estado, enquanto estiver presente o interesse público nela. Exemplo: para prestar o serviço de saneamento básico (ou de energia elétrica) a determinada área, é necessário que a tubulação do saneamento (ou a fiação da energia elétrica) passe por dentro de uma propriedade. Essa passagem é a servidão administrativa.

Como se vê, a servidão administrativa é constituída para a realização de um serviço público ou de uma utilidade pública. Depende de autorização legislativa específica. Ademais, na servidão administrativa, a indenização é possível, mas apenas ocorre se houver dano efetivo (exemplo: incendiarem-se os cabos de energia elétrica, danificando a propriedade).

É possível constituir servidão administrativa sobre bem público? Sim, é possível, sem nenhuma restrição. União pode instituir servidão sobre bem do município; Estado pode instituir servidão sobre bem da União etc. Aqui, não se aplica o princípio da hierarquia federativa (este só se aplica em caso de desapropriação).

A servidão administrativa não retira a propriedade, mas apenas a restringe. É uma intervenção restritiva (o dono continua dono) no caráter exclusivo.

No caso das torres de alta tensão, o Poder Público, ao instalá-las, determina que não se pode construir, morar, plantar na área em que instaladas as torres. Como dito, na servidão, o dono continua dono. Assim, se, a título de servidão, o Poder Público acaba por impedir o uso do bem, trata-se, na verdade, de uma intervenção supressiva, e não restritiva (o Estado, na verdade, não apenas restringe, mas suprime a propriedade, toma-a para si).

Nos casos em que o Poder Público, sob o pretexto de estar instituindo uma servidão, na verdade, impede o uso e/ou lhe esvazia o conteúdo econômico, a intervenção é não restritiva, mas supressiva, pois o Estado, neste caso suprime a propriedade. Portanto, trata-se de uma forma de desapropriação, mas sem as formalidades da desapropriação

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exigidas pela lei. A desapropriação feita sem a observância dos ritos legais é chamada de desapropriação indireta. Se há desapropriação indireta, há o dever de indenizar pelo bem tomado. A hipótese das torres da alta tensão já foi reconhecida pela jurisprudência como desapropriação indireta.

Limitação administrativa Servidão administrativa

A atuação da Administração é geral: destinatários indeterminados, atingindo todos que se encontram na mesma situação.

A atuação da Administração tem destinatário específico.

Atinge o caráter absoluto da propriedade. Atinge o caráter exclusivo da propriedade.

Em regra, não há dever de indenizar. Há dever de indenizar, se houver dano efetivo.

A servidão civil não se confunde com a servidão administrativa. A servidão civil tutela interesse privado e é estudada pelo Direito Civil. A servidão administrativa tutela interesse público e é estudada pelo Direito Administrativo. A relação de dominação entre o serviente e o dominante é diferente na servidão civil e na servidão administrativa. É verdade que tanto a servidão civil quanto a administrativa são constituídas sobre uma relação de dominação. Essa relação de dominação é diferente em cada uma das situações.

Servidão civil: imóvel X é encravado, não possuindo acesso à via pública. Para que tal imóvel tenha acesso à via pública, para permitir seu acesso e o escoamento de sua produção, tem de ser constituída uma servidão sobre o imóvel Y (servidão de passagem). Neste caso, o imóvel X é o dominante e o imóvel Y é o serviente. A relação de dominação que ocorre no Direito Civil é sempre de um bem sobre outro bem.

Servidão administrativa: partindo do mesmo exemplo anterior, o serviço de energia elétrica, para chegar ao imóvel X, precisa passar pelo imóvel Y. Na servidão administrativa, o dominante é um serviço ou uma utilidade pública, que passa por um bem (o serviente). Na esfera administrativa, a dominação se dá por um serviço ou utilidade pública sobre um bem.

2.3 Requisição

Segundo o art. 5º, XXV, CF/88, no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano.

O fundamento da requisição é o iminente perigo. A requisição é uma situação temporária, permanecendo enquanto estiver presente o perigo. O proprietário será ulteriormente indenizado se houver dano. Exemplo: requisição de um galpão para abrigar flagelados da chuva. O caráter da propriedade que a requisição atinge é a exclusividade, pois o proprietário a exerce junto com o Estado.

Como dito, a requisição tem caráter temporário. Ocorre que, na prática, muitas vezes, o Poder Público não toma as providências para devolver o bem (por exemplo, retirar os desabrigados do galpão), de modo que o particular tem de tomar providências cabíveis (por exemplo, propor reintegração de posse). O particular, na requisição, muitas vezes fica à mercê do Poder Público.

No caso em que o Poder Público requisita alimentos em um frigorífico, para alimentar desabrigados, trata-se, realmente, de requisição? Neste caso, o Poder Público, à primeira vista, não apenas restringe o direito de propriedade, mas o suprime, toma os gêneros alimentícios. Contudo, é realmente requisição, e não desapropriação. Segundo a doutrina, se os bens forem móveis e fungíveis, tratar-se-á, realmente, de requisição.

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Podendo-se devolver outro bem na mesma qualidade e quantidade, não fica caracterizada a desapropriação. Todavia, se o Poder Público, por exemplo, requisitar roupas que já têm dono, que já foram vendidas pela fábrica ao consumidor, não se tratará de requisição, mas de desapropriação, pois, neste caso, a roupa adquiriu identidade.

A requisição pode recair sobre móveis, imóveis e serviços.

2.4 Ocupação temporária

A ocupação temporária pode ocorrer em duas hipóteses, a saber:• Quando o Poder Público precisa construir uma obra pública e, para tal

fim, ocupa o terreno vizinho não edificado, para guardar os materiais da obra. Logo, pode ocorrer a ocupação temporária de imóvel vizinho a obra pública, com o fim de guardar os materiais utilizados na obra. Tal imóvel tem de ser não edificado. Esta hipótese está prevista no Decreto-Lei nº 3.365/41, que, apesar de ser norma geral sobre desapropriação, também traz algumas regras sobre outras modalidades de intervenção na propriedade. É o caso de ocupação mais cobrado em concursos.

• Para evitar desapropriação desnecessária. É a hipótese de haver suspeitas de existir um parque arqueológico ou mineral no imóvel de um particular. Neste caso, o normal seria desapropriar, para proceder à pesquisa, mas, aí, haveria o risco de, após desapropriar, descobrir-se que não há parque arqueológico algum, o que revelaria inutilidade na desapropriação. Logo, quando há suspeita de parque arqueológico, bem como de minérios, realiza-se a ocupação temporária, para proceder a essas pesquisas. Aqui, o objetivo, como dito, é evitar uma desapropriação desnecessária. Se, feita a pesquisa, identifica-se a existência de um parque arqueológico ou de minério, aí sim, realiza-se a desapropriação.

As características da ocupação temporária são as seguintes: (i) temporariedade (durando apenas enquanto ocorrer a obra ou pesquisa); (ii) restrição da propriedade, e não supressão; (iii) afeta o caráter exclusivo da propriedade; (iv) só há dever de indenizar no caso de efetivo dano.

2.5 Tombamento

Está previsto no Decreto-Lei nº 25/1937 e no art. 216, § 1º, da CF.A ideia do tombamento é de conservação da identidade de um povo. O

tombamento mais comum é o histórico. Porém, também são possíveis o tombamento cultural, o artístico (tombar, por exemplo, uma dança folclórica) e o paisagístico. São quatro hipóteses diferentes, cada uma delas se destinando à preservação do patrimônio relacionado ao tipo de tombamento.

O tombamento representa uma limitação perpétua ao caráter absoluto do direito de propriedade. Dessa forma, enquanto o patrimônio tombado existir, o tombamento também existirá.

Imagine-se que o Poder Público resolve tombar uma casa como patrimônio histórico. O dono da casa continuará na casa e continuará sendo dono, porém, não poderá modificar as características do imóvel. Logo, o caráter da propriedade atingido pelo tombamento é o absoluto: o sujeito continua dono, mas não pode modificar as suas características, o que mostra que se trata de uma intervenção que atinge a liberdade do proprietário e, portanto, o caráter absoluto da propriedade.

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O tombamento é uma restrição parcial, e não total, da propriedade. Contudo, há situações em que o Poder Público, alegando tombamento, impede que o proprietário tenha qualquer margem de liberdade sobre sua propriedade. Trata-se, na verdade, de mera simulação de tombamento. Se o Poder Público, na verdade, em vez de restringir o direito de propriedade, suprime o mesmo (impedindo que o proprietário tenha qualquer liberdade sobre o bem, que o proprietário goze economicamente do bem), não se trata de tombamento, mas de desapropriação indireta. Neste caso, a modalidade de intervenção na propriedade não é restritiva, mas supressiva.

Para a constituição do tombamento, além da necessidade da averbação da restrição no registro do imóvel, é necessário que essa intervenção tenha sido registrada em um livro próprio da Administração, o “Livro do Tombo”, no qual fica consignada a informação de que o bem está tombado. Logo, há três procedimentos necessários para constituir o tombamento: procedimento administrativo + registro no livro do tombo + averbação na escritura do imóvel.

O tombamento pode ser realizado em bens públicos ou privados, móveis ou imóveis.

Em regra, o tombamento não gera dever de indenizar. Contudo, é possível que haja dever de indenizar, quando o tombamento constituir também uma obrigação de fazer: por exemplo, quando o Poder Público tomba uma casa que está muito velha, precisando de cuidados, e determina que o proprietário faça uma obra de conservação da fachada. Neste caso, há o dever de indenizar.

Há dois tipos diferentes de competência para tombamento: competência material e competência legislativa. A competência material é a competência de realizar o tombamento. A competência material é competência comum, ou seja, cabe a todos os entes (todos os entes podem tombar, de acordo com o interesse local, regional ou nacional), conforme o art. 23, III, CF/88 (É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: [...] III - proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos; [...]). Nada impede que todos os entes políticos realizem tombamento sobre um mesmo bem.

Já a competência legislativa, que é a de legislar sobre tombamento, é concorrente, conforme o art. 24, VII, CF/88 (Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: [...] VII - proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; [...]). Portanto, à União cabe editar normas gerais, e aos Estados a competência para complementar as disposições gerais da União.

O tombamento pode ser realizado por pessoa jurídica da administração indireta? Não há nenhuma proibição contra isto no nosso ordenamento jurídico. Porém, não há, também, nenhuma lei que tenha criado uma entidade administrativa para esse fim. O comum, hoje, é que apenas os entes políticos realizem o tombamento.

O tombamento gera, para o proprietário do bem tombado, certas obrigações, a saber:

• Dever de conservar o bem tombado. Quando se fala em tombamento, o cuidado que se deve ter é o seguinte: como se sabe, o dever de preservação do bem tombado é imposto ao seu proprietário. Se este, para conservar o bem, precisar realizar uma reforma, será necessário obter uma autorização prévia do Poder Público. Ocorre que, em muitos casos, o Poder Público, quando requerido, demora muito para se pronunciar sobre a autorização para realizar a reforma de conservação. Contudo, se o proprietário realizar a obra sem a necessária autorização, será caracterizado o dano ao patrimônio tombado (podendo o proprietário ser processado pelo crime de dano). Realizar qualquer conserto sem autorização prévia caracteriza dano, e

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danificar é uma obrigação negativa imposta ao proprietário do patrimônio tombado. Logo, não danificar também é um dever inerente ao tombamento.

• É possível que sejam necessárias obras de conservação do bem, sem que o proprietário tenha condições de realizar a preservação. Neste caso, o indivíduo terá a obrigação de comunicar o ente que tombou, para que tome as devidas providências. Como se vê, a falta de dinheiro (de condições financeiras) não desobriga o proprietário da comunicação.

• Quando o tombamento recai sobre um bem público, esse bem se torna inalienável de forma absoluta, não podendo, portanto, ser transferido. Contudo, há uma ressalva: o bem pode ser transferido entre os próprios entes envolvidos. Exemplo: a União tomba um bem do Estado, o qual se torna inalienável de forma absoluta; contudo, o Estado, se quiser, pode transferir esse bem para a União. Esta é a única possibilidade de transferência de bem público tombado.

• Em caso de extravio ou furto, o proprietário tem cinco dias para comunicar.

• O patrimônio tombado gera, para o ente que o tombou, um direito de preferência na aquisição desse bem. Quem tombou pode comprar o bem tombado em primeiro lugar.

• O patrimônio tombado não pode sair do país, salvo por curto espaço de tempo, conforme o art. 14 do Decreto-Lei nº 25/1937. Exemplo: é tombada uma escultura, a qual passa a não poder sair do País. Contudo, se um museu em país estrangeiro realiza uma exposição, é possível que essa escultura deixe o Brasil para participar da exposição, por curto espaço de tempo.

• O proprietário de patrimônio tombado tem o dever de suportar a fiscalização por parte do Poder Público.

• O vizinho do patrimônio tombado não pode instalar placas e/ou cartazes que prejudiquem a visibilidade do patrimônio. É que o patrimônio tombado serve para contar a história de um povo, de modo que, se tiver sua visibilidade prejudicada, não conseguirá atingir os seus objetivos. Essa obrigação imposta ao vizinho não gera a obrigação de o Poder Público indenizar, devendo o particular, simplesmente, abster-se de atrapalhar a visibilidade do bem tombado. É o entendimento que prevalece.

Há várias modalidades de tombamento, a saber:• Quanto à eficácia: o tombamento acontece em dois momentos

diferentes, havendo o (i) tombamento provisório, que ocorre enquanto o procedimento de tombamento está em curso, com o fim de evitar que o proprietário frustre o tombamento; e o (ii) tombamento definitivo, ocorrente apenas quando chega ao fim o procedimento de tombamento.

• Quanto à constituição ou procedimento: o tombamento pode ser (i) voluntário, constituindo-se a pedido do interessado ou com a sua anuência; ou (ii) compulsório (tombamento de ofício), ocorrendo quando o proprietário não tenha pedido ou não queira o tombamento.

• Quanto aos destinatários: o tombamento pode ser (i) geral, atingindo uma área inteira, seja uma rua, um bairro, uma cidade; ou (ii) individual, que atinge um proprietário específico e um bem determinado.

2.6 Desapropriação

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É uma modalidade supressiva da propriedade, porque o Estado não apenas restringe, mas retira o direito de propriedade, transferindo-o para si. Trata-se de forma de aquisição originária da propriedade, o que significa que o Estado a adquire independentemente de qualquer relação anterior com o antigo proprietário.

Celso Antônio Bandeira de Mello chama a desapropriação de “sacrifício de direito”, pois ela não apenas restringe a propriedade, mas a retira. Logo, não se pode dizer que a desapropriação é manifestação do poder de polícia, já que se trata de sacrifício de direito.

Se o direito de propriedade, na desapropriação, é retirado, o caráter do direito de propriedade que é atingido é a perpetuidade: o caráter perpétuo do direito de propriedade significa que a propriedade será do dono enquanto for da sua vontade. Portanto, a desapropriação afeta o caráter perpétuo da propriedade.

Deve-se lembrar, sempre, que a desapropriação é uma transferência compulsória da propriedade: o Estado adquire o bem independentemente da vontade do proprietário, mediante indenização.

Há a competência material (competência para efetuar a desapropriação) e a competência legislativa para desapropriar. Segundo o art. 22, II, CF/88, somente a União pode legislar sobre desapropriação (Compete privativamente à União legislar sobre: [...] II - desapropriação; [...]). A competência material é, em primeiro lugar, dos entes políticos.

A desapropriação tem duas etapas: a fase declaratória (declaração do interesse na desapropriação do bem) e a fase executiva (concretização da desapropriação). Quando é um ente político que desapropria, ele pode realizar todas as fases da desapropriação (pode declarar e pode executar a desapropriação). O Decreto-Lei nº 3.365/41, contudo, prevê, em seu art. 3º, que também podem promover a desapropriação os delegados.

Quando o diploma legal fala em delegados, a quem ele se refere? Veja-se que esse Decreto-lei é de 1941, quando o conceito de delegado era bastante diferente do que se tem hoje. Assim, o que se deve entender por “delegados”, nos moldes do art. 3º do Decreto-Lei nº 3.365/41, são os entes da Administração Indireta (autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista), as concessionárias e permissionárias de serviço público, bem como os demais delegados.

Esses entes previstos no art. 3º do Decreto-Lei nº 3.365/41 têm competência material, mas não podem realizar todas as etapas da desapropriação. Os delegados apenas podem realizar a fase executiva da desapropriação. Exemplo: a União decreta a desapropriação e transfere a execução a uma autarquia (esta irá pagar e imitir-se na posse do bem). Portanto, a competência material dos delegados não é plena, mas restrita à fase executiva da desapropriação, não possuindo competência para decretar a desapropriação. Logo, os entes do art. 3º do Decreto-Lei nº 3.365/41 dependem da atuação prévia dos entes políticos.

É importante memorizar os cinco elementos definidores da desapropriação (e de cada modalidade de desapropriação). Esses elementos são os seguintes: (i) objeto; (ii) competência (sujeito ativo); (iii) fundamento da desapropriação; (iv) indenização; e (v) procedimento.

2.6.1 Objeto

É possível a desapropriação de bens móveis (determinado uniforme utilizado em evento importante) e de bens imóveis, em que pese ser mais comum a desapropriação destes últimos. É possível, também, a desapropriação de bens corpóreos e de bens incorpóreos (por exemplo, as ações de uma empresa). Também é cabível a desapropriação de espaço aéreo. É possível, igualmente, a desapropriação de subsolo.

Podem ser desapropriados tanto os bens privados quanto os bens públicos. Quanto aos bens públicos, é inegável que eles podem ser objeto de desapropriação. Contudo, há uma ressalva a ser feita: o art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 3.365/41 determina que o bem público, para ser desapropriado, tem de respeitar uma ordem, podendo a União desapropriar bens dos Estados e dos municípios; os Estados desapropriar bens dos seus

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próprios municípios; restando aos municípios desapropriar, tão somente, o patrimônio privado. Trata-se do princípio da hierarquia federativa.

É verdade que o município não pode desapropriar bem da União. Todavia, o município tem competência material para desapropriar. O problema, aqui, não está na competência do município, mas no objeto que ele está desapropriando. O vício, aqui, não é de competência, mas de objeto. Logo, o município pode desapropriar, mas deve respeitar a ordem do art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 3.365/41, o qual, se desrespeitado, gera vício de objeto e não vício de competência.

Há bens que não podem ser objeto de desapropriação, quais sejam: (i) direitos da personalidade; (ii) direito autoral; (iii) direito à vida; (iv) direito à imagem; (v) direito a alimentos.

2.6.2 Modalidades

2.6.2.1 Desapropriação comum, ordinária ou geral

É a regra geral, com indenização prévia, justa e em dinheiro.Ocorre por (i) necessidade pública, por (ii) utilidade pública ou por (iii)

interesse social. Tem como fundamento o art. 5º, XXIV, CF/88 (a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição).

Necessidade ou utilidade pública é hipótese de desapropriação que está prevista no Decreto-Lei nº 3.365/41, o qual estabelece uma lista de fundamentos que caracterizam necessidade ou utilidade pública. Essa lista está prevista no art. 5º do referido diploma.

O legislador tratou a necessidade e a utilidade pública como expressões sinônimas, mas a doutrina entende que são conceitos diferentes. A diferença apontada pela doutrina é a seguinte: se a desapropriação se fundar em motivo urgente, enquadra-se como necessidade pública; se o mesmo motivo não apresentar urgência, tratar-se-á de utilidade pública. A lista é a mesma para as duas hipóteses, sendo a diferença dada pela presença ou não de urgência.

Além de necessidade e da utilidade pública, a desapropriação comum ou ordinária também pode ter como fundamento/pressuposto o interesse social. O interesse social está disciplinado na Lei nº 4.132/62, a qual traz, em seu art. 2º, um rol de situações que representam interesse social: normalmente, as hipóteses de interesse social estão ligadas à redução das desigualdades sociais (desapropriar para construção de casas, por exemplo).

Quando se fala em desapropriação comum ou ordinária, todos os entes podem realizá-la, seja por motivo de necessidade, de utilidade pública ou motivo de interesse social. Ademais, todos os bens podem ser objeto de desapropriação comum, salvo os expressamente vedados.

Os bens desapropriados por interesse social podem ser transferidos, uma vez que podem ser destinados a particulares. Ex: desapropriação para construção de parque industrial (desapropriação urbanística); desapropriação do entorno a obra pública, para após vendê-lo quando valorizado (desapropriação por zona ou extensão).

2.6.2.2 Desapropriação extraordinária ou sancionatória

Essa modalidade ocorre em dois casos: de descumprimento da função social da propriedade e de tráfico de entorpecentes. Aqui, portanto, ela aparece/funciona como pena, como sanção.

As hipóteses de desapropriação sancionatória são as seguintes:

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• Descumprimento da função social da propriedade (CF, art. 5º, XXII: a propriedade atenderá a sua função social): é necessário ter em mente que a função social não é um parâmetro subjetivo. O que caracteriza a função social e o que caracteriza o seu descumprimento? É a lei que determina o que é a função social da propriedade. A primeira hipótese de desapropriação-sanção por descumprimento da função social é a desapropriação para fins de reforma agrária (desapropriação rural). Os seus fundamentos se encontram nos arts. 184 e 191 da CF/88, estando a matéria regulamentada na Lei nº 8.629/93, na Lei Complementar nº 76/93 e na Lei Complementar nº 88/96. A Lei nº 8.629/93 prevê, em seu texto, hipóteses de cumprimento da função social da propriedade, a exemplo do respeito às regras ambientais, do respeito às regras da relação de trabalho, do adequado aproveitamento da propriedade. A desapropriação-sanção rural (isto é, para fins de reforma agrária) só pode ser realizada pela União. Ademais, essa desapropriação só pode atingir bens imóveis rurais. A indenização, neste caso, se dará em títulos da dívida agrária (TDA), emitidos pelo governo, em caso de reforma agrária, e eles são resgatáveis em até 20 anos, a partir do segundo ano de sua emissão. A indenização paga em TDA, resgatável em até 20 anos, diz respeito apenas à terra nua. As benfeitorias necessárias e úteis são indenizadas em dinheiro (as voluptuárias são pagas em TDA). Não podem ser desapropriadas: pequena e média propriedades, desde que o proprietário não possua outra, e seja a propriedade produtiva, conforme o art. 185, I e II, CF/88. A segunda hipótese de desapropriação-sanção é a desapropriação urbana (ou urbanística), que tem como fundamento o descumprimento do plano diretor. As justificativas para essa hipótese de desapropriação se encontram no art. 182, § 4º, CF/88, e a regulamentação é feita pela Lei nº 10.257/01 (Estatuto da Cidade). Primeiro, o município determina o parcelamento (loteamento) ou edificação (construção) compulsórios. O proprietário tem 1 ano para elaborar o projeto e 2 anos para iniciar a execução do projeto. Se o proprietário ignorar a determinação de parcelamento ou edificação compulsórios, permanecendo, portanto, em descumprimento da função social, o município institui o IPTU com alíquota progressiva no tempo. Essa alíquota pode chegar a 15%, durante o decorrer de 5 anos, não podendo a alíquota de um ano ser superior ao dobro da alíquota do ano anterior. A prática mostra que essa é a hipótese mais eficaz. Se, mesmo com a cobrança de IPTU com alíquota progressiva, o proprietário não cumpre as medidas determinadas pelo município, aí sim, ocorre a desapropriação. No caso de desapropriação urbanística, a competência para realizá-la é somente dos municípios e do Distrito Federal. Neste caso, apenas pode ser objeto da desapropriação imóvel urbano, e a indenização é feita em TDP (título da dívida pública), resgatável em até 10 anos.

Aula 4 (xx de agosto de 2012)

• Prática de ilícito: é a desapropriação-sanção para caso de tráfico ilícito de entorpecentes. Esta hipótese está prevista no art. 243 da CF/88 e na Lei nº 8.257/91. O dispositivo constitucional prevê a desapropriação confiscatória quando há glebas de terras utilizadas para plantação de psicotrópicos proibidos no imóvel. Neste caso, após a desapropriação, o bem é destinado ao assentamento de colonos, para a plantação de produtos alimentícios e medicamentosos. Não é devida nenhuma

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indenização. Além disso, podem ser objeto da desapropriação confiscatória quaisquer bens de valor econômico apreendidos em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes (como um carro utilizado para o transporte das drogas). O bem expropriado, neste caso, será destinado à investigação e repressão do tráfico ou para casas de recuperação de viciados. Essa desapropriação é chamada, também, de desapropriação-confisco ou de expropriação, porque não há, no caso, o dever de indenizar. O Estado toma o bem e não há indenização.

2.6.2.3 Desapropriação indireta

É o ponto mais polêmico na doutrina, no tema intervenção do Estado na propriedade.

Muitas vezes, a Administração finge uma intervenção restritiva, mas, na verdade, retira a propriedade. Quando ela faz isso, pratica, na verdade, uma desapropriação, mas sem observar o procedimento legalmente previsto. Tal hipótese é chamada de desapropriação indireta.

A desapropriação indireta atua, portanto, como um esbulho administrativo: a Administração simplesmente toma a propriedade, já que realiza uma desapropriação sem observar o procedimento devido, sem formalidades, sem tomar os cuidados necessários. Trata-se de um apossamento irregular, verdadeiro abuso perpetrado pela Administração Pública.

Há uma linha muito tênue entre as modalidades restritivas de intervenção no direito de propriedade e a desapropriação indireta. Por exemplo, quando a Administração institui uma servidão e diz que, na área, o proprietário não pode construir, não pode transitar, não pode permanecer, está, na verdade, suprimindo a propriedade. Contudo, a análise não é fácil no caso concreto. Diante disso, o STJ criou parâmetros objetivos para distinguir a desapropriação indireta das modalidades restritivas de intervenção na propriedade, como fez no ERESP 92278650.

Os requisitos para se falar em desapropriação indireta são os seguintes: (i) que o bem já se encontre apossado pelo Estado, sem a observância do devido processo legal; (ii) o bem apossado tem de já estar afetado, isto é, destinado a uma finalidade pública; (iii) a situação fática tem de ser irreversível (tem de ser impossível retornar à situação original); e (iv) ter ocorrido a total desvalorização do bem.

Esses requisitos são cumulativos, à exceção do último (ter ocorrido a total desvalorização do bem), que é autônomo em relação aos três anteriores. Tais parâmetros

50 ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. DECRETO N. 750/93. PRESERVAÇÃO DA MATA ATLÂNTICA. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA DE ESVAZIAMENTO DO CONTEÚDO ECONÔMICO DO PROPRIEDADE. PRECEDENTES DE AMBAS AS TURMAS E DA PRÓPRIA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO DO STJ. 1. A desapropriação indireta pressupõe três situações, quais sejam: (i) apossamento do bem pelo Estado sem prévia observância do devido processo legal; (ii) afetação do bem, ou seja, destina-lo à utilização pública; e (iii) irreversibilidade da situação fática a tornar ineficaz a tutela judicial específica. 2. A edição do Decreto Federal n. 750/93, que os embargantes reputam ter encerrado desapropriação indireta em sua propriedade, deveras, tão somente vedou o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou em estados avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica, sendo certo que eles mantiveram a posse do imóvel. Logo, o que se tem é mera limitação administrativa. Precedentes: REsp 922.786/SC, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 18 de agosto de 2008; REsp 191.656/SP, Relator Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 27 de fevereiro de 2009; e EREsp 901.319/SC, Relatora Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, DJ de 3 de agosto de 2009. 3. As vedações contidas no Decreto Federal n. 750/93 não são capazes de esvaziar o conteúdo econômico da área ao ponto de ser decretada a sua perda econômica. 4. Recurso de embargos de divergência conhecido e não provido. (EREsp 922786/SC, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2009, DJe 15/09/2009)

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são uma construção jurisprudencial, não havendo nada em lei sobre isso. São apenas regras objetivas para facilitar e objetivizar a análise do caso concreto.

Os instrumentos de proteção da posse são plenamente cabíveis: interdito proibitório, ação de manutenção na posse e ação de reintegração da posse. A reintegração de posse, contudo, só é cabível se o Estado ainda não deu finalidade pública ao bem, pois, caso contrário, não cabe mais devolução. O Decreto-Lei nº 3.365/41 dispõe que, se o bem já está integrado ao patrimônio público, por meio da sua afetação, não mais é possível a devolução do bem, sendo cabível apenas a ação de desapropriação indireta, para obter a indenização cabível e devida.

Decreto-Lei nº 3.365/41, art. 35. Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos.

Como é feita a indenização na hipótese de desapropriação indireta? Evidentemente, a indenização tem de ocorrer a partir do momento da perda da posse, isto é, a partir do momento em que o proprietário é esbulhado. Será, pois, posterior, justa e mediante precatório.

Apesar do teor do art. 10, parágrafo único, do Decreto-Lei nº 3.365/41, a jurisprudência entende que o prazo prescricional da pretensão pela indenização na desapropriação indireta é de 20 anos, típico dos direitos reais. Neste sentido, o enunciado nº 119 da súmula do STJ: A ação de desapropriação indireta prescreve em vinte anos.

Passados mais de 20 anos sem que o proprietário reclame a indenização por desapropriação indireta, pode o Estado, para regularizar a propriedade, propor ação de usucapião.

O prazo prescricional da ação de desapropriação indireta, de qualquer forma, é tema que apresenta muita divergência. Há decisões adotando o prazo de 5 anos, outras adotando o prazo de 15 anos e outras adotando o prazo de 20 anos. Recentemente, o STJ adotou o prazo de 20 anos (RESP 1192106). Porém, a situação ainda não está resolvida, havendo muita discussão, inclusive dentro do próprio STJ.

2.6.2.4 Reserva ambiental e desapropriação florística

Em muitas áreas de interesse ambiental, a proteção se constitui por meio de limitação administrativa. Contudo, é possível que a limitação seja total, impedindo o proprietário de fazer qualquer coisa na propriedade. Neste caso, o Estado disfarça uma intervenção supressiva sob o pretexto de realizar uma limitação. Trata-se da desapropriação florística, que ocorre quando a preservação da propriedade é total, impedindo completamente o seu uso (suprime, e não simplesmente restringe).

Em muitas hipóteses, a reserva ambiental acarreta o esvaziamento econômico do bem, e, neste caso, representa uma desapropriação indireta. A desapropriação florística é a constituída para fins de reserva ambiental, e pode ocorrer direta ou indiretamente.

2.6.3 Procedimento administrativo da desapropriação

A desapropriação pode se resolver por completo na via administrativa. Uma desapropriação não tem, necessariamente, de desaguar na via judicial, mas apenas em duas situações: quando não há acordo quanto ao valor ou quando o proprietário é desconhecido.

O procedimento administrativo da desapropriação ocorre em duas fases/etapas: fase declaratória e fase executiva.

2.6.3.1 Fase declaratória

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A Administração publica o decreto de desapropriação (declara a desapropriação). Utiliza-se, para tanto, do decreto expropriarório, ato do próprio chefe do Poder Executivo.

O Decreto-Lei nº 3.365/41 também permite que a desapropriação seja declarada por meio de uma lei de efeitos concretos. Essa lei de efeitos concretos não deixa de ser uma lei, mas ela possui destinatário específico. Na forma é lei; no conteúdo é um ato administrativo.

Qual o conteúdo fundamental desse decreto (ou dessa lei de efeitos concretos)? O seguinte:

• O fundamento legal em que se apóia a desapropriação pretendida.• A identificação específica do bem.• A destinação do bem, isto é, qual finalidade será dada ao bem

desapropriado.• Quem é o proprietário que está sofrendo a desapropriação. Se o

sujeito passivo é indeterminado, a desapropriação não pode se resolver na via administrativa, sendo obrigatória a via judicial.

• Qual o recurso orçamentário que suportará a desapropriação, isto é, o pagamento da indenização devida. A Administração tem de fazer a reserva do recurso orçamentário que pagará a conta.

A partir do momento em que o Estado declara a desapropriação, em qualquer momento ele pode entrar no bem, mas desde que pague, previamente, a indenização.

Uma vez decretada a desapropriação, a declaração traz alguns efeitos. O bem será submetido à força do Estado (apesar de ainda não ter-se apossado, pode entrar, medir, fiscalizar etc). A decretação fixa as condições deste bem: a partir da decretação de desapropriação só serão indenizadas as benfeitorias necessárias e as úteis previamente autorizadas. A decretação também dá inicio ao prazo de caducidade.

2.6.3.2 Fase executiva

A fase em que ocorre o pagamento e a entrada no bem é a chamada fase executiva. Entre a decretação da desapropriação e a entrada no bem há um intervalo, intervalo este chamado de prazo de caducidade. É necessário existir um prazo para que a Administração execute a desapropriação, para que o proprietário não tenha de esperar a vida toda pela providência desapropriatória.

O prazo de caducidade é de 5 anos, quando se tratar de desapropriação por necessidade ou utilidade pública. Se, decorridos esses 5 anos, o Estado não executa a desapropriação, a decretação da desapropriação perde o seu efeito, e o Estado terá de decretá-la novamente, desde que respeite o prazo de carência, que é de 1 ano. É o que prevê o art. 10 do Decreto-Lei nº 3.365/41.

Decreto-Lei nº 3.365/41, art. 10. A desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente, dentro de cinco anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará. (Vide Decreto-Lei nº 9.282, de 1946) Neste caso, somente decorrido um ano, poderá ser o mesmo bem objeto de nova declaração. Parágrafo único. Extingue-se em cinco anos o direito de propor ação que vise a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 2001)

Já se a decretação for por interesse social, o prazo de caducidade será de 2 anos, e não haverá período de carência em caso de expirar o prazo de caducidade.

A ação judicial de desapropriação é uma ação de procedimento especial. Em resumo, três características marcam esse procedimento especial:

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• Não se pode discutir qualquer assunto, mas apenas o valor e o respeito às formalidades.

• O juiz pode determinar a antecipação da produção da prova pericial (a perícia é antecipada para o início do processo), de modo que, já na inicial, o autor da ação indica os assistentes técnicos e formula os quesitos para a perícia, fazendo o mesmo o réu na sua contestação.

• Possibilidade de imissão provisória na posse (que é a autorização do juiz para o Estado entrar no bem de forma antecipada).

A ação de desapropriação, evidentemente, não é um procedimento rápido, pois só a discussão do valor leva bastante tempo. A imissão provisória na posse é um incidente na ação de desapropriação. Para o juiz conceder a imissão provisória na posse, deve haver dois requisitos, a saber: situação de urgência e depósito prévio do valor oferecido pela Administração.

Havendo a imissão provisória na posse, o juiz autoriza o levantamento de parte do valor depositado. Não pode haver o levantamento total do valor, porque, ao fim, o valor da indenização decidido pelo juiz pode ser inferior ou superior ao proposto pelo Estado. Assim, o levantamento pode ser de até 80% do depósito prévio, segundo o art. 33, § 2º, do Decreto-Lei nº 3.365/41.

A diferença entre o que o Estado ofereceu e o que foi determinado na sentença é paga em precatório, pois débito judicial é sempre pago por meio do regime de precatório. Logo, parte é paga em dinheiro e outra parte é paga em precatórios.

2.6.4 Indenização

Os componentes da indenização, na desapropriação, são os seguintes: (i) valor do bem (o valor praticado no mercado); (ii) danos emergentes (o que efetivamente se perdeu com a desapropriação) e lucros cessantes (o que o proprietário deixou de ganhar em razão da perda da propriedade); (iii) juros moratórios e juros compensatórios; (iv) correção monetária; (v) honorários advocatícios (que apenas serão pagos se houver ação judicial, obviamente); (vi) despesas judiciais (também só serão pagas quando na via judicial).

Os juros compensatórios servem para compensar o proprietário pela perda da posse. Se há acordo quanto ao valor, não há de se falar em compensação da perda da posse, pois, neste caso, paga-se previamente, para, depois, entrar no bem. Os juros compensatórios só são devidos quando o Estado entra no bem sem pagar integralmente a indenização prévia.

Concedida, na via judicial, a imissão provisória na posse, o proprietário, evidentemente, perde a posse. Contudo, a ação judicial apenas é concluída anos depois. Por isto, cabem os juros compensatórios. Ver ADI 2332 MC.51

51 EMENTA: - Ação direta de inconstitucionalidade. Artigo 1º da Medida Provisória nº 2.027-43, de 27 de setembro de 2000, na parte que altera o Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, introduzindo o artigo 15-A, com seus parágrafos, e alterando a redação do parágrafo primeiro do artigo 27. - Esta Corte já firmou o entendimento de que é excepcional o controle judicial dos requisitos da urgência e da relevância de Medida Provisória, só sendo esse controle admitido quando a falta de um deles se apresente objetivamente, o que, no caso, não ocorre. - Relevância da argüição de inconstitucionalidade da expressão "de até seis por cento ao ano" no "caput" do artigo 15-A em causa em face do enunciado da súmula 618 desta Corte. - Quanto à base de cálculo dos juros compensatórios contida também no "caput" desse artigo 15-A, para que não fira o princípio constitucional do prévio e justo preço, deve-se dar a ela interpretação conforme à Constituição, para se ter como constitucional o entendimento de que essa base de cálculo será a diferença eventualmente apurada entre 80% do preço ofertado em juízo e o valor do bem fixado na sentença. - Relevância da argüição de inconstitucionalidade dos parágrafos 1º e 2º do mesmo artigo 15-A, com fundamento em ofensa ao princípio constitucional da prévia e justa indenização. - A única conseqüência normativa relevante da remissão, feita pelo § 3º do aludido artigo 15-A está na fixação dos juros no percentual de 6% ao ano, o que já foi decidido a respeito dessa taxa de juros. - É relevante a alegação de que a restrição decorrente do § 4º do mencionado artigo 15-A entra em choque com o princípio constitucional da garantia do justo preço na desapropriação. - Relevância da

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Enunciado nº 408 da súmula do STJ: Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória n. 1.577, de 11/06/1997, devem ser fixados em 6% ao ano até 13/09/2001 e, a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula n. 618 do Supremo Tribunal Federal.

Enunciado nº 618 da súmula do STF: Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano.

Os juros compensatórios incidem a partir da perda da posse, até a data de expedição do precatório, conforme o art. 100, § 12, CF/88: A partir da promulgação desta Emenda Constitucional, a atualização de valores de requisitórios, após sua expedição, até o efetivo pagamento, independentemente de sua natureza, será feita pelo índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança, e, para fins de compensação da mora, incidirão juros simples no mesmo percentual de juros incidentes sobre a caderneta de poupança, ficando excluída a incidência de juros compensatórios. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 62, de 2009).

Em um primeiro momento, a MP 2.183 determinou que os juros compensatórios incidiriam sobre a diferença entre o que foi obtido na sentença e o que o Estado queria pagar. Tal regra, contudo, foi objeto de controle de constitucionalidade, no STF, na ADI 2332.

Nessa ADI, o STF decidiu que, na verdade, os juros compensatórios não incidem simplesmente sobre a diferença. É que esses juros servem para compensar o período em que o proprietário ficou sem o bem e sem o dinheiro (incidente, portanto, a partir do momento em que o proprietário perde a posse, mas não é indenizado).

Quando há imissão provisória na posse, o Estado deposita o valor que propôs, e o juiz defere o levantamento de até 80% desse valor. O proprietário, no caso, não fica no prejuízo de apenas o restante do valor do depósito. Na verdade, o proprietário apenas não tem prejuízo no que respeita ao valor que levantou quando da imissão provisória na posse. Sobre todo o restante (remanescente do depósito prévio e o que mais foi determinado na sentença) é que há o prejuízo. Logo, os juros compensatórios devem incidir sobre a diferença do valor fixado na sentença e o valor que foi levantado pelo proprietário quando da imissão provisória na posse.

Assim, o STF realizou interpretação conforme da MP 2.183, determinando que os juros compensatórios incidem sobre o valor determinado na sentença subtraído do valor que foi levantado na oportunidade da imissão provisória na posse.

Enquanto os juros compensatórios compensam o proprietário pela perda da posse, os juros moratórios compensam o credor pelo atraso no pagamento da indenização. Os juros moratórios são de até 6% ao ano.

A previsão de juros moratórios também é decorrente de medida provisória (a 1.577, que foi substituída pela 2.183). Atualmente, encontram-se previstos no art. 15-B do Decreto-Lei nº 3.365/41.

argüição de inconstitucionalidade do parágrafo 1º do artigo 27 em sua nova redação, no tocante à expressão "não podendo os honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinqüenta e um mil reais)". Deferiu-se em parte o pedido de liminar, para suspender, no "caput" do artigo 15-A do Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941, introduzido pelo artigo 1º da Medida Provisória nº 2.027-43, de 27 de setembro de 2000, e suas sucessivas reedições, a eficácia da expressão "de até seis por cento ao ano"; para dar ao final desse "caput" interpretação conforme a Constituição no sentido de que a base de cálculo dos juros compensatórios será a diferença eventualmente apurada entre 80% do preço ofertado em juízo e o valor do bem fixado na sentença; e para suspender os parágrafos 1º e 2º e 4º do mesmo artigo 15-A e a expressão "não podendo os honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinqüenta e um mil reais)" do parágrafo 1º do artigo 27 em sua nova redação. (ADI 2332 MC, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Tribunal Pleno, julgado em 05/09/2001, DJ 02-04-2004 PP-00008 EMENT VOL-02146-02 PP-00366)

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Os juros moratórios são devidos a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o precatório deveria ter sido pago, nos termos do art. 100 da CF/88. É que o prazo para o pagamento do precatório apresentado ate 1º de julho é do primeiro ao último dia do ano seguinte. Logo, só há mora se expirado esse prazo sem pagamento.

Se o precatório só é expedido após 1º de julho de 2010, só é pago em 2012. Se é expedido até 1º de julho de 2010, a partir de 1º de janeiro de 2012, se não houver o pagamento, a Administração estará em mora, incidindo juros moratórios. Conclusão: só incidem os juros moratórios a partir do 1º dia do exercício seguinte ao exercício em que o precatório deveria ter sido pago. Por isto, os enunciados nº 12 e 70 da súmula do STJ encontram-se superados.

2.6.5 Direito de extensão

Esse direito se aplica à hipótese em que a Administração desapropria parte de uma propriedade, deixando um remanescente seu que fica, por conta da desapropriação, sem valor econômico.

Assim, o direito de extensão é o direito do proprietário de exigir a desapropriação da área total, com a indenização pelo total, quando a área remanescente ficar, por conta da desapropriação parcial, sem valor econômico ou sem utilidade.

2.6.6 Tredestinação

É a mudança de motivo na desapropriação. É o caso em que o Estado, ao desapropriar, dá ao bem destinação diversa da alegada quando da decretação da desapropriação. Trata-se da mudança de motivo na desapropriação.

A tredestinação apenas é lícita, apenas é legal, quando mantida a destinação de interesse público do bem. É hipótese em que há mudança de motivo, mas não há ofensa à teoria dos motivos determinantes (pois mantém a destinação de interesse público).

2.6.7 Retrocessão

A retrocessão é o direito que tem o proprietário de ter o bem de volta ou de receber uma indenização, quando o Estado não lhe dá a destinação anunciada. Se o Estado desapropria e não cumpre a finalidade, dá direito à retrocessão: o expropriado pode receber o bem de volta, devolvendo a indenização, ou receber indenização, a depender do entendimento.

É matéria muito divergente na doutrina e na jurisprudência. Há três correntes diferentes, a saber:

• A retrocessão é um direito real e, em virtude da sequela, o expropriado pode perseguir o bem com quem quer que ele esteja, e receberá o bem de volta.

• A retrocessão é direito pessoal, motivo pelo qual o expropriado receberá indenização por perdas e danos.

• A retrocessão é um instituto misto (pode ser real ou pessoal), o que significa que pode haver devolução do bem (se for real) ou indenização (se for pessoal).

A jurisprudência vem afirmando que, se não for cumprida a destinação, o proprietário tem direito de pedir o bem de volta, já que a retrocessão é instituto de natureza real; se, porém, for dada outra destinação pública, tendo sido o patrimônio incorporado a uma finalidade pública, a tredestinação será lícita, não podendo o bem ser devolvido, em que pese poder haver condenação em perdas e danos.

Aula 5 (4 de setembro de 2012)

3 PROCESSO ADMINISTRATIVO

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Processo não se confunde com procedimento. A distinção, contudo, é útil apenas no plano teórico, não tendo tanta utilidade no plano prático. Processo é o conjunto de atos que leva a uma decisão final, a um provimento final. O procedimento é a maneira de realizar esses atos, é a forma pela qual cada um dos atos do processo é realizado. Procedimento, portanto, é a forma de prática dos atos.

Finalidades do processo administrativo:• Mecanismo de documentação do quanto realizado na Administração,

independentemente do administrador;• Condição de forma do ato administrativo, legitimando a prática do ato

pelo administrador. É pelo processo que se demonstra o atendimento aos requisitos do ato, o seu motivo, a sua finalidade etc. Ademais, o processo dá publicidade ao ato. Por exemplo, quando é caso de contratação direta, é imprescindível haver um processo de justificação da não licitação, para legitimar a prática do ato de contratação direta. Aliás, o ato administrativo, após sua prática, é anexado ao próprio processo de onde se originou. O processo, portanto, é instrumento de legitimação do ato praticado;

• Tendo em vista que o processo fundamenta e dá publicidade ao ato (por exemplo, no processo de desapropriação, demonstra-se qual o interesse em jogo), ele é visto como um mecanismo de transparência do ato praticado pelo administrador;

• Instrumento de controle;• O processo também se mostra como instrumento de defesa para a

parte, que pode demonstrar, caso questionada, o fundamento (inserido no processo administrativo) do ato administrativo praticado. O processo é onde a parte pode se defender, onde pode justificar o ato praticado. A defesa pode ser exercida de várias formas: produção de provas, depoimento de testemunhas etc.

3.1 Princípios do processo administrativo

3.1.1 Princípio do devido processo legal

Previsto no art. 5º, LIV, CF (ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal), determina que o processo esteja de acordo com um modelo previsto na lei e na Constituição, assegurando relação participativa e igualitária entre as partes.

Esse princípio está intimamente ligado ao princípio da legalidade para a administração pública: o administrador só pode fazer o que a lei permite. No mesmo diapasão, o processo administrativo deve respeitar o modelo previsto no ordenamento jurídico.

3.1.2 Princípios do contraditório e da ampla defesa

O modelo constitucional de processo administrativo, a partir de 1988, passou a ser pautado no contraditório e na ampla defesa. O art. 5º, LV, CF determina que os processos administrativos e judiciais estejam sujeitos a contraditório e ampla defesa: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Contraditório é o conhecimento/ciência da existência do processo contra si. Quando à parte é dada ciência do processo, ela é chamada ao processo, formando-se, aí, a relação processual, relação esta que é bilateral. Portanto, além da ciência do processo, o contraditório constitui a bilateralidade da relação processual.

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Como se sabe, o Brasil é um Estado democrático de Direito, de modo que ninguém pode ser processado e condenado ser ter prévia ciência do processo. Logo, o contraditório é inerente ao Estado democrático de Direito.

Não basta, todavia, a ciência do processo: a parte deve ter condições de influir na decisão (ampla defesa). Assim, junto ao contraditório, vem o direito de defesa, a ampla defesa.

Veja-se que, para o princípio da ampla defesa ser concretizado, não basta que a Administração conceda prazo para a parte se defender, sendo necessário que proporcione todas as condições necessárias para que o direito de defesa seja exercido regularmente. Por exemplo, é necessário que a parte tenha ciência dos fatos que lhe são imputados, que a parte tenha acesso aos autos e a todas as informações existentes.

Exigências da ampla defesa:• A parte, para concretizar o seu direito de defesa, tem de realizar

defesa prévia, isto é, tem de realizar defesa antes da decisão final. Veja-se que defesa prévia exige, do legislador, um procedimento pré-determinado. É necessário que a parte já conheça as ferramentas que terá à disposição para se defender no processo. Inclusive, conhecer o procedimento é necessário para se traçar a própria estratégia de defesa. Portanto, dentro da ideia de defesa prévia, o procedimento deve ser um procedimento já definido, já estabelecido. Ademais, ainda dentro da necessidade de defesa prévia, as sanções devem ser pré-estabelecidas, pois é preciso que a parte já saiba desde o início o que pode com ela acontecer ao fim do processo.

• A parte deve ter acesso às informações do processo. É necessário que a parte conheça o conteúdo do processo. Ao contrário do processo judicial, no processo administrativo, não se faz carga, não é possível levá-lo para casa.52 Hoje, a jurisprudência, inclusive do STJ, entende que a Administração é obrigada a viabilizar a tirada de cópias, embora não seja obrigada a arcar com o custo da reprodução (que fica a cargo do interessado). Inclusive, é possível que a própria Administração faça as cópias e cobre pelo serviço. O problema, neste último caso, é que algumas Administrações cobram preços abusivos pelas cópias. A jurisprudência controla isso, determinando que os preços sejam acessíveis e razoáveis.

• A parte tem direito à produção de provas. Isto é um mecanismo que garante a defesa da parte. A produção de provas faz parte da garantia de ampla defesa. O direito à produção de provas não pode reduzir-se a meras formalidades. O direito de defesa enquanto produção de provas significa prova produzida e prova avaliada, isto é, prova interferindo efetivamente no convencimento do julgador. Logo, não basta fazer prova e juntá-la aos autos sem que seja examinada. Para o exercício do direito de defesa, é necessário que haja prova produzida e prova interferindo no convencimento do julgador. Quanto ao email institucional, entende a jurisprudência que é banco de dados da instituição, podendo ser utilizado como prova contra o titular da conta.

• A defesa técnica é indispensável, no processo administrativo, para que seja concretizada a ampla defesa? Quando se fala em defesa técnica, refere-se à presença do advogado. O advogado precisa estar presente no processo administrativo? Tal discussão interessa em processo administrativo disciplinar, não estando presente em outras áreas. É que o processo disciplinar tem maior força condenatória. A

52 Na verdade, o Estatuto da OAB admite a carga ao advogado, o que é dificultado pela Administração.

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primeira regra que surgiu, no Brasil, era de que a presença do advogado em processo administrativo disciplinar era facultativa. A partir daí, a jurisprudência passou a se consolidar: o STJ, durante muitos anos, construiu a orientação de que o advogado ajuda no processo, porque fiscaliza, peticiona, acompanha produção de provas etc. Por conta disso, o STJ chegou à conclusão de que a presença do advogado era benéfica ao processo, contribuindo para a sua regularidade. A Corte considerou que a grande parte dos casos de nulidade em PADs era por desrespeito ao contraditório e à ampla defesa, o que poderia ser controlado pelo advogado. Nesse sentido, o STJ editou o enunciado nº 343 de sua súmula, dispondo que É obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar. Por conta disso, as pessoas que foram processadas e punidas nos cinco anos anteriores à edição desse enunciado, sem a presença de advogado, começaram a discutir seus processos, afirmando que estes seriam nulos. Se o processo era nulo, sua eventual demissão seria ilegal, de modo que o servidor teria direito a retornar ao seu cargo de origem, com todas as vantagens do período em que esteve afastado (reintegração). Isso, evidentemente, gerou um caos, mormente para as contas públicas. A matéria chegou ao STF, que editou o seguinte enunciado (nº 5) de sua súmula vinculante: A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a constituição. Com a edição deste último enunciado, o de nº 343 do STJ perdeu força, embora até hoje não tenha sido revogado. Como se vê, o STF ressuscitou a facultatividade da defesa técnica em processo administrativo disciplinar.

• A parte tem direito a recurso, mecanismo de defesa, mesmo que não haja previsão específica nesse sentido. Como se sabe, alguns editais de concurso preveem não existir direito de recurso. Isto é legítimo? Evidentemente, não. O direito de recurso independe de previsão específica para o caso. Não pode o edital do concurso, portanto, impedir o recurso. Veja-se, ainda, que, para ser viabilizado o direito de recurso, o interessado deve ter ciência do que o prejudicou efetivamente no caso concreto. Para viabilizar a interposição do recurso, é necessário que a Administração dê publicidade à motivação da decisão, é necessário que a Administração motive a sua decisão. É possível a exigência de depósito prévio para a interposição de recurso administrativo? Neste caso, entender que sim seria atrelar o direito de recurso à condição financeira da parte. Isto foi amplamente discutido no STJ e no STF. No que diz respeito ao depósito prévio, há os enunciados nº 373 da súmula do STJ (É ilegítima a exigência de depósito prévio para admissibilidade de recurso administrativo) e nº 21 da súmula vinculante do STF (É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo). Logo, não é possível condicionar o direito de recurso à condição financeira do interessado.

Segundo o enunciado nº 3 da súmula vinculante do STF, Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão.

O enunciado tem a seguinte ideia: quando alguém puder ser atingido por uma decisão, este sujeito precisa ter oportunidade de se manifestar, precisa participar da tomada de decisão. No TCU, ocorria o seguinte: a Corte recebia as contas prestadas pelo

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administrador, e, percebendo algo errado, chamava-o a prestar informações, por exemplo, a respeito de um contrato de fornecimento de bens e serviços. Neste caso, a empresa contratada tem de ser ouvida, tem de participar da tomada de decisão, pois a decisão poderá prejudicá-la.

Contudo, quando se trata da apreciação da legalidade da concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, a enunciado da súmula afasta a necessidade de contraditório e ampla defesa. É que a concessão de aposentadoria, reforma ou pensão é um ato complexo, que, como já estudado, depende de duas manifestações de vontade: da Administração e do TCU (este revê o ato quanto à sua legalidade).

Na verdade, no ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma ou pensão, há, sim, contraditório e ampla defesa, mas estes ocorrem junto à Administração Pública, e não perante o TCU. É que o servidor requer a aposentadoria administrativamente, e, sendo concedida, ele já passa a gozar do benefício, não tendo de aguardar pela decisão do TCU. O servidor, portanto, desde já recebe os proventos.

Esse ato apenas se aperfeiçoa com as duas manifestações de vontade. Portanto, o TCU apenas complementa o ato. O TCU, ao revisar o ato, não retira direito do servidor, haja vista o ato não estar, ainda, pronto e acabado.

Todavia, o STF decidiu que, se o TCU deixar transcorrerem 5 anos sem se manifestar, sem decidir, terá de dar oportunidade de contraditório e ampla defesa ao servidor em inatividade. Portanto, passados 5 anos, o TCU terá de oportunizar contraditório e ampla defesa ao servidor. Isso foi decidido, pelo STF, nos MS nº 2511653 e 2605354.

53 EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. NEGATIVA DE REGISTRO A APOSENTADORIA. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. GARANTIAS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. 1. O impetrante se volta contra o acórdão do TCU, publicado no Diário Oficial da União. Não exatamente contra o IBGE, para que este comprove o recolhimento das questionadas contribuições previdenciárias. Preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada. 2. Infundada alegação de carência de ação, por ausência de direito líquido e certo. Preliminar que se confunde com o mérito da impetração. 3. A inércia da Corte de Contas, por mais de cinco anos, a contar da aposentadoria, consolidou afirmativamente a expectativa do ex-servidor quanto ao recebimento de verba de caráter alimentar. Esse aspecto temporal diz intimamente com: a) o princípio da segurança jurídica, projeção objetiva do princípio da dignidade da pessoa humana e elemento conceitual do Estado de Direito; b) a lealdade, um dos conteúdos do princípio constitucional da moralidade administrativa (caput do art. 37). São de se reconhecer, portanto, certas situações jurídicas subjetivas ante o Poder Público, mormente quando tais situações se formalizam por ato de qualquer das instâncias administrativas desse Poder, como se dá com o ato formal de aposentadoria. 4. A manifestação do órgão constitucional de controle externo há de se formalizar em tempo que não desborde das pautas elementares da razoabilidade. Todo o Direito Positivo é permeado por essa preocupação com o tempo enquanto figura jurídica, para que sua prolongada passagem em aberto não opere como fator de séria instabilidade inter-subjetiva ou mesmo intergrupal. A própria Constituição Federal de 1988 dá conta de institutos que têm no perfazimento de um certo lapso temporal a sua própria razão de ser. Pelo que existe uma espécie de tempo constitucional médio que resume em si, objetivamente, o desejado critério da razoabilidade. Tempo que é de cinco anos (inciso XXIX do art. 7º e arts. 183 e 191 da CF; bem como art. 19 do ADCT). 5. O prazo de cinco anos é de ser aplicado aos processos de contas que tenham por objeto o exame de legalidade dos atos concessivos de aposentadorias, reformas e pensões. Transcorrido in albis o interregno qüinqüenal, a contar da aposentadoria, é de se convocar os particulares para participarem do processo de seu interesse, a fim de desfrutar das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa (inciso LV do art. 5º). 6. Segurança concedida. (MS 25116, Relator(a):  Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 08/09/2010, DJe-027 DIVULG 09-02-2011 PUBLIC 10-02-2011 EMENT VOL-02461-01 PP-00107)54 EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. APRECIAÇÃO DA LEGALIDADE DO ATO DE CONCESSÃO INICIAL DE APOSENTADORIA, REFORMA E PENSÃO. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA APENAS SE PASSADOS MAIS DE CINCO ANOS. TERMO INICIAL. DATA EM QUE O PROCESSO ADMINISTRATIVO É RECEBIDO NA CORTE DE CONTAS. EMBARGOS ACOLHIDOS. I - O termo inicial do prazo para apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão conta-se a partir da data em que o processo

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3.1.3 Princípio da verdade real

É a verdade plena, absoluta, aquilo que realmente aconteceu.Hoje, o que se precisa é de verossimilhança, isto é, daquilo que mais se

aproxima do que realmente aconteceu. O que se busca, portanto, é a maior aproximação com aquilo que foi produzido no mundo real.

3.1.4 Princípio da oficialidade

Esse princípio tem alguns desdobramentos, a saber: (i) impulso oficial, significando que, independentemente de provocação das partes, o processo andará; (ii) informalidade, não havendo forma pré-estabelecida (no processo judicial, vigora o formalismo).

3.1.5 Princípio da celeridade do processo

Está previsto no art. 5º, LXXVIII, CF, dispositivo que foi introduzido pela EC 45/04: a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

A celeridade é uma medida de justiça: se se demora demais, a medida se torna injusta. O processo, portanto, deve ser concluído em um prazo razoável, como medida de justiça.

3.2 Principais aspectos da Lei nº 9.784/99

A Lei nº 9.784/99 é a chamada norma geral de processo administrativo para o âmbito federal. Ela se aplica tanto para a Administração direta quanto para a Administração indireta, mas no âmbito federal. Cada ente pode ter a sua lei sobre processo administrativo, ou seja, tem competência para legislar sobre o assunto: Esta Lei estabelece normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração (art. 1º).

O art. 69 da lei determina que ela é de aplicação subsidiária, ou seja, sempre que houver lei específica, esta será aplicada, de modo que a Lei nº 9.784/99 apenas será aplicada se não houver lei específica para o caso. Somente no silêncio da lei específica é que se aplica a Lei nº 9.784/99: Os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei.

A Lei nº 9.784/99 prevê expressamente o respeito ao princípio da publicidade, determinando que o processo administrativo é público. Dessa forma, qualquer indivíduo pode ter acesso aos autos do processo, ressalvados os casos de sigilo previstos na Constituição. No geral, contudo, o processo administrativo atende à publicidade.

Ainda, segundo a lei, é vedada, em processo administrativo, a cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei. Assim, administrador público que cobra despesas processuais age ilegitimamente, a menos que se trate das despesas cuja cobrança é permitida em lei.

A Lei nº 9.784/99 também veda provas ilícitas no processo administrativo. Nesse sentido, é interessante analisar a seguinte situação: é feita uma interceptação telefônica sem prévia autorização judicial, mas, por meio dessa interceptação telefônica, descobre-se que um servidor estava desviando verbas públicas da repartição. Essa prova ilícita não pode ser utilizada para condenar o servidor, mas pode ser utilizada como elemento que acione a investigação, isto é, como informação que acarrete a abertura de processo. Logo, o elemento ilícito pode ser utilizado para a investigação, mas não para condenar o servidor.

administrativo é recebido na Corte de Contas. II – Embargos acolhidos. (MS 26053 ED-segundos, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 14/04/2011, DJe-096 DIVULG 20-05-2011 PUBLIC 23-05-2011 EMENT VOL-02527-01 PP-00010)

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E quanto aos prazos no processo administrativo? São contados da mesma forma que os prazos judiciais: não se conta o dia do começo, mas se conta o dia do final. Ademais, quando o prazo é em dias, se a lei não especifica que se trata de dias úteis, considerar-se-á que são dias corridos. Ainda, prazo processual não começa nem termina em dia não útil (para a Administração). O seu início e o seu término são sempre prorrogados para o primeiro dia útil seguinte, se caírem em dia não útil. Se a lei nada falar sobre o prazo, este será de 5 dias.

Os atos administrativos (atos do processo) devem ser praticados na própria repartição e no horário de funcionamento da repartição. Inclusive, quando o servidor leva serviço para casa, ele coloca a data de dia útil e o horário de funcionamento. Excepcionalmente, contudo, quando o interesse público justificar, o ato administrativo pode ser praticado fora do horário de funcionamento: no caso de atos já iniciados e de prejuízo na demora.

Não se tem uma forma específica para os atos do processo (informalismo), salvo casos especificados em lei.

No processo administrativo, não há diferenciação entre citação e intimação. Tudo é intimação ou notificação, que pode ser feita de inúmeras maneiras (correio, eletrônico etc). Não há o cuidado com a nomenclatura que existe no processo judicial, importando que o interessado tenha efetiva ciência do ato.

O comparecimento do intimado só é obrigatório se a intimação tiver sido realizada com 3 dias úteis de antecedência da prática do ato para o qual foi intimado. O não comparecimento não gera a confissão ficta. Ademais, a lei disciplinará as formalidades para a intimação, segundo cada caso.

Ordem a ser respeitada na prática dos atos do processo administrativo:• Instauração do processo: quem pode instaurar o processo

administrativo? Em concurso, afirmou-se que “o processo administrativo, assim como o judicial, somente se instaura por provocação do administrado, ainda que a Administração possa, de ofício, adotar medidas necessárias para a adequação da estrutura do processo”. Esta assertiva é verdadeira ou falsa? É falsa. O processo administrativo, além de poder ser instaurado a requerimento do interessado, também pode ser instaurado de ofício pela Administração, independentemente da vontade do interessado. O processo administrativo pode ser iniciado com um auto de infração, por uma portaria, ou por uma declaração de necessidade (licitação). Cada processo administrativo tem um início diferente. Pode ser iniciado também a pedido do interessado, por meio de requerimento. Particularidades do PAD: instauração do processo por portaria, e nesse momento também é nomeada a comissão.

• Instrução do processo: trata-se da fase em que se produzem as provas. Todas as provas permitidas em Direito podem ser realizadas no processo administrativo. São vedadas provas ilícitas, havendo permissão quanto ao resto.

• Oportunidade de defesa: será dada oportunidade de defesa após a instrução do processo. É importante lembrar que o prazo de defesa é de 10 dias, e, como a lei não diz expressamente que esses dias são úteis, tratam-se de 10 dias corridos.

• Relatório: passadas as fases anteriores, a comissão encarregada pelo processo elabora o relatório do processo, que nada mais é do que um resumo do que aconteceu no processo. Após o relatório, a comissão, que também instruiu e recebeu a defesa, entrega o processo pronto para a autoridade encarregada pelo julgamento. Como se vê, é diferente do que ocorre no processo judicial, no qual a mesma autoridade instaura o processo, instrui, recebe a defesa e julga. No processo administrativo, a autoridade julgadora não tem proximidade

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com a prova. Por conta disso, o relatório elaborado pela comissão não pode ser simplesmente um resumo do processo, devendo ser um relatório conclusivo, isto é, um resumo que sugira como deve a autoridade concluir/julgar o processo (deferir ou indeferir o pedido, condenar ou absolver etc). Regra geral, o relatório não vincula a autoridade superior. No PAD, a composição da instrução, defesa e relatório é chamada de inquérito administrativo. Neste âmbito, o relatório vincula a autoridade superior, salvo contrariedade às provas dos autos.

• Julgamento do processo: a comissão remete o processo à autoridade competente para julgar. Do julgamento é possível interpor recurso.

• Recurso: a parte, após receber o julgamento, acaso reste inconformada, pode recorrer. A interposição de recurso, em processo administrativo, é um pouco diferente da via judicial, como se verá a seguir.

Na via administrativa, a parte inconformada poderá recorrer. Contudo, a primeira providência a ser pedida é a reconsideração da decisão. A parte, portanto, formula um pedido de reconsideração. E, obviamente, é a própria autoridade julgadora que aprecia o pedido de reconsideração (o que deve fazer no prazo de 5 dias). Na mesma oportunidade, a parte inconformada pede que, acaso não haja a reconsideração, a autoridade julgadora converta o pedido de reconsideração em recurso hierárquico e o encaminhe à autoridade superior competente para examinar o recurso.

A parte tem 10 dias para apresentar o recurso.Se a autoridade superior está dentro do mesmo órgão da autoridade

recorrida, o recurso se chama “hierárquico próprio”. Por outro lado, se essa autoridade superior está em órgão diferente, chama-se o recurso de “hierárquico impróprio”.

Na via administrativa, os recursos podem ser apresentados até, no máximo, três instâncias, a depender do caso determinado em lei. Ademais, se o recurso é interposto perante autoridade incompetente, ela não deve extinguir o processo, mas, sim, indicar qual é a autoridade competente e reabrir o prazo para a interposição do recurso.

O prazo que a autoridade tem para julgar o recurso administrativo é de 30 dias. Todavia, o recurso não será conhecido se for interposto (i) fora do prazo, (ii) perante órgão incompetente, (iii) quando já exaurida a instância administrativa ou (iv) por parte ilegítima.

É possível a reformatio in pejus no recurso administrativo, uma vez que a Administração deve agir na legalidade. Se o processo administrativo já transitou em julgado, não mais cabendo recurso na via administrativa, diz-se que a decisão produziu coisa julgada administrativa.

Imagine-se que, já havendo coisa julgada administrativa, surge um fato novo, uma situação nova que modifique o caso. Nesta hipótese, qual a solução? Cabe, aí, a revisão do processo. Surgindo fato novo, a parte pode pedir a revisão do processo. Em revisão, não é possível a reformatio in pejus, isto é, não é possível a reforma para piorar a situação da parte.

3.3 Processo administrativo disciplinar

3.3.1 Sindicância

A sindicância funciona como um inquérito policial, uma investigação prévia, assumindo o caráter inquisitório. No caso, todavia, de constatação de infração punida com advertência ou suspensão de até 30 dias, a sindicância transforma-se em processo (sumário), que não pode ser inquisitivo.

Caso seja comprovado, na sindicância, que não houve infração, haverá o arquivamento.

Na acumulação ilegal de cargos, antes de se instaurar qualquer procedimento, chama-se a parte para optar por um dos cargos em 10 dias. Caso não se

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opte, instaura-se o processo. Se fizer a opção até a defesa, reconhece-se a sua boa-fé e será exonerado. Caso não faça a opção, provada a acumulação ilegal, haverá demissão de todos os cargos.

3.3.2 PAD

Deve durar, no máximo, 60 dias, prorrogáveis por mais 60. Tem como etapas: instauração, inquérito administrativo e decisão. É possível o afastamento do servidor por até 60 dias, com remuneração. É um processo punitivo.

Aula 6 (5 de setembro de 2012)

4 CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO

Controle é um mecanismo de vigilância, instrumento pelo qual se fiscalizam os atos praticados pela Administração Pública. Se, no exercício desse mecanismo de fiscalização, for verificado um erro ou uma falha, será possível corrigi-los. Logo, o controle é não apenas um mecanismo de fiscalização, mas também um mecanismo de correção de condutas.

O controle, hoje, é um mecanismo que dá transparência à atividade administrativa. Além disso, o controle é um mecanismo que se presta a inibir a corrupção dentro da Administração Pública, a afastar a desonestidade. O controle, portanto, tem um papel importante na manutenção da probidade no seio da Administração Pública.

O controle da administração pública pela sociedade já existe desde a Declaração dos Direitos do Homem de 1789, quando se falava em controle das contas pelo povo. No Brasil, o controle começa a partir de 1826, quando surge uma estrutura de controle, com órgão próprio para esse fim. Foi criado, nesse ano, um tribunal de revisão de contas. A concretização do controle, no Brasil, contudo, só ocorre a partir da proclamação da república. Apenas em 1890 é que foi criado o primeiro tribunal de contas no Brasil, por meio do Decreto nº 966/1890.

4.1 Tipos de controle

Existem dois tipos de controle, que não se confundem: (i) controle político e (ii) controle da Administração.

O controle político tem como foco as questões políticas, as questões de governo. Esse tipo de controle é melhor estudado no Direito Constitucional, com a expressão “pesos e contrapesos”.

O controle da Administração tem como foco a atividade administrativa, e não a atividade política do Estado. Esse tipo de controle é estudado justamente no Direito Administrativo.

Em algumas situações, o controle político se confunde com o controle da Administração. São casos em que o controle reúne características do controle político e do controle da Administração.

4.1.1 Controle político

O Poder Executivo controla o Poder Legislativo por meio da sanção e do veto do Presidente da República, que são instrumentos por meio dos quais o Chefe do Executivo controla a atividade do Poder Legislativo.

O Poder Legislativo também controla o Poder Executivo, no caso, por exemplo, dos crimes de responsabilidade do presidente da república: a Câmara dos Deputados instaura o processo e o Senado julga.

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O orçamento, ainda que seja elaborado pelo Poder Executivo, tem de ser aprovado por lei, de modo que as leis orçamentárias são instrumentos de controle do Poder Legislativo sobre o Poder Executivo.

O Poder Legislativo também controla o Poder Judiciário, no que diz respeito ao seu orçamento (da mesma forma que faz em relação ao Poder Executivo).

Também é possível que o Poder Executivo controle o Poder Judiciário, a exemplo da nomeação dos ministros do STF (e dos tribunais superiores), que é feita pelo Chefe do Poder Executivo: a Corte mais importante do país tem seus membros nomeados pelo Poder Executivo.

O Poder Judiciário controla o Poder Executivo e o Poder Legislativo, por meio das diversas ações judiciais, sejam as ações de inconstitucionalidade, as ações de mandado de segurança, as ações ordinárias contra atos desses Poderes etc.

4.1.2 Controle administrativo

O controle da Administração é exercido em face da atividade administrativa do Estado. É um mecanismo, um sistema por meio do qual se revê toda a atividade administrativa do Estado. O controle busca a transparência, evita desperdícios, abusos, arbitrariedades, ilegalidades, bem como serve de mecanismo para aplicar punições.

Os autores mais modernos dizem que o controle da Administração, hoje, no Brasil, possui dois pilares, duas bases, a saber:

• Princípio da legalidade: a atividade administrativa é controlada tendo como parâmetro a legalidade, o princípio da legalidade. Essa legalidade da atividade administrativa não é uma legalidade restrita, mas uma legalidade em sentido amplo, que abrange, além das leis, os princípios e as regras constitucionais. Logo, por meio desse controle não se revê apenas o respeito às leis, mas também às regras e princípios da Constituição. Dessa forma, rever um ato administrativo porque ele não é, por exemplo, eficiente ou proporcional, representa controle de legalidade. O Judiciário não pode rever o mérito dos atos administrativos, mas pode rever sua legalidade, e a observância dos princípios constitucionais diz respeito à legalidade, e não ao mérito.

• Controle de políticas públicas: a escolha de políticas públicas, pelo administrador, sempre foi livre. Contudo, diante dos reiterados abusos, surgiu um novo critério para o controle da atividade administrativa: o controle das políticas públicas. Esse critério foi firmado na ADPF 45, na qual o STF passou a admitir a possibilidade do controle de políticas públicas, restringindo a liberdade do administrador, desde que com apoio nos princípios constitucionais. E, como o controle feito com base nos princípios constitucionais é um controle de legalidade (em sentido amplo), é perfeitamente possível o controle de políticas públicas, já que feito com apoio nos princípios constitucionais. Assim, é possível o Judiciário rever políticas públicas, desde que a política pública controlada ofenda algum princípio constitucional. A escolha da política pública tem de ser razoável, e, se não for razoável, pode ser revista pelo Judiciário. Logo, o Administrador tem, sim, liberdade para escolher política pública, desde que ela seja razoável e proporcional.

O controle da Administração não pode ser ocasional, devendo ser exercido de forma permanente, antes da prática do ato, durante a prática do ato e após a prática do ato.

4.1.2.1 Classificação do controle administrativo

De acordo com o órgão controlador:

(a) Controle legislativo

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É o controle exercido pelo Poder Legislativo, podendo ser realizado de forma direta, quando o Poder Legislativo utiliza a sua própria estrutura, e de forma indireta, por meio dos tribunais de contas (longa manus do Poder Legislativo).

Os tribunais de contas têm sua competência prevista nos arts. 71 e ss. da CF. Fiscaliza as contas, submetendo o julgamento ao Poder Legislativo (por isso é controle indireto). A partir de 2005, os tribunais de contas passaram a controlar também as sociedades de economia mista.

As Comissões Parlamentares de Inquérito são formas de controle direto da Administração, pois representam o próprio Poder Legislativo (já que as CPIs são comissões do próprio Congresso Nacional). A CPI apenas investiga, e, identificados os fatos, encaminha-os às autoridades competentes para que tomem as providências cabíveis.

O Congresso Nacional pode, a qualquer tempo, convocar o administrador público para prestar informações na Casa Legislativa.

Ademais, o Poder Legislativo pode sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do seu poder regulamentar (art. 49, V, CF/88). Como se sabe, o chefe do Poder Executivo tem poder de normatizar (o chamado poder regulamentar), mas esse poder tem de ser complementar à lei, tem de buscar a fiel execução/aplicação da lei, não podendo exorbitar dela nem contrariá-la. A sustação feita pelo Congresso Nacional suspende a eficácia do ato.

O Poder Legislativo também controlará a declaração de guerra, a celebração de paz e a passagem ou permanência de forças estrangeiras pelo País.

A regra geral é que o chefe do Poder Executivo nomeia e exonera os dirigentes das entidades da Administração Indireta livremente, quando quiser. Excepcionalmente, contudo, o Senado participa da nomeação de dirigentes de entidades da Administração Indireta, como ocorre com os dirigentes das agências reguladoras e com os dirigentes do Banco Central.

A Petrobrás é uma sociedade de economia mista, e, como tal, tem o dever de licitar, conforme a Constituição e o art. 1º da Lei nº 8.666/93. O art. 173, § 1º, III, CF/88 dispõe que as estatais, quando exploradoras da atividade econômica, podem ter procedimento próprio de licitação, conforme previsão em lei.

A Lei nº 9.478/97 instituiu a Agência Nacional de Petróleo – ANP, dispondo que a Petrobrás poderia ter um procedimento simplificado de licitação, definido pelo presidente da república, por meio de decreto.

Editado o decreto, o Tribunal de Contas da União questionou o procedimento. A matéria foi objeto de discussão no MS 25888, no Supremo Tribunal Federal. Até agora existe apenas decisão liminar, no sentido de que, por enquanto, a Petrobrás pode continuar utilizando o procedimento simplificado.

De acordo com o enunciado nº 347 da súmula do STF, O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público. O argumento da Petrobrás foi de que o TCU estaria fazendo controle de constitucionalidade. Ademais, a Petrobrás não tem mais o monopólio da distribuição, não precisando mais de licitação.

O STF entendeu que o controle a que se refere o enunciado de súmula não é concentrado, mas incidental.

A ADI 3026 dispôs que a Ordem dos Advogados do Brasil não precisa realizar concurso público. Quanto aos demais Conselhos de Classe, a situação ainda está indefinida, entendendo o TCU que há obrigatoriedade do concurso.

O STF decidiu que a Empresa de Correios e Telégrafos deve licitar, apesar de ter tratamento de Fazenda Pública, não podendo utilizar o sistema privado de franquia. A ECT tem a exclusividade no serviço postal, mas atenção: isto não significa monopólio. Monopólio é para atividade econômica e exclusividade serve para o serviço público (ver ADPF 46).

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(b) Controle judicial

É aquele exercido pelo Poder Judiciário, que pode controlar a atividade administrativa por meio das diversas ações judiciais, nas quais pode exercer o controle não de mérito, mas de legalidade ampla, dos limites da discricionariedade.

Exemplos de ações judiciais controladoras dos atos administrativos são: ação popular, ação civil pública, ação de improbidade administrativa, ação de controle da constitucionalidade, mandado de segurança, mandado de injunção etc.

O mandado de segurança, seja ele individual ou coletivo, é uma ferramenta muito importante para o controle da Administração. Lembre-se que os atos praticados por empresa pública e sociedade de economia mista só podem ser questionados via MS quando no âmbito da prestação de serviço público (se o ato for de gestão comercial, não caberá MS).

Hoje, é muito comum o administrado procurar o Poder Público e formular um requerimento, sem obter, contudo, resposta. O que representa esse silêncio administrativo? Ele é um nada, não produz efeito algum, salvo quando a lei lho atribuir expressamente.

Pode-se ajuizar MS em face do silêncio administrativo, por violação ao direito líquido e certo de petição. O órgão jurisdicional não irá resolver de imediato a questão, mas, sim, fixar um prazo para que o administrador resolva. Todavia, Celso Antonio Bandeira de Melo ensina que, se o ato for estritamente vinculado, mera conferência de requisitos, o judiciário pode resolver.

(c) Controle administrativo

É o controle da atividade administrativa exercido pela própria Administração. O controle pode ser interno (quando exercido pelo próprio órgão controlado) ou externo (quando feito por outro órgão da Administração). Por meio do exercício do poder de autotutela, a Administração pode anular os seus atos ilegais ou revogar os inconvenientes (enunciados nº 346 e 473 da súmula do STF).

Mas é possível que o controle administrativo venha de outros órgãos (controle administrativo externo), e bons exemplos são os controles exercidos pelo CNJ e pelo CNMP, que são órgãos administrativos que controlam administrativamente, respectivamente, o Poder Judiciário e o Ministério Público. Outro instrumento de controle administrativo externo são as controladorias, corregedorias.

Veja-se que, em sede de controle administrativo, o Poder Judiciário pode não só anular, mas também revogar os seus próprios atos.

De acordo com a extensão do controle:

(a) Controle interno

É o realizado pelo órgão responsável pela atividade controlada, no âmbito da própria estrutura do prolator do ato. O controle interno tem vários objetivos: (i) cumprimento de metas; (ii) eficiência nas regras orçamentárias, financeiras e patrimoniais; (iii) fiscalização sobre as operações de crédito realizadas pelo órgão; (iv) ferramenta para o controle externo.

Um dos instrumentos de controle interno é a fiscalização hierárquica.

(b) Controle externo

Realizado por entidade estranha à Administração responsável pela atividade controlada (ex: TCU, CNJ, CNMP etc).

(c) Controle externo popular

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É o controle realizado pelo cidadão, por meio de consultas e audiências públicas, ou da disponibilidade das contas municipais pelo período de sessenta dias. Ainda, denunciando ou representando aos órgãos competentes, impugnando editais de licitação, propondo ação popular etc.

De acordo com a natureza do controle:

(a) Controle de legalidade

Pode ser realizado tanto pela Administração quanto pelo Judiciário. Tem como resultado a retirada do ato administrativo ilegal ou inconstitucional por meio de anulação. A Administração Pública tem o prazo de 5 anos para anular atos ilegais (Lei nº 9.784/99, art. 54), quando este produzirem efeitos favoráveis aos administrados. Produz efeito ex tunc.

Para Celso Antônio, se a anulação for benéfica ao administrado, deve possuir efeitos retroativos; se for prejudicial ao administrado, possui efeitos ex nunc.

Ainda, se a retirada de um ato ilegal causar mais prejuízos do que a sua manutenção, os demais princípios do ordenamento jurídico (que não o da legalidade) devem ser observados, e o ato deve ser mantido. A manutenção do ato ilegal é chamada estabilização dos efeitos do ato administrativo. Isso, atualmente, é reconhecido pela jurisprudência, especialmente no que respeita à segurança jurídica (ex: funcionário de fato há vinte anos dentro da Administração).

(b) Controle de mérito

É o controle de discricionariedade (oportunidade e conveniência). Acarreta a revogação do ato, que não pode ser realizada pelo Poder Judiciário (no âmbito do controle judicial).

No que tange à revogação, não há prazo. O controle pode acontecer a qualquer tempo. No entanto, não se admite revogação de ato vinculado, de ato que gerou direito adquirido, nem de ato que já produziu seus efeitos. Esse rol é exemplificativo e essas limitações dizem respeito ao conteúdo, não ao prazo.

De acordo com a oportunidade:

(a) Prévio ou preventivo

Antecede a prática do ato. Exemplo: o Senado deve aprovar, previamente, a aquisição de empréstimo externo pela União.

(b) Concomitante ou sucessivo

Ocorre durante a prática do ato. Exemplo: auditoria durante a execução do orçamento.

(c) Corretivo ou subsequente

Ocorre após a prática do ato.

De acordo com a hierarquia:

(a) Controle hierárquico

É o controle realizado na base da relação hierárquica (chefe-subordinados): ordenação, avocação, delegação, revisão, aplicação de sanções etc.

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(b) Controle finalístico ou por vinculação

Diz respeito somente à finalidade do ato. É realizado no caso de descentralização.Ferramenta importante é a supervisão ministerial (controle de receitas, despesas,

cumprimento de finalidades específicas), controle da Administração direta sobre a indireta. Por meio da supervisão ministerial, o chefe do poder executivo irá nomear os

dirigentes da Administração indireta: normalmente de forma livre pelo presidente da república (exceções: agências reguladoras e BACEN precisam de aprovação do Senado).

Aula 7 (xx de setembro de 2012)

5 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

A relação entre Estado e particulares é impositiva: não vigora autonomia da vontade. Por isto, exige-se mais do ente estatal, a sua responsabilidade é maior, é objetiva.

Fundamentam a responsabilidade civil do Estado: (i) se a conduta é ilícita, o fundamento é o princípio da legalidade; (ii) se a conduta é lícita, o fundamento é o princípio da isonomia (a sociedade que se beneficia com o ato deve indenizar o indivíduo prejudicado por ele).

5.1 Histórico da responsabilidade civil do Estado

A primeira fase foi a da irresponsabilidade do Estado (the king can do no wrong). O Brasil, contudo, já começa a sua história na segunda fase, a da responsabilidade para situações específicas.

Depois, a responsabilidade se amplia, evoluindo para a subjetiva (CC/1916): punição de conduta ilícitas culposas. Deveria haver uma conduta estatal, um dano, um nexo de causalidade entre esses dois elementos e a culpa ou dolo do agente estatal.

A quarta fase é a que substitui a modalidade culpa do agente, na responsabilidade subjetiva, pela culpa do serviço (a fim de evitar o "jogo de empurra" entre os agentes públicos que concorreram para o ato). Bastaria à vítima demonstrar que o serviço não foi prestado ou o foi de maneira ineficiente, sem precisar apontar agentes públicos (responsabilidade anônima). No Direito francês, a teoria da culpa do serviço foi chamada de faute du service.

Quinta fase: no Brasil, desde a Constituição de 1946, já se adota a teoria da responsabilidade objetiva, a qual persiste até os dias atuais. Para tal teoria, basta comprovar a conduta estatal, lícita ou ilícita, o dano e o nexo causal. Ausentes quaisquer desses elementos (ex: culpa exclusiva da vítima55, caso fortuito, força maior etc), exclui-se a responsabilidade do Estado (teoria do risco administrativo).

Há, contudo, situações que, segundo alguns doutrinadores, impedem a exclusão da responsabilidade estatal. São os casos de material bélico, sustância nuclear, e dano ambiental. Nesta hipótese, a teoria adotada é a do risco integral do Estado.

5.2 Elementos definidores da responsabilidade civil do Estado

Hoje, a responsabilidade civil do Estado é aquiliana, extracontratual. O seu fundamento está no art. 37, § 6º, da CF: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

55 Se a culpa for concorrente, Estado e vítima responderão na medida de sua participação para o evento danoso.

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5.2.1 Sujeito

Os sujeitos responsáveis são as pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviço público.

Após alguma polêmica, o STF decidiu que a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de Direito Privado prestadoras de serviço público é sempre objetiva, independentemente de a vítima ser usuária ou não do serviço público. Isso foi decidido, inclusive, em sede de repercussão geral, no RE 59187456.

A pessoa jurídica da Administração Indireta responde por atos de seus agentes (responsabilidade primária). O Estado, na qualidade de titular do serviço público prestado por aquela entidade, responde subsidiariamente (responsabilidade secundária).

5.2.2 Conduta

Não há dúvida quanto à conduta comissiva: a responsabilidade é objetiva. No caso de conduta omissiva, entendia-se que a responsabilidade também era objetiva. De uns 5 anos para cá, passou-se a adotar a responsabilidade subjetiva. Hoje, já se discute a volta à responsabilização objetiva.

A responsabilidade subjetiva pela conduta omissiva exige os seguintes requisitos: o descumprimento de um dever legal e um dano evitável (o Estado não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo). Observam-se o mínimo existencial e a reserva do possível.

5.2.3 Dano

O dano indenizável é o jurídico, e não o meramente econômico (lojistas não têm direito à manutenção de um museu em torno do qual trabalham; residentes não têm direito a que o bairro residencial não se transforme em misto).

Além de jurídico, o dano tem de ser certo. Dano certo é o dano determinado ou, ao menos, determinável, ou seja, aquele cujo valor é definido ou pode ser estipulado.

Se a conduta do Estado for lícita, o dano precisa ser, ainda, especial, isto é, particularizado, com vítima certa; e anormal. Não se pode falar em responsabilidade do Estado em decorrência da poluição da cidade, do congestionamento no trânsito, da poeira de uma obra, porque não são situações anormais, mas situações que fazem parte do cotidiano de uma cidade.

5.3 Ação judicial de indenização

Em que pesem algumas orientações do STF, o STJ entende que a vítima pode ajuizar a ação tanto em face da pessoa jurídica quanto em face do agente. Para o STJ,

56 EMENTA: CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO. CONCESSIONÁRIO OU PERMISSIONÁRIO DO SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA EM RELAÇÃO A TERCEIROS NÃO-USUÁRIOS DO SERVIÇO. RECURSO DESPROVIDO. I - A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é objetiva relativamente a terceiros usuários e não-usuários do serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. II - A inequívoca presença do nexo de causalidade entre o ato administrativo e o dano causado ao terceiro não-usuário do serviço público, é condição suficiente para estabelecer a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de direito privado. III - Recurso extraordinário desprovido. (RE 591874, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 26/08/2009, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-237 DIVULG 17-12-2009 PUBLIC 18-12-2009 EMENT VOL-02387-10 PP-01820)

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se a ação é ajuizada em face do Estado, segue-se a teoria objetiva. Contudo, se a ação é ajuizada em face do agente, deve ser seguida a teoria subjetiva.

Se a ação é ajuizada contra o Estado, este pode, em ação regressiva, cobrar do agente os prejuízos com os quais arcou. Mas, se a ação é ajuizada em face do agente, este só responde se tiver agido com culpa ou dolo. Diante disso, conclui-se que, se o Estado move a ação regressiva contra o seu agente, esta ação deve observar a teoria subjetiva (o agente só pagará se tiver agido com culpa ou dolo). Portanto, entre o Estado e o agente, aplica-se a teoria da responsabilidade subjetiva.

Na doutrina, prevalece que não cabe a denunciação da lide, porque, com ela, passa-se a discutir, na ação, culpa ou dolo, e culpa ou dolo amplia o objeto do processo, pois a responsabilidade do Estado diante da vítima é objetiva, sem discussão de culpa ou dolo. Logo, por causar a procrastinação da solução do feito, a doutrina entende que não é cabível a denunciação da lide, por contrariar uma das razões de ser desta intervenção de terceiros.

Contudo, denunciação da lide é matéria do CPC, que é lei federal, e matéria relativa a lei federal é julgada pelo STJ. A nossa jurisprudência, especialmente do STJ, diz que cabe a denunciação da lide, afirmando a Corte, inclusive, que ela é aconselhável, por representar economia e celeridade para o processo. Mas, cuidado, pois o STJ também deixa claro que se trata apenas de uma faculdade do Estado, que só denuncia se quiser. Se o Estado quiser denunciar, é possível, mas, se não quiser, pode ajuizar a ação de regresso depois.

Inicialmente, o prazo prescricional para o ajuizamento da ação de indenização era de 5 anos, aplicando-se o art. 1º do Decreto-lei nº 20.910/32. Era isso que prevalecia na jurisprudência, inclusive do STF e do STJ.

Porém, com o advento do novo Código Civil, o qual, no seu art. 106, informa que o prazo prescricional para reparação civil é de 3 anos, passou-se a entender que o prazo prescricional para ação cobrando a responsabilidade do Estado seria este (3 anos). O entendimento, inclusive, foi adotado pelo STJ e por alguns doutrinadores.

Ocorre que, na metade de 2010, o STJ voltou a reconhecer como de 5 anos o prazo prescricional. Portanto, hoje prevalece, novamente, o prazo de 5 anos para o ajuizamento da ação pela responsabilidade civil do Estado.

Doutrinadores continuam defendendo o prazo prescricional de 3 anos. Mas não se pode ignorar que decisões recentes do STJ voltaram a reconhecer o prazo de 5 anos para a prescrição da pretensão de indenização contra o Estado. É necessário aguardar a consolidação do posicionamento em um ou em outro sentido.

Já para a ação de regresso do Estado contra o agente, não há prescrição. Trata-se de pretensão imprescritível, pois, segundo a CF/88, art. 37, § 5º, é imprescritível o ressarcimento ao Erário (A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento).

5.4 Independência de instâncias

O mesmo ato pode caracterizar um ilícito penal, um ilícito administrativo e um ilícito civil. Estas três esferas são autônomas e independentes. Cada uma das ações tem objetivos diferentes. É possível, inclusive, que o agente seja condenado em uma esfera e absolvido em outra.

A regra é a independência das instâncias. Excepcionalmente, contudo, existirá comunicação entre elas, quando houver absolvição penal por inexistência do fato ou por negativa da autoria.

Lei nº 8.112/90, art. 126. A responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso de absolvição criminal que negue a existência do fato ou sua autoria.

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CPPArt. 65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato.

CC, art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.

Aula 8 (04 de outubro de 2012)

6 IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Improbidade administrativa é o designativo técnico para a chamada corrupção administrativa, que promove o desvirtuamento da função pública, afrontando a ordem jurídica. Revela-se pela (i) aquisição de vantagens patrimoniais indevidas, (ii) exercício nocivo da função pública, (iii) tráfico de influência ou (iv) desfavorecimento da coisa pública em favor da privada.

O primeiro dispositivo constitucional que trata da improbidade administrativa é o art. 14, § 9º, que visa a evitar a improbidade em período eleitoral: Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.

Outro dispositivo constitucional que regula a hipótese é o art. 15, V, que prevê a suspensão de direitos políticos (que não podem ser cassados) em virtude da prática de ato de improbidade administrativa: É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: [...] V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.

Outra hipótese prevista na Constituição é a prática de crimes de responsabilidade pelo presidente da república, conforme o art. 85, V. Crimes de responsabilidade são aqueles que podem culminar no processo de impeachment do presidente: São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: [...] V - a probidade na administração; [...].

Finalmente, o art. 37, § 4º, CF, é o principal dispositivo para a matéria aqui estudada. Este artigo prevê medidas a serem adotadas em caso de improbidade administrativa: Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Este dispositivo (art. 37, § 4º, CF) foi regulamentado pela Lei nº 8.429/92, que traz outras medidas além das adotadas na Constituição e define a natureza jurídica do ato de improbidade administrativa. No Brasil, portanto, regulam a improbidade administrativa o art. 37, § 4º, da CF e a Lei nº 8.429/92.

A Lei de Improbidade também é chamada de “Lei do Colarinho Branco”, porque reprime a prática de ilícitos por indivíduos mais abastados. A ideia é punir administrador ímprobo. Foi aprovada e publicada em 1992. A partir daí, passou-se a discutir de quem seria a competência para processar e julgar a ação de improbidade. Quando o STF resolveu sobre a competência, afirmando ser do Judiciário, surgiu outra discussão: o agente político que responde por crime comum também responde por improbidade administrativa e por crime de responsabilidade?

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Ademais, na ADI 218257, que foi decidida em 2010, a Lei de Improbidade teve sua constitucionalidade questionada. Houve duas questões discutidas nessa ação, mas apenas uma delas foi resolvida. Alegou-se que a lei sofreria de uma inconstitucionalidade formal (por vício no seu processo legislativo). Tal ADI foi julgada improcedente, ficando, portanto, afastada a inconstitucionalidade formal.

Hoje, ainda se critica a falta de tipificação na Lei de Improbidade, porque as condutas nela previstas como atos de improbidade não se apresentam com um verbo bem definido, são muito genéricas, não são bem tipificados pela lei. Contudo, essa questão (de inconstitucionalidade material) ainda não foi enfrentada pelo STF.

6.1 Competência legislativa

A Constituição não dispõe expressamente a respeito da competência para legislar sobre improbidade administrativa. A doutrina resolve tal problema realizando interpretação do art. 37, § 4º, da CF, a considerar que, como é da União a competência para legislar sobre direito eleitoral e civil (suspensão de direitos políticos, ressarcimento, indisponibilidade de bens etc), é também de sua competência legislar sobre improbidade: quem legisla sobre as medidas de improbidade, legisla sobre improbidade (CF, art. 22, I). Por isso, a Lei nº 8.429/92 possui âmbito nacional.

Alguns autores, fazendo uma distinção, dizem que essa competência do art. 22, I, da CF/88 se refere apenas à matéria estritamente administrativa. Para matérias estritamente administrativas, a competência é inegavelmente da União. Já no que respeita a matérias procedimentais, essa parte da doutrina entende que a competência seria concorrente, com base no art. 24, XI, que se refere a procedimentos em matéria processual: Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: [...] XI - procedimentos em matéria processual; [...].

6.2 Natureza jurídica do ilícito de improbidade administrativa

A CF/88 dispõe que são medidas de improbidade a indisponibilidade de bens, o ressarcimento, a suspensão de direitos políticos etc, além das medidas penais cabíveis. Ora, se o constituinte teve de deixar claro que são também cabíveis medidas penais, significa que as medidas de improbidade não possuem natureza penal.

Veja-se que um mesmo ato pode, além de caracterizar improbidade administrativa, representar a prática de um crime. Uma mesma conduta, além de representar ato de improbidade administrativa, pode caracterizar crime. Para ser crime, contudo, é necessário que o respectivo tipo esteja previsto na lei penal. A mesma conduta pode ser ato de improbidade se estiver prevista na Lei nº 8.429/92 e pode ser crime se estiver assim prevista nas leis penais.

Ademais, quando um servidor público pratica uma infração funcional, as sanções possíveis são demissão, suspensão e advertência. Como se vê, a sanção

57 EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. 1. QUESTÃO DE ORDEM: PEDIDO ÚNICO DE DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DE LEI. IMPOSSIBILIDADE DE EXAMINAR A CONSTITUCIONALIDADE MATERIAL. 2. MÉRITO: ART. 65 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA LEI 8.429/1992 (LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA): INEXISTÊNCIA. 1. Questão de ordem resolvida no sentido da impossibilidade de se examinar a constitucionalidade material dos dispositivos da Lei 8.429/1992 dada a circunstância de o pedido da ação direta de inconstitucionalidade se limitar única e exclusivamente à declaração de inconstitucionalidade formal da lei, sem qualquer argumentação relativa a eventuais vícios materiais de constitucionalidade da norma. 2. Iniciado o projeto de lei na Câmara de Deputados, cabia a esta o encaminhamento à sanção do Presidente da República depois de examinada a emenda apresentada pelo Senado da República. O substitutivo aprovado no Senado da República, atuando como Casa revisora, não caracterizou novo projeto de lei a exigir uma segunda revisão. 3. Ação direta de inconstitucionalidade improcedente. (ADI 2182, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 12/05/2010, DJe-168 DIVULG 09-09-2010 PUBLIC 10-09-2010 EMENT VOL-02414-01 PP-00129 RTJ VOL-00218- PP-00060)

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administrativa não é a mesma da sanção pela improbidade. Pela prática de um ilícito administrativo, o sujeito é julgado através de um processo administrativo disciplinar (PAD), pela própria Administração. Já a prática de ilícito de improbidade quem julga é o Poder Judiciário.

Contudo, nada impede que um ato de improbidade também esteja descrito na lei como infração funcional. Um mesmo ato pode ser ilícito de improbidade e infração funcional. Por exemplo, um sujeito que desvia, para si, um helicóptero da Administração pratica ato de improbidade (enriquecimento indevido) e infração administrativa.

Não tendo natureza penal nem administrativa, o STF, na ADI 279758, decidiu que o ilícito de improbidade administrativa tem natureza civil. Trata-se de ilícito civil.

Se a conduta está descrita como ilícito na Lei nº 8.429/92, tem natureza de ato de improbidade (natureza civil); se a conduta está descrita como ilícito no Código Penal, tem natureza de crime; e se a conduta está prevista como ilícito no Estatuto dos Servidores, tem natureza de infração administrativa. Logo, será possível a instauração de três processos (um judicial civil, um administrativo e um judicial criminal).

Embora a regra seja a independência das instâncias, excepcionalmente, comunicar-se-ão: (i) no caso de absolvição penal pela inexistência do fato ou negativa da autoria (Lei nº 8.112/90, art. 126; CC, art. 935; CPP, art. 66), gerando absolvição geral (em todas as instâncias); (ii) se, no processo penal, reconhecer-se excludente de ilicitude ou culpabilidade, isto fará coisa julgada no processo civil, não significando, necessariamente, absolvição no processo civil (a questão pode ser incidental) [CPP, art. 65].

Improbidade administrativa vs. crime de responsabilidade

58 EMENTA: [...] IV. Ação de improbidade administrativa: extensão da competência especial por prerrogativa de função estabelecida para o processo penal condenatório contra o mesmo dignitário (§ 2º do art. 84 do C Pr Penal introduzido pela L. 10.628/2002): declaração, por lei, de competência originária não prevista na Constituição: inconstitucionalidade. 1. No plano federal, as hipóteses de competência cível ou criminal dos tribunais da União são as previstas na Constituição da República ou dela implicitamente decorrentes, salvo quando esta mesma remeta à lei a sua fixação. 2. Essa exclusividade constitucional da fonte das competências dos tribunais federais resulta, de logo, de ser a Justiça da União especial em relação às dos Estados, detentores de toda a jurisdição residual. 3. Acresce que a competência originária dos Tribunais é, por definição, derrogação da competência ordinária dos juízos de primeiro grau, do que decorre que, demarcada a última pela Constituição, só a própria Constituição a pode excetuar. 4. Como mera explicitação de competências originárias implícitas na Lei Fundamental, à disposição legal em causa seriam oponíveis as razões já aventadas contra a pretensão de imposição por lei ordinária de uma dada interpretação constitucional. 5. De outro lado, pretende a lei questionada equiparar a ação de improbidade administrativa, de natureza civil (CF, art. 37, § 4º), à ação penal contra os mais altos dignitários da República, para o fim de estabelecer competência originária do Supremo Tribunal, em relação à qual a jurisprudência do Tribunal sempre estabeleceu nítida distinção entre as duas espécies. 6. Quanto aos Tribunais locais, a Constituição Federal -salvo as hipóteses dos seus arts. 29, X e 96, III -, reservou explicitamente às Constituições dos Estados-membros a definição da competência dos seus tribunais, o que afasta a possibilidade de ser ela alterada por lei federal ordinária. V. Ação de improbidade administrativa e competência constitucional para o julgamento dos crimes de responsabilidade. 1. O eventual acolhimento da tese de que a competência constitucional para julgar os crimes de responsabilidade haveria de estender-se ao processo e julgamento da ação de improbidade, agitada na Rcl 2138, ora pendente de julgamento no Supremo Tribunal, não prejudica nem é prejudicada pela inconstitucionalidade do novo § 2º do art. 84 do C.Pr.Penal. 2. A competência originária dos tribunais para julgar crimes de responsabilidade é bem mais restrita que a de julgar autoridades por crimes comuns: afora o caso dos chefes do Poder Executivo - cujo impeachment é da competência dos órgãos políticos - a cogitada competência dos tribunais não alcançaria, sequer por integração analógica, os membros do Congresso Nacional e das outras casas legislativas, aos quais, segundo a Constituição, não se pode atribuir a prática de crimes de responsabilidade. 3. Por outro lado, ao contrário do que sucede com os crimes comuns, a regra é que cessa a imputabilidade por crimes de responsabilidade com o termo da investidura do dignitário acusado. (ADI 2797, Relator(a):  Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 15/09/2005, DJ 19-12-2006 PP-00037 EMENT VOL-02261-02 PP-00250)

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Entendia-se que as sanções de suspensão de direitos políticos e perda da função pública eram sanções políticas, chocando com o âmbito de penalização do crime de responsabilidade. O STF, contudo, entende tais sanções como civis, podendo-se, perfeitamente, processar o administrador público pela improbidade e pelo crime político ao mesmo tempo.

6.3 Elementos constitutivos do ato de improbidade

6.3.1 Sujeito passivo

Lei nº 8.429/92, art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei. Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.

As autarquias profissionais (conselhos de classe) enquadram-se na qualificação de autarquias e, portanto, podem ser sujeitos passivos de ato de improbidade, mormente porque a anuidade dessas classes tem natureza tributária. Demais, os sindicatos, como são beneficiários da parafiscalidade, arrecadando contribuição sindical, também podem ser sujeitos passivos. Partidos políticos também podem sofrer por ato de improbidade, uma vez que sobrevivem de duas receitas: dinheiro privado e fundo de participação, sendo este dinheiro público. Por fim, OS, OSCIP, sistema S, entidades de apoio, como também recebem recurso público, também estão sujeitas à improbidade.

Perceba-se que as entidades protegidas pela Lei de Improbidade são muito semelhantes às protegidas por ação popular. Na diferença, a ação popular (Lei nº 4.717/65) tem como objetivo a anulação de um ato ilegal. Ela não se presta a punir o servidor, embora até possa discutir perdas e danos. Não há condenação do servidor pelo seu ato. A legitimidade para o ajuizamento da ação popular é do cidadão (qualquer pessoa em pleno gozo dos seus direitos políticos). Já a ação de improbidade administrativa tem como objetivo não só retirar o ato ilegal, mas, especialmente, aplicar sanção ao servidor pela prática do ato de improbidade. A legitimidade para o ajuizamento da ação de improbidade não é do cidadão, mas do Ministério Público ou da pessoa jurídica lesada.

6.3.2 Sujeito ativo

Lei nº 8.429/92Art. 2°. Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.Art. 3°. As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

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Podem ser sujeito ativo o agente público e o terceiro que induza, concorra para o ato, ou dele se beneficie.

Perceba-se que, nos polos da ação de improbidade, o sujeito ativo pode ser o Ministério Público ou a pessoa jurídica lesada (ex: União), e o sujeito passivo é o agente público que praticou o ato ímprobo.

Pessoa jurídica pode, sim, ser sujeito ativo de ato de improbidade, por se enquadrar no art. 3º da lei. Se a pessoa jurídica induzir, concorrer ou se beneficiar com a prática do ato, pode se enquadrar como sujeito ativo do ato de improbidade. Veja-se que o sujeito que responde pelo art. 3º não sofrerá todas as sanções da lei, porque não é agente público. Ele responderá apenas pelas sanções compatíveis com a sua situação (por exemplo, não poderá sofrer perda de função pública, já que não a exerce). Haverá desconsideração da personalidade jurídica da empresa, atingindo os seus sócios, que serão os réus em eventual ação.

O herdeiro responde pelo ato de improbidade da pessoa que sucede? Isto é respondido pelo art. 8º da Lei nº 8.429/92 (O sucessor daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se enriquecer ilicitamente está sujeito às cominações desta lei até o limite do valor da herança). O herdeiro, evidentemente, não sofre todas as sanções (por exemplo, não sofre suspensão de direitos políticos). O herdeiro suporta as consequências patrimoniais, e apenas até o limite das forças da herança.

Há grandes discussões sobre a aplicação da Lei de Improbidade aos agentes políticos, mormente por haver quem afirme que pode caracterizar bis in idem (responder por improbidade e por crime de responsabilidade). Veja-se que agente político é aquele que se encontra no topo, no comando de cada um dos Poderes. É aquele que representa a vontade do Estado, exercendo funções constitucionais (chefes do Poder Executivo, seus vices e secretários imediatos; membros do Poder Legislativo; desde 2002, o STF entende que magistrados e membros do MP também são agentes políticos)59.

As discussões sobre os agentes políticos são as seguintes:(i) Bis in idem. O agente político, no Brasil, responde por improbidade

administrativa e, também, por crime de responsabilidade? Lembre-se que o crime de responsabilidade tem natureza política, e o ato de improbidade tem natureza civil, embora sofra algumas sanções com natureza política. Há bis in idem se o agente responde pelos dois? Sobre isso, três orientações diferentes devem ser consideradas:

• A primeira se deu no julgamento da RCL 2138 pelo STF. Neste julgado, a Suprema Corte decidiu que os agentes políticos não seriam alcançados pela Lei de Improbidade. Consignou-se que, se o mesmo ato caracteriza ato de improbidade e crime de responsabilidade, este prevalece, afastando o ato de improbidade. Portanto, o agente político não responderia por improbidade, desde que a conduta se enquadrasse também como crime de responsabilidade. Ocorre que essa decisão do STF foi proferida por uma composição diferente da que há hoje no Tribunal. Como a composição da Corte foi alterada, essa posição já se encontra superada, não mais se aplicando atualmente.

• A segunda orientação (é a que prevalece, tanto no STF quanto no STJ) é de que o agente político responde, sim, por ato de improbidade administrativa, independentemente de o ato também caracterizar crime de responsabilidade. A ideia, aqui, é de que se tratam de ilícitos de naturezas diferentes, de modo que o agente político responde tanto por crime de responsabilidade quanto por ato de improbidade administrativa (por este, é processado na 1ª instância). Neste sentido, o AI 506323 do STF. O STF somente afasta da Lei de Improbidade o presidente da república, em razão do art. 85 da CF (São crimes de

59 Diplomata e ministros e conselheiros do tribunal de contas: há divergência se são, ou não, agente político.

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responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: [...] V - a probidade na administração; [...]).

• Há que se falar, também, em uma decisão isolada tomada no STJ. Não se pode falar que se trata do entendimento adotado, sendo apenas uma decisão isolada. Essa decisão foi proferida na RCL 2790. Neste julgado, Teori Albino Zavascki consignou que, anos atrás, o STF, discutindo ato de improbidade de seus próprios ministros, decidiu que ministro do STF, por ato de improbidade seu, não pode ser julgado pela primeira instância, mas apenas pelo próprio STF. A Suprema Corte entendeu que isso é uma decorrência do sistema de competências estabelecido na Constituição, sendo absurdo ou contrassenso conceber que ministro do STF seja julgado por outro órgão que não o próprio STF, já que, entre as sanções, encontra-se a perda do cargo. Tomando como base esse julgado do STF, o STJ decidiu que não é lógico que governador de Estado seja julgado por juiz de 1º grau, já que é possível que ele sofra a perda do cargo, o que faz com que ato de improbidade de governador deva seja julgado pelo STJ. Essa decisão do STJ leva à seguinte conclusão: agente político responde, sim, por ato de improbidade administrativa, mas com foro privilegiado, nos mesmos moldes do foro privilegiado para o julgamento de crimes comuns, haja vista as possíveis sanções pelo ato. Essa decisão do STJ não pode ser encarada como sua jurisprudência dominante (é apenas uma decisão isolada), mas é de extrema importância. Nas ADIs 2797 (supra) e 2860, o STF entendeu que os agentes políticos não possuem foro privilegiado na ação de improbidade administrativa.

Aula 9 (15 de outubro de 2012)

6.3.3 Ato de improbidade

O ato de improbidade não precisa ser ato administrativo: basta ser uma simples conduta, inclusive omissiva. O rol de atos de improbidade, pela lei, é exemplificativo: atos que geram enriquecimento ilícito (art. 9º); atos que geram dano ao erário (art. 10); atos que violam princípios administrativos (art. 11). Veja-se que, de acordo com o art. 21, o ato de improbidade independe de dano econômico, salvo para a aplicação da pena de ressarcimento ao erário.

O ato de improbidade não está condicionado ao controle do Tribunal de Contas (Lei nº 8.429/92, art. 21, II). Nesse sentido, pode-se agir de modo ímprobo mesmo quando há fiscalização do Tribunal de Contas. É que a aprovação do TC é feita por amostragem, não havendo uma análise detalhada de cada ato. Todavia, quando o TC rejeita as contas, liga-se o sinal de alerta no tocante à configuração da improbidade.

Muitas vezes, o administrador é negligente na fiscalização da arrecadação tributária e na fiscalização da execução dos contratos. Evidentemente, se o Estado arrecada menos tributos do que deveria, terá prejuízos. Logo, a negligência na arrecadação tributária caracteriza ato de improbidade que causa lesão ao erário. Também a falta de fiscalização da execução dos contratos administrativos, como o de concessão do serviço de coleta de lixo, também causa dano ao patrimônio público. É, portanto, ato de improbidade que causa lesão ao erário.

Para analisar se houve ato de improbidade, deve-se trilhar o seguinte caminho: primeiro, avaliar se houve enriquecimento ilícito (art. 9º). Não caracterizada esta hipótese, avaliar se houve dano ao erário (art. 10). Finalmente, não caracterizado dano ao erário, avaliar se houve ofensa a princípio administrativo (art. 11). Como se vê, analisa-se, nessa ordem, da infração mais grave à mais leve (as mais leves são subsidiárias às mais graves).

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Demais, tais infrações devem ser analisadas à luz da conduta do agente público, e não do particular, pois este pode enriquecer-se sem que aquele o faça.

Ato praticado com desvio de finalidade é, evidentemente, ilegal. Ora, se é ilegal, viola a legalidade, ferindo, consequentemente, princípio da administração pública. Portanto, ato praticado com desvio de finalidade, por ser ilegal e, consequentemente, violar princípio da administração, caracteriza improbidade administrativa (art. 11 da Lei nº 8.429/92).

Outra hipótese trazida expressamente pelo art. 11 da Lei nº 8.429/92 é a de o administrador não publicar os seus atos. Ora, todos os atos administrativos, em regra, devem ser publicados, por força do princípio da publicidade. Assim, se o Administrador não dá publicidade aos seus atos, pratica ato de improbidade administrativa por violação a princípio da administração pública.

Quanto ao elemento subjetivo da conduta ímproba, tem-se que, nos casos dos arts. 9º e 11, considera-se apenas o dolo. No caso do art. 10, por expressa previsão legal, considera-se dolo e culpa.

6.3.4 Sanções

Estão listadas no art. 12 da Lei nº 8.429/92, que amplia o rol do art. 37, § 4º, da CF:

Lei nº 8.429/92, art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: I - na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos; II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos; III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos. Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.

Esse dispositivo separa, em seus incisos, as sanções para cada modalidade de ato de improbidade, como se pode perceber. Assim, se o ato for do art. 9º, só se podem aplicar as penas do inciso I; se o ato for do art. 10, só se podem aplicar as penas do inciso II; e, se o fato for do art. 11, só se podem aplicar as penas do inciso III. Porém, o juiz não tem de aplicar todas as penas de cada um dos incisos. Não há mais, portanto, a ideia chamada “pena em bloco”: o juiz, em cada caso concreto, seleciona fundamentadamente quais das penas cabíveis aplicará ao caso.

Importante: na hipótese do inciso II do art. 12 (supra), o acrescido ilicitamente é do terceiro (que deverá ser o responsável pelo ressarcimento), não do agente público. Se é o

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agente quem enriquece ilicitamente, a hipótese é a do art. 9º, com as sanções do inciso I do art. 12. Ainda, no caso do inciso III do art. 12, o dano é o causado pelo terceiro, sendo este quem deverá ressarcir o erário. Por fim, veja-se que as penas de perda de função e de suspensão de direitos políticos só podem ser aplicadas a partir do trânsito em julgado da decisão (Lei nº 8.429/92, art. 20, caput).

6.4 Ação judicial de improbidade administrativa

A natureza jurídica da ação de improbidade administrativa é de ação civil pública, segundo a maioria da doutrina. A ação pode ou não ser precedida de inquérito civil.

A legitimidade ativa para a ação de improbidade é do Ministério Público ou da pessoa jurídica lesada (a pessoa jurídica lesada é uma daquelas previstas no art. 1º da Lei nº 8.429/92). Se a pessoa jurídica lesada é que ajuíza a ação, o MP é obrigatoriamente chamado a participar do processo. Por outro lado, se é o MP que ajuíza a ação, a pessoa jurídica lesada também é chamada para participar.

Veja-se que, na hipótese de o agente processado ser o representante da pessoa jurídica, não haverá a participação dela. Portanto, não é sempre que a pessoa jurídica lesada participa. É que o representante da pessoa jurídica lesada não precisará produzir provas contra si mesmo. Neste caso, a pessoa jurídica é notificada do processo, mas se queda inerte, não se manifesta.

É vedado, em ação de improbidade, qualquer tipo de acordo, transação ou composição (diferentemente da ação civil pública comum) [Lei nº 8.429/92, art. 17, § 1º]. Demais, prevalece, atualmente, que não existe foro privilegiado para a ação de improbidade administrativa. Isso foi discutido na ADI 2860 e na ADI 2797.

Em ação de improbidade é possível a utilização de algumas medidas cautelares, quais: indisponibilidade de bens; sequestro; desbloqueio de informações bancárias e telefônicas; bloqueio de contas bancárias; afastamento preventivo do agente público (por exemplo, para evitar que ele destrua provas). Esse afastamento preventivo não tem prazo fixado em lei, mas ele será feito sem prejuízo da remuneração. Portanto, o afastamento é sem prazo e com remuneração (Lei nº 8.429/92, art. 20, parágrafo único).

No tocante ao prazo prescricional para a ação de improbidade, há duas principais regras: a primeira delas é de que o prazo prescricional será de 5 anos, quando o agente ímprobo exerce mandato eletivo, cargo em comissão ou função de confiança. Esse prazo é contado da data em que o sujeito deixa o cargo. Para os demais servidores, o prazo será o mesmo para a aplicação da pena de demissão. Normalmente, esse prazo é de 5 anos. O início da contagem do prazo, porém, não ocorre no dia em que o sujeito deixa o cargo, mas na data em que se toma conhecimento a infração.

Finalmente, lembre-se que o ressarcimento ao erário, conforme o art. 37, § 5º, da CF/88, é imprescritível (A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento).

Lei nº 8.429/92Art. 14. Qualquer pessoa poderá representar à autoridade administrativa competente para que seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade. § 1º A representação, que será escrita ou reduzida a termo e assinada, conterá a qualificação do representante, as informações sobre o fato e sua autoria e a indicação das provas de que tenha conhecimento. § 2º A autoridade administrativa rejeitará a representação, em despacho fundamentado, se esta não contiver as formalidades estabelecidas no § 1º deste artigo. A rejeição não impede a representação ao Ministério Público, nos termos do art. 22 desta lei. § 3º Atendidos os requisitos da representação, a autoridade determinará a imediata apuração dos fatos que, em se tratando de servidores federais, será processada na forma prevista nos arts. 148 a 182 da Lei nº 8.112, de

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11 de dezembro de 1990 e, em se tratando de servidor militar, de acordo com os respectivos regulamentos disciplinares.Art. 15. A comissão processante dará conhecimento ao Ministério Público e ao Tribunal ou Conselho de Contas da existência de procedimento administrativo para apurar a prática de ato de improbidade. Parágrafo único. O Ministério Público ou Tribunal ou Conselho de Contas poderá, a requerimento, designar representante para acompanhar o procedimento administrativo.Art. 16. Havendo fundados indícios de responsabilidade, a comissão representará ao Ministério Público ou à procuradoria do órgão para que requeira ao juízo competente a decretação do seqüestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano ao patrimônio público. § 1º O pedido de seqüestro será processado de acordo com o disposto nos arts. 822 e 825 do Código de Processo Civil. § 2° Quando for o caso, o pedido incluirá a investigação, o exame e o bloqueio de bens, contas bancárias e aplicações financeiras mantidas pelo indiciado no exterior, nos termos da lei e dos tratados internacionais.Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar. § 1º É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput. § 2º A Fazenda Pública, quando for o caso, promoverá as ações necessárias à complementação do ressarcimento do patrimônio público. § 3º No caso da ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, a pessoa jurídica interessada integrará a lide na qualidade de litisconsorte, devendo suprir as omissões e falhas da inicial e apresentar ou indicar os meios de prova de que disponha. § 3o No caso de a ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se, no que couber, o disposto no § 3o do art. 6o da Lei no 4.717, de 29 de junho de 1965. (Redação dada pela Lei nº 9.366, de 1996) § 4º O Ministério Público, se não intervir no processo como parte, atuará obrigatoriamente, como fiscal da lei, sob pena de nulidade. § 5o A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001) § 6o A ação será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da existência do ato de improbidade ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente, inclusive as disposições inscritas nos arts. 16 a 18 do Código de Processo Civil. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001) § 7o Estando a inicial em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação do requerido, para oferecer manifestação por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações, dentro do prazo de quinze dias. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001) § 8o Recebida a manifestação, o juiz, no prazo de trinta dias, em decisão fundamentada, rejeitará a ação, se convencido da inexistência do ato de improbidade, da improcedência da ação ou da inadequação da via eleita. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001) § 9o Recebida a petição inicial, será o réu citado para apresentar contestação. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001) § 10. Da decisão que receber a petição inicial, caberá agravo de instrumento. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001) § 11. Em qualquer fase do processo, reconhecida a inadequação da ação de improbidade, o juiz extinguirá o processo sem julgamento do mérito. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001) § 12. Aplica-se aos depoimentos ou inquirições realizadas nos processos regidos por esta Lei o disposto no art. 221, caput e § 1o, do Código de Processo Penal. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 2001)Art. 18. A sentença que julgar procedente ação civil de reparação de dano ou decretar a perda dos bens havidos ilicitamente determinará o pagamento

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ou a reversão dos bens, conforme o caso, em favor da pessoa jurídica prejudicada pelo ilícito.

7 CONSÓRCIOS PÚBLICOS

7.1 Consórcios e convênios administrativos da Lei nº 8.666/93

Há os consórcios previstos na Lei nº 11.107/05 e os previstos na Lei nº 8.666/93, que são diferentes. Esta prevê os convênios e consórcios administrativos, enquanto aquela prevê os consórcios públicos. Os convênios e consórcios administrativos estão previstos no art. 241 da CF:

CF, art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos.

Regulamentando a matéria, dispõe o art. 116 da Lei nº 8.666/93:

Lei nº 8.666/93, art. 116. Aplicam-se as disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração. § 1o  A celebração de convênio, acordo ou ajuste pelos órgãos ou entidades da Administração Pública depende de prévia aprovação de competente plano de trabalho proposto pela organização interessada, o qual deverá conter, no mínimo, as seguintes informações: I - identificação do objeto a ser executado; II - metas a serem atingidas; III - etapas ou fases de execução; IV - plano de aplicação dos recursos financeiros; V - cronograma de desembolso; VI - previsão de início e fim da execução do objeto, bem assim da conclusão das etapas ou fases programadas; VII - se o ajuste compreender obra ou serviço de engenharia, comprovação de que os recursos próprios para complementar a execução do objeto estão devidamente assegurados, salvo se o custo total do empreendimento recair sobre a entidade ou órgão descentralizador. [...]

A ideia central nos convênios e consórcios administrativos é a busca de interesses comuns/convergentes. Em um convênio, há a possibilidade de participação de entidades públicas de qualquer natureza (qualquer das pessoas políticas e qualquer das pessoas jurídicas de Direito Público pertencentes às suas administrações indiretas) e de particulares. Um exemplo de convênio é o estágio: é comum, por exemplo, universidades (públicas e privadas) celebrarem convênios com órgãos públicos para realização de estágios. Ora, se pode haver a participação de entidades públicas de qualquer espécie e de particulares, trata-se de convênio.

Já no consórcio administrativo, só pode haver a participação de entidades estatais da mesma espécie. Assim, só pode haver consórcio administrativo de um estado-membro com outros, de um município com outros. Ademais, não se admite, em consórcio administrativo, a participação de particulares.

Os convênios e consórcios administrativos representam instrumentos de descentralização administrativa. Como os interesses dos conveniados ou consorciados são comuns, e não contrapostos, os seus integrantes não são chamados de partes, mas de partícipes.

Dentro do convênio ou consórcio, cada entre cooperará de acordo com as suas possibilidades. Por isso, a responsabilidade é conforme à participação.

A cooperação é associativa, sem, contudo, adquirir nova personalidade jurídica. Demais, para a constituição dos convênios e consórcios, não se exige autorização legislativa prévia. Contudo, embora não haja essa exigência, alguns estados-membros e

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municípios passaram a prever tal exigência em suas leis. Instado a se pronunciar sobre o tema, o STF já decidiu que a exigência de autorização legislativa para a celebração de convênios e consórcios administrativos é inconstitucional. Assim foi decidido em inúmeras ADIs, como as de nº 34260, 1857 e 1166.

A participação e a responsabilidade de cada ente nos convênios e consórcios administrativos são fixadas por meio de um instrumento chamado “plano de trabalho”. Este instrumento está definido no art. 116, § 1º, da Lei nº 8.666/93 (supra).

Celebrado o convênio ou o consórcio, é preciso dar ciência ao Poder Legislativo. Veja-se que este não precisa autorizar a parceria, mas apenas tomar ciência dela. Inclusive, o STF já declarou inconstitucional qualquer exigência de autorização legislativa prévia.

Celebrado o convênio ou consórcio, ele está sujeito a controle e fiscalização, tanto por órgãos específicos de controle (como controladorias) quanto pelo Tribunal de Contas. No âmbito do convênio ou do consórcio, há liberação de recursos, a qual ocorre de acordo com um cronograma. Só se pode liberar a parcela seguinte se tiver havido a prestação de contas referente à parcela anterior.

É necessário controlar a liberação das parcelas, o cumprimento das finalidades e do cronograma (tudo previsto no plano de trabalho). Dentro desse controle, é necessário saber o seguinte: é possível haver retenção das parcelas de recursos, se não forem prestadas contas da parcela anterior, se não for atendida a finalidade prevista, se não forem cumpridos os cronogramas previstos, e se não forem adotadas as medidas saneadoras (estas servem para ajustar os atrasos nos cronogramas). Ocorrendo tais circunstâncias, é possível reter as parcelas futuras.

Finalmente, os saldos dos recursos dos convênios e dos consórcios devem ficar guardados em caderneta de poupança, para prazos iguais ou superiores a um mês. Se o prazo for menor, deverá ser utilizado fundo de aplicação financeira de curto prazo ou aplicações em mercado aberto, lastreado em título da dívida pública.

Se ocorrer a extinção do convênio ou do consórcio com saldo remanescente, esse dinheiro deverá ser devolvido, no prazo de 30 dias, à entidade que o desembolsou, sob pena de instauração de processo de tomada de contas especial.

7.2 Consórcios públicos da Lei nº 11.107/05

São formas de colaboração entre entes políticos para gestão associada de serviços públicos ou atividades públicas de interesse comum.

Inicia-se com um protocolo de intenções, que deve ser aprovado pelas Casas legislativas dos entes interessados. Após, celebra-se o contrato de consórcio. Alfim, o consórcio leva à criação de uma nova pessoa jurídica, chamada de “associação”.

A nova pessoa jurídica pode ser de Direito Público ou de Direito Privado: no primeiro caso, será espécie de autarquia; no segundo, seguirá regime híbrido, semelhante ao da empresa pública e da sociedade de economia mista.

60 EMENTA: Direito Constitucional. CONVÊNIOS: AUTORIZAÇÃO OU RATIFICAÇÃO POR ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO. PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO INCISO XXI DO ART. 54 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARANÁ, QUE DIZ: "Compete, privativamente, à Assembléia legislativa: XXI - autorizar convênios a serem celebrados pelo Governo do Estado, com entidades de Direito Público ou privado e ratificar os que, por motivo de urgência e de relevante interesse público, forem efetivados sem essa autorização, desde que encaminhados à Assembléia Legislativa, nos noventa dias subseqüentes à sua celebração". 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que a regra que subordina a celebração de acordos ou convênios firmados por órgãos do Poder Executivo à autorização prévia ou ratificação da Assembléia Legislativa, fere o princípio da independência e harmonia dos poderes (art. 2º, da C.F.). Precedentes. 2. Ação Direta julgada procedente para a declaração de inconstitucionalidade do inciso XXI do art. 54 da Constituição do Estado do Paraná. (ADI 342, Relator(a):  Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 06/02/2003, DJ 11-04-2003 PP-00025 EMENT VOL-02106-01 PP-00001)

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No protocolo de intenções, estabelecer-se-á o nome, a duração e a sede do consórcio. Além disso, devem constar: entes envolvidos; área de atuação (diretamente ligada a quem participa do consórcio); natureza jurídica da associação; normas sobre a assembleia geral (instância máxima); representantes (mandato, eleição etc); regime de pessoal; regras de gestão.

Quando o consórcio é contratado por ente consorciado, é dispensado de licitação. Demais, de acordo com o art. 24, § 1º, da Lei nº 8.666/93, Os percentuais referidos nos incisos I e II do caput deste artigo serão 20% (vinte por cento) para compras, obras e serviços contratados por consórcios públicos, sociedade de economia mista, empresa pública e por autarquia ou fundação qualificadas, na forma da lei, como Agências Executivas. Os percentuais referidos neste dispositivo são os que permitem a dispensa de licitação.

Segundo o art. 23, § 8º, da Lei de Licitações, No caso de consórcios públicos, aplicar-se-á o dobro dos valores mencionados no caput deste artigo quando formado por até 3 (três) entes da Federação, e o triplo, quando formado por maior número. Os valores referidos neste dispositivo são os definidores das modalidades de licitação.

O contrato de programa acontece quando um ente da federação firma acordo com um consórcio público.

Os recursos financeiros do consórcio seguem contabilidade pública, especialmente se a natureza da pessoa jurídica for de Direito Público. Se a natureza for privada, também serão aplicados procedimentos financeiros públicos. Os recursos estão sujeitos ao controle pelos tribunais de contas de cada uma dos entes consorciados.

Finalmente, a extinção do consórcio dependerá da aprovação de lei por cada um dos poderes legislativos dos entes consorciados. Ainda, a saída de um consorciado ou a própria extinção do consórcio não prejudicam as obrigações já assumidas.

Aula 10 (16 de novembro de 2012)

8 ESTATUTO DO SERVIDOR PÚBLICO (Lei nº 8.112/90)

8.1 Agentes públicos

Agente público é todo aquele que exerce função pública, temporária ou permanentemente, com ou sem remuneração, não importando o tipo de vínculo (nomeação, designação etc).

O agente político é agente público regido por lei específica ou diretamente pela constituição federal (senadores, deputados, vereadores, magistrados, membros do Ministério Público, chefes dos poderes executivos e seus respectivos vices, além dos auxiliares imediatos, como ministros e secretários).

O servidores estatais são os agentes públicos que atuam na Administração direta e na indireta. O servidor público é o servidor estatal que atua em pessoa pública, podendo ser titular de cargo ou de emprego (o que é definido pela lei que rege o servidor): o titular de cargo, no âmbito federal, está sujeito à Lei nº 8.112/90; o titular de emprego atua no regime celetista.

O servidor público está sujeito, hoje, ao regime jurídico único na esfera federativa específica.

O servidor estatal que atua em pessoa privada (portanto, somente na Administração indireta) é chamado de "servidor de ente governamental de Direito Privado". É titular de emprego no regime celetista.

Por fim, os "particulares em colaboração", não perdendo a sua condição de particulares, exercem, em alguma medida e tempo, função pública (ex: mesário, jurado etc).

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8.2 Cargo, função e emprego público

Cargo é a unidade de competência, a mais simples e indivisível. Está sujeito ao regime estatutário e a sua criação depende de lei, em número certo e denominação específica, sendo remunerado por pessoa jurídica de Direito Público.

Serviços auxiliares do Poder Legislativo são criados por resolução da própria Casa, e, não, por lei (CF, art. 51, IV, e 52, XIII). Contudo, a remuneração desses cargos depende de lei.

Função pública é o feixe unitário de atribuições, também precisando ser criada por lei. A única função prevista no ordenamento jurídico brasileiro é a de confiança (CF, art. 37, V): difere de cargo em comissão na medida em que este, que serve para direção, chefia e assessoramento, pode ser exercido por qualquer pessoa (livre nomeação e livre exoneração), ressalvado o número mínimo, previsto em lei, que será atribuído a servidor de cargo efetivo; enquanto aquela, a função de confiança, que também serve para direção, chefia e assessoramento, só pode ser atribuída a quem já exerce cargo efetivo.

Emprego público também representa um núcleo de encargos permanentes, mas no regime jurídico celetista. É retribuído por pessoa jurídica de Direito Público, nisto diferindo do "emprego", que é retribuído por pessoa de Direito Privado. A criação do emprego público também depende de lei.

8.3 Regime jurídico dos titulares de cargo público

8.3.1 Classificação dos cargos públicos

8.3.1.1 Quanto à posição estatal

O cargo de carreira é o organizado de forma escalonada, contando com um plano de ascensão funcional. Já o cargo isolado não possui plano de ascensão funcional, não havendo a organização em forma escalonada.

8.3.1.2 Quanto à vocação para retenção

O cargo em comissão não possui nenhuma garantia de retenção, enquanto o cargo efetivo, que depende de concurso público, tem os seus ocupantes nomeados em caráter definitivo, podendo o servidor adquirir estabilidade no cargo, necessitando-se de processo administrativo ou judicial para a sua demissão.

Possui ainda mais garantia de retenção o cargo vitalício, cujo integrante é nomeado em caráter definitivo, dependendo o desligamento de processo judicial. É o caso do magistrado, do membro do MP, dos ministros dos tribunais de contas.

8.3.2 Provimento dos cargos públicos

Provimento é o ato por meio do qual o agente público é investido no cargo. Divide-se em originário e derivado: o primeiro ocorre quando se adentra, pela primeira vez, em determinada carreira, ainda que já se tivesse exercido cargo em outra (a única forma de provimento originário é a nomeação); o segundo, quando se modifica de cargo (i) no mesmo plano (provimento derivado horizontal), cuja hipótese é a readaptação (em decorrência de limitação física ou mental [Lei nº 8.112/90, art. 24]), (ii) para plano superior, que pressupõe a organização em carreira (provimento derivado vertical), cuja hipótese é a promoção, ou (iii) no caso de reingresso.

Enunciado nº 685 da súmula do STF: aaaaaaa.

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O ato de aceitação do servidor nomeado é a tomada de posse – assunção do compromisso de bem servir – formando-se, então, a relação jurídica, a investidura. O servidor nomeado tem o prazo de 30 dias para tomar posse (enunciado n° 16 da súmula do STF: aaaaaa). Após a posse, o servidor nomeado e investido terá 15 dias para entrar em exercício. Se o servidor não entrar em exercício no prazo legal, será desinvestido, isto é, exonerado. No caso de não tomar posse, simplesmente a nomeação torna-se sem efeito.

No caso de provimento derivado por reingresso, tem-se a reintegração (RJU, art. 28), a recondução (RJU, art. 29), a reversão (RJU, art. 25) e o aproveitamento (RJU, arts. 30 a 32):

• A reintegração tem lugar quando o servidor foi desligado de forma ilegal; reconhecida a ilegalidade, por decisão administrativa ou judicial, o servidor tem direito de ser reintegrado no cargo de origem ou no resultante de eventual transformação (deslocando, inclusive, novo servidor que lá esteja), ou, ainda, ficando em disponibilidade no caso de o cargo ter sido extinto. Sendo reintegrado, o servidor adquire todas as vantagens do período em que esteve afastado. Veja-se, ainda, que a reintegração somente ocorre no caso de o servidor ser estável.

• A recondução ocorre na hipótese em que, por razão de reintegração do antigo ocupante do cargo ou de inabilitação em estágio probatório (veja-se que não é a hipótese de o servidor não gostar do novo cargo; neste caso, é a jurisprudência que admite), o servidor retorne ao seu cargo de origem, se estiver vago. Não estando vago o cargo de origem, reconduz-se para um equivalente vago. Não existindo este, ficará o servidor em disponibilidade. Também pressupõe servidor estável.

• Reversão ocorre quando junta médica oficial declara insubsistentes os motivos da aposentadoria por invalidez. A outra hipótese de reversão é a pedido do servidor aposentado, mas no interesse da administração.

• No aproveitamento, o servidor que estava em disponibilidade retorna ao cargo de origem ou a equivalente vago. Veja-se que, enquanto disponível, o servidor é considerado inativo, sendo remunerado proporcionalmente ao seu tempo de serviço (inatividade remunerada).

8.3.3 Formas de deslocamento do servidor

Remoção é deslocamento do servidor que pode acontecer a pedido ou de ofício no âmbito da mesma carreira, com ou sem mudança de sede (RJU, art. 36).

A redistribuição é a forma de deslocamento do servidor para atender a reorganização ou extinção de órgãos ou entidades. O servidor que não for redistribuído será colocado em disponibilidade.

A substituição ocorre especificamente nos casos de cargos ou funções de direção, chefia e assessoramento, além dos cargos tidos pela lei como de natureza especial (RJU, arts. 38 e 39).

8.3.4 Desinvestidura

É a hipótese de destituição do cargo, nos seguintes casos:• Demissão: desligamento do servidor em caráter sancionador,

penalizando-o pela prática de infração grave (RJU, art. 132). Depende de processo administrativo disciplinar.

• Exoneração: desligamento do servidor em caráter não sancionador, a seu pedido ou no interesse da Administração (de ofício), cujas

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hipóteses são a ad nuttum, a decorrente de não entrada em exercício no prazo legal, a decorrente de inabilitação em estágio probatório – neste último caso exigindo-se processo administrativo (CF, art. 41, § 4°) –, a decorrente de não aprovação em avaliação periódica de desempenho (CF, art. 41, § 1°, III), a decorrente de escolha, por servidor de boa-fé, do cargo onde não quer ficar, no caso de acumulação ilegal de cargos, e, por fim, a decorrente de excesso de despesas, devendo-se racionalizar a máquina pública (CF, art. 169).

8.3.5 Vacância

Ter-se-á a vacância nos casos de exoneração, demissão, promoção, readaptação, aposentadoria, falecimento e posse em outro cargo inacumulável.

Aula 11 (xx de novembro de 2012)

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