DIREITO AO ESQUECIMENTO: UMA EXTENSÃO AO DIREITO … · Direito ao esquecimento – Direito de ser...

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FACULDADE DE DIREITO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO MAIARA HENRIQUES PIRES DIREITO AO ESQUECIMENTO: UMA EXTENSÃO AO DIREITO DA PERSONALIDADE E UM GARANTIDOR À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA São Bernardo do Campo São Paulo 2017

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FACULDADE DE DIREITO DE SÃO BERNARDO DO CAMPO

MAIARA HENRIQUES PIRES

DIREITO AO ESQUECIMENTO: UMA EXTENSÃO AO DIREITO DA

PERSONALIDADE E UM GARANTIDOR À DIGNIDADE DA PESSOA

HUMANA

São Bernardo do Campo – São Paulo

2017

MAIARA HENRIQUES PIRES

DIREITO AO ESQUECIMENTO: UMA EXTENSÃO AO DIREITO DA

PERSONALIDADE E UM GARANTIDOR À DIGNIDADE DA PESSOA

HUMANA

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado

ao Curso de Direito, da Faculdade de Direito

de São Bernardo do Campo, como parte das

exigências para a obtenção do título de

bacharel.

Orientador: Profº. Drº. Marcelo Benacchio.

São Bernardo do Campo

2017

"Que os vossos esforços desafiem as impossibilidades, lem-

brai-vos de que as grandes coisas do homem foram conquis-

tadas do que parecia impossível."

CHARLES CHAPLIN

Primeiramente aos meus pais, por todo suporte, com-

preensão e carinho necessários. Aos meus familiares, que desde

criança me ajudaram, e que me fizeram se tornar quem sou hoje.

Aos meus amigos, que colaboraram de todas as formas,

tiveram paciência e lutaram junto comigo para chegar até aqui.

Ao meu orientador, pelo suporte, pelas suas correções е

incentivos.

Resumo

A monografia objetiva examinar o “Direito ao Esquecimento” na nossa ordem jurídica, com

foco especialmente em relação aos direitos garantidos à vida privada, à liberdade de imprensa e à

dignidade da pessoa humana. O trabalho irá tratar ainda de conceituar a vida privada, a dignidade e o

interesse público,bem como situar o “Direito ao Esquecimento” frente aos princípios constitucionais.Irá

demonstrar como se deu o seu reconhecimento e como é a aplicação,especialmente no que tange aos

conflitos que podem existir quando vai ao encontro do direito a informação.

Palavras-chave:

Direito ao esquecimento – Direito de ser deixado em paz – Privacidade – Liberdade de

Imprensa – Direito da Informação.

Abstract

This monograph aims to examine the "the right to be let alone " in our legal system, focusing

especially on the rights guaranteed to private life, the press and the dignity of the human person. This

paper is a space for private life, a dignity and a public interest, as well as situation or "the right to be let

alone" in front of constitutional principles. It will demonstrate how it has been recognized and how it is

applied, especially with regard to the conflicts that may exist when it meets the right to information.

Key words:

Right to be forgotten - Right to be left alone - Privacy - Freedom of the Press - Right to

Information.

SUMÁRIO

1 - INTRODUÇÃO.................................................................................................................7

2 - O DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE DE EXPRESSÃO E SUA EXTEN-

SÃO.......................................................................................................................................... 9

2.1 - Dignidade da Pessoa Humana................................................................................... ... 14

2.2 - Direito a Honra........................................................................................................... ... 16

2.3 - Direito a Informação.................................................................................................. ... 18

2.4 - Direito a Vida Privada e a Intimidade...................................................................... .. 20

2.5 - Direito a Imagem........................................................................................................... 22

2.5.1 - Tutela Jurídica da Imagem.........................................................................................23

3 - A TEORIA DO DIREITO AO ESQUECIMENTO...................................................... 26

3.1 - O Direito a ser Esquecido frente a liberdade de informação..................................... 27

3.2 - O Direito ao Esquecimento como Garantia da Dignidade..................................... ... 30

3.3 – A interpretação dada pelo Sistema Constitucional Brasileiro X Tratamento dado

por outros países ................................................................................................................ ... 31

4 – ANÁLISE JURISPRUDENCIAL................................................................................ .. 34

4.1 - O Enunciado 531 do Conselho Federal de Justiça (CFJ) ...................................... ... 34

4.2 - “Chacina da Candelária” REsp 1.334.097................................................................ .. 35

4.3 - “Aída Curi” REsp 1.335.153..................................................................................... ... 36

4.4 - Caso Automax Comercial X Google – REsp 1.396.417”.............................................38

5 - CONCLUSÃO.................................................................................................................. 40

6 - BIBLIOGRAFIA............................................................................................................... 42

7

1 - INTRODUÇÃO

O presente estudo traz a baila uma discussão sobre o direito ao esquecimento,

muito embora em forma de antítese, pois se depara em momentos com o direito à in-

formação e à liberdade de imprensa. Para isso, buscou-se abordar a origem do direito ao

esquecimento através da exposição de conceitos de direitos fundamentais e direitos da

personalidade.

O trabalho se iniciou abordando o direito fundamental à liberdade de expressão e

a sua extensão, assim, foi conceituado o direito da dignidade da pessoa humana que é o

princípio basilar do direito ao esquecimento, bem como o direito à honra, o direito à

informação, o direito à vida privada e à intimidade e o direito à imagem.

Buscou-se trazer o questionamento de até que ponto a vida pode ser explícita, e

se é certo que mesmo após o individuo pagar sua dívida para com a sociedade seja alvo

de perseguição midiática?

Deste modo, foi abordado a Teoria do Direito ao Esquecimento apontando suas

possíveis origens, conforme o tratamento dado por outros países e as maneiras que pode

ser aplicado para garantir o direito a ser esquecido. Bem como as dificuldades de apli-

cação desse direito diante da evolução das tecnologias e a dificuldade de alguma infor-

mação poder ser “apagada”.

Assim, a presente monografia trata da pretensão na aplicação do direito de ser

esquecido, baseando-se ainda, no viés da dignidade da pessoa humana, e também nos

direitos da personalidade, em especial, aqueles ligados a imagem, que estão intimamen-

te ligados ao direito ao esquecimento.

A presente discussão acerca do Direito ao Esquecimento terá ainda, apresenta-

ções de julgados com suas devidas, e importantes interpretações, haja vista que esta

rediscussão se faz sempre necessária, devendo haver a análise do caso concreto, bus-

cando como base de compreensão os diretos da personalidade e a dignidade da pessoa

humanada, para possibilitar o posicionamento ao direito de ser esquecido.

8

Ainda sobre a origem do direito ao esquecimento foi tratado do Enunciado 531

da VI Jornada de Direito Civil do CFJ, o qual trouxe pela primeira vez no Brasil uma

disposição explicita sobre o direito ao esquecimento e sobre como esse deve ser visto

sob a óptica da dignidade da pessoa humana, conforme dispõe “A tutela da dignidade da

pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito de esquecimento”.

O enunciado é o entendimento Majoritário de doutrinadores ao interpretarem o

Código Civil, onde sua orientação direciona para a inclusão do direito ao esquecimento,

sendo visto esse como um direito de personalidade (artigo 11 do Código Civil).

O objetivo da Monografia tem a pretensão de abordar o direito ao esquecimento,

e colocá-lo como um garantidor do direito fundamental a dignidade da pessoa humana e

uma extensão dos direitos da personalidade. Sendo analisado frente aos princípios cons-

titucionais da liberdade de expressão, da liberdade de imprensa e do direito à informa-

ção, o que nos levará a uma colisão entre a proibição da divulgação de fatos passados e

estes outros direitos.

Por fim, a pesquisa será realizada analisando e procurando identificar os proces-

sos, os conflitos existentes e as contradições envolvidas na existência de um novo direi-

to. Para isso buscou-se comparar os direitos já existentes e o conflito entre eles, e em

especial, analisando a jurisprudência com casos que já foram decididos anteriormente

para chegar a uma melhor compreensão do direito aqui tratado.

9

2 - O DIREITO FUNDAMENTAL À LIBERDADE DE EXPRESSÃO E SUA

EXTENSÃO.

Os direitos fundamentais são aqueles direitos que o direito vigente qualifica co-

mo tais, e com relação a esses Carl Schmitt1 estabeleceu dois critérios formais de carac-

terização: sendo o primeiro pelo qual os direitos fundamentais são todos os direitos ou

garantias nomeados e especificados na Constituição Federal, e pelo segundo, são direi-

tos fundamentais aqueles direitos que receberam da Constituição um grau mais elevado

de garantia ou de segurança jurídica.

Os direitos fundamentais são classificados em direitos fundamentais de primeira

geração, que são aqueles direitos relacionados à liberdade, os de segunda geração, que

são os direitos sociais, culturais e econômicos, os de terceira geração, que são aqueles

direitos ligados a fraternidade, que não se destinam à proteção dos interesses individuais

do indivíduo. E, por fim, com a globalização política que vem sendo desenvolvida no

Brasil, surgem também os direitos fundamentais de quarta geração, que são o direito à

democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo.2

Posto isto, interessa-nos os direitos de primeira geração e os de quarta geração,

visto haver uma vinculação essencial entre os direitos fundamentais, as liberdades do

indivíduo e a dignidade da pessoa humana.

O direito as liberdades é consagrado de diversas formas pela Constituição Fede-

ral de 1988, sendo algumas de suas formas a liberdade de pensamento e de expressão,

que como dito, são direitos fundamentais e possuem ampla proteção jurídica, devido a

sua importância.

O homem é um ser social, e que pela sua natureza tem a necessidade de exterio-

rizar o que pensa, decorrendo de sua natureza humana a vontade de pensar e de expor o

que pensa, por isso torna-se fundamental a tutela da liberdade do pensamento.

1 Carl Schmitt apud BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 31. Ed. São Paulo: Malheiros,

2016, p. 575. 2 Idem, p. 585.

10

Para Gilberto Haddad Jabur: “seria ilógico, incalculável e inútil que o atributo de

pensar ficasse confinado, permanecesse oculto no intelecto. Decorre da Natureza huma-

na um dever de expressão associado à liberdade de pensamento”.3

A principal finalidade da liberdade de expressão, tanto quanto a expressão da

atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, estão relacionadas à liberda-

de de manifestação de pensamento. Uma vez que através desse são produzidos materiais

de informação que fornecem embasamento a construção de opinião própria pela socie-

dade sobre diversos temas, e é um direito resguardado a todos os cidadãos, independen-

temente de sua cor, convicção ideológica ou raça, estando disposto no artigo 5º, incisos

IV e IX, da Constituição Federal.

Na lição de Jabur: "liberdade de pensamento sem liberdade de expressão é, pois,

como já se frisou, de pouquíssima valia para o homem e de nenhuma serventia para a

sociedade".4

Os direitos de liberdade aqui tratados tem dupla proteção: podendo serem mani-

festados pelos próprios cidadãos em ações do dia a dia, como também são resguardados

no âmbito da Televisão, Rádio e Internet, em todas as suas formas verbais ou não ver-

bais.

São através desses meios, onde se é protegido a liberdade de expressão, que é

exercido o direito de receber informações pelos cidadãos, por serem as principais fontes

de busca para formação da opinião própria, visto que grande parcela da sociedade é

atingida com as informações que são veiculadas e onde se é buscado informações.

A liberdade de informação e de expressão, além de terem previsão na legislação

federal nacional, também estão assegurados em documentos internacionais, como na

Declaração Universal dos Direitos Humanos, que em seu artigo XIX dispõe:

[...] toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este di-

reito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opinião e procurar,

3 JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 154. 4 JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 154, p. 155.

11

receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e inde-

pendentemente de fronteiras.5

Bem como na Convenção Americana de Direitos Humanos, a qual dispõe no ar-

tigo 13:

Artigo 13 – Liberdade de pensamento e de expressão

1. Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de ex-

pressão. Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir

informações e ideias de qualquer natureza, sem considerações de fron-

teiras, verbalmente ou por escrito, ou de forma impressa ou artística,

ou por qualquer meio de sua escolha.

2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode

estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que

devem ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias

para assegurar:

a) o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas;

b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou

da moral públicas.

3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias e meios

indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de

papel de imprensas, de freqüências radioelétricas ou de equipamentos

e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer ou-

tros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de idéias

e opiniões.

4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia,

com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção mo-

ral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso.

5. A lei deve proibir toda propagando a favor da guerra, bem co-

mo toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua

incitamento à discriminação, à hostilidade, ao crime ou a violência.6

Todo ser humano é capaz de pensar e tem assegurado a liberdade de pensamen-

to, o que está diretamente ligado à liberdade de expressão, que é por onde se expõe o

que se pensa intimamente. E a liberdade de informação está dentro da liberdade de ex-

pressão, visto a informação ser repassada através da exteriorização do pensamento. Em-

bora essas se distinguam justamente por na liberdade de informação ocorrer a divulga-

5 Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. 2. ed. São Paulo: Edipro, 2005. p. 111.

6 Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), de 1969. Disponível

em: < http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm>. Acesso em

10 jan. 2018.

12

ção de fatos, que devem ser verdadeiros, e na liberdade de expressão poderem se tratar

de pensamentos e não ser necessário serem fatos verdadeiros.

Neste sentido, existe também proteção constitucional a liberdade de imprensa,

que é garantida também como uma forma de proteção ao cidadão e ao seu direito à in-

formação, porém essa é limitada a sua função social, que é o dever de informar verda-

deiramente.

Não há como se negar que a imprensa tem grande "poder" sobre a sociedade,

sendo de maneira a auxiliar ou a denegrir, por isso, a atuação da imprensa, não deve e

não pode ser falsa, tampouco atingir os direitos de outrem.

Como dispõe Jabur:

Os limites de atuação da imprensa encontram-se no exercício desim-

pedido do direito alheio de similar envergadura personalíssima. Ao la-

do do respeito à moral pública e aos bons costumes, absorvidos pela

comunidade e consagrados pelo direito, repousam o respeito à vida

privada e a homenagem à honra entre tantas outras formas de projeção

da personalidade humana, implementos fundamentais ao desenvolvi-

mento espiritual pleno, indispensável à expansão do próprio indivi-

duo.7

Ainda com relação a liberdade de informação, de expressão e de imprensa, a

Constituição Federal assegura o "acesso à informação" no artigo 5º, inciso XIV, que diz

respeito ao Direito à Informação, informação essa que deve ser verdadeira, como já dito

anteriormente. Também assegurado juntamente com a liberdade de expressão no artigo

19, parágrafos 1º a 3º, da Declaração Universal de Direitos Humanos, na Convenção

Americana de Direitos Humanos.

Na atualidade, houve a evolução das tecnologias e dos meios de comunicação,

com isso surgiram novos modos das pessoas manifestarem seu pensamento e de busca-

rem informações, sobretudo, através da Internet que é hoje uma das maiores fontes de

busca de informações utilizadas pela sociedade.

7 JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 189.

13

A Internet chegou ao Brasil em 1988 através de iniciativa de acadêmicos de São

Paulo (Fapesp - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e do Rio de

Janeiro (UFRJ- Universidade Federal do Rio de Janeiro, e LNCC - Laboratório Nacio-

nal de Computação Cientifica), ficando no início restrita a comunidade acadêmica8, e

hoje "a informação encontra-se amplamente descentralizada, disponível e a baixo cus-

to".9

Como dispõe Pedro Augusto Zaniolo:

O imediatismo na obtenção de informações e a convivência lado a la-

do com a noção de on-line passaram a fazer parte do nosso cotidiano.

[...]

A internet é notoriamente um meio de comunicação eletrônica, cons-

tituída não apenas por computadores e equipamentos de telecomuni-

cações, mas principalmente por uma rede mundial de Indivíduos.10

No Brasil, a Internet é regulada pela Lei nº 12.965/2014, popularmente conheci-

da como o Marco Civil da Internet que estabelece os princípios, garantias, direitos e

deveres para o uso da Internet, bem como "determina as diretrizes para atuação da Uni-

ão, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria", como dis-

põe o artigo 1º.

O Marco Civil da Internet surgiu como uma forma de proteção à sociedade, mas

também como uma forma de impactar e auxiliar o Poder Judiciário, que até então se via

a mercê de certas situações em que a legislação da época não abarcava, tendo em vista a

evolução dos recursos tecnológicos disponíveis na Internet e nas relações virtuais.

Conforme consta no livro publicado pelo Congresso Nacional "a nova lei escla-

rece e consolida que os direitos constitucionais, como o de inviolabilidade das comuni-

cações e de direito à informação, são válidos também para o mundo virtual".11

8 ZANIOLO, Pedro Augusto. Crimes Modernos - O impacto da Tecnologia no Direito. 2. ed. Curitiba:

Juriá, 2012, p. 147. 9 Idem, p. 137.

10 ZANIOLO, Pedro Augusto. Crimes Modernos - O impacto da Tecnologia no Direito. 2. ed. Curiti-

ba: Juriá, 2012, p. 137. 11

Brasil. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Marco Civil da Internet. 2. Ed. Distrito Federal:

Câmara, 2015, p. 15. Disponível em <http://livraria.camara.leg.br/livros/e-books/marco-civil-da-

internet.html> Acesso em 20 de outubro de 2017.

14

Após o surgimento do Marco Civil da Internet, passaram a surgir novas discus-

sões com relação ao conceito de liberdade de expressão e qual a extensão dessa, tendo

em vista que é garantido a liberdade de expressão e de informação a todos, porém essas

liberdades não são absolutas.

A liberdade de expressão e de informação não são absolutas, pois estão limitadas

a esfera privada do outro e ao que se entende por dignidade da pessoa humana, estas que

não podem ser atingidas de forma indiscriminada pelas noticias divulgadas e pelas ma-

nifestações de pensamento da sociedade.

2.1 - Direito a Dignidade da Pessoa Humana

A dignidade da pessoa humana é um conceito abrangente, e por ser amplo e

englobar diversas concepções somente há unanimidade entre os autores quanto a

amplitude e abstração desse, o que dificulta a elaboração de um conceito fechado.

De acordo com Paulo Bonavides:

A vinculação essencial dos direitos fundamentais à liberdade e à dig-

nidade da pessoa humana, enquanto valores históricos e filosóficos,

nos conduzem sem óbices ao significado de universalidade inerente a

esses direitos como ideal da pessoa humana.12

Considerando-se a dignidade da pessoa humana como um conjunto de regras,

princípios e valores a ser seguido por todas as normas e ações a se tomar como um prin-

cípio matriz da Constituição.

Esse direito foi consagrado na Constituição Federal de 1988 no artigo 1º, inciso

III, sendo um dos pilares do nosso ordenamento jurídico, tanto que posto na Constitui-

ção em seu artigo primeiro e consagrado como fundamento do Estado Democrático de

Direito, atraindo o conteúdo de todos os outros direitos também consagrados na Consti-

tuição.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa

Rica), de 1969, também dispôs no artigo 11, § 1º, que “toda pessoa humana tem direito

ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade”.

12

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 31. Ed. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 576.

15

De acordo com Gilmar Mendes, "a dignidade é um atributo intrínseco"13

, nasce

com o homem e é de sua essência, se confundindo com a própria natureza do ser huma-

no.

Desmembrando-se o princípio em uma tentativa de conceitua-lo a pessoa huma-

na diz respeito ao critério biológico, o que diferencia o homem de outros animais. E a

dignidade é a característica a qual está intimamente ligada à pessoa humana, o que faz

tornar o ser humano merecedor de respeito e proteção.

A dignidade da pessoa humana é um principio fundamental que traz o mínimo

existencial a pessoa humana, e se desenvolve estando presente em direitos como a vida,

a saúde, a honra, a privacidade, a educação, dentre outros.

Neste sentido, disse Jabur:

[...] a dignidade corporifica-se mediante o reconhecimento, preserva-

ção e consagração dos direitos personalíssimos e das liberdades civil,

vistos uns e outros em seu significado superlativo, capaz de assegurar

o respeito às irrefutáveis exigências características e exclusivas da es-

pécie humana, entre as quais a privacidade vem ganhando foros.14

É certo que deve o Estado proporcionar a busca de condições de uma vida digna

as pessoas e garantir também sua liberdade, sem a interferência de qualquer pessoa,

agindo com total autonomia ao fazer suas escolhas, para que seja a dignidade garantida.

E embora o interesse o público prevaleça sobre o interesse privado, a dignidade

da pessoa humana quando confrontada com outros direitos como a liberdade de expres-

são e de pensamento, deve ser ponderado no caso concreto.

De modo, que haja preocupação sobre a proteção do indivíduo, o protegendo de

qualquer humilhação ou situação vexatória, sendo garantida a liberdade de expressão

porém de maneira que essa não seja exercida de forma a atingir a privacidade, a intimi-

dade e a honra de outrem, que são direitos decorrentes da dignidade.

13

MENDES, Gilmar Ferreira. Colisão de Direitos Fundamentais Liberdade de Expressão e de Co-

municação e direito á honra e á Imagem. Revista de informação legislativa, v. 31, n. 122, p. 297-301,

abr./jun. 1994, p. 03. Disponível em < http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/176193> Acesso em 20

de outubro de 2017. 14

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 210.

16

2.2 - Direito a Honra

A honra pode ser vista de duas formas: honra objetiva e honra subjetiva, a pri-

meira diz respeito a reputação da pessoa, o que compreende o nome e a fama no ambi-

ente familiar, profissional ou comercial. A segunda, diz respeito ao sentimento pessoal

de estima, ou a consciência da própria dignidade15

.

O direito a honra abrange tanto a honra objetiva quanto a subjetiva, sendo neste

caso o bem jurídico protegido a reputação, ou como também chamada à consideração

social, a fim de preservar a imagem da pessoa frente à coletividade e a sua dignidade

humana.

Neste sentido, disse Bittar:

Com efeito, sendo a honra, objetivamente, atributo valorativo da pes-

soa na sociedade (pessoa como ente social), a lesão reflete, de imedia-

to, na opinião pública, considerando-se perpetrável por qualquer meio

possível de comunicação (escrito, verba, sonoro, etc).16

Posto isso, compreende-se que a honra é o direito que visa à proteção do indiví-

duo sobre como é visto perante a sociedade. E a afronta a esse direito por qualquer meio

de comunicação, por consequência leva a lesão de sua reputação.

O art. 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988, estabelece que "são inviolá-

veis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito

a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa

Rica), de 1969, também dispôs no artigo 11, § 1º, que “toda pessoa humana tem direito

ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade”.

Assim como pode se observar pelas legislações nacional e internacional que pre-

veem o direito a honra, a “honra” é um conceito inerente à personalidade e reflete a ob-

servância ao princípio da dignidade da pessoa humana, de modo a garantir a dignidade

15

BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 1. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989,

p. 125. 16

BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 1. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989,

p. 126.

17

da pessoa de quaisquer ofensas ou humilhações diretamente ligadas a sua pessoa, asse-

gurando-se a boa imagem perante a coletividade.

Nesse sentido, afirmou Jabur: "é sintomático que o homem careça de respeito e

boa reputação para alcançar seus mais difíceis desideratos. A boa reputação assegura a

estima social. Sem prestígio, o homem isola-se pelo descrédito."17

Com a evolução das tecnologias a reputação pode vir a ser

atingida por diversos meios, em especial pela internet, que é o meio pelo qual são veicu-

ladas notícias e divulgadas informações por qualquer pessoa, sem a utilização de filtros.

Além do que, na atualidade, a internet é o maior meio de comunicação a ocorrer

as lesões do direito à honra, já que a internet é o instrumento pelo qual um grande nú-

mero de pessoas tem acesso à informações de maneira instantânea e que podem ser ver-

dadeiras ou falsas.

Diferente do que acontece com as mídias como televisão, jornais e revistas o

emissor da notícia na internet não é facilmente identificado, o que dificulta a responsa-

bilização do agente se comparado com as antigas mídias.

Diante do grande alcance e das dificuldades de identificação e responsabilização

do individuo que publica informações na rede, a liberdade propiciada pela internet torna

o ambiente digital um local de violação de direitos da personalidade, em especial o di-

reito à honra, aqui tratado, e o direito a imagem, que em seguida será conceituado.

2.3 - Direito a Informação

O acesso à informação é um direito fundamental previsto no artigo 5º, inciso

XXXIII, artigo 37, parágrafo 3º, inciso II e no artigo 216, parágrafo 2º, todos da Consti-

tuição Federal de 1988.

17

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 275.

18

O direito a informação diz respeito ao acesso à informação e reflete o outro polo

do direito de comunicação, visto ser deste que a liberdade de expressão ou opinião é

identificada porque quem manifesta seu pensamento e que por consequência informa.18

O conceito do direito a informação é amplo e abrange tanto a informação jorna-

lística, como outros tipos de informação, como informações do governo, de empresas

privadas, de universidades e quaisquer instituições de interesse público, e até mesmo

informações divulgadas por pessoas comuns na rede.

Ter informações é essencial para o exercício da cidadania e toda a sociedade tem

direito de receber informações de interesse público ou particular, que devem ser presta-

das, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas informações que tenham sigilo.

A Lei nº 12.527/2011, conhecida como a Lei de Acesso à Informa-

ção, regulamenta o direito constitucional de acesso à informação da sociedade, visando

garantir a obtenção de informações públicas. A Lei entrou em vigor em 16 de maio de

2012 e criou mecanismos online que possibilitam a qualquer pessoa, física ou jurídica,

sem exigência de demonstração de justificativa, o recebimento de informações públicas

dos órgãos e entidades.

A Lei foi criada para aplicação a União, Estados, Distrito Federal e Municípios,

incluindo os Tribunais de Conta e Ministério Público. Entidades privadas sem fins lu-

crativos também são obrigadas a dar publicidade às informações referentes ao recebi-

mento e à destinação dos recursos públicos por elas recebidos. No Governo Federal, a

Lei de Acesso à Informação foi regulamentada pelo Decreto nº 7.724/2012.

O direito a informação é um direito individual e diz respeito tanto ao direito de

receber informações como a liberdade de informar, e sua principal finalidade é fornecer

embasamento para a construção de opinião sobre assuntos públicos.

Nas palavras de José Afonso da Silva:

Nesse sentido, a liberdade de informação compreende a procura, o

acesso, o recebimento e a difusão de informações ou ideias, por qual-

18

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 166.

19

quer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada qual pe-

los abusos que cometer. O acesso de todos à informação é um direito

individual consignado na Constituição, que também resguarda o sigilo

da fonte, quando necessário ao exercício profissional (art. 5º, XIV).19

Além disso, o direito à informação não diz respeito a qualquer informação, mas

sim a divulgação de informações verdadeiras e corretas, devendo ser repeitado por todos

aqueles que exteriorizam seus pensamentos ou que trabalham divulgando informações.

Em especial, o direito a informação verdadeira é um direito que deve ser observado pela

imprensa, assim ocorrendo porque a imprensa é a maior formadora de opinião pública,

com relevante função social.20

Como dito por Luiz Manoel Gomes Junior:

Indispensável, contudo, é que a conduta de quem exerce o direito de

informar seja diligente na averiguação dos fatos que envolvam a in-

formação. Exige-se que a informação seja verdadeira. Isso, no entanto,

não priva o seu autor da proteção contra informações equivocadas ou

mesmo errôneas, mas apenas deixa evidenciado o dever de diligência

e cuidado na averiguação dos fatos e, sobretudo, na elaboração do tex-

to informativo.21

Desta forma, o nosso ordenamento jurídico embora dê ampla liberdade para ma-

nifestação de pensamentos e exteriorização desses, garante também a liberdade de rece-

ber informações verdadeiras, que deve ser observada não só por aquelas pessoas que

trabalham com notícias, mas por todos aqueles que se utilizam de meios de comunica-

ção e expõe opiniões.

2.4 - Direito a Vida Privada e a Intimidade

O Direito a Vida Privada por muitos autores é utilizado como sinônimo do direi-

to à intimidade, mas outros entendem serem direitos distintos, isso se dá em especial

pela análise do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, o qual declara a inviolabili-

19

DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25. Ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p.

246. 20

PINHO, Judicael Sudário de. Colisão de Direito Fundamentais: liberdade de comunicação e direito à

intimidade. Revista Themis, Fortaleza, CE, 2003, v. 3, n. 2, p. 128. Disponível em <revistathe-

mis.tjce.jus.br/index.php/THEMIS/article/download/327/306> Acesso em 11 de novembro de 2017. 21

JUNIOR, Luiz Manoel Gomes. Revista CEJ, V. 9 n. 29, p. 98, abr./jun. 2005. O direito difuso à informação

verdadeira e a sua proteção por meio das ações coletivas : a função social da informação. Disponível em

<http://www.jf.jus.br/ojs2/index.php/revcej/article/view/668/848>. Acesso em 12 de dezembro de 2017.

20

dade a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, e que considerou tais

direitos como distintos por menciona-los separadamente.

A maioria da doutrina entende que há uma distinção entre o direito à vida privada e

à intimidade, mas que essa distinção é sutil e se dá quanto à abrangência desses, sendo que

o direito à intimidade tem um caráter mais restrito do que o direito à vida privada.

Com relação à intimidade refere-se ao modo de ser de cada pessoa, ao interior

dessa aliada aos sentimentos próprios e as suas relações com outras pessoas, o que ca-

racteriza sua identidade. Já a vida privada é composta por informações que somente a

própria pessoa pode escolher se as divulga ou não, portanto, a vida privada pode ser

considerada como gênero ao qual pertence o direito a intimidade.

Neste sentido, disse Jabur:

Por isso é que o direito à vida privada, corolário de outro valor, su-

premo que é - a dignidade da pessoa humana-, deve renovar a preocu-

pação sociojurídica em conter as ameaças e lesões que diariamente so-

fre. A privacidade é o refugio impenetrável pela coletividade, deven-

do, pois, ser respeitada.22

Assim, a violação ao direito à inviolabilidade da vida privada trata-se do direito

de proteção a divulgação de informações da pessoa que o seu titular não deseje compar-

tilhar. E sendo garantido esse, é previsto sanções quando ocorrerem ofensas.

A violação da privacidade também leva a responsabilização, conforme dito por

José Afonso da Silva:

A violação da privacidade, portanto, encontra no texto constitucional

remédio expeditos. Essa violação, em algumas hipóteses, já constituiu

ilícito penal. Além disso, a Constituição foi explícita em asseguras, ao

lesado, direito a indenização por dano material ou moral decorrente da

violação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das

pessoas, em suma, do direto à privacidade.23

Como outros direitos, o direito à vida privada e à intimidade por vezes pode vir a

se chocar com o direito à informação, tratado no item anterior. Nestes casos, devem ser

22

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 254. 23

DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25. Ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p.

210.

21

levados em conta o caso concreto e deste conflito considerar qual direito irá prevalecer,

já que a jurisprudência vem reconhecendo casos em que o interesse do individuo em não

ter suas informações divulgadas vem a prevalecer com relação ao interesse público de

receber as informações.

O tratamento das informações pessoais deve ser feito de forma transparente, e

com respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, bem como às

liberdades e garantias individuais, de acordo com o artigo 56, do Decreto nº 7.724/12.

As informações pessoais que digam repeito à intimidade, vida privada, honra e

imagens terão acesso restrito, e somente poderão ser autorizadas sua divulgação diante

de previsão legal ou consentimento expresso titular dessas.

No caso daquelas pessoas que já estejam mortas ou ausentes, o artigo 55, pará-

grafo único, do Decreto nº 7.724/12, dispõe que os direitos assistem ao cônjuge ou

companheiro, aos descendentes ou ascendentes.

O consentimento não será exigido quando as informações forem necessárias à

prevenção e diagnóstico médico, quando a pessoa estiver física ou legalmente incapaz, e

para utilização única e exclusivamente para o tratamento médico; à realização de estatís-

ticas e pesquisas científicas de evidente interesse público ou geral, previstos em lei,

sendo vedada a identificação da pessoa a que as informações se referirem. Ainda, ao

cumprimento de ordem judicial; à defesa de direitos humanos; ou à proteção do interes-

se público e geral preponderante.

Desta forma, como pode se desprender, o direito a vida privada e a intimidade

também não são absolutos, devendo ser confrontados com o interesse o público e anali-

sado no caso concreto.

2.5 - Direito a Imagem

O direito a imagem esta previsto no artigo 5º, incisos, X e XXVIII, da Constitui-

ção Federal, portanto, dentre do Título II Dos Direitos e Garantias Fundamentais. É

também previsto como um Direito da Personalidade nos artigos 11 e seguintes, do Có-

digo Civil de 2002.

22

O direito a imagem é irrenunciável, inalienável e intransmissível, porém dispo-

nível, o que significa que pode ser licenciada por seu titular a terceiros.

Apesar desse direito possuir relação com os demais direitos de personalidade, é

um direito autônomo ou próprio, o que repercute diretamente no momento de eventual

ação indenizatória ante o uso indevido da imagem do indivíduo.

A imagem é a forma de identificação, diz respeito a aquilo que é perceptível vi-

sivelmente na pessoa, e pode ser considerada também sobre outras manifestações hu-

manas como a voz e sinais distintivos.24

Como dito por Bittar:

Consiste no direito que a pessoa tem sobre a sua forma plástica e res-

pectivos componentes distintos (rostos, olhos, perfil, busto, etc.) que

individualizam no seio da coletividade. Incide, pois, sobre a confor-

mação física da pessoa, compreendendo esse direito um conjunto de

caracteres que a identifica no meio social.25

Porém, a imagem não está limitada ao aspecto físico, no seu significado propri-

amente dito, diz repeito também às formas de retratação do aspecto visual, bem como a

reprodução da aparência, ou a indicação de qualquer parte do corpo que se possa reco-

nhecer a pessoa.26

A divulgação indevida da imagem da pessoa, além de violar o direito a imagem,

pode infringir o direito a vida privada e a intimidade, já que embora estes sejam direitos

protegidos individualmente pelo nosso ordenamento jurídico eles possuem certas afini-

dades.

Existem também limitações ao direito a imagem, firmadas tanto pela doutrina

como pela jurisprudência já esse também não é considerado um direito absoluto. Esse

posicionamento que vem tendo grande repercussão diante do grande uso das redes soci-

24

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 267. 25

BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 1. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,

1989, p. 87. 26

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 269.

23

ais que é onde mais se observa o uso da imagem e também no campo do direito à infor-

mação onde se busca vincular noticias e é feito o uso da imagem das pessoas.

A Constituição Federal de 1988 não prevê de forma expressa uma limitação ao

direito à imagem, sendo que tal limitação ocorre sob o fundamento da prevalência do

interesse coletivo sobre interesse individual ou quando observado o direito à imagem

diante de outros direitos igualmente tutelados na Constituição.

Porém, essa limitação não significa que possam existir abusos que venham a de-

negrir a imagem do individuo e que ofendam ao já tratado aqui Princípio da Dignidade

da Pessoa Humana.

Esse direito atualmente vem ganhando destaque devido ao progresso tecnológico

dos meios de comunicação, já que hoje é possível a captação mais fácil e a reprodução

instantânea de conteúdo para o mundo todo em segundos, o que traz dificuldades na

proteção desse direito e de outros como a honra, a intimidade e a vida privada.

2.5.1 - Tutela Jurídica da Imagem

O direito a imagem, bem como o direito a honra, o direito a vida privada e a In-

timidade, se violados, encontram a possibilidade de reparação civil assegurada constitu-

cionalmente, como constituem, em algumas hipóteses, ilícitos penais.27

Com relação ao direito a imagem, asseverou Bittar que a tutela desse direito é

tríplice esquematizada:

Para a tutela do direito à imagem, tríplice é a esquematização proteti-

va, abrangendo providências de ordem administrativa - quando exis-

tentes órgãos próprios - penal - quando suscetível a ação de ingressar

em algum dos delitos tipificados (como os de violação a documento;

lesão à honra; etc.) - e civil - esta, efetivamente, a mais importante de

reação.28

Porém, é importante observar que embora o direito a imagem, a honra, a vida

privada e a intimidade sejam direitos fundamentais amplamente protegidos pelo nosso

27

LEITE, George Salomão e LEMOS, Ronaldo. Marco Civil da Internet. 1. Ed. São Paulo: Atlas S.A., 2014, p.

353. 28

BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade. 1. Ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária,

1989, p. 93.

24

ordenamento jurídico, nem mesmo esses direitos são absolutos, pois são condicionados

por exigências de ordem moral e ordem jurídica.29

A violação ao direito a imagem impõe a obrigação de reparar os danos eventu-

almente sofridos, seja pelo dano material causado, que é aquele que traz a redução do

patrimônio e gera o dever de restauração do equilíbrio patrimonial, seja através do dano

moral, que diz respeito à fixação de uma indenização.30

Além do que diferentemente do direito a honra, onde se exige a comprovação do

dano para aferição de eventual indenização, como determina o artigo 20, do Código

Civil de 2002, o direito a imagem quando ofendido independe de prova ou prejuízo para

ficar caracterizado o dever de indenização. Conforme jurisprudência pacificada do STJ

que deu surgimento a Sumula 403:

Súmula 403, STJ - Independe de prova ou prejuízo a indenização pela

publicação não autorizada da imagem de pessoa com fins econômicos

ou comerciais31

.

No seguimento da internet no Brasil, a imagem, a honra, a vida privada e a inti-

midade são os principais objetos de proteção. Já que é onde se observa o maior número

de ofensas a esses direitos, e onde está a maior preocupação diante da dificuldade de

identificação do agente ofensor.

É permitido que os usuários emitam suas opiniões, mas não podem ocorrer ex-

posições que causem constrangimento a pessoa, sendo os limites de alcance desses di-

reitos a dignidade da outra pessoa e a sua vida privada.32

A tutela da imagem não existe com o fim de afrontar o direito à informação e a

liberdade de expressão, mas sim, relativizar ambos direitos, a fim de que seja garantida

a proteção do indivíduo em sua intimidade, mas garantido o interesse público e ocorren-

do a censura.

29

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 69. 30

DA SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25. Ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p.

210. 31

Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/docs_internet/revista/eletronica/stj-revista-sumulas-

2014_38_capSumula403.pdf>. Acesso em 10 jan. 2018. 32

LEITE, George Salomão e LEMOS, Ronaldo. Marco Civil da Internet. 1. Ed. São Paulo: Atlas S.A.,

2014, p. 354.

25

Sendo a busca de proteção ao direito a honra, a imagem, a vida privada e a inti-

midade acaba se chocando com outros direitos, como o direito a informação e a liberda-

de de expressão. E é a colisão entre esses direitos que deu origem ao chamado "direito

ao esquecimento", que será tratado no próximo capítulo.

26

3 - A TEORIA DO DIREITO AO ESQUECIMENTO

Há diferentes opiniões sobre o surgimento do direito ao esquecimento, alguns

acreditam ter surgido nos Estados Unidos e outros na Europa, mais especificamente na

Alemanha.

Neste sentido, publicou Lima:

A partir da discussão gerada pela inquietude de Mayer-Schönberger

(2009), o direito ao esquecimento passou a ter visibilidade. A União

Europeia, com histórico de preocupação relativo à proteção de dados

pessoais, também aderiu ao movimento e iniciou estudos visando a re-

ver o tratamento legal da proteção de dados. Assim, no contexto da

revisão em curso sobre a atual Diretiva de Proteção de Dados no

46/1995, está sendo debatida a possibilidade de introduzir nas norma-

tivas europeias o direito a ser esquecido. Nesse sentido, em maio de

2009 a Comissão Europeia organizou uma conferência dedicada a de-

bater o uso de dados pessoais e sua proteção, bem como examinar os

novos desafios para a privacidade. Foi então que, em 25 de janeiro de

2012, o Conselho e o Parlamento europeus propuseram a codificação

do direito ao esquecimento em uma Diretiva e um Regulamento.33

No Brasil, o direito ao esquecimento surgiu com o caso Doca Street nos anos 70,

que resumidamente trata-se de um caso que Raul Fernando do Amaral Street, conhecido

por Doca, assassinou Ângela Diniz em dezembro de 1976, e mesmo após ter cumprido

pena em 2003, a emissora Rede Globo de Televisão, no programa Linha Direta/Justiça,

retomou passar o caso, Doca ingressou com uma ação pedindo para que não fosse mais

divulgado o caso, que tinha o direito de ser esquecido.34

Mas há a ideia de que o direito ao esquecimento não surgiu nesse momento, mas

que ele já existia antes quando tratado do direito de reabilitação dos condenados que já

cumpriram pena conforme previsto no artigo 94 caput, do Código Penal e regulado pelo

artigo 202 da Lei de Execução Penal (Lei nº 7210/1984), o que traz a ideia do direito de

ser esquecido por fatos pretéritos de sua vida.

33

LIMA, Erik Noleta Kirk Palma. Revista de Informação Legislativa - Direito ao esquecimento: discussão

europeia e sua repercussão no Brasil, 2013, p. 273/274. Revista de informação legislativa, v. 50, n. 199, p.

271-283, jul./set. 2013. Disponível em <http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/502929>. Acesso em 20 de

outubro de 2017. 34

LIMA, Erik Noleta Kirk Palma. Revista de Informação Legislativa - Direito ao esquecimento: discussão

europeia e sua repercussão no Brasil, 2013, p. 277.

27

Porém, oficialmente no Brasil, e com o nome de "direito ao esquecimento" sur-

giu esse direito da personalidade através do Enunciado 531, da VI Jornada de Direito

Civil do Conselho Federal de Justiça (CFJ).

O Enunciado 531 ao dispor que “a tutela da dignidade da pessoa humana na so-

ciedade da informação inclui o direito ao esquecimento”, estabelece que o direito de não

ser lembrado eternamente pelo equívoco pretérito ou por situações constrangedoras ou

vexatórias é uma forma de proteger a dignidade humana.

No ano de 2013, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça fixou ainda o enten-

dimento de que ninguém é obrigado a conviver para sempre com erros do passado, e

assim, embora o direito ao esquecimento tenha tido origem na esfera criminal, atual-

mente tem sido estendido a outras áreas, em especial nas novas tecnologias de informa-

ção diante de invasões de privacidade pelas mídias sociais, blogs, provedores de conte-

údo ou buscadores de informações e a facilidade e rapidez da divulgação de informa-

ções.35

3.1 - O Direito a ser Esquecido frente a liberdade de informação

O direito ao esquecimento, após o Enunciado 531 do CFF, passou a ser conside-

rado como um dos direitos da personalidade, e esse consiste no direito de não ser lem-

brado eternamente por um fato pretérito ou por situações constrangedoras ou vexatórias,

ao ponto de a pessoa desejar que o evento seja esquecido ou que, ao menos, o assunto

não seja reavivado por qualquer membro da sociedade.36

Hoje, os casos sobre direito ao esquecimento julgados pelo STJ estão pendentes

de decisão do Supremo Tribunal Federal, tendo como relator o ministro Dias Toffoli,

que já reconheceu a repercussão geral sobre o assunto, mas o caso ainda não foi julga-

do.37

35

Consultor Jurídico. Direito ao Esquecimento é Garantido por Turma do STJ, 21 de outubro de

2013. Disponível em <https://www.conjur.com.br/2013-out-21/direito-esquecimento-garantido-turma-stj-

enunciado-cjf>. Acesso em 03 de outubro de 2017. 36

ROSENVALD, Nelson. Do direito ao Esquecimento ao direito de ser esquecido. Carta forense.

Publicado em 03 de abril de 2017. Disponível em <http://www.cartaforense.com.br/conteudo/artigos/do-

direito-ao-esquecimento-ao-direito-a-ser-esquecido/17477>. Acesso em 04 de outubro de 2017. 37

Direito ao esquecimento permite manter o anonimato. Jornal do advogado, São Paulo, Ano XLII, nº

421, p. 19, outubro de 2016.

28

De acordo com a petição do Google protocolada no dia 06/09/2017 no Supremo

Tribunal Federal para ingresso como Amicus Curiae no Recurso Extraordinário

1.010.6/RJ que tem por objeto a repercussão a existência de um direito ao esquecimento

na esfera cível, passível de ser invocado por vítimas de crimes e seus familiares, o Bra-

sil só perde para a Rússia no ranking de países que mais enviam ordens para o Google

remover conteúdo de suas plataformas, analisando os dados desde o ano de 2009, foram

5.261 solicitações de órgãos governamentais, emanando a ordem de quase 70% pelo

Judiciário, envolvendo 54 mil itens na internet.38

O direito ao esquecimento surgiu como uma das raízes dos direitos da personali-

dade, buscando se proteger as pessoas das informações que são divulgadas nos meios de

comunicação. A ideia do “direito de ser esquecido” é justamente limitar o acesso eterno

a algumas informações pessoais existentes nos jornais, na TV, na internet e outros mei-

os.

Sendo uma das principais dificuldades na aplicação deste encontrar parâmetros

objetivos de adequação entre a tutela da intimidade e a liberdade de informação. Já que

o direito ao esquecimento não atribui a sociedade o direito de apagar fatos ou de rees-

crever a história (ainda que seja a própria história).

O direito a ser esquecido contempla a possibilidade de se discutir os limites da

utilização de informações de fatos pretéritos, pelo modo e a finalidade com que são

lembrados, também conhecido essa garantia pelo que a doutrina tem chamado de “supe-

rinformacionismo”.

De acordo com BONAVIDES [...] "uma assertiva do constitucionalista espanhol

Javier Perez Royo, no cap. 5 do seu curso de Direito Constitucional 'sem interpretação

não há direito.' Ou com mais propriedade, 'Não há direito que não exija ser interpreta-

do.'"39

38

LUCHETE, Felipe. Brasil é segundo país que mais manda Google apagar conteúdo da internet.

Consultor Jurídico. Publicado em 09 de setembro de 2017. Disponível em

<https://www.conjur.com.br/2017-set-09/brasil-pais-manda-google-tirar-conteudo-internet>. Acesso em

03 de outubro de 2017. 39

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 31. Ed. São Paulo: Malheiros, 2016, p. 610.

29

Outro argumento utilizado pelo Google na petição do pedido de ingresso como

Amicus Curiae é que a quantidade de solicitações de exclusão de conteúdos no Brasil, já

supera países mais populosos e com percentuais mais elevados de conectividade. E para

a empresa “o problema brasileiro é o excesso de cerceamento judicial das liberdades de

expressão, informação e imprensa”.

Atualmente, a discussão reside no fato de ninguém saber qual é o limite do direi-

to ao esquecimento, visto que a aplicação desse gera a possibilidade de impedir a divul-

gação de informações, mesmo que verdadeiras. Afrontando-se por vezes com o interes-

se jornalístico na divulgação de informações, e ainda para alguns, opõe-se até mesmo

com o direito de ser informado da sociedade. Por outro lado, o direito ao esquecimento

protege a divulgação de informações que não sejam contemporâneas e causem a pessoa

transtornos das mais diversas ordens.

De acordo com o Dr. Walter Vieira Ceneviva, presidente da Comissão de Liber-

dade de Imprensa da OAB SP, ele acredita que:

Acho que o maior dilema do direito ao esquecimento é o de enquadrar

quem pode pedi-lo e quem é obrigado a atendê-lo. Imagine uma víti-

ma de um crime: pode haver casos em que seja justo suprir as referên-

cias ao seu nome ou mesmo à sua família; eles querem e podem ser

esquecidos. Imagine, por outro lado, um portal de notícias judiciárias:

ele não pode ser obrigado a suprimir uma notícia legitimamente veicu-

lada, contemporaneamente ao crime, ou à sua punição.40

A liberdade de informação está diretamente ligada à liberdade de imprensa, e no

campo dos direitos personalíssimos, qualquer forma de divulgação de imagens, sons ou

palavras sobre alguém pode vir a atingir a reputação. Além do que, a informação divul-

gada pela imprensa é formadora de opinião pública e tem um amplo alcance, o que pode

ser prejudicial a pessoa de qual é o foco da informação que estava sendo divulgada.

Desta forma, embora seja essencial a manutenção da liberdade de impressa é

igualmente necessário garantir limites à liberdade de imprensa. A atuação de forma ili-

mitada da imprensa e das informações divulgadas pela própria sociedade nos meios de

comunicação pode vir a ferir os direitos personalíssimos de outrem.

40

Direito ao esquecimento permite manter o anonimato. Jornal do advogado, São Paulo, Ano XLII, nº

421, p. 19, outubro de 2016.

30

Neste sentido, Jabur:

Os limites de atuação da imprensa encontram-se no exercício desim-

pedido do direito alheio de similar envergadura personalíssima. Ao la-

do do respeito à moral pública e aos bons costumes, absorvidos pela

comunidade e consagrados pelo direito, repousam o respeito à vida

privada e a homenagem à honra, entre tantas outras formas de proje-

ção da personalidade humana, implementos fundamentais ao desen-

volvimento espiritual pleno, indispensável à expansão do próprio indi-

víduo.41

A informação não deve ferir, ofender ou vulgarizar, essa deve acrescentar, edu-

car e esclarecer, garantindo a dignidade da pessoa humana frente a divulgação de infor-

mações.

3.2 - O Direito ao Esquecimento como garantia da Dignidade

O direito ao esquecimento visa proteger melhor a imagem da pessoa humanada e

a sua dignidade, perante a sociedade, em especial, nos meios como revistas, jornais e na

internet.

Ao retomar informações do passado da pessoa, atinge-se sua dignidade, pois não

se respeita o direito à sua privacidade e a dignidade assenta-se sobre o pressuposto de

que cada indivíduo possui um valor intrínseco, destacando das demais coisas.42

A dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser

humano que o faz merecer ter respeito e consideração pelo Estado e pela sociedade,

implicando, em direitos e deveres fundamentais que asseguram a proteção da pessoa

contra atos de cunho degradante e desumano.

A dignidade coloca a pessoa humana um papel central no universo, como care-

cedor de proteção e garantias, bem como lhe conferindo capacidade de fazer escolhas e

de determinar seu próprio futuro.43

41

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 189. 42

BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais

e a construção do novo modelos. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 283.

31

Toda pessoa humana nasce com dignidade, sendo todos iguais, não havendo

qualquer distinção ou gradação ou escala de merecimento e tampouco se perde a quali-

dade de merecedor de dignidade, uma vez que ela é inerente à pessoa.44

A dignidade é um principio mutável e amplo que acompanha a evolução social e

se adéqua as necessidades do indivíduo. E dessa forma que o principal argumento para

sustentação do direito ao esquecimento é o Principio da Dignidade da Pessoa Humana.

Atualmente vivemos numa era em que a informação é cada vez mais acessível e

rápida, já que há uma evolução dos meios tecnológicos e com essa das redes sociais,

além do que há um alastramento do uso de rádios, jornais, livros e revistas já que agora

podem ser acessados virtualmente.

E com isso, é enfrentado um grande desafio de controle da intimidade e da vida

privada das pessoas. Os sites de busca e redes sociais, em especial, disponibilizam in-

formações na rede, que podem ser acessadas de maneira ágil e prática. Porém, essas

informações podem conter abuso em sua divulgação e até mesmo retomar informações

já adormecidas, como já citadas anteriormente.

Desta forma, o direito de ser esquecido é uma garantia que se busca para efetiva-

ção da dignidade da pessoa humana, que vem a ser invocado para impedir exploração de

fatos do passado e de divulgação de informações de maneira exacerbada e que atinjam a

personalidade.

3. 3 - A interpretação dada pelo sistema Constitucional Brasileiro X Tratamento dado

por outros Países

Os países lidam de forma diversa com o direito ao esquecimento, direito esse

chamado nos países de língua inglesa como the right to be let alone e, em países de lín-

gua espanhola, como derecho al olvido.

Enquanto no Brasil é visto sob a óptica da proteção do direito de personalidade,

na União Europeia a questão é tratada sob o ângulo da proteção do tratamento e livre

43

BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais

e a construção do novo modelos. 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 286. 44

JABUR, Gilberto Haddad. Liberdade de Pensamento e Direito à Vida Privada – conflitos entre

Direitos da Personalidade. Editora Revista dos Tribunais. Edição 2000, p. 210.

32

circulação dos dados pessoais de pessoas naturais, por meio da previsão de um direito

de retificação, apagamento ou bloqueio de dados a ser concretizado contra quem realiza

o tratamento destes.

Conforme mencionado pelo Ministro Dias Toffoli, relator no Recurso extraordi-

nário com agravo 833.248/RJ, do caso Ainda Curi, um dos mais conhecidos precedentes

internacionais foi o caso do espanhol Mario Conteja González que processou em 2010

as empresas Google Spain, S.L. e Google Inc., para que se abstivessem de indicar regis-

tros nos seus índices de busca de um leilão de imóvel realizado por dívidas suas, que já

estavam pagas na época do processo, ocorrido em 1998. O Tribunal de Justiça da União

Europeia decidiu, em 13 de maio de 2014, que os registros originais do leilão deveriam

ser mantidos no sítio eletrônico de origem, mas o Google deveria deixar de indicá-los

em buscas pelo nome do interessado, com fundamento na Diretiva Europeia de Proteção

de Dados Pessoais, diploma legal existente no país.45

O Parlamento Europeu também aprovou um conjunto de leis que deixará as re-

gras sobre privacidade na internet mais rígida, trata-se da Regulação Geral de Proteção

de Dados, garantindo aos cidadãos europeus maior poder sobre a forma como suas in-

formações pessoais são coletadas, armazenadas e até mesmo comercializadas na inter-

net. Com essa lei é possível pedir a retirada de informações de quaisquer sites – como a

exclusão inteira de um perfil no Facebook, por exemplo.

No Brasil existem duas propostas em andamento que pretendem regular o direito

ao esquecimento: o Projeto de Lei 1.676/2015, que pretende obrigar que meios de co-

municação social criassem telefones e endereços para ouvir pessoas que desejem apagar

seus nomes em notícias veiculadas no passado. E o Projeto de Lei (PL) 8.443/2017,

apresentado no dia 31 de agosto de 2017, pelo deputado federal Luiz Lauro Filho (PSB-

SP) que o Direito ao Esquecimento e propõe mudanças nos artigos 7 e 9 da Lei do Mar-

co Civil da Internet, de 2014.

O PL 8.443/2017 prevê, entre outras coisas, que “todo cidadão tem o direito de

requerer a retirada de dados pessoais que sejam considerados indevidos ou prejudiciais à

sua imagem, honra e nome, de qualquer veículo de comunicação de massa”.

45

Acórdão disponível em <http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=CELEX:62012CJ0131> .

Acesso em 15 de novembro de 2017.

33

O deputado teve a iniciativa após a decisão do Tribunal de Justiça da União Eu-

ropeia no caso citado acima que ocorreu na Espanha, na ação proposta por Mario Conte-

ja González e que concedeu o direito de não ver nos resultados de busca do Google in-

formações sobre seu antigo caso.

A preocupação com a tutela da intimidade tem levado alguns países a criar me-

canismos de controle de divulgação, dentro ou fora da internet, de informações que en-

volvam a imagem e privacidade. O que vem gerando a criação de jurisprudências e le-

gislações em diversos países, e até mesmo no Brasil caso do Enunciado 531 do CFJ.

34

4 - ANÁLISE JURISPRUDENCIAL

Neste capítulo será analisado o surgimento do Enunciado 531 da VI Jornada de

Direito Civil do Conselho da Justiça Federal (CJF), e três acórdãos do Superior Tribunal

de Justiça que abarcam o tema do direito ao esquecimento.

4.1- Enunciado 531- Conselho Federal de Justiça (CFJ)

O direito ao esquecimento surgiu com a ideia de assegurar a proteção da intimi-

dade, da vida privada, da honra e da imagem, assim como da tutela do princípio de pro-

teção à dignidade da pessoa humana. E com esse busca-se limitar a divulgação de in-

formações, aplicando-se o principio da razoabilidade a esse, ponderando o principio da

dignidade e a proteção dos direitos da personalidade da pessoa com a liberdade de in-

formação.

No ano de 2013 foi editado o Enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil do

Conselho da Justiça Federal (CJF), que consagrou o “Direito ao Esquecimento”, entre

os direitos da personalidade que é versado no Código Civil em seu artigo 11.

O enunciado dispõe:

ENUNCIADO 531 – A tutela da dignidade da pessoa humana na soci-

edade da informação inclui o direito ao esquecimento.

Uma norma que garante e protege a imagem e vida privada, que por extensão

também se aplicaria à preservação de informações de fatos passados do indivíduo. Con-

forme a justificativa do Enunciado:

Os danos provocados pelas novas tecnologias de informação vêm-se

acumulando nos dias atuais. O direito ao esquecimento tem sua ori-

gem histórica no campo das condenações criminais. Surge como par-

cela importante do direito do ex-detento à ressocialização. Não atribui

a ninguém o direito de apagar fatos ou reescrever a própria história,

mas apenas assegura a possibilidade de discutir o uso que é dado aos

fatos pretéritos, mais especificamente o modo e a finalidade com que

são lembrados.46

46

CONSELHO FEDERAL DE JUSTIÇA. Enunciados aprovados na VI jornada de Direito Civil.

Enunciado 531. Disponível em <http://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/142>. Acesso em 15 de

agosto de 2017.

35

O enunciado é uma orientação doutrinária baseada na interpretação do Código

Civil, mais especificamente no artigo 11, do Código Civil de 2002, e elenca o direito de

ser esquecido entre um dos direitos da personalidade.

Após sua edição, o direito ao esquecimento passou a ter mais enfoque na juris-

prudência brasileira, e ganhando destaque em alguns casos de sua aplicação, começando

a ser criado os contornos e a forma de aplicação.

4.2 - “Chacina da Candelária”- REsp 1.334.097

O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial

nº 1.334.097–RJ, que teve como relator o Ministro Luis Felipe Salomão, o qual teve a

oportunidade de se manifestar acerca da aplicabilidade do direito ao esquecimento.

O caso analisado tratava-se da história de um dos acusados de ter participado do

trágico episódio conhecido como a Chacina da Candelária, ocorrido no Rio de Janeiro

em 1993, mas que ao final do processo-crime, fora considerado inocente.

A Chacina da Candelária, como ficou conhecida, ocorreu na noite de 23 de julho

de 1993, onde dois carros com placas cobertas pararam em frente à Igreja da Candelária.

Em seguida, os ocupantes atiraram contra dezenas de pessoas, a maioria crianças e ado-

lescentes, que estavam dormindo nas proximidades da Igreja, resultando em 8 mortes,

sendo seis menores e dois maiores, e ficando várias crianças e adolescentes feridos.

Depois de realizada as investigações descobriu-se que os autores dos disparos

eram policiais. Jurandir, que era acusado como partícipe do crime, após 3 anos presos,

no tribunal do júri foi absolvido por negativa de autoria pela unanimidade dos membros

do Conselho de Sentença.

Ocorre que, anos após a absolvição, a TV Globo através do programa Linha Di-

reta produziu documentário sobre o episódio, apontando novamente o seu nome como

uma das pessoas que haviam participado do crime.

O fato do programa ter levantado novamente a história, fez com que Jurandir

passasse a ser visto em seu convívio como assassino. Isso acabou causando-lhe, no en-

36

tender do STJ, violação a direitos da personalidade, a saber: direito a paz, privacidade e

intimidade.47

A rede Globo alegou em recurso especial que era “incabível o acolhimento de

um direito ao esquecimento ou o direito de ser deixado em paz” e “que não seria possí-

vel retratar a trágica história dos homicídios da Candelária sem mencionar o recorrido,

porque se tornou, infelizmente, uma peça chave do episódio e do conturbado inquérito

policial”.48

O STJ, no entanto, entendeu que era possível a exibição do programa de fazer

um resgate histórico, sem identificar Jurandir. No dizer do STJ, no bojo do referido

acórdão:

[...] a despeito de a chacina da Candelária ter se transformado em fato

histórico – “que expôs as chagas do país ao mundo, tornando-se sím-

bolo da precária proteção estatal conferida aos direitos humanos da

criança e do adolescente em situação de risco” –, a fatídica história

poderia ter sido contada de forma fidedigna sem que para isso a ima-

gem e o nome do autor precisassem ser expostos em rede nacional.

Desta forma, como pode se verificar Jurandir foi absolvido, e ao ser revista a his-

tória teve prejuízo e não teve seu direito de ser deixado em paz ou ser deixado de lado,

tendo sua imagem explorada e sua privacidade violada pelo programa de TV, ferindo a

sua dignidade. E o Superior Tribunal de Justiça entendeu pela aplicação do direito ao

esquecimento no caso da Chacina da Candelária, reconhecendo o direito do autor de ser

esquecido pelos fatos pretéritos.

4.3 - Aída Curi – Resp 1.335.153

Também julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso

Especial nº 1.334.097–RJ, que teve o mesmo relator do caso “Chacina da Candelária” o

Ministro Luis Felipe Salomão, houve uma nova formação de jurisprudência sobre a

aplicação do direito ao esquecimento.

47

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.334.097/RJ, 4ª Turma, Rel. Luis Felipe Salomão, jul-

gado em 28.05.2013, DJe 10.09.2013, p. 06. Disponível em:

<https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1239004&n

um_registro=201201449107&data=20130910&formato=PDF> Acesso em 08 de agosto de 2017. 48

Idem, p. 10.

37

O caso Aída Curi ocorreu em Copacabana, no Rio de Janeiro, na noite do dia 14

de julho de 1958, após o termino de uma aula Aída Jacob Curi aguardava o ônibus para

ir para casa com sua amiga Ione Arruda Gomes.

As duas foram surpreendidas pela abordagem de dois rapazes Ronaldo Guilher-

me de Souza Castro e Cássio Murilo Ferreira, os quais roubaram a bolsa de Aída com

todos seus pertences. Com o intuito de recuperar seus objetos roubados, Aída seguiu os

rapazes, que adentraram a recepção de um prédio, ao perceber que estavam sendo se-

guidos, os mesmos levaram-na a força para dentro do elevador.

Aída teria sido levada à força pelos dois rapazes ao topo de um edifício, na Ave-

nida Atlântica, onde, ajudados pelo porteiro do prédio, tentaram abusa-la sexualmente, e

que, segundo a perícia, lutou contra os três agressores por pelo menos trinta minutos até

vir a desmaiar por fatiga. Para tentar encobrir o crime os homens teriam atirado Aida do

terraço do prédio tentando simular um suicídio, o que causou a sua morte.

Neste caso, Cassio foi condenado pelo homicídio, o porteiro e Ronaldo foram

condenados apenas por atentado ao pudor e tentativa de estupro.

Após quase 50 anos, a história desse crime foi apresentada pela TV Globo atra-

vés do programa Linha Direta em um documentário com a divulgação do nome da víti-

ma e de fotos reais. Os irmãos da vítima então entraram com ação contra a emissora

com o objetivo de receber indenização por danos morais, materiais e à imagem, alegan-

do a ausência de contemporaneidade da notícia e dos fatos passados, o que teria abrindo

antigas feridas já superadas quando à morte da irmã, buscando assim o direito ao esque-

cimento de não ter revivida, contra a vontade deles, a dor antes experimentada.

O pedido foi julgado improcedente, tanto em primeiro quanto em segundo grau,

chegando ao STJ pelo RESP nº 1.335.153-RJ interposto pelos autores. E o julgamento

apesar de reconhecer o direito dos familiares de esquecer o episódio, entendeu que não

havia necessariamente o dever de indenizar, sob o fundamento que a notícia trata-se do

crime e não da imagem da vítima, e que embora tenha havido um desconforto pelos

irmão por reviver a história, esse não caberia dano moral.

38

Como o cerne da matéria veiculada foi o crime em si, e não a imagem da vítima,

não se poderia falar em dano moral. A isso se somaria o fato de que a reportagem contra

a qual se insurgiram os autores foi ao ar 50 (cinquenta) anos depois da morte de Aída

Curi, razão pela qual não haveria, nos tempos presentes, o mesmo abalo vivenciado à

época do acontecimento. É dizer: muito embora tenha gerado algum desconforto aos

irmãos, seria inexistente o dano moral.

Há alguma semelhança entre o Caso da Chacina da Candelária e o caso de Aída

Curi, por ambos alegarem o sentimento de desgosto pela divulgação do nome e da ima-

gem, e buscarem o reconhecimento do direito ao esquecimento. Porém, neste caso, em-

bora se reconheça o direito ao esquecimento por fatos pretéritos como um direito exis-

tente, entende-se que não se alcançava o caso já que após décadas do crime haveria en-

trado em domínio público e que não haveria como se tratar do caso emblemático Aída

Curi, sem mencionar a mesma.

4.4 - Caso Automax Comercial X Google – REsp 1.396.417

O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial

nº 1.396.417–MG, que teve como relatora a Ministra Nancy Andrighi, julgou sobre o

dever dos provedores de internet de remover conteúdos ilegais ou ofensivos, desde que

tenham recebido o pedido de retirada do ar com a indicação do endereço virtual, e que

não estão obrigados a fazer controle prévio do que é publicado.

Foi proposta ação cominatória cumulada com de indenização por danos materi-

ais e morais, pela empresa Automax Comercial Ltda em face do Google, sob a alegação

de que a pagina que fora criada no site de relacionamento Orkut fora mantido pelo Goo-

gle, e que esse estaria vinculando indevidamente a logomarca da empresa e incluindo

conteúdo ofensivo à sua imagem e honra objetiva, com uma comunidade com o nome

“Enganado pela Automax”.

Em primeira instância a ação foi julgada parcialmente procedente condenando o

Google a excluir do site de relacionamentos Orkut a logomarca da empresa autora, po-

rém não foi reconhecido o direito a indenização, foi interposto recurso de apelação pela

ré, e o acórdão manteve a sentença em sua íntegra. Assim, foi interposto Recurso Espe-

39

cial nº 1.396.417 –MG pelo Google, sob alegação de violação dos artigos 248 do Código

Civil de 2002 e 461, §§ 1º, 3º, 4º e 6º, do Código de Processo Civil de 1973.

O julgamento foi realizado no dia 07/11/2013 pela 3ª Turma do Superior Tribu-

nal de Justiça, mantendo a decisão de primeira e segunda instância que obrigavam o

Google a remover do Orkut o logotipo da empresa Automax. A mudança do julgamento

foi com relação ao entendimento sobre a responsabilidade do provedor.

Pelo acórdão passou a entender-se que os provedores de conteúdo, notadamente

de sites de relacionamento social não respondem objetivamente pela inserção de posts

ofensivos ou violadores de direitos autorais; não podem ser obrigados a exercer um con-

trole prévio do conteúdo dos posts inseridos nos perfis ou comunidades; e devem assim

que tiverem conhecimento inequívoco da existência de post reputado ilegal e/ou ofensi-

vo a direito autorais, removê-lo preventivamente pelo prazo de 24 horas, para que possa

verificar a alegação, sob pena de ser considerado responsável solidariamente com o au-

tor do dano pela omissão praticada.

No presente caso, pode-se verificar uma das formas que se busca a aplicação do

direito ao esquecimento na internet em casos que haja a violação da imagem. Embora

no referido caso não se trate especificamente do tema do direito ao esquecimento, é uma

amostra do entendimento que vem se posicionando a jurisprudência.

40

6 - CONCLUSÃO

O “Direito ao Esquecimento” surgiu há tempos em discussões de cortes interna-

cionais em casos de divulgação de informações pessoais, e no Brasil mais recentemente,

com o nome de direito ao esquecimento após o Enunciado 531 da VI Jornada de Direito

Civil do CFJ, embora já conhecido de outros modos como nos casos de ressocialização.

O tema foi tratado pelos ministros do Superior Tribunal de Justiça, em casos

emblemáticos como a Chacina da Candelária e o caso Aída Curi aqui tratados, sendo

abordado como o direito que o indivíduo tem a exigir que não sejam publicadas infor-

mações passadas sobre a sua pessoa de forma abusiva.

Assim, de acordo com o Conselho Federal de Justiça o direito de ser esquecido

está entre os direitos da personalidade, e pode ser considerado como uma extensão des-

ses já que está intimamente ligado ao direito a imagem, a honra, a vida privada e a inti-

midade da pessoa.

O direito ao esquecimento é a garantia da pessoa de não ter informações/noticias

sobre sua vida ou sua imagem de situações passadas ou vexatórias divulgadas pelos

meios de comunicação.

O direito de ser deixado em paz possui uma amplitude muito abrangente, pois

engloba a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão e o direito a informação, se

tornando parte inerente ao direito de todos, por ser uma forma de garantir a dignidade da

pessoa humana. Embora isso não signifique que haja uma censura, o que ocorre, é que é

garantida todas as liberdades, porém essas não podem ser exercidas de tal forma que

atinjam a liberdade de outrem.

Deste modo, embora tenha proteção à liberdade de “expressão, da atividade inte-

lectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licen-

ça” (art. 5º, inciso IX, da Constituição Federal), garante-se a “intimidade, vida privada,

honra e imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou

moral decorrente de sua violação” (art. 5º, inciso X, da Constituição Federal).

41

Esse direito é fundamental, ainda mais na sociedade atual que vive um momento

de hiperinformação, na qual há um menor espaço da privacidade e uma maior facilidade

na divulgação de informações e recebimento dessas por um maior número de pessoas. A

privacidade do indivíduo diz respeito ao direito de evitar-se o conhecimento de terceiros

de certos aspectos de sua vida, por fazer parte exclusivamente de sua intimidade.

A vida de outras pessoas, por vezes, é assunto de notícias e diz respeito ao direi-

to de ser informado, mas a maneira com que é abordada a noticia não pode ferir a digni-

dade, além do que, há o tempo certo para a divulgação, não podendo certos assuntos

passados serem retomados de modo que prejudiquem a imagem. Assim, é essencial o

direito a informação e a liberdade de imprensa, mas esses não podem ser exercidos de

modo que atinjam a vida privada de outras pessoas.

Não é certo que um indivíduo que já tenha sido julgado, como exemplo no caso

do Jurandir no citado caso Chacina da Candelária, e que já tenha pago por sua divída

perante a sociedade venha a ser alvo de perseguição midiática, e tenha a sua vida preju-

dicada por serem retomadas certas noticias já esquecidas.

Também não é certo que com a internet, tecnologia essa altamente valorizada na

atual sociedade, venha as pessoas sofrerem danos a privacidade, a honra e a imagem em

razão do exercício da liberdade de manifestação de pensamento e de imprensa. Devendo

haver fiscalização maior ainda nesse campo, garantindo-se o direito ao esquecimento e

os direitos da personalidade da pessoa.

Por certo, após os estudos e a analise de casos concretos, conclui-se que quando

diante do interesse público e o interesse privado, o primeiro sempre se sobressai, mas

deve ser ponderado analisando-se caso a caso.

Posto isto, conclui-se que o direito ao esquecimento vem ganhando maior espaço

no nosso direito e vem sendo regulamentado, porém ainda há grandes dificuldades na

maneira que deve ser aplicado (em especial no âmbito da internet) e na ponderação des-

se frente a liberdade de imprensa, a liberdade de manifestação de pensamento e o direito

a informação.

42

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