Direito das Coisas II - Professor Eduardo Hoffmann · PDF fileDireito das Coisas II ... efeito...
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2.8 DO DIREITO DO PROMITENTE COMPRADOR
Ao cabo do que já era reconhecido pela doutrina, o Código Civil de 2002,
elevou o direito do promitente comprador ao status de direito real.
Dantes, tão somente constava por disposição do art. 1.088 do Código
Civil de 1916 que: Quando o instrumento público for exigido como prova do contrato,
qualquer das partes pode arrepender-se, antes de o assinar, ressarcindo à outra as perdas
e danos resultantes do arrependimento, sem prejuízo do estatuído nos arts. 1.095 e 1.097.
Tal disposição afastava a possibilidade do promitente comprador exigir
o cumprimento do contrato da parte contrária, e, durante algum tempo, a doutrina
brasileira deu guarida a essa norma, assim como a jurisprudência que a chancelou em
homenagem ao vestuto princípio nemo peaecise ad factum cogi potest (ninguém pode ser
obrigado a praticar especificamente determinado ato).
2.8.1 Efeitos da promessa de compra e venda
Cuida-se de um direito que tem como fonte concreta uma promessa de
compra e venda. Através de uma avença prévia, as partes acordam sobre o objeto e
sobre as condições, e ajustam a celebração futura de um contrato.
No direito brasileiro, duas particularidades impedem considerar a
promessa como mero contrato preliminar: a) a possibilidade prevista na legislação
esparsa e no CPC, sendo disciplinada no art. 466-B: Se aquele que se comprometeu a
concluir um contrato não cumprir a obrigação, a outra parte, sendo isso possível e não
excluído pelo título, poderá obter uma sentença que produza o mesmo efeito do contrato a
ser firmado. b) a atribuição, ao promitente comprador, de um direito real sobre o bem.
A promessa de compra e venda vista por essas particularidades seria
contrato preliminar impróprio, daí por que sua nomenclatura de compromisso de
compra e venda.
Para a doutrina brasileira mais recente, o surgimento de um direito real
em favor do compromissário ou promitente comprador é a nota característica desse
contrato típico decorrente de seu registro no Cartório de Registro de Imóveis.
2.8.2 Cláusula de arrependimento
A inexistência de cláusula de arrependimento é condição para que o
contrato típico de promessa de compra e venda produza seus normais efeitos.
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Compreenda-se arrependimento como a manifestação de vontade
contrária à anteriormente declarada, no sentido de não mais concretizar negócio
jurídico.
A cláusula de arrependimento encontra lugar nos contratos
preliminares, pois o negócio jurídico perfeito e acabado é, em princípio, irretratável, não
podendo ser desfeito, nem modificado, salvo através de novo acordo.
As arras ou sinal, conforme aplicação do art. 420 do Código Civil
aplicam-se também à promessa de compra e venda, nesse sentido, confira-se: Se no
contrato for estipulado o direito de arrependimento para qualquer das partes, as arras ou
sinal terão função unicamente indenizatória. Neste caso, quem as deu perdê-las-á em
benefício da outra parte; e quem as recebeu devolvê-las-á, mais o equivalente. Em ambos
os casos não haverá direito a indenização suplementar.
A regra do art. 1.417 do Código Civil, comporta a seguinte distinção: a)
contempla ela o contrato que podemos chamar de preliminar de compra e venda, com
cláusula de arrependimento, que é, de fato, um pré-contrato, gerador de direitos apenas
de natureza pessoal, sobre essa espécie incidindo as regras gerais sobre o contrato
preliminar, e; b) promessa de compra e venda tradicionalmente conhecida em nosso
meio jurídico como compromisso de venda, contrato irretratável que, registrado no
Cartório de Imóveis, confere ao promitente comprador direito real à aquisição do
imóvel.
2.8.3 Forma do contrato
É adotado em nosso sistema o princípio da liberdade das formas para a
expressão dos atos de vontade. Confira-se o contido no art. 107 do Código Civil: A
validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei
expressamente a exigir.
De outro ponto, reza o art. 108 do Código Civil: Não dispondo a lei em
contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à
constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de
valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
Exigida, assim, em princípio, é a escritura pública para qualquer
constituição ou transferência de direito imobiliário de imóvel de valor superior ao valor
indicado.
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De se recordar que a controvérsia sobre a necessidade de escritura
pública para a promessa de compra e venda decorria do entendimento de alguns de que
o contrato preliminar deveria ter a mesma forma do contrato definitivo, se esse fosse
solene, sob pena de afrontamento da finalidade das normas que impõem a forma
especial. Hoje, a teor do novo Código Civil, a promessa de compra e venda pode ser
celebrada por instrumento público ou particular, não importando o valor do negócio.
2.8.4 Registro no Cartório de Imóveis
Exige-se para que o promitente comprador obtenha direito real à
aquisição do imóvel, o registro no CRI da localidade do bem do contrato respectivo.
Registrada também deve ser, para os mesmos fins, a cessão da promessa.
O primeiro efeito do registro é a irretratabilidade do contrato que, no
entanto, não impede a resolução do contrato por inadimplemento, bem como, sua
dissolução por mútuo acordo.
Ainda, tem o registro valor erga omnes, impondo ao promitente
vendedor o exercício das faculdades de usar, gozar e dispor da coisa prometida,
enquanto vigorar o contrato.51
Neste sentido, confira-se: EXECUÇÃO FISCAL. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. PENHORA DE IMÓVEL. Promessas de compra e venda registradas em
Cartório de Notas. Impossibilidade. 1. O art. 1.417 do Código Civil prevê expressamente a
obrigatoriedade do registro da promessa de compra e venda em Cartório de Registro de
Imóveis, para que o promitente comprador adquira direito real à aquisição do imóvel. 2-
Estando os contratos de promessa de compra e venda de imóveis registrados em Cartório
de Notas, é impossível a aceitação da penhora destes bens, oferecidos pelo promitente
comprador, uma vez que não detém direitos 2. Recurso Improvido52. Ainda: PENHORA.
BEM IMÓVEL. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. AUSÊNCIA DA
AVERBAÇÃO NO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS. Conforme dispõem os art.s 1.227 e
1.245 do Código Civil, não se adquire a propriedade de bem imóvel por ato inter vivos sem
o respectivo registro do título translativo no Cartório de Registro de Imóveis. Destarte, a
falta da aludida averbação no que tange ao instrumento contratual particular de
51 Ver súmula 239 do STJ: O direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis. 52 TJMG; AG 1.0349.03.003396-4/001; Jacutinga; Segunda Câmara Cível; Rel. Des. Nilson Reis; Julg. 13/03/2007; DJMG 30/03/2007.
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promessa de compra e venda não lhe confere eficácia erga omnes, a teor do disposto art.
1.417 do Código Civil, vinculando apenas os signatários, além de revelar-se como elemento
de prova insuficiente para comprovar a propriedade perante terceiros53.
2.8.5 Direito real
Durante algum tempo se discutiu acerca de qual natureza é o direito
atribuído ao promitente comprador, mas hoje, como o próprio código expressa, trata-se
evidentemente de um direito real à aquisição.
A este respeito Miguel Maria de Serpa Lopes, já dizia: Finalmente, temos
essa figura recém introduzida no nosso direito, a do ônus real resultante do compromisso
de compra e venda, a que denominamos de direito real de aquisição, o qual, do mesmo
modo, se reflete sobre o ius disponendi, por isso que, quando o mesmo devedor venha a
alienar a coisa que prometeu vender, o comprador, ao adquiri-la, se subordina ao ônus real
que sobre ela pesa, ou seja, a obrigação de outorgar a escritura definitiva.54
2.8.6 Direitos do titular de direito real
Informa o art. 1.418 do Código Civil: O promitente comprador, titular de
direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste
forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no
instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.
a) exigência da outorga da escritura definitiva de compra e venda
A lei dispõe que a exigência do promitente comprador, titular de direito
real, quanto à outorga da escritura definitiva de compra e venda, tanto pode ser feita ao
promitente vendedor como a terceiros. Trata-se de efeito do direito de seqüela que o
direito real confere ao promitente comprador.
Este vínculo é uma garantia contra todos, pois, registrada a promessa, o
efeito do direito real decorrente é oponível erga omnes.
Aliás, em vista do grande avanço do sistema processual brasileiro,
poderá o promitente comprador se valer de outras ações cujo objeto seja exigir do
promitente vendedor o cumprimento da obrigação assumida.
53 TRT 3ª R.; AP 00474-2006-037-03-00-5; Segunda Turma; Rel. Juiz Vicente de Paula Maciel Júnior; Julg. 26/06/2007; DJMG 06/07/2007 54 Curso de direito civil, v. 4. p. 39.
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b) adjudicação do imóvel
A adjudicação é o ato do juiz pelo qual é determinada a transferência de
uma coisa do patrimônio de alguém para o de outra pessoa. O ato é uma sentença. É a
sentença do juiz a examinar a resistência do promitente vendedor em outorgar a
escritura definitiva, solucionando assim a pendência, sentença que, de acordo com as
disposições pertinentes do CPC, substitui o título e, desde que registrada no CRI
competente, transfere a propriedade da coisa adjudicada em definitivo.
A exigência do registro, para fins de execução da obrigação de fazer
contra o vendedor, desde a década de 60 vem sendo minimizada. O STF no acórdão RE
51.273, já admitia o registro do contrato no curso da ação de adjudicação. Algum tempo
depois tal entendimento foi sumulado, basta ver o contido na Súmula 168: Para os efeitos
do Decreto-lei 58, de 10.12.1937, admite-se a inscrição imobiliária do compromisso de
compra e venda no curso da ação.
Posteriormente o STJ emanou decisão, posteriormente convertida na
Súmula 239 proclamando que o direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao
registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis.
Atualmente a jurisprudência e doutrina, em que pese travarem pequena
discussão admitem a desnecessidade do registro para fins de adjudicação, contudo,
ressalvam ser imprescindível para fins de oposição quanto à terceiro.