Direito e Economia Na Regulacao - Serie GVLaw

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Direito na Prática.

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  • Direito econmico :direito e economia naregulao setorial Mario Gomes Schapiro,coordenador. SoPaulo : Saraiva, 2009. (Srie GVlaw)Vrios autores.Bibliografia.1. Direito econmico 2.Direito econmico -Legislao I. Schapiro,Mario Gomes. II. Srie.08-09415 CDD-34:33

    ndice para catlogo sistemtico:

  • 1. Direito econmico 34:33

    Diretor editorial Antonio Luiz de Toledo PintoDiretor de produo editorial Luiz Roberto Curia

    Editora Manuella SantosAssistentes editoriais Rosana Simone Silva / Larissa Casares

    Produo editorial Ligia Alves / Clarissa Boraschi Maria CouraEstagirio Vinicius Asevedo Vieira

    Preparao de originais Maria Lcia de Oliveira Godoy / Raquel ModoloDe Nardo

    Arte e diagramao Cristina Aparecida Agudo de Freitas / Isabel GomesCruz

    Reviso de provas Rita de Cssia Queiroz Gorgati / Regina MachadoServios editoriais Karla Maria de Almeida Costa / Carla Cristina Marques

    / Ana Paula Mazzoco

    Data de fechamento daedio: 11-11-2008

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  • Aos alunos do GVlaw.

  • APRESENTAO

    A FGV formada por diferentes centros de ensino e pesquisa comum nico objetivo: ampliar as fronteiras do conhecimento, produzir etransmitir idias, dados e informaes, de modo a contribuir para odesenvolvimento socioeconmico do pas e sua insero no cenriointernacional.

    Fundada em 2002, a Escola de Direito de So Paulo privilegiou umprojeto diferenciado dos currculos tradicionais das faculdades de direito,com o intuito de ampliar as habilidades dos alunos para alm da tcnicajurdica. Trata-se de uma necessidade contempornea para atuar em ummundo globalizado, que exige novos servios e a interface de diversasdisciplinas na resoluo de problemas complexos.

    Para tanto, a Escola de Direito de So Paulo optou pela dedicao doprofessor e do aluno em tempo integral, pela grade curricularinterdisciplinar, pelas novas metodologias de ensino e pela nfase empesquisa e publicao. Essas so as propostas bsicas indispensveis formao de um profissional e de uma cincia jurdica altura dasdemandas contemporneas.

    No mbito do programa de ps-graduao lato sensu, o GVlaw,programa de especializao em direito da Escola de Direito de So Paulo,tem por finalidade estender a metodologia e a proposta inovadoras dagraduao para os profissionais j atuantes no mercado. Com pouco tempode existncia, a unidade j se impe no cenrio jurdico nacional atravs deduas dezenas de cursos de especializao, corporativos e de educaocontinuada. Com a presente Srie GVlaw, o programa espera difundir seumagistrio, conhecimento e suas conquistas.

    Todos os livros da srie so escritos por professores do GV law,profissionais de reconhecida competncia acadmica e prtica, o que tornapossvel atender s demandas do mercado, tendo como suporte slidafundamentao terica.

    O GVlaw espera, com essa iniciativa, oferecer a estudantes,advogados e demais profissionais interessados insumos que, agregados ssuas prticas, possam contribuir para sua especializao, atualizao ereflexo crtica.

    Leandro Silveira PereiraCoordenador do GVlaw

  • PREFCIO

    Os anos 1990 assistiram a dois fenmenos simultneos ecomplementares no campo da organizao econmica: a desconstituio deum modelo de desenvolvimento econmico baseado na centralidade estatale a abertura do mercado brasileiro s disputas comerciais internacionais.De um lado, a reforma do Estado significou uma privatizao dos serviospblicos, que at meados dessa mesma dcada eram ofertados pelasempresas estatais. De outro lado, a forma com que se procedeu ainternacionalizao econmica do Pas implicou uma aderncia abrupta doBrasil aos termos do ambiente concorrencial externo.

    Ambos os fenmenos assentaram-se em uma profundareorganizao jurdico-institucional do ambiente econmico nacional, que,em razo disso, passou a funcionar de acordo com novos pressupostos eparmetros.

    Notadamente no campo dos servios essenciais, essa virada demodelo representou novo engate entre o ambiente pblico e o privado.Setores como telecomunicaes, energia, transporte, entre outros, indicamexatamente a ocorrncia desse fenmeno. No lugar das empresas estataisou de uma regulao incisiva do Estado, tais ramos passaram a contar coma prestao privada de suas atividades e com um aparato regulatrioorientado pelas razes de mercado (market-oriented). Basta ver, porexemplo, a significativa mudana sofrida por boa parte desses setores noque se refere forma de remunerao, que deixou de ser calculada na basede custos para assumir mecanismos baseados em produtividade, indicandoassim uma aderncia lgica privada.

    Aludidas alteraes institucionais, no entanto, no so triviais enem desprovidas de intensos conflitos de interesse. A desregulao daeconomia e a conseqente possibilidade da atuao privada em setoresanteriormente pblicos trazem consigo dilemas de difcil soluo, tais comoa rida compatibilizao entre as necessidades dos usurios e osimperativos econmicos dos prestadores. Os servios pblicos, ainda queexecutados pela livre iniciativa, no deixam de apresentar um carteressencial para os seus demandantes, que os percebem como atividades quedevem permitir uma fruio universal. Os investidores encarregados dessessegmentos econmicos, por sua vez, balizam-se na obteno mxima deretorno econmico e lucratividade. A tenso entre eficincia e eqidade ,portanto, constitutiva desse novo captulo da organizao dos serviospblicos.

    Os textos de Alexandre Faraco, sobre o setor de telecomunicaes,de Vinicius Marques de Carvalho, sobre o setor de saneamento, e o de

  • Mnica Guise, sobre medicamentos, esto voltados exatamente a essadifcil composio. Enquanto o setor de telecomunicaes foi pioneiro nabusca de uma soluo, embora ainda carente de uma efetivaimplementao, capaz de articular universalizao e participao privada, osetor de saneamento s muito recentemente veio a dispor de um marcoregulatrio para tentar dirimir esta e outras controvrsias. J o setor demedicamentos, que apresenta a mesma disputa, ao buscar mediar ointeresse privado dos laboratrios, protegido na forma de patentes, e odireito dos pacientes ao acesso a medicamentos importantes, resvala nasregulaes internacionais, como o acordo TRIPs e as competncias daOMC.

    Os impasses apresentados pelas reformas econmicas nos setorestratados por este livro abrangem tambm outros componentes. Para almdessa difcil justaposio entre a efetivao de direitos e a persecuolucrativa, a consolidao desse novo modelo institucional traz aindadificuldades no que tange ao pleno funcionamento de uma economiaconcorrencial, em segmentos dotados de extensas e intensas falhas demercado. Nesse sentido, o artigo de Eduardo Guimares, sobre a regulaode transportes terrestres, indica justamente os limites desse setor paraconviver em um ambiente concorrencial.

    Problemas de mercado tambm so partilhados pelo setor areo,como revela o texto de Alessandro Oliveira. Embora esse segmentoapresente maior competitividade entre os operadores, padece de umaconcentrao de empresas e de uma restrio de aeroportos, o que acabapor prejudicar a adequada prestao de tal servio.

    Um ltimo desdobramento da reorganizao institucional pela qualestes setores passaram explorado no artigo de Mariana Mota Prado.Trata-se dos problemas de desenho e de implementao a que estoassociadas as reformas econmicas. No caso do setor eltrico, porexemplo, a autora nos mostra como as assimetrias existentes entre aconcepo e o funcionamento das alteraes institucionais podem provocarum movimento de repetidas reformas das reformas.

    Com esse leque de temas, este livro procura percorrer algunsaspectos importantes de um conjunto de setores regulados. Muito emborano sejam estes setores os nicos submetidos regulao pblica, todoseles apresentam uma caracterstica comum, qual seja, o fato deconstiturem atividades destinadas fruio pelos usurios. Por tal razo,outros setores igualmente regulados no foram tratados neste livro.

    Eis, enfim, artigos com diferentes cores e leituras, cada qualdedicado a um setor, cada qual com uma perspectiva acerca da tensa ecomplementar relao existente entre o Estado e o mercado. O que os

  • unifica? Talvez seja o propsito: fazer destas pginas apenas umaprovocao capaz de estimular novas e sucessivas pesquisas no terreno doDireito e da Economia da regulao.

    Mario Gomes SchapiroCoordenador

  • SUMRIO

    APRESENTAOPREFCIO

    1 O SETOR DE ENERGIA ELTRICAMARIANA MOTA PRADO

    1.1 INTRODUO1.2 POR QUE REGULAR O SETOR DE ENERGIA ELTRICA?1.3 A CRISE DAS EMPRESAS ESTATAIS E A PROPOSTA DEREFORMA1.4 O PERODO DE TRANSIO: RUMO AO LIVRE MERCADO1.5 A CRISE: REFORMANDO A REFORMA1.6 APS A CRISE: O PROBLEMA DO ANEXO V1.7 MUDANA DE CURSO: O GOVERNO LULA E A CONTRA-REFORMA1.8 MERCADO VERSUS ESTADO?1.9 CONCLUSOREFERNCIAS

    2 REGULAO DAS TELECOMUNICAES: ENTRE CONCORRNCIA EUNIVERSALIZAOALEXANDRE DITZEL FARACO

    2.1 INTRODUO2.2 ANTECEDENTES: A ORGANIZAO DO SETOR DETELECOMUNICAES NO BRASIL E A PRIVATIZAO DOSISTEMA TELEBRS

    2.2.1 DO CAOS AO MONOPLIO ESTATAL2.2.2 PRIVATIZAO E ABERTURA DO SETOR: DOMONOPLIO ESTATAL CONCORRNCIA PRIVADA2.2.3 A EVOLUO DO SETOR APS APRIVATIZAO

    2.3 UNIVERSALIZAO E CONCORRNCIA NA REFORMA DOSETOR DE TELECOMUNICAES2.4 POLTICAS DE UNIVERSALIZAO NO BRASIL APS AREFORMA SETORIAL E O IMPASSE NA UTILIZAO DO FUST

    2.4.1 UNIVERSALIZAO APS A PRIVATIZAO

  • 2.4.2 A ATUAO DO TCU NA DEFINIO DAFORMA DE APLICAO DO FUST2.4.3 A PROPOSTA DE CRIAO DO SCD

    2.5 CARTER COMPLEMENTAR ENTRE CONCORRNCIA EUNIVERSALIZAO NO ACESSO A REDES DIGITAIS2.6 CONCLUSOREFERNCIAS

    3 REGULAO NO SETOR DE TRANSPORTE TERRESTRE NO BRASILEDUARDO AUGUSTO GUIMARES

    3.1 INTRODUO3.2 MARCO LEGAL E INSTITUCIONAL DA REGULAO3.3 CONCESSO RODOVIRIA

    3.3.1 AS CONCESSES RODOVIRIAS NO BRASIL3.3.2 A NATUREZA DA REGULAO DASCONCESSES RODOVIRIAS3.3.3 A CONCORRNCIA PELO MERCADO: ALICITAO DAS OUTORGAS DE CONCESSO3.3.4 A REGULAO DURANTE A VIGNCIA DOCONTRATO DE CONCESSO

    3.4 OS SERVIOS DE TRANSPORTE RODOVIRIO3.4.1 O MARCO REGULATRIO: EVOLUORECENTE E LEGISLAO VIGENTE3.4.2 A PRTICA DA REGULAO

    3.5 CONCESSO FERROVIRIA3.5.1 A PRIVATIZAO DAS FERROVIAS NO BRASIL3.5.2 QUESTES REGULATRIAS

    REFERNCIAS

    4 REGULAO DA OFERTA NO TRANSPORTE AREO: DOCOMPORTAMENTO DE OPERADORAS EM MERCADOSLIBERALIZADOS AOS ATRITOS QUE EMERGEM DA INTERFACEPBLICO-PRIVADOALESSANDRO V. M. OLIVEIRA

    4.1 INTRODUO4 . 2 ESTRUTURA E EVOLUO DO MARCOREGULATRIO DO TRANSPORTE AREO

  • 4.2.1 A POLTICA DE FLEXIBILIZAO DAAVIAO COMERCIAL BRASILEIRA4.2.2 LEGISLAO EM VIGOR SOBRE ACONCESSO DE LINHAS AREAS

    4 . 3 DISCUSSO SOBRE O PROCESSO DEDETERMINAO DA CAPACIDADE PRODUTIVA PELASFIRMAS EM MERCADOS AREOS LIVRES4 . 4 ESTUDO DE CASO: EVOLUO DASFREQNCIAS DE VOS DOMSTICOS E IMPACTOSDO COMPORTAMENTO COMPETITIVO RECENTE DASCOMPANHIAS AREAS4.5 CONSIDERAES FINAISREFERNCIAS

    5 ELEMENTOS PARA A IMPLEMENTAO DO NOVO MARCO REGULATRIONA GESTO DOS SERVIOS DE SANEAMENTO BSICO NO BRASIL: QUALO ESPAO DA INICIATIVA PRIVADA?VINICIUS MARQUES DE CARVALHO

    5.1 INTRODUO5.2 O SANEAMENTO BSICO NA ATUALIDADE: DESAFIOS EINTERFACES DO SETOR5 . 3 SANEAMENTO BSICO COMO SERVIO PBLICO NACONSTITUIO DA 19885.4 SANEAMENTO BSICO E FEDERAO: COMPETNCIAS ETITULARIDADE

    5 . 4 . 1 DISTRIBUIO DE COMPETNCIAS NACONSTITUIO DE 1988: COMPETNCIAS COMUNS,SERVIOS SOCIAIS E O SANEAMENTO BSICO

    5.4.1.1 COMPETNCIAS DA UNIO5.4.1.2 COMPETNCIAS DOS ESTADOS5.4.1.3 COMPETNCIAS DOS MUNICPIOS

    5.4.2 COMPETNCIAS CONSTITUCIONAIS E OSSERVIOS DE SANEAMENTO: A CONTROVRSIA DATITULARIDADE5.4.3 IMPACTO DAS COMPETNCIASCONSTITUCIONAIS SOBRE A GESTO DOSSERVIOS DE SANEAMENTO BSICO: O DESAFIO DACOOPERAO, DO PLANEJAMENTO E DO

  • FINANCIAMENTO5.4.3.1 PLANEJAMENTO E SERVIOS DESANEAMENTO BSICO5.4.3.2 FINANCIAMENTO DOS SERVIOSDE SANEAMENTO BSICO

    5.5 LIMITES E DESAFIOS PARTICIPAO PRIVADA NAPRESTAO DOS SERVIOS DE SANEAMENTO BSICO

    5.5.1 LIMITES PARTICIPAO PRIVADA:INTEGRAO INTER-SETORIAL,INTERGOVERNAMENTAL E A UNIVERSALIZAO DOSSERVIOS

    5.5.1.1 INTEGRAO INTERSETORIAL: AGESTO DE RECURSOS HDRICOS5.5.1.2 INTEGRAOINTERGOVERNAMENTAL: ASUSTENTABILIDADE TERRITORIAL5.5.1.3 O DESAFIO DAUNIVERSALIZAO: ASUSTENTABILIDADE SOCIAL

    5.5.2 ALTERNATIVA PARA PARTICIPAO PRIVADANA GESTO DOS SERVIOS DE SANEAMENTOBSICO: A SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA

    5.6 CONSIDERAES FINAISREFERNCIAS

    6 PROPRIEDADE INTELECTUAL E O MERCADO FARMACUTICO: UMAREFLEXO SOBRE A APLICAO DE LICENAS COMPULSRIAS NOMARCO DE POLTICAS NACIONAIS DE SADE PBLICAMNICA STEFFEN GUISE

    6.1 INTRODUO6.2 O MERCADO FARMACUTICO E O CONTEXTOINTERNACIONAL DE PROTEO PATENTRIA6.3 EFEITOS CONCRETOS DA ELEVAO DE PREOS PARA OBRASIL6.4 A LICENA COMPULSRIA6.5 O CASO EFAVIRENZ6.6 CONSIDERAES FINAISREFERNCIAS

  • 1 O SETOR DE ENERGIA ELTRICA

    Mariana Mota Prado

    Bacharel em Direito pela Universidade de So Paulo, mestre (LL.M.) edoutora (J.S.D.) pela Faculdade de Direito da Universidade de Yale, EUA,

    professora (assistant professor) da Faculdade de Direito daUniversidade de Toronto, Canad.

    1.1 Introduo

    O presente captulo apresentar breve histrico das diversasreformas pelas quais passou o setor de energia eltrica brasileiro de 1992at 2006. Sero descritos trs momentos de importantes mudanas nesseperodo, intitulados aqui de reforma, reforma da reforma e contra-reforma.Esses momentos mostram que, em grande parte, o funcionamento domercado de eletricidade se baseia na complexa regulao (leis,regulamentos e contratos) que governa as relaes entre consumidores,empresas e governo. Eles ilustram tambm as dificuldades em governartais relaes: vrias das reformas implementadas no Brasil no geraram osresultados esperados.

    O captulo est dividido em sete partes. A primeira explicabrevemente o funcionamento do mercado de energia eltrica e indica quaisos elementos bsicos que compem a regulao setorial. A segunda analisaa crise das empresas estatais e do modelo regulatrio do setor ao final dosanos 1980. A terceira analisa as reformas implementadas no setor deenergia eltrica brasileiro no perodo de 1995 at o fim do processo deprivatizao (a reforma). A quarta, a crise do setor, suas causas e assolues adotadas (a reforma da reforma). A quinta discute uma dasprincipais seqelas da crise, as negociaes do valor das indenizaesprevistas no anexo V dos contratos de compra e venda de energia. A sextaoferece um resumo das reformas implementadas recentemente pelogoverno Lula (a contra-reforma). Finalmente, a stima discute se asreformas aqui apresentadas podem ser classificadas como pr-mercado e

  • pr-Estado. A concluso apresenta um resumo das lies que podemos tirardessa breve anlise.

    1.2 Por que regular o setor de energia eltrica?

    O mercado de energia eltrica se divide em quatro grandes setores:gerao, transmisso, distribuio e comercializao. As empresas deenergia eltrica podem atuar nesses setores por meio de integraovertical, ou com uma estrutura desverticalizada. Empresas integradasverticalmente so as que interligam atividades dentro do processo produtivoou interligam produo e distribuio. Por exemplo, no setor eltrico umaempresa verticalizada no apenas produzir energia, mas ela tambm vaidistribuir essa energia para o consumidor final. Empresas integradasverticalmente atuam em dois ou trs mercados ao mesmo tempo. Emcontraste, as empresas desverticalizadas atuam em apenas um setor econtratam os servios prestados por outras empresas nos outros setores.Em geral, a desverticalizao das empresas no setor eltrico vista comoalgo que pode, potencialmente, aumentar a eficincia do mercado como umtodo, dado que ela permite introduzir competio nos setores competitivosdesse mercado, separando-os dos setores que so considerados comomonoplios naturais.

    No setor eltrico, os setores de transmisso e distribuio1 soconsiderados monoplios naturais, ou seja, neles no h possibilidade decompetio entre as empresas. Nesses dois setores h redes quebasicamente transportam energia por meio de fios. Para haver competio,portanto, seria necessrio multiplicar as redes de transmisso edistribuio que cobrem determinada rea geogrfica, de maneira que osconsumidores pudessem escolher a empresa que transportaria a energia ato local onde ela seria consumida. Duplicar ou multiplicar essas redes,todavia, envolve altos custos, e o retorno que as empresas teriam por taisinvestimentos no seria suficiente para motivar seu ingresso no mercado.Como resultado, esses mercados acabam sendo naturalmente estruturadoscomo monoplios naturais, nos quais apenas vivel a sobrevivncia deuma nica empresa.

    Os setores potencialmente competitivos so o de gerao e o derevenda. Mas nem sempre foi assim: o setor de gerao foi, por muitotempo, considerado um monoplio natural. Ele apenas se tornou competitivocom a integrao das redes de transmisso de energia eltrica. Essaintegrao passou a dar aos consumidores acesso a geradoras que estavam

  • distantes do local de consumo (STOFT, 2002, p. 7). Ainda que haja apenasum fio que chegue ao local de consumo de eletricidade (distribuio),graas aos servios de transmisso, esse fio conecta o consumidor avrios geradores de energia. Dessa forma, em teoria, o consumidor podeescolher de quem comprar. A oferta e a procura de energia nesse sistemapoderiam determinar preos sem que houvesse interferncia do Estado nosistema de gerao. Mas isso seria apenas na teoria.

    Na prtica, existem dois obstculos que impedem que o mercado degerao de energia eltrica seja competitivo. Primeiro, o modo em que sed o consumo de energia torna quase impossvel determinar padres deconsumo de acordo com variaes de preo. Isso ocorre porque a energiaeltrica consumida continuamente, dentro de um dcimo de segundo apartir do momento em que produzida. E no h possibilidade deestocagem. Assim, no momento em que o consumidor consegue obterinformao sobre o preo real da energia, aquela informao j nonecessariamente reflete o custo da energia que ele est consumindo nessemomento. Portanto, o consumidor no consegue responder efetivamente sflutuaes reais de preo e, por conseqncia, a lei da oferta e da procurano funciona como em um mercado perfeito (STOFT, 2002, p. 14-15).

    O segundo obstculo a impossibilidade de desconectarconsumidores que estejam descumprindo seus contratos, seguindo umavariao do preo de custo em tempo real (STOFT, 2002, p. 15). Nomercado de energia eltrica, o consumidor pode usar energia da rede semter nenhum contrato: quando uma fonte consumidora de energia se conecta rede, ela vai puxar a corrente eltrica daquela rede. Por causa disso, osistema constantemente monitorado para garantir que est sendoproduzida a mesma quantidade de eletricidade que est sendo consumida atodo o momento, sem nenhum desequilbrio2. Portanto, a empresa podefisicamente desconectar o consumidor da rede, mas no pode recusar-se alhe fornecer energia eltrica no exato momento em que o consumidordeixou de cumprir seu contrato. Em outras palavras, h inimputabilidade nosistema. Isso impede que o preo dos contratos seja determinado pela leida oferta e da procura.

    Em razo da impossibilidade de estocagem, exigncia de equilbrioem tempo real e inimputabilidade as caractersticas especficas do setordescritas acima , os agentes esto impossibilitados de tomar decisessegundo a oscilao dos preos em tempo real. Como conseqncia, umregime exclusivamente de livre competio no possvel no setor deenergia eltrica. Sempre necessrio haver regulao (SIOSHANSI, 2006, p.71). O propsito da regulao no inventar novos esquemas de preo,mas sim tentar estabelecer mecanismos que garantam que os preos

  • cobrados sero o mais prximos possvel daqueles que existiriam sehouvesse livre mercado. O pressuposto que a competio favorece oconsumidor final, pois gera incentivos para que as empresas reduzam seuscustos de produo e sejam mais eficientes. Portanto, um dos objetivos daregulao tentar estabelecer regras que gerem incentivos para que asempresas se comportem, tanto quanto possvel, como elas secomportariam em um ambiente competitivo. Alternativamente, a regulaopode simplesmente definir o preo do produto ou servio a fim de garantirque ele seja o mais prximo possvel do preo cobrado em um ambientecompetitivo, como no caso dos monoplios naturais de transmisso edistribuio.

    Ainda que se reconhea que nenhum mercado de eletricidade foi oupoderia ser completamente desregulado, quanto e que tipo de regulaodeve ser utilizado nesse mercado uma das questes mais controversasda literatura (SIOSHANSI, 2006, p. 71). O argumento a favor da regulao que o setor de energia eltrica, assim como muitos outros setores de infra-estrutura, no funciona espontaneamente como um livre mercado. Mas h,por outro lado, argumentos contra a regulao. Sem chegar a defender queo setor teria competio perfeita se desregulado, esses crticos daregulao apenas apontam para as deficincias regulatrias. Portanto, umdos argumentos a favor da desregulao de certos setores do mercado deenergia eltrica seria a crena de que as ineficincias do prprio mercadogeram menos custos que as ineficincias geradas pela regulao. Oargumento, todavia, controverso, pois no h dados nem para sustent-lonem para derrub-lo (STOFT, 2002, p. 10-11). A experincia emprica sugereque mesmo um mercado competitivo que funciona bem precisa de umregulador ou, no mnimo, um monitor de mercado ou uma autoridade decontrole de cartis (SIOSHANSI, 2006, p. 71).

    Apesar do consenso sobre a necessidade de regulao, muitosautores se referem s reformas do setor eltrico como a desregulao dosetor. Dada a inevitvel necessidade de alguma regulao, um termo maisapropriado para descrever tais reformas reestruturao. Um processode reestruturao que uma tentativa de redefinir os papis dos agentesque operam no mercado, do regulador, e/ou redefinir as regras do jogo pode envolver desregulao em alguns nveis, mas no em todo o mercado.Por exemplo, quando a Califrnia reestruturou seu mercado, ela desregulouo mercado atacadista ao eliminar quase todas as restries que impediamas geradoras de definir o preo da energia no atacado, mas manteve osetor de comercializao completamente regulado, no caso, com a definiode um teto de preo, ou o valor mximo que poderia ser cobrado pelosservios de comercializao (price cap). Ainda que o processo de

  • reestruturao no envolva desregulao, ele pode tentar introduzircompetio em alguns ou em todos os segmentos do mercado e removerbarreiras para comrcio e trocas. Esse tipo de reforma freqentementechamado de liberalizao (SIOSHANSI, 2006, p. 71).

    Os processos de reestruturao do setor eltrico em geral estoassociados a processos de privatizao, mas no devemos confundi-los.Enquanto a reestruturao diz respeito definio dos papis dos agentes edas regras do jogo, a privatizao geralmente se refere venda de ativosestatais para o setor privado. importante notar que, apesar de estaremfreqentemente associados, possvel liberalizar o mercado semnecessariamente privatizar as empresas do setor (SIOSHANSI, 2006, p. 71).

    Alm da eficincia (e preo razovel para consumidores), areestruturao do setor eltrico e as mudanas na regulao tambm tmoutras preocupaes, como atrair investimentos para expanso eaprimoramento da infra-estrutura existente. Vrios modelos regulatriosgeram poucos investimentos na expanso da capacidade de gerao(JOSKOW, 2006). Essa preocupao ainda mais relevante e proeminenteem pases em desenvolvimento, nos quais h uma demanda crescente(SIOSHANSI, 2006, p. 70).

    O restante deste captulo mostrar uma srie de obstculos eproblemas enfrentados na tentativa de conceber e implementar um modeloregulatrio no setor eltrico brasileiro que reduzisse os obstculos paracompetio e atrasse investimentos privados para o setor.

    1.3 A crise das empresas estatais e a proposta de reforma

    As empresas estatais criadas a partir da dcada de 50 dominaramo setor eltrico brasileiro e foram um modelo bem-sucedido at o final dadcada de 80, quando comearam a enfrentar grandes dificuldadesfinanceiras (PIRES, 1999, p. 140-141). Nesse perodo, devido a uma crisefiscal, o Estado foi obrigado a reduzir drasticamente o volume deinvestimentos nas empresas estatais (GOLDENBERG e PRADO, 2003).Progressivamente, o governo parou de financiar o setor eltrico, alm decortar subsdios e isenes tarifrias para estatais. Alm da falta deinvestimento estatal, as tarifas cobradas haviam sido utilizadas paracontrole inflacionrio e por isso estavam altamente comprimidas, nocobrindo os custos de operao das empresas do setor (PINHEIRO, 2003, p.7; FERREIRA, 2003, p. 190 e s.). A falta de recursos financeiros do governocoincidiu tambm com crescentes dificuldades na obteno de

  • financiamento externo. Como resultado, ao final dos anos 1980 as estataisdo setor estavam com dvidas considerveis. As conseqncias dessasituao financeira logo se tornaram visveis: no perodo anterior crise(entre 1951 e 1980) a capacidade de gerao aumentou em mdia 9,8% aoano. A partir do incio da crise at a primeira reforma (entre 1981 e 19933)essa taxa caiu para 4,1% ao ano o que estava abaixo do aumento noconsumo (5,3% ao ano) (PINHEIRO, 2003, p. 8).

    No perodo de 1995 a 1999, foi implementada uma srie dereformas visando abertura do mercado e ao estabelecimento decompetio no setor. Essas reformas regulatrias, intituladas deReestruturao do Setor Eltrico Brasileiro (RE-SEB), foram acompanhadasde um ambicioso plano de privatizao4. Tanto o processo de privatizaoquanto a reforma regulatria eram possveis solues para a crise dasempresas do setor: enquanto a privatizao permitiria arrecadar fundospara lidar com a crise fiscal do Estado, ela tambm era vista como umapotencial soluo para a falta de investimento no setor; a reformaregulatria, alm de atrair investimento privado, deveria estabelecercompetio entre as empresas privadas, aumentando a eficincia naprestao dos servios, e, ao mesmo tempo, deveria proteger osconsumidores contra preos monopolsticos e abusos de poder de mercado.

    A reforma propunha um modelo diametralmente oposto quele quepredominou no setor at o incio da dcada de 90, caracterizado porintegrao vertical de um lado, especialmente entre empresas de gerao etransmisso, e, de outro, por cooperao entre todas as empresas no setor.A reforma regulatria visava a abolir essa estrutura com: a) criao decompetio nos servios de gerao; b) acesso irrestrito s redes detransmisso e distribuio; e c) criao de competio nos servios decomercializao. Para tanto, era necessrio desverticalizar todas asempresas verticalmente integradas (GOLDENBERG e PRADO, 2003, p. 225).Isso garantiria um funcionamento independente dos setores competitivos(gerao e comercializao) e no competitivos (transmisso edistribuio) do mercado de eletricidade.

    A privatizao comeou pelas empresas que no estavamverticalmente integradas. Enquanto estas eram vendidas em leilespblicos, o governo promovia a reestruturao daquelas integradasverticalmente. A reestruturao das empresas foi acompanhada de: a) umasrie de restries a futuras integraes verticais5; b) limitaes participao acionria em outras empresas que prestavam o mesmoservio (integrao horizontal), tanto para distribuio quanto para geraoe para a soma dos dois6; c) regras que previam o progressivo aumento do

  • nmero de consumidores livres, que poderiam escolher de quem comprareletricidade; d) regras que previam o aumento da flexibilidade para queempresas de gerao e distribuio pudessem negociar livrementecontratos de compra e venda de energia.

    Essas reformas, especialmente as descritas nos itens c e d acima,no geraram os resultados esperados, como veremos a seguir.

    1.4 O perodo de transio: rumo ao livre mercado

    A reforma implementada a partir de 1995 (governo FHC) reconheciaos setores de distribuio e transmisso como monoplios naturais,enquanto visava a transformar os setores de gerao e comercializao emmercados competitivos. Como mencionei na segunda seo, a competiono setor de gerao de energia eltrica possvel porque, em princpio, oconsumidor pode adquirir energia de qualquer geradora conectada rede.

    A interligao de diversos geradores com diversos consumidoresexige, todavia, algum tipo de coordenao para garantir que a mesmaquantidade de energia consumida esteja sendo gerada quasesimultaneamente. Para assegurar tal coordenao, a reforma implementadano governo FHC manteve um modelo centralizado de despacho fsico etransferiu a responsabilidade pela operao do sistema ao OperadorNacional do Sistema (ONS), que uma associao civil sem fins lucrativos.O ONS foi criado em 1998 e coordenado por representantes das empresasde gerao, transmisso e distribuio, por exportadores e importadores deenergia, por consumidores livres e pelo Ministrio das Minas e Energia (Lein. 9.648/98 e Dec. n. 2.655/98). Ele substituiu o Grupo Coordenador paraOperao Interligada (GCOI), que era controlado pela Eletrobrs.

    Enquanto o ONS garantia o equilbrio fsico, operando o sistema dedespacho de forma centralizada, e enquanto o sistema de transporte deenergia (transmisso e distribuio) era reconhecido como monoplionatural, a reforma pretendia introduzir livre competio nos setores degerao e comercializao (ARAJO, 2006, p. 548). Os diversos agentes domercado geradoras, distribuidoras, agentes comercializadores,exportadores e importadores de energia poderiam assinar contratosbilaterais de longo prazo para compra e venda de energia. Isso ocorreriasem um controle centralizado do Estado. Tais contratos seriam registradosno mercado atacadista de energia (MAE)7. O MAE tambm coordenaria omercado de curto prazo (spot market), no qual o excesso de energia podia

  • ser comercializado.A completa implementao desse livre mercado seria precedida de

    um perodo de transio de oito anos (Lei n. 9.648/98). Durante o perodo detransio, existiria um mercado regulado e o livre mercado. No mercadoregulado haveria contratos bilaterais entre geradoras e distribuidoras deenergia eltrica, os chamados contratos iniciais. No mercado livre, a energiaseria negociada livremente. Ao final do perodo de transio, a compra evenda de energia seria livremente negociada. O propsito da transio eraevitar uma mudana imediata para o regime de livre negociao doscontratos de fornecimento de energia, o que causaria um choque nos preosda eletricidade (PIRES, 1999, p. 150). No incio do perodo de transio, osnicos agentes que podiam participar desse livre mercado eram os agentescriados pelo novo modelo: produtores independentes, agentescomercializadores, e consumidores livres.

    Aludidos agentes no existiam no modelo regulatrio anterior,controlado pelo Estado. Produtores independentes so geradores de energiaque produzem eletricidade para consumo prprio, ou para sercomercializada com outros geradores, distribuidoras ou consumidores livres(i. e., eles no podem fornecer energia diretamente para consumidorescativos) (Lei n. 9.074/95, arts. 11 e 12). Agentes comercializadores soentidades que vendem energia no livre mercado, e os comercializadores queforam constitudos apenas para esse fim so empresas que no tm ativosno setor (Lei n. 9.427/96, art. 3, XIV, e Res. ANEEL n. 265/98). Finalmente,consumidores livres, como o prprio nome sugere, so aqueles que podemadquirir eletricidade diretamente dos geradores ou de qualquer outraentidade que opera no sistema (Lei n. 9.074/95, arts. 15 e 16, e Dec. n.2003/96). Os consumidores livres so o oposto dos consumidores cativos.Estes so atendidos pelas distribuidoras locais e no tm outra opo senocomprar energia da nica distribuidora que presta servios na regio ondeeles se encontram.

    Apesar de limitado no incio, o nmero de participantes no mercadolivre deveria aumentar progressivamente. O pressuposto era que, quantomaior o nmero de consumidores livres, maior seria a competio no setor.Portanto, os critrios para que um agente se tornasse consumidor livremudariam progressivamente. Em 1995, consumidores com demanda igual ousuperior a 10 MW eram livres e, se eles quisessem deixar o mercadoregulado, poderiam comprar eletricidade diretamente das geradoras e/ouprodutores independentes (Lei n. 9.074/95, art. 15)8. A partir de 2000,aqueles com uma demanda igual ou superior a 3 MW passaram a serconsumidores livres (art. 15, 2). A flexibilidade progressiva do critrio dedefinio do consumidor livre tinha como propsito atrair um nmero cada

  • vez maior de consumidores para o livre mercado, gerando competioprimeiro entre distribuidoras e geradores e posteriormente entre agentescomercializadores.

    Os resultados, porm, ficaram aqum do almejado: a maioriadaqueles que se qualificavam como consumidores livres decidiu permanecerno mercado regulado, como consumidores cativos (BAJAY, 2006, p. 870). Hpelo menos uma possvel razo para essa deciso: ao se tornaremconsumidores livres, as empresas tinham de migrar do mercado reguladopara o livre mercado. Isso, todavia, gerava grande desvantagem, pois nomercado regulado havia subsdios cruzados para beneficiar consumidoresindustriais (que compem uma parcela significativa de consumidoreslivres). Tais subsdios eram perdidos na migrao para o livre mercado(BAJAY, 2006, p. 870). O resultado que o nmero de consumidores queoptaram por se tornar consumidores livres foi significativamente menor queo esperado: a regulao criou a possibilidade para que eles fossem livres,mas no forneceu incentivos para que esses consumidores sassem domercado regulado.

    Alm do progressivo aumento no nmero de consumidores livres,outra mudana deveria ocorrer no perodo de transio: o aumento daquantidade (e do tipo) de energia negociada no livre mercado. Enquanto aenergia produzida pelas geradoras recm-construdas (energia nova) podiaser livremente negociada no livre mercado, a energia velha, produzidapelas empresas geradoras existentes (que, em sua maioria, j estavamoperando havia anos e j haviam amortizado seus investimentos), estavasujeita a um controle estrito. Na primeira fase do perodo de transio, de1998 a 2002, as velhas empresas geradoras foram obrigadas a assinarcontratos com as distribuidoras, chamados contratos iniciais, quedefiniam o preo de venda da energia velha at 2002. A partir de 2003,25% do total de energia negociada por meio dos contratos iniciais seriaadicionado ao mercado livre todo ano. Conseqentemente, a quantidade deenergia negociada no mercado livre aumentaria e, no final da segunda fasedo perodo de transio, toda a eletricidade produzida no Brasil deveria sercomercializada por meio dele. Esse processo seria simultneo ao processode ingresso crescente de consumidores livres no livre mercado. O resultadofinal esperado era, portanto, um progressivo movimento de migrao emdireo ao livre mercado de eletricidade. Mas isso acabou no ocorrendo.

    Com a contra-reforma implementada por Lula em 2004, toda aestrutura de funcionamento do setor foi modificada (como veremos emmaior detalhe na seo 1.7, abaixo), e o processo de transio nunca foicompletado. Antes de analisar isso, todavia, precisamos entender o queantecedeu a contra-reforma de Lula: a crise do setor eltrico.

  • 1.5 A crise: reformando a reforma

    A seo anterior ilustrou a dificuldade em utilizar regulao paraestabelecer um livre mercado sob condies nas quais a livre competiono ocorre espontaneamente. A presente seo trata de outro objetivo daregulao: atrair investimentos privados para o setor. Nesse aspecto, asreformas implementadas no Brasil enfrentaram um desafio adicional, poisprecisavam tambm atrair investimentos para expanso e aprimoramentodos servios de infra-estrutura de maneira a preencher a lacuna deixadapelo perodo de estrangulamento fiscal do Estado brasileiro (PIRES, 1999, p.138).

    Logo aps o incio do processo de privatizao e reforma do setor,houve melhora na qualidade do servio e aumento da eficincia no setor deenergia eltrica. A causa principal dessa melhora foi a reduo de perdas nosistema de distribuio e corte de pessoal dentro das empresas (PINHEIRO,2003, p. 8). Tambm houve aumento de investimentos no setor em geral(ARAJO, 2006, p. 554, figura 15.10). Esse aumento corresponde ainvestimentos no setor de transmisso e distribuio e inclui aquelesutilizados para consertar problemas com as antigas redes (PINHEIRO, 2003,p. 8). Em gerao, todavia, os resultados no foram to bons.

    Conforme mencionado anteriormente, o setor eltrico passava porgraves problemas financeiros ao final da dcada de 80. Portanto, eraimperativo que a reforma atrasse novos investimentos, garantindo que ocrescimento da oferta acompanhasse o natural crescimento da demanda. Afalta de investimentos estatais na dcada de 80 resultou em uma expansoda capacidade de gerao inferior expanso da demanda/consumo. Aindaque tenha havido investimentos e que a expanso da capacidade de geraotenha superado a expanso do consumo em alguns anos aps aprivatizao9, isso no foi suficiente para preencher a lacuna entreconsumo e gerao criada pela falta de investimentos nos anos 80. Avagarosa expanso da capacidade de gerao, aliada a um perodo dequarenta dias sem chuva no vero de 2001, culminou na crise de energiaeltrica e em um perodo de racionamento que durou de junho de 2001 atfevereiro de 2002 (Medida Provisria n. 2.148-1, arts. 13 e s.).

    Existe consenso em torno do fato de que, se os projetos de geraoplanejados que nem sequer comearam a ser construdos e aqueles cujasobras estavam com o andamento atrasado tivessem sido finalizados, a

  • crise no teria ocorrido10. A falta de chuvas no perodo de janeiro efevereiro de 2001, portanto, no teria culminado em uma crise, seguida deracionamento, se a expanso da capacidade de gerao tivesse ocorridoconforme previsto. Isso porque sistemas predominantemente hdricosexigem um constante equilbrio entre (i) uso imediato da gua nosreservatrios, que reduz custos a curto prazo mas aumenta custos futuros,e (ii) preservao da gua para futuro uso, aumentando o custo imediatodado o uso de energia oriunda das termoeltricas, mas reduzindo o custofuturo (CAMARGO e MENDES, 2003, p. 521). Optou-se pelo uso imediato dagua, contando-se com a disponibilidade de uma capacidade de geraomaior no futuro, o que no ocorreu.

    Apesar desse consenso, h divergncias sobre as razes pelas quaisessa expanso da capacidade de gerao no ocorreu. Um relatriogovernamental com um diagnstico da crise (relatrio Kelman)11 oferecealgumas explicaes de por que o governo no previu a crise e por que nohouve investimentos em gerao. Vale destacar duas. Primeiro, quanto falta de previso e aes preventivas, o governo estaria sem informaesacuradas sobre a gravidade do problema. Segundo, quanto falta deinvestimentos em gerao, houve grande ineficincia dentro da mquinagovernamental e falta de comunicao e coordenao entre diferentessetores do governo (como a ONS, a ANEEL, o MME e a Presidncia daRepblica). Por exemplo, as empresas estatais que tinham planos parainvestir em gerao foram impedidas de faz-lo em razo das restriesimpostas pela poltica macroeconmica do governo.

    Apesar de concordar com a maior parte do diagnstico oferecidopelo relatrio Kelman, alguns especialistas acreditam que a falta deinvestimentos em gerao, especialmente em usinas termoeltricas, deve-se a problemas estruturais do modelo implementado por FHC. Uma versomais conciliatria do argumento afirma que no seria possvel estabelecerum regime de competio entre hidroeltricas e termoeltricas no Brasilsem a utilizao de medidas contrrias lgica de mercado, como reduode eficincia ou redistribuio de recursos, que atrasse investimentos paraa termoeletricidade (ARAJO, 2001, p. 93; ARAJO, 2006, p. 555). Emvirtude da predominncia de energia hidroeltrica e do alto custo deproduo de energia termoeltrica, as termoeltricas apenas despachariamenergia ocasionalmente. Isso torna o investimento em termoeletricidademuito arriscado, pois o investidor no tem garantia nenhuma de retorno(ARAJO, 2006, p. 555). Por isso, as medidas se tornavam necessrias ato momento em que a composio da matriz energtica estivesse maisequilibrada.

  • Uma verso mais crtica do argumento defende a idia de que omodelo de mercado competitivo simplesmente inadequado para o sistemabrasileiro, que tem uma matriz hidroeltrica e exige coordenao entre asgeradoras. Em suma, as falhas das reformas foram causadas pelaimportao de um modelo regulatrio estrangeiro, o qual no foidevidamente adaptado ao setor eltrico brasileiro (GOLDENBERG e PRADO,2003, p. 225-228 e 233).

    Uma srie de medidas foram implementadas para debelar a crise,dentre as quais o racionamento de energia eltrica que resultou emsignificante reduo da demanda de energia no sistema. Tal racionamentoresolveu o problema da escassez de energia, mas gerou outro problema,que discutiremos a seguir.

    1.6 Aps a crise: o problema do Anexo V

    Conforme mencionado anteriormente, a reforma do setor eltricoproposta pelo governo FHC exigiu que as empresas de distribuio deenergia assinassem contratos de longo prazo com as geradoras para operodo de 1998 at 2002 (os chamados contratos iniciais). Asdistribuidoras concordaram em assinar tais contratos, que correspondiam aquisio de 100% da energia por elas consumida, desde que fossemprotegidas contra a possibilidade de racionamento do consumo de energiaeltrica. Para tanto, foi criado o Anexo V dos contratos de compra deenergia eltrica, que garantia compensao para as distribuidoras em casode racionamento.

    Em junho de 2001, o governo brasileiro imps um racionamento emvirtude da crise energtica discutida na seo anterior. Os consumidoresforam obrigados a reduzir seu consumo de energia, sendo estabelecidasdiferentes metas para diferentes consumidores (GCE, Res. n. 8, de 25-5-2001)12. Como conseqncia, os nveis de consumo de energia reduziramalgo em torno de 20%. As distribuidoras de energia eltrica imediatamenteexigiram a indenizao prevista no Anexo V dos contratos de compra deenergia. Naquele momento, 80% das empresas de distribuio haviam sidoprivatizadas, enquanto 80% das geradoras permaneciam nas mos doEstado, que seria o principal responsvel pelo pagamento das indenizaes.

    O governo alegou que as indenizaes, segundo os termos dasclusulas contratuais, levariam a maioria das geradoras de energia eltrica falncia. Aps intensas negociaes, foi acordado que o governocompensaria as distribuidoras pelas perdas. Os termos da compensao

  • foram definidos no Acordo Geral do Setor Eltrico13. Por meio do acordo, ogoverno securitizou 80% das perdas com emprstimos do Banco Nacionalde Desenvolvimento Econmico e Social (BNDES) e autorizou umarecomposio tarifria extraordinria a partir de janeiro de 2002, de maneiraa garantir receitas para que as distribuidoras pagassem tais emprstimos.

    Os percentuais de aumento de tarifas no corresponderam quelesinicialmente exigidos pelas distribuidoras, as quais, no incio dasnegociaes, pediam uma recomposio tarifria que fosse capaz derecompensar suas perdas dentro de um perodo de dezesseis meses. Emvez disso, o governo ofereceu um aumento que deveria cobrir tais perdasdentro de um perodo de trs anos (36 meses). As empresas acabaram poraceitar os termos do acordo, e os consumidores tiveram de arcar comaumentos que variaram de 2,9% a 7,9%. O perodo inicialmente previstono foi suficiente para indenizar algumas empresas por suas perdas.Nesses casos, o governo decidiu estender para at dez anos o perodo dereajuste extraordinrio.

    No fim das contas, o governo, as empresas e os consumidoresacabaram arcando com os custos do apago. O governo ofereceuemprstimos do BNDES e teve de enfrentar o impacto poltico negativo doaumento das tarifas, interpretado como uma ofensa pelos consumidores,que haviam cumprido seu papel respeitando as metas de racionamento. Asgeradoras e distribuidoras tiveram de arcar com uma diminuiosignificativa das receitas, que no foi totalmente evitada pelo acordo dosetor. E os consumidores passaram a pagar mais pela eletricidade, com osaumentos tarifrios.

    1.7 Mudana de curso: o governo Lula e a contra-reforma14

    Em 2004, o governo implementou novo modelo no setor eltricobrasileiro. Uma das principais caractersticas desse modelo foi aimplementao de uma estrutura mais centralizada que, em contraste como modelo anteriormente implementado por FHC, d menos espao paraforas de mercado (ARAJO, 2006, p. 560).

    O modelo Lula manteve um mercado de gerao competitivo, masrestringiu bastante a quantidade de contratos que podem ser negociadoslivremente. Alguns contratos de venda de energia podem ser negociadoslivremente, o que foi chamado de Ambiente de Contratao Livre (ACL).Outros contratos, todavia, esto restritos ao Ambiente de ContrataoRegulada (ACR). Esses ltimos so chamados Contratos de Comercializaode Energia Eltrica no Ambiente Regulado (CCEAR). As distribuidoras so as

  • principais participantes do ACR15. Os consumidores e comercializadorespodem negociar livremente e assinar contratos bilaterais no ACL. Asgeradoras que operam em regime de servio pblico, os produtoresindependentes, os autoprodutores e os comercializadores podem todos optarentre vender energia no ACR ou no ACL (Leis n. 10.847/2004 e 10.848/2004).

    Fonte: Cmara de Comercializao de Energia Eltrica(www.ccee.org.br.).

    No ACR, em vez de livre contratao, h leiles de energia. Baseadana demanda prevista pelas distribuidoras, a ANEEL (diretamente ou pormeio da Cmara de Comercializao de Energia Eltrica16,CCEE) promoveleiles de energia pelo critrio da menor tarifa (Dec. n. 5.163/2004, art. 20,VII). Tanto as geradoras de servio pblico quanto os produtoresindependentes, os autoprodutores e os agentes comercializadores podemoferecer energia nos leiles. O vencedor ser aquele que oferecer o menorpreo por MW/hora e assinar CCEARs com as distribuidoras.

    H dois tipos de CCEAR, um para compra de energia de novosempreendimentos e outro para compra de energia dos empreendimentosexistentes. O primeiro tem durao mais longa, sendo de no mnimo 15 eno mximo 30 anos, e o leilo realizado 3 ou 5 anos antes do prazo paraincio do suprimento. O segundo contrato dura no mnimo 5 e no mximo 15anos, e o leilo realizado um ano antes do prazo para incio dosuprimento. O prazo de durao mais longo dos contratos para novos

  • empreendimentos serve como incentivo para investimentos no setor, dadoque os investidores sabem que, se conseguirem vencer o leilo com amenor tarifa, tero demanda assegurada. Essa demanda tambm garantida pela exigncia imposta pelo novo modelo de que asdistribuidoras contratem 100% da sua demanda de energia17. Vale notarque os prazos de 5 e 3 anos para incio do suprimento permitem aosinvestidores organizar o financiamento do projeto de construo, para queas usinas hidroeltricas (em geral, 5 anos) e termoeltricas (em geral, 3anos) estejam em funcionamento no prazo previsto.

    No prazo de at um ano antes do incio do suprimento, podem serrealizados leiles de ajuste, nos quais h apenas um vendedor e umadistribuidora. Diferentemente dos contratos assinados em outros leiles, osde ajuste no podem ter mais de dois anos de durao, bem como nopodem representar mais de 1% do total da carga necessria paraatendimento do mercado consumidor (Dec. n. 5.163/04, art. 26). O propsitodos leiles de ajuste permitir que as empresas distribuidorascomplementem a carga de energia inicialmente contratada para atender demanda dos consumidores finais.

    Do ponto de vista econmico, o ACR tido como um pool decompradores, pois um grupo de distribuidoras atua como um compradornico no leilo de energia. Dentro do pool, as geradoras que vencem o leiloassinam diversos CCEARs, um com cada distribuidora participante daqueleleilo especfico. O resultado disso que as geradoras assumem menosriscos com relao ao retorno do capital investido, pois, ainda que uma dasdistribuidoras se torne inadimplente, menos provvel que todas elas ofaam ao mesmo tempo (CORREIA et al., 2006a, p. 619). Isso deveriareduzir o preo dos contratos de compra e venda de energia, que, em geral,tem embutido o risco de descumprimento do contrato pela outra parte(ROCHA e GARCIA, 2006, p. 3829).

    Alm disso, ao organizar a demanda por energia em forma de poole fechar a compra com quem oferecer a tarifa mais barata, o sistema estpreocupado em evitar abuso de poder de mercado e garantir modicidadetarifria para o consumidor final (CORREIA et al., 2006, p. 511 e 522). Comoos leiles de energia influenciam o preo da tarifa paga pelos consumidorescativos, que so aqueles servidos pelas distribuidoras sob um regime demonoplio natural, eles tambm servem para assegurar tarifas razoveis.

    No ACL, podem participar geradoras, agentes de comercializao,importadores e exportadores de energia eltrica e consumidores livres.Conforme explicado anteriormente, os consumidores livres podem escolherseus provedores de energia (pagando uma taxa pelo uso das redes de

  • transmisso e distribuio). No ACL, os vendedores e compradores tmliberdade para estabelecer os termos dos contratos bilaterais de compra evenda de energia. diferena do modelo anterior, h agora incentivosconcretos para a migrao de consumidores cativos para esse mercado.Tais incentivos incluem: reduo dos preos (em parte em razo doexcesso da produo gerada pelo racionamento), eliminao de barreirastributrias18, reduo do prazo para migrao de trs para um ano19, epossibilidade de retorno ao status de consumidor cativo no prazo de cincoanos. E o aumento no nmero de consumidores livres no mercado foisignificativo: de 34 consumidores livres em 2004, a CCEE passou a ter 466em 2005 e 613 at dezembro de 2006.

    H outros aspectos importantes do novo mercado que no seroexplorados em maior detalhe aqui. Vale mencionar, todavia, que asavaliaes iniciais do novo modelo foram positivas (CORREIA et al. 2006, p.528). Porm, o sistema est operando h muito pouco tempo parapodermos afirmar definitivamente que ele funciona. E ainda h questesimportantes para serem resolvidas, que no foram sequer mencionadasaqui, como o licenciamento ambiental e o problema do gs natural.Devemos adotar, portanto, um otimismo parcimonioso (ARAJO, 2006, p.563).

    1.8. Mercado versus Estado?

    A breve apresentao dos problemas com as reformas do setoreltrico brasileiro e a anlise simplificada dos modelos regulatriosapresentada aqui poderia levar alguns a concluir, equivocadamente, que noBrasil houve uma tentativa frustrada de implementar um regime de livremercado, seguida da criao de um modelo de estrito controlegovernamental. Em outras palavras, o leitor poderia ficar tentado a rotularas reformas de FHC como pr-mercado e as de Lula como pr-Estado.

    Tal distino, todavia, no completamente acurada. As reformasde FHC de fato se utilizaram de uma pesada retrica pr-mercado. Contudo,ainda que a transio tivesse sido bem-sucedida, o setor de gerao nopoderia ser considerado um livre mercado, por trs razes. Primeiro, omodelo implementado pelo governo FHC decidiu manter a coordenao entreas usinas hidroeltricas, observando em parte o controle centralizado quepredominava no perodo pr-privatizao (ARAJO, 2006, p. 538). Afirmamos especialistas que, em virtude da predominncia da matriz hidroeltrica e

  • da existncia de bacias interligadas, a coordenao permite a otimizao douso da gua, aumentando a eficincia do sistema. A razo simples:dentro de uma mesma bacia hidroeltrica, o consumo ou estoque de guade uma usina afeta diretamente a quantidade de gua disponvel para outrasusinas. Alm disso, a coordenao do uso da gua entre bacias permite queo sistema interligado administre melhor a gerao de energia em perodosde seca e perodos chuvosos. Esse tipo de coordenao parece peculiar aosistema brasileiro. Outros sistemas de matriz predominantemente hdricano adotaram esse tipo de mecanismo, porque ou eles possuem maisusinas termoeltricas no sistema ou eles esto interligados com outrossistemas cuja matriz termoeltrica mais significativa (ARAJO, 2006, p.550).

    A segunda razo que as peculiaridades do sistema hdrico e odespacho centralizado levaram implementao de um mecanismo queeliminava a livre competio entre geradoras: o Mecanismo de Realocaode Energia (MRE) (ARAJO, 2006, p. 538 e 549). O MRE um mecanismofinanceiro para reduo do risco hidrolgico e foi implementado em 1998(Dec. n. 2.655/98, Cap. IV, seo II).

    A terceira razo pela qual as reformas de FHC no criariam livrecompetio o fato de que o modelo de determinao do preo no mercadode curto prazo (spot) no era totalmente definido pela lei da oferta e daprocura. Em vez de definir o preo de curto prazo com base nas ofertasfeitas em leiles de energia, o MAE funcionava de acordo com preosestabelecidos por meio de frmulas, e os resultados eram definidos porcomputadores, com base em alguns dados fornecidos pelos agentes domercado (ARAJO, 2006, p. 548-549).

    Portanto, ainda que as reformas implementadas por FHC tivessemsido bem-sucedidas, por causa das trs razes apresentadas acima, restamdvidas de que se poderia considerar esse um livre mercado com efetivacompetio entre empresas, no qual os preos eram determinados pela leida oferta e da procura.

    Em contraste, as reformas de Lula, que so claramente maiscticas das foras de mercado do que as de FHC, acabaram por estabelecerum esquema no qual contratos livres correspondem a 18% do total deenergia consumida. Um nmero significativamente maior do que aqueleobtido durante o governo FHC (ARAJO, 2006, p. 538).

    Os grficos abaixo demonstram o aumento do nmero de contratosbilaterais e da quantidade de energia negociada livremente de 2001 a 2006:

  • Fonte: Cmara de Comercializao de Energia Eltrica(www.ccee.org.br.).

  • Fonte: Cmara de Comercializao de Energia Eltrica(www.ccee.org.br.).

    1.9 Concluso

    As vrias reformas pelas quais passou o setor eltrico brasileirono atingiram os resultados esperados por, basicamente, duas razes:falhas de desenho e falhas de implementao. Falhas de desenho soaquelas que no adaptam o modelo regulatrio s peculiaridades do pas noqual tal reforma est sendo representada. Algumas vezes, os problemascom o desenho se tornam visveis apenas com o tempo. As falhas deimplementao ocorrem quando o desenho e a estrutura do mercado soslidos, mas a implementao tem problemas porque o processo detransio no evolui conforme o esperado ou porque a implementao dasreformas no conduzida da melhor forma possvel (o que pode ocorrer emrazo da resistncia poltica ou de outros fatores externos reforma). No

  • caso do Brasil, parece ter havido falhas de desenho na reformaimplementada por FHC, aliadas a falhas de implementao (ARAJO, 2001,p. 85; SIOSHANSI, 2006, p. 72).

    Em ambos os casos (falhas de desenho ou de implementao),torna-se necessrio conduzir reformas das reformas, o que tem ocorridoem diversos pases ao redor do mundo. Ajustes s reformas originais foramou esto sendo implementados no Chile, na Argentina, na Colmbia, nosEstados Unidos (Califrnia) e at mesmo na Inglaterra, que era consideradaum modelo para outros pases (SIOSHANSI, 2006, p. 73). As reformasimplementadas no Brasil para lidar com a crise de energia eltrica e arecente reforma do setor se enquadram, portanto, em um padrorelativamente comum no cenrio internacional.

    Quais as conseqncias disso? Mercados de energia eltricaparecem estar adotando, ou j adotaram, formas hbridas, nas quais asempresas no esto completamente desverticalizadas, nem totalmenteprivatizadas, nem se conduzem de modo verdadeiramente competitivo. Emalguns casos, essas formas hbridas parecem ser transitrias, mas emoutros no parece haver inteno (ou a opo) de criar um mercadocompletamente desverticalizado, privatizado e liberalizado (SIOSHANSI,2006, p. 75). Esse ltimo parece ser o caso do Brasil atualmente, aps asreformas implementadas por Lula.

    Isso bom ou ruim? difcil dizer. No h consenso na literaturasobre as vantagens e desvantagens da integrao vertical e privatizao nosetor eltrico (SIOSHANSI, 2006, p. 76). Como conseqncia, tal qualindicado na segunda seo do captulo, h pouco consenso sobre que tipo deregulao e em que intensidade deveria ser usado no setor. Mais do queisso, no h consenso sobre o que constitui um mercado de energia eltricabem estruturado, nem h um ndice universal para comparar performance dediferentes mercados (SIOSHANSI, 2006, p. 81).

    Portanto, no devemos questionar-nos se determinadas reformas noBrasil resolveram definitivamente os problemas do setor. Em virtude deconseqncias imprevisveis, evolues inesperadas, ou obstculos que noesto sob controle dos formuladores de polticas pblicas, reformas que soperfeitamente aceitveis hoje podem tornar-se disfuncionais a qualquermomento. A pergunta mais importante a ser feita se determinadareforma vivel e resolve os problemas atuais do sistema (ARAJO, 2006,p. 559). E uma resposta positiva no deve impedir-nos de reconhecer queoutras reformas provavelmente sero necessrias em um futuro prximo.

  • REFERNCIAS

    ARAJO, Joo Lizardo de. A questo do investimento no setor eltricobrasileiro: reforma e crise. Nova Economia, Belo Horizonte, v. 1, n. 1, p.77-96, jul. 2001.. The case of Brazil: reform by trial and error? In: SIOSHANSI,Fereidoon P.; PFFANBERGER, Wolfgang. Electricity Market Reform: aninternational perspective, Elsevier Science, Cap. 16, p. 565-594, 2006.BAJAY, Srgio Valdir. Integrating competition and planning: a mixedinstitutional model of the Brazilian electric power sector. Energy, v. 31,Issues 6-7, p. 865-876, maio/jun. 2006.CAMARGO, Ivan; MENDES, Dilemar de Paiva. Risk responsibility for supplyin the Brazilian energy market. Power Engineering Society GeneralMeeting, IEEE, v. 1, p. 520-524, 2003.CORREIA, Tiago B.; MELO, Elbia; COSTA, Agnes M. Anlise e avaliaoterica dos leiles de compra de energia eltrica proveniente deempreendimentos existentes no Brasil. Revista Economia, Braslia:ANPEC, v. 7, n. 3, p. 509-529, set./dez. 2006.CORREIA, Tiago B.; MELO, Elbia; COSTA, Agnes M.; SILVA, Adriano(2006a). Trajetria das reformas institucionais da indstria eltricabrasileira e novas perspectivas de mercado. Revista Economia, Braslia:ANPEC, v. 7, n. 3, p. 607-627, set./dez. 2006.FERREIRA, Carlos Kawall Leal. Privatizao do setor eltrico no Brasil(2003). Disponvel em:

  • PINHEIRO, Armando Castelar. Regulatory reform in Brazilianinfrastructure: Where do we stand?. Braslia: IPEA, Working Paper n. 964,2003. Disponvel em: < http://ssrn.com/abstract=482823>.PIRES, Jos Carlos Linhares. O processo de reformas do setor eltricobrasileiro. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, p. 137-198,dez/1999.ROCHA, Katia; ALCARAZ GARCIA, Francisco A. Credit risk in the pool-implications for private capital investments in Brazilian power generation.Energy Policy, v. 34, issue 18, p. 3827-3835, December 2006. Disponvelem:
  • objetivos macroeconmicos. Por causa disso, as reformas regulatrias quegarantiriam o funcionamento do setor foram deixadas em segundo plano(BAJAY, 2006, p. 869).5 Apesar de a nova regulao estabelecer condies mais estritas do queaquelas que vigoravam anteriormente, ela ainda permitia algum nvel deintegrao, com algumas limitaes. Veja, por exemplo, Resoluo ANEEL n.94/98, art. 3: Um mesmo agente, atuando como Agente de Gerao ecomo Agente de Distribuio, no poder ter a soma aritmtica de suaparticipao na capacidade instalada nacional com a sua participao nomercado de distribuio nacional superior a 30% (trinta por cento); art.6: Uma empresa de distribuio s poder adquirir energia eltrica deempresas de gerao a ela vinculadas ou destinar energia por ela mesmaproduzida, para atendimento aos consumidores no contemplados nos arts.15 e 16 da Lei n. 9.074, de 7 de julho de 1995, at o limite de 30% (trintapor cento) dos requisitos desses consumidores.6 O novo quadro regulatrio tambm estabelecia limitao ao poder demercado, sendo o percentual autorizado diferente para cada regio (Res.ANEEL n. 94/98, arts. 1 e 3).7 O MAE foi previsto na Lei n. 9.648/98 e regulamentado pelo Decreto n.2.655/98. As bases de funcionamento do MAE foram definidas em umacordo entre os agentes do setor chamado Acordo de Mercado.8 A Lei n. 9.074/95 foi posteriormente modificada pela Lei n. 9.648/98 que,por sua vez, foi completada pela Resoluo ANEEL n. 264/98. Em 1998,esses consumidores livres tambm eram autorizados a contratar comconcessionrias ou agentes comercializadores no sistema interconectado.9 De 1990 a 1994 a expanso mdia da capacidade de gerao era de 1.069MW por ano. De 1995 a 1999 foi de 2.101 MW/ano. Apesar de ter havidogrande expanso da capacidade em 2000 (4.262 MW), em 2001 esse nmerofoi reduzido a 2.498 MW.10 O anncio da crise em maio de 2001 foi seguido pela criao da Cmarade Gesto da Crise de Energia (GCE), que, por sua vez, criou uma fora-tarefa (task force) para oferecer um diagnstico e sugerir solues. Lideradopor Jerson Kelman, esse grupo produziu o relatrio Kelman, que se tornouum diagnstico consensualmente aceito na literatura especializada. Paraalguns autores que corroboram esse ponto do relatrio Kelman, videARAJO, 2006, p. 555 (afirmando que o relatrio Kelman foi considerado,por todos os envolvidos, um acurado diagnstico tcnico) e GOLDENBERG ePRADO, 2003, p. 230.11 Vide nota de rodap 10, supra.

  • 12 Para os consumidores industriais existiam metas de 15% a 25%; paraempresas estatais e servio pblico, eram de at 35%; para consumidoresresidenciais e comrcio, era de 20%.13 Formalizado na Medida Provisria n. 14/2001 e posteriormente convertidona Lei n. 10.438/2002.14 A literatura especializada freqentemente se refere reformaimplementada por Lula como a Reforma da Reforma (ARAJO, 2006, p.558). O termo contra-reforma parece mais apropriado, todavia, porque areforma de Lula representa um recuo em alguns aspectos da reformainiciada em 1990 e a construo de regras institucionais para o retorno doplanejamento central e estatal e para os investimentos pblicos que haviamsido abandonados (CORREIA et al., 2006a, p. 618).15 Alm de adquirir energia mediante leiles, as distribuidoras podemcomprar energia da Hidroeltrica de Itaipu, das geradoras dentro doPrograma de Incentivos s Fontes Alternativas de Energia (PROINFA),gerao distribuda (conforme definida pelo Dec. n. 5.163/2004, art. 14) econtratos bilaterais assinados antes de 16 de maro de 2004.16 A CCEE uma entidade privada, sem fins lucrativos, e foi criada pelonovo modelo para substituir o MAE, ainda que mantenha muito da estruturainstitucional dele cinco conselheiros no conselho de administrao, sendoo Presidente nomeado pelo Ministrio das Minas e Energia Lei n.10.848/2004 e Conveno de Comercializao, instituda pela ResoluoANEEL n. 109/04.17 No modelo anterior, elas eram obrigadas a contratar apenas 85% antesda crise e 95% depois da crise.18 Conselho Nacional de Poltica Fazendria, Convnio ICMS n. 117/2004.19 Lei n. 10.848/2004 e Decreto n. 5.163/2004. Anteriormente a migraoera definida pela Resoluo ANEEL n. 264/98.

  • 2 REGULAO DAS TELECOMUNICAES: ENTRE CONCORRNCIA EUNIVERSALIZAO

    Alexandre Ditzel Faraco

    Professor do programa de educao continuada e especializao emDireito GVlaw, professor do programa de ps-graduao em Direito

    (mestrado e doutorado) da Pontifcia Universidade Catlica do Paran,doutor e livre-docente em Direito pela Universidade de So Paulo.

    2.1 Introduo

    O presente texto1 se prope a fazer uma descrio geral eabrangente do setor de telecomunicaes e de sua respectiva disciplinajurdica. Est dividido em quatro partes. A primeira delas faz umaretrospectiva da organizao do setor e da reforma que teve como marco aprivatizao do Sistema Telebrs.

    Em seguida, discute-se como essa reforma foi traduzida no mbitojurdico e normativo a partir da tenso entre os dois princpiosfundamentais que norteiam a legislao setorial (universalizao econcorrncia). Argumenta-se que concorrncia e universalizao no sovetores que se excluem, mas podem estar diretamente relacionados, sendoainda possvel identificar, em alguns contextos, uma relao de dependnciaentre um e outro.

    Com o propsito de aprofundar a anlise dessa questo especfica,o texto segue na terceira parte com uma discusso sobre as polticas deuniversalizao subseqentes privatizao do Sistema Telebrs. Na quartaparte, por fim, avalia-se como a implementao eficiente de uma polticade universalizao do acesso a redes digitais tem uma relao dedependncia com as condies de concorrncia no setor (o que tambmconduz a uma anlise da evoluo recente das normas voltadas promooda concorrncia nas telecomunicaes).

  • 2.2 Antecedentes: a organizao do setor de telecomunicaes no Brasil ea privatizao do sistema Telebrs

    2.2.1 Do caos ao monoplio estatal

    Historicamente as telecomunicaes brasileiras estiveram de mododireto associadas ao denominado Sistema Telebrs. A sua origem remonta dcada de sessenta do ltimo sculo, quando a Unio Federal procuroumelhor sistematizar a forma pela qual os servios eram prestados. Suaefetiva implantao, porm, ocorreu apenas no incio dos anos 1970.

    At ento, o setor era marcado por uma significativa fragmentao,com diversas empresas locais e regionais operando sem coordenao ecomprometendo o desenvolvimento de uma rede nacional integrada. Noplano constitucional, a telefonia local e estadual no era alocada ao mbitode competncia da Unio, razo pela qual proliferavam concesses porparte de Estados e Municpios2. Estima-se que durante os anos 1960atuavam no Pas cerca de mil e duzentas operadoras3, e a maior parte dotrfego telefnico era controlado por empresas de capital estrangeiro4.

    At a promulgao da Lei n. 4.117, de 27 de agosto de 1962,tambm no havia uma sistematizao legislativa quanto matria. Essediploma legal, em seu art. 42, autorizou a Unio a criar uma empresaencarregada de explorar os servios de sua competncia, os quais foramdefinidos pelo seu art. 10 como os: (i) servios dos troncos que integramo Sistema Nacional de Telecomunicaes, inclusive suas conexesinternacionais; e (ii) servios pblicos de telgrafos, de telefoniainterestaduais e de radiocomunicaes, ressalvadas as excees legais. AEmbratel foi a empresa criada com base nessa autorizao legislativa.

    Em 1968, o governo adquiriu a Companhia Telefnica Brasileira e,gradualmente, foi obtendo o controle da maioria das operadoras do Pas5.Segundo observa Florinda Antelo Pastoriza,

    a idia bsica era criar um sistema nacional de telecomunicaesque permitisse unificar e compatibilizar tecnicamente a rede, umavez que a fragmentao da indstria havia produzido grandeheterogeneidade de equipamentos, prejudicando a interligao entreas diversas regies do pas e elevando o custo de operao dosistema6.

  • A fragmentao do poder de outorgar concesses perdurou at aConstituio de 1967, a qual concentrou de forma expressa tal competnciana Unio7. Subseqentemente, a Lei n. 5.792, de 11 de julho de 1972,estruturou o Sistema Telebrs e autorizou, em seu art. 11, a transformaoda Embratel em uma sociedade de economia mista que passaria a sersubsidiria da Telebrs, procedimento que foi regulamentado pelo Decreto n.70.913/72.

    Por volta de 1973, mediante aquisies e fuses, a Telebrsreduzira o nmero de operadoras para trinta e sete, quase todas sob o seucontrole. Por meio do Decreto n. 74.379/74, a Telebrs foi designadaconcessionria geral para a explorao dos servios pblicos detelecomunicaes. Em linhas gerais, as operadoras controladas pelaTelebrs cuidavam da telefonia local e interestadual. A Embratel ficouencarregada de operar a rede bsica ligando os grandes centros urbanosbrasileiros, a telefonia internacional, a transmisso de dados e os serviosde telex.

    J na dcada de noventa, quando o governo federal definiu as etapasvisando reestruturao do Sistema Telebrs, este era formado por umaholding, a Telebrs, que controlava vinte e sete empresas estaduais oulocais, alm de uma operadora de longa distncia nacional e internacional (i.e., a Embratel).

    Havia, ainda, quatro empresas no controladas pela Unio: aCompanhia Rio-grandense de Telecomunicaes (CRT), do Governo doEstado do Rio Grande do Sul; os Servios de Comunicaes Telefnicas(Sercomtel), da Prefeitura de Londrina (Estado do Paran); as CentraisTelefnicas de Ribeiro Preto (Ceterp), da Prefeitura de Ribeiro Preto(Estado de So Paulo); e a Companhia de Telecomunicaes do BrasilCentral (CTBC), de capital privado e sediada em Uberlndia (sua rea deatuao estende-se pelo Tringulo Mineiro, nordeste de So Paulo, sul deGois e sudeste do Mato Grosso do Sul)8.

    A existncia dessas empresas no afetava a estruturamonopolizada do setor, pois atuavam dentro de reas geogrficasdelimitadas, sem concorrer com nenhuma outra operadora. Ademais,dependiam necessariamente daquelas ligadas Telebrs para integraremsuas redes locais e regionais ao sistema nacional de telecomunicaes.

    Esse modelo centralizado foi determinante para o desenvolvimentoda infra-estrutura de telecomunicaes no Brasil, que fora prejudicado, emlarga escala, pela existncia de um setor fragmentado e pouco regulado, noqual as decises econmicas ficavam a cargo de agentes que atuavam semnenhuma coordenao e de autoridades locais que no dispunham do

  • necessrio suporte tcnico.Ressalte-se, ainda, que at a Unio Federal efetivamente assumir

    os servios, o volume de investimentos era bastante insuficiente, tendoresultado em uma rede incapaz de atender demanda associada aodesenvolvimento de outros setores da economia. A presena estatal e osinvestimentos pblicos foram, portanto, os meios de superao daincapacidade de a iniciativa privada alocar ao setor os recursos necessrios.

    No momento da promulgao da Constituio de 1988, o modeloconstrudo em torno do monoplio estatal foi recepcionado e confirmado. Oart. 21, XI, no apenas atribuiu Unio a competncia para explorar osservios de telecomunicaes, mas expressamente estabeleceu que issodeveria ser feito de forma direta ou mediante empresas sob controleacionrio estatal.

    2.2.2 Privatizao e abertura do setor: do monoplio estatal concorrnciaprivada

    A mudana na forma de organizao das telecomunicaesbrasileiras se insere em um contexto mais amplo de reviso do papel doEstado. As polticas desenvolvimentistas no Brasil tradicionalmente sebasearam em aes tomadas a partir do Estado, o qual assumiu um papelnuclear na industrializao e no perodo ininterrupto de crescimentoeconmico que se verificou durante as dcadas de quarenta a oitenta.

    Com a crise fiscal dos anos 19809, verifica-se um crescenteesgotamento da capacidade de investir do Estado e uma inaptido parareverter a queda na taxa de crescimento econmico. Esse quadro foiagravado por um dficit pblico crescente, o qual, por sua vez, impulsionavao processo inflacionrio. Paralelamente crise fiscal, colocou-se umquestionamento quanto forma de atuao do Estado no domnioeconmico, a qual se estendia por praticamente todos os setores e tambmdava mostras de esgotamento.

    O programa de reforma do Estado brasileiro origina-se da busca dealternativas para o enfrentamento de uma crise fiscal, sendo marcadoinicialmente por uma estratgia de contnua improvisao (i. e., sem umaorientao clara e sistemtica quanto aos objetivos dessa reforma), naqual, porm, j se fazia presente o objetivo de retrao do aparato estatalsobre a economia10.A discusso sistemtica quanto ao papel que deveriadesempenhar o Estado (e a nova regulao a ser implementada) surgeapenas em um segundo momento, confirmando a opo de reorganizar aeconomia em torno do mercado. H, assim, uma definitiva ruptura com o

  • modelo anterior de regulao e de desenvolvimento impulsionado peloEstado.

    Conforme consta do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado,preparado pelo Ministrio da Administrao Federal e da Reforma do Estadoem 1995, o objetivo visado era o fortalecimento da funo estatal depromotor e regulador do desenvolvimento econmico e social, deixando,porm, de ser o Poder Pblico o responsvel direto por ele. Nesse sentido,colocar-se-iam como inadiveis reformas econmicas orientadas para omercado, que, acompanhadas de uma poltica industrial e tecnolgica,[garantissem] a concorrncia interna e [criassem] as condies para oenfrentamento da competio internacional.

    O novo modelo de regulao das telecomunicaes ir refletir taispremissas. Baseou-se no propsito de conferir maior espao de atuao aosagentes privados (e reduo, por meio da privatizao, da prestao diretados servios por empresas estatais), assim como na tentativa de garantir aimposio de limites ao poder econmico (transferido a particulares noprocesso de privatizao) mediante o fortalecimento dos mecanismos demercado (i. e., da concorrncia).

    O primeiro marco normativo de implementao do novo modelo foia Emenda Constitucional n. 8/95, que alterou a redao do art. 21, XI. Foielaborada com o claro propsito de permitir a reestruturao do setor detelecomunicaes com base na quebra do monoplio pblico e passagempara um regime de mercado. Viabilizou, ainda, as privatizaes, na medidaem que retirou a exigncia de que os servios de telecomunicaes fossemprestados por empresas sob controle estatal. Dando seqncia a esseprocesso, promulgao da aludida emenda seguiu-se a Lei n. 9.295, de 19de julho de 1996.

    Esta foi direcionada, antes mesmo de qualquer definio maisconcreta quanto ao novo modelo que se buscava, a abrir concorrnciaalguns segmentos tidos como de alta atratividade para o setor privado. Sobessa lei foram feitas licitaes para a concesso da explorao dadenominada Banda B do ento denominado Servio Mvel Celular (SMC). Nostermos do art. 3 desse diploma, a explorao seria feita apenas por meiode concesses. Optou o legislador, conseqentemente, por um regime deservio pblico.

    A Lei n. 9.295/96 disciplinou, tambm, a prestao do SMC peloSistema Telebrs (i. e., pelo conjunto de operadoras controladas pela UnioFederal, as quais praticamente detinham o monoplio sobre os servios detelecomunicaes). As operadoras estaduais e locais j vinham atuandonesse mercado com base em permisses. A lei determinou que taispermisses fossem transformadas em concesses (art. 4), devendo as

  • respectivas operadoras constituir empresas especficas para a exploraodesses servios (art. 4, pargrafo nico, e 5).

    Houve, com base nisso, uma duplicao das operadoras regionaissob o controle da Telebrs, as quais passaram a operar a denominadaBanda A do SMC em regime de concesso. Posteriormente, vieram a serprivatizadas junto com todo o Sistema Telebrs. Nesse primeiro momentoda abertura do setor, portanto, institui-se um duoplio em relao telefonia mvel11.

    No tocante s empresas do Sistema Telebrs, cabe destacar queno houve propriamente a outorga de uma concesso, visto que asatividades continuaram a ser prestadas e controladas pelo prprio Estadoem regime de servio pblico. Conforme posio adotada por GeraldoAtaliba, a qual acabou por modificar substancialmente o entendimentoprevalecente na doutrina brasileira, no h uma relao entre concedente econcessionrio quando este houver sido criado pelo titular do servio, comcapitais prprios12.

    Efetivamente no h uma concesso quando a atividade no sai daesfera imediata de controle estatal, tampouco se verifica a transfernciados seus riscos, os quais continuam sendo assumidos pelo Poder Pblico,que despendeu os recursos necessrios constituio da respectivaempresa13. Apesar de haver uma descentralizao administrativa, o PoderPblico continuar controlando diretamente a organizao e a prestao dosservios14.

    A Lei n. 9.295/96 foi praticamente inteira revogada pela Lei Geral deTelecomunicaes (LGT, Lei n. 9.472/97), a qual procurou organizar deforma ampla e sistemtica o novo modelo institucional dastelecomunicaes. Disciplinou os regimes de prestao dos servios, acriao da Anatel e a privatizao do Sistema Telebrs.

    O art. 18, III, da LGT estabeleceu a necessidade de o PoderExecutivo aprovar um plano geral de outorgas de servio prestado noregime pblico (PGO). Sua finalidade, segundo o art. 84, seria definir a reade atuao das operadoras, o nmero delas, os prazos de vigncia dasconcesses e o de admisso de novas prestadoras. Sua elaborao coube,nos termos do art. 19, III, Anatel mediante prvia consulta pblica.

    Uma vez instalada a Anatel15, a elaborao desse plano colocava-secomo o passo seguinte do processo de liberalizao e privatizao. O art.187 da LGT autorizou o Poder Executivo a reestruturar e desestatizar asempresas controladas pela Unio. Nos termos do art. 188, essareestruturao deveria ser feita com vistas a compatibilizar as reas de

  • atuao das empresas com o PGO.Em 4 de dezembro de 1997, o Conselho Diretor da Anatel submeteu

    consulta pblica uma primeira verso do PGO (Consulta Pblica 2). Averso final sofreu poucas mudanas e foi aprovada pelo Decreto n. 2.534,de 2 de abril de 1998. O servio enquadrado no regime pblico foi apenasaquele assim j classificado pela prpria LGT (i. e., o Servio TelefnicoFixo Comutado STFC, de qualquer mbito, destinado ao uso do pblico emgeral; cf. art. 64, pargrafo nico, da LGT). Todos os demais,conseqentemente, deveriam ser prestados em regime privado.

    O PGO dividiu o territrio nacional em quatro regies e trinta equatro setores. Cada um destes foi delimitado pela rea de atuao dasoperadoras at ento controladas pela Telebrs, alm das outras quatroempresas independentes16. Esses setores so distribudos em trs Regiesgeogrficas17, sendo que a denominada Regio IV congrega todo o territrionacional, correspondendo rea de atuao da Embratel.

    Conforme o art. 207 da LGT, as operadoras que j atuavam emcada um dos setores deveriam pleitear a celebrao de contratos deconcesso que passariam a regular a atuao delas nos termos do PGO.Dentro dos seus respectivos setores nas Regies I, II e III, as operadorasficaram habilitadas a prestar servios locais e de longa distncia no mbitoda prpria regio. Embratel, com atuao em todo o territrio nacional,coube a prestao de servios de longa distncia nacional (no limitado aointra-regional) e internacional.

    No PGO tambm ficou estabelecido o cronograma de abertura domercado de telefonia fixa. Aps a privatizao deveria ser instaurado umprocedimento licitatrio para a expedio de autorizaes a fim de que umnovo prestador viesse a atuar no regime privado em cada uma dasreferidas regies. As empresas que receberam essas autorizaes ficaramconhecidas como empresas-espelho18.

    Instaurou-se, assim, a exemplo do que ocorrera com a telefoniamvel, um regime temporrio de concorrncia entre um nmero limitado deempresas, cuja data-limite, pelo menos no plano jurdico, era 31 dedezembro de 2001, quando deixou de haver qualquer restrio quantidadede empresas prestadoras do STFC. Destaque-se, tambm, que o STFC seriaprestado concomitantemente no regime pblico e no privado. No mbito doprimeiro, colocaram-se, em princpio, apenas as operadoras que j atuavamna prestao do servio em regime de monoplio. Todas as demaisempresas que viessem a ingressar no mercado de telefonia estariamsubmetidas a um regime privado.

    Subseqentemente aprovao do PGO, e tomando-o como base, o

  • Decreto n. 2.546, de 14 de abril de 1998, aprovou o modelo dereestruturao do Sistema Telebrs, com vistas poster ior privatizao.Nesse momento, importante lembrar, a Telebrs j no controlava apenasas operadoras de telefonia fixa, mas tambm as empresas que exploravama telefonia mvel e que foram constitudas nos termos do art. 5 da Lei n.9.295/96.

    O modelo baseou-se na ciso da Telebrs em doze empresas,tambm holdings, que passaram a controlar as respectivas operadoras.Foram constitudas quatro empresas para a telefonia fixa (controladorasdas operadoras que integravam, respectivamente, as Regies I, II, III e IVdo PGO) e oito empresas para a telefonia mvel.

    A privatizao foi feita por meio da alienao onerosa das aes depropriedade da Unio, que lhe asseguravam o controle acionrio dessas dozeempresas. Foi vedada a aquisio, por um mesmo acionista ou grupo deacionistas, de participao maior ou igual a 20%: (i) em mais de uma dasquatro empresas de telefonia fixa; (ii) em mais de uma das empresas queintegravam as reas de concesso 1 a 6 da Banda A; (iii) em mais de umadas empresas que integravam as reas de concesso 7 a 10 da Banda A;(iv) em qualquer das empresas de telefonia mvel em rea territorial ondej detivesse concesso para o mesmo servio na Banda B (cf. art. 7, Dec.n. 2.546/98).

    Como mencionado acima, as empresas privatizadas assinaram,antes do incio do processo de privatizao, contratos de concesso nostermos do art. 207 da LGT. Estes foram mantidos em todos os seustermos com a alienao do controle acionrio pela Unio19.

    2.2.3 A evoluo do setor aps a privatizao

    Nos anos subseqentes privatizao, o setor continuou dominadopelas empresas formadas a partir da Telebrs, pelo menos no mbito doSTFC (cuja infra-estrutura tambm o principal suporte para a prestaode outros servios, como o de transmisso de dados). Em cada uma dastrs regies em que foi dividido o Pas, a concorrncia evoluiu apenas emrelao aos servios de longa distncia, sendo que nos servios e redeslocais ainda h a preponderncia das concessionrias privatizadas (agoraoperando sob as denominaes de Telemar/Oi Regio I, Brasil Telecom Regio II e Telefonica Regio III).

    A concorrncia nos servios de longa distncia, em cada regio, d-se principalmente entre a Embratel e a concessionria que atua na regio,com participao menor da espelho da Embratel (a Intelig) e outras

  • empresas de porte mais reduzido. As empresas-espelho especficas a cadauma das regies no tiveram um impacto significativo nos anosimediatamente subseqentes privatizao. A GVT, que atua na Regio II,continua operando e em expanso. A Vsper, porm, que recebeu aautorizao para as Regies I e III acabou por ser vendida Embratel em200320.

    Aps a abertura plena do setor (i. e., o fim do duoplio legal),tambm houve pouca entrada relevante no mbito local. H um nmero atexpressivo de empresas que detm autorizao, as quais, contudo,normalmente exploram alguns nichos de mercado e no representam umapresso concorrencial efetiva s concessionrias21. Na verdade, foram asconcessionrias que expandiram sua rea de atuao aps a privatizao,passando a atuar na prestao de outros servios de telecomunicaes eem outras reas geogrficas.

    Nos termos do PGO, as concessionrias privatizadas s poderiamsolicitar autorizao para prestar outros tipos de servio a partir de 31 dedezembro de 2003 ou, antes disso, a partir de 31 de dezembro de 2001,quando todas as concessionrias da Regio houvessem cumpridointegralmente as obrigaes de universalizao e expanso que, segundoseus contratos de concesso, deveriam cumprir at 31 de dezembro de200322. Houve, de fato, o reconhecimento pela Anatel do adiantamento documprimento dessas metas, o que permitiu, a partir de 2002, a expanso darea de atuao das concessionrias.

    Os grupos econmicos das trs concessionrias regionais, alm deatuarem na prestao do STFC e de servios de transmisso de dados,tambm oferecem servios de telefonia mvel. So bastante ativos, ainda,no mercado em expanso de oferta de acesso Internet em banda larga (oqual no Brasil dominado por esses grupos)23. Atualmente buscamingressar na oferta do chamado triple play, caracterizado pela vendaagregada de servios de voz (telefonia), de transmisso de dados (acessoem banda larga Internet) e de contedo audiovisual (televiso).

    Isso implica, para as concessionrias de STFC, o desenvolvimentode estratgias que permitam a oferta de servios de televiso, mbito emque tradicionalmente no atuaram. H, basicamente, trs formas possveisde fazer isso. A primeira seria por meio da construo de uma rede prpriapara servios de televiso por assinatura24. Outra opo seria realizar adistribuio de contedo audiovisual por meio da prpria Internet (achamada TVIP), o que uma possibilidade ainda limitada25. A ltimaforma, que efetivamente foi adotada, a concentrao por meio de

  • aquisies. De fato, Telemar/Oi e Telefonica adquiriram ou firmaramparcerias com empresas que j detinham redes de televiso por assinaturapara viabilizar seu ingresso no mercado de distribuio de contedoaudiovisual26.

    A Embratel, por sua vez, divisou na oferta agregada de pacotestriple play a possibilidade de ingressar na prestao dos servios locais devoz para usurios residenciais. Conjuntamente com a rede Net de televisopor assinatura, utiliza a capacidade de transmisso de dados da infra-estrutura da rede de televiso para disponibilizar um servio de voz viaInternet (VoIP). Esse servio oferecido pela Net em conjunto com os deacesso em banda larga Internet e de televiso27. Embora isso impacte aconcorrncia no mbito do servio de voz local, representa uma alternativaainda limitada fora da oferta de pacotes triple play, tendo em vista a baixapenetrao das redes de televiso por assinatura no Brasil28.

    Em relao ao servio de telefonia mvel, a concorrncia muitomais expressiva. Alm dos grupos que se formaram a partir do duopliodas Bandas A e B, as prprias concessionrias de STFC, como dito,expandiram suas atividades para o servio mvel. No primeiro trimestre de2007, 47,6% da populao brasileira tinha a opo de escolher entre osservios de quatro prestadoras diferentes. Em virtude da prpriaconcorrncia (e conseqente reduo de preos) e da oferta dos serviospr-pagos, a expanso desse servio foi rpida e alcanou o nmero de102,2 milhes de linhas no primeiro trimestre de 200729.

    2.3 Universalizao e concorrncia na reforma do setor detelecomunicaes

    A traduo jurdica e normativa da reforma do setor detelecomunicaes descrita acima, cujo principal marco legal a LGT, estna tenso e complementaridade entre dois princpios fundamentais:concorrncia e universalizao.

    O primeiro reflete a idia de superao de uma organizao setorialbaseada no monoplio (estatal), assim como de um tipo de atuao estatalintervencionista que lhe era prpria e que buscava, a partir de uma relaode hierarquia entre administrao pblica e agente econmico, fixardiretamente as principais variveis econmicas (preo a ser cobrado,investimentos a serem feitos, inovaes a serem introduzidas). Diante doesgotamento dessa forma de atuao do Poder Pblico sobre a economia,

  • marcada pela centralizao do processo decisrio (e, por conseguinte, doprocesso de coleta e anlise das informaes necessri