Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

120
1 DIREITO PENAL: CONCEITO E FINALIDADE Sob o aspecto formal, direito penal é o conjunto de normas que qualifica certos comportamentos humanos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções a ser-lhes aplicadas. Já sob o enfoque sociológico (doutrina moderna), direito penal é mais um instrumento (ao lado dos demais ramos do direito) de controle social de comportamentos desviados, visando assegurar a necessária disciplina social, bem como a convivência harmônica entre os membros do seu grupo. OBS: O direito penal deve ser a ultima ratio Princípio da intervenção mínima. Os funcionalismos (funcionalismo teleológico e funcionalismo sistêmico) discutem a função do direito penal. O funcionalismo teleológico tem como defensor Roxin; já o sistêmico é defendido por Jakobs. A função do direito penal é assegurar bens jurídicos indispensáveis, valendo-se das medidas de política criminal ( Roxin). A função do direito penal é resguardar a norma, o sistema, o direito posto, atrelado aos fins da pena ( Jakobs). Ex: Furto de uma caneta BIC. Para Roxin, aplica-se o princípio da insignificância. Para Jakobs, não

Transcript of Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

Page 1: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

1

DIREITO PENAL: CONCEITO E FINALIDADE

Sob o aspecto formal, direito penal é o conjunto de normas que qualifica certos comportamentos humanos como infrações penais, define os seus agentes e fixa as sanções a ser-lhes aplicadas.

Já sob o enfoque sociológico (doutrina moderna), direito penal é mais um instrumento (ao lado dos demais ramos do direito) de controle social de comportamentos desviados, visando assegurar a necessária disciplina social, bem como a convivência harmônica entre os membros do seu grupo.

OBS: O direito penal deve ser a ultima ratio Princípio da intervenção mínima.

Os funcionalismos (funcionalismo teleológico e funcionalismo sistêmico) discutem a função do direito penal. O funcionalismo teleológico tem como defensor Roxin; já o sistêmico é defendido por Jakobs.

A função do direito penal é assegurar bens jurídicos indispensáveis, valendo-se das medidas de política criminal (Roxin).

A função do direito penal é resguardar a norma, o sistema, o direito posto, atrelado aos fins da pena (Jakobs).

Ex: Furto de uma caneta BIC. Para Roxin, aplica-se o princípio da insignificância. Para Jakobs, não (tal prática deve ser tratada como crime – direito penal do inimigo).

Alguns autores diferenciam, ainda, o direito penal objetivo e o direito penal subjetivo. O direito penal objetivo seria o conjunto de leis penais em vigor no país (ex: o CP). Já o direito penal subjetivo seria o direito de punir (jus puniendi) do Estado.

Ora, o direito penal objetivo é expressão ou emanação do direito penal subjetivo. Um não vive sem o outro.

OBS: O poder punitivo do Estado é LIMITADO:

a) Limitação temporal: prescrição (exemplo). b) Limitação espacial: art. 5º CP (princípio da territorialidade).

Page 2: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

2

c) Limitação modal: princípio da dignidade da pessoa humana (esse princípio não encontra exceções).

O poder punitivo é monopólio do Estado (regra). Exceção (tolerada pelo Estado): art. 57 da Lei 6.001/73 (Estatuto do Índio).

Art. 57. Será tolerada a aplicação, pelos grupos tribais, de acordo com as instituições próprias, de sanções penais ou disciplinares contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel ou infamante, proibida em qualquer caso a pena de morte.

FONTES (origem jurídica) DO DIREITO PENAL

1) Fonte material (ou de produção ou de criação): órgão encarregado da criação do direito penal. Em regra, somente a União está autorizada a produzir, a criar direito penal (exceção: art. 22 parágrafo único da CF).

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

Parágrafo único. Lei complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo.

2) Fonte formal (ou de revelação ou de divulgação): processo de exteriorização da fonte material.

Doutrina clássica Doutrina moderna1. Imediata – Lei.2. Mediata –

Costumes, princípios gerais de direito.

1. Imediata: De direito penal

incriminador (Lei e atos administrativos complementares de normas penais em branco).

De direito penal não incriminador (Constituição,

Page 3: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

3

Tratados Internacionais, Lei e Jurisprudência – por causa das súmulas vinculantes).

2. Mediata: Costumes, princípios gerais de direito.

OBS: Qual é o status dos Tratados Internacionais (de acordo com a tendência do STF)?

Tratados Internacionais ratificados antes da EC 45 (e após a CF/88):

Tratados Internacionais ratificados depois da EC 45:

Min. Celso de Mello: norma constitucional – direitos humanos (Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de São José da Costa Rica).

Min. Gilmar Mendes:- Direitos Humanos: Quórum qualificado = norma constitucional. Quórum simples = supra legal.- Não referente a direitos humanos: Quórum qualificado = legal. Quórum simples = legal.

Fontes mediatas (costumes e princípios gerais de direito):

Costumes: espécie de fonte formal mediata, consistente nos comportamentos uniformes e constantes pela convicção de sua obrigatoriedade e necessidade jurídica. Jamais um costume será incriminador.

OBS: Mas, o costume pode revogar infração penal?

1ª corrente (majoritária): Não. De acordo com a LICC, aplicável ao CP, a Lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.

2ª corrente (minoritária – Luiz Flávio Gomes): Sim. É perfeitamente possível o costume revogador em caso de perda de eficácia social. Ex: Jogo do bicho (para a 2ª corrente).

Page 4: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

4

No direito penal, a relevância está no costume interpretativo (ex: art. 155 p. 1º CP).

Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.

Princípios gerais de direito: direito que vive na consciência comum de um povo. Esses princípios podem ser positivados ou não.

INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL

A finalidade da interpretação é extrair da norma o seu real significado.

Quanto à origem (sujeito que interpreta):

1. Autêntica ou legislativa: a interpretação é dada pela própria lei (ex: art. 327 CP).

Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.

§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.  

§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.

2. Doutrinária ou científica: a interpretação é dada pelos estudiosos.

3. Jurisprudencial: fruto das decisões reiteradas dos nossos tribunais.

OBS: Súmulas Vinculantes (interpretações que vinculam o Judiciário).

Page 5: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

5

Art. 103-A da CF. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.

§ 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.

§ 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.

§ 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.

OBS: Onde se encontra a exposição de motivos do CP? A doutrina majoritária leciona que essa interpretação é elaborada pelos estudiosos que participaram da elaboração da norma, ou seja, é doutrinária ou científica (entendimento de Rogério Greco e Flávio Monteiro de Barros).

Quanto ao modo:

1. Gramatical: leva em conta o sentido literal das palavras.2. Teleológica: indaga-se a vontade ou intenção objetivada na

lei.3. Histórica: procura-se a origem da lei.

Page 6: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

6

4. Sistemática: a lei é interpretada com o conjunto da legislação ou mesmo considerando os princípios gerais de direito (essa é a mais utilizada).

Quanto ao resultado (isso é o que mais interessa):

1. Declarativa: a letra da lei corresponde exatamente àquilo que o legislador quis dizer.

2. Extensiva: amplia-se o alcance das palavras para se alcançar a vontade do texto. Para Rogério Sanches, o direito penal brasileiro admite, excepcionalmente, interpretação extensiva contra o réu (ex: art. 157 p. 2º I CP).

Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:

§ 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade:

I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;

Arma, no seu sentido próprio, é todo instrumento fabricado com finalidade bélica. Já no seu sentido impróprio, arma pode ser todo o instrumento com ou sem finalidade bélica, mas que serve ao ataque ou defesa (ESSA É A INTERPRETAÇÃO – EXTENSIVA – QUE PREDOMINA NO BRASIL). Mas, há doutrinadores que não admitem interpretação extensiva contra o réu (a exemplo de César Roberto Bittencourt).

OBS: Interpretação analógica não se confunde com interpretação extensiva. Na interpretação analógica, o resultado que se busca é extraído do próprio dispositivo, que, depois de enunciar exemplos, encerra de forma genérica, permitindo ao intérprete encontrar outros casos (ex: art. 121 p. 2º I, III e IV). NA INTERPRETAÇÃO ANALÓGICA É POSSÍVEL INTERPRETAÇÃO CONTRA O RÉU!

Art. 121. Matar alguém:

§ 2° Se o homicídio é cometido:

Page 7: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

7

I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe;

III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;

IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido;

Já a analogia é regra de integração, e não de interpretação. Nesse caso, ao contrário dos anteriores, partimos do pressuposto de que não existe uma lei a ser aplicada ao caso concreto, motivo pelo qual se socorre daquilo que o legislador previu para outro similar. A ANALOGIA SÓ PODE SER IN BONAM PARTEM!

3. Restritiva: reduz-se o alcance das palavras para corresponder à vontade do texto.

4. Progressiva (ou adaptativa ou evolutiva): aqui se exige do intérprete uma atualização dos diplomas normativos diante do avanço das ciências. Ex: para Rogério Greco, um transexual pode ser vítima de estupro, caso altere seu registro civil.

Princípios Gerais do Direito Penal

Princípios relacionados com a missão fundamental do Direito Penal

Princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos: o direito penal, para ser utilizado de forma legítima, deve ter como missão proteger os bens jurídicos mais relevantes do homem.

Princípio da intervenção mínima: o direito penal está legitimado a agir quando houver o fracasso dos demais ramos do direito, acrescido da relevante lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado.

Características: subsidiariedade (o direito penal intervém em abstrato somente quando ineficazes os demais ramos do direito – “ultima ratio”) e fragmentariedade (o direito penal intervém em

Page 8: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

8

concreto somente quando houver relevante lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado).

OBS: O princípio da intervenção mínima não serve apenas para tipificar comportamentos, mas também para abolir a criminalização de comportamentos (ex: adultério).

Princípio da insignificância: O STF tem analisado o princípio da insignificância não sob a ótica do agente, mas do ponto de vista da realidade econômica do país (Min. Carlos Brito).

OBS: Para uma parte do STJ, o princípio da insignificância não se aplica ao criminoso habitual. Mas, há no STJ uma 2ª corrente que diz que o princípio da insignificância independe de características subjetivas do agente. Não é possível dizer qual prevalece...

Princípios relacionados com o fato do agente

Princípio da exteriorização ou da materialização do fato: O Estado só pode incriminar penalmente condutas humanas voluntárias, isto é, fatos (direito penal do fato, sem esquecer as características do autor, para fins de individualização da pena). Esse princípio está positivado no art. 2º do CP.

Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.

Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

Princípio da legalidade:

Art. 1º do CP - Não há crime (infração penal – abrange crime e contravenção penal – o CP se aplica subsidiariamente à LCP – interpretação moderna / garantista) sem lei anterior que o defina. Não há pena (também medida de segurança 1ª corrente (Francisco de Assis Toledo): não concorda, pois considerando a finalidade curativa da medida de segurança, não está submissa ao princípio da legalidade. Pode-se criar medida de segurança por decreto, medida provisória etc.; 2ª corrente (majoritária): sendo

Page 9: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

9

uma espécie de sanção penal, submete-se também ao princípio da legalidade – onde está escrito pena, essa corrente lê sanção penal ) sem prévia cominação legal.

O citado dispositivo constitui uma real limitação estatal de interferência na esfera de liberdade individual.

Este princípio também está expresso no art. 5º XXXIX da CF, in verbis:

Art. 5º XXXIX CF - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

E está previsto também no art. 9º da Convenção Americana de Direitos Humanos.

OBS: Qual é a origem histórica do princípio da legalidade? Uma 1ª corrente diz que é o Direito Romano. Uma 2ª corrente entende que é a Carta de João Sem Terra. O Direito Penal brasileiro, majoritariamente, entende que é o iluminismo / Revolução Francesa.

OBS: Princípio da legalidade é sinônimo de reserva legal? 1ª Corrente: princípio da legalidade é sinônimo de reserva legal (essa corrente entende Lei em sentido amplo). 2ª Corrente (Flávio Monteiro de Barros): princípio da legalidade não se confunde com reserva legal (essa corrente entende Lei em sentido estrito). 3ª corrente (Fernando Capez e doutrina majoritária): Princípio da Legalidade = reserva legal + anterioridade. Então o art. 1º CP seria uma previsão do princípio da legalidade.

Esse princípio é a viga mestra do garantismo (através do garantismo: ampliação das garantias e mitigação do poder punitivo do Estado):

a) Não há crime sem lei (sentido restrito – não abrange, por exemplo, as Medidas Provisórias). Mas, MP pode, ao invés de criar crime, legislar sobre direito penal não incriminador? 1ª corrente (majoritária): Interpretando

Page 10: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

10

gramaticalmente o art. 62 p. 1º I b CF, MP não pode tratar de qualquer assunto de Direito Penal. 2ª corrente (Luiz Flávio Gomes): admite-se MP para tratar de direito penal não incriminador. Ex: todo mundo viu e ninguém falou nada sobre a MP do estatuto do desarmamento, convertida em lei (inclusive o STJ e o STF admitiram).

b) Essa lei precisa ser anterior aos fatos que busca incriminar. OBS: a retroatividade benéfica é possível.

c) Essa lei anterior precisa ser escrita (proibição do costume incriminador – mas é possível costume interpretativo).

d) Essa lei anterior e escrita precisa ser estrita (proibição da analogia incriminadora – é plenamente possível a analogia in bonam partem).

e) Essa lei anterior, escrita e estrita precisa ser certa (de fácil compreensão / entendimento): é daqui que deriva o princípio da taxativa ou mandato de certeza.

f) Essa lei anterior, escrita, estrita e certa precisa, também, ser necessária (desdobramento lógico do princípio da intervenção mínima).

OBS: Existe norma que contém a pena determinada, porém seu preceito primário (seu conteúdo) permanece indeterminado, dependendo para sua exeqüibilidade de complementação de outra norma ou ato administrativo (enquanto não complementada, a norma não tem eficácia). É a chamada norma penal em branco. Esse tipo de norma é compatível com o princípio da legalidade? Sim, pois apesar de ser indeterminada e, aparentemente, violar o princípio da taxatividade, a norma não tem eficácia até haver complementação.

OBS: Espécies de norma penal em branco:

1) Norma penal em branco homogênea (ou em sentido amplo): lei complementa lei (mesma espécie normativa).

Homóloga ou homovitelínea: mesmo estatuto (ex: art. 327 CP).

Heteróloga ou heterovitelínea: estatutos diferentes.2) Norma penal em branco heterogênea (ou em sentido

estrito): lei complementada por espécie normativa diversa da

Page 11: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

11

lei, como, por exemplo, uma portaria (ex: Lei de Drogas – drogas são previstas em portaria do Ministério da Saúde).

OBS: Norma penal em branco heterogênea é constitucional? Rogério Greco entende que a norma penal em branco em sentido estrito é inconstitucional, porque quem está dando o seu conteúdo não é o legislador, mas o executivo (o executivo estaria usurpando a função do legislador). Mas, a doutrina majoritária entende que foi o legislativo que deu essa autorização ao executivo, até porque, no exemplo das drogas, é impossível ao legislador prever todas as possibilidades (cada vez que surgisse uma droga nova, o legislador teria que acrescentar na lei – processo legislativo...).

3) Norma penal em branco ao revés ou invertida: norma penal em branco invertida. Nesse caso, o complemento normativo diz respeito à sanção, e não ao conteúdo proibido, que está determinado (ex: genocídio – Lei 2.889/56).

OBS: A norma penal em branco invertida só pode ter como complemento uma lei, nunca um ato administrativo (um ato administrativo não poderia estabelecer sanções penais)!

Fundamentos do princípio da legalidade:

1) Fundamento político: impede o poder punitivo com base no livre arbítrio.

2) Fundamento democrático: o parlamento, representante do povo, deve ser o responsável pela criação de crimes.

3) Fundamento jurídico: uma lei prévia e clara produz importante efeito intimidativo.

Princípio da ofensividade (ou da lesividade): Para que ocorra a infração penal é imprescindível efetiva lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado.

Crimes de perigo abstrato (o perigo não precisa ser comprovado, pois presumido absolutamente por lei). Crimes de perigo concreto

Page 12: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

12

(o perigo precisa ser comprovado) determinado (a alguém) ou indeterminado (carece de vítima certa).

Adotando-se o princípio da ofensividade, os crimes de perigo abstrato passam a não mais ser recepcionados pela Constituição Federal (aliás, os crimes de perigo abstrato também ferem o princípio da ampla defesa).

OBS: O STF considera que o emprego de arma desmuniciada é fato atípico (aplicação do princípio da ofensividade ou lesividade).

Princípios relacionados com o agente do fato

Princípio da responsabilidade pessoal: Proibi-se o castigo (responsabilidade) penal pelo fato de outrem. Proibi-se também o castigo coletivo.

Art. 29 do CP – Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

Exemplo de ofensa a esse princípio: No crime de sonegação fiscal, o MP tem o péssimo hábito de denunciar todos os sócios da empresa.

Princípio da responsabilidade penal subjetiva: Não basta que o fato seja materialmente causado pelo agente, só podendo ser responsabilizado se o fato foi querido, aceito ou era previsível. Ou seja, não há responsabilidade penal sem dolo ou culpa.

OBS: Há dois dispositivos no CP que, se não fossem corrigidos pela doutrina, preveriam a responsabilidade penal objetiva no direito brasileiro (resquícios de responsabilidade penal objetiva no direito brasileiro).

a) Embriaguez não acidental completa.b) Rixa (art. 137 parágrafo único).

Art. 137 - Participar de rixa, salvo para separar os contendores:

Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.

Parágrafo único - Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza

Page 13: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

13

grave, aplica-se, pelo fato da participação na rixa, a pena de detenção, de seis meses a dois anos.

Princípio da culpabilidade: não há responsabilidade penal sem um agente capaz, com potencial consciência da ilicitude, sendo dele exigível conduta diversa (esse princípio é extraído dos elementos da culpabilidade).

Princípio da igualdade: Previsão no art. 5º caput da CF e no art. 24 da Convenção Americana de Direitos Humanos.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

Essa igualdade não é apenas formal, mas substancial (deve-se tratar os iguais de maneira igual e os desiguais de maneira desigual na medida de sua desigualdade).

Exemplo: Art. 117 da LEP:

Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de:

I - condenado maior de 70 (setenta) anos;

II - condenado acometido de doença grave;

III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental (esse inciso merece interpretação constitucional – obedecendo ao princípio da isonomia – devendo ter interpretação extensiva aos condenados cujos filhos menores deles dependam);

IV - condenada gestante.

Princípio da presunção de inocência: Esse princípio possui guarida constitucional (art. 5º LVII).

Page 14: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

14

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

O STF, atento à redação do dispositivo constitucional, tem preferido denominar este princípio de “princípio da não-culpabilidade”, que é mais compatível com o nosso sistema – até pela própria redação do dispositivo supramencionado (ex: prisões cautelares).

O art. 8º item 2 da Convenção Americana de Direitos Humanos SIM, traz efetivamente o princípio da presunção de inocência.

Conseqüências desse princípio:

1) Prisão somente após condenação definitiva (prisão provisória exige imprescindibilidade – é exceção);

Art. 312 do CPP. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência (conveniência não é sinônimo de imprescindibilidade – crítica de Vicente Greco) da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

STJ Súmula nº 9 - A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência.

2) A responsabilidade penal do acusado deve ser comprovada pelo órgão de acusação;

3) O princípio da presunção de inocência é o que fomenta o “in dubio pro reo” (esse princípio foi criado no âmbito do processo penal – provas – mas já foi democratizado – para não dizer banalizado -, sendo inclusive utilizado para dirimir conflitos de normas).

Princípios relacionados com a pena:

Page 15: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

15

Princípio da proibição da pena indigna: a ninguém pode ser imposta uma pena ofensiva à sua dignidade (à dignidade humana). Esse princípio tem previsão na Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 5º item 1).

Princípio da humanidade ou humanização das penas: nenhuma pena pode ser desumana, cruel ou degradante. Também tem previsão na Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 5º item 2), além de previsão constitucional.

Princípio da proporcionalidade: Também tem guarida constitucional (trata-se de um princípio implícito no texto constitucional), e diz que a pena deve ser proporcional à gravidade da infração, sem desconsiderar as qualidades do agente. Esse princípio deve ser observado nos seguintes momentos:

a) Legislativo (cominação da pena em abstrato – prevenção geral);

b) Judicial (aplicação da pena em concreto);c) Execução da pena.

Princípio da pessoalidade da pena: Esse princípio tem guarida constitucional (art. 5º XLV).

XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;

Esse princípio é absoluto ou relativo?

a) 1ª corrente (Flávio Monteiro de Barros): Relativo (exceção prevista no próprio dispositivo constitucional – 2ª parte – a pena de confisco passa da pessoa do condenado).

b) 2ª corrente (majoritária na doutrina): Absoluto. É tão absoluto que a Convenção Americana de Direitos Humanos não prevê qualquer exceção para sua aplicação. A 2ª parte do dispositivo constitucional mencionado não representa pena, mas EFEITOS da pena.

Page 16: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

16

Princípio da vedação do “ bis in idem ” : ninguém pode ser punido mais de uma vez pela prática de um mesmo ato. Vejamos o art. 61 do CP:

Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem ou qualificam o crime:

I - a reincidência (Luiz Flávio Gomes, Paulo Rangel e Paulo Queiroz acham que a reincidência é um exemplo claro de “bis in idem” A maioria discorda, lecionando que a reincidência é uma circunstancia necessária para a individualização da pena);

Lei penal no tempo

A lei nasce para regular os fatos praticados durante a sua vigência.

Em regra, no direito penal (assim como no processo penal) vigora o tempus regit actum ou irretroatividade da lei.

Quando no tempo, o crime se considera praticado?

a) Teoria da atividade: No tempo da conduta.b) Teoria do resultado: No tempo da consumação, ainda que

outro seja o da atividade.c) Teoria mista: Teoria da atividade + teoria do resultado.

O CP adotou a teoria da atividade (art. 4º CP).

Art. 4º - Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.

OBS: Questão do horário de verão: Segundo o STJ, o horário de verão é transitório, fictício e possui finalidade de economizar energia. Portanto, aplica-se o ECA ao delinqüente que acabou de completar 18 anos em horário de verão (essa é a posição, por exemplo, de Guilherme de Souza Nucci e da jurisprudência majoritária).

Sucessão de lei penal no tempo: Regra = irretroatividade (art. 1º CP).

Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.

Page 17: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

17

Mas, há exceções (art. 2º e 3º CP):

Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória (abolitio criminis – supressão da figura criminosa).

Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado (retroatividade da lei penal mais benéfica).

Art. 3º - A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.

Situações:

1) Quanto da prática do fato = fato atípico. Mas, lei posterior passou a considerá-lo crime. Irretroatividade.

2) Quanto da prática do fato = crime. Mas, lei posterior aboliu o crime. Retroatividade.

3) Quando da prática do fato = crime. Mas, lei posterior diminuiu a pena. Retroatividade.

4) Quando da prática do fato = crime. Mas, lei posterior aumentou a pena. Irretroatividade.

OBS: Qual é a natureza jurídica da abolitio criminis (art. 2º CP)? A 1ª corrente diz que é uma hipótese de exclusão da tipicidade (Flávio Monteiro de Barros). Já a 2ª corrente pensa que exclui a punibilidade (teoria adotada pelo CP).

OBS: Lei abolicionista não respeita a coisa julgada (mesmo a coisa julgada sendo uma garantia fundamental – proteção da pessoa humana individualmente considerada).

OBS: Essa condenação pode ser executada no cível, mesmo que abolido o crime.

Page 18: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

18

OBS: Lei abolicionista retroage no período de vacatio legis? 1ª corrente (majoritária): Lei abolicionista não retroage na vacatio, pois desprovida de eficácia jurídica e social. 2ª corrente (minoritária): Considerando a finalidade da vacatio, a lei pode, se mais benéfica, retroagir nesse estado, desde que o seu destinatário demonstre conhecimento.

OBS: Como tratar a sucessão da lei penal no tempo e a continuidade delitiva? O art. 71 do CP diz que, por uma ficção jurídica, só há um furto. Conseqüentemente, só há uma pena. Qual? A inicial ou a última pena legalmente prevista no período de continuidade? 1ª corrente: in dubio pro reo (conforme já havíamos mencionado, há uma latente banalização do princípio). 2ª corrente (majoritária): aplica-se a súmula 711 do STF.

STF - SÚMULA Nº   711 - A LEI PENAL MAIS GRAVE APLICA-SE AO CRIME CONTINUADO OU AO CRIME PERMANENTE, SE A SUA VIGÊNCIA É ANTERIOR À CESSAÇÃO DA CONTINUIDADE OU DA PERMANÊNCIA.

OBS: É possível combinação de leis? 1ª corrente (Nelson Hungria – é a corrente que prevalece entre os doutrinadores clássicos): não, pois o juiz estaria usurpando a função do legislador. 2ª corrente (Damásio e a maioria da doutrina moderna): sim, pois se o juiz pode o mais, que é ignorar a Lei A (inteira) e aplicar a Lei B, pode o menos, que consiste apenas em ignorar uma parte da lei. Inclusive, há precedente do STJ e, também, do STF.

OBS: Na fase de execução, quem aplica a lei penal mais favorável, uma vez que já houve trânsito em julgado? Depende. Se for uma norma de mera aplicação matemática, o próprio juiz das execuções aplica a lei. Se ela demanda juízo de valor: deve-se utilizar o instituto da revisão criminal (essa é a interpretação mais adequada da súmula 611 do STF).

SÚMULA 611 do STF: Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna.

Page 19: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

19

OBS: O art. 3º do CP representa uma ultra-atividade maléfica autorizada por lei (“a lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência”)!

Lei temporária (também chamada lei temporária em sentido estrito): é aquela que tem prefixado no seu texto o tempo de sua vigência.

Lei excepcional (ou temporária em sentido amplo): é a que atende a transitórias necessidades estatais, tais como guerras, calamidades, epidemias etc. Perdura por todo o tempo excepcional.

Se não fosse o art. 3º, as leis excepcionais e temporárias estariam fadadas à inutilidade.

OBS: Maurício Antônio Ribeiro Lopes e Zaffaroni entendem que o art. 3º do CP não foi recepcionado pela CF/88, pois o texto magno não prevê essa exceção. Porém, prevalece na doutrina a idéia de que o referido dispositivo é compatível com a CF.

Alteração do complemento da norma penal em branco: A norma penal em branco pode ser complementada por lei (mesma espécie normativa) ou por atos administrativos (espécie normativa diversa). Se o legislador altera o complemento da norma penal em branco se o complemento for lei, a sua alteração mais benéfica retroage (ex: é crime casar ocultando impedimentos – os impedimentos estão na lei civil – complemento normativo; suponhamos que eu esteja sendo processado porque ocultei o impedimento X; se houve uma supressão desse impedimento da lei civil, a lei mais benéfica deve retroagir para me beneficiar); no caso de norma penal em branco heterogênea: depende! Quando o complemento da norma penal em branco for norma infralegal (ato administrativo, por exemplo), o decisivo é saber se a alteração da norma implica ou não na supressão do caráter criminoso ou se se trata de mera atualização (ex: lei de drogas – portaria que elenca vários tipos de drogas – ato administrativo retira o “lança-perfume” da portaria – houve uma supressão da figura criminosa. Logo, houve abolitio criminis – retroage. 2º ex. Lei = “é proibido vender carne acima do

Page 20: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

20

preço tabelado” – crime contra a economia popular; portaria estabelece a tabela; ocorre uma inflação enorme – a portaria é atualizada. Logo, o sujeito continuará sendo processado porque não houve supressão do caráter criminoso da conduta, mas mera atualização da tabela).

Há uma parcela da doutrina (Flávio Monteiro de Barros) que investiga o momento em que surgiu a norma infralegal e sua alteração: se no estado de normalidade (ex: portaria da lei de drogas), sua alteração benéfica retroage; se num estado de emergência (ex: portaria de congelamento de preço) sua alteração não retroage, aplicando-se o espírito do art. 3º do CP. É o mesmo resultado, mas alcançado com raciocínios diferentes.

OBS: Como fica a retroatividade e ultratividade de súmula vinculante? Alterações de súmula vinculante benéfica retroagem (mesmo raciocínio adotado para as leis – retroatividade da súmula mais benéfica).

OBS: Aquilo que era considerado rapto (privar alguém da liberdade de locomoção para fins libidinosos) hoje é considerado seqüestro qualificado. Não houve abolitio criminis! Não se pode confundir abolitio criminis (aqui há uma supressão formal e uma supressão da matéria criminosa. Ex: o rapto consensual desapareceu do ordenamento jurídico brasileiro; adultério; sedução) com princípio da continuidade normativo-típica (aqui existe uma alteração – e não uma supressão – formal e manutenção da matéria criminosa. A intenção do legislador é outra = manter o fato como crime, alterando apenas sua roupagem – o tipo. Ex: rapto violento – art. 219 CP – virou seqüestro qualificado – art. 148, p. 1º, V CP, alterado pela Lei 11.106/05; nova lei de falências – delitos falimentares; nova lei de armas).

Art. 148 - Privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere privado:

Pena - reclusão, de um a três anos.

§ 1º - A pena é de reclusão, de dois a cinco anos:

Page 21: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

21

(...)

V - se o crime é praticado com fins libidinosos (esse inciso, estabelecido pela Lei 11.106/05, revogou o antigo crime de rapto, previsto anteriormente no art. 219 do CPB – PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE NORMATIVO-TÍPICA, que não deve ser confundido com a figura do abolitio criminis).

Lei penal no espaço

Princípios para solucionar os conflitos de lei penal no espaço:

Princípio da territorialidade: Aplica-se a lei penal do território do delito (não importa a nacionalidade dos envolvidos ou do bem jurídico lesado).

Princípio da nacionalidade ativa: Aplica-se a lei penal da nacionalidade do agente (não importa o local do crime ou a nacionalidade da vítima ou do bem jurídico).

Princípio da nacionalidade passiva: Aplica-se a lei penal da nacionalidade do agente se praticado crime contra co-cidadão (não importa o local do crime).

Princípio da defesa / da proteção / real: Aplica-se a lei da nacionalidade da vítima ou do bem jurídico (não importa o local ou nacionalidade do agente).

Princípio da justiça universal (ou cosmopolita): O agente fica sujeito à lei do país onde for capturado (não importa o local do crime, nem nacionalidade dos envolvidos).

Princípio da representação / princípio da bandeira / subsidiário: A lei penal nacional aplica-se aos crimes praticados em embarcações ou aeronaves privadas, quando no estrangeiro e aí não são julgados.

O princípio-regra (no Brasil e em quase todos os países) é o da territorialidade relativa ou temperada pela intraterritorialidade (art. 5º do CP):

Page 22: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

22

Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional (princípio da territorialidade relativa ou temperada pela intraterritorialidade).

§ 1º - Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar (pois em alto-mar nenhum país exerce soberania).

§ 2º - É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil (princípio da reciprocidade).

OBS: Territorialidade = lei brasileira sendo aplicada no Brasil. Extraterritorialidade = lei brasileira sendo aplicada no estrangeiro. Intraterritorialidade = lei estrangeira sendo aplicada no Brasil.

Mas, o que é o território nacional? É o espaço físico + espaço jurídico (ou por ficção, ou por equiparação) – art. 5º p. 1º CP.

OBS: Embaixada não é extensão do território que representa! A embaixada, entretanto, é inviolável (a polícia não pode chegar chutando a porta de uma embaixada – há regras internacionais a serem respeitadas).

Problemas trazidos pela doutrina (Basileu Garcia):

1) Os destroços do navio naufragado continuam ostentando sua bandeira.

2) Em alto-mar, um navio brasileiro e um navio chileno colidem e os sobreviventes fazem uma jangada com os destroços. Nessa jangada, um canadense mata um argentino. Que lei aplicar? A legislação não resolve este problema. Basileu Garcia orienta que, na dúvida, deve-se aplicar o princípio da nacionalidade passiva.

Page 23: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

23

3) Uma embarcação pública colombiana atraca no porto brasileiro. O marinheiro (colombiano) desce e pratica crime de estupro contra uma brasileira. Qual lei deverá ser-lhe aplicada? Depende da finalidade do agente ao descer do navio: se for pública – lei colombiana; se for particular – lei brasileira.

Quando um crime se considera praticado no Brasil? Precisamos definir o lugar do crime. Há três teorias: teoria da atividade, teoria do resultado e teoria da ubiqüidade ou mista (adotada pelo Brasil – art. 6º do CP).

Art. 6º - Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado (adoção pelo CP da teoria da ubiqüidade ou mista).

Observações:

1) É indispensável que no Brasil haja, pelo menos, o início da execução (mera cogitação ou mero ato preparatório praticado no Brasil não induz território nacional).

2) Crime cometido dentro do território nacional, a bordo de avião, que apenas sobrevoou o país não se aplica a lei penal brasileira, mas sim o instituto da “passagem inocente” aplicado quando a aeronave passa pelo território nacional apenas como passagem necessária para chegar ao seu destino (CUIDADO para não aplicar a letra fria do art. 5º p. 2º).

3) Crime à distância não se confunde com crime plurilocal. No crime à distância o delito percorre pluralidade de Estados soberanos (aí surge um conflito internacional de jurisdição – deve ser aplicado o art. 6º do CP = teoria da ubiqüidade, que nasceu exatamente para solucionar conflito internacional de jurisdição). No crime plurilocal o delito percorre uma pluralidade de locais de um mesmo Estado (aqui há um conflito interno de competência – o art. 6º não serve para

Page 24: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

24

dirimir conflito de competência – deve ser aplicado o art. 70 do CPP, que adota a teoria do resultado. OBS: no caso da Lei 9.099/95 a teoria adotada não é a do resultado, mas a da atividade).

Art. 70.  A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução.

§ 1o  Se, iniciada a execução no território nacional, a infração se consumar fora dele, a competência será determinada pelo lugar em que tiver sido praticado, no Brasil, o último ato de execução.

§ 2o  Quando o último ato de execução for praticado fora do território nacional, será competente o juiz do lugar em que o crime, embora parcialmente, tenha produzido ou devia produzir seu resultado.

§ 3o  Quando incerto o limite territorial entre duas ou mais jurisdições, ou quando incerta a jurisdição por ter sido a infração consumada ou tentada nas divisas de duas ou mais jurisdições, a competência firmar-se-á pela prevenção.

Hipóteses de extraterritorialidade: são hipóteses excepcionais – precisam estar expressas em lei (taxativamente). E elas estão: art. 7º do CP.

Art. 7º - Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro:

I - os crimes:

a) contra a vida ou a liberdade do Presidente da República (o princípio da defesa ou real fundamenta esta hipótese de extraterritorialidade);

b) contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público (princípio da defesa ou real);

c) contra a administração pública, por quem está a seu serviço

Page 25: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

25

(princípio da defesa ou real);

d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil (1ª corrente (prevalente na doutrina): princípio da defesa ou real; 2ª corrente: princípio da justiça universal; 3ª corrente (menos correta): princípio da nacionalidade ativa);

II - os crimes:

a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir (princípio da justiça universal);

b) praticados por brasileiro (princípio da nacionalidade ativa);

c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados (esse é exatamente o conceito do princípio da representação).

§ 1º - Nos casos do inciso I, o agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que absolvido ou condenado no estrangeiro (EXTRATERRITORIALIDADE INCONDICIONADA).

§ 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições (cumulativas) (EXTRATERRITORIALIDADE CONDICIONADA):

a) entrar o agente no território nacional (OBS: basta entrar; não precisa permanecer. OBS: território nacional – físico e jurídico. OBS: condição de procedibilidade – se o MP não prova que o sujeito entrou no território, não pode o juiz aceitar a denúncia);

b) ser o fato punível também no país em que foi praticado (OBS: a doutrina entende que esta alínea tem natureza de condição objetiva de punibilidade – pode haver processo, mas só pode haver condenação aqui se o fato for punível no outro país também);

c) estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição (OBS: igualmente tem natureza de condução objetiva de punibilidade);

d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena (OBS: o Brasil respeita a coisa julgada

Page 26: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

26

estrangeira);

e) não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.

§ 3º - A lei brasileira aplica-se também ao crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil, se, reunidas as condições previstas no parágrafo anterior (1ª corrente (Flávio Monteiro de Barros e Luiz Flávio Gomes): princípio da nacionalidade passiva – essa teoria está errada porque eles não são co-cidadãos; 2ª corrente (majoritária): princípio da defesa ou real. OBS: de acordo com a 2ª corrente o Brasil só não adota – em nenhuma hipótese – o princípio da nacionalidade passiva ; já para a 1ª corrente o Brasil adota todos os princípios, a depender da hipótese) (EXTRATERRITORIALIDADE HIPERCONDICIONADA):

a) não foi pedida ou foi negada a extradição;

b) houve requisição do Ministro da Justiça.

OBS: Não existe extraterritorialidade para contravenção penal!

Problema: O Presidente Lula está na Suíça resolvendo questões internacionais de interesse do Brasil. Na hora vaga, Lula resolve passear no Shopping sozinho (sem segurança – privacidade). Um bandido comete um roubo seguido de morte (latrocínio): Hipótese de extraterritorialidade condicionada (pois não se trata de crime contra a vida nem contra a liberdade do Presidente da República). Mas CUIDADO! Se o agente souber que Lula é o Presidente do Brasil, aí a hipótese é de crime contra a segurança nacional (Lei 7.170/83).

OBS: Existe algum caso de extraterritorialidade previsto em lei especial? Sim, na Lei de Tortura (art. 2º).

Art. 2º da Lei 9.455/97 O disposto nesta Lei aplica-se ainda quando o crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira.

Page 27: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

27

O art. 8º do CP existe para evitar o bis in idem:

Art. 8º - A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas (critério judicial – claro que a decisão deve ser fundamentada), ou nela é computada, quando idênticas.

Por que a imunidade não fere o princípio da isonomia? Porque ela não é pessoal; é funcional. Não serve à pessoa, serve ao cargo.

Trataremos, aqui, apenas de algumas espécies de imunidades (outras são estudadas em Direito Constitucional):

1) Imunidade diplomática: É prerrogativa funcional de direito público internacional de que desfrutam:

a) Os chefes de governo ou de Estado estrangeiro, sua família e membros da sua comitiva;

b) Embaixador e sua família (OBS: a esposa do embaixador tem imunidade, desde que ela não seja nacional do país onde ele serve. Ex: o embaixador da Itália no Brasil casa-se com uma brasileira – ela não possui imunidade no Brasil, é claro);

c) Os funcionários do corpo diplomático e suas famílias;

d) Funcionários das organizações internacionais (ex: ONU), quando em serviço;

OBS: E os agentes consulares, são imunes? Somente possuem imunidade quanto aos crimes relacionados à sua função (pois os agentes consulares não possuem função representativa, mas tão somente administrativa).

OBS: Quando se diz que há imunidade, não quer dizer que não devem obediência à nossa lei; eles só escapam de suas conseqüências jurídicas (respondem pela lei de seu país).

Page 28: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

28

OBS: Imunidade diplomática não impede investigação policial!

OBS: Qual a natureza jurídica dessa imunidade? A maioria da doutrina entende que estamos diante de uma causa pessoal de isenção de pena. Luiz Flávio Gomes entende que se trata de uma causa impeditiva da punibilidade.

OBS: O diplomata pode renunciar a essa imunidade? Não. Mas o país que ele representa pode despi-lo desse manto protetor.

2) Imunidade parlamentar absoluta (material / substancial / real / inviolabilidade / indenidade – que é como Zaffaroni chama a imunidade parlamentar absoluta): Art. 53 da CF.

Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente (a jurisprudência do STF ampliou para imunidade administrativa e política), por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

Natureza jurídica da indenidade:

1ª corrente (Pontes de Miranda): Causa excludente de crime.

2ª corrente (Basileu Garcia): Causa que se opõe à formação do crime.

3ª corrente (Aníbal Bruno): Causa pessoal de exclusão de pena.

4ª corrente (Magalhães Noronha): Causa de irresponsabilidade.

5ª corrente (Frederico Marques): Causa de incapacidade pessoal penal por razoes políticas.

6ª corrente (Zaffaroni e Luiz Flávio Gomes): Causa de atipicidade.

Page 29: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

29

Qual é a relevância de saber a natureza jurídica da indenidade? Para saber a punibilidade do partícipe. Quatro teorias discutem isso:

Teoria da acessoriedade mínima: basta que o fato do partícipe seja típico.

Teoria da acessoriedade média (limitada) – adotada pelo Brasil, segundo a doutrina: basta que o fato seja típico + ilícito.

Teoria da acessoriedade máxima: o fato tem que ser típico + ilícito + culpável.

Teoria da hiperacessoriedade: o fato tem que ser típico + ilícito + culpável + punível.

O STF adota a 6ª corrente (a indenidade é causa de atipicidade) e, conseqüentemente, o partícipe (por exemplo, o assessor do parlamentar) acaba se “safando”.

Mas, e a súmula 245 do STF?

SÚMULA 245 do STF: A imunidade parlamentar não se estende ao co-réu sem essa prerrogativa.

A maioria da doutrina (exceção: Nucci) restringe a interpretação dessa súmula apenas para a imunidade relativa (e não para a absoluta).

Agora, vejamos as seguintes situações (acerca da imunidade parlamentar absoluta):

a) Ofensa proferida nas dependências da casa legislativa: de acordo com o STF, o nexo funcional é presumido (relativamente – o ofendido deve comprovar a inexistência de nexo).

b) Ofensa proferida fora das dependências da casa legislativa (ou até mesmo em outro estado da federação): de acordo com o STF, nessa hipótese o

Page 30: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

30

nexo funcional não é presumido (o parlamentar deverá comprovar o nexo).

OBS: O parlamentar possui imunidade “propter officio” (onde quer que se encontre).

3) Imunidade parlamentar relativa (formal ou quanto ao processo): Art. 53, p. 3º, 4º e 5º.

§ 3º Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da ação. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001)

§ 4º O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de quarenta e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001)

§ 5º A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o mandato. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001)

EC 35/2001:

ANTES DEPOIS

O STF precisava de autorização da casa legislativa respectiva para processar o parlamentar.

A imunidade abrangia crimes praticados antes ou depois da diplomação.

A imunidade abrangia

O STF não precisa de autorização para processar o parlamentar (a casa legislativa pode, no entanto, sustar o andamento do processo).

A imunidade só alcança delitos praticados após a

Page 31: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

31

crimes comuns ou funcionais.

diplomação.

A imunidade abrange crimes comuns e funcionais.

OBS: Essa EC 35 é retroativa ou só alcança os fatos praticados após a sua vigência? Prevalece o entendimento de que essa Emenda é irretroativa (só pode alcançar fatos praticados após a sua vigência). A minoria entende que essa Emenda possui caráter apenas processual (norteada pelo tempus regit actum).

OBS: Esta imunidade impede o parlamentar de ser investigado? Trata-se de prerrogativa extraordinária / excepcional, que não alcança os atos investigatórios (posição do STF). Então, essa imunidade não susta nem IP nem IC.

OBS: O Congresso Nacional pode sustar processo de improbidade? Não. Apenas pode sustar ação penal!

4) Imunidade quanto à prisão: Art. 53, p. 2º da CF.

§ 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001)

Regra: parlamentar não pode ser preso. Exceção: salvo em flagrante de crime inafiançável.

OBS: A prerrogativa que o p. 2º do art. 53 da CF prevê, de acordo com o STF, diz respeito apenas às prisões provisórias (e não às definitivas – com trânsito em julgado).

OBS: Também não cabe prisão civil contra os parlamentares!

Page 32: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

32

OBS: Não podemos confundir injúria qualificada (prevista no art. 140, p. 3º do CP) com o delito de racismo (previsto em lei especial):

INJÚRIA QUALIFICADA (há doutrinadores chamando de “racismo impróprio”)

RACISMO

O agente atribui qualidade negativa (xingamento).

Crime afiançável.

Prescritível.

Ação Penal de iniciativa privada.

Segregação.

Inafiançável (até mesmo o parlamentar pode ser preso no racismo).

Imprescritível.

Ação Penal de iniciativa pública incondicionada.

5) Imunidade quanto ao foro: Art. 53, p. 1º da CF:

§ 1º Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001)

OBS: Essa imunidade não alcança processos civis; somente processos penais (inclusive por crimes praticados antes de o sujeito tornar-se parlamentar).

OBS: Crime doloso contra a vida: os parlamentares vão a júri popular? Deputados e Senadores não vão a júri (porque a CF excepciona-se, dando ao parlamentar foro por prerrogativa de função, que afasta até mesmo a competência do Tribunal do Júri).

OBS: O foro especial somente permanece enquanto perdurar o mandato. Terminado o mandato, o processo é remetido ao juízo competente (que não é mais o STF).

Page 33: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

33

6) Imunidade quanto ao dever de testemunhar: Art. 53, p. 6º da CF:

§ 6º Os Deputados e Senadores não serão obrigados a testemunhar sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001)

OBS: Essa imunidade serve para que o parlamentar não precise testemunhar acerca de informações de que tem conhecimento, sem que incorra no delito de falso testemunho.

OBS: Essa imunidade só alcança informações relacionadas ao exercício do mandato.

OBS: Art. 221 do CPP:

Art. 221. O Presidente e o Vice-Presidente da República, os senadores e deputados federais, os ministros de Estado, os governadores de Estados e Territórios, os secretários de Estado, os prefeitos do Distrito Federal e dos Municípios, os deputados às Assembléias Legislativas Estaduais, os membros do Poder Judiciário, os ministros e juízes dos Tribunais de Contas da União, dos Estados, do Distrito Federal, bem como os do Tribunal Marítimo serão inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados entre eles e o juiz.

Essa prerrogativa do art. 221 do CPP não se estende ao parlamentar investigado ou processado (somente para o parlamentar na qualidade de testemunha).

OBS: Parlamentar que se licencia para exercer cargo no executivo perde todas as imunidades parlamentares (mas tem que manter o decoro)!

Page 34: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

34

OBS: Deputado Estadual tem as mesmas imunidades do Deputado Federal? Sim. A CF, no art. 27, p. 1º, prevê o princípio da simetria.

§ 1º - Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando- sê-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas.

Mas, o deputado estadual tem foro especial (TJ – em crimes não federais – ou TRF – em crimes federais). Esse foro especial afasta a competência constitucional do Tribunal do Júri?

SÚMULA 721 do STF: A competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente pela Constituição estadual.

O foro especial do deputado estadual não está previsto somente na constituição estadual, mas também na Constituição Federal. Então, ele não vai a Júri!

OBS: A imunidade do deputado estadual é irrestrita (não abrange apenas o território do seu estado).

OBS: Vereador tem imunidade? Em regra, vereador só tem imunidade material, e mesmo assim limitada ao município em que exerce a vereança. Em regra, o vereador não possui imunidade relativa, mas a Constituição Estadual pode dar ao vereador foro especial (dois exemplos: Piauí e Rio de Janeiro).

OBS: Vereador vai a Júri? Sim! Aplica-se a Súmula 721 do STF (que já vimos).

TEORIA DO DELITO

Page 35: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

35

OBS: Seria melhor dizer “TEORIA GERAL DA INFRAÇÃO PENAL”.

O Brasil é dualista (ou binário), ou seja, prevê apenas duas espécies de infração penal:

a) Crime (ou delito);

b) Contravenção Penal (ou “crime anão” – Nelson Hungria; delito liliputiano; crime vagabundo).

A LICP diz que crime é punido com reclusão e detenção; contravenção penal é punida com prisão simples.

OBS: O porte de droga para uso próprio (usuário – art. 28 da Lei 11.343/06) é crime ou contravenção penal?

Art. 28.  Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas;

II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

Luiz Flávio Gomes entende que se trata de infração penal sui generis (simplesmente com base na LICP – não há pena de reclusão, nem de detenção, nem de prisão simples). O STF diz que é crime! Baseia-se a Suprema Corte na CF/88.

OBS: O porte ilegal de arma de fogo, até 1997, era contravenção penal. Depois passou a ser crime (e algumas hipóteses, de acordo com o estatuto do desarmamento, inafiançáveis). O que levou a isso (caracterização de um fato como contravenção ou crime)? Mera opção política (critério político)!

Diferenças entre crime e contravenção penal (previstas na LCP):

CRIME CONTRAVENÇÃO PENAL

Page 36: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

36

Pena privativa de liberdade = reclusão e detenção.

Espécie de ação penal = Ação Penal Pública / Ação Penal de iniciativa privada.

A tentativa é punível.

Extraterritorialidade é admitida.

Competência para processo e julgamento: Justiça Estadual ou Federal.

Limite de cumprimento da pena: 30 anos (mesmo que a pena imposta na sentença seja superior a 30 anos).

“Sursis”: período de prova (2 a 4 ou 4 a 6 anos).

Reclusão e detenção: é possível que o agente cumpra pena em regime fechado (ainda que por meio da regressão).

Pena privativa de liberdade = prisão simples.

Espécie de ação penal = só pode ser perseguida mediante Ação Penal Pública Incondicionada (exceção: como pode o crime de lesão corporal leve ser objeto de ação penal pública condicionada à representação e a contravenção de vias de fato ser objeto de ação penal pública incondicionada? Por isso, a jurisprudência entende que, na contravenção de vias de fato deve ser objeto de ação penal pública condicionada a representação. OBS: O STF não concorda com essa jurisprudência, entendendo que não há exceções – aliás, o tipo de ação penal não está ligado à gravidade do fato delituoso – ex: estupro é objeto de ação penal pública condicionada – e é gravíssimo).

A tentativa não é punível (a tentativa é possível nas contravenções, mas não é

Page 37: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

37

punível).

Extraterritorialidade não é admitida.

Competência para processo e julgamento: só pode ser competência da Justiça Estadual (art. 109, IV, CF). Exceção: contravenção penal praticada por quem tem foro por prerrogativa de função federal (ex: deputado federal – STF) OBS: a conexão não atrai a contravenção penal para o julgamento pela Justiça Federal!

Limite de cumprimento da pena: 5 anos.

“Sursis”: período de prova (1 a 3 anos).

Prisão simples: não é possível (JAMAIS) que o agente cumpra pena em regime fechado (nem que por meio da regressão).

Essas diferenças norteiam o legislador na opção política de classificar um fato como crime ou contravenção penal.

Conceito de infração penal:

1) Conceito formal: é aquilo que está estabelecido em norma incriminadora sob ameaça de pena (crime é aquilo que o legislador diz que é crime).

Page 38: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

38

2) Conceito material: é comportamento humano causador de relevante e intolerável lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado passível de sanção penal.

3) Conceito formal-material: une os dois conceitos anteriores.

4) Conceito analítico: leva em consideração os elementos que compõem a infração penal. Esse conceito (analítico) varia conforme a teoria adotada. Vejamos um “aperitivo” (visão panorâmica das teorias):

Teoria causalista: crime é um fato típico + ilícito + culpável.

OBS: O DOLO E A CULPA ESTÃO NA CULPABILIDADE!

Teoria neokantista (tem base causalista – nasce do causalismo): crime = fato típico + ilícito + culpável.

OBS: O NEOKANTISTA ADMITE ELEMENTOS VALORATIVOS NO TIPO!

Teoria finalista: também entende que o crime possui três elementos/requisitos/substratos: crime = fato típico + ilícito + culpável.

OBS: O DOLO E A CULPA MIGRAM PARA O FATO TÍPICO!

Teoria finalista dissidente: crime = fato típico + ilícito.

OBS: PARA ESSA TEORIA, A CULPABILIDADE É MERO PRESSUPOSTO DE APLICAÇÃO DA PENA.

Teoria social da ação: crime = fato típico + ilícito + culpável.

OBS: O DOLO E A CULPA, INTEGRANTES DO FATO TÍPICO, VOLTAM A SER ANALISADOS NA CULPABILIDADE.

Page 39: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

39

ESSAS SÃO AS TEORIAS CLÁSSICAS. VEJAMOS AS MAIS MODERNAS:

Funcionalismo teleológico (Roxin): o crime tem três elementos: fato típico + ilicitude + REPROVABILIDADE.

OBS: PARA ROXIN, A CULPABILIDADE É LIMITE DA PENA, E NÃO REQUISITO DO CRIME.

OBS: A PREOCUPAÇÃO DO DIREITO PENAL É RESGUARDAR BENS JURÍDICOS, ADMITINDO PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO, AINDA QUE NÃO POSITIVADOS.

Funcionalismo sistêmico ou radical (Jakobs): crime = fato típico + ilícito + culpável.

OBS: PARA JAKOBS, A PREOCUPAÇÃO DO DIREITO PENAL É RESGUARDAR A NORMA (O IMPÉRIO DA NORMA/O SISTEMA), NÃO ADMITINDO PRINCÍPIOS GERAIS NÃO POSITIVADOS. JAKOBS TRABALHA COM O “DIREITO PENAL DO INIMIGO” (QUEM FERE A NORMA É INIMIGO DO SISTEMA).

Ex: subtração insignificante (de 1 real): para Roxin, não trata-se de crime, pois o bem jurídico não foi atingido (aplicação do princípio da insignificância); para Jakobs, trata-se de crime, pois a norma foi atingida e ponto final (Jakobs não reconhece o princípio da insignificância, pois ele não está positivado).

Teoria constitucionalista do delito (Luiz Flávio Gomes): crime = fato típico + ilícito + punível em abstrato (previsão de pena).

OBS: A CULPABILIDADE É MERO PRESSUPOSTO DA PENA.

OBS: FT + ILIC sem pena em abstrato NÃO É CRIME!

Page 40: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

40

Sobre essas teorias, que se desenvolveram ao longo da história e que visam conceituar o crime (analiticamente), é importante realizar uma análise mais apurada. Segue uma aula do professor Luiz Flávio Gomes sobre o assunto:

LUIZ FLÁVIO GOMES

TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO DELITO

O crime tem dois requisitos (apenas):

1) Fato formal e materialmente típico;2) Antijuridicidade.

LFG não tem a mesma visão legalista do finalismo dissidente; a visão é constitucionalista.

O que chama a atenção nesse conceito é o aspecto material da tipicidade, que significa ofensa ao bem jurídico. Exemplo de um fato formalmente típico, mas que não o é sob o aspecto material fato insignificante.

O min. Celso de Mello, em seus julgados, fala em tipicidade formal e material.

Não podemos, de forma alguma, confundir crime com fato punível. Fato punível é fato formal e materialmente típico, antijurídico e quando há ameaça de pena (punibilidade). Ou seja, fato punível nada mais é do que um crime + punibilidade.

Se o fato não é punível, ele é penalmente irrelevante (ex: lei previdenciária).

DO FATO TÍPICO

Evolução histórica do fato típico:

1) CAUSALISMO (final do séc. XIX e começo do séc. XX): Von Liszt e Beling. O fato típico é objetivo e valorativamente neutro. Esse fato típico possui quatro requisitos:

Conduta; Resultado naturalístico (ex: homicídio);

Page 41: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

41

Nexo de causalidade; Adequação típica (fato adequado à lei).

OBSERVAÇÕES:

Tipo penal é mera descrição abstrata do crime, ou seja, é valorativamente neutro (não há considerações de valor).

O fato típico é distinto da antijuridicidade. Dolo e culpa: eram estudados dentro da culpabilidade.

2) NEOKANTISMO (século XX – de 1900 a 1930): Mezger. O fato típico é objetivo e valorativo (sempre). Para eles,

o legislador nunca tipifica fatos que não sejam valorativamente condenáveis.

Essa teoria (que tem base causalista) recupera a teoria dos valores de Kant.

Esse fato típico possui quatro requisitos: Conduta; Resultado naturalístico; Nexo de causalidade; Adequação típica.

A grande diferença para o causalismo é o acréscimo da dimensão valorativa!

OBSERVAÇÕES:

O tipo penal não é valorativamente neutro. A tipicidade é indício da antijuridicidade (antes se dizia que

tipicidade era totalmente diferente de antijuridicidade). Dolo: é um dolo normativo ou jurídico, composto de dois

requisitos: consciência do fato (e vontade de praticá-lo) e consciência da ilicitude.

Crítica: como exigir que o homem comum saiba o que é ilícito?

Resposta de Mezger: Teoria da valoração paralela na esfera do profano (como o leigo vê a ilicitude). Com o tempo se viu que mesmo o leigo tem consciência do que é ilícito e do que é ilícito.

3) FINALISMO (1940 a 1960):

Page 42: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

42

Hans Welzel. Fato típico tem duas dimensões: é objetivo e subjetivo

(nunca antes ninguém havia dito isso em Direito Penal) = Welzel chama isso de “tipo complexo”.

Há quatro requisitos da parte objetiva: Conduta; Resultado naturalístico; Nexo causal; Adequação típica.

A partir do finalismo: o dolo e a culpa passam a fazer parte da tipicidade (antes de Welzel o dolo e a culpa faziam parte da culpabilidade).

OBS: Segundo Luiz Flávio Gomes, 90% dos livros de direito penal no Brasil seguem essa estrutura finalista (são finalistas).

OBS: Até aqui, estudamos três doutrinas clássicas de Direito Penal. Daqui pra frente é tudo direito penal moderno.

4) FUNCIONALISMO MODERADO OU TELEOLÓGICO (1970): Claus Roxin. A tipicidade tem três dimensões: o fato típico é objetivo,

subjetivo e normativo. Dimensão objetiva:

Conduta; Resultado naturalístico; Nexo de causalidade; Adequação típica.

O dolo é subjetivo (subjetivo é tudo que emana da cabeça do réu) e a culpa é normativa (o que exige um juízo de valor do juiz). OBS: Welzel dizia que tanto o dolo quanto a culpa são subjetivos.

Duas coisas fazem parte da dimensão subjetiva do tipo: Dolo; Intenções especiais (em alguns tipos penais – ex:

furto). A terceira dimensão do fato típico, para Roxin, é a

normativa (valorativa). No âmbito dessa dimensão,

Page 43: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

43

Roxin desenvolveu a teoria da imputação objetiva. A teoria da imputação objetiva significa valorar duas coisas em direito penal: a conduta e o resultado.Com base em que critério se valora a conduta? Criação ou implemento de um risco proibido relevante. Se a conduta cria um risco permitido, não é típica (do ponto de vista valorativo). Ex: conduzir o carro pelo “eixão” a 80 km/h, na faixa, “tudo certinho”.Com base em que critérios se valora o resultado? O resultado tem que ser objetivamente imputável ao risco criado. Em outras palavras, o crime tem que ter nexo entre o resultado produzido e o risco criado (“nexo de imputação”). Ex: o autor do furto não responde pela morte do dono do carro por infarto.O resultado também tem que ser valorado no âmbito de proteção da norma (para que a norma foi feita?).

Há repercussões dessa teoria na jurisprudência dos tribunais mais modernos do Brasil, inclusive há julgados no STJ.

5) FUNCIONALISMO REDUCIONISTA OU CONDENCIONISTA (década de 80):

Zaffaroni. Zaffaroni criou a “teoria da tipicidade conglobante”: o

tipo tem que ter a terceira dimensão (valorativa). Zaffaroni aceita a teoria da imputação objetiva de Roxin. Mas, ele incorpora e sintetiza tudo em uma frase: “se existe uma norma que fomenta, determina ou permite uma conduta, o que está fomentado, determinado ou permitido por uma norma não pode estar proibido por outra”. Ex: aborto em caso de estupro.

Mas o que é novo em Zaffaroni, com relação a Roxin? A dimensão normativa (ou material) da tipicidade, para Zaffaroni, se divide em:

Criação ou implemento de riscos proibidos relevantes.

Page 44: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

44

Resultado jurídico (ofensa relevante ao bem jurídico).

Imputação objetiva do resultado.6) TEORIA CONSTITUCIONALISTA DO DELITO (2001):

Luiz Flávio Gomes. Dimensão objetiva: não muda nada. Dimensão subjetiva: não muda nada (dolo + intenções

especiais). Dimensão material (terceira dimensão do fato típico): é

valorativa! O juiz tem que valorar a conduta do agente (com

base na idéia: a conduta criou ou implementou riscos proibidos relevantes?).

O juiz tem que valorar o resultado jurídico (ofensa relevante ao bem jurídico). Quais são as seis exigências para que o resultado jurídico seja penalmente relevante?

Concreto (não se aceita perigo abstrato – conflita com a teoria da ofensividade).

Transcendental (o resultado tem que afetar terceiros – princípio da alteralidade).

Relevante. Intolerável. Objetivamente imputável ao risco criado. Tem que estar no âmbito de proteção da

norma.

Por que existe esse aspecto material?

a) Teoria tridimensional do direito (Miguel Reale): direito = fato, valor e norma.

b) Neoconstitucionalismo.

Continuando...

Sujeitos do crime:

Page 45: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

45

1) Sujeito ativo: é o autor da infração penal (quem age ou omite).

Quem pode ser sujeito ativo? Qualquer pessoa física com idade mínima de 18 anos. Pessoa Jurídica pode ser autora de crime? Há três correntes:

1ª corrente: PJ não pratica e nem pode ser responsabilizada penalmente. Entende essa corrente que estamos diante de uma possibilidade de responsabilidade penal objetiva (não pode).

2ª corrente: PJ pratica crime ambiental (previsão na CF e na Lei 9.605/98), podendo ser responsabilizada penalmente. Trata-se de uma responsabilidade objetiva autorizada pela CF (a CF pode excepcionar-se a si mesma).

3ª corrente (prevalece – é a posição adotada pelo STJ e por Luiz Flávio Gomes): PJ não pratica crime, nem mesmo ambiental, mas pode ser responsabilizada penalmente nas infrações contra o meio ambiente. Essa teoria não trabalha com a idéia de responsabilidade penal objetiva, mas com a idéia de responsabilidade penal social. Os requisitos para a responsabilidade penal da PJ por infração contra o meio ambiente estão no art. 3º da Lei 9.605/98.

Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.

Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.

A responsabilidade penal da PJ não afasta a da pessoa física (sistema da dupla imputação).

Page 46: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

46

2) Sujeito passivo: é a pessoa que sofre as conseqüências da infração penal.

Quem pode ser sujeito passivo? Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Temos alguns crimes cujo sujeito passivo é indeterminado. São os chamados “crimes vagos” (ex: crimes contra a família).

Temos alguns crimes que obrigatoriamente têm pluralidade de sujeitos passivos. São os chamados “crimes de dupla subjetividade passiva” (o TIPO descreve uma obrigatoriedade de pluralidade de sujeitos passivos – ex: violação de correspondência – dois sujeitos passivos: destinatário e remetente; abortamento não consentido – dois sujeitos passivos: gestante e feto).

Sujeito passivo próprio: aqui a lei exige qualidade ou condição especial da vítima (ex: infanticídio – a vítima é o feto; estupro – a vítima será mulher).

A PJ pode ser vítima de crime contra a honra?

1ª corrente: pode ser vítima de calúnia (para isso admite-se que a PJ pratique crime – no caso, crime ambiental) e difamação.

2ª corrente (majoritária): pode ser vítima apenas de difamação!

Essas duas correntes não admitem que a PJ seja vítima de crime de injúria (pois a PJ não tem honra subjetiva).

3ª corrente (Mirabete): a PJ não pode ser vítima de nenhum crime contra a honra. Mirabete observa que os arts. 138/139/140 estão no título “crimes contra a pessoa” (e pessoa, aqui, é pessoa física – não abrange a PJ).

Page 47: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

47

PJ pode ser vítima do delito “extorsão mediante seqüestro”? Sim. Ex: eu posso seqüestrar o Silvio Santos, mas quem paga o resgate é o SBT; eu seqüestro o Abílio Diniz e quem paga o resgate é o Pão de Açúcar.

Objeto material de um crime: pessoa ou coisa sobre a qual recai a conduta criminosa do agente.

Sujeito passivo se confunde com objeto material? Pode se confundir. Ex: Furto: Rogério é o sujeito ativo; Renato é o sujeito passivo; carteira é o objeto material. Outro exemplo: Homicídio: Rogério é o sujeito ativo; Renato é o sujeito passivo; Renato também é o objeto material. Normalmente o sujeito passivo não se confunde com objeto material.

Existe delito sem objeto material? Sim. A doutrina cita dois exemplos: ato obsceno e falso testemunho.

Objeto jurídico: interesse tutelado pela norma (ex: vida).

Existe crime sem objeto jurídico? Não. Crime sem objeto jurídico não é crime (buscar a punição de alguém sem que haja interesse isso não é direito penal).

OBS: A professora Alice Bianchini defende (trata-se de posição minoritária) que há um crime no CP que é carente de objeto jurídico; por isso não pode ser aplicado: tráfico internacional de pessoas – art. 231 do CP (não há emprego de violência; não há emprego de fraude; não há grave ameaça e a pessoa não exerceu a prostituição).

Art. 231. Promover, intermediar ou facilitar a entrada, no território nacional, de pessoa que venha exercer a prostituição ou a saída de pessoa para exercê-la no estrangeiro.

Há crimes de dupla objetividade jurídica (são crimes que têm pluralidade de bens jurídicos). Ex: denunciação caluniosa (art. 339 do CP) – honra do inocente e regularidade das atividades da Administração Pública.

Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de

Page 48: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

48

processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente

FATO TÍPICO

Os diversos fatos que ocorrem no mundo dividem-se em:

1) Fatos da natureza: não interessam para o direito penal.

2) Fatos humanos: dividem-se em:

Desejados: não interessam ao direito penal.

Indesejados: o direito penal não se preocupa com todos os fatos indesejados (o direito penal é subsidiário e fragmentário princípio da intervenção mínima). O direito penal se preocupa com uma conduta produtora de um resultado (nexo causal) que se adéqua a um tipo (adequação típica).

O fato típico é o primeiro requisito/elemento/substrato (nomenclatura utilizada por Bettiol) do crime.

Conceito de fato típico:

1) Conceito analítico: fato típico é o primeiro substrato (Bettiol) do crime.

2) Conceito material: fato típico é um fato humano indesejado, norteado pelo princípio da intervenção mínima, consistente numa conduta produtora de um resultado que se ajusta formal e materialmente a um tipo penal.

Elementos ou requisitos do fato típico:

a) Conduta;

b) Resultado;

c) Nexo causal;

d) Adequação típica.

Page 49: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

49

CONDUTA

Conceito analítico: elemento do fato típico.

Conceito material: varia conforme a teoria adotada, no tocante ao conceito de crime (do causalismo ao funcionalismo).

Para a teoria causalista: o crime é um fato típico/ilícito/culpável e a conduta pertence ao fato típico. Para o causalismo, conduta consiste no movimento corporal voluntário que causa modificação no mundo exterior.

OBS: Conduta, para o causalismo, está desprovida de dolo e culpa (o dolo e a culpa são espécies de culpabilidade).

OBS: A conduta é objetiva, não admitindo qualquer valoração.

Crítica nº 1: A conduta não abrange os delitos omissivos (pois exige para a conduta o movimento).

Crítica nº 2: O causalismo ignora a presença de elementos subjetivos do tipo. Ex: art. 299 do CP:

Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.

Crítica nº 3: O causalismo ignora elementos normativos do tipo. Ex: art. 154 do CP:

Art. 154 - Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem.

Para o Neokantismo: também entende que o crime é fato típico/ilícito/culpável. O Neokantismo (que tem base causalista) discorda apenas do conceito material de conduta. Para o Neokantismo, conduta é ação ou OMISSÃO, não mais neutra,

Page 50: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

50

expressando uma valoração negativa da lei. Reconhece a presença de elementos normativos.

Crítica nº 1: A conduta continua desprovida de dolo e culpa (são analisados na culpabilidade – não como espécies, mas como requisitos da culpabilidade).

Crítica nº 2: Essa teoria é contraditória, pois tem base causalista e reconhece elementos normativos (a base da teoria é contraditória, considerando as suas conclusões).

Para o finalismo: crime continua sendo fato típico/ilícito/culpável. Para os finalistas, a conduta deixa de ser concebida como mero processo causal para ser enfocada como requisito de uma atividade finalista (exercício vidente).

OBS: o dolo e a culpa migram da culpabilidade para o fato típico.

Crítica nº 1: O finalismo só explica bem o crime doloso (é frágil quanto ao crime culposo) – nasceu para o crime doloso.

Crítica nº 2: O finalismo centralizou a sua teoria no desvalor da conduta (deixou para o segundo plano o desvalor do resultado).

Para o finalismo dissidente: crime = fato típico/ilícito (o crime está despido da culpabilidade, que não mais integra o crime e passa a ser mero pressuposto de aplicação da pena. O restante dos comentários é idêntico ao finalismo clássico.

Para a teoria social da ação: volta a ser tripartite (crime = fato típico/ilícito/culpável). Para essa teoria, conduta (adotando a estrutura do finalismo) é o comportamento humano socialmente relevante.

OBS: o dolo e a culpa integram a conduta, porém, voltam a ser analisados na culpabilidade (o dolo e a culpa integram a conduta, mas acabam trazendo também um grau de reprovação). Há quem diga que o CP adotou essa teoria (com base na redação do art. 59).

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade (para a teoria social da ação, aqui são analisados, novamente, o dolo e a culpa), aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja

Page 51: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

51

necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime.

Crítica: Essa teoria não é clara quanto ao significado da expressão “socialmente relevante”.

Para o funcionalismo teleológico (Roxin): o crime tem três substratos: fato típico/ilicitude/reprovabilidade (a reprovabilidade é constituída de imputabilidade/potencial consciência da ilicitude/exigibilidade de conduta diversa/necessidade da pena). Para Roxin, a culpabilidade é limite da pena. A conduta, orientada pelo princípio da intervenção mínima, consiste no comportamento humano voluntário causador de relevante e intolerável lesão ou perigo de lesão a bens jurídicos tutelados.

OBS: o dolo e a culpa permanecem no fato típico.

OBS: admite aplicação de princípios gerais não positivados (ex: princípio da insignificância).

OBS: a preocupação principal de Roxin (finalidade principal de sua teoria) é com a proteção de bens jurídicos.

Crítica: reprovabilidade como substrato do crime; a reprovabilidade não é substrato, mas conseqüência.

Para o funcionalismo sistêmico/radical (Jakobs): para essa teoria, o crime continua fato típico/ilícito/culpável. A conduta se encontra no fato típico. Para Jakobs, conduta é causação/provocação de um resultado evitável, violador do sistema, frustrando as expectativas normativas.

OBS: o dolo e a culpa permanecem no fato típico.

OBS: a preocupação de Jakobs não é mais com a proteção de bens jurídicos, mas com o respeito ao sistema (“império da norma”). Se você não respeita o sistema/a norma, você é um inimigo (por isso a expressão “direito penal do inimigo”).

OBS: Jakobs não admite/reconhece a aplicação de princípios gerais não positivados (Jakobs não trabalha com o princípio da

Page 52: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

52

insignificância, pois não está positivado o que importa é o sistema posto).

Crítica: a doutrina dele serve a estados totalitários.

NO BRASIL, PREVALECE O FINALISMO (dizem até que é a teoria adotada pelo CP). MAS A TENDÊNCIA É O FUNCIONALISMO DE ROXIN (porém, corrigido na culpabilidade).

Base da conduta comportamento voluntário.

CAUSAS DE EXCLUSÃO DA CONDUTA:

1) Caso fortuito ou força maior;

2) Coação física irresistível;

OBS: coação moral exclui culpabilidade.

3) Atos reflexos (sujeito matou com o dedo na tomada) – ato reflexo provocado não exclui a conduta;

4) Estado de inconsciência (ex: sonâmbulo/hipnose);

ESPÉCIES DE CONDUTA:

1) Dolosa/culposa;

2) Ação/omissão.

CRIME DOLOSO:

Previsão legal: art. 18, I do CP.

Art. 18 - Diz-se o crime:

I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo.

Conceito de dolo: é a vontade LIVRE e consciente dirigida a realizar (ou aceitar realizar) a conduta prevista no tipo penal incriminador. Esse é o conceito que normalmente se encontra na doutrina. E está errado! A vontade não tem que ser LIVRE! Se

Page 53: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

53

eu tiver vontade + livre = dolo com culpabilidade! Se eu tiver vontade não livre = dolo sem culpabilidade!

Portanto, segundo a doutrina, o dolo só tem dois elementos: vontade + consciência! Vejamos:

1) Elemento volitivo vontade (querer ou aceitar);

2) Elemento intelectivo consciência (previsão).

Dolo não se confunde com o mero desejo. Por quê? Qual é a diferença? No dolo, o agente quer o resultado delitivo como conseqüência de sua própria conduta (“eu vou te matar”). No desejo, eu quero o resultado não advindo da minha conduta (“tomara que você morra”).

Teorias do dolo:

1) Teoria da vontade: dolo é a vontade consciente de querer praticar a infração penal.

2) Teoria da representação: nessa teoria o agente prevê o resultado como possível e, ainda assim, decide continuar a conduta.

Crítica: abrange a culpa consciente.

3) Teoria do consentimento/ou do assentimento: essa teoria é um corretivo da anterior. O agente prevê o resultado como possível e, ainda assim, decide continuar agindo, assumindo o risco de produzi-lo (agora não está abrangida a culpa consciente).

O Brasil adotou, segundo a maioria da doutrina, a teoria da vontade para o dolo direto e a teoria do assentimento para o dolo eventual. Vejamos o art. 18 do CP:

Art. 18 - Diz-se o crime:

I - doloso, quando o agente quis o resultado (teoria da vontade – dolo direto) ou assumiu o risco de produzi-lo (teoria do assentimento – dolo eventual);

Page 54: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

54

Espécies de dolo:

1) Dolo direto (ou determinado): configura-se quando o agente prevê o resultado, dirigindo sua conduta na busca de realizar esse mesmo resultado.

2) Dolo indireto (ou indeterminado): o agente, com sua conduta, não busca resultado certo e determinado. O dolo indireto tem duas subespécies:

Dolo alternativo: o agente prevê uma pluralidade de resultados (ex: matar ou ferir) e dirige sua conduta na busca de um ou outro (com igual intensidade).

Dolo eventual: o agente prevê pluralidade de resultados. Quer um, mas assume o risco de produzir o outro (ex: resultados previstos: morte e lesão; eu quero a lesão, mas assumo o risco de matar).

3) Dolo cumulativo: o agente pretende alcançar dois resultados em seqüência. É o caso de progressão criminosa.

4) Dolo de dano: a vontade do agente é causar efetiva lesão ao bem jurídico.

5) Dolo de perigo: a vontade do agente é apenas expor a risco o bem jurídico tutelado (ex: art. 132 do CP – perigo para a vida ou saúde de outrem).

6) Dolo genérico: o agente tem vontade de realizar a conduta sem um fim específico.

7) Dolo específico: o agente tem vontade de realizar a conduta típica buscando um fim específico.

OBS: dolo genérico e dolo específico trata-se de uma classificação ultrapassada (hoje fala-se em dolo sem ou com elemento subjetivo do tipo).

8) Dolo geral (também chamado de erro sucessivo): veremos na próxima aula.

Page 55: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

55

9) Dolo de primeiro grau: é sinônimo de dolo direto.

10) Dolo de segundo grau: também é chamado de dolo necessário; o agente, para alcançar o resultado querido, realiza outro não diretamente visado, mas necessário para alcançar o fim último. Não se confunde com o dolo eventual. Qual é a diferença do dolo eventual para o dolo de segundo grau? Não se confundem, pois nesse último o resultado não diretamente querido é necessário para se alcançar a finalidade buscada; no dolo eventual o outro resultado não é necessário, mas sim possível (eventual). Ex (de Rogério Greco): eu quero matar uma pessoa que está em um avião; para isso jogo uma bomba no avião (a morte dos outros passageiros é necessária para alcançar o resultado).

Luiz Flávio Gomes diz que a teoria da representação foi adotada no dolo de 2º grau (ou seja, o agente prevê o resultado e não pára de agir).

11) Dolo de propósito: é o dolo refletido.

OBS: nem sempre majora a pena.

12) Dolo de ímpeto: é o dolo repentino.

OBS: é sempre uma atenuante da pena.

13) Dolo antecedente: antecede a conduta.

14) Dolo concomitante: é o dolo presente ao tempo da conduta.

15) Dolo subseqüente: é o dolo posterior à conduta.

A DOUTRINA critica veemente essa classificação (dolo antecedente / concomitante / subseqüente o dolo tem que ser sempre concomitante à conduta (não interessa se estava a vontade presente antes e/ou depois da conduta). Ex: receptação (a vontade tem que estar presente no momento da conduta). Exceção: actio libera in causa – embriaguez

Page 56: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

56

voluntária/preordenada (exemplo em que não há dolo na conduta, mas a vontade/consciência anterior basta).

16) Dolo normativo: dolo adotado pela teoria psicológica normativa da culpabilidade (neokantista). É elemento da culpabilidade e tem como requisitos: a) consciência; b) vontade; e c) consciência ATUAL da ilicitude.

17) Dolo natural: dolo adotado pela teoria normativa pura da culpabilidade (finalista). Integra o fato típico e tem como elementos a consciência e a vontade (o elemento normativo – consciência atual da ilicitude – é transformado em requisito da própria culpabilidade, não mais atual e sim POTENCIAL).

O que é valoração paralela na esfera do profano? A consciência atual da ilicitude (dolo normativo) é analisada na esfera do leigo (do profano).

Doente mental tem dolo? Sim. Então, doente mental tem consciência e vontade (mas uma vontade dentro de seu precário mundo valorativo).

OBS: Há doutrina dizendo que o tipo de dolo interfere na pena (o dolo direto deve ser mais severamente punido que o dolo eventual).

OBS: o “dolo geral” nós veremos na matéria “erro de tipo”.

CRIME CULPOSO: Art. 18 do CP:

Art. 18 - Diz-se o crime:

II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

Conceito: consiste numa conduta voluntária que realiza um fato ilícito não querido pelo agente, mas que foi por ele previsto (culpa

Page 57: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

57

consciente) ou lhe era previsível (culpa inconsciente) e que podia ser evitado se o agente atuasse com o devido cuidado.

O melhor conceito de crime culposo está no art. 33, II do CPM:

Art. 33. Diz-se o crime:

II - culposo, quando o agente, deixando de empregar a cautela, atenção, ou diligência ordinária, ou especial, a que estava obrigado em face das circunstâncias, não prevê o resultado que podia prever ou, prevendo-o, supõe levianamente que não se realizaria ou que poderia evitá-lo.

Elementos da culpa:

a) Conduta (ação/omissão);

b) Violação de um dever de cuidado objetivo (o agente atua em desacordo com o que esperado pela lei e sociedade);

OBS: é aqui que eu analiso as modalidades de culpa (ou modalidades de violação de um dever de cuidado objetivo):

Imprudência (afoiteza)

Negligência (falta de precaução)

Imperícia (falta de aptidão técnica para o exercício de arte, ofício ou profissão).

OBS: A DENÚNCIA TEM QUE APONTAR E DESCREVER A MODALIDADE DE CULPA (sob pena de inépcia).

Atentemos para o seguinte quadro:

ANTES DA LEI 11.719/08 DEPOIS DA LEI 11.719/08

“Mutatio Libelli”:

Sem aditamento (nova pena não superior à inicial);

“Mutatio Libelli”

Somente com aditamento (pouco importa a nova pena).

Page 58: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

58

Com aditamento (nova pena superior à inicial).

c) Resultado naturalístico;

Crime culposo pode não ser material? Vejamos:

CRIME MATERIAL CRIME FORMAL CRIME DE MERA CONDUTA

O tipo penal descreve CONDUTA + RESULTADO NATURALÍSTICO

O tipo penal descreve CONDUTA + RESULTADO NATURALÍSTICO (dispensável).

O tipo penal somente descreve CONDUTA.

Então, em regra não! Mas há exceções, como, por exemplo, o art. 38 da Lei 11.343/03 (que é formal).

Art. 33.  Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

d) Nexo de causalidade entre conduta e resultado;

e) Previsibilidade: o resultado deve ter sido abrangido pela previsibilidade do agente (ou seja, possibilidade de conhecer o perigo).

Exceção: culpa consciente (na culpa consciente não há mera previsibilidade, mas efetiva previsão).

Page 59: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

59

f) Tipicidade: o crime culposo somente pode ser previsto se houver expressa previsão legal (art. 18, parágrafo único do CP).

Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

O crime culposo fere o princípio da legalidade? O crime culposo é espécie de tipo “aberto”. Nos delitos culposos a ação do tipo não está determinada legalmente. Seus tipos são, por isso, “abertos”, dependendo de complementação judicial durante a análise do caso concreto. Então, o crime culposo, em tese, violaria o critério de certeza expresso no princípio da legalidade. Porém, o tipo culposo traz o mínimo de determinação necessário em obediência ao princípio da legalidade (o legislador não teria como prever todas as hipóteses de negligência/imprudência/imperícia).

Espécies de crimes culposos:

1) Culpa consciente: o agente, apesar de prever o resultado, decide prosseguir com a conduta, acreditando não ocorrer ou que pode evitá-lo com suas habilidades. É a culpa COM previsão.

2) Culpa inconsciente: o agente não prevê o resultado, que, entretanto, era objetiva e subjetivamente previsível. Neste caso, qualquer outra pessoa, naquelas circunstâncias, poderia prever a ocorrência daquele resultado. É a culpa SEM previsão (porém, com previsibilidade).

3) Culpa própria: é aquela em que o agente não quer e não assume o risco de produzir o resultado. É gênero do qual são espécies a culpa consciente e a culpa inconsciente.

4) Culpa imprópria (ou culpa por extensão, por assimilação ou equiparação): é aquela em que o agente, por erro, fantasia certa situação de fato, supondo estar agindo acobertado por uma excludente da ilicitude (descriminante putativa), e, em razão disso, provoca intencionalmente o resultado ilícito.

Page 60: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

60

Apesar de a ação ser dolosa, o agente responde por culpa por razões de política criminal. Ex: Renato vai em direção de Rogério, à noite, coloca a mão no bolso e Rogério, pensando que Renato está pegando uma arma, saca uma arma e atira em Renato; porém, Renato estava apenas pegando seu batom. A culpa está na parte final do art. 20 p. 1º do CP:

Descriminantes putativas

§ 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.

Trata-se de uma discriminante putativa por erro evitável!

Analisemos o seguinte quadro:

________________________

PREVISÃO VONTADE

DOLO DIRETO Prevê o resultado. Quer realizar o resultado.

DOLO EVENTUAL Prevê o resultado. Assume o risco de produzir o resultado.

CULPA CONSCIENTE (também chamada de culpa com previsão)

Prevê o resultado. Não quer e nem assume o risco de produzi-lo (acredita que pode evitá-lo).

CULPA INCONSCIENTE Não há previsão do resultado (que era previsível).

Não quer e nem assume o risco de produzir o resultado.

Então, qual é a diferença de dolo eventual para culpa consciente? A diferença não está no campo da previsão, mas no

Page 61: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

61

campo da vontade (ver quadro acima). OBS: STJ decide reiteradamente que “racha” é dolo eventual!

Existe no Direito Penal compensação de culpas? No Direito Penal não existe compensação de culpas (isso é coisa de Direito Civil). Mas a culpa concorrente da vítima atenua a responsabilidade do agente!

CRIME PRETERDOLOSO (também chamado de pretereventual):

Previsão legal: art. 19 do CP.

Agravação pelo resultado

Art. 19 - Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente.

Espécies de crime agravado pelo resultado:

1) Crime doloso agravado dolosamente (ex: homicídio qualificado);

2) Crime culposo agravado culposamente (ex: crime de incêndio qualificado pela morte);

3) Crime culposo agravado dolosamente (ex: homicídio no trânsito qualificado pela omissão de socorro);

4) Crime doloso agravado culposamente (ex: lesão corporal seguida de morte).

Somente esta 4ª espécie é considera preterdolo!

Conceito de preterdolo: crime preterdoloso é uma espécie de crime agravado pelo resultado, onde o agente pratica um crime distinto do que havia projetado cometer, advindo resultado mais grave, decorrência de negligência, imprudência ou imperícia. É um misto de dolo (na conduta) e culpa (no resultado).

Elementos do preterdolo:

a) Conduta dolosa visando determinado resultado (ex: lesão);

Page 62: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

62

b) Provocação de resultado culposo mais grave do que o originalmente projetado (ex: morte);

c) Nexo causal entre conduta e resultado (ex: lesão corporal seguida de morte);

OBS: É imprescindível que o resultado mais grave seja culposo (imputar resultado sem culpa é responsabilidade penal objetiva). Se o resultado mais grave é fruto de caso fortuito ou força maior, o agente só responderá pela lesão, e não pela morte.

Ex: Dou um soco em alguém (num bar cheio de mesas); essa pessoa cai e bate a cabeça em uma mesa e morre preterdolo! Ex: dou um soco em alguém, que, na queda, bate a cabeça em um prego e morre só respondo por lesão corporal!

“Vias de fato” seguida de morte configura lesão corporal seguida de morte? Não, porque isso seria analogia in malam partem. Configura, então, homicídio culposo!

ERRO DE TIPO:

Previsão legal: Art. 20 do CP.

Erro sobre elementos do tipo

Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.

Conceito: erro de tipo é a falsa percepção da realidade. Entende-se por erro de tipo aquele que recai sobre as elementares (causa de atipicidade absoluta ou relativa), circunstâncias do crime (podendo excluir causas de aumento, agravantes ou presunções legais), justificantes ou qualquer dado que se agregue a determinada figura típica.

Não podemos confundir erro de tipo com erro de proibição! Erro de tipo é a falsa percepção da realidade, ao passo que erro de proibição é a falsa percepção da ilicitude do comportamento. No erro de tipo o agente não sabe o que faz; já

Page 63: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

63

no erro de proibição o agente sabe o que faz, mas desconhece sua proibição.

O erro de tipo pode ser:

a) Essencial: quando recai sobre dados principais do tipo! Exemplo da caça em local próprio de caça (vi um arbusto se mexendo e atirei; porém, era uma pessoa).

Inevitável exclui dolo (porque não há consciência) e excluir culpa (porque não há previsibilidade); o agente não responde por nada!

Evitável exclui dolo (porque não há consciência), mas permanece a previsibilidade (permanece a culpa); o agente responde por crime culposo!

Mas, quando o erro é inevitável e quando o erro é evitável?

1ª corrente (clássica – minoritária): para saber se o erro é evitável ou inevitável, basta que nos socorramos do homem médio.

2ª corrente (moderna – majoritária): para saber se o erro é evitável, devemos analisar o caso concreto.

b) Acidental: quando recai sobre dados periféricos / acidentais / secundários do tipo! Exemplo do furto de sal no supermercado (que eu troquei por açúcar).

Sobre o objeto

Quanto à pessoa

Na execução

Resultado diverso do pretendido

Erro sobre o nexo causal

OBS: No erro de tipo essencial, se alertado, o agente pára de agir ilicitamente; já no erro de tipo acidental, se alertado, o agente corrige o comportamento e continua agindo ilicitamente.

Page 64: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

64

ANALISEMOS AS HIPÓTESES DE ERRO DE TIPO ACIDENTAL.

Erro sobre o objeto: não tem previsão legal; trata-se de uma criação da doutrina.

Conceito: representação equivocada do objeto material “coisa”. Nesse caso, o agente faz sua conduta recair sobre coisa diversa da pretendida. Ex: o agente quer subtrair sal, mas acaba, por erro, subtraindo açúcar; o agente queria subtrair um relógio de ouro, mas acabou, por erro, subtraindo um relógio de latão.

Conseqüência jurídica (soluções apontadas pela doutrina):

1) Não exclui dolo nem culpa;

2) Não isenta o agente de pena;

3) O agente responde pelo crime como o erro sobre o objeto é irrelevante, o agente responderá pelo crime considerando a coisa efetivamente atingida.

OBS: Zaffaroni discorda dessa solução, entendendo que deve ser aplicado o princípio do in dubio pro reo.

Erro quanto a pessoa: previsão legal art. 20 p. 3º do CP.

Erro sobre a pessoa

§ 3º - O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.

Conceito: representação equivocada do objeto material “pessoa”. Nesse erro, o agente representa equivocadamente alguém, atingindo pessoa diversa da pretendida. Não há erro na execução! Ex: quero matar meu pai. Representei mal quem entrou em casa e acabei matando meu tio (irmão gêmeo do meu pai).

Conseqüência jurídica (solução dada pela lei):

1) Não exclui dolo nem culpa;

Page 65: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

65

2) Não isenta de pena;

3) O agente responde pelo crime, porém considerando a vítima virtual (a vítima pretendida).

Erro na execução: tem previsão legal art. 73 (chamado pela doutrina “aberratio ictus”).

Erro na execução

Art. 73 - Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que pretendia ofender, atinge pessoa diversa, responde como se tivesse praticado o crime contra aquela, atendendo-se ao disposto no § 3º do art. 20 deste Código. No caso de ser também atingida a pessoa que o agente pretendia ofender, aplica-se a regra do art. 70 deste Código (concurso formal de delitos).

Conceito: o agente, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, atinge pessoa diversa da pretendida. Ex: o filho mira o pai, porém quando dispara, por erro no uso dos meios de execução, atinge o tio que está ao lado.

OBS: No erro sobre a pessoa, o agente representa mal, mas executa bem; já no erro na execução, o agente representa bem, mas executa mal!

O art. 73 refere-se em erro na execução que recai sobre o mesmo bem jurídico (pessoa – pessoa); não se fala em pessoa – coisa ou coisa – coisa (essas duas hipóteses estão previstas no art. 74 do CP: resultado direto do pretendido).

Conseqüência jurídica (solução):

1) Não exclui dolo nem culpa;

2) Não isenta de pena;

3) O agente responde pelo crime, porém considerando-se a vítima virtual (e não a vítima real).

OBS: São as mesmas conseqüências do erro sobre a pessoa!

Page 66: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

66

Espécies de “aberratio ictus”:

a) Por acidente a vítima pode ou não estar no local. Ex: a mulher quer matar o marido e coloca veneno em sua marmita; porém, o marido esqueceu a marmita em casa e quem comeu o alimento envenenado foi o filho.

b) Por erro no uso dos meios de execução a vítima está no local. OBS: Esta espécie de erro está umbilicalmente ligada à falta de perícia do agente. Ex: uma execução com arma de fogo;

OBS: A conseqüência jurídica é a mesma!

Resultado diverso do pretendido: previsão legal art. 74 (é a chamada “aberratio delicti” ou “aberratio criminis”). O art. 74 também é uma espécie de erro na execução, porém com resultado diverso do pretendido!

Resultado diverso do pretendido

Art. 74 - Fora dos casos do artigo anterior, quando, por acidente ou erro na execução do crime, sobrevém resultado diverso do pretendido, o agente responde por culpa, se o fato é previsto como crime culposo; se ocorre também o resultado pretendido, aplica-se a regra do art. 70 deste Código.

Conceito: o agente, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, provoca resultado diverso do pretendido, ferindo bem jurídico de natureza diversa. Ex: quero danificar o veículo do meu desafeto, porém, por erro na execução, acabo por atingir o motorista, que vem a falecer.

Não podemos confundir o art. 73 (“aberratio ictus”) com o art. 74 (“aberratio delicti”):

“ABERRATIO ICTUS” (ART. 73)

“ABERRATIO DELICTI” (ART. 74)

Resultado igual ao pretendido. Resultado diverso do pretendido.

Atinge bem jurídico igual Atinge bem jurídico diverso

Page 67: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

67

(pessoa – pessoa). (coisa – pessoa).

Conseqüência jurídica:

Não exclui dolo/culpa;

Não isenta de pena;

O agente responde pelo resultado considerando a vítima pretendida.

Conseqüência jurídica:

Não isenta de pena;

Responde o agente pelo resultado diverso do pretendido (bem jurídico efetivamente lesado), a título de culpa.

Ex: quero danificar o veículo do meu desafeto, porém, por erro na execução, acabo por atingir o motorista, que vem a falecer. Repondo por homicídio culposo.

OBS: De acordo com Zaffaroni (e é o entendimento que prevalece na doutrina e na jurisprudência), não se aplica o art. 74 do CP se o resultado produzido atinge bem jurídico menos valioso que o do resultado pretendido, sob pena de prevalecer a impunidade. Neste caso, o agente responde pela tentativa do resultado pretendido.

Para quem não concorda com este posicionamento, a tentativa branca jamais será punida.

Erro sobre o nexo causal: não há previsão legal trata-se de uma criação da doutrina (é o chamado “aberratio causae”).

Conceito: o agente, visando produzir determinado resultado mediante certo nexo causal, acaba por produzir o resultado visado, porém com outro nexo.

Há duas espécies de “aberratio causae”:

a) Erro sobre o nexo em sentido estrito o agente, mediante um só ato, produz o resultado visado, porém com nexo

Page 68: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

68

diverso. Ex: empurro alguém, para cair do penhasco e morrer afogada, mas a vítima morre com traumatismo craniano.

b) Dolo geral o agente, mediante conduta desenvolvida em dois ou mais atos, produz o resultado visado, porém com outro nexo. Ex: eu esgano minha filha, querendo matá-la; achando que ela morreu, eu a jogo pela janela e ela morre, na verdade, com traumatismo craniano.

Conseqüência jurídica da “aberratio causae”:

1) Não exclui dolo/culpa;

2) Não isenta de pena;

3) O agente responde pelo crime (resultado provocado). Mas qual nexo será considerado: o pretendido ou o efetivo?

1ª corrente o agente responde considerando-se o nexo pretendido; para evitar a responsabilidade penal objetiva.

2ª corrente o agente responde considerando-se o nexo efetivo (diverso do pretendido); o dolo se dirige ao resultado (e o resultado você atingiu).

3ª corrente (Zaffaroni) na dúvida, o juiz deve aplicar o princípio do in dubio pro reo.

Não há corrente prevalente (e não há posicionamento jurisprudencial consolidado).

Questões boas de concurso público:

Resultado pretendido quero envenenar a comida do cachorro (para matá-lo). Resultado produzido matei o filho do dono do cachorro. Houve um erro. Mas qual erro? Erro na execução (“aberratio criminis”) art. 74.

Um agente falsifica uma folha de cheque do banco ITAÚ. O promotor o denuncia por falsidade de documento público (o cheque, segundo o art. 297 p. 2º do CP, é um documento público por equiparação). Mas o réu, na defesa, diz que não

Page 69: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

69

sabia que o cheque de um banco privado era documento público por equiparação (o réu não sabia da existência do art. 297 p. 2º). E aí? Erro de subsunção! Não há previsão legal é uma criação da doutrina. Trata-se de um erro que recai sobre valorações jurídicas equivocadas, sobre interpretações jurídicas errôneas. O agente interpreta equivocadamente o sentido jurídico do seu comportamento. Conseqüência jurídica (solução da doutrina):

Não exclui dolo nem culpa;

Não isenta de pena;

O agente responde pelo crime, podendo o erro gerar, no máximo, uma atenuante genérica.

Eu quero matar um agente federal. Do lado dele estava um investigador da polícia civil. Atiro para matar o agente federal (vítima pretendida). Mas, por erro na execução, atinjo o policial civil. Que erro é esse? “Aberratio ictus” (art. 73). De quem é a competência para julgar? O art. 73 traz regra de direito penal, que interfere na punição, mas não na competência. Ou seja, para o direito penal considera-se a vítima virtual; mas para o processo penal considera-se a vítima real!

ERRO DETERMINADO POR TERCEIRO tem previsão legal (art. 20 p. 2º do CP).

Erro determinado por terceiro

§ 2º - Responde pelo crime o terceiro que determina o erro.

Conceito: No erro de tipo, o agente erra por conta própria/por si só. Já no erro determinado por terceiro há outra pessoa que induz o agente em erro.

Conseqüências jurídicas: Quem determina o erro dolosamente responde por crime doloso; quem determina o erro culposamente responde por crime culposo (hipótese de autoria mediata); o enganado, e não agiu com dolo nem culpa, fica isento de pena.

Page 70: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

70

Ex: médico quer matar o paciente e, enganando a enfermeira, troca a ampola da seringa.

Não podemos confundir erro de tipo com delito putativo por erro de tipo: nos dois casos, o agente não sabe o que faz. Mas há diferenças:

ERRO DE TIPO DELITO PUTATIVO POR ERRO DE TIPO

O agente imagina estar agindo licitamente.

O agente ignora a presença de uma elementar.

O agente pratica fato típico sem querer.

Ex: Atiro num arbusto, imaginando que lá se escondia um animal (mas era uma pessoa).

O agente imagina estar agindo ilicitamente.

O agente ignora a ausência de uma elementar.

O agente pratica o fato atípico sem querer.

Ex: Atiro em uma pessoa que já estava morta, mas eu não sabia.

(MP/RJ) O marido quer matar a mulher. Ele, então, pega as cápsulas de remédio dela e troca por veneno. Quando ele volta ao quarto, percebe que ela estava dormindo. Do lado dela estava um frasco idêntico ao das cápsulas que ele trocou, mas ela não havia tomado o veneno, mas outro remédio. O que é isso? Fato atípico, pois dolo geral pressupõe início da execução (Rogério Sanches discorda, entendendo que houve sim início da execução; seria, então, hipótese de dolo geral).

Vamos nos situar: estamos estudando o fato típico. Dentro do fato típico estamos em conduta (onde estudamos: conceito; espécies – dolo e culpa). Agora, precisamos estudar a ação (crime comissivo) e a omissão (crime omissivo).

AÇÃO (CRIME COMISSIVO)

Page 71: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

71

O crime comissivo está descrito num tipo proibitivo, isto é, um tipo através do qual o direito penal protege bens jurídicos, proibindo algumas condutas desvaliosas.

O agente pratica o crime infringindo o tipo proibitivo (os tipos proibitivos configuram a regra no CP).

OMISSÃO (CRIME OMISSIVO)

O crime omissivo esta previsto em tipos mandamentais, isto é, tipos através dos quais o direito penal protege bens jurídicos determinando a realização de condutas valiosas.

O agente deixa de agir de acordo com o que determinado pela norma.

A norma mandamental pode decorrer:

a) Do próprio tipo penal (são tipos penais que têm a expressão “deixar de”);

Esse é o crime omissivo próprio!

b) De uma cláusula geral (art. 13 p. 2º do CP).

Esse é o crime omissivo impróprio!

Relevância da omissão

§ 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância (ex: policial);

b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado (ex: professor em excursão de escola);

c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado (ex: eu te empurrei na piscina).

Quadro comparativo Crime omissivo próprio VS. Crime omissivo impróprio:

Page 72: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

72

CRIME OMISSIVO PRÓPRIO CRIME OMISSIVO IMPRÓPRIO

Dever genérico de agir (recai sobre todos). Ex: prestar socorro ao próximo.

Existe uma subsunção direta (fato/norma). O dever de agir deriva da própria norma mandamental (a omissão está descrita no tipo incriminador).

Não se admite a tentativa.

Natureza jurídica: ausência de ação esperada.

Dever especial de evitar o resultado (não se trata de mero dever de agir), que recai sobre pessoa especial. Ex:

Subsunção indireta. O dever de evitar o resultado deriva de cláusula geral (art. 13 p. 2º do CP). A omissão não está descrita no tipo (como você tinha o dever de evitar o resultado, vai responder por ação – como se houvesse praticado o resultado).

Admite-se a tentativa.

Natureza jurídica: uma realidade onde falta a causalidade. O agente responde penalmente porque não evita resultado que estava obrigado a evitar.

O que é um crime de conduta mista? É um crime que reúne as duas espécies de comportamento (ação e omissão). O próprio tipo penal traz os dois comportamentos (uma ação seguida de uma omissão). Ex: art. 169, parágrafo único, II (apropriação indébita de coisa achada – que é um “crime a prazo”); art. 168-A (apropriação indébita previdenciária).

RESULTADO

Page 73: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

73

Há duas espécies de resultado:

1) Resultado naturalístico da conduta do agente resulta alteração física no mundo exterior (a morte no homicídio; a diminuição patrimonial nos crimes contra o patrimônio etc.).

2) Resultado normativo da conduta do agente resulta lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado.

Classificação do crime quanto ao resultado:

1) Crime material o tipo penal descreve: conduta + resultado naturalístico;

O resultado naturalístico é indispensável para a consumação (ex: art. 121; art. 155).

2) Crime formal o tipo penal descreve: conduta + resultado naturalístico;

O resultado naturalístico é dispensável para a consumação. A consumação é antecipada para o momento da conduta – por isso o crime formal é também chamado de “crime de consumação antecipada”. Ocorrendo o resultado naturalístico que era dispensável, estamos diante de um mero exaurimento (o juiz considera esse exaurimento na fixação da pena). Ex: extorsão (art. 158); crimes contra a honra.

3) Crime de mera conduta o tipo penal descreve uma mera conduta (é um tipo que não tem resultado naturalístico). Ex: violação de domicílio (art. 150).

O que é um tipo incongruente? No tipo incongruente há incongruência entre os elementos objetivo e subjetivo do tipo (por exemplo: crime formal você quer mais do que o legislador exige; você quer mais do que subjetivamente se exige).

O que é um delito de tendência interna transcendente? É uma espécie de delito de intenção. Ou seja, você quer mais do que o legislador exige. Portanto, trata-se de uma espécie de delito formal. O delito de tendência interna transcendente se divide em:

Page 74: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

74

a) De resultado cortado: o resultado naturalístico dispensável depende de comportamento de terceiros alheios à execução. Ex: extorsão mediante seqüestro (art. 159).

b) Atrofiado de dois atos: o resultado naturalístico, também dispensável, depende de novo comportamento do agente. Ex: falsificação de moedas.

Essa classificação é encontrada na obra de Francisco de Assis Toledo.

Todo crime tem resultado naturalístico? Não. Nem todos os crimes geram alteração no mundo exterior. Todo crime tem resultado normativo? Sim. Não há crime sem resultado normativo. Todos os crimes representam lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado. Prevalece hoje o entendimento (impulsionado pelo funcionalismo penal) de que o resultado que integra o fato típico é o resultado normativo (não interessa se o crime é material, formal ou de mera conduta).

RELAÇÃO DE CAUSALIDADE

Conceito: é o nexo causal; vínculo entre conduta e resultado. O estudo da causalidade busca concluir se o resultado, como um fato, ocorreu da ação e se pode ser atribuído, objetivamente, ao sujeito ativo, inserindo-se na sua esfera de autoria por ter sido ele o agente do comportamento.

A relação de causalidade é requisito essencial do fato típico? Depende do resultado que você entende que integra o fato típico (para quem entende que o resultado que integra o fato típico é o resultado naturalístico, o resultado só essencial nos crimes materiais – fundamento dessa corrente: art. 13 do CP). A corrente majoritária entende que o resultado jurídico é que integra o fato típico; então, para essa corrente (impulsionada pelo funcionalismo penal), a relação de causalidade é requisito essencial do fato típico. Essa segunda corrente faz uma releitura do art. 13 do CP.

Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a

Page 75: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

75

ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

O art. 13, “caput”, adotou a causalidade simples, generalizando as condições, é dizer, todas as causas concorrentes se põem no mesmo nível de importância, equivalendo-se em seu valor (é a teoria da equivalência dos antecedentes causais). A teoria da equivalência dos antecedentes causais, sozinha, não chega à causa; essa teoria deve ser aliada à teoria da eliminação hipotética dos antecedentes causais (no campo mental da suposição e da cogitação, o aplicador deve proceder à eliminação da conduta do sujeito ativo para concluir pela persistência ou desaparecimento do resultado. Persistindo não é causa; desaparecendo é causa).

A teoria da causalidade simples pode regressar ao infinito (ex: eliminem do mundo o pai e a mãe do Fernandinho Beira Mar – nenhum de seus crimes teria ocorrido).

É exatamente contra esse regresso ao infinito que surge a teoria da imputação objetiva. O pai e a mãe do Fernandinho são causa dos delitos por ele cometidos. Mas não são responsáveis. A causa, portanto, regressa ao infinito; a responsabilidade é que encontra limites. A teoria da imputação objetiva não busca limites apenas à responsabilidade, mas também à causa.

TEORIA DA CAUSALIDADE SIMPLES

TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA

A causa depende tão somente do nexo físico.

A causa depende de nexo físico + nexo normativo.

O que é nexo normativo?

Criação ou incremento de risco proibido relevante. O que é risco proibido? É um risco não tolerado pela sociedade.

Page 76: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

76

Resultado com desdobramento causal normal da conduta.

Responsabilidade = dolo/culpa + ilicitude + culpabilidade.

Apenas depois de preenchidos os requisitos acima é que se inicia o exame da responsabilidade.

Responsabilidade = dolo/culpa + ilicitude + culpabilidade.

Insurgindo-se contra o regresso ao infinito decorrente da causalidade simples, a teoria da imputação objetiva enriquece a relação de causalidade, acrescentando o nexo normativo, composto de:

a) Criação ou incremento de um risco não permitido (não tolerado pela sociedade);

b) A exigência de que o resultado esteja na linha de desdobramento causal normal da conduta.

Com isso, a teoria da imputação objetiva consegue limitar a imputação.

Para parcela da doutrina, a imputação objetiva consiste no corretivo do nexo causal (um limite, um novo filtro antes de se chegar à responsabilidade). Para Luiz Flávio Gomes, a criação ou incremento de um risco não permitido deve ser analisado na tipicidade material (é um corretivo da tipicidade).

CONCAUSAS:

Conceito: Pluralidade de causas concorrendo para o mesmo evento.

As concausas podem ser:

1) Absolutamente independentes a causa efetiva do resultado não se origina direta ou indiretamente de outra;

Page 77: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

77

2) Relativamente independente a causa efetiva do resultado decorre direta ou indiretamente de outra.

Estas, por sua vez, podem ser:

a) Pré-existente a causa efetiva é anterior a outra;

b) Concomitante a causa efetiva é concomitante (presente ao mesmo tempo) a outra;

c) Superveniente a causa efetiva é posterior a outra.

Conseqüências:

Ex: “A” às 19h deu veneno para “C”. “B” às 20h deu um tiro em “C”. “C” morreu às 21h em razão do emprego de veneno. “A” responde por homicídio (não é para este agente que existe o estudo das concausas). “B” responde pelo que? A concausa é absolutamente independente preexistente portanto, “B” responde por TENTATIVA!

Conseqüência da concausa absolutamente independente preexistente TENTATIVA.

Conseqüência da concausa absolutamente independente concomitante TENTATIVA.

Conseqüência da concausa absolutamente independente superveniente TENTATIVA.

Ou seja, toda vez que a concausa for absolutamente independente, a conseqüência é que o agente responde por tentativa!

Ex: “A” deu uma facada em “B”, que morreu porque era hemofílico (morreu em razão de hemorragia anormal). “B” não produziu plaquetas suficientemente para estancar o sangue. Estamos diante de concausa relativamente independente preexistente.

Conseqüência da concausa relativamente independente preexistente CONSUMAÇÃO, desde que a circunstância seja do conhecimento do agente (de modo a evitar a responsabilidade penal objetiva).

Page 78: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

78

Conseqüência da concausa relativamente independente concomitante CONSUMAÇÃO.

Até agora, estávamos no art. 13, “caput” (que trabalha com a idéia de “causalidade simples”).

Art. 13 - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

Vamos ao art. 13, p. 1º (que trabalha com a idéia de “causalidade adequada” somente haverá imputação do resultado ao agente se, no conjunto das causas, fosse sua conduta, consoante as regras de experiência comum, a mais adequada à provocação do resultado ocorrente):

§ 1º - A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.

Conseqüência da concausa relativamente independente superveniente que por si só causou o resultado TENTATIVA. Ex: teto que cai na cabeça do paciente que está internado porque sofreu um tiro.

Conseqüência da concausa relativamente independente superveniente que não por si só causou o resultado CONSUMAÇÃO. Ex: erro médico. PARA A PROVA DO CESPE, INFECÇÃO HOSPITALAR TEM O MESMO TRATAMENTO DO ERRO MÉDICO.

OBS: O que significa a expressão “por si só”? O resultado sai da linha de desdobramento causal normal da conduta. É um evento imprevisível ao agente. O que significa a expressão “não por si só”? O resultado está na linha de desdobramento causal normal da conduta. É um evento previsível.

Page 79: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

79

Luiz Flávio Gomes ensina que o art. 13, p. 1º é o berço da imputação objetiva no Brasil; ele tem predicados de imputação objetiva! Portanto, a imputação objetiva está positivada no nosso código (causalidade adequada – ela evita o regresso ao infinito).

Existe nexo causal em crime omissivo?

a) Crimes omissivos próprios ou puros há somente a omissão de um dever de agir, imposto normativamente, dispensando, via de regra, a relação de causalidade (são delitos de mera conduta).

b) Crimes omissivos impróprios o dever de agir é para evitar o resultado concreto; estamos diante de um crime de resultado material, exigindo, conseqüentemente, a presença de nexo causal entre conduta omitida (e esperada) e o resultado. Esse nexo, no entanto, para a maioria da doutrina, não é naturalístico (do nada não pode vir nada). Na verdade, o vínculo é jurídico, isto é, o sujeito não causou, mas como não o impediu é equiparado ao verdadeiro causador do resultado (é o “nexo de não impedimento” ou, nas palavras de Zaffaroni, “nexo de evitação”).

TIPICIDADE

AULA: 29/10

Culpabilidade

Revisão do que já foi visto:

Fatos -> humanos -> da natureza

Direito penal é seletivo: se preocupa apenas com fatos humanos. Porém há fatos humanos desejados e indesejados. Interessa ao Direito Penal apenas os indesejados. O Direito Penal é norteado pelo Princípio da Intervenção Mínima. O DP é fragmentário, subsidiário. Para interessar ao DP é necessário fato humano indesejado, que constitui uma conduta produtora de um resultado que se ajusta perfeitamente ao tipo penal fato típico.

Fato típico é o 1º substrato do crime

Ilicitude é o 2º substrato do crime.

Page 80: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

80

Culpabilidade

Seria a culpabilidade o 3º substrato do crime?

1ª corrente (bipartida) – adotada pelo Código Penal: a culpabilidade não integra o crime. Objetivamente, para a existência do crime, é prescindível. O crime existe por si mesmo com os requisitos: fato típico e ilicitude. Mas, o crime só será ligado ao agente se este for culpável.

Conclusão: a culpabilidade é pressuposto de aplicação da pena, mero juízo de censura.

2ª corrente (tripartida): a culpabilidade integra o crime, sendo seu 3º substrato. É um juízo de censura extraído da análise como o sujeito ativo se situou e se posicionou, pelo seu conhecimento e querer, diante do episódio com o qual se envolveu.

Teorias da culpabilidade

1ª – Teoria Psicológica

2ª – Teoria Psicológica Normativa da Culpabilidade

3ª Teoria Normativa Pura (Extremada)

4ª Teoria Limitada da Culpabilidade

Tem base causalista

Tem base neokantista

Tem base finalista

Tem base finalista

- Culpabilidade - espécies: a) dolo; b) culpa;

- Culpabilidade – elemento: imputabilidade.

Crítica: colocar 2 fenômenos tão distintos como espécies do mesmo gênero.

- Culpabilidade – sem espécies.

- Culpabilidade tem elementos: imputabilidade; exigibilidade de conduta diversa; culpa e dolo (dolo normativo). O dolo é constituído de consciência e vontade e atual consciência da ilicitude (elemento normativo).

- Culpabilidade:

- imputabilidade

- exigibilidade de conduta diversa;

* culpa: migrou para o fato típico);

* dolo: migrou para o fato típico, mas despido do elemento normativo (como dolo natural –

- Culpabilidade é constituída de:

- imputabilidade; exigibilidade de conduta diversa; potencial consciência da ilicitude.

* a descriminante putativa sobre fato é tratada como erro de tipo.

Page 81: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

81

Crítica: dolo e culpa na culpabilidade.

consciência e vontade).

* a descriminante putativa sobre fato é tratada como erro de proibição.

Dolo normativo

Adotado pelos Neokantistas, adeptos da teoria psicológica normativa da culpabilidade, o dolo normativo integra a culpabilidade como seu elemento, tendo como requisitos: a) consciência (ver se o agente sabe o que faz); b) vontade; c) atual consciência da ilicitude (elemento normativo – é ver se o agente sabe que o que faz contraria o ordenamento jurídico). Essa consciência do agente quanto à ilicitude é a valoração na esfera do profano, e não técnica.

Dolo natural

Adotado pelos finalistas, adeptos da teoria normativa pura da culpabilidade, migra para o fato típico tendo como requisitos apenas elementos naturais, quais sejam: consciência e vontade.

A consciência da ilicitude deixa de pertencer ao dolo para integrar a própria culpabilidade, porém não mais como atual e sim como potencial.

Pergunta: qual é a repercussão de se mudar a consciência da ilicitude de atual para potencial?

Elementos da culpabilidade (o Brasil adotou a teoria limitada da culpabilidade)

a) Imputabilidade -> do agente

b) Exigibilidade de conduta diversa -> do agente

c) Potencial consciência da ilicitude -> do agente

* a culpabilidade é do agente, pois é subjetiva (em sentido contrário LFG: a culpabilidade é do fato).

Page 82: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

82

Imputabilidade

É a capacidade de imputação, ou seja, possibilidade de atribuir a alguém a responsabilidade pela prática de uma infração penal. É o conjunto de condições pessoais que conferem ao sujeito ativo a capacidade de discernimento e compreensão para entender seus atos e determinar-se conforme esse entendimento.

Capacidade ou incapacidade para negócios jurídicos Direito Civil

Imputabilidade ou inimputabilidade Direito Penal

Imputabilidade não é sinônimo de responsabilidade. Imputabilidade é pressuposto; responsabilidade é conseqüência.

Obs. Imunidade parlamentar absoluta: é imputabilidade sem responsabilidade.

O Código Penal não define imputabilidade, mas traz hipóteses de inimputabilidade, isto é, o CP define a contrario sensu.

Critérios de definição de inimputabilidade

1. Biológico: leva em conta apenas o desenvolvimento mental do acusado (doença mental ou idade), independentemente de sua capacidade de discernimento no momento da conduta. Para esse critério, todo louco é inimputável.

2. Psicológico: considera apenas se o agente, no momento da conduta tinha capacidade de discernimento, independentemente da sua condição mental. Para esse critério importa considerar se o agente sabia em que consistia sua conduta.

3. Biopsicológico: considera inimputável o agente que apresenta desenvolvimento mental incompleto ou retardado, não tendo capacidade de discernimento no momento da conduta.

O CP adotou o critério biopsicológico. Assim, no Brasil, nem todo louco é inimputável. Para ser inimputável há de ser louco e incapaz de saber o que estava fazendo.

Hipóteses de inimputabilidade

1ª Hipótese: inimputabilidade em razão de anomalia psíquica (CP 26 caput).

Doença mental: deve ser tomada em sua maior amplitude e abrangência, isto é, qualquer enfermidade que venha a debilitar as funções psíquicas. O acusado é processado e, embora absolvido (absolvição imprópria) é submetido a medida de segurança (espécie de sanção penal).

Page 83: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

83

OBSERVAÇAO

A semi-imputabilidade não exclui o dolo, portanto, compatível com as circunstancias subjetivas do artigo 26 em seu caput.

2ª Hipótese:inimputabilidade em razão da idade do agente – art. 27 do CP.

Critério para definir menoridade – art. 228, CF

1 corrente: status de cláusula pétrea para este art.;

2 corrente- não reconhece esse status, sendo possível, portanto a alteração por meio EC (capez).

Art. 4 da CP – análise da imputabilidade no momento da conduta.

Pouco importa se houve maioridade civil, o DP trabalha com a idade cronológica.

OBSERVAÇAO

Emoção – estado súbito e passageiro – causa atenuante;

Paixão – sentimento crônico e duradouro) – se equipara a doença a depender do grau.

3ª Hipótese: Embriaguez – art. 28, II

CONCEITO – é a intoxicação aguda e transitória causada pelo álcool, cujos efeitos podem variar de uma ligeira excitação inicial até o estado de paralisia e coma.

Álcool – equipara a qualquer substancia de efeito análogo.

EMBRIAGUEZ

ORIGEM GRAU

Acidental – proveniente de caso fortuito (o agente desconhece o caráter inebriante da substancia que ingere) ou força maior (o agente é obrigado a ingerir a substancia);

Pode ser completa (isenta de pena – art. 28, parágrafo 1 – critério biopsicológico) ou incompleta

Page 84: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

84

Não – acidental – pode ser voluntaria (o agente quer se embriagar) ou culposa (o agente não quer, mas contribui pra isso. Ex: exagerou na dose).

Pode ser completa ou incompleta – ambas não excluem a imputabilidade – art. 28, II.

Patológica – doentia. Pode ser completa ou incompleta – art. 26, caput ou parágrafo 2 a depender do grau)

Preordenada – bebe para cometer o crime

Pode ser completa ou incompleta – agravante de pena – art. 61, II, letra ‘L’.

TEORIA ACTIO LIBERA IN CAUSA O ato transitório revestido de inconsciência decorre de ato antecedente que foi livre na vontade, transefrindo-se para esse momento anterior a constatação da imputabilidade.

CUIDADO

O uso irresponsável dessa teoria pode gerar responsabilidade penal objetiva.

EMBRIAGUEZ AO VOLANTE

ATO ANTECEDENTE LIVRE NA VONTADE

ATO TRANSITÓRIO REVESTIDO DE

INCONSCIÊNCIA

Momento: ingestão da bebida;

Situação: O agente bebia, prevê o resultado e tem vontade de agir(dolo direto) (d

Momento: o atropelamento;

Situação: completamente embriagado, você atropela e mata.

A teoria da actio libera in causa analisa a imputabilidade no momento antecedente, onde o agente era livre na vontade.

Situação: o agente previu o resultado e assumiu o risco de faze-lo (dolo eventual)

Situação: completamente embriagado, você atropela e mata. AQUI o agente responde pelo homicídio e

Page 85: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

85

responde a titulo de dolo eventual.

Situação: O agente bebia, prevê o resultado e negligentemente o faz

Situação: completamente embriagado, você atropela e mata. – responde a titulo de culpa consciente.

Situação: O agente bebia, não prevê, mas era previsível o resultado.

Situação: completamente embriagado, você atropela e mata.- responde por culpa incosnciente.

Situação: O agente bebe todas, não prevê o resultado e ele Tb não era previsível.

Situação: completamente embriagado, você atropela e mata.- REDUNDA EM RESPONSABILIDADE OBJETIVA, mesmo que não estivesse bêbado aquela pessoa no meio da estrada iria ser atropelada. AQUI A TEORIA NÃO ATUA.

ATENÇAO

Art. 306, CBT –

Elementar: 6 dg/l

a)bafômetro – apura – NÃO SOU OBRIGADA A FAZER ESTE TESTE;

b)exame de sangue – apura - NÃO SOU OBRIGADA A FAZER ESTE TESTE.

c)exame clínico – não apura

d)qualquer outro meio – não apura

Page 86: Direito Penal 1 - Rogério Sanches - 2008

86

O STJ decidiu que o bafômetro não é meio aceito como prova para apurar a quantidade de álcool do sangue, mas sim para saber a quantidade de álcool concentrado no ar dos pulmões.

Badan Palhares tb disse que o exame de sangue Tb não apura, pq nenhum local do corpo agrega a mesma quantidade de álcool.