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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO DIREITO SUCESSÓRIO DOS COMPANHEIROS PERANTE O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO MARINA BARRETO DOS SANTOS Itajaí, 06 de junho de 2006.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

DIREITO SUCESSÓRIO DOS COMPANHEIROS PERANTE O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

MARINA BARRETO DOS SANTOS

Itajaí, 06 de junho de 2006.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

DIREITO SUCESSÓRIO DOS COMPANHEIROS PERANTE O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

MARINA BARRETO DOS SANTOS

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professora MSc Denise Schmitt Siqueira Garcia

Itajaí, 06 de junho de 2006.

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AGRADECIMENTOS

Meus sinceros agradecimentos aos meus pais, por serem pessoas igualmente belas e importantes em minha vida, e pelos estímulos que me impulsionaram a buscar vida nova a cada dia. Obrigada por dizerem, algumas vezes, o que eu realmente precisava ouvir, em vez do que eu queria que vocês dissessem.

À minha irmã, pelo incentivo e apoio em todas as horas que preciso.

Meu especial agradecimento ao meu namorado Fernando, pelo companheirismo e pela disposição, sempre presente, em ajudar.

À minha avó, por sempre torcer por mim, externo aqui minha gratidão.

À minha tia Marísia, pelo amor e carinho a mim proporcionado.

Ao Leonardo, por saber que estará sempre presente quando eu precisar.

Aos meus amigos, pela confiança e amizade, sem as quais a vida não tem sentido.

À minha colega e amiga Tatiane, não só pelo apoio na pesquisa bibliográfica, mas também pela amizade a mim concedida.

À professora Denise pela orientação, incentivo e dedicação, sem os quais esta monografia não teria a mesma qualidade.

Enfim, às pessoas que mais amo nessa vida, as quais fizeram, fazem e sempre farão parte da minha história.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais, Marilson Miguel Barreto dos Santos e Marilze Trevisan Barreto dos Santos, pela formação e educação que me deram, e por sempre terem possibilitado a concretização dos meus sonhos, acreditando neles e compartilhando, todos os momentos da minha vida, sejam eles bons ou ruins.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 06 de junho de 2006.

Marina Barreto dos Santos Graduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Marina Barreto dos Santos, sob o

título Direito Sucessório dos Companheiros perante o Ordenamento Jurídico

Brasileiro, foi submetida em 06 de junho de 2006 à banca examinadora composta

pelos seguintes professores: Professora MSc. Denise Schmitt Siqueira Garcia,

Professora MSc Ana Lúcia Pedroni e Professora MSc. Andrietta Kretz, e aprovada

com a nota 10 (dez).

Itajaí, 06 de junho de 2006.

Denise Schmitt Siqueira Garcia Orientadora e Presidente da Banca

Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Ascendentes

Aqueles de quem se descende. São parentes ascendentes o pai, o avô, o bisavô

etc1.

Companheiro sobrevivente ou companheiro supérstite

Aquele que viveu com o falecido, com o intuito de formar família, que tem direito à

herança, porém somente em relação aos bens adquiridos onerosamente na

constância da união estável2.

Concubinato

O concubinato é classificado como puro ou impuro. O concubinato puro é

sinônimo de união estável, portanto, se apresenta como uma união duradoura

entre homem e mulher livres, que não estão impedidos legalmente de se casar.

Já o concubinato impuro, é aquela relação não eventual, em que um dos amantes

ou ambos possuem algum impedimento matrimonial. Cumpre salientar, que o

ordenamento jurídico atual passou a utilizar os termos união estável e

companheiros, tornando as terminologias concubinato e concubinos em uniões de

segunda classe3.

Cônjuge

É aquela pessoa que convive, devido a um laço matrimonial, como outra pessoa.

Portanto, são aquelas pessoas unidas devido ao intuito de formar família4.

1 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Jurídico . São Paulo: Rideel, 1997. 2 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões. v. 7. 3. ed. São Paulo: Atlas,

2003, p. 119. 3 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões . v. 6. 17 ed.

São Paulo: Saraiva, 2002, p. 345-346. 4 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 109.

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De cujus ou de cuius

A pessoa que faleceu, e que por esta ocasião deixa o seu patrimônio aos seus

sucessores5.

Descendentes

São aquelas pessoas que descendem, ou seja, nascem devido a outras pessoas.

Portanto, descendentes são os filhos, netos, bisnetos etc6.

Direito das Sucessões

Conjunto de normas que disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa

que morreu a seus herdeiros, em virtude de lei ou de testamento7.

Direito Real de Habitação

É o direito que é assegurado a uma pessoa, sem prejuízo da participação que lhe

caiba na herança, de continuar residindo no imóvel destinado à residência

familiar, desde que seja o único daquela natureza a inventariar8.

Filiação Híbrida

Filiação híbrida é quando se tem filhos do autor da herança e do companheiro

sobrevivente e filhos só do autor da herança9.

Herança

Conjunto que engloba direitos, obrigações, bens e encargos, que são transmitidos

após a morte10.

Outros parentes sucessíveis

5 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . v. 5. 14 ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2004, p. 03. 6 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Jurídico . São Paulo: Rideel, 1997. 7 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 3. 8 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2004, p. 149. 9 GARCIA, Denise Schmitt Siqueira. Direito sucessório do cônjuge na sucessão legítima no

ordenamento jurídico brasileiro. II semana de divulgação cientifica do CERJURPS. 10 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 37.

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Ascendentes e colaterais de até 4º grau, que possam vir a concorrer com o

companheiro sobrevivente caso não haja descendentes11.

Sucessão Legítima

Sucessão legítima é aquela que deriva da lei conforme a ordem de vocação

hereditária12.

Sucessor

Sucessor é aquele que recebe os bens deixados pelo falecido; a título universal,

ou até mesmo a título singular um determinado bem13.

União Estável

União Estável é a convivência de duas pessoas de sexos diferentes, fora do

matrimônio, de caráter estável, mais ou menos prolongada, para o fim de

satisfação sexual, assistência mútua e dos filhos comuns e que implica uma

presumida fidelidade da mulher ao homem14.

11 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 116. 12 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões . v. 7. 25. ed. São Paulo: Saraiva,

2002, p. 16. 13 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 224. 14 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 287.

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SUMÁRIO

RESUMO .............................................................................................................. XI

INTRODUÇÃO......................................................................................................12

CAPÍTULO 1......................................... ................................................................16

DIREITO SUCESSÓRIO.......................................................................................16 1.1 BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS ACERCA DO DIREI TO DAS SUCESSÕES........................................................................................................16 1.2 FUNDAMENTO DO DIREITO DAS SUCESSÕES. ........... .............................20 1.3 CONTEÚDO DO DIREITO DAS SUCESSÕES. .............................................22 1.4 CONCEITUAÇÃO DO DIREITO DAS SUCESSÕES. ......... ...........................23 1.5 TRANSMISSÃO DA HERANÇA......................... ............................................25 1.6 ESPÉCIES DE SUCESSÃO. ..........................................................................26 1.6.1 SUCESSÃO LEGÍTIMA ......................................................................................26 1.6.2 SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA ...........................................................................28 1.6.3 SUCESSÃO SINGULAR .....................................................................................30 1.6.4 SUCESSÃO UNIVERSAL ...................................................................................31 1.7 ESPÉCIES DE SUCESSORES ......................................................................34 1.8 NOÇÃO DE HERANÇA............................... ...................................................38 1.9 CLASSIFICAÇÃO DAS HERANÇAS..................... ........................................40

CAPÍTULO 2......................................... ................................................................44

UNIÃO ESTÁVEL ...................................... ...........................................................44 2.1 BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS ACERCA DO SURGI MENTO DA UNIÃO ESTÁVEL ...................................... ...........................................................44 2.2 ANÁLISE DOS TERMOS UTILIZADOS PARA IDENTIFICAR A UNIÃO ESTÁVEL............................................ ..................................................................51 2.3 CONCEITUAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL.................. .....................................53 2.4 PRESSUPOSTOS PARA CONSTITUIÇÃO DE UMA UNIÃO EST ÁVEL. .....56

CAPÍTULO 3......................................... ................................................................65

DIREITO SUCESSÓRIO NA UNIÃO ESTÁVEL................ ...................................65 3.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO SUCESSÓRIO DOS COMPANHEIROS ................................................................................................65 3.2 DIREITO SUCESSÓRIO COM BASE NO ATUAL CÓDIGO CIV IL. ..............76 3.2.1 CONCORRÊNCIA COM OS DESCENDENTES COMUNS............................................78 3.2.2 CONCORRÊNCIA COM OS DESCENDENTES SÓ DO AUTOR DA HERA NÇA. ...............80 3.2.3 CONCORRÊNCIA COM OUTROS PARENTES SUCESSÍVEIS . ....................................83 3.2.4 HERDEIRO DA TOTALIDADE DA HERANÇA . .........................................................85 3.3 DIREITO REAL DE HABITAÇÃO. ..................... ............................................88

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CONSIDERAÇÕES FINAIS............................... ...................................................91

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...................... ........................................94

ANEXOS...............................................................................................................96

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RESUMO

O presente trabalho de monografia, intitulado “Direito

Sucessório dos Companheiros perante o Ordenamento Jurídico Brasileiro” busca

explicitar os modos pelos quais se dá o Direito Sucessório decorrente da relação

entre um homem e uma mulher, que apesar de não possuírem laços

matrimoniais, convivem em união estável como se casados fossem. Com a

entrada em vigor da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, os

companheiros receberam a qualificação de entidade familiar, merecedora de

proteção do Estado; e portanto, a partir daí, fez-se necessário a elaboração de

uma lei para regulamentar a vida dessas pessoas. Os Direitos Sucessórios dos

Companheiros, antes das normas estabelecidas no artigo 1.790 do Código Civil

de 2002, estavam estabelecidos nas Leis 8.971/94 e 9.278/96, que acabavam por

atribuir aos companheiros sobreviventes direitos hereditários equivalentes aos

dos cônjuges supérstite, e em alguns aspectos, chegava a favorecer mais os

primeiros do que aos últimos. Para tanto, modificações foram trazidas pelo atual

Código, as quais geraram divergências doutrinárias e jurisprudencias, pois ao

invés de fazer as adaptações e consertos que a doutrina já propugnava, o

legislador estranhamente deixou de fornecer explicitamente solução para algumas

hipóteses; como por exemplo, a concorrência do companheiro com filhos comuns

e filhos só do autor da herança, bem como sobre o Direito real de habitação;

embora tenha evoluído em alguns aspectos. O propósito deste trabalho de

conclusão de curso, é procurar criar aqui, um campo fértil para a compreensão

deste tema tão divergente; porém, cumpre salientar, que este trabalho não poderá

definir o certo ou errado no que diz respeito as divergências, tendo em vista a

omissão do legislador.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia para obtenção do título de bacharel

em direito, tem como objeto o estudo do Direito Sucessório dos Companheiros

perante o Ordenamento Jurídico Brasileiro.

O seu objetivo geral é investigar, à luz da doutrina e

legislação, a real intenção do legislador no que diz respeito ao artigo 1.790 do

Código Civil de 2002, ou seja, o Direito Sucessório dos Companheiros. Portanto,

o presente trabalho de conclusão de curso, fará uma abordagem complexa acerca

do direito sucessório daquelas pessoas que não são ligadas entre si pelo

matrimônio, mas que não tem impedimentos para tal feito, e além do que

possuem o intuito de constituir família. A estas pessoas, que apesar de não serem

herdeiros necessários e nem ter direito à legítima, alguns direitos são conferidos;

portanto, com a morte do de cujus, o companheiro (a) supérstite não só receberá

a meação de que é titular, como também terá direito a herdar os bens do falecido,

porém, cumpre ressaltar, que apenas em relação àqueles bens adquiridos

onerosamente na vigência do estado convivencial.

Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, que irá tratar de uma

forma mais ampla o Direito Sucessório, estabelecendo o conteúdo, fundamento e

conceito do direito das sucessões, bem como uma visão histórica acerca deste

direito. O mesmo Capítulo tratará da transmissão da herança, que se dá

imediatamente após a morte do de cujus aos herdeiros legítimos e

testamentários; também das espécies de sucessão, que pode ser legítima,

testamentária, singular e universal; bem como as espécies de sucessores, que

não é o mesmo que falar em herdeiros, como pode-se verificar no Capítulo ora

citado. Por fim, trará uma noção acerca da herança, bem como as espécies de

heranças existentes no Ordenamento Jurídico Brasileiro.

O Capítulo 2 irá abordar a União Estável para que haja uma

maior compreensão em relação ao Direito de Sucessões, tendo em vista que este

e o Direito de Família caminham juntos. Breves considerações históricas acerca

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da União Estável, bem como o conceito desta e os termos utilizados para lhe

identificar, estarão presentes no Capítulo 2. Matéria relevante, que também estará

presente, são os pressupostos para constituição de uma União Estável, sem os

quais não se dará o Direito Sucessório do convivente. Por muitas vezes, o

conteúdo acerca do Direito Sucessório irá reportar-se ao Direito de Família, para

tanto fez-se necessário este Capítulo.

Já o Capítulo 3, trará exclusivamente o tema deste trabalho

de conclusão de curso, fazendo primeiramente breves considerações históricas

acerca do Direito Sucessório dos Companheiros. Posteriormente será abordado o

artigo 1.790 do Código Civil de 2002, bem como seus incisos, que é o dispositivo

relativo ao objeto deste estudo. Tratará, portanto, da concorrência do

companheiro com descendentes comuns, descendentes só do autor da herança e

concorrência com outros parentes sucessíveis, e ainda, a possibilidade de o

companheiro supérstite ser herdeiro da totalidade da herança. Por fim, como não

poderia faltar, o último Capítulo deste trabalho irá abordar o Direito Real de

Habitação, que é matéria muito discutida após a publicação do atual Código Civil.

O presente Relatório de Pesquisa se encerrará com as

Considerações Finais, nas quais serão apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre o Direito Sucessório dos Companheiros perante o Ordenamento Jurídico

Brasileiro.

Para a presente monografia foram levantados os seguintes

problemas:

� Qual será a quota hereditária que o companheiro supérstite terá direito quando concorrer juntamente com descendentes comuns e descendentes exclusivos do falecido?

� A totalidade da herança, caso não haja parentes sucessíveis, é restrita aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável?

� O companheiro supérstite possui ainda o direito real de habitação?

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Como resposta para os problemas argüidos anteriormente,

foram levantadas as seguintes hipóteses:

Em relação ao problema 1, ou seja, a concorrência do

companheiro supérstite com descendentes comuns e com descendentes só do

autor da herança, o legislador foi omisso. No inciso I, do artigo 1.790 do Código

Civil, o legislador trouxe as coordenadas para caso o companheiro concorra com

descendentes comuns; já no inciso II, traçou normas para o caso de o

companheiro herdar com os descendentes só do autor da herança. Porém,

inusitadamente, o legislador deixou de fornecer solução para os casos em que o

companheiro concorre tanto com descendentes comuns, como com descendentes

só do autor da herança. Por conta disto existe uma grande divergência

doutrinária, tendo em vista que alguns doutrinadores entendem que o

companheiro supérstite tem que receber quota igual ao dos descendentes, e

outros entendem que cabe ao companheiro a metade do que couber a cada um

dos descendentes comuns ou só do autor da herança.

Outra divergência ocorre no que diz respeito ao problema 2.

Alguns doutrinadores acreditam ser a totalidade da herança restrita aos bens

adquiridos onerosamente na constância da união estável, com o fundamento de

que o inciso IV aludi ao caput do artigo 1.790 do Código Civil. Outros entendem

que esta totalidade diz respeito aos bens adquiridos na vigência ou não da união,

pois parece ser injusto ficar os bens do falecido para a Fazenda, deixando o

companheiro supérstite desamparado; acreditam os doutrinadores não ter sido

esta a intenção do legislador.

No que concerne ao problema 3, ou seja, o direito real de

habitação, direito este que estava previsto na Lei nº. 9.278 de 1996, em seu artigo

7º, outra grande dúvida surge. Não é sabido se este direito continua vigorando ou

se foi revogado com a promulgação do atual Código Civil. Alguns doutrinadores

entendem que deve permanecer o direito real de habitação para que os

companheiros não fiquem desamparados, outros entendem que não.

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Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase

de Investigação foi utilizado o Método15 Indutivo16, com as Técnicas17, do

Referente18, da Categoria19, do Conceito Operacional20 e da Pesquisa

Bibliográfica21.

15 “Método é a forma lógico-comportamental-investigador na qual se baseia o pesquisador para

buscar os resultados que pretende alcançar”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquis ador do direito . 4 ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2000, p.85.

16 “Pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral: este é o denominado método indutivo”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito , 2000, p.85.

17 “Técnica é o conjunto diferenciado de informações reunidas e acionadas em forma instrumental para realizar operações intelectuais ou físicas, sob o comando de uma ou mais bases lógicas investigatórias”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito , 2000, p.86.

18 “Referente é a explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa". PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, 2002, p. 63.

19 “Categoria é a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia". PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito , 2002, p. 37.

20 “Conceito operacional (=cop) é uma definição para uma palavra e expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito , 2002, p. 51.

21 “à técnica da pesquisa bibliográfica em livros, em repertórios jurisprudenciais e em coletâneas legais, por exemplo”. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito , 2002, p. 100.

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CAPÍTULO 1

DIREITO SUCESSÓRIO

1.1 BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS ACERCA DO DIREI TO DAS

SUCESSÕES

No presente sub item, a abordagem acerca da evolução

histórica do direito das sucessões, foi feito com base na doutrina de Coulanges22,

A Cidade Antiga.

Por muito que remontemos na história da raça indo-européia, de que as populações gregas e itálicas descendem, notamos não ter esta raça acreditado que tudo se acabasse com a morte, para o homem, depois desta curta vida23. (...)

Imaginava-se que nesta segunda existência, a alma

permanecia associada ao corpo. Portanto, quando um corpo era enterrado em um

túmulo, acreditava-se que lá era colocado algo vivo. Desta maneira, eram

seguidos alguns ritos fúnebres, no intuito de que as pessoas que ali tivessem sido

enterradas, vivessem bem em baixo da terra24.

Desde os mais remotos tempos, deram estas crenças lugar a normas de conduta. Como, entre os antigos, o morto necessitasse de alimento e de bebida, concebeu-se como dever dos vivos, satisfazer-lhe esta sua necessidade. O cuidado de levar aos mortos os alimentos não esteve a cargo do capricho ou dos sentimentos variáveis dos homens; foi obrigatório. Assim se estabeleceu toda esta religião da morte, cujos dogmas cedo

22 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga . Trad. Fernando de Aguiar. 4 ed. São Paulo: Martins

Fonte, 1998. 23 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p.7. 24 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1988, p. 8.

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desapareceram, durando, no entanto, os seus ritos até o triunfo do cristianismo25.

Os mortos eram tidos como entes sagrados, portanto, para

estes haviam cultos, um deles era o fogo sagrado, como demonstra o Livro

primeiro, capítulo III da Obra de Coulanges26:

Toda casa de grego ou de romano possuía altar, neste altar deveria haver sempre restos de cinzas e brasas. Era obrigação sagrada do dono de cada casa conservar o fogo, dia e noite. (...) O fogo só deixava de brilhar sobre o altar quando toda a família havia morrido; lar extinto, família extinta, eram expressões sinônimas entre os antigos27.

(...) Uma das primeiras regras do culto dos mortos estava no fato de este apenas poder ser prestado aos mortos de cada família que pelo sangue lhes pertencia. O funeral só podia realizar-se religiosamente quando presidido pelo parente mais próximo. Quanto a refeição fúnebre, que se renova em épocas determinadas, só a família tinha o direito de assistir, estando todo o estranho rigorosamente excluído dela. Acreditava-se que o morto só aceitava a oferenda quando esta lhe fosse prestada da mão dos seus: queria apenas o culto dos seus descendentes. A presença de um homem estranho na família logo perturbava o repouso dos manes. Por essa razão, a lei proibia o estrangeiro de se aproximar do túmulo28. (...)

Cada família deveria ter o seu fogo sagrado, não existiam

regras uniformes para esta religião doméstica. Cada lar protegia somente os seus

da maneira que achava ser melhor. Ninguém podia intervir nas regras da família

vizinha, portanto, cada família estabelecia as normas do seu fogo sagrado. O pai

de família era quem ordenava as regras que deveriam ser seguidas29.

Esta religião só podia propagar-se pela geração. O pai dando a vida ao seu filho transmitia-lhe ao mesmo tempo, com a vida, a

25 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 14. 26 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 18. 27 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 18-19. 28 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 29. 29 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 31-32.

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sua crença, o seu culto, o direito de manter o lar, de oferecer a refeição fúnebre, de pronunciar as fórmulas da oração30. (...)

A regra estabelecida para o culto é que se transmita de varão em varão, e a regra para a herança é que esteja em conformidade com o culto. A filha não se considera apta para continuadora da religião paterna, pois casa e, casando-se, abjura do culto de seu pai para adotar o do esposo, não tem, portanto, nenhum título à herança. Se acontecesse algum pai deixar os bens à filha, a propriedade ficaria divorciada do culto, e tal fato não pode admitir-se. A filha não poderia mesmo cumprir o primeiro dever do herdeiro, ou seja, o de continuar a série das refeições fúnebres, pois só aos antepassados de seu marido virá oferecer os sacrifícios. A religião proíbe-lhe, pois, herdar de seu pai31.

É preciso atentar, que tanto no direito grego, como no

romano, o filho adquiria o culto e a propriedade; jamais adquiria ou um ou outro,

pois não era permitido adquirir a propriedade isoladamente do culto32.

“Se o pai tinha apenas uma filha, podia adotar um filho e dar-

lhe sua filha em casamento. Podia também instituir por testamento um herdeiro

que casasse com a filha”33.

Se o pai da filha única morria, sem ter adotado, nem testado, o antigo direito exigia que fosse herdeiro o seu parente mais próximo, ficando este herdeiro na obrigação de casar com a filha. Por virtude deste princípio o casamento do tio com a sobrinha esteve autorizado, e até mesmo exigido, pela lei. Há mais: se esta filha já estava casada, devia desquitar-se do marido para vir casar com o herdeiro de seu pai. O herdeiro podia também já ser casado; devia divorciar-se para casar com a parente34. (...)

(...) A filha não se considera apta a herdar. Mas, por atenuação muito natural ao rigor deste princípio, a filha única considerava-se já como intermediária pela qual a família pode continuar. Não

30 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 33. 31 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 71. 32 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. .69. 33 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 74. 34 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 75.

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herdava, mas o culto e a herança transmitiam-se por sua intervenção35.

Se um homem morria sem filhos, era necessário encontrar

um descendente em linha masculina, para que este pudesse prosseguir o culto da

família. Foi necessário estabelecer uma ordem de sucessão, no intuito de não

deixar o fogo sagrado se apagar36.

(...) Se determinado homem, tendo perdido o filho e a filha, apenas deixasse netos, quem herdava era o filho de seu filho, e não o filho de sua filha. À falta de descendente, o herdeiro era o irmão e não a irmã; o filho do irmão, nunca o filho da irmã. À falta de irmãos e de sobrinhos, tornava-se preciso remontar na série dos ascendentes do defunto, subindo-se sempre na linha masculina até se encontrar um ramo que se tivesse destacado da família por varão; depois baixava-se de novo este ramo de varão em varão, até se encontrar um homem ainda vivo, era o herdeiro37.

Havia a possibilidade da emancipação e da adoção. A

emancipação desligava o filho do culto paterno, e o afastava da herança; e a

adoção inseria o adotado ao culto da família adotante, assim como no patrimônio

da mesma. Um mesmo homem não pode ter dois cultos, e da mesma forma

também não pode herdar bens de duas famílias, por este motivo, o adotado, irá

apenas herdar bens e seguir o culto doméstico da nova família38.

No que diz respeito ao direito de testar, o direito primitivo era

um tanto quanto obscuro, e achava-se em conflito com as crenças religiosas, já

que a propriedade era inerente ao culto, e este era hereditário. O testamento era

pouco utilizado, porque não foi reconhecido na sua origem como um direito

natural, e desta forma, conservavam-se as tradições. Acreditava-se que os bens

não pertenciam ao homem; pertenciam a sua família, aos antepassados e à

35 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 76. 36 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 76. 37 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 76. 38 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 78.

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posterioridade, já que estes bens não foram adquiridos devido ao trabalho, mas

devido ao culto doméstico39.

A religião doméstica não permitia a divisão do patrimônio,

portanto, apenas um homem da família herdaria os bens40.

A velha religião estabelecia diferenças entre o filho primogênito e o segundogênito: “O primogênito”, diziam os antigos arianos, “foi procriado para o cumprimento do dever com os antepassados; os outros nasceram do amor.” Por virtude desta superioridade original, o filho mais velho tinha, depois da morte do pai, o privilégio de presidir a todas as cerimônias do culto doméstico, era este filho quem oferecia as refeições fúnebres e pronunciava as fórmulas da oração: “porque o direito de pronunciar as orações pertence àquele que primeiro veio ao mundo”. O primogênito era, pois, o herdeiro dos hinos, o continuador do culto, o chefe religioso da família. Da crença derivava a regra do direito: só o primogênito herdava os bens41. (...)

(...) Algumas vezes, o segundogênito era adotado por outra família e nela herdava; em outras vezes, o segundo filho esposava alguma filha única; ou, por fim, recebia o lote de terra de uma família extinta. Quando faltavam todos estes recursos, os filhos mais novos eram ainda enviados para as colônias42.

É nestas breves considerações históricas acerca do direito

das sucessões, que se pode acreditar que as leis que então governavam,

deixaram alguns vestígios no direito de hoje.

1.2 FUNDAMENTO DO DIREITO DAS SUCESSÕES.

No início da socialização dos indivíduos, inexistia a

propriedade individual, apenas a coletiva. Com a individualização da propriedade,

o sujeito passou a ser titular do patrimônio, sendo assim, criou-se o instituto da

39 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 79-80. 40 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 82. 41 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 82. 42 COULANGES, Fustel de. A Cidade antiga , 1998, p. 83-84.

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sucessão hereditária. Após essa transformação, tornou-se inevitável, as

discussões filosóficas e jurídicas a respeito de seu fundamento43.

Afirma Rodrigues44 que muitos pensadores acreditam que

deveria ser abolido o direito sucessório, visto que, além de injusto, as pessoas

que são beneficiadas por receberem uma herança, deixam de trabalhar,

acarretando, desta forma, em uma diminuição de mão-de-obra nacional. Porém,

entende o doutrinador ora citado, que o direito hereditário deve ser conservado,

pois provoca um maior interesse individual que coincide com o interesse social,

que por sua vez, gera a melhor mola para o progresso.

Venosa45 sustenta que:

A idéia da sucessão por causa da morte não aflora unicamente no interesse privado: o Estado também tem o maior interesse de que um patrimônio não reste sem titular, o que lhe traria um ônus a mais. Para ele, ao resguardar o direito à sucessão (agora como princípio constitucional, art. 5º, XXX, da Carta de 1988), está também protegendo a família e ordenando a sua própria economia. Se não houvesse direito à herança, estaria prejudicada a própria capacidade produtiva de cada indivíduo, que não tenha interesse em poupar e produzir, sabendo que sua família não seria alvo do esforço.

Nesse mesmo sentido, Rizzardo46 afirma que:

Assenta-se o fundamento no patrimônio, constituído dos bens ou relações econômicas que vinculam alguém aos bens. E os bens são o fulcro de toda a gênese e evolução do ser humano, motivo de suas aspirações e batalhas travadas no curso da História. Numa fase primitiva, no entanto, o ser humano vivia mais em determinado grupo, e como todos os seres humanos encontravam na natureza o que necessitavam para viver, não possuíam ainda o sentimento de apego a certos bens. Exceto quanto aos objetos de

43 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucess ões . v. 6. 2 ed.

São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 25. 44 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 5-6. 45 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões . v. 7. 3. ed. São Paulo: Atlas,

2003, p. 18. 46 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das sucessões . v. 1. Rio de Janeiro: AIDE Editora, 1996, p. 22.

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uso pessoal, como a clava, ou o arco e a flecha, e alguns adornos47. (...)

Na medida em que se acentuavam e formavam relações entre a pessoa e os bens, foi surgindo a idéia de transmissão hereditária, mas no intuito de preservação da própria família48. (...)

É nítido, que a transmissão hereditária é um incentivo ao

indivíduo para amealhar e manter o patrimônio amealhado, tendo em vista que o

homem sempre busca proteger os seus entes queridos. Portanto, a transmissão

estimula o indivíduo a produzir mais, e tal comportamento leva ao crescimento da

economia nacional.

1.3 CONTEÚDO DO DIREITO DAS SUCESSÕES.

O homem é perseguido pelo estigma de sua morte, porém

isso não o faz parar de batalhar por um patrimônio ainda maior, já que aos seus

parentes, ou pessoas escolhidas por ele, poderá proporcionar uma vida melhor.

Porém, para regularizar esta substituição que deriva da morte, foi necessário a

criação de normas. O presente sub item irá tratar do conteúdo do direito das

sucessões.

Como demonstra Venosa49:

Quando se fala, no direito, em direito das sucessões, está-se tratando de um campo específico do direito civil: a transmissão de bens, direitos e obrigações em razão da morte. É o direito hereditário, que se distingue do sentido lato da palavra sucessão, que se aplica também à sucessão entre vivos.

O direito das sucessões disciplina, portanto, a projeção das situações jurídicas existentes, no momento da morte, da desaparição física da pessoa, a seus sucessores.

47 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das sucessões , 1996, p. 22. 48 RIZZARDO, Arnaldo. Direito das sucessões , 1996, p. 22. 49 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 15-16-19.

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Diniz50 faz comentário referente ao conteúdo do direito das

sucessões, ao assim afirmar:

Em nosso Código Civil, o direito das sucessões dividi-se em quatro partes: 1ª) sucessão em geral, onde traça normas sobre a sucessão legítima e testamentária, relativas à transmissão, à administração, à aceitação, à renúncia, à petição de herança e aos excluídos da sucessão; 2ª) sucessão legítima, abrangendo a transmissão da herança, que se opera em virtude de lei, às pessoas constantes da ordem de vocação hereditária; 3ª) sucessão testamentária, contendo disposições relativas à transferência de bens causa mortis por ato de última vontade; 4ª) inventário e partilha, concernente as normas sobre o processo judicial não contencioso, por meio do qual se descrevem os bens da herança, se lavra o título de herdeiro, se liquida o passivo do monte, se paga o imposto de transmissão mortis causa e se realiza a partilha dos bens entre os herdeiros. Ao lado dessas normas sobre inventário e partilha, há outras que disciplinam as colações e os sonegados51.

O conteúdo do direito de sucessão é limitado, designa os

sucessores e regula a transmissão dos bens e das dívidas do autor da herança. O

conteúdo inicia-se no artigo 1.784 do Código Civil de 2002, e termina no artigo

2.027; porém, cumpre salientar, que o artigo referente ao tema do presente

trabalho de conclusão de curso, é o 1.790 do Código Civil.

1.4 CONCEITUAÇÃO DO DIREITO DAS SUCESSÕES.

Com base nas obras de doutrinadores brasileiros, seguem

neste subtítulo, alguns conceitos sobre o direito das sucessões.

Venosa52 sustenta que: “Suceder é substituir, tomar o lugar

de outrem no campo dos fenômenos jurídicos. Na sucessão, existe uma

50 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões, 2002, p. 7. 51 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 29. 52 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 15.

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substituição do titular de um direito. Esse é o conceito amplo de sucessão no

direito”.

No entendimento de Rodrigues53:

(...) o direito das sucessões se apresenta como o conjunto de princípios jurídicos que disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa que morreu a seus sucessores . A definição usa a palavra patrimônio, em vez de referir-se à transmissão de bens ou valores, porque a sucessão hereditária envolve a passagem para o sucessor, tanto do ativo como do passivo do defunto.

Neste diapasão, Diniz54 tece os seguintes comentários:

O direito das sucessões vem a ser o conjunto de normas que disciplinam a transferência do patrimônio de alguém, depois de sua morte, ao herdeiro, em virtude de lei ou de testamento (CC55, art. 1.786). Consiste, portanto, no complexo de disposições jurídicas que regem a transmissão de bens ou valores e dívidas do falecido, ou seja, a transmissão do ativo e do passivo do de cujus ao herdeiro56.

Esclarece, no entanto, Monteiro57 que:

Num sentido amplo, a palavra sucessão significa o ato pelo qual uma pessoa toma o lugar de outra, investindo-se, a qualquer título, no todo ou em parte, nos direitos que lhe competiam. Nesse sentido se diz, por exemplo, que o comprador sucede ao vendedor no que concerne à propriedade da coisa vendida. (...)

No direito das sucessões, entretanto, emprega-se o vocábulo num sentido mais restrito, para designar tão somente a transferência da herança, ou do legado, por morte de alguém, ao herdeiro ou legatário, seja por força de lei, ou em virtude de testamento58 (...)

53 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 3. 54 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 3. 55 Código Civil Brasileiro. 56 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 3. 57 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões . v. 6. 35 ed.

rev. e atual. por Ana Cristina de Barros Monteiro França Pinto. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 1. 58 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões , 2003, p. 1.

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Portanto, direito das sucessões nada mais é, do que o

conjunto de normas que regula a transmissão de bens, direitos e obrigações do

falecido, aos seus herdeiros legítimos e testamentários.

1.5 TRANSMISSÃO DA HERANÇA.

Regra de suma importância para este sub item, é o que

dispõe o artigo 1784, do Código Civil: “Aberta a sucessão, a herança transmite-se,

desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”.

No que concerne à transmissão da herança, Venosa59 tece

os seguintes comentários:

Por nosso direito, com a morte, abertura da sucessão, o patrimônio hereditário transmite-se imediatamente aos herdeiros legítimos e testamentários (art. 1.784; antigo, art. 1572). Trata-se da adoção do sistema pelo qual a herança transmite-se de pleno direito. Trata-se de aplicação do sistema de saisine60, de origem germânica. O princípio da saisine representa uma apreensão possessória autorizada. É uma faculdade de entrar na posse de bens, posse essa atribuída a quem ainda não a tinha61.

Discorre Rodrigues62 que:

Ora, como não se pode conceber direito subjetivo sem titular, a titularidade dos direitos do de cujus deve-se transmitir, desde o preciso instante de sua morte, a seus sucessores a título universal. Caso contrário, seu patrimônio ficaria sem dono durante algum tempo, o que, como já disse, é inconcebível63.

59 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 28. 60 Na herança, o sistema da saisine é o direito que têm os herdeiros de entrar na posse dos bens

que constituem a herança. 61 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 28. 62 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 11. 63 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 11.

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De modo similar, postula Diniz64 que:

(...) o momento da transmissão da herança é o da morte do de cujus; daí a importância da exata fixação do dia e da hora do óbito, uma vez que uma precedência qualquer, mesmo de segundos, influi na transmissão de acervo hereditário. (...)

Dispõe o artigo 6º do Código Civil que a existência da

pessoa natural termina com a morte; e, é neste momento, que se dá a

transmissão da herança, mesmo que os herdeiros não saibam do ocorrido65.

1.6 ESPÉCIES DE SUCESSÃO.

1.6.1 Sucessão Legítima

Sucessão legítima é aquela que deriva da lei, conforme a

ordem de vocação hereditária, que está prevista no artigo 1.829 do Código Civil.

Segundo Rodrigues66:

A sucessão legítima é a que decorre da lei. Se o defunto, por exemplo, deixou de fazer testamento, seu patrimônio, por força da lei, irá aos seus descendentes; inexistindo descendentes, aos seus ascendentes; não havendo nem descendentes nem ascendentes, ao seu cônjuge; à falta daqueles parentes e de cônjuge, aos colaterais até o quarto grau. O cônjuge sobrevivente concorre com os descendentes, observado o disposto no nos arts. 1.829, I, e 1.832, e com os ascendentes, consoante os arts. 1.829, II, 1.836, caput, e 1.837. Note-se que a transmissão da herança aos sucessores se efetua sem manifestação de última vontade do falecido, mas decorre da lei. Trata-se da sucessão legítima. Portanto, quando alguém se conforma que seus bens, por sua morte, passem ao patrimônio ao patrimônio das pessoas que a lei chama para recolhê-los, escusa de fazer testamento. Daí a

64 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 29-

30. 65 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões , 2003, p.

14. 66 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 16.

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afirmativa, encontradiça em muitos escritores, de que a sucessão legitima é o testamento presumido do de cujus67.

A sucessão legítima ocorre não apenas quando a pessoa

deixou de fazer testamento, mas também nos casos em que o fez, porém, este

caducou, ou foi julgado nulo68.

A sucessão é simultaneamente legítima e testamentária quando o testamento do defunto não abrange todos os seus bens. (...) Em ocorrendo o caso, os bens referidos no testamento se transmitem aos herdeiros testamentários e aos legatários. Os bens restantes são deferidos aos herdeiros legítimos, na ordem de vocação hereditária69.

Sobre sucessão legítima, apregoa Gomes70 que:

Ocorre quando o falecido não houver disposto, no todo ou em parte, dos bens, em testamento válido, ou quando não pode dispor de parte desses bens por ter herdeiros necessários. Na segunda hipótese, dá-se inevitavelmente. Denomina-se sucessão legitimária71.

A existência de testamento não exclui, portanto, a sucessão legítima, porquanto, ainda sendo válido e eficaz, se dará havendo herdeiros obrigatórios ou havendo bens excedentes das disposições testamentárias. Quando ineficaz, por haver caducado, ou ter sido declarado nulo, aplicam-se em substituição, as regras da sucessão ab intestato72.

Cumpre ressaltar, que a sucessão explicitada neste subtítulo

é predominante no ordenamento jurídico brasileiro; sendo a sucessão

testamentária a exceção.

67 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 16. 68 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 17. 69 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 17. 70 GOMES, Orlando. Sucessões . 12 ed. rev., atual. e aumentada de acordo com o Código Civil de

2002 por Mario Roberto Carvalho de Faria. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 39. 71 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 39 72 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 39.

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1.6.2 Sucessão Testamentária

Sucessão testamentária é aquela oriunda do desejo

expresso do testador, através de testamento, desde que este seja válido. A

sucessão testamentária pode ser a título universal ou singular, como pode-se

verificar no presente sub item.

Rodrigues73 discorre que:

A sucessão testamentária, é aquela oriunda da manifestação

de última vontade do falecido, porém, deve ser respeitada a solenidade prescrita

pelo legislador.

Com efeito, este permite a disposição de bens por testamento; apenas limita essa liberdade de disposição no caso de ter o testador herdeiros necessários, ou seja, descendentes, ascendentes ou cônjuge, pois, nessa hipótese, só pode o testador dispor da metade de seus bens, visto que a outra metade constitui a reserva daqueles herdeiros que, fora o caso excepcional de deserdação ou exclusão, a ela têm direito.74

Para Diniz75:

A sucessão testamentária, oriunda de testamento válido ou de disposição de última vontade. Todavia, ante o sistema da liberdade de testar limitada, adotado pela lei pátria, se o testador tiver herdeiros necessários, ou seja, cônjuge supérstite, descendentes e ascendentes sucessíveis (CC, arts. 1.845 e 1.846), só poderá dispor de metade de seus bens (CC, art. 1.789), uma vez que a outra metade constitui a legítima daqueles herdeiros. Assim sendo, o patrimônio do de cujus será dividido em duas partes iguais: a legítima, que cabe aos herdeiros necessários, a menos que sejam deserdados (CC, art. 1.961), e a porção disponível, da qual pode livremente dispor, feitas as exceções do art. 1.805 do Código Civil, concernentes à incapacidade testamentária passiva. A porção disponível é fixa, compreendendo a metade dos bens do testador, qualquer que

73 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 16-143. 74 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 143. 75 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 17-

18.

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seja o número e a qualidade dos herdeiros. É preciso não esquecer, ainda, que, se o testador for casado pelo regime de comunhão parcial de bens (CC, art. 1.667), a metade dos bens pertence ao outro consorte; assim, para calcular a legítima e a porção disponível deve-se considerar tão somente a meação do testador. Donde se infere que, em nosso direito, só haverá absoluta liberdade de testar, isto é, de dispor de todos os bens por testamento para depois da morte, quando o testador não tiver herdeiros necessários, caso e que poderá afastar de sua sucessão, se o desejar, os colaterais (CC, art. 1.850)76.

Gomes77 salienta que “Testamentária é a sucessão cuja

devolução se regula, no todo ou em parte, conforme a vontade de defunto

expressa num ato jurídico, que se denomina testamento”.

Pela sucessão testamentária recebem os bens deixados tanto os herdeiros instituídos como os legatários nomeados, mas a possibilidade de instituí-los, ou nomeá-los, só existe se o interessado emprega o instrumento próprio que lhe oferece a lei, em caráter de exclusividade, para alcançar esse fim 78.

A existência de testamento válido não exclui a sucessão legal. Havendo bens não compreendidos nas disposições de última vontade, aplicam-se à sua transmissão as regras da devolução aos sucessores legítimos79.

Portanto, a lei assegura as pessoas capazes, o direito de

dispor de seus bens; porém, para garantir a sucessão testamentária alguns

pressupostos devem ser cumpridos. Tais pressupostos são: o testador tem que

ser pessoa capaz de dispor dos seus bens; o sucessor tem que ser pessoa capaz

de recebê-los; a declaração de vontade tem que ser na forma exigida em lei; e por

fim, tem que haver observância dos limites ao poder de dispor, como já foi

explicitado no presente subtítulo.

76 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 17-

18. 77 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 86. 78 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 86. 79 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 86.

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1.6.3 Sucessão Singular

Ocorre sucessão a título singular quando, através de

testamento, o sucessor recebe um bem certo e determinado. Portanto, a pessoa

beneficiada, que é chamada de legatário, receberá um legado.

Segundo Rodrigues80:

A sucessão se processa a título singular quando o testador se dispõe a transferir ao beneficiário um bem determinado, como, por exemplo, na cláusula testamentária que deixa a alguém um automóvel, determinado prédio, certas ações de companhia etc.

“O legatário sucede ao falecido a título singular, ou seja,

determinado bem destaca-se da herança, como coisa certa e individuada, para

incorporar-se ao patrimônio do legatário”81.

De modo similar, postula Diniz82 que quanto aos seus efeitos

a sucessão pode ser a título singular:

A título singular, quando o testador transfere ao beneficiário apenas objetos certos e determinados, p. ex.: uma jóia, uma cavalo, uma determinada casa situada na Rua “X” etc. Nessa espécie de sucessão é o legatário que sucede ao de cujus em bens ou direitos determinados ou individuados, ou em fração do patrimônio devidamente individuada, sub-rogando-se, de modo concreto, na titularidade jurídica de determinada relação de direito, sem representar o falecido, pois não responde pelas dívidas e encargos da herança, já que sucede apenas in rem aliquam singularem. Portanto, se o testador contemplar alguém com coisa concreta, definida, singularizada, ter-se-á a nomeação de legatário83.

80 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 17-18. 81 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 18. 82 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 20. 83 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 20.

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A sucessão mortis causa pode dar-se a título singular, pela

transferência de bens determinados, como ensina, Gomes84:

A sucessão a título singular deriva unicamente de testamento, limitando-se a objeto determinado que pode compreender um conjunto de bens, contanto que não formem unidade na qual percam sua individualidade – singularum rerum.

Descreve Venosa85 que:

A sucessão a título singular, no direito hereditário, ocorre, por via do testamento, quando o testador, nesse ato de última vontade, aquinhoa uma pessoa com um bem certo e determinado de seu patrimônio. Cria, assim, a figura do legatário o titular do direito, e o legado, o objeto da instituiçao feita no testamento.

É fácil, portanto, diferenciar a sucessão à título singular e à

título universal; tendo em vista que a primeira se dá apenas por testamento, pelo

qual o sucessor recebe uma deixa testamentária determinada, que é denominada

de legado; enquanto a sucessão à título universal, que será analisada no próximo

subtítulo, se dá através de testamento ou conforme a ordem de vocação

hereditária (sucessão legítima), pelo qual o herdeiro, e não mais o legatário,

recebe a totalidade do patrimônio do de cujus.

1.6.4 Sucessão Universal

A sucessão a título universal, pode-se dar através da

sucessão legítima e testamentária, desde que, o herdeiro substitua na totalidade

ou em fração ideal o patrimônio do de cujus, portanto receberá não apenas

direitos, como também obrigações.

Ensina Rodrigues86:

Diz-se que a sucessão se processa a título universal quando o herdeiro é chamado a suceder na totalidade dos bens do de cujus, ou em uma parte alíquota deles, ou seja, o sucessor se sub-roga

84 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 6-7. 85 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 16. 86 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 17-18.

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na posição do finado, como titular da totalidade ou de parte da universitas iuris, que é o seu patrimônio, de modo que, da mesma maneira que se investe na titularidade de seu ativo, assume a responsabilidade por seu passivo87.

A sucessão a título universal dá-se, por exemplo, na cláusula testamentária que defere ao herdeiro todos os bens do de cujus, ou em um terço, um quarto de seu patrimônio, ou, exemplificativamente, quando o testador declara deixar aos herdeiros seus bens, ou seus valores imobiliários, situados em tal país. A deixa se refere a uma universalidade e, por conseguinte, a sucessão se processa a título universal88.

“O herdeiro sucede a título universal porque a herança é uma

universalidade. Pode-se mesmo imaginar que o herdeiro substitui a pessoa do

defunto, tomando seu lugar na relação jurídica universal”89.

Quanto aos seus efeitos a sucessão pode ser a título universal, como

demonstra Diniz90:

A título universal, quando houver transferência da totalidade ou de parte indeterminada da herança, tanto no seu ativo como no passivo, para o herdeiro do de cujus. Haverá instituição de herdeiro, se o testador deixar ao beneficiário a totalidade de seu patrimônio, ou uma porção abstrata de seus bens: meação, porção disponível, 1/3, 1/4, 1/5 etc., todos os móveis ou os imóveis existentes em certo município etc. O herdeiro é, portanto, chamado a suceder no todo ou numa quota-parte do patrimônio do de cujus, sub-rogando-se, abstratamente, na posição do falecido, como titular da totalidade ou de parte ideal daquele patrimônio no que concerne ao ativo, e assumindo a responsabilidade relativamente ao passivo.

Para finalizar, é preciso lembrar que a sucessão legítima será sempre a título universal, transferindo-se aos herdeiros a totalidade ou uma fração ideal do patrimônio do falecido, ao passo que a sucessão testamentária pode ser universal, se o testador

87 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 17. 88 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 17. 89 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 18. 90 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 20.

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instituir herdeiro que lhe sucede no todo ou na quota ideal de seus bens91 (...)

Acerca da Sucessão Universal, Venosa92 diz que:

Quando, pela morte, se transmite uma universalidade, ou seja, a totalidade de um patrimônio, dá-se a sucessão hereditária, tem-se a herança, que é uma universalidade, pouco importando o número de herdeiros a que seja atribuída.

Por conseguinte, outro comentário indispensável, é o de

Wald93 que afirma que:

A sucessão na totalidade dos bens do sucessor não significa necessariamente que deva caber a integralidade dos mesmos a uma só pessoa, sendo tanto herdeiro aquele que recebe todo o patrimônio como quem se limita a herdar uma fração maior ou menor deste, ou seja, tanto é herdeiro quem recebe a metade, o terço ou quarto da herança como quem a recebe integralmente. Evidentemente, nesta atribuição patrimonial haverá exata correspondência entre a parte do passivo e do ativo que cada herdeiro recebe. Assim, o herdeiro que recebe um terço da herança terá direito a um terço do ativo e responderá por um terço do passivo94.

Cumpre salientar, que as dívidas do de cujus, serão pagas

até o limite do ativo da herança. O patrimônio do herdeiro, aquele não recebido

pela herança, não será prejudicado95.

Após analisados as espécies de sucessões existentes no

ordenamento jurídico brasileiro, importante é delimitar os tipos de sucessores

existentes, quais são: herdeiros testamentários, herdeiros legítimos e legatários.

Portanto, o próximo subtítulo irá tratar especificamente dos sucessores, que

podem ser a título universal ou singular.

91 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 20. 92 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 16. 93 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 2-3-4. 94 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 4. 95 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 4.

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1.7 ESPÉCIES DE SUCESSORES

Falar sobre sucessores não é o mesmo que falar em

herdeiros, já que a figura do legatário também sucede o falecido. Herdeiros são

aqueles que recebem uma universalidade dos bens do de cujus; e legatário é

aquele sucessor que recebe a título singular um determinado bem, embora possa

receber uma universalidade de fato, exemplo disto é uma biblioteca, porém isto

não o transforma em um sucessor universal96.

Acerca das espécies de sucessores, o ordenamento jurídico

brasileiro, admite a seguinte classificação97:

1. herdeiros testamentários;

2. herdeiros legítimos, podendo estes serem classificados

como herdeiros necessários e facultativos;

3. e ainda os legatários.

Cahali98, conceitua as espécies de sucessores existentes:

Herdeiros legítimos são aqueles sucessores eleitos pela legislação, através da ordem de vocação hereditária (art. 1.829), ou por regra especial, como ocorre na sucessão entre companheiros decorrente da união estável (CC, art. 1.790)99.

Herdeiros testamentários, ou instituídos, são aqueles indicados como beneficiários da herança por disposição de última vontade, podendo, inclusive, ser também herdeiros legítimos, quando se quer favorecê-los mais do que aos outros da mesma classe de preferência, com quem eventualmente estejam concorrendo (dentre os parentes colaterais do mesmo grau, o testador estabelece que um deles receberá, por herança, 30% do patrimônio, sem prejuízo do quinhão a que tem direito na

96 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 224. 97 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucess ões , 2003, p.

56. 98 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucess ões , 2003, p.56-

57-58. 99 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucess ões , 2003, p.56.

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concorrência com os demais herdeiros da mesma classe). Nestas condições sucede o instituído como herdeiro testamentário (30%) e como herdeiro legítimo, na proporção do seu quinhão100.

Legatários, que, como visto, não se confundem com herdeiros, merecendo tratamento jurídico próprio, são os sucessores instituídos por testamento para receber determinado bem, certo e individualizado, e a título singular, podendo igualmente coincidir com a pessoa do próprio herdeiro legítimo ou testamentário, mas, pelas disposições de última vontade, em relação ao legado, em face da sucessão, terá também esta qualidade própria e específica (a instituição de filho como legatário de um determinado imóvel, de valor pequeno em relação ao patrimônio, sem prejuízo da parte que lhe caiba na herança, para a qual, como herdeiro legítimo, concorrerá com seus irmãos e/ou cônjuge/companheiro sobrevivente)101.

Há certos herdeiros, que não podem ser afastados da

sucessão, estes são chamados de herdeiros necessários. Havendo estes, o

testador poderá dispor de apenas 50% do seu patrimônio. Nota-se, desta forma,

que existe uma limitação à liberdade de testar102.

Esta classe é composta pelo cônjuge, descendentes e ascendentes do de cujus (CC, art. 1.845), sem limitação de grau quanto aos dois últimos (filhos, netos, bisnetos etc., e pais, avós, bisavós etc.). São os sucessores que não podem ser excluídos da herança por vontade do testador, salvo em casos específicos de deserdação, previstos em lei. Se não for este o caso, o herdeiro necessário terá resguardado a sua parcela, caso o autor da herança decida fazer testamento, restringindo-se, desta forma, a extensão da parte disponível para transmissão de apenas metade do patrimônio do de cujus103.

Os herdeiros legítimos do falecido que não compuserem a categoria dos herdeiros necessários são denominados herdeiros

100 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucess ões , 2003,

p.56-57. 101 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucess ões , 2003,

p.57. 102 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucess ões , 2003, p.

57. 103 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucess ões , 2003, p.

57.

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facultativos. Assim, os colaterais até o 4º grau podem ser privados da herança, bastando ao testador não os contemplar nas disposições de última vontade (CC, art. 1.850)104.

Sobre os herdeiros legítimos, leciona Rodrigues105:

No Título II do Livro V, o Código Civil disciplina a sucessão legítima, ou seja, a que opera por força de lei e que ocorre quando o de cujus faleceu sem deixar testamento, ou quando seu testamento caducou, ou foi julgado ineficaz.

Configurando-se uma dessas hipóteses, ou ainda no tocante aos bens não compreendidos no testamento, a lei convoca pessoas da família do finado, de acordo com a ordem nela fixada, denominada ordem de vocação hereditária, para receberem a herança.

A ordem de vocação hereditária, que é estabelecida por lei

no artigo 1.829 do Código Civil, nada mais é do que a relação preferencial, as

pessoas que são chamadas para receber a herança do de cujus106.

Artigo 1829 . A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte107:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II – aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente;

III – ao cônjuge sobrevivente;

IV – aos colaterais.

Em resumo: herdeiros legítimos são aqueles que recebem a

universalidade dos bens do de cujus, baseada nas disposições legais, previstas

no artigo 1.829 do Código Civil de 2002, que é aplicável na falta de declaração de 104 CAHALI, Francisco José. Curso avançado de direito civil: direito das sucess ões , 2003, p.

58. 105 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 93-94. 106 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 94. 107 BRASIL. Código Civil . 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

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vontade do testador ou no caso de nulidade, anulação ou caducidade do

testamento, devendo ser obedecida a ordem de vocação hereditária108.

Por sua vez, Gomes109 ensina que: “Herdeiro legítimo é a

pessoa indicada na lei como sucessor nos casos de sucessão legal, a quem se

transmite a totalidade ou quota-parte da herança”.

“Contrapõe-se-lhe o herdeiro testamentário, que é sucessor

a título universal nomeado em testamento”110.

Prossegue Gomes111 ensinando que:

Herdeiro necessário é o parente e o cônjuge com direito a uma quota-parte da herança, da qual não pode ser privado. A parte reservada aos herdeiros legitimados chama-se legítima. Constitui-se, entre nós, da metade dos bens do falecido.

O herdeiro necessário, impede que o testador, por ato de

última vontade, disponha de todo o seu patrimônio. Portanto, havendo estes, o

testador poderá testar apenas à metade dos bens disponíveis112.

“São herdeiros necessários: os descendentes e ascendentes

sem limitação no grau de parentesco e, ainda, o cônjuge”113.

Sobre os legatários, Wald114 ensina que legatário é aquele

beneficiário, que recebe um bem certo e determinado, e não o patrimônio inteiro,

nem mesmo uma quota deste.

Wald115, faz uma colocação acerca da distinção dos

legatários e herdeiros:

108 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 93-94. 109 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 40. 110 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 40. 111 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 40. 112 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 40-41. 113 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 41. 114 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 2.

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Os elementos característicos do legado são a transmissão de um bem específico e o fato de o legatário não responder pelo passivo da herança, enquanto o herdeiro propriamente dito tem direito a uma quota, fração ou parcela do patrimônio do falecido, abrangendo tanto os haveres como os débitos da massa de bens que constitui o espólio116.

Com a morte, os sucessores previstos no presente subitem,

exceto o legatário, terão direito à herança, que é tratada no próximo subtítulo.

1.8 NOÇÃO DE HERANÇA

Os conceitos de herança e sucessão, principalmente quando

se aborda a classificação das heranças e as espécies de sucessões existentes no

ordenamento jurídico brasileiro, são um pouco parecidos, já que a herança e a

sucessão podem ser legítimas e testamentárias. Para haver uma melhor

compreensão do que é herança, é necessário fazer uma diferenciação entre

ambos os conceitos.

Venosa117, tece os seguintes comentários:

Embora, com freqüência, se empregue o termo sucessão, como sinônimo de herança, já vimos que é necessária a distinção. A sucessão refere-se ao ato de suceder, que pode ocorrer por ato ou fato entre vivos ou por causa da morte118.

Destarte, a herança entra no conceito de patrimônio. Deve ser vista como o patrimônio do de cujus. Definimos o patrimônio como o conjunto de direitos reais e obrigacionais, ativos e passivos, pertencentes a uma pessoa. Portanto, a herança é o patrimônio da pessoa falecida, ou seja, do autor da herança119.

115 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 135. 116 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 2. 117 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 20-21. 118 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 20. 119 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 21.

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O patrimônio transmissível, portanto, contém bens materiais ou imateriais, mas sempre coisas avaliáveis economicamente. Os direitos e deveres meramente pessoais, como a tutela, a curatela, os cargos públicos, extinguem-se com a morte, assim como os direitos personalíssimos120.

Nessa mesma linha de pensamento, Diniz121, entende por

herança:

O objeto da sucessão causa mortis é a herança, (...) A herança é, portanto, o patrimônio do falecido, ou seja, o conjunto de bens materiais, direitos e obrigações (CC. Arts. 91 e 943) que se transmitem aos herdeiros legítimos ou testamentários. Até mesmo as pretensões e ações de que era titular o falecido e as contra ele propostas, se transmissíveis forem, passarão aos seus herdeiros. Entretanto, não há a transmissão de todos os direitos e de todas as obrigações do autor da herança, visto que: a) há direitos personalíssimos que se extinguem com a morte, como o poder familiar, a tutela, a curatela e os direitos políticos; b) há direitos e deveres patrimoniais que não passam aos herdeiros, por serem inerentes à pessoa do de cujus, como a obrigação de fazer infungível (CC, art. 247); a empreitada ajustada em consideração à qualidade pessoal do empreiteiro (CC, art. 626, in fine); o uso, o usufruto e a habitação (CC, arts. 1.410, II, 1.413 e 1.416), as obrigações alimentares. O herdeiro não é o representante do de cujus, pois sucede nos bens e não na pessoa do autor da herança; assume, pois, apenas a titularidade das relações jurídicas patrimoniais do falecido.

Sobre Herança, Gomes122 entende que:

“Herança é o patrimônio do defunto. Não se confunde com o

acervo hereditário constituído pela massa dos bens deixados, porque pode

compor-se apenas de dívidas , tornando-se passiva”.

A herança é coisa, classificada entre as universalidades de direito. (...) Forma-se de um complexo de relações jurídicas, não se confundindo com as universalidades de fato que se compõem de

120 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 21. 121 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 36-

37-38. 122 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 7.

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coisas especificamente determinadas. Não é suscetível de divisão em partes materiais, enquanto permanece como tal123.

Compreende todos os direitos que não se extinguem com a morte. Excluem-se os que não se concebem desligados da pessoa, como os direitos de personalidade. Integram-na bens móveis e imóveis, direitos e ações, obrigações. Abrange também coisas futuras. Sendo universalidade de direito, é suscetível, abstratamente, de aumento ou diminuição124.

Portanto, a herança nada mais é, do que o conjunto que

engloba direitos, obrigações, bens e encargos; que são transmitidos a uma

pessoa, ou a um conjunto de pessoas, em razão da morte de um indivíduo.

1.9 CLASSIFICAÇÃO DAS HERANÇAS

A herança pode ser classificada como legítima, necessária e

testamentária. O presente sub item irá tratar sobre estas três espécies de herança

existentes no Código Civil Brasileiro.

Acerca da classificação das heranças, registra Wald125 que:

Os princípios básicos dominantes no direito pátrio, nesta matéria, são os da liberdade de testar, respeitada a legítima, e tendo mero caráter supletivo a ordem de vocação sucessória estabelecida pela lei, que só se aplica no caso de não haver testamento126.

Tem-se, então, três espécies de herança127:

1. a herança testamentária, baseada na vontade do testador;

2. a herança legítima, baseada nas disposições legais de caráter supletivo aplicáveis na falta de declaração de vontade do

123 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 7. 124 GOMES, Orlando. Sucessões , 2004, p. 7. 125 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 16. 126 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 16 127 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 16.

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testador ou no caso de nulidade, anulação, caducidade do testamento;

3. a herança necessária, obedecendo a um princípio de ordem pública, que se impõe mesmo quando contraria as determinações testamentárias.

Sobre herança legítima, Diniz128 diz que:

Decorrente de lei, constituindo-se a sucessão legítima, desde que não haja testamento, ou o existente caducar ou for declarado nulo. Todavia, podem coexistir simultaneamente a sucessão legítima e testamentária, desde que, em testamento, o de cujus haja disposto de metade de seus bens, destinando a outra aos seus herdeiros necessários ou legitimários129.

Prossegue Diniz130, acerca da herança testamentária:

“Deferida por força de testamento feito pelo de cujus,

respeitando a legítima dos herdeiros necessários, se houver, ou dispondo sobre a

totalidade de seus bens, na ausência de descendentes ou ascendentes”.

Acerca da herança legítima, discorre Rodrigues131:

(...) “A sucessão legítima, ou seja, aquela que opera por

força de lei e que ocorre quando o de cujus faleceu sem deixar testamento, ou

quando seu testamento caducou, ou foi julgado ineficaz”132.

Configurando-se umas dessas hipóteses, ou ainda no tocante aos bens não compreendidos no testamento, a lei convoca pessoas da família do finado, de acordo com a ordem nela fixada, denominada ordem de vocação hereditária, para receberem a herança133.

Portanto, a herança é legítima, quando baseada nas

disposições legais, aplicável na falta de declaração de vontade do testador ou no 128 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico , 1998, p. 712. 129 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico , 1998, p. 712. 130 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico , 1998, p. 713. 131 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 93. 132 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 93. 133 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 93.

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caso de nulidade, anulação ou caducidade do testamento, devendo ser obedecida

a ordem de vocação hereditária.

Entende Rodrigues134, que herança necessária é:

Quando o falecido houver deixado herdeiro necessário, seu patrimônio se divide, por assim dizer, em duas partes: a quota disponível e a legítima de seus herdeiros necessários.

É obvio que só aquilo que constituía seu patrimônio é transmitido a seus herdeiros. Portanto, se o defunto era casado pelo regime da comunhão, separa-se, antes da partilha, a meação do cônjuge sobrevivente. Essa meação não se confunde com a herança, e o cônjuge sobrevivente apenas conserva aquilo que já era seu e que estava em condomínio, em seu casal135.

Verifica-se, portanto, que herança necessária é aquela

destinada aos herdeiros legítimos e necessários, que são os descendentes,

ascendentes e o cônjuge.

Sobre herança testamentária leciona Rodrigues136:

“Ao lado da sucessão legítima, que se processa por força de

lei e nos casos analisados, encontra-se a sucessão testamentária, que deriva da

manifestação de última vontade, revestida da solenidade prescrita pelo

legislador”137.

Com efeito, este permite a disposição de bens por testamento; apenas limita essa liberdade de disposição no caso de ter o testador herdeiros necessários, ou seja, descendentes, ascendentes ou cônjuge, pois, nessa hipótese, só pode o testador dispor da metade de seus bens, visto que a outra metade constitui a reserva daqueles herdeiros que, fora o caso excepcional de deserdação ou exclusão, a ela têm direito138.

134 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 124. 135 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 124. 136 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 143. 137 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 143. 138 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito das sucessões , 2002, p. 143.

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Sobre os tipos de herança existentes no ordenamento

jurídico, leciona Venosa139:

A compreensão de herança é de uma universalidade. O herdeiro recebe a herança toda ou uma quota-fração dela, sem determinação de bens, o que ocorrerá somente na partilha. O herdeiro pode ganhar essa condição por estar colocado na ordem de vocação hereditária (art. 1.829; antigo, art. 1.603) ou por ter sido aquinhoado com uma fração da herança por testamento.

Nota-se que o doutrinador destacou dois tipos de herança, a

legítima que é baseada nas disposições legais, devendo ser obedecida a ordem

de vocação hereditária; e a testamentária que é aquela baseada na vontade do

testador, através de um testamento140.

Prossegue Venosa141, enfatizando que herança necessária

é:

Quando a lei estabelece uma herança necessária, está-se colocando no meio termo. Permite sempre o testamento, mas restringe o alcance quando há qualquer herdeiro na linha descendente, ou, sem sua falta, na linha ascendente. A plena liberdade de testar fica para quando os herdeiros já estão mais distantes na linha do parentesco, quando então a lei presume que diminuem os vínculos afetivos142.

Com a classificação das heranças, chega ao fim o Capítulo 1

da presente monografia, onde se pode verificar aspectos gerais sobre o direito

sucessório, os quais são importantíssimos para o entendimento do “Direito

Sucessório dos Companheiros no Ordenamento Jurídico Brasileiro”. O próximo

Capítulo irá tratar da União Estável, visto que os direitos sucessórios previstos no

artigo 1.790 do Código Civil, que são o objeto deste trabalho de conclusão de

curso, decorrem desta União.

139 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 21. 140 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 21. 141 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 202. 142 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 202.

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CAPÍTULO 2

UNIÃO ESTÁVEL

2.1 BREVES CONSIDERAÇÕES HISTÓRICAS ACERCA DO SURGI MENTO DA

UNIÃO ESTÁVEL

O presente sub título demonstrará como o ordenamento

jurídico evoluiu para tratar das problemáticas que envolvem os companheiros, e

nota-se como a Igreja Católica interferiu em relação a este assunto.

Depois de um período longo de batalhas, as concubinas

tiveram alguns benefícios garantidos, visto que, a Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988, consagrou proteção à família compreendendo tanto

as famílias fundadas pelo casamento, como as uniões de fato, como verifica-se a

seguir.

Venosa143 entende que:

Paralelamente ao casamento contrapõe-se a união livre que também gera efeitos jurídicos. A união de fato só passa a apresentar relevância de negação jurídica a partir da instituição do casamento sob forma legal no século XVI. O fato é que a família é um fenômeno social preexistente ao casamento, um fato natural. A sociedade, em determinado momento histórico, institui o casamento como regra de conduta. A partir daí surge a problemática da união conjugal sem casamento.

Durante muito tempo o legislador viu no casamento a única

forma de constituição de família, negando efeitos jurídicos à união livre, mais ou

menos estável. Essa oposição persistiu por muito tempo devido à influência da

Igreja Católica. Coube por isso à doutrina, a partir da metade do século XX, tecer

143 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família . v. 6. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2003,

p. 49.

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posições em favor dos direitos dessas pessoas unidas não pelo matrimônio,

preparando terreno para a jurisprudência e para a alteração legislativa144.

(...) A jurisprudência, de início, reconheceu direitos obrigacionais no desfazimento da sociedade conjugal concubinária, determinado a divisão entre os cônjuges do patrimônio amealhado pelo esforço comum. Em outras situações, quando isso não era possível, para impedir o desamparo da concubina, os tribunais concediam a ela (ou excepcionalmente a ele) uma indenização por serviços domésticos, eufemismo que dizia muito menos do que se pretendeu. O Supremo Tribunal Federal acentuava que esses efeitos patrimoniais decorriam de relações obrigacionais criadas pela convivência do casal, repelindo efeitos de família145. (...)

Gradativamente, foram surgindo conquistas legislativas,

doutrinárias e jurisprudenciais, como a Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal,

que sintetizou que “comprovada a existência de fato entre os concubinos, é

cabível a sua dissolução judicial com a partilha do patrimônio adquirido pelo

esforço comum”; e o artigo 226, § 3º da Constituição da República Federativa do

Brasil de 1998, que reconheceu a união estável entre homem e mulher como

entidade familiar. Por conseguinte surgiram as Leis 8.971/94 e 9.278/96 que

trouxeram benefícios aos conviventes, porém não suficientes, portanto, em

conseqüência disso, o Código Civil de 2002 trouxe inovações no que concerne à

união estável146.

Sobre o surgimento da união estável, expressivas e de

grande relevância, são as colocações de Rizzardo147:

Cumpre, primeiramente, observar que, numa fase primitiva, não havia exclusividade nas relações entre o homem e a mulher. No alvorecer do gênero humano, as uniões ocorriam em momentos de procriação, visando sobretudo essa finalidade, formando-se um elo à semelhança do que se efetua entre o macho e a fêmea no

144 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 49. 145 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 50-51. 146 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 51. 147 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 894-895.

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reino animal, com domínio do líder ou mais forte, que vencia ou afugentava os concorrentes do mesmo grupo148.

A perenização das uniões apareceu com a evolução do ser humano, quando mais se destacavam e firmavam os grupos, e se sociabilizavam as pessoas, evoluindo o estreitamento das relações. Todavia, o sentido de família ou continuidade das uniões, com o agregamento da prole que surgia, decorreu, num momento inicial, das imposições religiosas, até que o Estado assumiu essa função, dada a necessidade de proteção e regulamentação. Foi quando se introduziram algumas formas para registrar ou documentar as uniões, acompanhadas de solenidades para marcar a sua oficialização. Mesmo assim, não se impunha uma fidelidade obrigatória, tanto que admitidas com certa normalidade a concomitância de relações paralelas149. (...)

Na Roma dos imperadores, bem como para os escravos, era

comum haver apenas uma união de fato. Tanto no alto império, que engloba

militares, políticos imperadores, cidadãos nobres; quanto para os escravos, o

concubinato se difundiu150.

(...) As conquistas e riquezas trazidas de povos dominados impulsionaram a degradação dos costumes e da disciplina, levando a depravação, aos bacanais e à decadência do casamento. A reação iniciou com Augusto, que impôs várias leis, como a Lex Julia de Adulteris, trazendo impedimentos nas uniões, e seguindo o endurecimento com a aceitação do cristianismo. Constantino emitiu decretos contra o concubinato, e retirando direitos aos filhos originados de uniões ilegais. Ao tempo dos imperadores cristãos, já no final do século IX, simplesmente se aboliram as uniões de fato151. (...)

Na medida em que se implantava a Igreja Católica, ou se expandia o cristianismo entre os povos, combatiam-se as uniões livres e paralelas ao matrimônio oficial ou religioso, dada a insistência da pregação da fidelidade conjugal, vendo-se no matrimônio um sacramento, ou a manifestação de um sinal divino, com a sua indissolubilidade. Na verdade, mesmo dando u dos

148 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família . 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 894. 149 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 894. 150 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 895. 151 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 895.

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cônjuges carta de divórcio ao outro, segundo o rigor dos evangelhos, sequer novas uniões são permitidas (Mateus, capítulo 5, versículo 32). Na Idade Média, dominou o combate à poligamia e às uniões extraconjugais, tornando-se as relações sexuais fora do casamento um dos maiores pecados. Difundiam-se como sinais de santidade a castidade e o celibato, o que predominou durante séculos e ainda prevalece hoje em certos setores tradicionais da religião católica, inclusive com a proibição ao controle da natalidade por métodos diferentes que a abstinência no período fértil da mulher152. (...)

Porém, mesmo havendo essa pregação por parte da Igreja

Católica, era evidente que continuavam existindo relacionamentos paralelos ao

casamento, bem como o Alcorão, que aceitava que um homem casasse com até

quatro mulheres, portanto, no direito muçulmano era aceito a poligamia153.

No geral, mesmo disciplinando as uniões, com a imposição da exclusão de relações concomitantes com outra pessoa, manteve-se a união conjugal de fato como instituição civil, reconhecendo-se a sua existência e protegendo certos efeitos, especialmente os de ordem patrimonial154. (...)

Na Idade contemporânea, deu-se início à evolução dos

direito das concubinas, visto que a jurisprudência começou a reconhecer os

direitos destas mulheres155.

No que concerne à fase de formação do direito brasileiro, o

antigo direito luso não cuidou da espécie, sendo assim, O Código Civil Brasileiro

de 1916, que entrou em vigor em 1917, herdou das Ordenações Filipinas

proibições de doações e de disposições testamentárias à concubina, bem como,

muitos outros preconceitos em relação aos filhos havidos da união; tais

preconceitos foram sendo minimizados conforme as jurisprudências que vinham,

152 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 896. 153 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 896. 154 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 896. 155 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 897.

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cada vez mais, porém lentamente, reconhecendo os direitos desta população que

até então se mostrava desamparada com rompimento da relação156.

Em 1937, levantou-se a teoria de prestação de serviços ao

companheiro, portanto, era devido à concubina uma indenização pelos serviços

prestados ao seu amásio, no período da convivência157.

Dentro do caráter que dava a maioria da doutrina e da jurisprudência no começo da formulação dos fundamentos, não se estava diante de um salário convencionado ou estipulado para compensar os serviços. Pelo contrário, argumentava-se, “o trabalho da concubina mais se equipara à indenização civil, pois é contraprestação de zelo e carinho que a mulher dá ao homem, atendendo-o efetivamente em todas as horas de convivência. A indenização à concubina não se pode confundir com o salário devido à doméstica que, materialmente e sem nenhum outro interesse que não o mister que lhe é reconhecido, faz jus à indenização pelo tempo que, ao amásio, dedicou e não como a doméstica ao trabalho executado158”159.

Em verdade, o trabalho é gratuito, considerado como decorrência normal da convivência, mas com resultados favoráveis ao concubino que, por esta razão, tinha maior comodidade, menos despesas, a vida organizada, o lar ordenado e a sua própria pessoa atendia em múltiplas necessidades. A ausência da mulher, no conjunto familiar, resultava em considerável aumento de ônus domésticos e num acréscimo de responsabilidades ao homem, que nem sempre manifestava disponibilidade e qualidades para o desempenho160.

Portanto, duas soluções tornaram-se evidenciadas e ambas

em benefício da concubina. A primeira solução encontrada foi a de atribuir-se à

companheira uma indenização, devido aos serviços prestados por ela ao seu

amásio; a segunda foi a de dar-lhe participação no patrimônio adquirido pelo

esforço comum, entendendo-se haver existido, entre os concubinários, uma

156 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 897. 157 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 897. 158 Revista dos Tribunais , 452/224. 159 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 898. 160 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 898-899.

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sociedade de fato que, que ao ser desfeita, implicava na divisão do patrimônio

social161.

Quanto a dissolução da sociedade conjugal de fato, com o direito de partilha do patrimônio formado, já o vetusto direito luso, nas Ordenações que perduraram no Brasil até o advento do Código Civil, já tinha regra a respeito: “Outrossim, serão meeiros, provando que estiveram em casa teúda e manteúda, ou em casa de seu pai, ou em outra, em pública voz e fama de marido e mulher por tanto tempo que, segundo o direito, baste presumir matrimônio entre eles...” (Livro IV, Tít. 46, § 2º)162.

A começar de 1950, alcançou a matéria grande desenvolvimento, gerando debates e dirigindo-se para o reconhecimento do direito da mulher – direito que se consolidava pretórios pátrios. Posicionavam na vanguarda o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, o de São Paulo, o de Minas Gerais, e o do Rio de Janeiro. Mais cedo ou mais tarde, a posição favorável atingiu os demais Estados, chegando a culminar no Supremo Tribunal Federal que, num dos muitos julgamentos, assentou: “A jurisprudência do STF predomina no sentido de que se for reconhecida no curso da união livre more uxorio a existência de uma sociedade de fato, pela conjugação de esforços entre os concubinos na formação do patrimônio, tem direito a mulher à partilha dos bens. A medida maior ou menor da colaboração da mulher naqueles esforços é secundaria e se reconhecida pelo Tribunal que julgou os fatos, não pode ser reexaminada em recurso extraordinário”163.

Ao homem (concubinário), se estendeu o mesmo direito,

tendo em vista que podia pleitear a partilha dos bens do casal, adquiridos com as

economias de ambos durante a convivência164.

Foi com a Constituição Federal de 1988 que se tornou dogma o direito, a ponto de inserir o concubinato estável em uma forma de família. (...) É elevada a união estável à categoria de entidade familiar, com a proteção do Estado. Nada mais fez a Carta Federal

161 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: direito de família . v. 6. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p.

289. 162 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 899. 163 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 899. 164 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 899.

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que reconhecer um fenômeno social comum e generalizado em todo o País, tornando-se necessária a sua regulamentação. Seguiram-se, nesse intento, a Lei nº 8.971, de 29.12.1994, tratando dos direitos dos companheiros a alimentos e a sucessões; e a Lei nº 9.278, de 13.05.1996, com regras sobre a conversão da união estável em casamento. Esses diplomas cuidam, pois, dos efeitos das uniões estáveis, discriminando os direitos e obrigações, dentro da ordem de requisitos para a sua caracterização165.

Por fim, o Código Civil de 2002, trouxe disposições

diferentes daquelas contidas nas leis acima especificadas, bem como os

elementos que caracterizam a união estável e os impedimentos de constituição da

união estável166.

Assunto de suma importância, foram as regras trazidas em

relação ao direito das sucessões, que dispõe assuntos referentes à morte de um

dos companheiros. Serão aplicadas as regras do regime de comunhão parcial de

bens, ou seja, entra na comunhão o patrimônio formado e adquirido

onerosamente durante a união. Outro ponto a ser analisado, é a concorrência

existente entre o companheiro com os descendentes e ascendentes do de cujus,

bem como com outros parentes sucessíveis167. Tais regras, terão um estudo

aprofundado no capítulo 3 do presente trabalho de conclusão de curso.

É evidente, que a mudança na maneira de pensar dos

indivíduos, foi a mola propulsora na aceitação de uma realidade fática que sempre

existiu na humanidade, visto que, ao longo da história, mesmo contrariando

normas, sempre houve o concubinato. A necessidade de adequação da realidade

social com a jurídica, teve como conseqüência a evolução do Direito.

165 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 900. 166 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 900. 167 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 900-901.

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2.2 ANÁLISE DOS TERMOS UTILIZADOS PARA IDENTIFICAR A UNIÃO

ESTÁVEL.

Para haver conhecimento pleno sobre o conceito de união

estável, é necessário haver uma comparação entre as expressões união estável e

concubinato, já que este último, continua sendo citado nas doutrinas atuais.

Portanto, o presente sub item irá tratar sobre esta matéria.

Sobre as terminologias união estável e concubinato, ensina

Diniz168 que:

“A União estável distingue-se da simples união carnal

transitória e da moralmente reprovável, como a incestuosa e a adulterina. Logo, o

concubinato é o gênero do qual a união estável é a espécie”169.

“A união de fato ou o concubinato pode ser: puro ou

impuro”170.

Será puro (CC, arts. 1.723 e 1.726) se se apresentar como uma união duradoura, sem casamento civil, entre homem e mulher livres e desimpedidos, isto é, não comprometidos por deveres matrimoniais ou por outra ligação concubinária. Assim, vivem em união estável ou concubinato puro: solteiros, viúvos, separados judicialmente ou de fato e divorciados171. (...)

Ter-se-á concubinato impuro ou simplesmente concubinato, nas relações não eventuais em que um dos amantes ou ambos estão comprometidos ou impedidos legalmente de se casar. No concubinato há um panorama de clandestinidade que lhe retira o caráter de entidade familiar (CC, art. 1.727), visto não poder ser convertido em casamento. Apresenta-se como: a) adulterino (RTJ, 38:201; JTJ, 243:186; RT, 458:224, 649:52, 728:342), se se fundar no estado de cônjuge de um ou ambos os concubinos, p. ex., se homem casado, não separado de fato, mantém, ao lado da família

168 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia. v. 5. 19. ed. São

Paulo: Saraiva, 2004, p. 345-346-347. 169 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 345. 170 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 345. 171 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 345.

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matrimonial, uma outra (RTJ, 75:965, 117:1264 e 1269); e b) incestuoso, se houver parentesco próximo entre os amantes172.

Reforçará tal idéia o Projeto de Lei n. 6.960/2002 ao propor a seguinte modificação ao art, 1.727: “As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar e que não estejam separados de fato, constituem concubinato, aplicando-se a este, mediante comprovação da existência de sociedade de fato, as regras do contrato de sociedade. Parágrafo único. As relações meramente afetivas e sexuais, entre o homem e a mulher, não geram efeitos patrimoniais, nem assistenciais”173.

Sobre união estável ou concubinato puro, ensina Rizzardo:

(...) Representa a união de um homem e uma mulher em situação de inexistência de impedimentos para o casamento. Por extensão, abrange a união de pessoa separada de fato com outra pessoa. Ou corresponde à união entre pessoas já separadas de fato ou de direito, ou viúvas, ou divorciadas, ou solteiras, apresentando-se à sociedade como constituindo uma união, com as qualidades da exclusividade, fidelidade, vida em comum, moradia sob o mesmo teto, ostensividade e durabilidade174.

Importante é ressaltar, que um relacionamento amoroso

pode não ser considerado união estável, mas sim concubinato impuro, porque

ocorre quando vigorava plenamente o casamento, ou porque ocorre

concomitantemente com os impedimentos para casar.

Portanto, ambos tem como pressuposto a união prolongada,

ou a convivência constante, porém, a diferença existente entre união estável e

concubinato impuro, é de que neste último, inexistem elementos que disciplinam o

casamento, portanto, há impedimentos para tal efeito175.

172 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 346-347. 173 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 347. 174 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 892. 175 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 893.

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Sobre a União estável, expressivas são as colocações de

Pereira176:

Os impedimentos matrimoniais, conhecidos anteriormente como “dirimentes públicos” no Código de 1916 (art. 183, incisos I a VIII), identificados no Código de 2002 como “Impedimentos” (art. 1.521), devem afastar a caracterização da união estável, com exceção expressa daquela união que envolve pessoa casada, mas separada de fato. Neste aspecto, o legislador de 2002 solucionou a questão ao reconhecer a possibilidade da união estável à pessoa que “se achar separada de fato”, concedendo a ela os efeitos jurídicos da união estável.

O ordenamento jurídico atual, passou a utilizar os termos

união estável e companheiros, desta forma, as terminologias concubinato e

concubinos tornaram-se uniões de segunda classe.

Cumpre salientar, que a união estável é sinônimo de

concubinato puro, tendo em vista que não há elementos que impeçam o

matrimônio, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento. Porém,

mesmo sendo sinônimos, o ideal é utilizar o termo união estável, pois, como

explicitado anteriormente, o ordenamento jurídico brasileiro passou a utilizar esta

terminologia. Por sua vez, será classificado como concubinato impuro, aquela

união em que existem elementos que causem impedimentos ao casamento177.

Tal distinção não tem a função de discriminar, apenas serve

para manter a coerência das leis brasileiras, afastando, portanto, a poligamia;

visto que, o ordenamento jurídico brasileiro se espelha no princípio da

monogamia178.

2.3 CONCEITUAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL.

Para atender a uma realidade social, criou-se a união

estável, que tem como objetivo proteger famílias extramatrimoniais, mas que

176 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . v. 5. 14 ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2004, p. 546. 177 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 49. 178 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 49.

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podem ser convertidas em casamento, a qualquer tempo. O presente sub item irá

trazer o conceito de União Estável na visão de doutrinadores brasileiros, visto

que, no sub título anterior, foram tratados apenas os aspectos que diferenciam a

união estável do concubinato impuro, já que estes não podem ser confundidos.

Segundo Diniz179:

Ao matrimônio contrapõe-se o companheirismo, consistente numa união livre e estável de pessoas livres de sexos diferentes, que não estão ligadas entre si por casamento civil. A Constituição Federal, ao conservar a família, fundada no casamento, reconhece como entidade familiar a união estável, notória e prolongada de um homem com uma mulher, vivendo ou não sob o mesmo teto, sem vínculo matrimonial, desde que tenha condições de ser convertida em casamento, por não haver impedimento legal para sua convolação. A proteção jurídico-constitucional recai sobre uniões matrimonializadas e relações convivenciais more uxório, que possam ser convertidas em casamento. Com isso, a união estável perde o status de sociedade de fato e ganha o de entidade familiar, logo não pode ser confundida com a união livre, pois nestas duas pessoas de sexos diferentes, além de não optarem pelo casamento, não tem qualquer intentio de constituir família180.

Neste diapasão entende Venosa181 que:

(...) Na união estável existe a convivência do homem e da mulher sob o mesmo teto ou não, mas more uxório, isto é, convívio como se marido e esposa fossem. Há portanto, um sentido amplo de união de fato, desde a aparência ou posse de estado de casado, a notoriedade social, até a ligação adulterina. Nesse sentido, a união estável é um fato jurídico, qual seja, um fato social que gera efeitos jurídicos.

Venosa enfatiza que a união estável é um fato social que

gera efeitos jurídicos, o que o torna um fato jurídico. Sendo assim, por ser um fato

jurídico, gera conseqüências jurídicas182.

179 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 335-336. 180 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 335-336. 181 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 49.

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Dispõe a Constituição da República Federativa do Brasil, em

seu artigo 226 § 3º, que:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do

Estado.

§3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união

estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

A Lei nº 9.278/96, no artigo 1º, enfatiza que: “É reconhecida

como entidade familiar à convivência duradoura, pública e contínua, de um

homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família”.

Por sua vez, Rizzardo183 ensina que:

O significado é facilmente perceptível. A palavra ‘união’ expressa ligação, convivência, junção, adesão; já o vocábulo ‘estável’ tem o sinônimo de permanente, duradouro, fixo. A expressão corresponde, pois, à ligação permanente do homem com a mulher, desdobrada em dois elementos: a comunhão de vida, envolvendo a comunhão de sentimentos e a comunhão material; e a relação conjugal exclusiva de deveres e direitos inerentes ao casamento184.

Breves são as considerações de Rodrigues185:

(...), numa rápida definição, poder-se caracterizar a união estável como a união do homem e da mulher, fora do matrimônio, de caráter estável, mais ou menos prolongada, para o fim de satisfação sexual, assistência mútua e dos filhos comuns e que implica uma presumida fidelidade da mulher ao homem186.

Com o estudo da União Estável, tornou-se evidenciado, que

na medida em que os preconceitos foram sendo deixados de lado e os indivíduos

foram evoluindo na maneira de pensar, fez-se necessário a adequação da

182 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 52-53 183 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 885. 184 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família , 2005, p. 885. 185 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: direito de família , 2002, p. 287. 186 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: direito de família , 2002, p. 287

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realidade fática e do ordenamento jurídico. Portanto, devido a essa evolução, foi

reconhecida uma legitimidade familiar àquelas pessoas de sexos diferentes, que

se unem com o intuito de formar uma família, sem haver casamento,

denominando-se esta instituição como União Estável. A evolução social, fez com

que o ordenamento jurídico fosse modificado, exemplo disto, foi a Constituição

Federal de 1988 e a Lei nº 9.278/96, que reconheceram a União Estável como

entidade familiar.

2.4 PRESSUPOSTOS PARA CONSTITUIÇÃO DE UMA UNIÃO EST ÁVEL.

Para classificar os pressupostos, deve-se levar em

consideração o texto constitucional, bem como a legislação ordinária.

Discorre Venosa que são cinco os elementos presentes em

nossa legislação para caracterizar a união estável, são eles: a estabilidade, a

continuidade da relação, a diversidade de sexos, a publicidade e objetivo de

constituir uma família187. Diversamente do autor ora citado, Diniz entende ser sete

os elementos caracterizadores presentes no ordenamento jurídico brasileiro,

como a diversidade de sexos, ausência de matrimônio civil válido e de

impedimento matrimonial entre os conviventes, notoriedade de afeições

recíprocas, honorabilidade, fidelidade ou lealdade, coabitação e ainda a

colaboração da mulher no sustento do lar188. Verifica-se, portanto, que existem

controvérsias entre os entendimentos de alguns autores, e portanto, o presente

sub item, irá fazer um estudo aprofundado em relação a esta matéria.

Venosa demonstra os elementos caracterizadores, que

entende estar estabelecido na lei:

Se levarmos em consideração o texto constitucional, nele está presente o requisito da estabilidade na união entre o homem e a mulher. Não é qualquer relacionamento fugaz e transitório que

187 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 53-54-55. 188 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 336-343.

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constitui a união protegida; não podem ser definidas como concubinato simples relações sexuais, ainda que reiteradas189.

Portanto, a relação tem que ser duradoura, porém não há

um tempo determinado, um período mais ou menos longo caracteriza essa

estabilidade na relação do casal; mas isto não é regra, visto que existem casos

em que o tempo foi ínfimo, porém caracterizou a entidade familiar com o

nascimento de um filho190.

A continuidade da relação é outro elemento. Entende-se

que a relação não pode ter idas e vindas, seguidas interrupções191.

Porém, frisa Venosa que192: “Nem sempre uma interrupção

no relacionamento afastará o conceito de concubinato”.

A Constituição, assim como o art. 1.723, também se refere expressamente à diversidade de sexos , à união do homem e da mulher. Como no casamento, a união do homem e da mulher tem, entre outras finalidades, a geração de prole, sua educação e assistência193. (...)

É essencial, portanto, que a união estável ocorra entre

pessoas de sexos diferentes. Porém, é importante destacar, que o Tribunal de

Justiça do Rio Grande do Sul, já reconheceu como união estável a convivência

entre pessoas do mesmo sexo.

A publicidade é outro elemento da conceituação legal. Ganha realce, portanto, a notoriedade da união. A união de fato que gozará de proteção è aquela na qual o casal se apresenta como se marido e mulher fossem perante a sociedade, situação que se avizinha da posse de estado de casado. A relação clandestina, velada, à socapa, não merece a proteção da lei194.

189 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 53. 190 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 53-54. 191 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 54. 192 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 54. 193 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 55. 194 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 55.

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O objetivo de constituir uma família é também um

elemento básico para a caracterização da união estável, como verifica-se abaixo:

(...) Não é necessário que o casal de fato tenha prole comum, o que se constituiria elemento mais profundo para caracterizar a entidade familiar. Contudo, ainda que sem filhos comuns, a união tutelada é aquela intuitu familiae, que se traduz em uma comunhão de vida e interesses. Sem o objetivo de constituir família, a entidade de fato poderá ser um mero relacionamento afetivo entre os amantes, gerando, no máximo, sociedade de fato em relação a bens adquiridos por esforço efetivo de ambos195.

Segundo Diniz, são elementos essenciais, portanto aqueles

previstos em lei, os seguintes pressupostos:

Diversidade de sexo , pois entre pessoas do mesmo sexo haverá tão-somente uma sociedade de fato, exigindo-se além disso, convivência duradoura e continuidade das relações sexuais, que a distingue de simples união transitória. (...) Meras relações sexuais acidentais e precárias, ainda que repetidas durante muito tempo, não revelam companheirismo, que requer estabilidade, ligação permanente entre homem e mulher para fins essenciais à vida social, isto é, aparência de “casamento” perante terceiros ou de “posse de estado de casado”196. (...)

Muitos doutrinadores adotam o prazo de 5 anos, prazo que

anteriormente era adotado pela Lei 8.971/94, como suficiente para caracterizar o

estado convivencial, porém, entende Diniz não ser aconselhável determinar

prazos, visto que pode-se caracterizar a união estável em um lapso de tempo

menor, desde que haja afeição recíproca, enfim a intenção de formar uma

família197.

Sobre a definição do lapso temporal, salienta Diniz198 que:

(...) o estabelecimento de qualquer prazo afastaria da tutela legal certas situações que a ela fariam jus e daria ensejo a manobras

195 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 55. 196 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 336-337. 197 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 337. 198 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 339.

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de fraude à lei com interrupção forçada da convivência às vésperas da consumação do lapso temporal para o seu reconhecimento como união estável e para a produção de seus efeitos jurídicos199. (...)

Ausência de matrimônio civil válido e de impediment o matrimonial entre os conviventes (CC, art. 1.723, § 1º), não se aplicando o art. 1.521, VI, no caso de a pessoa casada encontrar-se separada de fato ou judicialmente. “As causas suspensivas do art. 1.523 do Código Civil não impedirão a caracterização da união estável” (CC, art. 1.723, § 2º). E pode ser reconhecida a união estável de separado judicialmente, pois a separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e fidelidade recíproca e ao regime de bens (CC, arts. 1.723, § 3º, e 1.576)200.

“Notoriedade de afeições recíprocas , que não significa de

modo algum publicidade”201.

A união estável não terá que ser pública, visto que, os

conviventes podem ter um relacionamento discreto, em que apenas os mais

íntimos saibam de tal ligação; portanto, será notório à um círculo mais restrito de

pessoas202.

A convivência more uxório deve ser notória, os companheiros

deverão tratar-se, socialmente, como marido e mulher, aplicando-se a teoria da aparência, revelando a intentio de constituir família, traduzida por uma comunhão de vida e de interesses, mesmo que não haja prole comum (TJSP, Ap. 167.994-1, j. 10-9-1991 – Rel. Almeida Ribeiro)203. (...)

“Honorabilidade , pois deve haver uma união respeitável

entre homem e mulher (RT, 328:740; RTJ, 7:24 e CC, art. 1.724), pautada na

affectio”204.

199 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 339. 200 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 340. 201 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 340. 202 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 340-341. 203 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 341. 204 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 341.

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Entende a doutrinadora Diniz, que a fidelidade ou lealdade ,

também é pressuposto para constituição de uma união estável, pois a existência

deste pressuposto revela a intenção de vida em comum. Portanto, não havendo

relação monogâmica, o relacionamento será considerado nas palavras de Diniz,

como uma “amizade colorida”; sendo assim, não terá proteção do Estado205.

Todavia é preciso esclarecer que tal dever de fidelidade visa tão-somente valorizar a união estável, podendo os conviventes rompe-la, livremente, sem sofrer, em regra, qualquer sanção. Mas a quebra de lealdade pode implicar injúria grave, motivando a separação dos conviventes, gerando em atenção à boa-fé de um deles indenização por dano moral (RT, 437:157) e os efeitos jurídicos da sociedade de fato. Será, portanto, imprescindível a unicidade de “amante”, similarmente ao enlace matrimonial, pois, por exemplo, a união de um homem com duas ou mais mulheres faz desaparecer o “valor” de ambas ou de uma das relações, tornando difícil saber qual a lesada. Porém, excepcionalmente, em atenção à boa-fé daquelas mulheres em união simultânea com o mesmo homem, há decisão aceitando o direito de indenização e os mesmos efeitos da união estável, mesmo não caracterizada, às que foram enganadas por ele206.

Outro elemento caracterizador da união estável é a

coabitação, como registra Diniz:

Coabitação , uma vez que a união estável deve ter aparência de casamento. Ante a circunstância de que no próprio casamento pode haver uma separação material dos consortes por motivo de doença, viagem ou de profissão, a união estável pode existir mesmo que os companheiros não residam sob o mesmo teto, desde que seja notório que sua vida se equipara à dos casados civilmente (Súmula 382 do STF). Por isso, fez bem o novel Código Civil (art. 1.724) em não contemplar esse dever207.

205 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 342-343 206 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 342-343. 207 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 343.

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Ainda no que diz respeito aos pressupostos essenciais, Diniz

faz um breve comentário acerca da colaboração da mulher no sustento do lar, não

tratando esta, apenas como fonte de dissipação e despesas208.

Além dos pressupostos existentes na lei, os doutrinados

apontam alguns que tornam-se relevantes no caso concreto, embora sejam

secundários.

Venosa, classifica os seguintes elementos, que não estão

previstos em lei, mas que são admitidos no caso concreto:

Dever de fidelidade , visto que, a violação deste dever, pode

em alguns casos, fazer cair por terra a comunhão de vida, de interesses e de

sentimentos209.

O art. 1.724 do Código Civil estabelece que as relações

entre os companheiros devem pautar-se por lealdade, respeito e assistência, e de

guarda, sustento e educação dos filhos. O dever de lealdade não se identifica

perfeitamente, como é patente, com o dever de fidelidade210.

Outro elemento que pode ser levado em consideração é a habitação comum . O legislador não a mencionou, no que andou bem. A Súmula 382 do Supremo Tribunal Federal já dispunha que “a vida em comum sob o mesmo teto, more uxorio, não é

indispensável à caracterização do concubinato”. A experiência social demonstra que há uniões sólidas, duradouras e notórias sem que o casal resida sob o mesmo teto. O próprio casamento pode conter uma separação material dos cônjuges por motivos de saúde, trabalho, estudo etc. Não se trata, portanto, de elemento conclusivo211.

Sobre a relação de unicidade do companheiro ou

companheira, e ainda sobre a existência do casamento religioso, ensina

208 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 343. 209 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 56. 210 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 56. 211 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 56.

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Venosa212 que: “A relação de unicidade do companheiro ou companheira também

é lembrada pela doutrina. A idéia central é no sentido de que a pluralidade de

relações pressupõe imoralidade e instabilidade”. (...)

Outro aspecto importante no tema é a existência de casamento religioso . Como, perante nosso sistema, somente é válido o casamento civil, o singelo casamento religioso estampa uma relação de fato. No entanto, estabelecida a relação derivada dessa união como concubinária, não resta duvida de que a bênção religiosa define uma relação de moralidade e respeito que auxilia o julgador para a tipificação de uma união estável213.

Diniz214, relaciona os seguintes elementos que tornam-se

relevantes para caracterizar a união estável, embora sejam secundários:

1) A dependência econômica da mulher ao homem , mas de um lado, pode haver concubinato puro, ou união estável, mesmo que a mulher não viva a expensas do companheiro, por ter meios próprios de subsistência, e, por outro lado, é possível que alguém tenha uma mulher por uns tempos, sob sua total dependência econômica, sem que haja união concubinária, p. ex., se um indivíduo leva uma jovem para as férias em uma estação climática.

2) A compenetração das famílias , havendo relações do amante com a família da concubina, contudo, não descaracteriza o concubinato se, p. ex., o homem evitar comunicar seu ambiente familiar com o de sua amante215.

3) Criação e educação pela convivente dos filhos de se u companheiro 216.

4) Casamento religioso, sem o efeito civil e sem seu a ssento no Registro Públic o217.

212 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 56. 213 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito de família , 2003, p. 56. 214 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 343-344. 215 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 343. 216 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 343. 217 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 344.

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5)Casamento no estrangeiro de pessoa separada judicialmente 218.

6) Gravidez e filhos da convivente com o homem com que m vive . A existência de prole comum não é requisito obrigatório para

caracterizar a união estável, porque é admissível casamento entre pessoas idosas ou estéreis e porque pode haver filhos sem que seus pais vivam em estado de companheirismo219.

7) Situação da companheira como empregada doméstica do outro 220.

8) Maior ou menor diferença de idade entre os conviven tes 221.

9) Existência de contrato pelo qual homem e mulher convencionam viver sob o mesmo teto, estipulando normas atinentes a questões morais e econômicas. Por esse contrato de coabitação, manifestam a intenção de se unir, criando uma sociedade de fato, propondo-se a comungar seus esforços e recursos, ao encontro de seus mútuos interesses. Podem convencionar que os bens móveis e imóveis adquiridos onerosamente por eles, durante o relacionamento, não sejam tidos como fruto de colaboração comum, não pertencendo, portanto, a ambos, em condomínio, em partes iguais (CC, art. 1.725). Nada impede, por exemplo, que coloquem clausulas concernentes à administração desse patrimônio, à previdência social, ao direito da companheira de utilizar o sobrenome do convivente etc. ambos declaram ser conviventes222.

Sobre os pressupostos para constituição da União Estável,

Rodrigues223 entende que:

Dentre os vários elementos capazes de configurar a união estável, o que, realmente, parece fundamental para esse fim é a presumida fidelidade da mulher ao homem. Aliás, em muitos casos, poder-se-ia mesmo dizer que o elemento básico

218 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 344. 219 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 344. 220 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 344. 221 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 344. 222 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito de famíl ia, 2004, p. 344. 223 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: direito de família , 2002, p. 287.

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caracterizador da relação é a presumida fidelidade recíproca entre os companheiros, pois ela não só revela o propósito de vida em comum e o de investirem-se eles na posse do estado de casados, como cria uma presunção juris tantum de que o filho havido pela

mulher foi engendrado por seu companheiro.

A notoriedade da união, a dependência econômica da

mulher ao homem e mesmo a vida em comum sob o mesmo teto são elementos

que apesar de não serem essenciais para a caracterização da união estável,

facilitam. Por ser estes elementos não essenciais, poder-se-á conceber uma

união estável em que a mulher não dependa do homem, nem com ele reside.

Porém, para Diniz, é indispensável para a caracterização da união estável, o

requisito presunção de fidelidade, portanto, mesmo havendo uma relação estável

entre a mulher casada e na convivência do marido, e outro homem, não há como

caracterizar a união concubinária224.

No decorrer do presente sub título, encontra-se pontos

controvertidos, exemplo disto, é no que diz respeito aos pressupostos fidelidade e

habitação em comum. Verifica-se que os doutrinadores Diniz e Venosa os

classificam de forma diversa; enquanto Diniz os classifica como elementos

essenciais, Venosa entende ser estes elementos secundários. O importante, no

que concerne à este assunto, é de que mesmo sendo secundários, tais elementos

são essenciais ao caso concreto.

Uma vez caracterizada a união estável, resta saber as

conseqüências jurídicas. O Capítulo 3, do presente trabalho de conclusão de

curso, irá tratar sobre as conseqüências jurídicas da união estável em relação ao

direito das sucessões.

224 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: direito de família , 2002, p. 287.

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CAPÍTULO 3

DIREITO SUCESSÓRIO NA UNIÃO ESTÁVEL

3.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO SUCESSÓRIO DOS

COMPANHEIROS

Até a promulgação do dispositivo legal vigente, as

jurisprudências, a Constituição da República Federativa do Brasil, a Lei 8.971/94,

bem como a Lei 9.278/96, foram fundamentais no que diz respeito aos direitos

sucessórios dos companheiros, como pode-se verificar no presente sub item.

Pereira225 entende que:

Numa visão retrospectiva, é possível afirmar que o direito brasileiro, antes mesmo do advento do novo Código Civil, já reconhecia em favor dos companheiros certos direitos sucessórios. Embora com terminologia vacilante – aludia-se ora a “companheiros”, ora a “conviventes” -, as duas leis que, na década de 90 do século passado, se ocuparam do tema reconheciam a quem vivesse em união estável com o de cuius uma participação

no acervo hereditário, em concorrência com herdeiros de classes mais favorecidas (descendentes e ascendentes); e, na ausência destes, possibilitavam o chamamento do companheiro a receber a herança em sua integralidade, preferindo aos parentes colaterais do finado.

Em sua obra, Instituições de Direito Civil – Direito das

sucessões, Pereira esboça os direitos sucessórios que foram conferidos aos

companheiros, com a promulgação da Lei nº 8.971, de 29 de dezembro de 1994,

bem como com a promulgação da Lei nº 9.278, de 10 de maio de 1996; como

verifica-se a seguir226:

225 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . v. 6. 15 ed. Rio de Janeiro:

Editora Forense, 2005, p. 151. 226 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 152.

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(a) usufruto sobre porção variável do acervo hereditário: concorrendo com descendentes (e não apenas com “filhos”, como, por equívoco evidente, constava do texto legal), aquele direito incidia sobre um quarto; concorrendo com ascendentes, sobre metade (Lei nº 8.971/94, art. 2º, nºs I e II)227;

(b) na falta de descendentes e ascendentes, cabia ao companheiro a totalidade da herança (Lei nº 8.971/94, art. 2º, nºIII), caso em que ele a recebia como seu proprietário228;

(c) direito real de habitação sobre o imóvel destinado à residência familiar, sujeito, porém, à resolução em virtude de nova união estável ou de casamento de seu titular (Lei nº 9.278/96, art. 7º, parágrafo único)229.

Ao analisar os direitos sucessórios adquiridos pelos

companheiros na década de 90, fica evidente que o companheiro estava em uma

situação mais favorável do que o próprio cônjuge, visto que, ao cônjuge não era

permitido cumular o usufruto vidual (Código de 1916, art. 1.611, § 1º) com o

direito real de habitação (art. 1611, § 2º)230.

É importante lembrar, que a 3ª Turma do Superior Tribunal

de Justiça, entendeu que a Lei 8.971, de 29 de dezembro de 1994, não colocou

os companheiros entre os herdeiros necessários e que, portanto, ao testador não

era ilícito excluir o companheiro de sua herança, tendo em vista que, só não

podem ser excluídos do testamento, no qual o testador dispõe todo o seu

patrimônio, os herdeiros necessários231.

Adverte, Pereira232, que “para as sucessões abertas antes

da Lei n º 8.971/94, não há que cogitar de direito sucessório do companheiro ao

menos, na sucessão legítima”, visto que, os direitos sucessórios resultam da Lei

227 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 152. 228 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 152. 229 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 152. 230 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 152. 231 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 153. 232 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 153.

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vigente da época, e antes de 1994 não havia Lei que disciplinasse o direito

sucessório dos companheiros, portanto, estes ficavam desprotegidos233.

Por fim, o atual Código Civil, trouxe quatro hipóteses

distintas: aquela em que o sucessor concorre com descendentes comuns; outra

em que concorre com descendentes não comuns; e ainda, aquela em que

concorre com outros parentes sucessíveis; e, não havendo parentes sucessíveis,

terá direito à totalidade da herança234.

Nesse sentido, discorre Pereira que:

Analogamente ao que se deu com a vocação sucessória do cônjuge, também a do companheiro evoluiu no sentido de conferir-lhe propriedade sobre os bens transmitidos, e não apenas direitos reais limitados (usufruto e habitação) que lhe eram reconhecidos pela legislação precedente (Leis nºs 8.971, de 29 de dezembro de 1994, e 9.278, de 10 de maio de 1996). Em compensação, o Código Civil de 2002, contrariando o sistema que resultava da primeira daquelas duas leis, situou o companheiro em si posição pior na ordem de vocação hereditária: na ausência de descendentes e de ascendentes, e a partir da vigência do novo diploma, o companheiro passou a ser chamado em concorrência com “outros parentes sucessíveis”, e não mais na qualidade de herdeiro único (Lei nº 8.971/94, art. 2º, nº III). No sistema agora em vigor, apenas quando o de cuius não tinha parente sucessível

algum é que se atribuirá ao companheiro a herança em sua integralidade235. (...)

É importante lembrar, que os companheiros só concorrerão

com descendentes, ascendentes ou outros parentes sucessíveis, quando os bens

forem adquiridos onerosamente na constância da união estável. Esta restrição

não havia anteriormente, como ensina Pereira236:

A Lei nº 8.971/94 não circunscrevia o direito sucessório do companheiro apenas a bens com tais características. Em

233 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 153. 234 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 153-154. 235 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 154. 236 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 155.

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dispositivo que não cuidava de sucessão, aquele diploma reconhecia ao companheiro direito à metade dos bens, quando estes resultassem de atividade em que houvesse sua colaboração: mas o que ali se instituía era um condomínio entre os companheiros, cuja dissolução, por morte de um deles, haveria de ensejar ao outro (como nos casamentos de que resulta comunhão patrimonial) o reconhecimento de sua meação (...)237

A meação, era cabível ao companheiro sobrevivente, por

direito de propriedade mantido em comunhão durante a vigência do

companheirismo, e não em virtude do falecimento do companheiro238.

É evidente que, o Código Civil de 2002, acabou por frustrar

os companheiros, visto que, caso estes não cheguem a formar onerosamente

patrimônio em comum, ficam excluídos da sucessão; portanto, não terão direito à

meação, e nem ao menos direito à concorrer com descendentes, ascendentes ou

outros parentes sucessíveis239.

Pereira240, entende que o legislador tem o objetivo de

amparar o companheiro, por este motivo, tece o seguinte comentário:

(...) se deve interpretar a expressão “herança”, constante dos nºs III e IV do art. 1.790, em seu sentido próprio, mais abrangente do que “bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável” (caput). No rigor da boa técnica, o conteúdo do caput deveria ser comum a todas as hipóteses em que o dispositivo a seguir se desdobra; no caso específico, porém, se a “herança” de que tratam os nºs III e IV se limitar aos bens comuns (conforme sugere o caput), chegaríamos a situações de extrema iniqüidade, como a do de cuius que, sem parentes sucessíveis e sem haver feito

testamento, houvesse vivido, em união estável, durante longos anos, no curso dos quais não chegou a adquirir bens que se tivessem comunicado ao companheiro. Não parece razoável, ter por vacante a herança, destinando-a ao ente estatal, quando, entre duas possíveis interpretações de dispositivo acerca da sucessão legítima, há de se dar preferência àquela que maior

237 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 155. 238 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 154. 239 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 155. 240 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 156.

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proteção confira à família (em especial, aos familiares mais próximos, como é o caso) 241.

A aparente incongruência entre o caput e os dois últimos incisos do art. 1.790 (na redação atual do novo Código Civil) se resolveria, assim, pelo entendimento de que, nas hipóteses de concorrência com descendentes, comuns ou não, a participação do companheiro na herança do de cuius está efetivamente restrita

aos bens mencionados no caput, ao passo que, quando deva concorrer com “outros parentes sucessíveis”, a fração seria calculada sobre a totalidade da herança242.

O doutrinador Wald243, em sua obra Direito das Sucessões,

ensina que foi a partir dos anos 60, que a doutrina e a jurisprudência tornaram-se

mais maleáveis, com o objetivo de proteger àquelas pessoas unidas não pelo

matrimônio, desde que fossem de sexos diferentes e não houvesse adultério;

afastando, portanto, todas as sanções que pesavam sobre estas relações. Sendo

assim, começou a se entender que os efeitos patrimoniais de uma sociedade de

fato deveriam ser reconhecidos, se tivessem sua origem numa coabitação entre

duas pessoas de sexo diferente, que convivessem como se casados fossem. E

ainda, na década de 70, a Lei nº. 6515/77, chegou a possibilitar as companheiras

o uso do patronímico do companheiro.

Em relação à evolução histórica do direito sucessório dos

companheiros, Wald244 tece os seguintes comentários:

Com a entrada em vigor da atual Constituição Federal, a união estável entre o homem e a mulher recebeu a qualificação de entidade familiar, merecedora de proteção do Estado. Competia, pois, ao legislador elaborar uma lei que regulamentasse as vidas dessas pessoas, o que foi feito primeiramente em 29 de dezembro de 1994, quando entrou em vigor a Lei n. 8.971, que disciplina sobre o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão. Em relação aos alimentos, consolidou-se a jurisprudência dos

241 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 2005, p. 156. 242 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 2005, p. 156 243 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões . 12 ed. São Paulo:

Saraiva, 2002, p. 76-77. 244 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 76-77-78.

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tribunais; em relação ao direito sucessório da companheira, ou do companheiro, passou-se a uma nova etapa do direito brasileiro245.

Além dessa lei, o parágrafo único do art. 7.º da Lei n. 9.278, de 10-5-1996, que disciplina o § 3.º do art. 226 da Constituição Federal/88, dispõe igualmente sobre o direito sucessório dos companheiros, (...)246.

O Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 380, que

estabelecia que “comprovada a existência de sociedade de fato entre os

concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio

adquirido pelo esforço comum”. Caso não restasse comprovado que os bens

foram adquiridos devido ao esforço comum, o concubino não teria direito

patrimonial algum. Atualmente, esta súmula pode ser aplicada aos casos em que

haja concubinato impuro, ou seja, quando há impedimentos para o casamento247.

A divisão do patrimônio no companheirismo pertencia ao

campo do direito das obrigações, portanto, esse tipo de demanda era processado

pela Vara Cível, e não pelo Juiz da Vara de Família. Apenas em 1996, com a

promulgação da Lei n. 9.278, a matéria relativa à união estável, passou a ser de

competência da Vara da Família, assegurado o segredo de justiça248.

Acentue-se que a Lei n. 8.971/94 não definia o que se deve entender por união estável. Isto, de fato, foi feito pelo art. 1.º da Lei n. 9.278/96. Aquele estatuto legal simplesmente levou em consideração o lapso temporal de cinco anos, a fim de caracterizar a relação de fato entre um homem e uma mulher como sendo duradoura e capaz de ensejar a aplicação da lei, desde que as pessoas envolvidas fossem solteiras, viúvas, divorciadas ou separadas judicialmente. Essa situação, entretanto, foi alterada com a entrada em vigor da Lei n. 9.278/96, que no seu art. 1.º dispensou o requisito relativo ao lapso temporal e deixou de considerar o estado civil da pessoa envolvida na união estável. O parâmetro passou a ser a notoriedade e a durabilidade dessa

245 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 76. 246 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 76. 247 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 77-78. 248 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 78.

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entidade familiar, a fim de que ela fosse considerada como união estável249.

O companheiro passa a figurar na ordem sucessória, na Lei

n. 8.971/94 em seu artigo 2º, conforme haja ou não descendentes e ascendentes

do de cujus250.

Inspirando-se na ordem sucessória estabelecida tradicionalmente pela lei civil, o companheiro (ou a companheira) passa a receber a totalidade da herança quando o de cujus não tiver descendentes,

nem ascendentes, figurando assim em terceiro lugar na vocação hereditária, ocupando a posição que o Código Civil reconhece ao cônjuge (arts. 1.603, III, e 1.611). Como, na falta de parentes, em linha reta, vivos e na ausência de testamento do falecido, a lei civil atribuiu a herança ao cônjuge cuja sociedade conjugal não esteja dissolvida no momento da morte do outro, o companheiro (ou a companheira) se substitui, no caso, ao cônjuge, assumindo a sua posição251.

A companheira supérstite (ou o companheiro), herdava

como se fosse cônjuge viúva (ou cônjuge viúvo), mas somente nos casos em que

o regime do casamento não era o da comunhão universal252.

(...), o companheiro (ou a companheira) recebe em usufruto a quarta parte dos bens do de cujus quando concorre com

descendentes deste ou comuns, e a metade se, não havendo descendentes, concorrer com ascendentes do falecido. No caso, a lei se refere à distribuição dos bens entre o companheiro (ou a companheira) e tão-somente os filhos do de cujus, sendo que a

interpretação sistemática nos leva a concluir que o legislador se referiu, na realidade, aos descendentes de qualquer grau (filhos, netos ou bisnetos)253.

Wald faz comentário acerca dos direitos concedidos aos

companheiros após a criação das Leis 8971/94 e 9278/96, afirmando que o

249 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 79. 250 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 79. 251 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 79 252 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 79-80. 253 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 80.

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legislador dava mais direitos aos companheiros do que aos cônjuges casados sob

o regime da separação ou da comunhão parcial de bens; tendo em vista que, no

caso da sociedade de fato ou da colaboração na formação do patrimônio do

falecido, o companheiro supérstite se igualava ao cônjuge casado sob o regime

da comunhão universal, pois recebia a metade dos bens da herança. Além do

que, conforme a Lei nº. 9278/96, artigo 7º, parágrafo único, aos companheiros era

proporcionado inclusive o direito real de habitação em relação ao imóvel onde

residia a família, desde que não constituísse outra união ou casamento254.

Prossegue Wald255, ensinando que:

Por fim, o art. 3.º da Lei n. 8.971/94 determina que, se os bens deixados pelo companheiro falecido resultarem de esforço comum, o sobrevivente terá direito à metade do patrimônio. Esta norma não está mais em vigor, em razão da Lei 9.278/96 ter estabelecido que o patrimônio adquirido a título oneroso na constância da união estável pertencerá a ambos em condomínio e em partes iguais (Lei n. 9.278/96, art. 5.º), desde que não haja estipulação em sentido contrário em contrato escrito. Não há mais necessidade, portanto, de o companheiro supérstite comprovar o esforço comum na aquisição dos bens comuns, a fim de ter direito à metade do patrimônio deixado pelo autor da herança256.

Apesar de não previsto em lei, o companheiro ou a

companheira somente teriam direto a suceder o de cujus, se no momento do óbito

a união estável ainda existisse, tendo em vista que, muitas companheiras

poderiam pleitear os direitos hereditários de uma mesma pessoa, por terem tido

em momentos diferentes uma união com o falecido257.

(...) o companheiro sobrevivente independentemente do prazo de duração da união estável, mas, desde que comprovadas sua durabilidade e sua estabilidade, é meeiro em relação aos bens adquiridos onerosamente na sua vigência, exerce o direito de habitação sobre o imóvel residencial, ex vi da Lei n. 9.278/96, e

254 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 80. 255 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 80-81. 256 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 80-81. 257 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 81.

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recebe, em usufruto, parte do patrimônio, se concorre com descendentes ou ascendentes do de cujus, ou a totalidade da

herança, se não houver parentes em linha reta do falecido, conforme determinação da Lei n. 8.971/94. (...)258

E por fim, o atual Código Civil, em seu art. 1.790, também

regulamentou os direitos sucessórios dos companheiros.

Dispõe o art. 1.790 que:

“A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:

I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;

II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;

IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança”.

Venosa259, em relação à evolução do direito sucessório dos

companheiros, tece os seguintes comentários:

Até a promulgação da Constituição de 1988, dúvidas não havia de que o companheiro ou companheira não eram herdeiros . A nova Carta reconheceu a união estável do homem e da mulher como entidade a ser protegida (art. 226, § 3º, “devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”). Contudo, em que pesem algumas posições doutrinárias e jurisprudenciais isoladas, tal proteção não atribuiu direito sucessório à companheira ou companheiro. Os tribunais admitiam a divisão do patrimônio adquirido pelo esforço comum dos concubinos, (hoje denominados companheiros ou conviventes), a título de liquidação de uma sociedade de fato (Súmula 380 do STF). De qualquer modo , essa divisão podia

258 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 81. 259 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões. v. 7. 3. ed. São Paulo: Atlas,

2003, p. 111.

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interferir na partilha de bens hereditários quando, por exemplo, tivesse havido o chamado concubinato impuro ou adulterino e o autor da herança falecesse no estado de casado, com eventual separação de fato. Nessa situação, perdurante até a novel legislação, cabia ao juiz separar os bens adquiridos pelo esforço comum dos pertencentes à meação ou herança do cônjuge260. (...)

Caso não atribuísse parte do patrimônio amealhado pelo

esforço comum, a jurisprudência concedia indenização às companheiras, devido

aos serviços domésticos prestados. Havia evidente eufemismo, que dizia muito

menos do que se pretendia261.

No ano de 1994, a Lei nº 8.971 inseriu os companheiros na

ordem de vocação hereditária. Dispõe o artigo 2º desta lei que:

(...)

I – o (a) companheiro (a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova união, ao usufruto da quarta parte dos bens do de cujus, se houver filhos deste ou comuns;

II – o (a) companheiro (a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova união, ao usufruto da metade dos bens do de cujus, se não houver filhos, embora sobrevivam ascendentes;

III – Na falta de descendentes e de ascendentes, o (a) companheiro (a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança.

Por sua vez, o artigo 1º desse diploma, dispunha que

apenas participariam desta sucessão as companheiras de um homem solteiro,

separado judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele vivia há mais de 5

(cinco) anos, ou dele tenha prole, enquanto não constituir nova união e desde que

prove a necessidade; portanto, só nestes casos poderiam valer-se do disposto na

Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968. Nota-se, que apenas o chamado

concubinato puro era protegido, os conviventes sobreviventes de um concubinato

impuro ou adulterino não teriam direito hereditário, e pouco importava se o

260 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 111. 261 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 111.

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falecido era separado de fato, visto que a lei foi bem clara ao dispor as pessoas

quem seriam protegidas.

No que concerne à Lei 8.971/94, discorre Venosa262 que:

(...) a lei pretendeu atribuir direito a alimentos, referindo-se somente à lei processual que regula a ação de alimentos, omitindo-se quanto ao direito material. Essa lei também restringiu o direito aos conviventes não casados com mais de cinco anos de vida em comum ou com prole.

O artigo 3º deste mesmo diploma, quanto ao direito de

meação, completava que263:

Quando os bens deixados pelo (a) autor (a) da herança resultarem de atividade em que haja colaboração do (a) companheiro (a) sobrevivente terá direito à totalidade da herança264.

Para fins de meação, o companheiro sobrevivente tinha que

provar sua colaboração na atividade que resultou os bens, visto que esta

colaboração não se presumia; diferente do ocorre atualmente, pois o companheiro

é meeiro em relação aos bens adquiridos onerosamente na convivência,

independentemente do tempo que convivem juntos ou da existência de prole265.

A Lei nº 9.278/96 atribui ao companheiro direito real de

habitação, isto é, dissolvida a união estável por morte de um dos companheiros, o

sobrevivente teria direito real de habitação, relativamente ao imóvel destinado à

residência da família, enquanto vivesse ou não constituísse novo casamento ou

união266.

Importante salientar, que o Código Civil de 2002, não se

refere ao direito real de habitação; portanto, grande dúvida existe no âmbito

262 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 112. 263 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 112. 264 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 112. 265 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 112-113. 266 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 113.

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jurídico, ao que diz respeito aos direitos dos companheiros em relação ao imóvel

destinado a moradia267.

Cita Venosa que:

Se for entendido que as lacunosas disposições do Código de 2002 sobre a união estável revogaram as leis anteriores, a união estável será colocada, no novo sistema, em posição de inferioridade. Haverá uma restrição de direitos conquistados no passado, inclusive este de habitação268. (...)

Após análise retrospectiva acerca da sucessão dos

companheiros, o próximo subtítulo trata sobre o direito sucessório dos

companheiros no ordenamento jurídico brasileiro atual, que é o foco principal

deste trabalho de conclusão de curso.

É importante frisar que, embora não esteja incluído na

ordem de vocação hereditária, e nem possuir o atributo de herdeiro necessário, o

companheiro além de ser meeiro, tem direito à participar da herança; porém, sua

participação vai incidir apenas quanto aos bens adquiridos onerosamente na

constância da união estável.

3.2 DIREITO SUCESSÓRIO COM BASE NO ATUAL CÓDIGO CIV IL.

Antes de tratar da concorrência dos companheiros com

outros herdeiros do de cujus, cumpre salientar, que salvo contrato escrito entre os

companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da

comunhão parcial de bens. Portanto, o (a) companheiro (a) será meeiro, bem

como herdeiro em relação aos bens adquiridos onerosamente na constância da

união estável.

267 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 113. 268 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 116.

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Sobre o contrato escrito que possa vir a adotar outro regime

de bens, ensina Venosa269 que:

(...) o companheiro ou companheira receberá os bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável. Em primeiro lugar, há, portanto, que se definir, no caso concreto, quais os bens que foram adquiridos dessa forma durante a união e quais os bens que serão excluídos dessa divisão. Em segundo tema, há de se recordar que o art. 1.725 do novo Código permite que os companheiros regulem suas relações patrimoniais por contrato escrito. Na ausência desse documento, aplicar-se-á, no que couber, como estampa a lei, o regime da comunhão parcial de bens. Pois bem: havendo contrato na união estável que adote outro sistema patrimonial, é de perguntar se esse regime terá repercussão no direito sucessório. O legislador deveria ter previsto a hipótese, mas, perante sua omissão, a resposta deverá ser negativa. Não há que se levar em conta que o contrato escrito entre os conviventes tenha o mesmo valor jurídico de um pacto antenupcial, o qual obrigatoriamente segue regras estabelecidas de forma e de registro. Desse modo, consoante os termos peremptórios do caput do art. 1.790, o convivente somente poderá ser aquinhoado com patrimônio mais amplo do que aquele ali definido por meio de testamento. O contrato escrito que define eventual regime patrimonial entre os companheiros não pode substituir o testamento270.

Portanto, na opinião do doutrinador Venosa271, o contrato

escrito não pode substituir o regime estipulado por Lei, tendo em vista a omissão

do legislador em relação a esta matéria, e nem mesmo poderá substituir o

testamento.

Requisito essencial, embora não previsto na legislação, é de

que só ocorrerá o direito sucessório dos companheiros, se o outro falecer na

vigência da união.

269 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 119. 270 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 119. 271 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 119.

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Colocações importantes sobre a Sucessão dos

Companheiros no Ordenamento Jurídico Brasileiro atual, faz Diniz272:

Há desigualdade de tratamento sucessório entre cônjuge e convivente sobrevivo, pois aquele é, em certos casos, herdeiro necessário privilegiado, podendo concorrer, ou não, com descendente e ascendente do falecido. O convivente, não sendo herdeiro necessário, pode ser excluído da herança do outro, se ele dispuser isso em testamento (CC, arts. 1.845, 1.846 e 1.857), pois só tem direito à sua meação quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável273. (...)

Os próximos subtítulos tratam da concorrência dos

companheiros com outros parentes do autor da herança, quanto aos bens

adquiridos onerosamente na vigência da união estável, conforme o disposto no

artigo 1.790 do Código Civil. Cumpre salientar, que o convivente supérstite só irá

herdar quando não houver testamento que o exclua.

3.2.1 Concorrência com os descendentes comuns.

O Presente subtítulo, bem como os três próximos, trata,

exclusivamente, sobre as possibilidades existentes para a sucessão do

companheiro, tendo por base o artigo 1.790 do Código Civil de 2002.

O artigo 1.790 do Código Civil de 2002, em seu inciso I, fala

em concorrência “com filhos comuns”, mas ensina Pereira que deve-se entender,

que a referência correta é “descendentes comuns”. No que diz respeito a

nomenclatura descendentes comuns, Pereira274 expõe que:

(...) se assim não for, os descendentes comuns mais remotos (netos, bisnetos, etc.) acabariam por enquadrar-se entre aqueles “outros parentes sucessíveis” de que fala o nº III do art. 1.790, com isso produzindo resultados absurdos: basta imaginar que o cônjuge, se concorrer com muitos netos comuns (quatro ou mais), terá direito a ¼ da herança (art. 1.832), enquanto o companheiro, na mesma situação, receberia a fração (maior) de 1/3 – a lei teria,

272 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 117. 273 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 117. 274 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 158.

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em iguais circunstâncias, conferido ao companheiro mais direitos que ao cônjuge.

Prossegue Pereira275, ensinando que:

Se a expressão “filhos comuns”, como aqui sustentado, deve ser lida como descendentes comuns, isso quer dizer que, concorrendo à herança estes e o companheiro do de cuius, a

partilha se fará por cabeça, aquinhoando-se igualmente todos os sucessores chamados por direito próprio, tal como se passa na sucessão simultaneamente aberta em favor do cônjuge e de descendentes comuns (art. 1.832), mas dela distinguindo-se em que o novo Código em nenhum caso reservou quota mínima ao companheiro276.

Registra Venosa277, fazendo uma observação relevante:

De acordo com o inciso I, se o convivente concorrer com filhos comuns, deverá receber a mesma porção hereditária cabente a seus filhos. Divide-se a herança em partes iguais, incluindo o convivente sobrevivente. Inexplicável que o dispositivo diga que essa quota será igual à que cabe “por lei” aos filhos. Não há herança que possa ser atribuída sem lei que o permita. Como, no entanto, não deve ser vista palavra inútil na lei, poder-se-ia elocubrar que o legislador estaria garantindo a mesma quota dos filhos na sucessão legítima ao companheiro, ainda que estes recebessem diversamente por testamento. Essa conclusão levaria o sobrevivente à condição de herdeiro necessário. A nosso ver, parece que essa interpretação nunca esteve na intenção do legislador e constitui uma premissa falsa278.

Não há muito o que falar sobre a concorrência do

companheiro supérstite com os filhos em comum; já que, o atual Código Civil, foi

direto ao prever os direitos sucessórios decorrentes desta concorrência. Porém,

para o entendimento dos próximos subtítulos, se faz necessário estar atento, visto

que vários são os posicionamentos dos juristas.

275 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 158. 276 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 158 277 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 121. 278 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 121.

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3.2.2 Concorrência com os descendentes só do autor da herança.

O artigo 1.790 do diploma legal vigente, estabelece em seu

inciso II, que se o companheiro ou a companheira concorrerem à herança com

filhos apenas do autor da herança, terão direito a metade do que couber a cada

um dos filhos. O mesmo artigo, em seu inciso I, estabelece a quota da herança

equivalente ao companheiro caso concorra com filhos comuns. Porém, mais uma

lacuna foi encontrada no Código Civil de 2002, visto que o legislador não

estabeleceu quanto cabe ao companheiro quando concorre com filhos comuns e

também com filhos só do autor da herança. Aí é que surge uma grande

divergência doutrinária, e o presente subtítulo, além de tratar da concorrência do

companheiro com descendentes só do autor da herança, trata sobre tal

divergência.

Sobre a concorrência do companheiro com descendentes só

do autor da herança, leciona Pereira279:

Na segunda hipótese do art. 1.790, concorrem “descendentes só do autor da herança” e o companheiro, dizendo a lei que ao último tocará a “metade do que couber a cada um daqueles”. A redação é defeituosa, pois nem todos os descendentes chamados terão, forçosamente, direito a frações idênticas: o legislador, pela redação dada ao dispositivo, parece ter partido da premissa oposta (e equivocada). É perfeitamente possível que, ao lado do companheiro, concorram, por exemplo, filhos e netos do autor da herança, quando os últimos sejam convocados por direito de representação e, conseqüentemente, dividam a quota do filho pré-morto (novo Código Civil, arts. 1.835 e 1.855). A “metade”, a que se refere o texto legal, deve ser, pois, calculada sobre a fração que couber aos descendentes chamados por direito próprio: havendo a simultânea vocação de filhos e netos (apenas) do de cuius, a parte do companheiro deverá corresponder à metade do

que tocar singularmente a cada filho e à(s) estirpe(s) do(s) filho(s) pré-morto(s)280.

279 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 158. 280 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 158.

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No que diz respeito a divergência existente, referente a

quota da herança equivalente ao companheiro ou companheira no caso de

existirem descendentes comuns, bem como descendentes somente do autor da

herança, discorre Pereira281 que:

O novo Código, estranhamente, deixa de fornecer explícita solução para a hipótese em que o companheiro seja chamado a suceder, ao mesmo tempo, com descendentes comuns (por exemplo, filhos do casal) e com descendentes não comuns – incorrendo, também aqui, na omissão antes detectada no tocante à disciplina da sucessão do cônjuge. Como os filho do de cuius –

quer aqueles provenientes da união estável entre ele e o companheiro sobrevivo, quer os de outra qualquer origem – têm os mesmos direitos sucessórios (Constituição Federal, art. 227, § 6º), seria logicamente inadmissível cogitar de solução por meio da qual os critérios dos incisos I e II fossem, ambos, aplicados simultaneamente: o companheiro não poderia receber quota idêntica à dos filhos comuns, a qual também correspondesse à metade daquela atribuída aos não comuns – as frações dos primeiros e dos últimos devem ser forçosamente iguais282. (...)

Entende Pereira, que o correto é aplicar a solução menos

prejudicial ao companheiro supérstite, portanto, o inciso I do artigo 1.790 do

Código Civil; sendo assim, a partilha deve se dar por cabeça, em igualdade de

condições para todos aqueles chamados por direito próprio. O entendimento do

doutrinador ora citado, recai sob o inciso I, por levar em consideração que o

legislador não reservou quota mínima em relação ao companheiro na hipótese de

descendência comum, mas ao cônjuge reservou283.

Como antes anotado, se for muito elevado o número de descendentes, a participação do companheiro na herança poderá tornar-se excessivamente diminuta, até pelo fato de a fração, que vier a ser-lhe atribuída, incidir apenas sobre os “bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável” (art. 1.790, caput), e não sobre toda a herança. È verdade que a solução aqui preconizada agrava a possibilidade de os bens, antes integrantes

281 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 158-159-160. 282 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 158-159. 283 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 159-160.

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do patrimônio do de cuius, virem a mudar de linhagem: o que foi

transmitido hereditariamente ao companheiro sobrevivo se destinará, por ocasião de seu óbito, aos seus herdeiros (inclusive, a seu eventual novo companheiro ou a seu cônjuge), e não mais aos do autor da primeira herança – raciocínio que poderia conduzir à preferência pelo critério do nº II do art. 1.790, que favorece a perpetuação dos bens dentro da mesma linhagem, pela maior concentração da herança nos descendentes284. (...)

Entende Francisco285, que concorrendo com filhos comuns e

com filhos só do autor da herança, o companheiro irá receber a metade que

couber a cada um deles. Nesse sentido, exemplifica Francisco:

O autor da herança deixa dois filhos comuns ao companheiro sobrevivente e outro filho, que é só do autor da herança. O companheiro, quanto aos bens adquiridos na constância da união, faz jus à metade do que cabe a cada filho. Assim, é contado como se fosse um filho, o que faz com que lhe caiba 1/8 da herança, que é a metade do que lhe caberia se fosse um filho. O restante é dividido entre os três filhos, ficando cada um com 7/24 da herança, portanto286.

Na hipótese de o companheiro supérstite concorrer com

filhos comuns e filhos só do autor da herança, acredita Veloso287 que diante do

princípio constitucional da igualdade, os filhos do de cujus terão que receber

quotas hereditárias iguais; porém ao companheiro sobrevivente caberá a metade

do que couber a cada filho só do autor da herança. Discorre o doutrinador ora

citado, que:

A solução que proponho, tentando remediar a falha do legislador, e enquanto a lei não é reformada, pode prejudicar o companheiro sobrevivente – que estaria mais gratificado se o escolhido fosse o inciso I –, mas não desfavorece os descendentes exclusivos do de

284 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 159-160. 285 FRANCISCO, Caramuru Afonso. Código Civil de 2002: o que há de novo . 1 ed. São Paulo:

Editora Juarez de Oliveira, 2002, p. 280. 286 FRANCISCO, Caramuru Afonso. Código Civil de 2002: o que há de novo , 2002, p. 280. 287 VELOSO, Zeno. Direito de família e o novo Código Civil . Coordenação Maria Berenice Dias

e Rodrigo da Cunha Pereira. 3 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 289.

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cujus, não se devendo esquecer que os filhos do companheiro

sobrevivente ainda têm a expectativa de herdar deste288.

Por outro lado, Venosa289 tece os seguintes comentários:

Na forma do inciso II do art. 1.790, se o convivente concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles. Atribui-se, portanto, peso 1 à porção do convivente e peso 2 à do filho do falecido ou falecida para ser efetuada a divisão na partilha. No entanto, se houver filhos comuns com o de cujus e filhos somente deste concorrendo

à herança, a solução é dividi-la igualitariamente, incluindo o companheiro ou companheira. (...)

Perante a divergência encontrada, complicado é definir qual

a solução que deve ser aplicada aos casos em que o companheiro supérstite

concorre com descendentes comuns e também com descendentes só do autor da

herança. Para tais situações, caberá ao juiz da causa decidir, até que seja

reformado o Código Civil, com o propósito de extinguir a má redação do

legislador.

3.2.3 Concorrência com outros parentes sucessíveis.

Não havendo descendentes comuns ou só do autor da

herança, o companheiro irá concorrer com outros parentes sucessíveis, portanto

ascendentes e colaterais até 4º grau, obedecendo à ordem do artigo 1.829 do

Código Civil de 2002.

Quando concorrer com outros parentes sucessíveis, sejam

legítimos ou testamentários, o companheiro terá direito a 1/3 (um terço) da

herança, e os demais 2/3 (dois terços) serão divididos. Em sua obra, Pereira290,

ensina que os demais 2/3 serão divididos por linhas, caso os parentes chamados

forem ascendentes. Se forem chamados os colaterais do de cujus, os 2/3 serão

divididos por cabeça ou por estirpe, visto que, apesar de os mais próximos

288 VELOSO, Zeno. Direito de família e o novo Código Civil , 2003, p. 289. 289 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 121. 290 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 160.

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excluírem os mais remotos, há uma hipótese, em que pode haver o direito de

representação, que é o caso dos filhos dos irmãos do de cujus291.

Francisco292, em sua obra “Código Civil: o que há de novo?”,

exemplifica o direito sucessório dos companheiros quando concorre com parentes

sucessíveis (artigo 1790, III, do Código Civil), que não são os descendentes:

O autor da herança deixa os pais e o companheiro sobrevivente. O companheiro fará jus a 1/3 da herança, quanto aos bens adquiridos onerosamente na Constancia da união, sendo que o restante será repartido entre os ascendentes sucessíveis, ficando cada pai com 1/3 da herança, também293.

O autor da herança deixa dois avós paternos e um avô materno, além do companheiro sobrevivente. O companheiro fará jus a 1/3 da herança, quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância da união, sendo que o restante será repartido entre os ascendentes sucessíveis. Como há distinção de linha (art. 1.836, § 2º, do CC), o avô materno herda 1/3 e cada avô paterno, 1/6 da herança294.

O autor da herança deixa dois irmãos e o companheiro sobrevivente. Quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância da união, o companheiro herda 1/3 da herança assim como cada irmão295.

O autor da herança deixa, além do companheiro sobrevivente, um cônjuge do qual estava separado de fato há menos de dois anos (art. 1.830 do CC). O companheiro sobrevivente, quanto aos bens adquiridos na constância da união, faz jus a um terço da herança, herdando o cônjuge sobrevivente os outros 2/3296.

O doutrinador Veloso, em sua obra, se mostra inconformado

com a concorrência entre o companheiro sobrevivente e os “outros parentes

sucessíveis” (ascendentes e colaterais), tendo em vista que em uma sociedade

291 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 160. 292 FRANCISCO, Caramuru Afonso. Código Civil de 2002: o que há de novo , 2002, p. 280 293 FRANCISCO, Caramuru Afonso. Código Civil de 2002: o que há de novo , 2002, p. 280 294 FRANCISCO, Caramuru Afonso. Código Civil de 2002: o que há de novo , 2002, p. 280 295 FRANCISCO, Caramuru Afonso. Código Civil de 2002: o que há de novo , 2002, p. 280 296 FRANCISCO, Caramuru Afonso. Código Civil de 2002: o que há de novo , 2002, p. 280

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contemporânea, onde estão quase extintas as relações entre parentes colaterais

de 4º grau (quando não extintas), principalmente nas grandes metrópoles, o

companheiro que formou família, manteve uma convivência séria com o de cujus,

tenha que receber apenas 1/3 dos bens adquiridos onerosamente na vigência da

união estável297.

Ademais, o companheiro sobrevivente só herdará sozinho

quando não houver descendentes, ascendentes e colaterais até 4º grau, e apenas

quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância da união. Discorre o

doutrinador ora citado, que a vocação dos colaterais até o quarto grau é uma

generosidade do legislador, e que a sucessão destes deveria ser no máximo até

terceiro grau298.

Leciona ainda Veloso, que em relação à concorrência com

os outros parentes sucessíveis, os direitos dos companheiros estão em

desigualdade com os dos cônjuges, visto que, à estes últimos cabe 1/3 da

herança se houver ascendentes em primeiro grau, ou a metade da herança, se

houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau, e isto,

independentemente de o cônjuge ser meeiro299.

Entretanto, cumpre assinalar, uma observação em que o

doutrinador Pereira afirma que, em qualquer das hipóteses de concorrência do

companheiro com parentes do de cujus, àquele fará jus ao direito de acrescer.

3.2.4 Herdeiro da totalidade da herança.

O companheiro será herdeiro da totalidade da herança,

quando não houver outros parentes sucessíveis (descendentes, ascendentes e

colaterais até 4º grau). Este dispositivo seria de fácil compreensão, se não

houvesse uma discussão doutrinária em relação a este assunto. Alguns

doutrinadores entendem que essa “totalidade da herança” diz respeito apenas aos

bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável; outros entendem

297 VELOSO, Zeno. Direito de família e o novo Código Civil , 2003, p. 293. 298 VELOSO, Zeno. Direito de família e o novo Código Civil , 2003, p. 290. 299 VELOSO, Zeno. Direito de família e o novo Código Civil , 2003, p. 292.

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que esta “totalidade” diz respeito aos bens adquiridos na constância ou não da

união.

Pereira300, entende que:

Se, por fim, não houver parentes sucessíveis, o companheiro “terá direito à totalidade da herança” (art. 1.790, nº IV). Por “totalidade da herança” deve-se entender a porção não testada: o art. 1.790 (como as demais normas sobre sucessão legítima) faz abstração do exercício da liberdade de testar. Havendo testamento, o que nele não estiver compreendido tocará ao companheiro da herança (art. 1.788).

A opinião do jurista Nery Junior, é de que está obscuro na lei

como se dá a sucessão dos bens adquiridos a título gratuito pelo falecido, na

hipótese de ele não ter deixado parentes sucessíveis. O jurista entende que

nestes casos a herança deve ser atribuída na sua totalidade ao companheiro

sobrevivente, antes que o ente público beneficiário da herança jacente301.

Neste viés, ante a falta de técnica legislativa, Nery Junior302

sugere uma interpretação que beneficie os interesses dos companheiros, por

achar que esta seria a real intenção do legislador:

O CC 1790 caput, sob cujos limites os incisos que se lhe seguem

devem ser interpretados, somente confere direito de sucessão ao companheiro com relação aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nada dispondo sobre os bens

adquiridos gratuitamente durante esse mesmo período. É de se indagar se, em face da limitação do CC 1790 caput, o legislador ordinário quis excluir o companheiro da sucessão desses bens, fazendo com que a sucessão deles fosse deferida à Fazenda. Parece-nos que não, por três motivos: a) o CC 1844 manda que a herança seja devolvida ao ente público, apenas na hipótese de o de cujus não ter deixado cônjuge, companheiro ou parente

sucessível; b) quando o companheiro não concorre com parente

300 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil , 2005, p. 160. 301 JUNIOR, Nelson Nery e NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo Código Civil e legislação

extravagante anotados . São Paulo: Editora RT, 2002, p. 600. 302 JUNIOR, Nelson Nery e NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo Código Civil e legislação

extravagante anotados , 2002, p. 600.

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sucessível, a lei se apressa em mencionar que o companheiro terá direito à totalidade da herança (CC 1790 IV), fugindo do comando do caput, ainda que sem muita técnica legislativa; c) a abertura de herança jacente dá-se quando não há herdeiro legítimo (CC 1819) e, apesar de não contar do rol do CC 1829, a qualidade sucessória do companheiro é de sucessor legítimo e não de testamentário303.

Em suas colocações, Gomes304 também faz referência ao

artigo 1.844 do Código Civil, ao assim lecionar:

O inciso IV do dispositivo em comento prevê a hipótese em que, não havendo herdeiros sucessíveis, tem direito o companheiro à totalidade da herança. Apesar de o inciso aludir ao caput do

artigo, que se atém somente aos bens adquiridos a título oneroso durante a união estável, cabe ao companheiro sobrevivente a totalidade dos bens, havidos a qualquer título, na constância ou não da união estável, caso não haja parentes com direito à sucessão. Essa interpretação se coaduna com o disposto no artigo 1.844, inserido no capítulo da ordem da vocação hereditária, que estatui que a herança somente é devolvida ao Estado se não houver cônjuge, companheiro, nem parente algum sucessível305.

De modo contrário ao que entende os juristas Nery Junior e

Gomes, leciona Veloso306 que:

A “totalidade da herança”, mencionada no inciso IV do artigo 1.790, é da herança a que o companheiro sobrevivente está autorizado a concorrer. Mesmo no caso extremo de o falecido não ter parentes sucessíveis, cumprindo-se a determinação do caput do artigo 1.790, o companheiro sobrevivente só vai herdar os bens que tiverem sido adquiridos onerosamente na vigência da união estável. Se o de cujus possuía outros bens, adquiridos antes de

iniciar a convivência, ou depois, se a título gratuito, e não podendo esses bens integrar a herança do companheiro sobrevivente, passarão para o Município ou para o Distrito Federal, se

303 JUNIOR, Nelson Nery e NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo Código Civil e legislação

extravagante anotados , 2002, p. 600. 304 GOMES, Orlando. Sucessões . 12 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 68. 305 GOMES, Orlando. Sucessões . 12 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 68. 306 VELOSO, Zeno. Direito de família e o novo Código Civil , 2003, p. 289.

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localizados nas respectivas circunscrições, ou à União, quando situados no Território Federal (art. 1.844)307.

Portanto, no entendimento de Veloso, mesmo parecendo

injusto o companheiro herdar a totalidade da herança somente quanto aos bens

adquiridos onerosamente na constância da união estável, é isto o que ocorre;

visto que os incisos devem ser interpretados sob os limites do caput.

3.3 DIREITO REAL DE HABITAÇÃO.

Há uma grande divergência doutrinária no que diz respeito

ao direito real de habitação, tendo em vista que, o atual Código Civil foi omisso

em relação a este direito, que estava elencado na Lei nº 9.278/96, em seu artigo

7º. Portanto, o que se discute é se esta Lei foi ou não revogada, pois se esta for

considerada revogada, exclui-se o direito real de habitação aos companheiros.

Entende Wald308 que o companheiro supérstite não mais tem

o direito real de habitação, mas, no entanto, acredita que o mesmo não tenha

saído prejudicado pela nova Lei, tendo em vista que:

(...), embora o companheiro supérstite concorra com ascendentes ou descendentes, como hoje já acontece, e não mais seja titular do direito real de habitação, além de passar a concorrer com demais parentes sucessíveis, ou seja, colaterais até quarto grau, ele passará a ter direito a uma cota do patrimônio do de cujus e

não mais única e exclusivamente ao usufruto de parte dos bens deste, como ocorre hoje309.

De modo contrário, posiciona-se Diniz310:

(...), urge lembrar que o companheiro sobrevivente, por força da Lei n. 9.278/96, art. 7º, parágrafo único, e, analogicamente, pelo disposto nos arts. 1.831 do CC e 6º da CF, também terá direito

307 VELOSO, Zeno. Direito de família e o novo Código Civil , 2003, p. 289. 308 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 82. 309 WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Suce ssões , 2002, p. 82 310 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 117.

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real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família, mas pelo Código Civil tal direito só é deferido ao cônjuge sobrevivente. Diante da omissão do Código Civil, o art. 7º, parágrafo único daquela Lei estaria vigente por ser norma especial311.

Monteiro312, sustenta que:

O Código de 2002 não manteve para o companheiro o direito real de habitação sobre o imóvel que servia de residência à família, sendo o único dessa espécie a inventariar. Esse privilégio, que lhe fora outorgado pela Lei n. 9.278/96, foi reservado por esse Código somente ao cônjuge sobrevivente.

Oliveira313 entende não mais haver o direito real de

habitação em relação aos companheiros, e ainda faz uma ressalva em sua obra

sobre a desigualdade existente entre os companheiros e os cônjuges no que diz

respeito a este assunto. Neste sentido, discorre que:

(...) Decai o direito de usufruto, não mais previsto no novo ordenamento civil, o que se justifica diante da participação do companheiro (assim como do cônjuge) na herança atribuída aos descendentes e ascendentes. Também desaparece, e aqui sem justificativa, o direito de habitação em favor do companheiro, muito embora seja previsto para o cônjuge sobrevivente (art. 1831 do NCC), que ainda passa a qualificar-se como herdeiro necessário (art. 1.845 do NCC).

Sobre o direito de habitação em favor do companheiro, poder-se-ia argumentar com a subsistência do disposto no art. 7º, p. ún., da Lei 9.278/96, enquanto não expressamente revogado pelo Novo Código Civil. O argumento se justifica em reforço à extensão analógica do mesmo direito assegurado ao cônjuge sobrevivente,

311 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: direito das suce ssões , 2002, p. 117. 312 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil: direito das sucessões . 35 ed.

São Paulo: Saraiva, 2003, p. 101. 313 OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável: do concubinato ao casamento: antes e

depois do novo código civil . 6 ed. São Paulo: Editora Método, 2003, p. 213.

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mas restará sempre a controvérsia diante da regulamentação distintiva constante do novel ordenamento314.

Sobre habitação e usufruto, ensina Oliveira315:

Habitação distingue-se de usufruto, pois tem caráter mais restrito. Consiste em uso para moradia, não abrangente da percepção dos frutos, pois somente confere direito de habitar, gratuitamente, imóvel residencial alheio. Quem habita não pode alugar nem emprestar a coisa, mas somente ocupa-la com sua família.

O direito de habitação em relação aos companheiros,

perdurava enquanto o beneficiário vivesse ou não constituísse nova união ou

casamento, incidindo apenas sobre o imóvel de residência da família316.

Por fim, cumpre assinalar a opinião do doutrinador Venosa,

que é a favor da manutenção do direito real de habitação em relação aos

companheiros, alegando que “a manutenção do direito de habitação no imóvel

residencial do casal atende às necessidades de amparo do sobrevivente, como

um complemento essencial ao direito assistencial de alimentos” 317.

Diante da divergência doutrinária demonstrada no decorrer

deste subitem, notório é, que o Código Civil de 2002 necessita de uma reforma,

com o propósito de esclarecer a dúvida dos aplicadores do direito. Porquanto,

cabe ao juiz da causa decidir se aplica ou não o Direito Real de habitação aos

companheiros.

314 OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável: do concubinato ao casamento: antes e

depois do novo código civil , 2003, p. 213. 315 OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável: do concubinato ao casamento: antes e

depois do novo código civil , 2003, p. 209. 316 OLIVEIRA, Euclides Benedito de. União Estável: do concubinato ao casamento: antes e

depois do novo código civil , 2003, p. 209. 317 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: direito das sucessões , 2003, p. 121.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com a conclusão deste estudo verifica-se que o direito

sucessório dos companheiros apresenta graves problemas, devido a má redação

do dispositivo que o regula, gerando divergências doutrinárias e jurisprudenciais.

No decorrer deste trabalho de conclusão de curso pode-se

verificar as falhas do legislador, e neste viés nota-se que as regras vigentes

podem ensejar profundas distorções.

Primeiramente, há de salientar que, estranhamente o direito

sucessório dos companheiros está previsto nas disposições gerais do Código Civil

de 2002, enquanto deveria estar no capítulo que regula a ordem de vocação

hereditária, porém esta é uma falha insignificante em relação a todas as outras.

O Direito Sucessório dos companheiros sobreviventes está

previsto em um único artigo e seus incisos (artigo 1.790 do Código Civil), que

limita, em qualquer caso, que os companheiros ou companheiras, herdarão

unicamente quanto aos bens adquiridos onerosamente na constância da união

estável.

Importante destacar, que as hipóteses levantadas na

introdução deste trabalho de conclusão de curso não podem ser confirmadas,

tendo em vista que, pela quantidade de divergências doutrinárias, não há como

dar uma resposta precisa.

Em relação à hipótese 1, ou seja, a concorrência do

companheiro supérstite com descendentes comuns e com descendentes só do

autor da herança, alguns juristas entendem que à todos os filhos, comuns ou não,

bem como ao companheiro, caberá a mesma quota, por levar em consideração

que o legislador não reservou quota mínima em relação ao companheiro na

hipótese de descendência comum, mas ao cônjuge reservou. Ademais, se for

muito elevado o número de descendentes, a participação do companheiro na

herança poderá tornar-se excessivamente diminuta, até pelo fato de a fração, que

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vier a ser-lhe atribuída, incidir apenas sobre os “bens adquiridos onerosamente na

vigência da união estável”, e não sobre toda a herança. Outros entendem que aos

filhos cabe a mesma proporção, mas ao companheiro cabe a metade do que

caberá a cada filho do de cujus, para não desfavorecer os descendentes só do

autor da herança, tendo em vista que os filhos do companheiro sobrevivente

ainda têm a expectativa de herdar deste. Portanto, diante da omissão do

legislador, caberá ao juiz da causa decidir.

No que diz respeito à hipótese 2, alguns doutrinadores

acreditam ser a totalidade da herança restrita aos bens adquiridos onerosamente

na constância da união estável, com o fundamento de que o inciso IV aludi ao

caput do artigo 1.790 do Código Civil. Outros entendem que apesar de o inciso

aludir ao caput do artigo, que se atém somente aos bens adquiridos a título

oneroso durante a união estável, cabe ao companheiro sobrevivente a totalidade

dos bens, havidos a qualquer título, na constância ou não da união estável, caso

não haja parentes com direito à sucessão, visto que o artigo 1844 do CC manda

que a herança seja devolvida ao ente público, apenas na hipótese de o de cujus

não ter deixado cônjuge, companheiro ou parente sucessível; além do que, a

abertura de herança jacente dá-se quando não há herdeiro legítimo e, apesar de

não contar do rol do CC 1829, a qualidade sucessória do companheiro é de

sucessor legítimo e não de testamentário. Ademais, é duro aceitar que na

hipótese de o falecido ter deixado apenas bens adquiridos antes da união estável,

o companheiro não terá direito a nada, e, portanto, ficará toda a herança para o

Estado.

No que concerne à hipótese 3, ou seja, o direito real de

habitação, alguns doutrinadores entendem ter sido este direito revogado pelo

atual Código Civil, visto que não veio expresso neste; outros entendem que deve

permanecer o direito real de habitação, pois diante da omissão do Código Civil, o

art. 7º, parágrafo único daquela Lei estaria vigente por ser norma especial.

Por fim, outra questão muito discutida pelos doutrinadores é

em relação à concorrência dos companheiros com outros parentes sucessíveis,

pois entendem os juristas que o companheiro sobrevivente está em situação

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desprivilegiada em relação ao cônjuge, visto que estes últimos não concorrem

com colaterais e nem mesmo com ascendentes. Além do que, entende-se que

houve uma generosidade excessiva por parte do operador do direito, que admite

o chamamento para a sucessão dos colaterais até o 4º grau, pois inconcebível é

que estes, que muitas vezes não tem contato algum com o falecido, venha

receber uma herança, que por motivos óbvios deveria ser exclusivamente do

companheiro, tendo em vista os laços de afeto, de convivência.

Após demonstrado todos estes fatos, fica absolutamente

evidente que o Código Civil, na parte que foi objeto este estudo, precisa

urgentemente de uma reforma, com o propósito de esclarecer as dúvidas

existentes quanto a concorrência com filiação híbrida e quanto ao direito real de

habitação; e ainda, trazer soluções justas no que diz respeito ao direito sucessório

dos companheiros em concorrência com os “outros parentes sucessíveis” e

quanto a herança vacante.

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REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil . Brasília, DF: Senado, 1988.

BRASIL. Código Civil . 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

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GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário Jurídico . São Paulo: Rideel, 1997.

JUNIOR, Nelson Nery e NERY, Rosa Maria de Andrade. Novo Código Civil e legislação extravagante anotados . São Paulo: Editora RT, 2002.

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PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito . 4 ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2000.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil . v. 5. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

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WALD, Arnoldo. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Sucessões. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

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ANEXOS

LEI No 8.971, DE 29 DE DEZEMBRO DE 1994.

Regula o direito dos companheiros a alimentos e

à sucessão.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta

e eu sanciono a seguinte lei:

Art. 1º A companheira comprovada de um homem solteiro, separado

judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou

dele tenha prole, poderá valer-se do disposto na Lei nº 5.478, de 25 de julho de

1968, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade.

Parágrafo único. Igual direito e nas mesmas condições é reconhecido ao

companheiro de mulher solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva.

Art. 2º As pessoas referidas no artigo anterior participarão da sucessão do(a)

companheiro(a) nas seguintes condições:

I - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito enquanto não constituir nova

união, ao usufruto de quarta parte dos bens do de cujos, se houver filhos ou

comuns;

II - o(a) companheiro(a) sobrevivente terá direito, enquanto não constituir nova

união, ao usufruto da metade dos bens do de cujos, se não houver filhos, embora

sobrevivam ascendentes;

III - na falta de descendentes e de ascendentes, o(a) companheiro(a)

sobrevivente terá direito à totalidade da herança.

Art. 3º Quando os bens deixados pelo(a) autor(a) da herança resultarem de

atividade em que haja colaboração do(a) companheiro, terá o sobrevivente direito

à metade dos bens.

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Art. 4º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário.

Brasília, 29 de dezembro de 1994; 173º da Independência e 106º da República.

ITAMAR FRANCO

Alexandre de Paula Dupeyrat Martins

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LEI Nº 9.278, DE 10 DE MAIO DE 1996.

Regula o § 3° do art. 226 da Constituição

Federal.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta

e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e

contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição

de família.

Art. 2° São direitos e deveres iguais dos convivent es:

I - respeito e consideração mútuos;

II - assistência moral e material recíproca;

III - guarda, sustento e educação dos filhos comuns.

Art. 3° (VETADO)

Art. 4° (VETADO)

Art. 5° Os bens móveis e imóveis adquiridos por um ou por ambos os conviventes,

na constância da união estável e a título oneroso, são considerados fruto do

trabalho e da colaboração comum, passando a pertencer a ambos, em

condomínio e em partes iguais, salvo estipulação contrária em contrato escrito.

§ 1° Cessa a presunção do caput deste artigo se a a quisição patrimonial ocorrer

com o produto de bens adquiridos anteriormente ao início da união.

§ 2° A administração do patrimônio comum dos conviv entes compete a ambos,

salvo estipulação contrária em contrato escrito.

Art. 6° (VETADO)

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Art. 7° Dissolvida a união estável por rescisão, a assistência material prevista

nesta Lei será prestada por um dos conviventes ao que dela necessitar, a título de

alimentos.

Parágrafo único. Dissolvida a união estável por morte de um dos conviventes, o

sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não constituir nova

união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família.

Art. 8° Os conviventes poderão, de comum acordo e a qualquer tempo, requerer a

conversão da união estável em casamento, por requerimento ao Oficial do

Registro Civil da Circunscrição de seu domicílio.

Art. 9° Toda a matéria relativa à união estável é d e competência do juízo da Vara

de Família, assegurado o segredo de justiça.

Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 11. Revogam-se as disposições em contrário.

Brasília, 10 de maio de 1996; 175º da Independência e 108º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Milton Seligman