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DIREITOS DE AUTOR E CONDIÇÕES DE UTILIZAÇÃO DO TRABALHO POR TERCEIROS

Este é um trabalho académico que pode ser utilizado por terceiros desde que respeitadas as regras e

boas práticas internacionalmente aceites, no que concerne aos direitos de autor e direitos conexos.

Assim, o presente trabalho pode ser utilizado nos termos previstos na licença abaixo indicada.

Caso o utilizador necessite de permissão para poder fazer um uso do trabalho em condições não

previstas no licenciamento indicado, deverá contactar o autor, através do RepositóriUM da Universidade

do Minho.

Licença concedida aos utilizadores deste trabalho

Atribuição-NãoComercial-SemDerivações CC BY-NC-ND

https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/

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DECLARAÇÃO DE INTEGRIDADE

Declaro ter atuado com integridade na elaboração do presente trabalho académico e confirmo que não

recorri à prática de plágio nem a qualquer forma de utilização indevida ou falsificação de informações

ou resultados em nenhuma das etapas conducente à sua elaboração.

Mais declaro que conheço e que respeitei o Código de Conduta Ética da Universidade do Minho.

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Contributo das TIC para o ensino-aprendizagem na disciplina de História

RESUMO

As escolas públicas do Estado do Rio Grande do Sul estão desatualizadas em Tecnologias de

Informação e Comunicação (TIC). As salas de aulas atuais continuam sem recursos eletrônicos,

baseadas no sistema de ensino do século passado, usando o quadro verde e giz. O que a escola possui

são computadores em laboratório para pesquisa com acesso à internet e alguns equipamentos

portáteis, instalados para um período determinado de aula, sendo depois retirados e guardados

novamente, causando transtorno e perda de tempo. Partindo desta problemática, realizamos um

estudo de caso sobre o uso das TIC na disciplina de História. Partiu-se do referencial teórico sobre as

TIC aplicadas ao ensino (GUTIERREZ, 2004; WESTON; BAIN, 2010; ALMEIDA; VALENTE, 20111; LIMA,

2012), destacando-se o histórico do uso da tecnologia no ensino, a questão das fontes utilizadas e das

narrativas construídas. A investigação empírica consiste em estudo de caso (YIN, 2001; AMADO, 2014)

realizado com turma de 9º ano de escola pública no interior do estado do Rio Grande do Sul – Brasil.

Trata-se de metodologia de caráter qualitativo, baseada na observação e intervenção do pesquisador,

incluindo a aplicação de questionários, a interação via rede social, a elaboração de vídeos e o registro

em Diário de Bordo. Como principais resultados, observamos que, embora presentes na vida do

estudante, as TIC ainda podem ser mais potencializadas no ensino. É preciso investir em tecnologias

inovadoras a par de métodos de trabalhos também inovadores mesmo que articulados com os mais

tradicionais, buscando-se o saber acumulado em harmonia com as novas tecnologias. Há um grande

potencial no uso das TIC, conforme ficou demonstrado pela produção da turma ao longo do período

letivo.

Palavras-chave: Ensino; História; TICs.

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ICT contribution to teaching and learning in the History subject

ABSTRACT The state schools of Rio Grande do Sul are outdated in Information and Communication Technology

(ICT). Today's classrooms remain without electronic resources, based on the education system of the

last century, using the green board and chalk. What the school has are laboratory computers for

research with internet access, and some portable equipment, installed for that particular period of

class, are then removed and stored again, causing inconvenience and waste of time. Based on this

problem, we seek to conduct a case study on the use of ICT in the discipline of history. It departs from

the theoretical framework on ICT applied to education (GUTIERREZ, 2004; WESTON; BAIN, 2010;

ALMEIDA; VALENTE, 20111; LIMA, 2011), highlighting the history of the use of technology in

education, the question of sources used and the narratives constructed. The empirical investigation

consists of a case study (YIN, 2001; AMADO, 2014) conducted with a 9th grade public school class in

the interior of the state of Rio Grande do Sul - Brazil. It is a qualitative methodology, based on the

researcher's observation and intervention, including the application of questionnaires, interaction via

social network, the elaboration of videos and the logbook. As main results, we observed that, although

present in the student's life, ICT can still be potentiated in teaching. It is necessary to invest in

innovative technologies alongside traditional methods, seeking accumulated knowledge in harmony with

new technologies. There is great potential in the use of ICT, as demonstrated by class production

throughout the school year.

Keywords: History; ICTs; Teaching.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................. 1

2 O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM E AS TIC .................................................................... 5

2.1 Breve histórico ........................................................................................................................ 6

2.2 TIC em debate: potencialidades e dificuldades ......................................................................... 16

3 AS TIC E O ENSINO DE HISTÓRIA .............................................................................................. 35

3.1 As fontes e as TIC .................................................................................................................. 36

3.1.1 Fake news, credibilidade e construção da história ................................................................. 45

3.2 As narrativas ......................................................................................................................... 52

4 APRESENTAÇÃO DA METODOLOGIA .......................................................................................... 65

5 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS .................................................................................. 73

5.1 ANÁLISE DOS DADOS ............................................................................................................ 73

5.1.1 Quanto ao perfil do aluno .................................................................................................... 74

5.1.2 Quanto ao uso da tecnologia ................................................................................................ 78

5.1.3 Quanto às mídias utilizadas ................................................................................................. 80

5.1.4 Quanto às fontes consultadas .............................................................................................. 83

5.1.5 Quanto aos aspectos didáticos e de conteúdo ....................................................................... 87

5.1.6 Quanto às interações efetuadas ........................................................................................... 94

5.1.7 Quanto aos materiais produzidos ......................................................................................... 99

5.1.8 Quanto à estrutura narrativa e ao uso das TIC..................................................................... 103

5.1.9 Quanto às percepções sobre o uso das TIC ........................................................................ 106

5.2 A título de síntese ................................................................................................................ 112

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................ 118

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................................. 124

Apêndices ................................................................................................................................. 128

APÊNDICE I – Questionário I ...................................................................................................... 129

APÊNDICE II – Questionário II .................................................................................................... 131

APÊNDICE III – Questionário III ................................................................................................... 132

APÊNDICE IV – Questionário IV ................................................................................................... 133

APÊNDICE V – Diário de Bordo ................................................................................................... 135

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Johannes Gutenberg, considerado o pai da imprensa ....................................................... 10

Figura 2 – Modelo de comunicação unidirecional .............................................................................. 13

Figura 3 – Modelo de comunicação multidirecional .......................................................................... 14

Figura 4 – Site da Biblioteca Digital Mundial ..................................................................................... 24

Figura 5 – Cena do filme “O Nome da Rosa”, de Jean-Jack Annaud (1986) ...................................... 36

Figura 6 – Observador e observado: as fontes não são neutras ......................................................... 39

Figura 7 – Site oficial do movimento terraplanista ............................................................................. 48

Figura 8 – O youtuber Felipe Neto em seu canal na internet .............................................................. 55

Figura 9 – Os bichos do jogo Pókemon em ação: ferramenta narrativa .............................................. 59

Figura 10 – O personagem “Squirtel”, do jogo PókemonGO .............................................................. 60

Figura 11 – Atividade de pesquisa com a mídia social Facebook ....................................................... 83

Figura 12 – Postagem com fotos da II Guerra Mundial ...................................................................... 85

Figura 13 – Fotografias feitas pelos alunos ....................................................................................... 92

Figura 14 - Fotografia produzida na visita ao Museu Militar de Panambi – RS .................................. 100

Figura 15 - Imagem inicial da apresentação das fotografias ............................................................. 100

Figura 16 – Vídeo produzidos para a atividade de fotografia ............................................................ 102

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Uso da tecnologia pela turma em casa ............................................................................ 76

Gráfico 2 – Síntese das respostas ao Questionário 2 ......................................................................... 77

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1 INTRODUÇÃO

A utilização das TIC ocorre em diversos ambientes da sociedade. A escola também deve

priorizar as TIC no ensino para incrementar a formação do aluno, além de incorporar novas

contribuições com mudanças também nos aspectos didáticos e pedagógicos, tornando a aula

mais atrativa para quem ensina e para quem aprende. Segundo Almeida e Valente (2011, p. 74)

quando o aluno “não consegue progredir (...) cabe ao professor orientar o aluno para empregar

as funções e operações propiciadas pelas TIC”. Assim o aluno pode reorganizar, buscar

informações e, entre outras atividades, fazer a socialização dos trabalhos.

A partir de uma nova visão de educação se criam as condições para integração das

tecnologias ao currículo que possam contribuir para o uso das TIC no sistema educacional, e

lançou-se um desafio aos alunos para responderem à modernização e inovação, utilizando as

TIC. Com a integração das TIC ao currículo, novas habilidades foram desenvolvidas e geraram

transformação em sala de aula. A investigação procurou responder às seguintes questões:

Problema

O problema de que partimos pode ser formulado da seguinte maneira:

Como as TIC podem contribuir para o ensino-aprendizagem na disciplina de

História?

Subdividimos o problema nas seguintes questões que orientam as etapas da

investigação:

- Quais as principais contribuições conceituais para a discussão sobre o uso das TIC no

ensino?

- Quais as ferramentas didáticas que podem potencializar o uso das TIC em sala de aula

com vistas à aprendizagem dos alunos?

- Que atividades letivas se beneficiam do uso das TIC por parte dos alunos?

- Que estratégias e metodologias de trabalho melhor se ajustam ao uso de TIC nas aulas

de História?

A pesquisa foi executada na escola pública Cândido Machado, onde leciono, pertencente

ao estado do Rio Grande do Sul, Brasil, município de Cruz Alta, em uma turma de alunos do 9º

ano do Ensino Fundamental. Para conhecê-los melhor, realizamos uma pesquisa via questionário

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para ter conhecimento sobre as tecnologias digitais e de equipamentos eletrônicos que os alunos

possuiam e usavam, colhendo, assim, subsídios para um plano de trabalho didático. Com esses

resultados, obtivemos suporte às atividades para implementar as TIC nas aulas.

Nossa investigação começa pela revisão da literatura. Essa tarefa tem início no Capítulo

I, no qual abordamos a evolução histórica das TIC em sua relação com o ensino. Aqui, nos

interessa situar o fenômeno em suas linhas gerais, preparando o terreno para aspectos

subsequentes de nossa pesquisa.

Ainda no Capítulo I, adentramos as diversas visões dos autores que vêm trabalhando

sobre o uso da tecnologia em sala de aula. Procuramos mostrar, neste ponto, as controvérsias

envolvidas na temática abordada, como por exemplo a discussão acerca da resistência dos

docentes em adotar as TIC em sua prática cotidiana.

No Capítulo II, também de cunho conceitual, trazemos a discussão sobre o uso das TIC

especificamente no ensino da disciplina de História. Com isso, buscamos adentrar a

especificidade de nosso objeto de estudo, demonstrando os pontos mais sensíveis de

convergência entre a tecnologia e o campo da História.

Nesse sentido é que abordamos duas questões a nosso ver centrais: a) como está sendo

feito o uso das fontes históricas no cenário do avanço técnico; b) como as narrativas históricas

estão sendo construídas a partir do uso das TIC.

O recorte que efetuamos aqui visa a salientar os aspectos que a nosso ver podem

contribuir para a investigação que nos propusemos fazer. Partimos da percepção de que a

mudança tecnológica, acelerada nas últimas décadas pelo advento da internet e da comunicação

online, impactou de forma profunda a maneira como se obtém e se gerencia o conhecimento. Aí

está a razão de nos determos na reflexão acerca das fontes históricas.

O acesso quase ilimitado a uma gama imensa de dados em escala planetária vem

abalando diversas áreas. A área da História não poderia ser uma exceção, sobretudo porque

está fortemente ancorada na memória comum, nos registros e nos acervos institucionalmente

preservados. Ora, é precisamente esse acervo comum que passa a ser objeto de constante

revisão e questionamento em nossos dias marcados pela onipresença dos buscadores e das

mídias sociais. A autoridade das fontes – oficiais, governamentais, acadêmicas – está em xeque

desde que as pessoas descobriram que podem ser agentes desse processo de descoberta, o

que, por si só, coloca em primeiro plano a discussão sobre as fontes, a qual nos absorve neste

primeiro segmento do Capítulo II.

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Ainda no Capítulo II, buscando aproximar a reflexão das questões que interessam ao

historiador, trazemos uma reflexão sobre o impacto das TIC nas formas de narrar a História. O

avanço técnico fez exacerbar as possibilidades narrativas, muito além do que tradicionalmente

se empregava: impressão, fotografia, vídeo, áudio, linguagem multimídia, aplicativos em

dispositivos móveis – são todos recursos que se somam às possibilidades da narrativa

tradicional.

Nossa abordagem, nesse ponto, procura mostrar as potencialidades do uso desses

materiais, mas também destacar o que eles têm de desafiador para as práticas tradicionais da

narrativa histórica. Escrever uma história não é o mesmo que narrar um fato através de

imagens. Diferentes linguagens operam em lógicas próprias. É com esse entendimento que

buscamos trazer, neste segmento de nossa investigação, algumas questões que merecem

reflexão.

A partir dessa abordagem é que deitamos as bases para aproximar, de um lado, as

potencialidades da tecnologia no ensino; de outro, as implicações de tal uso para a didática da

disciplina de História.

É com base nessas discussões que avançamos, no Capítulo III, para apresentar a

metodologia de nossa investigação Nesse ponto, mostramos os conceitos e métodos de que

lançamos mão para coletar dados mediante emprego das ferramentas metodológicas como

Diário de Campo, Questionários, Observação in loco e para adentrar o corpus de nossa análise,

composto a partir de estudo de caso que enfoca o uso das TIC por uma turma de História.

Cumpre salientar que se trata de metodologia de cunho qualitativo, que se ampara em

vasta tradição na área das Ciências Sociais.

Assim é que, no Capítulo IV, dedicado à descrição e análise dos dados obtidos na

pesquisa empírica, adentramos propriamente a fase derradeira da presente investigação. Nela,

estão reunidos os dados que colhemos ao longo dos meses de trabalho de campo, os quais são

apresentados em categorias e que são interpretados com base nos conceitos expostos nos

capítulos iniciais.

Dividimos este capítulo em dois segmentos, um inicial, para a descrição e análise; outro

final, para a síntese que elaboramos a partir da análise prévia. Nesse ponto, procuramos

descrever e interpretar de forma detalhada os principais dados que coletamos do trabalho de

campo.

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Com isso, são dadas as condições para que, por fim, concluamos nossa investigação. É

o que fazemos no segmento final, nas “Conclusões”, que reúnem um olhar sobre toda a

trajetória de nossa pesquisa – da revisão teórica inicial aos aspectos metodológicos, passando

pelos dados e análise, até chegar à síntese final. Ali retomamos o ponto de partida – a

questão/problema que motivou nossa investigação – e seus diversos desdobramentos,

salientando a motivação inicial e as respostas que conseguimos obter, tanto da investigação

conceitual como da pesquisa empírica.

Nesse ponto, trazemos para o primeiro plano as descobertas mais relevantes de nossa

investigação, assim como as eventuais lacunas que merecem ulteriores aprofundamentos.

A revolução trazida pela tecnologia afeta todas as esferas da atuação humana. É a partir

dessa premissa que, nas páginas a seguir, empreendemos um olhar que busca desvelar o

impacto do uso das TIC sobre a prática e a reflexão na área de História.

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2 O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM E AS TIC

A internet pode ser ferramenta útil ao processo de aprendizagem porque proporciona o

acesso a uma ampla quantidade de informações e, além disso, sustenta a construção de um

conhecimento significativo ao possibilitar respostas às necessidades de informação dos

discentes. A presença das TIC na escola deve ter como foco promover o acesso às informações,

auxiliar na construção de conhecimentos, desenvolver novas habilidades como o uso de

diferentes mídias, facilitar o processo de criação de redes colaborativas de aprendizagem e

propiciar melhor interação entre a comunidade escolar (alunos, professores, pais e outros).

Nos últimos anos a tecnologia tem sido um tema recorrente das reflexões de pedagogos,

professores, pesquisadores e demais profissionais que trabalham com o ensino (LIMA, 2012;

FAGUNDES, 2012; KHAN, 2013). Quase sempre temos um viés que busca compreender o

impacto das novas técnicas sobre os processos de ensino-aprendizagem, anotando seus pontos

positivos, suas carências, os riscos potenciais e as possíveis adaptações para a didática. Não

faltam avanços e recuos nesse contexto, já que a técnica impõe desafios e traz desdobramentos

importantes para a vida profissional e para a socialização de todos os envolvidos.

É nesse sentido que empreendemos nossa investigação que surge da observação

cotidiana de nossa prática docente, num universo cada vez mais mergulhado nas relações com

a tecnologia, sobretudo a digital – computadores, tablets, celulares, i-phones, entre outros. Aos

poucos essa presença acentuada de aparelhos que permitem o contato imediato e

descentralizado trouxe diversas questões que merecem ser investigadas, pois impactam no

ensino tanto quanto as questões de conteúdo das disciplinas curriculares.

As promessas de avanços ligados à adoção das TIC são acompanhadas de temores

quanto à presença das máquinas e da inteligência artificial, numa reedição dos clássicos

embates entre a racionalidade fria das máquinas e as ideias humanistas (SENNETT, 2013).

Superar essa dualidade representa um dos maiores desafios para todos os que atuam na

educação.

Vamos buscar autores que nos ajudem a explicar sobre as tecnologias digitais na

transformação, informação e as novas possibilidades de expressão e comunicação que hoje se

apresentam e que não existiam, como a leitura online e navegação de hipertextos. As TIC trazem

novos modelos de se comunicar. Por exemplo a escrita, que é tradicionalmente linear e

sequencial, pode apresentar-se agora como multimodal, quando várias conexões de

comunicação trabalham em conjunto na hipermídia (LEMKE, 2002).

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Veremos que essa mudança foi-se processando de forma intermitente ao longo da

história da educação, ligada ao uso de determinados instrumentos naturais e artificiais

(McLUHAN, 1979) que contribuíram para moldar as formas de socialização e de conhecimento.

As TIC tornam-se uma ferramenta importantíssima no processo de aprendizado,

permitem informações que sustentam o conhecimento com novas habilidades na comunicação,

nas redes colaborativas, na comunidade escolar e com todas as pessoas se envolvendo na

criação de novas habilidades.

Todavia, para que possamos avançar, é preciso darmos perspectiva ao nosso olhar, a

fim de melhor compreender as relações entre o ensino e a tecnologia. Um olhar sobre o

desenvolvimento histórico das tecnologias permite-nos avançar na compreensão de seu impacto

sobre o cenário da educação atual. É o que faremos no próximo segmento.

2.1 Breve histórico

Desde os primórdios, a técnica esteve associada ao ensino. A palavra falada, início da

tradição oral, contava com a memória como suporte principal. As sociedades tradicionais, que

passavam o conhecimento de forma não sistemática pela fala, apoiavam-se na repetição das

histórias em torno dos ciclos da natureza (ELIADE, 1992a; 1992b; GOODY, 2012).

A longa tradição da oralidade é um cenário especulativo no que diz respeito à pré-

história da humanidade, já que a história propriamente só começa a ser registrada de maneira

ordenada quando os registros escritos passam a ser utilizados. Mas as sociedades ágrafas, que

ainda existem no mundo e que serviram de base para os estudos antropológicos, oferecem uma

aproximação valiosa para se entender como era esse universo sem a palavra escrita

basicamente, era um universo apoiado na memória e na repetição (GOODY, 2012; ELIADE,

1992a). Um universo circular, marcado pela sucessão dos ciclos da natureza e pela visão do

sagrado. Eis um vislumbre desse mundo a partir da perspectiva de Mircea Eliade, em seu já

clássico “Mito do eterno retorno” (1992a):

Qual seria o significado da vida para um homem que pertence a uma cultura tradicional? Acima de tudo, significa viver de acordo com modelos extra-humanos, de conformidade com determinados arquétipos. Viver em conformidade com os arquétipos significava respeitar a “lei”, pois a lei era apenas uma hierofania primordial, a revelação in illo tempore das normas da existência, feita por uma divindade ou um ser místico. E se, por meio da repetição de gestos paradigmáticos e através de cerimônias periódicas o homem antigo conseguia (...) anular o tempo, ainda assim ele vivia em harmonia com os ritmos cósmicos. Podemos até dizer que

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ele entrava nesses ritmos (basta que lembremos como a noite e o dia são “reais” para ele, assim como as estações, os ciclos da lua os solstícios). (ELIADE, 1992a, p. 89, grifos no original)

A escrita quebra esse ciclo ao permitir que a memória se apoie nas notações, o que

trouxe mais segurança às trocas – econômicas e simbólicas – que passaram a acontecer desde

então. Para nossa investigação, é importante reter essa diferença entre ambos os universos, já

que elas evidenciam o impacto que a mudança técnica tem sobre as relações e a cultura

humana, pois se trata justamente disso: de uma mudança técnica significativa para a cultura

humana, em que hoje, de tão familiarizados com ela, nem nos darmos conta dessa dimensão

técnica representada pela escrita.

Sobre a diferença entre fala e escrita, Jack Goody (2012, p. 54), lembra-nos:

Muitas vezes nos esquecemos de que uma sociedade puramente oral tem uma abordagem diferente à linguagem do que aquela que existe quando a escrita intervém. A linguagem é evanescente e não pode ser estudada, analisada, revista da mesma maneira que Eliot descreve na frase “a luta interminável com palavras e significados”. Essa é normalmente uma experiência com a escrita, mas muito raramente, se é que ocorre alguma vez, com a fala. Essa é a diferença entre os dois registros: a fala é intempestiva, a escrita envolve “pensamento”, reflexão sobre o que escrevemos, mesmo que seja apenas porque o que foi escrito passa a ser um objeto material.

Já na Antiguidade Clássica, a invenção da escrita foi recebida com desconfiança pelos

pensadores gregos que viam na disseminação da nova técnica, na célebre passagem de

Sócrates, em Fedro, o enfraquecimento da faculdade da memória (PLATÃO, 1986).

A escrita parece ter sido o primeiro passo na revolução do conhecimento, permitindo o

registro ao longo do tempo e do espaço. Se antes o homem estava preso ao seu presente, dado

o registro precário da memória que caracterizava as sociedades tradicionais, a invenção da

escrita permitiu-lhe superar o tempo e o espaço, registrando o pensamento – e o conhecimento

– de forma duradoura.

Os rituais das sociedades primitivas registrados por Jack Goody (2012a; 2012b) revelam

parte desse impacto: “a escrita torna a fala “objetiva”, transformando-a em um objeto de

inspeção visual além da inspeção auditiva; é a mudança do receptor do ouvido para os olhos, e

do produtor da voz para a mão” (2012a, p. 57).

Mas ela, a escrita, também teve consequências mais profundas sobre a própria essência

do ser humano e de seu convívio em sociedade. O impacto da escrita foi muito além da questão

da memória: teve ecos na autopercepção do indivíduo e na organização da sociedade.

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Para nossas sociedades que foram amplamente educadas a partir da palavra escrita,

essas questões nem sempre são claras: é como se estivessem naturalizadas, tal é a presença da

palavra escrita em nossa cultura. Tal naturalização torna por vezes obscura a relação entre

pensamento e linguagem e as implicações que o registro oral e escrito tem sobre a maneira

como nos comunicamos e como entendemos o mundo.

A escrita é monológica. Sua natureza nos remete à atividade privada:

Escrever ocorre em privado. Construímos uma autobiografia, como um diário, em privado. A privacidade significa que não enfrentamos o problema de uma comunicação direta e imediata com o público, o problema de interrupção ou sua supressão autoritária; temos a paz e o lazer para construir. (GOODY, 2012b, p. 124)

A fala é dialógica. Sua natureza faz apelo à intervenção e atenção constante ao

interlocutor.

O discurso oral não funciona assim; o orador está sendo interrompido constantemente porque, a não ser em situações autoritárias, o discurso oral é dialógico e interativo. De um ponto de vista, não há nenhuma separação real entre o orador e o público. Todos são oradores, todos são ouvintes (de certo tipo) e a conversação prossegue com começos e pausas, muitas vezes com frases incompletas e quase sempre com narrativas não terminadas. (GOODY, 2012b, p. 125)

Monologismo da palavra escrita e dialogismo da palavra falada são aspectos importantes

a considerar quando olhamos para a história da educação. Afinal, o mestre que fala e é

interrompido pelo estudante está em posição bem diversa daquele que escreve e dialoga apenas

consigo mesmo. Ambas as situações, que implicam o uso de instrumentos tidos como

“naturais”, não propriamente tecnológicos – a fala e a escrita – são na verdade expressões de

um uso técnico, em sentido amplo: a voz projeta o pensamento tal como a escrita, mas ambas

as situações diferem quanto à possibilidade de feedback da audiência, entre outras diferenças.

Avançando mais um pouco, temos a tradição dos copistas dos mosteiros medievais,

lugares que concentraram durante séculos o conhecimento do mundo ocidental. Baseada na fiel

reprodução da tradição acumulada nos livros, a tarefa dos copistas remete-nos a uma relação de

transmissão de informações – quanto mais fiel à fonte, melhor. A relação entre a palavra escrita

e a fala altera, segundo alguns autores, de forma indelével o conteúdo do conhecimento.

Nas memórias de Santo Agostinho, temos alguns flagrantes do quadro do ensino

durante a Idade Média: valorizava-se a retórica a partir da leitura dos clássicos gregos e latinos.

Os alunos eram conquistados pela habilidade do mestre em transmitir as lições, em aulas que

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se concentravam no comentário sobre as escrituras sagradas e sobre os assuntos de ciência:

“Não me esforçava por aprender o que o bispo dizia, mas só reparava no modo como ele falava”

(SANTO AGOSTINHO, 1996, p. 141).

Mas aqui ainda estamos no âmbito da palavra escrita à mão. Apesar de representar um

grande avanço para a cultura humana, ela ainda é um processo lento e especializado, cujo

impacto sobre a sociedade e sobre as formas de transmissão de conhecimento se circunscreve

à capacidade dos copistas. Os mosteiros medievais concentram poder porque são os

responsáveis pela transmissão do conhecimento acumulado. Durante séculos, eles

representaram a instituição responsável pela disseminação do conhecimento, das letras, da

ciência, fazendo a ligação entre a Antiguidade Clássica e a Idade Moderna. No cenário clássico,

o ensino ainda era fortemente marcado pela performance do mestre, num processo não-linear:

Antes de os livros serem amplamente distribuídos, o ensino não era linear. Os professores ensinavam o que sabiam, da maneira que lhes parecesse melhor. Cada professor, portanto, era diferente, e quando um deles adquiria reputação de sabedoria, originalidade, ou, ainda, oratória emocionante – não necessariamente de informação acurada – os estudantes corriam para ele. Como um adorado rabino ou padre em uma cidade pequena, ele era considerado algo que não se podia conseguir em nenhum outro lugar. Seus estudantes, por sua vez, recebiam uma educação – e às vezes desinformação – única para essa turma específica. (KHAN, 2013, p. 78)

A velocidade com que o conhecimento se disseminou sofreu forte impulso no século XV,

com a novidade trazida pela invenção da prensa de tipos móveis por Johannes Gutenberg, em

cerca de 1450. Se antes o conhecimento era restrito a uma elite encastelada nos mosteiros

medievais, agora, com o advento da imprensa e no contexto do Renascimento, tudo muda.

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Figura 1 – Johannes Gutenberg, considerado o pai da imprensa

Fonte: https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Johannes_Gutenberg.jpg

A invenção da imprensa, segundo o pensador Marshall McLuhan (1979), trouxe uma

nova maneira de organização da sociedade. Ela influenciou a fundação dos estados modernos,

os ideais iluministas de liberdade, igualdade e fraternidade, o império da lei sobre a tradição.

Isso porque ela contribuiu para disseminar o conhecimento em um novo patamar, inerente à

capacidade de reprodução da palavra impressa.

A Igreja e o Estado Absolutista perceberam esse caráter revolucionário da imprensa

desde o início, e as perseguições havidas nesse período são a crônica de uma luta que só

terminou com a Revolução Francesa na Europa, mas se estendeu de diversas formas em nosso

país, ainda colônia de Portugal naquele momento. Há uma longa história de cerceamento à

liberdade de expressão e informação no Brasil Colônia (BAHIA, 1990; SODRÉ, 1999), pois o

acesso a esses bens simbólicos sempre representou poder e, em decorrência disso, uma

ameaça ao status quo.

Nelson Werneck Sodré (1999) aponta que não foi outro o motivo da implantação tardia

da universidade e da imprensa no Brasil: ao contrário das colônias espanholas, que conheceram

imprensa e universidade bem antes, a então colônia portuguesa se manteve mais “dócil” e

sujeita à exploração na medida mesmo de sua ignorância. Na então colônia portuguesa, o

material impresso era visto como essencialmente “pecaminoso”, veículo potencial de

revoluções, alvo dos mais renitentes censores e da mais arraigada perseguição:

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Instrumento herético, o livro foi, no Brasil, visto sempre com extrema desconfiança, só natural nas mãos dos religiosos e até aceito como peculiar apenas ao seu ofício, e a nenhum outro. As bibliotecas existiam nos mosteiros e colégios, não nas casas de particulares. Mas ainda aquelas foram pouquíssimas, de livros necessários à prática, constituindo exceção mesmo os edificantes. (SODRÉ, 1999, p. 11)

Daí o atraso da disseminação da imprensa e da universidade na colônia. Esse cenário é

diferente quando olhamos para o ensino em outras partes do mundo a partir da invenção dos

tipos móveis por Gutenberg.

O ensino, embora sempre tenha tido um cunho elitizado, sofreu o impacto da invenção

da imprensa: livros publicados em diversos países passaram a ser conhecidos no mundo todo.

Dissemina-se a informação e o conhecimento com velocidade muito superior ao ritmo anterior,

marcado pela memória e pela reprodução manual. Com isso, universaliza-se a ciência,

formando-se aos poucos uma nova elite intelectual, marcada pelos valores burgueses da era pós-

absolutista.

Durante séculos, essa verdadeira revolução silenciosa se desenvolveu nas sociedades

ocidentais, moldando a percepção e a reprodução do conhecimento em sala de aula e fora dela.

A escola que floresceu nesse período tem na escrita e no livro didático o seu paradigma

básico: é regida pela palavra escrita, que organiza e categoriza a realidade em segmentos

compartimentados, marcados pela hierarquia, e ainda fortemente ligada à fixação mnemônica.

Nesse longo período, que vai das primeiras universidades na Idade Média até a

disseminação do ensino universal resultante do Iluminismo e da Revolução Industrial, as escolas

dedicam-se sobretudo à reprodução do saber. São espaços voltados para a memorização do

conhecimento acumulado, com vistas à sua reprodução no mundo do trabalho que aos poucos

começa a se delinear a partir da Revolução Burguesa. Livro, lousa, quadro negro, alfarrábios, giz

e voz: eis os principais instrumentos utilizados nessa tarefa, nos níveis elementares da

educação, e que moldariam a cultura do ocidente até os dias atuais.

As transformações trazidas pela Revolução Industrial no século XVIII somaram-se de

forma constante, resultando em descobertas científicas de grande impacto para a organização

prática da vida social e do conhecimento – já no século XIX, a disseminação do uso da

eletricidade, por exemplo, revolucionou a vida nas cidades, ampliando de forma vertiginosa a

velocidade de comunicação.

Já na metade do século XX, o capítulo final desta breve história tem início: a revolução

da chamada era pós-industrial, quando o computador passa a concentrar as potencialidades

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técnicas em velocidade exponencialmente maior do que se dava no período anterior. Algumas

décadas mais tarde, com o advento da internet e sua exploração comercial já nos anos 1990,

temos o cenário atual da transformação tecnológica, cujo impacto se faz sentir em todas as

esferas da vida.

Para muitos, a instantaneidade permitida pela comunicação online trouxe-nos

novamente para um cenário pré-Gutenberg marcado pelo imediatismo, pela oralidade, pela

singularidade da experiência tribal.

Nessa linha de raciocínio, alguns estudiosos levantam o argumento de que estamos de

alguma forma voltando ao estado de coisas anteriores à invenção da imprensa e da própria

escrita: o mundo estaria ficando muito parecido com a sociedade ágrafa. A tese de que a

sociedade contemporânea está se tornando muito parecida com o mundo anterior à revolução

da escrita, quando a informação circulava mediante fofoca, que ditava o comportamento social,

foi levantada pelo pesquisador Thomas Pettit, conforme relato de Caio Túlio Costa (2014, p. 84):

Essa teoria é de autoria do professor dinamarquês Thomas Pettit, da Universidade do Sul da Dinamarca. Para ele, a web nos faz regressar a um estado pré-Gutenberg. Estado este definido pelas tradições orais: informações em fluxos e c. Ela ecoa, de certa forma, a teoria da modernidade líquida de Zygmunt Bauman, outro pensador fundamental no entendimento da realidade, para quem os conceitos, antes sólidos, na atualidade se amoldam a cada situação, assim como os líquidos se ajustam e tomam a forma de seus receptáculos.

Estaríamos de certa maneira retornando a uma comunicação construída com base na

lógica da fala, em lugar da lógica da escrita. A imediaticidade, a emotividade, a interatividade e

outras características da oralidade tenderiam a se fazer mais presentes nas trocas

comunicacionais agora possibilitadas pelo advento das mídias sociais.

Os estudiosos da Comunicação advertem-nos acerca da mudança do modelo ora em

curso (ANDERSON; BELL; SHIRKY, 2013; COSTA, 2014). Antes o processo de comunicação era

regido pela emissão de informações de maneira unidirecional, de uma fonte para vários

receptores, como na comunicação via jornal ou televisão, ou bidirecional, de um para um, como

na comunicação telefônica. Nesse contexto, a comunicação tendia a ser unívoca, privilegiando o

emissor. Era a base para a hierarquia nos processos de trocas simbólicas. Com a emergência da

internet na metade da década de 1990 e com a subsequente invenção das redes sociais, o

modelo foi alterado de forma indelével.

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A Figura 2 sintetiza o modelo que predominou nos processos de comunicação até a

metade do séc. XX.

Figura 2 – Modelo de comunicação unidirecional

Fonte: http://www.e21.com.br/blog/

Os grandes meios de comunicação da era pré-digital, como jornal, rádio e televisão,

seguiam grosso modo o modelo acima, marcado pela emissão de um para muitos, com pouca

possibilidade de resposta – feedback – por parte da audiência. Mas agora a comunicação pode

ser efetuada de maneira multidirecional, com vários emissores e receptores em permanente

troca de posição, de forma imediata. Trata-se de uma comunicação mais rápida, em que as

mudanças são assimiladas ao processo sem intermediação necessária das instituições até então

válidas – o Estado, a grande mídia, a academia –, e marcada pelo particularismo.

O modelo de comunicação foi subvertido, passando de uma situação fortemente

hierárquica, de cima para baixo, para uma configuração multimodal, mais “horizontal” – em que

pesam as novas fontes de poder representadas pelos grandes grupos da comunicação online,

como Google, Facebook, Apple etc.

A Figura 3, abaixo, representa o modelo multimodal e multidirecional que caracteriza a

comunicação em rede e online. Pode-se observar que, diferentemente do modelo anterior, aqui

temos uma comunicação de todos para todos, de forma simultânea.

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Figura 3 – Modelo de comunicação multidirecional

Fonte: https://pt.depositphotos.com/

Ao subverter o modelo tradicional de trocas simbólicas, a comunicação digital trouxe

diversas mudanças para a organização social, afetando todas as esferas da atuação humana –

aí incluído o ensino. A Figura 3 sintetiza essas mudanças, mostrando os vários pontos de

contato dos indivíduos entre si, num desenho extremamente complexo de interações e trocas

simbólicas.

Para ilustrar o esquema representado na figura acima, há diversos exemplos que podem

ser trazidos nesse contexto de mudança: a luta entre os taxistas e os motoristas de aplicativos, o

confronto entre a rede hoteleira e os aplicativos de aluguel, o embate entre as faculdades de

educação presencial e aquelas de ensino à distância, a luta da mídia tradicional – grandes

grupos de jornal, rádio e televisão – para encontrar um novo modelo de negócio, frente aos

gigantes do Vale do Silício.

Em termos mcluhianos, são embates que revelam a fronteira entre o mundo regido pela

lógica da palavra escrita e aquele onde a comunicação se baseia na troca imediata de sinais

típica da comunicação oral. São todas atividades que sofreram fortemente o impacto das novas

tecnologias, que afetam as relações de trabalho e a economia global de forma crescente e que

decretam o fim de várias atividades e o começo de outras.

As consequências de tal mudança estão sendo sentidas ainda hoje, em diversas esferas

da vida em sociedade: a organização do trabalho, a estruturação das relações afetivas, a

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organização do conhecimento – todas as faces da vida social e da própria natureza humana se

ressentem da revolução trazida pela comunicação online.

Talvez a experiência mais comum para os docentes nos dias de hoje seja a de

conquistar a atenção de sua turma, roubada pela fixação de crianças e adolescentes nas telas

dos celulares... Eis aí a imagem que resume o dilema trazido pelo avanço técnico e a invasão

das TIC no cotidiano, desde o início deste milênio.

Se antes a preocupação era com a falta de criatividade e o pensamento único,

resultantes da organização centrada na palavra escrita, hoje a situação se inverteu: o excesso de

informação e a dispersão dele resultante, o questionamento da autoridade do professor e a

perda das referências institucionais é que trazem os maiores dilemas para a educação.

A mudança de paradigma vem sendo estudado por uma série de pesquisas, em diversas

áreas. A educação, em particular, tem sentido o impacto da mudança técnica. A interatividade

possibilitada pelo ensino a distância, a dispersão da atenção dos alunos, o questionamento da

autoridade do professor: eis algumas das questões importantes que a mudança tecnológica

trouxe para o debate sobre o ensino.

Salientamos que, por se tratar de um processo ainda recente, é preciso cautela na

avaliação do que pode ser proveitoso para a educação da gama de avanços técnicos. Afinal, nas

palavras de McLuhan, “o homem cria a ferramenta; a ferramenta recria o homem”. Por isso

mesmo, é necessário investigar em que ponto a mudança tecnológica impacta sobre as relações

humanas, particularmente as de ensino na presente investigação: só assim nos parece possível

acolher os avanços históricos de forma condizente com os objetivos da educação.

Em outras palavras, não se trata de adotar uma postura tecnicista, que vê na tecnologia

a resposta para todas as questões da humanidade. Muito antes pelo contrário, trata-se de

envidar esforços para entender como a tecnologia impacta nas questões humanas, mas partindo

do fato de que hoje a reflexão acerca desse fenômeno é incontornável. Negar a realidade é uma

postura contraproducente para o debate, daí a necessidade de encará-la de frente, em seu

contexto histórico e com todas as suas peculiaridades. A reflexão crítica sobre as TIC pode nos

levar a um patamar diferenciado de abordagem para as questões do ensino que tanto nos

ocupam como professores e pesquisadores.

Neste breve histórico, procuramos mostrar a relação muito peculiar que se estabelece

desde os primórdios até nossos dias entre as ferramentas técnicas e o seu uso em sala de aula.

Essa relação tem potencial revolucionário, mas apresenta diversas dificuldades para sua efetiva

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utilização, o que tem gerado uma série de debates entre os estudiosos. É o que veremos no

segmento seguinte.

2.2 TIC em debate: potencialidades e dificuldades

Comecemos este espaço com uma citação:

O velho modelo de sala de aula simplesmente não atende às nossas necessidades em transformação. É uma forma de aprendizagem essencialmente passiva, ao passo que o mundo requer um processamento de informação cada vez mais ativo. Esse modelo baseia-se em agrupar os alunos de acordo com suas faixas etárias com currículos do tipo tamanho único, torcendo para que eles captem algo ao longo do caminho. Não está claro se este era o melhor modelo cem anos atrás; e, se era, com certeza não é mais. Nesse meio-tempo, novas tecnologias oferecem uma esperança de meios mais eficazes de ensino e aprendizagem, mas também geram confusão e até mesmo temor; com exagerada freqüência, os recursos tecnológicos não fazem muito mais do que servir de maquiagem. (KHAN, 2013, p. 9, grifo no original)

Para Salman Khan, a escola do futuro tem relação inextricável com o uso da tecnologia

e da comunicação online. A sala de aula virtual ofereceria uma resposta necessária para o

ensino, sobretudo em países do terceiro mundo, onde o acesso ao conhecimento é dificultado

por condições estruturais precárias. Ao vencer as barreiras espaciais e temporais, as aulas

online seriam a alternativa mais adequada para a alfabetização em diversos níveis de ensino.

Ao trazermos esse autor para o debate, indicamos já nessa escolha uma questão

interessante: o fato de Khan ser oriundo do mercado financeiro, tendo despertado para as

questões do ensino por mero acaso – começou a dar aulas a uma prima em dificuldade com a

matemática, e a partir disso se tornou uma referência para o ensino mediado pelas TIC,

sobretudo quando obteve o apoio do multimilionário Bill Gates para a criação de uma

universidade online, a Khan Academy. Hoje, a Khan Academy tem uma versão em português e

cobre um cem número de disciplinas. O acesso é mundial, levando conhecimento gratuito a

todos os que se dispuserem a aprender.

Essa trajetória singular mostra, a nosso ver, um aspecto típico do cenário atual de uso

das tecnologias: a emergência de novos atores no debate sobre o uso das TIC para o ensino. A

presença sempre mais forte da geração que já cresceu no ambiente mediado pela tecnologia – a

chamada Geração Y – é um dos aspectos que marcam o debate sobre a inserção das TIC nos

processos de ensino-aprendizagem.

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Parece haver, num momento inicial, uma certa euforia em relação às potencialidades da

tecnologia, quase como se elas representassem uma panaceia para a educação. Mas

obviamente a técnica por si só não representa mais do que um meio de se chegar a algo, não

podendo ser tomada como a finalidade ou mesmo o ponto mais relevante do processo. Vimos

que ao longo da história do ensino a presença dos recursos técnicos foi motivo de reflexão

eventual, como algo incidente. Mas essa presença ganhou novo patamar no contexto atual,

marcado pela irrupção violenta de meios que revolucionaram as noções de tempo e espaço,

assim como as formas de acesso ao conhecimento.

Dados recentes dão conta de um número crescente de propostas de ensino a distância,

por exemplo. Tal modalidade de ensino implica diversas expertises necessárias ao perfil docente

e discente, nem sempre acessíveis. Não basta apenas equipar uma escola: é preciso refletir

sobre o impacto das TIC sobre os processos de ensino-aprendizagem.

Seja como for, há diversos senões no caminho da escola do futuro proposta por Khan.

Um deles é a falta de acesso à estrutura tecnológica mínima em várias localidades do mundo –

e o Brasil é uma delas. Outra dificuldade são as limitações dos próprios professores no trato

com a tecnologia, pois esses muitas vezes tiveram sua formação no modelo mais tradicional de

alfabetização. A seguir analisaremos alguns desses fatores que impactam sobre o ensino

mediado pela tecnologia. Trata-se de um apanhado não exaustivo, por meio do qual

prosseguimos na contextualização de nossa investigação.

No final do século XX, as tecnologias não contribuíram muito no desenvolvimento da

educação, pelas dificuldades de acesso à tecnologia e pela lentidão nos sistemas. Mas, com os

avanços nas últimas décadas na comunicação, pode-se instantaneamente acessar qualquer fato

ocorrido no mundo.

A revolução digital tem instigado diversos estudiosos a entender e fazer uso das TIC

como ferramenta de ensino (JENKINS, 2009; LIMA, 2012; FAGUNDES, 2012). São iniciativas

que vão das experiências de uso da internet para educação à distância, passam por projetos de

cunho educativo utilizando as mídias (Educomunicação) e chegam ao relato e reflexão sobre as

experiências de educação digital no Brasil:

Uma condição fundamental para lidar com a complexidade de um novo currículo é incluir totalmente a escola na nova cultura digital: a construção dessa escola, sua estrutura, organização e funcionamento incorporados em uma cultura que privilegie e favoreça o funcionamento em rede, com a mobilidade conectando espaço e tempo. Em resumo: uma cultura em que a informação não seja massificada, mas produzida pelos próprios aprendizes no acesso e no uso de diferentes espaços, não os retendo

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aos limites do espaço tridimensional, único diretamente acessível aos sentidos da percepção humana, mas acessando e convivendo com as imensas possibilidades dos espaços digitais “n-dimensionais”, por meio dos quais nossa cognição pode desenvolver as funções de representação dos processos de abstração reflexionante operando conceitos sobre as abstrações refletidas, interagindo em redes de comunicação em tempos tanto sequenciais como simultâneos. (FAGUNDES, 2012, p. 51)

A partir das observações de Léa Fagundes, percebemos que a tarefa de adentrar o

mundo da educação digital é um passo que vai muito além do óbvio representado pela adoção

de estrutura tecnológica: a cultura digital diz respeito a todo o ambiente de ensino, abrangendo

as formas de interagir nos diferentes espaços e alterando a percepção temporal dos agentes.

Veja-se que a autora menciona a produção dos próprios alunos nesses espaços em rede

que vão além da tridimensionalidade usual. Isso implica reconhecer que a escola digital ou a

educação voltada para o uso das TIC tem potencial de subverter o modelo até então reinante de

ensino, modelo ainda afeito à estrutura anterior, na qual o processo de comunicação era muito

mais monológico e hierárquico, conforme vimos ao repassar a mudança paradigmática do

modelo comunicacional.

A visão que a autora nos entrega é a de uma nova relação, mais rica porque resultante

de uma atitude mais engajada de professores e alunos no processo de ensino-aprendizagem.

Tudo isso está no horizonte dos que analisam o impacto das TIC em sala de aula.

Mas há, obviamente, alguns senões para que tais possibilidades se concretizem. As

condições materiais em que educadores atuam na escola brasileira são um fator importante a

considerar nesse contexto, já que elas representam elementos concretos da realidade

encontrada pelos trabalhadores em educação e afetam diretamente as expectativas e a

performance de professores e alunos.

Ignorar as condições objetivas do contexto também não ajuda. Além da infraestrutura inadequada em um grande número de escolas, aponta-se para a insuficiente formação do corpo docente, relacionada, entre outros fatores, à baixa atratividade da carreira, às difíceis condições de trabalho, à estrutura e qualidade dos cursos de formação inicial e à pouca valorização de seu ofício pela sociedade brasileira. Tampouco deixa de ser relevante a defasagem de aprendizagem dos estudantes, uma conseqüência inevitável do perverso percurso de desigualdade de oportunidades sociais, econômicas e educacionais com que vivemos, como se naturais fossem, desde o início de nossa constituição como nação. (LIMA, 2012, p. 28).

Quando se fala em termos da realidade brasileira, é sempre necessário fazer essa

ressalva: lembrar o déficit histórico da educação em relação à qualidade do ensino, sobretudo

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das escolas públicas; repisar os índices escandalosamente baixos de desempenho nos testes

internacionais; insistir na necessidade de valorização da carreira do magistério e de inclusão das

classes mais baixas no processo educativo.

Os esforços para superar essas questões devem ser efetivados também na esfera

política, pois dizem respeito à valorização do ensino como fator básico para o avanço social. Mas

não é possível simplesmente esperar que as melhorias sejam trazidas pelo governo: é preciso

avançar no que é possível fazer, considerando o espaço próprio da educação, os instrumentos

de que dispõem as escolas e – o principal – a motivação do elemento humano.

É certo que tem havido avanços na medida em que diversos pesquisadores e mesmo

pessoas leigas se juntam ao esforço de educar por meio do uso das TIC. Também é certo que as

experiências com a tecnologia tendem a ser mais presentes na medida em que elas se tornam

mais acessíveis em termos financeiros. Foi assim com todos os aparelhos que trouxeram bem-

estar à humanidade.

Mas, novamente, os aparelhos por si sós não representam avanço em termos de

educação, se não forem acompanhados pela reflexão.

Muitos dos críticos mais pertinentes apontam para o descuido de pensadores que se

renderam à técnica como ápice da trajetória humana. McLuhan mesmo foi um dos alvos dessas

críticas. Ao conceber a história humana como uma espécie de derivado da evolução tecnológica,

ele abriu o flanco para as críticas mais diversas, sobretudo daqueles que compreendiam o

caráter humanista da cultura e da educação como elemento primordial.

A nosso ver, é possível contemporizar nesse ponto, fazendo um esforço para colher os

melhores frutos de ambas as tradições – tanto aquela que vê no homem o foco central do

conhecimento como aquela que aponta para a tecnologia como um dos fatores mais relevantes

do processo de conhecimento.

Atualmente, as tecnologias são muito rápidas, gerando facilidades para o seu uso, mas

para alguns professores a incorporação das TIC na educação consiste no uso em suas práticas

como apenas um suporte educativo, desconsiderando o seu uso educativo por parte dos alunos

(ALMEIDA; VALENTE, 2011). Tal postura pode acarretar a mera troca de um suporte por outro,

perdendo-se o principal: a potencialidade da tecnologia para o ensino, as peculiaridades que

cada suporte oferece, a riqueza potencial de novos formatos e linguagens para o processo

educativo.

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Afinal, se a voz e a presença física do professor são fundamentais para gerar empatia –

podendo ser vistos nesse sentido como instrumentos técnicos – a luz, o som, o enquadramento

e a edição de um vídeo didático também são recursos que podem gerar mais ou menos

empatia, a depender de sua utilização.

O que muda é apenas a dimensão, mas se trata essencialmente de um mesmo

fenômeno: o corpo do professor é um instrumento de ensino tanto quanto o é o quadro negro, o

vídeo-documentário, o livro didático etc. A nosso ver, a partir dessa consciência, podemos vencer

os obstáculos representados pela resistência ao uso das TIC. E eles existem.

São diversos os relatos de estudos que demonstram haver forte resistência por parte dos

docentes em aprender a utilizar as TIC (ALARCÃO, 2008; LIMA, 2012; KHAN, 2013). A questão

merece especial atenção por parte de todos aqueles que querem ver o uso da tecnologia como

um recurso a mais no processo de ensino-aprendizagem. É preciso, de alguma forma, lançar luz

sobre as causas dessa resistência, buscando-se maneiras de superá-la, a fim de avançarmos no

domínio e no uso criativo da tecnologia em sala de aula.

O professor não tem necessidade de ser um especialista na questão de tecnologia para

depois usar o conhecimento na atividade pedagógica, ambos os domínios podem evoluir

paralelamente. Experiências em Educomunicação mostram que é possível um meio-termo entre

a especialização no conteúdo e o adequado uso da técnica em sala de aula, em diversos níveis

de ensino.

Às vezes, basta um passo pequeno para se conquistar um avanço significativo. A

familiaridade com os celulares, por exemplo, tem sido objeto de diversas experiências didáticas

que visam a fazer uso das TIC em sala de aula.

Um professor tem mais facilidade em se adaptar a uma inovação se ela se encaixa na

sua concepção de professor. Alarcão (2008) enfatiza que o professor que está de bem consigo

mesmo tende a embarcar em ações inovadoras para o uso da TIC na educação e se concentra

nas tecnologias para usar em suas práticas.

As experiências mais promissoras implicam esse comprometimento dos professores em

acolher o uso das TIC, sempre de maneira crítica, a fim de que as práticas possam ser

transformadas de forma positiva. Daí a importância de se considerarem aspectos como a

formação do professor, seu histórico, a relação que estabelece com a tecnologia, suas

concepções acerca do ensino e da didática: são todos elementos que confluem para uma

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abordagem criativa da tecnologia, sem embargo da experiência acumulada nas práticas

docentes tradicionais.

Isso vai ao encontro das concepções de Jonassen (2007) e Weston e Bain (2010) e Eles

referem que as TIC não são vistas como ferramentas tecnológicas, mas como ferramentas

cognitivas, capazes de expandir a capacidade intelectual de seus usuários e de alterar estruturas

e procedimentos, de modo que elas possam efetivamente trazer contribuição significativa. Tal

concepção acolhe a ideia segundo a qual a tecnologia não é apenas um meio, mas parte

integrante de todo o processo de conhecimento. Aqui temos, novamente, entre outras

ressonâncias, as palavras do pensador da mídia que cunhou a expressão “aldeia global”,

Marshall McLuhan (1979).

Para McLuhan, como adiantáramos no segmento anterior, os meios de comunicação

são como extensões do homem. Isso quer dizer que eles funcionam como amplificadores e

substitutos dos órgãos sensoriais, especializando e modificando os sentidos. A roda é uma

extensão da perna assim como a câmera é uma extensão do olho, conforme professava o

pensador canadense. A memória digital dos computadores seria o equivalente à nossa própria

memória, assim como a inteligência artificial seria a extensão de nosso próprio raciocínio,

ampliado nos suportes eletrônicos e digitais.

Conforme o estudioso, a especialização dos sentidos representada pelas invenções

tecnológicas seria a responsável pelas principais transformações da sociedade ao longo do

tempo. Essa concepção do papel da mídia parece promissora para que possamos entender o

debate que se desenvolve acerca do uso das TIC na educação. Ela é atualizada e compartilhada

por outros pensadores que veem na tecnologia um auxílio para se pensar sobre a humanidade,

sem descurar de refletir acerca de suas implicações menos evidentes (JENKINS, 2009; KHAN,

2013).

Seguindo por esse caminho, não espantaria ao professor ter de lidar com uma câmera

de vídeo ou com a memória eletrônica dos computadores: eles seriam, também, parte de seu

“organismo”. Afinal, se o pensamento é transmitido pela fala e pela escrita, como vimos no item

anterior, podemos considerá-las ambas, fala e escrita, como sendo meios de comunicação,

também eles necessitando de técnicas para bem expressar o pensamento. E não é exatamente

isso que faz o professor ao planejar sua aula pensando em momentos diferenciados, nos quais

utiliza recursos como a exposição oral, a escrita no quadro negro, a leitura silenciosa ou em voz

alta do livro didático?

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Quanto mais utilizados esses recursos, mais à vontade ele fica criando a expertise que

só a experiência acumulada possibilita criar. Ao encarar seu próprio corpo e os recursos que

utiliza como meios de comunicação, o docente pode lançar um olhar mais amigável para os

outros recursos tecnológicos, ficando igualmente mais à vontade em sua relação com as TIC. Eis

aí uma senda promissora na discussão acerca da dificuldade do docente em encarar as novas

tecnologias em seu cotidiano...

Papert (1986) diz que aprendizagem inclui uma “mistura de mídias”, sofisticando o

desenvolvimento da criatividade, produzindo conhecimento. Essa mistura pode ser entendida, a

nosso ver, como desde aqueles elementos corpóreos, como a voz e os gestos do professor, até

aqueles propriamente tomados como extensões para além do organismo humano – as câmeras

de vídeo, os gravadores de áudio, os computadores e os aplicativos. Mas saber qual o meio mais

indicado para determinada atividade didática ainda é um desafio que, muitas vezes, passa

desapercebido para os professores.

É necessário nesse ponto adotar uma postura mais humilde, própria de todo o cientista

frente à natureza: como usar esse instrumento de forma que ele expresse o que eu pretendo

expressar? Quais as maneiras mais eficazes de abordar os fenômenos? Até que ponto a fala

sozinha dá conta da tarefa didática de introduzir determinada temática? Qual a relação entre a

linguagem escrita e a visual, na leitura, memorização e construção do conhecimento?

Todas essas são questões que impactam sobre o processo de ensino-aprendizagem e

que são afetadas de forma direta pelo uso que se faça das TIC. Mas para fazê-las é preciso

primeiramente se dispor a rever os métodos de ensino, a aprender as novas linguagens, a

dialogar com a tecnologia em um nível muito mais profundo do que, por exemplo, a mera

adoção de um aparelho celular como fonte de pesquisa.

Muitos autores consideram haver uma grande falta da alfabetização digital. Ora, para as

pessoas usarem as tecnologias em contexto letivo precisam de as dominar minimamente. As TIC

permitem ao educando desenvolver habilidades em diferentes esferas e trabalhos. Só por esse

motivo, já seria importante considerá-las como parte das questões que merecem o olhar do

educador. Mas o fato é que há motivos muito mais prementes para que se considere o uso

das TIC como crucial: a dispersão provocada pelas redes sociais sobre a atenção dos alunos; a

onipresença dos dispositivos eletrônicos no cotidiano da população infanto-juvenil; a sedução da

linguagem multimídia da comunicação online – todos são motivos mais do que sérios para

refletir sobre elas.

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Esses e diversos outros fatores contribuem para que as TIC sejam uma questão crucial

no debate sobre o ensino, a metodologia e a didática, nas diversas disciplinas que compõem a

grade curricular. Não é possível ignorá-las, tal a sua onipresença, dentro e fora da sala de aula.

A riqueza das pesquisas que abordam as TIC está em mostrar as possibilidades que

surgem a partir do uso da tecnologia em consonância com os métodos tradicionais de ensino.

Pois não se trata de simplesmente adotar a técnica como se fosse a resposta mágica para os

problemas da educação, mas sim de encará-la como elemento que pode contribuir para o

avanço das questões inerentes às relações de ensino-aprendizagem.

Mostrar a relação possível entre a tradição acumulada pelo docente e as novas

possibilidades trazidas pelas TIC parece-nos o caminho mais promissor quando discutimos as

potencialidades da tecnologia. Pois não se pode ignorar a quantidade de experiência acumulada

pelos professores antes do grande impacto da comunicação digital, que aconteceu já no final do

século XX. Gerações de professores que foram formados pelo sistema mais tradicional de ensino

ainda estão na ativa: é deles que falamos quando nos referimos à resistência em trabalhar com

as tecnologias... E é absolutamente natural que seja dessa forma, já que não se pode apagar

uma história da noite para o dia, e o caminho para a mudança passa pelo conhecimento e pelo

hábito (SENNETT, 2013).

Mas mesmo iniciativas singelas como a pesquisa pelos buscadores de internet como

Google podem trazer resultados promissores para diversas disciplinas. Veja-se o caso, a título de

ilustração, do site da Biblioteca Digital Mundial, disponível a um clique em todo o planeta.

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Figura 4 – Site da Biblioteca Digital Mundial

Fonte: https://www.wdl.org/pt/. Captura de tela.

Só o fato de se poder acessar tal quantidade de documentos, em diversas línguas, já é

por si só revolucionário: permite comparar diferentes culturas, conhecer o passado, tomar

contato com línguas desconhecidas, entre outras possibilidades absolutamente inviáveis há

apenas algumas décadas.

Em outro exemplo, podemos considerar que o uso, ainda que incipiente, de aparelhos

como os celulares para a realização de tarefas didáticas pode ser um fator de estímulo

incomparável para o aluno, que aprende a encarar a tecnologia como aliada não apenas do

entretenimento, mas sobretudo do conhecimento.

Cada evolução tecnológica pode permitir que surjam novas aprendizagens, esclarecem

Behar e Torrezzan (2009). Estes autores defendem o uso de materiais digitais, como, por

exemplo, textos, animações, vídeos, imagens, aplicações, páginas web, de forma isolada ou em

combinação, com fins educacionais. É importante notar que os autores enfatizam o surgimento

de novas aprendizagens a partir do uso dos variados materiais disponíveis ao professor.

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De fato, como vimos salientando, não basta apenas usar determinada mídia. É

necessário sobretudo refletir acerca desse uso, problematizando-o no contexto da educação e

das áreas envolvidas com o uso das TIC. Dado esse primeiro passo, de caráter epistemológico,

pode-se partir para seus desdobramentos, que são muitos, e que incidem sobre a metodologia

de ensino e a didática.

Por exemplo, ao se considerar como a tecnologia afeta a temporalidade da sala de aula,

temos diversos pontos para reflexão. Salman Khan (2013) propõe uma revisão profunda do

tempo das tarefas, sob o ritmo de uma nova postura diante dos processos de ensino, à luz do

uso das TIC. Em suas propostas, que incluem desde a revisão das atividades no período de

férias até a adoção de turmas mistas, vemos como a discussão sobre as TIC é na verdade parte

da discussão maior e mais importante sobre o processo de ensino-aprendizagem como um todo.

É nesse contexto que ele vitupera contra o processo padrão que se vê nas escolas e

universidades: “Mesmo as nossas atividades extracurriculares habituais tendem a encorajar um

trilhar ordeiro por caminhos previsíveis” (KHAN, 2013, p. 241).

Para fugir da previsibilidade que tende a produzir mais do mesmo em massa, se faz

necessário atentar para o impacto que um ensino aberto às TIC pode ter sobre toda a estrutura

da escola.

Em parte, a rotina escolar, o pouco tempo disponível para atividades extra-classe, e a organização curricular por disciplinas não favorecem a interação entre os professores, nem mesmo dentro de uma mesma unidade escolar. As ações e políticas que promovem a inclusão das TIC na educação devem buscar influenciar estratégias que assegurem oportunidade de intercâmbio de conhecimento sobre a prática e sobre novas abordagens metodológicas, para que essa implantação cumpra com os objetivos propostos e concretize o alto potencial transformador que essas tecnologias trazem ao espaço escolar. (LIMA, 2012, p. 32)

Aqui temos a percepção de uma realidade que inclui as TIC no contexto maior em que

elas estão inseridas. A reflexão sobre elas faz sentido nesse movimento permanente de refletir

sobre os aspectos centrais do processo de ensino-aprendizagem – os quais vão muito além do

uso eventual de recursos tecnológicos em sala de aula. Mais uma vez, cumpre registrar que falar

sobre as TIC é falar, por consequência, de processos mais amplos que sempre terão

importância para a reflexão docente.

Também Spinelli (2005) afirma que, na aprendizagem, os recursos digitais são refeitos

infinitamente, auxiliando no aprendizado, estimulando a capacidade criadora dos alunos na

elaboração de trabalhos. É de se notar a ênfase que os autores atribuem à criatividade como

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inerente ao uso da tecnologia. Este ponto merece atenção, já que todas as mudanças técnicas

costumam trazer um período de experimentação inicial, sendo logo depois incorporadas às

práticas mais efetivas.

Está claro que não se trata de atribuir às TIC o condão de por si sós despertarem a

criatividade. Trata-se, antes, de compreender a mudança de perspectiva que elas podem

fornecer a professores e alunos. Por exemplo, uma pesquisa que seja efetuada a partir do

buscador Google e uma pesquisa que se baseie na biblioteca pública municipal da cidade em

que se localiza a escola: há diferenças nos resultados da pesquisa? Quais são elas? Como o

aluno procedeu para fazer sua pesquisa em cada caso?

Ao responder a essas e outras tantas possíveis questões em sua prática docente, o

professor pode ampliar sua consciência acerca do impacto das TIC sobre sua prática, o que lhe

permite aperfeiçoar seu método de ensino, ajustando aí o uso crítico da tecnologia.

Para Gutierrez (2004) o emprego das TIC desafia a sua integração para a educação do

século XXI. A modernização das tecnologias está presente em todas as atividades da economia

do mundo, não se vive mais sem as tecnologias em rede. Mas a integração é incipiente em sala

de aula, principalmente no Ensino Fundamental e Ensino Médio. Atualmente, em muitos casos,

se restringe à preparação de testes, provas, impressão de atividades e de conteúdos. Vimos no

segmento anterior como uma breve história da evolução das TIC pôde nos auxiliar a

compreender a sua relação com a educação e o currículo.

A inclusão das TIC com ferramenta didática é ainda controversa. Alguns autores criticam

a simples inclusão das TIC na escola, como Cuban (2003). As TIC auxiliam o trabalho do

professor e o aluno consegue assimilar melhor usando novos letramentos, que são explorados

com uso da imagem, do som, da animação, quebrando o uso de apenas informação impressa.

Mas é preciso refletir sobre esse uso, com vistas a torná-lo parte do processo de conhecimento,

permitindo incorporá-lo no cotidiano do aluno, do professor e da escola.

A formação totalmente baseada na memorização não dá mais conta de preparar para a

sociedade do conhecimento, sendo somente repassadora, mas precisa ser geradora do

conhecimento, pois “existem diferentes aplicações que podem ser exploradas [em função] dos

objetivos que o professor pretende atingir” (ALMEIDA; VALENTE, 2011, p. 78).

Com o avanço das formas de busca pela internet – em buscadores como Google e

Yahoo –, o conhecimento memorizado passa a ser, em parte, dispensável. Mais importante que

memorizar o volume de informações que se pode acessar via Google, os processos de ensino

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devem estar voltados para a compreensão do processo de construção do conhecimento e para a

sua aplicação aos problemas da vida cotidiana. Não se trata, portanto, de memorizar, mas de

saber como acessar a memória para quando precisarmos dela.

Segundo o estudo Educação no Século 21 (2016, p. 122), as mídias sociais

e as tecnologias promovem conversas, discussões e aprendizagem mútua. E não apenas entre aluno e professor, mas também entre os próprios estudantes e de professor para professor (...). Para que a tecnologia seja definida como “social”, deve cumprir pelo menos um dos seguintes critérios: permitir a partilha de conteúdos, incentivar a cooperação e facilitar a aprendizagem formal, bem como a informal.

Ao serem compartilhadas as ideias, socializam-se os conteúdos, aumenta-se a interação

com os demais, aumentando o conhecimento. Mas isso não é um processo automático: se as

práticas seguem a linha convencional e unidirecional que caracterizou a história da educação em

seus primórdios, as TIC serão apenas reprodutoras de um conhecimento marcado pela

reprodução e a hierarquia. Um dos grandes desafios trazidos pelas TIC é justamente a mudança

de postura do professor, que passa a ser visto com facilitador de um processo de aquisição de

conhecimento, em vez de um centro gerador e reprodutor de informações.

No entanto, a formação docente ainda se baseia nesse modelo convencional de

reprodução, em que pesem os esforços em contrário (KHAN, 2013).

Temos hoje acesso a inúmeras inovações e ferramentas digitais, mas, como refere

Miranda (2006, p. 77), “a inovação educativa aparece mais no discurso do que nas práticas”.

Embora muito se fale sobre a necessidade de mudança, é necessário empregar e demonstrar, e

possivelmente servir de orientação, para outros professores e alunos. Seguindo a linha de

pensamento de Chagas (2011), sem mudança, não há inovação.

A dificuldade de passar da teoria à prática talvez seja resultado do processo de formação

e da cultura profissional. Afinal, não é de uma hora para outra que processos históricos podem

ser modificados. Mas ter consciência deles é o primeiro passo para mudá-los.

Quem nos faz refletir é Miranda (2006, p. 77), para quem “as mudanças nos modos de

pensar e de fazer são mais lentas do que a evolução tecnológica”. De fato, a defasagem entre o

ritmo das mudanças tecnológicas e o ritmo de aprendizagem é um fator que se faz presente no

fenômeno de resistência à adoção das TIC por parte dos quadros docentes mais antigos. Tudo

depende do ritmo em que as mudanças são adotadas, assim como da adoção de uma política

de formação permanente de professores. Alguns autores apresentam ponderações sobre esse

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processo. É o caso de Silva (2004). Para ele, há uma clara evolução ao longo da história da

docência, estando a mudança presente na vida dos professores e alunos, umas vezes imposta e

institucionalizada, outras de forma mais informal, embora sempre gradual.

Para que esse não seja um processo traumático, cumpre cercá-lo de todos os cuidados

que se costuma tomar frente à formação do próprio aluno: afinal, ao encarar formas inovadoras

de abordagem e instrumentos didáticos, também os professores passam a ser aprendizes, e é

necessário esforço e paciência de parte de todos os envolvidos.

Assim, fica claro que a evolução acontece, podendo ser gradual. Procura-se com este

trabalho conhecer a utilização das novas tecnologias, assim como ter a percepção dessas

mudanças, quanto às dimensões que vamos alcançar – se elas são sinônimo de fatores da

inovação, que se podem traduzir em ganho pelos instrumentos utilizados pelos professores com

os alunos em sala de aula.

Reconhecer a necessidade de uma atitude de acolhimento das experiências, sem os

preconceitos e pré-concepções que costumam minar os esforços de inovação, é um primeiro e

importantíssimo passo nessa direção, como argumentam os estudiosos a que recorremos neste

segmento.

De acordo com Sayder (2004), com a velocidade digital online, busca-se a informação

mais precisa e rápida para os alunos nas atividades escolares em sala de aula. Tal precisão e tal

velocidade são características típicas da comunicação digital, por meio da qual se acessam, por

meio de um clique, as mais diversas informações. Essa aceleração que aos poucos foi sendo

dada à comunicação online já vinha sendo efetuada pelas mídias anteriores, como as de vídeo e

áudio, mas agora, com a internet, a velocidade é bem maior. Eis um trunfo nas pesquisas que o

docente pode conduzir em suas atividades didáticas, confrontando diferentes formas de se

chegar a determinada informação do conteúdo da disciplina que está sendo trabalhada. E

também, é claro, refletindo, junto com a turma, sobre as consequências de semelhante

velocidade para o processo de ensino-aprendizagem.

Papert (1986), como vimos, fazia referência à aprendizagem que inclui uma “mistura de

mídias”, sofisticando o desenvolvimento da criatividade e produzindo conhecimento. Ao

confrontar diferentes mídias em um meio como os sites e blogs da internet, é possível testar os

meios mais adequados para as diferentes tarefas didáticas. Há pessoas que respondem melhor

à comunicação visual, outras à comunicação verbal, e assim por diante. Os processos de

aprender e ensinar, ao serem confrontados com as possibilidades da mídia online, onde via de

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regra há uma convergência de várias linguagens – texto escrito, áudio, fotografia, vídeo,

animações etc. –, tendem a ser enriquecidos.

Nesse sentido, é necessário inserir as tecnologias no currículo, discutindo o que significa

essa integração e como ela é tratada por diferentes autores. O professor pode não se sentir

confortável para a prática pedagógica, mas o uso das TIC é importante para o aluno, que

aprende a ler e interpretar o conteúdo de mídia.

É preciso que enfrentemos o desafio de sair da zona de conforto eventualmente

representada pela prática tradicional, sob pena de não mais atingirmos o aluno, que está

mergulhado nesse mundo infinitamente mais veloz e interativo do que costumam ser as aulas

expositivas tradicionais. Reconquistar esse aluno que foi seduzido pela tecnologia não é uma

tarefa impossível, contanto que a escola se predisponha a refletir sobre sua prática, acolhendo

novas experiências e transformando alguns de seus processos historicamente constituídos.

É nessa direção que podemos conduzir o uso das TIC para que se possa construir de

fato um saber mais amplo e inclusivo: “construção do saber, de enriquecimento moral e social

(...) cada aluno como ser humano à procura de si próprio, em reflexão conjunta com os demais

e com o mundo que o rodeia” (SILVA, 2001, p. 846).

O ponto crucial parece ser de fato este apontado por Silva (2001): fazer da utilização das

TIC um passo na reflexão mais ampla que permite ao aluno crescer como indivíduo e como

cidadão. Aqui ecoam de forma recorrente as palavras de Paulo Freire (1987), que colocava a

educação no horizonte moral do homem, como resposta à situação de injustiça advinda da

dominação.

Nesse contexto, uma das missões dos profissionais de educação é fornecer aos alunos

condições iguais para seu futuro profissional, que possa competir de igual com os opressores,

realmente uma missão muito árdua contra a qual a elite reage com força para que isso não

ocorra e para continuar a opressão: “daí a necessidade que se impõe de superar a situação

opressora. Isto implica o reconhecimento crítico, a “razão” desta situação, para que, através de

uma transformadora que incida sobre ela, se instaure uma outra, que possibilite aquela busca

do ser mais” (FREIRE, 1987, p. 46).

A tecnologia deve estar a serviço do conhecimento e do homem, e não o contrário. Só

assim estaremos de fato construindo as potencialidades humanas, que conduzem à liberdade.

No contexto desta investigação, liberdade é entendida como potencialidade de os alunos

usufruírem as tecnologias com acesso à internet de modo responsável, com o foco no ensino. O

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professor pode auxiliar com pequenas dicas ao usar software, mas o objetivo principal no uso

das TIC deve advir das necessidades do aluno.

Ao implementar e usar todos os meios que estão ao nosso alcance, não devemos

esquecer o caderno, o livro didático e as demais ferramentas de trabalho, que devem ser

pensadas e utilizadas em harmonia com as novas tecnologias. O potencial de cada uma precisa

ser considerado, a fim de que possam convergir para uma melhora no processo de ensino e

aprendizagem. Isso implica valorizar os meios tradicionais, a par dos novos meios tecnológicos,

permitindo ao professor uma permanente reflexão sobre os instrumentos de sua formação e sua

adequação aos desafios didáticos atuais.

Afinal, assim como o advento da televisão não significou o fim da rádio, e assim como o

advento da rádio não significara, mais lá atrás, o fim do jornal impresso, também o advento das

mídias digitais não deve significar o abandono das mídias tradicionais que eram utilizadas como

instrumento didático: a voz e o corpo do professor, o quadro negro, a lousa branca, o giz, os

pincéis, o livro impresso, o caderno... Enfim, a totalidade das ferramentas utilizadas antes do

advento das TIC precisa ser reavaliada, mas jamais abandonada. Elas representam importantes

ferramentas, ainda hoje, insubstituíveis até certo ponto: a voz e o raciocínio do professor são

ainda o instrumento mais eficiente e a tecnologia mais efetiva para a tarefa de ensinar, já que,

sempre que faltar energia elétrica, por exemplo, é a essas velhas e boas ferramentas que

voltaremos para com elas construir o conhecimento.

Definem-se de forma mais abrangente os recursos didáticos nesse processo, que podem

incorporar ainda: um cartaz, uma canção, uma apostila, um filme, um livro, um jornal, uma

página na web – todos eles podem ser objetos de aprendizagem. A integração das TIC no

currículo “ainda não aconteceu” (ALMEIDA; VALENTE, 2011, p. 69). E não aconteceu ainda

justamente pela tendência generalizada que temos de temer o novo e de nos apegarmos ao

conhecido. Nossa cultura escolar deve muito a essa tendência que, se por um lado garante a

autoridade e a transmissão, por outro tende a espantar as formas de inovação e de

experimentação. Contra essa tendência de apego às técnicas e métodos tradicionais, o docente

precisa se dar conta do universo em transformação à sua volta.

Eis um exemplo, trazido por Salman Khan:

Melhorar a proporção do tempo aluno/professor não exige necessariamente mais dinheiro, e sim boa vontade para repensar a metodologia usada. Se nos afastarmos da aula expositiva, os alunos poderão receber mais atenção individual e os bons

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professores terão a chance de se dedicar mais a fazer aquilo que primeiramente os levou ao ensino: ajudar as crianças a aprender. (2013, p. 124, grifo no original)

Com isso, o autor afirma que a questão da didática e da tecnologia são aspectos de um

assunto mais amplo, que inclui a organização do ensino para otimizar o processo de

aprendizagem. Às vezes, organizar o tempo de forma diferenciada no atendimento ao aluno já é

por si só uma resposta significativa para os desafios do ensino.

É certo que existem mudanças pontuais em algumas escolas. Para incrementar, é

preciso acelerar as mudanças em todos os segmentos, é preciso que as tecnologias possam ser

integradas no currículo. Para tanto, é preciso superar o debate sobre o bem ou mal inerente à

técnica: na verdade, ela serve o homem, e por isso exige que se pense sobre a finalidade que se

busca ao inseri-la no processo de ensino-aprendizagem.

A classe dos educadores ainda não se organizou para viabilizar propostas que façam

algo condizente. Os professores que estão na linha de frente, diante de 30, 40 alunos, aceitam

mudanças que foram feitas para eles e não por eles, de acordo com Weston e Bain (2010).

Esse parece ser sobretudo o resultado do conflito de gerações frente ao desafio

tecnológico. Como vimos, há natural defasagem entre os que nasceram na cultura do livro

impresso e da mídia eletrônica (rádio e tevê) e aqueles que já vieram ao mundo na era da

internet e da cultura digital (LÉVI, 1996; JENKINS, 2009). Mas essa diferença entre as gerações

não precisa significar necessariamente um abismo intransponível. As formações de professores

são momentos valiosos para se estreitar o vínculo entre as gerações, para a troca de saberes e

para a descoberta de novas perspectivas que incluem o uso das TIC. Tal uso não pode se

resumir ao que é tradicionalmente feito: via de regra, a subutilização de recursos, por imperícia e

falta de treinamento com as ferramentas tecnológicas.

É o que se verifica, por exemplo, no uso dos laptops como fonte direta de informação,

substituindo as fontes impressas como livro para produção de textos e, em grande parte, eles

substituem o lápis e o papel. Basicamente, transpõe-se de um meio para outro a mesma tarefa,

sem atentar para as potencialidades da nova mídia. Perde-se dessa forma as potencialidades

das TIC, que passam a ser meros registros digitais, simplesmente automatizando as velhas

práticas, ainda conforme Weston e Bain (2010).

Mas um laptop não é uma máquina de escrever com uma tela... Assim como a televisão

não é uma rádio com imagem. Cada mídia tem especificidades de linguagem, formas de

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percepção diferenciada por parte dos usuários, um “vocabulário” e uma “gramática” próprios. É

preciso aprender a utilizá-los de maneira adequada, se quisermos avançar para o uso criativo.

A verdadeira revolução está em uma mudança de atitude em relação ao processo de

ensino que deixa de seguir a linearidade típica dos processos unidirecionais – marcados pela

organização rígida, a disciplina e a hierarquia – e se abre para as potencialidades de um ensino

calcado no diálogo e na emancipação humana. A técnica passa a ser parte desse contexto, e

não fim último do processo.

Os desafios, como visto, são imensos.

Se há predisposição genérica em aceitar a novidade das TIC no horizonte das

discussões conceituais, há, por outro lado, barreiras reais que dificultam o acesso e a

familiarização com a tecnologia. Mas também vimos que essas dificuldades não são

inescapáveis: há diversas iniciativas que apontam para um meio-termo promissor, no qual a

experiência acumulada se soma à inovação trazida pelas TIC, com resultados promissores.

Esse é o caminho apontado por alguns pesquisadores (FAGUNDES, 2012; LIMA, 2012;

KHAN, 2013) que veem na intermediação tecnológica parte das respostas para as questões do

ensino nesta era da informação compartilhada e que apresentam sua própria visão da escola

nesse novo contexto:

A escola não seria um lugar de silêncio; seria mais uma colmeia que uma capela. Os estudantes que necessitassem de sossego poderiam buscar recantos privados. Mas o espaço maior estaria zunindo com jogos e atividades colaborativas. A aprendizagem em ritmo próprio, em vez de marchas uníssonas, estimularia os alunos a compartilhar suas descobertas mais recentes sobre os funcionamentos do universo. Aulas voltadas para o domínio meticuloso de conceitos – conceitos inter-relacionados – seriam ministradas em harmonia com a efetiva forma de conexão do nosso cérebro, e preparariam os alunos a funcionar num mundo complexo, onde não há mais lugar para “é bom o suficiente”. (KHAN, 2013, p. 247, grifos no original)

Trata-se de uma mudança de atitude em relação ao meio ambiente escolar, atitude essa

que passaria a considerar os instrumentos como parte da epistemologia do ensino, para então

considerá-los seriamente na construção de uma proposta didática. Só assim, parece-nos, é

possível avançarmos em direção a um ensino que acolha, para além da novidade eventualmente

representada pelo uso das TIC, as implicações epistemológicas desse uso para a área da

Educação.

Afinal, conforme a lição perene de Paulo Freire (1987), a educação é um processo

crítico, que implica na dinâmica permanente de aprender e ensinar entre os sujeitos envolvidos.

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A pedagogia do oprimido, como pedagogia humanista e libertadora, terá dois momentos distintos. O primeiro, em que os oprimidos vão desvelando o mundo da opressão e vão comprometendo-se na práxis, com a sua transformação; o segundo, em que, transformada a realidade opressora, esta pedagogia deixa de ser do oprimido e passa a ser a pedagogia dos homens em processo de permanente libertação. (1987, p. 57)

Para que tal libertação pelo ensino seja possível, é necessário considerar também a

dimensão da tecnologia, pois ela de igual forma oferece possibilidades de reverter os processos

historicamente opressores, representados pela padronização do pensamento, o desperdício de

tempo em tarefas de mera reprodução, a obediência cega à autoridade do mestre, conforme

depreendemos da visão de Salman Kahn (2013). Superar as visões negativas do uso das TIC é

um primeiro e importante passo nessa direção; superar o “deslumbramento” com a técnica é o

passo complementar nessa mesma direção.

Neste sentido, na busca do saber com as TIC, há uma maior interação com objetivos

desafiadores do orientador com os orientados em compreender a magnitude do mundo,

especificamente na disciplina de História, onde desenvolverão uma consciência mais crítica e

inserida aos fatos estudados, transformando-se em um novo patamar de cidadão.

Mas é preciso, para tanto, avançar, encarando as deficiências e buscando alternativas

para uma educação libertadora. Nesse sentido, a reflexão sobre as TIC deve, a nosso ver, inserir-

se no quadro mais amplo da reflexão sobre a Educação, sem se furtar à análise das

especificidades incidentes no uso da tecnologia em cada disciplina.

Retomando o autor que citamos no início deste segmento, ele faz menção ao uso

consciente da tecnologia como a chave que pode mudar o ensino.

O que tornará possível atingir essa meta é o uso consciente da tecnologia. Vou enfatizar: uso CONSCIENTE. Claramente, acredito que a aprendizagem e o ensino aprimorados pela tecnologia são a nossa melhor chance para um futuro educacional acessível e equitativo. Mas a questão-chave é como usar a tecnologia. Não basta botar um punhado de computadores tablets dentro da sala de aula. A ideia é integrá-la à forma como ensinamos e aprendemos. Sem uma integração significativa e criativa, a tecnologia em sala de aula pode vir a ser apenas mais um artifício muito caro. (KHAN, 2013, p. 125, grifos no original)

De que forma escapar à armadilha que se apresenta na adoção indiscriminada de

tecnologia, só para acompanhar o fluxo das novidades?

A reflexão tem de guiar o processo. Vimos que diversos autores têm se debruçado sobre

o tema, a fim de extrair as lições que vão ser perenizadas para as gerações futuras.

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Foi essa reflexão que buscamos fazer no presente capítulo, para mostrar tanto a

pertinência de uma visão que vê a tecnologia entrelaçada ao processo educativo ao longo do

tempo histórico, como também para compreender os principais pontos do debate que vem

sendo feito sobre esse tema.

A consciência de que a técnica é uma parte do processo e não o todo ajuda a dar a ela

a devida dimensão. Afinal, a escola segue sendo uma instituição fundamental para a formação

do ser humano, mais do que nunca nas sociedades altamente complexas, mas tal papel precisa

do olhar renovado dos educadores para as questões da tecnologia, sob pena de a realidade

ultrapassar a escola e esta se tornar irrelevante para os desafios que ora se apresentam.

A nosso ver, a experiência histórica precisa ser valorizada, a par da adoção das TIC:

uma dimensão não anula a outra. É possível avançar colhendo o melhor que ambas têm a

oferecer, como demonstram algumas iniciativas promissoras (SNYDER, 2002; LIMA, 2012;

KHAN, 2013). E isso tudo deve estar ancorado na realidade de cada escola, a fim de não

descurarmos das carências estruturais de regiões e países pobres, onde a tecnologia é ainda

restrita à elite.

São diversas as questões que merecem atenção no debate acerca do uso das TIC em

sala de aula. O que trouxemos aqui foi apenas uma parte, para podermos avançar em nossa

investigação.

Diferentes áreas do conhecimento apresentam potencialidades diversas de uso das TIC.

No próximo capítulo, vamos focar nosso olhar sobre a área de nossa investigação, analisando a

relação entre as TIC e o ensino da História.

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3 AS TIC E O ENSINO DE HISTÓRIA

No caso das aulas de História, o uso da tecnologia oferece imenso potencial, talvez mais

até do que se verifica em outras áreas do conhecimento. O fato de tradicionalmente a História

resultar do registro oral e escrito e ser sistematizada de maneira escrita parece ter relação com

esse potencial. As histórias contadas no ambiente familiar, as narrativas que povoam a televisão

e o cinema, o mundo encantado dos livros: tudo conflui para que a história seja objeto do

interesse das pessoas comuns, fora do âmbito do ensino.

Walter Benjamin (1980) desenvolveu uma reflexão muito interessante sobre o narrador

que pode nos inspirar na direção de um entendimento: este se faz presente na cultura quando o

homem, até então um aventureiro, se torna sedentário, olha para o passado e conta o que viveu.

A empatia trazida por uma boa história tem apelo universal. Mas contá-las exige talento e

técnica, seja para o contador tradicional, que mantém sua audiência presa à tensão que

imprime em cada gesto e tom de voz, seja para o professor de história, que afinal tem o desafio

de narrar de forma sistemática mantendo o interesse de sua turma.

Nesse sentido, há várias questões que podem ser destacadas quando consideramos o

uso das TIC no ensino de História. No presente momento de nossa investigação, vamos deitar

nosso olhar para dois pontos centrais: o primeiro deles, em “As fontes e as TIC”, é a discussão

sobre a natureza e a validade das fontes históricas nesse contexto de grande questionamento

sobre a verdade factual. Tal é a importância dessa questão, que também a abordamos em um

subitem específico, “Fake news, credibilidade e construção da história”, para compreendermos

melhor o impacto dela sobre o ensino. Num segundo momento, no item “As TIC e as

narrativas”, veremos como o uso das TIC tem impactado sobre a narrativa histórica que vem

sendo construída em sala de aula.

Como vimos, o potencial do uso das TIC na disciplina de História é grande. Veremos, na

próxima seção, de que forma esse uso tem impactado nos métodos de construção do

conhecimento histórico, a começar pelo impacto das TIC sobre a pesquisa histórica junto às

fontes.

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3.1 As fontes e as TIC

Como vimos, uma questão que merece atenção para a disciplina de História diz respeito

ao uso das fontes históricas. A autoridade das fontes tem sido constantemente questionada no

contexto da comunicação online. A facilidade de acesso aos buscadores da internet é parte da

explicação. Hoje qualquer pessoa com acesso à internet pode pesquisar num banco de dados

virtualmente infinito, acessando buscadores como o Google ou redes sociais como o Facebook e

o WhatsApp.

Nas sociedades tradicionais, a autoridade das fontes estava relacionada à antiguidade. A

memória era apanágio dos mais velhos, que detinham o poder sobre o grupo justamente por

trazerem os ensinamentos de um tempo pregresso sagrado, inacessível aos mais novos.

A reverência com que os velhos eram tratados mesmo na sociedade letrada é ilustrada

de forma primorosa no romance “O nome da Rosa”, de Umberto Eco.

Figura 5 – Cena do filme “O Nome da Rosa”, de Jean-Jack Annaud (1986)

Fonte:http://1.bp.blogspot.com/

Vemos ali o peso dado à autoridade dos anciões que dominavam o mosteiro, e que se

dedicavam a manter a leitura dos clássicos gregos sob o rígido e sisudo olhar do catolicismo.

Aqui ainda estamos na indefinição relativa entre o que é lenda, o que é misticismo e o que é

realidade. As fontes históricas competem com uma variedade de outras fontes, tão ou mais

poderosas do que elas. A autoridade maior ainda compete à tradição, e seu arauto se identifica

com o mais velho.

Tal autoridade migrou ao longo dos séculos para a palavra escrita, o livro em especial:

ele se tornou a fonte mais confiável do registro histórico, a ponto de muitas pessoas acreditarem

em algo pelo simples fato de esse algo estar em letra de fôrma.

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A “luta” entre a autoridade da palavra falada versus a da palavra escrita ilustra,

conforme alguns estudiosos, cosmogonias distintas: o mundo cíclico e mítico das sociedades

arcaicas versus o mundo histórico das grandes religiões monoteístas (PAGLIA, 1992; ELIADE,

1992; 2001). Mas ilustra também, conforme podemos observar no exemplo do romance de Eco,

a questão sobre a autoridade das fontes históricas.

Para o mundo arcaico das sociedades tradicionais ágrafas e também para o mundo

antigo grego e romano, a autoridade dos anciões não oferecia opção: dever-se-ia aceitá-la e

ponto final. A fonte última era sagrada ou divina: foi dela que a palavra, falada ou escrita, chegou

até o demiurgo que a tornou manifesta.

Com o avanço das sociedades e o lento despertar da racionalidade e do método

científico, esse estado de coisas naturalmente se modificou. A fonte da informação histórica foi

sendo esquadrinhada em sua materialidade, cada vez mais sujeita à revisão e ao

questionamento crescentes (GOODY, 2012). A incerteza quanto à autoridade da fonte abriu as

portas para a crescente certeza do método científico.

À medida que os instrumentos e as formas de registro da realidade foram se

aprimorando – a escrita, o som, a imagem –, as fontes passaram a ter uma outra abordagem.

Agora, não é a memória dos mais velhos que detém o monopólio da autoridade, mas sim os

registros materiais deixados pelas gerações pregressas. É a eles que o historiador recorre

quando quer encontrar a informação precisa e exata: arquivos, documentos, cartas, livros etc.

A memória ainda tem seu valor, sobretudo como dimensão humana a ser entendida

pela historiografia. Os registros dedicados à história oral recuperam e preservam essa dimensão.

Aqui, temos as fontes que efetivamente presenciaram os fatos históricos, chamadas a dar seu

testemunho e suas impressões acerca deles. É o que vemos, por exemplo, no tipo de relato

histórico construído pela historiadora Ecléa Bosi em seu livro “Memória e sociedade: lembrança

de velhos” (1994).

Não se trata de uma obra com proposta de amostragem: o intuito que me levou a empreendê-la foi registrar a voz e, através dela, a vida e o pensamento de seres que já trabalharam por seus contemporâneos e por nós. Este registro alcança uma memória pessoal que [...] é também uma memória social, familiar e grupal. (BOSI, 1994, p. 37)

Ao chamar o testemunho dos trabalhadores de São Paulo, Ecléa Bosi centra seu foco

nos depoimentos dos velhos que viveram aquele período – a primeira metade do século XX. Com

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isso, incorremos em uma seara que traz a dimensão afetiva do relato: as memórias ligadas à

vida familiar, à infância, à rotina do trabalho... A escolha das fontes desses relatos é um fator

crucial: para compor um painel humanizado do trabalho naquele período histórico, a

pesquisadora teve de recorrer a um grupo variado de atores sociais, em uma faixa etária já bem

avançada em idade – acima dos 70.

O critério para seleção das fontes, aqui, passa pelo testemunho de terem vivido

determinado período histórico, na condição de trabalhadores: isso constituiu o fio condutor para

a coleta dos depoimentos, todos feitos de forma oral, a partir das conversas e entrevistas, todas

elas marcadas pela abordagem informal, sem que a pesquisadora ficasse presa a um roteiro

predefinido.

A técnica ou método da história oral serve a pesquisadores de áreas como a história, a

antropologia e a sociologia (HAGUETTE, 1992) e está no rol das metodologias qualitativas em

ciências sociais. Compreende as conversas, a realização de entrevistas abertas e o registro da

ambiência que cerca a fonte que está sendo ouvida: todos esses elementos confluem para

recriar as condições em que as informações foram obtidas, o que inclui a dimensão humana da

própria fonte entre os registros.

Ao observarmos esse método, que tem grande uso nas ciências sociais e humanas,

algumas considerações devem ser feitas. A primeira delas diz respeito à necessidade de

considerar a abordagem humanizada das fontes, pois só assim se consegue acessar o relato

afetivo do passado (MEDINA, 2006). A segunda consideração se refere ao caráter eventualmente

falho da memória. Aqui não se está buscando propriamente a verdade factual, mas sobretudo o

impacto gerado pelos fatos sobre a fonte consultada.

Até que ponto uma falha da memória não revela mais do que revelaria a informação

precisa? Se atentarmos para as lições da psicanálise (FREUD, 2006), que vê pistas significativas

nos erros comuns da linguagem cotidiana, temos um indício significativo também nas eventuais

falhas mnemônicas das fontes... Tal “falha” é na verdade um trunfo em certo sentido, e é

nesses termos que, novamente, Ecléa Bosi as defende:

Não dispomos de nenhum documento de confronto dos fatos relatados que pudesse servir de modelo, a partir do qual se analisassem distorções e lacunas. Os livros de história que registram esses fatos são também um ponto de vista, uma versão do acontecido, não raro desmentidos por outros livros com outros pontos de vista. A veracidade do narrador não nos preocupou: com certeza, seus erros e lapsos são menos graves em suas conseqüências que as omissões da história oficial. (BOSI, 1994, p. 37)

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A depender dos objetivos do relato, a questão sobre a veracidade das informações deve

ser relativizada – até porque a verdade segue sendo relativa para a ciência em geral e para as

ciências sociais e humanas em especial.

Figura 6 – Observador e observado: as fontes não são neutras

Fonte:http://samael.org/

Seja como for, há de se considerar as questões epistemológicas e metodológicas que

estão implicadas nesse ponto de escolha das fontes e de sua confiabilidade.

Tudo isso serve para que possamos atentar em nossa prática docente para a atenção

necessária na construção da metodologia da investigação histórica. Há aspectos riquíssimos nas

mais variadas questões, a começar pela decisão sobre quem ouvir. Serve também para não nos

esquecermos de que, apesar do avanço técnico, há assuntos que devem ser pensados de forma

contextual, e que apontam para recursos e fontes às vezes deixadas em segundo plano.

Para muitos, nem passa pela cabeça fazer uso da memória e das vivências das pessoas

que, avançadas em idade, são a memória viva da sociedade. As fontes ouvidas pelo método da

história oral não nos deixam esquecer uma lição singela: se é experiência humana, tem interesse

para o registro histórico. Entrevistar o avô que vivenciou e participou do clima político em sua

juventude, a bisavó que foi pioneira no trabalho feminino, o mendigo que foi testemunha da

mudança na paisagem urbana – são todas histórias que ficariam relegadas ao silêncio se essas

fontes forem ignoradas. O relato que pode vir de cada uma delas tem valor inestimável para a

preservação da memória e a reconstituição da história, e sem a exigência de grandes recursos

financeiros para sua obtenção.

Via de regra, no entanto, os relatos mais importantes provêm justamente das fontes que

não são oficiais. Por não estarem comprometidas com a verdade oficial, elas trazem pontos de

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vista que são menos afetados pelo viés ideológico corrente. Em cima desses relatos é que

costumamos observar a face mais crua e real do mundo, que a historiografia oficial e o status

quo costumam “editar”. O impacto dos relatos contidos em documentos como fichas médicas e

registros demográficos (FOUCAULT, 1978; 1987), que marcaram a historiografia e a

antropologia contemporânea, vêm justamente do recurso às fontes não oficiais e à voz dos até

então ignorados. Daí a importância de dar voz para essas parcelas até então excluídas da

narrativa oficial, tarefa que foi cumprida até o momento pelos pesquisadores que se ocupam da

busca pela verdade histórica – jornalistas, historiadores, antropólogos, sociólogos etc.

Até aqui consideramos a questão das fontes a partir do registro oral, tomado como

ponto de partida de grande importância para o relato histórico. Com base nesses registros,

concomitante ao testemunho de quem presenciou o acontecimento, temos um aspecto crucial

da discussão acerca das fontes de informação histórica. A oralidade é o domínio do afeto, da

invenção e da reação ao entorno – o que acaba por marcar os depoimentos e registros obtidos

por tal método. É preciso ter consciência da relação entre o meio utilizado e os efeitos que ele

implica – na lição de McLuhan, “o meio é a mensagem”.

Vale notar que agora, com os recursos que a tecnologia possibilita – a gravação de som

e imagem sendo muitas vezes a porta de acesso ao registro permanente dos que não têm

educação formal –, temos a eclosão do registro oral feito pelas próprias fontes que antes só nos

eram acessíveis mediante o trabalho do pesquisador.

Como vimos, a revolução da internet e das mídias sociais trouxe a oralidade para o

primeiro plano novamente, sem a necessidade de passar antes pela transcrição... A volta a essa

comunicação mais imediata e pautada pelo ritmo da fala tende a instaurar uma outra lógica de

trocas simbólicas. Abrem-se diversas linhas de questionamentos possíveis sobre as fontes

impregnadas da oralidade: como o contexto afeta o registro, qual a relação entre a palavra falada

e a escrita, qual a credibilidade que deve ser dada para o relato produzido dessa forma. Refletir

sobre esses pontos com a turma ajuda a aprofundarmos nossa prática como docentes e

historiadores e a compreender o impacto que as TIC podem ter sobre a construção do relato

histórico.

As fontes escritas, por sua vez, trazem a variável da permanência e da constância para o

primeiro plano. A partir do momento em que a palavra escrita entra em cena, como vimos no

capítulo anterior, muda a relação do homem com o mundo a sua volta (GOODY, 2012). A

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memória passa a ser esquadrinhada, depurada e analisada com base no registro, o que a torna

mais precisa e verificável pelo grupo de indivíduos dedicados a contar a história.

Isso não significa obviamente que o relato histórico escrito será certeiro ou indubitável.

Significa sobretudo que ele pode se amparar em um meio menos instável do que a memória ou

o relato oral. Afinal, a fala precede a escrita, e não o contrário. Tudo o que está materializado

nos textos saiu da mente humana – embora a cultura material em que estamos mergulhados,

eivada do conhecimento livresco, faça-nos constantemente esquecer esse truísmo.

Em sala de aula, o livro didático costuma ocupar esse lugar relevante de referência para

a verificação da constância das informações. É a este registro escrito que via de regra professor

e aluno costumam voltar, amiúde, para se certificar da correção dos conteúdos estudados.

As fontes escritas que se concentram no livro didático permitem sistematizar uma série

de informações que, de outra forma, seria difícil reunir e transmitir. As grandes narrativas que

deram sentido para a trajetória humana – como por exemplo a explicação psicanalítica, o

estruturalismo, o marxismo etc. – talvez tenham tirado muito de sua força explicativa da

autoridade que a fonte escrita transmite. Afinal, a palavra acabada, impressa, finalizada em uma

página de livro foi o veículo milenar da transmissão cultural em nossa sociedade. Durante muito

tempo, pelo simples fato de estar escrito, era tido como verdadeiro.

Aliás, para muitos, o que está escrito nos textos sagrados tem o selo da Verdade literal e

absoluta ainda hoje, avançados que estamos no tempo da racionalidade. A autoridade que

preside à interpretação das escrituras sagradas pode muito bem ter se comunicado aos novos

sacerdotes de nossa era predominantemente laica – professores sendo talvez os principais

representantes desse grupo.

O tempo longo de produção de uma obra escrita ajuda a explicar tal fenômeno: eram

poucos os que tinham os meios de materializar seu pensamento em texto escrito antes do

avanço tecnológico que trouxe as impressoras para dentro de casa. O processo de edição de

uma obra escrita consiste em diversos “filtros”, que ajudam a testar a veracidade das

informações: conselhos editoriais, pares científicos, revisores, especialistas ad hoc... Para chegar

à publicação, o processo de produção das narrativas históricas era naturalmente hierárquico, até

mesmo elitista.

O aluno e o professor da disciplina de história certamente se inserem nesse processo

que subjaz à adoção do livro didático como fonte das informações históricas. A confiabilidade

que se atribui à informação tem relação direta com a certeza sobre a autoridade de quem

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escreveu, o que por sua vez deve ser documentado sob as formas canônicas do método

científico: citações com fontes referidas, rol de autores e documentos citados, contraste entre

diferentes pontos de vista, entre vários outros recursos de que se serve o pesquisador para

construir sua pesquisa e seu relato.

O que queremos salientar nesse ponto, quando estamos considerando as fontes escritas

em sua relação com as TIC, é o fato de que elas carregam consigo características ligadas ao

suporte em que se materializam: a possibilidade de verificação e contraste de diferentes versões,

a permanência ao longo do tempo, a necessidade de eventuais ajustes na interpretação para

adequá-la à realidade mutante. Seja como for, nos cerca de quinhentos anos de reinado da

palavra impressa pós-Gutenberg, as sociedades contemporâneas conheceram o poder da

organização pela palavra escrita (McLUHAN, 1979; KHAN, 2013), e a História, como ramo do

saber, depurou seus métodos de escolha das fontes também amparada nas características do

suporte escrito.

Mas a trajetória relativamente linear desse processo teve um ponto de inflexão nas

décadas recentes.

A incorporação das Tecnologias de Informação e Comunicação às rotinas didáticas da

disciplina de História trouxe desafios consideráveis e novas questões para a discussão sobre as

fontes. Isso porque a comunicação online e o surgimento das redes sociais colocaram em cena

novos elementos, relacionados com a mudança do processo de comunicação, como vimos no

capítulo precedente: dispersão do polo emissor, “horizontalização” do processo, questionamento

da hierarquia etc.

O quadro é bastante diverso do cenário anterior, em que a autoridade do historiador se

apoia no relato livresco e na referência aos arquivos institucionalizados – bibliotecas, coleções,

museus etc. Agora, a tecnologia possibilita, no limite, que cada indivíduo perscrute a superfície

do planeta de maneira independente, recolhendo dados e construindo versões a partir dessas

iniciativas.

Grandes redes colaborativas, que reúnem pesquisadores do planeta inteiro, viraram a

nova base de coleta e troca de informações científicas (LÉVY, 1999; JENKINS, 2009). A

biblioteca universal, sonhada pelos sábios desde a Antiguidade, hoje existe e está disponível de

graça para quem tem acesso à internet: chama-se Google no ocidente. O sonho iluminista de

construir a Enciclopédia reunindo todo o conhecimento do mundo também se materializou:

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chama-se Wikipedia e é construído por especialistas do mundo inteiro que colaboram de forma

voluntária, em um processo permanente de construção.

A conexão, a colaboração e a interatividade passam a ditar a dinâmica da produção do

conhecimento em todas as áreas. Vamos de uma concepção que via no saber livresco o ponto

final da cadeia do saber para outra, bem diversa, na qual o conhecimento parte do saber livresco

– e dos demais suportes como vídeo, áudio, foto, sites etc. – para ser aplicado a situações

concretas, em que se faz necessário (KHAN, 2013).

O tempo da comunicação se acelerou de forma exponencial, como observam diversos

pesquisadores (LÉVY, 1999; JENKINS, 2009; RECUERO, 2009). O impacto disso sobre a

produção do conhecimento é inaudito. As velhas formas de aprender estão aos poucos perdendo

o sentido – se o aluno pode acessar virtualmente tudo em seu celular, por que ir à sala de aula?

Se pode acessar em casa aulas disponibilizadas de graça por um canal do Youtube, por que iria

se deslocar para uma escola particular para receber igual conteúdo, porém pago?

As TIC impõem sua presença em todas as áreas, causando o que muitos chamam de

“disfunção” nos modos de produção – uma mudança tão brusca que os desorganiza sem que

tenham tempo de se adaptar.

Os melhores esforços que atualmente estão sendo feitos apontam para a necessidade

de adaptar as antigas formas de aprendizagem às novas linguagens e procedimentos trazidos

pelas TIC. Perceber o que a disciplina em questão tem a contribuir nesse novo cenário é crucial.

No caso da disciplina de História, acreditamos que a discussão sobre as fontes é um dos pontos

que podem ser aprofundados, pois as TIC impactam diretamente na credibilidade da informação

construída, e ao historiador compete refletir sobre esse impacto e apontar caminhos para

superar as incertezas.

Dessa forma, no cenário atual das TIC e da comunicação digital, o que está escrito nos

livros passa a ser, mais do que nunca, relativizado. As fontes ouvidas eram de fato as mais

relevantes para a temática estudada? Havia outros pontos de vista que ficaram de fora? Quais?

As fontes que porventura ficaram de fora apresentam versão diferente? Em que sentido? E por

que foram escolhidas as primeiras e não as segundas para compor a lição? Eis algumas das

questões com que os pesquisadores e professores começam a se deparar quando as TIC se

tornam acessíveis aos alunos, dentro e fora da sala de aula.

Para respondê-las, exige-se uma reflexão sobre esse intermediário que se fez tão

presente nos últimos tempos – a tecnologia. Ignorar aquelas questões é deixar de fora o que

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está no centro do interesse dos alunos; enfrentá-las passa, a nosso ver, pela concepção das TIC

como mais do que um mero intermediário: elas de fato alteram a relação didática e interferem

na epistemologia da disciplina e do campo de saber da História.

A variedade de fontes de informação para a pesquisa prévia é inaudita e se amplia

constantemente. Se, por um lado, isso representa um ganho, dada a possibilidade de contrastar

diferentes versões, por outro representa um risco, dada a dificuldade de verificação e checagem

dos registros.

O que fazer diante de tal impasse?

A nosso ver, a discussão sobre as fontes históricas pode ser enriquecida pela variável

representada pelas TIC. Em vez de percebê-las como elemento estranho que tende a solapar a

autoridade, elas podem servir como um ponto de reflexão sobre como o conhecimento histórico

é construído. Como se chega ao cânone em diferentes culturas? Quais os registros que serviram

de base para as informações trazidas pelas fontes ouvidas? Como avaliar a veracidade de

informações contraditórias? São perguntas que podem guiar essa reflexão, e que certamente vão

possibilitar o aprofundamento das questões que a História pode colocar para os alunos.

É nessa direção que apontam diversos pesquisadores que têm refletido sobre as TIC

(ALARCÃO, 2008; LIMA, 2012; KHAN, 2013): compreender o que significam em termos

epistemológicos, para além do seu uso instrumental. Expandir nosso entendimento sobre os

processos de aquisição de conhecimento. Repensar nosso mecanismo de percepção. Instaurar

uma atitude de curiosidade, questionamento e criatividade.

O que não se pode é prosseguir na atitude tradicional como se ainda vivêssemos num

mundo sem internet ou redes sociais. Isso só faz contrastar a realidade que o aluno encontra

dentro e fora da sala de aula – em clara desvantagem para a versão apresentada dentro da sala.

No Brasil, os problemas estruturais enfrentados pela educação (LIMA, 2012), sobretudo

o baixo desempenho nos testes internacionais, tendem a se acentuar com a dificuldade

representada pela mudança de ambiente tecnológico. Importante, então, acompanhar com

muita atenção as consequências advindas da transformação tecnológica sobre a didática. No

caso da disciplina de História, a chegada das TIC, sobretudo os meios online de comunicação,

colocou em questão desde o início a seleção das fontes.

A crise de autoridade das narrativas contemporâneas tem relação direta com o

questionamento das fontes tradicionais de informação, na esteira das transformações

tecnológicas das últimas décadas. Ficou mais fácil questionar a autoridade, mas nem por isso há

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garantias de que nos aproximamos da verdade histórica – pois esta segue sendo uma questão

filosófica de fundo, para além de um parâmetro fundamental para a organização da vida prática.

Recentemente, as dificuldades foram ampliadas, com a disseminação em nível global

das chamadas fake news – notícias falsas, construídas de maneira a parecerem verdadeiras,

pois imitam o formato tradicional das notícias. Diversos pesquisadores têm abordado o

fenômeno das fake news (DALMAZO; VALENTE, 2018; MARDA; MILAN, 2018), todos

legitimamente preocupados com o impacto potencial da disseminação de mentiras, boatos e

falsidades em escala global. Dada a sua implicação para o debate sobre as fontes históricas, o

assunto merece um olhar mais atento. É o que faremos a seguir.

3.1.1 Fake news, credibilidade e construção da história

Vamos começar por uma definição. As fake news consistem em notícias produzidas com

a intenção explícita de distorcer a verdade (DALMAZO; VALENTE, 2018). Elas não se confundem

com outros fenômenos semelhantes, como é o caso das paródias, cujo objetivo central é o

entretenimento. A finalidade das notícias falsas é justamente confundir a audiência, em nome de

um ponto de vista ou ideologia, da má-fé ou do voluntarismo de quem as produz. Pretende-se

com isso usar a informação como arma no embate ideológico, não como peça do quebra-cabeça

da verdade.

As notícias falsas ou fake news, como estão sendo chamadas mesmo em português,

merecem um destaque proporcional ao seu efeito nos últimos acontecimentos em nível mundial.

Recapitulando, teríamos, apenas nos cinco anos precedentes, os seguintes fatos que teriam sido

impulsionados ou mesmo totalmente construídos a partir das fake news: vitória de Donald

Trump na eleição presidencial nos Estados Unidos, saída do Reino Unido da União Europeia,

vitória de Jair Bolsonaro no Brasil. Isso para ficarmos nos mais conhecidos, aqueles que têm

dimensão política e que, portanto, afetam a vida de milhões de pessoas no mundo todo.

Desde que as redes sociais passaram a ser usadas como arma política, a presença das

fake news se tornou uma questão incontornável para o debate público. No centro desse debate

está a questão da verdade e do que ela representa para a democracia (GUROVITZ, 2016). Afinal,

como bem sabemos, a verdade tem um valor em si mesmo, servindo como correspondência

entre a percepção e o mundo externo. Essa correspondência, que acaba por guiar a ação

humana, é o que tem servido como base para a ciência e a organização das sociedades

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seculares. É uma acepção que concorre com a tradicionalmente associada à política. É o

jornalista Helio Gurovitz (2016, p. 1) quem lembra que há

duas acepções distintas para a palavra verdade. Simplificando um debate ainda em curso entre filósofos sobre como distingui-las, uma verdade pode ser chamada de “factual”. A outra, de “racional”. A primeira é incontestável, deriva de raciocínio lógico, conhecimento científico, testemunhos e provas documentais. A segunda, de interpretações e valores – está sujeita a debate.

A primeira tem por base os fatos verificáveis mediante registro; a segunda se assenta na

argumentação, no debate de ideias. Mas a fronteira entre as duas passou a ser objeto de

discussão recentemente: há gente que questiona por exemplo a existência do Holocausto,

ignorando todas as provas acumuladas da existência dele.

Como consequência perniciosa dessa situação que ganhou fôlego com o advento das

redes sociais, as novas gerações correm o risco de desprezar a verdade construída por cientistas

e historiadores, adotando em seu lugar aquela que lhes parecer mais conveniente. O

revisionismo coloca em xeque as profissões que se dedicam a trabalhar com a verdade – entre

elas a História.

O movimento de reescrever a História a partir de sua própria conveniência já é

conhecido de todos aqueles que detêm um mínimo de conhecimento... histórico. É o que nos

lembra ainda Gurovitz, relembrando a política de “apagamento” dos adversários adotada pela

ditadura do proletariado na União Soviética e estendendo tal entendimento ao que se passa na

política contemporânea:

É por isso que reescrever a história, a ponto de apagar das fotos a imagem dos assassinados nos expurgos, era tão importante para Stálin. Também por isso, faz sentido que políticos denunciados na Operação Lava Jato, como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou o ex-deputado Eduardo Cunha, contestem os fatos com tanta veemência e desfaçatez. Ou que o presidente-eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, minta com tamanha cara-de-pau. Eles não estão no jogo da verdade, mas no jogo do poder. Disfarçar mentiras ou opiniões de verdades factuais é um modo extremamente eficaz de persuasão, ingrediente essencial para a conquista e o exercício desse poder. (2016, online)

O grande problema dessa tendência de reduzir tudo à opinião e ao ponto de vista é que

ela solapa a base sobre a qual se erguem áreas que trabalham com a verdade factual, como é o

caso da Justiça, do Jornalismo, da História, da Filosofia e tantas outras. Elas estão interessadas

na verdade factual e não na dita verdade racional – que se ocupa de pontos de vista acerca dos

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fatos. Seguindo o mesmo autor em sua explanação, ele pontua a diferença entre as

perspectivas:

A diferença é que, enquanto os políticos ou aqueles que vivem de opiniões e persuasão querem mudar o mundo, dar-lhe a melhor forma segundo seus interesses, crenças e ideologias, quem se ocupa da verdade factual – filósofos, cientistas, acadêmicos, juízes, jornalistas e, espera-se, hoje também programadores – não pode nem mesmo se arrogar o dever de travar uma luta que é, em sua essência, interna ao universo da política. [...] O trabalho de todos eles, embora fundamental para a saúde do ambiente político, está, por definição e necessidade, fora dele. Exige “não-compromisso e imparcialidade, liberdade de interesses privados no pensamento e no julgamento”. São na maioria profissões cuja necessidade é óbvia, reconhecida pelos próprios políticos e defendida nas constituições democráticas. (2016, online)

O diagnóstico feito pelo autor ajuda-nos a entender o que se passa atualmente com a

verdade na História. Embora dedicando-se ao jornalismo no texto em análise, Gurovitz estende

suas conclusões para áreas afins, como é o caso daquela em que atuam os historiadores. E

conclui que a crise por que passam as áreas que se ocupam da verdade factual tem relação

direta com a mudança tecnológica das últimas décadas. Novamente, estamos falando sobre TIC.

De fato, o surgimento da internet e das redes sociais deu vazão a uma série de

fenômenos que, olhados sob a perspectiva do historiador, trazem questionamentos aos cânones

da profissão.

No caso do ensino da História, as preocupações estão centradas no debate acerca da

reescrita do passado por parte de segmentos radicais, a par do necessário debate acerca da

legitimidade de um olhar mais plural sobre o registro histórico. Pois se de um lado há um

legítimo movimento de reescrita da história, a partir da versão dos segmentos que foram

alienados pela historiografia “oficial” – como os negros, as mulheres, os gays etc. –, de outro

lado, e mais recentemente, há uma crescente insurreição contra os parâmetros que definem a

verdade histórica e científica.

É preciso distinguir entre o revisionismo legítimo das minorias que foram historicamente

caladas pela versão oficial e o revisionismo ilegítimo dos grupos extremistas que tomaram o

debate público nos últimos anos.

Movimentos de negação de fatos históricos como o Holocausto durante a Segunda

Guerra Mundial já são objeto de grande preocupação entre os estudiosos de todos os quadrantes

(GUROVITZ, 2016; ORTELLADO, 2018; MARDA; MILAN, 2018). Questiona-se, nesse revisionismo

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espúrio, a própria noção de verdade, que passa a ser relativizada em prol de interesses

presentes de grupos em busca de poder.

Outros movimentos há que questionam inclusive o fato cientificamente comprovado de

que a Terra é redonda. O chamado movimento terraplanista já angariou uma série de seguidores

no mundo todo, e eles se mostram infensos à lógica da ciência, por mais que sua crença na

terra plana seja negada pelos fatos científicos (GOES, 2019).

Figura 7 – Site oficial do movimento terraplanista

Fonte: https://theflatearthsociety.org/home/. Captura de tela.

Tudo isso seria cômico se não fosse trágico, na medida em que tais pessoas podem,

quando em posição de poder, cercear o pensamento racional e o método científico.

Até que ponto é legítimo questionar o registro histórico e as fontes documentais em

nome desse relativismo? E o que essa situação pode nos ensinar sobre a relação entre as TIC e

a História?

Para começar, ela pode nos auxiliar a reavaliar o nosso fazer como historiadores, a partir

da percepção de que a disseminação de novas tecnologias, por si só, tem um alto poder de

mudança sobre o conhecimento. O questionamento suscitado hoje em dia diante dos mais

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prosaicos fatos que há décadas eram dados como inquestionáveis é ele mesmo um tema para

ser explorado na reflexão sobre o impacto que as TIC podem ter sobre o mundo e o

conhecimento. Qual o limite entre a opinião e o fato?

A nosso ver, seja qual for o limite, é imprescindível que avaliemos a noção de fontes

históricas e que reflitamos, junto com os alunos, sobre o que faz a legitimidade de uma

determinada fonte.

Por exemplo, é necessário refletir sobre o papel das instituições nesse processo de

escolha das fontes confiáveis: assim como os institutos de pesquisa e a imprensa séria ainda

ocupam um lugar de autoridade privilegiado em relação a outras fontes, é preciso entender por

que as coisas são assim. Uma das razões, que nos parece um ponto de partida interessante

para o debate com a turma da disciplina de História, é o processo de controle e de avaliação

exercido pelos pares.

Por mais que haja possibilidade de questionamentos sobre a verdade factual que

embasa o registro do historiador, há também uma série de fatores que contribuem para

fortalecê-la. É o caso, por exemplo, da pressão exercida pelos pares e pela opinião pública, em

se tratando de institutos de pesquisa científica e da imprensa tradicional respectivamente.

As instituições podem servir como filtros – embora não infalíveis – das notícias falsas,

na medida em que funcionam com base em lógica distinta da comunicação das mídias sociais.

O tempo, o contexto comunicativo, os órgãos dos sentidos – tudo funciona em outro registro, e

essa diferença é fundamental para que se entenda a relação com a verdade subjacente a cada

processo comunicativo.

Ao nos depararmos com uma notícia produzida pela imprensa tradicional, por exemplo,

podemos indagar acerca do trabalho de produção daquela notícia – a equipe responsável, o tipo

de procedimento, a linguagem utilizada. O mesmo pode ser feito ao analisarmos um artigo

científico, publicado em revista especializada: como é feita a seleção dos textos, quais os autores

que são referenciados na bibliografia, quais os procedimentos metodológicos. Na mesma linha

de verificação, podemos analisar a informação oriunda de rede social: onde foi divulgada, por

qual grupo, como foi construída. A comparação entre essas diferentes fontes é por si só

ilustrativa do que podemos obter para a discussão sobre a História ao considerar o impacto das

fake news e das TIC sobre a realidade.

Com isso, se pode instigar o aluno a refletir e a agir no sentido de testar suas próprias

fontes quando desafiado a encetar uma pesquisa na disciplina de História. Em outras palavras,

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não basta crer na primeira informação com que nos deparamos. Isso vale para o pesquisador

como para o aluno que começa a buscar informações para dar seus primeiros passos na

disciplina de História.

A atitude de vigilância – epistemológica – diante da informação é um primeiro passo

para que possamos construir um registro confiável das personagens e fatos históricos.

Todavia, como vimos, é bastante disseminada nos dias de hoje a informação falsa – as

fake news em sentido amplo –, o que traz consequências potencialmente danosas para o debate

público e para a saúde da democracia. Parece-nos que está aí uma boa oportunidade de encetar

o debate sobre a importância de selecionar com critérios as fontes históricas.

Até que ponto, por exemplo, podemos confiar no que recebemos pelas mídias sociais –

WhatsApp, Facebook, Twitter etc.? Essa informação foi elaborada por quem? De onde foi

retirada? Que tipo de linguagem utiliza? Quais as fontes em que se baseia?

Mesmo nas situações prosaicas que alimentam o cotidiano, podemos suscitar a reflexão

de nossos alunos.

São questões que ajudam a criar uma visão crítica sobre o que consumimos em termos

de informação midiática. Diversos estudiosos das fake news vêm somando esforços para educar

as novas audiências no consumo de informação (GUROVITZ, 2016; DALMAZO; VALENTE, 2018).

Resultam desses esforços os tutoriais e manuais que reúnem dicas de como analisar a

veracidade de uma informação colhida nas redes sociais. Elas vão da análise do texto da notícia

– excesso de adjetivos para captar o leitor, linguagem sensacionalista etc. –, passam pelos

marcadores macrotextuais – como títulos, “cartolas” e vinhetas –, e vão até a referência às

fontes consultadas pela reportagem e à assinatura do jornalista.

São dicas elementares e, a nosso ver, extremamente úteis, sobretudo para o discente

que se vê incumbido de pesquisar para a disciplina de História. Considerando a onipresença das

mídias digitais e dos aparelhos de comunicação – computador, laptop, celular, iPhone etc. –, o

aluno fatalmente vai acessá-los para realizar sua pesquisa. Sabendo disso, cabe ao professor

dar-lhe os subsídios para que esse uso seja bem efetuado e possa servir de base para o registro

histórico.

Com isso, podemos avançar de forma mais segura, ao mesmo tempo em que

suscitamos uma série de questões relevantes para o ensino da História. Afinal, a fonte é o

começo, a base sobre a qual se erigem os relatos. Para que os relatos sejam minimamente

confiáveis, é preciso submetê-las ao escrutínio cuidadoso que sempre marcou a investigação

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histórica – sobretudo numa época marcada pelas fake news e todas as formas de falseamento

da verdade.

O passo inicial pode ser dado com as dicas de verificação sugeridas pelos autores que

têm estudado o assunto (DALMAZO; VALENTE, 2018). A partir dele, se podem conduzir debates

de cunho metodológico e epistemológico: Como proceder diante da dúvida acerca da veracidade

da informação encontrada? O que este procedimento pode nos ensinar sobre a construção da

verdade histórica?

O problema das notícias falsas não é exclusivo de nossa época. Mas talvez ele tenha

sido impulsionado em grande medida pelo ambiente em que vivemos imersos, sobretudo pelo

advento das mídias digitais e sua capacidade exponencial de difundir informações. Afinal, em um

sentido filosófico, a verdade é um conceito difícil de definir, pois que abrange desde a noção de

correspondência entre fato e relato até a relatividade do ponto de vista como possibilidade

interpretativa (GUROVITZ, 2016). Nos últimos tempos, inclusive, a expressão “pós-verdade”

ganhou espaço no debate político, entendida como deliberada ignorância acerca da verdade

factual e usada como arma argumentativa entre diferentes pontos de vista...

Os tempos, definitivamente, não estão nada propícios às profissões e áreas do saber

dedicadas a trabalhar a partir da noção de verdade. E as mídias digitais e sociais parecem ter

muito a ver com esse estado de coisas. Disso decorre a necessidade de analisá-las, de

compreender o mecanismo que elas instauram e de ampliar o debate público, ainda que não

saibamos ao certo o alcance que a esfera pública tradicional detém hoje, nem a fatia que as

mídias digitais abarcam desse espaço.

Iniciativas como a regulação mais apurada dos novos grandes players da era digital –

Facebook, Google, Amazon – podem ser um caminho, assim como a regulação estatal, que já

vem sendo efetivada em alguns países (MARDA; MILAN, 2018).

As fontes são parte essencial nesse processo: checá-las é uma tarefa que cabe a todos

os profissionais que têm compromisso com a verdade. Iniciativas como a criação de agências de

checagem são valiosas no processo de fortalecimento daquela busca e já rendem seus frutos na

forma de dicas e recomendações para a população diante de mensagens jornalísticas.

Vimos no capítulo anterior, na reconstituição histórica da evolução da tecnologia, que a

comunicação oral opera em uma lógica diferenciada da escrita, e talvez aí tenhamos uma pista

do que se passa com as fake news. Elas estão sendo difundidas pela mesma lógica que se

observa na fofoca e no boato, só que agora essa fofoca e esse boato têm um poder de difusão

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em escala global. Daí advêm os perigos e desafios impostos pelas novas tecnologias, assim

como podem advir suas potencialidades. Alguns cuidados elementares se fazem necessários

para que o aluno não seja mais um propagador de informação falsa.

Checar as fontes, ouvir mais de uma fonte, comparar o que elas dizem: eis alguns

antídotos para a difusão da mentira e da falsidade via mídias digitais.

Para o historiador, eis uma grande oportunidade de refletir sobre seus métodos de

trabalho e sobre a essência de sua atividade – inclusive para avaliar o lugar que esta ocupa no

debate contemporâneo. Debates em sala de aula, seminários acadêmicos, atividades didáticas e

reflexões epistemológicas são algumas das ocasiões em que podemos questionar a construção

da informação histórica, bem como o papel que as fontes desempenham no processo, e nesse

contexto cabe, a nosso ver, especial atenção aos fenômenos recentes que incidem sobre o

assunto – como é o caso das fake news e sua propagação no mundo atual.

Até aqui analisamos como as fontes podem ser utilizadas no contexto da comunicação

online, quais os cuidados necessários para seu uso e de que forma elas podem ser

instrumentalizados em situações didáticas na disciplina de História. No segmento seguinte,

vamos trazer alguns pontos acerca da narrativa histórica resultante do uso da tecnologia. De que

maneira as TIC têm impactado sobre a narrativa feita no âmbito da disciplina de História?

3.2 As narrativas

Durante muito tempo a narrativa histórica foi sinônimo de narrativa oral ou escrita. Foi

dessa maneira, como vimos, que as histórias foram contadas, primeiro na tradição oral antes da

invenção da escrita, depois na tradição escrita, sob o formato do livro. Foram milênios de

tradição da palavra, que cristalizaram formas e estilos de se contar a História.

Com a revolução da comunicação online e o advento da era pós-industrial – marcada

pelo mundo virtual – as formas de narrar também sofreram mudanças significativas. Nas aulas

de História, é possível acompanhar esse impacto, a partir dos materiais utilizados para a

construção da narrativa histórica.

Se antes o professor tinha à sua disposição o livro e os livros-texto, com a narrativa

histórica reduzida à sua forma escrita, à medida que os recursos técnicos foram chegando –

sobretudo os audiovisuais, como a fotografia já na segunda metade do século XIX, e como o

vídeo e o áudio, já na segunda metade do século XX –, as narrativas históricas passaram a

contar com esses novos recursos. A mídia de massa – cinema, rádio, televisão, jornal impresso,

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revista – se apoia nessas linguagens para compor suas mensagens. A sala de aula, como

microcosmo do mundo real e lugar de experimentação, também os tem incorporado.

Para incorporá-los, contudo, é necessário um conhecimento prévio da “gramática”

dessas mídias, a fim de que seus recursos possam ser plenamente utilizados.

Nesse sentido, há contribuições valiosas na área denominada “Educomunicação”,

campo do saber em que as práticas da comunicação estão a serviço das práticas educacionais,

e que tem, no Brasil, um vasto rol de pesquisas teóricas e trabalhos práticos (CITELLI, 2002;

COSTA; 2002). Ela pressupõe a convergência de esforços de educadores de ambas as áreas –

educação e comunicação – assim como dos profissionais da mídia, todos voltados para

potencializar os meios que permitem educar.

O uso dos recursos midiáticos no ensino já tem longa tradição no Brasil, como mostram

os programas das tevês e rádios educativas e também das emissoras comerciais, os espaços

dos jornais e revistas e as publicações especializadas. Foram utilizados já a partir da década de

1970, nos esforços pela alfabetização e pela formação em nível médio e técnico (SOARES,

1996). Antes disso, mesmo a rádio teve sua origem marcada pela função educativa, ao menos

nos moldes pensados por seu principal nome na década de 20 – Roquete Pinto (MOREIRA,

2000).

Nesse sentido, as narrativas históricas já vinham fazendo uso de recursos para além da

palavra escrita – fotografia, documentário televisivo, reportagem radiofônica, entre outras

formas. Os recursos técnicos vinham sendo paulatinamente inseridos na narrativa, com

predomínio absoluto do suporte escrito, como o livro e o livro didático.

Durante muito tempo, o uso da tecnologia veio a reboque da função principal do ensino

na era industrial: transmitir informações para instrumentalizar as gerações e torná-las aptas à

reprodução do modo de vida da sociedade. Agora, não mais. A perspectiva que se abre para

quem atua com o ensino está permeada pela noção de criatividade e de construção colaborativa,

que apontam para soluções que extrapolam o horizonte já posto do mercado de trabalho e da

organização social (KHAN, 2013).

Nesse processo também estão implicadas as técnicas necessárias para apresentar o

material histórico, encadeando-o numa lógica narrativa rica e atraente para o educando.

São diversas as formas de se chegar a um resultado esteticamente atraente e ao

mesmo tempo relevante em termos de conteúdo. Por exemplo, mediante o planejamento prévio

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das narrativas, com foco no roteiro que se pretende seguir ao narrar aquele acontecimento

histórico.

Ao levantarem as fontes de informação na pesquisa prévia, os alunos já partem de uma

base sólida de informações para a etapa seguinte de seu trabalho, que consiste na elaboração

de uma narrativa que faça sentido, seja verossímil no nível do conteúdo e seja atraente no nível

da forma.

Com o advento da mídia digital, essa presença das narrativas audiovisuais, que já era

expressiva, tornou-se incontornável: para alcançar o interesse do aluno, é fundamental ao

professor – seja de qual disciplina for – atentar para o uso das TIC em sala de aula. Mas vimos,

previamente, no Capítulo I, que nem sempre essa incorporação dos recursos tecnológicos é uma

realidade. Por isso se faz necessário atentar para um uso mais consciente das TIC no contexto

das disciplinas escolares – e em especial, nosso foco aqui, na disciplina de História.

A onipresença dos aparelhos digitais tende a ditar as regras de como a informação e o

conhecimento são obtidos pelas novas gerações. Ela vem se somar aos recursos audiovisuais,

trazendo mais agilidade ao processo de produção, edição e divulgação das atividades didáticas:

se antes, por exemplo, o aluno podia elaborar um vídeo ou um jornal para divulgação restrita por

meio do suporte impresso – jornal-laboratório, festivais de vídeo intraescolares etc. –, hoje as

possibilidades são infinitamente maiores. É possível por exemplo a produção e divulgação em

mídias de grande alcance – como o Facebook, o Youtube, os blogs e sites – em tempo real,

chegando-se a uma audiência incomensuravelmente maior em um tempo infinitamente menor.

Fenômenos recentes envolvendo essas plataformas dão uma ideia das potencialidades

que as novas mídias apresentam para o aprendizado. Veja-se, por exemplo, o caso dos

youtubers, que conquistaram milhões de fãs no Brasil e no mundo, fora da mídia tradicional. Ao

atraírem crianças e adolescentes para seus canais – em geral de entretenimento – eles

desempenham papel diferenciado na cultura de nossos jovens. As referências visuais e

linguísticas que eles trazem, a maneira como se dirigem ao público, a edição do material que

disponibilizam – tudo são elementos que passam a compor a dinâmica da comunicação

contemporânea e que acabam se tornando referência para as novas gerações.

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Figura 8 – O youtuber Felipe Neto em seu canal na internet

Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=hgXxutYhSDc. Captura de tela.

Importante é conhecê-los e entender o lugar que ocupam no imaginário e nas narrativas

das novas gerações, para que possamos seguir falando a mesma língua que elas. É muito mais

provável que assim conseguiremos criar empatia e diálogo com os jovens, que já nasceram

mergulhados nas referências culturais da era digital.

Eis algumas das razões pelas quais entendemos que as técnicas da produção midiática

– que incluem tanto a mídia tradicional como a mais recente mídia digital – são essenciais para

a conscientização do aluno. Ao tomar contato com a realidade viva da construção do

conhecimento, o educando é incentivado a cultivar um olhar mais crítico, de quem produz

conhecimento e informação, e não somente os consome.

Ao conhecermos os jovens youtubers que conquistaram a atenção de nossos alunos,

temos maiores chances de falar a linguagem dessa nova geração. Trata-se, em suma, de

aumentar o repertório que temos acerca de nossa cultura – uma cultura interligada, digital, que

mistura as velhas e as novas referências em um continuum que tende a extrapolar de forma

permanente as velhas referências da era industrial (JENKINS, 2009). Ampliar o repertório

significa nesse caso conhecer esses novos rostos da comunicação online, despindo-nos dos

preconceitos que podem impedir-nos de semelhante atitude.

Veremos que a linguagem desses novos comunicadores está marcada pela

informalidade e pelo bom humor, e veremos também que tais elementos são o mais das vezes o

recurso que utilizam para passar mensagens que vão muito além do entretenimento. Mensagens

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que vão da divulgação científica à pregação de valores como o feminismo, o respeito às

diferenças e ao meio ambiente.

A forma como enunciam seu discurso e constroem sua retórica é fundamental para

garantir-lhes o interesse da nova geração. A nosso ver, é necessário aprender com humildade a

lição que eles têm a ensinar aos professores que querem abraçar as TIC. A performance que se

ancora na informalidade da linguagem e no humor é parte dessa lição. Mas há muitas outras.

Ao enfocarmos a maneira como as narrativas históricas são construídas, os recursos

disponíveis no âmbito das TIC são considerados em interação: experiências didáticas (COSTA,

2002) mostram que essa é a forma mais adequada de conduzir as produções da disciplina de

História.

Em termos de narrativa baseada na imagem, um parâmetro interessante que se pode

tomar como ponto de partida são as produções documentais – vídeos de caráter jornalístico e

histórico, que abordam temas variados a partir de diversas fontes, com o uso de vários recursos

narrativos, como registros fotográficos que reconstituem a época em estudo, histórias em

quadrinhos, cenas de filmes e cenas exclusivas, produzidas pelos próprios alunos.

O documentário é um formato tradicionalmente associado às mídias audiovisuais, de

amplo emprego no jornalismo, na arte e na história, constituindo-se numa TIC de grande

utilidade para a didática.

Abordar os diferentes gêneros e usos do documentário em sala de aula permite ao aluno

conhecer formas variadas de expressão do fato histórico: entrevistas com fontes especializadas

no assunto; imagens de arquivo; dramatizações feitas pelos próprios estudantes; edição e

montagem criativa do relato, com recursos de edição tais como o flash back, a narrativa

cronológica, as interpolações alegóricas para “quebra” da linearidade, entre muitas outras

possibilidades.

A vantagem de semelhante formato está na aproximação que o documentário tem com

os conteúdos científicos, na medida em que ele é empregado o mais das vezes como registro fiel

aos fatos. Para a disciplina de história, a abordagem permitida pelo formato do documentário

tende a ser enriquecedora. O mais importante é entender a lógica deste gênero de narrativa, os

recursos que ele pode abranger e, então, definir o tipo de atividade a ser efetuada.

Aqui um ponto que talvez seja necessário salientar é a validade das fontes não livrescas

– o mais das vezes, temos testemunhos de pessoas que vivenciaram os fatos e cujo depoimento

é feito oralmente e utilizado como tal no documentário. A expressão, as rugas, a fala, os lapsos

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de memória: tudo tem um potencial riquíssimo de aproveitamento para as produções

documentais. Mas tal potencial exige abertura por parte do docente em encarar os desafios de

validar as informações que estão para além do livro escrito, como vimos no segmento anterior,

sobre as fontes.

A educação dos sentidos também deve ser considerada neste ponto: a linguagem visual

e sonora que é chamada para construir a narrativa documental exige um certo tempo de

treinamento para que o professor e a turma se acostumem com sua gramática. Os rudimentos

de tal educação dos sentidos nos são dados, ao que parece, pela linguagem televisiva e

cinematográfica, assim como pela linguagem radiofônica – todas essas, são expressões

onipresentes na cultura, e de fácil acesso pelas plataformas digitais. Mas nunca é demais

insistirmos em que se faz necessário predisposição para aprender a gramática própria desse tipo

de narrativa.

Herdeiros da revolução trazida por Gutenberg com a invenção da imprensa, parece que

há uma tendência, na geração criada pela tradição livresca, em colocar o objeto livro e por

conseguinte a palavra impressa em primeiro plano quando se pensa em narrativa. Vimos, no

capítulo anterior, como essa contingência afetou o mundo ocidental, e talvez seja o caso de

seguirmos em vigilância contra os resquícios dessa valorização excessiva do registro escrito em

nossas produções históricas.

Mas quando se trata de uma narrativa que usa som e imagem como o documentário em

vídeo, é preciso atentar para além da palavra escrita. A lógica da narrativa por imagem nem

sempre coincide com a da linguagem verbal escrita. É preciso entender a interação entre esses

tipos diversos de linguagem com os recursos que propiciam o diálogo entre elas.

Um dos elementos que compõe a linguagem audiovisual presente no documentário é o

roteiro (SARAIVA; CANNITO, 2004). Ele ajuda a dar lógica para a narrativa, funcionado com uma

escrita guiada dos elementos que devem estar presentes na história a ser contada. Com isso,

fica mais fácil encarar o desafio de contar uma história que não seja apenas escrita nem seja

feita para ser lida.

Que imagens e sons usar na abertura do documentário? Que tipo de texto pode amparar

as imagens selecionadas? Como ordenar os momentos em que teremos entrevistas e os que

serão preenchidos pela voz de um narrador? Essas são algumas das questões que podem ser

respondidas a partir da elaboração de um roteiro prévio, o qual permite visualizar o emprego dos

recursos audiovisuais em uma sequência temporal definida.

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Já em termos de narrativa baseada na palavra escrita, no texto, um parâmetro

promissor pode ser encontrado nas narrativas em formato de blog – material disponibilizado na

web que pode agregar tanto blocos de texto tradicionais – em que a lógica narrativa está nas

frases – como na interação permitida pelas ferramentas online de navegação pluridirecional –

quando o leitor é quem escolhe o roteiro a seguir dentre uma série de links.

As histórias construídas por meio deste formato podem contar com os recursos

adicionais de vídeo, áudio e fotografia, mas aqui a base é de fato o texto escrito. Decorre disso

que os blogs estão mais próximos dos recursos inerentes aos textos – a estruturação de frases e

parágrafos num todo que faça sentido – mas nem por isso deixam de possibilitar interação com

outras formas de linguagem.

Vantagem adicional do formato do blog e de outras plataformas digitais diz respeito à

facilidade de acesso, tendo em vista que boa parte dessas ferramentas é de acesso franqueado,

ao menos para as produções mais simples. Isso permite potencializar o investimento de

recursos eventualmente necessários para a realização das atividades didáticas: via de regra,

basta a conexão com a internet e algum dispositivo de acesso. Há também templates – modelos

– gratuitos disponibilizados na web, o que certamente é um convite à experimentação das

produções feitas em sala de aula.

O importante, a nosso ver, é pensarmos nas narrativas a partir dos recursos disponíveis,

adequando as atividades à realidade escolar que vivenciamos. Trabalhos relativamente baratos

em termos financeiros podem ser extremamente bem sucedidos para as finalidades da

disciplina. Aqui, mais uma vez, cabe ressaltar o papel que cabe à criatividade, como propulsora

das realizações didáticas.

Até mesmo os jogos ou games, que tradicionalmente eram tidos apenas para a função

de entretenimento, podem ser aliados no processo de elaboração das narrativas históricas. Há

uma infinidade deles disponível sob a forma de aplicativos e software nas mais variadas

plataformas – desde aqueles voltados para o lazer até os especificamente projetados com fins

didáticos. Que tal conhecer, como docentes, o que os nossos alunos estão jogando nas horas

vagas, com vistas a nos aproximarmos do seu universo simbólico e ainda utilizarmos alguns dos

personagens e situações em favor de nossa disciplina? E, mais ainda, que tal empregarmos esse

universo tão familiar às novas gerações em nossas narrativas produzidas com as turmas?

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Figura 9 – Os bichos do jogo Pókemon em ação: ferramenta narrativa

Fonte: https://www.mobilegamer.com.br/

Eis um exemplo: o jogo PókemonGO. Logo que foi lançado, o jogo teve grande impacto

sobre crianças, adolescentes e mesmo adultos. Já de início, diversos professores mais criativos

também conseguiram encontrar utilidade didática para a onda que conquistou a audiência

sequiosa de novidades. Um dos usos foi nas aulas de inglês. Aproveitando o fato de que os

nomes dos monstrinhos virtuais são formados pela combinação de palavras em inglês, uma

atividade bastante produtiva para as aulas daquela disciplina era mostrar a relação entre o

monstro e o seu nome.

Via de regra o nome indicava as qualidades ou poderes do bicho. Assim, por exemplo, o

personagem chamado “Squirtle” é o resultado da combinação de “squirrel” (esquilo em inglês) e

“turtle” (tartaruga). O trocadilho resultante da operação “squirrel” + “turtle” = “Squirtle”, além

de ser engraçado, é instrutivo para as aulas de inglês. Na figura que o representa, temos o rabo

de esquilo e o restante do corpo de tartaruga, como se pode conferir abaixo.

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Figura 10 – O personagem “Squirtel”, do jogo PókemonGO

Fonte: https://db.pokemongohub.net/pokemon/7

Se isso serve para disciplinas de inglês, serve com certeza para todas as demais. Há

relatos de uso do jogo para a integração de crianças autistas (BBC, 2016), por exemplo, assim

como nas aulas de matemática.

E quanto à disciplina de História?

Que tal pensarmos numa reconstituição histórica da “linhagem” dos monstrinhos e

desafiarmos as crianças a escreverem sobre isso? Ou então, para nossos alunos adolescentes,

que tal encarar o desafio de contar a linhagem do jogo antes de ele se transformar em um

aplicativo de celular, no contexto da indústria do entretenimento mundial? Ou ainda, avançando

no nível de complexidade, que tal refletirmos criticamente sobre o tempo pré-histórico, a

geologia, as formas de adaptação da natureza à realidade mutante?

São infinitas as possibilidades trazidas pelos games, dos mais simples e solitários aos

que só podem ser jogados em grupo. O que nos parece válido, acima de tudo, é não perder de

vista o universo simbólico de nossa principal audiência – o aluno e sua cultura, seus ídolos, seus

heróis. Novamente, estamos tocando na questão relativa ao repertório da nova geração, que

inclui seus personagens, sua linguagem, seus enredos e narrativas.

Vê-se que se restringir aos formatos padronizados da narrativa histórica clássica é

perder a oportunidade de ser mais efetivo no diálogo com as novas audiências. Pode-se até

mesclar a tradição livresca com as novas linguagens e formatos, mas é essencial sair das

estruturas padronizadas e restritivas que imperam nas narrativas que se embasam na palavra

escrita.

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Canais do Youtube, documentários, blogs, games – compreender as formas de uso e de

interação que essas ferramentas possibilitam permite usar as Tecnologias de Informação e

Comunicação em sala de aula e estar predisposto a aprender mais. Ao percebermos que

estamos mergulhados na cultura digital – que forma o que alguns autores chamam uma

“ecologia midiática” (RUBLESCKI, 2013) –, o acolhimento desses recursos e informações torna-

se no mínimo mais natural: eles estão aí, compõem o quadro da nossa cultura em permanente

evolução. Há de haver predisposição em conhecê-los melhor.

Se é verdade que o texto e a linguagem escrita estão perdendo sua proeminência nas

narrativas, é preciso que saibamos como proceder frente às novas maneiras de narrar. E para

isso às vezes basta prestar atenção ao entorno, que está de fato permeado pelos signos da

cultura online, muito próxima de um registro oral, como vimos. Assim se cria repertório. E

também se começa a criar a expertise necessária para que usemos e dominemos as TIC. Ou ao

menos convivamos com elas de forma harmônica, dentro e fora da sala de aula.

Com esse conhecimento prévio, as narrativas que iremos elaborar sairão enriquecidas, e

certamente atrairão mais a atenção de nossos alunos.

O que se obtém com essas atividades didáticas é matéria prima para a reflexão sobre a

História: como se produz o conhecimento histórico, quais suas possibilidades, sua fontes, suas

formas de narrar. Assim, parece, podemos avançar no entendimento das TIC em seu caráter

instrumental para as TIC como um meio se produção de conhecimento. Ao focarmos em

aspectos específicos desse uso em uma disciplina também específica – a História – entendemos

que surgem elementos para se pensar de maneira mais concreta nas questões didáticas e

metodológicas de nossa prática pedagógica.

Com isso, queremos enfatizar que hoje é possível fazer muito com muito pouco, quando

se pretende utilizar a tecnologia em sala de aula. O ponto crucial talvez seja a coordenação do

saber já existente nas áreas envolvidas. No caso, pensamos que o foco da disciplina de História

aponta para a necessidade de aprofundarmos nosso conhecimento sobre aspectos da produção

midiática como a seleção das fontes e a construção da narrativa final. Ao destacarmos esses

dois aspectos do trabalho com as TIC, procuramos trazer o debate para o campo do factível e do

dia a dia das atividades da disciplina de História.

Cotidianamente, nos deparamos com a questão da verificação das fontes. O viés que

marca os discursos, o lugar de fala do historiador, as questões relativas à polifonia e ao

dialogismo (BAKHTIN, 1992; 2013), intrínsecas à construção discursiva – eis alguns pontos que

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estão presentes no debate acerca das fontes históricas. Hoje, como vimos, esse debate está

ampliado pela eclosão das chamadas fake news. Explorar esse tema, dentro do tema maior das

fontes históricas, nos parece de extrema necessidade, a fim de que possamos formar cidadãos

críticos e leitores atentos da realidade.

Sugerimos que a perspectiva do questionamento das fontes históricas pode ser uma

oportunidade excelente para suscitar o debate sobre a epistemologia da História. Isso pode

começar pela reflexão sobre como conseguimos obter determinada informação: uma notícia de

jornal, uma conversa com a família ou os amigos, uma pesquisa na biblioteca... Comparar as

diferentes versões oriundas dessas fontes distintas é uma tarefa que pode fornecer insights para

que a criança e o jovem aprendam a questionar o conhecimento que costumam receber

“pronto”, no formato dos livros e do livro texto.

A formação de uma consciência crítica, nos moldes do que defendia Paulo Freire (1987)

e diversos outros educadores (LIMA, 2012; KHAN, 2013), começa nos pequenos gestos. É

nesse sentido que podemos fazer uso mesmo dos desencontros oriundos das fake news: elas

servem para formar um aluno mais crítico sobre a necessidade de checar as fontes, e podem

ser transformadas em aliados da didática nas aulas de História.

Ao analisarmos as narrativas e sua relação com as TIC, procuramos apontar para a

especificidade das linguagens e dos formatos da comunicação mediada pela tecnologia. Nesse

ponto, ressaltamos a existência de um repertório a ser conhecido e incorporado pelo professor,

se este quiser se aproximar das narrativas de seus alunos. Também aqui há de se ressaltar a

necessidade de estar predisposto a conhecer as novidades tecnológicas e suas diferentes

possibilidades.

Um ponto importante a enfatizar quando consideramos as plataformas e formatos

digitais é a medida de sua liberdade. Explica-se. É algo inerente aos formatos tradicionais uma

certa rigidez na disposição das partes, ou, em outras palavras, um fechamento das opções

narrativas, em prol da previsibilidade do conteúdo. Isso pode ser visto por exemplo no formato

padrão de início, meio e fim que caracteriza a fábula, ou nos clichês que se utilizam nas

narrativas cinematográficas e televisivas, todas de grande apelo e muito típicas da cultura de

massa (BENJAMIN, 1980, JENKINS, 2009).

É necessário atentar para que esses formatos não virem uma camisa de força para o

aluno: ali onde se vê apenas repetição de um padrão narrativo, pode-se ver igualmente variação

e criatividade – desde que o professor tenha abertura para tanto.

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Também é preciso estar atento para a chamada “transmídia” – ou seja, a incorporação

de recursos de mídias diferentes em uma plataforma específica (JENKINS, 2009). Dessa mistura

entre linguagens e formatos distintos podem surgir novas e valiosas formas de se contar uma

história. Cabe ao docente definir as melhores estratégias e plataformas, a par de um mínimo da

expertise necessária para trabalhar com cada uma delas.

É claro que os esforços necessários nesse aprendizado sobre as narrativas não são

individuais: é preciso que a escola e o governo forneçam os meios para que o professor possa

ganhar a expertise necessária para aprender e dominar as novas linguagens. Mas não se pode

subestimar a atitude: estar predisposto para incorporar aspectos da nova cultura é um primeiro

e importante passo a ser dado.

Há um nível de investigação histórica que passa pela seleção das fontes e,

posteriormente, pela elaboração da narrativa. Procuramos mostrar ao longo deste capítulo como

esses dois níveis são impactados pela disponibilidade das TIC dentro e fora de sala de aula. Mais

do que isso, buscamos demonstrar em que medida tais questões podem contribuir para a

reflexão acerca do ensino da disciplina de História. Aqui adentramos de forma incidental as

questões metodológicas, didáticas e epistemológicas que cercam nossa área de atuação.

Parece-nos que há um campo promissor de estudos que podem derivar desse contraste

entre o uso das TIC no cotidiano do discente e no uso específico que este vem a fazer das TIC

para a disciplina de História: a questão da confiabilidade das fontes; a questão da origem dos

registros; a questão da natureza dos materiais disponíveis para a narrativa histórica; a questão

da convergência das várias linguagens – escrita, visual, sonora, oral – como parte do registro e

da narrativa histórica. Essas e muitas outras questões nos instigam a prosseguir em nossa

investigação, agora olhando para a etapa empírica.

É necessário, no entanto, atentar para o que está em jogo quando se pensa no uso da

mídia em sala de aula: as questões ideológicas envolvidas no processo de comunicação, as

dificuldades de acesso dos diferentes públicos, a hegemonização dos conteúdos a partir do viés

dos que ocupam os lugares socialmente privilegiados – são todas questões que merecem

espaço de discussão e reflexão em sala de aula. Refletir sobre a mídia, analisá-la, torná-la uma

presença consciente nos conteúdos abordados em sala de aula é um fator primordial na

almejada consciência crítica das novas gerações (FREIRE, 1987; LIMA, 2012; KHAN, 2013).

Feita essa incursão pelas questões que tocam diretamente a produção do conhecimento

histórico, é tempo de apresentarmos o percurso metodológico que embasa a pesquisa de campo

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da presente investigação. É o que faremos no Capítulo III, o seguinte, antes de adentrarmos na

descrição e análise dos dados, tema do Capítulo IV.

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4 APRESENTAÇÃO DA METODOLOGIA

Neste capítulo apresentaremos as bases metodológicas de nossa pesquisa em sua fase

empírica. Trata-se de detalhar o caminho que trilhamos em nossa análise, explicitando as

referências que seguimos para delimitar o corpus, descrever, analisar e interpretar os dados,

tarefas que serão efetivadas no capítulo seguinte.

Em nossa investigação, optamos por seguir o viés qualitativo em termos de metodologia.

Isso significa, primeiramente, que nosso foco estará na interpretação dos dados a partir de

categorias conceituais e não na quantificação. As metodologias qualitativas em ciências sociais

mostram-se ferramentas adequadas para as investigações focadas na avaliação dos fenômenos

sociais (HAGUETTE, 1992), por fazerem aflorar aspectos significativos, como a experiência dos

grupos e indivíduos, a percepção subjetiva dos sujeitos que compõem o universo da

investigação, os fatores cotidianos que interferem na dinâmica dos grupos estudados, entre

outros.

Partindo de Lemke (2002), entendemos que as novas tecnologias transformam o

conhecimento, na medida em que rompem com o modelo anterior, baseado na escrita linear. As

conexões possibilitadas pela escrita multimodal, em rede, trazem consequências para o a

construção do conhecimento, para a percepção e para o raciocínio.

Em nossa verificação empírica, trabalhamos com questões dissertativas do livro didático

e de outras fontes como a fotografia, que foram pesquisadas e respondidas na plataforma com o

uso do Facebook, como canal de comunicação fechado – isto é, somente para os alunos e

coordenação pedagógica da escola, professora orientadora do mestrado Doutora Altima Ramos –

, respondidas e enviadas ao professor por e-mail. Lembramos, que a escola proíbe o uso de

celular/telemóveis. Todos os trabalhos pedagógicos, com uso da tecnologia foram executados

fora da sala de aula. O professor pode usar tecnologia, como notebook, de uso pessoal, a escola

não possuí para fornecer, apenas alguns computadores na biblioteca com acesso a internet e

data show. Acesso à internet - wi-fi, somente em algumas salas de aulas. Para outras salas,

quando for necessário, fizemos uso pessoal do smartphone disponibilizando a internet ao

notebook.

Conforme Snyder (2004), para os alunos usarem as tecnologias, devem saber empregá-

las nas práticas sociais, desafiando a educação deles com recursos digitais, processador de

texto, e-mail, bate-papo, listas de discussão, hipertexto, blog, internet, web. Foi nesse sentido

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que trabalhamos, construindo um projeto de pesquisa com a turma, no qual o uso das TIC foi

fundamental.

Problema e objetivos

Problema

O problema de que partimos pode ser formulado da seguinte maneira:

Como as TIC podem contribuir para o ensino-aprendizagem na disciplina de

História?

Subsidiariamente, temos as seguintes questões que orientam as etapas da investigação:

- Quais as principais contribuições conceituais para a discussão sobre o uso das TIC no

ensino?

- Quais as ferramentas didáticas que podem potencializar o uso das TIC em sala de aula

com vistas à aprendizagem dos alunos?

- Que atividades letivas se beneficiam do uso das TIC por parte dos alunos?

- Que estratégias e metodologias de trabalho melhor se ajustam ao uso de TIC nas aulas

de História?

Essas questões orientaram nossa investigação e é a partir delas que traçamos os

objetivos da pesquisa. São eles:

Objetivo principal

- Investigar como o uso das TIC para o ensino da História pode contribuir para a

aprendizagem e para a motivação dos alunos

Objetivos específicos

- Revisar (previamente) a literatura acerca do tema das TIC aplicadas ao ensino;

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- Enfocar (previamente) as questões relativas ao uso das TIC na disciplina de História,

com foco nas fontes e a configuração das narrativas;

- Realizar verificação empírica do uso das TIC em sala de aula de disciplina de História,

mediante estudo de caso;

- Descrever e analisar a relação da turma com as TIC, enfocando a percepção e os usos

feitos da tecnologia nas atividades propostas;

- Contrastar os dados empíricos com os conceitos previamente expostos, obtendo a

partir disso as conclusões da investigação.

Metodologia

Em termos metodológicos, o trabalho consistiu em estudo de caso (YIN, 2001; AMADO,

2014). Esta metodologia é indicada para investigações focadas no como e no porquê das

situações em estudo – ou seja, compreende investigações preocupadas em descrever processos

e em buscar explicações sobre as causas de fenômenos.

Amado (2014, p. 132) diz que o Estudo de Caso etnográfico é o estudo em

profundidade de um único caso, através da observação participante, apoiada pelas entrevistas:

em geral não se foca diretamente nas necessidades práticas dos atores, mas preocupa-se com

interpretações e significados que estes atribuem aos contextos em que participam pois isso pode

ser motor do desenvolvimento.

Os sujeitos da presente investigação são 17 (dezessete) alunos de uma turma do 9º ano

de Ensino Fundamental da escola estadual Cândido Machado, do município de Cruz Alta – Rio

Grande do Sul. Temos que ter ciência de que há trocas de alunos entre as escolas por

incompatibilidade entre alunos, professores e direção, mudança de residência. Quanto aos

alunos novos que chegaram a partir do segundo trimestre, não os incluimos.

A recolha de dados foi efetuada mediante aplicação de questionário de caracterização da

amostra, observação e Diário de Campo, trabalhos dos alunos e questionário final de resposta

aberta para conhecer o pensamento dos alunos em relação ao trabalho por eles realizado. A

análise dos dados foi feita com base na Análise de Conteúdo (BARDIN, 2011), construindo-se

categorias de análise a partir dos elementos coletados. A seguir, detalhamos os passos

metodológicos.

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Etapa 1 - Questionário

Primeiramente, foi feita a verificação dos conhecimentos da turma sobre as TIC –

equipamentos que os alunos possuem, uso e grau de domínio sobre eles, entre outras questões.

Dessa forma, obtivemos subsídios para traçar o nível de habilidades da turma em

relação ao uso das TIC, o que nos serviu como ponto de partida para a implementação de

práticas pedagógicas que contemplaram esse conhecimento e potencializaram o seu

desenvolvimento na disciplina de História.

Esses dados trouzeram elementos para a proposta de prática pedagógica que

apresentaremos ao final, como resultado da investigação.

Ao introduzir novos recursos, registrar as novas formas de pensar e de ensinar com a

inclusão das TIC no currículo escolar, foi nosso objetivo explorar e aproveitar as potencialidades

das novas tecnologias no processo de ensino e aprendizagem, registrando o uso e o impacto

destes novos recursos na interação e participação do aluno na construção do conhecimento.

Como professor de História, aferimos neste contexto o ensino, a aprendizagem e

também as dificuldades quesurgiram durante o emprego das tecnologias.

Essa sistematização do conhecimento parece-nos essencial para uma posterior

mudança de mentalidades de professores e de hábitos no ensino. Descrever o uso das TIC em

sala de aula e refletir sobre essas práticas permitiu-nos vislumbrar os obstáculos que

embaraçam as práticas e as potencialidades aí existentes.

Etapa 2 – Plano de aula com uso das TIC

Com as respostas coletadas dos alunos, implementamos um plano de aula com o uso

das TIC usando os equipamentos portáteis do professor e os disponíveis existentes na escola. O

estudo contou com a participação dos alunos que começaram o ano letivo nesta turma, que

somam em torno 17 estudantes.

Buscamos incrementar didaticamente o conhecimento que os alunos têm no uso da

tecnologia e o seu grau de interesse com as TIC, tentando mobilizar a turma para que se

envolvesse na utilização das tecnologias no processo de ensino e aprendizagem, o que hoje é

muito incipiente nas escolas públicas do RS.

Conhecendo o perfil tecnológico da turma, escolhemos as ferramentas digitais a serem

disponibilizadas e incorporadas às atividades didáticas. Utilizamos, entre outras, as seguintes

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ferramentas: WhatsApp, Facebook, Digital Moovly, Word, Corel Draw, PowerPoint, entre outo

software, além de equipamento hardware como smartphone e computadores em rede e tablet.

Esses instrumentos foram utilizados na produção e apresentação de trabalhos,

pesquisa, produção de vídeos, trabalho com fotografia, elaboração de resumos, entre outras

atividades. Com o auxílio das ferramentas, pretendemos a inclusão das TIC na educação,

promovendo a inclusão digital, aplicando os componentes curriculares aos alunos.

A atividade principal, para a qual confluiram os esforços da turma foia elaboração de um

vídeo documentário, nos termos a seguir.

Propusemos a produção de um vídeo sobre a Primeira e Segunda Guerras Mundiais. Foi

um trabalho em grupo de 4 a 5 integrantes. O tempo de duração do vídeo é de 4 minutos.

Para embasar a turma, fizemos uma pesquisa exploratória prévia, utilizando a mídia

social Facebook. O professor conduziu a discussão, que versou sobre os seguintes tópicos: a)

Consumismo. Os alunos fizeram uma comparação do consumo brasileiro com o dos os EUA; b)

Intolerância. Os alunos pesquisaram sobre uma notícia relativa à intolerância no mundo; c)

Preconceito racial. Os alunos trabalharam uma notícia que relatava o preconceito racial no

mundo; d) Medidas protecionistas. Foi pedido aos alunos um exemplo de um país em ação

protecionista; e) Bolsa de Valores. Os alunos trabalharam uma notícia sobre a Bolsa de Valores

de um determinado país; f) Antissemitismo. Os alunos pesquisaram e deram um exemplo de

uma ocorrência no mundo.

Usamos smartphones em sala de aula para pequenas pesquisas e atividades, para

entender melhor a matéria em discussão e para questionamento do professor ou do aluno.

Assim, buscaram-se as respostas na hora e socializou-se entre a turma o tema em estudo.

A partir dos resultados dessa tarefa, teremos os elementos para refletir acerca do

impacto das TIC nas aulas de História, com ênfase na relação que a turma construiu com as

fontes utilizadas e nas soluções narrativas empregadas na elaboração do trabalho.

Etapa 3 – Diário de Campo

Nesta fase de verificação empírica, fizemos uso de um Diário de Campo, a fim de

descrever as atividades desenvolvidas pelo grupo, registrando a receptividade do uso das TIC

pelos alunos, as reflexões surgidas no contato com as TIC e o uso que a turma fazia das

tecnologias nas tarefas propostas.

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O Diário é ferramenta recorrente nas investigações em ciências sociais (ZAMBERLAN,

2014), já que permite um registro sistemático do que acontece na situação estudada, incluindo

a descrição dos fenômenos e a interpretação deles pelo pesquisador.

Dessa forma, o Diário serviu de subsídio para o registro do dia a dia das aulas,

permitindo a descrição e o comentário de fatos e fenômenos relevantes para a investigação.

Fizemos uso dessa ferramenta desde o início até o final da verificação empírica.

Etapa 4 – Segunda verificação

Nesse ponto de nossa pesquisa, fizemos nova verificação do processo de ensino-

aprendizagem com o uso das TIC. Consistiu na aplicação de questionário de resposta aberta

para aferição da percepção dos alunos sobre as atividades efetuadas durante o período letivo

delimitado.

Aqui pretendemos verificar o impacto da tecnologia na elaboração dos trabalhos, bem

como a maneira como o aluno percebeu tal impacto. Foi o marco final da coleta de dados

empíricos, que permitiru a comparação entre a situação inicial e o período final do Estudo de

Caso.

Etapa 5 – Análise e reflexão

A partir daí, analisar os dados coletados durante todo o processo e a experiência

realizada, refletindo sobre a integração das TIC ao processo de ensino-aprendizagem, tomando

por base os dados obtidos durante o Estudo de Caso e as reflexões conceituais previamente

efetuadas.

Nesse ponto mostramos em que medida se pode aprimorar o ensino-aprendizagem

usando as ferramentas digitais. O foco dessa reflexão foi o uso feito das TIC pela turma na busca

de fontes históricas e na construção da narrativa em História. Pretendemos, assim: a) avaliar o

grau de satisfação no uso da tecnologia; b) verificar se a expectativa inicial condizia com o

emprego da tecnologia; c) analisar o impacto na aprendizagem do aluno, em seu envolvimento e

em sua participação, bem como no entendimento dos conteúdos das aulas. A análise foi

efetuada em forma de tópicos, considerando em cada um deles os principais aspectos presentes

no Estudo de Caso.

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Amostra

Uma turma do 9º ano do Ensino fundamental da qual somos professor regente foi a

escolhida para implantação das TIC na disciplina de História. A caracterização da amostra foi

feita no período de um mês, quando aplicamos o questionário inicial. Três meses depois, no

período final da verificação, aplicamos novo questionário, totalizando 4 (quatro) meses de

verificação empírica. A cada mês foi feita a avaliação da integralidade dos conteúdos abordados.

Síntese

Como antes referimos, fizemos uma recolha de dados principalmente qualitativos. Os

alunos responderam com frequência mensal a miniquestionários de resposta aberta, dando

conta da sua percepção acerca do decorrer do trabalho na aula. O professor fez observação

participante a registou suas notas em Diário de Campo. Com efeito, os estudos realizados pela

abordagem qualitativa centram-se “[...] na perspectiva do sujeito, cujo objetivo é investigar

opiniões, percepções, representações, emoções e sentimentos de professores, alunos, gestores

escolares, pais de alunos, sobre um determinado tema ou questão” (GATTI; ANDRÉ, 2010, p.

35).

Conforme os autores, a pesquisa qualitativa é definida como um tipo de investigação

voltada para a interpretação, baseada na observação e análise, acerca de determinada questão.

Isso significa que ela é capaz de identificar e analisar dados que não se restringem à dimensão

quantitativa. Podemos citar como exemplo a observação e análise de sentimentos, percepções,

intenções e comportamentos. Os resultados deste tipo de pesquisa não são apresentados

através de recursos estatísticos. Nesta pesquisa, os dados obtidos não são, portanto, tabulados

para obtenção de resultado. São apresentados através de relatórios que enfocam os pontos de

vista dos envolvidos.

Neste este estudo, foram respeitados os direitos de cada aluno que participou do

projeto, nomeadamente havendo compromisso de sigilo e de anonimato de seus dados, Foi-lhes

dado conhecimento do estudo e e a informação completa dos resultados, tendo sido respeitado

o desempenho de cada aluno. Foi solicitada a autorização da instituição a que pertencemos para

efetivá-lo.

No próximo capítulo, faremos a descrição e a análise dos dados oriundos de nosso

corpus. Trata-se do capítulo em que apresentamos os dados da observação empírica, etapa final

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de nossa investigação. Nele, traremos também a interpretação dos dados, com base nos autores

e conceitos que foram abordados nos dois capítulos iniciais.

Dessa forma, cremos efetuar o movimento fundamental da investigação científica a que

nos propusemos: da revisão dos principais conceitos à análise dos dados, e dessa até a

reelaboração conceitual, resultante do confronto entre os conceitos e a realidade empírica. Com

isso, chegaremos, ao final do capítulo seguinte, em nova síntese conceitual, a ser retomada em

suas linhas gerais também na conclusão, que vem a encerrar a presente investigação.

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5 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS DADOS

Neste segmento, vamos apresentar os dados obtidos em nossa pesquisa de campo,

bem como a análise e interpretação desse material. Trata-se de estudo de caso focado em uma

experiência didática com turma do 9° ano da disciplina de História. Primeiramente, algumas

palavras para contextualizar nosso corpus.

Os dados que trazemos para a análise provêm de atividades de ensino envolvendo o uso

das TIC. Consistem: a) nos 4 (quatro) questionários aplicados à turma, nos quais fizemos um

diagnóstico sobre a percepção dos alunos acerca do uso das tecnologias (em apêndice), antes e

depois de colocá-los em contato com as TIC; b) na participação dos alunos em atividade com a

mídia social Facebook; c) na atividade sobre fotografia, que consistiu em visita ao Museu Militar

na cidade de Panambi e na elaboração de documentação fotográfica; d) no produto final

elaborado pela turma, que consistiu em vídeos-documentários sobre a Segunda Guerra Mundial;

e, de forma complementar, e) também nas observações que fizemos em nosso Diário de Bordo,

no qual registramos as atividades realizadas ao longo do período letivo: fatos do cotidiano,

questões relacionadas com o ensino e a didática, percepções acerca do impacto das atividades

sobre a turma, entre outros elementos úteis.

Todos esses elementos formam o conjunto de dados empíricos que coletamos e

construímos nessa fase da investigação. Por se tratar de uma abordagem qualitativa, a ênfase

está na intepretação a partir de categorias conceituais, que reunimos de acordo com a afinidade

dos elementos, conforme detalhado a seguir.

5.1 ANÁLISE DOS DADOS

Seguiremos uma sistemática na qual separamos cada segmento principal dos dados

obtidos em categorias conceituais, descrevendo o que foi observado em cada uma delas,

comparando esses dados com o estado da arte previamente elaborado e interpretando-os a

partir da síntese entre o que foi lido e o que foi verificado na fase empírica. Com isso,

contrastamos os dados e os conceitos, elaborando uma intepretação com base na percepção

resultante do que vivenciamos desde a elaboração do problema de nossa dissertação até a

obtenção dos resultados do estudo de caso.

Nas abordagens qualitativas, como vimos, está em primeiro plano a elaboração de

categorias conceituais a partir da observação dos fenômenos. No que segue, vamos condensar

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nosso olhar em cada uma das principais categorias de nossa análise, abrangendo desde o perfil

do aluno antes das atividades até a percepção final desse mesmo aluno quando já concluída a

fase empírica – passando pelos dados acerca do uso das fontes, do tipo de narrativa construído,

do tipo de conteúdo elaborado etc.

Uma grande síntese seguirá dessa etapa, ainda no presente capítulo. Ela servirá como

momento de reflexão sobre a análise e também como forma de “ligarmos os pontos” de cada

um dos elementos analisados, buscando demonstrar a relação entre todos e como cada um

deles reflete as questões centrais que motivaram nossa investigação. Comecemos, pois, a nossa

análise.

5.1.1 Quanto ao perfil do aluno

Os alunos que compõem a turma encontram-se em média na faixa etária dos 13 aos 14

anos de idade. Estão, portanto, na chamada Geração Z, aquela que já nasceu no contexto da

comunicação online, entre 1992 e 2010.

A partir do Questionário 1, percebemos que o perfil do aluno em relação às TIC é de

quem conhece e convive com a tecnologia fora da sala de aula. Embora muitos tenham relatado

que o acesso se restringe a aparelhos e software como celular e Word, trata-se de um

conhecimento que já vem antes da escola. Na maioria dos casos, o aluno mantém um contato

cotidiano com o aparato que permite a comunicação online. Isso é um aspecto da questão que

nos interessa, pois o uso da tecnologia fora da sala de aula a princípio pode ser visto como um

facilitador da abordagem em sala de aula.

Percebe-se que a grande maioria faz uso da tecnologia fora da sala de aula, mas que há

também um número significativo de estudantes que o fazem raramente.

A partir do Questionário 2, fizemos um diagnóstico sobre as expectativas da turma

quanto ao uso das TIC, indagando-lhes, por exemplo, sobre como se sentem em relação a elas e

se têm receio de usá-las em sala de aula.

De maneira geral, o aluno que participou de nossao projeto se insere no perfil que

observamos ao considerar a revisão de literatura: os autores apontam para uma geração que já

nasce em contato com as TIC (SILVA, 2001; SANTAELLA, 2004). Uma geração cujo letramento

se dá diretamente com o uso da tecnologia, não mais apenas com o tradicional livro didático.

Uma geração que tem mais intimidade com o teclado (do computador, do tablet e do celular) do

que com o caderno.

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Ao situarmos a nossa amostra de alunos na Geração Z, não podemos deixar de notar

que há algumas peculiaridades nesta amostra. Não se trata de um bloco homogêneo. O perfil

etário desse aluno, embora o situando na geração conectada desde o nascimento, deve ser

ponderado pelas respostas que obtivemos: em alguns casos, o aluno tem acesso mais restrito à

tecnologia, talvez por questão de renda.

Tal como nos lembram vários autores (ALMEIDA; VALENTE, 2011; LIMA, 2012), falar

em escola pública no Brasil é falar na distorção de renda e nas consequências que isso ocasiona

para o ensino. O aluno de nossa amostra reflete esse paradigma da escola brasileira. Se, de um

lado, temos aqueles com pleno acesso aos bens de consumo, que incluem os aparelhos

tecnológicos, de outro temos aqueles que somente têm acesso ao mínimo, como televisão e

rádio, mídias já suplantadas em termos de comunicação e de conhecimento. Muitos projetos

que se desenvolvem no quadro atual da escola brasileira tendem a ignorar esse fato ou

subestimá-lo, o que tende a causar distorções nos resultados. O acesso aos bens de consumo

mais valorizados é ainda uma questão a ser enfrentada para que tenhamos a plena

disseminação das TIC entre a faixa etária dos adolescentes.

Descontados esses fatores, há de se considerar que, pela faixa em que a maioria se

encontra, existe grande familiaridade com a cultura online, a presença da tecnologia e o uso

eventual desses meios no cotidiano dos alunos que compõem a amostragem. Várias respostas

obtidas no Questionário 1 apontam para isso, como se pode conferir na amostra abaixo:

Dos 17 alunos que retornaram o questionário, todos responderam ter acesso à internet

em casa e um número expressivo – 14 – revelou utilizar a tecnologia todos os dias.

No Gráfico 1, pode-se visualizar o uso da tecnologia pela turma em casa, conforme as

respostas colhidas na questão 3 do Questionário 1.

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Fonte: Elaborado pelo autor.

A proximidade com as TIC está no cerne da geração que nasceu no final dos anos 90. O

perfil do aluno da turma com a qual trabalhamos reflete essa realidade, assim como a realidade

econômica do país em que vivemos – com graus por vezes acentuados de desigualdade.

Um total de 4 alunos – cerca de 25% da amostra – disse ter feito algum curso na área

de informática ou de TIC.

Quanto às expectativas da turma, fizemos 5 questões objetivas que foram apresentadas

no Questionário 2, o qual foi respondido por 15 alunos. A partir das respostas dadas pelos

alunos, temos os seguintes resultados:

- A maioria da turma se sente à vontade com as TIC.

- Metade da turma tem receio de usar as TIC em sala de aula.

- A maioria não tem conhecimento sobre como empregar as TIC em sala de aula.

- A maioria concorda que as TIC são importantes para pesquisa como aluno.

- A maioria acha que as TIC são uma ferramenta adequada para a aula de História.

O Gráfico 2, abaixo, traz a esses resultados de forma sistematizada.

0

2

4

6

8

10

12

14

16

18

Uso da Tecnologia

Questionário 1/3

branco

Raramento

Freguentemente

Usa

Gráfico 1 – Uso da tecnologia pela turma em casa

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Gráfico 2 – Síntese das respostas ao Questionário 2

Fonte: Elaborado pelo autor

Vê-se que o conhecimento prévio existe: a turma já tem contato com as tecnologias,

sentindo-se segura quando indagada sobre se se sente à vontade para empregar as TIC de

forma geral (Questão 1).

Já quando indagada sobre o uso em sala de aula (Questão 2), a turma revela que tem

dúvidas, demonstrando receio ou desconhecimento (Questão 3) sobre como empregar as TIC no

ambiente da escola e especificamente para a disciplina de História.

Seja como for, a turma acha que as TIC são importantes para a pesquisa e informação

do aluno (Questão 4) e que podem auxiliar na disciplina que conduzimos (Questão 5).

No Questionário 3, fizemos uma abordagem mais qualitativa, com perguntas abertas

sobre as expectativas da turma quanto ao uso das TIC de forma geral e no ambiente escolar,

mais especificamente na disciplina de História. Um total de 13 alunos respondeu ao

questionário. Eis uma síntese das principais respostas.

– A maioria tem boa expectativa sobre o uso das TIC na disciplina de História: 12 alunso

avaliam como bom, interessante, importante etc.; apenas 01 tem dúvida, por causa da distração

que o uso pode acarretar;

– Sobre diferença entre escrever no caderno ou num meio eletrônico, a turma está

inclinada a aceitar a digitação, pela facilidade e pela familiaridade que já tem com a técnica: 12

0123456789

Não me sinto àvontade com as TIC.

Tenho receio deempregar as TIC em

sala de aula.

Não tenhoconhecimento sobrecomo empregar as

TIC no ensino-aprendizagem

As TIC sãoimportantes para

pesquisa einformação como

aluno

Acho que a TIC não éuma ferramenta

adequadada para amatéria de História

Questionário 2

1. Discordo sem dúvida 2. Discordo 3.Nem concordo e nem discordo

4. Concordo 5. Concordo sem dúvida

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avaliam de forma positiva, e apenas 01 demonstra dúvida, apontando a distração como um

problema.

– Sobre como avalia a dificuldade em apresentar trabalho em audiovisual, mais da

metade demostra incerteza ou temor: 7 acham que teria dificuldade, 2 demonstram incerteza e

4 acham que não teriam dificuldade.

– Sobre capacidade de responder e argumentar no Facebook e WhatsApp, a turma

demostra ter familiaridade com as redes e aplicativos: 9 avaliam positivamente sua capacidade

argumentativa nas redes, mas 4 acham que é complicado misturar estudos e redes sociais.

– Sobre uso das TIC em tempo real para fazer pesquisa em sala de aula, a turma tem

expectativa bastante positiva: 12 de 13 alunos acham que será uma experiência boa, inovadora,

legal etc., e apenas 01 que seria “mais ou menos”.

Os dados que integram o perfil do discente são tomados como ponto de partida de

nossa verificação empírica, pois conhecendo os sujeitos de nossa pesquisa conhecemos parte

essencial da investigação, e podemos avançar para as demais questões. O uso que esses

sujeitos fazem das TIC é nosso próximo ponto de análise.

5.1.2 Quanto ao uso da tecnologia

Ao analisarmos os dados do Questionário 1, percebemos que a turma tem um

conhecimento relativo das TIC: alguns as utilizam de maneira sistemática, seja nas atividades

fora de sala de aula, seja nas atividades didáticas. Outros se mantêm apartados do uso das TIC,

tendo apenas um conhecimento superficial, tanto fora como dentro da sala de aula.

Eis um exemplo do que levantamos acerca do uso feito pela turma.

A quase totalidade dos alunos que retornaram o questionário – 14 – faz uso diário da

tecnologia, sendo que um respondeu fazer uso “frequentemente”, tendo havido ainda duas

respostas em branco.

Vimos previamente que a tecnologia, onipresente em nossa sociedade, tem sido

utilizada das mais variadas formas em todas as esferas da atividade humana. Vimos que o

caráter por vezes disruptivo do uso da tecnologia pode colocar em xeque as estruturas

consolidadas, mudando hábitos e costumes.

O uso que os alunos fazem das TIC se insere nesse contexto.

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Observa-se, de um lado, que eles estão se integrando ao movimento mais amplo por

que passa a sociedade contemporânea – marcada pela revolução nas formas de comunicar e de

aprender (SILVA; GOMES, 2000). De outro lado, observa-se que tal mudança não é linear,

homogênea. Pelo contrário, temos uma série de peculiaridades no uso que os estudantes fazem

da tecnologia.

Alguns estão bastante presos às formas mais tradicionais de aprendizagem, como o livro

didático e a aula presencial, comandada por um professor. Também aqui temos a presença

mais forte da mídia tradicional, sobretudo da televisão, como forma de conhecimento da

realidade, entretenimento e pesquisa.

Nas respostas da turma ao Questionário 1, isso aparece por exemplo quando alguns

referem o pouco uso do livro como ponto negativo do uso das TIC em sala de aula. Por outro

lado, a grande vantagem do uso da tecnologia é justamente facilitar o aprendizado e a pesquisa:

grupos de 7 e 4 alunos respectivamente indicaram esses pontos como aspectos positivos do uso

da tecnologia em sala de aula.

Vimos previamente, na discussão conceitual, que a história da educação é também a

história do uso dos instrumentos técnicos de reprodução do conhecimento. Tal perspectiva se

aplica de todo ao corpus ora em análise: há o ritmo do livro didático, marcado pela transmissão

unilateral e pela autoridade do professor, assim como há o ritmo multimodal da comunicação

online, marcada pela horizontalidade do processo de comunicação (DIAS, 2000; BEHAR, 2009;

ALMEIDA; VALENTE, 2011).

O uso das TIC pela turma revela uma série de nuances, mas de uma forma geral

podemos afirmar que os estudantes que mais as utilizam fora da sala de aula são também os

que mais o fazem nas atividades didáticas.

A predominância é pela leitura de sites e blogs, assim como de portais de notícias e

jornais online, quando se trata de usar as TIC para as atividades de ensino. Chama a atenção o

fato de não haver menção ao telejornal como fonte de informação e pesquisa, bem como àrádio

e ao jornal impresso. A menção explícita é pela internet e pelas redes sociais, pelas quais via de

regra se distribui e se acessa a informação das mídias tradicionais.

No caso dos Questionários 2 e 3, também há respostas que nos remetem ao uso feito

pelos alunos: eles demonstram segurança quando indagados sobre sua relação com a

tecnologia no cotidiano, alguns observando inclusive que fazem uso diário das TIC e também

que esse uso pode auxiliar nas atividades em sala de aula, facilitando a aprendizagem. Isso fica

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destacado na resposta à questão 1 do Questionário 2, sobre se o aluno se sente à vontade com

as TIC: a grande maioria respondeu que sim. Também fica destacado na resposta à questão 2

do Questionário 3, sobre a diferença entre escrever no caderno ou num meio eletrônico: a

grande maioria – 12 de 13 alunos – respondeu que seria melhor no meio eletrônico, por já estar

habituada e pela agilidade que isso proporciona.

A questão que surge é como usar no ensino, em sala de aula, esse conhecimento

prévio. E aí a turma vacila, demonstrando dúvidas sobre como seriam as aulas e as atividades

empregando-se as TIC, embora alguns ponderem que, com orientação e moderação no uso das

redes sociais, as TIC seriam positivas para as aulas, em particular as de História.

A consciência crítica sobre a própria realidade (FREIRE, 1987) implica a consciência

sobre o uso da tecnologia para ampliar o conhecimento. Daí a preocupação que podemos

apontar nesse momento: a de que o uso das TIC feito pelos alunos fora da sala de aula esteja

desconectado dos objetivos do ensino, a de que não haja diálogo entre o uso voltado ao

entretenimento e aquele voltado ao estudo e à reflexão.

De toda a forma, os dados permitem avançar atentando para as nuances e fornecendo

elementos concretos para que tenhamos mais clareza acerca do uso das TIC feito pela turma.

5.1.3 Quanto às mídias utilizadas

Observa-se que o celular é o meio mais utilizado pelos alunos em seu cotidiano e

também nas atividades escolares. Indagados, no Questionário 1, sobre as mídias que costumam

utilizar em seus estudos, 14 referiram o aparelho celular. O aparelho reúne as condições de

portabilidade, agilidade e acessibilidade econômica, o que o faz onipresente na vida da

população brasileira e mundial. Também houve referência ao computador (9), tablet (3),

notebook (3) e livro (1).

A onipresença dos celulares na vida contemporânea tem sido objeto de estudo de vários

autores (GUTIERREZ, 2004; EDUCAÇÃO NO SÉCULO 21, 2016). Ao observarmos as respostas

da turma em análise, encontramos a confirmação desse quadro mais geral: também nesta

turma o celular é o meio mais utilizado.

Ao reunir as funcionalidades múltiplas que permitem produzir e transmitir informações

de maneira ágil e dinâmica, celulares e smartphones atraem naturalmente a todos os que

precisam dessas funcionalidades em seu cotidiano, como é o caso dos estudantes.

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Para além dessas mídias, temos também o uso de computadores, seja nas atividades

laboratoriais promovidas pela escola, seja os de uso doméstico. Eles se fazem presentes nas

respostas da turma como importante meio de informação e conhecimento, ferramenta de uso

cotidiano para as atividades de estudo e entretenimento.

O uso de computadores parece mais relacionado à pesquisa do que o de outras mídias.

O fato de várias escolas possuírem uma sala de informática não deixa de ser significativo quanto

ao uso que se faz desse instrumento tecnológico: no espaço fechado da sala de aula,

assemelhando-se a um livro/caderno sobre a carteira escolar, ele possui de fato um uso mais

relacionado com o estudo. A comodidade da escrita no teclado tradicional dos computadores –

desktop, tablet, notebook –, assim como a facilidade de leitura das telas maiores parecem ter

influência sobre esses dados.

O acesso à mídia tradicional, como tevê e rádio, via celulares e computadores, também

pode ser mapeado de forma indireta entre os jovens que responderam o questionário. É talvez a

isso que se referem algumas das respostas sobre a pesquisa efetuada com as TIC: a maioria

recorre ao buscador Google para sanar suas dúvidas. Ali se podem encontrar as mais variadas

informações em mídias também variadas, como programas de tevê no YouTube, acesso a rádios

e outras mídias. Não se trata propriamente de considerar o suporte em si do livro impresso, do

rádio ou da tevê como objetos, mas sim de considerar a maneira como eles são acessados via

internet, pelo computador e sobretudo pelo celular.

Isso fica patente considerando-se as atividades que desenvolvemos na sequência, como

a da produção de fotografias e de vídeo, para as quais a pesquisa da turma recorreu a fontes

que estão disponíveis na internet, muitas delas provenientes da mídia tradicional.

O uso feito pela turma remete-nos a fenômenos como a transmídia e a remediação

(DIAS, 2000; SANTAELLA, 2004): a apropriação e distribuição de mídias antigas pelas novas, a

partir de buscadores como o Google, em arquivos digitais dos mais variados tipos, que vão dos

portais de notícias aos sites de entretenimento, aos sites de vídeo, áudio e fotografia.

Nesse sentido é que podemos interpretar as respostas da turma quanto a como veem os

pontos positivos e negativos do uso das TIC na disciplina de História: alguns registaram a

necessidade de organizar a pesquisa e também de evitar a dispersão da turma pelas redes

sociais. A presença oculta dos meios de comunicação tradicionais é perfeitamente

compreensível. Como vimos previamente, no Capítulo III, estamos em plena era da

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transformação da mídia, com forte concorrência entre as novidades tecnológicas que

ressignificam a forma de produzir e circular informação (LÉVY, 1996; 1999).

Fenômenos como a convergência entre as mídias (JENKINS, 2009) marcam a fase atual

da comunicação e do conhecimento: não se trata apenas da concorrência, mas sobretudo do

convívio simbiótico, em novos arranjos que agregam os meios da antiga comunicação de massa

– jornal, rádio e televisão – e os novos meios – computador, tablet, celular etc.

Jornais, revistas e livros quase não foram mencionados na amostra como possíveis

mídias ou fontes de consulta. Talvez pelo fato de não mais se constituírem como a referência

inicial quando se fala em termos de pesquisa. Todavia, não deixa de ser significativo que a

menção a essas formas mais tradicionais de acesso tenha sido tão reduzida: sinal talvez mais

contundente da Geração Z e de sua relação com as mídias em geral. A nosso ver, as formas

tradicionais de produção e transmissão de conhecimento mostram-se integradas ao fluxo das

novas mídias, em um processo que compõe o que os estudiosos vêm chamando de nova

ecologia da mídia (COSTA, 2014).

Embora restrito, o uso que a turma faz da mídia impressa demonstra, tal como no caso

da tevê e da rádio, que esses meios tradicionais de obtenção de conhecimento e informação

seguem sendo acessados por uma parcela da população, talvez de uma maneira residual, mas

que é necessário considerar ao propor atividades com as TIC.

Novamente, há de ser ter em mente aqui a noção de convergência (JENKINS, 2009), a

qual ajuda a entender as formas híbridas de acesso ao conhecimento. O livro eventualmente

será lido em uma tela móvel, como a do tablet. A televisão eventualmente será vista da tela do

computador. A rádio será eventualmente ouvida no celular. Mas todas essas mídias, embora

“misturadas” em dispositivos próprios, seguem tendo suas características de origem – como é o

caso da organização linear da comunicação impressa, do apelo da imagem na comunicação

televisiva, da prioridade do som na comunicação radiofônica etc.

Ao atentarmos para o uso que se faz da mídia analisando os dados coletados da turma,

é preciso não esquecer que essa mesma mídia está sendo usada, de forma mais ou menos

indiferenciada, para as atividades de ensino: o aluno usa o que tem a seu dispor, de maneira

intuitiva, assim como a criança o faz ao ser apresentada a um aparelho celular.

Podemos nos indagar, nesse ponto, sobre como esse uso poderia ser otimizado, caso

houvesse um monitoramento e orientação por parte da escola. Afinal, muitas das pesquisas que

conduzimos em nível escolar pressupõem a utilização de meios de investigação – e as TIC

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entram nesse momento como personagens importantes. Por exemplo, na consulta às fontes

para pesquisa da informação e construção do conhecimento, tema do próximo segmento.

5.1.4 Quanto às fontes consultadas

As fontes que a turma utiliza foram verificadas com base na atividade de uso da mídia

social Facebook. A atividade consistiu em pesquisa sobre os seguintes temas: consumismo,

intolerância, preconceito racial, protecionismo, bolsa de valores e antissemitismo. De cada um

deles, solicitamos à turma que fizesse uma pesquisa prévia, lendo uma notícia, e a seguir fizesse

um comentário sobre o que entendeu do assunto pesquisado. Na Figura 11, a seguir, um

exemplo das postagens efetuadas:

Figura 11 – Atividade de pesquisa com a mídia social Facebook

Fonte: Captura de tela.

A atividade, extraclasse, se estendeu por cerca de 5 (cinco) semanas, entre março e

maio de 2019, e teve a participação de mais da metade da turma. O teor da participação foi

bastante irregular. Alguns respondiam com base apenas na postagem da notícia pesquisada,

sem elaborar comentário próprio, deixando a interpretação em segundo plano ou mesmo

ignorando-a. Isso nos forçou a lembrá-los constantemente sobre a necessidade de dizer, em

suas palavras, o que haviam compreendido sobre a leitura efetuada.

Poucos efetivamente cumpriram a íntegra do solicitado nesta etapa da investigação, que

era pesquisar sobre o tema daquela semana – racismo, bolsa de valores etc. – e comentar, em

um texto de cerca de 10 (dez) linhas, o que entenderam do assunto pesquisado. Houve diversos

casos em que o aluno não mencionou a fonte pesquisada, não referindo o link de acesso ao

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texto que lhe deu subsídios para a postagem. Nesses casos, o professor efetuou pesquisa na

web, utilizando o buscador Google, para verificar se o texto postado era de autoria do aluno ou a

simples reprodução de material pesquisado na internet. Também nesses casos reiterávamos a

necessidade de o aluno se ater ao enunciado da atividade (GATTI; ANDRÉ, 2010).

Houve também, é necessário frisar, alguns, poucos, alunos que efetivamente cumpriram

o que foi pedido na atividade com a mídia social: postaram o link da notícia lida e elaboraram

um texto curto de sua autoria, comentando ou interpretando o que foi lido. Mas esses foram

uma minoria. A maior parte da turma optou pelo caminho da reprodução pura e simples do texto

que embasou sua pesquisa, copiando o colando o link da matéria ou o próprio texto da matéria

na íntegra, no espaço dedicado à postagem na mídia social.

Outro aspecto que merece registro é o tipo de fonte acessada pela turma para realizar a

atividade. Via de regra, os alunos ficaram apenas em uma única fonte de informação, de sites de

estudo como o Nova Escola ou de pesquisa geral como a Wikipédia. Quase ninguém se

aventurou por outros sites dos muitos que estão disponíveis na web para a pesquisa escolar e a

pesquisa em geral (SANTAELLA, 2004).

Além disso, não houve postagem que extrapolasse o texto escrito, apesar de

estimularmos, amiúde, a inclusão de informações ilustrativas complementares, como links de

vídeos, de jogos, imagens etc. A bem da verdade, apenas uma postagem foi feita com o uso de

recursos fotográficos, ainda no início das atividades com o Facebook: trata-se de um link com

fotos de vestígios da Segunda Guerra Mundial, conforme se pode verificar na Figura 12.

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Figura 12 – Postagem com fotos da II Guerra Mundial

Fonte: Captura de tela do Facebook.

No mais, as postagens se ativeram de maneira bastante restrita a parte do teor do

enunciado das atividades, sem que o aluno buscasse mais fontes do que as imediatamente

disponíveis em pesquisa na internet.

Outro aspecto da atividade diz respeito à interação possibilitada pelo Facebook

(GUTIERREZ, 2004). A princípio, a rede permite que se estabeleça o diálogo entre os

participantes do grupo, que podem fazer comentários e estabelecer contato com os demais

integrantes. A ideia da interação é justamente essa: permitir que o modelo comunicacional se

enriqueça com a participação efetiva de todos os que integram a comunidade virtual, sem as

amarras que caracterizaram por séculos a comunicação de massa, marcada pela hierarquia

(DIAS, 2000; BEHAR; TORREZAN, 2009; KHAN, 2013).

Nas atividades que conduzimos com a turma, chamamos a atenção para este aspecto

da participação, estimulando os alunos a comentarem as postagens dos colegas, a fim de que

pudéssemos avançar na criação do conhecimento compartilhado, que caracteriza a

comunicação atual. Mas esse ideal não se concretizou. Até houve participação, mas sob outras

formas, como foi o caso das curtidas e reações com emojis, feitas por alguns dos alunos como

resposta às postagens dos colegas. Comentário, no entanto, não houve nenhum.

Nas conversas que conduzimos em sala de aula, nesse período, levantamos uma pista

para tal fenômeno: em geral, o aluno pensa não ter autoridade para fazer comentários sobre o

conteúdo pesquisado pelos colegas. Assim, prefere apenas curtir, demonstrando aprovação e

afeto, mas evitando a crítica. Fator que colhemos positivamente: quanto ao estudo das palavras

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inseridas do Facebook, quando inseridas no contexto do estudo didático, não havia necessidade

de complementação. Por serem palavras complexas, percebemos que os alunos tinham o

conhecimento e estavam cientes da História Mundial. Somente esse fato minimizou horas de

explicação, o uso de palavras chaves para o entendimento da matéria. Assim, o uso da rede

social facilitou o processo de aprendizagem e os alunos ampliaram o conhecimento. Era

justamente esse o objetivo principal: antes de aplicar o conteúdo de História, o aluno já teria um

estudo feito com pesquisa na internet, sem saber o porquê dessas palavras.

Salientamos que é primeira vez que os alunos têm acesso à tecnologia educacional.

Depois de oito anos de estudo regular, eles conheceram um novo recurso de ensino.

Os resultados da atividade como Facebook são estimulantes. Revelam, ao que parece,

uma atitude peculiar do aluno em relação à pesquisa e à interação com o uso das TIC. Ao

mesmo tempo em que se reconhece como parte de um mundo dominado pela tecnologia, o uso

que o estudante faz dos recursos tecnológicos para a pesquisa escolar ainda é bastante restrito.

As pesquisas feitas mostram que via de regra a turma se ateve à superfície dos conceitos

pesquisados. Uma pesquisa no Google com as palavras-chaves que usamos mostra que em

geral os primeiros resultados são aqueles que os alunos utilizaram em suas postagens. Trata-se

de fontes de fácil acesso, voltadas para o ensino, focadas na definição conceitual e no texto

escrito. O resultado foi uma certa padronização das respostas, já que oriundas de fontes

semelhantes.

Podemos questionar se a atitude da turma em relação às fontes utilizadas em suas

pesquisas não refletiria na verdade uma atitude mais geral em relação ao ensino e ao

conhecimento formal. Afinal, a relativa “timidez” com que a turma utilizou a web para fazer sua

pesquisa não reflete de forma alguma a atitude da chamada Geração Y, que nasceu conectada e

se sente muito à vontade no ambiente online. Essa mesma geração pesquisa em diversas fontes

desde antes de entrar na escola. E talvez a escola seja justamente o ponto a ser ponderado aqui

(GUTIERREZ, 2004; BEHAR; TORREZZAN, 2009).

Talvez o fato de saberem estar sendo avaliados tenha contribuído para deixar a turma

mais reticente em relação à pesquisa efetuada: tanto no tipo de conteúdo que foi pesquisado –

restrito à definição pura e simples do termo, sem ilustrações – como no tipo de comentário que

foi elaborado. Afinal, trata-se de uma atividade didática, que em última análise vai compor uma

nota e ajudar a definir a situação do aluno no final do período letivo – aprovado ou não.

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Ao menos na etapa de nossa investigação em que utilizamos a mídia social Facebook

como ponto de partida para a pesquisa nas fontes históricas, o uso efetivo dessa ferramenta se

mostrou bastante limitado. As fontes consultadas pela turma demonstram apego aos caminhos

mais acessíveis e de fácil consulta – não necessariamente os mais aprofundados (LIMA, 2012).

Seja como for, o fato é que a pesquisa empírica mostra neste ponto que há de se

atentar para a maneira como usamos as fontes em ambiente mediado pelas TIC. Elas, as TIC,

não garantem a priori o aprofundamento da pesquisa realizada pelo aluno. Mas também não se

colocam como obstáculo. Tudo está na maneira como as utilizamos. No caso da turma, a

atividade serviu como base para o desenvolvimento de outras etapas de nosso percurso,

preparando-a para a elaboração de um vídeo sobre a Primeira e Segunda Guerra Mundial.

5.1.5 Quanto aos aspectos didáticos e de conteúdo

Neste segmento nos deteremos nos principais aspectos atinentes à didática e ao

conteúdo da disciplina de História que pudemos anotar e observar no momento empírico de

nossa investigação. Trata-se sobretudo das observações que reunimos em nosso Diário de

Bordo, que são estendidas em termos analíticos, no quadro mais amplo dos fenômenos

observados na fase empírica.

O uso de instrumentos tecnológicos, como as tecnologias de informação e as mídias

sociais, é uma realidade em várias escolas do Brasil (LIMA, 2012). As TIC estão presentes em

instituições públicas e privadas, incorporando-se aos poucos à prática docente. A forma como

isso tem afetado a didática e o estudo dos conteúdos específicos das disciplinas ainda está

sendo mensurada e avaliada: em certo sentido o que existe são indicações e recomendações,

mas é preciso considerar que em grande medida estamos todos tateando em busca de

respostas para as questões do ensino nesses tempos de transição.

Assim foi que encaramos a tarefa de utilizar as TIC com uma turma do ensino

fundamental (9° ano) de História: com as indicações gerais de outras experiências (PAPERT,

1985; SILVA; GOMES; SILVA, 2006), mas sabendo que o essencial viria da nossa prática e da

reflexão acerca dela. Utilizamos o Diário de Bordo para registrar os fatos mais relevantes dessa

experiência. Com ele foi possível indicar o que vimos tanto na reação da turma aos questionários

como nas atividades propostas pelo Facebook, a atividade de fotografia e a atividade de

elaboração do vídeo sobre a Primeira e a Segunda Guerras Mundiais.

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Para começar, é necessário dizer que o uso da tecnologia, embora relativamente

comum no cotidiano da turma – veja-se quanto a isso a maior parte das respostas ao

Questionário 1, 2 e 3 –, ainda causa certo estranhamento como atividade didática. Ao menos foi

o que percebemos na reação da turma à nossa proposta de usar as mídias sociais como

instrumento didático.

Num primeiro momento, os alunos pareciam não entender muito bem qual o ponto das

atividades, qual a relação entre os conteúdos e a utilização das TIC. Isso nos forçou a retomar de

maneira contínua as razões de nossa didática, tanto nas aulas presenciais como nos contatos

online com a turma mediante o Facebook. O próprio termo que se usa para designar as

tecnologias de informação e comunicação foi motivo de espanto no início das atividades:

Escrevi a sigla TIC e expliquei o que queira dizer. Foi uma surpresa, não tinham o menor sentido para eles sobre isso. Isso era obviedade, que jamais houve qualquer menção, até porque não é uma prática pública, que são raríssimas escolas que aplicam as TIC (Diário de Bordo, 21/02/2019).

De maneira recorrente, fizemos menção ao uso das TIC e a sua importância como

ferramenta de conhecimento e de pesquisa histórica, lembrando ao aluno as razões de estarmos

utilizando os instrumentos técnicos e também o significado deles para a construção do

conhecimento.

A interação possibilitada pelas redes sociais despertou nos alunos a consciência sobre

novas formas de construir o conhecimento e também sobre o papel do professor nesse

processo. Tanto é assim que as reações, registradas sobretudo em sala de aula, revelaram uma

postura de questionamento e de reflexão sobre o assunto. É o que anotamos e registramos no

trecho abaixo:

O olhar dos alunos nos corredores chamava a atenção, que quase todos estavam maravilhados. O que tinha de diferente era Facebook, era algo novo, uma novidade na educação. As postagens feitas e o retorno do professor deram uma nova ascensão nas declarações; pensavam que era algo burocrático, algo estático, sem nenhuma sensação de produtividade, mecânico. Que nada, há uma troca de valores na educação, todos acompanham, têm o retorno imediato, a qualquer hora um sabe o que o outro vez, o aluno avalia de várias formas, o seu como os outros, o que escreveu (Diário de Bordo, 29/03/2019).

Em termos didáticos, pensando nas lições que foram tiradas pelos autores que vêm

estudando o tema do uso das TIC (SILVA; GOMES, 2000; SILVA, 2001), procuramos adotar uma

posição intermediária entre a informalidade da comunicação oral e a formalidade da escrita em

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nossas intervenções na mídia social utilizada – no caso, o Facebook. A nosso ver, isso permite

maior proximidade com a linguagem da Geração Y, ao mesmo tempo em que garante a

manutenção da autoridade do professor no ambiente online.

Sentimos, no entanto, que essa primeira experiência ainda deixou muitas questões para

serem mais bem trabalhadas. Se a linguagem que utilizamos nos pareceu adequada – usando

um tom mais informal e alguns recursos visuais como os emojis, assim como as curtidas que

fizemos nas postagens dos alunos –, os alunos pareceram mais tímidos do que se espera em

suas interações, como vimos no item anterior.

Em termos didáticos, isso sinaliza, ao que parece, a diferença entre os ambientes – o

real e o virtual – e a necessária compreensão de como agir em cada um deles para potencializar

o seu uso.

Na lição de McLuhan (1979), “o meio é a mensagem”. Ou seja, o suporte em que a

comunicação é efetuada – a voz, o quadro negro, o microfone, o ciberespaço – traz junto a si

uma forma específica de comunicar e de dizer. A informalidade da fala pode ser temperada pela

perenidade e formalidade da escrita nas mensagens que elaboramos em nossas trocas pelas

mídias sociais (GOODY, 2012).

Os formatos que trabalhamos nas atividades didáticas merecem atenção nesse

momento. No caso do Facebook, nos ativemos a postagens curtas, de cerca de 10 (dez) linhas,

com caráter interpretativo. Elas estariam baseadas em informação pesquisada na web (notícia,

texto científico etc.). Tal formato possibilita observar, a nosso ver, tanto a capacidade de uso da

internet como ferramenta de pesquisa como a capacidade do aluno em se expressar, nos

próprios termos, sobre aquilo que leu.

Ao mesmo tempo, é um formato que permite agilidade no trato com uma turma de

cerca de 17 alunos. Isso porque ao planejarmos a atividade ponderamos acerca da necessidade

de dar um retorno ou feedback permanente para a turma. As postagens deveriam ser

comentadas ou respondidas pelo professor com frequência, e isso só seria necessário para

tanto.

Nesse sentido, priorizamos as respostas às postagens dos alunos no período em que se

estendeu a atividade pelo Facebook, o que por vezes implicava acessar e dar feedback em

horários e dias da semana fora da nossa rotina escolar. Eis um outro ponto a considerar, já que

o tempo, sendo nosso bem mais precioso, também requer cuidado ao pensarmos nas atividades

de ensino que extrapolam o horário presencial em sala de aula. Para reforçar a participação,

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instigamos os alunos em certos momentos específicos, conforme registrado no seguinte trecho

do Diário:

Aproveitei para falar das postagens, sobre tempo para inserir a pesquisa, as respostas como devem ser. Mostrei no meu computador pessoal para um aluno que não tinha postado ainda. É importante o argumento do professor, no sentido instigar a produção, lembrar, auferir, demandar (Diário de Bordo, 05/04/2019).

Vimos que a pesquisa na internet realizada pelo aluno deixou a desejar nessa fase, e

que a expressão textual se ateve quase sempre à reprodução literal do que foi lido pelo aluno

nas pesquisas efetuadas. Os registros do Diário mostram como isso aconteceu:

Os alunos concluintes do Ensino Fundamental/Ensino Básico do 3º ciclo – Português, último ano, se sentem inseguros de fazer resumos – com algumas exceções, é claro –, acostumados a copiar. Percebo que essa foi a tônica nas postagens, mesmo com a cobrança do professor. A mudança colaborou, neste sentido, com a internet, que ajudou a copiar, sem desenvolver a prática de condensar o texto, algo tão essencial dentro de um espaço delimitado pelo professor (Diário de Bordo, 13/05/2019).

Pensamos que talvez fosse necessário estabelecer outros estímulos para que a interação

pudesse ser mais efetiva, como por exemplo mais referências à cultura jovem, como sites de

jogos, músicas e esportes. Nesse ponto de nossa didática, contudo, optamos por não

sobrecarregar a turma com muitas informações, dada a novidade que já encaramos ao propor a

interação via web e o uso de outras TIC como ferramentas didáticas (GUTIERREZ, 2004; BEHAR;

TORREZZAN, 2009).

Refletimos que já tínhamos novidades o suficiente para realizar as atividades do período

letivo, daí a necessidade de controlar o uso de novos insumos, a fim de evitar a dispersão.

A interação que não se verificou ou que se verificou muito fracamente nas postagens da

página da turma no Facebook acabou se verificando no ambiente da sala de aula. Ali é que se

concentraram os comentários sobre as pesquisas efetuadas, mediante a provocação do

professor, que questionava a turma sobre o andamento das pesquisas e as descobertas

efetuadas.

Entre os vários incidentes e questionamentos significativos que registramos nesse

momento, eis alguns:

De maneira diferente, os alunos gostam muito de contradizer, “enrolar” o professor no processo de cumprir a tarefa, como: não sabia como fazer, não sabia a data da

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entrega, fiz um pouco, me perdi, faltei aula e ninguém me informou, achei que era na semana que vem. Todas estas situações foram ditas, além de outras desculpas (Diário de Bordo, 13/05/2019).

Também é necessário registrar, nesse ponto, que a experiência teve um grande impacto

em minha didática. Como professor, senti-me mais acolhido pela turma logo após a primeira

postagem que efetuei no Facebook. Era como se de alguma forma tivesse me aproximado mais

da turma, que parecia me ver como parte da turma deles agora. São impressões que marcam,

pois com o tempo aprendemos a conhecer as reações e o estado de espírito do grupo com o

qual trabalhamos, e certamente a reação da turma demonstrou o impacto da novidade e o

acolhimento da iniciativa. Eis um trecho do Diário que aponta nessa direção:

Interação entre alunos e professor é outro ponto positivo sobre as postagens, ganha dinamismo e praticidade, permite ler e reler. Mesmo que não queira “curtir”, fica a sinalização para o administrador de quantos visualizaram aquela postagem e quem foi o aluno. Tudo isso permite maior controle, saber de antemão quem participa, o interesse de cada aluno e o foco na aprendizagem (Diário de Bordo, 13/05/2019).

O fato de ter proposto e construído uma atividade didática na mídia que a turma

conhece e com a qual costuma interagir parece ter tido um efeito positivo, aproximando os

universos simbólicos do professor e do aluno. O conhecimento que foi construído nesse

processo parece ir além da mera pesquisa sobre os termos históricos: é um conhecimento que

diz respeito ao todo do processo didático e que perpassa as questões de ensino em sua essência

(ALARCÃO, 2008).

A mesma proximidade se verificou na atividade com o uso da fotografia. Ela consistiu

numa viagem de estudos ao Museu Militar de Panambi-RS, na qual os alunos tiveram por tarefa

fazer registro fotográfico da viagem e posteriormente efetuar a análise das fotografias,

considerando aspectos técnicos da composição da imagem abordados previamente em sala de

aula.

Nessa atividade, o nível de interação foi bem maior do que na atividade com a mídia

social Facebook. A viagem foi em clima de empolgação e a tarefa teve êxito em termos de

participação e envolvimento dos alunos. O fato de ser uma atividade presencial parece ter sido

decisivo para o resultado positivo que encontramos aqui.

O meio utilizado – a fotografia – também teve impacto sobre os resultados em termos

didáticos e de conteúdo.

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A turma se envolveu de forma efetiva nas tarefas propostas, fazendo as fotos e

analisando-as conforme os parâmetros estudados. O fato de cada um ter se envolvido na viagem

e ter de produzir suas fotografias seguramente tem relação com o sucesso dessa atividade: o

aluno estava efetivamente presente na viagem que deu início à tarefa, e teve de se envolver com

as questões técnicas para apresentar o produto final da atividade. Tudo isso deu outra dimensão

ao que foi realizado: a dimensão do envolvimento e da construção de um produto, que passou

pela fase da coleta de informações in loco, da observação da realidade e do manuseio

tecnológico, e que resultou em um produto palpável, com a marca de cada um dos alunos que

fizeram a atividade.

São elementos que devem ser ponderados e avaliados quanto ao seu impacto sobre a

didática e a apreensão dos conteúdos no contexto do uso das TIC em sala de aula. Eles parecem

sinalizar que é necessário muito mais do que indicar o uso de ferramentas, incorporá-las ao

ensino de forma “orgânica” – ou seja, de maneira natural, como parte regular do processo de

ensino (ALMEIDA; VALENTE, 2011). Nossa percepção nesse ponto é que a atividade de

fotografia concretizou de forma plena a adoção das TIC no processo didático, possibilitando

aprofundar os conteúdos da disciplina de História e ao mesmo tempo dando ao aluno maior

autonomia no uso da técnica.

Algumas fotografias produzidas pela turma ilustram essa atividade:

Figura 13 – Fotografias feitas pelos alunos

Fonte: Captura de tela do Facebook.

No caso do formato utilizado para a atividade do vídeo, optamos pelo documentário,

dada a confluência de temas que ele abrange e sua adequação para a abordagem factual e

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histórica. Como vimos no Capítulo III, o formato do documentário permite aplicação da narrativa

histórica em um contexto rico de possibilidades formais e de conteúdo.

Aqui pudemos observar que a turma se dedicou com bastante interesse e afinco na

realização das atividades, na mesma linha do que observamos na tarefa com a fotografia.

Todavia, a impressão inicial foi de resistência e receio, tal como registramos no

Questionário 3, que indagava sobre as expectativas da turma para a realização de um vídeo,

como visto previamente.

O diferencial, novamente, parece ter sido o acesso e a autonomia que foi dada à turma

para construir em seus termos as narrativas propostas. O fato de terem de trabalhar em grupos,

contudo, trouxe outros elementos, que não estavam presentes na atividade com a fotografia.

Os dados dessa fase da pesquisa mostram que em termos didáticos o caminho parece

estar marcado pela necessidade de interação entre os métodos tradicionais – uso do quadro

negro e do livro didático, bem como das aulas dialogadas – e os métodos possibilitados pelas

TIC – como a interação online, o uso de buscadores para a pesquisa e as ferramentas de

elaboração multimídia, na linha do que propõe Behar e Torrezzan (2009).

Em termos de conteúdo, a fase empírica mostrou que temos nas TIC um instrumento

relevanteque pode auxiliar a expandir o debate e aumentar e aprofundar o conhecimento do

campo da História. Talvez elas, as tecnologias, mereçam mesmo um destaque maior no capítulo

da evolução do homem e da sociedade, como queria McLuhan (1979) e como vêm observando

os autores contemporâneos (JENKINS, 2009; LÉVY, 1996; 1999).

As iniciativas na direção de um uso voltado para a melhoria dos processos de ensino

mostram, contudo, que o avanço só é possível se houver uma reunião de esforços – uma

sinergia, como querem alguns – em busca de um ideal comum. Foi o que também nós

observamos ao considerar a experiência que conduzimos com a turma de História. Se, por um

lado, houve boa receptividade dos alunos, por outro esbarramos em algumas resistências que

poderíamos chamar estruturais: a falta de um espaço laboratorial adequado sendo talvez a

principal delas.

A didática com o uso das TIC exige um ambiente escolar que acolha de forma natural a

presença da tecnologia. Salman Kahn (2013) já nos mostrava que a sala de aula ideal era um

misto de elementos tradicionais e inovadores, e também um misto de vários tipos de experiência

com o conteúdo. Grupos discutindo tópicos de forma interativa, com o auxílio de professor e

monitores, focados todos na resolução prática de problemas relacionados com a realidade da

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vida. Espaço físico desenhado de forma a quebrar o layout tradicional e hierárquico que

caracteriza a maior parte dos espaços educacionais da rede pública. Pesquisa e diálogo em

primeiro plano, mais do que memorização de conteúdos. São todas propostas que exigem o

repensar das nossas práticas docentes, e cuja implementação se coloca como um desafio

coletivo para a escola, muito mais do que uma iniciativa individual.

Em nossa experiência, por exemplo, sentimos falta de um espaço de interação voltado

para as práticas inovadoras em termos didáticos: fóruns e discussões que tematizem o uso das

TIC ainda são raros ou enviesados, enfocando aspectos que pouco ou nada alteram a realidade

de defasagem entre a experiência em sala de aula e aquela que o aluno vivencia fora da escola.

O resultado das experiências que conduzimos, embora exitosos em termos de avaliação

e dos produtos construídos pela turma – como os fóruns no Facebook, as fotografias feitas pela

pelos alunos, os vídeos produzidos para a atividade sobre a Primeira e Segunda Guerra Mundiais

– podem ser apenas um ponto fora da curva normal, se não houver iniciativas que garantam a

continuidade desses esforços.

A troca de experiências entre os professores, a realização de feiras tecnológicas na

escola, a sistematização dessas experiências em forma de reflexões escritas – artigos, capítulos

de livros, livros e teses etc. – são algumas das possibilidades que listamos como exemplos de

iniciativas para aprofundar e tornar conhecidas outras experiências semelhantes conduzidas

pelos colegas docentes. Só assim nos parece possível avançar em direção a um uso profícuo das

TIC em termos de conteúdos e em termos didáticos.

A sociedade do conhecimento tem nas TIC um elemento essencial, que deve ser nosso

aliado na busca pela qualidade do ensino, pela excelência didática e pelo aprofundamento dos

conteúdos – de História como das demais disciplinas.

5.1.6 Quanto às interações efetuadas

Neste segmento vamos analisar de que forma ocorreram as interações da turma ao

longo da experiência didática que conduzimos. Importa-nos enfocar especificamente o uso das

TIC como meios de interlocução entre os alunos entre si e com o professor, a qualidade dessas

interações e as diferenças e semelhanças com as formas tradicionais de interação não mediada

pelas TIC.

Em primeiro lugar, é preciso frisar que sim, as interações ocorridas diferiram largamente

daquelas em que a comunicação se dava pelas vias tradicionais – as trocas orais feitas nas

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conversas presenciais em sala de aula. Ao introduzirmos atividades com as TIC, surgiram outras

dimensões para essas trocas. Era como se por assim dizer o espaço virtual fosse agregado ao

espaço presencial, e isso afetou de maneira indelével todo o processo de trocas simbólicas que

conduzimos com a turma.

Sabe-se que a comunicação varia conforme o suporte utilizado e que certos recursos

implicam diferentes resultados (APPLE, 1993; BEHAR; TORREZAN, 2009). A fala, por exemplo,

tem um apelo à emoção e à empatia dos que se acham presentes na situação imediata. A

escrita é mais fria, no sentido de ser o resultado de um processo racional, que implica tempo

maior de reação. As produções que utilizam recursos audiovisuais compõem híbridos, nos quais

podem ser mesclar as reações emotivas da fala, o apelo da linguagem sonora e visual, assim

como a eventual racionalidade do discurso escrito.

A multimodalidade da comunicação online, à qual fomos apresentados nos capítulos

anteriores (DIAS, 2000), traz o desafio de congregar diversos códigos em uma situação de

instantaneidade e de quebra da hierarquia da comunicação tradicional. O tempo diferenciado de

resposta, a presença/ausência simultânea dos envolvidos no processo e a reação emotiva são

elementos que por si só alteram todo o processo de comunicação (GUTIERREZ, 2004). É

precisamente disso que estamos falando ao abordar a qualidade das interações que vivenciamos

na experiência com a turma de História do 9º ano da escola com que trabalhamos em nossa

pesquisa.

Em nossa experiência, isso ficou bem claro já a partir da atividade com a mídia social

Facebook, quando pudemos ter contato pela primeira vez com os formatos e os tempos

específicos de uma comunicação mediada pela tecnologia. Já fizemos menção às ferramentas

didáticas utilizadas nessa atividade, como foi o caso dos textos curtos e dos recursos visuais de

interatividade que utilizamos para dar um tom mais coloquial às interações efetuadas.

A turma se mostrou mais à vontade, contudo, na comunicação tradicional, por meio de

perguntas em sala de aula, presencialmente, do que nas postagens escritas na rede social.

Talvez isso tenha se dado pelo receio de errar em termos ortográficos e gramaticais, levando em

conta a perenidade da escrita e o fato de que essas mensagens eram objeto de avaliação.

Seja como for, o espaço que tivemos de discussão em sala de aula foi o suficiente para

efetuarmos as interações necessárias para o andamento das atividades. Aqui, a fala presencial

serviu como um moderador e um elucidador da interação online. Ela permitiu a “leitura” da

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situação como um todo – as expressões faciais, as mãos, a postura, o tom da voz – elementos

que não podem ser acessados na comunicação virtual mediada pela palavra escrita.

Isso faz pensar sobre o papel relevante e até o momento insubstituível da comunicação

oral presencial, que tantas vezes é referido como uma vantagem do ensino presencial frente às

experiências de ensino à distância (SANTAELLA, 2004).

Remete-nos igualmente aos recursos que vêm sendo desenvolvidos no âmbito

tecnológico para otimizar a comunicação mediada por TICs: chamadas de vídeo, mensagens de

áudio, audiodescrição para surdos etc. São respostas que se agregam ao pacote de soluções

que a indústria midiática constrói de forma permanente para que o usuário tenha uma

experiência cada vez mais completa no mundo virtual.

Todavia, por prudência metodológica e para evitar o ruído causado pelo excesso de

recursos, optamos por não sobrecarregar o aluno com as informações necessárias para efetivar

esses níveis de comunicação na tarefa com o Facebook. Como dissemos, já a novidade do uso

da rede social pareceu-nos inovação suficiente nesse primeiro passo que demos em direção ao

uso das TIC.

Mas ficam os ensinamentos relativos às interações ocorridas: elas estão diretamente

relacionadas com a linguagem e o meio utilizado. Faz-se necessário potencializar o uso de cada

um a partir de seus próprios recursos: o caráter imediato da fala, da oralidade; o caráter mais

perene e impessoal da escrita; o impacto da linguagem visual. São muitos os elementos que

podem ser agregados ao potencial da comunicação mediada pelas TIC em sala de aula.

As interações feitas no uso das TIC em outras atividades, como a de fotografia e de

elaboração do vídeo sobre a 1ª e 2ª Guerras Mundiais, mostraram-se mais profícuas. Aqui os

alunos pareciam estar bem mais à vontade para realizar as tarefas e para refletir sobre elas em

conversas entre si e com o professor, conforme anotamos em nosso Diário de Bordo.

O vídeo produzido foi a tônica naquela semana, tendo havido muitos comentários. A escola, com pouca tecnologia educacional para oferecer para os alunos, demostra que pode fazer mais com o que tem à disposição, e criar mecanismos de desenvolvimento maior na educação. Solicitei legendas nas fotos. A foto ajuda no entendimento, mas pode fornecer informações adicionais (Diário de Bordo, 13/05/2019).

O entendimento dos enunciados se fez mais claro na comunicação direta, presencial,

provavelmente pela possibilidade de o aluno sanar suas dúvidas imediatamente, sem o tempo

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de espera que pode ocorrer na comunicação online. O tempo diferenciado de uma e outra forma

de comunicação tem certamente alguma influência na qualidade das interações efetuadas.

Mas há também a questão da exposição pública que está implícita na comunicação

mediada pela rede. O aluno pode se sentir mais tímido em se manifestar publicamente, com

receio de cometer algum erro ou uma gafe. Nesses casos, parece, a tendência é não dizer: não

se manifestar, não comentar, não curtir. Assim como fica em silêncio em sala de aula para não

passar vergonha por supostamente não saber, o aluno pode silenciar nos grupos de discussão

na web pelo mesmo motivo, especialmente porque sabe que está sendo avaliado.

Em alguma medida, há paralelismo ou semelhança entre a lógica do mundo “real” e a

do mundo online, embora sempre com peculiaridades. Isso a ponto de alguns estudiosos (LÉVY,

1996; 1999; JENKINS, 2009) sugerirem uma possível indiferenciação progressiva entre esses

dois níveis de experiência: estaríamos tão imersos no ambiente virtual que ele já não seria uma

dimensão à parte da realidade, mas um aspecto da realidade.

No caso das interações via Facebook com a turma, há certamente a dimensão comum

da experiência de ser avaliado, de conversar com o professor, de fazer uma atividade. Mas

mostrá-las para o restante do grupo não é o mesmo do que conduzi-las na esfera mais restrita

do contato professor-aluno.

Eis um ponto que precisamos registrar, então: a pressão social do grupo, do entorno,

como elemento presentes nas interações via Facebook. As regras da comunicação um–um (de

uma pessoa para outra) não são as mesmas quando se considera a comunicação um–muitos ou

muitos–muitos. Muda a hierarquia, muda a percepção da situação para todos os envolvidos.

Quando o aluno vinha perguntar, depois de já feito a atividade, em particular, sobre

determinada dúvida que teve na atividade já postada na rede social, percebíamos que estava em

ação nesse momento o seu entendimento sobre como de fato funciona ambiência da rede

online. Assim, a resposta que daríamos em público, também nós a dávamos em privado,

respeitando a pressão do grupo sobre a situação concreta.

Esses são alguns indícios que anotamos no Diário de Bordo sobre a interação via

Facebook e que talvez contribuam para a reflexão sobre as formas de nos comunicarmos em

sala de aula com a mediação das TIC na rede social.

Seja como for, nas interações com as TIC fora do ambiente online – atividades com

fotos e com vídeos – houve maior participação e com melhores resultados. O fato de se

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dedicarem à resolução de tarefas práticas – fotografar, gravar, editar, finalizar o material – pode

ter sido o diferencial para a qualidade as interações com essas TIC (SILVA, 2001).

O interesse da turma era despertado logo de início, com o anúncio sobre as atividades.

O fato de envolverem viagem e pesquisas fora da sala de aula parecem ter contribuído para

aumentar a interação tanto no nível tradicional – fala e escrita presencial – como no nível

mediado por TIC – grupos de WhatsApp e trocas de mensagens por mídias sociais.

O manuseio de câmeras fotográficas com o objetivo de produzir e analisar fotografias

revelou-se uma atividade de grande apelo para turma. Os termos uma cultura de selfies e de

exposição de fotográfica virtual em aplicativos como o Instagram ajuda talvez a explicar a

naturalidade com que a turma encarou a tarefa e a qualidade dos trabalhos resultantes.

Afinal, já existe uma cultura da fotografia e da imagem, assim como o amplo acesso aos

meios técnicos de produção – câmeras, tablets, celulares etc. Tudo isso contribuiu para tornar a

atividade de fotografia um momento de efetiva interação da turma com a atividade e dos alunos

entre si e com o professor.

Novamente, é preciso atentar para a importância das atividades que implicam uso e

manuseio prático de materiais, em situações que são relativas à prática laboratorial. Elas

parecem concentrar potencialidades muito interessantes para o teor das interações.

Ao mergulhar na solução de questões palpáveis, ao observar o processo de feitura e ao

participar da elaboração dos produtos, o aluno parece tender a se soltar naturalmente. O

“censor” interno de cada um tende a relaxar e a comunicação flui de maneira mais natural.

Obviamente que não estamos sugerindo que a tecnologia seja por si só uma panaceia

para a questão da qualidade das interações no ensino. Mas procuramos mostrar pelo relato da

experiência conduzida que ela, a tecnologia, certamente pode incrementar as interações, desde

que atentemos aos elementos que estão em jogo (LÉVY, 1999).

No caso, chamamos a atenção para os elementos constituintes do contexto em que

ocorreram as interações: a menor ou maior formalidade; o tipo de comunicação prevalente – se

oral, se escrita, se multimodal –, as regras que regiam a situação – se havia avaliação ou não

por parte do professor – entre outros elementos que compunham as situações analisadas.

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5.1.7 Quanto aos materiais produzidos

Neste segmento deitaremos nosso olhar para os materiais que a turma produziu ao

longo do período letivo e que se relacionam com as atividades de uso das TIC: aqui estão

incluídas as fotografias da atividade sobre este tópico, bem como a atividade de produção de um

vídeo sobre a Primeira e Segunda Guerra Mundiais. O que nos interessa enfocar, nesse

segmento, são os produtos propriamente ditos, os materiais que resultaram das atividades

didáticas e dos estudos que conduzimos no período de nossa pesquisa. Eles incluem as TIC em

seu processo de pesquisa e de elaboração final e foram pensados como formas de aplicação

prática do conhecimento sobre a tecnologia, voltada para a disciplina de História.

Em termos estruturais – ou seja, em termos de forma e de conteúdo –, as produções

condizem com o que se espera do uso das TIC: a turma conseguiu realizar as atividades sem

grandes dificuldades no nível técnico. Para tanto, os estudantes fizeram uso de materiais

próprios: as câmeras fotográficas dos aparelhos celulares e as câmeras de vídeo e software de

edição de vídeo também instalados nos celulares.

Para efetuar a elaboração dos materiais, foram feitas orientações presenciais em sala de

aula, nas quais explicamos os tipos de materiais e os formatos que esperávamos encontrar nas

produções da turma.

Salientamos, desde o início, que era necessário atentar para as questões de forma –

que incluem linguagem, roteiro, a “gramática” utilizada pelo meio de comunicação, o

acabamento final – e de conteúdo – o trabalho de pesquisa conceitual prévio, o tipo de resposta

encontrada para a tarefa proposta, a consistência da argumentação apresentada – e que ambos

os aspectos estavam sendo avaliados pelo professor, assim como questões ligadas à

pontualidade e à participação efetiva nas atividades.

As produções fotográficas foram efetuadas na viagem de estudos que realizamos à

cidade de Panambi, quando visitamos o Museu Militar. Nossa intenção era aplicar a uma tarefa

concreta os fundamentos da linguagem fotográfica e ver como a turma se envolveria e realizaria

a atividade. O produto final desse processo foram as fotografias elaboradas pelos alunos, uma

amostra da qual pode ser conferida na Figura Y;

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Figura 14 - Fotografia produzida na visita ao Museu Militar de Panambi – RS

Fonte: Allana Viegas.

Na figura abaixo, temos outra amostra do material produzido e postado na rede social

Facebook.

Figura 15 - Imagem inicial da apresentação das fotografias

Fonte: Gabriel Sampaio.

Também solicitamos à turma que produzissem vídeos a partir do tema da Primeira e

Segunda Guerra Mundiais. Aqui tivemos contribuições muito interessantes, que já começaram a

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ser efetuadas aquando da atividade com fotografia. Um dos grupos pelo menos fez a atividade

com o uso de software de edição de imagens, o que deu a ela um caráter híbrido, entre a

fotografia e o vídeo.

A nosso ver, isso demonstra o quanto as linguagens se complementam e se conectam

em nossa época, o que nos remete ao conceito de convergência, abordado na revisão de

literatura (JENKINS, 2009).

Nas atividades com o vídeo, sentimos uma participação maior, com resultados que

revelam a criatividade da turma e o uso dos conhecimentos históricos que foram previamente

estudados. Talvez isso se deva à interação havida entre os alunos para produzirem os vídeos, já

que era uma atividade em grupo. Talvez também pelo fato de a interação ocorrer

presencialmente, com as orientações sendo feitas e as dúvidas sendo tiradas em sala de aula.

Ou talvez ainda se deva ao roteiro (SARAIVA; CANITO, 2004) construído previamente, que serviu

de guia para a elaboração dos vídeos e cuja discussão em nível conceitual abordamos

previamente. A pesquisa histórica que embasou as narrativas produzidas teve certamente um

papel relevante no produto final.

No Diário de Bordo, registramos algumas observações sobre a experiência com o vídeo:

Vejo que a produção de vídeo agrega muita aprendizagem de diferentes formas: primeiro precisam interpretar o texto para a produção. Os alunos vão ler, rever, sem isso não vão ter capacidade de produção, criando uma cronologia e detalhamento na produção. Segundo, farão pesquisa para incrementar, usando fotografia, tabela e maneira de distribuição. Terceiro, a montagem final, os detalhes, o emprego da voz, forma correta de dicção, contribuem para autoavaliar. Quarto, aprendem a fazer roteiro e, neste caso, uns sobressaem sobre outros dentro do grupo com as tecnologias, mas todos acabam aprendendo. O trabalho produzido permite ser visto por várias pessoas, e a satisfação para os alunos mostra que valeu o trabalho, porque o retorno chega, e os enche de orgulho (Diário de Bordo, 12/07/2019).

O fato é que sentimos que nessa fase de nossa pesquisa as coisas realmente fluíram de

maneira mais tranquila, e os materiais produzidos são a prova disso. A Figura 16, abaixo, mostra

um vídeo que foi produzido por grupo de alunos já na atividade de fotografia.

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Figura 16 – Vídeo produzidos para a atividade de fotografia

Fonte: Captura de tela do Facebook.

Aqui tivemos iniciativa por parte de um dos grupos de alunos em mostrar a produção já

na linguagem do vídeo, o que avaliamos de forma positiva, já que demonstra iniciativa e

criatividade por parte dos alunos envolvidos. Foi o que registramos no Diário de Bordo:

Na segunda tarefa, de produção com fotografia, teve um grupo que fez mais do que o solicitado, entraram na dinâmica e produziram um vídeo. Mostra a capacidade do grupo de exercer a criatividade, sendo útil o conhecimento aprendido fora da escola, em tecnologia, como os cursos de informática em empresas particulares. Agora pode agregar à produção e incentivar outros alunos a buscar. Faz-se útil, antes seria usado somente quando entrasse no mercado de trabalho. Agora, ao contrário, vai levar mais esse conhecimento. No mercado de trabalho, a exigência, no sistema de automação que se amplia a cada momento, vai colocar um valor a mais no seu currículo. A escola passa a colaborar naquela tarefa de atender às exigências de mercado na informatização de produção industrial (Diário de Bordo, 13/05/2019).

O registro demonstra nossa grata surpresa com a iniciativa do grupo, que foi além do

que era pedido no enunciado da atividade, trazendo já o vídeo e sua linguagem para a atividade

com a fotografia. A convergência apontada por Henry Jenkins (2009) parece ter se manifestado

nesse ponto.

O elemento didático que parece ter contribuído mais para que alcançássemos o

resultado positivo foi, a nosso ver, a organização das instruções e a interação dos alunos. Isso

nos remete às palavras de Salman Khan (2013), quando projetava uma escola para o futuro:

atividades que envolvam a turma de forma a solucionar questões práticas. Se o engajamento

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não foi plenamente obtido nas discussões que conduzimos via Facebook, por outro lado foi

plenamente alcançado nas atividades que envolviam o fazer prático e presencial. O desafio

parece ser levar o mesmo tipo de atividade para a esfera online, ajustando os mecanismos que

permitem interação nesse ambiente.

De qualquer forma, só o fato de disponibilizarmos os produtos das atividades nas redes

sociais já aponta para a conexão possível entre o mundo “real” e o mundo “virtual” (LÉVI, 1996;

RECUERO, 2009).

5.1.8 Quanto à estrutura narrativa e ao uso das TIC

Os materiais que a turma construiu ao longo do período letivo foram, como vimos, de

diferentes naturezas: interações via Facebook; fotografias sobre exposição no Museu Militar de

Panambi; vídeos sobre a Primeira e Segunda Guerra Mundiais.

Nosso interesse nesse ponto é verificar que tipo de narrativa a turma conseguiu elaborar

para cada uma dessas tarefas. Nosso olhar enfoca neste segmento tanto a linguagem verbal –

que inclui a comunicação oral e escrita – como a linguagem visual – que inclui as fotografias e a

imagem em movimento. Interrogamos a maneira como foram organizadas as mensagens no

contexto do uso das TIC. Para tanto, trazemos alguns exemplos do material produzido bem

como algumas anotações do Diário de Bordo em que registramos aspectos da construção dos

materiais.

Para começar, chamamos a atenção ao registro escrito, que encontramos nas

postagens do Facebook, e ao qual já fizemos referência ao abordarmos o uso das TIC feito pela

turma.

É necessário frisar que as mensagens elaboradas nessa fase de nossas atividades foram

bastante marcadas pela pesquisa de material via buscadores de internet, como Google e Firefox.

A estrutura das mensagens resultou dessa pesquisa prévia, num nível que chegou a

comprometer a originalidade das postagens feitas pela turma. A manobra de “copiar e colar”

marcou a produção textual nessa atividade com o Facebook. As narrativas produzidas aqui foram

muito mais o resultado da reprodução do que da escrita do aluno (DIAS, 2000; GUTIERREZ,

2004).

Vimos que os textos resultantes dessa manobra de cópia de conteúdo pronto, já

disponibilizado em sites da internet, tem baixíssimo grau de autoria por parte de quem fez a

postagem. Na maior parte das vezes, uma simples pesquisa pelo buscador Google mostra que a

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postagem foi baseada na primeira sugestão da palavra-chave da atividade. Sites de auxílio aos

estudos ou sites sobre ciência e sobre conhecimento, como os ligados ao Governo e a Wikipédia,

figuram entre os mais utilizados pelos alunos.

A mera reprodução mescla-se, eventualmente, com traços de apropriação por parte do

estudante: uns fazem menção às informações retiradas dos sites como fonte de pesquisa. Mas a

maioria apropria-se do conteúdo da internet sem qualquer distinção entre o que é seu e o que é

do outro. Trata-se de uma espécie de naturalização da cópia.

Mas esse fenômeno não é exceção nos dias atuais, em absoluto.

Vimos previamente, na revisão de literatura, que a era da comunicação online trouxe

diversas mudanças na relação do indivíduo com os materiais disponíveis na internet (LÉVY,

1999; JENKINS, 2009). A pesquisa escolar certamente vem sendo afetada pela nova forma de

se acessar informação. A facilidade de pesquisar em repositórios especializados, a onipresença

dos buscadores, os aplicativos que permitem tradução e busca minuciosa por tema – tudo tende

a propiciar a apropriação dos conteúdos de forma livre e indiscriminada.

Foi o que aconteceu com a turma nessa fase de nossa pesquisa de campo. A maioria

encara a tarefa de pesquisa como o apropriar-se do conteúdo da web, sem sequer mencionar a

fonte utilizada. Percebendo essa tendência, colocamos explicitamente nos enunciados das

questões a necessidade de o aluno mencionar a fonte original, colocando o endereço que fora

pesquisado o conteúdo da postagem. Ocorre que essa menção, que não foi seguida por todos,

era apenas parte da tarefa. Pois pedíamos também que o aluno escrevesse um texto curto com

suas próprias palavras.

Poucos o fizeram, no entanto. A autoria própria se encontra raramente nas postagens do

Facebook feitas pela turma.

O mecanismo de reprodução pura e simples foi a regra, em que pesem as orientações

dadas por nós.

Utilizar as fontes disponibilizadas na internet como base para a pesquisa escolar é uma

operação elementar, que deve a nosso ver se o ponto de partida para que possamos dar início a

muitas tarefas didáticas (LEMKE, 2002; GUTIERREZ, 2004). O ponto de chegada, porém, deve

ser mais amplo: uma produção em que se possa perceber a apropriação e o entendimento

efetivo do aluno acerca dos conteúdos estudados.

Nas produções fotográficas, por outro lado, observamos mais criatividade e traços

autorais. Aqui os alunos tiveram de colocar mãos à obra literalmente: além de pesquisarem

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previamente sobre o assunto, eles também tiveram de produzir as fotografias, como

mencionamos previamente.

Aqui, a turma não poderia simplesmente “copiar e colar” conteúdo alheio: as fotos

tinham de ser feitas pelo próprio aluno, com os equipamentos disponíveis – câmeras de celular.

O estudo dos conteúdos era a parte inicial da atividade com as fotos, que incluiu

também a viagem à cidade de Panambi-RS, para conhecer de perto o tema dos equipamentos

militares. A produção prática era a fase final do processo. Isso resultou em produtos que incluem

os conceitos e a organização imagética das informações. O aluno tinha de contar sua história por

meio de legendas, dando sentido à narrativa por meio da interação entre texto e imagem.

Aqui tivemos maior envolvimento da turma e produções com traço autoral. O fato de

manusearam o aparelho celular cotidianamente contribuiu, ao que parece, para o nível de

excelência técnica de algumas produções.

Algo semelhante observamos na produção final, o vídeo sobre a Segunda Guerra

Mundial. Também aqui era necessário unir conteúdo e narrativa de forma a contar uma história,

dessa vez por meio da linguagem do vídeo.

As produções mostram que a turma de fato conseguiu reunir os dois aspectos da tarefa

solicitada: informação de cunho histórico de um lado, narrativa histórica autoral de outro. Trata-

se de vídeos curtos, com cerca de cinco minutos, em que os grupos de estudantes tinham de

contar suas histórias acerca da Primeira e Segunda Guerra Mundial.

A base conceitual e factual foi semelhante: além dos temas estudados em sala de aula,

tivemos as pesquisas na internet, que embasaram as atividades efetuadas previamente – no

Facebook e com as fotos.

Os formatos utilizados pela turma tiveram a marca do documentário, que une a

informação histórica e jornalística, e pode agregar diversos recursos, com entrevistas, imagens

de arquivo e dramatização. Aqui a criatividade esteve em primeiro plano: foram diversos tipos de

enredo e muitas maneiras de contar a mesma história. Os recursos técnicos utilizados foram os

aparelhos celulares, dos quais os alunos utilizaram as câmeras de gravação de vídeo, e

aplicativos e software de edição para vídeo.

Algumas das produções ecoam a cultura do site de vídeos Youtube, e parecem ter se

inspirado nos principais nomes que movimentam aquele site. Outras produções parecem ter se

inspirado nas narrativas do cinema e da televisão, assim como na tradição literária.

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O fato de a cultura da imagem ser hoje bastante forte, sobretudo para a formação da

nova geração de estudantes, deixou suas marcas nas narrativas construídas pela turma. O uso

dos recursos da linguagem oral e escrita parece ser subsidiário da força da imagem quando se

trata da linguagem do vídeo. Tal fenômeno merece atenção quando consideramos o uso dessa

ferramenta em sala de aula.

Os grupos que construíram roteiros prévios (SARAIVA; CANITTO, 2004) com mais

cuidado obtiveram produções mais consistentes, tanto em nível de conteúdo como de forma.

Isso parece apontar para o necessário diálogo entre os elementos que estão presentes na

linguagem do vídeo – som, imagem, texto –, e a relação entre eles, sua “gramática” própria.

5.1.9 Quanto às percepções sobre o uso das TIC

Neste segmento consideramos as respostas ao Questionário 4 da disciplina, centrado na

percepção dos alunos sobre a experiência com as TIC ao longo do primeiro bimestre letivo de

2019. É a verificação posterior às experiências e atividades que a turma vivenciou ao longo do

período de estudos, que incluem as pesquisas com o auxílio do Facebook; a atividade com a

fotografia no museu da aeronáutica na cidade de Panambi; a elaboração dos vídeos sobre as 1ª

e 2ª Guerra Mundial, já no final do período analisado. Todas essas atividades também foram

monitoradas pelo Diário de Bordo que escrevemos ao longo desse período, e que permitiu o

registro das percepções dos alunos sob o ponto de vista do professor. Utilizamos a ferramenta

do Diário, neste ponto, para auxiliar a interpretar as respostas dos alunos, complementando-as e

as contextualizando a partir dos dados e fatos que registramos no Diário.

Vimos previamente que a experiência da turma era variada quanto ao uso das TIC,

sendo que a maioria fazia uso delas para entretenimento e eventualmente para estudo, sem, no

entanto, considerá-las como um elemento essencial para as atividades escolares.

No Questionário 4, aplicado já na fase final da investigação, essa percepção mudou de

forma sensível. Tivemos uma percepção muito mais atenta ao papel das TIC, agora como

elemento importante para as atividades didáticas e o estudo. É o que se percebe na síntese das

respostas, que podem ser resumidas nos termos seguintes:

1 – Quanto aos fatores de aprendizagem com o uso das TIC em sala de aula, a turma

em sua maioria (5) os relacionou aos instrumentos utilizados. Um remeteu à facilidade de

transmissão de conteúdo e outro afirmou haver coisas boas e ruins no uso.

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2 – O Datashow foi o mais lembrado (6) ao lado do computador (3), livro (1) e Google

(1).

3 – Todos (7) afirmaram não ter nenhuma dificuldade no uso das TIC na aprendizagem.

4 – Sobre diferenças no uso social e educativo, a maioria (4) disse ter ficado mais fácil,

outros tangenciaram o tema (2) e (1) não viu diferença.

5 – Sobre como avaliavamm o uso em sala, comparando com e sem TIC, a grande

maioria (6) viu de forma positiva a experiência, e apenas (1) não viu diferença.

6 – Sobre como avaliam os colegas nas atividades com as TIC, a maioria (5) os avalia de

forma positiva, destacando o interesse e a concentração nas atividades, e apenas (2) como

desinteressados.

7 – Sobre as mudanças em sala com o uso das TIC, a maioria (3) destaca o volume

maior de matérias e de conteúdo, (2) destacam que não há mais escrita e (2) tangenciam a

questão.

8 – Sobre se o professor contribuiu no processo, todos (7) responderam que sim.

9 – Sobre se as TIC contribuíram no ensino, todos (7) responderam sim (considerando-

se pelo contexto que 3 delas de forma presumida).

Os alunos não se estenderam nos comentários, sendo que as repostas se ativeram ao

essencial e às vezes sem distinguir o aspecto que estava sendo solicitado na pergunta,

sobretudo no caso das questões 8 e 9.

Apesar do baixo retorno desse último questionário, vê-se que os alunos já têm mais

consciência sobre o papel que a tecnologia desempenha na sua relação com o conhecimento,

especificamente para a pesquisa no âmbito da História. Tais percepções, de forma geral,

também se fizeram perceber em nossas anotações no Diário de Bordo. Notamos que o uso das

TIC, apesar de ser uma constante na vida do aluno, nem sempre era percebido em sua

dimensão de protagonismo para os estudos.

Um exemplo disso é o uso que a turma faz da ferramenta Google, como buscador de

informações na internet. Ao final de sua experiência com as atividades envolvendo explicitamente

o uso das TIC, a turma passou a identificar a pesquisa no buscador como importante ferramenta

de estudo. Na atividade com o Facebook esse mecanismo de pesquisa foi utilizado de forma

quase automática, revelando uma postura de incorporação acrítica e não necessariamente

enriquecedora para o estudo.

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Vimos isso ao considerar, em item anterior, que os fóruns de discussão eram o mais das

vezes respondidos com trechos copiados de sites como a Wikipédia e outros voltados para os

tópicos da educação. Mas não havia necessariamente a apropriação desses conteúdos pelos

alunos, já que eles não faziam a interpretação dessas informações nem as colocavam em seus

próprios termos, conforme solicitávamos nos enunciados das atividades propostas.

O fato é que a incorporação da tecnologia nem sempre vai resultar necessariamente em

melhores estratégias didáticas nem em avanços para o conhecimento. Se não houver a análise

crítica e a reflexão sobre o que se está fazendo, a técnica tende a ser apenas um meio, sujeito

ao bom ou ao mau uso. A experiência com o Facebook nos alertou para essas questões que vêm

sendo discutidas há um bom tempo (GUTIERREZ, 2004; ALMEIDA; VALENTE, 2011), mas que

somente com a experiência prática pudemos de fato encarar.

Nesse sentido, as reflexões que conduzimos em nosso Diário de Bordo sobre as

atividades na rede social ajudam a clarear a percepção que os alunos tiveram da experiência

assim como o próprio professor naquele momento:

[...] o aluno acha que o desenvolvimento de uma atividade é para o professor ver e fornecer a nota, sobre o que ele produziu; no caso da atividade na rede social, serve principalmente para os colegas da classe: como fez, que assunto abordou, comparar o seu trabalho com o do colega, a dinâmica no trabalho, exemplos que pode seguir em outra produção. Tudo é enriquecedor quando se trata de aprendizagem (Diário de Bordo, 13/05/2019).

Da experiência de pesquisa com o uso do Facebook, a turma parece ter a percepção de

que a pesquisa é de fato o que foi feito: a busca pelo Google da definição dos conceitos

sugeridos pelo professor. Em certos casos, há como que uma naturalização dos meios de busca

e da citação sem crédito às fontes consultadas. Em outros, o aluno demonstra que reconhece o

limite entre o que é seu e o que é de outras fontes, e que percebe o papel desempenhado pela

tecnologia nesse processo. Assim, a percepção da turma sobre essa primeira experiência parece

refletir, de fato, o uso efetivamente feito da tecnologia: uma ferramenta por vezes tomada de

forma irrefletida para alcançar um determinado objetivo (MARDA; MILAN, 2018).

Necessário registrar novamente que por diversas vezes chamamos a atenção da turma

para a necessidade de referir as fontes e de atentar para elas ao procurar informações. Nas

respostas ao Questionário 4, aparecem alguns indícios sobre como a turma lidou com isso: o

acesso às TIC facilita a pesquisa. Tais respostas relevam talvez o início de uma maior

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consciência acerca do uso da TIC nas atividades de estudo, sobretudo por parte daqueles que

haviam adquirido o hábito de usá-las sem refletir sobre esse uso.

Algo diferente se pode observar na percepção dos alunos quanto ao uso das TIC de

forma mais ampla. Nesse ponto, acontece um fenômeno interessante: a turma avalia o uso dos

equipamentos em termos positivos, sem os temores que se manifestaram no Questionário 1. A

ampla maioria demostrou segurança no uso dos equipamentos e não referiu dificuldade ao

avaliar a experiência.

A fala dos alunos reflete o que havíamos registrado no Diário de Bordo: a turma parecia

bem mais à vontade para a realização da atividade de registro fotográfico, disposição essa que já

percebêramos na viagem de estudos que realizamos para tal fim. O uso do celular para tirar

fotos e gravar vídeos é talvez a chave para entender as respostas dos alunos sobre essa

atividade. Aspectos técnicos, como a incidência de luz e o ângulo, o enquadramento e os efeitos

especiais da edição – sombreamento, cortes, intensidade da cor etc. –, necessários para se

obter um bom resultado talvez ajudem a explicar a percepção diferenciada da turma quanto à

relação com as TIC nessa atividade.

Isso porque o aluno, ao fazer as fotos, tem de considerá-las de forma bastante objetiva,

pois elas serão objeto de apreciação visual, o que implica a predisposição em ouvir a opinião dos

colegas e do professor, de consultá-lo para saber o que acharam da fotografia, de tirar dúvidas

sobre como obter esse ou aquele resultado, entre outros fatores que, por si sós, já demandam

uma postura mais aberta ao diálogo e à reflexão sobre o que se está fazendo.

A familiaridade com as câmeras de celular tem também o seu quinhão no rol das

explicações para a percepção da turma nesta atividade com as fotografias. Mas aqui não há

naturalização da cópia, pois a atividade induz por si a um fazer que, esse sim, está muito

naturalizado no cotidiano do aluno – a cultura das selfies, o aplicativo Instagram e outros fatores

ajudam a entender esse fenômeno, na linha do que nos propõe Henry Jenkins (2009).

Na mesma linha, podemos analisar as respostas relativas à atividade de elaboração de

vídeo. Aqui também se percebe que a percepção dos alunos após a experiência vivenciada no

período letivo traz a marca da reflexão: os temores iniciais foram substituídos pela autoconfiança

no trato com os equipamentos.

O diferencial, nesta atividade, foi o grau elevado de trabalho em grupo, sendo

necessário, para chegar ao resultado final, uma coordenação das várias etapas do processo

entre os integrantes de cada grupo. Isso certamente exigiu da turma uma racionalidade maior na

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hora de definir seu projeto e de efetivamente realizá-lo. E essa racionalidade transparece, a

nosso ver, nas respostas ao questionário final. Nelas se pode notar a ênfase dada ao

planejamento e às fases da atividade, bem como ao diálogo com os colegas.

No Diário de Bordo, também pudemos registrar alguns elementos que ajudam a

contextualizar esse ponto.

Muito se pergunta: qual o momento ideal para inserir vídeos? Uns falam que no início da nova matéria; outros, interagindo e contextuando juntos; e outros depois do conteúdo. Sempre costumo empregar didaticamente do meio para o final daquele conteúdo. Vejo que os alunos assimilam melhor o vídeo quando têm um conhecimento prévio; vai reviver, somar, compreender melhor o conteúdo e a incorporação de novo conhecimento, que o vídeo geralmente traz novos elementos que não estavam no livro didático (Diário de Bordo, 12/06/2019).

O envolvimento da turma nos chamou a atenção, como se vê nas anotações do Diário,

mais do que o que observamos nas duas atividades anteriores. O caráter de atividade em grupo

parece-nos a chave para entender as razões da percepção da turma sobre o uso das TIC na

atividade com o vídeo. Tal como na fotografia, ela demanda um mínimo de domínio técnico, num

grau talvez mais complexo que o da fotografia: a imagem em movimento implica uma linguagem

própria, como sabemos, assim como a presença do áudio, o roteiro, e sobretudo a confluência

dessas linguagens a partir da palavra escrita que serve de base, via de regra, para as narrativas

elaboradas.

Com isso, queremos ressaltar que foi necessária, nessa fase das atividades, uma maior

sincronia entre os alunos, entre esses e o professor, e entre todos e a possível audiência dos

vídeos elaborados. Essa complexidade, a nosso ver, se reflete nas percepções externadas pelos

alunos. Eles acabam por se estender sobre os aspectos técnicos da experiência e na relação

entre esses e os conteúdos estudados – no caso, as informações e fontes sobre a Segunda

Guerra Mundial.

Novamente aqui, temos a presença de um aparato técnico que se impõe à reflexão,

dada a necessidade de considerar questões como a ideia da narrativa (MEDINA, 2006), a forma

como ela se materializou num roteiro (SARAIVA; CANNITO, 2004), os recursos utilizados para

contar a história – sonoros, visuais, textuais, dramáticos etc. Isso resultou em considerações

específicas sobre o uso das TIC para a realização da atividade, que mostram como o aluno

passou a lidar com a variável da tecnologia no seu processo de aprendizagem.

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Quando afirma, por exemplo, que a atividade exigiu esforço para dominar a linguagem

do vídeo, o aluno tem de considerar os imperativos da tecnologia, suas limitações e

possibilidades, na realização da tarefa proposta. Aqui, diferentemente do que observamos na

atividade com o Facebook, referida acima, não é possível “copiar e colar” as repostas no

fórum... O que força, de certa forma, a uma outra postura diante do conhecimento – mais ativa,

mais questionadora e mais focada no fazer.

Some-se a isso a necessária interação com os demais integrantes do grupo, e temos um

vislumbre sobre a boa acolhida da atividade e os resultados que obtivemos com ela. Talvez

também o fato de ter sido a última das várias atividades propostas tenha resultado em uma

compreensão mais aprofundada, que só pode advir com a maturação e o tempo.

Sintetizando o que recolhemos quanto à percepção da turma no uso das TIC, é possível

afirmar que os alunos absorveram o uso da tecnologia ao longo do processo, reagindo conforme

a complexidade da atividade proposta, assim como conforme o grau de familiaridade com o uso

da ferramenta e conforme o tipo de interação havida. Todos esses fatores, e outros que talvez

nos tenham passado sem o devido registro, concorreram para formar uma percepção acerca das

TIC por parte da turma. Que percepção seria essa? A princípio, um entendimento sobre como a

tecnologia pode contribuir para as atividades propostas.

Ao trazer para o primeiro plano a presença das TIC no processo de ensino e

aprendizagem, nossa intenção era justamente suscitar a reflexão por parte do aluno acerca

desse processo, instilando a visão crítica no cotidiano da escola (FREIRE, 1987). A turma passou

a considerar o instrumento técnico sob a dimensão do aprendizado, não apenas como um meio

neutro a ser empregado para a consecução de determinado objetivo. A avaliação feita pelos

alunos sobre esses instrumentos apresenta diferentes vieses: alguns ressaltam a familiaridade já

existente na vida cotidiana, o caráter quase automático do uso feito das TIC. Outros se detêm

sobre aspectos normalmente ignorados, ressaltando o estranhamento e as novas possibilidades

que o uso das TIC trouxe para as atividades em sala de aula.

Ao problematizarmos a experiência, fazendo explícitas as observações que antes ficavam

restritas a uma prática quase automática de uso das TIC, as percepções foram sendo

modificadas, com um olhar mais atento para aquilo que a técnica pode agregar ao ensino.

Assim, por exemplo, uma simples pesquisa no buscador Google, que antes era um

procedimento naturalizado, passou a suscitar questões como a veracidade das informações, da

autoria e da ideologia subjacente ao processo de pesquisa.

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Dessa forma, a depender do grau de envolvimento e da experiência prévia do aluno,

tivemos percepções matizadas, cada uma delas refletindo as peculiaridades da experiência de

uso da tecnologia em diferentes vivências em sala de aula e fora dela.

De qualquer maneira, o material analisado traz elementos que podem contribuir para

que compreendamos o alcance do impacto da tecnologia nas atividades de ensino da área de

História.

5.2 A título de síntese

Após olharmos em detalhe cada um dos aspectos da pesquisa de campo que

conduzimos previamente, é chegada a hora de sintetizarmos os principais resultados da análise.

Trata-se de destacar as principais descobertas da análise, considerando a totalidade das

atividades desenvolvidas, as relações entre elas e delas com o referencial teórico que guiou

nossa investigação até este ponto.

Ao iniciarmos nossa pesquisa de campo, a intenção era perceber como a turma se

apropriava das TIC nos processos de ensino e aprendizagem, como esse processo se

apresentava considerando o impacto da tecnologia e quais as contribuições que as TIC podem

oferecer especificamente para o ambiente de uma disciplina de História. Nesta síntese,

seguiremos o roteiro geral representado pelas respostas obtidas a cada uma dessas questões.

Primeiramente, é necessário destacar que existe uma grande quantidade de trabalhos

acadêmicos sobre o papel e o efeito das TIC sobre os processos de ensino e aprendizagem

(APPLE, 1993; ALMEIDA; BEHAR; TORREZAN, 2009; VALENTE, 2011), alguns desses tendo

servido de base para nossa revisão de literatura. A tecnologia se coloca com uma questão

desafiadora, que ocupa tanto as reflexões teóricas dos pesquisadores como as investigações de

caráter prático.

Na etapa empírica de nossa investigação, pudemos constatar que algumas das questões

permanecem como desafios para os pesquisadores, como é o caso da relação que se estabelece

com as TIC no ambiente familiar e no ambiente da sala de aula. Constatamos que o uso feito

pelos alunos por vezes se manifesta de maneira automática, como algo que está subsumido na

cultura, dependendo do tipo de contato que o estudante tem com a tecnologia. É o que se

observa, como vimos, no uso e manuseio do celular, que se tornou quase mais um órgão do

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corpo do aluno em diversas atividades de seu dia a dia. Na escola isso tem obviamente seus

reflexos.

Muitos alunos se sentem tolhidos quando se pede que desliguem seus aparelhos para

que a atenção se concentre nos pontos da disciplina. Mas ao mesmo tempo também muitos

deles simplesmente não conseguem fazer as atividades da disciplina de forma satisfatória

utilizando o aparelho. Isso vale também para outros recursos técnicos, como a pesquisa na

internet, na grade de programação da televisão, nos aplicativos de celular, entre outros recursos.

Ao que parece, o uso cotidiano está desvinculado na maior parte das vezes de um uso

voltado para a pesquisa e para o aprender. Apenas quando se trabalha intencionalmente com a

tecnologia, mentalizando o aluno para seu uso em prol do conhecimento e da pesquisa, é que

temos alguma resposta no sentido de usá-la para aprimorar as atividades de ensino. Ao menos

foi nessa direção que percebemos os dados obtidos em nossa pesquisa de campo: a turma

mostrou-se consciente do uso das TIC somente quando provocada pelas tarefas que requeriam o

uso e a reflexão sobre o uso de forma explícita.

Vimos previamente que a cultura deste início de século está marcada pelas rápidas

transformações técnicas e pela onipresença da mídia, sobretudo das redes sociais (LÉVY, 1999;

RECUERO, 2009). Os jovens que estivemos acompanhando nesse período fazem parte da

chamada Geração Z, ou seja, da geração que já nasceu no novo milênio, conectada, na era da

internet. A naturalidade com que os alunos se apropriam das TIC parece muito mais um traço

cultural do que uma qualidade ativa para certas demandas do conhecimento em sala de aula.

Há necessidade de orientação e de reflexão nesse uso, para que ele se efetive como um aliado

do conhecimento.

Foi o que vimos, por exemplo, na atividade com a rede social Facebook, que, a nosso

ver, deixou a desejar em termos de conteúdos e resultados da pesquisa. Em vez de

potencializarem suas investigações sobre os tópicos solicitados, a grande maioria preferia

simplesmente usar o Google como uma ferramenta automática e exclusiva de pesquisa, o que,

em lugar de enriquecer as pesquisas efetuadas, acabou por tornar as respostas padronizadas e

por vezes repetitivas.

Cabe portanto repensar a formas como encaramos as TIC e a socialização das novas

gerações que já nascem em contato muito estreito com a tecnologia.

A forma como as TIC impactam sobre as atividades de ensino reflete variáveis como a

didática e o planejamento do processo de aprendizagem. A tecnologia por si só não traz

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necessariamente um benefício, já que é antes de tudo um meio para se alcançar determinados

objetivo. Mas ela pode ser muito melhor aproveitada para o ensino se for pensada e planejada

conforme as necessidades específicas das turmas e dos conteúdos em questão.

Foi nesse sentido que avaliamos as atividades de fotografia e de elaboração de vídeo

documentário, cujos frutos nos pareceram bem mais satisfatórios. O diferencial delas parece ter

sido a maneira como foram planejadas e o tanto que demandaram em termos de organização

dos estudantes e de efetivo envolvimento da turma. Nesses elementos é que parece estar a

chave da incorporação das TIC no ensino: é preciso atentar para a maneira como se pensa na

didática, incorporando as TIC e a reflexão sobre elas como parte do processo.

Questões como o tempo diferenciado das atividades nas redes sociais são um exemplo

disso: sincronizar o tempo presencial e o tempo à distância, de forma a otimizar o processo de

ensino, é uma questão que demanda organização e também reflexão. Em nossa experiência, por

exemplo, notamos que houve certa dificuldade da turma em cumprir os prazos de postagem na

rede social Facebook, e que a qualidade das postagens foi afetada sobretudo pelos que

entregaram as atividades fora do prazo estipulado.

Por outro lado, essa dificuldade era justificada pela turma como decorrente da

necessidade de se dedicarem às tarefas de outras disciplinas. Apesar de considerarmos o prazo

de uma semana para as postagens, essa justificativa de alguns alunos deve ser levada em conta,

dada a novidade e o estranhamento inicial das atividades de ensino mediadas pela internet.

É preciso atentar para a relação com os tempos e os processos que envolvem as

diferentes práticas, sobretudo as questões técnicas no caso das TIC, pois essas acabam por se

sobrepor em certos momentos às demais questões didáticas.

Especificamente quanto às contribuições da tecnologia para a disciplina de História,

foram muitas as pistas e os dados que surgiram em nossa pesquisa de campo. A principal delas

tem relação com a questão das fontes do conhecimento na pesquisa histórica. Vimos

previamente (ORTELLADO, 2018; DALMAZO; VALENTE, 2018; MARDA; MILAN, 2018) que este

ponto é sensível nos dias atuais: na era das chamadas fake news, a verdade está em cheque

assim como está o conhecimento científico.

Nas atividades que conduzimos com a turma, a questão das fontes foi um dos pontos

mais destacados de nosso planejamento, em consonância com o que discutimos previamente na

fundamentação teórica. Pretendíamos verificar, em nível empírico, como a turma usava a

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tecnologia para fazer a pesquisa histórica, que tipo de fonte era pesquisado e quais recursos

eram mobilizados pela turma para concretizar suas tarefas.

Nesse sentido é que as atividades foram pensadas: a pesquisa histórica inicial traria os

elementos de base para as narrativas que seriam elaboradas pela turma. Daí, por exemplo, a

solicitação explícita, na atividade com a rede social Facebook, de que os alunos referissem as

fontes pesquisadas, identificando o seu endereço na rede. Daí também a nossa preocupação em

contextualizar o tema gerador da Primeira e Segunda Guerra Mundiais, na viagem que

efetuamos à cidade de Panambi, e que serviu como mote para a atividade de fotografia e,

posteriormente, para a de elaboração dos vídeos-documentários sobre o tema da Guerra.

Os resultados das atividades, somados às observações que fizemos no Diário de Bordo,

mostram que as fontes históricas são acessadas de maneira muito superficial quando se trata da

pesquisa sobre determinado tópico com base a internet. Ao menos na experiência dessa turma,

a regra foi uma pesquisa que se satisfez quase nos primeiros tópicos encontrados no buscador

Google, como já observamos na análise prévia. Isso acarretou um processo cumulativo, já que

as atividades foram pensadas num crescendo de complexidade.

A pesquisa de base sendo limitada ou pouco aprofundada, seus desdobramentos

também o foram, ao menos em nível conceitual. Em que pese a qualidade e a criatividade das

produções em foto e vídeo, a pesquisa que os embasou poderia por certo agregar mais pontos

de vista e outras versões e personagens, dada a riqueza potencial da internet. Eis um dos pontos

que precisamos observar com mais cuidado quando do planejamento da disciplina de História: o

valor das fontes originais, das personagens históricas, dos testemunhos e dos tipos de registro

que sobreviveram ao tempo.

Para além da internet, há um vasto mundo de registros inacessíveis ao internauta, mas

às vezes muito próximos da realidade da turma. É o caso, por exemplo, das histórias orais dos

anciãos da comunidade que vivenciaram momentos históricos importantes e que são os

testemunhos vivos dos acontecimentos. A não ser que alguém se disponha a registrá-las, as

histórias dessas pessoas se perderão com elas, sem nunca terem sido registradas no mundo

real ou no virtual.

É preciso dar atenção a esses registros, com o auxílio inestimável das TIC, incorporando-

os às pesquisas e disponibilizando-os na rede. Isso realimentaria o ciclo de informações, mas de

maneira contextualizada e humanizada, como testemunho histórico para as novas gerações. E

aqui entra também o papel das narrativas, como vimos na discussão prévia (BENJAMIN, 1980;

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MEDINA, 2006). Trata-se de atentar para a forma como as histórias são contadas, utilizando-se

dos recursos das TIC.

Na investigação que conduzimos, observamos que as narrativas produzidas pela turma

têm potencial para cativar os leitores/espectadores/apreciadores, revelando a criatividade e o

desprendimento da nova geração no uso dos meios técnicos para a produção de mensagens

com linguagens variadas. Pudemos observar in loco um pouco dessa dinâmica de criação, ao

propormos e orientarmos algumas das etapas das atividades de fotografia e de elaboração dos

documentários em vídeo. O que percebemos nesses momentos foi que a turma se serve das TIC

– como as câmeras fotográficas e de vídeo, assim como dos softwares de edição de material

audiovisual – de maneira quase “automática”, incorporando naturalmente as ferramentas às

tarefas propostas. A familiaridade com esses meios contribuiu, sem dúvida, para que as tarefas

práticas tivessem um bom desempenho e os resultados tenham sido bastante satisfatórios. A

nosso ver, é preciso potencializar essa relação, trazendo para o nível da consciência esse

domínio e o que ele implica para a produção do conhecimento e a pesquisa histórica (DIAS,

2000; BEHAR; TORREZZAN, 2009).

Um primeiro passo nessa direção, de tornar consciente o uso das TIC, demos ao

questionar a turma na verificação final. As respostas que obtivemos nessa fase apontam, a

nosso ver, para uma tomada de consciência pela turma acerca do uso da tecnologia como

ferramenta de acesso ao conhecimento. Esses momentos de reflexão se fazem necessários

amiúde, como um feedback que vai enriquecer o processo nas etapas seguintes, ao pensarmos

nas disciplinas das próximas turmas. Os autores que trabalham com as TIC (BEHAR;

TORREZAN, 2009; ALMEIDA; VALENTE, 2011; LIMA, 2012) têm insistindo nesse ponto, e a eles

juntamos nossa pesquisa e nossa experiência pessoal como testemunho. De fato, o uso da

tecnologia, apesar de disseminado no cotidiano de boa parte dos estudantes, é ainda pouco

utilizado na tarefa da pesquisa escolar e da ampliação do conhecimento científico.

A nosso ver, a resposta deve vir do esforço dos docentes em planejar e implantar

projetos que possam integrar no dia a dia das práticas escolares o conhecimento já previamente

exercitado pelo aluno em seu trato cotidiano com a tecnologia. Isso está relacionado com

questões mais amplas, como o planejamento coordenado das atividades entre as várias

disciplinas em projetos inter e transdisciplinares, ou como os debates ampliados entre os

professores nos seminários de formação de professores, onde se realizam os relatos das

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vivências acadêmicas, possibilitando a troca de experiências didáticas (DIAS, 2000; BEHAR;

TORREZZAN, 2009; ALMEIDA; VALENTE, 2011).

Um espaço mínimo para a realização das atividades, como a sala ou o laboratório de

informática, quando existentes, podem potencializar essas experiências, assim como as viagens

de estudo, como tivemos a oportunidade de fazer em nossa experiência para a atividade de

fotografia. A interação com o ambiente, repensado o espaço da sala de aula, como sugerido por

Khan (2013), parece ter um papel relevante nessa aproximação com o ambiente real em que as

interações com as TIC e a própria vida acontecem. Pudemos documentar isso ao verificar as

reações da turma ao ambiente externo, quando da viagem ao Museu Militar no município de

Panambi-RS: os alunos estavam mais descontraídos e as atividades tiveram um resultado muito

interessante.

A partir de todos esses elementos, é possível afirmar que a incorporação das TIC, em

nossa experiência didática, revela potencialidades imensas, que devem ser levadas em conta na

reflexão e na práxis do processo de ensino-aprendizagem.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nossa investigação termina aqui por mera necessidade de colocarmos um ponto final.

Pois, na verdade, ela continua. Vai se fazer presente em nossa prática cotidiana, como fator de

reflexão permanente, e a ela seguiremos voltando em investigações futuras que, cremos, podem

ser desdobradas a partir das questões que ficaram em aberto.

E não poderia ser diferente, a nosso ver, já que o uso das Tecnologias de Informação e

Comunicação (TIC) é um tema candente para o conhecimento, seja ele de qual área for. No caso

da área sobre a qual nos debruçamos aqui, a História, há diversas questões que, acreditamos,

foram respondidas, dentro de nossas limitações, mas muitas outras ficaram por responder.

Começamos por uma interrogação central: de que forma as TIC podem ser utilizadas no

processo de ensino-aprendizagem da disciplina de História. Os vários desdobramentos dessa

questão é que guiaram nossos passos até este ponto, dos quais cumpre agora uma breve

síntese, para que possamos apreciar o que ficou dessa jornada.

Primeiramente, acompanhamos o desenvolvimento histórico do uso da tecnologia na

área da educação. Nesse breve resumo, procuramos demonstrar, mais do que tudo, a relação

intrínseca entre ambos – o conhecimento faz uso, desde antes da existência formal da escola,

de recursos técnicos, entendidos em sentido amplo: a voz, o raciocínio, a fala (DIAS, 2000;

ALMEIDA; VALENTE, 2011; GOODY, 2012). Ainda no capítulo inicial, trouxemos a ilustração do

debate, por vezes acalorado, sobre o uso da tecnologia em sala de aula. Aqui, registramos que o

assunto é ainda polêmico, seja pela dificuldade de acesso de vastos contingentes em nosso país,

seja pela resistência dos próprios professores, muitos deles alfabetizados nos moldes

tradicionais, sem contato com as TIC (APPLE, 1993; ALARCÃO, 2008; LIMA, 2012).

A seguir, abordamos, no Capítulo 2, o uso específico das TIC na disciplina de História.

Nossa intenção aqui foi trazer alguns elementos que, a nosso ver, podem ser profícuos para o

entendimento da mídia e sua relação com o ensino da referida disciplina. Foi a partir disso que

analisamos o tratamento dado a elementos cruciais do ensino da História: a questão das fontes

(PAPERT, 1985; SILVA; GOMES, 2000) e o formato da narrativa (MEDINA, 2006). Nesse ponto,

também abordamos algumas contribuições da Educomunicação (CITELLI, 2002; COSTA, 2002),

considerando a reflexão que aí se faz sobre a instrumentalização da mídia para a reflexão crítica

(FREIRE, 1987).

Nesses dois capítulos iniciais, o foco foi a revisão da literatura atinente ao tema de nossa

investigação. Deles, destacamos a compreensão da relação complexa que se estabelece entre as

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TIC e o ensino da História. As potencialidades são imensas, pelo que pudemos acompanhar dos

autores referidos, mas é preciso avançar em termos de identificação dos aspectos mais

profícuos em termos didáticos. Para tanto, fizemos na sequência a abordagem da metodologia

de nossa pesquisa.

Assim, no Capítulo 3, nos ocupamos da descrição da metodologia empregada em nossa

investigação, esclarecendo os principais métodos e autores que embasam nossa abordagem.

Trata-se de análise qualitativa, que teve por base estudo de caso (HAGUETTE, 1992; YIN, 2001),

a partir do qual traçamos as balizas de nossa análise. Nesse ponto, nosso interesse central foi

colocar os parâmetros de nossa análise e os aspectos procedimentais que seguimos. Como isso,

explicitamos os caminhos que foram percorridos, com vistas a possibilitar aos demais

investigadores que também o façam em investigações futuras. Elaboramos categorias de análise,

com base nos conceitos expressos previamente e nos instrumentos de coleta de dados – Diário

de Bordo e quatro questionários que foram aplicados à turma sob investigação.

Finalmente, no capítulo seguinte, efetuamos a descrição do corpus e a análise dos

dados obtidos. Procuramos demonstrar, nesse ponto, como os conceitos apresentados nos

capítulos iniciais auxiliam a interpretar os fenômenos descritos no corpus. Isso foi feito por meio

das categorias de análise que construímos, reunindo os dados mais significativos e realizando

sua interpretação. Aqui, nossa exposição foi dividida em dois momentos: um descritivo-analítico,

em que descrevemos a analisamos o caso que dá base empírica para nossa investigação; outro

sintético, momento final em que procuramos juntar os diversos aspectos resultantes da análise

em um todo coerente, ao finalizarmos o capítulo anterior.

A partir de agora, faremos as considerações finais da dissertação, tomando por base a

totalidade de nossa investigação – do problema que nos motivou a efetuá-la até os resultados

que obtivemos a partir do estudo de caso. Trazemos, nesse sentido, algumas reflexões que

atravessam nossa investigação de maneira não-linear, a par das respostas que encontramos

para o problema de pesquisa e seus desdobramentos.

De que maneira as TIC podem contribuir para o processo de ensino-aprendizagem da

disciplina de História?

Essa foi a pergunta que nos guiou até aqui. Respondê-la implica desdobrar diversos

aspectos do que vimos ao longo dessas páginas. A primeira resposta que encontramos diz

respeito aos aspectos estruturais da disciplina de História. Ao se constituir como área do

conhecimento, a História implica procedimentos e técnicas, como o cuidado na verificação dos

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fatos, a pesquisa dos registros, a construção de uma narrativa verossímil, entre outros elementos

(GATTI; ANDRÉ, 2010).

Reconhecendo a importância desses elementos, podemos situar a incidência das TIC

sobre eles, e fazer uso desse conhecimento para refletir sobre nossas práticas, além de

potencializar o interesse dos educandos em sala de aula. Refletir, por exemplo, sobre a

importância de escolher as fontes de forma criteriosa (DIAS, 2000; DALMAZO; VALENTE, 2018),

pode despertar o aluno para questionar outras formas de produção e reprodução de

conhecimento. E isso, a nosso ver, contribui para o aluno alcançar uma postura mais crítica –

finalidade inestimável de todo processo de ensino-aprendizagem...

Ao considerarmos o impacto da TIC sobre o ensino da História, evidenciou-se que a

escolha das fontes é um dos fatores que sofrem mais fortemente esse impacto. Por isso nos

dedicamos a revisar a relação com as fontes históricas (item 2.1), a fim de preparar o terreno

para a verificação empírica, realizada no Capítulo 5. E, de fato, o que vimos ao longo da análise

reforçou nossa percepção acerca da importância das TIC sobre as fontes históricas.

O levantamento de informações realizado pelos alunos demonstrou que a internet é a

fonte mais acessada para a realização das atividades de pesquisa histórica. A maioria da turma

recorre a ela de maneira natural, tendo incorporado a rede mundial de computadores a suas

atividades escolares cotidianas.

Mas nem sempre esse uso é acompanhado de reflexão crítica. Eis aí um dos pontos

mais promissores que encontramos para pensar sobre o impacto da TIC na disciplina de

História: questionar o uso naturalizado da internet como fonte primeira de informação. O que

dizer das fontes orais que não estão na rede, mas que guardam informações e relatos inéditos

sobre os fatos passados? E por que atribuir ao que está publicado na internet o valor de verdade

absoluta? Eis alguns pontos que procuramos suscitar nos debates em sala de aula, como parte

das atividades de avaliação sobre o impacto das Tecnologias de Informação e Comunicação

sobre o ensino da História.

É possível perceber nas colocações e respostas dos alunos, conforme visto no Capítulo

5, os ecos da cultura atual de naturalização da internet e de rompimento das barreiras de

autoridade tradicionais, muito embora com matizes diversos, conforme as condições de acesso

do aluno e sua cultura familiar.

De qualquer forma, é possível afirmar que o impacto das TIC quanto à seleção das

fontes históricas se faz notar tanto na percepção dos alunos como na produção da turma. E esse

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uso acaba por impactar diversos outros aspectos das práticas em sala de aula, na medida em

eu as condições de acesso influenciam na produção prática e na percepção dos alunos sobre a

presença da tecnologia no processo de ensino e aprendizagem.

O mesmo vale para a construção das narrativas. Ao colocarmos em evidência os

processos de edição, os recursos oferecidos pelas diferentes linguagens – visual, escrita, sonora,

multimídia –, a “gramática” da narrativa e os significados que tais elementos implicam (COSTA,

2002; SARAIVA; CANNITO, 2004; ALMEIDA; VALENTE, 2011), temos uma vasta gama de

aspectos que podem enriquecer o debate sobre a construção da narrativa histórica. Vimos que

esses fatores contribue9m para que o aluno perceba os processos ideológicos que permeiam a

técnica: a escolha do ponto de vista implica um viés para o relato, assim como a escolha dos

recursos que são utilizados no relato.

As produções resultantes da turma em análise mostram que a presença das TIC pode

enriquecer em muito a atividade didática, mas seu uso precisa ser trazido para o nível da

reflexão consciente, retirando-o do nível automático em que por vezes se encontra, sobretudo no

caso das gerações que já nasceram imersas no ambiente online e conectado – como é o casa

da turma em questão.

Os questionários aplicados antes e depois da experiência que conduzimos permitiram

traçar alguns parâmetros nessa relação da turma com a tecnologia aplicada em sala de aula. No

diagnóstico inicial, percebemos que o uso é algo relativamente comum para os alunos fora da

sala de aula, mas que havia receio de trazê-lo para o ensino e aprendizagem.

Tal receio se desfez na verificação final, quando a turma demonstrou não ter tido

dificuldade no emprego das TIC, e mesmo não ter visto diferença significativa entre a situação

anterior e a posterior. Ao mesmo tempo, tivemos algumas manifestações que parecem indicar

uma percepção intermediária, em que o aluno ainda tem certo estranhamento no uso das TIC

para as atividades da disciplina, embora reconheça que no geral a experiência foi proveitosa.

A cultura da convergência (JENKINS, 2009) que vivemos atualmente nos ajuda a

entender as percepções a turma sobre o uso das TIC e também os eventuais problemas que

verificamos na realização de certas tarefas. O caso das postagens do Facebook, por exemplo.

Nessa atividade, o que verificamos de fato foi a prevalência da cópia de informações de sites de

pesquisa, sem que o aluno tenha realizado a intepretação e o comentário que solicitáramos no

enunciado da atividade.

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A nosso ver, tal fenômeno é uma das consequências do uso indiscriminado e acrítico

que pode ser feito das informações disponíveis na internet. O fenômeno das fake news, que

abordamos previamente (MARDA; MILAN, 2018; ORTELLADO, 2018), ajuda-nos a entender esse

dado presente em nossa experiência didática. Hoje em dia a informação é abundante e está

disponível quase sem reservas. Mas a pesquisa histórica – e a pesquisa escolar de uma forma

geral – requer uma postura crítica, que agregue os métodos de investigação e a postura do

pesquisador ao uso das TIC (SILVA; GOMES, 2000; SNYDER, 2002; KHAN, 2013; BLIKSTEIN;

CAMPOS, 2019).

De outro lado, nas atividades de aplicação e construção com fotografia e vídeo, notamos

uma predisposição maior da turma em participar e em dar vez à criação, para além da cópia e

da mera transposição de conteúdos prontos. Isso parece indicar que fatores como a organização

dos grupos, a distribuição de tarefas e a testagem de técnicas narrativas podem representar

importantes elementos coesivos do grupo no trabalho com as TIC.

É nessa direção que apontamos em nossa análise: a necessidade de uma sinergia entre

os métodos tradicionais e as ferramentas tecnológicas, a fim de que possamos fazer uso, de

forma cumulativa, das boas experiências didáticas que transcendem o tempo e otimizam o uso

da tecnologia.

As limitações que encontramos pelo caminho, como o acesso restrito à internet e a falta

de um espaço físico diferenciado como uma sala de informática, não impediram que

pudéssemos construir, com a turma, uma série de produtos que mostram as potencialidades da

tecnologia para o ensino e aprendizagem da disciplina de História. Tais limitações, como vimos

(SOARES, 1996; SILVA, 2001; WESTON; BAIN, 2010; LIMA, 2012), são recorrentes, não apenas

no Brasil. Elas não impedem, contudo, que sigamos apontando caminhos a partir das pesquisas

que conduzimos.

Uma das questões que podem ser aprofundadas em pesquisas posteriores, por

exemplo, é a relação entre os métodos tradicionais e aqueles aplicados ao ambiente mediado

pelas TIC. De que forma potencializar essa relação, levando em conta que a técnica, por si só, é

apenas um instrumento, que necessita avaliação e humanização permanente? Outro tema que

deixamos como sugestão para investigações futuras é o contraste entre as fontes e narrativas

tradicionais e aquelas oriundas da pesquisa via TIC: de que forma elas podem ser utilizadas no

ensino e aprendizagem da História?

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Para concluir, registramos que a experiência que conduzimos com a turma transformou

nossa prática docente tanto quanto a percepção dos alunos sobre o uso das TIC. O registro de

tal transformação, no Diário de Bordo, tem relação com um novo olhar sobre a minha prática

como professor. Ela foi alterada em sua base, já que as atividades com as TIC exigiram um

envolvimento diferenciado, que foi desde o planejamento das atividades até o acompanhamento

em tempo real, para além da sala de aula. Tudo isso deixou marcas, como um olhar mais atento

para a influência dos meios técnicos sobre a atividade docente e sobre os processos de

sociabilidade nos quais aluno e professor estão imersos. As perspectivas que se abrem são

muitas. Tenhamos o espírito crítico (FREIRE, 1987) e o idealismo necessário (KHAN, 2013) para

encará-las.

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Apêndices

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APÊNDICE I – Questionário I

Questionário 1 – 1ª FASE DA PESQUISA 1. Você fez algum curso de aperfeiçoamento em computador? Na resposta positiva, quais foram os cursos? ______________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 2. A sua digitação em computador é: Assinale: Lenta Devagar Normal Rápida 3. Costuma usar tecnologia em casa? Não Sim Com que frequência? Nunca raramente frequentemente todos os dias

4. Quando você tem alguma dificuldade para fazer alguma tarefa no computador você pede

ajuda? Para quem ou como resolve?

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

________________________________________________

5. Sobre seus colegas de classe, você acha que sabem:

Mais que você Mesma coisa, Você sabe muito mais que eles

6. Você utiliza algum material de multimídia que lhe ajude em suas tarefas de casa ou na

escola? Qual (tevê, rádio, computador, tablet, celular etc.)?

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

____________________________

7. Quais os programas de computador existentes que mais faz uso?

______________________________________________________________________

____________________

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8. Tem acesso à internet em casa?

_____________________________________________

9. Em sua opinião, o que é necessário para o professor e o aluno utilizarem as tecnologias com

fins educacionais?

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________

10. Cite alguns aspectos positivos e negativos da utilização das tecnologias na educação. __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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APÊNDICE II – Questionário II

Segundo questionário com questões de resposta fechda sobre o uso das tecnologias.

Marque as questões de acordo com sua avaliação de um (1) a cinco (5), 5 concordo sem

dúvida; 4 concordo; 3 nem concordo e nem discordo; 2 discordo; 1 discordo sem dúvida:

1. Não me sinto à vontade com as Tecnologias de Informação e Comunicação - TIC.

1 2 3 4 5.

2. Tenho receio de empregar as TIC em sala de aula.

1 2 3 4 5.

3. Não tenho conhecimento como empregar no ensino-aprendizagem.

1 2 3 4 5.

4. As TIC são importantes para pesquisa e informação como aluno.

1 2 3 4 5.

5. Acho que a TIC não é uma ferramenta adequada para a matéria de História.

1 2 3 4 5.

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APÊNDICE III – Questionário III

Questionário sobre uso das TIC na disciplina de História – Questionário 3 1. Qual a sua opinião sobre o emprego das tecnologias digitais na disciplina de História? 2. Que diferença faz para você, aluno, em vez de escrever no caderno, escrever num meio eletrônico, interagindo com os colegas sobre um determinado tema? 3. Avalia que terá dificuldade ou não para apresentar trabalhos de pesquisa em vídeo (com som e imagem)? 4. Como analisa sua capacidade de responder e argumentar sobre determinado assunto da matéria nos meios de comunicação social, como Facebook e WhatsApp? 5. Como seria fazer pesquisa em sala de aula usando notebook, tablet, smartphone em tempo real? Respostas:______________________________________________________________

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APÊNDICE IV – Questionário IV

Questionário sobre uso das TIC na disciplina de História Questionário 4 1. Quais os fatores de aprendizagem com o uso da tecnologia em sala de aula? _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 2. Quais métodos ou equipamentos que mais auxiliaram na tarefa solicitada pelo professor? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 3. Teve dificuldade teve na aprendizagem com os equipamentos digitais? Quais? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 4. Há diferença no modo como usava as redes sociais, agora empregadas na Educação? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 5. Como avalia a sala de aula com e sem o uso das tecnologias? ____________ _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 6. Com o emprego das TIC, como você analisa os seus colegas na participação na aula, produção de trabalhos e tarefas? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 7. Que mudanças própria ao professor no uso das Tecnologias a partir de sua experiência em sala de aula? ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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____________________________________________________________________________________________ 8. O professor contribui na aprendizagem com os meios digitais? Faça relatos. _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 9. Os recursos tecnológicos que usamos na escola contribuíram para o ensino? Teve deficiências? Cite exemplos. ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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APÊNDICE V – Diário de Bordo

Diário de Bordo – data 21/02/2019

Nesta quinta-feira iniciei o ano letivo com no nono ano do ensino fundamental, último

ano nesta escola para esses.

A maioria dos alunos já me conhecia por ter lecionado no sétimo ano, neste mesmo

colégio.

Nesta aula disse que tínhamos um desafio de uma dissertação de mestrado e que a

turma escolhida eram vocês alunos que faríamos a empregabilidade das TIC.

Escrevi a sigla TIC e expliquei o que queira dizer. Foi uma surpresa, não tinham o menor

sentido para eles sobre isso. Isso era obviedade, que jamais houve qualquer menção, até porque

não é uma prática pública, que são raríssimas escolas que aplicam as TIC.

O espanto foi maior quando expliquei em detalhes sobre o emprego das TIC na

aprendizagem, usando recursos tecnológicos na produção de vídeo, tarefas no Facebook,

trabalho sobre visita a museu com produção em fotografia.

“Professor”, falou uma aluna, “não dá, isso não sei fazer”. Ficou claro a falta de

informação, estão completando nove (9) anos de estudo e pouco da aprendizagem foi usada em

tecnologias. Expliquei que com seu devido tempo e de forma detalhada será implementada, cada

um ao seu tempo, sobre as atividades propostas.

Já havia observado, em outro colégio, que os alunos usam meios tecnológicos de forma

básica, quando são solicitadas tarefas têm dificuldade de fazer buscas. Se usam

sistematicamente as TIC, terão maior aproveitamento na produção com o uso das tecnologias.

Como professor e como aluno de mestrado há uma inovação e isso causa preocupação

aos alunos, que terão pela frente um enriquecimento, vão transpor barreiras e quem sabe no

final desse período terão uma ideia diferente sobre o quanto poderá ampliar as aulas e o

aprendizado incluindo as tecnologias.

Apresentei o primeiro questionário para responder. Algumas questões os alunos tiveram

dificuldade de responder, por pouco conhecimento das palavras novas, que estavam lendo pela

primeira vez. Tínhamos consciência que ocorreriam essas dificuldades na pesquisa empírica. Na

avaliação sistemática e ao cruzar os dados, poderemos observar o que de fato ocorreu nesses 4

meses e seus resultados, se facilitou a vida dos alunos nos estudos, aproveitando melhor o

tempo, facilitando a forma de aprender e a forma de assimilar conteúdo.

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Na pergunta sobre pontos negativos e positivos do uso das TICs, tive que auxiliar, os fiz

refletir se estamos prontos para usar smartphone em sala de aula, se usariam para fins

particulares ou para aprendizagem em sala de aula. É proibido por lei no estado do Rio Grande

do Sul os alunos das escolas pública usarem celular na escola. Na escola, em todas as salas,

tem um recado proibindo o seu uso.

Presenciei muitas dificuldades de alunos para escrever palavras de cunho tecnológico,

software de programas, de buscas. Isso se deve à falta de empregabilidade das tecnologias e de

pouco uso para fins de aprendizado. Usam a internet para programas para jogos e coisas

básicas do dia a dia, Whatsapp, Facebook, mas nada de produção que gera conhecimento.

Não olhei as respostas dos alunos para não direcionar ou intervir durante o período da

coletas de dados. Percebo desde já que essa pesquisa vai contribuir para tirar muitas dúvidas

para nós, professores.

Diário de Bordo – data 26/02/2019

Por causa da abordagem na aula anterior sobre as TIC, seis alunos fizeram pesquisa

para obter conhecimento sobre assunto. Solicitei que apresentassem para os colegas o que

aprenderam na pesquisa. Como não tinha fonte da pesquisa, percebi que um dos alunos coletou

de informações de um site de Portugal por conter a palavra telemóvel, palavra que se refere a

nós, brasileiros, como celular.

A direção sugeriu, na feira das ciências da escola, em novembro, para os alunos

produzir uma pesquisa usando as TIC. Sugestão aceita. Incentivar os alunos para, na produção

da pesquisa, usar ferramentas tecnológicas na apresentação. Haverá vídeos produzidos que

possam ser usados para este fim. Outras produções também podem ser incluídas.

Diário de Bordo – data 08/03/2019

Na aula passada queria entregar o questionário. Três aos alunos, que não tinham

terminado a atividade proposta por mim, pediram que fosse entregue em outro momento.

Permiti que continuassem com a atividade, até porque estavam concentrados nesta tarefa.

Com e-mail da Doutora Altina, pedindo que fizesse registros em fotografia para inserir na

produção da dissertação aos alunos que participam da pesquisa, pedi à direção da escola a

autorização para as fotos. Aconselharam, para isso, que enviasse aos pais dos alunos uma

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autorização, para os pais assinarem, permitindo fotografar os seus filhos no ambiente escolar.

Neste dia, entreguei a solicitação de autorização.

Na aula de hoje, ao término da primeira aula (são dois períodos, o 4º e 5º), pediram

para entregar o questionário, estavam interessados em responder. Fiquei contente com os

alunos, enquanto respondiam às questões da pesquisa, explicava a forma das aulas com

emprego das tecnologias durante o primeiro semestre: desenvolvimento de um vídeo, atividade

no Facebook e uma viagem de estudo ao museu, que dispõe de equipamentos bélicos, usados

na 1ª e da 2º Guerra Mundial. Faz parte do currículo do 9º ano.

Sobre o vídeo, foi dividido em 4 grupos para produção, com 4 temas específicos que

foram estudados: Industrialização e Imperialismo, 1ª Guerra Mundial, Revolução Russa,

Fascismo e Nazismo. Os alunos disseram que não gostariam de fazer a apresentação aos

colegas, receio de cometer erro e receber gozação. Não queriam se expor na frente do professor

e dos colegas, tipo, da gíria, “pagar mico” aos colegas e professor na desenvoltura da

apresentação. Neste sentido, a tecnologia educacional favorece aos alunos. Então informei a eles

que produzindo o vídeo, e neste caso o vídeo vem produzido com voz, imagem, texto, não

precisa apresentar, só rodar o trabalho, e que pode incluir arranjos como: fotografias, tabelas,

textos, símbolos, figuras. Quando forneci essa explicação, gostaram da ideia. Falei a eles que os

colegas ou professor podem fazer perguntas ou esclarecimentos e receber críticas (positivas ou

negativas) sobre a produção.

Na aula de hoje, usei o equipamento Datashow (da escola) e mostrei aos alunos a

página do Facebook, via internet (a internet do meu celular/telemóvel via roteador wi-fi para o

notebook pessoal, que a escola não tem para fornecer aos professores, naquela área da escola),

para demostrar aos alunos que ainda não estavam no grupo do Facebook. Colocando a eles o

prazo final e a nota que receberiam pela atividade. Teve apenas um aluno, que não tinha

Facebook, logo se manifestou. Pedi se tinha acesso pelos pais ou irmão, disse que não gostaria

de acessar através deles. Neste caso, respeitando a vontade dele, ele fará o trabalho e a aluna

Ágatha foi colocada como moderadora, para contribuir com os colegas diariamente, enquanto o

professor leciona nas segundas e sextas.

Diário de Bordo – data 29/03/2019

O olhar dos alunos nos corredores chamava a atenção, que quase todos estavam

maravilhados. O que tinha de diferente era Facebook, era algo novo, uma novidade na educação.

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As postagens feitas e o retorno do professor deram uma nova ascensão nas declarações;

pensavam que era algo burocrático, algo estático, sem nenhuma sensação de produtividade,

mecânico. Que nada, há uma troca de valores na educação, todos acompanham, têm o retorno

imediato, a qualquer hora um sabe o que o outro vez, o aluno avalia de várias formas, o seu

como os outros, o que escreveu.

O professor deve também sempre comentar, repetir, lembrar, discutir o assunto, com o

tempo passa a gostar, participar e colaborar. Temos alunos que não participaram, e as

desculpas para não participar são de não fazer as tarefas, mas não há dificuldade, todos têm

celular.

Diário de Bordo – data 5/04/2019

Apliquei o teste conforme a programação do colégio, para a turma. No teste, foram

formuladas duas questões sobre o uso do Facebook, um momento ideal para receber as críticas.

As questões eram: 1. O que acharam do uso do Facebook na educação, antes do uso e depois

das postagens?; 2. Você buscou alguma forma de confirmar a informação? Quais?. Na primeira

questão, uma forma de averiguar, avaliar, a satisfação do aluno. Na outra, sobre o tema de

investigação, que faz parte da dissertação, quando abordamos se compreende e analisa a

veracidade dos meios pesquisados. Sobre isso abordaremos na dissertação.

Aproveitei para falar das postagens, sobre tempo para inserir a pesquisa, as respostas

como devem ser. Mostrei no meu computador pessoal para um aluno que não tinha postado

ainda. É importante o argumento do professor, no sentido instigar a produção, lembrar, auferir,

demandar.

Diário de Bordo – data 13/05/2019

Terminadas as tarefas de postagens no Facebook, o que podemos constatar como

ferramenta de aprendizagem? Vamos tentar responder as várias opções que oferece e as

contradições que ocorrem.

Para o professor que usa o Facebook, ele consegue definir bem o cronograma com os

alunos, tudo fica claro sobre a tarefa. De maneira diferente, os alunos gostam muito de

contradizer, “enrolar” o professor no processo de cumprir a tarefa, como: não sabia como fazer,

não sabia a data da entrega, fiz um pouco, me perdi, faltei aula e ninguém me informou, achei

que era na semana que vem. Todas estas situações foram ditas, além de outras desculpas.

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Teve um argumento de uma aluna que não acessa o Facebook, mas tem como saber:

neste caso, recebe um aviso no próprio e-mail, toda vez que alguém posta o trabalho, ou o

professor quando inclui um novo trabalho de pesquisa. Para quem não fez as tarefas ou deixou

de fazer alguma, não tinha qualquer argumento. Para o professor, se torna mais fácil compilar

os dados e conferir e avaliar. Tem a data da postagem e hora, nome do aluno. O registro de tudo

o que acontece. Pode sugerir, argumentar e solicitar alguma mudança, no horário que melhor

convier, com praticidade e comodidade.

Em dois momentos, entreguei um relatório parcial para os alunos, com nomes e

participação e nota. Era para que soubessem que estavam sendo avaliados, uma forma de

cobrança, para estarem ciente do seu progresso nas postagens ou não.

Um aluno apenas não tinha o Facebook, enviou para mim no final do prazo, neste caso

não postei para ele, mas recebeu nota proporcional ao seu desenvolvimento. Esse aluno, depois,

também sentiu a importância do Facebook e fez o seu cadastro. Por que esse interesse? Os

comentários que circulavam entre as postagens dos alunos no ambiente escolar, entre eles da

classe, além da própria aula de História, ele ficava alheio a tudo o que ocorria. Embora fosse

fechado, para os alunos da classe, o professor, orientadora da dissertação e a orientadora

pedagógica da escola, sobre a participação, interação, fatos comentados, discursão, críticas. É

interessante perceber comentários entre alunos sobre a matéria, há um aprendizado

diferenciado.

Os alunos, quando chega o último ano do Ensino Médio e não há mais uma

continuidade neste colégio, eles terão que continuar os estudos em outro colégio, ocorre um

desestímulo do aluno naturalmente, há uma acomodação para estudar, sabendo que terão

novos professores. Tudo isso impacta no aprendizado do aluno, outros assuntos são mais

importantes que o conteúdo curricular, mas, com a interação das tecnologias, ajuda na missão

de ensinar, acaba estimulando no processo de ensino e aprendizagem. Neste sentido, houve

aprimoramento no ensino, otimizando o tempo em incentivá-los na produção escolar. Este ano,

por exemplo, os conteúdos propostos estão de acordo com o cronograma do ano. Poderei

aprofundar os conteúdos de História, auxiliando os conhecimentos para quando estiver no

Ensino Médio.

Em sala de aula o professor pode auxiliar com exemplos e dicas no processo de

produção, a interação. Os alunos nesta idade, em torno de 14 anos, na adolescência, prestam

mais atenção naquilo que lhes convêm, sempre prontos a novidades. Dessa forma, a novidade é

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atraente, claro, até começar as postagens e fazer as tarefas. Depois das primeiras tarefas

realizadas com postagens, se torna, para uns, uma obrigação, pela nota que recebe; para

outros, um trabalho prazeroso e de aprendizagem.

Interação entre alunos e professor é outro ponto positivo sobre as postagens, ganha

dinamismo e praticidade, permite ler e reler. Mesmo que não queira “curtir”, fica a sinalização

para o administrador de quantos visualizaram aquela postagem e quem foi o aluno. Tudo isso

permite maior controle, saber de antemão quem participa, o interesse de cada aluno e o foco na

aprendizagem.

Os professores podem adicionar um bate-papo entre os participantes. A visualização do

portal pode ser criada num perfil próprio, anexar uma fotografia do grupo, por exemplo. Optamos

não colocar qualquer visualização por tratar-se de uma pesquisa e evitar conotação de

exploração midiática, com corpo docente e discente, e, assim, evitar qualquer controvérsia, pois

podem ocorrer críticas tanto positiva como negativas, sendo o objetivo principal a aprendizagem

do aluno - mesmo sendo um grupo fechado. Contudo, achamos importante sua personalização,

garante um atrativo, podendo sofrer mudanças conforme o desenrolar das tarefas, de acordo

com as ações pedagógicas que vão ocorrendo. Esse trabalho pode ser uma tarefa, os alunos

fazem a criação e depois a escolha, entre outras formas, uma escolha de uma foto.

As palavras incrementadas no portal toda a semana têm o cunho de ampliar o

conhecimento do aluno, além da sala de aula, colabora quando essas palavras estão inseridas

no contexto de estudo, já associando aquilo que investigou antes de ser abordado em sala de

aula, fazendo sentido a afirmação contida no livro didático. Para o professor, evita de parar o

conteúdo e explicar até todos compreenderem, por se tratar de uma palavra essencial para

entender todo o conteúdo. Assim, ele pode dar atenção a outros fatos, enriquecendo a matéria.

Os alunos concluintes do Ensino Fundamental/Ensino Básico do 3º ciclo – Português,

último ano, se sentem inseguros de fazer resumos – com algumas exceções, é claro –,

acostumados a copiar. Percebo que essa foi a tônica nas postagens, mesmo com a cobrança do

professor. A mudança colaborou, neste sentido, com a internet, que ajudou a copiar, sem

desenvolver a prática de condensar o texto, algo tão essencial dentro de um espaço delimitado

pelo professor. A exigência de dez linhas foi justamente para isso, tornar-se mais atrativo para

quem ler. Um texto compacto, a essência, que foi solicitado, quando o texto é longo geralmente

nós não terminamos a leitura. Ainda, o aluno acha que o desenvolvimento de uma atividade é

para o professor ver e fornecer a nota, sobre o que ele produziu; no caso da atividade na rede

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social, serve principalmente para os colegas da classe: como fez, que assunto abordou,

comparar o seu trabalho com o do colega, a dinâmica no trabalho, exemplos que pode seguir

em outra produção. Tudo é enriquecedor quando se trata de aprendizagem.

Na segunda tarefa, de produção com fotografia, teve um grupo que fez mais do que o

solicitado, entraram na dinâmica e produziram um vídeo. Mostra a capacidade do grupo de

exercer a criatividade, sendo útil o conhecimento aprendido fora da escola, em tecnologia, como

os cursos de informática em empresas particulares. Agora pode agregar à produção e incentivar

outros alunos a buscar. Faz-se útil, antes seria usado somente quando entrasse no mercado de

trabalho. Agora, ao contrário, vai levar mais esse conhecimento. No mercado de trabalho, a

exigência, no sistema de automação que se amplia a cada momento, vai colocar um valor a

mais no seu currículo. A escola passa a colaborar naquela tarefa de atender às exigências de

mercado na informatização de produção industrial.

O vídeo produzido foi a tônica naquela semana, tendo havido muitos comentários. A

escola, com pouca tecnologia educacional para oferecer para os alunos, demostra que pode

fazer mais com o que tem à disposição, e criar mecanismos de desenvolvimento maior na

educação. Solicitei legendas nas fotos. A foto ajuda no entendimento, mas pode fornecer

informações adicionais.

Diário de Bordo – data 07/06/2019

Durante os anos de professor, sempre usei as tecnologias na educação, agora não seria

diferente. Os alunos do 9º ano optaram pelo uso do projetor, que projeta o texto, para

transcrever para o seu caderno, do que o professor escrever no quadro-negro ou ditar, por

exemplo. O resumo ou esquema produzido para a aula de História, retirado do livro didático, foi

produzido no computador e aplicado aos estudantes. Ao preparar a aula escrevendo em

equipamento eletrônico, o professor tem várias possibilidades de aplicar o conteúdo (ditar o

texto, escrever no quadro-verde, projetar, entregar impresso).

Enquanto os alunos escrevem para seus cadernos, uso esse tempo para interagir sobre

o tema da aula curricular, observando e acompanhando o progresso da atividade. O uso da

tecnologia ajuda aprimorar o tempo do ensino, quer dizer, o tempo usado é empregado direto no

conhecimento do aluno, em menor tempo, com o uso das tecnologias. Esse dado, muitas vezes,

não é objeto sinalização de produtividade, fator de ganho de tempo. Por exemplo: gosto de trazer

impressas as atividades que os alunos vão produzir em sala de aula. Entregado impresso, eles já

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podem iniciar de imediato a atividade proposta pelo professor. Dependendo da complexidade da

atividade, pode por este fato comprometer uma aula inteira, só para entregar a atividade, sem o

aluno produzir nada, apenas preparar para produzir o que foi proposto pelo professor, para

depois resolver a atividade.

O tempo de aprendizado é um fato que a tecnologia educativa contribuiu para ganho de

produtividade. O professor distribuiu melhor o tempo naquela aula, produzindo com o tempo

ganho em conhecimento do aluno, colaborando, tirando dúvida no momento em que mais

precisam, respondendo os questionamentos dos alunos. Assim, o aluno fica comprometido na

produção e concentrado da sua atividade, não fica disperso, por não conseguir progredir e

tirando atenção dos outros colegas, porque o professor não pode auxiliar naquele momento.

Algo que gosto de fazer é testar os equipamentos, quais as tomadas existentes que

funcionam. Os cabos de energia estão corretos, a distância necessária para uma boa projeção.

Uso o wi-fi do meu próprio celular, quando necessário, para não depender da estrutura da

escola, que pode a qualquer momento não ter acesso à internet, com perda de tempo.

Diário de Bordo – data 21/06/2019

Já ocorreu alunos perguntarem em prova se podem incluir as respostas sobre o vídeo

mostrado. A resposta é afirmativa. Para nós, professores, essa pergunta tem significado positivo

no emprego da tecnologia. As tecnologias fazendo seu papel de ampliar o conhecimento dos

estudantes, colaborando na educação e mostrando interação na produção do saber.

Muito se pergunta: qual o momento ideal para inserir vídeos? Uns falam que no início da

nova matéria; outros, interagindo e contextuando juntos; e outros depois do conteúdo. Sempre

costumo empregar didaticamente do meio para o final daquele conteúdo. Vejo que os alunos

assimilam melhor o vídeo quando têm um conhecimento prévio; vai reviver, somar, compreender

melhor o conteúdo e a incorporação de novo conhecimento, que o vídeo geralmente traz novos

elementos que não estavam no livro didático.

Os alunos, em princípio, podem até achar uma forma de fuga para a aula; não deixa de

ser uma aula diferente, que pode durar um período curto ou longo, em que há aprendizado.

Com os meios tecnológicos empregados, aprende-se de forma mais natural, sem que o

artificialismo do ensino seja empregado – decorar, repetir, reproduzir, entre outros métodos,

para aquele momento até a prova.

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Diário de Bordo – data 12/07/2019

O vídeo produzido pelos alunos fomentou muitos comentários na escola, pela direção e

os próprios alunos. Para mim, professor, sabendo do potencial dos alunos, bastava solicitar um

trabalho deles, de acordo com as regras, e eles vão incrementar, e a resposta surge na

produção deles. Por trás disso vem aprendizagem, o que é mais importante, com a minha ajuda,

em algumas fotos tiradas por mim. Tenho experiência em jornalismo por várias décadas, o que

contribuiu para sugerir meios de produção e arranjo na produção deles. Acabo, às vezes,

exigindo muito, é aquele porcentual final, que dá um trabalho final bem-acabado.

Entreguei novos trabalhos para fazer em vídeos, que estarão disponibilizados em

setembro ou outubro. Poderei apenas apresentar na dissertação.

Hoje, os alunos tomaram gosto pelas aulas com o uso das tecnologias. Há uma

exigência para não parar com esse processo, que aumenta a facilidade para os alunos na

aprendizagem. Outras turmas recebem a minha atenção, mostram vídeos, fazem trabalho em

Power Point. Deixo a produção de trabalho com várias opções: Produção com uso de cartaz, em

slides e vídeos. Acaba saindo nas três opções. Trabalho também com todas as outras turmas

com material impresso, que consegue maior produção no ensino e na aprendizagem.

Vejo que a produção de vídeo agrega muita aprendizagem de diferentes formas: primeiro

precisam interpretar o texto para a produção. Os alunos vão ler, rever, sem isso não vão ter

capacidade de produção, criando uma cronologia e detalhamento na produção. Segundo, farão

pesquisa para incrementar, usando fotografia, tabela e maneira de distribuição. Terceiro, a

montagem final, os detalhes, o emprego da voz, forma correta de dicção, contribuem para

autoavaliar. Quarto, aprendem a fazer roteiro e, neste caso, uns sobressaem sobre outros dentro

do grupo com as tecnologias, mas todos acabam aprendendo. O trabalho produzido permite ser

visto por várias pessoas, e a satisfação para os alunos mostra que valeu o trabalho, porque o

retorno chega, e os enche de orgulho. O trabalho é árduo e muitas vezes não se dão conta de

quantas horas precisaram para produzir, mas é muito melhor do que algo como uma pesquisa

solicitado professor, que fica entre o professor e o aluno ou grupo depois é jogada no lixo, ou

guardado numa escrivaninha sem uso do material. Ganha no audiovisual, pois sempre pode

rever a sua produção e ser vista a todos os momentos.

O conhecimento eles têm, e o que falta, eles buscam. Precisam apenas uma ideia, e um

desafio está lançado. No Ensino Médio, mais trabalho de pesquisa será exigido, e tendo no seu

desenvolvimento trabalhos em vídeos, será um facilitador no desenvolvimento e prática. Quando

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entrar no mercado de trabalho, a exigência será maior e o aluno preparado para o trabalho terá

melhor opção para os cargos mais exigidos e também a melhor renumeração, neste mundo

cada vez mais concorrido e exigente, como demostra o mercado de trabalho.

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