Diretrizes para a Vigilância do Câncer relacionado ao trabalho.

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O Instituto Nacional do Cancer- Inca, divulgou no dia 30 de abril, um importante documento que estuda a correlação entre a incidencia do Cancer e as atividades dos trabalhadores.

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MINISTRIO DA SADEInstituto Nacional de Cncer Jos de Alencar Gomes da Silva (INCA)

Diretrizes para a vigilncia do cncer relacionado ao trabalho

Diretrizes para a vigilncia do cncer relacionado ao trabalho

MINISTRIO DA SADE Instituto Nacional de Cncer Jos Alencar Gomes da Silva (INCA)

Diretrizes para a vigilncia do cncer relacionado ao trabalho

Rio de Janeiro - RJ 2012

2012 Instituto Nacional de Cncer Jos Alencar Gomes da Silva/ Ministrio da Sade. Todos os direitos reservados. A reproduo, adaptao, modificao ou utilizao deste contedo, parcial ou integralmente, so expressamente proibidas sem a permisso prvia, por escrito, do INCA e desde que no seja para qualquer fim comercial. Venda proibida. Distribuio gratuita. Esta obra pode ser acessada, na ntegra, na rea Temtica Controle de Cncer da Biblioteca Virtual em Sade - BVS/MS (http://bvsms.saude. gov.br/bvs/controle_cancer) e no Portal do INCA (http://www.inca.gov.br). Tiragem: 5.000 exemplares

Elaborao, distribuio e informaes MINISTRIO DA SADE INSTITUTO NACIONAL DE CNCER JOS ALENCAR GOMES DA SILVA (INCA) Coordenao-Geral de Aes Estratgicas Coordenao de Preveno e Vigilncia (Conprev) rea de Vigilncia do Cncer Relacionado ao Trabalho e ao Ambiente Rua Marqus de Pombal, 125/5 andar Centro 20230-240 Rio de Janeiro RJ Tel.: (0xx 21) 3207-5969 E-mail: [email protected]/ [email protected] http://www.inca.gov.br Organizao Ftima Sueli Neto Ribeiro Ubirani Barros Otero Equipe de Elaborao No anexo

Edio Coordenao-Geral de Aes Estratgicas Coordenao de Educao (CEDC) Rua Marqus de Pombal, 125/3 andar Centro 20230-240 Rio de Janeiro RJ Tel.: (21) 3207-5500 Superviso Editorial Letcia Casado Edio e Produo Editorial Tas Facina Copidesque Rita Machado Reviso Maria Helena Rossi Oliveira Capa, Projeto Grfico e Diagramao Mariana Fernandes Teles Ilustraes de Capa e Abertura de Captulos lvaro Victorio Ilustraes Internas Mariana Fernandes Teles Normalizao Bibliogrfica e Ficha Catalogrfica Iara Rodrigues de Amorim

Impresso no Brasil / Printed in Brazil Flama I59d Instituto Nacional de Cncer Jos Alencar Gomes da Silva. Coordenao Geral de Aes Estratgicas. Coordenao de Preveno e Vigilncia. rea de Vigilncia do Cncer relacionado ao Trabalho e ao Ambiente. Diretrizes para a vigilncia do cncer relacionado ao trabalho / Instituto Nacional de Cncer Jos Alencar Gomes da Silva, Coordenao Geral de Aes Estratgicas, Coordenao de Preveno e Vigilncia, rea de Vigilncia do Cncer relacionado ao Trabalho e ao Ambiente ; organizadora Ftima Sueli Neto Ribeiro. Rio de Janeiro : Inca, 2012. 187 p. Inclui referncias. ISBN 978-85-7318-197-5 (verso impressa) ISBN 978-85-7318-195-1 (verso eletrnica)

1. Cncer ocupacional. 2. Vigilncia do ambiente de trabalho. 3. Vigilncia em sade do trabalhador. 4. Exposio ocupacional. 5. Carcingenos ambientais. 6. Fatores de risco. 7. Doenas profissionais. I. Ribeiro, Ftima Sueli Neto, org. II. Ttulo. CDD 616.994 Catalogao na fonte Seo de Bibliotecas/ Coordenao de Educao Ttulos para indexao Em ingls: Guidelines for Surveillance in Job Related Cancer Em espanhol: Directrices para la vigilancia del cncer relacionado al trabajo

AgradecimentosA todos os tcnicos, especialistas, pesquisadores e sindicalistas que contriburam com opinies, comentrios, texto e suporte para a elaborao deste documento. Aos tcnicos Diogo Rebello Simes, Ftima Regina Souza, Flvia Carvalho, Juliana Chrisman, Maria Clara Cmara, Maria Godiva Lima, Marianne Tabalipa, Patrcia Boccolini, Patrcia Vaz, da rea de Vigilncia do Cncer Relacionado ao Trabalho e ao Ambiente, da Coordenao de Preveno e Vigilncia do Instituto Nacional de Cncer Jos Alencar Gomes da Silva (Conprev/INCA), pelas contribuies ao longo de todo o processo. Aos profissionais Cludio Noronha e Eduardo Franco, do INCA, que no s leram todo o livro como deram inestimveis contribuies, bem como ao Dr. Guilherme Franco Netto, Carlos Vaz e Daniela Buosi, do Departamento de Vigilncia em Sade Ambiental e Sade do Trabalhador do Ministrio da Sade (DSAST/MS), pelo apoio e incentivo.

SumrioAGRADECIMENTOS APRESENTAO INTRODUO PARTE I. CNCER E TRABALHOCAPTULO 1. O CNCER E A RELAO COM O TRABALHO 1.1. Carcinognese 1.2. Carcinogenicidade CAPTULO 2. CNCER E A EXPOSIO OCUPACIONAL 2.1. Toxicologia 2.2. Agentes cancergenos 2.3. Classificao dos agentes ou das substncias CAPTULO 3. TIPOS DE CNCER E A RELAO COM A EXPOSIO OCUPACIONAL 3.1 Pele 3.2 Pulmo 3.3 Mesotelioma de pleura e peritnio 3.4 Bexiga 3.5 Cavidade nasal, sinonasal, nasofaringe, orofaringe, laringe 3.6 Hematolgico 3.7 Estmago e esfago 3.8 Fgado 3.9 Pncreas 3.10 Mama 3.11 Crebro e Sistema Nervoso Central CAPTULO 4. POLTICAS PBLICAS E DIREITO EM CNCER RELACIONADO AO TRABALHO 4.1. Cenrio da situao do cncer no Brasil 4.2. Assistncia ao cncer e a relao com o trabalho 4.3. Rede de Ateno Integral Sade do Trabalhador 4.4. Regulamentao trabalhista 4.5. Possibilidades de dilogo entre as polticas 4.6. Direitos do portador de cncer relacionado ao trabalho

3 13 15 1921 21 23 27 28 36 40 47 48 49 51 53 54 56 60 61 62 63 66 69 70 76 80 81 84 85

PARTE II. VIGILNCIA DO CNCER RELACIONADO AO TRABALHOINTRODUO

8991

CAPTULO 5. VIGILNCIA DOS CASOS COM DIAGNSTICO DE CNCER 5.1. Os registros de cncer 5.2. Vigilncia epidemiolgica no Sistema nico de Sade 5.3. Vigilncia a partir dos dados previdencirios CAPTULO 6. VIGILNCIA DOS TRABALHADORES EXPOSTOS 6.1. Vigilncia com base em monitoramento biolgico 6.2. A vigilncia da exposio a agentes cancergenos no ambiente de trabalho CAPTULO 7. INDICADORES AMBIENTAIS CAPTULO 8. VIGILNCIA A PARTIR DE BASES SECUNDRIAS 8.1. Relao anual de informaes sociais (RAIS) 8.2. Cadastro geral de empregados e desempregados (Caged) 8.3. Cadastro de atividades econmicas: informaes municipais e/ou estaduais CAPTULO 9. VIGILNCIA A PARTIR DA EXPOSIO NOS AMBIENTES DE TRABALHO 9.1. Vigilncia da exposio 9.2. Identificao de processos cancergenos 9.3. Reconhecimento e avaliao de risco nos ambientes de trabalho: inspeo local 9.4. Controle da exposio no ambiente de trabalho CAPTULO 10. LIMITES E POTENCIALIDADE DE ESTUDOS EPIDEMIOLGICOS

93 93 102 111 113 113 114 117 121 121 122 122 123 125 126 128 129 131

PARTE III. DISCUSSO FINAL REFERNCIAS ANEXOSANEXO 1. Cancergenos por categoria e evidncias (forte e suspeito) de carcinogenicidade para humanos ANEXO 2. Principais cancergenos presentes em ambientes de trabalho segundo a classificao de risco pela IARC e ACGIH e o nmero de CAS ANEXO 3. Circunstncias ou atividades ocupacionais reconhecidas como cancergenas pela IARC ANEXO 4. Modelo de inventrio de agentes cancergenos para identificao e localizao geogrfica ANEXO 5. Matriz detalhada de vigilncia dos casos a partir do agente cancergeno ANEXO 6. Roteiro de inspeo sobre o uso seguro de substncia qumica nos ambientes de trabalho ANEXO 7. Estatuto do Homem ANEXO 8. Equipe de elaborao

133 137 157157 161 169 171 172 173 185 187

Lista de ilustraesFIGURASFIGURA 1. As etapas da carcinognese FIGURA 2. Fases de exposio, toxicocintica, toxicodinmica e efeitos das substncias qumicas no organismo humano FIGURA 3. Etapas, desde a exposio at a doena, destacando os fatores identificveis e as oportunidades de interveno FIGURA 4. Modelo da ficha dos Registros de Cncer de Base Populacional FIGURA 5. Modelo da ficha do Registro Hospitalar de Cncer (frente) FIGURA 6. Modelo da ficha do Registro Hospitalar de Cncer (verso) FIGURA 7. Modelo de ficha de Registro do Histrico Ocupacional FIGURA 8. Modelo da ficha de Registro de Cncer Relacionado ao Trabalho no Sinan (frente) FIGURA 9. Modelo da ficha de Registro de Cncer Relacionado ao Trabalho no Sinan (verso) FIGURA 10. Fluxo de informao para o cncer relacionado ao trabalho FIGURA 11. Modelo de laudo para solicitao/ autorizao de procedimento ambulatorial (APAC/ONCO) FIGURA 12. Modelo de Declarao de bito FIGURA 13. Desfechos dos acidentes de trabalho e correspondncia com os tipos de benefcios da Previdncia Social no Brasil 112 109 110 36 96 98 99 103 105 106 107 35 22

QUADROSQUADRO 1. Histrico de associao de local primrio do cncer e exposio ocupacional QUADRO 2. Classificao de carcinogenicidade pela GHS QUADRO 3. Tipos de classificao para carcinogenicidade QUADRO 4. Fatores de risco para cncer da pele no melanoma QUADRO 5. Fatores de risco para cncer da pele melanoma QUADRO 6. Fatores de risco para cncer do pulmo QUADRO 7. Fatores de risco para mesotelioma QUADRO 8. Fatores de risco para cncer da bexiga QUADRO 9. Fatores de risco para cncer das cavidades nasais e seios paranasais QUADRO 10. Fatores de risco para cncer da cavidade oral, da faringe e da laringe QUADRO 11. Fatores de risco para leucemias e mielodisplasias QUADRO 12. Fatores de risco para mieloma mltiplo QUADRO 13. Fatores de risco para linfomas no Hodgkin QUADRO 14. Fatores de risco para cncer do estmago e do esfago QUADRO 15. Fatores de risco para cncer do fgado QUADRO 16. Fatores de risco para cncer do pncreas QUADRO 17. Fatores de risco para cncer da mama 27 44 45 49 49 51 53 54 56 56 58 58 60 61 62 63 66

QUADRO 18. Fatores de risco para cncer do crebro QUADRO 19. Estudos nacionais de risco ocupacional para cncer segundo o tipo de anlise de risco e os principais resultados QUADRO 20. Neoplasias relacionadas com o trabalho, segundo agentes etiolgicos ou fatores de risco QUADRO 21. Caractersticas dos registros de cncer QUADRO 22. Inventrio de trabalhadores potencialmente expostos em municpio determinado QUADRO 23. Matriz de exposio ocupacional slica no Brasil QUADRO 24. Fora Motriz QUADRO 25. Presso QUADRO 26. Situao QUADRO 27. Sntese da Matriz FPEEEA das observaes feitas em 22 indstrias do polo gesseiro de Pernambuco, em 2007 QUADRO 28. Atividades econmicas consideradas cancergenas pela Agncia Internacional para Pesquisa do Cncer QUADRO A1. Cancergenos por categoria e evidncias (forte e suspeito) de carcinogenicidade para humanos QUADRO A2. Principais cancergenos presentes em ambientes de trabalho segundo a classificao de risco pela IARC e ACGIH e o nmero de CAS QUADRO A3. Circunstncias ou atividades ocupacionais reconhecidas como cancergenas pela IARC QUADRO A4. Modelo de inventrio de agentes cancergenos para identificao e localizao geogrfica QUADRO A5. Matriz detalhada de vigilncia dos casos a partir do agente cancergeno

67 71 74 94 115 116 118 118 118 119 127 157 161 169 171 172

Lista de siglas e abreviaturasACGIH American Conference of Governmental Industrial Hygienists (Conferncia Americana Governamental de Higiene Industrial) ADN cido desoxirribonucleico AICR Associao Internacional de Registros de Cncer AIDS Sndrome da imunodeficincia adquirida AIH Autorizao de internao hospitalar Anvisa Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria APAC Autorizao de procedimentos de alta complexidade BCME Bis (clorometil) ter BPW Sistema de base populacional para a web BRCA Gene supressor de tumor relacionado ao cncer da mama Cacon Centro de Assistncia de Alta Complexidade em Oncologia Caged Cadastro Geral de Empregados e Desempregados CAS Chemical Abstracts Service CAT Comunicao de acidente de trabalho CBO Classificao Brasileira de Ocupaes Cerest Centros de Referncia em Sade do Trabalhador CFC Clorofluorcarbono CGVAM Coordenao-Geral de Vigilncia em Sade Ambiental CID Classificao Internacional das Doenas CIPA Comisso Interna de Preveno de Acidente de Trabalho CLT Consolidao das Leis Trabalhistas CNAE Classificao Nacional de Atividades Econmicas Conprev Coordenao de Preveno e Vigilncia CPMF Contribuio Provisria sobre Movimentao ou Transmisso de Valores e de Crditos e Direitos de Natureza Financeira CPTEC Centro de Previso do Tempo e Estudos Climticos CRM Conselho Regional de Medicina DDE Diclorodifenildicloroetileno DDT Diclorodifeniltricloroetano DO Declarao de bito DTR Delegacia Regional do Trabalho EBV Vrus Epstein-Barr EPA Environmental Proctetion Agency (Agncia de Proteo Ambiental Americana) FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Servio FISPQ Ficha de Informaes de Segurana de Produto Qumico FPEEEA Fora Motriz-Presso-Estado-Exposio-Efeito-Aes

GHS Globally Harmonized System of Classification and Labelling of Chemical / Sistema Harmonizado Globalmente para a Classificao e Rotulagem de Produtos Qumicos HBV Vrus da hepatite B HIV Vrus da imunodeficincia humana HPA Hidrocarboneto policcllico aromtico HPV Papilomavrus humano HTLV 1 Human T lymphotropic virus type 1 (vrus T-linfotrpico humano tipo 1) IARC International Agency for Research on Cancer (Agncia Internacional para Pesquisa do Cncer) Ibama Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renovveis IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica ICMS Imposto sobre Circulao de Mercadoria e Servios INCA Instituto Nacional de Cncer Jos Alencar Gomes da Silva INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais INSS Instituto Nacional do Seguro Social IPI Imposto sobre Produtos Industrializados IPVA Imposto sobre a Propriedade de Veculos Automotores LAN Light-at-night LOAS Lei Orgnica de Assistncia Social MCPA 2-methyl-4-chlorophenoxyacetic acid (cido 2-metil-4-clorofenoxiactico) MCPP 2-methyl-4-chlorophenoxypropionic acid (cido metil clorofenoxipropionico) MEO Matriz de Exposio Ocupacional MPAS Ministrio da Previdncia e Assistncia Social MS Ministrio da Sade MTBE ter metil tert-butil MTE Ministrio do Trabalho e Emprego NIH Instituto Nacional de Sade dos Estados Unidos da Amrica do Norte NR Normas Regulamentadoras NTP National Toxicology Program OCDE Organizao para a Cooperao e o Desenvolvimento Econmico OCHA Occupational Safety and Health Administration OIT Organizao Internacional do Trabalho OMS Organizao Mundial da Sade OSHA Occupational Safety and Health Administration PAH Hidrocarbonetos policclicos PCB Bifenil policlorado PCE Tetracloroetileno PCMSO Programa de Controle Mdico de Sade Ocupacional PEA Populao economicamente ativa PPRA Programa de Preveno de Riscos Ambientais PVC Cloreto de polivinila

RAIS Relao Anual de Informaes Sociais RCBP Registro de Cncer de Base Populacional Renast Rede Nacional de Ateno Integral Sade do Trabalhador RF-EMF Radiofrequncia dos campos eletromagnticos RGPS Regime Geral da Previdncia Social RHC Registro Hospitalar de Cncer RJU Regime Jurdico nico SEER Surveillance, Epidemiology and End Results (Programa de Vigilncia, Epidemiologia e Resultados Finais) SES Secretarias Estaduais de Sade SESMT Servio de Engenharia de Segurana e Medicina do Trabalho SFH Sistema Financeiro de Habitao Siab Sistema de Informao da Ateno Bsica SIH Sistema de Informaes Hospitalares SIM Sistema de Informao de Mortalidade Simpeaq Sistema de Informao e Monitoramento de Populaes Expostas a Agentes Qumicos Sinan Sistema Nacional de Agravos de Notificao Sipac Sistema de Informao de Procedimentos de Alta Complexidade SISSOLO Sistema de Informaes de Vigilncia em Sade em reas com Populaes Expostas a Solo Contaminado SNC Sistema Nervoso Central SUB Sistema nico de Benefcios SUS Sistema nico de Sade SVS Secretaria de Vigilncia em Sade TCE Tricloroetileno TLV Threshold Limit Values (limites de tolerncia) Unacon Unidade de Assistncia de Alta Complexidade em Oncologia UBS Unidade Bsica de Sade Vigiquim Vigilncia em Sade Ambiental Relacionada s Substncias Qumicas Visat Vigilncia em Sade do Trabalhador

ApresentaoA presente Diretriz para a Vigilncia do Cncer Relacionado ao Trabalho configura uma contribuio tcnica para a abordagem do cncer decorrente da exposio a agentes cancergenos presentes no ambiente e nos processos de trabalho. A Diretriz est em consonncia com o movimento internacional para controlar a exposio ambiental e ocupacional a agentes cancergenos, dadas suas caractersticas, seus potenciais efeitos sade humana e, paradoxalmente, sua alta possibilidade de preveno. O documento uma iniciativa do Instituto Nacional de Cncer Jos Alencar Gomes da Silva (INCA), por meio da rea de Vigilncia do Cncer Relacionado ao Trabalho e ao Ambiente da Coordenao de Preveno e Vigilncia (Conprev), com a colaborao de pesquisadores e profissionais com notria experincia nas reas de preveno, assistncia e vigilncia do cncer. Resulta de trs oficinas de trabalho, a partir de uma concepo geral, e evolui com a elaborao, a avaliao e o consenso de textos em diversas reunies iniciadas no ano de 2008. Cada captulo foi elaborado por um grupo de especialistas, submetido anlise e apreciao de um comit de consultores e novamente discutido pelo conjunto de autores. Para otimizar o alcance e reduzir o volume do material, foram necessrias muitas verses, resguardando as ideias centrais, que culminaram em um texto final estruturado em um ordenamento progressivo, voltado para instrumentalizar tcnicos e demais interessados no tema. O formato final desta diretriz visa a organizar, sistematizar e disponibilizar os diversos procedimentos para registro, acompanhamento e interveno, no mbito da vigilncia, voltados para o cncer decorrente do trabalho. Tem como objetivo subsidiar as aes da assistncia e vigilncia realizadas pelas instncias competentes do Sistema nico de Sade (SUS) e, em particular, pela Rede Nacional de Ateno Integral Sade do Trabalhador. A inteno maior oferecer aos profissionais de sade subsdios, por meio de orientaes tcnicas e epidemiolgicas, capazes de enfatizar a necessidade de buscar, na histria pessoal e profissional do trabalhador, dados, informaes ou mesmo indcios de contato com compostos potencialmente cancergenos presentes no ambiente e nos processos de trabalho. Na sua essncia, espera-se que seja valorizado o registro dos riscos nos instrumentos devidos, ou, pelo menos, a exposio da forma mais detalhada possvel. Nesse sentido, o acolhimento dos trabalhadores e uma detalhada anamnese ocupacional so os principais instrumentos para a identificao e o reconhecimento da exposio. Esta Diretriz consubstancia um inventrio de sistemas j implantados, inciativas nacionais ou pontuais para abordar os fatores de risco, e aponta para a necessria integrao das instncias do SUS e desta com as esferas previdencirias, trabalhistas e ambientais. Espera-se que este documento instrumentalize o SUS na abordagem da vigilncia que inclui a suspeio, a identificao clnica, o encaminhamento dos casos com confirmao da exposio decorrente do trabalho para os nveis de complexidade devidos, bem como inclui a contrarreferncia desses servios para desencadear as aes de vigilncia epidemiolgica e de vigilncia nos ambientes e processos de trabalho. Por fim, espera-se ainda que facilite a atuao da assistncia e da preveno de forma integrada em todos os

nveis, que compartilhe responsabilidades, informaes e instrumentos com a sociedade, os movimentos organizados e outros campos diretamente envolvidos, como a educao, o meio ambiente e a poltica de desenvolvimento.

Instituto Nacional de Cncer Jos Alencar Gomes da Silva

IntroduoO cncer representa atualmente a segunda causa de morte no mundo. Responde por 20% dos bitos na Europa, com mais de 3 milhes de novos casos e 1,7 milhes de bitos por ano (Whosis, 2010). Constitui uma importante questo de sade pblica, tanto nos pases desenvolvidos, como nos pases em desenvolvimento (Parkin et al., 2005; Levi et al., 2004), principalmente porque a preveno pode reduzir a ocorrncia em at 30% dos casos (Whosis, 2010) e alguns, diretamente relacionados ocupao, como o mesotelioma, podem ser completamente prevenveis. O carter desigual desse cenrio que mais de 70% de todas as mortes por cncer ocorrem em pases subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento (Whosis, 2010). Os dados mais recentes disponveis na srie Globocan da Agncia Internacional de Pesquisa em Cncer (Ferlay et al., 2010) apresentam os valores de incidncia, prevalncia e mortalidade mundial de cncer para 2008. A estimativa de 12,7 milhes de novos casos, 7,6 milhes de mortes, com uma taxa de incidncia de 181,6 casos em cada 100 mil pessoas. Os cinco tipos de cncer de maior incidncia so: pulmo (1,60 milhes de casos), mama (1,38 milhes), clon e reto (1,23 milhes), estmago (989 mil) e prstata (903 mil casos). O cncer de pulmo apresenta tambm a taxa de mortalidade mais alta (19,4 em 100 mil), seguido dos de mama (12,5 em 100 mil), estmago (10,3 em 100 mil), fgado (10 em 100 mil) e clon e reto (8,2 em 100 mil) (Ferlay et al., 2010). Para a Amrica do Sul, Amrica Central e Caribe, estimou-se, para 2008, cerca de 1 milho de casos novos de cncer e 589 mil bitos. Em homens, o tipo mais comum estimado foi o cncer da prstata, seguido por pulmo, estmago, clon e reto. Para as mulheres, o tipo mais frequente estimado foi o cncer da mama, seguido por colo do tero, clon e reto, estmago e pulmo (Ferlay et al., 2010). No Brasil, as estimativas para o ano de 2012 apontam a ocorrncia de 518.510 casos novos de cncer. O cncer da pele do tipo no melanoma (134 mil casos novos) o mais incidente na populao brasileira, seguido pelos tumores da prstata (60 mil), mama feminina (53 mil), clon e reto (30 mil), pulmo (27 mil), estmago (20 mil) e colo do tero (18 mil), acompanhando o mesmo perfil da magnitude observada para a Amrica Latina (INCA, 2011). No tocante etiologia, aproximadamente 80% dos casos de cncer esto relacionados a fatores ambientais, em maior ou menor grau, evitveis (WHO, 2002). Esses fatores envolvem gua, terra, ar, ambiente de consumo (alimentos, medicamentos, fumo, lcool e produtos domsticos), ambiente cultural (estilo, costumes e hbitos de vida) e ambiente ocupacional. Apenas para o cncer do pulmo, o segundo tipo mais incidente entre homens no Brasil, as estatsticas europeias projetam que um em cada dez casos desse cncer pode ser decorrente do trabalho (EUROGIP, 2010). Isso representa, aproximadamente, 1.780 casos de cncer do pulmo decorrentes do trabalho no Brasil em 2010. No clssico estudo de Doll e Peto (1981) para os Estados Unidos, foi estimado que 30% dos cnceres de todas as origens seriam decorrentes do tabagismo, 35% da alimentao inadequada, 10% devido infeco, 7% relacionados ao comportamento sexual e reprodutivo de alto risco, 4% devido a exposies ocupacionais e 3% consequentes do uso de lcool. A proporo de cncer decorrente

do trabalho desse estudo contestada por Fritschi e Driscoll (2006) e Clapp et al. (2007), sob a argumentao de que ela est desatualizada, no foi corretamente dimensionada e no foi levada em conta a existncia de muitas lacunas no conhecimento dos produtos qumicos e na sua relao com o cncer, alm da magnitude do risco de cada substncia cancergena. Assim, muito provvel que os valores tenham sido subestimados. Considera-se que aproximadamente 10,8% dos casos de cncer (excluindo pele no melanoma) em homens e 2,2% dos casos de cncer em mulheres so causados por exposio ocupacional (Fritschi; Driscoll, 2006). Em geral, pode-se estimar entre 8% e 16% a proporo de cncer decorrente da exposio ocupacional. Essas estimativas dizem respeito ao risco populacional. Como o risco ocupacional se concentra em trabalhadores ocupados e expostos, a sua importncia fica diluda quando a estimativa na populao se d sem a devida ponderao da exposio ocorrida no ambiente de trabalho. Para compreender melhor esses riscos, a mensurao adequada o risco atribuvel a cada exposio. Leigh (1996) estimou para os Estados Unidos que entre 6% e 10% de todos os cnceres humanos esto relacionados com exposio ocupacional, poluio ambiental e radiao ionizante, enquanto Steenland et al. (2003) encontraram 3,5%, em mdia, com 5,5% entre os homens. Para a Inglaterra, a estimativa de 6%; na Espanha, 4%; e, na Austrlia, 1,5% (Monson; Christiani, 1997; Deschamps et al., 2006). Na Alemanha, imputa-se a apenas quatro substncias qumicas a responsabilidade por mais de 90% dos casos de cnceres atribudos exposio ocupacional: asbestos; aminas aromticas; hidrocarbonetos policclicos (PAH) e benzeno (Deschamps et al., 2006). O cncer ocupacional considerado uma forma de toxicidade retardada em seu curso clnico e em seu desfecho, devido exposio a agentes qumicos, fsicos ou biolgicos classificados como cancergenos, presentes no ambiente de trabalho (Simonato; Saracci, 1983). Para a Occupational Safety and Health Administration (OSHA, 1981), considerado um potencial cancergeno ocupacional qualquer substncia, combinao ou mistura de substncias que causem aumento da incidncia de neoplasias ou uma reduo substancial no perodo de latncia entre a exposio e o aparecimento da doena em humanos ou mamferos, com resultado de exposio oral ou drmica ou qualquer outra exposio que resulte na induo do tumor em um local distinto de onde ocorreu a exposio. Essa definio inclui qualquer substncia cancergena ocupacional potencial que metabolizada por mamferos. As doenas em sua relao com o trabalho podem ser classificadas de duas formas. A primeira como doena profissional, quando existe relao direta com condies de trabalho especficas, a exemplo do desenvolvimento de osteossarcoma em adultos por exposio radiao ionizante e do mesotelioma de pleura por exposio ocupacional ao asbesto (amianto). A nomenclatura adequada para esse tipo de doena cncer ocupacional (Brasil, 2001). A segunda forma, que engloba a maioria das neoplasias, a doena relacionada ao trabalho, isto , que tem sua frequncia, surgimento ou gravidade modificados pelo trabalho. Segundo a classificao de Shilling (1984), no caso da doena ocupacional, o trabalho causa necessria e, no caso de doenas relacionadas ao trabalho, esse pode ser entendido como um fator de risco, ou seja, um

atributo ou uma exposio que est associada com uma probabilidade aumentada de ocorrncia de uma doena. Para a maioria dos cnceres, a nomenclatura adequada de cncer relacionado ao trabalho. Na prtica, a caracterizao etiolgica ou de nexo causal ser essencialmente de natureza epidemiolgica, seja pela observao de um excesso de frequncia em determinados grupos ocupacionais ou profisses, seja pela ampliao quantitativa ou qualitativa do espectro de determinantes causais, que podem ser conhecidos a partir do estudo dos ambientes e das condies de trabalho. A eliminao desses fatores de risco reduz a incidncia ou modifica o curso evolutivo da doena ou agravo sade (Brasil, 2001). Os cnceres relacionados ao trabalho tm sido mal dimensionados pela escassez de pesquisas no pas. Quando comparados aos demais fatores de risco, a ocupao ainda no enfatizada, mesmo quando o risco bem conhecido e documentado, como o caso dos cnceres por asbesto, benzeno, derivados do carvo, radiao ionizante, alta tenso, entre outros. A invisibilidade do cncer relacionado ao trabalho no Brasil pode ser avaliada pela irrisria participao de 749 casos de neoplasia relacionada ao trabalho (0,23%) dentre os auxlios-doena acidentrios concedidos pela Previdncia Social. Desses, 683 foram casos de neoplasia maligna (cncer) (Brasil, 2009a). Dentre os 113.801 casos de auxlios-doena por cncer (previdencirio e acidentrio), o cncer relacionado ao trabalho representou 0,66%. Para os registros de acidente de trabalho (com Comunicao de Acidente de Trabalho CAT), os casos de cncer foram 51 no ano de 2009, representando 0,23% dos casos de doenas ocupacionais (Brasil, 2009b). Entre os pases que possuem polticas pblicas voltadas para o cncer relacionado ao trabalho, como a Espanha e a Itlia, as estimativas identificam que, entre todos os casos de cncer, de 4% a 6% podem ser atribudos exposio ocupacional (Gonzles; Agudo, 1999; Aubrun et al., 1999). A maioria das estimativas da carga de cncer relacionado ao trabalho nos pases industrializados situa-se em torno de 5% do total de cnceres (Weiderpass et al., 2007), com variaes importantes, principalmente ligadas ao tipo de exposio, que permite identificar risco atribuvel em at 40%. Cncer atribuvel ocupao foi estimado no Reino Unido em 6% por Higginson em 1980, em 4% na Itlia por Tomatis em 1990, em mdia 5,5% para a Europa com 9% para homens por Boffetta e Kogevinas em 1999, em 3% em mdia para a Frana e 6% para homens por Deschamps em 2006 (Weiderpass et al., 2007). Confrontada a literatura internacional, em que a participao dos pases europeus e da Amrica do Norte sobrepuja enormemente a produo cientfica brasileira, a importncia do cncer relacionado ao trabalho nesses pases mais enfatizada, mesmo em centros de trabalho mais sujeitos ao controle de agentes txicos potencialmente cancergenos. No campo das polticas pblicas, a falta de informao sobre o papel do trabalho na causalidade do cncer no tem favorecido a sua priorizao no debate sobre o tema e nas estratgias de preveno divulgadas pelos rgos de sade. Pode-se inferir a existncia de um verdadeiro silncio epidemiolgico (Corra, 2008) para a situao dos cenrios de exposio a agentes cancergenos nos centros de trabalho do Brasil, cujo manuseio de substncias txicas em inmeras situaes beira as condies europeias do sculo XVIII, a falta de informao sistemtica e as medidas de preveno em sade e segurana no trabalho ainda no consideram a existncia desse risco.

Parte I:

Cncer e Trabalho

Captulo 1.

O cncer e a relao com o trabalhoCncer o nome dado a um conjunto de mais de 100 doenas que tm em comum o crescimento desordenado (maligno) de clulas que invadem os tecidos e rgos, podendo espalhar-se (metstase) para outras regies do corpo. Dividindo-se rapidamente, essas clulas tendem a ser muito agressivas e incontrolveis, determinando a formao de tumores (acmulo de clulas cancerosas) ou neoplasias malignas. Os diferentes tipos de cncer correspondem aos vrios tipos de clulas do corpo. Outras caractersticas que diferenciam os diversos tipos de cncer entre si so a velocidade de multiplicao das clulas e a capacidade de invadir tecidos e rgos vizinhos ou distantes (metstases).

1.1. CarcinogneseO processo de formao do cncer chamado de carcinognese ou oncognese e, em geral, acontece lentamente, podendo levar vrios anos para que uma clula cancerosa se prolifere e d origem a um tumor visvel. A carcinognese um processo altamente complexo do qual participam fatores de risco herdados e fatores de risco ambientais, tais como a alimentao, o hbito de fumar, a ocupao e a exposio radiao e a agentes qumicos. A carcinognese pode ser desencadeada por agentes fsicos, biolgicos e qumicos. Os agentes cancergenos fsicos incluem a radiao solar, a radiao ionizante e a radiao no ionizante (Barbato, 2008). O mecanismo da carcinognese fsica, pela radiao, reside na sua capacidade de induzir mutaes. Essas mutaes podem resultar de algum efeito direto da energia radiante ou de efeito indireto intermediado pela produo de radicais livres a partir da gua ou do oxignio. Dois mecanismos podem estar envolvidos na induo do cncer por raios ultravioleta: leso do DNA pela formao de dmeros de pirimidina e imunossupresso (INCA, 2008). A carcinognese biolgica ocorre pela incorporao do DNA do vrus ao DNA da clula hospedeira, que passa a ser utilizada para a produo de novos vrus. Como exemplos de agentes biolgicos com potencial cancergeno temos o Papilomavrus humano (HPV), o vrus Epstein-Barr (EBV), o vrus da hepatite B (HBV), o retrovrus HTLV 1 e o Helicobacter pylori (Barbato, 2008). Acredita-se que os agentes biolgicos atuem como promotores da proliferao celular, criando condies propcias para mutaes por erros de transcrio do DNA (INCA, 2008). A carcinognese qumica um processo sequencial, que ocorre aps a exposio a agentes qumicos genotxicos, de ao direta ou indireta, e/ou a agentes qumicos no genotxicos (epigenticos) presentes no ambiente geral (gua, terra e ar), no consumo (alimentos e medicamentos), nos ambientes social e cultural (estilo e hbitos de vida) e no ambiente ocupacional (indstrias qumicas e afins) (Klauning; Kamendulis, 2008). O processo de carcinognese composto por trs etapas distintas: a iniciao, a promoo e a progresso. A iniciao a primeira etapa do processo cancergeno, na qual clulas normais de um determinado rgo ou tecido so convertidas em clulas com potencial para tornarem-se tumor

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(clulas iniciadas). uma fase rpida e irreversvel. Agentes qumicos ou fisicos que agem nessa etapa so chamados de agentes iniciadores. Os agentes iniciadores levam a danos genticos que incluem mutaes e delees. Esses danos genticos atingem genes fundamentais para a regulao e o controle do crescimento celular. As clulas iniciadas precisam passar por pelo menos um ciclo de diviso celular para que a alterao no DNA seja fixada e torne-se permanente. A iniciao sozinha no suficiente para a formao de tumores (Klauning; Kamendulis, 2008). A promoo envolve a expanso clonal das clulas iniciadas e exige a proliferao celular. A segunda etapa da carcinognese (promoo) caracterizada por ser uma etapa longa e reversvel, no genotxica, que no envolve modificaes diretas no DNA e que resulta da exposio a doses repetidas do agente cancergeno, em intervalos curtos. O agente promotor no tem ao mutagnica nem cancergena e, para conseguir efeito biolgico, deve persistir no ambiente. O estgio final do processo de carcinognese, a progresso, envolve a converso de leses prneoplsicas benignas em cncer neoplsico. Nesse estgio, eventos genotxicos adicionais podem ocorrer resultando em dano adicional ao DNA, incluindo aberraes cromossmicas e translocaes. uma etapa irreversvel, na qual as clulas tornam-se imortalizadas, perdendo, inclusive, a capacidade de reparar qualquer tipo de dano (Klauning; Kamendulis, 2008; Oliveira et al. 2007; Gomes-Carneiro et al., 1997). A Figura 1 sintetiza as diferentes etapas da carcinognese.

Iniciao AGENTE CARCINOGNICO

Qumico Fsico BiolgicoInativao Eliminao

Reparao Dose biolgica efetiva A D N Ativao de Proto-oncogenes MutaoPromoo

Alteraes Genticas

Exploso Clonal Seletiva

Instabilidade Genmica

N E O P L A S I A

Dano Oxidativio

Reordenamento Cromossmico

Alteraes Enzimticas

ALTERAES CELULARES

Figura 1. As etapas da carcinognese Fonte: INCA, 2008.

Os tumores malignos apresentam duas propriedades peculiares: a invaso dos tecidos circunvizinhos e o comprometimento a distncia (metstase). Esse definido como o comprometimento a distncia por uma parte do tumor que no guarda relao direta com o foco primrio.

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1.2. CarcinogenicidadeCarcinogenicidade a capacidade de substncias qumicas ou outro fator ambiental induzir o aparecimento de neoplasias malignas. Diversas substncias presentes no meio ambiente tm o potencial de alterar a estrutura do genoma e/ou a expresso da informao gentica, aumentando o risco para o desenvolvimento de cncer. importante ressaltar que a anlise de uma nica substncia no reflete a situao real de exposio, pois os indivduos so expostos a misturas de substncias e a outros riscos que podem atuar de forma cumulativa ou antagonista entre si, ou ainda conter componentes desconhecidos. Estimase que existam mais de 60 milhes de substncias qumicas, das quais mais de 200 mil so de uso industrial. Atualmente, considera-se que inmeras substncias qumicas e certos agentes fsicos (radiaes) tm potencial cancergeno para o homem. Os termos cancergeno, enquanto adjetivo, e carcingeno, enquanto substantivo, so formados por: Cancer(i), o antepositivo que contm a ideia de cancro, e o pospositivo do grego -geno, que contm as ideias de origem, gerar e nascimento. Distinto do vocbulo carcinognico, que, adicionado do pospositivo -ico, traz a ideia de semelhana, referncia. Assim, cancergeno deve ser considerado um agente ou substncia, qumico ou fsico, ou uma mistura de substncias qumicas que induzem o cncer ou aumentam sua incidncia. O carcingeno produz novo crescimento neo neoplsico no tecido ou rgo, aumenta a taxa de formao de tumores, ou aumenta o nmero de combinaes de tumores malignos e benignos em uma populao. Os agentes cancergenos podem ser divididos em genotxicos, que interagem com o DNA e causam mutaes, ou no genotxicos, que influenciam a progresso de clulas iniciadas por mecanismos no genticos (Klauning; Kamendulis, 2008). Evidncias de carcinogenicidade so obtidas por meio de estudos epidemiolgicos, toxicolgicos ou pelo mecanismo de ao das substncias (ACGIH, 2001). As melhores evidncias de carcinogenicidade so aquelas obtidas em estudos epidemiolgicos prospectivos, porm, esses so caros, complexos e s podem ser realizados aps a exposio humana por longos perodos. Alternativamente aos estudos epidemiolgicos, pode-se realizar ensaios toxicolgicos, in vivo e in vitro, com o objetivo de avaliar o potencial cancergeno de substncias qumicas (ACGIH, 2001). Os cancergenos qumicos podem penetrar no corpo pela pele, vias respiratrias ou por via oral, pela ingesto acidental ou proposital. Muitas substncias so conhecidas por serem genotxicas e apresentarem potencial para causar alteraes genticas em tecido-alvo. Tais alteraes, se ocorrerem em proto-oncogenes e genes supressores tumorais que esto envolvidos no controle do crescimento ou de diferenciao celular, podem levar ao desenvolvimento de cncer nos rgos-alvo (Keshava; Ong, 1999). Um cancergeno de ao direta geralmente atua sobre rgo ou tecido principal de contato, por exemplo: o bis (clorometil) ter (BCME), quando inalado, pode causar cncer do pulmo; o contato da pele com certas substncias provenientes de fornos de combusto pode causar cncer da pele

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(NIOSH, 1977). No caso da exposio ao benzeno, o potencial cancergeno atribudo a produtos do seu metabolismo e , por isso, chamado de carcingeno secundrio ou de ao indireta (Aksoy, 1985). Sua toxicidade medular deve-se capacidade de ligao de um ou mais de seus metablitos a macromolculas, como o ADN e as protenas. Essa propriedade confere ao benzeno ao radiomimtica, responsvel pela interferncia nas clulas progenitoras da medula ssea e por dano ao microambiente medular, resultando em leucemia (Ruiz et al., 1993). O tempo decorrido entre a exposio a um determinado agente e a deteco clnica do tumor pode variar em funo de uma srie de fatores ligados ao agente, ao tipo, ao tempo da exposio e ao trabalhador. Isso chamado de efeito latente e a durao desse tempo chamada de tempo de latncia. Tem durao varivel, sendo geralmente longa, de 20 a 50 anos para tumores slidos, ou curta, de 4 a 5 anos para as neoplasias hematolgicas (Brasil, 2001). O estabelecimento de nexo entre o cncer e a exposio decorrente da ocupao, por muitas vezes, dificultado por esse longo intervalo de tempo. As exposies combinadas de certos agentes podem gerar efeito sinrgico. Isso ocorre quando o efeito da combinao maior do que o esperado dos componentes individualmente. Esse efeito tem sido encontrado em exposies a mltiplos cancergenos, isso , certas combinaes podem induzir a aumento na incidncia de cncer ou reduzir o perodo de latncia. Alm disso, a exposio a alguns agentes cancergenos e no cancergenos (em diferentes momentos ou no) pode, tambm, diminuir o perodo de latncia ou aumentar a incidncia de cncer (NIOSH, 1977). As substncias cancergenas podem produzir outros efeitos como dermatites, queimaduras de pele, irritao de olhos e pele, danos aos pulmes e a outros rgos, entre outros. Esses sintomas so frequentemente resultado de exposio a altas concentraes e, geralmente, ocorrem muito prximos ou imediatamente aps as exposies. Alguns cancergenos podem tambm afetar o sistema reprodutivo dos trabalhadores expostos, como podem ser mutagnicos, embriotxicos e/ ou teratognicos (OMS, 1974; Flamm; Lorentzen, 1985; Klaassen, 2008; Soto, 2010). Os agentes mutagnicos so substncias que interagem com o DNA e causam mutaes. Mutaes gnicas so trocas na sequncia do DNA de um gene. Os agentes embriofetotxicos so substncias capazes de induzir efeitos adversos sobre o desenvolvimento embriofetal. Os efeitos incluem retardo do desenvolvimento embriofetal e embrioletalidade (Rogers; Kavlock, 2008). H evidncias de que as esposas dos trabalhadores expostos a cloreto de vinila tm risco aumentado para abortos (NIOSH, 1977). Os agentes teratognicos so substncias que ocasionam malformaes congnitas (Dicke, 1989). Para determinar se (ou em que extenso) trabalhadores podem sofrer danos em consequncia da exposio a agentes txicos, considera-se o limiar de dose abaixo da qual a maioria dos trabalhadores expostos no ficaria doente. No entanto, os cientistas divergem sobre qual seria a exposio necessria a um cancergeno para que o cncer se desenvolva. Alguns ponderam que qualquer exposio se traduz em risco potencial para o desenvolvimento de um tumor, isto , que no existe limiar de dose para agentes cancergenos genotxicos, enquanto outros avaliam que o potencial de cada agente est relacionado ao seu mecanismo de ao carcinognica. Portanto, como no se tem completo conhecimento sobre a ao das substncias cancergenas, no aceitvel a adoo de limites de exposio.

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A questo da adoo de limites de exposio se confunde com o limite de tolerncia adotado na legislao brasileira (Portaria n 3.214, do Ministrio do Trabalho e Emprego MTE, Norma Regulamentadora NR n 15) sobre o pagamento de adicional de insalubridade para os trabalhadores. Em ambos os casos, o tema deve ser tratado com muito cuidado, preconizando-se medidas de controle que evitem toda e qualquer exposio a agentes cancergenos suspeitos ou confirmados. Um grande nmero de substncias, agentes fsicos, qumicos e biolgicos ou misturas presentes no meio ambiente podem alterar a estrutura do genoma e/ou a expresso da informao gentica, aumentando o risco de desenvolvimento de cncer. Para consensuar e divulgar o conhecimento acumulado sobre o potencial cancergeno dos agentes qumicos, fsicos e biolgicos presentes tanto na esfera ambiental como ocupacional, agncias regulamentadoras internacionais, como a International Agency for Research on Cancer (IARC, 2010) e a Environmental Protection Agency (EPA, 2007), desenvolvem critrios de classificao dessas substncias. Essa tarefa complexa e os mtodos at hoje empregados possuem limitaes na operacionalizao e na interpretao dos resultados. Est em implantao um sistema globalmente harmonizado de classificao de perigos e um sistema compatvel de rotulagem, incluindo folha de informao de segurana de produto e smbolos facilmente compatveis, conhecido pela sigla GHS (The Globally Harmonized System of Classification and Labelling of Chemical Sistema Harmonizado Globalmente para a Classificao e Rotulagem de Produtos Qumicos).

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Captulo 2.

O cncer e a exposio ocupacionalAs concentraes de substncias cancergenas, em geral, so maiores nos locais de trabalho do que em outros ambientes extralaborais. Segundo as estimativas da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), aproximadamente 440 mil pessoas morreram no mundo em 2005 como consequncia da exposio a substncias perigosas no trabalho. Mais de 70% dessa cifra, ou seja, aproximadamente 315 mil pessoas, morreram de cncer relacionado ao trabalho. Uma proporo significativa dos casos de cncer decorrente do trabalho teve como causa a exposio ao amianto (OIT, 2009; EUROGIP, 2010). Hmlinen et al. (2007) estudaram a situao mundial dos bitos no trabalho e identificaram como principais causas: o cncer (32%), as doenas do aparelho circulatrio (26%) e os acidentes (17%). Nos pases em desenvolvimento, os trabalhadores esto se aposentando mais tarde e, devido s caractersticas do processo de industrializao, esto sendo expostos a muitos tipos de substncias e sob condies de trabalho desfavorveis por um longo tempo. O primeiro relato associando cncer ocupao foi descrito por Percival Pott, em 1775, relacionando cncer de escroto em limpadores de chamin como decorrente da exposio fuligem. Todavia, o modelo experimental da carcinogenicidade da fuligem s foi demonstrado em 1920, ou seja, 150 anos depois da primeira observao epidemiolgica (OIT, 2009). O processo histrico da associao entre cncer e ocupao est descrito no Quadro 1, a seguir.Quadro 1. Histrico de associao de local primrio do cncer e exposio ocupacional

Ano1775 1822 1875 1876 1876 1879 1894 1895 1898 1906 1910 1911 1917 1926

AutorPott Pars Volkmann Volkmann Bell Harting e Hesse Unna Rehn Mackenzie Frieben Wilson Pfeil Leymann Prunes

Local do cncerEscroto Pele Pele Pele Pele Pulmo Pele Bexiga Pele Pele Pele Pulmo Pele Pele

RiscoLimpadores de chamin Arsnio Cera, carvo Alcatro de carvo leo de corte Radiao ionizante Radiao ultravioleta Aminas aromticas Cresoto Raios X leos e lubrificantes Produtos cromados Antraceno cru Salpeter

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Quadro 1. Histrico de associao de local primrio do cncer e exposio ocupacional (continuao)

Ano1929 1932 1935 1952

AutorMartland Grenfell Lynch e Smith Weil et al.

Local do cncerOssos Pulmo e seios nasais Pulmo Seios nasais

RiscoRdio Nquel Asbestos lcool isoproplico

A associao de cncer com causas ocupacionais tem sido demonstrada por meio de estudos epidemiolgicos (Stellman, 1998). A partir de 1965, com a criao da IARC pela Organizao Mundial da Sade (OMS), ficou a cargo dessa Agncia o consenso internacional para o reconhecimento do carter cancergeno das substncias, agentes ou outras formas de exposio. No que tange exposio ocupacional, o papel da IARC tem sido fundamental no sentido de reconhecer os ambientes complexos e as mltiplas exposies que ocorrem no ambiente de trabalho e que no permitem a identificao de agentes isolados. Aps a dcada de 1960, muitos outros estudos demonstraram a relao entre a atividade ocupacional e o cncer.

2.1. ToxicologiaConsiderando-se que a carcinognese um processo altamente complexo, do qual participam fatores de risco herdados e ambientais relacionados condio social, aos hbitos alimentares, ao estilo de vida, ocupao e exposio a agentes fsicos e qumicos, a contribuio mais expressiva da toxicologia para a reduo da incidncia do cncer se faz por intermdio da identificao dos fatores de risco de natureza qumica. A avaliao toxicolgica permite identificar substncias qumicas potencialmente cancergenas e torna possvel implementar medidas regulatrias para reduzir a exposio humana a elas (Gomes-Carneiro et al., 1997). As substncias qumicas, estranhas ao organismo e sem valor nutritivo, so chamadas xenobiticos, e aquelas capazes de causar dano a um sistema biolgico, alterando uma funo ou levando-o morte, sob certas condies de exposio, so chamadas de agentes txicos (Oga et al., 2008). A intoxicao a manifestao do efeito txico e corresponde ao conjunto de sinais e sintomas que revelam o desequilbrio produzido pela interao do agente txico com o organismo. Para que ocorra um efeito txico, o agente ou seu metablito ativo deve atingir o stio (local) correto de ao, na dose (concentrao) correta e com durao (perodo de tempo) suficiente para produzir o dano (manifestaes txicas) no organismo (Eaton; Gilbert, 2008). A toxicologia define dose como a quantidade do agente txico que alcana o tecido-alvo em um determinado perodo de tempo (Thorne, 2008). A ocorrncia de efeito txico , portanto, dependente das propriedades fsico-qumicas do agente, da situao de exposio (dose, via, durao e frequncia), da suscetibilidade do organismo e da

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via de metabolizao (Eaton; Gilbert, 2008). Dessa forma, para caracterizar o potencial de perigo de um agente qumico necessrio conhecer no somente o tipo de efeito produzido, mas tambm considerar as informaes sobre o agente, a exposio e a sua cintica no organismo. As principais propriedades fsico-qumicas que podem influenciar na toxicidade de um agente so: solubilidade, presso de vapor, constante de ionizao, reatividade qumica, estabilidade, tamanho da partcula, coeficiente de partio, entre outras (Eaton; Gilbert, 2008). Quanto composio qumica, entre os principais grupos envolvidos em exposies ocupacionais, destacam-se: halgenos; produtos alcalinos; compostos inorgnicos de oxignio, nitrognio e carbono; hidrocarbonetos alifticos, alicclicos, aromticos e halogenados; fenis e compostos fenlicos; lcoois, glicis e derivados; compostos epxi; teres; cetonas; aldedos; cidos orgnicos e anidridos; steres; fosfatos orgnicos; cianetos e nitrilas; compostos de nitrognio e metais. Alm da composio qumica, a forma fsica pode potencializar as vias de absoro a partir da via principal de exposio. As substncias podem se apresentar em diferentes formas, como descritos em Salgado e Ferncola (1989) e discutidos a seguir. GASES: so fluidos, sem forma nem volume prprios, que permanecem no estado gasoso nas condies normais de presso e temperatura. Exemplos: monxido de carbono (CO), sulfeto de hidrognio (H2S), xidos de nitrognio (NO e NO2), oznio (O3), anidrido sulfuroso (SO2) e outros. VAPORES: so formas gasosas de substncias normalmente slidas ou lquidas em condies ambientais que podem retornar a seus estados originais dependendo de alteraes das condies de presso e/ou temperatura. Exemplos: vapores resultantes da volatilizao de solventes orgnicos, como benzeno, sulfeto de carbono, tetracloreto de carbono, tolueno, xileno, lcoois, teres e outros. AERODISPERSOIDES: so partculas de tamanho reduzido, no estado slido ou lquido, dispersas no ar, que podem manter-se em suspenso por um longo perodo de tempo. Podem apresentar tamanho variado de acordo com o tipo de substncia e o modo como a partcula formada. Partculas muito pequenas, cujas dimenses se aproximam das molculas gasosas e partculas solveis difundemse, alcanando a corrente sangunea. As partculas pouco solveis sofrem um lento processo de desintegrao at que possam ser absorvidas ou eliminadas. Os aerodispersoides se classificam em: Poeiras: formam-se pela desagregao mecnica de slidos maiores, como produtos de minerao, madeiras, fibras vegetais, slica e amianto, entre outros. Fumos: so obtidos pela condensao ou oxidao de vapores gerados pelo aquecimento de slidos tais como metais e plsticos. Geralmente, so partculas pequenas, de 0,001 a 0,5 m. Neblinas: resultam da condensao de substncias lquidas que se volatilizaram. Nvoas: formam-se pela ruptura de substncias que em condies normais de temperatura e presso se apresentam na forma lquida. Exemplo: nvoas de leo formadas durante o corte e a moagem de sementes oleaginosas, durante processos de galvanizao, pinturas com spray, nvoas de H2SO4 nos ambientes onde se carregam baterias eltricas. Fumaas: so constitudas por gases, vapores, partculas slidas e lquidas, resultantes da

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combusto incompleta de materiais carbonceos, tais como: carvo e leos, geralmente so menores que 0,1 m (Salgado; Ferncola, 1989). Os principais fatores que influenciam a toxicidade em relao situao de exposio para um qumico especfico so a via de exposio (administrao), a durao e a frequncia da exposio (Eaton; Gilbert, 2008). Deve ser considerada, ainda, a intensidade da exposio, que depende, entre outros fatores, da concentrao do agente txico no local de trabalho, do tipo e intensidade de trabalho, da durao diria da exposio ao longo da vida profissional, da frequncia da exposio pelo trabalhador e das condies ambientais (temperatura, umidade e ventilao). As principais vias de introduo de agentes qumicos no organismo humano so trato gastrointestinal, pulmes e pele. A via de introduo pode influenciar na toxicidade da substncia qumica. Por exemplo: espera-se que um agente que detoxificado pelo fgado seja menos txico quando introduzido no organismo por via oral (passagem pela circulao porta) do que por inalao (circulao sistmica). A comparao da dose letal de um agente txico por diferentes vias de exposio tambm fornece informaes teis relacionadas sua absoro. Nos casos em que as doses letais por via oral e drmica so similares quela administrada por via intravenosa, pressupe-se que o agente pronta e rapidamente absorvido por essas vias. Por outro lado, quando a dose letal drmica muito maior que a dose letal oral significa que a pele constitui uma barreira efetiva absoro do agente txico (Eaton; Gilbert, 2008). As vias de introduo possuem maior ou menor destaque, de acordo com a rea da toxicologia em estudo. Por exemplo: as vias pulmonares e cutneas so as mais importantes na toxicologia ocupacional e ambiental. A durao e a frequncia com que o organismo permanece em contato com o agente txico so importantes na determinao e intensidade do efeito txico. No entanto, as condies de exposio no so to claramente definidas em seres humanos. Nos estudos experimentais conduzidos em animais, os tipos de exposio so divididos em quatro categorias: aguda, subaguda, subcrnica e crnica. Na exposio aguda (curto prazo), o contato ocorre em um perodo de tempo no superior a 24 horas; as exposies subagudas e subcrnicas ocorrem em um perodo de um ms ou menos ou no perodo de um a trs meses, respectivamente; e a exposio crnica ocorre quando as exposies se repetem durante um longo perodo de tempo (meses, anos ou toda a vida) (Eaton; Gilbert, 2008). Para inmeras substncias, os efeitos txicos observados nas exposies agudas so diferentes daqueles produzidos por exposies repetidas. Por exemplo: a principal manifestao txica aguda do benzeno a depresso do Sistema Nervoso Central (SNC), enquanto exposies repetidas podem resultar em toxicidade para a medula ssea com aumento do risco para o desenvolvimento de leucemia. Nas exposies agudas, as substncias qumicas so rapidamente absorvidas e os efeitos produzidos geralmente so imediatos. Entretanto, algumas vezes, nota-se a ocorrncia de efeitos retardados, similares ou no aos produzidos nas exposies crnicas. Por outro lado, as exposies crnicas a um agente txico podem produzir efeitos imediatos (agudos) aps cada administrao, alm dos efeitos produzidos em longo prazo (crnicos) em baixas concentraes do agente (Eaton; Gilbert, 2008). A variabilidade da resposta biolgica em funo da suscetibilidade de cada indivduo outro fator importante em toxicologia. Existem situaes em que exposies iguais determinam respostas

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iguais e outras nas quais se observam respostas diferentes. Por exemplo: para dois trabalhadores que desempenham funes iguais durante 30 anos e, portanto, esto expostos no mesmo ambiente e nas mesmas condies, possvel que apenas um deles desenvolva uma enfermidade determinada pela exposio aos agentes txicos presentes no ambiente de trabalho. Nenhuma pessoa igual outra e, assim sendo, as respostas txicas podem variar de um indivduo para outro. Resguardando-se a diferena gentica, um dos aspectos observados em respostas diferentes entre indivduos de uma mesma espcie est diretamente interligado aos processos toxicodinmicos e toxicocinticos (absoro, distribuio, biotransformao e excreo), conforme Figura 2 e descrio detalhada a seguir.

2.1.1. ToxicocinticaAbsoroAbsoro o processo pelo qual os agentes txicos atravessam as membranas e entram na corrente sangunea. As principais vias de exposio de agentes txicos no organismo so a respiratria, a drmica e a oral (Oga et al., 2008). Principais vias de introduo do agente txico no organismo: Via respiratria a principal via de introduo de agentes txicos no organismo humano e assume importncia fundamental em toxicologia ocupacional, pois: No ambiente de trabalho, a maioria dos agentes qumicos se encontra sob a forma de gases, vapores e/ou partculas. O sistema respiratrio apresenta contato direto com o meio ambiente. Um volume considervel de ar alcana as vias respiratrias: cerca de 5 a 6 litros/min de ar entram pelas vias respiratrias de uma pessoa em repouso e at 30 litros/min quando em movimento. A intensa atividade e o esforo fsico do trabalhador facilitam a penetrao do agente txico no organismo. O trato respiratrio possui extensa rea, com cerca de 90 metros, e superfcie alveolar de aproximadamente 70 metros, mantendo, portanto, um ntimo contato com os contaminantes presentes no ar. O trato respiratrio permevel e ricamente vascularizado, permitindo, assim, rpida e eficiente absoro. O agente qumico absorvido poder atingir o SNC e outros rgos sem passar pelo sistema heptico.

As vias respiratrias superiores e os alvolos tomam parte na reteno e absoro de agentes txicos e sua atuao depende do estado fsico do agente txico: Partculas: a reteno de partculas est ligada ao seu tamanho. Quanto maior o dimetro da partcula, menor a penetrao. Cinquenta por cento das partculas com dimetro superior a 8 mm so retidas pelas fossas nasais. Os mecanismos que impedem a penetrao nos estgios mais profundos das vias respiratrias so a atividade dos clios vibrteis, a incorporao da

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partcula ao muco secretado pelas clulas e o reflexo nervoso ocasionado pela presena de corpos estranhos. Juntos, esses mecanismos concorrem para a rejeio das partculas e impedem a sua penetrao. Entretanto, se a partcula alcana os alvolos, seu destino poder ser: passagem direta para o sangue, dependendo do seu tamanho e solubilidade; remoo at os brnquios, seguida de deglutio ou expectorao; passagem para o sistema linftico; reteno nos alvolos, podendo causar pneumoconioses. Os efeitos txicos mais comumente observados so inflamao e irritao das vias areas superiores (Oga et al., 2008). Gases e vapores: gases com solubilidade pronunciada apresentam uma tendncia maior a serem retidos nas vias areas superiores. O cido clordrico e o amonaco so muito hidrossolveis e afetam principalmente as vias respiratrias superiores. Os vapores nitrosos, menos solveis em gua, penetram mais profundamente e lesionam os alvolos. A absoro alveolar de gases txicos depende do gradiente de presso entre o ar alveolar e o sangue. Quanto maior a presso do ar alveolar, maior ser a absoro. Gases com baixa presso no ar alveolar apresentam maior tendncia a serem eliminados.

Via cutnea A pele um rgo formado por mltiplas camadas de tecidos e representa cerca de 10% do peso corpreo. No estado ntegro, a pele constitui uma barreira efetiva contra a penetrao de substncias qumicas exgenas. No entanto, alguns agentes podem sofrer absoro cutnea, dependendo de fatores como a anatomia e as propriedades fisiolgicas da pele e das propriedades fsico-qumicas dos agentes. A camada mais interna a derme, composta de tecido gorduroso, conjuntivo, irrigado por capilares e vasos sanguneos. A pele relativamente impermevel maioria dos ons, bem como s solues aquosas; entretanto, permevel a grande nmero de agentes txicos slidos, gases e lquidos impermeveis (Oga et al., 2008). Algumas substncias atuam diretamente sobre a pele, causando efeitos deletrios na epiderme, como corroso, sensibilizao e mutaes gnicas. Os cidos, as bases e certos sais e oxidantes so exemplos de substncias que comumente causam efeitos locais. A atividade desses agentes pode se restringir aos tecidos de contato ou estender-se aos tecidos mais profundos da derme, promovendo efeitos sistmicos. Os efeitos sistmicos resultam da atuao de agentes txicos sobre as clulas ou tecidos distantes do local de acesso, aps a sua absoro e distribuio pelo organismo (Oga et al., 2008). Existem centenas de produtos, com ampla utilizao no meio industrial, que exercem ao irritante mesmo em pequenas concentraes, como cido clordrico, cido oxlico, fenol, clorofenol e amonaco. Os sabes e solventes so considerados irritantes suaves, havendo a necessidade de exposies repetidas para provocarem irritao. Outros agentes qumicos, como resinas epxi, corantes azoicos, derivados do alcatro da hulha, metais (nquel, cromo e cobalto), di-isocianatos, etilamina, trietilamina, trietilenodiamina, perxido de benzoila, dietilanilina, anidridoftlico, entre outros, podem produzir reaes alrgicas em indivduos hipersensveis. O arsnio, ao favorecer a sntese de melanina, produz hiperpigmentao, e a prata, por deposio, produz o mesmo efeito. Deve ser ressaltado que todas as situaes que levam alterao da integridade da pele, principalmente dos elementos que compe as barreiras orgnicas, favorecem a absoro de outras substncias.

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Vrios fatores podem interferir na absoro pela pele: o tamanho da partcula, a sua solubilidade em gua e em lipdios, seu peso molecular e seu grau de ionizao com relao exposio ocupacional. Merecem destaque a circulao perifrica, a durao do contato cutneo e a temperatura do local de trabalho, isso , pode haver um aumento de 1,4 a 3 vezes na velocidade de penetrao cutnea de agentes qumicos para cada 10C de aumento na temperatura. trabalho, isso , pode haver um aumento de 1,4 a 3 vezes na velocidade de penetrao cutnea de agentes qumicos para cada 10C de aumento na temperatura. A energia solar configura um cancergeno parte, pois, embora sua ao se d na pele, a ao cancergena ocorre nas clulas superficiais ou profundas. Via oral A absoro por essa via ocorre ao longo de todo o trato gastrointestinal. Alguns fatores, tais como: grau de dissociao das substncias, grau de lipossolubilidade da forma no ionizada e taxa de dissoluo, solubilidade do agente txico no pH do trato gastrointestinal, estabilidade do agente txico em enzimas digestivas e na flora intestinal, plenitude e vacuidade no trato gastrointestinal, veculo e tipo de formulao do composto, presena de outras substncias qumicas que possam interagir com o agente txico, entre outros, podem influenciar a absoro de compostos qumicos pela parede gastrointestinal. Em geral, essa via representa um papel secundrio na esfera ocupacional, entretanto, a exposio a poeiras de certos elementos, como chumbo, arsnio, cdmio, pode ocorrer pela via digestiva. Isso se deve ao fato de que, no meio industrial, a contaminao por essas poeiras pode ocorrer diretamente via mos ou alimentos contaminados.

DistribuioOs agentes so transportados pelo sangue para diversos tecidos, portanto, a distribuio depende do fluxo sanguneo nos diferentes rgos, alm de sofrer interferncia de outros fatores, como ligao s protenas plasmticas, diferenas de pH e coeficiente de partio leo/gua de cada substncia. O equilbrio de distribuio atingido facilmente nos tecidos que recebem grande circulao de fluidos (corao, crebro e fgado) e mais lentamente nos rgos pouco irrigados (ossos, unhas, dentes e tecido adiposo). Na fase inicial da distribuio, os rgos altamente irrigados recebem grande quantidade do agente txico, mas, aps algum tempo, os rgos menos irrigados podem acumular maior quantidade do agente, desde que possuam maior afinidade ou poder de reteno. Animais expostos ao chumbo, por exemplo, aps 2 horas de exposio tm 50% do chumbo administrado depositado no fgado. J 30 dias aps a exposio, 90% do metal que permanece no organismo est ligado ao tecido sseo. Agentes lipoflicos, como alguns agrotxicos organoclorados e as bifenilas policloradas, se concentram no tecido adiposo e, em caso de mobilizao rpida de gordura, suas concentraes aumentam e podem causar toxicidade (Oga et al., 2008).

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A toxicidade do agente depende do seu volume de distribuio, mas nem sempre o local de maior distribuio o rgo mais lesado. s vezes, um rgo funciona como simples depsito. Ademais, o acmulo do agente no tecido de depsito pode conferir toxicidade, como o acmulo de flor na matriz ssea que causa a fluorose.

BiotransformaoNos mamferos, os agentes txicos so alvo de uma srie de reaes enzimticas, cujo resultado a transformao de molculas lipoflicas em metablitos mais hidrossolveis e, portanto, passveis de serem eliminados. Esse processo de biotranformao um importante processo de desintoxicao, porm, a biotransformao pode, em alguns casos, converter compostos quimicamente inertes em metablitos altamente reativos (por exemplo, reativos com a molcula de DNA). Esse processo, conhecido como ativao metablica, pode causar efeitos adversos, incluindo citotoxicidade, imunotoxicidade, mutagnese e carcinognese. O metabolismo do benzeno, por exemplo, gera radicais epxidos com alto potencial cancergeno. Sendo assim, de grande importncia, nos estudos toxicolgicos, a determinao dos metablitos que so gerados no organismo. Essa anlise realizada nos estudos toxicocinticos e, em geral, esses metablitos so medidos no sangue e na urina. A Figura 2 mostra a cintica de substncias qumicas no organismo humano. As substncias orgnicas txicas, uma vez nos organismos, so metabolizadas por meio de transformaes que as tornam, em geral, mais polares, para serem mais facilmente excretadas. Essas reaes ocorrem principalmente no fgado e so catalisadas por enzimas hepticas. As biotransformaes so agrupadas em reaes que compreendem reaes de oxidao, reduo, hidrlise e conjugao. Embora no seja muito comum, certas substncias inorgnicas, como o arsnio, tambm podem ser metabolizadas. Com outras substncias, o metabolismo heptico pode originar compostos mais txicos do que o original. Por exemplo: no metabolismo do benzeno so gerados radicais epxidos aos quais atribudo o potencial cancergeno do benzeno.

Excreo o processo pelo qual as substncias qumicas so eliminadas do organismo. Os agentes txicos so excretados por diferentes vias e, na maioria das vezes, sob a forma de produtos mais hidrossolveis, aps a sua biotransformao. As vias de excreo mais representativas so a urinria, a fecal e a pulmonar. A urina excreta substncias hidrossolveis, enquanto as fezes carregam substncias no absorvidas no trato digestivo e tambm os produtos excretados pela bile. A via pulmonar a responsvel pela excreo de gases e vapores (Oga et al., 2008). Embora a excreo possa ocorrer pela bile, pelo ar expirado, pelo suor, pela saliva e pelos fneros, a via urinria a mais importante via de eliminao para a maioria das substncias. Grande parte dos compostos orgnicos, incluindo benzeno, tolueno e xileno, eliminada pelos rins.

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AGENTE QUMICO

Fase de exposio

- Ar - gua - Alimentos

Avaliao ambiental

Vias de introduo

Absoro Fase toxicocintica Eliminao Biotransformao Fase toxicodinmica

Distribuio Avaliao biolgica

Ligao em molculas crticas

Ligao em molculas no crticas Efeitos no adversos

Efeitos adversos

Fase clnica

Leses pr-clnicas

Vigilncia da sade

Leses clnicas

Figura 2. Fases de exposio, toxicocintica, toxicodinmica e efeitos das substncias qumicas no organismo humano Fonte: Adaptado de Bernard e Lauwerys (1984).

Durante sculos, o ambiente de trabalho desempenhou um papel significativo no aparecimento de efeitos adversos sobre a sade humana devido exposio a substncias qumicas perigosas. A toxicologia ocupacional a aplicao dos princpios e metodologias da toxicologia com o objetivo de compreender e gerenciar a exposio a agentes qumicos no trabalho. A toxicologia define dose como a quantidade do agente txico que alcana o tecido-alvo em um determinado perodo de tempo. No ambiente ocupacional, entretanto, o termo exposio usado como substituto de dose e a resposta a substncias qumicas dependente tanto dos fatores do hospedeiro, tais como: suscetibilidade gentica, idade, gnero e estado nutricional (Figura 3), como da dose (Thorne, 2008).

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Alm disso, determinados ambientes de trabalho tm o potencial de superexpor os trabalhadores a vrios agentes txicos e frequentemente difcil estabelecer o link causal entre a doena do trabalhador e a sua ocupao, uma vez que existe uma grande distncia de tempo entre a exposio e o surgimento dos efeitos txicos relacionados exposio. A Figura 3 mostra esse longo caminho a partir da exposio at a doena subclnica ou efeitos adversos sade. Em geral, os efeitos decorrentes das exposies a doses moderadas de substncias qumicas com elevada toxicidade surgem em um curto perodo de tempo. No entanto, exposies prolongadas a baixas doses, at mesmo quando o agente txico apresenta elevada toxicidade, podem resultar em efeitos crnicos, como o cncer, aps um longo perodo de tempo (toxicidade tardia). Nesses casos, a associao com a exposio ocupacional complexa e, na maioria das vezes, no feita de maneira correta. Com o objetivo de fazer a associao correta entre a exposio e a doena, os toxicologistas realizam o processo de avaliao de risco ocupacional, que, em conjunto com o biomonitoramento, o desenvolvimento de programas de proteo no ambiente de trabalho e a vigilncia sade (Figura 3), vai minimizar os riscos ao qual esses trabalhadores esto expostos.

Sucetibilidade gentica Exposio associada aditiva, antagonista ou sinrgica Idade, gnero nutrio, hbitos de vida

Fatores por modi car

Exposio

Concentrao Durao Frequncia Dose Biomonitoramento

Inquritos e Programas de Sade

Efeitos adversos sadeProgresso

Nvel subclnico Trabalhador saudvelReparo

Limites de Exposio Ocupacional Proteo Individual ou Coletiva Controle Tecnolgico ou Administrativo

Figura 3. Etapas, desde a exposio at a doena, destacando os fatores modificveis e as oportunidades de interveno Fonte: Adaptado de Thorne (2008, p. 1275).

2.2. Agentes CancergenosQuanto forma de utilizao das substncias qumicas, importantes compostos cancergenos encontram-se entre os metais pesados, os agrotxicos, os solventes e as poeiras. A lista detalhada dos cancergenos mais comuns no ambiente e no trabalho encontra-se no Anexo 1, adaptada de Reuben (2010). A seguir, sero destacados alguns de grande importncia para o Brasil.

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2.2.1. MetaisO reconhecimento do potencial cancergeno dos metais antigo. Possui grande importncia na contaminao ambiental, particularmente na contaminao de efluentes, vazamentos de indstria ou deposio incorreta de processamento de substncia qumicas a partir de ambientes de trabalho domiciliar ou informal (WHO, 1977). Os metais podem se apresentar de forma pura ou combinada com outros metais ou como contaminante de misturas. Somente para alguns metais existem evidncias suficientes de carcinogenicidade para o homem. Entre os mais comuns esto o arsnio, o berlio, o cdmio, o mercrio e o nquel. O cromo e o chumbo so considerados provavelmente cancergenos (WHO, 2007).

2.2.2. AgrotxicosAtualmente o Brasil ocupa o primeiro lugar como consumidor mundial de agrotxicos. Utilizados principalmente na agricultura, mas tambm na pecuria, na conservao de madeira, de alimentos, na produo de flores e como domissanitrios (ex: inseticidas domsticos). A populao rural constitui o grupo populacional mais diretamente exposto, muitas vezes desde a infncia, porm toda a populao pode ter contato com agrotxicos, seja pela ocupao, pela alimentao ou pelo ambiente. Alguns compostos testados em animais evidenciaram carcinogenicidade, como os organocloradados, alguns derivados do enxofre e o creosoto, um composto formado por hidrocarbonetos aromticos, cidos e alcatro, muito utilizados na preservao da madeira. Outras substncias so promotoras de tumor, como o diclorodifeniltricloroetano (DDT), clordane e lindane (IARC, 2010). Em humanos, compostos derivados do arsnio e inseticidas tm sido classificados pela IARC como cancergenos. Estudos epidemiolgicos so controversos nos achados que identificam a relao entre a exposio a agrotxicos e o aumento do risco de cncer. Associaes positivas entre cnceres hematolgicos e exposies ocupacionais a substncias qumicas foram observadas em estudos de caso-controle no sul do Estado de Minas Gerais para trabalhadores expostos a agrotxicos ou a preservantes de madeira e para trabalhadores expostos a solventes orgnicos, lubrificantes, combustveis e tintas (Silva, 2008). Solomon et al. (2000) e Clapp et al. (2007) encontraram relao entre agrotxicos e cncer, incluindo os cnceres hematolgicos, do trato respiratrio, gastrointestinais e do trato urinrio, entre outros. Wijngaarden et al. (2003) descrevem a exposio intrauterina e a ocorrncia de cncer do crebro na criana. Miligi et al. (2006) associaram a exposio a herbicidas fenoxiacticos com aumento de risco para sarcoma, linfoma no Hodgkin, mieloma mltiplo e leucemias; exposio a triazinas (herbicidas) ao aumento de risco para cncer do ovrio; exposio a inseticidas organofosforados ao aumento de risco para linfoma no Hodgkin, leucemias e cncer da prstata e a exposio a organoclorados ao aumento de risco para cncer da mama. Ainda sobre o cncer da mama, Snedeker (2001) observou resultados controversos entre cncer e nveis sanguneos ou no tecido adiposo do inseticida DDT e de seu metablito diclorodifenildicloroetileno (DDE).

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Para o herbicida Glifosato, amplamente comercializado no pas, estudos relacionam a ocorrncia de linfoma no Hodgkin (Hardell et al., 2002; De Ross et al., 2003; Cox, 2004) e mieloma mltiplo (De Ross et al., 2005). Outros estudos indicam associao positiva entre o uso de carbofurano (metilcarbamato de benzofuranila) e o desenvolvimento de cncer do pulmo (Bonner et al., 2005) e o uso do herbicida Paraquat e tumores no SNC (Lee et al., 2005). Alm dos agrotxicos j citados, alguns contaminantes em formulaes comerciais tambm podem apresentar aumento de risco para cncer. O grande nmero de estudos que apontam o potencial cancergeno dos agrotxicos e a ocorrncia de outros agravos sade humana relacionados a esses produtos colocam o uso extensivo desses qumicos no centro das preocupaes da Sade Pblica. A complexidade das medidas de preveno que urgem ser discutidas e adotadas no pas resultam de sua utilizao de forma descontrolada, a associao entre diversos tipos e marcas de agrotxicos e a naturalizao de sua manipulao.

2.2.3. Solventes orgnicosSo misturas de substncias classificadas em duas categorias: solventes alifticos e solventes aromticos. Solventes alifticos possuem predominncia de hidrocarbonetos parafnicos, provenientes do fracionamento de naftas e querosenes, originados da destilao de petrleo. Entre os solventes alifticos, destacam-se a aguarrs, diluente de tintas, fluidos hidrogenados, solvente mdio e solvente para borracha. Na indstria de petrleo, os solventes aromticos so provenientes do processamento de naftas nas unidades de reforma cataltica e de recuperao de aromticos. So obtidos como produtos quimicamente puros ou misturas. Entre os solventes aromticos, destacam-se benzeno, tolueno e xilenos. Muitos solventes utilizados na indstria so substncias altamente volteis e inflamveis. Estudos epidemiolgicos encontraram associaes entre exposies ocupacionais a alguns tipos de solventes e o aparecimento de cncer. Entretanto, uma relao de causalidade muitas vezes no pode ser determinada. Como na maioria dos estudos envolvendo exposies a substncias qumicas, a dificuldade de caracterizar a exposio aos agentes e o no controle de variveis de confundimento podem ter contribudo para a inconsistncia dos resultados. Os solventes so intensamente utilizados no Brasil, desde a indstria qumica e petroqumica at o uso domstico de removedores de ceras e tintas, alm de intensamente utilizados nas pequenas oficinas mecnicas de automveis, de peas, de eletroeletrnicos e quaisquer outras que necessitem de remoo de graxas e gorduras. O desconhecimento de seu papel cancergeno propiciou que a manipulao disseminada ocorresse sem qualquer cuidado e de forma trivial, no obstante o reconhecimento do risco para carcinognese de estudos nacionais, conforme descrito por Machado et al. (2003).

2.2.4. Formaldedo um composto inflamvel e incolor que rapidamente se polimeriza em temperatura ambiente. solvel em gua, lcool e em outros solventes polares, mas tem baixa solubilidade em solventes polares, mas tem baixa

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solubilidade em solventes no polares. A formulao comercial mais encontrada aquela em soluo aquosa com concentrao de 30% a 50% da substncia, popularmente conhecida como formol ou formalina. Formaldedo se decompe em metanol e monxido de carbono temperatura de 150C. rapidamente absorvido no trato respiratrio e gastrointestinal e, apesar de possvel, a absoro drmica no muito rpida. Devido ao seu rpido metabolismo, um aumento na concentrao sangunea no foi observado em seres humanos e em ratos aps exposio respiratria. O formaldedo possui grande variedade de usos. Na produo de resinas industriais (principalmente ureia-formaldedo, fenolformaldedo, poliacetal e resinas de melanina-formaldedo). amplamente utilizado na fabricao de colas, pastas e vernizes (que contm resinas de ureia-formaldedo dissolvidas em solventes orgnicos) para produtos de madeira, celulose, produtos de papel, plsticos, fibras sintticas e em acabamentos txteis. usado tambm como um intermedirio qumico potencial que inclui o uso na agricultura, como desinfetante industrial, domstico e desinfeo hospitalar. Como soluo aquosa chamada formalina, comumente utilizado como conservante para peas anatmicas, patologia, histologia, embalsamamento e conservante de alimentos. O uso de resinas, tendo como base o formol, na indstria txtil ou na finalizao de tecidos e artigos de vesturio, pode expor trabalhadores do setor varejista. Outros exemplos de exposio ocupacional podem ocorrer em trabalhadores de fundies, na indstria de fibra vtrea sinttica, na produo de plsticos, na agricultura, utilizado como conservante para forragem e como um desinfetante. Tambm em processos industriais, como tratamento de peles e couros, conservao de cevada e acar de beterraba, carvo e processamento de borrachas e abrasivos (IARC, 2006a; U.S. Department of Health and Human Services, 2010). Nos ltimos anos, no Brasil, os sales de beleza tm utilizado extensivamente o formol como alisante capilar nas denominadas escovas progressivas. A Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (Anvisa) proibiu o uso com essa funo, bem como em produtos de limpeza (detergentes, desinfetantes, alvejantes e demais materiais saneantes RDC n 35, de 3 de junho de 2008). Devido sua solubilidade em gua, o formol rapidamente absorvido pelo trato respiratrio e gastrointestinal, e rapidamente metabolizado. Embora o formol ou metablitos sejam capazes de penetrar na pele humana, a absoro drmica mais leve, porm podem induzir a dermatites de contato. Dessa forma, o formol txico se ingerido, inalado ou tiver contato com a pele, por via intravenosa, intraperitoneal ou subcutnea. A exposio ao formaldedo vem sendo associada, pela International Agency for Research on Cancer (Agncia Internacional para Pesquisa do Cncer IARC) (2006) e pela U.S. Department of Health and Human Services (2010), a cncer da nasofaringe, linfohematopoitico, sinonasal, da cavidade bucal, da faringe, da laringe e do pulmo (ou a combinao desses), alm de cncer de cabea e pescoo.

2.2.5. PoeirasDiversas poeiras presentes no ambiente de trabalho so reconhecidamente cancergenas e podem resultar da degradao (intencional ou acidental) de metais e agrotxicos. Outras poeiras de origem mineral possuem importante papel nos processos de trabalho e na contaminao ambiental como o asbesto/amianto e a slica.

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Asbesto ou amianto se apresenta como um silicato fibroso em distintas formas qumicas. um material resistente a cidos e possui propriedades isolantes ao calor e eletricidade. No Brasil, a indstria do fibrocimento representa uma importante fonte de exposio associada exposio na minerao. O pas se configura como um dos cinco maiores produtores de amianto do mundo, com uma produo mdia de 250 mil toneladas por ano. A quase totalidade do amianto comercializado no pas do tipo crisotila ou amianto branco, mas diversos produtos contaminados com outras formas de amianto proibidas por lei so encontrados, tal como em talco industrial, pedra-sabo, vermiculita, alm de material isolante aplicado no final dos anos de 1980 em diversos estabelecimentos pblicos e privados. A IARC reconhece todos os tipos de amianto como sendo cancergenos (Brasil, 2005), possuindo o mesotelioma uma relao inequvoca com a exposio ao amianto. A slica refere-se aos compostos de dixido de silcio (SiO2) nas suas vrias formas, incluindo: slicas cristalinas, slicas vtreas e slicas amorfas. Entre as formas cristalinas, a mais conhecida o quartzo, abundante nos mais variados tipos de rocha, na areia e nos solos. A slica pode ser encontrada na natureza em oito diferentes arranjos estruturais polimorfos do SiO2 e, dentre esses, os sete mais importantes na crosta terrestre so: -quartzo, cristobalita, tridimita, moganita, keatita, coesita e stishovita (Ribeiro, 2010b). Possui ampla distribuo nos processos de trabalho e faz parte da constituio da crosta terrestre, motivos pelos quais a sua disseminao se d de diversas formas e em muitas situaes. Estudos recentes de Ribeiro (2010a) dimensionam os expostos, no Brasil, em 3,1 milhes trabalhadores formais, ou 5,2% da mo de obra ocupada no ano de 2007. Estudos epidemiolgicos demonstram que h maior risco de desenvolvimento de cncer do pulmo em silicticos do que em no silicticos, e h evidncias demonstrando que o persistente processo de inflamao dos pulmes gera substncias oxidantes que resultam nos efeitos genotxicos no parnquima pulmonar. O grupo de trabalho descrito em Straif et al. (2009) reafirmou a carcinogenicidade da poeira de slica cristalina e o aumento do risco de cncer de pulmo para vrias indstrias e processos de trabalho. O mecanismo do cncer pela exposio slica se d pela clearance de partculas fraturadas, levando ativao de macrfagos e persistente inflamao (Straif et al., 2009). A reviso de Steenland et al. (2001) demonstrou, em estudos de coortes, que a exposio acumulativa por 15 anos foi um forte e crescente preditor de cncer do pulmo, particularmente em minas subterrneas, onde o risco aumentou de forma linear com o aumento de exposio, variando de 1,0 a 1,6 vezes. O risco de cncer do pulmo para trabalhadores expostos a ambientes com 0,1 mg/m3 de slica livre respirvel foi 1,7 vezes. O risco de cncer do pulmo avaliado por Wong (2002) em trabalhadores expostos slica foi 2,1 vezes maior quando comparados aos no expostos e, entre os trabalhadores com silicose, o risco aumentou para 2,8 vezes.

2.3. Classificao dos agentes ou das substnciasExistem diferentes formas de classificao para o mesmo agente. As restries para a exposio a substncias qumicas baseadas no conhecimento da toxicidade potencial ou da carcinogenicidade so bastante recentes. Em 1962, a lista da Conferncia Americana Governamental de Higiene Industrial (ACGIH) incluiu, num apndice, trs substncias qumicas carcinognicas para as quais deveria se adotar controle extremamente severo. Em 1968, a lista da ACGIH foi expandida para nove substncias carcinognicas

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com a recomendao de no permitir a exposio, por qualquer via. Essa filosofia expressava o consenso de que a exposio ocupacional s substncias qumicas carcinognicas deveria ser controlada (Kraybill; Mehlman, 1977). O princpio admitido era de que a exposio, ainda que em nveis mnimos de concentraes, poderia gerar risco elevado de induo ao cncer, portanto, no haveria nveis seguros de exposio. Em 1972, a lista anual do programa da ACGIH classificou os cancergenos em dois grupos: cancergenos para animais ou para humanos. A partir da dcada de 1980, observou-se grande alterao nos documentos produzidos pela ACGIH quanto ao potencial cancergeno de compostos usados em alguns processos de trabalho. Essa passou a considerar evidncias obtidas em estudos com seres humanos (primariamente epidemiolgicas) e experimentais com animais (primeiramente bioensaios de carcinognese), com grande nfase nos estudos com seres humanos cujos nveis de exposio tenham sido medidos ou estimados para as substncias qumicas ou os processos em considerao. A ordem de preferncia sugerida era: estudos epidemiolgicos de coorte, caso-controle, relato de casos a partir de registros clnicos e estudos epidemiolgicos descritivos (usualmente obtidos de fontes de dados secundrios) (ACGIH, 2001, 2006). A ACGIH (2001) considerou cancergenas as substncias que podem gerar ou potencializar o desenvolvimento de um crescimento desordenado de clulas e recomenda que sejam classificadas nas seguintes categorias: A1 Carcingeno humano confirmado: o agente cancergeno para o ser humano, com base em evidncias de estudos epidemiolgicos. A2 Carcingeno humano suspeito: os dados so conflitantes ou insuficientes para confirmar o agente como cancergeno para o homem, ou seja, o agente cancergeno em experimentos animais nas doses, por via de administrao, em locais, tipos histolgicos, ou por mecanismos considerados relevantes para a exposio de trabalhadores. A notao A2 usada principalmente quando h evidncia limitada de carcinogenicidade em seres humanos e evidncia suficiente de carcinogenicidade nas experincias em animais, com relevncia para os seres humanos. A3 Carcingeno animal confirmado com relevncia desconhecida para seres humanos: o agente cancergeno em experimentos com animais em doses relativamente altas, por vias de administrao, em locais, tipos histolgicos ou por mecanismos considerados no relevantes para a exposio de trabalhadores. Os estudos epidemiolgicos disponveis no confirmam um aumento do risco de cncer em seres humanos expostos. As evidncias disponveis no sugerem que este agente seja um provvel causador de cncer em seres humanos, exceto sob condies excepcionais de via de ingresso no organismo ou de nvel de exposio. A4 No classificvel como cancergeno humano: agentes com suspeita de carcinogenicidade para o ser humano, mas os dados existentes so insuficientes para serem avaliados de forma conclusiva. Estudos in vitro em laboratrio ou estudos com animais no apresentam indicaes de carcinogenicidade suficientes para classificar o agente em uma das outras categorias. A5 No suspeito como cancergeno humano: o agente no suspeito de ser um carcingeno humano, com base em estudos epidemiolgicos bem conduzidos em seres humanos. Os estudos

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dispem de dados suficientes de seguimento, as histrias de exposio apresentam doses suficientemente elevadas e poder estatstico adequado para concluir que a exposio ao agente no representa um risco significativo de cncer para os seres humanos. As substncias para as quais no se dispe de dados sobre carcinogenicidade em seres humanos ou experimentos em animais no devem receber designao quanto carcinogenicidade. Para a ACGIH (2001, 2006), os trabalhadores expostos aos cancergenos A1 no devem estar submetidos a nenhum limite de exposio (Threshold Limit Values TLV), alm de adequadamente protegidos para eliminar toda a possibilidade de exposio. Para os cancergenos A1 com TLV e para os A2 e A3, a exposio dos trabalhadores, por qualquer via de absoro, deve ser cuidadosamente controlada, mantendo nveis to baixos quanto seja possvel, abaixo do TLV. Para a IARC (2006b, p. 5)Um agente denominado como cancergeno se for capaz de aumentar a incidncia de neoplasmas malignos, reduzindo sua latncia ou aumentando sua severidade ou multiplicidade. A induo de neoplasma benigno pode, em algumas circunstncia, contribuir para o julgamento de que um agente cancergeno.

Os termos neoplasma e tumorso usados indistintamente (IARC, 2006b). A avaliao das evidncias de carcinogenicidade obtida a partir de estudos com seres humanos e experimentos em animais. Devem ser realados os dados mecansticos e outras evidncias que sejam relevantes para a avaliao da carcinogenicidade e que tenham importncia suficiente para afetar a avaliao total. Isso inclui dados de leses pr-neoplsticas, patologia de tumores, efeitos genticos e relacionados, relao entre a estrutura e a atividade, metabolismo e toxicocintica, parmetros fsico-qumicos e agentes biolgicos anlogos. Assim, para se chegar a uma avaliao total da carcinogenicidade dos agentes para os seres humanos, considera-se o conjunto das evidncias como um todo. As publicaes da IARC procuram identificar os agentes cancergenos para seres humanos e compreendem revises de todos os estudos epidemiolgicos pertinentes, experimentaes em animais e testes in vitro. Tanto os estudos epidemiolgicos como os realizados em animais apresentam vantagens e desvantagens. Para um agente ser considerado cancergeno para o homem, devem existir substanciais evidncias epidemiolgicas que suportem tal classificao. O conceito epidemiolgico de agentes cancergenos o mais simples, uma vez que a exposio a qualquer agente em que seja observada uma associao causal com aumento da incidncia de tumores permite a categorizao desse agente como cancergeno. Entretanto, esses achados tm de ser encarados com cautela e devem ser complementados com os resultados de estudos experimentais controlados, em animais e clulas que, ao contrrio do mtodo epidemiolgico no qual as informaes advm de observaes, fornecem dados de experimentos controlados, in vivo e in vitro (Klaassen, 2008). A IARC adota como metodologia, para elaborar suas publicaes, a constituio de grupos de especialistas internacionais para produzir consensos do estado da arte das pesquisas. Os consensos

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so divulgados atravs de monografias temticas, servem de referncia para as recomendaes da OMS e adotam como classificao quatro grupos (IARC, 2010), conforme descritos a seguir:

2.3.1. Grupo 1 O agente (mistura) cancergeno para humanosEssa categoria usada quando h evidncia suficiente de carcinogenicidade nos humanos. Excepcionalmente, um agente (mistura) pode ser colocado nessa categoria quando a evidncia em humanos menor do que suficiente, mas h uma suficiente evidncia de carcinogenicidade em experincias com animais e uma forte evidncia, em humanos expostos, de que o agente (mistura) atua atravs de um mecanismo relevante de carcinogenicidade. At dezembro de 2010, existiam 73 substnc